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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE GOIÁS

CAMPUS GOIÂNIA
LICENCIATURA EM MÚSICA

BRUNNA BEATRIZ SANTOS GOMES

CRIAR E TOCAR: CARACTERIZAÇÃO DE UM PROJETO SOCIAL

GOIÂNIA
2018
BRUNNA BEATRIZ SANTOS GOMES

CRIAR E TOCAR: CARACTERIZAÇÃO DE UM PROJETO SOCIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso


de Licenciatura em Música do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás – Campus
Goiânia, como requisito para a obtenção da nota final
da disciplina de TCC e do título de licenciado(a)(s)
em Música

Orientador(a):

GOIÂNIA
2018
BRUNNA BEATRIZ SANTOS GOMES

CRIAR E TOCAR: CARACTERIZAÇÃO DE UM PROJETO SOCIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


curso de Licenciatura em Música do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de
Goiás – Campus Goiânia, como requisito para a
obtenção da nota final da disciplina de TCC e do
título de licenciado(a)(s) em Música.

Orientador(a):

APROVADO EM ______/_______/__________

________________________________________________________________________
Luciene Maria Bastos ( IFG)
Orientador(a)

________________________________________________________________________
Cristiano aparecido da Costa (IFG)
Membro da banca examinadora

________________________________________________________________________
Gustavo Araújo Amui (IFG)
Membro da banca examinadora

GOIÂNIA
2018
RESUMO

O presente estudo buscou apresentar e analisar o Projeto Criar e Tocar da cidade


de Anápolis. O objetivo foi entender como o ensino de música é desenvolvido em projetos
sociais e como auxilia na inclusão social. Para isso fez-se a contextualização dos projetos
sociais que ensinam música no Brasil, apresentando a relevância para a sociedade e formas de
contribuições desse tipo de projeto que tem como foco a inserção social pela arte. Esta
pesquisa é de cunho qualitativo, de estudo bibliográfico e análise documental. Dessa forma,
para compreender o processo de inclusão social através da música em Projetos Sociais, foram
realizadas análises das Propostas Pedagógicas do Projeto. Neste estudo foi possível constatar
que o Projeto Criar e Tocar evidencia a possibilidade de experiências musicais que ampliam a
visão de mundo dos envolvidos e provoca transformações significativas na vida do indivíduo.

Palavras-chave: Ensino de música. Educação. Escolas estaduais.


ABSTRACT

The present study sought to present and analyze the CriareTocar Project of the
city of Anápolis. The goal was to understand how music teaching is developed in social
projects and how it helps in social inclusion. In order to do so, we contextualized the social
projects that teach music in Brazil, presenting the relevance to society and forms of
contributions of this type of project that focuses on social insertion through art. This research
is qualitative, of bibliographic study and documentary analysis. Thus, to understand the
process of social inclusion through music in Social Projects, analyzes of the Project's
Pedagogical Proposals were carried out. In this study it was possible to verify that the Criar
and Tocar Project evidences the possibility of musical experiences that broaden the world
view of those involved and cause significant transformations in the life of the individual.

Key-words: Social project. Music. Criar e Tocar.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 6
1 CONTEXTUALIZANDO PROJETOS SOCIAIS .................. ERRO! INDICADOR NÃO
DEFINIDO.
1.1. PROJETOS SOCIAIS QUE ENSINAM MÚSICA NO BRASIL... ERRO! INDICADOR
NÃO DEFINIDO.
1.2. MODELOS DE PROJETOS SOCIAIS NO BRASIL .................................................... 10
1.2.1 Projeto Guri ...................................................................... Erro! Indicador não definido.
1.2.2 Projeto Villa Lobinhos ..................................................... Erro! Indicador não definido.
1.2.3 NEOJIBA.......................................................................... Erro! Indicador não definido.
2 METODOLOGIA ................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
2.1 CAMINHO PERCORRIDO ............................ ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
2.2 MÉTODOS UTILIZADOS ............................. ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
2.2.1 Revisão Bibliográfica ....................................................... Erro! Indicador não definido.
2.2.2 Análise Documental.......................................................... Erro! Indicador não definido.
2.2.3 Pesquisa de campo............................................................ Erro! Indicador não definido.
3 O PROJETO CRIAR E TOCAR DA CIDADE DE ANÁPOLIS.... ERRO! INDICADOR
NÃO DEFINIDO.
3.1 CONTEXTUALIZANDO O PROJETO .......... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
3.1.1COMO NASCEU O PROJETO..................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
3.2 PROPOSTA PEDAGÓGICA .......................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
3.2.1 ESTRATÉGIAS E METODOLOGIAS DE ENSINO ........ ERRO! INDICADOR NÃO
DEFINIDO.
3.2.2 SISTEMA DE AVALIAÇÃO ...................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
3.2.3 PERFIL DO EGRESSO ............................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
REFERÊNCIAS ......................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
ANEXO A – PROPOSTA PEDAGÓGICA CRIAR E TOCAR E PONTO DE
CULTURA TOCANDO COM ARTE 2011 ...........ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
ANEXO B – PROJETO CRIAR E TOCAR ENDEREÇO DOS NÚCLEOS 2019/01
.....................................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
ANEXO C – REGULAMENTO INTERNO DO PROJETO CRIAR E TOCAR ... ERRO!
INDICADOR NÃO DEFINIDO.
ANEXO D – FICHA DE MATRÍCULA ................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
ANEXO E – FEMA, FETIVAL DE MÚSICA DE ANÁPOLIS ERRO! INDICADOR NÃO
DEFINIDO.
ANEXO F – CRIAR E TOCAR UNIEVANGELICA 2014 A 2016 ... ERRO! INDICADOR
NÃO DEFINIDO.
ANEXO G – MATRICULADOS 2019 ...................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
6

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo apresentar de que forma a aplicação do


ensino de música em projetos sociais auxilia na inclusão social, com a finalidade de analisar o
benefício do Projeto Criar e Tocar da cidade de Anápolis. Será analisada a influência do
Projeto e como funciona, fazendo um parâmetro de contextualização de projetos sociais que
ensinam música no Brasil, apresentando a relevância para a sociedade e formas de
contribuições desse tipo de projeto que tem como foco a inserção social pela arte.

O Projeto Criar e Tocar se destaca por proporcionar formação artística e


profissional aos participantes e, sobretudo, pelo seu aspecto social. De acordo com Candé
(2001), os projetos sociais que ensinam música, têm essencialmente uma natureza social e
humana que atravessam séculos. Suas práticas sociais e relações se estabelecem entre pessoas
e comunidades na qual se inserem. Estes projetos contribuem para a aprendizagem a partir da
convivência, tendo a prática artística como desenvolvimento humano.

[...] a música tem uma inserção bastante acentuada junto às pessoas, independente
de seu gênero, idade ou classe social. Este movimento está diretamente relacionado à
facilidade com que a música permeia o cotidiano das pessoas e cidades, penetrando os mais
diversos ambientes do cotidiano, com o papel de resgatar a memória, mas também de registrar
as marcas da vida sonora de diferentes culturas na história da humanidade. Se esta presença
musical é tão efetiva na vida do homem, não se pode considerá-la como um ornamento, mas
se constitui em um fato social abrangente e presente, porque através dela existe uma
comunicação afetiva, simbólica e sensível, que se estabelece mesmo que inconscientemente.
(2012, p. 93).

