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PROBLEMATIZANDO ESTEREÓTIPOS DE GÊNERO NA EDUCAÇÃO

INFANTIL

Girlane Martins Machado


Karyne Dias Coutinho¹

Dentre os propósitos e as práticas curriculares da Educação Infantil, não é raro


identificar certa idealização da infância e da criança, muitas vezes associada aos
estereótipos, identidades de gêneros, noções históricas e culturalmente constituídas que
parecem ultrapassadas no contexto atual. Nesse contexto, a profissão de educadora
infantil também está atrelada a certa idealização do papel feminino na sociedade, ligado
ao cuidado e à maternidade. Nesse sentido, tomando-se por base especialmente os
estudos de Badinter (1985) e Ariès (1978), este trabalho teve como objetivo
problematizar idealizações e estereótipos de infância, de criança e do papel de
educadora infantil num Centro Municipal de Educação Infantil na cidade de
Natal/RN/Brasil.

Palavras-chave: Educação infantil; Relações de gênero; Sexualidade.

APRESENTAÇÃO

Atualmente, na educação infantil está muito presente a preocupação com a


formação das identidades de gênero e sexual, gestoras/es, professoras/es se indagam
como a sexualidade infantil se manifesta e como reagir à essas manifestações. As
crianças, por sua vez, procuram satisfazer suas curiosidades em torno de seus corpos e
expressam suas ânsias por explorar as diversas possibilidades de produzirem sentidos
para eles.
Não é desconhecida a observação do desconforto dos profissionais da educação
infantil quando são convidados a vivenciar situações em que as crianças expressam
sentidos relacionados à identidade de gênero e sexualidade. Muitas vezes, é exigida uma
postura que passe “segurança” e uma visão “positiva” e “saudável” sobre essas
questões.

¹Girlane Martins Machado - Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação –


Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Karyne Dias Coutinho – Professora Doutora do Departamento Departamento de Práticas


Educacionais e Currículo do Centro de Educação-Universidade Federal do Rio Grande do
Norte.
Na busca para que professoras e professores tenham a capacidade de formar
meninos e meninas, cujas identidades de gênero sejam “normais” e suas sexualidades
sejam “saudáveis”, é que muitas proposições pedagógicas são alimentadas por noções
atreladas silenciamento da diversidade sexual e à manutenção dos estereótipos de
gênero. Entendendo aqui estereótipo por uma “representação simplificada e
simplificadora, parcial, exagerada, geralmente negativa e prejudicial de um grupo,
resistente à correção pela evidência empírica” (JUNQUEIRA; ANDRADE,
CARVALHO, 2009, p.15).
Nesse sentido, na tentativa de perceber as pessoas como representantes de um
grupo, cujas características são iguais para todos, se atribui sentidos e significados aos
modos de ser menino e menina. “A escola tem sido acusada de reforçar os estereótipos
de gênero (entre outros) ao socializar crianças e adolescentes conforme as normas de
gênero, ou seja, segundo compreensões tradicionais e opressivas do que é masculino (e
“adequado” para os homens) e do que é feminino (e “adequado” para as mulheres)”
(JUNQUEIRA; ANDRADE, CARVALHO, 2009, p.15).
Dessa forma, determinadas práticas educativas continuam imprimindo traços de
diferenças, que classificam e distinguem crianças em práticas tidas como banais do
cotidiano escolar. Louro (1997, p.63) se refere a essas práticas como “práticas
rotineiras e comuns, os gestos e as palavras banalizados que precisam se tornar alvos de
atenção renovada, de questionamento e, em especial, de desconfiança”.
Intentou-se descrever e analisar cada prática discursiva enquanto enunciado,
como “um acontecimento, que nem a língua nem o sentido podem esgotar inteiramente”
(FOUCAULT, 1986, p.32), sendo assim funções que atravessam falas ou frases,
ultrapassando os limites das unidades estruturais da linguagem. Como bem Fisher
(2001, p.202) explicita: “Descrever um enunciado, portanto, é dar conta dessas
especificidades, é apreendê-lo como acontecimento, como algo que irrompe num certo
tempo, num certo lugar”.
Nesse trabalho, buscou-se perceber quais eram essas funções, que operam sobre
várias unidades, como a fala, frases ou proposições, atentando para a análise das
condições que possibilitaram a emergência de tais enunciados, ou seja procurando
contextualizar cada enunciado em sua complexidade de sentidos.
Os enunciados foram registrados em um diário de campo e as observações
ocorreram nos momentos da preparação e ida ao banho, brincadeira de “faz-de-conta”
( com adereços e fantasias) e momento livre no pátio, onde as crianças e educadoras
infantis desenvolviam desenvolviam atividades de brincadeira no parque, caixa de areia
e/ou nas “motocas” em um Centro Municipal de Educação Infantil-CMEI da cidade de
Natal/RN.
Apenas demos atenção analítica para as cenas que nossos olhares capturaram
como expressivas no que se refere aos estereótipos normalmente atrelados à infância e
criança e ao papel da educadora infantil ligado à maternidade. Como esse estudo trata-se
de uma pesquisa qualitativa, não almejou-se generalizar dados a partir da quantidade de
sujeitos da pesquisa ou de dados coletados. As noções e sentidos sobre gênero
associados à tais estereótipos foram localizados nos estudos de gênero, especialmente
em Elisabeth Badinter (1985) e Philipe Ariès (1978).

