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ACÓRDÃO Nº 28/2015

Processo n.º 559/2014


3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

1. A., Lda., ora recorrente, impugnou no Tribunal Administrativo e


Fiscal de Braga o ato de liquidação de taxa praticado ao abrigo da alínea
l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, na
redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro,
relativo ao Posto de Abastecimento de Combustíveis localizado na EN
204 KM 37,100 E.
A impugnação foi julgada improcedente, pelo que a impugnante
interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte, que, por
acórdão de 27 de fevereiro de 2014, lhe negou provimento.
Desta decisão, a recorrente interpôs recurso para o Tribunal
Constitucional, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, a fim de
ver apreciada «a inconstitucionalidade material do art. 15º, n.º 1, alínea
l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada pelo
Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, na parte em que o mesmo é
interpretado e aplicado no sentido de as taxas ali previstas incindirem
sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas abastecedoras dos
postos de abastecimento, por violação direta do art. 266º/2 da CRP e dos
princípios da proporcionalidade e da justiça nela consagrados».
O Tribunal recorrido admitiu o recurso.
Tendo o recurso prosseguido para apreciação de mérito, a recorrente
apresentou alegações em que formula as seguintes conclusões:

«A) A Recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a


constitucionalidade da norma contida no art. 15º, n.º 1, al. l) do Decreto-Lei
n.º 13/71, se for interpretada no sentido de se entender bomba de
combustível como mangueira abastecedora, por entender que a mesma
padecerá de várias inconstitucionalidades, ocorrendo uma frontal violação
dos princípios constitucionalmente consagrados da proporcionalidade e
justiça - v. art. 266º, n.º 2 CRP – da liberdade de iniciativa económica privada
– art. 61º/1 – além de ser organicamente inconstitucional.
B) Sem prejuízo de esta norma ter sido revogada muito recentemente
pelo Decreto-Lei n.º 84/2014, de 29/05, a verdade é que a ora Recorrente tem
sido alvo de inúmeras e sucessivas liquidações deste tipo de taxas sobre
mangueiras abastecedoras de combustível, por parte das B., referentes aos
vários postos de abastecimento que detém por todo o território nacional, que
considera não só ilegais, como inconstitucionais, razão pela qual pretende
submeter à apreciação de V. Exas. esta questão que se afigura de grande
relevância jurídica e social.
C) É inequívoco que a letra do preceito em causa determina a incidência
objetiva da taxa sobre as bombas abastecedoras, não havendo quaisquer
razões lógico-jurídicas que levem a que a norma em causa possa ser objeto de
uma interpretação corretiva.
D) Com efeito, esta norma de incidência objetiva manteve-se inalterada,
continuando a base da tributação a ser as bombas de abastecimento e não as
mangueiras dessas bombas, que são apenas “elementos” dessas bombas,
sendo que a bomba de abastecimento é o dispositivo mecânico que permite,
designadamente, mover ou elevar materiais líquidos, no caso, combustíveis,
desde o depósito que está enterrado no posto, até ao depósito do veículo a
abastecer.
E) Se o legislador tivesse pretendido alterar a base da incidência objetiva
desta taxa, passando a assentar no número de mangueiras e não nas bombas,
seguramente que o teria escrito expressamente e não teria mantido o mesmo
texto, quando em 2004, através do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, alterou
a norma, mas mantendo inalterada a base de incidência objetiva de
tributação – quando em 2004 já proliferavam as bombas multiproduto.
F) Deste modo, e de acordo com as regras e princípios da interpretação
e aplicação da lei consagrados no artigo 9.°, n.° 3 do Código Civil, em que o
intérprete deve sempre presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento
corretamente e em termos adequados, conclui-se que a taxação desta norma
deve incidir sobre a bomba de combustível enquanto possibilidade de
extração do mesmo do depósito onde está armazenado para o recetáculo do
veículo automóvel.
G) Além disto, diga-se que por uma questão prática e por impossibilidade
física, o abastecimento apenas pode ser feito em simultâneo por dois
veículos, um de cada lado da bomba, no máximo!
H) O que se tributa não deve ser a disponibilização de um produto, mas o
benefício retirado da possibilidade de em determinado momento um veículo
automóvel ser abastecido no posto de abastecimento, e por isso, as
possibilidades de abastecimento não são proporcionais ao número de
mangueiras.
I) Já vários Acórdãos do TC se pronunciaram sobre esta questão,
referindo que o critério de fixação do quantum de uma taxa é relevante, em
termos de se aferir da utilidade que o sujeito passivo dela extrai, não
podendo ser completamente alheio aos custos da entidade pública ou a essa
utilidade.
J) Perante esta jurisprudência, decorre que o critério encontrado pela B.
para fixar o montante das taxas a pagar, nos termos do referido art. 15º, n.º
1, al. l) do DL 13/71, baseando-se no número de mangueiras e não no número
de bombas já constitui uma total desproporção, que compromete a
correspondência que deverá existir entre o serviço prestado (o
licenciamento) e a utilidade que a entidade que explora os postos retira.
K) Se é verdade que uma mangueira é o equipamento da bomba de
abastecimento que representa uma possibilidade de saída do carburante do
depósito onde este se encontra armazenado para o depósito do veículo, o
facto é que cada cliente apenas poderá optar por um produto de cada vez,
não obstante ter várias ofertas de produtos (geralmente, são quatro os
produtos disponibilizados: gasóleo, gasolina s/ chumbo 95 e 98, e gasolina
“Gforce”).
L) Nem poderá a B. dizer que o licenciamento rodoviário que é feito
nestes moldes tem como finalidade “garantir a prevenção das condições de
segurança e circulação na estrada e dos seus utentes” eventualmente,
traduzida numa maior necessidade de manutenção das estradas, e que um
maior número de mangueiras “implica o necessário aumento de número de
entradas e saídas da estrada e o aumento do respetivo tráfego médio diário
da via que procuram.”
M) Porque todos estes argumentos, para além de não terem ficado
provados nos autos, são totalmente falaciosos e não têm o mínimo de
correspondência com a realidade.
N) Em primeiro lugar, porque hoje em dia, como é do conhecimento geral
e facto notório, quase todas as operadoras de postos de abastecimento
dispõem dos mesmos carburantes, não sendo pelo fator produto que um
cliente vai escolher determinado posto para abastecer o seu veículo (mas sim
pelo fator preço ou eventuais descontos efetuados).
O) E em segundo lugar, o tráfego automóvel não é proporcional ao
aumento das mangueiras de um posto, nem implica um maior número de
entradas ou saídas do mesmo, isto porque os automobilistas utilizam
determinada estrada (nacional, regional ou autoestrada) em função do
respetivo destino e não em função de existir determinado posto de
abastecimento ou área de serviço nessa via.
P) Ora, a cobrança de uma taxa pelo número de mangueiras e não pelo
número de bombas de abastecimento, pelo respetivo licenciamento, não é a
adequada para assegurar o fim de interesse público que supostamente se visa
atingir; não é indispensável e excede o que seria razoável em relação aos
objetivos a prosseguir.
Q) Taxar assim uma bomba não pelo número de utilizadores potenciais,
mas pelo número de mangueiras existentes, significa apenas uma “caça”
desproporcional e ilegítima à taxa e uma violação da livre iniciativa
económica privada.
R) É que na verdade e face ao exposto, a interpretação (inconstitucional)
supra referida feita pela B., está a impor à Recorrente que se organize
economicamente de uma única forma: que cada bomba não pode ter mais de
uma mangueira (voltando ao sistema das bombas monoproduto), com graves
prejuízos para a própria eficiência económica assim como com prejuízos
iguais para os consumidores, que verão menor disponibilidade de
combustíveis e mais tempo de espera.
S) Aí, sim, o resultado poderá ser maior insegurança no tráfego, pelo
acumular de demasiadas viaturas à espera de abastecer em cada posto de
combustíveis...
T) A ratio legis desta norma não poderá dispensar esta análise em que
chegaremos à conclusão que é manifestamente desproporcional,
completamente alheio e excessivo, até desta perspetiva da utilidade para o
operador do posto, ter que pagar uma taxa pelo licenciamento das bombas,
entendidas como mangueiras abastecedoras.
U) É esta proibição do excesso, a falta de razoabilidade resultante da
liquidação das taxas pelo número de mangueiras que se verifica no caso e
que impõe a conclusão de qua há violação do princípio constitucional da
proporcionalidade e da justiça.
V) Ainda quanto a este ponto e sem prescindir de todos os argumentos
apresentados no sentido da inconstitucionalidade desta interpretação do art.
15º, n.º 1, al. l) do referido DL, diga-se que o recentíssimo Decreto-Lei n.º
84/2014, de 29/05, veio revogar o referido art. 15º/1/al. l) do DL 13/71, com
efeitos a partir de 30/05/2014, substituindo a taxação de bombas de
combustível, pelo “número de litros de combustíveis vendidos em cada ano”.
W) O que nos leva a reafirmar o caráter mais funcional e prático desta
norma, em que a taxa deverá incidir pela utilidade económica que é retirada
da própria atividade do posto de abastecimento de combustíveis e não pela
quantidade de equipamento, v.g mangueiras/pistolas.
X) Além disto, o ato de liquidação não resulta de um sinalagma
proveniente do exercício do zelo pela segurança da circulação ou do impacto
nas condições de segurança da circulação imanente à construção ou
existência do posto de abastecimento em causa.
Y) Pelo que nos termos em que este tributo é exigido apenas se pode
considerar um imposto e por isso verifica-se a apontada inconstitucionalidade
orgânica, por violação do art. 103º, n.º 2 e 165º, n.º 1, al. i) ambos da CRP,
pois como ficou demonstrado nos autos existe uma impossibilidade prática de
mais que uma viatura abastecer numa bomba, apesar de esta ter mais do que
uma mangueira (ou dois veículos se a bomba tiver dois lados de
abastecimento).

A recorrida B., S.A. contra-alegou, pugnando pela improcedência do


recurso.
Cumpre apreciar e decidir.
2. A recorrente, no requerimento de interposição do recurso,
expressamente afirmou que «o presente recurso para o Tribunal
Constitucional é restrito à questão da inconstitucionalidade material do
art. 15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a
redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, na parte em que o
mesmo é interpretado e aplicado no sentido de as taxas aí previstas
incidirem sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas
abastecedoras dos postos de abastecimento, por violação direta do art.
266.º/2 da CRP e dos princípios da proporcionalidade e da justiça nele
consagrados».
Porém, em sede de alegações, invocou, ainda, a questão da
inconstitucionalidade orgânica do referido preceito legal, por violação do
princípio da legalidade tributária (artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1,
alínea i), da Constituição), e a questão da inconstitucionalidade material
do mesmo preceito, por violação da liberdade de iniciativa económica
privada, consagrada no artigo 61.º, n.º 1, da mesma Lei Fundamental.
Ora, independentemente da perspetiva que se adote quanto ao exato
sentido e alcance do conceito processual de objeto do recurso, no âmbito
da fiscalização concreta da constitucionalidade, afigura-se que, sem
prejuízo do poder conferido pelo artigo 79.º-C da LTC, não está o
Tribunal Constitucional obrigado a pronunciar-se sobre questões de
inconstitucionalidade cuja apreciação não foi requerida no momento
processualmente oportuno, que é precisamente o do requerimento de
interposição do recurso, donde deve consequentemente constar a
indicação, não apenas da norma cuja inconstitucionalidade se pretende
ver apreciada, mas também da norma ou princípio constitucional que se
considera violado (artigo 75.º-A, nºs. 1 e 2, da LTC) – cf., neste sentido,
Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 139/03, 424/2007 e 107/1011.
Sendo este o caso, em relação às novas questões de
inconstitucionalidade colocadas em sede de alegações do recurso, apenas
se apreciará a questão da inconstitucionalidade do artigo 15.º, n.º 1,
alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada
pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, «na parte em que o mesmo é
interpretado e aplicado no sentido de as taxas aí previstas incidirem
sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas abastecedoras dos
postos de abastecimento, por violação direta do art. 266.º/2 da CRP e dos
princípios da proporcionalidade e da justiça nele consagrados», que é
única questão de inconstitucionalidade que a recorrente, em observância
do correspondente ónus legal, enunciou no requerimento de interposição
do recurso.
3. A questão de inconstitucionalidade que, feita a antecedente
delimitação, constitui objeto do presente recurso, foi recentemente
apreciada pelo Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 846/2014, que
não julgou inconstitucional a norma da alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do
Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação do Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro, na interpretação segunda a qual pelo
estabelecimento ou ampliação de postos de combustível é devida taxa por
cada mangueira abastecedora de combustível instalada (atribuindo-se à
expressão «bomba abastecedora de combustível» o sentido de
«mangueira abastecedora de combustível»).
Invocou-se, em fundamento de um tal juízo de não
inconstitucionalidade, o seguinte:

