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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Mary Jane Shalders Pereira Mendes

O conceito de "inteligência espiritual"

Mestrado em Ciência da Religião

São Paulo
2016
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC-SP

Mary Jane Shalders Pereira Mendes

O conceito de "inteligência espiritual"

Mestrado em Ciência da Religião

Dissertação apresentada à
Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial
para obtenção do título de
MESTRE em Ciência da
Religião, sob a orientação do
Prof. Dr. Frank Usarski

São Paulo
2016
Banca examinadora

__________________________________________

__________________________________________

__________________________________________
“Sempre afirmei e continuo afirmando:
quem deseja ser feliz deve primeiramente
tornar feliz seus semelhantes, pois a divina
recompensa que disso provém será a
verdadeira felicidade. Buscar a própria
felicidade com o sacrifício alheio é criar
infelicidade para si mesmo.”

Mokiti Okada
Agradecimentos

Agradeço à CAPES pela bolsa concedida, pois sem esta não seria
possível a iniciação e conclusão deste trabalho.
Agradeço igualmente à Fundação São Paulo, pela bolsa concedida, pois
sem ela não seria possível a iniciação e conclusão deste trabalho.
Agradeço ao meu orientador Prof. Dr. Frank Usarski, por ter-me conduzido
a um nível mais elevado de aprendizado.
Agradeço aos professos Deborah Pereira e João Décio Passos pela
acolhida.
Agradeço especialmente ao meu querido e amado avô, Emile Zola Pereira
Mendes (in memoriam), que sempre investiu em minha educação.
Agradeço à Andreia Bisulli, pelo carinho e dicas nos momentos em que
eu não enxergava uma saída.
Resumo

MENDES, Mary Jane Shalders Pereira. O conceito de "inteligência


espiritual".

Esta dissertação apresenta um neologismo sob a ótica da ciência da


religião, “a inteligência espiritual”. A inteligência espiritual consiste em um dos
vários tipos de inteligência e pode ser construída independentemente do grau de
QI.
A inteligência espiritual precisa de um aprofundamento no
autoconhecimento. Trata-se da integração da vida interior da mente e do espírito
com a vida exterior de trabalho no mundo, tanto pessoal quanto profissional,
mostrando que não são comportamentos distintos.
Ela pode ser cultivada por meio de práticas espirituais. Seu ápice é a
maturidade espiritual expressa através da percepção verdadeira (sabedoria e
significados) perante as escolhas. Isso contribui para o discernimento de
escolhas assertivas que contribuam para o bem-estar próprio e do semelhante.
A inteligência espiritual pode ser desenvolvida em todos os lugares,
dentro das tradições religiosas e fora delas, como no ambiente de trabalho e na
convivência em sociedade.

Palavras-chave: Inteligência espiritual; liderança; inteligência.


Abstract

MENDES, Mary Jane Shalders Pereira. O conceito de "inteligência


espiritual".

This dissertation presents a neologism from the perspective of the science


of religion, spiritual intelligence. Spiritual intelligence suggests it may be one of
various types of intelligence and that can be built regardless of the IQ level.
Spiritual intelligence needs a deepening of self-integration of the inner life
of mind and spirit with the outer life of work in the world, both personal and
professional, showing that they are not different behaviors.
It can be cultivated through spiritual practices and the apex is the express
spiritual maturity through true perception (wisdom and meanings) before the
choices. What itself contributes to the insight in making assertive choices that
contribute to their own well-being and his neighbor.
Spiritual intelligence can be developed everywhere, inside and outside of
religious traditions regardless of belief, in the workplace and living in society.

Keywords: Spiritual quotient; leadership; intelligence.


Abreviaturas

DMN Default-mode network


EAT Espiritualidade no Ambiente de Trabalho
FIERGS Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul
GEPI Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Interdisciplinaridade e
Espiritualidade na Educação
IM Inteligências múltiplas
INTERESPE Interdisciplinaridade e Espiritualidade na Educação
MMR Módulo da Meta-Representação
QE Quociente emocional ou inteligência emocional
QI Quociente de inteligência ou inteligência intelectual
QS Quociente espiritual ou inteligência espiritual
RH Recursos Humanos
SRM Stakeholder Relationship Management
Índice de ilustrações

Figura 1: Mapa de sentido ................................................................................ 72


Figura 2: Definição do processo de dimensão individual ................................. 91
Figura 3: Definição do processo de dimensão da empresa ............................. 91
Sumário

ABREVIATURAS .............................................................................................................. 8
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES ................................................................................................. 9
INTRODUÇÃO................................................................................................................ 12
CAPÍTULO I – SOBRE A INTELIGÊNCIA ESPIRITUAL OU “QS” ........................................... 15
I.1. Primeira aproximação........................................................................................ 15
I.2. A construção do conceito de inteligência espiritual ............................................ 17
I.3. A relação entre o QS e a configuração do indivíduo .......................................... 21
I.4. O conceito de felicidade segundo o QS ............................................................. 25
I.5. A busca pelo sentido ......................................................................................... 27
I.6. Mercado, marketing, pessoas “3.0” ................................................................... 29
I.7. O líder segundo a inteligência espiritual ............................................................ 31
CAPÍTULO II – INTELIGÊNCIA E ESPIRITUALIDADE............................................................ 35
II.1. Breve panorama introdutório ............................................................................ 35
II.2. A contextualização do conceito de inteligência ................................................. 36
II.2.1. A arquitetura da mente............................................................................... 36
II.2.2. O processamento do pensamento criativo ................................................. 39
II.2.3. A mentalidade cognitiva fluida.................................................................... 40
II.2.4. Comparativo da evolução da mente ........................................................... 41
II.2.5. O mapa das inteligências ........................................................................... 42
II.2.6. Inteligência emocional................................................................................ 46
II.2.7. QI – quociente de inteligência .................................................................... 47
II.3. A contextualização do conceito de espiritualidade ............................................ 47
II.3.1. A espiritualidade – contexto religioso ......................................................... 48
II.3.2. As práticas espirituais ................................................................................ 48
II.3.3. Espiritualidade em tempos contemporâneos .............................................. 50
II.3.4. Espiritualidade e psicologia ........................................................................ 51
II.3.5. Experiências de espiritualidade e cérebro .................................................. 53
II.3.6. Espiritualidade e marketing ........................................................................ 54
II.3.7. Espiritualidade nas empresas .................................................................... 57
II.4. Espiritualidade no ambiente de trabalho ........................................................... 61
II.4.1. A espiritualidade no local de trabalho......................................................... 66
II.4.2. O mapa de sentido ..................................................................................... 71
II.4.3. Parcerias espirituais e parcerias no trabalho .............................................. 76
CAPÍTULO III – ANÁLISE CRÍTICA DO CONCEITO DE INTELIGÊNCIA ESPIRITUAL .................. 79
III.1. Apresentação dos termos da análise ............................................................... 79
III.1.1. A inteligência espiritual no âmbito acadêmico da inteligência ................... 79
III.1.2. A inteligência espiritual no âmbito acadêmico da espiritualidade .............. 84
III.1.2.1. Práticas relacionadas à espiritualidade ............................................... 85
III.1.2.2. Afinidades entre a inteligência espiritual e a espiritualidade ............... 86
III.1.2.3. Inteligência espiritual e espiritualidade: distinção de conceitos ........... 87
III.2. A inteligência espiritual em comparação à "workplace spirituality"................... 89
III.2.1. Liderança espiritual inteligente na "workplace spirituality" ......................... 90
III.2.2. A workplace spirituality dentro do conceito de inteligência espiritual –
críticas e controvérsias ........................................................................................ 92
III.2.3. Imagem de empresas bem-sucedidas que enfatizam a "workplace
spirituality" no conceito de inteligência espiritual .................................................. 95
CONCLUSÃO ................................................................................................................ 98
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................. 101
Introdução

A atenção para temas como espiritualidade explodiu no cenário


globalizado a partir de 2007, como aponta Kees Waaijman (2007) em seu artigo
sobre a Interdisciplinaridade do fenômeno da espiritualidade.
Apenas para citar dois exemplos de como esse conceito ganhou
importância, vale lembrar os livros lançados por Silas Malafaia sob o título
Inteligência Espiritual (2011), nos quais o autor afirma que a inteligência
espiritual é um dom divino que possibilita ver a Deus. Outro livro de destaque
que figurou na lista dos mais vendidos, O monge e o executivo (2006), de James
C. Hunter, coloca na cena principal o conceito de “espiritualidade” e como ela
pode influenciar no workplace spirituality das empresas.
A reflexão sobre o estudo do tema “espiritualidade” foi um desafio de
pesquisa para várias disciplinas. Cada uma delas definiu o fenômeno segundo
sua ótica. Waaijman, citado acima, destaca a importância de estudos nas mais
variadas áreas do conhecimento para propor uma análise multifacetada que
inclua teologia, filosofia, literatura científica, ciência da religião, sociologia,
história, antropologia, psicologia, educação, medicina, administração e ciências
biológicas.
A disponibilidade de temas sobre espiritualidade em um mercado
secularizado possibilitou o surgimento, em 2001, de um novo conceito:
“inteligência espiritual”. Os estudos sobre esse novo conceito demonstram que
a inteligência espiritual é um neologismo. Ele foi introduzido publicamente a partir
de pesquisas mais relevantes de produção acadêmica sobre o tema, em
disciplinas como psicologia, a administração de empresas, pedagogia e filosofia.
Esses estudos resultaram em inúmeras publicações, dissertações e teses.
Na visão dos autores, os elementos principais que definem o conceito de
inteligência espiritual são bastante similares e algumas características se
sobressaem.
O psiquiatra Robert Cloninger (2011) se refere à inteligência espiritual
como um modelo de personalidade que gera integração na dimensão espiritual
e na da autotranscendência.

12
Já o psicólogo Robert Emmons (2000) aborda o conceito de inteligência
espiritual como a relação da experiência religiosa e ética e o uso adaptativo que
se faz da informação espiritual como provedora de capacidade que abarca a
transcendência humana, o sentido e os comportamentos virtuosos, a fim de
facilitar a vida cotidiana.
Frances Vaughan (2003) afirma que inteligência espiritual é a capacidade
para compreender com profundidade as questões existenciais por meio de
distintos níveis de consciência, indo além de uma habilidade mental. Ou seja,
trata-se da conexão da vida pessoal com o transpessoal, do Eu com o espírito.
Na obra de Tony Buzan (2001), defende-se a ideia de que a inteligência
espiritual no âmbito dos negócios empresariais, além de capacitar para viver
experiências na busca de sentido, serviria para lidar com problemas profissionais
através de atitudes altruístas e solidárias, ajudando inclusive a aumentar os
rendimentos.
Francesc Torralba (2013) pondera que a inteligência espiritual habilita a
levar a cabo os variados aspectos da vida e salienta que não se deve confundi-
la com a consciência religiosa. Para o autor, o fato de o indivíduo possuir essa
forma de inteligência permite-lhe a vivência da experiência religiosa. Para ele, a
inteligência espiritual é um dado antropológico, não uma questão de fé.
Isabel Gómez Vilalba (2014) e Hermínia Prado Godoy (2010) pesquisam
a espiritualidade na educação, tendo estudos sobre a inclusão do tema na
construção de um currículo interdisciplinar na educação. Hermínia é doutora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e faz parte de dois grupos de
estudos e pesquisas sobre espiritualidade na instituição: GEPI e INTERESPE.
David King (2008) entende que a inteligência espiritual é própria dos
filósofos, pois transcende a inteligência lógico-matemática, pois seu pensar
penetra nas questões existenciais e capacita para um pensamento crítico que
contempla a natureza da existência, o universo, o tempo.
Além dos autores citados acima, existem pesquisas acadêmicas que se
referem ao estudo empírico e teórico da espiritualidade e inteligência espiritual
nas áreas de administração de empresas, pedagogia e teologia.
Essas pesquisas abordam a experiência da espiritualidade e sua relação
com o desempenho dos trabalhadores, educação espiritual e espiritualidade nas
empresas.

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Já existem na Europa e nos Estados Unidos publicações virtuais sobre a
temática da inteligência espiritual (KING, 2008) que ajudam na discussão sobre
o tema, o que não deixa de ser um indicativo de um crescente interesse literário
pelo assunto.
No âmbito da Ciência da Religião, alguns estudos de mestrado e
doutorado abordam temas como a relação entre espiritualidade e a formação do
administrador na contemporaneidade e a espiritualidade no mundo corporativo,
mas não especificamente sobre inteligência espiritual.
A Ciência da Religião já transcendeu os limites de estudos das religiões
no âmbito institucional. Cabe então, a Ciência da Religião estudar esse
fenômeno, impelida por conhecer mais sobre o conceito, acompanhando as
mudanças e inovações, para saber se se trata de uma nova modalidade de
espiritualidade.
Isso tudo reflete a pluralidade interdisciplinar do conceito de inteligência
espiritual, em um mundo cada vez mais interconectado, o que corrobora para
que a Ciência da Religião, com sua estrutura multidisciplinar, estude o
neologismo a fim de tentar entender como se processa a configuração inspirada
pela discussão em outras áreas citadas anteriormente.
A proposta desta dissertação é apresentar esse novo conceito de
inteligência espiritual, cunhado por Danah Zohar e Ian Marshall, e desvendar o
processamento desse conceito do ponto de vista antropológico.
Analisaremos esse novo conceito em três capítulos. O primeiro capítulo
será dedicado à apresentação dos principais aspectos sobre a inteligência
espiritual. A pesquisa procede no segundo capítulo, quando abordaremos a
inteligência na origem do pensamento criativo e racional; em seguida
pontuaremos os elementos da espiritualidade e como se desenvolve a
espiritualidade no ambiente de trabalho. No terceiro capítulo faremos uma
análise comparativa com base no conceito de inteligência espiritual.

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Capítulo I
Sobre a inteligência espiritual ou “QS”

I.1. PRIMEIRA APROXIMAÇÃO

Neste capítulo, vamos abordar um conceito relativamente recente no


campo acadêmico: “inteligência espiritual”. A questão central, neste momento, é
examinar a afirmação de que a inteligência espiritual representa uma
continuidade, uma categoria a mais no rol das inteligências aceitas por parte
significativa da academia, segundo a formulação da teoria de Howard Gardner
acerca das “múltiplas inteligências”, em 1983.
Nosso intuito, portanto, é familiarizar o leitor com o conceito segundo sua
formulação, examinando-o a partir de obras produzidas em diferentes campos
acadêmicos. Trata-se de colocar de lado eventuais ideias preconcebidas sobre
o tema e buscar examiná-lo a partir de uma perspectiva diferenciada.
O capítulo foi estruturado de forma a conceituar e apresentar os
fundamentos científicos da inteligência espiritual, buscando também descrever
o processo pelo qual o indivíduo, ao desenvolvê-la e assumi-la, tornar-se-ia mais
realizado e presente em suas escolhas vitais. Por fim, o capítulo ainda apresenta
um caminho para o desenvolvimento da inteligência espiritual.
A história do conceito de inteligência espiritual tem origem nos
pesquisadores Danah Zohar e Ian Marshall. Danah Zohar é pós-graduada em
ciência da religião, filosofia e psicologia pela Universidade de Harvard e
atualmente é professora na Universidade de Oxford, Inglaterra, além de prestar
consultoria a equipes de liderança corporativa ao redor do mundo. Ian Marshall
é psiquiatra e psicoterapeuta formado em Oxford, com diversos artigos
acadêmicos sobre a natureza da mente. Ambos ministram palestras e discursam
em workshops, fóruns e seminários sobre inteligência espiritual no meio
empresarial. No Brasil foram entrevistados por revistas como Exame e Valor
Econômico, em 2002, 2005 e 2010. Suas obras foram publicadas parcialmente
em blogs e outros sites relacionados ao tema liderança. Em 2015 estiveram no
Brasil para uma palestra na FIERGS (Federação das Indústrias do Estado do

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Rio Grande do Sul), ministrando o workshop "QS – conectando o 'cérebro
corporativo' a uma liderança com propósito e motivação".
Ambos são autores do livro Inteligência espiritual. QS – aprenda a
desenvolver a inteligência que faz a diferença, que relaciona os conceitos de
inteligência e espiritualidade. Publicada em Londres no ano 2000, essa é a obra
inaugural do conceito e das discussões subsequentes sobre a inteligência
espiritual. Foi traduzida para a língua portuguesa e publicada no Brasil em 2012,
depois de ter sido publicada em outros 27 idiomas. A edição brasileira é dividida
em cinco partes: I – “O que é QS”; II – “A prova científica da inteligência
espiritual”; III – “Um novo modelo do Eu”; IV – “Usando o QS”; e V – “Podemos
melhorar nosso QS?”.
Depois de estabelecer o conceito, Zohar e Marshall publicaram outras
obras relacionadas ao tema, como Capital Espiritual, SQ: Connecting with our
Spiritual Intelligence, O ser quântico e SQ – Spiritual Intelligence: The Ultimate
Intelligence, esta última escrita em coautoria com o psicólogo e escritor Daniel
Goleman.
A partir da introdução do conceito, outros autores escreveram livros e
utilizaram a temática da inteligência espiritual como referência ou conceito
central. O tema aparece em pelo menos 795 citações. Entre os autores que
utilizaram o conceito estão B. Mac Gilchrist, J. Reed e K. Myers (2001), J. R.
Carrette (2005), R. King (2005), S. Cartwright e N. Holmes (2006), R. Gill (2011)
e M. J. Johnstone (2015).
O tema é tratado nos contextos da bioética, da enfermagem, da psicologia
do trabalho, da educação básica, das novas formas de liderança, da aquisição
silenciosa da religião e de novas formas de marketing. As áreas que concentram
o maior volume de estudos são as da psicologia, administração de empresas,
pedagogia e filosofia.
Vale observar que, a despeito das possíveis representações não
acadêmicas de um conceito como o de inteligência espiritual – em contextos
como o da literatura de autoajuda, por exemplo –, é perfeitamente possível
observar, ao relacionar os trabalhos, a seriedade com que o tema é encarado
pelo universo acadêmico.

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I.2. A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE INTELIGÊNCIA ESPIRITUAL

Para construir seu conceito, Danah Zohar e Ian Marshall fizeram uma
profunda pesquisa dos trabalhos de 137 autores que investigaram as relações
entre “espiritualidade” e “inteligência”. Entre eles, figuram nomes como John
Locke, Thomas Kuhn, Sigmund Freud, William James, Carl Gustav Jung, Viktor
Frankl, Joseph Campbell, Daniel Goleman, Geoffrey Ahern, Margaret Boden,
David Bohm, S. L. Bressler, Jean Chevalier, Howard Gardner, W. Singer, James
Hillman, Julian Houston e Claridge Gordon.
Seu conceito de uma nova forma de inteligência, contudo, toma forma a
partir da apropriação e expansão da Teoria das Múltiplas Inteligências, de
Howard Gardner.
A inteligência espiritual, QS (quociente espiritual) ou inteligência da alma
seria o principal fator de referência para determinar de que maneira abordar e
solucionar questões de sentido e valor, “a inteligência com a qual podemos
inserir nossos atos e nossa vida em um contexto mais amplo, mais rico, mais
gerador de significado” (ZOHAR; MARSHALL, 2012, p. 17). Essa inteligência,
segundo os autores, propicia uma avaliação mais consistente de uma ação ou o
porquê de a escolha de um determinado caminho na vida ter mais sentido do
que outro.
Esse porquê, de fato, assume valor exponencial em uma civilização
marcada pela instabilidade, em que mudanças rápidas, ambiguidades e
incertezas fazem com que o indivíduo se sinta exaurido, inseguro e desprotegido.
Diante disso, os autores propõem o desenvolvimento do quociente espiritual
(daqui para a frente, QS), inteligência capaz de formular e revogar criativamente
as regras para estabelecer uma nova visão de cada situação existencial, mesmo
as mais singelas.
A natureza do cérebro é conservadora; as mudanças de hábitos,
sentimentos e pensamentos são demoradas. As complexas estruturas cerebrais
registram cada fato ao longo da história de cada indivíduo, em uma arquitetura
fascinante que se assemelha à dos becos tortuosos e prédios amontoados de
antigas cidades.
O QS, observam Zohar e Marshall, não mantém conexão necessária com
a religião, podendo ser elevado em indivíduos autodeclarados “ateus” e reduzido

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em pessoas que se consideram “religiosas”. A chave reside em que o indivíduo
com alto grau de QS poderia praticar qualquer religião, mas sem preconceito,
fanatismo, exclusividade ou estreiteza. Do mesmo modo, sem ser absolutamente
“religioso”, ele poderia ter qualidades extraordinariamente espirituais.
Segundo os autores, um QS devidamente desenvolvido seria capaz de
ampliar a criatividade da pessoa, participando ainda de mudanças de regras e
situações. Ele também permitiria fazer escolhas acerca das questões associadas
ao bem e ao mal, inerentes a cada ser humano.
O QS diferiria das demais inteligências por ser o embasamento
necessário para o funcionamento eficaz do QI (quociente de inteligência ou
inteligência intelectual) e do QE (quociente emocional ou inteligência emocional),
sendo o QS (quociente espiritual ou inteligência espiritual) a inteligência final, em
condições ideais de promover o funcionamento das três inteligências juntas e
apontar, como resultado, para um novo direcionamento de pensamento e
emoção ao indivíduo que se propõe a desenvolver esse tipo de inteligência.
Tal processo, ao contrário do que preconizou por muito tempo o
paradigma ocidental, não é exclusivamente lógico e racional. Pensamos não só
com a “cabeça”, friamente, mas também com as emoções, o corpo (QE) e o
espírito, as visões, esperanças, percepção de sentido e valor (QS).
A diferença principal entre QE e QS, segundo os autores, é o limite. O QE
promove uma adaptação comportamental a determinada situação, ou seja,
“significa trabalhar dentro dos limites da situação, permitindo que a situação me
oriente” (ZOHAR; MARSHALL, 2012, p. 19). No QS ocorrem perguntas em
relação a uma situação particular, através da criação de um “segundo Eu” que
pode criar uma visão mais ampla de si, o que “implica trabalhar com os limites
da situação em que se encontra, permitindo conduzir a situação” (IDEM).
Portanto, ocorre uma expansão criativa da consciência para poder conduzir a
situação de forma mais benéfica.
As inteligências podem estar ligadas a um dos três sistemas neurais do
cérebro. Todos os tipos de inteligência que Howard Gardner descreve são, na
verdade, variações do QI, do QE e do QS, bem como de suas configurações
neurais associadas.
A inteligência humana tem suas raízes no código genético e na evolução
da vida. A percepção da inteligência sofre influência diária pelo acesso às

18
informações, contato com pessoas e contato audiovisual. Do ponto de vista
neurológico, porém, tudo o que influencia a inteligência é processado no cérebro
e também por prolongamentos neurais ao longo do corpo.
Certo tipo de organização neural permite um pensamento basicamente
lógico, racional, pautado por regras – a chamada inteligência intelectual ou QI.
Um segundo tipo de pensamento, mais associativo, afetado por hábitos e
que capacita para o reconhecimento de emoções e padrões, é o QE ou
inteligência emocional.
Um terceiro tipo permite aflorar o pensamento criativo, formulador e
revogador de regras – o QS ou inteligência espiritual. Esse tipo de pensamento
transforma o padrão dos outros dois tipos de inteligência, conferindo o papel de
mediador da vida espiritual e proporcionando senso de sentido e valor em cada
contexto.
Até poucas décadas atrás, só era conhecida a “fiação neural serial” no
cérebro humano, base da inteligência intelectual, sendo que posteriormente foi
identificada a “fiação neural associativa”, base da inteligência emocional.
Já são estudadas linhas que comprovam a existência de uma terceira
fiação neural, chamada unitiva ou integrativa, capaz de unificar dados no
cérebro, ou seja, permitir a visão integrativa, sistêmica ou contextual. A
inteligência espiritual integra o material surgido dos outros dois processos: razão
e emoção. Ela dá ao Eu um centro unificado, gerador de sentido.
O QS, como descrito pelos autores, “é a capacidade interna, inata, do
cérebro e da psique humana, extraindo seus recursos mais profundos do âmago
do próprio universo” (ZOHAR; MARSHALL, 2012, p. 23). Ele independe da
cultura ou de valores; é um instrumento desenvolvido ao longo de milhões de
anos que “habita” e habilita o cérebro a descobrir e aplicar o sentido na solução
de problemas. É anterior a qualquer forma de expressão religiosa que seu
portador possa ter tido.
Danah Zohar e Ian Marshall compilaram grande volume de estudos
neurológicos, psicológicos e antropológicos para fundamentar teoricamente a
existência da base neurológica do QS. Esses estudos tentam provar
cientificamente a existência do QS como sendo a inteligência que opera a partir
do centro do cérebro – das funções neurológicas unificadoras do cérebro – e que

19
integra todas as outras inteligências. Segundo os autores, há diversas correntes
específicas de pesquisa científica para comprovar a existência do QS.
Os autores se apropriam de uma dessas correntes para sustentar a
existência do QS e elaborar a conceituação da inteligência espiritual. Essa
corrente diz respeito ao programa de pesquisa do neurologista e antropólogo
biólogo Terrance Deacon, da Universidade de Harvard. A pesquisa se refere à
evolução da imaginação simbólica e seu consequente papel no cérebro, e segue
a linha de argumentação da evolução social para expor a faculdade da
inteligência espiritual em questão.
Danah Zohar e Ian Marshall afirmam que, do ponto de vista evolutivo, o
trabalho de Deacon sobre a linguagem e a representação simbólica demonstra
que, literalmente, o QS foi usado para desenvolver o cérebro humano. Assim
Danah Zohar e Ian Marshall (2012, p. 26) afirmam:

O QS instalou uma “fiação” necessária para nos tornarmos quem somos e nos fornece
o potencial de instalar “nova fiação” – para crescimento e transformação, para evolução
ulterior de nosso potencial humano.