Em vista disso, o problema de pesquisa em que se propõe este trabalho, delimitou-


se em colher informações e dados sobre de que forma a aplicação do ensino de música em
projetos sociais auxilia a inclusão social tendo como referência o Projeto Criar e Tocar da
Cidade de Anápolis. Tudo isso levando em conta o foco desses projetos que é a inserção
social pela arte e a contribuição do Criar e Tocar para a cidade de Anápolis nos quesitos
musical e social tendo em vista: como funciona, comunidade que este Projeto Social atende
dificuldades, mudanças na percepção de mundo dos alunos e a importância do projeto.
7

Autores como Penna (2014), Kleber (2006), Hikiji (2006), Cruvinel (2005),
ressaltam a importância de projetos sociais que ensinam música. Projetos esses associados a
ONGs, ações governamentais ou não. Em suas pesquisas estes autores contextualizam e
evidenciam a importância desses projetos a partir de conceitos sócias que influenciam na
educação musical atual.Neste contexto autores como (SOUZA, 2000; 2008; PENNA, 1990;
2008), apontam a importância de se partir da cultura de cada um que se musicaliza, ou seja, a
vivência do aluno como ponto de partida para o processo de ensino e aprendizagem musical.
Hikiji (2006) explica que na participação em Projetos Sociais que ensinam música, esses
jovens se encontram longe do risco social, pois estão produzindo arte e se expressando, ou
seja, estruturando-se simbolicamente.
Esta pesquisa se justifica através da inclusão social a partir do ensino de música
em Projetos Sociais, em contribuição para o seu público alvo. No momento em que
visivelmente a sociedade brasileira sofre cada vez mais com a violência, o presente trabalho
propõe-se a descrever o impacto que os Projetos Sociais que ensinam música podem causar
para mudar esta realidade. Nesta pesquisa o Projeto Criar e Tocar da cidade de Anápolis foi o
objeto de estudo, e um dos principais motivos para a elaboração deste Programa Social foi a
situação de risco dos jovens da cidade, pois o projeto atende crianças e adolescentes das
periferias, de baixa renda e que estão em constante situação de risco. Um dos vários motivos
para se criar iniciativas de programas sociais é a crescente violência em suas diversas facetas,
assim como o uso de drogas.
Os projetos sociais que ensinam música são exemplos de educação intencional
não-formal. Segundo Almeida (2005), a educação intencional não-formal é um tipo de
educação em que existe a intenção de desenvolver uma atividade pedagógica, mas de forma
menos sistemática e o interesse de aprendizagem pertence propriamente aos alunos.
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1 CONTEXTUALIZANDO PROJETOS SOCIAIS

Neste primeiro capítulo serão contextualizados os Projetos Sociais que ensinam


música. Buscou-se entender o que são, como funcionam e o porquê desses projetos a fim de
introduzir e iniciar a compreensão deste trabalho de pesquisa.
Segundo Cohen e Franco (1993) os projetos sociais são como uma ponte entre
desejo e realidade que nascem com o intuito de possibilitar mudanças, suprindo uma certa
carência ou alterando uma situação-problema. Sendo assim, os projetos sociais são iniciativas
individuais ou coletivas que visam contribuir com a melhoria da qualidade de vida das
pessoas que vivem em uma certa comunidade, transformando suas realidades.

1.1 PROJETOS SOCIAIS QUE ENSINAM MÚSICA NO BRASIL

Cruvinel (2005, p.17), aponta que programas sociais que trabalham o ensino
coletivo e gratuito de música podem promover a transformação, do ponto de vista individual e
coletivo.
No Brasil, os projetos sociais juntamente com as Associações não governamentais
(ONGs) contribuem de forma efetiva para o ensino de música e inclusão social em
comunidades carentes, e vêm se disseminando como uma oportunidade para que os jovens
possam ascender socialmente e sair da linha de pobreza na qual são limitados quando se
discute auto desenvolvimento e progressão material. Muitos desses projetos no Brasil e no
mundo têm como base o El Sistema, que é um modelo didático musical que foi idealizado e
criado na Venezuela em 1975 como programa de estado pelo maestro e economista José
Antônio Abreu. Este projeto consiste em um sistema de educação musical pública que tem
como o objetivo levar a música clássica às comunidades carentes dando oportunidades a
jovens confinados a pobreza.
A música clássica em projetos sociais vem mudando o destino de vários jovens
carentes pelo Brasil, projetos como NEOJIBA1 na Bahia, Projeto Guri em São Paulo e Projeto
Villa Lobinhos na cidade do Rio de janeiro, são alguns exemplos que se destacam
possibilitando o contato com uma nova perspectiva de vida e possibilidade de mobilização
social,além das experiências oferecidas por esses Projetos.
Kleber (2006) debate sobre as possíveis abordagens da educação musical em
Projetos Sociais ressaltando a importância de não negar a bagagem cultural trazida pelo
1
NEOJIBA, Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia.
9

aluno.Mais do que isso, o autor afirma que deve-se valorizar e inserir essa bagagem no
processo de ensino aprendizagem.É válido destacar que nestes projetos, a maioria dos relatos
são de melhorias no aprendizado escolar e mudanças positivas na forma de pensar e
agir.Santos (2004) também reflete sobre a valorização atual do ensino de música em projetos
sociais em detrimento do ensino de música nas escolas. Mostra que um pode complementar o
outro, e destaca a importância de uma reflexão constante por parte dos educadores musicais
que trabalham em Projetos Sociais acerca da questão de como a música pode contribuir para
uma melhor qualidade de vida das pessoas. Segundo Del Ben e Hetschke:

A música pode contribuir para a formação global do aluno, desenvolvendo a


capacidade de se expressar através de uma linguagem não-verbal e os
sentimentos e emoções, a sensibilidade, o intelecto, o corpo e a
personalidade [...] a música se presta para favorecer uma série de áreas da
criança. Essas áreas incluem a “sensibilidade”, a “motricidade”, o
“raciocínio”, além da “transmissão e do resgate de uma série de elementos
da cultura”. (Del Ben; Hetschke, 2002, p. 52-53).

Muitos alunos chegam nestes núcleos com problemas emocionais, familiares e


comportamentais e encontram na música uma forma de alívio para estas tensões.Tourinho
(1993a, p. 69) afirma que,

Além do “conteúdo” afetivo sensivelmente aprendido em experiências com


música, o ouvir e/ou produzir música em grupo pode provocar uma forma
especial de prazer que tanto serve para integrar os participantes como para
marcá-los em suas especificidades de idade, função e mesmo gênero.

No contexto de projetos sociais que ensinam música, a motivação dos alunos é


algo bastante relevante, como dito anteriormente, esses projetos são oferecidos geralmente a
comunidades carentes, Santos (2006) afirma que:

Um dos grandes desafios da educação musical contemporânea tem sido


contemplar a diversidade sociocultural existente, bem como encontrar meios
de aproximar significativamente a música dessas realidades, considerando
assim contextos, espaços e metodologias que transcendem os universos
formais das instituições (2006, p.108).

De certa forma a música orquestral para essas pessoas não é algo do cotidiano. Os
pais geralmente não consomem este tipo de música e consequentemente os filhos não estão
habituados, criando uma certa barreira. Os projetos sociais vêm com o intuito de quebrar estes
paradigmas e oportunizar experiências e educação musical a estas comunidades.
Segundo Arroyo (2002), a educação musical do século XX era direcionada a
academia e a música orquestral por muito tempo foi elitizada. Para se estudar música era
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preciso ir até uma escola específica, fazer aulas particulares ou até mesmo estudar em
conservatórios. Ao longo do tempo, ocorreram mudanças nas ciências sociais que
influenciaram na área da música e principalmente na pedagogia musical. Segundo a autora, a
reflexão sobre as sociedades levou a uma descentralização do pensamento eurocêntrico,
possibilitando assim, a área da música ser direcionada por esses novos pensamentos.
Um questionamento bastante apontado sobre estes projetos é o seguinte: por que
ensinar música clássica para crianças e jovens de baixa renda? Por que não ensinar música
popular? Ou ensinar instrumentos populares?
O fato é, quando estas crianças e jovens em desvantagem social entram em uma nova
perspectiva de vida, é possível perceber aumento na confiança e autoestima a partir do
momento em que se sentem valorizados. A responsabilidade de tocar em um grupo, de um
precisar do outro passa a ser um fator essencial para a interação em grupo. Muitos jovens
chegam nesses projetos se sentindo incapazes, e pelo fato de estarem aprendendo um
instrumento, desenvolvendo uma nova perspectiva evivenciando uma variedade antes
desconhecida, é possível ter perspectivas em relação a mudança da realidade daquele
indivíduo.

