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volume 3
cirurgia do trauma
cirurgia plástica
ortopedia
ORTOPEDIA
CAPÍTULO
1
Conceitos gerais
Gustavo Merheb Petrus
1. Terminologia ortopédica
A - Anquilose
Perda da mobilidade articular decorrente da evolução
natural de uma doença ou trauma.
D - Artrose ou osteoartrite
É o processo degenerativo que acomete as articulações,
com diminuição progressiva da cobertura cartilaginosa e
desenvolvimento de deformidades.
E - Artrodese
Perda intencional da mobilidade articular decorrente de
Figura 1 - Anquilose do quadril uma cirurgia realizada com essa finalidade.
F - Axonotmese
B - Artrite
Lesão parcial do tecido nervoso, em que pode ocorrer
Processo inflamatório que acomete uma articulação. recuperação parcial espontânea.
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CONCEITOS GERAIS
ORTOPEDIA
Figura 4 - Radiografia de uma escoliose
K - Fratura
Perda ou solução de continuidade no tecido ósseo.
L - Fratura exposta
Fratura cujos fragmentos ósseos ou o hematoma fratu-
rário são expostos ao meio ambiente.
Figura 3 - Cifose
H - Claudicar
Mancar.
I - Consolidação
Processo fisiológico que leva à formação óssea no foco
de uma fratura.
Figura 5 - Fratura exposta grau IIIC de Gustillo e Anderson
J - Escoliose
Curvatura da coluna no plano coronal, tanto fixa quanto
corrigível e maior que 10°. A Figura 4 mostra o cálculo da
M - Fratura cominuta
deformidade vertebral. Fratura que apresenta mais de 3 fragmentos.
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ORTO P ED I A
P - Axoniotmese
Interrupção do axônio com bainhas conectivas intactas.
Há degeneração walleriana causando paralisia motora, sen-
sitiva e autonômica, porém pode haver recuperação, com
tempo variável de acordo com o nível da lesão.
Q - Neurotmese
Lesão completa de um nervo, não sendo possível a re-
cuperação espontânea. Todo o nervo e suas estruturas es-
tão lesados. Não há integridade do epineuro e a reparação
sempre é cirúrgica. A regeneração e a reinervação nunca
são completas e, geralmente, os pacientes evoluem com
alguma deficiência residual quanto à função motora e sen-
sitiva.
R - Osteomielite
Processo infeccioso que atinge os ossos agudamente,
Figura 6 - Fratura cominuta podendo cronificar.
S - Pseudoartrose
N - Luxação
Falha da consolidação óssea, resultando em uma falsa
Perda de congruência articular.
articulação com franco movimento, podendo ser ou não
infectada.
O - Neuropraxia
A estrutura do nervo permanece intacta, porém a con-
dução axonal é interrompida. Figura 8 - Fratura distal de tíbia e fíbula esquerdas
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CONCEITOS GERAIS
T - Redução
Manobra que permite o alinhamento de um osso com
fratura e desvios dos fragmentos ou a correção de uma lu-
xação.
U - Redução cruenta
Correção do alinhamento de uma fratura por meio de
acesso cirúrgico.
V - Redução incruenta
Correção do alinhamento de uma fratura utilizando
tração manual ou por aparelhos sem abertura do foco de
fratura.
W - Retardo de consolidação
Demora para a consolidação de uma fratura além do
tempo médio.
ORTOPEDIA
X - Sequestro
Fragmento de tecido ósseo desvitalizado encontrado
nas osteomielites crônicas.
Y - Tratamento conservador
Por medidas não cirúrgicas, geralmente com uso de ges-
so ou órteses.
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SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO CIRÚRGICO
CAPÍTULO
2
Doenças do metabolismo ósseo
Gustavo Merheb Petrus
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D O E N Ç A S D O M E TA B O L I S M O Ó S S E O
O equilíbrio entre as concentrações de formas mais Raquitismo por redução do fosfato extracelular
ou menos ativas de vitamina D está relacionado aos níveis - Síndrome de má absorção intestinal;
sanguíneos de cálcio e paratormônio. Quando ocorre de-
- Drogas: hidróxido de alumínio, glicocorticoides;
ficiência da 1,25-diidroxivitamina D, como nas deficiências
- Causas genéticas.
nutricionais, não ocorre absorção adequada de cálcio pelo
intestino delgado, com resultante hipocalcemia, que esti- Raquitismo por redução do cálcio extracelular
mula a paratireoide a manter a calcemia à custa de baixa - Síndrome de má absorção intestinal;
reabsorção de fósforo pelo rim. - Drogas: glicocorticoides, colestiramina;
Os baixos níveis de cálcio e fósforo levam à falha na mi- - Ingestão deficiente de cálcio.
neralização da matriz óssea e na calcificação da cartilagem Raquitismo por defeitos primários da mineralização
e tecidos osteoides, com alteração do processo de cresci-
- Drogas: etidronato, fluoretos, alumínio, chumbo;
mento epifisário, quadro conhecido como raquitismo. A
- Causas genéticas: hipofosfatasia autossômica recessiva, hipo-
osteodistrofia renal é a denominação para o raquitismo de-
fosfatasia autossômica dominante.
corrente de insuficiência renal crônica.
* Fator de crescimento dos fibroblastos-23.
C - Etiologia
D - Diagnóstico
O raquitismo nutricional inclui o causado por deficiência
de vitamina D e por carência na ingesta de cálcio ou fos- As manifestações clínicas do raquitismo dependem da
fato. São raros atualmente, encontrados em prematuros, etiologia, da idade de início e da intensidade, manifestan-
do-se desde a infância até a adolescência, quando ocorre
crianças com dietas atípicas ou que não tenham exposição
fusão da placa de crescimento. Os sintomas iniciais geral-
adequada ao sol.
mente são inespecíficos, incluindo retardo ponderal, esta-
ORTOPEDIA
Causas gastrintestinais incluem problemas hepáticos e
tural e da erupção dentária; infecções de vias aéreas, irrita-
do intestino delgado, icterícia obstrutiva e enteropatias e os
bilidade e sudorese cefálica são relatadas. Somente em fase
casos de síndromes de má absorção, como colite ulcerativa,
posterior, as deformidades ósseas são notadas nos mem-
doença de Crohn, enteropatia sensível ao glúten, sarcoido-
bros inferiores, submetidos às maiores cargas, geralmente
se e tuberculose.
mais intensas nos lactentes do que nas crianças maiores.
Outras causas incluem raquitismo resistente à vitamina
No lactente que engatinha, o encurvamento pode ocorrer
D, como diabetes fosfato (defeito dos túbulos renais com
nos antebraços, mas menos pronunciado.
falha na reabsorção de fosfato); falha na síntese de 1,25-dii-
Ao exame físico, observam-se alargamento de punhos,
droxivitamina D; insensibilidade a 1,25-diidroxivitamina D;
joelhos e tornozelos (por expansão metafisária), deformi-
e acidose tubular renal.
dades em membros superiores e inferiores (joelho varo,
A hipofosfatemia familiar (raquitismo tubular renal) é
joelho valgo – Figura 1), fronte proeminente, rosário raquí-
uma doença genética ligada ao cromossomo X, com he-
tico (notado na extremidade anterior das costelas, por ex-
rança dominante, causando deformidade óssea aguda. As
pansão da junção costocondral), deformidade torácica por
crianças são hipodesenvolvidas; os meninos, os mais aco-
projeção esternal anterior (tórax em “peito de pombo”) e
metidos, mas não acontece miopatia, e o cálcio sérico está sulco de Harrison (deformidade torácica determinada pela
normal, assim como o paratormônio. ação do diafragma na respiração).
Tabela 1 - Tipos de raquitismo e suas causas
Raquitismo por falta ou ação deficiente da vitamina D
- Exposição solar deficiente;
- Ingestão de vitamina D insuficiente;
- Síndrome de má absorção;
- Alterações do metabolismo da vitamina D: hepatopatias crô-
nicas, insuficiência renal crônica, uso crônico; de anticonvulsi-
vantes (fenobarbital, difenil-hidantoína), acidose prolongada;
- Causas genéticas: raquitismo dependente da vitamina D tipo I
(deficiência da 1-alfa-hidroxilase), raquitismo dependente da vi-
tamina D tipo II (defeito no receptor da 1,25(OH)2 vitamina D).
Raquitismo por redução do fosfato extracelular
- Doenças que cursam com aumento da fosfatúria:
· FGF-23* independente: tubulopatias, síndrome de Fanconi;
· FGF-23 dependente: tumores mesenquimatosos, displasia
fibrosa poliostótica, síndrome dos nevos epidérmicos. Figura 1 - (A) Joelho varo e (B) joelho valgo. Fonte: uptodate.com
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ORTO P ED I A
E - Laboratório
No raquitismo por falta da vitamina D, as alterações
laboratoriais dependem da intensidade da deficiência,
Figura 3 - Criança com raquitismo avaliada pelo calcidiol plasmático. Em crianças, valores de
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D O E N Ç A S D O M E TA B O L I S M O Ó S S E O
calcidiol plasmático inferiores a 10 a 12ng/mL indicam defi- do-se da má qualidade do osso, do tempo aumentado para
ciência de vitamina D, sendo inferiores a 5ng/mL na maioria obtenção da consolidação e da tendência para recidiva das
das crianças com raquitismo por deficiência dessa vitamina. deformidades, principalmente em crianças jovens.
No início da deficiência da vitamina D, o hiperparatireoidis-
mo secundário mantém a calcemia e o calcitriol plasmático, 3. Osteodistrofia renal
com tendência à hipofosfatemia e à elevação da FA sérica.
O agravamento da deficiência da vitamina D resulta em
alterações mais evidentes – hipocalcemia, hipofosfatemia, A - Definição
elevação da FA sérica, redução do calcitriol plasmático, hi- A osteodistrofia renal é definida como o conjunto de
pocalciúria e hiperparatireoidismo secundário. Nas formas anormalidades ósseas que se estabelece em pacientes
genéticas de raquitismo relacionado à vitamina D, as altera- com insuficiência renal crônica, gerando quadros como os-
ções laboratoriais são intensas – hipocalcemia acentuada, teoporose, osteomielite, gota, distúrbios do metabolismo
hipofosfatemia, acentuada elevação da FA sérica, hipocalci- do cálcio e do fósforo, ou decorrentes de complicações do
úria e elevação significativa do PTH. tratamento instituído (osteoporose pelo uso de corticoide,
Resumidamente, o cálcio e o fósforo abaixo do normal, necrose asséptica).
fosfatase alcalina e paratormônio elevados e baixos níveis Os distúrbios osteometabólicos que acontecem durante
de 1,25-diidroxivitamina D no sangue. Na urina, os níveis de a progressão da insuficiência renal crônica concorrem para
cálcio e fosfato estão diminuídos. o surgimento do hiperparatireoidismo secundário, um tipo
de osteodistrofia de alto turnover ósseo. Assim, a retenção
Tabela 2 - Alterações laboratoriais dos diferentes tipos de raquitismo
de fósforo e a redução dos níveis de vitamina D e conse-
Deficiência de Tubular renal Glomerular quentemente da concentração de cálcio são fatores mais
vitamina D (familiar) renal que suficientes para estimular a secreção de PTH.
ORTOPEDIA
Soro A osteodistrofia renal compreende 4 entidades: raqui-
- Ca ↓ Normal ↓ tismo (osteomalácia), osteíte fibrosa, osteoesclerose e cal-
-P ↓ ↓ cificação ou ossificação patológicas.
↑ Por conta do dano renal, há retenção de fosfato e di-
- FA ↑ ↑ minuição da produção renal de 1,25-diidroxivitamina D, le-
↑
Urina vando à diminuição da reabsorção de cálcio no intestino,
acarretando hipocalcemia e hiperparatireoidismo secundá-
- Ca ↓ ↓ ↓
rio. Clinicamente, instala-se um quadro de raquitismo e de
-P ↓ ↓ osteíte fibrosa.
Ca = Cálcio; P = fosfato; FA = Fosfatase Alcalina.
F - Tratamento
O tratamento envolve níveis aumentados de fósforo, fos-
fato e vitamina D na dieta. A exposição aos raios solares ultra-
violeta, azeite de oliva e ergosterol são fontes de vitamina D.
Uma quantidade suficiente de raios ultravioleta do sol
a cada dia e o fornecimento adequado de cálcio e fósforo
na dieta podem prevenir o raquitismo. Comprovou-se que
a reposição de vitamina D corrige o raquitismo ao serem
usados métodos de medicina e terapia de luz ultravioleta.
O tratamento do raquitismo pela simples deficiência de
vitamina D consiste na administração oral diária de 2.000 a
5.000UI de vitamina D por 6 a 10 semanas. Se a criança não
responde a esse regime de terapia, provavelmente tem um
raquitismo refratário à vitamina D.
Geralmente, crianças menores que 6 anos, com defor-
midades leves de até 15° de desvio, tendem a responder Figura 6 - Radiografia do úmero proximal mostrando alterações
positivamente ao tratamento para controle metabólico. devido à osteodistrofia renal
Podem-se tentar órteses corretivas.
O tratamento cirúrgico é indicado para crianças acima
de 6 anos e com graves deformidades, refratárias a outras
B - Clínica
medidas de tratamento. Realizam-se osteotomias correti- A clínica é semelhante à do raquitismo. Além disso,
vas, e deve-se ponderar a fixação a ser utilizada, lembran- como pode ocorrer calcificação periarticular, causando limi-
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ORTO P ED I A
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Raquitismo
- Cálcio e fósforo abaixo do normal, fosfatase al-
calina e paratormônio elevados e baixos níveis
Exames
de 1,25-diidroxivitamina D no sangue;
laboratoriais
- Na urina, os níveis de cálcio e fosfato estão di-
minuídos.
- Administração oral diária de 2.000 a 5.000UI
de vitamina D por 6 a 10 semanas;
Tratamento - O tratamento cirúrgico é indicado para crian-
ças acima de 6 anos e com graves deformida-
des, e realizam-se osteotomias corretivas.
ORTOPEDIA
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SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO CIRÚRGICO
CAPÍTULO
3
Ortopedia pediátrica
Gustavo Merheb Petrus
1. Acondroplasia
A acondroplasia é o tipo mais comum de nanismo, em
que se observa alteração na formação de osso endocon-
dral, mas com formação normal de osso intramembranoso.
Caracteriza-se por membros curtos, com cabeça protube-
rante (principalmente testa), nariz “em sela”, canal verte-
bral lombar estreitado e alterações pélvicas.
Apresenta herança autossômica dominante, porém, em
85% dos casos, é causada por uma mutação genética alea-
tória. A mutação do gene foi localizada no receptor do fa-
tor de crescimento do fibroblasto tipo 3 (FGFR3). Acomete
ambos os sexos, e sabe-se que pais mais velhos têm maior Figura 1 - Características da acondroplasia
chance de ter filhos acondroplásicos.
Ocorre uma lordose lombar, com protrusão caracterís-
O acometimento da acondroplasia ocorre na placa de
tica das regiões glútea e abdominal. As mãos são curtas e
crescimento, principalmente na camada proliferativa, le-
alargadas, com todos os dedos do mesmo tamanho, e há
vando a alterações na região metafisária do osso. Deste
um aumento do espaço entre o 3º e o 4º quirodáctilos (mão
modo, o crescimento longitudinal do osso ocorre de forma
“em tridente”). O desenvolvimento muscular é acima do
mais lenta. A ossificação periosteal é normal, levando a um normal, as funções endócrinas e sexuais normalmente são
crescimento normal em largura dos ossos longos que pode normais, e a inteligência é normal ou acima do normal.
ser confundido como uma largura anormal, pois o osso está
diminuído em comprimento.
O diagnóstico é feito ao nascimento, com o bebê muito
pequeno, principalmente seus membros. Com a evolução,
observam-se o tamanho do tronco normal e um encurtamen-
to dos membros. Os acondroplásicos não conseguem colocar
as mãos abaixo do trocânter maior (na posição ereta); nas
pessoas normais, a mão encosta no terço médio da coxa.
Observa-se um crânio braquicefálico, com uma cabeça
aumentada de diâmetro, o que pode ser confundido com
hidrocefalia. O comprimento anteroposterior está diminuí-
do, e a testa aumentada com face alargada e com dentição
normal. Figura 2 - Criança com acondroplasia
120
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
A radiografia caracteriza-se por todos os ossos longos cabeça do rádio, talvez pelo fato de haver um alargamen-
de tamanho reduzido, com largura e densidade normais, to da cabeça do rádio que dificulta sua articulação com o
assim como as epífises, com metáfises alargadas e epífi- úmero.
ses normais (a acondroplasia não acomete a epífise). Os A frouxidão ligamentar também está presente e por isso
seguimentos proximais (úmero e fêmur) são mais acome- muitas crianças acondroplásicas podem flexionar a articu-
tidos que os distais, a fíbula é maior que a tíbia, e observa-
lação dos dedos, punhos, cotovelos, cintura e joelhos a um
-se na placa de crescimento o formato de V no centro. A
ângulo extremo.
bacia apresenta as asas do ilíaco quadradas, com o sacro
diminuído de tamanho e o teto acetabular largo e achata- Pode ocorrer a nítida curvatura da tíbia em virtude dos
do; o osso frontal proeminente com calvária aumentada e joelhos e pés varos. Porém há alguns casos clínicos caracte-
base do crânio pequena. Na coluna, diminuição progressi- rizados por valgismo.
va no sentido descendente da distância interpedicular da
região dorsal até a lombar, ao contrário do que acontece 2. Doença de Legg-Calvé-Perthes
fisiologicamente.
O tórax apresenta diâmetro anteroposterior diminuí-
do, com costelas curtas e esterno alargado e curto. Ocorre A - Definição e considerações gerais
uma sinostose entre os corpos vertebrais com diminuição A doença de Legg-Calvé-Perthes é definida como uma
progressiva do tamanho do canal vertebral entre a 1ª e a necrose isquêmica ou avascular do núcleo secundário de
5ª vértebras lombares, podendo causar estenose do canal ossificação da epífise proximal do fêmur durante o desen-
vertebral.
volvimento, podendo acontecer entre os 2 e os 16 anos de
Quanto aos adolescentes, o nanismo acondroplásico
idade, com predominância entre os 4 e 9 anos.
pode fazer diagnóstico diferencial com cretinismo, raquitis-
ORTOPEDIA
mo e síndrome de Morquio. A evolução do nanismo é óti- Recebe essa denominação porque 3 autores a descreve-
ma e não apresenta, normalmente, artrose, pois as epífises ram ao mesmo tempo: Legg (americano), Calvé (francês) e
são normais. Podem evoluir com dor frequente nas costas Perthes (alemão). O acometimento inicia-se na região ante-
acompanhada de ciatalgia e, em cerca de 11% dos casos, rolateral da epífise e progride para a região posteromedial
com paraplegia devido à estenose progressiva da coluna do núcleo de ossificação.
lombar. A cartilagem hialina é nutrida por embebição do líqui-
Dentre as principais desvantagens citadas pelos acon- do sinovial, portanto não é acometida por essa condição.
droplásicos não estão suas respectivas limitações físicas, A doença é totalmente autolimitada, apresentando a sua
mas sim a percepção da sociedade frente às suas condições. fisiopatologia dividida em 4 fases:
Muitos relataram provocações, grosserias, discriminações, - Necrose;
entre outras formas de preconceito, como sendo as piores
dificuldades encontradas para o envolvimento com a socie- - Fragmentação (radiograficamente, caracterizada pela
dade, prejudicando o convívio social e consequentemente cabeça pulverizada; é a fase em que acontece a defor-
a qualidade de vida. midade da cabeça femoral, caso tenha contato entre a
Não há prejuízo do desenvolvimento mental, mesmo epífise e o lábio do acetábulo);
nos casos que apresentam a referida hidrocefalia, que pode - Reossificação;
estar presente na infância. - Remodelação ou residual.
Em crianças acondroplásicas, admitem-se 2 mecanis-
mos na gênese da hidrocefalia decorrentes das alterações É importante lembrar que a cura da necrose ocorre de
esqueléticas da base do crânio: anterior para posterior e de lateral para medial.
- Obstrução liquórica no nível da cisterna magna;
- Diminuição da absorção liquórica, ocasionada por uma B - Incidência
hipertensão venosa, decorrente de uma constrição das
A doença acomete 4 vezes mais meninos que meninas,
veias jugulares no nível dos forames jugulares.
sendo o lado esquerdo mais comum. De 10 a 20% são bila-
As mãos são pequenas, largas e os dedos curtos com terais, e a principal idade para o seu acometimento é entre
separação entre a 3ª e 4ª falanges (mão em tridente). A 4 e 9 anos.
postura do paciente se caracteriza por uma acentuação da
cifose torácica e da lordose lombar, com abdome protru- C - Etiologia
so, no qual o surgimento de hérnia umbilical não é raro.
Alguns autores ainda citam o surgimento de uma cifose Não há etiologia definida. Há teorias, como sinovite com
toracolombar e ainda uma exacerbação das massas mus- aumento da pressão hidrostática intracapsular, aumento da
culares glúteas. São relatados, também, certa limitação na coagulação e da viscosidade sanguínea, aumento dos lipí-
movimentação dos cotovelos e subluxação congênita da dios e infartos de repetição.
121
ORTO P ED I A
E - Classificação
Catterall, em 1971, descreveu uma classificação prog-
nóstica em 4 grupos: grupo I – acometimento de até 25%
Figura 4 - Vascularização da região proximal do fêmur da cabeça femoral; grupo II – até 50%; grupo III – até 75%;
grupo IV – acima de 75%. Outra classificação utilizada é a
de Salter e Thompson, que avalia o sinal da lise subcondral
D - Quadro clínico radiograficamente (sinal de Caffey), dividindo o quadril em:
O quadro clínico é de dor na região do quadril ou joe- A – sinal de Caffey <50%; B – sinal de Caffey >50% da super-
lhos, devido à irradiação do nervo obturatório. Podem-se fície articular. Essa é uma classificação precoce, que permite
observar limitação da abdução, rotação interna e flexão do prever o grau de necrose da cabeça femoral.
quadril em graus variados, dependendo do grau de acome- No mesmo ano, Catterall criou 5 critérios para a cabeça
timento da necrose. Quanto menor a idade de acometi- em risco: calcificação lateral na epífise, lise metaepifisária
mento, melhor o prognóstico; quanto maior o grau de obe- (sinal da unha), presença de cisto metafisário (geoides),
sidade, pior o prognóstico. horizontalização da fise e subluxação lateral da epífise.
No início, os sintomas são pouco intensos, e, ao exame Atualmente, além desses sinais, são considerados sinais da
clínico articular, haverá maior ou menor restrição dos movi- cabeça em risco a extensão da cabeça femoral descoberta
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ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
G - Tratamento
O objetivo do tratamento é obter e manter o quadril
centralizado durante o período ativo da doença para, no fi-
nal do processo, obter uma cabeça femoral perfeitamente
congruente com o acetábulo.
A congruência articular pode ser mantida por métodos
cirúrgicos e não cirúrgicos.
ORTOPEDIA
Figura 5 - Classificação grau I de Catterall e sua evolução
Figura 7 - Gesso pelvipodálico (ou broomstick) para manter a ca-
beça femoral centrada no quadril
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ORTO P ED I A
B - Etiologia
A etiologia permanece desconhecida. No entanto, há
um consenso em relacioná-la com o processo infeccioso
ativo ou recente, com reações alérgicas e trauma. Autores
demonstraram associação a infecções virais e bacterianas,
Figura 9 - Órtese em repouso em especial com focos amigdalianos.
C - Incidência
A predominância é de 2:1 no sexo masculino, em rela-
ção ao feminino.
O número aproximado de casos é difícil de ser determi-
nado, já que boa parte não procura atendimento médico
especializado.
É, geralmente, unilateral. A faixa etária mais comum
ocorre entre 3 e 8 anos, com pico em torno dos 6 anos.
D - Quadro clínico
Figura 10 - Osteotomia de Salter
A queixa principal é de dor de início súbito no quadril de
uma criança saudável, localizada na face anterior da coxa ou
do joelho. Existe limitação funcional do membro afetado,
que é mantido em flexão e rotação externa. A claudicação
acontece durante a marcha. Além disso, podem estar pre-
sentes outros sintomas e sinais clínicos comuns aos proces-
sos inflamatórios articulares.
Os sintomas duram alguns dias (de 1 a 10 dias). A evolu-
ção é benigna, sem deixar sequelas anatômicas e funcionais.
Achados laboratoriais e de imagens são normais.
E - Diagnóstico diferencial
Artrite séptica, doença de Legg-Calvé-Perthes, artrite
Figura 11 - Radiografia pós-operatória: osteotomia acetabular e reumatoide juvenil, febre reumática, leucemia e tumores
osteotomia valgizante do fêmur fixado com placa angulada malignos ou benignos.
124
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
F - Tratamento B - Etiologia
O tratamento é sintomático, e parece essencial repou- A etiologia da luxação congênita do quadril pode ser
sar a articulação afetada. Medicações analgésicas e anti- hiperfrouxidão ligamentar, fatores relacionados à estabili-
-inflamatórias não hormonais podem ser usadas. dade do quadril, posição intrauterina, fatores genéticos e
A punção da articulação não está indicada como trata- ambientais. Sabe-se que a displasia acetabular é resultado
mento da sinovite, somente para fins de diagnóstico dife- de uma luxação do quadril e não a causa da mesma.
rencial com outras condições. A incidência de luxação é bem maior em crianças que
nasceram de parto pélvico; outro fator de aumento dessa
4. Displasia congênita do quadril incidência é a diminuição do volume intraútero (oligodram-
nia), que faz diminuir a mobilidade intraútero e aumentar a
A - Introdução pressão abdominal sobre o feto. O lado esquerdo é acome-
tido, na maioria das vezes, pela posição fetal mais comum
Embriologicamente, o desenvolvimento dos MMIIs e dos
ser o dorso lateral esquerdo. O sexo feminino é acometido
MMSSs inicia-se na 5ª semana de gestação, e a cartilagem arti-
cerca de 4 a 6 vezes mais do que o masculino.
cular do acetábulo e a cabeça femoral iniciam o seu desenvol-
Nos diversos tipos de displasia do quadril, podem ser ob-
vimento na 8ª semana de gestação. Com 11 semanas, o qua-
servadas diversas alterações estruturais que variam de inten-
dril está totalmente formado; a cabeça femoral já é esférica,
sidade de acordo com a gravidade da displasia. Por exemplo:
com 5 a 10° de anteversão, e o acetábulo com 40°. A criança
cápsula frouxa e hiperelástica, ligamento redondo alongado
dentro do útero encontra-se com os quadris em flexão, adução
e distendido, inversão do labrum. Pode apresentar dificulda-
e rotação externa, sendo essa posição a mais estável.
de para redução devido à inversão do labrum, interposição
A definição de displasia do quadril é ampla, pois vai da
do ligamento redondo e pulvinar fibrogorduroso.
simples instabilidade do quadril com frouxidão ligamentar
ORTOPEDIA
até a luxação completa do mesmo. A displasia é uma anor- A maioria das crianças com displasia do desenvolvimen-
malidade da articulação do quadril na qual o fêmur, o ace- to do quadril nasce com instabilidade, mas cerca de 90%
tábulo e a cápsula estão alterados. dos casos se resolvem em 3 meses de forma espontânea.
C - Diagnóstico
O diagnóstico dos recém-nascidos de até 2 meses é feito
por meio da manobra de Ortolani (flexão, abdução e rota-
ção externa simultâneas do quadril, com o dedo indicador
pressionando o trocânter maior em direção ao acetábulo), a
qual é responsável pela redução de um quadril luxado (ruído
de Clumk). No recém-nascido, a cabeça luxada posterolate-
ralmente é facilmente reduzida, porém, no bebê de maior
idade, a contratura das partes moles dificulta a redução.
O teste de Barlow determina se o quadril é luxável ou
não, portanto é um teste provocativo de luxação. A criança
deve ter os 2 quadris fletidos, e se deve examinar 1 quadril
Figura 13 - Luxação do quadril
por vez; o quadril examinado deve estar fletido a 90° e deve-
A displasia pode ser classificada em teratogênica ou tí- rá ser aduzido (essa posição é a de máxima instabilidade para
pica. A teratogênica normalmente está associada a outras a luxação do quadril). Quanto ao recém-nascido, a posição
malformações, como artrogripose e mielomeningocele. fisiológica do quadril e do joelho é de 15 a 20° de flexão (po-
Apresenta uma acentuada luxação do quadril, já diagnos- sição de maior estabilidade), e, com o desenvolvimento, essa
ticada intraútero, e, ao nascimento, a luxação não pode ser flexão diminui. Diante de um recém-nascido com quadril em
reduzida pela manobra de Ortolani. extensão, deve-se sempre pensar em luxação.
A luxação típica ocorre em criança normal e pode ser in- Outros sinais clínicos devem ser observados, como o en-
traútero (fetal ou pré-natal), ao nascimento (perinatal), ou curtamento do fêmur em relação ao lado contralateral, obser-
após o nascimento (pós-natal). É importante determinar o vado com o quadril e joelhos fletidos a 90° (sinal de Galeazzi),
momento da luxação para a determinação do prognóstico. hipotrofia da musculatura do membro inferior, proeminência
A luxação típica pode ser dividida em 3 tipos: quadril lu- do trocânter maior, assimetria das pregas inguinais e glúteas
xado, quadril luxável e quadril subluxado. O quadril luxado (sinal de Peter-Bade) e limitação da abdução do quadril.
em neonatos pode ser facilmente reduzido pela manobra Outras doenças musculoesqueléticas podem estar fre-
de Ortolani; o quadril luxável pode ser provocado (para que quentemente associadas à luxação do quadril: torcicolo
a luxação ocorra) pela manobra de Barlow; e o quadril su- muscular congênito, metatarso varo, pé calcâneo valgo e
bluxável pode mostrar-se com hiperfrouxidão. hiperfrouxidão ligamentar.
125
ORTO P ED I A
É importante saber que a radiografia normal não signi- Radiograficamente, observa-se um retardo na ossifica-
fica quadril normal, pois, muitas vezes, não houve tempo ção da cabeça femoral.
para que ocorressem alterações ósseas identificáveis ao
raio x. O exame radiográfico do recém-nascido é prejudica-
do, já que a ossificação da cabeça femoral ocorre com 3 a
6 meses, estando indicada a avaliação com ultrassom nesta
faixa etária. O ultrassom dinâmico do quadril sob estresse
confirmará o diagnóstico.
As radiografias devem ser feitas com 20 a 30° de flexão
dos quadris e devem ser marcadas as seguintes linhas: linha
de Hilgenreiner ou linha Y – que passa no topo da cartila-
gem trirradiada; linha de Perkins – traçada a partir da mar-
gem mais lateral do acetábulo, é perpendicular à linha de
Hilgenreiner e determina os quadrantes de Ombrédanne, e
a epífise femoral deve ficar no quadrante inferior e medial;
linha de Menard ou de Shenton – é traçada a partir da bor-
da medial do colo femoral com a borda superior do forame
obturatório e deve ser suave e sem quebra. Outra medida
de extrema importância é o índice acetabular, traçado a par- Figura 16 - Radiografia com luxação da cabeça femoral esquerda
tir da linha de Hilgenreiner e o ponto mais alto da superfície
lateral do acetábulo, sendo o normal 27,5° com variação de No diagnóstico, após a idade em que se inicia a mar-
2,5°, e, acima de 30°, o quadril é considerado displásico. cha, ocorre o sinal de Trendelenburg positivo. Na luxação
bilateral, há a marcha de pato ou de marinheiro. O achado
radiográfico é óbvio, com a cabeça deslocada superolate-
ralmente.
D - Tratamento
O tratamento da displasia do desenvolvimento do qua-
dril deve considerar a idade do paciente e objetiva manter,
o mais precocemente possível, um contato concêntrico da
cabeça femoral no acetábulo displásico e, com isso, promo-
ver o desenvolvimento do acetábulo.
a) De 0 a 6 meses
O dispositivo de Pavilik é a órtese mais utilizada atual-
mente, pois permite a mobilidade ativa do quadril. Suas
indicações são crianças de até 4 a 6 meses, com luxação
perinatal típica do quadril e quadris instáveis, reduzidos su-
Figura 15 - Assimetria dos membros inferiores avemente por meio da manobra de Ortolani.
126
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
ORTOPEDIA
a zona de segurança de Ramsey. No acompanhamento dos Pode-se tentar a redução incruenta após tenotomia dos
casos de redução fácil, deve ser retirado o suspensório de adutores e GPP, em caso de sucesso na redução. Caso não
Pavilik em 3 semanas para realizar um estudo radiográfico e se obtenha a redução ou ela se mantenha instável, deve ser
observar a concentricidade da cabeça. O tempo mínimo de feito o tratamento cirúrgico com redução cruenta e poste-
imobilização é de 6 semanas; uma boa regra é o tempo de rior imobilização com GPP.
tratamento ser igual ao dobro da idade da criança em se-
manas quando se inicia a utilização do dispositivo. Quando d) Maiores de 18 meses
não se consegue reduzir um quadril, deve-se realizar tração. O tratamento nesta faixa etária é quase sempre cirúrgi-
co. Se houver instabilidade após redução, deve-se realizar
b) De 6 a 12 meses
osteotomia acetabular (Salter) associada, e pode-se realizar
Em crianças de 6 a 12 meses, deve ser realizada redução osteotomia varizante do fêmur proximal a partir dos 3 anos
incruenta sob anestesia e gesso pelvipodálico (GPP). Caso de idade nos casos em que o colo femoral for valgo.
não se obtenha uma redução satisfatória, deve-se realizar A osteotomia de Salter está indicada a crianças maiores
uma artrografia para verificar como estão a cápsula, a posi- de 18 meses e menores de 6 anos. Sabe-se que a cirurgia
ção do limbo, a presença e o estado do ligamento redondo e de Salter é de redirecionamento, não alterando o tamanho
pulvinar e a profundidade e a forma do acetábulo. Durante a da cavidade acetabular, sendo o fulcro realizado na sínfise
execução da artrografia, pode-se determinar a zona de segu- púbica. Por isso a osteotomia deve ser realizada até 6 anos,
rança de Ramsey. pois, a partir dessa idade, não se consegue dar fulcro na
sínfise pubiana. O máximo de abaixamento do índice ace-
tabular conseguido com o Salter é de 10°. Portanto, deve-
-se realizar a cirurgia de Salter com o índice acetabular até
40°; a partir de então, realiza-se a acetabuloplastia tipo
Pemberton.
Um pré-requisito para a realização do Salter: deve ape-
nas estabilizar uma articulação concêntrica e completa-
mente reduzida e não reduzir uma articulação. O quadril
a ser operado deve ter movimento normal ou próximo do
normal, pois, caso haja limitação da mobilidade após a ci-
rurgia, ocorrerá uma mudança do eixo de deambulação da
criança sem melhora do movimento.
As complicações mais comuns são lesão do nervo is-
quiático, lesão do nervo femoral, perda da correção obtida
devido ao esmagamento do enxerto, necrose avascular, re-
Figura 19 - Artrografia do quadril luxação ou ressubluxação.
127
ORTO P ED I A
Outra técnica é a osteotomia do inominado pericapsu- lógica. O acometimento bilateral é de cerca de 25 a 70%
lar do ílio (Pemberton), a qual se inicia entre as 2 espinhas dos casos.
ilíacas e continua posterior até a cartilagem trirradiada. O A descrição do biótipo mais comum acometido pela
fulcro dessa osteotomia é na cartilagem trirradiada e, para doença é a criança obesa com atraso do desenvolvimento
realizá-la, deve-se ter a cartilagem aberta. sexual (tipo Frölich) e, em poucos casos, os pacientes altos
As complicações mais comuns do tratamento cirúrgico e magros (tipo Mikulicz).
são as recidivas e a necrose avascular da cabeça femoral.
C - Etiologia
A etiologia não está bem definida, e existem várias te-
orias, mas nenhuma explica completamente a razão do
deslizamento. As mais discutidas são as teorias traumática,
anatômica, familiar, hormonal e a causada pela sinovite.
A etiologia do deslizamento é multifatorial, e as 4 prin-
cipais causas são:
- Aumento na altura da fise;
- Alteração do ângulo de inclinação e aplanamento da fise;
- Carregamento anormal da placa de crescimento;
- Insuficiência do colágeno e proteoglicanos.
D - Patogenia
Para ocorrer o escorregamento, deve haver uma força
de cisalhamento maior que as forças estabilizadoras da epí-
fise da cabeça femoral. Essas forças estabilizadoras intrínse-
cas da epífise femoral são pericôndrio, anel pericondral, in-
clinação da fise, altura da fise, processos mamilares e fibras
colágenas transfisárias.
Sabe-se que o pericôndrio se estabiliza cerca de 75% da
cabeça femoral na infância e que, com o envelhecimento,
diminui progressivamente.
O aumento da fise acontece por conta do excesso
do hormônio do crescimento e de testosterona, hipoti-
reoidismo, hipopituitarismo, hipogonadismo e diminuição
da função da vitamina D. Deve-se saber que um descola-
Figura 21 - Tipos de osteotomia para tratamento de displasia do mento epifisário pode associar-se a alterações endócrinas,
quadril por isso a grande maioria dos pacientes apresenta síndro-
me adiposo-genital (obeso e genitália subdesenvolvida) ou,
5. Epifisiólise bem raramente, é muito magra e alta.
O descolamento normalmente acontece na camada hi-
pertrófica da fise. Sabe-se que o hormônio do crescimento
A - Introdução leva a um aumento da altura da fise, estimulando o desliza-
A epifisiólise, ou coxa vara do adolescente, ocorre du- mento, e que o estrogênio leva a uma diminuição da altura
rante o período de crescimento rápido da adolescência, da fise, dificultando muito o deslizamento. Sabe-se, ainda,
quando há o enfraquecimento da fise femoral superior as- que o deslizamento mais comum é o posterior.
sociado às forças de cisalhamento do peso do corpo que
podem levar ao escorregamento da epífise em relação ao E - Quadro clínico
colo femoral. Trata-se de uma alteração da relação anatô- O quadro clínico varia de acordo com o estágio da doen-
mica normal entre a cabeça e o colo femoral. ça. Nos casos crônicos, a dor é na virilha, com irradiação para
a região anterolateral da coxa e joelhos. Essa dor pode piorar
B - Epidemiologia com atividade e esforço físicos. A dor pode ter-se originado
É mais comum no sexo masculino, em negros, em me- há vários meses, e o paciente caminha com marcha antálgica
ninos com idade de 13 a 15 anos e em meninas, de 11 com o membro rodado externamente. O grau de limitação
a 13 anos. É raro acometer meninas após a menarca. Em de mobilidade de movimento depende do grau de desliza-
relação a meninos antes dos 13 anos que apresentem des- mento. Os movimentos mais limitados são abdução, rotação
lizamento, deve-se sempre solicitar avaliação endocrino- interna e flexão do quadril; quando forçados, pode haver dor.
