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A (IN) COERÊNCIA DA TUTELA PENAL AMBIENTAL COMO ULTIMA RATIO

PARA CONCRETUDE DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Francisco Mauro Rodrigues Pinto 1

Resumo:
O positivismo jurídico no âmbito da tutela ambiental tem sua evolução em face da degradação
dos recursos naturais e na proporção das necessidades de proteção e manutenção destes recursos
para a atual e futuras gerações, o que leva o presente trabalho a perquirir a coerência da tutela
penal ambiental como ultima ratio para concretude da dignidade da pessoa humana, para a qual
a sadia qualidade de vida é imprescindível. Imperioso estudar as diversas vertentes da proteção
ao meio ambiente, no direito brasileiro, para explanar se a tutela penal ambiental guarda
coerência com a garantia da sadia qualidade de vida buscando entender se sua eficácia coíbe
os crescentes níveis da exploração predatória do meio ambiente, responsável pela ocorrência
de crimes ambientais, cujo interstício temporal se apresenta cada vez menor, afetando de forma
implacável o construto e/ou preservação da dignidade da pessoa humana, face ao
desenvolvimento da sociedade contemporânea, denominada sociedade de risco e, sua relação
intrínseca com o desenvolvimento tecnológico, econômico e social. Tais aspectos tornam o
presente trabalho parametrizado pela pesquisa bibliográfica e documental. Esta, alojada no
âmbito do arcabouço jurídico brasileiro e, aquela consubstanciada no parque da produção
didática evidenciando, livros, teses e monografias, cujo objetivo foque o meio ambiente, a
proteção jurídica ambiental, e a utilização do direito penal para proteção desse bem jurídico.

Sumário:
1. Introdução. 2. Meio ambiente. 2.1 Conceito de meio ambiente. 2.2 Dignidade da Pessoa
Humana. 2.3. Interdependência entre a dignidade da pessoa humana e o meio ambiente. 3.0
Produção da tutela ambiental. 3.1 Tutela ambiental internacional. 3.2 Tutela ambiental
brasileira. 3.2.1 Vertentes tutelares administrativa, penal e civil. 4.0 A sociedade de risco e seus
riscos. 5.0 A tutela penal como “ultima ratio”. 6.0 Considerações finais. 7.0 Referência
bibliográfica.

Palavras-chave:
TUTELA AMBIENTAL. DIGNIDADE. MEIO AMBIENTE.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por foco pesquisar a construção da tutela ambiental sua
relação com a dignidade da pessoa humana para entender se existe coerência na utilização do
direito penal como último recurso para atingimento da dignidade da pessoa humana tendo em
vista ser o meio ambiente o bem jurídico tutelado e a qualidade de vida considerada
constitucionalmente como imprescindível para a realização da dignidade da pessoa humana.

1
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro Universitário do Triângulo – UNITRI como requisito
obrigatório para a obtenção do título de bacharel em Direito, sob orientação da Profª Luciana Bernardelli. E-mail
do autor: fmauropinto@hotmail.com
Tal estudo torna-se fundamental em virtude de desastres ambientais cuja ocorrência
tem aumentado e cujos efeitos são devastadores para o meio ambiente, o que faz com que a
grande maioria da sociedade clame pela proteção penal para assegurar as garantias
constitucionais e seus direitos fundamentais, individuais e coletivos, de modo a resguardar os
bens jurídicos tutelados, o que faz com que a tutela ambiental evolua na tentativa de coibir as
degradações cada vez mais constantes do meio ambiente, enquanto a outra parte busca e
desenvolve tecnologias cada vez mais potentes para exploração dos recursos naturais e
propícias ao intento de maior lucratividade, desprezando os efeitos negativos de seu uso e
colocando em risco não só os direitos transindividuais difusos mas, a dignidade da pessoa
humana e como ocorrido ultimamente a própria vida.
A problemática, perseguida como foco deste estudo, recebe uma abordagem
dedutiva, cuja pesquisa bibliográfica se debruçará sobre materiais já produzidos com base em
livros, artigos científicos, cursos, material didático e documental. Para tanto, a leitura crítica da
legislação vigente, artigos científicos acerca do tema estudado, jurisprudência, dentre outros
que disponham sobre as sanções administrativa, civil e penal ambiental nas condutas e ações
danosas e ou de risco ao meio ambiente e a qualidade de vida, através da lesão ou ameaça de
lesão ao meio ambiente, para entender a coerência do mecanismo da tutela jurídica penal, como
ultima ratio no alcance da dignidade da pessoa humana.
Desenvolve-se o presente trabalho em sua primeira parte explanando sobre os temas
meio ambiente e dignidade da pessoa humana, relacionando a interdependência entre esta e o
meio ambiente. Na segunda parte aborda-se a produção da tutela ambiental internacional,
nacional e suas vertentes administrativa, civil e penal, como demonstrativo de sua evolução.
Em terceira parte descreve a sociedade de risco, seu papel e os riscos oriundos do uso de
poderosas tecnologias relacionando-as com o uso da tutela penal como ultima ratio.

2. MEIO AMBIENTE E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

2.1 CONCEITO DE MEIO AMBIENTE

O conceito internacional de meio ambiente propagado pela Organização


das Nações Unidas é definido como: “Meio ambiente é o conjunto de elementos físicos,
químicos, biológicos e sociais que podem causar efeitos diretos ou indiretos sobre os seres
vivos e as atividades humanas” (COSTA, 2019, p.1).

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No Brasil, o conceito legal é expresso pela Lei nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981,
que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e traz a seguinte definição: "Art. 3º -
Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - Meio ambiente, o conjunto de condições,
leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a
vida em todas as suas formas".
No entanto, cabe observar que os demais incisos pertencentes à referida lei e ao
mesmo artigo 3º, além de complementarem a definição legal do termo meio ambiente,
estabelecem a significância de vertentes ambientais outras como forma de estender ao máximo
a abrangência conceitual e, ao mesmo tempo, torna-lo didaticamente prático segmentando-o
como estratégia de preenchimento de possíveis lacunas não atingidas plenamente pelo
significado estabelecido no inciso I, senão vejamos:

(...) II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características


do meio ambiente;
III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que
direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais
estabelecidos;
IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável,
direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;
V - recursos ambientais, a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas,
os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo e os elementos da biosfera.

Assim o caráter explicativo da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente dispõe


conceitualmente o objeto e a forma das variáveis ambientais a que se refere e que compõe o
todo do bem jurídico tutelado, deixando antever de maneira transparente e sem subterfúgios os
núcleos verbais dos componentes do conjunto a que se refere a concepção expressada no artigo
supracitado de forma a açambarcar com sua amplitude toda e qualquer possibilidade de geração,
manutenção e preservação da vida sobre o planeta, envolvendo vertentes significativas e
passíveis de serem afetadas pelos danos causados pela ação humana.
Tal explicação deixa claro que qualquer alteração no sistema ambiental provocada
pela ação humana coloca em risco a vida, desta e das futuras gerações.

