Sei sulla pagina 1di 5

1.2.

A CRISE DA _l\JfASCULINIDADE E A
CRISE DA l\fODERNIDADE

TELMA lJú~ZELL(

Falar de "masculinidade" é falar necessariamente de "se-


xualidade" e de '·corpo". Mas, de que maneira o "corpo" é, hoje
. .- ?
\'isuahzado no pensamento contemp~raneo. O pensador belga'
Jean Ladriere observa em seu livro Etica e pensamento cien-
tífico1 que a ciência se ocupa do "corpo" como um fato objttí-
vo, e que, no entanto, sabemos ser o corpo mais do que um
fato objetivo, pois é, enquanto corpo que somos, "sujeito",
"pessoa", "existência". Enquanto corpo, somos ''objeto" e ao
mesmo tempo a forma concreta de um perpétuo ultrapa.ssa-
mento de nós mesmos, como objeto em "direção a" (ao mundo,
ao outro, etc.), em seu existir único e singular. A noção de
··corpo", assim como a de ··sexualidade ... é vista no pensamento
contemporâneo dentro do contexto de uma "transcendentalidade
constitutiva", o que significa dizer como processos de concre-
tização de '·sentidos '', "realidades'', e ''mundos próprios ... fun-
dados, como veremos a seguir, em ''esquemas existenciJis ...
''imagens primordiais", "idéias coletivas", '•intencionalidades ...
O filósofo francês Maurice f\-ferleau-Pontv dedicou toda
uma obra à consideração da temática do "corp~··. nJ instãnc1.1
desta "transcendentalidade constitutiva". Segundo .'-ferleau-

• Doutora em Filosofia das Cit?nCJJS HumJnJs J· .


adjunta da UERJ. P~ J Univt!rsidJdt' d~ PJns. pror~s.sor.l-

1. LADRI ÊRE. J. Étic(I e pensumcnto cientificv. C1.1. d.is LetrJs se:-' L' ._, . p 1
~ r .nr · ~,.10 au o.

118
pon t ,,J• tudo o que
_
somos,

inclusive
..
o corpo, o somos na base
de uma situ~çao ~e.!ª.~º ~ue ~o~n_am.?~ no~sa, seg_undo um
"esqu~ma ex1stenc1a! , pre-pr:~1cat1vo , isto e, anterior a todo
•uízo ou consi<leraçao voluntaria. Nada do que somos vem do
:xterior ou é acidental, mas . tudo o que somos "mostra" um
"sentido de mundo", uma "direção'', um "certo estar no mun-
do", enfim. uma "apropriação vivencial'' <lo mundo. Nosso corpo
não é para nós um agregado de ór~àos justapostos no espaço,
mas nós o temos como uma ''posse individual'', conhecemos a
posição de cada membro graças a um "esquema corpóreo",
esquema que é nossa maneira de dizer "como estamos no mun-
.,
do .
Carl Gustav Jung esposou, igualmente, esta tese do trans-
cendentalismo constitutivo, porém na sua forma kantiano-
apriórica. De fato, embora tenha reiterado inúmeras vezes que
considerava sua obra uma visão essencialmente psicológica e
não filosófica do homem, nunca deixou de reconhecer a impor-
tância do pensamento filosófico, especialmente da filosofia
transcendental de Kant. A filosofia da qual Jung distinguia in-
sistentemente o seu trabalho era aquela que parte de um conceito
de realidade abstrato, não admitindo nenhum saber apriórico, ne-
nhum dado primordial, e que considera todo real um "cons-
tructo'', decorrente de uma construção empírico-racional.
Jung, ao contrário, se inscreve nesse movimento de pensa-
mento contemporâneo que visualiza a realidade como fundada
em "estruturas inerentes à experiência vivencial", concebendo.
entre outros fenômenos, o da ''sexualidade'' como ligado a
"idéias coletivas". Sobre a sexualidade, diz Jung:
"O que está além da sexualidade ou do instinto de poder
é a 'atitude para com a sexualidade ou com o poder'.( ...)
Na medida em que a atitude não é apenas um ienômeno
intuitivo, ou seja, inconsciente e espontâneo, mas uma
função consciente, ela é principalmente ·concepção'.
Nossa concepção em todas as coisas problemáticas é al-
tamente influenciada por certas idéias coleti\'as. (... ) Es-

119
sas idéias coletivas estão em íntima relaçã
-
cepçao de v1.da ou cosmov1sao
.-
dos séculosoOcom .•acon.
passados ,,2. u mJ/en1os