128
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
ORTOPEDIA
ciente que deambule; deve-se passá-lo para a maca e rea-
(envolve história crônica e agudização). Foi classificada por
lizar o raio x com o maior cuidado possível, internando-o
Fish, de acordo com o grau de deslizamento, em:
com tração. Esse é considerado um caso de emergência.
Além disso, realizar radiografias simples nas posições ante- - Pré-deslizamento ou grau I: observa-se apenas um
roposterior e Lauenstein (posição de rã). alargamento da fise com rarefação, e não há desloca-
Aos achados radiográficos, observa-se alargamento da mento real;
fise, com medialização da epífise. Caso se trace uma linha - Deslizamento mínimo ou grau II: observa um desloca-
paralela ao eixo superior do colo do fêmur, ela deve cortar a mento máximo de menos de 1/3 do diâmetro da me-
epífise da cabeça femoral nos casos normais (linha de Klein). táfise do colo femoral;
Se essa linha não cruzar a epífise femoral, haverá indica-
ção de que houve o escorregamento (sinal de Trethowan).
- Deslizamento moderado ou grau III: deslizamento
Outro parâmetro é a área justa-articular metafisária do colo menor que metade do diâmetro;
que está dentro do acetábulo nos quadris normais e fora - Deslizamento grave ou grau IV: deslizamento maior
nos quadris deslizados. Outro sinal muito importante é o de que metade do diâmetro.
Steel, uma linha de esclerose sobreposta no colo femoral,
observado no deslizamento precoce, quando a cabeça fe- Essa medida se dá sempre na radiografia de maior des-
moral deslizou apenas para posterior. lizamento.
Pode-se medir o ângulo da fise com o colo, que, no quadril
normal, é de, no mínimo, 87° e é menor no quadril doente. G - Tratamento
A epifisiólise é uma emergência ortopédica; deve-se
sempre internar o paciente em tração de Russel e realizar
tratamento cirúrgico, pois qualquer movimento intempes-
tivo do indivíduo pode aumentar o deslizamento. O trata-
mento definitivo com tração ou gesso não deve ser utiliza-
do, pois levaria muito tempo para que a fise se fechasse, e
o risco de condrólise seria muito alto.
Alguns autores preconizam o uso de hormônios sexuais
nos pacientes com a fise quase fechando, porém não há ne-
nhuma prova de sua função.
Recomenda-se a fixação in situ aos casos de deslizamen-
to menor de 2/3 da cabeça femoral (60%). O objetivo do
tratamento da epifisiólise é impedir o aumento do desliza-
Figura 23 - Linha de Klein na radiografia anteroposterior mento e aumentar a rapidez do fechamento da fise.
129
ORTO P ED I A
A - Introdução
Figura 25 - Fixação in situ na epifisiólise
A coxa vara congênita compreende uma anormalidade
A fixação profilática do lado contralateral é indicada a na extremidade proximal do fêmur caracterizada por uma
pacientes de baixo nível socioeconômico (não consegue diminuição do ângulo cervicodiafisário e presença de defei-
acompanhar), com doenças endócrinas e negros, na pre- to primário no colo femoral. Deformidade progressiva, em
sença radiológica de sinais de pré-deslizamento, com bióti- que ocorre deslocamento posteroinferior gradual da epífise
proximal do fêmur.
pos típicos relacionados à doença e a crianças muito jovens
A coxa vara do desenvolvimento pode ser definida como
devido à incidência aumentada. O parafuso deve sempre
uma deformidade não detectável ao nascimento que acar-
entrar mais anteriormente no colo, pelo fato de o desliza-
reta diminuição do ângulo cervicodiafisário para menos de
mento ser posterior; quanto maior o deslizamento, mais
120 a 135°.
anterior a entrada do parafuso.
Sabe-se que o tratamento cirúrgico com fixação in situ
sem tentativa de redução oferece melhor resultado. Nos ca-
sos de escorregamento crônico agudizado, pode-se tentar 1
ou, no máximo, 2 reduções; não se deve tentar a redução
anatômica do escorregamento.
Caso haja mais de 80% de escorregamento, podem ser
realizadas osteotomias do fêmur proximal, porém têm indi-
cação restrita, devido ao grande número de complicações.
Figura 27 - (A) Coxa vara, <120°; (B) normal, 120 a 135° e (C) coxa
valga, >135°
B - Incidência
Não há predileção por etnia ou sexo, e o acometimento
unilateral é de 2 a 3 vezes mais comum que o bilateral.
C - Diagnóstico diferencial
Displasias ósseas, como doença de Morquio, disostose
Figura 26 - Pós-operatório: osteotomia do fêmur proximal bilateral cleidocraniana, displasia epifisária múltipla, condrodispla-
130
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
sia metafisária, doença de Gaucher, deficiência focal pro- O defeito em varo é progressivo e tanto maior quanto
ximal do fêmur, displasia espondiloepifisária congênita e mais vertical é a zona de ossificação irregular. O trocânter
osteogênese imperfeita. maior torna-se relativamente elevado, e há diminuição da
A deformidade em varo do fêmur pode, ainda, ocorrer distância articulotrocantérica.
após necrose avascular da cabeça, epifisiólise, osteomielite,
artrite séptica, raquitismo, traumatismos e doença de Paget.
D - Etiologia
A causa exata não é conhecida, mas têm sido demons-
trados aspectos hereditários. A deformidade está relaciona-
da a um gene mutante herdado de forma dominante.
Além da hereditária, outras teorias para explicar a etio-
logia da deformidade incluem anormalidades metabólicas
que causam deficiência ou retardo no processo de ossifica-
ção, anormalidades mecânicas que acontecem no início da
marcha, dano vascular ao aspecto inferior do colo femoral e
anormalidades do desenvolvimento que causam alterações
na formação e na maturação da cartilagem.
A deformidade em varo acontece por alteração biome-
cânica do local.
E - Clínica
ORTOPEDIA
O diagnóstico costuma ser tardio. Mais da metade dos
casos é diagnosticada após os 5 anos de idade. Dificilmente
a doença é notada antes do desenvolvimento da marcha
independente.
A claudicação, indolor, é a queixa inicial dos pais. O tro-
cânter maior torna-se relativamente proeminente e eleva-
do no lado afetado. Nas deformidades unilaterais, ocorrem
diminuição do comprimento do membro afetado e marcha
de Trendelenburg por insuficiência do músculo glúteo mé-
dio. Costuma haver diminuição da amplitude de abdução e
rotação medial do quadril.
F - Aspectos radiográficos
Figura 29 - Radiografia mostrando coxa vara
Há diminuição do ângulo cervicodiafisário (< 90°), e a
placa fisária se apresenta afilada e se torna verticalizada. G - Tratamento
Os objetivos do tratamento são a correção do ângulo
cervicodiafisário, a obtenção de um melhor posicionamento
da epífise femoral proximal e a prevenção de deformidades
secundárias. O tratamento conservador é ineficaz (gessos e
órteses de abdução e rotação medial e tração).
Os pais devem ser orientados quanto ao aspecto pro-
gressivo da deformidade e à necessidade de tratamento
cirúrgico corretivo, em grande parte das vezes.
São critérios para intervenção cirúrgica: ângulo cervico-
diafisário <90° e marcha de Trendelenburg. Para a decisão
do tratamento, o paciente deve ser avaliado quanto à idade
e limitações funcionais.
A indicação cirúrgica é de osteotomia valgizante, que
promove a mudança da posição vertical da epífise femoral
para posição horizontal, diminuindo, assim, as forças de
cisalhamento sobre o colo e favorecendo a ossificação do
Figura 28 - Radiografia com coxa vara à direita defeito ósseo.
131
ORTO P ED I A
H - Complicações B - Epidemiologia
Recorrência da deformidade, fechamento prematuro Acomete mais o sexo feminino, e a idade relatada do
da fise, crescimento excessivo do trocânter maior, displasia 1º episódio de luxação é após os 12 anos. Não há relação
acetabular e pseudoartrose, necrose avascular da cabeça entre o 1º episódio e os subsequentes, e consideram-se 3
femoral, discrepância do comprimento dos membros infe- episódios no mínimo para achar o diagnóstico, bem como o
riores e artrite degenerativa. medo do paciente e a falta de segurança em usar o joelho
para atividades esportivas.
7. Luxação recidivante da patela São fatores que podem determinar luxação recidivante:
alterações congênitas na inserção do músculo vasto late-
ral, determinando maior tensionamento lateral; patela alta
A - Introdução que permite à patela sair do sulco intercondilar e se des-
Trata-se de instabilidade patelar, em geral progressiva, locar lateralmente quando o joelho é fletido; desequilíbrio
que permite que o mecanismo femoropatelar tenha mais muscular; frouxidão ligamentar pós-traumática; luxações
mobilidade e que a patela sofra deslocamentos laterais traumáticas maltratadas ou não tratadas podem levar ao
periódicos. As alterações podem ser de partes moles ou ós- deslocamento repetitivo; e, finalmente, fatores congênitos,
seas, da patela ou do fêmur. como agenesia ou hipoplasia da patela, hipoplasia do côn-
dilo lateral ou alterações na profundidade do sulco inter-
condilar e assimetria da patela.
C - Diagnóstico
Dor articular exacerbada com esportes e atividades físi-
cas mais intensas, principalmente que exigem muita potên-
cia muscular do quadríceps. Podem ocorrer sinovite com
leve derrame articular e, ainda, uma sensação de falta de
força ou bloqueio articular e o relato do paciente de que
sente que vai cair durante a marcha ou a corrida.
132
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
Ao exame físico, devem-se observar a altura da patela, superfícies articulares, com erosões na cartilagem hialina,
dos côndilos femorais e o alinhamento do joelho para de- de início na articulação femoropatelar e, posteriormente,
terminar um possível valgo prévio. Testam-se a força mus- na femorotibial.
cular do quadríceps, a presença de atrofia muscular, o grau Existe um processo reacional inflamatório, com quadro de
de flexão-extensão e a mobilidade laterolateral da patela, sinovite crônica, dor, derrame articular e atrofia quadricipital.
bem como a possibilidade ou não de luxá-la manualmente.
Em caso de luxação provocada ao exame físico, em geral E - Tratamento
há uma dor aguda ou o paciente refere uma sensação igual Devem-se avaliar fatores etiológicos, grau de desloca-
à que acontece nas recidivas. mento e instabilidade, tempo de evolução, número e cau-
Faz-se o estudo radiográfico de rotina com radiografias sas dos episódios e grau de artrose, se existente.
em anteroposterior e perfil e axiais da patela em 45 e 90° Deformidades angulares do joelho, em varo ou valgo, se
de flexão, que mostram com clareza as alterações articu- existentes, devem ser corrigidas simultaneamente.
lares femoropatelares e femorotibiais, a forma da patela e Inicia-se o tratamento com medidas conservadoras,
os sinais de alterações congênitas e de degenerações que como órtese e fisioterapia.
podem estar presentes. A fisioterapia objetiva fortalecer a musculatura do vasto
medial e alongar as estruturas posteriores e laterais do jo-
elho. A maioria dos pacientes é tratada através de medidas
conservadoras, sendo indicada cirurgia à minoria.
Preconiza-se o tratamento cirúrgico se há falha no trata-
mento conservador. A cirurgia básica é uma quadricepsplas-
tia, além de tensionamento do vasto medial associado à libe-
ração do retináculo lateral da patela. Quando se observa uma
ORTOPEDIA
lateralização da inserção do tendão patelar, deve-se reinseri-
-lo mais medialmente e fixá-lo com parafuso esponjoso.
No pós-operatório, a imobilização é mantida em 20° de
flexão por 4 semanas, em caso de cirurgia apenas em partes
moles. Se ocorrer reinserção do tendão patelar, o prazo será
de 6 a 8 semanas.
Após a retirada do gesso, deve-se iniciar fisioterapia
para recuperar a mobilidade articular e as atrofias muscula-
Figura 33 - RM do joelho mostrando a luxação lateral da patela res, geralmente bastante intensas nesses pacientes.
133
ORTO P ED I A
Nesta patologia, ocorre um afastamento do fêmur e da O exame físico mostra ressalto do menisco discoide na
tíbia. Sendo uma estrutura “anormal” interposta na interli- interlinha articular lateral, que pode ser considerado audí-
nha articular do joelho, promove uma compressão nas car- vel, visível e palpável ao levar o joelho de flexão para exten-
tilagens hialinas principalmente do côndilo femoral. são, que também pode ser bloqueada nos graus finais de
Trata-se de uma malformação congênita, cuja etiologia ain- movimento.
da não está esclarecida. Na grande maioria dos casos, localiza- Atrofia do quadríceps e derrame articular podem estar
-se no menisco lateral (externo). Pode atingir ambos os sexos. presentes.
D - Diagnóstico
O diagnóstico é geralmente tardio, costuma acontecer
após os 5 anos, quando surgem os primeiros sintomas.
Inicia-se dor indefinida e progressiva aos movimentos
finais da extensão ou da flexão, e pode ocorrer sensação
de falseio ou queda iminente durante a marcha e a corrida.
Motivos de queixa são ruídos articulares ou cliques que cor- Figura 37 - (A) RM mostrando menisco discoide e (B) menisco nor-
mal e forma discoide
respondem ao deslocamento meniscal.
Progressivamente, a sintomatologia torna-se mais evi-
dente em relação à dor. A redução das atividades habituais
F - Tratamento
ou esportivas da criança e o surgimento de claudicação e O tratamento quase sempre é cirúrgico, uma vez que
bloqueio da mobilidade articular são sinais mais evidentes medidas conservadoras, como repouso, imobilização, fisio-
de menisco discoide e surgem mais tardiamente. terapia e anti-inflamatório não curam a deformidade nem
134
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
promovem a volta do paciente a suas atividades normais. As anormalidades em varo ou valgo determinarão com-
A cirurgia realizada é a meniscoplastia realizada por via ar- pressões em um ou outro compartimento do joelho e dis-
troscópica. tensões constantes às estruturas capsuloligamentares. Sem
as correções, têm-se a presença de instabilidades e o de-
senvolvimento de artrose.
ORTOPEDIA
de vitamina D, fósforo e cálcio podem ocasionar arque-
Figura 38 - Artroscopia do joelho amento dos membros inferiores;
- Displasias ósseas: displasias epifisárias e metafisárias,
9. Joelho varo exostose múltipla familiar congênita, acondroplasia e
encondromatose afetam o crescimento, podendo oca-
sionar alterações em varo;
A - Introdução
- Deformidades congênitas: tíbia vara congênita, pseu-
O varismo do joelho consiste em um desvio do eixo lon- doartrose congênita da tíbia e alterações congênitas
gitudinal em direção lateral, com afastamento entre as 2 do fêmur podem ocasionar varismo do joelho;
articulações. Ocorre um desvio da perna em direção à linha - Alterações epifisárias: ocorrem secundariamente à
média do corpo, e há aumento da distância intercondilar. doença de Blount, às fraturas e lesões epifisárias, à
O ângulo entre o fêmur e a tíbia depende da idade: varia sequela de osteomielite do fêmur ou tíbia, além de tu-
de 5 a 10° de varo ao nascimento até 10 a 12° de valgo na mores situados nessas localizações.
fase dos 3 anos e normaliza para 5 a 7° de valgo a partir dos
6 anos de idade até a fase adulta. O exame radiográfico é importante, pois fornece a me-
dida exata do eixo femorotibial, mais preciso do que a medi-
ção clínica. A radiografia é realizada com filme panorâmico
em posição ortostática.
135
ORTO P ED I A
A - Introdução
A doença de Blount é uma alteração da porção medial
da epífise proximal da tíbia que ocasiona um varismo tibial.
Possivelmente, o distúrbio é causado por forças de com-
pressão excessivas sobre a fise medial durante a fase de
varismo fisiológico do joelho.
Pode acometer ambos os sexos, com leve predominân- Figura 44 - Radiografia com tíbia vara de Blount
cia em meninas. A idade de aparecimento está entre o 1º e
o 10º ano de vida, e é mais frequente a apresentação uni-
lateral.
C - Tratamento
Classifica-se, segundo Blount, em 3 tipos: Órteses corretivas podem ser usadas para o tratamento
a) Infantil: quando se inicia entre 1 e 3 anos. da forma infantil nos estágios I e II, embora não haja com-
b) Juvenil: afeta crianças de 4 a 10 anos. provação científica consistente de sua efetividade. Acredita-
136
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
se que o uso de órtese do tipo longa possa ser efetivo até - Displasias epifisárias;
os 3 anos de idade. Se a correção não for obtida até essa - Tumores benignos: osteocondroma, encondroma, cis-
idade, indica-se o tratamento cirúrgico. tos ósseos que causam pressões anormais nas placas
Do estágio III em diante, o tratamento é sempre cirúrgico. de crescimento, provocando desvios em valgo;
Nos estágios III e IV, a osteotomia valgizante proximal da tíbia, - Frouxidão ligamentar: síndromes de hiperelasticidade
na maioria dos casos, é suficiente para corrigir a deformidade. como Ehlers-Danlos, Down e osteogênese imperfeita;
Já nos estágios V e VI, se faz presente a fusão da fise medial. - Raquitismo.
Portanto, é necessário associar à osteotomia outros procedi-
mentos, como a hemiepifisiodese lateral da tíbia e da fíbula.
ORTOPEDIA
Figura 46 - Criança de 3 anos com joelho valgo
137
ORTO P ED I A
e) Tratamento
Quando há dor moderada, é melhor proteger o pé em
um gesso deambulatório abaixo do joelho, e, durante as 3
semanas iniciais, é melhor evitar apoio mediante o uso de
muletas. Após a remoção do gesso, deve-se utilizar uma
cunha para elevação do arco plantar medial e evitar ativida-
des físicas, como corridas e esportes ativos.
Quando a dor é mínima ou o pé assintomático, um su-
porte para o arco longitudinal é o único tratamento neces-
sário. O prognóstico é bom; o navicular reconstitui-se em
um mínimo de 6 meses.
Figura 47 - Epifisiodese medial
B - Infração de Freiberg
12. Osteocondrites
As osteocondrites são definidas como um distúrbio idio- a) Introdução
pático na ossificação endocondral de epífises ou apófises. Trata-se de uma metatarsalgia anterior, na qual a cabeça
Ocorre fragmentação do osso subcondral e de sua cartila-
do 2º metatarsiano tem uma aparência esmagada. A doen-
gem. As teorias mais aceitas associam as osteocondrites à
isquemia e trauma. ça é vista em adolescentes, geralmente após os 13 anos de
idade. Mais prevalente no sexo feminino, com cerca de 75%
A - Doença de Köhler dos casos, pode ser bilateral e ocorrer na cabeça dos outros
metatarsianos.
a) Introdução
É uma doença autolimitada do navicular do tarso carac- b) Etiologia
terizada por achatamento, esclerose e rarefação irregular. A causa exata não é conhecida, mas a etiologia mais
Incomum, acontece mais em meninos (cerca de 80%). A aceita é a insuficiência vascular.
idade média de início dos sintomas se dá aos 5 anos nos
meninos e 4 anos nas meninas, e, em 1/3 dos casos, ambos c) Achados clínicos e radiológicos
os pés são envolvidos. Dor sob a 2ª ou quaisquer das cabeças metatarsianas
b) Etiologia afetadas, edema local e limitação do movimento da articu-
Há evidências de que existe uma base mecânica, resul- lação metatarsofalângica. A radiografia demonstra achata-
tado de forças de compressão repetidas. mento e irregularidade da cabeça metatarsiana.
c) Clínica
Marcha antálgica, apoiando seu peso no lado lateral do
pé para aliviar o estresse sobre o arco longitudinal medial.
Dor e sensibilidade sobre o osso navicular, espessamento e
edema na área afetada.
d) Achados radiológicos
Achatamento do navicular, estreitamento, rarefação ir-
regular e esclerose do osso afetado.
138
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
ORTOPEDIA
Figura 49 - Radiografia com infração de Freiberg na cabeça do 2º
metatarso
d) Tratamento Figura 50 - Anatomia e local do acometimento da osteocondrite da
tuberosidade anterior da tíbia no joelho
O tratamento é conservador em se tratando do adoles-
cente. No estágio agudo doloroso, o pé é protegido por um O estresse sobre o tendão patelar no nível do ponto
gesso deambulatório abaixo do joelho até o alívio dos sin- de sua inserção é a causa primária da doença de Osgood-
tomas, geralmente em 3 a 4 semanas. A seguir, a pressão Schlatter. A causa é o trauma, não a necrose avascular do
sobre a cabeça metatarsiana deve ser aliviada por um coxim tubérculo tibial proximal.
metatarsiano.
Quanto aos casos em que persistem os sintomas, o osso c) Quadro clínico
avascular ou a cabeça metatarsiana é curetada, e é preen- O quadro clínico é composto de dor local na porção an-
chida a cavidade com enxerto ósseo autógeno. Em relação terior do joelho. O desconforto e a dor são agravados ao
aos adultos, se os sintomas forem incapacitantes, indicam- correr, subir e descer escadas, pular ou submeter o joelho à
-se medidas cirúrgicas que consistem na ressecção da cabe- pressão direta, como ajoelhar-se.
ça metatarsiana. Com o repouso, a dor diminui ou desaparece. À inspeção
e à palpação, o espessamento do tendão patelar e o aumen-
C - Doença de Osgood-Schlatter to excessivo da tuberosidade são evidentes. A área de sensi-
bilidade máxima é a inserção do tendão patelar ao osso.
a) Introdução
d) Achados radiográficos
A doença de Osgood-Schlatter consiste em uma síndro-
Inchaço de tecidos moles anterior à tuberosidade tibial
me caracterizada por dor e edema no nível do tendão pate-
e espessamento do ligamento patelar. É mais bem visualiza-
lar e aumento excessivo do tubérculo tibial proximal. Essa é
do na incidência lateral.
uma doença da pré-adolescência, comumente encontrada
Fragmentação da epífise não é uma característica da
entre os 11 e 15 anos em meninos e 8 e 13 anos em meni-
doença.
nas. A proporção encontrada de meninos é de 3 a 4:1 em
Há 3 tipos distintos de manifestações radiográficas nos
relação às meninas. Geralmente, há um rápido estirão de
estágios tardios:
crescimento e participação ativa em esportes. Pode ser bi-
lateral de 25 a 50% dos casos.
- Tuberosidade proeminente e irregular;
- Tuberosidade proeminente e irregular, além de uma
b) Etiologia pequena partícula livre de osso localizado anterior e
A doença é causada pelo estresse traumático de um superior à tuberosidade da tíbia;
mecanismo quadricipital encurtado sobre a tuberosidade - Partícula livre de osso anterior à tuberosidade, mas,
tibial proximal, em um período de crescimento, quando o fora isso, a tuberosidade parece normal.
139
ORTO P ED I A
140
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
B - Quadro clínico
Os achados clínicos dependem do grau de acometimen-
to da doença, mas em geral os pacientes apresentam baixa
estatura, deformidades torácicas, deformidades dos mem-
bros, alargamento da parte superior do crânio e face com
forma triangular.
As deformidades ósseas seguem um padrão predeter-
minado. Geralmente, ocorrem encurvamento anterior do
úmero, da tíbia e da fíbula e encurvamento anterolateral do
fêmur, do rádio e da ulna. Com relação à coluna vertebral,
as vértebras podem ser achatadas ou bicôncavas, e a cifo-
escoliose torácica é a deformidade mais comum, agravada
por frouxidão ligamentar, osteoporose e fraturas de com-
pressão da vértebra.
ORTOPEDIA
Figura 55 - Esclera azulada
C - Classificação
Sillence classificou a doença em 4 tipos, considerando o
tipo de herança e a apresentação clínica da doença:
- Tipo I: forma mais leve e comum, herança autossômica
dominante. Subclassificada em A e B, de acordo com
Figura 54 - Deformidades ósseas e baixa estatura a ausência e a presença de dentinogênese imperfeita.
As escleras são azuladas, e as primeiras fraturas ocor-
Em virtude da deformidade torácica e da coluna, asso-
rem em idade pré-escolar. Deformidades significativas
ciadas à hipotonia muscular, ocorrem insuficiência respira-
estão ausentes;
tória e infecções pulmonares de repetição, que limitam a
vida desses pacientes. - Tipo II: forma perinatal letal, herança autossômica re-
À radiografia, o sinal mais característico é a osteopenia cessiva, o óbito ocorre logo após o nascimento. A cau-
difusa, que pode estar associada às múltiplas fraturas e de- sa da morte se deve à hemorragia intracraniana;
formidades. - Tipo III: forma mais grave de acometimento (a despei-
Os dentes são translúcidos e com coloração amarelada. to do tipo II). Acontecem fraturas no 1º ano de vida, e
Em geral, a 1ª dentição é mais acometida que a 2ª, com as deformidades, ao longo dos meses. Herança autos-
desgaste da dentina, aparecimento de cárie e encurtamen- sômica recessiva;
to dos dentes. - Tipo IV: forma intermediária entre os tipos I e II. É o
A esclera azulada é um achado frequente e resulta do tipo menos comum; a esclera é normal, a dentinogê-
aumento da permeabilidade à luz, revelando os pigmentos nese imperfeita é comum, e a herança é autossômica
e os vasos sanguíneos presentes no fundo do olho. dominante.
141
ORTO P ED I A
D - Tratamento
O objetivo é obter o máximo de função, reduzindo a
incapacidade e oferecendo ao paciente independência nas
atividades do dia a dia. É importante que diversas especiali-
dades participem do tratamento.
Mais recentemente, os bifosfonados, inibidores da rea-
bsorção óssea, têm sido utilizados como terapêutica sistê-
mica com bons resultados, uma vez que reduzem a dor, au-
mentam a reabsorção e a densidade mineral óssea, levando
à diminuição da fragilidade óssea e, consequentemente, à
redução das fraturas. Dentre os bifosfonados, utiliza-se o
pamidronato dissódico em intervalos de 4 meses em um
total de 3 tratamentos por ano.
Em relação ao tratamento ortopédico, suas funções são
o tratamento e a prevenção de fraturas, a redução de defor-
midades secundárias e a preservação da função do membro.
Devem-se estimular exercícios para o fortalecimento
muscular, os quais, por sua vez, promovem aumento da
densidade óssea, além de utilizar órteses quando indicado
para prevenir fraturas e deambular.
No caso de fraturas, estas devem ser imobilizadas com
Figura 57 - Radiografia com deformidades dos membros inferiores gesso, o menor tempo possível, para evitar perda de massa
em uma criança com osteogênese imperfeita tipo IV óssea e muscular e, consequentemente, fraturas de repeti-
142
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
ORTOPEDIA
tura extraforaminal, devem ser realizados a ressecção do
clusive da mão. É o 2º tipo mais comum, e a recuperação
neuroma e o enxerto local com o nervo sural.
espontânea com frequência é incompleta.
Desde o nascimento, as crianças que apresentam lesão
c) Paralisia baixa (Klumpke): lesão isolada das raízes de
total e/ou síndrome de Horner (miose, ptose palpebral, enof-
C8 a T1. É raramente encontrada.
talmia e anidrose) têm prognóstico reservado devido à ocor-
rência de avulsão das raízes. Nesses casos, pode ser utilizada Tabela 1 - Classificação da paralisia braquial obstétrica
alguma técnica de neurotização (transferência de nervo). Tipo Raízes Manifestações
Nas lesões não tratadas, após os 2 anos de vida, diversas - Braço acometido sem movimento,
técnicas de liberação articular, transferência tendinosa e os- ao lado do corpo, com o ombro ro-
teotomias têm sido descritas e empregadas. dado internamente, cotovelo esten-
dido e punho ligeiramente fletido;
B - Anatomia - Perda da abdução e da rotação ex-
terna do braço. Incapacidade para
O plexo braquial é formado pelas raízes de C5, C6, C7, Erb-Duchenne a flexão do cotovelo e supinação do
C8 e T1. C5 a C7
(paralisia alta) antebraço. Ausência do reflexo bici-
pital e de Moro no lado acometido;
- Preservação da força do antebraço e
da capacidade de preensão da mão.
Possibilidade de deficiência sensorial
na face externa do braço, antebraço,
polegar e indicador.
- Flexão do cotovelo e supinação do
antebraço;
- Acometimento dos músculos da
mão com ausência do reflexo de pre-
Klumpke ensão palmar. Reflexos bicipital e ra-
(paralisia C8 e T1 dial presentes. Síndrome de Horner
baixa) (ptose palpebral, enoftalmia, miose,
e anidrose facial) quando há envolvi-
mento das fibras simpáticas cervicais
e dos primeiros nervos espinhais to-
rácicos.
- Membro superior acometido fláci-
Completa C5 a T1
do com todos os reflexos ausentes.
Fonte: Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação.
Figura 59 - Formação do plexo braquial
143
ORTO P ED I A
E - Diagnóstico G - Tratamento
O exame físico bem realizado é o método mais prático e Nos primeiros 3 meses, considerado um período de
confiável de avaliar a severidade da lesão neural. Devem-se observação de possível recuperação neurológica, deve ser
avaliar as movimentações espontâneas do ombro, cotovelo, instituído o tratamento conservador. A manipulação articu-
punho e dedos e realizar testes provocativos como reflexo lar do ombro e do cotovelo deve ser realizada pelos pais e
de Moro. Além disso, avaliar presença ou ausência da sín- orientada pelo médico e pelo fisioterapeuta. O objetivo é
drome de Horner. evitar contraturas que se instalam com rotação interna e
adução do braço e pronação do antebraço.
O tratamento cirúrgico compreende a tentativa de re-
paração direta da estrutura neural com emprego de técni-
cas microcirúrgicas e técnicas ortopédicas convencionais de
atuação nas sequelas ocorridas no membro superior.
A intervenção cirúrgica direta do plexo braquial tem sido
realizada a partir do 3º mês de vida até 1 ano. De 1,5 a 2 anos,
a resposta à reconstrução neurológica não é tão boa, e as alte-
rações esqueléticas secundárias tendem a se estabelecerem.
O reparo microcirúrgico pode ser feito por liberações
Figura 60 - Exame físico mostrando a ausência de mobilidade do externas e internas; enxertos e neurorrafias para rupturas,
membro superior esquerdo e transferências de nervo ou neurotização para as avulsões
ou lesões intraforaminais.
É importante monitorizar o retorno da função do bíceps Diversas técnicas cirúrgicas são descritas para a corre-
como indicador de recuperação do plexo braquial. ção das sequelas, baseadas no alongamento das partes mo-
Radiografias são realizadas para descartar fraturas ou les e transferências musculares. A cirurgia mais utilizada é
paralisia do diafragma do lado acometido. RM pode ser re- a de Sever e L’Episcopo, que consiste na liberação do peito-
alizada na tentativa de distinguir as avulsões das rupturas ral maior e do subescapular, com transferência do redondo
extraforaminais. maior para rotador externo.
Não é utilizado, como rotina, exame eletroneuro-
miográfico. 15. Escoliose idiopática
A - Definição
A escoliose idiopática é uma deformidade tridimensio-
nal da coluna, de causa ainda não conhecida, caracterizada
por um desvio no plano frontal maior que 10°. A escoliose
também inclui alterações no plano sagital e rotacional.
A escoliose desvia a coluna da linha média no plano fron-
tal, e a maior rotação está localizada no ápice da curva. A ro-
tação é feita em direção à convexidade da curva que produz
a giba costal, proeminência observada no teste de Adams.
F - Diagnóstico diferencial
Pseudoparalisia por fratura da clavícula ou úmero proxi-
mal; aplasia congênita das raízes do plexo braquial; varicela
congênita do membro superior; paralisia cerebral; com-
pressão intrauterina por banda de constrição ou cordão
umbilical; paralisia por má adaptação intrauterina. Figura 62 - Deformidades da escoliose
144
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
ORTOPEDIA
Figura 64 - Teste de Adams, normal na figura à esquerda e com a
curvatura da escoliose à direita
C - Classificação
Quanto à idade, divide-se em escoliose:
- Infantil: até os 3 anos;
- Juvenil: de 4 a 10 anos;
- Adolescente: de 11 a 17 anos; Figura 65 - Linha do prumo mostrando coluna vertebral com esco-
E - Exames complementares
Devem-se observar alguns fatores, como a idade no
momento do aparecimento, história familiar, velocidade de A avaliação radiográfica é feita com o paciente em pé,
crescimento, sinal de puberdade e presença da menarca em incidência em perfil e frente, expondo toda a coluna em um
meninas. só filme.
145
ORTO P ED I A
A - Introdução
A escoliose idiopática do adolescente é a forma mais
Figura 66 - Radiografia anteroposterior da coluna total com es-
comum de escoliose, que incide em até 2% dos adolescen-
coliose
tes. Em curvas de pequena magnitude, a distribuição entre
Deve-se observar a existência de alterações de partes meninos e meninas é igual; em curvas com mais de 20°, a
moles e ósseas, como acunhamento vertebral, hemivérte- incidência de meninas é de 4:1 em relação aos meninos.
bras e barra óssea, para descartar a escoliose de origem O sexo feminino é mais sujeito à progressão do que o
congênita. masculino. A 2ª fase do estirão do crescimento é um fator
A quantificação da curva é realizada pelo método de potencial de piora da deformidade, pois metade desse cres-
Cobb. Tomam-se, como referência, a placa superior da vér- cimento se faz no nível do tronco. Quando o Risser for zero
tebra terminal cranial e a placa inferior da vértebra caudal. ou 1, a chance de piora será maior.
Desenha-se uma perpendicular a essas linhas, medindo o Nem todas as curvas se estabilizam após o término do
crescimento.
ângulo formado com o encontro delas. O ângulo mostra o
grau da escoliose.
B - Tratamento
- Tratamento conservador: nas curvas com menos de
20°, a minoria delas progride, requerendo somente
observação. As curvas com menos de 25° devem ser
avaliadas a cada 4 a 12 meses. O principal fator de-
terminante do intervalo do retorno é a fase de cresci-
mento em que a criança se encontra. As que estão no
estirão do crescimento devem ser vistas a cada 4 a 6
meses.
146
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
ORTOPEDIA
147
ORTO P ED I A
D - Tratamento
O tratamento conservador com fisioterapia é indicado
no dorso curvo postural ou nas deformidades discretas,
Figura 73 - Dorso curvo com cifose <50°.
A órtese mais empregada é o colete de Milwaukee, in-
B - Etiologia dicado aos casos de deformidades não graves, flexíveis em
A etiologia é desconhecida. Sabe-se que a deformidade geral, com cifose <70° e aos casos de pacientes com poten-
acomete, igualmente, ambos os sexos. cial de crescimento.
C - Quadro clínico
Frequentemente, surge perto da puberdade como um
defeito postural, o que usualmente retarda o diagnóstico.
Inicia-se com um aumento da cifose torácica ou toracolom-
bar, algumas vezes acompanhada de dor não intensa, que
piora aos esforços.
Figura 74 - (A) Paciente com dorso normal e (B) paciente com dor- Figura 76 - Tratamento conservador do dorso curvo como colete
so curvo de Milwaukee
148
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
O colete gessado, empregado aos casos mais graves com que permanecerão, independentemente do tratamento
cifose acima de 70° e deformidades rígidas, é conhecido instituído e do resultado final. A avaliação da torção tibial é
como gesso antigravitacional (descrito por Risser), em que a muito difícil nos recém-nascidos, mas torna-se mais eviden-
correção é realizada em mesa ortopédica. Frequentemente, te a torção interna à medida que a criança cresce, estando
são necessárias trocas de gesso. sempre associada, em maior ou menor intensidade.
O tratamento cirúrgico, indicado a deformidades graves Classifica-se o pé torto em postural, idiopático ou verda-
e rígidas no final do crescimento ou a pacientes adultos, é deiro e teratológico.
raramente empregado.
A - Definição
O Pé Torto Congênito (PTC) é uma deformidade com-
plexa que compromete as estruturas ósseas e partes moles
caracterizada, clinicamente, por equino do retropé, varo do
calcâneo, adução e supinação do médio e antepé e cavo.
O PTC idiopático ocorre em crianças sem alterações sub-
jacentes que justifiquem o quadro e não se resolve de forma
espontânea. Outros tipos de pés tortos são: o postural, que Figura 77 - Criança com pé torto bilateral
se resolve habitualmente com manipulações; o neurológico,
O PTC postural é flexível e corrigido com manipulação ou
ORTOPEDIA
associado à mielomeningocele; e o sindrômico, presente nas
crianças com outras anomalias congênitas; os 2 últimos, ge- necessita somente de algumas trocas de gesso para obter a
ralmente rígidos e muito resistentes ao tratamento. correção das deformidades. Quanto ao PTC idiopático ou ver-
A incidência é de 1:1.000 nascidos vivos, é bilateral em dadeiro, a deformidade é mais acentuada e pouco flexível. Já
50% dos casos e acomete, mais frequentemente, o sexo o teratológico caracteriza-se pela rigidez, associação a síndro-
masculino, a uma proporção de 2:1. mes, dificuldade de correção e altas taxas de recidiva.
A radiografia avalia os ossos do pé, mas o exame é de
B - Etiologia pouca importância porque se encontram pouco ossificados
e não aparecem bem na radiografia. Deve-se avaliar o ân-
A etiologia é desconhecida. A incidência aumenta em gulo entre o eixo longitudinal do talo e do calcâneo que se
ocorrência de casos familiares, sugerindo influência ou de- encontra diminuído (ângulo de Kite).
terminação genética. Na radiografia anteroposterior avaliamos os ângulos ta-
Na anatomia patológica, praticamente todas as estrutu- localcâneo (normal de 20 a 50°), talo-1º meta (normal de 0
ras do pé apresentam anormalidade, mas as principais es- a 20°) e talo-5º meta (o normal é zero).
tão no retropé. A deformidade óssea mais importante ocor- No perfil avaliamos os ângulos talocalcâneo (normal de
re no talo, que apresenta a extremidade anterior desviada 25 a 50°), o tibiotalar (70 a 100°) e o tibiocalcâneo com dor-
medial e plantar, o colo encurtado e o corpo pequeno. siflexão máxima (25 a 60°).
