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O QUE É LIBERDADE? 5
HUMANIDADE E LIBERDADE 5
LEI, POVO E MERCADO. ESTADO E LIBERDADE. PODER E DINHEIRO 6
O MERCADO 9
AÇÃO 9
TEMPO 9
CONHECIMENTO 10
TROCAS 11
MOEDA 12
PROCESSOS DE MERCADO 12
JUROS 14
O VILÃO 16
A INEFICIÊNCIA COMPETITIVA DO ESTADO 17
COMO O ESTADO ATRAPALHA O POVO 18
A VERGONHA DO ESTADO: A FORÇA! 21
A CAPACIDADE DA AÇÃO 23
A LEI 30
O Homem é. 30
O Homem Age segundo sua Lei. 31
O direito é o estudo das leis. 31
A justiça é o processo de hermenêutica das leis particulares em prol de uma lei universalmente
cognoscível. 32
Direito é consensual e não-consensual. 33
A lei evolui. 34
O homem justo busca a lei justa 34
A ÉTICA LIBERTÁRIA 37
Porque ética? Comentários acerca da filosofia platônica 37
Como se dá a ética? Comentários acerca de Aristóteles 38
Sobre John Locke e Considerações sobre individualismo 38
Kant e o Imperativo Categórico 39
Quem é o ser? Resposta de Heidegger 40
Signos, Significados, Semiótica e Verdade com Peirce 41
Consciência Semiótica e Bakhtin 42
Reflexões Racionais Comunicativas 43
O ideal e a filosofia Habermasiana 43
Rothbard e a Autopropriedade
Rothbard, o pai do austro libertarianismo; o maior inimigo do estado que já viveu. Aquele que
ficou marcado para história com um sistema baseado em um mínimo normativo, qual seja o de
que: 45
Ética Argumentativa Hoppeana 47
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 50
Justiça 50
Conceitos 50
Nossas teses passariam pela maiêutica de Sócrates? 50
Céfalo e Polemarco. 51
Trasímaco, o político 56
Justiça Privada 59
Teoria jurídica 59
Devido Processo Legal 59
O estoppel 60
Os tribunais privados. 65
Ambientes de leis privadas 67
A internet 67
As relações internacionais 68
Notas dos Autores 70
Economia 71
Sobre a Liberdade 73
Sobre a Liberdade Positiva 74
Sobre a Liberdade Negativa 75
Sobre as concepções mais gerais de Liberdade 75
Aproximando a Liberdade de Vontade da Liberdade Negativa e Propriedade 77
O Estado Contra a Liberdade 77
Liberdade de Expressão, o fluir das ideias 83
Liberdade de Expressão, seus limites, e arbitrariedades estatais 84
O Estado e sua Arbitrariedade para com a Liberdade de Expressão 86
Liberdade de Expressão Negativa 88
Conclusão 89
Propriedade Intelectual 91
Do Tangível ao Intangível 91
Direitos, Escassez e o Imaterial 92
Acerca da PI 93
Utilitarismo e PI 95
Notas dos autores 96
Referências Bibliográficas 96
As Polêmicas Error! Bookmark not defined.
Libertários estão apenas contra o Estado 98
O que é Propriedade Privada 99
Escassez vs. Não Abundância 99
Libertários são contra toda força e coerção 100
– Autopropriedade – 103
Sistemas de Proteção Privada 105
Distinção entre Estado e Governo 106
Criação de um Estado em uma Anarquia Libertária? 107
Restituição vs. Retribuição 109
Sobre a Punitividade Retributiva 111
Sobre a Punitividade Restitutiva 113
Libertários são apenas contra Agressão e Ameaças Diretas 114
– Ameaças Indiretas – 115
– Culpabilidade Indireta – 117
Nas Obrigações Positivas 119
O Caso do Lago 121
O Aborto 122
Responsabilidades Tutelares 123
Transferência de Guarda 125
REFERÊNCIAS 126
A nossa liberdade poderia ser mínima. Nesse caso, nossas possibilidades seriam apenas
uma ilusão, todas as nossas grandes decisões teriam sido tomadas desde já pelo arcabouço
de elementos que fizeram parte da construção da nossa personalidade. Isso significaria
que nada decidiríamos sobre coisa alguma. Curioso, não é mesmo? Mas afirmar isso é
afirmar que todas as nossas escolhas poderiam ser previstas e então o mundo já estaria
inteiramente calculado em alguma instância. Então ler livros ou sonhar seriam apenas
mais do mesmo.
Em suma, a Liberdade só pode ser algo nesse meio termo, algo entre a liberdade máxima
e a liberdade mínima. Por fim, pensar nisso é pensar na liberdade como algo que precise
ser medido, definido por um conceito humano não absoluto mas fixo que nos possibilite
pensar melhor em tudo isso. A luta por entender e definir a liberdade é uma luta
eminentemente humana e o que isso significa?
Que todo e qualquer conceito que adotemos de liberdade deve ser capaz de expressar a
nossa humanidade e descrever-nos como seres completos. Para você que está aqui porque
há demanda por críticos de livros, você pode dizer desde já que o autor passa o livro
inteiro defendendo a tese de que liberdade é o poder que cada ser possui de determinar
nossos objetivos finais e que ele fará isso através de coisas como propriedade privada,
livre mercado e contratos. Mas isso seria apenas parte da verdade.
Essa forma de pensar é tão verdadeira quanto humana, capaz de mover as peças e
amadurecer pensamentos. O que faremos aqui será uma jornada de questionamentos e
ponderações acerca das coisas que consideramos que conhecíamos.
Ao agir, todo homem pretende alcançar determinados fins, que descobriu que são
importantes para si. Meio é tudo aquilo que o agente (indivíduo) acredita ser
subjetivamente adequado para conseguir o fim. Utilidade é a apreciação subjetiva que o
agente faz ao meio, em função do valor do fim que ele pensa que o meio lhe permitirá
alcançar. Neste sentido, valor e utilidade são correlatos, uma vez que o agente projeta o
valor subjetivo que dá ao fim para o meio que acredita ser útil para alcançá-lo,
precisamente através do conceito de utilidade.
Os fins e os meios nunca estão dados; pelo contrário, são o resultado da atividade
empresarial essencial que consiste precisamente em criar, descobrir ou, simplesmente,
compreender quais são os fins e meios relevantes para o agente em cada circunstância na
sua vida. E, a partir da concepção da ação, podemos, então, entender o conceito de tempo,
o qual é essencial para a prospecção de toda ação. 1
TEMPO
Toda ação necessita do tempo para ser concebida. Mas, o sentido de “tempo” comumente
utilizado é o “Newtoniano”, determinista, ou seja, a ideia de que o tempo é uma linha
homogênea na qual o indivíduo apenas pode projetar novas ações a partir do que ele
passou naquela determinada linha do tempo. Mas na sua concepção subjetiva, aquele que
é adotado pela Escola Austríaca, ou seja, tal como o tempo é subjetivamente sentido e
experimentado pelo agente dentro do contexto de cada ação. De acordo com esta
concepção subjetiva do tempo, o agente sente e experimenta o seu transcorrer à medida
em que age, ou seja, à medida em que cria, descobre, ou simplesmente se dando conta
dos novos fins e meios, de acordo com a essência da já explicada função empresarial. A
ação enquanto é causada e efetuada pelos indivíduos faz com que haja uma sequência
temporal, a qual sem a mesma não haveria o sentido de passado, presente e a ideia de
futuro.
CONHECIMENTO
Há dois tipos de conhecimento, segundo Hayek, o técnico-científico, ou seja, o do tipo
articulável, presente em materiais como: jornais, artigos e livros. E o que não é articulável
e encontra-se disperso nas mentes dos indivíduos, para Hayek esse é o conhecimento mais
relevante para a ciência econômica e, portanto, para a coordenação da sociedade.
iii) encontra-se disperso nas mentes dos indivíduos, no sentido de que ele não é “dado”,
mas sim, disseminado por uma parcela dos indivíduos integrantes da sociedade;
Quando a ação humana não envolve outros agentes, mas somente um agente e os meios
e fins da ação, podemos denominar de troca austística*. Commented [1]: wtf???
Os agentes A e B podem fazer uma troca interpessoal. Onde um agente transfere um meio
que considera menos útil, e pega da outra parte um meio que considera mais útil para seu
plano de ação. A ação de troca interpessoal somente acontece se as duas partes da ação
considerar que o meio que vão receber é mais útil do que o meio que vão entregar. Caso
o meio que fosse entregue ser considerado mais útil, do que o recebido pelo agente, a
ação de troca interpessoal não se realizará.
Assim o agente A pode oferecer a B um meio que seja considerado útil por B, em troca
B entrega à A o meio R de que tanto precisa para usar na sua ação planejada.
Os dois agentes terão atingido condições mais satisfatórias, o agente A terá adquirido o
meio que precisava para executar seu plano de ação, e atingir o fim que está buscando. E
o agente B adquiriu um outro meio que poderá ser útil para seu plano de ação, e atingir o
fim que está buscando, que é diferente do fim que A busca.
Assim a troca interpessoal resulta na coordenação entre os agentes, que atingem fins mais
satisfatórios excludentes por meio de uma ação que envolve a cooperação entre os dois
agentes. Que disponibilizam meios para os outros agentes executar seus planos de ação,
ao mesmo tempo que recebe de volta deles outros meios que são úteis para seus próprios
planos de ação.3
MOEDA
Moeda é usado como meio de troca entre indivíduos, ou seja, serve como ponte para
empreendimentos onde – antes do surgimento – era dificultado por falta de um
denominador comum. Antes da moeda, as trocas eram feitas de forma arbitrária e, por
isso era impossível se criar uma complexa “estrutura de produção” formada por fatores
de produção como bens de capital, mão-de-obra e terra. Todos estes fatores são
combinados de modo a aprimorar o processo produtivo em cada estágio da cadeia de
produção. E todos estes fatores são pagos em dinheiro.
É mais barato usar moeda do que não usar moeda, ficar no escambo, e ter que descobrir
qual meio em específico o agente B acredita ser útil.
Nesta circunstância o agente A, pode ser que não tenha o meio que B queira, terá que
encontrar outro agente C que tenha o meio que o agente B quer, e adquirir por meio de
troca interpessoal com o agente C o meio que B quer. Mas também pode acontecer que o
agente A não tenha o meio que C quer, e então terá que encontrar um agente D, que tenha
o meio que C quer.
A criação do dinheiro traz outro grande benefício. Uma vez que todas as trocas são feitas
em dinheiro, todas as ‘taxas de câmbio’ ou ‘razões de troca’ são expressas em valores
monetários, de modo que as pessoas agora podem comparar o valor de mercado de cada
bem em relação aos demais. Se um aparelho de televisão é trocável por três onças de ouro,
e um automóvel é trocável por 60 onças de ouro, então nota-se que um automóvel “vale”,
no mercado, vinte aparelhos de televisão. Tais ‘taxas de câmbio’ ou ‘razões de troca’ são
os preços, e o dinheiro-mercadoria serve como um denominador comum para todos os
preços. É o estabelecimento de preços monetários no mercado o que permite o
desenvolvimento de uma economia civilizada, pois somente os preços permitem ao
empreendedor fazer o cálculo econômico*.
PROCESSOS DE MERCADO
São os milhões de agentes, exercendo ações de troca interpessoal. E a partir dessas trocas
interpessoais, geram os preços e os preços demonstram a preferência subjetiva dos
agentes que compõe a sociedade, além disso, transmite o conhecimento aos agentes de
que, outros agentes executaram ações de troca interpessoal no passado, e que foi trocado
por X preço, produto ou serviço. E baseado no preço presente os agentes fazem ações
visando no futuro obter algum lucro.
Por meio das escolhas compradoras, um vendedor obtém prejuízo ou maior lucro pela
venda de seus serviços e produtos, e o processo empresarial de lucro e prejuízo, guia os
vendedores a melhor alocar os recursos escassos de maneira a produzir e vender os
serviços e produtos que melhor atenda as demandas compradoras.
Perdendo clientes o vendedor por consequência terá menos lucro, e até poderá entrar em
prejuízo, o que por consequência poderá levar ele a falência, ganhando mais clientes o
vendedor terá mais lucro, receberá mais unidades monetárias das trocas interpessoais
feitas com os compradores, e por consequência enriquecerá mais do que o vendedor que
não conseguir satisfazer as demandas compradoras.
JUROS
Os juros, para Böhm-Bawerk, não podem ser explicados pela produtividade física do
capital. Imagine que um casal de patos gere seis patinhos daqui a vinte e oito dias (que é
o tempo médio de incubação da espécie) e que cada pato - filhote ou adulto - custe R$
50,00. Então, os seis patinhos excedentes não explicam os juros, pois, em caso contrário,
seria interessante para qualquer um comprar hoje o casal de patos por qualquer preço
menor do que R$ 400,00 para vendê-lo daqui a vinte e oito dias - quando, então, já seria
de oito o total de animais - pelos R$ 400,00. Porém, acontece que as forças de mercado
(entre elas a competição e as expectativas) fariam com que o preço presente dos oito patos
subisse para os R$ 400,00.
Quanto maior a preferência temporal menos disposta estará a pessoa de fazer ações que
demoram mais tempo, e quanto menor a preferência temporal mais disposta estará a
pessoas de renunciar ao fim das ações mais curtas e executar ações que demoram mais
tempo.
Quanto maior a preferência temporal das pessoas na sociedade, menos pouparam, por
consequência a oferta de poupança será menor, em contrapartida o consumo presente
maior, o que causará um aumento da demanda compradora por poupança, ao mesmo
tempo uma oferta vendedora menor de poupança, o que causará um aumento dos juros.
Tendo a preferência temporal da maioria das pessoas diminuído por consequência terá
um consumo presente menor, tendo então por consequência uma demanda compradora
por poupança menor, e um aumento da poupança, resultando em juros mais baixos.
1-DE SOTO, Jesús Huerta. 2013. Socialismo, Cálculo econômico e Função empresarial.
A primeira das frases é a de que o estado é essencialmente um interventor. Essa frase por
si só para qualquer particular seria o suficiente para fazer com que um indivíduo fosse
considerado um grande mal. Pense comigo, diga assim “Pedro é essencialmente um
interventor”. O que você pensa sobre Pedro? Bom sujeito não pode ser.
Vamos falar mais de Pedro. Digamos que Pedro tenha realmente bons motivos para
intervir, seria uma boa que ele fosse um interventor em essência ainda assim? Bem, basta
pensar que um interventor em essência sempre interferirá no curso das coisas ainda que
o curso das coisas não exija intervenção. Haverão situações onde Pedro estará justificado
em intervir, é verdade. Mas se pararmos para pensar, a maior parte das ações precisa ser
voluntária em essência para que haja coesão social o suficiente para se organizar uma
sociedade.
Sendo assim, um interventor por essência faz diversas intervenções negativas que em
muito ultrapassam suas intervenções positivas. E é exatamente isso que acontece com o
estado. O estado interfere nos aspectos econômico-sociais de diversas formas. Para isso,
vale-se de meios que ultrapassam em muito o imaginário do indivíduo. Por enquanto,
vamos nos ater apenas aos aspectos sociais e aos problemas que a própria existência do
mesmo traz, trouxe e pode vir a trazer na vida de todos que estão caminhando nessa
jornada Espero que esteja pronto o leitor para que perceba, entenda e sinta de uma vez
por todas o quão maléfico o estado é em essência e que reveja suas ações toda vez que
cruzarem o caminho de um interventor como esse.
A INEFICIÊNCIA COMPETITIVA DO ESTADO
É plenamente concebível que aquele que nos lê acredita veementemente que o estado é
um bom interventor, um ladrão no melhor estilo Robin Hood que é capaz de mudar o
fluxo da riqueza de forma que beneficie igualmente a todos e que sem sua existência, o
mais pobre seria o maior prejudicado. É possível que acredite que sem estado não há
segurança, educação, saúde e justiça. É possível que acredite sinceramente que
diariamente é beneficiado por esse bom camarada.
Mas vamos refletir por apenas um instante; o que pensaria do estado se fosse esse um
indivíduo? Pense num indivíduo que certo dia adentrou na sua casa e que lhe cobra por
serviços que você não requereu. Pense que esse mesmo indivíduo comece a controlar
aquilo que gasta e comece a te escravizar em uma porcentagem da renda que recebe todo
mês. Como você se sentiria com isso? Isso. com certeza, lhe causaria muita estranheza,
não é mesmo? Então porque não é estranho quando esse mesmo indivíduo faz alguma
dessas coisas com um pedaço de papel o autorizando?
Liberdade é sobre opções, sobre aquilo que nos é possível. A força é o extremo oposto da
possibilidade porque ela fala de uma necessidade imperativa que não dialoga com os
nossos esforços de compreender o mundo. Quando o estado limita nossas ações através
de um monopólio da violência e da justiça, é evidente que mesmo nas melhores das
intenções, longe de criar segurança, a está minando. O estado não tem como ser o protetor
da propriedade privada porque é o primeiro a desrespeitá-la.
Pense num sujeito que lhe dissesse essa frase: “Ora, se eu sou a única alternativa, porque
haveria de ser melhor? Ou ainda que quisesse ser melhor, seria melhor usando-me de que
referencial?” Essa é a genuína mentalidade do estado e a indicação de porque os serviços
estatais são tão desconectados da realidade. E como não poderia ser? Ao optar por
favorecer todos os referenciais a todo o tempo, o estado acabará por satisfazer nenhuma
ou apenas uma parcela destes. Normalmente aqueles que tiverem mais condições de
exercer lobby por sobre a ação do próprio estado, os chamados amigos do rei.
COMO O ESTADO ATRAPALHA O POVO
A próxima frase é a de que o estado mata. E isso é mais comum do que possa parecer.
Vamos contar uma história aqui, do tipo de história que você com certeza já ouviu em
algum lugar, com alguém próximo ou consigo mesmo.
Havia uma garota com um problema em uma de suas pernas, carregava consigo uma dor
excruciante. Quase não conseguia se locomover e seus pais tiveram que levantar a filha
que embora pesasse mais do que quando criança, parecia leve diante do fardo que
suportavam para o hospital na esperança de que lá encontrasse atendimento. Infelizmente
para a família que estamos acompanhando, este hospital fazia parte do nosso Sistema
Único de Saúde (SUS).
Acredito que deva existir uma crença no SUS de que se você marcar a consulta para muito
tempo depois do agendamento, a pessoa pode simplesmente superar aquele status e não
precisar mais do médico, talvez em virtude da cura, provavelmente da morte. E digo isso
porque essa me parece ser a única explicação para que uma garota tenha que esperar 9
meses por um atendimento enquanto sente o mundo se partindo em suas pernas. É a
gestação da indiferença.
A eles, apenas restou se dirigir ao primeiro hospital que pôde e requerer que algum
daqueles seres iluminados, chamados naquela situação de médicos, lhe enxergando como
um ser padrão lhe entregasse alguma resposta padrão que ao menos ajudasse ela com a
dor. Só que o problema das respostas padrões é que elas são incapazes de se comunicar
com a realidade tal com ela é. E a realidade grita. Foi o que aconteceu quando a garota
teve uma reação medicamentosa devido à negligência médica e seu pai que carregava o
peso do mundo teve que carregar o fardo de salvar sua filha.
Sem enfermeiros, sem médicos. Ele e apenas ele teve que salvar sua filha. Um
observador atento poderia enxergar a enfermeira mais próxima com seu smartphone em
mãos ou o médico assistindo o jogo logo ali. E o que mais causa espanto sincero no meio
disso tudo é justamente o quão próximas de nós essas frases estão. Nenhuma dessas frases
causa estranheza de ler. A verossimilhança é mantida e isso poderia ter ocorrido com
qualquer um que use serviços públicos a qualquer momento. E por que isso acontece?
Bem, a resposta pode estar mais aparente do que imaginamos. Pensemos em duas
situações onde um sujeito precise de um serviço médico. Pensamos? Ótimo. Vamos
descartar agora essas duas situações. Iremos usar a minha perspectiva de como as coisas
acontecem. A partir de agora estamos falando de um bilionário dono de centenas de
hospitais no mundo todo. “Mas, como assim? Porque?” Pode ser a pergunta clara que
alguém faria sobre uma afirmação estapafúrdia como essa. Porque eu tenho a força.