«3. A recorrente sustenta a inconstitucionalidade da interpretação que o


acórdão recorrido conferiu à alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei
n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro, interpretação segundo a qual pelo estabelecimento
ou ampliação de postos de combustível é devida taxa [no montante de
€1.362,30] por cada mangueira abastecedora de combustível instalada. No
entender da recorrente, tal interpretação viola os princípios da
proporcionalidade e da justiça, ínsitos no n.º 2 do artigo 266.º da
Constituição.
Deve começar por dizer-se – em consonância, aliás, com a argumentação
aduzida nas alegações do recurso – que, no caso, a incidência das taxas sobre
as bombas abastecedoras surge como um instrumento dirigido à salvaguarda
da finalidade legal do licenciamento, a qual, de acordo com o disposto no
artigo 12.º n.º 1, do Decreto-Lei n.º 13/71, consiste na não afetação da
estrada e da perfeita visibilidade do trânsito.
Contudo, e independentemente desta verificação de princípio, há que
sublinhar que o que está em causa nos presentes autos é a questão de saber
se a interpretação, adotada pelo tribunal a quo quanto ao disposto no artigo
15.º, n.º 1, alínea l) do já mencionado Decreto-Lei n.º 13/71, segundo a qual
«uma mangueira abastecedora de combustível» corresponde à expressão
«bomba abastecedora de combustível», é, por algum motivo, contrária à
Constituição. Não cabendo ao Tribunal ajuizar sobre o eventual «acerto» ou
«desacerto» que, no estrito plano infraconstitucional, possa ser reconhecida
a esta interpretação, o que se lhe pede resume-se à questão de saber se a
mesma [interpretação] contraria quaisquer «normas» ou «princípios»
constitucionais (artigo 277.º, n.º 1, da CRP), designadamente aqueles que a
recorrente invoca. Em suma, trata-se de saber se «taxar cada mangueira
instalada» (ao invés de «taxar a bomba de gasolina» em si mesma
considerada) tem como consequência a liquidação de um tributo em
montante que se deva considerar, face à Constituição, desproporcionado e
injusto.
Da eventual violação do princípio da proporcionalidade
4. Como é vulgarmente consabido, o princípio da proporcionalidade ou da
proibição do excesso encontra sede textual em diversos preceitos da
Constituição, entre os quais se incluem os artigos 18.º, n.º 2, in fine, e o
artigo 266.º, n.º 2.
Sobre o sentido a conferir a tal princípio tem sido constante a
jurisprudência do Tribunal. A ideia de «proporção» ou de «proibição do
excesso – ideia essa que, em Estado de direito, vincula as ações de todos os
poderes públicos – refere-se, diz o Tribunal, «fundamentalmente à
necessidade de uma relação equilibrada entre meios e fins: as ações
estaduais não devem, para realizar os seus fins, empregar meios que se
cifrem, pelo seu peso, em encargos excessivos (e, portanto, não equilibrados)
para as pessoas a quem se destinem» (cfr. Acórdão n.º 634/93). Além disso,
como se disse, entre muitos outros, no Acórdão n.º 187/2001, «o princípio da
proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação
(as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se
como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de
outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da
exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os
fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos
para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou
proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas
excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos)». Da
caracterização de cada um destes «testes» ou «subprincípios» se tem
encarregado ainda numerosa jurisprudência (veja-se, entre outros, o Acórdão
n.º 632/08).
5. A verificação da conformidade da norma ou interpretação normativa
sindicada com o princípio da proibição do excesso exige, contudo e antes de
mais, a consideração cautelosa do objeto do recurso e a caracterização da
posição jurídica da recorrente. É que, como bem se sabe, o juízo relativo à
«proporcionalidade» do agir estadual não se sustenta sempre do mesmo
modo, qualquer que seja a natureza da norma infraconstitucional que se
tenha que julgar e qualquer que seja a posição jurídica subjetiva por essa
mesma norma afetada. Pelo contrário: o iter metódico a seguir na
fundamentação desse juízo será diverso, devendo ser tanto mais exigente
quanto mais intensa for, in casu, a afetação, por via legislativa, de posições
jurídico-subjetivas que devam ser qualificadas como fundamentais.
6. Como se assinalou, a recorrente configura o juízo de
inconstitucionalidade por si alegado na violação dos princípios consagrados
no artigo 266.º, n.º 2 da CRP.
Contudo, não será seguramente este o «parâmetro» aplicável à questão
sob juízo.
O n.º 2 do artigo 266.º da CRP consagra os limites à atuação das
autoridades administrativas no exercício dos seus poderes discricionários. É
no contexto do uso destes poderes que a Administração está obrigada a agir
no respeito pelos princípios da proporcionalidade e da justiça. Ora, as taxas
em causa, em si mesmas consideradas, não resultam da prática de ato
discricionário, pois que se encontram diretamente previstas no ato normativo
que as suporta. Por outro lado, o objeto do presente recurso é constituído,
não por uma atuação administrativa, mas sim pela interpretação
(jurisdicional) de uma certa norma – como, aliás, não podia deixar de ser –,
norma essa incluída, de resto, em ato formalmente legislativo. Quer isto dizer
que não está em causa a questão de saber se a autoridade administrativa
agiu em (des)conformidade com a Constituição. O que está em causa é a
questão de saber se determinada norma, constante de ato legislativo e
aplicada pelo juiz da causa com certa interpretação, se conforma com as
exigências constitucionais pertinentes, mormente as que decorrem os
princípios da proporcionalidade e da justiça. O facto de estes últimos
receberem (também) apoio textual no n.º 2 do artigo 266.º da CRP não
implica portanto, só por si, que seja este o parâmetro a aplicar ao caso sub
judicio.
7. Excluída que está a aplicação ao caso do disposto no n.º 2 do artigo
266.º, resta saber se a norma sob juízo, contida em ato legislativo, se pode
configurar como norma restritiva de um direito, liberdade e garantia, de
forma a que se lhe aplique o previsto na parte final do n.º 2 do artigo 18.º da
CRP.
A doutrina e a jurisprudência constitucional têm sido firmes no sentido de
concluir que o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode
ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais, face
à qual seja legítimo invocar o regime dos requisitos ou exigências que valem,
constitucionalmente, para as leis restritivas de direitos, liberdades e
garantias. Isto mesmo decorre, desde logo, da existência da
(impropriamente) chamada «constituição fiscal», na qual se definem as
garantias dos contribuintes, os princípios formais e materiais que conformam
o conceito constitucional de imposto, e a configuração deste último não como
afetação de um direito mas antes como obrigação pública de todos os
cidadãos, quando constituída nos termos do artigo 103.º da CRP. E se isto
assim é relativamente à imposição unilateral que forma o imposto, também o
é em relação a esses outros tributos que são as taxas [artigo 165.º, n.º 1,
alínea i) da CRP]
É abundante a jurisprudência constitucional sobre esta última figura.
De acordo com esta jurisprudência, existe uma conceção constitucional
de taxa que resulta da união entre as seguintes premissas: (i) a necessidade
da existência de uma relação sinalagmática entre o tributo que se presta e a
utilidade privada que dele se retira; (ii) contudo, a desnecessidade de uma
exata equivalência económica entre uma coisa e outra; (iii) a aferição do seu
montante em função não só do custo mas também do grau de utilidade
prestada; e (iv) a exigência de uma não manifesta desproporcionalidade na
sua fixação (Acórdão n.º 115/2002: itálico nosso).
Quer isto dizer que, se a «conceção constitucional de tributo» – a qual
inclui impostos e taxas – é inimiga de qualquer construção que veja
similitudes entre estas imposições e as vulgares restrições a direitos,
liberdades e garantias, tal como estas últimas são reguladas pelo artigo 18.º
da CRP, nem por isso se dispensa, quanto a elas, o requisito ou crivo da
proporcionalidade, enquanto expressão de um princípio que, como já se
disse, vale em Estado de direito (artigo 2.º) para todo o agir estadual. Esta
afirmação, no que às taxas diz respeito, adquire especial sentido na exata
medida em que, aí, a imposição pressupõe um vínculo de signalamaticidade
entre o que se presta (e o quanto se presta) e a utilidade privada que da
prestação se retira.
Contudo, neste domínio, o que o Tribunal sempre disse foi que da
Constituição apenas se retiraria a exigência de uma não manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante devido, dada a impossibilidade
de entender o elemento estrutural da taxa (a «correspectividade» ou
«sinalagmaticidade», vistas essencialmente como categorias jurídicas), como
algo equivalente a uma correspondência económica estrita entre o montante
a prestar e o valor da respetiva contraprestação (entre muitos outros,
Acórdãos n.os 115/02; 1108/96; 640/95; 461/87; 205/87).
8. Não havendo razões para dissentir desta firme e já antiga
jurisprudência, também se não vê como, in casu, concluir pela
inconstitucionalidade da interpretação da norma adotada pela decisão
recorrida, com fundamento em violação do princípio da proporcionalidade.
Face aos elementos disponíveis, é impossível afirmar que existe uma
manifesta desproporcionalidade entre o montante devido pelo recorrente e a
contraprestação por ele obtida, contraprestação essa que – como já se disse –
se traduziu no licenciamento do posto de combustível que o mesmo
recorrente economicamente explora. Não estando estes dois elementos, que
compõem o «sinalagma» próprio da taxa, relacionados entre si através dos
critérios da equivalência económica, e não sendo possível determinar que o
primeiro – devido ao sentido atribuído pela decisão recorrida à norma
aplicada in casu – atingiu um montante tal que onera de forma excessiva a
exploração económica do bem, impossível também se torna concluir que
houve, por efeito da interpretação adotada pela instância, uma manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante da taxa. Tanto basta para que
se não julgue inconstitucional tal interpretação, por violação do princípio da
proporcionalidade.
Da eventual violação do princípio da justiça
10. As considerações acabadas de tecer (inclusive, no que toca à
inaplicabilidade, ao caso, do disposto no artigo 266.º da CRP), valem na
íntegra para a invocada violação do princípio da justiça, decorrente também
da «ideia» de Estado de direito consagrada no artigo 2.º da CRP. A total
ausência de elementos fácticos suficientes torna impossível suportar um juízo
sobre a matéria. Por outro lado, acresce ser ainda discutível que o princípio
da justiça, em si mesmo considerado, assuma relevância autónoma para
efeito de controlo de constitucionalidade [a doutrina tende a minimizar o
alcance prescritivo deste princípio, considerando-o «um princípio aglutinador
de subprincípios que encontram tradução autónoma noutros preceitos
constitucionais e legais – como é o caso da igualdade, da proporcionalidade e
da boa fé» e «residualmente, um princípio como uma “capacidade irradiante”
própria» (leia-se, entre outros, DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de
Direito Administrativo, Volume II, Coimbra, 2.ª edição, 2011, p. 151; em
sentido aparentemente idêntico, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA,
Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra,
1993, p. 925)]. Tal discussão, porém, é inútil para os presentes autos, posto
que o decisivo é que não existe qualquer evidência de excesso ou injustiça
resultante da interpretação normativa que foi acolhida na decisão recorrida.
11. Em suma, não se descortina qualquer vício de inconstitucionalidade
na alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro,
na redação do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na interpretação
que vinha sindicada.

Estando em causa, no presente recurso, interpretação do citado


preceito legal que materialmente equivale àquela sobre que recaiu a
pronúncia do Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 846/14, e não
havendo razões para dissentir das razões invocadas, é de reiterar o juízo
de não inconstitucionalidade nele formulado.
4. Pelo exposto, decide-se:
a) não julgar inconstitucional a norma da alínea l) do n.º 1 do artigo
15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação do Decreto-
Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na interpretação segundo a qual pelo
estabelecimento ou ampliação de postos de combustível é devida taxa por
cada mangueira abastecedora de combustível instalada, atribuindo-se à
expressão «bomba abastecedora de combustível» o sentido de
«mangueira abastecedora de combustível».
b) Negar, em consequência, provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em vinte e cinco
(25) unidades de conta.
Lisboa, 14 de janeiro de 2015 - Carlos Fernandes Cadilha - Catarina
Sarmento e Castro - Maria José Rangel de Mesquita- Lino Rodrigues
Ribeiro - Maria Lúcia Amaral
ACÓRDÃO Nº 115/2015

Processo n.º 963/14


2.ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

Relatório
A., Limitada, impugnou o ato de liquidação no valor de € 6.811,50,
correspondente à taxa a que se refere a alínea l), do n.º 1, do artigo 15.º,
do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, atualizada pelo Decreto-Lei
n.º 25/2004, de 24 de janeiro, relativa ao posto de abastecimento de
combustíveis localizado na EN n.º 1, ao Km. 278,030, em S. João da
Madeira, praticado pelo Diretor Regional de Aveiro da B., S.A.

No Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro foi proferida sentença,


em 10 de maio de 2013 que julgou improcedente a impugnação.

A Impugnante recorreu desta decisão para o Tribunal Central


Administrativo Norte que julgou improcedente o recurso.

A Impugnante interpôs recurso desta decisão para o Tribunal


Constitucional, questionando a constitucionalidade do artigo 15.º, n.º 1,
l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação que lhe foi
conferida pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na
interpretação de que as taxas aí previstas incidem sobre o número de
mangueiras e não sobre as bombas abastecedoras, por violação do artigo
266.º, n.º 2, da Constituição.

Apresentou alegações com as seguintes conclusões.