Os ligamentos são espessados, e os músculos, hipoplá- O osso que apresenta maior deformidade é o tálus, que
sicos. tem seu colo encurtado e sua superfície medial diminuída.
O ângulo formado pelo eixo longo da cabeça e do colo com
C - Diagnóstico o eixo longo do corpo do tálus é chamado ângulo de decli-
O diagnóstico do PTC é evidente, observando-se as de- nação, que no pé normal do adulto é de aproximadamente
formidades referidas, pé equino varo, cavo, aduto e supino. 150 a 160° e no PTC seu valor está entre 115 e 135°.
O grau de deformidade e flexibilidade é variável.
O diagnóstico do PTC no recém-nascido é essencialmen- D - Tratamento
te clínico. O objetivo do tratamento é um pé plantígrado, indolor,
Existe grande dificuldade em avaliar e reproduzir as me- flexível, com boa força muscular e que permita o uso de cal-
dições radiográficas. Os núcleos de ossificação são arredon- çado comum. O tratamento é iniciado o mais precocemente
dados e excêntricos em seus moldes cartilaginosos, impos- possível, por meio de manipulação e trocas de gesso. Caso
sibilitando, por vezes, o correto traçado de seus eixos. Além não se obtenha um resultado satisfatório, indica-se o trata-
disso, raramente conseguem-se radiografias com adequado mento cirúrgico.
posicionamento dos pés. Os métodos de manipulação para corrigir a deformida-
Além das deformidades características do PTC, obser- de e a imobilização com trocas seriadas de gesso mais co-
vam-se uma atrofia da perna e um tamanho menor do pé, nhecidos são de Kite e Ponseti.
149
ORTO P ED I A
19. Resumo
Quadro-resumo
Acondroplasia
- Definição: tipo mais comum de nanismo, caracteriza-se por mem-
bros curtos, com cabeça protuberante e alterações pélvicas;
- Etiologia: apresenta herança autossômica dominante, porém, em
85% dos casos, é causada por uma mutação genética aleatória;
- Fisiopatologia: ocorre na placa de crescimento, principalmente
na camada proliferativa, levando a alterações na região metafi-
sária do osso; o crescimento longitudinal do osso ocorre de for-
ma mais lenta;
- Diagnóstico: feito ao nascimento, com o bebê muito peque-
no, principalmente seus membros, uma cabeça aumentada de
diâmetro, lordose lombar; as mãos são curtas e alargadas; as
funções endócrina e sexuais normalmente são normais, assim
como a inteligência;
- Radiografia: ossos longos de tamanho reduzido, com largura e
densidade normais, assim como as epífises, com metáfises alar-
gadas e epífises normais.
Doença de Legg-Calvé-Perthes
- Definição: necrose isquêmica ou avascular do núcleo secundário
de ossificação da epífise proximal do fêmur durante o desenvol-
vimento;
Figura 78 - (A) Manipulação e gesso para correção do pé torto con- - Incidência: acomete 4 vezes mais meninos do que meninas;
gênito e (B) órtese utilizada após a retirada do gesso lado esquerdo mais comum; 10 a 20% são bilaterais; idade en-
tre 4 e 9 anos;
O tratamento cirúrgico é indicado após os 9 meses, e é - Etiologia: indefinida; há teorias, como sinovite com aumento da
realizada uma liberação das estruturas mediais e postero- pressão hidrostática intracapsular, aumento da coagulação e da vis-
laterais do pé, com a correção da deformidade e fixação da cosidade sanguínea, aumento dos lipídios e infartos de repetição;
articulação talonavicular e subtalar. - Quadro clínico: dor na região do quadril ou dos joelhos; limita-
Em crianças com mais de 4 anos e deformidades rígidas, ção da abdução, rotação interna e flexão do quadril em graus
pode-se usar a talectomia. variados; marcha com claudicação; nos casos crônicos graves,
Deformidades graves em crianças acima de 10 anos po- pode haver sinal de Trendelemburg;
dem ser corrigidas com fixador externo de Ilizarov ou com - Classificação: Catterall e Stulberg;
artrodese tríplice. - Diagnóstico diferencial: sinovite transitória, pioartrite, artrites
reumáticas, tumores ósseos, displasias epifisárias, hipotireoidis-
mo e anemias hemolíticas;
- Tratamento: obter e manter o quadril centralizado durante o perí-
odo ativo da doença; utilizar aparelhos ou órtese tipo Atlanta (ou
Scottish Rite); gesso tipo broomstick; os meios cirúrgicos consistem
em osteotomias para reorientação do acetábulo sobre a cabeça
femoral (osteotomia de Salter) ou osteotomia varizante do fêmur.
Sinovite transitória do quadril
- Definição: caracteriza-se por um quadro agudo de dor, afetando
um dos quadris de uma criança sadia. Apresenta uma limitação
funcional da articulação e dificuldade na marcha. Os sintomas
duram por um tempo curto, e a recuperação completa ocorre
em todos os casos;
Figura 79 - Cirurgia para correção do pé torto congênito e uso do - Etiologia: desconhecida. No entanto, relaciona-se com o processo
fixador externo tipo Ilizarov para correção progressiva das defor- infeccioso ativo ou recente e associação a infecções virais e bacte-
midades rianas, em especial com focos amigdalianos;
150
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
ORTOPEDIA
- Classificação pelo grau de deslizamento:
- Incidência: maior em crianças que nasceram de parto pélvico; · Pré-deslizamento ou grau I: deslizamento mínimo ou grau II;
oligodramnia; · Deslizamento moderado ou grau III: deslizamento grave ou
- Localização: lado esquerdo é mais comum; grau IV.
- Sexo feminino: acometido cerca de 4 a 6 vezes mais do que o - Tratamento: emergência ortopédica; deve-se sempre internar
masculino; o paciente em tração e realizar tratamento cirúrgico com fi-
- Diagnóstico: xação com parafuso in situ nos casos de deslizamento menor
· Recém-nascidos de até 2 meses de idade – manobra de de 2/3 da cabeça femoral (60%). Caso haja mais de 80% de
Ortolani, teste de Barlow, encurtamento do fêmur em relação escorregamento, podem ser realizadas osteotomias do fêmur
ao lado contralateral (sinal de Galeazzi), hipotrofia da muscu- proximal, porém têm indicação restrita, em razão do grande
latura do membro inferior, proeminência do trocânter maior, número de complicações;
assimetria das pregas inguinais e glúteas (sinal de Peter-Bade) - Objetivo do tratamento: impedir o aumento do deslizamento
e limitação da abdução do quadril; e aumentar a rapidez do fechamento da fise.
· Após a idade em que se inicia a marcha, ocorre o sinal de Coxa vara congênita
Trendelenburg positivo. Na luxação bilateral, há a marcha de - Definição: anormalidade na extremidade proximal do fêmur ca-
pato ou de marinheiro. O achado radiográfico é óbvio, com a racterizada por uma diminuição do ângulo cervicodiafisário;
cabeça deslocada superolateralmente; - Epidemiologia: não há predileção por etnia ou sexo, e o acome-
· É importante saber que a radiografia normal não significa qua- timento unilateral é 2 a 3 vezes mais comum que o bilateral;
dril normal, pois, muitas vezes, não houve tempo para que - Diagnóstico diferencial: displasias ósseas, como doença de
ocorressem alterações ósseas identificáveis ao raio x; Morquio, disostose cleidocraniana, displasia epifisária múltipla,
· Ultrassom dinâmico do quadril sob estresse confirmará o diag- condrodisplasia metafisária, doença de Gaucher, deficiência fo-
nóstico. cal proximal do fêmur, displasia espondiloepifisária congênita e
- Tratamento: tem como objetivo manter, o mais precocemente osteogênese imperfeita;
possível, um contato concêntrico da cabeça femoral no acetábu- - Etiologia:
lo displásico e, com isso, promover o desenvolvimento do acetá- · Diagnóstico: costuma ser tardio, após os 5 anos de idade; clau-
bulo; considera a idade do paciente: dicação, diminuição da amplitude de abdução e rotação medial
· De 0 a 6 meses: órtese de Pavilik; do quadril;
· De 6 a 12 meses: realizada redução incruenta sob anestesia e · Radiografia: diminuição do ângulo cervicodiafisário (<90°), e a
GPP; placa fisária se apresenta afilada e se torna verticalizada;
· De 12 a 18 meses: redução incruenta após tenotomia dos adu- · Tratamento: cirurgia para a correção do ângulo cervicodiafisá-
tores e GPP; rio, a obtenção de um melhor posicionamento da epífise femo-
· Maiores de 18 meses: cirúrgico; osteotomia acetabular (Salter) ral proximal e a prevenção de deformidades secundárias.
associada, e pode-se realizar osteotomia varizante do fêmur Luxação recidivante da patela
proximal a partir dos 3 anos nos casos em que o colo femoral - Definição: instabilidade patelar que permite deslocamentos la-
for valgo. terais periódicos;
151
ORTO P ED I A
152
ORTOPEDIA PEDIÁTRICA
Paralisia obstétrica
- Diagnóstico diferencial: pseudoparalisia por fratura da clavícula
ou úmero proximal; aplasia congênita das raízes do plexo bra-
quial; varicela congênita do membro superior; paralisia cerebral;
compressão intrauterina por banda de constrição ou cordão um-
bilical; paralisia por má adaptação intrauterina;
- Tratamento: nos primeiros 3 meses, tratamento conservador
com manipulação articular para evitar contraturas;
- Tratamento cirúrgico: reparação direta da estrutura neural com em-
prego de técnicas microcirúrgicas e técnicas ortopédicas convencio-
nais de atuação nas sequelas ocorridas no membro superior.
Escoliose idiopática
- Definição: deformidade tridimensional da coluna, de causa ain-
da não conhecida, caracterizada por um desvio no plano frontal
maior que 10;
- Etiologia: desconhecida;
- Classificação quanto à idade:
· Infantil;
· Juvenil;
· Adolescente;
· Adulta;
- Exame físico: forma do tronco, compensação das curvas, exame
ORTOPEDIA
neurológico e desenvolvimento puberal. Exame do alinhamento
com o prumo e o teste de Adams;
- Avaliação radiográfica: paciente em pé, incidência em perfil e
frente, expondo toda a coluna em um só filme. A quantificação
da curva é realizada pelo método de Cobb;
- Índice de Risser: a maturidade esquelética é avaliada pela radio-
grafia da pelve.
Pé torto congênito
- Definição: deformidade que se caracteriza por equino do retro-
pé, varo do calcâneo, adução e supinação do médio e antepé e
cavo;
- Incidência: bilateral em 50%; mais frequentemente no sexo
masculino;
- Etiologia: desconhecida;
- Localização: deformidade óssea mais importante ocorre no talo;
- Diagnóstico clínico: pé equino varo, cavo, aduto e supino; atrofia
da perna e um tamanho menor do pé, que permanecerão, inde-
pendentemente do tratamento instituído e do resultado final;
- Radiografia: avalia o ângulo entre o eixo longitudinal do talo e
do calcâneo que se encontra diminuído (ângulo de Kite);
- Tratamento: iniciado o mais precocemente possível, por meio
de manipulação e trocas de gesso. Caso não se obtenha resulta-
do satisfatório, indica-se o tratamento cirúrgico.
153
SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO CIRÚRGICO
CAPÍTULO
4
Doenças neuromusculares
Gustavo Merheb Petrus
1. Paralisia cerebral vando à PC, e é uma das principais causas de morte nesse
período.
Sabe-se que os eventos que levam ao comprometimen-
A - Conceito to cerebral são diminuição de O2, devido à hipoxemia (di-
A Paralisia Cerebral (PC) diz respeito à lesão em um cé- minuição da concentração de O2 no sangue), ou isquemia
rebro imaturo, determinando alterações motoras, como (diminuição da perfusão de sangue no cérebro). A isquemia
distúrbios da postura e do movimento. Os distúrbios não é a mais importante forma de privação de O2. No período
são progressivos, mas permanentes. neonatal, ocorre a soma destas 2 situações, hipoxemia e
Com a evolução, pode ocorrer uma piora do quadro clí- isquemia. A encefalopatia hipóxico-isquêmica se caracte-
nico devido ao aumento das contraturas musculares e da riza, portanto, pelo conjunto hipoxemia e isquemia, que,
rigidez articular. associadas a alterações metabólicas, principalmente do
As lesões cerebrais podem causar rebaixamento mental, metabolismo da glicose, levam a alterações bioquímicas,
alteração da visão, fala e audição, comprometendo a intera- biofísicas e fisiológicas, que se traduzem por manifestações
ção e o aprendizado. clínicas secundárias ao comprometimento fisiológico ou es-
O comprometimento do Sistema Nervoso Central (SNC) trutural. Provavelmente a depressão cerebral é uma forma
nos casos de PC decorre de fatores endógenos e exógenos, de proteção na hipóxia severa.
que em diferentes proporções estão presentes em todos os As alterações neuropatológicas da encefalopatia hipó-
casos. Deve-se considerar, dentre os fatores endógenos, o xico-isquêmica variam com a idade, com a natureza da le-
potencial genético herdado, ou seja, a suscetibilidade maior são e com a forma de intervenção, resultando em necrose
ou menor do cérebro para se lesar. Junto com as potenciali- neuronal seletiva, status marmoratus, lesão cerebral paras-
dades de sua atividade motora, instintivo-afetiva e intelec- sagital, leucomalácia periventricular ou necrose isquêmica
tual, herda também a capacidade de adaptação, ou seja, a cerebral focal e multifocal.
plasticidade cerebral, que é a base da aprendizagem. Muitas vezes, não se consegue determinar a causa da
Entre os fatores exógenos, considera-se que o tipo de PC, mas um distúrbio comum é a hipóxia cerebral, que fa-
comprometimento cerebral vai depender do momento em vorece o aparecimento de hemorragias intraventriculares
que o agente atua, de sua duração e da sua intensidade. ou intracranianas, que danificam o cérebro. Outras causas
Quanto ao momento em que o agente etiológico incide so- de risco envolvem problemas maternos como pré-natal mal
bre o SNC em desenvolvimento, distinguem-se os períodos conduzido, alcoolismo, drogas, má nutrição e infecções ma-
pré-natal, perinatal e pós-natal. ternas, como rubéola, toxoplasmose e citomegalovírus.
Com o progresso da neonatologia, há um aumento da
B - Etiologia sobrevida e do número de crianças prematuras nascidas
A associação de asfixia pré e perinatal é responsável com baixo peso e com anóxia perinatal.
pelo maior contingente de comprometimento cerebral do Os cuidados pré-natais com a gestante são de funda-
RN, é a 1ª causa de morbidade neurológica neonatal, le- mental importância para a prevenção.
154
DOENÇAS NEUROMUSCULARES
ORTOPEDIA
• Hiperbilirrubinemia (hemolítica ou por incompati-
Os pacientes com PC têm principalmente comprometi-
bilidade);
mento motor, influenciando o seu desempenho funcional.
• Hipoglicemia;
Segundo Schwartzman (1993) e Souza & Ferraretto (1998),
• Distúrbios hidroeletrolíticos. a PC pode ser classificada por tipo de disfunção motora ex-
- Pós-natais trapiramidal ou discinético (atetoide, coreico e distônico),
• Infecções: atáxico, misto e espástico; ou pela topografia das lesões
(localização no corpo), que inclui tetraplegia, monoplegia,
* Meningites;
* Encefalites. diplegia e hemiplegia. Na PC, a forma espástica é a mais
• Trauma craniano; encontrada e frequente em 88% dos casos.
Quanto à disfunção motora:
• Acidente cerebrovascular;
- Atetoide: caracterizada por movimentos involuntários.
• Cardiopatia congênita cianótica;
Nesse tipo, os movimentos são involuntários devido a
• Anemia falciforme; um estímulo ineficaz e excessivo que o cérebro envia
• Malformações vasculares; ao músculo, não sendo capaz de manter um padrão;
• Encefalopatias desmielinizantes (pós-infecciosas ou - Coreico: acomete crianças e jovens do sexo feminino
pós-vacinais). com movimentos involuntários e descoordenados dos
• Anóxia cerebral: membros e dos músculos da face (dança de São Guido);
* Acidente por submersão; - Distônico: incoordenação do tônus muscular;
* Aspiração de corpo estranho; - Atáxico: dificuldade de coordenação motora (tremo-
* Insuficiência/parada respiratória. res ao realizar um movimento);
• Síndromes epilépticas (West e Lennox-Gastaut);
- Mistos: quando apresentam pelo menos 2 tipos asso-
• Status epilepticus: ciados de alteração do movimento (exemplo: espásti-
* Desnutrição. co e atetoide);
C - Diagnóstico - Espástico: ocorre uma lesão do córtex cerebral, dimi-
nuindo a força muscular e aumentando o tônus mus-
O diagnóstico é clínico e deve ser feito no 1º ano de cular. A tensão muscular encontra-se aumentada ao
vida, por um especialista. A 1ª observação geralmente é a realizar algum alongamento da musculatura ou mes-
da mãe, que relata ao médico que o filho está demorando mo um estiramento.
a equilibrar-se, movimenta pouco as pernas ou tem os pés
mais duros que o normal. Quanto à topografia da lesão:
Tônus muscular anormal (espasticidade ou atetose), - Tetraplegia(hemiplegia bilateral ou quadriplegia):
contratura muscular, crescimento ósseo anormal (defor- ocorrendo em 9 a 43% dos casos, com lesões difusas
155
ORTO P ED I A
bilateral no sistema piramidal apresentando tetrapa- ficada em situação de estresse ou esforço físico maior. Em
resia espástica com retrações em semiflexão severas, um estudo com 100 casos de PC, a forma espástica ocorreu
síndrome pseudobulbar (hipomimia, disfagia e disar- 55 vezes, com predomínio para tetraparesia em 25 casos.
tria), e até microcefalia, deficiência mental e epilepsia; Nas formas coreoatetósicas, ao lado dos movimentos
- Diplegia: surge em 10 a 30% dos pacientes, mais involuntários característicos, podem-se observar alterações
comum em prematuros, comprometendo os mem- do tônus muscular do tipo distonia, com variações para
bros inferiores e podendo apresentar hipertonia dos mais ou para menos, durante a movimentação ou na ma-
músculos adutores, denominada síndrome de Little nutenção da postura. Foram observadas em 11% dos casos.
(cruzamento dos membros inferiores e marcha “em Nas formas atáxicas, encontram-se importantes altera-
tesoura”). Há vários graus para classificar a intensida- ções do equilíbrio e da coordenação motora, associadas à
de do distúrbio, podendo ser pouco afetado (com um hipotonia muscular nítida; essa forma esteve presente em
prognóstico bom, sendo capaz de se adaptar à vida 9% dos casos do estudo. As formas mistas são caracteriza-
diária) ou grave com limitações funcionais. Ao 1º ano das por diferentes combinações de transtornos motores pi-
de vida, a criança pode se apresentar hipotônica, pas- ramidoextrapiramidais, piramidoatáxicos ou piramidoextra-
sando para distonia intermitente, com tendência ao piramidal-atáxicos, tendo sido a 2ª forma mais frequente,
opistótono quando estimulada. Nos casos mais graves, 26% dos casos.
a criança pode permanecer num desses estágios por Transtornos auditivos ocorrem por comprometimento do
toda a vida, porém geralmente passa a exibir hiper- VIII nervo craniano, desde o seu núcleo até a saída pelo orifí-
tonia espástica, inicialmente extensora e, finalmente, cio auditivo interno, e podem estar relacionados ao mesmo
com graves retrações semiflexoras; fator etiológico do qual resultou o quadro de PC, ou pelo uso
- Hemiplegia: é a mais comum de todas, comprometen- de drogas que atingem o nervo auditivo, como alguns anti-
do mais o membro superior; é acompanhada de espas- bióticos usados nos casos de sepse e meningites neonatais.
ticidade, hiper-reflexia e sinal de Babinski. O padrão Alterações da movimentação ocular são frequentes,
hemiplégico caracteriza-se pela postura semiflexora sendo a mais comum o estrabismo convergente, por lesão
do membro superior, com o membro inferior hipe- do nervo abducente. A dificuldade visual pode se mani-
restendido e aduzido, e o pé em postura equinovara, festar por catarata nos casos de toxoplasmose congênita,
podendo ser encontradas hipotrofia dos segmentos hemianopsias por lesão quiasmática ou pós-quiasmática,
acometidos, hemi-hipoestesia ou hemianopsia. além de outros transtornos visuais.
Associado ao distúrbio motor presente na ECNPI, o qua-
dro clínico pode incluir:
- Deficiência mental – ocorre de 30 a 70% dos pacientes.
Está mais associada às formas tetraplégicas, diplégicas
ou mistas;
- Epilepsia – varia de 25 a 35% dos casos, mais associado
à forma hemiplégica ou tetraplégica;
- Distúrbios da linguagem;
- Distúrbios visuais – pode ocorrer perda da acuidade
Figura 2 - Classificação de PC de acordo com a localização e a visual ou dos movimentos oculares (estrabismo);
gravidade neurológica: (A) paralisia espástica unilateral; (B) tetra-
paresia espástica; (C) diplegia espástica (predomínio nos MMII);
- Distúrbios do comportamento – são mais comuns nas
(D) tetraparesia assimétrica (predomínio de um dos lados) e (E)
crianças com inteligência normal ou limítrofe, que se
diplegia assimétrica (MMII bilateralmente e um dos MMSS mais sentem frustradas pela sua limitação motora, quadro
que o outro) agravado em alguns casos pela superproteção ou re-
jeição familiar;
A forma mais frequente é espástica ou piramidal. - Distúrbios ortopédicos – mesmo aos pacientes subme-
Dependendo da localização e da extensão do comprometi- tidos à reabilitação bem orientada, são comuns retra-
mento, manifesta-se por monoplegia, hemiplegia, diplegia, ções fibrotendíneas (50%), cifoescoliose (15%), “coxa
triplegia ou tetraplegia. Nas formas espásticas, encontram- valga” (5%) e deformidades nos pés.
-se hipertonia muscular extensora e adutora dos membros
inferiores, hiper-reflexia profunda e sinal de Babinski, e dé- Tabela 1 - Classificação da PC
ficit de força localizado ou generalizado, dependendo da ex- Espástica
tensão do comprometimento. Na forma diplégica, também Diplegia
chamada de Little, a espasticidade dos membros inferiores - Boa função manual;
é muito intensa, resultando na posição em tesoura ao se
- Má função manual;
tentar colocar o paciente em pé, enquanto nos membros
- Assimétrica.
superiores a espasticidade é leve e, muitas vezes, só identi-
156
DOENÇAS NEUROMUSCULARES
ORTOPEDIA
joelho e equinismo dos pés. Nos membros superiores, ocor- a maioria anda, e são estes os que mais se beneficiam com
re flexão do cotovelo, do punho e dos dedos, em associação cirurgias ortopédicas.
à dificuldade de movimentos finos da mão.
G - Tratamento
O tratamento e a reabilitação são multidisciplinares, en-
volvendo médicos de várias especialidades. O objetivo é pro-
porcionar ao paciente independência nas atividades da vida
diária, comunicação inteligível, locomoção independente,
educação e uma satisfatória integração familiar e social.
O tratamento da PC visa controlar as crises convulsivas,
as complicações decorrentes das lesões e a prevenção de
outras doenças, contraturas ou problemas.
O tratamento medicamentoso baseia-se no uso de an-
ticonvulsivantes e psiquiátricos, quando necessários, para
Figura 3 - Pé equino na paralisia hemiparética obter controle dos distúrbios afetivo-emocionais e da agi-
tação psicomotora.
O tratamento cirúrgico envolve cirurgias ortopédicas
para corrigir deformidades e estabilizar a articulação, além
de preservar a função e aliviar a dor.
A fisioterapia objetiva inibir a atividade reflexa anormal,
normalizando o tônus muscular, e facilitar o movimento
normal, consequentemente melhorando a força, flexibilida-
de, amplitude de movimento (ADM), e as capacidades mo-
toras básicas para a mobilidade funcional. As metas de um
programa de reabilitação são reduzir a incapacidade, pre-
venir contraturas e deformidades e otimizar a função. Os
Figura 4 - Paralisia tetraparética alongamentos musculotendinosos devem ser lentos e reali-
zados diariamente para manter a amplitude de movimento
b) Lesão do sistema extrapiramidal: lesão nos núcleos e reduzir o tônus muscular. Exercícios de grande resistên-
da base, condicionando o aparecimento de movimentos in- cia podem auxiliar no fortalecimento muscular, mas com
voluntários classificados em atetoide, coreico e distônico. as devidas precauções em pacientes com lesões centrais,
Existe o tipo misto, em que ocorre espasticidade associada pois reforçarão as reações tônicas anormais já existentes,
a movimentos involuntários. aumentando a espasticidade.
157
ORTO P ED I A
A - Definição
A artrogripose pode ser definida como contratura arti-
cular congênita de 2 ou mais articulações, não progressiva,
em diferentes áreas do corpo. Trata-se de entidade congê-
nita não progressiva, caracterizada por alterações da pele,
tecido celular subcutâneo, que é inelástico, e aderido aos
planos profundos, acompanhado de ausência das pregas
cutâneas, músculos atrofiados e substituídos por tecido
fibrogorduroso, articulações deformadas com limitação da
mobilidade, rigidez e espessamento das estruturas periarti-
culares e com sensibilidade conservada.
A etiologia é desconhecida, porém há uma relação entre
acinesia fetal e artrogripose. Quanto mais precocemente os
movimentos articulares forem restringidos, mais graves se-
rão as contraturas articulares ao nascimento.
As deformidades, geralmente, são simétricas e a gravi-
dade das mesmas manifesta-se mais intensamente quanto
mais distais forem as articulações na extremidade.
Estas alterações nos membros podem estar associadas
a outras malformações, tanto viscerais como neurológicas,
estando presentes em inúmeras doenças agrupadas por
Hall, sob o denominador comum das múltiplas contraturas
articulares congênitas.
Os prováveis fatores relacionados à diminuição do movi-
mento fetal são anomalias do SNC (processo neuropático), Figura 5 - Crianças com artrogripose
anormalidades musculares, anormalidades do tecido conjun-
Nos membros inferiores, os quadris geralmente em fle-
tivo, limitação do espaço intrauterino e doenças maternas.
xão, abdução e rotação externa apresentam-se luxados em
1/3 dos casos. Os joelhos podem estar em flexão ou exten-
B - Classificação de Hall são. Já os pés podem ter várias deformidades, sendo mais
- Tipo I: envolvimento principal dos membros: comum o pé torto cavo varo.
158
DOENÇAS NEUROMUSCULARES
C - Tratamento
ORTOPEDIA
3. Mielomeningocele
A - Definição
A mielomeningocele, uma das mais graves anomalias
congênitas compatíveis com a vida, é uma lesão cística, con-
tendo liquor e tecido nervoso no seu interior, acompanhada
de alterações motoras e sensitivas de acordo com o nível e
a extensão do acometimento da região da coluna vertebral
e da medula espinhal. Figura 8 - Ultrassonografia com mielomeningocele
Figura 9 - Mielomeningocele
Figura 6 - Malformação e lesão cística
159
ORTO P ED I A
4. Poliomielite
A - Definição
O termo “poliomielite” é oriundo do grego – poliós (cin-
zento), myelós (medula) e ítes (inflamação). Trata-se de
uma doença aguda e infecciosa causada por um vírus com-
posto por cadeia simples de ácido ribonucleico (RNA), cuja
transmissão ocorre primariamente pela via oral-fecal (por
meio de objetos, alimentos e/ou água contaminados com
fezes) ou por transmissão direta, de pessoa a pessoa (por
meio de secreções nasofaríngeas).
A poliomielite compreende uma doença infecciosa agu-
da causada por um grupo de vírus neurotrópicos que, ini-
cialmente, invadem os tratos gastrintestinal e respiratório
e espalham-se para o SNC por meio da via hematogênica. Figura 10 - Microscopia eletrônica do vírus
160
DOENÇAS NEUROMUSCULARES
C - História clínica
No Brasil, a última epidemia de poliomielite registrada
ocorreu em 1984, sendo que o último caso registrado foi em
1989. A partir de 1990, o Brasil cumpriu todos os critérios
estabelecidos pela Comissão Internacional de Certificação
da Erradicação da Poliomielite, recebendo em 1994 o cer-
tificado de interrupção da transmissão autóctone do polio-
vírus.
Com o advento da imunização, a incidência no número
de casos diminuiu drasticamente em todo o mundo. No
entanto, uma fração dos pacientes que já desenvolveu po-
liomielite, durante as décadas de 1960 e 1970, está apre-
sentando atualmente os efeitos tardios da doença. Esses Figura 11 - Sequela da poliomielite com atrofia do membro inferior
efeitos se manifestam clinicamente como nova fraqueza esquerdo
e fadiga musculares, dores musculares e articulares, dis-
túrbios respiratórios e do sono, disfagia, dentre outros, os - Síndrome pós-poliomielite
ORTOPEDIA
quais em conjunto foram denominados de “síndrome pós- A Síndrome Pós-Poliomielite (SPP) foi descrita pela 1ª
-poliomielite.” vez em 1875 por Raymond, quando descreveu o caso de
um homem de 19 anos, acometido anteriormente pela po-
a) Modo de transmissão
liomielite paralítica e que estava desenvolvendo um qua-
A transmissão ocorre principalmente por contato direto dro caracterizado por nova fraqueza e atrofia muscular. O
pessoa a pessoa. A boca é a porta de entrada do poliovírus, paciente apresentava paresia no braço e perna esquerdos.
fazendo-se a transmissão pelas vias fecal-oral ou oral-oral, Cerca de 100 anos depois, estudos demonstraram que pa-
esta última através de gotículas de muco da orofaringe (ao cientes com história médica prévia de poliomielite paralíti-
falar, tossir ou espirrar). As más condições habitacionais, a ca poderiam desenvolver, após anos de estabilidade clínica
higiene pessoal precária e o elevado número de crianças e funcional, novos sinais e sintomas, tais como perda da for-
numa mesma habitação constituem fatores que favorecem ça muscular e atrofia. A partir deste momento, a SPP passou
a transmissão do poliovírus. a ser reconhecida pela comunidade médico-científica como
uma condição clínica que pode afetar indivíduos anterior-
b) Período de incubação mente acometidos pela poliomielite paralítica.
O período de incubação é geralmente de 7 a 12 dias, A SPP pode ser definida e caracterizada por novos sinto-
podendo variar de 2 a 30 dias. mas neuromusculares que ocorrem ao menos 15 anos após
um período de estabilidade clínica e funcional ter sido atin-
c) Período de transmissibilidade gida em pacientes com história prévia de poliomielite sin-
O período de transmissibilidade pode iniciar antes do tomática. Os sinais e sintomas que caracterizam a SPP são:
surgimento das manifestações clínicas. Em indivíduos sus- nova fraqueza, fadiga, atrofia e dor musculares, dor articu-
cetíveis, a eliminação do vírus se faz pela orofaringe por um lar, distúrbio do sono, intolerância ao frio, dificuldades res-
período de cerca de 1 semana, e pelas fezes por cerca de 6 piratórias e de deglutição e aumento recente de peso. Os
semanas, enquanto que, nos indivíduos reinfectados, a eli- sintomas neuromusculares podem acontecer em membros
minação do vírus se faz por períodos mais reduzidos. previamente acometidos pela doença ou não. O processo é
O curso da doença é subdividido nos seguintes estágios: caracterizado por uma piora lenta dos sinais e sintomas da
- Fase aguda: dura de 5 a 7 dias; é o período de doença SPP sendo, portanto, uma doença progressiva.
aguda em que pode ocorrer a paralisia; Embora a fisiopatologia desses sintomas não seja clara,
diferentes mecanismos têm sido elencados. Dentre esses
- Fase de convalescença: encerra o período de 16 meses mecanismos, o mais aceito postula que a degeneração ou
após a fase aguda; durante esse tempo, há um variado disfunção das unidades motoras gigantes, manifestada pela
grau de recuperação da força muscular; deterioração periférica (axônio e/ou junção neuromuscu-
- Fase crônica ou residual: é o estágio final da doença lar), são, provavelmente, o resultado da solicitação meta-
depois da recuperação da força muscular. Acompanha bólica excessiva das unidades motoras gigantes (overuse
o resto da vida do paciente. muscular).
161
ORTO P ED I A
D - Tratamento 5. Resumo
O tratamento varia com o estágio da doença e a gravida-
de, e a extensão da paralisia. Quadro-resumo
Paralisia cerebral
- Definição: lesão em um cérebro imaturo, determinando al-
terações motoras, e os distúrbios não são progressivos, mas
permanentes;
- Etiologia: hipóxia cerebral (problemas maternos como pré-
-natal mal conduzido, alcoolismo, drogas, má nutrição e in-
fecções maternas, como rubéola, toxoplasmose e citomega-
lovírus);
- Diagnóstico: é clínico e deve ser feito no 1º ano de vida; re-
tardo do desenvolvimento neuromotor; tônus muscular anor-
mal; contratura muscular, crescimento ósseo anormal; perda
do controle muscular efetivo; e problemas com o equilíbrio;
Figura 12 - Relação entre a vacinação e o número de casos
- Tratamento e reabilitação: multidisciplinares, envolvendo
Na fase aguda, a função do médico é confortar o pacien- médicos de várias especialidades;
te e prevenir deformidade. Uma manifestação nos estágios - Objetivo: proporcionar ao paciente independência nas ativi-
iniciais é o espasmo muscular, caracterizado pela contração dades da vida diária, comunicação inteligível, locomoção in-
dependente, educação e satisfatórias integrações familiar e
protetora dos músculos para prevenir movimentos poten-
social.
cialmente dolorosos. Na fase aguda, o uso de analgésicos
Artrogripose
e calor úmido local servem para aliviar a sensibilidade dos
músculos e diminuir o desconforto. - Definição: contratura articular congênita de 2 ou mais articu-
lações, não progressiva, em diferentes áreas do corpo; doença
Na fase de convalescença, os objetivos do tratamento
congênita e não progressiva;
são obtenção de recuperação máxima dos músculos indi-
- Etiologia: desconhecida, há uma relação entre acinesia fetal e
viduais, restauração da mobilidade articular, prevenção
artrogripose;
de deformidades e alcance de um bom estado fisiológico
- Classificação de Hall:
do sistema neuromuscular tanto quanto possível. Deve-se
· Tipo I: envolvimento principal dos membros:
fazer uso de órteses para o alinhamento apropriado dos
* Amioplasia;
membros, realizar ampla mobilização articular, realizar * Acometimento distal dos membros.
exercícios ativos para interagir as unidades motoras recu- · Tipo II: envolvimento dos membros e de outras áreas do cor-
peradas em padrões normais de mobilidade e treino de po;
marcha e equilíbrio. · Tipo III: envolvimento dos membros associado à disfunção do
SNC.
- Clínica: inteligência normal; há diminuição ou ausência de
massa muscular, que é substituída por tecido fibroso ou gor-
duroso; contraturas articulares, cotovelos em extensão (em
alguns casos em flexão), punhos em flexão, quadris em flexão,
abdução e rotação externa; joelhos podem estar em flexão ou
extensão;
- Tratamento: o tratamento ortopédico visa à correção das de-
formidades e ao ganho de mobilidade das articulações acome-
tidas.
Mielomeningocele
- Definição: é uma lesão cística, contendo liquor e tecido nervo-
so no seu interior, acompanhada de alterações motoras e sen-
sitivas de acordo com o nível e a extensão do acometimento da
região da coluna vertebral e da medula espinhal;
- Etiologia: desconhecida, com alguns fatores de risco. Um dos
mais conhecidos é a deficiência de ácido fólico na nutrição ma-
terna;
Figura 13 - Órtese para auxílio na deambulação - Clínica: a paralisia resultante é simétrica e do tipo flácida;
Na fase crônica, devem-se prevenir deformidades e cor- - Diagnóstico: o diagnóstico pré-natal pode ser feito com a dosa-
gem sérica materna de alfa-fetoproteína e a ultrassonografia;
rigi-las, caso se desenvolvam.
162
DOENÇAS NEUROMUSCULARES
Mielomeningocele
- Tratamento: preconizado o fechamento da bolsa ou a repa-
ração da lesão nas primeiras 24 horas de vida do bebê, para
evitar maior comprometimento neurológico; no tratamento
neurocirúrgico, há ainda a necessidade de derivação da hidro-
cefalia, que acompanha 90% dos pacientes.
Poliomielite
- Definição: compreende uma doença infecciosa aguda causada
por um grupo de vírus neurotrópicos que, inicialmente, inva-
dem os tratos gastrintestinal e respiratório e espalham-se para
o SNC através da via hematogênica;
- Clínica: fraqueza muscular e paralisia flácida aguda, fascicula-
ção e hiporreflexia;
- Etiologia: o vírus da poliomielite é do grupo enterovírus, que
inclui os vírus coxsackie e ECHO;
- Modo de transmissão: contato direto pessoa a pessoa; a boca
é a porta de entrada do poliovírus;
- Síndrome pós-poliomielite: caracterizada por novos sintomas
neuromusculares que ocorrem ao menos 15 anos, após um pe-
ríodo de estabilidade clínica e funcional ter sido atingida em
pacientes com história prévia de poliomielite sintomática. Os
sinais e sintomas são nova fraqueza, fadiga, atrofia e dor mus-
ORTOPEDIA
culares, dor articular, distúrbio do sono, intolerância ao frio,
dificuldades respiratórias e de deglutição e aumento recente
de peso;
- Tratamento: varia com o estágio da doença e a gravidade e a
extensão da paralisia.
163
SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO CIRÚRGICO
CAPÍTULO
5
Infecção osteoarticular
Gustavo Merheb Petrus
164
INFECÇÃO OSTEOARTICULAR
velos. As articulações das mãos e dos pés não raramente O VHS e a PCR mostram-se principalmente úteis para a
são acometidas. avaliação da resposta ao tratamento. A PCR possui algumas
Na criança, a articulação mais acometida também é o vantagens, apresentando uma elevação e uma queda mais
joelho, com o quadril sendo mais frequentemente atingido precoce quando o processo inflamatório diminui ou cessa,
do que em adultos e idosos. além de sofrer menos variações com a idade e alterações mor-
O acometimento poliarticular varia de zero a 24%. fológicas e quantitativas das hemácias, como é o caso da VHS.
