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Movimento Indígena

APRENDENDO COM A EXPERIÊNCIA


Subsídio para o debate sobre as perspectivas do movimento indígena e sua
articulação nacional
I - Contexto histórico.
A década de 70 marca o início de uma ampla articulação dos povos indígenas, impulsionada a
partir das Assembléias indígenas que começaram a se realizar em diferentes partes do país, apoiadas
pelo Cimi. Desse diálogo entre os povos indígenas ficou evidente a semelhança dos problemas que
enfrentavam como o esbulho de suas terras, as invasões, a violência, o desrespeito à diversidade
cultural e o descaso do governo.
O eixo das lutas do movimento indígena para além das suas aldeias passou a ser a terra. Esse
eixo mobilizador funcionou como elo de unidade do movimento, que de acordo com as distintas
realidades foi estimulando a criação de variados instrumentos de luta e níveis diferentes de organização.
A passagem, em 1980, das Assembléias Indígenas diretamente para a criação de um
instrumento de luta nacional – a UNI (União das Nações Indígenas) mostrou-se um equívoco após
alguns anos. Sem os pés fincados na realidade concreta dos diferentes povos, ficou à margem do
movimento indígena que ia sendo construído em termos locais e regionais e por isso foi deslegitimada
como instância interlocutora dos povos indígenas em termos nacionais.
As memoráveis conquistas constitucionais em 1988 foram fruto da força do movimento indígena
articulado em termos locais e regionais, com o apoio de aliados na sociedade brasileira. Estas
conquistas animaram a bases indígenas que foram construindo diferentes instrumentos de luta para
assegurar esses direitos. Articulações e organizações de lideranças, professores, agentes de saúde,
mulheres e estudantes indígenas proliferaram país afora.
Muitos povos que mantinham sua identidade oculta voltaram a se assumir como indígenas,
terras foram retomadas e os índios residentes nas cidades começaram a se manifestar, fazendo com que
as estatísticas populacionais que acusavam 100.000 índios em 1970, passassem a registrar hoje um
considerável aumento, estimando a população indígena em 510.000 pessoas.
Essas conquistas são ainda mais significativas por serem resultado de lutas concretas do
movimento indígena contra o latifúndio e a política anti-indígena oficial.
Aprovada a Constituição, que atribuiu a responsabilidade principal na demarcação das terras e
na proteção dos bens indígenas à União, delegando ao Congresso Nacional questões importantes como
a autorização para a mineração e construção de hidrelétricas, e a feitura de uma Lei Complementar
dispondo sobre o relevante interesse público da União nas terras indígenas, muitas coisas em relação a
questão indígena passaram a ser decididas em Brasília.
No contexto pós constituinte, portanto, a questão nacional ganhou relevância ainda maior,
reabrindo novamente o debate sobre a forma do movimento indígena ocupar seu espaço nesse nível.
A mobilização indígena de 1992, que também aprovou um documento com as propostas do
movimento indígena para o Estatuto dos Povos Indígenas, teve como tarefa viabilizar uma instância
nacional. Os representantes indígenas apontaram duas maneiras para se organizarem nesse nível:
1. Um conselho de articulação composto por representantes dos povos e organizações indígenas,
facilitadora do intercâmbio de experiências que se reuniria em Brasília periodicamente e
promovia uma distribuição de tarefas;
2. Uma Coordenação Executiva eleita, com escritório montado.
Tendo presente a experiência da UNI, avaliada como uma organização que construiu um grande
chapéu de palha, mas sem os esteios para sustentá-lo, os integrantes da mobilização indígena, optaram,
por ampla maioria, pela primeira proposta, tanto assim que o nome escolhido foi "Conselho de
Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil".
As primeiras reuniões do Conselho, que incluíam representantes indígenas de todo país,
buscaram concretizar as expectativas da mobilização e fez um esforço muito grande para apoiar as lutas
concretas das comunidades indígenas.
Em dado momento, com a finalidade de facilitar a articulação, o Conselho resolveu delegar para
uma Comissão menor o seu papel. A partir desse momento, houve um distanciamento das bases,
favorecendo para que posições individuais prevalecessem sobre a vontade coletiva. O Capoib passou
então a reproduzir, de outra maneira, a experiência frustrada da UNI. Foi proposta inclusive uma
mudança no estatuto para que o Capoib adotasse a proposta que foi rejeitada em 1992.