A) A Recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a
constitucionalidade da norma contida no art. 15º, n.º 1, al. l) do Decreto-Lei
n.º 13/71, se for interpretada no sentido de se entender bomba de
combustível como mangueira abastecedora, por entender que a mesma
padecerá de várias inconstitucionalidades, ocorrendo uma frontal violação
dos princípios constitucionalmente consagrados da proporcionalidade e
justiça - v. art. 266º, n.º 2 CRP - daliberdade de iniciativa económica privada -
art. 61º/1 - além de ser organicamente inconstitucional.
B) Sem prejuízo de esta norma ter sido revogada multo recentemente
pelo Decreto-lei n.º 87/2014, de 29/05, a verdade é que a ora Recorrente tem
sido alvo de inúmeras e sucessivas liquidações deste tipo de taxas sobre
mangueiras abastecedoras de combustível, por parte das Estradas de
Portugal, referentes aos vários postos de abastecimento que detém por todo o
território nacional, que considera não só ilegais, como inconstitucionais,
razão pela qual pretende submeter à apreciação de V. Exas. esta questão que
se afigura de grande relevância jurídica e social.
C) É inequívoco que a letra do preceito em causa determina a Incidência
objetiva da taxa sobre as bombas abastecedoras não havendo quaisquer
razões lógico-jurídicas que levam a que a norma em causa possa ser objeto de
uma interpretação corretiva.
D) Com efeito, esta norma de incidência objetiva manteve-se inalterada,
continuando a base da tributação a ser as bombas de abastecimento e não as
mangueiras dessas bombas, que são apenas "elementos” dessas bombas,
sendo que a bomba de abastecimento é o dispositivo mecânico que permite,
designadamente, mover ou elevar materiais líquidos, no caso, combustíveis,
desde o depósito que está enterrado no posto, até ao depósito do veículo a
abastecer.
E) Se o legislador tivesse pretendido alterar a base da incidência objetiva
desta taxa, passando a assentar no número de mangueiras e não nas bombas,
seguramente que o teria escrito expressamente e não teria mantido o mesmo
texto, quando em 2004, através do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, alterou
a norma, mas mantendo inalterada a base de incidência objetiva de
tributação - quando em 2004 já proliferavam as bombas multiproduto.
F) Deste modo, e de acordo com as regras e princípios da interpretação e
aplicação da lei consagrados no artigo 9.º, n.º 3 do Código Civil, em que o
intérprete deve sempre presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento
corretamente e em termos adequados, conclui-se que a taxação desta norma
deve Incidir sobre a bomba de combustível enquanto possibilidade de
extração do mesmo do depósito onde está armazenado para o recetáculo do
veículo automóvel.
G) Além disto, diga-se que por uma questão prática e por impossibilidade
física, o abastecimento apenas pode ser feito em simultâneo por dois
veículos, um de cada lado da bomba, no máximo!
H) O que se tributa não deve ser a disponibilização de um produto, mas o
benefício retirado da possibilidade de em determinado momento um veículo
automóvel ser abastecido no posto de abastecimento, e por isso, as
possibilidades de abastecimento não são proporcionais ao número de
mangueiras.
I) Já vários Acórdãos do TC se pronunciaram sobre esta questão,
referindo que o critério de fixação do quantum de uma taxa é relevante, em
termos de se aferir da utilidade que o sujeito passivo dela extrai, não
podendo ser completamente alheio aos custos da entidade pública ou a essa
utilidade.
J) Perante esta jurisprudência, decorre que o critério encontrado pela B.
para fixar o montante das taxas a pagar, nos termos do referido art. 15º, n.º
1, al. l) do DL 13/71, baseando-se no número de mangueiras e não no número
de bombas Já constitui uma total desproporção, que compromete a
correspondência que deverá existir entre o serviço prestado (o
licenciamento) e a utilidade que a entidade que explora os postos retira.
K) Se é verdade que uma mangueira é o equipamento da bomba de
abastecimento que representa uma possibilidade de saída do carburante do
depósito onde este se encontra armazenado para o depósito do veículo, o
facto é que cada cliente apenas poderá optar por um produto de cada vez,
não obstante ter várias ofertas de produtos (geralmente, são quatro os
produtos disponibilizados: gasóleo, gasolina s/ chumbo 95 e 98, e gasolina
"Gforce”).
L) Nem poderá a A. dizer que o licenciamento rodoviário que é feito
nestes moldes tem como finalidade “garantir a prevenção das condições de
segurança e circulação na estrada e dos seus utentes" eventualmente,
traduzida numa maior necessidade de manutenção das estradas, e que um
maior número de mangueiras "implica o necessário aumento de número de
entradas e saídas da estrada e o aumento do respetivo tráfego médio diário
da via que procuram."
M) Porque todos estes argumentos, para além de não terem ficado
provados nos autos, são totalmente falaciosos e não têm o mínimo de
correspondência com a realidade.
N) Em primeiro lugar, porque hoje em dia, como é do conhecimento geral
e facto notório, quase todas as operadoras de postos de abastecimento
dispõem dos mesmos carburantes, não sendo pelo fator produto que um
cliente vai escolher determinado posto para abastecer o seu veículo (mas sim
pelo fator preço ou eventuais descontos efetuados).
O) E em segundo lugar, o tráfego automóvel não é proporcional ao
aumento das mangueiras de um posto, nem implica um maior número de
entradas ou saídas do mesmo, isto porque os automobilistas utilizam
determinada estrada (nacional. regional ou autoestrada) em função do
respetivo destino e não em função de existir determinado posto de
abastecimento ou área de serviço nessa via.
P) Ora, a cobrança de uma taxa pelo número de mangueiras e não pelo
número de bombas de abastecimento, pelo respetivo licenciamento, não é a
adequada para assegurar o fim de interesse público que supostamente se visa
atingir; não é indispensável e excede o que seria razoável em relação aos
objetivos a prosseguir.
Q) Taxar assim uma bomba não pelo número de utilizadores potenciais,
mas pelo número de mangueiras existentes, significa apenas uma "caça”'
desproporcional e ilegítima à taxa e uma violação da livre iniciativa
económica privada.
R) É que na verdade e face ao exposto, a interpretação (inconstitucional)
supra referida feita pela B., está a impor à Recorrente que se organize
economicamente de uma única forma: que cada bomba não pode ter mais de
uma mangueira (voltando ao sistema das bombas monoproduto), com graves
prejuízos para a própria eficiência económica assim como com prejuízos
iguais para os consumidores, que verão menor disponibilidade de
combustíveis e mais tempo de espera.
S) Aí, sim, o resultado poderá ser maior insegurança no tráfego, pelo
acumular de demasiadas viaturas à espera de abastecer em cada posto de
combustíveis…
T) A ratio legis desta norma não poderá dispensar esta análise em que
chegaremos à conclusão que é manifestamente desproporcional,
completamente alheio e excessivo, até desta perspetiva da utilidade para o
operador do posto, ter que pagar uma taxa pelo licenciamento das bombas,
entendidas como mangueiras abastecedoras.
U) É esta proibição do excesso, a falta de razoabilidade resultante da
liquidação das taxas pelo número de mangueiras que se verifica no caso e
que impõe a conclusão de qua há violação do princípio constitucional da
proporcionalidade e da justiça.
V) Ainda quanto a este ponto e sem prescindir de todos os argumentos
apresentados no sentido da inconstitucionalidade desta interpretação do art.
15º, n.º 1, al. l) do refendo DL, diga-se que o recentíssimo Decreto-Lei n.º
87/2014, de 29/05, veio revogar o referido art. 15º/1/al. l) do DL 13/71, com
efeitos a partir de 30/05/2014, substituindo a taxação de bombas de
combustível, pelo “número de litros de combustíveis vendidos em cada ano”.
W) O que nos leva a reafirmar o caráter mais funcional e prático desta
norma, em que a taxa deverá incidir pela utilidade económica que é retirada
da própria atividade do posto de abastecimento de combustíveis e não pela
quantidade de equipamento, v.g mangueiras/pistolas.
X) Além disto, o ato de liquidação não resulta de um sinalagma
proveniente do exercício do zelo pela segurança da circulação ou do impacto
nas condições de segurança da circulação Imanente à construção ou
existência do posto de abastecimento em causa.
Y) Pelo que nos termos em que este tributo é exigido apenas se pode
considerar um imposto e por isso verifica-se a apontada inconstitucionalidade
orgânica, por violação do art. 103º, n.º 2 e 165º, n.º 1, al. l) ambos da CRP,
pois como ficou demonstrado nos autos existe uma impossibilidade prática de
mais que uma viatura abastecer numa bomba, apesar de esta ter mais do que
uma mangueira (ou dois veículos se a bomba tiver dois lados de
abastecimento).
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., se requer que seja
determinada a inconstitucionalidade do art. 15º, n.º 1, al. l) do Decreto-Lei
n.º 13/71, como interpretado no sentido de se entender "bomba de
combustível” como “mangueira abastecedora” por violação dos princípios
constitucionais acima mencionados, como é de Lei e de Justiça!

A Recorrida apresentou contra-alegações em que se pronunciou pela


improcedência do recurso.

