Sei sulla pagina 1di 20

Instituto de Terapia: Famíília, Casal, Comunidade e Indivííduo

RED DE DIÁLOGOS PRODUCTIVOS


2012/2013

Terapia Comunitaí ria: um espaço coletivo de diaí logo e


conversaçoõ es transformadoras

Marilene Grandesso1

Caminante no hay camino


Caminante son tus huellas el camino y nada más
Al andar se hace el camino, y al volver la vista atras
Se ve la senda que nunca se ha de volver a pisar
Caminante no hay camino, se hace camino al andar…
Antônio Machado

Contextualizando
O desenvolvimento de praí ticas criativas de transformaçaõ o social em
contextos desafiadores tem ilustrado que o acaso e a circunstaâ ncia incentivam a
açaõ o inovadora que se daí , muitas vezes, de forma inesperada. Esta eí a
compreensaõ o que tenho do trabalho de Karl Tomm com o que nomeou como
questionamento reflexivo, a praí tica de Tom Andersen com as equipes reflexivas

1
Psicoí loga, Doutora em Psicologia Clíínica, Terapeuta de Famíília, casais e
indivííduos, Terapeuta Comunitaí ria, Fundadora e Coordenadora do INTERFACI –
Insitututo de Terapia: Famíília, Casal, Comunidade e Indivííduo. Coordenadora do
Certificado Internacional em Praí ticas Colaborativas oferecido pelo Interfaci
juntamente com Houston Galveston Institute e Taos Institute, orientadora de
grupos de Praí ticas Narrativas, Porfessora e Supervisora de Terapia de Famíílias e
Casais da Universidade Catoí lica de Saõ o Paulo, membro do Taos Institute, Red de
diaí logos productivos, IFTA, AFTA, ABRATEF e ABRATECOM, autora do livro Sobre
a reconstruct do significado: uma análise epistemological e hermenêutica da
prática clínica.

1
depois compreendidas como processos reflexivos, os diaí logos abertos de Jaakko
Seikkula, e a Terapia Comunitaí ria proposta por Adalberto Barreto, dentre tantos
outros desenvolvimentos. A necessidade cria a ocasiaõ o, o terapeuta ousa e, como
um praí tico reflexivo (Schoö n,1996) favorece o desenvolvimento de sua praí tica. O
impacto da açaõ o criativa, no momento em que se daí , vem do fator surpresa diante
do sentido que emerge como possiblidade inovadora. Algo se processa como
novidade instigadora e esperançosa, convidando para se continuar caminhando
na mesma direçaõ o. Ao proceder desta forma, o terapeuta, como produtor de
conhecimento e como um praí tico reflexivo, coloca em linguagem sua criaçaõ o,
oferecendo a oportunidade de constituir sua descoberta como uma ferramenta
uí til para outras ocasioõ es e outros contextos.
No caso especíífico da Terapia Comunitaí ria Integrativa (TCI) o contexto
generativo veio da demanda de uma populaçaõ o carente de recursos, vivendo em
situaçoõ es de insalubridade. Recursos insuficientes para fazer frente aà s
necessidades baí sicas de atençaõ o aà sauí de, escassos recursos econoâ micos para
permitir moradias de qualidade míínima, poucas oportunidades de emprego,
especialmente para pessoas sem formaçaõ o acadeâ mica baí sica, acabavam gerando
bolsoõ es de pobreza e, junto com isso, formas degradantes e perversas de vida.
Em tais contextos, o uso de aí lcool e outras drogas se propagava em ritmo intenso,
desencadeando a violeâ ncia nas suas mais perversas formas. Este quadro, na
deí cada de 1980 em Fortaleza, na regiaõ o Nordeste do Brasil, uma das capitais
procuradas pela beleza de suas praias e natureza privilegiada, levou Adalberto
Barreto a desenvolver uma forma inusual de trabalho comunitaí rio, junto aà
populaçaõ o da favela de Pirambu. Formada por uma populaçaõ o de migrantes
vindos do interior do estado do Cearaí na ilusaõ o de que uma cidade grande
realizaria o sonho de viver com dignidade, essas pessoas acabavam se
submetendo a uma vida degradante em que sobreviver passava a ser um desafio
constante a ser vencido dia por dia. Coordenador de uma resideâ ncia meí dica na
Universidade Federal do Cearaí , Adalberto desencantou-se com uma praí tica de
psiquiatria tradicional que medicalizava a pobreza e o produto da injustiça social.
Conforme Waldegrave (1990) ressalta, muitos dos problemas que as pessoas
vivem e pelos quais procuram algum tipo de terapia, decorrem das condiçoõ es de
desigualdade e injustiça social do macro-contexto econoâ mico e social. Por outro

2
lado, quando os problemas saõ o muito desafiadores e persistentes, acabam
favorecendo a submissaõ o social, pela qual as pessoas, como os corpos doí ceis que
Foucault (1987) descreve, se conformam aà quilo que naõ o veem como mudar.
Algumas questoõ es instigadoras construííram o contexto generativo para a
TCI como uma praí tica inovadora para esses contextos. Dentre elas:
 Como passar de uma praí tica de caraí ter assistencialista, hierarquizada e
geradora de dependeâ ncia em relaçaõ o ao profissional especialista, para
uma praí tica transformadora e ampliadora das possiblidades existenciais?
 Como mudar o foco do problema para recursos e possibilidades?
 Como fazer circular os conhecimentos adquiridos nos contextos da vida,
reconhecendo-os e legitimando-os como conhecimento local, como saber
que vem “de dentro”, um saber insider?
 Como resgatar os valores culturais e saberes ancestrais construtores de
identidades e formas de vida, tantas vezes ameaçados pelo sofrimento
croâ nico e pela exclusaõ o social?
 Como favorecer a criaçaõ o de víínculos e o fortalecimento de redes
solidaí rias em que as experieâ ncias pudessem ser compartilhadas e uma
identidade coletiva possa fortalecer valores e praí ticas colaborativas?
 Como desenvolver uma praí tica deselitizada, possíível com sistemas
amplos, favorecendo uma transformaçaõ o social que pudesse ser
construíída no coletivo e estendida para contextos mais amplos da
populaçaõ o?
 Como contemplar a complexidade das relaçoõ es humanas, nas suas mais
distintas organizaçoõ es, indo aleí m do domíínio psi, convidando para o
diaí logo discursos muí ltiplos, vindos da antropologia cultural, sociologia,
educaçaõ o e espiritualidade, dentre outra?

