Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
- 1º Semestre -
Bibliografia:
● Cruz, Sebastião – Direito Romano (ius romanum); 1 Introdução. Fontes; 4ª
Edição; Coimbra, 1984.
2. Noção real:
Ius (direito) é tudo aquilo que tem especiais atinências com o iustum (o justo, o exacto,
o devido). Ius pode ser tomado em vários sentidos. Muitos autores enumeram 26
acepções, a saber 6 delas:
Sentido normativo: Ius é a norma jurídica, o conjunto de normas jurídicas ou o
ordenamento jurídico, que determina o modo de ser ou de funcionar duma
comunidade social, ou ainda de princípios jurídicos.
3
3. Sentido muito amplo (sensu latíssimo):
Diz respeito a tudo que é direito romano. É a junção do direito romano stricto sensu
com o direito romano lato sensu (tradição romanista).
Segundo o critério político, as fases do Ius Romanum são tantos quantos os períodos da
história política de Roma. Teve 4 épocas:
• 1ª Época: Época Monárquica (753 a.C. a 510 a.C.);
• 2ª Época: Época Republicana (510 a.C. a 27 a.C.);
• 3ª Época: Época Imperial (27 a.C. a 284 d.C.);
• 4ª Época: Época Absolutista (284 d.C. a 565 d.C.).
Crítica: Este critério, não pode ser utilizado como critério - base, muito menos como
critério exclusivo, para fixar as várias épocas do Direito Romano, pois nem sempre e
nem só as transformações políticas de Roma influem na evolução do Ius Romanum.
Além disso, quando há influência, a evolução do Ius Romanum e a das instituições
políticas de Roma não são simultâneas; primeiro verifica-se a evolução das instituições
políticas e só mais tarde a do Ius Romanum. Todavia, este critério não deve ser
totalmente posto de parte, pois o Ius Romanum, sob certo aspecto, é uma manifestação
do poderio político de Roma. Por isso, deve ser utilizado, não só como critério
secundário para ajudar a estabelecer a periodização fundamental, mas até, por vezes,
como critério principal para se fazerem certas divisões ou subdivisões em determinada
época, período ou etapa.
Crítica: Embora este critério tenha a sua importância, não deve ser usado como
principal, pois não nos indica duma forma directa, a evolução do direito privado de
Roma, mas sobretudo a evolução do (chamado) direito público de Roma. Mas este
4
critério pode ser utilizado para estabelecer ou caracterizar alguns períodos ou etapas de
certas épocas.
O critério jurídico é externo, quando nos dá uma visão jurídica do Ius Romanum.
Segundo este critério, o Direito Romano dividir-se-ia em 3 períodos históricos:
• Período do Direito Romano nacional ou quiritário (753 a.C. a 242 a.C.);
• Período do Direito Romano universal ou do ius gentium (242 a.C. a 395/476);
• Período do Direito Romano Oriental ou Helénico (395/476 a 565).
● Época Arcaica (753 a.C., data da fundação da Urbs até 130 a.C., data da
promulgação da lex Aebutia de formulis)
É o período de formação e do estado rudimentar das instituições jurídicas romanas,
sobre as quais, muitas vezes, somente podem formular-se hipóteses, devido à escassez
de documentos.
A principal característica é a imprecisão: não se vê ainda bem o limite do jurídico, do
religioso e do moral; estes três mundos formam como que um todo, um só mundo; as
instituições jurídicas surgem sem contornos bem definidos, como que num estado
embrionário.
5
● Época Clássica (130 a.C. A 230 – em 228, Ulpianus é assassinado):
É o período de verdadeiro apogeu e culminação do ordenamento jurídico romano. Por
isso, a época clássica muito justamente é considerada modelo e cânon comparativo para
as épocas posteriores e etapa final da evolução jurídica precedente.
As principais características são a exactidão e a precisão. A grandeza do Direito
Romano encontra-se nesta época. A casuística serve para estilizar o Direito Romano. Os
jurisconsultos romanos da época clássica tinham subtileza, mas não especulação;
sobretudo, eram dotados duma intuição jurídica penetrante. O Direito Romano clássico
é, pois, de artífices, mas não de especulativos. Sabiam, não apenas interpretar e aplicar
as normas aos casos concretos, mas sobretudo criar a norma adequada para um caso,
especial e não previsto nas normas já existentes. Daí que a ciência jurídica
(jurisprudência) da época clássica fosse permanentemente fecunda e criadora.
A época clássica não é toda igual. A divisão desta época assenta em 3 etapas:
I – Época Pré-Clássica: (130 a.C. a 30 a.C.) É um período de intenso desenvolvimento
ascensional em direcção ao estado de grandeza do Ius Romanum atingindo a época
seguinte;
II – Época Clássica Central: (30 a.C. a 130) É o período de esplendor e de maior
perfeição do Direito Romano, surgindo, como figura central e representativa, não só
desta etapa mas de toda a época clássica, Iulianus.
III – Época Clássica Tardia: (130 a 230) É um período em que já se nota, por vezes, o
início de certa decadência, manifestada sobretudo na falta de génio criador. Por isso, os
jurisconsultos deste final da época clássica dedicam-se não já a obras de comentário,
mas às de compilação – repetir e coordenar o que os grandes mestres disseram.
6
principiavam a invadir o Império. A esse Direito Romano pós-clássico ocidental
corrompido, chama-se Direito Romano Vulgar.
No Oriente, a partir de 395 essa confusão manifesta-se através de uma reacção contra
certas manifestações vulgaristas isoladas. Nisto consiste precisamente o classicismo –
uma tendência intelectual que pretende valorar e imitar o clássico e reagir contra as suas
deturpações. A par deste espírito classicista verifica-se um progresso do Ius Romanum
sob a influência da filosofia e direitos gregos. É a helenização do Ius Romanum, a
mecânica dos conceitos, aplicada no campo jurídico, faz realçar as contradições ou
ambiguidades textuais, apresenta as dúvidas surgidas na interpretação, cita as opiniões
contrárias, numa palavra, enfrenta a dificuldade para depois a superar, apresentando a
solutio do caso. É ainda devido à influência do helenismo que no Direito Romano pós-
clássico oriental se nota uma tendência para as Regulae Iuris, para as Definitiones, para
a generalização, etc.
7
Direito e Política em Roma (pp.56 S. Cruz):
A conexão de carácter privatístico, entre direito e política em Roma é, pois, bastante
clara a partir de Augusto, tornando-se evidente no Baixo-Império.
Mas também já existia antes de Augusto, quando os jurisconsultos tinham autoridade
social proveniente da sua linhagem. A jurisprudência, fonte principal do ius, não era
uma simples profissão, mas um ministério. Dar respostas, aconselhar, orientar a vida
das pessoas nas suas dificuldades sobretudo em casos de litígio, isso era próprio da
aristocracia. Portanto, certos nobres, criavam e exerciam influência profunda e segura
sobre os seus clientes. Estes, para recompensarem os grandes favores dos conselhos
recebidos, prestavam indefectivelmente o serviço de apoiar o seu jurisconsulto nas lutas
eleitorais.
A conexão de carácter publicístico, entre Direito e Política em Roma é reconhecida e
afirmada por todos os autores. Política e Direito trabalham em uníssono para cumprir
uma missão de dimensão universal. A política romana, na sua multiplicidade de atitudes
é orientada não por efémeras ideologias mas por um sentimento profundo e perene da
perpetuidade e supremacia do Populus Romanus, concebido como uma sólida e forte
organização jurídica. A grande finalidade da política romana é manter firme o
ordenamento jurídico.
Quanto ao Povo, a sociedade romana, desde o início, era formada essencialmente pelos
patrícios (os aristocratas, a classe social elevada, que detinham todos os direitos) e pelos
plebeus (a classe humilde que não tinham regalias nem direitos). Daí que houvessem
lutas entre plebeus e patrícios: os plebeus desejavam a equiparação aos patrícios, eram
tão cidadãos como os patrícios; possuíam a condição de membros da civitas na
organização político-militar, que era feita por centuriae (organização militar) e tribus
(divisão territorial de carácter predominantemente militar).
O povo, detentor duma parcela do poder político, exercia os seus direitos manifestando
a sua vontade em assembleias, denominadas comícios (comitia). Estes celebravam-se,
dum modo obrigatório, em determinados dias, e também sempre que a entidade
competente os convocasse. Os comícios mais antigos e mais importantes foram os
comícios das cúrias (comitia curiata). De início, só os patrícios faziam parte das cúrias;
mas os plebeus também conseguiram acesso. Das várias atribuições que teriam os
comitia curiata da época monárquica deve destacar-se a investidura do rei no poder, por
meio da lex curiata de império. É bastante duvidoso que exercessem funções
legislativas; na República, as atribuições dos comitia curiata foram absorvidas pelos
comitia centuriata e pelos comitia tributa, conservando apenas as atribuições religiosas.
9
Magistratura (Magistrados): A palavra latina magistratus tanto significa o cargo
de governar (magistratura) como pessoa que governa (magistrado). Inicialmente, os
magistrados são os verdadeiros detentores do imperium (que anteriormente pertencia
aos reis). O imperium é um poder absoluto, um poder de soberania; os cidadãos não
podem opor-se ao imperium.
Limites ao imperium:
- Temporalidade: os magistrados normalmente têm um cargo anual;
- Pluralidade: o poder está repartido por várias magistraturas;
- Colegialidade: os magistrados reuniam se em colégios no entanto cada magistrado
estava encarregado de um determinado sector.
As magistraturas importantes eram: a dos cônsules, a dos censores, a dos pretores, a dos
questores e a dos edis curuis. Estas magistraturas designavam-se «magistraturas
ordinárias».
Poderes dos magistrados: «potestas», «imperium», e «iurisdictio»
A potestas era o poder de representar o Populus Romanus. Era comum a todos os
magistrados, mas cada um tinha esse poder, em maior ou menor grau, conforme a
Suas atribuições, dentro das quais podia vincular, com a sua vontade, a vontade do povo
romano, criando assim direitos e obrigações para a civitas.
O imperium era o poder de soberania. Continhas as seguintes faculdades:
1. Comandar os exércitos;
2. Convocar o senado;
3. Convocar as assembleias populares;
4. Administrar a justiça.
O imperium não é como a potestas comum a todos os magistrados, mas própria dos
cônsules, dos pretores e do ditador.
A iurisdictio é o poder específico de administrar a justiça duma forma normal ou
corrente. Era o poder principal dos pretores. Competia igualmente ao edís curúis, porém
só para organizar os processos litigiosos referentes às matérias em que eles deveriam
superintender, e também aos questores, mas só para administrar a justiça em causas
criminais. O pretor era um magistrado que tinha os 3 poderes: potestas, imperium
e iurisdictio.
No aspecto jurídico, a magistratura mais importante é a dos pretores, seguindo-se-lhe a
dos edis curuis e a dos questores.
Pretor: A palavra praetor, No início, era uma designação genérica para indicar o chefe
de qualquer organização. Por isso, os cônsules, que são os magistrados mais antigos,
considerados os imediatos continuadores dos reis como detentores do poder supremo, de
início intitularam-se praetores, isto é, «chefes militares».
Depois da criação da questura (cerca do ano 450 a.C.) e da censura (em 443 a.C.), a
palavra praetor ainda conservou um certo carácter genérico, pois era comum de
qualquer magistrado (cônsul, questor ou censor).
Em 367 a.C., além dos edis curuis, pelas Leges Liciniae Sextiae foi criada a
magistratura dos pretores. Então, pretor passa a significar apenas o magistrado
especificamente encarregado de administrar a justiça de uma forma normal ou corrente,
nas causas civis. Presidia à 1ª fase do processo, «fase in iure», onde era analisado o
aspecto jurídico da causa. Na 2ª fase, chamada «apud iudicem», é que se apreciava a
10
questão de facto, sobretudo o problema da prova, e se dava a sentença; esta fase
desenrolava-se perante o iudex, que não era magistrado mas um particular, e portanto
distinto do pretor.
A «fase in iure» era importantíssima; decisiva para a vida do processo; verificava-se um
ius – dicere, uma afirmação solene da existência ou não existência de direito que
concretizava-se num iudicare iuber (ordem dada pelo pretor ao juiz para proferir a
sentença conforme se provasse ou não determinado facto).
Na 2ª fase do processo, não há ius – dicere, mas um simples iu-dicare, um aplicar o
direito, isto é, julgar, decidir conforme uma ordem jurídica já anteriormente fixada.
De início só havia um pretor. A partir do ano 242 a.C., a administração da justiça é
distribuída por 2 pretores: o pretor urbano (praetor urbanus), encarregado de
organizar, dentro das normas do ius civile, os processos civis em que só interviessem
cidadãos romanos; e o pretor peregrino (praetor peregrinus), incumbido de organizar,
dentro das normas do ius gentium, os processos em que pelo menos uma das partes era
um peregrino, quer dizer, um non-civis.
Sempre que se fala de pretor, entende-se o pretor urbano. Este é a figura genial dentro
do Ius Romanum, o homem preocupado e totalmente dominado pelo espírito de justiça,
com a ânsia de atribuir a cada um o que é seu (suum cuique tribuere). Ele é o elemento
de ponderação colocado entre o ius e a lex. O pretor era o intérprete da lex, mas
sobretudo o defensor do ius.
O povo romano, vira-se confiante para Octávio, vendo nele o princeps civitatis, o
primeiro entre os cives, o mais indicado para restaurar a paz e a justiça, vencendo o caos
moral, político e económico dos últimos tempos. Octávio César Augusto aproveita-se
inteligentemente de todas as circunstâncias e afirma-se um político muito hábil quando
finge não querer nada, nenhumas honras, para consegui-las todas e todos os poderes.
Instaura uma nova forma constitucional – o principado (ainda hoje não se sabe bem o
que é o principado; os autores continuam a discutir a natureza de vários problemas do
principado). Pode se dizer que o principado era uma monarquia sui generis, de
tendência absolutista, baseada no prestígio do seu fundador, mas sem desprezar as
estruturas republicanas existentes (era um império com aparências republicanas e
democráticas).
Princeps: A grande novidade trazida por esta reforma constitucional, instaurada no ano
27 a.C., é a criação do princeps. É a figura central da nova constituição política.
Acumula uma série de títulos (Augustus, Imperator, Pater Patriae) e de faculdades que
lhe são outorgadas pelos órgãos republicanos sobreviventes.
O princeps não é um magistratus. Encarna um novo órgão político, de carácter
permanente, investido de um imperium especial e da tribunicia potestas contrastando
com as características das magistraturas republicanas (temporalidade, pluralidade e
colegialidade). Augusto vai, pouco a pouco, concentrando na figura do princeps, o
imperium das magistraturas, a auctoritas do senado e, sob certo aspecto, a maiestas do
povo.