2.2. DIGINIDADE DA PESSOA HUMANA

Nas colocações de Kant (2004) apud Vitor Santos Queiroz (2005),

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A dignidade é o valor de que se reveste tudo aquilo que não tem preço, ou seja, que
não é passível de ser substituído por um equivalente. Dessa forma, a dignidade é uma
qualidade inerente aos seres humanos enquanto entes morais: na medida em que
exercem de forma autônoma a sua razão prática, os seres humanos constroem distintas
personalidades humanas, cada uma delas absolutamente individual e insubstituível.
(2005, 2).

Conforme se percebe no enunciado kantiniano, a dignidade expressa valores


intrínsecos, subjetivos, absolutos, de caráter singular e, nos dizeres de Vitor Santos Queiroz
(2005, 17), que continua afirmando em sua explanação, que (...) “a noção de Kant acerca da
autonomia racional do ser humano serve como um dos fundamentos teóricos do princípio da
dignidade humana...”.
Traduzidos e exponenciados na Carta Magna de 1988 pelo Princípio da Dignidade
da Pessoa Humana, tais valores encerram em si a garantia ao cidadão do acesso ao bem-estar
individual e coletivo, inclusive da inviolabilidade de seus direitos pelo Estado, tornando assim
corolário da Constituição brasileira vigente.
Corolário este que não garante a dignidade da pessoa humana, mas assegura que
pelo esforço próprio, esta pessoa tenha acesso às condições necessárias para alicerçar sua
dignidade.
Desta forma, preceitua Ingo Wolfgang Sarlet ao conceituar a dignidade da pessoa
humana:

[...] temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada
ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do
Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e
deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de
cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais
mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa
e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os
demais seres humanos. (2005, p. 9).

Aliás, condições estas, as quais o ser humano, por livre arbítrio, institui patamar
almejado como ideal para seu padrão de vida e presente desde seus relacionamentos sociais até
sua realização material, quer sejam subjetivos ou objetivos, ressaltando inexoravelmente,
habitação, trabalho, saúde, lazer, conforto térmico, estabilidade financeira, bens materiais,
iluminação e segurança pública, educação, mobilidade, saneamento básico, qualidade do ar,
transporte público, qualidade das águas, paz, dentre outras, pois não há como parametrizar
conteúdo absoluto para a dignidade da pessoa humana, vez que esta depende de projetos
existenciais diversos e do entendimento singular acerca da felicidade. O que é absoluto é o
direito à dignidade e não a dignidade da pessoa humana em si, cujo conteúdo é relativo. E,

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conforme se observa, o homem deve ser merecedor, donde se deduz que o ser humano tem de
buscar o seu lugar de destaque, conforme ele assim o entenda, defina e deseje pois sem sua
vontade, determinação e direcionamento de suas ações não logrará êxito em alcançar o lugar
almejado.

2.3. A INTERDEPENDÊNCIA ENTRE A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O MEIO


AMBIENTE.

A ligação inata entre o meio ambiente e a vida imputa a esta a dependência


incontinenti àquele, vez que não se concebe, com naturalidade, vida digna sem um ambiente
adequadamente digno, pois para que haja vida inteligente necessário se torna ter também um
lugar apropriado, a não ser que isolemos o ser humano ou escalonemos o entendimento do que
seja dignidade. Há de ressaltar, neste tocante, a existência de meios outros que sejam
alternativos.
Assim é que no Brasil, como presente primeiro, reconhecido de público e garantido
constitucionalmente, desde sua concepção, recebe o nascituro, o direito à personalidade
jurídica. Presente este que não vem só, mas que traz embutido a efetivação da condição de
pessoa humana e como tal portadora de aptidão para possuir e desfrutar, de imediato, de direitos
e obrigações. Portanto, de um lado, direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum de todos e, de outro, obrigações, que derivadas também da Constituição
Brasileira de 1.988, exponenciam a interdependência entre meio ambiente e qualidade de vida,
inerente à dignidade da pessoa humana, que tem por escopo ser o fiel do equilíbrio no que se
refere à exploração responsável e a manutenção preditiva dos recursos naturais para a presente
e futuras gerações.
Logo, o direito à vida e, sobretudo, a uma vida digna, cujo elo legal se depreende,
de início, do art. 1º, III, da Constituição Federal de 1988, estampado no Princípio da Dignidade
da Pessoa Humana como pilar da República Federativa do Brasil e, como direito e garantia
fundamental do indivíduo em seu art. 5º, inciso III ao proibir a tortura e o tratamento degradante
ou desumano. Fundamentos de garantia a liberdade, segurança, propriedade e a inviolabilidade
do direito à vida como condicionantes essenciais para efetivação do acesso à dignidade humana.
A dignidade da pessoa humana lastreia o direito internacional, perpassando por
Tratados, Carta das Nações Unidas (1945), Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948),
Conferências ambientais, (1972, 1992, 1997, 2002, 2012), cujos relatórios apontam diretrizes
para políticas públicas, dentre outros, o que foge ao foco deste trabalho.

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Destarte segundo assertiva conceitual de Immanuel Kant,

(...) No reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa
tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se
acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende
uma dignidade. (2007 p.77)

Dignidade, cuja definição negativa do conceito na doutrina brasileira, tem seu


fundamento na tese kantiniana, a qual pressupõe duas premissas básicas: “a) toda conduta que
trate o ser humano como meio e, b) toda conduta que externalize menosprezo em relação à
condição humana. Ambas, se violadas, caracterizam agressão à dignidade da pessoa humana.”
(KANT, 2007 p.77).
Pois bem, pelo viés humanitário ou social, a dignidade da pessoa humana nos
remete como norteador do Estado Democrático de Direito, a conceitos subjetivos como ética,
moral, religiosidade, espiritualidade etc. Valores esses, inerentes ao ser humano, cuja
concepção e aplicabilidade encontram respaldo em inúmeros tratados internacionais, nos quais
o fundamento tem por linha mestra não a efetivação da dignidade da pessoa humana, mas
simplesmente a garantia de acesso ao direito à dignidade da pessoa humana, como princípio
basilar universal, tornando exponencial os direitos sociais inerentes a todo e qualquer ser
humano.
Tais assertivas, de pronto, nos permite enfatizar que a natureza, tal qual se
apresenta, aliada aos fatores valorativos, comumente designados como fatores artificiais ou
construídos, inerentes ao ser humano, resultam, sem sombra de dúvidas, no elemento de
composição do meio ambiente, cuja abrangência conceitual demonstra conglobabilidade e,
sobretudo, finitude.
Lição esclarecedora nos oferta Pedro Lenza citando José Afonso da Silva:

O meio ambiente é, assim, a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e


culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas
formas. A integração busca assumir uma concepção unitária do ambiente
compreensiva dos recursos naturais e culturais. (2012 - p.1425).

