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Resumo:
O positivismo jurídico no âmbito da tutela ambiental tem sua evolução em face da degradação
dos recursos naturais e na proporção das necessidades de proteção e manutenção destes recursos
para a atual e futuras gerações, o que leva o presente trabalho a perquirir a coerência da tutela
penal ambiental como ultima ratio para concretude da dignidade da pessoa humana, para a qual
a sadia qualidade de vida é imprescindível. Imperioso estudar as diversas vertentes da proteção
ao meio ambiente, no direito brasileiro, para explanar se a tutela penal ambiental guarda
coerência com a garantia da sadia qualidade de vida buscando entender se sua eficácia coíbe
os crescentes níveis da exploração predatória do meio ambiente, responsável pela ocorrência
de crimes ambientais, cujo interstício temporal se apresenta cada vez menor, afetando de forma
implacável o construto e/ou preservação da dignidade da pessoa humana, face ao
desenvolvimento da sociedade contemporânea, denominada sociedade de risco e, sua relação
intrínseca com o desenvolvimento tecnológico, econômico e social. Tais aspectos tornam o
presente trabalho parametrizado pela pesquisa bibliográfica e documental. Esta, alojada no
âmbito do arcabouço jurídico brasileiro e, aquela consubstanciada no parque da produção
didática evidenciando, livros, teses e monografias, cujo objetivo foque o meio ambiente, a
proteção jurídica ambiental, e a utilização do direito penal para proteção desse bem jurídico.
Sumário:
1. Introdução. 2. Meio ambiente. 2.1 Conceito de meio ambiente. 2.2 Dignidade da Pessoa
Humana. 2.3. Interdependência entre a dignidade da pessoa humana e o meio ambiente. 3.0
Produção da tutela ambiental. 3.1 Tutela ambiental internacional. 3.2 Tutela ambiental
brasileira. 3.2.1 Vertentes tutelares administrativa, penal e civil. 4.0 A sociedade de risco e seus
riscos. 5.0 A tutela penal como “ultima ratio”. 6.0 Considerações finais. 7.0 Referência
bibliográfica.
Palavras-chave:
TUTELA AMBIENTAL. DIGNIDADE. MEIO AMBIENTE.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por foco pesquisar a construção da tutela ambiental sua
relação com a dignidade da pessoa humana para entender se existe coerência na utilização do
direito penal como último recurso para atingimento da dignidade da pessoa humana tendo em
vista ser o meio ambiente o bem jurídico tutelado e a qualidade de vida considerada
constitucionalmente como imprescindível para a realização da dignidade da pessoa humana.
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Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro Universitário do Triângulo – UNITRI como requisito
obrigatório para a obtenção do título de bacharel em Direito, sob orientação da Profª Luciana Bernardelli. E-mail
do autor: fmauropinto@hotmail.com
Tal estudo torna-se fundamental em virtude de desastres ambientais cuja ocorrência
tem aumentado e cujos efeitos são devastadores para o meio ambiente, o que faz com que a
grande maioria da sociedade clame pela proteção penal para assegurar as garantias
constitucionais e seus direitos fundamentais, individuais e coletivos, de modo a resguardar os
bens jurídicos tutelados, o que faz com que a tutela ambiental evolua na tentativa de coibir as
degradações cada vez mais constantes do meio ambiente, enquanto a outra parte busca e
desenvolve tecnologias cada vez mais potentes para exploração dos recursos naturais e
propícias ao intento de maior lucratividade, desprezando os efeitos negativos de seu uso e
colocando em risco não só os direitos transindividuais difusos mas, a dignidade da pessoa
humana e como ocorrido ultimamente a própria vida.
A problemática, perseguida como foco deste estudo, recebe uma abordagem
dedutiva, cuja pesquisa bibliográfica se debruçará sobre materiais já produzidos com base em
livros, artigos científicos, cursos, material didático e documental. Para tanto, a leitura crítica da
legislação vigente, artigos científicos acerca do tema estudado, jurisprudência, dentre outros
que disponham sobre as sanções administrativa, civil e penal ambiental nas condutas e ações
danosas e ou de risco ao meio ambiente e a qualidade de vida, através da lesão ou ameaça de
lesão ao meio ambiente, para entender a coerência do mecanismo da tutela jurídica penal, como
ultima ratio no alcance da dignidade da pessoa humana.