1.2. MODELOS DE PROJETOS SOCIAIS NO BRASIL

1.2.1 Projeto Guri

Hoje, os projetos sociais possuem uma abordagem sociocultural menos rígida e


mais humanizada, com pedagogias voltadas para a vivência do indivíduo, atendendo suas
singularidades. Procura adaptar-se a cada realidade apresentada, além de uma transformação e
integração cultural e social dos participantes.
O Projeto Guri que ensina música por meio de orquestras didáticas e corais para o
público prioritariamente de baixa renda, se situa no estado de São Paulo. Teve seu início na
década de 90e é considerado o maior programa sociocultural brasileiro.É uma iniciativa da
Secretaria de Estado e Cultura.(PROJETO GURI, 2019).
Em seu início no ano de 1995 o projeto contava apenas com um polo e 180
alunos. De acordo com Hikiji (2006), o projeto se expandiu e, até o ano de 2006 contava com
202 polos, atendendo cerca de 25 mil crianças e adolescentes, incluindo internados e
desinternados da FEBEM. O projeto se destacou ao longo do tempo recebendo vários prêmios
de fomento a cultura, como em 2000, quando foi escolhido para representar o Brasil na Suíça
11

no Encontro Internacional da Rede Global de Educação para a paz e em Nova York, na


Assembléia geral das Nações Unidas em favor da infância. Outro destaque deste projeto são
as apresentações orquestrais, corais, cameratas e etc., que ao se apresentarem juntamente com
grandes nomes da música popular brasileira deram a possibilidade de maior visibilidade ao
projeto.
Segundo Hikiji (2006), os alunos do projeto fazem geralmente duas aulas por
semana, as aulas são coletivas com cerca de dois ou vinte alunos, sendo de coral ou
instrumento, com duração em média de uma a duas horas. A teoria musical é introduzida
durante o aprendizado do instrumento ou com o maestro do polo que fica por conta dos
ensaios da orquestra após cada aula. A proposta geral do Guri é que cada polo possua uma
orquestra e um maestro, os alunos entram no projeto em contato imediato com o instrumento,
e logo lhes são apresentados os repertórios eruditos e popular com arranjos simples fazendo
parte da didática aplicada. A autora também afirma que a proposta apresentada pelo Guri é
que, com pouco tempo no projeto o aluno possa participar da orquestra, sendo assim uma das
estratégias de pedagogia musical e intervenção social.
Em seu livro A Música e o Risco: etnografia da performance de crianças e jovens
participantes de um projeto social de ensino musical, Hikiji (2006) faz entrevistas com
coordenadores e alunos do Projeto Guri, sobre o que representa e a sua relevância para os
alunos. É possível observar nessas entrevistas que há uma diferença na visão dos alunos e dos
gestores. Para a maioria dos alunos, a música ensinada no projeto não é um passatempo, mas
uma forma de mudar de vida, como por exemplo, seguir profissionalmente na carreira
musical.Por muitas vezes a frase “tocar em algum lugar” é citada nas entrevistas. Já para os
gestores o foco principal do projeto não é a formação de músicos, mas sim a formação de
cidadãos mais instruídos,a música nesse caso seria como o meio para esta transformação.
Um dos Polos mais importantes no quesito socioeducativo do Projeto Guri é o da
Fundação CASA (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente) a antiga FEBEM
(Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor). O projeto atende internos, que veem na música
uma forma de saída e reestruturação fora do mundo do crime. Muitos internos reconhecem a
prática musical como uma alavanca de mudança de condição e como fornecedora de
perspectivas, independentemente de suas condições. Hikiji (2003) aponta que apesar do
preconceito da sociedade em relação aos internos, quando os alunos pegam seus instrumentos
deixam de ser “os meninos” da FEBEM e se tornam outras pessoas, deixam o olhar
cabisbaixo, a timidez e se soltam com os instrumentos.
12

De acordo com os idealizadores e gestores não só do Guri, para se aprender


música erudita, é preciso entender e associar uma série de fatores como disciplina,
concentração e interação. A partir do momento em que o aluno ingressa na orquestra do
Projeto e começa a aprender um instrumento erudito é preciso ter disciplina e uma prática
diária, precisam interagir em grupo, ouvir e entender o que acontece a sua volta.

1.2.2 Projeto Villa Lobinhos

O Projeto Villa Lobinhos,que foi institucionalizado em 2000, ligado à organização


não governamental Viva Rio, no Rio de Janeiro, também é um exemplo de projeto social que
ensina música. Segundo Kleber (2006), o Projeto Villa Lobinhos (PVL) é financiado por
pessoas físicas que investem em projetos culturais e educacionais e tem como objetivo central
promover a educação musical para jovens entre 12 e 20 anos, oriundos de comunidades
pobres da região metropolitana do Rio de Janeiro. Os jovens participam de aulas de percepção
musical, prática instrumental, prática de conjunto e informática durante um período de três
anos. Os alunos recebem, ainda, apoio pedagógico para as aulas da escola de ensino regular.
Nesses projetos crianças e adolescentes têm perspectivas que talvez não teriam em seus lares,
como uma rotina adequada de estudos e a possibilidade de seguir uma carreira profissional de
músico.
A orquestra do Projeto Villa Lobinhos é formada por alunos de vários projetos
sociais da região metropolitana do Rio de Janeiro e por ex-alunos que uma vez por semana se
reúnem e fazem parte da orquestra. Os alunos recebem formação mais aprofundada em
música dentro do próprio projeto e atuam não só nesse ambiente, mas em outros contextos
como músicos ou professores. Kleber (2006), falando sobre o Projeto Villa Lobinhos, afirma
que embora a proposta pedagógico-musical do projeto reforce a formação com aulas
individuais dos instrumentistas, há uma junção com aulas que reúnem mais alunos no mesmo
espaço e tempo.Segundo a pesquisadora, “um dos eixos condutores na concepção do processo
de ensino e aprendizagem musical é a experiência musical na sua concretude, mediante o
fazer musical coletivo” (2006, p.109).
Kleber (2006) afirma também que o corpo docente é completamente móvel e que
muda basicamente todo ano, pois depende da escolha de instrumentos que os alunos fazem.
Além da orquestra, grupos espontâneos são formados pelos alunos, como o Grupo de Choro
“Isto é Brasil”. Os coordenadores do projeto veem esta prática como momento de
13

aprendizagem em que os alunos escolhem seu repertório, improvisam e tocam em diferentes


conceitos.
De acordo com Kleber (2006), a partir do momento em que o aluno entra no
Projeto, tudo o que acontece com eles, os coordenadores e professores passam a acompanhar.
Isso mostra o vínculo que é criado ao longo dos anos, desde a entrada no projeto até a saída.
Como diz a autora não se trata só de ensinar e aprender música, mas sim a influência mútua
em todos os aspectos na vida do aluno. O envolvimento de todos colaboram para a formação
da identidade do Projeto.

1.2.3 NEOJIBA

Como citado anteriormente, outro projeto que se destaca através do ensino de


música no sentido sociocultural, é o NEOJIBA, Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e
Infantis da Bahia. É um exemplo inovador de política pública que alia, de forma pioneira na
Bahia, as áreas da Cultura, da Educação e do Desenvolvimento Social. O programa foi criado
em 2007 pelo pianista, educador, regente e gestor cultural Ricardo Castro e está vinculado à
Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social do Governo do Estado da
Bahia. A gestão da iniciativa é realizada pelo Instituto de Ação Social pela Música (IASPM),
fundado em 2008 para promover, incentivar e apoiar o desenvolvimento e a interação social
pela prática musical coletiva. (NEOJIBA, 2019).
O projeto NEOJIBA tem como principal objetivo a integração social através da
excelência musical, com foco principal nas práticas de orquestra e de coral (NEOJIBA, 2012).
Segundo Nóbrega e Boal-Palheiros (2015), o projeto conta com aproximadamente 4.600
integrantes em todo o Estado, com idades entre 6 e 29 anos, e uma grande parte recebe bolsa-
auxílio. As aulas de música no Projeto acontecem depois das aulas regulares, e variam em
torno de dezesseis horas semanais, dependendo do núcleo.As autoras afirmam que de acordo
com dados levantados, o NEOJIBA realizou e tem realizado turnês na Europa, Estados
Unidos, fazendo grandes concertos em importantes salas e com participação de renomados
solistas da música erudita, como, Lang Lang 2, Maxim Vengerov3, entre outros grandes
nomes.
Em seu trabalho, Nóbrega e Boal-Palheiros (2015), destacam o intercâmbio que
acontece entre o Projeto Venezuelano El Sistema e o NEOJIBA.Pelo fato de o projeto
brasileiro ter sido inspirado pelo modelo venezuelano,muitos músicos do El sistema vem para

