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Casa de Memória Transxingu: ação cultural participativa na Amazônia

brasileira

Idanise Sant’Ana Azevedo Hamoy1


Universidade Federal do Pará
idahamoy@gmail.com

RESUMO:

Este artigo visa estabelecer algumas relações entre aspectos teóricos e


metodológicos de Boas Práticas de ação cultural com implantação de museus.
Tendo como estudo de caso a criação da Casa de Memória Transxingu,
localizada no município de Altamira no estado do Pará, resultado de ação
compensatória estabelecida no Plano Básico Ambiental da Usina Hidrelétrica de
Belo Monte. O texto aborda pontos conceituais de ações culturais que devem ser
considerados na criação e implantação de espaços museológicos.

Palavras Chave: Ação cultural, museologia, Belo Monte, Altamira

RESUMEN:

Este artículo pretende establecer algunas relaciones entre aspectos teóricos y


metodológicos de Buenas Prácticas de acción cultural con implantación de
museos. Con el estudio de caso la creación de la Casa de Memoria Transxingu,
ubicada en el municipio de Altamira en el estado de Pará, resultado de acción
compensatoria establecida en el Plan Básico Ambiental de la Usina
Hidroeléctrica de Belo Monte. El texto aborda puntos conceptuales de acciones
culturales que deben ser considerados en la creación e implantación de espacios
museológicos.

Palabras clave: Acción cultural, museología, Belo Monte, Altamira

A criação de um novo museu alimenta expectativas e cultiva esperanças. Criar


é realizar algo através da utilização de recursos, através de práticas que almejam
alcançar um objetivo. E o objetivo dessa criação recai no que é estabelecido no
Estatuto de Museus2, como definição do que é considerado museu: “as
instituições sem fins lucrativos que conservam, investigam, comunicam,
interpretam e expõem, para fins de preservação, estudo, pesquisa, educação,
contemplação e turismo, conjuntos e coleções de valor histórico, artístico,

1
Doutora em Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais/BR. Professora Adjunta da Universidade
Federal do Pará na Faculdade de Artes Visuais, curso de Museologia.
2
Lei Federal Brasileira no. 11.904/2009, regulamentada pelo Decreto de Lei Federal 8.124/2013
científico, técnico ou de qualquer outra natureza cultural, abertas ao público, a
serviço da sociedade e de seu desenvolvimento”3.

Considerando essa condição e avaliando o risco de perda de bens culturais de


regiões impactadas por grandes projetos, a partir da autorização para a
construção da hidrelétrica de Belo Monte no estado do Pará (norte do Brasil), o
Instituto Nacional de Patrimônio Histórico Brasileiro-IPHAN, definiu como ação
compensatória, a criação de uma casa de memória de caráter regional no
município de Altamira, polo de convergência territorial para a região do Xingu.
Trata-se de uma ação institucional de estabelecer medidas compensatórias para
as regiões impactadas diretamente ou de influência, pelo empreendimento de
construção da hidrelétrica.

A Usina hidrelétrica de Belo Monte, foi construída no Rio Xingu, e abrange uma
área de influência direta do impacto que envolve cinco municípios dessa região:
Altamira, Anapu, Brasil Novo, Senador José Porfírio e Vitória do Xingu. É
considerada a terceira maior hidrelétrica do mundo, cujo dois primeiros assentos
se referem às usinas hidrelétricas de Três Gargantas na China e Itaipu,
binacional na fronteira brasileira com o Paraguai.

Para a sua construção foi necessário o remanejamento de comunidades, que


produziam suas manifestações e ações culturais espontaneamente,
independente de vínculo ou suporte institucional. As dinâmicas sociais e culturais
que existiam nesses espaços comunitários, por terem esse caráter espontâneo,
possuíam poucos registros, e quase nenhuma documentação de sua existência.
Nesse sentido, seguindo a metodologia de Inventário Nacional de Referências
Culturais (INRC) do IPHAN foram mapeadas e registradas Celebrações,
Edificações, Formas de Expressão, Lugares, Ofícios e Modos de Fazer além de
uma série de registros de histórias de vida.

