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Interação em Psicologia, 2008, 12(1), p.

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Impacto das Configurações Familiares no Desenvolvimento de Crianças e


Adolescentes: Uma Revisão da Produção Científica

Débora de Oliveira
Aline Cardoso Siqueira
Débora Dalbosco Dell’Aglio
Rita de Cássia Sobreira Lopes
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

RESUMO
O presente estudo teve por objetivo mapear a produção científica sobre o impacto das diferentes
configurações familiares, no desenvolvimento de crianças e adolescentes. Foram selecionados
abstracts de periódicos científicos nacionais e internacionais indexados em diferentes bases de dados,
através de combinações de descritores. A revisão dos abstracts resultou em 415 artigos produzidos
nos períodos de 1955 a 2005, sendo que 401 internacionais e 14 nacionais. Observou-se um maior
número de publicações a partir da década de 1990. Na literatura internacional, houve predomínio de
estudos empíricos, de caráter quantitativo. Estes focalizavam, em sua maioria, famílias monoparentais
e adolescentes, em comparação com crianças. Os resultados também revelaram uma maior freqüência
de estudos que não encontraram mudanças e conseqüências significativas de diferentes configurações
familiares para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. No entanto, percebeu-se que, entre os
estudos que identificaram mudanças e conseqüências significativas, houve um predomínio das
negativas em relação às positivas, o que faz pensar na estigmatização de configurações diferentes da
família nuclear. Ainda que a análise tenha se baseado apenas em abstracts, acredita-se que permitiu
vislumbrar o estado da arte sobre o tema.
Palavras-chave: diferentes configurações familiares; crianças, adolescentes; “estado da arte”.

ABSTRACT
The Impact of Family Configurations on Child and Adolescent Development:
The Review the Scientific Production
The present study aimed to review the scientific production on the impact of different family
configurations on child and adolescent development. Abstracts from national and international
periodicals, indexed in different databases, through combinations of keywords, were selected. The
review identified 415 articles printed between 1955 and 2005, 401 of which were international and 14
were national. There was a greater number of publications from the 1990´s. In the international
literature, there was a predominance of quantitative, empirical studies. Most of them focused on
single-parent families, and on adolescents as opposed to children. The results also revealed a greater
frequency of studies which did not find significant changes and consequences of the different family
configurations for child and adolescent development. However, in studies which did identify
significant changes and consequences, focus on the negative was more frequent than the positive,
which raises the question of stigmatization of family configurations that are different from the nuclear
family. Even though the analysis was based on abstracts alone, it is believed that it allowed for the
characterization of the state of art in the area.
Keywords: different family configurations; children; adolescents; “state of art”.

