Sei sulla pagina 1di 97

O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Diretoria da Associação Paulista do Ministério Público


Biênio 2008/2010
Presidente Cultural
Washington Epaminondas Medeiros Barra Ailton Cocurutto
1° Vice-Presidente Aline Jurca Zavaglia Vicente Alves
Antonio Luiz Benedan Christiano Jorge Santos
2° Vice-Presidente Valter Foleto Santin
Herberto Magalhães da Silveira Júnior Defesa das Prerrogativas, Garantias e
1° Secretário Segurança Funcionais:
Eduardo Roberto Alcântara Del-Campo Deborah Kelly Affonso
2° Secretário Mágino Alves Barbosa Filho
Luiz Fernando Rodrigues Pinto Júnior Esportes:
1º Tesoureiro Eder do Lago Mendes Ferreira
Nadir de Campos Júnior Eduardo Caetano Querobim
2° Tesoureiro José Reynaldo de Almeida
Ana Lucia Menezes Vieira Marcelo Freire Garcia
Relações Públicas Estudos Institucionais
Thales Cezar de Oliveira Everton Luiz Zanella
Patrimônio Francismar Lamenza
José Roberto Rochel de Oliveira Vilma Hayek
Aposentados Yuri Giuseppe Castiglione
Antonio Gusman Filho Informática
Antonio Celso Pares Vita
Prerrogativas
Jurisprudência Civil
José Antonio Franco da Silva
Arthur Migliari Júnior
Eurico Ferraresi
CONSELHO FISCAL
Inês Makowski de Oliveira Bicudo
Regina Célia Ribeiro
Titulares:
Rita Di Tomasso Martins
Clóvis Alberto D’AC de Almeida Jurisprudência Criminal
Newton Silveira Simões Júnior José Luiz Saikali
Roberto Luiz Ferreira de Almeida Júnior Karina Bagnatori
Suplentes: Perseu Gentil Negrão
Antonio Bandeira Neto Valéria Carvalho Pinto Guedes Piva
Sérgio Claro Buonamici Jusprev:
Vilson Baumgartner Mário Victor de Felício
Marta de Paula Fernandes
DEPARTAMENTOS Legislação
Danilo Palamone Agudo Romão
CEAL Francisco de Lucio Tersi
Coordenador: Wallace Paiva Martins Júnior Irene Moreno Vasconcellos
Secretário: Jorge Assaf Maluly Juang Yuh Yu
Aposentados Laurani Assis de Figueiredo
Ana Marta Smith Correa Orlando Patrimônio
Eudes Quintino de Oliveira Júnior André Luiz Marcassa
Felício Sylla José Ângelo Oliva
José Arnaldo Vianna Cione Tânia Maria Alves de Camargo Silva
Lauro Santo de Camargo Publicações:
Rodolfo Luiz Taddei Barbosa Maximiliano Roberto Ernesto Fuhrer
Silvio Barros de Almeida Thales Cezar de Oliveira

1
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Relações Públicas: Presidente Prudente:


Marcos Lucio Barreto Titular: Silvio Martins Barbatto
Oswaldo Monteiro da Silva Neto Suplente: Rufino Eduardo Galindo Campos
Turismo e Convênios: Ribeirão Preto:
José Eduardo Diniz Rosa Titular: Sebastião Donizete Lopes dos Santos
Maria Salete de Miranda Suplente: Daniel José de Angelis
São José do Rio Preto:
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DAS Titular: Antonio Ganacin Filho
REGIÕES Suplente: Aristides Pereira dos Santos
Sorocaba:
Araçatuba Titular: Arnaldo Marinho Martins Júnior
Titular: Dório Sampaio Dias Suplente: Renato Monteiro
Suplente: Luiz Antonio de Andrade Taubaté:
Baixada Santista Titular: Luis Dias Fernandes
Titular: Sandro Ethelredo Ricciotti Barbosa Suplente: Paulo José de Palma
Suplente: Eliana Figueira de Mello Vale da Ribeira:
Bauru Titular: Adolfo Sakamoto Lopes
Titular: Fernando Masseli Helene Suplente: Rodrigo Alves de Araujo Fiusa
Suplente: Célio Parisi
Campinas: DIRETORES REGIONAIS
Suplente: Geraldo Navarro Cabañas
Titular: Celso Rocha Cavalheiro
Araçatuba
Franca:
Diretor: Joel Furlan
Titular: Augusto Soares de Arruda Neto
Adjunto: Diana Maria da Silva Braus
Suplente: Dílson Santiago de Souza
Bauru
Guarulhos:
Diretor: Paulo Sérgio Foganholi
Titular: Luciana Frugiuele Pires Galvão
Adjunto: Jeronymo Crepaldi Júnior
Suplente: José Mário Buck Marzagão Barbuto
Campinas
Itapetininga:
Diretor: Simone Rodrigues Horta Gomes
Titular: Dalmir Radicchi
Suplente: Leandro Conte de Benedicto Adjunto: Valcir Paulo Kobori
Jundiaí: Franca
Titular: Jocimar Guimarães Diretor: Décio Antonio Piola
Suplente: Francisco Carlos Cardoso Bastos Adjunto: Paulo César Correa Borges
Litoral Norte: Presidente Prudente
Titular: Moacyr Whitaker Cohn de Assumpção Diretor: Nelson Roberto Bugalho
Suplente: Eloísa Balizardo Whitaker Cohn de Adjunto: Elaine de Assis e Silva
Assumpção Ribeirão Preto
Marília: Diretor: Aroldo Costa Filho
Titular: Jurandir Afonso Ferreira Adjunto: Sebastião Sérgio da Silveira
Suplente: Celso Bellinetti Júnior Santos
Mogi das Cruzes: Diretor: Ézio Benito Ferrini Júnior
Titular: Luciana Malheiros Adjunto: Ivan da Silva
Osasco: São José do Rio Preto
Titular: Fabio Luis Machado Garcez Diretor: José Américo Ceron
Suplente: Maria Eugênia Vieira de Morais Adjunto: Luiz Donizeti Delmaschio
Ourinhos: Sorocaba
Titular: Aguilar de Lara Cordeiro Diretor: Daniel Isidio de Almeida
Suplente: Adelino Lorenzetti Neto Adjunto: Eduardo Francisco dos Santos Júnior
Piracicaba: Taubaté
Titular: Antonio Carlos Perez Antunes da Silva Diretor: Paulo Rogério Bastos Costa
Suplente: Luiz Sérgio Hulle Catani Adjunto: Manoel Sérgio da Rocha Monteiro

2
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

O Estatuto da Criança e do
Adolescente e os Direitos
Fundamentais

LUIZ ANTONIO MIGUEL FERREIRA

EDIÇÕES APMP - 2008

3
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Composto e Diagramado pelo


Departamento de Publicações da
Associação Paulista do Ministério Público
Rua Riachuelo, nº 115 - 11º andar - Centro
Tel.: (11) 3188-6464 - São Paulo - SP
e-mail: publica@apmp.com.br

4
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO .............................................................................................. 07

CAPÍTULO I – Disposições gerais sobre o Estatuto da Criança e do


Adolescente .............................................................................. 09
1. Origem ............................................................................................. 09
2. Designação e características ........................................................... 10
3. Doutrina da Proteção Integral ........................................................ 12
4. Estrutura .......................................................................................... 14
5. Princípios fundamentais .................................................................. 15
6. Interpretação .....................................................................................17

CAPÍTULO II – Os direitos fundamentais. ................................................... 18


1. Os Direitos fundamentais na Constituição de 1988 ...................... 18
2. Os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes ............ 20

CAPÍTULO III – O direito à vida e à saúde ................................................... 23


1. A proteção legal do direito à vida e à saúde .................................... 23
2. O direito à vida e a saúde no ECA – normas de caráter geral .......... 24
3. Capítulo específico do ECA sobre o direito à vida e à saúde .......... 26
4. Infrações penais e administrativas .................................................. 33

CAPÍTULO IV – O direito à liberdade, ao respeito e à dignidade ................ 35


1. Direito à liberdade .......................................................................... 35
2. Direito ao respeito .......................................................................... 37
2.1 - Integridade física ................................................................. 39
2.2 - Integridade psíquica e moral .............................................. 39
3. Direito à dignidade ......................................................................... 40

CAPÍTULO V – O direito à convivência familiar e comunitária .................. 42


1. Disposições gerais ........................................................................... 42
2. Família natural e família substituta ................................................ 45
3. A guarda .......................................................................................... 47
4. A tutela ............................................................................................ 49
5. A adoção .......................................................................................... 49

5
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Capítulo VI – O direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer. ............ 56


1. A educação e seus objetivos ........................................................... 56
2. Os direitos da criança e do adolescente em relação à educação ...... 57
3. Dever do Estado com a educação .................................................. 59
4. Responsabilidade dos pais e responsáveis ..................................... 60
5. Obrigações dos dirigentes das escolas ........................................... 60

CAPÍTULO VII – O direito à profissionalização e à proteção no trabalho ....... 63


1. Idade mínima para o trabalho ........................................................ 63
2. Direitos do trabalhador adolescente ............................................... 64
3. Trabalhos proibidos ao adolescente ............................................... 64
4. Aprendizagem .................................................................................. 65
5. Trabalho educativo .......................................................................... 67

CAPÍTULO VIII – As obrigações .................................................................... 69

CAPÍTULO IX – Defesa dos direitos fundamentais ...................................... 72


1. Responsáveis pela defesa dos direitos fundamentais ..................... 72
2. Família ............................................................................................. 73
3. Escola .............................................................................................. 76
4. Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente ..... 79
5. Conselho Tutelar ............................................................................. 82
6. Ministério Público ........................................................................... 85

CAPÍTULO X – Considerações finais ............................................................. 87


1. Outros direitos previstos no ECA .................................................. 87
2. Uma lei inovadora .......................................................................... 90
3. O desafio ......................................................................................... 92

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 93

6
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Apresentação

A longa experiência de trabalho na Promotoria de


Justiça de Presidente Prudente, com atribuição na área da
criança e do adolescente, credencia o autor a elaborar o pre-
sente trabalho com linguagem simples, objetiva e didática.

A estrutura do trabalho está centrada na Constitui-


ção Federal, fundamento primário do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que no seu artigo 227 garante à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saú-
de, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização,
à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária.

O presente estudo fornece ao Promotor de Justiça


abrangente fundamentação teórica dos direitos fundamentais,
que são a expressão normativa, na ordem constitucional brasi-
leira, dos direitos da pessoa humana. Tais direitos, cujo respei-
to se impõe como exigência da dignidade humana, previstos no
ECA mereceram cuidado de capítulos específicos que enunci-
am o catálogo dos direitos sociais, dizendo respeito à vida e à
saúde, à liberdade, ao respeito, à convivência familiar e comu-
nitária, à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, o direito à
profissionalização e à proteção do trabalho sem deixar de reco-
nhecer, igualmente, as obrigações, abordadas no Capítulo VIII,
tema correlato dos direitos previstos na legislação.

Fernando Grella Vieira


Procurador-Geral de Justiça
7
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

8
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS SOBRE O ESTATUTO
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

1. ORIGEM
Em sua origem, a legislação menorista brasileira, num primeiro
momento, ficou vinculada à parte do direito que trata da família (no Códi-
go Civil – regras relativas à capacidade civil, poder familiar), ou sob a
perspectiva de natureza penal (Código Criminal e Penal), quando tratava
da questão da inimputabilidade e, ainda, a leis esparsas de natureza assis-
tencial. A codificação da legislação na área do menor ocorreu em 1927,
com o Código Mello Matos – Decreto nº. 17.943-A, que também represen-
tava o primeiro Código de Menores da América Latina. Posteriormente,
uma nova legislação, o Código de Menores de 1979 – Lei nº. 6697 de 10 de
outubro de 1979 –, disciplinou a questão do menor e adotou o princípio da
situação irregular, surgindo daí a figura do “menor em situação irregular”.
Diante da nova postura advinda da Constituição Federal de 1988, o
Código de Menores, então vigente, entrou em conflito com a lei maior, não
só em relação ao princípio, mas também em relação aos direitos funda-
mentais consagrados, surgindo assim a necessidade de sua alteração.
Como bem esclarece VERONESE (1997, p. 47):
Apesar de toda a inovação no que tange à assistência, prote-
ção, atendimento e defesa dos direitos da criança e do adolescente,
constantes na Constituição Federal, estes não poderiam se efetivar
se não regulamentados em lei ordinária. Se assim não fosse, a Cons-
tituição nada mais seria do que uma bela, mas ineficaz carta de in-
tenções. Portanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei nº.
8.069 de 13 de julho de 1990 surgiu com a difícil e nobre tarefa de
viabilizar os citados direitos.
Em decorrência das novas normas constitucionais, que preconiza-
vam um novo paradigma em relação à criança e ao adolescente, tornou-se
imperativa a elaboração de um instrumento legal para garantir a efetivação
dos direitos fundamentais da população infanto-juvenil. Nascia, assim, o
Estatuto da Criança e do Adolescente.

9
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

O advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº. 8.069,


de 13.07.1990) proporcionou uma mudança significativa no que diz res-
peito ao direito do menor. Representou uma alteração de princípios, con-
gregando as transformações ocorridas em nível nacional e internacional.
Essa mudança teve sua origem na Declaração Universal dos Direitos
da Criança, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20 de
novembro de 19591. Os documentos internacionais serviram de suporte para
o reconhecimento das crianças e dos adolescentes como pessoas humanas,
possuidoras de direitos fundamentais a serem preservados e garantidos.
No cenário nacional, a legislação constitucional também acompa-
nhou a evolução ordenada a nível internacional, sendo que o tratamento
dispensado às crianças e aos adolescentes sofreu avanços e retrocessos
dependendo dos diferentes momentos políticos e sociais por que o país
passou. E essa situação culminou com a atual Constituição Brasileira, pro-
mulgada em 05 de outubro de 1988, que representa um marco importante
na questão da infância e da juventude. Assimilando toda a evolução envol-
vendo a criança e o adolescente, acabou reconhecendo-os como titulares
de direitos sociais e políticos, acolhendo a doutrina da proteção integral,
contemplada em seu artigo 227, que estabelece:
Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar
à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultu-
ra, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e co-
munitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

2. DESIGNAÇÃO E CARACTERÍSTICAS.
Já na própria escolha do legislador para designar a lei, verifica-se a
nova concepção no tratamento das questões relativas à criança e ao ado-

1
Posteriormente, seguiram-se as regras mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça
da Infância e da Juventude - Regras de Beijing - Res. 40/33 de 29 de novembro de 1985; as Diretrizes
das Nações Unidas para a prevenção da delinqüência juvenil - Diretrizes de Riad, de 1º de março de
1988; e a Convenção sobre o Direito da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas
em 20 de novembro de 1989 e aprovada pelo Congresso Nacional Brasileiro em 14 de setembro de
1990.

10
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

lescente. Como se sabe, Estatuto refere-se a uma lei especial de uma cole-
tividade ou corporação, como por exemplo, de um setor do funcionalismo
público, ou de um clube. Preferindo denominar o texto legal como Estatu-
to, e não Código, - como era chamada anteriormente a lei menorista (Códi-
go de Menores) – o legislador procurou afastar-se da conotação de penali-
dade e do estigma criminal e marginalizante que existia em relação aos
menores, tornando clara a nova perspectiva, com destaque para os seus
direitos fundamentais.
Além disso, passou a utilizar a expressão ‘crianças e adolescentes’,
introduzida pela Constituição Federal (art. 227), em lugar de ‘menores’,
termo que possuía conotação discriminatória, por expressar algo pequeno,
parcela desprivilegiada da população (de menor), sentido incompatível com
as disposições contidas na nova lei que preconizava a criança e o adoles-
cente com seres que merecem um tratamento diferenciado. Estabeleceu-se,
então, que se entende por criança a pessoa até 12 anos de idade incomple-
tos e, adolescente, aquele entre 12 e 18 anos de idade (ECA, art. 2º).
Vale lembrar que a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos
da Criança estabelece, em seu artigo 1º., que se considera como criança
todo ser humano com menos de dezoito anos de idade. A lei brasileira foi
fiel a esse parâmetro, mas dividiu a faixa etária em dois grupos que deno-
minou crianças e adolescentes. Ainda que não exista um critério biológico
ou psicológico para tal distinção, ela se impôs por uma questão de política
legislativa, em razão das conseqüências oriundas da prática de ato infraci-
onal por criança e adolescente (medidas protetivas e socioeducativas)2.
A alteração mais importante e significativa da nova legislação re-
fere-se à base doutrinária, ou seja, passou-se do direito tutelar do menor
(menor em situação irregular - objeto das medidas judiciais) para o da pro-
teção integral (crianças e adolescentes como sujeitos de direitos).
A nova legislação apresenta, ainda, como características, a
municipalização das ações em favor da criança e do adolescente, com a efeti-

2
Aliás, esse critério etário vem sendo adotado com freqüência pelo legislador, como por exemplo, ao
fixar a idade de 16 a 18 anos para a maioridade civil relativa (C. Civil, art. 4, I); de 16 anos para
exercer o direito de votar (CF, art. 14, II, “c” ) e para adquirir a capacidade núbil (C. Civil, art.
1517); 18 anos para a maioridade penal e a capacidade civil plena (C. Civil, art. 5º) e para se
candidatar ao cargo de vereador (CF., art. 14, Parágrafo 3º, VI, “d”).

11
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

va participação da comunidade, visando tornar-se um instrumento de desen-


volvimento social e de concretização dos direitos consagrados. Garante os
princípios do contraditório e da ampla defesa e prevê a criação do Conselho
Tutelar, órgão encarregado dos casos envolvendo criança e adolescente em
situação de risco pessoal e social. Também deixou de penalizar a pobreza, a
partir do momento em que estabeleceu que a carência de recursos materiais
não constitui motivo para a perda ou suspensão do poder familiar. Por fim, o
ECA estabeleceu regras a respeito da internação do adolescente infrator, até
antes da decisão judicial, e definiu como crimes específicos situações em
que crianças e adolescentes figuram como vítimas.

3. DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL


A doutrina jurídica adotada pela Constituição Federal em relação à
criança e ao adolescente foi a da Proteção Integral, que representava a
nova concepção advinda da Convenção Internacional sobre os Direitos da
Criança da ONU e da Declaração Universal sobre os Direitos da Criança.
E o Estatuto da Criança e do Adolescente tratou de detalhar a nova doutri-
na, contemplando o exercício dos direitos estabelecidos, conforme seu ar-
tigo 4º., que manteve a mesma redação do artigo 227 da Constituição Fede-
ral, onde se declara ser dever da família, da sociedade e do Estado assegu-
rar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida,
à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cul-
tura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e co-
munitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, dis-
criminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
A doutrina jurídica da proteção integral tem seus princípios expres-
sos basicamente em três artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente,
ou seja:
• Criança e adolescente como sujeitos de direito - artigo 3º.
• Criança e adolescente como destinatários de absoluta prioridade -
artigo 4º.
• Respeito à sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento -
artigo 6º.
Criança e adolescente como sujeitos de direitos: deixam de ser ob-
jetos das medidas que lhes digam respeito ou meros sujeitos passivos, para

12
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

terem assegurados todos os direitos fundamentais consagrados na Consti-


tuição, da mesma forma que a pessoa adulta. Até porque a Constituição
Federal, ao prever a igualdade perante a lei, determina que homens e mu-
lheres são iguais em direitos e obrigações e não faz distinção entre as pes-
soas maiores ou menores de idade.
Criança e adolescente como destinatários de absoluta prioridade:
implica na primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circuns-
tâncias; precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevân-
cia pública; preferência na formulação e na execução das políticas sociais
públicas e destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacio-
nadas com a proteção à infância e à juventude (ECA., art. 4º, parágrafo
único). Isso significa que os direitos assegurados à população infanto-ju-
venil devem ser efetivados com prioridade sobre quaisquer outros direitos,
garantindo-lhes uma ordem de preferência sobre os demais.
Respeito à sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento: os
direitos consagrados à pessoa adulta também se aplicam ao cidadão-me-
nor, mas levando-se em consideração o fato de que ainda é um ser em
formação, o que exige adaptações para a consolidação desses direitos.
Essa nova doutrina, afirma Veronese (1997, p. 15), tem como alicer-
ce a convicção de que a criança e o adolescente são merecedores de direi-
tos próprios e especiais, que, em razão de sua condição específica de pes-
soas em desenvolvimento, estão a necessitar de uma proteção especializa-
da, diferenciada e integral.
Assim, o Estatuto representa um conjunto de instrumentos jurídicos
capaz de reconhecer na criança e no adolescente um cidadão, que também
tem direitos e não somente obrigações. Como esclarece Elias (1994, p. 02)
a proteção integral há de ser entendida como aquela que abranja todas as
necessidades de um ser humano para o pleno desenvolvimento de sua per-
sonalidade.
Dessa forma, a eles são garantidos todos os instrumentos necessári-
os para assegurar seu desenvolvimento físico, mental, moral e espiritual,
em condições de liberdade e dignidade, cabendo à família, à sociedade e
ao Estado a responsabilidade dessa tarefa.
Deixou-se de lado a visão do menor como objeto de compaixão,
abandonado, maltratado, em situação irregular ou não, para assumi-lo como
13
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

sujeito de direitos, centro da legislação adotada. Buscou a nova doutrina


tratar de todos, sem qualquer discriminação, não mais se referindo a um só
tipo de jovem, o menor em situação irregular.
Almejando garantir à criança e ao adolescente pleno desenvolvi-
mento, respeitando suas peculiaridades, contempla princípios vigentes em
nosso ordenamento jurídico que eram ignorados pela legislação revogada,
modificando a intervenção estatal discricionária praticada anteriormente.
É certo que essa postura provocou inúmeras reações contrárias, pos-
to que não se vislumbrava na criança e no adolescente um ser humano com
direitos iguais aos das pessoas maiores, ou seja uma criança-cidadã ou um
adolescente-cidadão.
Isso, no entanto, não significa dizer que a nova doutrina assegura às
crianças e aos adolescentes apenas direitos. Continuam eles com as obriga-
ções que lhes são peculiares, como as decorrentes do poder familiar3. E,
conforme afirma Sêda (1996, p. 31), se digo que alguém (idoso, adulto,
adolescente ou criança) tem direitos, automaticamente estou também di-
zendo, mesmo sem dizer, que tem deveres. Cada direito implica, no seu
limite, num dever.
Nesse particular, deve ficar patente que a todo direito corresponde
uma obrigação, ou que a figura do direito tem como correlato o dever.
Aliás, o artigo 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente deixa consigna-
do, quanto à forma de interpretar a lei, que deve ser levada em considera-
ção a questão dos direitos e deveres individuais.