Esse mapeamento foi conduzido por uma equipe de profissionais de diferentes


áreas de conhecimento4, a partir de visitas aos municípios e escuta de vários

3
BRASIL. Lei 11904, de 14 de janeiro de 2009. Institui o Estatuto de Museus e dá outras providências.
Brasília- F, jan 2009. Parágrafo 1º.
4
Equipe técnica da empresa Scientia Consultoria Científica, composta por Arquitetos, Historiadores,
Antropólogos, Sociólogos, Licenciados em Arte e Museólogo
grupos sociais. Nessas reuniões, denominadas de oficinas participativas,
realizadas em cada município, os líderes comunitários, organizadores de
procissões, brincantes de folias, moradores antigos, apontavam e definiam o que
de fato eles consideravam seu maior patrimônio, suas manifestações culturais e
suas tradições que estavam em processo de desaparecimento com as
mudanças de vários ciclos econômicos. Dentre os mais citados estão o ciclo da
borracha, a construção da rodovia transamazônica e a construção da
hidrelétrica, como ciclos marcantes na vida social, econômica e cultural. Essas
identificações foram sendo registradas em vídeos, fotos, coleta de documentos,
que gerou um acervo de bem culturais dessa região, destinado a compor a Casa
de Memória.

As pessoas dessa região precisavam falar. Precisavam ser ouvidas. Esses ciclos
econômicos se estabeleceram de fora para dentro, de cima para baixo. A forte
migração impulsionada por esses movimentos gerou uma região multicultural
com uma riqueza invisibilizada por sistemas institucionalizados de cultura.

Ali se percebia claramente uma zona de contato, que de acordo com o conceito
de Mary Louise Pratt,5 “é a copresença espacial e temporal dos sujeitos
anteriormente isolados por disjunturas geográficas e históricas (...) cuja
trajetórias agora se cruzam” e que deve ser compreendida muito mais do ponto
de vista relacional, interativa do que dentro de uma visão unilateral ou falsa
impressão de imparcialidade desenhada em um contexto que enfatiza o modelo
de civilização institucionalizadas e subestima as outras culturas enraizadas e
construídas espontaneamente.

A partir dessa percepção, perguntamos como eles queriam essa Casa de


Memória? Que espaços seriam necessários? Então desde o programa de
necessidades que antecede o projeto arquitetônico de um espaço, foi definido e
discutido em todos os municípios, nas oficinas participativas. Corroborando o
pensamento de Ricardo Rubiales6 quando indica que o contato entre a equipe

5
PRATT, Mary Louise. Os olhos do Império: relatos de viagem e transculturação. Tradução Jézio
Hernani Bonfim Gutierre. Bauru, SP: EDUSC, 1999, pp.11-38
6
RUBIALES, Ricardo. Mediación y Museos: notas de museos e interaciones humanas. (2009). [ebook]
Mexico: Ricardo Rubiales. Disponível em: http://educacionenmuseos.com/wordpress/rr/ Acesso em 04
de agosto de 2018
do museu e os usuários deve ser uma interação de qualidade, aonde se presume
a intencionalidade e a reciprocidade para compreensão das expectativas e
necessidades do público. Eles desejavam, antes de mais nada, um espaço para
as apresentações de suas danças, aliás, dois: um aberto denominado “terreiro”
e um fechado como um teatro. Depois foi surgindo outras necessidades: uma
sala para cursos diversos, uma sala para inclusão digital. A equipe técnica se
perguntava: onde irá ficar todo esse acervo coletado? Quando a questão foi
posta, a resposta veio na simplicidade de uma palavra sábia: “para as nossas
coisas, tem que ter um lugarzinho!” Definindo o que deveria ser aquele espaço:
um espaço para aquela comunidade, pensado por eles e que atendesse os seus
anseios.

Considerando o território de abrangência compreendendo cinco municípios,


durante as oficinas participativas, os grupos iniciaram um processo de
denominação da Casa de Memória. Além do caráter regional, deveria ter um
nome que representasse essa multiplicidade de aspectos. Observaram então
que essa é uma região por natureza definida pelo Rio Xingu e construindo
caminhos comunicacionais pela Rodovia Transamazônica. Brasil Novo e Anapu
são municípios da terra, da rodovia. Vitória do Xingu e Senador José Porfírio são
município da água, do rio. Altamira, possui uma localização estratégica, é o ponto
de convergência, por terra e por água. Entre as conversas, definiram que o nome
apropriado para esse território cultural seria Transxingu.