2
Famoso pianista chinês conhecido mundialmente.
3
Violinista Russo.
14

o Brasil e vice-versa para trocas de experiências musicais, participam de festivais, oficinas e


etc. A presença desses músicos é de fundamental importância para a transmissão de
experiências vivenciadas, assim como a motivação que trazem aos alunos.
Nas pesquisas de Nóbrega e Boal-Palheiros (2015), a proposta de repertório do
projeto é de música erudita, mas, no começo da iniciativa os idealizadores não achavam que
seria uma boa ideia, pelo fato da música erudita ainda não ser um paradigma para a sociedade
baiana e ainda ser tratada como cultura de elite. Após o início do Projeto, não foi observado
nenhum tipo de resistência dos participantes relacionado a esse fator, e hoje, o repertório
predominante no projeto é o erudito, mas há uma flexibilidade com a música brasileira.
Contudo, são utilizados repertórios que motivem os alunos e que sejam atrativos ao público.
Nóbrega e Boal-Palheiros (2015), comentam ainda sobre o ensino adotado no
projeto que são voltados para ensaios de naipe e de orquestra. A autora ainda diz que as aulas
e os ensaios dependem basicamente do repertório da orquestra.São aplicados os métodos
como Suzuki e Willems e métodos voltados para o ensino de coradas, de variados autores. De
acordo com as autoras:

Através da prática orquestral, procura-se atingir o empoderamento dos


participantes, nos âmbitos pessoal e social. Há também uma preocupação
comum para que o ambiente promova motivação durante a aprendizagem e o
ensino esteja voltado à formação integral do indivíduo, conectada com o seu
meio sociocultural. (NOBREGA; BOAL-PALHEIROS, 2015, p. 8-9).

De acordo com Hikiji (2006), em projetos como Guri, Villa Lobinhos, NEOJIBA
e tantos outros, é necessário entender que a música se configura como elemento de
intervenção social. Nem sempre quando o termo “carente” é utilizado, significa que está
sendo analisado apenas o fator financeiro do indivíduo, e sim, todos os aspectos que
compõem o conjunto de necessidades básicas para o desenvolvimento da criança e/ou
adolescente, sendo eles financeiros ou emocionais. Os projetos sociais, servem de pontes para
aproximar os alunos carentes da música, e também para ajuda-los a enfrentar suas duras
realidades, que por muitas vezes são prejudiciais, pois estas crianças podem estar expostas a
problemas sociais tais como drogas, violência e trabalho infantil. Sendo assim, nos projetos
sociais que ensinam música, o aluno tem a oportunidade de aprender e também ter acesso a
ferramentas e atividades que os auxiliam no exercício da cidadania.Segundo Penna:

[…] os projetos educativos extra-escolares, com finalidade social, têm


mostrado a validade, no ensino das artes, das funções contextualistas – tais
como o desenvolvimento da autoestima, da autonomia, da capacidade de
simbolizar, analisar, avaliar e fazer julgamentos, além de um pensamento
15

mais flexível […] Muitas vezes, tais projetos articulam essas funções
contextualistas, voltadas para a formação global dos alunos, com o domínio
do fazer artístico, inclusive como alternativa de profissionalização. (Penna,
2006, p. 37).

É possível observar de acordo com a autora que o ensino de música em projetos


sociais tem se conectado com os novos conceitos do ensino e da aprendizagem desenvolvidos
pela educação musical contemporânea, que estão ligados as diferentes dimensões do
aprendizado musical dentro de uma realidade social. Nessa perspectiva, o enfoque é voltado
tanto para a necessidade de uma educação musical adequada aos valores particulares de um
contexto cultural, como para possibilidade de uma proposta educacional de ensino de música
que abrange diferentes universos musicais.
Projetos tais como os que foram focalizados aqui se justificam, por um lado, pela
oportunidade oferecida a estudantes de certa comunidade para realizar um conjunto de
atividades para as quais Grubisic (2012, p. 60) afirma: “esses projetos sociais trabalham
basicamente a inserção social pela música através de práticas em grupos musicais de
orquestra”.O autor argumenta ainda que tais projetos vêm se tornando cada vez mais
importantes na sociedade e para a sociedade, pela capacidade de envolverem um número
significativo de alunos e por atingir uma boa repercussão pública e também a mídia.
Autores importantes da educação musical brasileira defendem este tipo de
iniciativa. Como citado anteriormente,pelo fato de promover mudanças significativas na vida
das pessoas.Independentemente destes projetos sociais aqui citados serem mantidos por
ONG’s, políticas governamentais e outros, todos tem em comum o foco voltado para a
inserção social através da música, prática em conjunto e utiliza de instrumentos clássicos
neste processo. E segundo Arroyo (2002), Penna, (2003); Swanwick, (2003), a educação
musical como área de conhecimento tem discutido a necessidade de transformar suas práticas
pedagógico-musical para atender às transformações culturais do mundo contemporâneo,
globalizado e multicultural.
16

2 METODOLOGIA

Neste capítulo será abordada a metodologia da pesquisa. Optou-se por uma


pesquisa qualitativa, de estudo bibliográfico e análise documental. Dessa forma, para
compreender o processo de inclusão social através da música em Projetos Sociais, realizou-se,
análise das Propostas Pedagógicas do Projeto Criar e Tocar da cidade de Anápolis.

2.1 CAMINHO PERCORRIDO

Metodologicamente, esta pesquisa é de natureza qualitativa, pois ela busca


analisar a relevância do Projeto para a sociedade, apresentando a inclusão social através da
arte e baseia-se em uma revisão bibliográfica. O procedimento é o estudo que compreende a
observação de fatos e fenômenos, a coleta de dados referentes aos fatos e, finalmente, a
análise e interpretação desses dados, com base numa fundamentação teórica consistente,
objetivando compreender e explicar o problema pesquisado.
Detectou-se também a necessidade da pesquisa bibliográfica a partir do momento
em que se fez uso de materiais já elaborados: livros, artigos científicos, revistas, documentos
eletrônicos e enciclopédias na busca e alocação de conhecimento sobre o ensino de música em
projetos sociais como forma de inclusão social, correlacionando tal conhecimento com
abordagens já trabalhadas por outros autores. Também foi entendido como um procedimento
importante o estudo de caso como procedimento técnico. Tem-se como base para o resultado
da pesquisa um caso em específico que poderá ser expandido futuramente.
A revisão bibliográfica deste trabalho tem como foco principal listar os principais
conceitos e estudos sobre o tema, reunindo textos que exploram o tema/problema de pesquisa
que é a inclusão social através do ensino de música em projetos sociais de forma ampla. De
acordo com Marconi e Lakatos (2002), a pesquisa bibliográfica, abrange toda a bibliografia
tornada pública em relação ao tema de estudo, o principal foco é que o pesquisador esteja em
contato com todo o material disponível sobre o assunto.
A pesquisa qualitativa, realizada nesse estudo, é usada na forma de estudo de
caso, pois permite conhecer a realidade particular em profundidade. De acordo com Penna
(2015, p.36), esse tipo de estudo é bastante indicado para se conhecer em profundidade uma
realidade específica, uma unidade bem delimitada, seja a prática pedagógica de uma
professora, uma turma, uma escola ou como neste trabalho um projeto social. Conhecer a
17

fundo uma realidade pode dar base a discussões teóricas relevantes, que auxiliam na
compreensão das realidades mais amplas.
Sobre a análise documental nesta pesquisa, foi proposto trazer algumas discussões
pautadas em pesquisa bibliográfica e exploratória que envolvem a análise documental
associada a esta pesquisa. Gil (1999) afirma que, a análise documental consiste em uma série
de operações que buscam estudar documentos no intuito de procurar compreender contextos
sociais e econômicos. A análise documental tem sua relevância, uma vez que através dela o
pesquisador pode coletar, tratar e analisar suas fontes informacionais. Para a elaboração de
uma pesquisa no campo social, é necessário que o pesquisador esteja ciente da quantidade e
diversidade de informações existentes hoje.
Segundo Penna (2015), as fontes documentais são indispensáveis aos estudos de
caráter histórico sobre a educação. Podem constituir a principal fonte de dados em uma
pesquisa documental, ou podem, em um estudo de caso, ser articulada a dados obtidos através
de observação e/ou entrevista, com vista a um maior aprofundamento e a uma maior
compreensão do fenômeno pesquisado. Outra justificativa para o uso de documentos em
pesquisa é que ele permite acrescentar a dimensão do tempo à compreensão do social. A
análise documental favorece a observação do processo de maturação ou de evolução de
indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos, comportamentos, mentalidades, práticas, entre
outros. (CELLARD, 2008).