4. ESTRUTURA
O fundamento primário do Estatuto da Criança e do Adolescente é a
Constituição Federal, que ditou a sua estrutura. Com efeito, no seu artigo
227, ficou estabelecido à criança e ao adolescente, com absoluta priorida-
de, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissi-
onalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negli-
gência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

3
Código Civil, artigo 1634.

14
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Trata-se de uma norma de eficácia plena com aplicação imediata.


Contudo, o legislador ordinário detalhou-a, quando da sua elaboração, a
fim de que ficasse explicitado como os direitos fundamentais determina-
dos no artigo 227 da Constituição se concretizam.
Assim, na primeira parte do Estatuto da Criança e do Adolescente -
livro I -, o legislador tratou dos direitos fundamentais, especificando como
eles serão assegurados à população infanto-juvenil. A Constituição estabe-
lece, por exemplo, o direito da criança e do adolescente à saúde. O Estatuto
detalhou, em capítulo próprio4, como se garante esse direito, ou seja,
explicitando ações como atendimento médico do Sistema Único de Saúde,
tratamento especializado ao portador de deficiência, fornecimento gratuito
de medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao tratamento, bem
como habilitação ou reabilitação, entre outras.
No livro II, correspondente à parte especial, ficaram estabelecidas a
política de atendimento, as medidas de proteção, as normas relativas à prá-
tica do ato infracional, as medidas aplicáveis aos pais ou responsáveis, a
criação dos conselhos tutelar, da justiça da infância e da juventude e, por
fim, a definição de crimes e infrações administrativas.
Há correspondência entre os direitos fundamentais e os meios proces-
suais para alcançá-los, ficando claro que a nova lei tratou tanto do direito subs-
tantivo como adjetivo, dividindo-os em cada livro, numa seqüência lógica.

5. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Muitos princípios adotados pela nova legislação encontram sua ori-
gem na Constituição Federal, na Convenção sobre o Direito da Criança e
nas Regras de Beijing. Assim, adotando a classificação de Rita Maxera
(MENDES e COSTA, 1995, p. 74/75), temos os seguintes princípios:
PRINCÍPIO DA HUMANIDADE: baseia-se no princípio da respon-
sabilidade social do Estado e na obrigação de assistência para o processo
de ressocialização, de onde se deriva a proibição de penas cruéis e degra-
dantes. Encontra referência no Estatuto da Criança e do Adolescente, nos
artigos 15, 16, 17, 18 e 126.

4
Capítulo I do Estatuto da Criança e do Adolescente.

15
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE: traduz a proibição de existência de


delito e pena sem a pré-existência de lei anterior. Consagra o brocardo
jurídico nullum crimen, nulla peona sine lege. No Estatuto, este princípio
está sedimentado nos artigos 103, 108 e 110.
PRINCÍPIO DA JURISDICIONALIDADE: pressupõe a existência
dos requisitos essenciais da jurisdição, qual seja, juiz natural, independên-
cia e imparcialidade do órgão. O artigo 111 do ECA faz expressa referên-
cia a ele.
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO: pressupõe uma clara definição
dos papéis processuais pelas partes envolvidas no procedimento, ou seja,
Juiz, Ministério Público e Defensor, com igualdade de tratamento. Este prin-
cípio, que não era contemplado no Código de Menores, passa a ser estabele-
cido nos artigos 110 e 111 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
PRINCÍPIO DA INVIOLABILIDADE DA DEFESA: prevê a presen-
ça de defensor em todos os atos processuais, desde o momento em que se
imputa o cometimento de uma infração. O Estatuto da Criança e do Ado-
lescente refere-se a este princípio nos artigos 111 - III, 124 - III e 206.
PRINCÍPIO DA IMPUGNAÇÃO: assenta-se na possibilidade de se
recorrer a um órgão superior. Há previsão expressa no Estatuto da Criança
e do Adolescente quanto à possibilidade dos recursos (artigos 137 e 198).
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO: o tipo de
procedimento a ser obedecido deve estar previsto em lei, não podendo vin-
cular as partes à discricionariedade do órgão jurisdicional. O devido pro-
cesso legal está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo
110. Com relação a este princípio, existe a exceção estabelecida no artigo
153 do Estatuto, que faculta à autoridade judiciária investigar fatos e orde-
nar de ofício as providências necessárias, quando a medida judicial a ser
adotada não corresponder a procedimento previsto no Estatuto da Criança
e do Adolescente ou em outra lei. Mas, nesse caso, estabelece a oitiva do
Ministério Público e, sempre que possível, do advogado, quando se fizer
presente no procedimento. Essa investigação tem caráter administrativo.
PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE DO PROCESSO: para este princí-
pio fica assegurada a possibilidade, aos sujeitos processuais, de ter acesso
aos atos do processo e, ao mesmo tempo, a conveniência de se proteger a
identidade da criança e do adolescente como forma de evitar a estigmatiza-
ção (artigo 143).

16
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

É certo, porém, que devido à ligação existente entre o Estatuto da


Criança e do Adolescente e os demais ramos do direito, aos quais às vezes
faz expressa referência (art. 103, 152 e 198), não há como negar que os
princípios desses ramos jurídicos também têm inteira aplicação nesta área
específica do direito, como, por exemplo, o duplo grau de jurisdição, os
princípio da territorialidade e da inocência, entre outros.

6. INTERPRETAÇÃO
A regra básica para interpretação do Estatuto da Criança e do Ado-
lescente encontra-se no artigo 6º, no qual o fim social a que a lei se dirige,
as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos
e a condição peculiar de criança e adolescente como pessoas em desenvol-
vimento refletem a preocupação do legislador em garantir atenção especial
a essa parcela da comunidade.
A proteção dos interesses das crianças e dos adolescentes prevalece
sobre qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado. O legislador
constituinte fez a opção pela população infanto-juvenil, conferindo-lhe
prioridade absoluta, o que significa que os direitos que lhes foram conferi-
dos têm primazia sobre os demais, quando em conflito.
Também deve ser levado em consideração o posicionamento da cri-
ança e do adolescente frente a uma situação jurídica, na qual tenha especial
interesse. Nesses casos, o ECA estabelece a necessidade de se ouvir a cri-
ança ou o adolescente e o respeito à sua manifestação. Nas hipóteses de
colocação em família substituta (ECA, artigo 28, parágrafo 1º e 45, pará-
grafo 2º e 111, V) a opinião da criança ou do adolescente é de suma rele-
vância porque está em jogo o seu próprio destino. Assim também deve ser
interpretado o Estatuto, segundo a manifestação de vontade da criança e do
adolescente.
Esta interpretação tem por fundamento o fim social e a exigência do
bem comum5, acrescidos da situação peculiar da criança e do adolescente
como pessoas em desenvolvimento.

5
Artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil.

17
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO II
OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

1. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988


Entre os fundamentos da República Federativa do Brasil, apontados
pela Constituição Federal de 19886, encontram-se a cidadania e a dignida-
de da pessoa humana. Para a efetividade desses fundamentos, tratou o le-
gislador constituinte de dedicar capítulo específico referente aos direitos e
garantias fundamentais da pessoa humana, essenciais à manutenção da vida
em sociedade.
Arrolou como direitos fundamentais7:
• Direitos individuais e coletivos;
• Direitos sociais;
• Direitos de nacionalidade;
• Direitos políticos;
• Direitos referentes aos partidos políticos.
Esses direitos evoluíram de acordo com a própria evolução da soci-
edade. Nesse sentido, T. H. MARSHAL (MEKSENAS, 2002, p. 38) e
NORBERTO BOBBIO (1992, p.32) revelam que, na evolução dos direitos
dos homens, encontramos três grupos distintos:
a) Direitos civis: correspondentes ao conjunto das liberdades indivi-
duais estabelecidas por meio da igualdade jurídica. Compreende-
se o direito de liberdade, como o direito que tende a limitar o
poder do Estado e a reservar para o indivíduo, ou para os grupos
particulares, uma esfera de liberdade em relação ao Estado;
b) Direitos políticos: referentes ao exercício do poder, e são estabe-
lecidos por mecanismos de participação social e política. Os di-
reitos políticos, segundo BOBBIO, são aqueles os quais – conce-
bendo a liberdade não apenas negativamente, como não impedi-
mento, mas positivamente, como autonomia – tiveram como con-
seqüência a participação cada vez mais ampla, generalizada e
freqüente dos membros de uma comunidade no poder político (ou
liberdade no Estado);

6
Artigo 1º.
7
Titulo II da Constituição Federal.

18
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

c) Direitos sociais: que se apresentam como o conjunto das garanti-


as mínimas do bem-estar econômico, de acordo com os padrões
culturais aceitos por uma sociedade. São regidos pelo signo da
igualdade e visam ao bem-estar social. Os direitos sociais expres-
sam o amadurecimento de novas exigências – podemos mesmo
dizer, de novos valores – como os do bem-estar e da igualdade
não apenas formal, e que poderíamos chamar de liberdade através
ou por meio do Estado.
A responsabilidade pela garantia desses direitos, segundo esclarece
MEKSENAS (2002, p. 38), estaria dividida também em três níveis de ins-
tituições: a) para os direitos civis, os tribunais; b) para os direitos políticos,
as assembléias, câmaras e congressos locais e nacionais, como espaços
institucionais de representação popular nas tomadas de decisão e elabora-
ção de legislação; c) para os direitos sociais, o conjunto de ações públicas
com fins sociais que se apresentam nas mais diversas instituições, entre
elas aquelas correspondentes à saúde, à educação e à previdência.
Na Inglaterra, lembra MARSHAL, a consolidação de tais direitos
não ocorreu ao mesmo tempo, ou seja, os direitos civis foram estabeleci-
dos no século XVIII, os políticos, no século XIX e os sociais, no século
XX. No Brasil, a afirmação de tais direitos se deu a partir do século XIX, e
numa ordem diversa, isto é, estabeleceram-se primeiramente os direitos
políticos, alguns direitos sociais (principalmente na era Vargas) e, por fim,
os direitos civis, com dificuldades naturais, devido às mudanças da forma
de governo e das políticas desenvolvidas.
Hoje, a doutrina classifica esses direitos fundamentais como de primei-
ra, segunda e terceira geração. Nesse sentido destaca MORAES (1988, p. 45):
a) Direitos fundamentais de primeira geração: são os direitos e ga-
rantias individuais e políticos clássicos (liberdades públicas);
b) Direitos fundamentais de segunda geração: são os direitos econô-
micos sociais e culturais, surgidos no início do século. Entre os
direitos sociais incluem-se aqueles relacionados com o trabalho,
o seguro social, a subsistência, o amparo à doença, à velhice, etc.
c) Direitos de terceira geração: os chamados direitos de solidarieda-
de ou fraternidade, que englobam o direito a um meio ambiente
equilibrado, a uma saudável qualidade de vida, ao progresso, à
paz, à autodeterminação dos povos e a outros direitos difusos.

19
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

A finalidade dos direitos fundamentais, conforme destacado, está


relacionada à cidadania e a dignidade da pessoa humana, sendo que a cri-
ança e o adolescente acabaram por receber destaque, em face de sua condi-
ção como pessoa em desenvolvimento.

2. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS CRIANÇAS E DOS ADO-


LESCENTES
Com a Constituição, as crianças e os adolescentes também foram reco-
nhecidos como cidadãos e passaram a usufruir todos os direitos constitucio-
nalmente consagrados, que se aplicam às pessoas maiores de 18 anos. Passa-
ram da situação de menor para a de criança cidadã e adolescente cidadão.
A base de sustentação da Constituição Federal de 1988, em relação
aos direitos fundamentais da criança e do adolescente foi a Convenção
sobre o Direito da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações
Unidas, em 20 de novembro de 1989, que adotou o princípio da proteção
integral e a necessidade de reconhecer a criança como pessoa em desen-
volvimento, merecedora de proteção especial.
Essa proteção integral e especial, consubstanciada nos direitos fun-
damentais constitucionalmente assegurados, foi estabelecida em todos os
artigos (5º ao 17 da CF) que se aplicam à pessoa maior de idade, com a
ressalva de que, em relação à criança e ao adolescente deve ser considera-
da a sua condição de pessoa em desenvolvimento. Com destaque, e de
forma específica em relação à população infanto-juvenil, a Constituição
Federal de 1988 estabeleceu:
Art. 6: São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a mora-
dia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na
forma desta Constituição.
Art. 227: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança e ao adolescente, com absoluta prioridade o direi-
to à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discrimi-
nação, exploração, crueldade e opressão.

20
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

MORAES (1998, p. 54/55) esclarece que, além desses direitos, me-


rece registro a questão da inimputabilidade penal prevista no artigo 228 da
Constituição Federal (são penalmente inimputáveis os menores de dezoito
anos, sujeitos às normas da legislação especial), que encerraria hipótese
de garantia individual prevista fora do rol exemplificativo do artigo 5º.
Dessa forma, podem ser arrolados, em relação à criança e ao adoles-
cente, como fundamentais, os direitos à (ao):
• vida
• saúde
• alimentação
• educação
• lazer
• profissionalização
• cultura
• dignidade
• respeito
• liberdade
• convivência familiar e comunitária
• proteção contra toda forma de negligência, discriminação, explo-
ração, crueldade e opressão
• inimputabilidade penal
Os responsáveis diretos pela efetivação desses direitos fundamentais,
conforme estabelecido na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da
Criança e do Adolescente são: a família, a sociedade em geral, a comunidade
e o Estado, devendo todos agir de forma conjunta para conseguir tal fim.
A lei ainda criou outros órgãos, como o Conselho Tutelar, e conferiu
legitimidade a outras instituições (Ministério Público e as Associações le-
galmente constituídas) para a garantia desses direitos. Exigiu, também, a
criação dos Conselhos de Direitos para estabelecerem a política relativa à
efetivação dos direitos fundamentais no Município, Estado e União.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, cumprindo o papel para o
qual foi instituído, buscou regulamentar a efetividade desses direitos fun-
damentais conferidos à infância e à juventude, garantindo os meios legais
para a sua realização, com o detalhamento das ações judiciais que forem
necessárias em cada situação. Dessa forma, do artigo 7º. ao 69, o legislador

21
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

estatutário detalhou os direitos fundamentais relacionados à criança e ao


adolescente.
Verifica-se que o Estatuto não criou qualquer direito novo em bene-
fício da criança e do adolescente, tendo apenas regulamentado o que já
tinha sido especificado pelo legislador constituinte, reconhecendo-os como
sujeitos de direitos.
Deixou consignado, o texto legal, que a ação ou omissão relaciona-
das aos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes devem ser
punida na forma da lei, estabelecendo que não serão admitidas ações negli-
gentes, discriminatórias, cruéis, violentas, de exploração e opressão dirigidas
à população infanto-juvenil (ECA, art. 5º).

22
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO III
O DIREITO À VIDA E À SAÚDE

1. A PROTEÇÃO LEGAL DO DIREITO À VIDA E À SAÚDE


A vida e a saúde, garantidas com o nascimento da pessoa e seu pos-
terior desenvolvimento, encontraram, no Direito, um instrumento impor-
tante para a sua efetivação.
Houve necessidade da intervenção legal, uma vez que as relações
que se firmavam, principalmente com a criança e o adolescente, não se
apresentavam de forma protetiva e saudável. O direito à vida e à saúde das
crianças e dos adolescentes precisou ser garantido por lei, diante do fla-
grante desrespeito instaurado.
A título de exemplo, são inúmeros os relatos de investigações cien-
tíficas na área biológica e médica envolvendo crianças, com evidente ofen-
sa à sua condição de pessoa humana em desenvolvimento. Não se garantia
o direito ao respeito, à dignidade, à saúde e até mesmo à vida das crianças.
Testes de vacinas, como a anti-rábica e a de varíola, eram realizados em
crianças, que muitas vezes não representavam o modelo ideal.
Somente com o passar dos anos é que ocorreu o reconhecimento das
crianças e dos adolescentes como possuidores de direitos, como a vida e a
saúde, proporcionando-lhes, paulatinamente, uma proteção legal. Assim,
no Brasil, o direito à vida e à saúde está formalmente garantido na Consti-
tuição Federal e em leis ordinárias editadas posteriormente.
Como um desses textos legais, o Estatuto da Criança e do Adoles-
cente (Lei n. 8.069, de 13/07/1990) especificou, em capítulo próprio, como
se efetiva a garantia de tais direitos a essa parcela da comunidade. Revela
que é mediante a aplicação de políticas sociais públicas que permitam o
nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas
de existência das crianças e adolescentes, que se estarão garantindo a vida
e a saúde.
É certo que, para a garantia efetiva do direito à vida e à saúde das
crianças e dos adolescentes, outras leis foram editadas, como a Lei Orgâni-
ca da Saúde – nº. 8.080, de 19 de Setembro de 1990 -, que dispõe sobre as
condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organiza-
ção e o funcionamento dos serviços correspondentes, as leis municipais
que tratam dos Conselhos Municipais de Saúde.

23
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Essas leis buscam dar efetividade ao comando constitucional, ado-


tando princípios como a universalidade, eqüidade e integralidade e visam
à promoção8, à proteção9 e à recuperação10 da saúde.
Mas o Estatuto da Criança e do Adolescente, por ser uma lei que
trata especificamente desse segmento da comunidade, assume especial re-
levância, uma vez que traz, em seu bojo, a preocupação com o nascimento
e desenvolvimento da criança e o seu reconhecimento como pessoa huma-
na, com direito à dignidade e ao respeito, apontando ações para a promo-
ção, proteção e recuperação de sua saúde.
A análise do capítulo específico do ECA em relação ao direito à vida
e a saúde revela o tratamento dispensado pela Lei a essa questão.

2. O DIREITO À VIDA E À SAÚDE NO ECA - NORMAS DE CARÁ-


TER GERAL
O ECA tratou do direito à vida e à saúde em capítulo próprio, esta-
belecendo diretrizes para a sua concretização. Porém, em outros capítulos
e artigos, deixa consignada a relação que se firma com este tema, ressal-
tando a importância de sua análise.
Ao estabelecer que criança e adolescente devem ser prioridade ab-
soluta, o Estatuto deixa evidente que essa prioridade deve ser considerada
também na área da saúde, com ações que venham a materializar esse co-
mando. Nesse sentido, diz a lei:
Art. 4º - É dever da família, da comunidade, da sociedade em
geral e do Poder Público assegurar com absoluta prioridade, a efeti-
vação dos direitos referentes à vida, à saúde ....
Parágrafo único: A garantia da prioridade compreende:
a) primazia em receber proteção e socorro em quaisquer cir-
cunstâncias;

8
Entendendo como promoção a educação em saúde, bons padrões de alimentação e nutrição, adoção
de estilos de vida saudáveis, uso adequado e desenvolvimento de aptidões e capacidades,
aconselhamentos específicos, como os de cunho genético e sexual.
9
Como proteção, a vigilância epidemiológica, vacinações, saneamento básico, vigilância sanitária,
exames médicos e odontológicos periódicos, entre outros.
10
Recuperação da saúde, abrangendo diagnóstico e tratamento de doenças, acidentes e danos de
toda natureza, limitação da invalidez e reabilitação.

24
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de re-


levância pública.
Verifica-se que os profissionais que atuam na área da saúde devem
garantir, à criança e ao adolescente, a prioridade absoluta quanto ao recebi-
mento de proteção, socorro e atendimento.
Esse atendimento encontra fundamento no que estabelece o artigo
5º. do texto legal, onde se lê:
Art. 5º - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qual-
quer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, cru-
eldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado, por
ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Ainda em relação às normas de caráter geral que abrangem o direito
à vida e à saúde das crianças e dos adolescentes, merece registro o direito
ao respeito com que devem ser tratados, que consiste na inviolabilidade de
sua integridade física, psíquica e moral (ECA, art. 17).
Deve-se mencionar, também, o direito à dignidade, que se revela
pela obrigação de colocar as crianças e os adolescentes a salvo de qualquer
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor
(ECA, art.18).
Visando, ainda, a uma proteção mais específica em relação à saúde
do adolescente trabalhador, o Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe
a realização de atividades em locais perigosos e insalubres, prejudiciais ao
seu desenvolvimento físico e psíquico (ECA, art.67).
Quando o legislador tratou da política de atendimento à criança e ao
adolescente, estabeleceu, para garantir o direito à vida e à saúde, a necessi-
dade de implantação de serviços especiais de prevenção e atendimento
médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração,
abuso, crueldade e opressão (ECA, Art. 87, III).
Verifica-se, por essa análise, que o direito à vida e à saúde foi muito
enfatizado pelo ECA, não só em relação à política de atendimento, como
também às ações dos profissionais que atuam no setor, compartilhando a
responsabilidade com os pais ou responsáveis, bem como com a própria
criança e o adolescente.
Com efeito, ao tratar das medidas de proteção que se aplicam às
crianças e aos adolescentes, o Estatuto faz expressa referência à questão da
saúde, explicitando:
25
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Art. 101 – Verificada qualquer das hipóteses previstas no arti-


go 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as
seguintes medidas:
V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiá-
trico, em regime hospitalar ou ambulatorial;
VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio,
orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos.
No que se aplica aos pais ou responsáveis, o Estatuto deixou assentado:
Art. 129 – São medidas aplicáveis aos pais ou responsáveis:
III – encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;
VI – obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento.
Por fim, ao se referir a proteção judicial dos interesses individuais,
difusos e coletivos, o ECA garantiu a possibilidade de se ingressar com
ação judicial para fazer valer os direitos previstos, em especial aqueles
relacionados à saúde. Assim determinou:
Art. 208 – Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de
responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao
adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular:
VII – de acesso às ações e serviços de saúde.
Além de reafirmar no ECA o direito à vida e à saúde, contemplou o
legislador um capítulo específico a respeito do tema.

3. CAPÍTULO ESPECÍFICO SOBRE O DIREITO À VIDA E À SAÚDE


O Estatuto tratou do direito à vida e à saúde no Capítulo I – artigos
7º. a 14, onde se afirma que a criança e o adolescente têm direito à proteção
à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que
permitam o seu nascimento e seu desenvolvimento sadio e harmonioso, em
condições dignas de existência.
A primeira conclusão que se extrai da análise deste direito é que o
meio, ou a forma, pelo qual se garante o direito à vida e à saúde resume-se
a políticas sociais públicas11, e o objetivo dessas ações é garantir o nasci-

11
Que se traduz pelas ações concretas do poder público para fazer valer o que está descrito na lei em
relação ao direito à saúde, em face da realidade vivenciada por crianças e adolescentes. É a ponte
que liga a lei à situação concreta.