O trabalho do neuropsicólogo canadense Michael Persinger no laboratório


da Universidade Laurentian (1990) demonstra que ocorre no cérebro uma reação
química quando se concentra em experiências espirituais “criadas” por estímulo
artificial dos lobos temporais. Uma das conclusões da pesquisa de Persinger
aponta que talvez haja nos lobos temporais, em pessoas inteiramente normais,
uma circuitaria neural especializada, ligada à religião.
O fenômeno da crença religiosa talvez seja fruto dessa “fiação
permanente” no cérebro. Outro trabalho científico, desenvolvido por
Ramachandran (1997) e equipe, observou que existe um aumento da atividade
nos lobos temporais ligados às experiências espirituais. Segundo a pesquisa,
quando indivíduos são expostos a palavras com conotação religiosa ou
espiritual, ocorre um aumento das atividades nos lobos temporais.
Ambos os pesquisadores (Persinger e Ramachandran) batizaram a área
dos lobos temporais ligada à experiência religiosa ou espiritual de “ponto de
Deus” e acrescentaram a sugestão de que ela possa ter surgido para atender a
alguma finalidade evolutiva do ser humano. Uma importante questão levantada
por Danah Zohar e Ian Marshall é sobre se a atividade neural no “ponto de Deus”

20
contribui para a inteligência espiritual. Danah Zohar e Ian Marshall (2012, p. 108)
afirmam:

O “ponto de Deus” é um componente fundamental de nossa inteligência espiritual mais


vasta, e a atividade dos lobos temporais, apenas a maneira de a natureza permitir que o
cérebro desempenhe um papel em nosso conhecimento mais profundo de nós mesmos
e no universo.

A importância do estudo do “ponto de Deus” para o conceito de


inteligência espiritual se faz primordial, segundo a leitura dos autores, por ser a
condição necessária à própria existência. Porém, não é suficiente apenas
“existir". As percepções e habilidades especiais conferidas pelo “ponto de Deus”
devem ser alinhavadas com as emoções, motivações e potenciais, e postas em
diálogo com o centro do Eu e sua maneira especial de conhecer.
O que, em certa medida, indicaria a configuração de um QS elevado é tê-
lo funcionando como um facilitador que promove a habilitação para a integração
de “todo o cérebro, todo o Eu, toda a vida” (ZOHAR; MARSHALL, 2012, p. 215).
A recomendação de Danah Zohar e Ian Marshall se vale praticamente dos
mesmos princípios e apontam que, para elevar o QS, são necessárias algumas
práticas, dentre elas a solidão (para ganhar maturidade), o silêncio (com papel
decisivo para experimentar a realidade interior), a contemplação (para ser
receptivo ao invisível), o espiritual na arte (que, impregnado na obra artística,
serve de deleite ao observador), o exercício físico (para transcender as
resistências da natureza e o cansaço corporal) e o exercício da solidariedade
(através da consciência da conexão ao outro, suas dores e sofrimentos).

I.3. A RELAÇÃO ENTRE O QS E A CONFIGURAÇÃO DO INDIVÍDUO

Segundo Zohar e Marshall, o ser humano nasce para cumprir uma missão
como indivíduo, sendo livre de crenças ou religiões, concebido para ser um ser
completo e constituído por duas substâncias ou naturezas: “corpo” e “espírito”.
A existência ou não do espírito não será tratada no presente estudo. O
uso do termo aqui tem por objetivo indicar uma condição: há um “direcionamento
moral que o ser humano, em sua integralidade, assume ao ir na direção de
valores carnais ou espirituais” (ANJOS, 2007); o espírito seria, então, uma

21
“característica específica do ser humano, como ser pensante e livre, torna-se um
fator decisivo para a conceituação de espírito” (IDEM).
Zohar e Marshall defendem a ideia de que cada ser humano possui suas
próprias características e de que sua evolução espiritual se dá de forma singular,
tanto no nível íntimo quanto por maneiras diferentes de experimentar e testar
vivências individuais. Para galgar as etapas da evolução espiritual, identificá-las
e desenvolvê-las ao longo da jornada da vida, o processo se inicia no nível da
individualidade, do Eu. Essas etapas podem ser divididas e classificadas a partir
de categorias do QS, como frequência, intensidade e constância das práticas.
Já os níveis são subdivididos em graus de maturidade e estados espirituais.
Zohar e Marshall prometem que, através de uma abordagem centrada no
ser humano e com foco nas suas necessidades, a vivência plena do QS
propiciaria uma manifestação íntima e por inteiro das necessidades reais e
intangíveis. Os indivíduos que fazem ou pretendem fazer uso profundo dessa
prática espiritual passariam por mudanças de pensamento nas maneiras de ver
e pensar, o que propiciaria alterações no comportamento. Ao mesmo tempo,
deve-se perceber que o conhecimento do centrar-se em si mesmo não deve ser
o objetivo final, e, sim, uma ferramenta de autoconhecimento para estabelecer
uma conexão mais estreita, em que se sinta uma ligação mais amável, amorosa
e serena para com o próximo, o planeta e natureza.
Os autores postulam que o cumprimento da missão do indivíduo precisa
estar alinhado com os valores que ele tem como primordiais, sua visão de mundo
e as perspectivas de futuro. A descrição de um modelo mais profundo e
detalhado da individualidade, do Eu, representaria o caminho dessa nova forma
de encarar a realidade e a possibilidade de ser um catalisador para gerar
mudanças. Afinal, Zohar e Marshall argumentam que o desenvolvimento do QS
sem mudança de comportamento não implica o verdadeiro propósito da
inteligência espiritual.
O ser humano é descrito pelos autores a partir de uma perspectiva que
passa de análises exteriores para uma maior importância às análises do interior,
do interno, do Eu, da individualidade. A visão essencialmente racional de o
indivíduo encarar as experiências vivenciadas está sendo repensada.
A funcionalidade do conceito de QS busca tornar o indivíduo consciente
da sua capacidade de acesso à própria consciência e a seu inconsciente

22
pessoal, bem como situá-lo em uma esfera mais próxima do Eu, com acesso a
uma lógica espiritual. Essa seria, de acordo com os autores, uma nova forma,
uma nova motivação, assim como novas vontades e novas premissas que
influenciariam pensamento, sentimento e comportamento. Dessa forma, criar-
se-ia um ciclo virtuoso no qual o ser humano iria adquirindo essas novas
habilidades de conotação espiritual.
Através de práticas, o indivíduo começa a sentir vontade de fazer mais
reflexões, um trabalho interior, para se aperceber de e aprimorar essas
habilidades a ponto de elas se tornarem naturais e inerentes a seu modo de vida.
O desenvolvimento de QS é realizado no Eu interior, profundo, amplo, íntimo e
constante.
Danah Zohar e Ian Marshall sugerem a formulação de algumas perguntas
que propiciariam o conhecimento e a possível verificação dos valores que o
indivíduo tem mais em conta e como ele sente determinada situação. Essas
perguntas ajudariam a identificar as potencialidades individuais e ampliar o
alcance do Eu interior dentro dessa nova perspectiva. Essas potencialidades são
consideradas individuais e diferentes em cada indivíduo e relacionam-se com a
integração dos aspectos comportamentais, dentro de uma escala de valores com
diferentes graus de relevância e níveis de importância.
As constantes mudanças interiores, menores ou maiores, acabam por
culminar com a própria mudança de conduta e rumo da missão de vida.
Aumentam a probabilidade de o indivíduo progredir e elevar-se continuamente,
sobretudo aquele que desenvolve a prática do QS. Mas vale a ressalva de que
quem o pratica o faz para atingir na reta final o objetivo de ser uma pessoa mais
solidária, mais altruísta.
A prática do QS, sugerem os autores, desperta no indivíduo a capacidade
de fazer questionamentos e permite que ele faça perguntas a si mesmo,
deslocando-se para um “segundo Eu” para checar se quer estar em uma
situação particular e trabalhar para gerar um movimento que transcenda os
limites, e não uma adequação a determinada situação.
Zohar e Marshall chamam a atenção para a metáfora sobre a natureza e
incitam a observá-la, lá onde tudo continua em constante evolução, o que
resultaria em um paralelo de uma lógica natural de evolução do QS. O ser

23
humano também deveria evoluir continuamente em seu lado espiritual, seguindo
o exemplo da natureza.
Contudo, com esse novo conceito o progresso atinge, além da esfera
material (negócios, profissão e posição socioeconômica), a esfera espiritual,
criando-se uma base sólida para reter essas conquistas, com a liberdade de
assumir uma postura sobre si mesmo e fazer de sua vida pessoal um projeto
único.
Não obstante a inteligência espiritual excluir as necessidades materiais e
se preocupar unicamente com o bem-estar espiritual, não está promovendo uma
verdadeira transformação, pois a ideia de solução dos problemas materiais (não
estamos falando de problemas existenciais) é que permitirá obter uma
verdadeira tranquilidade espiritual. Quando se reconhece que esse é um dos
benefícios do desenvolvimento do QS, adquire-se um estado de tranquilidade
quase absoluto, mesmo diante dos problemas. Esse, segundo os nossos
autores, seria um benefício central do cultivo do QS.
O ápice desse desenvolvimento seria a percepção da inteligência
espiritual no indivíduo, que pode ser identificada com alguns critérios pontuados
por Torralba (2013, p. 107):

Uma pessoa cultivada espiritualmente é capaz de viver a si mesma e as relações com


os outros e com o mundo de um modo significativamente distinto. O desenvolvimento
integral e pleno de uma pessoa é possível apenas se forem estimuladas todas as suas
faculdades e inteligências. Isso exige trabalho da inteligência espiritual. Os benefícios
que emanam disso são múltiplos e justificam exaustivamente o esforço.

A aplicabilidade desse conceito permitiria ao indivíduo a experiência da


prática do conceito de QS em todos os outros âmbitos da vida humana, como no
trabalho, entre os familiares e entre o meio social.
Os campos e níveis de aplicação do conceito de inteligência espiritual não
são construídos no âmbito religioso. A edificação desse conceito é algo interior,
não havendo a necessidade de frequentar igrejas, templos ou casas de difusão,
ou fazer peregrinações, penitências e quaisquer rituais litúrgicos.
Ou seja, o indivíduo ganharia poder para se libertar de dogmas e
doutrinas, sem, no entanto, depender do pertencimento a alguma crença
religiosa. Danah Zohar e Ian Marshall acrescentam que o conceito de QS não

24
surgiria em um estilo de vida paralelo à vida cotidiana; ele estaria intimamente
unido e gerando a força da autorrealização – assim como quando Maslow
redefiniu a base de sua pirâmide. Pois quem cultiva a inteligência espiritual vive
mais intensamente cada sensação, cada situação, experiência e relação
interpessoal, das passageiras às duradouras.
O ser humano experimenta a capacidade do autodirigir a vida como um
projeto, sendo que a vivência do conceito de QS impulsiona essa possibilidade
de transformar a vida em um projeto dentro da missão, visão e valores que mais
se aproximam da identidade individual, para ordenar o QI e QE. Ou seja,
segundo Zohar e Marshall, a realização pessoal de um projeto abre a
possibilidade de uma experiência de se dedicar a uma atividade que transcenda
o Eu, gerando felicidade.

I.4. O CONCEITO DE FELICIDADE SEGUNDO O QS

Para Danah Zohar, Ian Marshall e Francesc Torralba, em todos os tempos


o ser humano aspirou à felicidade, primeiro e último objetivo do indivíduo e meta
de todo preparo, esforço e aperfeiçoamento. Porém, muitos indivíduos, não
obstante a desejarem, permanecem sem desfrutá-la.
Isso ocorre quando se observa apenas o material, a geração e acúmulo
de riquezas. Em um período da história da humanidade em que a sociedade é
apelidada de “sociedade do espetáculo, da diversão e do consumo massivo”,
constantemente solicita-se às pessoas que se abandonem – deixando seu Eu
interior – para “se esparramar” em atividades sem fim. Fazem essas atividades
feitas para satisfazer um desejo após o outro, e, quando surgem medos e
incertezas provenientes de questionamentos, agarram-se a atividades que
geram prazer para fugir do sofrimento. Esse ciclo não pode ser interrompido,
pois, para alguns indivíduos, ele seria a melhor forma de manter tudo
funcionando a contento.
A busca da felicidade através do conceito de inteligência espiritual é uma
inversão dos valores sobre diversão e acúmulo de riquezas. Ela possibilita um
processo de melhor conhecimento de si mesmo, fator indispensável para o
desenvolvimento harmônico da pessoa, como pondera bem o filósofo Gabriel

25
Madinier (1969), inscrevendo também a questão do imediatismo tecnológico
como fator de alienação do Eu.
Em uma cultura marcada pelo embotamento espiritual, facilmente ocorre
a distorção de valores, sentido etc. As pressões sociais do grupo e a urgência
em comprar cercam os indivíduos por todos os lados, confundindo o motivo da
busca por algo. A pergunta que gera confusão é a que relaciona o querer e o
precisar. Os autores afirmam categoricamente que, para ter a felicidade, uma
das maneiras é ser espiritualmente mais inteligente, buscando a verdadeira
motivação pessoal e procurando a realidade por trás de qualquer desejo
superficial.
Se a análise for superficial, pode-se perceber, talvez, certa discordância
entre felicidade e inteligência. Em geral, a felicidade ou infelicidade do ser
humano depende de como estão seus pensamentos. O QS capacita a pessoa a
antecipar problemas, resolver situações, imaginar alternativas e planejar o
projeto de vida. Danah Zohar e Ian Marshall propõem essa prática para capacitar
o indivíduo a ser o gerador de mais momentos de felicidade.
No conceito de inteligência espiritual, na elevação espiritual, a principal
condição é a inteligência da percepção verdadeira. Esse elemento, explicam
Danah Zohar e Ian Marshall, consiste em ter o discernimento aguçado para
entender o funcionamento das relações interpessoais de forma mais correta,
com maior grau de pureza, condizente com a circunstância e sem auferir
julgamentos.
Conseguir compreender as coisas significaria possuir uma inteligência
espiritual elevada. Descobrir rapidamente a lógica que rege a situação seria uma
capacidade resultante de um indivíduo que possui uma aguçada inteligência
espiritual, significando que houve reflexo no espelho da alma.
Estando em conformidade com a lógica da inteligência espiritual, tudo
transcorrerá com mais facilidade, e os obstáculos irão sendo derrubados tanto
quanto possível com sabedoria e clareza de pensamentos, alternando
momentos de resignação, reflexão e conscientização para lidar e, assim,
proceder diante dos acontecimentos da vida, emendam os autores Francesc
Torralba e Ian Marshall.

26
Essa abordagem reitera a afirmativa de que se reconhece que o QS está
novamente participando da esfera do intelecto e que, por isso, requer a devida
atenção.
Outro aspecto fundamental para a compreensão do tema é a confusão
entre prazer e felicidade. Zohar e Torralba reforçam a diferença entre os dois
conceitos: o prazer é a percepção subjetiva de um bem corporal, uma impressão
agradável, e a felicidade não se identifica com o prazer, embora tampouco se
oponha a ele. A felicidade, do ponto de vista do QS, é muito mais que um estado
de ânimo imaginário, como define Torralba: “A felicidade tem a ver com a
realização dos próprios valores e ideais, com a experiência de cumprir com o
próprio dever, com a sensação interior de viver uma vida com sentido”
(TORRALBA, 2013, p. 289).
A felicidade seria possível, segundo Torralba e Zohar, pelo cultivo do QS,
ao facilitar um diálogo entre a razão e a emoção, entre a mente e o corpo. A
inteligência espiritual (QS) forneceria um núcleo para crescimento e
transformação, um centro ativo, unificador e gerador de sentido ao Eu.
Danah Zohar observa que, em várias partes do mundo, muitas pessoas já
conseguiram atingir um nível de bem-estar material. “Ainda assim, querem mais.
Muitas falam de um vazio […]. O ‘mais’ que preencheria o vazio raramente não
tem qualquer ligação com a religião formal” (ZOHAR; MARSHALL, 2012, p. 22),
e, sim, com o cultivo do QS.

I.5. A BUSCA PELO SENTIDO

Segundo Torralba e Zohar, o grande problema na mente do homem


moderno é o sentido. Esse assunto já foi tratado por diversos autores, como
Viktor Frankl (1946), e nesta dissertação não temos a intenção de nos aprofundar
no assunto. O objetivo aqui é trazer o tema para a discussão segundo o ponto
de vista do QS, que tem uma de suas referências no próprio Viktor Frankl.
Danah Zohar e Ian Marshall afirmam que a falta de um sentido mais
profundo na vida é a crise básica de nossa época, mesmo em indivíduos
religiosos ou naqueles que prosperaram economicamente. Os caminhos a serem
percorridos ao longo da vida são muito mais “trilháveis” caso se saiba, a partir
de motivações um pouco mais profundas, o porquê de percorrê-los.

27
Seguir um caminho com inteligência espiritual significa ser uma pessoa
fortemente comprometida e dedicada a algo. O QS pode ser utilizado como
ferramenta para entender todas as “coisas” de forma correta, e o critério do
conceito é dar sentido à solução de problemas existenciais.
Nossos autores acrescentam que essa busca de sentido deve ser feita
pelo uso do QS, porque ele é inato a qualquer ser humano. O QS serve para
abrir novos caminhos, descobrir novas manifestações de sentido, ser algo que
“nos toque” e que possa nos guiar para dentro de “nós mesmos”.
Entendendo o âmago das palavras e reconhecendo não só valores
existentes em nossa cultura, é possível fazer a conexão com a sabedoria que
chega além do ego ou da mente consciente e ter parâmetros para averiguar se
se está de acordo com um propósito que supera o ego, e também a capacidade
interna, inata, do cérebro e da psique humana, de extrair seus recursos mais
profundos do âmago do próprio universo.
Os autores denominam o QS, ou a inteligência espiritual, de “inteligência
da alma” (ZOHAR; MARSHALL, 2012, p. 23),

a inteligência com a qual nos curamos e com a qual nos tornamos seres verdadeiramente
íntegros. Ansiamos por uma união mais profunda, mais comunhão […], mas poucos
recursos encontraram em nosso ser limitado […]. O QS […] conecta com a sabedoria
que nos chega de além do ego ou da mente consciente.

Danah Zohar e Ian Marshall traçam um paralelo entre felicidade e busca


de sentido em que ambos os conceitos estão interligados e mais ou menos
dependentes entre si em diferentes circunstâncias.
As pessoas mais felizes são as que cultivam o QS, pois conseguem
ajustar necessidades e possibilidades, conhecendo-se e conectando-se consigo
mesmas, não se propondo metas excessivas ou projetos de vida irrealizáveis
que, consequentemente, lhes causarão frustração.
O desenvolvimento do QS permite ao indivíduo desfrutar do sabor de
viver, de um estado de êxtase por se encontrar e fazer parte do cosmos em
virtude de sua relação com os demais seres.
Algumas características encontradas em pessoas felizes que praticam o
desenvolvimento da inteligência espiritual, observam os autores Danah Zohar e
Ian Marshall, são a forma especial de ser, estar e perceber a realidade repleta

28
de beleza; a capacidade de comover-se intimamente diante de tudo o que existe;
a intuição que não advém somente de um raciocínio lógico; a convicção de que
a força do QS é poderosa; a fidelidade à voz interior; a capacidade de aceitar
situações limítrofes e perder, mesmo estando com a razão; a esperança,
determinação e coragem que se estendem no tempo e com um bem querer
universal.

I.6. MERCADO, MARKETING, PESSOAS “3.0”

Uma nova era se aproxima em um contexto histórico-social do


capitalismo, quando a abordagem centrada no consumidor é trocada pela
abordagem centrada no ser humano, e na qual a lucratividade tem como
contrapeso a responsabilidade corporativa. Essa, em breves palavras, é a
perspectiva de Philip Kotler, conhecido como o “pai do marketing moderno”, para
a construção da ideia de “marketing 3.0”, apresentada em 2005. É uma nova
maneira de fazer e ver os negócios da perspectiva da espiritualidade e, por que
não, do QS.
Para apresentar as noções-chave de uma nova realidade (que algumas
empresas já adotaram com vantagens econômicas), traremos o próprio Kotler,
que apresenta e defende a evolução do marketing. Responsável por conceitos
reconhecidos de marketing (“marketing 1.0” e “marketing 2.0”), ele passou a
afirmar que o “marketing 3.0” é uma tendência centrada no ser humano para
chegar a seu espírito, buscando um sentido cada vez maior para a sua vida.
Kotler (2012, p. 4) afirma com brilhantismo:

Hoje, estamos testemunhando o surgimento do marketing 3.0, ou a era voltada para os


valores. Em vez de tratar as pessoas simplesmente como consumidoras, os profissionais
de marketing as tratam como seres humanos plenos: com mente, coração e espírito […].
Buscam não apenas satisfação funcional e emocional, mas também satisfação espiritual,
nos produtos e serviços que escolhem.