2.2 METODOS UTILIZADOS

2.2.1 Revisão Bibliográfica

Inicialmente houve um levantamento bibliográfico sobre a temática de Projetos


Sociais e Projetos Sociais que ensinam música que pudessem contribuir e introduzir a
pesquisa. A pesquisa bibliográfica foi o método mais importante para a contextualização do tema
pesquisado e é possível ressaltar a necessidade deste tipo de pesquisa, isso porque foram usados
materiais já publicados, constituído principalmente de livros, artigos e teses, de autores como
Kleber (2006), Hikiji (2006), Nóbrega e Boal-Palheiros (2015), Arroyo (2002), Penna (2006,
2003) entre outros.
Depois, desta mesma forma, houve a contextualização de projetos sociais que
ensinam música no Brasil. Foram escolhidos três projetos localizados em diferentes regiões
brasileiras, Projeto Guri que se localiza no estado de São Paulo, Projeto Villa Lobinhos na
18

região metropolitana do Rio de janeiro e o NEOJIBA na Bahia. Estes projetos foram


escolhidos para esta pesquisa pelo fato de terem o ensino de música voltado para a inclusão
social de crianças e adolescentes e também por terem a sua base pedagógica, logística e
gestora semelhantes ao Projeto Criar e tocar localizado na cidade de Anápolis.

2.2.2 Análise Documental

Nesta parte da pesquisa, foram feitas análise de documentos fornecidos pelo


Projeto Criar e Tocar da cidade de Anápolis. Toda pesquisa tem uma fonte de dados, no caso
desta parte da pesquisa foram fontes primárias, dados de documentos que ainda não foram
tratados, que não sofreram nenhum tipo de análise e que não foram usados para nenhum tipo
de estudo. Neste caso:

Para pesquisar precisamos de métodos e técnicas que nos levem


criteriosamente a resolver problemas. [...] é pertinente que a pesquisa
científica esteja alicerçada pelo método, o que significa elucidar a
capacidade de observar, selecionar e organizar cientificamente os caminhos
que devem ser percorridos para que a investigação se concretize (GAIO,
CARVALHO e SIMÕES, 2008, p. 148).

Como esta pesquisa teve um lado sociológico, a pesquisa documental permite


analisar a problemática deste trabalho mais a fundo e de forma indireta, que neste caso é a
caracterização de um Projeto Social por meio de documentos como: materiais pedagógicos do
ano de 2011, regulamento interno, fichas, documentos quantitativos, programas, panfletos,
matérias em jornais e etc.
Para Lakatos e Marconi (2003), a pesquisa documental segue o mesmo caminho
da pesquisa bibliográfica. O que as difere é que enquanto a pesquisa bibliográfica utiliza
fontes por materiais já elaborados, como trabalhos publicados em sites, a pesquisa documental
recorre a fontes mais diversificadas, sem tratamentos analíticos, como: documentos oficiais,
revistas, cartas, filmes, pinturas, entre outras. A característica da pesquisa documental é que a
fonte de coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se
denomina de fontes primárias.

2.2.3 Caracterização e Análise

Este estudo buscou caracterizar Projetos Sociais que ensinam música, mas
também buscou ir além da pesquisa bibliográfica, coletando documentos na própria
19

instituição, que é o Projeto Criar e Tocar, na cidade de Anápolis. De acordo com Penna
(2015), nenhum método de pesquisa é independente ou autossuficiente. Dessa forma, esta
pesquisa utilizou e mesclou procedimentos de pesquisa bibliográfica, documental e de campo.
Para conhecer o universo da pesquisa foram levantados dados que se identificam
com a temática estudada, que são os Projetos Sociais que ensinam música. Foram escolhidos
três Projetos de três regiões diferentes do país, Projeto Guri (SP), Villa Lobinhos (RJ) e
NEOJIBA (BA). A partir daí foi feita a descrição de cada projeto, características, organização
mantenedora (estado ou ong), como os alunos ingressam nesses projetos, foco principal para
tais iniciativas. Foi possível observar que todas apesar de suas semelhanças e diferenças, estes
projetos tem em comum o foco principal, que é inserção social pela arte.
O processo de coleta de dados se iniciou no mês de abril de 2019. Foi solicitada a
permissão da pesquisa para a diretoria e coordenação pedagógica do Projeto Criar e Tocar
através de e-maile WhatsApp. Houve uma boa recepção da gestão do Projeto em relação a
pesquisa, a partir daí começou a coleta de dados em documentos guardados na própria sede do
projeto Criar e Tocar que fica na Unievangélica na cidade de Anápolis.
Foi possível perceber nesta busca de documentos e informações que o Projeto não
guarda muitos documentos, arquivos para identificar a sua história e, muitos dos programas,
panfletos de apresentações não são datados. Houve um pouco de dificuldade para identificar
datas de apresentações, formatura de alunos, recitais, provas e etc. não foram fornecidos
alguns documentos como: portaria de abertura do projeto, e propostas pedagógicas de alguns
anos.
20

3 O PROJETO CRIAR E TOCAR NA CIDADE DE ANÁPOLIS

Neste capítulo, serão apresentados e discutidos através da análise qualitativa


interpretativa, os documentos fornecidos pelo Projeto Criar e Tocar da cidade de Anápolis.
Subdividiu-se este capítulo em duas partes: na primeira, contextualização do Criar e Tocar e
como nasceu, e na segunda, a proposta pedagógica do Projeto.

3.1 CONTEXTUALIZANDO O PROJETO

O Projeto Criar e Tocar é um Projeto de Inclusão Social que teve inicialmente


como ferramenta a Música e as Artes Plásticas. Atualmente o Projeto oferece somente o
ensino de música, onde os alunos aprendem instrumentos da Orquestra Clássica e a prática
orquestral. O Projeto foi fundado em 2005 e atende crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos
em situação de risco social de bairros mais afastados da região central da cidade de Anápolis.
Sua execução é possível pela parceria entre a Associação Educativa Evangélica (AEE) e a
Prefeitura de Anápolis, por meio da Secretaria de Cultura e Desenvolvimento Social.
O objetivo do Projeto é incluir socialmente crianças e adolescentes de baixa renda
e em situação de risco social, desenvolver nos alunos a capacidade de trabalhar em equipe e
disciplina, tendo em vista que são itens básicos para a prática em conjunto.O ensino coletivo
aplicado através da prática de orquestra e pequenos grupos, encontra-se como uma ferramenta
didática capaz de modificar o sujeito por meio da socialização. Em relação ao ensino coletivo
da música, Cruvinel (2003, p. 2) afirma que:

O ensino Coletivo é uma importante ferramenta para o processo de


democratização do ensino musical, contribuindo de forma bastante
significativa neste processo. A musicalização através do ensino coletivo,
pode dar acesso a um maior número de pessoas à Educação Musical,
aumentando a razão professor/aluno por esforço hora/aula ministrada.
Alguns projetos ligados a essa filosofia de ensino vêm surgindo no país
alcançando êxito, tanto na área pedagógica quanto na social. Pode-se afirmar
que o estudo da música, através do ensino coletivo, veio democratizar o
acesso do cidadão à formação musical.

