Sei sulla pagina 1di 430

CONSELHO EDITORIAL

Dr. C. Boris Santana Cabrera (Cuba)


Dr. C. Israel López Pino (Cuba)
Dr. C. Edgardo Romero Fernández (Cuba)
Prof.ª Dr.ª Adriana Espíndola Corrêa (UFPR- Brasil)
Prof. Dr. Pedro Rodolfo Bodê de Moraes (UFPR- Brasil)
Prof.ª Dr.ª Liana Carleial (UFPR- Brasil)
Prof. Dr. José Juliano de Carvalho Filho (USP-Brasil)
Prof. Dr. Roberto di Benedetto (UP-Brasil)
Depósito legal junto à Biblioteca Nacional, conforme Lei n.º 10.994
de 14 de dezembro de 2004

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)


Bibliotecária responsável: Luzia Glinski Kintopp – CRB/9-1535
Curitiba - PR

D598 Direito à cidade e ao trabalho : olhares de Brasil e Cuba = Derecho a


la ciudad y al trabajo : miradas desde Brasil y Cuba / Organização
de Jaime García Ruiz ... et al.— Curitiba : Kairós Edições, 2016.
428 p. ; 21 cm.

ISBN – 978-85-63806-35-2
Vários autores

1. Direito – Brasil. 2. Direito – Cuba. 3. Trabalho – Brasil. 4.


Trabalho – Cuba. 5. Ensino superior – Brasil. 6. Ensino superior
– Cuba. 7. Planejamento urbano – Brasil. 8. Planejamento urbano –
Cuba. 9. Cooperativas – Brasil. 10. Cooperativas – Cuba. I. Faria,
José Henrique de. II. Pontes, Daniele. III. Fanini, Valter. IV. Faria,
José Ricardo Vargas de. V. Silva, Eduardo Faria. VI. Título.
CDD: 340

IMPRESSO NO BRASIL/PRINTED IN BRAZIL

Coordenação editorial
Antônia Schwinden
Editoração eletrônica
Ivonete Chula dos Santos
PREFÁCIO

José Henrique de Faria

Inobstante as distintas práticas sociais que serviram de referência para as


reflexões, este livro trata, de fato, do que se pode nominar de teoria crítica urbana e
regional. Diferentes matrizes de onde partem distintas representações da realidade se
unem em uma preocupação comum: as cidades se constituem, social, política, jurídica,
cultural e economicamente, no espaço privilegiado da vida cotidiana. Não se trata de
colocar, nas cidades, a centralidade das questões que afetam diretamente as condições
de produção material da existência, mas de circunscrever o que se desenvolve neste
espaço. É aqui, bem onde se desenrola o drama da vida, que se pode observar a ação de
um sistema que tanto é opressor como libertador, que tanto é fruto do autoritarismo
como da democracia, que tanto é impositivo como libertário. Tampouco se trata de
escolha entre opostos, tal como um maniqueísmo de gabinete, mas de uma consequente
decisão coletiva em que o objeto é a plenitude da vida mesma.
A experiência que constitui a condição de refletir criticamente sobre o dia
a dia e seus desideratos, sobre as aspirações de uma condição que entrega uma
humanidade desenvolvida em torno de uma relação socialmente comprometida com
a justiça, não pode ser mera elucubração, mas um projeto concretamente ancorado.
A cidade não é a produtora do sistema socioeconômico, mas é seu lugar de realização
e é nela que se operam as vivências. Olhar as cidades não deve ser tal como olhar
para singularidades ou particularidades não assistidas pelas políticas públicas, mas
identificar nelas aquelas condições que se reproduzem em seu substrato. Trata-se,
portanto, de um espaço de luta ao alcance do processo transformador. Não há como

5
mudar o mundo a partir das cidades, mas há como refletir sobre como atuar no mundo
se originando em suas reflexões.
Os planos, as políticas públicas, o reconhecimento social, a participação
paritária nas decisões, a distribuição igualitária da riqueza materialmente produzida
e a realização emocional, não estão dadas geneticamente nas formações urbanas,
mas é nelas que estas condições são vividas e é nelas que precisam ser enfrentadas.
Refletir sobre tais condições equivale a agir sobre aquilo que aparentemente está fora
de alcance, dada sua magnitude. Se é necessário principiar uma transformação sobre
algum espaço concreto, este espaço é exatamente aquele em que a vida se concentra.
Contudo, o problema político não é mero detalhe na produção teórica, pois a teoria
deve ter uma finalidade concreta de orientar a prática política já que se baseia na
análise crítica dela. O que se denomina práxis, por conseguinte, não pode ser uma
questão coadjuvante em uma análise crítica, porquanto o compromisso político da
teoria é com os sujeitos do trabalho e com os mecanismos de resistência e de oposição
a todo sistema político opressivo. É também importante considerar, igualmente, a
inclusão dos sujeitos socialmente excluídos da comunidade política e econômica,
porque afastamento não é sinônimo de privação de direitos.
Quando se trata de trabalhadores sem emprego, sem moradia ou sem terra, é
preciso levar em conta que no estudo desses grupos sociais não se pode desconsiderar
a possibilidade da heterogeneidade de suas demandas e tampouco desprezar as
dificuldades de sua organização política. Isso porque esses também são grupos
de trabalhadores que lutam pelo reconhecimento de suas condições de existência,
pela garantia da distribuição da riqueza material economicamente justa, pelo
asseguramento de um nível de representação política que permita o estabelecimento
de critérios de justiça e pela conquista da realização emocional decorrente do sucesso
de suas ações. Essa luta se desenrola no interior do sistema econômico, podendo ser
inclusive à sua revelia, quer como resistência, quer como oposição visando superá-lo.
O argumento que se desenvolve neste livro recorre à concepção de que os
sujeitos coletivos lutam pelo reconhecimento social como forma de integração
plena na sociedade como sujeitos iguais; lutam por uma redistribuição isonômica,

6
igualitária e justa da riqueza material como resultado da produção de suas condições
de existência; lutam pela representação política nas esferas de decisão como forma
de pertença social e como procedimentos que estruturam os processos públicos de
confrontação; lutam também pela sua realização no plano emocional como direito
inalienável de uma vida plena de sentidos.
A concepção que se defende neste livro se vincula a uma teoria que busca
encontrar inspiração nas avaliações críticas da realidade afastando-se tanto das
interpretações que fazem da ideologia a própria teoria quanto das que não consideram
que os estudos que tratam dos aspectos objetivos e subjetivos subsistem na análise de
um mesmo fenômeno. Trata-se de uma conjunto de análises que se organizam em torno
de um projeto de sociedade que venha a ser estruturada pela luta política em favor de
um modo de produção correspondente à autogestão social, como forma organizada
de gestão social democrática e dos empreendimentos necessários à construção de
uma tal sociedade.
Este livro trata da organização jurídica do Estado cubano em relação
ao urbanismo; da política, Estado e democracia no Brasil; da estratégia de
desenvolvimento em Cuba; das relações de mercado ante as trocas socioeconômicas
em Cuba; da política econômica e financiamento do Estado; da educação e trabalho
docente; do panorama da educação superior no Brasil; das formas e relações de
trabalho em Cuba; da política de emprego em Cuba; do estudo das lutas sociais
no Brasil; da análise feminista do tráfico de mulheres nas cidades brasileiras; do
cooperativismo e da cultura cooperativa na transição socialista; dos antecedentes
e da realidade das cooperativas, da liberdade de associação e da organização das
cooperativas no Brasil; dos planos diretores no Brasil e da trajetória do discurso
da politização do planejamento; da cidade como obra humana; do planejamento
participativo para a reabilitação do subcentro urbano; da planificação urbana
participativa; da estratégia de planejamento participativo para a gestão local de
desenvolvimento da habilitação integral da habitação; da propriedade e posse da
moradia em Cuba e no Brasil. São, todos, temas que se concentram na condição de
vida como direito à cidade e ao trabalho.

7
Este livro, portanto, não trata de uma simples tergiversação sobre a vida
vivida. Não trata apenas dos direitos à moradia, transporte, trabalho, necessidades e
demandas. Trata de uma jornada bem mais complexa, carregada de contradições, de
uma dinâmica que não se esgota nos escaninhos dos escritórios do pensamento, mas
que se atreve a questionar a condição mesma da dignidade da condição propriamente
humana. Neste livro também são consideras as unidades de representação política,
as unidades ditas sociais, as agências públicas e as unidades coletivistas de trabalho.
Todas estas unidades encontram-se no interior do Estado Contemporâneo, ainda que
eventualmente se oponham a ele.
Mais que uma parceria entre pesquisadores cubanos e brasileiros, este livro
é uma reflexão sobre a diferença entre o ser-em-si e o ser-para-si na construção e
na produção da existência humana. Em síntese, este livro reafirma a concepção de
que é condição primordial para o estabelecimento de uma gestão social que haja um
permanente questionamento acerca da forma com que são organizadas as relações
de trabalho e de produção das condições de existência, de maneira a se garantir: a
justiça nos processos de reconhecimento social dos grupos autônomos e emancipados;
a distribuição igualitária da riqueza coletivamente produzida; a participação
paritária nos processos de decisão; e a realização emocional pelos resultados da
práxis política dos sujeitos. Compreender as condições objetivas e subjetivas pelas
quais os sujeitos coletivos produzem suas condições de vida em sociedade revela
muito acerca das probabilidades de consolidação de uma gestão social democrática.

8
SUMÁRIO

PREFÁCIO........................................................................................................ 5
José Henrique de Faria

Características del sistema jurídico y la


organización jurídica del Estado socialista
cubano actual........................................................................................ 13
Dr. Iván P. Santos Víctores
Dr.a Yadira García Rodríguez

La organización jurídica del Estado cubano en


relación al urbanismo..................................................................... 31
MSc. Yulier Campos Pérez
MSc. Irina Pérez Trujillo

Política, Estado e Democracia no Brasil:


olhares sobre um país multiétnico....................................... 43
Eduardo Faria Silva
Anderson Marcos dos Santos

Estrategia de desarrollo en Cuba:


el financiamiento del desarrollo local en la
actualización del modelo cubano ....................................... 67
Dr. Jaime García Ruiz
MsC. Dagoberto Figueras Matos
Lic. Lienny García Pedraza

Las relaciones de mercado ante los cambios


socioeconómicos en Cuba: nuevas propuestas
en los procesos de la vivienda................................................... 87
Lic. Lisandra Martinto Curbelo
Dr. Jaime García Ruiz

9
POLÍTICA ECONÔMICA E FINANCIAMENTO DO ESTADO........ 101
Valter Fanini

Educación y trabajo docente.


La Educación Superior en Cuba................................................. 125
MSc. Víctor Almanza Tojeiro
MSc. Mercedes Rivas Pérez

BREVE PANORAMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL


(2005 – 2014).................................................................................................... 137
Claudia Regina Baukat Silveira Moreira

Las formas y relaciones de trabajo en Cuba.................. 147


MSc. Luisa Fajardo Nápoles
MSc. Dagoberto Figueras Matos
MSc. Idalsis Fabré Machado

La política del empleo en Cuba a partir del 2010.


Su expresión en el Trabajo por Cuenta Propia.............. 169
Máster Orestes Díaz Benítez
Máster Allan Valdez Montañés

Os limites do neodesenvolvimentismo na
superação da superexploração do trabalho na
América Latina: a estrutura dependente
brasileira..................................................................................................... 185
Naiara Andreoli Bittencourt

PROPOSTA DE ESTUDO DAS LUTAS SOCIAIS NO BRASIL:


uma análise de caso a partir de Nancy Fraser
e István Mészáros.................................................................................. 201
Ana Carolina Horst
Deise Luiza da Silva Ferraz
José Henrique de Faria

UMA ANÁLISE FEMINISTA DO TRÁFICO DE MULHERES


NAS CIDADES BRASILEIRAS.................................................................... 233
Clara Maria Roman Borges

10
Cooperativismo y la cultura cooperativa en la
transición socialista........................................................................ 259
Grizel Donéstevez Sánchez

Cooperativas: antecedentes y realidad en el


desarrollo del municipio de Manicaragua................... 277
Lic. Jorge Manuel García Vázquez
Dra. Grizel Donéstevez Sánchez
Lic. Malena Hereira Domínguez

Liberdade de Associação e
a Organização das Cooperativas no Brasil.................... 287
Diorlei dos Santos
José Antônio Peres Gediel

Os Planos Diretores no Brasil e a Trajetória do


Discurso da Politização do Planejamento..................... 305
José Ricardo Vargas de Faria

A cidade como obra humana:


Problematizando as relações sociedade/cidade x
natureza no capitalismo e no socialismo ...................... 327
Carlos RS Machado
Tainara F. Machado

El planeamiento participativo para la


rehabilitación del subcentro urbano
¨Abel Santamaría¨ en la ciudad de Santa Clara........... 339
MSc. Arq. Lien Cruz Domínguez
Dra. Arq. Gloria Esther Artze Delgado
MSc. Lic. Dayana Mesa Hernández

La planificación urbana participativa en la


ciudad de Santa Clara. Retos y perspectivas................. 353
MSc. Darmis Machado Macahado
MSc. Dayana Mesa Martínez

11
Estrategia de planeamiento participativo para la
gestión local de desarrollo de la rehabilitación
integral del hábitat en Manicaragua y Remedios.
Hábitat 2........................................................................................................ 367
Dra. Arq. Gloria Esther Artze Delgado
MSc. Arq. Lien Cruz Domínguez
MSc. Lic. Dayana Mesa Hernández

Propiedad y posesión de la vivienda en Cuba.................. 391


Dra. Yisel Muñoz Alfonso
Lic. Elizabeth Quiroga Morejón

PROPRIEDADE E POSSE: NO LIMITE DA FUNÇÃO......................... 413


Daniele Regina Pontes
Gabriel Schulman
Stefania Poeta Pontes

12
Características del sistema jurídico y la
organización jurídica del Estado socialista
cubano actual

Dr. Iván P. Santos Víctores1


Dr.a Yadira García Rodríguez2

1. Introducción

En la actualidad, para el desarrollo de todos los países resulta


de gran importancia e interés el estudio de las relaciones orgánicas
existentes entre el sistema jurídico y el estado, su interrelación e
integración. En Cuba socialista esos complejos y poli-dimensionales
nexos se manifiestan en el reconocimiento y consagración por el Estado
de las normas jurídicas establecidas en defensa de toda la sociedad.

1 Doctor en Ciencias Históricas área Politología. URSS (1990). Profesor


Titular del Departamento de Filosofía, Facultad de Ciencias Sociales de la Universidad
Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV). Con experiencia en el área de Ciencias
Políticas y Derecho Constitucional, Estudios de Políticas Públicas, Desarrollo Local.
E-mail: ivansv@uclv.edu.cu
2 Doctora en Ciencias Filosóficas por la Universidad Central “Mata Abreu”
de las Villas (UCLV), Cuba (2009). Profesora Titular del Departamento de Derecho
de la Facultad de Ciencias Sociales UCLV. Con experiencia en el área de Economía
Política, Filosofía y Teoría del Derecho. E-mail: yadirag@uclv.edu.cu

13
Para un país con un sistema socio-político socialista como Cuba,
el perfeccionamiento paulatino y ordenado del sistema jurídico posee un
gran valor y significación, lo cual es un reto que se ve acrecentado luego
del VI Congreso del Partido Comunista en que se adoptaron una serie de
políticas y tareas encaminadas al progreso de la sociedad y la economía
cubanas, en función de las cuales será necesario elaborar y aprobar una
serie de normas para crear la base legal e institucional que respalde las
modificaciones funcionales, estructurales y económicas que se adopten
para el avance de la sociedad cubana.
Sin embargo, para ello en estos momentos en Cuba resulta imposible
circunscribirse solo al desarrollo, ordenamiento y perfeccionamiento
de las normas y regulaciones jurídicas; debe desarrollarse un proceso
integral en el que se perfeccionen las instituciones jurídicas y que también
abarque todos los elementos integrantes del sistema jurídico nacional,
en el cual se reflejen las características propias del sistema político y la
sociedad cubana actual en su proceso de renovación.
Como otros conceptos de las ciencias sociales y jurídicas el de
“sistema jurídico” ha sido interpretado y definido de diferente forma y
desde diferentes enfoques por parte de juristas, politólogos, gobernantes
y otros. Unos autores lo han limitado al sistema de normas jurídicas, en
tanto otros lo ven desde un espectro más amplio en que se contemplan
también las relaciones jurídicas en su interconexión.
Igualmente, desde un enfoque sistémico y polidimensional,
también otros autores plantean que el sistema jurídico comprende
tanto la estructura del derecho como ente normativo, como el papel y
la correlación entre la producción del derecho y su aplicación por los
operadores u órganos correspondientes3.

3 Kudriavtsev, V. y Kazimirchuk, V. El sistema jurídico del socialismo. Edit.


Ciencias Sociales Contemporáneas. Moscú. 1987. p.32.

14
Aquí, a partir de la teoría de los sistemas sintetizada por Ludwig
von Bertalanffy y las concepciones dialécticas de Georg Wilhelm
Friedrich Hegel y Karl Marx, la cual plantea que los sistemas constituyen
un conjunto de elementos que están interconectados, interrelacionados y
son interdependientes dialécticamente, analizaremos el sistema jurídico
en la sociedad socialista cubana como un concepto que sintetiza en
un nivel superior la integridad e interconexión dialéctica de todas las
partes o elementos que lo conforman, tanto en el ámbito de la teoría del
derecho, como en su producción y aplicación práctica.
Como fenómeno social objetivo todo sistema jurídico al tener
vigencia en un lugar y un momento histórico determinado, será
propio y en correspondencia con un tipo de estado, sistema político y
sociedad concreta. Igualmente, regido por el Estado, tendrá la finalidad
de favorecer la convivencia y de fijar pautas para la regulación de la
conducta de las personas naturales y jurídicas a través del ordenamiento
jurídico o conjunto sistematizado de leyes, normas y reglas vigentes en
el país y sociedad correspondiente. Para ello su Constitución o Carta
Magna actúa como norma suprema del ordenamiento jurídico del Estado
y como pilar del sistema jurídico. Tal es el caso de Cuba.
El desarrollo del estado y la sociedad cubana actual y futura
está no solo indisolublemente e indefectiblemente relacionado con
el perfeccionamiento constante de los procesos económicos y socio-
políticos, sino también con el desarrollo cualitativo del sistema jurídico
vigente y de la labor jurídica y legislativa en el país.

2. El desarrollo del sistema de normas jurídicas en Cuba


socialista

Después del triunfo de la Revolución Cubana el 1 de enero de


1959, se inició la conformación de un régimen de auténtica justicia social
en el que se promulgaron por el Gobierno Revolucionario un conjunto

15
de leyes de amplio carácter popular, como fueron la primera Ley de
Reforma Agraria en mayo de ese año, las Leyes de Nacionalización de
finales de los años sesenta y otras que, luego de la declaración del paso
a la creación de un estado con un sistema socio-político de carácter
socialista, fueron aprobadas. Así se logró estructurar un sistema de
normas, generales, objetivas e impersonales de obligatorio cumplimiento
tanto para las instituciones políticas, sociales y de masa como para los
ciudadanos. Todo ello todavía al amparo de la Ley Fundamental de
Febrero de 1959, que no era otra cosa que la Constitución Cubana de
1940 modificada acorde a las necesidades de ese momento. Se inició
entonces la transición de un tipo de sistema jurídico burgués a otro de
carácter popular y socialista.
Ese proceso de aprobación de normas en beneficio de toda la
población tuvo otro impulso en la década del setenta, cuando Cuba se
inserta en el sistema de estados socialistas entonces existente y comienza
una nueva etapa en el desarrollo socio-económico del país. Se reinicia
en esa década un complejo y continuo proceso de perfeccionamiento,
modernización y sistematización del sistema jurídico cubano.
Ese proceso condujo a la elaboración de un anteproyecto de
constitución en 1975 más ajustado a las nuevas condiciones del país, y
que fue sometido a un proceso de discusión pública donde participaron
más de seis millones de cubanos, los cuales formularon numerosas
propuestas que llevaron a modificar el 60% de los artículos propuestos.
Aplicadas las modificaciones propuestas y convertido en
proyecto de Constitución con carácter socialista, este fue sometido
a un referéndum popular para su aprobación final el 15 de febrero de
1976 en el que participó el 98% de los electores, de los cuales el 97,7%
de los ciudadanos lo hizo afirmativamente; convirtiéndose así en la
norma jurídica de mayor nivel para el país en que se regulan los órganos
con capacidad legislativa, así como los principios y fundamentos del
contenido de las leyes.

16
A partir de entonces, el proceso de perfeccionamiento y
modernización del sistema de normas jurídico que tuvo lugar en las
tres últimas décadas del siglo XX, se dirigió a todas las ramas del
Derecho y creó un coherente conjunto de normas que son aplicadas en
la esfera judicial, entre las que se encuentran cronológicamente entre
otras las siguientes:

Código de Familia de 1975, Constitución de la República de 1976,


Administrativo y Laboral de 1977, Ley de Seguridad Social de 1979, ,
Código de Trabajo de 1985, Código Civil de 1987, Código Penal de 1987,
Ley Electoral No. 72, 1992, Ley de Sistema Tributario de 1994, Ley de la
Defensa Nacional. No. 75, Ley de los Tribunales Populares de 1997, Ley
de la Fiscalía General de la República de 1997, Decreto-Ley del Sistema
de Justicia Laboral de 1997. Ley de la Inversión Extranjera”, No. 118, 2014.

Sin embargo, los cambios constitucionales de mayor significación,


importancia y repercusión en el perfeccionamiento del sistema
de normas jurídico en Cuba fueron los introducidos en la reforma
constitucional de 1992 y luego en la del 2002. En la primera se abrió
constitucionalmente el camino al conjunto de cambios económicos
que se vienen implementando. La segunda reforma en 2002, introdujo
en su artículo tercero una cláusula de intangibilidad, que por su visión
sistémico-constitucional, imposibilita cambiar el sistema político
vigente, fijando la ruta que deben tener todos los cambios prácticos y
legales sobre la economía, la política y la sociedad que se adopten en
el país.
Aunque durante el primer decenio del presente siglo la
producción de nuevas normas y la derogación de otras ya obsoletas
continuó, fue a partir del 2010 que el perfeccionamiento del sistema
jurídico cubano se ha convertido en una necesidad imperiosa debido
a los retos que enfrenta el país en diferentes planos de la vida social.
Ello ha obligado a una aceleración de ese perfeccionamiento en el

17
tercer quinquenio, el cual se ha puesto de manifiesto con la aprobación
y puesta en vigor de 210 disposiciones legales, la derogación de 618
normas ya obsoletas y la modificación de otras 40 solo entre los años
2012 y 2014 y que aún continúa.
Según Homero Acosta, secretario del Consejo de Estado de
Cuba, las principales disposiciones normativas aprobadas se dividen
en cuatro grupos, a saber: 1) las que responden a las necesidades
de la actualización del modelo económico; 2) las dirigidas al
perfeccionamiento de la Administración del Estado y los experimentos
en los órganos locales en las provincias de Artemisa y Mayabeque, para
el futuro perfeccionamiento de los gobiernos a ese nivel; 3) las relativas
a las transformaciones en la administración de justicia y la labor de
la Fiscalía General de la República; y 4) las referidas a la eliminación
de prohibiciones injustificadas en las condiciones actuales del país4.
También, Acosta declaró que lo anterior forma parte de un proceso, que
producto de una agenda legislativa intensa, culminará en una reforma
de la Constitución Cubana como expresión de los cambios presentes
y futuros requeridos en el país. Ampliando al respecto el secretario
del Consejo de Estado señaló, además, que se analiza la posibilidad de
regular integralmente toda la labor normativa en el país
Aunque se puede afirmar que el país está institucionalizado porque
tenemos más de 700 normas jurídicas vigentes, lo anterior demuestra
como en las condiciones actuales del desarrollo estatal y del sistema
de normas jurídico cubano surgen nuevas necesidades de regulación
legislativa de varias esferas de la vida social, producto de los nuevos tipos
de relaciones socio-económicas y políticas surgidas; las cuales conducen
y darán lugar a amplios e inevitables cambios cualitativos.

4 Citado por Gomes Bugallo, Susana. Cuba busca coherencia y unidad del
ordenamiento jurídico. En: Juventud Rebelde. Año 49, No. 285. 20 de Set.2014, pág.1.

18
La reconfiguración del actual modelo económico – como
subsistema del sistema social cubano – influirá decididamente en
el rediseño de otros subsistemas como el jurídico y se reflejará en el
ordenamiento jurídico del Estado.

3. La organización jurídica del estado cubano

La organización jurídica del estado cubano tiene su origen en la


tradición romano-germánica y el constitucionalismo socialista, la cual
se materializa en la Constitución Cubana de 1976 – base jurídica de los
órganos estatales - que se caracteriza por su forma rígida, organizando
el país como república unitaria en la que una de las características
fundamentales de los órganos del estado socialista es la unidad y relación
mutua entre todas las partes integrantes, y la representación de la
voluntad soberana de todo el pueblo.
Cuba como estado unitario está formado por la unión indisoluble
de las provincias y los municipios. Los órganos supremos y locales que
conforman el Estado cubano poseen determinadas competencias que
le son propias y están reguladas por la Constitución y las leyes. Estos
órganos se dividen en dos tipos:
a) Los órganos de poder, integrados por la Asamblea Nacional del
Poder Popular, el Consejo de Estado y las asambleas locales
(provinciales y municipales);
b) Los órganos de dirección y administración, conformados por
el Consejo de Ministros y los consejos de administraciones
provinciales y municipales.

El Capítulo IX de la Constitución Cubana regula los principios de


organización y funcionamiento de los órganos estatales, en el Articulo

19
68 se establece que estos órganos se integran y desarrollan su actividad
sobre la base de los principios de la democracia socialista, la cual
establece que todos los órganos representativos del poder son electivos
y renovables, tienen la obligación de rendir cuenta de su actuación,
y sus representantes pueden ser revocados; las disposiciones de los
órganos estatales superiores son de obligatorio cumplimiento para
los inferiores, los cuales tienen que rendir cuenta de su gestión a los
primeros; asimismo, la libertad de discusión, el ejercicio de la crítica y la
autocrítica y la subordinación de la minoría a la mayoría rigen en todos
los órganos estatales colegiados.
En la organización y funcionamiento de los órganos estatales
quedan expresados en forma manifiesta el principio de la unidad del
poder en que se establece claramente la división de funciones para que
cada órgano estatal pueda siempre, en el marco de sus competencias,
desenvolver su actividad con autonomía e iniciativa.
A diferencia del estado burgués que postula la separación de
poderes, en el sistema de los órganos del estado socialista cubano el
principio de la unidad de poder es un rasgo característico, ya que el
poder se ejerce en función de todo el pueblo y sobre la base de lo regulado
constitucionalmente. En el sistema jurídico del estado socialista cubano
no existen contradicciones entre los diferentes órganos estatales, ni
a nivel de los órganos supremos ni de los locales. Todos los órganos
estatales cubanos tienen autonomía restricta, pues las normas y
disposiciones aprobadas por ellos deben obedecer a los principios de la
Constitución y las leyes establecidas al respecto.

4. Los órganos superiores del Poder Popular

Los Artículos 69 y 70 de la Constitución establecen que la


Asamblea Nacional del Poder Popular es el órgano supremo del poder

20
del Estado y representa la voluntad soberana de todo el pueblo, y es el
único órgano con potestad constituyente y legislativa en la República.
La Asamblea Nacional del Poder Popular se compone de diputados
elegidos mediante el voto, libre, directo y secreto de los electores por un
término de cinco años, según la Ley Electoral y solo extendible a más
tiempo en caso de guerra u otras circunstancias excepcionales que
impidan la celebración de elecciones.
Al constituirse una nueva legislatura los diputados eligen entre
ellos al Presidente, al Vicepresidente y al Secretario. Igualmente, eligen
a los integrantes del Consejo de Estado, que ejercerá las funciones de la
Asamblea Nacional, cuando esta no esté reunida. Ese Consejo de Estado
estará integrado por un Presidente, un Primer Vicepresidente, cinco
Vicepresidentes, un Secretario y veintitrés miembros más. El Presidente
del Consejo de Estado posee la jerarquía de Jefe de Estado y de Gobierno.
El Consejo de Estado es responsable ante la Asamblea Nacional
del Poder Popular y tiene la obligación de rendirle cuenta de todas
sus actividades.
La Asamblea Nacional, además de sus funciones constitucionales
y legislativas, tiene la potestad de discutir y aprobar los planes de
desarrollo económico y social, así como el presupuesto del Estado;
acordar el sistema monetario y crediticio; aprobar los lineamientos
generales de la política exterior e interior; revocar los decretos-leyes
del Consejo de Estado y los Decretos y disposiciones del Consejo
de Ministros que contradigan la Constitución o las leyes; conceder
amnistías; declarar el estado de guerra en caso de agresión militar al país
y acordar los tratados de paz, entre otras.
En la labor de la Asamblea Nacional del Poder Popular juegan un
importante papel las Comisiones Permanentes de trabajo - conformadas
según diferentes ramas de la producción y los servicios, las cuales se
encargan previamente de preparar el trabajo legislativo a desarrollar y
aprobar por la Asamblea.

21
Los Artículos 82 y 83 de la Constitución Cubana dejan claramente
establecido que la condición de diputado no entraña beneficios
personales ni económicos,, y que estos no recibirán salario por el
desempeño de estas funciones, sino que continuarán recibiendo el sueldo
de su centro de trabajo, manteniendo el vínculo laboral habitual con este.
Aunque los diputados no gozan de privilegios personales diferentes a los
de sus electores, no pueden ser detenidos, ni sometidos a proceso penal
sin autorización de la Asamblea Nacional, o del Consejo de Estado si no
está reunida aquella, salvo en caso de delito flagrante.
Las principales atribuciones del Consejo de Estado como
órgano de poder supremo se regulan en los Artículos 90 al 92 de la
Constitución, allí se establece, entre otras, que puede sustituir a
propuesta de su Presidente a los miembros del Consejo de Ministros
entre uno y otro período de sesiones de la Asamblea del Poder Popular;
impartir instrucciones de carácter general a los tribunales a través
del Consejo de Gobierno del Tribunal Supremo Popular e impartir
también instrucciones a la Fiscalía General de la República; designar y
remover embajadores de Cuba ante otros estados, y otorgar o suspender
beneplácito a los representantes diplomáticos para Cuba de otros países;
así como suspender disposiciones del Consejo de Ministros y de las
Asambleas Locales del Poder Popular que no se ajusten a la Constitución
o las leyes, o afecten intereses generales o de localidades del país.
El Consejo de Estado tiene también la potestad de revocar
los acuerdos y disposiciones de los consejos de administraciones
provinciales y municipales que contravengan la Constitución o las
leyes, o afecten intereses de otras localidades o los generales del país.
El Presidente del Consejo de Estado y Jefe de Gobierno cubano
tiene la atribución de representar al Estado y al Gobierno, y dirigir
su política general; presidir el Consejo de Ministros; desempeñar la
Jefatura Suprema de todas las instituciones armadas, y encabezar el

22
Consejo de Defensa Nacional y otras atribuciones que se le confieren
constitucionalmente.
El Consejo de Ministros, como máximo órgano ejecutivo y
administrativo constituye el Gobierno de la República de Cuba, y
tiene como función principal organizar y dirigir la ejecución de las
actividades políticas, económicas, culturales, científicas, sociales y
de la defensa acordadas por la Asamblea Nacional del Poder Popular;
así como dirigir la administración del Estado y unificar y fiscalizar
la actividad de los organismos de la Administración Central y de las
Administraciones Locales. Tiene, igualmente, la obligación de rendir
cuenta periódicamente de todas sus actividades ante la Asamblea
Nacional del Poder Popular.
Otro órgano estatal de gran importancia para Cuba es el Consejo
de Defensa Nacional, este según el Artículo 101 de la Constitución
Cubana es la institución que se constituye y prepara desde tiempos
de paz para dirigir el país en las condiciones de estado de guerra,
durante la guerra, la movilización general o el estado de emergencia.
Su organización, facultades y funciones están determinadas por la ley.

5. Los órganos locales del Poder Popular

Los órganos locales del Poder Popular constituidos en las


demarcaciones político-administrativas en los niveles provincial y
municipal representan la base de apoyo de los órganos superiores o
supremos del poder estatal cubano, ellos según el Artículo 103 de la
Constitución están envestidos de la más alta autoridad para el ejercicio
de las funciones estatales en sus demarcaciones respectivas y para ello,
dentro del marco de su competencia, y ajustándose a la ley, ejercen
gobierno. Para el ejercicio de sus funciones, los órganos locales del
Poder Popular se apoyan desde el nivel inframunicipal en los Consejos

23
Populares, y actúan en estrecha coordinación con las organizaciones de
masas y sociales.
Las Asambleas Provinciales y municipales, como órganos locales
de poder, están encargados de hacer efectivas en sus respectivas
instancias las leyes y demás disposiciones de los órganos superiores
del Estado. Tienen, además, la atribución de elegir y revocar a sus
respectivos Presidentes y Vicepresidentes, así como designar y sustituir
a sus Secretarios; controlar y fiscalizar la actividad de los Consejos de la
Administración y las entidades que se le subordinan; adoptar acuerdos
y dictar disposiciones, dentro del marco de la Constitución y las leyes
vigentes, sobre asuntos de interés para sus propias instancias; coadyuvar
al desarrollo y cumplimiento de los planes de producción y servicio de
las entidades radicadas en sus respectivos territorios.
Los Presidentes de las Asambleas Provinciales y Municipales son a
la vez presidentes de sus correspondientes Consejos de la Administración
y representan al Estado en sus demarcaciones territoriales.
Los Consejos de Defensa a nivel provincial, municipal y de las
Zonas de Defensa se constituyen y preparan, partiendo de un plan
general de defensa y del papel y responsabilidad que corresponde a los
consejos militares de los ejércitos de las demarcaciones respectivas.

6. Las instituciones jurídicas cubanas como elementos


integrantes del sistema jurídico

El sistema Judicial y Legal de la República de Cuba se suscribe


en las tradiciones y características del Derecho Continental Europeo
del que tomó las correspondientes instituciones judiciales, aunque en
su elaboración tuvo en cuenta las condiciones sociales, culturales y
jurídicas propias de la sociedad cubana contemporánea.

24
6.1 El Ministerio de Justicia

Es el Organismo de la Administración Central del Estado,


integrante del Consejo de Ministros, encargado de dirigir, ejecutar y
controlar la política jurídica de la nación; procurar el mejoramiento
del trabajo jurídico en la esfera de la economía nacional y el continuo
perfeccionamiento del orden legal; estudiar, proponer y dirigir la
sistematización de las leyes, así como comprobar y evaluar su eficacia.
También tiene la obligación de dirigir y controlar
metodológicamente la actividad notarial y registral, además de
determinar la demanda y asignación de los graduados universitarios en
Derecho; se encarga de contribuir a la divulgación jurídica y de elevar la
cultura jurídica de los ciudadanos. Dirige, igualmente, la Gaceta Oficial
de la República.

6.2 Los Tribunales y la Fiscalía

La Constitución Cubana en su Capítulo XIII, en los artículos 120


al 126 deja claramente establecidos el papel y objetivos de los tribunales
y la fiscalía, los cuales como elementos fundamentales del sistema
jurídico del país poseen una estrecha relación, por cuanto a ambos en
el marco de sus respectivas competencias, les corresponde asegurar el
cumplimiento exacto de la Carta Magna y las leyes por parte de todas
las personas jurídicas y naturales en el país.
Desde su aprobación, la Constitución Cubana reflejó en un mismo
y único capítulo los principios que regulan el papel y objetivos de los
Tribunales y de la Fiscalía General de la República, reafirmando así la
necesaria relación que debe existir entre ellos, aunque posean diferentes
funciones. El Fiscal general es miembro por derecho propio del Consejo
de Gobierno del Tribunal Supremo.

25
La Constitución Cubana en su Artículo 121 establece claramente
que los tribunales constituyen un sistema de órganos estatales,
estructurados con independencia funcional de cualquier otro, y sólo
subordinados jerárquicamente a la Asamblea Nacional del Poder
Popular y a su Consejo de Estado. Esta subordinación –según plantea
Fernando Álvarez Tabío – es de carácter político para reafirmar el
principio socialista de la unidad del poder, representado en esos órganos
superiores del Poder Popular5.
La jurisdicción y competencia de los tribunales se ajusta a la
división político-administrativa del país y a las necesidades de la
función judicial. Por ello están organizados en tres niveles jerárquicos:
los tribunales municipales; los tribunales provinciales y el Tribunal
Supremo Popular, que radica en Ciudad de La Habana, capital del país.
Existen también en Cuba los Tribunales Militares.
Además, deja definido que el Tribunal Supremo Popular ejerce la
máxima autoridad judicial y sus decisiones son definitivas. Su Consejo
de Gobierno ejerce la iniciativa legislativa y la potestad reglamentaria
en materia relativa a la administración de justicia; tomando decisiones,
aprobando normas y dictando instrucciones de obligatorio cumplimiento
para todos los tribunales, a los efectos de establecer una práctica jurídica
uniforme en la interpretación y aplicación de la ley. El Tribunal Supremo
Popular actúa así como un órgano creador de jurisprudencia sobre la
base de la experiencia judicial.
En sus artículos 122 y 126 la Constitución Cubana regula que
los jueces son independientes y obedecen solo a la ley, y que los fallos
y demás resoluciones dictados por los tribunales son de obligatorio
cumplimiento para todos. Se establece, además, que los tribunales

5 Álvarez Tabío, Fernando. Comentarios a la Constitución Socialista. Edit.


Pueblo y Educación. Habana 1988. Pág. 378.

26
funcionan de forma colegiada, y los jueces profesionales los legos poseen
iguales derechos.
En Cuba tanto los cargos de jueces profesionales como los
legos son electivos y renovables durante un determinado período de
mandato. Las Asambleas del Poder Popular en sus diferentes instancias
municipal, provincial y nacional, tienen la facultad de su elección
y también la facultad de su revocación de ser necesario, según el
procedimiento establecido.
Los tribunales tienen igualmente la obligación de rendir cuenta
periódicamente sobre los resultados de su trabajo ante sus respectivas
Asambleas del Poder Popular.
De acuerdo con la Constitución Cubana en su Artículo
127, la Fiscalía General de la República es el órgano del Estado al
que corresponde como objetivo fundamental ejercer el control y la
preservación de la legalidad sobre la base de la vigilancia del estricto
cumplimiento de los preceptos constitucionales, las leyes y demás
disposiciones legales por los organismos del Estado, entidades
económicas y sociales y por los ciudadanos y la promoción del ejercicio
de la acción penal pública en representación del Estado.
La Fiscalía General de la República como institución jurídica se
subordina única y directamente solo a la Asamblea Nacional del Poder
Popular y al Consejo de Estado, del cual recibe instrucciones directas.
Los órganos de la Fiscalía están organizados verticalmente en todo el
territorio nacional, subordinándose directamente a la Fiscalía General
de la República, manteniendo independencia total de todos los órganos
locales de gobierno.
La Fiscalía está estructurada en: Fiscalía General de la República.
Fiscalías, Provinciales. Fiscalías Municipales y Fiscalía Militar.
Según el Artículo 129 de la Constitución, el Fiscal General de la
República, así como los vicefiscales generales son elegidos y pueden

27
ser revocados por la Asamblea Nacional del Poder Popular. Los fiscales
provinciales y municipales son designados por el Fiscal General de la
República, según la Ley de Organización del Sistema Judicial.
La Fiscalía General de la República, al igual que otros órganos
de la administración central del estado cubano, tiene la obligación de
rendir cuenta periódicamente de su gestión ante la Asamblea Nacional
del Poder Popular, como estipula en su Artículo 130 la Constitución.
La Comisión de Asuntos Jurídicos y Constitucionales de la
Asamblea Nacional tiene la responsabilidad de analizar previamente
los informes de rendición de cuenta tanto del Tribunal Supremo Popular
como de la Fiscalía General de la República, a esos efectos emitirá los
dictámenes pertinentes para ser evaluados y aprobados con los informes
por el Pleno de la Asamblea Nacional que adoptará posteriormente los
acuerdos correspondientes.

6.3 Las Notarías Estatales y los Bufetes Colectivos como parte del
sistema jurídico

En Cuba la actividad y función notarial está organizada, según


la Ley No. 50/1984 de las Notarías Estatales, en un sistema de notarías
estatales, facultadas para dar fe de los actos jurídicos extrajudiciales,
de conformidad con la ley. Para ello el país cuenta con 223 unidades
notariales, las cuales cubren todos los municipios del territorio nacional.
La Organización Nacional de Bufetes Colectivos, creada en 1965,
es una entidad autónoma, de interés social y carácter profesional, con
personalidad jurídica y patrimonio propio, integrada voluntariamente
por abogados de alta calificación y experiencia profesional en las
diferentes ramas del Derecho. Sus profesionales gozan de total
independencia, y disfrutan de todos los derechos y garantías legales

28
para exponer sus alegatos en relación con el derecho que defienden.
La organización cuenta con oficinas a lo largo y ancho de Cuba en una
extensa red de 180 Bufetes y 72 Unidades Territoriales, contando con
una Dirección Provincial en cada una de las provincias cubanas.

6.4 La formación académica de los juristas

Los cursos para la formación académica de los profesionales del


Derecho constan de programas de estudios con similares exigencias y
se desarrollan en la mayoría de las universidades del país; siendo las
más antiguas en esta labor la Universidad de La Habana, la Universidad
de Oriente, la Universidad Central de Las Villas y la Universidad
de Camaguey.

6.5 La Unión Nacional de Juristas de Cuba

Fundada el 8 de junio de 1977, al amparo del artículo 7 de la


Constitución de la República, como organización no gubernamental y
con personalidad jurídica propia, la Unión Nacional de Juristas de Cuba
agrupa a todos los profesionales del Derecho y ejerce su influencia en
todo el sistema jurídico del país. A través de sus numerosas sociedades
científicas contribuye a la superación de sus miembros y al progreso
de la ciencia y la práctica del Derecho, lo que se pone de manifiesto en
la celebración de diversos eventos científicos y en la actividad laboral
de sus miembros. La Unión de Juristas de Cuba está afiliada a varias
instituciones internacionales de abogados.

29
7. Conclusiones

El sistema jurídico y la organización jurídica del estado socialista


cubano actual, conforman un sistema que funciona como una unidad
dialéctica en que todas sus partes se complementan, interactúan y son
interdependientes. Como todo sistema, responde a las características del
sistema socio-político vigente en el país y se encuentra en un proceso de
renovación, respondiendo a las condiciones históricas actuales de Cuba.
A esos efectos, debe continuar desarrollándose un proceso integral en
el que se perfeccionen las normas jurídicas, las instituciones jurídicas
y la Constitución Cubana y que también abarque todos los elementos
integrantes del sistema jurídico nacional.

Bibliografía

Álvarez Tabío, Fernando. (1988). Comentarios a la Constitución Socialista.


Edit. Pueblo y Educación. Habana.
Cuba. Constitución de la República de Cuba, 2009. En: Gaceta Oficial de la
República de Cuba. Edición Extraordinaria No. 3, del 31 de enero del 2003.
Gomes Bugallo, Susana. (2014). Cuba busca coherencia y unidad del
ordenamiento jurídico. En: Juventud Rebelde. Año 49, No. 285.
Kudriavtsev, Vladímir y Kazimirchuk, Vladímir. (1987). El sistema jurídico
del socialismo. Edit. Ciencias Sociales Contemporáneas. Moscú.
Santos Víctores, Iván P. (2004). Educación, ciencia y cultura en Cuba:
regulación jurídico-constitucional y garantías materiales. En: UnB. Cadernos
do Ceam. NESCUBA. Panorama da realidade cubana. Ano IV, No. 12 – marco
2004. Págs. 85-94.

30
La organización jurídica
del Estado cubano en relación al urbanismo

MSc. Yulier Campos Pérez1


MSc. Irina Pérez Trujillo2

1. La Administración Pública y el urbanismo en Cuba

En el sistema político cubano resalta el papel del Estado como


elemento principal; y corresponde a la Administración Pública,
como titular de su función ejecutiva y administrativa, la satisfacción
directa e inmediata de las necesidades colectivas o intereses públicos,
pasando por una organización, científicamente articulada, pero
inevitablemente mutable.

1 Licenciado en Derecho por la Universidad Central “Marta Abreu” de Las


Villas (UCLV), Cuba (2010). Especialista de postgrado en Derecho Civil y Patrimonial
de Familia (UCLV, 2012). Profesor Asistente del Departamento de Derecho de
la Facultad de Ciencias Sociales, UCLV. Con experiencia en el área del Derecho
Cooperativo y la Propiedad Intelectual. E-mail: ycperez@uclv.edu.cu
2 Licenciada en Derecho por la Universidad Central “Marta Abreu” de Las
Villas (UCLV), Cuba (2001). Especialista de postgrado en Asesoría Jurídica (UCLV,
2008). Profesora Auxiliar del Departamento de Derecho de la Facultad de Ciencias
Sociales, UCLV. Con experiencia en el área del Derecho Administrativo, Urbanístico, y
las servidumbres administrativas. E-mail: irinap@uclv.edu.cu

31
El diseño de organización de la Administración Pública debe
ser flexible para poder responder a los constantes cambios que
pudieran requerirse y su eficaz acción está condicionada por una
adecuada estructuración.
El objetivo de la actividad organizadora de la Administración, y
del Estado en general, se dirige a racionalizar el número, ordenación y
cometido de sus estructuras, entendiéndose en todos los niveles, o sea,
ministerios, organismos centrales, entidades y unidades administrativas;
adecuar sus estructuras a sus criterios de planificación, programación,
coordinación y cooperación, la disminución de las plantillas, y la
adopción de estructuras para las instituciones estatales provistas de
la mayor sencillez y flexibilidad posible, para el logro de la máxima
eficiencia en su gestión.3
La organización administrativa en Cuba ha estado matizada
en los últimos años por profundas transformaciones que responden
precisamente a los necesarios cambios para perfeccionar el modelo
económico y social, los que han tenido mayor relevancia a partir de la
política aprobada luego de la celebración del Sexto Congreso del Partido
Comunista de Cuba.
El Consejo de Ministros y los organismos de la Administración
Central del Estado –Ministerios o Institutos- son los encargados en
el ejercicio de su actividad ejecutiva y administrativa, de rectorar las
distintas ramas, sub- ramas o actividades de la gestión estatal en el país.
Específicamente, respecto a la gestión administrativa en el
urbanismo intervienen varios organismos de la Administración Central
del Estado y otros órganos de las localidades entre los que se destacan
el Ministerio de la Construcción, el Instituto de Planificación Física y

3 Lezcano, J. R. (2004). Temas de Derecho Administrativo cubano. Editorial


Félix Varela. La Habana. p. 319.

32
el Ministerio de Ciencia Tecnología y Medio Ambiente; así como sus
respectivas direcciones o delegaciones en los territorios dirigidas por las
Administraciones locales. Las tareas que corresponden a estas entidades
resultan muy complejas por la diversidad de sectores que incluyen y por
la dinámica que los caracteriza; pero por la trascendencia que tienen para
la colectividad, deben actuar con un enfoque holístico.
Una de las más recientes modificaciones en la estructura orgánica
relacionada con el urbanismo en Cuba tuvo lugar con la promulgación
del Decreto-Ley 322 de 2014, modificativo de la Ley No. 65, de 23 de
diciembre de 1988, “Ley General de la Vivienda”, por el que las funciones
y facultades que correspondían al Instituto Nacional de la Vivienda
y su Presidente son asumidas por el Ministerio de la Construcción
y su Ministro, respectivamente. En Cuba este es el Organismo de la
Administración Central del Estado encargado de dirigir y controlar la
aplicación de la política estatal y del Gobierno en cuanto a la Vivienda.

2. El Instituto de Planificación Física como organismo


rector en el urbanismo: delimitación de sus funciones

La planificación física es la actividad que, en concordancia con los


objetivos, tareas y directrices del Plan Único de Desarrollo Económico
y Social y mediante la investigación de la condiciones naturales,
demográficas, económicas y técnicas del país, procura el ordenamiento
territorial en sus diferentes niveles, con el fin de lograr la más correcta
distribución territorial de las fuerzas productivas.4
La creación de esta actividad en Cuba sucede en 1960 como parte
del Ministerio de la Construcción. En el contexto de la implementación

4 Decreto número 21. Reglamento sobre la planificación física. Gaceta oficial


de la República de Cuba, edición ordinaria de 9 de marzo de 1978.

33
de la división Político-Administrativa de 1976, el Instituto pasa a
la Junta Central de Planificación, hoy Ministerio de Economía y
Planificación, y se crean 14 Direcciones Provinciales de Planificación
Física subordinadas administrativamente a los Órganos Provinciales
del Poder Popular. En el perfeccionamiento de esta actividad en el
país, especialmente en las temáticas de las ciudades se crean en 1985
las Direcciones de Arquitectura y Urbanismo (DAU) con funciones de
control e información territorial, subordinadas administrativamente a
los Órganos Municipales del Poder Popular, y se conforma el Sistema de
la Planificación Física con el Instituto como organización rectora. Es en
1999 cuando se crean las Direcciones Municipales de Planificación Física
(DMPF) en lugar de las DAU, a partir del Acuerdo Nº 3435 del Comité
Ejecutivo del Consejo de Ministros, las que asumen nuevas funciones de
planeamiento y gestión que se descentralizan desde el nivel provincial
para consolidar la integración del Sistema de la Planificación Física.
A partir del año 2009 el Instituto se reconoce como Organismo de
la Administración Central, con el Acuerdo No. 6686 del Consejo de
Ministros al traspasarse a la subordinación de este Órgano de Gobierno.
El Instituto de Planificación Física (IPF) tiene como funciones
principales5:
• Dirigir la aplicación de políticas territoriales y urbanas
referidas al uso y destino del suelo y de las edificaciones; la
localización de inversiones; la organización territorial del
Sistema de Asentamientos Humanos; la estructura físico-
espacial de estos y los vínculos con sus áreas de influencia;
el diseño urbano y el paisajismo asociados a la imagen de las
zonas rurales y urbanas; y el catastro nacional.

5 Acuerdo Nº 3808 del Comité Ejecutivo del Consejo de Ministros, de fecha


20 de noviembre de 2000; Decreto 299 de 20 de agosto de 2012 y Decreto Ley 322 de 31
de julio de 2014.

34
• Elaborar y proponer al Consejo de Ministros el esquema y
plan nacional de ordenamiento territorial, los esquemas y
planes especiales de ordenamiento territorial de actividades
productivas y no productivas, cuencas hidrográficas, macizos
montañosos, territorios costeros, regiones turísticas, zonas
con regulaciones especiales, infraestructuras técnicas, los que
rebasen el marco provincial y otros por decisión estatal, previa
conciliación con los organismos y entidades correspondientes.
• Integrar los planes generales de ordenamiento territorial y
urbanismo a nivel nacional, provincial y municipal, con las
proyecciones a mediano y largo plazos de la economía y con
su plan de inversiones.
• Establecer las prioridades y asesorar, revisar y aprobar
técnicamente los esquemas y planes de ordenamiento
territorial y urbanismo de las regiones, provincias, municipios,
ciudades, asentamientos, zonas con regulaciones especiales y
otros, en estrecha coordinación con los organismos y entidades
correspondientes.
• Ejercer el papel rector en el enfrentamiento a las ilegalidades
en materia de ordenamiento territorial y urbanismo, y demás
actividades en el ámbito de su competencia; ejecutar o disponer
con ese fin la inspección estatal en todo el territorio nacional y
dictar las normas y procedimientos para su ejecución en todos
los niveles.
• Elaborar, dictar, proponer, aplicar y controlar la legislación en
materia de ordenamiento territorial, urbanismo y catastro, así
como los instrumentos metodológicos, técnicos y normativos,
según corresponda.
• Establecer y controlar las normas para el mejor funcionamiento
de los asentamientos urbanos y rurales.

35
• Elaborar y proponer, con la participación de los órganos,
organismos y entidades correspondientes, los estudios
territoriales para el perfeccionamiento de la División Político-
Administrativa.
• Elaborar, aprobar y controlar los procedimientos para
el otorgamiento de certificados de macrolocalización,
microlocalización, licencias de construcción, autorizaciones
y certificados de habitable-utilizable.
• Confeccionar los certificados de macrolocalización y
aprobar técnicamente los certificados de microlocalización
de inversiones de interés nacional, previa consulta con los
organismos y entidades correspondientes.
• Elaborar y aprobar las normas y procedimientos sobre la
asignación de terrenos estatales a las personas naturales que
los soliciten para construir viviendas, según las prioridades
que establezca el Estado; el otorgamiento, cobro y cancelación
del derecho perpetuo de superficie y las reclamaciones de
derecho que de ello se deriven.
• Elaborar y aprobar las normas y procedimientos sobre
los dictámenes técnicos para la descripción y tasación de
viviendas, la certificación de medidas y linderos, la certificación
catastral, el traspaso de solares yermos y azoteas, así como el
ejercicio del derecho de tanteo a favor del Estado.
• Diseñar, dirigir y controlar el Sistema de Información de
la Planificación Física y su vinculación con el Sistema de
Información del Gobierno, mediante el uso de las tecnologías
de la informática y las comunicaciones.
• Establecer las políticas para el Sistema de la Planificación Física
en materia de desarrollo científico-técnico, comunicación
institucional, capacitación, colaboración internacional y

36
perfeccionamiento institucional, y realizar investigaciones
científicas sobre problemáticas asociadas al ordenamiento
territorial, el urbanismo y el catastro.
• Organizar e impartir cursos de postgrado, habilitación,
seminarios y conferencias en temas relacionados con el
ordenamiento territorial, el urbanismo y el catastro, en
coordinación con el Ministerio de Educación y el Ministerio
de Educación Superior y sus instituciones en el país.
• Representar al país ante los organismos internacionales y
en los eventos que corresponda en materia de ordenamiento
territorial, urbanismo, asentamientos humanos, hábitat
y catastro.

El Sistema de la planificación física se ha consolidado como


institución y en su quehacer interactúa con el Gobierno, las instituciones,
las universidades, las entidades económicas y la población, en aras de
un territorio y ciudad ordenados, en correspondencia con las demandas
crecientes de la sociedad.
Las funciones que este Instituto despliega han decursado por
varios momentos de desarrollo desde su surgimiento, lo que se evidencia
desde la evolución en su organización estatal, hasta la efectividad en
la gestión y aplicación de los normas jurídicas que tienen que ver
directamente con la planificación física y el urbanismo.
En la actualidad la planificación física ha cobrado especial interés;
a tales efectos se ha reorganizado la actividad a partir del traspaso de
funciones al Instituto que antes correspondían a otros organismos, y
se han modificado y aprobado un conjunto de normas jurídicas que
refuerzan y organizan su actuar.
Como se declaraba antes, el Decreto Ley 322 Modificativo de
la Ley Nº 65 Ley General de la Vivienda, de fecha 31 de julio de 2014

37
establece un conjunto de funciones que son competencia del IPF que
hasta ese momento correspondían a otros organismos, como el extinto
Instituto Nacional de la Vivienda.
No obstante lo que se ha hecho resulta aún insuficiente, pues
anteceden décadas de indisciplinas e ilegalidades en la población
en torno a la planificación física y el urbanismo, lo que unido a la
deficiente gestión estatal evidencia lo complejo del asunto y el gran
reto del Instituto.

3. El urbanismo y su respaldo legal en Cuba

El urbanismo es la actividad que, a partir de conceptos y


métodos científicos propios, propone, regula, controla y aprueba las
transformaciones espaciales en el ámbito rural y urbano con diversos
niveles de la precisión, integrando las políticas económicas, sociales
y ambientales, y los valores culturales de la sociedad en el territorio,
con el objetivo de contribuir al logro de un desarrollo sostenible. Su
contenido trasciende el espacio de las viviendas para incorporar también
la infraestructura física (vías, servicios públicos, otras construcciones)
y las actividades socioeconómicas de la población. Cada día se demanda
más que se prevea su desarrollo desde una perspectiva holística,
sistémica, democrática y participativa.
El IPF, tal como se declaraba antes, es el organismo rector en Cuba
en materia de urbanismo, no obstante, unido a este aparece la gestión
de otras instituciones, tal es el caso del Ministerio de la Construcción,
el Ministerio de Justicia y otras entidades nacionales, que refuerzan el
carácter sistémico con que debe ser atendida la actividad.
En manos de la organización administrativa, de sus agentes y de
la población en general está el deber de encontrar el equilibrio entre

38
la población que habita un espacio urbano del territorio nacional y
las actividades y servicios que en dicho espacio se realizan. Por su
complejidad, la ordenación urbanística implica la actuación coordinada
de los factores del proceso urbano y de los componentes del sistema
jurídico- institucional.
Así, a continuación se exponen las principales legislaciones que
en el ordenamiento jurídico cubano regulan la temática del Hábitat en
los espacios urbanos:
La Constitución de la República de Cuba no contiene precepto
específico referente al urbanismo, pero en su articulado se incluyen
disposiciones que promueven el desarrollo económico y social sostenible
y el deber del estado de satisfacer las necesidades de la colectividad lo
que está en concordancia con los objetivos del urbanismo.6
La Ley 81, Ley del Medio Ambiente, tiene como objeto establecer
los principios que rigen la política ambiental y las normas básicas
para regular la gestión ambiental del Estado, así como las acciones
de los ciudadanos y la sociedad en general, a fin de proteger el medio

6 Constitución de la República de Cuba de 24 de febrero de 1976, reformada


en julio de 1992 y en junio de 2002. Gaceta Oficial Extraordinaria No. 3 de 31 de enero de 2003.
Artículo 27. El Estado protege el medio ambiente y los recursos naturales del
país. Reconoce su estrecha vinculación con el desarrollo económico y social sostenible
para hacer más racional la vida humana y asegurar la supervivencia, el bienestar
y la seguridad de las generaciones actuales y futuras. Corresponde a los órganos
competentes aplicar esta política.
Es deber de los ciudadanos contribuir a la protección del agua, la atmósfera, la
conservación del suelo, la flora, la fauna y todo el rico potencial de la naturaleza.
Artículo 103. (Tercer párrafo). Las Administraciones Locales que estas
Asambleas constituyen, dirigen las entidades económicas, de producción y de servicios
de subordinación local, con el propósito de satisfacer las necesidades económicas, de
salud y otras de carácter asistencial, educacionales, culturales, deportivas y recreativas
de la colectividad del territorio a que se extiende la jurisdicción de cada una.

39
ambiente y contribuir a alcanzar los objetivos del desarrollo sostenible
del país. La gestión ambiental adquiere gran importancia en el contexto
urbano en el que se requieren acciones que contribuyan al desarrollo
pleno de los habitantes de un territorio determinado; valorando los
factores ambientales y encauzando las actividades humanas mediante
la actuación sobre el comportamiento de los actores implicados
para conseguir los objetivos planteados, evitando la duplicidad de
funciones, los conflictos de competencia, los vacíos en la acción, y
optimizando así los recursos disponibles. En ella deben participar de
modo coordinado, los órganos y organismos estatales, otras entidades
e instituciones, y los ciudadanos en general, de acuerdo con sus
respectivas competencias y capacidades.
Otra legislación importante en el urbanismo es el Decreto Nº 21,
Reglamento sobre la Planificación Física, de 28 de febrero de 1978, el que regula
las particularidades de diversos planes en relación con la planificación
física y específicamente sobre los planes urbanos. Especial mención
merece el artículo 29 de esta norma que establece que las propuestas de
planes directores urbanos serán objeto de conocimiento por la población
propia de las ciudades y pueblos a los cuales los mismos van dirigidos;
y que el proceso de elaboración y ejecución de las propuestas de planes
directores urbanos se hará conforme a una metodología y calendario
que propicien la participación activa y consciente de la población en
dicho proceso. Una de las fortalezas de los últimos años en Cuba está en
que se ha logrado el trabajo consciente de los organismos involucrados
en cada ciudad del país en la elaboración y ejecución de los planes de
desarrollo urbano, pero entre las principales deficiencias que se presenta
se encuentra la falta de coordinación de estos organismos y la escasa
participación ciudadana, tanto en la elaboración como en la ejecución.
En cuanto al régimen contravencional se pueden citar varias
legislaciones vigentes que se relacionan con el hábitat en las ciudades

40
pero se destaca el Decreto 272 de 20 de febrero de 2001, Contravenciones en
materia de Ordenamiento Territorial y Urbanismo, el que constituye un aporte
considerable en la ordenación del territorio en Cuba; pero se necesita
aún de mayor exigencia en la aplicación de sus disposiciones, pues sus
preceptos son violados con frecuencia y hay una total impunidad para el
infractor; o también sucede que se comete la contravención a sabiendas
de las consecuencias; pero estas son más convenientes para el infractor
que el hecho de no cometerla.
Otras legislaciones importantes en este tema son:
El Decreto 141 de 1988 Contravenciones del orden interior;
Decreto- Ley 138 de 1993, De las aguas terrestres;
Decreto 211 de 1996 Contravenciones de las Regulaciones para los
Servicios de Acueducto y Alcantarillado; y
Decreto- Ley 200 de 1999, De Las Contravenciones en Materia de Medio
Ambiente.
Luego de analizada la organización estatal en torno al urbanismo
en Cuba, así como el conjunto de normas que lo regulan y sustentan,
se demuestra el interés del estado en lograr una gestión adecuada del
hábitat en la ciudades, no obstante, esto es solo el punto de partida, pues
este asunto mucho depende de la acción de la población y de la sociedad
en general, cuestión esta en la que queda mucho por andar en Cuba.

Bibliografía

Bassols Coma, M. Ordenación del territorio y medio ambiente. Aspectos jurídicos.


Revista de Administración Pública Nº 95. España.
Bermejo Vera, J. y otros. (1998) Derecho Administrativo. Parte Especial.
3era edición. Civitas. Madrid. España.
Colectivo de autores, (2000) Derecho Ambiental Cubano, Editorial
“Félix Varela”, La Habana. Cuba.

41
Colectivo de autores. (2004) Temas de Derecho Administrativo Cubano.
Tomo I. Editorial Félix Varela. La Habana. Cuba.
Coyula Cowley, M. (1997) Ambiente urbano y participación en un socialismo
sustentable. En: Revista TEMAS, número 9.
Fernández Núñez, J. M. (1996) Derecho Urbanístico y ordenamiento urbano
en Cuba. En Revista Cubana de Derecho. No. 12. 1997- 1998 Editada por la
Unión Nacional de Juristas de Cuba. La Habana. Cuba.
Fernández Rodríguez, T. R. (1997) Manual de Derecho Urbanístico. 12ª
Edición. Abella. Madrid. España.
García de Enterría, E. y Fernández, T. R. (2006) Curso de Derecho
Administrativo I. Parte I. Editorial Félix Varela. La Habana. Cuba.
Rodríguez Otero, C. y otros (2006) El ordenamiento territorial y la
adaptación a los cambios globales. (Cap. VI de la investigación “Los asentamientos
humanos, el uso de la tierra y los cambios globales”) Copia digital
disponible en CD del Curso a distancia de Derecho Ambiental Internacional
Contemporáneo. La Habana.

42
Política, Estado e Democracia no Brasil:
olhares sobre um país multiétnico

Eduardo Faria Silva1


Anderson Marcos dos Santos2

1. Introdução

O presente ensaio apresenta uma reflexão sobre a organização


jurídica do estado brasileiro, considerando o processo político da
constituinte de 1987-88 que delineou os contornos da nação e reconheceu
o seu caráter multiétnico.
Nesse prisma, foram articulados os sentidos normativos e os
limites jurídicos-antropológicos da participação social na tomada de
decisão política da administração pública, no tocante à determinação
constitucional ligada ao aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos

1 Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Professor


Titular de Direito Constitucional da Universidade Positivo. Coordenador da Pós-
Graduação em Direitos Humanos e Desenvolvimento da Universidade Positivo.
Assessor Jurídico do SENGE/PR. Endereço eletrônico: eduardo.faria.silva@up.com.br
2 Doutor em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP). Mestre em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do
Paraná (UFPR). Professor de Direito Civil e Antropologia e Sociologia no Curso de
Direito da Universidade Positivo. Endereço eletrônico: anderson.santos@up.edu.br

43
os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em
terras indígenas (art. 231, §3º, da CF). De igual forma, apresenta-se um
sentido substantivo democrático ao processo público de participação
em um país multiétnico e evita-se que ele seja utilizado como um
instrumento de mera legitimação processual e decisória.
A história da violência colonizadora ainda infligida aos povos
indígenas no Brasil justifica o recorte temático assumido no ensaio.
Radicalizar o processo democrático, por meio da participação plena
desses povos na tomada de decisão estatal em projetos de grande
impacto social (megaobras), respeitadas suas peculiaridades culturais,
acaba sinalizando e apresentando-se como uma métrica para todos os
grupos sociais de garantia da efetivação do texto constitucional de base
liberal e igualitária.

2. Regime jurídico constitucional e (in)visibilidade

O atual regime jurídico-constitucional do país tem seu marco legal


inaugural na Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de
outubro 1988, a qual expressa um momento de transição político-jurídica
de um regime autoritário militar (1964-84) para um ordenamento de
base democrática, que valoriza substancialmente os princípios da
liberdade e da igualdade.
O novo texto constitucional é um olhar pelo retrovisor da matriz
europeia do Estado democrático de bem-estar social e paradoxalmente
um novo caminho no delineamento do país. Aquela expressa um passado
construído após a Segunda Guerra Mundial, com o sistema de Bretton
Woods, que, dentro das bases capitalistas de mercado e consumo, buscou
universalizar os direitos sociais básicos como educação, trabalho, saúde,
moradia e previdência. Contudo, esse modelo europeu já apresentava na

44
década de 1970 sinais de esgotamento, que abriria espaço nos anos 80
para uma agenda política de restrição de direitos sociais à população,
denominada neoliberal.
Anacronicamente o passado-presente-futuro são interligados
no Brasil na constituinte de 1987-88 e o texto constitucional publicado
acaba assegurando um regime democrático, que prescreve uma série
de direitos sociais com base na liberdade e igualdade. O “dever-ser”
garantido projeta um país que não encontra referência na realidade
nacional. Os elementos centrais do estado democrático e social
apresentavam indicadores extremamente baixos, sendo a ausência de
políticas públicas concretas de distribuição de renda e transformação
social os principais motivos.
São novas prescrições jurídicas e realidades sociais antigas
que se confrontavam, cabendo às instituições e às forças políticas
nacionais imprimirem esforços para deslocar os fatos marcados pelo
autoritarismo e a colonialidade 3 para um momento democrático
liberal-igualitário.4
O diálogo entre o Estado e a sociedade é um fundamento da nova
ordem constitucional e instrumento central nesse processo de transição
e efetivação das prescrições constitucionais para a transformação do
país. Robert Dahl afirma que o direito à contestação pública por parte
dos cidadãos e a possibilidade de participação social no processo

3 QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder e classificação social. In:


SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (Orgs.). Epistemologias do sul.
Coimbra: Almedina, 2009. (Série Conhecimento e Instituições).

4 As ações para efetivarem o conteúdo constitucional definido pelo poder


constituinte originário encontraram resistências de diversas ordens. Destaca-se como
referência, em primeiro, a manutenção dos grupos políticos detentores do poder nas
principais instituições com capacidade de mudança social. Em segundo, a rápida
alteração da Constituição para adequar o país a nova ordem mundial definida pelo
Consenso de Washington.

45
decisório estatal marcam o estágio da democracia política nacional.5
Diferentes mecanismos institucionais, além da eleição, podem assegurar
a contestação e a participação, como os conselhos de políticas públicas,
as conferências de políticas públicas, as ouvidorias, as mesas de diálogos,
os fóruns interconselhos, as consultas públicas, as reuniões públicas e
as audiências públicas.
A construção de um diálogo democrático no Brasil, que assegure
a efetiva participação dos cidadãos, é mais difícil e complexa que a de
um regime constitucional democrático na sociedade europeia. No Brasil
são 305 etnias, que falam 274 línguas distintas6, com culturas próprias,
absolutamente distintas da europeia, que têm tempos, espaços de
percepção da realidade e desejos distintos e, em muitos casos, conflitantes.
Como todos os outros países das Américas – até recentemente –
o Brasil não reconhecia aos indígenas a plena cidadania e, portanto, a
participação nas decisões políticas, de forma coletiva ou individualmente7.
A legislação nacional, incluindo as antigas Constituições, não dava
nenhuma visibilidade política e mantinha os povos indígenas à margem

5 Robert Dahl, no seu livro Poliarquia, trata de aspectos da democratização,

em especial, no “desenvolvimento de um sistema político que permite oposição,


rivalidade ou competição entre um governo e seus oponentes”. Com as devidas
mediações, a reflexão de Dahl foi utilizada como referência no presente ensaio. (DAHL,
Robert A. Poliarquia: participação e oposição. São Paulo: Edusp, s.d. p. 25.)
6 REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Disponível em: <http://www.
brasil.gov.br/governo/2012/08/brasil-tem-quase-900-mil-indios-de-305-etnias-e-274-
idiomas> Acessado em: 10 de novembro de 2015.
-96. p./PPGAS – UFAM, Manaus: UEA EdiçoRADO, Sheilla Borges. errit do
pluralismo jurntro do territ serviço e o profissional ha
7 SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. Os povos indígenas e o direito
brasileiro, In: SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de e BERGOLD, Raul Cezar. Os
direitos dos povos indígenas no Brasil: desafios no século XXI. Curitiba: Letra da Lei, 2013.
Pp. 13-34.

46
da sociedade nacional, não reconhecendo sua existência coletiva e só
reconhecia ao indivíduo a plena cidadania quando este deixava de ser
índio e se integrava na sociedade branca, dita “civilizada”.
Dois fatores contribuíram para a construção histórica desse
regime jurídico. O primeiro, a forma Estado concebida pela modernidade
europeia, que pressupunha a existência de um poder soberano exclusivo,
sob um território determinado e sob uma população de indivíduos
que partilha supostamente os mesmos símbolos e valores nacionais. O
segundo, o arraigado pensamento colonial, que não se encerra com a
independência e permanece no imaginário cultural de uma sociedade
cuja elite se vê como um europeu de segunda classe, mas superior
aos pobres, aos índios e aos negros. O silêncio colonial dos antigos
marcos normativos ignorava, assim, uma característica estruturante da
sociedade brasileira: sua diversidade étnica e cultural.
Essa realidade multiétnica foi constitucionalmente reconhecida,
assegurada e resguardada pela Constituição de 1988 (art. 231 e 232 da
CF), que deu visibilidade aos povos indígenas como sujeitos coletivos,
encerrando a longa política integracionista que vinha do Brasil colônia;
reconheceu aos indivíduos indígenas o direito de continuar a serem
índios, ou seja, a possibilidade de serem cidadãos plenos sem deixarem
as características de sua etnia; garantiu a proteção da cultura material
e imaterial dos povos; e, o mais importante para a continuidade da
existência desses povos, criou mecanismos jurídicos e institucionais
para proteção dos seus territórios.
Todavia, a forma de reconhecimento e proteção constitucional
encontra limites intrínsecos e extrínsecos que dificultam e, em alguns
casos, impossibilitam a efetivação da plena cidadania dos povos
indígenas. Os pressupostos da forma Estado, da modernidade europeia,
ainda restam presentes na Constituição de 1988: o poder soberano é
estatal, o território é nacional e o imaginário e os valores culturais (entre

47
elas os da cultura jurídica) são os da sociedade europeizada, mesmo que
sob o véu da universalidade.
O fim da invisibilidade, dessa maneira, assume a forma de um
“reconhecimento em conflito” 8. Observe-se que são garantidos os
direitos culturais, as línguas e tradições indígenas, mas o idioma oficial é
o português, os feriados são católicos e o direito é o estatal; os territórios
são propriedade da união e de posse dos povos, mas rivalizam essa posse
com outros usos de interesse nacional, como segurança e exploração
de riquezas e energia; a própria identidade indígena é submetida a um
limite que lhe é culturalmente externo, o da nacionalidade brasileira9.
É nesse quadro de conflito pela efetivação dos direitos que os
mecanismos institucionais de participação devem ser utilizados pela
administração pública no diálogo com a sociedade10, em especial, nas
ações de planejamento e execução de políticas públicas ligadas aos
projetos de infraestrutura como a construção de hidrelétricas, ferrovias,
rodovias, portos, aeroportos etc. O impacto das megaobras para a
população apresenta uma infinidade de externalidades e as decisões
estatais necessitam da legitimação social para serem consideradas
plenamente democráticas.

8 BELTRÃO. Jane Felipe; OLIVEIRA, Assis da Costa. Povos indígenas e


cidadania: inscrições constitucionais como marcadores sociais da diferença na América
Latina. In: LIMA, Antonio Carlos de Souza (Coord.). Antropologia & Direito: temas
antropológicos para estudos jurídicos. Brasília / Rio de Janeiro / Blumenau: Associação
Brasileira de Antropologia / Laced / Nova Letra, 2012. Pp.715-744.
9 Acórdão na PET 3388.
10 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São
Paulo: Malheiros, 2012. MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. São Paulo:
RT, 2002. FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson Abreu. Processo Administrativo. São
Paulo: Malheiros, 2001. BUENO, Vera Cristina Caspari Monteiro Scarpinella. As Leis
de Procedimento Administrativo: uma leitura operacional do princípio constitucional
da eficiência. In: Revista de Direito Constitucional e Internacional. São Paulo: RT, vol. 39. p.
267-288, abr/jun-2002.

48
3. Igualdade, participação e democracia

A capacidade do governo de dar respostas às preferências dos


cidadãos definidos constitucionalmente como iguais, no campo da
política, é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito,
pois dá legitimidade às suas ações e a sua permanência11. A igualdade
mencionada deve ser compreendida no plano formal e material, exigindo-
se, assim, um tratamento desigual para os que são desiguais, na medida
das suas desigualdades, com o objetivo de se conseguir uma posterior
isonomia12 13.
Tal entendimento é a afirmação do princípio constitucional em
sua plenitude e permite que todos os povos existentes no país sejam
considerados como iguais nas suas pretensões, considerando-se,
contudo, as suas diferenças no momento das decisões sobre as ações
estatais. A percepção das diferenças é que poderá ensejar resultados
mais isonômicos para todos.
Essa compreensão materializa uma visão liberal da igualdade,
nas suas dimensões política e jurídica, e dá concretude para um ideal
de cidadania-democrática. Robert Dahl acrescenta na análise que esses
“cidadãos plenos” necessitam “oportunidades plenas” de: (a) “formular
suas preferências; (b) de expressar suas preferências a seus concidadãos
e ao governo através da ação individual e da coletiva; (c) de ter suas
preferências igualmente consideradas na conduta do governo, ou seja,

11 DAHL, Robert A. Poliarquia...p. 25.


12 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes,
2000. p. 283-285.
13 DWORKIN, Ronald. A virtude soberana: a teoria e a prática da igualdade. São
Paulo: Martins Fontes, 2005.

49
consideradas sem discriminação decorrentes do conteúdo ou da fonte
da preferência.”14
As oportunidades plenas – entendidas como o que eu posso
fazer plenamente –15 dão um significante e um significado às diversas
formas de participação social na condução dos processos decisórios
sobre políticas públicas nacionais, com destaque ao objeto do ensaio,
àquelas relativas ao aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os
potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em
terras indígenas.
A participação deve garantir condições para que os cidadãos
identificados com a temática a ser debatida tenham assegurada a
possibilidade de elaborar e de expressar as suas preferências de forma
livre e em igualdade de condições. Essa garantia está prevista na
Constituição Federal do Brasil (art. 5º e 231 § 3º da CF) e reforça a ideia
de participação social na tomada de decisão sobre as políticas públicas
governamentais.
Elaborar e expressar as suas preferências exige: (a) que a
participação dos indivíduos e dos grupos interessados seja representativa;
(b) que todos tenham acesso prévio a todos os elementos que serão
discutidos na esfera pública; (c) que todos tenham garantido apoio
técnico para realizar a análise e a reflexão sobre o tema; (d) que todos
tenham espaço e tempo adequado para expressar a sua preferência; (e)
que o conteúdo dito seja considerado na ação das instituições políticas.16

14 DAHL, Robert A. Poliarquia...p. 26.


15 ELSTER, Jon. Peças e engrenagens das ciências sociais. Rio de Janeiro: Relume-
Dumará, 1994. p. 29-37.
16 SILVA, Eduardo Faria. Audiência pública e participação social na
efetivação do Estado Democrático. In: ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno; DOURADO,
Sheilla Borges. Consulta e participação: a crítica à metáfora da teia de aranha. Manaus:
UEA Edições; PPGSA/PPGAS – UFAM, 2013. p.81-96.

50
O governo que desconsiderar os cinco pontos mencionados
estará – consciente ou inconscientemente – restringindo a participação
real dos cidadãos e viciando o processo democrático. Em outras palavras,
o governo não estará sendo responsivo às preferências dos cidadãos, as
oportunidades não serão plenas e o ideal de democracia estará maculado.
A democracia exige participação substancial, a qual têm um sentido de
prescrição de ação que exige a observância dessa orientação.

4. A participação social e suas fragilidades

Os espaços de participação social no processo decisório da


administração pública e os resultados concretos obtidos pelos
cidadãos indicam a força da democracia no país. O Brasil é signatário
da Convenção n.º 169, da OIT, que determina que o governo deve
“consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados
e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez
que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis
de afetá-los diretamente.”17
A regra contida na norma internacional vai ao encontro e tem o
mesmo status dos dispositivos constitucionais que garantem os processos
participativos e a necessidade de oitiva das comunidades indígenas,
quando forem planejadas ou executadas ações de aproveitamento dos
recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a
lavra das riquezas minerais (art. 1º e 231 § 3º da CF).
As prescrições internacionais incorporadas ao ordenamento
jurídico nacional e as normas constitucionais condicionam a ação do
governo e são critérios de validade a serem observadas, sob pena de sua

17 art. 6, 1, a, Convenção 169, OIT.

51
ausência ou simulação macular o conceito de democracia. Interessante
destacar que a própria Convenção fixa a necessidade de a administração
estabelecer meios para que os povos possam participar livremente das
decisões que lhes afetem direta ou indiretamente (art. 6, 1, b, Convenção
n.º 169 da OIT).
As possibilidades de participação social são inúmeras e em
diferentes circunstâncias, que podem ter um impacto significativo na
vida dos povos ou simplesmente criar, modificar ou extinguir uma ação
estatal de menor relevância. Importante é definir as medidas que afetam
diretamente os povos e que ensejam necessariamente a sua consulta.
Um dos filtros a ser utilizado foi definido pela Constituição
Federal no tocante aos recursos hídricos e minerais. Qualquer ação
relativa ao aproveitamento de ambos os recursos nos seus territórios
enseja a consulta aos povos, pois se tratam de medidas com alto impacto
direto e só podem ser executadas com megaobras.
Como mencionado anteriormente, distintos mecanismos
democráticos são disponibilizados nacionalmente para garantir
uma consulta consistente, de boa-fé e de maneira apropriada ao que
vai ser debatido, tendo como objetivo a possibilidade de um acordo
ou consentimento.
Entre os distintos mecanismos, as audiências públicas têm um
sentido normativo ao prescrever uma conduta ao governo relacionado à
efetiva participação social. São espaços que possibilitam a materialização
da orientação constitucional sobre democracia participativa e que
constituem e fundamentam o Brasil (art. 1º da CF).
As regulações sobre o tema são difusas e pontuais, apesar de
serem utilizadas nas três esferas da administração (União, Estados e
Municípios) cotidianamente. É possível identificar dispositivos sobre
as audiências em diferentes normas como na Lei n.º 9.784, de 29 de
janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal, na Lei n.º 8.666, de 21 de junho de

52
1993, que institui normas para licitações, na Resolução n.º 009, de 3 de
dezembro de 1987, do Conselho Nacional do Meio Ambiente, que dispõe
sobre critérios básicos e diretrizes gerais para a avaliação do impacto
ambiental, na Lei n.º 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que dispõe sobre
a concessão e permissão de serviço público, na Lei n.º 9.427, de 26 de
dezembro de 1996, que disciplina o regime das concessões de serviços
públicos de energia elétrica, na Lei n.º 10.257, de 10 de julho de 2001, que
define a política urbana, na Lei n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, que
institui a Lei Orgânica do Ministério Público.
A pulverização de normas que dispõem sobre audiências públicas
para temas diversos que passam por áreas do conhecimento jurídico
distintas (constitucional, administrativo, ambiental, energético etc.)
evidencia a ausência de uma regulação universal que, por um lado,
apresente parâmetros mínimos orientadores do conteúdo e dos
procedimentos a serem adotados em todas as fases do evento; por outro,
vincule a ação do governo na realização da audiência e na garantia da
participação social.
A prática autoritária é utilizada de forma corrente para legitimar
procedimentos que fundamentam decisões governamentais pela aparente
publicização das informações. Todavia, os encontros carecem de efetiva
participação social, que é garantida e exigida constitucionalmente. A
construção da Usina de Belo Monte, no Estado do Pará, foi judicializada
pelo Ministério Público Federal – MPF18, pois, no entendimento do

18 O Ministério Público Federal já ajuizou quinze ações contra a construção do


Complexo de Belo Monte. Os objetos das demandas são variados e envolvem a ausência
de realização de audiências públicas, ausência de oitiva prévia dos povos indígenas,
impossibilidade de remoção dos povos indígenas Arara e Juruna para assegurar o
respeito ao direito da natureza e das gerações futuras, improbidade administrativa,
irregularidades no licenciamento ambiental, irregularidades que ensejam a suspensão
da licença de instalação concedida pelo Ibama sem que as condicionantes impostas
pelo próprio órgão tenham sido cumpridas.