A família constitui-se em um centro formador da bros (De Antoni, 2005). É o principal agente de sociali-
sociedade, bem como do desenvolvimento individual e zação da criança, que influencia na aquisição de suas
da maturidade emocional de cada indivíduo (Winnicott, habilidades, comportamentos e valores apropriados
1965/2001). Família pode ser entendida como um para cada cultura, constituindo-se em uma dimensão
conjunto de relações caracterizadas por influência essencial na vida dos indivíduos. A família caracteriza-
recíproca, direta, intensa e duradoura entre seus mem- se como parte essencial na construção da saúde emo-
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cional de seus membros, tendo como função básica a de compreendê-las e de avaliar os seus efeitos sobre
proteção e o bem-estar destes (Minuchin, 1982; Osório, os membros envolvidos (Ramires, 2004; Wagner,
1992). 2002), ainda não são conclusivas as suas conseqüências
A instituição família vem sofrendo modificações no desenvolvimento de crianças e adolescentes (Amato,
através da história, que pode variar de uma cultura 1995). O IBGE aponta que, especificamente, o au-
para outra. Apesar das mudanças, a família apresenta mento de separações e divórcios (de 1991 a 2002,
capacidade de sobrevivência e de adaptação, origi- houve um crescimento de 59,6%) e de recasamentos
nando diferentes formas de composições e de padrões (de 1991 a 2002, houve aumento de 5,5%) têm feito
relacionais (Wagner, 2002). Para Figueira (1986), hou- com que muitas crianças e adolescentes não cresçam
ve um processo de modernização da família guiado mais na presença de pais biológicos, e convivam com
pelo ideal de uma família “igualitária” em detrimento o recasamento destes e com novos irmãos (IBGE,
de um ideal hierárquico, herança do sistema patriarca- 2002/2003). Algumas vezes, essas famílias enfrentam
lista. As transformações paradigmáticas, ocorridas problemas associados às desvantagens econômicas,
principalmente a partir de meados do século XX, no exigindo de pelo menos um dos progenitores uma
que diz respeito à configuração e ao funcionamento maior energia e tempo, não só no trabalho, mas tam-
familiar, provocaram alterações na estrutura e na dinâ- bém nas atividades domésticas e de cuidado com os
mica de suas relações, contribuindo para a concepção filhos (Dessen & Braz, 2005). Estes aspectos acabam
contemporânea de família. Essas modificações têm interferindo na qualidade das relações e no tempo que
acarretado mudanças nos padrões de funcionamento os pais permanecem com os filhos, exigindo modifi-
entre os seus membros, levando a um processo de cações na rotina diária em decorrência da reorganiza-
assimilação e de construção de novos modos de rela- ção familiar. Para Ramires (2004), as alterações na
cionamento (Wagner, Ribeiro, Arteche & Bornholdt, vida afetiva, social e profissional dos pais exigem, por
1999). vezes, mudanças na rede de convivência e de apoio
Em decorrência disso, a família da atualidade é ca- das crianças, introduzindo a necessidade de relacio-
racterizada por redefinições de papéis, hierarquia e namentos com seus familiares e com novos parceiros.
sociabilidade, permitindo diferentes configurações fa- Na literatura, alguns autores apontam o prejuízo e
miliares, que estão centradas na valorização da solida- o sofrimento atrelados à separação e ao divórcio, en-
riedade, da fraternidade, na ajuda mútua, nos laços de tendendo-os como um choque doloroso e angustiante
afeto e de amor (Fonseca, 2002; Perrot, 1993; Rizzini, (Carter & McGoldrick, 1989/2001; Wallestein, 1985),
2002), em detrimento da exigência da consangüinida- já que podem desencadear problemas de ajuste psico-
de (Fachin, 2001; Goldani, 1994). Segundo Osório lógico e social nas crianças e adolescentes (Walsh,
(2002), diferentes configurações consistem no modo 1993). Outros autores destacam o seu potencial de
como se dispõem e se inter-relacionam os membros de reorganização e o amadurecimento precoce destes, que
uma mesma família, que estabelecem relações não tendem a expressar mais atitudes amorosas com os
apenas por laços consangüíneos. Assim, observa-se pais quando comparados aos filhos de famílias intactas
que o entendimento atual de família não está mais (Parish & Necessary, 1994). Segundo Hetherington e
atrelado necessariamente à concepção de família nu- Stanley-Hagan (1999), crianças de famílias monopa-
clear, composta de mãe, pai e filhos, seguindo o mo- rentais podem apresentar maior nível de bem-estar do
delo tradicional patriarcal. A noção de família tem se que as de famílias nucleares com alto nível de conflito,
ampliado na medida em que procura incluir e compre- uma vez que o bem-estar infantil está associado ao
ender as diferentes relações entre os seus membros. bem-estar dos pais e ao relacionamento entre eles.
No cotidiano, é possível encontrar famílias seguindo
modelos tradicionais, casais dividindo os cuidados dos Além do nível de conflito do ambiente familiar, o
filhos e da organização familiar, mulheres e homens desenvolvimento cognitivo e das estruturas de pensa-
assumindo sozinhos o sustento financeiro da família/ mento das crianças também podem influenciar na
produções independentes (monoparentalidade), famílias compreensão e nas respostas frente ao divórcio dos
reconstituídas/recasadas, casais sem filhos, casais ho- pais (Ramires, 2002). Crianças de oito a nove anos de
mossexuais, casal com filhos adotivos, entre outras. idade tendem a apresentar maior vulnerabilidade às
transições familiares, indicando maiores dificuldades
Embora essas modificações estruturais na organi-
e estresse para lidar com esse momento do divórcio em
zação familiar tenham aumentado o interesse pelo
função do grau de maturidade de seu desenvolvimento
estudo da família nas últimas décadas, com o intuito
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cognitivo e socioemocional (Kaslow & Schwartz, 1987/ Lilacs, Psyc-Info, Scielo e Bvs-Psi. Os descritores
1995; Ramires, 2004; Wallerstein & Kely, 1996/ 1998). utilizados para o levantamento foram: família, confi-
Outros pesquisadores também apontam que as difi- guração familiar, divórcio, recasamento, separação,
culdades de funcionamento familiar não estão, neces- monoparentalidade, família monoparental, família
sariamente, associadas à sua configuração, mas sim às reconstituída, crianças e adolescentes, em português; e
relações que se estabelecem entre os seus membros em inglês, family, family configuration, single-parent
(Grossman & Rowat, 1995). A competência ou saúde family, children, single-family, adolescents, separation,
da família depende de fatores como o desempenho de divorce, remarriage, remarried, blended family e
papéis específicos e a delimitação da função de auto- stepfamily. Buscou-se utilizar diferentes combinações
ridade nas figuras parentais, a qual é fundamental para dessas palavras, com o objetivo de realizar um levan-
um funcionamento familiar saudável e para o bem- tamento abrangente que incluísse o maior número de
estar de seus membros (Féres-Carneiro, 1992; Féres- estudos da área. Dessa forma, somente os estudos que
Carneiro, 1998). Além disso, a qualidade da comuni- focalizaram os temas da separação/divórcio, recasa-
cação estabelecida entre os cônjuges e a satisfação mento, monoparentalidade e seus efeitos sobre o desen-
conjugal também constituem preditores de uma boa volvimento de crianças e adolescentes foram selecio-
saúde física e emocional das crianças (Erel & Burman, nados nesse levantamento. Foram identificados 415
1995; Féres-Carneiro, 2003; Kreppner, 2000). abstracts de artigos científicos indexados, entre o
período de 1955 a 2005, sendo 401 internacionais e 14
Em função da pluralidade de relações afetivas e de nacionais. A identificação das informações e o levan-
configurações familiares e de seu impacto no desen- tamento de categorias de análise dos dados foram
volvimento de crianças e adolescentes, faz-se necessá- realizados em duas etapas. As categorias de análise
rio conhecer e sistematizar as pesquisas nesse campo foram elencadas previamente, buscando identificar
de conhecimento. Dessa forma, o objetivo do presente quantitativamente três informações: o ano de publica-
estudo foi mapear a produção científica sobre as fa- ção, as características da amostra e o método utilizado.
mílias separadas/divorciadas, recasadas e monopa- Após esta etapa, os abstracts encontrados foram anali-
rentais a partir de estudos nacionais e internacionais sados qualitativamente, de forma a conhecer os prin-
de periódicos científicos indexados, apontando a ten- cipais temas pesquisados e compreender as tendências
dência da produção científica, as escolhas metodoló- observadas da produção. Para os abstracts que não
gicas e as características das amostras desses estudos. apresentaram as informações investigadas, a categoria
Além disso, buscou-se discutir os principais aspectos de análise foi considerada como não especificada.
que vêm sendo investigados e destacados em diferen-
tes décadas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
MÉTODO Os resultados foram organizados a partir de quatro
categorias de análise dos dados a priori: (1) Publica-
A opção metodológica de pesquisa de levanta- ção de artigos científicos por década; (2) Método e
mento e de avaliação do conhecimento sobre determi- amostra dos artigos publicados; (3) Tipo de configu-
nado tema é um desafio para o pesquisador que busca ração familiar abordado nas publicações; (4) Conteú-
conhecer o já construído e produzido para, somente do temático das publicações. Os abstracts foram clas-
depois, dedicar-se a temas ainda não explorados no sificados separadamente por dois juízes e, em caso de
campo científico (Ferreira, 2002). Segundo esta auto- discordância, utilizou-se um terceiro juiz. A seguir,
ra, as pesquisas de caráter bibliográfico são conheci- serão apresentadas e discutidas as categorias de análi-
das pela denominação de “estado da arte” ou “estado se dos dados.
do conhecimento”. Nos últimos 15 anos, há um desta-
que significativo de pesquisas que realizam uma des-
1) Publicação de artigos científicos por década
crição da produção acadêmica e científica sobre de-
terminado tema. Dentro dessa perspectiva, o levanta- Esta primeira categoria de análise refere-se ao le-
mento e a avaliação de abstracts constituem um meio vantamento da produção científica internacional e
de vislumbrar com maior abrangência a literatura ci- nacional por década. Observou-se que os estudos so-
entífica, promovendo a divulgação e a facilitação do bre os temas em foco surgiram timidamente nas déca-
acesso aos dados estudados. das de 1950 e de 1970, havendo um acréscimo pro-
gressivo nas décadas de 1980, 1990 e 2000, conforme
Esta pesquisa incluiu a produção científica dos úl-
a Figura 1.
timos 50 anos, das seguintes bases de dados: Medline,
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158