A análise do líquido sinovial é fundamental para o diag-
C - Quadro clínico nóstico da artrite séptica. Comumente encontram-se refe-
A duração média da sintomatologia antes da admissão rências citando que contagem de leucócitos acima de 50.000/
varia de 3 a 12 dias. A manifestação clínica mais importante mm3 é altamente sugestiva de artrite de origem infecciosa. A
é a dor tanto em repouso quanto ao movimento seguido contagem diferencial de células mostra predomínio de po-
do aumento de volume articular. Outras manifestações in- limorfonucleares (PMN), constituindo na maioria das vezes
cluem limitação de movimento articular, calor local e febre, mais de 90% das células. Estes dados ajudam e tornam a in-
presente em 44 a 58% dos pacientes. fecção altamente provável, mas não definem o diagnóstico,
uma vez que outras afecções como artrite reumatoide, psori-
ática e gota também mostram predomínio de PMN e podem,
eventualmente, ter contagem acima de 50.000 células/mm3.
ORTOPEDIA
Figura 3 - Procedimento de punção articular do quadril para aná-
lise do líquido sinovial
Figura 1 - Atrite séptica no joelho direito de uma criança
O raio x é de pouca validade diagnóstica, uma vez que
alterações características ocorrem em um estágio mais tar-
dio da artrite séptica. As manifestações precoces são repre-
sentadas pelo edema dos tecidos moles periarticulares. Já
as tardias são a osteopenia justa-articular e erosões ósseas.
Porém, o raio x pode ser utilizado para avaliar lesões arti-
culares preexistentes ou sequelas do processo infeccioso.
Osteomielite adjacente é um diagnóstico que pode ser feito
usando o raio x, principalmente em crianças.
A ultrassonografia é útil para avaliar presença de líquido
nas articulações, em especial as mais profundas como a do
quadril, bem como guiar a punção articular. No entanto, sua
utilidade para avaliar se a presença de líquido decorre de
Figura 2 - Joelho com sinais de edema, hiperemia local sugestiva um processo infeccioso ou puramente inflamatório, ou seja,
de artrite séptica ajudar no diagnóstico, é baixa.
E - Diagnóstico diferencial
D - Exames complementares
A artrite séptica entra no diagnóstico diferencial da sín-
Na população pediátrica, a febre pode ser encontrada drome da monoartrite aguda.
em uma maior parcela dos casos. As 3 maiores causas são a artrite induzida por cristais,
Leucocitose periférica é encontrada em metade dos em especial gota, trauma e infecção.
pacientes, variando nos estudos entre 35,4 e 64% dos ca-
sos. O aumento da VHS (velocidade de hemossedimenta-
F - Agente etiológico e sua identificação
ção) é observado em torno de 95% dos pacientes. A PCR
(Proteína C Reativa) parece ser mais sensível, estando au- A cultura do líquido sinovial é fonte de identificação em
mentada em alguns pacientes com VHS dentro da faixa de 70% dos casos. A hemocultura é positiva em torno de 35%
normalidade. dos casos. A bacterioscopia é positiva em apenas 50% dos
165
ORTO P ED I A
166
INFECÇÃO OSTEOARTICULAR
A localização metafisária está relacionada à vascu- gerais do paciente. Manifestações sistêmicas de septicemia
larização da região, onde as artérias nutrientes terminais aguda, como febre alta, calafrios e vômitos, podem ocorrer.
continuam por “lagos venosos” sinusoidais. Neste local, há Nos recém-nascidos e lactentes, a febre pode estar ausen-
baixo fluxo sanguíneo e pouca concentração de monócitos, o te, sendo a irritabilidade e a recusa alimentar os achados
que favorece a fixação bacteriana. A multiplicação bacteriana clínicos mais consistentes.
favorece a formação de trombos ou êmbolos sépticos e fenô- O sintoma mais frequente é a dor óssea, com piora ao
menos tromboembólicos, gerando congestão local, aumen- movimento do membro acometido. A dor é localizada; um
to da pressão intraóssea, isquemia e áreas de necrose, com aumento de volume local acompanhado de calor local está
formação progressiva de pus, o que ocasiona dor intensa. A usualmente presente. A palpação pode identificar o local
difusão do pus, através dos canais de Havers e Volkmann, mais exato da dor.
rumo à cortical externa, forma um abscesso subperiosteal,
provocando descolamento progressivo do periósteo.
ORTOPEDIA
Figura 5 - Sinais clínicos de osteomielite aguda nos ossos do pé
C - Diagnóstico
O exame radiográfico simples é a 1ª etapa na investiga-
ção por métodos de imagem em osteomielite porque pode
sugerir o diagnóstico correto, excluir outras doenças ou for-
necer indícios para outras condições patológicas.
Demora de 10 a 21 dias para que uma lesão óssea se
torne visível em um exame radiográfico convencional, pois
é necessária uma redução de 30 a 50% na densidade óssea
para que haja uma alteração radiográfica aparente.
Figura 4 - Anatomia vascular da região metafisária Essa insensibilidade para o diagnóstico precoce da infec-
ção óssea torna necessário o emprego de métodos alterna-
A secreção purulenta pode drenar espontaneamente
tivos, como a cintilografia e a ressonância magnética, para a
pelo subcutâneo e pela pele. Nas articulações em que a
detecção precoce da osteomielite.
região metafisária se encontra dentro da cápsula, como o
quadril, o ombro e o cotovelo, essa drenagem provoca uma
artrite séptica secundária, com danos para a cartilagem ar-
ticular e riscos de luxação ou subluxação.
Quanto aos recém-nascidos até os 18 meses, os vasos
metafisários atravessam a placa epifisária; assim, a fise não
constitui uma barreira para a expansão do processo infec-
cioso para a epífise e cavidade articular até essa idade.
Nos recém-nascidos, os germes mais encontrados são
o estreptococo do grupo B e os bacilos Gram negativos.
Entre os 2 meses e 3 anos de idade, o Haemophilus influen-
zae aparece como o agente etiológico. Após os 3 anos, o
Staphylococcus aureus e o estreptococo dos grupos A e B
são os agentes patógenos mais comuns.
B - Quadro clínico
Os sinais e os sintomas dependem da gravidade da in-
fecção, da localização, da idade e das condições clínicas Figura 6 - Radiografia de perna com osteomielite
167
ORTO P ED I A
B - Quadro clínico
O início dos sintomas é insidioso. A criança não de-
monstra um quadro de doença infecciosa aguda grave, com
pouca ou nenhuma limitação funcional. A queixa mais im-
portante é a dor localizada com períodos de remissão e de
exacerbação.
Os sintomas podem estar presentes por semanas, me-
Figura 8 - Radiografia e cintilografia mostrando a hipercaptação ses ou anos, e o estudo laboratorial tem pouca importância.
na osteomielite O diagnóstico baseia-se no aspecto radiográfico da lesão,
que é lítica, bem delimitada, com bordas escleróticas e co-
A leucocitose e o aumento da VHS não são específicos
nhecida como abscesso de Brodie. Essas lesões podem ser
de infecção óssea e podem, numa fase inicial, ser normais.
localizadas na metáfise, epífise e, mais raramente, diáfise.
A contagem de leucócitos é um indicador pobre de osteo-
mielite hematogênica aguda, e apenas 35% dos pacientes
apresentaram alteração no momento da admissão.
Em crianças de 1 a 36 meses de vida, níveis de PCR abai-
xo de 5mg/dia afastam a possibilidade de uma infecção bac-
teriana de maior gravidade; a osteomielite hematogênica
aguda está entre essas infecções.
Os níveis de PCR após o tratamento adequado encontram-
-se normalizados aos 9 dias de evolução, e a VHS, com 29 dias.
D - Tratamento
Um tratamento precoce e adequado é o principal fator
que influencia o resultado final da osteomielite. As 2 prin-
cipais sequelas são destruição da placa de crescimento e
osteomielite crônica. Na suspeita do diagnóstico, a criança
deve ser internada. Figura 9 - Abscesso de Brodie na região epifisária do fêmur distal
168
INFECÇÃO OSTEOARTICULAR
C - Diagnóstico
Quadro pregresso de infecção, com diagnóstico tardio
ORTOPEDIA
ou tratamento mal conduzido.
Figura 10 - Sequência do tratamento da osteomielite na tíbia pro- A infecção tardia (longa evolução) é a consequência
ximal: (A) diagnóstico; (B) tratamento cirúrgico com drenagem e natural da evolução das osteítes agudas e osteomielites
(C) curetagem e radiografia mostrando a resolução da infecção
hematogênicas agudas quando não tratadas ou tratadas in-
corretamente. Nesta patologia é importante termos em 1º
4. Osteomielite crônica lugar a certeza do diagnóstico.
O diagnóstico é baseado no quadro clínico e as sínteses
dos meios auxiliares de diagnósticos:
A - Introdução
- História de infecção;
A osteomielite crônica é, geralmente, resultante da os- - Fístulas;
teomielite aguda não diagnosticada, não tratada ou tratada - Dores na zona.
de maneira tardia ou inadequada.
B - Patogenia
A infecção normalmente tem início na metáfise dos os-
sos longos, pela sua particularidade da irrigação, já que a
área é ricamente vascularizada com numerosas anastomo-
ses. Por isso, um fluxo sanguíneo mais lento proporciona as
condições para a sedimentação do êmbolo séptico e produz
as circunstâncias ideais para o crescimento bacteriano.
Os micro-organismos (devido a vários fatores) podem
induzir a uma reação inflamatória aguda. Os restos necró-
ticos produzidos formam o pus – que não é mais do que
exsudato contendo leucócitos polimorfonucleares, fibrina e
restos necróticos que se desenvolvem formando abscessos
intraósseos, medulares e atingem muitas vezes a superfície Figura 11 - Fístula na região posterior do joelho
óssea onde forma um abscesso subperiostal (nos casos da
osteomielite hematogênica), e posteriormente este absces-
- Exames complementares
so espalha-se pelas estruturas vizinhas em ambos os casos.
Ao mesmo tempo, o periósteo reage formando o invó- - Velocidade sedimentação aumentada (se há agudiza-
lucro (osso neoformado). Se o processo não para, a infor- ção do processo ou não);
mação evolui para uma situação de cronicidade, isto é, os - Leucograma com leucocitose moderada;
produtos bacterianos, a isquemia e as enzimas dos polimor- - Hemograma normalmente baixo;
169
ORTO P ED I A
- Biópsia (pode determinar se a infecção evoluiu para A tomografia pode ser usada para melhor visualização e
um carcinoma de células escamosas ou confirmar a localização da lesão.
infecção);
- Cultura e antibiograma (normalmente polibacteriana); D - Tratamento
- Radiografia simples; Por tratar-se de osso desvitalizado e sem irrigação, ne-
- MRI e cintilografia; nhum antibiótico tem capacidade de atuação no sequestro.
- CT scan. O antibiótico deve ser utilizado para combater a bacteremia
e continuado por 3 a 6 semanas, até que a PCR se norma-
As radiografias simples indicam, na maior parte das lize. O tratamento é sempre cirúrgico, por retirada do se-
vezes do diagnóstico, presença do sequestro + invólucro. questro e do tecido necrótico.
Deve-se ter o cuidado de não fazer o diagnóstico só com
radiografias, pois é possível confundir com tumor.
170
INFECÇÃO OSTEOARTICULAR
ORTOPEDIA
cém-nascidos e lactentes, a febre pode estar ausente, sendo a
irritabilidade e a recusa alimentar os achados clínicos mais con-
sistentes. O sintoma mais frequente é a dor óssea, e aumento
de volume local acompanhado de calor local está usualmente
presente. A palpação localiza a dor;
- Exames de imagem: nos primeiros dias da doença, não apa-
recem alterações na radiografia, e há alterações a partir de 14
dias. A ecografia demonstra o edema de partes moles, o desco-
lamento periosteal ou um abscesso subperiostal. A cintilografia
óssea com tecnécio-99m é sensível no início do quadro e apre-
senta área de hipercaptação no foco da infecção. A ressonân-
cia magnética permite uma visualização precoce das alterações
teciduais na medula óssea e nas partes moles;
- Exames laboratoriais: hemograma com leucocitose e desvio à
esquerda, VHS aumentada, bem como a PCR. A hemocultura é
positiva apenas em 60% dos casos;
- Tratamento: precoce com antibiótico sistêmico; após 48 horas
do início da doença, realizar drenagem cirúrgica;
- Complicações: septicemia, pioartrite e cronificação.
Osteomielite subaguda
- Quadro clínico: o início dos sintomas é insidioso, e não ocorre
um quadro de doença infecciosa aguda grave, com pouca ou
nenhuma limitação funcional. A queixa mais importante é a
dor localizada. Os sintomas podem estar presentes por se-
manas, meses ou anos, e o estudo laboratorial tem pouca
importância;
- Diagnóstico: baseia-se no aspecto radiográfico da lesão, que
é lítica, bem delimitada, com bordas escleróticas e conhecida
como abscesso de Brodie;
- Tratamento: conservador, com antibioticoterapia por 2 a 3 sema-
nas, e, quando não há resposta ao tratamento clínico, indica-se
o tratamento cirúrgico com curetagem e limpeza da lesão, com
antibiótico pós-operatório.
171
SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO CIRÚRGICO
CAPÍTULO
6
Ortopedia adulto
Gustavo Merheb Petrus
B - Epidemiologia
Atinge homens e mulheres, com predomínio no sexo
feminino (com deficiência estrogênica) e em indivíduos
idosos.
As mulheres brancas na pós-menopausa apresentam
maior incidência de fraturas. A partir dos 50 anos, 30% das
mulheres e 13% dos homens podem sofrer algum tipo de Figura 1 - Células do tecido ósseo envolvidas no remodelamento
fratura por osteoporose ao longo da vida.
No início de cada ciclo de remodelamento, os osteoclas-
C - Fisiopatologia tos escavam o osso, formando lacunas na sua superfície e
O remodelamento ósseo é um processo contínuo de re- cavidades no seu interior. Após cerca de 2 semanas, os oste-
tirada de osso para o sangue e formação de osso novo, ocu- oclastos são deslocados pelos osteoblastos que em um pe-
pando de 20 a 30% do esqueleto a cada momento. Através ríodo aproximado de 3 meses preenchem a área absorvida
do remodelamento, o tecido ósseo substitui células velhas com osso novo.
por novas (o que ocorre em todos os tecidos) e o organismo Até, aproximadamente, 30 anos de idade a quantidade
pode dispor de elementos importantes que são armazena- de osso reabsorvido e reposto é igual. A partir daí, inicia-
172
O R T O P E D I A A D U LT O
-se um lento balanço negativo que vai provocar, ao final de D - Causas secundárias
cada ativação das unidades de remodelamento, discreta
perda de massa óssea. Inicia-se, portanto, um lento proces- Há um grande número de doenças e de drogas associa-
so de perda de massa óssea relacionada com a idade – os- das à osteoporose e ao aumento do risco de fraturas, como:
teoporose senil – no qual, ao longo de suas vidas, as mu- - Hipercortisolismo;
lheres perderão cerca de 35% de osso cortical (fêmur, por - Hiperparatireoidismo;
exemplo) e 50% de osso trabecular (vértebras), enquanto - Hipertireoidismo;
os homens perderão 2/3 desta quantidade. - Acromegalia;
Além desta fase lenta de perda de massa óssea, as mu- - Neoplasias do sistema hematopoético;
lheres têm um período transitório de perda rápida de osso
no qual a queda de estrógenos circulantes, que ocorre des-
- Cirrose biliar primária;
de a pré-menopausa, desempenha papel importante. O pe- - Doenças inflamatórias intestinais;
ríodo transitório de perda rápida pode se manter por 4 a 8 - Doença celíaca;
anos, nos quais a perda óssea chega até a 2% ao ano. O osso - Pós-gastrectomia;
trabecular é metabolicamente mais ativo e mais responsivo - Homocistinúria;
às alterações do funcionamento do organismo, o que pode - Hemocromatose;
explicar por que, neste tipo de osso, a perda óssea inicia-
-se, em ambos os sexos, na 3ª década e a massa total de
- Doenças reumáticas inflamatórias.
osso declina 6 a 8% a cada 10 anos. Também a resposta à Nos homens, a presença de uma causa secundária de
queda estrogênica é mais intensa, havendo grande acelera- osteoporose é a mais frequente (30 a 60%), sendo o uso
ção do remodelamento ósseo e perda de 5 a 10% de massa de glicocorticoide, o hipogonadismo e o alcoolismo as mais
óssea ao ano em 40% das mulheres – osteoporose da pós-
ORTOPEDIA
prevalentes. Nas mulheres na pós-menopausa, a presença
-menopausa. de causas secundárias é menos comum, embora deva ser
considerada.
E - História clínica
Deve-se considerar a avaliação de mulheres na pós-me-
nopausa que apresentem 1 ou mais fatores clínicos de risco
citados, após 65 anos, independente da presença de fatores
de risco, e de homens com fatores de risco para fraturas.
Os sintomas são secundários às fraturas. Quando ocor-
re nas vértebras, a dor pode ser de 2 tipos. Uma é agu-
da, localizada, intensa, mantendo a paciente imobilizada
e relacionada com fratura em andamento. Em situações
Figura 2 - Microscopia eletrônica do trabecular ósseo normal à es- de dor aguda, inicialmente ela pode ser mal localizada,
querda e com osteoporose à direita espasmódica e com irradiação anterior ou para bacia e
membros inferiores. A fratura vertebral pode ainda não
Observam-se, portanto, 2 padrões distintos de altera- ser observável com precisão em exame radiológico, difi-
ções no funcionamento das unidades de remodelamento cultando o diagnóstico.
que levarão à osteoporose. Um é lento e dependente da Também ocorrendo com frequência, a dor pode ser de
idade – osteoporose senil – e o outro relacionado com longa duração e localizada mais difusamente. Nestes casos,
defeito na formação óssea; os osteoclastos produzem ocorrem microfraturas que levam a deformidades verte-
lacunas de profundidade normal ou até menores, mas brais e anormalidades posturais e consequentes complica-
os osteoblastos são incapazes de preenchê-las comple- ções degenerativas em articulações e sobrecarga em mús-
tamente. culos, tendões e ligamentos.
Já as modificações que ocorrem com a queda de estró-
Apenas as medidas de DMO podem identificar os pa-
genos levam a um remodelamento em que há maior núme-
cientes com massa óssea reduzida.
ro de osteoclastos e cada um produz uma cavidade mais
A avaliação de fatores de risco clínicos pode ser útil para
profunda; também há aumento da atividade dos osteoblas-
as seguintes situações:
tos que tentam corrigir o defeito, mas não conseguem, ca-
racterizando o remodelamento acelerado onde a atividade - Identificar mulheres de elevado risco para fraturas;
de reabsorção é maior e, no final de cada ciclo, haverá um - Aumentar a conscientização sobre osteoporose;
declínio significativo de massa óssea – osteoporose da pós- - Desenvolver estratégias sociais para a prevenção de
-menopausa. fraturas e tratamento da osteoporose.
173
ORTO P ED I A
Tabela 1 - Fatores de risco clínicos para osteoporose e fraturas teoporose, mas são úteis para o diagnóstico diferencial de
Fatores maiores outras doenças que podem acometer o osso.
- Sexo feminino;
- DMO;
I - Medidas de massa óssea
- Fratura prévia; - Densitometria óssea
- Ascendência asiática ou caucasiana; A densitometria óssea, o exame de referência para o
- Idade avançada em ambos os sexos; diagnóstico da osteoporose, é realizada por técnica de
- História materna de fratura do colo femoral e/ou osteoporose; DEXA – absorciometria por raio x com dupla energia – e for-
nece valores reprodutíveis em sítios importantes de fratu-
- Menopausa precoce não tratada (antes dos 40 anos);
ras associadas à osteoporose.
- Tratamento com corticoides.
O diagnóstico é realizado pela avaliação da coluna lom-
Fatores menores bar, fêmur proximal e antebraço, segundo os critérios pro-
- Amenorreia primária ou secundária; postos pela OMS.
- Hipogonadismo primário ou secundário em homens;
- Baixo índice de massa corpórea;
- Tabagismo;
- Alcoolismo;
- Sedentarismo;
- Tratamento com drogas que induzem à perda de massa óssea,
como heparina, varfarina, anticonvulsivantes (fenobarbital, fe-
nitoína, carbamazepina), lítio e metotrexato;
- Imobilização prolongada;
- Dieta pobre em cálcio;
- Doenças que induzem à perda de massa óssea.
F - Exame físico
Devem-se avaliar estatura, peso corporal, hipercifose
dorsal, abdome protruso, deformidades esqueléticas e si-
nais físicos de doenças associadas à osteoporose.
G - Avaliação laboratorial
O critério atual para diagnóstico de osteoporose é per-
da de 25% de massa óssea quando comparada com adulto
jovem. Assim, diagnóstico precoce de osteoporose é feito
através da densitometria óssea, enquanto o estudo radio-
lógico somente mostra alterações inequívocas quando há
perda de 30% da massa óssea.
A avaliação laboratorial deve ser dirigida, primeiramen-
te, à exclusão das doenças que causam perda óssea e aos
distúrbios do metabolismo mineral que contribuem para a
perda de massa óssea.
Devem ser considerados, como avaliação mínima para
todos os pacientes, os seguintes testes laboratoriais:
- Hemograma completo;
- VHS, cálcio, fósforo, fosfatase alcalina e creatinina
plasmática;
- Calciúria de 24 horas;
- Urinálise. Figura 3 - Aparelho de densitometria óssea e gráfico do resultado
174
O R T O P E D I A A D U LT O
As medidas de DMO devem ser realizadas nas seguintes dieta balanceada. Em relação ao esqueleto, o nutriente
situações: mais importante é o cálcio. Sua ingestão está relacionada
- Todas as mulheres de 65 anos ou mais; com a obtenção do pico de massa óssea, assim como o tra-
- Mulheres com deficiência estrogênica com menos de tamento e a prevenção da osteoporose.
45 anos; Leite e derivados contêm a maior proporção de cálcio
- Mulheres na peri ou na pós-menopausa (com um fator biodisponível, embora se possa valer também de outras
de risco maior ou 2 menores); fontes.
Uma adequada exposição solar é necessária para a pro-
- Mulheres com amenorreia secundária por mais de 1 dução de vitamina D na pele, fundamental para a manu-
ano;
tenção de um esqueleto de boa qualidade. A vitamina D
- Todos os indivíduos que tenham sofrido fratura por pode ser de origem vegetal ou animal, ambas equivalentes,
trauma mínimo ou atraumática;
e podem ser utilizadas igualmente na complementação vi-
- Indivíduos com evidências radiográficas de osteopenia tamínica.
ou fraturas vertebrais; Os idosos são uma população de risco para a deficiên-
- Homens com 70 anos ou mais; cia de vitamina D. A produção cutânea de vitamina D dos
- Indivíduos com perda de estatura (>2,5cm) ou hiperci- idosos equivale a 1/3 da dos jovens, quando submetidos à
fose torácica; mesma irradiação. Recomenda-se que todos os idosos de
- Indivíduos em uso de corticoide por 3 meses ou mais 70 anos ou mais recebam suplementação de vitamina D.
(dose >5mg de prednisona); A atividade física é importante para a prevenção e o tra-
- Mulheres com índice de massa corporal baixo (<19kg/m2); tamento da osteoporose. Durante a atividade física, com a
- Portadores de doenças ou uso de medicações associa- contração muscular, ocorre deformação, e o osso a inter-
preta como um estímulo à formação. O pico de massa óssea
ORTOPEDIA
das à perda de massa óssea;
é atingido entre a adolescência e os 35 anos. Uma das ma-
- Monitoramento da massa óssea durante o tratamento. neiras de evitar a osteoporose é aumentar a massa óssea
na infância e na adolescência. Quanto aos idosos, o maior
Os resultados da DMO são apresentados por meio de: objetivo da prevenção é minimizar as perdas de massa ós-
- Valores absolutos: são utilizados para monitorizar as sea e evitar as quedas.
mudanças ao longo do tempo. Embora o osso responda tanto ao aumento quanto à di-
- T-escore: é calculado em Desvio-Padrão (DP), toman- minuição da carga mecânica, é mais fácil perder osso pela
do, como referência, a DMO média do pico de massa inatividade do que ganhá-lo por meio do aumento de car-
óssea em adultos jovens: ga. Atividades com carga, como a marcha, têm mais efeito
• Até -1 DP = normal; sobre os ossos do que as sem carga, como bicicleta e nata-
• De -1,1 a -2,5 DP = osteopenia; ção. A atividade física com carga promove mais bem-estar,
• Abaixo de -2,5 DP = osteoporose; melhora a qualidade de vida e aumenta a massa muscular
• Abaixo de -2,5 DP na presença de fratura = osteopo- e a formação óssea, e deve ser feita, pelo menos, 3 vezes
rose estabelecida. por semana, em dias alternados, durante, no mínimo, 30
minutos.
- Z-escore: é calculado em DP, tomando, como referên- As quedas constituem a principal causa de morte aciden-
cia, a DMO média esperada para indivíduos da mesma tal para maiores de 65 anos. A fratura do quadril na oste-
idade, etnia e sexo. Resultados com escore z -2 DP ou oporose pode ocorrer em 90%, em virtude de quedas, e o
abaixo podem sugerir causas secundárias de osteopo- restante em virtude de movimentos de torção do fêmur com
rose. queda consequente. Se evitar a queda, serão evitadas 90%
das fraturas do quadril. Devem-se adequar o ambiente e a
J - Prevenção residência para o idoso deambular sem o risco de quedas.
A osteoporose, a respeito de outras doenças crônicas,
tem etiologia multifatorial. Fatores genéticos contribuem K - Tratamento farmacológico
com cerca de 46 a 62% da DMO, e o restante pode ser afe- Os fármacos que atuam sobre o tecido ósseo são classi-
tado por fatores relacionados ao estilo de vida, como nu- ficados em 2 grupos: agentes antirreabsortivos (reposição
trição. hormonal, raloxifeno, bifosfonatos, calcitonina, cálcio e vi-
O papel da nutrição relaciona-se ao desenvolvimento da tamina D) e os estimulantes de formação óssea (PTH).
maior e melhor massa óssea possível durante o crescimen- Estudos mostram decréscimo de 50% nas fraturas ver-
to e à proteção do esqueleto contra a perda de cálcio em tebrais e de 25% nas fraturas não vertebrais em usuárias de
longo prazo. TRH por 5 anos.
A massa óssea adequada a cada indivíduo está associa- Uma substância da classe dos moduladores seletivos de
da a uma boa nutrição, que deve ser constituída de uma receptores de estrogênios (SERMs), o raloxifeno exerce os
175
ORTO P ED I A
efeitos benéficos de estrogênio sem estimular tecidos como de mama é contraindicação ao uso de estrógenos;
mama e endométrio. Além disso, previne a perda óssea e - Quanto às doenças cardiovasculares, o uso de estróge-
diminui o risco de fratura vertebral em 40 a 55%. nos diminui os níveis de colesterol total e LDL e aumen-
Os bifosfonatos (alendronato e risedronato) reduzem o ta HDL; além disto, atua diretamente em estruturas da
risco de fraturas vertebrais em 30 a 50%. parede vascular produzindo um efeito antitrombótico.
A utilização do análogo do PTH demonstra, efetivamen- Progestágenos têm efeito contrário, mas adequando-
te, aumentar a massa óssea, quando comparada ao place- -se doses menores conseguem-se bons resultados.
bo, além de reduzir o risco de fraturas.
As drogas utilizadas no tratamento da osteoporose atuam c) Calcitonina e bisfosfonatos
diminuindo a reabsorção óssea ou aumentando sua formação. Inibem a atividade dos osteoclastos. Têm as mesmas in-
dicações e resultados que os estrógenos e ação analgésica
a) Agentes antirreabsortivos
que torna atraente seu uso em fraturas por osteoporose. É
Não há consenso se estas drogas somente estabilizam uma alternativa para as mulheres que não podem ou não
ou aumentam discretamente a massa óssea ou se produ- querem usar estrógenos.
zem ganhos significativos. O acompanhamento dos trata- As calcitoninas de salmão são as mais resistentes à
mentos tem mostrado aumento da densidade óssea e dimi- degradação no homem e, por isso, são as mais potentes.
nuição do número de fraturas, mas o ganho de massa óssea Porém, o uso de calcitonina tem se restringido aos pacien-
pode não superar o limiar de fratura, principalmente se o tes que não toleram bisfosfonatos e também aos episódios
tratamento for iniciado tardiamente. de fratura. Sempre que for prescrita calcitonina, deve-se
b) Estrógeno acrescentar pelo menos 1 tomada de cálcio suplementar 1
a 2 horas após. Densitometrias de controle não antes de 1
A Reunião de Consenso do III Simpósio Internacional so-
ano e os novos marcadores bioquímicos são indispensáveis
bre Osteoporose, em 1990, estabeleceu que estrógenos são
nestes casos.
o tratamento de escolha na osteoporose da pós-menopausa.
Há formas distintas de bisfosfonatos com potência e
A fase acelerada de perda óssea que ocorre em 40% das mu-
tempo de ação diferentes que são utilizados para outras do-
lheres logo após a menopausa é responsável por 30 a 50%
enças ósseas. Etidronato é o mais antigo bisfosfonato usado
de todo osso perdido ao longo de suas vidas. Portanto, o tra-
em osteoporose e, mais recentemente, foram lançados o
tamento deve ser iniciado precocemente a fim de prevenir a
alendronato e o risedronato. São altamente eficazes.
queda inicial de massa óssea. Com esta conduta, consegue-
Os bisfosfonatos devem ser administrados longe de re-
-se diminuir em 50% a incidência de fraturas. A reposição
feições e é necessária suplementação de cálcio.
hormonal deve ser mantida pelo menos 5 a 8 anos, corres-
pondendo ao período do climatério em que o remodelamen- d) Cálcio
to ósseo é mais acelerado. Após a suspensão do tratamento, A quantidade de cálcio alimentar necessária para man-
mesmo que seja com menor intensidade, retornam os ciclos ter a massa óssea é desconhecida. Propõe-se que adoles-
de remodelamento com balanço negativo, sendo prudente, centes recebam 1.200 a 1.500mg/dia, homens 800mg/
se não houver contraindicação, a permanência da hormono- dia, mulheres na pré-menopausa 1.000mg/dia, mulheres
terapia de reposição por 20 anos ou mais. na pós-menopausa 1.500mg/dia, mulheres grávidas e em
Quando a osteoporose está estabelecida, os resultados período de lactação devem receber 1.200 a 1.400mg/dia e
são menos eficazes mas ainda positivos. Não há idade-li- idosos, 1.200 a 1.600mg/dia.
mite para se iniciar reposição hormonal. A rigor, se houver O pico de massa óssea atingido na idade adulta tem um
densidade óssea abaixo de um desvio-padrão para a idade, componente genético importante, mas, certamente, defi-
o tratamento deve ser indicado pelo menos para mulheres ciência de ingesta e aumento de oferta interferem em al-
até 75 anos de idade. Entretanto, nestes casos, outras dro- guma proporção. Trabalhos que estudaram a influência do
gas antirreabsortivas podem estar mais bem indicadas. cálcio no ganho de massa óssea em osteoporose da pós-
Controvérsias a respeito de contraindicações e para efei- -menopausa e senil estabeleceram em 1.200 a 1.500mg a
tos de estrógenos permanecem. Recomendamos, a toda pa- quantidade a ser administrada por dia.
ciente que pretende usar hormônios, indispensável aconse- Pode haver suplementação alimentar e é importante o
lhamento e acompanhamento com ginecologista. uso noturno, principalmente em idosos, devido ao jejum
Os defensores do uso de estrógenos afirmam que: prolongado. Um copo grande de leite, um copo de iogurte
- A maior incidência de câncer de endométrio é elimina- ou um pedaço grosso de queijo têm 300mg de cálcio.
da com o uso de progestágenos; não está estabelecido
que estrógenos provocam câncer de mama e seu uso e) Vitamina D3
não se acompanha de maior mortalidade. Ao contrá- O uso de vitamina D3 nos idosos é indispensável para
rio, as tomadoras de estrógenos estão indiretamente aumentar a absorção intestinal de cálcio e estimular o re-
protegidas porque fazem acompanhamento médico modelamento ósseo. Recomenda-se o uso de 800U de vita-
adequado. Mesmo assim, história familiar de câncer mina D3 ou 0,5μg de calcitriol ou alfacalcidol.
176
O R T O P E D I A A D U LT O
f) Estimulantes da formação óssea - Mulheres com DMO baixa e limítrofe se fatores de ris-
- Fluoreto de sódio: é um potente estimulador da ativi- co presentes;
dade osteoblástica. Vários estudos mostram aumento - Mulheres para quem as medidas preventivas não far-
da densidade do osso trabecular, mas, aparentemente, macológicas não são efetivas.
sem reduzir o número de fraturas. São muito pouco
utilizados, limitando-se às situações em que precisa- São recomendações e comentários para o tratamento
mos estimular o osteoblasto; da osteoporose:
- Paratormônio (PTH) intermitente em doses baixas: o - Anticoncepcionais não devem ser indicados para o tra-
efeito positivo sobre aumento da densidade óssea com tamento ou prevenção;
o uso de PTH em doses baixas intermitentes tem sido ci- - Suplementação de cálcio e vitamina D, em geral, é in-
tado na imprensa leiga. Ainda está sendo usado somente dicada a situações clínicas bem definidas, que incluem
em pesquisa. À semelhança do que ocorre com fluoreto, baixa ingestão ou déficit de absorção pelo trato gas-
parece que, dependendo da dose e tempo de uso, PTH trintestinal;
pode aumentar a osteoporose. Enquanto estas questões - Análogos da vitamina D representam terapia coadju-
não estiverem resolvidas, o PTH não poderá ser usado ro- vante no tratamento da osteoporose.
tineiramente no tratamento da osteoporose;
- Exercícios e prevenção de quedas: em uma extensa L - Recomendações posológicas
revisão, concluiu-se que exercícios de carga são úteis
como coadjuvantes ao tratamento, em qualquer idade. - Raloxifeno: 60mg/dia, VO;
Eles devem ser mantidos regularmente, pois sedenta- - Alendronato sódico: 10mg/dia ou 70mg/semana, VO;
rismo leva à perda do que se ganha com exercícios pré- - Risedronato sódico: 5mg/dia, VO;
ORTOPEDIA
vios. Os indivíduos não osteoporóticos também devem - PTH: 20mg/dia, SC;
ser estimulados a praticar exercícios tais como cami- - Calcitonina nasal: 200UI/dia.
nhar e correr. A manutenção de musculatura potente e
a destreza que a prática de exercícios e esportes man-
têm são importantes para a prevenção de quedas. Os
2. Lombalgia e lombociatalgia
idosos devem ser aconselhados a evitar calçados com
solado de couro, escadas sem corrimão, levantar-se ra- A - Introdução
pidamente, tapetes soltos, assoalho encerado e tantos
outros fatores de risco para quedas. - Consenso Brasileiro de 2000
A dor lombar constitui uma grande causa de morbidade
g) Terapêutica combinada
e incapacidade, perdendo apenas para a cefaleia, na esca-
A racionalização desta proposta é ativar, deprimir, liberar, la dos distúrbios dolorosos que afetam o homem. Cerca de
repetir. Parece ser o esquema que mais se adapta ao trata- 80% das pessoas, em alguma fase da vida, são acometidas
mento da osteoporose senil. Inicialmente, é dado um medi- por dores lombares.
camento que estimule a formação e, após, outro que diminua
a reabsorção óssea. Um período livre, teoricamente, permite
às áreas de remodelamento aumentar a fabricação de osso.
Vários esquemas têm sido testados. Parece sensata a asso-
ciação fluoreto de sódio/cálcio como estimulantes dos oste-
oblastos e calcitonina ou bisfosfonatos como depressores da
atividade dos osteoclastos. A dose de fluoreto de sódio reco-
mendada é 30 a 40mg/dia durante 2 a 3 meses e a oferta de
cálcio diária, ao redor de 1.500mg, sempre com uma tomada
à noite. O cálcio deve ser mantido mesmo após a suspensão
do flúor. Devido à intolerância que os pacientes idosos po-
dem apresentar, a associação medicamento/leite ou iogurte
é boa alternativa. Vitamina D3 800U ou 0,50μg de calcitriol
ou alfacalcidol são indispensáveis em idosos. Quando dispo-
nível, o PTH deverá ser o estimulante de escolha.
Quando e como tratar a osteopenia ou a osteoporose?
- Mulheres com osteoporose na pós-menopausa:
• Fraturas atraumáticas e baixa DMO;
• T-escore de DMO de -2,5 DP ou menos. Figura 4 - Lombalgia
177
ORTO P ED I A
178
O R T O P E D I A A D U LT O
ORTOPEDIA
- Sinal do arco de corda: levanta-se a perna do paciente, tende a diminuir com a idade, em razão:
a) Da progressiva desidratação.
como na manobra de Lasègue, até que a dor apareça;
b) Do surgimento de fissuras na zona entre o núcleo e o
nesse momento, faz-se uma flexão do joelho. Havendo
anel fibroso.
redução e/ou desaparecimento da dor, o sinal é con-
c) Da diminuição de sua altura e consequentemente do
siderado positivo para o diagnóstico de hérnia discal;
espaço intervertebral, modificando o equilíbrio estático e
- Sinais não orgânicos de lombalgias psicossomáticas: há dinâmico da unidade funcional.
simulação de dor lombar ao se fazer compressão axial no
d) Da predisposição genética.
topo do crânio ou fazendo rotação da pelve e ombros,
e) Das alterações bioquímicas.
evitando movimentar a coluna, e discrepâncias no sinal
f) De alterações ambientais.
de Lasègue, quando pesquisado sentado ou deitado;
- Sinais de alerta: sinais ou sintomas apresentados pelo
paciente que possam ser devidos a outras enfermida-
des sistêmicas que não à lombalgia aguda mecânica.
a) De tumor ou infecção:
- Idade acima de 50 ou abaixo de 20;
- História de câncer;
- Sintomas como febre, calafrios, perda de peso, sem
outra explicação convincente;
- Infecção bacteriana recente, dependentes químicos,
imunossuprimidos;
- Dor com piora noturna;
- Dor com piora em decúbito dorsal.
b) De fratura:
- Trauma maior;
- Trauma menor em idosos ou osteoporóticos.
c) De síndrome de cauda equina:
- Anestesia em sela;
- Disfunção de bexiga;
- Déficit neurológico progressivo ou grave em membros Figura 6 - Ressonância magnética da coluna lombar mostrando
inferiores. hérnia de disco entre os segmentos L5 e S1
179
ORTO P ED I A
H - Tratamento cirúrgico
A lombalgia mecânica comum é sempre de tratamento
conservador. Se resistente e existindo um evidente substra-
to clínico-patológico para essa evolução atípica, podem ser
feitas infiltrações nas discopatias (Modic tipo I, II ou III), in-
filtração de pontos dolorosos, infiltração perifacetária, de-
Figura 7 - Anatomia da coluna lombar nervação facetária e artrose do segmento vertebral.