53
órgão, na construção da megaobra de infraestrutura energética nacional
ocorreu o “cerceamento do direito de participação da sociedade
civil e da violação do direito à informação, bem como cerceamento
das prerrogativas institucionais do Ministério Público, além das
irregularidades decorrentes do Regimento Interno das audiências
públicas.”19
As limitações apresentadas pelo MPF se deram pela inobservância
do governo de disponibilizar o estudo de impacto ambiental em prazo
hábil para análise – o documento foi publicizado apenas nove dias antes
da audiência – e o número de encontros realizados desconsiderou todas
as cidades e localidades a serem impactadas pela obra, ou seja, inúmeros
interessados não tiveram acesso às audiências para elaborar e expressar
suas preferências.
Os impactos que a obra irá produzir não podem ser
desconsiderados e os interessados devem ter oportunidades plenas de
participar do processo decisório. As informações apresentadas pelo
MPF na ação apontam “que a obra afetará direta e indiretamente 66
municípios e 11 terras indígenas, atingindo, apenas na cidade de Altamira
20 mil pessoas, que terão que sair de suas casas, e ao longo do curso, o
rio Xingu terá 100 quilômetros de extensão drasticamente alterados”.20
Os fatos apresentados pelo MPF na ação civil pública ensejaram o
deferimento de medida liminar em favor das comunidades interessadas.

19 Ação Civil Pública, Classe: 7100, Processo n.º 2009.39.03.000575-6. Autores:


Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado do Pará. Réus: Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente, Eletrobrás e Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A –
ELETRONORTE.
20 Ação Civil Pública, Classe: 7100, Processo n.º 2009.39.03.000575-6. Autores:
Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado do Pará. Réus: Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente, Eletrobrás e Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A –
ELETRONORTE.

54
É relevante ler a reflexão do Juiz Federal da Subseção de Altamira,
Edison Moreira Grillo Júnior, que afirma que a

audiência pública é não apenas a concreção do princípio constitucional


da publicidade, do dever estatal de informar adequadamente os seus atos
aos administrados, mas, também, a afirmação do princípio constitucional
da democracia participativa (art. 1º, parágrafo único da CRFB), em
que o povo é convocado a participar ativamente da discussão sobre
questões determinantes para a vida em coletividade. Assim, no caso
vertente, a audiência pública não pode ser considerada, como sustentam
os requeridos, mero ato ritualístico encartado no procedimento de
licenciamento ambiental, com o único propósito de cumprir etapa
procedimental, sem maiores consequências para a formação do ato
administrativo final que decidirá sobre a vialibilização do projeto do AHE
Belo Monte. A audiência pública deve ostentar a seriedade necessária, a
fim de que possa fielmente servir à finalidade para a qual foi criada, que, no
caso presente, é informar custos, benefícios e riscos do empreendimento,
propiciando o debate franco e profundo com as populações envolvidas,
em que seja possível, não apenas ouvir, mas discordar e contribuir com
sugestões extraídas a partir de suas experiências íntimas com o meio
ambiente em que sobrevivem, já que a obra lhes afetará substancialmente
o modo de viver. A vantagem disso é que o projeto se aperfeiçoa dentro
do Estado de Direito e da consensualidade democrática, o que é benéfico
aos interesses nacionais.21 22

21 Liminar parcialmente deferida na Ação Civil Pública, Classe: 7100, Processo


n.º 2009.39.03.000575-6. Autores: Ministério Público Federal e Ministério Público do
Estado do Pará. Réus: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, Eletrobrás e Centrais
Elétricas do Norte do Brasil S.A – ELETRONORTE.
22 A decisão liminar foi parcialmente deferida em 10 de novembro de 2009.
Dois dias depois, em 12 de novembro de 2009, a medida foi suspensa por decisão
monocrática expedida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

55
Garantir aos cidadãos que serão atingidos a possibilidade de
elaborar e de expressar suas preferências nas audiências públicas é
primordial e condição de efetivação dos princípios fundamentais do
Estado Democrático brasileiro (artigos 1º ao 4º da CF/1988). É uma
condição e uma relação de troca de conhecimento, experiências e
sentimentos. Não é uma ação unilateral de transferência de informações
por parte do Estado com fins “ritualísticos”. Do contrário, esses
encontros, ao invés de audiências públicas, são, nos dizeres de Agustín
Gordillo, públicas audiências ou sessões públicas. As diferenças são
estruturantes e merecem a devida atenção para que se garantam a
contestação pública e a participação social.

1.3 Audiencia pública y pública audiencia o sesión pública. Town


Meetings
Cabe distingu ir la ‘pública audiencia’ o sesión pública para enfatizar
que en la audiencia pública no se trata meramente de celebrar una
sesión administrativa con asistencia pasiva y muda del público, radio,
televisión, periodismo, etc., sino de realizar una audiencia en la cual
el público es parte interesada y activa, com derechos de naturaleza
procedimental a respetar dentro de la concepción ahora expandida del
debido proceso constitucional; con derecho de ofrecer, producir prueba
y controlar la que se produce, alegar, etc. El concepto de participación
pública es así esencial al de audiencia pública establecido por la ley, sin
perjuicio de que además la audiencia debe estar abierta al conocimiento
del público, periodismo, etc. En ocasiones la legislación hace referencia
meramente a ‘audiencias’, pero de su contexto cabe interpretar que se
trata de las mismas audiencias públicas aquí mentadas.23

23 GORDILLO, Agustín. Tratado de Derecho Administrativo. La defensa del


usuario y del administrado. 4.ed. Buenos Aires: Fundación de Derecho Administrativo,
2000, t.2. p. XI8.

56
A definição do que é audiência pública comporta valores
principiológicos que evitam a realização de encontros pelo governo
sem a possibilidade de contestação pública e participação social,
que teriam apenas o condão de legitimar ações que garantam, por
exemplo, a construção de uma megaobra. As prescrições delineadas
para as audiências públicas por Gordillo dialogam com os princípios
constitucionais da igualdade, legalidade e publicidade, fato que merece
uma análise específica.

5. Aceleração, progresso e outras temporalidades

A superação das fragilidades apontadas acima é um requisito


indispensável para se falar de um regime democrático multiétnico –
porém insuficiente –, pois a participação plena dos povos indígenas nas
decisões da administração púbica deve ter como pressuposto a garantia
do diálogo intercultural e o reconhecimento da autonomia dos povos,
com as suas percepções de tempo e espaço distintas.
O aproveitamento dos recursos hídricos, dos potenciais
energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras
indígenas, em especial os megaempreendimentos, são ações e processos
que decorrem de uma opção política, de uma escolha sobre o tipo de
desenvolvimento que um Estado tem ou pretende ter e qual posição
que ocupa ou quer ocupar dentro do espaço geopolítico atual e
futuro. Contudo, a lógica do processo de desenvolvimento moderno, a
necessidade de produção de bens para consumo em escala exponencial
e fundamentalmente a concepção de espaço e tempo de vida, que os
alimenta e ao mesmo tempo dele decorrem, são absolutamente distintos
dos interesses dos povos indígenas.
A diferença é abismal e é importante compreender como a
sociedade ocidental de matriz europeia construiu sua forma específica de

57
lidar com a ideia de desenvolvimento, produção, espaço e tempo de vida
para podermos demarcar e refletir sobre as diferenças e as dificuldades
de um diálogo efetivo entre Estado nacional e povos indígenas.
Até o final da Idade Média a concepção do tempo na Europa
tinha uma característica muito própria, de certa forma tratava-se de um
tempo cíclico, em que passado, presente e futuro não guardavam muitas
distinções. Era aberto e disponível para a ação e para as iniciativas de
liberdade, mas não sobre um futuro aberto e sim, sobre um futuro em
que os acontecimentos não se modificavam essencialmente em relação
aos do presente e do passado.24 Para essa cristandade, orientada por um
pensamento escatológico, o futuro e seu horizonte eram marcados pelo
final dos tempos, e a expectativa de um futuro efetivamente diferente
era remetida para uma vida além da terrena.25
A percepção deste tempo cíclico, do horizonte escatológico e das
previsões do fim do mundo, que eram elementos de integração da Igreja
Católica, dão lugar, com o fim das guerras civis religiosas e a ascensão
dos Estados absolutos, ao cálculo político e à contenção humanista26
que vão afastar as expectativas do fim dos tempos e um novo horizonte
vai se abrir para o futuro. O passado como exemplo magistral é afastado

24 “Colocada sobre o horizonte do fim do mundo, é inessencial a diferença


temporal entre os acontecimentos do passado e os do presente. Mais ainda, como todos
esses acontecimentos são, de diversos modos, ‘figuras’ antecipadas do fim, circulam
entre todos eles relações de simbolização analógica que superam em densidade de
significação as relações cronológicas.” RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa. Tradução
Roberto Leal Ferreira, rev. Maria da Penha Villela-Petit. Campinas, SP: Papirus, 1997,
Tomo III, p. 407.
25 KOSELLECK, Reinhart. O futuro passado dos tempos modernos. In:
______ Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução
Wilma Patrícia Maas; Carlos Almeida Pereira, revisão César Benjamin. Rio de Janeiro:
Contraponto – PUC-Rio, 2006, p. 24.
26 KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado ..., p. 27 et seq..

58
e uma nova temporalização da história é construída na medida em que
se forja o conceito de “novo tempo”,27 como um novo período histórico
que se estaria a viver desde o século XVIII.
É então nesse período que surge a ideia de progresso, com
a elaboração da concepção de um futuro propriamente inédito,
misturando prognósticos racionais e outros salvacionistas, em uma
ousada combinação de política e profecia. Para Koselleck, o progresso
“descortina um futuro capaz de ultrapassar o espaço do tempo e da
experiência tradicional, natural e prognosticável, o qual, por força de
sua dinâmica provoca por sua vez novos prognósticos, transnaturais
e de longo prazo”28. Para o historiador, é dessa maneira que o futuro
passa a ser caracterizado por dois momentos: pela aceleração e por seu
caráter desconhecido.
Esse novo conceito vem à tona quando se procurou reunir as
experiências dos três séculos antecedentes, fundamentalmente
no âmbito das inovações técnicas, o que constituiu a ideia de um
progresso único e universal. As várias experiências de progresso
localizadas e setoriais que modificavam cada vez mais o cotidiano
da vida, eram experimentadas de maneiras diferentes conforme a
localidade, e todas essas experiências remetiam “à contemporaneidade
do não-contemporâneo, ou inversamente, ao não-contemporâneo no
contemporâneo”29. O que possibilitou uma nova configuração social e

27 Sobre o passado visto como historia magistra vitae ver: KOSELLECK,


Reinhart. História Magistra Vitae – Sobre a dissolução do topos na história moderna
em movimento. In: ______ Futuro passado ..., p. 41-60. Sobre a constituição da noção de
“novo tempo”, de “tempo moderno” e “modernidade”, ver:. KOSELLECK, Reinhart.
“Modernidade” – sobre a semântica dos conceitos de movimento na modernidade. In:
______ Futuro passado ..., p. 267-304.
28 KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado ..., p 36.
29 KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado ..., p. 317.

59
política em que o progresso servia de balança para experiências afetadas,
nessa perspectiva, por um coeficiente de variação temporal. A diferença
entre grupos, ou países, ou classes sociais poderia ser medida por essa
balança, em que cada elemento poderia ter consciência de estar à frente
ou atrás dos outros. Uma corrida se iniciava, e uns então procuravam
alcançar os outros e ultrapassá-los.30
O progresso científico e técnico-industrial foi aí um elemento-chave.
Os grupos, as classes e os países dotados de uma superior capacidade
técnica olhavam de cima para baixo o grau de desenvolvimento dos
outros povos. Aqueles que se julgavam com um nível superior entendiam
ter o direito de dirigir esses povos considerados atrasados.31 Uma lógica
de dominação, mas, muito mais que isso, uma lógica de distanciamento
da experiência como organizadora do futuro. Lógica que lança tudo e
todos em direção a uma busca ilimitada por esse futuro vislumbrado
como progresso.
Esse processo de aceleração do tempo e a corrida pelo progresso
são impulsionadas por aquilo que alguns pesquisadores denominam
virada cibernética. Catherine Walbdy32, uma das primeiras a usar essa
expressão, denomina virada cibernética, como uma guinada que operou

30 Segundo Paul Ricouer: “Não é muito contestável que a ideia de progresso


foi que serviu de laço entre as duas acepções da história: se a história efetiva tem um
curso sensato, então, a narrativa que dela fazemos pode pretender igualar-se a esse
sentido, que é o da própria história. Assim é que o surgimento do conceito de história
como um singular coletivo é uma das condições nas quais se pôde constituir a noção de
história universal”. RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa ..., p. 363.

31 KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado ..., p. 317.

32 Waldby, Catherine. The Visible Human Project: Informatic Bodies and


Posthuman Medicine. London & New York: Routledge, 2000. (apud SANTOS, Laymert
Garcia dos. A informação após a virada cibernética. In: ______ et al. Revolução tecnológica,
internet e socialismo. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2003).

60
uma mudança na lógica da técnica, que passa a ter como elemento
central a informação e, com isso, mudou os rumos da aceleração ao
propiciar um rearanjo na aliança estabelecidade nos primórdios da
modernidade entre o capital, a ciência e a tecnologia, e colocou a
tecnociência como o motor de uma acumulação com a pretensão de
abarcar todo o mundo existente.33
O espaço do poder político não fica alheio a essas transformações,
pois percebe que ele é ocupado por quem tem mais força para definir
do ritmo das diferentes temporalidades e é, nesse sentido, que uma
nova forma de disputa aparece, a qual Paul Virilio vai dar o nome de
cronopolítica.34 Nesse novo jogo político o que se disputa é a velocidade,
é a definição do poder por aquele que consegue ir mais rápido.
Deixamos a disputa pelo espaço da geopolítica e entramos na disputa
do espaço-tempo da cronopolítica. Numa lógica de exclusão-inclusão,
esperança-desesperança, desenvolvimento-subdesenvolvimento, em
que tudo passa pela capacidade de os indivíduos, povos e Estados
serem mais ou menos rápidos.35
Essa lógica de aceleração tecnológica e econômica – imprimida de
forma diferente pelos países no jogo da geopolítica e da econômica política
mundial – é o elemento propulsor das decisões estatais em avançar sobre
os territórios indígenas com seus megaempreendimentos. É a partir
dessa lógica que se constroem os argumentos da imprescindibilidade
e inevitabilidades dos empreendimentos, da necessidade inexorável de
apropriação e dominação dos espaços, ao mesmo tempo em que todo o

33 SANTOS, Laymert Garcia dos. Revolução tecnológica ..., p. 9-10.

34 VIRILIO, Paul. Guerra pura: a militarização do cotidiano. Tradução Elza


Miné; Laymert Garcia dos Santos. São Paulo: Brasiliense, 1984, p. 17.

35 VIRILIO, Paul. Velocidade e Política. Tradução Celso Mauro Paciornik.


São Paulo: Estação Liberdade, 1997, p 57.

61
processo de participação social se afigura como entrave no giro veloz
que a engrenagem deveria ter.
Entre os cidadãos que partilham valores culturais nacionais, a
democracia é inadequada para a decisão da cronopolítica. O desajuste
ocorre exatamente porque o tempo dos cidadãos plenos para elaborarem
a expressarem as suas preferências – como dito no tópico três – é maior
que o tempo decorrente do processo de aceleração da engrenagem da
cronopolítica. Agrava-se – com restrição ou eliminação – a participação
dos povos indígenas, que sequer partilham desse processo histórico de
construção cultural que estabeleceu sentidos muito específicos para a
ideia de progresso, desenvolvimento, tempo de vida etc.
Não cabe aqui fazer essa análise do tempo de cada povo, o
que aliás é impossível, pois cada etnia tem sua própria concepção de
espaço, tempo de vida, de relação entre passado, presente e futuro. Cada
povo constrói sua imagem e seu imaginário de mundo a partir de sua
cosmologia, de sua história e de seus mitos, muitos deles ainda vivos.
Porém é possível afirmar que aceleração e progresso são conceitos por
vezes desconhecidos, em outros casos conhecidos, mas indesejados.
O tempo é o tempo da natureza, dos ciclos naturais, dos ciclos sociais
também, mas não o tempo do progresso técnico e econômico, muito
menos da aceleração pós-virada cibernética.
O diálogo político, para ser efetivamente democrático, deve passar
por aí, pela aceitação da impossibilidade da universalidade cultural do
tempo e do progresso. É que, de regra, o universal é somente um relativo
que arrogantemente tomou para si o direito de intitular-se universal.
A democracia, especificamente os mecanismos de participação
social, em um país multiétnico como o Brasil deve considerar dois
aspectos a respeito da concepção de temporalidade: que os tempos
são diferentes, inclusive o tempo para as decisões; e que o valor sobre o
tempo também o é.

62
6. Considerações finais

A organização político-jurídica do Estado brasileiro foi


significativamente alterada com a Constituição Federal de 1988. A
perspectiva jurídica de construção de um Estado de bem-estar social,
como forte valoração dos princípios fundamentais da liberdade e
igualdade, abriu uma janela de oportunidades para as forças políticas
nacionais transformarem a realidade nacional com a ampliação dos
indicadores de saúde, educação, moradia, trabalho etc.
O ponto central desse processo é a ideia da democracia
como elemento propulsor do desenvolvimento, pois permitiria uma
participação ativa dos cidadãos plenos no processo de construção
da esfera pública e privada. A abertura constitucional retirou da
invisibilidade os povos indígenas e apresentou uma séria de garantias em
consonância com as orientações internacionais sobre os povos indígenas
e tribais.
O reconhecimento foi um passo fundamental para a ideia de
igualdade entre os povos dentro do território nacional – mesmo se
reconhecendo todas as limitações e contradições decorrentes da
concepção de estado moderno. Não obstante, a igualdade formal tem
diferenças materiais conflitantes e intransponíveis, que o processo
de desenvolvimento, progresso, produção, espaço e tempo moderno
apresentam – vistos em fatos como a construção de megaobras em
locais que dão sentido à vida e à existência de determinados povos, cujo
impacto representa o seu extermínio.
Os caminhos para eventual reorganização das diferenças – dentro
da perspectiva democrática – foram apresentadas em diferentes países
como Canadá, Bolívia, Bélgica, Suíça. Estes adotaram a concepção de
Estado Plurinacional e, com suas especificidades, a perspectiva do
pluralismo jurídico.

63
Ambos os pluralismos podem aprofundar o ideal democrático de
cidadania plena, com o reconhecimento da autonomia dos povos sobre
seus territórios e seus destinos, na expressão usada pela antropóloga
Rita Segato: que cada povo trame os fios da sua história.36

Referências

ANTUNES, Paulo de Bessa. Curso de Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Lumen


Jures, 2000.
BELTRÃO. Jane Felipe; OLIVEIRA, Assis da Costa. Povos indígenas e
cidadania: inscrições constitucionais como marcadores sociais da diferença
na América Latina. In: LIMA, Antonio Carlos de Souza (Coord.). Antropologia
& Direito: temas antropológicos para estudos jurídicos. Brasília / Rio
de Janeiro / Blumenau: Associação Brasileira de Antropologia / Laced / Nova
Letra, 2012. Pp.715-744.
BUENO, Vera Cristina Caspari Monteiro Scarpinella. As Leis de
Procedimento Administrativo: uma leitura operacional do princípio
constitucional da eficiência. In: Revista de Direito Constitucional e Internacional.
São Paulo: RT, vol. 39. p. 267-288, abr/jun-2002.
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra:
Almedina, 1998.
DAHL, Robert A. Poliarquia: participação e oposição. São Paulo: Edusp, s.d.
DWORKIN, Ronald. A virtude soberana: a teoria e a prática da igualdade. São
Paulo: Martins Fontes, 2005.
DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
ELSTER, Jon. Auto-realização no trabalho e na política: a concepção
marxista da boa vida. Lua Nova – Revista de Cultura e Política, São Paulo,
n.25, p.61-101, 1992.

36 SEGATO, Rita Laura Segato. Que cada povo teça os fios da sua história:
o pluralismo jurídico em diálogo didático com legisladores. In: Direito.UnB,
janeiro – junho de 2014, v. 01, n.01. p. 65 – 92.

64
ELSTER, Jon. Peças e engrenagens das ciências sociais. Rio de Janeiro: Relume-
Dumará, 1994.
FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson Abreu. Processo Administrativo. São
Paulo: Malheiros, 2001.
GORDILLO, Agustín. Tratado de Derecho Administrativo. La defensa del
usuario y del administrado. 4.ed. Buenos Aires: Fundación de Derecho
Administrativo, 2000.
GROSSI, Paolo. Primeira lição sobre direito. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 1991.
KOSELLECK, Reinhart. O futuro passado dos tempos modernos. In: ______
Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução
Wilma Patrícia Maas; Carlos Almeida Pereira, revisão César Benjamin. Rio de
Janeiro: Contraponto – PUC-Rio, 2006.
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. São Paulo: RT, 2002.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo:
Malheiros, 2012.
QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder e classificação social. In:
SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (Orgs.).
Epistemologias do sul. Coimbra: Almedina, 2009. (Série Conhecimento e
Instituições).
RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa. Tradução Roberto Leal Ferreira, rev. Maria
da Penha Villela-Petit. Campinas, SP: Papirus, 1997, Tomo III.
SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo: para uma nova cultura
política. Porto: Afrontamento, 2006.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Sociología jurídica crítica: para un nuevo
sentido común en el derecho. Madrid: Trotta; ILSA: Bogotá, 2009.
SANTOS, Laymert Garcia dos. A informação após a virada cibernética. In: ______ et
al. Revolução tecnológica, internet e socialismo. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo, 2003.

65
SEGATO, Rita Laura Segato. Que cada povo teça os fios da sua história: o
pluralismo jurídico em diálogo didático com legisladores. In: Direito. UnB,
janeiro – junho de 2014, v. 01, n.01. p. 65 – 92.
SILVA, Eduardo Faria. Audiência pública e participação social na efetivação
do Estado Democrático. In: ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno; DOURADO,
Sheilla Borges. Consulta e participação: a crítica à metáfora da teia de aranha.
Manaus: UEA Edições; PPGSA/PPGAS – UFAM, 2013. p.81-96.
SILVA, Eduardo Faria. Economia solidária e o direito: da utopia à colonialidade.
Tese (Doutorado em Direito) -Programa de Pós-Graduação em Direito da
Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2011.
SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. Os povos indígenas e o direito
brasileiro. In: SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de e BERGOLD, Raul
Cezar. Os direitos dos povos indígenas no Brasil: desafios no século XXI. Curitiba:
Letra da Lei, 2013. Pp. 13-34.
VIRILIO, Paul. Guerra pura: a militarização do cotidiano. Tradução Elza Miné;
Laymert Garcia dos Santos. São Paulo: Brasiliense, 1984.
VIRILIO, Paul. Velocidade e Política. Tradução Celso Mauro Paciornik. São
Paulo: Estação Liberdade, 1997.
WOLKMER, Antônio Carlos. Pluralismo jurídico: fundamentos de uma nova
cultura no Direito. 3. ed. São Paulo: Alfa-Omega, 2001.

66
Estrategia de desarrollo en Cuba: el
financiamiento del desarrollo local en la
actualización del modelo cubano

Dr. Jaime García Ruiz1


MsC. Dagoberto Figueras Matos2
Lic. Lienny García Pedraza3

1. Introducción

El problema del desarrollo ha sido de gran interés tanto para


investigadores como para decisores y beneficiarios; siendo esencial la

1 Doctor en Ciencias Económicas por la Universidad de La Habana, Cuba


(1999). Profesor Titular del Departamento de Marxismo de la UCLV. Con experiencia en
el área de Economía Política, Estudios de Mercado, Desarrollo Local y cooperativismo.
E-mail: jaime@uclv.edu.cu
2 Licenciado en Historia, Máster en Desarrollo Comunitario. Profesor asistente

de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas, Cuba, del Departamento de


Sociología de la Facultad de Ciencias Sociales. Con experiencia en el área de Economía
Política, en estudios de Cooperativismo y Desarrollo Local. Participa en la ejecución de
proyectos de desarrollo local y territorial. E-mail: dagoberto@uclv.edu.cu
3 Licenciada en Sociología por la Universidad Central “Marta Abreu” de
Las Villas (2013). Profesora de Filosofía del Departamento de Marxismo de la UCLV.
Colaboradora del proyecto internacional: Promoción del desarrollo económico local y
territorial desde los gobiernos municipales e instituciones locales, en la actualización
del modelo económico cubano, financiado por Ayuda Popular Noruega (APN). Trabaja
el desarrollo desde la dimensión socioeconómica. E-Mail: liennygp@uclv.cu

67
planificación y estructuración del desarrollo sobre todo socioeconómico
y fundamentalmente en países subdesarrollados. De tal manera los países
subdesarrollados se han visto en la necesidad de elaborar una estrategia
de desarrollo y políticas sociales que guíen el camino permitiéndole salir
del estado existente y posibilitando que la población tenga satisfechas
en gran medida sus necesidades básicas.
La estrategia de desarrollo económico y social de Cuba después
de 1959 pasado estuvo inspirada en el Programa del Moncada,
indisolublemente ligada a la solución de los problemas identificados en
el mismo y las líneas a optar. La primacía se fijó en el desenvolvimiento
de la economía del país y su efecto social en las condiciones del proyecto
de construcción socialista propuesto y en correspondencia a reconocer
el entorno externo y las condiciones macro-económicas, en que se
desenvolvía la vida económica y social del país en dicho contexto histórico.
La política socioeconómica se convierte en la forma concreta
que adopta la estrategia. La misma constituye un conjunto de medidas
y acciones adoptadas por el Estado en las distintas dimensiones:
económicas, sociales, ambientales, científico-técnicas, culturales
y jurídicas. En la actualidad estas políticas constituyen parte de las
políticas públicas al ser el Estado el órgano que las crea y las regula.
Son consideradas también como “el conjunto más o menos coherente
de principios y acciones gestionadas por el Estado, que determinan la
distribución y el control social del bienestar de una población por vía
política” (Herrera, M. y Castón, P., 2003).
Las políticas sociales son un subconjunto de las políticas públicas.
En esencia, ellas van dirigidas a perfeccionar las condiciones de vida de la
población y en especial de los grupos más vulnerables de la sociedad. El
eje central de las mismas es la satisfacción de las necesidades materiales
y espirituales de los miembros de la sociedad, por lo que a lo largo de la
historia las políticas sociales ha estados dirigidas sobre todo a revertir
la pobreza (Valdes Paz, J. y Espina M., 2011: 13-14).

68
Las políticas sociales están determinadas por cómo se conciben
y qué fines persiguen, por el modelo socioeconómico en el que
se encuentran, por la parte del gasto público que se destina a ellas,
por la prioridad social que tienen, por los gestores y beneficiarios y
especialmente por sus mecanismos de ejecución. Aclarar además, que
el tipo de beneficiario y receptor no influye en la forma en que recibirán
los bienes, pero sí debe quedar clara la necesidad de un mecanismo que
permita su implementación en la práctica (Valdes Paz, J. y Espina M.,
2011: 13-14).
Un acercamiento a tal propuesta, impone identificar de forma
concisa las ideas que la precedieron y permita clarificar, ¿qué entender
por desarrollo económico y cual sería el deseado para el proyecto social
propuesto? Si consideramos los fines generales, se deseaba un desarrollo
económico nacional, mediante el crecimiento sostenido y persistente
del país y la elevación del consumo del conjunto de la población para
erradicar los niveles de pobreza acumulados en los sectores más
desprotegido de la sociedad cubana hasta ese momento histórico. Se
trababa pues de dinamizar los recursos materiales, los recursos humanos,
financieros y socio-culturales existentes y que estos se combinaran de
forma óptimas para el logro de un sistema de protección social que
irradiaría todos los segmentos de población distribuida en nuestro
espacio geográfico. Tal disposición constituía el hilo conductor en
la política económica y social definida desde el ideal de la máxima
dirección política en el poder.

2. Antecedentes en el pensamiento económico y social


de la Estrategias de desarrollo económico y social
en Cuba

El proyecto de Construcción Socialista propuesto a inicio de la


década del siglo pasado, imponía no pocos retos, económicos, sociales

69
y políticos. En el orden económico, se reconocía por pensadores
económicos (Colectivo de autores, 2008: pp. 119-197) desde la década del
50 del siglo, de una insuficiencia en la estructura económica existente en
el periodo y de la incapacidad de su pivote central, es decir, la industria
azucarera como generadora de la masa de recursos financieros para
alcanzar objetivos tales como garantizar el empleo de una población
creciente y elevar su nivel de vida. Ello estaría sustentado por políticas
inversionistas y comerciales de la época que limitaban el cumplimiento
de tales objetivos.
Era reconocida, la necesidad de fomentar la industrialización del
país pero sin dejar de mostrarse de acuerdo del significado de la agro
industria azucarera y que tal decisión imponía identificar las fuentes
de capital necesario para promover el desarrollo económico, así como
los problemas de la balanza de pagos a partir de considerar líneas
desarrollo que sustituyeran importaciones, que permitieran liberar
divisas orientadas al mercado de consumo interno del país. Por último,
no se dejaba de reconocer la necesidad de inversiones en la esfera de los
servicios –transporte, comunicaciones entre otros – que permitieran
aprovechar las denominadas inversiones de capital externo.
Estos perfiles de pensamiento económicos, referidos
anteriormente, eran reconocidos como problemas de la sociedad cubana
y que debían ser resueltos en las condiciones de las relaciones sociales
de producción establecida desde el nacimiento de la República. Otros
pensadores económicos4, desde posiciones más avanzadas consideraban
que la situación real de nuestra estructura económica y social requería
de la erradicación de la estructura de poder conformada que convertía

4 Ver en Colectivo de autores. Antología del Pensamiento Económico


Cubano, Tomo II, Regino Boti y Felipe Pazos, pp. 319-346, Fidel Castro, pp. 347-360,
Raúl Cepero Bonilla, Jacinto Torras, Carlos R. Rodríguez, pp. 361-441.

70
el país en un círculo vicioso de dependencia y subdesarrollo (Obra cit.
en Colectivo de autores, 2008).
En este sentido el hilo conductor de estos pensadores partía de
reconocer las contradicciones, que en plano interno y externo eran
determinantes en el desenvolvimientos de las relaciones de producción,
atadas a la contradicción capital-trabajo existentes al interior del país y
su dependencia a las relaciones económicas internacional conformadas
y especial con los Estados Unidos, que se levantaba como principal
barrera para solventar los problemas del desarrollo económico, social
y políticos del país.

3. Estrategia de desarrollo económico y social. Sus etapas

El triunfo de la Revolución cubana, creó la posibilidad real de


generar una Estrategia de desarrollo económica y social que se orientara
a erradicar dos problemas vitales existentes en la sociedad cubana,
de ese momento histórico: el problema del empleo y la sustitución
de importaciones. Tal pretensión exigía de cambios en la estructura
económica, social y de nuestras instituciones establecidas, orientados
al perfeccionamiento de la sociedad de forma integral.
Un examen a esta estrategia, indica que su concepción e
instrumentación tiene como punto de partida la valoración crítica del
pensamiento económico precedente. Los medios seguidos para alcanzar
los objetivos propuestos, pueden apreciarse en sus principales etapas5.

5 Ver. Bogomolov A. cit en Colectivo de autores. (1979).CUBA: experiencia del


desarrollo social, Moscú: Editorial Progreso; Rodríguez, J. (1990). Estrategia del desarrollo
económico en Cuba, La Habana: Editorial de Ciencias Sociales; Figueroa, V. (2009)
Economía Política de la Transición al Socialismo. Experiencia cubana, La Habana: Editorial de
Ciencias Sociales. Con dicha propuesta se puede establecer una periodización de la
estrategia cubana de desarrollo socioeconómico cubano.

71
Desde estas se identifican logros, errores y lecciones aprendidas en cada
una de ellas, y nos permite un aprendizaje para el planteamiento de la
necesidad de un desarrollo económico y social sustentable, basado en
una política económica equilibrada, y un acercamiento al movimiento
real a través de los recurso materiales, humanos, financieros, la gestión
del conocimientos y de administración que nos permitan solventar las
contradicciones existente en la sociedad cubana actual y nos posibilite
alcanzar su objetivo fundamental: lograr la independencia nacional, la justicia
social y la equidad.
Es aceptado que la primera etapas abarca de 1962 a 1964 y se
caracterizó por tener como medio fundamental la industrialización
acelerada a partir de la expansión de la industria pesada, la
diversificación de la agricultura y la redistribución del fondo agrícola
cañero y la sustitución creciente de las importaciones por la producción
nacional. Se elabora el primer plan cuatrienal y existía el mercado de
la pequeña y mediana empresas privadas y de las empresas del cálculo
económico, extremadamente centralizado. De tal manera las estrategias
se sustentaron en primer lugar en el “Sistema Presupuestado de
Financiamiento” en la industria y en segundo lugar, en el modelo del
“Cálculo Económico” en la agricultura (Figueroa, A., 2009: 258).
Esta vía de instrumentación de la estrategia, en las condiciones
de una economía monoproductora y mono exportadora confrontó
diversas barreras; como las fuentes de financiamiento, la falta de
recursos humanos preparados para el dominio de las nuevas tecnologías
y de gestión administrativa de las nacientes unidades industriales y
el incremento de las importaciones de productos intermedios para el
cierre del ciclo productivo. Este primer propósito fortaleció el sector
industrial, generándose la génesis de una concepción agroindustrial
del país en no pocas ramas; capacitó e instruyó a un ejército de
trabajadores industriales procedentes de sectores menos productivos y

72
desempleados totales o temporales y diversos cuadros en la gestión del
desarrollo industrial. Se puede reconocer que las acciones realizadas
fortaleció la base industrial del país creando condiciones para el
posterior desarrollo industrial.
El cambio de concepción hacia la apertura del denominado
“camino agrícola” constituía la búsqueda de bases autóctonas, a partir
de una estructura económica que sustentara el desarrollo económico y
social del país, teniendo en cuenta el entorno externo existente.
Tal giro en la búsqueda de fuentes de financiamiento estuvo
condicionado por el acuerdo azucarero entre Cuba y la URSS, en 1962,
que nos aseguraba un mercado de exportación estable del principal
producto de forma creciente y precios convenidos en correspondencia a
las necesidades de abastecimiento de petróleo del país, bienes intermedio
y de capital. Ello constituyó un contragolpe a la acción de la ruptura de
la relaciones económica impuesta por Estados Unidos de Norteamérica
y que procuraba desarticular el sistema de proporciones interno atado
a un mercado internacional conformado desde 1902, bajo la égida de los
tratados de reciprocidad de 1902 y 1934.
En el año 1963 se precisó por la máxima dirección del país que
el sector agrícola, en las condiciones de Cuba, debía constituir la
locomotora del desarrollo económico, teniendo como punto de arrancada
a la agroindustria azucarera, la ganadería y otras producciones como el
café, cítricos, arroz y otros cultivos varios. A partir de este momento el
desarrollo industrial se integraba a la agricultura, de aquí que algunos la
definieran también como una Estrategia agrario-industrial (Bogomólov,
A. cit en Colectivo de autores, 1979: 128).
Tal cambio marca una nueva etapa entre 1964 y 1970. Esta estuvo
caracterizada por un modelo Agroindustrial exportador, basado en un
proceso inversionista que privilegiaba el sector agrícola con énfasis en
la agroindustria azucarera, infraestructuras hidráulicas, viales, energía

73
eléctrica, industria química y de la mecánica y los materiales de la
construcción. Las inversiones de la agricultura en la etapa duplicaron
el de la industria. Las inversiones en la industria se caracterizaron por
ampliar la industria alimentaria sobre todo la azucarera y en la química
estuvo orientada en lo fundamental a la producción de fertilizantes y la
mecánica a la producción de implementos agrícolas u otros medios para
la industria azucares.
El sistema de dirección se caracterizó por acciones donde el plan
tuvo un carácter extremadamente centralizado. Desde 1967 funciona
una dualidad de mecanismos económicos – el Sistema Presupuestario
y el Cálculo Económico –, se abandona los fundamentos básicos del
sistema contable por el denominado sistema de Registro económico,
basado fundamentalmente en el control físicos, se deja considerar como
principio básico de la distribución el aporte por la cantidad y calidad
del trabajo y se desarrollaron otras acciones que tenían como punto
de partida la concepción de la construcción paralela del socialismo y
el comunismo, la cual fue enjuiciada desde lo político en el conocido
análisis sobre los errores cometidos por Castro Fidel Ruz en el Informe
al Primer Congreso del Partido Comunista de Cuba.6
La tercera etapa se constriñe al periodo de 1970 a 1975, donde
el entorno interno, en lo político, económico y socio-cultural fue
sometido a una valoración crítica del funcionamiento de la sociedad
cubana, con una amplia participación social, en cuestiones relativas
al funcionamiento de la sociedad en las diferentes esferas. En cuanto
al desarrollo económico, se destacó el resultado de la zafra azucarera
del país de 1970, la cual alcanzaba 8 millones de toneladas superando
la de 1952, pero incumpliéndose el compromiso de los “diez millones

6 Ver Castro Ruz, F. (1976). Informe Central al I Congreso del PCC, La Habana,
DOR del CC del PCC.

74
de toneladas de azúcar”. Ello estuvo acompañado de un decrecimiento
en el resto de los sectores de la economía nacional, generándose
desproporciones económicas que afectaron los objetivos estratégicos del
proyecto económico-social. En el entorno externo se incrementaban las
acciones del bloqueo económico, comercial y financiero de los Estados
Unidos de Norteamérica hacia Cuba y el país fortalece sus relaciones
con el entonces Campo Socialista con su ingreso al Consejo de Ayuda
Mutua Económica (CAME) en 1972.
En lo político se define la necesidad de crear las bases materiales,
económicas, sociales, de gestión de la economía social por nuevos
mecanismos de dirección y la expansión de nuevas ideas en el proceso
de construcción del socialismo, que tiene como punto culminante los
acuerdos del Primer Congreso del Partido Comunista de Cuba. En tales
condiciones emergen los fundamentos de la política económica y social
de una nueva etapa.
La tercera etapa se desarrolla de 1975 a 1985. La estrategia estuvo
sustentada en un modelo de desarrollo industrial con base en una
industrialización. Dicha industrialización estaba orientada a la formación
de complejos industriales, y mantenía como pivote del desarrollo el
Complejo Agroindustrial Azucarero (CAIA), fuente principal generadora
de excedentes económicos, apoyada en la expansión y procesamiento del
Níquel y del Cítrico, insertado en la División Internacional del Trabajo,
al interior del sistema de los países socialista. Con esto, se debía generar
el desbordamiento de recursos financieros que respaldara el proceso
inversionista en el resto de los Complejos Productivos en expansión, las
infraestructuras productivas y de los servicios, y como colofón lograr el
crecimiento económico y el desarrollo social de la nación.
Desde la gestión económica, el modelo se sustentaba en la
planificación de la economía y el reconocimiento de la existencia
objetiva del mercado. Se comienzan a elaborar los planes quinquenales.

75
El mercado internacional se realizaba en alrededor de un 85% con los
países miembros del CAME, basados en el Rublo transferible y con la
URSS funcionaba un intercambio sobre la base de los denominados
precios resbalante para los precios del petróleo y el azúcar. En el plano
de la economía interna, el mercado es altamente regulado y centralizado
y en 1984 aparecen aperturas en el comercio minorista, creándose el
Mercado Libre Campesino7 (MLC) de productos agropecuarios y el
Mercado Paralelo, y se autorizan determinados servicios – plomería,
carpintería entre otros – mediante el trabajo personal bajo el concepto
del otorgamiento de patentes a los productores privado individuales.
El modelo de gestión de este período estuvo basado en la
implementación del Sistema de Dirección y Planificación de la Economía
(SDPE) el cual reconocía cierto espacio a las relaciones mercantiles
y al mercado. Se despliega la planificación centralizada basada en los
balances materiales y un sistema único de distribución de los factores
de la producción y de sus resultados.
La instrumentación de las medidas económicas de esta etapa
comenzó a manifestar una disminución de la eficiencia económica del
país, por el agotamiento del modelo económico e influencias del entorno
externo. Los bienes de capital y los productos intermedios no siempre
respondían a patrones internacionales, se incrementaron los gastos de
importación por peso producido y se elevó la importación de alimentos
desde el exterior. En el plano interno se inician inversiones no concluidas
en tiempo, existiendo demoras en su puesta en marcha, que afectaban
obras industriales, de infraestructuras y obras sociales. Ello comenzó a
provocar una recesión económica que tuvo su primera manifestación en
la necesidad de renegociar la deuda externa en el año 1982 con los países

7 El Mercado Libre Campesino es comienza a funcionar en octubre de 1984 y


es suspendido oficialmente en 1986.

76
de economía de mercado. Este conjunto de hechos económico planteó
la necesidad de iniciar en el país un proceso de Rectificación de Errores
y Tendencias Negativas a partir del año 1986, donde se orienta una
revisión del Sistema de Dirección y Planificación que se utilizaba como
instrumento de gestión de la economía. Esto dio lugar a una nueva etapa.
El cuarto período recorre de 1986 a 1989. Se orientan acciones
para lograr mejores resultado en los proceso inversionista del país,
incrementar la productividad del trabajo, mediante una mejor utilización
de los recursos humanos. Se somete a revisión crítica la implementación
hecha del (SDPE) y 1986, la copia de modelos de dirección de países
socialistas, el cumplimiento del plan a partir de su relación en valor
y especie. Se restringe el espacio del mercado interno al poner fin al
funcionamiento oficial el Mercado Libre Campesino. En la etapa inicial
de búsqueda de una nueva práctica en la gestión para el establecimiento
de los cambios en el SDPE, se comienza a producir el derrumbe del campo
socialista, provocándose una segunda ruptura de nuestras relaciones
económica externas. Esto induce una modificación del entorno externo
para Cuba, lo que provoca desproporciones en la macroeconomía y una
caída violenta del PIB8
De 1990 a 2010, el entorno resulta en extremo complejo para
el país, al tener que reorientar sus relaciones económicas externa a
las economías de mercado, bajo un proceso de recrudecimiento del
bloqueo económico, comercial y financiero desde los Estado Unidos.
Se inicia un proceso de integración en América Latina y el Caribe con
la constitución del ALBA9. Es necesario preparar el entorno interno,

8 Se considera que entre 1990 y 1993, el PIB cubano decreció en un 34,7 %.

9 La Alternativa Bolivariana para los pueblos de Américas (ALBA) fue


propuesta por el Presidente Hugo Chávez Frías en ocasión de la III Cumbre de Jefes
de Estado y de Gobierno de la Asociación de Estados del Caribe, celebrada en la isla de
Margarita en diciembre del 2001.

77
en condiciones donde la macroeconomía había sido desarticulada de
la economía mundial y había ocurrido una ruptura del intercambio
comercial. Ello da lugar al inicio de una quinta etapa.
Modelada por la necesidad de realizar inversiones en esferas que
permitieran una rápida recuperación de las mismas y lograr mejores
tasas de beneficio, a partir de potencialidades existentes en el país
no suficientemente explotadas, comienza a desarrollarse el Programa
Nacional del Turismo, la creación de Polos Científicos, la prestación
de servicios científico técnico en el exterior. Con ello se gestan las
bases para el paso de un comercio de exportaciones tradicionales a
exportaciones no tradicionales, transitando paulatinamente de una
economía productiva basada en los sectores primarios y secundarios
a otra sustentada en el sector terciario como fuente fundamental de
captación de ingresos externos. Se comienza un proceso de cambios
estructurales y funcionales en la economía. Se modifica la estructura
de la propiedad en el sector agrícola, con la creación de las Unidades
Básicas Producción Cooperativa (UBPC), la entrega de tierras ociosas
en usufructo para producciones específicas como el tabaco, el café,
las producciones de autoconsumo, entre otras. Se amplían la ley de
inversiones extranjera para facilitar la creación de empresas con capital
extranjero bajo diferentes modalidades.
Aparecen nuevos espacios para el mercado interno de libre
formación de precios con la aparición Mercado Libre Agropecuario, el
Mercado de Artículos Industriales y Artesanales, el Mercado de Divisas
y el Mercado de Precios Topados o Mercado Agropecuario Estatal. El
modelo de gestión se caracterizó por la planificación centralizada basada
más en balances financieros que en los balances materiales. Se comienza
a delimitar las funciones estatales de las empresariales, acompañado de
un proceso de Perfeccionamiento Empresarial.

78
La sexta etapa abarca del 2010 hasta la actualidad, cuya
estrategia está caracterizada por la actualización del modelo cubano:
modelo agroindustrial exportador y de sustitución de importaciones y
fortalecimiento del sector servicios, sobre todo los relacionados con la
producción de conocimientos. Se retoma la planificación quinquenal y
estratégica y se le da mayor espacio a los mercados de libre formación
de precios bajo regulación planificada. Como modelo de gestión se tiene
en cuenta el balance plan-mercado.
A partir de lo analizado anteriormente se entenderá por desarrollo
al como

“proceso universal de cambio y transformación que acusa su carácter conforme al


tipo de relaciones sociales de producción prevalecientes, los valores, la ideología e
intereses clasistas de la sociedad de que se trate y que se materializa en un espacio-
tiempo concretos” (García, J., 2007: 4).

A pesar de todas las vías, formas y mecanismos que ha adoptado


Cuba y las etapas por las que ha transitado para impulsar su desarrollo,
siempre ha tenido un eje esencial; el logro de la independencia nacional,
la justicia social y la equidad. Por tanto el principal objetivo ha sido
mejorar el bienestar de las personas, basado fundamentalmente en el
principio de participación popular.
Con estos objetivos como guía, el proceso revolucionario tuvo que
atravesar etapas duras para sacar el país adelante. Las crisis de los años
90 o como también se le conoce, Período Especial en Tiempo de Paz, es
un ejemplo de ese gran esfuerzo. De esta manera se toman como ejemplo
las iniciativas latinoamericanas de desarrollo local, donde se utilizaban
los recursos de la localidad y se ponían al servicio de la misma. Así, Cuba
encuentra una manera de potenciar los territorios en su integración con
el resto de la economía nacional.

79
4. Financiamiento al desarrollo en el ámbito local

El recorrido por las etapas de las estrategias de desarrollo


estudiadas nos indica la existencia de contradicciones que resultan
impedimentos o elementos propulsores del desarrollo económico y social
del país. También pueden aparecer acciones desde la política económica
que consiguen impulsar o trabar el desarrollo de las fuerzas productivas
de la sociedad.
Hasta aquí hemos destacado, desde los mecanismos económicos
establecidos, la contradicción centralización versus descentralización.
En la etapa referida entre 1990-2010 comienza a aparecer diferentes
acciones descentralizadora, por ello nos detendremos en particular en
el financiamiento al desarrollo en el ámbito local, como componente
dinamizador y de superación de las contradicciones en la dinámica de
los procesos reales del desarrollo de las localidades y los territorios de la
economía cubana, qué cambios inducidos – o no – han tenido lugar y, por
tanto, la aparición y solución de las ataduras al impulso del desarrollo
de las fuerzas productivas.
En etapa referida de la estrategia de desarrollo económico
y social; hilo conductor de la transición en el socialismo cubano,
como expresión de la unidad de política y economía, además de las
contradicciones que emanan del entorno macroeconómico – como
las que se dan entre la acumulación y el consumo, entre el consumo
realizado a través de los ingresos provenientes del trabajo y los fondos
sociales de consumo, entre el desarrollo económico y el desarrollo
social, entre la regulación planificada y el mercado, etcétera –, pueden
aparecer otras de carácter territorial y local o generadas por los cambios
introducidos desde la política económica en el establecimiento de un
nuevo modelo socioeconómico.
A partir de estudios realizados por diversos investigadores
cubanos del tema y en particular por un grupo de profesores de la

80
Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas10, nos podemos referir
a las siguientes contradicciones: a) los grados de descentralización
económico-financiera que se pretende introducir a nivel local y la
centralización gubernamental territorial y sectorial; b) la producción-
apropiación de excedentes económicos por los productores directos y
los órganos de gobiernos locales y territoriales; c) la liberación del acceso
a los bienes de consumo (eliminación del racionamiento) y el tránsito
paulatino al subsidio a los segmentos de la población de más bajos
ingresos; ch) la restructuración del empleo (proceso de disponibilidad
laboral bajo el principio de idoneidad demostrada) y las ofertas de
nuevas alternativas de empleo; d) los distintos tipos de economía a nivel
local, portadores de intereses económicos diferentes.
El sentido, emana de reconocer lo territorial y local como un
complejo sistema – totalidad – de relaciones sociales de producción,
heterogéneas en sus vínculos e interdependencias. De aquí la
configuración-diferenciación más nítida de las clases y grupos sociales
en los territorios con intereses económicos diferentes y contradictorios,

10 Desde los años 2000, un colectivo de profesores de la UCLV han


investigado y publicado un grupo de trabajo en Revistas y libros referidos al tema
del desarrollo y al desarrollo local y territorial, las tendencias y contradicciones
de dicho proceso. Entre los libros los más significativos son: 1. García, J. (2007).
Desarrollo Sustentable e Integración para América Latina y el Caribe. A Cidade
Sustentável e o Desenvolvimento Humano na América Latina. Temas e Pesquisas. Universidad
Federal de Río Grande (FURG): Río Grande, 2. Colectivo de autores UCLV. (2013).
Desarrollo Territorial y Local: Procesos de Integración. Sancti Spíritus: Editorial
Luminaria, 3. Colectivo de autores UCLV. (2013). Innovación Social y Desarrollo
Local. Documentación y Sistematización de Experiencias. Sancti Spíritus: Editorial
Luminaria, 4. García, J. (2013). Reforma de los noventa y actualización del socialismo
en Cuba: continuidad y ruptura. Revista Economía y Desarrollo. No. 1 enero-junio, pp.
35-53. Editorial Universidad de La Habana, 5. Colectivo de autores UCLV (2014).
Desarrollo y Cooperativismo. Desafíos al modelo Económico Cubano. La Habana: Editorial
Caminos, 6.Colectivo de autores UCLV. (2015). Sector privado individual cuentapropista. Enfoque
y perspectiva en Villa Clara. La Habana: Editorial Caminos.

81
que exigen encontrar soluciones desde la política que reconozcan, sobre
bases reales, la integración local, regional, nacional e internacional e
impliquen actores individuales y sociales desde local
Desde finales de la etapa antes mencionada comienzan a
desarrollarse acciones para movilizar fuentes de financiamiento desde
los gobiernos municipales para generar proyectos de inversión, que en la
etapa del 2010 hasta la actualidad tienen como base de instrumentación las
Estrategias de Desarrollo Municipal (Colectivo de autores, 2013: p. 107).
Tales decisiones contiene elementos germinales de reconocer la división
social del trabajo en la localidad, construida y reconstruida desde la geo-
historia de cada uno de nuestros municipios y, por tanto, la existencia de
diferentes tejidos productivos locales con diferentes niveles de desarrollo
que imponen objetivamente el establecimiento de procesos de cooperación
horizontal e intersectorial a escala local. Tal proyección procura potenciar
la complementación local entre los distintos sectores y ramas económicas
del territorio y los Programas Nacionales que se asientan en cada uno
de ellos – Programa Alimentario, Programa del Turismo, Programa de
Protección del Medio Ambiente, etc.
Las acciones concretas en la instrumentación del nuevo modelo
económico en la etapa que se inicia en 2010, expresan que la estrategia a
seguir, el principio fundamental del desarrollo local y las políticas están
en la potenciación, a este nivel, de las formas productivas cooperativa
y privada individual, así como la forma familiar pequeña y mediana.
Las cooperativas deben concebirse en los ámbitos de la producción,
del trabajo asociado y de créditos y servicios en la producción
agropecuaria, la pequeña industria, la industria local y los servicios,
que restablezcan los lazos de cooperación e integración locales por
acciones centralizadoras que se comenzaron a establecer al interior
de los Sistemas de Dirección y Planificación de la Economía en Cuba
(Vilariño Ruiz, A. y Domenech Nieves, S., 1986)

82
La propia experiencia actual incluye en el mecanismo de gestión
para el desarrollo local, la separación de las funciones administrativas
de las de gobierno, una mayor delegación de funciones a los gobiernos
locales en los marcos de la dialéctica centralización-descentralización
y la reproducción del sistema empresarial enclavado en el territorio,
lo que debe garantizar la reproducción del territorio sin autarquía,
así como la utilización de instrumentos monetario-financieros para
el desarrollo local.
En cuanto a esto último se concibe la introducción de instrumentos
tales como el financiamiento central, los impuestos tributarios de los
cuentapropistas del territorio, el tributo territorial a los consejos de
la administración municipales por las empresas y cooperativas donde
operan sus establecimientos – definido centralmente teniendo en cuenta
las características de cada municipio11 – y, por último, parte de los
ingresos generados por proyectos locales gestionados por entidades
económicas enclavadas en el municipio.
Se conciben las estrategias y la planificación local para el desarrollo
integral de forma consciente, a partir de los recursos disponibles a
esta escala y en todas sus dimensiones y principios básicos, lo que
debe contrarrestar u oponerse a la espontaneidad que introducirán,
objetivamente con más fuerza, los instrumentos monetarios mercantiles
y de mercado. La contradicción entre la regulación consciente y el
mercado regulado con su grado de espontaneidad también tiene que
resolverse a este nivel.
En las concepciones estratégicas que se comienzan a introducir
se define desde los municipios los pivotes de su desarrollo y sus fuentes
de acumulación originarias externas, centralizadas, no centralizadas e

11 En este año 2015 se ha establecido en la provincia de Villa Clara el pago del


1 % del ingreso bruto sin distinción de municipios.

83
internas, que indican un proceso iniciado con las propias limitaciones
de carácter objetivo y subjetivo en que enmarca el proceso de
instrumentación del nuevo modelo económico.
Lo referido anteriormente, nos indica que este proceso no se limita
a cambios en el mecanismo de gestión del desarrollo, sino que pasa por
los cambios necesarios en las formas de pensar y actuar de los distintos
actores a los diferentes niveles, lo que es objeto de estudio, desde nuestro
grupo de trabajo. Esto es, la identificación de las barreras y las vías de su
superación para lograr el objetivo supremo de la Estrategia de nuestro
desarrollo económico y social, sustentado por políticas económicas
definidas y redefinidas en sus diferentes etapas.

5. Conclusiones

La estrategia de desarrollo plasma la concepción del desarrollo


del económico y social identificándose los diferentes objetivos alcanzar
desde una perspectiva multidimensional, dígase económica, socio-
cultural, medioambiental, tecnológica, política y jurídicas entre otras,
que emanan de la máxima dirección del país a partir de reconocer el
entorno interno y externos en que se desenvuelve la economía nacional.
La estrategia construida ha demostrado que se debe tener como
partida de su conformación los canales de participación, desde abajo,
con una adecuada interrelación centralización versus descentralización,
por lo que son muy importante las capacidades locales. Ello permite
combinar de forma efectiva los Programas nacionales de desarrollo con
los Programas de cada territorio y sus localidades.
Nuestra experiencia muestra a través de las diferentes etapas que la
estrategia contiene la determinación de los programas de acción y las vías
de solución de los problemas del desarrollo entre los que se encuentran:

84
a) la transformación de la base socioeconómica y de la estructura de
la producción, b) la creación de la Base Técnico-Material, es decir el
desarrollo de las fuerzas productivas, c) la acumulación, sus fuentes tanto
de orden interno como externo, y vías, así como el consumo.
El mecanismo económico establecido resulta el campo más
complejo y delicado del proyecto de desarrollo socialista, pues refleja
la conciliación efectiva entre las fuerzas productivas y las relaciones
sociales de producción y la acción de las leyes económicas.
Al aglutinar la estrategia el desenvolvimiento de la sociedad en
su conjunto trasciende los ámbitos puramente económicos y toca los
aspectos políticos y sociales.
La estrategia cubana de desarrollo socioeconómico tuvo y tiene
hoy un objetivo fundamental: lograr la independencia nacional, la justicia
social y la equidad, donde los seres humanos son los protagonistas y
beneficiarios directos del desarrollo.

Bibliografía

Bogomolov A. cit en Colectivo de autores. (1979). CUBA: experiencia del


desarrollo social, Moscú: Editorial Progreso.
Colectivo de autores. (2008). Antología del Pensamiento Económico Cubano, Tomo
II, La Habana: Editorial Félix Varela.
Colectivo de autores. (2013). Desarrollo Territorial y Local: Procesos de Integración.
Sancti Spíritus: Editorial Luminaria.
Colectivo de autores. (2013). Innovación Social y Desarrollo Local; Documentación y
Sistematización de Experiencias. Sancti Spíritus: Editorial Luminaria.
Colectivo de autores. (2013). Manual para la constitución de cooperativas de la
producción y servicios de la vivienda. Sancti Spíritus: Editorial Luminaria.
Colectivo de autores. (2014). Desarrollo y Cooperativismo. Desafíos al modelo
Económico Cubano. La Habana: Editorial Caminos.

85
Colectivo de autores. (2014). Guía para la constitución de cooperativas no
agropecuarias. La Habana: Editorial Caminos.
Colectivo de autores. (2015). Sector privado individual cuentapropista. Enfoque y
perspectiva en Villa Clara. La Habana: Editorial Caminos.
Figueroa V. (2009). La economía política de la construcción del socialismo, La
Habana: Editorial de Ciencias Sociales.
García, J. (2007). Desarrollo Sustentable e Integración para América Latina y el
Caribe. A Cidade Sustentável e o Desenvolvimento Humano na América
Latina. Temas e Pesquisas. Universidad Federal de Río Grande (FURG): Río
Grande.
García, J. (2013). Reforma de los noventa y actualización del socialismo en
Cuba: continuidad y ruptura. Revista Economía y Desarrollo. No. 1 enero-
junio. Pp. 35-53. Editorial Universidad de La Habana.
Herrera, M. y Castón, P. (2003). “Las políticas sociales en las sociedades
complejas”. Barcelona: Ariel Sociología.
Rodríguez, J. (1990). Estrategia del desarrollo económico en Cuba, La Habana:
Editorial de Ciencias Sociales.
Valdes Paz, J. y Espina M. (2011). “América Latina y el Caribe: la política
social en el nuevo contexto. Enfoques y experiencias”, Oficina Regional
de Ciencia para América Latina y el Caribe, Organización de las Naciones
Unidas para la Educación, la Ciencia y la Cultura, FLACSO.
Vilariño Ruiz, A. y Domenech Nieves, S. (1986). “El sistema de dirección y
planificación de la economía en Cuba. Historia, actualidad y perspectiva”, La Habana:
Editorial Pueblo y Educación.

86
Las relaciones de mercado ante los cambios
socioeconómicos en Cuba: nuevas propuestas en
los procesos de la vivienda

Lic. Lisandra Martinto Curbelo1


Dr. Jaime García Ruiz2

1. Las relaciones de mercado en los procesos de la vivienda

Entre las formas de producción en la transición socialista existen


aquellas que admiten un grado mayor de regulación social directa y otras
que, por su naturaleza socioeconómica, buscan un espacio para realizarse
como formas comerciales libres. Aparece entonces, la necesidad objetiva
de la existencia de formas de compra-venta regulada y libre. El mercado
de productos o servicios, bajo una u otra forma, es el mecanismo que

1 Licenciada en Sociología de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las


Villas, Cuba (2009). Profesora Asistente del Departamento de Sociología de la Facultad
de Ciencias Sociales, UCLV. Con experiencia en el área de Economía Política, Estudios
de Mercado y Desarrollo Local. E-mail: lmartino@uclv.edu.cu
2 Doctor en Ciencias Económicas por la Universidad de La Habana, Cuba
(1999). Profesor Titular del Departamento de Marxismo de la UCLV. Con experiencia en
el área de Economía Política, Estudios de Mercado, Desarrollo Local y cooperativismo.
E-mail: jaime@uclv.edu.cu jaime@uclv.edu.cu

87
vincula los distintos tipos y formas de economía existente en espacio y
tiempo concretos.
El comercio de productos y servicios en Cuba, desde 1968, cuando
se nacionalizó el mercado privado, hasta octubre de 1994 – excepto la
etapa de 1980-1986 en que funcionó el Mercado Libre Campesino para
los productos agropecuarios – se basó oficialmente en el comercio
mayorista y minorista estatal. De la experiencia histórica acumulada
y la Reforma Económica en los años 90ta, surgirieron cambios en el
mecanismo económico con el reconocimiento y la apertura de nuevos
mercados, que los hiciera corresponder a las necesidades objetivas con
la estructura socioeconómica emergente de la reforma de la tenencia de
la tierra desde 1993.3
En la década de los años 90ta. se abre un proceso creciente de
apertura de mercados en las relaciones económicas cubanas con el
Mercado Libre Agropecuario, el de Artículos Industriales y Artesanales,
el Mercado Monetario de las Divisas, el Mercado de productos
y servicios en divisas y el Mercado de Precios Topados o Mercado
de Precios Máximos. Con la actualización del modelo de desarrollo
socioeconómico que postula el VI Congreso del Partido Comunista de
Cuba (PCC) en abril de 2011, los mercados bajo regulación planificada
son parte consustancial del mecanismo de gestión. Se instauran nuevos

3 La crisis de los noventa tiene también su génesis interna en el agotamiento


del modelo económico implantado desde los años setenta que reprodujo la experiencia
de Europa del Este y de la URSS. Modelo económico basado en dos paradigmas: la
identificación de la propiedad estatal con la propiedad socialista, y el mercado con el
capitalismo. Su aplicación en Cuba se tradujo en una globalización de la estatización,
que por su amplitud y profundidad, dio lugar a la socialización formal de una gran
parte de las fuerzas productivas nacionalizadas y a una ruptura de la lógica estructural
y evolutiva de la economía de transición al socialismo. Figueroa Albelo, V.: UBPC:
Desarrollo Rural y Participación, parte I, p. 3, Editorial Universidad de La Habana,
Facultad de Filosofía e Historia, Departamento de Sociología, abril/1996.

88
mercados en los sectores no agropecuarios de la economía y en una parte
de ellos los precios se establecen libremente mientras que el acceso de
los consumidores a los bienes y servicios no está limitado. Aparecen por
primera vez los mercados de abasto y de medios de producción.
La problemática del mercado en Cuba no ocupó un lugar
destacado en las investigaciones y publicaciones científicas anteriores
a los años noventa. La ciencia no podía tratar fenómenos que no
formaban parte de la realidad económica concreta del país. En esos
años era negada la existencia objetiva de la ley del valor4 o ley de los
precios, apenas era reconocida formalmente en la teoría y la práctica
de la transición al socialismo.
Tal situación limitó el desarrollo de los mecanismos del mercado
y, por tanto, las posibilidades potenciales de elevar la eficiencia del
sector constructivo y de sus agentes económicos concretos. El modelo
de planificación centralizada, basado en los balances materiales y en la
regulación administrativa, la asignación centralizada de materias primas,
materiales y la prestación de servicios de la construcción de vivienda,
pretendió excluir la acción del mercado.
La exclusión del papel del mercado, de las palancas mercantiles y
monetarias y de los mecanismos de dirección y gestión correspondientes,
condujo a la más completa monopolización estatal del comercio
mayorista y minorista de los materiales y servicios de la construcción.
Las reglas establecidas subestimaron el papel estimulador del mercado
sobre la producción. Ello se tradujo en la aparición y crecimiento de
un sector de economía informal, de producción y comercialización de
materiales y servicios de la construcción de viviendas que alcanza su
nivel máximo hacia el año 2010, aún existente.

4 La proporción de valor está determinada por las cantidades de trabajo-


tiempo humano que se requiere para producir las mercancías. Su negación constituye
un sin sentido, en cualquier formación económico-social que ocurra.

89
Los Lineamientos de la Política Económica y Social aprobados por
el VI Congreso del PCC, reconocen los errores históricos cometidos y
se llevan a cabo nuevas acciones en cuanto a los procesos de la vivienda,
entre las que se destacan las siguientes:
• Se desencadena un proceso de cambios en los métodos y
mecanismos de funcionamiento de la base productiva en el
sector de la producción de materiales, en la construcción y
rehabilitación de la vivienda que hacen posible el diseño y
puesta en marcha de formas productivas inéditas y renovadas,
lo que abre una etapa cualitativamente nueva en este sector.
• Se produce un retorno a la descentralización, de forma muy
similar a como se hizo en los años más difíciles de la crisis
de los 90ta., práctica que en aquellos dramáticos momentos
permitió crecer en la construcción de viviendas en condiciones
económicas extremas.
• Se prevé la formación de nuevas figuras productivas, el
establecimiento de mecanismos económicos, monetario-
financieros y la transferencia de nuevas y más facultades
a los gobiernos locales que faciliten, estimulen e integren
los procesos de la vivienda a los programas de Iniciativas
Municipales para el Desarrollo.
• Se crean incentivos para ampliar el sector económico no
estatal como receptor del personal excedente del aparato
estatal, entre ellos la ampliación del Trabajo por Cuenta
Propia (TCP) y la flexibilización de sus regulaciones para
permitir que el sector pueda crecer. En el caso de la vivienda,
la meta trazada es lograr en el 2015 que el 70% del sector
productivo sea no estatal.
• Se deslindan las funciones estatales de las empresariales,
lo que propiciará la reproducción del sistema empresarial

90
enclavado en un mismo territorio. Se cambia el concepto de
subsidio: en lugar de subsidiar a la empresa, se subsidiarán
a las personas o familia cuyos bajos ingresos no le permiten
acceder a los servicios de la vivienda. Además se incentiva la
producción local de materiales como una vía de disminuir los
costos energéticos y de transportación, y ofertar un producto
de más bajo precio a la población.

El perfeccionamiento de la Ley General de la Vivienda flexibilizó


los actos de transmisión de la propiedad de la vivienda. Ante ello las
familias cubanas acceden a créditos bancarios para la construcción o
rehabilitación de su vivienda, lo cual ha generado nuevas condiciones
e incentivos para que la población mejore su actual vivienda, y la
dinamización del sector en general.
El modelo productivo de la vivienda que ha funcionado en
Cuba desde 1959 ha sido predominantemente estatal. La producción y
suministro de materiales de construcción se ha realizado a través de la
Industria de Materiales del Ministerio de la Construcción (MICONS),
basada en grandes unidades productivas industriales, alejadas de los
centros de entrega, lo que repercute en altos costos de producción.
(Donéstevez, et. al., 2010)
Los servicios constructivos eran ofertados a la población por
una entidad presupuestada conocida como “Micro Brigadas Sociales
y Servicios a la Vivienda”. La población que podía acceder a una nueva
vivienda, o a servicios de rehabilitación, debía estar incluida en un
plan estatal, que daba prioridad a familias afectadas por fenómenos
meteorológicos, y otros planes estatales priorizados. Los tiempos de
espera para recibir los servicios de la entidad solían ser de años, y la
calidad del servicio no siempre satisfactoria. Prácticas ilegales como el
desvío de recursos, la venta ilegal de materiales de construcción dirigidos
al mercado negro se hicieron comunes.

91
En el último decenio se estimuló la llamada “construcción por
esfuerzo propio”, como una vía de vincular a la familia a la construcción
de su propia vivienda. El número de las mismas construidas según este
modelo, superó con creces las construidas por el Estado, pero aun así, la
limitada disponibilidad de materiales, y otros aspectos organizativos y
funcionales resultó un freno a este programa. De esta forma se comenzó
a acumular un déficit de viviendas en el país, que llegó a estar en el orden
de las 700 000 (Donéstevez, et al, 2010). A este contexto se le adicionan
los daños proporcionados por la inclemencia climática.
A partir de enero de 2011 se crea un mercado minorista de libre
acceso de materiales de construcción, operado por el Ministerio de
Comercio Interior (MINCIN) como principal sistema de acceso de la
población a los materiales de construcción, con precios no subsidiados.
Este mercado lleva intrínseco una fórmula de redistribución socialista de
los fondos monetarios captados por las ventas, pues los excedentes que
se producirán de la recaudación por ventas de materiales son la fuente
de un fondo estatal de subsidio que favorece a las personas o familias de
más bajos ingresos, en cuanto al acceso en igualdad de condiciones a los
materiales y servicios de la vivienda ofertados.
La solución del problema de la eficiencia económica del país y el
impulso al crecimiento de las fuerzas productivas, no puede reducirse
a la planificación centralizada basada en los balances materiales;
tampoco a la planificación financiera, sino que tiene que tomar en
cuenta la heterogeneidad socioeconómica existente y los insuficientes
niveles de desarrollo y socialización de las fuerzas productivas que
imponen la implementación de formas de mercados intervinculados y
regulados estatalmente.
Los límites impuestos por la ampliación de las formas no estatales
al crecer el aislamiento de los productores exigen de perfeccionar los
mecanismos de planificación y de utilización de aquellas señales que

92
el mercado puede proporcionar en los marcos de una determinada
estrategia de desarrollo. Se trata de emplear las utilidades generadas en
los marcos de la acción de la ley del valor y del mercado en función de
los sectores vulnerables de la población.

2. Nuevas propuestas ante las Nuevas Figuras Productivas

La aparente contradicción entre la voluntad política del Estado


cubano, establecida en los Lineamientos, y la situación real actual
existente en la mayoría de los municipios para implementarlos, se
puede resolver con la adopción de formas socialistas de propiedad
colectiva, como las cooperativas de primer grado, que son propuestas
para diferentes sectores.
En el caso del sector objeto de estudio trabajaría los procesos de
la producción y servicios del sistema local de la vivienda; entiéndase,
la producción, comercialización, transporte de materiales de la
construcción, mantenimiento, conservación y preservación del fondo
habitacional y del estado constructivo; que pueden organizarse y existir
bajo diversas modalidades condicionadas a las peculiaridades de cada
territorio o localidad.
Estas cooperativas pueden operar de forma flexible en el
espacio económico municipal, pues tienen la posibilidad de mantener
relaciones contractuales con otras cooperativas, empresas, unidades
presupuestadas y otras formas no estatales (lineamiento 27), lo que les
permite superar una buena parte de los obstáculos que han enfrentado
las unidades productivas estatales y los Trabajadores por Cuenta Propia
(TCPs) en la actividad de producción de materiales y oferta de servicios
en el campo de la vivienda.
El mercado por un lado presenta un carácter institucional. Este
ángulo se refiere a que su apertura, los sujetos que en él participan y cómo

93
lo hacen, el tratamiento de los diferentes segmentos del mercado, los
canales y sus reglas de funcionamiento son preestablecidas oficialmente
por el Estado.
Por otro lado, socioeconómicamente es heterogéneo y por tanto
contradictorio. En él deben participar todos los sujetos económicos
productores -figuras productivas- objetivamente existentes en cada
territorio, localidad y en el país en su conjunto visto como totalidad sin
exclusión: a) los productores estatales, b) cooperativas agropecuarias
(CPA, UBPC, CCS); c) cooperativas de la construcción y; c) productores
privados individuales o familiares formalizados o no. Tal estructura
socioeconómica se refleja en las tendencias del mercado, tanto del lado
de la oferta, como en el de la demanda; y, por consiguiente en el nivel
de los precios.
La regulación planificada del mercado local de materiales de
la construcción y servicios de la vivienda deberá efectuarse mediante
diferentes vías y mecanismos:
1. Sistema de contratación, en él se definen los planes y destino
de las producciones fundamentales de la cooperativa y el resto
de las formas productivas existente.
2. Sistema de comercialización. Determinación los tipos y
segmentos del mercado, los canales y sujetos participantes,
tanto en las funciones físicas como económicas del mercadeo.
3. Sistema de precios locales-territoriales: Se trata de la
determinación a nivel local-territorial del sistema de precios
sobre la base de los costos de producción, de tal forma que
incentive a los productores y proteja a los consumidores.
Según el Artículo 25 del Decreto-Ley 305, los precios y
tarifas de los productos y servicios que comercializan las
cooperativas se determinarán por estas, según la oferta y la

94
demanda, excepto aquellos que se establecen por los órganos
estatales competentes.

4. Sistema impositivo: impuesto sobre las ventas de materiales;


10% (Regulaciones, 2011, 62) sobre el valor de las ventas
realizadas directamente por la cooperativa. El 40% del
monto total del impuesto sobre el valor de las ventas, según lo
establecido por el MINCIN queda a disposición del municipio
para el desarrollo local.

5. Política crediticia. Estimula uno u otro tipo de producción


cuando el tipo de interés favorece la inversión productiva.

6. Control de la calidad por parte de la entidad facultada al


respecto.

7. Responsabilidad social: los compromisos que el Gobierno


local asigne para la construcción, mantenimiento y reparación
de obras sociales como, círculos infantiles, hogares de ancianos,
escuelas, etc. que pueden ser asumidas por las diferentes
formas productivas y especialmente la cooperativa.

El mercado de productos de la construcción y los servicios


constructivos está compuesto por distintos tipos de mercados, canales
y segmentos de demandantes con existencia objetiva.
Los tipos de mercados se clasifican de acuerdo a los eslabones del
flujo de producción y servicios, los tipos de economías y por la moneda
que interviene en el acto de compra-venta. Así se pueden identificar los
siguientes tipos de mercados:

Según los eslabones del flujo productivo: el primer eslabón de la


cadena lo compone el Mercado de Insumos, que tiene que ver con la
producción e materias primas para la producción de materiales de la

95
construcción, el segundo eslabón corresponde al Mercado de Materiales
de la Construcción y por último, el eslabón referido al Mercado de
Construcción, Mantenimiento y Rehabilitación de la Vivienda.

Según los tipos de economía: el Mercado Estatal de materiales de la


construcción (MINCIN) y de los servicios de la vivienda, el Mercado
Informal de materias primas, materiales de la construcción y servicios
de la vivienda que ejecuta dicho sector.

Según el tipo de moneda que interviene en el acto de compra-venta: el


Mercado en CUP y Mercado en CUC.

La comercialización del producto de las cooperativas para la


realización de las ventas de materiales de la construcción y servicios
constructivos se puede efectuar por dos canales diferentes:

a) Uno medio; Cooperativa-MINCIN-Consumidor. En tal caso


el MINCIN actúa como intermediario entre las cooperativas y
los consumidores finales de los materiales de la construcción
y puede ser utilizado para una parte de la producción de las
cooperativas y en aquellos territorios donde las distancia
entre el productor y los consumidores indique la necesidad
de transportación, almacenamiento y gestión de venta por
parte del Estado. Además, es utilizado para los materiales de
la construcción no producidos por la cooperativa.

b) Directo; Cooperativa-Consumidor. Se trata de la venta por


la propia cooperativa de las producciones contratadas según
prioridades de la localidad y de los excedentes en mercados
libres sin la intermediación del MINCIN.

En cada uno de los canales deben ser definidos los segmentos de


beneficiarios según prioridades municipales y territoriales. Hasta hoy

96
pueden distinguirse nítidamente tres segmentos de consumidores: un
segmento de demandantes de altos ingresos, uno de ingresos medios y
otro segmento compuesto por la población vulnerable con ingresos muy
bajos y necesitados de subsidios estatales.
Para la cooperativa debe considerarse prioritariamente el canal
directo de comercialización, siempre que quede demostrado el beneficio
económico y social para ambas partes (cooperativa-consumidor). En
dicho canal, la cooperativa vende directamente a aquellos beneficiarios
según prioridades locales, territoriales y nacionales establecidas, sin
intermediación del MINCIN. Esto permitirá incentivar económica
y funcionalmente al productor y proteger a los consumidores en el
caso de que se reduzcan los precios a cuenta de la disminución de los
gastos de comercialización a través de transportación de materiales que
puede asumir el consumidor; el almacenamiento, cuando las ventas se
efectúan en el propio Almacén (local de producción o patio del taller); los
gastos en salarios a trabajadores del comercio y otros gastos de energía,
etc. Todo ello abriría la posibilidad de reducir precios a cuenta de la
reducción de los gastos superfluos que en determinadas condiciones
genera la comercialización a escala local.

3. Consideraciones

Entre las prioridades de las políticas sociales en Cuba se


encuentra la construcción de viviendas. Para ello la elevación de la
oferta de los materiales de la construcción es una condición necesaria,
pero no suficiente, mientras que las relaciones de mercado y su
comprensión y utilización inadecuada se convierten en un freno del
proceso social de producción.
Con la actualización del modelo económico cubano se produce la
ampliación de mercados libres a nivel territorial, a través de la aparición

97
y reconocimiento de nuevas figuras productivas. En correspondencia con
ello las relaciones de intercambio han de cambiar sin dejar de mantener
la disciplina de mercado y su regulación.
La solución a esta contradicción en las condiciones de la transición
al socialismo, con diversidad de tipos de economía y formas de gestión y
propiedad correspondiente, pasa por el reconocimiento de la existencia
de precios monopolio de los materiales de la construcción y de la renta.

Bibliografía

AUTORES, C. D. 2009a. Propuestas sobre la viabilidad del cooperativismo en


el sistema de procesos de construcción de la vivienda en Cuba.
AUTORES, C. D. 2009b. Solicitud de constitución de la cooperativa de
producción de materiales de construcción y de viviendas. [Accessed Abril 2012].
AUTORES, C. D. 2011b. Creación del tejido productivo no estatal de la
vivienda en los municipios cubanos.
AUTORES, C. D. 2011c. Pilotaje de Nuevas Figuras Productivas en la
Vivienda en los Municipios Cubanos. [Accessed 2012].
AUTORES, C. D. 2011d. Proyecto para la creación de las cooperativas en la
construcción de viviendas en Cuba. [Accessed abril 2012].
AUTORES, C. D. 2013. Manual para la constitución de cooperativas de la
producción y servicios de la vivienda. Ediciones Luminaria, Cuba.
DELGADO, E. M. Desarrollo territorial y local en Cuba.
FIGUEROA ALBELO, V. abril/1996. UBPC: Desarrollo Rural y Participación,
parte I, p. 3, Editorial Universidad de La Habana, Facultad de Filosofía e
Historia, Departamento de Sociología.
FIGUEROA,V., GARCIA J., SERRA E.: Contradicciones en el sector agrícola
no estatal de Villa Clara y Expectativas de la expansión del cooperativismo.
MARX, C. 1970a. Contribución a la crítica de la Economía Política, La Habana,
Editorial Pueblo y Educación.

98
MARX, C. 1974. Trabajo asalariado y capital, La Habana, Editorial de Ciencias
Sociales.
OLIVA, S. L. 2011. Estudio de la Potencialidades Económicas de la Pequeña y Mediana
Producción Mercantil Privada para el Desarrollo Local del municipio de Sagua La
Grande. UCLV.
SÁNCHEZ, G. D. et. al. 2010. Expediente Nuevas Figuras Productivas en el
Sector de la Vivienda. UCLV.
SÁNCHEZ, G. D y otros. 2011. El nuevo cooperativismo en la cuba del Siglo XXI,
Publicación en la Revista Economía. Editada en Brasil.
SHEPHERD, A. W. 2000. Servicios de Información de Mercados – Teoría y
Práctica. Roma.
SHEPHERD, A. W. 2008. Cómo vincular a los productores con los mercados.
2011. Lineamientos de la Política Económica del VI Congreso del PCC y la
Revolución. Cuba.
Decreto Ley No. 147 De la Reorganización de los Organismos de la
Administración Central del Estado. MINISTERIO DE FINANZAS Y
PRECIOS RESOLUCIÓN No. 368 – 2010
RESOLUCIÓN No. 517/11 MINISTERIO DE FINANZAS Y PRECIOS
INSTITUTO NACIONAL DE LA VIVIENDA. Cartilla técnica subsidios de
viviendas. Manual para la evaluación técnico-económica de la solicitud del
subsidio a otorgar para ejecutar acciones constructivas en una vivienda, 2012.

99
POLÍTICA ECONÔMICA E FINANCIAMENTO DO ESTADO

Valter Fanini1

1. INTRODUÇÃO

A política econômica, vista como o conjunto de intervenções


efetuadas pelos governos nacionais no sentido de provocar mudanças
reais no processo de produção e consumo de bens e serviços em regimes
econômicos capitalistas, tem estreita relação com o financiamento do
Estado pelo setor privado e com a formação das dívidas públicas, em
especial com a dívida pública mobiliária interna (DPMFi) formada
por títulos públicos que são vendidos inicialmente pelo poder público
(mercado primário) e depois seguem sendo comercializados pelo setor
financeiro (mercado secundário).
As políticas econômicas implementadas pelos governos nacionais
no sentido de produzir alterações no processo econômico real tomou
expressão a partir das ideias de John Maynard Keynes em sua obra
“A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda” quando se opôs

1 Engenheiro Civil. Mestre em Desenvolvimento Econômico pela Universidade


Federal do Paraná UFPR). Pós-Graduado lato sensu em Administração Pública pela
Fundação Getulio Vargas (FGV). Vice-presidente do SENGE-PR (Sindicato dos
Engenheiros no Estado do Paraná).

101
a visão dos economistas clássicos sobre a garantia do equilíbrio do
emprego, juros e da relação entre oferta e demanda agregada da economia
exclusivamente pelas forças do mercado.
A partir de Keynes a teoria econômica coloca o Estado como
protagonista na manutenção do equilíbrio geral da economia por meio do
acionamento de instrumentos monetários e fiscais que se convencionou
chamar de politica econômica do setor público.
Segundo a teoria de keynesiana, a arrecadação de tributos e sua
aplicação, os empréstimos governamentais e a emissão de moeda passam
a ter um papel fundamental no que se convencionou chamar de ações
governamentais anticíclicas na economia, ou seja, o Estado é capaz
de acelerar ou desacelerar a formação da renda nacional atendendo
aos interesses de toda a sociedade, já que as visões individualistas de
capitalistas e consumidores são por demais imprecisas para impedir
excessos tanto no sentido do crescimento exagerado quanto nos
processos de recessão econômica.
Sob esta óptica, a administração da dívida pública passa a ter
importante papel no sentido de capturar a poupança privada buscando
aumentar a demanda agregada em momentos de recessão econômica com
a ampliação dos gastos e dos investimentos públicos, ou, contrariamente,
em momentos de excesso de demanda contraí-la promovendo a sua
retenção e a consequente redução nos investimentos.
Acontece que em qualquer situação quando os governos tomam
poupança privada vendendo títulos públicos são obrigados a remunerá-
los com o pagamento de juros sobre o valor nominal de cada título
vendido. O que garante aos detentores de títulos públicos rendimentos
com baixíssimo grau de risco, já que a garantia de pagamento desses
títulos é dada por toda a sociedade e não de forma isolada por um único
indíviduo ou empresa.

