Sei sulla pagina 1di 13

II Congresso de Pesquisa e Extensão da FSG

http://ojs.fsg.br/index.php/pesquisaextensao

ISSN 2318-8014

O ENLACE SOCIAL PROVOCADO PELO DISPOSITIVO DO


ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO PARA A CONSTRUÇÃO DE UM
PROCESSO INSTITUINTE
Ana Paula Rabello Soaresa, Cassiano Castro Santanab, Evelaine da Silva Jacobic, Rafael Wolski
de Oliveirad
a
Graduando em Psicologia (FSG). Faculdade da Serra Gaúcha (FSG); anapaulasoares94@yahoo.com.br
b
Graduando em Psicologia. Faculdade da Serra Gaúcha (FSG); kassianosantana@hotmail.com
c
Graduando em Psicologia. Faculdade da Serra Gaúcha (FSG); eve.jacobi@hotmail.com
d
Mestre em Psicologia Social e Institucional (UFRGS). Faculdade da Serra Gaúcha (FSG); rafael.wolski@fsg.br

Informações de Submissão Resumo


Ana Paula Rabello Soares, endereço: Rua Buscamos com o artigo apresentado fundamentar o enlace social do
Os Dezoito do Forte, 2319 apto 502- dispositivo Acompanhamento Terapêutico (AT) para o processo
Caxias do Sul - RS - CEP: 95020-472 instituinte, este que emerge da Reforma Psiquiátrica com o objetivo
de reinserção e desinstitucionalização de sujeitos em sofrimento
psíquico. Para romper com a lógica excludente, envolvida pelos
Palavras-chave: estigmas instituídos, o meio social precisa passar pelo processo
Acompanhamento Terapêutico. instituinte, reconstruindo-se assim como uma Instituição. Neste
Instituído. Instituinte. Analisadores. sentido, o nosso objetivo é refletir a modalidade clínica como
Dispositivos. dispositivo num processo que pode caucionar mudanças. Realizamos
uma pesquisa qualitativa com referenciais bibliográficos no período
de 1991 a 2013 circunscritos pela psicanálise, os quais levantam
conceitos que nos fazem pensar neste processo institucional.

1 INTRODUÇÃO

O presente artigo discorre sobre a possibilidade do dispositivo do Acompanhamento


Terapêutico como enlace social para o processo instituinte. Ao pensarmos no verossímil
movimento de mudança no meio social consideramos um espaço marcado pela exclusão
desses sujeitos que agora são levados às ruas para um trabalho (psico)terapêutico.
Indispensável pensar no movimento da Reforma Psiquiátrica e nas pessoas em sofrimento
psíquico que passaram pela lógica da institucionalização. Para tanto, nos fundamentamos na
Análise Institucional sobre a situação atual daquilo que está congelado e instituído no espaço
urbano, refletindo no funcionamento do socius como Instituição.

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 426

Os referenciais bibliográficos utilizados, datados no período 1991 a 2013, asseguram a


compreensão e servem como analisadores dos conceitos e os seus deslizamentos.
Construímos, então, uma pesquisa qualitativa sobre o impacto do AT1 como dispositivo que
destoa do cotidiano dos meios urbanos e das relações sociais. Sendo assim questionamos se
também é possível neste encontro a desconstrução de conceitos normativos a partir deste
acompanhar incomum, passível de um movimento transicional.
A psicanálise permeia e teoriza a construção dos temas abordados. Alguns conceitos
de instituição e de instituído como forma de compreendermos a configuração e o
funcionamento social presente, levantando e verificando analisadores, os quais surgem de um
desejo de mudar, e a possibilidade de uma prática clínica como um dispositivo de mudança.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