Atingir o espírito e buscar sentido são dois elementos fundamentais do


conceito de QS. Então, a partir desse ponto abre-se uma brecha para acessar a
necessidade do espírito da pessoa. Essa busca de sentido mexe com as
expectativas pessoais e com o mercado de trabalho, ou seja, com a própria “alma
do capitalismo”.

29
As lideranças que conseguirem enxergar esses valores precisam também
estar alinhadas com o próprio cultivo do QS, a fim de que possam adotar uma
gestão mais condizente com o conceito de inteligência espiritual.
Dessa forma, postulam Danah Zohar e Ian Marshall, as lideranças
ofereceriam uma contribuição maior à concretização da missão, visão e valores
ao conciliar o interesse dos indivíduos, fossem eles stakeholders (agentes do
processo produtivo) ou clientes, com o objetivo final do conceito de inteligência
espiritual: oferecer soluções para os problemas da sociedade, pensar no
próximo, no semelhante.
Segundo Kotler, o “marketing 3.0” leva o conceito de marketing à arena
de aspirações, valores e espírito humano. O “marketing 3.0” acredita que os
consumidores são seres humanos completos, cujas outras necessidades e
esperanças jamais devem ser negligenciadas. Desse modo, o “marketing 3.0”
complementaria o marketing emocional com o marketing do espírito humano.
Pensando nos valores imprescindíveis em uma sociedade que precisa
reinventar a forma de fazer negócios para que possa se manter viva, Kotler
(2012, p. 5) pontua o momento que estamos vivendo:

Em épocas de crise econômica global, o marketing 3.0 adquire relevância ainda maior
para a vida dos consumidores, na medida em que são afetados por rápidas mudanças e
turbulências nas esferas social, econômica e ambiental. Doenças tornam-se pandemias,
a pobreza aumenta e a destruição do meio ambiente caminha a passos largos. As
empresas que praticam o marketing 3.0 oferecem respostas e esperança às pessoas
que enfrentam esses problemas e, assim, tocam os consumidores em um nível superior.
No marketing 3.0, as empresas se diferenciam por seus valores […] e voltados para o
espírito.

Danah Zohar complementa o raciocínio sobre o empresariado ao


estimular uma conduta pessoal e com os pares em que haja espaço para
construir um estilo de vida que atenda às necessidades pessoais e profissionais,
que reserve tempo para tudo que seja considerado importante – assim é o
profissional centrado, o “indivíduo 3.0”.

30
I.7. O LÍDER SEGUNDO A INTELIGÊNCIA ESPIRITUAL

No conceito de inteligência espiritual, o líder precisa estar disposto a


desenvolver suas habilidades, pois tem de atingir o espírito, e para tal deve
colocar-se no nível de cada indivíduo a fim de ser igualmente entendido pelo
outro. E, quando o líder desenvolve a inteligência espiritual, ele consegue se
desconstruir, libertar-se de seu “ego”, de suas opiniões, tornando-se versátil,
livre e desimpedido para escutar, levando em consideração o momento (diário)
de uma situação (projeto, atividade) e o ambiente (descontraído ou formal).
Danah Zohar e Ian Marshall (2012) afirmam que um líder pode ser forte
em um aspecto e fraco em outros. Contudo, ele pode cultivar-se e desenvolver-
se, pois nasce com a capacidade de usar todas as três inteligências (intelectual,
emocional e espiritual).
A liderança, no conceito de inteligência espiritual, difere dos
“mandamentos” da prática da espiritualidade e, segundo Danah Zohar, pode ser
fomentada através da aplicação de 12 princípios:

1. Autoconhecimento. Este princípio difere da autoconsciência emocional


de Daniel Goleman no que se refere ao conhecimento que se tem em
determinado momento. A autoconsciência espiritual significa reconhecer-
se no que existe e preocupar-se com o "para que se vive" e o "pelo que
se morre". Ou seja, trata-se de uma vida fiel a si próprio, mas que sabe
respeitar o limite do outro. Ser autêntico para permitir trazer a verdade do
Eu interior ao mundo exterior através da ação.
2. Espontaneidade. Ter espontaneidade não significa meramente agir sob
caprichos. Refere-se, sim, ao comportamento autêntico afinado com
autodisciplina, prática e autocontrole. É necessário desapegar-se dos
problemas – de infância, projeções, suposições, interpretações e
preconceitos – e situar-se no presente, sensível ao momento do agora.
Espontaneidade ecoa responsabilidade e integração.
3. Visão e valores. Visão é a capacidade de enxergar algo que nos inspira,
algo mais amplo do que a visão da empresa ou uma visão para educação.
É a procura por respostas para as questões maiores, mais difíceis, como
a diferenciação: Por que queremos que o mundo obtenha nossos
produtos? Para você poder fazer o que tem vontade, realizar sua missão
31
com prazer e permitir que o que você faz faça diferença. Saber que
escolheu uma vida que é conduzida por visão e valores.
4. Holística. Na física quântica, holística se refere a sistemas que estão tão
integrados que cada parte é definida por todas as outras partes do
sistema. O que eu penso, sinto e valorizo afeta o mundo inteiro. O holístico
incentiva a cooperação, porque, como você percebe que é parte do
mesmo sistema como todo mundo, assume a responsabilidade por sua
parte do todo. A falta de holística incentiva a concorrência e, como
consequência, a separação. Para os empreendimentos humanos serem
mais eficazes, precisamos de líderes que saibam promover a cooperação
e o sentido de unidade.
5. Compaixão. Não é apenas não reconhecer ou aceitar os sentimentos, é
senti-los. Isso é particularmente difícil de fazer com alguém que fere ou
insulta o outro. O grande salto é conseguir sentir a dor e frustração por
trás do comportamento. Não se pode permitir ser tratado de maneira
hostil, e muitas vezes é preciso lutar contra. Mas lutar com compaixão,
com compreensão, com o conhecimento do adversário.
6. Celebração da diversidade. A compaixão está fortemente relacionada
com o princípio da diversidade. Muitas organizações oferecem programas
de diversidade que consistem, por exemplo, em colocar uma mulher no
conselho de administração, ou assegurar que a força de trabalho tenha
percentagens específicas de vários grupos étnicos. A paixão pela própria
opinião e a capacidade de aprender uns com os outros está nas
diferenças. Um grande líder ajuda seus liderados a entenderem como lidar
com o perfil de cada um. Quando as pessoas discordam do líder, elas
literalmente fazem aflorar novos caminhos neurais, exigem a criatividade.
O que faz com que haja uma reprogramação no cérebro, desafiando
suposições e questionando valores, bem como resultando em novo
aprendizado transcendente. Quando um líder inspira o surgimento de
confrontos com um diálogo espiritual, o empreendimento compartilhado
torna-se um meio de conter uma nova fórmula e de deixar emergir algo
novo. Ao não trazê-lo para o grupo, perde-se essa energia. Celebrar a
diversidade significa apreciar sair da zona de conforto, porque, ao fazê-lo,
o líder faz pensar e crescer.

32
7. Independência. Significa “estar contra a multidão”, estar disposto a ser
impopular pelo que se acredita. É uma vontade de ir sozinho, mas só
depois de considerar cuidadosamente o que os outros têm a dizer.
Qualquer líder visionário deve, quase por definição, ficar sozinho às
vezes. Esses líderes estão muitas vezes à frente de seu tempo.
8. Humildade. É o outro lado do campo da independência, quando se
percebe ser um ator numa peça maior e que a própria atuação poderia
estar errada. Então o líder se questiona impiedosamente. “Estou certo de
pensar o que penso? Ouvi todos os argumentos contra o oponente?
Tenho pensado seriamente sobre isso?” Humildade torna um líder grande,
não pequeno.
9. Tendência a fazer perguntas fundamentais. “Por que estamos fazendo
isso dessa forma, em vez de outra maneira? Por que estou nesta
empreitada, e qual sua finalidade? Por que não estamos realizando outra
coisa?” Einstein contava que, quando era criança, estava sempre com
problemas na escola, porque os professores o acusavam de fazer
perguntas estúpidas. Quando se tornou famoso, brincava dizendo que,
agora que todos pensavam que ele era um gênio, estava autorizado a
fazer todas as perguntas estúpidas. As respostas são um jogo finito
jogado dentro de limites, regras e expectativas. As perguntas são um jogo
infinito. Grandes líderes são chamados para grandes questões.
10. Ressignificação. Refere-se à capacidade de distanciar-se de uma
situação para ter uma visão mais ampla do todo. Um dos maiores
problemas do mundo atual é o pensamento de curto prazo. Como a
comunidade empresarial sabe, a maioria das empresas mantém o foco no
retorno trimestral, quando são apresentados os resultados, e
consequentemente os retornos e dividendos para os acionistas são
pagos.
11. Uso positivo da adversidade. Esse princípio diz respeito à capacidade
de reconhecer e aceitar os próprios erros. Quantos ficam presos em
atitudes equivocadas, por não admitir terem dado um passo inicial errado
para não perder a credibilidade? Em vez de ter a coragem de reconhecer
o erro, mantêm o curso equivocado da ação, enredando-se mais
profundamente na confusão. Os grandes líderes têm confiança em admitir

33
erros com o uso positivo da adversidade, e também da capacidade de
reconhecer que o sofrimento é inevitável na vida. Há coisas dolorosas que
os seres humanos têm dificuldade de lidar, mas os erros tornam o líder
mais forte, sábio e corajoso.
12. Senso de vocação. Esse princípio resume a inteligência espiritual e o
capital espiritual. Vocação vem do latim vocare, que significa “chamar”.
Originalmente, referia-se à vocação de um religioso para servir a Deus.
Hoje, muitas vezes refere-se às profissões, como medicina, magistério e
direito. Segundo Danah Zohar, o ideal seria se os negócios se tornassem
uma vocação que atraísse pessoas com um propósito maior e um desejo
de fazer riqueza que beneficiasse não apenas aqueles que os criaram,
mas também a comunidade e o mundo. Pode-se chamar de “cavaleiros”
os líderes de negócios que podem trazer tal mudança, homens e mulheres
que, como os Cavaleiros Templários da Idade Média, fazem um voto de
prestar serviço para algo maior do que eles mesmos.

34
Capítulo II
Inteligência e espiritualidade

II.1. BREVE PANORAMA INTRODUTÓRIO

Neste capítulo será apresentado ao leitor um breve panorama sobre o


estudo das inteligências, com ênfase em alguns aspectos que abordam a origem
da mente, da história do pensamento, das inteligências, da criatividade, da
arquitetura da mente, do surgimento da consciência.
A compilação e a escolha desses elementos se fazem necessárias para
que no próximo capítulo tracemos um paralelo desses elementos dentro do
conceito de inteligência espiritual na perspectiva dos autores Danah Zohar e Ian
Marshall. Estes últimos recorrem aos estudos sobre inteligência para
fundamentar a sequência do QS. Como exemplo, utilizam a Teoria das Múltiplas
Inteligências, como se processa o pensamento e a consciência, para servir de
instrumento e para nortear sua tese de que há mais um tipo no quadro das
inteligências.
O conceito de inteligência espiritual seria, na visão desses autores, mais
um campo de necessidades e capacidades do ser humano do que supostamente
uma continuidade no processo da arquitetura da mente.
Os mistérios da compreensão da inteligência intrigam pesquisadores
desde tempos remotos e algumas questões sobre a arquitetura da mente podem
ajudar a inserir a natureza do pensamento de um indivíduo no que tange à
inteligência espiritual, citada no capítulo I.
Em um segundo momento mostraremos que a espiritualidade pode ser
praticada sem vínculo com religião ou crenças, sendo também uma categoria de
análise comportamental do indivíduo.
Tal abordagem vai ao encontro de Danah Zohar e Ian Marshall, dois
autores respeitados que, além de valorizar o estudo do ser humano sem
descartar a espiritualidade, são fontes recorrentes para os autores do QS.
Portanto, a intenção é falar sobre como se deu a evolução da mente e o
estudo dessa evolução, e consequentemente sobre processo do pensamento,

35
que é fundamental para o estudo da inteligência, espiritualidade e inteligência
espiritual.
A escolha desses elementos, novamente, levou em conta a relevância
deles quanto ao conceito de inteligência espiritual, como ressonância a algumas
características apresentadas no primeiro capítulo.
Traçaremos, então, de forma sucinta as principais abordagens –
antropológica, histórica e ontológica – sobre a espiritualidade, que também são
apresentadas no conceito de inteligência espiritual.

II.2. A CONTEXTUALIZAÇÃO DO CONCEITO DE INTELIGÊNCIA

II.2.1. A arquitetura da mente

A mente humana é um assunto que vem sendo objeto de estudo por


psicólogos e filósofos, porém não existe consenso sobre uma única e verdadeira
definição que possa ser utilizada. Os aspectos do intelecto humano continuam a
ter destaque em estudos que procuram analisar como se desenvolvem as
capacidades de linguagem, motora, da consciência.
Quem introduz o assunto sob nova perspectiva é Steven Mithen (1996),
que coloca em análise a abordagem arqueológica para tentar estudar a mente
de nossos antepassados. Ele fez um levantamento sobre os estudos da mente
e constatou que, nas últimas duas décadas, ocorreu um avanço, pois novas
questões passaram a ser consideradas pertinentes.
Anteriormente os estudos remetiam a uma análise sobre as relações
evolutivas e o comportamento. Agora o avanço se dá na análise do pensamento,
ou seja, o que se passava nas mentes de ancestrais e antepassados, a chamada
arqueologia cognitiva.
A arqueologia cognitiva, termo cunhado por esse mesmo autor, considera
que o poder de expansão do cérebro ao longo da evolução humana e sua relação
com as mudanças de comportamentos devem ser fonte para estudo, para
análise de informações sobre como se processou a explosão cultural, e quais
resultados geraram nas modificações de estilos de vida, devido à tamanha
diversidade cultural originada na mente criativa humana.

36
Ainda segundo Mithen, a primeira explosão cultural aconteceu entre
sessenta mil e trinta mil anos atrás, quando apareceram as primeiras
manifestações artísticas, com uma tecnologia complexa para o momento em
questão e com o surgimento de formas ritualistas de cunho religioso, propiciando
importantes transformações comportamentais associadas ao Homo sapiens
sapiens.
A compreensão de que a mente moderna é produto de um longo e lento
processo evolutivo, que precisou de milhares de anos nesse caminho de
transformação, ocorre desde os primeiros acontecimentos da história, os quais
contribuíram para definir a natureza da mente humana (MITHEN, 1996).
A visão da mente moderna pode começar a ser conceituada a partir da
análise de que o processo de adquirir conhecimento se desenvolve pela mente-
esponja e pela mente-computador. O conceito de mente-esponja refere-se à
maneira como a mente absorve, embebeda-se, de informação e “espreme” para
lembrar a informação e utilizá-la. O conceito de mente-computador é o de que a
mente, além de registrar a informação, tem outros mecanismos que são
comparados a outras informações e combinações, adquirindo aprendizagem
(MITHEN, 1996).
Ambos os conceitos são tentativas de descrever o funcionamento da
mente. Mas ainda existe outra questão a ser analisada: como ocorre o processo
criativo e como a mente corresponde a vários e diferentes estímulos ao mesmo
tempo?
Para entender o processo criativo e imaginário, os psicólogos Tom Wynn
e Jean Piaget (1985) introduzem o conceito de mente-canivete-suíço e criticam
o conceito de mente-esponja e mente-computador.
Segundo eles, a mente opera como um canivete suíço, em que cada
dispositivo é projetado para solucionar um tipo de problema bem específico
(MITHEN, 1996). Essa analogia funciona melhor a partir da adoção de algumas
terminologias para especificar esses dispositivos (domínios cognitivos, módulos
de inteligência), a fim de compreender o processo da imaginação e o
pensamento criativo.
Investigar o processamento e desenvolvimento desses dispositivos na
visão da mente-canivete ajudará a análise da arquitetura da mente. Trata-se de

37
um processo importante que servirá de embasamento para a correlação entre
pensamento e inteligência espiritual.
Dois grandes pesquisadores da década de 1980, Jerry Fodor e Howard
Gardner, introduzem novas ideias sobre a arquitetura da mente e apresentam o
processo de modularidade.
Fodor (1980) defende que existem dois sistemas: de percepção (inata à
mente humana) e de cognição; e, segundo ele, é neste último que ocorrem os
processos de pensar, resolver problemas, imaginar, e que também é nele que
reside a inteligência. Porém, declara que é impossível estudá-los, embora
conclua seu estudo dizendo que o processo da evolução humana foi possível
pelo fato de a arquitetura da mente moderna ser tão engenhosa que permitiu a
adaptação ao mundo ao redor.
Gardner (1986), por sua vez, propõe que a mente é constituída de vários
tipos de inteligência e que o desenvolvimento de cada uma delas sofre influência
do contexto cultural individual. Enfatiza que as múltiplas inteligências interagem,
trabalham em conjunto harmoniosamente e se fortalecem mutuamente. Essa
seria uma característica do desenvolvimento humano.
Portanto, Steven Mithen (1996) compila os estudos de Fodor e Gardner e
apresenta a possibilidade de a arquitetura da mente ser composta de dois
canivetes suíços, em que um dos dispositivos trabalha independentemente e o
outro, em conjunto. Para defender esta hipótese, Mithen traz para discussão as
recentes ideias da psicologia evolutiva, na qual a grande diferença em relação à
ideia do funcionamento da mente, em comparação com a teoria de Gardner, é
que as inteligências não podem ser moldadas pelo contexto cultural do
desenvolvimento, ou seja, são imunes ao mundo externo.
Os psicólogos Leda Cosmides e John Toody (1987), que defendem essa
teoria, afirmam que a mente moderna é produto da evolução humana e que
existe uma compulsão positiva e uma facilidade no envolvimento e na aplicação
de regras, refletindo uma característica fundamental da arquitetura da mente.
A psicologia do desenvolvimento tem outra visão, mais favorável, segundo
Steven Mithen, de como é o processo de modularidade mental. Existe um
conjunto de conhecimentos (linguísticos, psicológicos, biológicos e físicos)
intuitivos e inatos dentro da mente, que estão diretamente relacionados com as
escolhas do estilo de vida.

38
A psicologia do desenvolvimento, na análise de Karmiloff-Smith (1992),
costura a possibilidade de que a modularização dos processos mentais possa
ser produto da evolução humana. Essa evidência tece o argumento de que os
módulos (dispositivos) começam a operar juntos, “ou seja, podem surgir
pensamentos que combinem conhecimentos antes ‘presos’ dentro de domínios
específicos” (MITHEN, 1996, p. 89).

II.2.2. O processamento do pensamento criativo

Steven Mithen explica o surgimento da criatividade a partir da sugestão


de Gardner de que a execução das atividades humanas mais complexas de
inteligência funciona sem interrupção, gerando um fluxo de conhecimento, e
sugere que a sabedoria se processa nos seres humanos que têm mais
capacidade de criar conexões entre os domínios cognitivos.
A criatividade foi muito bem explicada e descrita por Margaret Boden
(1994), e Steven Mithen se apropria da ideia da autora.
A evidência de que o pensamento utiliza novas maneiras de processar o
conhecimento já adquirido nos domínios cognitivos tem sido amplamente
defendida por psicólogos (até mesmo os evolucionistas) para conceituar a
essência da criatividade humana.
Steven Mithen se apropria dessas ideias e acrescenta o argumento de
Dan Sperber (1994) de que a mente moderna pode ser modular e criativa ao
mesmo tempo, e com a evolução desenvolveu um módulo altamente
especializado: o Módulo da Meta-Representação (MMR).
A finalidade desse módulo é abrigar “conceito de conceitos” e
“representações de representações”; à medida que um novo conceito é adquirido
pode tomar o “lugar” de outro conceito preexistente e modificá-lo a partir da
maneira como a mente processa esse conhecimento. Mithen pontua que “o MMR
é como uma agência de coletar e distribuir informação, por onde novas ideias
passam antes de encontrar um lar” (1996, p. 91).
A habilidade de pensar tais conceitos é certamente uma evolução
contínua da arquitetura da mente moderna.

39
II.2.3. A mentalidade cognitiva fluida

Steven Mithen mostra em seu livro que, durante a evolução da arquitetura


da mente, os pensamentos e conhecimentos adquiridos agora fluem livremente
e criam novos pensamentos, estimulando a imaginação.
Essa fluidez cognitiva está relacionada com as mudanças da linguagem e
da consciência da mente. A linguagem dos humanos arcaicos era
essencialmente utilizada para a comunicação social. Porém, a mente, através do
domínio da linguagem, começou a veicular informações não sociais.
O papel da consciência reflexiva evoluiu por ser uma característica
fundamental da linguagem e da inteligência social. Essa inteligência serviu como
parâmetro de análise comportamental entre os indivíduos. O conhecimento já
existente na mente humana foi “trazido” até o consciente. Assim, ficou definido
o papel da consciência como integradora, dentro da mente, da linguagem e da
inteligência social, que apresentavam um certo grau de criatividade.
O surgimento da mente moderna é consequência das características
comportamentais que fluíam da mente do homem arcaico à medida que a
linguagem social passou a ter múltiplas funções, quando os indivíduos passaram
a ter uma percepção cada vez mais acentuada de seus conhecimentos sobre o
mundo e da consciência como um mecanismo integrador que liberava as
inteligências que “trabalhavam” isoladas.
Mithen volta a afirmar que a evolução da mente conferiu uma vantagem
reprodutiva aos portadores da inteligência social. Eles se tornaram mais
“capazes de prever e de manipular o comportamento de outros membros dos
seus grupos” (MITHEN, 1996, p. 329).
Já o aparecimento da inteligência geral ocorreu devido ao processo de
informações exigido da mente para analisar as relações de custo/benefício das
“estratégias comportamentais, dando lugar a uma aquisição do conhecimento
pelo aprendizado associativo” (MITHEN, 1996, p. 329).
Um aspecto relevante da fluidez cognitiva é a possibilidade de novos tipos
de atividades, dentre elas a religião. Esse mesmo autor argumenta que a
arquitetura da mente começou a mudar e “as crianças passaram a nascer em
um mundo onde a arte e a ideologia religiosa já estavam presentes” (MITHEN,
1996, p. 339).

40
Ainda segundo ele, a religião é um produto da fluidez cognitiva:

Ela depende de processos psicológicos que originalmente evoluíram em domínios


cognitivos especializados e apenas veio à tona quando esses processos puderam
trabalhar integradamente (MITHEN, 1996, p. 345).

A propriedade que define a mente moderna nada mais é do que a fluidez


cognitiva, que é o resultado do conhecimento de novos tipos de domínios
específicos.