Como uma forma de fazer frente a interrogantes como essas, Adalberto


Barreto desenvolveu gradativamente a praí tica da TCI, de forma tal que o caminho
foi sendo construíído ao caminhar. Esta praí tica hoje, espalhada por todo o Brasil e
inserida em distintos contextos e populaçoõ es, tornou-se parte de polííticas
puí blicas praticadas especialmente nos contextos da sauí de e justiça. Ao propor
uma metodologia conversacional que ao socializar os problemas desviava o foco

3
da careâ ncia e deí ficit para competeâ ncias e soluçoõ es coletivas, Adalberto favoreceu
o fortalecimento de indivííduos, comunidades e redes, conforme promovia a
autoria e agenciamento. Como psiquiatra, teoí logo, antropoí logo e terapeuta de
famíílias, Adalberto Barreto imprimiu uma pluralidade de olhares no que diz
respeito aà fundamentaçaõ o teoí rica da TCI – o pensamento sisteâ mico, a
comunicaçaõ o, a antropologia cultural, a pedagogia de Paulo Freire e o conceito de
resilieâ ncia, organizaram a metodologia dessa praí tica que vem sendo proposta
nos cursos de capacitaçaõ o no Brasil e em outros paííses do mundo.

A TCI como uma prática narrativa e colaborativa de conversação


dialógica
Compreendemos a TCI como uma praí tica poí s-moderna críítica (Grandesso,
2009, 2011) organizada por conversaçoõ es dialoí gicas em torno de significados
preferidos que promovem a inclusaõ o e justiça social, construíídas a partir da
legitimaçaõ o da igualdade de geâ nero e etnias, a autodeterminaçaõ o cultural, a
importaâ ncia do espaço comum construíído nas comunidades, o pertencimento e a
espiritualidade (Waldegrave, 1998). Descontruindo o entendimento tradicional
associado ao conceito de terapia, a praí tica da TCI favorece a açaõ o do terapeuta
como um agente de transformaçaõ o social, capaz de favorecer polííticas mais
amplas comprometidas com a eí tica da igualdade e respeito pela dignidade
humana promovidas pelo exercíício do diaí logo.
Muito embora a TCI naõ o se proponha como uma praí tica voltada para a
soluçaõ o de problemas, soluçoõ es acabam decorrendo do poder transformador das
conversaçoõ es num contexto de acolhimento e respeito, conforme organiza-se
para fortalecer as trocas colaborativas numa dimensaõ o propagada por redes
solidaí rias. Ao se trabalhar desta forma em contextos comunitaí rios nos
afastamos da busca por diagnoí sticos de problemas e de teorias da mudança.
Nosso foco gerador eí o significado da experieâ ncia vivida como sofrimento ou
como superaçaõ o e as formas de aprendizado e construçoõ es de recursos que
decorrem de possiblidades reflexivas de ampliaçaõ o de conscieâ ncia (Freire, 1983,
1989, 2002). Em termos bem sinteí ticos, o que buscamos eí o acolhimento do
sofrimento, nas suas mais diversas manifestaçoõ es, e a criaçaõ o de um espaço de
reflexaõ o compartilhada da qual novas alternativas de vida possam ser

4
favorecidas. Quando os temas trazidos saõ o relatos de experieâ ncias de sofrimento,
a TCI promove conversaçoõ es voltadas para açoõ es baí sicas de sauí de comunitaí ria e
educaçaõ o críítica, favorecendo a prevençaõ o, manejo de crises e inserçaõ o social.
Nesse sentido,
Reforçar os vínculos entre as pessoas da comunidade,
mobilizar e valorizar as competências vindas da
experiência, do saber local e da cultura, coloca o
terapeuta comunitário a serviço da consciência social
transformadora que devolve às pessoas a condição de
autoria de sua própria história e sujeito de suas
escolhas. (Grandesso, 2009)

Descrevo a seguir, a partir de um recorte dialoí gico e narrativo, como, a partir


da proposta original de Adalberto Barreto, compreendemos e desenvolvemos
nossa praí tica no contexto de uma polifonia de vozes teoí rico-praí ticas, construíídas
a cada novo encontro com a comunidade. Para fundamentar o que a praí tica da
TCI propoõ e, começo por apresentar os norteadores teoí ricos que teâ m sido uí teis
para organizar e impulsionar sua açaõ o transformadora e naõ o trivial:
 O pensamento sisteâ mico novo paradigmaí tico, convidando a
compreender as relaçoõ es comunitaí rias aà luz da complexidade. Dessa
forma, o pensamento sisteâ mico incentiva o terapeuta comunitaí rio a
ampliar o foco de sua mirada para contemplar a diversidade daquilo
que se apresenta a cada momento tecido junto, conforme diz Morin
(1995, 1996). Esta visaõ o novo paradigmaí tica ressalta tambeí m a
imprevisibilidade presente nas organizaçoõ es humanas – e assim,
colocando-se aberto para o ineí dito e inesperado de cada momento, o
terapeuta comunitaí rio mostra-se sensíível para o emergente no campo
das relaçoõ es comunais e para a linguagem como forma de construçaõ o
de sentido. Como norteador de praí ticas, o princíípio da
imprevisibilidade convida a dar eâ nfase aos processos, mais que aos
conteuí dos. E, um outro princíípio organizador enfatiza a
intersubjetividade presente nas relaçoõ es humanas como formas de
estar no mundo. Ao assumirmos esse princíípio estamos considerando,
portanto, que a açaõ o de um eí constitutiva em relaçaõ o ao outro,
convidando aà responsabilidade relacional, conforme proposta por
McNamee & Gergen (1999);

