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Rio de Janeiro:
F. Alves, 1978.
2. A INTERPRETAÇÃO DE SONHOS
É desde a Traumdeutung que se instaura essa temática. Em seu último capítulo, Freud
procede a um verdadeiro confronto da concepção analítica com a concepção filosófica do
inconsciente; de fato, porém, esta última concepção não serve de ponto de demarcação.
Subscrevendo as palavras de Theodor Lipps, segundo as quais o inconsciente é "o
problema da psicologia" s, enfatiza seu contraste com o consciencialismo da psicologia
dominante, defendendo a paridade do psiquico e do oonsciente e reduzindo, assim, a
idéia de "processos inconscientes" a um absurdo (Widersinn). (p. 26-27)
3. SOBRE A PSICOTERAPIA
4. O CHISTE
Em seu estudo de 1905 sobre O chiste em suas relações com o inconsciente, Freud
procede ao que ele mesmo chama de uma " digressão" sobre o obstáculo filosófico, como
gerador dos "hábitos de pensamento" nocivos à compreensão de sua "teoria nova": [...], a
filosofia é a colocação em forma do modo de pensar ( Denkweise) consciencialista
dominante. (p. 29)
Para derrubar esse ponto de vista dominante, Freud roga que se considere o caráter
convencional e revis:ivel das definições que, longe de qualificarem essências intangíveis,
remetem a um "material fenomenal", muito embora "as pessoas que combatem o
inconsciente como absurdo ou impossível não tenham retirado suas impressões das fontes
de onde decorre, pelo menos para mim, a necessidade de reconhecer sua existência". A
argumentação de Freud é significativa: ele se recusa a opor uma tese a outra, mas remete
à fonte de informações (hipóteses, sonhos, neuroses, etc.) que revela a necessidade de
aderir às suas conclusões. (p. 29)
Contudo, além disso, mostra que há uma maneira truncada de pensar o inconsciente sem
pensá-lo realmente, afirmando-o como "algo susceptível de consciência", mas "no qual
não havíamos pensado até então". Donde este monstro teórico que é o inconsciente
consciencialista, consciente virtual, pontual e provisoriamente rejeitado aos limites
imediatos da esfera da atenção-sentinela. Ai se encontram a psicologia clássica e a
filosofia das "percepções insensíveis". (p. 29)
Uma elucidação análoga surge em outro ensaio técnico: Delírio e sonho na "Gradiva" de
Iensen (1907). Ao evocar a relação inconsciente que se liga, no espírito do personagem
do romance, Norbert Hanold, entre um detalhe de sua infância e uma percepção atual,
aproveita para justificar o emprego do termo "inconsciente" (que ainda não recebeu, nessa
época, sua determinação completa, vale dizer, metapsicológica)20• Reivindica o termo
para designar essa representação ativa, que manifesta "efeitos" no exterior, sem no
entanto acender a consciência, precisando que seu uso se generalizou a ponto de tomar-
se "inevitável" no vocabulário da psicopatologia moderna. E então que formula o desejo
de "ver esse inconsciente subtraído a todas as querelas dos filósofos e dos filósofos da
natureza''21 • Freud recusa, pois, as argúcias terminológicas, solicitando que lhe seja
permitido usar o termo "inconsciente" para designar uma realidade experimental: "Para
esses processos psíquicos que se comportam ativamente sem no entanto atingir a
consciência ~o sujeito, não possuímos, até o presente, melhor termo, e não exprimimos
outra coisa com nosso inconsciente". (p. 30)
Está claro, porém, que por detrás dessa querela de. palavras, oculta-se um confronto
teórico de fundo. Com efetto, se a palavra é contestada, é porque designa, do ponto de
vista consciencialista, uma contradictio in adjecto. Através desse termo, é "a existência
de tal inconsciente" que é combatida como "absurda". O in-consciente é um tipo de
realidade inconceitualizável desse ponto de vista, portanto, informulável. Aos olhos de
Freud, essa falsa querela só pode provir do fato de os detratores do inconsciente "jamais
terem lidado com os fenômenosmpsíquicos apropriados". (p. 30-31)
Mas aqui se introduz uma idéia suplementar: por falta desse conhecimento experimental,
a filosofia teve que consagrar, revestindo-o de uma indumentária teórica, o
consciencialismo ingênuo, no qual consiste a ilusão do senso comum. Por conseguinte,
os filósofos permaneceram "sob o jugo da experiência corrente, segundo a qual todo
fenômeno psíquico, na medida em que se torna ativo e intensivo, deve, por isso mesmo,
tornarse consciente". E essa aliança do senso comum e da especulação filosófica que
constitui a força do consciencialismo dominante. (p. 31)
7. O INTERESSE DA PSICANALISE
Porque a filosofia se funda sobre a psicologia. Quer dizer ao mesmo tempo que a
psicologia é uma parte da filosofia, enquanto esta não pode deixar de integrar suas
aquisições, e que o objeto da psicologia, ciência especial, também constitui um dos
objetos fundamentais reivindicados pela filosofia: o homem enquanto psique. Temos a(
um círculo que conforta o consciencialismo: com efeito, a filosofia, obrigada a apoiar-se
nas ·informações fornecidas por sua base psicológica, a elas assimila, por isso mesmo, o
consciencialismo, enquanto que a psicologia, ao voltar-se para os princípios filosóficos,
neles encontra a justificação primordial de seus postulados operatórios - consciencialistas.