Analisando cenas

Os sujeitos das observações são crianças da faixa etária de 2 anos a 2 anos e


meio, inseridas no nível II da Educação Infantil e em sua maioria residentes de um
bairro periférico da cidade de Natal/RN. As outras sujeitas são as educadoras infantis,
Elena (nome fictício), que atuava no turno matutino e Isadora, educadora do turno
vespertino de um Centro Municipal de Educação Infantil-CMEI.
Cabe ressaltar sobre a instituição de educação infantil, que essa nem sempre
possuiu a concepção atual de “educação infantil”, associada aos eixos: educar, brincar e
cuidar. Assim, suas funções eram outras, ligadas especialmente ao cuidado da criança
para viabilizar que a mãe pudesse trabalhar e isolar as crianças da vida dos adultos.
Ariès (1978) exemplifica que na Idade Média, século XVI e início do XVII, as crianças
não eram separadas da dinâmica de vida adulta. Como exemplo, cita que dormiam na
mesma cama e brincadeiras sexuais eram comuns entre crianças e adultos. Ariès deixa
claro que os sentimentos de respeito e cuidado com a infância não existiam e a noção de
pedofilia também não.
A partir de católicos e protestantes da França e Inglaterra no final do século
XVI, é que surge um movimento de preocupação com essa fase da vida, com o uso de
uma linguagem adequada e com determinados pudores (ARIÈS, 1978). Nesse contexto,
educadores produziram uma vasta literatura, que atentava para o cuidado com os
“anjos”, crianças costumeiramente associadas à pequenos adultos ainda não
corrompidos.
Formou-se àssim essa concepção moral da infância que insistia em sua fraqueza mais do
que naquilo que M. de Grenaille chamava de sua "natureza ilustre", que associava sua
fraqueza a sua inocência, verdadeiro reflexo da pureza divina, e que colocava a
educação na primeira fileira das obrigações humanas.(ARIÈS, 1978, p.120)

Na esteira disso, cabe ressaltar que atualmente, ainda para resguardar certa
“pureza” associada à infância e às crianças, as instituições de educação infantil, como
exemplo o CMEI onde uma das pesquisadoras desse estudo atuava, estabelecem uma
rotina em que a criança é cuidada de maneira que possam preservar o que possuem de
ingênuo. Noção essa que é relacionada muitas vezes à manutenção de identidades de
gênero e sexuais fixas e simplificadas. Como exemplo, evidenciou-se que na preparação
e ida ao banho, momento que ocorre antes da segunda refeição do dia (almoço), as
crianças são separadas por sexo e as educadoras zelam para que suas genitálias não
sejam vistas e que tomem banho separadamente, primeiramente meninas e depois
meninos.
Entre as educadoras, havia certo pânico com a ideia de algum menino fosse
junto com uma menina ao banheiro. Outro receio era que as crianças se encontrassem
sozinhas no banheiro sem a vigilância de um adulto. Ao citar o Regulamento para as
crianças de Port-Royal de Jacqueline Pascal, Ariès (1978, p.121) exemplifica:

"É preciso vigiar as crianças com cuidado, e jamais deixá-las sozinhas em nenhum
lugar, estejam elas sãs ou doentes". Mas "é preciso que essa vigilância contínua seja
feita com doçura e uma certa confiança, que faça a criança pensar que é amada, e que os
adultos só estão a seu lado pelo prazer de sua companhia. Isso faz com que elas amem
essa vigilância, em lugar de temê-la.