26
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

mento e o desenvolvimento sadio das crianças e adolescentes, ou seja, o


Estatuto não se satisfaz, apenas, com a garantia do nascimento da criança,
mas objetiva propiciar meios para que ela cresça e se desenvolva.
Essa situação revela que, caso o município não possua políticas pú-
blicas para garantir a efetivação desse direito, é perfeitamente cabível uma
medida judicial visando à sua realização, com o objetivo de assegurar re-
serva no orçamento para a sua concretização ou mesmo a imediata implan-
tação, nos casos que se revelam urgentes. Também é tema a ser incluído na
pauta do Conselho Municipal de Direitos das Crianças e dos Adolescentes,
posto ser ele a instituição responsável para ditar a política pública nessa
área, no município.
Políticas públicas na área da saúde referem-se a diretrizes e ações,
incluídas as de caráter preventivo, desenvolvidas pelo município, e que
visam garantir o nascimento da criança e seu posterior desenvolvimento.
Trata-se de uma ação ampla, que abrange coordenação e fiscalização, en-
volvendo os setores público e privado, o que as diferencia do simples ser-
viço público realizado nessa área. Tais políticas podem refletir a preocupa-
ção do município, entre outros temas ligados à vida e à saúde, como a
violência doméstica, maus-tratos, aleitamento materno, gravidez na ado-
lescência, prevenção de deficiências ou mortalidade infantil.
O Estatuto da Criança e do Adolescente apresenta, de maneira sepa-
rada e didática, as situações que implicam a garantia do nascimento da
criança e as ações que se devem executar para o seu desenvolvimento. De
tal modo, as normas apresentadas em seus artigos 8º., 9º. e 10 dão especial
atenção ao nascimento, apresentando e garantindo ações direcionadas à
gestante, para possibilitar-lhe um parto com dignidade; regulamenta o aten-
dimento pré e perinatal, o apoio alimentar, o aleitamento materno, o regis-
tro dos prontuários e a identificação do recém nascido, a prevenção de
anormalidades metabólicas e o alojamento conjunto do neonato e a mãe.
Diz a lei:
Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de
Saúde, o atendimento pré e perinatal.
§ 1º A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de aten-
dimento, segundo critérios médicos específicos, obedecendo-se aos
princípios de regionalização e hierarquização do Sistema.
27
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

§ 2º A parturiente será atendida preferencialmente pelo mes-


mo médico que a acompanhou na fase pré-natal.
§ 3º Incumbe ao poder público propiciar apoio alimentar à
gestante e à nutriz que dele necessitem.
Art. 9º O poder público, as instituições e os empregadores
propiciarão condições adequadas ao aleitamento materno, inclusive
aos filhos de mães submetidas a medida privativa de liberdade.
Essas regras, apesar de aparentemente preverem direitos relativos à
gestante, na verdade buscam garantir o direito do nascituro (nascimento
sadio e harmonioso), daí porque inseridas no Estatuto da Criança e do Ado-
lescente.
A seguir, após assegurar o nascimento, tratou o legislador menorista
de garantir o desenvolvimento da criança. As regras dos artigos 11, 12, 13
e 14 referem-se à forma como deve ocorrer o atendimento de crianças e
adolescentes que necessitem de cuidados médicos, estabelecendo regras
quanto a internação, realização de exames obrigatórios, fornecimento de
medicamentos, próteses e outros recursos terapêuticos. Regulamentou a
obrigatoriedade de denúncia de maus-tratos envolvendo crianças e adoles-
centes, a prevenção odontológica e a vacinação obrigatória.
Estabelece a lei:
Art. 10. Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à
saúde de gestantes, públicos e particulares, são obrigados a:
I - manter registro das atividades desenvolvidas, através de
prontuários individuais, pelo prazo de dezoito anos;
II - identificar o recém-nascido mediante o registro de sua
impressão plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem preju-
ízo de outras formas normatizadas pela autoridade administrativa
competente;
III - proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica
de anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como pres-
tar orientação aos pais;
IV - fornecer declaração de nascimento onde constem neces-
sariamente as intercorrências do parto e do desenvolvimento do
neonato;
V - manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato a
permanência junto à mãe.

28
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Art. 11. É assegurado atendimento integral à saúde da criança


e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, garan-
tido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promo-
ção, proteção e recuperação da saúde.
§ 1º A criança e o adolescente portadores de deficiência rece-
berão atendimento especializado.
§ 2º Incumbe ao poder público fornecer gratuitamente àque-
les que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos
relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação.
Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão
proporcionar condições para a permanência em tempo integral de
um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou
adolescente.
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos
contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados
ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de ou-
tras providências legais.
Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de
assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermida-
des que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de
educação sanitária para pais, educadores e alunos.
Parágrafo único. É obrigatória a vacinação das crianças nos
casos recomendados pelas autoridades sanitárias.
Merecem atenção especial algumas questões referentes à proteção à
saúde, como a denúncia de suspeita ou confirmação de maus-tratos e o
direito da companhia dos pais ou responsáveis em caso de internação.

a) Denúncia de suspeita ou confirmação de maus-tratos


Pelo ECA, toda ação ou omissão que prejudiquem o desenvolvi-
mento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de dignidade
e de liberdade, configuram maus-tratos. Portanto, a criança e o adolescente
não devem ser objetos de negligência, discriminação, exploração, violên-
cia, crueldade e opressão, sendo coibidas tanto a prática omissiva quanto a
comissiva.
Os maus-tratos podem ser:
29
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

FÍSICOS: uso de força física de forma não acidental, geralmente


praticado pelos pais, responsáveis, familiares ou pessoas próximas à crian-
ça ou ao adolescente, com o objetivo claro ou não de ferir, deixando ou não
marcas evidentes. São ações contundentes, cortantes ou calóricas, poden-
do ser exemplificadas por murros, tapas, chutes, mordidas, agressões com
objetos, espancamentos e queimaduras.
PSICOLÓGICOS (emocionais): interferência negativa dos respon-
sáveis pela criança ou adolescente. Embora não provoquem lesões eviden-
tes, trazem prejuízos psicológicos, propiciando o desenvolvimento de sen-
timento auto-destrutivo, o que influencia em seu caráter e personalidade.
Esse tipo de maus-tratos configura-se por meio de rejeições, hostilidade,
frieza, agressões verbais, depreciação, desrespeito, discriminação, exigên-
cias incompatíveis com a idade da criança ou adolescente, chantagem, etc.
SEXUAIS: utilização de criança ou adolescente para gratificação
sexual de um adulto, adolescente mais velho ou criança maior, envolvendo
a exploração sexual, a prostituição, a exibição de pornografia ou o uso de
criança ou adolescente para produção de pornografia. As condutas podem
ser realizadas com ou sem violência. A verificação do abuso sexual se dá
por meio da percepção de comportamentos exteriorizados pela criança ou
adolescente, que ficam lesados emocionalmente.
NEGLIGÊNCIA: ato de omissão do responsável pela criança ou pelo
adolescente, que se caracteriza pela ausência de provimento, ou de provi-
mento adequado das necessidades básicas para seu perfeito desenvolvi-
mento. Ocorrem nos casos em que a criança ou o adolescente não recebem
os nutrientes adequados, além das situações em que não são oferecidas
proteção e supervisão adequadas.
A ocorrência dos maus-tratos, ou mesmo a suspeita de ocorrência,
implica na necessidade de medidas que levem à proteção da criança ou do
adolescente vítima. Em observância ao que dispõe o ECA12, constata-se
que o Conselho Tutelar é mencionado explicitamente como destinatário da
denúncia de maus-tratos, sendo esta obrigatória. Entretanto, a interpreta-

12
ECA - Artigos 13 e 56, I.

30
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

ção extensiva dos artigos leva a apontar como autoridades competentes


para recebimento da denúncia de suspeita ou confirmação de maus-tratos,
além do Conselho Tutelar, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a
Polícia Civil ou Militar.
Assim, cada órgão competente para recebimento da denúncia de
maus-tratos deve ter sua atuação: o Juiz da Infância e da Juventude analisa
as situações de risco e aplica as medidas protetivas, e o Juiz Criminal (Jecrim
e Juízo Comum) julga as infrações penais; o Ministério Público fiscaliza o
Conselho Tutelar, tem legitimidade para tomar medidas judiciais com rela-
ção à suspensão ou destituição do poder familiar e para aplicação de medi-
das protetivas à vítima e sua família. Além disso, é incumbido de propor a
ação penal, nos casos em que a legislação permite, para a punição do
agressor. Em síntese, defende os direitos fundamentais da criança e do
adolescente (art. 201, VIII do ECA); a autoridade policial investiga a con-
duta de maus-tratos, caso tenham resultado em infração à norma penal,
preparando elementos para que o Ministério Público possa interpor a ação
correspondente; o Conselho Tutelar aplica medidas de proteção à criança e
ao adolescente vítima (art. 136, I c.c. o art. 101 do ECA) bem como medi-
das aos pais (art. 136, II c.c. o art. 129 do ECA). Também comunica ao
Ministério Público o fato que constitua infração administrativa ou penal
contra criança ou adolescente (art. 136, IV do ECA).
Mas vale ressaltar que o destinatário primeiro da denúncia é o Con-
selho Tutelar do município onde reside a vítima. Assim, mesmo que ela
venha a receber atendimento em outra cidade, a denúncia deve ser realiza-
da na cidade de origem, onde ocorreram os maus-tratos.
Esclarecido o ponto atinente ao destinatário da comunicação dos
maus-tratos, resta explanar acerca dos responsáveis pela denúncia.
Em primeira análise, deve ser observado o artigo 18 do ECA, que
determina a todos o dever de resguardar a dignidade da criança e do ado-
lescente. Em complementação a esse preceito legal, o artigo 4º relaciona a
família, a comunidade, a sociedade em geral e o poder público como obri-
gados a garantir que os direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,
ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária da criança
ou adolescente sejam efetivados. Dessa forma, não há dúvida de que todos

31
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

os que suspeitem ou tenham conhecimento da prática ilícita de violência


(maus-tratos) contra criança ou adolescente devem denunciá-la.
Aliás, o ECA, de forma clara, estabelece: “É dever de todos prevenir
a ocorrência de ameaça ou violação de direitos da criança e do adolescen-
te” (art. 70).
Não obstante essa determinação geral, o ECA aponta alguns respon-
sáveis específicos pela notificação dos maus-tratos, que assim são listados
devido à sua atuação perante a sociedade e seu dever profissional de asse-
gurar o tratamento digno à criança e ao adolescente. Assim, o artigo 56,
inciso I, aponta aos dirigentes de estabelecimentos de Ensino Fundamental
o dever de informar ao Conselho Tutelar os casos de maus-tratos envol-
vendo seus alunos. Além do dispositivo supracitado, o artigo 245 do ECA
individualiza o médico, o professor ou responsável por estabelecimentos
de atenção à saúde e de escolas, pré-escolas ou creches como responsáveis
pela denúncia.
Dessa forma, notificar casos ou suspeitas de maus-tratos às autori-
dades tidas como competentes (Conselho Tutelar, Ministério Público, Po-
der Judiciário e Polícia) é exercício de cidadania, sendo incumbido a todos
esse dever, que decorre da proteção integral, fundamento que embasa todo
o ECA.]

b) Direito da companhia dos pais ou responsáveis em caso de interna-


ção; necessidade de medicamentos, próteses e outros recursos para
tratamento
Ainda como decorrência das regras estatutárias relativas ao direito à
vida e à saúde, podem, a criança e o adolescente, proporem ação judicial
para garantir a presença de um dos pais ou responsável, nos casos de inter-
nação médica quando haja recusa por parte do estabelecimento de atendi-
mento a saúde. Esse direito não é dos pais ou responsáveis, mas das crian-
ças e dos adolescentes de tê-los em sua companhia. Também podem in-
gressar com medida judicial para garantir acesso às ações e serviços de
saúde, bem como a medicamentos, próteses e outros recursos referentes
a tratamento, habilitação e reabilitação.
Na verdade, a todo direito previsto no capítulo referente ao direito
à vida e à saúde, está assegurada a correspondente medida judicial para

32
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

concretizá-lo, conforme consignado no capítulo referente à proteção ju-


dicial dos interesses individuais, difusos e coletivos, que não exclui qual-
quer tipo de ação para a defesa desses direitos (ECA, artigos 208, § úni-
co, e 212).
Como decorrência do direito da criança e do adolescente de ter a
companhia dos pais ou responsável nos casos de internação, os responsá-
veis que se recusarem a acompanhar o filho internado, poderão sofrer
alguma das medidas previstas no artigo 129 do ECA, em especial a ad-
vertência, por parte do Conselho Tutelar (ECA, art. 136, II), que é o ór-
gão a ser acionado pelo hospital.

4. INFRAÇÕES PENAIS E ADMINISTRATIVAS


A aplicabilidade da lei, no que diz respeito ao direito à vida e à
saúde, requer a possibilidade de impor uma sanção ao infrator no caso de
descumprimento. Assim, para a efetividade de tais dispositivos, estabele-
ceu o Estatuto da Criança e do Adolescente a ocorrência de crime e infra-
ção administrativa para algumas situações.
Os crimes previstos referem-se aos encarregados de serviço ou di-
rigente de hospitais que não cumprirem as obrigações impostas pelo ECA
quanto à manutenção de registro de suas atividades e o fornecimento da
declaração de nascimento (Art. 10). A infração penal está assim prevista:
Art. 228 – Deixar o encarregado de serviço ou o dirigente de
estabelecimento de atenção à saúde da gestante de manter registro
das atividades desenvolvidas, na forma e prazo referidos no artigo
10 desta Lei, bem como de fornecer à parturiente ou a seu respon-
sável, por ocasião da alta médica, declaração de nascimento, onde
constem as intercorrências do parto e do desenvolvimento do
neonato.
Pena – detenção de 6 meses a 2 anos.
Por outro lado, o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimen-
to de atenção à gestante que não identificar corretamente o neonato e a
parturiente na ocasião do parto, ou não realizar os exames, visando ao di-
agnóstico de anormalidades no metabolismo também se responsabilizarão
criminalmente. A infração é a seguinte:
Art. 229 – Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de esta-
belecimento de atenção à saúde de gestante de identificar correta-

33
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

mente o neonato e a parturiente, por ocasião do parto, bem como de


proceder aos exames referidos no artigo 10 desta lei.
Pena – detenção de 6 meses e 2 anos.
Como infração administrativa, o Estatuto estabelece a obrigatorie-
dade de o médico, ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde,
bem como o professor, ou responsável por creche, pré-escola ou institui-
ção de Ensino Fundamental de comunicar, à autoridade competente, os
casos envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos. Observa-se, do
citado dispositivo, que, diante da preocupação com a integridade física da
criança e do adolescente, até os casos de suspeita de maus-tratos obrigam a
comunicação. Assim está previsto:
Art. 245 – Deixar o médico, professor ou responsável por es-
tabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-es-
cola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de
que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de
maus-tratos contra criança ou adolescente.
Pena – multa de 3 a 20 salários referência, aplicando-se o do-
bro em caso de reincidência.
Quando a lei se refere à comunicação dos casos de suspeita ou con-
firmação de maus-tratos, está tratando da questão da violência doméstica,
que se manifesta sob as modalidades de agressões físicas, sexuais, psicoló-
gicas ou em razão da negligência. Essa violência apresenta-se como um
fenômeno que abrange todas as classes sociais, sem distinção, e de forma
intensa, e é resultado do abuso do poder disciplinador ou do poder parental.
Vale registrar que a violência ocorre de forma velada, posto que os
casos notificados não correspondem ao que realmente acontece. Observa-
se uma subnotificação, ou seja, sua ocorrência é maior do que apontam os
registros. Nesse caso, o conhecimento dos trâmites legais para a efetivação
da denúncia é pertinente ao profissional da área da saúde, para que se pos-
sa garantir o direito à vida e à saúde da criança vitimizada.

34
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO IV
O DIREITO À LIBERDADE,
AO RESPEITO E À DIGNIDADE

Ao estabelecer que crianças e adolescentes têm direito à liberdade, ao


respeito e à dignidade como pessoas em desenvolvimento, assegurando-lhes
direitos civis, humanos e sociais, o Estatuto elevou-os à condição de cida-
dãos, retirando-os da situação de meros receptores de benefícios para satis-
fação de suas necessidades básicas, considerando-os agentes que podem tra-
balhar, direta ou indiretamente, para a conquista dos direitos contemplados,
assumindo, em contrapartida, as obrigações que lhe são naturais.
Assim estabelece o ECA:
Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao
respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de de-
senvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais
garantidos na Constituição e nas leis.
Para tanto, explicitou o que se deve entender por direito à liberdade
(ECA, art. 16), ao respeito (ECA, art. 17) e à dignidade (ECA, art. 18) em
relação à criança e ao adolescente, tratando cada tema em artigos distintos.

1. DIREITO À LIBERDADE
O direito à liberdade, preconizado no Estatuto da Criança e do Ado-
lescente, não significa a ausência de limites às crianças e aos adolescentes.
Na verdade, conforme assevera PEREIRA (1996, p. 74), “transmitir ao
jovem a idéia ou sentimento de liberdade não é incentivá-lo a romper com
os limites que a própria vida e os adultos lhe impõem, mas é conscientizá-
lo das razões desses limites e dar-lhe alternativas de opções conscientes
diante deles.”
Daí resulta que o direito em questão engloba a liberdade religiosa e
política, de locomoção, de pensamento, de expressão, de informação e de
participação, apresentando-se como elementos da cidadania infanto-juve-
nil. Diz expressamente a lei:
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitá-
rios, ressalvadas as restrições legais;

35
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

II - opinião e expressão;
III - crença e culto religioso;
IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI - participar da vida política, na forma da lei;
VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.
Essa liberdade tem como destinatários tanto a criança e o adolescen-
te, bem como os pais, responsáveis e a comunidade em geral. Em relação à
criança e ao adolescente, o direito à liberdade pode ser exercido, desde que
não contradiga uma obrigação que lhe é imposta. Assim, o direito de fre-
qüentar os espaços e logradouros públicos apresenta-se inviável quando é
exercitado em horário escolar ou em horário noturno inadequado para o
padrão familiar. Da mesma forma, a liberdade de opinião e de expressão
não pode ser interpretada de forma tão elástica a ponto de incorrer em
desrespeito ou ofensa verbal.
O direito à liberdade, assegurado a crianças e adolescentes, afirma
SILVA (in CURY, Munir et ali, 1992, p. 66) “se volta especialmente contra
constrangimentos de autoridades públicas e de terceiros, mas também con-
tra os pais e responsáveis que, porventura imponham à criança ou ao ado-
lescente um constrangimento abusivo que possa ser caracterizado como
uma situação cruel, opressiva ou de violência ou, mesmo, de cárcere priva-
do, o que pode até dar margem ao exercício do direito de buscar refúgio e
auxílio, previsto no inciso VII.”
Foi necessário consignar expressamente esse direito, uma vez que o
passado assim recomendava, quando existiam reformatórios, internatos e
abrigos, onde a internação de crianças e adolescentes era a regra geral a ser
aplicada, com manifesta privação da liberdade.
A título exemplificativo, o Estatuto estabelece algumas situações
que devem ser consideradas no âmbito do direito à liberdade. São elas: o
direito de ir e vir nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressal-
vadas as restrições legais, como no caso da limitação da idade para deter-
minados espetáculos públicos (art. 75); opinião e expressão, com a oitiva
da criança ou do adolescente nas questões que lhe são pertinentes, tais
como colocação em família substituta (ECA, art. 28, §1º, 45, § 2º, 111, V;
161, § 2º, e 168); crença e culto religioso, estabelecendo expressamente a

36
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

assistência religiosa ao internado (ECA, art. 94, XII e 124, XIV); brincar,
praticar esportes e divertir-se, sempre respeitando sua condição de pessoa
em desenvolvimento (ECA, art. 71); participar da vida familiar, comunitá-
ria (ECA, art. 19, 92, I, V, VII e IX e 100); participar da vida política, na
forma da lei, como no caso dos grêmios ou entidades estudantis (ECA, art.
53, IV); buscar refúgio, auxílio e orientação, como forma de garantir sua
integridade física e psíquica.
Como expressão máxima desse direito e diante do cometimento de
um ato infracional, constata-se que a criança não pode ser privada de sua
liberdade e o adolescente, somente na hipótese de flagrância ou por ordem
escrita e fundamentada da autoridade judiciária.
O direito à liberdade sofre as limitações naturais decorrentes do exer-
cício do poder familiar, bem como das regras impostas pela legislação em
geral e também do próprio Estatuto da Criança e do Adolescente.
São exemplos de limitações previstas no ECA: classificação para
acesso às diversões e espetáculos públicos (art. 75); proibição de entrada e
permanência em locais que explorem jogos de bilhar, sinuca ou congêneres
(art. 80); autorização para viajar (art. 83) e ainda, quanto à competência da
autoridade judiciária em autorizar ou disciplinar a entrada, permanência
ou participação de criança e adolescente em eventos (artigo 149, I e II).
Outra forma de limitação ao direito à liberdade consiste nos regulamen-
tos escolares, aos quais o aluno (criança ou adolescente) deve se sujeitar, como
por exemplo, quando se trata de horário, uniforme, uso de celular, etc.
O Estatuto ainda estabelece, em relação ao adolescente infrator, a
medida socioeducativa de liberdade assistida. Como a própria designação
esclarece, nessa situação o adolescente terá algumas restrições ao seu di-
reito à liberdade, sendo que deverá ser assistido por um orientador. As
medidas de semiliberdade e internação, por sua vez, restringem ainda mais
a liberdade do adolescente infrator.