As antigas magistraturas republicanas, na aparência, mantêm-se, mas o seu poder é
quase irrelevante; estão subordinadas ao princeps e numa situação de colaboração
forçosa; transformam-se em funcionários executivos, nomeadamente os cônsules e os
pretores.
Com a morte de Augusto, ficava aberto o caminho para o despotismo e para o
absolutismo, para a monocracia, que vem a instaurar-se como forma constitucional em
284.
Senado: A princípio, ganha uma certa importância. As suas decisões (senatusconsulta)
12
durante um século têm carácter legislativo.Com Augusto, perde grande parte da sua
autoridade política, que vai passando para o princeps. No final do principado, os
senatusconsulta são meros discursos do imperador.
Povo: Os comitia não foram abolidos; mas, pouco a pouco, deixam de funcionar. As
suas atribuições passam em parte para o senado, mas sobretudo para o exército.
Característico do principado é a criação dum corpo burocrático de funcionários –
oficiais da casa do princeps, que hão-de chegar a fiscalizar tudo. Estes funcionários
dependem unicamente do imperador, respondem exclusivamente perante ele e
administram o Império segundo uma directriz burocrática.
13
Dominado (284 a 476)
Os cinquenta anos antes da subida de Diocleciano ao poder, verificada em 284,
caracterizam-se por:
1. Lutas internas, por causa do problema da sucessão dos imperadores e ainda por
causa da exigência manifestada por várias províncias de quererem equiparar-se a
Roma;
2. Falta de prestígio da autoridade pública;
3. Conflitos entre o Império Romano e o Cristianismo;
4. Crise económica;
5. Infiltração dos bárbaros;
6. Demasiada extensão do Império.
14
f) Tradição Romanista: Direito Romano lato sensu (pp.91 S. Cruz):
Estudo do Ius Romanum (séculos VI a XX)
Primeiro Período (séculos VI a XI):
No Oriente, o estudo do Ius Romanum ainda é feito com esplendor.
Depois da queda do Império do Ocidente (476) e mesmo depois da compilação do Ius
Romanum e da morte de Justiniano (565), o estudo de Direito Romano no Oriente,
continua a ser feito ainda com bastante elevação.
A literatura jurídica é abundante e variada. De início, além de obras de tradução,
escrevem-se comentários breves ao CIC, os escólios; depois surgem os trabalhos de
síntese, reelaboração e de confronto de várias partes da compilação Justinianeia; e
finalmente, aparecem obras autónomas, entre as quais devem sublinhar-se, a Écloga
(séc. VIII), os Basílicos (direitos dos reis; séculos IX e X) e o Hexábilos (século XIV).
15
2) Escola dos Pós-glosadores ou comentadores, de Perusa (sécs. XIII a XV)
Estes juristas empregam o método dialéctico ou escolástico e comentam já não
directamente o CIC, mas sim as glosas dos séculos XII e XIII, sobretudo a «Magna
Glosa de Acúrsio». Eles são os verdadeiros fundadores da ciência jurídica pois o
comentário penetra no sensus da norma enquanto a glosa preocupa-se unicamente com a
letra da norma. As figuras principais desta escola foram: Cino de Pistoia, Baldo e
Bártolo. As escolas dos glosadores e dos pós – glosadores formam o chamado sistema
do «mos italicus», em que a finalidade do estudo do Direito era essencialmente prática.
16
g) Direito Romano sensu latíssimo (pp. 101 S. Cruz):
O Direito Romano sensu latíssimo compreende o Ius Romanum vigente em Roma e no
seu Império durante 13 séculos, assim como a tradição romanista que já conta 14
séculos.
Essa tradição romanista, (quer do Ocidente, quer do Oriente, e quer dos países que
tiveram a «recepção» quer dos outros países do resto do mundo que sentiram
simplesmente qualquer espécie de influência do Direito Romano) é formada
estruturalmente pelo direito do CIC. Esse direito, porém, foi adaptado às necessidades
dos tempos, modificado principalmente por elementos jurídicos canónicos, cientificado
segundo as directrizes das várias escolas.
h) Concepçoes Jurídícas modernas aplicadas ao Direito Romano (pp. 45-58 Santos Justo):
Há uma série de conceitos fundamentais que estão na base da ciência do direito. A
formação desses conceitos resulta da evolução histórica, onde participaram os
glosadores, comentadores e pandectistas:
1. Direito objectivo:
É o conjunto de normas jurídicas que disciplinam a conduta humana na sua vivência em
sociedade. Os romanos não tinham este conceito, apenas distinguiam ius civilis
romanum, ius honorarium e ius gentium.
O Direito Romano rege-se pelo princípio da personalidade que se aplica exclusivamente
aos cidadãos romanos. Há excepções: os estrangeiros que gozam do ius commercii,
podem transmitir a propriedade por mancipatio, contrair obrigações por stipulatio e se
tiverem o ius conubii, podem contrair núpcias. O pretor também lhe concedeu a
possibilidade de demandar e ser demandado em tribunal.
Quanto ao âmbito espacial, o Direito Romano respeitou a autonomia jurídica das
cidades aliadas ou conquistadas que, continuaram a viver segundo os seus direitos; no
entanto, este princípio sofreu, na prática desvirtuamentos: nas províncias, os edicta dos
governadores, redigidos segundo a lex provinciae, respeitavam o direito indígena mas
lentamente foram acolhendo normas do ius gentium e normas do edictum do pretor
urbano. Assim, existiam vários regimes jurídicos que se aplicavam simultaneamente:
direito indígena, Direito Romano especial (provincial) e o Direito Romano de Roma.
O Edictum Perpetuum de Iulianus, eliminou as diferenças entre os éditos dos pretores e
dos governadores das províncias e criou um único édito.
Em relação ao âmbito temporal das normas jurídicas, rege o princípio da não
retroactividade justificado pela necessidade de respeitar os direitos adquiridos e de
transmitir segurança ao trafico jurídico. Contudo, este princípio é derrogado quando,
por exigência da vida social, a lex manifesta expressamente o carácter retroactivo; e a
lex nova faz a interpretação da lei anterior ou limita-se a desenvolver os princípios
contidos na lex antiqua.
2. Subsunção:
A norma que a fonte do direito oferece apresenta-se frequentemente na forma duma
proposição condicional (ex. se A matar B, A vai preso). O facto constitui a previsão ou
hipótese; as consequências, a estatuição ou coacção. A norma é aplicada pelos
particulares que se abstêm de praticar actos proibidos, concertam as suas relações
17
jurídicas segundo esse modelo ou cumprem espontaneamente as obrigações assumidas.
Na falta deste acatamento voluntário, o juiz aplica a norma auxiliado por jurisconsultos,
por isso o juiz constitui o órgão especialmente vocacionado para interpretar e aplicar o
direito.
3. Cessação da vigência:
É quando uma norma deixa de vigorar. O povo ou o legislador, que oferece a norma
jurídica, pode fazer cessar a sua vigência. O costume deixa de vigorar quando o povo
pratica actos contrários (costume contrário) ou deixa de o observar (desuso). Pode
também ser revogado por uma lex, embora os romanos tivessem um elevado respeito
pelo costume.
A lex pode deixar de vigorar por:
- Caducidade: a própria lex contém um determinado prazo de vigência, findo o qual
cessa.
- Revogação:
_Abrogatio: a lex posterior retirar a vigência total da lex anterior;
_Derrogatio: a lex posterior retira a vigência parcial da lex anterior;
_Expressa: decorre directamente da lei que se revogará;
_ Tácita
- O costume contra legem: tendo a lex e o costume o mesmo valor, o costume pode
cessar a vigência da lex se esta o contradizer. Em 319, a constituição de Constantino
reconhece a grande autoridade do costume mas determina que não pode afastar a razão
ou a lei, mas a lei pode cair em desuso ou ser simplesmente ignorada.
4. Direito Subjectivo:
A ordem jurídica reconhece aos particulares várias faculdades ou poderes de actuação
que constituem direitos subjectivos, que manifestam a autonomia individual; no entanto
dependem do reconhecimento de personalidade e de capacidade jurídica (de gozo ou de
exercício).
Noção: É o poder ou faculdade de exigir de outrem, um comportamento activo ou
negativo/ facere ou non-facere/ de per si ou integrado num acto de autoridade pública
que se impõe a outra pessoa/ adversário ou contra-parte.
Quando, nos limites reconhecidos pelo direito objectivo e no uso da sua autonomia
individual, um indivíduo dita normas que ordenam a sua conduta e mesmo a conduta
alheia, estas normas adquirem uma posição semelhante às definidas pelos órgãos do
Estado, ou seja, são designadas leges privatae (ex: lei das XII tábuas).
Os direitos subjectivos podem ser:
18
(2) Direitos subjectivos processuais:
Traduz-se no direito de pedir a concessão de uma:
a) Actio: para tutelar um direito subjectivo material.
b) Exceptio: para invocar factos susceptíveis de conduzirem à improcedência da
actio.
6. Interpretação:
É um acto metodológico que procura determinar o sentido normativo de uma fonte
jurídica: obter uma norma (ou critério) jurídica que permita decidir um problema que
reclama uma solução jurídica.
A sua índole não é simplesmente hermenêutica ou exegética mas normativa: procura
assimilar o sentido jurídico normativo ao problema concreto, de modo a que possa ser
um critério juridicamente adequado de uma justa causa.
Para interpretar a norma, são necessários elementos:
(1) Elemento gramatical: é a letra, é a análise da letra da norma jurídica.
(2) Elementos lógicos:
a) Históricos: a norma normalmente aparece num determinado estado
jurídico e necessita do estudo histórico da época;
b) Sistemático: a norma não aparece isolada, está dentro de um sistema de
normas jurídicas;
c) Teleológico (objectivo): que objectivo se pretende com aquela norma.
19
Havia provérbios entre os romanos que traduzem as práticas jurídicas não romanas:
- Onde quer que haja a mesma razão da lei, a disposição da lei deve ser a mesma;
- Cessando a razão da lei, cessa a própria lei;
- Onde a lei não distingue, não deve o intérprete distinguir (com situações diversas);
20
para não se criarem institutos híbridos. Também não existiam muitos conceitos (pessoa,
capacidade jurídica, negócio jurídico…) e quando existiam, muitas vezes eram
imperfeitos.
4) Diferenciação de conceitos: houve uma grande tendência para diferenciar os
conceitos, manifestando-se na separação do jurídico, dos usos sociais e das regras
morais.
5) A força da tradição: A evolução das instituições jurídicas foi lenta, prudente e
conservadora: raramente o direito anterior é derrogado, apesar de inadequado. No
âmbito das antigas instituições, o respeito pela tradição explica que o sistema do ius
civile tenha subsistido ao lado do ius honorarium, etc.
6) Ponderação e coordenação de liberdade e autoridade: para os romanos a liberdade
tinha um significado próprio, diferente da liberdade grega. Era a faculdade natural de
fazer o que se quer a não ser que seja proibido pela força ou pelo direito. O direito
privado reconhece à liberdade 2 aspectos diferentes:
- No reconhecimento, pelas instituições jurídicas privadas, de um carácter
predominantemente individualista que se manifesta numa acentuada hostilidade a todos
os limites impostos à autonomia particular;
- No reconhecimento de um largo âmbito de actuação à autonomia individual. No
Direito Romano privado a liberdade e a autoridade não se excluem, antes pressupõem-
se reciprocamente: liberdade sem autoridade é anarquia e autoridade sem liberdade é
tirania.
7) Os jurisconsultos consideraram diversos vínculos e meios coercivos sociais e
morais: Fides, Officium, Humanitas e a Amicitia:
- Fides: significa ter fé. Inicialmente corresponde ao compromisso que uma pessoa
assumia com outra e mais tarde corresponde ao procedimento fiel do que se
comprometera. Tinha força moral, nela se fundamentava a força do juramento. Tinha
sanções!
- Officium: implica um comportamento perante os outros: obriga-nos a ser úteis e a
prestar serviços desinteressadamente. Exemplos de situações disciplinadas pelo dever
moral que caracterizam o officium são: a tutela, o patronato, a potestas do paterfamilias
e a sucessão legítima contra o testamento. O officium é gratuito.
- Humanitas: é a obrigatoriedade de respeitar e valorizar a pessoa humana com vista a
obter um maior grau possível de perfeição. É um dever meramente moral.
- Amicitia: foi um valor importante na esfera moral e social e no campo jurídico. É a
garantia que o fiador dá ao credor.
21
Título II: Fases características do dto romano (pp. 27, Santos Justo):
a) Ius e fas:
Primeiramente, a religião e o direito confundiam-se, distinguindo-se os actos em lícitos
ou ilícitos, segundo a vontade ou não dos deuses. Fas, começou por designar os actos
lícitos; depois de um processo de abstracção, começou a significar norma ou conjuntos
de normas que estabelecem o que é permitido aos homens pelos deuses e cuja
desrespeito é sancionada com penas religiosas (equivale a ius divinum).
Ius, inicialmente significava o que era lícito, ou seja, o que era permitido pela vontade
divina (faz = ius); contudo, ius veio a evoluir em dois sentidos: o de jus divinum
(constituído por normas que disciplinam as relações entre homens e deuses) e ius
humanum (formado por normas que regulamentam as relações entre os homens).
Assim, é possível dizer que ius confunde-se com faz na acepção de ius divinum, mas
afasta-se deste no sentido de ius humanum.
c) Iuris praecepta:
São princípios jurídicos. Ulpianus aponta-nos três princípios fundamentais que
espelham a unidade entre a religião, moral e direito:
1) Viver honestamente (dependente das 4 virtudes cardeais: prudência, temperança,
fortaleza e justiça);
2) Não prejudicar os outros;
3) Atribuir a cada um o que é seu;
Trata-se de princípios fundamentais do direito e, por isso, são essenciais a qualquer
norma jurídica.
22
d) Ius publicum e ius privatum (direito público e direito privado):
Primitivamente, as relações do populus eram disciplinadas pela lex e as relações dos
cives eram reguladas pelo ius civile. Quando a lex tornou se fonte do direito, a
contraposição ius – lex foi substituída pela distinção entre ius publicum e ius privatum.
Ius publicum pode ser entendido em dois sentidos:
I) Direito criado pelos órgãos estatais: são normas que derivam da Lei das XII
tábuas e das outras leges publicae (lex rogata, plebiscitum, senatusconsultum,
contitutio imperial) ==> o ius publicum é criado pela lex (publica) enquanto o ius
privatum é constituído por normas e princípios conservados e elaborados pela
Jurisprudência.
II) Direito que disciplina a organização política e o funcionamento dos poderes
públicos nas relações internas e internacionais.