"Idéias coletivas", "imagens primordiais", na ling


.t . . "
junguiana, "esquemas ex1s enc1a1s , na expressão de Merl
uagem
Ponty, "intencionalidades", na palavra do filósofo alemão~~--
mund Husser1, são as diferentes maneiras de o pensament
, o
contemporâneo assina1ar o carater transcendental do corpo e
do espírito humanos. A realidade é concebida como "configu.
·ração'', como "constituição" de "maneiras de visar", de "circun.
visões". Dentro dessa perspectiva, como pensar a crise da
masculinidade?
Sendo a experiência vivencial mais do que uma simples
experiência, sendo "saber'', porque fundada em estruturas
aprióricas - como quer esta visão por nós denominada de
"transcendentalista-constitutiva" - toda crise, enquanto vivên•
eia, deverá ser compreendida como crise de "direção", de "cir•
cunvisão". Nesse caso, a qual crise de "visão" estaria ligada a
crise da "masculinidade", hoje vivenciada?
O filósofo alemão Edmund Husserl, em sua última obra. A
crise das ciências européias3, analisa os impasses filosóficos
do chamado pensamento moderno. A "modernidade", que tem
seu ponto alto na ciência e na técnica e raízes na Grécia Antiga
(como mostra Martin Heidegger), consiste, essencialmente, se-
gundo a análise husserliana, em um visualizar sob o modelo do
"objeto". Uma visão sob o modelo do "objeto" é uma \'isão
abstrata, observa Husserl, é a busca de regras de uma univer·
s~lidade incondicionada, um visar que despreza tudo O que é
simplesmente subjetivo-relativo. Tal visar "objetivista" seria. se-

2. JUNC. C.C. Tipos psicológicos. Vozes. Petrópolis. 199 I. p. 215.


3. HliSSERL. E. la crtse des sciences europeennes e/ t. . .
0
cendental CaJlimard. Paris. I 976. Phenomeno/og1e truns-

120
gundo Husserl. ª.:~zã~ da _cri~e do p~nsamento moderno, crise
da qual a consequenc1a prmc1pal sena uma desumanização do
pensamento.
Ora. uma visão objetivista do mundo é, essencialmente,
uma visão masculina do mundo. E isto, não só porque a mas•
culinidade, enquanto sexualidade e corpo, estaria ligada à am-
bigüidade do vivenciar a si mesmo, ao mesmo tempo, como
4
"objeto" e "sujeito'' mas, ainda, porque uma visão masculina
do mundo, sabemos, tem sido uma visão racional e abstrata,
diferentemente da visão feminina, preponderantemente concre-
ta. Como diz Vera Von der Heydt no seu livro Pais e mães:
"O pai encarna a consciência: seu reino é a razão e o co-
nhecimento, a luz e o sol. Numa sociedade patriarcal são os
velhos, os pais que governam, legislam e mantêm viva a tradi-
- ,,s
çao .
A mulher, a mãe, diríamos, está sempre voltada para a "sin-
gularidade'' das situações, dos acontecimentos; ao homem, ao
pai, cabe zelar pelo cumprimento dos princípios, das regras
gerais, abstratas.

4. Merleau-Ponty observa que. sendo a experiência e a existência - enquanto trans-


cendentalidades - um apossar-se dos fatos ou do mundo à luz de -e!>Quemas exis-
tenciais", "tudo o que vivemos e aprendemos tem sempre vários sentidos·. Há.
portanto. na vivência humana, "um princípio de indeterminação". sendo existen-
cialmente "ambí1<1ua". E essa ambigüidade se mostra particularmente na experiência
sexual: tendo um corpo posso ser reduzido a um "objeto" pelo olhar Jo outro. e
não mais contar, para ele. como pessoa, ou. ao contrário. posso transformar-me em
seu mestre e. por minha vez. visualizá-lo como "objeto". Esse domínio. porém. é um
impasse. porque. no momento em que meu valor é reconhecido pdo desejo do
outro. o outro não é mais a pessoa pela qual desejo ser reconhecido; t! um ser
fascinado, sem liberdade e que. por essa razão. não mais ,onta para mim. f. isto
porque, conclui Merleau-Ponty. ter um corpo si~nifiC.1, em nível da expen~ncia
vivenciJI. que posso ser intt:ncionado como um "objeto" pelo outro. quando. n.i
verdade. busco St!r visto como "suJeito" (MERLEAU-PONTY. M. Phénoménologie
de la perception. Gallimard. Paris, 1945).
5. VON DER HEYDT. V. ln: HILLMAN et ai. Pais e mdes. Símbolo. S.io Paulo. 19i9.
p. 161.

121
Haveria, assim. uma estreita ligação a n
crise da mascu 1m1. ·ct ad e e a cnse
. da modernid
' osso
d Ver, entre .
apresentam no Oc1.dente. Mais a e, tal cofllo s<t
. do que uma Quest~
· log1ca,
psii.:ológica ou soc10 • · a cnse ªº
· da masculinid d Pur.ªfllentE:E:
. em Que a e ten~ taízts
ou fundamentos f I·1 oso' f'1cos, na medida \4

blemática de natureza transcendental, situa-se ~oe~quanto Pro.


investigar filosófico. Inspirados pelos pensament c:açào" do
fos aqui citados, poderíamos ainda dizer, para te:· os filóso.
· · mascu11~~
crise do existir · e.da ~ h~~ada "modernidade~ inar Que~
guram a quebra do eqwltbno d1alet1co "objeto-sujeit ,, c~nfi.
Iizando-se no pnma . do do "ob.~e to", em uma etern o f, cn s♦••• 1.(1•

ambigüidade existencial, levando ao "fechamento a"ª , uga da


da "explosão para ,. , negan do a transcendentalidade da, aerecusa
. .
. d d . d "
eia efet1van o um processo e cnse e sentido" ou . . x1sten.
,
processo . -
de desumamzaçao. , seJa, urn

122

Potrebbero piacerti anche