102
O sistema financeiro não tardou a perceber que os ganhos
rentistas obtidos pelos juros das dívidas públicas constituem uma forma
bastante segura de auferir elevados lucros caso seja possível elevar as
dívidas pública dos países a patamares em que as taxas de juros sobre
os títulos públicos não sejam mais determinadas pelos governos e sim,
impostas pelo sistema financeiro, ou seja, a dívida pública deixa de ser
um instrumento de política econômica dos governos para atender à sana
rentista dos detentores de títulos públicos.
Esse é um projeto comum do sistema financeiro em todo o mundo,
iniciado na década de 1970 com o endividamento dos países em dólares
para fazerem frente à primeira e segunda crises do petróleo e mais tarde
na conversão da dívida em dólares em dívida em moeda nacional.
O Brasil tem sido vítima deste processo com maior ênfase a partir
da década de 1980, quando a dívida externa contraída na década de 1970,
durante a fase de elevada liquidez internacional derivada da oferta dos
“petrodólares”, contratadas com juros vinculados a taxa “prime” do FED
(Federal Reserve Bank) ou a “Libor” controlado por Bancos Ingleses,
subiram de valores que variavam de 5,5% a.a para valores entorno e
20,5%a.a.
A partir do ano de 1994, já em regime de livre circulação de
capitais financeiros, começa no Brasil o ciclo especulativo do capital
financeiro nacional e internacional sobre as taxas de câmbio e da dívida
púbica mobiliaria federal, aproveitando-se das fragilidades dos regimes
de combate à inflação sustentado inicialmente pela âncora cambial e a
partir de 1999 pelo regime de metas de inflação, conseguindo com isso
ampliar em inúmeras vezes a dívida pública interna pela imposição de
juros escorchantes.
Ao longo deste artigo vamos apresentar questões conceituais
envolvendo o tema da formulação das políticas econômicas, do
financiamento do Estado e da formação da dívida pública, para no final

103
apresentar como o Brasil foi vitimado pelo sistema financeiro nacional
e internacional que manipularam e especularam com o câmbio e com os
títulos públicos produzindo um crescimento brutal da dívida pública,
mesmo tendo o Brasil produzido ano após ano expressivos superávits
fiscais sistematicamente transferidos aos setores rentistas em forma de
juros da dívida pública.

2 CONCEITOS UTILIZADOS NESTE ARTIGO

2.1 Divida pública e privada

O conceito de dívida está simetricamente associado ao conceito


de crédito, isto é, para cada unidade de dívida existirá uma unidade
de crédito no sistema financeiro de determinada economia. Em outras
palavras, não existe devedor sem que haja um credor; assim, a soma
com sinais invertidos de todos os créditos e débitos de uma economia é
igual a zero. Sendo a dívida uma relação estabelecida entre dois agentes
econômicos, em que um deles exerce o papel de credor e o outro de
devedor, para se avançar na conceituação de dívidas públicas e privadas
deve-se verificar qual é a função que os sistemas de créditos e débitos
exercem na economia, ou seja, qual o papel do sistema financeiro de
uma economia.
Se utilizarmos a identidade geral de equilíbrio da renda nacional
na qual a renda ofertada (Ys) é igual à renda consumida (Yd), teremos,
em uma economia fechada, a seguinte identidade:
Ys = Yd
Ys = C + I + G

O valor de venda de todos os produtos ofertados na economia


(Ys) em determinado período é igual ao valor de todos os produtos

104
consumidos pelas famílias (C), mais o valor dos investimentos feitos
pelos empresários (I) e mais os gastos do governo (G).
Por outro lado, o valor de venda de todos os produtos ofertados
na economia (Ys) é composto do valor da remuneração das famílias
(W), do lucro retido pelas empresas (Se) e do valor das receitas do
governo (T).
Ys= W + Se + T
Depreende-se que W = C, Se = I e T = G.

As três igualdades estabelecidas acima expressam que para que


toda a renda ofertada seja consumida em um determinado período é
necessário que as famílias gastem todos os seus salários e rendas, as
empresas invistam todos os seus lucros e o governo aplique todas as
suas receitas. Caso alguma dessas igualdades não seja estabelecida em
um determinado período, haverá a formação de estoque não planejado
na economia, o que configura um processo de recessão econômica.
Ora, considerando que essas igualdades nunca acontecem no
curto prazo, seja por um mês, seja por um ano, que todas as famílias
não gastam imediatamente os seus salários, que os empresários não
investem imediatamente os seus lucros e que os governos podem
não aplicar todos os tributos arrecadados, então a economia estaria
sempre formando estoques, movimentando-se sempre em direção a
um processo recessivo.
Para que isso não aconteça, é necessário que os agentes
econômicos transfiram entre si as receitas financeiras auferidas em um
determinado período e não gastas no mesmo período. As transferências
de recursos financeiros entre os agentes econômicos dão origem aos
títulos de crédito, que representam simultaneamente o direito de
receber e a obrigação de pagar determinada quantia de moeda entre
dois agentes econômicos.

105
A transferência de recursos financeiros entre dois agentes
econômicos privados dá origem a títulos privados de dívida. A
transferência de recursos financeiros entre um agente privado e
o governo, tendo o governo como tomador, dá origem a títulos da
dívida pública. A transferência de recursos financeiros entre agentes
econômicos não dá origem obrigatoriamente a títulos de dívidas. Essa
relação entre agentes econômicos poderá ser conduzida por meio de um
contrato de empréstimo. Quando a dívida fica representada por meio de
títulos ela é denominada dívida securitizada.
Uma vez formados, os títulos de dívidas poderão ser negociados
entre os agentes econômicos como uma mercadoria, formando um
mercado de títulos de crédito que irá compor, com outras formas de
transação financeira, o sistema financeiro nacional.

2.2 Políticas monetária e fiscal

As políticas monetária e fiscal são os instrumentos pelos quais


formam-se, administram-se ou eliminam-se as dívidas públicas
mobiliárias. Vistas de forma inversa, pode-se dizer que a emissão e o
resgate de títulos públicos constituem um poderoso instrumental de
execução dessas políticas públicas.

2.2.1. Objetivos da política monetária

A política monetária diz respeito ao conjunto de instrumentos


levado a efeito pelos governos por meio de seus bancos centrais com o
objetivo de controlar a liquidez do mercado, a qual está relacionada à
oferta de moeda disponível para transações econômicas representada

106
pelos meios de pagamento da economia (M1)2, sendo que o seu controle
define, em última instância, a taxa de juros do mercado financeiro.

2.2.2 Instrumentos de execução da política monetária

Para a execução de sua política monetária os bancos centrais


contam com alguns instrumentos de controle de oferta de moeda. São eles:
� operações com títulos públicos;
� emissão de moeda (papel-moeda ou moeda escritural);
� controle das reservas bancárias (depósitos compulsórios);
� empréstimos de liquidez às instituições financeiras (operações
de redesconto);
� controle e seleção de créditos;
� compra ou venda de moeda estrangeira;
� prefixação da taxa básica de juros da economia.

2.2.3 Objetivos da Política Fiscal

Política fiscal é o processo pelo qual os governos promovem


alterações de ordem econômica por meio do controle das variáveis
representadas pelo nível de tributação e pelos gastos governamentais.

2.2.4 Instrumentos de execução da política fiscal

Para atingir os objetivos da política fiscal o governo intervém


sobre o processo econômico de duas formas distintas: num primeiro
momento atuando sobre os agentes econômicos e capturando parcela

2 Meios de pagamento (M1): são por definição formados pelo somatório do


papel-moeda em poder do público e dos depósitos à vista nos bancos comerciais.

107
da renda nacional mediante o processo tributário, e, num segundo
momento, devolvendo à sociedade a renda retirada da economia por meio
dos gastos e investimentos públicos, fazendo uso do planejamento e da
execução orçamentária.
Esses dois momentos da execução da política fiscal são efetivados
pelo emprego de duas políticas perfeitamente distintas no contexto da
administração pública, designadas como política tributária e política
orçamentária. Da conjugação dessas duas políticas públicas surge um
terceiro elemento de elevada importância na execução da política fiscal,
a saber: o déficit orçamentário, representado pela diferença entre os
valores financeiros arrecadados por meio do processo tributário e os
valores gastos por meio do processo de execução orçamentária.
Desse modo, os três principais instrumentos de execução
da política fiscal dos governos são: a política tributária, a política
orçamentária e o déficit orçamentário.
O Déficit Orçamentário das contas do governo é o responsável
pela variação da dívida pública, para mais ou para menos, dependendo,
para isso, que sejam produzidos déficits positivos ou negativos. Uma
vez produzido, deverá ser coberto por receitas extratributárias
originárias da emissão de moeda, do aumento da dívida interna ou
por financiamento externo.
Portanto, o cálculo do déficit orçamentário e a verificação dos
fatores que lhe deram origem passaram a ser, em regimes de restrição
orçamentária, o indicador financeiro para verificar o desempenho da
política fiscal dos governos.

108
3. O PROCESSO DE EVOLUÇÃO RECENTE DA DÍVIDA PÚBLICA
MOBILIÁRIA FEDERAL NO BRASIL

A dívida pública mobiliária federal brasileira variou de cerca


de US$ 20.000,00 milhões para cerca de US$ 40.000,00 entre ao anos
de 1983 e 1993 (gráfico 1), o que representa uma variação, em dólares
americanos, de 100% em dez anos.

GRÁFICO 1 - CRESCIMENTO DA DÍVIDA MOBILIÁRIA FEDERAL

FONTE: Banco Central

Para um período equivalente que vai do ano de 1994 a 2004 a


variação em reais foi de 373% em dez anos (ver tabela 1).
O excessivo crescimento da Dívida Pública Mobiliária Federal
entre os anos de 1994 e 2004 não pode ser explicado pelo desequilíbrio
das contas do tesouro, já que nesse período o governo acumulou um
superávit primário de 3.361,29 bilhões equivalente a 68% do PIB médio
do período (ver tabela 3). A razão desse crescimento encontra-se,
portanto, nas políticas monetária e cambial adotadas pelo governo a
partir do Plano Real.

109
TABELA 1 – VARIAÇÕES HISTÓRICAS DA DPMFi E DO PIB – 1994-2014
EVOLUÇÃO DO PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), E DA DPMFI
EM VALORES DE 2014 - BRASIL - 1994 A 2014
Período PIB (em R$ milhões) DPMFI Relação DPMFi/PIB %
1994 3154176,82 330.146,30 10,47
1995 3287283,93 505.071,54 15,36
1996 3374726,6 750.297,05 22,23
1997 3485078,54 1.012.227,57 29,04
1998 3489610,54 1.261.561,91 36,15
1999 3517178,69 1.424.652,62 40,51
2000 3627775,49 1.498.167,06 41,30
2001 3678197,82 1.621.419,37 44,08
2002 3790510,18 1.456.082,02 38,41
2003 3833753,42 1.548.987,25 40,40
2004 4054576,26 1.562.396,09 38,53
2005 4184409,15 1.591.754,82 38,04
2006 4350194,97 1.755.286,20 40,35
2007 4614246,17 1.894.383,94 41,06
2008 4849304,89 1.813.123,77 37,39
2009 4843203,89 1.837.377,47 37,94
2010 5207811,21 2.138.052,02 41,05
2011 5411395,6 2.135.570,96 39,46
2012 5515185,22 2.186.198,29 39,64
2013 5681390,85 2.140.077,50 37,67
2014 5687308,99 2.183.611,00 38,39
FONTE: Banco Central
Em valores monetários de 2014 corrigidos pelo IGPM/FGV.

A aceleração inicial da dívida nos anos de 1993 e 1994 se deu


em função do deliberado aumento das reservas do Banco Central,
que, aproveitando uma conjuntura que associava a normalização com
credores internacionais, a redução dos juros nos Estados Unidos e os
altos juros no Brasil, resultou num ingresso de capital externo da ordem
de 2% do PIB anuais. Por isso, dado o equilíbrio em conta corrente, as
reservas aumentaram, nesse período, cerca de 2,5% do PIB a.a atingindo,

110
no conceito de caixa, em torno de US$ 40 bilhões em junho de 1994
(LLUSSÁ, 1998, p.59).
Na visão de Franco (1995), esse processo teve duas consequências:
de um lado, o expressivo volume de reservas tornava menos provável
uma crise cambial, permitindo, inclusive, que a nova moeda pudesse
se ancorar no câmbio; de outro, o crescimento das reservas gerou um
processo em que a esterilização das operações externas aumentava a
dívida pública, que pressionava os juros internos, ampliava o diferencial
de juros e, por fim, estimulava mais entradas de capital e acumulação
de reservas.
Sem poder mexer nas elevadas taxas de juros, um dos pilares
de estabilização de preços no início do Plano Real, o governo deixa o
câmbio se apreciar, o que veio a contribuir com a redução das taxas
de inflação em relação aos insumos importados e a concorrência de
bens de consumo importados, dada a abertura comercial que vinha
se processando.
A combinação dos fatores: câmbio valorizado e abertura comercial
produziu elevados déficits em conta corrente, que continuaram a ser
compensados pela Conta de Capital no fechamento do Balanço de
Pagamento do setor externo.
A crise mexicana desencadeada em dezembro de 1994 provocou
um movimento de fuga de capitais externos, o que obrigou o governo
a atuar no sentido de manter o equilíbrio econômico agora em sentido
contrário. Para evitar uma desvalorização do Real, o governo voltou a
atuar no mercado de câmbio vendendo divisas e adotando o regime de
bandas cambiais, promovendo desvalorizações periódicas para manter a
paridade relativamente estável em relação ao índice de preços no atacado.
O segundo movimento do governo foi a elevação das taxas de juros
dos títulos da dívida pública, no sentido de estancar a fuga de capitais
especulativos que estavam alocados e ativos financeiros nacionais.

111
A manutenção de elevadas taxas de juros dos títulos públicos até
1999 serviu a dois importantes propósitos de estabilização econômica:
manter superavitária a conta de capital do balanço de pagamentos para
fazer frente ao déficit da conta corrente e para conter as pressões de
demanda do mercado interno.
No ano de 1999, a eclosão das crises asiática e russa voltou a
provocar fuga maciça de capitais especulativos alocados em ativos
financeiros no Brasil, o que obrigou o governo a uma nova rodada
de elevação das taxas de juros e venda de divisas. No entanto, nesse
momento, a manutenção de taxas de juros reais acima de 30% e a venda
de mais de 50% das reservas de divisas foram insuficientes para conter
a fuga de capitais, o que levou o Banco Central, em maio de 1999, a
abandonar o regime de bandas cambiais, deixando o câmbio flutuar
sobre a pressão dos mercados, perdendo nesse momento a política
econômica sua âncora cambial.
A perda da âncora cambial não levou o governo a mudar o foco
principal de sua política econômica, que era o controle das taxas de
inflação. Em junho de 1999 o governo brasileiro, mediante decreto
presidencial, adotou o regime de metas de inflação como instrumento
orientador da política econômica, sinalizando que o instrumental de
política monetária é que seria acionado para o controle inflacionário,
visto que entregou a responsabilização pelo atingimento das metas
estabelecidas ao Banco Central do Brasil.
Dentro do instrumental de política econômica à disposição do
Banco Central para o controle da inflação, as elevadas taxas de juros
básicos da economia continuariam a ser utilizadas, agora no sentido
de controlar o nível de liquidez proporcionado por um volume de R$
1.424,00 bilhões (ver tabela 1) em títulos públicos.
A manutenção das taxas de juros básicos da economia
estabelecidas pelo Copom, taxa Selic, em patamares bastante elevados

112
(tabela 2) foi o principal ingrediente para que a dívida mobiliária federal
aumentasse de R$ 330,14 bilhões, em dezembro de 1994, para R$ 2.183,61
bilhões em dezembro de 2014, apesar de ter efetuado o pagamento no
mesmo período de R$ 3.361,29 bilhões por meio de recursos fiscais com
a formação permanente de superávits fiscais em seus orçamentos anuais.

TABELA 2 - COMPARATIVO ENTRE AS TAXAS SELIC


ANUAL E OS ÍNDICES DE PREÇOS

COMPARATIVO ENTRE AS TAXAS


SELIC ANUAL E OS ÍNDICES DE PREÇOS
Ano SELIC (1) IGPM (2) (1) - (2)
1996 24,02 9,18 14,84
1997 25,08 7,74 17,34
1998 29,04 1,78 27,26
1999 26,05 20,10 5,95
2000 17,74 9,95 7,79
2001 17,65 10,38 7,27
2002 19,37 35,31 -15,94
2003 22,89 8,71 14,18
2004 16,44 12,42 4,02
2005 19,15 1,20 17,95
2006 15,06 3,84 11,22
2007 11,98 7,74 4,24
2008 12,38 9,80 2,58
2009 9,92 -1,71 11,63
2010 10,00 11,32 -1,32
2011 17,77 5,09 12,68
2012 8,57 7,81 0,76
2013 8,23 5,53 2,70
FONTES: Taxa Selic – Banco Central do Brasil; IGP-DI, IGPM –
Fundação Getúlio Vargas

113
Para entender o rápido crescimento da dívida brasileira em relação
à renda nacional é necessário utilizar um modelo algébrico que relacione
as principais variáveis que influenciam a sua mudança ao longo do tempo
(LEITE, 1994, p.297).
Tomando inicialmente as variáveis básicas de explicitação do
processo de formação da dívida pública, tem-se:
Dt – Dívida Pública no ano “t”
Dt -1 – Dívida Pública no ano anterior “t-1”
Yt – Renda Nacional no ano “t”
Yt-1 – Renda Nacional no ano anterior “t-1”
G – Gastos do Governo no ano “t”
T – Arrecadação Tributária do Governo no ano “t”
Dessa forma, o crescimento da dívida ao final de um exercício,
representado pela diferença entre (Dt – Dt-1), resulta da necessidade
de financiamento do déficit primário (G – T) do referido exercício,
somado ao pagamento dos juros incidentes sobre a dívida existente no
ano anterior, dado pela expressão (r. Dt-1), onde “r” é a taxa de juros
média aplicada sobre a dívida no ano anterior.
Tem-se, então, que:
(Dt – Dt-1) = (r. Dt-1) + (G – T) (1)
Fazendo o déficit atual como um percentual (z) do PIB (Yt)

(G – T) = z. Yt (2)
Substituindo-se a equação (2) na equação (1) e isolando o valor
da dívida presente (Dt) obteremos a expressão que nos fornece o valor
da dívida ao final de um determinado exercício fiscal:
Dt = (1 + r) Dt-1 + zYt (3)
Considerando a variação anual do PIB como Yt/ Yt-1 = (1 + g),
onde “g” é a taxa de crescimento anual da renda nacional, então tem-se:
Yt = (1 + g)Yt-1 (4)

114
Finalmente, para se expressar a dívida pública como um
percentual do PIB, estabelecendo a relação (Dt/Yt), tem-se que dividir
a expressão (3) pela expressão (4), obtendo a seguinte equação:
dt = (1 + r)/(1 + g). dt-1 + z (5)
A equação (5) revela que a dívida como proporção do PIB (dt) ao
final de determinado exercício fiscal “t” depende da proporção observada
no final do exercício fiscal anterior (dt-1) e da relação entre o fator de
juros reais (1 + r) pagos pela dívida e o fator de crescimento do PIB (1 +
g), bem como do déficit fiscal primário observado no exercício corrente.
Portanto, os fatores que contribuem decisivamente para a redução
da relação dívida/PIB é a realização de uma taxa de crescimento da renda
nacional superior à taxa média de juros paga sobre a dívida pública, bem
como a realização de um déficit fiscal primário negativo ou, dizendo de
forma equivalente, à obtenção de superávit primário no orçamento fiscal.
A equação (5) não contempla a hipótese de emissão de moeda
para o resgate ou pagamento de juros de dívida pública. Caso isso
venha a acontecer, deve-se incluir um terceiro elemento na equação,
representado pela relação entre o valor da expansão da base monetária
(ΔB) e o valor da renda nacional no período (Yt). Fazendo (ΔB) / (Yt).
= b, obtém-se a expressão que se segue:
dt = [(1 + r)/(1 + g)]. dt-1 + z – b (6)
No caso da formação da dívida pública brasileira a partir de 1993,
verifica-se que, apesar de se ter um fator “z” quase sempre negativo,
superávit primário na execução do orçamento federal, este fato não tem
sido suficiente para compensar a relação [(1 + r)/(1 + g). d t-1] de modo
a fazer que a relação final entre a dívida mobiliária federal e o PIB seja
decrescente.
A tabela a seguir demonstra essa afirmação:

115
Tabela 3 – Pagamento de juros da DPF entRe os anos de 1994
e 2004

FONTE: Banco Central


Em valores monetários de 2014corrigidos pelo IGPM/FGV.

A dívida pública tem sido usada exaustivamente como


instrumento de política econômica, de modo que se pode afirmar que ela

116
tem sido a panaceia para a solução de todos os principais desequilíbrios
macroeconômicos originários das políticas de combate à inflação a
partir do ano de 1994. Na fase inicial cumpriu o papel fundamental no
equilíbrio do Balanço de Pagamentos; a partir de 1998, com o início da
crise cambial, foi prestadora de hedge cambial para a economia e a partir
de 1999 foi a variável-chave do modelo de metas de inflação adotado
desde então pelo governo. Portanto, desde 1994 o governo utiliza os
mecanismos da formação de dívida para conseguir relativa estabilização
dos preços na economia.
No entanto, ao resolver problemas de ordem macroeconômica o
governo federal vem gerando outro crescente problema, que é a formação
da dívida pública. Uma vez formada, a dívida pública passa a influenciar
o regime econômico, dadas as características que os títulos públicos
possuem de exercer o papel de moeda no sistema de trocas da economia,
já que grande parte da dívida mobiliária federal é de propriedade de
cotistas de Fundos de Investimentos Financeiros, pessoas físicas ou
jurídicas, que têm garantia de liquidez diária em seus investimentos,
que dá a esses títulos públicos características de moeda ou quase
moeda, devendo, portanto, ter o seu potencial de gerar demandas
econômicas em curto prazo controlado diariamente por elevadas taxas
de juros, fechando, assim, um ciclo em que os juros pagos pela dívida
pública geram, a cada dia, maiores riquezas financeiras que devem ser
imobilizadas com taxas de juros cada vez mais elevadas.
O processo de administração da dívida pública exclusivamente
por meio da interação entre política monetária e o mercado de títulos
públicos, em que de um lado está o poder público, com o objetivo
de regular a velocidade renda de uma massa de riqueza financeira
equivalente hoje a cerca de 40% do PIB, e, de outro, os proprietários de
títulos públicos visando maximizar os seus ganhos rentistas, resulta em
um processo acelerado de crescimento da dívida pública mobiliária, que
não é sustentável no longo prazo.

117
Diante de um quadro de dívida pública com elevado nível de
liquidez e hipertrofiada em relação às dimensões da renda nacional, a
economia fica permanentemente ameaçada por pressões inflacionárias
derivadas da existência de uma elevada riqueza financeira líquida
nas mãos de agentes econômicos. A redução da ameaça inflacionária
produzida pela liquidez da dívida pública deve ser neutralizada
diariamente pelo governo por meio de sua política monetária. Ao
mesmo tempo em que o governo busca a neutralização do potencial
inflacionário da dívida pública mobiliária, busca também a redução
da relação dívida/PIB, bem como a redução de seu nível de liquidez.
No entanto, o mercado financeiro, que trabalha com expectativas
racionais aplicadas à maximização de seus ganhos rentistas, conhecendo
os objetivos de política econômica do governo e suas condicionantes
macroeconômicas, pode se posicionar sempre da maneira a obter os
melhores benefícios, não respondendo às tentativas do governo em
diminuir sua vulnerabilidade em relação ao nível de liquidez da dívida
pública. Por exemplo, uma tentativa de colocação de títulos da dívida
remunerada pela correção monetária mais uma taxa de juros de 6%
a.a. não é aceita pelo mercado, que percebe que os títulos remunerados
pela taxa Selic proporcionam maiores ganhos, da mesma forma que não
aceita títulos de longo prazo, na expectativa de que os títulos de curto
prazo sempre poderão proporcionar ganhos superiores aos fixados nas
posições de longo prazo.
A redução da dívida pública via compra de títulos por meio do
superávit primário do orçamento federal tem seus limites estabelecidos
pela capacidade contributiva da economia em relação ao processo
tributário e pelos efeitos colaterais derivados da transferência de renda
do setor produtivo da sociedade, em especial do setor assalariado, para
o setor rentista. Essa transferência de renda entre o setor produtivo
para o setor rentista pode gerar importantes efeitos macroeconômicos

118
desestabilizadores do sistema de preços, porquanto o rentista,
diferentemente da classe assalariada, de quem foi extraída a renda que
forma o superávit primário, tende a não ampliar o seu nível de consumo,
mas sim a ofertar estes recursos no mercado de moeda, transferindo a sua
riqueza da posição de títulos de crédito público para títulos de crédito
privado, o que obrigatoriamente resulta em uma baixa das taxas de juros
do mercado, provocando um ciclo acelerado de crescimento da renda, via
financiamento do consumo e do investimento, que poderia, de qualquer
forma, resultar em um novo processo inflacionário.
Por outro lado, o regime de metas de inflação com metas bastante
reduzidas em relação ao histórico da inflação brasileira nos últimos
cinquenta anos retira do governo a possibilidade de redução da dívida
via redução dos juros reais, enquanto a taxa básica de juros em níveis
elevados reduz o nível de investimento, mantendo o crescimento da
renda nacional via expansão da oferta em taxas muito pequenas em
relação às taxas de crescimento anteriores aos anos oitenta. Esses dois
fatores combinados impedem que a relação dívida/PIB não se reduza
vis-à-vis os esforços despendidos com a compra de títulos por meio do
superávit primário do orçamento federal.
Portanto, observa-se que a administração da dívida pública levada
a cabo exclusivamente por mecanismos de mercado, pelos quais a relação
entre os agentes econômicos se faz exclusivamente via preço, no caso
do mercado de moedas e títulos, via taxa de juros, não traz os efeitos
desejados à sociedade como um todo. O governo pode e deve adotar
outros mecanismos de relação com o mercado de títulos públicos que não
sejam exclusivamente via taxa de juros, da mesma forma que no campo
da microeconomia vendedores e compradores estabelecem relações
contratuais, que pressupõem uma negociação entre as partes, para a
produção de determinados insumos que, devido às suas especificidades,
não podem ser obtidos no mercado spot.

119
Os tomadores de decisões sobre a dívida pública pelo lado do
mercado, considerando que 76% dos títulos da dívida pública pertencem
ou à carteira própria de bancos ou são administrados por Fundo de
Investimentos Financeiros, não passam de algumas centenas, sendo,
portanto, perfeitamente identificados e com quem a autoridade
monetária mantém estreitos vínculos, como é o caso dos “dealers” nas
operações de compra e venda de títulos ou da Andima, na precificação
de títulos públicos. Desse modo, é perfeitamente possível estabelecer
outras formas de relação pactuadas entre governo e mercado financeiro
que ultrapassem os limites das taxas de juros, já que se trata de um
mercado totalmente regulado pelo governo, e sobre o qual ele detém
absoluto controle das operações diárias.
Outro aspecto que deve ser levado em conta na administração
da dívida pública brasileira é o diferencial de potencial de liquidez que
possui cada título, a depender de quem é o seu proprietário. Define-se
aqui, como potencial de liquidez, a tendência que determinado valor de
moeda fixado em título público possui de deixar essa forma de reserva
de valor e entrar no circuito econômico da renda, mediante o consumo
ou o investimento. É possível identificar a diferença de potencial de
liquidez entre o título pertencente a um assalariado cotista de um
Fundo de Investimento Financeiro e um título pertencente à carteira
própria de um banco. Os bancos, sendo instituições que não investem
e nem consomem, e que somente utilizam a propriedade dos títulos
como forma de garantia de suas operações de empréstimos, poderiam
deixar de ser remunerados via taxa de juros de mercado sem que isso
provocasse qualquer alteração na liquidez ou impacto de demanda
sobre a economia. Portanto, considerando a possibilidade que o governo
possui de acessar e negociar com a totalidade dos tomadores de decisões
no mercado de títulos públicos; considerando o domínio absoluto das
informações relativas aos proprietários da dívida pública mobiliária;

120
levando em conta que o governo não pode abrir mão da soberania sobre
a administração da moeda, e, ainda, que os mecanismos de mercado para
a administração da dívida pública entram em choque com os objetivos de
política macroeconômica para o controle da inflação, o governo brasileiro
poderia adotar mais mecanismos de natureza política de negociação e
pactuação entre atores, e menos os mecanismos de mercado via taxa
Selic, tendo em vista que possui todos os meios de fazê-lo.
Outro aspecto que deve ser observado ao se concluir este texto é
que a elevação da taxa básica de juros da economia representa apenas
um dos instrumentos de política monetária à disposição do Banco
Central para controle inflacionário e que tem como efeito colateral a
produção de dívida pública. Outros instrumentos com capacidade de
alterar a liquidez da economia estão à disposição do Banco Central e
podem ser utilizados sem que produzam dívida pública. Podemos citar
alguns já apresentados no corpo deste trabalho, tais como: alteração da
base monetária; controle das reservas bancárias por meio de mudanças
das taxas de depósitos; controle e seleção de créditos, podendo chegar
ao tabelamento da taxa de juros; alteração no regime de mobilidade de
capital; e alteração no regime de administração do câmbio.
Os instrumentos de política monetária são eficientes para alterar
a liquidez do mercado e influir sobre a demanda agregada da economia
em curto prazo. No entanto, um modelo de combate à inflação levado a
cabo pelo governo deve também atuar pelo lado da oferta, sob o risco de,
cada vez mais, utilizar instrumentos de política monetária para conter
a demanda que tenderá sempre a alcançar a renda potencial de uma
economia estagnada. Para atuar pelo lado da oferta, os instrumentos
de política fiscal são muito mais eficazes que os de política monetária,
principalmente quando todos os instrumentos de política monetária
estão sendo utilizados para reduzir a liquidez de uma economia com
excesso de moeda. A política fiscal, por meio de seus instrumentos

121
básicos, a tributação e a orçamentação, possui a faculdade de deslocar
renda no sentido da ampliação da formação bruta de capital fixo tanto de
cunho privado como público, além de aprimorar toda a base institucional
sobre a qual se assenta a economia capitalista. Portanto, uma política
econômica, mesmo que tenha o foco no controle do processo inflacionário
e, indiretamente, se centre no processo de desenvolvimento econômico,
deveria ser de responsabilidade de uma instância de governo que atuasse
de forma geral sobre as políticas monetária e fiscal, como o Ministério
do Planejamento, no caso brasileiro, e não de uma instituição que atua
somente sobre o regime monetário, como ocorre no Brasil, onde o
atingimento das metas de inflação é responsabilidade do Banco Central.
A dívida pública, por outro lado, administrada por meio de altas
taxas de juros, desequilibra o processo de distribuição de renda a favor
do ganho rentista em detrimento dos ganhos assalariados e do capital
produtivo. Esta potencialização dos ganhos rentistas se processa tanto
pelo lado do governo, que paga juros da dívida pública por meio de
recursos tributários, quanto pelo lado do processo de produção, ao elevar
as taxas de juros do mercado financeiro por meio das taxas básicas de
juros do Banco Central.
O desequilíbrio na distribuição da renda nacional não representa
exclusivamente uma falha ética e moral no seio da sociedade. Representa,
sobretudo, uma anomalia do processo de produção econômica
capitalista, que compromete o crescimento econômico uma vez que
este é dependente da distribuição de renda equilibrada entre os salários,
que geram demanda, e os ganhos capitalistas, que geram os meios de
produção. A presença exagerada do participante rentista, não dotado
de característica de consumidor e nem de investidor, retirando moeda
do circuito da produção e consumo e retendo-a em forma de ativo
financeiro, gera desequilíbrio entre a quantidade de renda produzida e
a que será efetivamente consumida em cada ciclo econômico.

122
4. CONCLUSÃO

Das considerações feitas até aqui, pode-se concluir que os


instrumentos de políticas monetária e fiscal à disposição dos governos
constituem um poderoso recurso para a manutenção do equilíbrio
econômico e mesmo de alavancagem de seu crescimento, e que a
execução dessas duas políticas pode produzir dívida pública em forma
de título público sem que isso constitua uma anomalia econômica. Neste
caso, os juros pagos pelos títulos públicos representam, tão somente, a
remuneração oferecida pela sociedade pelos benefícios obtidos com as
políticas econômicas.
Verifica-se também que, uma vez vendidos ao público, os títulos
da dívida pública são trocados entre agentes econômicos formando
um mercado de títulos públicos que garante aos proprietários desses
papéis elevada liquidez e, em alguns casos, liquidez equivalente à
moeda nacional. No entanto, o crescimento da dívida em relação à renda
nacional poderá subordinar as políticas monetária e fiscal à sua rolagem,
fazendo com que estas políticas acabem sendo voltadas exclusivamente
para a neutralização dos efeitos da própria dívida pública. Neste caso,
as políticas monetária e fiscal perdem a capacidade de promover o
desenvolvimento econômico e acabam por ter um fim em si mesmas,
fazendo com que os juros pagos pela dívida pública representem muitas
vezes somente uma transferência brutal de renda do setor produtivo para
os rentista constituindo-se numa anomalia do processo econômicos e
uma enorme injustiça social.

REFERÊNCIAS

FRANCO, Gustavo. O Plano real e outros ensaios. Rio de Janeiro: Livraria


Francisco Alves, 1995.

123
LEITE, José Alfredo A. Macroeconomia: teoria, modelos e instrumentos de
política econômica. São Paulo: Atlas, 1994
LLUSSÁ, Fernanda Antonia Josefa. Credibilidade e administração da dívida pública:
um estudo para o Brasil. Rio de Janeiro: BNDES, 1998.
MUSGRAVE, Richard Abel. Teoria das finanças públicas: um estudo da
economia governamental. (Trad.) Auriphebo Berrance Simões. São Paulo:
Atlas; Brasília: INL, 1973.
MUSGRAVE, Richard Abel. The teory of public finance. New York: Mcgraw-
Hill, 1959.
PEREIRA, José Matias. Finanças públicas: a política orçamentária no Brasil.
São Paulo: Atlas, 1999.
GIAMBIAGI, Fábio; MOREIRA, Maurício Mesquita. A economia brasileira nos
anos 90. Rio de Janeiro: BNDES, 1999.

124
Educación y trabajo docente.
La Educación Superior en Cuba

MSc. Víctor Almanza Tojeiro1


MSc. Mercedes Rivas Pérez2

1. Desarrollo

Desde enero de 1959 el Trabajo Docente en la Educación Cubana


se ha ido estructurando orgánicamente en cada uno de sus niveles:
primario, medio y superior, evitando los cambios bruscos en el tránsito
de una enseñanza a otra e implementando programas que respondan
a las exigencias de cada momento para elevar la calidad del proceso
docente educativo y mantener los índices que requiere la sociedad en
constante perfeccionamiento.

1 Master en Historia y Cultura por la UCP “Félix Varela” de Villa Clara,


Cuba (2002). Profesor Auxiliar del Departamento de Historia de la Universidad
Central “Marta Abreu” de Las Villas. Con experiencia en el área de Historia Universal
y de América. E-mail almanza@uclv.edu.cu
2 Master en Ciencias Pedagógicas por la UCP “Félix Varela” de Villa Clara,
Cuba (2000). Profesora Auxiliar del Departamento de Historia de la Universidad
Central “Marta Abreu” de Las Villas. Con experiencia en el área de Historia
Universal, de España y en Didáctica de las Ciencias Sociales y Humanísticas. E-mail:
mercedesr@uclv.edu.cu

125
En el caso de la Educación Superior los planes se han ido
perfeccionando en función de la pertinencia social y abarcan un amplio
campo de desarrollo hacia la formación de pregrado, de posgrado,
de investigación científica y de extensión universitaria, teniendo en
cuenta las condiciones histórico-concretas. En este nivel de enseñanza
la vinculación continua entre docencia e investigación ha sido
imprescindible para el trabajo, el profesor enseña a aprender y aprende
enseñando, para lo cual requiere actualización teórica y preparación
metodológica en función del profesional que está formando.
La capacidad del ser humano de transmitir sus conocimientos y
experiencias le ha dado una gran ventaja, la de enseñar y aprender. Sin
embargo, el binomio que se forma entre enseñar y aprender no es simple,
razón por la cual en las comunidades de profesionales y de educadores
tienen lugar importantes debates e intercambios sobre la instrucción en
la que muchos de los especialistas coinciden en indicar que la docencia
universitaria necesita respaldo teórico de carácter científico y probatorio
con referencia continua que demuestre las fuentes utilizadas y que
estimule el enfrentamiento a diversos enfoques.
El desarrollo de habilidades profesionales se convierte en un
aspecto de especial importancia en la proyección del trabajo docente
de los profesores universitarios, es una tarea esencial en el proceso
de enseñanza-aprendizaje, aunque tiene que seguir atendiéndose el
resto, porque en muchos casos los estudiantes llegan a la Universidad
con carencias y necesidades de seguir desarrollando sus estructuras
cognitivas, sus posibilidades de adquirir información de las fuentes, de
expresarse y comunicarse adecuadamente en una sociedad en constante
perfeccionamiento, de ahí que los docentes al impartir sus clases tengan
que situar la esencia humana de sus Disciplinas en el centro del quehacer
pedagógico universitario.

126
En la docencia el profesor direcciona su trabajo hacia la realidad
de forma tal que aprender se considere un proceso de construcción y
reconstrucción de saberes sobre objetos, procesos y fenómenos por parte
del sujeto que aprende al adquirir no sólo conocimientos, sino también
formas de comportamiento, aptitudes, valores, en correspondencia con
sus conocimientos previos, experiencias, motivaciones e intereses acorde
al contexto sociocultural.
La Universidad es fuente directa para responder a las demandas
de la sociedad, de allí emergen profesionales, dirigentes, responsables
del futuro, que deben tener autonomía y responsabilidad para actuar
y tomar decisiones, donde su preparación y formación universitaria
es decisiva.
La enseñanza en la Educación Superior sitúa al profesor
universitario como dirigente del proceso de enseñanza aprendizaje que
orienta y mediatiza el aprendizaje, elevando las exigencias de acuerdo
a las concepciones más actuales del conocimiento y la investigación,
teniendo en cuenta el factor sociológico, psicológico y pedagógico.
Una clase de excelencia en la Educación Superior necesita
una investigación de excelencia, como afirma la profesora Francisca
López Civeira:

“…la actualización teórica, junto a la de contenido específico, es requisito


indispensable para una mayor calidad en la docencia, así como la preparación
metodológica en los aspectos pedagógicos que exige nuestra profesión” (3).

La dirección científica del maestro en la actividad cognoscitiva,


práctica y valorativa de los alumnos tiene en cuenta el nivel de desarrollo
alcanzado por estos y sus potencialidades para lograr los objetivos,

3 Francisca López Civeira. “¿Qué historia enseñamos?”, en: El Historiador, La


Habana, 19 de abril del 2001, pp. 20.

127
tomando como referencia el mejoramiento de los resultados en los
diagnósticos aplicados a través del semestre.
El trabajo docente en la Educación Superior al concebir la
aplicación de una didáctica desarrolladora se imbrica con los procesos
de socialización y comunicación que propician la independencia
cognoscitiva y la apropiación del contenido de enseñanza
(conocimientos, habilidades, valores).
Se trabaja además en la formación de un pensamiento reflexivo y
creativo, que permita al estudiante “llegar a la esencia”, establecer nexos
y relaciones y aplicar el contenido a la práctica social, de modo tal que
solucione problemáticas no sólo del ámbito universitario, sino también
familiar y de la sociedad en general.
Cuando el estudiante consulta diversas fuentes y se entrena
con enfoques diferentes sobre diversos temas que antes no conocía se
implica afectivamente y comparte con otros coetáneos, con la familia,
la comunidad y la sociedad es capaz de asumir posiciones y deviene en
dinamizador del proceso formativo del profesional.
El aula universitaria constituye un lugar donde se comparten
ideas, se estimulan pensamientos, se amplía la capacidad de pensar, de
ejercitar en argumentos de temas, que incluyen problemas, preguntas,
sugerencias en la que los docentes en sus relaciones con sus estudiantes
pueden cumplir su función de formadores.
El profesor que trabaja en esta enseñanza necesita conocer el
modelo del profesional de la Carrera y la actividad laboral que realizarán
una vez graduados, la docencia en este nivel no se limita al empleo de
las fuentes sino a ampliar el espectro de su aplicación en el proceso
docente educativo que transita durante cinco años y que esto constituya
un disfrute en la asimilación de los conocimientos, ello implica que en
el trabajo docente se desarrolle una valoración personal de lo que se
estudia, de modo que el contenido adquiera sentido para el alumno

128
y que este interiorice su significado, aspecto que se controla en las
universidades cubanas con la aplicación de las encuestas de satisfacción
a los estudiantes sobre las diferentes materias que recibe.
Trabajar en función del modelo del profesional en las diferentes
Carreras por parte de los docentes estimula el desarrollo de estrategias
que permiten regular los modos de pensar y actuar, que contribuyan a la
formación de acciones de orientación, planificación, valoración y control.
En Cuba, las experiencias de los últimos años, llevan a plantear la
necesidad de redefinir el objeto de estudio de la Teoría de enseñanza que
tiene precisamente por objeto el estudio del proceso de enseñanza de
una forma integral. En la actualidad la Teoría de la enseñanza tiene como
objeto: la instrucción y la enseñanza, incluyendo el aspecto educativo
del proceso docente, las condiciones que propicien el trabajo activo y
creador de los estudiantes y su desarrollo intelectual.
Hay autores que han limitado la Teoría de la enseñanza al proceso
de enseñanza, centrando la atención sólo en el docente, sin embargo se
ha demostrado que este debe ser en el proceso de enseñanza-aprendizaje,
en su carácter integral desarrollador de la personalidad de los alumnos,
expresado en la unidad entre instrucción, enseñanza, aprendizaje,
educación y desarrollo.
Dentro del trabajo docente en la Educación Superior la selección
de métodos y procedimientos por parte del docente es básica para
garantizar la dinámica del proceso, de forma tal que se imponga la
exclusión gradual de los métodos reproductivos y que todo análisis se
haga con carácter productivo, reflexivo y aplicativo para enriquecer
las potencialidades instructivas y educativas del proceso de enseñanza
desde lo histórico-social.
En el mundo de hoy, donde la información y las comunicaciones
han alcanzado niveles insospechados con el desarrollo de las
tecnologías, el profesor ha dejado de ser la única y principal fuente

129
de información, por lo que se ha empleado el término de facilitador
para quienes ejercen esta profesión, pero la enseñanza no puede ser
despersonalizada, este docente debe lograr el disfrute colectivo en
el intercambio con sus estudiantes y para eso tiene que sentir lo que
dice, tiene que creerse, llegar con la palabra y no dejarse aplastar por
la revolución científico-técnica.
La convergencia entre la electrónica, la informática y las
telecomunicaciones que se experimenta en la actualidad impone a los
estudiantes universitarios modificar en lo esencial no solo sus hábitos
y patrones de conducta, sino incluir su forma de pensar puesto que
las nuevas Tecnologías de la Información y las Comunicaciones (TIC)
transforman a corto plazo las estructuras y sistemas educativos de los
países donde se ha aplicado con intensidad, agudizando al mismo tiempo
desigualdades y diferencias entre los sistemas educativos de los llamados
países del tercer mundo ya que el nivel de acceso no ha sido homogéneo.
El Sistema Educacional cubano ha hecho grandes esfuerzos para que
exista la mayor equidad posible al poner al alcance de profesores y
estudiantes los recursos disponibles para su preparación acorde al nivel
en que se trabaje y estudie.
Es innegable que la rapidez de la información a veces cambia
el significado del contenido y si el profesor no se actualiza puede
llevar imprecisiones o conceptos y metodologías desactualizados en
el tratamiento de un tema, por lo que en el proceso de enseñanza-
aprendizaje adquiere gran importancia la constante preparación del
docente, saber discernir entre lo esencial y no esencial de los contenidos
que imparte y despojarse de prejuicios para tratar temas de forma clara
y objetiva, no dejar intersticios teóricos, vincular los contenidos a
la realidad social con flexibilidad de pensamiento que conduzcan al
intercambio de alto nivel para la sociedad.

130
La enseñanza en la Universidad debe crear un clima favorable
en la comunicación con flexibilidad de pensamiento que genere una
motivación intrínseca en los estudiantes en función de sus expectativas,
por lo que el profesor universitario tiene que ser especialista en
diagnóstico, en recursos de aprendizaje y dominar contenidos
interdisciplinarios que le permitan orientar al estudiante, de forma tal
que enseñe, investigue y gestione el conocimiento.
El profesor universitario, como profesional dedicado a la
enseñanza, debe aspirar a ser especialista al más alto nivel de la Ciencia,
constante investigador que amplía fronteras de su rama del saber y como
miembro de una comunidad académica asumir conductas y actitudes
que le permitan contribuir a la formación de valores en sus educandos.
En Cuba, el alma de la escuela en cualquier nivel de enseñanza,
incluso la universitaria, ha sido y seguirá siendo el educador, de ahí que
para el logro de la necesaria comunicación “…lo decisivo será siempre la altura
humana, el compromiso con la nación a la que se pertenece y la cultura histórica y
pedagógica que logre adquirir como parte imprescindible de su cultura general e
integral el docente universitario”(4), es por ello que cuando se estudien los
principales resultados del trabajo docente en las Disciplinas que se
cursan en las diferentes Carreras se aprecia al docente como un laborioso
sembrador de ideas en sus estudiantes, que entraña una síntesis de
ciencia, arte y pasión.
Es decir, el trabajo docente en la Universidad logra sembrar ideas
para enseñar a argumentar, ejecutar y proyectar tareas de aprendizaje que
constituyen fuente formidable de educación en valores, e instrumento
imprescindible para la ineludible batalla de pensamiento que se requiere
en la actualidad y enfrentar los desafíos de estos tiempos.

4 Díaz Pendas Horacio. Notas sobre la enseñanza de la Historia de Cuba


Revista Cuba Socialista, No. 46, enero-marzo 2008, pp. 23

131
Desde inicios del triunfo revolucionario el Comandante Ernesto
Guevara había alertado: “…se necesita un largo camino, un proceso… de largos
años de estudio… el estudio no es patrimonio de nadie… pertenece al pueblo entero…
por eso quisiera que ustedes, hoy dueños de la Universidad, se la dieran al pueblo…” (5)
Esas ideas fueron llevándose a la práctica a través de programas
educacionales para elevar la cultura general integral del pueblo cubano
en los diferentes niveles de enseñanza, dentro de esos programas
el Proceso de Universalización de la Educación Superior ocupó un
importante lugar, posibilitando extender progresivamente la enseñanza
universitaria a todos los municipios del país con la implementación de
un nuevo modelo pedagógico.
El proceso en sí generó dificultades porque rompía esquemas de
enseñanza aplicados tradicionalmente y proponía transformaciones en
el aprendizaje de los estudiantes. Para los profesores constituyó un gran
reto pues necesitaban estar capacitados al asumir una docencia diferente
utilizando alternativas que permitieran materializar los propósitos de
la Educación Superior hacia el logro de la independencia cognoscitiva
de los estudiantes, modificando la interacción personal entre profesor y
alumno por la acción conjunta de diversos recursos didácticos y el apoyo
de tutores que orientaran y posibilitaran el aprendizaje.
El aprendizaje, en el nuevo modelo que se estructuró para la
Universalización, mostró la necesidad de una mayor vinculación a la
sociedad que los modelos tradicionales, muchos de los estudiantes que
se fueron insertando en este proceso formaban parte de una población
que no aspiraba ni tenía proyectos de cursar una Carrera universitaria
y ante los nuevos planes de la Revolución encontraron una posibilidad
de estudiar y formarse como profesionales universitarios; la labor de

5 Ernesto Che Guevara. Intervención en la Universidad Central “Marta


Abreu” de Las Villas. Documento impreso. Diciembre de 1959.

132
los docentes y tutores insertados en el proyecto, identificados con los
objetivos y aspiraciones del mismo, asumieron ese proceso de interacción
en los municipios, apoyados por el colectivo de la Universidad (Sede
Central), donde la participación y cooperación entre sus miembros
pudiera ir propiciando el desarrollo desde adentro.
En esa interacción los estudiantes se fueron apropiando de la
realidad con reflexión sobre sus propias necesidades de forma consciente,
adquiriendo autonomía en el establecimiento de fines y compromisos
que facilitaran el aprendizaje y desarrollaran valores con protagonismo
en estos procesos.
Como señalara el Dr. Carlos Álvarez, “…el estudiante como sujeto de su
aprendizaje, de su formación no se incorpora a la dinámica del proceso de una forma
eficiente por la simple exigencia social expresada en el objetivo trazado por el profesor
a él como punto de partida; lo hace cuando esta exigencia externa se convierte en una
necesidad propia.”(6)
El encargo social de este nuevo modelo da prioridad a la acción
de los educandos, reconoce problemas y ofrece oportunidades para
que actúen potenciando el saber en saber hacer a través de contenidos
procedimentales que a su vez potencian actitudes y comportamientos
para saber actuar en contenidos actitudinales y de la esfera de los valores
en función de objetivos educacionales claramente definidos.
Hoy la Educación Superior en Cuba continúa perfeccionándose,
el proceso de Integración constituye la piedra angular en las nuevas
transformaciones del Ministerio de Educación Superior con el objetivo
de contribuir a seguir elevando la calidad, la equidad y la pertinencia
en este nivel; para ello se trabaja en el respaldo jurídico hacia la
preparación continua de profesionales, la formación del perfil amplio y
la especialización posterior, con el objetivo de garantizar su superación

6 Carlos Álvarez Zayas. La Escuela en la vida.

133
de acuerdo con la plaza que le corresponde ocupar, pero en el proceso
de Integración que recién se inicia es importante mantener el equilibrio
entre el aparato conceptual pedagógico y el conocimiento de las
Ciencias particulares. La Cultura General es básica, el educador debe
saber de diagnóstico, objetivos, métodos, estrategias de aprendizaje
y niveles de desempeño cognitivo, con amplio dominio del sistema
de conocimientos de las Disciplinas particulares para lograr una
proyección pedagógica confiable.
En este proceso de perfeccionamiento y transformaciones se trata
de ir integrando los Centros de Educación Superior, con la preparación
de perfiles amplios para enfrentar los retos actuales; la creación de un
nuevo nivel de enseñanza de Educación Superior no Universitaria, la
disminución del tiempo de duración de las Carreras universitarias, el
establecimiento del dominio del idioma inglés para obtener el título
universitario son algunos de los cambios propuestos.
Para ello las Universidades les brindarán a los estudiantes
diversos cursos y el acceso a plataformas informáticas que les permitan
aprender de forma autónoma, los profesores por su parte continuarán
perfeccionando su trabajo teórico, metodológico e investigativo en sus
diferentes formas de docencia, vinculados al perfil profesional de los
estudiantes, de forma tal que estimule el pensamiento, la capacidad de
reflexión y aplicación con voluntad transformadora ante los cambios
que requiere la sociedad sobre principios de igualdad y justicia social.

Bibliografía

Álvarez Zayas, Carlos M. La Escuela en la vida. La Habana. Editorial Félix


Varela. 1995.
Castro Ruz, Fidel. Una revolución solo puede ser hija de la cultura y de las
ideas. Editora Política. La Habana. 1999.

134
Colectivo de autores. Didáctica. Teoría y Práctica. Editorial Pueblo y
Educación. La Habana. 2007.
______. Habilidades para el aprendizaje en la Educación Superior. Compendio
de materiales. La Habana. Editorial Félix Varela.2003.
Díaz H. Damaris. La Didáctica Universitaria. Referencia imprescindible
para una enseñanza de calidad. Revista Electrónica Interuniversitaria de
Formación del Profesorado. 1999.
Díaz Pendás, Horacio. Notas sobre la enseñanza de la Historia de Cuba.
Revista Cuba Socialista. Nº 46. Enero-Marzo. 2008.
Lira A. Luis A. Didáctica Universitaria. Material Impreso. Perú. 2000.
López Civeira, Francisca. ¿Qué historia enseñamos? El Historiador, La
Habana, 19 de abril del 2001.
Pagés Blanch, Joan. Psicología y Didáctica de las Ciencias Sociales. Editora
Técnica. España. 1994.
Zilberstein, José. Aprendizaje y categoría de una Didáctica Desarrolladora.
Artículo de la red Galeón. Consultado el 30-09-2015.

135
BREVE PANORAMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL
(2005 – 2014)

Claudia Regina Baukat Silveira Moreira1

1. INTRODUÇÃO

Dentre os países da América Latina, o Brasil é um dos que mais


tardiamente vai implementar faculdades, apenas no século XIX. Já
as primeiras Universidades são fundadas apenas no século XX. Essas
instituições tiveram como objetivo a formação dos quadros da elite,
responsável pela criação e implementação de um projeto de Nação
(SCHWARCZ, 1993; DURHAM, 2005).
Reconhecido como um privilégio, o acesso à Educação Superior
representa, do ponto de vista econômico, uma alavanca de ascensão
social. Segundo levantamento da OCDE (2013), um trabalhador
brasileiro com diploma de Ensino Superior recebe um salário, em média,
157% maior do que aquele com Ensino Médio. Em suma, este nível de
Educação, na experiência brasileira, é um forte vetor de desigualdade.

1 Bacharel e licenciada em História (UFPR, 1997); mestra em História


(UFPR, 2000); doutoranda em Políticas Educacionais (UFPR); professora do curso de
Direito da Universidade Positivo.

137
Contudo, mudanças estruturais quanto à terminalidade
da Educação Básica – que têm garantido a ampliação do número
de concluintes do Ensino Médio – têm exercido pressão pela
democratização do acesso aos chamados níveis mais elevados da
Educação. Apesar de não haver consenso sobre o reconhecimento
da Educação Superior como um Direito2, o fato é que cada vez mais
jovens brasileiros vislumbram a possibilidade de ter uma formação
em nível superior.
Este anseio tem, de alguma forma, repercutido sobre a formulação
de Políticas Públicas. De um lado, tem-se o enunciado dos Planos
Nacionais de Educação (PNEs) que estabelecem como meta uma taxa
de escolarização líquida de 30% (BRASIL, 2001) e 33% (BRASIL, 2014)
e, de outro, iniciativas que promoveram a ampliação da oferta de vagas
em instituições públicas e privadas. Sem adentrar no debate sobre
a natureza das escolhas políticas realizadas e do modelo escolhido
para a ampliação, este texto objetiva apresentar um panorama geral da
Educação Superior no Brasil no que se refere às mudanças na oferta de
vagas aos cursos de graduação, aos custos e ao perfil das Instituições de
Ensino Superior a partir de 2004, quando tramita no Congresso Nacional
o Projeto de Lei n.º3582, que institui o Programa Universidade Para
Todos (ProUni), entendido aqui como um marco efetivo de perseguição
à meta imposta pelo PNE 2001 e que passou a conceder bolsas parciais
e integrais de estudos em Instituições Privadas de Ensino Superior para
estudantes oriundos da Rede Pública de Educação Básica.

2. POLÍTICAS E INDICADORES

No decurso da última década, o Estado Brasileiro implementou


uma série de políticas e programas que impactaram sobre todas as

2 Sobre este debate ver OLIVEIRA (2007) e MOREIRA (2014).

138
Instituições de Ensino Superior do país, tanto as públicas quanto as
privadas. Esse conjunto de medidas foi constituído: (i) pelo ProUni,
instituído pela Lei n. 11.096/2005; (ii) pelo REUNI (Programa de Apoio
à Planos de Reestruturação e Expansão das Universidade Federais)
instituído pelo Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007; (iii) pela
instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica
e Tecnológica (Lei n. 11.892/2008); (iv) pela reformatação dada em
2010 ao Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), por meio da Lei n.
12.202/2010 e (v) pela Lei n. 12.711/2012 que instituiu a Política de Cotas
nas Universidades e Instituições Federais de Ensino Superior.
Conforme podemos verificar no Gráfico a seguir, a demanda por
este nível de ensino é atendida sobretudo pelo setor privado, cuja curva
de crescimento de matrículas praticamente acompanha a curva total na
última década. Apesar de, no conjunto, representar muito menos que
as matrículas privadas, as matrículas em instituições federais também
passaram por um significativo incremento a partir de 2010, resultado do
REUNI e da ampliação e interiorização da Rede de Institutos Federais
de Educação Tecnológica. Segundo levantamento realizado pelo Grupo
de Estudos Multidisciplinares em Ação Afirmativa (GEMAA), diferente
daquilo que brada o senso comum, a política de cotas implementada pela
Lei n.º 12.711/2012 não subtraiu vagas ocupadas tradicionalmente pela
meritocracia. O argumento é que, antes da lei, por efeito do REUNI, o
número total de vagas em Instituições Federais de Ensino Superior –
IFES praticamente dobrou. Então, as cotas ocupam essa dilatação da
oferta, restando intocável o lugar tradicionalmente reservado à “classe
média” na Universidade (FERES JUNIOR et al., 2013).

139
GRÁFICO 1 – Evolução das matrículas no Ensino Superior,
segundo a categoria administrativa (2004 – 2013)

Fonte: a autora (2014), a partir dos dados do Censo da Educação Superior 2004 – 2013,
MEC/INEP.

A participação do setor privado no conjunto das matrículas passou


por discreto aumento no período: de 71,7% em 2004, para 73,5% em 2013.
Considerando que o número global de matrículas passou de 4.163.733 em
2004 para 7.305.977 em 2013 – uma taxa de 75,46% na década –, o Gráfico
1 permite perceber os seguintes momentos de inflexão: no caso das IFES,
o ano de 2009, possivelmente como efeito do REUNI e do processo de
ampliação da Rede de Institutos Federais de Educação Tecnológica; no
caso das instituições privadas, o crescimento é constante entre 2005 e
2008, possível resultado do ProUni, com perda de fôlego entre 2008 e
2009, com retomada a partir de 2010, induzida pelo FIES.
No ano de 2004 a taxa de escolarização bruta3 no Ensino Superior
era de 17,3% e a taxa de escolarização líquida era de apenas 10,3%

3 Taxa de escolarização bruta é o percentual de matrículas em função da


população entre 18 e 24 anos de idade. Taxa de escolarização líquida é o percentual de
jovens entre 18 e 24 anos de idade matriculados na Educação Superior em comparação
com a população da mesma faixa etária. Nos comparativos internacionais, a taxa de
escolarização líquida tem sido utilizada como indicador de inclusão.

140
(BRASIL/MEC/INEP, 2004), portanto muito aquém da meta do PNE de
2001, que impunha 30% de escolarização líquida até o final da década.
Este dado foi usado como argumento para a defesa da implementação do
ProUni, durante sua tramitação no Congresso Nacional no ano de 2004,
já que se considerava impossível atingir a meta sem o fomento à iniciativa
privada. No ano de 2012, a taxa de escolarização bruta subiu para 28,7%
e a taxa líquida para 15,1% (IBGE/PNAD, 2012 apud BRASIL/MEC/
INEP, 2012), o que mais uma vez sugere que as políticas de ampliação
do acesso ao Ensino Superior têm contribuído para a inclusão efetiva
dos mais jovens, egressos do Ensino Médio.

TABELA 1 – Estimativa de percentual de vagas ocupadas em


IES privadas por bolsistas ProUni
Número de bolsas Número de % de vagas
Número total
Ano concedidas no matrículas em ocupadas por
de bolsas*
ano IES Privadas bolsistas
2005 112.275 112.275 3.321.094 3,38%
2006 138.668 250.943 3.632.487 6,90%
2007 163.854 414.797 3.914.970 10,59%
2008 225.005 639.802 4.255.064 15,03%
2009 247.643 775.170 4.430.157 17,49%
2010 241.273 877.775 4.736.001 18,53%
2011 254.598 968.519 4.966.374 19,50%
2012 284.622 1.028.136 5.140.312 20,01%
2013 252.374 1.032.867 5.373.450 19,22%

Fonte: A autora (2014), a partir de dados do SISPROUNI/MEC; Censo da Educação


Superior 2005 – 2013, MEC/INEP.
* Este número é a soma das bolsas concedidas nos últimos quatro anos que é, em média,
a duração dos cursos de graduação. Não foram considerados, neste cálculo, a evasão e
os trancamentos.

No caso do ProUni, a falta de dados sobre os beneficiários


acaba por prejudicar a realização de análises mais refinadas. Contudo,

141
conforme demonstrado na Tabela acima, a proporção de vagas ocupadas
por bolsistas gira em torno de 20% do total daquelas oferecidas pelas
IES privadas. Cumpre lembrar que há uma variedade de instituições
privadas no que se refere à organização acadêmica (Universidades,
Centros Universitários, Faculdades Integradas, Faculdades Isoladas)
bem como ao perfil das mantenedoras (filantrópicas, comunitárias,
com fins lucrativos). Apenas as IES filantrópicas e sem fins lucrativos
é que são obrigadas, por lei, a aderir ao ProUni. As demais instituições
aderiram voluntariamente em troca de um pacote de isenções fiscais
(BRASIL, 2005).
Contando com 87% das instituições e 73% das matrículas, o setor
privado é prevalente no que se refere à oferta de Educação Superior
no país. O perfil é dessas instituições é, na sua maioria, composto por
pequenas faculdades, localizadas no interior, o que contrasta com a
realidade das instituições públicas – especialmente as federais – que
são majoritariamente Universidades localizadas nas capitais (BRASIL/
MEC/INEP, 2012).
Considerando a maior capilaridade das IES privadas, compreende-
se o fomento que o Estado brasileiro deu ao setor. Se, de um lado, há
a política de bolsas, que garantiu o acesso em regime de gratuidade
para a grande maioria dos beneficiados em IES privadas4, de outro, a
partir de 2010, com a nova formatação dada ao Fundo de Financiamento
Estudantil (FIES) há uma mudança profunda no financiamento das
IES privadas que têm nele uma ferramenta importante de garantia de
pagamento pelos serviços prestados.

4 À exceção do ano de 2008, em que as bolsas parciais (25% e 50%) têm a


mesma proporção das bolsas integrais, o ProUni tem priorizado a concessão de bolsas
integrais (MOREIRA, 2014).

142
TABELA 2 – Comparativo entre o número de contratos do
FIES e a ampliação do total de matrículas em IES
privada (2009 – 2013)

Taxa de crescimento Total de Taxa de crescimento


Total de
dos contratos em matrículas das matrículas em
Ano contratos
relação ao ano IES relação ao ano
FIES
anterior privadas anterior
2009 32.781 - 4.430.157 -
2010 75.603 130% 4.736.001 6,90%
2011 153.400 102% 4.966.374 4,86%
2012 433.885 182% 5.140.312 3,50%
2013 556.000 28% 5.373.450 4,53%
Fonte: a autora (2015), a partir de dados de HOPER EDUCAÇÃO (2014); Censo da
Educação Superior 2009 – 2013 (INEP/MEC).

Os dados constantes da Tabela 2 indicam que o Estado brasileiro


passou a atuar de maneira mais efetiva na concessão de crédito aos
estudantes do Ensino Superior. As taxas de crescimento de aditação de
novos contratos cresceu ano após ano de maneira muito superior à taxa
de crescimento das matrículas. Isso significa que o fomento estatal não
impulsionou uma ampliação do acesso, mas sim a transferência para o
Estado do risco da inadimplência do setor. Estudantes já matriculados
foram encorajados a requerer crédito subsidiado do FIES, bolsistas
ProUni com bolsas parciais foram também encorajados a financiar a
parte não coberta pela bolsa de sua mensalidade. O crédito era farto e
as condições, vantajosas.
A fartura de crédito pode ser apontada como um dos fatores
que tem levado o Ensino Superior privado brasileiro a um processo
de concentração de mercado concomitante a um processo de
internacionalização do capital. Pequenas IES têm sido adquiridas
por grupos financeiros (chamados de Empresas Consolidadoras ou

143
Grupos Consolidadores), interessados em retorno rápido e no mercado
em expansão. Para se ter ideia, segundo dados da consultoria Hoper
Educação (2014), em 2004 as vinte maiores empresas prestadoras de
serviços educacionais de nível superior concentravam 14% das matrículas
do setor privado. Em 2013, doze Grupos Consolidadores detiveram 40%
das matrículas das IES privadas, sendo que os dois maiores (Kroton e
Anhanguera) concentravam mais de um milhão de alunos.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decurso da década compreendida entre 2005 e 2014, a


questão do acesso ao Ensino Superior ingressou na agenda brasileira
de maneira irreversível. Isso representou uma mudança no perfil das
Instituições Federais de Ensino Superior, que passaram por um processo
de interiorização e ampliação de vagas (como resultado do REUNI),
diversificação da organização acadêmica (resultado da criação da
Rede de Educação Tecnológica) e inclusão de grupos sociais antes
alijados do acesso às IFES (resultado da política de cotas). Contudo, o
Estado atuou também como indutor da ampliação da rede privada de
Educação Superior, o que provocou sobretudo uma mudança no perfil
das mantenedoras das instituições e teve, como efeito, a concentração
do mercado.
Sem desconsiderar o significado da ampliação do acesso, o
contexto de crise econômica observado a partir de 2015 há de se impor
sobre as políticas para o Ensino Superior. Os cortes no orçamento da
União já têm resultados visíveis na restrição ao crédito via FIES, bem
como na contrição das verbas de custeio das Universidades Federais.
Este é um elemento forte a ser considerado porque compromete a meta
do PNE 2014, que é de elevar a taxa bruta de matrículas a 50% até

144
2024. Meta ousada, considerando que esta taxa era, em 2010, de apenas
28%. Contudo, na comparação com alguns países5, há muito ainda a
ser conquistado, sem descuidar do debate sobre o modelo de Educação
Superior que o país precisa e para qual projeto de Nação.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Plano Nacional de Educação, Lei n. 10.172, de 9 de janeiro de 2001.


Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/L10172.pdf>. Acesso
em: 02/11/2015.
_____. Plano Nacional de Educação, Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/
l13005.htm>. Acesso em: 02/11/2015.
_____. Projeto de Lei n. 3582/2004. Disponível em: <http://www.camara.gov.
br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=219649&filename=
PL+3582/2004>. Acesso em: 4/01/2014.
_____. Lei n. 11.096, de 13 de janeiro de 2005. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/L11096.htm>. Acesso em:
15/01/2014.
_____. Decreto n. 6.096, de 24 de abril de 2007. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6096.htm>. Acesso
em: 01/11/2015.
_____. Lei n. 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11892.htm>. Acesso em:
01/11/2015.
_____. Lei n. 12.202, de 14 de janeiro de 2010. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Lei/L12202.htm>. Acesso em:
31/10/2015.

5 A título de comparação, as taxas brutas de cobertura de matrículas (2010):


Chile 52%, França 56%, Reino Unido (59%), Uruguai 64%, Espanha 69%, EUA 82%
(HOPER EDUCAÇÃO, 2014).

145
_____. Lei n. 12.711, de 29 de agosto de 2012. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm>. Acesso em:
20/04/2013.
_____. MEC/INEP. Resumo técnico do Censo da Educação Superior: 2004 – 2012 (9
v.). Disponível em: <http://download.inep.gov.br/download/superior/2004/
censosuperior/Resumo_tecnico-Censo_2004.pdf>. Acesso em: 29/09/2014.
_____. MEC/INEP. Sinopse estatística do Censo da Educação Superior 2013.
Disponível em: < http://portal.inep.gov.br/superior-censosuperior-sinopse>.
Acesso em: 29/09/2014.
DURHAM, E.R. Educação superior, pública e privada (1808-2000). In:
BROCK, C.; SCHWARTZMAN, S. (Orgs.). Os desafios da educação no Brasil. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. p.197- 240.
FERES JUNIOR, J. et al. O impacto da Lei no 12.711 sobre as universidades
federais. Levantamento das políticas de ação afirmativa (GEMAA), IESP-UERJ, set.
2013, p. 1-34.
HOPER EDUCAÇÃO. Cenário mercadológico brasileiro da graduação privada –
EaD. [s.l.]: 2014. Disponível em: <http://www.abed.org.br/congresso2014/
arquivos/APE50_cenario_mercadologico_brasileiro_graduacao_privada_ead.
pdf> Acesso em: 31/10/2015.
SCHWARCZ, L.M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão
racial no Brasil (1870-1930). São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
OCDE. Brasil – Country Note – Panorama sobre a Educação 2013: Indicadores
OCDE. Disponível em: http://www.oecd.org/edu/Brazil_EAG2013%20
Country%20Note%20(PORT).pdf Acesso em: 07/01/2014.
OLIVEIRA, R. P. de. O direito à educação. In: _____.; ADRIÃO, T. (Orgs.).
Gestão, financiamento e direito à educação: análise da Constituição Federal e da
LDB. 3.ed. revista e ampliada. São Paulo: Xamã, 2007.
MOREIRA, C.R.B.S. Políticas de acesso ao Ensino Superior no Brasil: uma questão
de Direito? Trabalho apresentado no III Seminário Regional Sul da ANPAE.
Curitiba, 2014.
_____. Programa Universidade para Todos (ProUni): democratização do acesso ao
Ensino Superior? Relatório de pesquisa apresentado ao Seminário de Tese
em Políticas Educacionais do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2014.

146
Las formas y relaciones de trabajo en Cuba

MSc. Luisa Fajardo Nápoles1


MSc. Dagoberto Figueras Matos2
MSc. Idalsis Fabré Machado3

1. Introducción

Cuando la literatura especializada trata las formas de trabajo,


aparecen diversas interpretaciones alrededor de una temática, que se

1 Licenciada en Economía Política, Máster en Desarrollo Comunitario,


profesora asitente de la Universidad Central “Marta Abreu” de la Las Villas (UCLV),
Cuba, del Departamento de Sociología de la Facultad de Ciencias Sociales. Con
experiencia en el área de Economía Política, en estudios de Cooperativismo y Desarrollo
Local. Participa en la ejecución de proyectos de desarrollo local y territorial, E-mail:
luisa@uclv.edu.cu
2 Licenciado en Historia, Máster en Desarrollo Comunitario, profesor asistente
de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV), Cuba, del Departamento
de Sociología de la Facultad de Ciencias Sociales. Con experiencia en el área de Economía
Política, en estudios de Cooperativismo y Desarrollo Local. Participa en la ejecución de
proyectos de desarrollo local y territorial. E-mail: dagoberto@uclv.edu.cu
3 Licenciada en Sociología por la Universidad Central “Marta Abreu” de Las
Villas (UCLV), Cuba (2008), Máster en Desarrollo Social del Programa FLACSO –
CUBA, Universidad de La Habana (2013). Profesora de Sociología en la UCLV.
Profesora-Investigadora del Centro de Estudios Comunitarios (CEC) de la UCLV.

147
presenta sencilla en un primer momento, pero que se complejiza luego
cuando se analiza cada uno de los ámbitos donde se realiza el trabajo, por
los entrelazamientos que se dan entre ambos ámbitos, y la diversidad en
las fuentes de trabajo. La imposibilidad de abarcar las diversas formas
de trabajo con la profundidad que requerirían, es el principal obstáculo
al emprender un tema novedoso y al mismo tiempo tratado de manera
fragmentada por disímiles enfoques y disciplinas. De esta manera es que
se decide irrumpir en las formas del trabajo, atendiendo a las relaciones
sociales en que este se inserta, es decir, dentro y fuera del empleo.
Es un desafío al poder de síntesis, revelar mediante un recorrido
por varias décadas del proceso revolucionario cubano, el lugar e
importancia que se le confiere a al empleo en la política social del país,
los resultados positivos alcanzados, y las incongruencias que en algunos
momentos surgieron por la falta de concordancia de la política económica
y la política social; hasta llegar al contexto actual de transformaciones
que contiene aspectos que en décadas anteriores se consideraban
inamovibles. De ahí, la importancia que desde la perspectiva histórica
se realicen adecuadas precisiones y justas valoraciones de cada período,
sin los cuales pudieran aflorar interpretaciones sesgadas, parciales,
poco explícitas de la necesidad y el sentido de las transformaciones que
acontecen en el país.

2. Apuntes sobre el trabajo y las relaciones sociales del


empleo

El empleo es la forma de trabajo más fácil de entender, y uno de


los indicadores fundamentales que indica la situación económica, social,
y política de un territorio o de un país. El nivel y grado de empleo de
las mujeres y hombres expresa la disposición y el aprovechamiento del

148
factor más importante de las fuerzas productivas de la sociedad: el hombre.
El empleo se concibe cuando un trabajador o (a) un (empleado (a))
ofrece al empleador su fuerza de trabajo mediante un contrato., es decir
las energías físicas y mentales que posee a cambio de una remuneración
(salario, sueldo). 4, Marx concibe la capacidad o fuerza de trabajo como
“el conjunto de las condiciones físicas y espirituales que se dan en la
corporeidad, en la personalidad viviente de un hombre y que éste pone
en acción al producir valores de uso de cualquier clase” (Marx, 1973).
El nivel del salario, las condiciones en que se realiza el trabajo, las
oportunidades de promoción en los puestos de trabajo, de capacitación, y
el nivel de cobertura de protección y seguridad de los trabajadores (salud,
seguridad social, entre otros), depende del sistema socioeconómico
imperante en el país, del desarrollo económico y social que posea, y la
organización y fuerza del movimiento obrero5. De igual manera influye
la dimensión y el poder económico de las empresas empleadoras, y el
tipo de contrato convenido entre empleado/empleador.

4 Puede ser gratificado de manera adicional mediante el otorgamiento de un


pago monetario especial (plus, primas, premios), y recibir obsequios y otros beneficios
asociados a la competencia laboral, es decir, por el resultado del trabajo,
5 A principios del siglo XIX, antes de que se desarrollase el sistema industrial,
los salarios y la jornada laboral se acordaban mediante negociaciones directas entre
los empresarios y cada trabajador. La legislación, la opinión pública y la situación
económica no favorecían ni siquiera el nacimiento de organizaciones de trabajadores.
Debido a que el poder negociador estaba del lado de los empresarios se produjeron
multitud de abusos, por lo que, a pesar de las condiciones desfavorables, los trabajadores
se asociaron y crearon sindicatos para exigir mejores condiciones laborales, acudiendo
para ello a la huelga o a cualquier otro tipo de acción que les permitiera alcanzar
sus objetivos. Un instrumento clave fue la aparición de la negociación colectiva, que
consolidó la posición como fuerza social de los trabajadores, que consiguieron imponer
acuerdos logrados mediante este tipo de negociación. Además, se desarrollaron tres
tipos de legislaciones que garantizaban una mejor resolución de la conflictividad
laboral: la legislación de la seguridad en el trabajo, de las relaciones laborales y de las
condiciones que regirían la negociación colectiva entre empresarios y trabajadores

149
Por ser uno de los elementos esenciales de la relación de trabajo,
es imprescindible definir las relaciones laborales, cuyos elementos no
existen de manera aislada, sino que en conjunto forman un sistema
en que sus componentes están interrelacionados. El sociólogo cubano
Euclides Catà Guilarte señala que en el plano teórico nacional e
internacional se entiende por relaciones laborales, “como aquellas que
se establecen entre el sindicato, los trabajadores, gerentes, y entidades
laborales en las que el Estado, y las entidades que lo forman regulan el
empleo a través de diversas leyes, decretos, normativas, orientadas a la
sociedad y a las esferas parciales (sectores productivo y de servicios)”.
(Cata E., 2004).
En la economía formal son las organizaciones empresariales las
que demandan mayor número de empleos, y constituyen las fábricas,
empresas u otras entidades un importante ámbito de socialización para
el individuo. Al integrarse a la vida laboral, surge ante el empleado, un
nuevo referente social donde se ponen de manifiesto nuevas pautas,
costumbres, comportamientos y se promueven y trasmiten valores.
A través del desarrollo de la ciencia, se introducen en la
producción y los servicios nuevas tecnologías, y se crean empleos que
exigen mayor nivel de conocimientos y habilidades, lo que no descarta
las formas de empleos habituales en ramas tradicionales que ocupan a
trabajadores de poca calificación a cambio de bajas remuneraciones.6 En
los países de menor desarrollo, en correspondencia con las insuficiencias

6 En general, las empresas que utilizan tecnologías más avanzadas establecen


diversas formas de contrato empleado/empleador. La contratación fija, convenio por
tiempo determinado, el empleo a tiempo parcial, el empleo temporal, el convenio por
obra, la subcontratación, y otras en la que puede estar presente, el empleo asalariado
no declarado. Algunas de estas formas se introducen con eficiencia en el creciente
sector de los servicios, en los que se establecen las condiciones propicias para que los
profesionales que poseen amplios conocimientos, aptitudes y habilidades ejecuten con
eficiencia el trabajo calificado. Las posibilidades de utilizar las tecnologías de avanzada
en el sector de los servicios en países de menor desarrollo, son muy reducidas.

150
de la estructura productiva e infraestructura, predominan los empleos u
ocupaciones que requieren menor intensidad de conocimientos.
En relación al empleo de hombres y mujeres, todavía está presente
en países de diversos niveles de desarrollo la segmentación sexual del
trabajo, tampoco se ha podido suprimir las prácticas discriminatorias
de que son objeto las mujeres, que junto a los jóvenes – sobre todo las
mujeres jóvenes-, son los más frágiles en el mercado de trabajo. Vale decir
sin embargo, que si se analiza en el tiempo, internacionalmente se ha ido
dando una mayor presencia femenina en el empleo, aunque continúa
reinando las desigualdades en las remuneraciones de las mujeres con
respecto a los hombres por igual trabajo aportado.
Aunque cada uno con sus particularidades, en los países
de diferentes niveles de desarrollo económico, existe también el
autoempleo o trabajo por cuenta propia, considerado un componente
del sector informal, una actividad privada, que tiene por titular una
persona o un colectivo, según la forma básica que adopte, siendo el
titular o la directiva del grupo quien responda por las obligaciones
y los riesgos económicos. La primera de estas formas se visualiza
especialmente en algunos oficios y profesiones- editores, diseñadores,
contables, asesores financieros, artesanos, etc que realizan un
trabajo autónomo o con una porción pequeña de ayuda familiar o de
contratados; y la segunda, el trabajador puede ser miembro de una
organización como lo es una cooperativa de producción, de trabajo, o
cualquier otra sociedad laboral con derecho pleno a participar en sus
beneficios y en la toma de las decisiones.7 En realidad, hay diversas
tipologías del trabajo por cuenta propia, desde el trabajo autónomo,
personal, hasta la presencia de unidades económicas que funcionan a
pequeña o mediana escala, pero que por las ganancias que ingresan son
consideradas microempresas.

7 Véase en “Sector Privado Individual cuentapropista, Enfoque y Perspectiva en Villa


Clara” comp Figueras D, Muñoz R. pág. 29

151
3. El trabajo fuera del empleo

Para entender el trabajo hay que tener en cuenta las relaciones


sociales en que se inscriben.8 El trabajo doméstico es una de las formas
de trabajo fuera del empleo más visible, aunque en muchos casos se trate
de manera simple como un agregado de otras investigaciones (género,
familia, empoderamiento de las mujeres etc.). El trabajo doméstico,
denominado también trabajo productivo doméstico, es aquel que se
realiza en el ámbito del hogar mediante labores específicas cuya finalidad
es la reproducción individual y social, y contempla una amplia gama de
labores y obligaciones del hogar (la elaboración de alimentos para la
familia, la limpieza y cuidado del vestuario y calzado, la limpieza del
hogar y de los medios en que se transportan sus miembros, la gestión y el
suministro de los productos de la canasta básica, etc), y las transacciones
para de pago de producciones y servicios recibidos. 9 Es perceptible en
el hogar, la división sexual del trabajo en lo concerniente a la gestión,
organización, dirección, y control de las actividades que se prestan o se
realizan con fines de la reproducción individual y social en el ámbito
doméstico. Por lo general, se mantienen los esquemas patriarcales
que recargan de tareas a las mujeres en los distintos tipos de familias
(nucleares y extendidas).
Cabe resaltar también como formas de trabajo fuera del empleo, el
que se realiza mediante relaciones interpersonales y la participación en
las organizaciones de vecinos, comunitarias. Son trabajos de solidaridad
social y voluntarios, el primero, son acciones solidarias de ayuda a

8 Véase en “Nuevas formas de Enfocar el trabajo “de Phal R.E en Sociología y


Política Social del Trabajo. Selección de Lecturas. Comp. Euclides Catà Guilarte, pàg77
9 En el ámbito doméstico se efectúan servicios de gran importancia social, y
es la atención a los ancianos, a los discapacitados, y el acompañamiento que requieren
estos para asistir a instituciones de salud, religiosas, e incluye el acompañamiento a la
escuela de los hijos menores y la ejecución de sus deberes escolares.

152
vecinos, colegas, que antes situaciones similares puede ser recompensado
de la misma manera, el segundo, es más anónimo, no está basado en
obligaciones de interacción interpersonal ni asociado a ningún tipo de
recompensa recíproca. Ambas formas son igualmente de gran valía por
lo que ellas tributan en el bien y el valor social.
Tanto el trabajo con fines de la reproducción, de solidaridad
social y el trabajo voluntario puede ser realizado por trabajadoras (es)
asalariadas (os), por lo que se plantea que estos tienen una doble y
hasta triple jornada de trabajo. El hecho de que el trabajo doméstico lo
realicen las denominadas “amas de casas” u hombres que residen solos
en el hogar, no cambia para nada el beneficio social de este trabajo.
Internacionalmente se reconoce que son las mujeres las que
realizan la mayor carga del trabajo doméstico. Aun cuando se registre
la creciente concurrencia de las mujeres al mercado de trabajo, son
múltiples los factores que inducen a que la población femenina
apta para el trabajo, posea calificación o no, busque ocuparse en la
economía formal o informal frente a la carestía de la vida cotidiana, y las
posibilidades de contribuir a sufragar parte de los gastos del hogar. El
creciente apoyo público o privado para el cuidado de niños y ancianos
en instalaciones creadas al efecto en las ciudades (guarderías, círculos
infantiles, seminternados e internados, hogares de ancianos), y la
existencia de establecimientos de comidas rápidas, y otros proveedores
de importantes servicios, atenúan la carga de trabajo doméstico y
favorecen la incorporación de las mujeres a un empleo.10

10 Se debe distinguir el trabajo doméstico en el hogar, con el trabajo doméstico

pagado que es una modalidad de empleo asalariado. Hay otros elementos que se
aprecian especialmente en los países desarrollados y es la extensión de la edad fértil
de la mujer y la tardanza en formar un hogar y decidir tener hijos. El empleo doméstico
pagado, bastante generalizado en algunos países es en fin de cuentas trabajo asalariado
y no el trabajo doméstico al que se hace referencia en el epígrafe

153
4. El trabajo dentro y fuera del empleo en Cuba

Cuando la Revolución toma el poder político (1ro de enero de


1959), una de las principales prioridades del gobierno revolucionario
fue enfrentar el fenómeno social del desempleo en sus distintas formas,
entre ellas el llamado “tiempo muerto” asociado al carácter estacional
de la producción cañero azucarera del país.11. En los dos primeros años
después del triunfo revolucionario, el empleo aumentó con bastante
celeridad dada la alta demanda de trabajadores para las nuevas
industrias, y la construcción de la infraestructura que reclamaba el el
proceso de desarrollo iniciado. 12. La promulgación de las leyes agrarias
y la extensión de los servicios básicos, sobretodo de educación y salud
pública, fueron puntales en el aumento de la oferta de empleos., y a la que
este aumentaba, se daban pasos graduales en la elevación de los salarios13
En el segundo quinquenio de los años setenta, se da inicio al
proceso de institucionalización del país, a través del cual se dota a la
Revolución de una base sólida, y de instituciones eficaces y perdurables.
Con la aprobación y establecimiento de la nueva Constitución de la
República de Cuba en febrero de 197614 quedaba atrás la estructura
provisional mantenida durante los primeros años de la Revolución.