O ensino coletivo da música em projetos sociais tem se destacado no cenário atual


pelos resultados obtidos e pela relevância sociocultural que propiciam.Nesse sentido,
incentiva o estudo contínuo, o aperfeiçoamento musical e artístico, buscando a melhoria no
estudo da performance difundindo a música clássica através da prática orquestral.
21

A prática orquestral no Projeto Criar e Tocar é dividida em duas sessões,


orquestra A, onde estão os alunos mais avançados e orquestra B, onde a prática acontece com
os alunos iniciantes. A orquestra B tem como propósito a preparação para a orquestra dos
avançados.São trabalhados arranjos facilitados para iniciação da prática em conjunto. A
orquestra do Projeto Criar e Tocar se apresenta e apresentou-se em diversos locais e ao longo
de sua história inclusive em festivais importantíssimos no Brasil e no cenário Goiano.
Segundo os documentos analisados, Regulamento Interno do Projeto Criar e
Tocar (vide Anexo C e D), para que o aluno possa ingressar no Projeto é preciso que elese
encaixe em alguns critérios. Primeiro o responsável da criança ou adolescente precisa ira
secretaria do Projeto preencher uma ficha contendo os dados do próprio responsável e do
aluno, nesta mesma ficha, há um questionário socioeconômico, pois o Projeto é destinado a
crianças e adolescentes de baixa renda. Após isso é feito um processo de triagem de acordo
com os dados fornecidos pela ficha e os critérios estabelecidos pelo Projeto. Caso o jovem
seja selecionado, a coordenação entra em contato com a família.
De acordo com o documento fornecido, Regulamento Interno do Projeto Criar e
Tocar (vide anexo C), pelo Projeto as aulas acontecem de segunda a sexta, das 13:45 às 17:15,
com um intervalo de vinte minutos, onde é servido um lanche para os alunos. São oferecidas
aulas de violino, viola clássica, violoncelo, contrabaixo acústico, flauta transversal, clarineta,
saxofone, trombone, trompete, percussão e canto coral, além das aulas de teoria e percepção
musical. Assim que o aluno escolhe o instrumento que deseja tocar é montado uma grade de
segunda a sexta com dois horários por dia, divididos em aulas de instrumento, aulas teóricas e
prática de orquestra ou banda sinfônica.
Em 2013 a orquestra do Projeto Criar e Tocar foi convidada a se apresentarem um
dos mais importantes festivais de música do Brasil, em sua décima quinta edição, o festival
Eleazar de Carvalho que acontece em Fortaleza (CE)4.Um total de 42 alunos do Projeto Criar
e Tocar da UniEVANGÉLICA embarcaram da cidade de Anápolisno dia 30 de junho de 2013
em direção a Fortaleza, para participarem deste importante festival. A orquestra representou a
cidade de Anápolis sob a regência do maestro Regis Dias.Foram apresentadas pela orquestra
músicas do repertório brasileiro e arranjos de renomadas músicas européias de importantes
compositores como Beethoven e Dvorak. Os 42 integrantes, a equipe de 4 professores, e o
fotografo oficial Eduardo Coelho, ficaram em Fortaleza até o dia 07 de julho.

4
Link da matéria <http://www.unievangelica.edu.br/noticias/4273>
22

A orquestra Sinfônica do Projeto também foi requisitada várias vezes para fazer
apresentações na embaixada da Áustria em Brasília5. Um dos eventos mais importantes no
Distrito Federal foi “Uma Noite em Viena”.Foi a terceira vez que o grupo foi convidado a se
apresentar a pedido da Embaixada da Áustria. Sob a regência do maestro Jessé Mendes da
Silva, a Orquestra Criar e Tocar apresentou sucessos internacionais e nacionais, destacando as
valsas e a música popular brasileira. Um dos momentos marcantes da apresentação foi a
reprodução do sucesso “Asa Branca”, de Luiz Gonzaga. A apresentação foi retribuída por
aplausos do público presente, dentre embaixadores de vários países e autoridades, como o ex-
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa.
Desde o ano de 2008o Projeto Criar e Tocar é palco do (FEMA)6 Festival de
Música de Anápolis (Vide Anexo E), que traz em sua programação apresentações e oficinas
pedagógicas. A principal finalidade deste festival é proporcionar aos alunos do Criar e Tocar,
e demais projetos de ensino da música a oportunidade de ampliação de conhecimentos e
aprimoramento técnico. O evento estimula a troca de experiências musicais com foco no
aperfeiçoamento desta linguagem artística. Grubisic (2012, p. 78) descreve os projetos sociais
com orquestras da seguinte forma:

Os projetos sociais com orquestras são vistos numa perspectiva de


movimentos sociaisuma vez que trabalham a construção de uma identidade
coletiva dentro do grupo musical.Isso vem através de ações coletivas em
redes que provocam nos sujeitos mudanças devalores em relação à
sociedade. Dentro do grupo social cada novo membro adiciona aosdemais
integrantes novas formas de valores. Por outro lado, os membros mais
experientesexercem influência nos novos membros numa relação dinâmica
de trocas de saberes evalores.

A partir do momento em que o indivíduo é envolvido em uma aprendizagem


musical por intermédio de um grupo social,Chá a possibilidade de oferecer oportunidades de
trocas e compartilhamento de ideias e aprendizados acarretando a contribuição para uma
educação musical rica e motivadora, na qual o próprio indivíduo se desenvolve pela interação
coletiva de conhecimentos.
O trabalho desenvolvido na orquestra do Projeto permite ao aluno o
desenvolvimento de habilidades fundamentais para a vida profissional. Pelo fato de ser uma
atividade que envolve relações sociais e trocas de experiências e vivências na execução de
diversos instrumentos. A prática da música orquestral desenvolve o lado artístico/musical e

5
Link da matéria: <http://anapolis.go.gov.br/portal/multimidia/noticias/ver/orquestra-criar-e-tocar-se-apresenta-
na-embaixada-da-ustria>
6
Link da matéria: <http://www.unievangelica.edu.br/noticias/4401>
23

social do aluno. Pode-se destacar a interação entre alunos em suas trocas de experiências,
saberes relativos aos instrumentos que tocam, a vivência de trabalhos em grupo e o convívio.
Ao evidenciar um projeto social, o ensino da música orquestral e a prática de
orquestra, é possível identificar uma série de possibilidades essenciais que podem contribuir
para o desenvolvimento progressivo e o êxito do projeto.Dentro do ensino coletivo da música,
podemos relacionar diferentes formas para o desenvolvimento pedagógico das atividades. No
que diz respeito à formação de conjuntos musicais, destacam-se os grupos orquestrais, a
exemplo da formação de grupos instrumentais, como a Banda Sinfônica do Projeto e o Octeto
de cordas, esses capazes de diversificar e estimular o ensino coletivo do instrumento.
Pelo fato da prática orquestral e o aprendizado de um instrumento clássico ser
algo distante da maioria das famílias de baixa renda, um Projeto como o Criar e Tocar
proporciona uma maior curiosidade deste grupo, pois é algo novo que se insere em suas vidas.
De acordo com Fonterrada (2004, p. 87) “muito projetos de inclusão social proporcionam
atividades culturais interessantes que chama a atenção do aluno”, e a música tem um papel
importante neste quesito.