II.2.4. Comparativo da evolução da mente

A mente humana passou pela alternância entre a fase de inteligências


especializadas múltiplas e de integração como parte do processo evolutivo da
mente. Existem três estágios para a arquitetura da mente. Steven Mithen faz
uma analogia com a mente-computador e descreve os estágios como um
processo complexo.
No primeiro estágio, estabelece-se o plano geral do programa para
processar rotinas distintas conectadas, ou seja, “rodar” o programa para que as
rotinas funcionem juntas. Essa é a analogia em que os ancestrais tinham a
inteligência geral como um sistema para funcionar, mas sem complexidade.
No segundo estágio, o programador adiciona aos poucos as ferramentas,
porque, se o fizer de uma única vez, a remoção de erros torna-se impossível e
provavelmente o programa entrará em pane. Para ser duradouro é preciso
adicionar ponto a ponto, testar a funcionalidade, repetir novamente o processo
até atingir a complexidade objetivada. A analogia com a arquitetura da mente é
que esta foi construída passo a passo pelas inteligências especializadas; já com
a inteligência geral, foi o programa que permitiu o funcionamento dessa
construção.
O terceiro estágio é quando ocorre a integração de um programa
complexo. Na mente, a linguagem e a consciência passaram a ser utilizadas
como integradoras.

41
II.2.5. O mapa das inteligências

O quadro das inteligências de Howard Gardner (1980) é base fundamental


para o entendimento do capítulo I. Sua teoria serve para dar continuidade a esse
novo tipo de inteligência, proporcionando uma autonomia mental emanada
diretamente da inteligência, cumprindo uma função adaptativa, permitindo viver
e construir a evolução dos meios ao redor.
Gardner define inteligência como a capacidade de resolver problemas ou
de elaborar produtos que sejam valorizados em um ou mais ambientes culturais
e comunitários específicos, sem dimensionar a existência ou propor a
possibilidade de ela ser inata ou adquirida.
A teoria das inteligências múltiplas (IM) proposta por Gardner tem por
finalidade oferecer, no entendimento do autor, a melhor leitura sobre as
competências cognitivas (o estudo da mente). Competências estas que são a
descrição de um conjunto de capacidades, talentos ou habilidades mentais,
imperativamente chamados de inteligências.
Todos os indivíduos possuem essas inteligências em suas devidas
proporções. O que difere é o grau da manifestação de determinada inteligência
e suas possíveis combinações.
Ao contrário do conceito de QI, essa visão das inteligências múltiplas
apresenta uma visão pluralista da mente, uma teoria mais humana e mais
verídica, afirma Gardner, o que vem a refletir mais adequadamente os dados do
comportamento humano dito inteligente.
O desenvolvimento das inteligências sofre interferência do contexto social
e cultural em que o indivíduo se encontra, apesar de Gardner não romper com a
maioria de teóricos que afirmam que a inteligência está no interior da mente do
indivíduo.
O que Gardner propõe é que a teoria das múltiplas inteligências adaptou
o conceito de inteligência ao pluralizar e contextualizar.
Para defender a importância da contextualização da inteligência, Gardner
pondera que, além dos indivíduos serem criaturas biológicas, são igualmente
criaturas culturais. O desenvolvimento de uma ou mais inteligências sempre vai
depender de “uma interação entre as inclinações biológicas e as oportunidades
de aprendizagem que existem numa cultura” (GARDNER, 1980, p. 180).

42
A cultura em que o indivíduo está inserido sofre também influências da
época e lugar geográfico em que se encontra, o que interfere no grau de
manifestação das potencialidades das inteligências.
A importância das estruturas econômico-sociais de determinada
sociedade corrobora com a afirmativa, na visão do autor, de que a inteligência é
conceituada como representante de uma dinâmica entre inclinações individuais
e necessidades e valores de uma sociedade.
A pluralização do conceito de inteligências confere ao indivíduo um
avanço no conceito de visão unitária sobre inteligência. A medida a ser auferida
é o termômetro cognitivo, evidenciando que, assim como a voz e o rosto das
pessoas são diferentes, a mente de cada indivíduo é diferente.
Essa pluralidade da inteligência pode ser dimensionada em combinações
de sete a várias centenas de dimensões mentais. Somando-se a isso a
contextualização cultural, socioeconômica e biológica, fica evidente a quantidade
imensa de mentes distintas com personalidades diferentes.
Portanto, faz-se necessário o entendimento sobre os possíveis traços de
comportamento devido à “crescente consciência do indivíduo de suas próprias
forças e estilo intelectual característico”, encerra Gardner (1980, p. 194). Então,
é de máxima importância reconhecer e estimular todas as variadas inteligências
humanas e todas as possíveis combinações.
Gardner (1983) também explora e ressalta os aspectos das competências
das inteligências em sua obra, para depois deixar um caminho para ampliar a
noção de inteligência espiritual.
A seguir, será apresentado o mapa das inteligências traçadas por Howard
Gardner:

1. Inteligência linguística. Trata-se da utilização da linguagem para


construir, expressar e analisar significados complexos. As competências
da inteligência linguística são falar, saber escutar, ler e escrever. Em
algumas pessoas existe uma aptidão natural para o aprendizado de
atividades como traduzir um texto, conhecer outra língua, escrever uma
tese. A aprendizagem de outra língua, por exemplo, requer esforço e a
formação do pensamento de um modo próprio da outra cultura. Isso exige
um empenho que alguns indivíduos adquirem com mais facilidade.

43
2. Inteligência sonora. As competências da inteligência sonora facilitam a
capacidade de reconhecer padrões sonoros, como sons e ritmos.
Grandes músicos e compositores têm esta qualidade potencializada.
Indivíduos podem utilizar essa inteligência para apreciar ritmos e detectar
sons que geram desconforto, alegria, ansiedade, e diversas outras
emoções.
3. Inteligência lógico-matemática. Essa inteligência é a base principal para
os testes de QI (coeficiente intelectual). Por muitos anos foi considerada
a única forma de mensurar a inteligência. Atualmente, é mais uma
expressão dela, não sendo mais considerada como o ápice da inteligência
humana. A competência da inteligência lógico-matemática é a resolução
de problemas por métodos indutivos e dedutivos mediante raciocínio
lógico, com números e padrões abstratos.
4. Inteligência cinestésico-corporal. É a capacidade de utilizar o corpo
para realizar atividades. A competência está ligada ao domínio da própria
corporeidade e à capacidade de orientar os movimentos para fins mais
elaborados, como atividades físicas. A educação desse tipo de
inteligência é adquirida através de modalidades de exercícios físicos,
dança, esportes, artes cênicas. Um domínio maior sobre o corpo e
habilidades motoras (e também emocionais), como equilíbrio,
concentração, destreza, rapidez, precisão, dentre outras, é alcançado
pelo estímulo para atingir os limites de superação.
5. Inteligência espacial-visual. Essa inteligência permite reconhecer
imagens visuais, criar imagens mentais, raciocinar acerca de espaço e
dimensão, reproduzir imagens internas e externas. As competências
desse tipo de inteligência capacitam para resolver questões relativas à
elaboração e construção de projetos em formatos tridimensionais,
desenhos, cálculos e medições, tecnologia da informação.
6. Inteligência intrapessoal. Essa inteligência é crucial para formar uma
imagem da identidade do sujeito, compreender as necessidades, aptidões
e desejos. As competências dessa inteligência propiciam um contato com
os próprios sentimentos e uma maior aproximação entre distintas
emoções para possibilitar um conhecimento de si mesmo, o

44
autoconhecimento, como condição para o êxito na vida pessoal e
profissional.
7. Inteligência interpessoal. Essa inteligência, também chamada de social,
habilita a compreensão do outro, bem como o altruísmo, a empatia, o
saber colocar-se na pele do outro para tentar captar e entender pontos de
vista distintos e semelhantes, sofrimentos, temperamentos, motivações e
intenções. As competências dessa inteligência contribuem para as
relações sociais, criam vínculos e alianças entre pessoas que às vezes
não têm afinidades mas sim objetivos em comum, e criam coesão para a
gestão do trabalho em equipe. Essa capacidade está presente de modo
mais aprofundado e sofisticado em líderes.
8. Inteligência naturalista-ecológica. Essa inteligência habilita a observar
o ambiente natural e os processos, a identificar os elementos da natureza.
Tal competência capacita para estudar os fenômenos e proteger os
organismos vivos.

Gardner deixa um direcionamento para futuros estudos da


contextualização da teoria das inteligências múltiplas, esclarecendo que requer
a estimulação dos diferentes arranjos e grupos de inteligência em vários níveis,
como as unidades governamentais, a intimidade da unidade familiar, a sala de
aula ou os numerosos locais de trabalho. Estes últimos, por sinal, apresentam
necessidades, demandas, opções, oportunidades, características com aspectos
que precisam de estudos cuidadosos, em contraposição a uma “sociedade
encharcada de consumismo, mídia e cultura de massa” (GARDNER, 1980, p.
214).
Os indivíduos que são ajudados a desenvolver suas inteligências, acredita
Gardner, se sentem mais engajados, competentes e, portanto, mais inclinados a
servirem à sociedade de maneira construtiva.
Toda a explanação acima serve de embasamento para introduzir a
importância que o autor considera para uma abordagem da visão da mente
diferenciada, centrada no indivíduo.
Levando em conta que as pessoas (mesmo pertencentes a um grupo
específico) possuem formas cognitivas diferenciadas e contrastantes, saber
reconhecer suas muitas facetas é um avanço da ciência comportamental que

45
pode trazer insights e entendimentos importantes para ajudar a entender
fenômenos como a crise de identidade.

II.2.6. Inteligência emocional

O objetivo da inteligência emocional, segundo Daniel Goleman, é dar mais


atenção à competência emocional do indivíduo e cultivar com mais vigor as
aptidões do coração humano, equilibrando a racionalidade com a compaixão.
Goleman conclui que, quando não ocorre uma união entre cabeça e coração, o
intelecto se empobrece. Sua obra mais conhecida, Inteligência emocional, é de
1995, porém este trecho é bastante pertinente aos dias atuais:

Hoje, a neurociência defende a sério as emoções. As novas da ciência são


encorajadoras. Dizem-nos que, se dermos mais atenção sistemática à inteligência
espiritual – a aumentar a autoconsciência, a lidar mais eficientemente com nossos
sentimentos aflitivos, a manter otimismo e a perseverança apesar das frustrações, a
aumentar a capacidade de empatia e envolvimento, de cooperação e ligação social –, o
futuro pode ser mais esperançoso (GOLEMAN, 1995, p. 8).

Os sociobiólogos indicam que o indivíduo, durante a evolução, deu à


emoção um papel essencial na psique humana. Afirma Goleman: “Quando se
trata de modelar nossas decisões e ações, o sentimento conta exatamente o
mesmo – e muitas vezes mais – que o pensamento” (1995, p. 18).
O que o autor afirma é que existe uma linha teórica que segue o caminho
de Gardner, ao dizer que há a possibilidade de transmitir inteligência às
emoções.
O cérebro é admiravelmente flexível, moldando os pensamentos
permanentemente. Encontra-se em constante aprendizado através do exame
rotineiro da autorreflexão da consciência. Isso se traduziria na evolução das
aptidões (inteligências) individuais, pois a mente (pensamento) observa e
investiga as experiências, incluindo as emoções.
Existe uma distinção entre estar consciente dos sentimentos e agir para
mudá-los. O autor entende que existe o reconhecimento de ambos e que
identificar o estado de espírito negativo é o passo para se livrar dele, fechando
o ciclo da autorreflexão da consciência.

46
Concluindo essa linha de raciocínio, Goleman introduz o termo "espiritual"
ao explicar o significado da autoconsciência: “Consciente ao mesmo tempo de
nosso estado de espírito e de nossos pensamentos sobre esse estado de
espírito” (GOLEMAN, 1995, p. 60).

II.2.7. QI – quociente de inteligência

Alfred Binet introduziu no meio acadêmico o teste de QI (quociente


intelectual), um medidor para tentar quantificar a capacidade mental de
raciocínio e suas habilidades intelectuais, através de uma escala que indicaria a
potencialidade do indivíduo.
Essa abordagem do conceito de inteligência funciona bem para certos
indivíduos, organizações e sociedades como um teste que legitima uma seleção
através do mérito, quando esta é a única métrica a ser analisada.
A insatisfação ou falta de complementaridade ao conceito de QI, devido à
sua visão unitária da inteligência, foi expressa já pelo próprio Alfred Binet. A
discussão que se inicia é por causa da escala de valor para medição. Com
prática, treino e, acima de tudo, método, podem-se subir degraus na escala da
inteligência, conforme a atenção, a concentração, a memória e o julgamento.
A crítica à teoria do QI é ela medir a inteligência e as qualidades
intelectuais do indivíduo através de uma linearidade. Já o QS, diferentemente do
QI, não é uma inteligência quantificável, mas inclui o contexto cultural, biológico,
social e individual.

II.3. A CONTEXTUALIZAÇÃO DO CONCEITO DE ESPIRITUALIDADE

A contextualização do conceito de espiritualidade na visão de Sam Harris


(2015), Clarissa de Franco (2013), Paul Heelas (2008), Carl Jung e Vitor Frankl
(1946, apud ROBERTSON, 2001, p. 382) terá destaque devido a alguns
aspectos específicos, tais como o sentido da vida, a busca da felicidade, a
autorrealização, o pensamento.
Trata-se de ambientar um assunto que já apresenta diversas
conceituações, sem a pretensão de escolher uma única como verdadeira. Serão
utilizadas algumas variações da contextualização da espiritualidade dentro do
conceito de inteligência espiritual, que ora são convergentes, ora divergentes.
47
II.3.1. A espiritualidade – contexto religioso

É importante ressaltar que o uso do conceito de espiritualidade está fora


do contexto de religião, situando-se em um campo distinto da religiosidade. Para
Franco (2013, p. 400), tomando por base o psicólogo Vergote, a espiritualidade
“ganhou uma conotação de racionalidade humana, sendo o elemento que nos
caracterizaria enquanto espécie”.
Vergote utiliza a psicologia como forma de analisar a personalidade do
indivíduo do ponto de vista da espiritualidade, sendo considerada por ele uma
ciência autônoma, a ciência positiva do homem. O objetivo é investigar a
natureza humana dos fenômenos da espiritualidade com suas experiências,
atitudes. A espiritualidade é uma das fontes de busca que o indivíduo pode
utilizar para obter acolhimento, orientação, apoio emocional; um direcionamento
que busca um sentido maior da vida (FRANCO, 2013).
Segundo Sam Harris, a espiritualidade pode propiciar um despertar na
natureza da mente, na maneira de pensar, sem deixar de ser um conceito
escorregadio e com vertentes suscetíveis a uma gama de interpretações e
conceituações em sua abordagem.
A Organização Mundial de Saúde definiu espiritualidade como um caráter
pessoal:

Tem-se por espiritualidade o conjunto de todas as emoções e convicções de natureza


não material, com a suposição de que há mais no viver do que ser percebido ou
plenamente compreendido, remetendo a questões como significado e sentido da vida,
não se limitando a nenhum tipo específico de crença ou prática religiosa (apud FRANCO,
2013, p. 400).

II.3.2. As práticas espirituais

O objetivo das práticas espirituais é tratar da mesma realidade, pois as


pessoas de todas as fés percebem muitas das mesmas verdades. Sendo assim,
a noção de consciência e do cosmos disponível à mente humana pode, em
princípio, ser avaliada por qualquer indivíduo, seja ele judeu, cristão, muçulmano
ou budista. Como afirma Harris (2015), isso indica apenas que a cognição e a
emoção humana são mais arraigadas que a religião. Contudo, tal afirmativa não

48
consegue assegurar que todas as possibilidades espirituais são bem
compreendidas pelas doutrinas das religiões.
Harris (2015) começa a trilhar um raciocínio para distinguir a
espiritualidade e as práticas da espiritualidade. O autor inicia essa diferenciação
ao discorrer sobre as doutrinas encontradas nas tradições religiosas, ocidentais
e orientais, por não derivarem dos mesmos insights nem serem lógicas, sábias,
empíricas ou parcimoniosas. E o mote dessas tradições tampouco aponta para
uma mesma realidade fundamental.
Harris então conclui que as doutrinas religiosas com “seus ensinamentos
também não se prestam no mesmo grau a serem exportadas para além das
culturas que as conceberam” (HARRIS, 2015, p. 29).
Assim, na visão do autor, existe uma diferenciação nítida no conceito de
espiritualidade, que é a experiência, a prática, que ele chama de instruções
empíricas. Ele considera que qualquer indivíduo, em princípio, pode ter uma
experiência de transcendência com o espiritual e cita como exemplo Mestre
Eckhart (c. 1260 – c. 1327) e Al-Hallaj (858-922), reiterando que o ponto de vista
de ambos não condizia com as ideias básicas de suas fés.
Aponta, com isso, que existe uma abertura para a possibilidade da
experiência espiritual sem dependência de uma determinada fé, vínculo a uma
determinada religião ou crença em alguma divindade. As práticas da
espiritualidade, como ele reitera, salientam a primazia da mente e têm por
objetivo permitir ao indivíduo compreender a natureza de sua própria mente.
Quando se tem conhecimento sobre o funcionamento da mente, o
domínio sobre ela se torna mais controlado e fácil, e sua adaptação às
circunstâncias difíceis é possível, trazendo paz de espírito. Essa afirmativa é
coerente com Harris, quando este enfatiza que o domínio da mente está
intimamente conectado a uma conduta de vida ética e à vida espiritual. O objetivo
final é asseverar “com absoluta clareza que a vida espiritual consiste em superar
a ilusão do self com uma grande atenção voltada à nossa experiência” (HARRIS,
2015, p. 40).
Tal experiência conjumina com a verdade da espiritualidade, que é
incentivar o indivíduo a investigar certos insights da consciência por conta própria
e seus possíveis estados de espírito.

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Nesse sentido, Harris emenda que o egoísmo com sabedoria e o altruísmo
são quase equivalentes, quando devidamente pré-moldados na mente, pois
capacitam o indivíduo a servir em prol de um bem comum, em um mundo que
precisa desesperadamente melhorar.
O encontro da reorientação do caminho a seguir, a descoberta da missão
pessoal perante os outros e o mundo não deixam de ser a famigerada busca de
sentido. A mudança de consciência é mais uma maneira de interpretar o conceito
sobre espiritualidade.
Clarissa Franco elencou diversas definições sobre o conceito de
espiritualidade e percebeu um denominador comum: “A ideia corrente hoje em
termos de espiritualidade é a de que ela está vinculada a uma busca pessoal de
sentido, com ênfase no aperfeiçoamento do potencial humano” (2013, p. 402).
Isso para criar condições de atender aos anseios de autorrealização, autonomia
em relação às instituições, autenticidade, espontaneidade, criatividade,
liberdade, mal-estar em relação à materialidade do mundo.
Outros autores que conceituam a espiritualidade no campo da psicologia
reafirmam que sua inclusão no rol da saúde foi um impacto significativo e
positivo.
Com ou sem comprovação científica concluída, mas com estudos em
grupos de indivíduos, constatou-se que a espiritualidade é um instrumento
bastante utilizado para dar suporte às questões que se referem ao significado da
vida, como forma de incentivo a uma mudança de comportamento no que diz
respeito à busca desse sentido, da existência, da missão, do darma, termos
esses encontrados nas obras citadas.

II.3.3. Espiritualidade em tempos contemporâneos

A análise da espiritualidade se concentra em duas dimensões: no discurso


científico e no discurso religioso.
A espiritualidade está conectada com a psicologia e a saúde. O grande
entrave que dificulta o estudo pelo olhar científico é a inexistência de uma escala
de medidas, apesar de serem recorrentes, na atualidade, vários estudos
científicos que abordam o tema.

50
Alan Charles Robertson (2010) cita como exemplo dessa tendência o
aparecimento, desde a década de 1990, de livros sobre o tema da
espiritualidade, os quais permaneceram por longo tempo na lista top ten do New
York Times, como os de Deepak Chopra e Sam Harris, por exemplo.
A sociedade americana de psicologia está bastante sensível ao estudo da
espiritualidade como fator de importante à saúde mental, física e psicológica do
ser humano, pelo fato de considerar a natureza humana complexa e pela
maneira como o indivíduo se relaciona com a experiência espiritual.
Na mesma linha segue a teoria de Abraham Maslow, a qual fundamenta
que existe um colapso total de todas as fontes de valores fora do indivíduo e que
“não há outro lugar para onde nos voltarmos senão para dentro, para o Eu, como
local de valores. Paradoxalmente, até alguns existencialistas religiosos
concordam em boa parte com essa conclusão” (MASLOW, 1962 p. 36).

II.3.4. Espiritualidade e psicologia

Maslow, em sua teoria mais conhecida sobre as necessidades básicas


humanas, salienta que essas necessidades provavelmente são comuns a toda
a humanidade, produzindo valores que podem ser compartilhados. Contudo, as
necessidades idiossincrásicas geram outro tipo de valor, que faz referência à
maneira subjetiva de sentir, ver e reagir de cada pessoa.
Esses valores, então, são resultado das diferenças construídas a partir
das preferências e formas de relacionamento do indivíduo com o cosmos.
As necessidades são, também, capacidades e, como tais, são valores
intrínsecos. À medida que as capacidades se diferenciam na individualidade, os
valores também fluem na mesma proporção.
Além disso, Maslow afirma que todas as pessoas são capazes de
individuação e faz um comparativo com questões relacionadas à espiritualidade
e à religião, ao formular a hipótese de que os mais variados tipos de crenças
religiosas e espirituais podem ser tomadas como expressões de aspirações
humanas, ou seja, o que as pessoas gostariam de vir a ser se pudessem. Isso
de certa forma validaria a afirmação de que todas as pessoas anseiam pela
individualidade ou tendem a ela.

51
Essa formulação tange às características da inteligência espiritual.
Maslow faz a seguinte afirmação:

Isso é assim porque a nossa descrição das características reais das pessoas
autorrealizadoras ou individualizantes equipara-se, em muitos pontos, aos ideias
recomendados pelas religiões, por exemplo, a transcendência do Eu, a fusão do
verdadeiro, do bom e do belo, a contribuição para outros, a sabedoria, honestidade e
naturalidade, a renúncia de desejos “inferiores” em favor dos “superiores”, maior amizade
e gentileza, a fácil diferenciação entre fins (tranquilidade, serenidade, paz) e meios
(dinheiro, poder, status), o declínio de hostilidade, crueldade e destrutividade (1962, p.
190).