128

106
Nacionais
Internacionais

8 7 6
0 1 0 0 0 1

1950 1960 1972 a 1980 a 1990 a 2000 a


1979 1989 1999 2005

Figura 1. Publicação de artigos internacionais e nacionais por década.

A partir da década de 1980 houve um crescimento indivíduos, na medida em que não vivenciar esse pa-
abrupto de estudos, no âmbito internacional, sobre drão de família pode levar ao sofrimento psíquico
famílias separadas/divorciadas, recasadas e monopa- (Narvaz & Koller, 2005).
rentais e os efeitos no desenvolvimento de crianças e É possível dizer que os resultados observados estão
adolescentes inseridos nesses contextos. No Brasil, associados ao fato de que, nessas últimas duas déca-
este crescimento foi visualizado na década de 1990. das, as transformações ocorridas nas configurações
Apesar de pouco expressivo, pode-se constatar que o familiares provocaram alterações na estrutura e na
número de publicações, em um período de cinco anos dinâmica das relações familiares, tanto a nível inter-
na década de 2000, é promissor quando comparado à nacional quanto, especialmente, a nível nacional. Es-
produção de toda década de 1990. sas transformações no âmbito privado das relações
De acordo com Wagner (2002), as pesquisas pro- familiares exigiram também uma mudança no campo
duzidas, no Brasil, surgiram timidamente na década científico, que passou a ter maior interesse por estes
de 1980, em decorrência da legitimização do divórcio temas, na medida em que se dedicou a descrever as
ocorrida em dezembro de 1977, e enfocaram os cha- estruturas de parentesco, a analisar as leis referentes à
mados “filhos do divórcio”. Bucher e Rodrigues (1990) família, as repercussões sobre os indivíduos, dentre
apontam que os temas recasamento e famílias recons- outros temas atrelados ao contexto familiar (Dessen &
tituídas foram pouco investigados na década de 1980 Braz, 2005; Ramires, 2004; Wagner, 2002). Ainda
no Brasil, em função do tabu e do obscurantismo que que em menor número de publicações, quando compa-
cercavam as relações não legais entre homens e mu- rado ao internacional, pesquisadores brasileiros passa-
lheres. Para estes autores, a legitimação da união está- ram a interessar-se pela compreensão das diferentes
vel entre homem e mulher como entidade familiar, na configurações familiares e de seus efeitos sobre os
nova Constituição Federal de 1988, pode ser conside- membros envolvidos.
rada um marco importante no incentivo de pesquisas
sobre as diferentes configurações familiares. Os valo- 2) Método e amostra dos artigos publicados
res conservadores e as crenças familiares tradicionais Esta categoria de análise refere-se ao levantamento
prescritos pela sociedade influenciam na vida dos da produção nacional e internacional em termos de