A crise do Capoib se agravou na Marcha e Conferência Indígena 2000, quando seus
representantes articularam uma proposta, que soou como uma traição, no contexto das manifestações
triunfalistas oficiais, para a esmagadora maioria das lideranças indígenas presentes. Desde então o
Capoib se desarticulou por completo e o seu nome passou a ser usado por pessoas que não foram
indicadas pelo movimento indígena.
A Conferência Indígena 2000 também revelou que o Capoib estava falando uma língua que não
estava sendo entendida por suas bases e que nem sempre era a expressão da vontade das
comunidades indígenas.
A Pós Conferência realizada em Pernambuco, avaliando essas dificuldades do movimento
indígena resolveu deslegitimar o Capoib como instância nacional, até que não houvesse uma ampla
discussão a respeito. Criou uma Comissão articuladora integrada por dois representantes indígenas por
Estado, com a finalidade de resgatar a força do movimento indígena que vem das comunidades e
encaminhar as resoluções da Conferência.
II – O contexto atual
A partir das informações, reflexões e avaliações feitas na Conferência Indígena 2000, na Pós
Conferência e nas nossas reuniões da Comissão Indígena vamos tentar fazer uma síntese sobre a
realidade atual do movimento indígena nacional.
No contexto neoliberal, onde algo só tem valor quando transformado em mercadoria, o desafio
cresce ainda mais, pois os nossos valores culturais são sistematicamente agredidos e os nossos direitos
fundamentais desrespeitados. A política do atual governo, a serviço desse sistema econômico tem
investido para conquistar a confiança do nosso movimento, abrindo espaços formais para a participação
indígena em Conselhos, Comissões, etc. inclusive adotando um discurso semelhante àquele que os
usamos em nossos encontros e assembléias. É a política do "faz de conta" que as terras estão sendo
demarcadas e respeitadas, que a atenção à saúde e educação é específica e diferenciada, enfim, que os
direitos estão sendo assegurados. Muitos parentes estão sendo empregados para dar respaldo à política
oficial. É a estratégia de desmobilizar o movimento indígena, investindo na divisão e passando
atribuições de assistência do governo às organizações para mantê-las ocupadas e para desviar sua
atenção das questões centrais indispensáveis para a construção da autonomia. Essa política não aceita
um não como resposta e quando isso acontece, usa a repressão para intimidar como aconteceu com a
Conferência Indígena 2000, em Coroa Vermelha, ou como vem acontecendo em Roraima com as
manobras militares em terras indígenas.
Essa estratégia do governo, a curto prazo, pretende abrir brechas legais para facilitar o acesso
aos recursos naturais existentes nas nossas terras, através da aprovação do Estatuto do Índio. Enquanto
não consegue seus objetivos com a aprovação da nova lê,i adota a política dos fatos consumados
promovendo a invasão das terras indígenas com projetos hidrelétricos, militares, ambientais
(sobreposição de unidades de conservação), rodoviários, etc. (É importante destacar, que apesar de todo
o investimento governamental na divisão do movimento indígena, conseguimos até agora inviabilizar a
aprovação da nova legislação indigenista proposta pelo governo). E, a longo prazo, inviabilizar o projeto
de futuro próprio dos povos indígenas.
Existe também um descaso governamental muito grande em relação aos índios isolados, muitos
deles no limite de suas possibilidades de fuga para refúgios inacessíveis nas matas e portanto em
situação de risco de extermínio cada vez maior.
Apesar de todas as dificuldades que essa política governamental cria para os povos indígenas,
nosso movimento vai avançando com lutas concretas em defesa dos nossos direitos. Continua um
importante processo de retomadas de terras em praticamente todas as regiões do país e reação aos
projetos governamentais impostos. Na saúde e educação, continua a busca de um modelo autônomo.
Está em curso também um processo importante de ressurgimento de povos indígenas que passam a
assumir publicamente as identidades indígenas ocultas. Fenômeno semelhante acontece nas cidades,
onde é cada vez maior o número de famílias que assumem sua identidade indígena.
A partir da realidade que vimos, podemos apontar alguns desafios nosso movimento em nível
nacional, hoje:
1. A construção da unidade do movimento indígena em torno de estratégias comuns para fortalecer
a autonomia dos diferentes povos indígenas.