Este é um ponto de partida para qualquer ação cultural. Não se trata de importar
modelos já estabelecidos de uma determinada região, é pensar em estratégias
singulares para cada nova ação. Fugir do mito binário de escolha entre um ou
outro, e avançar nos processos de alteridade, estabelecendo assim mais
práticas de análise do que de síntese. Escutar as diversas falas, provocar a
experiência e construir um significado, esse era o caminho! Investindo nessa
linha de ação, as expectativas eram muito boas. Um novo espaço, uma nova
proposta construtiva.

O local determinado para a construção da Casa de Memória Transxingu, foi uma


antiga olaria, localizada as margens do Rio Xingu no município de Altamira. Da
antiga olaria se preservou a chaminé e dois fornos antigos, como registro do
local. Dessa forma o projeto arquitetônico foi concebido, e a ideia inicial
apresentada em todos os municípios para ajustes. Foi definida a construção de
6 espaços na área de 13.873.49m² disponível para esse fim, a saber:
Auditório/Teatro, Área coberta dos Fornos, Sala Multiuso, Espaço Museológico,
Administração e um Terreiro para apresentações de danças e celebrações.

Chega o momento de desgarrar-se da expectativa e investir no dever fazer. É


quando nos afastamos do pensamento definidor de ideias para a lógica dos
processos. Como usar esse espaço para desenvolver uma efetiva ação cultural?
Afinal de contas, nos quatro cantos do mundo, também se criam museus. Mas
apesar de todas as metodologias e manuais de boas práticas, é o componente
local que será o agente determinador de como as ações poderão ser pensadas.

Seguindo uma lógica de processos, tomamos as bases conceituais de boas


práticas de ações culturais, mas continuamos a constituição desse novo museu
ou dessa Casa de Memória que possui em sua organização um espaço
museológico, de forma participativa, congregando as representações que desde
a concepção permaneciam presentes nas oficinas participativas. Com a
consciência de que era necessário a institucionalização desse espaço,
garantindo a escuta e manifestação e o acesso democrático.

Casa de Memória é uma denominação composta de dois termos distintos do


ponto de visto matérico, mas com confluências internas bastante próximas
quando se leva em consideração a percepção pessoal individual e coletiva.
Compreendemos “casa” como a moradia, lugar material construído para ser um
lugar privado, de proteção, de intimidade. A casa é sempre de algo ou de alguém
nessa linha de pensamento, o sentido de pertencimento é definido na
preposição: de Memória.

Memória, que é uma faculdade da alma, imaterial, para utilizar o termo que
clássicos Aristóteles, Agostinho e Aquino utilizavam. E séculos mais tarde
definida por Baumgarten como a disposição natural para reconhecer e se
lembrar dos perceptos reproduzidos.7 Tomando o termo a partir do pensamento

7
KIRCHOF, Edgar. Estética e Semiótica: de Baumgarten e Kant a Umberto Eco. Porto Alegre: EDIPUCRS,
2003.
bergsoniano, a memória representativa é a continuidade da pessoa, a realidade
fundamental, a consciência de duração pura. Define o ser essencial de cada
pessoa e a torna diferente de todas as demais, conservando o seu passado e o
atualiza no presente, confirmando sua história e tradição. Guardar, armazenar,
recuperar informações, fatos imagens presenciadas e até mesmo àquelas
relatadas por terceiros, são as atividades da memória individual, que por
envolver terceiros, também é coletiva e compartilhada.

Casa de Memória traz esse sentido de individualidade, e que por uma


necessidade humana de interagir e se relacionar com outros da mesma espécie
são compartilhadas, e passa a constituir-se coletivamente. Esse é o sentido
conceitual desse espaço. Não se trata de um lugar privado exclusivamente, é um
espaço de convivência que desperte em cada visitante o sentido de
pertencimento a esse lugar, que conte a história de cada um para todos, e a
história de todos para cada um que esteja ali. No qual as experiências sejam
compartilhadas, ensinadas e aprendidas. E sendo uma casa, todos estejam
compromissados com a sua permanência, seguindo o conceito de Museu
Integral apresentado na Mesa Redonda de Santiago do Chile (1972) na qual o
museu é destinado, segundo um dos seus postulados “a situar o público dentro
de seu mundo, para que tome consciência de sua problemática como homem-
indivíduo e homem-social” e ainda na Declaração de Caracas (1992) que
destaca o potencial do museu contemporâneo de promover a “tomada de
consciência do poder decisivo que possui para o desenvolvimento dos povos,
refletindo a ação social do museu”.