O Estado romano nas relações com os particulares não desprendia se do ius publicum;
os actos de administração do imperador deviam se submeter às normas de ius privatum.
O ius publicum e o ius privatum distinguem-se por vários critérios:
Critério dos sujeitos: é de direito publico quando as normas fossem sobre a cidade
e que regulassem a organização da mesma; são de direito privado normas que regem
relações entre particulares. Crítica: há relações entre o estado e cidadãos que estão
sujeitos a ius privatum (ex: o Estado quando arrenda um prédio para instalar os seus
serviços age como um privado).
Critério da utilidade: estava-se perante ius publicum quando as normas tenham
objectivos no interesse da comunidade social; pertence ao direito privado normas
que satisfaçam objectivos de necessidade dos particulares. Crítica: Nem sempre os
interesses da colectividade e dos particulares se contrapõem. Muitas vezes são
coincidentes, implica ver em cada momento se satisfaz interesses públicos.
Critério do afastamento: estamos perante direito público quando as normas não
podem ser afastadas pela simples vontade dos particulares; e estamos perante direito
privado quando as normas que podiam ser afastadas pela vontade dos particulares.
Crítica: Há normas que proíbem os pactos que lhe apanham (ex: direito relativo aos
menores); Há normas de direito a que não se pode prescindir.
Critério dos sujeitos: é de direito público a organização e a actividade do Estado e
de direito privado, as normas que regulam as relações entre particulares.
e)Ius scriptum e ius non scriptum (direito escrito e direito não escrito):
Ius scriptum é o direito escrito, de acordo com o Corpus Iuris Civilis. São normas de ius
scriptum a lex, plebiscito, senatusconsultum, éditos dos magistrados, constituições
imperiais, respostas dos jurisconsultos. Pertence ao ius non scriptum o costume
(designado inicialmente por mores maiorum e posteriormente denominado por tácito
consenso do povo), a interpretação e o ius gentium.
f)Ius civile, ius praetorium e ius honorarium (direito civil, pretório e honorário):
O ius civile é o direito próprio de uma civitas (cidade). Segundo Papinianus, as suas
fontes são: a lei, os plebiscitos, os senatusconsultos, as constituições imperiais e a
jurisprudência; e Iulianus juntou-lhe o costume. No início era chamado de quiritário
(Quirites eram os primitivos cidadãos romanos). O ius civile era um direito formalista e
23
rígido; as suas normas regulavam as relações jurídicas onde intervinham os poderes
pessoais do paterfamilias.
Em 367 a.C., foi criado o pretor urbano (um magistrado especial para ministrar a
justiça); os seus poderes era o imperium, potestas e a iurisdictio; as suas funções eram:
Conceder e denegar actiones;
Coagir as partes a assumirem determinadas obrigações (stipulationes praetoriae);
Dar a posse de bens em litígio (missio in possessionem);
Ignorar os efeitos jurídicos de um acto (restitutiones in integrum);
Concedia protecção processual a determinadas situações de facto (inderdicta);
Em 242 a.C., foi criado o pretor peregrino cuja função era a de administrar a justiça
entre cidadãos e peregrinos e entre peregrinos.
Em 67 a.C., a lex Cornelia de iurisdictione impôs obrigação jurídica de os pretores
respeitarem os seus éditos, para pôr termo aos abusos cometidos por alguns pretores.
Entretanto, o pretor começou a proteger casos não previstos pelo ius civile, criando um
novo sistema jurídico que constitui o ius praetorium.
Assim, surgiu um dualismo jurídico (o ius civile e o ius praetorium) que subsistiu até a
época Justinianeia.
O ius civile e o ius praetorium têm fontes diferentes: o ius civile tem como fonte a lei,
os plebiscitos, os senatusconsultos, as constituições imperiais e a jurisprudência
enquanto o ius praetorium tem como fonte o édito do pretor.
Diferente desta distinção é a noção de ius honorarium, constituído por todo o ius não
civile; resulta dos éditos dos magistrados e por isso, o ius praetorium é sinónimo do ius
honorarium.
24
o direito comum tinha carácter geral e o direito singular, carácter específico/ particular.
O ius singulare pode traduzir-se de duas formas:
I) Benefício (beneficium): caso em que o ius singulare traduz uma vantagem especial
à pessoa a quem se aplica (beneficium competentiae e beneficium inventarii).
II) Privilégio (privilegium): era uma pena ou medida desfavorável imposta a uma
pessoa por uma lex ditada nos comícios (a Lei das XII tábuas era um exemplo disto).
- Países onde tinha sido proibido o ensino: o ensino é retomado nas respectivas
universidades e com maior intensidade do que antes. Isto acontece, por exemplo com a
Alemanha e com a URSS.
- Países onde nunca tinha penetrado o ensino do Direito Romano: hoje também faz
parte dos respectivos programas universitários (na Pérsia, Israel, China e Japão).
25
se pode abrir para sair direito” (segundo Cícero).
Pode-se distinguir dois tipos de fontes de direito: fontes de ius civile (constituído por
leis, plebiscitos, senatusconsultos, constituições imperiais e jurisprudência) e fontes de
ius praetorium (resultava do direito elaborado e introduzido pelos pretores para
interpretar, corrigir e integrar o ius civile por motivo (razão) da utilidade pública).
- Historiadores (Políbio, César, Tito Lívio, Dio Cássio, Tácito, Suetónio, etc.)
- Gramáticos e etimologistas (Varrão, Valério, Probo, Festo, etc.)
- Escritores dramáticos (Plauto, Terêncio,etc.)
- Filósofos, retóricos e oradores (Cícero, Aulo Gélio, Quintiliano, etc.)
- Padres da igreja (Arnóbio, Minúcio Félix, Lactâncio, Sto Ambrósio, Sto Agostinho; Sto
Isidoro de Sevilha, etc.)
26
Fontes do Ius Civile
II) Fontes elaboradas no Ocidente, depois da queda do Império (em 476):
Compreendem:
Codex Euricianus
- Edictum Theodorici
Leges Romanae Barbarorum - Lex Romana Burgundionum
- Lex Romana Wisigothorum
c) Costume: mores maiorum, consuetudo e usus (pp.169, S. Cruz; pp.78, Santos Justo):
O costume, pela ordem do tempo e pela importância, é a primeira fonte manifestandi. A
sua fonte existendi é o populus. O Ius Romanum principiou por ser consuetudinário, ou
seja, um direito cuja fonte única, de início, era o costume. O conceito de costume para
os romanos, segundo muitos autores é divergente. Nas fontes jurídicas e nas fontes
extra-jurídicas romanas, aparecem três palavras para indicar, a ideia de costume: usus,
consuetudo e mores maiorum:
Mores maiorum: é uma expressão antiquíssima, a primeira usada para exprimir a ideia
de costume, e significa essencialmente «a tradição duma comprovada moralidade»;
uma tradição inveterada que se impunha aos cidadãos como norma e como fonte de
normas, nas suas relações recíprocas, limitando o exercício de cada um sobre a
superfície da terra romana, ou seja, uma regra distribuidora. Portanto, quando se fala de
mores maiorum, não se deve pensar num direito que nasce espontaneamente do tacitus
consensus populi (fundamenta a lei e o costume; tinham ambos o mesmo valor), visto
que para os romanos os princípios novos derivaram dos antigos (mores maiorum);
estavam ali contidos, bastava descobri-los. Competia aos juristas revelar os mores
27
maiorum.
Esta distinção começou a decair, talvez por não haver uma diferença substancial entre as
leges que declaram nulos os actos contrários (perfectae) e as leges que o pretor protege
(imperfectae).
As leges rogatae são citadas pelo nome adjectivado do magistrado proponente; e, por
vezes, junta-se o cognome e o pré-nome. Se a proposta parte de um cônsul, figuram os
nomes dos dois colegas adjectivados e unidos. E não raro surge uma indicação sumária
do seu conteúdo.
A actividade legislativa é escassa e quase sempre incidiu sobre matérias de direito
público. Com a queda do regime republicano e a afirmação do principado, a lex rogata
28
foi substituída pelos senatusconsulta.
Entretanto, a noção de lex estende-se passando a compreender não só as antigas leges
rogatae, mas também os senatusconsulta, o édito do pretor e as constituições imperiais.
29
justinianeia e passaram ao direito moderno.
31
se opor), usa expedientes próprios para criar direito (ius praetorium), mas de forma
indirecta
- 3ª Fase ( a partir de 130 a.C.)
A partir da lex Aebutia de formulis, o pretor, baseado na sua iurisdictio (poder
específico de administrar justiça dum modo normal), mediante expediente adequado,
cria também direito (ius praetorium) e agora duma forma directa (por via processual). E
assim que vários casos não previstos pelos ius civile, o pretor concede uma actio
própria, por isso denominada actio praetoria. E como em direito Romano ter actio é ter
ius, o pretor concedo actio, cria directamente ius.
Stipulationes praetoriae – é uma stipulatio como outra qualquer, que tem de específico
o facto de ser imposta pelo pretor (daí praetoria), a fim de proteger uma situação social
não prevista pelo ius civile e que merecia protecção.
I – Noção de stipulatio
É um negócio jurídico tipicamente obrigacional, por isso, destinado essencialmente a
criar obrigações.
A stipulatio consiste estruturalmente numa pergunta:
spondes mihi dare centum (feita pelo credor - « o stipulator»),
e numa resposta – spondeo (dada pelo devedor («o promissor»).
Esta pergunta e esta resposta unem-se de tal maneira que não formam uma pergunta -
resposta, mas «geram» algo totalmente novo: a obrigação. Por isso os romanos
chamavam à stipulatio « conceptio verborum »
Características da « Stipulatio » :
● solene – feito com a invocação e a presença espiritual dos Deuses, empregando-se a
palavra “spondeo” (usada primitivamente nas promessas feitas a deuses).
● formal – tinha uma forma jurídica, era realizado entre presentes, porque tinha de ser
usada uma fórmula própria, «sacramental» - spondeo mihi dare certum ?
spondeo (bastava a substituição ou alteração de uma palavra para o negócio ficar nulo.
● verbal - oral - Devia empregar-se palavras, não escritas, mas orais; é um negócio
verbal (verbis contrahere). (Não pode efectuar-se uma stipulatio, a não ser que ambas as
partes falem e estejam presentes.
● Abstracto – É um negócio jurídico, em que se prescinde da sua causa jurídica.
O « Stipulator » diz - prometes dar-me cem ? - e o Promissor responde - «prometo».
Mas nem um nem outro se refere se é em virtude de um empréstimo ou duma compra e
venda ou dum aluguer ou duma doação. Não se fala da causa jurídica desse negócio, ao
efectuar-se esse negócio.
O Pretor, baseado no seu imperium (poder de soberania a que ninguém ousa opor-se) –
decretando uma missio in possessionem ou até uma manus iniectio consegue
desvincular as partes. Aqui, nas restitutiones in integrum, ele, de início, ordena que as
partes se desvinculem. Numa palavra, «desfaçam» a stipulatio efectuada.
Conceito de «restitutio in integrum»:
«Restitutio» - deriva de restituere que procede de re+stature (= repor no lugar ou estado
anterior). «In integrum» - Por inteiro, integralmente, de novo – como estava antes.
Portanto, segundo uma definição nominal, restitutio in integrum (também designada
«integri restitutio») consiste no resultado de colocar as coisas no seu lugar, como
consequência de se considerar inexistente o negócio jurídico que originou tal situação;
voltar tudo à situação anterior à celebração desse negócio jurídico.
Definição real (conceito) – Restitutio in integrum ou integri restitutio é um expediente
do pretor, baseado no seu «imperium», a considerar como inexistente um negócio
jurídico injusto mas válido perante o «ius civile», fundamentando-se (o pretor) em
circunstâncias de facto para tomar essa disposição.
33
a) Dolo («Dolus») o termo não é unívoco. Tem vários significados, mesmo só em
Direito Romano, notemos apenas duas: 1 - Num sentido amplo, significa a intenção má
de prejudicar outrem, isto é, não só a vontade de realizar o acto mas também a
consciência de que esse acto é lesivo dos direitos ou interesses de outrem; O dolo como
vício de vontade, «Dolus bonus» e «dolus malus»; 2 - O dolo, como vício de vontade,
são os artifícios empregados para que outrem se mantenha num certo erro e manifeste a
sua vontade num determinado sentido, que, a saber a verdade, ou não manifestaria
qualquer vontade ou então manifestaria em sentido diferente.
34
(apreensão de bens).
Interdicta (interditos): Um interdictum (interdito) era uma ordem sumária, dada pelo
pretor baseada no seu «imperium», para resolver de momento uma situação que tem a
protegê-la pelo menos uma aparência jurídica, ficando porém essa ordem condicionada
a uma possível apreciação ulterior.
O interdictum era concedido ou a pedido dum interessado ou em caso de interesse
público, a pedido de qualquer cidadão, e denominavam-se «interdicta populares».
Os interdicta eram redigidos em termos imperativos.
Espécies de «interdicta»: Em virtude das expressões imperativas usadas nas fórmulas
dos vários interditos, estes podiam ser exibitórios, restituitórios e proibitórios:
▪ Exibitórios – se a ordem do pretor se destinava a que alguém apresentasse ou
mostrasse, exibisse uma coisa.
▪ Restituitórios – se a sua finalidade era ordenar a devolução, a restituição duma coisa.
▪ Proibitórios – se se destinam a impedir (proibir) que alguém fosse perturbado no gozo
dum direito que está desfrutando pacificamente.
► Entre as várias aplicações dos «interdicta», estão os relativos à posse - «interdictos
possessórios»: são expedientes do pretor destinados a proteger a posse, pois o «ius
civile» não lhe concedia protecção jurídica. Não formam uma espécie à parte de
interditos. Os interditos constituem uma das várias aplicações dos interditos.
» Classes de interditos possessórios:
1-retinendae possessórios (são proibitórios)
2-recuperandae possessionis (são restitutórios)
1- Interdicta retinendae possessionis (interditos para reter a posse) – Estes interditos têm
por objecto obter o reconhecimento da posse, no caso der perturbação ou incómodo por
parte de terceiros. Só se aplicam aos que estiverem a desfrutar uma posse pacífica, isto
é, obtida não por violência, nem clandestinidade, nem a título precário, quer dizer, por
favor. Os Interdicta retinendae possessórios podem ser «uti possidetis e utrubi»:
▪ Uti possidetis: eram interditos proibitórios concedidos para a defesa da posse de coisas
móveis. Podia ser concedido:
I – ao proprietário civil, isto é, aquele que tinha adquirido a (propriedade da) coisa por
um negócio jurídico, válido à face do ius civile; geralmente através da mancipatio.