5
 A Antropologia Cultural, ressaltando a dimensaõ o soí cio-histoí rica que
resgata valores culturais e conhecimento comum desenvolvidos nos
contextos de vida;
 A comunicaçaõ o como organizadora de contextos relacionais como
“açaõ o conjunta”, que, rizomaticamente, constroí i um entendimento
comunal, indo aleí m da linguagem verbal;
 A pedagogia de Paulo Freire que convida aà horizontalidade das
relaçoõ es e ao diaí logo como proposta de transformaçaõ o, valorizando o
saber de cada pessoa, legitimando-a como co-autora dos processos de
mudança especialmente pela ampliaçaõ o de conscieâ ncia pela reflexaõ o e
açaõ o;
 O conceito de resilieâ ncia que, indo aleí m de histoí rias dominantes sobre
os problemas vividos, ilumina as histoí rias de aprendizados e
competeâ ncias decorrentes da vivencia das mais alarmantes situaçoõ es;
 O entendimento da vida humana como sendo organizado pelas
narrativas construíídas na linguagem nos muí ltiplos contextos de vida e
de relaçoõ es (Gergen, 2009). Conforme entende que a vida eí
multihistoriada e que as narrativas organizam a experieâ ncia (White &
Epston, 1990; White, 2007) a TCI convida para a construçaõ o de
histoí rias de competeâ ncias, a partir do relato de experieâ ncias de
descobertas e aprendizados em situaçoõ es do cotidiano;
 As praí ticas de conversaçaõ o dialoí gica que constroem um espaço de
acolhimento da alteridade, pelo exercíício da escuta generosa, proí pria
dos espaços de confiança e de exercíício da autoria (Anderson, 2007;
Hoffman, 2007).

A equipe INTERFACI vem desenvolvendo essa praí tica de conversaçaõ o


propositada que favorece a criaçaõ o de redes solidaí rias, mobilizando os recursos e
competeâ ncias das pessoas, famíílias e comunidades, suscitando a dimensaõ o
transformadoras das conversaçoõ es e das comunidades, desde o ano de 2000.
Atualmente, estamos envolvidas num trabalho junto a uma instituiçaõ o de sauí de,
que atende a uma populaçaõ o de usuaí rios de drogas e suas famíílias.

6
A metodologia conversacional desenvolvida na TCI
A TCI se organiza a partir de uma metodologia compreendida por cinco
etapas distintas que orientam conversaçoõ es propositadas: acolhimento, escolha
do tema, contextualizaçaõ o, problematizaçaõ o e rituais de encerramento. Antes de
apresentaí -las aqui, gostaria de ressaltar que por um bom tempo me questionei se
poderia uma conversaçaõ o apresentar-se como dialoí gica e, ao mesmo tempo, ser
estruturada em etapas. Se compreendemos o diaí logo como um processo em
aberto, do qual nenhuma pessoa eí proprietaí ria, e cujo caminho naõ o se pode
prever, uma conversa cujas etapas pudessem ser mudadas pelo terapeuta
poderia parecer naõ o compatíível com uma postura dialoí gica. Como justificar a
passagem de uma etapa para outra sem que isso significasse um fechamento para
uma construçaõ o do diaí logo, no qual o movimento e direçaõ o saõ o construíídos a
partir de dentro da proí pria conversa? As respostas que me ajudaram a construir
um entendimento satisfatoí rio decorreram da revisitaçaõ o da proposta de nossa
praí tica. A TCI eí destinada a promover um espaço de conversaçaõ o com pequenos,
meí dios e grandes grupos. Faz parte de minha experieâ ncia com a TCI, mesmo que
tenha sido exceçaõ o, a conduçaõ o de rodas com grandes grupos – 250, 450 e 1400
participantes. O sucesso dessas praí ticas, no meu entender, deveu-se justamente aà
orientaçaõ o de uma metodologia organizada em etapas. Poder convidar uma
comunidade para estar em conversaçaõ o, apresentar seus dilemas e problemas,
compartilhar suas experieâ ncias de sucesso e processar a experieâ ncia vivida
atraveí s de uma reflexaõ o compartilhada, exige uma habilidade de conduzir o
processo enquanto deixa o conteuí do aberto em torno dos propoí sitos da
conversa. Este eí exatamente o papel do terapeuta comunitaí rio: cuidar do
processo de tal forma que as individualidades sejam respeitadas e o sentido de
comunidade possa ser tecido vivencialmente. Como uma praí tica poí s-moderna, a
conversaçaõ o na roda de TCI eí construíída num entrelaçamento entre perguntas e
respostas, sendo de responsabilidade compartilhada entre todos os
participantes. O tema organizador da conversaçaõ o, nos bons moldes Freireanos,
surge e eí escolhido pelo proí prio grupo. Na busca da compreensaõ o do tema
escolhido, toda a comunidade presente pode fazer perguntas. A contextualizaçaõ o
do tema escolhido decorre da viveâ ncia da pessoa que protagoniza a conversa e, a

7
ampliaçaõ o das possiblidades de vida decorrem de uma grande partilha de
experieâ ncias de eâ xito, que organizam um menu de alternativas de sucesso
convidando cada participante a revisitar suas histoí rias de competeâ ncias. A
principal habilidade do terapeuta comunitaí rio consiste em transitar pelas etapas
dessas praí ticas como se estivesse numa dança de coreografia harmoniosa e
esteí tica que fizesse deslizar os passos sem rupturas e que todos os envolvidos
pudessem sentir-se confortaí veis e envolvidos na dança.