1 O conceito de Acompanhamento Terapêutico e o contexto histórico

Por volta das décadas de 50 e 60 inicia-se um movimento antipsiquiátrico de âmbito


global, no qual países envolvidos questionavam-se sobre as instituições asilares e o tratamento
da loucura como doença mental, o que reforçava a exclusão dos sujeitos estigmatizados pelos
sintomas (ARAÚJO, 2007). Nesta proposta, a doença surge como diagnóstico que emerge
num sintoma e precisa ser tratada na visão medicocêntrica, na qual o louco ocupa um lugar de
quem nada sabe, desapropriado de sua história ou individualidade, tornando-se somente a
enfermidade e, por isso, sem perspectiva de expressão como pessoa. (CABRAL, 2005).
A possibilidade de mudança tinha como foco a inserção da pessoa em sofrimento
psíquico no meio social, uma alternativa de atuação nas áreas urbanas, como um tratamento
mais eficaz, no qual o louco, em outro cenário, tem uma outra possibilidade de expressão,
propiciando uma forma de reinserção social. Neste contexto, com essa proposta nasce um
lampejo sobre Acompanhamento Terapêutico (ARAÚJO, 2007).
Pensou-se numa clínica antipsiquiátrica em que, junto ao cotidiano, se exerceria a
função terapêutica. Nessa lógica, há registros de uma prática semelhante ao Acompanhamento
Terapêutico na Argentina em 1970: os conhecidos “atendentes terapêuticos” (BERGER;
MORETTIN; NETO, 1991; CARVALHO, 2004). Acrescenta-se que para a constituição do
AT foram necessários alguns movimentos históricos, como o antipsiquiátrico inglês, da

1
Supressão de Acompanhamento Terapêutico

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 427

psiquiatria democrática italiana e da psicoterapia institucional francesa. Assim, surgiram as


primeiras nomenclaturas para aqueles que acompanhavam os sujeitos nessa
desinstitucionalização, como o “auxiliar psiquiátrico” e o “amigo qualificado” (BARRETO,
2000). Os relatos sobre acompanhamento terapêutico no Brasil foram registrados apenas em
1991, no livro “A RUA COMO ESPAÇO CLÍNICO: Acompanhamento Terapêutico (A
Casa)”. Por sua vez, a reforma psiquiátrica ganhou força no âmbito nacional na década de 90,
quando o número de estruturas manicomiais diminuiu gradativamente. (SILVA, 2005).
No Brasil ocorreu um movimento reverso à desinstitucionalização psiquiátrica que
acontecia no mundo, em função da ditadura que vigorava no país, a qual foi caracterizada por
grandes represálias em relação ao dito louco em meio ao social (ibid). Enquanto em outros
países como, Argentina, Itália, Inglaterra e França havia debates sobre o método ineficaz dos
manicômios, no Brasil eram construídos mais hospitais psiquiátricos (BERGER, MORETTIN
e NETO, 1991). Por volta dos anos 40 existiam cerca de 60 instituições manicomiais, entre
privadas e filantrópicas. Na década de 80 esse número aumentou para uma média de 360
(SILVA, 2005).
Salienta-se que a Reforma Psiquiátrica no Brasil se desenvolve com as comunidades
terapêuticas em que, independentemente dos saberes e profissionais, “psis” ou não “psis” se
envolveram no tratamento dos sujeitos em sofrimento psíquico, idealizando o enlace do meio
cotidiano com a loucura (BERGER; MORETTIN; NETO, 1991). A Reforma Psiquiátrica foi
um movimento que provocou um deslocamento de espaços fechados e moldurados por muros
para outros cenários sociais, ambientes abertos e de circulação. Logo a mudança provocou
também uma contestação para a reformulação da postura dos profissionais, conduzindo a
outras formas de tratamentos, diferentemente das clínicas convencionais que não asseguravam
mais a eficácia terapêutica (PALOMBINI, 2004).
Evidencia-se que a desinstitucionalização nessa perspectiva é um processo sem
finitude, porque significa muito mais que acabar com as clínicas asilares, abalar os alicerces
físicos e criar outras formas de atendimento a salutar à pessoa em sofrimento psíquico, para
desinstitucionalização representa uma parcela desse processo (SILVA, 2005).
Revela Araújo (2007) que a clínica aberta quer dizer de um modos operandi em que a
clínica pode se realizar em todos os lugares, apresentando-se em duas faces. Corresponde uma
face à atuação nas ruas, onde se busca retomar algo que se perdeu subjetivamente, ou seja,
restaurar atividades subjetivas cronificadas e criar outras até então inéditas. A outra face
refere-se à própria função clínica, que, assim como no consultório, permite passagens as quais