*
Fundamentação
A questão de inconstitucionalidade que constitui objeto do presente
recurso, foi recentemente apreciada pelo Tribunal Constitucional, nos
seus Acórdãos n.º 846/2014, 28/2015 e 90/2015 (acessíveis em
www.tribunalconstitucional.pt) que não julgaram inconstitucional a norma
da alínea l), do n.º 1, do artigo 15.º, do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de
janeiro, na redação do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na
interpretação segunda a qual pelo estabelecimento ou ampliação de
postos de combustível é devida taxa por cada mangueira abastecedora de
combustível instalada.
Invocou-se, em fundamento de um tal juízo de não
inconstitucionalidade, no primeiro destes acórdãos o seguinte:
«…3. A recorrente sustenta a inconstitucionalidade da interpretação que
o acórdão recorrido conferiu à alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei
n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro, interpretação segundo a qual pelo estabelecimento
ou ampliação de postos de combustível é devida taxa [no montante de
€1.362,30] por cada mangueira abastecedora de combustível instalada. No
entender da recorrente, tal interpretação viola os princípios da
proporcionalidade e da justiça, ínsitos no n.º 2 do artigo 266.º da
Constituição.
Deve começar por dizer-se – em consonância, aliás, com a argumentação
aduzida nas alegações do recurso – que, no caso, a incidência das taxas sobre
as bombas abastecedoras surge como um instrumento dirigido à salvaguarda
da finalidade legal do licenciamento, a qual, de acordo com o disposto no
artigo 12.º n.º 1, do Decreto-Lei n.º 13/71, consiste na não afetação da
estrada e da perfeita visibilidade do trânsito.
Contudo, e independentemente desta verificação de princípio, há que
sublinhar que o que está em causa nos presentes autos é a questão de saber
se a interpretação, adotada pelo tribunal a quo quanto ao disposto no artigo
15.º, n.º 1, alínea l) do já mencionado Decreto-Lei n.º 13/71, segundo a qual
«uma mangueira abastecedora de combustível» corresponde à expressão
«bomba abastecedora de combustível», é, por algum motivo, contrária à
Constituição. Não cabendo ao Tribunal ajuizar sobre o eventual «acerto» ou
«desacerto» que, no estrito plano infraconstitucional, possa ser reconhecida
a esta interpretação, o que se lhe pede resume-se à questão de saber se a
mesma [interpretação] contraria quaisquer «normas» ou «princípios»
constitucionais (artigo 277.º, n.º 1, da CRP), designadamente aqueles que a
recorrente invoca. Em suma, trata-se de saber se «taxar cada mangueira
instalada» (ao invés de «taxar a bomba de gasolina» em si mesma
considerada) tem como consequência a liquidação de um tributo em
montante que se deva considerar, face à Constituição, desproporcionado e
injusto.
Da eventual violação do princípio da proporcionalidade
4. Como é vulgarmente consabido, o princípio da proporcionalidade ou da
proibição do excesso encontra sede textual em diversos preceitos da
Constituição, entre os quais se incluem os artigos 18.º, n.º 2, in fine, e o
artigo 266.º, n.º 2.
Sobre o sentido a conferir a tal princípio tem sido constante a
jurisprudência do Tribunal. A ideia de «proporção» ou de «proibição do
excesso – ideia essa que, em Estado de direito, vincula as ações de todos os
poderes públicos – refere-se, diz o Tribunal, «fundamentalmente à
necessidade de uma relação equilibrada entre meios e fins: as ações
estaduais não devem, para realizar os seus fins, empregar meios que se
cifrem, pelo seu peso, em encargos excessivos (e, portanto, não equilibrados)
para as pessoas a quem se destinem» (cfr. Acórdão n.º 634/93). Além disso,
como se disse, entre muitos outros, no Acórdão n.º 187/2001, «o princípio da
proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação
(as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se
como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de
outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da
exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os
fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos
para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou
proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas
excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos)». Da
caracterização de cada um destes «testes» ou «subprincípios» se tem
encarregado ainda numerosa jurisprudência (veja-se, entre outros, o Acórdão
n.º 632/08).
5. A verificação da conformidade da norma ou interpretação normativa
sindicada com o princípio da proibição do excesso exige, contudo e antes de
mais, a consideração cautelosa do objeto do recurso e a caracterização da
posição jurídica da recorrente. É que, como bem se sabe, o juízo relativo à
«proporcionalidade» do agir estadual não se sustenta sempre do mesmo
modo, qualquer que seja a natureza da norma infraconstitucional que se
tenha que julgar e qualquer que seja a posição jurídica subjetiva por essa
mesma norma afetada. Pelo contrário: o iter metódico a seguir na
fundamentação desse juízo será diverso, devendo ser tanto mais exigente
quanto mais intensa for, in casu, a afetação, por via legislativa, de posições
jurídico-subjetivas que devam ser qualificadas como fundamentais.
6. Como se assinalou, a recorrente configura o juízo de
inconstitucionalidade por si alegado na violação dos princípios consagrados
no artigo 266.º, n.º 2 da CRP.
Contudo, não será seguramente este o «parâmetro» aplicável à questão
sob juízo.
O n.º 2 do artigo 266.º da CRP consagra os limites à atuação das
autoridades administrativas no exercício dos seus poderes discricionários. É
no contexto do uso destes poderes que a Administração está obrigada a agir
no respeito pelos princípios da proporcionalidade e da justiça. Ora, as taxas
em causa, em si mesmas consideradas, não resultam da prática de ato
discricionário, pois que se encontram diretamente previstas no ato normativo
que as suporta. Por outro lado, o objeto do presente recurso é constituído,
não por uma atuação administrativa, mas sim pela interpretação
(jurisdicional) de uma certa norma – como, aliás, não podia deixar de ser –,
norma essa incluída, de resto, em ato formalmente legislativo. Quer isto dizer
que não está em causa a questão de saber se a autoridade administrativa
agiu em (des)conformidade com a Constituição. O que está em causa é a
questão de saber se determinada norma, constante de ato legislativo e
aplicada pelo juiz da causa com certa interpretação, se conforma com as
exigências constitucionais pertinentes, mormente as que decorrem os
princípios da proporcionalidade e da justiça. O facto de estes últimos
receberem (também) apoio textual no n.º 2 do artigo 266.º da CRP não
implica portanto, só por si, que seja este o parâmetro a aplicar ao caso sub
judicio.
7. Excluída que está a aplicação ao caso do disposto no n.º 2 do artigo
266.º, resta saber se a norma sob juízo, contida em ato legislativo, se pode
configurar como norma restritiva de um direito, liberdade e garantia, de
forma a que se lhe aplique o previsto na parte final do n.º 2 do artigo 18.º da
CRP.
A doutrina e a jurisprudência constitucional têm sido firmes no sentido de
concluir que o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode
ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais, face
à qual seja legítimo invocar o regime dos requisitos ou exigências que valem,
constitucionalmente, para as leis restritivas de direitos, liberdades e
garantias. Isto mesmo decorre, desde logo, da existência da
(impropriamente) chamada «constituição fiscal», na qual se definem as
garantias dos contribuintes, os princípios formais e materiais que conformam
o conceito constitucional de imposto, e a configuração deste último não como
afetação de um direito mas antes como obrigação pública de todos os
cidadãos, quando constituída nos termos do artigo 103.º da CRP. E se isto
assim é relativamente à imposição unilateral que forma o imposto, também o
é em relação a esses outros tributos que são as taxas [artigo 165.º, n.º 1,
alínea i) da CRP]
É abundante a jurisprudência constitucional sobre esta última figura.
De acordo com esta jurisprudência, existe uma conceção constitucional
de taxa que resulta da união entre as seguintes premissas: (i) a necessidade
da existência de uma relação sinalagmática entre o tributo que se presta e a
utilidade privada que dele se retira; (ii) contudo, a desnecessidade de uma
exata equivalência económica entre uma coisa e outra; (iii) a aferição do seu
montante em função não só do custo mas também do grau de utilidade
prestada; e (iv) a exigência de uma não manifesta desproporcionalidade na
sua fixação (Acórdão n.º 115/2002: itálico nosso).
Quer isto dizer que, se a «conceção constitucional de tributo» – a qual
inclui impostos e taxas – é inimiga de qualquer construção que veja
similitudes entre estas imposições e as vulgares restrições a direitos,
liberdades e garantias, tal como estas últimas são reguladas pelo artigo 18.º
da CRP, nem por isso se dispensa, quanto a elas, o requisito ou crivo da
proporcionalidade, enquanto expressão de um princípio que, como já se
disse, vale em Estado de direito (artigo 2.º) para todo o agir estadual. Esta
afirmação, no que às taxas diz respeito, adquire especial sentido na exata
medida em que, aí, a imposição pressupõe um vínculo de signalamaticidade
entre o que se presta (e o quanto se presta) e a utilidade privada que da
prestação se retira.
Contudo, neste domínio, o que o Tribunal sempre disse foi que da
Constituição apenas se retiraria a exigência de uma não manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante devido, dada a impossibilidade
de entender o elemento estrutural da taxa (a «correspectividade» ou
«sinalagmaticidade», vistas essencialmente como categorias jurídicas), como
algo equivalente a uma correspondência económica estrita entre o montante
a prestar e o valor da respetiva contraprestação (entre muitos outros,
Acórdãos n.ºs 115/02; 1108/96; 640/95; 461/87; 205/87).
8. Não havendo razões para dissentir desta firme e já antiga
jurisprudência, também se não vê como, in casu, concluir pela
inconstitucionalidade da interpretação da norma adotada pela decisão
recorrida, com fundamento em violação do princípio da proporcionalidade.
Face aos elementos disponíveis, é impossível afirmar que existe uma
manifesta desproporcionalidade entre o montante devido pelo recorrente e a
contraprestação por ele obtida, contraprestação essa que – como já se disse –
se traduziu no licenciamento do posto de combustível que o mesmo
recorrente economicamente explora. Não estando estes dois elementos, que
compõem o «sinalagma» próprio da taxa, relacionados entre si através dos
critérios da equivalência económica, e não sendo possível determinar que o
primeiro – devido ao sentido atribuído pela decisão recorrida à norma
aplicada in casu – atingiu um montante tal que onera de forma excessiva a
exploração económica do bem, impossível também se torna concluir que
houve, por efeito da interpretação adotada pela instância, uma manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante da taxa. Tanto basta para que
se não julgue inconstitucional tal interpretação, por violação do princípio da
proporcionalidade.
Da eventual violação do princípio da justiça
10. As considerações acabadas de tecer (inclusive, no que toca à
inaplicabilidade, ao caso, do disposto no artigo 266.º da CRP), valem na
íntegra para a invocada violação do princípio da justiça, decorrente também
da «ideia» de Estado de direito consagrada no artigo 2.º da CRP. A total
ausência de elementos fácticos suficientes torna impossível suportar um juízo
sobre a matéria. Por outro lado, acresce ser ainda discutível que o princípio
da justiça, em si mesmo considerado, assuma relevância autónoma para
efeito de controlo de constitucionalidade [a doutrina tende a minimizar o
alcance prescritivo deste princípio, considerando-o «um princípio aglutinador
de subprincípios que encontram tradução autónoma noutros preceitos
constitucionais e legais – como é o caso da igualdade, da proporcionalidade e
da boa fé» e «residualmente, um princípio como uma “capacidade irradiante”
própria» (leia-se, entre outros, DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de
Direito Administrativo, Volume II, Coimbra, 2.ª edição, 2011, p. 151; em
sentido aparentemente idêntico, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA,
Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra,
1993, p. 925)]. Tal discussão, porém, é inútil para os presentes autos, posto
que o decisivo é que não existe qualquer evidência de excesso ou injustiça
resultante da interpretação normativa que foi acolhida na decisão recorrida.
11. Em suma, não se descortina qualquer vício de inconstitucionalidade
na alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro,
na redação do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na interpretação
que vinha sindicada.”
Aderindo à transcrita fundamentação conclui-se que não se verifica a
inconstitucionalidade material da interpretação normativa objeto do
presente recurso que foi alegada pelo Recorrente.
Mas a Recorrente, nas suas alegações, invocou ainda que a
interpretação normativa em causa sofre do vício de inconstitucionalidade
orgânica. Alega que sendo desproporcionada a taxa em causa, a mesma
resulta num verdadeiro imposto, pelo que se verifica uma
inconstitucionalidade orgânica, por violação da reserva de lei da
Assembleia da República em matéria fiscal (artigo 165.º, n.º 1, i), da
Constituição).
A apreciação desta questão encontra-se prejudicada pela
fundamentação do julgamento da inconstitucionalidade material, uma vez
que se considerou que não existe uma manifesta desproporcionalidade
entre o montante devido a título de taxa e a contraprestação obtida, pelo
que está afastada a possibilidade de se considerar que estamos perante
um verdadeiro imposto.
Por estas razões é de reiterar o juízo proferido nos Acórdãos n.º
846/2014, 28/2015 e 90/2015 e não havendo razões para dissentir das
razões invocadas, é de reiterar o juízo de não inconstitucionalidade nele
formulado.

*
Decisão
Nestes termos, decide-se:
a) não julgar inconstitucional a norma da alínea l) do n.º 1 do artigo
15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação do Decreto-
Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na interpretação segundo a qual pelo
estabelecimento ou ampliação de postos de combustível é devida taxa por
cada mangueira abastecedora de combustível instalada, atribuindo-se à
expressão «bomba abastecedora de combustível» o sentido de
«mangueira abastecedora de combustível»;
e, em consequência,
b) julgar improcedente o recurso interposto por A., Limitada.

*
Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades
de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do
Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (artigo 6.º, n.º 1, do mesmo
diploma).

Lisboa, 11 de fevereiro de 2015 - João Cura Mariano - Ana Guerra


Martins - Pedro Machete - Fernando Vaz Ventura -Joaquim de Sousa
Ribeiro
ACÓRDÃO Nº 121/2015

Processo n.º 753/14


3.ª Secção
Relator: Conselheiro Catarina Sarmento e Castro

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I- Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Central Administrativo


Sul, veio A., S.A. interpor recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1,
alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização,
Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante
designada por LTC), identificando, como objeto do recurso, a
interpretação, extraída do artigo 15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º
13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro, conducente ao sentido de as taxas ali previstas
incidirem sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas
abastecedoras dos postos de abastecimento.
Invoca a recorrente a inconstitucionalidade material de tal sentido
interpretativo, por violação direta do artigo 266.º, n.º 2, da Constituição
da República Portuguesa, e dos princípios de proporcionalidade e de
justiça consagrados em tal preceito.

2. O processo teve início na impugnação, apresentada pela aqui


recorrente, contra o ato de liquidação de taxa relativa à emissão de
licença de obras de remodelação de um posto de abastecimento de
combustíveis. Invocou a recorrente, além do mais, a
inconstitucionalidade da norma de incidência objetiva da taxa colocada
em crise, plasmada no artigo 15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º
13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro.
Por decisão de 27 de maio de 2013, o Tribunal Administrativo e Fiscal
de Beja julgou a impugnação improcedente, mantendo o ato de
liquidação.
Inconformada, a aqui recorrente interpôs recurso para o Tribunal
Central Administrativo Sul.
Por acórdão de 30 de abril de 2014, foi negado provimento ao recurso
e confirmada a decisão recorrida.
É deste acórdão que a recorrente interpõe o presente recurso de
constitucionalidade.
3. Notificada para o efeito, a recorrente apresentou alegações,
concluindo do seguinte modo:
“A) A Recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a
constitucionalidade da norma contida no art. 15º, n.º 1, al. l) do Decreto-Lei n.º
13/71, se for interpretada no sentido de se entender bomba de combustível
como mangueira abastecedora, por entender que a mesma padecerá de várias
inconstitucionalidades, ocorrendo uma frontal violação dos princípios
constitucionalmente consagrados da proporcionalidade e justiça - v. art. 266º,
n.º 2 CRP – da liberdade de iniciativa económica privada – art. 61º/1 – além de
ser organicamente inconstitucional.
B) Sem prejuízo de esta norma ter sido revogada muito recentemente pelo
Decreto-Lei n.º 84/2014, de 29/05, a verdade é que a ora Recorrente tem sido
alvo de inúmeras e sucessivas liquidações deste tipo de taxas sobre mangueiras
abastecedoras de combustível, por parte das Estradas de Portugal, referentes
aos vários postos de abastecimento que detém por todo o território nacional,
que considera não só ilegais, como inconstitucionais, razão pela qual pretende
submeter à apreciação de V. Exas. esta questão que se afigura de grande
relevância jurídica e social.
C) É inequívoco que a letra do preceito em causa determina a incidência
objetiva da taxa sobre as bombas abastecedoras, não havendo quaisquer razões
lógico-jurídicas que levem a que a norma em causa possa ser objeto de uma
interpretação corretiva.
D) Com efeito, esta norma de incidência objetiva manteve-se inalterada,
continuando a base da tributação a ser as bombas de abastecimento e não as
mangueiras dessas bombas, que são apenas “elementos” dessas bombas, sendo
que a bomba de abastecimento é o dispositivo mecânico que permite,
designadamente, mover ou elevar materiais líquidos, no caso, combustíveis,
desde o depósito que está enterrado no posto, até ao depósito do veículo a
abastecer.
E) Se o legislador tivesse pretendido alterar a base da incidência objetiva
desta taxa, passando a assentar no número de mangueiras e não nas bombas,
seguramente que o teria escrito expressamente e não teria mantido o mesmo
texto, quando em 2004, através do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, alterou a
norma, mas mantendo inalterada a base de incidência objetiva de tributação –
quando em 2004 já proliferavam as bombas multiproduto.
F) Deste modo, e de acordo com as regras e princípios da interpretação e
aplicação da lei consagrados no artigo 9.°, n.° 3 do Código Civil, em que o
intérprete deve sempre presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento
corretamente e em termos adequados, conclui-se que a taxação desta norma
deve incidir sobre a bomba de combustível enquanto possibilidade de extração
do mesmo do depósito onde está armazenado para o recetáculo do veículo
automóvel.
G) Além disto, diga-se que por uma questão prática e por impossibilidade
física, o abastecimento apenas pode ser feito em simultâneo por dois veículos,
um de cada lado da bomba, no máximo!
H) O que se tributa não deve ser a disponibilização de um produto, mas o
benefício retirado da possibilidade de em determinado momento um veículo
automóvel ser abastecido no posto de abastecimento, e por isso, as
possibilidades de abastecimento não são proporcionais ao número de
mangueiras.
I) Já vários Acórdãos do TC se pronunciaram sobre esta questão, referindo
que o critério de fixação do quantum de uma taxa é relevante, em termos de se
aferir da utilidade que o sujeito passivo dela extrai, não podendo ser
completamente alheio aos custos da entidade pública ou a essa utilidade.
J) Perante esta jurisprudência, decorre que o critério encontrado pela B.
para fixar o montante das taxas a pagar, nos termos do referido art. 15º, n.º 1,
al. l) do DL 13/71, baseando-se no número de mangueiras e não no número de
bombas já constitui uma total desproporção, que compromete a
correspondência que deverá existir entre o serviço prestado (o licenciamento) e
a utilidade que a entidade que explora os postos retira.
K) Se é verdade que uma mangueira é o equipamento da bomba de
abastecimento que representa uma possibilidade de saída do carburante do
depósito onde este se encontra armazenado para o depósito do veículo, o facto é
que cada cliente apenas poderá optar por um produto de cada vez, não obstante
ter várias ofertas de produtos (geralmente, são quatro os produtos
disponibilizados: gasóleo, gasolina s/ chumbo 95 e 98, e gasolina “Gforce”).
L) Nem poderá a B. dizer que o licenciamento rodoviário que é feito nestes
moldes tem como finalidade “garantir a prevenção das condições de segurança
e circulação na estrada e dos seus utentes” eventualmente, traduzida numa
maior necessidade de manutenção das estradas, e que um maior número de
mangueiras “implica o necessário aumento do número de entradas e saídas da
estrada e o aumento do respectivo tráfego médio diário da via que procuram”.
M) Porque todos estes argumentos, para além de não terem ficado provados
nos autos, são totalmente falaciosos e não têm o mínimo de correspondência
com a realidade.
N) Em primeiro lugar, porque hoje em dia, como é do conhecimento geral e
facto notório, quase todas as operadoras de postos de abastecimento dispõem
dos mesmos carburantes, não sendo pelo fator produto que um cliente vai
escolher determinado posto para abastecer o seu veículo (mas sim pelo fator
preço ou eventuais descontos efetuados).
O) E em segundo lugar, o tráfego automóvel não é proporcional ao aumento
das mangueiras de um posto, nem implica um maior número de entradas ou
saídas do mesmo, isto porque os automobilistas utilizam determinada estrada
(nacional, regional ou autoestrada) em função do respectivo destino e não em
função de existir determinado posto de abastecimento ou área de serviço nessa
via.
P) Ora, a cobrança de uma taxa pelo número de mangueiras e não pelo
número de bombas de abastecimento, pelo respectivo licenciamento, não é a
adequada para assegurar o fim de interesse público que supostamente se visa
atingir; não é indispensável e excede o que seria razoável em relação aos
objetivos a prosseguir.
Q) Taxar assim uma bomba não pelo número de utilizadores potenciais, mas
pelo número de mangueiras existentes, significa apenas uma “caça”
desproporcional e ilegítima à taxa e uma violação da livre iniciativa económica
privada.
R) É que na verdade e face ao exposto, a interpretação (inconstitucional)
supra referida feita pela B., está a impor à Recorrente que se organize
economicamente de uma única forma: que cada bomba não pode ter mais de
uma mangueira (voltando ao sistema das bombas monoproduto), com graves
prejuízos para a própria eficiência económica assim como com prejuízos iguais
para os consumidores, que verão menor disponibilidade de combustíveis e mais
tempo de espera.
S) Aí, sim, o resultado poderá ser maior insegurança no tráfego, pelo
acumular de demasiadas viaturas à espera de abastecer em cada posto de
combustíveis...
T) A ratio legis desta norma não poderá dispensar esta análise em que
chegaremos à conclusão que é manifestamente desproporcional,
completamente alheio e excessivo, até desta perspetiva da utilidade para o
operador do posto, ter que pagar uma taxa pelo licenciamento das bombas,
entendidas como mangueiras abastecedoras.
U) É esta proibição do excesso, a falta de razoabilidade resultante da
liquidação das taxas pelo número de mangueiras que se verifica no caso e que
impõe a conclusão de qua há violação do princípio constitucional da
proporcionalidade e da justiça.
V) Ainda quanto a este ponto e sem prescindir de todos os argumentos
apresentados no sentido da inconstitucionalidade desta interpretação do art.
15º, n.º 1, al. l) do referido DL, diga-se que o recentíssimo Decreto-Lei n.º
84/2014, de 29/05, veio revogar o referido art. 15º/1/al. l) do DL 13/71, com
efeitos a partir de 30/05/2014, substituindo a taxação de bombas de
combustível, pelo “número de litros de combustíveis vendidos em cada ano”.
W) O que nos leva a reafirmar o carácter mais funcional e prático desta
norma, em que a taxa deverá incidir pela utilidade económica que é retirada da
própria atividade do posto de abastecimento de combustíveis e não pela
quantidade de equipamento, v.g mangueiras/pistolas.
X) Além disto, o ato de liquidação não resulta de um sinalagma proveniente
do exercício do zelo pela segurança da circulação ou do impacto nas condições
de segurança da circulação imanente à construção ou existência do posto de
abastecimento em causa.
Y) Pelo que nos termos em que este tributo é exigido apenas se pode
considerar um imposto e por isso verifica-se a apontada inconstitucionalidade
orgânica, por violação do art. 103º, n.º 2 e 165º, n.º 1, al. i) ambos da CRP, pois
como ficou demonstrado nos autos existe uma impossibilidade prática de mais
que uma viatura abastecer numa bomba, apesar de esta ter mais do que uma
mangueira (ou dois veículos se a bomba tiver dois lados de abastecimento).

Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., se requer que seja


determinada a inconstitucionalidade do art. 15º, n.º 1, al. l) do Decreto-Lei n.º
13/71, como interpretado no sentido de se entender “bomba de combustível”
como “mangueira abastecedora”, por violação dos princípios constitucionais
acima mencionados, como é de Lei e de Justiça!”

A recorrida B., S.A. igualmente apresentou alegações, pugnando, a


final, pela improcedência do recurso.

Cumpre apreciar.

II - Fundamentos

4. Esta 3.ª Secção do Tribunal Constitucional já teve oportunidade de


proferir acórdão, no âmbito de autos de recurso com objeto e alegações
semelhantes aos apresentados neste processo.
Dada a similitude de situações, reiteramos a fundamentação aduzida
em tal acórdão, com o n.º 28/2015 (disponível
em www.tribunalconstitucional.pt):
“(…) A recorrente, no requerimento de interposição do recurso,
expressamente afirmou que «o presente recurso para o Tribunal Constitucional é
restrito à questão da inconstitucionalidade material do art. 15.º, n.º 1, alínea l),
do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei
n.º 25/2004, de 24/01, na parte em que o mesmo é interpretado e aplicado no
sentido de as taxas aí previstas incidirem sobre o número de mangueiras e não
sobre as bombas abastecedoras dos postos de abastecimento, por violação direta
do art. 266.º/2 da CRP e dos princípios da proporcionalidade e da justiça nele
consagrados».
Porém, em sede de alegações, invocou, ainda, a questão da
inconstitucionalidade orgânica do referido preceito legal, por violação do
princípio da legalidade tributária (artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i),
da Constituição), e a questão da inconstitucionalidade material do mesmo
preceito, por violação da liberdade de iniciativa económica privada,
consagrada no artigo 61.º, n.º 1, da mesma Lei Fundamental.
Ora, independentemente da perspetiva que se adote quanto ao exato
sentido e alcance do conceito processual de objeto do recurso, no âmbito da
fiscalização concreta da constitucionalidade, afigura-se que, sem prejuízo do
poder conferido pelo artigo 79.º-C da LTC, não está o Tribunal Constitucional
obrigado a pronunciar-se sobre questões de inconstitucionalidade cuja
apreciação não foi requerida no momento processualmente oportuno, que é
precisamente o do requerimento de interposição do recurso, donde deve
consequentemente constar a indicação, não apenas da norma cuja
inconstitucionalidade se pretende ver apreciada, mas também da norma ou
princípio constitucional que se considera violado (artigo 75.º-A, nºs. 1 e 2, da
LTC) – cf., neste sentido, Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 139/03,
424/2007 e 107/1011.
Sendo este o caso, em relação às novas questões de inconstitucionalidade
colocadas em sede de alegações do recurso, apenas se apreciará a questão da
inconstitucionalidade do artigo 15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71,
de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01,
«na parte em que o mesmo é interpretado e aplicado no sentido de as taxas aí
previstas incidirem sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas
abastecedoras dos postos de abastecimento, por violação direta do art.
266.º/2 da CRP e dos princípios da proporcionalidade e da justiça nele
consagrados», que é única questão de inconstitucionalidade que a recorrente,
em observância do correspondente ónus legal, enunciou no requerimento de
interposição do recurso.
(…) A questão de inconstitucionalidade que, feita a antecedente
delimitação, constitui objeto do presente recurso, foi recentemente apreciada
pelo Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 846/2014, que não julgou
inconstitucional a norma da alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º
13/71, de 23 de janeiro, na redação do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de
janeiro, na interpretação segundo a qual pelo estabelecimento ou ampliação
de postos de combustível é devida taxa por cada mangueira abastecedora de
combustível instalada (atribuindo-se à expressão «bomba abastecedora de
combustível» o sentido de «mangueira abastecedora de combustível»).
Invocou-se, em fundamento de um tal juízo de não inconstitucionalidade,
o seguinte:

«3. A recorrente sustenta a inconstitucionalidade da interpretação que o


acórdão recorrido conferiu à alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei
n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro, interpretação segundo a qual pelo estabelecimento
ou ampliação de postos de combustível é devida taxa [no montante de
€1.362,30] por cada mangueira abastecedora de combustível instalada. No
entender da recorrente, tal interpretação viola os princípios da
proporcionalidade e da justiça, ínsitos no n.º 2 do artigo 266.º da
Constituição.
Deve começar por dizer-se – em consonância, aliás, com a argumentação
aduzida nas alegações do recurso – que, no caso, a incidência das taxas sobre
as bombas abastecedoras surge como um instrumento dirigido à salvaguarda
da finalidade legal do licenciamento, a qual, de acordo com o disposto no
artigo 12.º n.º 1, do Decreto-Lei n.º 13/71, consiste na não afetação da
estrada e da perfeita visibilidade do trânsito.
Contudo, e independentemente desta verificação de princípio, há que
sublinhar que o que está em causa nos presentes autos é a questão de saber
se a interpretação, adotada pelo tribunal a quo quanto ao disposto no artigo
15.º, n.º 1, alínea l) do já mencionado Decreto-Lei n.º 13/71, segundo a qual
«uma mangueira abastecedora de combustível» corresponde à expressão
«bomba abastecedora de combustível», é, por algum motivo, contrária à
Constituição. Não cabendo ao Tribunal ajuizar sobre o eventual «acerto» ou
«desacerto» que, no estrito plano infraconstitucional, possa ser reconhecida
a esta interpretação, o que se lhe pede resume-se à questão de saber se a
mesma [interpretação] contraria quaisquer «normas» ou «princípios»
constitucionais (artigo 277.º, n.º 1, da CRP), designadamente aqueles que a
recorrente invoca. Em suma, trata-se de saber se «taxar cada mangueira
instalada» (ao invés de «taxar a bomba de gasolina» em si mesma
considerada) tem como consequência a liquidação de um tributo em
montante que se deva considerar, face à Constituição, desproporcionado e
injusto.
Da eventual violação do princípio da proporcionalidade
4. Como é vulgarmente consabido, o princípio da proporcionalidade ou da
proibição do excesso encontra sede textual em diversos preceitos da
Constituição, entre os quais se incluem os artigos 18.º, n.º 2, in fine, e o
artigo 266.º, n.º 2.
Sobre o sentido a conferir a tal princípio tem sido constante a
jurisprudência do Tribunal. A ideia de «proporção» ou de «proibição do
excesso – ideia essa que, em Estado de direito, vincula as ações de todos os
poderes públicos – refere-se, diz o Tribunal, «fundamentalmente à
necessidade de uma relação equilibrada entre meios e fins: as ações
estaduais não devem, para realizar os seus fins, empregar meios que se
cifrem, pelo seu peso, em encargos excessivos (e, portanto, não equilibrados)
para as pessoas a quem se destinem» (cfr. Acórdão n.º 634/93). Além disso,
como se disse, entre muitos outros, no Acórdão n.º 187/2001, «o princípio da
proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação
(as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se
como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de
outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da
exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os
fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos
para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou
proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas
excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos)». Da
caracterização de cada um destes «testes» ou «subprincípios» se tem
encarregado ainda numerosa jurisprudência (veja-se, entre outros, o Acórdão
n.º 632/08).
5. A verificação da conformidade da norma ou interpretação normativa
sindicada com o princípio da proibição do excesso exige, contudo e antes de
mais, a consideração cautelosa do objeto do recurso e a caracterização da
posição jurídica da recorrente. É que, como bem se sabe, o juízo relativo à
«proporcionalidade» do agir estadual não se sustenta sempre do mesmo
modo, qualquer que seja a natureza da norma infraconstitucional que se
tenha que julgar e qualquer que seja a posição jurídica subjetiva por essa
mesma norma afetada. Pelo contrário: o iter metódico a seguir na
fundamentação desse juízo será diverso, devendo ser tanto mais exigente
quanto mais intensa for, in casu, a afetação, por via legislativa, de posições
jurídico-subjetivas que devam ser qualificadas como fundamentais.
6. Como se assinalou, a recorrente configura o juízo de
inconstitucionalidade por si alegado na violação dos princípios consagrados
no artigo 266.º, n.º 2 da CRP.
Contudo, não será seguramente este o «parâmetro» aplicável à questão
sob juízo.
O n.º 2 do artigo 266.º da CRP consagra os limites à atuação das
autoridades administrativas no exercício dos seus poderes discricionários. É
no contexto do uso destes poderes que a Administração está obrigada a agir
no respeito pelos princípios da proporcionalidade e da justiça. Ora, as taxas
em causa, em si mesmas consideradas, não resultam da prática de ato
discricionário, pois que se encontram diretamente previstas no ato normativo
que as suporta. Por outro lado, o objeto do presente recurso é constituído,
não por uma atuação administrativa, mas sim pela interpretação
(jurisdicional) de uma certa norma – como, aliás, não podia deixar de ser –,
norma essa incluída, de resto, em ato formalmente legislativo. Quer isto dizer
que não está em causa a questão de saber se a autoridade administrativa
agiu em (des)conformidade com a Constituição. O que está em causa é a
questão de saber se determinada norma, constante de ato legislativo e
aplicada pelo juiz da causa com certa interpretação, se conforma com as
exigências constitucionais pertinentes, mormente as que decorrem os
princípios da proporcionalidade e da justiça. O facto de estes últimos
receberem (também) apoio textual no n.º 2 do artigo 266.º da CRP não
implica portanto, só por si, que seja este o parâmetro a aplicar ao caso sub
judicio.
7. Excluída que está a aplicação ao caso do disposto no n.º 2 do artigo
266.º, resta saber se a norma sob juízo, contida em ato legislativo, se pode
configurar como norma restritiva de um direito, liberdade e garantia, de
forma a que se lhe aplique o previsto na parte final do n.º 2 do artigo 18.º da
CRP.
A doutrina e a jurisprudência constitucional têm sido firmes no sentido de
concluir que o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode
ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais, face
à qual seja legítimo invocar o regime dos requisitos ou exigências que valem,
constitucionalmente, para as leis restritivas de direitos, liberdades e
garantias. Isto mesmo decorre, desde logo, da existência da
(impropriamente) chamada «constituição fiscal», na qual se definem as
garantias dos contribuintes, os princípios formais e materiais que conformam
o conceito constitucional de imposto, e a configuração deste último não como
afetação de um direito mas antes como obrigação pública de todos os
cidadãos, quando constituída nos termos do artigo 103.º da CRP. E se isto
assim é relativamente à imposição unilateral que forma o imposto, também o
é em relação a esses outros tributos que são as taxas [artigo 165.º, n.º 1,
alínea i) da CRP]
É abundante a jurisprudência constitucional sobre esta última figura.
De acordo com esta jurisprudência, existe uma conceção constitucional
de taxa que resulta da união entre as seguintes premissas: (i) a necessidade
da existência de uma relação sinalagmática entre o tributo que se presta e a
utilidade privada que dele se retira; (ii) contudo, a desnecessidade de uma
exata equivalência económica entre uma coisa e outra; (iii) a aferição do seu
montante em função não só do custo mas também do grau de utilidade
prestada; e (iv) a exigência de uma não manifesta desproporcionalidade na
sua fixação (Acórdão n.º 115/2002: itálico nosso).
Quer isto dizer que, se a «conceção constitucional de tributo» – a qual
inclui impostos e taxas – é inimiga de qualquer construção que veja
similitudes entre estas imposições e as vulgares restrições a direitos,
liberdades e garantias, tal como estas últimas são reguladas pelo artigo 18.º
da CRP, nem por isso se dispensa, quanto a elas, o requisito ou crivo da
proporcionalidade, enquanto expressão de um princípio que, como já se
disse, vale em Estado de direito (artigo 2.º) para todo o agir estadual. Esta
afirmação, no que às taxas diz respeito, adquire especial sentido na exata
medida em que, aí, a imposição pressupõe um vínculo de signalamaticidade
entre o que se presta (e o quanto se presta) e a utilidade privada que da
prestação se retira.
Contudo, neste domínio, o que o Tribunal sempre disse foi que da
Constituição apenas se retiraria a exigência de uma não manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante devido, dada a impossibilidade
de entender o elemento estrutural da taxa (a «correspectividade» ou
«sinalagmaticidade», vistas essencialmente como categorias jurídicas), como
algo equivalente a uma correspondência económica estrita entre o montante
a prestar e o valor da respetiva contraprestação (entre muitos outros,
Acórdãos n.ºs 115/02; 1108/96; 640/95; 461/87; 205/87).
8. Não havendo razões para dissentir desta firme e já antiga
jurisprudência, também se não vê como, in casu, concluir pela
inconstitucionalidade da interpretação da norma adotada pela decisão
recorrida, com fundamento em violação do princípio da proporcionalidade.
Face aos elementos disponíveis, é impossível afirmar que existe uma
manifesta desproporcionalidade entre o montante devido pelo recorrente e a
contraprestação por ele obtida, contraprestação essa que – como já se disse –
se traduziu no licenciamento do posto de combustível que o mesmo
recorrente economicamente explora. Não estando estes dois elementos, que
compõem o «sinalagma» próprio da taxa, relacionados entre si através dos
critérios da equivalência económica, e não sendo possível determinar que o
primeiro – devido ao sentido atribuído pela decisão recorrida à norma
aplicada in casu – atingiu um montante tal que onera de forma excessiva a
exploração económica do bem, impossível também se torna concluir que
houve, por efeito da interpretação adotada pela instância, uma manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante da taxa. Tanto basta para que
se não julgue inconstitucional tal interpretação, por violação do princípio da
proporcionalidade.
Da eventual violação do princípio da justiça
9. As considerações acabadas de tecer (inclusive, no que toca à
inaplicabilidade, ao caso, do disposto no artigo 266.º da CRP), valem na
íntegra para a invocada violação do princípio da justiça, decorrente também
da «ideia» de Estado de direito consagrada no artigo 2.º da CRP. A total
ausência de elementos fácticos suficientes torna impossível suportar um juízo
sobre a matéria. Por outro lado, acresce ser ainda discutível que o princípio
da justiça, em si mesmo considerado, assuma relevância autónoma para
efeito de controlo de constitucionalidade [a doutrina tende a minimizar o
alcance prescritivo deste princípio, considerando-o «um princípio aglutinador
de subprincípios que encontram tradução autónoma noutros preceitos
constitucionais e legais – como é o caso da igualdade, da proporcionalidade e
da boa fé» e «residualmente, um princípio como uma “capacidade irradiante”
própria» (leia-se, entre outros, DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de
Direito Administrativo, Volume II, Coimbra, 2.ª edição, 2011, p. 151; em
sentido aparentemente idêntico, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA,
Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra,
1993, p. 925)]. Tal discussão, porém, é inútil para os presentes autos, posto
que o decisivo é que não existe qualquer evidência de excesso ou injustiça
resultante da interpretação normativa que foi acolhida na decisão recorrida.
10. Em suma, não se descortina qualquer vício de inconstitucionalidade
na alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro,
na redação do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na interpretação
que vinha sindicada.”