Desenvolve-se o presente trabalho em sua primeira parte explanando sobre os temas
meio ambiente e dignidade da pessoa humana, relacionando a interdependência entre esta e o
meio ambiente. Na segunda parte aborda-se a produção da tutela ambiental internacional,
nacional e suas vertentes administrativa, civil e penal, como demonstrativo de sua evolução.
Em terceira parte descreve a sociedade de risco, seu papel e os riscos oriundos do uso de
poderosas tecnologias relacionando-as com o uso da tutela penal como ultima ratio.
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No Brasil, o conceito legal é expresso pela Lei nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981,
que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e traz a seguinte definição: "Art. 3º -
Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - Meio ambiente, o conjunto de condições,
leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a
vida em todas as suas formas".
No entanto, cabe observar que os demais incisos pertencentes à referida lei e ao
mesmo artigo 3º, além de complementarem a definição legal do termo meio ambiente,
estabelecem a significância de vertentes ambientais outras como forma de estender ao máximo
a abrangência conceitual e, ao mesmo tempo, torna-lo didaticamente prático segmentando-o
como estratégia de preenchimento de possíveis lacunas não atingidas plenamente pelo
significado estabelecido no inciso I, senão vejamos:
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A dignidade é o valor de que se reveste tudo aquilo que não tem preço, ou seja, que
não é passível de ser substituído por um equivalente. Dessa forma, a dignidade é uma
qualidade inerente aos seres humanos enquanto entes morais: na medida em que
exercem de forma autônoma a sua razão prática, os seres humanos constroem distintas
personalidades humanas, cada uma delas absolutamente individual e insubstituível.
(2005, 2).
[...] temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada
ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do
Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e
deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de
cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais
mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa
e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os
demais seres humanos. (2005, p. 9).
Aliás, condições estas, as quais o ser humano, por livre arbítrio, institui patamar
almejado como ideal para seu padrão de vida e presente desde seus relacionamentos sociais até
sua realização material, quer sejam subjetivos ou objetivos, ressaltando inexoravelmente,
habitação, trabalho, saúde, lazer, conforto térmico, estabilidade financeira, bens materiais,
iluminação e segurança pública, educação, mobilidade, saneamento básico, qualidade do ar,
transporte público, qualidade das águas, paz, dentre outras, pois não há como parametrizar
conteúdo absoluto para a dignidade da pessoa humana, vez que esta depende de projetos
existenciais diversos e do entendimento singular acerca da felicidade. O que é absoluto é o
direito à dignidade e não a dignidade da pessoa humana em si, cujo conteúdo é relativo. E,
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conforme se observa, o homem deve ser merecedor, donde se deduz que o ser humano tem de
buscar o seu lugar de destaque, conforme ele assim o entenda, defina e deseje pois sem sua
vontade, determinação e direcionamento de suas ações não logrará êxito em alcançar o lugar
almejado.
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Destarte segundo assertiva conceitual de Immanuel Kant,
(...) No reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa
tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se
acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende
uma dignidade. (2007 p.77)
Mas, não é só isso. O princípio da dignidade da pessoa humana traz em seu bojo
tamanha importância, de corolário da Constituição Brasileira, que o sobrepõe, como norteador,
de todos os bens, valores e demais princípios constitucionais, embora não haja entre eles, via
de regra, hierarquização e nem exclusão.
Logo tais objetivos e condições requerem para seu atingimento circunstâncias que
trazem de forma explícita ou implícita a necessidade de uma garantia maior, como preconiza o
artigo 225 da Carta Maior de 1988,
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- Grifo nosso.
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Desta forma, o Princípio fundamental da Dignidade da Pessoa Humana figura como
norteador do arcabouço jurídico brasileiro abrangendo múltiplas vertentes cujos valores
existenciais advêm do contrato social vigente e são, por excelência, valores inerentes e
exclusivos do ser humano.
Deduz que tais valores não se restringem aos aspectos materiais, mas, alinhavam os
demais direitos focando o homem como destinatário do meio ambiente ecologicamente correto,
direito transindividual, coletivo, essencial para o construto da dignidade da pessoa humana.
Enfim, alinhavando todos as possibilidades legais e intergeracionais de usufruto dos
direitos, como afirma Édis Milaré, [...] “a rigor não existe uma rígida separação entre os direitos
das diferentes gerações, pois todos convergem para que a dignidade humana seja constituída e
preservada”. (2015, p.131).