As etapas da TCI
A proposta original de Adalberto Barreto eí composta de cinco etapas a saber:
1. Acolhimento
2. Escolha do tema
3. Contextualizaçaõ o
4. Problematizaçaõ o
5. Rituais de Encerramento
Obviamente, toda praí tica tem as marcas dos envolvidos no seu
desenvolvimento e, portanto, reserva espaço para a singularidade dos
participantes em questaõ o. Mas, em linhas gerais, a TCI apresenta uma
simplicidade enquanto proposta e uma efetividade para orientar uma
conversaçaõ o com pequenos e grandes grupos, favorecendo a construçaõ o de um
espaço de confiança para a partilha de experieâ ncias num domíínio puí blico. Sua
habilidade como construir espaços de diaí logo contudo, demanda uma açaõ o
coordenada para conduzir um processo com começo, meio e finalizaçaõ o de forma
produtiva. Essa tarefa naõ o eí trivial. Promover o diaí logo exige a orquestraçaõ o dos
participantes envolvidos. E, fazer isso em grandes grupos, coloca um desafio
adicional de cuidar das pessoas em si e da comunidade como um coletivo.
Descrevo a seguir como temos realizados essas etapas de acordo com a proposta
original, a postura colaborativa e dialoí gica e o enfoque narrativo.

1. Acolhimento
Como toda praí tica colaborativa, a TCI pressupoõ e um acolhimento
hospitaleiro em que todos possam se sentir anfitrioõ es. Qualquer espaço fíísico em
que as pessoas possam estar confortaí veis, lugares em que as pessoas vivem ou

8
frequentam, desde que permitam estar olhos nos olhos, pode construir o espaço
conversacional. Um ambulatoí rio de atendimento em uma instituiçaõ o, uma escola,
uma associaçaõ o de bairros, uma igreja, uma penitenciaí ria, um clube, uma praça
puí blica, enfim, qualquer lugar em espaços puí blicos ou privados pode oferecer o
contexto para essa praí tica. Assim, ao inveí s de deslocar as pessoas para espaços
naõ o habituais, a roda de conversa da TCI pode ser realizada onde as pessoas
costumeiramente vivem, aumentando a chance de participaçaõ o.
As boas vindas podem ser dadas com o auxíílio de muí sicas trazidas ou criadas
pela comunidade. O enfoque narrativo incentiva transformar este espaço numa
envolvente cerimoâ nia de definiçaõ o (White, 2007) em que os participantes
possam ganhar visibilidade para suas histoí rias de realizaçoõ es, atraveí s da
legitimaçaõ o da comunidade. Aquela realizaçaõ o que permaneceria na obscuridade
pode ganhar reconhecimento e importaâ ncia no contexto comunitaí rio. Isto
favorece a incorporaçaõ o de habilidades e competeâ ncias na construçaõ o das
histoí rias das identidades individuais ou coletivas. A recuperaçaõ o de uma doença,
o nascimento de um filho, o aniversaí rio de algum membro da famíília, o encontro
de um emprego, um tempo mais de abstineâ ncia de drogas, enfim, os mais
diversos feitos teâ m um espaço de apreciaçaõ o e reconhecimento, favorecendo a
incorporaçaõ o de uma visaõ o mais apreciativa de si proí prio e dos outros. Dizer seu
nome, o que gostaria de celebrar e receber o reconhecimento coletivo favorece
sair da clandestinidade enquanto aprecia suas proí prias realizaçoõ es (Gergen,
2009). Uma muí sica ou uma poesia podem selar esse momento promovendo um
envolvimento coletivo numa emoçaõ o de apreço. EÉ uma hora tambeí m de
descontraçaõ o na qual brincadeiras e jogos populares de curta duraçaõ o ajudam a
construir um clima de confiança, necessaí rio para facilitar as etapas seguintes.

2. Escolha do Tema
Orientado pela metodologia de Paulo Freire (1983; 1989; 2002), o tema
organizador da conversaçaõ o eí escolhido pelo grupo a partir das propostas
trazidas pelas pessoas presentes. Assim, no exercíício da horizontalidade das
relaçoõ es, significados compartilhados acabam sendo oportunizados como portas
de entrada para o diaí logo entre as pessoas presentes. As pessoas