Estando em causa, no presente recurso, interpretação do citado preceito


legal que materialmente equivale àquela sobre que recaiu a pronúncia do
Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 846/14, e não havendo razões para
dissentir das razões invocadas, é de reiterar o juízo de não
inconstitucionalidade nele formulado.”

Em concordância com tal fundamentação, que subscrevemos,


concluímos, como nos citados acórdãos, com os n. os 846/2014 e 28/2015,
pela não inconstitucionalidade da interpretação do artigo 15.º, n.º 1,
alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada
pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, no sentido de a taxa
fixada, a pagar pelo estabelecimento ou ampliação de postos de
combustível, ser devida por cada mangueira abastecedora de
combustível instalada, atribuindo-se, assim, à expressão “bomba
abastecedora de combustível” o sentido de “mangueira abastecedora de
combustível”.

III – Decisão

Pelo exposto, decide-se:


a) não julgar inconstitucional a interpretação do artigo 15.º, n.º 1,
alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada
pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, no sentido de a taxa
fixada, a pagar pelo estabelecimento ou ampliação de postos de
combustível, ser devida por cada mangueira abastecedora de
combustível instalada, atribuindo-se, assim, à expressão “bomba
abastecedora de combustível” o sentido de “mangueira abastecedora de
combustível”;
b) E, consequentemente, julgar improcedente o presente recurso.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 (vinte e


cinco) unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º,
n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (artigo 6.º, n.º 1, do
mesmo diploma).

Lisboa, 12 de fevereiro de 2015 - Catarina Sarmento e Castro - Maria


José Rangel de Mesquita - Lino Rodrigues Ribeiro -Carlos Fernandes
Cadilha - Maria Lúcia Amaral

ACÓRDÃO Nº 315/2015

Processo n.º 61/15


3ª Secção
Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I Relatório

1. A., S.A. interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul


(TCA-Sul) da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de
Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida
contra a liquidação emitida pela B., S.A., nos termos do art. 15.º, n.º1, al.
l) do Decreto-lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação que lhe foi dada
pelo Decreto-lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, de taxas no montante total
de 1.362,30 Euros, correspondente ao aumento de uma mangueira
abastecedora no posto de abastecimento de combustíveis sito na EN 118,
ao km 97,900, Lado Direito, Chamusca.

2. Por Acórdão de 13/11/2014, o TCA-Sul negou provimento ao


recurso, confirmando a sentença recorrida. Fundamentou-se, inter alia,
no seguinte:

«(…)
O conceito de “bomba abastecedora de combustível” para efeitos de
incidência da taxa pela emissão de licença para o estabelecimento ou
amplificação de postos de combustíveis, prevista no artigo 15.º do Decreto-
Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro (com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro), corresponde ao de “mangueira abastecedora”,
enquanto dispositivo destinado a transferir combustível de um reservatório
para um depósito de veículo automóvel, e não ao de “unidade de
abastecimento”.
Este conceito é aquele que melhor se compagina com a necessidade de
prevenir as condições de segurança e circulação nas estradas, tributando o
risco rodoviário acrescido que resulta do maior número de saídas de
combustível licenciadas.
Tal imposição não pode padecer de inconstitucionalidade orgânica por se
tratar de um imposto, já que a mesma surge como a contrapartida jurídica de
uma autorização ou licença (art. 15.º do citado Decreto-Lei n.º 13/71), ou
seja, em áreas onde a atividade dos particulares não é livre mas sim
condicionada, pelo que à luz do disposto no art. 4.º, n.º2, da LGT, a mesma é
subsumível no conceito de taxa.
A liquidação do tributo previsto no citado art. 15.º do Decreto-Lei n.º
13/71, de 23 de janeiro, não padece de inconstitucionalidade material por
violação do princípio da proporcionalidade.»

3. Inconformada, a A., S.A. interpôs recurso para o Tribunal


Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º1 do artigo 70.º da LTC, em
requerimento do seguinte teor:
«O presente recurso para o Tribunal Constitucional é restrito à questão
da inconstitucionalidade material e orgânica do art. 15.º, n.º1, al. l) do
Decreto-lei 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24/01, na parte em que o mesmo é interpretado e aplicado no
sentido de as taxas ali previstas incidirem sobre o número de mangueiras e
não sobre as bombas abastecedoras dos postos de abastecimento, por
violação direta do art. 266.º/2 da CRP e dos princípios da proporcionalidade e
da justiça nele consagrados.»