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 428

remetem à passagem de um ponto a outro, como em um discurso ou num corpo em


movimento. No AT, o ato de passear pela cidade “faz passar algo” (ibid, p.21), vários
fragmentos desconstruídos e reconstruídos numa outra imagem ‒ uma reconstrução subjetiva.
A intenção do AT é identificar o que é inerente às condições intrínsecas do paciente e
aprimorar suas qualidades para possível reinserção social. (COELHO, 2007). Araújo (2007)
relata que o AT é também uma clínica peripatética, uma vez que se entende que as paisagens
do percurso dão forma ao terapêutico do acompanhar. As possibilidades dessa entrada e estar
no socius englobam aspectos além do indivíduo. Trata-se da ação deste perante os
acontecimentos das ruas, e nisso as inúmeras intervenções decorrentes desse meio ambiente e
das relações que aí se estabelecem. Intervenções a partir do inesperado, que surgem no andar
e nas vivências da complexa subjetividade da vida.
A clínica do AT se diferencia pelo setting clínico, que é o espaço coletivo, e se
assemelha ao atendimento convencional pela característica de postular que o paciente se
reconheça e conviva melhor dentro da sua organização psíquica, promovendo o bem estar
social. É através dos vínculos e da transferência que se desenvolve a relação entre
acompanhante e acompanhado. O acompanhante tem um papel mais ativo se comparado a
abordagens tradicionais devido ao uso da rua e seu meio social como espaço clínico. É
inevitável que o at2 não se mantenha neutro ao cotidiano das andanças, nas quais o
acompanhante improvisa conforme os acontecimentos do inusitado (BARRETO, 2000).
Embora o AT tenha iniciado pelo tratamento com psicóticos, nos últimos anos esta
prática tem sido ampliada e cada vez mais vem sendo utilizada para o tratamento de todos os
sujeitos em sofrimento psíquico (BARRETO, 2000). O termo sofrimento psíquico é utilizado
de tal forma que não se destaca a doença do sujeito, mas o individuo em si, num entendimento
fenomenológico, referindo, portanto, não apenas sua condição mental, mas o próprio ser e
suas características individuais (COELHO, 2007).
É vital ao sujeito esta relação com o outro, e de pertencimento à espécie humana, que
vai se dar neste seu encontro com a realidade compartilhada e com suas próprias
características individuais, para que assim possa se sentir como sujeito no real (BARRETO,
2000). Para Coelho (2007) as cidades e os meios urbanos são propiciadores da reabilitação
destes sujeitos.

2
Supressão para acompanhante terapêutico

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 429

2 A Instituição e o Instituído

Ao longo da história das sociedades foram postulados lugares diferentes num sistema
piramidal no qual a religião estava no topo. Na contemporaneidade “os lugares estão em igual
paridade” (LEBRUN, 2009, p.38). Vê-se que há uma mudança do coletivo em que aqueles
antes assujeitados passam a contribuir para reinventar a vida coletiva como sujeitos atuantes e
não mais submetidos. (LEBRUN, 2009).
As transformações sociais históricas estabelecem a complexidade da vida social. A
evolução dos conhecimentos e sua aplicação e a evolução dos sistemas que organizam a
sociedade industrial capitalista e tecnológica caracteriza o processo das relações interpessoais
e o funcionamento social. Atualmente de maneira ainda mais complexa que nas civilizações
anteriores. De fato, o progresso social acarreta uma grande complexidade funcional, e por
conseguinte a construção das organizações e instituições (BAREMBLITT, 2002).
Ao conceituar a Instituição temos que considerar que ela não se sustenta somente em
quatro paredes, mas precisa ser entendida em uma forma abstrata. A Instituição é produzida
por uma lógica norteadora que precisa ser percebida, sentida e observada. Entende-se que ela
pode ser todos os espaços sociais (LOURAU, 1993). Neste sentido, “a noção de instituição é
um artifício, um modelo teórico que permite compreender o que se passa numa casa, escola,
hospital, fábrica, bairro, cidade (desde que não muito grande)” (ibid, p. 61).
Lourau salienta ainda ser possível realizar-se uma Análise Institucional3 nas cidades
sem que se precise focar tão somente o termo instituição. Logo, observa-se que o tempo e o
social-histórico regem a instituição no seu dinamismo e movimento, enquanto “o instituído, o
status quo, atua com um jogo de forças extremamente violento para produzir uma certa
imobilidade” (ibid, p. 11-12).
Complementa Baremblitt (2002)
[...] uma sociedade não é mais que isso: um tecido de instituições que se
interpenetram e se articulam entre si para regular a produção e a reprodução da vida
humana [...] são entidades abstratas, por mais que possam estar registradas em
escritos ou conservadas em tradições. (p. 26)