11 En enero de 1959 la Revolución encontró 700 mil desempleados de una


población de 6 millones 700 mil habitantes. El 45% de los desempleados eran de las
áreas rurales, aunque en las ciudades y poblados aumentaban los barrios marginales
a cuenta de la población rural que migraba a las ciudades y pueblos, disputándose los
pocos trabajos con la población urbana.
12 Así lo confirma la primera estrategia de desarrollo (1961-1964).
13 En el Informe Central al Primer Congreso del Partido se plantea que de 1959
a 1974 se habían creado 1 millón 400 mil nuevos empleos. Se fueron también elevando
los salarios a los trabajadores más vulnerables.
14 Luego de una amplia discusión del pueblo, se aprobó y puso en vigencia a
partir del 24 de febrero de 1976.

154
Entre los derechos, deberes y garantías fundamentales contenidos
en la nueva Constitución se plantea, que el trabajo en la sociedad socialista es
un derecho, un deber y un motivo de honor para cada ciudadano (Cap. VII, artículo
45)15 La prioridad que se le dio al empleo desde los primeros años del
proceso revolucionario, con la nueva Constitución quedaba refrendado
como un derecho. Por otro lado, en correspondencia con la igualdad de
todos los ciudadanos, expresados en el artículo 42 de la Constitución
(Cap. VI), irían desapareciendo las expresiones discriminatorias por
raza, color de la piel, sexo, origen nacional, creencias religiosas y
cualquier otra lesivas a la dignidad humana. La igualdad para alcanzar
un empleo no sería la excepción
Puede afirmarse, que en las dos primeras décadas de la Revolución
el comportamiento del empleo u ocupación muestra resultados positivos.
El número de personas aptas para el trabajo que pudieron ocuparse en
la esfera de la producción o de los servicios, influyó en el crecimiento
económico del país, y en los ingresos de las familias, ambos necesarios
para disminuir las inequidades y desigualdades heredadas del pasado.
Sin embargo, la insuficiente atención a los vínculos entre la política
social y la política económica y a la influencia entre ambas políticas y sus
objetivos, dio lugar a que los recursos disponibles para la producción y
los servicios no se utilizaran con la eficiencia posible.16 17

15 En otros de sus artículos se establece el derecho de la mujer en la


igualdad de retribución del trabajo, y en la igualdad civil, política, social y en el seno
de la familia, a las vacaciones retribuidas de maternidad, y el derecho de todos los
trabajadores a recibir la protección de la seguridad social en la vejez, en la enfermedad
o en los accidentes.
16 Véase en el Informe Central al Ier. Congreso del Partido Comunista de
Cuba`, la parte errores cometidos en. En particular los errores en relación a los sistemas
de dirección económica establecidos.
17 Ello, puede ser viable temporalmente, y siempre y cuando se despliegue un
fuerte proceso inversionista generador de nuevos empleos como en las primeras dos

155
Desde el primer quinquenio de los años ochenta, comienza a
vislumbrarse elementos germinales de desproporciones económicas
y desequilibrios financieros así como comportamientos no deseados
en la esfera laboral. En ese período el crecimiento de la economía del
país es de un 8% como también crecen la productividad del trabajo, las
remuneraciones, y la ocupación. Esta última crece vertiginosamente18
mediante el pleno empleo garantizado por la vía estatal, con pretensiones
de evitar el desempleo ante la llegada a la edad laboral de los nacidos
en la década del sesenta, en que hubo una real “explosión demográfica”
A pesar del crecimiento económico, se podía apreciar que la diferencia
entre el ritmo de crecimiento anual de la productividad del trabajo y, de
los salarios era poco significativa correlación entre estos últimos daba
señales de ineficiencia en el uso de la fuerza de trabajo.
El cambio de estructura de la ocupación que favorecía en el
quinquenio anterior a las actividades de servicios, privilegió ahora las
actividades del sector productivo, en especial a la agricultura. Este
cambio de estructura influyó en la disminución en un 15% de mujeres
incorporadas a nuevos empleos, y las actividades por cuenta propia
que pudieran haber servido como alternativa de empleo no fueron
suficientemente vigorizadas.

décadas de la Revolución., pero, resulta contraproducente si no está acompañado de


políticas de inversiones que conduzcan a altos niveles de eficiencia, y no se distinga
convenientemente el pleno empleo, del empleo total..
18 Entre 1981 y 1985, el incremento promedio anual del PIB fue elevado (8.2%),
el incremento medio anual de la productividad del trabajo apenas rebasó en un 0,2%
al incremento medio anual de las remuneraciones medias y el incremento medio anual
de la de la ocupación fue solo un 0.9% inferior al de la productividad del trabajo, por lo
que en parte el crecimiento del PIB se debió también a la mayor ocupación. Una de las
consecuencias de la ineficiencia productiva, fueron los incumplimientos de importantes
rubros exportables, y en un aumento de la dependencia de algunos sectores de los
suministros externos.

156
En el quinquenio 86-90 algunos comportamientos negativos en
el ámbito laboral, fueron más visibles. La indisciplina laboral en sus
diversas manifestaciones, además de las fluctuaciones de trabajadores,
mostraba la desmotivación por el trabajo. La etapa denominada
proceso de rectificación de errores y tendencias negativas, iniciado en Cuba
partir del año 1986, intentó recuperar la moral de trabajo, suprimir las
“plantillas infladas” y erradicar otras situaciones ilegales que habían
ido proliferando en las empresas estatales. Más allá de las conductas
indeseadas no acordes con el sistema socioeconómico que se construía,
el modelo económico vigente daba señales de agotamiento.
El año 1989, se establece a través de la Resolución 51 cuestiones
centrales de las relaciones laborales en el país. Aun cuando se omitían
importantes relaciones de trabajo que tenían lugar en la sociedad cubana
como el trabajo por cuenta propia o autoempleo, era imprescindible
rescatar la centralidad del trabajo, y ofrecerle mayor jerarquía a los
ingresos cuya fuente principal fuera la cantidad y calidad del trabajo
aportado.19

5. Los complejos años 90

El derrumbe del campo socialista, ocasionó un abrupto descenso


de los principales indicadores económicos del país, sirva de ejemplo la
fuerte caída del producto interno bruto (PIB) que descendió en un 35%
en relación a 1989, y la contracción de las importaciones en un 75%. Este
significativo descenso afectó en poco tiempo a todas las esferas de la
sociedad cubana (económica, social, política), en particular, a la esfera
económica por la alta dependencia de los vínculos externos. Si bien el

19 Véase a Ángela Ferriol y Alfredo González en “El empleo en Cuba, 1986-1990 en


“Cuba, Crisis y Ajuste. Situación Social 1990-1996”.pag 27.

157
derrumbe del llamado “socialismo real” en los país del entonces campo
socialista fue el detonante de la irrupción de la crisis, otros factores
(externos e internos) influían en la situación económica existente y en
las posibilidades de una salida de la crisis.
En el plano externo, se le añadía a las graves afectaciones por lo
acontecido en el campo socialista, los estragos del bloqueo económico,
comercial, financiero, impuesto por los Estados Unidos de Norteamérica
a Cuba, y su recrudecimiento con su alto costo económico y social. El
bloqueo económico, constituyó – y constituye en la actualidad 20-, un
obstáculo notorio para iniciar un proceso de recuperación económica y
continuar paulatinamente el desarrollo previsto
En lo interno, las desproporciones y desequilibrios económicos,
las insuficiencias en el uso de los factores de la producción (material y
humano), el déficit presupuestario, y la escasez de divisas convertibles
eran las características que matizaban el contexto existente. En ese
escenario se debía decidir un derrotero factible para la recuperación
económica, que evitara las medidas de “choque” que pusieran en peligro
la protección de los trabajadores, y las conquistas sociales que obraban a
favor de la homogenización social y la equidad en la sociedad cubana.21
Emprender los ajustes en la economía y a la vez garantizar
las conquistas sociales, era un proceso difícil, pero que no admitía
postergarse en el tiempo. Se inicia el período de ajustes a partir de
1993, con la adopción y establecimiento de medidas estructurales,
organizativas, y funcionales que indicaba que se trataba de una reforma

20 Se calcula, según cifras muy convencionales, que el costo económico del


bloqueo es en la actualidad es de aproximadamente de 830 733 mil, millones de dólares.
21 Un aumento leve del ritmo de salario por encima del ritmo de crecimiento
de la productividad del trabajo que tuvo una caída (2,4%) promedio anual; la no
correspondencia del pago del trabajo de los resultados laborales; el crecimiento
desproporcionado de la ocupación en el sector no productivo.

158
económica desplegada en el contexto del periodo especial22, en la cual se
colocaba a la eficiencia en el centro de la política económica. Era una
necesidad imperiosa la adaptación del modelo económico cubano a la
realidad nacional e internacional, pero, si complejo resultaba insertarse
en el mercado internacional, no menos lo era emprender el saneamiento
de las finanzas internas y recaudar divisas para resolver el déficit de la
liquidez monetaria internacional.
En lo concerniente al camino seleccionado, en el período 1993-
1996 se adoptan medidas para acrecentar un mayor número y diversidad
de formas de propiedad y de gestión no estatales. Mediante la apertura
de la inversión extranjera surgen las empresas mixtas; se crean Unidades
Básicas de Producción Cooperativas (UBPC) en las hasta entonces
empresas agropecuarias estatales y se amplía el trabajo por cuenta
propia, este último persiguiendo dos objetivos, aumentar la oferta de
bienes de consumo y servicios destinados a la población, y una alternativa
viable de empleo para el alto número de subempleados y trabajadores
disponibles sin posibilidades de ser reubicados por el Estado.
Cabe subrayar que, el mantenimiento del pleno empleo por la
vía estatal,23no había ofrecido hasta entonces, suficiente espacio al
autoempleo o trabajo por cuenta propia. Según estudiosos del sector
informal y sus etapas en Cuba, si bien el trabajo por cuenta propia en
décadas anteriores no fue suprimido, la política del Estado orientada al
sector informal, y al trabajo por cuenta propia en particular, hizo que
su desenvolvimiento tuviera un carácter cíclico, moviéndose entre los
estrechos marcos de la restricción y la tolerancia.24

22 Período Especial en Tiempo de Paz.


23 Empleaba a más del 90% de los ocupados.
24 Véase a Chassagnes Oscar y Ana Domínguez en “El sector informal en Cuba
en El Sector Mixto en la Reforma Económica Cubana.

159
No es posible pasar por alto tampoco el surgimiento del sector
emergente a lo largo de los años noventa, sector que serviría de motor
para el desarrollo y dinamizador de los demás sectores de la economía.
El sector emergente, en que se ubica el turismo por ejemplo, tuvo una
inmediata atracción para el empleo de la población en especial la más
joven y calificada, por las mejores condiciones de trabajo que ofrecía y
las posibilidades de obtener parte de las remuneraciones en moneda
libremente convertible con el estímulo adicional de la tasa de cambio
reinante. ,,25 En la agricultura, las construcciones, las industrias, y otros
sectores estatales tradicionales no era posible ofrecer tales condiciones
ni medios.
En materia de política fiscal y monetaria se realizaron acciones
para disminuir el déficit del Presupuesto y sanear las finanzas
internas. La despenalización de la tenencia de divisas, la autorización
a las remesas desde el exterior, el incremento de visitas familiares de
cubanos al extranjero, fueron claves para el ingreso de divisas al país
y la recaudación mediante la venta de bienes y servicios en las tiendas,
creadas al efecto, para la recaudación de divisas (TRD). Las posibilidades
ofrecidas con esas medidas, diversificó la entrada de los ingresos de las
familias, a lo que se unía la existencia de un grupo de personas asociadas
al mercado sumergido que concentraba en sus manos la porción mayoritaria
de la liquidez monetaria en manos de la población.26 Las afectaciones
a la homogeneidad social y equidad fueron apreciables, no obstante
mantenerse los servicios básicos gratuitos (educación, salud) y la amplia
cobertura de la seguridad social cubana.

25 La dualidad monetaria sigue siendo un problema a resolver en los momentos


actuales, aunque gradualmente se han introducido cambios que posibilita el uso de
ambas monedas, sin embargo la base es la tasa de cambio vigente.
26 La liquidez llegó a estar por encima de los 11 mil millones de pesos.

160
En la primera década del presente siglo XXI se trató de recuperar
la centralidad del Estado como principal agente empleador y garante
de la protección de los trabajadores en ese ámbito. En ese periodo la
política del empleo fue dirigida al tratamiento legal de los trabajadores
disponibles, buscar programas de empleo territoriales, ampliación de
opciones de empleo en los servicios sociales, se establece el estudio como
empleo, el pleno empleo para discapacitados apto para el trabajo, entre
otros (Echevarría D. 2014). Lo antes referido no en todos los caso tuvo
el efecto deseado, como es el estudio como empleo, muy extendido en
el contexto del redimensionamiento de las industrias, y en particular,
la Restructuración de la Industria Azucarera.27
A partir del año 2007 se inicia el proceso de actualización
del modelo económico y social cubano que modifica las formas de
propiedad, gestión y el empleo. En las nuevas condiciones se emprende
el redimensionamiento del empleo estatal, del que debían salir alrededor
de1.5 millones de personas ocupadas, las cuales debían ser asumidas por
otras formas de empresas no estatales u optar por el autoempleo, cada
una siguiendo las reglamentaciones legales establecidas.
Empero, en los últimos años para la actualización del modelo
económico cubano, y con la aprobación e implementación paulatina de
los Lineamientos Económicos y Sociales se reconoce y promueve además
de la empresa estatal socialista como forma principal en la economía
nacional, otras formas de gestión y diversidad de actores sociales,
además de la planificación que sigue siendo el método fundamental de
conducción de la economía.28

27 El desmontaje de un número importante de centrales azucareros del país,


estableció para proteger a los trabajadores afectados varias alternativas, que incluía la
jubilación anticipada, la baja voluntaria, ubicación en otros empleos, y el estudio como
empleo Esta última, era una salida a corto plazo con implicaciones a mediano plazo.
28 Véase en la Gaceta Oficial de la República de Cuba, del 17 de junio del
año 2014.

161
En relación a las amplias posibilidades de la contratación de
trabajadores por entidades no estatales, un ejemplo lo constituyen
son las cooperativas agrícolas en sus diversas formas (UBPC, CPA,
CCS) que pueden contratar trabajadores, muchos de ellos por períodos
temporales, en todos estos casos se paga un impuesto por la utilización
de la fuerza de trabajo además del correspondiente pago a la seguridad
social. Mientras que las cooperativas no agropecuarias (CNA) pueden
contratar trabajadores por un período máximo de tres meses, llegado
este tiempo el trabajador contratado se incorpora como miembro de la
cooperativa, o cesa el período de contratación.
Para el trabajo por cuenta propia y las posibilidades de
contratación de trabajadores existen dos regímenes el general, y el
simple, el primero se aplica para los titulares que tienen ingresos
más elevados (paladares, hostales, carpinteros etc.), en el que no se
establece límites en el número de trabajadores a contratar, y hasta
cinco empleados no paga impuesto por la utilización de la fuerza de
trabajo, aunque sí deben pagar la contribución a la seguridad social.
En el simple que son los de menos ingresos, se realiza el trabajo por
lo general con un ayudante o miembros de la familia y se contribuye
solamente a la seguridad social. De acuerdo con la resolución 353/2013,
todas las actividades de trabajo por cuenta propia autorizadas (181)
pueden contratar a trabajadores, aunque se establece la prohibición de
contratación o el empleo a personas que no alcancen la mayoría de edad,
incluso constituye un delito hacerlo.29

29 Todo este proceso enriquece y complejiza aún más el análisis sobre el


mundo del trabajo en la sociedad cubana, pues incluso hasta formas tradicionales
de trabajo doméstico se ofrecen como servicios remunerados, pero al mismo tiempo,
no se encuadran en las clásicas o típicas manifestaciones del llamado autoempleo ni
pueden clasificarse de acuerdo a los estándares de las actividades tipificadas en el
cuentapropismo.

162
El nuevo Código de Trabajo 30 que tuvo un amplio proceso
de consulta con los trabajadores, en asambleas dirigidas por las
organizaciones sindicales, fue aprobado en diciembre del 2013 en la
Asamblea Nacional del Poder Popular. Dicho Código, consolida y
perfecciona las regulaciones que garantizan la protección de los derechos
y el cumplimiento de los deberes derivados de la relación jurídico-laboral
establecidas entre los trabajadores y empleadores, y deja expuesto el
reconocimiento y respaldo de las garantías jurídicas de los derechos y
deberes tanto de unos como de otros, atemperados a los cambios que se
comenzó a operar en la economía nacional.
Con el fin de elevar la eficiencia en el trabajo, en el Código de
Trabajo se plantea el principio de idoneidad demostrada para determinar
la persona que se pretende contratar, su permanencia en el cargo,
promoción en el trabajo y capacitación por parte de la entidad, siguiendo
una serie de principios que aparecen en el documento. A las relaciones
de trabajo especiales se le dedica un capítulo (VII), distinguiendo
las relaciones entre personas naturales, y otras relaciones de trabajo
específicas para especialistas y técnicos de algunos sectores y ramas.
(Medicina, rama artística, entre otras).
Conviene resaltar que atemperada a la nueva realidad de cambios
que vive el país, y la búsqueda continua de acrecentar la eficiencia en
el uso de los recursos de que dispone, y en el ámbito laboral una mayor
correspondencia del trabajo aportado con los ingresos provenientes de él,
se establece mediante la Resoluciòn17/2014 cambios en la política salarial,
al vincular el salario a los resultados del trabajo, sin que se determine un
máximo de salario, con algunas excepciones por razones económicas del
comportamiento de los indicadores de la empresa empleadora.

30 En las asambleas sindicales los trabajadores expresaron importantes


modificaciones a la versión original, reflejado en la norma vigente actual en aplicación.

163
6. Una breve mirada al trabajo en el ámbito doméstico en
Cuba

La diversidad y el volumen de labores que se realizan en los


hogares cubanos, es de gran beneficio para la familia y la sociedad.
En Cuba existe a pesar de la aprobación del Código de Familia en
1975, patrones culturales patriarcales que hacen que recaiga todavía
en las mujeres el peso del trabajo doméstico. Si bien la denominada
revolución energética y la extensión en el país de la adquisición y uso de
efectos electrodomésticos durante este año, es un importante paliativo
a la llamada “doble jornada de trabajo”, en particular para las mujeres,
ellas siguen teniendo el mayor peso de los quehaceres del hogar y las
responsabilidades con los miembros de la familia.
Aun cuando en el 201431 el 37,2 de los ocupados del país son
mujeres, el 58.1 % de las mujeres son graduadas universitarias, y el
63.3· trabajan como profesionales y técnicas, muchas de ellas con
responsabilidades en la esfera científica y en cargos de dirección,
expresiones de lo que se ha avanzado que en el empoderamiento
e igualdad de género en el país, por lo regular las mujeres asumen
las principales labores del hogar, que incluye la atención a los
discapacitados, a menores, y a los ancianos. Por una parte, como se
hacía referencia anteriormente, persisten los patrones patriarcales y la
segmentación sexual del trabajo en el ámbito de muchos hogares es un
hecho, y por otra, muchas mujeres no desean perder el poder que tienen
en la dirección, organización, y control de los quehaceres del hogar.
En el año 2014 la situación económica en Cuba, y en particular
del empleo y el salario, muestran señales alentadores, sin embargo, hay

31 Tomado de la UNEI, de la Oficina Nacional de Estadística e Información el


Panorama de la Economía Cubana en el 2014.

164
retos como el envejecimiento de la población, y el aumento de la relación
de dependencia al que se le està dando atenciòn pero no lo suficiente
todavìa. El envejecimiento de la poblaciòn influye en àmbito laboral y
en el àmbito domèstico, este ùltimo, por las caracterìsticas actuales y
las insufificiencias de la infraestructura para enfrentar la situaciòn que
tiende a crecer. En el año 2014 las personas de 60 años o más era el 19%
de la población cubana ello indica la necesidad de diseñar políticas
que se correspondan con esa realidad, o se afectará la ocupación de las
mujeres que por lo general son las que asumen la responsabilidad de los
adultos mayores. La baja tasa de natalidad, y la migraciones de jòvenes
en grupos de edades propicia para la reproducción no deja de ser un
problema en los años venideros en lo que a reemplazo de trabjadores
se refiere.

7. Conclusiones

La relaciones sociales en que se inserta las diversas formas de


trabajo, resulta imprescindible para comprender, los disímiles matices
de cada una de sus manifestaciones desde la realidad concreta de
distintos países. El nivel de desarrollo económico alcanzado por un
país, constituye el soporte material del nivel y grado en que se emplee
la población apta para el trabajo en edad laboral, y al mismo tiempo
es imprescindible para a la creación de la infraestructura económica y
social, y el condicionamiento material que mitigue los rigores del trabajo
en el ámbito doméstico. Sin embargo, no es suficiente con poseer la base
material en ambos casos, si se carece de políticas sociales y económicas
efectivas, orientadas hacia la consecución de tales propósitos.
La relación de trabajo, y el tratamiento laboral en su totalidad
responden al carácter de las relaciones laborales imperantes en un país,

165
y estas a su vez al sistema socioeconómico existente. Las relaciones
laborales se establecen mediante regulaciones jurídicas, en las que se
expresa los roles y funciones de los actores centrales involucrados,
siendo principales las relaciones empleador/empleado. El alcance y
lugar del Estado en las relaciones laborales, puede ser mayor o menor,
dependiendo de régimen económico existente, y por ende, del carácter
de dichas relaciones.
El beneficio y valor social del trabajo doméstico, las interrelaciones
vecinales y comunitarias, son un componente de los procesos de
reproducción individual y social. La importancia de esta forma de
trabajo no es suficientemente reconocida y valorada en la actualidad.
Las publicaciones en la mayoría de los casos constituyen un agregado de
las investigaciones sobre la igualdad de género o se utiliza para confirmar
la existencia de patrones culturales patriarcales en los hogares.
El itinerario del empleo en Cuba antes del proceso de
actualización del modelo económico y social cubano iniciado en el
año 2007, muestra los aciertos y desaciertos en el tratamiento del
empleo en las décadas anteriores, La política del Estado del pleno
empleo, – vistas a evitar el desempleo –, convirtió a la vía estatal como
casi la única posible para acceder a un empleo. Las limitaciones al
trabajo por cuenta propia o autoempleo, y la insuficiente variedad de
figuras económicas ofertantes de empleos, condujo a la elevación de
las “plantillas infladas”, el subempleo, la subutilización de la fuerza de
trabajo calificada, la desmotivación por el trabajo, que ocasionaron el
surgimiento de comportamientos negativos no acordes con el proyecto
social que se edificaba.
En el nuevo contexto surgen o se amplía la existencia de
figuras económicas (trabajadores por cuenta propia, microempresas,
cooperativas no agropecuarias), que conjuntamente con las formas
productivas y de servicios existentes con anterioridad están autorizadas

166
para contratar trabajadores. Resumiendo, la actualización del modelo
económico y social, cubano expresado en los lineamientos económicos y
sociales que se implementan en la actualidad, deberá afectar en el corto
plazo la homogeneidad y equidad social imperantes durante décadas,
es inevitable. En el largo plazo, los resultados de las transformaciones
emprendidas deberán provocar mayores beneficios económicos y sociales
a la sociedad cubana.

Bibliografía

Catà Guillarte, Euclides (comp.) (2004) Sociología y Política Social del


Trabajo. Selección de Lecturas. La Habana Editorial Félix Varela-
Castro Fidel. Informe Central. Primer Congreso del Partido Comunista de
Cuba, La Habana. Editorial Pueblo y Revolución
Constitución de la República de Cuba (2006) La Habana. Editorial Félix
Varela
Colectivo de Autores. Antología del Pensamiento Económico Cubano. Tomo
III. La Habana Editorial Félix Varela
Colectivo de Autores (1995) El Sector Mixto en la Reforma Económica
Cubana. La Habana, editorial Félix Varela.
Documentos del Partido (2012) Resolución sobre los Lineamientos de la Política
Económica y Social del Partido y la Revolución. La Habana. Editorial s/d
Echevarría León, Dayma (2014) “Empleo y territorio: desafíos actuales para la
equidad en Cuba” en Miradas a la Economía Cubana desde una perspectiva
territorial. La Habana Editorial Caminos,
Ferriol Muruaga, Ángela (1998) “Política Social, un enfoque para el análisis” en
Cuba, Crisis, Ajuste y Situación Social. 1990-1996, La Habana, Editorial de
Ciencias Sociales.
______ (2003) “ El empleo en Cuba: 1980-1996. en de Urrutia L. (comp) en Trabajo
Social Aplicado Selección de Lecturas, La Habana, Editorial Félix Varela,

167
Figueras M Dagoberto, Muñoz (2015). Sector privado individual cuentapropista.
Enfoque y perspectiva en Villa Clara. La Habana: Eeditorial Caminos.
Gaceta Oficial de la República de Cuba. Código del Trabajo. Edición
Extraordinaria. La Habana 17 de junio del 2014.
Marx. C (1973) El Capital. Tomo I, La Habana, edición Venceremos.

168
La política del empleo en Cuba a partir del 2010.
Su expresión en el Trabajo por Cuenta Propia

Máster Orestes Díaz Benítez1


Máster Allan Valdez Montañés2

1. Introducción

En la clausura del IV Período Ordinario de Sesiones de la Asamblea


Nacional del Poder Popular un aspecto que mereció significativa
atención fue la productividad del trabajo, teniendo en cuenta que la
misma al cierre de 2009 decreció respecto al año anterior. En este sentido
se precisó que el subempleo y el exceso de plantilla en la mayoría de las

1 Licenciado en Estudios Socioculturales. Máster en Ciencias Políticas y


profesor asistente con ocho años de experiencia, especializado en Economía Política,
investigador de grupo de desarrollo local de la facultad de Ciencias Sociales. Es
miembro la ANEC y autor de diversas publicaciones en temas referidos a las nuevas
formas productivas que se instrumentan en el modelo económico cubano.
2 Allan Valdés Montañez (1958). Máster en Pensamiento Integracionista
Latinoamericano, profesor auxiliar con más de diez años de experiencia en el
departamento de Marxismo de la UCLV. Diplomado en Economía Internacional y
Economía Política marxista. Investigador de la Cátedra de Pensamiento Filosófico
de la UCLV y miembro del Proyecto PRODEL-APN y de la Asociación Nacional de
Innovadores y Racionalizadores de Cuba. Es autor de varias publicaciones.

169
actividades del país es una de las causas principales que genera dicho
resultado, problemática que se tendría que enfrentar de manera gradual
y progresiva mediante un proceso de reordenamiento laboral. La política
que ha seguido la Revolución implica no dejar a nadie desamparado, así
como propiciar la igualdad de condiciones para que todos los cubanos
tengan una fuente de ingreso legal.
No se trata de que el Estado se presente con un alto carácter
paternalista, sino que tenga la capacidad de reorientar el proceso
hacia los sectores estratégicos del país. El reordenamiento laboral, y su
instrumentación se realiza bajo un férreo control, al igual que las formas
de empleo que se generan en el sector privado individual son controladas
por el Estado, el cual garantiza la regulación de estas nuevas formas de
gestión de la propiedad.

2. Causas que condicionan el proceso de reordenamiento


laboral

Para nadie es un secreto que tanto el derrumbe del Socialismo en


Europa, la desintegración de la Unión Soviética y el recrudecimiento
del bloqueo, constituyeron las principales causas de la agudización de
la situación económica en Cuba, lo que condujo a una difícil y compleja
situación desde el punto de vista económico, político y social. En este
período el país aún se encontraba inmerso en el proceso de rectificación
de errores y eliminación de tendencias negativas. La Revolución enfrentó
una de la peor crisis de su historia, a pesar de la escasez de recursos
materiales y la paralización de un número importante de fábricas, el país
no dejó a nadie desamparado.
Por otro lado la caída de la producción agravó las condiciones
que generan nuevas fuentes de empleos, paralelamente se expandió

170
la economía subterránea y el subempleo. Se estima que el número de
trabajadores subempleados en 1993 podía haber llegado a un millón
de personas. Esto estuvo determinado no solo por la política de
sostenimiento laboral, lo que implicó a la postre el desequilibrio entre
el salario nominal y real, donde se redujo la capacidad adquisitiva de
la clase trabajadora, debido al bajo respaldo productivo. El impacto
de las medidas sobre el empleo y los salarios fue la caída violenta de
la productividad así como el aumento de la liquidez en la circulación.
Por otro lado, el período especial y la brutal guerra económica del
imperialismo incrementaron los efectos negativos que se venían
manifestando a finales de la década del ochenta con la existencia de
plantillas infladas, enfoques paternalistas desestimuladores del trabajo,
altos índices de ausentismo, afectaciones de la eficiencia, entre otros.
A lo anterior se añade que muchos de los problemas relacionados
con la planificación, formación y distribución de la fuerza laboral, el
desestimulo por los bajos salarios, la insuficiente preparación de los
graduados de las enseñanzas técnica, superior y otros, tanto en las
empresas como en las unidades presupuestadas, se fue solucionando
con la ubicación de más personal, lo que generó las plantillas infladas.
Ante las realidades que enfrenta el país, agravadas por las afectaciones
climatológicas y las adversas condiciones internacionales, confirman la
necesidad de realizar y enfrentar transformaciones necesarias a través
de políticas que respondan a las condiciones históricas.
La optimización en el uso de la fuerza laboral, la elevación de la
productividad del trabajo, el ahorro de recursos materiales y financieros, la
ampliación y diversificación de la producción y los servicios, la generación
de ingresos de divisas a través del incremento de las exportaciones de
bienes y servicios, así como la ley de inversión extranjera, además de
la reducción de las erogaciones mediante la sustitución efectiva de las
importaciones, están dentro de las actuales prioridades.

171
Uno de los aspectos claves a tener en cuenta es la estructura
demográfica de Cuba, el incremento gradual de la edad de jubilación
basado en la necesidad impostergable de lograr enfrentar, en un
largo plazo, el déficit de fuerza de trabajo que provoca el proceso de
envejecimiento y la baja natalidad. Esto no está reñido con la necesidad
de reducir las plantillas infladas e incrementar la productividad y la
eficiencia en la utilización de la fuerza de trabajo. Se hace necesario
por tanto llevar a cabo un proceso de disponibilidad laboral, el que
tiene como premisa el principio de la idoneidad demostrada, aun
cuando en el orden personal los directivos y la vanguardia política de
la sociedad puedan verse involucrados en la misma. De igual modo los
sindicatos tienen como tarea fundamental lograr que se desarrolle el
proceso con objetividad.
Al respecto, el general de ejército Raúl Castro Ruz3 señaló: “La
batalla económica constituye hoy, más que nunca, la tarea principal y
el centro del trabajo ideológico de los cuadros, porque de ella depende
la sostenibilidad y preservación de nuestro sistema social”. Continuó
expresando que: “Sin una economía sólida y dinámica, sin eliminar
gastos superfluos y el derroche, no se podrá avanzar en el nivel de vida
de la población, ni será posible mantener y mejorar los elevados niveles
alcanzados en la educación y la salud que gratuitamente se garantizan
a todos los ciudadanos”. Sin que las personas sientan la necesidad de
trabajar para vivir, amparadas en regulaciones estatales excesivamente
paternalistas e irracionales, jamás estimularemos el amor por el trabajo,
ni solucionaremos la falta crónica de constructores, obreros agrícolas e
industriales, maestros, policías y otros oficios indispensables que poco a
poco van desapareciendo. Si mantenemos plantillas infladas en casi todos
los ámbitos del quehacer nacional y pagamos salarios sin vínculo con

3 Discurso pronunciado en la Clausura del IX Congreso de la UJC. p. 5.

172
los resultados, elevando la masa de dinero en circulación, no podremos
esperar que los precios detengan su ascenso constante, deteriorando
la capacidad adquisitiva del pueblo. Sabemos que sobran cientos de
miles de trabajadores en los sectores presupuestados y empresarial,
algunos analistas calculan que el exceso de plazas sobrepasa el millón
de personas y éste es un asunto muy sensible que estamos en el deber
de enfrentar con firmeza y sentido político”.4
Por otra parte existe un desequilibrio extremo en cuanto a la
distribución de trabajadores por sectores claves para la economía del
país, como la producción de alimentos, la construcción y el sistema
educacional, etc. Lo que hace necesario el reordenamiento laboral. Al
respecto Raúl expresó: “Nos enfrentamos a realidades nada agradables,
pero no cerramos los ojos ante ellas. Estamos convencidos de que hay que
romper dogmas y asumimos con firmeza y confianza la actualización, ya
en marcha, de nuestro modelo económico […]”.5
Evidentemente el peso de las medidas adoptadas implica una
reestructuración de la economía cubana, las cuales son necesarias
para eliminar las deformaciones estructurales del sistema económico.
Son decisiones indispensables que contribuirán al mejoramiento de la
disciplina social, laboral, disminuir la corrupción y otros vicios presentes
en nuestra sociedad, cuyo objetivo principal es salvar las conquistas
alcanzadas hasta nuestros días. Los Lineamientos consideraron en el plan
2011, la reducción de más de 500 mil trabajadores en el sector estatal para
dar cumplimiento a la Proyección de la economía 2011-2015. Con vistas
a garantizar el ordenamiento y la aplicación de tan complejo proceso, es
preciso acometer las medidas que permitan reducir las plantillas infladas,
para ello se ha aprobado la aplicación de la política siguiente:

4 Idem. p. 5.
5 Ibidem.

173
� Desarrollar procesos de disponibilidad bajo el principio de la
idoneidad demostrada.
� Ampliar el ejercicio del trabajo por cuenta propia y otras
actividades del sector no estatal como alternativa de empleo.
� Aplicar un régimen tributario para el ejercicio del trabajo por
cuenta propia que de respuesta al nuevo escenario económico.

Para dar cumplimiento a esta política se aplicarán las siguientes


medidas:
� Ratificar el principio de idoneidad demostrada en el proceso
de determinación de trabajadores disponibles. El jefe de la
entidad, en consulta con la organización sindical y teniendo
en cuenta la recomendación del Comité de Expertos,
determina los trabajadores que permanecen laborando y los
que quedan disponibles.
� Incorporar, como alternativas de reubicación, el trabajo por
cuenta propia y otras actividades del sector no estatal. En
el sector estatal ésta se realizará en las plazas que resulte
imprescindible cubrir.
� Eliminar la incorporación al estudio como forma de empleo y la
jubilación anticipada. Modificar el actual tratamiento laboral
y salarial para los trabajadores disponibles e interruptos,
con el propósito de reducir gastos y estimular la gestión del
trabajador en la búsqueda de su reubicación.

Estas medidas comprenden a las empresas que aplican el


perfeccionamiento empresarial. Se establece que de persistir la
imposibilidad de trabajar, se evalúa excepcionalmente una protección
económica temporal de la Asistencia Social, cuyo otorgamiento y cuantía
dependerá de las condiciones e ingresos del núcleo familiar. En ese

174
empeño el Partido deberá controlar que el proceso se realice en un
clima de transparencia, con la información oportuna a los trabajadores,
en el que las decisiones estén debidamente colegiadas y creadas todas
las condiciones organizativas requeridas, evitando que se produzcan
errores vinculados a manifestaciones de discriminación de cualquier
tipo o favoritismo en la toma de decisiones.
El proceso de racionalización laboral lleva a cabo la liquidación
del subempleo, pasándose así, en un primer momento, a una situación
de equilibrio del “mercado laboral”. Por supuesto, la intención no es
quedarse allí, sino promover que la mano de obra, ahora provisionalmente
excedente se emplee productivamente y lo más rápidamente posible en
otras formas de propiedad y gestión económicas. Entendido de que
no solo existen reservas de empleo no explotadas, sino también de
que la medida racionalizadora provee incrementos de productividad
y producción lo que, a su vez hará que el mercado laboral se mueva
a una situación de equilibrio donde la economía alcance nuevamente
un equilibrio con pleno empleo, pero ahora con un nivel superior de
productividad de la mano de obra y correspondientemente, con un
salario real medio superior
En tal sentido el reordenamiento laboral incide positivamente
en la organización y ejecución de una política de empleo que resulte
viable para lograr los niveles de eficiencia y productividad deseada. Las
principales transformaciones en la política de empleo como resultado
del reordenamiento laboral son:
1- Reducir las plantillas infladas y por tanto los niveles de
subempleo.
2- Modificar la estructura del empleo en el sentido de dirigirlo a la
esfera productiva, a las ramas que producen bienes y servicios
y romper el desequilibrio existente entre la esfera productiva
y la no productiva.

175
3- Ampliar el trabajo en el sector no estatal. Para esto el modelo
de gestión reconoce y promueve, además de la empresa estatal
socialista, que es la forma fundamental de propiedad en la
economía nacional, las modalidades de inversión extranjera
previstas en la ley (empresas mixtas, contratos de asociación
económica internacional, entre otras), las cooperativas, los
agricultores pequeños, los usufructuarios, los arrendatarios,
los trabajadores por cuenta propia y otras formas.
4- Proyectar la formación de la fuerza de trabajo calificada en
correspondencia con las demandas actuales y el desarrollo
del país.

Para llevar a cabo el punto 1 y 2 se dicta el Reglamento sobre el


Tratamiento Laboral y Salarial Aplicable a los Trabajadores Disponibles
e Interruptos.6 En los artículos del 1 al 13 de dicho documento se regulan
todo el proceso organizativo, la determinación de los trabajadores
disponibles y el tratamiento de los mismos.
Por otra parte, el sector no estatal incluye la participación de
capital extranjero como complemento del esfuerzo inversionista nacional
en las actividades que sean de interés del país en correspondencia con
las proyecciones del desarrollo económico social a corto, mediano y
largo plazo, de modo tal que satisfaga diversos objetivos como el acceso
a tecnologías, métodos de administración, diversificación y ampliación
de los mercados de exportación, sustitución de importaciones, aporte
de financiamiento externo, entre otros. Tales medidas al interior del
sector deben contribuir a la creación de nuevas fuentes de empleo. En
relación con la formación de Cooperativas No Agropecuarias, se crearán
en actividades de producción y servicios.

6 Gaceta Oficial, Resolución No. 35/2010: Este reglamento legisla toda la


organización e instrumentación del proceso de reordenamiento laboral.

176
Respecto al punto 4, es necesario dar continuidad y complementar
el proyecto de capacitación de los trabajadores no estatales para lograr
su acceso a esta actividad con la misma sistematicidad que los del sector
estatal por lo que la viabilidad del reordenamiento laboral en la práctica
pasa por el diseño de programas de capacitación dirigidos a estos
trabajadores. Además la formación de la fuerza de trabajo calificada debe
responder a un estudio de demanda de fuerza de trabajo en el territorio,
logrando integrarse con una misma mirada, hacia un fin común.

3. Rasgos generales del trabajo por cuenta propia como


forma de empleo-ingresos

La política de empleo reconoce en algunos países como una


modalidad el trabajo informal, en otros como una forma de autoempleo.
Esto es lo que hoy se denomina en Cuba trabajo por cuenta propia
y su explicación puede partir de la pequeña producción mercantil
(PPM). Como elemento de la economía de transición al socialismo,
heterogénea esencialmente, se encuentra este tipo de economía. Esta
fue la primera forma de producción de los artesanos y campesinos, que
se distingue por la división social del trabajo y la pequeña propiedad
privada del productor sobre los medios de producción y el fruto de su
trabajo, donde propietario y productor son una misma persona, por lo
cual no existe explotación.
Dicha producción se basa en el trabajo individual del productor
y su familia y, cada cual se apropia de los resultados de su trabajo. Este
sector agrupa una masa importante de productores individuales –
en los sectores agropecuarios y no agropecuarios – que dado su
carácter dual deben ser atraídos por la clase obrera y convertirse en
aliados estratégicos de la misma. Históricamente este tipo socio-

177
económico concentra fundamentalmente a campesinos, artesanos
y pequeños comerciantes, por lo que su transformación es decisiva
para el nuevo régimen social, ya que la pequeña producción mercantil
no puede constituir la base económica de las nuevas relaciones
socialistas de producción.
En otras palabras, en condiciones económicas propicias la PPM
puede generar relaciones capitalistas de producción. Por otro lado, sobre
todo en las condiciones actuales de Revolución Científico Técnica, las
inversiones con técnicas de avanzadas no resultan factibles de aplicar a
pequeños productores; de ahí la tendencia a frenar el proceso científico-
técnico de alguna manera. La vía para solucionar la disyuntiva antes
expuesta consiste en la transformación socialista de la PPM que toma
forma concreta de realización en la cooperativización, cuyo proceso
consiste en la agrupación de productores individuales para de forma
colectiva organizar el proceso de producción y de servicios, basada en
la voluntariedad, el interés económico común, la autogestión, entre
otros principios básicos. La evolución paulatina de formas simples –
cooperación en la producción, el consumo, abastecimientos, créditos,
servicios – a formas superiores de cooperación (medios de producción,
medios de trabajo, tierra y el proceso de trabajo), la ayuda por parte
del Estado y la labor político ideológica así como el esclarecimiento de
las ventajas de la producción colectiva, consolidan el desarrollo de esta
forma productiva.
Esta esfera tiene una importancia vital para la economía de
cualquier país, al generar una parte importante de los productos
alimenticios y otros bienes de consumo para la población, servicios
básicos y constituir una fuente de materias primas para la industria
transformativa. Esto se acentúa cuando se trata de países que están en el
proceso de Construcción del Socialismo en condiciones de subdesarrollo,
como el caso de Cuba. El tipo socialista de economía surge, no solo con

178
la eliminación del tipo capitalista, sino también por la transformación
socialista de la PPM a base de la cooperativización.
El 13 de marzo de 1968 con la Ofensiva Revolucionaria fueron
expropiados algo más de 58 mil establecimientos privados, al respecto el
Primer Congreso del Partido hizo un juicio valorativo de aquellos hechos
que tienen una indudable actualidad con los ajustes que se realizan en
el actual modelo económico cubano. “Tal medida no era necesariamente
una cuestión de principios en la construcción del socialismo en esa
etapa, sino el resultado de la situación de nuestro país en las condiciones
de bloqueo económico impuesto por el imperialismo y la necesidad de
utilizar de modo óptimo los recursos humanos y financieros a lo que se
sumaba la acción política negativa de una capa de capitalistas urbanos,
que obstruían el proceso. Esto, desde luego, no exonera a la Revolución
de la responsabilidad y las consecuencias de una administración
ineficiente de los recursos, que contribuyeron a agravar el problema
financiero y la escasez de fuerza de trabajo.”7
Con la promulgación del Decreto Ley número 14 en 1978, se
impulsa nuevamente esta actividad, pues el mismo reconoce la necesidad
de revitalizar el trabajo por cuenta propia y regula el tratamiento
que este recibía. Reconoce además el papel de esta actividad en la
satisfacción de determinados productos y servicios para la población,
los que el sector estatal no siempre podía garantizar.8En los años 1976
y 1980, el nuevo impulso de la actividad, la situación del empleo se
hace menos densa. Así en 1981 se formuló una nueva regulación; la
Resolución No. 9, la cual incrementó las actividades permitidas para

7 Colectivo de autores. Manual de Economía política de la construcción del


Socialismo. Editorial MES. Cap. IV. p. 114.

8 O, Chassagnes y A, Domínguez. El sector informal en Cuba, en El sector


mixto en la reforma económica cubana. Editorial Félix Varela, La Habana, 1995. p. 72.

179
el sector por cuenta propia a 63 categorías. Como resultado, muchos
trabajadores manuales empezaron a producir de manera privada algunos
artículos muy sencillos, pero de gran demanda, aumentando la cifra de
los trabajadores a 70 052. En 1986, comienza un nuevo período en el que
se establecen limitaciones para el trabajador por cuenta propia.
Con el proceso de rectificación se analizan los problemas que
se estaban produciendo en el sector, lo que trajo consigo la decisión
de eliminar la política de estimulación a esta actividad, al mismo
tiempo que se detienen las inscripciones. La reforma económica cubana
implementada en la década de los años noventa, tiene particularidades
respecto a otras experiencias ejecutadas en la región, derivadas de
las condiciones de partida de la economía en que se han realizado
las transformaciones, del deseo expreso del gobierno de mantener
el sistema socialista y por ser un país bloqueado económicamente.
Durante los años 1989-1993, esta reforma tuvo su período de
preparación en el cual las medidas económicas adoptadas se centraron
inicialmente en tratar de incrementar las fuentes en divisas y en reducir
el impacto social del ajuste externo que se preveía luego de la caída
del Campo Socialista. En esos primeros años se impulsaron varios
programas de desarrollo y se estimuló la producción de alimentos con
vista a la sustitución de importaciones.
En 1992, se realizaron cambios en la constitución del país para
tomar en cuenta las nuevas formas de propiedad. En esta etapa se produce
la reinserción de la economía cubana en la economía internacional
dado por el proceso de dolarización introducido. Dicha dolarización
se diferencia de otras presentes en la región en que surge, no solo por
perturbaciones monetarias y desbalances macroeconómicos, sino por
existir en el país un sistema monetario mercantil subdesarrollado. Otros
de los componentes de los cambios que se producen fue la ampliación del
espacio a la actividad no estatal. Además de la apertura a las inversiones

180
extranjeras, se entregó en usufructo gratuito parte significativa de la
tierra agrícola que poseía el Estado a cooperativas y a trabajadores y
jubilados que quisieran explotarla y se flexibilizó el trabajo por cuenta
propia .Lo más importante en adición a la flexibilización de la actividad
por cuenta propia fue:
� Establecer nuevos mecanismos para la vinculación laboral de
los graduados universitarios tales como la creación de reservas
científicas, incluyendo un tratamiento salarial particular.
� Ampliar formas especiales de remuneración al trabajo,
como complemento al sistema salarial vigente. Pueden ser
en divisa, moneda nacional o en especie; y son de aplicación
principalmente en las actividades generadoras de divisas.
� Diseñar programas de empleo municipales y condicionar
a la creación de nuevos empleos, la aplicación de
redimensionamiento empresarial.
� Crear un mecanismo que intermedia con los inversionistas
extranjeros en la contratación de trabajadores, el salario y la
seguridad social.

Por otra parte es conocido que dentro de la política social, la


situación del empleo es uno de los problemas económicos, políticos y
sociales más graves del mundo de hoy, empero es uno de los campos
en que la política de la Revolución ha tenido más logros, pues “la
eliminación del desempleo como fenómeno social, la rápida ubicación del
personal que egresa de las aulas, la incorporación de la mujer al trabajo
creando facilidades para su permanencia, la seguridad del trabajador, la
humanización del trabajo y la conciliación de los intereses de los jóvenes
en los procesos de entrada a la ocupación son aspectos importantes
de sus logros, los que se han tratado de mantener aún en períodos

181
de elevada dinámica de la población en edad laboral o de moderado
crecimiento económico”9.
Es necesario recordar que en el caso cubano, la crisis económica
mundial, redujo la capacidad financiera del Estado, limitó su potencial
para una continuada ampliación de los programas y servicios sociales
específicos, y rebajó notablemente su capacidad de influir en el bienestar
material de la población. También, se incrementó el margen de grupos
sociales vulnerables en este período. No obstante, el denominador común
y objetivo central de la política del Estado sigue siendo la consecución
del pleno empleo, tarea sumamente compleja, por lo que se buscan
opciones en la diversificación de las fuentes de empleo tanto desde el
punto de vista de las diferentes formas de propiedad (trabajo por cuenta
propia, cooperativas y sector mixto), sectores y tipos de producción
(esfera de los servicios, agricultura urbana, suburbana y rural a partir
del Decreto Ley 257, etc.), como modalidades de empleo (empleo social,
el estudio, la pequeña propiedad privada y las formas de cooperativas).

4. A manera de conclusiones

Ante la coyuntura actual, el reordenamiento en los niveles de


empleo, se ha realizado de forma organizada, paulatina, evitando los
despidos masivos y combinando la necesaria reducción de personal con
determinada medidas de protección social, la búsqueda de opciones
de reubicación y el desarrollo de un programa de recalificación de
la fuerza de trabajo. Se han tomado, además, medidas específicas
para la protección de los grupos más vulnerables. Cabe destacar los
programas especiales para los discapacitados, la revitalización de

9 E, Catá Guilarte. Sociología y Política Social del Trabajo en Selección de


Lecturas. Editorial Félix Varela. La Habana.2004 .p. 89.

182
la atención al empleo femenino y juvenil, así como la atención a los
problemas territoriales.
Con la reforma económica cubana crece la heterogeneidad
socioeconómica tanto desde el punto de vista de la propiedad sobre
los medios de producción, como desde el ángulo de la combinación de
diferentes principios reguladores de la actividad económica, a saber,
la planificación y el mercado. Esto tiene su expresión en una nueva
cualidad de la correlación entre la centralización y la descentralización.
Lo que contribuye a una mayor racionalidad en el uso de la fuerza
de trabajo, al mismo tiempo deberá producirse un incremento de la
riqueza social, que permitirá sustentar las políticas públicas orientadas
a resolver los problemas socioeconómicos acumulados en las últimas
dos décadas. Estos cambios originarán un equilibrio estructural en la
balanza comercial de Cuba.

Bibliografía

Arribillaga, I. “Trabajo por Cuenta Propia: Mitos y Verdades.” Consultado el


2 de febrero de 2014 en http://www.mujeresdeempresa.com,2000.
Catá Guilarte, E. Sociología y Política Social del Trabajo en Selección de
Lecturas. Editorial Félix Varela. La Habana.2004.
Colectivo de autores .El sector mixto en la reforma económica cubana.
Editorial Félix Varela. La Habana, 1995.
Constitución de la República de Cuba. Editora política .La Habana, 2010.
Colectivo de autores. Manual de Economía política de la construcción del
Socialismo. Editorial MES
Everleny Pérez Villanueva, O. y Vidal Alejandro, P. “Relanzamiento del
cuentapropismo en medio del ajuste estructural.” Ponencia para el Seminario
del CEEC 2011 consultado el 5 de junio de 2013 en http://www.ceec.uh.cu.

183
Figueras, Miguel A. Aspectos Estructurales de la Economía Cubana. Editorial
Ciencias Sociales .La Habana, 2002.
Figueroa Albelo, V .Ensayos de la Economía Política de la Transición al
Socialismo en la experiencia en Cuba. Edición electrónica. Texto completo
[En Línea].Disponible en http://www.eumed.net/libros/2006b/vmfa/
[Accesado el 15 de Febrero del 2012].2001.
Oficina Nacional de Administración Tributaria. Villa Clara. Dirección de
Servicios Fiscales y Control de la Recaudación.
Resolución No 33, 2010, de la Ministra de Trabajo y Seguridad Social, que
regula la contratación de créditos y servicios de trabajadores permanentes
asalariados que trabajan para los agricultores, de los servicios de trabajadores
agropecuarios eventuales que ejercen el TCP.
Lineamientos de la Política Económica y Social del Partido y la Revolución.VI
Congreso del PCC .Año 53 de la Revolución. Aprobado el 18 de abril del 2011.
Chassagnes ,O y Domínguez ,A. El sector informal en Cuba, en El sector
mixto en la reforma económica cubana. Editorial Félix Varela, La Habana,
1995.
Shassanges, O. “El sector mixto en la reforma económica cubana.” Ed. Félix
Varela, 1995.
Resolución Económica del V Congreso del PCC. (Suplemento) (1997)
Periódico Granma.
Resolución No 33, 2010, de la Ministra de Trabajo y Seguridad Social, que
regula la contratación de créditos y servicios de trabajadores permanentes
asalariados que trabajan para los agricultores, de los servicios de trabajadores
agropecuarios eventuales que ejercen el TCP.
Resolución No. 10/95 Autorización a Profesionales Universitarios para
Ejercer Trabajos por Cuenta Propia.

184
Os limites do neodesenvolvimentismo na
superação da superexploração do trabalho
na América Latina: a estrutura dependente
brasileira

Naiara Andreoli Bittencourt1

1. A dependência latino-americana

É somente pós-industrialização que as relações imperialistas


e coloniais assumem um caráter mundial integrado pela economia
capitalista, que produz, de um lado, um mercado unificado de
mercadorias, força de trabalho e capitais e, de outro, uma alta
concentração de tecnologia e a produção de capitais em centros
hegemônicos de países dominantes, delimitando a divisão internacional
do trabalho (SANTOS, 2011, p. 20). É com a especialização da
industrialização e o crescimento da classe trabalhadora urbana europeia
que há a demanda de uma grande disponibilidade de produtos agrícolas

1 Mestranda em Direitos Humanos e Democracia do Programa de Pós-


graduação em Direito da UFPR, pesquisadora da Capes-CNPq, membro do NEFIL –
Núcleo de Estudos Filosóficos do PPGD-UFPR.

185
proporcionados pelos países latinos. A estruturação industrial pós-
guerras tinha como objetivo suprir basicamente duas necessidades dos
países centrais: 1) a expansão produtiva de matérias-primas e produtos
agrícolas para responder à industrialização capitalista hegemônica2; e 2)
o aumento do mercado interno dos países dominados para consumo dos
produtos manufaturados dos grandes centros (BAMBIRRA, 2012, p. 66).
Theotônio dos Santos caracteriza a dependência latino-americana
como uma situação em que certo grupo de países tem sua economia
condicionada pelo desenvolvimento e pela expansão de outra à qual
está submetida e só pode se construir como reflexo da expansão dos
países dominantes, de forma negativa ou positiva, por meio de um
desenvolvimento desigual e combinado (SANTOS, 2011, p. 361). A
dependência delinear-se-ia por três fatores centrais: 1) o desenvolvimento
industrial dependente de um setor exportador que possibilita o ganho
de capital para adquirir os equipamentos utilizados no setor industrial;
2) o desenvolvimento industrial é condicionado às flutuações da balança
comercial, reiteradamente deficitária pela remessa de lucros aos países
centrais e pelo crescimento das dívidas externas; 3) o desenvolvimento
industrial é também influenciado diretamente pelo monopólio
tecnológico dos impérios e a necessidade de aquisição de maquinarias e
matérias-primas industrializadas do exterior (SANTOS, 2011, p. 371-377).
A estrutura produtiva dependente combina a conservação dos alicerces
agrários ou mineradores mais atrasados para fornecer mais-valia aos
setores industriais. Além disso, as estruturas industrial e tecnológica,
ao invés de guiarem-se pelas necessidades internas de desenvolvimento,
atrelam-se aos interesses de empresas multinacionais, o que gera uma

2 Nesse sentido, o processo de mecanização agrícola e industrialização do


campo, fomento da utilização de insumos e sementes dos países centrais, principalmente
com a Revolução Verde na década de 1970, redefine o processo de dependência agrária
da América Latina.

186
organização interna altamente desigual, com alta concentração de
renda, subutilização da capacidade instalada, exploração intensiva dos
mercados nos grandes centros urbanos, diferença entre os níveis salariais
internos e alta taxa de exploração da força de trabalho (SANTOS, 2011,
p. 377-378).
Diferente dos países industrializados, que se baseiam no
consumo interno dos trabalhadores como fator central para a demanda
das mercadorias que serão produzidas, os países latino-americanos
funcionam servindo aos mercados externos, sem se preocuparem com o
consumo e com a reposição do salário dos trabalhadores e trabalhadoras,
mas sim explorando esta força de trabalho ao máximo e substituindo-a
irrefreavelmente pelo exército de reserva, quando esta não mais lhe servir
(MARINI, 2011, p. 155-156).
Deste modo, o papel da América Latina no mercado mundial
possibilita que a acumulação das nações industrializadas e imperialistas
se desloque da produção de mais-valia absoluta para a mais-valia relativa,
de tal modo que a extração do lucro nos países centrais decorre mais
do aumento da capacidade produtiva por meio da tecnologia do que
da exploração do trabalhador. Já aqui, o desenvolvimento produtivo
baseia-se na superexploração do trabalhador e na combinação da
extração de mais-valia relativa e absoluta, cuja chave explicativa se dá
pela troca desigual (MARINI, 2011, p. 138). A troca desigual implica que
os países periféricos vendam as mercadorias a um preço de produção
inferior, em razão da maior produtividade pela extração cruel da mais-
valia mediante a superexploração, a fim de compensar a perda gerada
pelo comércio internacional (MARINI, 2011, p. 145-147). Assim, uma
parte considerável da mais-valia aqui produzida é enviada aos impérios
por meio da “estrutura de preços vigente no mercado mundial, pelas
práticas financeiras impostas por estas economias, ou pela ação direta
dos investidores estrangeiros no campo da produção”. Para ressarcir

187
tal drenagem, a burguesia local cria mecanismos de aumento do valor
absoluto da mais-valia pela superexploração dos camponeses, mineiros
e operários (MARINI, 2013, p. 52).
O controle do parque industrial latino-americano que se
consolidou no pós-guerra, principalmente com o protagonismo dos
Estados Unidos, intensificou o ingresso de capitais internacionais das
grandes potências, cujos principais efeitos são: o domínio dos setores
industriais pelo capital estrangeiro; a concentração e monopolização
da economia por meio da instalação de megaempresas transnacionais,
com absorção por meio de fusões com as empresas nacionais; a
desnacionalização crescente dos meios de produção; a integração dos
interesses das empresas estrangeiras com a burguesia local; a integração
da política de governo e a política externa dos países latino-americanos
com os Estados Unidos (intensificada nas Ditaduras Militares); e a
consequente integração militar (BAMBIRRA, 2012, p. 126).

2. A superexploração dos trabalhadores e trabalhadoras

O trabalho assalariado no continente erige-se apenas com a


consolidação do capitalismo industrial mundial e sua conexão global
com necessidade de mercados consumidores, no decorrer no século XIX.
Tal panorama, anteriormente composto essencialmente de atividades
agrário-exportadoras, também desenvolve o proletariado urbano-
industrial, o que se acentua nos períodos pós-guerras (ANTUNES,
2011, p. 18-19). Segundo Ricardo Antunes, a classe trabalhadora latino-
americana passa a ser composta, sobretudo, nos “centros exploradores
de salitre, cobre, prata, carvão, gás e petróleo, na indústria têxtil, nos
serviços portuários e ferroviários, na construção civil e em pequenos
estabelecimentos fabris”. (2011, p. 19)

188
Dessa forma, no processo de industrialização, os países latino-
americanos, com o pretexto de compensar a dificuldade de competição no
mercado internacional, valem-se de diversos instrumentos na produção
interna, em que a coluna que se estrutura e reflete a dependência é a
superexploração do trabalho dos povos que aqui existem. Inclusive
vale ressaltar que é nesse período que o taylorismo e o fordismo aqui se
implantam (ANTUNES, 2011, p. 22).
A regra do capital baseia-se na exploração do trabalho. Nas
economias centrais o aumento da acumulação e da mais-valia3 decorre
principalmente do barateamento real da força produtiva, e especialmente
com a “redução do valor dos bens necessários para a subsistência do
trabalhador”. Nas economias periféricas, entretanto, há uma elevação
desproporcional da desvalorização da força de trabalho (MARINI,
2013, p. 172). A superexploração é, portanto, uma forma particular de
exploração que viola o valor da força de trabalho (OSORIO, 2013, p. 10).
O consumo dos trabalhadores latino-americanos é secundário
em relação aos setores produtivos, de forma que contam mais como

3 A mais-valia pode ser dividida, para uma melhor apreensão do modus


operandi de exploração do capital, em mais-valia absoluta e relativa, sendo que a
primeira “forma a base geral do sistema capitalista e ponto de partida para a produção
do mais-valor relativo” (MARX, 2013, p. 578). Em suma, a mais-valia absoluta é baseada
na prolongação da jornada de trabalho, em que o grau de produtividade é constante.
Verifica-se pelo aumento do número de horas trabalhadas: aquilo que se trabalha além
do tempo do trabalho necessário e, para isso, também deve ser considerado o número de
jornadas de trabalho simultâneas da coletividade do trabalho social utilizado; assim, há
diminuição relativa do trabalho necessário porque o tempo total de trabalho aumentou
(MARX, 2013, p. 579-580). Já a mais-valia relativa ocorre quando a jornada de trabalho
é fixa, mas o tempo necessário para a produção também diminui porque aumenta a
potência produtiva do trabalho; eleva-se com a cooperação e com a intensificação
do ritmo do trabalho; há o aumento da mecanização o que reflete na substituição do
trabalho qualificado pelo simples, na redução de salários e na dilatação do exército de
reserva gerado pelo desemprego; além disso, também se qualifica pelo trabalho social
mediante a expansão da produtividade coletiva; sendo que há diminuição absoluta do
tempo de trabalho necessário (MARX, 2013, p. 579-580).

189
produtores de valor do que como consumidores, sendo que os padrões
de reprodução são voltados aos mercados exteriores e não ao mercado
interno (OSÓRIO, 2013 p. 29).
Para Enrique Dussel (1988, p. 327) a superexploração não é um
fundamento da dependência e sim, uma consequência, evitando-se
tautologias. A essência ou fundamento da dependência seria a transferência
de mais-valia de um capital nacional menos desenvolvido para um mais
desenvolvido, e para compensar a perda desse valor necessita-se extrair
ainda maior quantia de mais-valia do trabalho-vivo periférico.
Inicialmente as nações latino-americanas edificaram o processo de
acumulação com base na mais-valia absoluta por meio do elastecimento
exacerbado da jornada de trabalho, muito em decorrência da ausência de
regulamentações trabalhistas (MARINI, 2013, p. 173). Posteriormente,
novas formas de exploração foram implementadas, adicionando também
a mais-valia relativa, sem diminuir a mais-valia absoluta. Além disso,
o salário devido ao trabalhador pelo tempo de trabalho necessário
despendido para produção é extremamente baixo, isto é, o valor pago é
inferior ao valor indispensável para reprodução da vida do trabalhador
(MARINI, 2013, p 173).
Desse modo, a elevação da intensidade do trabalho, a prolongação da
jornada de trabalho e a expropriação de parte do trabalho necessário ao operário
para repor sua força de trabalho (o trabalho é remunerado abaixo do seu
valor) são os três mecanismos essenciais da produção na América Latina
e funcionam como aumento da mais-valia aos capitalistas, os quais se
baseiam na exploração das trabalhadoras e trabalhadores e não por meio
do progresso da capacidade produtiva para enfrentar os monopólios
globais (MARINI, 2011, p, 147). Assim, a superexploração funciona como
um mecanismo de compensação para o desenvolvimento capitalista industrial
dependente para contrabalancear as transferências de valor oriundas da
troca desigual (CARCANHOLO, M., 2013. p. 114).

190
Tais características procedem não somente pelo baixo
desenvolvimento das forças produtivas, como também pelas atividades
predominantes, a indústria extrativa e a agricultura, que demandam
uso extensivo e intensivo da força de trabalho e permitem baixar a
composição-valor do capital (MARINI, 2011, p. 149).
O que ocorre nos países desenvolvidos e centrais só nos
momentos de crise, acontece aqui permanentemente: a intensificação e
prolongação da jornada de trabalho e a apropriação do fundo de consumo
dos trabalhadores. Isso determina um prematuro esgotamento dos
trabalhadores, sua depredação e apropriação de sua vida útil de forma
fugaz (OSÓRIO, 2013 p. 34). Isto é, há um privilégio da prolongação
e intensificação da jornada de trabalho ante os desenvolvimentos das
forças produtivas técnicas, inclusive pela razão de que sempre houve
um monopólio tecnológico dos países centrais, tanto pelo sistema de
patentes em vigor como pelas barreiras dos altos custos de importação
das máquinas necessárias para competir no mercado internacional
(RUIZ ACOSTA, 2013, p. 72).
Além disso, a concentração monopolística dos principais setores
industriais determinou a não diversificação da produção e a estagnação
do emprego, vez que a dependência financeira e tecnológica implicou
um alto nível de endividamento externo; a imprescindibilidade dos
recursos naturais; a devastação ambiental; a incapacidade de absorção do
exército de reserva; a incorporação massiva em condições extremamente
precárias das mulheres no mercado de trabalho; e o crescimento das
desigualdades regionais e sociais (RUIZ ACOSTA, 2013, p. 73).
Sob a égide do neoliberalismo, que intensifica a dependência,
percebemos ainda mais a degradação dos salários, jornadas de trabalho
extenuantes e extrema intensidade nos ritmos e tempos de trabalho, que
demonstram a atualidade da categoria de superexploração do trabalho.

191
3. O neoliberalismo e o neodesenvolvimentismo: impactos
sobre o trabalho

Na América Latina é no começo da década de 1970 que países como


o Chile e a Argentina apresentam projeções neoliberais antecipadas.
Mas, em geral, somente na década de 1980 é que a reorganização do
capital mundial redefine a divisão internacional do trabalho, promove
a reestruturação produtiva e edifica o neoliberalismo também neste
continente. Esses anos desenham a primeira fase do neoliberalismo
na América Latina, conforme Carlos Eduardo Martins (2011, p. 313),
em que ainda não havia reorganização da divisão internacional do
trabalho ou plano de desenvolvimento para a parte “subdesenvolvida”
do continente, o que se explica também pela crise que a grande potência
norte-americana enfrentava.
Em 1989, o Consenso de Washington 4 marca a política
direcionada do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco
Mundial, do Banco Interamericano de Desenvolvimento e de diversos
agentes políticos e econômicos da América, que buscam direcionar
recomendações neoliberais fundadas nas instituições financeiras
norte-americanas supostamente aplicáveis nos países latinos. Dentre
os mandamentos “sugeridos”, elencam-se principalmente: o corte
brutal de gastos públicos; a liberalização da economia, com abertura
comercial e desregulamentação; a redução estatal sobre o setor privado;
o investimento estrangeiro direto, com eliminação de restrições; a
privatização de estatais; a reforma fiscal e tributária; e a fundação dos
marcos de direito à propriedade intelectual (AYERBE, 1998).

4 O Consenso de Washington representaria a segunda grande fase do


neoliberalismo latino-americano, em que os EUA se propõem a um novo ciclo de
expansão internacional (MARTINS, 2011, p. 313).

192
Esse pano de fundo político esclarece a vertente da reestruturação
produtiva mundial, que reafirma o caráter dependente latino-americano.
Isso porque o ingresso do capital estrangeiro é tão massivo que reassume
o mercado no continente, cujos principais agentes são as empresas
multinacionais que se baseiam na exploração do trabalho (a mão de
obra barata latino-americana) e numa extensa remessa de lucros aos
seus países centrais. (SANTOS, 2011, p. 500). As multinacionais operam
com procedimentos altamente monopólicos que derivam da tecnologia
exigente de alta concentração de capital e de procedimentos que absorvem
as empresas competidoras e dominam todo o mercado em que operam.
Tais empresas passam ainda por contradições quanto aos interesses da
matriz e das filiais e à indecisão sobre o desenvolvimento nacional e o
desenvolvimento do capital estrangeiro (SANTOS, 2011, p. 500-503).
A nova divisão internacional do trabalho projetada por Theotônio
dos Santos (2011, p. 500) considera que há o início de uma inversão
baseada na expansão do setor de serviços em detrimento do setor
industrial, devido ao avanço da tecnologia. Ainda que os centros
hegemônicos continuem necessitando de matérias-primas, há uma
necessidade que as periferias adquiram máquinas e produtos elaborados
pelos centros para serem vendidos no mercado interno, caracterizando
um processo de substituição de importações e exportações.
Mesmo assim, continua sendo atribuído às economias
dependentes a produção de bens manufaturados de consumo
básico e de setores menos estratégicos e complexos.
Ressalta-se também que com a crise do capital marcada pelo
ano de 1982 e posteriormente seguida pelas políticas neoliberais das
décadas de 1980 e 1990, a força de trabalho sofreu uma desvalorização
inédita desde o pós-guerra. Iniciativas que demonstram a redução real
dos salários, o incremento do exército industrial de reserva, a entrada
massiva de milhões de mulheres no mercado em condições informais
e precárias e a emigração de campesinos e pobres das periferias para

193
os países do Norte para trabalhar em condições semiescravas (RUIZ
ACOSTA, 2013, p. 74).
O neoliberalismo também trouxe a expansão proporcional das
jornadas em todo o globo, mais acentuadamente na América Latina.
Enquanto nos países centrais a média semanal de horas trabalhadas
em 1980 era de 41 horas, na periferia a média era de 48,1 horas. Já na
década de 1990, a média dos impérios era de 40,2 horas trabalhadas por
semana, enquanto nos países subdesenvolvidos a média chega a 47,8
horas semanais, mesmo com todo o implemento tecnológico (RUIZ
ACOSTA, 2013, p. 78).
Contudo, é perceptível a alteração do cenário completamente
neoliberal na América a partir dos anos 2000, período em que
se iniciou um cenário excepcional na América Latina, no qual o
neodesenvolvimentismo5 passa a ser o paradigma impulsionado por governos
mais progressistas e coalizões políticas na região, que incluem o apoio
de trabalhadores, pobres, classes médias locais e setores da burguesia
nacional. Há um rechaço à ideia de livre mercado e à tentativa de
maior regulação estatal, buscando um alto desempenho econômico
simultaneamente a programas sociais, o que reduziu de certa forma a
intensidade da devastação da força de trabalho das últimas décadas,
denominado pela CEPAL como “crescimento com equidade”6 (RUIZ
ACOSTA, 2013, p. 85).

5 Armando Boito Jr (2012, p. 5) tem sido um dos principais formuladores no


Brasil sobre esse período político protagonizado por uma “frente neodesenvolvimentista”,
cujo objetivo primordial é o desenvolvimento do capitalismo, dirigida por uma burguesia
nacional que envolve classes trabalhadoras. Segundo Boito, a frente neodesenvolvimentista
“busca o crescimento econômico do capitalismo brasileiro com alguma transferência de
renda, embora o faça sem romper com os limites dados pelo modelo econômico neoliberal
ainda vigente no país”.
6 Essa seria, segundo Carlos Eduardo Martins (2011), a terceira fase do
neoliberalismo latino.

194
Giovanni Alves (2014, p. 132) pontua que o Estado
neodesenvolvimentista é financiador, investidor e regulador. Tal
postura no Brasil implicou uma transferência de renda à classe
trabalhadora mais pobre, o aumento da formalização dos contratos de
trabalho, a queda no desemprego e o aumento do consumo interno, com
uma caracterização do que se passou a denominar “nova classe média
brasileira”. Contudo, mesmo com os quase 20 milhões de empregos
criados na década de 2000 no Brasil, a maioria esmagadora é de postos
de até um e meio salário mínimo (2014, p.135).
A questão é que tal modelo neodesenvolvimentista ainda é
atrelado ao mercado mundial capitalista e ao domínio dos impérios. Isso
porque é vulnerável aos ascensos e descensos do mercado, especialmente
do preço de matérias-primas e da capacidade de financiamento externo.
Se os anos de 2010 e 2011 foram de relativa recuperação para os países
latino-americanos a reerguida europeia e estadunidense e a desaceleração
chinesa já anunciaram tempos delicados ao sul global, de forma que seu
crescimento pode ser excepcional e passageiro, o que se demonstrou em
2014 e 2015 (RUIZ ACOSTA, 2013, p. 86).
Como projeto político, o neodesenvolvimentismo não pode ser
confundido com a implementação de um Estado de bem-estar-social
nos moldes europeus7, uma vez que tal modelo inexistiu na América
Latina e inexistiria futuramente na condição capitalista dependente. O
neodesenvolvimentismo procura construir um patamar de acumulação
do capital que diverge das políticas ortodoxas neoliberais no que tange
às políticas sociais e incremento de renda da população mais miserável

7 Importante pontuar que os Estados de bem-estar-social na Europa


apenas se edificaram pela complexidade das relações econômicas globais e do
fornecimento barato de matérias-primas e alimentos dos países periféricos, o que
possibilitou um incremento tecnológico e alta industrialização, elevando a condição
dos trabalhadores europeus.

195
e elevando sua condição de vida, mas sem alterar a estrutura industrial
brasileira (percebe-se que houve desindustrialização), sem realizar
reformas sociais de base fundamentais (agrária, urbana, tributária,
política) e ainda comprometido com o pagamento da dívida pública
(ALVES, 2014, p. 136).
A grande contradição desse modelo de política econômica
atrelada ao mercado mundial é a impossibilidade do desvencilhamento
da condição dependente latino-americana, uma vez que a concorrência
internacional e as trocas econômicas desiguais sempre determinam
que se reduzam os custos sociais da força de trabalho (ALVES, 2014,
p. 140). Nesse panorama, mais empregos formais são criados, com a
ascensão de setores populacionais antes altamente marginalizados e
postos de trabalho precários. Desses postos a maioria é preenchida por
jovens das camadas mais baixas e, de outro lado, por jovens fortemente
escolarizados em postos subalternizados.
Contudo, percebe-se que os impactos na morfologia do trabalho
permanecem, como: a redução do proletariado estável e tradicional,
com substituição de mão de obra flexível e desregulamentada, a
terceirização (Nos anos 2000 havia cerca de 3 milhões de trabalhadores
terceirizados e 15 milhões em 2013); trabalho temporário e parcial (part-
time); subcontratações; informalidade; a expansão do setor de serviços
e o desemprego no setor industrial; a exclusão de jovens e idosos do
mercado de trabalho, mas contraditoriamente o aumento do trabalho
infantil; a expansão do trabalho feminino – atingindo cerca de 40%
da força de trabalho na maioria dos países latino-americanos, com
remuneração 30% menor que a força de trabalho masculino e com uma
série de direitos cerceados e ocupação nos setores mais precarizados – ;
e o crescimento do trabalho em domicílio com a mescla do trabalho
doméstico (ANTUNES, 2011, p. 47-48).

196
Dessa forma, se observarmos os três fatores da superexploração do
trabalho pontuados por Marini, percebe-se que todos eles permanecem
em vigência de forma bruta aos trabalhadores e trabalhadoras brasileiros.
A remuneração da força de trabalho permanece abaixo de seu valor,
ainda que tenha havido melhoras significativas em comparação à década
de 1990, não fora possível recuperar as perdas salariais. O salário mínimo
ainda é menor do que o custo necessário para a reprodução da vida dos
trabalhadores, de forma que em 2011, por exemplo, o salário mínimo era
menos da metade do poder aquisitivo dos trabalhadores em comparação
com o ano de criação do salário mínimo em 1940. Ressalta-se, ademais,
que 55% da população ocupada recebe até 3 salários mínimos no Brasil
(LUCE, 2013, p. 133).
No que tange à prolongação da jornada de trabalho, verifica-se
que entre 2003 e 2009, cerca de 40% dos trabalhadores brasileiros
cumpria jornadas laborais semanais acima de 44 horas (limite previsto
na Consolidação das Leis Trabalhistas) e nas regiões metropolitanas
25,5% dos trabalhadores cumprem jornadas semanais de mais de 49
horas. Viu-se também um aumento das jornadas especialmente nos
setores de serviços e comércio (os que geraram mais empregos formais)
entre os anos de 1990 e 2006. Dados que se somam à flexibilização da
legislação trabalhista em relação à jornada – como o banco de horas, os
trabalhos aos domingos no comércio, a negociação de intervalos intra e
interjornadas (LUCE, 2013, p. 139).
Quanto à intensidade de trabalho, é difícil apresentar dados
concretos. Mas é possível afirmar que não houve incremento tecnológico
que possibilitasse o aumento da mais-valia relativa, mas sim que se
aprimorou no Brasil o modelo just-in-time de exploração do trabalho,
com medidas legislativas que combinaram a intensificação do trabalho
com a remuneração abaixo do valor, como é o caso da regulamentação
dos empregos em tempo parcial, postos temporários (de contratação

197
somente no auge de produção e comercialização nos setores industriais e
de comércio) e terceirizações. Outro dado que demonstra a intensificação
do trabalho é o aumento significativo de acidentes de trabalho registrados
no CAT (Comunicado de Acidente de Trabalho), a exemplo da elevação
de 47% de 1997 a 2008. Certamente houve uma ampliação dos registros e
na metodologia dos comunicados, mas o número é brutal e só demonstra
a crescente tendência capitalista dependente de aumentar o desgaste
físico-psíquico dos trabalhadores (LUCE, 2013, p. 145).
Obviamente as políticas implementadas na última década no
Brasil são historicamente nunca vistas, com elevação da condição da
camada mais pobre brasileira e deslocamento de postos informais
para formais, porém pouco se alterou na morfologia do trabalho no
Brasil, caracterizado pela superexploração da força de trabalho e do
esgotamento precoce dos trabalhadores e trabalhadoras que aqui vivem.
De forma que a grande contribuição da teoria marxista da dependência
se mostra mais visível que nunca: ou há uma alteração estrutural no
capitalismo dependente nos países latino-americanos ou a divisão
internacional do trabalho continuará a imperar, sendo que quem
“paga a conta” é a classe trabalhadora. Não é possível desenvolver o
subdesenvolvimento dentro dos marcos do capitalismo internacional.
Transformar o cenário do trabalho na América Latina é repensar o
modelo econômico em que estamos inseridos.

Referências

ALVES, Giovanni. Trabalho e neodesenvolvimentismo: choque de capitalismo e


nova degradação do trabalho no Brasil. Bauru: Projeto Editorial Práxis; Canal
6, 2014.
ANTUNES, Ricardo. O Continente do labor. São Paulo: Boitempo Editodial,
2011.

198
ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do
trabalho. 2. ed., rev., ampl. São Paulo: Boitempo, 2009.
AYERBE, Luis Fernando. Neoliberalismo e Política Externa na América Latina.
São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.
BAMBIRRA, Vânia. O capitalismo dependente latino-americano. Tradução de
Fernando Correa Prado e Marina Machado Gouvêa. Florianópolis: Insular,
2012.
BOITO JR, Armando. As bases políticas do neodesenvolvimentismo. Trabalho
apresentado na edição de 2012 do Fórum Econômico da FGV / São Paulo.
Disponível em: <http://eesp.fgv.br/sites/eesp.fgv.br/files/file/Painel%203%20
-%20Novo%20Desenv%20BR%20-%20Boito%20-%20Bases%20Pol%20
Neodesenv%20-%20PAPER.pdf>. Acessado em: 10.10.2014.
CARCANHOLO, Marcelo Dias. (Im)precisiones acerca de la categoría
superexplotacion de la fuerza de trabajo. En: Centro de Estudios e Investigación en
Ciencias Sociales. Revista Razón y Revolución, número 25 – debate sobre la
superexplotación. Buenos Aires: Ediciones RYR, ler. semestre de 2013.
CARCANHOLO, Reinaldo A. (Org.). Capital: essência e aparência. São Paulo:
Expressão Popular, 2011.
DUSSEL, Enrique Domingo. Hacia un Marx desconocido: un comentario de los
Manuscritos del 61-63. México, D.F.: Siglo Veintiuno Editores; Iztapalapa, 1988.
LUCE, Mathias Seibel. Brasil: ¿”Nueva clase media” o nuevas formas
de superexplotación de la clase trabajadora?. En: Centro de Estudios e
Investigación en Ciencias Sociales. Revista Razón y Revolución, número 25 –
debate sobre la superexplotación. Buenos Aires: Ediciones RYR, ler. semestre
de 2013.
MARINI, Ruy Mauro. Desenvolvimento e Dependência. Em: TRASPADINI,
Roberta; STEDILE, João Pedro (orgs). Ruy Mauro Marini – vida e obra. 2. ed.
São Paulo: Expressão Popular, 2011, p. 213-216.
MARINI, Ruy Mauro. Dialética da dependência. Em: TRASPADINI, Roberta;
STEDILE, João Pedro (orgs). Ruy Mauro Marini – vida e obra. 2ª ed. São
Paulo: Expressão Popular, 2011, p. 131-186.
MARINI, Ruy Mauro. Subdesenvolvimento e Revolução. Tradução de Fernando
Correa Prado e Marina Machado Gouvêa. Florianópolis: Insular, 2013.

199
MARTINS, Carlos Eduardo. Globalização, Dependência e Neoliberalismo na
América Latina. São Paulo: Boitempo, 2011.
MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. Livro I: o processo de
produção do capital. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo,
2013.
OSORIO, Jaime. Fundamentos de la superexplotación. En: Centro de Estudios e
Investigación en Ciencias Sociales. Revista Razón y Revolución, número 25 –
debate sobre la superexplotación. Buenos Aires: Ediciones RYR, ler. semestre
de 2013.
RUIZ ACOSTA, Miguel A. Devastación y superexplotación de la fuerza de trabajo en
el capitalismo periférico: una reflexión desde América Latina. En: Centro de Estudios
e Investigación en Ciencias Sociales. Revista Razón y Revolución, número
25 – debate sobre la superexplotación. Buenos Aires: Ediciones RYR, ler.
semestre de 2013.
SANTOS, Theotonio dos. Imperialismo y dependencia. Caracas, Venezuela:
Fundación Biblioteca Ayacucho, 2011.