II – ao proprietário natural – o que tinha adquirido uma coisa sem ser através de um
negócio jurídico, válido à face do ius civile; algo semelhante como hoje, comprar um
imóvel, pagar e não fazer escritura pública;
III – ao precarista – o que possui a título precário, mas só no caso de ser perturbado na
sua posse por alguém, diferente do dono da coisa, pois este tinha contra o precarista.
«interdicta recuperandae possessionis de precário»,
IV – ao credor de um penhor sobre coisa imóvel.
▪ Interdicta utrubi – eram interditos proibitórios concedidos para a defesa da posse de
35
coisas móveis. Podia ser concedido:
I – ao presumível possuidor.
II – ao sequester – pessoa imparcial, a quem se confiava em depósito uma coisa, sobre
que existia litigio, até se discutir em juízo e determinar a sua propriedade.
III – ao credor de um penhor sobre coisa móvel.
2- Interdicta recuperandae possessionis: (interditos para recuperar a posse) Estes
interditos possessórios são restitutórios. Destinam-se a recuperar a posse; de alguma
forma perdida, pelo menos momentaneamente pelos seguintes factos:
- ou porque alguém entregou, por favor, uma coisa a outrem, por certo tempo, e este
agora recusa-se a devolvê-la, e então para o obrigar a restituir há o «interdictum
recuperandae possessionis de precário»;
- ou porque alguém, que tinha obtido a posse de uma coisa, de uma forma normal, foi
privado dela pela violência, então contra quem se apoderou à força existe o interdictum
recuperandae possessionis unde vi»;
- ou, finalmente, porque alguém, embora tendo obtido a posse pela violência, foi, depois
esbulhado pela força armada, existe contra ele (que usou homens armados para expulsar
o outro que tinha conseguido a posse pela força simples) – o interdictum recuperandae
possessionis vi armata
36
A fórmula tem várias partes:.
1- Intentio: indica o estado da questão, a pretensão do
Partes ordinárias demandante (quem reclama);
2- Condemnatio: cláusula que manda condenar ou absolver o
demandado.
1- Demonstratio: se a intentio é incerta;
Partes eventuais 2- Adjudicatio: se a actio é divisória, ou se se trata de uma coisa
comum, objecto de discussão.
1- Exceptio: cláusula concedida directamente a favor do
Partes demandante;
extraordinárias 2- Praescriptio: cláusula concedida directamente a favor do
demandante.
Posição do pretor, depois da lex Aebutia de formulis (nova forma de processar), ara
além de subtrair ou colocar sob acção do ius civile, como já procedia até 130 a.C.,
também – sempre que a justiça ou a equidade assim o exigissem:
1 – a de neutralizar a actio civilis (ou recusando a concessão de actio [«denegatio
actionis»] ou inutilizando a sua eficácia concedendo uma «exceptio».
2 – a de criar actiones próprias
Desta forma, o pretor passou a integrar e a corrigir directamente o ius civile por via
processual.
Os novos expedientes do pretor, criados por via processual (lex Aebutia de formulis),
não vieram substituir os expedientes baseados no «imperium».
1- Para neutralizar uma «actio civilis», cuja aplicação redundaria numa injustiça, o
pretor tem à sua disposição, além duma «restitutio in integrum»:
• Uma denegatio actionis, se ele nega a concessão da actio civilis, pois verifica
nitidamente que essa concessão, embora prevista pelo ius civile, em determinado
caso concreto, seria uma evidente injustiça;
• Uma exceptio, pela qual se frustra a actio civilis, que ele mesmo concedeu. É uma
cláusula concedida directamente a favor do demandado, que inutiliza a pretensão
do demandante.
Desta forma, o pretor passou a integrar e a corrigir directamente o «ius civile» por
via processual.
37
um facto ou até um negócio que se sabe que existe.
• Actiones Utiles – se o pretor aplica, por analogia, actiones civilis a casos
diferentes, mas semelhantes, dos que o ius civile protege; aqui, há lógica, por
semelhança.
• Actiones adiecticiae qualitatis – são actiones que responsabilizam também o
«paterfamilias», total ou parcialmente, pelas dívidas de um seu filius ou servus,
provenientes de contratos celebrados por estes alieni iuris.
Formas utilizadas pelo pretor, nas concessões dos seus expedientes: «decreta» e
«edicta»: O pretor podia utilizar duas formas:
• ou o decretum (decreto), quando resolvia imperativamente te um caso particular;
• ou o edictum (édicto), quando anunciava ao público, com a devida antecedência, a
concessão de certos expedientes integrada num programa geral das suas actividades. A
forma normal, era através de éditos (edicta), pois, deste modo, o público sabia,
antecipadamente e de certeza, todas as hipóteses previstas pelos ius civilis ou pelo
pretor, nas quais este prometia ou não protecção jurídica. O «ius praetorium» nem
sequer aparentemente podia ser considerado arbitrário ou incerto; pelo contrário, a todos
inspirava confiança.
38
Os edicta do pretor eram afixados publicamente no «fórum» para que, sem dificuldade,
pudessem ser lidos, rectamente, terminavam sempre com a sigla, q.s.s.s., que significa
quae supra sunt scripta (é uma forma de mostrar que o édito é escrito). A princípio, o
pretor, não estava vinculado às disposições contidas no seu «edictum», pois o respectivo
conteúdo, para ele, era matéria arbitrária; mas, na prática, respeitava sempre as
promessas feitas, porque era até o mais interessado nisso, para não comprometer o êxito
do «ius praetorium». O seu comportamento estava bem controlado. Todavia, no ano 67
a.C., a «lex Cornélia» de «edictis praetorum» impôs ao pretor a vinculação ao seu
próprio edicta.
♦ Os edicta podiam ser:
• perpétua ou anual, os que eram dados pelo pretor, no início da sua magistratura,
contendo os vários critérios que seguiria, no exercício das suas funções durante esse
ano. Eram afixados no fórum, nas calendas de Janeiro.
• Repentina surgem, como actos do imperium do pretor, proferidos em qualquer altura
do ano, para resolver situações novas, surgidas inesperadamente, e que nem o «ius
civile» e nem o «edictum perpetuum» (anual) solucionavam.
• Tralaticia, os que permanecem iguais de um ano para o outro, como que trespassando
do pretor anterior para o sucessor.
• Nova são as disposições que o pretor, de determinado ano, acrescenta por sua
iniciativa.
Codificação dos «edicta» do pretor: O chamado “Edictum Perpetuum”:
Até à época de Labeo, há bastantes edicta nova; o carácter «tralatício» dos edictos
converte-se em fenómeno geral: não há necessidade de grandes inovações a fazer pelo
pretor; por outro lado, também dificilmente as poderia fazer, pois ele, como todos os
magistrados, está muito subordinado ao imperador. Assim, a decisão de Adriano (117-
138) foi de mandar codificar todos os edictos para serem fixados ordenada e
definitivamente num só, não constituiu um facto verdadeiramente novo ou estranho. O
imperador encarregou esse trabalho ao jurista Salvius Iulianus que levou cerca de dois
anos a efectuá-lo. Concluído e confirmado pelo senado que lhe estabeleceu
imutabilidade; foi publicado à volta do ano 130 d.C.; desde o séc. IV, é designado por
«Edictum Perpetuum» (ordenação definitiva dos edictos). Agora a palavra perpetuum
tem o significado de definitivo, não já de anual, como primitivamente. A existência do
«Edictum Perpetuum» ou «Ordinatum», de Iulianus, é atestada por várias fontes
(jurídicas e não jurídicas) e é admitido pelos autores, excepto por António Guarino.
Após a sua fixação em 130, o pretor quase se limitava a publicar, todos os anos, o
Edictum Perpetuum ou Ordinatum. Deste modo, o edictum perdeu a sua importância
como fonte autónoma para se converter quase num texto legal. Embora continue a ser
«ius praetorium» a verdade é que as alterações são dadas, não já pelo pretor, mas pelos
jurisprudentes, que escreveram sobre ele largos comentários, e sobretudo pelo
imperador, que principiava a concentrar nas suas mãos todas as fontes do direito.
Título IV – Período Romano na Penín. Ibérica: (pp. 67-98, Hist. Dto Português):
O direito existente na Península antes da romanização, é chamado de Direito primitivo
ou Ibérico.
A característica mais importante a evindenciar é que a Península não oferecia uma
unidade étnica, linguística, cultural, religiosa, política, económica ou jurídica; constituía
39
um conjunto muito diversificado.
Existe uma reconstituição muito fragmentária e insegura das instituições dessa época; as
fontes disponíveis também são muito escassas: restos epígraficos e arqueológicos e
também dados que se recolhem nas obras de escritores da Antiguidade. Muitas das
inscrições encontradas, além de redigidas em latim e grego, também estão escritas em
línguas desconhecidas. Além disso, muitas das obras abordam temas sem a mínima
conexão com o direito; outras, fornecem esclarecimentos importantes sobre as
instituições jurídicas dos primitivos povos peninsulares. Povos anteriores à conquista
romana: pode se mencionar os povos autóctones e as colonizações estrangeiras que
ocupavam a Península Ibérica no séc. III a. C., antes da dominação romana.
Os povos autóctones: As multiplicidades étnicas dos primitivos povos peninsulares
tiveram diferenças culturais e de desenvolvimento económico. Alguns deles limitavam-
se a uma reduzida produção agrícola, e outros, além de uma economia agrária próspera,
também tiveram actividades industriais e mineiras, assim como intercâmbios mercantis
(era do seu conhecimento já, o uso da moeda).
Não obstante da grande variedade de raças, torna-se possível reconduzir os povos que
habitavam a Península, no tempo da conquista romana, a cinco grupos fundamentais:
Tartéssios, Iberos, Celtas, Celtiberos e Franco-Pirenaicos. Deve salientar-se que
cada um destes grupos étnicos se subdividia em vários povos:
1) Tartéssios: eram considerados o povo mais culto e adiantado da Península.
Encontravam-se estabelecidos ao Sul, aproximadamente na região delimitada
pelo rio Guadiana. Destacam-se entre eles, os Turdetanos, que ocupavam a bacia
do baixo Guadalquivir.
2) Iberos: encontravam se na orla oriental, expandindo-se no interior, na região da
Catalunha e Aragão. Pertencia a esta raça os Cantabros e os Cantábricos, fixados
nas montanhas das Astúrias e Santander.
3) Celtas: ocupavam o Noroeste e sudoeste (Minho e Galiza actuais) e ao sul do rio
Tejo. A noroeste tomavam o nome de Galaicos que abarcava os Lucenses e os
Bracarenses.
4) Celtiberos: resultaram de uma fusão ou mescla dos Iberos e dos Celtas. Trata-se
de um dos grupos mais importantes da Península; neles incluía-se os Lusitanos,
situados entre os rios Douro e Tejo.
5) Franco-Pirenáicos: Localizavam-se no extremo norte da Península (regiões de
Navarra e Vascongadas). Este grupo teve uma considerável expansão cultural.
Destacam-se os Vasconsos, que se situavam na actual Pamplona.
40
2) Gregos: Os seus primeiros contactos com a Península recuam ao séc. VII a.C..
Também vieram movidos por objectivos comerciais. Criaram algumas colónias
na Andaluzia oriental e expandiram-se, depois, para o norte, ao longo da costa,
com a ocupação das ilhas Baleares e a fundação de Marselha. Em meados do séc.
VII a.C., Marselha passou a constituir o centro de onde irradiou toda a
colonização dos gregos no Mediterrâneo.
3) Cartagineses: Cartágo, antiga colónia fenícia, tornou-se uma das mais fortes e
ricas cidades da época, que procurava disputar com os gregos a supremacia
política e económica no Mediterrâneo ocidental. As relações comerciais dos
cartagineses com a Península vinham de longe. Ja no séc. VI a.C., se
estabeleceram em Ibiza. Após a destruição de Tiro, foram os continuadores dos
fenícios, mostrando-se interessados em manter o domínio sobre as colónias que
estes tinham fundado na Hispânia. A cidade de Cartagena (Nova Cartágo) foi o
seu pólo de irradiação. É importante notar que os cartagineses têm uma diferença
relativamente aos Fenícios e aos gregos que sempre se centraram na costa
mediterrânica. Os cartagineses tiveram uma verdadeira conquista territorial e
penetraram nas zonas interiores, criando lutas com povos indígenas e colónias
gregas. Sabe-se que a II Guerra Púnica interrompeu o domínio dos Cartagineses.
Antes dos romanos: Existiam inúmeros Estados, inclusive dentro do mesmo grupo
étnico, com dimensões mais ou menos reduzidas. Neles adoptaram-se modelos diversos
de organização interna em que se reflectia o grau de evolução política e algumas
possíveis influências dos povos colonizadores. Discute-se sobre se a unidade estadual
seria constituída pela tribo ou pela cidade; mas pode dizer-se que não havia um modelo
uniforme: o estado-tribo (de natureza territorial, prevaleceu entre os Celtas e Celtiberos)
e o Estado-cidade (correspondendo à pólis típica da antiguidade mediterrânica). Estas
unidades políticas eram integradas por clãs ou gentilidades e por grupos locais ou
povoados.
Haviam dois tipos de regimes políticos: Monarquias (que podiam ser vitalícias ou
hereditárias) e as repúblicas (de feição aristocrática); e existiam duas assembleias: de
tipo aristocrático e assembleia popular (composta por todos os homens livres da
comunidade).
- Confederações de Tribos: A realidade era a coexistência de vários grupos mais ou
menos isolados e autónomos, tanto economicamente como também do aspecto
político e ético-jurídico. Assim, existiam confederações de tribos quando, por
exemplo, surgisse um invasor estrangeiro que pusesse em risco a segurança da tribo;
as confederações tinham carácter transitório e objectivos político-militares.
- Classes sociais: distiguiam-se os homens livres dos servus ou escravos. Os escravos
eram considerados coisas e, como tal, objectos de direitos; e podiam pertencer a
particulares ou a comunidades políticas. Os homens livres tinham personalidade
jurídica; entre eles, destacam-se os nobres (classe privilegiada que agrupava os mais
poderosos, cujo poder provinha da linhagem, riqueza, força militar ou do
desempenho de cargos públicos); nos homens livres, também avulta a maioria da
população livre que estava numa posição inferior, com uma condição social e
económica que variava muito de caso para caso. Com as dificuldades da vida, os
mais inferiores encontravam amparo nos poderosos com quem tinham uma relação
41
de clientela ( vínculo em que o patrono dava protecção económica e pessoal ao
cliente que se obrigava a ser fiel e submisso ao patrono). Os clientes tinham a sua
liberdade pessoal limitada resultante da relação de clientela. Havia também a devotio
(devoto), uma variante da clientela militar que tinha aspecto religioso, onde se fazia
um voto a uma divindade, a qual o cliente atribuía a sua vida ao patrono. Se o
patrono morresse, o cliente tinha que se suicidar; isto era explicado no facto da
divindade não ter aceite o voto e por isso, a vida dele era um acto ilícito.