9
individualmente apresentam seus temas de interesse e a comunidade elege o que
mais lhe toca no momento.
Para começar, convidamos as pessoas a estruturarem um contexto de
confiança para auto-exposiçaõ o atraveí s do acordo coletivo sobre alguns
orientadores da conversaçaõ o. Apresentados como regras conversacionais, as
pessoas legitimam ou propoõ em outras formas de atençaõ o ao processo. Dentre
elas costumamos propor:
 Falar no primeira pessoa – eu - de modo a favorecer a autoria das suas
colocaçoõ es e para trazer para bem perto da experieâ ncia vivida. Assim,
saõ o preferidos os relatos bem pessoais, naõ o os abstratos sobre
conceitos ou ideologias geneí ricas. Uma preocupaçaõ o, um dilema ou
duí vida, uma situaçaõ o de sofrimento, ou mesmo uma conquista
significativa e transformadora . enfim, algum relato que venha de
dentro do vivido;
 Fazer sileâ ncio para favorecer uma escuta respeitosa do outro. Nossa
cultura brasileira eí bastante falante e entusiaí stica. Portanto, para que
uma pessoa possa ser ouvida e uma escuta generosa incentivada,
temos que construir esse espaço de forma cuidadosa. Se o grupo for
muito numeroso, faz-se necessaí rio o uso de microfones que possam
promover a conexaõ o entre as pessoas a partir da escuta;
 Ouvir para compreender o outro e sua experieâ ncia, portanto, naõ o
julgar, naõ o interpretar e, muito menos ainda, criticar. Essa eí uma
condiçaõ o necessaí ria para que as pessoas sintam confiança para falar
de suas questoõ es pessoais, muitas vezes taõ o difííceis de se expor, num
contexto puí blico.
 Convidar as pessoas a assumirem o compromisso quanto ao que
querem partilhar e ao quanto querem tornar aberto na roda de
conversa. Como se trata de um contexto comunitaí rio, e, portanto,
puí blico, solicitamos que guardem seus segredos e privacidades
maiores que naõ o lhes pareça convenientes para este tipo de exposiçaõ o.
Da mesma forma, cada participante, protagonista num dado momento,
pode decidir se lhe parece desejaí vel e conveniente responder a alguma
pergunta. Se uma pergunta da comunidade convidar o participante a ir

10
para um lugar de exposiçaõ o que lhe pareça inconveniente, ele(a)
poderaí naõ o responde-la.
 Naõ o dar conselhos. O conselho pressupoõ e que uma pessoa possa saber
o que eí melhor para a outra. EÉ , portanto, hieraí rquico. A TCI se propoõ e
como uma conversa dialoí gica e, assim, pressupoõ e que se fale um com o
outro e naõ o para o outro numa genuíína relaçaõ o withness (Hoffman,
2007).
 Compartilhar trechos de muí sicas, poesias, piadas, histoí rias e
proveí rbios que tenham a ver com o que estaí sendo conversado. Esta eí
uma forma de construir uma força contextual de acolhimento e
compreensaõ o. A muí sica pode ser usada como uma metaí fora
favorecendo um sentido de intimidade e conexaõ o. As pessoas se
irmanam e saõ o solidaí rias nas cançoõ es.
 Explicitando ainda o que foi mencionado acima, se alguma pergunta
lhe parecer indevida ou gerar algum desconforto, a pessoa pode se
permitir o direito de naõ o respondeâ -la.

Enfim, essas regras organizadoras da conversaçaõ o saõ o oferecidas como formas


de cuidado para que a confiança possa surgir. Originalmente, elas surgiram da
proí pria comunidade. Como as rodas de TCI saõ o abertas aà participaçaõ o, estamos
sempre com um novo grupo a cada encontro. Assim, como acordos
conversacionais, essas regras saõ o sempre propostas para aprovaçaõ o ou mudança,
no sentido de retirada ou proposiçaõ o de novos acordos. Contudo, nestes 13 anos
de praí tica, as distintas comunidades com as quais temos trabalhados tem
considerado esses acordos como uí teis para cuidar das conversaçoõ es em espaços
puí blicos. A explicitaçaõ o desses acordos tem permitido tambeí m a construçaõ o de
um contexto de responsabilidades compartilhadas entre os(as) participantes
presentes. Todos(as) tornam-se responsaí veis por cuidar do processo.
Costumamos usar alguns dizeres para incentivo, tais como “quando a boca cala, o
corpo fala”; “este eí um espaço para se falar e ser compreendido”; “todos noí s
buscamos momentos especiais em que possamos nos sentir compreendidos”,
enfim... cada terapeuta comunitaí rio(a) constroí i um caminho para convidar a
participaçaõ o.

11
Uma vez estabelecido os acordos sobre a organizaçaõ o, a roda de TCI começa
solicitando aos participantes que apresentem o tema sobre o qual gostariam de
falar, dizendo o seu nome e, sucintamente, o que gostaria de estar
compartilhando. Naõ o se trata de narrar a situaçaõ o vivida, mas, simplesmente
nomeaí -la incluindo sobre o que gostaria de falar e por que. O(a) terapeuta
certifica-se de seu entendimento a cada proposta apresentada, numa espeí cie de
ritual de compreensaõ o e anota o nome da pessoa e o tema que ela propoâ s.
Levantados os temas, organizamos um momento de construir conexoõ es em torno
de significados compartilhados. Para isso a(o) terapeuta leâ os temas propostos,
com eâ nfase nos temas e naõ o na pessoa que o propoâ s e pede aos participantes que
os escutem, de modo a poder ser tocado por eles. A seguir o terapeuta pede aà s
pessoas que quiserem que apresentem qual dos temas lhes foi mais tocante e por
queâ . Esse momento favorece a construçaõ o de uma trama de significados comuns
que, embora surja do grupo, abrace toda a comunidade presente numa dimensaõ o
de coletividade. As pessoas vaõ o se organizando em torno dos significados
preferidos, favorecendo a escolha de um tema significativo para a conversa do
dia. A partir daíí procede-se aà seleçaõ o do tema que central aà conversaçaõ o do dia,
por votaçaõ o, sendo que cada participante pode votar somente uma vez.
Depois de agradecer aà s pessoas que naõ o tiveram seus temas escolhidos e de
abrir espaço para se falar sobre eles no final, caso sintam algum desconforto, o
terapeuta passa para a proí xima etapa.