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método (empírico ou teórico; quantitativo e/ou quali- observou-se um destaque para os estudos empíricos,
tativo) e características da amostra dos estudos entre o tanto em nível internacional (78,3%) quanto nacional
período de 1955 a 2005. De acordo com a Tabela 1, (71,42%).

TABELA 1
Freqüência de Artigos Internacionais e Nacionais por Método Empírico vs. Revisão
Internacionais Nacionais Total
f % f % f %
Empírico 314 78,3 10 71,42 325 78,31
Revisão 80 19,50 4 28,57 83 20
Não-especificado 7 1,74 - - 7 1,68
Total 401 100 14 100 415 100

Uma análise do tipo de método (quantitativo e/ou se às nuances de sentidos e aos elos lógicos dos rela-
qualitativo) foi realizada, conforme mostra a Figura 2. tos, detendo-se ao estudo de um determinado fenôme-
Os abstracts encontrados indicaram em sua descrição no (Creswell, 1994). O uso desse método permite
de método os seguintes termos: quantitativo, qualitati- muito mais a compressão e a descrição dos dados do
vo e quantitativo-qualitativo. Observou-se também que a generalização dos mesmos (Godoy, 1995a;
que alguns não especificaram o método utilizado. Em Godoy, 1995b). Já o método quanti-qualitativo, é en-
função de a análise do presente estudo centrar-se em tendido pelo continuum interativo entre esses dois
abstracts de artigos científicos, não foi possível iden- métodos. Esse entrelaçamento facilita a avaliação, o
tificar o tipo de técnica de análise utilizada pelos planejamento e a conduta da pesquisa, de tal modo
mesmos. Assim, entende-se por método quantitativo que maximiza ambas as metodologias (Benz &
os estudos que testam hipóteses, comparam construc- Newman, 1998; Creswell, 1994). Os estudos interna-
tos específicos a partir de grupos de análise (Creswell, cionais utilizaram método predominantemente quan-
1994). Através do uso desse método, é possível ter titativo (59,35%), seguido pelo método qualitativo
uma maior precisão na medida, uma vez que os dados (25,93%) e apenas 1,74% estudos utilizaram método
podem ser mais facilmente sumarizados e compará- quanti-qualitativo. Quanto aos estudos nacionais, cons-
veis, podendo ser generalizados para além da amostra tatou-se uma preferência pelo método qualitativo
estudada. Por sua vez, o método qualitativo não pro- (71,43%), seguido pelos métodos quanti-qualitativo
cura enumerar ou medir os eventos estudados, prende- (14,28%) e quantitativo (14,28%).

238

Internacionais
103 Nacionais

53

10 7
2 2 0

240 113 9 53

Quanti Quali Quanti-quali Não-


especificaram

Figura 2. Publicação de artigos internacionais e nacionais por método quantitativo vs. qualitativo.