- Direito penínsular pré-romano: além da falta de elementos que permitam a
reconstituição histórica, também se sabe que não existiu um único direito que
vigorasse uniformemente em todo o território, mas sim vários ordenamentos
jurídicos. Também é manifesto que os direitos primitivos prolongaram a sua
vigência para além da romanização, admitindo-se a persistência, durante séculos, de
instituições e princípios de raiz pré-romana, na época medieval.
- Direito dos povos autóctones:
a) fontes de direito: o direito primitivo tinha exclusiva e predominantemente natureza
consuetudinária no território peninsular. O costume eram as normas jurídicas que
surgiram pela prática reiterada das mesmas condutas, perante os vários problemas
e situações sociais, acompanhadas da convicção ou consciência da sua
obrigatoriedade. Sobressaem os pactos: de aliança ( pactos de hospitabilidade com
os romanos) e pactos de hospitabilidade (uma comunidade concedia a outra a
equiparação de direitos e, por vezes, estabelecia-se normas jurídicas para as
regular).
b) Instituições jurídicas: à falta de fontes históricas imediatas, junta-se a escassez das
fontes imediatas ou indirectas. Há dois tipos de métodos para suprir a falta de
elementos: comparativo e o das sobrevivências. O método comparativo serve a
reconstituição das instituições de uma determinada comunidade primitiva a partir
de dados conhecidos de outra que apresenta desenvolvimento análogo, mercê das
identidades étnicas, das condições de vida ou das ciscunstâncias culturais, sociais e
económicas; mas essas conclusões apenas se poderão aceitar em termos
aproximativos e prudentes,pois a analogia entre as sociedades comparadas nunca se
apresenta absoluta. O método das sobrevivências consiste em procurar o
conhecimento de uma certa época através da pesquisa dos vestígios que dela se
encontram nas épocas posteriores. Tem sido aplicado ao estudo do direito dos
primitivos povos peninsulares, a partir do sistema jurídico da Reconquista. É de
notar que este método é muito precário.
A conquista da Península Ibérica pelos romanos fez-se por duas fases: uma primeira,
fase de conquista com a finalidade dupla de subjulgar os povos locais, expulsar os
cartagineses e extrair o máximo de riqueza das regiões anexadas; termina em 19 a.C.
com o domínio da Cantábria e Astúrias. A segunda, fase da romanização, consistiu no
42
progressivo conhecimento e assimilação, pelos povos autóctones, das formas de vida,
cultura e do direito romanos; no entanto, nesta segunda fase, os romanos nao
abandonaram as preocupações económicas e militares.
A conquista da Península Ibérica durou dois séculos:
- 218 a.C., II Guerra Púnica, quando os romanos desembarcaram na Catalunha;
- 212 a.C., os romanos foram derrotados pelos cartagineses;
- 209 a.C., a reconquista inicia-se;
- 202 a.C., fim da II Guerra Púnica: os romanos expulsam definitivamente os
cartagineses;
- 137 a.C., os Lusitanos foram subjulgados (Morre Viriato e sucede-lhe Sertório, que é
assassinado em 72 a.C.;
- Entre 29 e 19 a.C., depois de quase toda a Península conquistada, faltava a Cantábria e
as Astúrias,que acabam por ser vencidas por Augusto.
2) Romanização jurídica:
Operou mediante as duas providências: concessão da latinidade e da cidadania:
a) Concessão da latinidade:
43
No ano de 73/74, o imperador Vespasiano outorgou o direito latino ou latinidade (ius
latii) aos habitantes da Hispânia. Em Roma, as pessoas livres classificavam-se pelo
Direito Romano em cidadãos, peregrinos e latinos: O cidadão tinha capacidade jurídica
plena no ius civile; podia contrair matrimónio (ius connubii); podia celebrar negócios
jurídicos de conteúdo patrimonial (ius commercii); podiam votar nos comícios (ius
sufragii); tinham o direito de aceder as magistraturas do Estado (ius honorum) e tinham
a faculdade de alistamento no exército (ius militae). Os peregrinos, antes de subjulgados
eram considerados “hostes”, estrangeiros ou inimigos; depois de submetidos, era lhe
reconhecido a liberdade pessoal e a faculdade de se regerem pelos seus direitos
nacionais; podiam-se também submeter às normas do ius gentium, quer nas relações
entre si, quer nas relações com os cidadãos romanos. Numa posição intermédia estavam
os latinos. Eles subdividiam-se em latinos antigos, latinos coloniais ou coloniários e
ainda latinos junianos. Os latinos antigos eram os primitivos habitantes do Lácio e
outras cidades equiparadas. Tinham o ius connubii, o ius commercii e ainda o ius
sufragii. Se estabelecessem residência definitiva em Roma, adquiriam automaticamente
a cidadania romana. Os latinos coloniais eram os habitantes das províncias a quem a
latinidade fora concedida como privilégio. Gozavam de ius sufragii e ius commercii.
Gaio faz uma distinção entre latinidade maior (em que um latino acede à categoria de
cidadão se fizesse parte do senado local ou cúria) e latinidade menor (era dada a
cidadania romana se exercesse alguma magistratura local). Os latinos junianos
provinham da Lex Iunia Norbana (19 d.C.) que integrava nesta categoria os escravos
que alcançassem a liberdade, mas sem cidadania.
Os povos penínsulares adquiriram a situação jurídica de latinos coloniais: tinham o ius
sufragii, o ius commercii em matéria de obrigações ou direitos de crédito, direitos reais
e direitos sucessórios, podendo litigar perantes os trinunais romanos; nao gozavam do
ius connubii, devendo, nesta matéria, regular se pelo seu direito tradicional.
b) Concessão da cidadania: A cidadania ia-se estendendo a um grande número de
penínsulares pela prestação de serviço no exército e pela ajuda na acção política e
administrativa de Roma. Em 212 d.C, Caracala estendeu a cidadania romana a todos
os habitantes do Império, de condição livre.
44
germânicas, o sistema jurídico hispânico estava longe da perfeição do direito romano
clássico, vigorando o chamado direito romano vulgar. Essa vulgarização do direito
romano levantava problemas: delimitação dos seus contornos; diferenciação entre o
direito pós-clássico e o direito vulgar; saber o que constituía o direito vulgar.
Muitos factores estão na base do direito romano vulgar, porém pode-se reconduzir a
dois parâmetros básicos: a descaracterização do sistema romano clássico e a persistência
ou revitalização de direitos locais ou regionais. Também a decadência do Império no
séc. III, as instituições romanas vigentes nas províncias foram deixadas, a falta de
cultura jurídica dos povos das províncias e a falta de jurisconsultos especializados, as
obras do direito clássico foram abandonadas e substituídas pelos seus comentários,
resumos ou antalogias, a simplificação verificada na redução dos princípios e dos
institutos foram mais alguns dos factores de emergência do direito romano vulgar.
O direito romano vulgar tornou possível contornar o direito romano às novas situações,
facilitando o encontro com o direito germânico e a continuidade de elementos do direito
romano nos séculos posteriores.
45
a) Separação completa do corpo da mãe;
b) Vida própria: o ser humano deve nascer vivo;
c) Forma humana: quem nasceu deve ter forma e natureza humana. Os monstros, os
prodígios e quem sofre de simples deformidades não gozam de personalidade jurídica.
Não basta, porém, que o nascimento tenha as características assinaladas para que o
nascido goze de personalidade e de capacidade jurídicas. O Direito Romano exige ainda
outros requisitos.
2. Capacidade Jurídica:
2.1 Preliminares
Durante muito tempo, só o paterfamilias (por ser livre, cidadão e independente) teve
capacidade jurídica de gozo e de agir. Mais tarde, foi reconhecida a estrangeiros,
embora limitada aos seus direitos nacionais e no âmbito do ius gentium.
Em 212, a constitutio Antoniniana estendeu a cidadania a todos os homens livres do
Império Romano que, em consequência, adquiriram a capacidade de gozo de direitos.
A capacidade jurídica de gozo nem sempre coincide com a capacidade de agir. Assim, o
infans (criança) pode ter um património se for independente, mas não pode por si só,
adquirir direitos e contrair obrigações; para intervir no comércio jurídico precisa de uma
pessoa (tutor) que o proteja. Por outro lado, pode alguém ter capacidade de agir e não
possuir capacidade de gozo: o servus pode realizar negócios jurídicos, mas os seus
efeitos produzem-se na esfera patrimonial do dominus.
46
romana (status civitatis) e tenha uma situação familiar (status familiae), não fica
plenamente equiparado ao ingénuo. Além destas limitações, vive numa relação de
dependência (direito de patronato) que se traduz em vários deveres:
a) De reverentia (obsequium ou honor): deve respeitar o seu patrono, como se fosse
seu pater;
b) De operante: deve prestar determinados serviços ao patrono, como administrar bens,
cuidar dos filhos, realizar trabalhos manuais, etc.;
c) De bona: é a obrigação recíproca de prestar alimentos, no caso de necessidade.
47
peregrini que não deixaram de ser. A constitutio Antoniniana não eliminou a categoria
dos dediticii.
2.2.3 Escravos:
2.2.3.1 Situação jurídica:
O Direito Romano distingue os homens em livres e escravos. Escravo é o homem que,
segundo o direito positivo, não goza de liberdade e tem como função servir um homem
livre. No início da República, as grandes explorações agrícolas e industriais converteram
os escravos em instrumentos de trabalho: o escravo entrou na categoria da res. O status
jurídico dos escravos não conheceu a homogeneidade no Direito Romano: consoante a
situação, assim eram considerados ora coisas (res) ora homens (homines) ora pessoas
(personae):
I – O escravo coisa (res):
A jurisprudência romana considera os escravos simples elementos patrimoniais,
classificando-os entre as coisas sujeitas ao regime dos direitos patrimoniais: a
propriedade, o usufruto, o penhor, a posse, etc.
São res mancipi como os fundi itálicos, as servidões rústicas e os animais de tiro e de
carga. Não gozam de personalidade jurídica e não se lhes reconhece a capacidade de
gozo de direitos que nela se apoia. Não são pessoas, mas coisas. Um dominus tem sobre
os seus escravos o mesmo poder que o direito reconhece ao proprietário duma coisa
vulgar. Privado de capacidade jurídica substancial, também não goza de capacidade
processual: enquanto coisa, um escravo não pode ser parte num processo judicial para
demandar e ser demandado.
II – O escravo homem (homo):
Se o escravo é juridicamente uma coisa, não deixa também de ser homem: um ser
dotado de inteligência, capaz de agir, de negociar, de constituir relações familiares.
O direito recusou à união sexual entre os escravos. A natureza humana cedo impôs
limites ao direito de vida e de morte que os dominos chegaram a ter sobre os seus
escravos.
A lex Petronia (de 191 d.C.) proibiu que o dominus a entregasse o escravo; a concessão
da liberdade ao escravo doente abandonado; a responsabilidade do dominus que, sem
razão, assassinou o seu escravo, punível como se este fosse alheio; a proibição do
comércio de escravos para fins imorais. É ainda por ser homem, portanto dotado de
inteligência e de capacidade para exprimir uma vontade, que os escravos podem praticar
determinados actos jurídicos de cujos efeitos, no entanto, só o dominus colhe vantagens,
tornando-se credor, proprietário ou titular de outros direitos. Os escravos têm
capacidade negocial.
Os escravos contraíam obrigações naturais que, se não podiam ser-lhes judicialmente
exigidas, impediam a repetitio (a faculdade de pedir a restituição do que
voluntariamente tivessem pago). A capacidade negocial, gerou o costume da concessão
de peculia: pequenos patrimónios autónomos que, sendo juridicamente propriedade do
dominus, pertencem de facto ao escravo. A sua protecção é confiada ao sentimento de
reprovação social contra o dominus que, invocando o seu dominium, prive o escravo
desses bens, a maioria das vezes adquiridos à custa do seu trabalho. E para demandar os
devedores do peculium se o dominus não quiser ou puder, o pretor concede ao escravo a
actio correspondente ao negócio realizado, com a ficção como se o escravo fosse um
48
homem livre.
Só a circunstância de os escravos serem homens explica a tutela das suas vida e honra:
na época clássica, o dominus podia pedir a condenação do homicida na pena de morte
ou na reparação do dano aquiliano; o estupro duma escrava era punido com a actio
iniuriarum ou com a actio legis Aquiliae; e o acusador dum escravo absolvido era
condenado, a favor do dominus, no dobro do preço do escravo.
Na condenação destes delicta subjaz a dupla dimensão dos escravos: a jurídica, de res; e
a natural, de homo. Enquanto res, justifica-se o ressarcimento dos danos patrimoniais
sofridos pelo dominus; como homo, explicam-se o delito capital e a actio iniuriarum
que era infamante.
2. Cativeiro de guerra: é a causa mais importante. Segundo o ius gentium, são escravos
quer os romanos aprisionados pelos inimigos, quer estes por aqueles. Porém, o ius
49
civile, só considera servi iustii os estrangeiros capturados; o cativo romano perde a
libertas, mas não se torna servus iustus. Os estrangeiros prisioneiros de Roma tornam-se
propriedade do Estado que pode destiná-los a serviços públicos, vendê-los a particulares
ou cedê-los a soldados. Mas o romano capturado pelo inimigo não é considerado
escravo, a sua personalidade jurídica cessaria e perderia todos os seus direitos. O
cativeiro só extingue as relações de facto como o matrimónio e a posse que não se
podem interromper. As relações jurídicas ficam suspensas; por isso, se o cativo
regressasse a Roma ou a uma cidade aliada, podia readquirir a liberdade e é integrado
em todos os seus direitos por efeito do postliminium. É necessário que o cativeiro seja
determinado por guerra pois a reintegração não se aplica a indivíduos capturados por
piratas ou ladrões, nem nos casos de guerra-civil ou de sublevação e aos desertores,
traidores e trânsfugas.
A consideração da morte durante a escravatura implica a perda da liberdade que
determina a negação da capacidade testamentária activa: os cativos não podem testar e o
testamento feito anteriormente é inválido. A lex Cornelia (81 a.C.) determinou que a
morte dever-se-ia considerar no momento em que caiu prisioneiro, isto é, quando ainda
era livre, salvando com esta ficção a validade dos testamentos.
50
1) Directo: com palavras imperativas, o testador concede a liberdade imediatamente
após a aceitação da herança e o escravo torna-se liberto do defunto;
2) Indirecto: o testador solicita ao herdeiro, legatário ou fideicomissário que conceda a
liberdade a um escravo determinado. O destinatário do pedido fica obrigado a
manumitir o escravo que pode pertencer ao testador, ao obrigado e mesmo a um
terceiro. Feita a manumissio, o escravo torna-se liberto do manumissor. Se o obrigado
não cumpre a sua obrigação de manumitir, o escravo torna-se livre se o testador assim
tiver disposto.