Com essa afirmação, Maslow reitera o conceito dos benefícios do cultivo


da inteligência espiritual e mais uma vez direciona o foco das buscas do indivíduo
como algo interno, o autoaperfeiçoamento. Esse autoaperfeiçoamento está
diretamente relacionado à inteligência espiritual, como um ciclo de virtudes.
No que diz respeito às várias teorias sobre comportamento, aquela que
mais se aproxima do ponto focal para fazer acontecer é a teoria hedonista, isto
é, o conceito de inteligência espiritual. A teoria hedonista só funciona para as
pessoas sadias (em busca de algo), e não para as pessoas embotadas, mesmo
que tenham valores “superiores”, pois ela de nada adianta se não houver a busca
por um nível mais graduado. O verdadeiro, o bom e o belo correlacionam-se um
pouco, mas somente nas pessoas ditas sadias se correlacionam fortemente.
Maslow e Gardner mais uma vez dividem o mesmo ponto de vista em
relação à potencialidade do indivíduo, colocando-o de novo como antecessor
primordial do conceito de inteligência espiritual.
A função do meio cultural e social consiste em fornecer condições para o
desenvolvimento das potencialidades (talentos, capacidades, inteligências,
competências), pois o indivíduo as possui numa forma incipiente, ainda
desconhecida.
Para Maslow, já que o ambiente tem o papel não de conferir
competências, mas sim de ser um meio de influência que potencializa o
surgimento dessas capacidades, a criatividade, a espontaneidade, a
individualidade, a autenticidade, o cuidado com os outros, a capacidade de amar,
o anseio de verdade são potencialidades embrionárias que pertencem ao ser

52
humano. Essas formas basicamente compõem seu modo de ver o mundo e de
viver dentro do conceito de inteligência espiritual.
Resta, então, a vontade de querer fazer com que essas potencialidades
aflorem. E o meio para isso é o cultivo do QS.
Outro autor que reverencia a importância da espiritualidade é Carl Jung.
Segundo ele, trata-se de um campo de estudo para a psicologia por ser a
espiritualidade um fenômeno psicológico.
Para Jung, a principal função da espiritualidade é manter o indivíduo em
equilíbrio, e ela é inerente ao ser humano. O cultivo da espiritualidade
proporciona-lhe o autoconhecimento e vice-versa, e, a partir do aprofundamento
do conhecimento de si mesmo, suas escolhas tendem a ser mais assertivas. É
através da conscientização de que existe a necessidade da expressão do Eu
que há o resultado da integração entre inconsciente e consciente.
Na visão junguiana, se essa perspectiva se configura, proporciona ao
indivíduo condições para alcançar seu objetivo supremo, sua missão, tornando-
se a fonte para encontrar sentido na vida. Isso tudo acontece através da
individuação, do autoconhecimento, pela identificação dos arquétipos como
guias espirituais da formação da personalidade (ou capacidades mentais, ou
talentos, ou inteligências) a serviço de um bem maior.

II.3.5. Experiências de espiritualidade e cérebro

Jose Luiz Cazarotto (2013) fez um levantamento sobre se a experiência


religiosa (espiritual) está associada a um conjunto consistente de áreas do
cérebro, e como é o processamento da ativação desse processo neurológico.
Assim como no mapa das múltiplas inteligências, é mais evidente detectar
a atribuição de funções em partes específicas do cérebro (área motora,
linguagem, habilidade interpessoal etc.), onde se localizam as percepções,
sensações e demais elementos de cognição.
O debate sobre os papéis funcionais de áreas específicas do cérebro e a
compreensão da função da experiência religiosa são hipóteses levantadas pelos
evolucionistas, mesmo sem perceber a relação imediata no emaranhado
cerebral.

53
Quanto aos fenômenos mais complexos, faz-se necessário apontar para
estudos já realizados sobre os psiquismos do lado direito e esquerdo do cérebro.
Há três mil anos, atribuía-se como factível a comunicação entre os
deuses, com suas “vozes”, e os seres humanos “mortais”, ou seja, entre mundo
invisível e mundo visível. Hoje se entende que esse fenômeno processou-se no
lado direito do cérebro, e o que permaneceu foram as orações e súplicas.
Jose Luiz Cazarotto explica assim esse fenômeno: "Em resumo, quanto
mais complexas forem as experiências, tanto mais elementos do cérebro atuam
e interagem ao mesmo tempo, demandando teorias compreensivas do
fenômeno" (2013, p. 374).
Na década de 1950, pesquisadores tentaram relacionar obsessões e
preocupações com um viés religioso; assim conduziram estudos sobre o
funcionamento do cérebro na direção de associar algumas patologias, como
epilepsia, esquizofrenia etc., às práticas religiosas.
Nos tempos atuais e com o uso de alta tecnologia, pode-se obter em
tempo real imagens do funcionamento do cérebro, permitindo o estudo da
experiência religiosa com pessoas normais e/ou saudáveis.
Em pessoas meditando ou orando, constatou-se uma redução de suas
atividades neurológicas. Cazarotto explica:

Em ambos os casos houve uma redução da atividade neurológica nos lóbulos parietais
e um aumento nos lóbulos frontais. Houve também um aumento de ativação
bilateralmente no giro cíngulo e no tálamo. Eles concluem que, uma vez que a região
parietal está relacionada à somestesia, às perturbações do esquema corporal e ao senso
do self, a hipoperfusão das regiões parietais resulta na dissolução da percepção dos
limites do self e em experiências religiosas intensas. Isso estaria correlacionado
positivamente com os relatos dos místicos, que afirmam estar mais próximos de Deus,
“esquecendo-se” de si mesmos. Ainda que esses estudos lancem mão de técnicas
refinadas, eles têm atrás de si ainda uma ideia da relação das áreas do cérebro e suas
funções (2013, p. 375).

II.3.6. Espiritualidade e marketing

O conceito de marketing 1.0, marketing 2.0 e marketing 3.0 foi cunhado


pelo “pai do marketing”, Philip Kotler (2012). E a divisão nessas três fases foi
feita levando em conta as mudanças tecnológicas que aconteceram no período.

54
A passagem do marketing 1.0 para o marketing 2.0 ocorreu devido à
transformação de um mundo mecânico (marketing 1.0) para um mundo
mecânico mais informatizado (marketing 2.0), o que implicou mudança no
relacionamento entre produtores e consumidores.
Novamente ocorreu outra transformação de um mundo mecânico
informatizado (marketing 2.0) para um mundo digital (marketing 3.0), o que
implicou um profundo impacto no comportamento entre produtores e
consumidores.
Esse novo desafio do marketing 3.0 exige uma guinada na forma de
pensar e fazer marketing, levando o executivo da área a repensar o conceito que
pretende adotar nas tomadas de decisão.
Ao longo dos anos o marketing evoluiu e acompanhou as tendências da
sociedade de mercado com o intuito de criar bem-sucedidas organizações
empresariais, as quais se mantiveram na vanguarda do desenvolvimento, da
qualidade da produção e da tecnologia de ponta.
Os avanços tecnológicos provocaram enormes mudanças na maneira
como as pessoas se relacionam, exigindo também uma transformação na
maneira como os produtos e serviços são elaborados nas organizações.
Portanto, é muito raro não encontrar uma empresa organizacional cuja
direção não declare, ao menos publicamente, que desejaria uma organização
suficientemente flexível para poder se ajustar rapidamente às necessidades de
seus consumidores, ao mercado, para fornecer seus produtos e serviços com o
máximo de qualidade e excelência no atendimento ao cliente.
A era do marketing 1.0 iniciou-se durante o desenvolvimento da tecnologia
na produção, na Revolução Industrial, e ele era estritamente centrado na venda
de produtos, sendo este seu único objetivo final. As empresas viam o mercado
e os consumidores como potenciais compradores em massa, que tinham apenas
necessidades físicas a serem supridas. A padronização e o ganho em escala, a
fim de reduzir ao máximo os custos de produção, para que os produtos fossem
adquiridos por preços baixos e por um volume maior de consumidores, foi a
estratégia central. Essa estratégia funcionou muito bem e teve famosos
defensores, como Henry Ford, que em uma frase exemplifica o conceito do
marketing 1.0: “O carro pode ser de qualquer cor, desde que seja preto”. A
exigência dos executivos no marketing 1.0 em relação a conceito e diretrizes era

55
de simplesmente desenvolver produtos que tivessem uma determinada
funcionalidade e instigar o consumidor sobre a necessidade de possuí-los.
O conceito de marketing 2.0, por sua vez, surgiu em decorrência da
tecnologia da informação e do advento da Internet, cujo núcleo é a disseminação
da tecnologia da informação. Ele tinha única e exclusivamente o objetivo de
satisfazer e reter os consumidores. O que se observa é que, desde o início dos
anos 1980, a força dominante na relação vendedor-cliente foi deslocada. Os
clientes passam a ter o controle do mercado, em vez dos vendedores, e são
aqueles primeiros que informam aos fornecedores o que desejam, quando
desejam, como o desejam e quanto pagarão. Portanto, o papel dos
consumidores já não era tão simples, o que exigia certa maleabilidade do
executivo de marketing, pois eles estavam mais bem informados e, com isso,
comparavam as marcas em categorias como qualidade e preço. Essa nova
situação, a princípio, foi perturbadora para as empresas que se acostumaram a
atuar no mercado de massa. Por isso, os executivos precisaram aprender a
acolher as preferências do consumidor, o que exigiu, para a perpetuidade da
venda dos produtos da empresa, a segmentação de mercado. Os consumidores
passaram a ser tratados de acordo com a regrinha de que “o cliente é rei”. Assim,
suas necessidades vão sendo solucionadas. As empresas que conseguiram
visualizar o consumidor em um novo patamar, considerando-o inteligente e
dotado de coração e mente, adaptaram-se melhor, ao tentar atender às
expectativas desse novo perfil de consumidor. O principal conceito do marketing
2.0 era a distinção, ou seja, tentar se diferenciar de outros produtos similares
disponíveis no mercado. As diretrizes da empresa direcionaram-se a ganhar
espaço no posicionamento do produto e da empresa perante o mercado. O valor
que os produtos conferiam era de que deveriam ser funcionais, como no
marketing 1.0, porém com certo apelo emocional, sim, para atingir o coração e a
mente do consumidor.
Por fim, a última fase do marketing, o marketing 3.0, se concretiza pela
pulverização de acesso à tecnologia, e também com o avanço das redes sociais.
O consumidor deixa de ser alvo de campanhas passivas de marketing. O
marketing 3.0 surgiu com a nova onda tecnológica, em que o mundo está nas
mãos dos consumidores (por exemplo, ao alcance dos smartphones). As
empresas estão mais atentas à voz do consumidor, a fim de entender sua mente

56
e captar os insights do mercado. O marketing 3.0 é voltado, portanto, para os
valores, e seu objetivo é fazer do mundo um lugar melhor. As empresas passam
a ver o ser humano como um indivíduo pleno, com coração, mente e espírito, e
seu conceito maior são os valores. Valores estes que devem estar inseridos no
desenvolvimento do produto, mantendo sua funcionalidade, mas ligados ao
emocional, já que agora o componente mais importante e inovador é a parte
espiritual. A empresa enxerga as diretrizes pelo ponto de vista da tentativa da
execução fiel de sua missão, de sua visão e de seus valores.
A diferença fundamental entre, de um lado, o marketing 3.0 e, do outro, o
marketing 1.0 e 2.0 é que o foco passou a ser o indivíduo, tornando-se a
organização secundária. Mesmo que se chegue a uma organização ideal, se o
modo de pensar e agir de cada indivíduo estiver errado, eles não poderão ser
administrados com eficiência, e o resultado, infalivelmente, não será bem-
sucedido. Portanto, a única forma de solucionar essa equação é melhorar a
natureza espiritual de cada indivíduo. Ou seja, deve-se considerar que o ser
humano é o ponto principal, e a organização social, um ponto secundário.

II.3.7. Espiritualidade nas empresas

Segundo Jerry Biberman, existem várias definições de espiritualidade. A


usada por ele é a mesma do Dalai Lama: “As qualidades do espírito humano são
amor e compaixão, paciência e tolerância, perdão, contentamento, senso de
responsabilidade, senso de harmonia, as quais trazem felicidade para si e para
os outros” (BIBERMAN, TISCHLER, 2000, p. 1).
Espiritualidade, na leitura de Biberman, é quando as pessoas se movem
para dentro de si mesmas, num processo profundo em busca de experiências
mais vastas, em direção à transcendência, a estar intimamente ligadas,
interdependentes, interconectadas com o universo inteiro, com todos e com tudo.
O resultado do crescimento espiritual, afirma Biberman, se dá de forma
individual, dentro de práticas, níveis e estados espirituais. Nas empresas, a
definição que mais aproxima o cultivo da inteligência espiritual ao trabalho é a
performance organizacional:

A estrutura dos valores organizacionais evidencia uma cultura que promove a


experiência transcendental dos empregados através dos processos de trabalho,

57
facilitando seu sentido de estar conectado a algo com sentimentos de compaixão e
alegria (BIBERMAN; TISCHLER, 2000, p. 2).

Reconhece-se a espiritualidade como uma manifestação íntima e inteira que propicia aos
indivíduos mudanças internas e maneiras de ver e pensar que geram mudanças de
comportamento. Para as organizações, essas mudanças podem vir na visão, propósito,
valores, culturas e programas internos, e as mudanças no comportamento, estruturas e
relações exteriores (BIBERMAN, 2008, p. 3).

O olhar do autor sobre a inteligência espiritual é sob a perspectiva de


grupos dentro das organizações, departamentos ou equipes de trabalho. A
implementação da espiritualidade nas organizações vem de várias direções.
Cada indivíduo traz sua própria inteligência espiritual, porém, segundo pesquisas
feitas por Biberman em empresas, algumas corporações encorajam seus
colaboradores a desenvolvê-las:

Algumas empresas reservam um tempo para a oração antes do início de reuniões,


algumas promovem treinamento de meditação e salas para meditação, e algumas
oferecem oportunidades para os colaboradores se reunirem com outros de
espiritualidade semelhante (BIBERMAN; TISCHLER, 2000, p. 4).

Seguindo esse raciocínio, Biberman constata que, para os cargos de


liderança,

as empresas estão cada vez mais usando técnicas como a investigação apreciativa,
discernimento e da meditação para aprofundar o pensamento de seus gestores e
desenvolver suas habilidades de pensar, sentir e agir de forma mais eficaz (BIBERMAN;
TISCHLER, 2000, p. 4).

Biberman também concorda com a opinião de muitos outros autores que


argumentam que o desenvolvimento da inteligência espiritual, sem uma
mudança de comportamento, não é verdadeira espiritualidade. Ele defende que
se esperam determinados comportamentos de pessoas mais espiritualizadas,
insistindo na justiça social e assegurando que o ambiente permaneça saudável.
Segundo ele, esses movimentos sociais são as forças externas que empurram
organizações de trabalho não só para agir de modo correto externamente, mas
também em relação aos próprios empregados. Houve uma mudança dramática
ao longo dos últimos cinquenta anos em direção a um melhor tratamento dos
empregados, e esta mudança está se acelerando:

58
Organizações estão incentivando os funcionários a crescer em muitos aspectos: pessoal,
profissional e espiritual. O aumento da capacitação e o trabalho em equipe estão criando
a necessidade de treinar os funcionários não só em áreas técnicas, mas também em
habilidades interpessoais, habilidades de equipe, habilidades de tomada de decisão e
assim por diante (BIBERMAN; TISCHLER, 2000, p. 4).

A constatação do autor é de que a pressão para manter a competitividade


nas empresas está cada vez maior, o que faz com que se aumente também a
pressão para ampliar a criatividade e a inovação na maioria delas. Como
empresas são geridas e operadas por pessoas, faz-se necessário para os
colaboradores ter oportunidades de aprender a aprender.
Biberman finaliza seu raciocínio pontuando:

Como os colaboradores ganham essas habilidades, eles estão descobrindo que


precisam fazer mais reflexões, um trabalho mais interior, para melhorar essas
habilidades. Este está na mesma direção do desenvolvimento da inteligência espiritual
(interior, mais profundo, mais amplo e mais conectado) (BIBERMAN; TISCHLER, 2000,
p. 4).

O propósito de apresentar esse modelo desenvolvido por Biberman é


mapear o território da pesquisa sobre a espiritualidade nas organizações e
analisar a espiritualidade em determinadas áreas. O modelo foi discriminado em
três dimensões:

1. Nível: refere-se ao nível de análise do estudo.


2. Medida: refere-se aos tipos de dados que estão sendo examinados ou os
fenômenos a serem medidos pelos instrumentos de mensuração e
procedimentos utilizados em cada estudo específico.
3. Validade: refere-se à forma em que o fenômeno em estudo é validado.

A tabela abaixo apresenta a definição das dimensões dos modelos:

59
DIMENSÃO DEFINIÇÃO

Nível individual Como um único indivíduo é medido.

Nível unidade de trabalho A unidade/área de trabalho pode significar uma


específica finalidade/objetivo ou uma equipe de trabalho
permanente ou de um departamento.

Nível organizacional Nível organizacional pode incluir qualquer nível de uma


organização inteira, incluindo uma divisão, uma unidade
estratégica de negócios, uma subsidiária, ou uma
corporação, conglomerado.

Nível social Este pode incluir medidas da economia nacional ou


mundial, de uma comunidade local em que a empresa
faz negócios, da empresa de clientes, das nações em
que a empresa atua, de comportamentos ou impactos
na sociedade como um todo em nível nacional ou nível
global, dos impactos sobre o ambiente físico.

Cognitivo Cognição tem relação com pensamento, conhecimento


e percepção. Incluem-se intenções e atitudes nessa
categoria (embora elas também tenham um componente
emocional).

Emocional Perguntas sobre como um indivíduo se sente sobre algo,


ou sobre como enfrentar os membros da empresa de
uma unidade de trabalho, ou a cultura empresarial,
seriam incluídas nesta categoria.

Ações/processos Qualquer tipo de comportamento observável está


incluído nesta categoria: de um indivíduo, de uma
equipe ou de uma organização de sistemas ou
processos.

60
Esta categoria destina-se a capturar todas as outras
Outros medidas. Um tipo que podemos antecipar é medidas de
lucratividade, participação de mercado e outros
resultados organizacionais ou de negócios. No nível
individual, promoções e aumentos de salário poderiam
ser as medidas previstas na presente categoria. Os
pesquisadores também podem estudar ou comparar a
adesão de pessoas em grupos profissionais ou outros
grupos: como a qualidade do desenvolvimento da
espiritualidade afeta alguns aspectos da carreira.

Validação interior Quando as perguntas são feitas por indivíduos que


provocam a forma como indivíduo, a empresa ou
unidade pensa ou sente sobre algo ou percebe uma
situação, ou sobre uma experiência interior; estas
declarações só podem ser validadas por questionar
cada indivíduo e testá-los para a veracidade. Não se
pode saber o que a outra pessoa está pensando,
sentindo ou percebendo.

Validação exterior Se a resposta a uma pergunta pode ser validada por


observação ou outros meios objetivos, encaixam-se
nesta categoria.

II.4. ESPIRITUALIDADE NO AMBIENTE DE TRABALHO

Estudos sobre a espiritualidade no trabalho aumentaram nos últimos


anos. No que diz respeito às empresas, o assunto recebeu o nome de
Espiritualidade no Ambiente de Trabalho (EAT), ou outras nomenclaturas
convergentes, que então chamaremos workplace spirituality.
Essa cultura espiritual reconhece que os empregados têm tanto uma
mente quanto um espírito que buscam encontrar significado e propósitos no
trabalho, bem como desejo de se conectar com outros empregados e ser parte
de uma comunidade. Tal movimento se dá devido à existência de motivações e
interesses de grandes fenômenos dentro de uma cultura mais ampla, que inclui
o aumento da diversidade étnica e espiritual; as mudanças sociais e econômicas;

61
a ampliação de uma ênfase global sobre os diretos humanos e a preocupação
com a justiça global e, finalmente, um movimento em contraposição às estruturas
organizacionais conhecidas (MARQUES; DHIMAN; BIBERMAN, 2011).
Sendo assim, a espiritualidade no trabalho não versa sobre as práticas da
organização, não é sobre a teologia de um líder espiritual. Em vez disso, é o
reconhecimento do posicionamento da espiritualidade dentro de uma
comunidade organizacional.
Empresas baseadas em uma cultura espiritual utilizam recursos voltados
à espiritualidade em programas de treinamento, seminários, workshops, que
prometem propiciar autodesenvolvimento espiritual, autorrealização, para ajudar
seus colaboradores na mudança de pensamentos negativos, ao combinar
transformações pessoais com resultados e metas da empresa.
Por que as organizações atualmente dão ênfase à espiritualidade?
Acredita-se que modelos históricos de gestão não tinham espaço para a
espiritualidade. Esses modelos geralmente eram focados em organizações que
foram executadas de forma eficiente sem fazer distinção ou dar relevância a
sentimentos e necessidades nas relações com os outros. Da mesma forma, a
preocupação com a vida interior de um empregado não teve nenhum papel na
gestão de organizações. Mas o estudo das emoções melhora nossa
compreensão de como e por que as pessoas agem. Uma consciência da
espiritualidade pode, portanto, ajudar a entender melhor o comportamento dos
colaboradores nas organizações.
Segundo Marques, Dhiman e Biberman,

As organizações que operam sob modernos paradigmas rígidos possuem estruturas


burocráticas e hierarquias de comando acorrentadas. Elas normalmente utilizam canais
de comunicação mais formais, possuem manuais de conduta muito formais e
procedimentos para cada atividade e função dentro da organização. Elas estão mais
focados em seguir as regras e procedimentos do que em agradar clientes internos e
externos. A crença na escassez de recursos leva a uma competição entre as áreas pelo
orçamento pessoal e outros recursos e leva a políticas e disputas por poder entre as
áreas. Por outro lado, de organizações que operam a partir do paradigma espiritual
espera-se que tenham maleabilidade estrutural na organização e uma maior abertura à
mudança. Elas acreditam que a abundância de recursos é a fonte que conduz a uma
maior interconectividade e cooperação entre as áreas, e a um maior empoderamento
dos colaboradores em todos os níveis da organização. Mais do que acreditar na

62
preservação do eu a qualquer custo, essas organizações estão voltadas à condução de
uma existência harmônica com a natureza, e, portanto, favorável à ecologia e ao meio
ambiente e mais atenta às necessidades internas e externas dos clientes. Essas
organizações frequentemente estimulam o pensamento criativo e o trabalho em equipe
das áreas para estabelecer e acompanhar o cumprimento da missão e dos objetivos da
organização (MARQUES; DHIMAN; BIBERMAN, 2011, p. 81).

Ressalta-se que a introdução da espiritualidade nas empresas não é


novidade no âmbito dos recursos humanos. Na realidade, muitas áreas desse
setor têm usado tal recurso há anos, empregando-a na seleção adequada de
funcionários, no estabelecimento de metas de desempenho e para recompensar
as pessoas, tornando o local de trabalho um ambiente solidário, onde a
comunicação é abundante e os funcionários se sentem livres para se expressar
e desenvolver suas habilidades.
Dessa forma, compreende-se que o conceito de espiritualidade é
embasado na ética, nos valores, na motivação, nos elementos de equilíbrio entre
trabalho/vida e liderança de uma organização. Empresas com um olhar espiritual
estão preocupadas em ajudar os funcionários a desenvolverem e alcançarem
seus potenciais, bem como em resolverem os problemas criados pelos conflitos
da vida de trabalho.
O que diferencia as empresas que privilegiam um conceito cultural
espiritual – com um discurso contemporâneo por meio do qual o significado do
trabalho é situado em um contexto moral e social amplo – de suas contrapartes
não espirituais? Embora as pesquisas sejam recentes nessa área, podemos
deduzir algumas características que tendem a ser associadas à organização
espiritual.
Embora a espiritualidade no trabalho tenha gerado algum interesse em
muitas organizações, existem várias críticas. Não iremos aprofundar os autores
que a criticam, pois isso exigiria um estudo mais aprofundado para segmentar
quais setores empresarias endossam a cultura do workplace spirituality. Mas
podemos adiantar que empresas de bens de consumo voltadas para alimentos,
bebidas e higiene tendem a ser mais dispostas a admitir que a espiritualidade
seja um fator de ganho, em relação às empresas do mercado de capitais,
financeiro, por exemplo. Em nossas leituras, não encontramos nenhuma
instituição bancária citada como caso de estudo.