Pensando nessa ação social do museu, definimos três eixos que norteariam toda
a concepção conceitual de planejamento do espaço: a vocação institucional,
identificação do território patrimonial e a delimitação do repertório patrimonial.

Quanto à vocação institucional, durante as oficinas participativas foram


coletados dados que respondiam as seguintes questões: Para que queremos
existir? (finalidade), o que queremos guardar? (valores), como agiremos?
(estratégia), o que queremos alcançar? (metas), para quem o fazemos? (público
alvo). A partir de debates organizamos palavras chave para responder a essas
questões em uma tabela, que permitisse a visualização de todos os municípios.
Tabela 1 - Palavras Chave de cada município em respostas às questões colocadas.

Finalidade Valores Estratégias Metas Público Alvo

Garantir o
Identidade e Interagir o
acesso e o
Altamira Fortalecer diversidade passado com o
direito à
Sociedade
cultural regional presente
memória
Manter viva a
Preservar / Diversidade Registrar /
Anapu Difundir cultural regional Expor
memória Sociedade
cultural
Promovendo Manter a
Brasil Preservar / Cultura Regional
ações memória Para todos
Novo Promover da Transxingu
educativas regional viva

Senador Manter a Sociedade, Povos


Através de Exemplo,
memória Memória dos Indígenas e toda
José viva da povos da região
registros testemunho,
Comunidade em
Porfírio coletados continuidade
região geral
Compartilhar
Promover os
Conhecer, População local e
Vitória do constantes significados,
divulgar, Origem, cultura de outros
Xingu apresentações, alimentando o
valorizar municípios
atividades respeito à
diversidade

A partir dessas palavras se constituiu a missão institucional nos seguintes


termos: Preservar e difundir a diversidade cultural do Transxingu, estabelecendo
relações entre passado e presente através do registro, exposição e atividades
continuas que garantam a memória viva pelo testemunho e compartilhamento de
significados permitindo o acesso democrático à toda sociedade.

Quanto a identificação do Território Patrimonial, o termo TRANSXINGU se


consolidou e foi sendo apropriado ao longo das oficinas participativas. Como
uma mescla de dois referentes para os povos dessa região. O rio que se faz de
rua, a estrada que se desenha como um rio na floresta. Povos do rio, povos da
floresta que demonstraram ter os mesmos objetivos, apesar de suas realidades
diferentes, desejam para si e para as gerações futuras a valorização e difusão
de sua riqueza multicultural., construído pela comunidade em outras atividades.

Quanto a delimitação do repertório patrimonial, se definiu a utilização de acervo


digital, como exposição de longa duração, que será alimentado
permanentemente, e que os objetos da cultura material serão catalogados e
poderão integrar exposições temáticas temporárias.
O espaço museológico, foi definido no como parte integrante do complexo
cultural Casa de Memória, para ser um lugar de encontro, reflexão, difusão e
afirmação do patrimônio cultural da região do baixo e médio Xingu, apresentando
sua história de maneira dinâmica viva e interativa, seguindo tendências mundiais
de composição de espaço museais contemporâneos, em que o público é
convidado a imergir e interagir com o espaço tornando-se parte integrante e
integradora da exposição, tendo como referência os museus tecnológicos.

A proposta curatorial foi definida a partir do conceito do território patrimonial


Transxingu, definido pelos representantes dos cinco municípios durante as
oficinas participativas. O conceito, a ideia que irá ser o caminho de
motivação/reflexão no percurso da exposição, é um recorte temático, o qual foi
orientado pelas relações das comunidades atuais e antigas com a floresta (terra)
e com o rio (água), refletindo assim as diferentes relações do homem com a
natureza.

O rio é o percurso natural da água, geralmente doce, que recorta o verde e


colorido das matas e também o cinza do concreto que dá forma às cidades. A
água que constantemente segue o seu fluxo – ora natural, ora canalizado – é
elemento essencial para surgimento e manutenção da vida, pois hidrata, nutre,
irriga, alimenta, transporta e gera energia.

A Terra é suporte da vida, alicerce da floresta que cobre esta região, chão de
sonhos, conquistas e lutas. Sonhos trazidos por muitos, de vários lugares, e hoje
habitam as margens da estrada. A terra que prometeu e agora conta a história
de homens e mulheres que seguiram pela estrada da vida, demarcando a história
e a memória de um povo. A estrada e suas terras barrentas dão continuidade ao
rio de águas esverdeadas, e nesse momento de transição, o verde da floresta
está por todos os lados, seja na água, seja na terra. A estrada torna-se uma
extensão do rio, que leva para muitos lugares já conhecidos ou não.