O tratamento cirúrgico da hérnia discal está indicado nos
F - Causas não mecânicas casos com déficit neurológico grave agudo (menos de 3 se-
manas), com ou sem dor; na lombociatalgia hiperálgica e,
a) Inflamatórias nas outras de menor intensidade, apenas para os pacientes
Espondiloartropatias soronegativas, como espondilite an- que não melhoram após 90 dias de adequado tratamento de
quilosante, síndrome de Reiter, espondilite psoriásica, espon- caráter emergencial, como também, nas lombalgias infeccio-
diloartropatias associadas a doenças inflamatórias intestinais. sas (espondiodiscites) com evolução clínica desfavorável. Na
Acometem pessoas geneticamente predispostas e têm síndrome da cauda equina (alteração de esfíncter, potência
como marcadores os antígenos de histocompatibilidade sexual e paresia dos membros inferiores) a cirurgia está indi-
(HLA-B27); nesta enfermidade, os ligamentos longitudinal cada em caráter emergencial, como também, nas lombalgias
anterior e posterior da coluna vertebral são os mais envol- infecciosas (espondiodiscites) com evolução desfavorável.
vidos, evoluindo, na maioria das vezes, para calcificação e A cirurgia também está indicada: na espondilólise, com
ossificação. Quase sempre, observa-se também o acome- espondilolistese, e espondilolistese degenerativa, com dor
timento das articulações sacroilíacas, com lesões erosivas lombar que não melhora com tratamento clínico; escorre-
e até anquilose. gamento vertebral progressivo no jovem (mesmo assinto-
mático); lombociatalgia e claudicação neurogênica devidas
b) Infecciosas ao canal estreito e que não responderam ao protocolo de
Discite. Os micro-organismos atingem a coluna verte- tratamento conservador.
bral por via hematogênica, linfática, por contiguidade e até
por inoculação direta. 3. Tendinopatias do membro superior
c) Metabólicas
Osteoporose, osteomalácia e hiperparatireoidismo que A - Introdução
cursam com baixa massa óssea. A osteoporose não dói, e A membrana sinovial reveste quase totalmente os ten-
sim as alterações mecânico-posturais dela decorrentes: dões e é uma estrutura especializada em deslizamento. Os
- Repercussão de doença sistêmica; retináculos são estruturas especializadas na contenção dos
- Lombalgia psicossomática; tendões junto ao plano ósseo, evitando que os tendões fa-
- Fibromialgia. çam um caminho mais curto quando os músculos se contra-
180
O R T O P E D I A A D U LT O
em. Os principais retináculos são os dos extensores do rádio Essas estruturas funcionam como polias que mudam
distal, dos flexores no carpo e o túnel osteofibroso dos dedos. a direção das forças que atuam durante a movimenta-
ção dos dedos. O aumento de volume do tendão ou a
diminuição do espaço da polia provocam um aumento
do atrito entre essas estruturas. As bainhas sinoviais re-
agem a tal agressão sempre da mesma maneira: edema,
aumento de volume e secreção de líquido sinovial. Com
tal reação, há maior desproporção conteúdo-continente,
formando um ciclo vicioso: trauma + edema + atrito +
trauma + edema.
Esta estenose associada à reação inflamatória da bainha
sinovial é denominada tenossinovite estenosante.
A tenossinovite refere-se a uma entidade anatomo-
patologicamente bem definida, com aumento de volume e
Figura 8 - Anatomia do tendão reação inflamatória ao redor dos tendões.
ORTOPEDIA
Figura 9 - Anatomia dos tendões do punho
O tratamento básico desse ciclo vicioso é a imobilização exames subsidiários são auxiliares no diagnóstico. Não se
associada a AINHs, podendo ser associados a infiltrações deve esquecer a obrigatoriedade do exame radiográfico em
com esteroides quando a dor não diminui. todos os pacientes.
Quando as mulheres entram na idade em torno da me- O tratamento das tendinites se inicia pela correção dos
nopausa, existem desequilíbrios hormonais que alteram vícios de postura, alongamentos e condicionamento físico.
a sinóvia. É difícil fazer o diagnóstico etiológico porque a Os medicamentos são coadjuvantes no alívio dos sintomas
reação sinovial é sempre a mesma nas diversas patologias: e na diminuição do processo inflamatório. São utilizados
edema, aumento de volume e secreção de líquido sinovial. AINHs e os corticosteroides orais ou com infiltração local
Assim, várias doenças metabólicas e colagenoses podem dependendo do caso.
apresentar sinovites, como diabetes, gota, lúpus etc.
O raio x, os exames laboratoriais, a ultrassonografia Não havendo melhora com o tratamento conservador, é
(USG) e a Ressonância Magnética (RM) podem mostrar a necessário o tratamento cirúrgico para ampliar os espaços
extensão e a etiologia da lesão. O diagnóstico é clínico, os para o deslizamento dos tendões.
181
ORTO P ED I A
B - Tenossinovite de DeQuervain
A tenossinovite de DeQuervain é uma tenossinovite estenosante do 1º compartimento dorsal dos extensores, sendo
tendinopatia das mais frequentes. A utilização da mão em desvio ulnar na maioria das situações do nosso dia a dia, como
usar garfo e faca, ferro de passar, teclado de computador, tem sido relacionada com essa patologia.
O diagnóstico é clínico pela manobra de Finkelstein, colocando o polegar fletido na palma da mão e fazendo desvio ulnar
do punho. Tal movimento provoca forte dor na região do estiloide do rádio.
O tratamento é clínico, com imobilização do polegar, punho e uso de anti-inflamatórios. Não havendo melhora, deve-
-se realizar a infiltração de esteroides com lidocaína na bainha dos tendões do abdutor longo e extensor curto do polegar.
Indicação de tratamento cirúrgico na falha do tratamento clínico.
182
O R T O P E D I A A D U LT O
visto em trauma, artrite reumatoide, gota ou outras doen- O tratamento inicial pode ser realizado com imobiliza-
ças metabólicas. ção e AINH, além de fisioterapia. O tratamento cirúrgico
através da liberação da polia é realizado caso não haja me-
lhora ou ocorra bloqueio do dedo.
ORTOPEDIA
Neste momento, o dedo funciona como gatilho, e um “clique”
pode ser ouvido ou sentido no momento da extensão total. Os nervos periféricos são muito vulneráveis à compres-
são. O comprometimento da microcirculação intraneural
resulta, rapidamente, em distúrbios da sensibilidade.
183
ORTO P ED I A
A fisiopatologia é atribuída a uma diminuição na dimen- C - Síndrome compressiva do nervo ulnar no co-
são do canal do carpo ou aumento do conteúdo. O canal do tovelo
carpo contém todos os tendões flexores superficiais e pro-
fundos dos dedos, flexor longo do polegar e nervo mediano. As causas de síndrome do canal cubital são doenças
O diagnóstico relaciona-se à queixa de hipoestesia insi- sistêmicas (diabetes, insuficiência renal, mieloma múltiplo,
diosa na região do território inervado pelo nervo mediano amiloidose, acromegalia, alcoolismo, hemofilia, hansenía-
(região ventral do polegar, dedo indicador, dedo médio e se) e causas extrínsecas (posição intraoperatório, tornique-
metade radial do dedo anular). A hipoestesia piora em de- te, atividade profissional, esporte, apoio inadequado).
terminadas posições, principalmente hiperflexão ou hipe-
rextensão do punho. As queixas pioram à noite. A fraqueza
dos músculos intrínsecos inervados pelo mediano (lombri-
cais radiais, oponentes do polegar, abdutor curto do pole-
gar e porção superficial do flexor curto do polegar) também
ocorre de forma insidiosa, com dificuldade progressiva em
desempenhar atividades manuais, principalmente as rela-
cionadas com preensão e pinça digital.
O sinal de Tinel, determinado pela presença de dor, hi-
perestesia ou choque na região do punho e no território
inervado pelo nervo mediano na mão durante a percussão
do canal do carpo (região ventral), é indicativo de síndrome
do túnel do carpo. Assim como o sinal de Phalen, determi-
nado pela presença de hipoestesia (formigamento) ou hipe-
restesia (dor), durante a hiperflexão do punho.
O estudo eletroneuromiográfico pode trazer subsídios
para confirmação diagnóstica e avaliação da intensidade
do comprometimento da função do nervo mediano. Esse
exame está indicado, principalmente, aos pacientes porta-
dores de sintomas pouco definidos ou atípicos e para fins
legais. O exame não é obrigatório, sendo o exame clínico
suficiente para o diagnóstico e a indicação do tratamento,
na grande maioria dos pacientes. Os exames de imagem
são raramente necessários. Figura 17 - Anatomia do nervo ulnar
O tratamento conservador, indicado para casos leves e
moderados, baseia-se na utilização de órteses estáticas de O quadro clínico mais comum é o de parestesia na face
posicionamento de punho e infiltração com corticoide. E o ulnar da mão e hiperestesia na face medial do cotovelo,
tratamento cirúrgico se baseia na exploração e na descom- agravado com a flexão do cotovelo e atividades que exigem
pressão do nervo mediano, realizadas através da secção do força e pronossupinação do antebraço. Esses sintomas po-
ligamento transverso do carpo. dem ser ainda maiores no período noturno, em razão da
postura de flexão do cotovelo. A inspeção estática deve ser
feita para avaliar as possíveis deformidades em valgo ou
varo do cotovelo, áreas cicatriciais e diferentes graus de de-
formidades em garra dos dedos anular e mínimo.
O tratamento conservador está indicado aos casos que
apresentam, como fatores causais, aspectos compressivos
dinâmicos, relacionados à postura em flexão persistente do
cotovelo ou mesmo pelo contato direto na região do túnel
cubital. Neste caso, deve-se utilizar órtese estática em ex-
tensão do cotovelo, de uso noturno, ou coxim no cotovelo
para atenuar eventuais impactos locais.
O tratamento cirúrgico consiste, basicamente, em 3 ti-
pos de procedimentos:
a) Descompressão in situ
Consiste na abertura de estruturas extrínsecas ao nervo
ulnar ao longo do seu trajeto no cotovelo. Tem indicação
em casos leves com sintomas intermitentes, sem subluxa-
Figura 16 - Tratamento cirúrgico com a neurólise ção do nervo ulnar e sem alteração óssea.
184
O R T O P E D I A A D U LT O
b) Epicondilectomia medial
Ressecção parcial do epicôndilo medial para obter a
transposição anterior espontânea do nervo ulnar. Figura 19 - Anatomia
c) Transposição anterior
ORTOPEDIA
Faz-se a descompressão completa de todos os possíveis
pontos de compressão do nervo ulnar no cotovelo associa-
da à sua transposição anterior, podendo colocá-lo em um
plano submuscular, intramuscular e subcutâneo.
a) Introdução
A síndrome do impacto, descrita por Neer em 1972,
demonstra a etiopatogenia e a evolução das lesões do
Manguito Rotador (MR) causadas pelo choque entre o ápi- Figura 20 - (A) Anatomia da musculatura do MR: (1) supraespi-
nhal; (2) infraespinhal; (3) subescapular e (4) redondo menor e (B)
ce do tubérculo maior do úmero e as suas inserções tendi-
arco coracoacromial, formando um teto para o úmero quando o
nosas contra o arco coracoacromial.
braço é elevado
b) Anatomia
c) História clínica
A articulação glenoumeral é estabilizada por estruturas
capsuloligamentares e tendíneas que a envolvem, principal- As alterações inflamatórias do MR e da CLB e das bolsas
mente o ligamento glenoumeral inferior e o MR (músculos serosas são as causas mais frequentes de dor no ombro, e
subescapular, supraespinhal, infraespinhal e redondo menor). cerca de 95% das lesões do MR são provocadas pela síndro-
Os músculos rotadores são, juntamente com a Cabeça me do impacto.
Longa do Bíceps (CLB), depressores e desaceleradores do Na etiopatogenia da síndrome do impacto, destacam-
membro superior. Esses músculos são excessivamente soli- -se morfologia do desfiladeiro do supraespinhal, excesso de
citados não só para atividades da vida diária, mas, principal- uso e envelhecimento biológico.
mente, para os esportes. As rupturas do MR são mais comuns em indivíduos aci-
O movimento de elevação do braço deve deslizar har- ma de 40 anos e podem ser parciais ou totais.
monicamente sob o arco coracoacromial (acrômio e liga- Neer descreveu 3 fases na evolução das lesões do MR:
mento coracoacromial) e a articulação acromioclavicular - Fase I: edema e hemorragia do músculo; pacientes jo-
,que formam um verdadeiro teto para o úmero. vens abaixo de 25 anos e ocorre em função do uso ex-
185
ORTO P ED I A
e) Tratamento
O tratamento indicado na fase I é conservador e consis-
te em combate à dor e, após o alívio dos sintomas, prescri-
ção de exercícios de fortalecimento muscular.
Na fase II, o tratamento pode ser conservador ou cirúr-
gico. O tratamento conservador traz benefícios e pode ser
suficiente, mas, quando não há melhora após 4 a 6 meses,
pode-se optar pelo tratamento cirúrgico, realizado por via
aberta ou artroscópica, procedendo-se a uma acromioplastia
a fim de diminuir os sintomas dolorosos e evitar possível rup-
tura do MR, como evidenciado na história natural da doença.
Na fase III, o tratamento de escolha é o cirúrgico por
meio da acromioplastia, com o objetivo de descomprimir
o espaço subacromial, realizando-se concomitantemente à
reconstrução do MR.
B - Bursite do ombro
186
O R T O P E D I A A D U LT O
Entre os tendões do MR e o arco ósseo existe a bursa su- Este impacto geralmente ocorre ao longo do tempo de-
bacromial para evitar atrito. vido à repetitiva atividade overhead, trauma, lesão anterior,
a má postura ou inatividade. Em um ombro instável, o MR
tem que trabalhar mais, o que pode causar lesões.
O trabalho excessivo do MR causa fadiga e eventual-
mente inflama e enfraquece devido à inibição da dor ou
laceração do tendão.
Quando o MR não funciona normalmente, é incapaz de
impedir a cabeça do úmero (braço) de se elevar ao espaço
subacromial, causando a bursa ou esmagando os tendões.
A falha no trato adequado dessa instabilidade faz com
que a lesão se repita. Má técnica ou maus hábitos de treina-
Figura 23 - Bursa subacromial mento, como treinar intensamente, também é uma causa
comum de lesões por overuse, como bursite ou tendinite.
Especificamente, a bursa subacromial fica entre o liga- Sinais e sintomas de bursite subacromial:
mento coracoacromial e o músculo supraespinhal, e ajuda a - Início gradual dos sintomas ao longo de semanas ou
reduzir o atrito neste pequeno espaço sob o acrômio. meses;
- Dor na parte externa do ombro;
- Dor pode se espalhar para o braço em direção ao co-
tovelo ou pulso;
- Dor piora ao deitar do lado afetado;
- Dor agravada quando se usa o braço acima da cabeça;
ORTOPEDIA
- Arco doloroso de movimento – dor sentida entre 60 e
90° de braço se movendo para cima e para fora.
d) Diagnóstico
A história e exame clínico demonstram queixa de dor
localizada no ombro com piora após atividades de elevação
do braço.
Os exames complementares podem ser a USG – muitas
Figura 24 - Quando o braço é elevado, a bursa se projeta lateral- vezes o teste mais útil para diagnosticar a bursite subacro-
mente mial – e, às vezes, RM – necessária para confirmar o diag-
c) Etiologia nóstico de bursite do ombro por apresentar maior sensibili-
dade e especificidade em comparação com a USG, que é um
Bursite em torno do ombro pode ser causada por trau- exame operador-dependente.
mas repetidos de menor intensidade, como o uso excessi-
vo da articulação do ombro e dos músculos ou um trauma
mais significativo, como uma queda.
Nas lesões tipo overuse, bursite é frequentemente asso-
ciada à tendinite/inflamação dos tendões do MR.
Alguns nascem com um espaço subacromial menor.
Condições como osteoartrite também podem causar o cres-
cimento de esporões ósseos subacromiais, o que restringe
ainda mais o espaço. Devido a esse estreitamento estrutu-
ral, é provável que os tecidos moles sejam comprimidos,
forçados e irritados no espaço subacromial, o que resulta
em bursite ou tendinite do MR.
Posturas que estreitam o espaço subacromial são:
- Braço diretamente acima;
- Braço trabalhando perto da ou na altura do ombro.
A síndrome do impacto pode ocorrer se o ombro for di-
namicamente instável. Isto significa que há uma combina-
ção excessiva de movimento articular, frouxidão ligamentar
e fraqueza muscular ao redor da articulação do ombro. Figura 25 - Exame e RM demonstrando bursite no ombro
187
ORTO P ED I A
e) Tratamento va. O ombro direito é o mais afetado e 60% dos casos são
Repouso relativo é um dos aspectos mais importantes assintomáticos.
do tratamento da bursite do ombro. Isso significa que se c) Etiologia
deve, em 1º lugar, parar de fazer o movimento ou atividade
A etiopatologia ainda não está esclarecida. A tendinite
que provocou a dor no ombro e evitar a realização de qual-
calcária é uma doença autolimitada que tende à cura es-
quer coisa que cause dor no ombro.
pontânea.
Analgésicos ou anti-inflamatórios.
d) Diagnóstico
O paciente relata desconforto e dor moderada, na fase
de deposição, que evolui para dor intensa na fase de reab-
sorção do cálcio.
As radiografias mostram a deposição de cálcio nos mús-
culos. O exame radiográfico é o método de eleição.
A USG permite a localização dos depósitos calcários,
mas é um exame que depende do operador.
E a RM é um exame de exceção.
e) Tratamento
O objetivo do tratamento é manter o ombro indolor e
com amplitude de movimento normal.
O tratamento pode ser conservador ou cirúrgico. Deve-
se iniciar com os métodos conservadores, com medicação
analgésica e anti-inflamatória. Na fase aguda, deve-se uti-
lizar bolsa de gelo no ombro com duração de 20 minutos.
Figura 26 - Terapia fria: gelo deve ser aplicado nos estágios iniciais Não se aconselha o uso de calor.
até 15 a 20 minutos a cada hora; conforme a dor no ombro melho- Alguns autores recomendam infiltração local com anes-
rar, você pode diminuir a frequência da terapia fria tésico e corticoide, apesar da possibilidade de produzir de-
generação tendínea.
Massagem dos tecidos moles em torno do ombro para
aliviar a tensão nos músculos pode ajudar com a dor e pre-
venir desequilíbrios musculares. Massagem direta na bursa
não é recomendada.
Acupuntura pode ajudar no controle da dor, a reduzir o
inchaço nas fases iniciais e também ajuda a relaxar os mús-
culos tensos ao redor da articulação do ombro.
Fisioterapia é particularmente eficaz na fase subaguda,
uma vez que a dor esteja estabelecida. Na bursite crônica
ou persistente, a fisioterapia pode ser necessária após inje-
ção de corticosteroide, que ajuda potencialmente a reduzir
a inflamação. As intenções do fisioterapeuta serão restabe-
lecer a extensão do movimento, corrigir a postura do om-
bro e trabalhar no fortalecimento do MR e do estabilizador
escapular.
C - Tendinite calcária
a) Definição
A deposição de sais de cálcio é frequente no MR do
ombro, e a localização mais comum é a região acromial do
tendão do músculo supraespinhal, nas proximidades de sua
inserção na tuberosidade maior do úmero.
b) Epidemiologia
As mulheres são mais atingidas do que os homens, à
proporção de 3:1. Ocorre na faixa etária entre 30 e 50 anos
e não tem relação com a atividade profissional ou esporti-
188
O R T O P E D I A A D U LT O
ORTOPEDIA
Figura 28 - Processo inflamatório na cápsula articular do ombro
b) Diagnóstico
O diagnóstico é essencialmente clínico; compreende
surto espontâneo de dor no ombro, restrição ativa e passiva
na elevação e rotação interna e, principalmente, externa do
ombro. A radiografia pode ser normal ou com desminerali-
zação óssea. E a artrografia demonstra redução acentuada
do volume articular do ombro.
c) Tratamento
Figura 27 - Infiltração da articulação do ombro A prevenção é o melhor método de tratamento. Deve-
se evitar imobilização prolongada, sempre preconizando
Na fase aguda, um método bastante eficaz compreende mobilização precoce. A fisioterapia deve ser realizada para
a punção e a aspiração da massa pastosa, com o auxílio de ganho de mobilidade e alívio da dor.
um aparelho de raio x para localizar a calcificação. O bloqueio anestésico é indicado, principalmente, quan-
Algumas escolas utilizam aparelho de litotripsia, mas os do associado à distrofia simpático-reflexa. E a liberação ar-
resultados ainda são duvidosos. troscópica do ligamento coracoumeral se indica aos casos
O tratamento cirúrgico está indicado no insucesso do refratários aos tratamentos já mencionados.
tratamento conservador, com a remoção da calcificação.
6. Doenças do quadril
D - Capsulite adesiva (ombro congelado)
a) Definição A - Osteoartrose do quadril
A capsulite adesiva (ombro congelado) é uma entidade
a) Introdução
clínica caracterizada pela presença de dor no ombro asso-
ciada à perda progressiva das amplitudes de movimentos As doenças degenerativas articulares acompanham a
ativos e passivos da articulação glenoumeral. É mais fre- humanidade desde a antiguidade. Os esportes de contato e
189
ORTO P ED I A
os exercícios com impactos articulares têm levado o homem ao uso inapropriado do próprio corpo e, como consequência,
as articulações de carga que ainda não se adaptaram adequadamente no processo evolutivo (quadril e joelho) sofrem as
consequências óbvias, que são o seu desgaste mecânico.
190
O R T O P E D I A A D U LT O
defeitos anatômicos (adquiridos, congênitos), traumatis- As causas metabólicas incluem artrite reumatoide, ar-
mos (sequelas), transtorno metabólico e tumores. trite gotosa e sequela de osteoporose e osteomalácia, por
alteração da matriz orgânica e inorgânica, e modificação da
b) Diagnóstico
forma do quadril por não suportar as cargas normais.
A apresentação clínica é com dor na virilha ou adutores
após esforços, dor ou desconforto na face anterior da coxa d) Tratamento
até a altura do joelho, dor em “queimação” na face anterior A 1ª opção de tratamento é o conservador, consideran-
da tíbia, dificuldade em colocar meias, cortar unhas, cruzar do a idade do paciente, a ocupação profissional, seu peso,
as pernas. Dor lombar baixa pode indicar artrose bilateral. a intensidade das atividades físicas e/ou desportivas, a etio-
O exame físico caracteriza-se com marcha claudicante, logia da artrose e o quanto seus sintomas interferem nas
limitação da rotação interna inicialmente e, posteriormen- ocupações diárias habituais.
te, da rotação externa, abdução e adução, sendo a flexão o São recomendações abandonar esportes de contato, re-
último movimento acometido. alizar atividades de lazer sem carga, hidroginástica, bicicle-
O exame complementar de eleição é a radiografia pa- ta, exercícios de alongamento e redução do peso corporal.
norâmica da bacia. Os exames complementares, como a Na fase aguda, deve-se realizar fisioterapia analgésica,
tomografia e a RM, são de exceção. uso de AINHs e repouso relativo.
ORTOPEDIA
Figura 31 - Artrose do quadril esquerdo
191
ORTO P ED I A
192
O R T O P E D I A A D U LT O
ORTOPEDIA
O diagnóstico diferencial inclui osteoporose transitória,
sinovite vilonodular, artrose degenerativa, artrite reumatoi- Figura 35 - Anatomia do joelho: vista posterior do joelho direito
de, artrite gotosa, infecção e tuberculose. em extensão
d) Tratamento A inserção femoral é mais frágil do que a tibial.
O tratamento não cirúrgico inclui repouso, muletas, fi- Esse ligamento é composto, classicamente, por 2 feixes
sioterapia e medicamentos, que não evitam a progressão principais: um anteromedial que se tensiona em flexão, e
da doença, que quase sempre evolui para a grave destrui- outro posterolateral, que é tensionado em extensão e fle-
ção articular. xão, sendo o de maior espessura.
A história natural da osteonecrose, em geral, favorece a A função do LCA é estabilizar a tíbia anteriormente, prin-
sua progressão, com evolução para quadril rígido e doloroso. cipalmente em extensão.
O tratamento cirúrgico prevê 2 alternativas: o que pre-
c) Mecanismo de lesão
serva a cabeça femoral e o tratamento artroplástico.
Os tratamentos que preservam a cabeça incluem a des- O mecanismo de lesão é geralmente a entorse do joe-
compressão do osso necrótico, a descompressão e coloca- lho, que é a rotação associada a um mecanismo em valgo
ção de enxerto ósseo livre ou vascularizado, osteotomias ou varo.
angulares e rotacionais.
As artroplastias de substituição estão indicadas quan-
do ocorre colapso, visando ao alívio da dor e à restauração
da função.
7. Lesões do joelho
193
ORTO P ED I A
Figura 38 - Manobra da gaveta anterior Figura 40 - Tratamento cirúrgico de lesão ligamentar no joelho
194
O R T O P E D I A A D U LT O
ORTOPEDIA
O Ligamento Cruzado Posterior (LCP) é composto de 2
partes principais, uma grande e anterior, a principal, e uma
menor e posterior. Origina-se no côndilo femoral medial e
se insere na parte posterior da tíbia. Esse ligamento é maior
e 2 vezes mais forte que o ligamento anterior. O LCP corres-
ponde por 89% da resistência à translação posterior da tíbia Figura 41 - Posteriorização da tíbia em relação ao fêmur
sobre o fêmur.
Os traumatismos causados pelos modernos veículos au- As lesões ligamentares podem ser classificadas em 3
tomobilísticos e pela participação em atividades esportivas, graus de gravidade. A lesão de 1º grau de um ligamento é
tanto competitivas quanto recreativas, e as lesões dos liga- classificada quando ocorre laceração de um número míni-
mentos no nível do joelho vêm se tornando cada vez mais mo de fibras do ligamento, mas sem instabilidade. As lesões
comuns. de 2º grau representam uma ruptura de maior número de
A estabilidade do joelho depende de vários fatores, fibras ligamentares, com maior perda da função e uma ins-
como os eixos mecânicos e as articulações dos membros tabilidade de leve a moderada. A lesão de 3º grau é uma
inferiores, os contornos ósseos, os estabilizadores intra- ruptura completa do ligamento, resultando em considerá-
-articulares, como os meniscos e ligamentos cruzados, e os vel instabilidade.
estabilizadores extra-articulares, como a cápsula articular A ruptura do LCP, muitas vezes, conduz à incapacidade
do joelho e os ligamentos colaterais e musculatura. moderada, mas a evolução em longo prazo mostra desen-
volvimento de osteoartrose, indicando sua importância na
b) Mecanismo de trauma biomecânica do joelho.
Frequentemente, os ligamentos do joelho são lesiona-
dos em atividades atléticas, em especial esportes de con- d) História natural da lesão
tato, como o futebol. Acidentes automobilísticos, princi- A história natural da evolução das lesões do LCP pode
palmente envolvendo motocicletas, são causas comuns de ser resumida em 3 fases. Primeiramente, o paciente evolui
ruptura de ligamentos do joelho. Um exemplo é quando o com incapacidade importante, referindo dor e instabilida-
joelho flexionado de um passageiro em um carro golpeia de do joelho, principalmente com este em extensão e ati-
o painel do automóvel, após uma batida, causando uma vidades que envolvam subir e descer escadas, período que
laceração do LCP. A ruptura isolada do LCP pode resultar dura, em média, de 3 a 18 meses. Na 2ª fase, o paciente
de um golpe direto à parte anterior da tíbia, com o joelho apresenta tolerância funcional, com retorno às atividades e
flexionado. aos exercícios esportivos em diversos graus de solicitação.
As lesões do LCP apresentam incidência muito menor, Durante esse período, observa-se degeneração articular
quando comparadas às do LCA, achado justificado por, pelo patelofemoral e femorotibial por alteração da biomecânica
menos, 2 fatores: maior tamanho do LCP e um mecanismo articular, fase que dura, em média, 5 anos. A fase final cor-
de trauma menos frequente. responde à artrose, principalmente tibiofemoral.
195
ORTO P ED I A
e) Tratamento
196
O R T O P E D I A A D U LT O
e) Classificação g) Tratamento
Classificação clínica: - Não cirúrgico: entorses de graus I e II com lesão isola-
- Agudo: <3 semanas; da do ligamento e grau III podem ser tratadas conser-
- Subagudo ou crônico: >4 a 6 semanas. vadoramente após a exclusão cuidadosa de qualquer
lesão associada que possa necessitar de uma interven-
Classificação quanto ao trauma:
ção cirúrgica;
- Grau I: permite abertura de 0 a 5mm;
- Grau II: permite abertura de 5 a 10mm; - Reparação cirúrgica: grau III com lesão do ligamento
colateral lateral.
- Grau III ou ruptura completa: permite abertura
>10mm.
D - Luxação recidivante da patela
a) Definição
A luxação da patela representa o seu deslocamento la-
teral em relação ao sulco femoral distal, com a perda da
congruência articular. A instabilidade femoropatelar é uma
das desordens mais frequentes da articulação dos joelhos e
pode acometer a ambos.
A dor é sentida na frente do joelho e acontece quando
a patela está sendo comprimida contra o fêmur. Apresenta
melhora após o retorno da patela ao seu lugar normal (re-
Figura 44 - Os 3 graus de lesão do ligamento colateral medial dução), que, em geral, é fácil e ocorre sozinho, esticando o
ORTOPEDIA
f) Exames complementares joelho.
A patela sempre se desloca lateralmente. O paciente
- Radiografia de joelho com carga e 45° de flexão, AP + pode informar que ela se moveu lateralmente ou que o res-
lateral + axial; to do joelho se moveu medialmente ou houve um trauma
- Radiografia com estresse; direto na patela, que se desloca.
- Ressonância nuclear magnética. Uma vez reduzida, o joelho apresenta-se como um joe-
lho traumático, em que um derrame articular (aumento de
volume) se instala em poucos minutos. Nesse caso, geral-
mente ocorre a desinserção ou a ruptura do estabilizador
da articulação, que é o ligamento patelofemoral medial. O
seu tratamento inadequado pode levar à recorrência da lu-
xação, ou seja, fazer com que a articulação se torne instável.
b) Diagnóstico
O diagnóstico é clínico, feito por meio da história e do
exame físico do paciente, tentando sempre determinar a
Figura 45 - Radiografia com estresse em valgo mostrando a aber- causa (etiologia), o tipo de trauma, o número de vezes que
tura medial da articulação do joelho já aconteceu a luxação e há quanto tempo. O paciente rela-
ta que “sentiu o joelho sair e voltar para o lugar”. Um exame
cuidadoso é de grande importância não somente para um
diagnóstico correto, mas também para uma avaliação da
magnitude das lesões associadas.
Eventualmente, ocorrem novas luxações e, com a progres-
são das lesões associadas, cada vez o “joelho (a patela) sai do
lugar” com maior facilidade e menor trauma. Com o passar do
tempo, atividades como dançar, pular pequenos obstáculos e
torcer o pé podem causar novo episódio de luxação.
Após o 1º episódio, o paciente demonstra insegurança e
apreensão, relatando certo grau de instabilidade do joelho,
o que o leva a diminuir suas atividades físicas e, consequen-
temente, acarreta uma hipotrofia (enfraquecimento) mus-
cular, apresentando um aumento do número de luxações.
Uma manobra no exame físico confirma o diagnóstico:
Figura 46 - Lesão ligamentar colateral medial teste da apreensão (sinal de Smilie). E os exames de ima-
197
ORTO P ED I A
gem (raio x, tomografia computadorizada e ressonância nu- de, integridade e consistência, o que leva também à perda
clear magnética) complementam o diagnóstico e ajudam a de parte ou totalidade da sua capacidade funcional.
identificar lesões associadas, importantes no planejamento A artrose é mais prevalente no homem do que na mu-
do tratamento. lher até os 45 anos de idade, mas depois se torna mais do-
minante na mulher. A obesidade é um dos fatores que pode
causar ou piorar a artrose.
A cartilagem normal do joelho é um tecido sem irriga-
ção sanguínea formado por uma grande matriz extracelular
e células dispersas neste material. A matriz extracelular é
composta de água que representa 66 a 80% de sua estru-
tura, colágeno e proteoglicanos. As células presentes são
chamadas de condócitos.
Esse conjunto de líquidos, fibras com direções diversas
e células é nutrido pelo líquido sinovial e o seu processo de
equilíbrio é controlado por diversas enzimas e fatores de
crescimento.
Na artrose há alteração desse equilíbrio causando a
desestruturação da cartilagem e sua fragmentação que se
manifesta através de lesões e ulcerações na superfície ar-
ticular.
c) Tratamento
Há uma grande variedade de tratamentos que podem
ser recomendados para as luxações, que se baseiam nos fa-
tores predisponentes.
Inicialmente, a forma conservadora consiste em um pro-
grama fisioterápico bem planejado, com reforço muscular
compensatório principalmente do músculo vasto medial
(músculo da parte medial da coxa que compõe o quadrí-
ceps), que é o grande estabilizador da patela.
O tratamento funcional, com excelentes resultados,
deve ser sempre a 1ª opção; se o tratamento conservador
falhar e as luxações se tornarem recorrentes, pode-se in-
Figura 48 - Lesão de cartilagem articular
dicar a cirurgia. Um dos procedimentos mais comuns é a
liberação do retináculo lateral na qual este é seccionado, A artrose resulta de uma combinação de fatores, como,
liberando medialmente a patela. por exemplo, um traumatismo, sobrecarga da articulação,
Dentre os tratamentos cirúrgicos, estão os procedimen- infecção e após cirurgias de ligamentos ou menisco. Mas a
tos que promovem o realinhamento proximal da muscula- mais comumente encontrada é a artrose idiopática ou pri-
tura do vasto medial oblíquo, a reconstrução do ligamento mária que ocorre sem qualquer causa aparente.
patelofemoral medial e o realinhamento distal por meio da
osteotomia de medialização da tuberosidade anterior da A - Fisiopatologia
tíbia.
As complicações possíveis do tratamento cirúrgico são A principal característica da doença é a perda progres-
limitação da mobilidade do joelho, distrofia reflexa (dor por siva da cartilagem da articulação. No entanto, existem ou-
disfunção neurológica) e recidiva da luxação. tras, tais como um novo crescimento ósseo logo abaixo da
cartilagem, que leva à esclerose do osso, microfraturas e
cistos ósseos. Além disso, ocorre o crescimento do osso nas
8. Artrose do joelho margens da articulação, o que leva à formação de osteófi-
A artrose do joelho ou gonartrose é uma doença dege- tos, responsáveis pela restrição dos movimentos. Observa-
nerativa da articulação do joelho e a prevalência da doença se também uma reação inflamatória nos tecidos moles que
aumenta com o envelhecimento da população, assim como estão à volta da articulação, decorrente das alterações des-
pela exposição do indivíduo jovem a situações de trauma- critas anteriormente. Ao longo do tempo, pode ainda ocor-
tismo articular. A cartilagem articular perde a sua elasticida- rer uma atrofia muscular.
198
O R T O P E D I A A D U LT O
ORTOPEDIA
gamentos dos músculos e tendões, ganho da amplitude arti-
cular e fortalecimento muscular. Como medidas analgésicas
têm-se o uso de gelo nas crises agudas, a aplicação de ca-
lor com uso de lâmpadas de infravermelho e aparelhos com
Figura 49 - Artrose de joelho
emissão de ondas curtas (nas dores persistentes), que pode
ocasionar uma remissão de meses. O exercício de fortaleci-
C - Exames complementares mento tem o objetivo de aumentar a massa muscular para
proteger a articulação. Os exercícios de aumento da ampli-
A radiografia simples do joelho com o paciente em apoio tude articular previnem as contraturas e a perda funcional.
monopodal é suficiente para o diagnóstico da gonartrose. O O tratamento cirúrgico tem indicação quando na per-
exame demonstra um pinçamento do espaço articular fe- sistência dos sintomas sem a melhora após o tratamento
morotibial no compartimento acometido. clínico ou para a correção das deformidades.
Como opção de tratamento cirúrgico temos a artrosco-
pia, a osteotomia (cirurgia para correção da deformidade)
e a artroplastia (substituição da articulação por prótese to-
tal). A indicação cirúrgica depende de vários fatores, entre
os mais importantes o grau de artrose, a idade e as condi-
ções de saúde do paciente.
D - Prevenção
A artrose é uma doença degenerativa e progressiva. Os
sintomas podem ser prevenidos através de hábitos saudá-
veis, como controle do peso, evitar atividades que sobrecar- Figura 51 - Radiografia após tratamento cirúrgico de osteotomia
regam as articulações, como trabalhos com excesso de peso valgizante do joelho
199
ORTO P ED I A
raro nos pés tipo grego, em que o hálux é mais curto que o
2º dedo. O pé plano também é responsável por hálux valgo
e encontrado nos pés reumatoides.
Existe um fator hereditário, visto em muitos casos com
história familiar presente.
Atinge mais os adultos e, quase exclusivamente, mulhe-
res, com predomínio acima dos 30 anos.
C - Diagnóstico
O diagnóstico é clínico, pois a deformidade é visível, em
maior ou em menor grau. O diagnóstico radiográfico é rea-
lizado na incidência dorsoplantar e perfil na posição ortos-
Figura 52 - Modelo de prótese total de joelho tática. Devem-se avaliar os vários ângulos e o estado das
articulações, sobretudo as metatarsofalângicas do hálux e
do 2º dedo:
B - Etiologia
São descritos vários fatores que produzem ou predis-
põem o aparecimento do hálux valgo. O uso de calçados
inadequados tem sido considerado a principal causa. A po-
sição em varo do 1º metatarsiano, que é normal até 12°,
seria outro fator etiológico.