63
Aqueles que argumentam contra a espiritualidade nas organizações
geralmente se concentram em duas questões: a primeira é a da legitimidade, ou
seja, as organizações têm o direito de impor valores espirituais a seus
empregados? A segunda questão relaciona-se à economia, ou seja, a
espiritualidade no local de trabalho pode ser revertida em lucros? Vamos olhar
brevemente para essas questões.
Os críticos alegam que as organizações não devem impor valores
espirituais aos trabalhadores. Essa crítica é, sem dúvida, válida quando se define
que espiritualidade significa levar a religião e Deus ao mundo do trabalho. No
entanto, a crítica parece ser menos severa quando se acredita que seu objetivo
limita-se a ajudar os funcionários a encontrarem significado em suas vidas no
âmbito do trabalho (MARQUES; DHIMAN; BIBERMAN, 2011).
A questão de saber se a espiritualidade e os lucros são objetivos
compatíveis, certamente, é relevante para qualquer ramo de negócios. A
evidência, embora limitada, indica que os dois objetivos podem ser
particularmente compatíveis. Vários estudos mostram que, em organizações que
introduziram a espiritualidade no local de trabalho, têm-se testemunhado
aumento da produtividade, maior satisfação do empregado e maior compromisso
organizacional. Tais estudos foram realizados em empresas metalúrgicas do Sul
do Brasil (BETTEGA, 2009).
Entre as características das empresas espirituais estão:

 forte sentido de propósito entre os membros da empresa, que se sentem


valorizados;
 concentração no desenvolvimento individual, em que os empregadores
ajudam no crescimento profissional e no desenvolvimento de um plano de
carreira;
 confiança e abertura, quando os relacionamentos entre os membros
organizacionais são caracterizados pela mútua confiança, honestidade e
transparência;
 capacitação de funcionários, em que eles estão autorizados a tomar
decisões, possuindo um forte senso de delegação de autoridade;

64
 e, por fim, uma cultura que incentiva os funcionários a serem eles mesmos
e expressarem seus humores e sentimentos sem culpa ou medo de
reprimenda (MARQUES; DHIMAN; BIBERMAN, 2011).

Uma das respostas sobre o porquê da espiritualidade no mercado de


trabalho teria como norte os benefícios que sua aplicabilidade pode gerar. Um
dos principais benefícios é que as pessoas ficam mais em contato com a fonte
da criatividade, pedra angular de qualquer negócio. A criatividade nos permite
lançar novos produtos e serviços, fazer mais com menos. Em essência, leva a
uma contribuição mais eficiente.
À medida que se avança mais em um serviço e na economia tecnológica,
pretende-se expandir continuamente a inovação e a criatividade. Mas não se
pode exigir isso de pessoas. “O capital humano” tem de ser tratado de forma
diferente do “capital financeiro”. É preciso criar uma atmosfera na qual a
criatividade e a inovação floresçam, e isso deve ser realizado através da
expressão abundante do espírito. Quando estamos mais em contato com a fonte
da criatividade, há também uma revitalização, uma renovação e um reforço na
resiliência (MARQUES; DHIMAN; BIBERMAN, 2011).
A espiritualidade contribui para a criação de um “espaço seguro”, no qual
as pessoas se sentem bem para falar sobre sua verdade sem medo de
represálias. As empresas não estão acostumadas a fazer isso como uma prática
cotidiana normal. No entanto, quando se permite que a verdade seja exposta
com segurança e respeito, velhos problemas se esclarecerem, novas
possibilidades emergem, e as pessoas se sentem mais alinhadas. Elas
trabalham juntas em uma equipe confiante.
O aumento do comportamento ético e moral deve ser um benefício. Mas
quem se importa se uma empresa é ética? Não é um negócio apenas, um lugar
em que se pode ver até onde pode chegar? Em uma palavra, não. Um valor
importante do comportamento ético para um negócio é o desenvolvimento da
confiança. Confiamos nas pessoas que operam em um quadro ético.
Empregados confiam em empregadores; empregadores confiam em
funcionários; e clientes confiam em uma empresa.
A espiritualidade no local de trabalho também promove a expressão de
talento, brilho e genialidade: talento no sentido de nossos dons divinos; brilho

65
em termos de nosso intelecto e a intensidade da luz que temos; e genialidade
não como um bem escasso, mas como algo que todo mundo tem. O verdadeiro
trabalho é conectar-se com esse gênio. E, além disso, a espiritualidade no local
de trabalho também leva a um aumento da autorrealização, da satisfação
pessoal, e a um profundo sentimento de pertença (MARQUES; DHIMAN;
BIBERMAN, 2011).
Na maioria das empresas, hoje, espírito e espiritualidade não são temas
falados. A primeira coisa necessária é tornar o ambiente seguro para que se
possa falar disso naturalmente, como as muitas outras conversas que temos no
trabalho, tais como: rentabilidade e inovações, assuntos pessoais sobre família,
saúde, planos, acontecimentos políticos, sociais… E por que não poder falar
sobre espiritualidade?

II.4.1. A espiritualidade no local de trabalho

A tendência de estabelecer e manter uma cultura espiritual nas


organizações é relativamente nova. Começou a ganhar mais espaço em 2005,
porém desde 1994 há estudos sobre o tema.
Ao unir os funcionários com um propósito comum, a espiritualidade no
trabalho fornece aos membros da organização uma maneira de contrabalançar
seu ambiente exigente e estressante. Segundo pesquisas avaliadas por Hicks
(2003), um local de trabalho espiritual também é benéfico para as empresas que
o fornecem, apresentando melhoras na produtividade e na redução da
rotatividade de seus funcionários.
Ainda de acordo com Hicks, os aspectos da espiritualidade no trabalho
procurados por membros da organização podem ser categorizados em três
áreas:

1. a busca de um significado e propósito no trabalho;


2. o desejo de se conectar com outras pessoas; e
3. o desejo de ser parte de uma comunidade.

Empresas que fornecem uma cultura que abraça a espiritualidade no


trabalho percebem que seus funcionários querem se sentir “valorizados” e
importantes para a sociedade. Portanto, tais organizações proporcionam meios

66
para que seus membros possam colaborar positivamente não só no trabalho,
mas também nos lugares em que vivem. Assim, percebem a importância de
fornecer a eles um ambiente que promova relações positivas, em que tenham
oportunidade de trabalhar com outros membros da equipe em torno de um
mesmo objetivo comum.
Contudo, segundo Hicks, ainda existem muitas pessoas que confundem
espiritualidade com religião:

O significado do termo espiritualidade é frequentemente mal interpretado e pode ter


conotações negativas para muitos indivíduos. A espiritualidade é frequentemente vista
no mesmo contexto religioso organizacional, com crenças, moral, regras e tradições
particulares. A espiritualidade, entretanto, não é formal, estruturada ou organizada. A
religião organizada tem mais um foco no exterior, enquanto a espiritualidade envolve um
olhar pessoal para dentro, para o interior e, portanto, acessível a todos, religioso ou não.
A religião considera a salvação o objetivo maior. A espiritualidade está sobre e além de
qualquer denominação religiosa específica e procura encontrar e experimentar os
princípios em comum e as verdades que cada religião tem a oferecer (HICKS, 2003, p.
48).

A temática religião na cultura organizacional é vista de forma altamente


inadequada para o local de trabalho, já que pressupõe definir ou delimitar
adequadamente sua área de atuação, ou, em muitos casos, interpretar
parcialmente todas as possibilidades advindas das suas crenças e rituais, ou
ainda por tratá-la de maneira simbólica.
Já a espiritualidade, por outro lado, é assunto mais brando para uma
discussão no ambiente de trabalho. Enfatizamos que, nesse caso, tanto a
espiritualidade como consequentemente a workplace spirituality são um
processo evolutivo, um movimento de transformação, e não uma qualificação
estática, ou seja, não significa que uma pessoa espiritualizada tenha todas as
virtudes, mas sim que ela se encontra num processo de busca para atingi-las.
Segundo Hicks (2003, p. 112), a espiritualidade leva a um sentimento
básico de se estar conectado com os outros e com o universo. Se uma única
palavra capta melhor o significado da espiritualidade e o papel fundamental que
ela desempenha na vida das pessoas, essa palavra é “interligação”. Os sócios
de empresas que se consideravam “mais espirituais” também demonstraram ter
as organizações “mais rentáveis”. Eles relatam que foram capazes de trazer mais

67
de seu “eu completo” para o trabalho, de implantar ali mais criatividade, emoções
e inteligência. Em suma, as organizações vistas como mais espirituais recebem
mais de seus participantes, e vice-versa.
Quem pratica a espiritualidade no seu local de trabalho não ofende a seus
colegas nem causa animosidade. Ao contrário, motiva-os a usar também sua
energia espiritual, que está no cerne de todos, para produzir produtos e serviços
com empenho e criatividade.
Nos últimos anos, de acordo com Hicks (2003), estudos sobre a
espiritualidade têm crescido consideravelmente, e uma parcela significativa
deles aborda os benefícios que traz para o ambiente de trabalho. Mesmo assim,
ainda carecem de avaliações empíricas direcionadas a mensurar tais benefícios.
Se a espiritualidade é uma experiência humana fundamental, por que ainda não
recebeu um tratamento sistemático. Uma das razões para essa negligência é
que se acredita que a espiritualidade é um fenômeno muito tênue, nebuloso e
polêmico para merecer um estudo acadêmico sério.
Apesar disso, certos estudos que nos chegam, como o de Hicks (2003),
revelam que praticar a espiritualidade no trabalho ajuda em pontos como:

a) Adesão às regras da empresa. Cada local de trabalho tem sua própria


cultura, que lhe define os sistemas de crenças e valores. A empresa deve
ter um manual do funcionário que inclua o seu código de conduta e outras
políticas internas, como vestimenta, horários, comportamento aceitável,
postura em relação ao recebimento de presentes etc. Além disso, fornecer
informações completas do que é esperado do funcionário e da empresa.
Empregadores que respeitam os funcionários devem conhecer e seguir
as regras e saber detalhá-las.
b) Tornar-se útil. Os funcionários envolvidos em uma cultura de
espiritualidade se sentem mais valorizados, e essa sensação de
pertencimento ajuda na criação de um alinhamento com os valores
organizacionais, tornando-se mais úteis.
c) Construção da confiança. A falta de respeito entre os membros da
empresa pode afetar as relações de trabalho. Quando o negócio não vai
bem, os empregadores são obrigados a reduzir as horas de serviço dos
funcionários ou realizar desligamentos para cobrir despesas, gerando

68
insatisfação. E, como todo empregador consciente sabe que certos erros
do empregado podem ser prejudiciais ao sucesso da empresa, isso pode
torná-lo ansioso, passando a gerenciar cada passo do empregado,
criando uma relação de opressão. Trabalhar a espiritualidade ajuda na
resolução desses problemas, pois falar abertamente e dizer a verdade,
respondendo às perguntas dos funcionários com verdade e entusiasmo,
e não com hesitação e incerteza, cria confiança na cultura organizacional.
Em contrapartida, o funcionário, ao ganhar o respeito de seu empregador,
tem mais chance de manter o emprego.
d) Bom relacionamento interno. Devem ser estabelecidas relações
internas positivas. O local de trabalho é composto de diferentes
personalidades que têm seus próprios valores, opiniões e crenças. Os
funcionários devem: aprender a aceitar as diferenças uns dos outros e
trabalhar para o bem comum; ser solidários com os colegas e tratá-los
com cortesia; evitar fofocas; dar exemplos positivos para os colegas de
trabalho, exibindo integridade, honestidade, dedicação, espírito de
abertura e confiança; ouvir as instruções; tomar a iniciativa quando a
situação pede; e assumir a responsabilidade por suas ações.

Como se pode notar, para Hicks (2003) a abordagem da espiritualidade


no trabalho concentra-se em cultivar valores que inspirem as pessoas a serem
nobres e dignas na forma como se envolvem com seus empregos e profissões.
Essa ética espiritual gira em torno de valores que, em um contexto de negócios,
podem até ser negligenciados, como integridade, honestidade,
responsabilidade, qualidade, cooperação, serviço, intuição, lealdade, respeito,
justiça e serviço, em detrimento do que se valoriza hoje, como eficiência, riqueza
material e concorrência.
Portanto, essa abordagem da espiritualidade no trabalho centra-se em
encontrar e preservar o significado de nossos empregos e carreiras. Milhões de
pessoas em todo o mundo estão levando vidas com uma rotina exigente e, às
vezes, trabalhando sem vontade, ânimo, satisfação, esforçando-se para proteger
seus direitos trabalhistas e garantir o suficiente para viver. Aí entra a
espiritualidade, que se concentra no ativismo social, na preservação do aspecto
humano valioso do trabalho e de práticas de negócios sustentáveis, que ajudem

69
os trabalhadores a proteger o que é significativo e valioso para eles, suas
famílias e comunidades.
Nesse contexto, pessoas de todos os níveis da hierarquia corporativa
cada vez mais estão querendo nutrir o espírito de seus funcionários, pois
perceberam que, quando eles são incentivados a expressar sua criatividade, o
resultado é uma força de trabalho mais satisfatória e sustentada. Pessoas felizes
trabalham mais e são mais propensas a permanecer em seus postos.
Um estudo realizado pelo altamente respeitado instituto Wilson Learning
Company (2008), sobre o desempenho de negócios, descobriu que 39% da
variabilidade no desempenho das empresas é atribuível à satisfação pessoal dos
funcionários. A espiritualidade foi citada como o segundo fator mais importante
para a felicidade pessoal (depois da saúde) pela maioria dos norte-americanos,
em uma pesquisa feita pelo EUA Weekend (2006), com 47% dos entrevistados
dizendo que a espiritualidade era o elemento mais importante de sua felicidade.
Portanto, grandes corporações já perceberam essa tendência e passaram a
valorizar a prática da espiritualidade na rotina de seus funcionários.
Os escritórios da Apple Computer, na Califórnia, têm uma sala de
meditação onde os funcionários reservam um tempo diário na empresa para
meditar ou rezar. Esse hábito comprovadamente melhorou a produtividade e a
criatividade da equipe. Um ex-gerente, que é agora um monge budista, faz
meditações regulares ali.
O presidente da Aetna, grande empresa internacional de seguros, Michael
A. Stephen, elogia os benefícios da meditação e explica a seus funcionários o
uso da espiritualidade em suas carreiras.
Avaya, uma empresa global de comunicações, tem uma sala reservada à
oração e à meditação que é especialmente apreciada pelos muçulmanos; como
eles devem rezar cinco vezes por dia, sentem-se respeitados e valorizados por
isso.
A editora Prentice-Hall criou uma sala de meditação em sua sede, que os
funcionários chamam de “Quiet Room”, onde podem sentar-se calmamente e
realizar um retiro mental, quando se sentem muito estressados no trabalho.
Já os diretores da Greystone Bakery, em Nova York, promovem um
período de silêncio meditativo antes de começar as reuniões para que todos

70
possam entrar em contato com seu estado interior e concentrar-se nas questões
a serem discutidas.

II.4.2. O mapa de sentido

A ideia de que existe um paralelo entre os significados, a dinâmica de


tomada de decisões e as ações de indivíduos e organizações é fundamental.
Existem inúmeros exemplos de estudos nesse sentido, e dentre eles se
destacam o de M. Eillen Higgins (2014) e Jude Neal (2013), que mostram
conclusivamente que ter um trabalho significativo, ou não tê-lo, influencia alguns
resultados importantes na vida organizacional, tais como motivação,
absenteísmo, comportamento no trabalho, envolvimento, satisfação no trabalho,
capacitação, estresse e desempenho.
Contudo, para algumas pessoas esse aspecto significativo tem um âmbito
maior. Muitas vezes o comprometimento no trabalho não é algo que possa ser
mecanizado pela mais recente moda de autoajuda ou técnica de gestão, nem
proposto e considerado conveniente. O ser humano precisa ser levado a sério
em suas ambições também pelo outro.
Dar um sentido para o trabalho, portanto, leva a muitos resultados
organizacionais desejados, mas sua aplicação exige coragem para questionar
alguns aspectos fundamentais dos negócios e para envolver-se com as questões
de forma sincera. Nesse cenário, o mapa de sentido mostra os elementos
necessários para um trabalho significativo e uma vida significativa (NEAL, 2013,
p. 123):

 definir e ficar em contato com o que é mais importante, ajudando a lidar


com os desafios do trabalho diário;
 desenvolver conscientemente um trabalho significativo e uma vida
significativa;
 passar facilmente da pergunta à ação;
 transformar as organizações de forma evolutiva.

Os autores Marjolein Lips-Wiersma e Lani Morris (apud NEAL, 2013)


desenvolveram um mapa de sentido com base nas conclusões de Lips-Wiersma
apresentadas em sua tese de doutorado. Esse trabalho focou a espiritualidade

71
no local de trabalho. As descobertas foram recolhidas a partir do depoimento de
um grupo de voluntários, levando à conclusão de que a espiritualidade no
trabalho se correlaciona diretamente com o significado que dão a suas
atividades.
A pesquisa inicial de Lips-Wiersma produziu um modelo de significado no
trabalho que começou a ser aplicado por um número de pessoas familiarizadas
com a própria atividade. Dada essa aplicação inesperada do modelo, Lips-
Wiersma e Morris expandiram a pesquisa para um conjunto muito maior e mais
amplo de participantes, o que levou ao desenvolvimento do mapa de sentido.

Figura 1: Mapa de sentido

Fonte: NEAL, 2013, p. 226

Esse mapa tem duas dimensões: uma relacional e outra presencial. A


dimensão de relacionamento se estende do eu (self) até os outros (others) (eixo
horizontal), enquanto a presença se estende do ser (being) ao fazer (doing) (eixo
vertical). Sua interseção forma quatro quadrantes:

72
1. desenvolvimento do eu interior (developing the inner self),
2. unidade com os outros (unity with others),
3. demonstração de pleno potencial (expressing full potential),
4. serviço aos outros (service to others).

Em sua pesquisa, os autores descobriram que as pessoas que


encontraram maior significado em seu trabalho também tinham um bom
desempenho nos quatro quadrantes. Isso significa que os indivíduos “felizes” no
trabalho são pessoas. Esse é o ponto onde o trabalho e a vida se encontram em
uma dança holística. A ideia de separar trabalho e vida pessoal é uma ilusão.
Não podemos ter uma vida de trabalho significativa se o restante de nossa
existência não está completo.
Lips-Wiersma e Morris (apud NEAL, 2013) também descobriram que as
dimensões do mapa de sentido se relacionam a um estado de tensão com seus
extremos. Ou seja, o extremo eu está em tensão com o extremo outros, assim
como o ser está em tensão com o fazer. Essas tensões deslocam do centro ideal
para uma posição em que a pessoa está em estado de inspiração completa.
Quando o foco é mais o eu do que os outros, a unidade de serviço aos
outros é desafiada. O oposto também é verdade. Quando estamos dedicados
aos outros em detrimento do eu, o desenvolvimento interior e a expressão do
próprio potencial são menos prováveis.
A dimensão da presença oferece uma tensão semelhante. Concentrar-se
apenas em ser nega a possibilidade de expressar o próprio potencial e a
manutenção de outros. No entanto, esse foco é menos provável do que o fazer.
Tendemos a nos concentrar no fazer à custa do ser. Isso se traduz em não nos
desenvolvermos e em não termos relações profundas e significativas.
O ponto-chave do mapa de sentido é buscar equilíbrio nas quatro áreas
de realização. Lips-Wiersma e Morris (apud NEAL, 2013) descrevem cada um
dos seus quadrantes da seguinte forma:

 O desenvolvimento do eu interior vem do envolvimento ativo com os


outros participantes de nossa vida e trabalho, dando o melhor de nós
mesmos. Existem três principais subtemas para este quadrante: (1)
desenvolvimento moral, (2) crescimento e (3) fidelidade a si mesmo.

73
Ressalte-se que o autoconhecimento é incorporado em todos os três
tópicos.
 A unidade com os outros refere-se ao significado da convivência com
outros seres humanos. Isso não quer dizer uniformidade. Envolve
principalmente encontrar a unidade na diversidade, que vem do
entendimento de que a humanidade é essencialmente uma e que
experimentar essa unidade é o que enriquece nossa humanidade global.
Tal dimensão também tem três principais subtemas: (1) trabalho em
conjunto, (2) partilha de valores e (3) pertença ao grupo.
 A demonstração de pleno potencial diz respeito ao sentido de deixar
nossa marca no universo, ou seja, ser ativo e exteriormente focado. Este
quadrante baseia-se no conceito de que todos somos únicos e
responsáveis por trazer nossos dons e talentos únicos ao mundo. Os três
subtemas para expressar todo esse potencial são: (1) criação, (2) alcance
e (3) influência.
 O serviço aos outros é a necessidade humana de fazer contribuições
para o bem-estar dos outros, de ajudar um indivíduo a fazer a diferença
no mundo em geral. Seus dois subtemas são: (1) fazer a diferença e (2)
satisfazer as necessidades da humanidade e do planeta.

O mapa de sentido é um conceito simples, com fortes implicações. Cada


um dos quadrantes oferece muita reflexão e oportunidade de encontrar sentido.
No entanto, sua perspectiva holística e equilibrada é a chave real. Aqui estão
alguns exemplos.
Focar extremamente no desenvolvimento interior pode levar à
passividade. Muito pouco foco nesse quadrante, porém, pode resultar em
negligenciar nossa própria identidade.
No serviço aos outros, uma atenção extrema pode resultar em martírio e
exaustão. O foco oposto seria negar a capacidade de contribuir com uma
comunidade. O foco extremo sobre os outros dois quadrantes – unidade com os
outros e demonstração de pleno potencial – tem implicações semelhantes:

Quando pedimos a centenas de pessoas que identificassem o que faz sentido em seu
trabalho, todos elas apresentaram as mesmas dimensões de sentido. Estas são tão
antigas quanto a humanidade, tanto a familiar quanto a universal. O mapa de sentido

74
não diz o que deve ser feito, mas captura o que os seres humanos sempre souberam a
respeito do sentido em seu trabalho (NEAL, 2013, p. 229).

Assim, compreende-se que as condições da vida se refletem no trabalho


e o trabalho é expressão da vida. O mapa de sentido é uma chave que abre para
o que nos é importante como seres humanos. Usando-o, é possível aprendermos
a:

 encontrar a direção significativa no trabalho e na vida;


 aumentar a alegria e a satisfação no trabalho e influenciar positivamente
as organizações.

Com base em mais de quinze anos de pesquisa, o mapa de sentido


resolve a complexidade da motivação intrínseca, tornando-a uma orientação
simples (NEAL, 2013). E mostra como fazê-lo:

 transformar apatia, cinismo e ressentimento em engajamento;


 ter conversas frequentes no trabalho que podem gerar mudanças;
 conectar autenticamente anseio pessoal com finalidade organizacional.

A utilização do mapa de sentido torna mais fácil a construção de equipes


integradas, a partir da atenção à paixão, criatividade, energia, compromisso e
produtividade de cada um. E isso é possível (NEAL, 2013)

 criando locais de trabalho significativos;


 reenergizando os locais de trabalho ao criar um nível mais profundo de
envolvimento entre os profissionais;
 alinhando perspectivas e valores, em que todos se sintam responsáveis;
 recuperando o sentido como uma necessidade humana fundamental para
as pessoas, organizações, comunidades e sociedade;
 expandindo e alinhando as práticas internas de trabalho significativo com
mais amplas metas de responsabilidade e sustentabilidade da
organização;
 recuperando o equilíbrio, ao criar níveis mais profundos de engajamento
para chegar a uma visão comum que inspire a todos;

75
 trabalhando de forma constante, com propósito, de forma colaborativa e
sustentável.