2. A mobilização permanente até a demarcação e garantia de todas as terras indígenas.
3. O fortalecimento das bases indígenas e dos seus mecanismos de controle sobre as
organizações indígenas.
4. A aprovação do Novo Estatuto dos Povos Indígenas, resgatando as propostas construídas pelo
movimento indígena na sua história de lutas.
5. A aliança com os setores que lutam contra o modelo econômico vigente e que vem se
aglutinando em torno do Foram Social Mundial.
6. O apoio aos processos de ressurgimento de povos indígenas e aos índios na cidade.
7. A mobilização em favor dos povos isolados ameaçados de extinção.
III – Aspectos a serem considerados
Podemos definir o movimento indígena como sendo a soma do conjunto das lutas desenvolvidas
pelas comunidades e organizações indígenas e suas formas de articulação com a finalidade de
assegurar os direitos históricos dos nossos povos à terra e de promoverem seus projetos de futuro
autonomamente, respeitadas as suas organizações próprias.
Vamos relacionar abaixo algumas características importantes a serem consideradas na
discussão da articulação do movimento indígena em termos nacionais:
1. A impressionante diversidade cultural que engloba 235 povos falando 180 línguas diferentes,
organizados em milhares de comunidades ou aldeias, muitas delas com grande autonomia umas
em relação às outras no mesmo povo.
2. As diferentes formas de compreender o mundo, de se relacionar com a natureza e com o
sobrenatural, de reagir diante dos problemas, de exercer a liderança.
3. As diferentes situações de contato com a sociedade brasileira, que vão desde os índios nas
cidades e os ressurgidos que estão assumindo sua identidade, até os povos "livres" (isolados)
fugindo desesperadamente da extinção.
4. Territórios ainda com recursos naturais relativamente abundantes e territórios arrasados e
insuficientes.
5. O grande número de formas de organização construídas na relação de contato para a defesa de
seus interesses no âmbito das comunidades, de um povo, de conjuntos de povos, de conjuntos
de organizações, de organizações por categoria e gênero.
6. Distintas posições políticas no seio das organizações indígenas.
7. As distâncias e o isolamento de muitos povos neste país de dimensões continentais.
IV – Questões para o debate
1. Qual o interesse das comunidades e povos indígenas na articulação do movimento indígena
nacional.
2. Em que exatamente uma instância nacional do movimento indígena pode contribuir com a luta
dos povos indígenas em todo país.
3. Qual seu nível de prioridade para o movimento indígena.
4. Quais são as lições que tiramos das duas experiências do movimento indígena em termos
nacionais: UNI e Capoib.
5. Como as comunidades, povos e organizações indígenas vão participar do movimento nacional.
6. Quem vai sustentar financeiramente a proposta.
7. Qual deve ser o papel do Cimi e de outros aliados.
É importante que antes de definir a forma que vai assumir a articulação nacional do movimento
indígena, as bases (comunidades, povos e organizações indígenas) cheguem a um amplo consenso
sobre a necessidade, importância e finalidade dessa instância nacional. Não é suficiente que a proposta
seja discutida somente no nível das lideranças.
Brasília, 08 março de 2002
Aurivan Truká, Pina Tembé, Dina XoKleng e Bruno Xavante
Grupo de Trabalho da Comissão Indígena Pós Conferência 2000

Projetos de lei ameaçam direitos indígenas


Propostas que favorecem interesses econômicos de grandes proprietários e fazendeiros
foram discutidas pelas lideranças indígenas
Reunida em Luziânia, GO, a Comissão Pós-Conferência fez uma análise da realidade indígena
no país, sob os aspectos da demarcação das suas terras e dos projetos de lei em tramitação no
Congresso Nacional.
Os 16 representantes dos povos Karajá, Potiguara, Truká, Karipuna, Curuaia, Xakriabá, Makuxi,
Wapixana, Xokleng, Pataxó Hã-Hã-Hãe, Pataxó e Umutina também discutiram o movimento indígena e a
preparação para o Fórum Social Mundial de 2003, durante o encontro que ocorreu entre 26 e 29 de
maio.
Legislação
Desde a sua criação (ver box), a Comissão foi encarregada de retomar as propostas do
movimento indígena para o Estatuto dos Povos Indígenas, que haviam sido encaminhadas ao Congresso
Nacional em 1992, e eram fruto de uma Assembléia Indígena que reuniu 350 lideranças de 101 povos e
55 organizações indígenas de todo o país.