3
“A Análise Institucional tenta, timidamente ser um pouco mais científica. Quer dizer, tenta não fazer um
isolamento entre o ato de pesquisar e o momento em que a pesquisa acontece na construção do conhecimento”
(LOURAU 1993, p.16) “[...] pretende trabalhar a contradição, seguir uma lógica dialética em oposição à lógica
indentitária característica das demais ciências – à exceção da Psicanálise” (ibid, p.10).

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 430

A mesma autora diz que na Instituição há duas vertentes importantes: o instituinte e o


instituído. Sendo que o instituído é o resultado do processo instituinte, o primeiro vigora as
normas das atividades e relações sociais. Portanto, vigorando os padrões da vida social, o
instituído necessita acompanhar as mudanças, produzindo “novos instituídos que sejam
apropriados aos novos estados sociais” (ibid, p.29).

2.1 Processo Instituinte

Os termos Instituído e Instituinte já passaram por uma leitura maniqueísta em que o


Instituinte era invariavelmente entendido como algo bom, sempre visto como o mocinho,
enquanto o instituído era visto como o vilão. No entanto, essa percepção foi derrubada, hoje
se consideram as contradições perante suas formas no processo Institucional (LOURAU,
1993).
Merleau-Ponty apud Lebrun (2009) teoriza que “o tempo é o modelo da instituição”
(p.17), ou seja, é o desejo de mudança que gera o enfraquecimento da ordem do que é
instituído, regido somente na dimensão temporal. Faz-se então o processo instituinte, que não
se estabelece de imediato. Novamente o cronológico constrói outras experiências com novos
sentidos baseados na exigência de outro futuro com o objetivo de refazer uma instituição.
Enquanto o instituído é o organizado, o instituinte é o organizante, aquele que é
necessário na reprodução do novo como processo de mudança. Por isso, por sua característica
dinâmica, normalmente gera desconforto e formula contestação, tornando-se passível de
conflito e levando a uma mutação do que está instituído (BAREMBLITT, 2002).
Lebrun (2009), numa releitura dos escritos de Deleuze (1953), discorre sobre o
instituído em uma postura coercitiva, onipotente, como uma lei instaurada, num lugar de
poder e opressão. No deslizamento ao pensamento lacaniano, o autor considera que para o
sujeito linguístico, falante, nunca haverá a satisfação plena nessa submissão, havendo a
contestação.
O Institucionalismo ao repensar a História discorre sobre a reconstrução do passado
que aparece vivo no presente, também atuante e determinante no futuro. Em termos dialéticos,
os tempos se constroem e se reconstroem para um presente de mudanças, lábil. Nessa lógica,
o preponderante retomado na História
[...] não é o igual, não é o idêntico, não é o regular [...] mas que o que se repete na
História é a diferença, é o acaso, é o inesperado, o acontecimento, o imprevisível, o

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 431

aleatório. E que estes são grandes ou pequenos momentos de repetição do diferente


(por exemplo: do instituinte) que depois vão tentar ser capturados pelo instituído,
pelo organizado e repetido como idênticos (BAREMBLITT, 2002, p. 38-39).