200
PROPOSTA DE ESTUDO DAS LUTAS SOCIAIS NO BRASIL:
uma análise de caso a partir de Nancy Fraser
e István Mészáros

Ana Carolina Horst1


Deise Luiza da Silva Ferraz2
José Henrique de Faria3

1 Psicóloga pela Universidade Federal do Paraná. Advogada com bacharelado


em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa. Mestre em Organizações e
Desenvolvimento pela FAE Centro Universitário. Analista Judiciária no Tribunal de
Justiça do Estado do Paraná na área da Psicologia.
2 Doutora, Mestra e Bacharela em Administração pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul. Professora Adjunta no Departamento de Ciências Administrativas
e Professora Permanente do Centro de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração –
Cepead – da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas
Gerais. Pesquisadora Mineira FAPEMIG. Tutora no Programa de Educação Tutorial.
Coordenadora do Núcleo de Estudos Críticos sobre Gestão de Pessoas e Relações
de Trabalho (Nec-GPRT). Pesquisadora dos seguintes grupos de pesquisa: SOCIUS
(ISEG/UTL), Economia Política do Poder em Estudos Organizacionais (UFPR/
CAPES) e Trama: Trabalho e Marxismo (UFJF/CAPES). Trabalha com as seguintes
áreas científicas: Administração, Sociologia, Psicologia e Economia Política. Temas
atuais de interesse: Consciência de Classe, Objetividade-Subjetividade, Marxiologia,
Materialismo Histórico Dialético, Ciência e Ideologia, Políticas Públicas
3 Professor Titular da UFPR, no Programa de Pós-Graduação Administração
(Mestrado e Doutorado). Coordenador do Programa de Mestrado Profissional em
Governança e Sustentabilidade (ISAE-PR). Graduação em Ciências Econômicas pela
Faculdade de Administração e Economia FAE-PR (1974), Especialização em Política

201
1. Introdução

As lutas e as consequentes conquistas no âmbito dos direitos


sociais e trabalhistas alcançadas pela população ao longo do século XIX
e XX apontam para as mazelas geradas pela implantação hegemônica
do sociometabolismo do capital, como sistema portador de uma lógica
de exploração. Karl Marx, em seus estudos, já previa as desigualdades e
dificuldades às quais a classe trabalhadora estaria exposta, em função do
movimento de produção e acumulação de capital que, inexoravelmente,
produz um processo de pauperização dos trabalhadores. Esse não se
resume ao comumente referenciado poder de compra do trabalhador,
mas em considerar a relação entre a produção da riqueza social e sua
forma de distribuição. No que se refere à distribuição igualitária da
riqueza, pode-se afirmar que esta se torna impossível sob o modo
capitalista de produção devido à divisão desigual da propriedade dos
elementos simples do trabalho. Em outras palavras, uma distribuição
equânime da riqueza é incompatível com o sistema de capital e seu
processo de acumulação, pois este se edifica sobre a apropriação de
valor excedente. Mesmo que o processo de pauperização seja inerente
à acumulação do capital, esta pode intensificar-se ou arrefecer-se em
função das reivindicações e conquistas dos trabalhadores organizados.
Por esse motivo, os conflitos sociais constituem uma das forças capazes
de resistir ao domínio do capital e a análise destes conflitos permite
problematizar o processo de pauperização quanto a sua tonicidade.
Os conflitos sociais, conforme os “escritos de Jena” de Hegel,
seriam mecanismos de transformação social na construção de uma

Científica e Tecnológica pelo IPEA/CNPq (1983), Mestrado em Administração pela


Universidade Federal do Rio Grande do Sul – PPGA/UFRGS (1979), Doutorado em
Administração pela Universidade de São Paulo – FEA/USP (1984) e Pós-Doutorado em
Labor Relations pelo Institute of Labor and Industrial Relations – ILIR – University of
Michigan (2003).

202
sociedade em que as relações sociais estariam estruturadas a partir do
respeito e do reconhecimento intersubjetivo. (Faria, 2011, p. 06). Em
um primeiro momento, Fraser (2008) argumenta que os conflitos se
manifestam na luta pela distribuição igualitária da riqueza materialmente
produzida e pelo reconhecimento social. Entretanto, posteriormente,
Fraser (2002) argumenta que a construção de relações sociais justas
não se esgotariam nestes dois critérios, já que a justiça se constituiria
apenas quando houvesse também o alcance da paridade de participação
nas decisões que dizem respeito aos interesses da sociedade. É a partir de
uma interpretação democrática radical que Fraser defende a concepção
de que todos sejam considerados como pares para o regramento da
vida social (Fraser, 2008). Isso significa que a participação paritária
nos processos decisórios inclui a possibilidade de decidir acerca da
distribuição da riqueza e do reconhecimento social, ou seja, acerca
do processo de pauperização material e dos critérios valorativos que
determinam a exclusão social. Assim sendo, compõe a proposta de
modelo de análise dos conflitos sociais de Fraser (2008) as seguintes
categorias: reconhecimento social; redistribuição da riqueza material; e
representação paritária nos processos de decisão.
Os conflitos sociais, no âmbito das relações de trabalho
contemporâneas, geralmente são marcados pelas reivindicações
conduzidas pelas organizações sindicais. Os sindicatos atuam
apresentando propostas, participando de discussões, organizando
movimentos de paralização ou protesto etc., visando não só garantir
os direitos mínimos já conquistados pelos trabalhadores, como
também melhorar as condições de trabalho e de renda. Ao mesmo
tempo, diante das novas conformações sociais decorrentes do avanço
no desenvolvimento das forças produtivas, as organizações sindicais,
especialmente por meio das centrais sindicais, procuram ampliar suas
ações propondo políticas públicas para que a justiça social seja alcançada

203
em seu mais amplo conceito, garantindo igualdade de direitos e de
realização das necessidades da classe trabalhadora. Assim sendo, as
reivindicações não são permanentemente as mesmas, pois constituem
um movimento que transcende a concretude local da luta tendo em vista
a efetivação de uma política mais ampla, a qual é condicionada tanto pelo
contexto social, econômico e jurídico-político como pela particularidade
dos interesses de cada especialidade do trabalho produtivo, decorrente
da divisão técnica do trabalho.
No Brasil das últimas décadas, a ação sindical dos trabalhadores
tem sido avaliada como de cooperação com o movimento de acumulação
do capital por alguns pesquisadores. Para Alves (2005), a partir da
ofensiva do capital no campo da produção na década de 1970, constituiu-
se um novo e precário mundo do trabalho em que uma das características
centrais é a relação neocorporativa, de caráter propositivo, estabelecida
entre os sindicatos dos empregados e os empregadores, o que impõe
limitações às ações de contestação à lógica do capital. Esse processo
corporativo é identificado também por Iasi (2006), que menciona o seu
desdobramento para o avanço da constituição da consciência de classe,
apresentando-o como um movimento de regressão diante dos progressos
já obtidos historicamente.
A consciência de classe dos trabalhadores, que se aprimora por
meio do enfrentamento do processo expandido de acumulação do capital,
é uma condição necessária para a superação da autoalienação no trabalho
(Mészáros, 2008). Mészáros analisa a correspondência entre os
interesses contingentes e necessários das classes sociais, propondo a tese
de que os interesses contingentes da classe capitalista coincidem com
seus interesses necessários, tendo em vista que ambos repõem a alienação
no processo de trabalho. Por sua vez, isso não é verdadeiro para a classe
trabalhadora, tendo em vista que os interesses contingentes podem
contribuir para a reposição dos interesses necessários da classe oponente,

204
ou seja, a perpetuação das condições de exploração, enquanto se impõem
como necessidade histórica para a classe trabalhadora a superação
dessas condições. As reivindicações pela superação da autoalienação
correspondem, para Mészáros (2008), aos interesses necessários
que constituem a consciência da classe trabalhadora. Portanto, as
lutas sindicais, como mediadoras do movimento de constituição dos
interesses da classe trabalhadora, devem ser analisadas tanto em seu
conteúdo quanto em sua potencialidade para a construção de relações
sociais não alienadas. É com a intenção de apresentar um instrumento
analítico que permita tal análise que elaboramos as reflexões a seguir.
A construção deste instrumento de análise exigiu uma aproximação
entre as concepções de redistribuição material, reconhecimento social
e participação paritária, apresentadas por Fraser, e a concepção da
constituição da consciência de classe elaborada por Mészáros (2008),
a partir dos escritos de Marx, sintetizada nas categorias de interesses
contingentes e interesses necessários.
A análise da pauta de reivindicações dos professores do ensino
superior público federal do Paraná durante a greve de 2011 foi o objeto
empírico que permitiu a qualificação do instrumento. Cabe destacar
que esse objeto possui uma limitação importante no que se refere a sua
amplitude, visto que ele não reflete a totalidade das relações sociais
existentes no seu processo de construção. Por outro lado, não invalida
a pesquisa realizada uma vez que, ainda que com um campo empírico
reduzido – a pauta de reivindicação dos professores –, foi possível
analisar e estabelecer relações entre a luta social dos professores e
os conceitos teóricos propostos. Em suma, o objetivo deste estudo é
contribuir com a compreensão das limitações e possibilidades de luta
social dos movimentos sociais a partir de um modelo analítico que
considere tais categorias. Para tanto, foram analisadas as pautas de
reivindicações dos professores da Universidade Federal do Paraná. Esses,

205
ao construir suas reivindicações, tendem a repercutir diretamente no
devir dos conflitos sociais pela especificidade de sua atuação, pois trata-
se de trabalhadores que têm sob sua responsabilidade a tarefa de formar
outros trabalhadores e sua ação prática acaba servindo de exemplo para
ações futuras.
A partir do diálogo entre as teorizações de Fraser e Mészáros e
da pesquisa empírica realizada propõe-se um modelo que se desenvolve
sobre seis categorias de análise, conforme apresentado no item 1 deste
texto. A análise dos dados, apresentados no item 2, explicita de que
modo as reivindicações estão contempladas no modelo. Destaca-se que
nenhum modelo pode ter a pretensão de retratar o real em sua totalidade,
pois ele deve ser um instrumento que simplifique e esclareça as análises
sem deixar de identificar os aspectos importantes que permitam propor
explicações acerca do objeto de estudo (Dye, 2009).

2. Justiça Social e Consciência de Classe

Marx (2007) desenvolveu um detalhado e preciso estudo sobre


o modo de sociabilidade capitalista, demonstrando que seu ponto
nevrálgico é o movimento de acumulação da riqueza, por um lado, e,
por outro, o crescimento da pauperidade, constituindo, portanto, uma
sociabilidade que possuiu como um de seus desdobramentos fundantes
a injustiça. O fenômeno da justiça social não instaura um debate novo,
porém adquire contornos específicos conforme os valores morais de
determinada época histórica, como, por exemplo, as reivindicações que
nasceram na década de 1960 e pautaram o debate por meio da afirmação
da identidade de grupos considerados minorias e que permanecem até a
atualidade. A luta pela justiça social descolou-se da reivindicação pela
redistribuição do produto social do trabalho em direção à esfera da

206
intersubjetividade. Esfera que, para Fraser (2008), necessita permanecer,
porém sem obscurecer a luta pela justiça distributiva. Entende-se, aqui,
que a discussão acerca da justiça social carece de maior profundidade
em termos de uma estrutura de sociedade que se encontra dividida em
classes. Endente-se, também, em conformidade com o debate marxista,
que o movimento da classe-em-si para a constituição da classe-para-
si necessita passar pelo reconhecimento social da classe, pelo acesso
igualitário à riqueza produzida e pela participação paritária nos
processos de decisão.
As propostas analíticas de Fraser permitem avançar no debate
sobre as injustiças para além do mero reconhecimento da identidade
do grupo, recuperando o debate sobre as classes. Porém, encontra como
limitação analítica a não superação do horizonte intelectual dos que
advogam pela democracia radical, acreditando na possibilidade de uma
equidade discursiva como móvel central para a construção de uma
sociedade justa. Para tratar desse ponto, considera-se necessário aportar
uma discussão realizada por Mészáros (2008) acerca da construção
da consciência de classe a partir da identificação dos interesses
contingentes e necessários, uma vez que ela permite compreender
que a justiça não ocorre apenas por meio da construção de campos
simétricos de discursividade. Isso porque a linguagem como elemento
estruturado e estruturante das relações sociais tem como pressuposto
constitutivo, sob o sociometabolismo do capital, uma distribuição
desigual dos elementos determinantes das relações sociais de produção.
Tal distribuição é reforçada pela desigualdade do discurso que, ao ser
elaborado, permanentemente a confirma, de modo que o próprio conceito
de justiça tem como determinante a ética capitalista. A desigualdade da
distribuição da qual Mészáros se refere é aquela analisada por Marx e
que tem como desdobramento a formação de uma injustiça social.

207
Ao aportar Mészáros à discussão das categorias apresentadas
por Fraser, está se propondo também um refinamento à proposta da
autora que, em termos práticos, permitirá analisar as possibilidades de
constituição da consciência de classe para si que a classe trabalhadora
está criando ao estabelecer, por meio de reivindicações, o embate com
a classe capitalista. Para tanto, serão abordadas, a seguir, com maiores
detalhes as discussões dos conceitos propostos por Mészáros e Fraser.

2.1 A Justiça Social Segundo as Categorias de Análise de Nancy Fraser

A análise da justiça social, para Nancy Fraser, deve ser realizada


a partir de três categorias: a do reconhecimento social, que está ligada à
dimensão cultural; a da redistribuição da riqueza material, que abrange a
esfera econômica; a da paridade de participação, que remete à dimensão
política. As três categorias encontram-se entrelaçadas na realidade,
estão imbricadas e se reforçam dialeticamente. Portanto, existem
separadamente apenas na realidade teórica como elementos didáticos
(Faria, 2011).

Apenas abstraindo a complexidade do mundo real pode-se divisar


um esquema conceptual que possa iluminá-lo. […] Mesmo a mais
material instituição econômica tem uma dimensão cultural constitutiva,
irredutível. Reciprocamente, mesmo a mais discursiva prática cultural
tem uma dimensão político-econômica constitutiva, irredutível.
(Fraser, 2008, p. 13).

Para Nancy Fraser, as demandas por reconhecimento efetuadas


por movimentos sociais, em virtude da nova configuração mundial
globalizada e multicultural da era pós-socialista, fizeram com que se
alterassem as análises dos antigos conflitos de classe por conflitos de
identidade social advindos das reivindicações e problematizações acerca

208
da dominação cultural. A mundialização do capital, pós-reorganização
produtiva, teria gerado uma nova gramática de reivindicação política,
da redistribuição para o reconhecimento (FRASER, 2002). Com isso,
desvaloriza-se a luta política de classe e a categoria econômica, de forma
que a proeminência da cultura se sobrepõe ao mesmo tempo em que se
verifica o declínio das políticas de classe. Os conflitos sociais teriam
se apresentado com uma desconexão entre as dimensões culturais e
econômicas, sem tematizar as desigualdades econômicas marcadas pela
injustiça inerente ao sistema capitalista.
As reivindicações de igualdade econômica são hoje menos salientes
do que durante o apogeu fordista do Estado-Providência keynesiano.
Os partidos políticos que antes se identificavam com projetos de
redistribuição igualitária abraçam hoje uma escorregadia “terceira via”,
cuja substância verdadeiramente emancipatória, quando a têm, está
mais relacionada com o reconhecimento do que com a redistribuição.
(Fraser, 2002, pp. 08-09).
Fraser considera que o deslocamento ocorre pelo fato de a
discussão sobre o reconhecimento ocorrer pela via da equidade das
identidades sustentada por uma ética valorativa que considera a
opção dos grupos pelo que julgam ser “o bem viver”. Conforme destaca
Silveirinha (2005, p. 34):

A razão porque estas pessoas devem ser reconhecidas não pode ser
porque as reconhecemos através de um critério ético relativamente
às formas de vida por si escolhidas. Porque, se assim fosse, também
teriam direito a reconhecimento, como direito a procurar uma forma
de autorrealização, as identidades racistas. O critério tem antes de
ser de justiça assente numa base de paridade participativa e, portanto,
também comunicacional.

Desse modo, Fraser (2008) considera que, para que ocorra a


paridade participativa, é necessário manter as reivindicações da

209
esfera cultural ao lado da esfera econômica. Para isso, Fraser busca o
conceito de status social, por meio da teoria do reconhecimento, para
complementar o debate das desigualdades econômicas pela via da esfera
cultural, possibilitando a tridimensionalidade da vida social: cultural-
econômica-política.

It is unjust that some individuals and groups are denied the status
of full partners in social interaction simply as a consequence of
institutionalized patterns of cultural value in whose construction they
have not equally participated and which disparage their distinctive
characteristics assigned to them. (Fraser, 2008, p. 39).

A categoria do reconhecimento social, por meio da discussão


acerca das hierarquias de status, permite que Fraser (2008) resgate as
discussões sobre as classes sociais. Para Fraser (2008), uma sociedade
estruturada em classes constitui uma hierarquia de status que, por
sua vez, é constituinte da reprodução da estrutura de classes. Ambas
obstaculizam uma participação paritária. Enquanto a estrutura de
classes impõe restrições ao acesso às oportunidades de participação
igualitária, a hierarquia de status nega aos indivíduos o reconhecimento
da paridade. Diante do prestígio conferido aos diferentes componentes
das classes, seus status sociais, cada um participa ativamente de acordo
com o reconhecimento que lhe seja atribuído pela coletividade. Os mais
reconhecidos são os que têm maior espaço para participação política
ou, pelo menos, maior espaço de apresentação do seu discurso e de
valorização no espaço público.
De acordo com Faria (2011), em um primeiro momento, quando
da discussão com Axel Honneth (Fraser & Honneth, 2003)
Fraser concentra seus argumentos na polarização entre a questão da
redistribuição da riqueza e do reconhecimento social. Posteriormente,
Fraser (2009) introduz na discussão a categoria da participação

210
paritária como um terceiro elemento para a análise dos critérios de
justiça social. É pela dimensão de participação paritária que fica claro
quem pode reivindicar por redistribuição e reconhecimento e como
tais reivindicações serão debatidas e julgadas, afirma Fraser (2009). “A
justiça requer arranjos que permitam a todos os membros (adultos) da
sociedade interagir entre si como pares” (Fraser, 2002, p. 13) e ainda:

O significado mais geral de justiça é a paridade de participação. De


acordo com esta interpretação democrática radical do princípio de
igual valor moral, a justiça requer acordos sociais que permitam a
todos participar como pares na vida social. Superar a injustiça significa
desmantelar os obstáculos institucionalizados que impedem a alguns
participar em igualdade com outros, como sócios com pleno direito na
interação social. (Fraser, 2008, p. 39).

Fraser (2002) destaca que só haverá paridade de representação


na medida em que ocorra tanto a distribuição de recursos materiais que
assegurem independência e voz dos participantes, garantindo iguais
oportunidades para alcançar a consideração social, quanto padrões
institucionalizados de valor cultural que exprimam igual respeito por
todos os participantes.
A questão que se desdobra da explanação de Fraser acerca da
construção de uma justiça social, nos termos por ela postos, refere-
se às limitações concretas das condições de uma redistribuição
material efetiva que possibilitem romper com a estrutura valorativa
dos status sociais, construindo, portanto, as (im)possibilidades
de participação paritária. Conforme discutido anteriormente é da
natureza do sociometabolismo do capital o processo de pauperização,
a distribuição desigual da riqueza social e, por conseguinte, uma
hierarquização do status. Refletindo acerca dessa questão, torna-se
necessário acrescentar à discussão de Fraser os argumentos acerca da

211
consciência de classe propostos por Mészáros, tendo em vista que essa
se relaciona tanto com a estrutura de classe quanto com a estrutura
de status e se constrói na participação nas duas esferas, ainda que não
seja uma participação consciente nem paritária.

2.2 Consciência de Classe: Interesses Contingentes e Necessários em


Mészáros

De acordo com a interpretação de Mészáros (2008), para


Marx (2008), a ideologia – que se (re)produz pelas diferentes formas
discursivas – compõe a consciência social de uma época e se constitui das
percepções herdadas e construídas pelos sujeitos a partir das relações
estabelecidas para a produção da vida material. Sob o sociometabolismo
do capital, as relações ocorrem conforme a estrutura de classes e,
portanto, a consciência social da época manifesta-se como consciência
de classe.
Ainda segundo Mészáros (2008), a (re)produção mútua das
classes se dá como se as relações sociais estabelecidas sob o capital fossem
leis universais que se impõem sobre o homem, e não produtos sociais
da própria forma de organização do modo de produção e distribuição
econômica. Tais relações estruturadas e estruturantes geram condições
objetivas e subjetivas de classes reciprocamente correspondentes, de
maneira que o enriquecimento de uma prescinde do empobrecimento
da outra.

O próprio trabalhador produz, por isso, constantemente a riqueza


objetiva como capital, como poder estranho, que o domina e explora, e
o capitalista produz de forma igualmente contínua a força de trabalho
como fonte subjetiva de riqueza, separada de seus próprios meios de
objetivação e realização, abstrata, existente na mera corporalidade
do trabalhador, numa só palavra, o trabalhador como trabalhador

212
assalariado. Essa constante reprodução ou perpetuação do trabalhador
é a condição sine qua non da produção capitalista (Marx, 2007, p. 195).

Para Mészáros (2008), a ruptura com o que se pode chamar


lógica da (re)produção do sociometabolismo do capital passa por
estranhar criticamente tal conjunto de “leis” que são impostas com o
status de leis naturais. Assim, é necessária, embora não como condição
suficiente, a constituição da consciência da necessidade da superação
da autoalienação do trabalho. Mészáros (2008) argumenta, a partir
de sua interpretação de Marx, que essa é a tarefa histórica da classe
trabalhadora, tendo em vista que são os trabalhadores os sujeitos da
alienação. As condições objetivas necessárias para o enfrentamento e
a superação das desigualdades impostas pelo sistema capitalista só
atingirão maturidade com o desenvolvimento da “autoconsciência
como consciência da necessidade de desalienação” (Mészáros,
2008, p. 64), entendida como fator “subjetivo” crucial para o processo
de justiça social.
A luta de classes, nesse contexto, aponta para a capacidade
emancipatória da classe trabalhadora em busca da justiça social negada
pelo sistema capitalista de produção. Luta esta que compõem a esfera
política e que só é possível pela constituição de uma consciência que
corresponda à concretude das relações antagônicas existente entre
capital e trabalho, estando o último subsumido à necessidade de
valorização do primeiro. Portanto, da formação de uma consciência de
classe que tencione a superação da alienação a que a lógica capitalista
submete os sujeitos nela inseridos. Posto está que o interesse necessário
da classe trabalhadora corresponde à necessária superação das relações
antagônicas de produção, em suma, a superação da propriedade privada
e do trabalho alienado, que impõe a subordinação estrutural do trabalho
ao capital.

213
Assim, o que está em pauta não é a questão de como obter ‘um melhor
salário para o escravo’ (Marx) nem mesmo a questão de uma mudança
no tom de voz – cuidadosamente filtrado pela ‘engenharia humana’ [ou
o setor de Gestão de Pessoas] – que transmite os ditames da produção
de mercadorias para os trabalhadores, mas uma reestruturação radical
da ordem social vigente. (Mészáros, 2008, p. 69).

Mészáros (2008) aponta a dialeticidade do desenvolvimento da


consciência de classes como uma condição historicamente inevitável.
Esse desenvolvimento é fruto da mediação necessária da atuação humana
autoconsciente, que demanda a instituição de organizações coletivas que
permitam intervenções dinâmicas no curso do desenvolvimento social.
Sendo assim, Mészáros (2008, p. 89) apresenta duas possíveis formas de
construção de consciência de classe: a consciência de classe contingente
e a consciência de classe necessária. “A consciência de classe contingente
(...) percebe simplesmente alguns aspectos isolados das contradições, [a
consciência de classe necessária] as compreende em suas interrelações,
isto é, como traços necessários do sistema global do capitalismo.”

Por outro lado, a classe se autonomiza, por sua vez, em face dos
indivíduos, de modo que estes encontram suas condições de vida
predestinadas e recebem já pronta da classe a sua posição na vida e,
com isso, seu desenvolvimento pessoal; são subsumidos a ela (Marx,
2007, p.63)

A consciência de classe necessária do agente do trabalho está,


portanto, diretamente relacionada com o conceito de interesse necessário
da classe, pela essencialidade da subordinação e da oposição estrutural
das classes no sistema capitalista. Entretanto, como já destacaram
Marx e Mészáros, os indivíduos por si só não dão conta da totalidade
das relações sociais. Estando “quer queiram ou não, […] subordinados
à ‘existência independente’ que as classes adquirem no curso do seu

214
desenvolvimento” (Mészáros, 2008, p. 75), são as relações alienadas
que primeiro aparecem à consciência social do indivíduo, ainda que,
em contradições parcializadas. A consciência contingente é, portanto,
esta que está posta e que percebe partes das contradições inerentes ao
sistema capitalista, que percebe, por exemplo, a injustiça social apenas
em termos de não reconhecimento das identidades grupais.
Por sua vez, a perpetuação da alienação do trabalho é o que
permite a reprodução das classes e, consequentemente, a reprodução
do domínio do capital sobre o trabalho. Desse modo, para Mészáros, à
classe capitalista interessam mudanças que possam perpetuar o controle
antagônico do sociometabolismo da humanidade, enquanto à classe
trabalhadora essas mudanças apenas reforçam sua subsunção formal
e(ou) real.
Mészáros ainda menciona a relação entre os interesses individuais
e os interesses das classes e como suas diferenças aparecem entre as
duas classes. Para a classe capitalista, os interesses individuais coincidem
com os interesses gerais da classe enquanto para a classe trabalhadora­
tal coincidência é apenas contingente. Em outros termos, os interesses
dos diferentes indivíduos da classe capitalista são necessários para a
perpetuação do sociometabolismo do capital, de modo que os interesses
contingentes desses indivíduos, tomados ou não em grupos, tendem
a coincidir com os interesses necessários da classe, sua consciência
necessária de classe. A burguesia visa manter “o auto-interesse individual
dos membros particulares do grupo dominante [que] está diretamente
relacionado ao objetivo geral de retenção da posição privilegiada e
estruturalmente dominante que o grupo, como um todo, tem na
sociedade.” (Mészáros, 2008, p. 69).
As diferenças entre os interesses da classe dominante e da classe
dominada e o exercício de poder daquela sobre esta permitem que as
reformas e concessões conquistadas pela classe trabalhadora sejam

215
aquelas que podem ser incorporadas ao sistema capitalista, prolongando
a subordinação existente. Para Mészáros (2008), entretanto, há uma
força compensatória nessa relação, uma vez que, com o impacto dessas
reformas e concessões no desenvolvimento das forças produtivas,
contribui-se para a maturação das contradições sociais, que, por sua vez,
tensiona o movimento da constituição da consciência, da parcialidade à
totalidade das contradições. Desenvolver o interesse de classe necessário
significa, desse modo, perceber as contradições do sistema capitalista
e questionar o estado de ordem das coisas, questionando, inclusive, a
propriedade privada, ainda que se trate de um conflito social de ordem
local. Nas palavras de Mészáros (2008, p. 85):

Mesmos os fenômenos de conflito social de aparência puramente local


têm de ser relacionados à totalidade objetiva de um estágio determinado
do desenvolvimento econômico. Sem um esforço consciente de interligar
os fenômenos sociais específicos às tendências gerais e às características
do capitalismo como sistema global, o significado desses fenômenos
permanece obscuro.

Cabe, portanto, aos trabalhadores identificar os seus interesses


de classe contingentes e necessários, para que, pela interconexão de
ambos, possam potencializar o movimento progressivo da consciência
de classe (Ferraz, 2010), possibilitando condições concretas de
ação consciente dos trabalhadores na luta de classes rumo à superação
da autoalienação. Nesse sentido, a mobilização política em defesa
de interesses contingentes pode vir a possibilitar o tensionamento
das relações estabelecidas entre as classes sociais em sua totalidade,
desnaturalizando as estruturas sociais de produção mútua das classes e
tensionando a luta entre elas – ainda que essa não tenha sido a intenção
inicial de seus agentes.
As argumentações de Mészáros em sua interpretação de Marx
sugerem que a injustiça social do sistema capitalista apontada por Fraser

216
se constitui pela persistência da submissão do trabalho ao capital. A
injustiça social, portanto, não é um fator social autônomo e abstrato, mas
histórico e condicionado às relações sociais de produção das condições
de existência. Assim, a permanência da distribuição desigual da riqueza
material em prol da acumulação e da centralização do último desencadeia
uma estruturação valorativa de status, tendo em vista que a compreensão
das relações sociais ocorre pela parcialidade das mesmas. Considerando
que para Fraser a construção da justiça social precisa, em termos
didáticos, ser distinguida entre reivindicações na esfera econômica,
na esfera política e na esfera cultural, respectivamente, as lutas pela
redistribuição, pela participação paritária e pelo reconhecimento, pode-
se mencionar que os interesses, sejam contingentes ou necessários,
sejam do trabalhador ou do comprador da força de trabalho, se
manifestam na concretude das relações sociais de distintas formas,
conforme apontamentos de Fraser. Desse modo, defende-se, aqui, a
proposição de que a análise das lutas sociais por meio das categorias
redistribuição, reconhecimento e participação paritária necessitam
identificar a relação entre essas e a constituição da consciência de classe,
ou seja, a potencialidade dessas lutas no desenvolvimento dos interesses
contingentes ao necessário.
Nesse sentido, sugere-se que, para além da identificação dos
critérios de mobilização social nas distintas instâncias, seja também
problematizada a potencialidade das mesmas como mobilizadoras
da compreensão das contradições percebidas de forma individual/
particular e suas relações com a totalidade. Em suma, uma análise
das reivindicações dos grupos sociais na relação com os interesses
contingentes e necessários.
A composição das duas propostas em forma de um modelo
analítico decorre do fato concreto de que a efetivação de uma participação
paritária não se efetua na prática em função do condicionante estrutural

217
da desigualdade de distribuição e reconhecimento, pois a possibilidade
de justiça social é historicamente construída por meio da luta por
igualdade nessas instâncias. É essa condição relacional que mobiliza os
sujeitos da prática social. Ao mesmo tempo, a ação prática se desenvolve
sobre o condicionante da compreensão parcializada das relações sociais
impostas pela contradição fundamental do sociometabolismo do capital.
Para Mészáros, essa parcialidade limita a constituição da consciência de
classe necessária à emancipação humana fazendo o embate permanecer
nas relações parcializadas entre os agentes. Desse modo, o movimento
rumo à totalidade permite a potencialidade da constituição de uma
solidariedade entre os grupos da classe, o que tensiona o movimento de
constituição da classe para si.
O movimento da parcialidade à totalidade é, consabidamente,
dinâmico e estabelecido de forma relacional, portanto pode conter
tanto o movimento de progressividade quanto de regressividade na
progressividade avançada, para usar um termo de Iasi (2006). Esse
movimento é representado na Quadro 1 pelas flechas de saída dupla. As
linhas tracejadas mostram a inexistência de limites absolutos entre as
instâncias, de modo que um mesmo elemento que é tomado como móvel
de reivindicação em uma das instâncias pode apresentar potencialidade
de desdobramentos oportunos em qualquer uma das outras, inclusive
na própria.

218
Quadro 1 – Modelo Analítico para Estudo dos Conflitos
Sociais de Classe

Instâncias
Interesse Contingente Interesse Necessário
Consciência
de Classe

Econômica Redistribuição Material Imediata Redistribuição Material Ampliada

Cultural Reconhecimento Social Imediato Reconhecimento Social Ampliado

Política Participação Paritária Imediata Participação Paritária Ampliada

Elaboração dos Autores

Em suma, a relevância dessa aproximação entre as construções


teóricas analíticas de Fraser e Mészáros possibilita problematizar
elementos que estabeleçam uma solidariedade intraclasses no sentido
de compreensão dos grupos sociais parcializados, em função da divisão
social do trabalho cada vez mais especializada. A potencialidade desse
modelo, em termos analíticos, corresponde à abertura para a discussão
das limitações das demandas dos grupos intraclasses e o tensionamento
para a superação das parcialidades, atentando, portanto, para as relações
recíprocas estabelecidas entre os interesses contingentes dos sujeitos
submetidos ao capital e a relação com os interesses necessários desses
sujeitos rumo ao estabelecimento de relações emancipadas.

219
Este modelo permite que se efetue uma análise, ainda que não
em toda sua extensão, da pauta dos professores universitários de uma
instituição de ensino federal localizada no Estado do Paraná. A análise
exposta a seguir não pretende esgotar o tema, mas apenas exemplificar
as potencialidades do modelo analítico proposto.

3. A Análise da Pauta das Lutas dos Professores da UFPR

A crescente precarização das relações de trabalho, a desvalorização


da atividade e a desqualificação da força de trabalho refletem a história
da produção capitalista que visa à subsunção tanto da vida produtiva
como da vida social, à produção da mais-valia. Sendo assim, a educação
também assume o caráter de mercadoria, devendo mostrar resultados e
produtividade para atestar sua eficiência, repercutindo, como atestam
outros estudos (Ferreti, 2002; Frigoto, 1998), diretamente na
qualidade do ensino oferecido e na saúde dos trabalhadores.
Os professores de ensino público compõem uma categoria de
trabalhadores que apesar de não estar diretamente inserido no processo
de produção de mais-valia, contribui, com suas atividades, para a
valorização do capital, seja por meio de pesquisas que são incorporadas
no processo produtivo, seja pela preparação da força de trabalho
demandada pelo “mercado”. Desse modo, a luta dos professores constitui-
se como luta dos trabalhadores. Contudo, a relevância da atuação
reivindicatória dos professores na sociedade é por vezes secundarizada
em face das reivindicações de outras categorias profissionais ou até
mesmo intracategorias. No Brasil, por exemplo, a disparidade entre a
remuneração e as condições de trabalho dos professores universitários
e os professores secundaristas e de ensino básico torna alguns pontos
das pautas dos primeiros questionáveis pelo senso comum. Esse é um
dos desdobramentos das diferenças de status sociais.

220
O maior poder de compra dos professores universitários em
relação à grande parte da população e o capital intelectual distintivo
desses profissionais os coloca em uma posição que, na aparência
das relações sociais, os salvaguardam do processo de precarização.
Entretanto, na concretude das relações de trabalho dos docentes
universitários, tal processo é vivenciado, por exemplo, por meio da
exigência do aumento da produtividade, segundo critérios definidos
pelo CNPq e pela Capes que são em grande medida alheios à realidade
da função social da docência e da pesquisa, direcionando o trabalho
dos professores não para o que é socialmente mais importante, mas
para o que mais pontua. Diante dessa realidade, os professores do
ensino público superior, coletivamente organizados, buscam alterar a
realidade imposta objetivando “garantir a qualidade e autonomia das
Universidades Públicas, condições dignas para o exercício profissional,
isonomia e garantia no emprego, a democratização das instituições e das
relações de trabalho”. (Andes, 2011).
A análise das reivindicações dos professores da UFPR, neste
texto, é realizada por meio da pauta publicada na website do sindicato
representante da categoria. Nela constam os pontos considerados móvel
de luta pelos professores reunidos em assembleia e que embasou a
greve de 2011. O texto foi confrontado com o modelo construído pela
convergência das categorias de Fraser e Mészáros. Alguns pontos
específicos necessitaram a compreensão do contexto do qual emergem,
como a reivindicação pela avaliação do estágio probatório, por
exemplo. Isso demandou uma coleta de informações com membros dos
sindicatos. Esse processo ocorreu por meio do relato explicativo dos
pontos questionados. A escolha desses membros foi por conveniência.
Os diálogos não foram analisados, por não serem objetos desse estudo,
mas subsidiaram a compreensão dos pontos em si.
Antes de iniciar a análise propriamente dita, é preciso esclarecer
que, em termos clássicos, as reivindicações de funcionários públicos

221
junto aos governantes poderiam ser teoricamente rechaçadas como
luta de classes. Contudo, tais profissionais são destinatários do fundo
público e esse é constituído por parte da riqueza socialmente produzida
que é apropriada pelo Estado em forma de tributo. Assim, as atividades
dos professores se não atendem às demandas da classe trabalhadora,
atenderão às da classe capitalista. Portanto, conforme destaca Oliveira
(1998), a destinação do fundo público é um móvel de luta entre classes
sociais. Este esclarecimento se torna necessário por conta da concepção
de trabalho produtivo (aquele que produz mais-valia) e improdutivo
(aquele que não gera diretamente valor excedente). Embora não inseridos
diretamente no processo de produção de mais valor, os professores
compõem uma categoria social implicada nesta produção, seja como
artífices do desenvolvimento científico e tecnológico apropriado pelo
capital, seja como desenvolvedor de estratégias de gestão e de realização
do valor gerado, seja como intelectual orgânico (para usar o conceito
gramsciano) da classe trabalhadora.
Esclarecida essa questão, convém destacar-se que há pontos
reivindicatórios que compreendem mais do que uma categoria.
Como já explicitado, as categorias de análise constituem recursos de
pesquisa, pois concretamente não se pode conceber a realidade atuando
enquadrada em “departamentos analíticos”. Assim, na análise aqui
empreendida foram sublinhados os aspectos mais marcantes de cada
ponto e, em alguns casos, esses foram avaliados em sua completude para
afirmar a reciprocidade entre as categorias. O Quadro 02 apresenta de
forma sintética os pontos analisados e sua categorização central.

222
Quadro 2 – Consciência de Classe e Interesses

Instâncias
Interesse Contingente Interesse Necessário
Consciência
de Classe

Redistribuição Material Imediata Redistribuição Material Ampliada

Estabelecimento de limite máxima de 12 horas-aula Posicionamento dos Conselhos sobre os cursos pagos na
para professores em regime 40h e DE de 10 horas/aula UFPR
para professores em regime de 20h (alteração da Melhoria das condições que garantam a qualidade do
resolução 108 /00 do CEPE) . ensino, pesquisa e extensão em todos os Setores e
Estabelecimento de limite máximo de alunos por sala particularmente naqueles que aderiram aos programas de
de aula, respeitando particularidades e diversidades dos adesão a projetos de expansão e ou ampliação de vagas na
cursos e suas diretrizes curriculares . Universidade (Reuni, Expandir e outros) e garantia de
Econômica Limitação da abertura de novas vagas/turmas nos
cursos sempre que se ultrapassarem os limites máximos
infraestrutura necessária para a realização das atividades
de ensino, pesquisa e extensão, sem a qual não devem ser
dos critérios acima estipulados (número máximo de abertos novos cursos e/ou vagas (salas, bibliotecas,
horas-aula dos docentes e número máximo de alunos laboratórios, etc)
por sala de aula) ou que não apresentem condições Exigência da contrapartida do governo em recursos
estruturais de funcionamento . humanos (servidores docentes e técnicos-administrativos )
Revisão dos valores de bolsa para professor sênior e infraestrutura sob pena de não abertura de processo
(conforme o realizado para os substitutos) e retirada da seletivo .
restrição de atuação dos mesmos na pós-graduação Garantia de moradias estudantis em todos os campi da
latu -sensu. UFPR .
Funções Gratificadas para todas as Coordenações e
chefias de Departamentos .

Reconhecimento Social Imediato Reconhecimento Social Ampliado


Implantação de progressão automática na carreira . Contra o PL 1749 /2011 , que privatiza a saúde e a
Realização imediata da avaliação de Estágio Probatório educação, fere a autonomia universitária, precariza o SUS
dos docentes do Setor Litoral (e demais Setores em que e os HU’s e restringe o acesso dos estudantes da UFPR no
isso ocorra), que mesmo após cinco anos na HC .
Cultural Universidade ainda não passaram por nenhum tipo de
avaliação, com garantia de estabilidade aos mesmos .
Melhorar a acessibilidade para pessoas com necessidades
especiais .
Reconhecimento institucional dos casos de assédio na
UFPR .
Regularização dos ambientes da UFPR de acordo com
os laudos já realizados, que comprovam a insalubridade
e avaliação nos demais ambientes .

Participação Paritária Imediata Participação Paritária Ampliada

Eleição direta para a Direção do Centro de Educação Estatuinte já! Constituição de uma coordenação paritária
Física e Desportos (CED) dos três segmentos universitários para realização de um
Estabelecimento de uma política de pós-graduação da Congresso Universitário que redefinirá o conceito de
UFPR que fortaleça a produção do conhecimento que UFPR e seus contornos jurídicos .
contemple os seguintes aspectos: a) transparência dos
critérios de credenciamento e recredenciamento de
Política docentes; b) transparência na distribuição e utilização
dos recursos pelos programas e; c) garantia de
representação nos conselhos setoriais .
Manutenção da comissão de saúde do trabalhador
composta pela APUFPR -SSIND, SINDITEST e
PROGEPE, conferindo a essa instância caráter
deliberativo quanto a resolução das questões relativas a
essa temática a serem executadas pela PROGEPE

223
A análise da pauta de reivindicações dos professores da UFPR
aponta tanto para reivindicações de interesses que claramente se referem
às questões individuais (maiores salários, menor carga horária de sala de
aula, melhoria de infraestrutura, entre outros) e que compõem o quadro
dos interesses de classe contingente, quanto para interesses mais amplos,
que abarcam interesses da sociedade de modo geral, contribuindo para
a melhoria das condições sociais, integrando o que se pode entender
como interesses de classe necessários (reivindicação de participação
paritária nas decisões, posicionamento contrário a privatização da saúde
e da educação, garantia de condições de igualdade para portadores de
necessidades especiais, entre outros). Cada um dos itens apresentados
no Quadro 02 refere-se primordialmente a uma das categorias de Nancy
Fraser, as quais foram ponderadas, para efeito de análise, pela proposição
de Mészáros sobre os interesses contingentes e necessários.
As reivindicações que se referem à redistribuição material
se relacionam, conforme a descrição de Mészáros, com interesses
contingentes de classe, tanto em sua manifestação particular da
categoria, quanto na manifestação do interesse social mais amplo,
configurando a redistribuição material e a redistribuição material
ampliada, respectivamente. Ambos os interesses impactam na repartição
do fundo público, isto é, na repartição da riqueza social apropriada pelo
Estado, reivindicando maior investimento na educação, que repercutirá
em valorização do valor, com força de trabalho melhor formada,
reduzindo custos de qualificação para o sistema de capital.
Os interesses de classe contingentes que visam a uma distribuição
material circunscrita à categoria se apresentam nas reivindicações de
cunho individual dos professores, ainda que expressos coletivamente,
tendo em vista que buscam remuneração adequada à contrapartida
social do trabalho desenvolvido na universidade e à limitação das
horas/aula e do número de alunos em sala de aula. Com essa pauta, a

224
discussão concerne ao valor da mercadoria força de trabalho do docente,
seja pelo aumento salarial, seja pela diminuição da produtividade.
A reivindicação pela limitação da produtividade docente, medida
em número de “alunos produzidos”, desdobra-se na demanda pela
contratação de novos professores dado o aumento do número de vagas
nas universidades públicas.
Já os interesses ligados à redistribuição material ampliada
apresentam-se nas questões que estão para além de interesses individuais
ou de retorno material individual, configurando reivindicações
extracategoria, na medida em que tais itens refletem interesses de ordem
social que visam garantir melhorias nas condições de vida da sociedade.
Os professores, ao inserirem na pauta de reivindicação a melhoria de
infraestrutura para as atividades de ensino e pesquisa, de condições que
garantam a qualidade de ensino, principalmente no caso de adesão ao
Reuni e Expandir, e ainda, de moradia estudantil, caminham para uma
reivindicação de repartição do fundo público em benefício da sociedade
de modo geral e, nesse ponto, indicam reconhecer a condição do outro,
de modo que a luta pela redistribuição material ampliada imbrica-se à
categoria do reconhecimento. Trata-se dos docentes, reconhecendo a
condição de status dos discentes e demais membros da sociedade.
Se a luta dos docentes aponta para o reconhecimento do outro,
ela também indica a reivindicação por reconhecimento, que pode ser
dividida em reconhecimento social e reconhecimento social ampliado.
O reconhecimento social é aquele no qual o sujeito quer ser reconhecido
nos seus direitos, a partir da atividade desenvolvida, do empenho
colocado para a realização do seu trabalho. Já o reconhecimento social
ampliado é aquele cuja repercussão está para além do reconhecimento
dos direitos do trabalhador no exercício de suas atividades, está para
um reconhecimento que abrange parcelas da sociedade no ambiente da
universidade e fora dele, em que se considera o outro como sujeito de
direito a despeito da categoria à qual pertence.

225
O interesse de classe contingente referente à realização de estágio
probatório relaciona-se com direitos dos professores já expressamente
previstos na legislação pertinente e que, contudo, não têm sido
respeitados pelos agentes públicos competentes. Há ofensa, portanto,
ao direito regulamentado dos professores quanto à legislação que
determina a realização do estágio probatório ao término do período
exigido em lei. O reconhecimento reivindicado nesse caso é tão somente
o reconhecimento do direito já reconhecido pela legislação brasileira.
No item referente ao assédio moral verifica-se a ocorrência de um
duplo desrespeito ao profissional. Há o desrespeito que determinados
servidores exercem, ao atacar repetida e voluntariamente seus pares,
subordinados ou superiores acarretando danos à saúde do agredido, que
tem sua integridade, dignidade e personalidade ferida no ambiente de
trabalho e há, novamente, o desrespeito ao trabalhador ao lhe ser negado
o combate e a punição dentro do ambiente em que o mesmo ocorreu.
Trata-se, portanto, da estrutura institucional oportunizando o não
reconhecimento do professor enquanto sujeito de direito.
Com relação ao reconhecimento social ampliado verifica-se que
a contrariedade ao projeto de lei que privatiza a saúde e a educação
é um item de pauta que abarca tanto a questão da redistribuição
material ampliada quanto o reconhecimento. Todavia, cabe destacar
o reconhecimento em função desta instância demonstra que a saúde e
a educação são direitos sociais inalienáveis e, deste modo, não devem
responder aos interesses de agentes privados.
A terceira categoria, a participação paritária, encontra-se presente
em vários dos pontos referidos nos itens anteriores, na medida em que
a mesma se dá pela conquista de voz e voto que contemplam estes
pontos mencionados que poderiam ser alcançados, ou pelo menos, mais
justamente debatidos. A participação paritária nas esferas de decisão,
seja nos colegiados superiores, seja nos níveis da política pública, é

226
uma das formas de destacar pontos referentes ao reconhecimento e
à redistribuição. Tal categoria destaca-se a partir do entendimento
que “tem como pressuposto básico o estabelecimento de relações de
igualdade na medida em que rompe o processo de alienação, expande e
estimula a difusão do conhecimento, além de destruir a estrutura social
verticalmente hierarquizada”, de acordo com Faria (2011, p. 45).
Os professores lutam pela participação paritária ao reivindicarem
a organização dos interesses da universidade a partir do voto paritário
de todos que a compõe, sejam professores, alunos ou técnicos. Essa
participação paritária levaria à definição do conceito da universidade e
de seus contornos jurídicos, isto é, definiria todas as ações posteriores
da universidade e, nesse sentido, a relevância da participação
paritária de todos. O status existente na sociedade entre classes e, na
universidade entre as diversas categorias, a partir dessa reivindicação,
pode levar a uma alteração dessa condição e, inclusive, permitir uma
reflexão mais ampla, gerando repercussões que superem tais diferenças
de status na sociedade. Tal reivindicação dos professores contempla o
que se propõe aqui seja uma participação paritária ampliada, uma vez
que, para além dos interesses que a categoria de professores tenha em
relação ao destino da universidade, os interesses de todos os membros
que a compõem são levados em consideração ao reivindicarem a
constituição de uma estatuinte com a coordenação paritária dos três
segmentos universitários4.

4 Não cabe aqui uma argumentação sobre o conceito de paridade, mas


seria necessário discuti-lo na ação política. A paridade absoluta (cada qual um voto)
transferiria as decisões de três categorias funcionais a apenas uma delas (no caso, a
dos estudantes), dado o número de seus componentes em comparação com as demais.
A paridade proporcional confere a cada categoria funcional o direito a 1/3 do colégio
eleitoral, o que faz com que o voto individual de um membro de uma das categorias
(no caso, a dos docentes) tenha um valor maior do que o voto dos demais membros das
outras categorias. Em ambos os casos a paridade será relativa.

227
Ao reivindicarem critérios claros para o credenciamento e
recredenciamento dos professores, transparência na distribuição e
utilização dos recursos pelos programas e garantia de representação
nos conselhos setoriais e nos colegiados superiores, os professores
reconhecem a existência de diferenças no interior da própria categoria
de docentes. Todos os professores devem ter acesso aos critérios
estabelecidos para a universidade, bem como devem ter o direito de
participar da definição de tais critérios. Desse modo, é possível extinguir
a prática em que uns definem e se beneficiam das suas decisões,
reorganizando, portanto, a própria distribuição material a partir da
dinâmica do reconhecimento e da participação paritária.
Os itens de pauta das reivindicações que postulam a manutenção
da comissão de saúde do trabalhador, conferindo a essa instância caráter
deliberativo ante a universidade e a exigência de eleições diretas para
a direção do centro de educação física, representam o interesse dos
professores em participar das decisões que lhes afetam diretamente. São,
portanto, reivindicações que podem ser classificadas como participação
paritária imediata, que, somadas aos pontos de pauta que se configuram
em participação paritária ampliada. Tal conformidade de participação
poderia em sua prática levar a transformações significativas no âmbito
da universidade, conferindo maior reconhecimento às categorias que
a integram, contribuindo para a construção de, como destaca Faria
(2011), uma sociedade com relações sociais pautadas no respeito e no
reconhecimento intersubjetivo.

4. Considerações Finais

A análise da pauta de reivindicação dos professores da UFPR


durante a greve de 2011 possibilitou a reflexão a respeito de quais

228
interesses existem para esta categoria, em contraposição àquilo
que lhes é oferecido como contrapartida ao trabalho realizado, por
um Estado que se subordina ao sistema de capital. A análise do
caso corroborou a definição de um modelo, construído a partir das
categorias propostas por Nancy Fraser – categorias que compõem o
cenário para a justiça social – e da consciência de classe, propostas
por István Mészáros, com a composição dos interesses contingentes
e necessários. O estudo desenvolvido apontou para a necessidade
de se considerar o “estágio de consciência de classe” de determinada
categoria de trabalhadores para que a potencialidade da luta social
se transponha dos interesses contingentes ao interesse necessário da
classe trabalhadora. Considerando que esse movimento de transposição
necessita romper com a parcialidade para a consciente elaboração da
totalidade, a análise das pautas específicas de cada categoria permitiu a
identificação de pontos de convergência para a categoria dos professores
em seu movimento totalizante, como, por exemplo, as reivindicações que
visam à redistribuição material ampliada, o reconhecimento ampliado e
participação paritária ampliada. Esse “estágio” (consciência ampliada)
mostra as ligações entre a categoria dos professores e outros grupos
sociais que mantêm a solidariedade de classe. A simples presença das
três categorias em sua manifestação imediata nas reivindicações dos
professores não bastaria para a ocorrência das mobilizações com a
potencialidade de superação das contradições do sistema de capital e,
nesse sentido, da superação dos status que o compõe para o alcance de
maior justiça social.
A ação consciente dos trabalhadores caminharia rumo à superação
da autoalienação pela mobilização política em defesa, em um primeiro
momento, dos interesses contingentes, que pelo tensionamento de
luta entre as classes levaria à compreensão dos interesses necessários
e à conscientização da importância da luta para o rompimento das

229
estruturas sociais de classe. A construção dessa consciência de classe
necessária se dá na concretude das relações sociais, a partir dos elementos
objetivos e subjetivos que o momento histórico confere a determinada
sociedade. A superação da injustiça social gerada no sistema de capital
não ocorre tal como se encontra teoricamente exposto, especialmente no
caso de Nancy Fraser, entretanto, tal teorização é importante para que
os sujeitos ativos na sociedade possam estruturar e organizar sua luta e,
deste modo, reorganizar os rumos que o capitalismo mesmo propõe aos
trabalhadores. Esse movimento concreto das relações sociais pode ser
visto na pauta de reivindicações dos professores quando esta apresenta
pontos de luta que visam atender não somente aos próprios professores
da universidade, mas igualmente a uma parcela da sociedade que está
diretamente afetada pelas decisões da universidade.

REFERÊNCIAS

ALVES, G. O novo (e precário) mundo do trabalho: reestruturação produtiva e


crise do sindicalismo. São Paulo: Boitempo editorial, 2005.
ANDES. Informativo Andes, n° 01. Brasília: julho-2011.
DYE, T. R. Mapeamento dos modelos de análise de políticas públicas.
In: HEIDMANN, F.; & SALM, J.F. Políticas Públicas e Desenvolvimento: bases
epistemológicas e Modelos de Análise. Brasília: UNB, 2009.
FARIA, J. H. Condições de uma gestão democrática do processo de trabalho.
EPPEO: Curitiba, 2011. (working paper).
FERRAZ, D. L. S. Desemprego, exército de reserva, mercado formal-informal:
rediscutindo categoria. Tese de doutorado pela UFRGS, 2010. Disponível em:
http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/22741
FERRETI, C. J. Empresários, trabalhadores e educadores: diferentes olhares
sobre as relações trabalho e educação no Brasil nos anos recentes. In:
LOMBARDI, J.C.; SAVIANI, D; & SANFELICE, J.L. (Orgs.). Capitalismo,

230
trabalho e educação. Campinas, SP: Autores Associados, HISTEDBR, 2002.
p.97-118.
FRIGOTTO, G. Educação, Crise do trabalho assalariado e do
desenvolvimento: teorias em conflito. In: ______ Educação e Crise do Trabalho:
perspectivas de final de século. Petrópolis: Vozes, 1998.
FRASER, Nancy. A justiça social na globalização: redistribuição,
reconhecimento e participação. Revista crítica de ciências sociais. nº 63,
outubro, 2002. p. 7-20.
FRASER, N. Adding Insult to Injury. London: Verso, 2008.
FRASER, N. Reenquadrando a justiça em um mundo globalizado. São Paulo: Lua
Nova, 2009. 77, 11-39.
FRASER, N.; & HONNETH, A. Redistribution or recognition? A political-
philosophical exchange. London: Verso, 2003.
IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe. Expressão Popular, 2006.
MARX, K.; & ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo: Boitempo editorial,
2007.
MARX, K. O Capital: crítica da economia política, livro I, volume I.
Tradução de Reginaldo Sant´Anna. 26 ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2008.
MÉSZÁROS, I. Consciência de classe necessária e consciência de classe
contingente. In: Filosogia, ideologia e ciência social. Boitempo editorial, 2008.
p. 55-90.
OLIVEIRA, F. Os Direitos do Antivalor. Petrópolis: Vozes, 1998.
SILVEIRINHA, M. J. Democracia deliberativa e reconhecimento: Repensar o
espaço público. In: Revista de Comunicação e Linguagens, Retórica, 2005.

231
UMA ANÁLISE FEMINISTA DO TRÁFICO DE MULHERES
NAS CIDADES BRASILEIRAS

Clara Maria Roman Borges1

1. A LUTA DO MOVIMENTO FEMINISTA BRASILEIRO PELA


IGUALDADE DE CONDIÇÕES NO MERCADO DE TRABALHO2

No Brasil, a reivindicação das mulheres por igualdade de direitos


trabalhistas ganhou visibilidade pela primeira vez em 1919, quando
a bióloga Bertha Lutz participou como representante de nosso país
na Primeira Conferência do Conselho Feminino da Organização
Internacional do Trabalho – OIT, que aprovou recomendações de
salário igual para homens e mulheres, bem como a criação de um
serviço de inspeção para assegurar a aplicação das leis de proteção dos
trabalhadores e das trabalhadoras. (SAFFIOTI, 2013, p. 358).
Três anos depois, essa pioneira do movimento feminista brasileiro,
inspirada pelas feministas inglesas e norte-americanas, instalou

1 Mestre e Doutora em Direito pela Universidade Federal do Paraná.


Professora Associada de Direito Processual Penal no Curso de Graduação e no Programa
de Pós-graduação em Direito da UFPR. Professora Titular de Direito Processual Penal
na Universidade Positivo.
2 Alguns trechos desta análise sobre as lutas do movimento feminista no
Brasil foram retirados do artigo BORGES e LUCCHESI, 2015.

233
oficialmente a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino – FBPF,
que trazia em seu estatuto os propósitos de elevar o nível de instrução
feminina; proteger as mães; garantir o trabalho e o desenvolvimento
profissional feminino; assegurar às mulheres direitos políticos e estreitar
laços com outros países americanos a fim de colaborar na manutenção
da paz. (SAFFIOTI, 2013, p. 359)
Nessa época, o movimento feminista tinha inúmeras vertentes
e Bertha Lutz representava aquela que se identificava com os ideais de
estratos médios da população brasileira e visava à expansão da estrutura
capitalista no Brasil para a abertura de novas vias à emancipação
econômica feminina (SAFFIOTI, 2013, p. 378). Porém, não se pode deixar
de mencionar que o feminismo paralelamente tinha sua face operária,
com as anarquistas da “União das Costureiras, Chapeleiras e Classes
anexas”, que chamavam a atenção para a precária situação da mulheres
nas fábricas.
Em que pese a luta incessante, somente em fevereiro de 1932 as
mulheres sem distinção conquistaram seu direito de voto com a alteração
do Código Eleitoral pelo Governo Provisório de Getúlio Vargas (1930-
1934), que não era um grande simpatizante das causas feministas, mas
precisava amenizar as pressões do período Revolucionário.
Ressalte-se que a partir desse momento as mulheres passariam
a influenciar na concepção de políticas estatais visando à ampliação
dos direitos trabalhistas e, principalmente, à igualdade de condições de
trabalho para homens e mulheres. Ainda em maio de 1932, assistiriam à
promulgação do Código de Trabalho das Mulheres3, que estabelecia em
seu primeiro artigo a igualdade salarial independente de sexo, assegurava
a licença maternidade, a continuidade do emprego da mulher grávida
e o direito de intervalos para amamentação. (SAFFIOTI, 2013, p. 365)

3 Decreto n.º 21.417/1932 (BRASIL, 1932)

234
Ademais, nesse importante ano, Bertha Lutz também passou a
integrar a comissão formada pelo Governo Provisório de Getúlio Vargas
para elaboração do Anteprojeto da Constituição, e nos seus discursos
de abertura dos trabalhos constituintes deixou claro que tinha a missão
de lucidamente continuar a luta por direitos individuais e sociais sem
distinção de gênero, iniciada com o movimento que garantiu o direito
feminino ao voto4. Ressalte-se que nas palavras dessa feminista as
mulheres não formavam apenas uma classe, mas a metade da população
que trabalhava incessantemente no lar, sem qualquer reconhecimento,
profissionalmente mal remunerada e cujo talento era constantemente
frustrado quanto à possibilidade de desenvolvimento e expansão.5
O mesmo tom igualitário se identifica nas suas propostas para
o Anteprojeto de Constituição, publicadas sob o título “13 Princípios
Básicos”, dentre as quais se destacam a abolição da penosa dupla
jornada de trabalho da mulher proletária, “que cumpre pena dobrada,
acrescentando ao horário de fábrica, o trabalho, sem horário medido,
que desempenha no lar”; a aplicação de leis de proteção ao trabalho sem
distinção de sexo e nacionalidade; a previsão de assistência à mulher
grávida e do seu direito de ausentar-se do trabalho durante a gravidez
sem perder o emprego, assim como o direito de assistência social na
velhice. Entretanto, dentre todas, a mais ousada é a declaração de
direitos civis, econômicos e políticos sem qualquer distinção de gênero,
classe ou nascimento. (LUTZ, 1933)
Em 1937, a deputada Bertha Lutz apresentou o Projeto do Estatuto
da Mulher (PL n.o 736/1937) à Câmara dos Deputados e na exposição de
motivos apontava a necessidade de revogação da legislação vigente que
conflitava com o texto da Constituição de 1934, a qual garantira o direito

4 LUTZ, 1936.
5 LUTZ, 1936.

235
de voto feminino e abrira espaço à investidura das mulheres nos cargos
do governo. Esse Estatuto buscava revogar o Decreto n.o 21.417/19326
e estender os direitos da trabalhadora, de modo a assegurar licença
maternidade de três meses, com remuneração integral, sendo que parte
do seu salário seria pago pelo poder público, e o direito da trabalhadora
braçal e de balcão de faltar dois dias por mês sem descontos. 7 O grande
problema desse projeto era que ignorava as condições de trabalho
impostas por uma sociedade capitalista, pois a sua defesa dos interesses
femininos acabava se subordinando aos da burguesia empresarial, que
via nesta proteção muitas vezes desnecessária da trabalhadora uma
oportunidade para diminuir a contratação feminina ou precarizá-la de
forma a aumentar o lucro. (SAFFIOTI, 2013, 371)
Em que pese as críticas tecidas contra essas feministas, que
foram acusadas de importar ideias que não eram compatíveis com a
sociedade brasileira e que não tinham por fundamento as verdadeiras
relações sociais que inferiorizavam a mulher, não se pode negar que seu
discurso foi imprescindível para demarcar o espaço de participação da
mulher neste contexto conturbado da sociedade brasileira. Em suma,
a despeito da falta de compreensão do funcionamento opressor da
sociedade capitalista em relação à mulher, o discurso de Bertha Lutz e
suas companheiras foi imprescindível para despertar a consciência em
relação ao domínio patriarcal no Brasil, bem como ensejar a promulgação
de várias leis que buscavam estabelecer certa igualdade de gênero
(SAFFIOTI, 2013, p. 368 e ss).
Nos anos que se seguiram, algumas das propostas de Bertha
Lutz se concretizaram em leis, tal como o Estatuto da Mulher Casada,
promulgado em 1962, que modificava a condição de incapacidade civil

6 BRASIL, 1932
7 LUTZ, 1937.

236
da mulher casada. Todavia, verifica-se um expressivo hiato no que se
refere à participação do movimento feminista no processo legislativo
que se estende de 1937 ao final da ditadura militar.
Isso não significa que o movimento das mulheres cessou de
lutar pelos direitos femininos, pois não obstante as dificuldades de
manifestação pública impostas pela ditadura getulista (1937-1945),
as feministas tiveram uma participação importante na aprovação da
Consolidação das Leis do Trabalho de 1943 (Decreto Lei n.o 5.4528), a
qual finalmente assegurou a proteção à maternidade, com a concessão de
licença a mulher por seis semanas antes e seis semanas depois do parto e
a garantia do emprego. Mas tal como todos os movimentos sociais foram
silenciadas no processo formal de concepção e elaboração dos textos
legislativos no Brasil.
Na década de 1950, o movimento feminista se destacou nas ações
da Federação de Mulheres do Brasil, que participou da greve dos 300 mil
e da Passeata da Panela Vazia, lutando pelo aumento do salário mínimo
e contra a carestia da vida, a qual inclusive deu origem à Lei Delegada
n.o 4, que conferia amplos poderes às autoridade públicas para controlar
a oferta e o consumo de mercadorias e tornaria necessária a criação da
Superintendência Nacional do Abastecimento – SUNAB (BANDEIRA
e MELO, 2010, p. 23).
No governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961), as várias
associações feministas tiveram seu funcionamento suspenso, porém
tal medida não foi suficiente para impedir a atuação clandestina desses
grupos de mulheres que apoiavam as mães solteiras, ensinavam costura
e outras atividades manuais que pudessem permitir o seu sustento, bem
como ampliavam paulatinamente sua participação nos sindicatos.
Em que pese a efetiva participação das mulheres da classe média
na Marcha da Família com Deus pela Liberdade (série de manifestações

8 BRASIL, 1943.

237
contra a ameaça comunista e o Governo de Jango), a qual criou
o substrato perfeito para a concretização do golpe de Estado pelos
militares em 1964, não se pode dizer que o movimento feminista teria
empreendido um retrocesso em sua caminhada para a construção de uma
sociedade mais igualitária. (SARTI, 1988, p. 42).
Note-se que ao longo da ditadura militar muitas mulheres
participaram dos movimentos revolucionários, foram forçadas a deixar
o seu país, sofreram torturas e castigos justamente por não estarem em
suas casas cuidando dos filhos e do marido, por terem sido consideradas
avançadas demais e por esse motivo associadas à prostituição, como
consta de seus testemunhos transcritos nas obras “Direito à memória
e à verdade: luta, substantivo feminino” (OJEDA e MERLINO, 2010),
“Ex-presos políticos e a memória social da tortura no Paraná (1964-
1978)” (CALCIOLARI e MONTEIRO, 2006), “Mulheres e militância:
encontros e confrontos durante a ditadura militar” (GIANORDOLI-
NASCIMENTO; TRINDADE e SANTOS, 2012) e Relatório Final da
Comissão Nacional da Verdade (CNV, 2014).
Apesar das inúmeras dificuldades enfrentadas no exílio, as
mulheres perseguidas pelo governo militar fizeram várias reuniões para
discutir a luta por seus direitos, inclusive sob a censura e reprovação
dos homens exilados, na maioria das vezes seus companheiros, que
viam no feminismo uma distração no movimento pelo fim da ditadura
(PINTO, 2003). Em suma, o movimento feminista sobreviveu de várias
maneiras e não deixou de pautar que a luta pelo direito das mulheres e
pela igualdade de gênero não deveria se subordinar ou ser eclipsada pelas
lutas gerais do povo brasileiro pelo retorno da democracia. (BANDEIRA
e MELO, 2010, p. 25).
Contudo, na década de 1960, a participação das mulheres
nos sindicatos ainda era secundária e as reivindicações trabalhistas
daquele momento se concentravam na jornada de trabalho exaustiva,

238
no arrocho salarial, na falta de democracia nas relações de trabalho e
eram discutidas por algumas categorias profissionais e pelos chefes de
família, reconhecidos institucionalmente como interlocutores pelos
governantes. Em síntese, as mulheres eram coadjuvantes nesse processo
de negociação dos direitos trabalhistas, ou seja, apenas indiretamente
cidadãs. (GIULIANI, 2013, p. 643)
Isso inclusive leva alguns autores a afirmarem que a tentativa
dos militares em despolitizar e calar os cidadãos em relação aos direitos
humanos, bem como o afastamento da mulher no que se refere à vida
política, foram justamente os fatores que levaram ao fortalecimento
do movimento feminista na década de 1970, de modo a aproximá-lo
do radicalismo dos movimentos ocorridos nos EUA e na Europa na
década anterior e a permitir sua organização para reivindicar a anistia
e a reabertura democrática. (SOARES, 1998, p. 35). A Conferência da
ONU, que estabeleceu 1975 como ano internacional da mulher, serviu
de estopim para a fundação de Centros feministas em São Paulo, Rio
de Janeiro e Paraná, que lutavam pela virada democrática (SARTI,
1988, p. 63).
Portanto, num contexto brasileiro de ausência de democracia, o
feminismo não esmoreceu e neste mesmo ano sob o patrocínio da ONU
e da Associação Brasileira de Imprensa, os grupos de mulheres e jornais
feministas se multiplicaram na luta contra a supremacia masculina, a
exploração feminina no mercado de trabalho, a violência sexual e pelo
direito ao prazer (BANDEIRA e MELO, 2010, p. 26).
Simultaneamente, organizavam-se associações femininas
de bairros, clubes de mães, ligados à Igreja Católica, associações
profissionais e grupos sindicalizados para exigir melhores condições
de trabalho, creche para os filhos e a redução da pobreza (SARTI,
1988, p. 64).
No final da década de 1970, as trabalhadoras rurais passaram a se
reunir no seio da Pastoral da Terra para questionar a precariedade do seu

239
vínculo com a terra, engolido por grandes fazendas, que substituíram as
culturas de autoconsumo por culturas comerciais ou por agropecuária
bovina. No Nordeste, os grupos de mulheres rurais lutavam pela sua
cidadania frente aos atrasos na implementação dos programas de
emergência contra a seca e também exigiam que fosse respeitada a lei
trabalhista que assegurava salário mínimo integral e acesso à previdência
social. (GIULIANI, 2013, p. 647-648)
Todavia, o movimento feminista voltaria a participar efetivamente
das decisões políticas e do processo constituinte brasileiro em meados
da década de 1980, com a redemocratização do país, o que coincidiu
com o momento em que suas lutas se pluralizaram e encontraram como
ponto de aglutinação as questões relativas à violência contra a mulher
e à discriminação social e, principalmente, a busca por mecanismos
adequados para combatê-la (SARTI, 1988, 42).
Assim, tanto as trabalhadoras rurais como as urbanas militavam
para rever a divisão sexual no trabalho e a relação de poder na
representação sindical, isto é, para combater a dominação masculina
que lhes impunha o trabalho do lar, a educação dos filhos, os menores
salários e o papel secundário na representação sindical. (GIULIANI,
2013, p. 651)
O Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres, criado em
1985 junto ao Ministério da Justiça, foi responsável por articular a
pauta feminina que deveria ser discutida no momento da elaboração da
Constituição de 1988. Em que pese a enorme distância dessas demandas
de cidadania em relação àquelas contempladas no documento final
promulgado, vários direitos que visavam à diminuição das diferenças
de gênero nas relações de trabalho foram garantidos. Dentre essas
conquistas, verifica-se a ampliação do tempo de licença maternidade, a
introdução da licença paternidade, a fixação de limites diferenciados de
idade para aposentadoria dos homens e das mulheres, a reciprocidade

240
no casamento com a igualdade entre homem e mulher, a possibilidade
de registro de propriedade de terra no nome da mulher, assim como uma
série de benefícios previdenciários.
Porém, somente em 1993, após muitos debates, a Central Única
dos Trabalhadores- CUT procurou efetivamente reduzir as disparidades
sexuais na representação sindical, abrindo um maior espaço para a
participação das mulheres nas diretorias, com a fixação de cotas mínimas
na disputa de cargos diretivos, e finalmente permitindo que as mulheres
institucionalizassem sua luta por direitos trabalhistas.
Esse período também foi marcado pela denúncia das
discriminações no mercado de trabalho, dos assédios sexuais nas relações
trabalhistas, do incentivo dos empregadores para esterilização feminina
e da persistência nas diferenças salariais entre homens e mulheres e o
trabalho escravo. (GIULIANI, 2013, p. 658-660)
Na primeira década do novo milênio, os direitos das trabalhadoras
continuaram seu processo de ampliação, com a possibilidade de extensão
da licença maternidade para cento e oitenta dias àquelas que trabalham
para pessoas jurídicas vinculadas ao “Programa Empresa Cidadã” (Lei
n.o 11.770/2008)9 e, recentemente, com o reconhecimento de todos os
direitos trabalhistas às empregadas domésticas (EC no 72/201310 LC n.o
150/201511).
Não obstante esse avanço na garantia formal dos direitos
trabalhistas das mulheres, é preciso reconhecer que muitos deles
estão longe de ganhar efetividade, tanto pela dominação masculina
naturalizada na sociedade brasileira como pela desigualdade social que
impuseram nas relações de trabalho a condição de explorada à mulher

9 BRASIL, 2008.
10 BRASIL, 2013.
11 BRASIL, 2015.

241
integrante da “ralé”12. Tal pode ser comprovado pelos índices alarmantes
do tráfico interno e internacional de mulheres nas cidades brasileiras
para fins de exploração sexual e trabalho escravo.

2. A SUBMISSÃO E EXPLORAÇÃO DA MULHER DA RALÉ BRASILEIRA

Pierre Bourdieu alertava para essa naturalização da dominação


masculina nas sociedades ocidentais, isto é, para a experiência dessas
sociedades que consideram a divisão socialmente construída entre
os sexos como dados da natureza e a superioridade masculina como
propensão biológica, dispensando qualquer justificação. Asseverava o
sociólogo francês que, dessa forma, a visão androcêntrica do mundo
se impõe sem necessidade de discursos para legitimá-la e a ordem
social passa a funcionar como uma imensa máquina simbólica que
ratifica a dominação masculina, alicerçada na divisão sexual e na
suposta superioridade dos homens, bem como distribui de maneira
estrita as atividades a cada um dos sexos, reservando a eles aquelas mais
prestigiosas e economicamente mais vantajosas (2014). Nas relações de
trabalho contemporâneas, isso fica claro na atribuição de cargos de poder
aos homens, nas exigências desumanas que recaem sobre as mulheres
que estão no comando de grandes corporações, na desvalorização do
trabalho feminino doméstico, nos obstáculos acadêmicos enfrentados
pelas mulheres que desenvolvem pesquisas nas áreas das ciências exatas,
da medicina ou do direito criminal.
Com base neste raciocínio, pode-se inferir desde logo que
assegurar formalmente direitos trabalhistas às mulheres não evita que
sejam discriminadas e exploradas em suas atividades laborais, pois as leis

12 SOUZA, 2011.

242
e o conhecimento jurídico são permeados por essa visão androcêntrica,
são concebidos dentro dessa ordem masculina fundada na divisão
sexual do trabalho, que se encontra impregnada nas estruturas objetivas
e cognitivas da nossas sociedade. Tanto os parlamentares como os
gestores das empresas privadas/públicas e os sindicatos, que participam
diretamente do processo de concepção e aplicação das leis trabalhistas,
são irremediavelmente homens ou mulheres submetidos a essa máquina
simbólica que faz funcionar a dominação masculina. (BOURDIEU, 2014)
Essa incapacidade do direito de retirar a mulher dessa condição de
inferioridade e vulnerabilidade pode ser problematizada de modo mais
aprofundado a partir do pensamento de Judith Butler (2015), que reflete
sobre a tese foucaultiana de que os sistemas jurídicos de poder produzem
os sujeitos que afirmam representar (FOUCAULT, 1988). Noutras
palavras, a filósofa norte-americana entende que o discurso jurídico
não reconhece identidades naturalmente estabelecidas ou socialmente
construídas e lhes assegura direitos, mas produz, torna coerente, limita,
unifica, normaliza e perpetua certas identidades para esconder a noção
desse “sujeito anterior a lei” e apelar a essa formação discursiva como
uma premissa fundacional naturalizada que posteriormente legitima sua
hegemonia reguladora. (BUTLER, 2015, p. 48). Nesse sentido, o discurso
jurídico produz a mulher – a identidade feminina –, que afirma apenas
representar, estabelece os seus limites e o seu papel, dissimulando
que deixou de reconhecer a existência da complexidade da identidade
feminina, de suas múltiplas facetas que se encontram distantes dessa
formação discursiva, a partir da naturalização da identidade que ele
mesmo produziu.
Então, num primeiro momento, tem-se a impressão de que
as noções jurídicas regulam contingencialmente a esfera política de
forma exclusivamente negativa, por meio de interdições, proibições,

243
regulamentações, controle e até medidas de proteção das pessoas
vinculadas a essa estrutura política. Contudo, os sujeitos submetidos e
regulados por essas estruturas se constituem, definem-se e reproduzem-
se de acordo com as imposições dessas mesmas estruturas e não são por
elas simplesmente limitados.
A formação jurídica da linguagem e do exercício do poder que
reconhece as mulheres como o sujeito do feminismo ou dos direitos
trabalhistas femininos é uma formação discursiva e resultado de uma
versão específica da política de representação. Desse modo, o sujeito
feminista, a mulher titular de direitos trabalhistas está discursiva e
descontextualizadamente formada pela mesma estrutura política
que, supostamente, promoverá a sua emancipação. Em suma, torna-se
complicada a emancipação do sujeito feminista, na medida em que o
direito que o representa de forma universal e excludente é o mesmo
que estabelece o caminho de sua emancipação. Nas palavras da autora,
“por um lado a representação funciona como instrumento operacional
dentro de um procedimento político que pretende ampliar a visibilidade
e a legitimidade para as mulheres como sujeitos políticos, por outro,
a representação é a função normativa de uma linguagem que, ao que
parece, mostra ou distorce o que se considera verdadeiro acerca da
categoria das mulheres.” (BUTLER, 2015, p. 46-47)
Portanto, a partir dessa análise, é possível concluir que o discurso
jurídico brasileiro sobre os direitos trabalhistas das mulheres, forjado nas
lutas do movimento feminista, define, produz o sujeito desses direitos de
maneira descontextualizada, como se o representasse, e acaba limitando
o exercício da cidadania, excluindo muitas mulheres do gozo desses
direitos e deixa de cumprir a promessa de emancipação. Além disso, ao
enunciar direitos para os sujeitos reconhecidos biologicamente como
do sexo feminino, intensifica a submissão dos corpos a uma ordem

244
binária de gênero masculino/feminino, produto de um contrato social
heterocentrado, cujas performatividades normativas foram inscritas
nos corpos como verdades biológicas, acentuando uma pretensa
superioridade do homem e legitimando a dominação masculina. 13
(BUTLER, 2008)
Noutras palavras, o discurso jurídico dos direitos trabalhistas das
mulheres define as destinatárias desses direitos, a partir de uma ficção
cultural, perpetuada por meio de atos reiterados que a legitimam, a qual
funciona com base na suposta verdade biológica do sexo feminino. Esse
discurso jurídico descolado da realidade assegura direitos a uma pessoa
com biótipo considerado pelo saber médico como do sexo feminino, que
exerce performances correspondentes ao gênero feminino, que é branca,
tem formação escolar, é parte numa relação de trabalho consensual e
normatizada, é heterossexual e escolheu a maternidade. Por esse motivo,
os direitos trabalhistas das mulheres dificilmente são acessíveis à mulher
pobre, negra, lésbica ou ainda a outras identidades subliminarmente
consideradas perversas pela linguagem jurídica, tais como transgêneros
e intersexuais.

13 “Os gêneros diferenciados são uma parte do que ‘humaniza’ os indivíduos


dentro da cultura atual; em realidade sancionamos constantemente aqueles que não
representam o gênero. (...) Assim, o gênero é uma construção que reiteradamente dissimula
sua gênese; o acordo coletivo tácito de atuar, criar e garantir gêneros diferenciados e
polares como ficções culturais resta dissimulado pela credibilidade dessas produções e
por sanções que acompanham o fato de não crer nelas; a construção nos ‘obriga’ a crer na
sua necessidade e naturalidade. As opções históricas materializadas através de distintos
estilos corporais não são senão ficções culturais reguladas de forma punitiva, que
alternadamente se personificam e se desviam sob coação. Há que se considerar que uma
sedimentação de normas de gênero gera o fenômeno peculiar de um ‘sexo natural’ ou uma
‘mulher real’ ou qualquer quantidade de ficções sociais constantes e impositivas, e que
esta sedimentação ao longo do tempo criou uma série de estilos corporais que, de forma
reificada, se manifestam como configuração natural dos corpos em sexos que existem
numa relação binária um com o outro.” (BUTLER, 2015, p. 272-273)

245
Sabe-se que em nosso país as mulheres pobres são na sua
maioria excluídas pelos direitos trabalhistas, principalmente porque é
improvável que integrem uma relação de trabalho legalizada ou que se
sintam representadas por esse discurso jurídico, até pela naturalização
da desigualdade social que esse mesmo discurso promove.
Para explicar essa naturalização da desigualdade no Brasil,
decorrente do avançado estágio do capitalismo, Jessé Souza afirma que
nossa sociedade é composta por homo economicus, isto é, por “agentes
racionais que calculam suas chances relativas na luta social por
recursos escassos, com as mesmas disposições de comportamento e
capacidades de disciplina, autocontrole e autorresponsabilidade”. Nessa
perspectiva, o marginalizado social é percebido como alguém que possui
as mesmas capacidades e disposições do indivíduo da classe média,
pois a miséria é sempre vista como contingente e fortuita, superável
com a ajuda tópica do Estado, o que a torna uma escolha deliberada
do indivíduo ou decorrência da sua falta de responsabilidade. (2011,
p. 17). Tal situação se exemplifica no discurso que leva a sociedade a
acreditar que basta estabelecer direitos trabalhistas para as mulheres,
bem como a fiscalização formal da efetivação desses direitos, para evitar
o trabalho escravo nas confecções, nas casas abastadas e a exploração da
prostituição nas grandes cidades, afinal nesta perspectiva a exploração
do trabalho só existe porque os explorados escolhem ou contribuem
para sua miséria.
Além disso, esclarece que o liberalismo economicista, consolidado
como visão hegemônica no país desde 1970 e 1980, construiu uma falsa
oposição entre o mercado como reino paradisíaco de todas as virtudes
e o Estado identificado com a corrupção e o privilégio, a qual permitiu
que a eternização dos privilégios econômicos de alguns poucos fosse
vendida como interesse de todos na luta contra a corrupção, pensada
como mal de origem e supostamente estatal. Então, todos os reais

246
conflitos e contrastes sociais se tornaram invisíveis e, consequentemente
naturalizados, na medida em que sua causa foi reduzida à dramatização
dessa falsa oposição entre mercado divinizado e Estado demonizado.
(2011, p. 16)
Aliás, essa percepção economicista liberal das classes sociais
e seus conflitos, vinculada essencialmente ao diferencial de renda,
também torna invisíveis os fatores e as precondições morais, sociais,
emocionais e culturais que constituem esse diferencial e contribuem para
a desigualdade social, impondo uma cegueira em relação à transferência
desses valores imateriais na reprodução das classes e dos privilégios
sociais, impedindo, por exemplo, que mulheres negras e pobres se
identifiquem como destinatárias de direitos trabalhistas ou definidas
pelo discurso jurídico. (SOUZA, 2011, p. 18)
Nesse sentido, percebe-se que nas classes altas brasileiras
monopolizadoras do poder econômico, os filhos terão a mesma vida
privilegiada dos pais na medida em que herdam seu capital imaterial,
seu estilo de vida sofisticado, seu bom gosto, suas relações profissionais
e sociais, bem como seu patrimônio, e isso faz com se vejam como
merecedores dos privilégios sociais, como se fosse algo justo, devido e
natural. Na classe média, a cegueira da visão economicista de mundo é
ainda mais evidente, reproduzindo-se nas próprias precondições que
permitirão os filhos dessa classe competirem na aquisição e reprodução
do capital cultural dos ricos. Desse modo, no cotidiano e na vida privada
da casa, são criadas afetivamente as precondições que torna a classe
média esforçada e disciplinada merecedora do capital cultural do sucesso
material. Portanto, filho que vê o pai lendo um livro, a mãe fazendo um
curso de inglês e o irmão estudando um instrumento se sente motivado
a estudar e com autoconfiança para alcançar o sucesso. Além disso,
passa a agir como se as mesmas precondições fossem estendidas para as
classes baixas e a deduzir que o seu fracasso se deve à falta de esforço,

247
disciplina e ambição. Por fim, em razão do abandono social e político, que
determinam a falta desse capital imaterial, a “ralé” não possui nenhuma
chance da ter sucesso. Ao contrário, percebe-se nascida para o fracasso,
acostuma-se com ele, acredita que não é suficientemente disciplinada
e responsável para alcançá-los. Em síntese, as mulheres dessa classe
social brasileira não se sentem merecedoras do trabalho digno e dos
direitos a ele inerentes, mas percebem-se como subcidadãs destinadas
à exploração e ao descaso estatal. (SOUZA, 2006)
Nas palavras do autor brasileiro, “a ‘ralé’ brasileira moderna não
se confunde com o simples lumpemproletariado tradicional. Como ela
não encontra emprego no setor produtivo que pressupõe uma relativa
alta incorporação de conhecimento técnico ou ‘capital cultural’, ela
só pode ser empregada como corpo, ou seja, como mero dispêndio de
energia muscular.” Então, como corpo é explorada a preços baixos no
trabalho de empregada doméstica, no trabalho masculino desqualificado
ou na prostituição. (SOUZA, 2011, p. 24). Assim, pode-se constatar que
“a miséria das classes excluídas do acesso a capital cultural e capital
econômico é, além de econômica e social, uma miséria existencial e
moral ainda maior do que a miséria existencial das classes médias e altas
vítimas, por exemplo, de um expressivismo romântico transformado em
mero consumo.” (SOUZA, 2011, p. 389)
Enfim, esse raciocínio é capaz de indicar alguns dos fatores que
tornam alarmantes os índices de tráfico de mulheres pobre e negras nas
cidades brasileiras para fins de exploração sexual e trabalho escravo,
tal como demonstram as pesquisas recentes adiante analisadas.
Essas pessoas traficadas não se percebem sujeitos de direitos, não se
identificam com as mulheres protegidas pelas leis trabalhistas brasileiras,
pelo contrário, sentem que não merecem ser protegidas em suas relações
de trabalho.