Tomando o eixo longitudinal do espaço se criou o caminho das águas e o


caminho das terras. Nesses caminhos são apresentadas as categorias de
objetos catalogados e definidas no inventário: Lugares, Edificados, Celebrações,
Ofícios e modos de fazer, Formas de expressão e Histórias de vida. Ao centro
está localizado um estúdio, para que novas histórias sejam registradas. E ao
fundo foi desenhado uma sala de pesquisa, com todo o acervo catalogado
disponível para pesquisa.

Todo o material passou por um processo de edição e seleção para a exposição


de longa duração que está sendo montada. Paralelo a esse trabalho, se
desenvolveu o programa educativo, entre os outros programas previstos do
Plano Museológico. Considerando as experiências muito positivas de interação
entre museu e escolas, foi proposta uma formação com os professores de
escolas dos cinco municípios, com o objetivo de propor o despertar de sentido
de pertencimento e apropriação para que se tornem multiplicadores das ações
culturais que podem vir a acontecer nesse espaço.

Para essa formação de professores, seguimos a proposta participativa utilizada


nas oficinas com as comunidades dos municípios. Tomando os princípios já
citado de intencionalidade e reciprocidade, nos aprofundamos na Teoria da
modificabilidade cognitiva e a experiência de aprendizagem mediada,
defendidas e apresentadas pelo professor e psicólogo israelita Reuven
Feuerstein. Com a intenção de debater e difundir conceitos relacionados com o
acervo da Casa de Memória, mas que tivessem uma utilização mais efetiva
também nas salas de aulas, promovendo assim uma interação através da
seleção e interpretação dos diversos estímulos que estarão disponíveis no
espaço museológico da Casa de Memória.

Privilegiamos os grupos de professores que atuam nas zonas rurais dos


municípios, pelo fato de possuírem mais limitações de acesso aos núcleos
urbanos. Realizamos o mapeamento desses professores e solicitamos que eles
criassem as demandas para as formações, divididas em quatro etapas: a
primeira seria feita a apresentação do projeto da Casa de Memória, a segunda
e terceira com abordagem do tema de interesse dos professores e a quarta será
realizada no espaço já pronto, momento no qual os professores receberão o
material educativo que está sendo desenvolvido para esse fim. Entre os temas
eleitos pelos professores estão os seguintes: Patrimônio Material e Imaterial,
Jogos e Patrimônio, Elaboração de projetos culturais, Cartografia e Patrimônio,
A Base Nacional Comum Curricular e o Patrimônio Cultural, Educação
Patrimonial nas classes multisseriadas8.

Observamos que as demandas não estavam somente relacionadas ao espaço


geográfico da Casa de Memória, mas considerando as distâncias da zona rural
e a sede do município de Altamira no qual está localizada a Casa de Memória, a
intenção desses professores, de fato estava relacionada em ir além de uma
necessidade imediata de conhecer e difundir o espaço museológico, mas acima
de tudo, queriam conhecimentos de como promover experiências no próprio
espaço escolar de valorização e apropriação da própria histórica cultural dos
locais.

Entendemos que esse fator nos impelia ao encontro da teoria Aprendizagem


mediada de Feuerstein, quando se reporta não somente a intencionalidade e
reciprocidade, mas também a transcendência e significação. Envolvendo
aspectos sociais, éticos, valores e estratégias que permitissem superar uma
realidade imposta pelos ciclos econômicos, permitindo assim atribuir e
ressignificar os eventos que contavam a história pessoal de cada pessoa desse
lugar, que sofreram transformações, mas nem por isso deixaram de ter
importância e relevância cultural, a partir de uma lógica construída
horizontalmente de forma mediada e participativa. Esse diálogo funcionou como
um feedback para as perspectivas de intenções que se organizam quando se
inicia um projeto.

Nesse processo de construção da Casa de Memória, a organização institucional


baseada nos aspectos legais do Estatuto de Museus, junto com a comunidade
que alimentam as manifestações culturais dessa região, ao lado de professores
que estão nas escolas da zona rural dos cinco municípios, vivendo um pouco a
realidade local de múltiplas culturas fomentada nos fluxos de migração motivada
pelos ciclos econômicos, foi possível refletir principalmente sobre os conceitos e
práticas subjacentes às experiências no campo da educação e ação cultural
acumuladas em nosso percurso profissional.