Para fazer-se a intervenção e (re)pensar as organizações sociais utilizam-se recursos


como os analisadores e os dispositivos. Estes consistem na interpretação do pesquisador como
método para ascender o instituído e realizar o processo instituinte (LOURAU, 1993).

2.3 Analisadores e Dispositivos

Trata-se os analisadores de um termo absolutamente necessário à Análise Institucional,


sendo eles indicadores que emergem da problemática. Considera-se que os analisadores
apresentam-se de diferentes formas, podendo não somente ser considerados como fenômenos
a serviço da denúncia, ou com o intuito de exprimirem uma realidade conflitiva. Nessa lógica
são passíveis de autoanálise, contendo em si “elementos para se auto-entender, ou seja, para
começar o processo do seu próprio esclarecimento.” (BAREMBLITT, 2002, p.64).
Acrescenta Lourau (1993) que os analisadores oportunizam um movimento que faz
ressurgir e aparecer a Instituição com força, esta que antes estava oculta.
O analisador anda linearmente a um dispositivo e faz pensar na construção do mesmo,
este que significa fazer o movimento do que está(va) latente passar ao manifesto, ou seja, um
instrumento para a intervenção. Esta ferramenta desvela o desejo latente de mudança, que é
compreendido na interpretação proposta pelo dispositivo. Nesse sentindo, faz analisar
coletivamente uma circunstância ou cenário que se apresenta numa situação comum
(LOURAU, 1993).
O mesmo autor ainda diz que a Instituição é tudo o que é relativo ao um campo de
análise, ou seja, considerando desde casa à cidade, qualquer meio social suscetível aos
analisadores, sem preocupar-se com o termo Instituição, mas com as ocorrências do meio que
fazem aparecer o instituído e, por ora, o processo instituinte.
Percebe-se que alguns autores teorizam sobre as condições sociais em relação à
loucura. Coelho (2007) discorre sobre a dificuldade implicada socialmente de compreender e
conviver com a loucura. Dubois (2003), ao escrever sobre a inclusão, fala do privilégio de
conviver no seu cotidiano com a diferença. Entende que a mesma está além do direito de
respeitá-la, mas fala sobre a sua existência necessária que propicia a mudança, apesar de

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 432

afirmar que na sociedade está enraizada a cultura de excluir o diferente, ao invés de aceitar as
suas particularidades.
Ignoram-se estas particularidades do sujeito, considerando desde já que suas
produções e características vão somente de encontro a sua loucura, enfermidade ou sintoma.
Nessa lógica imediatamente se espera e faz-se que ele ocupe somente um lugar: o de louco
(CABRAL, 2005). Acrescenta-se, conforme Kinoshita (2001), que alguém estigmatizado
como doente carrega consigo somente o padrão que diz respeito a esse estigma, estreitando-se
qualquer possibilidade de sujeito social; anula-se a pessoa e espera-se do doente somente sua
condição de doente. Cabral (2005) ainda ressalta o símbolo que carrega a loucura de
indolência e morte, e o sujeito, a posição de desvalia e submetido à minoria.
No laço entre o social e o louco é que se encontra a dificuldade devido aos
preconceitos e estigmas, “esta marca invisível que está presente na cultura e, portanto, no
manicômio mental de cada um de nós” (ibid, p. 102).

[...] a força da desinstitucionalização ataca a “instituição” loucura, um específico


conjunto de disciplinas, saberes e práticas. Essa é a instituição a ser negada. [...] não
basta caminhar com os acompanhados pela cidade para minar a lógica manicomial,
nossa “livre circulação” ainda pode ser completamente presa pela perspectiva
instituição loucura (SILVA, 2005, p. 34).

