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O prestigiado ensaísta francês, na semana passada, em seu apartamento de Paris. ERIC HADJ
MARC BASSETS
Bruno Latour (Beaune, 1947) é um dos filósofos franceses mais influentes da atualidade.
Acaba de publicar Down to Earth. Politics in the New Climatic Regime (Com os pés no
chão. Política no novo regime climático, em tradução livre). O livro faz um diagnóstico
sobre um mundo onde tudo é perturbado pela mudança climática e permite
compreender fenômenos que vão das desigualdades até a globalização, passando pela
ascensão do populismo. A obra também é um pedido de ação e um manifesto
europeísta. E, finalmente, uma síntese do pensamento de um precursor de disciplinas
como a sociologia da ciência sobre os fatos e a verdade.
PERGUNTA. O senhor contou que uma vez, sobrevoando a baía de
MAIS INFORMAÇÕES Baffin numa viagem ao Canadá, viveu um momento revelador ao ver
como o gelo retrocedia. O que aconteceu?
Só acredito em você
P. Essa é a vertigem da qual fala no livro?
se você disser o que
eu quero ouvir
R. É como se o solo do país onde estou já não me fosse favorável. Não é ecológica no
sentido da natureza, mas é do território. O problema é esse sentimento de perder o
mundo. Já existia antes, mas eram os artistas, os poetas, que o sentiam. Agora é um
sentimento coletivo.
P. Segundo o senhor, uma elite, ante essa situação, diz: “Vamos embora”. Abandona o
barco.
R. Comparemos isso com as reações fascistas dos anos trinta. Há semelhanças, uma
espécie de retirada nacional, étnica. Mas naquela época eram projetos de
desenvolvimento.
R. Era uma loucura, mas era um projeto de civilização. Agora estamos diante de um
projeto para desfazer os vínculos, abandonar as construções. A reação mais
extraordinária de Donald Trump consiste em dizer: “Nós não temos problemas de
mudança climática; é algo que ocorre na casa de vocês, não na nossa.” Ele considera
que o continente americano não está sujeito aos mesmos problemas climáticos que a
Europa ou a China. Isso é uma novidade.
P. Mas Trump é uma exceção, não? O Acordo de Paris para combater a mudança
climática foi firmado pelos Governos do mundo todo, o que poderíamos chamar de
elites.
R. Sim, a reação dos que se sentem abandonados pelos que vão embora para Marte é
regressar ao Estado-nação como o imaginam, um Estado-nação imaginado, uma ficção.
O exemplo é o Brexit. Ao contrário dos fascismos, não há um retorno a uma conquista
territorial, e sim a um Estado-nação vazio de todo sentido prático. Então alguns vão para
Marte, outros regressam ao planeta nacional, que também é abstrato, e no meio
estamos os infelizes que pensamos que, em um momento ou outro, será preciso
aterrissar: reconciliar a economia, o direito, a identidade com o mundo real do qual
dependemos.
P. Aonde regressar exatamente?
R. As pessoas se queixam das fake news e da pós-verdade, mas isso não significa que
sejamos menos capazes de raciocinar. Para conseguir manter um respeito pelos meios
de comunicação, a ciência, as instituições, a autoridade, deve haver um mundo
compartilhado. É um tema que estudei no passado. Para que os fatos científicos sejam
aceitos, é preciso um mundo de instituições respeitadas. Por exemplo, sobre as vacinas
se diz: “Estas pessoas ficaram loucas, estão contra as vacinas.” Mas não é um problema
cognitivo, de informação. Os que são contra não serão convencidos com um novo artigo
na revista The Lancet. Essas pessoas dizem: “É este mundo contra este outro mundo, e
tudo o que se diz no mundo de vocês é falso.”
R. É preciso sustentar os fatos, não vivem sozinhos. Um fato é só um cordeiro frente aos
lobos.
R. Os que devoram os fatos. Um fato deve estar instalado numa paisagem, sustentado
pelos costumes de pensamento. São necessários instrumentos e instituições. As
vacinas são o exemplo de um fato que precisa de uma vida pública. Se eu sair pela rua
com uma seringa tentando vacinar as pessoas, serei considerado um criminoso. Se a
vida pública é deteriorada por pessoas que consideram que – não importa o que você
disser – este não é o mundo delas, os fatos não servem para nada.
P. Mas nesse caso há um fato: as vacinas são úteis, não importa se os outros acreditam
ou não.
R. No meu mundo e no dos leitores do EL PAÍS, sim. Mas nem todo mundo lê o seu
jornal, nem tem um doutorado, nem confia nas instituições médicas, nem vive num país
onde o Ministério da Saúde apoia as vacinas. É preciso muita coisa para sustentar os
fatos.
P. Qual é a solução?
Adere a
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