2. DIREITO AO RESPEITO
Quanto ao direito ao respeito, o Estatuto da Criança e do Adolescen-
te, repetindo o padrão referente ao direito à liberdade, estabeleceu que:
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da
integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abran-

37
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

gendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos


valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
O respeito à criança e ao adolescente, na visão de KORCZAK (1996,
p. 89). também implica “não humilhar, não maltratar, não torná-la escrava
do dia seguinte, não apagar os seus entusiasmos, não apressá-la, não pres-
sionar”. Significa também reconhecer que as crianças e os adolescentes
sentem cansaço, dor, indisposição, calor, frio, sono, fome, sede, mal-estar
e que tudo isso não pode ser considerado como desculpa ou mero capricho.
Sintetiza seu pensamento afirmando que se devem respeitar os segredos e
hesitações desse duro trabalho que é o crescimento.
Na mesma linha de pensamento, discorre DALLARI (1996, p. 21),
quando escreve que “é um erro muito grave, que ofende o direito de ser,
conceber a criança como apenas um projeto de pessoa, como alguma coisa
que no futuro poderá adquirir a dignidade de um ser humano”. É suprema
indignidade praticar qualquer espécie de violência contra uma criança, seja
física, psicológica ou moral, contida em todas as formas de discriminação.
Cada criança é sempre uma pessoa, com menor capacidade física e menos
defesa do que as demais, mas por isso mesmo, mais merecedora de um
tratamento honesto e afetuoso.
Uma das manifestações mais evidentes de ofensa ao direito ao res-
peito consiste na prática da violência doméstica, que se manifesta sob as
modalidades de agressão física, sexual, psicológica ou em razão da negli-
gência, que, como já afirmamos, está presente em todas as classes sociais,
sem distinção, e ocorre de forma intensa como resultado do abuso do po-
der disciplinador dos adultos, sejam eles pais, padrastos ou responsáveis,
que transformam a criança e o adolescente em meros objetos, com conse-
qüente violação de seus direitos fundamentais, em especial o direito ao
respeito como ser humano em desenvolvimento.
É certo que o Estatuto, em obediência a tal direito, estabelece a obri-
gação de se colocar toda criança e adolescente a salvo de qualquer forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opres-
são. Como forma de respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimen-
to, proíbe a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que
digam respeito a crianças e adolescentes a quem se atribua autoria de ato
infracional (ECA, art. 143 e 247), e pune criminalmente a utilização indevida

38
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

da imagem (ECA, art. 241). Essa proibição tem por objetivo preservar a
imagem, a dignidade e a identidade da criança e do adolescente, evitando
que sua exposição venha a marcá-los de forma negativa, comprometendo a
sua recuperação.
Compõem o direito ao respeito, a integridade física, psíquica e moral.

2.1. INTEGRIDADE FÍSICA


A inviolabilidade da integridade física, como forma de expressão do
direito ao respeito, “consiste em não poder o cidadão ser submetido a aten-
tados que venham comprometer parcial ou totalmente a integridade físi-
ca”, afirma Mattia (In: CURY, Munir et alli, 1992, p. 73). Assim, o direito
ao respeito deve, em primeiro plano, assegurar a incolumidade física das
crianças e dos adolescentes.
Esse direito está previsto em vários artigos do Estatuto, quando trata
dos maus-tratos (art.7º, 13, 56, I), da prevenção (art. 70) e dos crimes e
infrações administrativas praticados contra crianças e adolescentes (art.
242, 243, 244 e 245). Na verdade, busca garantir a integridade física da
criança e do adolescente no seio de sua família, com a proibição da violên-
cia doméstica (maus-tratos), bem como na comunidade, quando estabelece
crimes e infrações administrativas.
KORCZAK (1996, p. 94), ao abordar a questão referente à violência
física, faz importante observação sobre as conseqüências que ela produz
nas crianças. Afirma que existem ferimentos que cicatrizam sozinhos, ape-
nas com um bom curativo, e não deixam vestígios. Mas outros exigem
demorados cuidados e deixam doloridas cicatrizes, sujeitas a infecções.
Ou seja, as conseqüências da violência física vão além da ameaça à integri-
dade física da criança e do adolescente.

2.2. INTEGRIDADE PSÍQUICA E MORAL


Ao tratar da integridade psíquica e moral, como parte do direito ao
respeito, inovou o legislador a fim de garantir, a crianças e adolescentes,
pleno desenvolvimento nos aspectos físico, mental, moral, espiritual e so-
cial (ECA, art. 3º), em condições de liberdade e dignidade, respeitando sua
condição de pessoa em desenvolvimento.

39
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

A preocupação com a garantia à integridade psíquica e moral do


jovem encontra-se presente em todo Estatuto, refletindo na criação dos
serviços auxiliares do Judiciário, com equipe interprofissional, formada
principalmente por psicólogos e assistentes sociais, para aconselhamento,
orientação, encaminhamento e prevenção, bem como com o estabeleci-
mento de regras e fixação de parâmetros para os casos referentes a guarda,
educação, trabalho e prevenção, entre outros. Na verdade, todo o capítulo
da prevenção estabelecido pelo Estatuto busca o desenvolvimento digno
da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer ofensa à sua
integridade psíquica e moral.
A integridade psíquica acarretou a criação de medidas de proteção
(ECA, art. 101) aplicadas a crianças e adolescentes, como acompanhamen-
tos temporários, inclusão em programas de auxílio comunitários, tratamentos
psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial.

3. DIREITO À DIGNIDADE
O direito à dignidade é tratado no artigo 18 do ECA e resume-se ao
tratamento respeitoso que deve ser dispensado a crianças e adolescentes. O
dispositivo legal impõe essa obrigação a todos, indistintamente, e não so-
mente aos pais ou responsáveis. Diz a lei:
Art. 18. É dever de todos zelar pela dignidade da criança e do
adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano,
violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
Na verdade, a lei detalha o que já está previsto no artigo 5º., ou seja,
de que nenhuma criança ou adolescente deve ser objeto de qualquer forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Quando a criança e o adolescente estiverem sob a autoridade, guar-
da ou vigilânca de determinada pessoa (pai, responsável, padrasto ou ma-
drasta, professor, dirigente de entidade de abrigo ou unidade escolar, etc.),
o fato de submetê-los a vexame ou constrangimento constitui crime espe-
cífico, definido no artigo 232 do ECA:
Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua autorida-
de, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento:
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Segundo o Dicionário Aurélio, vexame é tudo aquilo que causa ver-
gonha, afronta, ultraje; constranger é obrigar pela força, coagir, tolher a
liberdade; desumano refere-se a tratamento bárbaro, cruel, bestial;

40
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

aterrorizante é um ato que causa terror, pavoroso, violento, que faz medo e
usa força bruta. A criança e o adolescente devem ser postos a salvo desses
tratamentos, como forma de respeito à sua dignidade.
Como forma de garantir a efetivação desse respeito, prevê o ECA13 a
proibição de se transportar adolescente, a quem se atribua autoria de ato
infracional, em compartimento fechado de veículo policial.
É ainda o direito à dignidade que deve ser levado em consideração
quanto às questões relativas à imprensa e à divulgação de atos judiciais,
administrativos ou policiais, envolvendo criança e adolescente. A liberda-
de de imprensa encontra, no direito à dignidade, a limitação necessária
para colocar a criança e o adolescente a salvo de qualquer tratamento desu-
mano, vexatório ou constrangedor14.
Como assevera Pereira (1996, p. 91), a “trilogia da liberdade-respei-
to-dignidade, como cerne da proteção integral, representa um novo
direcionamento no Direito Brasileiro quanto à proteção da infanto-adoles-
cência”, elevando as crianças e os adolescentes à condição de cidadãos.

13
Art. 178. O adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional não poderá ser conduzido ou
transportado em compartimento fechado de veículo policial, em condições atentatórias à sua
dignidade, ou que impliquem risco à sua integridade física ou mental, sob pena de responsabilidade.
14
Nesse sentido: Tribunal de Justiça de São Paulo: Apelação n. 12211-0 – Sorocaba-SP. Relator
Odyr Porto, 21/02/91. JTJ – 132/412.

41
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO V
DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR

1. DISPOSIÇÕES GERAIS
Como decorrência da regra estabelecida no artigo 227 da Constitui-
ção Federal, impõe-se garantir como direito da criança e do adolescente a
convivência familiar e comunitária, o que significa, como regra geral, que
toda criança ou adolescente devem ser criados e educados no seio de sua
família biológica, ou seja, naquela ligada a eles pelos laços de consangüini-
dade. Como exceção, podem criar-se e educar-se em família substituta naci-
onal, como medida de proteção, nas modalidades de guarda, tutela e adoção,
tendo como característica principal a inexistência de vínculo biológico entre
pai e filho. Excepcionalmente, fugindo à regra geral e à sua exceção, a crian-
ça ou o adolescente podem ainda ser criados em família substituta estrangei-
ra (ECA, art. 31), mas somente na modalidade de adoção.
Diz a lei:
Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e
educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família subs-
tituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambien-
te livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpe-
centes.
O objetivo da criação e educação da criança e do adolescente no seio
de sua família (biológica ou substitua) é afastar a possibilidade de sua co-
locação em abrigos ou internatos, privando-os da convivência familiar, in-
dispensável para o seu regular desenvolvimento. Esse novo paradigma acar-
reta a mudança de postura dos abrigos existentes, que devem promover a
convivência familiar e comunitária, sem a segregação ou o isolamento do
abrigado.
A família deve apresentar condições para o desenvolvimento sadio
da criança e do adolescente, num ambiente livre da presença de pessoas
dependentes de substâncias entorpecentes (ECA, art.19), ou da hipótese de
maus-tratos, opressão, ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável
(ECA, art. 130). Deve ser afastada toda situação que se mostre incompatí-
vel com o desenvolvimento digno, sadio e respeitoso da criança e do ado-
lescente e que não lhe ofereça um ambiente familiar adequado.

42
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Com um lar digno, não devem a criança e o adolescente ser alvos de


discriminações relativas ao estado de filiação. O Estatuto da Criança e do
Adolescente (art. 20), repetindo a regra prevista no artigo 226, parágrafo
6º. da Constituição Federal, igualou, em direitos e obrigações, os filhos
havidos, ou não, da relação do casamento, ou por adoção, proibindo a dis-
criminação até então em vigor. Estabelece o ECA:
Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento,
ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas
quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Isso porque a legislação civil revogada15 fazia distinção, quando qua-
lificava como filiação civil a que era derivada da adoção; filiação consan-
güínea legítima, a derivada de casamento válido, e filiação ilegítima, a
resultante da relação sexual extra matrimonial. Denominavam-se naturais,
os filhos ilegítimos oriundos de relação extra matrimonial entre pessoas
sem impedimento legal para o casamento e, espúrios, aqueles frutos de
relação entre pessoas impedidas de contraírem matrimônio.
Com a vigência da Constituição de 1988 e com o advento do Estatu-
to da Criança e do Adolescente, toda essa designação discriminatória, que
acarretava desigualdades entre os filhos, no plano patrimonial16 inclusive,
acabou sendo proibida, não ocorrendo mais nenhuma distinção entre as
filiações legítima, ilegítima e adotiva. Independente da origem da filiação,
todos são considerados filhos.
Ainda, dentro das normas gerais relativas ao direito à convivência
familiar, o Estatuto da Criança e do Adolescente regulamentou o direito
previsto no artigo 226, § 5º. e 229, da Constituição Federal, estabelecendo
a igualdade do pai e da mãe em relação ao poder familiar que dele decorre
quanto ao sustento, guarda e educação dos filhos. Igual disposição foi esta-
belecida no Código Civil vigente (art. 1631). Diz o ECA:
Art. 21. O pátrio poder será exercido, em igualdade de condi-
ções, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação

15
Código Civil de 1916.
16
Foram derrogados os artigos 337 e 1605, § 2º do Código Civil de 1916, que implicavam em
restrição ao direito sucessório do filho adotivo.

43
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de


discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a so-
lução da divergência.
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e edu-
cação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a
obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
Não há mais a exclusividade do pai em relação ao poder familiar e,
também, o seu exercício com a colaboração da mãe. Ambos devem exercer
tal atribuição. No caso de dúvida ou conflito entre os pais, quanto ao desti-
no do filho, pode-se recorrer à autoridade judiciária para saná-los, sendo
que, neste caso, deve-se ouvir o menor e considerar a sua opinião. Neste
particular, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e agora o Código Civil,
democratizaram a relação familiar, igualando os atores envolvidos, com
adoção do princípio da isonomia no resguardo dos interesses dos filhos.
Dentro do princípio adotado pelo ECA e Código Civil, a solução dos
conflitos entre os genitores deve ser aquela que melhor atenda ao interesse
da criança ou do adolescente.
As hipóteses previstas para a perda e suspensão do poder familiar,
no Código Civil, devem ser interpretadas em conjunto com outras possibi-
lidades apontadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
Assim, os pais perderão o poder familiar nas situações de aplicação
de castigo imoderado ao filho ou abandono, assim como a prática de atos
contrários à moral e aos bons costumes, ou quando incidirem, reiterada-
mente, no abuso de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes
(C.C. art. 1638); poderão ser suspensos do poder familiar quando abusa-
rem da autoridade parental, faltando com os deveres a eles inerentes, ou
arruinarem os bens dos filhos, ou forem condenados por sentença
irrecorrível, em crime cuja pena exceda a dois anos de prisão (C.C. art.
1637), bem como, se não assumirem o dever de sustento, guarda, educação
e a obrigação de cumprir as determinações judiciais (ECA, art. 22).
A carência de recursos materiais não se traduz em motivo para a
suspensão ou perda do poder familiar e, para a preservação da família, a
solução está no encaminhamento dos pais ou responsáveis, bem como da
criança e do adolescente, a projetos sociais que diminuam a situação de

44
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

risco detectada. O poder familiar deixou de ter relação direta com a situa-
ção econômica dos pais, não sendo motivo exclusivo para sua perda ou
suspensão17.
Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceu-se o procedi-
mento contraditório, para se decretar, judicialmente, a perda, ou suspensão
do poder familiar, conferindo legitimidade ativa ao Ministério Público, ou
a quem tenha interesse para dar início ao processo. Os interessados na
adoção ou tutela da criança ou do adolescente qualificam-se como legiti-
mados ativos para o processo de destituição.

2. FAMÍLIA NATURAL E FAMÍLIA SUBSTITUTA


O Estatuto da Criança e do Adolescente, em consonância com a re-
gra estabelecida na Constituição Federal (artigo 226, § 4º.), definiu família
natural como sendo a comunidade formada pelos pais, ou qualquer deles e
seus descendentes. As famílias legalmente constituídas, a proveniente de
união estável e a monoparental foram protegidas pela lei menorista, no afã
de garantir-lhes a guarda da criança e do adolescente, como regra geral
para sua criação.
Para oferecer garantia à formação da família natural, o Estatuto da
Criança e do Adolescente (art. 26)18 estabeleceu que os filhos, independen-
te da origem da filiação, poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou
separadamente, por meio de:

17
Cf. Julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo: “Estado de miserabilidade não pode ser razão
para impor a perda do direito de ter o filho sob responsabilidade. A perda do pátrio poder só se
permite quando os pais descumpram, injustificadamente, seus deveres e obrigações por desídia,
emulação e indignidade, tanto é assim, que o artigo 23 do ECA dispõe que a falta, ou carência de
recursos materiais, não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do pátrio poder“.
(Apelação Cível, n.º 19.192. Relator: Des. Ney Almada. 28.07.94).
18
A Lei n.º 8.560, de 29 de dezembro de 1992, ao regular a investigação de paternidade dos filhos
havidos fora do casamento, estabeleceu que o reconhecimento dos filhos pode ocorrer nas hipóteses
já estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, acrescentando outras duas situações:
a) escrito particular, a ser arquivado no cartório; b) manifestação expressa e direta, perante o
juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.
Por fim, o Código Civil sintetizou a matéria (art. 1609), estabelecendo que o reconhecimento dos
filhos havidos fora do casamento poderá ser feito: a) no registro de nascimento; b) por escritura
pública; c) escrito particular a ser arquivado em cartório; d) testamento, ainda que incidentalmente
manifestado; e) manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não
haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

45
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

a) termo de nascimento;
b) testamento;
c) escritura pública;
d) outro documento público.
Quanto à colocação em FAMÍLIA SUBSTITUTA, deve ser seguido
o que estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 101, VIII),
tratando-se de medida de proteção à criança e ao adolescente que pode ser
efetivada somente através de GUARDA, TUTELA ou ADOÇÃO, com a
observação dos seguintes princípios:
a. A colocação independe da situação jurídica da criança e do adolescente,
ou seja, pode estar sob o poder familiar regular dos genitores, ou em
situação de risco pessoal e social, como nas hipóteses do artigo 98 do
ECA (art. 28), em situação regular ou irregular, como definia o Código
de Menores revogado.
b. A criança e o adolescente, sempre que possível, devem ser ouvidos e ter
sua opinião considerada (ECA, art. 28, § 1º). Conforme assevera Luiz
Paulo Santos Aoki (CURY, Munyr et alii, 1992, p. 112), “a criança e o
adolescente deverão sempre ser ouvidos, não se referindo esta possibili-
dade a atributo pertinente ao Juízo, ou à ocasião processual, mas à con-
dição de a criança, ou adolescente, manifestar-se a respeito de ato que
vai, diretamente, influenciá-lo dali em diante”. O juiz levará em consi-
deração o posicionamento da criança e do adolescente, frente ao lar subs-
tituto, com atenção a sua idade e desenvolvimento psicológico, não fi-
cando vinculado à vontade expressada. Trata-se de assegurar o direito
previsto no artigo 16, II, do ECA, quanto à liberdade de opinião e ex-
pressão. Quando for o caso de adoção de adolescente, esta regra é obri-
gatória (ECA, art. 45, § 2º. – C.C. art. 1621).
c. Observação do grau de parentesco e a relação de afinidade ou de
afetividade entre a criança ou o adolescente e os requerentes do pedido
de colocação em família substituta (ECA, art. 28, § 1º). O objetivo dessa
regra é minorar as conseqüências da medida em relação ao adotado, ser-
vindo como princípio para se buscar a família ideal, no caso de existirem
várias interessadas.
d. Oferecer à criança e ao adolescente ambiente familiar adequado, devendo,
ainda, o interessado não apresentar nenhuma incompatibilidade com a medi-
46
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

da. Essa regra, prevista no artigo 29 do Estatuto da Criança e do Adoles-


cente não estabeleceu os casos específicos em que se mostra inviável a
colocação em família substituta. No entanto, podem-se arrolar as seguin-
tes hipóteses: convivência com pessoas dependentes de substâncias entor-
pecentes (ECA, art. 19), que tenham praticado maus-tratos, opressão, ou
abuso sexual (ECA, art. 130), que tenham dispensado tratamento desuma-
no, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor (ECA, art. 18), ou
sido negligentes (ECA, art. 5º) em relação a criança ou adolescente.
A colocação em família substituta – guarda, tutela ou adoção - é uma
medida de proteção cuja aplicação compete, privativamente, à Autoridade
Judiciária, diante do compromisso, expresso pelo interessado, de bem de-
sempenhar o encargo. Assim, a transferência da criança ou do adolescente
para terceiros, ou para entidades, sejam elas governamentais ou não, sem a
prévia determinação judicial, não pode ocorrer.
Excepcionalmente, na hipótese específica da guarda e em casos de
urgência, verificando-se a transferência, ela deve ser imediatamente
comunicada ao juiz competente. Essa exceção diz respeito às entidades
que mantêm programas de abrigo, nas quais o dirigente equipara-se ao
guardião (ECA, art. 92, § único e art. 93).

3. A GUARDA
Entre as relações decorrentes do poder familiar, está aquela relativa
ao direito dos pais de ter os filhos sob sua companhia e guarda (art. 1634,
II do Código Civil) que é exercitado tanto pelo pai como pela mãe, como
um dos deveres decorrentes do casamento19, não importando a relação exis-
tente entre eles (casamento ou união estável). No caso de ocorrer a dissolu-
ção da sociedade ou do vínculo conjugal pela separação judicial ou divór-
cio, o Código Civil20 estabeleceu regras pertinentes à guarda e proteção
dos filhos.
A par desse regramento, tratou o ECA de regulamentar outras hipó-
teses envolvendo a guarda de crianças e adolescentes (art. 33 a 35). No
Estatuto, ela não implica a suspensão ou destituição do poder familiar e,

19
Art. 1566, IV do Código Civil e art. 226, parágrafo 5º da CF.
20
Artigos 1583 a 1590.

47
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

como medida de proteção, só é admitida quando a criança ou o adolescente


estiverem enquadrados em uma das hipóteses previstas no artigo 98 do
ECA, ou seja, em situação de risco pessoal ou social. Diz a lei:
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente
são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem
ameaçados ou violados:
I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III - em razão de sua conduta.
Assim, são situações que podem levar a criança ou o adolescente a
uma família substituta, na modalidade de guarda, aquelas em que o menor
é abandonado ou encontra-se em entidade de abrigo devido à negligência
dos pais; empreendeu fuga e não se conhece o paradeiro de seus genitores
ou familiares; os pais mudam-se para outro país e não querem levar o filho.
Excepcionalmente, pode-se deferir a guarda, fora dessas hipóteses,
para atender situações peculiares ou suprir eventualmente a falta dos pais,
como no caso de descendentes de japoneses que vão trabalhar no Japão e
deixam seus filhos com parentes no Brasil, o que não significa que a crian-
ça ou o adolescente estejam em situação de risco pessoal ou social.
Dessa forma, pelo ECA, a guarda destina-se a:
a) regularizar a posse de fato da criança ou adolescente (art. 33, parágrafo 1º);
b) atender situações peculiares e excepcionais (art. 33, § 2º);
c) suprir a falta eventual dos pais ou responsáveis (art. 33, parágrafo 2º).
E estabelece o ECA21 a possibilidade de revogação da guarda a qual-
quer tempo mediante ato judicial fundamentado e ouvido o Ministério Pú-
blico. Essa decisão está subordinada à ocorrência de fato novo como, por
exemplo, o falecimento do guardião, não adaptação da criança ou do ado-
lescente, mudança de cidade ou retorno dos pais. Também justifica-se a
revogação da guarda na hipótese de o guardião ter requerido a tutela ou a
adoção da criança ou do adolescente.

21
ECA - art. 35.

48
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

4. TUTELA
Tendo por base os artigos 1728 a 1766 do Código Civil22, o ECA,
nos artigos 36 a 38, define a tutela como uma forma de colocação de crian-
ça ou adolescente em família substituta, visando substituir o poder familiar
em razão do falecimento dos pais ou de suspensão ou destituição do poder
familiar, conferindo a uma terceira pessoa capaz o direito de reger a pessoa
e administrar os bens de um incapaz. Confere ainda o direito de represen-
tação, assumindo uma abrangência maior do que a guarda. Exemplo típico
deste instituto é quando irmãos ou avós assumem os cuidados de crianças
ou adolescentes em razão do falecimento dos pais.
Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, portanto, o instituto da
tutela é uma forma de colocação em família substituta e deve ser aplicada
pelo Juízo da Infância e da Juventude aos menores que tenham até dezoito
anos de idade incompletos e, que se encontrem em situação de risco pesso-
al ou social, configurando dever de guarda (art. 36), o que implica, para o
tutor, assumir a assistência material, moral e educacional do tutelado.