A tramitação do Estatuto na Câmara dos Deputados está paralisada desde 1994, a pedido do
governo Fernando Henrique. Na ocasião das comemorações oficiais dos 500 anos, o governo formulou
uma proposta para o Estatuto. A Conferência Indígena não a aceitou, e a proposta foi reformulada por
iniciativa do Deputado Luciano Pizatto (PFL-PR). Diversas organizações indígenas consideraram que as
alterações não mexeram nos pontos polêmicos da proposta.
Buscando uma proposta de Estatuto que contemplasse as necessidades e direitos indígenas,
houve, a partir de maio de 2000, um processo amplo de consulta às comunidades e organizações, que
resultou na atualização das propostas apresentadas em 1992, durante a assembléia realizada em abril
de 2001.
Diante da resistência dos povos indígenas, os setores interessados nas suas terras mudaram de
estratégia. Abandonaram a proposta de aprovar o Estatuto e passaram a investir na aprovação de leis,
emendas constitucionais e decretos legislativos, separadamente.
Entre os casos mais visíveis, está a proposta de emenda constitucional (PEC) apresentada pelo
Senador Mozarildo Cavalcante (PFL-RR), que propõe emenda ao artigo 231 da Constituição, limitando
em 50% as terras indígenas e unidades de conservação por estado da Federação, e atribui ao Senado o
poder de aprovar a demarcação das terras indígenas. A PEC já foi aprovada na Comissão de
Constituição e Justiça do Senado.
O projeto de lei do deputado Luciano Castro (PFL-RR), cuja proposta é possibilitar o
arrendamento das terras indígenas, já foi aprovado na Comissão de Minorias da Câmara. Outros
exemplos são os projetos de decreto legislativo para a construção das hidrelétricas de Belo Monte, no
Pará; de Cotingo, em Roraima; da Ponte da Pedra, em MT, que incidem sobre terras indígenas
Há ainda o projeto de lei do Senador Romero Jucá (PSDB-RR), já aprovado pelo Senado e em
fase final de tramitação na Câmara dos Deputados, que abre de forma indiscriminada as terras indígenas
para exploração mineral.
No dia 29, a Comissão foi à Câmara dos Deputados para participar da reunião da Comissão de
Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias, onde tramita esse projeto de lei. A votação do projeto
foi adiada por falta de quórum.
Ainda no Congresso, a Comissão conversou com Eduardo Suplicy, líder do PT no Senado, e com
os assessores dos senadores Marina Silva (PT-AC) e Sebastião Viana (PT-AC), sobre a tramitação da
Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que trata das relações dos Estados Nacionais
com os povos indígenas. Rapidamente, após a visita, Suplicy conseguiu incluir a matéria na pauta de
votação do próximo dia 19 de junho, quando se espera que será aprovada. O Brasil é um dos poucos
países americanos que ainda não ratificaram essa Convenção, adotada pela 76ª Conferência
Internacional do Trabalho em junho de 1989.
Abaixo-assinado
A entrega das mais de 700.000 assinaturas recolhidas pelo abaixo-assinado que pede que seja
contemplada, no novo Estatuto dos Povos Indígenas, a proposta elaborada pelos povos durante
Assembléia Nacional dos Povos Indígenas, em abril de 2001, está prevista para o dia 19 de junho,
quando a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) será homenageada pelos seus 50 anos.
Antes dessa data, a Comissão pretende fazer reuniões com os presidentes da Câmara e do Senado e
com o bloco de oposição, em busca de apoio para a proposta.
Fórum Social Mundial
Durante a reunião, os representantes indígenas discutiram a participação no Fórum Social
Mundial de 2003, em Porto Alegre, RS.
Sugeriram ao Conselho Nacional do Fórum que haja uma Conferência sobre povos indígenas,
assim como ocorreu na edição do evento em 2002. O tema proposto é "Povos Indígenas e Estados
Nacionais na América Latina". "Nosso objetivo é aprender mais, nos articularmos cada vez melhor, levar
propostas e transmitir a experiência de vida de nossos povos, falar da realidade, das nossas lutas e
discutir soluções para os problemas", dizem.