3. Contextualização
Nesta etapa solicitamos aà pessoa que teve seu tema escolhido que o apresente
ao grupo. Em linhas gerais sugerimos e fazemos perguntas de modo a favorecer a
compreensaõ o de como esse problema eí um problema para a pessoa e por que. Ou
seja, o foco do entendimento que se procura estaí no significado da viveâ ncia do
problema para a pessoa, e naõ o, no entendimento do problema em si. A
comunidade eí tambeí m incentivada a fazer perguntas nessa mesma direçaõ o.
Esta etapa termina quando o terapeuta considera ter alcançado um
entendimento do problema escolhido, o que se estabelece em comum acordo
com a pessoa que o apresentou e que ocupa o centro da conversaçaõ o do dia.

12
O disparador para passagem para a proí xima etapa eí a elaboraçaõ o de uma
pergunta reflexiva a partir da contextualizaçaõ o do tema escolhido que serviraí de
contexto para a partilha de experieâ ncias do grupo. Chamamos de mote a essa
pergunta geradora. O mote pode seguir distintos modelos. Pode ser um mote
coringa, ou seja, aquele que se aplica para qualquer que seja o tema
contextualizado. Um exemplo de um mote coringa poderia ser – “Quem jaí viveu
uma situaçaõ o semelhante e como fez para fazer frente a ela?”. Tambeí m podemos
formular um mote especíífico que eleja como contexto de reflexaõ o o significado da
vivencia contextualizada no dia. Por exemplo, se o tema escolhido tivesse sido a
viveâ ncia de experieâ ncias de abandono, um mote especíífico poderia ser – “Quem
jaí viveu a dor do abandono e o que lhe ajudou a superaí -la?”. Podemos tambeí m
usar um mote metafoí rico cuja questaõ o proposta para reflexaõ o eí estruturada
simbolicamente, dando espaço para a partilha de uma variedade de experieâ ncias
distintas. Como exemplo, considere-se que um tema tenha apresentado relatos de
viveâ ncias de perplexidade e desnorteamento. Um mote simboí lico possíível
poderia ser – “Quem jaí se sentiu como uma vidraça/janela estilhaçada e como fez
para se recompor? Enfim, qualquer que seja a sua forma, o mote eí construíído
para convidar a comunidade a compartilhar experieâ ncias de sucesso, de
superaçaõ o, de aprendizagens e transformaçoõ es significativas na sua vida e visaõ o
de si mesma. Esses relatos oferecem tambeí m a oportunidade para a construçaõ o
de significados comunais em torno de valores de colaboraçaõ o, respeito e
legitimaçaõ o de cada pessoa como autora de histoí rias de competeâ ncias. Nascido
de ressonaâ ncias possííveis a partir da conversaçaõ o em torno do problema
escolhido, conveí m assinalar, ainda, que o mote surge a partir da habilidade do
terapeuta em gerar uma compreensaõ o compartilhada, ressaltando um significado
implíícito na histoí ria relatada durante a contextualizaçaõ o do tema escolhido.

4. Problematização
Depois de agradecer aà pessoa que estava no centro da contextualizaçaõ o, o
terapeuta solicita que ela se coloque num lugar perifeí rico, de escuta livre e
descompromissada das narrativas que viraõ o a seguir a partir dos relatos da
comunidade. Esta eí uma forma de protege-la de entrar numa vivencia pedagoí gica
como se a experieâ ncia do outro devesse ser assimilada para si. Naõ o se trata de

13
uma situaçaõ o instrutiva. A seguir apresenta-se o mote – pergunta geradora. Como
toda pergunta, o mote abre um espaço para um horizonte possíível de respostas.
O importante eí que o terapeuta ajude a iluminar as competeâ ncias, os
aprendizados, os valores e os propoí sitos de vida dos que compartilham suas
histoí rias, atraveí s de perguntas que convidem a narrativas de sucesso. EÉ como se
fizeí ssemos uma grande colheita de recursos e sabedorias da comunidade. Dada a
funçaõ o generativa da linguagem, ao ouvir a experieâ ncia do outro sobre suas
descobertas, aprendizados e competeâ ncias, cada pessoa, naõ o apenas a que teve
seu problema escolhido, pode resgatar suas memoí rias de vivencias de sucesso,
construindo narrativas organizadoras de uma visaõ o apreciativa de si mesma, de
suas relaçoõ es e circunstaâ ncias.
Geralmente a problematizaçaõ o ocupa o maior tempo da TCI. Conforme a
proposta dessa praí tica, o tema trazido por uma pessoa e escolhido por seu
interesse para o grande grupo, ao ser contextualizado, favorece a proposiçaõ o de
uma pergunta reflexiva em que toda a comunidade presente traga suas histoí rias
de competeâ ncias e aprendizados. Apresenta-se assim, um contexto
extremamente rico para a construçaõ o de histoí rias preferidas de autoria, histoí rias
sobre competeâ ncias e possibilidades. Aleí m disso, tomando como refereâ ncia as
praí ticas narrativas, o relato das histoí rias diante de uma comunidade acolhedora
configura-se como uma espeí cie de cerimoâ nia de definiçaõ o (White, 1997; 2007),
dando visibilidade aos narradores que de outra forma permaneceriam no
anonimato de suas vidas, permitindo-lhes ser legitimados como pessoas
competentes, reconhecidas por tantas “testemunhas externas” ali presentes que
podem ouvir, acolher e reconhecer seus relatos.