Logo, conjugar, de maneira qualiquantitativa características ambientais


relacionando-as com a efetivação de uma melhor qualidade de vida, pressupõe tratar com iguais
pesos e medidas as relações entre meio ambiente e a dignidade da pessoa humana. A qualidade
de vida representa as condições eleitas pelo ser humano como ideal para se viver. O que deixa
transparecer em sua raiz aspectos como a subjetividade e, sobretudo, a presença de dimensões
positivas e negativas, tais como: a felicidade, o conforto, a segurança, a insegurança, o medo e,
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a dor, ou seja, qualidade de vida que se traduz em matriz de valores do entendimento de
condições dignas de vida.
Tais valores e entendimentos são pressupostos de necessidades individualizadas do
ser humano e requerem juízo de valor singular e inerente às condições de vida de cada um, por
se tratar de eleições subjetivas e de foro íntimo, cujo significado é especial e particular para
cada um. O que significa dizer que a valoração de vida expressada pelo ser humano começa e
termina nele e em função dele.

O princípio da dignidade da pessoa humana está previsto, de maneira expressa, na


Constituição Federal de 1988 e em diversos tratados internacionais. Trata-se de um
princípio que tem intrinsicamente, conforme a doutrina, diversas dimensões. Estas
dão o contorno da dignidade da pessoa humana. A dimensão da não
instrumentalização aponta para a necessidade de observar o ser humano como um fim
em si mesmo e não como um meio para se atingir uma vontade (outro fim ainda que
legítimo), ainda que esse indivíduo pratique atos absolutamente contrários ao
ordenamento jurídico-constitucional, haveria de se respeitar a sua qualidade como
pessoa humana, como sujeito de direitos. (ALMEIDA, 2014 - p 3).

Mas, não é só isso. O princípio da dignidade da pessoa humana traz em seu bojo
tamanha importância, de corolário da Constituição Brasileira, que o sobrepõe, como norteador,
de todos os bens, valores e demais princípios constitucionais, embora não haja entre eles, via
de regra, hierarquização e nem exclusão.
Logo tais objetivos e condições requerem para seu atingimento circunstâncias que
trazem de forma explícita ou implícita a necessidade de uma garantia maior, como preconiza o
artigo 225 da Carta Maior de 1988,

[...] todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,


bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”2,
impondo-se ao Estado e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-
lo para as presentes e futuras gerações.

Ou seja, sendo o ambiente favorável para a concretização de uma vida digna


alinhava a qualidade ambiental como inerente à dignidade da pessoa humana. Logo, se a
dignidade é um atributo essencial da pessoa humana pelo simples fato de "ser humana”, então
a pessoa é merecedora de todo o respeito independente de origem, raça, sexo, crença, idade,
estado civil ou condição social e econômica, bastando para tanto que este ser possua, ou que a
vida lhe tenha concedido, a condição humana.

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- Grifo nosso.
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Desta forma, o Princípio fundamental da Dignidade da Pessoa Humana figura como
norteador do arcabouço jurídico brasileiro abrangendo múltiplas vertentes cujos valores
existenciais advêm do contrato social vigente e são, por excelência, valores inerentes e
exclusivos do ser humano.
Deduz que tais valores não se restringem aos aspectos materiais, mas, alinhavam os
demais direitos focando o homem como destinatário do meio ambiente ecologicamente correto,
direito transindividual, coletivo, essencial para o construto da dignidade da pessoa humana.
Enfim, alinhavando todos as possibilidades legais e intergeracionais de usufruto dos
direitos, como afirma Édis Milaré, [...] “a rigor não existe uma rígida separação entre os direitos
das diferentes gerações, pois todos convergem para que a dignidade humana seja constituída e
preservada”. (2015, p.131).
De tal forma, resta estabelecido na Política Nacional do Meio Ambiente, Lei nº
6.938, de 31 de agosto de 1981, em seu artigo 3º, inciso I que meio ambiente: “É o conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,
abriga e rege a vida em todas suas formas”.
Definição esclarecedora na qual o homem como integrante do meio ambiente
constitui seu centro vital, ora como receptáculo dos bens e serviços advindos deste, ora como
detentor de direitos e deveres relacionados à sua preservação, fatores essenciais para acesso e
construção da dignidade da pessoa humana, preceito este do qual todo homem é dotado.
Conceituações outras se encontram disseminadas pelo Brasil, mas que
simplesmente, adequam a este conceito legal o texto de sua definição, mantendo integralmente
a concepção acima expressa.

3. A PRODUÇÃO DA TUTELA AMBIENTAL

A tutela jurídica ao meio ambiente, de maneira universal, tem sua evolução em face
da degradação dos recursos naturais e na proporção da evolução concienscional das
necessidades de proteção e manutenção destes recursos, como reflexos da explosão da chamada
consciência ecológica, cujo despertar trouxe a criação e disseminação de movimentos sociais,
em prol da defesa do meio ambiente, pelo viés da organização de setores da sociedade civil, as
ONG’S (organizações não governamentais) ambientalistas.
Assim, a escalada do positivismo protetivo, no âmbito da tutela ambiental, tem por
escopo a exploração predatória dos recursos naturais que aliada ao desenvolvimento da
sociedade contemporânea, denominada sociedade de risco e sua relação intrínseca com o

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desenvolvimento tecnológico, econômico e social recebe forte clamor social no enfrentamento
das lesões ou ameaça de lesão ao meio ambiente.
As ideias ecológicas ganharam o mundo a partir da década de 70, e os grupos, agora
reconhecidos, pelo poder de agregar cada vez mais simpatizantes às suas propostas,
extrapolaram seus ideais, antes ambientais, passando a se envolverem em aspectos outros da
vida social. Estimulando a sociedade, ávida por segurança, a clamar pela tutela penal para
realizar a esperança de dignidade, em todos os aspectos, conforme promessa constitucional.

3.1. TUTELA AMBIENTAL INTERNACIONAL

Na medida em que os problemas ambientais se avolumaram, ao ponto de


ameaçarem o bem jurídico meio ambiente, passaram a despertar a atenção de todos e, em razão
deles, é que surgiram os movimentos das Conferências, dos Tratados, dentre outros, todos
atrelados aos principais problemas ambientais: poluição urbana e das águas, aquecimento global
e desmatamento cujos efeitos ameaçam ou causam lesão a direitos difusos, transindividuais e
acabam por comprometer a qualidade de vida o que dificulta a ascensão à dignidade da pessoa
humana.
Advindo do desenvolvimento da consciência ambiental que explodiu na década de
70, um grupo de estudiosos de diversas nações, intitulado Clube de Roma, realizou a primeira
reunião que tratou sobre meio ambiente, determinando por objetivo do grupo elaborar um
balanço dos problemas ambientais a nível mundial; buscar soluções e propor novas políticas
governamentais como forma de reduzir os danos causados ao meio ambiente. Este trabalho
resultou no relatório denominado de “The limits to growth” (Os limites do crescimento).
Surge então, o primeiro documento internacional que alude à preservação dos
recursos naturais, que remonta a 1972, quando da primeira grande conferência-marco na área
de meio ambiente, Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em
Estocolmo, da qual extraiu-se cinco princípios considerados como mais relevantes dentre os 26
anotados, são eles: o do poluidor pagador; da precaução; da responsabilidade comum e o da
cooperação entre os povos e, o do desenvolvimento sustentável. Este último ressalta a influência
do Tratado de Quioto no ordenamento jurídico pátrio, correlacionado com o princípio da
dignidade da pessoa humana.
Em 1992 ocorreu no Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento, chamada Rio 92. Dez anos depois, em 2002, ocorreu em
Joanesburgo, na África do Sul, a Rio+10, e em 2012, novamente no Rio de Janeiro, ocorreu