Dessa forma, as educadoras e seus olhares vigilantes atentam as crianças:


“quando forem no banheiro, sempre nos chamem, jamais vão sozinhas”. Essas regras
também tiveram seus efeitos na construção da identidade de educadora infantil, que
costumeiramente foi associada ao papel de mãe.
A partir de uma perspectiva histórico-sociológica, Elisabeth Badinter (1985)
explicita que o amor materno, como hoje o enxergamos, teria surgido no fim do século
XVIII, por meio da qual a imagem da mãe, de seu papel e de seu comportamento eram
idealizados. Nesse sentido, analisamos alguns enunciados que evidenciavam uma
correspondência entre o papel de educadora infantil ao mito do amor materno, como a
seguinte fala da educadora Isadora durante a preparação de uma menina para o
momento do banho: “olha, criança dá trabalho, mas menina dá muito mais, é corte,
cabelo, penteado...”.
Ficou aparente a ambiguidade presente nesse enunciado. Não se sabe se a
educadora fala enquanto profissional, pois essa fala poderia muito bem advir de uma
mãe preocupada com os cuidados de uma criança. Cuidados esses atribuídos ao
estereótipo de feminilidade que dita que menina deve ter o cabelo bem arrumado,
cortado e penteado, assim como uma “princesa”.
É relevante esclarecer sobre a construção sócio-histórica em torno das noções
idealizadoras em torno do papel de mãe, visto como uma condição biológica de forte
centralidade na identidade de muitas mulheres. Ao associar a condição materna ao
instinto biológico da mulher, Badinter (1985, p.133) exemplifica que, nesse sentido, “a
mulher está submetida a esse instinto, como todos os animais...” (BADINTER, 1985,
p.133). Ainda alimentando esse sentido ligado ao ser mulher, que se confunde com o
papel de educadora infantil, é que algumas educadoras reproduzem noções de
maternidade para as crianças ao eleger histórias e brincadeiras que conduzem as
meninas a pensarem sobre cuidado de um bebê, fazer parte de uma família ou brincar de
“casinha”.
Na brincadeira do “faz de conta”, que como o próprio nome induz a pensar,
deveria estimular a criatividade e imaginação das crianças, as duas educadoras
observadas induzem as crianças a pensarem sobre seus destinos. Para as crianças do
sexo feminino, a educadora Elena é bem clara ao estimular uma brincadeira de
“casinha”, dizendo: “Vamos imaginar que vocês são adultas e que moram com seus
maridos, agora quero saber se tem filhos e quantos tem?”.
Nesse enunciado, identifica-se a noção do gênero feminino relacional à
existência do gênero masculino. A visão que uma mulher adulta só é plenamente
realizada casada e com filhos é transmitida para as crianças alunas através de várias
práticas discursivas, na medida em que sentidos ligados à paternidade são ignorados. O
“discurso moralizador” (BADINTER, 1985), naturalizado a partir de obras como Émile
de Jean-Jaques Rousseau, dita uma “natureza feminina”, cuja existência é relativa às
necessidades e vida do homem. Sobre a ideia de “complemento” do homem, Badinter
(1985, p.172) nos convida a refletir sobre a invenção de uma “natureza” feminina: “Ela
é o que o homem não é, para formar com ele, e sob suas ordens, o todo da humanidade”.
Cabe ressaltar que outras análises e problematizações dos acontecimentos
enunciativos, demonstram a preocupação e cuidado das educadoras para que as crianças
não se “desviem” dos sentidos atrelados aos estereótipos de gênero. Ainda no momento
do “faz de conta”, identificou-se essa preocupação quando José (nome fictício) busca
pulseiras e se exibe para a educadora, que imediatamente o adverte: “essas pulseiras são
para meninas”.
No entanto, José pareceu ignorar essa intervenção e continuou experimentando
pulseiras e lenços. Percebe-se que a educadora se ocupou em demarcar os adereços
através de uma visão sexista e homofóbica. Qual elemento é temível nessa brincadeira?
O fato de uma criança estar transgredindo uma norma sobre ser menino, sem dúvida,
inquietou a prática da educadora, porém a resistência da criança em continuar brincando
com as pulseiras nos aponta a não naturalidade das escolhas dos meninos por
determinados objetos culturais. Sobre essas situações, Louro (p.45, 1997) afirma:

Os meninos também brincam de boneca, levam o bebê para passear de carrinho;


brincam de casinha com as meninas e preparam comidinhas saborosas. Estas
situações são cotidianas nas creches e pré-escola, e demonstram que as crianças
pequenas ainda não foram totalmente tomadas por uma sociedade
heteronormativa, que define um único modelo de feminino e de masculino.