Mas não somos também seres assim? Não somos apenas intérpretes parciais da realidade
com informações enviesadas e que tentam resolver diversos problemas através da
mensuração objetiva da realidade? O estado assim nos parece eminentemente humano,
compatível até, não? O ser humano ciente da própria incompletude olhou para o próximo
e encontrou nele a resposta para suas demandas. Eis como a sociedade interpreta
demandas:
Nós olhamos para o mercado, com nossas necessidades e nossas habilidades e refletimos
acerca da possibilidade de satisfazermos algumas das nossas demandas e termos algumas
das habilidades usadas em troca. Isso significa que o mercado não erra? Bem, o mercado
é em si eminentemente humano porque é justamente fruto das interações humanas em seu
estado mais primitivo então é claro que embora seja a soma das perspectivas humanas,
nossas próprias perspectivas são incompletas acerca da realidade, sendo essa soma mais
precisa mas não exaustiva.
Aliás, o estado e o mercado como instituições podem ser levados a última circunstância
quando analisamos seu caráter humano. Veja bem, um ser humano sozinho no mundo
não é capaz de vislumbrar mau ou bom. Tudo o que ele faz é uma inflexão para dentro de
si mesmo. Seus atos são. É somente com a existência de um outro ser que se vislumbra a
possibilidade de haver um parâmetro de correção das ações. É evidente que o mal e o bem
existem no mercado, mas esses pressupostos existem justamente em função da existência
dessas interações.
Isso significa que toda interação é mercadológica? Essa é uma reflexão interessante. Ela
levanta o que há de mais primordial sobre a sociedade. Tudo aquilo que fazemos no nosso
dia a dia é um processo de valoração dos sujeitos de um mundo entre os mundos que ele
poderia escolher. Sendo assim, somos então os substratos de compras diárias dos mundos
em que queremos viver. O estado é o ente de uma razão que utiliza o mundo como
instrumento das suas necessidades primordiais e o mercado é o ente de uma razão do
consenso, horizontal, voltada à satisfação dos interesses de cada um e de cada qual.
E um dos principais instrumentos para isso é justamente a burocracia. Ao criar a
burocracia, o estado está dizendo que você deve fazer o que ele quer nas condições em
que ele quer. Veja bem, já sabemos que o estado não é capaz de perceber o que
precisamos, mas é importante lembrar que ele também não é capaz de perceber a melhor
forma de fazer até mesmo aquilo que ele acredita que precisamos. O estado assim é o não
absoluto, negação dos meios e também dos fins.
Maquiavel em “O Príncipe” já nos afirmou que a maneira que alguém deveria governar
a população seria por meio do medo e da imposição. Esta prática foi adotada ao longo da
história por diversos países, e nos últimos tempos tem sido adotada em todas as ditaduras
da atualidade e da época contemporânea. Na Coréia do Norte, as pessoas são obrigadas a
chorar em um dia pré-determinado pela morte de um imperador, e podem ser mortas caso
se recusem.
O estado assim como um batedor de carteiras diz para os indivíduos “Ou seu dinheiro, ou
sua vida”, e por mais que o governo não saia de um arbusto ou de um beco e coloque uma
arma em sua cabeça tomando todo seu dinheiro, o roubo sistematizado que ele produz
não deixa de ser um roubo, o estado em sua vergonha é mais sutil do que um assaltante,
já que este último assume os riscos e a responsabilidade de seus crimes, e diferentemente
do governo, ele não toma seu dinheiro sobre a promessa de que o defenderá de outros
criminosos, ele não diz que pretende usar o seu dinheiro para você melhor do que você,
ele não te infantiliza desta forma.
Mais do que isso, ao se prostrar desde cedo como um fato na infância através da educação
institucional, nosso processo de socialização passa necessariamente pelos programas que
foram idealizados para a perpetuação da sua própria ideia. Cada geração se então mais
subserviente do que a outra. Em algum momento, mais do que ser a única viável, ela se
torna a única desejável. O motivo para isso é curioso.
Então quando temos apenas uma possibilidade, a preferência é indiferente. Então como
isso pode se dar? É que a noção da viabilidade é apenas uma aparência. Não deixamos de
ter personalidades, um eu interior que possui suas próprias necessidades e fins. Mesmo
ao se chocar com os fins do estado, o indivíduo mantém sua individualidade e mistura
seus próprios fins com os fins do estado conquanto única possibilidade viável. Nesse
sentido, projetamos nossas vontades e desejos de como deve ser o mundo no próprio
estado. Isso resultou na criação da democracia.
A CAPACIDADE DA AÇÃO
Nós somos livres ou somos escravos? Conseguimos escolher e optar por aquilo
que melhor nos satisfaça, ou alguém dita isso para nós? A frase de Spooner nunca fez
tanto sentido quanto no nosso século. A potencialidade da ação é tomada do indivíduo
pelo estado, e ele mesmo determina quais meios e fins nos são possíveis.
Em sua obra intitulada “A revolta de Atlas” Ayn Rand postula uma frase que é em muito
digna de reflexão:
De que adiantaria existir sem agir; se a ação é a força motriz de todas as mudanças
na sociedade e do mundo que nos rodeia? Não devemos nos abalar por conta das tiranias
impostas por esta entidade maléfica, o povo tem capacidade de ação enquanto a ação no
governo está restrita à capacidade de uma parcela de homens armados, mas impotentes
em sua casca humana, para resistir, existem diversos mecanismos de mercado que
envolvem desobediência que podem efetivamente e gradualmente diminuir mais ainda a
potência do estado e estes conceitos serão elucidados posteriormente.
Além disso, temos a própria perspectiva de que a ação violenta do estado em geral é
desconexa com a interação voluntária dos indivíduos, sendo assim, muitas vezes aquilo
que se faz cotidianamente nada tem a ver com a lei em si. Afinal, continuamos a ter
necessidades independente do estado ser incapaz de as suprir. Então como é esse processo
de resolução das nossas necessidades? Esse processo passará por instituições,
movimentos sociais e a política em si. Iremos expor como elas funcionam e então
demonstrar de que forma o estado as prejudica.
Mas as instituições não mudam apenas de dentro para fora. Os movimentos sociais
são responsáveis por modificar os estados de coisas que moldam as instituições, servindo
como mecanismos de enfrentamento sócio-cultural que culminam num processo de
reflexão dos agentes em torno das unidades estabelecidas. Em um cenário de livre
concorrência, os movimentos sociais são bem vindos porque possui enfrentamento
equânime com a unidade e essa relação é simbiótica.
Instituiçõ Movimento
es s
Resistência
Esta
Resistên
Instituiçõ
es
Moviment
Esta
Resistênci
Resistên
Moviment
os
Isso resulta num viés estatista que faz com que até mesmo as mais simples
questões sejam pensadas através do estado e não através dos próprios indivíduos. É essa
a mentalidade estatista, mentalidade essencialmente fascista, relembrando as palavras de
Mussolini:
Pense conosco, existe forma melhor de preservar algo do que através de um mito? As
mais diversas mitologias chegaram praticamente intactas ao longo de milhares de anos e
a razão para isso é o elemento transcendente que carregam que se mistura ao imaginário
criando uma sensação de pertencimento a um mundo maior do que nós mesmos. O estado
cria uma narrativa onde somos todos parte de uma mesma identidade nacional e que essa
identidade nacional ajuda a nos definir. Não somos mais apenas João, Maria, Daniel,
Eduardo, somos brasileiros. E como tais, temos deveres para com aquele que inventou
esses mesmos símbolos. Curioso, não é mesmo?
Bem, vamos investigar isso. Será que a identidade nacional artificialmente criada
é válida? Bem, símbolos são importantes. Eles diminuem de fato o custo de informação
e transladam para o próximo o máximo de informações sobre nós. Nesse sentido pode
parecer que a identidade nacional é importantíssima porque nos traz informações sobre a
nossa própria formação e sobre o processo de socialização pelo qual passaremos. Mas
será que isso é verdade?
Sendo assim, identidade só faz sentido numa visão de baixo para cima. O patriotismo
nacional é uma casca vazia de sentido e acima de tudo, um instrumento de dominação das
massas tal como são, sinceras. Bem, até aqui tratamos o estado como um ente neutro e
até mesmo concebemos um governo de pessoas bem intencionadas. Mas será que isso é
possível?
Poder. Se tivéssemos que traduzir tudo o que o estado é, diríamos que ele é a mais sincera
manifestação do poder na sociedade. Ele não apenas restringe o poder que é
legitimamente devido como o realoca para aqueles que deseja apoiar através da liberdade
dos outros. E o que isso nos diz sobre que tipo de pessoa são os governantes? Os
governantes, em geral, são aqueles que vêem o poder como instrumento para atingir seus
fins. Essa categoria de pessoa ao invés de escolher a liberdade, escolheu o controle. É
sobre alguém que deseja ver seu ideal estabelecido na realidade a todo e qualquer custo.
Seria contraditório que do poder pudesse vir a liberdade, eis que um é ausência de coerção
e o outro é coerção pura.
Então o que isso significa na prática? O que foi ganhado aqui? O que diferencia esses
argumentos ácidos contra o estado de qualquer outro argumento contra o “sistema”? Se
ele é muito maior do que nós, se ele é poder puro, se é por ele e somente ele que podemos
fazer qualquer alteração no sistema, porque qualquer uma dessas coisas importaria? Isso
tudo não é apenas uma utopia? Todas essas perguntas serão respondidas nos próximos
capítulos e acreditamos que passem pela forte perspectiva de que não importa o quão
nefastas as coisas pareçam estar, elas são resultado da ação humana e será através da ação
humana que ela voltará ao seu lugar, ou nas palavras de Rothbard:
Homem. Essa palavra assume a conotação de representar uma categoria, que através de
um exercício reflexivo será concebido como classe. Homem aqui assume um caráter
fortemente atrelado às características que usamos para saber que quando nos referimos a
João, Mariana e a Pedro, estamos falando de pessoas que fazem parte da mesma classe.
É. Essa palavra expressa diretamente dois conceitos, a existência do Homem, algo que se
manifesta no tempo-espaço de forma continuamente presente e mais ainda, em seu
sentido atributivo nos dirá que é infinitamente definido ou ainda indefinido em si. Não
podemos estamentar esse ser porque ele não cabe em nossas mensurações mais simples, Commented [2]: desconheço essa palavra.
passamos a reconhecer o caráter dinâmico e complexo do Homem. Essa busca é até Sei que quer algo relacionado à estamento
mesmo dicotômica, porque a definição do Homem por si só nos fará buscar características
básicas essenciais onde possamos nos apoiar para nos diferenciar. Enquanto a afirmação
do É nos dirá que todas essas afirmações são temporais e limitadas.
Nossa saída? Se tivéssemos uma saída para as definições possíveis do ser, esse seria um
livro de fenomenologia, não apenas um livro de fenomenologia, mas O livro de
fenomenologia. O manual definitivo do homem. Ao invés disso, reconhecemos nossa
distância para com uma referência exata do ser. Trabalharemos com essa indefinição e
vamos para o mundo normativo com a próxima afirmação.
O Homem Age segundo sua Lei.
Age. Essa palavra que já foi abordada no capítulo Mercado e nos diz que o homem é
homem agente, busca os melhores meios para alcançar os fins que almeja.
Segundo. De acordo com, em conformidade para. Assume-se aqui que a ação assume um
caráter de subordinação a essa conformidade.
Sua. Aquilo que lhe pertence. É interessante porque passa a ser um dos atributos do
próprio homem, dono dos seus desígnios e por isso mesmo livre. Autores como Sartre
diriam que somos até mesmo condenados a ser livres.
Lei. Lei é o parâmetro de correção da própria ação. É um estado de coisas almejado, algo
que vai até mesmo para além da valoração do bem e do mal, abarcando aquilo que é justo
e injusto, desejável e indesejável. A lei aqui é o que irá restringir a ação e é onde se
manifesta a individualidade do agente, pois, sem isso teríamos que todo agente nas
mesmas circunstâncias agiria da mesma forma, o que é uma inverdade, eis que possuímos
em nós mesmos uma descrição de personalidade que aceita determinados estados de
coisas e recusa outros.
Como podemos ver, a lei aqui possui um caráter extremamente subjetivo nessa primeira
etapa. Ela se dá a nível individual, bottom-top e possui forte relação com a própria
personalidade do agente. Essas características são as que definem a lei em sua essência e
ao esquecermos disso não estaremos falando da lei em si, mas de uma construção
puramente formal da mesma.
Esse capítulo é sobre a lei e sobre a forma como o estado deturpa a mesma. Mas para
entender isso, precisamos simplesmente desmoralizar a academia explicitando o óbvio;
Sem um elo lógico causal correspondendo a um conteúdo jurídico, temos tão somente
estamentos que são políticos em si mesmos, descrevendo a forma como o próprio agente
vê o mundo e quer que nós vejamos esse mundo e acreditar que isso poderia substituir de
alguma forma um consenso universalmente reconhecível dos agentes é um salto lógico
tremendo.
Direito é consensual e não-consensual.
Qualquer afirmação normativa que tiver pretensões de ser válida deve ser capaz
de perceber que a própria normatividade estará em torno daquilo que é e que não é aceito
pelo indivíduo e que conquanto os elementos universais adquiridos pelos consensos entre
as leis particulares transcendam o próprio homem, qualquer tentativa de privilegiar
determinado conjunto de leis particulares em prol de outras nos assuntos onde não for
possível encontrar consenso será em si mesmo inválida.
Mais ainda, dentro das possibilidades do ser, algumas são dicotômicas, ser justo é não ser
injusto e isso é tudo aquilo que podemos falar sobre a justiça, pois sem essa perspectiva
toda visão que tivermos será a mensuração de uma justiça pessoal que nada diz sobre a
coletividade, um erro tão grave quanto o de ignorar a individualidade. A justiça assim é
muito mais do que entregar a cada um o que é seu, é enxergar os sujeitos como seres de
direito e entender como as interações entre eles criam as leis e as modificam em busca de
um mundo idealmente estabelecido e através daí perceber a lei no universo de
possibilidades normativas que então se abre como já dizia o ditado jurídico:
A percepção de que existe algo em comum em todos os agentes, qual seja a própria
racionalidade, nos dá a perspectiva de que haveriam fins universalmente valorados através da
própria razão. O alcance desses fins então seria um alcance universalmente valorado e dos quais
os agentes não poderiam se furtar de conhecerem. A esse estado universalmente valorado damos
o status de Dever.
Platão iria mais longe ainda e diria enfim que esse status de dever, de busca de um bem
universalmente valorado seria também a busca por uma medida em cada ação, sendo assim,
haveria em todo o agir uma justa medida, uma forma correta de agir em detrimento de outras
tantas erradas e que o buscar disso seria o buscar da ordem em si.
A percepção de que haveria uma medida justa para tudo, fará Aristóteles então
questionar-se das implicações disso e ainda mais, a pensar na questão acerca da identidade. Se há
uma medida justa para tudo, é porque há uma singularidade em cada coisa que dirá e definirá qual
é essa medida a ser alcançada, através da indicação dos fins. Assim, o ser é percebido por si
mesmo e a sua comparação será apenas o encontrar dos elementos da singularidade semelhantes
e diferentes entre os seres mas que nada dirá acerca do ser em si.
Ele ousará ir até mais além e dirá que aquilo que irá nos igualar será justamente o alcance desse
fim bom em si mesmo, chamando a isso de eudaimonia. Sendo assim, todos temos uma
possibilidade para o alcance das nossas próprias medidas e é nessa possibilidade que a ética faz
morada. Essa determinação individual seria de tal magnitude que infinitamente valiosa auxiliaria
o encontrar de uma ordem universalmente valorada e para o qual valeria a pena viver, vida boa.
Com isso, temos que o agir ético é o agir que nos conecta à sociedade como instrumentos de nós
mesmos e que indo mais longe ainda é o que é capaz de nos situar como indivíduos completos
para com nós mesmos.
Somos donos de nós mesmos, donos daquilo que pudermos misturar nosso
trabalho através do primeiro uso e principalmente, os próprios juízos do que é justo e
injusto. Longe do papel teleológico de um arcabouço político, são os indivíduos através
de uma teia de sentido que são responsáveis por mensurar a possibilidade de direito e de
almejar e buscar uma ordem justa. Nessa ética, não há quem se estabeleça por cima do
outro, são todos igualmente valorosos como agentes éticos, eis que partilham da mesma
natureza. A ética aqui é uma ética com fortes valorização do indivíduo que é o juiz e
garantidor de uma ordem que é estabelecida através da observância das consequências
das ações, mais do que buscarmos nossos fins, agora buscamos não impedir que a própria
ordem se estabeleça pela ação justa do próximo.
Kant, de certo, um homem intrigante. O homem que reformulou a metafísica, pondo ela
sob bases diversas. Seu projeto ético está em torno de uma parte da razão que seja
inteiramente voltada ao que há desde antes da experiência em si, uma razão apriorística.
Kant chamará essa parte da razão de razão pura. Kant possui a concepção da razão prática
também que lidará com as questões morais da realidade. Kant dirá que a razão prática
pura será aquela que poderá lidar com os elementos éticos de forma que qualquer sujeito
poderá chegar naquelas mesmas conclusões por si mesmo. Então, ele nos propõe um
exercício, maximizamos as nossas ações e então vemos se essa ação vem de fato da razão
prática pura. A esse exercício, Kant chamou de imperativo categórico.
O que tornou-se o diferencial, o grande insight de Kant então é tentar excluir aquilo que
diferencia a qualquer dois sujeitos para lidar apenas com os aspectos onde encontramos
semelhanças, dessa forma chegando a conclusões universais. Conclusões interessantes e
que afastariam totalmente um empirista (que acredita que as conclusões acerca da verdade
natural/moral será baseada na experiência) como Locke e que se baseiam fortemente nos
apontamentos de David Hume e Francis Bacon (ironicamente um empirista).
Apesar da descoberta interessante como a de Kant, havia homens que estavam prontos a
criticar certas afirmações estabelecidas como a de que não seria possível conhecer o ser
em si. E um desses homens, talvez o mais significativo foi justamente Martin Heidegger.
O que Heidegger quer afirmar essencialmente falando é qual a verdade do ser, seu sentido.
E a sua percepção passará pela separação necessária entre ente e o ser.
É interessante pensar em Peirce porque ele foi um homem curioso. Sua vida no
mínimo excêntrica o diferencia de muitos dos outros filósofos na mesma medida que a
complexidade de seu trabalho. Peirce diria que vemos o mundo através de signos. Esses
signos representam uma primeira instância da interação do mundo, na medida em que são
representações das coisas. Uma espécie de imagem mental que faz correlação com o
objeto na medida que através da razão encontramos significado para essa imagem.
A saída de Pierce pro problema foi perceber 4 coisas que são extremamente
importantes para a construção do conhecimento. São elas:
“Não há nenhuma distinção conceitual que não consista de nada que seja uma
diferença prática.” Procurar citação: The Cambridge Companion to Peirce (Mizak
2004). Isso significa que toda vez que distinguimos um algo de outro algo é em função
do fato que eles possuem diferenças práticas que possam ser percebidas para possibilitar
a distinção conceitual. Pense numa tesoura e numa tesoura sem ponta e a verdade dessa
afirmação fica deveras simples de ser percebida.
O conjunto de coisas que sabemos acerca do mundo são conjuntos de significações e
abstrações da verdade em si, já que só podemos conhecer aquilo que há para ser
conhecido, que é cognoscível. Nesse sentido, aquilo que eu sei sobre o mundo ainda que
através do “senso comum” será essencialmente conectado à própria verdade real. É claro
que em muitas vezes falhamos em perceber coisas simples acerca da realidade que estão
no senso comum e são falhas, mas é o processo crítico desse senso comum que irá resultar
na verdade e o motivo para isso é que não podemos originar a verdade, apenas
transformar nossa experiência em verdade.
Mas como saber que chegamos nessa verdade? Peirce dirá que a verdade é aquilo que
não é disputável, aquilo que por um tempo razoável se demonstra sólido ao ponto
de representar a verdade para aquela comunidade. Isso situa a verdade como algo
dinâmico, como algo que está mudando em função do contexto, capacidade de verificação
da realidade e principalmente do choque com outras verdades.