8
As classes multisseriadas é uma organização de ensino no qual o professor que ministra conteúdos de
diversas séries para alunos de diferentes idades em uma única sala de aula.
As dinâmicas que se estabelecerão na Casa de Memória são imprevisíveis.
Nossa ação não irá além de provocar a apreensão de um ponto de vista, também
percebido nas relações estabelecidas no diálogo com os partícipes locais. Mas
a intenção de deixar um caminho aberto para a captação de novos pontos de
vistas, através de novas entrevistas a serem produzidas no estúdio que integra
o espaço museológico, evidencia a proposta de estabelecer relações de
reciprocidade de escuta e diálogo permanente com àqueles que de fato vivem e
experimentam no seu cotidiano os acontecimentos que se desdobram nessa
região.

Pensar em um museu ou espaço museológico, é pensar em educação e ação


cultural. Se o espaço institucionalizado é o cérebro, que articula o comando e
direcionamento de todas as ações, a educação é o coração e as ações culturais
as artérias de condução. Estas carregam os fluxos da educação, trazendo para
fora, no sentido expresso do significado do verbo educar, todo o conhecimento
apreendido e promovido pelos agentes internos do museu. Fazer a mediação
entre agentes internos da Casa de Memória e seus visitantes, pela própria
natureza à qual se propõe a criação desse espaço, é promover a percepção de
transformações pelas quais o mundo e as pessoas passam, a partir de uma
perspectiva de dentro para fora. Reconhecendo assim que o conceito que temos
do mundo não é resultado da nossa percepção de mundo, e sim o inverso: a
nossa percepção de mundo é decorrente do conceito que formamos pelas
nossas expectativas e experiencias vivenciadas no mundo9. E os conceitos que
formamos são passíveis de mudanças provocadas muitas vezes pela mediação.
Seja através de evidências concretas ou de motivações transcendentes, que
exige, justamente pela nossa condição humana a participação de outros iguais
ou diferentes, mas que se encontrem no mesmo processo de busca de
questionamentos que mantenham o fluxo de expectativas e cultivo da
esperança.

Nesse ponto o próprio Rio Xingu se encarrega de nos dar as principais lições: os
contornos de obstáculos, que tornam o seu curso d’agua sinuoso não significam

9
SOUZA, Ana Maria Martins de. A mediação como princípio educacional: bases teóricas das
abordagens de Reuven Feuerstein. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2003, p. 49.
a covardia, a fuga do embate. Significam antes de tudo a intencionalidade de
manter o fluxo, a reciprocidade de trocar de direção, a transcendência de ir para
além do aqui e agora e o significado transmitido de geração a geração da
necessidade de permanecer e resistir na memória. Esse talvez seja o ponto de
partida para se promover uma ação cultural.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Decreto 8.124, de 17 de outubro de 2013. Regulamenta a Lei 11.904/2009.


Brasília-DF, out 2013.

BRASIL. Lei 11904, de 14 de janeiro de 2009. Institui o Estatuto de Museus e dá


outras providências. Brasília-DF, jan 2009.

ICOM. “Mesa Redonda de Santiago do Chile, 1972”, e “Declaração de Caracas, 1992”


in PRIMO, Judite. Museologia e Património: Documentos Fundamentais, Cadernos de
Sociomuseologia, nº 15. Lisboa: Universidade Lusófona, 1999, pp. 105-115 e pp.229-
249

KIRCHOF, Edgar. Estética e Semiótica: de Baumgarten e Kant a Umberto Eco.


Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.

PRATT, Mary Louise. Os olhos do Império: relatos de viagem e transculturação.


Tradução Jézio Hernani Bonfim Gutierre. Bauru, SP: EDUSC, 1999, pp.11-38.

RUBIALES, Ricardo. Mediación y Museos: notas de museos e interacciones


humanas. (2009). [ebook] México: Ricardo Rubiales. Disponível em:
http://educacionenmuseos.com/wordpress/rr/ Acesso em 04 de agosto de 2018.

SOUZA, Ana Maria Martins de. A mediação como princípio educacional: bases
teóricas das abordagens de Reuven Feuerstein. São Paulo: Editora SENAC São
Paulo, 2003.

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