Muitas vezes o exercício do acompanhante terapêutico é confundido com outras


profissões, frequentemente interpretado como cuidador ou até mesmo vigilante. Tal confusão
é constituída tanto pelo meio social frequentado por terapeuta e paciente quanto por familiares
e amigos de ambos, até mesmo pelo próprio acompanhado. Perante o rompimento desse
paradigma é que se efetua um trabalho analítico com maior efetividade (ARAÚJO, 2007).
A profissão que não está regulamentada e que não direciona ao um saber exclusivo,
mas a correlação de vários, garante o seu potencial terapêutico (PALOMBINI, 2004). Silva
(2005) apud Reis Neto (1995) menciona que o at já foi nomeado como “homem das ruas” e
que ainda hoje pode ser visto com descrédito. Lebrun (2009) também escreve que a falta de
reconhecimento de uma profissão pode ela ser nomeada por outra informalmente, ou seja,
para que haja o reconhecimento legítimo o convívio entre os homens pode determinar
mudanças, tornando possível normalizar profissões e o caminhar de alguns sujeitos nas ruas
sem que seja necessário normatizá-los.
Analisa-se que o desejo de mudança da perspectiva excludente existe, pois o discurso
da aceitação do diferente nunca esteve tão presente. Em decorrência disso, percebe-se o
constante fechamento das instituições psiquiátricas, sendo uma questão de tempo para que

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 433

elas sejam extintas. Todavia, percebe-se que a sociedade apresenta um despreparo para o
convívio com sujeitos antes passíveis de tratamento fechados entre os muros. Considerando as
questões singulares e/ou subjetivas, quer dizer que não se encontram manuais de instruções,
nem padrões que guiem o convívio ou adequações que devem ser seguidas numa
normatização. Por isso, é essencial o serviço do at, não apenas por uma questão de respeito
para com o acompanhado, mas no sentido de fazer com que ele atue, que seja parte de social e
não apenas esteja nele, possibilitando a partir desse encontro o movimento recíproco de
quebra de barreiras (ARAÚJO, 2007).

2.3.1 O dispositivo AT para processo instituinte

A Reforma Psiquiátrica serve-se do Acompanhamento Terapêutico como dispositivo,


uma vez que há a quebra de paradigmas antes engessados, tanto para o sujeito acompanhado
quanto para o meio social em que ele passa a circular (CABRAL, 2005). Apesar da distinção
entre o território e a subjetividade do indivíduo, compreende-se o primeiro como local de
atuação do sujeito. Não há separação entre ambos, pois a subjetividade no indivíduo
envolverá o território e concomitante um movimento recíproco acontecerá, acarretando
mutuas influências. Nesta concepção existe um processo de subjetivação que envolve a pessoa
e o social (ARAÚJO, 2007). Acrescenta Silva (2005) que o AT é considerado uma estratégia,
que em sua essência utiliza-se da rua como dispositivo e que produz nesse espaço os
processos de subjetivação. Desconstrói muros que enclausuram pela condição manicomial
enquanto no contato com o cotidiano explora e faz acontecer novas realidades, as diferenças e
a vida.
O AT ajusta-se lidando com o inusitado, sendo um privilégio desta modalidade
perceber a singularidade do paciente tanto de forma autônoma como coletiva, em atos. E
conforme lida com os eventos cotidianos neste trajeto, acompanhantes e acompanhados ficam
à mercê dos acontecimentos (ARAÚJO, 2007). Reforça Cabral (2005) o mesmo ponto de
vista ao falar que o Acompanhamento Terapêutico funciona como dispositivo na medida em
que proporciona outros dispositivos nesse processo de experimentação do social e dos seus
potenciais nessas ocorrências.
O AT proclama uma clínica, e não uma prática ou dispositivo adaptativo, ou seja, não
somente pensar no acompanhado ou nas relações cristalizadas. Contudo, é pensar ações de
reconstrução social, da realidade, com o uso também do acaso que se dá nas ruas que se

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 434

percorre, pensar também o incomum. Esse “dispositivo na prática clínica” significa