Bakhtin. É na sociedade que aprendemos a ser quem somos e a consequência disso será
que a nossa consciência é e só poderia ser semiótica, onde a própria matéria prima da
nossa consciência são os signos que usamos para expressar a nossa compreensão do
mundo. (Marx e a Filosofia da Linguagem)
Bakhtin está nos dizendo para percebermos que a nossa própria capacidade de pensar os
signos advém do fato que nós fomos ensinados por alguém, dizendo que a comunidade
comunicativa foi responsável até mesmo pelas nossas mais singelas ponderações sobre a
realidade e até pelo fato que pudemos ponderar em primeiro lugar. Isso faz com que não
consigamos mais pensar o homem fora da sociedade em que nasceu.
8. Reflexões Racionais Comunicativas
● Princípio DE: Habermas percebe que a única forma de possuir uma verdade
pragmática é por uma verdade onde todos os sujeitos podem vir a interferir na construção
da verdade, adicionando suas próprias construções individuais ao plano geral:
● Discurso Ideal: É a situação ideal de fala onde todas as regras necessárias para o
chegar de conclusões morais universalizáveis são atingidas e é possível então falar de
instâncias do dever, normas éticas.
Essa citação de Hoppe na introdução do livro A ética da liberdade nos dá uma boa noção
dos conceitos principais de Rothbard, quais sejam:
Rothbard irá argumentar que a única forma que não irá gerar mais conflitos será
justamente a alternativa onde há direitos de propriedade bem definidos.
Princípio da Não Agressão: É um princípio que orienta a nossa ação em torno de ações
voluntárias e de coordenação entre os sujeitos. Rothbard o define da seguinte forma:
Vimos que a única forma de uma proposição ser universalmente verdadeira ou ainda
verdadeira no sentido pragmático como pensado por Peirce é que ela leve em
consideração a comunidade comunicativa por meio do princípio do discurso, onde os
sujeitos participam como sujeitos ativos da ponderação moral.
● A verdade desta proposição não pode ser negada sem cair em contradição,
dado que qualquer tentativa de fazê-lo teria que ser feita na forma de um
argumento. Daí o “a priori” da argumentação.
Apel fundamentou a necessidade do discurso ao demonstrar que o ato de contrariar as
considerações pragmáticas essenciais acerca da própria argumentação seria contraditório.
● Argumentação não são sons flutuantes, mas uma ação humana, isto é, uma
atividade humana propositada empregando meios físicos – o corpo de uma
pessoa e várias coisas externas – a fim de alcançar um fim ou objetivo
específico: a obtenção do acordo sobre o valor verdade de uma dada
proposição ou argumento.
A argumentação lida aqui como uma ação humana, numa visão misesiana, indica que a
própria escolha de argumentar está carregada de uma valoração, qual seja da escolha de
um agir comunicativo como em Habermas em detrimento de um agir estratégico.
Hoppe aqui está nos afirmando que muito embora possa ter havido um momento de não
concordância, o momento da argumentação é concordância, ainda que seja a
concordância de dois sujeitos quanto ao fato que eles não concordam.
Aqui Hoppe quer afirmar que os pressupostos praxeológicos da argumentação, que ele
vai expor a seguir, são parte do a priori da argumentação e não podem ser como tais
contestados, igualando essas condições ao nível da transcendentalidade e mais
importante, ao mundo da vida.
Aqui Hoppe faz sua grande sacada, Ele estabelece aqui algo como o seguinte: “Estou
vendo que existem essas condições, essas chamadas regras de ação que determinam quais
são as normas legítimas a serem seguidas na comunidade, mas eu reparei que essas regras
de ação para a universalização são exatamente tal como como a autonomia que é descrita
pela autopropriedade rothbardiana.”
Essa correspondência não é puro acaso, que as regras da ação envolvendo a autonomia
sejam a própria autopropriedade, na verdade é que a própria autopropriedade ao ser lida
como direito de autonomia (direito de decisão dos próprios fins) é a expressão mais
sincera do que significa ser dono de si.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
APEL, Karl-Otto. Fundamentação última não-metafísica? In: Stein, ERNILDO; BONI, Luís A. de (Org.)
Dialética e liberdade: Festchrift em homenagem a Carlos Roberto Cirne Lima. Porto Alegre: Editora da
Universidade; Petrópolis-RJ: Vozes, 1993
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro,
2003. v. I. ______. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro,
2003. v. II
Justiça
1. Conceitos
a. Nossas teses passariam pela maiêutica de Sócrates?
Por tal, proponho analisar nesses pontos tão antigos e basilares, a fim de evidenciar não
só a atemporalidade de discurso, da relativamente recente tese libertária, mas também a
flexibilidade de se realizá-lo, seja em um contexto moderno ou não.
b. Céfalo e Polemarco.
Céfalo e Polemarco, defendem uma tese que a justiça se dá respectivamente ao: “dizer a
verdade e restituir o que se tomou” e “dar a cada um o que se lhe deve, fazendo bem aos
amigos e mau aos inimigos”. É importante ressaltar que, ambos aqui se fundamentam em
Simónides de Ceos, importante poeta grego, a qual o próprio Sócrates atribui as
qualidades de sábio e divino, e não se propondo a refutar sua tesa, apenas as más
interpretações feitas por seus colegas, da mesma.
Primeiro, a Céfalo:
Mas essa mesma qualidade da justiça, diremos assim simplesmente que ela consiste na verdade e em
restituir aquilo que se tomou de alguém; ou diremos antes que essas mesmas coisas, umas vezes é justa,
outras injusta? Como este exemplo: se alguém recebesse armas de um amigo em perfeito juízo, e este,
tomado de loucura, lhes reclamasse, toda a gente diria que não se lhe deviam entregar, e que não seria
justa restituir-lhes, nem tão pouco consentir em dizer toda a verdade a um homem nesse estado.
Mais do que salientar a contingência em parte da definição dada, na medida que é
indispensável o uso da sapiência para cumprir corretamente um imperativo, me permito
disto, uma crítica a como o estado, quase sempre, faz do direito um mero arranjo
burocrático, afastando-se inclusive do que a própria população considera justo.
A resposta libertária a esse problema, vem, primeiro, de uma teoria jurídica totalmente
justificada no direito natural, visando unicamente a prevalência da mesma, e segundo, a
interesse dos indivíduos que serão agora tratados como clientes, não mais subordinados.
Mais singelamente, esclareço nesse contexto, uma propensão de alguns libertários a
preferir a common law[1] como regime melhor que a civil law[2], uma vez que essa última
leva menos em conta os fatores particulares. Deixando claro que, no anarcocapitalismo,
cada um poderia escolher um sistema que melhor lhe atendesse.
Polemarco, acontecerá que, para muitos, quanto errarem no seu juízo sobre os homens, será justo
prejudicar os amigos, pois são maus aos seus olhos, e ajudar os inimigos, pois os têm por bons. E assim
afirmamos exatamente o contrário do que fizemos dizer a Simónides.
Sócrates aqui avisa o quão perigoso é seguir por essa definição, ao que nos lembra da
nossa própria falibilidade, fica claro o risco de, em erro, acabar por tratar da forma que
cremos ser devida ao amigo, alguém que, em acerto, entenderíamos como inimigo, assim
vice-versa.
Pode surgir ao leitor a dúvida, “mas e o libertário, ele também acusa o governista, não?”,
veja, é o estadista, seja rei ou político, legislador ou executor, que nos obriga a distingui-
lo, pois é aquele que almeja o poder ou que já o detém, que precisa reafirmar para si e
para os outros, sua posição acima dos demais. Tudo o que fazemos é apontar a
agressividade e ilegitimidade dessa postura, tanto quanto, a imoralidade de se mantê-la
ou advoga-la. Em outras palavras, não dividimos a sociedade, como meio ou fim, nós
apontamos aqueles que o fazem, deixando bem claro que não concordamos com isso.
Sócrates também nos explica que, mesmo que convictos do nosso julgamento, isso não
importaria, pois o justo jamais faria o mal, mas sim, sempre o bem, pois é nele que a
própria justiça se da.
Para responder a isso, é preciso esclarecer que a ética libertária se limita a descrever o
que é legítimo e ilegítimo dentro do que cabe a propriedade privada, ao passo que a teoria
jurídica, nos dá os parâmetros para qual as ações sempre se realizarão no exercício do
direito, e nunca em sua violação. Dito isso, cabe ao indivíduo refinar seus próprios valores
morais e pessoais, culturais e religiosos, para se adequar a uma vida justa. Dessa forma,
qualquer um que em seus discursos ignora o que é cabível eticamente, o que está nos
limites da proporcionalidade, propondo o que já não pode ser justificado, não está falando
sobre libertarianismo, ou respeitando suas bases fundamentais. Indo mais além, afirmo
que, fazer a justiça nos parâmetros que a define, é fazer o bem, inclusive para a parte
criminosa.
Antes de mais nada, fazer o bem não é meramente cumprir a vontade de alguém, ou prover
bem estar material, mas sim, alcançar o que lhe é próprio. Não podendo ser justo a um e
injusto ao outro, é próprio ao homem virtuoso então, por meio da razão, se civilizar,
refinando o agir de maneira a se afastar cada vez mais da barbárie.
c. Trasímaco, o político
Trasímaco dá aquela que é a definição que todo estadista oculta dentro de si, diz ele: “O
que está no interesse do mais forte”. É claro o absurdo de se afirmar isso nos dias de hoje,
afinal, dentro de nossa própria modernidade, buscamos sair do famoso estado de
natureza[4] e viver no domínio do direito, justamente para que não se impere a “lei do
mais forte”, que em suma, nada mais é que a pura violência. Agora, engana-se o leitor se
concluiu até aqui que Trasímaco simplesmente acredita na simples selvageria. Na
realidade, embora o Grego seja conhecido por seus sofismas, o mesmo descreveu
magistralmente a maneira que se dá um governo e a imposição de uma “sociedade
civil[5]”:
Ou seja, para Trasímaco, o mais forte impõe a sua conveniência o que chama de justiça,
e o mais forte dentro de uma sociedade é o governo, logo é ele quem tem a palavra final
sobre o que é justo ou injusto, a preservar seus próprios interesses… É curioso como isso
soa parecido com a visão hobbesiana do estado de natureza não é? “O homem é o lobo
do homem”, bom, ao que parece, tudo o que o Estado conseguiu fazer na prática desde
sempre é designar um líder para a matilha. Em verdade, se ele não deve ser assim, então
por que é? E se ele existe para nos tirar da selva, porque age como a pior das feras? Mas
das várias respostas possíveis que Sócrates poderia ter dado, a qual podem incluir apontar
falácias, exceções ou descrições mais coerentes, etc… Apenas usando de seu impecável
método, a maiêutica[3], forçou seu oponente a aceitar a refutação, sem precisar atacar a
definição dada:
Sócrates — Pois bem! Poderiam os olhos desempenhar bem a sua função se não
possuíssem a virtude que lhes é própria ou se, em lugar dessa virtude, possuíssem o vício
contrário?
Trasímaco — Como poderiam? Queres, por acaso, dizer a cegueira, em vez da vista?
Sócrates — Qual é a sua virtude, pouco importa; ainda não te pergunto, mas apenas se
cada coisa desempenha bem a sua função por virtude própria e mal pelo vício contrário.
Trasímaco — É como dizes.
Sócrates — Posto isto, os ouvidos, sendo privados da sua virtude própria,
desempenharam mal a sua função?
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — Este princípio pode ser aplicado a todas as outras coisas?
Trasímaco — Julgo que sim.
Sócrates — Então, analisa agora isto: a alma não possui uma função que nada, a não
ser ela, poderia desempenhar, como vigiar, comandar, deliberar e o resto? Podemos
atribuir estas funções a outra coisa que não à alma e não temos o direito de dizer que
elas lhe são peculiares?
Trasímaco — Não podemos atribuí-las a nenhuma outra coisa.
Sócrates — E a vida? Não afirmamos que é uma função da alma?
Trasímaco — Com certeza.
Sócrates — Portanto, afirmamos que a alma também possui a sua virtude própria?
Trasímaco — Afirmamos.
Sócrates — Então, Trasímaco, a alma executará bem essas funções se for privada da sua
virtude própria? Ou será impossível?
Trasímaco — Será impossível.
Sócrates — Em decorrência disso, é obrigatório que uma alma má comande e vigie mal
e que uma alma boa faça bem tudo isso.
Trasímaco — É obrigatório.
Sócrates — Ora, não concluímos que a justiça é uma virtude e a injustiça, um vício da
alma?
Trasímaco — Concluímos.
Sócrates — Por conseguinte, a alma justa e o homem justo viverão bem e o injusto, mal?
Trasímaco — Assim parece, de acordo com o teu raciocínio.
Sócrates — Então, aquele que vive bem é feliz e afortunado e o que vive mal, o contrário.
Trasímaco — Não há dúvida.
Sócrates — Portanto, o justo é feliz e o injusto, infeliz.
Trasímaco — Que seja!
Sócrates — E não é vantajoso ser infeliz, mas ser feliz.
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — Por conseguinte, divino Trasímaco, jamais a injustiça é mais vantajosa do
que a justiça.
Trasímaco — Que seja esse, Sócrates, o teu festim das festas de Bendis[6]!
Talvez seja essa a verdadeira saída para o estado de natureza, que o libertário propõe, ao
buscar nas palavras e não nas garras, um mundo melhor. Se o homem é o lobo do homem,
então deixemos de ser lobos, para de fato, sermos homens.
2. Justiça Privada
a. Teoria jurídica
No que tange a justiça em uma sociedade livre, esta seria tratada como qualquer outro
serviço, fornecida pelo mercado, estando sempre submetida à lei de propriedade privada,
tendo como função manutenção dos contratos e resguardar a propriedade privada.
O devido processo legal trata de uma série de normas a serem seguidas, punir qualquer
indivíduo sem seguir todos os critérios é uma ação ilegítima. Em um sistema de estado,
o devido processo legal prevê que ninguém pode ser punido antes de seu julgamento, em
alguns casos indo além, como por exemplo somente depois de dois ou três julgamentos…
Obviamente ele exige que não se pode privar nenhuma das partes do seu direito de fala,
e que sempre que uma parte apresentar um argumento, a outra deve poder retruca-lo.
Outro critério apresentado é de que a decisão nunca pode ser monopolizada somente por
um juiz, sendo assim, o indivíduo julgado sempre deve poder recorrer a 2° instância, além
de nenhuma das partes poderem escolher o juiz que fará qualquer um dos julgamentos. O
leitor atento deve notar que, excluindo o último ponto, que garante que nenhuma das
partes possam escolher o juiz, o sistema de justiça privada pode atender todos os
requisitos, isso mostra mais uma vez como o estado sequer é necessário para executar as
questões mais basilares de uma sociedade.
c. O estoppel
Escrito por Stephan Kinsella, e que pode ser considerado uma complementação da Ética
Argumentativa escrita por Hans Hermann-Hoppe, ambas derivadas jus racionalmente,
tem como base a common law, e é semelhante a Lei de Talião, mas verdadeiramente
fundamentada. A Lei de Talião consiste basicamente na reciprocidade da relação com
crime e pena, a lei diz que o criminoso deveria ser punido em mesma ou semelhante
medida ao dano causado pelo mesmo, e que o executor da punição deveria ser a vítima,
a parte lesada. A lei é popularmente conhecida pela famosa expressão popular:“olho por
olho, dente por dente”, o objetivo da lei era balancear juridicamente as ações dentro de
uma sociedade.
Imagine que uma mulher pouco dotada de beleza quebre uma garrafa de vidro, e então
ataque uma jovem modelo a início de carreira. Veja, a modelo depende de sua boa
aparência para seguir sua profissão, já a agressora, se meramente tiver seu rosto cortado,
sofrerá muito menos prejuízo, logo não seria justo simplesmente “dar o troco na mesma
moeda”, pois além de não representar qualquer “equidade”, de nada beneficiaria, senão
momentaneamente a satisfação um sentimento de vingança a vítima, que continuaria
tendo que lidar com todos os problemas causados pela injusta agressão.
Abordamos agora de forma mais precisa a teoria jurídica propriamente dita, o estoppel.
Como afirma Kinsella no início de seu artigo formulando sua tese:
O autor, de início, explica o propósito da pena, abordando logo depois sobre o que seria
uma punição, além do próprio conceito da aplicação da mesma, como descreve a seguir:
Além disso, Kinsella faz questão de introduzir o coração por trás da ideia de um
impedimento legal contido na ideia de consistência de pensamento, ele explica:
“O insight básico por trás desta teoria dos direitos é que uma
pessoa não pode contestar consistentemente sua punição se
ela mesma deu início ao uso da força. Ela é (dialogicamente)
"impedida" de afirmar a impropriedade do uso da força para
puni-la, por conta de seu próprio comportamento coercivo.
Esta teoria também estabelece a validade da concepção
libertária dos direitos enquanto direitos estritamente
negativos contra a agressão, a iniciação de força.”
É necessário explicar como acontece a punição para o que ele chama de “comportamento
agressivo”, e nesse ponto, resumidamente o autor afirma:
O leitor atento deve ter ideia de como Kinsella discorre sua derivação dessa tese que viria
a ser a teoria jurídica libertária. Tratado como ocorre a punição para o comportamento
agressivo, acredito que seja necessário tratar de argumentos, obviamente inválidos, que
um agressor poderia usar em sua defesa.
Sobre isso, o autor alega primeiramente:
Após isso, Kinsella demonstra outro argumento, também falho que um agressor poderia
utilizar em sua defesa:
Agora, Kinsella aponta um fator extremamente importante para a derivação de sua teoria,
o tempo, ao contrário dos marxistas, os austríacos levam em conta esse fator. Sobre isso,
o autor demonstra resumidamente, mas de forma mais longa que as anteriores o seguinte:
d. A natureza da mediação
Sendo os conflitos entre indivíduos algo inevitável em uma sociedade que precisa lidar
com a escassez de recursos, resolvê-los é essencial para que a boa convivência se
mantenha pacífica e produtiva.
De fato, a teoria legal libertária, dirá qual o direito básico de cada um, como
racionalmente pensar a proporcionalidade e as punições, que se deve seguir o devido
processo legal para se minimizar os erros de um julgamento... Mas acaba aí, não existe
perícia libertária, não existe método investigativo libertário, ou qualquer coisa do tipo, os
fatores materiais e “práticos” por assim dizer, já não estão mais nos limites teóricos e
cabíveis a deduções puramente lógicas. Para servir de ponte entre o que deve ser e como
faremos, estamos acostumados a recorrer a um intermediário, que será isento e imparcial,
mas veja, uma sociedade pode ser composta por apenas dois indivíduos, e se for o caso,
não existe a possibilidade de um terceiro ser o árbitro. Então isso significa que o conflito
não pode ser resolvido? Lógico que não.
3. Os tribunais privados.
O cenário anarcocapitalista é tão mais promissor que, caso você não se sinta confortável
com as avaliações fornecidas pode sem intermédio, realizar as próprias investigações, e
se a empresa responsável pelo tribunal ou pela auditoria, não quiser liberar as informações
que satisfaçam as tuas preocupações, ou que cumpram os teus critérios escolhidos, basta
buscar uma que o faça, ou até mesmo começar seu próprio negócio, atendendo a quem
tiver as mesmas demandas que você, afinal de contas, empreender é uma escolha válida
e louvável.
Talvez uma das últimas preocupações do leitor até aqui, sejam os custos financeiros da
justiça privada, afinal, a estatal é sustentada por impostos, e no anarcocapitalismo, cada
um teria que bancar a si mesmo. Então como um mendigo, ou alguém muito pobre teria
acesso?
O mercado não pode esperar a burocracia do estado, tempo é dinheiro, boas e más
decisões podem arruinar um negócio, e ninguém quer depender de fatores assim. Não é
atoa que é relativamente comum a existência de serviços de arbitragem privada no meio
empresarial. Alguns exemplos de associações com fins de mediação bem sucedidas, que
atuam inclusive a nível internacional são, a Associação Americana de Arbitragem —
AAA (American Arbitration Association) fundada em 1926, e Câmara Internacional do
Comércio — CCI (International Chamber of Commerce) fundada em 1919.
Entretanto alguém pode pensar, “mas essas instituições, como tudo, estão submetidas ao
governo não é? O que garante que sem ele as mesmas não deixariam de funcionar”. Bom,
para tornar as coisas mais interessantes, demonstrarei a seguir, ambientes que funcionam
“livres” de uma autoridade central.
b. A internet
Outra coisa, é que a não são as leis do governo que mantém a internet um local “amigável”
a quem usa. É bem verdade que existem regulamentações, e até serviços policiais
especificamente designados a punir crimes virtuais, mas veja, o real fator de civilização
virtual é o próprio interesse dos criadores de conteúdo em ter seu material visualizado e
divulgado.