5. DA ADOÇÃO
Representando uma ruptura com a cultura da adoção, sob a qual
ocorria uma “subvalorização da filiação adotiva frente à descendência de
sangue; o sigilo da filiação adotiva como proteção contra o preconceito, ou
como forma de evitar interferências negativas da família biológica; a prio-
ridade para famílias do tipo tradicional de candidatos à adoção, em detri-
mento de pessoas solteiras, divorciadas, viúvas, ou pessoas acima de qua-
renta anos de idade e que poderiam se dispor a adotar criança de difícil
colocação, e a condenação da mãe que entrega seu filho para adoção, sem
levar em conta a situação de exclusão social e a história de vida destas
mulheres” (FERREIRA e CARVALHO, 2000, p. 23), o Estatuto da Crian-
ça e do Adolescente tratou de disciplinar a adoção com a magnitude que
ela merece, traçando novas regras que buscam dar cumprimento ao princí-
pio da proteção integral.

22
Código Civil - Art. 1.728. Os filhos menores são postos em tutela: I - com o falecimento dos pais, ou
sendo estes julgados ausentes; II - em caso de os pais decaírem do poder familiar.

49
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Define-se a adoção como o instituto jurídico pelo qual uma pessoa


recebe outra como filho, independentemente de existir entre elas qualquer
relação de parentesco consangüíneo. Trata-se de uma “uma forma diferen-
te de ter filhos”, e por conseqüência, de constituir uma família. Não mais
se trata de imitar a natureza quando esta falha e, sim, de encontrar pais para
crianças que já existem. O certo é que, em vez de atender aos interesses
dos adultos que não podem gerar filhos, o instituto da adoção cuida do
interesse das crianças e adolescentes, que têm o direito de ter uma família.
O legislador menorista reconheceu o direito da criança de ser criada e
educada no seio da sua família natural (biológica), mas admitiu excepcio-
nalmente a família substituta (inclusive a estrangeira), como forma de ga-
rantir a convivência familiar e evitar o abandono. Assim, com o objetivo
claro de se evitar o abrigamento de crianças e adolescentes em instituição
que, por melhor que seja, não substitui a família, a adoção desempenha
papel importante na constituição de novas famílias.
As regras básicas para a adoção são as seguintes:
1. Qualquer pessoa, independente do seu estado civil - solteira, separada,
divorciada, viúva, casada, convivente ou concubina - desde que maior
de 18 anos de idade, no gozo de sua saúde física e mental, poderá se
candidatar a adotar uma criança ou adolescente. Os divorciados, ou se-
parados poderão adotar sozinhos, ou em conjunto23.
2. O adotante deverá ser 16 anos mais velho que o adotando (ECA, art. 42,
§ 3º) e, se for um casal, pelo menos um dos parceiros deve preencher
esse requisito.
3. O adotante deve revelar compatibilidade com o instituto da adoção e
oferecer ambiente familiar adequado (ECA., art. 29). O envolvimento
com substância entorpecente, a prática de maus-tratos, opressão, ou abuso
sexual, caracterizam-se empecilhos para a adoção, uma vez que o Esta-
tuto da Criança e do Adolescente declara que toda criança, ou adoles-
cente, tem direito de ser criado e educado em ambiente livre da presença
de pessoas dependentes de substância entorpecente (ECA, art. 19), e
com respeito à sua dignidade e integridade física, psíquica e moral (ECA,

23
Nesta última hipótese, é necessário: a) fazer a prova de que antes da separação já se havia iniciado
um estágio de convivência com o menor e b) declararem a qual dos dois adotantes caberá a guarda
do adotando, fixando, desde logo, o regime de visita (ECA, art. 42, §4º).

50
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

art. 18 e 130). O ambiente familiar deve ser analisado na elaboração de


estudo psicológico e social pela equipe técnica do Juizado da Infância e
da Juventude, quando essas situações, bem como outras que se apresen-
tarem, serão avaliadas.
4. A criança ou o adolescente a ser adotado deverá contar com, no máximo,
18 anos de idade na época do pedido (ECA, art. 40)24. A lei faculta,
porém, o pedido de adoção para adotando com mais de 18 e menos de 21
anos de idade, se ele já se encontrar integrado na família substituta e
bem adaptado.
5. A criança ou o adolescente, sempre que possível, deverão ser previa-
mente ouvidos a respeito da colocação em família substituta (guarda,
tutela ou adoção) e ter sua opinião considerada (ECA, art. 28, §1º. e
168). No entanto, no caso específico da adoção, o adotando maior de 12
anos deve, obrigatoriamente, ser ouvido, manifestando o seu consenti-
mento em relação ao pedido (ECA, art. 45, § 2º.).
6. A adoção deve apresentar reais vantagens ao adotando e fundar-se em
motivos legítimos (ECA, art. 43). Veronese (1997, p. 59) afirma que,
“através da adoção, estabelece-se uma filiação desbiologizante, uma ver-
dadeira opção de maternidade/paternidade, uma filiação cujo único fim
é o amor”. Esse requisito busca aferir esta circunstância, afastando toda
e qualquer situação que venha a prejudicar o adotando, nos aspectos
psicológico, social, material, ou assistencial.
7. A adoção, por interferir na relação parental, depende do consentimento
dos pais, ou representante legal do adotando, que poderá ser dispensa-
do, caso sejam desconhecidos, tenham sido destituídos do poder famili-
ar (ECA, art. 45, § 1º), ou na hipótese de pais falecidos.
8. Caso o adotante venha a falecer no curso do procedimento judicial, po-
der-se-á deferir o pedido, consolidando a vontade do falecido (adoção
póstuma). Os efeitos da adoção, nesse caso, retroagem à data do óbito.
Adoção por estrangeiro: A colocação de menor em família substi-
tuta estrangeira continua a ser exceção. A regra é que a família seja brasi-
leira. O estrangeiro só poderá receber uma a criança, ou um adolescente,
sob a forma de adoção, sendo-lhe vedada a colocação sob as modalidades

24
Acima dos 18 anos, a adoção far-se-á nos termos do Código Civil, através de processo judicial (art.
1623, § único).

51
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

de guarda ou tutela. Além das exigências normais para a adoção, no que se


refere ao procedimento respectivo inclusive, no caso de estrangeiro, obser-
var-se-ão os seguintes requisitos:
a) comprovação, mediante documento expedido pela autoridade compe-
tente do respectivo domicílio, de estar devidamente habilitado à ado-
ção, segundo as leis de seu país. (art. 51, § 1º.).
b) apresentação de estudo psicossocial, elaborado por agência especializa-
da e credenciada no país de origem (art. 51, § 1º.).
c) apresentação do texto pertinente à legislação estrangeira, acompanhado
de prova da respectiva vigência, caso determinar a Autoridade Judiciá-
ria de ofício, ou a pedido do Ministério Público (art. 51, § 2º.).
d) estudo prévio e análise de uma comissão estadual judiciária de adoção
(CEJAI) que fornecerá o respectivo laudo de habilitação, para instruir o
processo competente (ECA, art. 52).
e) obrigatoriedade de estágio de convivência a ser cumprido no território
nacional (ECA, art. 46, § 2º.) de, no mínimo 15 dias, para criança até 2
anos e de 30 dias, quando o adotando tiver mais de 2 anos de idade.
Adoção por ascendente e irmão do adotando: O Estatuto não per-
mite a adoção por ascendente (avós) e irmão do adotando25. Trata-se de
exceção à regra referente à observância do grau de parentesco e relação de
afinidade, ou de afetividade, na colocação de criança, ou adolescente, em
família substituta.
Para Rodrigues (1997, p. 335) a “proibição de adotar um neto talvez
se justifique na idéia de que o ato poderá afetar a legitimidade de herdeiro
necessário mais próximo, tal como o filho. Como o neto adotado assumirá
a posição de filho, para todos os efeitos, ele concorrerá, com o seu próprio
pai, à sucessão do avô”. No entanto, no caso de irmão adotar irmão, não se
vislumbra nenhum inconveniente.
Contudo, esclarece Pereira (1996, p. 263), “diante da equiparação dos
filhos, inclusive dos adotivos, o que se pretende evitar é que netos e irmãos
se transformem em filhos”. Também para Becker (1992, p. 146), a vedação

25
Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. § 1º Não
podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.

52
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

“justifica-se plenamente, pois, do contrário, estar-se-ia transformando, arti-


ficialmente, um vínculo familiar preexistente e com características próprias
diferentes da filiação em outro que, por sua vez, seria matriz de novos paren-
tescos, que alterariam de modo absurdo a constelação familiar”.
Adoção unilateral: O Estatuto permite a adoção por um concubino,
companheiro ou convivente apenas, mantendo-se o vínculo de parentesco
entre o adotado e o cônjuge, ou concubino, companheiro ou convivente do
adotante, e os respectivos parentes (ECA, art. 41, §1º.). Nesta hipótese,
altera-se apenas a relação que se firma entre o companheiro, concubino ou
convivente que está adotando e a criança ou adolescente adotado, perma-
necendo inalterada a filiação natural e a relação de parentesco com o genitor
ou genitora biológico integrante dessa relação e que não foi destituído do
poder familiar.
Estágio de convivência: A adoção exige o estágio de convivência,
que consiste em verificar a adaptação da criança, ou do adolescente, à fa-
mília dos requerentes. Está disciplinado no artigo 46 do ECA.
Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência
com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária
fixar, observadas as peculiaridades do caso.
§ 1º O estágio de convivência poderá ser dispensado se o ado-
tando não tiver mais de um ano de idade ou se, qualquer que seja a sua
idade, já estiver na companhia do adotante durante tempo suficiente
para se poder avaliar a conveniência da constituição do vínculo.
§ 2º Em caso de adoção por estrangeiro residente ou domicilia-
do fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território na-
cional, será de no mínimo quinze dias para crianças de até dois anos
de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de adotando
acima de dois anos de idade.
De acordo com as peculiaridades de cada caso, o juiz fixará o prazo
de estágio de convivência, podendo dispensá-lo se o adotando não tiver
mais de um ano de idade, ou independente da idade, se já estiver na compa-
nhia dos requerentes, durante tempo suficiente, para se avaliar a constitui-
ção do vínculo de afetividade e afinidade.
Na adoção por estrangeiro, o estágio é obrigatório e cumprir-se-á no
território nacional, com prazo mínimo fixado pela lei, dependendo da situ-
ação do adotando.
53
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Efeitos da adoção: Com o deferimento da adoção, o adotando ad-


quire a condição de filho, desfrutando de todos os direitos e obrigações
decorrentes. A par deste efeito de natureza pessoal, surgem também outros
efeitos de ordem patrimonial e penal. Uma vez constituída, a adoção se
torna irrevogável (ECA, art. 48), sendo que confere, ao adotado, o nome
do adotante, admitindo, também, a modificação de seu prenome (Código
Civil, art. 1627). Esse vínculo, criado pela sentença judicial, deve inscre-
ver-se no Registro Civil mediante mandado.
Cadastro dos adotantes e adotados: O Estatuto da Criança e do
Adolescente estabeleceu que a autoridade judiciária deve manter, em cada
comarca, um cadastro de crianças e adolescentes disponíveis para adoção
bem como um cadastro de pessoas interessadas na adoção26
Com relação à criança ou adolescente disponível para adoção, o ca-
dastro é realizado com base nos estudos técnicos realizados nos procedi-
mentos de acompanhamento, onde se verifica a impossibilidade da manu-
tenção da criança e do adolescente na família natural. Assim, esgotados os
meios legais para que a família assuma a criança ou o adolescente, poderá
o Ministério Público ingressar com a competente ação judicial de destitui-
ção do poder familiar, ficando os filhos disponíveis para a colocação em
família substituta, quando integrarão o cadastro de menores em condições
de serem adotados.
Os interessados em adotar, por sua vez, serão submetidos a um pro-
cedimento prévio de análise judicial para posteriormente integrarem o ca-
dastro dos adotantes. O procedimento para o cadastro dos adotantes deve
ser instruído com documentos pessoais dos interessados, que serão subme-
tidos a avaliação social e psicológica. A seguir, com a manifestação do
Ministério Público, o pedido é apreciado pelo juiz que determinará o regis-
tro no cadastro.

26
Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças
e adolescentes em condições de serem adotados e outro, de pessoas interessadas na adoção. § 1º O
deferimento da inscrição dar-se-á após prévia consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o
Ministério Público.§ 2º Não será deferida a inscrição se o interessado não satisfizer os requisitos
legais, ou verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 29.

54
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

O cadastro representa uma garantia para os interessados em adotar,


posto que passam por uma avaliação prévia que não será, necessariamente,
repetida quando ingressarem com o pedido de adoção. Nessa avaliação,
são analisados todos os requisitos para a adoção, e os futuros adotantes são
questionados sobre a motivação para adotarem, bem como sobre a revela-
ção da situação à criança adotada, etc. Os interessados cadastrados serão
os primeiros a ser chamados quando houver uma criança ou um adolescen-
te disponível para adoção.
A ordem prevista no cadastro não é seguida rigorosamente, uma vez
que a colocação do adotando depende de suas características e das prefe-
rências dos interessados na adoção.
O cadastro, que é realizado pela Vara da Infância e da Juventude da
comarca onde residem os interessados, deve integrar um cadastro central
para consulta de outros juízes.

55
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO VI
O DIREITO À EDUCAÇÃO, À CULTURA,
AO ESPORTE E AO LAZER

1. A EDUCAÇÃO E SEUS OBJETIVOS


O Estatuto representou a primeira legislação, após a edição da Cons-
tituição de 1988, a tratar do direito à educação para crianças e adolescen-
tes, posto que foi editado em 1990, enquanto que as leis que também tra-
tam do tema, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e a que
criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental
(FUNDEF hoje Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e da Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB) foram
aprovadas em 1996, e o Plano Nacional de Educação, em 2001. Assim,
durante seis anos, a legislação infanto-juvenil ditou os caminhos a serem
seguidos com relação à educação de crianças e adolescentes, já que a LDB,
então em vigor, não contemplava os avanços constitucionais presentes na
Constituição Federal. Ressalta-se, daí, a sua importância, já que a própria
LDB, editada posteriormente, não a contrariou, e teve seu foco voltado a
temas mais específicos, como a organização do sistema educacional, a com-
posição dos níveis escolares, a situação dos profissionais da educação e os
recursos financeiros destinados à área.
O ECA destinou o capítulo IV (artigos 53 a 59) à educação, à cultu-
ra, ao esporte e ao lazer. Os dispositivos esmiúçam os artigos da Constitui-
ção Federal27 que, ao estabelecer os direitos sociais, colocou em primeiro
lugar a educação como direito de todos e dever do Estado e da família,
promovida com a colaboração da sociedade e por ela incentivada.
Com relação à educação, o Estatuto traçou os seguintes objetivos28:
• desenvolvimento pleno da criança e do adolescente;
• preparo para o exercício da cidadania;
• qualificação para o trabalho.
Diz a lei:

27
CF. – artigos - 6, 205 a 214 e 227.
28
Estes objetivos estão previstos no art. 53 do ECA, que repetiu o estabelecido na Constituição
Federal (art. 205). A LDB também segue o mesmo enunciado (art. 2º).

56
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, vi-


sando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exer-
cício da cidadania e qualificação para o trabalho, ...
Esta regra também está prevista na Constituição Federal e na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional. O objetivo é dar uma diretriz
única para os fins da educação colocando em primeiro lugar o desenvolvi-
mento da criança e do adolescente que traz implicitamente à tona a questão
da qualidade do ensino, posto que somente uma educação de qualidade
pode favorecer esse desenvolvimento. Um aluno que deixa o Ensino Fun-
damental sem o conhecimento básico das disciplinas ministradas, não se
desenvolveu plenamente.
Em relação ao preparo para o exercício da cidadania, vale afirmar
que ser cidadão implica o reconhecimento e a concretização de seus direi-
tos civis, políticos e sociais29. A cidadania resulta na efetivação de tais
direitos e na luta para alcançá-los, independente da condição pessoal ou
social do indivíduo. Também implica o cumprimento de seus deveres. Es-
pecificamente em relação à criança e ao adolescente, reconhecê-los como
cidadãos é assegurar o que foi estabelecido tanto na Constituição Federal
(art. 227) como no Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 3, 4, e 5)
quanto aos seus direitos fundamentais. A educação deve proporcionar ao
aluno conhecimentos que o preparem tanto para a defesa de seus direitos
como para o desempenho de suas obrigações.
Por fim, quanto à qualificação para o trabalho, não há como negar a
relação direta que se estabelece entre os temas: educação e trabalho. O mun-
do globalizado exige cada vez mais a qualificação profissional do trabalha-
dor. Essa exigência implica a garantia de uma formação que venha a atender
as necessidades do trabalhador, proporcionando-lhe não só os conhecimen-
tos básicos necessários, mas também uma preparação profissional.

2. OS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE EM RELA-


ÇÃO À EDUCAÇÃO
Quanto aos direitos da criança e do adolescente, em relação à edu-
cação, o Estatuto regulamentou-os, nos incisos do artigo 53, especificando:

29
Verifica-se que, nesse sentido, a cidadania está intimamente ligada ao aspecto legal, em especial
com as leis que buscam garantir a efetividade dos direitos civis, políticos e sociais.

57
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

• Igualdade de condições para acesso e permanência na escola. Tal direito


consagra-se na CF, art. 206, I, e decorre do princípio da igualdade e da
proibição da discriminação, assegurado no artigo 5º. do ECA. O direito
também visa garantir a permanência do aluno na escola, como forma de
evitar a evasão. A regra vale para a escola pública e também para a parti-
cular, e é básica quando o tema é inclusão escolar.
• Direito de ser respeitado por seus educadores. O direito de ser tratado
com respeito encontra, no artigo 17 do ECA, a sua definição, ou seja,
consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da cri-
ança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identi-
dade, da autonomia, dos valores, das idéias e crenças, dos espaços e ob-
jetos pessoais. Visa evitar todo e qualquer tipo de castigo, que possa ser
intentado pelo educador. O direito é recíproco, devendo os educadores
também ser respeitados pelas crianças e pelos adolescentes.
• Direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias
escolares superiores. Tem por objetivo assegurar ao aluno, inconforma-
do com a avaliação, a possibilidade de buscar a sua reforma, não só junto
ao professor, como também nas instâncias superiores. Inegável que esse
direito, muitas vezes, exercer-se-á por seu responsável legal, no intuito
de exercitar a cidadania plena da criança ou do adolescente inconforma-
do. O critério avaliativo diz respeito não somente à nota recebida pelo
aluno, mas também à forma como se efetiva a avaliação.
• Direito de organização e participação em entidades estudantis. Também é
decorrência lógica do objetivo da educação, quanto ao preparo para o exer-
cício da cidadania, tendo por fundamento constitucional o art. 5º, XVII.
Trata-se de uma das modalidades do direito à liberdade, assegurado pelo
Estatuto, quanto à participação na vida política (ECA, art. 16, VI).
• Acesso a escola pública e gratuita próxima de sua residência. A preocu-
pação do legislador em relação à evasão escolar justificou tal direito.
Cada caso deverá ser avaliado, tendo em vista a peculiaridade de cada
situação, no que respeita à proximidade da residência30.

30
A Lei n. 11.700 de 13 de junho de 2008 alterou a LDB (Lei 9.394/96) para acrescentar no artigo 4º
o inciso X referente a: vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais
próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar 4 anos de idade.

58
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei nº 9.394/96


- contemplou alguns desses direitos em seu art. 3º, apontando, de outro
lado, os princípios norteadores do ensino, como a liberdade de aprender,
ensinar e pesquisar; o pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas; o
respeito à liberdade e o apreço à tolerância; a valorização do profissional
da educação; a gestão democrática da educação escolar; a garantia de pa-
drão de qualidade; a valorização da experiência extra-escolar e a vincula-
ção entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

3. DEVER DO ESTADO COM A EDUCAÇÃO


Apontou o Estatuto da Criança e do Adolescente o dever do Esta-
do31 quanto à educação, pormenorizando as ações governamentais que con-
duzam ao atendimento efetivo das pessoas nas creches, pré-escolas, no
Ensino Fundamental e Médio, além do atendimento especializado às pes-
soas portadoras de deficiência. Assegurou a obrigação de garantir ensino
noturno regular ao adolescente trabalhador e o desenvolvimento de pro-
gramas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimenta-
ção e assistência à saúde.
Conclui o Estatuto que a educação escolar do Ensino Fundamental
constitui direito público subjetivo, ou seja, o Estado deve oferecer escola
a todos aqueles que se encontram em condições de freqüentá-la.
Para Paula (1995, p. 94) deflui do direito público subjetivo “força
subordinante em relação ao Estado não só no que diz respeito ao cumpri-

31
ECA - artigo 54 – É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: I - ensino fundamental,
obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II -
progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio; III - atendimento educacional
especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV -
atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; V - acesso aos níveis
mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI
- oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador; VII -
atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar,
transporte, alimentação e assistência à saúde. § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é
direito público subjetivo. § 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua
oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente. § 3º Compete ao poder público
recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou
responsável, pela freqüência à escola. Quanto à garantia de creche, a Constituição Federal alterou
o ECA para estabelecer como dever do Estado a educação infantil, em creche e pré-escola às crianças
até cinco anos de idade (redação do artigo 207 de acordo com a Emenda Constitucional nº 53/06).

59
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

mento voluntário das obrigações, mas também na garantia de acesso ao


Judiciário para o suprimento coercitivo das omissões governamentais”.
Ademais, o não oferecimento ou a oferta irregular do Ensino Fundamental
acarretam a responsabilidade da autoridade competente. Este dever tam-
bém foi referendado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
em seu artigo 4º.

4. RESPONSABILIDADE DOS PAIS E RESPONSÁVEIS


Quanto à responsabilidade dos pais e responsáveis em relação aos
filhos ou pupilos em idade escolar, estabeleceu o Estatuto: a) o direito de
ter ciência do processo pedagógico; b) participar da definição das propos-
tas educacionais - parágrafo único do art. 53; c) obrigatoriedade de matri-
cular o filho na escola – art. 55.
O não cumprimento dessas obrigações é passível de sanções de na-
tureza civil e penal aos pais e responsáveis. Na esfera cível, é cobrada
responsabilidade em razão do poder familiar32, e na penal, sujeitam-se à
infração do artigo 246 do Código Penal, referente ao crime de abandono
intelectual. Podem ainda sofrer medidas previstas no próprio Estatuto da
Criança e do Adolescente (art. 129).