De tal forma, resta estabelecido na Política Nacional do Meio Ambiente, Lei nº
6.938, de 31 de agosto de 1981, em seu artigo 3º, inciso I que meio ambiente: “É o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,
abriga e rege a vida em todas suas formas”.
Definição esclarecedora na qual o homem como integrante do meio ambiente
constitui seu centro vital, ora como receptáculo dos bens e serviços advindos deste, ora como
detentor de direitos e deveres relacionados à sua preservação, fatores essenciais para acesso e
construção da dignidade da pessoa humana, preceito este do qual todo homem é dotado.
Conceituações outras se encontram disseminadas pelo Brasil, mas que
simplesmente, adequam a este conceito legal o texto de sua definição, mantendo integralmente
a concepção acima expressa.
A tutela jurídica ao meio ambiente, de maneira universal, tem sua evolução em face
da degradação dos recursos naturais e na proporção da evolução concienscional das
necessidades de proteção e manutenção destes recursos, como reflexos da explosão da chamada
consciência ecológica, cujo despertar trouxe a criação e disseminação de movimentos sociais,
em prol da defesa do meio ambiente, pelo viés da organização de setores da sociedade civil, as
ONG’S (organizações não governamentais) ambientalistas.
Assim, a escalada do positivismo protetivo, no âmbito da tutela ambiental, tem por
escopo a exploração predatória dos recursos naturais que aliada ao desenvolvimento da
sociedade contemporânea, denominada sociedade de risco e sua relação intrínseca com o
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desenvolvimento tecnológico, econômico e social recebe forte clamor social no enfrentamento
das lesões ou ameaça de lesão ao meio ambiente.
As ideias ecológicas ganharam o mundo a partir da década de 70, e os grupos, agora
reconhecidos, pelo poder de agregar cada vez mais simpatizantes às suas propostas,
extrapolaram seus ideais, antes ambientais, passando a se envolverem em aspectos outros da
vida social. Estimulando a sociedade, ávida por segurança, a clamar pela tutela penal para
realizar a esperança de dignidade, em todos os aspectos, conforme promessa constitucional.
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a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. Por fim, em
setembro de 2015, ocorreu em Nova York, na sede da ONU, a Cúpula de Desenvolvimento
Sustentável, na qual, todos os países membros da ONU definiram os novos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável, os ODS, como finalização do trabalho dos ODM - Objetivos do
Milênio. E, embora com prazo para 2030, mas com o trabalho começando desde já, a agenda
2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Em 1997, na cidade de Quioto, no Japão, é firmado o Protocolo de Quioto, no qual
o Brasil teve participação intensa e fundamental, tanto na elaboração de propostas, como em
iniciativas referentes ao evento em si, servindo de interlocutor entre os países desenvolvidos e
os em desenvolvimento, cujo objetivo principal consistia na sensibilização e adesão dos países
na campanha para redução da emissão de gases poluentes.
O Protocolo de Quioto inicia sua aplicação no Brasil a partir do Decreto Legislativo
número 144, de 20 de junho de 2002 que o aprova. Sendo ratificado em 23 de agosto de 2002
e promulgado em 12 de maio de 2005 pelo Decreto 5445.
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consagra concretude e evolução, permitindo eco às novas tendências e teorias ambientais e
dentre outros pontos contribuiu para aprimorar a tutela brasileira.
A Constituição Federal/88 traz, pois, a obrigatoriedade para as tratativas da
problemática ambiental, como parte integrante e indispensável para a qualidade de vida,
essencial à dignidade da pessoa humana, conforme se depreende do Capítulo VI, parte do Título
VIII, da Constituição Federal, intitulado “Da Ordem Social”.
Assim, a disposição central, referente ao Direito Ambiental, funda-se no art. 225 da
Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, in verbis:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum
do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
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artigo 170 consta a ordem econômica como garantidora do meio ambiente. No Parágrafo 3º do
artigo 174 resta estabelecido a proteção ambiental na atividade garimpeira cooperativa. Os
artigos 182 e 183 normalizam o meio ambiente construído, chamado urbano ou artificial. Reza
o artigo 186 requisitos para cumprimento da função social da propriedade rural relacionados
com a qualidade de vida. Refere-se o artigo 200 ao papel da saúde como colaboradora na
proteção ambiental e, ainda nos artigos 215 e 216 contornos de tratativas para o ambiente
cultural ambiental.