Pense comigo, o que motiva o Google a não permitir certos conteúdos em suas
plataformas? Será que sem o estado para proibir pornografia infantil, vídeos de estupro,
sites mal intencionados e criminosos entre outros, a empresa simplesmente iria os
ignorar? É evidente que não, uma empresa precisa zelar por boa reputação para atrair
mercado, assim como, na maioria do tempo, não é o governo que faz o Facebook e Twitter
deletarem postagens, até porque, muito do que é excluído sequer é ilegal, mas vai contra
os interesses do que os donos entendem ser a vontade dos clientes para qual a plataforma
é direcionada.
É a nossa própria evolução de decência que dita os padrões sociais aceitáveis, tanto para
empresas, quanto para o estado, que ao contrário do que se pensa, não é assegurador da
moral, mas assim como qualquer instituição que preze pela própria sobrevivência, precisa
se adequar a tal, para não ser massivamente rejeitada. Prova disso, é que os maiores
responsáveis por combater materiais sórdidos e criminosos, nas partes mais
descentralizadas e anônimas da internet, são especialistas independentes ou de alguma
célula ativista. Não há porque pensar que em um ambiente de livre mercado, estes, não
continuariam a ser incentivados a prestar o mesmo serviço, talvez até recebendo
pagamento para expandi-lo, já que é da própria sociedade, a vontade de se preservar.
c. As relações internacionais
É até bem estranho, mas você já parou pra pensar que não existe um “estado mundial”?
A ONU é só uma de várias associações, qualquer país pode entrar e sair dela a hora que
quiser, e nem mesmo precisa acatar a todas as suas resoluções. Pois é, uma nação se
relaciona com as outras na exata mesma condição a qual os anarcocapitalistas entendem
que os indivíduos de uma sociedade livre o farão, ou seja, através de acordos voluntários
e reciprocidade.
O Sr. Brasil a algum tempo, que mora no bairro América Latina, teve um
desentendimento com a Sra. Inglaterra em decorrência de certo prejuízo que a mesma
acabou tendo ao transitar pela calçada do sujeito. O Sr. Brasil, por sua vez, não acreditava
ser responsável e não estava disposto a pagar qualquer indenização solicitada pela Sra.
Inglaterra, que ficou extremamente furiosa, chegando a ameaçar do uso da força contra o
Sr. Brasil, o Sr. Brasil, também levantou a voz e disse que se ela quiser partir pra
violência, ele também vai. A situação ficou tensa, até que o Sr. Brasil resolveu pedir ao
Sr. Belga, que morava no mesmo bairro que a Sra. Inglaterra, Europa, para mediar a
situação. O Sr. Belga avaliou a situação e disse:
- Bom, Sr. Brasil, era sua responsabilidade cuidar da situação da calçada da sua casa,
então você precisa pagar os danos a Sra. Inglaterra, mas de fato ela foi muito deselegante
e não deveria ter te ameaçado, então o mínimo que ela precisa fazer é te pedir desculpas.
E como toda boa história, o final é feliz, Sr. Brasil pagou para a Sra, Inglaterra o que
devia e ela pediu desculpas por ter se excedido, voltando a se relacionar normalmente.
Claramente, isso só é só uma analogia, tentando se aproximar, para fins didáticos em um
episódio real, conhecido na história diplomática brasileira, como questão Christie[7].
Mas vamos pensar em alguns cenários possíveis que poderiam ter acontecido. Veja, na
época, a marinha real chegou a enviar um navio de guerra para a costa brasileira, e o
nosso Imperador na época, Dom Pedro II estava disposto a responder a mesma altura, não
seria muito difícil essa situação escalonar para um conflito armado, só que, que bem isso
faria para ambos? Nenhum, o Brasil perderia um importante parceiro comercial, assim
como a Inglaterra, um bom cliente e fornecedor, sem falar nos prejuízos com o conflito.
Mais do que isso, a Bélgica não tinha meios para obrigar militarmente qualquer
um a seguir a decisão tomada, e se essa fosse de alguma forma absurda, não só seria
rejeitada pelas partes, como sua execução seria vista como ilegítima pelo resto da
comunidade internacional, comprometendo seriamente a reputação do Rei Belga, o juiz
e de quem a aceitasse. Da mesma forma, como a deliberação foi nitidamente razoável,
mesmo qualquer lado podendo simplesmente se recusar a fazer o que lhe foi solicitado,
seria de quem agisse desse modo, o prejuízo a reputação, que acumularia aos próprios
infortúnios de se manter o conflito sem resolução.
Notas dos Autores
[1] Civil Law, sistema jurídico baseado no direito romano a qual sua essência se dá pela
codificação e fornecimento de leis escritas que devem ser seguidas pelos juízes dentro da
legislação.
[5] Estado Civil, passagem do estado de natureza à sociedade civil, onde os indivíduos
renunciam à liberdade natural e à posse natural, concordando em transferir a um terceiro
– o soberano – o poder da criação e aplicação de leis, tornando-se autoridade política.
Referências Bibliográficas
A República - Platão
Muito embora o leitor já tenha sido agraciado com uma básica narrativa sobre a liberdade,
faremos um pedido de que, por hora, se esqueça das informações anteriormente
apresentadas e, com suspensão de descrença, se concentre no que virá a seguir para que
possa entender o que está sendo apresentado. Imagine um quebra cabeças. É certo que as
peças iniciais sobre a liberdade o foram apresentadas, mas, agora, lhes serão dados alguns
motivos e algumas peças complementares para que possa terminar de montá-lo assim
como serão apresentadas algumas teorias sobre a liberdade. Então, preparado? Esperamos
que sim, pois, por agora, a liberdade começará a ser dissecada, parte por parte, pedaço
por pedaço.
O que é a liberdade? Como ela nasce e se finda nos homens? Como conciliar propriedade
e liberdade? E, por fim, o que o estado faz com a liberdade dos homens? Questões como
essas são essenciais para descrever uma sociedade libertária, afinal, não somos nós
aqueles que pregam a liberdade, mesmo que negativa? Somos e é nesse ponto que iremos
nos concentrar por agora; o conceito de liberdade. Esse conceito não assume aqui a
mesma conotação de livre-arbítrio, liberdade de vontade, ou simplesmente livre
deliberação, pois não existe tal coisa como liberdade irrestrita, e, como defendemos uma
sociedade ética, não poderia ser um termo, tal que englobasse violações dessa ética, e
ainda assim fosse tido como aceitável.
Mas então, o que significa liberdade para um libertário? Qual a melhor concepção de
liberdade e quais limitações são estas que são inerentes a todo homem? Primeiramente,
as tais limitações de liberdades, naturais a todo homem, são as limitações que habitam o
campo das limitações físicas, biológicas, ou até mesmo limitações mentais, cognitivas.
Por exemplo, e apenas para ilustrar a questão, não podemos pensar, ao menos atualmente,
em um homem que por sua livre deliberação de vontade possa dar um salto e alcançar a
lua.
Agora, falemos sobre a concepção comumente aceita de liberdade, o modelo que mais
frequentemente é idealizado.
Sobre a Liberdade Positiva
Comecemos então falando sobre a liberdade positiva, a liberdade que, pelo menos neste
livro, trataremos como sendo algo como o oposto da concepção de liberdade negativa 1.
Essa concepção se trata de uma liberdade de agir fora de quaisquer limites, uma liberdade
que se dá pela capacidade de se auto direcionar, sem restrição alguma, que se amplia ou
se diminui de acordo com as vontades do indivíduo, nas palavras de Isaiah Berlim:
"O sentido 'positivo' da palavra 'liberdade' deriva do desejo por parte do indivíduo em ser seu próprio
mestre. Eu desejo que minha vida e minhas decisões dependam de mim mesmo, não em forças externas de
qualquer tipo."(BERLIM, Isaiah, Four Essays On Liberty, 2002)
E qual o problema com essa liberdade para um libertário? Bom, essencialmente, defender
tal concepção de liberdade implica, em alguma instância possível, em defender também
possíveis violações de outros indivíduos alheios a si mesmo e essa liberdade, por mais
tentadora que seja, é também uma possível fonte, ao menos em teoria, de limitações de
iguais liberdades em outros indivíduos. Vejamos por exemplo o caso de um sequestro,
tomemos por sinais, o indivíduo que sequestrou chamaremos ele de X, e o indivíduo que
foi sequestrado o qual chamaremos de Y. X amarrou Y e o levou a um celeiro em algum
local isolado, no qual está o mantendo em cárcere.
Nesse caso, evidentemente X exerceu sua plena liberdade positiva, ao, sem quaisquer
restrições, alienar a liberdade positiva de Y, que agora se encontra limitado, por conta da
liberdade positiva de X. Claro que esse é apenas um caso de exemplo, mas não é difícil
encontrar vários outros possíveis exemplos do que uma liberdade ilimitada e irrestrita
causaria (tomando aqui ainda limitações físicas).
E essa liberdade, claro, é também um possível atentado contra as concepções éticas para
um libertário, pois se todos podem fazer tudo a qualquer momento, não há sequer como
pensar em um direito de propriedade privada, o qual é essencialmente fruto de liberdades
1
Estaremos utilizando um conceito relativamente bem definido sobre liberdade
positiva e negativa, muito embora, filósofos como John N. Gray tenham defendido
“Eu sou normalmente dito ser livre ao nível em que nenhum homem ou grupo de homens interferem na
minha atividade. Liberdade política nesse sentido é simplesmente a área em que um homem pode agir
dentro não obstruído por outros. Se eu sou prevenido por outros de fazer o que eu poderia de outra forma,
eu sou em certo nível não livre; e se essa área for retraída por outros homens além de um certo mínimo, eu
posso ser descrito como sendo coagido, ou, talvez, escravizado” (BERLIM, Isaiah, Four Essays On Liberty,
2002)
Primeiramente, cabe a nós entender que, a liberdade, agora tomada como uma concepção
mais geral, de liberdade de vontade, não é algo a ser dado, ou algo a ser construído, a
liberdade de decidir existe em cada momento da vida do ser humano, é algo fundamental
e basicamente elemento intrínseco a qualquer ser humano racional, principalmente numa
racionalidade essencialmente prática.
A liberdade humana surge no seio de qualquer decisão racional, pois, essencialmente,
somos seres que são colocados constantemente em situações de decisão, situações de
possibilidade, situações essas que nos forçam a agir de determinadas formas, ou de
deliberar sobre formas de agir em determinados casos. Tome por exemplo o caso de
alguém lhe perguntar se prefere café puro ou com leite. Mesmo um adepto do
determinismo teria de fazer essa escolha pois ele não poderia simplesmente dizer
“HAHA, eu sou adepto ao determinismo físico epifenomenalista e vou esperar que a
causalidade decida por mim". A pessoa poderia ficar ali durante todo o tempo de vida e
ainda assim não receber uma resposta.
Aqui vemos a necessidade de uso de nossa racionalidade prática para escolhermos entre
diferentes possibilidades, as tornando verdadeiras. Mesmo que o determinismo fosse
verdadeiro, não é possível conceber um modo de tornar esse aspecto da experiência
menos verdadeiro. Nas palavras de Searle:
“Liberdade humana é apenas um fato da experiência. Se nós quisermos alguma prova empírica desse fato,
nós podemos simplesmente apontar o subsequente fato de que é sempre nossa responsabilidade falsear
quaisquer previsões que alguém disponha a fazer sobre nosso comportamento. Se alguém prevê fazer algo,
eu posso muito bem é fazer outra coisa. Agora, esse tipo de opção não está aberto a geleiras descerem
escostas de montanhas ou bolas rolando abaixo um plano reclinado ou os planetas se movendo em suas
órbitas elípticas.” (SEARLE, John Rogers, ‘Minds, Brains and Science’, 2003)
E então podemos, por fim, entender como a concepção de liberdade apresentada agora e
a concepção de liberdade negativa diferem em definição, mas, não são de nenhuma
maneira excludentes.
Mas essa concepção geral não é basicamente o mesmo que a liberdade positiva? Não
necessariamente. Essa concepção geral é apenas uma abstração existente na própria
racionalidade e quando falamos de liberdade positiva, geralmente o fazemos pensando a
nível social, ou ao menos, a nível individual dentro de uma sociedade, embora isso não
pareça fazer muita diferença, é crucial para que possamos enxergar a liberdade
(positiva/negativa) como essencialmente um modo de agir dentro da sociedade, e não
apenas como a fundamentação da liberdade (que é a concepção geral de liberdade de
vontade).
Aproximando a Liberdade de Vontade da Liberdade Negativa e Propriedade
Qual outra forma melhor de sociedade senão a que visa valorizar e conciliar a liberdade
de vontade de um indivíduo com; o produto de seu trabalho livre e deliberado, sua
apropriação, seu homesteading, e tudo que ele pode fazer dentro dos limites objetivos
desse produto, desde que não interfira na também valorizada apropriação de outros seres
humanos? A liberdade negativa para libertários, portanto, não é apenas um fato, é também
um ver social que busca conciliar a deliberação de vontade de um, aqui expresso como o
produto de seu trabalho e suas relações sociais, para com todos.
Propriedad
e
Privada
Mas por que isso se dá? Simples, o estado, com sua suposta “defesa” a propriedade e ao
mercado, acaba por simplesmente violá-los. O que o estado em essência é?
“O que é o estado? O estado, nas palavras de Oppenheimer, é "a organização dos meios políticos"; é a
sistematização do processo predatório sobre um determinado território [04]. Pois o crime é, no máximo,
esporádico e incerto; já o parasitismo é efêmero e a coerciva ligação parasítica pode ser cortada a qualquer
momento por meio da resistência das vítimas. O estado, no entanto, providencia um meio legal, ordeiro e
sistemático para a depredação da propriedade privada; ele torna certa, segura e relativamente "pacífica" a
vida da casta parasitária na sociedade “ (ROTHBARD, Murray, A Anatomia do Estado, 2009)
Como pode uma instituição que se diz defensora da propriedade e do mercado, depredar
e alienar as propriedades dos indivíduos? Seja com cobrança de impostos, seja com
expropriações coercitivas de propriedades legítimas, seja com ameaças de violência para
aqueles que o desobedecem (em alguns casos com o efetivo uso da violência), seja com
intervenções econômicas na propriedade de indivíduos e seu direito livre de escolher o
que fazer com ela, tal como excessivas regulações e muros burocráticos sobre o mercado,
o estado continuamente possui formas (e encontra novas formas) de espoliar indivíduos
pacíficos, alienar sua vontade e infringir danos profundos na sua liberdade negativa,
demonstrando-se incompatível com a liberdade negativa.
Concluímos, portanto que, como defensores da liberdade, uma liberdade que pende tanto
a nós mesmos, quanto ao próximo, libertários são naturalmente incompatíveis com a
existência do estado. Bom, agora que chegamos aqui, para que possamos continuar, irei
voltar na questão da liberdade positiva, e apresentaremos, dessa vez, algumas críticas
mais concisas a mesma, de modo a demonstrar a fraqueza de uma concepção de liberdade
assim.
Primeiramente, iremos demonstrar, com argumentos, o motivo da liberdade positiva ser
socialmente nula, ou seja, incompatível com qualquer defesa de uma liberdade para todos.
O motivo, é bem simples, a liberdade negativa, como antes dito, é a liberdade
universalizável, uma concepção de liberdade perfeitamente compatível com a sociedade
(e não somente uma libertária), pois permite que todos os indivíduos se expressem dentro
de seus próprios limites de ação, uma liberdade que não interfere na dos outros.
Liberdade negativa é agir conforme sua própria vontade, mas dentro de certos limites,
estes que podem variar, desde a integridade de alguém, até, no caso de uma sociedade
libertária, a propriedade privada de outrem.
Agora que temos essas duas concepções de forma resumida; podemos nos concentrar em
pensar sobre a questão que foi apresentada com um exemplo. Tomemos que, em certa
sociedade anárquica, seja aceita a liberdade positiva e agora todos podem fazer o que
quiserem. Bom, é evidente que, nessa sociedade, no exato momento em que alguém
resolvesse danificar a vida de outras pessoas, ou as suas posses, essa atitude seria um ato
completamente legítimo. Porém, reflete-se, dentro de algum tempo, e começa-se a
perceber que, estão ocorrendo certos assassinatos, sequestros e agressões com as pessoas
pacíficas dessa sociedade de forma exagerada, e decidem que agora, todos os que
quiserem violentar ou ferir outras pessoas, terão de ser expulsos dessa sociedade (seja por
métodos igualmente bárbaros, seja por meio de ostracismo) Dentro de algum tempo após
esse novo acordo, as pessoas agora podem viver em paz. Bom, mas então, o que podemos
tirar do exemplo acima? Primeiramente, vamos analisar o que ocorre como primeiro caso,
com a liberdade positiva dessa sociedade. Os indivíduos, estavam sendo alienados de suas
vontades, ou seja, indivíduo X, estava alienando a vontade do indivíduo Y, coagindo,
restringindo, ou até mesmo cessando sua liberdade positiva.
O que isso nos diz? Simples, indivíduo Y agora não poderia exercer mais sua liberdade
positiva, em detrimento do exercício da liberdade positiva de X, está criada uma situação
onde prevaleceu o mais forte, e para o mais fraco lhe sobrou apenas uma liberdade
negativa, fruto de limites colocados coercitivamente por X. Algo como isso:
LIBERDADE
POSITIVA X
Y
LIBERDADE
Y NEGATIVA
X
Agora que vimos que a liberdade negativa, existiu mesmo com a idealização de uma
liberdade positiva, ao menos para o lado mais fraco do conflito, começamos a ver o
problema de uma liberdade positiva. Mas, não somente isso, agora veremos também o
que ocorreu, como instância de ação da sociedade, a reação a essa liberdade positiva. Os
indivíduos dessa sociedade, prezando pela ordem acima do caos, resolveram adotar suas
próprias medidas para conter tais casos de violação de pessoas inocentes (como
mencionado, a solução poderia envolver ostracismo ou remoção por meio de coerção), e,
portanto, agora os indivíduos contém uma limitação socialmente incentivada para que
não pratiquem atos desse porte.
Agora também pudemos ver que, em essência, após as mudanças dessa sociedade, com
as novas normas morais implementadas, instaura-se também um limite à liberdade
positiva, e então, como podemos dizer que uma liberdade que se propõe a ser irrestrita,
que esta seja restrita socialmente? Não podemos, a liberdade, que uma vez foi concebida
como positiva, agora se demonstra, em alguma instância, negativa. Creio que agora que
dissecamos a questão das falhas gerais da liberdade positiva, temos o suficiente para
descartá-la como caótica e socialmente insustentável, e portanto, podemos prosseguir
com nossa análise da liberdade.
Pois bem, temos que a liberdade positiva é falha, e agora, esmiuçaremos também alguns
modos de como o estado controla sua vida, e interfere na sua liberdade, não precisamos
ir longe para refletir sobre isso, veremos coisas do próprio Brasil.
2
A liberdade de expressão, embora possa ser concebida de formas positivas, não
será tratada neste capítulo como tal, pois existe em uma instância totalmente alheia a
quaisquer limites físicos que a liberdade positiva e negativa poderiam se instaurar.
libertários, pois as violações a essa suposta integridade mental que advém de “ofensas e
discriminações”3 é punida com restrições reais a liberdade de expressão física do
indivíduo.
Impostos e seus custos jurídicos positivados: No ramo empresarial, existe outro fator
sério que é a limitação da liberdade sobre a propriedade, uma violação clara sobre o
indivíduo, na forma do imposto, nesse caso específico, o imposto sobre as empresas4,
onde as consequências de se rebelar (sonegar) a esse ato tirano de cobrar tributos sobre
empresas são variadas, indo desde a cobranças de multas com juros altíssimos (que
acarretam também em outros problemas, caso sejam ignorados), até confiscos de
propriedade e bloqueio de fundo monetário.