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No que se refere ao levantamento das característi- entendida como uma transição vital, também estando
cas da amostra dos artigos internacionais e nacionais, associada a reorganizações sociais, emocionais e cog-
não foi possível mapear detalhadamente a faixa etária nitivas (Levisky, 1998). Outra hipótese que pode ser
dos participantes, visto que houve muitos estudos que pensada para explicar o maior número de pesquisas
falavam de “filhos”, sem especificar a idade, e tam- com adolescentes está relacionada, primeiro, ao está-
bém outros que incluíram tanto crianças quanto ado- gio de desenvolvimento cognitivo dos adolescentes,
lescentes. Observou-se uma tendência dos abstracts que os permite entender os instrumentos e responder
de não especificarem a faixa etária da amostra de cri- escalas auto-aplicativas com maior facilidade, e em
anças e de adolescentes (155; 100%). Entre os que segundo, pelo fato dos adolescentes colocarem-se
especificaram (260; 100%), observou-se uma tendên- acessíveis e disponíveis para participar de atividades
cia de amostras envolvendo adolescentes (109; novas, como uma pesquisa.
41,92%) e crianças (95; 36,53%), e de crianças e
adolescentes (56; 21,53%). 3) Tipo de configuração familiar abordada nas
De acordo com Bucher e Rodrigues (1990), os es- publicações
tudos enfocando os pais, madrastas, padrastos e a Esta categoria refere-se ao tipo de configuração
relação conjugal surgiram mais recentemente. É pos- familiar pesquisado pelos abstracts. A partir dos da-
sível dizer ainda que a tendência de focalizar a popu- dos, foram levantados quatro tipos de configuração:
lação de adolescentes, seguidos de crianças também (1) monoparentalidade, (2) divórcio/separação, (3) reca-
foi observada no contexto brasileiro. A multiplicidade samento e (4) diferentes configurações. Entende-se
de amostras, indicada pelo levantamento do presente por diferentes configurações os abstracts que tratavam
estudo, ressalta a preocupação dos pesquisadores em de mais de duas configurações familiares, como famí-
investigar as diferentes configurações e seus efeitos lia intacta, monoparental e recasada, ou ainda, referi-
sobre crianças e adolescentes, a partir de diferentes am-se às mesmas sem especificações.
pontos de vista. O predomínio de estudos com amos- Como pode ser visto na Tabela 2, entre os abs-
tras de adolescentes e de crianças pode estar associado tracts internacionais, houve um predomínio de estu-
ao nível de conflito envolvido nesses momentos de dos sobre monoparentalidade (50,37%), e entre os
transição familiar, podendo ter efeitos diretos sobre o abstracts nacionais, o tipo de configuração mais pes-
bem-estar psicológico, desenvolvimento cognitivo e quisado foi o divórcio/separação (50%). Não foi en-
emocional, estruturas de pensamento, relacionamento contrado nenhum estudo sobre monoparentalidade na
interpessoal, entre outros aspectos, levando crianças e amostra dos abstracts nacionais. Como o presente
adolescentes a apresentarem dificuldades para lidar estudo mapeou os abstracts indexados em banco de
com esta situação (Hetherington & Stanley-Hagan, 1999; dados, é possível que a produção nacional sobre a
Mazur, 1993; Parish & Necessary, 1994; Ramires, monoparentalidade, especificamente, esteja inserida
2002; Ramires, 2004; Wallestein, 1985; Walsh, 1993; em periódicos não indexados, em capítulos de livros
Wagner, 2002; Wagner & cols., 1999; Wagner, Falcke desenvolvidos por grupos de pesquisas em todo o
& Meza, 1997). Observa-se que estes aspectos são país, ou ainda, em dissertações e teses.
ainda mais focalizados na adolescência, visto que é

TABELA 2
Freqüência de Artigos Internacionais e Nacionais por Tipo de Configuração Familiar
Internacionais Nacionais Total
f % f % f %
Monoparentalidade 202 50,37 - - 202 48,67
Divórcio/Separação 63 15,71 7 50 70 16,86
Recasamento 47 11,72 2 14,28 49 11,8
Diferentes Configurações 89 22,19 5 35,71 94 22,65
Total 401 100 14 100 415 100

O predomínio da configuração monoparentalidade, tífica pelo funcionamento dessas famílias chefiadas


no contexto internacional, reflete a preocupação cien- por apenas uma figura parental e pela forma como