Em outra situação, na qual as crianças com a ajuda das professoras e auxiliares


se preparam para o banho na piscina, a professora organiza um desfile, cujas crianças,
com seus biquines e sungas, seriam as protagonistas. Nesse momento, Jorge inicia o
desfile com as mãos na cintura e todos da sala riem. Logo, a professora diz: “são as
meninas que devem pôr a mão na cintura e rebolar, os meninos mostram o muque, nada
de rebolar, viu!”.
A fala da professora revela a preocupação com a conduta das crianças, de forma
que não pareçam afeminados ou sejam chamados de “bichinha” pelos colegas. A visão
binária de gênero, também é responsável pela formação de estereótipos, ou seja, a noção
que só é possível admitir um modo de masculinidade e outro de feminilidade termina
por reprimir outras expressões e marcas de gênero. Ao descrever sobre a obra de
Rousseau, autor tão mencionado nos cursos de graduação em Pedagogia, Badinter
(1985, p.241) esclarece:

Tendo definido longamente o homem como uma criatura ativa, forte, corajosa,
inteligente e pensando na diferença sexual apenas sob a forma do “complemento”,
Rousseau estabelece logicamente como postulado que a mulher é naturalmente fraca e
passiva.

Ao estimular que meninas rebolem ao desfilar e meninos mostrem seus


“muques”, a educadora reforça a ideia de “responsabilidade moral” (ARIÈS, 1978) com
a formação identitária das crianças e uma especial vigilância aos traços que marcam o
estereótipo de feminilidade e masculinidade.
Segundo Finco (2010, p.4): “as educadoras mantêm a vigilância de modo a
garantir o cumprimento das normas sociais que dizem respeito à conduta desejável para
cada sexo”.
Assim, constata-se a resistência, transgressão ou não adaptação das crianças ao
heterosexismo, como problematizado no enunciado de duas meninas durante o “faz de
conta”, quando disseram de mãos dadas: “olha professora, vamos casar e Guga será o
filho”.
Em suma, constatou-se, através da análise de trinta enunciados oriundos dos três
situações da rotina da educação infantil observadas (hora do banho, brincadeira do faz
de conta e momento livre no pátio), que apesar da intervenção normativa, reforçadora
de estereótipos heterosexistas e da lógica binária de gênero menino/menina, as crianças
revelam e demonstram interesse e curiosidade por marcas de gênero diversas e brincam
com os papéis arquitetados pelos brinquedos, brincadeiras e situações mediadas pelas
educadoras. Dessa maneira, é necessário que educadores problematizem situações
relacionadas às práticas pedagógicas referentes à formação de papéis de gênero, que
muitas vezes fabricam opressões entre as crianças, como sexismo, machismo e
homofobia. Sintetizando, Louro (2001, p.542) afirma:

Escola, currículos, educadoras e educadores não conseguem se situar fora dessa história.
Mostram-se, quase sempre, perplexos, desafiados por questões para as quais pareciam
ter, até pouco tempo atrás, respostas seguras e estáveis. Agora, as certezas escapam, os
modelos mostram-se inúteis, as fórmulas são inoperantes. Mas é impossível estancar as
questões. Não há como ignorar as “novas” práticas, os “novos” sujeitos, suas
contestações ao estabelecido.

Considerações

Não é mais admissível que as práticas pedagógicas legitimem os destinos e


restrições que meninas e meninos devem assimilar para suas vidas. Cabe refletir que
assim, como a escola, o currículo, reproduzem culturas, modos de ser, nós, educadores,
somos ativos nesse processo e nos cabe a responsabilidade de reiterar ou transformar
determinadas noções e certezas relacionadas aos estereótipos de gênero, não permitindo
mais o silenciamento das diversas manifestações das identidades de gênero e sexuais.
Observou-se que as educadoras ainda transmitem valores religiosos que são
associados às suas funções enquanto educadoras, admitindo-se inferir nos
comportamentos, condutas e gestos, assim como uma “mãe” na vida de uma filha/o.
Também identificou-se agência na conduta das crianças, que em muitas situações, não
seguiam as normas e regras associadas sócio-historicamente para seu gênero.

Referências

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

BADINTER, Elisabeth. Um amor conquistado: o mito do amor materno. Tradução de


Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

LOURO, Guacira Lopes. Gênero, Sexualidade e Educação: uma perspectiva pós-


estruturalista. Petrópolis: Vozes, 1997.

LOURO, Guacira Lopes. Teoria queer: uma política pós-identitária para educação.
2001. Estudos Feministas., vol.9, n.2, ano 9, 2001, p.541-553.

FINCO, Daniela. Relações de gênero nas brincadeiras de meninos e meninas na


educação infantil. Proposições, vol.14, n.3 (42), set./dez., 2003, p.89-99.

FISCHER, Rosa Maria Bueno. Foucault e a análise do discurso em educação.


Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n.114, nov., 2001, p.197-223.

FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária,


1986.

JUNQUEIRA, Rogério Diniz; ANDRADE, Fernando Cézar Bezerra de; CARVALHO,


Maria Eulina Pessoa de. Gênero e Diversidade Sexual: um glossário. João Pessoa:
Universitária/UFPB, 2009.

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