5. Rituais de Encerramento
Para finalizar, geralmente costumamos pedir aos membros da comunidade
presente que façam um cíírculo num pequeno movimento de embalo, bem suave,
que metaforicamente convide a colocar eâ nfase na força da comunidade como
lugar de pertencimento e acolhimento. EÉ uma hora de refletir sobre a experieâ ncia
vivida na roda de TCI do dia. O terapeuta pode fazer um pequeno editorial do que
lhe tocou no que viu e ouviu na roda do dia e agradecer aos que compartilharam
sua experieâ ncia. A seguir, inspirado na metodologia freiriana de açaõ o-reflexaõ o,

14
convida o grupo a compartilhar o que foi tocante na roda de TCI do dia, o que
aprendeu, o que apreciou, que diferença fez participar deste diaí logo comunitaí rio.
Finalizamos a roda com uma muí sica ou outra forma mais pessoal de relaçaõ o.
Durante todas as etapas a muí sica pode se fazer presente, trazida por algum
membro da comunidade, ou mesmo pelo terapeuta. No ritual de encerramento,
as cançoõ es permitem estreitar as relaçoõ es pelo clima afetuoso que se instala,
favorecendo a construçaõ o de um coro de vozes irmanadas na emoçaõ o.
Um aspecto curioso que observamos, no final e a partir das rodas de TCI, eí a
mobilizaçaõ o espontaâ nea das pessoas procurando umas aà s outras para
compartilhar alguma experieâ ncia, perguntar alguma coisa em especíífico, na
organizaçaõ o e fortalecimento de redes dentro de redes.
A TCI pode ser optimizada em seu alcance atraveí s da elaboraçaõ o de
documentos coletivos, compartilhando a experieâ ncia da comunidade com outras
pessoas, suas instituiçoõ es ou outros grupos comunitaí rios. A palavra escrita em
forma de documento narrando experieâ ncias de superaçaõ o ajudam a dar
visibilidade e permaneâ ncia aos relatos de habilidades e competeâ ncias,
favorecendo a construçaõ o de uma visaõ o mais apreciativa sobre pessoas,
comunidades e perspectivas de futuro. As redes solidaí rias que vaõ o sendo
espontaneamente ativadas ajudam a levar adiante propoí sitos comuns e a
potencializar recursos pela açaõ o coordenada entre os membros da coletividade.

Considerações finais
A praí tica da Terapia Comunitaí ria, conforme aqui apresentada, configura-
se como um contexto de ampliaçaõ o da conscieâ ncia críítica sobre os dilemas
existenciais e as condiçoõ es e possibilidades da existeâ ncia, nos moldes que Freire
(Freire & Faundez, 1998) considera necessaí rios para a transformaçaõ o da histoí ria.
Como toda praí tica de terapia poí s-moderna, a pessoa do terapeuta estaí implicada
no processo que estaí sendo conduzido. Assim, cada pessoa, participante da
Terapia Comunitaí ria se coloca como especialista na suas histoí rias de dor e de
superaçaõ o e resilieâ ncia. Quanto aà (ao) terapeuta, esta(e) se apresenta como um(a)
organizador(a) da conversaçaõ o, um(a) especialista, se assim pudermos dizer, na
organizaçaõ o do processo de diaí logo generativo (Anderson & Goolishian, 1988;
Schnitman, 2008). Sua competeâ ncia, da mesma forma que em outras praí ticas

15
poí s-modernas, estaí em organizar o contexto de conversaçaõ o e em cuidar do
sistema-comunidade, para que as relaçoõ es, de acordo com o arranjos
conversacionais aceitos, se restrinja ao compartilhar de histoí rias vividas, tanto as
de sofrimento, como e, especialmente, as de competeâ ncias e aprendizados,
permitindo dar visibilidade para as formas de vida que as pessoas encontraram
de ampliar suas possiblidades. Esta espeí cie de açaõ o situada num contexto
comunitaí rio, favorece as possibilidades de validaçaõ o e legitimaçaõ o de cada
pessoa que usa desse espaço diante de testemunhas externas (White, 1997;
2007; Grandesso, 2006) abertas para escutaí -la respeitosamente e a favorecer seu
processo de troca e de reflexaõ o generativa.
Um dos aspectos que se destacam nos sistemas que se organizam nos
espaços de Terapia Comunitaí ria, especialmente quando conduzida com
populaçoõ es carentes, eí a centralidade de certas condiçoõ es de sofrimento.
Pobreza, violeâ ncia, injustiças decorrentes de situaçoõ es de discriminaçaõ o,
preconceito, desigualdade e exclusaõ o social aproximam as pessoas construindo
certas formas de relaçoõ es de intimidade. Embora muitas vezes jamais tenham se
visto antes, as pessoas se unem de modo solidaí rio, conforme se reconhecem
umas nas falas das outras, em histoí rias vividas naõ o apenas de sofrimento, mas
tambeí m de luta e superaçaõ o. Histoí rias ouvidas nestes contextos, embora sejam
de outras pessoas, remetem aà s histoí rias pessoais de cada um(a), numa condiçaõ o
de reflexaõ o que permite a ressignificaçaõ o da experieâ ncia vivida, da visaõ o de si
mesmo(a) e das perspectivas futuras. Embora cada pessoa seja uí nica, e da
mesma forma o seu sofrimento, as ressonaâ ncias e a compaixaõ o permitem a cada
participante se conectar com suas proí prias histoí rias, podendo colocar em
linguagem, as narrativas sobre o vivido, possibilitando a ampliaçaõ o da
conscieâ ncia críítica sobre sua condiçaõ o, seu contexto e suas possibilidades.
Da mesma forma, as competeâ ncias dos outros presentes nas histoí rias
narradas sobre superaçoõ es e experieâ ncia acumulada nos contextos de
adversidades e oportunidades presentes no cotidiano da vida, permitem a cada
presente reconhecer e nomear tambeí m as suas. Este contexto pode ser
compreendido como de aprendizagem social pela troca de experieâ ncias entre
pares num sentido Vygotskyniano do termo. Podemos dizer que nomear uma
situaçaõ o como um problema eí o primeiro passo na busca de possibilidades de