II.4.3. Parcerias espirituais e parcerias no trabalho

Parcerias espirituais são as relações mais gratificantes, substanciais e


profundas possíveis. São relações entre iguais, com o propósito de crescimento
espiritual. Crescer espiritualmente significa criar uma vida de mais alegria e
menos dor, mais significativa e menos vazia, de mais amor e menos medo.
Portanto, parcerias espirituais são arenas para descobrir e desafiar os medos e
explorar e cultivar o amor aos outros. É possível criar parcerias espirituais dentro
da família, com amigos, colegas de trabalho, vizinhos, e com o outro indivíduo
do casal. Não importa se é apenas um parceiro espiritual ou se são vários; tal
parceria opera-se da mesma maneira. É um veículo que dá suporte os parceiros
para que eles se tornem mais conscientes de suas emoções, de suas intenções,
e façam escolhas mais saudáveis, que podem ter consequências das quais eles
estão dispostos a assumir a responsabilidade.
Já o conceito de trabalho em parceria tem sido a fonte de muitos debates.
Giacalone e Jurkiewicz (2003, p. 44) dão algumas pistas:

 compromisso conjunto para o sucesso da organização;


 reconhecimento conjunto de cada um dos interesses legítimos;
 compromisso conjunto com a segurança do emprego;
 foco conjunto sobre a qualidade de vida no trabalho;
 compromisso conjunto para agir de forma transparente;
 compromisso conjunto para agregar valor ao serviço.

Esses princípios se traduzem em características comuns associadas ao


trabalho em parceria. Por exemplo, os funcionários demonstram forte
compromisso com os objetivos do negócio e são flexíveis em sua abordagem
para alcançar esses objetivos. Por sua vez, a organização entende a posição
deles e ouve suas preocupações, trabalhando ativamente para a formulação e a
implantação de políticas para abordar tais questões, sempre que possível.
O trabalho em parceria é uma relação baseada na satisfação mútua, ainda
que haja interesses distintos. Por isso, ela funciona melhor quando se cria uma

76
união na relação bem definida entre o gerenciador e o gerenciado (GIACALONE;
JURKIEWICZ, 2003, p. 44).
Sendo assim, é preciso um grande esforço concentrado para realizar
plenamente os objetivos da organização. O valor de colegas que são capazes
de colaborar e criar parcerias fortes não deve ser subestimado. Confiança e
lealdade construídas durante o processo de trabalho cria um ambiente de
respeito na equipe, pelas ideias individuais, e motiva.
Mudanças na força de trabalho ao longo do último meio século têm sido
numerosas, em que é evidente o esforço para aumentar a eficiência. Os espaços
de escritórios têm evoluído para estações de trabalho abertas, que exigem
flexibilidade e colaboração, e também se expandem para as casas e locais
remotos de todo o mundo, exigindo o enfrentamento de uma série de barreiras
de comunicação e distrações.
Manter os funcionários de longo data também é um desafio moderno no
negócio. Habilidades de parceria são valiosas na cultura geral da empresa em
termos de contração, para construir uma rede que vale a pena manter ao longo
do tempo. Pessoas que não são incapazes de construir parcerias ou trabalhar
de acordo com cultura da empresa não são indicados para permanecer em um
emprego por muito tempo (GIACALONE; JURKIEWICZ, 2003).
O professor da Universidade de Bradley, Helja Antola Crowe (2009)
escreveu um artigo sobre o desenvolvimento de parcerias, em que reconhece
que os ambientes verdadeiramente colaborativos transformam obstáculos em
oportunidades. Ou seja, ser flexível para as perspectivas dos outros cria
oportunidades para se chegar a ideias inovadoras, novas abordagens, além de
ajudar a conectar-se com diversos grupos de pessoas. A parceria impulsiona as
pessoas a desenvolver seus pontos fortes e a criar coisas únicas. Crowe também
observa que a diminuição de recursos normalmente força as pessoas a trabalhar
juntas em lugares diversos, e muitas vezes com pequenos orçamentos.
A colaboração eficaz conduz à satisfação individual, o que indiretamente
cria uma cultura entre empregado e empresa mais valiosa. Portanto, aí entra a
inteligência espiritual, que é um recurso para melhorar o estabelecimento de
parcerias, quando os empregadores valorizam os funcionários por certas
habilidades, tais como resolução de conflitos, calma sob pressão, aceitação de
críticas, liderança, empatia para com os colegas e outras atitudes colaborativas.

77
A linguagem corporal, cuidados com a própria saúde e comunicação são
algumas maneiras de melhorar a inteligência espiritual. Vale a pena ser capaz
de compreender outras pessoas e chegar a um acordo com ideias diferentes.
A colaboração pode soar como um slogan para a empresa moderna, mas
é uma maneira muito real de aprender com diversas circunstâncias e beneficiar
não só o indivíduo, mas a empresa como um todo. Os objetivos da organização
precisam ser claros e evidentes em todas as fases, para com todos os membros,
de modo que as técnicas de trabalho em conjunto possam ser realizadas. Dessa
forma, a colaboração diz respeito a um envolvimento eficaz, ou seja, é um acordo
de negócios necessário na era moderna, que não deve ser subestimado.

78
Capítulo III
Análise crítica do conceito de inteligência
espiritual

III.1. APRESENTAÇÃO DOS TERMOS DA ANÁLISE

Neste capítulo vamos apresentar uma análise crítica em relação ao


conceito de inteligência espiritual/existencial em relação à inteligência,
espiritualidade e workplace spirituality.
Os numerosos locais de trabalho em qualquer país industrializado
apresentam necessidades, demandas, opções, oportunidades e características
próprias, o que justifica a necessidade de “estudos cuidadosos sobre como as
inteligências são desenvolvidas nos locais de trabalho” (GARDNER, 1983, p.
214).
Portanto, propomos um debate reflexivo para trazer esse polêmico
assunto para discussão, e não um confronto direto com os renomados autores
que também tratam do tema. A polêmica existe porque o conceito de
espiritualidade, querendo ou não, vem ganhando destaque mesmo entre aqueles
sem embasamento acadêmico comprovado e tem sido usado
indiscriminadamente por pessoas que talvez não tenham estudado o assunto
com seriedade.
Acreditamos que ainda existe muito a se pesquisar para fazer o
levantamento adequado de outras questões, mas as que surgiram no decorrer
do período de pesquisa são apresentadas a seguir.

III.1.1. A inteligência espiritual no âmbito acadêmico da inteligência

Existem várias definições sobre o conceito de inteligência, devido à sua


complexidade. Neste capítulo vamos adotar de início a conceituação de
Torralba, um dos autores do conceito de inteligência espiritual:

Em última instância, a inteligência é uma faculdade tão escorregadia, astuta, tremenda


e espirituosa que um tratado científico convencional não faz jus à complexidade do

79
assunto. O que chamamos inteligência é, antes de tudo, a capacidade que ela tem de
criar-se a si mesma (2010, p. 19).

Vamos utilizar o conceito de inteligências múltiplas de Howard Gardner,


da Universidade de Harvard, psiconeurologista especializado no estudo da
inteligência humana, como base de comparação para o conceito de inteligência
espiritual de Danah Zohar e Ian Marshal, da Universidade de Oxford.
O próprio Gardner coloca como plausível a existência da inteligência
espiritual, também chamada por ele de inteligência da existência, porém se
mostra reticente quanto à afirmativa categórica de sua existência, apesar de não
descartá-la.
Quando Gardner escreveu a teoria das múltiplas inteligências (1983), ele
não mencionou a inteligência espiritual. Contudo, reconsiderou essa
possibilidade quando, na edição de 2000 de seu livro Mentes extraordinárias,
incluiu a inteligência existencial/espiritual.
A referência que Gardner faz sobre o conceito de inteligência espiritual,
que também chamou de inteligência existencial ou transcendente, está definida
neste trecho:

A capacidade para situar-se a si mesmo em relação ao cosmos, em relação a si mesmo


e em relação às características existenciais da condição humana, quais sejam, o
significado da vida, o significado da morte e o destino final do mundo físico e psicológico
em experiências profundas como amor a outra pessoa ou a imersão em trabalho de arte
(1999, p. 133).

A inteligência espiritual, existencial ou transcendente, segundo Gardner,


abrangeria a capacidade de refletir e ponderar sobre questões fundamentais que
em algum momento aparecem na vida das pessoas, como o significado da vida,
por que morremos ou como chegamos até aqui, desenvolvendo a sensibilidade
e a capacidade de lidar com elas de maneira satisfatória.
Segundo Gardner, tal capacidade seria uma característica principalmente
dos líderes espirituais e de pensadores filosóficos. Mas ressaltamos que esta e
as outras inteligências, como ele mesmo propõe, podem ser desenvolvidas
segundo alguns critérios.

80
Visto que os autores Danah Zohar e Ian Marshall utilizam a teoria das
múltiplas inteligências como base para o conceito cunhado por eles, veremos
alguns pontos de concordância e rejeição em relação a Gardner.
A inteligência espiritual, segundo Danah Zohar e Ian Marsall, é um meio
de gerar o autoconhecimento para criar um entendimento do significado da
existência (missão da vida), sendo que o objetivo final é entender que fazemos
parte de um todo e estamos interligados, interconectados, sendo o altruísmo a
finalidade.
A inteligência espiritual apresenta ferramentas para o autoconhecimento.
Entretanto, os autores ressaltam que devemos perceber que o conhecimento do
centrar-se em si mesmo não deve ser o objetivo final, mas sim uma ferramenta
de autoconhecimento para estabelecer uma conexão mais estreita, amável,
amorosa e serena para com o próximo, o planeta e a natureza.
Os momentos de dificuldade, quando nos deparamos com obstáculos,
desafios, surgem como medidores de pensamento e, conforme o padrão deste,
as respostas acontecem com maior ou menor grau de fluidez.
Os padrões comportamentais também se submetem ao mesmo critério,
quando enfrentamos problemas no trabalho, relacionamentos de qualquer
natureza ou doenças físicas. São nesses momentos que o QS nos direciona a
buscar soluções criativas que transcendam o Eu, que geram superação.
Se analisarmos as perspectivas de autores como Howard Gardner, Danah
Zohar, Ian Marshall e Francesc Torralba, antes expostas, percebemos que eles
entram em divergência, pelo fato crucial da falta de comprovação científica.
Porém, Gardner não descarta que a inteligência espiritual possa ser, sim, uma
forma de espiritualidade.
A contra-argumentação de Gardner alude às recomendações de como
desenvolver as potencialidades da inteligência espiritual. Essas habilidades do
ponto de vista da inteligência espiritual são aquelas necessárias para elevar o
“estado de espírito”, que, segundo Gardner, nada mais são do que práticas de
tipos de inteligências descritas a seguir:

 solidão (ganhar maturidade) – inteligência interpessoal;


 silêncio (com papel decisivo para experimentar a realidade interior) –
inteligência cinestésica e corporal;

81
 contemplação (para ser receptivo ao invisível) – inteligência naturalista,
ecológica;
 espiritualidade na arte (que, impregnado na obra artística, serve de deleite
ao observador) – inteligência espacial-visual;
 exercício físico (para transcender as resistências da natureza e o cansaço
corporal) – inteligência cinestésico-corporal;
 exercício da solidariedade (através da consciência da conexão com o
outro, de suas dores e sofrimentos) – inteligência interpessoal.

Um aspecto importante que devemos ressaltar é a capacidade de fazer


avaliações, capacidade esta que levou à contínua evolução das distintas
inteligências através de milênios, devido à inquietude do ser humano em sua
busca de sentido.
Gardner demonstra hesitação em falar abertamente sobre uma possível
nona inteligência, principalmente pela falta de evidências convincentes sobre
estruturas e processos cerebrais dedicados a tal forma de computação:

A inteligência existencial se qualifica bem como uma inteligência à luz do oitavo critério,
pois jovens de todo o mundo levantam as questões fundamentais sobre a existência:
Quem somos? De onde viemos? Do que somos feitos? Por que morremos? E estas
questões são capturadas em sistemas simbólicos tais como o mito, a arte, a poesia, a
filosofia e a religião. Alguns indivíduos parecem precoces em suas capacidades de
colocar tais questões cósmicas onde outros se prendem às coisas mais mundanas. Há
pouca evidência de tendências existenciais em primatas não humanos, mas nossos
próprios antecedentes evolutivos, tais como os neandertalenses, evidenciam sinais de
preocupação, se não preocupações últimas, em seus rituais fúnebres (2000, p. 6).

Gardner considera a discussão sobre as questões relativas à


espiritualidade e inteligência espiritual especificamente mais importantes para a
atualidade por serem provocativas. As dúvidas que ele coloca como forma de
ponderação mostram que ainda é cedo para validar o conceito de inteligência
espiritual do ponto de vista científico. Algumas perguntas ainda precisam ser
cientificamente respondidas:

 Quais são as formas pelas quais se pode mostrar que os recursos


espirituais estão sendo descritos?

82
 Como são descritos esses elementos/habilidades espirituais? Qual o
diferencial?
 Eles levam necessariamente a uma resolução de problemas mais eficaz
ou rápida, ou podem ser enganadores?
 Existem recursos que poderiam substituir os espirituais?

Gardner acredita em alguns aspectos do conceito de inteligência espiritual


pela possibilidade de várias habilidades juntas constituírem a da espiritualidade.
Segue a mesma linha de raciocínio ao sugerir que essa conjunção parece uma
característica das inteligências.
De fato, como proposto em sua teoria, cada uma das inteligências
apresenta graus diferenciados e realiza operações independentes entre si, que
podem ser separáveis, evoluir e regredir conforme a utilização.
As habilidades das inteligências, dada a natureza da experiência humana,
tendem a florescer e a se organizar como totalidade. Assim, a inteligência
musical, por exemplo, é a capacidade de perceber, discriminar, transformar
formas musicais. Indivíduos que possuem inteligência musical gostam de estar
em contato com a música, a estudam, se entregam ao prazer de ouvi-la e
aprendem facilmente canções, ritmos e melodias.
Por sua vez, a inteligência interpessoal é a capacidade de compreender
as emoções e agir corretamente diante das atitudes das outras pessoas, seja no
sentido do humor alheio, ideias, pensamentos, seja em relação a qualquer
atitude que apresente.
Um indivíduo com a inteligência interpessoal desenvolvida tende a ser
positivo, prestativo, fazer elogios de forma genuína, ter facilidade de interagir e
talento nato para liderar. A inteligência interpessoal traz muitos benefícios, mas
um dos principais é a criação de empatia.
Gardner veementemente afirma uma característica do indivíduo que é
bastante explorada na inteligência espiritual como uma habilidade: a humildade.
Contudo, rebate que certos indivíduos que pareciam ter habilidades de uma
suposta inteligência espiritual eram francamente antissociais, psicopatas ou,
para usar termo coloquial, maldosos.
Ele também critica a argumentação quanto à genética comportamental.
Traços da espiritualidade, como a humildade, aparecem como sendo, em certa

83
extensão, hereditários, e isto é usado indevidamente para concluir pela
existência de uma base cerebral e genética da espiritualidade.
Por fim, o autor finaliza ao relacionar que o conceito de inteligência
pertence mais propriamente ao campo da cognição e é correntemente conectado
às formas de processamento de informação.

III.1.2. A inteligência espiritual no âmbito acadêmico da espiritualidade

Vamos utilizar a definição da Organização Mundial da Saúde sobre


espiritualidade, considerada como um conjunto de emoções e convicções de
natureza não material que remete a questões como sentido da vida, sem se
limitar à crença ou prática religiosa. E nos agarramos ao reconhecimento de que
a espiritualidade não é importante apenas para viver bem; ela é essencial para
compreender a mente humana.
A melhor definição que encontramos sobre a inteligência espiritual é a de
que é um conjunto de capacidades com as quais abordamos e solucionamos
problemas de sentido e de valor.
Os indivíduos são essencialmente criaturas espirituais e deveriam
encontrar uma ressonância mais profunda em si e sentir a necessidade de fazer
perguntas fundamentais do tipo:

 Qual é o significado da minha vida?


 Qual minha missão?

O novo modelo de ser humano é descrito por Zohar e Marshall (2001)


como uma flor de lótus que abarca o céu e a terra, com três camadas principais:
a camada do ego, o meio associativo e o centro.
O centro está ligado, presumem os mesmos autores, a uma fonte que
consideram ter origem na história e na evolução do universo, fisicamente iniciada
no vazio quântico. “Não se pode viver nem compreender o Eu salvo em relação
a este centro, que é toda a criação expressa através da realidade física
experimentada como Eu” (ZOHAR; MARSHALL, 2001, p. 174).
Os mesmos autores defendem ainda que o conhecimento e o contato com
esse centro é fonte e chave para aumentar e utilizar a inteligência espiritual.

84
III.1.2.1. Práticas relacionadas à espiritualidade

A perspectiva espiritual inclui conteúdos existenciais que, por sua vez, têm
profundas implicações no bem-estar físico e psicológico. À medida que a pessoa
se abre para a espiritualidade, há uma integração com as outras dimensões da
vida, uma vez que atua como elemento integrador; por isso sua importância em
relação à saúde, mas não limitada a ela, contemplando também relacionamentos
e finanças.
A dimensão espiritual não requer condições especiais, podendo ser
trabalhada individualmente, em grupos, com pessoas de vários graus de
instrução, em ambientes variados, pois o que determina o start é uma vontade
que conjumina com uma conversa nos lugares mais inusitados possíveis, como
supermercados, academias, restaurantes, táxis, ambientes de trabalho. A
facilidade de sua aplicabilidade é uma das vantagens que a faz ser estimulada e
desenvolvida, também por não requerer arsenal ou conhecimento tecnológico.
A espiritualidade é, também, reconhecida como um processo que engloba
variadas práticas para encontrar a vontade de algo que transcenda o Eu. As mais
comuns, citadas por Sam Harris (2015), são a meditação, mindfullness,
consciência sem self. Outros estudos, como o de Carla Soares em sua tese de
mestrado sobre espiritualidade em enfermagem, também apontam para
meditação, ioga, exame de consciência, exercícios espirituais.
Já Victor Frankl acreditava que a dimensão espiritual do ser humano se
manifesta através da intuição, e para tal “é necessário que considere algo em si
que lhe diz o que fazer, que considere a voz da consciência moral […] percebida
como algo transcendente […] e capaz de orientá-lo” (FRANKL, 1993, apud
COELHO JÚNIOR, 2001).
As práticas espirituais servem para a pessoa orientar, mental e
fisicamente, suas motivações e prioridades, procurando não o benefício próprio,
mas o bem da comunidade.
Concentração, paz e libertação são também efeitos relatados por quem
pratica meditação, especialmente quando se enfrentam problemas na vida.
Sam Harris apresenta o estudo dos psicólogos e neurocientistas
Killingsworth e Gilbert (2012), que reconhecem os efeitos que a divagação dos
pensamentos na mente produz nas diversas fases da meditação.

85
A mente divagante é correlacionada à atividade nas regiões da linha
mediana do cérebro, em especial o córtex pré-frontal medial e o córtex parietal
medial. Essas áreas com frequência são chamadas de “rede padrão” ou “rede
de estado de repouso”, porque são as mais ativas quando estamos apenas em
compasso de espera, aguardando que algo aconteça. A atividade na rede padrão
tem a abrevição de DMN (default-mode network).
O importante sobre o DMN é que tende a ser mais ativo quando avaliamos
uma cena do ponto de vista da primeira pessoa (em vez de da terceira pessoa),
ou seja, quando nos colocamos sob a perspectiva do outro. De modo geral, esse
é um exemplo de como as práticas espirituais nos ajudam a prestar atenção ao
que está fora de nós, através de um olhar na primeira pessoa.
O estudo insinua, mesmo que ainda sem validação científica, uma ligação
física entre a experiência da prática espiritual, no caso a meditação, com o
sentido do self, em paralelo ao autoconhecimento segundo a inteligência
espiritual.

III.1.2.2. Afinidades entre a inteligência espiritual e a espiritualidade

A espiritualidade guia para uma orientação interna onde aflora a


expressão da liberdade interior orientada com sabedoria e responsabilidade. No
contexto do desenvolvimento, materializa-se na orientação do discernimento, na
cooperação e em uma ação de desenvolvimento humano eficaz, para quem a
pratica segundo a grande maioria de estudos sobre espiritualidade.
O processo de tomada de decisão, também designado discernimento, é o
processo pelo qual a pessoa sabiamente conhece a verdade como uma fonte
para tomar decisões importantes na vida pessoal de forma consciente,
discernindo a realidade e a perspetiva de mudança.
Ainda segundo Zohar e Marshall (2001), o indivíduo coloca os vários
aspetos de um dado problema numa perspetiva mais ampla, atendendo às
diferentes condições, circunstâncias e hipóteses. E, projetando as possíveis
consequências, escolhe a melhor opção para progredir segundo determinados
valores referenciais.
Assim, vemos que a espiritualidade também tem o papel de promover a
reflexão e o discernimento em tomadas de decisão inerentes a um modelo

86
referencial, isto é, considerando e ponderando a vontade e necessidades, os
valores e os objetivos que se deseja alcançar.
Na trajetória do desenvolvimento das práticas espirituais é fundamental
parar e rever sistematicamente, avaliar e tentar construir algo melhor para o
futuro a partir do presente e das condições reais que as pessoas envolvidas no
processo de desenvolvimento possuem, além de introduzir a criatividade em
busca de novas soluções.
Então, a espiritualidade é apontada como uma forma de ultrapassar o erro
de exportar modelos de desenvolvimento com base em outra cultura que não a
local, respeitando as características individuais e seus talentos, e integrando e
respeitando a diversidade, dando valor aos hábitos, às relações e à cultura.

III.1.2.3. Inteligência espiritual e espiritualidade: distinção de conceitos

Apresentar algumas características da espiritualidade e da inteligência


espiritual foi a maneira que encontramos para delinear a diferença de
conceituação de suas práticas e finalidades.
O que ficou visível na espiritualidade é a relevância das práticas
espirituais, consideradas como primordiais, necessárias, para a elevação
espiritual. A distinção está na maneira como a pessoa a vive, expressa e pratica.
Para exemplificar, citamos Sam Harris:

É possível praticar a maioria das técnicas da meditação budista ou o método do


autoconhecimento do Advaita e experimentar as mudanças anunciadas na consciência
sem jamais acreditar na lei do carma ou nos milagres atribuídos a místicos indianos
(2015, p. 32).

Não há dúvida de que muitas práticas da espiritualidade podem produzir


experiências interessantes em mentes divagantes. No entanto, deve ficar claro
que dedicar-se a uma prática espiritual baseada na inteligência espiritual difere
no sentido de que tal prática não é necessariamente voltada para a constância,
como mais uma atividade a ser praticada no dia a dia, mas sim a uma forma de
viver a vida e de manifestar o verdadeiro Eu. Para tanto, os momentos de
contemplação, por exemplo, não precisam ficar atrelados a belas paisagens de
montanhas ou jardins, mas também a paisagens cinzentas e urbanas, onde é

87
possível, com um olhar espiritualmente inteligente, se aproximar de belezas
peculiares.
Nesse sentido, Zohar (2000, p. 30) elenca algumas perguntas utilizadas
por indivíduos com um QS altamente desenvolvido, a quem os psicólogos
denominam “independentes de campo”, isto é, que possuem a capacidade de
trabalhar contra as convenções:

 Qual a capacidade de ser flexível (ativa e espontaneamente adaptativo).