5. OBRIGAÇÕES DOS DIRIGENTES DAS ESCOLAS


Estabeleceu o Estatuto as obrigações impostas aos dirigentes dos
estabelecimentos de ensino, no art. 56, ou seja, comunicar, ao Conselho
Tutelar, os casos de: a) maus-tratos envolvendo os seus alunos; b) reitera-
ção de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos esco-
lares; c) elevados níveis de repetência.
As obrigações dizem respeito ao Ensino Fundamental, que compre-
ende da 1ª à 9ª série, nos termos do artigo 32 da LDBE. No entanto, em
relação à comunicação de maus-tratos, a obrigação estende-se aos diri-
gentes de creche e pré-escola, posto que o legislador acabou por contemplá-
las, quando tratou das conseqüências da omissão na infração administrati-

32
O dever dos pais em relação à educação dos filhos está previsto no artigo 1634, I do Código Civil e
artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

60
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

va prevista no artigo 24533. Assim, o responsável pelo estabelecimento de


Ensino Fundamental, creche e pré-escola, bem como o professor, tem a
obrigação de comunicar à autoridade competente, ao Conselho Tutelar e,
na sua falta, à Autoridade Judiciária, os casos de confirmação de maus-
tratos e também de suspeita, sob pena de multa de três a vinte salários
referência, que se aplicará em dobro no caso de reincidência.
O procedimento tem por finalidade cumprir o disposto no artigo 226,
§ 8º da Constituição Federal, criando o mecanismo da comunicação à auto-
ridade competente, com a finalidade de coibir a violência no âmbito das
relações familiares.
Quanto à reiteração de faltas injustificadas e à evasão escolar, a
comunicação vincula-se ao prévio esgotamento dos recursos escolares. A
lei não fixou o número mínimo de faltas injustificadas. Assim, a comunica-
ção efetivar-se-á quando a ausência do aluno puder comprometer o seu
desenvolvimento escolar ou revelar alguma situação, quer no âmbito fami-
liar quer no social, que colabore para a sua ausência34.
Por fim, quanto à comunicação dos elevados níveis de repetência,
face à competência do Conselho Tutelar em assessorar o Poder Executivo
local na elaboração de proposta orçamentária para planos ou programas de
atendimento aos direitos da criança e do adolescente (ECA, art., 136, IX),
poderá efetivar-se alguma medida que promova a mudança dessa realidade
(ex. programa de reforço escolar), sem prejuízo das medidas de proteção a
se aplicarem ao menor (ex: ECA, art. 101, IV), ou das medidas aplicáveis
aos pais ou responsáveis (ECA, art. 129, V).
Convém ressaltar que o Estatuto estabeleceu, no artigo 70, a obriga-
toriedade a todos de prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos di-

33
Art. 245 – Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de
ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que
tenha conhecimento envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou
adolescente. Pena: multa de 3 a 20 salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de
reincidência.
34
Estabelece a LDB quanto a freqüência mínima do aluno: Art. 24, VI – o controle de freqüência
fica a cargo da escola, conforme o disposto no seu regimento e nas normas do respectivo sistema
de ensino, exigida a freqüência mínima de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para
aprovação.

61
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

reitos da criança e do adolescente. Dentro dessa lógica, assumem o profes-


sor e os dirigentes dos estabelecimentos de ensino, a obrigação de prevenir
eventual lesão ou violação dos direitos fundamentais dos alunos, cumprin-
do o que foi estabelecido na lei quanto à comunicação ao Conselho Tutelar
das questões relativas a maus-tratos (referente ao direito à vida, à integri-
dade física e psicológica, à saúde), faltas injustificadas, evasão escolar e
elevados níveis de repetência (direito fundamental à educação).

62
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO VII
O DIREITO À PROFISSIONALIZAÇÃO
E À PROTEÇÃO AO TRABALHO

O último capítulo do Estatuto, que trata dos direitos fundamentais


das crianças e dos adolescentes, refere-se à profissionalização e à proteção
ao trabalho. Obedeceu, o legislador estatutário, às regras estabelecidas35
na Constituição Federal e nas Convenções Internacionais sobre organiza-
ção do trabalho. Com relação à profissionalização e à proteção ao trabalho,
além do que prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente, devem ser ob-
servadas as regras previstas na Consolidação das Leis Trabalhistas36.

1. IDADE MÍNIMA PARA O TRABALHO


Muito embora a Convenção nº. 138 da Organização Internacional
do Trabalho (OIT)37 tenha estabelecido 15 anos como a idade mínima para
o trabalho, admitiu como exceção o trabalho aos menores de 14 anos nos
países em desenvolvimento.
Inicialmente, a Constituição Federal e o ECA, de acordo com a Or-
ganização Internacional do Trabalho, estabeleciam a proibição de qual-
quer atividade profissional a menores de 14 anos, salvo na condição de
aprendizes. Com a alteração promovida pela Emenda Constitucional nº.
20, de 15 de dezembro de 1998, o limite etário passou para 16 anos, o que
ficou previsto na Constituição Federal (art. 7º. XXXIII) e no ECA (art.
6038). Essa mudança não teve, porém como objetivo principal proteger o
adolescente trabalhador, e sim adequar a situação à legislação previdenciária.
De acordo com a legislação vigente, portanto, permite-se o trabalho do
adolescente a partir dos 16 anos (critério etário) e, a partir dos 14, como
aprendiz.

35
Artigos 7º XXX e XXXIII e 227 “caput” e § 3º da Constituição Federal bem como da Convenção nº
138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
36
Diz o ECA - Art. 61. A proteção ao trabalho dos adolescentes é regulada por legislação especial,
sem prejuízo do disposto nesta Lei. A legislação especial é a CLT. Com as regras previstas nos art.
402 a 410.
37
Artigo 2º. – O Decreto n. 4.134 de 15 de fevereiro de 2002 promulgou a convenção no Brasil.
38
A redação do artigo 60 do ECA não foi atualizada em relação à Constituição Federal, quanto à
idade de 16 anos para o trabalho.

63
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

2. DIREITOS DO TRABALHADOR ADOLESCENTE


Ao adolescente maior de 16 anos são assegurados todos os direitos
trabalhistas e previdenciários e, ao aprendiz, bolsa de aprendizagem. Ao
portador de deficiência, por sua vez, garante-se o trabalho protegido, como
decorrência da norma constitucional (art. 227, Parágrafo 1º, II) que estabe-
lece a criação de programas de atendimento e treinamento, considerando,
nesses casos, o tipo de deficiência e o grau de dificuldade apresentada, mas
que efetivamente o prepare para a atividade a ser desenvolvida. Esse traba-
lho protegido ao deficiente também implica a reserva de vagas no mercado
de trabalho.

3. TRABALHOS PROIBIDOS AO ADOLESCENTE


Obedecendo à Constituição Federal39, é vedado ao adolescente em-
pregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica
ou assistido em entidade governamental ou não governamental, o trabalho:
a) noturno (CLT, art. 73, § 2º e ECA, art. 67, I), realizado entre as 22 horas
de um dia e as 5 horas do dia seguinte;
b) perigoso ou insalubre (CLT, art. 189 e ECA., art. 67, II), em que as
atividades que por sua natureza, condições ou métodos de trabalho ex-
ponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de
tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do
tempo de exposição aos seus efeitos;
c) penoso (ECA., art. 67, II e CLT, art. 390), que demande o emprego de
força muscular para suportar peso superior a 20 quilos para trabalho
contínuo ou 25, para trabalho ocasional;
d) realizado em locais prejudiciais à formação e ao desenvolvimento físi-
co, psíquico, moral e social (CLT, art. 405, § 3º E eca., ART. 67, III),
como boates, cabarés, dancings, sapatarias, etc;
e) realizado em horários e locais que não permitam a freqüência à escola
(ECA. art. 67, IV).
Tais proibições exteriorizam o princípio da proteção integral asse-
gurado pela Constituição Federal.

39
CF. - artigo 7, XXXIII.

64
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

O trabalho do adolescente, exercido nas ruas, praças e outros


logradouros dependerá de prévia autorização do Juiz da Infância e da Ju-
ventude, que verificará a indispensabilidade da ocupação e se dela não
poderá advir prejuízo à formação moral do jovem trabalhador.
Quanto ao trabalho e sua compatibilização com o horário escolar,
cumpre anotar que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação40, ao tratar da
oferta da Educação Básica à população rural, procurou adequar o ensino às
atividades e peculiaridades da vida rural de cada região, admitindo organi-
zação escolar própria adequada ao ciclo agrícola, condições climáticas e
natureza do trabalho prestado. Ainda em relação à educação do adolescen-
te trabalhador, estabeleceu a CLT a obrigação de o empregador conceder
ao adolescente o tempo necessário para a freqüência às aulas (art. 427), e
coincidir o período de férias do emprego com as férias escolares, sem o seu
fracionamento. Estabeleceu ainda a possibilidade de extinção do contrato
de aprendizagem caso o adolescente apresente ausência injustificada à es-
cola que resulte na perda do ano letivo.

4. APRENDIZAGEM
Aprendizagem, na definição do Estatuto (art. 62), é a formação téc-
nico- profissional ministrada segundo as diretrizes e bases das leis da edu-
cação em vigor. Visa permitir que o adolescente aprenda uma profissão.
Segundo Oris de Oliveira41, formação técnico-profissional é aquela “que
se utiliza de processos adequados para que determinadas pessoas possam
adquirir os conhecimentos teóricos e práticos que as habilitem ao exercí-
cio competente de atividades especializadas que existem em uma socieda-
de em decorrência da divisão do trabalho”. Esta aprendizagem pode ocor-
rer na escola (LDBE, artigos 39 a 42) ou na empresa (ex. SENAI, SENAC).
Tem como principal característica a ausência de vínculo empregatício
(ECA, art. 65) e deve obedecer aos princípios estabelecidos no artigo 63
do ECA, quanto à:

40
Art. 28 da Lei nº 9394/96.
41
Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, Coord. Cury, Amaral e Silva e Mendez, 1ª
Edição, São Paulo, Malheiros Editores, 1992, p. 186.

65
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

• garantia de acesso e freqüência obrigatória ao ensino regular;


• atividade compatível com o desenvolvimento do adolescente;
• horário especial para o exercício das atividades.
No entanto, conforme esclarece Antonio Carlos Gomes da Costa, ao
citar a lição de Oris de Oliveira42, ocorre que “vulgarmente, e às vezes por
conveniência, qualifica-se como aprendiz o adolescente que começa a traba-
lhar exercendo qualquer atividade que não comporta profissionalização, como
a de office boy, estafeta, mensageiro, empurrador de carrinho ou ensacador
de compras em supermercados. No sentido técnico em que o termo deve ser
tomado na Constituição e no Estatuto, aprendiz é o adolescente que se
profissionaliza trabalhando dentro de um processo educacional em que se
utilizam métodos que levam ao conhecimento teórico-prático de um ofício
cujo exercício proficiente exige pré-qualificação”. Assim, as atividades cita-
das pelo estudioso não podem ser consideradas como aprendizado.
Na condição de aprendiz o adolescente não poderá desenvolver ati-
vidades em locais prejudiciais a sua formação, ao seu desenvolvimento
físico, psíquico, moral e social e nem horários e locais que não permitam a
freqüência à escola.
A legislação definiu o contrato de aprendizagem como sendo um
contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determina-
do, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 anos
e menor de 18 anos, inscrito em programa de aprendizagem, formação téc-
nico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico,
moral e psicológico, e o aprendiz, a executar, com zelo e diligência, as
tarefas necessárias à sua formação. O contrato de aprendizagem não pode
ter vigência por mais de dois anos.
Dessa forma, compete à empresa contratante:
• firmar o contrato de aprendizagem e inscrever o adolescente em
curso de aprendizagem, indicando a atividade que o adolescente irá exer-
cer e o curso correspondente;
• registrar o aprendiz na Carteira de Trabalho e Previdência Social,
anotando o contrato especial de trabalho de aprendiz;

42
ECA e o Trabalho Infantil, Antonio Carlos Gomes da Costa, São Paulo, Ed. Ltr., 1994, p.32

66
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

• garantir todos os direitos trabalhistas e previdenciários ao adoles-


cente trabalhador aprendiz;
• garantir as férias do empregado aprendiz, que devem coincidir com
o período de férias escolares do ensino regular;
• estabelecer uma jornada de trabalho de, no máximo, seis horas diárias.
Com relação ao adolescente aprendiz, estabelece a citada legislação
que ele deve executar com zelo e diligência as tarefas necessárias à sua
formação no curso profissionalizante e na atividade praticada na empresa
bem como manter a freqüência na escola de ensino regular e no curso
profissionalizante.
O contrato de aprendizagem pode ser extinto, regularmente, quando
o aprendiz completar a idade limite (18 anos) ou quando ocorrer o seu
termo final (2 anos) e ainda, excepcionalmente, como resultado de desem-
penho insuficiente ou inadaptação do aprendiz, de falta disciplinar grave,
ausência injustificada à escola que resulte em perda do ano letivo e por
solicitação do aprendiz.
A novidade introduzida pela Lei nº 10.097/00, que alterou vários
artigos da CLT quanto à questão do adolescente aprendiz, refere-se às enti-
dades que oferecem os cursos profissionalizantes. Na hipótese dos Servi-
ços Nacionais de Aprendizagem (ex. SENAC, SENAI) não oferecerem
cursos ou vagas suficientes para atender à demanda dos empregadores,
outras entidades estão autorizadas a garantir a formação técnico-profissio-
nal metódica ao adolescente aprendiz, como as Escolas Técnicas de Edu-
cação e as entidades sem fins lucrativos, que tenham por objetivo a assis-
tência ao adolescente e à educação profissional, registradas no Conselho
Municipal dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes.
Por fim, merece registro a norma estabelecida pela lei que obriga as
empresas a preverem a contratação de no mínimo 5% e no máximo 15% de
adolescentes aprendizes no conjunto de seus trabalhadores.

5. TRABALHO EDUCATIVO
De acordo com legislação em vigor, além da modalidade de trabalho
do adolescente como empregado, como aprendiz, e no trabalho familiar,
também está previsto o trabalho educativo.

67
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

O Estatuto da Criança e do Adolescente 43 tratou do trabalho


educativo que definiu como sendo a “atividade laboral em que as exigên-
cias pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educan-
do prevalecem sobre o aspecto produtivo”. Esse trabalho não estabelece
vínculo empregatício, ainda que prestado no âmbito das empresas, desde
que realizado sob responsabilidade de entidade governamental ou não go-
vernamental e que tenha por fim o aspecto educativo com vistas à profissi-
onalização.
A remuneração recebida pelo adolescente em face desse trabalho ou
da participação na venda dos produtos de seu trabalho não desfigura o
caráter educativo.
Vale registrar que como o trabalho é desenvolvido exclusivamente
sob a responsabilidade de entidades sem fins lucrativos, é imprescindível
que elas tenham registro junto ao Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente, posto que compete a esse órgão avaliar as con-
dições dessa atividade.

43
ECA - artigo 68, §1º.

68
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO VIII
AS OBRIGAÇÕES

Uma das críticas direcionadas ao Estatuto da Criança e do Adoles-


cente foi a de que estabeleceu somente direitos. No entanto, essa avaliação
não procede, já que as obrigações e os deveres estão implícitos para cada
direito previsto.
Crianças e adolescentes afirmam conhecer seus direitos, mas às ve-
zes alegam ter algum direito que não corresponde à realidade ou que não
está previsto em nenhuma legislação. Ainda assim insistem em reconhecê-
lo e os adultos (pais, professores e a sociedade em geral), por ignorância
ou desconhecimento, acabam aceitando seus argumentos. Vale registrar
que os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes são os previs-
tos na Constituição Federal, com semelhança aos garantidos à pessoa maior
de idade, com as peculiaridades decorrentes de sua faixa etária e de sua
condição de ser em desenvolvimento. Podem ser citados os direitos à (ao)
• vida,
• saúde,
• alimentação,
• educação,
• lazer,
• profissionalização,
• cultura,
• dignidade,
• respeito,
• liberdade,
• convivência familiar e comunitária,
• situação a salvo de toda forma de negligência, discriminação, ex-
ploração, crueldade e opressão,
• proteção à infância,
• inimputabilidade penal.
A todo direito corresponde uma obrigação. Logo, a relação que se
estabelece com os citados direitos também implica uma obrigação decor-
rente de sua observância.
Nesse contexto, crianças e adolescentes devem ser encarados como
sujeitos de direitos e também passíveis de deveres, obrigações e proibi-

69
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

ções, contidos no ordenamento jurídico, regimentos escolares e de clubes,


regras familiares, e as da sociedade em geral. Em casos de inobservância
de tais regras, podem cometer um ato infracional ou um ato indisciplinar,
devendo responsabilizar-se por eles.
Deve ficar patente que a todo direito corresponde uma obrigação e
que o direito da criança e do adolescente tem como limite o direito de outra
criança, de outro adolescente ou de um adulto, seja ele pai, professor, etc.
Como esclarece Bobbio (1992, p. 80): “A figura do direito tem como
correlato a obrigação. Assim como não existe pai sem filho e vice-versa,
também não existe direito sem obrigação e vice-versa”.
Tanto é verdade, que o Estatuto da Criança e do Adolescente foi
claro nesse sentido ao estabelecer:
Artigo 6º - Na interpretação desta Lei, levar-se-ão em conta
os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem-comum, os
direitos e deveres individuais e coletivos e a condição peculiar da
criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
Assim a criança e o adolescente têm direito a vida, o que encontra
como limite a vida de outrem, de modo que da mesma forma que não pode
sofrer violência, também tem a obrigação de não praticá-la; tem direito ao
respeito e a obrigação de respeitar; tem direito à educação e o dever de
deixar os outros alunos estudarem, não causando desordem ou indisciplina,
submetendo-se ao regimento escolar e às regras da escola.
No âmbito familiar, os filhos estão sujeitos ao poder familiar dos pais.
Esta relação é marcada por direitos e deveres, tanto dos pais como dos filhos.
Quanto aos filhos, a legislação civil44 estabelece como deve ocorrer o exercí-
cio do poder familiar. Prevê, entre outras, como obrigações dos filhos, a
obediência, o respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.
Na esfera escolar, se a legislação prevê a garantia do direito à educa-
ção a toda criança ou adolescente, também estabelece as obrigações ine-
rentes deste direito. Assim, deve o aluno respeitar o professor, obedecer ao
que estabelece o regimento escolar, ter adequado comportamento a fim de
não prejudicar o ensino em relação aos demais alunos (que também possu-
em o direito à educação).

44
Código Civil – artigo 1634.

70
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Constata-se, portanto, que a lei não estabeleceu apenas os direitos


da população infanto-juvenil, e quem assim a interpreta, revela desconhe-
cimento de seu conteúdo. Para garantir o desenvolvimento e o exercício de
uma cidadania plena, é preciso dar condições à criança e ao adolescente de
conhecer, sim, seus direitos, mas que os responsáveis por eles, especial-
mente pais e professores, exijam deles também o cumprimento de seus
deveres, tornando clara a relação entre esses dois pólos.

71
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO IX
DEFESA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

1. RESPONSÁVEIS PELA DEFESA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS


A lei estabeleceu quem são os responsáveis diretos pela defesa dos
direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes.
Retomando a redação dos textos legais, a Constituição Federal dispõe:
Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado as-
segurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direi-
to à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissiona-
lização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivên-
cia familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
Determinação repetida no Estatuto da Criança e do Adolescente:
Art. 4º - É dever da família, da comunidade, da sociedade em
geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efeti-
vação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educa-
ção, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,
ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Fica evidente, portanto, que são diretamente responsáveis: a famí-
lia, a comunidade (sociedade em geral) e o Estado (poder público), os quais
devem realizar um trabalho com independência e harmonia, visando ao
bem comum e ao desenvolvimento adequado das crianças e dos adolescen-
tes. Quando um desses responsáveis falha, sobrecarrega os outros. Exem-
plo claro pode ser visto na questão educacional. Quando a família falha na
educação (não escolar) do filho, acaba sobrecarregando a escola. Em ou-
tras hipóteses, ocorre a transferência de responsabilidade, como por exem-
plo, no caso em que a família transfere para a escola a responsabilidade
que lhe é inerente (dar remédios, levar ao médico, prover vestuário, ali-
mentação básica, etc.).
O sucesso na efetivação dos direitos requer o trabalho conjunto e
harmonioso (e não de um mesmo modo) da família, da comunidade e do
poder público o que fica evidente, por exemplo, na questão da violência.
Ao abordar o controle social da violência, esclarece REALE JÚNIOR (2004,
p. 3) que o controle social exerce-se, primeiramente, por via da família, da
escola, da igreja, atuantes na tarefa de socializar o indivíduo, levando-o a
72
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

adotar os valores socialmente reconhecidos e os respeitar, independente


da ação ameaçadora e repressiva da lei, que constitui uma espécie de con-
trole social, mas de caráter formal e residual, pois só atua diante do fra-
casso dos instrumentos informais de controle.
O ECA assim estabelece quando delega aos pais e também à socie-
dade a responsabilidade sobre os destinos das crianças e dos adolescentes.
Quando falham ou quando não conseguem impor-lhes os limites necessári-
os é que se justifica a intervenção estatal, via poder judiciário, para a apli-
cação das medidas legais (socioeducativa45 e protetiva46). A lei deve cum-
prir o papel que lhe foi reservado, mas políticas públicas precisam estar
voltadas para os demais meios de controle social, em especial a família e a
escola, de forma que uma sociedade menos violenta e sem a presença de
infratores resulte da conjugação de diversos fatores.
Esse exemplo relacionado à violência também se aplica aos direitos
fundamentais da criança e do adolescente. Dessa forma, a família, a socie-
dade e o poder público devem ter o conhecimento necessário dos direitos
fundamentais da população infanto-juvenil e desenvolver ações que ve-
nham a garantir a sua efetivação, como forma de se alcançar uma socieda-
de mais justa e igualitária, com o pleno desenvolvimento da criança e do
adolescente.

2. FAMÍLIA
À família submete-se a criança em um processo de socialização, com
um aprendizado constante. É em seu âmbito que se transmitem os valores e

45
ECA - Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao
adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação
de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade; VI -
internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
46
ECA - Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente
poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos pais ou
responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento
temporários; III - matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino
fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e
ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime
hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação
e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII - abrigo em entidade; VIII - colocação em família
substituta.