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a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. Por fim, em
setembro de 2015, ocorreu em Nova York, na sede da ONU, a Cúpula de Desenvolvimento
Sustentável, na qual, todos os países membros da ONU definiram os novos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável, os ODS, como finalização do trabalho dos ODM - Objetivos do
Milênio. E, embora com prazo para 2030, mas com o trabalho começando desde já, a agenda
2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Em 1997, na cidade de Quioto, no Japão, é firmado o Protocolo de Quioto, no qual
o Brasil teve participação intensa e fundamental, tanto na elaboração de propostas, como em
iniciativas referentes ao evento em si, servindo de interlocutor entre os países desenvolvidos e
os em desenvolvimento, cujo objetivo principal consistia na sensibilização e adesão dos países
na campanha para redução da emissão de gases poluentes.
O Protocolo de Quioto inicia sua aplicação no Brasil a partir do Decreto Legislativo
número 144, de 20 de junho de 2002 que o aprova. Sendo ratificado em 23 de agosto de 2002
e promulgado em 12 de maio de 2005 pelo Decreto 5445.

3.2. TUTELA AMBIENTAL BRASILEIRA

A tutela ambiental brasileira navega pelos princípios jurídicos positivados de


diversos ramos do Direito brasileiro, dentre eles, constitucional, administrativo, ambiental,
penal, processual penal, civil etc., com fluidez e ao mesmo tempo autonomia o que reafirma o
caráter uno do Direito.
Historicamente, temos que a Carta do Império de 1824, pelo viés da proteção à
saúde humana, traz por marco inicial lei disciplinando o tema, embora implicitamente, da saúde
ambiental. A Constituição Republicana de 1891 institui a competência legislativa da União para
legislar sobre minas e terras. A partir da Constituição de 1934, alargam os horizontes da
proteção ambiental ao instituir competência legislativa para a União em matéria de riquezas do
subsolo, mineração, águas, floresta, caça, pesca e a sua exploração; proteção às belezas naturais,
ao patrimônio histórico, artístico e cultural. Já, as Cartas seguintes, 1946 e 1947, basicamente,
mantiveram o texto anterior. Em 1969 o Governo Militar manteve as mesmas disposições
anteriores e surpreendeu com a introdução do vocábulo “ecológico” no texto legal.
Alastrando por diversos regimes, cuja ideologia dominante influencia o texto
positivado, a edição da tutela ao meio ambiente alcança no Brasil, em 1988, a Constituição
Verde, recebendo dedicação exponencial, trazendo além da garantia a direitos de 1ª, 2ª e 3ª
dimensões/gerações, a inclusão do capítulo VI, dedicado ao meio ambiente (art. 225) que

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consagra concretude e evolução, permitindo eco às novas tendências e teorias ambientais e
dentre outros pontos contribuiu para aprimorar a tutela brasileira.
A Constituição Federal/88 traz, pois, a obrigatoriedade para as tratativas da
problemática ambiental, como parte integrante e indispensável para a qualidade de vida,
essencial à dignidade da pessoa humana, conforme se depreende do Capítulo VI, parte do Título
VIII, da Constituição Federal, intitulado “Da Ordem Social”.
Assim, a disposição central, referente ao Direito Ambiental, funda-se no art. 225 da
Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, in verbis:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum
do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Extrai-se deste dispositivo constitucional a assertiva de necessidade da tutela


jurisdicional para efetivação dos direitos e deveres dele emanados, o que nos reporta ao art. 5º,
inciso XXXV da Constituição Federal de 1988: (...) “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”, cujo entendimento sobressai como garantia de aporte do
Judiciário, na defesa e preservação do meio ambiente para os titulares desse direito, sobre o
qual cabe a observação de que o mesmo ultrapassa a esfera da individualidade, atingindo a da
coletividade, cuja natureza indivisível torna este direito coletivo, difuso, transindividual, de
terceira geração.
A percepção ou conscientização da finitude dos recursos naturais impõe a
necessidade de enfrentamento à exploração desenfreada e o fim ao descaso para com o meio
ambiente, trazendo ao bojo constitucional de 1988 a proteção do meio ambiente.
Nasce, neste contexto, com a recepção pela Constituição Federal, no Capítulo VI,
dedicado ao meio ambiente, o status constitucional para disposições legais anteriores, como p.
ex. a Lei nº 6.938, de 31/08/81, referendada como um dos marcos da vertente ambiental por
instituir a Política Nacional do Meio Ambiente, que traz sua finalidade e o ferramental
necessário à sua eficácia. Importante apontar que a proteção constitucional ao meio ambiente
se encontra também em outros dispositivos externos ao capítulo dedicado.
Tal proteção constitucional se refere a uma gama variada de temas. O artigo: 5º,
inciso LXXIII traz a ação popular como meio de proteção ambiental. Temos nos artigos 20 ao
24 e 30, fragmentos ambientais como bens da União, atribuição à União, Estados, Municípios
e ao Distrito Federal de competências administrativas e legislativas sobre o meio ambiente. No
artigo 129, tem-se o Ministério Público como defensor institucional do meio ambiente. Já no

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artigo 170 consta a ordem econômica como garantidora do meio ambiente. No Parágrafo 3º do
artigo 174 resta estabelecido a proteção ambiental na atividade garimpeira cooperativa. Os
artigos 182 e 183 normalizam o meio ambiente construído, chamado urbano ou artificial. Reza
o artigo 186 requisitos para cumprimento da função social da propriedade rural relacionados
com a qualidade de vida. Refere-se o artigo 200 ao papel da saúde como colaboradora na
proteção ambiental e, ainda nos artigos 215 e 216 contornos de tratativas para o ambiente
cultural ambiental.
Evidenciada pela recepção no texto constitucional, a proteção ambiental traz à baila
o enfrentamento de questões cruciais para o meio ambiente, como a transindividualidade e a
responsabilização criminal ambiental da pessoa jurídica. Restando melhor evidenciado o
alcance positivo sobre a coletividade no artigo 81, do atual Código de Defesa do Consumidor -
CDC, in verbis:

A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser
exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe
de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes
de origem comum.