248
3. O TRÁFICO DE MULHERES NAS CIDADES BRASILEIRAS

Três importantes documentos estabelecem as diretrizes para


o enfrentamento do tráfico de pessoas no Brasil, o primeiro deles é
Protocolo de Palermo (ratificado pelo Decreto n.o 5.017/0414), que trata
da repressão e punição do tráfico de pessoas, em especial de mulheres e
crianças, o segundo é o Decreto n.o 5.948/0615, que estabeleceu o 1o. Plano
Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, e o terceiro é Decreto
n.o 7.901/1316, que estabeleceu o 2o Plano de Enfrentamento ao Tráfico de
Pessoas. Além disso, a legislação criminal brasileira também tipifica as
condutas relacionadas ao tráfico, permitindo a sua punição com penas
privativas da liberdade e restritiva de direitos, bem como de multa. 17
A definição do tráfico de pessoas estabelecida pela legislação
brasileira é ampla, decorrente da ratificação daquele documento
internacional, e abrange o

recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o


acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a
outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de
autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação
de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa

14 (BRASIL, 2004).
15 (BRASIL, 2006).
16 (BRASIL, 2013).
17 V. Art. 231, Código Penal (Tráfico internacional para fins de exploração
sexual; Art. 231-A, do CP (Tráfico interno para fins de exploração sexual); Art. 228,
do CP (Favorecimento à prostituição); Art. 230, do CP (Rufianismo); Art. 149, do
CP (Redução à condição análogo à de escravo); Art. 206, do CP (Aliciamento para o
fim de emigração); Art. 207, do CP (Aliciamento de trabalhadores de um local para
outro do território nacional) e Arts. 14 a 16, da Lei no 9.434/97 (Crimes contra a lei de
transplantes de órgãos).

249
que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração
incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras
formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura
ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.
(BRASIL, 2004)

O art. 3o, b, do Protocolo de Palermo, estabelece ainda que o


consentimento da vítima é irrelevante para a configuração do tráfico de
pessoas, quando ela é ameaçada, coagida, forçada, raptada, enganada,
obrigada por autoridade a que esteja sujeitada, ou quando se encontra
em situação de vulnerabilidade, a sua concordância não afasta o crime.
Isso significa que abstratamente a lei brasileira censura e pune o
tráfico de mulheres de modo a proteger justamente aquelas mulheres
incluídas numa subcidadania, aquelas que não se identificam com
o sujeito de direitos das leis trabalhistas, aquelas que se encontram
numa condição de vulnerabilidade anuladora do livre arbítrio. Porém,
a sua efetivação ainda está longe de acontecer, não só pela ausência
de políticas públicas que promovam o combate eficiente do tráfico de
pessoas, decorrente de uma série de fatores como a falta de estatísticas
sobre esse fenômeno, a não destinação adequada de recursos
orçamentários para os programas de enfrentamento do problema e
o despreparo dos agentes públicos para lidar com a complexidade
da questão, mas também pelo machismo que se reproduz de maneira
naturalizada na sociedade brasileira.
O diagnóstico do tráfico de pessoas no Brasil, a produção de
estatísticas sobre o número de vítimas, o perfil delas, a finalidade da ação,
as regiões de maior incidência, rotas usadas pelos traficantes, o perfil
desses, a ação dos poderes públicos para sua apuração e punição, bem
como dos órgãos responsáveis por amparar as vítimas, ainda é incipiente.
Tem-se como documentos oficiais que retratam esse deslocamento de

250
pessoas para fins de exploração apenas os relatórios governamentais de
2005 a 201118, 201219 e 201320.
Ressalte-se que a coleta desses dados enfrentou uma série de
dificuldades, primeiramente porque são várias as fontes consultadas
para se produzir uma visão adequada da incidência do tráfico em todas
as suas modalidades, desde os órgãos estatais que trabalham para sua
repressão até as vítimas, o que exige uma metodologia diversificada que
pode produzir resultados conflitantes. Além disso, o registro de dados
por parte dos poderes públicos ainda é deficiente e desencontrado,
uma vez que não foi implementado um formulário ou questionário
único e os agentes não foram qualificados para prestar adequadamente
as informações sobre as denúncias recebidas. Então, a polícia coleta
os dados de uma maneira, o Ministério Público do Trabalho de outra,
a Secretaria Nacional da Mulher de forma diversa, o que dificulta a
planificação e consolidação do fenômeno e o seu consequentemente
enfrentamento. Por fim, é preciso considerar que jamais se terão dados
precisos do tráfico de pessoas na medida em que a sua quantificação
é realizada com base em denúncias recebidas pelos órgãos estatais,
portanto, haverá sempre uma cifra oculta (SUTHERLAND, 2015), um
certo número de casos que não chega ao conhecimento do Estado ou que
são ignorados deliberadamente por ele.
Em que pese todas essas dificuldades impostas à compreensão do
fenômeno do tráfico de pessoas no Brasil, alguns dos dados coletados

18 Relatório Nacional sobre o Tráfico de Pessoas: consolidação dos dados de


2005 a 2011. Brasília: Secretaria Nacional de Justiça, 2013a.
19 Relatório Nacional sobre o Tráfico de Pessoas: dados 2012. Brasília:
Secretaria Nacional de Justiça, 2013b.
20 Relatório Nacional sobre o Tráfico de Pessoas: dados 2013. Brasília:
Secretaria Nacional de Justiça, 2014.

251
deixam clara a vitimização da mulher pobre e habitante da cidade pelo
tráfico de pessoas para fins de exploração sexual e trabalho escravo.
O Relatório de 2005 a 2011, na sua introdução, expressamente
reconhece que as mulheres advindas das classes populares, de baixa
escolaridade, mães solteiras, que moram com um parente na periferia
dos grandes centros urbanos, sem saneamento básico e transporte, são
alvo fácil para o tráfico com fins de exploração sexual. Muitas delas,
trabalham como cabelereiras, auxiliares de enfermagem, professoras do
ensino fundamental, vendedoras, secretárias e domésticas, sem direitos
e situação trabalhista regularizada. (BRASIL, 2013a, p. 24) Em síntese,
esses dados confirmam que a desigualdade social, o preconceito racial
e a inferiorização da mulher e de sua força de trabalho, próprias de uma
sociedade patriarcal, são fatores determinantes da sujeição ao tráfico
para fins de exploração sexual e trabalho escravo.
O quadro não se modifica no Relatório de 2012, os dados mais
completos sobre o tráfico advêm do sistema do Ministério da Saúde,
cujo cadastramento das vítimas atendidas nos hospitais relata que foram
registrados 130 vítimas de tráfico de pessoas e crimes correlatos, sendo
104 mulheres e 26 homens. Dentre as mulheres, 38 identificaram-se como
brancas e 55 como pardas ou negras e a faixa etária com maior incidência
é de 15 a 39 anos. Quanto aos casos específicos de tráfico de pessoas para
trabalho escravo, registrados pelo Ministério Público do Trabalho, das
2.771 vítimas, verifica-se que 80% são mulheres, 65% delas possui até 29
anos (BRASIL, 2013b).
Por fim, no Relatório de 2013, os dados praticamente se repetem,
apenas com mais informações por conta da melhoria nos órgãos de
recebimento de denúncias. Na Divisão de Assistência Consular do
Ministério das Relações Exteriores, foram registrados 62 casos de tráfico
internacional de pessoas, 41 revelavam a finalidade de exploração sexual
e 21 para trabalho escravo, sendo que na primeira situação 36 vítimas

252
identificaram-se como mulheres e na segunda, somente 7. No mesmo
sentido, apresentam-se os dados do Ministério da Saúde, os quais
reportam que dentre as 115 vítimas de tráfico atendidas no sistema de
saúde, 82 são mulheres, ou seja, 71,3% do total, 70,4% estão na faixa
etária de 0 a 29 anos, 50,4% identificaram-se como negras ou pardas,
34% concluíram o ensino fundamental, 35% declaram-se solteiras e 71%
residem na zona urbana. Inclusive, conforme os dados da Secretaria de
Direitos Humanos, o Estado de São Paulo concentra o maior número de
denúncias relativas ao tráfico de pessoas.
Veja-se que uma leitura desses relatórios, ainda que considere a
precariedade da coleta de dados, leva-nos a reconhecer que as condições
de vida dessas mulheres jovens, com baixa escolaridade, residentes
nas periferias das cidades brasileiras, que nada têm a perder, tornam
irrecusável e atraente a proposta ilusória dos traficantes para que
deixem suas casas em busca de um trabalho menos extenuante, de uma
remuneração capaz de atender suas necessidades e de sua família, de
uma vida diferente daquela que as sujeita a um subemprego e à miséria.
Dessa maneira, contata-se que o não reconhecimento dos direitos
trabalhistas de maneira ampla a todas as mulheres, a definição velada da
identidade do sujeito desses direitos restrita à mulher branca, inserida
no mercado de trabalho, que se encontra numa relação trabalhista
regularizada, é um importante fator que contribui para a ocorrência do
tráfico de mulheres para fins de exploração sexual e trabalho escravo
nos centros urbanos de nosso país.
Tal constatação permite inclusive concluir que a diminuição
efetiva desses índices do tráfico de mulheres pobres no Brasil não ocorrerá
simplesmente por políticas públicas que promovam o atendimento de
suas vítimas e a punição dos traficantes, ou ainda, pela ampliação de
direitos trabalhistas excludentes, permeados por uma ordem machista
e economicista, mas pelo reconhecimento e implementação do direito

253
à educação, à moradia digna, ao trabalho regularizado dessas várias e
diferentes mulheres que habitam a periferia das grandes cidades.
Para tanto, o direito certamente precisa se reinventar, estender
ao máximo sua representação às várias identidades e permitir que os
corpos reconheçam a si mesmos não como homens ou mulheres, mas
como corpos falantes que reconhecem outros corpos falantes, permitir
que esses corpos falantes reconheçam em si mesmos a possibilidade de
exercer esses direitos e de enunciá-los, renunciando a uma identidade
sexual fechada e determinada naturalmente.
Nessa perspectiva, sob a crítica dos direitos trabalhistas
contemporâneos, é possível ousar a reflexão sobre a necessidade de se
conceber um direito contrassexual, nos termos de Beatriz Preciado, que
não assegura “privilégios sociais e econômicos derivados da condição
masculina ou feminina – supostamente natural – dos corpos falantes no
âmbito do regime heterocentrado”, mas que os subverte, abrindo-se às
múltiplas identidades dos corpos. (2014, p. 36)
Enfim, a aventada e angustiante desilusão em relação à
maquinaria jurídica moderna dos direitos trabalhistas pode deslocar
nosso olhar para além das identidades únicas, do feminino universal
representado nas leis, pode nos provocar a discussão sobre as bases
de um discurso jurídico degeneralizado, que ao assegurar direitos não
exija sub-repticiamente que a pessoa se identifique como homem ou
mulher, mas que apenas enuncie-se como corpo falante para exercê-los,
e finalmente pode de forma revolucionária nos instigar a refletir um
direito concretamente emancipador.

REFERÊNCIAS

BANDEIRA, Lourdes; MELO, Hildete P. de. Títulos e memórias do feminismo no


Brasil. Brasília; SPM, 2010.

254
BUTLER, Judith. El género en disputa: el feminismo y la subversión de la identidad.
Trad. Maria António Muñoz. 7. ed. Barcelona: Paidós, 2015.
_____. Cuerpos que importan: sobre los limites materiales y discursivos del “sexo”. Trad.
Alcira Bixio. 2. ed. Buenos Aires: Paidós, 2008.
BORGES, Clara M. R.; LUCCHESI, Guilherme B. (Coautor). O machismo no
banco dos réus: uma análise feminista crítica da política criminal de combate à violência
contra a mulher. Revista da Faculdade de Direito da UFPR, n. 3, v. 60, p. 217-
277, 2015.
BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina: a condição feminina e a violência
simbólica. Trad. Maria Helena Kühner. Rio de Janeiro: Best Bolso, 2014.
CALCIOLARI, Silvia; MONTEIRO, Luiz Carlos (Coautor). Ex-presos
políticos e a memória social da tortura no Paraná (1964-1978). Curitiba: [Assembléia
Legislativa do Paraná], 2006.
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade 1: a vontate de saber. Trad. Maria
Thereza da C. Albuquerque e J. A. Guilhom Albuquerque, Rio de Janeiro:
Graal, 1988.
GIANORDOLI-NASCIMENTO, Ingrid F.; TRINDADE, Zeidi A. (Coautora);
SANTOS, Maria de Fátima S (Coautora). Mulheres e militância: encontros e
confrontos durante a ditadura militar. Belo Horizonte: EdUFMG, 2012.
LUTZ, Bertha. 13 Princípios Básicos: sugestões ao ante-projeto da Constituição. Rio de
Janeiro: FBPF, 1933.
PRECIADO, Beatriz. Manifesto contrassexual. Trad. Maria Paula Gurgel Ribeiro.
São Paulo: n-1 edições, 2014.
PINTO, Celi Regina Jardim. Feminismo, história e poder. Revista Sociologia
Polítca, Curitiba, v. 18, n. 36, p. 15-23, jun. 2010
_____. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo, Fundação Perseu Abramo,
2003.
SAFFIOTI, Heleieth. A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. 3. ed.
São Paulo: Expressão Popular, 2013.
SARTI, Cynthia. O feminismo no Brasil: uma trajetória particular. Cadernos de
Pesquisa, n. 64, São Paulo, fev., p. 38-47, 1988.

255
SOUZA, Jessé. A ralé brasileira: quem é e como vive. Belo Horizonte: Ed.UFMG,
2011.
_____. A construção social da subcidadania: para uma sociologia política da modernidade
periférica. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2006.
SUTHERLAND, Edwin H. Crime do colarinho branco. Trad. Clécio Lemos,
Rio de Janeiro: Revan, 2015.

DOCUMENTOS:

BRASIL, Decreto 21.417/32. Regulamenta as condições do trabalho das


mulheres nos estabelecimentos industriais e comerciais. Diário Oficial da
União, Rio de Janeiro, CF, de 19 de maio de 1932. Disponível em: <http://
www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-21417-17-maio-1932-
559563-publicacaooriginal-81852-pe.html>. Acessado em 19/01/16, às 15h30.
LUTZ, Bertha. [Discurso] Diário Oficial do Poder Legislativo. 20.07.1936.
Disponível em: <hs.unb.br/bertha/wp-content/uploads/2013/03/Bertha-
28_07_1936-Posse.pdf>. Acessado em 12/05/2015, às 13h.
LUTZ, Bertha. [Projeto de Lei no 736/1937]. Exposição de motivos. Câmara
dos Deputados. Comissão Estatuto da Mulher., 1937. Disponível em: <http://
lhs.unb.br/bertha/?series&paged=2>. Acessado em 12/05/15, às 13h.
BRASIL, Decreto Lei no 5.452/43. Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, CF, de 09 de agosto de
1943. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/
decreto-lei-5452-1-maio-1943-415500-publicacaooriginal-1-pe.html>.
Acessado em 19/01/16, às 15h30.
BRASIL, Decreto 5.017/04. Promulga o Protocolo Adicional à Convenção
das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à
Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres
e Crianças. Diário Oficial da União, Brasília, DF, de 15 de março de 2004.
Disponível em: <http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/97875/
decreto-5017-04>. Acessado em 19/01/16, às 15h30.

256
BRASIL, Decreto no 5.948/06. Aprova a Política Nacional de Enfrentamento
ao Tráfico de Pessoas e institui Grupo de Trabalho Interministerial com o
objetivo de elaborar proposta do Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico
de Pessoas – PNETP. Diário Oficial da União, Brasília, DF, de 27 de outubro
de 2006. Disponível em: <presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/95318/
decreto-5948-06>. Acessado em 19/01/16, às 15h30
BRASIL, Lei no 11.770/08. Cria o Programa Empresa Cidadã, destinado
à prorrogação da licença-maternidade mediante concessão de incentivo
fiscal, e altera a Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991. Diário Oficial da União,
Brasília, DF, de 10 de setembro de 2008. Disponível em: <ww.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11770.htm>. Acessado em 19/01/16, às 15h30.
BRASIL, Decreto no 7.901/13. Institui a Coordenação Tripartite da Política
Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e o Comitê Nacional de
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – CONATRAP. Diário Oficial da União,
Brasília, DF, de 05 de fevereiro de 2013. Disponível em: <http://presrepublica.
jusbrasil.com.br/legislacao/1034101/decreto-7901-13>. Acessado em 19/01/16, às
15h30.
BRASIL, EC no 72/2013. Altera a redação do parágrafo único do art. 7º da
Constituição Federal para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas
entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e
rurais. Diário Oficial da União, Brasília, DF, de 03 de abril de 2013. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc72.
htm>. Acessado em 19/01/16, às 15h30.
BRASIL, MJ. Relatório Nacional sobre o Tráfico de Pessoas: consolidação
dos dados de 2005 a 2011. Brasília: Secretaria Nacional de Justiça,
2013a. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/lpo-brazil/
noticias/2013/04/2013-04-08_Publicacao_diagnostico_ETP.pdf>. Acessado em
14/07/2015, às 13h30.
BRASIL, MJ. Relatório Nacional sobre o Tráfico de Pessoas: dados 2012.
Brasília: Secretaria Nacional de Justiça, 2013b. Disponível em: <http://www.
unodc.org/documents/lpo-brazil/noticias/2014/07/Relatorio_Dados_2012_-_
press_quality.pdf>. Acessado em 14/07/2015, às 13h30.
BRASIL, MJ. Relatório Nacional sobre o Tráfico de Pessoas: dados 2013.
Brasília: Secretaria Nacional de Justiça, 2014. Disponível em: <http://www.

257
dedihc.pr.gov.br/arquivos/File/2015/relatoriotraficodepessoas2013.pdf>.
Acessado em 14/07/2015, às 13h30.
BRASIL. CNV. Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade. Brasília:
CNV, 2014. Disponível em: <http://www.cnv.gov.br>. Acessado em 14/07/2015,
às 13h30.
BRASIL, LC no 150/2015. Dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico.
Diário Oficial da União, Brasília, DF, de 02 de junho de 2015. Disponível em:
<ww.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp150.htm>. Acessado em 19/01/16,
às 15h30.

258
Cooperativismo y la cultura cooperativa en la
transición socialista

Grizel Donéstevez Sánchez1

1. Introducción

La formación de cooperativas es un proceso que en la sociedad


moderna ha ido cobrando denodada importancia, sobre todo en los
periodos de crisis económicas. Se cuentan por cientos de millones
las personas que pertenecen a las cooperativas y según la Asociación
Internacional de Cooperativas (ACI) estas constituyen en la actualidad,
las organizaciones que más empleos crean a escala internacional. Lo
cierto es que ellas se presentan como un paliativo a los problemas de
los trabajadores en cuanto a la garantía de empleos, mejoría de ingresos
y atenuante a la incertidumbre que generan las crisis del capitalismo.
Son sustantivas en los programas de gobiernos progresistas del
continente latinoamericano como vía para la promoción del desarrollo

1 Economista. Profesora de Economía Política, graduada en la Universidad de


Lomonósov (1980). MSc. en Desarrollo Económico (1997). Dra. en Ciencias Económicas
(2006). Profesora titular de la Facultad de Ciencias Económicas de la Universidad
Central “Marta” Abreu de Las Villas. Presidenta de la Cátedra Investigación Desarrollo
Víctor Figueroa Albelo. Autora y coautora de numerosos artículos y libros sobre
economía campesina, desarrollo rural y cooperativismo.

259
de pequeñas localidades, la inclusión y la participación social de los
ciudadanos. No son pocos los avances obtenidos por las cooperativas y la
economía solidaria que las representa. La mejora en la calidad de vida, la
igualdad de género y el camino a la disminución de las inequidades tiene
en el movimiento cooperativo un elemento indispensable en la creación
de una nueva cultura basada en la cooperación y la participación social.
El cooperativismo se inscribe como una necesidad del proceso
de socialización en aquellas sociedades que no han alcanzado un
elevado desarrollo de las fuerzas productivas, son consideradas una
alternativa de desarrollo en una perspectiva local. Como factor de
desarrollo, las cooperativas, son capaces de escapar al límite de la
pequeña escala de la producción y los servicios, mediante los lazos de
cooperación que establecen entre el pequeño productor campesino y
artesano; en tal sentido, son consideradas como opciones al desarrollo
en pequeñas localidades. La propiedad cooperativa y las formas de
explotación colectiva o de grupo, son una alternativa a la propiedad
privada capitalista y es la base sobre la que descansa la superación de
sus límites históricos.
A razón, no resulta ocioso, descubrir en términos teóricos el
legado de los clásicos del marxismo respecto al papel de la cooperación y
el cooperativismo en el proceso de transformación social, desentrañando
su necesidad como factor dinamizador de las economías locales.

2. Cooperación, cooperativismo y cooperativas en la


teoría marxista

Es común que la teoría contemporánea considere que la


cooperación y las cooperativas ha existido desde los albores de la
humanidad, no obstante esta consideración puede ser inexacta cuando
se trata de explicar el cooperativismo contemporáneo.

260
En la concepción marxista, el trabajo y la cooperación que nace de
su actividad, ocupa un rol determinante en el desarrollo de la humanidad.
El concepto de que el trabajo es la actividad consciente de los hombres
encaminadas a la producción de bienes materiales, induce a pensar que
en esta interacción, los hombres trabajan en interconexión con otros
hombres del grupo humano al que pertenecen y es en esta colaboración
en las distintas actividades las que hacen posible la reproducción de
sociedad primitiva2.
La visión marxista sobre los socialistas utópicos y la experiencia
del movimiento cooperativo de los precursores junto a los estudios
sobre el capitalismo como sistema permitió colocar a la cooperación y
al cooperativismo en su justo lugar.
La cooperación –según Marx –, es imprescindible en el proceso
productivo porque: permite reducir el espacio donde se produce
en proporción a la escala de ésta; fomenta la emulación entre los
obreros y pone en tensión sus energías; provee a trabajos análogos de
muchos sello de continuidad y polifacetismo; ejecuta simultáneamente
distintas operaciones; economiza medios de producción y los empleas
colectivamente; la jornada de trabajo combinada, produce cantidades
mayores de valor de uso disminuyendo por tanto, el tiempo de trabajo
necesario3.

2 Recuérdese que la actividad de la recolección, la caza, la pesca exigían del


grupo para alcanzar el fin propuesto, la comunidad en los rústicos instrumentos de
trabajo y los resultados de este se repartían en proporción al aporte de los miembros.
Más tarde, se relaciona con el cooperativismo a las organizaciones que se dan en torno
a la producción o el comercio que implica cualquier nivel de cooperación del trabajo.
3 El régimen capitalista de producción, es por tanto, una necesidad histórica
para la transformación del proceso de trabajo en un proceso social y el proceso de
trabajo aparece como método de obtención de excedente económico, de plusvalía,
donde se intensifica el trabajo y su fuerza productiva. Arribando a la conclusión de que
“Todo trabajo directamente social o colectivo en gran escala, requiere en mayor o menor

261
En su dualidad, la cooperación es parte de la socialización de la
producción; en su primer estadio y su grado de desarrollo en general
está determinado por el nivel alcanzado por las fuerzas productivas
como su fundamento material. En segundo lugar, la socialización en su
movimiento alcanza determinados niveles y conforma determinados
tipos de organización social de la producción4. Las “asociaciones
voluntarias de productores libres” es el movimiento cooperativo o
cooperativismo y su forma la sociedad cooperativa, su unidad económica.
Estas, no son más que tipos “especiales” de empresas, sin fines de
lucro que adoptan el carácter de las relaciones reproducción de donde
son originadas; no son privativas de ningún modo de producción en
especial5. Por último, el carácter específico de la cooperativa, como
forma de propiedad y gestión colectiva, basadas en la participación y
la inclusión de sus gestores, se considera una forma transitoria de la
propiedad social. Su carácter y evolución está determinada por el modo
de producción al cual se adscriben.
La transformación de la cooperación simple y el trabajo cooperado
en trabajo coordinado de muchos sustentado en el desarrollo tecnológico
genera los lazos de interdependencia e interconexión de muchos

medida una dirección que establezca un enlace armónico entre las diversas actividades
individuales y ejecute las funciones generales que brotan de los movimientos del
organismo productivo total”, por su esencia la dirección capitalista posee dos aristas,
las cuales son, “de una parte, un proceso social de trabajo para la creación de un
producto y de otra parte un proceso de valorización del capital, por su forma (…) es una
dirección despótica”. O. citada…, pág. 287.
4 Es en el capitalismo donde el proceso de socialización y de cooperación
adquiere mayor auge, observándose la formación de diferentes tipos de empresas, a las
que se le atribuyen diferentes grados de cooperación y socialización productiva.
5 Gisel De Armas L. y G. Donéstevez S. (2010). “Características del
cooperativismo en el contexto América Latina y Cuba”. Monografía. Flujo ascendente
de información, UCLV. Villa Clara. Cuba.

262
procesos de trabajo en donde los obreros coordinados entre sí muestran
que es posible la producción social bajo su dirección.
En su misión histórica, las cooperativas demuestran que los
trabajadores pueden organizar, dirigir la producción material sobre
la base del trabajo cooperativo. Lo cierto es que para Marx había
una manera de superar el límite histórico del cooperativismo en los
marcos del capitalismo y por ello nos señala que: “para emancipar a las
masas trabajadoras, la cooperación debe alcanzar un desarrollo nacional y, por
consecuencia, ser fomentada por medios nacionales”.6Por lo tanto, nos recuerda que
solo la lucha de clases y la unión internacional de trabajadores por la
emancipación derrocarán al capital.

3. Hacia una sociedad de “cooperativistas cultos”

El triunfo de la Revolución de octubre en Rusia, plantea nuevas


interrogantes a las transformaciones socialistas: basadas estas en un
magro desarrollo industrial y precariedad de los sistemas productivos
en el agro. La heterogeneidad socioeconómica, con predominio de la
pequeña explotación campesina, determinó el reconocimiento de la
complejidad de la construcción socialista y el paso del comunismo de
guerra, al impuesto en especie, hacia 1921. La idea central de la Nueva Política
Económica (NEP), era el reconocimiento que ante la multiplicidad
de tipos socioeconómico, las relaciones mercantiles eran el paso atrás
necesario para la salida el aislamiento económico de los productores y
la crisis. El capitalismo de estado comienza hacer la figura económica
mediante la cual Lenin, reconoce la complejidad de la situación y el
camino para la socialización de los sectores más atrasados, en especial
los campesinos.

6 Ibídem. Pág. 12

263
La cooperativa formada a partir de la pequeña explotación
campesina es tratada como una de las formas del capitalismo de estado
y factor de desarrollo local. La necesidad de dinamizar el desarrollo
desde abajo a través del comercio entre productores agrícolas y entre
ellos y la pequeña industria artesanal local, era la mayor expectativa
para propiciar la reproducción de unos y otros eslabones de la cadena
productiva rusa.
En la medida en que las cooperativas campesinas contribuyeran a
aumentar el comercio y la participación de las localidades y se ampliaran
los lazos de cooperación, se podría según Lenin establecer la regulación
y el control sobre las cooperativas. Propiciar el incremento de la
producción local y el intercambio llevaría indefectiblemente al aumento
de las contribuciones al Estado proletario, al frente de desarrollo global7.
En los marcos de la transición socialista el movimiento
cooperativo está destinado a transformar las formas simples y privadas
de organización social en formas superiores de producción, propiciando
con ello la posibilidad de que la pequeña explotación privada se convierta
en una forma social o colectiva de la producción.
El rol de la cooperación, en el tránsito al socialismo en un
país atrasado conduce inevitablemente a la revolución cultural, la
cual se asienta en la revolución industrial como su base material. El
periodo de tránsito constituye entonces toda una época histórica de
transformaciones en cuyo centro está el hombre. Según Lenin, elevar
a la población al grado de “civilización”, con comprensión de todas las
ventajas de las cooperativas y que éstas organizaran la participación
en la sociedad, era preciso, “toda una etapa de desarrollo cultural de
las masas”8.

7 Ver Lenin, Vladimir Ilich (1975). Sobre el impuesto en especie. Obras


Escogidas en tres tomos. T 3 Editorial Progreso. Moscú. 1975. Pág.601-634
8 Lenin, Vladimir Ilich (1975). “Sobre las cooperativas”. Obras Escogidas en
doce Tomos. Tomo VII. Editorial Progreso. Moscú. 1975. Pág. 380

264
El cooperativismo con la toma del poder político y la existencia
de la propiedad social sobre los medios de producción, comienza a ser
el fundamento para “organizar toda la población en cooperativas”.9 “… la labor
cultural con los campesinos consistía en la organización de ellos en
cooperativas”; lo cual no era posible debido al bajo nivel de desarrollo
de la población, lo que retardaba el socialismo, no era posible pisar con
ambos pies terreno socialista”10.
Luego, la importancia que se le da a la cooperación en Rusia
estaba en el hecho que la revolución había conquistado la propiedad
sobre la tierra esta estaba en manos del Estado, solo quedaba socializar
al pequeño productor privado. El paso de la economía campesina “a un
nuevo orden de las cosas por el camino, más sencillo rápido y accesible”11, era la
cooperativa. Luego, el programa sobre la cooperación descansaba en la
organización en cooperativas de los “pequeños y muy pequeños campesinos”,
la conducción de estas por el proletariado, con el Estado ejerciendo el
control “sobre los intereses generales”; éste era la “premisa imprescindible
para edificar la sociedad socialista”.12
El incentivo del Estado a la cooperación pasa “por conceder
privilegios económicos, financieros y bancarios”, como garantía de la
nueva organización social en construcción, sin olvidar la necesidad de
vías prácticas en la preparación de “cooperadores cultos”13.

9 Lenin, Vladimir Ilich (1975).Obras Escogidas en tres tomos. T 3 Editorial


Progreso. Moscú. 1975. Pág.778
10 Ídem. Pág. 384

11 Ibídem. Pág. 779


12 Ibídem. Pág. 779
13 Ibídem. Pág. 781

265
4. La cultural del trabajo cooperado y el cooperativismo

La dimensión cultural en la temática del cooperativismo, es un


aspecto sobre el que no pocos estudiosos le han prestado atención, sobre
todo porque la transformación de la economía individual (privada) a
cooperativa implica ante todo la adquisición de una nueva cultura del
trabajo, “la cultura del trabajo cooperado”. En esta visión del problema, para
nada economicista, la nueva cultura del trabajo, es ante todo aprendizaje,
educación y transformación del hombre como principal sujeto y objeto
del cambio social. Con lo cual, los cambios en la economía están
aparejados con las transformaciones de la sociedad y de los hombres.
Constantemente no se toma en consideración o es desconocido,
este lado del análisis y al enfrentarnos a uno u otro modelo de tránsito
al socialismo, se olvida, que la nueva cultura del trabajo necesita de
tiempo y de un mecanismo de gestión que tome en consideración lo
mejor de las tradiciones y conocimientos de los que interviene en la
organización social que se formula, de manera que se generen espacios
de participación colectiva que permitan el ejercicio de este principio
cooperativo.
En éste, el hombre tiene que ser el centro en el nuevo organismo
económico; por eso es que los que defienden el cooperativismo en el
tránsito al socialismo enfatizan en que no es el afán de lucro el objetivo
primordial que dictamina el movimiento del organismo social. En lo
que tienen toda la razón, los que plantean que es necesario rectificar los
términos de creación de capacidades para la gestión de cooperativas, por el de
una educación para la gestión cooperativa.
En el sector agrario, junto a la transformación de la propiedad
territorial ocurre el proceso de socialización y formación de
cooperativas agrícolas; las tradiciones y cultura del trabajo campesino,
su racionalidad y tradiciones, no dejan de ejercer influencia en la

266
formación de “la nueva cultura del trabajo colectivo” y una “nueva
disciplina del trabajo”. Por supuesto todo esto es un proceso que no
está exento de grandes contradicciones que emergen de las propias
contradicciones del periodo de tránsito al socialismo. Recordemos
que en el caso de Cuba el desarrollo del capitalismo en la agricultura
transitó por la combinación de la economía de plantaciones, erigida
para la exportación y el minifundio fundamentalmente en una
especialización que también conjugaba la exportación de tabaco y el
autoconsumo familiar. La experiencia práctica decidió no desarrollar
el cooperativismo nada más que en su nivel primario, las Cooperativas
de Créditos y Servicios, con vistas a dinamizar el comercio y
abastecimiento de los pequeños productores.
Con posterioridad, el proceso de industrialización del
país alcanzó niveles de socialización en la agroindustria azucarera
acusando la necesidad de la cooperación de la economía campesina
hacia la primera mitad de los años 70. La formación de cooperativas
de campesinos (Cooperativas de Producción Agropecuarias) y más
tarde en los años 90 las cooperativas de trabajadores (Unidades Básicas
de Producción Cooperativas), convirtieron en una necesidad de la
socialización la educación cooperativa y la creación de una cultura del
trabajo cooperativo en el agro.
Todavía tras decenas de años en el proceso de socialización
agrícola las cooperativas en el sector necesitan de la elevación de la
cultura cooperativa y de mecanismos de gestión que contribuyan a su
consolidación como tipo especial de organización económica.
En los estudios sobre cooperativas agrícolas, efectuados en el
Grupo de Desarrollo rural y cooperativismo de la Universidad Central
“Marta” Abreu de Las Villas, se ha constatado, que allí donde la
cooperativa logra consolidarse mucho tiene que ver con la incorporación
y participación de los viejos campesinos, muchos de ellos fundadores y

267
aportadores de medios y tierras, pero con el aporte más importante, el
de la cultura campesina del trabajo.
En estas cooperativas se ha verificado que la tradición campesina
se va transformando y superando hacia una cultura del trabajo diferente,
-basado en la cooperación-; son aquellas que aplicando las nuevas
técnicas y tecnologías, superan los límites de la propiedad privada
campesina (pequeña explotación), al mismo tiempo que conservan
prácticas ancestrales, ahora sobre la base del trabajo colectivo, basados
en la técnica moderna. No dejan de lado a los mayores y promueven su
participación en la toma de decisiones, en la gestión de la cooperativa
lográndose que se combinen las tradiciones y la nueva racionalidad que
impone la cooperativa como tipo especial de empresa.
No obstante, allí donde no se ha producido cambios sustanciales
en el sistema productivo, las condiciones de trabajo no han sido
beneficiadas por la humanización del trabajo, se ha perdido el vínculo
con los socios aportadores ya sea por el envejecimiento o muerte, la
formación de la nueva cultura del trabajo cooperativo se ha visto lacerada
y ha dejado de influenciar al desarrollo de las localidades y en la sociedad
en general. Mucho más difícil ha sido la consolidación de las Unidades
Básicas de Producción cooperativas, en tanto desde su formación no
consiven el concepto de socios aportador, y esencialmente transcurre
el tiempo y las condiciones laborales y comunitarias al no cambiar,
tampoco se reflejan en la cultura del trabajo cooperado y el sentido de
pertenencia a la organización social.
Como proceso la nueva cultura y disciplina del trabajo cooperativo
en formación exige: 1) La transmisión, conservación y reproducción de
las viejas tradiciones agrícolas y su síntesis con las nuevas tecnologías
intensivas, potenciadoras de la producción y conservadoras del entorno
rural; 2) La organización de la producción con dirección participativa,
colectiva y consciente en la determinación del destino económico y
social de la misma. Premisa garante para la autonomía de la gestión, el

268
aprendizaje de los cooperativistas y condición indispensable del éxito. 3)
La nueva disciplina del trabajo es un proceso en el que el hombre transforma
los hábitos adquiridos por las formas privadas, a la vez que transforma
la realidad que lo rodea y se transforma a sí mismo. El resultado es
condición propicia para la creación del sentimiento de pertenencia
hacia lo colectivo, la superación del sentimiento de lo privado.14; combina
voluntades individuales, las transforma y potencia en forma colectiva.
La cooperación se convierte en una fuerza productiva especial.15
En la configuración de la fuerza de trabajo colectiva16 ocurre que:
el campesino transita de productor-propietario-privado a productor-
propietario-colectivo; las nuevas formas productivas germinan a cuenta
de la transmisión de la “vieja cultura campesina” y la adquisición y
formación de la nueva disciplina y cultura del trabajo cooperado; y,
porque en el campesino y su familia ocurre un proceso de la asimilación
de nuevas formas de convivencia social que superan los hábitos y
costumbres de aislamiento que le eran habituales17.
Se constata en la práctica del sector agropecuario que al crearse
las cooperativas agrícolas estas ejercen un impacto en el modo de vida y

14 Vea Lecciones de Economía Política del Socialismo (1990): t. 1, Editorial MES, La


Habana, 1990.
15 D. Figueras, M. y otros (1999) “La fuerza de trabajo colectiva en las
Cooperativas de Producción Agropecuaria”, en Participación Social cooperativismo,
Editorial F. Varela, La Habana 1997.
16 La combinación de voluntades individuales y el surgimiento de la fuerza
de trabajo colectiva, es un proceso complejo y prolongado que se inicia a partir
de la formación del sector socialista con la incorporación de obreros agrícolas,
semiproletarios del campo y campesinos, como miembros de la nueva organización
social: granja o cooperativa.
17 Donéstevez, S., G. (2006) La economía campesina en la transición al
socialismo en cuba: el proceso de descampesinización-campesinización. Editorial
Feijoo, ISBN-978-959-250-388-5. Santa Clara, Villa Clara.

269
de trabajo de campesinos y familiares. Algunos de estos cambios aportan
mayor riqueza al acervo de la cultura del trabajo agrícola tradicional,
mientras que en otros, dada la escala de la producción y el enfoque
industrial que se introdujo en las últimas décadas en la agricultura
cubana, provocan una ruptura de las “tradiciones campesinas”,
repercutiendo negativamente en la consolidación y racionalidad de la
cooperativa; complejidad que requiere de tiempo, para su superación al
poner a prueba la capacidad de la organización para su consolidación.18

5. La cultura cooperativa y el cooperativismo no


agropecuario en Cuba

El balance de los avances en la cultura del trabajo en las


cooperativas agrícolas debe constituir uno de los elementos esenciales
en el desarrollo de la ampliación del cooperativismo no agropecuario.
Algunos coincidirán que con anterioridad se discutía sobre la
cultura cooperativa en general y la del trabajo cooperativo agrícola en
particular. Ahora se trata de introducir un nuevo modelo cooperativo
más allá de la agricultura, con características diferentes; pero, al inducir
el cooperativismo, “sin cooperadores cultos”, es importante conocer la
educación para la gestión cooperativa y la transmisión dialéctica

18 Las investigaciones efectuadas en CPA tabacaleras de Cabaiguán, en la


provincia de S. Spíritus, en los años 90, mostraron un mayor sentimiento de pertenencia,
lo cual está fundamentado en la transmisión de la cultura laboral campesina e isleña
transmitida por los socios aportadores, el liderazgo, la organización del trabajo, entre
otras. Ver G. Donéstevez S. y L. Fajardo Nápoles, D. Figueras M., (1998): “La finca
cooperativa: Una nueva contribución al proceso de socialización en la CPA: La Nueva Cuba”, en
UBPC: Desarrollo Rural, Ed. Félix Varela, UH, 1995. Fajardo, N. L. y otros (1996): “La
presencia Isleña en el cultivo del tabaco en la CPA “La Nueva Cuba” de Cabaiguán,
en Revista Guize, Asociación Canaria de Antropología, volumen 3, 1996, Universidad de la
Laguna, Tenerife, España

270
de la “vieja cultura” es de vital importancia, al mismo tiempo que
contradictoria por el origen socio-clasista de los sujetos participantes.
La formación de la sociedad de “cooperadores cultos” en Cuba,
trata de reconocer que a las contradicciones generales que se presentan
en al ámbito agrícola y rural, se le adiciona la diversidad de sujetos
económicos que pueden y están presentes en las nuevas figuras productivas
que se multiplican, inducen o que existen de manera informal.
Su tránsito a la formalidad o a la institucionalidad, pasa por el
reconocimiento de la complejidad de la estructura económica de Cuba,
la que se perfila en su composición con un sector socialista, representado
por las empresas estatales y las cooperativas del tipo CPA y UBPC,
el capitalismo de estado que comulga con todas aquellas formas de
propiedad y de gestión que remedan la economía mixta de transición y
donde se encuentran: las cooperativas no agropecuarias del tipo privado
surgidas por la pequeña producción mercantil, las cooperativas de
Créditos y Servicios, los arrendamientos en el sector de los servicios,
el sector de la pequeña y mediana empresa privada no reconocida y el
autoempleo, entre otros.
Las cooperativas no agropecuarias surgidas a partir de la pequeña
producción privada individual se revelan como una forma del capitalismo
de estado la cual debe propiciar en interconexión con otras figuras
productivas el desarrollo de las localidades. El control y la regulación
social por parte de los gobiernos locales tendrán que figurar en las
políticas económicas y en los mecanismos de gestión gubernamentales
que propicien el acercamiento y consolidación de estas cooperativas y el
aprendizaje de los involucrados en las formas de cooperación y desarrollo
de las localidades.
La educación y la adquisición de la nueva cultura del trabajo, no
nace por generación espontánea. Los cambios que introduce el nuevo
modelo económico modifican las relaciones estado con los distintos

271
sujetos, sin olvidar que no es el capitalismo lo que se construye sino un
tránsito extraordinario al socialismo.
En cualquiera de las figuras productivas que se promuevan y
especialmente en las cooperativas, encontraremos un origen social
de la fuerza laboral diversa. Son obreros industriales, trabajadores
de servicios, empleados, jubilados, amas de casa, semiproletarios,
campesinos, entre otros, por lo tanto tendrán en su experiencia personal
diferentes perspectivas, nivel cultural, educación económica y prácticas
de trabajo cooperado, participativo y privados. A estos se les puede
sumar lazos familiares (con tradiciones productivas ancestrales) por
lo que las propuestas de organización deben ser con modelos de gestión
flexibles, atemperados a cada circunstancia y la capacitación “personalizada”,
diferenciada e incluso territorializada para cada experiencia. Lo que en el
argot popular se le está llamando y pocos comprenden “el traje a la medida”.
Por otra parte, el nuevo cooperativismo tiene que enfrentar a
través de la educación, las barreras que desde lo subjetivo, -población
y en algunos casos decisores,- ha condicionado la débil situación
económica del cooperativismo agrícola en los últimos 25 años y del
que sus modelos no son únicamente culpables. A esta circunstancia se
le adicionan: la pobre educación económica en la población, la falta de
tradición en cooperativas no agrícolas, la ausencia por muchos años de
un régimen legal no permisible del cooperativismo en el ámbito urbano.
El conocimiento que se tenga de la actividad económica en la
cual se va a inducir el cooperativismo u otra forma productiva, en
cualquiera de las ramas de la producción y los servicios es crucial
para proponer cualquier modelo de cooperativa o forma productiva
emergente. Las tradiciones productivas, la cultura laboral, las cadenas
productivas a escala de la localidad que existen como tradición y
que en ocasiones fueron abortadas como parte de los cambios que
se sucedieron en el proceso de socialización formal, en los primeros

272
decenios de revolución, no pueden dejar de tenerse en consideración;
por cuanto, algunas se han mantenido de manera informal, haciendo
imprescindible, su consideración.
Un buen análisis en aquellos sectores donde existen relaciones
de cooperación no formalizadas debe ser el comienzo para la creación
de esa nueva cultura de la cooperación y un buen incentivo para el
nuevo cooperativismo.
La práctica indica que una inducción apresurada de cooperativas,
sin la adecuada familiarización en la actividad de los futuros
cooperativistas, sin tomar en consideración la cultura heredada y las
tradiciones que puedan existir vivas en los territorios; los lazos de
cooperación, la formación y posterior consolidación de la organización
será lento o desde su fundación estará destinado al fracaso.
Las propuestas que está haciendo la universidad central en el
sector de la construcción de viviendas plantean diversidad de variantes
y tipos de economía diferentes. La filosofía ha sido a partir de las
experiencias que se tienen en los estudios agropecuarios en el país
hacer propuestas de un cooperativismo flexible, que vaya de las formas
más simples de cooperación hacia las más complejas tal y como ha sido
el movimiento espontáneo de la socialización de la producción y del
trabajo en la historia de la sociedad.
La inducción consciente de éste en las condiciones actuales
requiere de una diversidad, a la medida de los territorios y de una
intensidad que reconozca que no es solo el cooperativismo como
modelo la solución de todos los problemas de desarrollo, este es solo
una alternativa más.
Todo esto pudiera parecer solo teoría, pero la experiencia indica
que en las condiciones actuales cualquier modelo de cooperativa o
modelo de gestión basada en el trabajo colectivo auto-gestionado
necesita de una educación y organización del sistema de gestión que

273
pueda mostrar sostenibilidad en su desempeño sobre la base de la
participación activa de todos sus miembros.
Por otra parte, el diseño de la estructura economía de la
localidad al ser diversa debe concebir un modelo económico a escala
local en donde todas las formas productivas tengan participación
como miembros pariguales del organismo social y adopte las formas
productivas acordes a los recursos, las tradiciones, necesidades de la
comunidad, optimizándolos en bien de toda la sociedad. Estos aspectos
muchas veces no son suficientemente considerados; en ocasiones
son presentados como intrascendentes pero en realidad resultan de
vital importancia para el éxito del “nuevo cooperativismo” y el nuevo
modelo de gestión local.

6. A manera de conclusiones

Las formas cooperativas urbanas y rurales en Cuba, necesitan


de evaluación y monitoreo de la experiencia alcanzada sobre todo de
aquellos aspectos que tienen que ver con la esencia del movimiento. La
transición al socialismo necesita de la consolidación de la cultura de
la cooperación y la educación cooperativa expresada en determinados
principios y valores del cooperativismo. El aprendizaje de los socios, la
separación de los objetivos de las cooperativas con los de las empresas
capitalista, en aspectos tan esenciales como el afán por la ganancia y el
lucro, necesitan ser divulgados y aprendidos para la interiorización de
todos los que inducen el movimiento que puede ser eficaz si triunfa,
acercándonos a los ideales del socialismo. Los socios, sabrían, atender,
dirigir y conducir los destinos de la producción a escala de la sociedad
y en ese sentido estaríamos en el socialismo.
El camino del aprendizaje es largo camino y escabroso pero
transitable si se es capaz de evaluar y ajustar las circunstancias no

274
deseadas de la práctica del cooperativismo. En todo caso, la praxis, debe
estar precedida por la teoría y en su vínculo debe propiciar experiencias
exitosas que contribuyan al desarrollo y a la culminación del tránsito
al socialismo.

Bibliografía

Compilador Fajardo N. y otros (2014). Economía Política Contemporáneo


por qué desaparecer la crítica a la Economía Política”, Ediciones Izquierda
Viva. Junio 2014, Bogotá, Colombia. ISBN 978-958-58451-0-7.
Compiladora Pérez, N. y otros (1999): Participación Social y formas
organizativas de la agricultura. Editora Universidad de La Habana, Facultad
de Filosofía e Historia. Departamento de Sociología.
Compiladora Donéstevez G., y otros (2014). Manual para la constitución
de cooperativas de la producción y los servicios de la vivienda. Editorial
Luminarias. S. Spíritus, cuba. ISBN-978-959-204-357-2
Donéstevez, G; D, Figueras y L. Fajardo (1997): “Transformaciones agrarias y
desarrollo de las comunidades rurales. (Reflexiones para estudio de caso)”.
GEDERCO. Universidad Central de Las Villas.
Donéstevez, G. (2006) La economía campesina en la transición al socialismo en
cuba: el proceso de descampesinización-campesinización. Editorial Feijoo, ISBN-
978-959-250-388-5. Santa Clara, Villa Clara. UCLV. Libro digital, en el flujo
ascendente de Información. Biblioteca UCLV
Engels, F. (1973:) “El Capital”, en El Capital, tomo I y III, Editorial Ciencias
Sociales, La Habana.
Fajardo, L. (1994): La UBPC cañera de Villa Clara y la familia cooperativa.
Universidad Central de Las Villas. Biblioteca Central UCLV.
Fajardo, N. L. y otros (1996): “La presencia Isleña en el cultivo del tabaco en la
CPA “La Nueva Cuba” de Cabaiguán, en Revista Guize, Asociación Canaria de
Antropología, volumen 3, 1996, Universidad de la Laguna, Tenerife, España.
Muñoz, R. y otros (2014). Desarrollo y cooperativismo Desafíos al modelo
cubano de transición al socialismo (coautor) Editorial Caminos La Habana
2014 ISBN 978-959-303-091-5.

275
Cooperativas: antecedentes y realidad en el
desarrollo del municipio de Manicaragua

Lic. Jorge Manuel García Vázquez1


Dra. Grizel Donéstevez Sánchez2
Lic. Malena Hereira Domínguez3

1. Introducción

El cooperativismo agropecuario tiene una situación comprometida


a escala nacional, potenciada por la disminución del número de

1 Licenciado en Economía de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las


Villas, Cuba (2009). Profesor Auxiliar del Departamento de Economía de la Facultad
de Ciencias Económicas, UCLV. Con experiencia en el área de Economía Política,
Estudios de Cooperativismo, formación de PYME y Desarrollo Local. Aspirante a
Doctor en Ciencias Económicas. E-mail: jgvazquez@uclv.edu.cu
2 Economista. Profesora de Economía Política, graduada en la Universidad de
Lomonósov (1980). MSc. en Desarrollo Económico (1997). Dra. en Ciencias Económicas
(2006). Profesora titular de la Facultad de Ciencias Económicas de la Universidad
Central “Marta” Abreu de Las Villas. Presidenta de la Cátedra Investigación Desarrollo
Víctor Figueroa Albelo. Autora y coautora de numerosos artículos y libros sobre
economía campesina, desarrollo rural y cooperativismo. E-mail: grizel@uclv.edu.cu
3 Licenciada en Economía de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las
Villas, Cuba (2015). Economista en la Empresa “Ernesto Che Guevara”, municipio
Manicaragua. Villa Clara.

277
cooperativas y socios, además de una desfavorable situación económica
financiera, que facilita el incremento de las deudas en gran parte de las
cooperativas. A raíz de esto, se impone la búsqueda de alternativas en
el ámbito: económico, político y legal, que mejoren las condiciones y
aceleren la solución de los problemas que se presentan. A partir de los
acuerdos del VI congreso del PCC (2011) se plantea la ampliación del
cooperativismo en el sector no agropecuario, así como el fortalecimiento
y reordenamiento del modelo cooperativo. (Muñoz, Donéstevez &
García, 2014)
La situación del cooperativismo en el municipio de Manicaragua,
no se diferencia mucho de la existente a nivel nacional, por lo que es
necesario el análisis de la experiencia acumulada por el cooperativismo
agropecuario en el territorio, para perfeccionarlo y emplearlas para
las propuestas de cooperativas más allá del sector. La condición de
municipio rural, con excelente calidad de sus suelos y con abundantes
recursos naturales permiten desarrollar la producción: agrícola, ganadera
y la microminería para la producción de materiales de la construcción,
lo que puede favorecer el desarrollo del cooperativismo en diferentes
ramas productivas.

2. Antecedentes del cooperativismo en el municipio de


Manicaragua

El movimiento cooperativo en Manicaragua tiene sus inicios en


1960, al analizar los años de funcionamiento del movimiento cooperativo
en el municipio, es notable que la mayor parte de las cooperativas que
aún se mantienen funcionando presenten más de 40 años trabajando la
tierra, razón que justifica la cultura campesina del territorio, debido a
que su economía se sustenta en dicha actividad. En la misma medida que

278
ha avanzado el desarrollo de la economía cubana, así se ha transformado
el movimiento cooperativo. Al analizar el caso de las Cooperativas de
Créditos y Servicios (CCS), se aprecia cómo se han nutrido de diferentes
formas de propiedad sobre la tierra, cuando anteriormente existía una
sola, la propiedad privada, es decir los dueños de finca. En los años 70ta
aparecen los usufructuarios, pequeños agricultores, que al arrendar
las tierras daban paso a la complementación de numerosos planes
estatales como: el plan lechero “La Vitrina” y el tabacalero “El Hoyo de
Manicaragua”, por lo que quedaron menos hectáreas de tierras para el
usufructo familiar.
Las CPA representan una de las formas superiores de producción,
que lamentablemente desde los 90ta muestra un decrecimiento continuo
tanto en áreas como en socios.
Esta situación se reflejó a causa de la insuficiente atención estatal
que se vio afectada por el derrumbe del campo socialista, el aumento del
bloqueo y otros problemas subjetivos de carácter interno que unidos;
llevaron a las CPA hacia una situación económica muy deteriorada,
provocando la desaparición de muchas de las cooperativas por asfixia
económica (Alemán & Figueroa, 2005).
Las Unidades Básicas de Producción Cooperativa (UBPC) han
experimentado un comportamiento estable en los últimos tres años con
una media de 1 250 asociados en nueve unidades, bajo la supervisión
de las empresas “Empresa Cafetalera Jibacoa” y “Empresa Pecuaria La
Vitrina”. Ellas al igual que las restantes estructuras productivas han
tenido dificultades económicas financieras dando lugar a pérdida de
interés en los trabajadores, falta de motivación y carencia de sentido
de propiedad cooperativa, limitando su desarrollo económico y social.
Más tarde por necesidad del país de dar uso a las tierras ociosas
se emitieron una serie de resoluciones que de igual forma entregaban
tierra en usufructo para la producción de tabaco, café y leche y es así

279
por lo que hoy las CCS exponen diferentes formas de propiedad sobre
la tierra: propietario, arrendador y usufructuario.
De las tres formas de propiedad mencionadas, el usufructuario ha
sido el más inestable en los últimos tres años, debido a las características
del personal que ha solicitado las tierras a partir de la aprobación del
Decreto Ley 259 (2008) y el Decreto Ley 300 (2012).
Según Nova (2004) el fenómeno se produce a partir del 2012 a
causa de un movimiento del personal hacia el campo, preferiblemente
jóvenes. La tendencia que se manifiesta una vez en el campo es
que no prosperan a causa de la falta de recursos para enfrentar la
limpia de las tierras, desconocimiento para trabajar y hacer producir
la tierra; se añade a esto que algunos van al campo pensando en
cambios económicos rápidos, con mejoras sustanciales del nivel vida;
circunstancias que en la realidad no ocurren de esa forma. El resultado
es el retorno hacia las ciudades.
Otro aspecto relevante en el comportamiento de las formas de
propiedad mencionadas es la desintegración de varias Cooperativas
de Producción Agrícola (CPA) y CCS, donde ha predominado la falta
experiencia para trabajar la tierra, falta de apoyo con recursos para
comenzar hacer producir la tierra y desmotivación por no cumplirse
las expectativas familiares. La mayoría de los abandonos de tierras son
persona sin origen campesino, siendo la generalidad de los asociados
a las CCS usufructuarios acogidos a las resoluciones del Ministerio
de la Agricultura.

3. Características del cooperativismo en el municipio de


Manicaragua

El municipio de Manicaragua actualmente está situado en la


región central del país, al sur de la provincia de Villa Clara, y es el de

280
mayor extensión territorial. Presenta un área de 986,91 km2, con una
población de 71 640 habitantes, una densidad poblacional de 72,68 hab/
km2, ocupando el sexto lugar en la provincia.
Al analizar el cooperativismo agropecuario en el municipio
se cuenta en la actualidad 49 cooperativas conforman la estructura
económica del municipio y se dedican a diferentes actividades
económicas como: producción de tabaco, café, cultivos varios, crianza
de ganado y reciclaje de desechos. El mayor peso del movimiento
cooperativo recae en las Cooperativas de Créditos y Servicios (CCS) con
34 cooperativas, siendo a la vez la de mayor incidencia en la producción
de bienes y servicios. Le siguen las Unidades Básicas de Producción
Cooperativa (UBPC) con el 18,4% del total de las cooperativas y las
Cooperativas de Producción Agrícola (CPA) con el 10,2%. (ONE, 2014)
Las dificultades del sector cooperativo inciden en el
comportamiento de los resultados económicos, en el año 2014 solo
mostraban resultados positivos un total de: 32 CCS, 5 UBPC, 4 CPA. En
relación con los resultados de las restantes formas productivas, vieron
frenado su desarrollo al no poder compensar sus gastos con sus ingresos,
comenzando el período económico del 2015 con pérdidas en sus estados
de resultado.
En el municipio el sector cooperativo y campesino como sector
fundamental en el desarrollo agropecuario agrupa el 21% de trabajadores
del territorio, siendo la tendencia en los últimos años el aumento del
personal contratado, algo que no debe ocurrir pues la concepción de
incorporado en las cooperativas debe proceder de forma transitoria,
durante un corto período que está bien definido en cada cooperativa.
Las fuerzas de trabajo de las cooperativas están integradas en
un 20% por mujeres de diferentes edades que laboran en las diferentes
actividades agrícolas, e incluso ocupan cargos de dirección en los
diferentes niveles, desde miembro de las juntas directivas hasta

281
presidentas de cooperativa y suman en total 763 mujeres. La mujer en
específico necesita de ciertas condiciones como son cuidados de sus hijos
pequeños, atención a ancianos y los bajos salarios que se pagan hoy y
además, las cooperativas deben diversificar sus producciones para crear
más bienes y oportunidades de trabajo a la mujer.
Otro problema detectado es que el personal asociado a las
cooperativas en su mayoría se encuentra envejecido, siendo el número
de jóvenes incorporados a estas estructuras productivas insuficiente.
Los jóvenes cuentan en las ciudades con otras fuentes de empleo más
atractivas acentuándose los procesos de emigración hacia las ciudades.
La situación anterior influye en el déficit del personal calificado
para el funcionamiento de estas estructuras agrícolas, encontrándose la
mayor parte de los asociados en rangos educacionales menores de doce
grado. La situación más grave responde a que los hijos de campesinos
no estudian carreras afines al sector agropecuario.
Al analizar la estructura de tierras del municipio es notable que
el 85% de las tierras agrícolas se están en manos del sector cooperativo,
encontrándose en mayor porción en las UBPC y CCS, donde existen
áreas ociosas; así como parcelas ganaderas sin explotar debido al
descenso de la masa ganadera.
Debido al desaprovechamiento de la superficie de las tierra los
niveles de producción en los últimos años han decrecido y solo han
concentrado sus producciones en: viandas, hortalizas y granos; no siendo
así en la producción de leche y carne. Se han afectado la producción
de cítricos y frutales en correspondencia con las restantes actividades
económicas, las frutas representan el 8% de las toneladas de alimentos
entregadas por las cooperativas y los cítricos el 0.8%. Es notable el
ascenso acelerado de las producciones de hortalizas a consecuencia del
mal manejo y uso indebido de los suelos. (ONE, 2014)
Por tanto, se han afectado los ingresos promedios por socios al
disminuir los índices de ventas resultado de los descensos productivos

282
y mantenerse los asociados con poca variación en su composición,
reflejándose en los productores de granos, hortalizas, viandas y carne
porcina. Estos ingresos repercuten de forma significativa sobre la calidad
de vida de los asociados pero a su vez dificultan el trabajo y la motivación
de las cooperativas en su conjunto.
Otro aspecto importante en el desarrollo del movimiento
agropecuario del territorio lo constituyen las relaciones crediticias que
se efectúan a través del Banco. Los créditos se otorgan sobre la base de
los planes de producción y de inversión aprobados para cada prestatario.
El movimiento cooperativo está marcado por un gran endeudamiento
que es reflejo de baja productividad, falta de eficiencia y eficacia en el
proceso productivo, para realizar el análisis de este indicador se toma
un período de estudio que inicia en mayo 2013 hasta mayo 2015, con el
objetivo de mostrar los montos alcanzados en un período de dos años
por todo el movimiento cooperativo del territorio.
En la etapa de análisis las UBPC son las más endeudadas al
sobrepasar los 6 000.000,00 CUP en inversiones y 4 000.000,00 CUP en
créditos revolventes, siendo el nivel de solvencia de estas entidades muy
pobre para la liquidación de sus obligaciones. Sus niveles de producción
se encuentran estancados, contexto que repercute en los ingresos y
estos a su vez inciden negativamente en su economía, al no contar con
la liquidez necesaria para viabilizar parte de las actividades básicas del
proceso ganadero.
No siendo así en las CCSF, tipología a la cual pertenece el 66% de
las cooperativas del municipio, esta estructura productiva solo cuenta
con el 3.4% de la deuda total del sector, mientras que a las CPA pertenece
el 10.4% de la deuda total del sector cooperativo.
Es importante señalar que el endeudamiento por concepto de
inversiones y créditos revolventes se encuentra en niveles similares
en cuantía, tendencia que evidencia las dificultades del territorio para

283
desarrollar los medios de producción y lograr una efectiva gestión
financiera en el sector.

4. El desarrollo local en Manicaragua

Las cooperativas son, a pesar de las dificultades antes mencionadas


las principales productoras de alimentos para la formación de la canasta
básica de la población.
Estas formas productivas proveen de hortalizas, viandas, granos,
cítricos, frutales y producciones de la ganadería bovina y porcina a la
población del territorio garantizando parte del autoabastecimiento
local, concentrando el 90% de la ganadería en el sector cooperativo,
siendo este el principal suministrador de leche, carne vacuna y porcina,
además de distinguirse por la producción de aves y ovino caprinos, las
primeras actividades destinadas a cubrir la demanda del sector estatal
y las segundas dedicadas al autoconsumo de los asociados.
Las cooperativas no están enmarcadas en una solo línea productiva
aunque tienen definida su producción fundamental en el objeto social,
estas presentan un alto grado de diversificación en diferentes renglones
agropecuarios, basándose en el aprovechamiento de las tierras, se
caracterizan por presentar cultivos rotacionales (viandas, hortalizas,
granos), cultivos permanentes (café, frutales) y la base alimentaria de
la ganadería (pastos).
El aporte del movimiento cooperativo al presupuesto en el período
de enero 2013 a enero 2015 fue de 20 508.984,96 CUP que representa el
23% del aporte total del municipio, razón que evidencia la importancia
del sector en la economía del territorio.
El sector cooperativo agrupa cerca del 21% de los trabajadores
del municipio, índice que en los años 90ta sobrepasaba el 30% de los

284
ocupados, cifras que han decrecido por la tendencia al decrecimiento
en número de cooperativas y socios, además de presentar el municipio
altos niveles de envejecimiento poblacional que ocasiona que gran parte
de la masa asociada se retire cada año al alcanzar los años estimados
para la jubilación.
Las cooperativas son en el territorio una fuente de empleo
importante al concentrar un gran número de obreros agrícolas, que
en su mayoría son fruto de tradiciones familiares que han dedicado su
vida al cultivo de la tierra, no solo se encuentran los asociados a estas
estructuras productivas, los trabajadores contratados en actividades
eventuales como la recogida de café, corte de tabaco son significativos
en el resultado productivo de las mismas, al ser la mano de obra que
no deja desperdiciar las cosechas cuando estas entran en su fase pico
en los campos del municipio, siendo el pago a estos trabajadores en
dependencia de los rendimientos alcanzados en las labores diarias.
(ONE, 2014)

5. Conclusiones

La cooperativa constituye una empresa que debe lograr ser


eficiente en el plano social y eficiente y competitivo en el económico.
Solo así se podrá rescatar la verdadera naturaleza del cooperativismo.
Sin embargo, la práctica cooperativa en el municipio de Manicaragua
demuestra que estos principios no se cumplen de forma individual, ni
tampoco como sistema. Por tanto, es necesario lograr que la propiedad
cooperativa tenga una realización plena, y por ello deberá sustentarse
en dar un real cumplimiento a su responsabilidad social. Esto significa
que las empresas cooperativas deberán asegurar el cumplimiento de
su compromiso social sobre la base de su desempeño económico y
financiero principalmente, a partir de recursos propios generados como

285
excedentes de su gestión económica (utilidades), así como de otros que
se obtengan como resultados de asignaciones estatales con este fin o de
gestiones específicas con otras instituciones y organismos.

Bibliografía

2011, ‘Lineamientos de la política económica y social del Partido y la


Revolución’, VI Congreso del Partido Comunista de Cuba, La Habana Cuba.
Alemán, S & Figueroa, V 2005 El modelo cooperativo campesino en Cuba,
Editora Política, La Habana, Cuba. ISBN 959-01-0603-X
Decreto Ley No.259, 2008, Sobre la entrega de tierras ociosas en usufructo,
Gaceta Oficial de la República de Cuba. Edición Extraordinaria.
Decreto Ley No.300, 2012, Sobre la entrega de tierras estatales ociosas en
usufructo, Gaceta Oficial de la República de Cuba. Edición Extraordinaria.
Muñoz, R, Donéstevez, G & García, J 2014 Desarrollo y cooperativismo:
desafíos al modelo cubano de transición al socialismo, Editorial Caminos, La
Habana, Cuba. ISBN: 978-959-303-091-5
Nova, A 2004 ‘El cooperativismo línea de desarrollo en la agricultura cubana
1993-2003’, CEEC, Universidad de La Habana, Ciudad de La Habana, Cuba.
ONE 2014 Anuario Estadístico de Cuba. La Habana: ONE. Edición
electrónica a texto completo [en línea], recuperado el 29 de mayo de 2015,
http://www.one.cu/aec2009/esp/09_tabla_cuadro.htm.
Pérez, OE & Torres, R 2014, Miradas a la economía cubana desde una
perspectiva territorial, Editorial caminos, La Habana, Cuba.
ISBN: 978-959-303-085-4
Piñeiro, C 2012 ‘Ahora que sí van las cooperativas, vamos a hacerlo bien.
Roles de las cooperativas en el nuevo modelo económico cubano’. Revista
Temas, La Habana, Cuba.

286
Liberdade de Associação e
a Organização das Cooperativas no Brasil1

Diorlei dos Santos2


José Antônio Peres Gediel3

1. Introdução – Cooperação e Trabalho Digno

O debate em torno da obrigatoriedade de associação das


cooperativas a uma única entidade representativa do cooperativismo
nacional requer seja levada em consideração a importância das
sociedades cooperativas para a efetivação do direito ao trabalho, nas
áreas de crédito, habitação, transporte, saúde, educação, produção e
distribuição de alimentos.

1 Trabalho apresentado no evento “Direito à cidade e ao trabalho: olhares do


Brasil e Cuba” linha “desenvolvimento e cooperativismo”, que ocorrerá de 03 a 09 de abril de 2016, na
Universidad Central “Marta Abreu”, Las Villas, Cuba.”.
2
Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPR.
Membro do Núcleo de Estudos em Direito Cooperativo e Cidadania- NDCC da UFPR.
Advogado em Curitiba-PR.
3 Professor Doutor Titular de Direito da UFPR. Coordenador do Núcleo de
Direito Cooperativo e Cidadania-NDCC.

287
Nesse conjunto de atividades, há que se distinguir a atuação
das cooperativas denominadas empresariais, que são efetivamente
alinhadas à Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), da
atuação das pequenas cooperativas populares, que não se identificam
com a orientação do ente federativo. A divergência quanto a essa
orientação decorre da posição favorável da OCB em relação ao trabalho
assalariado na gestão de suas afiliadas e ao processo de gestão das
cooperativas. As pequenas cooperativas, em especial as vinculadas a
organizações e movimentos sociais, como o dos Agricultores Familiares,
incluindo os Assentados de Reforma Agrária, têm distinto e importante
papel na efetivação do direito ao trabalho, que não se confunde
com trabalho assalariado. Sob essa óptica, o direito à liberdade de
associação está relacionado ao direito do trabalho cooperativo, ou em
cooperação autogestionária.
O Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA4) informa
que até dezembro de 2014 o Brasil contava com 4.084 entidades da
agricultura familiar com DAP – Jurídica5, Declaração de Aptidão

4 BRASIL. <http://www.mda.gov.br/>. Acessado em 25 de outubro de 2015.


5 BRASIL. Lei 11.326-2006, lei que estabelece critérios para ser considerado
agricultor familiar no Brasil, esses critérios estão basicamente em seu art. 3º “Art. 3º
Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural
aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes
requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos
fiscais; II - utilize predominantemente mão de obra da própria família nas atividades
econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo
da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou
empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; (Inciso com redação dada pela
Lei nº 12.512, de 14/10/2011) IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua
família. Um módulo fiscal é uma medida relacionada a tributos baseada na possível
geração de renda da terra, variando entre 5 e 110 hectares. Utilizando essa definição,
84% das propriedades no Brasil pertencem a agricultores familiares, com uma média de
18,4 hectares. Em contrapartida, as propriedades que não são familiares têm em média
309 hectares.

288
ao PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar 6), em um universo de 462.787 agricultores familiares e
assentados de reforma agrária sócios dessas pequenas cooperativas.
Aponta, também, que a geração de trabalho é ainda maior, visto que
nem todos os membros da família são sócios da cooperativa. De regra,
o pai e (ou) a mãe são sócios cooperados. “Os números das propriedades
familiares são impressionantes, representando mais de 80% das unidades de
produção. De forma geral, mais de 12 milhões de pessoas, ou cerca de 75% de
todo o emprego rural, trabalham em propriedades familiares. Adicionalmente, a
agricultura familiar respondeu por 38% do valor bruto da produção agrícola em
2006”7 . Os produtos desses empreendimentos são diversificados tais
como, hortaliças, frutas, grãos, farinhas, panificados, conservas, doces,
carnes e derivados, leite e produtos lácteos, ovos, sucos, café, chás, mel,
erva-mate, açúcar entre outros.
Assim, as pequenas cooperativas agrárias têm se mostrado
importante instrumento de efetivação do trabalho digno, conforme
preceitos constitucionais, o que as afasta do trabalho subordinado. A
importância dessas pequenas cooperativas para a efetivação do direito
ao trabalho é inegável, conforme dados da Organização das Nações
Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), no Brasil, pois esse
segmento da agricultura responde por 75% do emprego rural. Vinculadas
à agricultura familiar, realizam grandes esforços para manter padrões de

6 Essa declaração é o documento oficial emitido pelo Ministério de


Desenvolvimento Agrário – MDA, para conceder um documento que se chama DAP
JURIDICA – Declaração de Aptidão ao PRONAF, a Cooperativa que possuir esse
documento é oficialmente reconhecida como de agricultor familiar; a categoria
agricultor familiar também inclui a de assentado da reforma agrária.
7 FAO. Perspectivas Agrícolas no Brasil: desafios da agricultura brasileira 2015-
2024, <https://www.fao.org.br/download/PA20142015CB.pdf>. Acessado em 25 de
outubro de 2015. p. 44.

289
autogestão, democracia e distribuição justa, que resultam do genuíno
trabalho cooperado.8
A despeito do importante desempenho econômico e social
realizado pelas pequenas cooperativas populares, a legislação
cooperativista anterior à promulgação da Constituição Federal de 1988
se apresenta como um limitador para seu avanço mais significativo,
uma vez que impõe limitações à liberdade de associação, estabelecendo
obrigatoriedade de filiação a apenas uma organização legalmente
reconhecida como única representante do todo o cooperativismo no
país, a OCB.
A obrigatoriedade de filiar-se à OCB não é uma novidade recente,
pois se sustenta em dispositivos da Lei n.º 5.764/1971. Daí porque as
cooperativas devem comprovar tal filiação para estabelecer relações
com o poder público, tais como: realizar o registro de seus documentos
nas Juntas Comerciais; habilitar-se em processos de licitação pública,
entre outras situações. Do ponto de vista jurídico, cabe analisar se tal
exigência é compatível com os quadros normativos vigentes no Brasil
que tratam do direito à liberdade de associação.

2. Liberdade de associação e democracia

A liberdade de associação é tratada pelo direito brasileiro em


consonância com as normativas de organismos internacionais, cujos
parâmetros supranacionais podem contribuir para que os Estados

8 As cooperativas empresariais vinculadas à Organização das Cooperativas


Brasileiras – OCB, possuem o total de 6.810 cooperativas com 11.583.766 (onze
milhões, quinhentos e oitenta e três mil, setecentos e sessenta e seis) sócios, com
338.885 (trezentos e trinta e oito mil, oitocentos e oitenta e cinco) de trabalhadores
empregados, não cooperados. Dados de 2013. BRASIIL. Disponível em: <http://www.
brasilcooperativo.coop.br/GERENCIADOR/ba/arquivos/diagnostico_consumo.pdf>,
Sistema OCB/Gedeg; Base: Dez/2013.

290
nacionais balizem a regulação jurídica da matéria. No plano do direito
internacional dos direitos humanos, a liberdade de associação foi
consagrada no art. 20 da Declaração Universal de Direitos Humanos
de 1948 e em outros muitos tratados e convenções internacionais,
como se verifica nos art. 21 e 22 do Pacto Internacional de Direitos
Civis e Políticos (1966), no art. 8º do Pacto Internacional de Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais (1966), nos artigos 15 e 16 da Convenção
Americana Sobre Direitos Humanos (1969) e no artigo 12 da Carta dos
Direitos Fundamentais da União Europeia, atualmente integrada ao
Tratado de Lisboa.
Particularmente relevante para a ordem jurídica brasileira é a
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José),
incorporada no ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto n.º 678 de
19929. Essa Convenção prevê o direito à liberdade em sentido amplo,
incluindo a liberdade de associação10 em seu art. 16, nos seguintes termos:
“Todas as pessoas têm o direito de associar-se livremente com fins ideológicos,
religiosos, políticos, econômicos, trabalhistas, sociais, culturais, desportivos ou de
qualquer outra natureza11”. Esse dispositivo está presente desde a origem
dessa norma internacional, ou seja, desde 1969, porém, somente foi
ratificado no Brasil em 199212. É possível notar que a liberdade de

9 SARLET, Ingo Wolfgang. MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERI,


Daniel. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. Revista, atualizada e ampliada. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2014. p. 516.
10 Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de San José da
Costa Rica), promulgado no Brasil pelo decreto de nº 678 de 06 de novembro de 1992.
11
Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/
instrumentos/sanjose.htm>. Acessado em: 19 de outubro de 2015.
12 Importante frisar que formalmente a liberdade de associação tinha previsão
na Constituição de 1967, art. 150, § 28(C 1/1969, art. 153, § 28, porém, não estava explicito
na Constituição a liberdade de associação cooperativa, como espécie de liberdade de
associação, o que somente se efetiva com a Constituição de 1988.

291
associação para a referida Convenção é ampla, e o direito de associar-se
livremente para fins trabalhistas, econômicos e sociais não pode sofrer
restrição por nenhuma norma infraconstitucional, como ocorre no Brasil,
com base na Lei n.º 5764/1971.
Se ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação e
nenhum dispositivo legal de menor força normativa pode impor vinculo
associativo, sob pena de violar dispositivos de pactos e convenções
internacionais dos quais o Brasil é signatário, tal disposição normativa
encontra-se em frontal desacordo com essas normas internacionais.
Importante notar que no plano do direito constitucional brasileiro
o reconhecimento da liberdade de associação, na condição de direito
fundamental, é mais recente e vem afirmado na Constituição de 1988. No
percurso constitucional brasileiro, todas as constituições asseguraram
a liberdade de associação 13 , mas no que diz com as associações
cooperativas, a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a contemplar
tal modalidade associativa, assegurando não apenas uma genérica
liberdade de criação e participação de cooperativa, e prevendo para as
Cooperativas um regime constitucional diferenciado, tal como ocorre
com o aspecto tributário (art. 146, c) e o estimulo ao cooperativismo (art.
174, §2º). Nessa perspectiva, as cooperativas constituem um particular
modo de organização social e meio de exercer a liberdade de associação.
A perspectiva constitucional adotada em 1988 restaura a
democracia no Brasil e reafirma a liberdade de associação suprimida
durante o período ditatorial, que perdurou de 1964 a 1985. Assegura a
ampla liberdade de associação dos cidadãos para fins lícitos e considera
a liberdade de associação em cooperativas um direito fundamental,

13 Constituição de 1891, art. 72, §§3º e 8º; Constituição de 1934, art. 113, ns. 5, 7
e 12; Constituição de 1937, art. 122, ns 3 e 9; Constituição de 1946, art. 141, §§ 7, 10, 12 e
13; Constituição de 1967, art. 150, § 28; EC 1/1969, art.153, §28. SARLET, Ingo Wolfgang.
MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERI, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 3. ed.
Revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 518.

292
previsto no art. 5° inciso, XVIII: “XVIII - a criação de associações e, na forma
da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência
estatal em seu funcionamento”14.
Assim, a liberdade de associação, da qual é espécie a liberdade
de criação e participação de cooperativas, é reconhecida e protegida
na condição de um direito fundamental15. A liberdade positiva como
direito de associar-se, e a liberdade em sentido negativo que é o direito
de desassociar-se, ou seja, mesmo após a manifestação de vontade de
se associar essa vontade pode ser alterada, se houver o interesse em
desassociar-se. A referência constitucional é para as pessoas físicas ou
jurídicas, o cidadão que tem interesse em ser sócio de uma Cooperativa,
ou qualquer outra forma de associação para fins licito, e para a pessoa
jurídica que tem interesse em vincular-se a outras pessoas jurídicas. No
caso das cooperativas, é perceptível que a legislação brasileira propõe
um sistema cooperativo, permitindo assim a formação de Cooperativas
singulares que podem vincular-se a Cooperativas centrais e estas por
sua vez podem vincular-se a uma confederação aos moldes previsto em
nossa legislação16.

14
Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acessado
em 20 de outubro de 2015.
15 SARLET, defende que o direito à liberdade de associação é cláusula pétrea
“assim, de acordo com o que já foi examinado na parte geral dos direitos fundamentais, cuida-se
de direito (mais precisamente de norma) diretamente aplicável, no sentido de que a ausência de lei
não impede a proteção do direito de livre associação, além de a abolição da liberdade de associação
(incluindo a criação de cooperativa) estar protegida na condição de “cláusula pétrea”, contra o poder
de reforma constitucional”, Ingo Wolfgang. MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERI,
Daniel. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. Revista, atualizada e ampliada. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2014. p. 519.
16
Brasil. Lei n.° 5764, de 16 de dezembro de 1971. Define a Política Nacional de
Cooperativismo, e institui o regime jurídico destas. O art. 6° da lei do Cooperativismo

293
Segundo Ingo Sarlet, a titularidade desse direito contempla dupla
dimensão, individual e coletiva, “uma de natureza individual e outra
coletiva. Na primeira dimensão o que se observa diz respeito ao direito
de associação da pessoa, membro de uma associação, a titularidade
que lhe corresponde, na qualidade de pessoa natural, mas também de
pessoas jurídicas que podem, por sua vez, também criar e integrar uma
associação” (SARLET, 2014: 521)
Ainda há que se falar da liberdade de criação de cooperativas,
sem autorização do Estado, conforme os ditames do art. 5° inciso XVIII
da Constituição de 1988. Para José Afonso da Silva, a liberdade de
associação, contém quatro direitos “o de criar associação (e cooperativas
na forma da lei), que não depende de autorização; o de aderir a qualquer
associação, pois ninguém poderá ser obrigado a associar-se; o de desligar-
se da associação, porque ninguém poderá ser compelido a permanecer
associado; e o de dissolver espontaneamente a associação, já que não se
pode compelir a associação a existir” (SILVA, 2011:267)17.
Visto todo o amparo Constitucional mencionado, ainda é bastante
inquietante a insistência do poder público brasileiro em exigir vinculo
único de toda cooperativa à Organização das Cooperativas Brasileiras

brasileiro estabelece em que consiste cada forma e Cooperativa, assim dispondo. Art.
6º As sociedades cooperativas são consideradas: I - singulares, as constituídas pelo
número mínimo de 20 (vinte) pessoas físicas, sendo excepcionalmente permitida
a admissão de pessoas jurídicas que tenham por objeto as mesmas ou correlatas
atividades econômicas das pessoas físicas ou, ainda, aquelas sem fins lucrativos; II -
cooperativas centrais ou federações de cooperativas, as constituídas de, no mínimo,
3 (três) singulares, podendo, excepcionalmente, admitir associados individuais;III -
confederações de cooperativas, as constituídas, pelo menos, de 3 (três) federações
de cooperativas ou cooperativas centrais, da mesma ou de diferentes modalidades.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5764.htm>. Acessado em
20 de outubro de 2015.
17 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35. ed. São
Paulo: Malheiros Editores, 2011. p. 267.

294
(OCB), seja para registro de atos constitutivos, seja para participar de
certames de licitação.
Para a presente análise, é importante, ainda, examinar a natureza
da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), pessoa jurídica
de direito privado, à qual por lei toda cooperativa tem obrigação de
associar-se, nos termos da Lei n.º 5.764/71.
Com efeito, no início do período da ditatorial recente (1964-1985),
até dois anos antes de ser aprovada a mencionada lei geral regulando,
em 1971, a criação e o funcionamento das cooperativas, havia, no Brasil,
duas entidades de representação nacional do Cooperativismo divergiam
entre si, Aliança Brasileira de Cooperativas (ABCOOP) e União Nacional
das Associações Cooperativas (Unasco). A consequência direta dessa
divergência foi a proposta governamental para a criação de uma nova
organização, na tentativa de unificação da representação18. Surge então,
a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), com criação em 02
de dezembro de 1969.
Essa organização realizou um movimento para avançar no aspecto
legislativo e o resultado veio em seguida com a promulgação da Lei n.º
5.764, em 16 de dezembro de 1971. Esta lei substituiu toda a legislação
anterior a respeito do Cooperativismo e reuniu os vários aspectos do
movimento, incluindo a unificação do sistema em torno da representação
única pela OCB. É importante mencionar que na década de 1980 as
cooperativas passaram gradativamente a se enquadrar num modelo
empresarial, incentivando o trabalho assalariado e permitindo sua
expansão econômica, para atender às exigências do desenvolvimento
capitalista agroindustrial adotado pelo Estado.

