De acordo com Propp, a estrutura padrão das narrativas do maravilhoso
apresenta essa disposição geral, com possíveis variações: o herói ou
protagonista, recebedor de dádivas mágicas, após a partida de sua casa dirige- se a um espaço remoto, sofre um dano (também chamado de prejuízo) por um antagonista, luta com este, vence-o e finalmente regressa.
A ocorrência dos mesmos esquemas narrativos em povos que dificilmente
poderiam ter mantido contato entre si. Morfologia dos contos de magia ou conto maravilhoso, i.e., descrição das partes que o constituem. (PROPP, 2010, p. 20): “Por contos de magia entenderemos [...] os que estão classificados no índice de Aarne e Thompson entre os números 300 e 749”. Grandezas constantes e grandezas variáveis: podem mudar os nomes das personagens; o que não muda são suas ações, ou funções. Por isso, “[..] o conto maravilhoso atribui ações iguais a personagens diferentes” (PROPP, 2010, p. 21). Propp estuda o maravilhoso a partir das funções das personagens, ou seja, segundo ele, nesse modo ficcional o que realmente importa é saber o que fazem, não o quem nem o como. “[...] as funções das personagens representam a parte fundamental do conto maravilhoso”. No conto maravilhoso, os elementos permanentes são as funções das personagens (constituintes básicas), independentemente da maneira pela qual são executadas. “As funções constituem os elementos fundamentais do conto maravilhoso, sobre os quais se constrói o curso da ação”. (p. 68)
Situação inicial (importante elemento morfológico): “O conto maravilhoso,
habitualmente, começa com certa situação inicial. Enumeram-se os membros de uma família, ou o futuro herói [...] é apresentado simplesmente pela menção a seu nome ou indicação de sua situação.”. (p. 26). Embora seu número seja limitado, nem todos os contos maravilhosos apresentam todas as funções. Após a situação inicial, surgem as funções: 1) afastamento, quando um dos membros da família sai de casa. O antagonista do herói (agressor): aquele que causa o dano, ou prejuízo. Pode ser o diabo, a bruxa etc. 2) ardil, quando o antagonista tenta ludibriar sua vítima para apoderar-se dela ou de seus bens. “Antes de tudo, o antagonista ou agressor assume feições alheias. [...] A bruxa se disfarça em ‘simpática velhinha’.” (p. 30) “O agressor atua utilizando diretamente meios mágicos” 3) cumplicidade, quando a vítima se deixa enganar, ajudando assim, involuntariamente, seu inimigo. “O herói deixa-se persuadir em tudo pelo antagonista, isto é, pega o anel, vai tomar banho de vapor, vai nadar etc.”. (p. 31) 4) dano, quando o antagonista causa dano ou prejuízo a um dos membros da família. Essa função “dá movimento ao conto maravilhoso”. (p. 31) As funções anteriores são “parte preparatória do conto maravilhoso, enquanto o nó da intriga está ligado ao dano.”. (p. 31) 5) fornecimento ou recepção do meio mágico, quando o meio mágico passa às mãos do herói. “Os meios mágicos podem ser: 1) animais (cavalo, águia etc.) [...]; 3) objetos que possuem propriedades mágicas, como, por exemplo, clavas, espadas [...]”. (p. 42). O objeto pode ser transmitido de várias maneiras ou mesmo fabricado. [recurso mágico; auxiliares (mágicos); dádivas mágicas] 6) deslocamento no espaço entre dois reinos, quando o herói é transportado, levado ou conduzido ao lugar onde se encontra o objeto que procura. (p. 49) Transporta-se a cavalo. Os auxiliares, sejam seres vivos ou objetos mágicos, exercem idêntica função. 7) combate, quando o herói e seu antagonista se defrontam em combate direto. 8) vitória, quando o antagonista é vencido. É mais comum em um combate em campo aberto. 9) reparação de dano ou carência, quando o dano inicial ou a carência são reparados. “Esta função forma uma parelha com o momento em que aconteceu o dano ou a carência dentro do nó da intriga. Com esta função o conto atinge o ápice. O objeto da busca se consegue ou mediante a força ou mediante a astúcia. O protagonista utiliza, às vezes, os mesmos meios do malfeitor quando este causou o dano inicial.” (p. 51) O morto ressuscita; o prisioneiro é libertado. (p. 53) 10) regresso, quando o herói volta para sua casa, ou os seus. Se realiza da mesma forma que a partida. Um caso de auxiliar mágico ou dádiva mágica em “El Cuerpo sin Alma”: [...] o auxiliar do conto pode ser considerado como a personificação do talento do herói. Na floresta ele recebe um animal ou a capacidade de se transformar em animal. (PROPP, 2002, p. 196) Uma categoria especial de auxiliares mágicos é constituída por toda sorte de artifícios incomuns. Frequentemente são irmãos, cada um dotado de uma habilidade qualquer. (PROPP, 2002, pp. 214-215)