A importância da responsabilização criminal ambiental da pessoa jurídica se revela,


principalmente, na submissão dos grandes empreendedores ambientais à igualdade perante a
lei, vez que antes tinham por parâmetros legais tão somente a vertente administrativa, cuja
eficiência deixa a desejar no que se refere à punição do risco ou do dano ambiental causado em
razão de sua fragilidade física, material e administrativa.
Assim, tornava fácil burlar ou subornar o sistema e suas formas de regulamentação
jurídica para defesa dos recursos naturais pois a eficácia da proteção estatal não passava, na
maioria dos crimes ambientais noticiados, de letra morta da lei colocada à disposição de
negociatas e falcatruas em detrimento da efetiva fiscalização das atividades que envolvem
maior complexidade.
Pessoas jurídicas normalmente requerem, por aspectos próprios, maior potencial
organizativo, disponibilidade de investimentos lastreados por tecnologias de ponta, capital de
giro, “know-how”, dentre outros, para empreenderem suas atividades, fatores que os classificam

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diferentemente das pessoas físicas, o que encontra lastro nos ensinamentos de Celso Antônio
Pacheco Fiorillo:

A penalização da pessoa jurídica foi um dos avanços trazidos pela Constituição


Federal de 1988. Avanço na medida em que se constatava que as grandes degradações
ambientais não ocorriam por conta de atividades singulares, desenvolvidas por
pessoas físicas. Elas apresentavam-se de forma corporativa. Com isso, fez-se
necessário, a exemplo de outros países (como França, Noruega, Portugal e
Venezuela), que a pessoa jurídica fosse responsabilizada penalmente. (2013. p. 84)

Responsabilização esta oriunda da recepção dos tratados internacionais, pela Carta


magna de 1988, conforme depreendido do §2º, de seu artigo 5º, o qual reza que, (...) “os direitos
e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos
princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do
Brasil seja parte”. Entra em cena, dentre outros, a responsabilização e penalização da pessoa
jurídica.
Após a Constituição Federal de 1988 surge a Lei 9605/98, Lei dos Crimes
Ambientais também denominada Código Penal Ambiental, que sistematizou as leis esparsas
até então existentes sobre o tema, mas pelas peculiaridades advindas em seu bojo, merecem
trabalho específico pois fogem ao contexto deste. Todavia, a título de mudança tutelar
significativa para o meio ambiente, citamos a elevação do status das condutas lesivas ao meio
ambiente de contravenção penal para crime, vez que facilmente os crimes ambientais
permaneciam impunes, considerados de menor potencial ofensivo, pois tais condutas, até
então, eram tratadas e punidas como contravenção penal conforme o caput do artigo 26 do
Código Florestal de 1965, in verbis: “Art. 26. Constituem contravenções penais, puníveis com
três meses a um ano de prisão simples ou multa de uma a cem vezes o salário-mínimo mensal,
do lugar e da data da infração ou ambas as penas cumulativamente”.

A exceção se referia ao artigo 45, § 3º, do mesmo códex, in verbis:

Art. 45. Ficam obrigados ao registro no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis - IBAMA os estabelecimentos comerciais
responsáveis pela comercialização de motosserras, bem como aqueles que
adquirirem este equipamento;
()
§ 3º A comercialização ou utilização de motosserras sem a licença a que se refere este
artigo constitui crime contra o meio ambiente, sujeito à pena de detenção de 1 (um) a
3 (três) meses e multa de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos de referência e a
apreensão da motosserra, sem prejuízo da responsabilidade pela reparação dos danos
causados.

13
Como se percebe, facilmente os crimes ambientais permaneciam impunes,
considerados de menor potencial ofensivo pois não se leva em conta a abrangência de sua
danosidade ou o real prejuízo causado pelo dano. Outro fato que chama a tenção eram as
circunstâncias nas quais a discricionariedade permitia ao Magistrado Julgador estranhamente
decidir, sem maiores critérios, ao bel prazer, por um quantum de aumento da pena privativa
de liberdade.
Ressalva se faz que os motivos de edição deste Código estão enraizados no
desenvolvimento agrícola, no avanço da mecanização e da pecuária extensiva cujas propostas
tecnológicas requeriam parâmetros legais para que sua implantação legal não fosse causa de
degradações ambientais desmedidas.
Características outras se referiam a reincidência, a intenção do auferimento de
lucro, a coação de alguém para consecução do crime, a condição do servidor público, o tempo
do crime, se cometido em finais de semana, à noite ou feriados, dentre outros. Mas todos sob
o manto da atualização do Código de 1934, em atendimento às nova demandas da época.
O ciclo se repete, a evolução tecnológica e empreendedora exige demandas que
requerem atenção especial por parte da tutela legal para que o bem jurídico protegido não
sofra ameaça ou lesão.
Atualmente, o advento de tecnologias inovadoras, o empreendedorismo da
sociedade de risco e o clamor social exigem novas atualizações da tutela ambiental
conduzindo o seu desenvolvimento a outro patamar cuja elasticidade do direito penal se faz
presente na tutela ambiental que alojada em vertentes temáticas permite que se puna a ameaça
de dano ou o dano ambiental em três esferas distintas: administrativa, civil e penal.

3.2.1. VERTENTES TUTELARES PENAL, ADMINISTRATIVA E CIVIL.

Resulta do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, as diretrizes referentes às


tutelas administrativa, penal e civil guarnecidas em seu parágrafo 3º, “(...) as condutas e
atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou
jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os
danos causados”.
Pelo disposto assevera-se a possibilidade de penalização tripla cumulativa, quando
da apuração e sanção ao agente causador do dano ambiental seja ele pessoa física ou jurídica,
trazendo à cena o Poder de Polícia como ferramental da Administração pública ao qual se impõe
conforme conceito dado pelo artigo 78 do CTN – Código Tributário Nacional, in verbis:

14
Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou
disciplinando direito, interesse ou liberdade, regular a prática de ato ou abstenção de
fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos
costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à
tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou
coletivos.

Logo o Poder de Polícia ambiental administrativa efetiva a supremacia do interesse


público sobre o particular ao realizar sua principal atividade, a fiscalização. Sua proatividade
permite a prevenção de danos e lesões ao meio ambiente por englobar permissões, licenças ou
aprovações de estudos técnicos como requisitos ao empreendimento, cuja análise prévia é de
suma importância por possibilitar antever as especificidades e dimensões de um dano futuro.
A esse respeito, entendendo a fragilidade das instituições e dos operadores do poder
de polícia, assevera Édis Milaré,

[...] não basta apenas fiscalizar: é preciso ainda - e acima de tudo – controlar o
emprego de técnicas, bem como a manipulação de substâncias no fabrico de produtos
que, por suas propriedades, acabam por comprometer a vida e o equilíbrio do meio
ambiente. (2015. p. 188).