Agora, o leitor pode também pensar; “mas é liberdade negativa da mesma forma, apenas
está sendo imposta pelo estado”. E é justamente por isso que não se pode ser aceito, a
liberdade negativa para um libertário, é fruto de uma organização voluntarista de
sociedade, baseada na ética de propriedade privada e o estado, por sua vez, é uma
instituição criminosa e impositiva, que demarca arbitrariamente seus territórios, e trata
como gado seus prisioneiros. Qualquer limite imposto por uma instituição assim deve ser
veementemente combatido e repudiado.
Agora, falaremos um pouco sobre a liberdade de expressão, qual a diferença para com as
liberdades positiva e negativa, por que deveria ser categorizada de maneira aparte, e quais
são seus limites e suas arbitrariedades.
Agora, tratemos de falar sobre a liberdade de expressão. Ela aqui se define, não
como uma ação comum, como se mover ou comer, mas como uma ação comunicativa ou
3
Ainda no campo da ofensa a liberdade de expressão, existe algo que pode ser
claramente descartado como arbitrário, mas ainda assim é mantido como crime capaz de
ser punido, falaremos sobre a arbitrariedade de ofensas e discriminações após o ponto
sobre a liberdade de expressão.
4
Note que, pela defesa verdadeira dos direitos de propriedade, apenas considero
aqui as empresas legítimas, que não possuem ligações corporativistas com o estado,
empresas que foram fundadas e são mantidas de formas legítimas.
monológica, ações que expressam idéias, pensamentos e opiniões. E então, tomemos que,
embora a liberdade de expressão seja uma das possíveis instâncias das liberdades gerais,
positivas, e negativas, ela está em uma categoria especialmente diferente, pois, mesmo
com tais correlações, ela possui propriedades únicas que a tornam essencialmente
diferente das ações causais não comunicativas.
Um exemplo é quando se conversa com alguém. Neste ato existe uma inerente exposição
de opiniões entre os sujeitos do discurso, exposição essa que pode ser realizada até mesmo
através de ofensas, mas, ainda assim, nenhum deles está violando a propriedade privada
do outro, e sim partilhando locuções verbais carregadas de intencionalidade. Agora,
quando temos dois indivíduos brigando em um bar, a situação começa a se demonstrar
diferente, pois, agora, ambos estão desferindo golpes uns nos outros, violando suas
propriedades. Essa distinção, parece ser apenas uma questão superficial, mas é essencial
para que possamos compreender os limites da liberdade de expressão, em relação a
liberdade negativa advinda da propriedade privada.
Tomemos então alguns exemplos, bem como uma explicação da forma como eles
efetivamente interagem de formas causais e objetivas nas pessoas, e suas propriedades.
Marcelo tinha uma rixa com Diego, e então Marcelo mandou que duas pessoas, pagas
por ele (vamos os chamar de X e Y), matassem toda a família de Diego.
Como pudemos perceber, Marcelo, diretamente5, não causou dano algum a Diego ou sua
família, apenas X e Y, porém, ainda assim Marcelo foi o responsável causal pelo estado
da família de Diego, pois dos atos dele, causaram se os efeitos que levaram a família de
Diego a ser assassinada (por X e Y), ambos, Marcelo, X, e Y, são os responsáveis por
esse crime, ambos são violadores de propriedade, e precisam ser punidos.
‘Carlos quer extorquir Maxwell, e então Carlos ameaça sequestrar e ferir a irmã de
Maxwell, Maxwell, por sua vez, ignora os “pedidos” de Carlos, e segue em frente. Por
conta disso, Carlos sequestra a irmã de Maxwell, e pede um resgate.
Nesse caso, o que temos que perceber é que, ainda que Carlos, pelo menos no início,
embora não houvesse feito mal algum a ninguém, apenas incitado que cometeria6 algo, e
houvesse realmente o feito, ainda poder-se-ia incorrer em punições. Os crimes nesse caso,
foram tanto a ameaça, quanto a ação posta em prática, o fato dele ter realmente feito algo,
e o de considerar atos como aquele legítimos durante a ameaça per se, vemos que esse é
mais uma das instâncias que se classifica como caso de borda.
1. Toda expressão não diretamente causal, no sentido que exista uma interferência
direta de 1 ou mais agentes alheios a quem profere, ou do resultado de suas ações (de
proferir), mas que causa ainda assim uma violação ética, é um caso de borda.
5
Em um sentido bem estrito, diretamente aqui denota uma ação direta do ator,
sem nenhuma interferência externa.
6
Esse caso, configura um caso de borda, pois as conclusões a serem tiradas dele
estão sustentadas em cima de um curso de ação que Carlos julgou como legítimo,
dentre todas as possibilidades de deliberação prática, o sequestro e a tortura foram
considerados por ele válidos, e, embora não se possa saber se Carlos vai ou não
fazer o que disse, pois Carlos, até o momento, não havia realmente ferido ninguém,
por conta de tais ameaças, é possível se valer da força para impedi-lo.
Agora que vimos um pouco sobre os casos de borda, vamos falar das arbitrariedades que
o estado faz com a liberdade de expressão, constituindo seus próprios casos de borda,
porém sem relações de causalidade objetivamente analisáveis, ou mesmo defensáveis.
O estado, porém, não respeita a questão da causalidade que pode ser obtida de modo
objetivo, ele impõe os próprios limites, cujos quais acha necessários às situações que
julga. Ao fazer isso, ele reduz a liberdade de expressão, não de modo justo ou ético, mas
de modo a obter poder de julgamento arbitrário sobre os casos que ele julga excepcionais,
seja por interesses como instituição, seja por interesses que julgam-se de interesse
coletivo.
Poder-se-á falar sobre alguns casos que o estado julga como excepcionais, para que
possamos traçar algum paralelo sobre sua arbitragem.
Gretzel era um homem facilmente irritável e se vestia de forma vulgar, certo dia, ele
encontra uma moça de cor escura em um bar, Jéssica, e após algum tempo de conversa,
ela diz algo que o deixa ofendido, sobre a vulgaridade com que ele se vestia, insinuando
que pessoas como ele não deveriam frequentar aquele tipo de bar (Gretzel não era um
homem dotado de muitas riquezas de fato, mas ainda tinha sua dignidade), e então, ele
desfere uma ofensa a raça de Jéssica, uma ofensa relativamente leve, mas resultado de
um ato que tentava restaurar um pouco de sua dignidade.
Após ser ofendida, Jéssica vai até uma delegacia e faz uma denúncia contra Gretzel, que,
por sua vez, é encarcerado pelo estado, respondendo por racismo7.
Nesse exemplo, Gretzel se defende das acusações de Jéssica, porém, ao mesmo tempo,
desferiu afirmações contra a raça (conjunto arbitrário de pessoas definido pela cor de
sua pele) de Jéssica, que o levou a ser preso, acusado de cometer um crime inafiançável.
7
Para melhor tipificação, Gretzel ofendeu a raça de Jéssica em um ato de fúria, ao
invés de ofender apenas a cor de Jéssica. Racismo se tipifica pelo estado como crime
inafiançável.
Esse caso definitivamente não é um caso de borda, e, mesmo tirando-se as ofensas
desferidas por Jéssica, digamos assim, mesmo se Gretzel tivesse apenas simplesmente
ofendido sua raça, ainda seria um julgamento arbitrário, além de um julgamento
incompatível com a ética libertária8. Arbitrário pois, na última instância da vontade, não
há como apontar que uma ofensa possui relação de causalidade na deliberação de agir de
um indivíduo, não há como dizer que, por conta de uma ofensa, X ou Y ficarão ofendidos,
ou mesmo se isso sequer iria importar, já que, como anteriormente dito, não existe
violação de propriedade neste ato.
Andrei xinga Fernandino, que por sua vez, o leva a ser preso por cometer um crime de
Ofensa Contra a Honra.
Nesse caso, Andrei apenas xingou Fernandino, mas existe um limiar objetivo que pode
ser extraído em xingar alguém? Veja, digamos que André tenha xingado Gordinez, que
por sua vez era seu amigo, e tomou a ofensa como algo bobo, e até divertido, digamos,
Gordinez também trocou alguns insultos com Andrei, ambos são velhos amigos. Qual a
diferença qualitativamente objetiva entre Andrei ter xingado Fernandino e Gordinez?
Simples, a subjetividade emocional de Fernandino, algo que não poderia de forma alguma
servir de parâmetro objetivo para um julgamento não arbitrário, pois veja, se Gordinez
relevou a ofensa, por que motivos Andrei poderia ter pensado que Fernandino não o faria
também? Ou mesmo que o leitor argumentasse sobre a amizade, também poderia-se dizer
que Gordinez e Andrei se conheceram justamente por conta de uma troca de ofensas,
talvez, num jogo de sinuca ou algo assim.
8
A ética libertária busca apenas lidar com crimes materiais, o que não se encaixa
de forma alguma em meras ofensas sem efeito causal que incorre em violação de
propriedade.
Muito embora isso não signifique que Gretzel, caso tivesse ofendido ela de forma
realmente discriminatória e não defensiva, devesse sair disso impune, uma sociedade
voluntarista libertária tende a ser discriminatória com os que assim merecem (no
julgamento moral das pessoas é claro), ou seja, Gretzel, e quem mais fosse, digamos
assim, “babaca”, seria ostracizado da sociedade (como Hans-Hermann Hoppe
costuma dizer, ‘fisicamente removidos’).
A situação, além de arbitrária, é incompatível com os princípios libertários, uma vez que
a subjetividade emocional, no que tange a não gerar violações de propriedade
objetivamente definíveis. Agora que temos essas informações, podemos entender os
casos de arbitrariedade/antieticidade libertária de julgamento, dentro dos seguintes
pontos:
Os casos de borda, como assim foram chamadas as instâncias de ação que ultrapassam
os limites considerados eticamente aceitáveis para determinadas comunicações,
constituem um legítimo limite sobre a liberdade de expressão, e com tais limitações
sociais sobre esse modo de agir, ela se situa, portanto, compatível com concepções
negativas de liberdade.
Agora, cabe também sobre algumas instâncias de quebra desses casos de borda, falar
sobre como elas devem ser tratadas, quando ocorrem. Primeiramente, falemos sobre as
ameaças, como anteriormente dito, casos em que o ator profere afirmações, que contém
em si mesmas determinadas legitimações de possíveis cursos de ação, que são anti éticos
ao ver libertário. Tomemos como exemplo uma ameaça de morte, indivíduo X, sobre
determinadas circunstâncias, digamos assim, com uma corda, ameaça individuo Y de
morte, esse individuo Y, então, pode se defender de X por meio do mínimo possível de
violência.
Digamos assim, que nesse caso, esse limite venha a ser simplesmente tomar a corda das
mãos de X, utilizando-se de uma arma, por exemplo (uma situação de forças claramente
desproporcionais, porém ainda assim possível). Porém, Y resolve, ao invés de apenas
ameaçar X para que largue a corda, atirar e matá-lo. Y foi claramente desproporcional, a
diferença de forças era notável, e a situação poderia ter se resolvido de forma diferente,
nesse caso, Y se torna um agressor, e deve ser punido.
Como acabamos de ver, nesses casos onde a liberdade de expressão ultrapassa seus
limites, ela deve ser punida, pois se comporta em âmbito social como uma liberdade
negativa (uma extensão da mesma, que se comporta de forma diferente em várias
instâncias), porém, tal como falado no tópico sobre a liberdade negativa, não devemos
aceitar todas as formas de limitação a essa liberdade, pois, como libertários, apenas nos
valemos de limites racionalmente justificáveis, de modo ético, e não meramente
arbitrário, e, como antes exposto no tópico sobre arbitrariedades estatais, reforço que o
estado, com suas leis positivadas, não possui legitimidade para julgar quais formas de
liberdade de expressão deveriam ou não serem limitadas em uma sociedade.
Dever-se-á notar que, quando afirmo que o estado é um delimitador de liberdade negativa,
isso per se não se aplica a ele, que é tal como uma instituição que, por meio da força e do
poder social nele depositado (a confiança das pessoas nessa instituição), ele ganha então
um status tal como possuidor de liberdade positiva, e nessa liberdade, ele acaba utilizando
da força para delimitar a liberdade de outrem.
Conclusão
Como pudemos ver neste capítulo, a liberdade assume várias formas, sejam elas positivas,
sejam negativas, ou sejam instâncias especiais da liberdade que se valem através da
comunicação ou monólogo. Todas essas formas de ser da liberdade, fazem parte do que
somos como humanos, do que somos como seres livres e racionais, e do que somos como
seres sociais, a liberdade que temos, é um aspecto intrínseco a nossa racionalidade, um
fato prático de ser humano.
Do Tangível ao Intangível
De modo que, por fim, resta algumas indagações: O indivíduo tem direito exclusivo sobre
tal propriedade imaterial?; Ou teria a lei que amparar esses direitos? A partir de
questionamentos comuns a estes, discorrerá-se sobre.
Para facilitar nossa comunicação, doravante, Propriedade Intelectual será referido como
PI.
Antes de tudo, faço uma atividade recursiva e questiono: O que torna o tangível passível
de apropriação? A resposta é escassez. Um ponto de inflexão mostrará que é a escassez
desses bens – isso porque a finitude dos elementos nos leva ao fato de que podem haver
conflitos; visto que duas ações sob o mesmo recursos escasso com propósitos diferente
são excludentes. Assim, a função social e ética fundamental dos direitos de propriedade
é prevenir conflito interpessoal quanto a recursos escassos. Acerca da ética, Hoppe diz:
Apenas porque existe escassez existe um problema de formular leis morais; apenas se os bens são
superabundantes (bens “livres”), nenhum conflito quanto ao uso dos bens é possível e nenhuma
coordenação de ação é necessária. Consequentemente, disso segue que qualquer ética, corretamente
concebida, deve ser formulada como uma teoria da propriedade, ou seja, uma teoria da atribuição de direitos
de controle exclusivo sobre meios escassos. Só assim se torna possível evitar conflitos até então inevitáveis
e sem solução (HOPPE, 1989, p.239).
Direitos de propriedade devem ser demonstravelmente justos, bem como visíveis, porque eles não podem
cumprir sua função de prevenir conflitos a menos que sejam aceitos como justos por aqueles afetados pelas
regras. Se os direitos de propriedade são alocados de maneira injusta, ou simplesmente agarrados à força,
é como se não houvesse direito algum; é novamente o poder contra a justiça, isto é, a situação anterior aos
direitos de propriedade. Mas como os libertários reconhecem, seguindo Locke, é apenas o primeiro
ocupante ou usuário de tal propriedade que pode ser seu dono natural. Apenas a regra do primeiro ocupante
garante uma alocação ética e não arbitrária de propriedade sobre recursos escassos. Quando direitos de
propriedade sobre meios escassos são alocados de acordo com a regra do primeiro (KINSELLA, 2017,
p.26)
Acerca da PI
A propriedade intelectual é um conceito amplo que cobre diversos tipos de direitos legalmente reconhecidos
sobre algum tipo de criatividade intelectual, ou que estão de alguma forma relacionados a idéias. Direitos
de PI são direitos sobre coisas intangíveis – sobre idéias, conforme expressas (direitos autorais), ou
conforme materializadas numa aplicação prática (patentes) (KINSELLA, 2017, p.9).
Como dito anteriormente, o direito à propriedade sendo definido como direito ao uso
exclusivo sobre determinado objeto, é aplicável a objetos tangíveis, mas e na questão de
idéias, patentes, e marcas registradas? Como poderia e se deveria ser aplicável um
conceito tão material à objetos tão imateriais?
Façamos um exercício imaginativo: Este livro - que lê agora - está dentro da definição
estatal do direito à propriedade intelectual; mesmo com você o tendo em suas mãos neste
momento, ou o tendo como arquivo em seu computador, dentro de seu disco rígido que é
capaz de ligar e coordenar todos os arquivos armazenados por conta da sua ligação à rede
elétrica. Mesmo que você o tenha comprado ou ganhado, ainda assim, de acordo com os
direitos autorais (caso este livro estivesse sobre o campo de jurisdição estatal), o caro
leitor não teria o direito para poder copiar, transcrever, imprimi-lo ou que assim seja,
mesmo que a tinta seja sua, que o papel seja seu, que todos os meios imagináveis capazes
de copiar uma obra sejam seus, ainda assim neste caso o direito a cópia estaria em nossas
mãos. É por esse e outros motivos, que criou-se termo em inglês copyright que determina
quem possui o direito a cópia sobre determinada obra criativa. Toda a construção de
palavras, as idéias expressadas neste livro, os conceitos formulados, todos pertenceriam
única e exclusivamente ao autor (isto na definição de direito autoral).
É de estarrecer-se ao pensar que num mundo onde existem tantas pessoas com
pensamentos criativos, caso duas pessoas pensem na mesma coisa, na mesma construção
e colocação de palavras, na mesma idéia de uma nova máquina ou invenção, de acordo
com a lógica da PI, haveria um conflito entre estes indivíduos.
Mais uma vez, façamos uma atividade imaginária. Imaginemos que existem duas pessoas:
Mateus e Henrique. Logicamente, é possível que Mateus e Henrique pensarem no
conceito de uma nova invenção ao mesmo tempo, sem que eles entrem em um conflito.
Todavia, no momento em que se tangibiliza tal conceito, é impossível que Mateus e
Henrique aloquem, sob uma motivação subjetiva, essa nova invenção para usos
excludentes sem que se gere um conflito. É clara a diferença entre algo tangível ao nosso
mundo e algo puramente conceitual, imaterial, que está apenas presente em nossa
consciência.
Para a lógica dos direitos autorais, ao redigirmos este livro que você está lendo, o direito
ao uso destes conceitos postulados é apenas nosso, dos autores. Mas da óptica libertária,
onde a lei de propriedade é a única racionalmente defensável e capaz de resolver conflitos,
toda essa idéia sobre posse de produtos imateriais cai completamente por terra.
O fato de eu descobrir a cura para alguma doença, e você a usá-la também, não me priva
da minha capacidade de continuar a usufruir desta idéia. É completamente diferente de
alguém possuidor de uma vacina ter ela tomada de suas mãos por outro indivíduo, o
conflito entre os agentes é claramente notado aqui, diferentemente do primeiro exemplo.
Agora demonstrando a não escassez das idéias, vamos mostrar algo que Kinsella
maravilhosamente escreveu:
O que, afinal, está realmente errado em reconhecer “novos” direitos de propriedade? Afinal, uma vez que
novas ideias, criações artísticas e inovações continuamente nos enriquecem, qual é o mal em se
“modernizar” e reconhecer novas formas de propriedade? O problema é que se direitos de propriedade são
reconhecidos sobre recursos não escassos, isso necessariamente significa que direitos de propriedade sobre
recursos tangíveis são correspondentemente diminuídos. Isso porque a única forma de reconhecer direitos
ideais em nosso mundo real, escasso, é alocar direitos sobre bens tangíveis. O fato de eu possuir um direito
efetivo de patente – um direito sobre uma ideia ou padrão, não sobre um recurso escasso – significa que eu
tenho algum controle sobre os recursos escassos de todos os outros. De fato, podemos perceber que direitos
sobre PI implicam uma nova regra para adquirir direitos sobre recursos escassos, que desloca o princípio
libertário de primeira ocupação. Isso porque, de acordo com a apropriação original libertária-Lockeana, é
o primeiro ocupante de um recurso escasso previamente sem dono que se torna seu dono, isto é, se apropria
dele. Uma pessoa que chega depois e toma controle de tudo ou parte de tal propriedade é simplesmente um
ladrão, porque a propriedade já tem dono. O ladrão efetivamente propõe uma nova e arbitrária regra de
apropriação para substituir a regra do primeiro ocupante, de fato a regra particularista “eu me torno o dono
da propriedade quando eu forçadamente a tomo de você”. É claro, tal regra não pode ser considerada como
tal, e é claramente inferior à regra do primeiro possuidor. A regra do ladrão é particular, não universal; ela
não é justa e certamente não é apropriada para evitar conflitos (KINSELLA, 2013, p.35)
Utilitarismo e PI
Discute-se muito sobre o fato de direitos autorais e patentes são causal e factualmente
agentes da fomentação da produção de trabalhos criativos e invenções, ou se os lucros
vindos de inovações ultrapassam os custos de um sistema que impõe a PI. Estudos
econométricos não mostram conclusivamente ganhos líquidos em riqueza (KINSELLA,
2017, p.19). Possivelmente existiria ainda mais geração de produtos e renda se não
houvessem leis que obrigam a existência da PI; talvez mais dinheiro para pesquisa e
desenvolvimento estivesse disponível se não estivesse sendo gasto em patentes e
tribunais. É possível que companhias tivessem um incentivo ainda maior para inovar se
elas não pudessem contar com um monopólio de quase vinte anos dessas invenções.