16
mudança. Da mesma forma, se pudermos reconhecer uma açaõ o ou postura de
vida como competeâ ncia, poderemos usaí -la como uma ferramenta para contextos
de necessidades futuras. Aqui temos toda uma fundamentaçaõ o teoí rico-
epistemoloí gica possíível sobre a construçaõ o do self, dotado de ageâ ncia e da
possiblidade de fazer escolhas nos contextos das relaçoõ es. Quando a comunidade
acolhe de forma respeitosa as histoí rias compartilhadas, reconhece cada
participante como um legíítimo outro, como diz Maturana. Da mesma forma, as
perguntas reflexivas e comentaí rios compartilhados, permitem a construçaõ o de
autobiografias com protagonistas mais competentes e cheio de possibilidades, jaí
reconhecidos diante de muitas testemunhas, ali presentes. Esta eí uma funçaõ o
extremamente rica do contexto comunitaí rio para construçaõ o da mudança – cada
participante ao compartilhar suas histoí rias pode construir novas versoõ es de si
mesmo, de re-autoria de sua vida e suas possibilidades futuras.
Assim sendo, esta praí tica de terapia pode ser compreendida como
facilitadora para a construçaõ o de novas autobiografias, de protagonismo
competente, conforme favorece a troca entre um eu-singular e um tu–
comunitário, favorecendo, portanto, a passagem do eu para o nós. Histoí rias naõ o
soí de sofrimentos, mas tambeí m de competeâ ncias trazidas pelos participantes da
Terapia Comunitaí ria, principalmente durante a Contextualizaçaõ o e
Problematizaçaõ o, saõ o acolhidas numa atitude de legitimaçaõ o, solidariedade,
respeito e compaixaõ o, construindo um contexto para que cada pessoa possa ser
reconhecida como um ser humano de valor, independente de sua origem e suas
circunstaâ ncias. A TCI como uma abordagem dialoí gica, nesse sentido, funda-se na
crença de que cada pessoa pode transformar a sua histoí ria e que a mudança
decorre da organizaçaõ o da comunidade em linguagem e diaí lgo, nas trocas sociais
entre o eu e o outro em contextos de construçaõ o coletiva de possibilidades de
vida.

Referencias Bibliográficas

Anderson, H. (2007). The heart and spirit of collaborative therapy: the


philosophical stance – “A way of being” in relationship and conversation. In H.

17
Anderson & D. Gehart Collaborative therapy: realtionships and conversations that
make a difference. New York: Routledge, Taylor & Francis Group, p. 43-59,.

Anderson, H. & Goolishian, H. (1988). Human Systems as linguistic system:


preliminary and evolving ideas about the implications for clinical theory. Family
Process, 27:371-393.

Foucault, M. (1987) Vigiar e Punir - História da Violência nas Prisões


Petroí polis: Vozes.

Freire, P. (1983). Pedagogia do oprimido. Saõ o Paulo: Paz e Terra.

Freire, P. (1989). Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

Freire, P. (2002). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática


educativa. Saõ o Paulo: Editora Paz e Terra S/A.

Freire, P. & Faundez, A. (1998). Por uma pedagogia da pergunta. Rio de


Janeiro: Paz e Terra..

Gergen, K. J. (2009). Relational being: beyond self and community. Oxford:


University Press.

Grandesso, M. (2005). Terapia comunitária: contexto de fortalecimento de indivíduos,


comunidades e redes. Família e comunidade, v, 1, n. 2, pp. 103-113.

Grandesso, M. A. (2006). Famíília e narrativas: histoí rias, histoí rias e mais histoí rias.
In C. M. de O. Cerveny (Org.) Família e... II. Saõ o Paulo: Casa do Psicoí logo, PP. 13-30.

Grandesso, M. (2009). Terapia comunitaí ria: uma praí tica poí s-moderna críítica:
consideraçoõ es teoí rico-epistemoloí gicas. Nova perspectiva sistêmica, Ano XVIII,
33 : 53-63.

18
Grandesso, M. Terapia Comunitária Integrativa e Terapia Narrativa: Ampliando
possibilidades (2011). In M. H. Camarotti, T. C. G. de P. Freire & A. de P. Barreto
(Orgs.), Terapia Comunitária Integrativa sem fronteiras: Compreendendo suas
interfaces e aplicações. Brasília: MISMEC-DF, pp. 196-224.

Hoffman, L. (2007). The art of “withness”: a new bright edge. In H. Anderson & D.
Gehart Collaborative therapy: realtionships and conversations that make a
difference. New York: Routledge, Taylor & Francis Group, p. 63-79, 2007

Morin, E. (1995). Introdução ao pensamento complexo. Lisboa: Instituto Piaget.

Morin, E. (1996). Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

Schnitman, D, F. (2008), Generative inquiry in therapy: from problems to


creativity. At Sungiman, T; Gergen, K. J.; Wagner, W. and Yamada, Y. (eds.),

Meaning in Action. Constructions, Narratives and Representations. Japan:
Springer, 73-95.

Schoö n, D. (1996). La crisis del conocimiento profesional y la buí squeda de una


epistemologíía de la praí ctica. In M. Pakman (Org.), Construcciones de la
experiencia humana (pp. 183-212). Vol. I, Barcelona: Gedisa.

Waldegrave, C. (1990). Just Therapy. Dwlwich Centre Newsletter: 1. pp. 5-42.

Waldegrave, C. (1998). The challenges of culture to Psychology and Postmodern


thinking. In M. McGoldrick (Ed.) Re-visioning family therapy: race, culture, and
gender in clinical practice. New York: Guilford Press, pp. 404-413.

White, M. (2007). Maps of narrative practice. York: W. W. Norton &


Company, Inc., 2007.

White, M. & Epston, D. (1990). Narrative means to therapeutic ends.


New York: W. W. Norton & Company, Inc.

19
20

Potrebbero piacerti anche