Afirma-se então a deficitária estrutura fiscalizatória brasileira que denota


possibilidades, cada vez mais frequentes, de flexibilização dos atos administrativos
discricionários como a fiscalização e o controle, colocando em risco a prazo e custos
incalculáveis, pelo desconhecimento cultural dos efeitos facilitados e do valor dos recursos
naturais irracionalmente explorados, os resultados obtidos com tal tolerância.
No âmbito civil, a tutela ambiental se perfaz em três categorias e tem por objetivo
na categoria reparatória o conserto do dano, pois não há mais como coibi-lo e quiçá repará-lo
como se tem visto atualmente. Já na classe preventiva, as ações se voltam para o semeio de
alternativas viáveis para solução da problemática ambiental, através da educação ambiental e
de estudos de minimização do risco. E, por fim, no contexto repressivo, ocorre a
responsabilização civil do agente infrator seja ele pessoa jurídica ou física, para o qual se utiliza
de sanções de natureza administrativas e ou pecuniárias na persecução de sua finalidade.
Com fama de ter caráter justiceiro, por trazer a restrição da liberdade como pena,
a tutela penal ambiental se enquadra como patrocinador da proteção e preservação do meio
ambiente, vez que para a sociedade seus efeitos parecem mais palpáveis evidenciando melhor
resguardo do gozo ao meio ambiente e consequentemente à dignidade da pessoa humana o
que, sem dúvida, é bem visto pela sociedade, enchendo-lhe os olhos, frente aos estragos cada
vez mais noticiados pelo uso indiscriminado da tecnologia.
15
Consequentemente, se a sociedade demonstra carência na posse e usufruto do bem
jurídico meio ambiente e exala avidez pelo cumprimento de seu papel por parte do Direito,
cabe ao Estado enfrentar os desafios face ao dinamismo tecnológico e a necessidade de novos
e específicos conhecimentos, nas áreas do saber e do desenvolvimento humano, exigência
desta vertente tutelar cuja lapidação técnica se faz necessária.
A este respeito bem leciona o ilustre Mestre Túlio Arantes Bozola:

Além disso, os bens jurídicos coletivos não são novidades no Direito Penal e
exclusividade da sociedade de riscos, a exemplo dos crimes de moeda falsa,
existente desde tempos remotos. Embora a sociedade de risco certamente tenha
acarretado significativo aumento no catálogo de bens dignos de tutela penal, não
provocou sua desnaturação. Todavia, apesar de não serem novidade na legislação
penal, tais bens não têm merecido a devida atenção da dogmática. Este abandono
tem incrementado as constantes críticas feitas aos bens jurídicos coletivos, que têm
sido questionados por sua vagueza e indeterminação e pela consequente utilização
dos tipos de perigo abstrato como instrumento de tutela. (2015 p. 149).

A edição da Lei 9.605/1998 inverteu a posição da tutela ambiental que antes


socorria-se da legislação esparsa, dos Códigos Penal, Civil, da Lei de Contravenções Penais
etc., detentora agora de dispositivo legal específico aos crimes contra o meio ambiente
incluindo infrações ambientais administrativas, processo penal e cooperação internacional
inerentes à preservação do bem jurídico protegido, dentre outros aspectos fundamentais.
O que evidencia a evolução da tutela jurídica ambiental na tentativa de
acompanhamento da ousadia dos empreendimentos ambientais cujos riscos colocam em
perigo o equilíbrio ambiental.

4. A SOCIEDADE DE RISCO E SEUS RISCOS.

O termo sociedade de risco tem sua origem atribuída a Ulrich Beck conforme:
O sociólogo alemão Ulrich Beck, no seu livro intitulado “Sociedade do Risco”, faz
um diagnóstico sobre a sociedade em seus diversos momentos históricos até chegar
ao momento atual (sociedade pós-moderna) em cujo contexto trabalha com a palavra
"riscos", em suas várias dimensões. Parte-se da ideia de que, em toda a história da
humanidade, os mesmos sempre existiram, porém, em grau e extensão diferentes,
posto que, num primeiro momento, tratava-se de riscos pessoais; num segundo
momento, mais especificamente na sociedade moderna clássica, os riscos atingiram
uma proporção maior, vindo a afetar a coletividade, devendo-se a isso, à
falta/deficiência do suprimento de algo, como, por exemplo, da falta de higienização
que propiciava o surgimento de epidemias etc.; na sociedade pós-moderna o quadro é
outro, os riscos com maior extensão atingem a sociedade, principalmente por excesso
de produção industrial, como, por exemplo, o excesso de poluentes que atingem a
camada de ozônio, o meio ambiente como um todo, comprometendo assim, as
gerações contemporâneas e futuras. (VIEIRA; ROBALDO. 2011. p.187)

16
A evolução social guarda estreita relação com a dignidade da pessoa humana, de tal
forma que se torna lógica a equação em que crescente a insegurança aumenta-se na mesma
proporção a busca por proteção. Neste diapasão ocorreu o surgimento de novos bens jurídicos,
como é o caso do meio ambiente e, neste contexto o Direito Penal, dada as suas peculiaridades
é invocado como salvador da pátria.
Há que se ressaltar, no entanto, que o Direito tem por parâmetros implícitos a
sublime função tutelar dos bens jurídicos tanto quanto a contenção do jus puniendi do Estado
e, em decorrência dos novos bens jurídicos com viés ambiental e da evolução social fomentada
a passos largos pela tecnologia e pela lucratividade, necessário então evoluir para alcançar, de
forma plena, as novas demandas da sociedade.
Neste viés, onde o lucro é o alvo, nada mais importa ao empreendedor senão auferir
maior vantagem econômica, cujo custo tornam os meios justificativas cabíveis para eles e seus
fins. A este respeito observamos a seguinte lição de Eliel Matias Rosa:

A sociedade hoje é baseada no risco. Em qualquer ação do homem em sua


singularidade, das instituições privadas e dos entes públicos, o risco está envolvido.
Tudo se baseia na especulação e no levantamento inicial de hipóteses que poderão ou
não tornar realidade. A busca incessante por lucro é o principal combustível que
fomenta a constante presença do risco. Toda a máquina social, em seus diversos
âmbitos, setores e ramos, é direta ou indiretamente movimentada pelo interesse na
lucratividade. Muitos outros interesses surgem então, diferente daqueles que deveriam
ser os legítimos interesses humanos, institucionais e de governos. Antes de sanar
determinada dificuldade de algumas pessoas, o homem busca localizar ali um
mercado consumidor em potencial ou um segmento ainda não explorado
comercialmente. (2013, p. 02)

Os riscos sociais advindos de atos lesivos ou ameaçadores ao meio ambiente como


devastação, desequilíbrio, contaminação, exploração excessiva etc., por um lado afrontam de
pronto a própria sociedade, atingindo frontalmente as regras positivadas para seu próprio
convívio pacífico. Por outro, avançam devastadoramente sobre os bens tutelados, para o que
requer-se de imediato respostas que evidenciem a proteção destes bens e a garantia destes
direitos.
Assim, de um lado, posto está o avanço do construto da tutela jurídica ambiental,
cujo objetivo protetor se realiza à medida que surgem novas ameaças. De outro, ameaças
potencializadas sob o uso de tecnologias, cujos resultados são incipientes no campo do
conhecimento humano, no tocante ao futuro desta e das gerações vindouras, quando da
exploração dos recursos naturais, relegando a segundo plano a finitude dos mesmos e
fomentando despudoradamente a denominada sociedade de risco que passa a produzir não só o
risco quantitativo mas também o qualitativo, como bem preleciona Ulrich Beck,
17
Não sabemos se vivemos em um mundo algo mais arriscado que aquele das gerações
passadas. Não é a quantidade de risco, mas a qualidade do controle ou – para ser mais
preciso – a sabida impossibilidade de controle das consequências das decisões
civilizacionais que faz a diferença histórica. Por isso, eu uso o termo “incertezas
fabricadas. (...) Na era do risco, as ameaças com as quais nos confrontamos não podem
ser atribuídas a Deus ou à natureza, mas à própria “modernização” e ao próprio
“progresso”. Assim, a cultura do medo vem do fato paradoxal de que as instituições
feitas para controlar produzem incontrolabilidade. (ULRICH BECK, p.7)

Há que se notar que a busca insana na qual não se observa a responsabilidade social,
a intergeracionalidade e a ética nas tomadas de decisões institucionais como pressupostos de
garantia da sobrevivência humana, extrapola os limites ditados pelo princípio do
desenvolvimento sustentável na busca do equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a
sustentabilidade, o que afronta a dignidade e a qualidade de vida, restando então buscar no
direito penal o garantismo constitucional para acesso à dignidade da pessoa humana.