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esta figura está promovendo ou não o desenvolvi- melhores habilidades na tomada de decisão (Hutchinson
mento de seus filhos (Grzybowski, 2002). Por outro & Spangler-Hirsch, 1989), comportamento positivo e
lado, no contexto nacional, houve maior interesse por uso de estratégias de solução de problemas (Leve &
famílias recasadas, pelo processo de adaptação famili- Fagot, 1997), possuíram altos índices de saúde mental
ar a esta nova situação e pelo reflexo no desenvolvi- e física (Hanson, 1986) e perceberam as figuras pa-
mento de crianças e adolescentes. De acordo com rentais de forma mais amigável do que crianças e
Wagner (2002), o recasamento passou a ser conside- adolescentes inseridos em famílias intactas (Asmussen
rado uma possibilidade de reconquistar e reconstruir & Larson, 1991).
vínculos de intimidade, afeto, companheirismo, pro- 3) Sem mudanças e conseqüências significativas:
movendo e facilitando a saúde de seus membros. Isto Incluiu os abstracts nos quais não há diferenciação
acabou por despertar o interesse de pesquisadores pelo entre crianças e adolescentes advindos de diferentes
conhecimento do funcionamento desses laços de afeto configurações familiares quanto ao construto investi-
reconstruídos. gado pelos estudos analisados, ou ainda, que aponta-
ram pontos positivos ou negativos influenciados pelas
4) Conteúdo temático das publicações características da amostra e não pela configuração
Esta categoria de análise refere-se aos conteúdos familiar. Exemplos: crianças não diferiram quanto à
temáticos dos abstracts empíricos e de revisão, focali- adesão ao tratamento para diabetes (Harris, Greco,
zando os resultados encontrados, no caso de artigos Wysocki, Elder & White, 1999); adolescentes não dife-
empíricos, e o tema em discussão, no caso dos artigos riram na avaliação de bem-estar psicológico (Wagner
de revisão de literatura. Esta análise teve como objeti- & cols., 1999); funcionamento familiar influenciou a
vo avaliar como foram consideradas as diferentes forma de ajustamento psicossocial de adolescentes
configurações familiares, investigando as mudanças e (Hops, Tildesley, Lichtenstein, Ary & cols., 1990); e
as conseqüências negativas, positivas, as que não apre- não houve diferença entre as configurações familiares
sentaram mudanças e conseqüências significativas e quanto à presença do transtorno depressivo em ado-
ainda as que priorizavam uma discussão sobre o tema. lescentes (Patten, Gillin, Farkas & cols., 1997).
Dessa forma, foram identificados quatro eixos, que 4) Discussão das mudanças e conseqüências signi-
serão mencionados a seguir. ficativas: Diz respeito àqueles abstracts que discuti-
1) Mudanças e conseqüências negativas: Refere-se ram as vivências e percepções de crianças, adoles-
aos abstracts que apontaram os prejuízos e as des- centes e famílias, ou ainda as transformações sociais,
vantagens ocorridas nas famílias monoparentais, reca- não apresentando a direção positiva ou negativa das
sadas e divorciadas/separadas no desenvolvimento de conseqüências das diferentes configurações familiares
crianças e adolescentes. Por exemplo: crianças e ado- no desenvolvimento de crianças e adolescentes e,
lescentes que vivenciaram divórcio, recasamento e portanto, não apresentando resultados conclusivos.
monoparentalidade apresentaram transtornos de con- Por exemplo: o aumento nas taxas de divórcio e reca-
duta (Pollinger, Samuels & Stadolnik, 2005), hiperati- samento e as transformações sociais em decorrência
vidade (Lalloo, Sheiham & Nazroo, 2003), transtorno dos arranjos familiares (Tasker & Richards, 1994;
psiquiátrico (Barocas, Seifer & Sameroff, 1985), pro- Taylor, 1987); e a importância da forma como as se-
blemas de saúde (Weissman, Jogerst & Dawson, 2003), parações e recasamentos são manejados para o desen-
mais probabilidade de abuso de drogas (Fletcher, volvimento de crianças e adolescentes (Swick, 1984).
2004) e desvantagens nas competências sociais e aca- Houve ainda abstracts que descreveram a percepção
dêmicas (Guidubaldi & Perry, 1984), entre outros de crianças sobre o recasamento e divórcio (Frizzo,
prejuízos. 2005) e exploraram o efeito psicológico das separa-
2) Mudanças e conseqüências positivas: Diz res- ções (Tusenius, 1989), entre outros, sem, no entanto,
peito àqueles abstracts que destacaram as oportunida- apresentar um posicionamento quanto às conseqüên-
des ocorridas em famílias monoparentais, divorcia- cias das mesmas.
das/separadas e recasadas para o desenvolvimento de A Tabela 3 apresenta o cruzamento do conteúdo
crianças e adolescentes. Por exemplo, pais de famílias temático por década. Os resultados encontrados aponta-
monoparentais utilizaram menos maus-tratos físicos ram que, no total, no que se refere ao conteúdo temá-
em comparação a famílias com as duas figuras paren- tico dos abstracts mapeados houve um predomínio
tais (Kroes, Kalff, Steyaert & cols., 2002), as crianças (34,94%) de artigos que não evidenciaram mudanças e
e adolescentes apresentaram mais amadurecimento e conseqüências significativas positivas ou negativas
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94 Débora de Oliveira; Aline Cardoso Siqueira; Débora Dalbosco Dell’Aglio & Rita de Cássia Sobreira Lopes

entre famílias nucleares e de diferentes configurações dos temáticos por década indicou que nas décadas
familiares para o desenvolvimento de crianças e ado- 1980 e 1990, houve um predomínio de estudos com
lescentes. Houve também uma evidência de abstracts conteúdo de discussão das mudanças e conseqüências
que não indicaram tendências negativas ou positivas significativas (43% e 33,94%, respectivamente). Na
para o desenvolvimento de crianças e adolescentes década de 2000, proporcionalmente comparada à dé-
(34,94%), mas apontaram as vivências, percepções e cada anterior, predominaram estudos que enfocaram
os possíveis manejos, não apresentando efeitos nega- as mudanças e conseqüências negativas ocorridas nas
tivos ou positivos conclusivos. A análise dos conteú- diferentes configurações familiares (41,04%).