Correlativamente, porém, uma revolução na base psicológica não pode deixar a filosofia
indiferente. Portanto, esta não pode permanecer imutável depois da revolução
psicanalítica: [...] (p. 32)
[...] Com efeito, a revolução psicanalítica não consiste na revelação do inconsciente. "A
filosofia, diz explicitamente Freud, preocupou-se muitas e muitas vezes com o problema
do inconsciente." Não se trata, pois, de importar uma matéria nova: o inconsciente já
constitui um capítulo importante do discurso filosófico. Em contrapartida, a teoria
analítica tem por efeito filosófico original o de recusar simultaneamente duas teses
filosóficas opostas e complementares: de um lado, o consciencialismo, que exclui o
inconsciente da vida psíquica; do outro, o transcendentalismo do Inconsciente (aqui, a
maiúscula tem um sentido) que hipostasia o Inconsciente em entidade metafísica.
Portanto, esse duplo efeito revelador ataca uma tese única: o divórcio do inconscieme e
do psiquico. (p. 33)
Eis a "consciência infeliz" que os filósofos se forjaram sobre o tema do inconsciente: "Ou
eles viram no 'inconsciente' um elemento místico, intangível e inapreensível, cuja relação
com o psiquismo permanecia obscura, ou identificaram o psiquismo com o conscient«, e
tiraram dessa definição a conclusão de que o inconsciente não era de ordem. psíquica e,
por conseguinte, não podia constituir um objeto de estudo da psicologia". (p. 33)
9. AS RESISTENCIAS À PSICANÁLISE
Donde a resistência da filosofia à psicanálise (pois é ela que se trata de explicar neste
escrito): "O que pode pensar o filósofo de uma doutrina como a psicanálise que diz que o
psíquico é, antes de tudo, inconsciente em si", senão recusá-la? Para a psicanálise, a
consciência deixa de ser o princípio essencial da alma, e reduz-se a "uma qualidade que
pode entrar num ato de consciência individual, como não entrar, e que, eventualmente,
nada o modifica se ele permanece em estado" (de consciência). (p. 37)
10. SELBSTDARSTELLUNG
Além do mais, Freud prevê duas falsas escapatórias possíveis, vale dizer, duas maneiras
de se digerir os fatos permanecendo na negação do inconsciente. Tais subterfúgios se
tomaram possíveis por um caráter essencial do inconsciente incessantemente reafirmado
por Freud: ele é incognoscível diretamente. Podemos, pois, dispensá-lo, seja postulando,
por detrás da consciência, uma segunda consciência, uma "consciência inconsciente", seja
distinguindo atos psíquicos "propriamente ditos" (conscientes) de atos "psicóides" que
nos possibilitariam pensar todo o material patológico sem questionar o primado dos
outros. (p. 39)
Ora, no primeiro caso, parece. que essa consciência inconsciente é, pelo menos, tão
misteriosa quanto a hipótese do psíquico inconsciente, ao passo que a distinção dos dois
tipos de atos psíquicos representa uma "estéril disputa de palavras". Tais paralogismos
constituem o indício de que devemos curvar-nos aos dados experimentais e reconhecê-
los, posto que advogam a manutenção do inconsciente psíquico. Freud conclui que "a
questão da natureza em si do inconsciente não é mais criteriosa nem mais rica de
perspectivas que a questão relativa à natureza do consciente". O erro filosófico consiste
justamente em pretender perscrutar a natureza em si, ao invés de reconhecer este caráter
que lhe é inerente de recusar todo acesso não experimental. É verdade que, neste limite,
a investigação metapsicológicas vem substituir a impossível investigação metafísica (ver
infra, cap. Ill). (p. 39)
Mas Freud precisa sua argumentação por considerações especiais: "Na opinião corrente,
esses processos conscientes não formam séries sem lacunas e em si acabadas, de tal forma
que não reste nenhuma saída senão admitir, além, processos físicos ou somáticos que
acompanham o psíquico, e aos quais devemos conferir uma completude superior às séries
psíquicas, pois alguns possuem processos conscientes paralelos, outros não". A démarche
de Freud é interessante de ser considerada ein sua complexidade mesma: ele começa
relembrando o aspecto lacunar dos processos conscientes, unanimemente reconhecido
como um fato. Donde a conveniência de se inferir a necessidade de completar esse tipo
de processo por processos auxiliares paralelos, de ordem somática. Mas, então,
precisamos distinguit dois tipos de processos: os processos somáticos simples e os
processos mistos, que comportam, além do mais, a qualidade consciente. Assim, o fator
considerado principal deve ser, finalmente, mantido por auxiliar. Inversamente, esses
processos somáticos aparentemente auxiliares (Parallel ou Begleit-Vorgiinge) deveriam
ser naturalmente considerados como "o psíquico propriamente dito". Ora, é contra isso
que "se insurgem" os filósofos. Ainda aqui, o organicismo é apresentado como o destino
normal e paradoxal do consciencialismo. (p. 40)