18 A divergência que existia a época é afirmada pela própria OCB em seu site
oficial quando descreve a história do sistema Cooperativista no Brasil. Disponível em:
<http://www.ocb.org.br/site/ocb/historia.asp>. Acessado em 20 de outubro de 2015.

295
O contexto político da época não pode ser ignorado, pois todo
esse movimento tinha forte apoio do Estado ditatorial brasileiro.
A institucionalização da Organização das Cooperativas Brasileiras
ocorreu no Congresso Brasileiro de Cooperativismo, realizado na cidade
de Belo Horizonte em dezembro de 1969. Nesse período, vigorava o Ato
Institucional nº 05, que limitou os direitos políticos e associativos
fundamentais e as liberdades democráticas, institucionalizando a
ditadura. Governava o país, após passagem por uma junta militar, o
General Emílio Médici, que se notabilizou por ser o mais violento e
repressor governante brasileiro.
É nesse momento que foi publicada a Lei n.º 5.764/1971, legislação
ainda vigente, como uma reivindicação da nova entidade criada para
representar o coperativismo brasileiro. O resquício ditatorial aparece
claramente na Lei n.º 5.764/71, que em seus artigos 105 e 107 estabelece
a obrigação de filiação de todas as Cooperativas na OCB para alguns
atos legais, tal como o direito de constituir-se, visto exigir filiação para
registros dos atos constitutivos nas juntas comerciais e para participar
de processos de licitação, conforme mencionado:

Art. 105. A representação do sistema cooperativista nacional cabe


à Organização das Cooperativas Brasileiras - OCB, sociedade civil,
com sede na Capital Federal, órgão técnico-consultivo do Governo,
estruturada nos termos desta Lei, sem finalidade lucrativa, competindo-
lhe precipuamente:
Art. 107. As cooperativas são obrigadas, para seu funcionamento, a
registrar-se na Organização das Cooperativas Brasileiras ou na entidade
estadual, se houver, mediante apresentação dos estatutos sociais e suas
alterações posteriores.

A Lei n.º 5.764/1971 estabeleceu uma clara limitação à liberdade


de associação e organização das cooperativas, e essas limitações são
recorrentemente invocadas pelos órgãos públicos, até o presente momento.

296
É com base nesses dispositivos que as Juntas Comerciais ainda
exigem que toda cooperativa deva provar sua filiação na OCB19 para
arquivar seus atos. No Brasil, a validade dos atos constitutivos depende
de arquivamento na Junta Comercial, ou seja, uma cooperativa para
ter existência jurídica depende que seus atos sejam arquivados, sem
isso ela sequer pode ser constituída. Mesma exigência tem ocorrido
nos processos de licitação, nos editais do poder público exigem a
prova de filiação das cooperativas na OCB para se habilitarem nos
certames, ou conforme a modalidade de licitação após vencer o certame
exige-se a prova de dita filiação na OCB. Resquício desse processo
histórico, o poder público brasileiro tem exigido filiação na Organização
das Cooperativas Brasileiras (OCB) para permitir que as pequenas
cooperativas possam participar de processos de licitação, apesar dos
aspectos jurídicos levantados anteriormente.
Como exemplo dessa realidade, citamos para ilustrar o caso
do edital de pregão eletrônico de n.º 052/DAAA/2014, processo n.º
00127/4444/2014, oferta de compra de n.º 080358000012014OC00072
desencadeado pela Secretaria de Estado da Educação do Estado de São
Paulo-SP, em que constou do item 1.5.2. do edital20.

19 Existe, ainda, discussão sobre a natureza jurídica da Organização das


Cooperativas Brasileiras (OCB), que em seu estatuto assegura ser de natureza privada,
como ela exerce um controle sobre as cooperativas nela filiada seria, em verdade, o
exercício de um poder de polícia, que no Brasil é vedada para entidade privada; isso
somente é assegurado para o poder público. Sobre o tema, ver GEDIEL, José Antônio
Peres (Org.). Estudos de direito cooperativo e cidadania. Curitiba: Programa de Pós-
Graduação em Direito da UFPR, 2010.
20 Informações sobre esse edital pode ser encontrado no site <www.bec.
fazenda.sp.gov.br>. Há que salientar que os dois editais aqui citados são usados como
exemplo, porém, essa exigência é padrão para o poder público brasileiro.

297
1.5.2. Se for cooperativa, declaração de que possui registro perante a
entidade estadual da Organização das Cooperativas Brasileiras, nos
termos do artigo 107 da Lei Federal nº 5.764, de 14 de julho de 1971
(Anexo V - Modelo 5).

É importante frisar que esse edital foi processado no ano de 2014


e tinha como objeto a aquisição de alimentos da agricultura familiar
advinda das pequenas cooperativas para escolas públicas do Estado
de São Paulo-SP. Essa política pública foi uma conquista das pequenas
cooperativas, no ano de 2009, que resultou na Lei n.º 1.1947/2009, que em
seu art. 14 assegurou que do total dos recursos disponibilizado pela União
para os demais Entes Federativos (Estados e Municípios) pelo mínimo
30% do que se destina para a alimentação escolar de escolas públicas
deva ser adquirido da agricultura familiar por meio de suas cooperativas.
No entanto, o procedimento de aquisição desses produtos tem de
obedecer à legislação que rege a administração pública, os procedimentos
de compra, como o pregão eletrônico ou outro meio de licitação. Nos
editais de compra para executar esse percentual que a lei assegura, os
órgãos do poder público têm exigido a necessidade de filiação da OCB,
seja para participar do certame, ou após a cooperativa ser vencedora,
antes de assinar o contrato administrativo. Os editais trazem um modelo
de declaração de filiação na OCB21.

21 Nesse caso em específico, a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo-

SP acatou recurso administrativo da Cooperativa de Comercialização Avante Ltda,


do Município de Querência do Norte-PR, para adjudicar o objeto para a Cooperativa,
a modalidade de licitação era pregão eletrônico, e pela Lei n.º 10.520/2002 nessa
modalidade de licitação primeiro descobre o vencedor e após o vencedor apresenta a
documentação de habilitação jurídica, em especifico a Cooperativa venceu a licitação
e quando da entrega da documentação foi desclassificada, assim, manejou recurso
administrativo alegando a inconstitucionalidade da exigência e juntando vasta
jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo-SP, que considera o
art. 107 da Lei n.º 5.764/1971 não recepcionada pela Constituição de 1988; o recurso foi
deferido e adjudicado o objeto do certame para a Cooperativa.

298
Essa exigência constou, também, do edital do município de
Fortaleza-CE, edital n.º 123322, pregão eletrônico de n.º 018/2014 registro
de preços, processo administrativo de n.º 2409083014593/2013, que no
item 14.3.5. previu tal obrigação de filiação. Esse edital tinha como objeto
aquisição de alimentos para as escolas públicas para alimentação escolar.
Trouxe a seguinte exigência “14.3.5 REGISTRO NA ORGANIZAÇÃO DAS
COOPERATIVAS BRASILEIRAS, no caso de cooperativa, acompanhado dos
seguintes documentos:”. Diferente do caso anterior, neste, uma cooperativa
da agricultura familiar que participou do certame, foi desclassificada, e
um dos motivos de tal resultado foi exatamente o contido no referido
item 14.3.5, que exigia filiação na OCB23.

3. O Poder Judiciário e a Liberdade de Associação das


Cooperativas

Vistas essas exigências descabidas, as cooperativas têm buscado


guarida junto ao Poder Judiciário, para promover uma discussão
constitucional e tentar reverter as arbitrariedades do poder público.
Citamos como exemplo alguns julgados, em especial do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo-SP.

22 Outras informações a respeito desse certame pode ser encontrado no site:


www.licitacoes-e.com.br.

23 Vejamos a decisão do pregoeiro, em <www.licitacoes-e.com.br>. “Fornecedor


desclassificado; Data/Hora : 18/02/2014-11:35:02; Fornecedor: COOPERATIVA DE COMERC. E
REFORMA AGRARIA AVANTE LT; Observação: Por ferir o disposto nos itens 14.3.5 e alíneas
«c», «d», «e», «f» e «g», bem como, por não apresentar a inscrição do Balanço Comercial
no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas de acordo com o disposto no item
14.5.7 do instrumento convocatório.”

299
Mandado de segurança pregão presencial cooperativa – exigência de
registro na organização das cooperativas brasileiras ou na entidade
estadual equivalente cláusula em descompasso com o artigo 5°, inciso
XVIII da Constituição Federal princípio da vinculação ao edital não
absoluto. Ordem concedida recursos oficial e da municipalidade de
campinas providos.24

Agravo de instrumento. Mandado de segurança. Licitação. Exigência, no


edital, de comprovação do registro da cooperativa na OCB ou OCESP,
fundada no art. 107, da Lei 5.764/71. Dispositivo não recepcionado pela
atual CF, art. 5º, XVII, XVIII e XX. Suspensão da exigência. Precedentes
deste Tribunal. Liminar mantida. Recurso não provido25.

Mandado de segurança. Ato administrativo. JUCESP que exigiu


registro da Cooperativa junto à OCESP para arquivamento de Ata da
Assembleia. Exigência ilegal. Arts. 105 e 107 da Lei nº 5.764/71 que não
foram recepcionados pela nova Constituição Federal. Inteligência do art.
5º, incisos XVII e XX da CF. Recurso provido (TJSP 3ª C. Dir. Público
Ap 0004662-91.2013.8.26.0053 Rel. José Luiz Gavião de Almeida j.
11.02.2014)26.

Interessante frisar que, nos três acórdãos examinados, o


embasamento jurídico se assenta na interpretação de que os artigos

24 Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – SP. Apelação Civil n.º
0099278.96.2008.8.26.0000. Município de Campinas SP e Asimatec S/C Ltda. acessado
em 21 de outubro de 2015.
25 Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – SP. Agravo de
instrumento de n.º 203873668.2014.8.26.0000. Fundação para o desenvolvimento da
educação – FDE e Sindicato da Cooperativas de Trabalho do Estado de São Paulo- SP –
SINCOTRASP.
26 Brasil. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – SP. Apelação Civil de
n.º 000466291.2013.8.26.0053, relator José Luiz Gavião de Almeida. Junta Comercial do
Estado de São Paulo-SP.

300
105 e 107 da Lei Federal n.º 5.764/71, que impõem a obrigatoriedade de
filiação das cooperativas na Organização das Cooperativas Brasileiras
OCB ou em na entidade estadual, não foram recepcionados pela atual
Constituição Federal, em razão do disposto no art. 5º, XVIII, o qual
estabelece que a criação de cooperativas independe de autorização,
sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.
Mencionam, ainda, os incisos XVII e XX do referido artigo 5º, que
garantem a liberdade de associação para fins lícitos e a liberdade de
associar-se e permanecer associado.
A importância das pequenas cooperativas, em especial das
cooperativas vinculadas à agricultura familiar, para o acesso ao trabalho é
incontestável, em que pese a permanente insistência da OCB e de alguns
órgãos públicos em considerar válidas tais disposições legislativas, que
obstam o direito à liberdade de associação.

4. Conclusões

Não há fundamento legal que possa assegurar a obrigatoriedade


de filiação de toda e qualquer cooperativa junto à Organização
das Cooperativas Brasileiras (OCB), visto que todos os tratados
internacionais dos quais o Brasil é signatário e a Constituição de 1988
asseguram a liberdade de associação e vedam tal obrigatoriedade. O
argumento de que a obrigatoriedade advém do contido nos artigo 105
e 107 da Lei n.º 5.764/2-1971 não deve prevalecer, pois estes artigos
não foram recepcionados pela Constituição vigente, que retomou a
democracia em nosso país e estabeleceu no rol dos direitos fundamentais
a liberdade de associação, deixando explícita a liberdade de criação e de
associação em cooperativas.
A obrigatoriedade de filiação junto à OCB exigida pelas Juntas
Comercias e demais órgãos públicos, em editais de licitações, inclusive

301
para que qualquer cooperativa deva estar filiada sob pena de ser excluída
dos certames, é, portanto, inconstitucional e deve ser combatida com
recursos administrativos junto a esses órgãos, e não obtendo êxito deve
ser questionada junto ao Poder Judiciário.
Nos últimos anos, o Judiciário brasileiro tem garantido a liberdade
de associação para as cooperativas, com base na interpretação de não
recepção dos artigos 105 e 107 da Lei n.º 5.764/1971 pela Constituição
Federal de 1988. Essa solidez jurisprudencial é uma conquista das
pequenas cooperativas, que historicamente nunca tiveram identidade
com o modelo empresarial do cooperativismo representado pela OCB.
Em decorrência de todas as questões antes apresentadas,
em 2014, parte considerável das pequenas cooperativas vinculadas
a assentamentos de reforma agrária e agricultura familiar fundaram
a União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias
(UNICOPAS27), que cumpre papel importante de representação dessas
pequenas Cooperativas.
Ressalte-se, porém, que mesmo com a criação dessa nova
organização, que tem por finalidade representar os interesses das
pequenas cooperativas, nenhuma delas está obrigada a se filiar, seja na
OCB, seja na UNICOPAS, em virtude dos preceitos constitucionais que
lhes asseguram a ampla liberdade de associação.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://


www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>.
Acessado em 20 de outubro de 2015.

27 Ata de assembleia geral de fundação da UNICOPAS, arquivado no 1º oficio


de Brasília, Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas, protocolo n.º 00119421, em
17.04.2014.

302
BRASIL. Lei 11.947, de 16 de junho de 2009. Diário Oficial da República Federativa
do Brasil, Brasília, DF, 17 de junho de 2009. Disponível em: <http://www2.
camara.leg.br/legin/fed/lei/2009/lei-11947-16-junho-2009-588910-norma-pl.
html>. Acessado em: 09 out. 2015.
CARLEIAL, Liana; PAULISTA, Adriane. Economia solidária: utopia
transformadora ou política pública de controle social? In: GEDIEL, José
Antônio Peres (Org.). Estudos de direito cooperativo e cidadania. Curitiba:
Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPR, n. 2, 2008.
FAO. Perspectivas Agrícolas no Brasil: desafios da agricultura brasileira 2015-
2024. Disponível em: <https://www.fao.org.br/download/PA20142015CB.
pdf>. Acessado em: 25 de outubro de 2015.
FRANKE, Walmor. Direito das sociedades cooperativas. São Paulo: Saraiva; USP,
1973.
GEDIEL, José Antônio Peres. Cooperativas populares: a legislação como
obstáculo. In: MELLO, Sylvia Leser de (Org.). Economia solidária e autogestão:
encontros internacionais. São Paulo: NESOL/USP; ITCP/USP; PW, 2005.
_____ (Org.). Estudos de direito cooperativo e cidadania. Curitiba: Programa de Pós-
Graduação em Direito da UFPR, 2005.
_____ (Org.). Estudos de direito cooperativo e cidadania. Curitiba: Programa de Pós-
Graduação em Direito da UFPR, 2010.
_____. O marco legal e as políticas públicas para economia solidária. In: FLEM.
Economia Solidária: desafios para um novo tempo. Salvador: FLEM, 2003.
_____ (Org.). Os caminhos do cooperativismo. Curitiba: UFPR, 2001.
HARDER, Eduardo. A definição da autonomia privada nas sociedades cooperativas:
função social e princípio da democracia. Curitiba, 2005, 124 p. Dissertação
(Mestrado em Direito), Programa de Pós-Graduação em Direito, UFPR,
Curitiba.
NAMORADO, Rui. Introdução ao Direito Cooperativo: para uma expressão
jurídica da cooperatividade. Coimbra: Almedina, 2000.
PONTES, Daniele Regina. Configurações contemporâneas do cooperativismo
brasileiro: da economia ao direito. Curitiba, 2004, 184 f. Dissertação (Mestrado
em Direito), Programa de Pós-Graduação em Direito, UFPR, Curitiba.

303
SARLET, Ingo Wolfgang. MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERI, Daniel.
Curso de Direito Constitucional. Revista, atualizada e ampliada. 3. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2014.
SINGER, Paul. Introdução à Economia Solidária. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo, 2002.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2011.
SILVA, Eduardo Faria. A organização das Cooperativas Brasileiras e a negação do
direito fundamental à livre associação. Dissertação de mestrado. Curitiba: UFPR,
2006. Disponível em: <http://www.direitocooperativo.ufpr.br/arquivos/
File/A_Organizacao_das_Cooperativas.pdf>. Acessado em 20 de outubro de
2015.

304
Os Planos Diretores no Brasil e a Trajetória do
Discurso da Politização do Planejamento

José Ricardo Vargas de Faria1

1. INTRODUÇÃO

Nos últimos quinze anos, observou-se no Brasil um ciclo de


intensa atividade planejadora na esfera municipal. A disseminação do
plano diretor como principal instrumento de política urbana no nível
local, acompanhado de planos municipais de políticas setoriais, decorre,
em parte, de diferentes obrigatoriedades legais estabelecidas em diversos
níveis normativos: Constituição Federal, Estatuto da Cidade, Políticas
Nacionais de Mobilidade Urbana, Saneamento Básico, Resíduos Sólidos,
Habitação etc.
Esse ciclo, que teve seu auge no caso dos Planos Diretores entre os
anos de 2005 e 2008, não pode ser explicado apenas pela obrigação legal,
pois existem no Brasil “leis que pegam e leis que não pegam” (FREITAG,
2001, p.2). O fato de mais de 60% dos municípios brasileiros (dentre os
quais muitos isentos da obrigatoriedade) possuírem ou terem iniciado a

1 Doutor em Planejamento Urbano e Regional. Professor do Departamento


de Transportes e dos Programas de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e em
Políticas Públicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

305
elaboração de seus planos diretores precisa ser investigado como parte
de um processo social de afirmação de um ideário e como resultado de
um significativo investimento político na disseminação do planejamento
urbano com nova feição2.
Contribui para esse processo a mudança do prestígio e da
associação de sentidos ao plano diretor. Se houve, por parte de
movimentos sociais, urbanistas e outros militantes progressistas sobre
as questões urbanas, um expressivo descrédito em relação os planos
diretores nas décadas de 1970 e 1980, a afirmação da sua centralidade
no processo constituinte de 1988, reconfigurou algumas estratégias
de luta e organização no campo da reforma urbana (Burnett, 2011;
Maricato, 2011; Faria, 2012). Ainda que não se possa afirmar que
tais estratégias tenham sido assumidas sem oposição, é necessário
reconhecer, tanto por parte do Governo Federal3 quanto do Fórum
Nacional da Reforma Urbana (FNRU)4, os esforços para, em certo
sentido, reinventar o planejamento urbano e seu instrumento principal:
o Plano Diretor. Esforços que combinaram, entre outros aspectos,
mobilizações em torno de conquistas legais, disputas institucionais,
conflitos ideológicos, produção de discursos, diagnósticos e prognósticos
que serviram à afirmação de um ideário hegemônico sobre os elementos

2 “Diz respeito a uma nova concepção de Plano Diretor pós-Estatuto, pois,


embora o instrumento ‘plano diretor’ seja anterior ao Estatuto da Cidade, o conceito
de Plano Diretor e, principalmente, suas formas de elaboração foram adaptados de
um formato anterior, mais burocrático e tecnocrático, para uma prática com ampla
participação da população. Neste contexto, ganhou destaque também a atuação da
sociedade civil organizada, especialmente dos movimentos sociais envolvidos com a
Reforma Urbana” (SANTOS JR.; SILVA; SANT’ANA, 2011, p.14)
3 Com destaque para a Secretaria Nacional de Programas Urbanos (SNPU)
do Ministério das Cidades.
4 Articulação de organizações não governamentais, entidades representativas
de segmentos profissionais e movimentos sociais ligados à reforma urbana.

306
constituintes de uma determinada ordem política no corpo social da
reforma urbana.
O objetivo deste trabalho é apresentar uma breve trajetória dos
discursos críticos sobre o planejamento urbano no Brasil e a conformação
da proposta identificada como “planejamento urbano politizado”,
que representa a inflexão no sentido atribuído ao papel dos planos
diretores e alinha parte do campo crítico ao conservador na afirmação
da centralidade do planejamento.
O texto está organizado para apresentar uma síntese das críticas
à história do planejamento urbano e a afirmação da nova feição do
planejamento, indicando seus elementos constituintes principais.
Conclui problematizando os resultados esperados e alcançados e o
papel da apropriação do plano diretor como objeto e instrumento de
luta no campo da reforma urbana.

2. A crítica da história do planejamento urbano no Brasil


e a formação do discurso reformista

A Reforma Urbana como programa de melhoria das condições de


vida urbana das classes populares, distinto, portanto, dos programas
associados à adequação das cidades aos interesses da reprodução do
capital (Burnett, 2011), se apresenta de maneira mais sistematizada
no Brasil no início da década de 1960, como parte do conjunto de
reformas de base no período do Governo de João Goulart. A essa
proposta, derrotada no nascedouro, tal como as demais reformas de
base, pelo golpe civil-militar de 1964, se sucede outra, mais exitosa
politicamente, gestada no contexto da luta contra a própria ditadura
que se instaurou.
Maricato (2011, p.99) defende a tese de que nesse período “um
conjunto de estudos acadêmicos construiu uma nova interpretação para

307
o urbano na periferia do capitalismo”, influenciados pela (e influenciando
a) formação e a orientação de movimentos políticos que militavam pelas
causas urbanas.
Além da crítica ao processo de urbanização, explorada por
Maricato (2011, p.99-169), há textos desse período que também
refletiam sobre o planejamento urbano, enfatizando seus limites, seu
descolamento dos interesses sociais ou seu caráter autoritário, para citar
algumas referências. A análise de algumas interpretações sobre a história
das intervenções urbanas permite identificar um conjunto de questões
orientadoras bastante influenciado pelo combate ao autoritarismo
e, mais tarde, pelo contexto da redemocratização. Benchimol, em
uma publicação de 1990 que viria a se tornar referência na análise das
reformas realizadas no mandato de Pereira Passos na Prefeitura do Rio
de Janeiro (1903-6), destaca o caráter autoritário da reforma, os despejos
realizados para efetivação do projeto e as transformações na forma de
apropriação do espaço que se reivindicavam “civilizadoras”, definindo
Pereira Passos como o Haussmann tropical. Em diferentes referências, as
reformas de Pereira Passos são consideradas como a primeira intervenção
de conjunto resultante de um plano geral para a cidade – nos termos de
Villaça, é o primeiro exemplo de planejamento urbano stricto sensu. Tais
reformas implantam parcialmente e se espelham no estilo parisiense do
Plano de Melhoramentos de 1875, que já esboçava essa visão de conjunto
(VILLAÇA, 1999, p.196; LEME et al., 1999, p.358).
O impacto do trabalho de Benchimol deve-se, além de suas
qualidades, ao conjunto de questões que o orientou e a aderência destas
às problemáticas candentes no final da década de 1980. Como afirmou o
próprio autor em entrevista mais recente,

vivi um período em que se apostou muito no potencial das organizações


comunitárias urbanas. Tanto associações de moradores do asfalto,
como das favelas. E elas cumpriam um papel importante, pois tiveram

308
a capacidade de influenciar a implementação de políticas públicas pelo
Estado (BENCHIMOL, 2007).

Neste sentido, seu trabalho também discute as resistências da


população5 às intervenções de Passos e a própria formação das favelas
nesse período. O “planejamento” contra o povo, que aprofunda a
segregação socioespacial6, é uma representação que se pode depreender
da pesquisa, corroborada em outras referências pelo seu oposto, o
atendimento aos interesses da elite e da valorização imobiliária (KOK,
2005). Além do caso do Rio de Janeiro, as intervenções urbanísticas
pontuais, assim como as propostas de planejamento globais que ocorriam
pelo território nacional compartilhavam o ideário do embelezamento e
do saneamento, produzindo um diagnóstico sobre as cidades brasileiras
que enfatizava o caráter sanitarista e “civilizador” das intervenções.
Villaça (1999) também discute as reformas destacando o
papel das elites dominantes no processo e seu projeto de cidade que,
essencialmente, busca lidar com e superar a contradição fundamental
com a qual se deparavam os administradores da cidade: subsistir como
burguesia moderna nacional, mas não se realizar como tal na medida em
que suas condições materiais e territoriais e espaciais são a expressão
do atraso, do colonialismo. Para Villaça (1999), era preciso instituir
fisicamente o que se germinava social e culturalmente, e as reformas
de Pereira Passos são a expressão da culminância da hegemonia da
classe dominante no trato do urbano e do seu pleno controle sobre os
instrumentos de planejamento.
Como destaca Azevedo (2003), em função do contexto dos
próprios analistas nas décadas de 1980 e 1990, as interpretações sobre

5 Ver também (SEVCENKO, 1998, p.21-7)


6 Vale destacar, contudo, que essa segregação não se realiza perfeitamente,
como atestam as referências sobre ambulantes na Avenida Central (KOK, 2005).

309
o início do século XX que se tornaram predominantes no campo do
planejamento urbano enfatizam um de seus aspectos: o caráter repressivo
do Estado. Complementa-se que as críticas também destacavam o
papel da burguesia na definição das finalidades e o aprofundamento da
segregação socio-espacial como decorrência das intervenções urbanas.
Nas críticas ao segundo momento do planejamento urbano
no Brasil – que trata do período compreendido entre 1930 e 1990,
de acordo com Villaça (1999) –, o tecnicismo dos planos e seu
progressivo rebuscamento e “cientifização”, que lhes conferiam certo
caráter de atividade intelectual autônoma sustentada na reverência
à racionalidade, passam a ter centralidade. Esse caráter racional
permearia não apenas os planos, mas os discursos de justificação
das atividades do Estado de modo geral. Como destaca Monte-Mór
(2008), as proposições racionalistas respondiam com vantagens, em
relação a outros paradigmas do urbanismo, às exigências e à ideologia
do desenvolvimentismo (MONTE-MÓR, 2008, p.39). É desse período
a disseminação do zoneamento e o plano diretor é o discurso que o
justifica, assim como a divisão social do espaço que lhe é correlata. Tal
como em Lefebvre, é destacado o caráter disciplinador do urbanismo
e do planejamento urbano.
Há também um destaque especial ao período de atuação do
Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFHAU) que, entre
1967 e 1973, financiou a elaboração de 273 planos ou estudos urbanos,
insistindo em uma perspectiva de integração intraurbana. Aponta-
se ainda o alto grau de dissociação entre os planos elaborados e os
investimentos efetivamente realizados nas cidades (MONTE-MÓR,
2008; BERNARDES, 1986; VILLAÇA, 1999). Essa questão constituirá
uma das mais recorrentes e incisivas críticas aos planos diretores pelos
técnicos e militantes da reforma urbana.

310
A análise dessas referências sobre a história do planejamento
também permite delinear o “norte” dos planejadores e as representações
dos historiadores, contribuindo para formar um quadro de referência
para o qual o novo planejamento deveria ser antípoda. Tal como destaca
Azevedo (2003) – possivelmente orientado pelas suas próprias utopias
urbanas ao enfatizar o aspecto integrador, culturalista e organicista das
intervenções propostas e realizadas por Pereira Passos –, a produção
teórica que analisou o planejamento urbano do início do século XX no
Rio de Janeiro se deu em um contexto marcado por mobilizações sociais
que reivindicavam a democratização do Estado brasileiro.
A utopia da cidade democrática e os valores da participação e da
apropriação popular do espaço urbano constituem elementos do “norte”
do pensamento sobre a questão urbana para uma parcela dos intelectuais
desde meados da década de 1970 até o final da década de 1980.
O diagnóstico de que o processo de urbanização aprofundava
a segregação, espoliava os trabalhadores e não atendia aos interesses
populares (KOWARICK, 1979; SINGER, 2010; MARICATO, 2011)
convergia com o diagnóstico de que o planejamento urbano não
enfrentava essas contradições ou, mais ainda, as reforçava. Essa crítica à
formação e à origem do planejamento urbano no Brasil é contemporânea
ou sucedânea das proposições do planejamento advocatício e
participativo da década de 1970 e, portanto, interroga o passado sobre os
aspectos autoritários do planejamento. Essas pistas permitem esboçar o
quadro de referência do “novo” planejamento urbano ou do planejamento
urbano politizado.
Villaça (1999) identifica a emergência de um terceiro período
do planejamento urbano, no qual o “novo plano diretor” deve se opor
ao “antigo” modo de planejar as cidades, justamente como “reação” aos
“problemas” que caracterizavam o planejamento. É importante destacar
que Villaça (1999) está orientado, de alguma forma, não apenas pelas
reivindicações de apropriação dos planos diretores pela reforma urbana

311
que aconteciam na década de 1990, mas, mais especificamente, pelo
próprio contexto da revisão do Plano Diretor de São Paulo e as disputas
políticas pela participação em sua elaboração.

3. O Plano Diretor como Instrumento de Reforma Urbana

Uma das primeiras referências que associa o plano diretor e a luta


pela reforma urbana é a publicação, em 1990, do livro organizado por
Grazia de Grazia (1990) intitulado “Plano Diretor como Instrumento
de Reforma Urbana”. Além de conter artigos que analisavam o processo
de aprovação da Constituição de 1988 e a incorporação do plano diretor
no capítulo da política urbana e discutiam os conteúdos que deveriam
orientar esses planos em uma perspectiva de reforma urbana, o livro traz
a apresentação da Carta de Princípios sobre o Plano Diretor, elaborada
durante o 2º Fórum Nacional sobre Reforma Urbana em 1989. Esse
dado parece ser a expressão de mudança de perspectiva daqueles que
se posicionavam criticamente em relação ao planejamento urbano, mas,
como se discutirá a seguir, evidencia um fenômeno mais complexo.
Desde o debate durante a Constituinte, que testemunhou
o surgimento do Movimento Nacional pela Reforma Urbana
(posteriormente Fórum Nacional da Reforma Urbana – FNRU) até a
Campanha Nacional do Plano Diretor Participativo, observou-se uma
disputa (simbólica e ideológica) pela apropriação do planejamento
urbano, no sentido de conferir-lhe novo conteúdo.
O processo constituinte forneceu os elementos básicos do
discurso em construção no movimento da reforma urbana, mas,
como enfatiza Tarrow (2009), não se pode compreender a ação dos
movimentos sociais apenas pelos seus elementos simbólicos, pela
narrativa. É necessário compreender também a forma específica

312
como esses elementos são mobilizados em contextos políticos (e
culturais) particulares. No período que se seguiu à promulgação da
Constituição de 1988 houve uma intensa produção legislativa para
elaboração das constituições estaduais e leis orgânicas municipais. O
movimento de reforma urbana esteve mobilizado para intervir nesses
processos procurando, em seus próprios termos, garantir os avanços
conquistados na Constituição de 1988 7.
Além desses, dois outros fóruns institucionais, intercambiados na
produção de conteúdo, mobilizaram os militantes: i) a regulamentação
dos dispositivos constitucionais da política urbana, com o longo
processo para aprovação do Estatuto da Cidade e ii) a elaboração de
planos diretores municipais. Nesse segundo fórum houve uma produção
significativa de conteúdo por parte, especialmente, de urbanistas
(arquitetos, advogados assistentes sociais etc.) ligados a gestões
municipais progressistas e de organizações não governamentais ligadas
ao movimento da reforma urbana, com destaque especial para o Instituto
Polis e a FASE. O objetivo era “reinventar” o plano diretor.

Por fim, gostaríamos de esclarecer que o texto procurou apenas


registrar algumas reflexões face à determinação constitucional que
impôs a elaboração de planos diretores urbanos. O afastamento inicial
desta exigência das demandas populares abriu, com relação à questão
urbana, um campo novo de processos sociais e políticos em curso,
cujos resultados não podem ser previstos [...] Neste sentido, torna-se
indispensável a atualização política e técnica deste instrumento [plano
diretor] para que [...] não ocorram recuos nas conquistas sociais. [...] A
Constituição não detalha o conteúdo dos planos, o que deixa em aberto
a possibilidade da sua reinvenção (TORRES RIBEIRO, 1990, p.23).

7 Grazia de Grazia em entrevista ao autor. GRAZIA, G. de. Entrevista em 23


de março de 2011.

313
A Carta de Princípios sobre o Plano diretor, elaborada pelo
Movimento Nacional pela Reforma Urbana (MNRU), sinteticamente,
enfatiza a democratização do planejamento, pois parte significativa
do conteúdo da Carta se refere às condições para elaboração de planos
diretores que considerassem as demandas populares.
Nas prefeituras, observavam-se iniciativas de elaboração de
planos diretores seguindo princípios de reforma urbana. Tais princípios
chegavam às prefeituras pelas mãos dos “técnicos progressistas”, que
eram alimentados, por sua vez, pelas entidades representativas dos
arquitetos (IAB, FNA, ABEA), pelas entidades que compunham o MNRU
e pelos partidos políticos, especialmente pelo PT, que intercambiavam
militantes com a reforma urbana. As iniciativas eram, então, divulgadas
como experiências inovadoras rumo ao direito à cidade, ao cumprimento
da função social da propriedade e à gestão democrática.
O Instituto Pólis foi um dos grandes disseminadores dessas
experiências, publicando cadernos, manuais, cartilhas que destacavam
a implementação de instrumentos jurídicos e urbanísticos em diversas
cidades brasileiras, mas há também publicações avulsas, textos para
discussão e eventos que se multiplicaram pelo país. Nesse processo,
Porto Alegre (JARDIM, 1996), Natal (TINOCO, 1996; BENTES, 1997),
Belo Horizonte (AMARAL, 1996), São José dos Campos (SOMEKH;
NERY JR., 1996), Diadema (HEREDA; NAGAI; KLINK; BALTRUSIS,
1997), Recife (BOTLER; MARINHO, 1997), entre outros passaram a
constituir a referência para as demais iniciativas de elaboração de planos
diretores na perspectiva da reforma urbana.
Há, contudo, dois destaques necessários: São Paulo e Rio de
Janeiro. No caso de São Paulo, a elaboração de um novo plano diretor
durante a gestão de Luiza Erundina (1989-1993) foi responsável por
produzir ou sistematizar diversas inovações a despeito da incapacidade
de implementação naquele contexto político (ZMITROVICZ, 1992;

314
ROLNICK; SOMEKH, 1990). No mandato seguinte, com Paulo Maluf
na prefeitura, se aprofundam os mecanismos de privilégio do capital
imobiliário, com a emissão dos CEPACs (Certificados de Potencial
Adicional de Construção) na operação Faria Lima (WILDERODE,
1997). Essas disputas no campo do planejamento urbano alimentam as
posições de contestação e confronto (TARROW, 2009) que contribuem
para consolidação do discurso do movimento de reforma urbana.
No Rio de Janeiro, também se expressava com mais evidência a
disputa entre o planejamento na perspectiva reformista, consubstanciado
no Plano Diretor de 1992, e os modelos do planejamento estratégico,
expressos no Plano Estratégico do Rio de Janeiro. Ironicamente, o Rio
de Janeiro se constitui no benchmarking do planejamento estratégico
no Brasil (NOVAIS, 2010) e, por isso mesmo, em um dos exemplos
paradigmáticos sobre o qual convergia a crítica reformista, como, por
exemplo, na análise da “venda de exceções” urbanísticas nas operações
interligadas no Rio de Janeiro (CARDOSO et al., 1997).
Esses casos, assim como a disputa com outros discursos sobre
a questão urbana e o planejamento, fornecem o inimigo necessário
(DELEUZE; GUATARI, 1995) para a mobilização do consenso e identidade
(TARROW, 2009, p.40-1) do movimento da reforma urbana. Nesse
sentido, é possível ampliar a afirmação de Bassul de que “o fato inegável
é o de que essa variegada experimentação municipal [...] foi decisiva para
que o projeto de Estatuto da Cidade vencesse resistências e superasse
reações” (BASSUL, 2004, p.72). Deve-se considerar não apenas as
experiências de “sucesso” do ponto de vista da reforma urbana, mas as
disputas em torno do arcabouço jurídico institucional da política urbana
brasileira. Assim, divergindo da afirmação de que “a direita percebeu a
possibilidade de morder os instrumentos do Estatuto da Cidade”8, deve-

8 Fala de Benny Schwasberg no XIV Encontro da ANPUR em 2011.

315
se reconhecer que o Estatuto incorporou, na disputa pela sua aprovação,
instrumentos orientados para afirmação do direito à cidade e da função
social da propriedade e outros orientados para a competitividade e o
empreendedorismo urbanos, mais especificamente, para a promoção
da atividade imobiliária. Como destaca Bassul (2004), referindo-se à
aprovação sem objeções nas comissões e no plenário da Câmara nas fases
finais da tramitação da lei,

Talvez porque as intenções dos dois blocos de opinião estivessem


taticamente dissimuladas – o MNRU ao ceder em suas propostas
intentando recuperar as perdas nas fases seguintes e o empresariado
por conseguir gradualmente incorporar instrumentos “benéficos para
as atividades imobiliárias” –, o projeto foi, para surpresa de muitos,
aprovado sem disputas. (BASSUL, 2004, p.107).

Essa trajetória que progressivamente incorporou o planejamento


urbano politizado à ideologia política da reforma urbana constitui uma
estratégia política que, para buscar efetividade, precisou estabelecer
diferenças entre um novo planejamento e um planejamento antigo,
precisou conferir ao novo uma identidade e precisou afirmá-lo como mais
adequado à solução dos problemas da realidade brasileira. A história,
portanto, foi objeto de uma interpretação orientada pelas questões
que emergiam do contexto de afirmação política da reforma urbana.
Em certo sentido, o presente preside o passado. Dialeticamente, se “os
homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua
livre vontade; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob
aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo
passado” (MARX, 1977, p.6), o próprio passado é acionado segundo as
exigências do presente. Reclamam-se representações sobre o passado,
que são representações do tempo histórico e que informam sobre os
reclamantes. Da crítica às origens e à formação do planejamento urbano

316
no Brasil, se permite destilar parte dos ideais do novo planejamento: a
participação política, a adesão aos interesses populares, a inscrição na
realidade da produção capitalista das cidades brasileiras etc.
A anunciação dos novos propósitos é apenas um dos aspectos do
investimento político na apropriação do planejamento urbano, e mais
especificamente dos planos diretores, pela ideologia política da reforma
urbana. A negação do passado, que sustenta a ressalva da imposição do
plano diretor pelas forças conservadoras, permite, ao mesmo tempo,
delinear a disputa ideológica pelo novo, que seguirá sendo confrontado
com outros contrários, como o planejamento estratégico, por exemplo.
Mas, além disso, há uma intensa produção de sentido, uma disseminação
de exemplos, do que deveria ser a aplicação dos instrumentos
urbanísticos comprometida com a reforma urbana. Experiências de
elaboração e implementação de planos diretores, cartilhas, guias e uma
produção significativa de artigos e livros contribuem para estabelecer
os marcos fundamentais do planejamento urbano politizado.

4. Do Estatuto da Cidade à Campanha Nacional pelos


Planos Diretores Participativos

Logo após a aprovação do Estatuto da Cidade, ainda no período


do Governo Fernando Henrique Cardoso, houve um investimento
inicial que contemplou pouco mais de uma centena de municípios, com
recursos a fundo perdido na linha de desenvolvimento urbano da Caixa
Econômica Federal, para elaboração de planos diretores participativos.
Em 2001, a publicação do Estatuto da Cidade: guia para implementação
pelos municípios e cidadãos, editado pelo Centro de Documentação e
Informação da Câmara dos Deputados e produzido pelo Instituto
Polis, passa a ser uma das poucas referências de que os municípios
dispunham para elaboração de seus planos. É também a mais

317
disseminada em conjunto com cartilhas e instrumentos de capacitação
e sensibilização distribuídos em todo o país no Kit das Cidades. Esse
guia se constitui em uma espécie de código comentado, bem à maneira
dos manuais jurídicos, e os autores interpretam e discutem as formas
de aplicação e implementação da lei. Com a coordenação geral de
Raquel Rolnick e coordenação jurídica de Nelson Saule Jr., o Guia
enfatiza a interpretação orientada pela perspectiva da reforma urbana.
Apenas como exemplo, um dos títulos do guia trata da “desapropriação
para fins de reforma urbana”, renomeando a seção IV do Estatuto da
Cidade que trata da “desapropriação com pagamento em títulos”.
Essa ação pode ser considerada como uma das mais importantes, até
aquele momento, no esforço de afirmação hegemônica do conteúdo
reformista do Estatuto da Cidade e, por consequência, na afirmação
da perspectiva do planejamento urbano politizado.
Com a criação, pelo Governo de Luís Inácio Lula da Silva em 2003,
do Ministério das Cidades – justificada na necessidade de integração das
políticas urbanas que, segundo documentos da equipe de transição, eram
desarticuladas e irracionais –, a questão do desenvolvimento urbano
aparece com significativo destaque, entendida como fundamental para
a ampliação da produção, a melhoria do fluxo de bens e serviços e da
qualidade de vida da população urbana. Além da integração das políticas,
da aproximação com as prefeituras e da centralidade da questão urbana
para o desenvolvimento do país e a melhoria da qualidade de vida das
pessoas, o Ministério das Cidades, na definição de seu objetivo e nos
discursos que justificavam sua existência, se apresenta como solução
institucional para o atendimento da demanda dos movimentos sociais
urbanos e da reforma urbana.
Essa vinculação, no entanto, vai bastante além do
compartilhamento de valores ou do discurso. De acordo com um
levantamento realizado por Gusso (2012), verifica-se que entre os cinco

318
secretários do mandato de Olívio Dutra no Ministério das Cidades (2003
a 2005), havia ao menos uma indicação direta do Fórum de Reforma
Urbana (Secretaria de Programas Urbanos – Raquel Rolnik), além de
outros nomes como Jorge Hereda (Secretário de Habitação) e Ermínia
Maricato (Secretária Executiva) que foram apoiados por movimentos
sociais ou participaram do movimento da reforma urbana. Nos seus
primeiros anos, os documentos oficiais e institucionais elaborados pelo
Ministério das Cidades, responsável pela política urbana, remetem, e de
certo modo procuram responder, aos princípios da reforma urbana e às
demandas dos movimentos sociais ligados à reforma urbana.
A instituição do processo de Conferências das Cidades também
reforça e reafirma este ideário. A primeira Conferência teve por objeto,
além da criação do Conselho Nacional das Cidades, o debate e aprovação
de um texto base, produzido pelo corpo técnico do Ministério, que
expunha as diretrizes gerais da política urbana brasileira e seu conteúdo
expressava a forte inspiração reformista. O controle (parcial), portanto,
dos aparelhos de produção ideológica do Estado municia o movimento
da reforma urbana na disseminação do seu discurso.
Passados, no entanto, dois anos, ocorre um rearranjo na aliança
político-partidária de sustentação do Governo Federal e o Ministério das
Cidades passa para a cota do Partido Progressista. Essa mudança levou à
saída de parte da equipe que compunha o campo da reforma urbana no
Ministério. Mantém-se, no entanto, a Secretaria de Programas Urbanos
sob a responsabilidade de Raquel Rolnick. Uma das ações desenvolvidas
pela secretaria foi a Campanha “Plano Diretor Participativo: Cidade de
Todos”, nos anos de 2005 e 2006. Conjugada à obrigatoriedade legal,
prevista no Estatuto da Cidade, de que municípios deveriam ter seus
planos diretores aprovados cinco anos após a promulgação do Estatuto o
efeito da campanha foi a proliferação de planos no período compreendido
entre 2006 e 2007.

319
Figura 1 – Evolução do percentual de municípios por classe
de tamanho da população que informaram
possuir plano diretor por ano de pesquisa
120%

100% 97%100% 99%


97% 99% 97%
100% 100%
91% 88%
85%
80%
77% Até 20.000 Hab.
75% 76% De 20.001 a 100.000 Hab.
65%
60% De 100.001 a 500.000 Hab.

50% Mais de 500.000 Hab.

42% Total
40%
31% 34% 32%
31% 26%
23%
20% 18%
18% 14% 15%
10% 9% 7%
0%
2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014

Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios (2001, 2004, 2005, 2008, 2009, 2013).

Essa intensa “ação planejadora”, como costumava definir Ana


Clara Torres Ribeiro, resultou em um atendimento expressivo da
obrigação legal estabelecida no Estatuto da Cidade. Em 2013, 90%
dos municípios com mais de vinte mil habitantes informavam possuir
planos diretores e outros 6% informavam que o tinha em elaboração
(MUNIC, 2013).
Em relação ao conteúdo, houve uma importante incorporação
do ideário da reforma urbana, que foi apoiado pela disseminação de
guias, matérias e cartilhas, tanto pelo próprio Ministério das Cidades,
quanto por organizações do FNRU. Além disso, a coordenação
nacional da campanha e as coordenações estaduais foram compostas
por representantes de governos, entidades técnicas e profissionais,
movimentos sociais e populares e ONGs (SANTOS JR.; SILVA;
SANT’ANA, 2011, p.16), muitos dos quais ligados ao FNRU.

320
A despeito da permanência, em termos de produção e
disseminação, de outros ideários urbanos, por agências internacionais,
associações empresariais, institutos de pesquisa e, fundamentalmente,
administrações municipais e estaduais orientadas por valores distintos
daqueles que constituem o núcleo da reforma urbana, testemunhou-se
no período recente o predomínio do ideário do direito à cidade, da função
social da propriedade e da gestão democrática.

5. A crítica aos Planos Diretores Participativos e sua


função ideológica

Em que pese os investimentos realizados na direção da politização


do planejamento, alguns autores, como Villaça (2005) e Burnett
(2009), questionam a efetiva realização dos pressupostos e princípios
evidenciados no Estatuto da Cidade por intermédio dos planos diretores.
Questionam qual o papel que os planos de fato cumpririam na produção
do urbano, no ordenamento do território e no estabelecimento de
diretrizes de ação dos setores públicos e privados. Para Burnett (2009), o
movimento da reforma urbana se deixou levar pela “ilusão do urbanismo
reformista” na medida em que concentrou seus esforços na questão
da participação em processos de planejamento, que seriam, segundo
o autor, “as bandeiras próprias do idealismo pequeno-burguês, [...]
desmobilizam e desorganizam as classes populares e seus movimentos
coletivos, isto é, de base política” (BURNETT, 2009, p.80).
O argumento de que os planos diretores seriam capazes de
garantir acesso à terra urbanizada para as populações mais pobres é
confrontado com outro que defende que, além dessa possibilidade não
se realizar, o investimento na elaboração dos planos desmobiliza as
lutas sociais recrudescendo ainda mais a acumulação, a concentração

321
e a espoliação urbanas. Assim, apesar do sucesso da transformação no
campo simbólico e institucional do planejamento, não se acompanha
o mesmo desempenho na mitigação da crise urbana. Essa constatação
alimenta a crítica às opções institucionais da luta pela reforma urbana.
Contudo, essa crítica talvez não enfrente uma questão importante:
se o planejamento urbano politizado não produz o que dele se espera
e, além disso, prejudica a organização política e as lutas sociais pela
reforma urbana, porque ainda dispõe de tanto prestígio?
Essa crítica, apoiada em uma visão de que o Estado, o direito e a
ideologia seriam sempre orientados pela reprodução da dominação, pela
continuidade do capitalismo e pela conservação de relações de poder,
subdimensiona a importância das disputas simbólicas e do conflito
ideológico e, por esse motivo, contribui para o desconhecimento do papel
dos planos diretores na reforma urbana.
No planejamento urbano politizado se produzem diagnósticos,
interpretações e prognósticos que, dialeticamente, afirmam e
obnubilam valores e hierarquias de sentido e de autoridade. Não foi
o propósito deste trabalho compreender o papel que o plano diretor
participativo operou na consolidação da ideologia política da reforma
urbana, mas apenas ilustrar brevemente a trajetória da construção de
um discurso que hoje concorre com o do empresariamento urbano
ou de uma perspectiva neoliberal sobre as cidades. Assumindo seu
caráter ideológico e fetichizado (VILLAÇA, 2004; BURNETT, 2009),
mas reconhecendo sua apropriação pela reforma urbana (RIBEIRO;
SANTOS JR., 2011), afirma-se que o plano diretor serviu à afirmação
de um consenso, na medida em que forneceu o conteúdo (os princípios
da reforma urbana), a arena (o planejamento participativo) e autorizou
os agentes (os segmentos). Contribuiu, portanto, para consolidação de
um ideário consensuado que, também, institui uma ordem política no
corpo social da reforma urbana.

322
Referências

AMARAL, F. M. P do. Lei de parcelamento, uso e ocupação do solo: a


experiência de Belo Horizonte. Anais do Seminário Políticas Públicas para o
Manejo do Solo Urbano: experiências e possibilidades. São Paulo: Pólis, 1996.
AZEVEDO, A.N. A reforma Pereira Passos: uma tentativa de integração
urbana. In: Revista Rio de Janeiro, n. 10, Dossie Temático. Maio a Agosto. 2003.
p.39-79.
BASSUL, J. R. Estatuto da Cidade: Quem ganhou? Quem perdeu? Tese de
Doutorado. Brasília: UnB, 2004.
BENCHIMOL, J. L. História não é só enfeite de bolo. Entrevista para
a Revista de História, Rio de Janeiro, ed 24, 13 de setembro de 2007.
Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/entrevista/jaime-
benchimol>. Acessado em 12 de julho de 2012.
______. Pereira Passos: Um Haussmann tropical – a renovação urbana da cidade
do Rio de Janeiro no início do século XX. Rio de Janeiro: Biblioteca Carioca,
1990.
BENTES, D. Aplicação de novos instrumentos urbanísticos no município de
Natal. In: ROLNICK, R.; CYMABALISTA, R. (Org.). Instrumentos Urbanísticos
contra a Exclusão Social. São Paulo: Pólis, 1997.
BERNARDES, L. Política urbana: uma análise da experiência brasileira. Análise
e Conjuntura. North America, 1.1, 13 09 2007. Publicado originalmente em
1986. Disponível em: <http://www.fjp.mg.gov.br/revista/analiseeconjuntura/
viewarticle.php?id=8>. Acessado em 23 de novembro de 2011.
BOTLER, M.; MARINHO, G. O Recife e a regularização de assentamentos
populares. In: ROLNICK, R.; CYMABALISTA, R. (Org.). Instrumentos
Urbanísticos contra a Exclusão Social. São Paulo: Pólis, 1997.
BURNETT, C. F. L. Da Tragédia Urbana à Farsa do Urbanismo Reformista: A
Fetichização dos Planos Diretores Participativos. Tese de Doutorado. São
Luis do Maranhão, 2009.
BURNETT, C. F. L. Da Tragédia Urbana à Farsa do Urbanismo Reformista: A
Fetichização dos Planos Diretores Participativos. São Paulo: Anablume; São
Luís: Fapema, 2011.

323
CARDOSO, A. L.; et al. Operações interligadas no Rio de Janeiro. In:
ROLNICK, R.; CYMABALISTA, R. (Org.). Instrumentos Urbanísticos contra a
Exclusão Social. São Paulo: Pólis, 1997.
DELEUZE, G.; GUATARI, F. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. v. 1. São
Paulo: Editora 34, 1995.
FARIA, J.R.V. Planos Diretores Participativos: a razão consensual no discurso da
reforma urbana. Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: IPPUR/UFRJ, 2012.
FREITAG, B. O Novo Estatuto da Cidade. Brasília: 2001. Disponível em:
<http://vsites.unb.br/ics/sol/itinerancias/publicacoes/publica.html>. Acessado
em 16 de novembro de 2011.
GRAZIA DE GRAZIA (Org.). Plano Diretor: instrumento de reforma urbana.
Rio de Janeiro: FASE, 1990.
GUSSO, R. J. Movimentos Sociais no Brasil Contemporâneo: O Fórum Nacional de
Reforma Urbana. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em
Sociologia Política da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis:
UFSC, 2012.
HEREDA, J. F.; NAGAI, S. S. K.; KLINK, J.; BALTRUSIS, N. O impacto
das AEIS no mercado imobiliário de Diadema. In: ROLNICK, R.;
CYMABALISTA, R. (Org.). Instrumentos Urbanísticos contra a Exclusão Social. São
Paulo: Pólis, 1997.
JARDIM, O. M. Porto Alegre: novo plano diretor como articulador dos novos
instrumentos de gestão urbana. Anais do Seminário Políticas Públicas para o
Manejo do Solo Urbano: experiências e possibilidades. São Paulo: Pólis, 1996.
KOK, G. Rio de Janeiro na época da Av. Central. São Paulo: Bei Comunicação, 2005.
KOWARICK, L. A Espoliação Urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
LEME, M. C. da S. A formação do pensamento urbanístico no Brasil: 1895-
1965. In: LEME, M. C. da S.; FERNANDES, A.; GOMES, M. A. F (Org.).
Urbanismo no Brasil 1895-1965. São Paulo: Studio Nobel/FAU USP/FUPAM,
1999.
MARICATO, E. O impasse da política urbana no Brasil. Petrópolis: Vozes, 2011.
MARX, K. O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1977.

324
MONTE-MÓR, R. L. de M. Do urbanismo à política urbana: notas sobre a
experiência brasileira. In: COSTA, G. M.; MENDONÇA, J. G. de. Planejamento
Urbano no Brasil: trajetórias, avanços e perspectivas. Belo Horizonte: C/Arte,
2008.
MUNIC. Pesquisa de Informações Básicas Municipais. Rio de Janeiro: IBGE, 2013.
NOVAIS, P. Uma Estratégia Chamada “Planejamento Estratégico”: Deslocamentos
espaciais e atribuição de sentidos na teoria do planejamento urbano. Rio de
Janeiro: 7 letras, 2010.
RIBEIRO, L. C. Q.; SANTOS JR., O. A. Desafios da questão urbana no Brasil.
Disponível em: <http://www.confea.Org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.
htm?infoid=13942&pai=8&sid=79&sub=876>. Acessado em 08 de novembro
de 2011.
ROLNICK, R.; SOMEKH, N. Perfil do Plano Diretor da Prefeitura do
Município de São Paulo. In: GRAZIA DE GRAZIA (Org.). Plano Diretor:
instrumento de reforma urbana. Rio de Janeiro: FASE, 1990.
SANTOS JÚNIOR, O. A.; SILVA, R. H.; SANT’ANA, M. C. Introdução. In:
SANTOS JÚNIOR, O. A.; MONTANDON, D.l T. (Org.). Os Planos Diretores
Municipais Pós-Estatuto da Cidade: balanço crítico e perspectivas. Rio de Janeiro:
Letra Capital: Observatório das Cidades: IPPUR/UFRJ, 2011.
SINGER, P. Economia política da urbanização. São Paulo: Contexto, 2010.
SOMEKH, N.; NERY JÚNIOR, J. M. A proposta de regulamentação do plano
diretor de São José dos Campos. Anais do Seminário Políticas Públicas para o
Manejo do Solo Urbano: experiências e possibilidades. São Paulo: Pólis, 1996.
TARROW, S. O poder em movimento. Petrópolis: Vozes, 2009.
TINOCO, M.; et al. Natal: o planejamento urbano na prática. Anais do
Seminário Políticas Públicas para o Manejo do Solo Urbano: experiências e
possibilidades. São Paulo: Pólis, 1996.
TORRES RIBEIRO, A. C. 1990. GRAZIA DE GRAZIA (Org.). Plano Diretor:
instrumento de reforma urbana. Rio de Janeiro: FASE, 1990.
VILLAÇA, F. As ilusões do plano diretor. São Paulo: 2005. Disponível em:
<http://www.flaviovillaca.arq.br/pdf/ilusao_pd.pdf>. Acesso em 04 de
setembro de 2010.

325
______. Uma contribuição para a história do planejamento urbano no Brasil.
In: DEÁK, C.; SCHIFFER, S. T. R. (Org.). O processo de urbanização no Brasil. São
Paulo, Editora da Universidade de São Paulo, 1999.
WILDERODE, D. J. V. Operações interligadas: engessando a perna de pau.
In: ROLNICK, R.; CYMABALISTA, R. (Org.). Instrumentos Urbanísticos contra a
Exclusão Social. São Paulo: Pólis, 1997.
ZMITROWICZ, W. (Org.). Planejamento Urbano: a conceituação e a prática.
Coleção Documentos. Série Estudos Urbanos 5. (mimeo). São Paulo: USP,
1992.

326
A cidade como obra humana:
Problematizando as relações sociedade/cidade x
natureza no capitalismo e no socialismo1

Carlos RS Machado
Tainara F. Machado2

1. Introdução

Este trabalho apresenta uma reflexão a partir de Henri Lefebvre3


sobre a cidade entre os anos 1960 e 1970, sua relação com a natureza e

1 Este trabalho parte de uma pesquisa realizada entre 2007 e 2008, e pesquisas
posteriores e reflexões da obra do autor por parte de um dos autores; e na atualidade,
faz parte de uma pesquisa sobre os conflitos e problemas ambientais no extremo Sul do
Brasil e leste do Uruguai (CNPq, Universal, 2014-2017) sob coordenação do Prof. Dr.
Carlos RS Machado.
2 Bolsista – pelo período de 2015 a 2017 – de mestrado Capes (Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) do Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGEDU/UFRGS), localizado
na Fauldade de Educação (FACED), na linha de pesquisa “Trabalho, Movimentos Sociais
e Educação”; sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Maria Clara Bueno Fischer .
3 Henri Lefebvre nasceu no ano de 1901, em Navarreux (Baixos Pirineus),
Sudoeste da França, estudou filosofia na Sorbonne, e como professor passou a lecionar
em escolas secundárias. Nos anos 1920 entrou para o Partido Comunista Francês, e
nos anos 1930, traduziu para o francês os inéditos de Marx (Manuscritos de 1844) e
de Hegel sobre a dialética e a teoria das contradições. Sob o nazismo na França milita
na clandestinidade. Nos anos 1940, com a criação do Centro Nacional para a Pesquisa
Científica (CNRS), passou do estudo da “filosofia pura” às práticas sociais, isto é, da
relação entre filosofia/pensamento com o cotidiano (LEFEBVRE, 1975, 223-226).

327
a produção do espaço no contexto da crise do capitalismo, e de suas
críticas ao marxismo institucionalizado “realmente existente” na URSS.
Partimos da hipótese da atualidade da obra do autor ao/no problematizar
a relação da sociedade com a natureza e da necessidade do resgate da
fórmula trinitária de Marx4, como vimos discutindo no relacionado aos
conflitos ambientais na América Latina, bem como das discussões por
que passa Cuba no aperfeiçoamento de seu socialismo.
Visa, ainda, constituir-se de base e(ou) fundamentos de pesquisa
a ser desenvolvida tendo como foco de estudos duas cidades: Rio Grande
(Brasil) e Santa Clara (Cuba)5. Uma capitalista (Rio Grande) que, nos
anos 1960 vivia sob uma ditadura civil-militar; outra socialista (Santa
Clara) que vivia sob a ditadura do proletariado. Disso pretendemos
argumentar, e pesquisar, sobre as possíveis contribuições do estudo
pregresso dessas duas realidades/cidades no sentido de: contribuir no
debate da superação da relação de domínio, exploração e apropriação
desigual da cidade/sociedade e da natureza sob o capitalismo; e
prospectar na cidade/sociedade socialista a hipótese da autogestão6,
local e cotidiana, como parte de um todo na permanência e no
aperfeiçoamento da utopia que ali se desenvolve.
O ponto de partida da reflexão surgiu, entre fins anos 1950 e
inícios dos 1970, quando a cidade foi foco da produção de Henri Lefebvre

4 Ver Carlos RS Machado, Los conflictos socio-ambientales en la subversión teórica


y práctica: reflexiones a la superación del capitalismo actual (no prelo, in Actuel Marx –
Intervenciones); versión reducida presentada en III Congreso Uruguayo de Sociología,
Nuevos escenarios sociales: desafíos para la sociología, Montevideo, 15-17 julio 2015, hecho en el
pos-doctorado sobe supervisión Prof. Dr. Javier Taks/Udelar), y financiada por CNPq
(2014-2017).
5 Punta del Este (Uruguai) talvez se agregue ao estudo, o que possibilitaria a
ampliação de intercâmbios já em desenvolvimento com pesquisadores deste país.
6 O tema da saberes do trabalho autogerido/associado em processo
produtivos solidários faz parte dos estudos do mestrado da autora Tainara F. Machado.

328
(Machado, 2008), e parte de outros: o marxista, do cotidiano, da cidade e
daqueles das últimas décadas de sua vida (sobre o Estado, a autogestão,
os ritmos sociais, resíduos etc.). Desse momento Lefebvre produziu 7
(sete) obras7. Apresentamos o contexto inserindo as obras e as polêmicas
vividas pelo autor, bem como suas utopias, para a partir disso, então,
assentar as bases da possível pesquisa conjunta.

2. O Contexto e as obras de Henri Lefebvre sobre a Cidade

O mundo encontrava-se em “ebulição” em 1959, pois em plena


guerra fria, o congresso do Partido Comunista da URSS rompe com o
legado de Stalin e o denuncia como responsável pela morte de milhares
de cidadãos soviéticos, por perseguições etc. O socialismo já tinha
se ampliado muito pelo mundo com a vitória dos soviéticos sobre os
nazistas, e o comunismo não era mais o “bicho papão”. Os chineses,
em 1949, tinham feito uma revolução popular e inúmeros movimentos
de libertação de ex-coloniais estavam em ascenso. Os vietnamitas
derrotaram os franceses os quais foram substituídos pelos norte-
americanos nos anos 1960.
Na América Latina, nas barbas do “tio Sam” os cubanos, em
1959, haviam derrubado uma ditadura apoiada pelos Estados Unidos
da América do Norte8 e em retaliação (boicote, bloqueios, invasões,
envenenamento de terras, animais e águas, sabotagens etc.) impelem

7 Não localizamos sete, conforme afirmou Hess (2002), apenas seis, nesse
período: Le droit à la ville (1968); Du rural à l’urbain e La révolution urbaine (1970); La pensée
marxiste el la ville (1972); Espaço e Política (1973); a Produção do espaço (1974).
8 Na entrevista Tiempos Equívocos (1968), Henri Lefebvre refere-se à
revolução cubana como uma revolução fora dos “parâmetros” tradicionais, da esquerda
institucionalizada, na época.

329
os cubanos a se aproximarem dos soviéticos. Isso, apesar de a Revolução
Cubana ter sido realizada de forma diferente daquela ocorrida na URSS
(1917) ou na China (1949), pois se colocava – antes de tudo – contra a
ditadura de Fulgêncio Baptista e somente depois é que, se definiu como
socialista. Após a Revolução Cubana, proliferaram ditaduras civis-militares
em todo o continente com o apoio dos EUA do Norte. No Brasil, a
ditadura instalar-se-ia em 1964, seguido pela Argentina, Chile, Uruguai
e outros países até a década de 19809.

3. O Direito à “outra cidade”

No livro A vida cotidiana no mundo moderno (1968) atualizando


as reflexões sobre o cotidiano de 1948, 1958 e 1961 diz que a cidade/
sociedade francesa (e mundial) passava por um mal-estar, pois se, de um
lado, apresentava um “crescimento (econômico, quantitativo, medido em
toneladas e em quilômetros) notável”, de outro, um “desenvolvimento
fraco”, pois as

relações sociais constitutivas (estruturadas-estruturantes), isto é, as


relações de produção e de propriedade que subordinam a sociedade
a uma classe (chamada burguesia) [...] pouco mudaram, a não ser
em função da estratégia de classe (sua consolidação no cotidiano)
(LEFEBVRE, 1991, p. 88).

Henri Lefebvre, ao perceber tais alterações no capitalismo, o


seu envolvimento político e as reflexões a partir de uma perspectiva

9 Ver Rui Mauro Marini, La lucha por la democracia en américa latina, em


que o autor argumenta que, se nos anos 1960 os EUA incentivaram e financiaram
ditaduras militares, agora, a estratégia era incentivar a ditadura do mercado, que por
meio do neoliberalismo proliferava pela América Latina, in: <http://bibliotecavirtual.
clacso.org.ar/ar/libros/secret/cuadernos/marini/marini.pdf>. Acessado em 02 nov. 2015.

330
crítica desde o marxismo10 captou as mudanças estratégicas que
ocorriam nesse sistema. O tema da cidade, nesse contexto, emerge no
final dos anos 1950 e inicio dos 1960, impelido por três motivações: das
transformações do capitalismo no relacionado à cidade (Lefebvre, 1975,
p. 226); das reflexões filosóficas sobre o espaço e o tempo em Descartes,
Kant, Leibniz, Heidegger, dentre outros; da emergência do conceito
de produção – a partir Hegel e Marx estendendo-se até o pensamento
moderno; contudo, num sentido mais amplo como a produção de todas
as coisas (sentidos, linguagem, trabalho, cidade etc.).
Em pleno calor dos eventos de Paris, de 1968, Lefebvre publica um
livro defendendo o direito à cidade e de ser a cidade obra dos cidadãos
e centro/lugar do poder instituído:

a cidade, obra e ato perpétuos, dá lugar a instituições específicas:


municipais. As instituições mais gerais, as que dependem do Estado,
da realidade e da ideologia dominante, têm sua sede na cidade política,
militar, religiosa. Elas aí coexistem com as instituições propriamente
urbanas, administrativas, culturais (LEFEBVRE, 1969, p. 53).

No entanto, adverte sobre as relações entre natureza e cultura


derivadas da relação da cidade com o campo e destas a ideia da produção
diferente de coisas/produtos da produção de obras:

Essa obra emerge de uma terra levemente modelada, originariamente


ligada aos grupos que a ocupam através de uma recíproca sacralização
que é a seguir profanada pela cidade e pela vida urbana (que captam
essa centralização, condensam-na e depois a dissolvem no transcorrer
das épocas, absorvendo-a na racionalidade) (LEFEBVRE, 1969, p.53).

10 Em 1958 tinha sido expulso do PCF devido à crítica ao marxismo, ao


considerá-lo uma sociologia e em referência ao que tinha ocorrido – institucionalizado –
na URSS, congresso PCUSS.

331
Em contraposição a esse modelo de uma nova cidade ou cidade do
futuro, uma cidade ideal, Lefebvre propõe a inversão completa11:

O direito à cidade manifesta-se como forma superior dos direitos: direito


à liberdade, à individualização na socialização, ao habitat e ao habitar.
O direito à obra (à atividade participante) e o direito à apropriação
(bem distinto à propriedade) estão implicados no direito à cidade
(LEFEBVRE, 1969, p. 124).

Porquanto, o direito à cidade não é apenas algo colocado ou


referido numa lei ou estatuto, mas algo resultante da ação dos sujeitos
em suas lutas e conflitos contra a outra cidade, a cidade capitalista, e pela
apropriação e usos daquilo que é produzido em/na/pela sociedade/cidade
no processo concreto vivido pelos cidadãos no cotidiano de/em cada
cidade. Isso porque, as mudanças, na e da cidade (a velha que apodrecia
e a nova idealizada pelo planejamento e pela técnica),

não corresponde[m] a uma apropriação pelo ser humano de seu próprio


ser natural (o corpo, o desejo, o tempo, o espaço). A contradição entre
crescimento e desenvolvimento sobrepõe-se então a uma contradição
mais grave e mais essencial entre domínio (técnico) e apropriação
(LEFEBVRE, 1991, p. 88).

Portanto, ele a diferencia domínio de apropriação onde: a


“apropriação (pelo ser humano de seu ser natural) → {corpo, tempo,
espaço, desejo → {valores em formação ou em vias de desaparecimento:
festa, lazer, esporte, cidade, urbanidade, natureza” (p. 95); é diferente
de dominação na “cotidianidade {pressões (determinismos verificados
por ciências, subjugados por técnicas) → {biológicos, geográficos,

11 De certa maneira, é a mesma reflexão marxista sobre a transformação do


Estado, ou seja, este não é igual ao existente, mas decorre de uma inversão completa se
comparado ao capitalismo.

332
econômicos, etc. → {múltiplos, mas agrupados na dominação social da
natureza, na práxis” (LEFEBVRE, 1991, p. 98).

Ao nível teórico, começamos a compreender que o ‘nosso espaço’ é


apenas um entre os possíveis, que talvez ele só exista relativamente a nós
(à nossa escala) e que em outro lugar ou numa outra escala pode haver
outros espaços, outras temporalidades. A descoberta da relatividade
acentua a descoberta da nova realidade sensível: da segunda ‘natureza’
anexada à primeira, do objeto-signo ou do signo-objeto. São mudanças
práticas nos critérios de apreciação que se impõem, ao mesmo tempo em
que mudanças conceituais (LEFEBVRE, 1991, p. 124).

Sendo assim, a apropriação, em sua relação com a cidade, trataria da

apropriação, pelo ser humano, da sua própria vida, dos seus próprios
desejos, do tempo e do espaço em seu redor. É aqui, em meu entender,
que se situam os limites do socialismo e do capitalismo. Pôr em primeiro
plano a apropriação, e não simplesmente o domínio da natureza, parece-
me marcar o início da construção desse “modelo de socialismo”, cuja
elaboração pretendo contribuir (LEFEBVRE, 1970, p. 80).

Entre julho e setembro de 1968, quando – em suas férias na


Espanha – concede uma entrevista à revista Triunfo (1970), ao ser
perguntado sobre a possibilidade de a Revolução de 1968 ter sido a última
do século XX, ele contesta, dizendo que: foi “o princípio da primeira
revolução deste século”, pois as anteriores “tinham o cunho agrário
do século XIX” (LEFEBVRE, 1970, p. 67). E, seria “necessário, hoje,
elaborar um novo modelo de socialismo” já que o elaborado por Lênin
transformou-se em socialismo de Estado, apesar de “que muitos [de
seus] elementos continuem a ser válidos”; esse velho modelo atingiu o
seu limite e esgotou suas possibilidades históricas (LEFEBVRE, 1970,
p. 72-73). Em alternativa diz:

O capitalismo, e até o socialismo, reduzido a objetivos econômicos,


objetivos de crescimento da produção, não respondem a um desejo

333
fundamental do ser humano, o da apropriação. Esforcei-me bastante
para pôr em relevo esse conceito de apropriação. Não se trata – entenda-
se bem – da propriedade. Trata-se da apropriação do mundo, na natureza,
e também da natureza própria, dos próprios desejos. [...] da necessidade
de apropriação do ser humano – e, através do ser humano, da sua própria
natureza, dos seus próprios desejos, do tempo e do espaço que o rodeia
(LEFEBVRE, 1970, p. 79).

Em conseqüência disso:

Do que se trata, agora, é de criar um novo socialismo, um modelo que


não construa o socialismo de cima para baixo, a partir do Estado, mas
de baixo para cima, através do movimento democrático das massas,
do conjunto da população – o qual coloca novos problemas [...] como
a autogestão. Trata-se de descobrir as formas, de criar as modalidades
de uma participação ativa e efetiva das pessoas nas empresas e também
na cidade, na gestão de todos os assuntos públicos. Na base, uma rede
de organismos, mais ou menos estáveis, conduz os assuntos sociais e
propõe soluções para os problemas, propõe e participa na elaboração
de soluções. (LEFEBVRE, 1970, p. 73-74).

Nesse sentido de discutir-repensar-problematizar-apropriar-


se, a autogestão (Fischer; Tiriba; 2009) (tanto do social quanto do
trabalho) contribui para este processo coletivo de pensar e pesquisar a
cidade. Possibilitando e visibilizando novas ressignificações de ações e
comportamentos, que são regulamentadas pela lógica do capital.

4. Conclusão

Portanto, pensar e pesquisar a cidade, na perspectiva teórica


que aqui expressamos, não pode ser algo individual mas sim, coletivo –
autogestionário. Para ser possível realizarmos tal empreitada na cidade
de Santa Clara (Cuba) e em Rio Grande (Brasil) destacamos/propomos

334
(proposição) alguns aspectos e(ou) elementos que poderiam configurar
como articuladores da relação da sociedade/cidade x natureza nos anos
1960/1970 nas respectivas cidades em seu contexto, do país e do mundo;
e úteis ao debate atual por seus cidadãos.
1) Como preâmbulo, no processo de construção do projeto,
inicialmente, seria necessário que todos os envolvidos tivessem
acesso e ocorresse uma discussão preliminar das obras centrais
de Lefebvre sobre o tema (a definir);
2) Um segundo momento seria a construção de dados e
informações das cidades como população, educação,
analfabetismo, atividades produtivas, desigualdade, problemas
e conflitos ambientais e urbanos etc.; e de como em cada uma
delas os poderes instituídos e(ou) as leis estabelecem a relação
da cidade/sociedade com a natureza e das utopias em debate
nas mesmas;
3) Um segundo momento, desde esta cidade realmente existente
hoje, desenvolveríamos o retorno a cidade do passado, aos anos
de 1960/1970, historicizando o processo vivido pela cidade/
sociedade em sua relação com a natureza, estacando as utopias,
a relação da cidade com o planejamento e/ou o planejamento da
e na cidade, a participação popular dos cidadãos nas decisões
naquele período;
4) O terceiro momento seria retorno à cidade atual, em ambos
os países, ou seja, ao retorno do estudo do primeiro ano, teria
talvez, as seguintes perspectivas: a) a hipótese de experiências
da autogestão da cidade/sociedade como parte e articulado ao
plano nacional produzido participativamente pelo povo, e seu
partido, em Santa Clara; b) e as contribuições e limites dessa
experiência ao debate e problematização da cidade capitalista
de Rio Grande.

335
REFERÊNCIAS

FISCHER, M.C.B.; TIRIBA, L. De olho no conhecimento “encarnado” sobre


trabalho associado e autogestão. In: Educação Unisinos; p. 201-210, setembro/
dezembro 2009.
HESS, Remi. Henri Lefebvre et la Pensée de l’espace. In. LEFEBVRE, Henri.
La production de l’espace. 4. ed. Anthopos: Paris, 2000.
LEFEBVRE, Henri. A natureza e o domínio da natureza, In: ______. Introdução à
Modernidade – Prelúdios. RJ: Paz e Terra, 1969 (1962 by les Éditions de Minuit,
França).
______. A Vida Cotidiana no Mundo Moderno, São Paulo. Editora Ática, 1991
(edição Galimard, 1968).
______. O direito à cidade, 1968 [1969].
______. Uma revolução cultural não pode desenrolar-se fora do campo da
política [entrevista, Revista TRIUNFO. Lisboa: Editorial O Século, 1970 [Verão
de 1968].
______. De lo rural a lo urbano. 4. ed. Barcelona (Espanha): Ediciones Península,
1978. (França: Editions Anthopos, 1970).
______. Henri. Re-produção das relações de produção. Porto, editora Scorpião, 1973.
______. Espace et politique. 2. ed. Anthopos: Paris, 2000 [1973].
______. A cidade do capital. Rio de Janeiro: DP e A editora, 1999. (1a ed. La pensée
marxiste et la ville, 1975).
______. Conversa com Henri Lefebvre. Revista Espaço e Debate, n. 30, 1991
[Tradução de Manuel Rolando Berrios] [Publicado em 1983, Villes en
Parallèle 7, 1983, e em Environment and Planning D, Society and Space,
March 1987, 5.].
MACHADO, Carlos RS. As vicissitudes da Construção da qualidade do ensino na
política pública de educação no município de Porto Alegre, de 1989 a 1996. Porto Alegre:
FACED/PPGEA, 1999 [Dissertação de Mestrado].
_____. Estado, Política e Gestão na/da Educação em Porto Alegre (1989-2004): avanços
e limites na produção da democracia sem fim. Porto Alegre: UFRGS/FACED, 2005
(Tese de Doutorado).

336
______. COSTA, Eder Dion; VÉRAS-NETO, Quintanilha; SOLER, Antônio.
Aspectos emergentes para/da cidade sustentável: a natureza, a educação, a justiça
e a economia popular e solidária. Cuba, 2008. [Trabalho apresentado no
Congresso Internacional de Educação UNIVERSIDADE 2008].
MARX, Karl. O Capital. La Habana: Editorial Ciências políticas, 1986.
WALLERSTEIN, Imammanuel. Uma política de esquerda para o século
XXI? Ou teoria e práxis novamente. In: (Org.). LOUREIRO, I.; LEITE, J. C.:
CEVASCO, M. E. O Espírito de Porto Alegre. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

337
El planeamiento participativo para la
rehabilitación del subcentro urbano
¨Abel Santamaría¨ en la ciudad de Santa Clara

MSc. Arq. Lien Cruz Domínguez1


Dra. Arq. Gloria Esther Artze Delgado2
MSc. Lic. Dayana Mesa Hernández 3

1 Master en Restauración y rehabilitación del patrimonio edificado (2015),


Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV). Profesora Titular del
Departamento de Arquitectura Facultad de Construcciones de la UCLV. Experiencia
en temas: Planeamiento y diseño participativo en procesos de intervención urbana y en
el patrimonio, su aplicación en los Planes Especiales de rehabilitación. Aplicación de
Modelos de planeamiento y diseño participativo. Email: liencd@uclv.cu
2 Master en Restauración del Patrimonio 1993/ ETSA Escuela Complutense de
Madrid. España Doctora en Ciencias Técnicas. 2007/CUJAE Habana Profesora Titular
del Departamento de Arquitectura Facultad de Construcciones/UCLV Experiencia en
temas: resolución de proyectos y ejecución de propuestas al planeamiento participativo
en el Centro Histórico de Santa Clara Coordinadora del programa de la Maestría
en Restauración y rehabilitación del patrimonio edificado Planeamiento y diseño
participativo en procesos de intervención urbana y en el patrimonio, su aplicación
en los Planes Generales de Ordenamiento Territorial PGOTU y Planes Especiales
de Rehabilitación Integral PERI. Diseño y aplicación de Modelos de planeamiento y
diseño participativo en sectores y barrios precarios de diferentes municipios de las tres
provincias centrales SC, Cienfuegos, SS Adecuación del planeamiento físico espacial a
las nuevas tendencias de envejecimiento poblacional. Email: gloria@uclv.edu.cu
3 Máster en Desarrollo Comunitario por el Centro de Estudios Comunitarios
(CEC) de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV), Cuba 2015.

339
1. Introducción

Ante la complejidad del hecho urbano, resulta indispensable


el concurso cada vez más eficiente de las ciencias aplicadas como la
sociología que continua ganando espacio con las diferentes técnicas y
herramientas de trabajo para permitir encontrar soluciones sostenibles
a contemporáneos y acumulados problemas de la ciudad existente.
La presente investigación aborda el campo de la sociología urbana
aplicada a la resolución de problemas de proyectos para la rehabilitación
en la escala urbana y arquitectónica.
Sujeta su pertinencia y sus principales aportes científicos
a los de carácter práctico en tanto concreta decisiones de proyecto
en correspondencia con el empleo consecuente de un procedimiento
diseñado para articular los resultados del estudio socio urbanístico
como vías para alcanzar la sostenibilidad en proyectos participativos de
entornos de valor histórico cultural como el antiguo regimiento militar
“Leoncio Vidal Caro”.
Constituye resultado del trabajo del Grupo de Planeamiento,
de la Línea de investigación científica universitaria: ¨Arquitectura y
Urbanismo Sustentable¨ que ha implementado y adecuado herramientas
de la sociología urbana y la sicología de comunidades para la toma de
decisiones en la gobernabilidad local sostenible, al obtener desde fases
primarias inversionistas soluciones de proyectos al planeamiento y
diseño participativo de carácter comunitario, en problemas de la escala
urbana y arquitectónica.
El resultado se obtiene por un colectivo de investigadoras del
Departamento de Arquitectura de la Facultad de Construcciones en

Profesora Asistente del CEC de la UCLV. Experiencia en temas de Equidad y


participación social, Desarrollo y planificación urbana, Estudios de género y urbanismo,
Estudios de movilidad urbana. E-mail: dmmartinez@uclv.edu.cu

340
la Universidad Central ¨Marta Abreu¨ de Las Villas, a solicitud de las
autoridades provinciales y Municipales del Gobierno y el Partido de
la ciudad de Santa Clara y habría sido imposible su realización sin la
accesoria de especialistas de Psicología de Comunidades de la propia
Universidad, de instituciones de cultura y la comunidad del barrio
Dobarganes, así como el trabajo de los estudiantes del cuarto año de la
Carrera de Arquitectura en el curso 2010-2011.

2. Metodología para diagnóstico y planeamiento


participativo de la rehabilitación de zonas de valor

I. Caracterización preliminar del problema de investigación


II. Definición de los objetivos de la indagatoria urbana
III. Diseño de las herramientas y el procedimiento factible
IV. Aplicación de las herramientas
V. Procesamiento de los resultados de la aplicación de las
herramientas.
VI. Análisis y diagnóstico de los resultados de la indagatoria
sociológica.

Explicación de los pasos


I. Caracterización preliminar del problema de investigación
Estudio de antecedentes
� Presentación a Forum de Ciencia y técnica, de los especialistas
del Museo Provincial Abel Santamaría, como investigaciones
socioculturales sobre la caracterización de la comunidad
residente y usuaria de la zona de emplazamiento urbano de la
Zona Urbana objeto de estudio.

341
� Investigaciones histórico-evolutivas del sitio objeto de la
Tercera gran transformación, donde la nueva rehabilitación
consiste en convertir el Conjunto Cultural en un subcentro
cultural y de servicios de la ciudad de Santa Clara.
� Resultados de la etapa de documentación grafica y descriptiva
sobre Planos de inventarios actualizados para fase de análisis y
diagnostico de la asignatura que permitieron la caracterización
socio urbanística del escenario objeto del estudio.