5. A TUTELA PENAL AMBIENTAL COMO “ULTIMA RATIO”.

Ora, se a interpretação correta dos ditames legais é o que conduz a uma decisão
acertada, qual seria então esta decisão reta, senão a disponibilização efetiva do meio ambiente
ecologicamente equilibrado, conforme preceitua o Estado? E de que forma assegurar esta
garantia, protegendo esta e as gerações futuras de uma possível falta de recursos ambientais?

Com o advento da Carta Maior, em 05 de outubro de 1.988, o Brasil efetiva o marco


constitucional da proteção ao meio ambiente, cujo espaço, até então timidamente entrecortado
no ordenamento jurídico brasileiro, evidencia agora especial atenção à problemática ambiental
e sua proteção, delegando e impondo ao Estado e à sociedade deveres e direitos, uns de forma
expressa, outros, quer pela complexidade, quer pela pontualidade, aguardariam posterior
regulamentação.
O novo arcabouço jurídico-institucional do Brasil consagrou cláusulas
transformadoras com o objetivo de alterar as relações econômicas, políticas e sociais, trazendo,
dentre outras, a ampliação das liberdades civis e dos direitos e garantias individuais, a
instituição da política agrícola e fundiária, as leis de proteção ao meio ambiente e com elas a
imposição de responsabilidade à sociedade e ao Estado pela preservação dos recursos naturais
para a presente e futuras gerações.
Entra em cena, neste contexto, a responsabilidade intergeracional, cujo sistema
jurídico, agora com viés ambientalista, busca a prevenção e/ou a reparação da lesão ou ameaça
de lesão ao meio ambiente a partir de parâmetros constitucionais que parametrizam a análise

18
conjunta do risco e do dano do empreendimento e seu potencial poluidor. O que de certa forma
trouxe uma evolução na regulamentação do meio ambiente a nível internacional, contribuindo,
sobremaneira, para melhor entendimento e transparência dos resultados advindos das ações
humanas desenvolvidas no meio ambiente, incorporando então características de
gerenciamento, planejamento e mecanismos de coerção ambientais.
Ao positivar o direito de “todos” à sadia qualidade de vida, portanto, ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, fator imprescindível para que tal se efetive, conforme se
depreende do texto constitucional, e instituir a responsabilidade como função dever do Poder
Público e da sociedade na sua defesa e preservação para as presentes e futuras gerações, o
Estado coloca em cena a tutela jurídica ambiental cujo exercício se efetiva através do poder de
polícia ambiental, tendo por ferramenta principal, a fiscalização.
Vários temas exigem conhecimentos específicos, por abordarem, o dinamismo e a
interdependência do meio ambiente dentre suas múltiplas vertentes, tais como meio ambiente
natural, artificial, do trabalho, do patrimônio genético, do ambiente cultural, etc., que internaliza
e empresta de vários ramos do direito seu positivismo, o que torna evidente o ser humano, e,
consequentemente, a vida como foco central desta tutela.
Se por um lado a escalada da devastação ambiental despertou o ser humano para
uma realidade assustadora, até então, inusitada, revelando o uso de processos produtivos
incompatíveis ou inadequados à preservação ambiental, por outro, os meios de comunicação,
cada vez mais, anunciam ilícitos, ou catástrofes ambientais que afetam diretamente a qualidade
de vida e, consequentemente, a dignidade da pessoa humana, visto ser aquela essencial para a
concretude desta. Direitos, para os quais, a sociedade requer, cada vez mais, a penalização como
via de garantismo.
Neste interim, resta claro a reação da população, que ao tomar conhecimento do
ocorrido, extravasa um mister de amor e revolta, baseados nas informações recebidas sobre os
ilícitos. Amor, em forma de apego à justiça, ao direito positivado, à esperança de resolver vez
por todas a reparação do dano, o retorno ao status quo ante. Revolta, que enfatiza a descrença
nas autoridades responsáveis e envolvidas no contexto da ilicitude, o que agrava a extensão do
dano, leva à comoção social e pode ensejar insegurança jurídica.
Desta forma clara é a concepção de que a evolução da tutela ambiental sofre
interferência direta dos danos sofridos e denota dinamismo face à evolução da sociedade de
risco, que exige cada vez mais segurança no exercício do desenvolvimento econômico, social
e da qualidade de vida. No entanto, embora ultrapasse o objetivo deste trabalho, necessário se

19
tornam estudos e inovações não só na definição do bem jurídico tutelado, mas também quanto
ao conteúdo e estrutura do injusto penal conforme assevera Túlio Arantes Bozola:

(...) faz-se necessário estudar a evolução dogmática de tal instituto, pois o que se
observa é que o desenvolvimento do bem jurídico acompanha o processo de evolução
de outros institutos do Direito Penal, em especial os delitos de perigo abstrato. (2015.
p.132)

No entanto, nos crimes ambientais o noticiário aponta vários fatores e novidades


tecnológicas cujo custo benefício parece apostar descaradamente, por incrível que pareça, nas
limitações e/ou pior, na flexibilização do poder de polícia, na fragilidade da vertente civil,
dentre outros, impondo riscos à qualidade de vida e, consequentemente, à dignidade da pessoa
humana. Riscos e ilícitos cuja percepção não é facilmente assimilada pelo cidadão mediano,
tornando seu apego e apelo, cada vez mais arraigado, à tutela penal ambiental, como
responsável pela correção necessária.
Acolhedor e esclarecedor é o posicionamento de Guilherme de Souza Nucci
conforme conceituou:

O direito penal não deve interferir em demasia na vida do indivíduo, retirando-lhe


autonomia e liberdade. Afinal, a lei penal não deve ser vista como a primeira opção
(prima ratio) do legislador para compor os conflitos existentes em sociedade e que,
pelo atual estágio de desenvolvimento moral e ético da humanidade, sempre estarão
presentes. (...) O direito penal é considerado ultima ratio, isto é, a última cartada do
sistema legislativo, quando se entende que outra solução não pode haver senão a
criação de lei penal incriminadora, impondo sanção penal ao infrator.” (...) “Enfim, o
direito penal deve ser visto como subsidiário aos demais ramos do direito.
Fracassando outras formas de punição ou de composição de conflitos, lança-se mão
da lei penal para coibir comportamentos desregrados, que possam lesionar bens
jurídicos tutelados. (2014. p. 66)