A manumissio testamentária pode ser feita a termo ou sob condição. Nestes casos, o
escravo manumitido pode adquirir a liberdade verificado o termo ou cumprindo a
condição a quem quer que o tenha adquirido ou recebido em penhor. A eficácia da
manumissio depende de duas condições: ser o manumissor titular do domínio; e ser
realizada numa das formas previstas pelo ius civile.
A manumissio feita pelo proprietário bonitário não produz efeitos. Porém, o pretor não
deixou de proteger o escravo, recusando ao dominus a actio para o reivindicar. Nas
manumissiones sem as formalidades impostas pelo ius civile, os escravos eram
protegidos pelo pretor; são as denominadas manumissiones menores ou irregulares,
compreendem várias modalidades:
a) Manumissio inter amicos: é a declaração de libertação feita na presença de
testemunhas;
b) Manumissio per epistilam: é a libertação por carta dirigida ao escravo;
c) Manumissio per mensam: ocorre, quando, a convite do dominus, o escravo se senta à
sua mesa.
51
2.2.3.4 Restrições à liberdade de manumitir:
Augusto limitou a liberdade de manumitir, implicando o exercício do poder de
disposição duma res.
O luxo, a ostentação e os ganhos arrecadados pelo trabalho dos libertos sem capacidade
testamentária fizeram engrossar o número de cidadãos romanos; as suas condutas nem
sempre cívicas; a diversificada origem étnica e o perigo do seu predomínio político
aconselhavam uma política protectora da romanidade:
- No ano 2, a lex Fufia Caninia ordenou que as manumissiones testamentárias se
fizessem nominatim e fixou limites: o dominus de 3 escravos só podia manumitir 2; o
de 3 a 10, podia manumitir metade; o que tivesse entre 11 e 30, uma terça parte; o
dominus de 31 a 100 escravos, um quarto; o que tivesse entre 101 e 500 só podia
manumitir um quinto.
- No ano 4, a lex Aelia Sentia determinou que o manumissor devia ter, pelo menos, 20
anos e o escravo não menos de 30, excepto se houvesse uma causa justa reconhecida por
um consilium e a manumissio revestisse a forma de vindicta; são nulas as
manumissiones em fraude aos credores; e os escravos delinquentes manumitidos não
adquirem a cidadania nem a latinidade, mas a condição de peregrini dediticii.
O direito justinianeu introduziu algumas alterações:
Conservou o requisito da iusta causa nas manumissiones não testamentárias feitas
por menores de 20 anos;
Concedeu a faculdade de os maiores de 17 anos manumitirem por testamento;
Dispensou a idade mínima de 30 anos dos escravos; manteve a nulidade das
manumissiones in fraudem creditorum;
Suprimiu a condição de peregrini dediticii;
Aboliu a lex Fufia Caninia.
52
O auge do colonato coincide com a decadência da escravatura, mas não deixa de ser
uma situação igualmente detestável.
O colonato é uma instituição do Baixo-Império que pretendia fixar os lavradores às
terras (sobretudo mais vastas: latifundi) para as tornar mais produtivas. O colonus é um
arrendatário hereditário e perpétuo: está incorporado ao solo com o direito de o cultivar
e a obrigação de pagar ao proprietário uma renda ordinariamente em espécie ou
dinheiro, que não deve ser alterada. Não pode alterar o cultivo do fundus nem separar-se
da terra e, se procurar fugir, incorre em prisão e na redução a escravo. Como garantia, o
colonus responde com os seus bens próprios.
Os colonos são homens livres; têm personalidade e capacidade jurídicas que lhes
permitem adquirir direitos reais, de crédito, sucessórios e contrair matrimónio com uma
pessoa livre non colona; não podem vender os seus bens sem o consentimento do
proprietário do fundus a que estão adstritos nem demandá-lo, excepto em causas
determinadas. Estão sujeitos ao poder de correcção do dominus fundi que os pode
reivindicar com uma actio in rem no caso de se afastarem.
A situação de colono podia ser determinada por:
1. Entrega voluntária ou submissão feita num contrato registado nos gesta
municipalia;
2. Nascimento de pai colono;
3. Prescrição de 30 anos: permanência durante esse tempo, vivendo como colonus;
4. Atribuição, pelo imperador, de prisioneiros bárbaros a terras públicas ou privadas;
5. Mendicidade que converte o mendigo em colonus de quem a denuncia.
2.2.4.3 Auctoratus:
É o homem livre que faz uma locação dos seus serviços de gladiador com um
empresário, obrigando-se, sob juramento, a lutar no circo e, sujeitando-se a morrer pelo
fogo e ferro. Conserva a liberdade e a cidadania, mas a submissão ao empresário produz
uma situação de quase escravidão que explica o delito de furtum cometido por quem se
apoderasse do auctoratus.
Esta figura desapareceu quando Constantino suprimiu as lutas dos gladidadores.
53
dinheiro pago pelo redemptor.
Em suma:
Status Libertatis:
a) Ingénuos
1. Cidadãos romanos b) Libertos
2. Estrangeiros (peregrinus)
3. Escravos (servus)
a) Persona in mancipio
b) Colonus
4. Situações afins à
c) Auctoratus
escravatura
d) Redemptus ab hostibus
e) Addictus e nexus
f) Homo liber bona fide serviens
2
.3 Status Civitatis:
2.3.1 Cidadãos romanos:
A cidadania é um estado (status civitatis) que interessa igualmente ao direito público e
privado: só o civis romanus pode participar nas relações que disciplinam.
Inicialmente vigorou o princípio da personalidade, por virtude do qual cada indivíduo
está sujeito ao direito da sua nacionalidade e no ano 212, Caracala concedeu a cidadania
a todos os habitantes do Império. O cidadão romano dotado de cidadania plena participa
nos direitos público e privado romanos: no direito público:
Goza do ius suffragii (direito de voto nas assembleias);
54
Goza do ius honorum (direito de acesso a magistraturas);
Goza do direito de servir nas legiões.
O cidadão romano tem um nome que assinala a sua privilegiada situação jurídica.
São cidadãos romanos os ingénuos e os libertos, embora os primeiros gozem duma
situação jurídica privilegiada quer no direito público quer no direito privado.
2.3.2 Latinos:
2.3.2.1 Latini veteres (ou prisci):
São os habitantes da antiga Liga e também podem ser os membros das colónias que
fundaram. A sua condição de confederados e a pertença à mesma comunidade nacional
justificam que os latinos não sejam considerados estrangeiros embora não tenham o
status de cidadão romano.
Juridicamente é-lhes permitido o gozo do ius commercii, do ius conubii, da testamenti
factio, da possibilidade recíproca de serem tutores e pupilos e da faculdade de
demandarem nos tribunais romanos com as actiones do Direito Romano.
Quanto ao direito público, gozam do direito de voto (ius suffragii).
55
sido expressamente concedido.
56
demandarem os patrerfamilias através de actiones adiecticiae qualitatis. E pelos direitos
dum filiusfamilias respondia igualmente, agora numa actio noxalis.
Os filiifamilias gozam ainda do ius conubii, segundo o ius civile. Porém, a uxor in manu
e os filii ficam sujeitos à manus e à patria potestas do seu paterfamilias.
Com o tempo, foi-lhes reconhecida a capacidade patrimonial activa. Na época imperial,
os bens adquiridos no serviço militar, tornaram-se propriedade do filiusfamilias; depois,
foi permitido que adquirissem a propriedade dos bens obtidos no desempenho dum
cargo público, no exercício da advocacia ou por concessão imperial; e finalmente foi-
lhes reconhecida a propriedade de todos os bens adquiridos, desde que não provenientes
do seu paterfamilias. No direito justinianeu só não pertencem a um filiusfamilias os
bens adquiridos no âmbito da administração dum peculium profecticium (património
que um paterfamilias confia à gestão de um filius). Justiniano aboliu também a noxae
deditio de pessoas livres e permitiu que fossem demandadas com a actio poenalis
comum.
57
Império Romano), esta capitis deminutio perdeu o seu alcance.
No direito justinianeu só ocorre no caso de desterro.
2.6.2 Idade:
A capacidade de agir adquire-se quando a inteligência está de tal modo desenvolvida
que temos consciência dos actos que praticamos. Os jurisconsultos romanos entendiam
que o desenvolvimento sexual e intelectual corriam paralelamente
e, por isso, para determinarem a capacidade de agir procuravam averiguar o acesso à
puberdade: este implicava o reconhecimento daquela. Os Sabinianos defendiam uma
inspectio corporis. Porém, este rigor produzia a variabilidade e, por isso, os
Proculeianos fixaram-na no momento em que o homem completava 14 anos e a mulher,
12. Esta solução foi acolhida no direito justinianeu por causa de decoro.
Entre os impuberes distinguem-se:
1. Os infantes: é infans aquele que não pode falar. Justiniano fixou a idade máxima
aos sete anos. O infans não goza de capacidade de agir e, por isso, os actos que se
referem à sua esfera patrimonial devem ser realizados pelos seus escravos ou tutor;
2. O infantia maior: é aquele que já ultrapassou a fase da infantia, mas ainda não
58
atingiu a puberdade. Já tem capacidade de agir, embora limitada: o acto que pratique
é eficaz, se for proveitoso; é nulo, se lhe causar dano, a menos que intervenha a
auctoritas do tutor. Sob certos aspectos, as fontes distinguem ainda os:
a) proximi infanti: não são responsáveis em matéria delitual;
b) proximi pubertati: são responsáveis por delitos, desde que os não ignorem.
Atingida a puberdade, adquire-se a plena capacidade de agir. Porém, a lex Laetoria (ou
Plaetoria) do ano 191 a.C. estabeleceu uma série de sanções a quem, aproveitando-se da
inexperiência dos menores de 25 anos, os enganasse em negócios que, todavia, se
consideram válidos.
Excepcionalmente, os imperadores concederem aos maiores de 20 ou 18 anos, se
homens ou mulheres, a faculdade de administrarem os seus bens se fossem considerados
dignos e capazes.
2.6.3 Sexo:
No ordenamento patriarcal romano, que tem por base a potestas do paterfamilias, a
posição jurídica da mulher romana é muito inferior à do homem.
Na esfera do direito público, a mulher não participa na res publica, desempenhando
funções de carácter público: não pode exercer uma magistratura nem postulare pro aliis
perante o magistrado.
No direito privado, está sempre sujeita à potesta alheia: à patria potestas, se
filiafamilias; normalmente à manus do marido, se esposa; e à tutela perpétua, se sui
iuris. Não pode ser tutora de impúberes e adoptar filhos; testemunhar um testamento;
garantir obrigações de homens. Por efeito duma lex Voconia (do ano 169 a.C.), é
incapaz de herdar por testamento de quem tenha mais de cem mil asses; e a
iurisprudentia estendeu o antifeminismo desta lex à sucessão ab intestata, excluindo as
mulheres colocadas num grau posterior ao de irmão.
Os jurisconsultos não se preocuparam em justificar esta situação que, face à família
romana, parecia natural. Por vezes, invocaram o pudor, a pudícia e a leviandade, mas
trata-se duma razão que «Parece mais aparente do que verdadeira».
A situação evoluiu com a transformação por que passou a concepção familiar romana. A
tutela decaiu: na época clássica, as mulheres ingénuas e libertas, respectivamente mães
de três e de quatro filhos, são desobrigadas; e desapareceu provavelmente depois de
Diocleciano. Entretanto, a sua capacidade testamentária (activa e passiva) fora
reconhecida.
Na legislação cristã acentua-se a protecção da mulher: justifica a reafirmação de que os
maridos não devem satisfazer os seus credores com os bens dotais; goza duma hipoteca
tácita sobre os bens do marido, que a coloca numa situação privilegiada em relação aos
restantes credores; há a faculdade de os maridos lhes fazerem doações; de as mulheres
de má condição contraírem legítimo matrimónio, se a abandonarem.
59
Exceptuam-se os intervalos lúcidos: quando temporariamente o demente recupera a
saúde mental.
Diferente do demente é o mente captus: àquele falta completamente a razão, embora
possa ter intervalos lúcidos; este apenas sofre de enfraquecimento ou de pouco
desenvolvimento intelectual. O mente captus é equiparado ao demente.
A lei das XII Tábuas e o pretor concederam-lhes um curador, a quem cabe a função de
cuidar da pessoa e do património do enfermo mental.
2.6.5 Prodigalidade:
Pródigo é o indivíduo que dissipa os seus bens. O magistrado (pretor ou governador de
província) pronuncia a interdictio que retira o ius commercii e coloca o seu património
sob curatela (cura).
Inicialmente, este instituto protegeu o património no interesse da família; por isso, a
interdictio só atinge a disponibilidade do património herdado em relação ao qual o
pródigo é equiparado ao enfermo mental.
Posteriormente, a equiparação ao demente é plena e, por isso, a interdictio atinge todo o
património do pródigo. Porém, a incapacidade de agir é limitada às alienações e não às
aquisições, pelo que o pródigo é, neste aspecto, equiparado ao infans maior. A
administração dos seus bens continua a ser atribuída a um curador.
Numa situação análoga encontram-se os debiles: aqueles que, por qualquer razão, não
podem cuidar dos seus bens. São também incapazes de agir e o seu património está
sujeito a curatela.
60
desonrosa de certos deveres. O iudex gozava ainda de grande liberdade para apreciar
se outros casos não previstos na lex nem no Edictum eram desonrosos. Por isso,
podemos distinguir duas situações:
a) a infamia: os seus requisitos encontram-se fixados na lex ou no Edictum do
pretor;
b) a turpido: o iudex aprecia-a e fixa-a livremente, inspirando-se na opinião pública
e nas ideias sociais dominantes.
2.6.7 Religião:
Na época pagã, a religião não teve influência na capacidade jurídica: todos os cultos
eram tolerados, a menos que repugnassem à consciência pública. As sanções criminais
ou administrativas que, na época republicana e nos primeiros séculos do Império,
puniam quem participasse em determinados actos religiosos, são justificadas por
motivos de ordem pública ou para reprimir a magia, a astrologia e actos particularmente
imorais. As perseguições dos cristão ter-se-ão fundado em motivos de segurança
pública, limitando-se os magistrados dotados do poder de imperium a exercer pelo seu
ius coercitionis. A recusa de os cristãos participarem nos sacrifícios aos deuses pagãos
ou aos imperadores constituía crimen sacrilegii.