Afirma-se isto, porque, indiscutivelmente, existem custos do sistema de patentes.
É evidente que as patentes são obtidas apenas após a tangibilização de uma ideia, após
sua aplicação; mas o mesmo não contempla ideias mais abstratas ou teóricas. O que
completado em:
Não fica claro se a sociedade está melhor com relativamente mais invenções práticas e relativamente menos
pesquisa e desenvolvimento teórico. Adicionalmente, muitas invenções são patenteadas por motivos
defensivos, resultando em salários de advogados de patentes e taxas de escritório de patente. Essas grandes
despesas seriam desnecessárias se não existissem patentes. Na ausência de leis de patente, por exemplo, as
companhias não gastariam dinheiro obtendo ou se defendendo contra patentes ridículas como as do
Apêndice. Simplesmente não foi mostrado que a PI leva a ganhos líquidos na riqueza. Mas não deveriam
aqueles que defendem o uso da força contra a propriedade de terceiros satisfazer o ônus da prova
(KINSELLA, 2017, p. 19, 20)?
Mas de certo que, um ponto utilitário não serve como parâmetro de justiça. E mesmo que
PI proporcionasse maiores lucros ou riquezas a sociedade (o que não é, necessariamente,
de fato), ora, a lei deve buscar a justiça, evidentemente; e não fatores financeiros.
Referências Bibliográficas
As Polêmicas
Muito se fala sobre libertarianismo, muito se fala sobre o estado, muitas coisas são ditas
por agentes do estado, muitas coisas são ditas pelos próprios libertários, e muitas dessas
coisas, particularmente, não são bem esclarecidas, existem por todos os lados defesas e
ataques feitos de maneira errônea ao libertarianismo, detalhes que, embora possam
parecer danosos ou tão graves, impactam na forma sobre como as pessoas enxergam o
libertarianismo per se, falamos sobre muitas dessas coisas nesse capítulo, e buscamos
esclarecer algumas delas, em prol de uma melhor visão sobre o que é realmente o
libertarianismo.
Avançando mais, falaremos também sobre as polêmicas que existem no meio libertário,
digamos assim, conflitos internos do movimento libertário, objetos de problematização,
que carecem de consenso, coisas como o aborto, a causalidade, a questão do voto, etc.
Tentarei falar sobre esses itens também, bem como também exporei de modo parcial
minha visão sobre alguns desses assuntos.
Bom, anunciado nosso tema, vamos iniciar nosso tour sobre as polêmicas mais famosas
envolvendo o libertarianismo.
Essa é uma questão definitivamente muito expressada, que libertários apenas se opõe ao
estado, sendo assim todas as outras formas de espoliação, grandes latifundiários de terras
ilegitimamente apropriadas, e mesmo empresas mancomunadas ao estado, estariam
perdoadas.
Alguns argumentos que já tive a oportunidade de ouvir, durante um bom tempo que passei
debatendo com pessoas, vindo também inclusive de libertários, e que reforçam essas
ideias incorretas, são:
“Sem o estado empresas gigantes (insira o nome de alguma aqui, rs) poderiam fornecer
serviços de forma mais barata!”
“Sem o estado a concorrência acabaria com as imensas empresas, abrindo assim um
caminho ao livre mercado!”
Mas isso de forma alguma poderia ser verdade! Anarco-Capitalistas não defendem apenas
o fim do estado, defendem o fim de todas as formas de hierarquias injustificadas,
hierarquias meramente impostas a base da força! Bem como defendem também o fim de
todas aquelas instituições, empresas ou pessoas que estão mancomunadas com o estado!
Isso obviamente inclui, e não exclusivamente, corporações com suas ligações com o
estado, que perdem quaisquer direitos de proclamar propriedade sobre si mesmas,
propriedade essa que possui como constituinte atos e meios anti éticos. Também inclui
aqueles que, com o grande estado protetor, mantém imensos latifúndios de terra,
propriedades ilegítimas mantidas pela força da imposição do estado! Não melhores do
que ele próprio, muitas essas propriedades não foram sequer apropriadas pelo princípio
de homesteading9, sendo supostamente fruto de pedaços de papel com a adesão de suposta
“legitimidade” advindos da instituição de coerção em massa chamada estado. E por
9
Para recursos escassos externos ao corpo, utiliza-se o princípio de apropriação
original lockeano, onde o primeiro e efetivo usuário de um meio inapropriado, toma
para si os direitos de propriedade sobre esse meio (a propriedade privada é de quem
possuir o melhor vinculo objetivo para com o meio em questão). Para mais detalhes,
ver ‘Journal of Libertarian Studies Volume 17, no. 2 (Spring 2003), pp. 11–37 ‘ Por Stephan
Kinsella.
último nessa listagem, mas não menos importante, empresas que se prestam a aceitar com
todo animo fundos do estado, produtos da espoliação feita a indivíduos pacíficos,
simplesmente por que não conseguem ser capazes o bastante de suprir as necessidades do
mercado, sim, falo deles, os chamados “incentivos” do estado sobre determinados
mercados10. Não cabendo a esse momento falar ou não da suposta efetividade de tais
serviços (que tende a ser negativa), apenas da questão ética, se não devolvidos (de modo
legítimo, obviamente), esses “incentivos” podem ser transferidos das empresas que os
receberam, de forma a punir o ato.
Propriedade privada, na concepção que melhor expressa seu conceito, pode ser descrita
como o direito socialmente reconhecido de controle sobre determinado meio escasso.
Portanto, poder-se-á dizer que a propriedade privada não é o meio em si, mas a relação
entre ator e meio.
O que é escassez? Qual a diferença entre escassez e não abundância? Simples, quanto que
a abundância é uma propriedade quantitativa dos recursos, a escassez é um atributo
qualitativo de meios de ação, poderiam existir infinitas quantidades de maça pelo
universo ou pelo planeta, mas ainda assim maçãs seriam escassas, não por conta de sua
quantidade, mas porque, vez que se tornem meios de ação, sempre estarão sujeitas a
conflitos de fins.
10
Não necessariamente poder-se-ia enquadrar o chamado “incentivo” de isenção
de impostos nessa categoria como anti éticos, visto que são casos excepcionais
(instância de não conformidade com o padrão) de não agressão. Em todo caso, são
apenas exceções, e não serão tratadas nesse texto, sendo consideradas apenas as
instâncias de ação de “incentivo” governamental pautadas em distribuição ou
expropriação de recursos ilegitimamente obtidos pelo estado (todos).
Um conflito nada mais é do que o emprego de fins contrapostos para determinado meio
por 1 ou mais atores. Um fim nada mais é do que aquilo que determinado ator intenta em
tornar factual.
Nessa situação, Robert possui um fim (comer a maçã totalmente), e está empregando
meios (seu corpo, a maçã) para atingir esse fim.
Agora, pensemos na questão da escassez, digamos que, Roberto, irmão gemio de Robert
quisesse usar a maçã que Robert está comendo para atingir o mesmo fim (comer a maçã
inteiramente).
Vemos nessa situação que, embora exista uma única maça (não abundância local), dois
indivíduos atribuíram fins exclusivos para ela11, um conflito foi criado, pois apenas um
dos indivíduos pode verdadeiramente performar a ação (comer a maçã por inteiro),
portanto dizemos que esse meio é escasso.
Isso não poderia ser mais inexato, libertários não se opõe ao uso da força ou coerção, o
uso da força e coerção é essencial para que uma sociedade voluntariamente organizada
em torno de uma ética objetiva e racional possam resolver seus conflitos internos, o item
a qual os libertários são veementemente contra, e que os define em essência, é a agressão,
o uso/iniciação de força injustificada (agressão)12.
11
Não necessariamente todos os fins são exclusivos, um fim é exclusivo apenas
quando em uma situação em que múltiplos fins são atribuídos ao meio (sendo do
próprio ator ou também de outros), sendo esse um deles, esse fim conflita com
outros fins desse escopo de ações.
12
A natureza da agressão não se perfaz apenas sobre o uso de força física, pois, no
geral, a agressão se dá em cursos de ação, a agressão é uma ação que possui conexão
Podemos pensar em alguns casos de ação, para que possamos compreender essa questão
de uma forma mais clara.
“Sales e Trogel entram no armazém, mas Sales estava armando algo contra Trogel, ele
fecha a porta do armazém por dentro e guarda a chave em seu bolso, em seguida, pega
um martelo e bate com ele na perna esquerda de Trogel”
Esse é um claro exemplo de iniciação do uso de força injustificada, uma agressão, Trogel
não havia feito nada de anti ético contra Sales para que este ato fosse justificável.
Agora, vejamos como essa situação se desenrolou:
Agora, de forma totalmente defensiva, Trogel se viu em uma situação na qual deveria
retirar o martelo das mãos de Sales, e nocauteá-lo com ele, para que pudesse fugir deste
local com vida, nesse caso, Trogel usou o mínimo de força possível para que pudesse
resolver o problema13.
Agora vejamos a situação novamente, dessa vez por outro ângulo, voltando ao momento
em que Trogel foi atingido:
“Trogel vislumbrou uma chance de vingança, encontrou no canto de um dos balcões uma
arma, no momento em que Sales estava distraído conseguiu pegá-la e apontar para Sales.
Sales, agora rendido, foi ordenado a largar o martelo, e assim o fez, em seguida, Trogel
causal entre o uso de um meio e um fim que inicia um ato ilícito. A força física,
portanto, é apenas uma das formas de agressão, falaremos mais sobre isso a frente.
13
O mínimo de força necessário é o modelo utilizado por libertários para que
sejam resolvidos conflitos diretos/indiretos como esse, que necessitam do uso de
força física.
Tome como exemplo um soco e um assassinato, entre esses dois eventos existe uma
clara diferença de força, pois de um lado o soco apenas machucou o alvo, porém o
assassinato é caracterizado pelo cessar da ação, e entre esses dois graus de força
existe um abismo quase intransponível.
ordenou a sales que lhe entregasse a chave para que pudesse fugir, dessa forma,
normalmente, a situação teria se resolvido com o mínimo de coerção necessária. Porém,
após receber a chave, Trogel resolve, em um ato de vingança furioso, matar Sales,
atirando contra sua cabeça.”
Essa situação difere substancialmente da anterior, ao passo que, entre o ato de matar e de
acertar a perna de alguém com um martelo, existe um abismo de desproporcionalidade
praticamente impossível de ser transpassado14.
1. Agressão pode ser descrita como a iniciação do uso de força injustificado (e.g.
Forçar alguém a te beijar), mas também, de forma mais precisa, como a conexão causal
entre utilizar um meio para se alcançar um fim ilícito (que viole a propriedade privada),
[e.g. Mandar alguém matar uma pessoa], para tornar a explicação mais simples, apenas
casos de iniciação de força física direta foram inseridos nesse tópico.
3. Toda retaliação por meio do uso da força que seja maior do que a força utilizada
na agressão iniciada, possui a pena de se tornar ela mesma uma agressão.
14
Muito embora seja possível pensar em casos onde essa situação seja justificada,
por exemplo, se Sales tivesse cúmplices no armazém, de modo que a única solução
possível para que Trogel pudesse fugir fosse matar Sales, um modo interessante de
dizer isso é, cada caso é um caso.
15
Um modo mais, por assim dizer, civilizado, e com maiores chances de
ressocialização criminal, de realizar punições em uma sociedade libertária, como
Kinsella uma vez disse, é com um sistema de restituições materiais monetárias,
desde que a parte agredida concorde, é claro.
Outra vantagem do sistema de restituições é a segurança jurídica, uma vez que, por
exemplo, se você matar um assassino que na verdade era inocente, você também
seria punido com a morte, mas se você tivesse apenas exigido uma restituição,
poderia apenas devolvê-la.
Agora que falamos um pouco sobre a agressão, uso da força, e coerção, falaremos também
sobre a questão da autopropriedade, uma grande fonte de controvérsias e confusões no
meio libertário.
– Autopropriedade –
A autopropriedade, ao contrário do que se pode pensar, não vem do primeiro uso sobre o
corpo, mas sim de sua relação especial para com ele. Para que essa situação se torne mais
clara, vamos pensar de forma a fazer uma análise sobre a questão.
O melhor modo de definirmos qual aquele que possui o melhor vinculo com um
meio não apropriado, é por meio da primeira apropriação, do homesteading, realizar a
mistura de seu trabalho para com esse meio.
Um outro modo de obter tal vínculo, é com uma transferência de propriedade, que
pode ocorrer tanto por meios contratuais, quanto por meios restitutivos.
De certo modo, o primeiro a misturar seus recursos com seu corpo são seus pais,
ao alimentá-lo, vesti-lo, e cuidá-lo.
Porém, isso não significa que eles tenham o melhor vinculo objetivo para com
você, pois existe um vínculo, vínculo esse que existe de forma especial, que é sua
identidade, você é um ser de direito, que em alguma instância, é expresso também pelo
seu corpo, você é representado diretamente por ele, mas também o controla, seu corpo é
tanto uma referência sua quanto seu meio de ação primário, e essa ligação especial é o
motivo de você, e não seus pais ou qualquer outra pessoa que interaja com você, ser seu
autoproprietário.
Essa explicação demonstra, de modo efetivo, a distinção clara a ser feita entre o corpo de
ação, e o indivíduo de direito, pois, não se trata de afirmar ou não que existe um dualismo
entre consciência e matéria, e a consciência seria algo mistico ou de outro mundo, mas
sim que existe uma diferença clara entre o modo como se analisa o indivíduo de direitos,
e o corpo desse indivíduo.
Tome como exemplo o seguinte:
“Michael cortou Davidson com uma faca de manteiga, Michael foi condenado a pagar
uma restituição a Davidson”
Não foi apenas a mão de Michael que cortou Davidson, de fato ela foi o meio de ação,
mas a ação tem que se dar com uma intenção, um fim a ser almejado, esse fim reside no
indivíduo, e não no meio, quando Michael feriu Davidson, portanto, Michael feriu
Davidson, Michael é um agressor, e não sua mão.
Essa distinção, embora possa não parecer a primeira vista, é grandemente necessária, de
modo que só é possível imputar um crime sobre um indivíduo, e não sobre meios, sendo
o corpo um meio de ação, esse corpo não pode ser o culpado de um crime, mas sim o
indivíduo ligado a ele, de forma que essa situação de perfaz sobre uma distinção de
categorias16, a distinção entre meio e ator.
E nessa relação prima facie entre meio de ação primário e indivíduo, que surge a questão
da autopropriedade, um reconhecimento intersubjetivo necessário a um discurso sobre
16
Muito embora, como anteriormente dito, essa distinção de categorias não
implique em uma distinção de natureza física ou mistica, apenas implica em uma
necessidade de categorização por sobre diferentes componentes de um indivíduo
(seu corpo, representação, e meio de ação, e sua natureza conceitual geral).
normas, cujo qual é um meio de ação primário, por que é o único meio que o indivíduo
pode usar de forma direta, e que todos os meios usados de forma indireta dependem, em
alguma instância, do uso desse meio.
[Apenas por diversão, pode ser interessante empregar a questão “Armas não matam
pessoas, pessoas matam pessoas” nessa questão, pois a culpa de um assassinato não é da
arma per se (embora envolva relação de causalidade com ela), mas do indivíduo que a
empunha, culpa advém como resultado de ações humanas. Uma arma, em circunstâncias
normais, não se levaria a atirar.]
Essa é uma questão que criou algumas controvérsias no meio libertário, como por
exemplo, algumas pessoas pensam que não se pode os utilizar contra agressores que não
concordaram com a empresa, um problema gerado em boa parte pela concepção
Rothbardiana de contratos.
A razão pela qual podemos utilizar de força contra um agressor17, não é por que houve
uma quebra de contrato, mas sim por que, ele mesmo, ao inciar o uso de força contra
você, concordou, mesmo que implicitamente, com a jurisdição na qual você está
submetido, de forma que retaliar contra ele não é uma violação do direito do agressor,
mas sim uma forma de fazer valer a justiça. A força de retaliação, é, como o próprio nome
indica, uma retribuição de força a nível proporcional, como já explicitado em explicações
anteriores.
Um outro tópico que gera certa confusão, é a questão sobre se nos opomos ou não a todos
os tipos de governo.
Isso, de forma clara, é um equívoco, libertários não se opõe a todas as formas de governo,
libertários se opõe a estados, e estados, embora sejam formas de governo, diferem
substancialmente de formas de governança privada.
O estado é uma instituição que pode ser descrita de diversas formas, mas podemos, ao
menos para fins de explicação, relacioná-lo a ao menos uma das seguintes características
(muito embora a esmagadora maioria dos estados, se não todos, possuam ambas as
características):
17
Refere-se a tanto o indivíduo agredido, quanto sua agência de segurança privada,
quanto um possível terceiro em algumas instâncias específicas.
integrantes não foram impositivamente colocados sobre, mas sim escolheram de forma
voluntária sua participação.
Falarei agora sobre um tópico, por assim dizer, controverso, diversas instâncias desse
argumento foram formadas ao longo do tempo, como o argumento de Holcombe sobre
agências de segurança privadas, mas não falarei sobre esses em específico no momento,
apenas sobre um, resumidamente, o argumento de que em uma sociedade libertária, com
o acumulo de propriedades por uma pessoa, acabaríamos com algum tipo de
autoproclamado novo estado, com esse proprietário sendo o administrador.
1. Um meio, uma vez apropriado (ou trocado), permanece com seu proprietário até
o fim dos tempos (seu horizonte de vida, para ser mais exato)
2. Uma vez que a propriedade é eterna (dentro de determinado tempo de vida), uma
pessoa poderia se apropriar de vastos territórios ao longo de sua vida (ou comprá-los,
supondo-se que exista alguém rico o bastante para isso), e, ao fazê-lo, ela obteria o poder
de controle sobre esses territórios.
As falhas desse argumento, no entanto, devem ser delicadamente expostas, para que se
desfaçam em cinzas.
Primeiramente, apropriar-se de um meio não o torna sua propriedade para toda vida, mas
sim até que o meio em questão seja visivelmente não trabalhado, ou seja, que o trabalho
inserido por sobre o terreno seja impossível de se distinguir de um terreno em estado de
natureza.
Ou seja, um grande latifundiário, eventualmente se depararia com o problema de manter
suas terras consistentemente apropriadas, de forma que isso se tornaria potencialmente
insustentável em vastos territórios18.
Como se pode notar, vez que o primeiro ponto é resolvido, os dois subsequentes
acabariam se tornando inúteis. Porém, para fins recreativos, desmantelaremos também o
terceiro ponto, uma propriedade dá lhe o poder de um estado por sobre seus moradores?
A resposta curta é, depende, essa é uma situação que deve ser analisada sobre diferentes
perspectivas.
Podemos pensar nesse poder como sendo o poder de violentar os moradores em questão,
nesse caso, poder-se-á de objetar sobre a natureza dessa violência, desde que não exista
um contrato entre o dono da propriedade em questão e seus moradores, especificando que
ambos consentem sobre esse ato, não existe motivo para que esse proprietário não
houvesse de restituir seus moradores.
Outro modo de analisar essa situação, é pela questão contratual, vez que é possível
perceber a ligação entre consentimento contratual e ausência de agressão, se pode objetar
que o ato não seria uma agressão a propriedade propriamente dito, se antes houvesse
algum consentimento contratual por sobre essa relação. O que não implica, obviamente,
que aqueles que não consentiram com esse contrato estejam sob suas regras19.
18
Poder-se-á contestar essa informação, utilizando-se de argumentos sobre mão de
obra, como uma pessoa contratada que manteria esses locais. Porém, como deveria
ser evidente, em uma situação na qual a propriedade se torna vasta o bastante para
fazer com que as pessoas fiquem sem territórios o bastante para se apropriar, os
custos de manter tais empregados seriam elevados as alturas. Outra possibilidade
seria se as pessoas em questão não aceitassem o trabalho, e, ao invés disso,
simplesmente resolvessem também se apropriar da terra, de forma que
eventualmente a propriedade desse latifundiário acabaria sendo fragmentada.