Parece linear o pensamento doutrinário no tocante à utilização do dispositivo penal


na proteção ambiental, a qual pressupõe que só deve ser utilizado desde que as demais vertentes
tutelares tenham exposto sua ineficácia perante o caso concreto, de forma que a utilização do
direito penal não se transforme em “prima ratio” para solução dos delitos ambientais.
Tanto a criação de uma nova legislação ou a extensão penal para o resguardo do
meio ambiente e do direito ao mesmo, conforme a garantia constitucional propõe, devem trazer
por objetivo, além do entrelaçamento das medidas protetivas, maior severidade nas
penalizações, considerando por agravantes o alto custo de recuperação, quando possível, do
dano causado, a afronta à dignidade da pessoa humana e, sobretudo, à vida.
Para tanto, quando possível a capacitação institucional, tornando tais medidas
protetivas e punitivas eficazes e salutares o suficiente para sanar ou mitigar as enfermidades
20
ambientais decorrentes de sua fragilidade ou da sua flexibilização. Contexto para o qual Claus
Roxin define:

A proteção de bens jurídicos não se realiza só mediante o Direito Penal, senão que
nessa missão cooperem todo o instrumental do ordenamento jurídico. O Direito Penal
é, inclusive, a última dentre todas as medidas protetoras que devem ser consideradas,
quer dizer que somente se pode intervir quando falhem outros meios de solução social
do problema, como a ação civil, os regulamentos de polícia, as sanções não penais,
etc. Por isso se denomina a pena como a “última ratio" da política social e se define
sua missão como proteção subsidiária de bens jurídicos. (2002 – p.65).

Outro fator a se considerar é o tratamento dado ao ilícito ambiental pela Lei nº


9.605/98 de 12 de fevereiro de 1998, cuja disposição sobre sanções penais e administrativas
cabíveis em condutas e atividades lesivas ou de ameaça ao meio ambiente, tem por punição
penalização próxima aos delitos considerados de somenos importância e via de regra,
solucionados nas esferas administrativa ou civil.
Embora alarmantes, os danos ambientais recorrentes apontam para a necessidade
cada vez maior da penalização dada à insensibilidade demonstrada pelos dirigentes das pessoas
jurídicas responsáveis por tais crimes frente à vida de sociedades circunvizinhas aos seus
empreendimentos e que, em sua maioria, dependem exclusivamente do empreendimento
econômico em tela.
Nesse sentido, cumpre ressaltar a opinião de Edis Milaré que analisando a inter-
relação entre o direito ao meio ambiente equilibrado e o direito ao desenvolvimento, conclui
que este último deve observar a questão ambiental, lecionando:

(...) o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, na sua concepção


moderna, é um dos direitos fundamentais da pessoa humana, o que, por si só, justifica
a imposição de sanções penais às agressões contra ele perpetradas, como extrema
ratio. Em outro modo de dizer, a última ratio da tutela penal ambiental significa que
esta é chamada a intervir somente nos casos em que as agressões a valores
fundamentais da sociedade alcancem o ponto do intolerável ou sejam objeto de intensa
reprovação do corpo social. (2015. p. 458).

Caso contrário restaria prejudicado, neste diapasão, o atendimento ao princípio da


supremacia do interesse público sobre o interesse privado, este último considerado sustentáculo
do Direito, pois, relegar esta supremacia em razão da lucratividade a qualquer custo, gera
insegurança e instabilidade, tanto jurídica quanto social, desabrochando daí a importância que
a Lei Ambiental representa como dispositivo legal, não só por sistematizar e unificar as
infrações penais e suas punições contra o meio ambiente em um só diploma legal, quanto ao
impor a responsabilidade penal ambiental às pessoas jurídicas, dentre outras inovações trazidas.

21
Embora carente de resposta afirmativa que contemple e assegure a disponibilização
efetiva do meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme preceitua o Estado, para
proteção desta e das futuras gerações é certo que o patamar atingido pelas inovações contidas
no texto legal merece todo o aplauso, embora não se garanta por si só, pois barreiras outras há
que vencer, como por exemplo as de origem doutrinária responsáveis para sua melhor aceitação
e, sobretudo, sobrevida, vez que seu dinamismo e desenvolvimento continuará vinculado aos
propósitos da sociedade de risco.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Extrai-se do exposto percepções concernentes ao uso da tutela penal como “ultima


ratio” em relação ao atingimento da dignidade da pessoa humana, as quais indicam que a
extensão desta tutela ao meio ambiente, embora tenha sua razão de edição, somente deve ser
considerada na resolução de lesão ou ameaça de lesão apenas e tão somente quando falharem
as demais vertentes tutelares, a administrativa e a civil.
Evidente a determinação do legislador originário na relevância para com o meio
ambiente, imprimindo caráter fundamental ao equilíbrio entre este e a dignidade da pessoa
humana, prejudicada por não prever, com rigor extremo, a flexibilização dos atos normativos
expressos por parte dos tomadores de decisões institucionais e ou dos operadores do poder de
polícia, cujo resultado pode levar a bancarrota todo o processo de administração ambiental.
Neste contexto, fatores primordiais para a eficácia plena, a segurança jurídica e,
sobretudo, a confiança da sociedade no Direito, devem ser reestruturados, reinventados e,
principalmente, dotados de estrutura material, física e humana, parametrizando com maior
rigidez a ética e a probidade administrativa ambiental em prol da sociedade, vez que mitigar
requisitos técnicos e ou legais para os empreendimentos ambientais pode significar mitigar a
qualidade de vida e quiçá, a própria vida.
O potencial de exploração dos recursos naturais deve ser analisado juntamente com
os resultados negativos de seu uso, não subestimando estes em detrimento daqueles, pelo
simples desconhecimento de seus efeitos ou pior, por motivos escusos.
Há que levar em consideração que a denominada sociedade de risco pode e deve
ser escalonada para melhor avaliação e atendimento nos quesitos punição e proteção, vez que
desta última dependem e a requerem a maioria esmagadora da sociedade e daquela, parte
percentualmente insignificante porém, detentora dos bens de produção e responsáveis pelo seu

22
uso, e que parecem se rotularem, e a seus familiares, como intocáveis frente aos resultados das
tragédias ambientais criminosas e provocadas pelas ações e atitudes do homem.
Isto posto, conclui-se que a coerência da tutela penal ambiental como ultima ratio
em relação à construção da dignidade da pessoa humana, resta prejudicada em face da
fragilização de fatores essenciais dadas as circunstâncias apontadas tais como, a penalização
simbólica do direito penal em relação aos resultados nem sempre passíveis de presunção dos
crimes ambientais, o dogmatismo jurídico e a flexibilização de requisitos técnicos e legais,
construtores da escalada de acesso à dignidade da pessoa humana a qual alicerça-se na
qualidade de vida.
É preciso mais, muito mais. É necessário o respeito ao meio ambiente e ao ser.
É necessário, sobretudo, aprender e compreender que o ter nem sempre vale mais.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. VEJA A ORIENTAÇÃO Nº 06

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