Carta
Em carta encaminhada ao Congresso, a Comissão Pós-Conferência listou também os conflitos
mais graves entre índios e não-índios em diferentes regiões do país, provocados pela lentidão da
demarcação e desintrusão de terras indígenas. Foram mencionados os casos dos Pataxó da Bahia, dos
Xukuru de Ororubá de Pernambuco, do Ñanderu Marangatu dos índios Kaiowá do Mato Grosso do Sul,
dos Krahô/Canela do Tocantins, dos Javaé da Ilha do Bananal (Tocantins), dos Curuaia do Pará, do
garimpo ilegal nas terras dos Cinta Larga (Mato Grosso e Rondônia) e da terra indígena Raposa/Serra
do Sol, em Roraima.
A Comissão Pós-Conferência
A Comissão foi criada em maio de 2000, para dar encaminhamento às decisões da Marcha e
Conferência dos Povos Indígenas, que ocorrera em abril daquele ano. A decisão foi tomada por cerca de
300 lideranças indígenas de todo o país, que estavam reunidas em Pesqueira, Pernambuco, por ocasião
do 2º aniversário do assassinato do líder indígena Xicão Xukuru.
Publicado no Jornal Porantim - n.º 246 - Jun/Jul-2002

Movimento indígena: construindo caminho


"Podemos definir o movimento indígena como sendo a soma do conjunto das lutas
desenvolvidas pelas comunidades e organizações indígenas e suas formas de articulação
com a finalidade de assegurar os direitos históricos dos nossos povos à terra e de promover
seus projetos de futuro autonomamente, respeitadas as suas organizações próprias".
GT- Comissão Indígena Pós-Conferência 2000
Animados pela Campanha da Fraternidade "Em busca de uma Terra Sem Males", um grupo de
trabalho definido pela delegação indígena da Pós-Conferência no Fórum Social Mundial 2002 reuniu-se
em Brasília para discutir encaminhamentos para os debates em torno do Estatuto dos Povos Indígenas,
da participação no FSM 2003 e elaborar um programa de discussão sobre a articulação local e nacional
do movimento indígena.
Estas questões foram levantadas pelos representantes indígenas e seus aliados nos últimos
meses. Por esta razão, este grupo, formado por Piná Tembé, Aurivan Truká, Diná Xokleng e Bruno
Xavante, com assessoria de Francisco Loebens, do Cimi Norte I e do secretariado, procurou definir um
processo de debates e reflexões desde as comunidades e aldeias, passando por encontros macro-
regionais e culminando com uma grande Assembléia Indígena Nacional, em meados do próximo ano.
Será um tempo de debate e acumulação de propostas e experiências que serão transformadas em
documentos de trabalho, que possibilitem uma ampla participação da definição das estratégias e
programas do movimento indígena.
Aprendendo com a experiência
A história do movimento indígena das últimas três décadas tem revelado importantes lições e
registrado avanços significativos, especialmente na demarcação e garantia das terras, conquista dos
direitos assegurados pela Constituição de 1988 e nos processos de luta, articulação e organização.
Esses são aspectos ressaltados no subsídio elaborado pelo Grupo de Trabalho.
As experiências da União das Nações Indígenas (Uni) e do Conselho e Articulação dos Povos e
Organizações Indígenas do Brasil (Capoib), cada qual se estendendo por uma década, devem estar bem
presentes no processo de discussão, a partir das aldeias e comunidades. Também as mais de duas
centenas de organizações locais e regionais demonstraram o quanto é importante consolidar
instrumentos de luta e canais de articulação, numa relação de diálogo permanente com as comunidades.
Organizaram-se professores indígenas, agentes de saúde, estudantes, mulheres, índios nas cidades.
A história não pára. Vamos avançar
Essas últimas décadas possibilitaram um aprendizado muito grande. A realidade dos povos
indígenas, porém, continua marcada por desafios, que são relatados no documento que o grupo de
trabalho produziu.
• "A construção da unidade do movimento indígena em torno de estratégias comuns para
fortalecer a autonomia dos diferentes povos indígenas.
• A mobilização permanente até a demarcação e garantia de todas as terras indígenas.
• O fortalecimento das bases indígenas e dos seus mecanismos de controle sobre as
organizações indígenas.
• A aprovação do novo Estatuto dos Povos Indígenas, resgatando as propostas construídas pelo
movimento indígena na sua história de lutas.