4. Notificado para o efeito, a recorrente apresentou alegações,


concluindo da seguinte forma:
«A) A ora Recorrente veio interpor o presente recurso de
constitucionalidade do douto Acórdão proferido pelo TCA Sul em 13/11/2014,
que julgou improcedentes os vícios de inconstitucionalidade invocados pela
Recorrente ao longo deste processo, referentes à norma contida no art. 15º,
n.º 1, al. l) do Decreto-Lei n.º 13/71, como interpretada no sentido de se
entender bomba de combustível como mangueira abastecedora, como tem
sido o entendimento da Recorrida, B., S.A.
B) Sem prejuízo de esta norma ter sido revogada muito recentemente
pelo Decreto-Lei n.º 87/2014, de 29/05, a verdade é que a ora Recorrente tem
sido alvo de inúmeras e sucessivas liquidações deste tipo de taxas sobre
mangueiras abastecedoras de combustível, por parte das Estradas de
Portugal, referentes aos vários postos de abastecimento que detém por todo o
território nacional, que considera não só ilegais, como inconstitucionais,
razão pela qual pretende submeter à apreciação de V. Exas. esta questão que
se afigura de grande relevância jurídica e social.
C) É inequívoco que a letra do preceito em causa determina a incidência
objetiva da taxa sobre as bombas abastecedoras, não havendo quaisquer
razões lógico-jurídicas que levem a que a norma em causa possa ser objeto de
uma interpretação corretiva.
D) Com efeito, esta norma de incidência objetiva manteve-se inalterada,
continuando a base da tributação a ser as bombas de abastecimento e não as
mangueiras dessas bombas, que são apenas “elementos” dessas bombas,
sendo que a bomba de abastecimento é o dispositivo mecânico que permite,
designadamente, mover ou elevar materiais líquidos, no caso, combustíveis,
desde o depósito que está enterrado no posto, até ao depósito do veículo a
abastecer.
E) Se o legislador tivesse pretendido alterar a base da incidência objetiva
desta taxa, passando a assentar no número de mangueiras e não nas bombas,
seguramente que o teria escrito expressamente e não teria mantido o mesmo
texto, quando em 2004, através do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, alterou
a norma, mas mantendo inalterada a base de incidência objetiva de
tributação – quando em 2004 já proliferavam as bombas multiproduto.
F) Deste modo, e de acordo com as regras e princípios da interpretação e
aplicação da lei consagrados no artigo 9.°, n.° 3 do Código Civil, em que o
intérprete deve sempre presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento
corretamente e em termos adequados, conclui-se que a taxação desta norma
deve incidir sobre a bomba de combustível enquanto possibilidade de
extração do mesmo do depósito onde está armazenado para o recetáculo do
veículo automóvel.
G) Além disto, diga-se que por uma questão prática e por impossibilidade
física, o abastecimento apenas pode ser feito em simultâneo por dois
veículos, um de cada lado da bomba, no máximo!
H) O que se tributa não deve ser a disponibilização de um produto, mas o
benefício retirado da possibilidade de, em determinado momento, um veículo
automóvel ser abastecido no posto de abastecimento, pelo que as
possibilidades de abastecimento não são proporcionais ao número de
mangueiras.
I) Já vários Acórdãos do TC se pronunciaram sobre esta questão,
referindo que o critério de fixação do quantum de uma taxa é relevante, em
termos de se aferir da utilidade que o sujeito passivo dela extrai, não
podendo ser completamente alheio aos custos da entidade pública e dessa
utilidade.
J) Perante esta jurisprudência, decorre que o critério encontrado pela EP
para fixar o montante das taxas a pagar, nos termos do referido art. 15º, n.º
1, al. l) do DL 13/71, baseando-se no número de mangueiras e não no número
de bombas constitui uma total desproporção, que compromete a
correspondência que deverá existir entre o serviço prestado (o
licenciamento) e a utilidade que a entidade que explora os postos retira.
K) Note-se inclusivamente que a douta Declaração de Voto do Exmo. Juiz-
Conselheiro, Dr. João Caupers, que, pronunciando-se sobre esta questão em
concreto, no recente Acórdão n.º 846/2014 proferido pela 1ª Secção do
Tribunal Constitucional no proc. n.º 1018/13, não pôde acompanhar o sentido
de decisão aí tomado e conclui no sentido de afirmar que a norma constante
do art. 15º/1/al. l) do DL 13/71 é inconstitucional se se interpretar “bomba
abastecedora de combustível como significando mangueira abastecedora de
combustível (…) por violação do princípio da proporcionalidade, inscrito no
artigo 266.º, n.º 2 da CRP.”
L) Se é verdade que uma mangueira é o equipamento da bomba de
abastecimento que representa uma possibilidade de saída do carburante do
depósito onde este se encontra armazenado para o depósito do veículo, o
facto é que cada cliente apenas poderá optar por um produto de cada vez,
não obstante ter várias ofertas de produtos (geralmente, são quatro os
produtos disponibilizados: gasóleo, gasolina s/ chumbo 95 e 98, e gasolina
“Gforce”).
M) Nem poderá a EP dizer que o licenciamento rodoviário que é feito
nestes moldes tem como finalidade “garantir a efetiva existência de
condições de segurança e comodidade adequadas à circulação rodoviária e
aos seus utentes”, ou ainda que um maior número de mangueiras determina
uma “maior procura de combustíveis e de outros produtos”, da mesma forma
como “a clientela do posto é aferida e propiciada por aquele número de
mangueiras”.
N) Porque todos estes argumentos, para além de não terem ficado
provados nos autos, são totalmente falaciosos e não têm o mínimo de
correspondência com a realidade.
O) Em primeiro lugar, porque hoje em dia, como é do conhecimento geral
e facto notório, quase todas as operadoras de postos de abastecimento
dispõem dos mesmos carburantes, não sendo pelo fator produto que um
cliente vai escolher determinado posto para abastecer o seu veículo (mas sim
pelo fator preço ou eventuais descontos efetuados).
P) E em segundo lugar, o tráfego automóvel não é proporcional ao
aumento das mangueiras de um posto, nem implica um maior número de
entradas ou saídas do mesmo, isto porque os automobilistas utilizam
determinada estrada (nacional, regional ou autoestrada) em função do
respetivo destino e não em função de existir determinado posto de
abastecimento ou área de serviço nessa via.
Q) Ora, a cobrança de uma taxa pelo número de mangueiras e não pelo
número de bombas de abastecimento, pelo respetivo licenciamento, não é a
adequada para assegurar o fim de interesse público que supostamente se visa
atingir; não é indispensável e excede o que seria razoável em relação aos
objetivos a prosseguir.
R) Taxar assim uma bomba não pelo número de utilizadores potenciais,
mas pelo número de mangueiras existentes, significa apenas uma “caça”
desproporcional e ilegítima à taxa.
S) A ratio legis desta norma não poderá dispensar esta análise em que
chegaremos à conclusão que é manifestamente desproporcional,
completamente alheio e excessivo, até desta perspetiva da utilidade para o
operador do posto, ter que pagar uma taxa pelo licenciamento das bombas,
entendidas como mangueiras abastecedoras.
T) É esta proibição do excesso, a falta de razoabilidade resultante da
liquidação das taxas pelo número de mangueiras que se verifica no caso e
que impõe a conclusão de qua há violação do princípio constitucional da
proporcionalidade e da justiça.
U) Ainda assim e sem prejuízo de quanto foi exposto, poderá entender-se
adicionalmente que a interpretaçãosupra referida feita pela EP, está a impor
à Recorrente que se organize economicamente de uma única forma: que cada
bomba não pode ter mais de uma mangueira (voltando ao sistema das
bombas monoproduto), com graves prejuízos para a própria eficiência
económica assim como com prejuízos iguais para os consumidores, que verão
menor disponibilidade de combustíveis e mais tempo de espera.
V) Aí, sim, o resultado poderá ser maior insegurança no tráfego, pelo
acumular de demasiadas viaturas à espera de abastecer em cada posto de
combustíveis...
W) Logo, a taxação por mangueira implica também uma restrição abusiva
à iniciativa económica privada da A. proibida pela Constituição, enquanto
restrição à liberdade de organização e de atividade da empresa privada.
X) Ainda quanto a este ponto e sem prescindir de todos os argumentos
apresentados no sentido da inconstitucionalidade desta interpretação do art.
15º, n.º 1, al. l) do referido DL, diga-se que o recentíssimo Decreto-Lei n.º
87/2014, de 29/05, veio revogar o referido art. 15º/1/al. l) do DL 13/71, com
efeitos a partir de 30/05/2014, substituindo a taxação de bombas de
combustível, pelo “número de litros de combustíveis vendidos em cada ano”.
Y) O que nos leva a reafirmar o caráter mais funcional e prático desta
norma, em que a taxa deverá incidir pela utilidade económica que é retirada
da própria atividade do posto de abastecimento de combustíveis e não pela
quantidade de equipamento, v.g mangueiras/pistolas.»

5. A recorrida contra-alegou, concluindo da seguinte forma:

«1º O conceito de bomba abastecedora de combustível previsto no DL


13/71 coincide com o que a EP designa por mangueira, enquanto parte
exterior de um artefacto mecânico através do qual a gasolina, ou outro
combustível, é transferido de um recipiente (depósito da bomba) para outro
(depósito do veiculo a abastecer).
2º Tal interpretação é corroborada pela própria redação da norma, na
medida em que, uma bomba abastecedora de combustível configura,
necessariamente, uma bomba/equipamento que abastece o veículo.
3º O termo por cada bomba abastecedora traduz a aplicação da taxa por
cada um (em termos individuais) dos equipamentos/mangueiras existentes no
posto de combustíveis.
4º Uma bomba abastecedora corresponde a cada possibilidade de saída
de combustível.
5º Para além do significado natural (e comum) da expressão utilizada,
importa, igualmente, verificar qual a razão de ser da lei, qual o fim visado
pelo legislador ao elaborar tal norma.
6º Pelo que, não deve ser descurado o facto do conceito de bomba
abastecedora se manter inalterado na legislação rodoviária desde a
publicação do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro.
7º Data em que os postos de abastecimento de combustíveis eram
constituídos por bombas monoproduto(simples), ou seja, por bombas através
das quais se abastecia apenas um carburante.
8º Com efeito, por cada bomba abastecedora de combustível (que
bombeia um só carburante), existente no posto de abastecimento era
aplicada a taxa fixada por lei.
9º Para efeitos de licenciamento “rodoviário”, porque é do que se trata, o
legislador impôs a cobrança das taxas por cada possibilidade de saída de
combustível.
10º A existência de bombas duplas e bombas multiproduto não alterou a
solução consagrada e o pensamento do legislador.
11º O aparecimento de tais bombas teve como objetivo a obtenção pelos
concessionários de um dado volume de vendas equivalente a tantos números
de bombas simples quantas as saídas permitidas por aquelas, mas com
redução de custos em contadores e área disponível.
12º Na verdade, a cada mangueira (ou bomba abastecedora de
combustível) podem estar associados subterraneamente vários depósitos que
permitirão a comercialização distinta de vários produtos, independentemente
de ser possível ou não a sua comercialização em simultâneo.
13º Assim, numa bomba simples, a taxa será aplicada uma única vez.
14º Se estiver em causa uma bomba dupla e/ou multiproduto, a taxa será
aplicada tantas vezes quantas o respetivo número de mangueiras de
escoamento.
15º Estamos perante o licenciamento rodoviário, cuja finalidade é
garantir a prevenção das condições de segurança e circulação na estrada e
dos seus utentes.
16º O licenciamento dos postos de abastecimento visa garantir a
prevenção das condições de segurança e circulação na estrada e dos que a
utilizam.
17º Verificando-se, no licenciamento dos PAC, entre outros aspetos por lei
determinados, a organização espacial do posto que pode interferir naquela
segurança e circulação.
18º Um maior número de bombas abastecedoras/mangueiras resulta
numa maior procura, atenta a capacidade máxima de abastecimento que é
aferida por aquele número de mangueiras.
19º Que por sua vez implica o necessário aumento de número de entradas
e saídas da estrada e o aumento do respetivo tráfego médio diário da via que
procuram.
20º Sendo esta uma vertente a ponderar aquando da atribuição do
licenciamento para o estabelecimento ou ampliação do posto de
combustíveis.
21º Aliás, a Jurisprudência nesta matéria é unânime e pacífica, pois
considera que: “o licenciamento pela EP dos postos de abastecimento, bem
como das obras a realizar neles, visa garantir a proteção das vias e dos que
as utilizam em todos os seus aspetos, em que é preponderante a segurança
do trânsito e da segurança em geral face à perigosidade própria do
armazenamento e manipulação dos combustíveis para os veículos
automóveis. (cfr: entre outros, Acórdão proferido pelo STA, no processo n.º
0250/04, in www.dgsi.pt).
22º Porque de segurança se trata, e para efeitos de aplicação das taxas
fixadas no Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, o conceito de bomba
abastecedora de combustível corresponde ao conceito de mangueira.
23º Na verdade, o Decreto-Lei n.º 25/2004 mantém em vigor o conceito
de bomba abastecedora de combustível para efeitos de cobrança de taxas
pelo licenciamento a conferir pela EP.
24º Ao manter, explicitamente, o conceito de bomba abastecedora de
combustível, o legislador pretendeu taxar individualmente cada possibilidade
de saída de combustível.
25º Por se considerar verificada uma relação sinalagmática entre o nº de
mangueiras e a a fluência de tráfego e, por usa vez, entre esta última e a
segurança.
26º Assim, o legislador ao recorrer à expressão “por cada bomba
abastecedora de combustível” quis tributar individualizadamente cada um
dos equipamentos que permitem o abastecimento de
combustíveis, equipamentos essesquantificáveis através do número de
mangueiras. (in, www.dgsi.pt).
27º O fator económico da tributação emerge da verificação e prevenção
das condições de segurança e circulação na estrada e dos seus utentes, que
não pode deixar de ter em conta o número de saídas de combustível num
posto existentes, pelo que a taxa deve ser aplicada por cada mangueira
abastecedora.
28º Em consonância, aliás, com o entendimento do STA, que nos
processos já citados decidiu que “(...) a base da incidência da taxa em causa
se afere por cada possibilidade de saída de combustível, a qual se encontra
indissociavelmente ligada à componente visível, por exterior, da bomba
abastecedora de combustível (a mangueira)”.
29º Tributar individualmente cada possibilidade de combustível, isto é,
por cada mangueira abastecedora, tem subjacente ao processo de
licenciamento a verificação e prevenção das condições de segurança e
circulação na estrada e dos seus utentes.
30º Que, e como atrás ficou dito, um maior número de bombas
abastecedoras/mangueiras resulta numa maior procura, atenta a capacidade
máxima de abastecimento que é aferida pelo número de mangueiras,
implicando o necessário aumento de número de entradas e saídas da estrada
e o aumento do respetivo tráfego médio diário da via que procuram.
31º Não violando, assim, qualquer princípio constitucional.»

Cumpre apreciar e decidir.


II Fundamentação

6. A norma objeto do presente recurso é a constante do disposto no


do artigo 15.º, n.º1, al. l) do Decreto-lei 13/71, de 23 de janeiro, com a
redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, na parte em que o
mesmo é interpretado e aplicado no sentido de as taxas ali previstas
incidirem sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas
abastecedoras dos postos de abastecimento. Invoca o recorrente violação
direta do artigo 266.º/2 da CRP e dos princípios da proporcionalidade e
da justiça nele consagrados.

7. Esta 3.ª Secção do Tribunal Constitucional já teve oportunidade de


proferir Acórdão, no âmbito de autos de recurso com objeto e alegações
semelhantes aos apresentados neste processo.
Dada a similitude de situações, reiteramos a fundamentação aduzida
em tal Acórdão, com o n.º 28/2015, a qual foi retomada pelo Acórdão n.º
121/2015 (ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt):
“(…) A recorrente, no requerimento de interposição do recurso,
expressamente afirmou que «o presente recurso para o Tribunal
Constitucional é restrito à questão da inconstitucionalidade material do art.
15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a
redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, na parte em que o
mesmo é interpretado e aplicado no sentido de as taxas aí previstas incidirem
sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas abastecedoras dos
postos de abastecimento, por violação direta do art. 266.º/2 da CRP e dos
princípios da proporcionalidade e da justiça nele consagrados».
Porém, em sede de alegações, invocou, ainda, a questão da
inconstitucionalidade orgânica do referido preceito legal, por violação do
princípio da legalidade tributária (artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i),
da Constituição), e a questão da inconstitucionalidade material do mesmo
preceito, por violação da liberdade de iniciativa económica privada,
consagrada no artigo 61.º, n.º 1, da mesma Lei Fundamental.
Ora, independentemente da perspetiva que se adote quanto ao exato
sentido e alcance do conceito processual de objeto do recurso, no âmbito da
fiscalização concreta da constitucionalidade, afigura-se que, sem prejuízo do
poder conferido pelo artigo 79.º-C da LTC, não está o Tribunal Constitucional
obrigado a pronunciar-se sobre questões de inconstitucionalidade cuja
apreciação não foi requerida no momento processualmente oportuno, que é
precisamente o do requerimento de interposição do recurso, donde deve
consequentemente constar a indicação, não apenas da norma cuja
inconstitucionalidade se pretende ver apreciada, mas também da norma ou
princípio constitucional que se considera violado (artigo 75.º-A, nºs. 1 e 2, da
LTC) – cf., neste sentido, Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 139/03,
424/2007 e 107/1011.
Sendo este o caso, em relação às novas questões de inconstitucionalidade
colocadas em sede de alegações do recurso, apenas se apreciará a questão da
inconstitucionalidade do artigo 15.º, n.º 1, alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71,
de 23 de janeiro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01,
«na parte em que o mesmo é interpretado e aplicado no sentido de as taxas aí
previstas incidirem sobre o número de mangueiras e não sobre as bombas
abastecedoras dos postos de abastecimento, por violação direta do art.
266.º/2 da CRP e dos princípios da proporcionalidade e da justiça nele
consagrados», que é única questão de inconstitucionalidade que a recorrente,
em observância do correspondente ónus legal, enunciou no requerimento de
interposição do recurso.
(…) A questão de inconstitucionalidade que, feita a antecedente
delimitação, constitui objeto do presente recurso, foi recentemente apreciada
pelo Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 846/2014, que não julgou
inconstitucional a norma da alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º
13/71, de 23 de janeiro, na redação do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de
janeiro, na interpretação segundo a qual pelo estabelecimento ou ampliação
de postos de combustível é devida taxa por cada mangueira abastecedora de
combustível instalada (atribuindo-se à expressão «bomba abastecedora de
combustível» o sentido de «mangueira abastecedora de combustível»).
Invocou-se, em fundamento de um tal juízo de não inconstitucionalidade,
o seguinte:

«3. A recorrente sustenta a inconstitucionalidade da interpretação que o


acórdão recorrido conferiu à alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei
n.º 13/71, de 23 de janeiro, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º
25/2004, de 24 de janeiro, interpretação segundo a qual pelo estabelecimento
ou ampliação de postos de combustível é devida taxa [no montante de
€1.362,30] por cada mangueira abastecedora de combustível instalada. No
entender da recorrente, tal interpretação viola os princípios da
proporcionalidade e da justiça, ínsitos no n.º 2 do artigo 266.º da
Constituição.
Deve começar por dizer-se – em consonância, aliás, com a argumentação
aduzida nas alegações do recurso – que, no caso, a incidência das taxas sobre
as bombas abastecedoras surge como um instrumento dirigido à salvaguarda
da finalidade legal do licenciamento, a qual, de acordo com o disposto no
artigo 12.º n.º 1, do Decreto-Lei n.º 13/71, consiste na não afetação da
estrada e da perfeita visibilidade do trânsito.
Contudo, e independentemente desta verificação de princípio, há que
sublinhar que o que está em causa nos presentes autos é a questão de saber
se a interpretação, adotada pelo tribunal a quo quanto ao disposto no artigo
15.º, n.º 1, alínea l) do já mencionado Decreto-Lei n.º 13/71, segundo a qual
«uma mangueira abastecedora de combustível» corresponde à expressão
«bomba abastecedora de combustível», é, por algum motivo, contrária à
Constituição. Não cabendo ao Tribunal ajuizar sobre o eventual «acerto» ou
«desacerto» que, no estrito plano infraconstitucional, possa ser reconhecida
a esta interpretação, o que se lhe pede resume-se à questão de saber se a
mesma [interpretação] contraria quaisquer «normas» ou «princípios»
constitucionais (artigo 277.º, n.º 1, da CRP), designadamente aqueles que a
recorrente invoca. Em suma, trata-se de saber se «taxar cada mangueira
instalada» (ao invés de «taxar a bomba de gasolina» em si mesma
considerada) tem como consequência a liquidação de um tributo em
montante que se deva considerar, face à Constituição, desproporcionado e
injusto.
Da eventual violação do princípio da proporcionalidade
4. Como é vulgarmente consabido, o princípio da proporcionalidade ou da
proibição do excesso encontra sede textual em diversos preceitos da
Constituição, entre os quais se incluem os artigos 18.º, n.º 2, in fine, e o
artigo 266.º, n.º 2.
Sobre o sentido a conferir a tal princípio tem sido constante a
jurisprudência do Tribunal. A ideia de «proporção» ou de «proibição do
excesso – ideia essa que, em Estado de direito, vincula as ações de todos os
poderes públicos – refere-se, diz o Tribunal, «fundamentalmente à
necessidade de uma relação equilibrada entre meios e fins: as ações
estaduais não devem, para realizar os seus fins, empregar meios que se
cifrem, pelo seu peso, em encargos excessivos (e, portanto, não equilibrados)
para as pessoas a quem se destinem» (cfr. Acórdão n.º 634/93). Além disso,
como se disse, entre muitos outros, no Acórdão n.º 187/2001, «o princípio da
proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação
(as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se
como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de
outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da
exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os
fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos
para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou
proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas
excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos)». Da
caracterização de cada um destes «testes» ou «subprincípios» se tem
encarregado ainda numerosa jurisprudência (veja-se, entre outros, o Acórdão
n.º 632/08).
5. A verificação da conformidade da norma ou interpretação normativa
sindicada com o princípio da proibição do excesso exige, contudo e antes de
mais, a consideração cautelosa do objeto do recurso e a caracterização da
posição jurídica da recorrente. É que, como bem se sabe, o juízo relativo à
«proporcionalidade» do agir estadual não se sustenta sempre do mesmo
modo, qualquer que seja a natureza da norma infraconstitucional que se
tenha que julgar e qualquer que seja a posição jurídica subjetiva por essa
mesma norma afetada. Pelo contrário: o iter metódico a seguir na
fundamentação desse juízo será diverso, devendo ser tanto mais exigente
quanto mais intensa for, in casu, a afetação, por via legislativa, de posições
jurídico-subjetivas que devam ser qualificadas como fundamentais.
6. Como se assinalou, a recorrente configura o juízo de
inconstitucionalidade por si alegado na violação dos princípios consagrados
no artigo 266.º, n.º 2 da CRP.
Contudo, não será seguramente este o «parâmetro» aplicável à questão
sob juízo.
O n.º 2 do artigo 266.º da CRP consagra os limites à atuação das
autoridades administrativas no exercício dos seus poderes discricionários. É
no contexto do uso destes poderes que a Administração está obrigada a agir
no respeito pelos princípios da proporcionalidade e da justiça. Ora, as taxas
em causa, em si mesmas consideradas, não resultam da prática de ato
discricionário, pois que se encontram diretamente previstas no ato normativo
que as suporta. Por outro lado, o objeto do presente recurso é constituído,
não por uma atuação administrativa, mas sim pela interpretação
(jurisdicional) de uma certa norma – como, aliás, não podia deixar de ser
–, norma essa incluída, de resto, em ato formalmente legislativo. Quer isto
dizer que não está em causa a questão de saber se a autoridade
administrativa agiu em (des)conformidade com a Constituição. O que está em
causa é a questão de saber se determinada norma, constante de ato
legislativo e aplicada pelo juiz da causa com certa interpretação, se conforma
com as exigências constitucionais pertinentes, mormente as que decorrem os
princípios da proporcionalidade e da justiça. O facto de estes últimos
receberem (também) apoio textual no n.º 2 do artigo 266.º da CRP não
implica portanto, só por si, que seja este o parâmetro a aplicar ao
caso sub judicio.
7. Excluída que está a aplicação ao caso do disposto no n.º 2 do artigo
266.º, resta saber se a norma sob juízo, contida em ato legislativo, se pode
configurar como norma restritiva de um direito, liberdade e garantia, de
forma a quese lhe aplique o previsto na parte final do n.º 2 do artigo 18.º da
CRP.
A doutrina e a jurisprudência constitucional têm sido firmes no sentido de
concluir que o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode
ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais, face
à qual seja legítimo invocar o regime dos requisitos ou exigências que valem,
constitucionalmente, para as leis restritivas de direitos, liberdades e
garantias. Isto mesmo decorre, desde logo, da existência da
(impropriamente) chamada «constituição fiscal», na qual se definem as
garantias dos contribuintes, os princípios formais e materiais que conformam
o conceito constitucional de imposto, e a configuração deste último não como
afetação de um direito mas antes como obrigação pública de todos os
cidadãos, quando constituída nos termos do artigo 103.º da CRP. E se isto
assim é relativamente à imposição unilateral que forma o imposto, também o
é em relação a esses outros tributos que são as taxas [artigo 165.º, n.º 1,
alínea i) da CRP]
É abundante a jurisprudência constitucional sobre esta última figura.
De acordo com esta jurisprudência, existe uma conceção constitucional
de taxa que resulta da união entre as seguintes premissas: (i) a necessidade
da existência de uma relação sinalagmática entre o tributo que se presta e a
utilidade privada que dele se retira; (ii) contudo, a desnecessidade de uma
exata equivalência económica entre uma coisa e outra; (iii) a aferição do seu
montante em função não só do custo mas também do grau de utilidade
prestada; e (iv) a exigência de uma não manifesta desproporcionalidade na
sua fixação (Acórdão n.º 115/2002: itálico nosso).
Quer isto dizer que, se a «conceção constitucional de tributo» – a qual
inclui impostos e taxas – é inimiga de qualquer construção que veja
similitudes entre estas imposições e as vulgares restrições a direitos,
liberdades e garantias, tal como estas últimas são reguladas pelo artigo 18.º
da CRP, nem por isso se dispensa, quanto a elas, o requisito ou crivo da
proporcionalidade, enquanto expressão de um princípio que, como já se
disse, vale em Estado de direito (artigo 2.º) para todo o agir estadual. Esta
afirmação, no que às taxas diz respeito, adquire especial sentido na exata
medida em que, aí, a imposição pressupõe um vínculo
de signalamaticidade entre o que se presta (e o quanto se presta) e a
utilidade privada que da prestação se retira.
Contudo, neste domínio, o que o Tribunal sempre disse foi que da
Constituição apenas se retiraria a exigência de uma não manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante devido, dada a impossibilidade
de entender o elemento estrutural da taxa (a «correspectividade» ou
«sinalagmaticidade», vistas essencialmente como categorias jurídicas), como
algo equivalente a uma correspondência económica estrita entre o montante
a prestar e o valor da respetiva contraprestação (entre muitos outros,
Acórdãos n.ºs 115/02; 1108/96; 640/95; 461/87; 205/87).
8. Não havendo razões para dissentir desta firme e já antiga
jurisprudência, também se não vê como, in casu, concluir pela
inconstitucionalidade da interpretação da norma adotada pela decisão
recorrida, com fundamento em violação do princípio da proporcionalidade.
Face aos elementos disponíveis, é impossível afirmar que existe uma
manifesta desproporcionalidade entre o montante devido pelo recorrente e a
contraprestação por ele obtida, contraprestação essa que – como já se disse –
se traduziu no licenciamento do posto de combustível que o mesmo
recorrente economicamente explora. Não estando estes dois elementos, que
compõem o «sinalagma» próprio da taxa, relacionados entre si através dos
critérios da equivalência económica, e não sendo possível determinar que o
primeiro – devido ao sentido atribuído pela decisão recorrida à norma
aplicada in casu – atingiu um montante tal que onera de forma excessiva a
exploração económica do bem, impossível também se torna concluir que
houve, por efeito da interpretação adotada pela instância, uma manifesta
desproporcionalidade na fixação do montante da taxa. Tanto basta para que
se não julgue inconstitucional tal interpretação, por violação do princípio da
proporcionalidade.
Da eventual violação do princípio da justiça
9. As considerações acabadas de tecer (inclusive, no que toca à
inaplicabilidade, ao caso, do disposto no artigo 266.º da CRP), valem na
íntegra para a invocada violação do princípio da justiça, decorrente também
da «ideia» de Estado de direito consagrada no artigo 2.º da CRP. A total
ausência de elementos fácticos suficientes torna impossível suportar um juízo
sobre a matéria. Por outro lado, acresce ser ainda discutível que o princípio
da justiça, em si mesmo considerado, assuma relevância autónoma para
efeito de controlo de constitucionalidade [a doutrina tende a minimizar o
alcance prescritivo deste princípio, considerando-o «um princípio aglutinador
de subprincípios que encontram tradução autónoma noutros preceitos
constitucionais e legais – como é o caso da igualdade, da proporcionalidade e
da boa fé» e «residualmente, um princípio como uma “capacidade irradiante”
própria» (leia-se, entre outros, DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de
Direito Administrativo, Volume II, Coimbra, 2.ª edição, 2011, p. 151; em
sentido aparentemente idêntico, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA,
Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra,
1993, p. 925)]. Tal discussão, porém, é inútil para os presentes autos, posto
que o decisivo é que não existe qualquer evidência de excesso ou injustiça
resultante da interpretação normativa que foi acolhida na decisão recorrida.
10. Em suma, não se descortina qualquer vício de inconstitucionalidade
na alínea l) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro,
na redação do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, na interpretação
que vinha sindicada.”

Estando em causa, no presente recurso, interpretação do citado preceito


legal que materialmente equivale àquela sobre que recaiu a pronúncia do
Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 846/14, e não havendo razões para
dissentir das razões invocadas, é de reiterar o juízo de não
inconstitucionalidade nele formulado.”

8. Em concordância com tal fundamentação, que subscrevemos,


concluímos, como nos citados acórdãos, com os n.os 846/2014 e 28/2015,
pela não inconstitucionalidade da interpretação do artigo 15.º, n.º 1,
alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada
pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, no sentido de a taxa
fixada, a pagar pelo estabelecimento ou ampliação de postos de
combustível, ser devida por cada mangueira abastecedora de
combustível instalada, atribuindo-se, assim, à expressão “bomba
abastecedora de combustível” o sentido de “mangueira abastecedora de
combustível”.

III – Decisão

Pelo exposto, decide-se:


a) não julgar inconstitucional a interpretação do artigo 15.º, n.º 1,
alínea l), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, com a redação dada
pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de janeiro, no sentido de a taxa
fixada, a pagar pelo estabelecimento ou ampliação de postos de
combustível, ser devida por cada mangueira abastecedora de
combustível instalada, atribuindo-se, assim, à expressão “bomba
abastecedora de combustível” o sentido de “mangueira abastecedora de
combustível”;
b) E, consequentemente, julgar improcedente o presente recurso.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 (vinte e


cinco) unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º,
n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (artigo 6.º, n.º 1, do
mesmo diploma).
Lisboa, 3 de junho de 2015 - Lino Rodrigues Ribeiro - Carlos Fernandes
Cadilha - Catarina Sarmento e Castro - Maria José Rangel de
Mesquita - Maria Lúcia Amaral

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