A situação alterou-se a partir de Constantino e sobretudo com a lei cunctos populos do
ano 380 que atribuiu ao Estado romano carácter confessional. Em consequência,
estabeleceram-se várias limitações que afectaram a vida de quem vive fora do credo
cristão ortodoxo. Os hereges não podem exercer cargos públicos, ter escravos cristãos,
testemunhar em actos jurídicos, fazer testamentos e doações. Os judeus não podem
contrair matrimónio com mulher cristã. A apostasia de um cônjugue constitui uma iusta
causa de divórcio. E os maniqueus carecem totalmente do ius commercii quer inter
vivos quer mortis causa.
61
influência na capacidade jurídica.
Superada a arcaica antítese entre cives e clientes, os plebeus viveram, nos primeiros
séculos de Roma, uma situação jurídica muito inferior à dos patrícios nas esferas dos
direitos público e privado, onde a Lei das XII Tábuas ainda consagra a proibição de
casamentos mistos. Não tardaria, no entanto, esta disposição a ser revogada pela lex
Canuleia no ano 445 a.C.. Seguiram-se o progressivo acesso da plebe às magistraturas e
a equiparação dos plebiscita às lex rogatae que marca, nos finais da
República, o fim daquela antítese. Os equites constituíram também uma classe a se com
influência no direito público, mas desapareceu na época clássica.
No âmbito do direito penal distinguem-se os honestiores e os humiliores: aqueles
pertencem a classes socialmente altas, sobretudo em atenção aos cargos que
desempenham e ao nascimento. Esta distinção justifica a diversidade das penas
aplicáveis. No Baixo – Império distinguem-se os honorati, os principales, os curiales e
os possessores. Esta classificação é relevante no acesso aos cargos públicos e, na esfera
do direito privado, interfere no matrimónio.
62
quem faleceu primeiro, os jurisconsultos afirmavam que morreram ao mesmo tempo.
O direito justinianeu afastou o critério da simultaneidade e estabeleceu uma presunção
de pré-moriência fundada na diferente resistência física: se, no mesmo acidente,
morreram pai e filho, presume-se que o filho morreu primeiro, se for impubes; sendo
pubes, considera-se que o pai morreu primeiro. Se em causa estiver a sucessão do
patrono, considera-se que o filho faleceu antes de pai liberto.
O Direito Romano não conheceu a instituição da ausência. As suas bases devem-se à
prática medieval que, considerando como termo ordinário da vida a idade de setenta
anos, presumiu falecido o ausente, cuja vida se ignora, quando tiver completado essa
idade. Se, quando se ausentou, já tinha os setenta anos, presumia-se falecido cinco anos
depois.
63
substituído ou completado pela perpetua consuetudo.
3. A actividade lícita.
Nada falta, para que possamos reconhecer a personalidade e a capacidade (de gozo e de
agir) jurídicas às corporações, embora com as limitações inerentes às suas natureza e
teleologia. Obviamente àquelas reconhecidas por lei ou por acto individual e
discricionário da Administração.
Quanto à sua organização, em regras, as corporações privadas seguem também, como
modelo, o municipium: têm um estatuto, uma assembleia geral, um cofre comum, um
conselho de administração e um ou vários representantes especiais (actores) ou
permanentes que se ocupam dos negócios e dos litígios.
Diferente da corporação é a sociedade modernamente denominada civil: aquela actua no
mundo jurídico como sujeito individual e autónomo; esta é uma simples relação
contratual entre os sócios. Os bens da corporação pertencem ao seu património; os da
sociedade constituem património comum dos sócios. Os credores da corporação só a
podem demandar; os da sociedade só podem accionar os sócios. A renovação dos
associados não afecta a subsistência da corporação; a morte ou a saída de um sócio
provoca, em regra, a extinção da sociedade. Na corporação, delibera a maioria; na
sociedade, tem-se em atenção a vontade individual dos sócios.
64
rendimentos ao fim previsto. Trata-se duma fundação fiduciária que não constitui uma
pessoa jurídica, mas tão-só um acto de disposição sub modo: o património é adquirido
pelo donatário, herdeiro ou legatário que assume a obrigação de cumprir o modus,
podendo ser constrangido a respeitar a vontade do fundador quer através de multa
(stipulatio poenae) quer sujeitando-o a transferir os bens para outra pessoa.
Por influência da caridade cristã, a partir do século V muitas pessoas afectaram grandes
patrimónios à criação e à manutenção de hospitais, asilos de órfãos, hospícios de
crianças abandonadas, de peregrinos, indigentes e velhos. O fundador transfere os bens
para a Igreja que se obriga a afectá-los in perpetuo aos fins piedosos ou benéficos
previstos. Duvida-se que tais patrimónios tenham constituído verdadeiras fundações.
O direito justinianeu concede vários privilégios às disposições patrimoniais para fins
religiosos ou de beneficência; e acentua o respeito pela vontade do fundador. Porém,
não chegou a afirmar-se decididamente a personalidade dos patrimónios fundacionais,
embora não se afastem vários aspectos que manifestam alguma autonomia: quando se
diz que o hospital (xenon) tem a faculdade de herdar, devendo o seu administrador
distribuir o património ou as rendas pelos enfermos, instaurar actiones, exigir créditos e
pagar aos credores.
São as bases sobre que assenta a concepção moderna das fundações.
65
2. Res in commercio e Res extra commercium
As res in commercio podem ser objecto de relações jurídicas patrimoniais, enquanto que
as res extra commercio, que quer, seja pela sua natureza física, seja pelo seu destino
jurídico, não podem constituir objecto de negócios jurídicos patrimoniais.
Nas res extra commercium, o seu ordenamento não é unitário, pois cada res tem um
regime próprio segundo a sua natureza e destino. Os jurisconsultos romanos distinguem
duas grandes categorias, determinadas por exigências estritamente humanas ou
religiosas que são:
a) as res humani iuris ( que se divide em 3 categorias)
i) res communes omnium – são as coisas susceptíveis de apropriação individual
porque pertencem a todos os homens. (ex: sucede com o ar, a água corrente, etc...).
Estas podem ser livremente utilizadas por cada indíviduo, sempre que não seja
prejudicado o direito dos outros.
ii) res publicae – são coisas que pertencem ao Estado (populus romanus). Porém,
nem todas são res extra commercium.
iii) res universitatis – são as coisas que pertencem às cidades (municipia e
coloniae) sujeitas à soberania de Roma. Umas satisfazem as necessidades colectivas e,
por isso, estão destinadas ao uso público, enquanto outras pertencem ao património dos
municipia e das coloniae, e portanto podem ser alienadas: estão in commercium.
b) as res divini iuris – não podem ser objecto de propriedade privada, por se
considerarem propriedades dos deuses. Entre estas, temos:
i) res sacrae – são as coisas afectadas ao culto dos deuses superiores, como os
templos, as aras e os bosques sagrados.
ii) res religiosae – são as coisas dedicadas aos deuses inferiores ou Manes.
iii) res sanctae – são as coisas colocadas sob a protecção dos deuses, mediante
uma cerimónia especial (sanctio).
66
Coisas consumíveis, são aquelas coisas cujo uso normal, provoca a sua destruição
(física, económica ou transformação).
Coisas não consumíveis, são as coisas cuja essência não é destruída, nem alterada pelo
seu uso normal, por isso, são susceptíveis de usufruto.
67
9. Coisas principais, acessórias e partes:
Coisa principal, é a coisa que, embora ligada a outra para satisfazer a mesma finalidade,
determina a função do todo: não está sujeita a um vínculo de subordinação física,
económica ou jurídica.
Coisa acessória, é uma coisa que, não sendo absorvida por outra e, portanto,
conservando a sua autonomia, contribui para facilitar o desempenho da função
económico – social atribuída à res principal. São res acessórias de um fundus, os
animais domésticos, os escravos, etc.
Parte, é uma res subordinada a outra (dita principal) segundo um critério não físico, mas
económico. Trata-se de uma coisa que completa outra, permitindo-lhe que desempenhe
plenamente a sua função. Os negócios jurídicos sobre a res inteira envolvem
necessariamente as suas partes e a reivindicatio daquela, compreende estas.
Conceito. Classificação:
A dogmática actual considera facto jurídico todo o facto da vida real que produz efeitos
jurídicos: a aquisição, modificação ou a extinção de direitos.
Os factos jurídicos podem ser:
1- Voluntários: constituem manifestações da vontade. Denominam-se actos jurídicos e
compreendem duas categorias;
a) Actos lícitos: estão de acordo com a ordem jurídica que os reconhece. Pode se
distinguir:
68
Negócios Jurídicos: são actos voluntários a que o ordenamento jurídico reconhece os
efeitos jurídicos que foram ou aparentam ter sido queridos pelos seus autores;
Simples actos jurídicos: São actos voluntários cujos efeitos jurídicos não são
determinados pela vontade, mas directa e imperativamente pela lei, embora
normalmente estejam de acordo com a vontade dos seus autores. São produzidos ex
lege e não ex voluntate;
Efeitos:
Os efeitos de um facto jurídico pode consistir na aquisição, na modificação e na
extinção de direito:
Aquisição de direitos: pode ser:
69
a) originária: surge um direito novo com base numa relação imediata com o seu
objecto, independentemente de qualquer relação jurídica que exista com outra pessoa.
Pode suceder que não exista antes a aquisição de qualquer direito dum anterior titular
mas pode também preexistir o direito dum titular anterior que se extinguiu ou ficou
limitado.
b) derivada: adquire-se um direito com base numa relação com uma pessoa que detinha
a sua titularidade. Trata-se duma aquisição que pressupõe um direito do anterior titular,
que se extingue ou limita, havendo entre os dois fenómenos um nexo causal e não
meramente cronológico. Pode-se distiguir na aquisição derivada:
Aquisição derivada translativa: o direito adquirido é o mesmo que já pertencia ao
anterior titular;
Aquisição derivada constitutiva: o direito adquirido filia-se num direito mais amplo
do anterior titular que se limita ou comprime;
Aquisição derivada restitutiva: sucede quando o titular de um direito real limitado se
demite dele. O proprietário recupera a plena propriedade por força da elasticidade ou
força expansiva do direito de propriedade.
2) Modificação de direitos:
Consiste na alteração ou mudança dos elementos de um direito que conserva a sua
identidade; portanto nao atinge a sua essência. Pode ser:
a) Modificação subjectiva: refere-se aos sujeitos que se substituem. Ex: a substituição
do sujeito falecido pelos seus herdeiros;
b) Modificação objectiva: refere-se a conteúdo do direito. Ex: fixação de um novo lugar
ou tempo para o cumprimento duma obrigação; aumento ou diminuição da renda num
contrato de arrendamento; etc...
Tempo:
O tempo constitui um facto jurídico involuntário quando o ordenamento jurídico lhe
atribui efeitos jurídicos. Exemplos:
6) Caducidade: tem lugar quando o ordenamento jurídico ou as partes fixam um
70
determinado período de tempo dentro da qual deve ser exercida certa faculdade
(direito ou acção). Passado esse tempo, a faculdade caduca. A caducidade é
oficiosa e o prazo não se suspende nem interrompe.
7) Prescrição: o ordenamento jurídico dá importância ao exercício continuado de
direitos ou à permanência numa situação de facto durante um certo período de
tempo. A prescrição deve ser invocada pelas partes e pode ser interrompida. Deve
se distinguir:
- prescrição aquisitiva (ou usucapião): ocorre quando a continuação de uma
situação de facto faz surgir um direito;
- prescrição extintiva: verifica-se quando o não exercício de um direito determina
a sua extinção.
8) Vetustas: consiste na permanência numa situação jurídica ou de facto durante um
período de tempo tão extenso que se perde a memória da sua origem.
9) Só decorrido um prazo estipulado é que é possível o exercício de um direito (ex:
obrigação a prazo: decorrido o tempo, o credor pode exigir o seu cumprimento).
71
práticos a que o ordenamento jurídico reconhece determinadas consequências jurídicas.
Nem todos os efeitos jurídicos têm sido previstos expressamente pelas partes, ou seja,
por força da lex derivem outras consequências nao contempladas pelos sujeitos. Esta
posição do ordenamento jurídicoe explica-se pela tendência de tipificar os negócios
jurídicos com efeitos jurídicos próprios, que é uma das características do Direito
Romano. Não nos afastaremos deste direito, referindo o Negócio jurídico como acto
voluntário lícito essencialmente constituído por uma ou várias declarações de vontade
privada que se dirigem à produção de certos efeitos práticos ou empíricos de natureza
patrimonial, tutelados pelo ordenamento jurídico em conformidade com a intenção do(s)
declarante(s).
b) limitada: não têm capacidade para alienar ou contrair obrigações, mas podem
adquirir. Sucede com os impubes infantia maior, com o pródigo e com as mulheres no
antigo ius civile).
Assim, têm capacidade plena, ou seja, podem realizar qualquer negócio jurídico todas
as pessoas que não estao acima referidas como incapazes. Porém os menores de 25 anos
e maiores de 14 anos (se homens) e 12 anos (se mulheres) tiveram especial protecção
pela lex Laetoria ou Plaetoria do ano de 191 a.C.
72
comportamentos que dão vida aos negócios jurídicos e permitem determinar a sua
natureza. Mas não basta a vontade: é essencial que esta seja declarada porque senão não
se pode falar em negócio jurídico.
Nos negócios formais, a vontade tem de estar manifesta nas formas estabelecidas pela
lex; nos negócios não solenes, pode expressar-se de qualquer modo (escrito, oralmente
ou por qualquer sinal). Podem também deduzir-se por interpretação de comportamentos
, situações modernamente consideradas manifestações tácitas de vontade. Mantêm-se as
antigas formalidades prescritas pelo ius civile, por virtude da mantalidade romana
pouco ousada à criação de novas formas, formas essas que já tinham perdido o seu
significado.
As formas de manifestação da vontade distinguem-se em:
a) Ad probationem: servem para provar a volutas. Podem documentar negócios não
solenes (ou não formais);
b) Ad substantiam: transmitem existência a um negócio jurídico. São prescritas
taxativamente pelo ordenamento jurídico e constituem a característica dos negócios
jurídicos solenes (ou formais). Servem também como elementos de prova.
3) Causa:
A causa constitui um elemento essencial e especial dos negócios jurídicos causais. A
sua definição está longe de ser pacífica, certo é que o DR ordenou e reagrupou as
diferentes relações económico-sociais em negócios jurídicos tipícos com efeitos
determinados; reconhecendo-lhe, por isso, que determinados fins são socialemente
úteis, ou seja, dignos de protecção.
Se a função económico-social ou a finalidade intrínseca faltar, o negócio jurídico causal
não existe (Ex: não haverá compra e venda se faltar o propósito de trocar a coisa pelo
preço, querendo as partes transmitir gratuitamente a propriedade duma res, ou seja,
simular uma doação.