3.1 COMO NASCEU O PROJETO

O Projeto Criar e Tocar nasceu do anseio da Professora Marisa Mota Espíndola de


trazer a inserção social através do ensino da música e a prática orquestral, dando a
oportunidade a crianças e adolescentes de baixa renda a aprender um instrumento e a
possibilidade de profissionalização.
De acordo com os documentos fornecidos pelo Projeto Criar e Tocar (Vide Anexo
A, p.1), em 2004 a professora Marisa que era na época Secretária de Cultura da cidade de
Anápolis teve a oportunidade de visitar um Projeto Social que funcionava em uma das favelas
de São Paulo.Mantido pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, este Projeto tinha as
mesmas características do que era idealizado pela professora. Ao conhecer o funcionamento e
sua atuação na sociedade, a professora trouxe a ideia para a cidade de Anápolis, e então
começou de forma imediata a trabalhar na implementação do Projeto Criar e Tocar, pela
Secretaria de Cultura e o professor Pedro Sahium que na época era Prefeito Municipal.
A partir daí, foi iniciada a procura de parcerias que poderiam colaborar para que a
realização do Projeto pudesse se concretizar. Na época, o Centro Universitário de Anápolis
(Unievangélica), estava em um processo de formação do seu departamento Cultural e dentro
deste contexto foi apresentado o Projeto ao conselho de cultura da universidade através do
24

Presidente Dr. Geraldo Espíndola, onde foi o ponta pé inicial para a formação do Projeto Criar
e Tocar, que tinha como proposta atingir crianças e adolescentes de baixa renda, o que
cumpria e era de acordo com a responsabilidade de cunho social da instituição.
Ainda nos documentos fornecidos com o histórico do Projeto (Vide Anexo A), foi
possível obter dados exatos do início do funcionamento do Projeto. Foram seis meses de
preparação e fomentação de parcerias para que no dia 5 de abril de 2005 o Projeto Criar e
Tocar iniciasse suas atividades. No seu início, foram convidados Professor Wellington José
Silva para assumir a direção do Projeto e assumir o papel como maestro, onde permaneceu até
o ano de 2009, e a Professora Liana Campos Potenciano na coordenação administrativa.
Segundo dados fornecidos pelo Projeto (Vide Anexo A), até o ano de 2011,
depois de seis anos de seu início, foram atendidos mais de 1000 crianças e adolescentes, tendo
formado três turmas de alunos em Teoria Musical e o funcionamento de uma Orquestra
Jovem.Atualmente a coordenação geral do Projeto Criar e Tocar é gerida pela Professora
Marisa Espíndola, idealizadora do Projeto, e os apoios financeiros do Criar e Tocar são
fornecidos pela Associação Educativa Evangélica (AEE) e pela Prefeitura Municipal de
Anápolis.
O primeiro polo do Projeto Criar e Tocar foi fundado em 2005, como citado
anteriormente. Hoje este polo fica na Unievangélica, em Anápolis. Nos anos de 2009 e 2010 a
professora Marisa Espíndola com o mesmo sonho de ver o Projeto se dissipando pela cidade
foram abertos mais quatro polos do Criar e Tocar em diferentes regiões da cidade. O segundo
polo iniciou suas atividades no dia 2 de março de 2009, no bairro Industrial Munir Calixto.Em
seu início foram matriculados cerca de 98 alunos. Com o intuito de receber recursos do
Governo Federal e Estadual, foi preciso mudar o nome do Projeto para Ponto de Cultura
Tocando com Arte, pois para ser possível conseguir o auxílio era preciso trocar o nome deste
segundo Projeto por questões burocráticas.
Até o ano de 2011o Projeto Criar e Tocar do núcleo bairro Industrial contava com
70 alunos e possuía uma orquestra didática. No dia 26 de fevereiro de 2010, foi aberta mais
uma unidade do Projeto Criar e Tocar no bairro Adriana Park, no mesmo ano foram abertos
mais dois Projetos, um núcleo no bairro Villa Operária e outro no bairro Paraíso. Até o ano de
2011, estes núcleos do Projeto Criar e Tocar contavam com cerca de 70 alunos cada. O núcleo
do bairro Paraíso foi a extensão do Projeto que já acontecia no Parque da Criança com o nome
de CLAI(Cento Livre de Artes Integradas) e até o ano de 2011, contava com 40 alunos7.

7
Todas estas informações encontram-se disponíveis no Anexo A.
25

Entre os anos de 2014 e 2016 foram matriculados mais de 1200 alunos que
passaram pelo Criar e Tocar nesse período. No ano de 2014 eram cerca de 361 alunos
matriculados em instrumento e teoria musical, em 2015, 437 alunos e 2016, 411. Consta
também a quantidade de alunos desistentes nestes mesmos anos nos documentos. No ano de
2015, 49 alunos desistiram, 2015, 77 e 2016, 40 alunos (Vide Anexo F).
A falta de identificação do indivíduo com o grupo, pode ser caracterizada
principalmente por aspectos de ordem social e problemas na área do relacionamento humano.
Segundo Tinto (1993) a evasão acontece quando o indivíduo não está integrado de forma
coerente ao sistema em que está vinculado. O autor relaciona o fenômeno da evasão com a
identificação do indivíduo com seu grupo de convivência no ambiente. O autor esclarece que
o ato de evadir consistido em um processo de interações a longo prazo. Assim, o próprio
indivíduo com um conjunto de determinadas características interage no sistema social e
acadêmico no caso do Criar e Tocar e por consequência o resultado desse processo interativo
em que acarretará à permanência ou a variadas formas de evasão. Muitas vezes os alunos não
se identificam com a proposta que o Projeto, ou chegam querendo aprender instrumentos que
não são fornecidos na instituição.
De acordo com os documentos analisados relacionados ao Histórico do Projeto
(Vide Anexo A), foi possível observar a justificativa para se abrir mais polos do Projeto. A
preocupação sobre as necessidades sociais crescentes, a sensibilidade do indivíduo em risco e
o crescimento da violência foram os principais fatores que levaram a abertura desses polos. A
ideologia seguida pelo Criar e Tocar desde o seu início é a busca do equilíbrio social através
da música, com o intuito de reduzir a vulnerabilidade social.
Hoje, o Projeto Criar e Tocar conta com 6 núcleos, núcleo Unievangélica que é o
polo principal, Nova Vila Jaiara que era o antigo Adriana Parque, Vivian Parque, Industrial,
núcleo da Igreja Batista e o núcleo na cidade de Goianésia. As aulas nestes polos acontecem
de segunda a sexta no turno vespertino, somente no núcleo Industrial são oferecidas aulas nos
dois períodos.Lá, o turno matutino funciona nas terças e quintas. O Criar e Tocar conta com
uma equipe de 31 professores de diversos instrumentos da orquestra clássica. Um total de 7
coordenadores de núcleo e um total de 2 professores de reforço escolar que atendem os
núcleos Nova Vila e Vivian Parque. A professora Marisa Espíndola é responsável pela
coordenação geral do Projeto, a coordenação pedagógica é gerida pela professora Ana
Cristina Pires. A parte administrativa do Projeto é gerida por Rosângela Moraes e a
assistência de secretaria por Hermes Cardoso de Ávila. (Vide Anexo B).
26

De acordo com os dados fornecidos pelo Criar e Tocar, atualmente a instituição


atende cerca de 431 alunos matriculados considerando todos os seus polos. (Vide Anexo G).
Quando os alunos do Criar e Tocar concluem o programa de ensino técnico de
música já estão com uma certa habilidade e prontos para prosseguir na busca de uma carreira
profissional. O Projeto se preocupa em retirar o aluno de um ciclo vicioso, onde muitas das
vezes quando chegam em uma certa idade os pais querem retirar o filho das aulas para
trabalhar. O Projeto se preocupa justamente com isso, a profissionalização destes alunos e
busca parcerias com universidades tanto do Brasil como do exterior para ampliar o currículo
de seus alunos.
No programa de ensino do Criar e Tocar os alunos têm a oportunidade de
aprender teoria musical, como também os instrumentos da orquestra clássica, o que leva a ter
uma formação básica chegando a um certo nível técnico musical.