“colaborar na produção da desnaturalização do cotidiano, na criação de formas múltiplas de
circular a/na cidade [...] romper com a lógica formatadora” (SILVA, 2005, p.94). Acima de
tudo, “colocar em xeque a ‘instituição’ loucura [...] produzir o novo.” (SILVA, 2005, p. 88).
Um processo de mudança, a “ação estaria a serviço da produção, da vida, do novo. Abalaria o
que até então era tido como ‘estável’ e ‘eterno’ (intituído)” (ibid, p. 94).
“A desospitalização do louco não garante a hospitalidade da loucura” (ARAÚJO,
2007, p. 166), ou seja, o seu acolhimento no meio urbano. O decreto em relação ao louco
continua inalterado, ele ainda é excluído, não é bem visto pelo social, estereotipado como o
perigoso, o “doido”, o qual preferencialmente está numa invisibilidade de olhar e escuta. É
serviço do acompanhante inserir a loucura no meio social. É ele que pode possibilitar o
contato entre ambos, a ponte que verifica as mudanças sociais decorrente de tal encontro.
Araújo (2007) utiliza a teoria de Foucault (1981), que acredita num cenário em
movimento, conforme as novas formas de relacionar-se e do relacionamento entre a
organização social e o louco. Concebe a política da amizade engajada no sentido do prazer,
que não se dá nas relações institucionalizadas. Pode haver prazer nas multiplicidades das
relações. Entre a organização social e o louco há a troca cortejada pelo prazer. A teoria vai
além, questiona a nossa organização que separa as classes condizentes com um sistema de
capital e, portanto, pensa no critério dos novos modos de vida. Modo de vida é ascender ao
valor e à subjetividade da pessoa ao seu modo; respeita, introduz a diferença, possibilita a
partilha e relações conduzidas pelo prazer da amizade.
Araújo (2007) abarca a constituição das concepções subjetivas concomitantes às
construções sociais, quer dizer a inseparabilidade sujeito/espaço. Então esse lugar não está
definido, assim como o individuo, a quem não basta somente habitar e viver nesse espaço.
Ambos os conceitos se reconstroem, andam juntos, recriam-se num processo de subjetivação
das pessoas e produção territorial.

3 METODOLOGIA

A metodologia de pesquisa é apoiada por questões além das tecnicistas. Quer dizer, a
elaboração do estudo deve ser conduzida na aliança das abordagens teóricas e pensamentos
apoiados por uma realidade, resultando na construção de hipóteses (MINAYO, 2012). Nesse
teor, escolhemos autores- referência por sua prática clínica no Acompanhamento Terapêutico

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 435

devido ao seu conhecimento prévio e à construção teórica a partir da sua prática. Dessa forma,
os mesmos critérios orientou a seleção dos autores ao discorrer a Análise Institucional, todos
circunscritos pela psicanálise.
Nessa perspectiva, realizamos um levantamento bibliográfico compreendendo o
período de 1991 a 2013 na formulação de uma pesquisa qualitativa. Entendemos, seguindo
Martins e Bicudo (1994), ser esta modalidade um método descritivo que não quantifica e nem
generaliza resultados. Percebe um fenômeno a ser estudado destacando sua singularidade,
respeitando sua interação com o social, observado numa ótica multidimensional.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo nos possibilitou refletir sobre o complexo funcionamento social no qual


estamos envolvidos, em que se formula como uma e várias Instituições. Nesse contexto,
estabelece-se o instituído, formatado pelas passagens históricas, percebe-se como se
designaram alguns estigmas instituídos. Estes que rotulam e excluem socialmente o diferente
e a loucura, firmados ainda nos moldes e alicerces manicomiais, na tentativa de tornar distante
esse sujeito que personifica para alguns a morte psíquica. Para outros sujeitos, que
compartilham essa realidade, firmam-se com o desejo de mudança, que pode acarretar um
eventual processo instituinte, este movimento que gera desconforto e conflito no convívio
social e também nas construções subjetivas particulares a cada indivíduo. Por isso, para o
movimento de mudança, precisamos pensar na emergência do desejo e em como torná-lo
factível. Nessa idealização, o Acompanhamento Terapêutico adentra ao processo instituinte.
Propomos com a Análise Institucional pensar no processo instituinte, com a utilização
do verossímil dispositivo Acompanhamento Terapêutico, uma modalidade clínica que busca
desconstruir pensamentos, conceitos e percepções cristalizados e congelados. A prática
significa dar voz e escutar os sujeitos à margem social, vivenciar com eles o inusitado nesse
contato direto com as ruas, ao mesmo tempo em que ressignifica, nessas passagens, o meio
social para a pessoa que se sente como sujeito pertencente a esse lugar compartilhado.
Instituir também, no fim do processo instituinte, algo totalmente novo, que desconstrói os
enclausuramentos materializados no socius e internalizados pelos sujeitos.
Trata-se de um movimento que propicia uma mutação social, que derruba barreiras,
ultrapassa fronteiras e desfaz alicerces da exclusão e do rótulo. Pensamos num dispositivo
que, junto ao acompanhado, resgata a sua (re)construção subjetiva, assim como a do meio