TABELA 3
Freqüências e Percentuais do Conteúdo Temático por Década
Conteúdos Temáticos 1950 1970 1980 1990 2000 Total
f % f % f % f % f % f %
Mud./Conseq. Positivas - - 1 12,5 9 8,41 15 9,09 12 8,95 37 8,91
Mud./Conseq. Negativas - - 4 50 28 26,17 52 31,51 55 41,04 139 33,5
Sem Mud./Conseq. - - - - 24 22,43 42 25,45 28 20,89 94 22,65
Significativas
Discussão das 1 100 3 37,5 46 42,99 56 33,94 39 29,1 145 34,94
Mud./Conseq.
Significativas
Total 1 100 8 100 107 100 165 100 134 100 415 100

Entre os estudos que apontaram as mudanças e CONSIDERAÇÕES FINAIS


conseqüências das diferentes configurações familiares O levantamento de estudos sobre famílias separa-
para o desenvolvimento de crianças e adolescentes, é das/divorciadas, recasadas e monoparentais, e seus
interessante notar que sobressaíram as mudanças e efeitos sobre o desenvolvimento de crianças e adoles-
conseqüências negativas em relação às positivas em centes permitiu identificar as principais características
todas as décadas. Estes resultados corroboram os es- da produção científica nesse campo. Percebeu-se que
tudos que mostraram os efeitos negativos dessas dife- os estudos sobre essa temática surgiram na década de
rentes configurações familiares, que destacam o cho- 1950, havendo um acréscimo progressivo nas últimas
que doloroso e angustiante vivenciado por crianças e décadas. Destaca-se um maior número de publicações
adolescentes inseridas nessas famílias (Carter & na década de 1990, tanto no âmbito internacional
McGoldrick, 2001; Wallestein, 1985), os problemas quanto nacional, e que os anos 2000 também têm se
de ajustamento psicológico e social (Parish & Neces- destacado pelo número de produções científicas, quan-
sary, 1994; Walsh, 1993) e as modificações no desen- do comparado proporcionalmente às décadas anterio-
volvimento cognitivo daqueles (Ramires, 2002). As res. Acredita-se que o destaque observado nos anos
modificações na rede de convivência, de apoio e de 1990 tenha ocorrido em função de uma possível
cuidado, na quantidade e qualidade de contato e de abertura e disposição, tanto dessas famílias quanto dos
vínculo com os filhos, a inclusão de novos parceiros, pesquisadores em acessar o contexto familiar em tran-
entre outros aspectos, são variáveis intimamente asso- sição.
ciadas ao ajustamento emocional. Parece ser consenso
na literatura que a separação/divórcio, o recasamento No que se refere à produção científica nacional,
e a monoparentalidade provocam uma reorganização observou-se um crescimento no número de publica-
da vida afetiva, social e econômica, tanto dos adultos ções, acompanhando a tendência internacional. Estes
quanto de crianças e adolescentes (Ramires, 2004). artigos são caracterizados, na sua maioria, como em-
Entretanto, é importante lembrar que reorganização píricos, quantitativos e de discussão sobre as mudan-
não implica somente efeitos negativos podendo repre- ças e conseqüências das diferentes configurações fa-
sentar também um potencial de crescimento às crian- miliares. Entretanto, a produção mostra-se ainda inci-
ças e adolescentes e suas famílias. piente, tornando-se necessário desenvolver pesquisas
que investiguem de maneira específica o impacto des-
sas configurações no desenvolvimento de crianças e

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Impacto das Configurações Familiares no Desenvolvimento de Crianças e Adolescentes 95