• A aliança com os setores que lutam contra o modelo econômico vigente e que vêm se
aglutinando em torno do Fórum Social Mundial.
• O apoio aos processos de ressurgimento de povos indígenas e aos índios na cidade.
• A mobilização em favor dos povos isolados ameaçados de extinção."
Ao contrário de paralisar ou gerar desânimo, a situação tem servido para que os povos indígenas
e seus aliados estejam empenhados em um permanente processo crítico e busquem criativamente
desenvolver instrumentos de organização e luta política.
Por fim, o grupo aponta algumas diferenças importantes a serem consideradas na discussão da
articulação do movimento indígena em termos nacionais:
• "A impressionante diversidade cultural que engloba 235 povos falando 180 línguas diferentes,
organizados em milhares de comunidades ou aldeias, muitas delas com grande autonomia umas em
relação às outras no mesmo povo.
• As diferentes formas de compreender o mundo, de se relacionar com a natureza e com o
sobrenatural, de reagir diante dos problemas, de exercer a liderança.
• As diferentes situações de contato com a sociedade brasileira, que vão desde os índios nas
cidades e os ressurgidos, que estão assumindo sua identidade, até os povos "livres" (isolados), fugindo
desesperadamente da extinção.
• Territórios ainda com recursos naturais relativamente abundantes e territórios arrasados e
insuficientes.
• O grande número de formas de organização construídas na relação de contato para a defesa
de seus interesses no âmbito das comunidades, de um povo, de conjuntos de povos, de conjuntos de
organizações, de organizações por categoria e gênero.
• Distintas posições políticas no seio das organizações indígenas.
• As distâncias e o isolamento de muitos povos neste país de dimensões continentais".
Com esses elementos de reflexão, a Comissão Indígena Pós-Conferência espera contribuir para
um amplo debate nas comunidades, nas aldeias, articulações e organizações indígenas.
Dividir para dominar
Análise da conjuntura no documento
"No contexto neoliberal, onde algo só tem valor quando transformado em mercadoria, o desafio
cresce ainda mais, pois os nossos valores culturais são sistematicamente agredidos e os nossos direitos
fundamentais desrespeitados.
A política do atual governo, a serviço desse sistema econômico, tem investido para conquistar a
confiança do nosso movimento, abrindo espaços formais para a participação indígena em Conselhos,
Comissões, etc., inclusive adotando um discurso semelhante àquele que usamos em nossos encontros e
assembléias. É a política do ‘faz de conta’ que as terras estão sendo demarcadas e respeitadas, que a
atenção à saúde e educação é específica e diferenciada, enfim, que os direitos estão sendo
assegurados. Muitos parentes estão sendo empregados para dar respaldo à política oficial. É a
estratégia de desmobilizar o movimento indígena, investindo na divisão e passando atribuições de
assistência do governo às organizações para mantê-las ocupadas e para desviar sua atenção das
questões centrais indispensáveis para a construção da autonomia.
Essa política não aceita um não como resposta e, quando isso acontece, usa a repressão para
intimidar como aconteceu com a Conferência Indígena 2000, em Coroa Vermelha, ou como vem
acontecendo em Roraima com as manobras militares em terras indígenas.
Essa estratégia do governo, a curto prazo, pretende abrir brechas legais para facilitar o acesso
aos recursos naturais existentes nas nossas terras, através da aprovação do Estatuto do Índio. Enquanto
não consegue seus objetivos com a aprovação da nova lei, adota a política dos fatos consumados
promovendo a invasão das terras indígenas com projetos hidrelétricos, militares, ambientais
(sobreposição de unidades de conservação), rodoviários, etc.
É importante destacar que, apesar de todo o investimento governamental na divisão do
movimento indígena, conseguimos até agora inviabilizar a aprovação da nova legislação indigenista
proposta pelo governo".

Egon Heck
Secretário Executivo do Cimi
Publicado no Jornal Porantim - Abril de 2002

Um breve histórico sobre o Movimento Indígena


A partir do texto constitucional, em 1988, abriram-se novas perspectivas de atuação e articulação
dos povos indígenas em nosso país. Segundo o Artigo 232 da Constituição Federal:
"Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em
defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo".
Este fato, além de uma série de outras injunções históricas, tornou possível o surgimento e
multiplicação das organizações indígenas locais e regionais em nosso país. Quais seriam essas
injunções?