Qualquer alteração anatômica do 1º segmento que in-
clui o 1º cuneiforme, 1º metatarsiano, falanges e articula-
ções existentes entre esses elementos pode contribuir para
o aparecimento do hálux valgo.
Há maioria absoluta de hálux valgo em pés tipo egípcio,
isto é, nos pés em que o hálux é maior que o 2º dedo, e é Figura 55 - Radiografia anteroposterior do pé com hálux valgo
200
O R T O P E D I A A D U LT O
ORTOPEDIA
leva à grave destruição articular;
Quadro-resumo - Epidemiologia: predomínio do sexo feminino;
Osteoporose - Etiologia: idiopática, doença de Gaucher, gota, radioterapia,
- Definição: distúrbio osteometabólico caracterizado pela dimi- cortisona, gravidez, lúpus eritematoso sistêmico, álcool, malá-
nuição da DMO e aumento da fragilidade esquelética e do risco ria, pancreatite, transplante renal, diabetes, hiperproteinemia,
de fratura. As principais manifestações clínicas da osteoporose fenômenos disbáricos, AIDS e coagulopatia;
são as fraturas; - Quadro clínico: dor no quadril, claudicação e limitação da mo-
- Epidemiologia: predomínio no sexo feminino (com deficiência bilidade do quadril;
estrogênica) e em indivíduos idosos; - Diagnóstico: radiografias, feitas em anteroposterior e perfil, a cin-
- Causas secundárias: doenças e medicamentos associados; tilografia com tecnécio, a tomografia computadorizada e a RM;
- História clínica: avaliação de mulheres na pós-menopausa com - Tratamento não cirúrgico: repouso, muletas, fisioterapia e me-
1 ou mais fatores clínicos de risco citados, após 65 anos, inde- dicamentos;
pendente da presença de fatores de risco, e de homens com - Tratamento cirúrgico: o que preserva a cabeça femoral e o trata-
fatores de risco para fraturas; mento artroplástico.
- Exame: densitometria óssea. Lesões do joelho
Síndromes dolorosas do ombro - Mecanismo de lesão: entorse do joelho;
- Definição: choque entre o ápice do tubérculo maior do úmero - Quadro clínico: dor, derrame articular e queixa de instabilida-
e as suas inserções tendinosas do MR (músculos subescapular, de no joelho;
supraespinhal, infraespinhal e redondo menor);
- Manobras diagnósticas: manobras de Lachman, gaveta ante-
- Etiopatogenia: morfologia do acrômio, excesso de uso e enve- rior e os testes provocativos de subluxação conhecidos como
lhecimento biológico; “manobras de ressalto”;
- Quadro clínico: dor no ombro e na face lateral do braço, rela- - Tratamento: sempre cirúrgico com reconstrução do ligamento.
cionada com os movimentos, limitação da mobilidade e dimi- Lesões do joelho – luxação recidivante da patela
nuição da força muscular. Sinais clínicos específicos, como sinal
do impacto (Neer, Hawkins-Kennedy e Yokun), teste de Jobe, - Definição: deslocamento lateral em relação ao sulco femoral
teste de Patte e teste de Gerber; distal, com a perda da congruência articular;
- Radiografias: osteocondensação do acrômio e do tubérculo - Diagnóstico: clínico; história e exame físico do paciente;
maior, osteopenia e cistos subcondrais do tubérculo maior, os- - Manobra diagnóstica: teste da apreensão (sinal de Smilie);
teófitos e diminuição do espaço umeroacromial, ascensão da - Exames de imagem: raio x, tomografia computadorizada e res-
cabeça do úmero e deformidades; sonância nuclear magnética;
- USG: não detecta lesões <1cm; entretanto, tem 98% de especi- - Tratamento conservador: fisioterapia, com reforço muscular;
ficidade quando a lesão é >1cm; - Tratamento cirúrgico: é útil na falha do tratamento conserva-
- RM: é o exame que fornece melhores informações das lesões dor e tem por objetivo realinhar a patela no sulco da tróclea
do MR; femoral.
201
SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO CIRÚRGICO
CAPÍTULO
7
Tumores ósseos
Gustavo Merheb Petrus
1. Lesões pseudotumorais
202
TUMORES ÓSSEOS
ORTOPEDIA
cientes esqueleticamente maduros.
O melhor tratamento é a curetagem da lesão e seu pre-
enchimento com autoenxerto.
Em ossos dispensáveis, faz-se a ressecção de todo o seg-
mento lesado sem reconstrução.
Da mesma forma que outras lesões benignas e pseudo-
tumorais, a quimioterapia e a radioterapia são contraindi-
cadas, uma vez que não apresentam nenhum efeito sobre
Figura 2 - Radiografia de paciente com cisto ósseo aneurismático células que não estejam em divisão celular ou apresentem
do fêmur distal mitoses.
A taxa de cura está em torno de 85%, com 15% de recor-
O quadro radiológico do cisto ósseo aneurismático mostra
rência resolvidos em uma cirurgia de revisão.
uma lesão excêntrica, insuflativa, bem delimitada e septada.
Os achados radiográficos variam com a maturidade e a C - Displasia fibrosa
localização da lesão. Costuma haver 3 estágios progressivos:
- A lesão apresenta-se restrita ao osso esponjoso, sem É uma lesão benigna ativa, pseudotumoral, que se
atingir o córtex. Nesta fase é geralmente uma lesão ar- caracteriza pela presença de tecido fibroso-conjuntivo
redondada e centralizada na metáfise; no qual se encontram trabéculas mal orientadas de osso
- Torna-se excêntrica, afila e insufla a cortical, atingindo imaturo e não lamelar. Pequenos focos de cartilagem po-
o periósteo, com uma imagem “em bolha de sabão”. dem estar presentes. É uma lesão do esqueleto em cres-
A área insuflada é contida por uma camada que tem cimento.
uma imagem em “casca de ovo”, com uma margem in- A displasia fibrosa é uma lesão óssea congênita pre-
terna mal definida, sem esclerose óssea. No interior enchida com tecido fibroso e ósseo. Frequente, com pe-
da lesão, septos delicados podem ser vistos. Pode ser quena predileção pelo sexo feminino, geralmente ocorre
encontrada reação periosteal em “casca de cebola” e entre 5 e 20 anos de idade. Pode apresentar-se na forma
triângulo de Codman; monostótica, a mais comum, e poliostótica, que tende
a acometer um membro ou um lado do corpo. Acomete
- Com a progressão, a lesão se expande, o osso cortical é
mais o fêmur proximal, ossos da face, tíbia, úmero, coste-
destruído e a lesão progride até os tecidos moles. São
las, rádio e ilíaco.
comuns as fraturas nessa fase.
A displasia fibrosa costuma manifestar-se na infância ou
O cisto ósseo aneurismático pode estar presente em adolescência, aparecendo como uma deformidade progres-
áreas do tumor de células gigantes, displasia fibrosa, con- siva ou como uma fratura. Clinicamente, pode manifestar-
droblastoma, osteoblastoma, casos em que é chamado de -se com dor, fratura patológica, alargamento e deformida-
secundário. des ósseas.
203
ORTO P ED I A
A síndrome de Albright é a associação de maturida- As lesões monostóticas da displasia fibrosa são, em sua
de esquelética adiantada, puberdade precoce na mulher, maioria, assintomáticas e não necessitam de tratamento.
manchas na pele e lesões ósseas. A deformidade mais As indicações cirúrgicas são:
comum é o arqueamento dos ossos longos, a forma mais - Deformidade grave ou progressiva de um membro;
típica “em cajado de pastor” causada pela varização pro- - Pseudoartrose após fratura;
ximal do fêmur. - Fraturas nos ossos longos em adultos;
Radiologicamente, as lesões podem mostrar aspecto - Dor persistente.
lítico com cistos, aspecto de vidro fosco ou áreas de calcifi-
cação e deformidades. A lesão se apresenta como lesões ra- O tratamento é conservador nas crianças. Fraturas pa-
diolúcidas intramedulares, com aspecto “nebuloso” descri- tológicas devem ser tratadas com tração ou imobilização
to classicamente como “vidro esmerilhado ou vidro fosco”. externa, e osteotomias devem ser realizadas antes de a de-
O aspecto radiográfico muitas vezes lembra um osso formidade acentuar-se.
diafisário sem limites entre cortical e canal medular, dando Lesões monostóticas no adulto, com risco de fratura e
a imagem de um osso maciço. sintomáticas, devem ser curetadas e preenchidas com en-
xerto ósseo, realizando osteossíntese, se necessário.
D - Granuloma eosinofílico
Lesão não neoplásica, pseudotumoral, benigna agressi-
va, de etiologia desconhecida, que se caracteriza por uma
proliferação intensa de elementos retículo-histiocitários
com quantidades variáveis de leucócitos eosinófilos, leu-
cócitos neutrófilos, linfócitos, células plasmáticas e células
gigantes multinucleadas.
O granuloma eosinofílico é a forma localizada da histio-
citose X, reticuloendoteliose de etiologia desconhecida. A
lesão pode ser única ou múltipla, é pouco frequente e atin-
ge mais o sexo masculino; a faixa etária mais comum está
entre 5 e 20 anos, e as localizações são quase sempre no
crânio, no fêmur, na mandíbula, nas costelas, nas vértebras
Figura 4 - Radiografia de paciente com displasia fibrosa do fêmur
(vértebra plana de Calvé) e nos ossos chatos.
e deformidade “em cajado de pastor”
As lesões costumam acometer as diáfises e raramente
as metáfises, localizando-se mais frequentemente na diá-
fise do fêmur.
Clinicamente, o granuloma eosinofílico apresenta dor e
aumento de volume. O quadro radiológico é o de uma lesão
osteolítica central, destruindo a cortical.
204
TUMORES ÓSSEOS
A histologia mostra que ele é constituído de leucócitos e tagem e enxerto ósseo. Contraindicam-se a injeção intra-
histiócitos, estes chamados de células de Langerhans. lesional de corticosteroides e a radioterapia, que não deve
O diagnóstico diferencial deve ser feito com tumores ser, em nenhum caso, indicada em lesões benignas.
malignos que acometem a diáfise do fêmur, como o sarco-
ma de Ewing, metástase de neuroblastoma, linfoma e com 2. Tumores benignos formadores de osso
osteomielite.
A - Osteoma osteoide
O osteoma osteoide é uma lesão osteoblástica benigna
caracterizada pelo tamanho reduzido, geralmente <1cm, o
contorno demarcado e a frequente presença de uma zona
de formação óssea reativa ao redor. Histologicamente, é
constituído por um tecido celular muito vascularizado com-
posto por osso imaturo e tecido osteoide.
Ocorre, principalmente, em crianças, adolescentes e
adultos jovens entre 10 e 25 anos. Cerca de 75% dos casos
surgem até os 25 anos.
O tumor é mais frequente em homens, com prevalência
de 2 a 4:1, e mais comum em indivíduos brancos. O quadro
clínico é de dor de intensidade crescente no local ou arti-
culações próximas, mais intensa à noite, podendo associar
aumento de volume. A dor acontece por conta da produção
ORTOPEDIA
de prostaglandinas provocada pelo tumor e, provavelmen-
Figura 7 - Radiografia da perna mostrando a lesão na tíbia te, pela presença de fibras nervosas no tumor e não parece
aumentar de volume com a evolução.
A cintilografia óssea detecta lesões múltiplas. A RM e a
O uso de ácido acetilsalicílico e de demais anti-inflama-
tomografia computadorizada mostram que granulomas são
tórios não esteroides proporciona alívio da dor.
contidos pelo periósteo e não invadem a região paravertebral.
Quando a lesão está presente na coluna vertebral, geral-
mente associa-se à escoliose dolorosa. As localizações mais
frequentes são metáfise femoral proximal, metáfise femo-
ral distal, metáfise proximal tibial e metáfise radial distal.
Nas mãos, a localização mais comum são as falanges.
O diagnóstico é realizado pela radiografia simples. A ca-
racterística radiográfica é de um nicho oval arredondado,
pequeno, radiotransparente, circundado por uma zona de
densidade variável, que corresponde à esclerose óssea re-
ativa. A cintilografia e a tomografia podem localizar a lesão
quando há dificuldade no diagnóstico.
205
ORTO P ED I A
B - Osteoblastoma
O osteoblastoma é uma lesão benigna ou de agressivi-
dade localizada, histologicamente semelhante ao osteoide,
que se caracteriza pelo tamanho maior (mais de 1 a 2cm)
e pela ausência de um cone de formação óssea visível ao
seu redor.
É mais comum no sexo masculino, à proporção de 2:1
e distribuição etária dos 3 aos 70 anos. A localização mais
frequente é a coluna dorsal, seguida por fêmur, tíbia e ossos
da mão.
O quadro clínico caracteriza-se por dor não noturna,
cuja intensidade, menor que no osteoma osteoide, não ne-
cessariamente reduz com os salicilatos.
Figura 10 - Cintilografia óssea com hipercaptação no osteoma os- Podem ocorrer edema e espasmo muscular.
teoide Radiograficamente, o osteoblastoma caracteriza-se por le-
são osteolítica superior a 2cm sem esclerose óssea ao redor.
O diagnóstico diferencial pode ser realizado com corpo
estranho reacional, osteomielite, osteocondrite e osteos-
sarcoma.
- Osteossarcoma
Figura 12 - (A) Radiografia de paciente com osteoma osteoide na O osteossarcoma é um tumor maligno caracterizado
tíbia e (B) TC mostrando osteoma osteoide no fêmur pela produção de osso imaturo e/ou matriz osteoide por
206
TUMORES ÓSSEOS
meio da proliferação das células tumorais. O tipo histológi- gos em 80 a 90% dos casos, principalmente a região do joe-
co pode ser predominantemente osteoblástico, condroblás- lho (60%). Especificamente, a extremidade distal do fêmur
tico e fibroblástico. O osteossarcoma também pode resultar é comprometida em cerca de 40% dos casos, a proximal da
da degeneração sarcomatosa de lesões benignas preexis- tíbia, em 20%, e a proximal do úmero, em 15%. O acometi-
tentes (doença de Paget, displasia fibrosa, osteonecrose, mento inicial exclusivo diafisário ou epifisário é raro.
osteomielite crônica) e de locais irradiados previamente. Em pacientes acima dos 50 anos, o esqueleto axial é
acometido em cerca de 40% dos casos, em decorrência de
lesões secundárias.
O tumor atravessa a placa epifisária em cerca de 80%
dos casos.
As características clínicas são inespecíficas, e o paciente
apresenta bom estado geral ao diagnóstico. Perda de peso
significativa e anemia ocorrem aos pacientes com doença
sistêmica, em geral na forma de metástases pulmonares.
Os principais sintomas são dor e aumento de volume local.
Figura 14 - Histologia do osteossarcoma A dor quase sempre é localizada, pode irradiar-se para a
articulação adjacente e começa de forma insidiosa e inter-
Existem várias formas de osteossarcoma: mitente, tornando-se constante e de intensidade progres-
- Clássico ou central: desenvolve-se no interior do osso; siva, não sendo aliviada por repouso, imobilização ou uso
- Justacortical: desenvolve-se junto ao periósteo, rela- de analgésico. Fraturas patológicas acontecem em cerca de
cionado ao tecido conectivo periosteal; 15% dos casos.
ORTOPEDIA
- Endosteal: é uma forma recém descrita de osteossar-
coma que tem origem no endósteo, dentro do osso;
é uma forma maligna de baixo grau que cresce lenta-
mente e metastatiza tardiamente;
- Telangiectásico: é uma forma maligna de alto grau que
mostra pouca ou nenhuma evidência de ossificação,
sofrendo necrose, degeneração cística e fraturas pato-
lógicas devido a seu rápido crescimento;
- Secundário à irradiação: é uma forma maligna de alto
grau que se desenvolve alguns anos depois de radiote-
rapia, geralmente nas áreas de “sombra” da aplicação;
- Secundário à doença de Paget: não é encontrado em
crianças, sendo responsável por um pico de incidência
nas faixas etárias mais avançadas.
Figura 15 - Adolescente com osteossarcoma do úmero proximal
É a 2ª neoplasia óssea maligna primária mais frequen- direito
te (atrás do mieloma) e a principal que acomete crianças e
Os níveis séricos de fosfatase alcalina estão elevados
adolescentes. Um 2º pico de frequência acontece após a 6ª
década de vida, resultante de lesões secundárias. nos pacientes com osteossarcomas, refletindo a alta ativi-
A grande maioria dos osteossarcomas tem origem no dade osteoblástica da célula tumoral. Apesar de ter pou-
canal medular e é denominada “osteossarcoma central”. co valor no diagnóstico, é importante no prognóstico, pois
Dividem-se em vários tipos, com base nas suas característi- seus valores tendem a diminuir após a ressecção cirúrgica
cas histológicas: convencional de alto grau de malignidade, completa do tumor.
telangiectásico, baixo grau de malignidade, células peque- O aspecto radiográfico caracteriza-se por uma lesão ma-
nas e multicêntricos. ligna de origem central óssea, que permeia e destrói o osso
Acomete pacientes, principalmente, na 2ª e na 3ª déca- medular e cortical, atravessa o periósteo, invade as partes
das da vida, em torno dos 15 anos. São muito raros abaixo moles e produz quantidades variáveis de osteoide neoplá-
dos 5 anos ou acima dos 40. sico. Os tumores com formação óssea predominante são
A maior prevalência está entre os caucasianos, adoles- denominados osteoblásticos ou esclerosantes; os tumores
centes de estatura alta e no sexo masculino em relação ao mais celulares, anaplásicos ou telangiectásicos, em que a
feminino, à proporção de 1,5 a 2:1. destruição óssea é predominante, apresentam padrão per-
O osteossarcoma apresenta uma preferência pelo es- meativo e são denominados osteolíticos. Geralmente, a for-
queleto apendicular, acometendo a metáfise dos ossos lon- ma mista, osteolítica e osteoblástica, é a mais frequente.
207
ORTO P ED I A
208
TUMORES ÓSSEOS
lógicos foram relacionados a ele: fatores genéticos, infarto Os métodos reconstrutivos a serem utilizados em pa-
ósseo e trauma. cientes submetidos à cirurgia com preservação dos mem-
Os principais diagnósticos diferenciais são: bros são diversos, e sua indicação depende da localização e
- Calo de fratura; da extensão do tumor, da idade do paciente e do prognós-
- Osteomielite aguda; tico. Nas lesões diafisárias ou metafisiodiafisárias, submeti-
- Osteoblastoma; das às ressecções intercalares, indica-se a solução biológica,
- Condrossarcoma; com enxerto ósseo autólogo vascularizado ou não, enxerto
- Fibrossarcoma; homólogo de banco de ossos ou a associação de ambos.
Nas lesões que acometem a epífise dos ossos longos, que
- Tumor de células gigantes; implicam ressecções osteoarticulares, as próteses não con-
- Sarcoma de Ewing; vencionais e os enxertos homólogos de banco articulares
- Linfoma; são uma alternativa possível.
- Carcinoma metastático. As metástases no osteossarcoma ocorrem por via hema-
togênica, acometendo principalmente o pulmão e os ossos.
O plano de tratamento para o osteossarcoma central O grau de resposta à quimioterapia é o principal fator
consiste em: prognóstico na sobrevida dos pacientes, que, atualmente,
- Estadiamento e biópsia: para se ter o diagnóstico defi- é de 60% em 5 anos.
nitivo;
- Quimioterapia neoadjuvante pré-operatória: com 4. Tumores cartilaginosos benignos
metotrexato em altas doses intravenosa ou epirrubici-
na, carboplatina, ifosfamida intravenosa, num total de
4 ciclos, o que leva aproximadamente 12 semanas. As A - Osteocondroma
ORTOPEDIA
principais vantagens da quimioterapia pré-operatória
O osteocondroma, uma projeção óssea com capa car-
são: a redução do edema, a diminuição do tamanho do
tilaginosa na superfície externa do osso, é uma lesão fre-
tumor e o efeito sobre as micrometástases;
quente, chamada também de exostose osteocartilaginosa
- Cirurgia: pode ser ablativa (amputação) ou de pre- ou simplesmente exostose. Não é uma verdadeira neopla-
servação do membro (ressecções, endopróteses, ho- sia, origina-se de brotos cartilaginosos junto ao lado metafi-
moenxertos), dependendo da resposta do tumor ao sário da fise. Pode ser solitário ou múltiplo, mais frequente
tratamento pré-operatório, da localização da lesão, da
no sexo masculino.
idade do paciente e da perspectiva de crescimento da
Lesão de crescimento lento, raramente apresenta sinto-
extremidade;
mas ou sinais antes dos 8 anos. Costuma aumentar de volu-
- Quimioterapia pós-operatória: 6 ciclos, aplicados em me perto da puberdade e cessar ao final do crescimento do
um período de aproximadamente 15 semanas após a indivíduo. O crescimento após esse período é sugestivo de
cirurgia. A manutenção ou não do esquema de qui- transformação maligna para condrossarcoma.
mioterapia ou o acréscimo de novas drogas depende Cerca de 90% dos osteocondromas ocorrem na metáfise
da resposta histológica do tumor à quimioterapia pré- dos ossos longos, em especial, joelho e ombro. Crescem no
-operatória. sentido oposto à epífise e podem, com o tempo, deslocar-
O objetivo da quimioterapia pré-operatória é diminuir -se na direção da diáfise.
o tumor, delimitar as margens e atuar sobre as microme- A lesão pode ser séssil ou pediculada. A exostose é co-
tástases. Dez dias após a cirurgia, inicia-se a quimioterapia berta por uma camada fina de pericôndrio, que é aderente
pós-operatória por, aproximadamente, 15 semanas. à cartilagem e continua com o periósteo do osso adjacente.
A cirurgia ideal é a ressecção em bloco do tumor com A capa de cartilagem costuma variar de 1 a 3mm em espes-
margens cirúrgicas livres de neoplasia, com preservação sura. Quanto mais jovem o paciente, mais espessa é a capa
dos membros quando possível, ou cirurgia ablativa (am- de cartilagem. O interior da exostose é constituído por osso
putação ou desarticulação); as margens cirúrgicas devem esponjoso normal, que é contínuo com o osso da metáfise
ser amplas, consideradas adequadas tanto para o osso adjacente.
como para partes moles, a fim de obter o controle local A maioria dos casos é assintomática, muitas vezes sendo
da doença. achados radiológicos ocasionais. As queixas mais comuns
A indicação absoluta para cirurgia ablativa baseia-se na são aumento de volume, disestesia quando próximo a al-
impossibilidade de uma ressecção com margens cirúrgicas gum nervo, deformidades articulares e atrito entre os os-
adequadas, decorrente, sobretudo, da resposta quimiote- sos. Sintomas dolorosos podem surgir nas bursas, e dor per-
rápica neoadjuvante e do comprometimento extenso em sistente associada a aumento de volume crescente sugere
partes moles, como tecido celular subcutâneo, pele, com- malignidade.
prometimento neurovascular e tumores ulcerados, infecta- A radiografia manifesta características típicas, como
dos ou biopsiados de forma inadequada. projeção exofítica, lesões bem delimitadas e, algumas ve-
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ORTO P ED I A
210
TUMORES ÓSSEOS
O tratamento dessas lesões é expectante, pois a maioria O tempo de história, em média de 6 a 12 meses, é vari-
se ossifica. Na presença de sintomas, a curetagem associada ável e depende do osso afetado.
a algum adjuvante (cauterização, álcool absoluto, fenol) é Na maioria das vezes, o tumor é epifisário, e é comum o
comumente suficiente para a cura da lesão. Enxertia óssea, comprometimento clínico da articulação vizinha, com pro-
preferencialmente autóloga, pode ser empregada nos casos gressiva impotência funcional. É mais frequente na região
de risco de colabamento mecânico, ao final do tratamento. do joelho, isto é, na epífise distal do fêmur e proximal da
A encondromatose ou doença de Ollier é uma patologia tíbia e, em seguida, região proximal do úmero e distal do rá-
rara, não hereditária, caracterizada por múltiplos tumores dio. Surge na 3ª e na 4ª décadas de vida, comprometendo,
cartilaginosos e que acomete, em 60% dos casos, o sexo
igualmente, ambos os sexos.
masculino. Usualmente, predomina em uma metade do es-
Radiograficamente, é descrito como lesão epifisária ca-
queleto, levando a encurtamento e deformidades ósseas.
racterizada por rarefação óssea de início excêntrica, respei-
As lesões raramente progridem após a puberdade, contudo
a transformação em condrossarcoma acontece de 30 a 50% tando a princípio os limites da cortical. Com a evolução, po-
dos casos, manifestando-se com dor e aumento do volume dem ocorrer rotura da cortical e comprometimento articular.
local rapidamente progressivo. São tumores de aspecto osteolítico, que destroem toda
A síndrome de Mafucci é uma condição rara, não he- a epífise, chegando até a cartilagem articular. O aspecto, na
reditária, que associa encondromatose aos hemangiomas. maioria das vezes, é de agressividade radiológica.
ORTOPEDIA
de proliferação de células gigantes multinucleadas, seme-
lhante aos osteoclastos.
É um tumor benigno agressivo, caracterizado por um
tecido muito vascularizado, constituído por um estroma de
células fusiformes ou ovoides e pela presença de numero-
sas células gigantes do tipo osteoclástico, uniformemente
distribuídas por todo o tecido neoplásico. Figuras de mitose
estão presentes em cada lesão, mas os núcleos das células
mononucleares e das células gigantes não são hipercromá-
ticos tampouco anaplásicos. Praticamente não há colágeno.
211
ORTO P ED I A
212
TUMORES ÓSSEOS
ORTOPEDIA
rém, não são patognomônicas do sarcoma de Ewing. gia se encontra muito pouco estroma entre as células, que
A RM é fundamental e imprescindível no estudo da inva- se apresentam de forma monótona e numerosa. As células
são das partes moles adjacentes, principalmente da relação são redondas e seus núcleos também.
com o feixe vasculonervoso. O diagnóstico diferencial inclui osteomielite, linfoma e
A detecção de metástases é fundamental na indicação osteossarcoma.
do tratamento. São mais frequentes no pulmão (30%), os-
sos (30%) e medula óssea (10%).
A biópsia, do tipo percutânea e com trefina de 3mm, é
fundamental para a confirmação diagnóstica. Deve ser re-
alizada no local onde será feito o acesso cirúrgico da pro-
vável ressecção, evitando descolamentos e a formação de
hematomas.
213
ORTO P ED I A
A cirurgia conservadora do membro está indicada aos Raramente, observa-se aumento de volume local. Sinais
casos em que não estão presentes lesões metastáticas; há sistêmicos também são raramente observados. Contudo,
boa resposta quimioterápica, com diminuição do tumor em pode ocorrer hipercalcemia secundária à secreção de pro-
mais de 50% do seu tamanho original e/ou sinais de reos- teínas semelhantes ao PTH (paratormônio).
sificação e regeneração óssea; não há comprometimento A radiografia simples, o melhor meio diagnóstico na
do feixe vasculonervoso; e não há infiltração da pele e do suspeita de uma lesão óssea metastática, é o método de
tecido celular subcutâneo. Realiza-se cirurgia ampla com imagem mais específico.
margens de segurança de 1cm ao redor do tumor. Utiliza-se a cintilografia óssea trifásica marcada com tec-
A cirurgia radical, que consiste na amputação ou na de- nécio por ser um exame sensível e prático para rastrear o
sarticulação, está indicada na impossibilidade de cirurgia esqueleto inteiro. Porém, não é um exame muito específi-
conservadora, com os casos apresentando-se sem metás- co, e devem-se sempre realizar radiografias simples quando
tases, que não respondem à quimioterapia e sem controle a cintilografia acusa alguma anormalidade na captação do
local por radioterapia. radiofármaco. Na coluna vertebral, pode-se utilizar RM.
As endopróteses são utilizadas nas ressecções amplas
de lesões metaepifisárias, em que há ressecção da super-
fície articular. O enxerto autólogo de fíbula é utilizado nas
lesões diafisárias em que são mantidas as superfícies articu-
lares. Para fixação, utilizam-se placas metálicas e parafusos.
214
TUMORES ÓSSEOS
Os objetivos do tratamento das lesões ósseas metas- um aumento compensatório na taxa de osso neoformado,
táticas visam, basicamente, oferecer ao paciente uma boa o que, algumas vezes, é refletido por um aumento na taxa
qualidade de vida, sem dor e com a melhor função possível. sanguínea de fosfatase alcalina.
Sempre que possível, deve-se identificar o tumor primá- A alteração na remodelação leva a modificações arqui-
rio; em 10 a 20% dos casos não se consegue fazê-lo. teturais caracterizadas pela formação de osso não lamelar,
A quimioterapia, assim como a hormonoterapia nos ca- de tamanho aumentado, mais vascular e menos compacto
sos de carcinoma de mama e próstata, tem um efeito crucial que o osso normal.
no controle das lesões ósseas metastáticas, principalmente Os locais mais frequentemente comprometidos são co-
nos casos com múltiplas lesões espalhadas pelo esqueleto. luna lombar e torácica, pelve e crânio. Algumas vezes, pode
A principal modalidade de tratamento das metástases haver deformidade óssea, com aumento de volume do crâ-
ósseas é a radioterapia, sendo as principais indicações o alí- nio e arqueamento dos ossos. O paciente queixa-se de dores
vio da dor e a manutenção da função. ósseas, e há maior suscetibilidade às fraturas patológicas.
A radioterapia é eficaz no controle temporário da dor,
assim como na diminuição ou controle local da destruição
óssea. A duração da resposta é variável, mas geralmente,
no câncer de próstata ou mama, ela costuma ser de 9 a 12
meses. A radioterapia diminui ou elimina a dor em 80 a 90%
das lesões ósseas metastáticas. Além disso, tem ação direta
na lesão, diminuindo o seu tamanho e a sua extensão para
partes moles. Mesmo após a ressecção de uma lesão me-
tastática e a substituição por endoprótese não convencio-
nal, deve-se lançar mão da radioterapia no pós-operatório.
ORTOPEDIA
As cirurgias para o tratamento das lesões ósseas metastá-
ticas podem ser divididas em procedimentos profiláticos, ou
seja, realizados antes da fratura, e cirurgias realizadas após a
fratura patológica ter ocorrido. O objetivo é o mesmo: propor-
cionar qualidade de vida, que significa deambulação sem dor.
As indicações consensuais para intervenção cirúrgica, nos
casos de lesão metastática vertebral, são compressão medu-
lar, instabilidade vertebral com dor mecânica intratável, fra-
tura/luxação da coluna, radiculopatia com sintomas progres-
sivos ou incontroláveis, crescimento do tumor, mesmo após
radioterapia, e extensão direta do tumor primário na coluna.
A cirurgia nos casos de fratura patológica de ossos longos
por lesões metastáticas tem o mesmo objetivo da cirurgia Figura 32 - Radiografia do fêmur proximal na doença de Paget
profilática, promover a deambulação sem dor, e deve ser re-
alizada o mais rápido possível. Não se deve hesitar em resse-
car o fêmur proximal fraturado de um paciente e colocar uma
endoprótese, permitindo carga e alta hospitalar precoce.
As fraturas patológicas da coluna devidas a metástases
têm absoluta indicação de cirurgia. Entretanto, em pacien-
tes com metástases e fraturas por compressão, sem envol-
vimento neurológico, a dor intratável geralmente responde
à radioterapia e ao uso de coletes.
8. Doença de Paget
A doença de Paget é uma alteração do processo de
remodelação do esqueleto que parece ter início com um
aumento na reabsorção óssea mediada pelos osteoclastos. Figura 33 - Radiografia de crânio com grande lesão lítica
Ocorre em 3% das pessoas idosas e é mais comum em pa-
cientes com ancestrais europeus. A chance de transformação maligna é de, aproximada-
A etiologia é desconhecida, e a lesão primária parece re- mente, 1% com o desenvolvimento de sarcoma osteogêni-
sidir em osteoclastos modificados, o que conduz a um evi- co secundário. E o diagnóstico diferencial inclui sarcoma os-
dente aumento de reabsorção óssea que pode ser detecta- teogênico, mieloma múltiplo, displasia fibrosa e carcinoma
do pelo aumento na excreção urinária de hidroxiprolina. Há metastático.
215
ORTO P ED I A
9. Mieloma múltiplo
O mieloma múltiplo é um tumor maligno que costuma
ser múltiplo ou difuso e se caracteriza pela presença de cé-
lulas redondas do tipo plasmócitos, com diferentes graus
de imaturidade e atipia. A lesão frequentemente é acom-
panhada da presença de proteínas anormais no sangue e
na urina (proteína de Bence-Jones) e, às vezes, substâncias
amiloides ou para-amiloides que se depositam no tecido
ósseo ou outros órgãos, principalmente no rim.
216
TUMORES ÓSSEOS
ORTOPEDIA
Figura 37 - Radiografia do crânio mostrando mieloma múltiplo;
Tumor de Ewing
lesões “em sal e pimenta”
- Incidência: em 80% dos casos, nas 2 primeiras décadas de vida;
Nas lesões localizadas, o tratamento cirúrgico consiste - Relação sexo masculino para feminino: 2:1;
na ressecção ampla ou na ressecção em bloco, seguida de - Clínica: dor e aumento de volume. Febre e emagrecimento po-
radioterapia. dem estar presentes, assim como lesões metastáticas, no iní-
O prognóstico dos pacientes com lesões múltiplas é ex- cio, em 1/4 dos casos. São raras as fraturas patológicas;
tremamente reservado, com sobrevida em 2 anos menor - Exame físico: aumento de volume, doloroso à palpação e com
que 50%, habitualmente em consequência de lesão renal. presença de circulação colateral venosa na superfície exube-
A radioterapia pode ser utilizada como tratamento para rante; pele lisa, avermelhada e edemaciada;
as lesões ósseas com bons resultados, principalmente nos - Localização: fêmur, seguido da tíbia, com predomínio nos
casos que apresentam risco iminente de fratura. membros inferiores em 2/3 dos casos. O acometimento nos
ossos longos é predominantemente diafisário;
10. Resumo - Exames laboratoriais: hemograma com anemia secundária à
leucocitose. A velocidade de hemossedimentação é elevada;
Quadro-resumo - Radiografia: osteólise com reação periosteal concêntrica e
Osteossarcoma múltipla, caracterizando classicamente o aspecto em “casca de
- Definição: tumor maligno com produção de osso imaturo e/ou cebola”;
matriz osteoide por meio da proliferação das células tumorais; - RM: invasão das partes moles adjacentes, principalmente da
- É a 2ª neoplasia óssea maligna primária mais frequente (atrás do relação com o feixe vasculonervoso;
mieloma) e a principal que acomete crianças e adolescentes; - Confirmação diagnóstica: biópsia;
- Acometimento: pacientes na 2ª e na 3ª décadas da vida, em - Diagnóstico diferencial: osteomielite, linfoma e osteossar-
torno dos 15 anos; coma;
- Prevalência: maior em indivíduos caucasianos, adolescentes de - Tratamento: quimioterapia e cirurgia.
estatura alta e no sexo masculino em relação ao feminino, à Lesões ósseas metastáticas
proporção de 1,5 a 2:1;
- Ocorrem mais lesões ósseas metastáticas do que tumores malig-
- Acometimento: maior no esqueleto apendicular, região da me- nos ósseos primários;
táfise dos ossos longos em 80 a 90% dos casos, principalmente
- Principais causadores: carcinomas de próstata e de mama;
a região do joelho (60%);
- O esqueleto axial é muito mais acometido pelas lesões ósseas
- O tumor atravessa a placa epifisária em cerca de 80% dos casos;
metastáticas do que o esqueleto apendicular. As vértebras são o
- Clínica: inespecífica, e o paciente apresenta bom estado geral local mais comum;
ao diagnóstico. Pode haver perda de peso significativa e ane-
- Clínica: presença de dor ou fratura patológica;
mia, dor e aumento de volume local;
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ORTO P ED I A
218
CAPÍTULO
8
Fraturas no adulto
Gustavo Merheb Petrus
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F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
da altura do corpo vertebral, desvio de 11° entre vértebras
adjacentes, translação de 3,5mm entre vértebras e espaço
Figura 5 - Radiografia com luxação C5-C6
discal >1,7mm.
O tratamento de lesões traumáticas é uma urgência por-
que podem determinar lesão medular imediata ou causá-
-la posteriormente, acarretando gravíssimas e definitivas
incapacidades para o paciente. E, na presença de sinais de
comprometimento medular, devem ser tomadas medidas
visando ao tratamento do trauma raquimedular.
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F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
L2 Flexão do quadril Não há
coxa
L3 Extensão do joelho Face medial do joelho Não há
Extensão do torno- Face medial do torno-
L4 Patelar
zelo zelo
L5 Extensão do hálux Face dorsal do pé Não há
S1 Flexão do hálux Face lateral do pé Aquileu
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F R AT U R A S N O A D U LT O
-se ao trauma de alta energia, como acidentes automo- anel pélvico, sendo necessária a atuação do ortopedista
bilísticos, atropelamentos e quedas de alturas, determi- para reduzir a fratura e o deslocamento do anel pélvico e
nando lesões instáveis e graves, tanto do ponto de vista estabilizar com a colocação do fixador externo ou de um
hemodinâmico quanto do mecânico, e que podem asso- clampe pélvico, a fim de obter um efeito de tamponamen-
ciar-se à lesão de outros órgãos ou de outras estruturas to do hematoma, pelo fechamento e pela compressão das
musculoesqueléticas. hemipelves.
Pacientes com lesões instáveis apresentam taxa de mor- O uso do fixador externo na emergência reduziu a in-
talidade de 14 a 50%. cidência de mortalidade nos pacientes com instabilidade
O anel pélvico é formado pela união de 3 ossos (2 ossos hemodinâmica após lesão do anel pélvico, pois atua re-
inominados compostos pelo ílio, ísquio e púbis e o sacro) duzindo o continente do anel, que normalmente está au-
estabilizados em suas articulações por fortes estruturas mentado, produzindo um efeito de tamponamento sobre
ligamentares, principalmente pelo ligamento sacroilíaco o sangramento do retroperitônio. Outra vantagem é que
posterior. E a sínfise pubiana une anteriormente os 2 ilíacos se trata de um método rápido e pouco invasivo.
com sua fibrocartilagem.
