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Gisele Toassa
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TOASSA, G. Beyond the 'Fractured Discourse': Reflections on the Subject and Methodology of
Intervention in School Psychology [versão em português]. In: SOUZA, M. P. R., TOASSA, G., &
BAUTHENEY, K. C. S. F.. (Org.). Psychology, Society and Education: Critical Perspectives in Brazil.
1ed.Hauppage, NY: Nova Publishers, 2016, v. 1, p. 113-130.
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Entre outras peculiaridades, Walsh, Teo, & Baydala (2014) fazem a crítica às
“mainstream psychologies” (psicologias hegemônicas, como o behaviorismo,
psicanálise, cognitivismo) por desenvolverem seus conceitos e práticas tendo por
referência sujeitos WEIRD (white, educated, industrial, rich, from democratic societies).
Indiferentes ao seu entendimento limitado sobre a diversidade do humano, carecem de
pensamento crítico, ético-político e de uma integração entre reflexão e ação (Teo,
2009).
A emergência da psicologia moderna no século XIX e XX sob a égide do
racismo científico e do sexismo explícito implicou na naturalização de generalizações
como raça, quociente intelectual, distúrbios ou dificuldades de aprendizagem. Para
Danziger (1990), esse tempo marcou-se pela origem policêntrica da psicologia, a
disputa pela aquisição de um status como ciência natural e as pretensões de
universalizar, mundo afora, perspectivas que tiveram origem em diferentes países
centrais do capitalismo. Segundo o mesmo autor,
the export of each of these forms was always accompanied by considerable
modification of the original. This process had some elements in
common with what is now referred to as indigenization.2 (2006, p.216)
O gradual transplante das psicologias hegemônicas no território brasileiro
inseriu-se na elaboração de políticas educacionais desastrosas. Entre elas, cite-se a
criação de classes de educação especial como depósito de crianças sem qualquer
necessidade deste tipo de atenção; diagnósticos padronizados, focados na psicometria
das “incapacidades” infantis; reprodução do discurso fatalista e preconceituoso, embora
com aparência de científico, sobre a criança pobre e mestiça; ocultamento ideologizado
das raízes sócio-econômicas da má qualidade do sistema público de educação. Para
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“Indigenization” consiste no processo de introdução de ideias, métodos e práticas psicológicas em países
distintos daqueles nos quais se originaram. Danziger (2006) constata que essa introdução sempre se
adapta ao novo contexto, havendo a priorização de certos aspectos em detrimento de outros, além de
reinterpretações e distorções próprias da cultura do país no qual ela ocorre.
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fazer frente a estes efeitos, se fez necessário um encontro com a história do Brasil e os
limites e possibilidades da indigenização de perspectivas psicológicas produzida no
exterior.
Assim, a emergência da crítica à universalização das psicologias hegemônicas se
tornou inseparável de uma compreensão nacionalista da colonização de exploração e
seus impactos na cultura brasileira. Suas raízes predominantemente marxistas se fizeram
à margem de termos mais recentes, como “pós-colonialismo” ou mesmo
“decolonização”, ainda pouco familiares à psicologia brasileira. Além dessa
reflexividade, as psicologias críticas buscaram também diferentes práticas – ou práxis –
de conteúdo emancipatório, dois aspectos que, segundo Teo, são definidores das
psicologias críticas (Toassa & Teo, 2015). Isso se acentuou com a ascensão dos
movimentos sociais nos anos 1960s, mesmo após o Golpe de 1964, que iniciou os 21
anos de ditadura militar no país, com severo endurecimento a partir de 1969 RF....
Nesse difícil contexto, the indigenization of institutional practices was damaged
by professional regulation em 1962. They lost status and legitimacy from 1962 to the
1970s (see Hur, 2006), em uma virada fortemente elitista e liberal. Seu perfil talhado
pela busca de um discurso laico sobre o self (Danziger, 1997) mostra-se desconectado
de um país no qual a religião e a tradição exerciam um papel norteador. Sobre a
psicologia como ciência do comportamento e intervenção sobre ele, afirma Leser:
Ela não encontra lugar num país onde as escolas são poucas e pequena a sua
procura, onde o encaminhamento profissional dos jovens resolve-se no âmbito
das ocupações tradicionais, onde a organização familiar e a educação das
crianças não oferecem problemas que fujam às soluções fixadas pelos costumes
e pelos preceitos morais e religiosos, onde uma industrialização incipiente não
tem problemas sérios com a mão-de-obra. (2010, p.153)
Também faltavam chances de inserção maciça em políticas públicas para
oferecimento da psicologia à população em geral. A clínica privada fundada em um
modelo liberal, com a reprodução de teorias e técnicas produzidas no Ocidente
estabeleceu-se como área de atuação hegemônica na psicologia.