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 436

social. Repensar também essas relações das organizações sociais com a pessoa, como uma
troca investida pelo prazer.

6 REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Fábio. Um passeio esquizo pelo acompanhamento terapêutico: dos


especialismos à política da amizade. Rio de Janeiro: Niterói, 2007.

BAREMBLITT, Gregorio F. Compêndio de análise institucional e outras correntes: teoria


e prática. 5 ed., Belo Horizonte, 2002: Instituto Félix Guattari.

BERGER, Eliane; MORETTIN Adriana Victorio; NETO, Leonel Braga. História. In: A
CASA, Equipe de Acompanhantes Terapêuticos do Hospital Dia (Org.). A Rua Como
Espaço Clínico: Acompanhamento Terapêutico. São Paulo: Escuta, 1991. p. 17-23.

BARRETO, Kleber Duarte. Ética e técnica no acompanhamento terapêutico: andanças


com Dom Quixote e Sancho Pança. 2. ed. São Paulo: Unimarco, 2000.

CABRAL, Károl Veiga. Acompanhamento Terapêutico Como Dispositivo da Reforma


Psiquiátrica: Considerações Sobre o Setting. Porto Alegre, 2005. Dissertação (Mestrado em
Psicologia Social e Institucional), Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, 2005.

CARVALHO, Sandra Silveira. Acompanhamento Terapêutico: Que Clínica é Essa? São


Paulo: Annablune, 2004.

COELHO, Carlos Frederico Macedo. Convivendo com Miguel e Mônica: uma proposta de
Acompanhamento Terapêutico de crianças autistas. Brasília, 2007. Dissertação (Mestrado
em Psicologia Clínica e Cultura), Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, 2007.

DUBOIS, Rejane Caspani. Movimentos de Inclusão: um lugar para aprender um lugar


para viver. In: FOLBERG, Maria Nestrovsky; CHARCZUK, Maria Solange Bicca (Org.).
Crianças psicóticas e autistas: a construção de
uma escola. Porto Alegre: Mediação, 2003. p.35-48.

KINOSHITA, Roberto Tykanori. Contratualidade e Reabilitação Psicossocial. In: PITTA,


Ana (Org.). Reabilitação Psicossocial no Brasil. São Paulo: Hucitec, 2001. p. 55-59.

LEBRUN, Jean-Pierre. Clínica da Instituição: o que a psicanálise contribui para a vida


coletiva. Porto Alegre: CMC Editora, 2009.

LOURAU, René. Análise Institucional e Práticas de Pesquisa. Rio de Janeiro: UERJ, 1993.

MARTINS, Joel; BICUDO, Maria Aparecida Viggiani. A Pesquisa Qualitativa em


Psicologia: fundamentos e recursos básicos. 2. ed. São Paulo: Moraes, 1994.

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014


II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) 437

MINAYO, Maria Cecília de Souza (Org.). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade.
Petrópolis, RJ: Ed. Vozes, 2012.

PALOMBINI, Analice de Lima et al. Acompanhamento terapêutico na rede pública: a


clínica em movimento. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004.

SILVA, Alex Sandro Tavares. A Emergência do Acompanhamento Terapêutico: O


Processo de Constituição de uma Clínica. Porto Alegre, 2005. Dissertação [Mestrado em
Psicologia Social e Institucional], Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS,
2005.

Caxias do Sul – RS, de 27 a 29 de Maio de 2014

Potrebbero piacerti anche