adolescentes. Pode-se inferir que a carência de pesqui- abstracts de periódicos científicos indexados, poden-
sas no Brasil, verificada nesse estudo, deve-se a dois do não dar a idéia da totalidade da produção científica.
motivos. Primeiramente, tendo em vista que este ma- Através do mapeamento e da avaliação de abstracts
peamento incluiu apenas periódicos indexados, é pos- de periódicos científicos, evidenciou-se também uma
sível que a produção brasileira sobre o tema esteja pluralidade de estudos sobre o tema. Esta sistematiza-
inserida em periódicos não indexados ou, ainda, em ção permitiu identificar o crescente avanço do campo
capítulos de livros desenvolvidos por grupos de pes- científico sobre o conteúdo temático e as transforma-
quisas em todo o país. Assim, um levantamento que ções de paradigmas que a organização familiar foi
inclua todos os veículos de publicação torna-se im- sofrendo ao longo dos tempos. Além disso, possibili-
portante para o real mapeamento do campo no Brasil. tou inferir que não há consenso na literatura quanto
O outro motivo considerado está relacionado ao tabu e aos efeitos das diferentes configurações para o desen-
aos valores predominantemente conservadores pre- volvimento de crianças e adolescentes. Podem-se en-
sentes na sociedade brasileira (Bucher & Rodrigues, contrar artigos que apontaram os prejuízos e outros
1990), podendo influenciar na motivação e disposição que mostraram os aspectos positivos, mas a maioria
dos pesquisadores a se inserirem em contextos familia- apresentou uma posição neutra, descrevendo, proble-
res não considerados “modelos válidos de família”, matizando e refletindo acerca dos fatores que podem
conforme apontam Narvaz e Koller (2005, p. 131). influenciar os efeitos dessas configurações sobre o
No que tange ao método científico, percebeu-se desenvolvimento.
uma evidência, tanto em nível internacional quanto Em contrapartida, ainda chama a atenção a tendên-
nacional, de um maior número de estudos empíricos cia predominante de artigos que enfocaram as mudan-
quando comparados aos de revisão de literatura sobre ças e conseqüências negativas em relação às positivas
o tema. Quanto ao tipo de configuração familiar abor- das diferentes configurações investigadas nesse artigo.
dado, observou-se predomínio da monoparentalidade É possível pensar que, de fato, as transições vivenciadas
nos artigos internacionais, seguido pelos abstracts que pelas famílias separadas/divorciadas, recasadas e mono-
falavam de pelo menos três configurações, de processo parentais estão carregadas de sofrimento e inúmeros
de divórcio/separação e, por fim, de recasamento. prejuízos ao desenvolvimento (Carter & McGoldrick,
Quanto à amostra, observou-se que há um maior 2001; Hetherington & Stanley-Hagan, 1999; Mazur,
número de investigações que não especificaram a 1993; Parish & Necessary, 1994; Ramires, 2002; 2004;
faixa etária da amostra envolvida, o que não permitiu Wallestein, 1985; Walsh, 1993; Wagner, 2002; Wagner
mapeá-la detalhadamente. Dos estudos que especifica- & cols., 1999; Wagner & cols., 1997). Por outro lado,
ram a faixa etária dos filhos, observou-se um predo- essas pesquisas ainda podem estar sob influência da
mínio de amostras envolvendo adolescentes em com- força social que estigmatiza as famílias que vivem
paração com crianças. Este número de pesquisas que nessas configurações, não considerando o potencial de
enfocou a adolescência pode ser entendido em função saúde presente nas mesmas.
de este período do ciclo de vida ser um processo que A literatura contemporânea tem apontado o poten-
ocorre durante o desenvolvimento do indivíduo cial de saúde que o sistema familiar tem para encon-
(Levisky, 1998), caracterizando-se como de transição trar alternativa na solução dos seus problemas e con-
e de adaptações às regras sociais. Por essa razão, é seguir conter os efeitos destrutivos em seus membros
possível compreender que os efeitos das diferentes (Féres-Carneiro, 1992). A plasticidade das relações no
configurações para adolescentes podem ser mais núcleo familiar pode gerar uma infinidade de recursos
expressivos e desencadear sintomas psicopatológicos, promotores de saúde. Uma família facilitadora do
maximizando os conflitos e as reorganizações nesse crescimento emocional e promotora de saúde não é
momento, e reforçando o interesse científico por essa aquela com ausência de conflitos (Wagner & cols.,
população. Por outro lado, também se pode pensar que 1999). Bons níveis de saúde familiar, muitas vezes,
o fato de os adolescentes apresentarem um desenvol- encontram-se associados a núcleos que favorecem
vimento cognitivo mais maduro e também a conveniên- tanto a expressão da agressividade, de raiva e hostili-
cia por participar de atividades novas e auto-respon- dade quanto de carinho, ternura e afeto. Para Walsh
díveis podem ser fatores que facilitem o desenvolvi- (1996), a capacidade de responder positivamente aos
mento de pesquisas junto aos mesmos. desafios enfrentados pelas famílias está relacionada ao
Cabe destacar, enquanto limitação do presente es- desenvolvimento de características de resiliência dos
tudo, que a análise dos dados está baseada apenas em membros e da própria família.

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96 Débora de Oliveira; Aline Cardoso Siqueira; Débora Dalbosco Dell’Aglio & Rita de Cássia Sobreira Lopes

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98 Débora de Oliveira; Aline Cardoso Siqueira; Débora Dalbosco Dell’Aglio & Rita de Cássia Sobreira Lopes

Recebido: 25/09/2007
Última revisão: 30/01/2008
Aceite final: 20/02/2008

Sobre as autoras:

Débora de Oliveira: Psicóloga, Mestre e Doutoranda em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Aline Cardoso Siqueira: Psicóloga, Mestre e Doutoranda em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Débora Dalbosco Dell’Aglio: Doutora em Psicologia do Desenvolvimento, pesquisadora do CNPq e Docente no PPG em Psicologia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Rita de Cássia Sobreira Lopes: Doutora pela Universidade de Londres (Inglaterra), pesquisadora do CNPq e Docente do PPG Psicolo-
gia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Endereço para correspondência: Rita de Cássia Sobreira Lopes: Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul –
Rua Ramiro Barcelos, 2600, Sala 108. 90035-003 – Porto Alegre, RS. Endereço eletrônico: sobreiralopes@portoweb.com.br.

Interação em Psicologia, Curitiba, jan./jun. 2008, 12(1), p. 87-98

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