73
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

as formas de comportamento julgadas corretas pela sociedade. Ao tratar do


tema referente ao direito à convivência familiar, duas premissas são ele-
mentares para a correta compreensão da questão:
a) Que o “ser humano não sobrevive isolado do contexto social e familiar,
tendo como característica básica a vivência em grupo” (CLEMENTE e
SILVA. 2000, p. 115).
b) Que a família constitui o local fundamental para o desenvolvimento
sadio da criança ou do adolescente.
Nessas premissas encontra-se, atualmente, a origem do direito à con-
vivência familiar e a sua importância. Isso porque a relação que se estabe-
lece entre o ser humano, que necessita viver em grupo, e a família, como
local privilegiado para o desenvolvimento da criança e do adolescente, tem
sua origem no nascimento. A “ligação neste caso é física, orgânica, pois
um cordão umbilical une o filho à mãe. Mesmo com o rompimento desse
cordão, a ligação permanece sob a forma de outros vínculos que se aperfei-
çoam e desenvolvem como os laços afetivo, psicológico e social.” É, pois,
na família que o ser humano encontra o seu primeiro grupo social, a pri-
meira referência para o seu desenvolvimento.
Decorre dessa relação a importância da família e do direito de a
criança ou o adolescente nela conviver e integrar-se para o seu completo
desenvolvimento. Nesse sentido, os autores são unânimes.
É no seio da família que se reproduz uma ideologia, que se
transmitem as normas, os valores dominantes, que constituem o su-
porte das relações sociais, numa dada sociedade. E mais: a família
constitui, como bem precisam os sociólogos, o primeiro lugar de apren-
dizagem dos valores e dos papéis mais fundamentais como as noções
de troca, de companheirismo, de respeito mútuo, de ordem, o sistema
de penalizações, de responsabilidade, de disciplina, a relação homem-
mulher e a relação mãe e criança. (LEITE, 1994, p. 79 e 80).
Na visão antropológica, o tema é assim tratado:
A antropologia diz que o homem se reúne em família não só
por causa das necessidades instintivas, mas também por algo de or-
dem simbólica, no sentido de estar no mundo, isto é, a necessidade
de comunicação. Portanto, o que faz o homem viver em família é sua
natureza social. É o movimento em direção ao outro que o faz asso-
ciar-se permanentemente. (SARTI, 1999, p. 45).
74
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Na Declaração Mundial sobre a sobrevivência, a proteção e o desenvol-


vimento da criança para a década de 1990, ficou expressamente consignado:
A família é a principal responsável pela alimentação e pela
proteção da criança, da infância à adolescência. A iniciação das cri-
anças na cultura, nos valores e nas normas de uma sociedade come-
ça na família. Para um desenvolvimento completo e harmonioso de
sua personalidade, a criança deve crescer num ambiente familiar,
numa atmosfera de felicidade, amor e compreensão. (KALOUSTIAN,
2002, p.7).
A lei também reconhece a importância da família para o adequado
desenvolvimento da criança e do adolescente e a efetivação de seus direi-
tos fundamentais.

Diz a Constituição Federal:


Artigo 226 - A família, a base da sociedade, tem especial pro-
teção do Estado.
E o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece:
Artigo 19 – Toda criança ou adolescente tem direito a ser cri-
ado e educado no seio da família e, excepcionalmente, em família
substituta, assegurada à convivência familiar e comunitária, em am-
biente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias en-
torpecentes.
Dessa forma, pela sua importância legal e social como o primeiro
núcleo de convivência, a família é a responsável direta pela efetivação dos
direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes.
Quando se fala de família, o modelo a que se refere é o da família
nuclear moderna47, caracterizada, hoje, pelo ingresso da mulher no merca-
do de trabalho e pela igualdade de direitos entre os cônjuges, com divisão
de tarefas na vida comum. Como o casamento não se apresenta como fonte
primária de procriação e ampliou-se a liberdade no que diz respeito à
filiação, as relações se firmam numa linearidade. A efetivação dos direitos

47
Diferente da família nuclear burguesa, calcada na monogamia e no trabalho doméstico da mulher, e
da família patriarcal, caracterizada por uma hierarquia vertical, centrada no matrimônio.

75
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

fundamentais dos filhos não é, portanto, uma obrigação imposta somente à


mulher e passa a ser compartilhada com o homem, quando ambos têm uma
vida em comum.
Conseqüentemente, é na família que a criança encontra o primeiro e
mais importante espaço de proteção, educação, segurança e desenvolvi-
mento (físico e emocional), no qual se inicia a construção da cidadania
infantil. Daí a importância da elaboração de políticas públicas que valori-
zem e aprimorem a família.

3. ESCOLA
A escola, que não limita seu papel apenas à transmissão de conheci-
mentos, constitui fator relevante no processo de reconhecimento de direi-
tos e obrigações e de interiorização dos valores sociais, pois impõe aos
alunos padrões de comportamento e os obriga a conviver, aprendendo que
devem respeito a si mesmos e ao outro. E essa ação se desenvolve não só
por meio de aprovações ou sanções, mas também pelo conteúdo dos ensi-
namentos e pelos exemplos levados à sala de aula.
Na verdade, ao traçar como objetivos da educação o pleno desenvol-
vimento da criança e do adolescente e o seu preparo para o exercício da
cidadania, a lei deixou implicitamente consignado que para se alcançar
esses objetivos, é necessário o desenvolvimento de ações que contemplem
o reconhecimento e a garantia dos direitos e das obrigações dos alunos.
Diante dessas considerações, não há como negar o relevante papel
da escola na responsabilidade pela garantia dos direitos fundamentais da
criança e do adolescente. Não é por outra razão que foram introduzidos nos
currículos escolares os temas transversais da educação objetivando favo-
recer a compreensão desses direitos fundamentais e obrigações.
O ECA deixou expressamente consignada esta responsabilidade:
Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino funda-
mental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de:
I - maus-tratos envolvendo seus alunos;
II - reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, es-
gotados os recursos escolares;
III - elevados níveis de repetência.

76
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Este artigo revela a proteção do direito fundamental à vida e à inte-


gridade física quanto aponta a necessidade da denúncia de maus-tratos,
bem como do direito à educação ao tratar da denúncia de reiteração de
faltas, evasão ou elevados níveis de repetência.
A escola, diante desse quadro, deve apresentar-se, conforme ensina
DI GIORGIO (2002, p. 147) no:
“... sentido de ser legitimamente, institucionalmente e no ima-
ginário social, uma entidade que cumpra socialmente uma função de
dinamizadora cultural e social do seu entorno e é a partir do cumpri-
mento dessa função mais ampla que ela poderá efetivamente atuar
eficazmente no sentido de não mais instruir, mas educar crianças,
jovens, adolescentes e também adultos”.
Também aponta para esse sentido o Parecer nº. CNE/CP 009, apro-
vado em 08 de maio de 2001, do Conselho Nacional de Educação, que trata
das Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores de
Educação Básica, em nível superior, que enseja este novo contexto:
Reforça a concepção de escola voltada para a construção de
uma cidadania consciente e ativa que ofereça aos alunos as bases
culturais que lhes permitam identificar-se e posicionar-se frente às
transformações em curso e incorporar-se na vida produtiva e sócio-
política. Novas tarefas passam a se colocar à escola, não porque seja
a única instância responsável pela educação, mas, por ser a institui-
ção que desenvolve uma prática educativa planejada e sistemática
durante um período contínuo e extenso de tempo na vida das pesso-
as. E, também, porque é reconhecida pela sociedade como a institui-
ção de aprendizagem e de contato com o que a humanidade pôde
produzir como conhecimento, tecnologia e cultura.
Mas para atingir esse objetivo, revela DI GIORGIO (2002) a neces-
sidade da ocorrência de diversos fatores, como: a escola deverá ser antes
de tudo formativa e o processo educativo deverá dar conta de problemas
reais; a universidade precisa estar mais próxima das escolas, às quais mais
verbas devem ser alocadas e, de forma mais efetiva, devem se incorporar
as novas tecnologias, com um número menor de alunos por professor; é
preciso ainda desenvolver nos alunos a capacidade de ensinar e aumentar
os espaços de comunicação (intercâmbios).
77
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Em relação ao professor, constata-se que teve o seu papel redesenhado


para atender às novas exigências legais e sociais, conferindo-lhe novas
atribuições, o que implica uma formação adequada, como um profissional
reflexivo, que é chamado a desempenhar o papel de verdadeira liderança
intelectual no sentido mais amplo da expressão. É necessário que o profes-
sor deixe de se ver como professor de uma determinada disciplina, para se
ver como um educador e um agente na garantia de direitos fundamentais.
No entanto, vale registrar o problema atual por que passa a escola
hoje, e em especial o profissional docente, para o desempenho satisfatório
de suas atribuições. A democratização da educação, com um sistema de
ensino de massas, exige um novo posicionamento do professor. Pois, para
“escolarizar cem por cento das crianças de um país implica pôr na escola
cem por cento das crianças com dificuldades, cem por cento das crianças
agressivas, cem por cento das crianças conflituosas, em suma, cem por
cento de todos os problemas sociais pendentes que se convertem assim em
problemas escolares” (ESTEVES. 1995, p. 121). Ou seja, os problemas da
escola e, diretamente do professor, foram multiplicados, e nesse cenário,
constata-se que, no ambiente escolar, muitas crianças e adolescentes não
têm reconhecidos os mais elementares direitos, como por exemplo, a con-
vivência familiar. O desafio que se apresenta, portanto, é como garantir os
direitos fundamentais a essa população educacional composta por uma
enorme diversidade.
Diante dessa nova ordem, deve-se registrar que a educação não pode
ser concebida como uma panacéia, à qual se credita a redenção do mundo,
a harmonia dos povos, a solução da pobreza, a eliminação dos males que
afligem a humanidade, a garantia de todos os direitos fundamentais, trans-
ferindo-se, ao professor, esse viés redentor, por ser um dos responsáveis
pelo desenvolvimento do sistema educativo.
Nesse sentido, vale lembrar que o professor não deve estar sozinho.
A família e a própria sociedade são co-responsáveis nesse processo
educativo para o reconhecimento dos direitos fundamentais e o completo
desenvolvimento da criança e do adolescente, numa perspectiva de um fu-
turo melhor.
78
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

4. CONSELHO MUNICIPAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO


ADOLESCENTE
A atual Constituição consagrou uma nova relação entre o Estado
(Município) e a comunidade, com o aprimoramento da democracia, que
passou a ser participativa e não apenas representativa. O artigo 1º, § único,
da Constituição Federal traduz essa relação inovadora, estabelecendo:
Art. 1º - Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Como decorrência desse modelo, a participação da população, por
meio de organizações, associações ou através de diferentes conselhos, é
sentida na formulação das políticas públicas como também no controle das
ações governamentais, refletindo o exercício direto do poder pelo povo.
Várias são as referências, na Constituição, à questão da participação popu-
lar, via conselhos municipais, estaduais e federal48.
Ao tratar do tema “criança e adolescente”, o texto legal também
apontou para uma diretriz que visa à descentralização político-administra-
tiva e à participação comunitária49.
Como forma de participação popular e buscando dar efetividade ao
que estabelece a Constituição Federal, com o Estatuto da Criança e do
Adolescente surge o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Ado-
lescente. Diz a lei:
Art. 88 – São diretrizes da política de atendimento:
I – Municipalização do atendimento;

48
CF. Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada
e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I – descentralização,
com direção única em cada esfera de governo; II – atendimento integral, com prioridade para as
atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III – participação da comunidade.
CF. - Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos
do orçamento da seguridade social, previstos no artigo 195, além de outras fontes, e organizadas
nas seguintes diretrizes: I - descentralização político administrativa, cabendo a coordenação e as
normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas
estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social. II – participação
da população, por meio de organizações representativas na formulação das políticas e no controle
das ações em todos os níveis. CF. - Art. 205 – A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
49
CF. arts. 227, § 7º e 204.

79
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

II – Criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos di-


reitos da criança e do adolescente, órgão deliberativo e controlador das
ações em todos os níveis, assegurada a participação popular paritária
por meio de organizações representativas, segundo leis federal, esta-
duais e municipais...
Tal conselho resulta de uma parceria estabelecida entre a sociedade
e o Estado com o objetivo de fixar diretrizes relativas às políticas públicas
envolvendo crianças e adolescentes, bem como de controlar as ações de-
senvolvidas.
Deve ser criado por lei, passando a integrar a estrutura do governo
federal, do Distrito Federal, dos estados, e dos municípios, com total auto-
nomia para tomar decisões em relação aos assuntos de sua competência.
No âmbito municipal, a Câmara de Vereadores deve elaborar a lei que re-
gulamenta o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescen-
te, garantindo-lhe caráter deliberativo, normativo e controlador.
Composição paritária:
A composição dos conselhos é paritária, ou seja, deve prever o mes-
mo número de membros representantes das áreas governamentais e não
governamentais, garantindo a representação da sociedade civil e do poder
público. Essa composição, lembra Costa (1993, p. 71), implica reconhecer
que as decisões “emanadas por maioria dos membros do Conselho, não são
decisões de Governo e nem da sociedade”.
Caráter deliberativo:
O Conselho de Direitos delibera, isto é decide, resolve. Não é um
órgão consultivo ou que apenas emite orientações, opiniões ou sugestões.
Os Conselhos de Direitos “são decisores públicos colegiados, isto é, o que
for decidido no Conselho deve ser transformado em política pública pelos
órgãos competentes das administrações federal, estaduais ou municipais”.
(COSTA, 1993, p. 72).
Caráter normativo:
Diante da competência de estabelecer regras para políticas públicas
envolvendo a criança e o adolescente, o Conselho de Direitos exerce fun-
ção normativa no sentido de emitir portarias, resoluções, pareceres e ou-
tros documentos pertinentes, que melhor orientem as ações e diretrizes a

80
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

serem desenvolvidas. É certo que essa função deve seguir o que foi traçado
pela legislação referente a essa parcela da população, sob pena de ser nor-
ma inválida.
Caráter controlador:
Segundo Pereira (1996, p. 593) “ser controlador das ações em todos
os níveis representa a possibilidade do Conselho de Direitos atuar de for-
ma ampla, uma vez fixadas as diretrizes governamentais. Este órgão deve
fiscalizar o direcionamento das políticas públicas, tomando, como
referencial os princípios fixados no artigo 4º do ECA.
O Conselho Municipal não é órgão executor e, no papel de
controlador, é sua competência levar ao Ministério Público toda e qualquer
irregularidade encontrada na execução dos projetos ou no atendimento das
diretrizes fixadas.
O Conselho de Direitos tem como objetivos e atribuições o acompa-
nhamento, a avaliação, o controle e a deliberação das ações públicas na
área da infância e da juventude visando assegurar a existência e a efetivi-
dade de políticas direcionadas à população infanto-juvenil.
Nesse sentido, o objetivo principal do Conselho é garantir que todas as
crianças e adolescentes sejam reconhecidos e respeitados como sujeitos de direi-
tos e de deveres e como pessoas em condições especiais de desenvolvimento.
Para que este objetivo seja atingido, torna-se indispensável que os
conselheiros conheçam a realidade de seu território e elaborem um plano
de ação, propondo estudos e pesquisas para dar subsídios às políticas pú-
blicas na área infanto-juvenil. É necessário também que o Conselho se
integre a outros órgãos executores de políticas públicas e demais Conse-
lhos como o da Saúde na discussão, por exemplo, a respeito de temas como
gravidez na adolescência.
Na efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescen-
te, devem ainda os membros do Conselho acompanhar e participar da ela-
boração, aprovação e execução do Plano Plurianual e da lei orçamentária,
bem como do processo de elaboração da legislação municipal relacionada
à infância e à juventude; gerir o Fundo Municipal dos Direitos da Criança
e do Adolescente, definindo a destinação dos recursos; promover e apoiar
campanhas educativas relacionadas à infância e à juventude; registrar as
ONGs e os programas de atendimento à criança e ao adolescente; deliberar
sobre o processo de escolha dos Conselheiros Tutelares, etc.

81
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Um Conselho Municipal funcionando nesses termos possibilita um


melhor direcionamento dos problemas relativos à criança e ao adolescente,
com a efetiva garantia dos direitos fundamentais consagrados na Consti-
tuição e no ECA. Representa a própria comunidade enfrentando seus pro-
blemas e buscando soluções.

5. CONSELHO TUTELAR
Outro órgão que prevê a participação da comunidade é o Conselho
Tutelar. Como afirma ZAGAGLIA (1999, p. 01), o conselho tutelar é uma
expressão da sociedade politicamente organizada, através de seus esco-
lhidos, que possibilita a efetividade social dos direitos fundamentais, os
quais se dispõem à estruturação de uma sociedade participativa e demo-
crática.
Com a criação do CONSELHO TUTELAR, o ECA confere à socie-
dade papel fundamental na garantia dos direitos das crianças e dos adoles-
centes, que não dependem mais apenas da intervenção do poder judiciário
para tê-los assegurados.
Art. 131. O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo,
não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumpri-
mento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei.
Verifica-se que a sua missão é zelar pelo cumprimento dos direitos
das crianças e dos adolescentes, sendo um dos operadores da política de
atendimento. O Conselho Tutelar deve ser criado por lei e cada município
deve ter no mínimo um conselho, composto por cinco membros (nem mais
e nem menos) cuja atuação se restringe á área municipal.
O processo de escolha do conselheiro tutelar é estabelecido em lei
municipal, sob responsabilidade do Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente, com a fiscalização do Ministério Público. A
comunidade local é responsável pela escolha dos conselheiros50.

50
ECA - Art. 132. Em cada Município haverá, no mínimo, um Conselho Tutelar composto de cinco
membros, escolhidos pela comunidade local para mandato de três anos, permitida uma recondução.
ECA - Art. 139. O processo para a escolha dos membros do Conselho Tutelar será estabelecido em
lei municipal e realizado sob a responsabilidade do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e
do Adolescente, e a fiscalização do Ministério Público.

82
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

São os seguintes os requisitos mínimos para ser conselheiro tutelar:


a) reconhecida idoneidade moral; b) idade superior a 21 anos; c) residir no
município. Pode a lei municipal estabelecer outras exigências, como a es-
colaridade mínima, aprovação em prova de conhecimentos, etc.
O Conselho Tutelar tem como responsabilidade tratar dos proble-
mas das crianças e adolescentes relacionados à justiça social, desempe-
nhando suas atribuições em parceria com todos aqueles órgãos, institui-
ções, organizações e pessoas (Conselhos Municipais, Polícia Civil e Mili-
tar, Universidades, ONGs, Secretarias de Governo, Associações de Bair-
ros, Escolas, Diretoria de Ensino, etc.) que, de forma direta ou indireta,
lidam com essas questões. Todos são seus parceiros necessários para o
efetivo cumprimento do princípio da proteção integral no que diz respeito
à efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. Trata-se de uma
instância voltada para a solução de problemas relacionados a violações ou
ameaças dos direitos da população infanto-juvenil, sem a necessidade de
acionar o poder judiciário.
O ECA apresenta o rol de atribuições do Conselho Tutelar, estabelecendo:
Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:
I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas
nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII;
II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as
medidas previstas no art. 129, I a VII;
III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto:
a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação,
serviço social, previdência, trabalho e segurança;
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de des-
cumprimento injustificado de suas deliberações.
IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que cons-
titua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança
ou adolescente;
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência;
VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judi-
ciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente
autor de ato infracional;
VII - expedir notificações;
VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança
ou adolescente quando necessário;

83
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da pro-


posta orçamentária para planos e programas de atendimento dos di-
reitos da criança e do adolescente;
X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a
violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da Consti-
tuição Federal;
XI - representar ao Ministério Público, para efeito das ações
de perda ou suspensão do pátrio poder.
Verifica-se que o Conselho atende criança ou adolescente em situa-
ção de risco social ou pessoal com a aplicação de medidas de proteção51,
visando garantir seus direitos fundamentais, assim como os pais ou res-
ponsáveis, podendo também aplicar-lhes as medidas necessárias52.
Diante da relevância das atribuições do Conselho Tutelar, o Estatuto
da Criança e do Adolescente inseriu dois artigos referentes às conseqüên-
cias para quem impedir ou dificultar a ação do conselheiro tutelar ou
descumprir as determinações do Conselho, sob forma de infração penal ou
administrativa:
Art. 236 – Impedir ou embaraçar a ação de autoridade judici-
ária, membro do CONSELHO TUTELAR ou representante do Mi-
nistério Público no exercício de função prevista nesta Lei.
Pena: detenção de 6 meses a 2 anos.
Art. 249 – Descumprir dolosa ou culposamente, os deveres ine-
rentes ao pátrio poder ou decorrentes de tutela ou guarda, bem assim
determinação da autoridade judiciário ou CONSELHO TUTELAR.
Pena: multa de 3 a 20 salários de referência, aplicando-se o
dobro em caso de reincidência.
Constata-se, assim, que o Conselho Tutelar é um órgão inovador no
contexto social, responsável pela operacionalização da política de atendi-
mento à criança e ao adolescente e, por conseqüência, pela garantia de seus
direitos fundamentais.
Quanto mais eficiente for esse órgão, melhor será a proteção à crian-
ça e ao adolescente. Contudo, vale registrar que o Conselho Tutelar não
atua de forma isolada. Há necessidade da implementação de políticas pú-

51
ECA – art. 101, I a VII.
52
ECA - art. 129, I a VII;

84
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

blicas no município, referentes à saúde, à educação, à convivência famili-


ar, ao lazer, à profissionalização, à assistência social, entre outras, para que
o Conselho possa atuar a contento. Pois de nada adianta o Conselho Tute-
lar determinar, como medida de proteção, o encaminhamento da criança
ou do adolescente a tratamento psicológico, ou uma medida de abrigo, se o
município não oferece esses serviços, assim como de nada serve obrigar a
matrícula e freqüência em escola, se há falta de vagas na rede escolar. Daí
porque trabalhar com a criança e o adolescente implica uma rede de ações
que envolvam a família, a sociedade e o poder público.