19
Dada a natureza das relações sociais humanas, não é de se surpreender que as
pessoas sob esse vínculo contratual obtivessem filhos (ou mesmo que já tivessem,
mas que os mesmos fossem demasiadamente pequenos para sequer saberem das
Anunciados esses dois argumentos interessantes sobre essa questão (que é basicamente
irrelevante, visto que são apenas conjecturas sobre a ação humana), passemos ao próximo
tópico.
Uma outra área que causa bastante confusão em muitos libertários, é a área das posições
a serem tomadas em relação a violações éticas, e sobre isso falaremos agora.
Antes de mais nada, quando tratamos de violações da ética libertária, temos de separar as
medidas a serem tomadas em duas categorias, são elas:
de ação punitiva, que envolve o agressor ceder algo para o agredido, de forma que o
força, podendo ser tanto punição posterior ao crime, quanto algo que se pode se
decisões de seus pais), esses filhos, por não possuírem vinculo contratual com o
dono da propriedade, estariam fora dessa relação contratual (o que não implica que
ele não poderia expulsar as crianças do local, desde que com o mínimo de violência
necessário).
20
É importante notar que aqui a retribuição e restituição são ambas formas de
punição, apenas possuem propriedades distintas, de forma de categorizá-las
diferentemente se mostra adequado.
conta21, situações que carregam muita subjetividade em seus julgamentos levam a uma
maior dificuldade de mensurar proporcionalidade22, porém, sendo elas causadas pelo
agressor e não pela vítima, recai sobre o agressor demonstrar que a punição advinda da
vítima é desproporcional e injusta e não a vítima.
21
Situações gerais de crimes comuns, e que podem ser objetivamente mensuradas
punições, e.g. Roubo de um chiclete não seria, em casos normais, compatível com
uma execução, porém uma execução ou tentativa de execução da vítima sim.
22
Situações que não possuem mensuração demasiadamente objetiva em relação a
suas punições, podem acarretar nessa situação, estas que podem variar de diferenças
de habilidades corporais, até a sentimentos psicológicos subjetivos da vítima em
relação a situação imposta a ela pelo agressor. (Nessas situações onde o agressor
acaba por ter de provar a desproporcionalidade de sua punição, cabe a contratação
de algum filósofo ou jurista, por exemplo), Para mais informações consulte o artigo
de Stephan Kinsella: Punishment and Proportionality: The Estoppel Approach
Sobre a Punitividade Retributiva
1. Retaliação Imediata
A retaliação imediata (relembrando que se prostra aqui como sinônimo de uma possível
autodefesa sobre situações de risco/agressão), possui como característica ser, na maioria
dos casos de ameaça de agressão / ocorrência continua de agressão (ambas formas de
agressão), subjetiva, tanto estados mentais psicológicos causados pelo agressor quanto
características físicas dos indivíduos envolvidos na situação de conflito podem interferir
na determinação do que pode ou não ser considerado proporcional durante uma retaliação,
sendo assim a vítima possui a maior reivindicação sobre seus atos durante a situação do
que o agressor, de forma que a responsabilidade do ato per se não é da vítima, mas dele23.
A retaliação posterior ao ato (nesse ponto se torna uma forma de punição do crime que
já ocorreu, e não apenas uma forma de autodefesa) ocorre quando a vítima de um crime
exige certa punição para com o agressor, de forma que, por exemplo, alguém que teve as
23
Isso pode ser melhor ilustrado ao se pensar em uma situação de risco, como
alguém apontando uma arma para você, uma ameaça de morte, normalmente não
seria possível, por exemplo, dizer que absolutamente todas as pessoas estariam
apontando a arma com a intenção de matar seu alvo (considere, por exemplo, uma
situação onde alguém lhe pregaria uma peça, por algum motivo bizarro, rs), porém,
devido à periculosidade da situação, agregado a possível alteração do estado
psicológico do indivíduo agredido, poder-se-á defender uma resposta a nível por
sobre a agressão, de modo que o indivíduo agredido possa sobreviver.
mãos cortadas, pode vir a exigir que seu agressor também as tenha24, e alguém que teve
o celular destruído, pode vir a exigir que o celular de seu agressor também o seja25.
Quando pensamos em uma situação de punição, cabe-se (como explicitado nas notas da
página anterior) que seja possível descrever uma punição que nos leve a certa
proporcionalidade, porém nem sempre isso é algo possível26, e algum nível de alegação
pode vir a ser exigido, considerem o seguinte exemplo:
24
Muito embora, no caso de quem teve as mãos cortadas, poder-se-á objetar por
uma punição mais rigorosa, no caso de um pintor por exemplo, que precisa de suas
mãos para que possa se sustentar, de forma que seja ideal cortar ambas as mãos do
agressor, ou mesmo todos os seus membros.
25
No caso de uma destruição de propriedades externas ao corpo, pode vir a ser
preferível pelo proprietário em questão que ele tenha uma restituição, muito embora
a restituição apenas seja a forma de se reaver o que foi perdido, e não uma punição
per se, portanto é possível que a vítima também exija uma recompensa adicional
como punição para o criminoso.
26
Muito embora seja interessante citar, ao menos de forma branda, que existem
certos tipos de crimes com determinadas linhas de proporcionalidade objetivamente
definíveis, embora não sobre todos esses casos essa determinação de proporção seja
precisa, devendo-se então levar a análise os casos como ocorrências individuais.
Tome como exemplo de eventos com punições retributivas claramente demarcáveis
o assassinato e o roubo de uma caixa de fósforos, nos fica claro que o assassinato
possui como punição possível o assassinato, o que não cabe ao roubo da caixa de
fósforos (as possibilidades de exceção de casos assim ainda serão tratadas).
assassino, e agora novas formas de punição tomam ares de possibilidade, como por
exemplo, a morte de X27.
Agora sobre a questão da restituição, temos que é interessante considerá-la uma forma,
como diria Kinsella, mais civilizada de fazer as coisas. A restituição, como anteriormente
explicitado, é a forma de punição que envolve o retorno de determinado recurso a vítima
de um crime, de forma a amenizar (ou quitar) seu crime, tomemos o seguinte exemplo
como norte:
27
Um grande problema com a ideia de punição retributiva, e mesmo a restitutiva, é
que a punição pode nunca vir a ser proporcional, e que a vítima não realmente se
satisfaça de alguma forma com a punição (retributiva), de modo que alguém com a
mão cortada não realmente ganharia sua mão de volta ao cortar a mão de seu
agressor (isso não implica que a punição não tenha um motivo, ou seja, efetiva). E
nos casos de restituição, uma proporcionalidade pode também nunca vir a ser
efetivada, pois quantidades de valor material podem não repor um dano psicológico
ou corporal, apenas confortar a vítima.
28
Como na questão do pintor que teve suas mãos cortadas, ou do homem que teve
a caixa de leite que era vital para seu filho furtada, poder-se-ão essas vítimas
requererem a punições decididas por si mesmos, cabendo ao agressor e não a vítima
a questão de tratar se a sentença é ou não proporcional.
Ao contrário do simples ato de devolver o recurso roubado a vítima, que deveria apenas
ser classificado como restituição da vítima, a punição restitutiva pode ocorrer de formas
diferentes, como a vítima obtendo mais 10.000,00$, ou até mais, cabendo, como dito
anteriormente, ao agressor se defender dessa condenação.
Agora, tomemos um outro exemplo, dessa vez um exemplo um pouco mais grave (eu
pessoalmente diria extremamente mais grave, rs):
X estupra Y
Porém, esse valor não necessariamente reflete uma punição proporcional ao ato, e de fato,
as variáveis contam mesmo aqui, desde os sentimentos subjetivos e estados psicológicos
da mulher estuprada, até questões sobre o estado financeiro do estuprador29.
Supondo-se, por exemplo, que o estuprador fosse bilionário, 1M$ não seria uma grande
perda para ele se fosse apenas uma questão de pagar, porém, talvez, fosse negociável que
arrancassem suas pernas e braços, ou que o torturassem lentamente, ou simplesmente que
ele entregasse metade de seu dinheiro (ou mesmo todo ele), de forma à ao menos tentar
convencer a vítima.
E no caso de um agressor sem muitos recursos, poder-se-á fazê-lo de escravo até que
pague suas dívidas, ou mesmo fazer as agressões físicas que citei acima, como antes dito,
é dever do agressor e não da vítima determinar que uma punição é desproporcional.
Essa é uma outra questão que permeia o pensamento libertário a um bom tempo, algo só
pode ser punido se puder ser classificado como violação física iminente ou violação per
29
Os argumentos apresentados no tópico sobre retribuição punitiva podem ser
aplicados mesmo em estupro, principalmente a questão sobre a proporcionalidade
inalcançável, vez que o estuprador não necessariamente poderia obter uma punição
que fosse equivalente ao causado na vítima (mesmo um estupro para esse estuprador
não equivaleria ao ocorrido com a mulher, visto que seus corpos são diferentes, bem
como seus estados psicológicos).
se, incluindo que apenas aqueles que estiveram diretamente envolvidos com a agressão,
possam ser considerados culpados.
A grande questão sobre isso, é que atos de agressão/violação podem ocorrer mesmo
quando indiretamente causados, bem como quando ameaças não diretas são firmadas30.
Para que possa ser feita uma melhor relação, vamos tratar de ambos os casos
separadamente.
– Ameaças Indiretas –
Como anteriormente dito nesse capítulo durante uma nota de rodapé, ameaças diretas e
imediatistas são um ponto de retaliação valido da vítima por serem uma alteração de
estados psicológicos causais, onde as ações do agressor tomam as possibilidades de ação
da vítima, até que somente sobre uma possível reação.
Porém, não apenas a ameaças diretas se vale uma reação de retaliação retributiva, poder-
se-á também retaliar contra ameaças indiretas, de forma que estas são também formas de
agressão, embora menos físicas31, para exemplificar, tomemos a seguinte questão:
“Um chefe mafioso chamado Charlattone ameaça o indivíduo Jefferson de morte em uma
semana, caso o mesmo não saia da cidade.”
30
Ameaça direta assume aqui uma conotação de iminência e materialidade, tome
como exemplo alguém apontando uma arma para sua cabeça.
Já uma ameaça indireta poderia aqui ser definida como atos de fala com
intencionalidade aberta a possibilidade de ação por sobre o alvo, tome como
exemplo uma ameaça de morte.
31
Ameaças se tornam formas de agressão na medida em que são também formas
de planejamento de ação, poder-se-á dizer que durante uma ameaça de morte por
exemplo, o agressor em questão está legitimando, dentro de todos os cursos de ação
possíveis para esse indivíduo, uma violação à vítima, e, portanto, restringindo o
número de possibilidades de ação da vítima, de forma que a retaliação se torna uma
das formas de autodefesa evidentes como curso de ação.
Para mais detalhes sobre ameaças verbais desse nível, consulte o capítulo sobre
direito, no tópico acerca da liberdade de expressão.
sair da cidade, não for satisfeita. Bem como, ao tomar esse curso de ação como valido,
Charlattone também restringiu o curso de ações de Jefferson, de modo que agora as
opções que ele possui para que não seja efetivamente morto são apenas:
A. Sair da cidade
B. Eliminar a ameaça que Charlattone de algum modo (considere que exista alguma
forma possível de o fazer)
Desse modo, Charlattone é um agressor de Jefferson, que agora está coagido a escolher
entre apenas duas opções (limitadas ao escopo do exemplo) para que possa sobreviver,
para que não tenha sua autopropriedade violada. Poder-se-á, portanto, dizer que Jefferson
pode legitimar o curso de ação em que ele “cuida” da ameaça que Charlattone representa,
e Charlattone não poderia objetar contra esse curso de ação, visto que ele mesmo já havia
o legitimado, ele é estopped32 de fazer isso.
Na imagem acima, podemos observar mais claramente os cursos de ação que Jefferson
poderia tomar, por conta das ações agressivas de Charlattone.
32
Estopped é um termo utilizado na teoria punitiva libertária Estoppel, que advoga
por uma incapacidade do agressor de negar seus próprios fatos, venire contra factum
proprium (ninguém pode negar seus próprios atos). Para mais informações sobre o
Estoppel, leia o capítulo Justiça, tópico O Estoppel.
Encerrada essa questão, partamos para a próxima.
– Culpabilidade Indireta –
Esse tópico já se torna mais complexo de elucidar, tendo em vista que é demasiadamente
controverso no meio libertário, variando de determinados autores para outros
determinados autores, porém, por motivos de consistência, colocarei aqui a posição de
Stephan Kinsella, desenvolvedor da teoria punitiva libertária, Estoppel.
“Um terrorista (atribua-o a X) envia uma bomba em uma caixa para alguém, sendo
transportado e entregue por um carteiro (este será Y), ela chega ao alvo, em seguida, após
recebê-la e entrar em casa, o alvo (chamaremos no de Z) abre a caixa, e, como resultado,
ela explode, matando Z.”
Não creio que preciso dizer o absurdo do que acabo de dizer, mesmo que a caixa tenha
sido entregue pelo carteiro, e mesmo que a vítima seja quem tenha aberto a caixa com o
explosivo, a culpa dessa relação de eventos causais é do terrorista, que à enviou, que
utilizou o carteiro de meio para atingir seu fim.
Poder-se-á dizer que pessoas não podem ser utilizadas como meios, porém, como acabo
de explicitar, e darei outro exemplo a seguir, isso não é verdade, muito embora não
possamos (a menos que isso envolva coerção, mas não estamos tratando desses casos
ainda) controlar as ações de indivíduos, pois estes possuem livre deliberação, ainda assim
podemos utilizar deles como meios para nossas ações, para que atinjamos nossos fins, o
que, obviamente, não remove a culpa ou responsabilidade desses indivíduos33, vejamos
agora outro exemplo:
“O líder de uma nova seita religiosa (será chamado de X) ordena a um de seus seguidores
que rapte e esquarteje uma pessoa. Seu seguidor (será atribuído a ele o símbolo Y) o faz,
raptando e matando uma pessoa (denominada como Z).”
Como pudemos perceber no exemplo anterior, muito embora tenha sido um ato de livre
deliberação de Y matar Z, não exclui-se o fato de que X empregou-o como meio de ação,
e que Y empregou também meios para concluir sua ação de matar Z, o fato de ambos
terem livre-arbítrio, ou de que as ações do líder da seita não tenha direta ligação com o
ato ocorrido (direta no sentido de ser aquele que matou) não muda esses fatos, portanto,
poder-se-á, nesse caso, atribuir a culpa criminal do fato a ambos, líder e seguidor.
33
Muito embora dever-se-á notar que o carteiro em questão, embora parcialmente
responsável, não é realmente um agressor, tendo em vista que a estrutura da
agressão seja o emprego de meios (que podem ser meros objetos, mas também
outros atores, com ou sem seu conhecimento) calculados para causar uma violação
das fronteiras físicas de uma pessoa não agressora ou sua propriedade.
Agora que terminamos essa questão, devemos ressaltar que, embora existam casos onde
a aplicação da culpa e relacionamento de causalidade seja relativamente simples de traçar,
não em todos os casos assim o seria, todos os casos são diferentes, ocorrem em
circunstâncias diferentes, e portanto, devem ser analisados de maneiras diferentes,
individualmente, a cada um com sua própria análise.
Passemos então para a próxima questão, que incluíra a substancial análise de casos
polêmicos e controversos entre os libertários, relacionados com a questão de causalidade,
culpabilidade e punibilidade em algumas relações.
Agora, um de nossos assuntos que mais controversos, variando sobre inúmeros pontos de
vista, a questão das obrigações, deveres positivos, bem como existem libertários que dirão
que isso não pode existir, também existem os que dirão que podem (como o próprio
Kinsella), e, como demonstrado durante boa parte desse capítulo, estou seguindo esta
linha, e, como esses argumentos ainda não foram respondidos devidamente, creio serem
uma posição sólida o bastante para que continuemos.
– Obrigações Negativas
Não invada
Por causalidade direta (empurrar alguém em um lago, por exemplo, o que não
ocorre se a pessoa em questão tiver caído sozinha, ou outra pessoa a tiver empurrado)
isso depois])
34
Muito embora, dever-se-á ressaltar que obrigações positivas, ao contrário do que
dão a parecer, funcionam basicamente do mesmo modo que obrigações negativas
para um libertário. Estando no mesmo campo da propriedade privada, as obrigações
positivas são formalidades abstratas para o que seria um impedimento de violação de
propriedade, vez que não cumpri-las acarreta em violações, como a pessoa jogada no
lago, que pode acabar vindo a morrer, aumentando sua punibilidade criminal.
O Caso do Lago
De longe uma das melhores maneiras que posso pensar para ilustrar essa questão, o caso
do lago é uma das melhores exemplificações de obrigatoriedade positiva (e também é um
dos exemplos muito usados por Kinsella), mas, como esse caso funciona? Veja o
exemplo:
“Rothgerald e Bricks estavam no na borda um lago com uma cachoeira, fazendo uma
expedição, quando de repente, Rothgeral resolve, em um ato maléfico, empurrar Bricks
(que não sabe nadar) diretamente ao fundo do lago em que a cachoeira deságua.”
Nesse exemplo, Rothgerald acaba de contrair uma obrigação positiva para com Bricks,
por conta de seus atos deliberados, agora Bricks se encontra em uma situação de
dependência e, se vir a morrer, agora Rothgerald não apenas seria culpado pelo estado de
dependência de Bricks, mas também por sua morte35 (aumentando absurdamente sua
pena, pois é um crime capital).
Portanto, a solução para que Rothgerald possa se livrar dessa pena capital, é salvar Bricks
de seu destino (criado por Rothgerald), resgatando-o do lago.
35
Ao contrário do que se possa pensar, violações de propriedade não estão restritas
ao direto momento do ocorrido de uma ação causal (veja os exemplos dados em
outras situações pelo capítulo), ao contrário, podem se develar durante diversos
outros momentos, entre diversas outras ações intermediarias (como no caso do
terrorista e a bomba, ou do líder da seita religiosa e, nesse caso específico, das ações
de Rothgerald que acarretaram a situação de Bricks).
O Aborto
36
Vale lembrarmos que, quando o termo sendo usado é aborto, estamos apenas
descrevendo a situação de interrupção da gravidez que acarreta / causada pela morte
da criança. É perfeitamente possível justificar um ato de aborto, se esse for
Agora, qual a situação onde não podemos imputar essa obrigatoriedade? Simples, o
estupro, um ato deliberado apenas por uma pessoa, que ainda assim gera uma criança,
porém que não contém relações causais com a mãe. Para explicar melhor a diferença das
duas situações (deliberação e estupro), siga os dois exemplos:
1. X pessoa sequestra Y pessoa e a leva para uma cabana em uma situação com uma
forte e letal nevasca.
2. Z pessoa joga Y pessoa na cabana de pessoa X durante uma forte e letal nevasca.
Da mesma forma funciona a gravidez fruto de atos deliberados de ambos os pais com
reais consequências, e a gravidez fruto de atos deliberados de apenas um dos pais (o
estuprador), sendo que suas subsequentes consequências apenas recairiam sobre este, se
a mãe resolvesse abortar nesse caso, não se poderia objetar sobre suas ações, apenas
responsabilizar o “pai” pelo destino de seu filho.
Responsabilidades Tutelares
Outro ponto que causa demasiada intriga entre os libertários, é a questão das
responsabilidades de tutela, as responsabilidades existentes na efetiva criação de um filho,
e sobre isso, seguindo novamente a mesma linha de quase todo capítulo, de
responsabilidades causais, discorrerei a seguir.
“Toreau acaba, como resultado de seus atos deliberados, fraturando as mãos de seu amigo
Oichi, que é um programador, e depende delas para sobreviver, como resultado, e pelo
fato deles serem amigos37, Toreau fica a cargo de cuidar de Oichi até que o mesmo possa
se recuperar dessa fratura, sendo responsabilidade legal de Toreau que alimente e ajude
Oichi até o momento de sua ‘alta’”.
Em uma situação em que Toreau não cumprisse com essa responsabilidade, e deixasse
Oichi morrer de fome ou qualquer outra necessidade de dependência, dependência
causada exclusivamente em alguma instância pelas ações de Toreau, o mesmo poderia
ser responsabilizado com uma pena capital, ou equivalente a tal.