Entretanto, a despeito deste perfil do psicólogo brasileiro, o discurso pró-
liberalismo, reforçado a partir do século XIX, nunca atravessou a epiderme da sociedade
– caracterizada por uma modernidade superficial e desconfortável, que Martins (2000)
denomina como modernidade anômala. A psicologia estabeleceu-se profissionalmente e
buscou reconhecimento em uma economia majoritariamente focada na agropecuária e
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Vale destacar que esses autores não se identificavam, por exemplo, com a mistura inusitada entre
psicanálise e eugenia que impregnou o pensamento do médico Júlio Porto-Carrero (1887–1937)
(Facchinetti, 2012), contemporâneo deles, que tratava o Brasil como “indivíduo doente" a ser tratado com
medidas de esterilização e outras restrições da reprodução dos pobres e anormais.
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O sentido predominante da ideia de paradigma na obra jovem de Kuhn é a de um “modelo” único de
realizações científicas a cada época, que orienta a proposição de problemas científicos e soluções para
uma comunidade de praticantes de uma ciência (Kuhn, 2005).
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Duas determinações contribuíram para a reprodução dessas ideias: a psicologia sofreu com (a) a
presença da ditadura na repressão à psicologia institucional e ao seu impulso à psicologia como profissão
liberal, centrada na clínica, (b) a carência de programas de pós-graduação na área, que tivessem
significativa produção em pesquisa (mesmo as iniciativas de realizar pesquisa na psicologia psicométrica
não contavam com muitos recursos, optando-se, em geral, pela simples tradução de instrumentos
estrangeiros de avaliação psicológica).
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In North America methods were almost “universally regarded as theory-neutral instruments, the
assumptions on which they were based were able to function as unrecognized theoretical models for
predefining basic features of reality under investigation” (Danziger, 1990, p.155).
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Endossando análise de Gouveia (de 1985), Angelucci et al (2004) observam que a sociologia da
educação também usava conceitos tomados ao marxismo, cuja base empírica reproduzia o neo-
positivismo e neo-empiricismo do discurso sociológico popular nas décadas anteriores.
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O centro vinculava-se ao Instituto Politécnico Nacional do México, tendo em Justa Ezpeleta e Elsie
Rockwel seus principais expoentes (ver Patto, 1993).
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Busca realizada no Scholar Google a 15 de Julho de 2015 indicou 1517 citações a Patto (2010), cerca de
324 citações a Patto (1984) e 269 à terceira edição revista da coletânea organizada por Patto (1981),
originalmente publicada em 1981.
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metodologias teóricas próprias das psicologias críticas (Teo, 1999, p.124)10. O “método
concreto”, ou seja, as técnicas e organização do trabalho de pesquisa e intervenção em
psicologia escolar crítica expressa a profundidade desse trabalho de construção e
reconstrução, começando a reflexão por totalidades mais amplas, e não simplesmente
pela criança.
Final considerations
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According to Teo, deconstruction is a negative analytical methodology, providing evidence of social
biases. It criticizes areas of traditional psychology. Reconstruction is a methodology that reconstructs
“theories, methods and concepts by theoretical, logical, or historical means” (p.125). Construction relates
to the critical development of theories, methods and concepts typical of a emancipatory standpoint, as
exploitation, liberation, alienation and so forth.
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Vygotski, L.S. (1995) Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. In:
Obras escogidas (Vol.3, pp.11-340). Madrid: Visor Distribuiciones (Texto original
de 1931).
Walsh, R. T., Teo, T., & Baydala, A. (2014). A critical history and philosophy of
psychology: Diversity of context, thought, and practice. Cambridge University Press.
World Economic Forum (2013) The Human Capital Report. Recuperado de:
http://www3.weforum.org/docs/WEF_HumanCapitalReport_2013.pdf