Evidenciada pela recepção no texto constitucional, a proteção ambiental traz à baila
o enfrentamento de questões cruciais para o meio ambiente, como a transindividualidade e a
responsabilização criminal ambiental da pessoa jurídica. Restando melhor evidenciado o
alcance positivo sobre a coletividade no artigo 81, do atual Código de Defesa do Consumidor -
CDC, in verbis:
A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser
exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe
de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes
de origem comum.
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diferentemente das pessoas físicas, o que encontra lastro nos ensinamentos de Celso Antônio
Pacheco Fiorillo:
Art. 45. Ficam obrigados ao registro no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis - IBAMA os estabelecimentos comerciais
responsáveis pela comercialização de motosserras, bem como aqueles que
adquirirem este equipamento;
()
§ 3º A comercialização ou utilização de motosserras sem a licença a que se refere este
artigo constitui crime contra o meio ambiente, sujeito à pena de detenção de 1 (um) a
3 (três) meses e multa de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos de referência e a
apreensão da motosserra, sem prejuízo da responsabilidade pela reparação dos danos
causados.
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Como se percebe, facilmente os crimes ambientais permaneciam impunes,
considerados de menor potencial ofensivo pois não se leva em conta a abrangência de sua
danosidade ou o real prejuízo causado pelo dano. Outro fato que chama a tenção eram as
circunstâncias nas quais a discricionariedade permitia ao Magistrado Julgador estranhamente
decidir, sem maiores critérios, ao bel prazer, por um quantum de aumento da pena privativa
de liberdade.
Ressalva se faz que os motivos de edição deste Código estão enraizados no
desenvolvimento agrícola, no avanço da mecanização e da pecuária extensiva cujas propostas
tecnológicas requeriam parâmetros legais para que sua implantação legal não fosse causa de
degradações ambientais desmedidas.
Características outras se referiam a reincidência, a intenção do auferimento de
lucro, a coação de alguém para consecução do crime, a condição do servidor público, o tempo
do crime, se cometido em finais de semana, à noite ou feriados, dentre outros. Mas todos sob
o manto da atualização do Código de 1934, em atendimento às nova demandas da época.
O ciclo se repete, a evolução tecnológica e empreendedora exige demandas que
requerem atenção especial por parte da tutela legal para que o bem jurídico protegido não
sofra ameaça ou lesão.
Atualmente, o advento de tecnologias inovadoras, o empreendedorismo da
sociedade de risco e o clamor social exigem novas atualizações da tutela ambiental
conduzindo o seu desenvolvimento a outro patamar cuja elasticidade do direito penal se faz
presente na tutela ambiental que alojada em vertentes temáticas permite que se puna a ameaça
de dano ou o dano ambiental em três esferas distintas: administrativa, civil e penal.
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Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou
disciplinando direito, interesse ou liberdade, regular a prática de ato ou abstenção de
fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos
costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à
tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou
coletivos.
[...] não basta apenas fiscalizar: é preciso ainda - e acima de tudo – controlar o
emprego de técnicas, bem como a manipulação de substâncias no fabrico de produtos
que, por suas propriedades, acabam por comprometer a vida e o equilíbrio do meio
ambiente. (2015. p. 188).
Além disso, os bens jurídicos coletivos não são novidades no Direito Penal e
exclusividade da sociedade de riscos, a exemplo dos crimes de moeda falsa,
existente desde tempos remotos. Embora a sociedade de risco certamente tenha
acarretado significativo aumento no catálogo de bens dignos de tutela penal, não
provocou sua desnaturação. Todavia, apesar de não serem novidade na legislação
penal, tais bens não têm merecido a devida atenção da dogmática. Este abandono
tem incrementado as constantes críticas feitas aos bens jurídicos coletivos, que têm
sido questionados por sua vagueza e indeterminação e pela consequente utilização
dos tipos de perigo abstrato como instrumento de tutela. (2015 p. 149).