6. MINISTÉRIO PÚBLICO
O Ministério Público brasileiro foi integralmente reformulado a par-
tir da atual Constituição Federal que, no artigo 127, definiu-o como “insti-
tuição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbin-
do-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis”.
Esse perfil constitucional apresenta o Ministério Público como “fis-
cal da lei e defensor dos interesses sociais”, com o dever de zelar pela
concretização da ordem social, da cidadania e da dignidade da pessoa hu-
mana, que são fundamentos do Estado Democrático de Direito.
Na área da infância e da juventude, a atuação do Promotor de Justiça
foi devidamente estabelecida53 como defensor intransigente dos direitos da
criança e do adolescente. Estabelece a lei, entre as atribuições do Promotor:
Art. 201 – Compete ao Ministério Público:
.......
VIII – zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais asse-
gurados à crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e ex-
trajudiciais cabíveis.
Tendo sido o ECA estrategicamente estruturado como meio para a
materialização dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, não
se pode olvidar que a inserção do Ministério Público no texto legal ocorreu
de modo intencional, definindo-o como um dos responsáveis pela sua con-
cretização. O Promotor de Justiça deixou de ser um mero fiscalizador da

53
ECA - artigos 200 a 205.

85
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

aplicabilidade da lei para atuar como um verdadeiro agente político, mu-


dando sua função de defensor do Estado, para defensor das crianças e dos
adolescentes.
Esse novo papel do Ministério Público tem proporcionado uma sig-
nificativa mudança no poder judiciário, diante do instrumental jurídico
colocado à sua disposição. Com efeito, ações judiciais de natureza social,
individual, coletiva e difusa passaram a integrar a rotina dos julgamentos
de nossos tribunais, com a “análise de questões que nunca haviam sido
enfrentadas”, como, por exemplo, as relacionadas à garantia de atendi-
mento médico, de inclusão educacional, à colocação das crianças em ado-
ção, à proteção ao trabalho, ao fornecimento de órteses e próteses, e de
medicamentos e de transporte escolar, entre outras.
Além dessas ações, muitas vezes de natureza individual, no caso de
omissão, inexistência, ou deficiência de políticas públicas relacionadas aos
direitos fundamentais previstos do ECA, pode o Ministério Público, via
ação judicial, ou extrajudicial, intervir para a sua concretização, com uma
atuação de natureza difusa e coletiva. Judicialmente, através de ações civis
públicas e, extrajudicialmente, mediante inquérito civil, procedimento pre-
paratório de inquérito civil (com o compromisso de ajustamento) e reco-
mendações. Pode, ainda, utilizando-se da estrutura da Promotoria, auxiliar
indiretamente aqueles órgãos que também exercem a função de formula-
dores de política pública, através de fornecimento de informações ou de
dados relativos à questão tratada. São exemplos de ações dessa natureza
aquelas que buscam garantir o transporte escolar, a inclusão de medica-
mentos na lista fornecida pelo poder público, etc.
Diante da relevância da atuação do Promotor de Justiça, e para al-
cançar maior resultado em suas ações, é necessário que ele integre a rede
de assistência e proteção à população infanto-juvenil, mantendo contato
direto com todos os segmentos que atuam na área da infância e da juventu-
de, como o poder público, as entidades de abrigo, programas de atendi-
mento, Conselho Tutelar, Conselho Municipal, professores e diretores de
escola, médicos, etc.
Verifica-se, pois, que os direitos fundamentais da criança e do adolescen-
te e a ação do Promotor de Justiça guardam uma relação direta e estreita que
pode fazer com que eles se tornem realidade, a partir de uma atuação eficiente da
Promotoria, em conjunto com os demais órgãos atuantes nessa área.

86
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CAPÍTULO X
CONSIDERAÇÕES FINAIS

1. OUTROS DIREITOS PREVISTOS NO ECA


O Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceu, no título II, os
direitos fundamentais já referidos, como direito à vida e à saúde, à liberda-
de, ao respeito e à dignidade, à convivência familiar e comunitária, à edu-
cação, à cultura, ao esporte e ao lazer e à profissionalização e à proteção do
trabalho, que foram objeto de análise em capítulos específicos.
No entanto, além desses, a citada legislação também regulamentou ou-
tros direitos mais específicos. São exemplos os direitos previstos aos adoles-
centes nas entidades que desenvolvam programa de internação, e no que cou-
ber às entidades que desenvolvem programas de abrigo. Estabelece o ECA:
Art. 94. As entidades que desenvolvem programas de interna-
ção têm as seguintes obrigações, entre outras:
I - observar os direitos e garantias de que são titulares os
adolescentes;
II - não restringir nenhum direito que não tenha sido objeto de
restrição na decisão de internação;
III - oferecer atendimento personalizado, em pequenas unida-
des e grupos reduzidos;
IV - preservar a identidade e oferecer ambiente de respeito e
dignidade ao adolescente;
V - diligenciar no sentido do restabelecimento e da preserva-
ção dos vínculos familiares;
VI - comunicar à autoridade judiciária, periodicamente, os
casos em que se mostre inviável ou impossível o reatamento dos
vínculos familiares;
VII - oferecer instalações físicas em condições adequadas de
habitabilidade, higiene, salubridade e segurança e os objetos neces-
sários à higiene pessoal;
VIII - oferecer vestuário e alimentação suficientes e adequa-
dos à faixa etária dos adolescentes atendidos;
IX - oferecer cuidados médicos, psicológicos, odontológicos
e farmacêuticos;
87
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

X - propiciar escolarização e profissionalização;


XI - propiciar atividades culturais, esportivas e de lazer;
XII - propiciar assistência religiosa àqueles que desejarem, de
acordo com suas crenças;
XIII - proceder a estudo social e pessoal de cada caso;
XIV - reavaliar periodicamente cada caso, com intervalo máximo
de seis meses, dando ciência dos resultados à autoridade competente;
XV - informar, periodicamente, o adolescente internado so-
bre sua situação processual;
XVI - comunicar às autoridades competentes todos os casos
de adolescentes portadores de moléstias infecto-contagiosas;
XVII - fornecer comprovante de depósito dos pertences dos
adolescentes;
XVIII - manter programas destinados ao apoio e acompanha-
mento de egressos;
XIX - providenciar os documentos necessários ao exercício
da cidadania àqueles que não os tiverem;
XX - manter arquivo de anotações onde constem data e cir-
cunstâncias do atendimento, nome do adolescente, seus pais ou res-
ponsável, parentes, endereços, sexo, idade, acompanhamento da sua
formação, relação de seus pertences e demais dados que possibili-
tem sua identificação e a individualização do atendimento.
§ 1º Aplicam-se, no que couber, as obrigações constantes des-
te artigo às entidades que mantêm programa de abrigo.
Em outras palavras, ao adolescente infrator internado, e naquilo que
couber à criança ou ao adolescente que se encontra em entidade de abrigo,
devem ser garantidos os direitos aqui previstos, como por exemplo, ter
atendimento personalizado, manter o vínculo familiar, ter vestuário e ali-
mentação adequados, cuidados médicos, psicológicos, odontológicos e far-
macêuticos, etc.
Quando a lei trata da questão judicial, em especial, dos atos infraci-
onais praticados por adolescentes, também estão previstos outros direitos
fundamentais, conforme reza o texto legal:
Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade
senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fun-
damentada da autoridade judiciária competente.

88
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Parágrafo único. O adolescente tem direito à identificação dos


responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado acerca de
seus direitos.
Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local onde
se encontra recolhido serão incontinenti comunicados à autoridade
judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele
indicada.
Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de res-
ponsabilidade, a possibilidade de liberação imediata.
Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determina-
da pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.
Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada e basear-
se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a
necessidade imperiosa da medida.
Art. 109. O adolescente civilmente identificado não será sub-
metido a identificação compulsória pelos órgãos policiais, de prote-
ção e judiciais, salvo para efeito de confrontação, havendo dúvida
fundada.
Ainda nessa linha de raciocínio, o Estatuto garantiu ao adolescente a
defesa técnica por advogado, o direito de ser ouvido pessoalmente pela
autoridade competente, bem como de solicitar a presença de seus pais ou
responsável em qualquer fase do procedimento, de contar com assistência
judiciária gratuita quando necessitar, e de ter garantida a igualdade na rela-
ção processual54.
Verifica-se que esses são os mesmos direitos também estabelecidos
para pessoa maior de idade em casos de processos ou de prisão em flagrante.
Quando o adolescente cumpre medida socioeducativa de interna-
ção, o ECA também garantiu-lhe alguns direitos como:

54
Tais direitos estão previstos na Constituição Federal, artigo 227, § 3º, IV que estabelece que o
direito a proteção especial abrangerá, ente outros, os seguintes aspectos: IV - garantia de pleno e
formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa
técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica; V - obediência
aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade.

89
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade,


entre outros, os seguintes:
I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do Minis-
tério Público;
II - peticionar diretamente a qualquer autoridade;
III - avistar-se reservadamente com seu defensor;
IV - ser informado de sua situação processual, sempre que solicitada;
V - ser tratado com respeito e dignidade;
VI - permanecer internado na mesma localidade ou naquela
mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável;
VII - receber visitas, ao menos, semanalmente;
VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos;
IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal;
X - habitar alojamento em condições adequadas de higiene e
salubridade;
XI - receber escolarização e profissionalização;
XII - realizar atividades culturais, esportivas e de lazer:
XIII - ter acesso aos meios de comunicação social;
XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e
desde que assim o deseje;
XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local
seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventu-
ra depositados em poder da entidade;
XVI - receber, quando de sua desinternação, os documentos
pessoais indispensáveis à vida em sociedade.
Na verdade, todos esses direitos têm ligação direta com o direito
fundamental à liberdade, ao respeito e à dignidade da pessoa humana, com
um detalhamento de ações que materializam os preceitos previstos nos ar-
tigos 15 a 18 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

2. UMA LEI INOVADORA


Quando entrou em vigor, o Estatuto da Criança e do Adolescente foi
alvo de severas críticas em face dos direitos estabelecidos. Na verdade, o
posicionamento contrário à sua vigência baseava-se no argumento que, além
de ser uma lei que garante somente direitos às crianças e aos adolescentes,
ignorando suas obrigações, seria uma legislação para o primeiro mundo e,
portanto, inadequada à nossa realidade.

90
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

Tais críticas não se sustentam. Como já demonstramos, a lei não


tratou apenas dos direitos das crianças e dos adolescentes. As obrigações
também estão presentes. Ocorre que não havia um consenso quanto à pos-
sibilidade de crianças e adolescentes serem portadores de direitos. Exem-
plo claro dessa concepção encontra-se na questão da agressão. Caso haja
uma agressão contra uma pessoa maior de idade, o agressor responde pela
prática do delito de lesão corporal ou vias de fatos, ou seja, responde cri-
minalmente pelo seu ato. Porém, se uma criança é agredida pelos pais, sob
o pretexto de educá-la, não se vislumbra qualquer ilegalidade. Ou seja,
agressão contra o maior é crime, contra o menor é educação. O maior é um
ser humano, o menor, um objeto que não sente dor. O maior tem direitos
que o menor não possuía. Então foi preciso que uma lei fosse editada para
fixar, de uma vez por todas, que as crianças e os adolescentes são seres
humanos e merecem ser respeitados em seus direitos fundamentais.
Na verdade, ocorreu com a criança e com o adolescente o mesmo
que se verificou no passado em relação ao negro e à mulher casada. As leis
abolicionistas55 e o Estatuto da Mulher Casada56 romperam com a discrimi-
nação e garantiram a cidadania do negro e da mulher. Na época, foram
contestadas. No entanto, revelaram um avanço no que diz respeito à digni-
dade do ser humano. O ECA rompeu com um passado marcado pela pre-
sença de menores nas ruas, carentes, em situação irregular, ‘trombadinhas’
ou infratores, reconhecendo as crianças e os adolescentes como sujeitos de
direitos fundamentais inerentes a qualquer pessoa humana, que merecem
proteção integral dada a condição de pessoa em desenvolvimento.
Também não se trata de uma lei elaborada para um país de primeiro
mundo. É um documento compatível com a nossa realidade, no qual é pre-
ciso consignar os direitos fundamentais e os meios para a sua concretiza-
ção. Será que num país de primeiro mundo haveria a necessidade de uma

55
Lei Áurea, de 13 de maio de 1988, assinada pela Princesa Isabel, na qual era declarada extinta a
escravidão; a proclamada por Euzébio de Queiroz, ministro do Império, que em 1850 tornou proibido
o tráfico de escravos; ou a proclamada em 1871, atribuída ao Visconde do Rio Branco, denominada
Lei do Ventre Livre, declarando livres todas as crianças que viessem a nascer de pais escravos e,
ainda, a de 1885, obtida pelo ministério de José Antonio Saraiva que declarava livres os escravos
maiores de 60 anos, denominada Lei dos Sexagenários.
56
Lei nº 4.12 de 27 de agosto de 1962 que alterou o Código Civil para garantir direitos e regulamentar
a situação jurídica da mulher casada.

91
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

lei para garantir o direito à vida (tratamento médico, medicamentos, órteses,


próteses, etc.) ou à educação (direito de freqüentar uma creche, pré-escola,
etc.)? Essa realidade é nossa e a lei nela se enquadra.
Pelo fato de ter um caráter inovador é que reuniu um grande número
de opositores. Porém, trata-se de uma legislação eficiente e pertinente àquilo
a que se propôs. É certo que passados vários anos de sua vigência, ainda é
possível encontrar resistência à sua aplicabilidade. Mas aos poucos ela
vem se sedimentando e sendo aplicada em sua integralidade, demonstran-
do sua importância para a cidadania infanto-juvenil.

3. O DESAFIO
A existência de um texto legal que reconhece a criança e o adoles-
cente como sujeitos de direitos, por si só não mudará a realidade. Essa lei
tem que “pegar”, ou seja, ser efetivamente aplicada em todos os seus ter-
mos, para aí sim, poder se alterar a situação das crianças e dos adolescen-
tes no que diz respeito à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à profissiona-
lização, à convivência familiar, à liberdade, ao respeito e à dignidade. Em
síntese, para garantir a cidadania dessa parcela da comunidade, há necessi-
dade de fazer da lei uma realidade.
O desafio encontra-se aí, ou seja, na efetivação ou concretização do
ECA. Pois se temos uma boa legislação, bem redigida e avançada, ela não
surtirá nenhum efeito, porém, se não for implementada em sua íntegra, o
que requer o compromisso de todos: família, sociedade e poder público.
Do contrário, continuaremos a criticá-la de maneira equivocada, pois
da mesma forma que não se pode criticar um remédio que não fez efeito em
relação à determinada enfermidade, sem tomá-lo, não há como criticar o
ECA sem implantá-lo. E, passados vários anos do início de sua vigência,
verifica-se, em muitos municípios, que a lei ainda não está sendo obedeci-
da. Aí reside o desafio.

92
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

BENEDITO, A. C. Justiça de menores no Brasil: sua verdadeira finalidade. In:


CURY, Munir (coord.) Temas de Direito do menor. Coordenação das Curadorias
de Menores do Ministério Público do Estado de São Paulo. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1987.
BEUST, L. H. Ética, valores humanos e proteção à infância e juventude.
In: AFONSO, A. K. et al. (coord.). Pela justiça na educação. Brasília: Mec/
Fundescola, 2000.
BECKER. M. J. In: CURY, Munir et al (coord.). Estatuto da Criança e do Ado-
lescente Comentado. São Paulo: Malheiros, 1992.
BOBBIO, N. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Bra-
sil, promulgada em 5 de outubro de 1988. 24ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. (Co-
leção Saraiva de Legislação).
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CP nº 009/2001 – Dire-
trizes curriculares nacionais para a formação de professores da educação
básica, em nível superior, curso de licenciatura de graduação plena. Brasília,
DF: CNE, 2001.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP nº 01, de 18 de
fevereiro de 2002 - Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de
Professores da educação básica, em nível superior (curso de licenciatura, de
graduação plena). Brasília-DF: CNE, 2002.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente: promulgado em 13 de julho de
1990. 9.ed. São Paulo: Saraiva, 1999. (Coleção Saraiva de Legislação).
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9394 de 20 de
dezembro de 1996.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacio-
nais: terceiro e quarto ciclos - apresentação dos temas transversais. Brasília, DF:
MEC/SEF, 1998.
BRASIL. Código Civil. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
BRASIL. Consolidação das Leis Trabalhistas. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de
maio de 1943.
BRASIL. Lei Orgânica da Saúde. Lei n. 8.080, de 19 de Setembro de 1990.
BUFFA, Éster. Educação e cidadania burguesas. In: BUFFA, Éster; ARROYO,
M. G.; NOSELLA, P. Educação e cidadania: quem educa o cidadão? 10.ed. São
Paulo: Cortez, 2002. p. 11-30.

93
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

CANOTILHO, J. J. G. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra:


Almedina, 1999.
COSTA, A. C. G. Pedagogia e Justiça. Revista da Escola Superior da Magis-
tratura do Estado de Santa Catarina. Florianópolis, v. 5, p. 165-175, 1998.
_______ É possível mudar. São Paulo: Malheiros Editores, 1993.
_______ O ECA e o Trabalho Infantil. São Paulo, Ed. Ltr., 1994.
COVRE, M. L. M. O que é cidadania. São Paulo: Brasiliense, 1991.
CRUANHES, M. C. S.. Cidadania: educação e exclusão social. Porto Alegre:
Fabris, 2000.
_______ Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. In: Cader-
nos de Pesquisa. Fundação Carlos Chagas. São Paulo: Autores Associados, n.116,
p. 245-262, jun. 2002.
CURY, M. et al (coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado.
São Paulo: Malheiros, 1992.
CLEMENTE, Maria Luzia e SILVA, Vilma Regina. A guarda de filhos como su-
porte para que os laços da união sejam mantidos. In: Direito de Família e Ciênci-
as Humanas. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 2000 (Cadernos de estudos
n.º 03). Vários autores.
DI GIORGIO, C. A. G. Por uma escola da consciência universal: a escola
dinamizadora do seu entorno em tempos de globalização. 2001. Tese (Livre-
docência). Presidente Prudente: Faculdade de Ciências e Tecnologia.
DUARTE, C. S. O Direito público subjetivo ao ensino fundamental na Consti-
tuição Federal Brasileira de 1988. São Paulo, 2003. Tese (Doutorado). Pós-gra-
duação em Direito: Universidade de São Paulo.
ELIAS, Roberto João. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente.
São Paulo: Ed. Saraiva, 1994.
ESTEVES, J. M. Mudanças sociais e função docente. In: NOVOA, Antonio (org.).
Profissão professor. 3. ed. Portugal: Porto Celina, 1995. p. 93-124.
FERREIRA, L. A. Ferreira O Estatuto da Criança e do Adolescente e o Professor.
Reflexos na sua formação e a atuação. São Paulo: Cortez, 2008.
__________ A Bioética e o Estatuto da Criança e do Adolescente. In: Revista
Intertemas. Presidente Prudente - Vol. 4, 2001. pág. 91-99.
__________ Indisciplina Escolar e Ato infracional. In: Revista Igualdade. Curitiba.
Vol. 8, n. 29, 2000. Pág. 42-52.
__________ O Promotor de Justiça social. In: Infância e Cidadania. São Paulo.
InorAdorpt, 2000.

94
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

__________ Implicações jurídicas do direito à vida e à saúde diante do Esta-


tuto da criança e do adolescente. Disponível no site: www.pjpp.sp.gov.br
__________ e PENHA, Juliana Álvares. A responsabilidade médica em relação
aos maus tratos de criança e adolescente e a legislação menorista.. Disponível
no site: www.pjpp.sp.gov.br
FERREIRA, Márcia Regina Porto; CARVALHO, Sônia Regina. 1º Guia de Ado-
ção de crianças e adolescentes do Brasil. São Paulo: Wimmers Editorial, 2000.
FRISCHEISEN, Luiza Cristina Fonseca. Políticas públicas – A responsabilidade
do administrador e o Ministério Público. São Paulo: Ed. Max Limonad, 2000.
KALOUSTIAN, Manoug (organizador) Família brasileira: a base de tudo. 5ª
edição. São Paulo: Cortez, 2002.
KARNAL, L. Estados Unidos, liberdade e cidadania. In: PINSKY, J. e PINSKY, C.
B. (org). História da cidadania. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2003.
KONZEN, A. A. O direito a educação escolar. In: BRANCHER, L. N.; RODRI-
GUES, M. M. e VIEIRA, A. G. (org). O direito é aprender.Brasília:
FUNDESCOLA/MEC, 1999, p. 659-668.
_______ Conselho Tutelar, escola e família – Parcerias em defesa do direito à educa-
ção. In: BRANCHER, L. N.; RODRIGUES, M. M. e VIEIRA, A. G. (org). O direito é
aprender. Brasília: FUNDESCOLA/MEC, 1999, p. 159-191.
LEITE, Eduardo de Oliveira. Temas de Direito de Família. São Paulo: Ed. RT, 1994.
MACHADO, M. T. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os
direitos humanos. Dissertação (mestrado), 2002. Pós-graduação em Direito.
Pontifícia Universidade Católica. São Paulo.
MALISKA, M. A. O direito à educação e a Constituição. Porto Alegre: Sérgio
Antonio Fabris, 2001.
MATTIA, F. M. Comentário ao art. 17 do ECA. In: CURY, Munir et al (coord.).
Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Malheiros, 1992.
MEKSENAS, Paulo. Cidadania, Poder e Comunicação. São Paulo: Cortez, 2002.
MENDEZ, Emílio Garcia e COSTA, Antônio Carlos Gomes. Das necessidades
aos Direitos. São Paulo: Malheiros Editores, 1994.
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 2ª Edição. São Paulo:
Atlas, 1998.
_______ A. de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 1998.
MOTTI, A. J. Ângelo e TALAYER, C. A. O segredo da utopia. In: SILVA, E.;
MOTTI, Ângelo (org.). 10 anos de Estatuto: a construção da cidadania da crian-
ça e do adolescente. Campo Grande: UFMS, 2001.

95
O Estatuto da Criança e do Adolescente e os Direitos Fundamentais

PAULA, P. A. G. de. Educação, direito e cidadania. Cadernos de Direito da


Criança e do Adolescente, São Paulo: n.1, Malheiros, p. 91-103, 1995.
PEREIRA, T. da S. Direito da criança e do adolescente: uma proposta
interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1996.
REALE JÚNIOR, M. – Instituições de Direito Penal. Rio de Janeiro: Forense,
2004.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1997, v. 6.
SARTI, Cynthia Andersen. Família – Visão Antropológica. In:Direito à Convi-
vência familiar e Comunitária. São Paulo: Secretaria de Assistência e Desenvolvi-
mento Social, 1999.
SÊDA, Edson. A proteção integral. 4ª Edição, São Paulo: Ed. Adês, 1996.
SILVA, J. A. da. Comentário ao artigo 16 do ECA. In: CURY, Munir et alii (Coor-
denadores). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo:
Malheiros, 1992.
SILVA, J. A. da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros,
1999.
SOARES, J. J. de B. Comentários ao artigo 133 do ECA. In: CURY, Munir et al
(Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. Comentários Jurí-
dicos e sociais. São Paulo: Malheiros, 1992.
VERONESE, J. R. P. Temas de direito da criança e do adolescente. São Paulo:
LTr, 1997.
_______ J. R .P. Os direitos da criança e do adolescente. São Paulo: LTr, 1999.
VOGEL, A. Do Estado ao estatuto. In: PILOTTI, F.; RIZZINI, I. (org.). A arte de
governar crianças. Rio de Janeiro: Instituto Interamericano Del Niño, 1995,
p. 229-346.
ZAGAGLIA, Rosangela. O Conselho Tutelar. Apostila digital do Programa de
Atualização em Direito da Criança. ABMP. Vol. 1, 1999, p. 1-9.

96

Potrebbero piacerti anche