37
Não implicando que apenas exista essa relação em casos de amizade, apenas
ressaltando que, por eles terem essa amizade, Oichi resolve não pedir uma
restituição monetária gigantesca ou punições retributivas violentas para Toreau, mas
apenas essa ajuda. (Esse exemplo é apenas analogo a situação da criança, pois, Oichi
tem a opção de acabar por pedir uma restituição financeira, ou uma punição
retributiva para Toreau, o que não existe no caso da criança, tendo em vista que a
mesma se encontra em uma situação de dependência exclusiva de tutoria).
38
Tendo em vista que essa independência é um caso de análise, e não exatamente
fora delimitado em que momento a criança estaria em uma situação de
independência (Hans-Hermann Hoppe por exemplo, afirmaria que essa situação se
dá quando a criança possui a capacidade de fugir e dizer não a possíveis tentativas
de recaptura), poder-se-á dizer que não é uma questão fechada no meio libertário.
Porém, assim como com as demais questões, a visão que me parece mais qualificada
para gerar essa delimitação, vem da teoria do desenvolvimento moral de Kohlberg.
Agora que falamos da tutoria, das responsabilidades legais de pais para com seus filhos
(desde que responsáveis causais pelo estado dos mesmos), falaremos de uma subquestão
desse tópico.
Transferência de Guarda
Para que essa questão se torne mais clara, veja uma ramificação do exemplo anterior:
“Toreau, ao invés de cuidar de seu amigo, pediu para que outra pessoa, chamada Febrette
o fizesse, pois precisaria de sua casa completamente durante aquele tempo (por quaisquer
motivos que sejam). Porém, essa pessoa acabou deixando que seu amigo Oichi morresse.”
Nesse caso, Toreau agora é responsável pela morte de Oichi, ao passo que Fabrette não
poderia ser assim responsabilizado, pois não possuía essa cadeia de responsabilidade que
Toreau possuía39.
39
Dever-se-á notar que Fabrette não possui a mesma responsabilidade causal de
Toreau, que causou o estado de dependência de Oichi, porém, isso não exclui
quaisquer violações que Fabrette cometa, como no caso específico em que ele
resolve matar Oichi, ainda existe uma violação, e ambos, Fabrette e Toreau,
acabariam por serem responsabilizados pela situação final de Oichi.
REFERÊNCIAS
Da ilegitimidade do estado
Pois bem, o que então mantém o estado como detentor do monopólio jurídico, sendo ele
o maior agressor da justiça e da liberdade? As pessoas apoiam decisões se elas virem que
elas forem justas e morais. Ou seja, se as pessoas enxergarem que as ações praticadas
pelo estado forem justas e morais, elas dão legitimidade ao grande leviatã. O estado, ao
deter legitimidade aos olhos de seus subordinados, não corre o risco de uma revolta e de
ser aniquilado enquanto ele pratica suas várias agressões. Até mesmo que o estado fosse
aniquilado por uma revolução armada, se as pessoas continuarem vendo a necessidade e
legitimidade de um estado, logo outro, provavelmente mais agressor, seria posto em
prática.
Dessa forma, podemos constatar que a batalha contra o estado não é uma batalha de
armas. O campo de batalha é intelectual, ele existe na mente de cada uma das pessoas.
Não surpreendentemente, o estado alicia os meios intelectuais para propagar sua falsa
legitimidade. Desde criança, somos expostos à doutrinação estatal por educação
obrigatória, intelectuais comprados, mídia tendenciosa e dependência de programas
governamentais.
Os ataques mais contundentes ao estado são aqueles que deterioram sua falsa
legitimidade. O humor tem a capacidade de transformar as maiores atrocidades e
agressões em riso, por um momento conseguimos olhar além do nefasto e rir da
absurdidade. Hans-Hermann Hoppe pontua de forma precisa:
O estado presume que você deve respeitá-lo, que você deve levá-lo muito a sério. Hobbes dizia que era
algo muito perigoso o fato de as pessoas rirem do governo. Portanto, tente sempre seguir a seguinte regra:
ria e zombe do governo o máximo possível (HOPPE, 2010).
Jordan Peterson uma vez disse em uma palestra que os humoristas são os canários na
mina de carvão da liberdade de expressão. Quantos humoristas já receberam processos
por engravatados que se sentiram ofendidos por serem expostos pela luz do humor? O
bobo da corte é o único que pode falar a verdade para o rei. Quando o bobo da corte é
morto por falar a verdade, sabemos que estamos vivendo na pior das tiranias
(PETERSON, 2018).
Libertarianismo Cultural
De certo que a transição para uma sociedade libertária não iria ocorrer da noite para o dia,
visto o vírus da cultura estatal presente na sociedade atual. Esta é a natureza da realidade
temporal em que vivemos. Todavia, o objetivo da liberdade imediata não deve ser
considerada algo utópico, porque a sua realização é dependente da vontade do homem,
sem demais restrições. Se, por exemplo, todo mundo repentina e imediatamente
concordasse com as vantagens predominantes da liberdade, então a liberdade total seria
alcançada imediatamente. Em suma, apesar de ser necessária uma conquista cultural, o
libertarianismo não é utopia.
Ademais, após a explanação de que o libertarianismo não é uma filosofia-política utópica,
é necessário elucidar, esclarecer os mecanismos, ou estratégias que utilizaremos para o
alvorecer da liberdade. Antes de tudo é necessário criar uma vacina para o vírus da cultura
estatal - diria que até mesmo retirar o tumor do câncer estatista. Acerca das estratégias e
ferramentas utilizadas para alcançarmos uma sociedade libertária, Hans-Hermann Hoppe
diz:
Como o estado e a doença estatista podem ser detidos? Darei início agora às minhas considerações
estratégicas. Em primeiro lugar, três princípios norteadores ou insights fundamentais devem ser
identificados. Primeiro:que a proteção da propriedade privada e a lei, justiça e a imposição da lei, são
essenciais para qualquer sociedade humana (HOPPE, 2013, p. 25).
Ora, pois, não há uma única explicação que justifique a atividade monopolística de tal
tarefa. O que, por fim, Hoppe completa:
"Na verdade, o que ocorre é precisamente que tão logo se tenha um monopolista se encarregando dessa
tarefa, ele irá necessariamente destruir a justiça (HOPPE, 2013, p.25)"
Para assegurar a predominância do correto pensamento estatista, um monopolista de proteção irá utilizar
sua posição privilegiada de operador de um esquema de extorsão para estabelecer rapidamente um
monopólio da educação. Mesmo durante o século XIX sob condições monárquicas decididamente
antidemocráticas, a educação, ao menos no nível da educação básica e universitária, já era em grande parte
organizada monopolisticamente e financiada compulsoriamente (HOPPE, 2013, p. 39).
Ademais, corroborando com a tese acima, a educação, quando pública, se torna o modelo
de doutrinação - e independente da doutrinação ser de esquerda ou de direita, é sempre
uma afirmação ao estado, uma doutrinação da cultura estatista. No tocante a isto,
nenhuma outra fala se fez a maior prova gritante da lobotomização que não a seguinte
afirmação de um dos patronos da educação pública:
Jeremy Belknap em um “Sermão Eleitoral” pregado em 2 de junho de 1785, perante o Tribunal Geral de
New Hampshire, idealizou uma educação pública e obrigatória à todos os jovens americanos. Ele apelou
para o exemplo da antiguidade quando, de acordo com Licurgo, onde os jovens deveriam pertencer mais
ao estado do que aos pais (KOHN, 1946, p. 304)
E isto fez com que o sistema educacional se torna-se compulsivo e encarecido. Ao invés
de gastarem milhões sobre temas frívolos e vazios, estariam gastando esse dinheiro de
forma muito mais otimizada com resultados muito mais produtivos à sociedade, de forma
geral. Entretanto, todo esse sistema educacional compulsório agrada muito o ego dos
professores e demais profissionais da área; pois, de certo que o estado gera diversos
empregos nesta área. Caso essa engenharia social sumisse, conjectura-se que diversos
profissionais estariam desempregados, e outros com salários à uma pequena fração
comparado ao atual. Por fim, isto gera em torno do estado, devido aos interesses
econômicos, um muro de legitimação intelectual, por assim dizer. Criando um
desequilíbrio político-ideológico, uma invasão bárbara na educação.
O trabalho criador exige ainda outras virtudes. Reúno aqui três das suas exigências que mutuamente se
corroboram, para que uma obra não seja curta nem indigente. Precisamos de trabalhar com constância, com
paciência, com perseverança. A constância mantém-se a pé firme, a paciência suporta as dificuldades, a
perseverança [...] Durante as horas de trabalho intenso, assalta-nos a tentação de interromper o esforço,
desde que o menor incidente traz a languidez e provoca o tédio [...] Nos momentos de inspiração, estas
armadilhas não oferecem grande perigo, porque a alegria da descoberta ou da produção opera como freio;
mas as horas ingratas não se fazem esperar e, enquanto dura, é poderosa a tentação (SERTILLANGES,
2010, p. 167, 168, 169).
E sobre a educação pública e compulsória: evidentemente que para um libertário genuíno,
o sistema educacional não deve ser centralizado, e ainda menos monopolizado. Acerca
de como se daria a educação e da vida intelectual no libertarianismo, apoiar-me-ei no
livro Educação Livre e Obrigatória de Rothbard. Inicialmente diz:
A educação deve ser conduzida num cenário institucional de liberdade, ou deve ser financiada e
administrada compulsoriamente? Esta é uma antiga questão que remonta aos primórdios da filosofia
política, mas que raramente é discutida hoje, no entanto, torna-se especialmente pertinente neste tempo de
aumento da violência e de declínio de valores nas instituições de educação pública. Decidir que o governo
e não a família é o principal responsável pela supervisão da educação da criança pode, num primeiro
momento, parecer uma pequena concessão. Mas [...] não é fácil – e pode de fato ser impossível – controlar
o poder político, uma vez que este ganha o controle da escolaridade. (ROTHBARD, 2013, p. 9)
A liberdade de expressão deve ser protegida, pois ela é a ferramenta usada no campo de
batalha intelectual. Todo tipo de tentativa a cercear a expressão deve ser identificada e
contida. O estado vai ser sorrateiro, criando leis de discurso de ódio ou uso obrigatório
de pronomes. Tudo isso não passa de uma maneira de controlar o que você pode ou não
falar, e ao controlar o que você pode ou não falar, ele está ultimamente alterando a própria
pessoa que você é. Devemos lembrar que a liberdade está nunca a mais de uma geração
a ser extinta (REAGAN, 1961), se não defendermos a liberdade de expressão hoje, a
próxima geração ao crescer sem liberdade não terá armas para lutar contra o leviatã, é só
ver regimes totalitários ainda existentes como a Coréia do Norte. A China pós-Mao ainda
vive sem saber o que é liberdade, salvo uma região chamada Hong Kong. Uma pequena
dose de liberdade já foi suficiente para gerar uma revolta popular contra a tirania[3].
Nossas crianças são sequestradas pelo estado para centros de doutrinação e lavagem
cerebral. O estado chama isso de escola, mas nós sabemos muito bem o que é isso. As
crianças são a nova geração, as herdeiras desse mundo que herdamos de nossos
antepassados, elas devem ser vacinadas contra a tirania e controle mental do estado. Por
mais que a doutrinação estatal seja obrigatória, a família como instituição tem o dever
moral de educar os filhos, pois o futuro deles depende deles não serem mais uma cabeça
de gado. O arcabouço ético libertário é uma vacina contra os absurdos pregados por
estatistas, a defesa da propriedade privada e a liberdade de expressão permitem que uma
criança questione falsas autoridades presentes na escola. O homeschooling ainda é
proibido no Brasil, mas isso não significa em jogar a toalha ainda, a maioria de nós
estudamos em escolas cujo conteúdo é administrado pelo MEC, ainda assim você está
lendo esse livro.
A Internet é vital para a liberdade de expressão. Nunca foi tão fácil, barato e
descentralizado o acesso à informação. Não nos surpreende o fato de estados ao redor do
mundo anseiam a regulamentação e monitoramento da Internet. Fomos alertados há muito
tempo, antes mesmo da Internet existir, sobre o perigo do monitoramento em massa por
George Orwell em seu livro “1984”. A Internet nos permite comunicar e procurarmos
informações de maneira livre e anárquica. Se soubermos que estamos sendo monitorados,
nós já agiremos de maneira diferente. O estado vai utilizar as mesmas desculpas de
sempre, dizendo que eles monitoram pela nossa segurança, mas de novo isso foi provado
mentiroso recentemente com Edward Snowden expondo o programa de vigilância interno
da NSA.
Após elucidação sobre a estratégia cultural, resta-nos dois insights a respeito: (i) de que
tentar alterar a estrutura educacional atual se torna pragmaticamente insustentável, com
o passar do tempo. Porque seria necessário bater de frente com toda a estrutura estatal já
existente (abro este parêntese para dizer que: devemos sim lutar contra o aparato estatal;
como devemos, também, ser realistas, a ponto de reconhecer a falibilidade de um
plano/estratégia). Além do mais que ao utilizar a via intelectual, de certa forma,
afirmarmo-a. (ii) Nem toda a população, nem educadores e intelectuais, são
completamente homogêneos ideologicamente.
Em contramão à abordagens mais macro, surge uma solução que visa os grupos pequenos.
Seccionando, então, a sociedade.
Uma vez que o número de territórios implicitamente separados atingisse uma massa crítica – e cada ação
bem sucedida em uma pequena localidade promoveria e alimentaria a próxima – o movimento seria
inevitavelmente mais radicalizado em um movimento de municipalização espalhado por toda a nação, com
políticas locais explicitamente de secessão e pública e insolentemente demonstrando desobediência à
autoridade federal.
E então, será em uma situação como esta – quando o governo central for obrigado a abdicar de seu
monopólio da violência e da tomada suprema de decisões judiciais, e quando a relação entre as autoridades
locais (em ressurgimento) e as autoridades centrais (prestes a perder seus poderes) puderem ser colocadas
em um nível puramente contratual – que recuperaremos o poder de defender nossa própria propriedade
novamente (HOPPE, 49, 2013).
O estado quer te tornar dependente dele (seja para que você pense sobre ele como algo
justo, ou que torne impossível imaginar como seria a vida sem um ditador; sempre para
perpetuar a cultura estatal. Torna-se, então, difícil pensar como funcionam coisas básicas
como estradas, praças, segurança pública, etc), o estado te torna dependente de um serviço
o qual ele monopoliza, e te faz acreditar que sem ele não o teria. Os burocratas te quebram
as pernas, para depois te darem muletas e dizerem que sem o estado você não andaria. Dê
um peixe a um homem e ele votará em você nas próximas eleições, ensine-o a pescar e
ele nunca mais precisará das migalhas de um burocrata.
O libertário é um devoto da justiça. A lei natural é sua filosofia e seu arcabouço, todas as
suas ações são norteadas pela ética. O objetivo da sua penosa luta é o fim da injustiça e a
alvorada da liberdade.
Por esta razão, o objetivo libertário, a vitória da liberdade, justifica os meios mais rápidos possíveis para se
alcançar o objetivo, mas estes meios não podem contradizer, e com isso enfraquecer, o próprio objetivo
(ROTHBARD, 2013, p. 340).
A pergunta central aqui é: É ético usar a máquina estatal contra ele mesmo? Pode parecer
uma pergunta simples, mas a resposta tem repercussões extensas sobre o ponto de vista
estratégico.
Se considerarmos que sim, podemos concluir que existam políticos libertários? Veja, o
político é um funcionário do estado, que não está sujeito à competição de mercado e que
não gera riqueza, ele recebe dinheiro por roubo (o leitor já sabe do que estamos falando).
Não seria isso incompatível com a ética libertária? Por outro lado, se o suposto político
libertário revogar leis e diminuir impostos, não estaria criando um saldo positivo contra
o dinheiro que ele se apropria? Essa é a vertente dos Gradualistas. Não é de se surpreender
que seja uma vertente extremamente controversa dentre libertários.
O Gradualista, ao utilizar a política para obter resultados em curto prazo, pode prejudicar
o movimento libertário ao longo prazo. Ao utilizar o perverso meio político, ele
inerentemente legitima o próprio sistema, quando o objetivo final do libertário é a
extinção do estado. Contra todo tipo de uso de sistemas estatais existe o Purista, que
constata que “Gradualismo na teoria é perpetuidade na prática” (ROTHBARD, 2010, p.
338). Segundo o Purista, os meios graduais são incompatíveis com o libertarianismo. O
Purista é um abolicionista, a liberdade deve ser defendida em sua totalidade, não existe
“meia-liberdade” agora para se ter liberdade completa depois. Não se negocia com o
inimigo. Porém se não pelos meios políticos que podem enfraquecer o estado de maneira
infiltrada, como aniquilar o estado por meios invasores?
No momento em que este livro foi escrito, estamos em um mundo estatizado. Nesse
momento, o Purista apertaria um botão que acabasse com toda a forma de estado se
existisse tal botão. Mas esse botão não existindo, que opções nos restam? O estado por
maior que seja, não consegue abranger e prever toda a ação humana. É possível agir por
baixo dos panos, enganando o estado e diminuindo o alcance de suas agressões.
Além da estratégia que o libertário adota, as maneiras dele agir podem ser apresentadas
de maneiras diferentes. O libertário pode decorrer de sua ética diariamente, em conversas,
debates, textos. A apresentação do conteúdo pode ter várias formas estéticas, ele pode ser
contundente, persuasivo, hilário, motivacional. Essa é outra dimensão em que os
discursos libertários podem se diferenciar. Mais especificamente, temos duas estéticas
prevalecentes, o Humanitarismo e o Brutalismo.
A ética libertária é radical em algumas de suas conclusões, tanto que não é surpreendente
a resistência acadêmica sobre a filosofia ética libertária. Como uma maneira de expor o
libertarianismo, os Humanitários o adornam, utilizando pautas mais leves como igualdade
e minorias a fim de deixá-lo mais atraente para o público. O Humanitário foca em pautas
como paz e liberdade, por vezes deixando de mencionar as pautas mais radicais como a
defesa de desassociação e discriminação.
O libertarianismo permite que ambos façam sua defesa do libertarianismo, pois eles não
agridem a propriedade de ninguém ao fazê-la. Qual será a maneira mais eficaz de
apresentar a ética libertária? Da mesma maneira que há grande discussão sobre Purismo
e Gradualismo, há uma grande discussão sobre as vantagens de um discurso sedutor
humanitário e um discurso não-diluído rigoroso brutalista. Nas palavras de Rothbard,
“libertarianismo não oferece um modo de vida; ele oferece liberdade, para que cada
pessoa seja livre para adotar e agir sob seus próprios valores e princípios morais.”
Notas dos autores
[1] A história nos relata que houve muitas invasões horizontais de bárbaros; hoje, porém,
vivemos uma invasão vertical de bárbaros, que é a que penetra pela cultura – como se vê
entre intelectuais que insistem em justificar o terrorismo, músicos que defendem uma
vida desregrada ou artistas que zombam da beleza
[2] Caos (em grego antigo χάος, khaos) refere-se a sem forma ou vazio que precede a
criação do universo ou cosmo no mito da criação na tradição grega, ou ao "hiato" inicial
citado para a separação original do céu e da terra da tradição abraâmica (KIRK, 1984).
[3] Hong Kong, após mais de um século como colônia britânica, teve sua soberania
regredida à China em 1997 sob o plano de um país, dois sistemas. Diferentemente do
regime socialista chinês, Hong Kong manteve seu sistema econômico e social que previa
direitos de propriedade, liberdade de imprensa e ocupação (CMAB, 2007). Em 2019, o
governo chinês propôs uma emenda de lei sobre extradição, o que causou preocupação
no povo de Hong Kong por temerem ficarem sujeitos ao sistema legal chinês. Uma grande
onda de protestos em massa ocorreram a favor da soberania de Hong Kong. Um deles,
em Victoria Park, 16 de junho de 2019, estima-se ser o maior protesto até então da história
de Hong Kong, com quase dois milhões de pessoas (REUTERS, 2019).
Referências Bibliográficas
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Disponível em: <https://www.cmab.gov.hk/en/issues/jd2.htm> Acesso em 27 de ago.
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em: <https://www.reuters.com/article/us-hongkong-extradition-idUSKCN1TH00P>
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ROTHBARD, Murray N. Ética da Liberdade. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises
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_____, Murray N. Educação Livre e Obrigatória. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises, 2013.
(https://mises.org/library/myth-and-truth-about-libertarianism)