Depois da estabilização do ponto de vista hemodi-
nâmico, é necessário um estudo por imagem para o diag-
nóstico da lesão da pelve. A realização de radiografia na
incidência anteroposterior, oblíqua a 60° craniocaudal (in
let) e a 45° caudocranial (out let), é fundamental para o
diagnóstico e a classificação da lesão. A incidência in let é
importante para avaliar desvios anteroposteriores, e a inci-
dência out let, para avaliar desvios verticais.
ORTOPEDIA
Figura 17 - Pelve
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F R AT U R A S N O A D U LT O
no caso de luxação e fratura-luxação da articulação sa- podem ocorrer por trauma direto, indireto, axial ou repeti-
croilíaca. tivo. São mais comuns no sexo masculino, e 80% acontecem
A utilização de barra sacra, ou de placa transilíaca, está no 1/3 médio, 15% no 1/3 lateral e 5% no 1/3 medial.
reservada a casos de lesões em que exista a fratura do cor-
po do sacro ou luxações bilaterais da articulação sacroilíaca. Tabela 6 - Classificação das fraturas da clavícula
Grupo I 1/3 médio
Grupo II 1/3 lateral
Grupo III 1/3 medial
ORTOPEDIA
Figura 25 - Radiografia com fixação interna da fratura da bacia desvia para posterior e superior, e o peso do membro supe-
rior que traciona o fragmento lateral e inferior.
As complicações precoces estão ligadas ao trauma ini- Às radiografias em incidências anteroposterior e Zanca
cial, sendo a hemorragia a principal complicação na fase
(15° de inclinação cefálica centrada na articulação acromio-
aguda, e às lesões associadas, estando o paciente susce-
clavicular), podem-se visibilizar fraturas do 1/3 lateral e fa-
tível a desenvolver Síndrome do Desconforto Respiratório
zer o seu diagnóstico.
do Adulto (SDRA), doença tromboembólica, pneumonia e
falência de múltiplos órgãos.
A infecção pode acontecer pela contaminação dos pinos
do fixador externo ou após a fixação interna. A dor residual
é uma queixa frequente, que pode decorrer de consolida-
ção viciosa, pseudoartrose ou artrose pós-traumática da
articulação sacroilíaca.
Lesão nervosa das raízes de L5 e S1 pode ocorrer na ins-
tabilidade vertical por tração.
A consolidação viciosa após fratura pode acontecer e
causar deformidade rotacional, obliquidade pélvica e dis-
crepância dos membros inferiores com alteração da marcha
normal.
4. Fratura da clavícula
A clavícula, o 1º osso a consolidar-se (5ª semana intrau-
terina), é o único osso longo em que ocorre ossificação in-
tramembranosa sem passar por um estágio cartilaginoso. É,
também, a única conexão óssea entre a cintura escapular e
o esqueleto axial.
Sua função é proporcionar força e estabilidade ao mem-
bro superior; além disso, é ponto de origem e inserção de
vários músculos, protege eficazmente as estruturas neuro-
vasculares e o ápice do pulmão, tem função cosmética e Figura 26 - Fratura da clavícula
auxilia na inspiração.
As fraturas da clavícula, que representam de 4 a 16% de O diagnóstico diferencial se dá somente com as luxações
todas as fraturas e 35% das fraturas da cintura escapular, acromioclaviculares e esternoclaviculares.
227
ORTO P ED I A
228
F R AT U R A S N O A D U LT O
O quadro clínico é composto por dor, movimentos de fragmentos estão desviados entre si, e a cabeça umeral con-
elevação e rotação do membro superior limitados, crepita- gruente com a glenoide.
ção e equimose.
Radiografias simples na incidência anteroposterior e
perfil da escápula e axilar fazem o diagnóstico. A TC está in-
dicada quando há dúvida quanto ao diagnóstico ou desvios
dos fragmentos, em fraturas com comprometimento da su-
perfície articular do úmero ou da glenoide e fratura-luxação
inveterada.
A classificação das fraturas foi descrita por Neer, com
base nos desvios dos fragmentos conforme descrito inicial-
mente por Codman. Considera-se desvio quando há deslo-
camento >1cm ou angulação >45° em relação ao fragmento
não fraturado.
ORTOPEDIA
Figura 32 - Radiografia com fratura do úmero proximal
a) Tratamento conservador
As fraturas com desvio <1cm ou angulação <45° e que
são estáveis e impactadas são tratadas com imobilização
toracobraquial, do tipo Velpeau, e mobilização precoce.
Após 15 dias de imobilização, iniciam-se exercícios passivos
e ativos leves.
b) Tratamento cirúrgico
Figura 31 - Classificação de Neer
A fratura instável com os fragmentos principais, segun-
- Tipo I: em 1 parte. Não deve ser considerada em 2 do Neer, desviados mais que 1cm ou mais que 45° tem indi-
partes, pois teve um desvio <45° e uma separação dos cação de tratamento cirúrgico.
fragmentos <1cm;
- Tipo II: em 2 fragmentos. Tem-se um desvio >1cm,
com angulação >45°; ou em 3 fragmentos ou 4, mas
somente 1 possui desvio maior do que 1cm, com essa
angulação;
- Tipo III: em 3 ou 4 fragmentos. Somente há desvio
maior em 3 fragmentos;
- Tipo IV: em 4 fragmentos, em que todos têm desvio
acima do permitido.
A importância da classificação está na identificação dos
fragmentos fraturados para que se saibam as condições
vasculares desses fragmentos e, com isso, se indique o tra-
tamento adequado.
A fratura em 2 partes é aquela em que somente 1 dos
segmentos está desviado em relação aos outros; a fratu-
ra em 3 partes, em que 2 segmentos estão desviados em Figura 33 - Radiografia com fixação da fratura com placa e para-
relação aos outros 2; a fratura em 4 partes, em que os 4 fusos
229
ORTO P ED I A
Fratura em 2 partes envolvendo o tubérculo maior pode As complicações dessas fraturas são lesão neurológica,
ser tratada com redução aberta e fixação do tubérculo com principalmente do nervo axilar, lesão vascular, osteonecro-
fios inabsorvíveis; fratura em 2 partes envolvendo o colo se da cabeça femoral, rigidez articular, consolidação viciosa
cirúrgico, com redução aberta e fixação interna com placa e pseudoartrose. Quanto maior o número de partes da fra-
e parafusos; fratura em 3 partes, geralmente envolvendo o tura, maior o número de complicações.
colo cirúrgico, o tubérculo maior e a diáfise, com redução
aberta e síntese com fios intramedulares e amarrilha do tu-
bérculo com fios inabsorvíveis. As fraturas em 4 partes po-
dem ser tratadas com síntese interna ou, em pacientes mais
idosos, ou fraturas mais graves, com prótese substituindo o
úmero proximal, preservando a glenoide.
6. Luxação do ombro
A luxação do ombro, uma das lesões traumáticas do
membro superior mais comuns na prática diária do ortope-
dista, caracteriza-se pela perda das relações entre a cabeça
do úmero e a glenoide. As luxações anteriores, as mais co-
muns, representam 95% dos casos; as posteriores relacio-
nam-se a choque elétrico e a convulsões.
A cabeça do úmero é grande e esférica; a glenoide é rasa
e pequena, o que permite grande mobilidade articular. É a
Figura 35 - Placa e parafusos utilizados para tratamento da fratu- articulação de maior amplitude de movimento do aparelho
ra do úmero proximal locomotor humano.
Para manter a estabilidade entre a cabeça do úmero e a
glenoide, existem vários mecanismos:
a) Mecanismos passivos (estáticos): congruência arti-
cular, pressão intra-articular negativa, fenômeno de ade-
são-coesão e barreira capsuloligamentar.
b) Mecanismos ativos (dinâmicos): musculatura do
manguito rotador e cabeça longa do bíceps.
Tabela 8 - Critérios para classificação da luxação glenoumeral
Quanto ao grau de
Subluxação e luxação.
instabilidade
Quanto à crono- Congênita, aguda, inveterada ou crônica e
logia recorrente ou recidivante.
Quanto ao meca-
Traumática e atraumática.
nismo de trauma
Quanto à volição
Voluntária ou involuntária.
do paciente
Anterior, posterior, multidirecional, supe-
Quanto à direção
rior, erecta e intratorácica.
Figura 36 - Fratura do úmero proximal tratada com fios
230
F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
Figura 38 - Paciente com luxação do ombro à esquerda Figura 41 - Radiografia com luxação anterior do ombro
231
ORTO P ED I A
As luxações glenoumerais agudas posteriores são de As lesões associadas à luxação posterior são fratura por
tratamento conservador, com redução incruenta e imobili- compressão da região anteromedial da cabeça do úmero,
zação. São indicações de cirurgia: quando há fratura da ca- fratura da borda posterior da glenoide e fratura da tubero-
beça do úmero acometendo mais de 30% de sua superfície sidade menor.
articular, irredutibilidade por interposição de partes moles
e fratura da tuberosidade menor ou da borda da glenoide 7. Fratura da diáfise do úmero
com grandes fragmentos e instabilidade pós-redução.
Para as luxações recidivantes, o tratamento indicado, A diáfise do úmero vai do bordo superior da inserção do
quando a causa é atraumática, é conservador com exer- músculo peitoral até a crista supracondílea.
cícios de fortalecimento e coordenação. Para as causas As fraturas da diáfise podem ser causadas por trauma
traumáticas, como há desinserção capsuloligamentar, o direto, com traços de fratura geralmente transversos ou co-
tratamento preconizado é cirúrgico, com técnicas que vi- minutos, ou trauma indireto, com traços espirais atribuídos
sam à reparação e plastias capsuloligamentares que podem às forças torcionais.
ser realizadas por via aberta ou artroscópica (cirurgia de O diagnóstico é essencialmente clínico, baseado na his-
Bankart e capsuloplastia de Neer) e/ou técnicas que visam tória e no exame físico. Há edema, deformidade do braço,
à substituição das estruturas lesadas (cirurgia de Bristow- impotência funcional e crepitação.
Latarjet). As radiografias em anteroposterior e perfil são suficien-
tes para confirmar o diagnóstico.
232
F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
Figura 45 - Tratamento conservador com “pinça de confeiteiro” da
8. Fraturas do cotovelo
fratura diafisária do úmero
A - Fratura do úmero distal
O tratamento cirúrgico tem indicações absolutas ou re-
lativas, dependendo do caso. As absolutas são fratura as- O úmero distal é dividido em 2 côndilos, lateral e medial,
sociada à lesão vascular, fratura exposta, paralisia do nervo cada um contendo uma porção articular e outra não articu-
radial, interposição de partes moles que dificultam a redu- lar. O epicôndilo medial dá origem aos músculos flexores do
ção, cotovelo flutuante, politrauma e fratura patológica por antebraço. O nervo ulnar localiza-se atrás do epicôndilo. O
doença maligna. As relativas são bilateralidade, obesidade epicôndilo lateral dá origem aos músculos supinador, exten-
e fratura segmentar. sores do antebraço e ancôneo.
233
ORTO P ED I A
Figura 50 - Fraturas tipo (A) I, tipo (B) II e tipo (C) III, com desvio
anterior do rádio; fraturas tipo (D) I e tipo (E) II, com desvio pos-
terior do rádio
234
F R AT U R A S N O A D U LT O
O exame físico apresenta-se com edema, dor e derrame A fratura ocorre na queda com a mão espalmada, o
articular. A incapacidade de estender ativamente o cotovelo cotovelo em discreta flexão e o antebraço em pronação. A
contra a gravidade, o sinal mais importante a ser pesquisa- posição de pronação do antebraço é fundamental para que
do, indica descontinuidade do aparelho extensor do coto- ocorra fratura da cabeça do rádio, enquanto a posição em
velo. A radiografia em perfil permite diagnosticar a fratura, supinação daquele leva à luxação pura do cotovelo.
e a incidência frontal é para complementar o diagnóstico.
O objetivo do tratamento é restaurar a anatomia arti-
cular e preservar a força motora de extensão, mobilidade e
estabilidade articulares.
As fraturas sem desvio podem ser tratadas com imobi-
lização gessada e cotovelo fletido a 90° por 3 a 6 semanas.
ORTOPEDIA
Figura 51 - Radiografia de perfil do cotovelo com fratura do ole-
crano
235
ORTO P ED I A
à procura de dor e edema que podem indicar dissociação A estabilidade do cotovelo é dividida entre as estruturas
aguda da articulação radioulnar distal. ósseas e ligamentares: tróclea, olécrano, cabeça do rádio,
As radiografias nas incidências anteroposterior e de per- ligamento colateral medial, ligamento colateral lateral e
fil fazem o diagnóstico. TCs podem ser utilizadas para um cápsula articular.
melhor estudo da fratura, mas não são fundamentais. O arco de movimento de flexão-extensão ocorre de 0
O tratamento da fratura tipo I é conservador, com uso a 150°, a supinação, 85°, e a pronação, 80°. O movimento
de tala gessada axilopalmar por 3 semanas; a esse período, funcional mínimo é de 30 a 130° de flexão-extensão, 50° de
segue-se a reabilitação. pronação e 50° de supinação.
Indica-se o tratamento cirúrgico nas fraturas marginais O mecanismo de trauma geralmente é indireto, na que-
da cabeça do rádio tipo II, quando o fragmento tem 1/3 ou da ao solo com apoio palmar, hiperextensão do cotovelo,
mais da superfície articular e apresenta um desvio >2mm estresse em valgo, abdução e supinação do antebraço.
ou 20° entre os fragmentos. A estratégia cirúrgica é fixar o
fragmento, com via de acesso lateral do cotovelo e fixação
com parafusos de 1,5mm ou 2mm, ou parafusos de Hebert,
na porção íntegra do colo e cabeça radial.
Nas fraturas cominutas tipo III, a estratégia é montar a
superfície articular com parafusos ou placas de minifrag-
mentos para a cabeça do rádio. Na impossibilidade de redu-
ção e de fixação, a ressecção simples da cabeça do rádio só
poderá ser feita se não houver lesão associada do antebra-
ço ou punho, ou luxação do cotovelo, pois, nessa situação, a
instabilidade do cotovelo se torna grosseira. Quando, após Figura 56 - Mecanismo de trauma na luxação do cotovelo
a ressecção da cabeça do rádio, ocorre instabilidade, indica-
-se prótese metálica de substituição da cabeça do rádio.
236
F R AT U R A S N O A D U LT O
A classificação pode ser feita em relação ao tempo da por um tempo, até o alívio da dor. A imobilização por tempo
lesão: aguda, crônica e recorrente. Pode-se classificar, tam- prolongado está relacionada a contraturas com déficit em
bém, com base na relação do rádio e ulna em relação ao extensão.
úmero distal: posterior (mais comum), anterior, lateral, me- As complicações descritas são perda da mobilidade, ge-
dial e divergente. ralmente a extensão; lesão neurológica (habitualmente, a
O tratamento para a luxação posterior compreende a recuperação é espontânea, mas a exploração cirúrgica deve
redução fechada sob analgesia e sedação. A redução é rea- ser realizada quando há piora neurológica, dor forte ou não
lizada, de preferência, com o paciente em decúbito ventral regressão em 3 meses após o déficit); lesão vascular, geral-
e o braço para fora da mesa de exame, e são feitas a tração mente a artéria braquial; síndrome compartimental; insta-
longitudinal e a flexão do cotovelo. bilidade com reluxação; ossificação heterotópica e miosite
ossificante.
ORTOPEDIA
lares. É necessário restaurar o comprimento, corrigir de-
Após a redução, deve-se examinar novamente o estado formidades axiais e rotacionais e realizar fixação interna
neurovascular do membro, avaliar a estabilidade e o arco rígida para permitir a mobilidade precoce no pós-opera-
de movimento da articulação e realizar radiografias. tório imediato, com recuperação funcional mais rápida e
Além disso, realizar imobilização com tala axilopalmar completa.
237
ORTO P ED I A
238
F R AT U R A S N O A D U LT O
c) Fratura do cassetete (nightstick): fratura isolada da apresenta queixa de dor aos exercícios e incômodo da placa
ulna; em geral, ocorre por defesa contra agressão. ou parafusos na pele. Caso seja feita, a retirada deve ocor-
rer após 18 meses da osteossíntese.
ORTOPEDIA
com placas e parafusos, sendo o método de eleição.
Quanto à fratura-luxação de Galeazzi, o tratamento
consiste na fixação da fratura do rádio e na avaliação da
estabilidade pós-redução da articulação radioulnar distal.
Se estável, é desnecessária a fixação; se instável, deve ser
fixada a articulação radioulnar distal, com fios metálicos e
imobilização axilopalmar por 4 a 6 semanas (quando o fio
metálico é retirado).
Quanto à fratura-luxação de Monteggia, o tratamento é Figura 66 - Anatomia do punho
realizado com redução e osteossíntese da ulna, que normal-
Os ligamentos volares e dorsais do carpo inserem-se no
mente permite a redução da cabeça do rádio.
rádio distal e são importantes estabilizadores, juntamente
As complicações descritas são pseudoartrose, infecção e
com a fibrocartilagem triangular que se origina no processo
sinostose (consolidação entre o rádio e a ulna, limitando a
estiloide da ulna e se insere no rádio distal.
movimentação de pronossupinação).
São epônimos a fratura de Colles (em que o fragmento
distal desvia em direção dorsal) e a fratura de Smith (o frag-
mento desvia em direção volar).
O diagnóstico clínico da fratura é realizado pela presen-
ça de dor, edema, deformidade e impotência funcional da
mão e punho após o trauma. O exame radiográfico em 2
incidências faz o diagnóstico.
239
ORTO P ED I A
Há inúmeras classificações para as fraturas do rádio dis- ocorrer no mesmo plano do arco de movimento da articula-
tal devido à dificuldade em obter uma ideal. Atualmente, as ção radiocárpica reforçam a aceitação de pequenos desvios,
mais citadas são as de Frykman, de Melone, a classificação principalmente em crianças menores com grande potencial
AO e a universal. de crescimento. Até 25° de desvio dorsal em crianças com
bom potencial de crescimento, as fraturas remodelam-se to-
talmente, sem nenhum déficit funcional. A redução da fratu-
ra e a sua manutenção são realizadas sem dificuldade pela
integridade do periósteo. A imobilização gessada é axilopal-
mar, por 4 a 6 semanas. O tratamento cirúrgico nas fraturas
do rádio distal em crianças, muito raro, é indicado quando há
perda da redução, por métodos fechados, fraturas expostas,
fraturas cominutas intra-articulares e síndrome comparti-
mental ou compressão aguda do túnel do carpo.
Em pacientes adultos, o tratamento depende do tipo
da fratura. Nas extra-articulares sem desvio, o tratamento
consiste na imobilização gessada braquiopalmar; nas extra-
-articulares com desvio, redutíveis e estáveis, consiste na
redução incruenta e imobilização gessada braquiopalmar
por 4 semanas e antebraquiopalmar por mais 2.
Nas fraturas extra-articulares e com desvio, redutíveis e
instáveis, o procedimento compreende a redução incruenta
e a fixação cirúrgica da fratura com fios percutâneos. Após a
fixação, a imobilização é antebraquiopalmar por 5 a 6 sema-
nas, quando são retirados os fios percutâneos.
240
F R AT U R A S N O A D U LT O
fios percutâneos e/ou fixador externo. Quanto às intra-arti- O mecanismo de trauma é uma queda com hiperex-
culares com desvio, irredutíveis, o tratamento compreende tensão do punho, levando a forças de compressão em seu
a redução aberta e a estabilização com fixador externo ou dorso e forças de tração em seu ventre. A posição da mão
placa e parafusos. durante a queda determina a região do escafoide fraturada.
Dessa forma, uma queda com desvio ulnar leva à fratura
do polo proximal, e uma queda com desvio radial, a uma
fratura do polo distal.
Ao exame físico, dor na tabaqueira e à compressão axial
do polegar são muito sugestivas. Solicitam-se radiografias
de frente com o punho fletido, PA com desvio ulnar, perfil
e oblíquas.
A radiografia de frente com o punho em flexão fazendo
compressão dos dedos contra a palma serve para diagnosti-
car as lesões ligamentares, principalmente do ligamento es-
cafossemilunar, que, à radiografia, se traduzirá por aumen-
Figura 71 - Tratamento cirúrgico de fratura do rádio distal com fios
to da distância entre eles (dissociação escafossemilunar).
percutâneos
O raio x de frente com desvio ulnar mostra o escafoide ver-
As complicações são consolidação viciosa, disfunção do ticalizado, evidenciando melhor o traço de fratura. Às radio-
nervo mediano, artrose radiocárpica, rigidez articular, rup- grafias oblíquas, o escafoide apresenta-se em seu maior eixo,
tura tendinosa e distrofia simpático-reflexa. e o perfil mostra a relação do escafoide com os demais ossos.
ORTOPEDIA
- Fratura do escafoide
O escafoide é responsável pela conexão entre a fileira
carpal proximal e distal e suportado por fortes ligamentos
divididos em intrínsecos e extrínsecos. Os ligamentos ex-
trínsecos são radioescafocapitato, radiossemilunar longo,
radiossemilunar curto, radioescafossemilunar e radiocár-
pico dorsal; os ligamentos intrínsecos formam o complexo
ligamentar escafossemilunar.
241
ORTO P ED I A
imobilizar com bloqueio do polegar, retirada da tala após 2 Sabe-se que o líquido sinovial impede a proliferação dos
semanas e fazer uma reavaliação. Caso a dor persista, deve- osteoblastos, o que gera maior chance de pseudoartrose.
-se radiografar novamente e, na dúvida, manter imobiliza- As fraturas com desvio e instáveis levam a maior chan-
ção por mais 6 semanas ou solicitar exames, como TC ou ce de pseudoartrose, portanto desvios >1mm e 20° entre o
RNM, a fim de melhor avaliação. O tempo de imobilização polo proximal e distal devem ser tratados com cirurgia.
é de 6 semanas, com gesso alto, e 3 semanas, com gesso Normalmente, o paciente com pseudoartrose apresenta
curto. dor, fraqueza e limitação da mobilidade do punho em asso-
ciação ou não à crepitação e alterações radiográficas.
Estudos recentes têm preferido o uso do enxerto vascu-
larizado em relação ao enxerto ósseo apenas, pelas vanta-
gens de melhor resistência biológica, melhor integração e
consolidação para o tratamento da pseudoartrose.
ORTOPEDIA
sobreposição de 1,5cm do dígito sobre o dedo vizinho. As fraturas do acetábulo são complexas, causadas por
As complicações acontecem em 1/3 dos pacientes, e, trauma de grande energia. A dificuldade de tratamento está
dentre elas, estão perda da redução, infecção dos pinos e na complexidade de seus traços e na dificuldade de acesso à
distrofia simpático-reflexa. A aderência tendinosa é uma articulação do quadril. Nas fraturas da coluna posterior do ace-
complicação importante que deve ser lembrada, e a tenóli- tábulo, há 40% de associação com lesão do nervo isquiático.
se é necessária para a liberação tendinosa. O deslizamento Todo o peso corporal passa por essa articulação, e qual-
dos tendões sobre a placa colocada dorsalmente pode ge- quer irregularidade articular leva à degeneração precoce.
rar dor e necessidade de retirada. O osso ilíaco é formado por 3 ossos: o ílio, o ísquio e
A fratura-luxação da base do 1º metacarpo, com traço
o pube. Tais ossos se juntam, formando a cartilagem trir-
articular, pequeno fragmento triangular interno e diáfise
radiada, localizada numa cavidade denominada acetábulo.
desviada por ação do músculo abdutor longo do polegar, re-
Este tem a forma arredondada, sendo formado pela coluna
cebe o nome de fratura-luxação de Bennett. Quando apre-
anterior, coluna posterior e teto acetabular. Nas colunas,
senta uma cominuição mais intensa, é chamada fratura-lu-
apresentam-se as paredes anterior e posterior. Pelo teto
xação de Rolando. O tratamento dessas fraturas é cirúrgico,
acetabular passa toda a carga do corpo.
podendo ser estabilizadas com fios de Kirschner cruzando
a fratura ou a articulação, indiretamente estabilizando-as.
Figura 78 - Radiografia com fratura complexa da mão Figura 80 - Anatomia do quadril e do fêmur proximal
243
ORTO P ED I A
O tipo de fratura depende da posição da cabeça do O tratamento visa restaurar a anatomia exata da articu-
fêmur na hora do trauma. O trauma geralmente é de alta lação para não alterar a sua biomecânica.
energia e pode ser direto (no trocânter maior) ou indireto, As fraturas desviadas devem ter redução anatômica, fi-
quando o painel de automóvel, por exemplo, traumatiza o xação rígida e mobilidade precoce. E as fraturas que atin-
joelho fletido do paciente. gem o teto acetabular são de indicação cirúrgica em todos
os casos.
O tratamento cirúrgico deve ser realizado por um cirur-
gião experiente. Fraturas complexas são mais difíceis de se-
rem fixadas e demandam um tempo de cirurgia mais longo,
aumentando a morbidade. Os materiais de implante utili-
zados são placas de reconstrução com parafusos corticais
e esponjosos.
244
F R AT U R A S N O A D U LT O
uma fratura por cisalhamento da cabeça femoral ou uma em mulheres. A média de idade é de 77 anos em mulheres
impactação de sua superfície articular. e 72 anos em homens. Em jovens, acontecem por trauma
de alta energia. É clara a associação à osteoporose.
Figura 83 - Anatomia do fêmur proximal Figura 84 - Paciente idoso com osteoporose e fratura do colo fe-
ORTOPEDIA
moral
As fraturas acontecem em 10% dos casos de luxação
posterior, e o mecanismo de trauma mais comum é o se-
cundário a acidentes automobilísticos.
Tabela 10 - Classificação de Pipkin para fraturas da cabeça do fêmur
Tipo I Fratura da cabeça abaixo da fóvea.
Tipo II Fratura da cabeça acima da fóvea.
Tipo III Fratura da cabeça concomitante do colo femoral.
Tipo IV Fratura concomitante do rebordo acetabular.
245
ORTO P ED I A
A revascularização do fragmento proximal depende de classificação mais utilizada é a de Garden, que considera o
uma osteossíntese rígida para que os vasos da medula ós- desvio dos fragmentos e oferece uma ideia quanto à vascu-
sea possam penetrar no fragmento. larização da cabeça.
O mecanismo de trauma pode ser direto, por queda Tabela 11 - Classificação de Garden
com trauma no trocânter maior, ou trauma indireto, por
Tipo I Fratura incompleta ou impactada.
contração muscular causando a fratura (a fratura causa a
queda). Esta pode ocorrer por microtraumas de repetição Tipo II Fratura completa sem desvio.
ou fratura patológica. Tipo II Fratura completa com desvio parcial.
O ângulo cervicodiafisário é de 130° +/- 7°. A anteversão Tipo IV Fratura completa com desvio total.
femoral é de 15°, em média. A vascularização acontece pe-
las artérias circunflexa lateral, anteriormente, e circunflexa b) Diagnóstico
medial, posteriormente. Formam o anel vascular extracap- Clinicamente, o paciente não deambula, havendo en-
sular, que emite ramos cervicais ascendentes para a cabeça curtamento e rotação externa no membro inferior não tão
femoral. A maior parte da vascularização da cabeça femoral exuberantes pela fratura ser intra-articular e a estrutura
está localizada na região posterossuperior, suprida pela ar- capsular limitar o encurtamento.
téria epifisária lateral. Há uma pequena quantidade de irri- Há dor na manipulação do membro. Pacientes com fra-
gação derivada da artéria do ligamento redondo. turas impactadas podem ser capazes de deambular e, algu-
mas vezes, procuram o médico após vários dias.
Radiograficamente, a fratura é vista na incidência ante-
roposterior, que deve ser feita em rotação interna. A radio-
grafia em perfil oferece a informação sobre a cominuição da
cortical posterior. Para detectar fraturas impactadas, pode
ser útil a RM.
c) Tratamento
Em princípio, o tratamento das fraturas do colo é cirúr-
gico.
- Fraturas Garden I: podem ser tratadas conservadora-
mente, mas isso é controverso. É mais seguro fixá-las
com 3 parafusos esponjosos para não ocorrer desvio;
Figura 87 - Fratura de colo do fêmur - Fraturas Garden II: são, geralmente, fixadas com para-
fusos esponjosos e paralelos. Como alternativa, pode
As fraturas podem ser classificadas, do ponto de vista ser usado um DHS com um parafuso antirrotatório cra-
anatômico, em subcapital, transcervical e basocervical. A nialmente.
246
F R AT U R A S N O A D U LT O
O DHS (Dynamic Hip Screw) tem indicação para fraturas Pode-se optar pela artroplastia em casos de severa os-
Garden III e IV. É importante que o pino-parafuso esteja no teoporose, idade avançada, desvio acentuado da fratura
centro do colo, tanto na frente como no perfil. e alta probabilidade de necrose da cabeça. A artroplastia
O paciente pode ser posicionado em uma mesa de tra- parcial pode ser do tipo Thompson, cimentada ou não, ou
ção ou uma mesa radiotransparente, com o uso do intensi- bipolar. Tais próteses devem ser indicadas a pacientes com
ficador de imagem para visualizar a redução. pouca expectativa de vida e pequena demanda funcional. A
A redução pode ser fechada pela manobra de Leadbetter, pacientes mais ativos e com uma expectativa de vida maior,
que consiste na tração da coxa com o quadril fletido a 90°, é indicada a artroplastia total.
rotação interna do membro e extensão gradual até atingir
10° de flexão. Alternativamente, a redução pode ser aberta.
ORTOPEDIA
Figura 91 - Prótese do quadril
C - Fraturas transtrocanterianas
As fraturas transtrocanterianas são as mais comuns na
região proximal do fêmur (aproximadamente, 50%) e acon-
tecem, principalmente, com pacientes idosos, na maioria
mulheres. A faixa etária de maior incidência está entre 66
e 76 anos. Quando ocorrem em jovens, são decorrentes de
trauma de alta energia e, em idosos, são causadas por que-
da da própria altura.
As fraturas ocorrem em uma região entre o pequeno e
o grande trocânter no fêmur proximal, ocasionalmente se
Figura 90 - Radiografia de fratura tratada com o DHS estendendo para a região subtrocantérica.
247
ORTO P ED I A
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ORTOPEDIA
Figura 96 - PFN Figura 97 - Radiografia de fra-
tura tratada com o PFN As complicações são perda da redução, pseudoartrose e
consolidação viciosa.
D - Fratura subtrocantérica
16. Luxação do quadril
A fratura subtrocantérica associa-se ao trauma de alta
Trata-se do mecanismo de trauma mais comum relacio-
energia. A região subtrocantérica está localizada entre o
nado a acidente automobilístico, constituindo um trauma
trocânter menor e 5cm distalmente a este. A particulari-
de grande energia. O mecanismo de trauma ocorre com o
dade dessa região, na presença de fratura, é atribuída ao
choque do painel do carro contra o joelho fletido ou queda
estresse biomecânico. É importante restaurar o contato da altura com o joelho estendido (o paciente caindo em pé).
da cortical medial nas fraturas subtrocantéricas. A região é A maioria das luxações é posterior e 15%, anterior. Mais
composta, predominantemente, de osso cortical e, assim, de 50% dos pacientes apresentam fraturas associadas.
é menos vascularizada em comparação com a região trans- A luxação do quadril é uma urgência ortopédica, pois
trocanteriana. pode haver lesão do nervo isquiático e um comprometi-
A musculatura inserida na região promove o desvio após mento da circulação sanguínea da cabeça femoral.
a fratura. O fragmento proximal sofre abdução pelo glúteo Nas luxações anteriores, o quadril está rodado externa-
médio, rotação externa pelos rotadores curtos, flexão pelo mente e abduzido. Nas luxações posteriores, muito mais
iliopsoas. O fragmento distal desvia-se para proximal e em frequentes, o paciente tem muita dor, o quadril fletido, ro-
varo devido à ação dos adutores. dado internamente e aduzido.
Clinicamente, o paciente apresenta dor, limitação fun-
cional, encurtamento, crepitação e hematoma na região
proximal da coxa. As radiografias de frente e perfil fazem o
diagnóstico.
As classificações descritas para a região são de
Fielding, com base na localização do traço de fratura, e de
Seinsheimer, que se baseia no número de fragmentos.
O tratamento é de preferência cirúrgico. Como método
de tratamento não cirúrgico, há a tração esquelética, indica-
da apenas para idosos sem condições clínicas de cirurgia, o
que apresenta alta taxa de mortalidade e pseudoartrose da
fratura. O tratamento cirúrgico pode ser realizado com re-
dução e osteossíntese utilizando placa de 95°, DHS ou haste
intramedular. Figura 99 - Paciente com luxação do quadril direito
249
ORTO P ED I A
250
F R AT U R A S N O A D U LT O
b) Medial: músculo grácil, adutor longo, adutor curto, O tratamento operatório é instituído, de preferência,
adutor magno, obturador externo, artéria, veia e nervo ob- dentro das primeiras 24 horas, o que traz benefícios ao pa-
turatório. ciente, em especial quanto às complicações pulmonares.
c) Posterior: músculo bíceps femoral, semitendíneo, se- O paciente com lesão isolada do fêmur deve ser subme-
mimembranoso, nervo isquiático e ramos da artéria femo- tido, inicialmente, à tração esquelética no nível da tíbia pro-
ral profunda. ximal (de preferência), com carga equivalente a 20% do peso
As fraturas geralmente acontecem em indivíduos jo- corporal, a fim de prevenir encurtamento e alinhar os frag-
vens, abaixo dos 30 anos e, predominantemente, homens. mentos, o que será de grande valia durante o ato cirúrgico.
Clinicamente, há encurtamento, crepitação, dor intensa e
edema. São comuns lesões de partes moles associadas, e
são realizadas radiografias em 2 incidências.
ORTOPEDIA
Figura 105 - Tração esquelética
Figura 104 - Radiografia em perfil do fêmur com fratura transversa Figura 106 - (A) Fixação externa da fratura do fêmur e (B) fixação
da diáfise com haste intramedular da fratura do fêmur
251
ORTO P ED I A
252
F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
Figura 112 - Radiografia com fratura do fêmur distal e fixação com LISS
253
ORTO P ED I A
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F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
lesão ligamentar. As prioridades no tratamento da luxação são a estabi-
lização esquelética e o restabelecimento do suprimento
vascular do membro, estando, em 2º plano, a reparação
ligamentar.
Normalmente, há a lesão total dos ligamentos cruzados
anterior e posterior, embora, ocasionalmente, se possa en-
contrar lesão de apenas 1 dos cruzados. Existe, concomitan-
temente, comprometimento em grau variável dos ligamen-
tos colaterais, da cápsula articular e dos meniscos.
Os objetivos do tratamento cirúrgico são obter uma boa
estabilização da articulação e proporcionar uma mobiliza-
ção precoce, a fim de evitar a formação de aderências intra-
-articulares que limitariam a flexão-extensão do joelho.
Melhores resultados são obtidos quando os ligamentos
cruzados são reconstruídos após 2 a 3 semanas, em razão
de uma menor tendência na formação destas aderências.
Caso haja grande comprometimento das estruturas pe-
riféricas, a intervenção deve ser precoce com reparação e,
Figura 119 - Paciente com luxação do joelho se preciso, reforçada com o tendão do semitendíneo me-
dialmente e o bíceps lateralmente.
Ao exame radiológico, a presença de avulsões ósseas
pelos ligamentos capsulares do joelho, fraturas da patela, 21. Fratura do planalto tibial
das espinhas tibiais, do planalto tibial e da cabeça da fíbula
O platô tibial é o segmento da tíbia proximal que se arti-
pode significar que houve luxação do joelho reduzida es- cula com os côndilos femorais. A fratura acontece por trau-
pontaneamente. ma direto, com uma força em varo ou valgo e carga axial. Na
A RM tem papel diagnóstico e realiza um levantamento maioria das vezes, está relacionada a pacientes jovens víti-
mais preciso das estruturas lesadas, no sentido de auxiliar mas de atropelamento. Em idosos, decorre da osteoporose.
no planejamento cirúrgico. Suspeita-se do diagnóstico na história clínica. Ao exame
físico, o paciente apresenta edema, derrame articular, mo-
A artroscopia, tanto diagnóstica como cirúrgica, está bilidade limitada e deformidade.
formalmente contraindicada, uma vez que a ruptura capsu- A punção articular da hemartrose alivia a dor do pacien-
lar presente na luxação faz o soro fisiológico, que distende o te, e a presença de gotículas de gordura no líquido é indica-
joelho, extravasar para os tecidos extra-articulares. tiva de fratura articular.
255
ORTO P ED I A
O envelope de tecidos moles do membro inferior deve A classificação mais utilizada é a de Schatzker:
ser cuidadosamente inspecionado, e a presença de dor ex-
trema e de parestesia pode ser indicativa de síndrome com-
partimental.
As radiografias nas várias incidências confirmam o diag-
nóstico e avaliam a existência de afundamentos articulares
e a extensão da fratura.
256
F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
dência. Pode variar de uma simples fratura sem desvio e
O prognóstico está relacionado com o grau de lesão de
mínima lesão de partes moles até uma amputação trau-
partes moles e com o grau de energia absorvido no mo-
mática.
mento da fratura.
As fraturas fechadas acontecem devido ao trauma de Os traços transversos e oblíquos curtos são causados
menor intensidade, em jovens, relacionadas ao esporte, e por trauma direto de maior intensidade.
em idosos, devido à osteoporose (por trauma torcional e Os traumas por esmagamento são de alta energia, pro-
quedas). vocados, normalmente, em acidentes de motocicleta ou
atropelamento, e resultam em grande cominuição da fra-
tura. Os traumas torcionais causam fraturas em espiral ou
oblíquas longas.
Quando a fratura envolve a superfície articular da tíbia
distal, que suporta o peso corporal, é definida como fratu-
ra do pilão tibial.
Clinicamente, ocorrem dor, crepitação, hematoma, le-
são ou não de pele com exposição óssea e deformidade. As
radiografias simples confirmam o diagnóstico.
257
ORTO P ED I A
Figura 129 - Fixador externo no tratamento da fratura dos ossos São fraturas articulares e interferem na estabilidade e
da perna na congruência da pinça tibiofibular.