Nos negócios abstractos, a forma substitui ou identifica-se com a causa. É com base na
causa, entendida como elemento essencial, que se distinguem os negócios jurídicos
causais (aqui, a causa é a condição da sua existência e, para isso é preciso averiguar se
corresponde à vontade das partes) e abstractos (onde basta o cumprimento da forma
prescrita).
4) Objecto:
A dogmática distingue o objecto imediato ou conteúdo (são os efeitos jurídicos a que o
negócio jurídico tende: a constituição, modificação ou extinção de relações jurídicas)
ou objecto mediato ou objecto stricto sensu (é constituído por uma ou mais coisas
corpóreas ou incorpóreas, uma ou várias prestações ou mesmo uma pessoa).
Assim, no contrato de compra e venda, o objecto imediato é a obrigação de o vendedor
tranferir a posse da res, assegurar o seu gozo pacífico e responder por evicção; o
comprador contrai a obrigação de tranferir a propriedade de uma soma de dinheiro
(preço). O objecto mediato será a res vendida e o preço.
O objecto (nas duas acepções) não pode ser física ou legalmente imposível nem ilícito e
imoral.
73
Os elementos acidentais são as cláusulas acessórias que as partes podem introduzir
para modificar o conteúdo, os efeitos ou a eficácia dum negócio jurídico sem o
sacrifício dos elementos essenciais.
Os elementos acidentais mais importantes são a condição (conditio), o termo (dies) e o
modo (modus):
1) Condição:
A condição é uma cláusula por virtude da qual a eficácia de um negócio jurídico é posta
na dependência dum acontecimentos futuro e incerto. Embora seja um elemento
acidental torna-se intrínseco e inseparável do negócio jurídico que condiciona
(denominam-se de negócios jurídicos condicionais).
A condição pode revestir-se de várias espécies:
a) Quanto ao efeito jurídico:
Suspensiva: O negócio jurídico só produzirá os seus efeitos se o acontecimento
futuro e incerto (condição) se verificar;
Resolutiva: O negócio jurídico deixará de produzir efeitos se o evento que o
condiciona se verificar.
O DR ignorou a condição resolutiva: aos seus jurisconsultos repugnava que uma
relação jurídica pudesse cessar com a simples verificação de um acontecimento futuro e
incerto.
74
e à eficácia dum negócio jurídico; por isso, consideram-se desnecessáriamente
repetidas (inútil);
IV) In praesens vel in praeteritum collatae: referem-se a um facto presente ou
passado. Não se trata dum acontecimento futuro nem a sua verificação é incerta;
não pode considerar-se incerto um acontecimento passado ou presente, mesmo
que no momento da celebração do negócio os sujeitos ignorem a sua existência;
V) Quae omni modo extiturae sunt: incidem sobre acontecimentos que, embora
sejam futuros, têm inevitavelmente de ocorrer.
2) Termo:
O termo é um facto futuro e objectivamente certo, a partir do qual começam ou cessam
ou efeitos de um negócio jurídico. Pode ser inicial (ou suspensivo) e final (ou
resolutivo).
O termo e a condição apresentam grande analogia e a sua analogia e a sua evolução
histórica ocorreu paralelamente: ambos se aplicaram inicialmente em negócios mortis
causa; e foram recusados nos negócios solenes do antigo ius civile. O termo distingue-
se da condição não só porque pressupõe um facto certo, mas também porque apenas
difere os efeitos ou a resolução de um negócio jurídico que já existe.
Os jurisconsultos começaram por não conceber o termo resolutivo e recorreram a dois
negócios jurídicos diferentes: um, puro e o outro, um pacto sujeito a termo suspensivo
que fazia cessar os efeitos daquele. Com o tempo acabaram por admitir o termo
resolutivo em negócios não formais e o pretor reconheceu a sua possibilidade nos
negócios jurídicos honorários. No Corpus Iuris Civilis, admitem-se os termos
resolutivos, mas persistem certas relações jurídicas que se consideram permanentes e,
por isso, é inconcebível que se possam constituir a tempo e revogar-se uma vez
cumprido o termo. O jurisconsultos romanos distinguem 2 momentos:
A celebração do negócio sujeito a termo;
O vencimento do termo;
No intervalo, o negócio jurídico considera-se inerte, mas não deixa de produzir alguns
efeitos. Os romanistas distinguem ainda quatro tipos de termos:
Dia certo e ano certo: “vendo um bem no dia 7 de Julho de 2010, até lá está
suspenso”;
Dia certo e momento incerto: “depois da morte, doou a alguém...”
Dia incerto e momento certo: “Alguém propõe que venderá a alguém no dia que
fizer 80 anos”;
Dia e momento incertos: “eu prometo que lhe vendo um bem, quando a minha filha
se casar” (depende de um terceiro elemento);
75
Estes dois últimos são condições embora com aparência de termos!
3) Modos:
É uma cláusula acessória através do qual o autor de uma liberalidade (doação, herança,
legado, manumissão) impõe ao beneficiário a obrigação de adoptar um certo
comportamento.
O modo difere da condição suspensiva: esta suspende os efeitos do negócio, enquanto a
obrigação onerada com o modo produz os seus efeitos. Nem deve confundir-se um
negócio jurídico onerado com um modo com um negócio jurídico sujeito a condição
potestativa. Devemos distinguir também o modo duma simples recomendação que não
produz efeitos jurídicos e é frequentemente feita no interesse do accipiens. O modo
desempenhou, em Roma, uma função particularmente importante: permitir obter
finalidades que o sistema romano da tipicidade dos actos jurídicos excluía. O
cumprimento do modo é um dever jurídico subsequente à recepção de liberalidade. O
direito clássico não ofereceu uma tutela directa dirigida a obrigar o beneficiário a
cumprir a sua obrigação, houve que recorrer a meios indirectos. O direito justinianeu
outorgava ao doador e aos herdeiros; havia uma condição para recuperar a res doada
quando o donatário não cumprisse o modo e também uma actio destinada à execução do
modo.
Se a actividade imposta como modo fosse impossível ou ilícita, o negócio jurídico
produzia, na época clássica, todos os seus efeitos, considerando-se o modo
acrescentado. Diferente é a solução justinianeia: o negócio jurídico somente se
considera válido se o modo impossível ou ilícito não foi o motivo determinante da
liberalidade.
76
3) Actio exercitória (refere-se a dívidas comerciais por via marítima);
4) Actio de peculio;
5) Actio de in rem verso;
6) Actio tributoria;
- Mediata ou indirecta:
Acontece quando uma pessoa actua por conta e no interesse de outra, celebra um
negócio jurídico cujos efeitos se produzem na sua esfera jurídica e depois, por força
duma relação jurídica pré-existente, é obrigada a transmitir esses efeitos à pessoa por
conta de quem e em cujo interesse actuou.
Esta relação jurídica entre representado e representante indirecto pode ser:
a)Legal: sucede com a tutela, curatela e algumas vezes na representação de pessoas
jurídicas;
b)Voluntária: Acontece com a nomeação de uma pessoa sui iuris como encarregado
de administrar todo o património ou encarregado de gerir um assunto determinado; com
o cognitor; ou quando, num contrato de mandato, alguém encarrega outra pessoa de
realizar uma determinada actividade.
No caso de alguém realizar negócio jurídicos por conta de outra pessoa sem estar
autorizado e sem pré-existir um vínculo jurídico, se esta confirmar o negócio jurídico,
assume retroactivamente perante quem realizou a mesma posição que teria se tivesse
autorizado previamente o representante. Trata-se do princípio ratihibitio mandato
comparatur, na qual, o negócio jurídico realizado pelo representante sem mandato é
considerado como se tivesse sido celebrado por um mandatário. Porém, não prejudica
os direitos eventualmente adquiridos por um terceiro entre a conclusão do negócio e a
ratificação.
77
vontade não se tenha formado de normal e são, por isso, motivações irregulares
(denomina-se vícios de vontade).
Divergência vontade-declaração:
1) Consciente ou intencional:
a) Simulação: divergência intencional entre a vontade e a declaração que procede de um
acordo entre o declarante e o declaratário e é determinada com o intuito de enganar
terceiros. Ditinguem-se a simulação absoluta (onde os simuladores fingem realizar um
negócio jurídico, mas, na verdade, não querem negócio jurídico nenhum) e simulação
relativa (na qual os simuladores fingem um negócio jurídico diferente do que na
verdade pretendem realizar).
Os efeitos da simulação variaram nas diferentes épocas do DR: na época arcaica, a
simulação era irrelevante, so se considerava a verba (declaração); Na época clássica, há
uma vasta casuística com soluções fundadas em argumentos por vezes estranhos à
simulação. Nas épocas pós-clássica e justinianeia parece ter-se imposto um conceito de
simulação que permitiu reagrupar os casos práticos.
A simulação distingue-se dos negócios:
- Imaginários: são aqueles que se tornaram formalidades utilizadas em diversos
negócios efectivamente queridos e não simulados;
- Fiduciários: São aqueles que são queridos, produzem os seus efeitos normais mas
tão limitados por pactos fidunciários.
b) Erro na declaração: o declarante declara algo de boa-fé mas na realidade diz outra.
Na época classica é visível uma orientação segundo a qual são ineficazes os negócios
jurídicos quando o erro apresente as seguintes características:
Desculpabilidade: o erro não deve tratar-se duma ignorância, cometido pelo homem
médio.
Essencialidade: se o erro não se tivesse cometido, o négocio não tinha acontecido.
Em DR há 2 tipos de negócios:
Mortis-causa: considera-se que o pensamento do disponente seja compatível com a
declaração;
78
Inter vivos: há a preocupação em coincidir a vontade com a segurança das relações
jurídicas. Importa distiguir:
1) Erro no negócio: tem a ver com a redacção do contrato. É nulo, não era a vontade;
2) Erro na pessoa: Há por exemplo, 2 gémeos, e um faz o negócio na vez do outro - É
nulo!
3) Erro no objecto: Ex: alguém diz que quer vender uma quinta mas enganou-se no
nome da quinta - o negócio é nulo.
4) Erro na quantidade: incide sobre a quantidade ou dimensões Há uma divergência e
entende-se no direito justinianeu que o negócio seria válido porque falta o consenso.
Vícios da vontade:
Pode tomar a forma de erro-vício; dolo e coacção:
1) Erro-vício: consiste na ignorância ou numa falsa ideia do declarante sobre alguma
circunstância de facto ou de direito que foi decisiva na formação da sua vontade
porque, se tivesse conhecido o verdadeiro estado das coisas, não teria querido o
negócio, ou pelo menos, não nos termos em que o comcluiu. Trata-se dum erro que
recai nos motivos que determinam a vontade.
O erro-vício pode recair sobre:
Os pressupostos do negócio;
A identidade duma pessoa;
o objecto;
Os motivos dum negócio;
2) Dolo: é uma astúcia, falácia ou maquinação utilizada para iludir, seduzir ou enganar
alguém. Trata-se de artifícios de que uma pessoa se serve para enganar outra de forma a
que manifeste a sua vontade num determinado sentido que não manifestaria ou
declararia em sentido diferente. O dolo compreende 2 momentos:
a) o conhecimento da actividade fraudulenta;
b) a decisão ou propósito de realizar essa actividade
3) Coacção: é a violência moral que consiste na ameaça dum mal grave a uma pessoa,
património ou familiar, para que faça um determinado negócio jurídico.
79
vícios que afectam os elementos internos (essenciais) desse negócio. Compreende a
nulidade (que é produzida por um vício mais grave que afecta o interesse público; e não
produz efeitos jurídicos. Pode ser total ou parcial e inicial ou sucessiva) e a
anulabilidade (é um vício menos grave e tutela fundamentalmente interesses privados.
O seu regime é diferente do que caracteriza a nulidade).
3) Ineficácia em sentido estrito: existe quando o negócio jurídico se considera válido
mas não produz todos os seus efeitos jurídicos.
- Sanação: A teoria da sanação da invalidade dos negócios jurídicos foi elaborada pelos
Pnadectístas no estudo de situações em que é possível corrigir os seus vícios e
tranformá-los em negócios plenamente válidos.
- Conversão: segundo a moderna dogmática, fala-se de conversão quando um negócio
jurídico, inválido por não satisfazer os requisitos exigidos a uma determinado tipo,
produz os efeitos jurídicos que são próprios de outro negócio. É possível se:
a) O ordenamento jurídico autorizar;
b) O primeiro negócio jurídico contiver os requisitos essenciais necessários à validade
do novo tipo;
c) A vontade hipotética das partes for nesse sentido;
d) O novo negócio proporcionar a consecução dos mesmos fins que as partes
perseguiam no primeiro.
80
Bilaterais são os negócios ou contratos em que há duas ou mais declarações de
vontade. (ex.: compra e venda, adopção, matrimónio, etc.). Dentro dos negócios
jurídicos bilaterais ou contratos, distinguem-se os contractos:
a) unilaterais: só produzem obrigações para uma das partes (ex: mútuo, doacção,etc.);
b) bilaterais: produzem obrigações para ambas as partes. (ex.: compra e venda,
arrendamento, etc.).
c) bilaterais imperfeitos: produzem inicialmente obrigação só para uma das partes,
mas há a possibilidade de, mais tarde, surgirem obrigações para a outra parte. (ex.:
comodato, depósito, penhor).
2) Negócios jurídicos formais (ou solenes) e não formais (ou não solenes):
São formais (ou solenes) os negócios jurídicos cuja existência depende da observância
duma forma precisa e taxativamente prescrita pelo ordenamento jurídico. (ex.:
macipatio, in iure cessio, stipulatio e a acceptilatio).
Não formais ou não solenes são os negócios jurídicos cuja vontade pode manifestar-se
de qualquer modo. Estes negócios pertencem aos ius civile e ao ius praetorium.
As formas através do qual a vontade se manifesta podem ser por: ad probationem ou ad
substantiam.
São inter vivos os negócios jurídicos que produzem efeitos jurídicos em vida das partes
sem ter que esperar-se pela morte do declarante. Sucede com a maioria dos negócios
jurídicos.
81
6) Negócios jurídicos iuris civilis, iuris honorarii (ou praetorium) e iuris gentium:
São negócios jurídicos do ius civile aqueles cujos efeitos jurídicos operam no campo
do ius civile. São solenes e só acessíveis aos cives romani assim como a sponsio, a
stipulatio, a mancipatio, etc.). São negócios jurídicos iuris honorarii (ou praetorium)
aqueles que, embora reconhecidos pelo ius civile, são protegidos pelo pretor no
exercício da sua função jurisdicional. São iuris gentium os negócios jurídicos que
também podem ser realizados por peregrinos como por exemplo a compra e venda.
FIM...
82