O termo sociedade de risco tem sua origem atribuída a Ulrich Beck conforme:
O sociólogo alemão Ulrich Beck, no seu livro intitulado “Sociedade do Risco”, faz
um diagnóstico sobre a sociedade em seus diversos momentos históricos até chegar
ao momento atual (sociedade pós-moderna) em cujo contexto trabalha com a palavra
"riscos", em suas várias dimensões. Parte-se da ideia de que, em toda a história da
humanidade, os mesmos sempre existiram, porém, em grau e extensão diferentes,
posto que, num primeiro momento, tratava-se de riscos pessoais; num segundo
momento, mais especificamente na sociedade moderna clássica, os riscos atingiram
uma proporção maior, vindo a afetar a coletividade, devendo-se a isso, à
falta/deficiência do suprimento de algo, como, por exemplo, da falta de higienização
que propiciava o surgimento de epidemias etc.; na sociedade pós-moderna o quadro é
outro, os riscos com maior extensão atingem a sociedade, principalmente por excesso
de produção industrial, como, por exemplo, o excesso de poluentes que atingem a
camada de ozônio, o meio ambiente como um todo, comprometendo assim, as
gerações contemporâneas e futuras. (VIEIRA; ROBALDO. 2011. p.187)
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A evolução social guarda estreita relação com a dignidade da pessoa humana, de tal
forma que se torna lógica a equação em que crescente a insegurança aumenta-se na mesma
proporção a busca por proteção. Neste diapasão ocorreu o surgimento de novos bens jurídicos,
como é o caso do meio ambiente e, neste contexto o Direito Penal, dada as suas peculiaridades
é invocado como salvador da pátria.
Há que se ressaltar, no entanto, que o Direito tem por parâmetros implícitos a
sublime função tutelar dos bens jurídicos tanto quanto a contenção do jus puniendi do Estado
e, em decorrência dos novos bens jurídicos com viés ambiental e da evolução social fomentada
a passos largos pela tecnologia e pela lucratividade, necessário então evoluir para alcançar, de
forma plena, as novas demandas da sociedade.
Neste viés, onde o lucro é o alvo, nada mais importa ao empreendedor senão auferir
maior vantagem econômica, cujo custo tornam os meios justificativas cabíveis para eles e seus
fins. A este respeito observamos a seguinte lição de Eliel Matias Rosa:
Há que se notar que a busca insana na qual não se observa a responsabilidade social,
a intergeracionalidade e a ética nas tomadas de decisões institucionais como pressupostos de
garantia da sobrevivência humana, extrapola os limites ditados pelo princípio do
desenvolvimento sustentável na busca do equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a
sustentabilidade, o que afronta a dignidade e a qualidade de vida, restando então buscar no
direito penal o garantismo constitucional para acesso à dignidade da pessoa humana.
Ora, se a interpretação correta dos ditames legais é o que conduz a uma decisão
acertada, qual seria então esta decisão reta, senão a disponibilização efetiva do meio ambiente
ecologicamente equilibrado, conforme preceitua o Estado? E de que forma assegurar esta
garantia, protegendo esta e as gerações futuras de uma possível falta de recursos ambientais?
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conjunta do risco e do dano do empreendimento e seu potencial poluidor. O que de certa forma
trouxe uma evolução na regulamentação do meio ambiente a nível internacional, contribuindo,
sobremaneira, para melhor entendimento e transparência dos resultados advindos das ações
humanas desenvolvidas no meio ambiente, incorporando então características de
gerenciamento, planejamento e mecanismos de coerção ambientais.
Ao positivar o direito de “todos” à sadia qualidade de vida, portanto, ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, fator imprescindível para que tal se efetive, conforme se
depreende do texto constitucional, e instituir a responsabilidade como função dever do Poder
Público e da sociedade na sua defesa e preservação para as presentes e futuras gerações, o
Estado coloca em cena a tutela jurídica ambiental cujo exercício se efetiva através do poder de
polícia ambiental, tendo por ferramenta principal, a fiscalização.
Vários temas exigem conhecimentos específicos, por abordarem, o dinamismo e a
interdependência do meio ambiente dentre suas múltiplas vertentes, tais como meio ambiente
natural, artificial, do trabalho, do patrimônio genético, do ambiente cultural, etc., que internaliza
e empresta de vários ramos do direito seu positivismo, o que torna evidente o ser humano, e,
consequentemente, a vida como foco central desta tutela.