Em primeiro lugar, o final das tentativas anteriores de articulação indígena de abrangência
nacional, particularmente da UNI-Nacional. Salvo raras exceções, como a UNI-Acre e Sul do Amazonas,
os esforços de regionalização da UNI não tiveram sucesso, não se enraízaram nas realidades locais e
regionais.
Em segundo lugar, os povos e comunidades indígenas continuaram a sofrer o impacto de
políticas governamentais anti-indígenas e a ação predatória e violenta dos invasores em todo o país.
Apesar do novo texto constitucional, o governo Sarney se orientava pelas concepções militares de
Segurança Nacional, da fase da ditadura e pelos interesses econômicos de seus aliados regionais,
constituídos por latifundiários, mineradores, madeireiros e políticos anti-indígenas.
Este conjunto de situações - falta de referência organizativa e agravamento das condições de
vida e sobrevivência, aliado, contraditoriamente, a uma sustentação legal para a ação política organizada
e autônoma criou as condições históricas para o surgimento, numa escala antes desconhecida, das
organizações indígenas locais que buscam representar povos e comunidades.
As organizações locais e regionais
O fenômeno do surgimento das organizações indígenas locais se disseminou pelo país com
rapidez extraordinária. As comunidades, inquietas na busca de defender seus territórios e demais direitos
à saúde, educação, subsistência e autonomia cultural, buscam se articular, se mobilizar e construir
referências organizativas que lhes permitissem:
 atuar na cidade, dando visibilidade a suas lutas e divulgando suas causas, reivindicações e
propostas;
 constituir alianças locais com movimentos sociais, Igrejas e entidades;
 criar interlocutores junto ao Estado e a sociedade civil e
 acionar o Ministério Público para defendê-los com base nos artigos 231 e 232 da Constituição
Federal.
Num primeiro momento, o formato das organizações indígenas segue o modelo institucional de
qualquer associação civil da sociedade nacional: com presidente, vice, secretário, tesoureiro, Conselho
Fiscal etc. Logo esse modelo passa a ser questionado, devido à sua excessiva formalidade e distância
da dinâmica política, cultural e religiosa existente no interior das comunidades e povos indígenas. Assim,
surgem as buscas por modelos de articulações e de estatutos alternativos, mais passíveis de controle
social das cúpulas dessas organizações por parte das comunidades. Surgem, então, as propostas de
figuras como "conselheiros" das aldeias, "coordenadores" ao invés de presidente, rodízio de
coordenadores, "coordenações ampliadas" etc.
A efervescência das organizações locais logo coloca outra questão em pauta: a necessidade de
se constituir organizações indígenas regionais. A proposta de criação de organizações indígenas
regionais surgiu baseada na necessidade de maior fortalecimento e visibilidade às lutas indígenas
localizadas, na necessidade de um acúmulo político e de pressão organizada sobre as ações
governamentais. As iniciativas de constituição dessas organizações surgiram na região amazônica, com
a COIAB (1989), no nordeste, com a Comissão Leste/Nordeste (1990), no sul com a ONI-Sul, entre
outras.
Na região amazônica já existia uma experiência maior de organizações que articulavam vários
povos ou mesmo organizações indígenas locais. É o caso da FOIRN, criada em 1987, do CIR e da UNI-
Acre. Este tipo de articulação continuou sendo constituído na região como por exemplo, o CIVAJA, a
CUNPIR e a ANTAPAMA.
Outros tipos de organizações continuaram surgindo, às vezes articulando um só povo, como a
Aty Guassu Guarani, a Ñemboaty Guassu Guarani ou articulando uma categoria, como a COPIAR.
Foram constituídas também organizações que articulavam indígenas moradores em cidade, como a
AMARN e o MEIAN, ambas de Manaus. Da mesma forma, surgiram inúmeras outras organizações
locais, nas cidades, nas comunidades e vilas, articulando agentes de saúde, mulheres, professores, de
um só povo, de vários povos etc.
A proliferação dessas organizações nas suas inúmeras formas em todo o país, por um lado e,
por outro, o não cumprimento pelo Estado das novas regras constitucionais, cria um outro desafio para
os povos indígenas - a criação de uma organização indígena nacional.