 Qual o grau elevado de autopercepção.
 Qual a capacidade de enfrentar e usar o sofrimento.
 Qual a qualidade de enfrentar e transcender a dor.
 Qual a qualidade de ser inspirado por visão e valores.
 Qual a relutância em causar dano desnecessário.
 Qual a tendência para ver as conexões entre coisas diversas (ser
holístico).
 Qual a tendência acentuada para fazer perguntas do tipo “Por quê” ou “O
que aconteceria se…” e procurar respostas “fundamentais”.

Para Zohar, responder a essas perguntas é mais importante para o


conceito de inteligência espiritual do que as práticas da espiritualidade.
Na nossa visão, contudo, ambas as propostas estão interligadas e a
fórmula é personalizada para cada indivíduo. Alguns precisam meditar mais que
outros para responder a tais perguntas. A outros, basta horas equilibradas entre
trabalho e família, atividade física e intelectual e entretenimento e ócio.
Assim sendo, diagnosticamos que as diferentes dimensões das práticas
da espiritualidade parecem comuns umas às outras e têm como finalidade o
desenvolvimento da personalidade, do Eu, do autoconhecimento.
Portanto, segundo a perspectiva de Zohar e Harris, podemos concluir que
ser espiritualista ou inteligente espiritualmente está associado a algum aspecto
do autoconhecimento, representado na “elevação da consciência espiritual”.

88
III.2. A INTELIGÊNCIA ESPIRITUAL EM COMPARAÇÃO À "WORKPLACE SPIRITUALITY"

Propomos tratar também do porquê do esforço em utilizar o quociente


espiritual ou inteligência espiritual na workplace spirituality e quais suas
implicações.
A definição de workplace spirituality que utilizaremos para servir de
comparativo ao conceito de inteligência espiritual é a de que existe por parte dos
colaboradores que trabalham nas empresas uma vida interior que nutre e é
nutrida pelo significado do trabalho que realizam dentro da comunidade onde
estão inseridos.
Assim, Giacalone e Jurkiewicz (2003) detectaram, além das
características básicas apresentadas na definição acima, outras dimensões
agregadas a ela, as quais, para facilitar, elencamos a seguir:

 habilidade de viver uma vida integrada com todas as áreas da vida;


 valores da organização evidenciados em sua cultura;
 alegria no trabalho;
 valores transcendentais.

Segundo esses autores, os executivos que ocupam cargos de liderança


ou que exercem influência dentro da hierarquia empresarial deveriam ser os mais
empenhados em conhecer e testar esses novos conceitos da workplace
spirituality.
Pelo que percebemos, o conceito de inteligência espiritual serve de
alicerce para a workplace spirituality. Os seus atributos iniciais,
autoconhecimento, valores e missão impulsionam a transformação de
comportamentos e atitudes. São essas dimensões que o indivíduo carrega para
dentro da empresa. A seu tempo, a organização dissemina através dos líderes
práticas e valores que influenciam e são influenciados pelos colaboradores, e
que totalizam sua cultura organizacional.
Segundo Francesc Torralba, especificamente esses executivos/líderes
também são consumidores, vivem no mesmo mundo tecnológico que nós e
sofrem as mesmas influências culturais que seus clientes estudados; clientes
estes que, segundo pesquisas feitas por Sisodia (2008) nos Estados Unidos,
estão mais interessados em experiências que lhes permitam ter satisfação em

89
suas vidas do que adquirir “coisas” (comprar, gastar, endividar-se, pagar,
acumular).
Tais comportamentos é que despertam nosso interesse, a partir do olhar
para o indivíduo e para sua unidade familiar até para dentro das empresas, no
ambiente de trabalho, em que as exigências de um bom comportamento, qual
seja, seguir as regras, estão cada vez mais atreladas à expectativa de um
resultado produtivo positivo, ou seja, lucrativo.

III.2.1. Liderança espiritual inteligente na "workplace spirituality"

Tentaremos esclarecer as possíveis convergências e divergências nos


aspectos que encontramos sobre a aplicação desse conceito, bem como seu uso
em outras fontes da literatura que serviram de base para este comparativo.
Também apresentaremos uma tendência chamada de Era da
Transcendência pelos professores de ciências humanas Andrew Delbanco
(2008) e Philip Kotler (2012), da qual são exemplos empresas que se
comprometeram com a aplicação do conceito de inteligência espiritual e do
capital espiritual da liderança na perspectiva da workplace spirituality.
Partiremos novamente, para facilitar a linha de raciocínio, da premissa de
que a inteligência espiritual é inerente ao ser humano, e, sendo as empresas
compostas de pessoas, o mundo empresarial não é espiritualmente neutro, da
mesma forma que a evolução do QS é um processo individual.
Autores como Vasconcelos (2008) e Cavanagh (1999) sugerem uma
continuidade à orientação espiritual organizacional por parte dos líderes e do RH.
Existem polarizações entre as empresas, ou seja, as que disseminam uma
cultura mais espiritualista e as que não o fazem. A tabela a seguir exemplifica as
principais dimensões de uma empresa propensa a cultivar a espiritualidade:
individual (1) e workplace spirituality (2):

90
Observar X
(satisfação)
Mudanças interiores: Reta final: ser mais
conduta e rumo da Indagar X (impulso) solidário, mais
missão de vida Agradecer altruísta
(transcender)

Figura 2: Definição do processo de dimensão individual

Organização:
Colaborador: Objetivo final:
Cidadania compartilhamento de
Significado do corporativa e riqueza e
trabalho responsabilidade conhecimento e bem-
Vida integrada social estar coletivo

Figura 3: Definição do processo de dimensão da empresa

O fundamento do capital espiritual visa servir como instrumento de


reflexão e fonte do processo que desencadeia nos indivíduos e na empresa o
poder de despertar o espírito progressista.
O líder, dentro desse contexto, é alguém capaz de despertar essa busca
por indagações, acompanhar o processo evolutivo respeitando a individualidade,

91
compreender as aspirações do outro e fornecer na medida certa os recursos
materiais e espirituais para as pessoas a seu redor realizarem suas funções.
O capital espiritual, que inclui o capital moral, serve para apontar os
caminhos que conduzem a uma liderança espiritual. Liderança esta que deve
estar de acordo com a missão, visão e valores da empresa, isto é, por que aquela
empresa existe, no que ela acredita e qual sua responsabilidade corporativa.
Philip Kotler cita precisamente:

Vemos uma empresa não apenas como um operador isolado em um mundo competitivo,
mas como uma instituição que opera com uma rede leal de parceiros – empregados,
distribuidores, revendedores e fornecedores. Se a empresa escolher com cuidado sua
rede de parceiros, se seus objetivos estiverem alinhados e as recompensas forem
equitativas e motivadoras, a empresa e seus parceiros, juntos, vãos se tornar um
competidor de peso. Para que isso ocorra, a empresa precisa compartilhar sua missão,
sua visão e seus valores com os membros da equipe, para que eles ajam em uníssono
com o objetivo de alcançar suas metas.

Hoje, estamos testemunhando o surgimento do Marketing 3.0, ou a era voltada para os


valores. Em vez de tratar as pessoas simplesmente como consumidoras, os profissionais
as tratam como seres humanos plenos: com mente, coração e espírito […]. Buscam não
apenas satisfação funcional e emocional, mas também satisfação espiritual, nos
produtos e serviços que escolhem (2012, p. 148).

As empresas que adotam esse modelo de gestão conseguem incentivar


e interferir nas decisões dos líderes, ao oferecer uma contribuição maior em
termos de missões, visões e valores para apresentar ao mundo. Seu objetivo é
também oferecer soluções para os problemas da sociedade.
Esse modelo de liderança inspirada no QS leva à concretização das metas
à arena das aspirações, valores e espírito humano, ao entender que os
consumidores são seres humanos completos, cujas outras necessidades e
esperanças jamais devem ser negligenciadas.

III.2.2. A "workplace spirituality" dentro do conceito de inteligência


espiritual – críticas e controvérsias

A maioria dos estudos que pesquisamos tem-se limitado a mostrar


resultados positivos e, geralmente, considera o fenômeno da workplace
spirituality como uma evolução positiva, sendo reconhecido amplamente como

92
“ganho-ganho-ganho”: bom para o trabalhador, bom para os colegas de trabalho
e bom para a organização (LIPS-WIERSMA et al., 2009). Reforçam a ideia de
que a workplace spirituality é uma revolucionária mudança de paradigma numa
direção nunca antes cogitada.
Isso corrobora a argumentação de que essa não é uma questão fácil de
lidar, ao contrário, é um assunto difícil, pois envolve um olhar cuidadoso, delicado
e fundamental para o Eu interior, o autoconhecimento da inteligência espiritual,
tão reforçada por Zohar (2012), através de um exercício permanente de reflexão-
ação e mudança de pensamentos e atitudes. Nesse contexto, então, a workplace
spirituality se tornaria uma ferramenta para esse autodesenvolvimento.
Entre os artigos publicados no Brasil, a maioria dos autores concorda com
essa linha de raciocínio, como, por exemplo, Souto e Rego (2006). Segundo
Kotler:

uma das principais características das sociedades avançadas e criativas é o fato de as


pessoas acreditarem na autorrealização, além de suas necessidades primárias de
sobrevivência […]. Como seres humanos complexos, acreditam no espírito humano e
estão atentos a seus desejos mais profundos (2012, p. 20).

A consideração que propomos apresentar segundo a nova interpretação


da clássica pirâmide de Maslow, que mostra a hierarquia de necessidades, é de
que deveria ser invertida. Maslow mostrou que existem níveis de necessidades
a serem supridas e que vão desde as de sobrevivência (necessidades básicas)
até as de segurança, sociais, de autoestima (ego) e de autorrealização
(significado).
Kotler afirma:

A pirâmide invertida poderia colocar a autorrealização como necessidade primária de


todos os seres humanos. As pessoas criativas de fato acreditam piamente na pirâmide
invertida de Maslow. A definição de espiritualidade como a valorização dos aspectos não
materiais da vida e as sugestões de uma realidade duradoura realmente encontram
relevância na sociedade criativa. Cientistas e artistas muitas vezes abrem mão do
conforto material em busca de autorrealização. Buscam algo que está além do que o
dinheiro pode comprar. Buscam significado, felicidade e realização espiritual […]. Na
mente do artista, espiritualidade e criatividade são semelhantes. Criatividade estimula
espiritualidade. A necessidade espiritual é o maior motivador da humanidade, que libera
a mais profunda criatividade humana (2012, p. 20).

93
O resultado que se apresenta dessa crescente tendência da sociedade é
que os indivíduos estão não apenas buscando produtos e serviços que
satisfaçam suas necessidades, mas também experiências e modelos de
negócios que toquem seu lado espiritual. Nesse sentido, no conceito de
inteligência espiritual o papel dos líderes é inspirar pelo caráter sincero, em
contrapartida ao carisma manipulador e interesseiro.
Estar atento para essa tendência de mercado é um passo que os gestores
e líderes, ou todos que ocupam cargos influentes, devem dar para que todos os
funcionários os levem a sério. Analisar as metas de longo prazo e a utilização
pessoal do cultivo da inteligência espiritual e seu desenvolvimento
provavelmente é uma forma eficaz de dirigirem suas equipes e otimizarem
recursos para o aumento da lucratividade, o que vem ao encontro da proposta
da workplace spirituality.
Os empregados – liderados - e líderes são, na realidade, os consumidores
mais próximos das práticas das empresas, as quais precisam fortalecer a
confiança em sua missão, visão e valores, para que ressoem no espírito humano
de seus empregados. Com autenticidade, devem realmente praticar esses
conceitos a ponto de se tornarem admiradas pelas concorrentes como aquelas
que fazem a diferença pessoal na vida das pessoas.
A alta direção da empresa deve estar ciente de que as mudanças são
necessárias e devem ser profundas:

Primeiro, a empresa precisa examinar as políticas corporativas atuais que podem


enfraquecer os valores corporativos […]. Modificá-las exige ação por parte de líderes da
empresa e colaboração dos empregados […]. Segundo, uma empresa deve criar um
mecanismo que associe diretamente ações e valores. Os valores da empresa mudaram
sua vida. Agora, é a vez para transformar os outros. Trata-se de criar uma plataforma a
partir da qual os empregados possam fazer a diferença (KOTLER, 2012, p. 91).

Desenvolver uma cultura corporativa com a contribuição da inteligência


espiritual significa alinhar os valores em que as empresas se embasam com o
comportamento dos empregados. E quem conduz essa costura é o líder, que
contemporiza, inspira, motiva, pensa e age diferente do convencional, sem
julgamentos nem autoritarismos.
O foco dessa estratégia empresarial é levar os empregados a querer
transmitir a missão da empresa a outros indivíduos, pois a existência desses
94
valores culturais inspira-os a realizar mudanças na própria vida e na vida dos
outros. Esse processo redefine para uma mudança de perspectiva: centralizar
nas necessidades dos outros e valores de todos, em vez de nos próprios erros
e dos outros. Tal atitude colabora para que não haja queixas, lamúrias ou
reclamações.
Portanto, favorecer o clima organizacional com soluções centradas no
conceito de aplicação da inteligência espiritual do ser humano é essencial para
buscar respostas centradas no outro, com o objetivo de atingir seu espírito, em
vez de simplesmente criticá-lo.

III.2.3. Imagem de empresas bem-sucedidas que enfatizam a "workplace


spirituality" no conceito de inteligência espiritual

Apesar de o lucro e a lucratividade serem cruciais, eles não deveriam ser


a finalidade da empresa, mas o fator limitante da atividade empresarial: é o teste
de validade. Se, em vez de homens de negócios, os diretores de empresas
fossem anjos, se preocupariam com a lucratividade mesmo não tendo nenhum
interesse pessoal em gerar lucro. A finalidade da organização deveria ser criar
um consumidor e administrar os impactos e responsabilidades sociais da
empresa, já que nenhuma de nossas instituições existe por si só nem é um fim
em si mesmo, mas atua em função da sociedade.
Assim como reitera Drucker (2002, p. 114), a organização deve prover
bens e serviços ao consumidor, mais do que gerar lucro aos acionistas ou
fornecer emprego aos trabalhadores. Essa definição, na visão da inteligência
espiritual, não se contradiz ao mostrar que o segredo das empresas mais
admiradas é uma boa gestão empresarial. Para tal, é preciso ir ao encontro de
uma abordagem mais abrangente, em que as empresas de todo e qualquer
tamanho e segmento repensam seu modelo de gestão para um modelo centrado
no ser humano, tornando-se veículos a serviço de todos os seus stakeholders –
empregados, fornecedores, comunidades em que atuam, acionistas:

 Os empregados, quando se sentem parte da empresa, retribuem com


gratidão, melhorando a produtividade e a qualidade com que realizam
planos e ações.

95
 Os fornecedores, quando percebem que são importantes como seres
humanos e não como instituição, conseguem ter mais flexibilidade,
selecionar as melhores ofertas e conceder mais benefícios adequados a
situações específicas de negócio.
 A comunidade, quando seus interesses são postos de forma que
promovam bem-estar e respeito, sente orgulho da presença da empresa
em sua região.
 Os acionistas também sentem orgulho da empresa que investe no fator
humano, sendo mais exigentes em relação ao caráter moral das
empresas que não o fazem, pois admiram as transformações que esse
tipo de gestão promove na sociedade e, claro, na lucratividade.

Após a crise de 2009, importantes personalidades do meio empresarial


assinaram uma declaração conjunta “que reivindicava o fim do imediatismo dos
mercados financeiros e solicitava a elaboração de políticas que alimentassem a
criação de valor para os acionistas e a sociedade no longo prazo” (KOTLER,
2012, p. 116). Isso porque o capitalismo voltado para o longo prazo proporciona
significativa contribuição ao estimular os acionistas a serem mais capazes de
suportar as oscilações do mercado do que seus concorrentes.
O desafio da liderança no conceito de inteligência espiritual é como fazer
com que a empresa se torne um instrumento a serviço da sociedade e,
concomitantemente, construa riquezas para os acionistas. As que conseguiram
esse feito acreditaram que criar valores que estabelecem vínculos emocionais,
e por que não dizer espirituais, maximiza seu valor perante a sociedade,
transformando a vida das pessoas.
Portanto, o que se depreende é que há mais possibilidade de obter
sucesso onde se combinam a eficácia operacional e a dimensão espiritual, a fim
de atingir o espírito dos stakeholders e, com isso, suprir suas necessidades
tangíveis e intangíveis.
“As empresas desprovidas de alma enfrentam um futuro duvidoso […]. Os
clientes querem se apaixonar, e, se não encontram o amor, eles optam por preço
e conveniência” (SISODIA, 2008, p. 36). Em razão disso, as empresas mais
admiradas “se empenham em conquistar espaço ou ganhar participação no

96
coração do seu cliente, e ele oferecerá a você participação na carteira”
(SISODIA, 2008, p. 3).
Quando a empresa entende qual é seu papel e por que está em
determinado ramo de atividade, e se esforça pela realização de sua missão, os
retornos financeiros são resultado de suas ações.
A responsabilidade corporativa nada mais é do que colher o lucro que
resulta da valorização, pelos indivíduos, da contribuição das empresas para o
bem-estar humano.
O modelo abaixo exemplifica a matriz baseada em valores SRM
(Stakeholder Relantionship Management) no conceito de inteligência espiritual.

MENTE CORAÇÃO ESPÍRITO


MISSÃO Proporcionar Realizar Praticar
[Por quê] SATISFAÇÃO ASPIRAÇÃO COMPAIXÃO
VISÃO
[O quê] Lucratividade Retorno Sustentabilidade
VALORES
[Como] SER MELHOR DIFERENCIAR-SE FAZER A DIFERENÇA

Assim, concluímos que alguns autores consideram a possibilidade de a


workplace spirituality servir como instrumento de propagação de valores
humanos, com finalidade maior do que exclusivamente lucrativa. Contudo, o
compartilhamento ou a distribuição da riqueza gerada, assuntos cruciais e
complexos, mostraram-se escassos nos artigos analisados, não havendo
nenhum comentário ostensivo a esse respeito.
Vasconcelos (2008), contudo, menciona o compartilhamento de riqueza
em organizações espiritualizadas. Tem-se em mente que espiritualidade e
dinheiro num primeiro momento não combinam, mas ao analisar esse
pressuposto profundamente nota-se que, ao suprir as necessidades espirituais
do colaborador, espera-se que o aspecto financeiro seja minimizado pela
organização. Assim, uma organização espiritualizada deve pensar como repartir
melhor o resultado de seus negócios.

97
Conclusão

A inteligência espiritual coletiva é baixa na sociedade moderna. Vivemos


em uma cultura espiritualmente desvantajosa, caracterizada por materialismo,
utilitarismo, egocentrismo míope, falta de sentido e recusa em assumir e redefinir
compromissos. Como indivíduos, porém, podemos agir para elevar nosso QS.
Na verdade, o prosseguimento da evolução da sociedade dependerá de haver
um número suficiente de indivíduos que assim procedam.
Trata-se de criar, planejar, divulgar, comercializar e acompanhar produtos
e serviços com gentileza, atenção, qualidade, verdade, beleza e bondade, bem
como estudos sobre como esses mesmos indivíduos se comportam em uma
sociedade encharcada de consumismo, mídia e cultura de massa, que não
privilegia ou incentiva o pensamento questionador, inovador e criativo.
Assim como Robert Wright (2014) trabalha a ideia da física moderna
acerca da realidade absoluta ao comparar os elétrons com Deus, nesta tese
usamos o mesmo argumento sobre o conceito de inteligência espiritual. Mesmo
que não se entenda alguma coisa com exatidão não significa que essa coisa não
exista.
O argumento que utilizamos seguindo a linha de raciocínio de Robert
Wright (2014) é de que conceber a existência do QS faz mais sentido que não
conceber. Ou seja, é melhor reconhecer o potencial do QS mesmo sem ter a
aprovação e certificação científica.
Jung (2014) afirma que o processo de conscientização é cultural. Ao se
escolher a unilateralidade do intelecto, da direção científica, ocorre um
desenvolvimento. Contudo, em termos humanos ocorre uma desvantagem,
talvez ao custo até da perda humanidade. Essa humanidade pode atingir um
brilhantismo espiritual quando evoca dentro de cada um de seus membros os
significados e os valores profundos.
Aquele que acredita na inteligência espiritual começa a desenvolver um
padrão no mundo moral, em que a origem está no inconsciente da mente, seu
lado espiritual. Validado pela expansão da criatividade, atinge resultado de sua

98
transcendência, ou seja, o desapego de ideias fixas, que se desenvolvem
naturalmente no cérebro humano por meio de uma evolução neurobiológica e
continua com a mudança de comportamento. Wright (2014, p. 256) descreve a
significativa direção dessa evolução que faz com que os religiosos suponham
que a origem dessas respostas seja, de algum modo, mais profunda que a
própria natureza.
Assim sendo, nosso objetivo nesta dissertação foi sugerir uma reflexão
acerca do paradigma espiritual como uma forma de compreensão da adoção do
conceito de inteligência espiritual nas empresas.
Por meio das análises realizadas na pesquisa, pudemos depreender que
em ambientes empresariais mais espiritualizados, nos quais os profissionais
(tanto liderados, quanto líderes) utilizam-se dos valores espirituais citados no
presente estudo, os relacionamentos podem ser viabilizados de forma mais
consciente, demonstrando a real situação empresarial, visto que quem decide
ou não por sua utilização possui dentro de si esses valores, praticando-os
habitualmente.
Caso a empresa opte pela workplace spirituality com a formação de um
sistema de cooperação mútua entre todos os participantes da equipe
empresarial em prol de um objetivo comum maior, podemos observar tal fato por
meio dos benefícios que serão gerados para a empresa, seus colaboradores e
stakeholders, no que diz respeito aos bons hábitos adquiridos a partir da
repetição sistemática dos valores elencados anteriormente, conforme defendeu
Cavanagh (2002).
A ciência da religião estuda mais de perto esse fenômeno religioso que
ocorre onde passamos a maior parte do dia, ou seja, no trabalho. Então,
academicamente, descortina-se uma possível abordagem alternativa à
racionalidade econômica, ao consumismo exagerado.
Profissionalmente, tal paradigma contribui para a formação de uma
empresa espiritualizada com atitudes voltadas às questões de ordem espiritual,
por meio da motivação e construção de um clima organizacional adequado aos
colaboradores, não somente visando ao lucro ou aspectos econômico-
financeiros.
Por fim, sugerem-se estudos complementares a este, que demonstrem a
influência da inteligência espiritual nas empresas. Há uma variedade de

99
perspectivas e abordagens. Assim, consideramos importante um estudo
empírico em profundidade, por meio de entrevistas ou estudos experimentais
que possam evidenciar uma situação antes e depois da utilização de valores
espirituais no ambiente empresarial.

100
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