Se por um lado a escalada da devastação ambiental despertou o ser humano para
uma realidade assustadora, até então, inusitada, revelando o uso de processos produtivos
incompatíveis ou inadequados à preservação ambiental, por outro, os meios de comunicação,
cada vez mais, anunciam ilícitos, ou catástrofes ambientais que afetam diretamente a qualidade
de vida e, consequentemente, a dignidade da pessoa humana, visto ser aquela essencial para a
concretude desta. Direitos, para os quais, a sociedade requer, cada vez mais, a penalização como
via de garantismo.
Neste interim, resta claro a reação da população, que ao tomar conhecimento do
ocorrido, extravasa um mister de amor e revolta, baseados nas informações recebidas sobre os
ilícitos. Amor, em forma de apego à justiça, ao direito positivado, à esperança de resolver vez
por todas a reparação do dano, o retorno ao status quo ante. Revolta, que enfatiza a descrença
nas autoridades responsáveis e envolvidas no contexto da ilicitude, o que agrava a extensão do
dano, leva à comoção social e pode ensejar insegurança jurídica.
Desta forma clara é a concepção de que a evolução da tutela ambiental sofre
interferência direta dos danos sofridos e denota dinamismo face à evolução da sociedade de
risco, que exige cada vez mais segurança no exercício do desenvolvimento econômico, social
e da qualidade de vida. No entanto, embora ultrapasse o objetivo deste trabalho, necessário se
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tornam estudos e inovações não só na definição do bem jurídico tutelado, mas também quanto
ao conteúdo e estrutura do injusto penal conforme assevera Túlio Arantes Bozola:
(...) faz-se necessário estudar a evolução dogmática de tal instituto, pois o que se
observa é que o desenvolvimento do bem jurídico acompanha o processo de evolução
de outros institutos do Direito Penal, em especial os delitos de perigo abstrato. (2015.
p.132)
A proteção de bens jurídicos não se realiza só mediante o Direito Penal, senão que
nessa missão cooperem todo o instrumental do ordenamento jurídico. O Direito Penal
é, inclusive, a última dentre todas as medidas protetoras que devem ser consideradas,
quer dizer que somente se pode intervir quando falhem outros meios de solução social
do problema, como a ação civil, os regulamentos de polícia, as sanções não penais,
etc. Por isso se denomina a pena como a “última ratio" da política social e se define
sua missão como proteção subsidiária de bens jurídicos. (2002 – p.65).
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Embora carente de resposta afirmativa que contemple e assegure a disponibilização
efetiva do meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme preceitua o Estado, para
proteção desta e das futuras gerações é certo que o patamar atingido pelas inovações contidas
no texto legal merece todo o aplauso, embora não se garanta por si só, pois barreiras outras há
que vencer, como por exemplo as de origem doutrinária responsáveis para sua melhor aceitação
e, sobretudo, sobrevida, vez que seu dinamismo e desenvolvimento continuará vinculado aos
propósitos da sociedade de risco.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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uso, e que parecem se rotularem, e a seus familiares, como intocáveis frente aos resultados das
tragédias ambientais criminosas e provocadas pelas ações e atitudes do homem.
Isto posto, conclui-se que a coerência da tutela penal ambiental como ultima ratio
em relação à construção da dignidade da pessoa humana, resta prejudicada em face da
fragilização de fatores essenciais dadas as circunstâncias apontadas tais como, a penalização
simbólica do direito penal em relação aos resultados nem sempre passíveis de presunção dos
crimes ambientais, o dogmatismo jurídico e a flexibilização de requisitos técnicos e legais,
construtores da escalada de acesso à dignidade da pessoa humana a qual alicerça-se na
qualidade de vida.
É preciso mais, muito mais. É necessário o respeito ao meio ambiente e ao ser.
É necessário, sobretudo, aprender e compreender que o ter nem sempre vale mais.
COSTA. Vinicius. Uma breve História da relação do Brasil com o Meio Ambiente.
IBRACAM. Viçosa – MG. Fev. 2109. Disponível Em: < https://ibracam. com.br/blog/uma-
breve-historia-da-relacao-do-brasil-com-o-meio >. Acesso em: 19 mar. 2019.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro.14. ed. rev.,
ampl. e atual. em face da Rio+20 e do novo “Código” Florestal — São Paulo: Saraiva, 2013.
922p. p.78–144.
23
KANT. Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. 54 - Metafísica dos
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Tradução: Paulo Quintela. Casagraf. 2007. p. 39–90.
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SIRVINKAS. Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. – 9ª ed. ver. e ampl. São Paulo -
Ed. Saraiva, 2011.
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