A organização indígena nacional
Um primeiro momento de encontro de representantes de diversas organizações indígenas, de
várias regiões do país, no contexto pós-constitucional, ocorreu no mês de junho de 1991, em Brasília.
Este encontro, denominado Reunião dos Povos e Organizações Indígenas sobre Legislação e Política
Indigenista Oficial, congregou 121 lideranças de 53 povos indígenas com o objetivo de estudar o projeto
do governo para um novo Estatuto do Índio e formular as propostas dos próprios povos e organizações
indígenas.
Foi constituída, então, uma Coordenação da Mobilização Indígena, formada por 12
representantes de organizações indígenas de todas as regiões do país, com as tarefas de manter as
organizações informadas e articuladas e de convocar a Mobilização Nacional no momento oportuno.
Esta coordenação reuniu-se três vezes durante o ano de 1991 e início de 1992, para preparar o
encontro maior e, durante estas reuniões, estudou e debateu diversos modelos para uma possível
organização indígena de âmbito nacional.
Em abril de 1992, finalmente, é realizado o Encontro de Povos e Organizações Indígenas, em
Brasília, que reuniu 350 lideranças de 101 povos e 55 organizações indígenas de todo o país. Na pauta,
o estudo e aprofundamento dos temas e propostas para o novo Estatuto do Índio e uma avaliação da
representação indígena nacional.
Ao final desta mobilização, é constituído o Conselho de Articulação dos Povos e Organizações
Indígenas do Brasil e foram eleitos 33 representantes, de todas as regiões do país. O caráter central
deste Conselho era de ser um instrumento de articulação e não de representação das lutas dos povos e
organizações indígenas. Segundo a proposta aprovada em plenário, ele deveria se reunir periodicamente
para trocar informações, experiências, fazer lobby, fortalecer lutas locais e regionais mas não constituir
uma estrutura permanente, um escritório com representação fixa em Brasília.
O Conselho reuniu-se cerca de três vezes, de acordo com o que foi proposto originalmente. Em
setembro de 1993 convocou e articulou nova mobilização indígena nacional com a finalidade de se
posicionar contra a tentativa de revisão constitucional e o ataque aos direitos indígenas então em curso.
Esta mobilização reuniu 292 lideranças de 79 povos e 47 organizações indígenas.
Devido, por um lado, às dificuldades de se manter uma articulação nacional permanente à
distância e, por outro, às constantes ameaças aos direitos indígenas na forma de projetos de lei no
Congresso Nacional, voltou à pauta das organizações indígenas a proposta de constituição de uma
organização indígena de âmbito nacional, com estatutos e personalidade jurídica próprias e com sede
em Brasília.
Entre dezembro de 1993 e março de 1995 houveram várias reuniões das organizações
indígenas quando, entre outras deliberações constava a de se realizar a 1ª Assembléia Geral do
CAPOIB. Esta Assembléia Geral foi realizada em abril de 1995, reunindo 201 lideranças de 77 povos e
40 organizações indígenas e nela foram aprovados um programa de trabalho e os estatutos do CAPOIB
como organização indígena nacional.
Os estatutos do CAPOIB, bastante estudados e discutidos nas bases e na própria Assembléia
Geral, tentaram marcar o caráter articulador da organização, garantir sua proximidade e controle pelos
povos e organizações indígenas, evitar a projeção de indivíduos e definir como metodologia de ação o
trabalho coletivo.
Organizações Indígenas
Algumas organizações indígenas existentes no Brasil:
AMARN - Associação das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro
AMTAPAMA - Articulação dos Povos Tupi dos Estados do Mato Grosso, Pará, Amapá e
Maranhão.
APOINME - Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e
Espírito Santo.
APOIS - Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Sul.
CIR - Conselho Indígena de Roraima.
CGTT - Conselho Geral da Tribo Tikuna
COIAB - Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira.
COPIAR - Comissão dos Professores Indígenas do Amazonas, Roraima e Acre.
COMITÊ TERENA
CUNPIR - Coordenação da União e Povos Indígenas de Rondônia, Norte do Mato Grosso e Sul
do Amazonas.
CIVAJA - Conselho Indígena do Vale do Javari.
FOIRN - Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro.
NGG - Ñemboaty Guassu Guarani.
UNI-AC - União das Nações Indígenas do Estado do Acre e Sul do Amazonas.

http://www.cimi.org.br/, -3/11/2002, às 23:00 h.

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