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F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
O complexo ligamentar medial é formado pelo ligamen- Figura 134 - Mecanismo de trauma da fratura do tornozelo
to deltoide superficial e profundo. A sindesmose é formada
pelo ligamento tibiofibular anterior, tibiofibular posterior, A fratura de Maisonneuve corresponde à fratura proxi-
ligamento transverso e ligamento interósseo. O arco de mo- mal da fíbula atribuída a um trauma torcional do tornozelo
vimento do tornozelo vai de 20° de flexão dorsal a 45° de com lesão da sindesmose associada.
flexão plantar. Os objetivos do tratamento são a redução anatômica
Clinicamente, o paciente com fratura apresenta dor, das estruturas articulares, a correção do comprimento fibu-
edema, deformidade, crepitação e limitação da mobilidade. lar e da rotação, e a translação talar. Essa redução deve ser
O diagnóstico por imagem das fraturas é feito pelas incidên- mantida até a consolidação da fratura, com estabilização
cias frente, frente com 20° de rotação medial e perfil. forte o suficiente para permitir mobilização precoce.
O tratamento conservador é indicado para fraturas está-
veis, sem desvio, com integridade do ligamento sindesmoi-
dal. Após a redução, a fratura é imobilizada em aparelho
gessado circular suropodálico por cerca de 6 semanas. Não
é permitida carga até a consolidação da fratura.
259
ORTO P ED I A
A - Fratura do talo
O talo é revestido por cartilagem em 60% da superfície
e possui 7 faces articulares. Os vasos sanguíneos penetram
pelas áreas não articulares, pelo seio do tarso. As fraturas
são classificadas de acordo com a região da fratura: corpo,
colo, cabeça e processo posterior ou lateral.
O mecanismo de fratura está relacionado, mais comu-
mente, a acidentes automobilísticos, por hiperdorsiflexão
Figura 136 - Radiografia de fratura do tornozelo do tornozelo. É historicamente conhecida por “fratura do
aviador”.
O tratamento cirúrgico é indicado para fratura-luxação,
fraturas expostas, fraturas com desvios e instáveis, fraturas Clinicamente, o paciente apresenta dor, limitação da
bimaleolares ou de um maléolo associada à lesão da sin- mobilidade e edema. As radiografias fazem o diagnóstico
desmose. de frente e perfil do tornozelo.
Para a fixação da fratura após redução aberta, são utili-
zadas placa DCP 3,5mm, ou placa 1/3 de cana, parafusos e
fios de Kirschner com função de banda de tensão, depen-
dendo do tipo da fratura.
260
F R AT U R A S N O A D U LT O
As complicações são osteonecrose, pseudoartrose e co- afundamento central, com tratamento cruento. A classifica-
lapso do talo associado à necrose. ção mais moderna (1995), de Sanders, utiliza a TC; o corte
coronal avalia melhor a faceta posterior do talo, dividindo-a
B - Fratura do calcâneo em 3 colunas: uma lateral, uma central e outra medial.
A fratura do calcâneo é a mais comum dos ossos do tar- É importante, em uma fratura do calcâneo, ter sempre
so, acomete pacientes normalmente em idade jovem e é em mente o risco alto de lesões associadas, cerca de 10%
secundária à queda de altura e acidentes automobilísticos. de síndrome compartimental, 10% associados à fratura da
Na sua porção anterior, o calcâneo apresenta 4 articu- coluna vertebral, 10% bilateral dos calcâneos e 5% expostos.
lações, uma que se articula com o cuboide, e as outras 3
que se articulam com o talo, sendo dividido em 3 porções:
anterior, média (do sustentáculo do talo) e posterior.
As fraturas do calcâneo, em cerca de 75% dos casos, são
intra-articulares, podendo ser por forças de tração ou por
forças de compressão axial. As fraturas por tração são as do
tubérculo posterior, devido à contração súbita do tríceps; e
as do processo anterior do calcâneo, devido a uma entorse
do tornozelo com tração do ligamento bifurcado, levando a
uma avulsão.
As fraturas por compressão devem-se ao impacto do
talo sobre o calcâneo, dividindo-o em 2 partes. Com a con-
tinuidade da força, há a formação de outros fragmentos,
ORTOPEDIA
levando a um calcâneo com tamanho diminuído, alargado
e com estiramento dos tendões fibulares e do nervo sural. Figura 142 - RM com fratura do calcâneo por estresse
O diagnóstico deve ser feito pela clínica (equimose plan-
tar é altamente sugestiva) e pelas radiografias – frente, per- O tratamento, nas fraturas do processo anterior, é con-
fil, axial de Harris e oblíquas de Bordem. As radiografias de servador; nas fraturas em língua do tubérculo posterior que
frente servem para avaliar a articulação calcâneo-cuboide. ocorreram por tração do tríceps, o tratamento é cirúrgico,
As radiografias de perfil avaliam o ângulo crucial de Gissane com fixação e imobilização por 4 a 6 semanas. As fraturas
e o ângulo de Böler (que varia de 20 a 40° e é medido atra- intra-articulares desviadas devem ser tratadas como qual-
vés de uma linha do tubérculo posterior até a parte supe- quer outra fratura intra-articular: redução anatômica, fixa-
rior da faceta posterior e outra linha da faceta posterior ção estável e mobilidade precoce.
até ao processo anterior do talo). A 1ª radiografia axial de
Harris avalia o achatamento do osso e o desvio em varo, e
as radiografias oblíquas (Bordem), se há comprometimento
da faceta posterior.
A TC é de extrema importância.
261
ORTO P ED I A
D - Fratura do 5º metatársico
A fratura por avulsão do 5º metatársico acontece por
mecanismo torcional, decorrente da avulsão óssea da base
pela inserção do tendão do músculo fibular curto. Responde
bem ao tratamento com bota gessada e se consolida a par-
tir de 6 semanas de imobilização.
A fratura da diáfise proximal, “fratura de Jones”, pode
ser por fadiga (bailarina) ou trauma e está localizada em
Figura 144 - Mecanismo de trauma da fratura-luxação de Lisfranc região de aporte sanguíneo menor. O tratamento pode ser
feito com imobilização gessada ou fixação estável com pa-
As lesões da articulação de Lisfranc se associam, na
rafusos ou banda de tensão.
maior parte das vezes, a fraturas da base dos metatársicos,
sendo a base do 2º mais frequente, embora possa haver
fraturas dos outros ossos. 25. Fraturas expostas
O mecanismo de trauma mais comum é de trauma axial
Os objetivos do tratamento, nos casos de fraturas ex-
com o pé fixo em posição de equino.
Clinicamente, o paciente tem dor e edema no dorso do postas, envolvem a prevenção da infecção, a obtenção da
pé. As radiografias de frente, perfil e oblíquas fazem o diag- consolidação óssea e a cicatrização de partes moles para
nóstico. permitir a recuperação funcional do membro acometido o
mais precocemente possível.
Fratura exposta é definida como aquela em que há rup-
tura na pele e dos tecidos moles subjacentes, permitindo a
comunicação óssea direta ou do hematoma fraturário com
o meio ambiente. Essa comunicação pode se dar pela boca,
tubo digestivo, vagina e ânus, estes últimos com grande fre-
quência nos casos de fraturas do anel pélvico. Quando uma
fratura acontece no mesmo segmento do membro com
uma ferida, deve ser considerada exposta até que se prove
o contrário.
O mecanismo de lesão acontece por 2 meios: aquelas
provocadas por trauma de alta energia absorvido pelo osso
e tecidos moles, com desvitalização tecidual, e aquelas com
baixo grau de energia.
A classificação mais utilizada é a de Gustillo e Anderson
Figura 145 - Radiografia com fratura-luxação de Lisfranc (1976), que as dividiram em 3 grupos distintos por meio
das diferentes características das lesões de partes moles e
configuração da fratura, além da análise do grau de conta-
minação:
- Tipo I: ferida de pele até 1cm. Lesão de dentro para
fora, lesão mínima de partes moles, fratura transversa
ou oblíqua curta e contaminação mínima;
- Tipo II: ferida de pele >1cm, mecanismo de fora para
dentro, lesão de partes moles extensa, esmagamento
mínimo ou moderado, contaminação moderada, comi-
nuição mínima da fratura.
- Tipo III: ferida com extensa lesão de partes moles ou
esmagamento, contaminação significativa, trauma de
Figura 146 - Tipos de fratura-luxação de Lisfranc alta energia e maior cominuição óssea:
262
F R AT U R A S N O A D U LT O
• IIIa: é possível a cobertura óssea com partes moles; tal procedimento não tenha sido realizado pela equipe de
• IIIb: não é possível a cobertura óssea com partes resgate.
moles; A sala de atendimento de emergência é um local poten-
• IIIc: lesão arterial, com necessidade de reparo cirúr- cialmente contaminado e, obviamente, não adequado para
gico. o exame e a manipulação da ferida, atos que devem ser re-
alizados no centro cirúrgico.
Nesta fase inicial, com o paciente ainda na sala de emer-
gência, iniciam-se antibioticoprofilaxia intravenosa e profi-
laxia para o tétano. O germe mais comumente encontrado
nas fraturas infectadas é o Staphylococcus aureus.
O antibiótico profilático utilizado geralmente é uma
cefalosporina de 2ª geração (cefazolina), e, quando o am-
biente é mais contaminado, associa-se um antibiótico para
cobertura contra Gram negativos como os aminoglicosídeos
(gentamicina ou amicacina).
A eficácia da antibioticoterapia precocemente adminis-
trada é bem documentada. Utiliza-se a terapêutica intra-
venosa até 48 e 72 horas, exceto naqueles com infecção
precoce, quando o esquema inicial deve ser mantido até o
resultado da cultura, momento em que deve ser iniciado o
esquema de antibiótico adequado.
O tratamento cirúrgico compreende limpeza da ferida,
ORTOPEDIA
debridamento e fixação da fratura.
263
ORTO P ED I A
A limpeza é realizada com 10L de solução salina, e a A escolha do método de fixação depende do tipo da
ação básica da irrigação é a remoção de detritos, ou seja, fratura. Dentre os fatores que influenciam essa tomada de
ação mecânica. decisão, podem-se citar grau de cominuição da fratura, lo-
A princípio, tais feridas, após o debridamento, devem calização anatômica, lesão de partes moles, grau de con-
ser deixadas abertas para posterior fechamento. Nas feri- taminação, estado geral do paciente e tempo de evolução
das provocadas por baixa energia, minimamente contami- desde o acidente.
nadas, principalmente em membro superior, pode-se optar A osteossíntese é possível por métodos de fixação exter-
pelo fechamento primário caso a ferida seja limpa, caso os nos ou internos.
tecidos necróticos e os corpos estranhos tenham sido re- O uso de fixadores externos, que podem ser utilizados
movidos, caso os tecidos sejam viáveis, e com a sutura feita para quase todos os tipos de fraturas, é um método rápido
sem tensão e a ausência de espaço morto. O restante das e de fácil realização. A desvantagem é que apresenta es-
feridas deve ficar aberto para reavaliação após 24 a 48 ho- tabilidade relativa, e, muitas vezes, é necessário um novo
ras, quando se realizam um novo debridamento cirúrgico e procedimento cirúrgico para a conversão para síntese defi-
a irrigação e a ferida é fechada caso haja condições ideais nitiva interna.
para isso. As sínteses internas podem ser por placas com parafu-
sos ou hastes intramedulares e estão indicadas para fratu-
ras expostas até grau IIIa. A vantagem é que são métodos
definitivos e promovem uma melhor fixação da fratura, e a
desvantagem é que aumentam o tempo cirúrgico e as pla-
cas promovem extensa dissecção de partes moles com des-
vitalização dos fragmentos e aumento de infecção.
Algumas fraturas expostas têm indicação de amputação,
devido à gravidade.
As indicações absolutas imediatas são fraturas expostas
da tíbia com lesão vascular, lesão do nervo tibial posterior,
lesão com esmagamento >6h de isquemia quente, lesão ex-
tensa muscular sem condição de reconstrução e lesão asso-
ciada a risco de vida que inviabiliza cirurgias externas.
A - Embolia gordurosa
Figura 150 - Fratura exposta do tornozelo tratada com limpeza,
debridamento e retalho de pele local A embolia gordurosa é uma grande causa de mor-
bidade e mortalidade após fraturas nos pacientes com
A grande complicação do fechamento primário dessas lesões múltiplas, além de causa importante de SARA.
feridas é a infecção, que pode evoluir para osteomielite, a Porém, está descrita em associação a uma variedade de
qual, como já se sabe, traz implicações sérias na evolução entidades não traumáticas, como doença do colágeno,
do tratamento, comprometendo o resultado final. diabetes, queimaduras, hemoglobinopatias, infecção
Após o debridamento e a limpeza, indica-se a estabili- grave, transfusão sanguínea, distúrbios metabólicos e
zação das fraturas. A fixação óssea, restaurando o compri- descompressão devido à altitude. O fator etiológico mais
mento e o alinhamento, evita a perpetuação da lesão das comum é uma fratura de osso longo em um paciente na
partes moles provocadas pelos fragmentos ósseos, dimi- 2ª ou na 3ª década de vida. A prevenção da síndrome
nui a formação de espaço morto e hematoma, permitindo de embolia gordurosa relaciona-se à fixação precoce da
maior cuidado das feridas e melhor mobilização e conforto fratura e mobilização do paciente.
do paciente. Os sinais e sintomas clínicos associados a tal síndrome
A estabilização das fraturas expostas diminui a prolifera- são evidentes em 0,5 a 2% dos pacientes com fraturas de
ção bacteriana e, consequentemente, os índices de infecção. ossos longos e em cerca de 10% dos pacientes com fraturas
264
F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
ondas T e um bloqueio de ramo direito.
O tratamento inicial é destinado à diminuição da hipoxe-
mia. Deve-se administrar oxigênio imediatamente e acom-
panhar os gases sanguíneos. A estabilização da fratura e a
fixação precoce dentro de 24 horas após a lesão diminuem
Figura 151 - Microscopia de embolia gordurosa
a incidência da síndrome de embolia gordurosa.
Os sinais e sintomas são os mesmos da SARA. O início B - Distrofia simpático-reflexa
dos sintomas pode ser imediato ou até 2 ou 3 dias após o
trauma: falta de ar, taquipneia, agitação e confusão men- Uma variedade de termos é usada para descrever a
tal. Hipóxia arterial é uma marca característica. Há uma distrofia: atrofia de Sudeck, distrofia reflexa e distrofia pós-
elevação constante da temperatura para 39 a 40°C. No 2º -traumática. A distrofia é caracterizada pela estimulação
ou no 3º dia após a lesão, podem ser vistas petéquias, ca- sensitiva crônica, resposta vasomotora persistente, res-
racteristicamente localizadas no tórax, axila, raiz do pes- posta motora e eventual atrofia dos tecidos, osso, tendão
coço e conjuntivas. A erupção petequial é efêmera e pode e músculo, com contraturas articulares, edema crônico e
durar apenas um curto período, desaparecendo rapida- fibrose.
mente. Uma série de reflexos dependentes de estimulação cru-
zada entre fibras sensitivas amielínicas danificadas e efe-
rentes simpáticas pode responsabilizar-se pela fisiopatolo-
gia subjacente.
Dor espontânea, hiperestesia e dor à palpação despro-
porcionais ao exame físico são os aspectos predominantes.
A dor varia em intensidade e caráter e pode ser acompa-
nhada por edema e diminuição na amplitude de movimen-
tação na extremidade comprometida.
Os achados clínicos são separados em 3 fases. A fase
inicial apresenta dor constante em queimação ou dor cons-
tante. A dor é aumentada por estímulos externos. A 2ª fase
desenvolve-se em cerca de 3 meses, e o paciente apresenta
edema, pele fria e lustrosa e amplitude articular limitada.
Na 3ª fase, ocorrem atrofia progressiva da pele e músculos,
movimento articular gravemente limitado por fibrose em
Figura 152 - Percurso do êmbolo do local de saída aos pulmões evolução e contraturas irreversíveis.
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F R AT U R A S N O A D U LT O
A perturbação sensitiva usualmente precede a disfun- A pressão tecidual normal dentro dos compartimen-
ção motora, porém hipoestesia fixa ou anestesia é um acha- tos fechados é de aproximadamente 0mmHg. Há perfusão
do relativamente tardio. Quando ocorre déficit motor óbvio inadequada e isquemia relativa quando a pressão tecidual
ou ausência de pulso, a isquemia usualmente já está bem dentro de um compartimento fechado se eleva para níveis
estabelecida, e pode haver dano permanente. A função mo- de 10 a 30mmHg da pressão arterial diastólica de um pa-
tora é a 1ª função nervosa a ser perdida quando um mem- ciente.
bro se torna isquêmico. Alterações irreversíveis nas fibras
O tratamento da síndrome compartimental é a descom-
musculares acontecem 6 horas após o início da isquemia
pressão precoce. A demora na descompressão adequada do
tecidual. A perda de pulso palpável se dá tardiamente.
compartimento pode resultar em lesão permanente dos te-
A medição das pressões teciduais intracompartimen-
cidos subjacentes. O músculo mostra alterações funcionais
tais tornou-se um instrumento clínico valioso. Whitesides
depois de 2 a 4 horas de tempo de isquemia, com perda fun-
e associados defenderam o uso de um aparelho simples de
cional irreversível com início após 4 a 12 horas. Contraturas
medição de pressão que consiste numa agulha e tubulação
são produzidas após 12 horas de isquemia total.
plástica cheios de soro fisiológico e ar ligados a um manô-
metro de mercúrio. A descompressão inicial deve ser feita fendendo-se ou
removendo-se imediatamente os aparelhos ou outros cura-
tivos circulares comprometedores. Caso a pressão tecidual
permaneça elevada ou os sintomas persistam, a fascioto-
mia descompressiva adequada deve ser efetuada como
procedimento de emergência.
A fasciotomia deve ser realizada em todos os comparti-
ORTOPEDIA
mentos apertados e via de acesso ampla.
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ORTOPEDIA
- Mecanismo de trauma: trauma direto, com traços de fratura diafisária proximal da ulna, associada à luxação da cabeça do
geralmente transversos ou cominutos, ou trauma indireto, com rádio com ou sem fratura; fratura do cassetete (nightstick): fra-
traços espirais atribuídos às forças torcionais; tura isolada da ulna;
- Diagnóstico: clínico, baseado na história e no exame físico. Há - Tratamento: considera-se o antebraço uma articulação, e o
edema, deformidade do braço, impotência funcional e crepita- tratamento geralmente é cirúrgico com redução anatômica e
ção. As radiografias em anteroposterior e perfil são suficientes fixação com placas e parafusos permitindo mobilidade preco-
para confirmar o diagnóstico; ce. Alguns casos têm tratamento com gesso quando a fratura é
- Tratamento: na maioria das vezes, conservador. Dentre as op- sem desvio.
ções, estão o aparelho gessado axilopalmar, a “pinça de con- Fratura do rádio distal
feiteiro” e a imobilização funcional. O tratamento cirúrgico
- Mecanismo de trauma: por trauma, como queda de altura, aci-
tem indicações absolutas ou relativas. As absolutas são fratura
dentes de trânsito e traumas esportivos; nos idosos, por trau-
associada à lesão vascular, fratura exposta, paralisia do nervo
mas de baixa energia, como simples queda ao solo, devido à
radial, interposição de partes moles que dificultam a redução,
osteopenia;
cotovelo flutuante, politrauma e fratura patológica por doen-
ça maligna. As relativas são bilateralidade, obesidade e fratura - Quadro clínico: dor, edema, deformidade e impotência funcio-
segmentar. nal da mão e punho após o trauma. O exame radiográfico em 2
incidências faz o diagnóstico;
Fraturas do cotovelo
- Tratamento: depende do tipo da fratura. O tratamento conser-
- Mecanismo de trauma: fraturas do cotovelo acontecem por
vador com gesso pode ser realizado em fraturas mais simples
trauma direto na região ou, na maioria das vezes, por trauma
sem desvio ou com desvio estáveis após a redução. O trata-
indireto por queda ao solo com a mão espalmada;
mento cirúrgico é realizado nas fraturas com desvio e instáveis.
- Quadro clínico: dor, deformidade, edema e hematoma na re-
Fratura dos ossos do carpo
gião do cotovelo. Deve-se avaliar se há presença de lesões neu-
rológicas ou lesões vasculares (nervos radial, ulnar e mediano; - Mecanismo de trauma: queda com hiperextensão do punho,
palpação da artéria ulnar e radial). Radiografia simples do co- levando a forças de compressão em seu dorso e forças de tra-
tovelo confirma o diagnóstico frente e perfil, ao passo que ra- ção em seu ventre. A posição da mão durante a queda deter-
diografias oblíquas são utilizadas em alguns casos; mina a região do escafoide fraturada;
- Tratamento: depende do tipo e da localização da fratura. Pode - Diagnóstico: ao exame físico, dor na tabaqueira e à compres-
ser conservador com a utilização de gesso braquiopalmar, ou são axial do polegar são muito sugestivas. Solicitam-se radio-
cirúrgico com redução da fratura e fixação com fios, parafusos grafias de frente com o punho fletido, PA com desvio ulnar,
ou placas; perfil e oblíquas;
- Tratamento cirúrgico: é importante a mobilidade precoce do - Tratamento: com gesso imobilizando braquiopalmar e blo-
cotovelo, para evitar rigidez articular, uma complicação comum queio do polegar; tratamento cirúrgico: fraturas instáveis com
nas fraturas que acontecem no cotovelo. Também após o trata- desvio;
mento conservador com gesso, deve-se iniciar fisioterapia para - Complicação mais comum: pseudoartrose, que tem indicação
a restauração da mobilidade articular. de tratamento cirúrgico.
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ORTO P ED I A
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F R AT U R A S N O A D U LT O
ORTOPEDIA
res do joelho, fraturas da patela, das espinhas tibiais, do pla- curta e contaminação mínima;
nalto tibial e da cabeça da fíbula podem significar que houve · Tipo II: ferida de pele maior que 1cm, mecanismo de fora
luxação do joelho reduzida espontaneamente; para dentro, lesão de partes moles extensa, esmagamento
- RM: exame de escolha para avaliar as lesões ligamentares e mínimo ou moderado, contaminação moderada, cominuição
planejamento do tratamento cirúrgico; mínima da fratura;
- A presença de lesão da artéria poplítea na luxação é descrita · Tipo III: ferida com extensa lesão de partes moles ou esmaga-
em até 40% dos casos; mento, contaminação significativa, trauma de alta energia e
maior cominuição óssea:
- As prioridades no tratamento da luxação são a estabilização
* IIIa: é possível a cobertura óssea com partes moles;
esquelética e o restabelecimento do suprimento vascular
* IIIb: não é possível a cobertura óssea com partes moles;
do membro, estando, em 2º plano, a reparação ligamentar.
* IIIc: lesão arterial, com necessidade de reparo cirúrgico.
Normalmente, há a lesão total dos ligamentos cruzados ante-
rior e posterior, que devem ser reconstruídos posteriormente. - Tratamento: antibioticoprofilaxia, vacina antitetânica, debri-
damento da ferida, irrigação com soro fisiológico abundante e
Fratura do planalto tibial
estabilização da fratura, a fim de evitar infecção e consolidação
- Mecanismo de trauma: por trauma direto, com uma força em da fratura.
varo ou valgo e carga axial;
Complicações das fraturas
- Diagnóstico: clínico e radiográfico;
- Etiologia: a embolização mecânica pela gordura de fato ocorre.
- Tratamento: conservador para fraturas sem desvio e com cirur- A teoria postula que ocorra alteração na estabilidade lipídica
gia para fraturas com desvio. Objetiva a redução anatômica da após trauma, o que, combinada à alteração dos padrões de
superfície articular, o alinhamento do eixo metafisário e a esta- fluxo na microcirculação, causa perfusão tecidual inadequada,
bilização dos fragmentos da fratura, permitindo a mobilidade
hipóxia tecidual e a síndrome de embolia gordurosa;
precoce.
- Clínica: o início dos sintomas pode ser imediato ou por até 2
Fratura diafisária dos ossos da perna
ou 3 dias após o trauma: falta de ar, taquipneia, agitação e con-
- Fratura dos ossos longos com maior incidência; muitas vezes, fusão mental. Hipóxia arterial é uma marca característica. Há
são fraturas expostas pelos ossos da perna se localizarem pró- uma elevação constante da temperatura para 39 a 40°C. No 2º
ximos à pele e pouca cobertura muscular; ou no 3º dia após a lesão, podem ser vistas petéquias, caracte-
- Clínica: dor, crepitação, hematoma, lesão ou não de pele com risticamente localizadas no tórax, axila, raiz do pescoço e con-
exposição óssea e deformidade. As radiografias simples confir- juntivas. A erupção petequial é efêmera e pode durar apenas
mam o diagnóstico; um curto período, desaparecendo rapidamente;
- Objetivos do tratamento: são a consolidação da fratura, a cica- - Tratamento: destinado à diminuição da hipoxemia; oxigênio
trização de partes moles, a recuperação funcional e a ausência imediato e acompanhamento de gases sanguíneos. A estabili-
de complicações. As opções de tratamento são diversas: gesso, zação da fratura e a fixação precoce dentro de 24 horas após
fixador externo, placa e parafusos e haste medulares; a lesão diminuem a incidência da síndrome de embolia gor-
- A consolidação ocorre em torno de 16 a 20 semanas. durosa.
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ORTO P ED I A
Distrofia simpático-reflexa
- Etiologia: caracteriza-se pela estimulação sensitiva crônica,
resposta vasomotora persistente, resposta motora e eventual
atrofia dos tecidos, osso, tendão e músculo, com contraturas
articulares, edema crônico e fibrose;
- Clínica: dor espontânea, hiperestesia e dor à palpação despro-
porcionais ao exame físico são os aspectos predominantes;
- Tratamento: mobilização do membro, analgésicos potentes,
apoio emocional e, se os métodos conservadores falham, al-
guma forma de interrupção simpática é usada, como drogas
simpático-líticas, bloqueios de nervos somáticos e bloqueios
de gânglio estrelado.
Síndrome compartimental
- Definição: a circulação e a função dos tecidos dentro de um es-
paço fechado são comprometidas por uma pressão aumentada
dentro desse espaço. A etiologia pode ser por:
· Tamanho diminuído do compartimento;
· Conteúdo aumentado do compartimento.
- Três teorias foram propostas para explicar o aparecimento da
isquemia tecidual:
· Espasmo arterial;
· O aumento da pressão tecidual ou a diminuição da pressão
arteriolar;
· As veias apresentam paredes finas e colapsam caso a pres-
são tecidual exceda a pressão venosa. O aumento da pressão
venosa reduz o gradiente arteriovenoso e, como resultado, o
fluxo sanguíneo tecidual.
- Clínica: dor, palidez, parestesias, paralisia e ausência de pulso.
A medição das pressões teciduais intracompartimentais confir-
ma o diagnóstico;
- Tratamento: descompressão cirúrgica precoce (fasciotomia). A
demora na descompressão adequada do compartimento pode
resultar em lesão permanente dos tecidos subjacentes.
272
CAPÍTULO
9
Fraturas em crianças
Gustavo Merheb Petrus
2. Tipos de fraturas
a) Completa: traço longitudinal, transversal, oblíquo, es-
piral e cominutiva.
b) Impactada ou torus: lesão por compressão em que
é esmagado o osso cortical e trabecular de cada lado da
Figura 1 - Periósteo espesso fratura. Isso é comum na região metafisária.
273
ORTO P ED I A
3. Desenvolvimento ósseo
a) Ossificação membranosa: ocorre nos ossos faciais
e em parte na clavícula. Os ossos derivados de membrana Figura 4 - Anatomia da epífise
formam-se diretamente a partir dos tecidos mesenquima- Seu suprimento sanguíneo provém da metáfise, da epí-
tosos que são análogos estruturais do osso final. fise e da região pericondral.
b) Ossificação endocondral: a formação endocondral Existem 2 tipos de epífise nas extremidades dos ossos
é o processo de ossificação primário dos componentes do longos, as de pressão e as de tração, também chamadas de
esqueleto axial e apendicular. Esse tipo é a substituição sin- apófises. As fises localizadas junto às epífises de pressão
cronizada de tecido cartilaginoso preexistente por tecido são normalmente submetidas a forças compressivas trans-
ósseo. mitidas através das articulações e são responsáveis pelo
crescimento longitudinal do osso. As fises situadas junto
4. Fraturas da fise às apófises são submetidas a forças de tração em razão da
contração dos músculos nelas inseridos.
As lesões da fise ocorrem em 20 a 30% das crianças com
A - Introdução lesões musculoesqueléticas e correspondem a uma região
A fise, também denominada de “placa epifisária” ou de fragilidade óssea, sujeitas às forças de cisalhamento ou
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F R AT U R A S E M C R I A N Ç A S
lesões por forças compressivas. As fises distais são mais já que não se consegue identificar essa lesão imedia-
propensas a lesões que as proximais. Nas crianças menores, tamente após o trauma. O prognóstico é ruim, pois
as lesões costumam acontecer na região metafisária. evoluem com deformidade secundária e progressiva;
O diagnóstico das lesões da placa de crescimento ba- - Tipo VI (modificada por Rang): lesão periférica da fise,
seia-se na suspeita clínica, podendo-se encontrar desde produzida por trauma local, avulsão das partes moles
uma fratura com desvio, acompanhada de dor intensa, ou queimaduras. O problema manifesta-se quando
edema e incapacidade funcional, até uma discreta dor lo- ocorre uma ossificação marginal, unindo a região me-
calizada na topografia da fise sem implicar deformidade ou tafisária à epífise.
limitação funcional significativa.
C - Tratamento
As tentativas de redução incruenta devem ser realiza-
das sob anestesia, por meio de manobras suaves, evitando
traumas maiores à fise, com 2 tentativas no máximo. Caso
ORTOPEDIA
não se obtenha uma redução satisfatória, deve-se avaliar a
necessidade de redução aberta, já que é possível a interpo-
Figura 5 - Fratura transepifisária do fêmur distal em criança sição de partes moles.
A investigação clínica deve ser auxiliada por exames ra- As fraturas dos tipos I e II de Salter-Harris são passíveis
diográficos convencionais, e, geralmente, 2 incidências or- de tratamento não cirúrgico, aceitando-se algum desvio
togonais são suficientes para caracterizar a lesão. angular, devido à capacidade de remodelação e, principal-
É importante lembrar a possibilidade de lesões compres- mente, pelo não acometimento da camada germinativa.
sivas, pois podem passar despercebidas, ocorrendo com Fraturas dos tipos III e IV necessitam de uma redução
maior frequência nas articulações do joelho e do tornozelo. anatômica, por serem articulares e comprometerem a ca-
Vale ressaltar que nenhum exame é capaz de confirmar se mada de células germinativas.
houve ou não lesão definitiva da placa de crescimento; logo, Deve-se avaliar a capacidade de estabilização apenas
diante de uma suspeita, o mais importante é orientar o pa- com imobilização gessada. Grandes articulações, como jo-
ciente e seus responsáveis a efetuarem acompanhamento elho e quadril, são submetidas a muitas forças deforman-
para identificar uma possível alteração do crescimento. tes que podem levar à perda de redução; nessa situação,
recomenda-se a fixação. Uma vez necessária a redução
B - Classificação (Salter-Harris) cruenta, é prudente associar-se à fixação interna. A fixa-
ção, quando necessária, é realizada com fios lisos metá-
- Tipo I: fratura envolvendo toda a fise com ou sem licos. O material de síntese é retirado logo que ocorre a
deslocamento em um só plano, sem fragmento me- consolidação.
tafisário;
- Tipo II: a fratura acomete, parcialmente, a placa de cres-
cimento e continua para a região metafisária, permane- D - Complicações
cendo um fragmento metafisário preso à epífise; As complicações podem advir da gravidade da lesão, de
- Tipo III: fratura através da epífise que se propaga em um tratamento inadequado, ou de intercorrência durante
direção à fise, com seu envolvimento parcial. Fratura o tratamento. Quanto maior a energia do trauma, maior a
intra-articular, e seu prognóstico está diretamente re- possibilidade de lesão definitiva da placa de crescimento.
lacionado à capacidade de restauração da superfície O sobrecrescimento ou a hipoplasia da epífise são situa-
articular; ções raras. Outras complicações são o retardo de consolida-
- Tipo IV: traço de fratura vertical que passa através da ção e a pseudoartrose.
epífise, fise e metáfise. Fratura intra-articular, e é man- A complicação mais frequente é a formação de barra
datória a redução anatômica; óssea que pode ser completa, determinando discrepância
- Tipo V: lesões da placa provocadas por forças com- longitudinal, ou incompleta, levando às deformidades an-
pressivas; o diagnóstico, muitas vezes, não é firmado, gulares progressivas, enquanto há crescimento.
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rior ao do agressor, que a expõe a estímulos sexuais im- de perna em crianças com idade <1 ano);
próprios para a idade ou a utiliza para sua satisfação se-
xual ou de outra pessoa. Estas práticas são realizadas por
- Lesões como equimoses, lacerações, hematomas, fra-
turas, queimaduras e mordeduras;
meio de violência física, ameaças e mentiras, e a vítima
é forçada a práticas sexuais eróticas sem ter capacidade - Lesões em vários estágios de cicatrização ou cura;
emocional ou cognitiva para consentir ou avaliar o que - Lesões em áreas não comuns de acidentes e quase
está acontecendo. sempre cobertas, como genitália e nádegas;
- Demora para procurar atendimento médico após o aci-
B - Fatores de risco para maus-tratos dente;
Existem condições que predispõem para a ocorrên-
- Crianças em situação de higiene precária, como vestu-
ário sujo e inapropriado ao clima local.
cia dos maus-tratos. Estas condições estão associadas ao
agressor, à vítima, à classe social, à comunidade e à família. Para os profissionais da saúde, a habilidade para dife-
a) São condições associadas ao agressor: renciar indícios de maus-tratos de outras doenças é de fun-
damental importância.
-A dependência de drogas, alcoolismo, história de
abuso, baixa autoestima, prostituição, imaturidade e D - Impacto dos maus-tratos sobre crianças e
transtornos de conduta; adolescentes
- Psiquiátricos ou psicológicos.
Os maus-tratos podem provocar danos para a criança,
b) São condições associadas à vítima: adolescente, família e sociedade por toda a vida. O impacto
Sexo diferente do desejado, dependência própria da in- da violência, entretanto, é influenciado por fatores como
fância, condições de saúde que exigem maiores cuidados idade, grau de desenvolvimento, tipo de abuso, frequência,
(prematuridade, doenças neurológicas, doenças graves, dis- duração, gravidade do abuso e a relação existente entre ví-
túrbios psicológicos, do sono, da alimentação e dos esfínc- tima e abusador.
teres), história de abusos anteriores, criança não desejada. As consequências da violência podem ser divididas em
psicológicas, comportamentais, sociais e físicas, embora
c) Fatores de risco associados ao meio social e à comu- esta seja uma divisão didática, uma vez que é impossível
nidade: separar uma forma da outra.
- Incluem falta de leis de proteção, desigualdade social, Vários estudos mostram que crianças submetidas à vio-
marginalidade, desemprego, analfabetismo, ambien- lência doméstica, quando comparadas às que não sofreram
tes conflituosos e alta; violência, são mais agressivas, têm baixa autoestima, déficit
- Aceitação de violência. A pobreza constitui um persis- de atenção, hiperatividade, dificuldade de relacionamento
tente fator de risco, sendo o abuso físico e a negligên- interpessoal, comportamento abusivo (serão também abu-
cia mais comuns em famílias que vivem na pobreza. sadores), baixo rendimento escolar, delinquência, gravidez
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ORTO P ED I A
precoce, uso de drogas, capacidade cognitiva e de desen- - Avaliar a capacidade de estabilização apenas com imobiliza-
volvimento da linguagem inferiores. ção gessada. Nas grandes articulações, recomenda-se a fixa-
Estas crianças e adolescentes apresentam graves conse- ção com fios lisos metálicos. O material de síntese é retirado
quências físicas, como dor, sofrimento ou estresse, associa- logo que ocorre a consolidação;
das ao abuso crônico, pois vivem em constante estado de - Complicações: a mais frequente é a formação de barra óssea,
alerta para maus-tratos. e as outras menos comuns são sobrecrescimento, hipoplasia
Do ponto de vista social, custos diretos incluem gastos da epífise, retardo de consolidação e a pseudoartrose.
com sistema de investigação judicial, cumprimento de pe-
nas e com o sistema de saúde. Custos indiretos incluem ati-
vidades criminais, doenças mentais, uso de drogas, violên-
cia doméstica, serviços de educação especial, desemprego
e aumento na frequência de utilização do sistema de saúde.
A violência contra a criança e o adolescente não ocorre
apenas em países em desenvolvimento e é tão frequente
que às vezes chega a ser banalizada. A história mostra que
a violência a que a criança é submetida, sob a forma de es-
pancamentos, abandono, escravidão, mutilações e infanti-
cídios, ocorre de longa data e se perpetua nos dias atuais. A
violência contra crianças e adolescentes é um grave proble-
ma, como atestam os dados epidemiológicos.
6. Resumo
Quadro-resumo
- Lesões envolvendo a fise podem levar a distúrbios agudos
ou crônicos do crescimento;
- A consolidação óssea é relativamente rápida na infância por
causa do periósteo espessado e extremamente osteogênico
e da abundante irrigação sanguínea que serve ao osso em
desenvolvimento.
- Tipos de fraturas:
· Completa;
· Impactada;
· Arqueada;
· “Em galho verde”.
- Na fise ou placa de crescimento, identificam-se 4 zonas distin-
tas: zona germinativa, zona proliferativa, zona de maturação
e zona de calcificação;
- Seu suprimento sanguíneo provém da metáfise, da epífise e
da região pericondral;
- O diagnóstico das lesões da placa de crescimento baseia-se
na suspeita clínica, podendo-se encontrar desde uma fratura
com desvio, acompanhada de dor intensa, edema e incapaci-
dade funcional, até uma discreta dor localizada na topografia
da fise sem implicar deformidade ou limitação funcional sig-
nificativa. Radiografias simples confirmam o diagnóstico;
- Lembrar a possibilidade de lesões compressivas;
- Classificação de Salter-Harris;
- Tratamento: tipos I e II de Salter-Harris são de tratamento não
cirúrgico; tipos III e IV necessitam de uma redução anatômica,
por serem articulares e comprometerem a camada de células
germinativas;
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