3.2 PROPOSTA PEDAGÓGICA

Martínez (2010, p.10) afirma que “[...]a proposta pedagógica não é apenas o
documento escrito, mas sim a intencionalidade educativa que se expressa de maneira viva no
conteúdo e na forma que assumem as ações educativas que caracterizam o trabalho”.A
proposta pedagógica constitui-se efetivamente como um instrumento útil para a organização
coerente do trabalho educativo. É possível observar na Proposta Pedagógica do Criar e Tocar
a linha de ensino e de atuação na comunidade, ela formaliza um compromisso assumido por
professores, funcionários, pais, alunos e líderes comunitários em torno do mesmo projeto
educacional, que no caso é o ensino de música com o objetivo de mudar uma realidade social.
Desde o seu início, o Projeto Criar e Tocar tem como foco pedagógico a prática
em conjunto. São seus princípios pedagógicos que viabilizam a profissionalização de seus
alunos e os dá a oportunidade de uma nova profissão e visão de mundo. Nessa perspectiva,
desenvolver um trabalho de educação musical, auxiliando crianças, adolescentes e jovens, a
construírem, aprimorarem e se apropriarem de habilidades artísticas e de expressão não
verbal, possibilita a percepção da importância que a música transfere ao ser humano como
ferramenta de transformação social, cultural e pessoal. “[...] uma educação musical só será
significativa quando conseguir fazer da experiência musical uma experiência para a vida na
sociedade e na cultura em geral” (QUEIROZ, 2004, p. 104).Ao longo do tempo o Projeto
sofreu várias mudanças até se firmar em uma proposta pedagógica sólida, no final de 2012
para o início do ano de 2013.
27

Na proposta pedagógica de 2011(vide Anexo A) fornecida pelo Criar e Tocar, o


aluno ingressava no projeto e passava por um processo de musicalização que na época duraria
um semestre. Neste período os alunos participavam de práticas em conjunto como “bandinha
rítmica”, canto coral e aulas de flauta doce. Após estes seis meses era introduzido um trabalho
de iniciação musical que duraria cerca de três anos, onde o aluno ingressa de fato nas aulas de
teoria e percepção musical, assim como a prática de instrumento e a prática orquestral inicial.
Após dois anos no projeto e seguindo estas etapas, o aluno teria condições de participar da
orquestra oficial do Criar e Tocar onde se encontram os alunos com um nível técnico
instrumental e teórico mais avançados. Este Programa Pedagógico de 2011 é anual, e estão
inseridas a prática instrumental e a teoria musical. Desde o ano de 2013 o Criar e Tocar
modificou este sistema anual e aderiu a uma proposta semestral. O aluno ainda continua
quatro anos no Projeto, mas agora suas metas a serem cumpridas na instituição são por
período. A única mudança na proposta foi esta.

3.2.1 ESTRATÉGIAS E METOLOGIAS DE ENSINO

De acordo com as Propostas Pedagógicas apresentadas pelo Criar e Tocar


(ANEXO A), as aulas precisam ser expositivas e dialogadas, individuais ou em grupo. As
aulas de Teoria Musical por exemplo são aulas ministradas em conjunto/turmas em que o
aluno utiliza de livros de teoria musical e apostilas que são formuladas pelo corpo docente do
Projeto.As aulas de instrumento musical são individuais, em duplas ou trios. Nessas aulas
práticas os alunos seguem um programa de métodos elaborados para o instrumento que
desejou estudar, e o ensino é voltado para a prática instrumental com “aulas de treinamento ou
estudo” voltadas para o desenvolvimento da técnica em conjunto.
Segundo Brasil (1998, p. 49), “o trabalho com música deve considerar que ela é
um meio de expressão e forma de conhecimento [..]”, e o estudo é fundamental para o
desenvolvimento da técnica e das habilidades musicais. Dentro desse contexto, é possível
perceber que os alunos têm recursos didáticos através dos quais podem se comunicar
artisticamente e desenvolver uma técnica teórico-prática bem construída, incentivando não só
o aprendizado, mas capacitando o aluno a expressar artisticamente suas emoções.
A música não precisa ser vista como uma disciplina, contudo deve ter seu espaço.
Segundo Ponso (2008, p.13), “a música é um saber específico, não com caráter fechado em si,
mas que auxilia, interage, enriquece e é aprendida em conjunto com as demais áreas do
conhecimento, seja a matemática, a literatura ou a história”. A música oferece infinitas
28

possibilidades no sentido de desenvolver a criatividade de aluno, pois através da arte cada um


pode se tornar fruto do próprio desejo.

3.2.2 SISTEMA DE AVALIAÇÃO

O Projeto dispõe de um processo de avaliação formal em função da especificidade


do desenvolvimento dos alunos e da sua prática pedagógica. As atividades musicais em grupo
beneficiam a autoestima, e também a socialização dos alunos. (Anexo A).
Segundo Beineke (2003), é importante considerar que, ao aprender música, ou ao
realizar aprendizagens em qualquer área do conhecimento, cada pessoa atribui certos
significados particulares para aquilo que aprende, reconstruindo seus saberes a partir das suas
vivencias. Quando pensamos num grupo musical, tal como a orquestra do Projeto Criar e
Tocar que aqui foi tratado como base de estudo, vê-se necessário e fundamental entender o
que significa essa diversidade de personalidades, pensamentos e costumes para poder
descrever e compreender como essas diferenças podem se constituir em material rico para os
próprios educadores musicais e professores de um modo geral. O grupo instrumental constrói,
na sua trajetória de aprendizagem musical, uma identidade específica como grupo, que, por
sua vez, pode abrigar e valorizar a diversidade, a solidariedade e apoio às diferenças.
A partir da análise do material, os sistemas de avaliação nesses projetos são
particulares e simbólicos, pois cada aluno tem sua singularidade. Há sim um programa a ser
cumprido independentemente de tais fatores, mas o mais importante é o processo em que esse
aluno se desenvolve.

3.2.3 PERFIL DO EGRESSO

Ao deixar o projeto o aluno deverá ter concluído o curso de Teoria musical e o


curso em nível técnico dos instrumentos musicais propostos, levando-o ao processo de
profissionalização musical e artística. (Anexo A).
Como citado no capítulo um, por ser mais longa difícil e exigir uma dedicação
mais intensa, a trajetória educacional da música orquestral oferece, progressivamente, novos
valores e uma nova visão sobre as perspectivas de vida. Na prática, esses projetos de
aprendizado caracterizam o ensino da música clássica mais como um caminho do que como
um fim em si próprio, possibilitando infinitas oportunidades aos seus alunos egressos. Neste
cenário, a transformação individual se traduz em uma alternativa de ascensão social. Nos
29

projetos de ensino da música clássica, como o Criar e Tocar, essa transformação se faz pela
construção de um espaço coletivo em que os mais desvalidos e carentes podem mudar suas
próprias vidas, possibilitando o crescimento pessoal destas pessoas para melhor acesso às
oportunidades já disponíveis.
Para Karter (2004), música e educação são produtos da construção humana, cuja conjugação
pode resultar numa ferramenta original de formação, capaz de promover tanto processos de
conhecimentos quanto de autoconhecimento. A partir do momento em que o aluno se desliga
do Criar e Tocar ele passa a ter possibilidades no meio musical e em tantos outros. Nem todos
os alunos que passaram pelo Projeto, necessariamente, se tornarão músicos, mas o fato é que
terão outros caminhos a explorar pela rica experiência que viveram.
30

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objetivo explicitar a relevância dos Projetos sociais que
ensinam música no Brasil. Também compreender como é desenvolvido o Projeto Criar e
Tocar da cidade de Anápolis. A partir das informações expostas nesse trabalho, constata-se que a
educação musical pode ser realizada não apenas através dos conservatórios de música, mas
também pode ser efetivada por meio de espaços não-formais como projetos sociais e ONGs, as
quais também não têm fins lucrativos.
No Brasil, os projetos como, Guri, Villa Lobinhos, NEOJIBA e o Criar e Tocar da
cidade de Anápolis são exemplos de espaços não-formais que incluem o ensino de música em
suas atividades, além de cooperarem para a inclusão social de crianças e jovens que vivem em
condições de risco social e sob um reduzido IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Com a estruturação desta pesquisa, foi possível ter acesso a informações que
comprovam a contribuição das práticas sociais aplicadas nos projetos citados no texto,
sobretudo no projeto Criar e tocar que foi o principal objeto de estudo. As práticas musicais
desenvolvidas com base na convivência diária, respeito mútuo, na escuta e no diálogo
construído com as pessoas que compõem estes projetos, se mostraram fatores primordiais para
a evolução e manutenção do aprendizado.
O Projeto Criar e Tocar evidencia a possibilidade de experiências musicais
ampliarem a visão de mundo dos envolvidos e provocarem transformações significativas na
vida do indivíduo, tornando-o mais autoconfiante, consciente, crítico e reflexivo sobre sua
realidade e a da sua comunidade.
31

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ANEXO A
ANEXO B
ANEXO C

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