Resultados de la caracterización preliminar


El PGOTU 2007, de Santa Clara, Plan general de Ordenamiento
territorial y urbanismo ha identificado en su sistema de centros el
potencial del Subcentro de ciudad que podrá ser desarrollado en el
antiguo regimiento militar de la época colonial ¨ Leoncio Vidal Caro¨´,
que resulto ser la tercera fortaleza militar de la tiranía Batistiana en
importancia en el país, con más de 3 000 efectivos al triunfo de la
revolución, solo antecedida por Columbia y el Cuartel Moncada y fue
convertido en Ciudad Escolar ¨Abel Santamaría ¨, inaugurando en el año
1961 el Instituto Politécnico Industrial Raúl Suárez, dentro del Programa
revolucionario indicado por el Comandante en Jefe, Fidel Castro Ruz,
de conversión los regimientos militares en escuelas.
En el 1076 la pieza principal del Instituto fue convertida en el
Museo Provincial Abel Santamaría, uso que conserva hasta la actualidad
y desde donde se han realizado diferentes estudios e indagatorias
comunitarios de impacto en el territorio que sirven de antecedentes
a la presente caracterización preliminar, base a la formulación de las
herramientas propias de las investigación que se requieren en los
proyectos de rehabilitación urbana integral de Zonas Urbanas de Valor
Histórico Cultural ZUVHC para configurar las nuevas herramientas
de investigación. Entre los estudios antecedentes revisados para la

342
caracterización preliminar se encuentran los dirigidos por la Directora
del Museo Lic. Margarita González y sus especialistas.
De modo preliminar la ZUVHC se caracteriza por poseer un
carácter urbano, con cuatro barrios de marcada identidad que son
Osvaldo Herrera, Zona sur del Centro Histórico, Raúl Sancho y
Subplanta, organizados en dos Consejos populares que son Centro y
Abel Santamaría. La población se caracteriza por poseer índices elevados
de envejecimiento, variadas respuestas en la composición de niveles
escolares, sexos y bajos índices de vinculación laboral especialmente en
el barrio de Subplanta.
Se registran elevados índices delictivos, sobretodo robos y
atracos, se presentan numerosos casos de alcoholismo, casos sociales y
presencia de casas culto de religiosidad fundamentalmente afrocubana
y presentante.
El estado de conservación del fondo está entre regular y mal y hay
déficit de servicios que genera movimientos pendulares caracterizándose
la Zona por tener familias tradicionales de clara identificación por
los miembros de la comunidad que utilizan los espacios libres más
significativos en tradiciones de fuerte intercambio social y otras
actividades cotidianas tales como empinar papalote, pasear mascotas
y juegos de adolescentes, además del descanso pasivo y contemplativo
especialmente del área verde arbolada existente en el sitio por los vecinos
inmediatos. Se ha identificado mediante la observación del uso social la
existencia del problema de accesibilidad presente en el sitio, asociado
al abandono general y deterioro de la estructura arquitectónica escolar
del Instituto Raúl Suarez y la escuela de Oficios
II. Definición de los objetivos de la indagatoria para
rehabilitación urbana
Se relacionan, los resultados de la caracterización preliminar del
comportamiento sociológico del escenario objeto de rehabilitación con

343
los nuevos objetivos que debe asumir la indagatoria ante el alcance del
nuevo proyecto de rehabilitación.
Aspectos a indagar: Nivel de arraigo y pertenencia, problemas y
ventajas sentidas de la comunidad, disposición y forma de implicarse
directamente en la rehabilitación.

Objetivos de la indagatoria
a. Identificar nivel de arraigo y pertenencia al sitio objeto de la
rehabilitación integral, progresiva y sostenible.
b. Identificación de prioridades principales sentidas por
la comunidad como aspectos negativos en el escenario a
rehabilitar.
c. Identificación sentida por prioridad de principales aspectos
positivos del escenario a rehabilitar.
d. Disposición para participar en la rehabilitación.
e. Formas de participación.

III. Diseño de las herramientas de la indagatoria sociológica


para rehabilitación urbana.
Método de trabajo para diseño de herramienta
A. Selección del tipo de herramienta a aplicar para la indagatoria
objeto de estudio.
Fundamental: Triangulación de información obtenida por la
Observación participante- las entrevistas y las encuestas, diseñadas,
aplicadas y procesadas.
Las herramientas fueron diseña para ser aplicadas
complementándose en la conclusión diagnóstica participativa,

344
auxiliándose de la observación del fenómeno medido y la técnica de
interactividad del trabajo en grupos. Se identifica la potencialidad de la
encuesta al objetivar cuantitativa y cualitativamente el análisis.

Organización y diseño de la investigación

Premisas organizativas:

1. Se definen las variables de análisis para indagatoria, ellas fuero:


• Arraigo y pertenencia
• Insatisfacciones y satisfacciones sentidas
• Disposición a incorporarse a la rehabilitación urbana.
• Formas de participación en el proceso rehabilitativo.

2. Formación y organización de la indagatoria, a través de 13


equipos a en calidad de GTCE compuesto por 36 estudiantes,
con misiones específicas y la responsabilidad del cruce de
información como referente sistémico.

3. Se distribuye la actividad de la indagatoria en tres unidades físico


espacial:
• Una ZUVHC, que abarca diferentes partes de algunos
consejos populares tales como: norte del Centro, noreste
del Abel Santamaría y sur-oeste de Camacho Libertad
• Cinco sectores interconectados al Conjunto Cultural Abel
Santamaría y
• Veinte objetos de obra de la arquitectura y 18 espacios
públicos.

4. Se trabaja la indagatoria en dos etapas fundamentales:


Etapa I. Indagatoria en la escala urbana en La ZUVHC Zona
Urbana de Valor Histórico Cultural, que aplico en:
Fase A: Entrevistas con diferentes actores e informantes claves:

345
(lideres de gobierno local, políticos, técnicos y especialistas
sociólogos culturales, museógrafos, licenciados del arte y la
literatura, museógrafos, lideres de la comunidad, médicos,
maestros, directivos de escuelas y centros, administrativos,
lideres estudiantiles, estudiantes, lideres naturales, promotores
culturales, etc.)
Fase B: Técnica de trabajo en grupo y paneles de trabajo.
Fase C: Encuesta socio urbana de Zona Urbana de Valor
Histórico Cultural
Etapa II: Indagatoria en escala de Arquitectura sobre
satisfacción de la comunidad respecto a usos de suelo tanto
del sistema edificado como del sistema de espacios públicos
5. El diseño de las preguntas se resuelve siguiendo algunas pautas
tales como:
a. Iniciar sondeo con preguntas generales y avanzan hacia las
especificas
b. Empleo de lenguaje claro de fácil comprensión
c. Simplificación y rapidez para precisar respuestas.
d. Alternativas de respuestas con flexibilidad de proposiciones
no estimadas
e. Facilidad de las respuestas identificando orden de prioridad
y evaluación de gradientes de comportamientos.

Diseño de las herramientas de indagatoria

Encuesta

Se diseña la encuesta específica en vínculo con la entrevista


complementaria de apoyo, asociando una tercera herramienta que es

346
el panel de trabajo en grupo, como herramientas fundamentales para
llevar a cabo la indagatoria sociourbana, cumplen como condición
su coherencia de indagatoria, la facilidad de su resolución o llenado,
redacción con lenguaje claro y sencillo, fácil tabulación, precisa en su
indagatoria con cinco objetivos exploratorios que aportan datos claves
al proyecto de rehabilitación urbana del sitio. Se aplican en muestra
representativa del universo de la población de la ZUVHC objeto de
estudio. Ver Anexos en presentación.

Panel de trabajo en grupo

Se realizan a lo largo del proceso desde los mismos inicios


diferentes encuentros de trabajo en grupo donde participan los diferentes
actores e informantes claves con el objetivo de presentar la situación de
conflicto de la Zona y sus posibles vías de solución
Actores e informantes claves para la indagatoria:
• Lideres administrativos y políticos del municipio: Primer
secretario del PCC Municipio Santa Clara, otros funcionarios
políticos; Presidentes y Vicepresidentes de Consejo de la
Administración Municipal, Responsables e Inversiones,
• Asesores Provinciales: Dirección Provinciales y Municipales
de Comunales; Dirección Provincial y Municipal de Cultura,
Dirección Provincial de Patrimonio Cultural, Dirección
Municipal de Planificación Física
• Directores de empresas y unidades, líderes del conjunto:
Museo provincial; Telecentro Cubanacan; Cocina Centralizada,
Escuela 28 de enero, 4ta Unidad de la PNR, Escuela de Oficios,
IPI Raúl Suárez; Sala Amistad, Piscinas, Presidentes de
Consejo Populares, Presidente Circunscripciones.

347
• Actores de la comunidad: líderes naturales, maestros, médicos,
lideres religiosos, trabajadores sociales, promotores culturales,
artistas plásticos, artesanos, profesores universitarios,
estudiantes universitarios, etc.

IV. Aplicación de las herramientas de la indagatoria sociológica.


Método de aplicación de las herramientas.
En el escenario objeto de indagatoria el tamaño de la muestra
resulto de más de 300 encuestas y su complementaria entrevista paralela.
Se emplearon métodos de muestreo aleatorio estratificado y
muestreo intencional, considerando estratos por: sexo, edad, nivel
ocupacional, emplazamiento urbanístico distributivo y nivel escolar.
El modo de aplicación de las herramientas fue directo y personal
con la asistencia requerida para llenado en caso de ancianos y niños.

V. Procesamiento de los resultados de la aplicación de las


herramientas
Para el procesamiento de los resultados se organizo la información
resultante elaborando tablas resúmenes de las respuestas siguiendo
el orden estructural de la encuesta. Se realizo un análisis cuantitativo
relacionando los resultados de las diferentes herramientas aplicadas, al
que se añadió el análisis cualitativo

VI. Análisis y diagnóstico de los resultados de la indagatoria


sociológica.
• Se analizan los resultados y sus tendencias de comportamiento
• Se calculan porcentualmente para facilitar análisis cuantitativos
• Se compatibilizan los resultados cuantitativos con análisis de
tipo cualitativos.
• Se obtienen conclusiones para diagnóstico.

348
Conclusiones para diagnóstico

De la indagatoria socio urbana se obtienen las siguientes


conclusiones diagnosticas:
1. El conjunto Cultural Abel Santamaría presenta un profundo
estado de deterioro técnico-constructivo, así como estado
de abandono urbanístico que no contribuye a la salvaguarda
de sus valores históricos y culturales ni al fortalecimiento de
sus potencialidades urbanas y paisajísticas, convirtiéndose
en una degradada zona de la trama existente por el riesgo de
vandalismo e la inseguridad ciudadana.
2. El conjunto cultural de predominio de usos de suelo educacional
evidencia un profundo deterioro de sus capacidades académica
en la especialidad tecnológica e industrial que le dio origen,
que exigen la refuncionalización inmediata de sus estructuras
espaciales existentes que reivindiquen sus potencialidades
urbanísticas en correspondencia con las definiciones del
PGOTU del 2007.
3. Los estudios socio urbanísticos de la ZUVHC, demuestran
entre los aspectos mas significativos del levantamiento
de insatisfacciones o determinación de la situación de
conflictos, problemas de accesibilidad y conectividad con
la ciudad existente, así como desaprovechamiento de sus
potencialidades altimétricas de visualización de la ciudad
tradicional.
4. La comunidad residente en la zona, objeto de indagatoria
evidencia elevados niveles de arraigo e identidad al sitio (por
ejemplo reparto Osvaldo Herrera y Raúl Sancho), asociándose
los menores valores al reparto de la sub planta.

349
5. La comunidad usuaria empleada en la zona, objeto de
indagatoria evidencian altos niveles de arraigo al sitio
por patrones de identidad y las múltiples ventajas del
emplazamiento dentro de las zonas centrales de la ciudad de
Santa Clara.
6. La indagatoria demostró la existencia de tradiciones de uso
de suelo que la comunidad desea preservar asociada a los
principales especiaos públicos como el juego libre e informal
de niños y adolescentes, la existencia de espacios verdes libres,
el empinar papalotes y paseas animales domésticos y mascotas
7. Los mayores niveles de satisfacción de la indagatoria, se
identifican asociados fundamentalmente a la memoria
colectiva, de desarrollo de costumbres y tradiciones ligadas al
espacio público así como a aspectos de facilidades de movilidad
por cercanía a las zonas centrales de la ciudad existente.
8. Los resultados de la indagatoria demuestran elevados
niveles de disposición a participar en la rehabilitación
urbana, principalmente en fase de ejecutividad, y aportación
de opiniones, menores cifras con el sufrago de gastos de
rehabilitación, conservación, así como de gestión y divulgación
del proyecto.
9. La indagatoria socio urbanística no refiere reconocimiento
conciente de la comunidad asociado a peligro de perdida
de valores patrimoniales urbanos y arquitectónicos,
contaminación higiénico sanitaria generada por el río Bélico,
10. Se evidencia elevados niveles de incertidumbre en usuarios y
residentes respecto a niveles de deterioro técnico constructivo,
incompatibilidad en los uso de suelo, así como subutilización y
sobre utilización de espacios arquitectónicos y libres públicos.

350
Se relaciona el diagnostico participativo para la más efectiva
toma de decisiones en la formulación de las propuestas de solución a
los problemas y las resolución de conflictos en el escenario objeto d
e la rehabilitación integral, progresiva y sostenible para el subcentro
¨Abel Santamaría

3. Conclusiones

1. El presente satisface las demandas del Gobierno Local


y el Partido en la ciudad de Santa Clara a la Facultad
de Construcciones de la UCLV, al obtener resultados
científicamente argumentados para su aplicación práctica de
enfoque participativo en la rehabilitación sustentable de una,
de las mas importantes Zonas Urbanas de Valor Histórico
Cultural ZUVHC de la ciudad, que enfrenta la urgente
necesidad de transformación de sus atmósferas deterioradas
y su conversión en el nuevo subcentro cultural y de servicios
¨Abel Santamaría¨ contentivo de la Plaza de igual nombre.
2. El resultado presenta el diseño de un proceder científico
investigativo de comprobado rigor que satisface el logro
de objetivos esenciales mediante la elaborando de un
procedimiento de trabajo y las herramientas: combinadas,
tales como la encuesta en combinación con entrevistas y la
observación participante.
3. Se evidencia la importancia del resultado en tanto se obtienen
informaciones de fuentes primarias y esenciales que garantizan
el éxito de la intervención en la medida en que las propuestas
respondan a necesidades sentidas de residentes y usuarios en
porcientos que resultan confiables.

351
4. La investigación socio urbanística evidencia la necesidad de
refuncionalizar con usos de suelos sostenibles que garanticen
la accesibilidad al sitio, el empleo de un modelo de gestión
estratégica progresiva que identifique prioridades de actuación
integral, por medio de la factibilidad que aportan los nuevos
lineamientos del modelo económico del país.
5. Los resultados de esta indagatoria comprueban la factibilidad
de empleo de las herramientas propuesta como vía para la
participación comunitaria desde fases primarias inversionistas
donde se encuentran los proyectos de planeamiento y diseño
urbano.

4. Recomendaciones

Poner a disposición de las autoridades solicitantes (PCC Y


CONSEJO ADMINISTRACION MUNICIPAL), los resultados de la
investigación sociológica presente para su valoración e implementación
estratégica
Incorporar el resultado en la Actualización del Plan General de
Ordenamiento Urbano de Santa Clara PGOUT

Bibliografía

Pérez Álvarez, Mayda. El diseño participativo comunitario Manual


metodológico
Vasallo Barrueta Norma. SELECCIÓN DE LECTURAS SOBRE Psicología
social y de comunitaria.
Artze Delgado, Gloria Esther y Vivian Guerra Morales. ENCUESTA PARA
INDAGATORIA SIOCIO URBANA. Fase de Arquitectura. UCLV. 2010.

352
La planificación urbana participativa en la
ciudad de Santa Clara. Retos y perspectivas

MSc. Darmis Machado Macahado1


MSc. Dayana Mesa Martínez2

1. Planificación urbana y participación social:


una reflexión necesaria

Repensar la ciudad, como construcción social, teniendo en cuenta


las mediaciones históricas, económicas, culturales y políticas, permite
recuperar la interrelación existente entre el espacio físico y el espacio
construido así como su influencia en la dinámica social. Los estudios
sobre ciudades, que en la actualidad, intentan comprender y explicar

1 Máster en Desarrollo Comunitario por el Centro de Estudios Comunitarios


(CEC) de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV), Cuba 2015.
Profesora Asistente del CEC de la UCLV. Experiencia en temas de Participación
social, Desarrollo y planificación urbana, Estudios de movilidad urbana. E-mail:
darmis@uclv.edu.cu
2 Máster en Desarrollo Comunitario por el Centro de Estudios Comunitarios
(CEC) de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV), Cuba 2015.
Profesora Asistente del CEC de la UCLV. Experiencia en temas de Equidad y
participación social, Desarrollo y planificación urbana, Estudios de género y urbanismo,
Estudios de movilidad urbana. E-mail: dmmartinez@uclv.edu.cu

353
la complejidad de los fenómenos urbanos, requieren de una mirada
holística, multidimensional e integral para lograr entender y transformar
las relaciones entre la sociedad y sus espacios, actualizar el significado
que se confiere a estos, tomando en cuenta la sociedad actual, sus valores
y sus perspectivas.
El urbanismo como disciplina práctica de intervención y
ordenación del territorio, con el fin de organizar el funcionamiento de
la ciudad y el acceso a los bienes y servicios colectivos de sus habitantes
y sus usuarios; no solo implica una mirada a lo físico-espacial; sino que
integra la transformación social, la calidad de vida de las poblaciones
más necesitadas y la reducción de desigualdades. Para enfrentar los retos
que impone este contexto, a la producción científica e investigativa, es
un emergente la integración de diversas disciplinas como la Sociología,
la Economía, la Ciencia Política; que permitan junto al Urbanismo y la
Arquitectura un análisis de los fenómenos en su complejidad, ya que la
práctica urbanística no solo consiste en decidir sobre el uso del suelo,
la localización de actividades y la forma física de los espacios; sino que
influye directamente en el acceso que las personas y los grupos sociales
tienen a lugares de empleo, equipamientos y servicios, y por tanto en
la reproducción de la vida cotidiana familiar. Las nuevas formas de
interacción emergentes, han convertido a las ciudades en escenarios de
prácticas sociales y espacios de organización de las diversas experiencias.
La ciudad desempeña un rol vital en el desarrollo de cada territorio
por sus potencialidades para generar economías más diversificadas
y dinámicas, crear empleos y riquezas, absorber el crecimiento de la
población y brindar los servicios básicos que se transforman en motores
del avance económico y social.
En América Latina, el tema de la planificación urbana ha alcanzado
gran connotación, asociado a problemáticas como la segregación
socio-espacial, la fragmentación del espacio, la informalidad urbana,

354
la exclusión, el desempleo y la vulnerabilidad, así como la necesidad
de evaluar sus efectos concretos en la solución de estas problemáticas.
Las consecuencias de las formas actuales del urbanismo, donde
intervienen acciones públicas y privadas son visibles; los espacios
monofuncionales, especializados y distantes (basada en el zoning del
urbanismo funcionalista); han marcado los valores de la vida moderna
actual resumidos en inhabitabilidad, inequidad, secularización e
individualización. La progresiva injerencia de las reglas del mercado
en la planificación urbana, en un contexto de expansión urbana y
privatización, ha supuesto el concepto de ciudadanía al de consumidor
y ha limitado la accesibilidad urbana a la capacidad de consumo de
los grupos sociales. Existe en apariencia, una igualdad de derechos y
oportunidades, que en esencia es más formal que real, por lo cual es
necesario tener en cuenta cómo los diferentes grupos sociales participan
en la construcción social del espacio urbano que habitan, y cómo se
integran las especificidades actuales de la vida en la ciudad.
Mediante la planificación se está construyendo la ciudad, sus
elementos principales, sus prioridades, sus problemas, en definitiva, su
futuro, […], la planificación es un ejercicio político en su forma más pura.
Si entendemos la política como una lectura de la realidad, como una
propuesta en la que se definen los colectivos y se marca una pauta de la
acción social…. La planificación define, […], crea y destruye conceptos y
realidades de la ciudad”. (Ruiz, 2000: 181-182) La planificación urbana
debe ser un proceso integrador de las necesidades diversas de los
individuos heterogéneos que hacen uso de la ciudad; los usos del suelo, la
ordenación y funcionalidad económica con factores culturales y sociales,
para garantizar el acceso equitativo de los sujetos heterogéneos a la
ciudad, no solo como usuarios sino como productores y transformadores
de su espacio. La participación es el instrumento que permite convertir el
diseño meramente funcional en un diseño relacional, donde interactúen

355
los diferentes intereses, logrando la articulación de la diversidad, una
plena ciudadanía y la equidad social.

2. ¿Qué entender por participación? ¿Cómo se articula


con la planificación urbana?

La participación social constituye una actividad práctica y


reflexiva de transformación de la realidad social, al tiempo que desarrolla
la capacidad e identidad de los actores que se autoconstruyen como
sujetos de poder en este proceso. (Fleitas et al., 2005: 197) Es un proceso
vinculado a las necesidades y motivaciones de los distintos grupos
y sectores que integran una sociedad, así como a la dinámica de las
relaciones establecidas entre ellos en distintos momentos, condiciones y
espacios, lo que va conformando todo un conjunto de redes que estimulan
u obstaculizan el desarrollo de auténticos procesos participativos.
Desde el punto de vista de participación, no solo significa asistir
o estar presente; sino intervenir, implicarse; o sea, supone una presencia
activa. Para participar, no basta la libertad y el derecho; un tratamiento
igualitario en un contexto de desigualdades sociales puede reforzar
inequidades. Existen todavía dificultades para la participación real de
los actores en los ámbitos decisores de la sociedad. Debe caracterizarse
por la diversidad, lo que significa lograr implicar a la mayor cantidad
de personas en la realización de actividades donde puedan exponer sus
opiniones e intereses dentro de los niveles organizativos alcanzados.
Así concebida se transforma en una vía de socialización del poder en
sus distintos niveles, condiciones y momentos, que facilite potenciar
las capacidades individuales y colectivas contenidas en una comunidad
y que son necesarias para el desarrollo de una sociedad que se rige
por principios de justicia social. Participación significa promover

356
protagonismos que incluyan en el ámbito local los asuntos del control,
las tomas de decisiones, gestión y evaluaciones necesarias que aseguren
la construcción de lo que algunos han nombrado “el ciudadano local”.
En materias espaciales trasciende habitualmente los estrechos márgenes
institucionales donde ha sido ubicada, va más allá de la simple y
superficial información receptiva de la población. Desde esta perspectiva,
los proyectos urbanos deben formar parte de un proyecto de ciudad
donde se articulen variables como la gobernabilidad, la habitabilidad y
la productividad.

3. ¿Cuáles han sido las premisas de la planificación


urbana en Santa Clara?

La planificación y el ordenamiento urbano ha sufrido, desde su


surgimiento en Cuba, de las consecuencias de un sistema basado en
la toma de decisiones centralizadas que no asimila con facilidad un
entorno caracterizado por una creciente diversidad de actores sociales
que intervienen en múltiples acciones económicas y territoriales.
El modelo de asignación central verticalizada ha provocado que la
población cada vez se encuentre excluida de los procesos de toma
de decisiones, incluso las instituciones municipales reducen su
participación a la información y en algunos casos la consulta. (García,
1996: 192) La década del 90, que marca una profunda crisis para el
país, con influencias pérsicas en la estructura social cubana, acentuó
los graves problemas de infraestructura técnica y de servicios, que
acrecentó las desigualdades e indisciplinas sociales, que hicieron
conflictiva la vida en la ciudad. Las problemáticas demandantes en
las ciudades cubanas, son cada vez más complejas e interrelacionadas,
la institucionalidad tradicional es ineficiente en sus soluciones; la

357
realidad social es tan dinámica que las instituciones necesitan una
actualización de las iniciativas de carácter público, que respondan a las
condiciones del contexto. La reestructuración de la política económica
y social del país, implica cambios radicales en el urbanismo, donde
interviene la descentralización de las decisiones a los gobiernos locales,
las nuevas figuras productivas que interactúan como nuevos agentes
económicos, nuevas formas de propiedad y gestión de la vivienda y
el hábitat en general, la focalización de las políticas sociales en su
visión multidimensional para atender desventajas sociales y crear
nuevas oportunidades, las nuevas formas de participación social que se
pretenden implementar para potenciar la interacción entre la ciudadanía
y el Estado. La renovación de los instrumentos del urbanismo, la
capacitación técnica, diseño de un sistema jurídico normativo único
son procesos emergentes para el actual contexto de cambio en Cuba,
que permitirían potenciar la participación real, consciente, organizada y
sistemática de los ciudadanos en el diseño de los espacios que utilizan y
moldea según sus necesidades, pero que a la vez influye en su dinámica
cotidiana y en las formas de interacción social.
Los objetivos de los planes urbanos, se han centrado en el
aseguramiento de las condiciones para la función productiva de las
ciudades, con la inclusión del desarrollo social, y su emplazamiento
en los entornos de relación. Pese a su orientación participativa, en
la práctica predominó la participación de los actores económicos en
detrimento de los sociales, lo cual afectó una de las premisas teóricas
de este tipo de planes que es la definición conjunta de un proyecto de
futuro. De esta manera la búsqueda de consenso, uno de los pilares del
planeamiento estratégico, considerado un valor añadido, se ha dado
entre actores económicos y políticos. (Rey, 2009: 35)

358
4. Santa Clara: ciudad, centro, movimiento

La ciudad de Santa Clara, con 326 años de fundada, constituye


capital del Sistema Urbano de la provincia Villa Clara, por su rango
poblacional, la cantidad de servicios y su extensión territorial (44.45%).
Dada su ubicación geográfica es considerada una de las cinco ciudades
más importantes del país, es sede de importantes instalaciones de
servicios provinciales y regionales en sectores como la salud, la
educación y la cultura. Es una ciudad concéntrica, su Centro Histórico
es constitutivo y constituyente de valores arquitectónicos, urbanísticos
y culturales. La ciudad se subdivide en dos grandes zonas, una ubicada
al centro, donde se concentra la mayor cantidad de población y las
instalaciones de servicios, así como la gran mayoría de los empleos; y otra
que bordea la zona de alta concentración y ocupa el resto del territorio,
donde la densidad poblacional es menor. Dentro de la ciudad se ubican
11 consejos populares totalmente urbanos y 8 mixtos, totalizando una
población que habita en asentamientos urbanos de 226155 habitantes
lo que representa el 91.5% habitantes del total municipal. (Censo, 2012)
Del total de población del municipio 247000, el 50.9% son
mujeres (125723) y el 49.1% son hombres (121277), siendo la población
femenina en las zonas urbanas y rurales la que alcanza la mayor cifra.
La población envejecida, mayores de 65 años, representa el 16.1% de la
población del territorio manifestándose una tendencia al envejecimiento
de la población. (PDI, 2013) El saldo migratorio muestra que continúan
saliendo más personas que las que entran, por lo que se considera una
ciudad emisora de población. Es una de las ciudades más envejecida
dentro de la provincia, lo que resulta preocupante por ser la cabecera
provincial, tener la mayor cantidad de población y déficit acumulados
de infraestructura. Por ello es importante considerar la necesidad de
preparar a la ciudad para asimilar esta situación teniendo en cuenta

359
en las soluciones de infraestructura y espacios públicos, accesibilidad,
distribución de las áreas verdes, vínculos con las zonas comerciales y
recreativas, así como la redistribución de las ofertas de empleo, al existir
una disponibilidad de los mismos en la medida en que la población
económicamente activa se envejece y retira del empleo activo.
La Dirección Municipal de Planificación Física, es la institución
encargada de dirigir el proceso de planificación urbana, en trabajo
conjunto con el Gobierno Municipal, la Dirección Municipal de
Economía y Planificación y la colaboración de otras instituciones. Dichas
instituciones a su vez están doblemente subordinadas a las entidades
provinciales y nacionales correspondientes. Mediante entrevistas
estructuradas a expertos y especialistas de las instituciones mencionadas,
se constató que la planificación urbana es entendida como un proceso
que permite orientar la transformación, ocupación y utilización
funcional de los espacios y lograr su desarrollo socio-económico. El Plan
General de Ordenamiento Territorial, constituye un instrumento técnico
y jurídico que permite dirigir acertadamente la gestión territorial, las
definiciones del uso y destino del suelo para el municipio. (PDI, 2013)
Esta visión y concepción tecnicista permite subordina temas centrales
como la calidad de vida de la población y el desarrollo social a intereses
económicos dominantes. La planificación urbana se basa en decisiones
centralizadas, verticalistas y en los recursos asignados para el territorio,
a través de la subordinación a las direcciones provinciales y nacionales
de estas instituciones. En este proceso participan las instituciones que
tienen como objeto social intervenir en las problemáticas urbanas, dígase
Empresa Eléctrica, Dirección de Transporte, Vivienda, Acueducto,
Comunales, Gastronomía, Estadística, CITMA, Cultura, INDER en
sus correspondientes direcciones municipales. La participación de
estas instituciones generalmente es informativa y en algunas ocasiones
consultivas, con el objetivo de planificar las proyecciones futuras

360
para el desarrollo urbano, que se convierte en la ejecución de tareas
designadas para cada institución. La articulación entre las instituciones
es insuficiente, no existe una coordinación real para la planificación de
los espacios y la gestión de los recursos, lo que implica que las acciones
en las zonas de nuevo desarrollo se realicen de forma fragmentada y
parcelada. La falta de aprovechamiento y cumplimiento del Plan General
de Ordenamiento Territorial y Urbano es una de las consecuencias más
recurrentes de la sectorialidad y del verticalismo en las decisiones, que
a su vez producen intermitencias en su implementación a través del
proceso inversionista municipal. La insuficiente autonomía municipal
y de Planificación Física específicamente, obstaculiza la sistematicidad
y efectividad de las inversiones y del funcionamiento de la Comisión
de Microlocalización de estas. Esta visión implica que los proyectos
urbanos no tengan una mirada integral e integrada que articule todas
sus dimensiones, prolongando los plazos de construcción, restauración
de parques, equipamientos e infraestructura.
La población ha estado excluida de estos procesos, no existen
experiencias de consultas populares u otras herramientas participativas
sistemáticas, que permita integrar en los diagnósticos las necesidades
reales de la población diversa que converge en la ciudad. El diagnóstico se
realiza teniendo en cuenta la visión de los directivos de los planificadores
y representantes de las instituciones y los directivos de las instituciones
y el gobierno municipal, en algunos casos basados en los planteamientos
de las reuniones de Rendición de Cuentas en las Circunscripciones.
Los especialistas entrevistados coinciden, que el discurso del marco
normativo a nivel provincial plantea la necesidad de una planificación
democrática, garantizando la participación de todos los sectores y
la obligatoriedad de tener en cuenta las aspiraciones y demandas de
toda la sociedad; para que se incorporen en los planes y programas. La
realidad dista de la normativa, a nivel municipal, la participación no se

361
realiza ni siquiera en su fase informativa, limitando los mecanismos de
intervención a la consulta institucional, a través de reuniones donde
participan como representantes de la población los miembros del
Consejo de la Administración Municipal y en algunos casos presidentes
de Consejos Populares seleccionados. La participación se limita a las
mesas directivas del municipio que se organiza y administra conforme
a los esquemas establecidos por la autoridad nacional, donde el nivel de
participación es mínimo y se centra en la información.
Una premisa importante es considerar que tanto la acción
de planificar los espacios habitados como la de participar en la
construcción del proceso de planificar y para quién se planifica, deben
ser los resultados de un proceso integral capaz de solucionar en teoría
y práctica los problemas y necesidades identificadas por la población
de esta localidad. La visión tecnicista, centralizada y normativa sobre la
planificación urbana en la ciudad de Santa Clara, invisibiliza y subordina
la intervención de los factores socioculturales en este proceso. Como
consecuencia se evidencian disímiles problemáticas sociales que
obstaculizan la vida cotidiana de los individuos que hacen uso de la
ciudad. El crecimiento de la informalidad, a partir de las migraciones;
la insuficiencia de servicios en las zonas de crecimiento espontáneo,
(generalmente en las periferias urbanas); las problemáticas relacionadas
con la movilidad urbana traducidas en la carencia de transporte
seguro y estable y el deterioro del trazado vial; el deterioro del fondo
habitacional y de las redes de acueducto y alcantarillado; unido a una
visión fragmentada y sectorialista de las políticas urbanas; son de las
problemáticas demandantes del contexto.
La realidad de Santa Clara, dista en gran medida de las
problemáticas identificadas en el Plan de Ordenamiento Urbano, por la
ausencia de diagnósticos participativos que integren las necesidades,
aspiraciones e imaginarios de la población con respecto a los servicios,

362
la movilidad, los espacios públicos y la vivienda; sobre todo que permita
focalizar las políticas para atender a las necesidades de los grupos de
la población vulnerable y crear nuevas oportunidades de acceso a los
recursos urbanos. Los análisis realizados justifican la caracterización del
proceso de planificación urbana sin la articulación del enfoque social,
circunscribiéndolo a un determinismo económico y una visión física
espacial funcionalista de las problemáticas sociales. Como consecuencia
se produce una ciudad cada vez más dispersa, disfuncional y desigual.
Si bien hasta el momento se ha abordado la necesidad de introducir
procesos de “descentralización en la toma de decisiones”, aún existen
problemáticas que las instituciones municipales no pueden solucionar
porque dependen de decisiones y normativas trazadas a nivel provincial
y/o nacional que rigen la dinámica de Santa Clara. En este caso se
encuentra la construcción y restauración de viales, de redes de acueducto
y alcantarillado. A través de estos principios se consolida y reproduce
la posición hegemónica que tiene el centro urbano de la ciudad donde
se concentran los principales recursos como servicios, instituciones
administrativas, espacios de ocio y recreación, vías principales; que
legitima la contradicción centro vs periferia, esta última, desprovista
de los principales recursos necesarios para la reproducción de la vida
cotidiana en las zonas urbanas.
El surgimiento de barrios informales e irregulares, y la
insuficiencia de los planes urbanos para su regularización, provoca
que los asentamientos sean cada vez más dispersos y obstaculice la
conectividad con respecto a las regulaciones urbanas para la disposición
de infraestructuras y servicios. Como resultado de este proceso, unido
a la sectorialización de las soluciones a las problemáticas de los
asentamientos, existen en la ciudad 8 barrios insalubres, generalmente
ubicados en la zona periférica. La extensión de la ciudad santaclareña
se ha regido por la lógica de la rentabilidad económica, lo que ha

363
provocado una pérdida de su calidad, debido a sus características
desfavorables para las relaciones sociales: grandes desplazamientos,
incremento de espacio viario en detrimento de los espacios públicos,
aislamiento, hacinamiento e inseguridad. Si bien ha estado siempre la
zona Centro en la portada de los análisis, las zonas periféricas merecen
una reflexión crítica y consciente. Dentro del límite urbano existen otras
zonas donde se evidencian problemáticas que se repiten y devienen
disfunciones sociales cotidianas relacionadas con la accesibilidad a los
servicios, la movilidad, la infraestructura y los espacios públicos. La
infraestructura y los equipamientos que conforman la ciudad, pueden
ser un importante mecanismo de redistribución e integración sociales,
pueden dualizar la sociedad urbana o en cambio articular barrios y
proporcionar mecanismos de integración y mayor calidad de vida a los
sectores sociales vulnerables.
La planificación urbana normativa y tecnicista, afecta de forma
desigual a distintos sectores de la población. La distribución desigual
de los espacios en la ciudad, basada en la funcionalidad sin previo
estudio de los usos y las necesidades sociales, propicia una concepción
fragmentadora del tejido urbano, que quebranta su accesibilidad, su
valor simbólico, su polivalencia, la intensidad de su uso social. En los
procesos de planificación urbanística en la ciudad de Santa Clara ha
fracasado la participación social debido a una deficiente interacción
con la ciudadanía y a no generar procesos dinámicos que trasciendan los
condicionamientos tecnocráticos y normativos. Una organización social
más justa y equitativa en todos los órdenes permitiría que los intereses
determinantes que condicionan el crecimiento urbano no fueran sólo los
especulativos y una falta de visión total acerca de un amplio abanico de
necesidades de una parte específica de su población. La nueva agenda
impone la instrumentación de mecanismos de planificación acordes a las
nuevas realidades locales, así como la implementación de la participación

364
de la población en tres dimensiones: como información, consulta y
decisión.
� Como información: los habitantes de la ciudad tienen el
derecho a ser informados de todos los proyectos urbanos, así
como también de los resultados esperados.
� Como consulta: es fundamental consultar a la población
acerca de los distintos programas y planes que se van a
implementar, y hacerlo con la disposición de saber promover,
escuchar y recoger las opiniones que podrían quedar o no en el
proyecto final. Esta forma de participación puede concebirse
como una exposición lo más amplia posible, por lo cual debe
contemplar los detalles de cada plan y las discusiones que
puedan surgir.
� Como decisión: por lo general, esta forma es valorada por
distintos autores como la más completa, mejor y superior
expresión del desarrollo democrático. Las personas son
integradas en los diferentes programas, planes y proyectos
en todas sus etapas, es decir, se incluye a toda la población en
los procesos de transformaciones (planificación y evaluación)
con posibilidad de hacer uso de sus capacidades respecto a los
objetivos, tareas, metas.

Las instituciones locales, en conjunto con el gobierno, tienen


la función de generar estrategias y elaborar políticas públicas
participativas, a favor de la cohesión social por medio de la regeneración
de centros y áreas degradadas, las nuevas centralidades, la mejora de la
movilidad y de la visibilidad de cada zona del territorio, la promoción
de nuevos productos urbanos y rurales que diversifiquen y reactiven el
tejido económico y social, creen empleos e ingresos.

365
Bibliografía

Dirección Municipal de Planificación Física. 2013. Plan de Desarrollo Integral


de Santa Clara. Villa Clara. Cuba.
Fleitas, R., et al. (2005) “Participación social de la mujer cubana en los 90” en
Proveyer, C., (Comp.) Selección de lecturas de sociología y política social de género. La
Habana, Editorial Félix Varela, pp.197-225.
García, C. (1996) “Participación y descentralización en el planeamiento
territorial” en Dilla, H., (Comp.) La participación en Cuba y los retos del futuro.
La Habana, Editorial CEA, pp. 183-194. Pascual, R., (2007) “Organizando
la participación” en Centro Capacitación Agenda 21 Local. Diplomado de
Planeamiento y Gestión Urbano – Ambiental, 18 abril 2007, Santa Clara.
Rey, G. (2010), Instrumentos innovadores para la intervención urbanística en áreas
centrales urbanas, Tesis en opción al grado de doctor, CUJAE, La Habana. Los
retos del hábitat social en Cuba.
Ruiz, E., (2000) Construcción simbólica de la ciudad. Política local y localismo.
Madrid, Consejo Editor de la Universidad Pablo Olavide Sevilla, Niño y
Dávila Editores.

366
Estrategia de planeamiento participativo para la
gestión local de desarrollo de la rehabilitación
integral del hábitat en Manicaragua y Remedios.
Hábitat 2

El perfeccionamiento de los instructivos de planeamiento para la gestión


estratégica y sustentable del desarrollo local, su impacto en los casos de
estudio de los Planes Especiales de Rehabilitación Integral del hábitat de
Manicaragua y Remedios

Dra. Arq. Gloria Esther Artze Delgado1


MSc. Arq. Lien Cruz Domínguez2
MSc. Lic. Dayana Mesa Hernández3

1 Master en Restauración del Patrimonio 1993/ ETSA Escuela Complutense de

Madrid. España Doctora en Ciencias Técnicas. 2007/CUJAE Habana Profesora Titular del
Departamento de Arquitectura Facultad de Construcciones/UCLV Experiencia en temas:
resolución de proyectos y ejecución de propuestas al planeamiento participativo en el
Centro Histórico de Santa Clara Coordinadora del programa de la Maestría en Restauración
y rehabilitación del patrimonio edificado Planeamiento y diseño participativo en procesos
de intervención urbana y en el patrimonio, su aplicación en los Planes Generales de
Ordenamiento Territorial PGOTU y Planes Especiales de Rehabilitación Integral PERI.
Diseño y aplicación de Modelos de planeamiento y diseño participativo en sectores y
barrios precarios de diferentes municipios de las tres provincias centrales SC, Cienfuegos,
SS Adecuación del planeamiento físico espacial a las nuevas tendencias de envejecimiento
poblacional. Email: gloria@uclv.edu.cu
2 Master en Restauración y rehabilitación del patrimonio edificado (2015),
Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV). Profesora Titular del Departamento
de Arquitectura Facultad de Construcciones de la UCLV. Experiencia en temas: Planeamiento
y diseño participativo en procesos de intervención urbana y en el patrimonio, su aplicación
en los Planes Especiales de rehabilitación. Aplicación de Modelos de planeamiento y diseño
participativo. Email: liencd@uclv.cu Máster en Desarrollo Comunitario por el Centro de
Estudios Comunitarios (CEC) de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV),
Cuba 2015. Profesora Asistente del CEC de la UCLV. Experiencia en temas de Equidad y
participación social, Desarrollo y planificación urbana, Estudios de género y urbanismo,
Estudios de movilidad urbana. E-mail: dmmartinez@uclv.edu.cu
3 Máster en Desarrollo Comunitario por el Centro de Estudios Comunitarios

(CEC) de la Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas (UCLV), Cuba 2015. Profesora

367
1. Desarrollo

Las tendencias actuales a nivel internacional, así como los


Programas de las Naciones Unidas para el Desarrollo (PNUD) orientan
intervenciones estratégicas con un enfoque sustentable visto a través
de la gestión local y participación social En este marco son destacables
los cambios en las políticas del país reflejados en la actualización del
“Modelo económico cubano” que se enfocan en una mirada desde adentro,
otorgando mayor iniciativa a los gobiernos locales de las mismas.
Estas entidades de la Planificación Física Cubana dotadas de
recurso humano capacitado elaboran herramientas de ordenación de
alto nivel, bien fundamentadas, que constituyen oportunos instrumentos
de gobernabilidad poco aprovechados por los decisores locales. Esta
fortaleza anulada, aún tiene una acción reducida en las aristas del amplio
problema del hábitat, pues en nuestras ciudades no existen planes
estratégicos enfocados en la rehabilitación urbana integral y sustentable
(Conde, 2011), los cuales son fundamentales para aquellas que poseen
valores relevantes del patrimonio de la nación.
El presente resultado logra propuestas concretas para el
perfeccionamiento de los instructivo metodológico que faciliten la
formulación más participativa de los Plan Especial de Rehabilitación
Integral del hábitat urbano, así como con la obtención de estrategias
sustentables de rehabilitación a partir del desarrollo local de los municipios.
Resulto fundamental la cobertura impacto y visibilidad del
proyecto internacional Hábitat 2, financiado por COSUDE. Agencia
Suiza para la Cooperación y el desarrollo que permitió un importante
polígono de experimentación práctica e introducción del resultado

Asistente del CEC de la UCLV. Experiencia en temas de Equidad y participación social,


Desarrollo y planificación urbana, Estudios de género y urbanismo, Estudios de movilidad
urbana. E-mail: dmmartinez@uclv.edu.cu

368
científico ¨Procedimiento metódico¨ en la escala municipal del territorio,
en particular Manicaragua y Remedios.
Se profundiza en el planeamiento participativo con un enfoque
transdisciplinario para la “Implementación de estrategias municipales
en la gestión del desarrollo local”, aplicando las herramientas del ¨
Procedimiento metódico¨ hasta abarcar las exigencias de Hábitat 2
al requerir el abordaje participativo del problema de la gestión más
sustentable del desarrollo local mediante el ¨Modelo de Planeamiento
participativo¨, fundamentado desde la Investigación Acción
Participación, IAP, Se concluye con la propuesta de perfeccionamiento
para los instructivo metodológico que permitan la formulación de Planes
Especiales de rehabilitación integral elevando el nivel de participativos,
lo que aseguran la mejor toma de decisiones en las estrategias de
desarrollo de los Municipios de Manicaragua y Remedios

2. Caso de estudio Manicaragua

Manicaragua constituye el escenario municipal que sirvió de


referencia para la definición y aplicación participante preliminar
del ¨Modelo de planeamiento participativo¨, posible de proponer y
aplicar, a modo de prueba piloto por los antecedentes de desarrollo de
las capacidades de participación que previamente había instalado la
Facultad de Ciencias Sociales, específicamente profesores y estudiantes
del cuarto año de la carrera de Sociología, que había logrado en el
desempeño practico, trabajar participativamente en el desarrollo de
capacidades de participación ciudadana.
Propuesto y desarrollado el ¨Modelo de planeamiento
participativo para la rehabilitación integral del hábitat en el municipio¨
(Sebastiao, 2013) se hace la primera aplicación en Manicaragua (Urtubia,

369
2013) a modo de primera validación del Modelo en la obtención de una
propuesta de solución al planeamiento participativo de la rehabilitación
en la escala territorial del municipio.
Las propuestas de planeamiento representaron una importante
contribución a modo de validación del nuevo instrumento propuesto
por el ¨Procedimiento metódico para planeamiento y diseño de la
rehabilitación integral del hábitat¨ (Artze, 2013) para ser aplicado en
Hábitat 2 tratando de tomar las más participativas decisiones que
permitieran la obtención de estrategias que más tarde hábitat pudiera
concretar en prioridad como Acciones demostrativas Locales ADL. Los
resultados constituyeron una aproximación validad de aplicación de las
nuevas herramientas definidas para la participación y favorables en tanto
en la actualidad son considerado los resultados por el Departamento
de Planificación Física Municipal de Manicaragua para la formulación
de los Planes Especiales de Rehabilitación y para la definición de las
acciones demostrativas Locales que complementan y aportan al proyecto
Hábitat 2 para la implementación de sus estrategas de desarrollo local en
el municipio. Por otro lado los Grupos vecinales creados en Manicaragua
por estas investigaciones para el desarrollo específico de capacidades
de participación en el planeamiento físico espacial y la formulación de
estrategias participativas de desarrollo en la gestión local del hábitat,
han continuado trabajando con otros equipos de investigadores, en
particular para los asentamientos de montaña

3. Caso de estudio Remedios

3.1 Antecedentes

El municipio de Remedios aplicó, por dos años consecutivos


el ¨Modelo de planeamiento participativo¨ a través de dos Tesis de
Arquitectura y una tesis de maestría de Restauración y rehabilitación

370
de patrimonio, vinculadas a la investigación del proyecto Hábitat 2,
desde el Departamento de Arquitectura y el Programa de la Maestría
Restauración y rehabilitación del patrimonio edificado, todo esto de
conjunto con la los Gobiernos locales, el departamento de Planificación
Municipal y la Oficina de Patrimonio
El impacto más significativo que tiene la aplicación del Modelo
de planeamiento participativo, en Remedios, está en la contribución
que hace al ¨Procedimiento metódico al profundizar las definiciones
en la escala territorial del municipio y el abordaje de los problemas del
hábitat en el Sistema de Asentamientos Humanos SAH, asi también en
establecer con mayor precisión los nexos y relaciones entre las diferentes
escalas del espacio físico y su desarrollo, ofreciendo la oportunidad de
estudio de un contexto patrimonial de alta significación no solo por sus
valores tangibles, sino el impacto intangible de la ciudad cabecera y su
Centro Histórico
Remedios resulta un singular ejemplo de ciudad cubana con altos
valores tangibles e intangibles, al ser la octava villa fundada por los
conquistadores españoles en el proceso de colonización, contar con el
reconocimiento internacional de sus fiestas populares “Las Parrandas”
y ademásconla declaratoriadel Centro histórico como Monumento
Nacional en diciembre de 1979. Otro elemento significativo de la
coyuntura de aplicación del Modelo de planeamiento participativo lo
constituyó el Amplio Programa de obras sociales ejecutadas en el centro
Histórico de la ciudad cabecera Remedios y demás asentamientos del
sistema del municipio, siendo los de carácter urbano: Buen Vista ;
Remate de Ariosa; Zulueta y Carrillo, estas tareas de alta significación
e impacto no pueden ser acometidas sin la formulación de una solución
al planeamiento participativo, como vía efectiva para mejorar la
gobernabilidad local: En tal dirección resultan de probada efectividad
los “Planes Especial de rehabilitación integral del hábitat urbano”, cuya
implementación progresiva y sustentable a partir de las nuevas políticas

371
económicas que ha trazado el país, ha de contribuir al mejoramiento de
la calidad de vida de los remedianos.
De acuerdo a los basamentos teóricos, conceptuales y
metodológicos, la investigación parte de datos oficiales entre los
que se relacionan los PGOTU de mayor actualidad en el Municipio,
Diagnósticos preliminares de hábitat en su etapa I, Los Resultados
del Censo de Población y Vivienda y toda la información de mayor
actualidad que se registra desde los órganos de Gobierno Local, sin
los que no asegura la requerida confiabilidad, Abarca toda una fase
de análisis y diagnóstico participativo en la escala territorial del
municipio de Remedios para concretar el planeamiento participativo de
la rehabilitación integral del hábitat urbano de Remedios. La aplicación
del Modelo de planeamiento participativo en el Municipio de Remedios
se concretó como una buena práctica y tanto el desarrollo de los Tres
talleres para Análisis, diagnóstico y planeamiento participativo, de la
rehabilitación del hábitat local, como la concreción de las propuesta de
sus Tres Estrategias Participativas en las diferentes escalas, la Municipal,
la Urbana y la de la Zona de Valor Histórico-Cultural, constituye para
Hábitat 2 una importante Acción Demostrativa Local que permite tomar
decisiones con mayor nivel de participación, así la mejor conciliación de
opiniones participantes entre actores formales e informales.
La constitución del Grupo Vecinal ¨Remedios Hábitat 2¨”
forma parte de las actuación consecuente que argumenta como valido
el ¨Modelo para planeamiento de la rehabilitación, y en Remedios
como en Manicaragua constituyó una fortaleza que trasciende el
tiempo real de actuación del proyecto hábitat y se instala como una
capacidad del municipio que trasciende y prepara a la comunidad
para la toma de decisiones.
La composición de este Grupo incluye un total de 28 miembros
con la exigida, por el método de la IAP; con representatividad en su
composición social.

372
El procesamiento que el procesamiento de los resultados de
las herramienta Encuesta diseñada específicamente para Remedios
en la indagatoria, se realizó a través del Software estadístico “SPSS
Statistics 22” haciéndose dos rondas de presentación y síntesis de los
resultados, una etapa que fue considerada preliminar y la segunda que
fue identificada como definitiva para la formulación de las propuestas
de planeamiento participativo y concreción de la estrategia de desarrollo
del hábitat en el municipio.
La etapa de análisis y diagnóstico parte de la documentación base
de planes que existen formulados para las diferentes escalas.
En el estudio del territorio la etapa es abordada en “Diagnóstico
local del hábitat en el municipio de Remedios” (Jiménez, 2015)
en el cual se obtiene un levantamiento actualizado del municipio
identificándose: potencialidades, déficits e inequidades y se plantean
las líneas estratégicas que permiten llegar a la solución del planeamiento
en la escala territorial de acuerdo a tres niveles de intervención, cuyo
contenido se relaciona a continuación

3.2 Contenido de la estrategia de planeamiento participativo

Escala territorial del municipio Remedios

NIVEL 0 de intervención: acciones emergentes en respuesta a


la situación máxima crítica identificada en las inequidades del territorio.
(Ver plano 1)
Subsistema edificado
• Acciones de consolidación estructural a piezas del patrimonio
con grado de protección I y II, concentradas en los asentamientos
urbanos, prioritariamente: Remedios, Zulueta, General Carrillo,
Buena Vista y Remate de Ariosa.

373
• Completamiento de la dotación de servicios básicos
identificados en el diagnóstico de los asentamientos urbanos:
Remate de Ariosa y General Carrillo.

Subsistema espacio público


• Mejorar constructivamente las vías que conectan la
ciudad de Remedios con los asentamientos urbanos al sur,
prioritariamente: Remedios-Zulueta, Zulueta-Remate de
Ariosa, Remate­-General Carrillo, Bartolomé-Buena Vista,
Zulueta-Buena Vista y Buena Vista-General Carillo.
• Mejorar los servicios de transporte en el municipio, priorizando
la zona sur más crítica.
• Conectar los espacios públicos relacionados con proyectos
del turismo: Mirador de Buena Vista y los Residuarios de
hojas fósiles.

Subsistema socio-cultural
• Iniciar programas de educación ambiental para la mitigación
de riesgos.
• Iniciar programas de educación en la conservación patrimonial:
- Tangible: Centro histórico de la ciudad de Remedios.
- Intangible: Fiestas populares de Remedios, Zulueta y Buena
Vista.
- Ambiental: Residuario de hojas fósiles (Zulueta y Buena
Vista), los Mogotes de Chiquitico Fabregat (especies
endémicas de la flora: el jibá, espuelas de rey y la fauna:
la perdiz y la lagartija de cola ancha), la Cueva del Calor
y el Mirador en Buena Vista y los bosques naturales con
variadas especies maderables (La Caridad y Mochocolo).

374
• Desarrollar capacidades de participación extendiendo la
experiencia de trabajo participativo de la ciudad de Remedios,
para la estructuración de políticas públicas en el SAH,
mediante la formación de “Grupos vecinales Hábitat 2”.
• Iniciar programas para el tratamiento de los grupos vulnerables
vinculados a la estrategia de desarrollo local.

Subsistema ambiental
• Gestionar el desarrollo de soluciones de proyecto para
alcantarillado y su implementación gradual, prioritariamente:
Remedios, Zulueta, General Carrillo, Buena Vista, Heriberto
Duquesne, Remate de Ariosa y Chiquitico Fabregat.
• Extender el uso de fuentes de energía renovable a partir de las
experiencias: el biogás (Heriberto Duquesne) y la eólica para
bombeo de agua (molinos de viento del poblado de General
Carrillo).

Subsistema gestión económica


• Explotar en toda su capacidad los talleres de producción de
materiales (ciudad de Remedios) y los yacimientos minerales
del municipio (dolomita, caliza, piedra y asfaltita).
• Elevar el presupuesto de inversiones para los asentamientos
urbanos: Remate de Ariosa, General Carrillo, Buena Vista y
Zulueta.
• Gestionar presupuestos especiales para la conservación de los
techos de madera en los tres asentamientos donde se realizan
fiestas populares.
• Implementar políticas públicas para estabilizar la fuerza de
trabajo agrícola en los asentamientos urbanos: Remate de
Ariosa y General Carrillo, dotándolos de servicios básicos

375
urbanos y mejores condiciones salariales y laborales en el
sector agrícola para su estimulación.
• Implementar políticas públicas para mejorar la comunicación
que aumenten los servicios de radio y telefonía fija para mitigar
la inequidad de conectividad.
• Implementar políticas públicas que beneficien a los grupos
vulnerables de la población.
• Estimular política para nuevas fuentes de empleo al margen
de la agricultura en Remate de Ariosa y General Carrillo.
• Elevar la liquidez en los asentamientos: Zulueta, Remate de
Ariosa, General Carrillo y Buena Vista.
• Gestionar financiamiento para activar nuevas zonas turísticas:
el Residuario de hojas fósiles, el Mirador de Buena Vista y las
zonas boscosas al sur.
• Gestionar políticas públicas para un mejor aprovechamiento
de las capacidades industriales y tecnológicas instaladas.

3.3 Contenido de la estrategia de planeamiento participativo

Escala urbana ciudad cabecera: Remedios

NIVEL 1 de intervención: acciones importantes que fortalecen


las potencialidades y déficits del territorio. (Ver plano 2)
Subsistema edificado
• Poner en valor las joyas de patrimonio y las zonas centrales
de los asentamientos urbanos prioritariamente: Remedios,
Zulueta y General Carrillo.
• Poner en valor la zona de playa en Jinaguayabo.
Subsistema espacio público
• Ejecutar una vía que conecte la ciudad de Remedios con la
Carretera Central y el Autopista Nacional.

376
• Poner en valor el Mirador de Buena Vista, los Residuarios de
hojas fósiles, los Mogotes de Chiquitico Fabregat y los bosques
naturales para desarrollar la modalidad de Turismo Rural.

Subsistema socio-cultural
• Monitorear y desarrollar los programas iniciados desde el
Nivel 0 de intervención.
• Incrementar las capacidades participativas alcanzadas en el
municipio.
• Divulgar los resultados de la estrategia.

Subsistema ambiental
• Ejecutar de forma gradual las soluciones de proyecto para
alcantarillado en las zonas centrales, prioritariamente:
Remedios, Zulueta, General Carrillo, Buena Vista, Heriberto
Duquesne, Remate de Ariosa y Chiquitico Fabregat.
• Monitorear y ampliar el uso de fuentes de energía renovable
a partir de las experiencias: el biogás (Heriberto Duquesne) y
la eólica para bombeo de agua (molinos de viento del poblado
de General Carrillo).

Subsistema gestión económica


Monitorear y ampliar las políticas abordadas en el Nivel 0 de
intervención respecto al desarrollo de los asentamientos urbanos
del municipio.
NIVEL 2 de intervención: acciones de completamiento articula
en un circuito las oportunidades identificadas en el territorio a modo
de recorrido turístico que responde a las líneas estratégicas del PDI y
principalmente a la No.1. (Ver plano 3)

377
Subsistemas edificados y espacio público
• Completamiento de la inversión y puesta en explotación
del “Circuito” que articula el acceso desde el Polo turístico
“Cayos de Villa Clara” al “Distrito histórico-cultural” y
desde este se distribuye al resto del territorio en el recorrido:
Jinaguayabo, “Distrito”, Heriberto Duquesne, Buena Vista
(Parrandas y Residuario), zonas boscosas al sur, General
Carrillo (Ecoturismo), Zulueta (Parrandas y Residuario)
y “Distrito” con salida a Santa Clara. El circuito puede ser
flexible y realizarse en el sentido contrario.
• Monitorear y conservar lo puesto en valor.

Subsistema socio-cultural y ambiental


• Monitorear y ajustar los programas iniciados desde el Nivel 0
de intervención y desarrollados en el Nivel 1.

Subsistema gestión económica


• Gestión del “Circuito turístico” para su máxima explotación.
• Monitorear y optimizar las políticas de acuerdo al resultado
de la explotación del “Circuito”

Una vez identificadas las prioridades estratégicas para el


planeamiento de la rehabilitación en la escala territorial de Remedios
fue posible enfocar el estudio en la escala urbana dirigido a la cuidad
cabecera de mayor relevancia en el municipio. La estrategia de
planeamiento participativo para la rehabilitación del hábitat urbano
consecuentemente con la aplicación del “Procedimiento metódico” se
fundamentó en las etapas de análisis y diagnóstico para la escala urbana
en esta ocasión.
Sobre la base de la versión preliminar de planeamiento consultada
en el Taller 2 y la implementación de programa “Aniversario 500” se

378
realizaron los ajustes pertinentes al planeamiento, el cual se somete
nuevamente al proceso de validación en el segundo momento del
Taller 3 de planeamiento participativo: “Encontrando una estrategia de
rehabilitación del hábitat local en Remedios” donde el análisis estadístico
concluyó que las desviaciones nunca exceden la unidad respecto a los
valores de la estrategia por lo que esta se considera oportuna como
una propuesta definitiva para manejar un proceso de rehabilitación
en el contexto actual de la ciudad de Remedios de acuerdo al criterio
procesado emitido por la muestra válida de participantes en el taller. Se
destaca que este resultado válido fue compatibilizado en un segundo
momento con los especialistas de la temática en la Ciudad los cuales
emitieron criterios profesionales favorables a la solución participativa de
planeamiento estratégico para la gestión local de rehabilitación integral
del hábitat en la ciudad de Remedios
La propuesta se conceptualiza a partir del desarrollo las
potencialidades del “Distrito histórico-cultural” que es además el área
de mayor concurrencia dentro del Centro histórico de la Ciudad. Sobre
esta base comienzan a extenderse las actuaciones de rehabilitación al
entorno inmediato, siguiendo la estructura de la trama que presenta la
Ciudad por anillos. Una vez consolidada el área urbana dentro de los
egidos se ponen en valor las sendas que la conecta con los asentamientos
inmediatos y por último se intervienen las vías del límite urbano y se
completan los sectores intermedios no rehabilitados.
El esquema de actuaciones es ordenado en tres niveles de
intervención de acuerdo a la metodología (Nivel 0, Nivel 1 y Nivel 2)
con actuaciones en los cinco subsistemas. El Nivel 0 realiza actuaciones
emergentes para mitigar los riesgos y permitir el futuro desarrollo de
la estrategia. El Nivel 1, de mayor extensión se estructura en seis fases
de acuerdo al concepto que maneja la intervención y en el Nivel 2 se
completa la rehabilitación al poner en valor las zonas que no fueron
intervenidas en el proceso hasta el momento.

379
Subsistema edificado (Plano 4).Acciones de evacuación de
personas, consolidación estructural, reparación y limpieza de cubiertas,
destupición de sistemas de desagüe pluvial, eliminación de plantas
parásitas y de patologías en los muros. Se desarrolla en dos fases:
• Fase 1: Inmuebles que no fueron atendidos en el programa
“Aniversario 500”
• Fase 2: Monitorear desde el Observatorio Urbano el programa
de actuaciones de mantenimiento y conservación especial de
los inmuebles puestos en valor en el programa “Aniversario
500” con grado de protección I y II.
o Etapa 1: Inmuebles en el entorno del nodo Parque “José
Martí”
o Etapa 2: Inmuebles con valores en el reto del área urbana

Subsistema espacio público (Plano 5).Acciones:


• Intervención paisajística en los accesos a la Ciudad: primero
desde Santa Clara, segundo desde Caibarién y tercero desde
el barrio precario “Cordón Corcho”. Construcción de aceras,
anulación de las barrearas arquitectónicas y corrección de
límites.
• Implementación de las regulaciones especiales para la
protección de la integridad para zonas urbanas homogéneas.

Subsistema socio-cultural (Plano 6).Acciones:


• Iniciar programas educativos respecto al conocimiento del
patrimonio, el valor de su cuidado y conservación a partir de su
puesta en valor a partir de la inercia generada por el programa
“Aniversario 500”.
• Difundir el conocimiento de las estrategias sustentables de
intervención sobre el patrimonio a través de la radio y escuelas.

380
• Iniciar programas de prevención ante el asedio al turismo.
• Iniciar programas de educación ambiental para elevar la
percepción del riesgo higiénico-sanitaria.
• Fortalecer el sistema de control del territorio, elevando el
monto de las multas por las violaciones urbanas.
• Iniciar y proponer planes de atención al barrio precario
“Cordón Corcho” y a los casos sociales dispersos en la Ciudad.

Subsistema ambiental (Plano 7).Acciones:


• Conectar al alcantarillado existente los inmuebles inmediatos
y extender al resto del Parque “José Martí” y ejecución de los
tramos declarados emergentes en la solución de alcantarillado.
• Poner en valor el sistema de drenaje pluvial original de la ciudad
de Remedios (destupición, limpieza y consolidación estructural).

Subsistema gestión económica (Plano 8).Acciones:


• Crear la “Oficina del Conservador de la Ciudad” y la “Red
de Ciudades Históricas”.
• Formular regulaciones especiales para la protección de la
integridad para zonas homogéneas (calle Antonio Maceo entre
Alejandro del Río y Gral. Carrillo y calle Andrés del Río entre
Enrique Malaret y Gonzalo de Quesada) y nodos (Parque “José
Martí”, Parque Infantil y Parque de la Raspadura).
• Ejecutar el presupuesto del “Modelo económico cubano”
basado en la explotación del Turismo Cultural. Emplear el
1% de los ingresos de las entidades productivas.
• Implementar el “Modelo de gestión” vinculado al Plan Especial
de Rehabilitación con visión prospectiva. Tesis de Maestría en
Restauración, Ing. Lilian Barrios Rojas (2015).
• Establecer contribuciones especiales a los cuentapropistas que
explotan el suelo del área central.

381
• Identificar e implementar nuevos proyectos motores,
dinamizadores.
• Formular e implementar el Plan Especial de la Rehabilitación
Integral del Hábitat para el Centro histórico de Remedios a
partir del planeamiento estratégico, Tesis de Arquitectura
Clara Menéndez Maribona (2014).
• Formular e implementar el Plan Especial de la Rehabilitación
Integral del Hábitat para la ciudad de Remedios a partir del
planeamiento estratégico, Tesis de Maestría en Restauración
Arq. Lien Cruz Domínguez (2015).
• Desarrollar y gestionar la implementación del Proyecto de
intervención integral para el nodo Parque “José Martí”. Tesis
de Maestría en Restauración Arq. Mario Mor Jardines (2015).
• Contratar a la empresa de vialidad y transporte para el
proyecto de peatonalización progresiva del nodo Parque
“José Martí”.
• Destinar un monto especial de presupuesto para
mantenimiento, prevención y conservación de los inmuebles
alrededor del nodo Parque “José Martí” a partir de la
vulnerabilidad generada por las fiestas populares.
• Gestionar económicamente la factibilidad del proyecto y
ejecución progresiva para puesta en valor y ampliación de
la red de alcantarillado y de drenaje pluvial al resto del área
urbana elaborado por el Instituto de Recursos Hidráulicos
(Empresa de Hidroeconomía).
• Gestionar respaldo económico para instalar sistemas de
tratamiento en los hospitales y pequeñas industrias de la
Ciudad.
• Captar financiamientos para la atención al barrio precario
“Cordón Corcho”.
• Establecer regulaciones urbanas especiales para actuaciones
constructivas en los inmuebles en explotación por el trabajo

382
no estatal (cuenta propia hostal) con grados de protección I y
II especialmente en el nodo Parque “José Martí”.
• Identificar y proponer entre las ADL emergentes al Proyecto
“Hábitat 2” las siguientes:
- ADL 1: Construcción de los tramos de maestros de
alcantarillado relacionados al completamiento del nodo
central.
- ADL 2: Crear un centro de capacitación para desarrollo de:
a. Capacidades de participación comunitaria local
asociado a la sede universitaria municipal.
b. Percepción del riesgo, peligro y vulnerabilidad de la
Ciudad.
c. Recuperación de los oficios perdidos de la restauración
(Escuela de Oficios).
d. Modos de atención a los sectores vulnerables de la
población.
e. Desarrollo de proyectos culturales.
- ADL 3: Construir el tramo de vía paralelo al eje del ferrocarril
que enlace la Ave. de Solidaridad con la calle Plácido.

3.4 CONTENIDO DE LA ESTRATEGIA DE PLANEAMIENTO


PARTICIPATIVO

Escala Zona Urbana de valor histórico cultura ZUVHC: Centro


Histórico Remedios

NIVEL 1 de intervención: acciones importantes


Se estructura en seis fases sucesivas delimitadas en prioridad por
los valores patrimoniales que concentran los anillos como zonas urbanas

383
homogéneas y las oportunidades que presenta la Ciudad para sustentar
la rehabilitación desde su centro hacia fuera. Estas fases son subdivididas
en sectores de intervención (nodos, sendas y mixtos) ordenados de
acuerdo su importancia en el proceso para denotar el carácter integral
de la rehabilitación en la imagen de la Ciudad durante la rehabilitación.
La intervención en la secuencia de sectores relacionada a continuación
es integral de acuerdo a los cinco subsistemas básicos del procedimiento.
• Subsistema edificado.Acciones para puesta en valor de los
inmuebles en los sectores intervenidos de acuerdo a programa
de actuación.
• Subsistema espacio público. Acciones para puesta en valor
del sistema de espacios público en los sectores intervenidos
de acuerdo a programa de actuación, eliminación de: las
barreras arquitectónicas, las redes aéreas y valorización del
espacio público con alta calidad de diseño. Monitorear desde
el Observatorio Urbano el deterioro de los sectores puestos
en valor.
• Subsistema socio-cultural.Continuar las campañas y
programas iniciados en el nivel 0.Ampliar las capacidades de
participación logradas y divulgar la estrategia y los resultados
alcanzados.
• Subsistema ambiental. Continuar la ejecución de los tramos
de alcantarillado hasta completar la solución para la totalidad
de la Ciudad de acuerdo a los sectores intervenidos en el
programa de actuación.
• Subsistema gestión económica. Ampliar la implementación
del “Modelo de gestión” vinculado al Plan Especial de
Rehabilitación con visión prospectiva. Tesis de Maestría en
Restauración, Ing. Lilian Barrios Rojas (2015).

384
4. Programa de actuaciones

Las acciones se estructuran en seis fases sucesivas desde el centro


de la Ciudad hacia afuera, a continuación se relaciona la secuencia
ordenada de sectores que compone cada fase.
• FASE 1 “Distrito histórico-cultural” (Plano 9)
• FASE 2 Primer anillo que compone la trama de la Ciudad
(Plano 10)
• FASE 3 Segundo anillo que compone la trama de la Ciudad
(Plano 11)
• FASE 4 Tercer anillo que compone la trama de la Ciudad
o Etapa 1 Zona norte del anillo (Plano 12)
o Etapa 2 Zona sur del anillo (Plano 13)
• FASE 5 Sendas que conectan la Ciudad con los territorios
inmediatos (Plano 14)
• FASE 6 Sendas periféricas y la circunvalación de la Ciudad
(Plano 15)

NIVEL 2 de intervención: acciones de completamiento (Plano 16)


Se estructura en ocho zonas urbanas intermedias, entre los
sectores intervenidos en el nivel 1 de intervención, continuas delimitadas
en prioridad por estado del hábitat priorizando las zonas precarias.
• Subsistema edificado. Acciones para puesta en valor y
mantenimiento de los inmuebles en los sectores intervenidos
de acuerdo a programa de actuación y monitorear desde el
Observatorio Urbano el deterioro de los sectores puestos
en valor.
• Subsistema espacio público. Acciones para puesta en valor del
sistema de espacios público en los sectores intervenidos de
acuerdo a programa de actuación, eliminación de: las barreras

385
arquitectónicas, las redes aéreas y valorización del espacio
público con alta calidad de diseño.
• Subsistema socio-cultural. Continuar las campañas y programas
iniciados en el nivel 0. Ampliar las capacidades de participación
logradas y divulgar la estrategia y los resultados alcanzados.
• Subsistema ambiental. Continuar la ejecución de los tramos
de alcantarillado hasta completar la solución para la totalidad
de la Ciudad de acuerdo a los sectores intervenidos en el
programa de actuación.
• Subsistema gestión económica. Monitorear la implementación
del “Modelo de gestión” vinculado al Plan Especial de
Rehabilitación con visión prospectiva durante el nivel 1 de
intervención. Tesis de Maestría en Restauración, Ing. Lilian
Barrios Rojas (2015) e implementarlo sobre la base de los
resultados de su aplicación.

4.1 Programa de actuaciones

Las zonas intervenidas son:

• Barrio “Cordón Corcho”.


• Salida a Jinaguayabo y Texico.
• Reparto “Orestes Acosta”.
• Zona de edificios multifamiliares Reparto “26 de Diciembre”.
• Zona intermedia de Carolina.
• Zona intermedia entre la circunvalación y el límite de
la Ciudad, tramo 1 desde el acceso de Santa Clara hasta la
Carretera a Zulueta.
• Zona intermedia entre la circunvalación y el límite de la
Ciudad, tramo 2 desde la Carretera a Zulueta hasta el acceso
de Caibarién.

386
Como dos salidas del planeamiento se precisan las regulaciones
con acotaciones específicas para la rehabilitación del hábitat y exigen
el estricto cumplimiento de las “Regulaciones Urbanas para la ciudad
de Remedios” contenidas su PGOU y la Cartera de proyectos con la
compilación de 25 soluciones de proyecto válidas para la intervención
en diferentes inmuebles.

5. CONCLUSIONES

1. Al aplicar consecuentemente el “Modelo de planeamiento


participativo” del “Procedimiento metódico” es determinante
el trabajo con el “Grupo Vecinal” y quedó oficialmente
constituido para la obtención de la solución participativa de
planeamiento estratégico para la gestión local de rehabilitación
integral del hábitat en la ciudad de Remedios.

2. Los resultados demuestran un mayor nivel de participación


en el trabajo de las escalas territorial del municipio y urbana
de Remedios, aplicando procedimientos y herramientas de
similar enfoque, donde el trabajo con los Grupos vecinales
resulta determinante tanto para la generación de nuevas
capacidades de participación en la comunidad, vinculando el
papel determinante de los a actores informales, como para la
identificación de prioridades en la producción social del hábitat.

3. La conceptualización del proyecto de planeamiento estratégico


para la escala territorial del municipio centra su atención en
el desarrollo integral y progresivo de un “Circuito” formado
por la mitigación de las inequidades, la acupuntura territorial
de focos de potencialidades y el fortalecimiento de sus

387
oportunidades, en la articulación con la cabecera provincial
y el Polo turístico “Cayos de Villa Clara”.

4. La conceptualización de la solución participativa de


planeamiento estratégico para la gestión local de rehabilitación
integral del hábitat en la ciudad de Remedios centra su
atención en el desarrollo integral y progresivo a partir del
“Distrito histórico-cultural” formado por la zona central de
mayor concurrencia que conecta la cabecera provincial, el Polo
turístico “Cayos de Villa Clara” y la continuidad del proceso
en el resto de la trama de anillos propia de su urbanismo.

Bibliografía

Artze, G.E. y I. Conde, (2011) Herramientas informáticas para estudios en el


planeamiento de los Planes Especiales de Rehabilitación Integral del hábitat
urbano.
Barton, J.R., (2006) “Sustentabilidad urbana como planificación estratégica”
en EURE [En línea], vol. 32, número 96, pp. 27-45. Disponible en: <http://
redalyc.uaemex.mx/pdf/196/19609603.pdf>.
Borja, J., (2011) “Claves para Interpretar la Ciudad después de la
Postmodernidad. El derecho a la ciudad en las regiones metropolitanas” en
Revista del III Seminario Internacional del IMPLAN, Urbanismo Socialmente
Responsable [En línea], pp. 2-59. Disponible en: <http://www.implan.gob.
mx/>.
Caio, L.P., (2014) Modelo de planeamiento participativo para la
rehabilitación integral del hábitat urbano. Tesis de maestría. Cuba,
Departamento de Arquitectura, Universidad Central “Marta Abreu” de Las
Villas.
CIDICT, (2015) Estilo Harvard para las referencias bibliográficas.
Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas.

388
CIDEU., (2012) Informe de actividad. Centro Iberoamericano de Desarrollo
Estratégico Urbano. Disponible en: <http://segib.org/upload/CIDEU.pdf>.
Cruz, L., (2012) Multimedia PROMERSI 2. Trabajo de diploma. Cuba,
Departamento de Arquitectura, Universidad Central “Marta Abreu” de Las
Villas.
DMPF., (2013a) Plan de Desarrollo Integral del Municipio de Remedios, PDI.
Villa Clara.
DMPF., (2013b) Plan General de Ordenamiento Territorial, PGOT.
Remedios, Villa Clara.
DMPF., (2013c) Plan General de Ordenamiento Urbano, PGOU. Remedios,
Villa Clara.
DPPF., (2001) Guía para la Elaboración de Planes Especiales del sistema
de áreas verdes. Santa Clara, Villa Clara: Departamento de Planeamiento
Municipal.
Jiménez, G., (2015) Diagnóstico local del hábitat en el municipio de
Remedios, “Hábitat 2”. Trabajo de diploma. Cuba, Departamento de
Arquitectura, Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas.
Lynch, K., (1976) ¿De qué tiempo es este lugar?, Edit. G. Dili.
Lynch, K., (2006) La imagen de la ciudad, Edit.G. Gili.
Menéndez, C., (2014) Estrategia de planeamiento participativo la
rehabilitación integral del hábitat en Centro histórico de la ciudad de
Remedios. Trabajo de diploma. Cuba, Departamento de Arquitectura,
Universidad Central “Marta Abreu” de Las Villas.

389
Propiedad y posesión de la vivienda en Cuba

Dra. Yisel Muñoz Alfonso1


Lic. Elizabeth Quiroga Morejón2

1. Presentación

La vivienda en Cuba y los derechos que sobre ella ostentan sus


titulares ha sido objeto de polémicas en el ámbito doctrinal y en la esfera
social, a partir de los diversos cuestionamientos a que se ha sometida la
legitimidad del derecho de propiedad sobre ella constituido,basados en
las múltiples limitaciones y prohibiciones que se fueron estableciendo
sobre esta.
Esta ha transitado por diversos momentos legislativos que se
inician el 6 de marzo de 1959 en que fue dictada una Ley que rebajaba
en hasta un 50 por ciento los alquileres a la población y el 14 de octubre

1 Dra. en Ciencia Jurídicas de la Universidad de la Habana (2004), Master


en derecho privado de la Universidad Politécnica de Valencia, España (2000),
profesora titular en el año 2011, con más de 18 años de experiencia en la docencia en la
Facultad de derecho, se especializa en el área del derecho civil, el derecho ambiental y
cooperativismo. E-mail: yiselm@uclv.edu.cu))
2 Lic. en Derecho por la Universidad Central “Marta Abreu” de las Villas
(2014), Años de experiencia: 1, Profesor universitario en adiestramiento, Profesora de
Derecho Notarial y Derecho Civil General. E-mail: equirogam@uclv.cu)

391
del año siguiente, se crea el Instituto Nacional de Ahorro y Vivienda,
que entre sus objetivos tenía el de construir viviendas económicas para
el pueblo y se dicta la Ley de Reforma Urbana de 14 de octubre de 1960,
que marcó un hito en el ordenamiento inmobiliario urbano y confirió el
carácter social y no de mero negocio jurídico al derecho de propiedad
sobre la vivienda, reordenando la propiedad y dándole la condición de
propietarios a quienes las ocupaban.
Continua con la primera Ley General de la Vivienda, Ley 48 de
1984, esta constituyó un nuevo paso en el camino de mejorar la situación
existente en el país, su promulgación se realizó en un contexto en el
que existía cierto grado de estabilidad económica, donde ya se había
consolidado el proceso revolucionario a partir de la institucionalización,
lo que significó un incremento en el fondo habitacional a partir de la
adaptación de locales, transformación de cuarterías, ampliaciones y
nuevas construcciones con participación importante de la población,
no obstante su resultado, a partir del proceso de rectificación de errores
a solo 4 años de su puesta en vigor se hizo necesario reconsiderar
algunas de sus formulaciones técnico-jurídicas, algunas de ellas en
lo referente a la transmisibilidad de la vivienda por compraventa y el
alcance de sus preceptos por lo que resultó derogada por la segunda Ley
General de la Vivienda, Ley 65 de 1987, que con una múltiple normativa
complementaria de carácter administrativo configuró un estatuto
jurídico particular sobre la vivienda y delimito los conceptos legales
de titularidad sobre la vivienda a dos: propiedad y arrendamiento, este
último como justo título posesorio, tal norma estuvo enmarcada en
múltiples disposiciones que restringían el derecho de propiedad fundado
ello en el contenido socioeconómico de la propiedad y le necesidad de
dar respuesta a una problemática habitacional existente en el país que
requería del ordenamiento y control estatal sobre este inmueble.
Esta Ley ha tenido en los últimos 4 años con el perfeccionamiento
del modelo económico y social del país, una progresiva trasformación

392
de sus políticas con la apertura del mercado inmobiliario con la
autorización de los actos traslativos de dominio, a lo que se agregan, las
políticas que establecieron para el otorgamiento de subsidios destinados
a la construcción o reparación de sus viviendas a las personas más
necesitadas económicamente y principalmente las afectadas por ciclones
y otros desastres; así como el otorgamiento de créditos a otras personas
para facilitar la ejecución de acciones constructivas
Las primeras transformaciones se producen al amparo del Decreto
Ley 288 y sus normas complementarias de 2011 y recientemente el
Decreto Ley 322 de 2014 que introdujo otras modificaciones sobre las
políticas constructivas y amplió aún más las facultades dispositivas de
los propietarios al permitir la trasmisión de solares yermos y azoteas.
Son cifras que ilustran sobre la amplia aplicación de estas políticas
los datos publicados recientemente:3
• Se han aprobado 63 mil subsidios aproximadamente y se han
entregado más de 1000 millones de pesos a los beneficiados.
• Se han otorgado aproximadamente unos 200 mil créditos por
un importe de 1800 millones de pesos.
• Se han vendido más de 57 mil viviendas y más de 157 mil casas
han sido donadas.
• En el 2014 se vendieron 2300 millones de pesos en ventas
de materiales de la construcción que es el 104% del plan.
Hay una cantidad de personas pendientes por la compra de
techos, áridos, barras de acero, puertas y ventanas, que son
los más deficitarios.
• El Estado está entregando 10 mil viviendas anuales como en
Santiago de Cuba, La Habana y otras provincias con precios
muy subsidiados a la población.

3 S/A, Nuevas políticas para la vivienda: elementos principales, www.


cubadebate.cu, 22 de enero de 2015, consultado 20 de septiembre de 2015

393
Es propósito del presente trabajo ilustrar sobre el régimen
de posesión y propiedad sobre la vivienda en Cuba y demostrar
la progresiva tendencia en la política estatal a la transferencia y
consolidación de la propiedad, bien de los inmuebles de propiedad
estatal que se transfieren en propiedad por medio de contratos
de compraventa como a través dela autorización de la trasmisión
de la vivienda propiedad personal entre personas naturales con
la consiguiente eliminación de limitaciones y restricciones, en
correspondencia con el principio de autonomía de la voluntad.
El artículo se estructura en tres parte la primera aborda
conceptualmente la vivienda y el derecho que sobre ella se establece
en el contexto cubano. Dando paso a la segunda parte donde se analiza
el derecho de propiedad valorando su contenido y manifestaciones
particulares en relación con la vivienda y la tercera aborda la posesión
sobre la vivienda y sus características más aguzadas

2. La vivienda breves precisiones conceptuales en el


contexto cubano

La vivienda en Cuba a partir de 1959 ha cursado por una diversidad


de status en cuanto a la titularidad que determinan el modo en que se
ejercen los derechos, sus limitaciones en diversas etapas hasta la fecha
y la progresiva tendencia hacia la consolidación de la propiedad, para lo
cual se han concebido diversos procesos denominados de transferencia
de la propiedad del Estado a los particulares, que han posibilitado
superar la condición de poseedores de múltiples titulares en diversas
variantes y títulos posesorios, configurando un estatuto inmobiliario
con peculiaridades del contexto socioeconómico y legal cubano.
La normativa de derecho civil cubano no contiene una regulación
específica sobre la vivienda en calidad de bien inmueble sino que asume

394
un carácter supletorio respecto a las regulaciones del bien inmueble y
da un tratamiento unitario a los bienes, ello determina que este sirva
de referente para reconocer dentro de la forma de propiedad personal
la que tiene por objeto la vivienda entre otros bienes en los artículos
156 y 157, apartado b), donde se establece que pueden constituir
propiedad personal la vivienda y además la casa de descanso, sin mayores
delimitaciones conceptuales.
Ello en correspondencia con el texto constitucional que
igualmente reconoce tal forma de propiedad en el artículo 21, donde
enuncia que se garantiza la propiedad personal sobre la vivienda que
se posea con justo título de dominio y los demás bienes y objetos que
sirven para la satisfacción de las necesidades materiales y culturales de
la persona, haciendo referencia a los conceptos de justo título no solo
dominico sino además posesorio, elementos sobre los que se volverá
más adelante.
Ese precepto contiene un reconocimiento a los derechos
patrimoniales sobre este bien, pero resulta anómico en cuanto al
reconocimiento del derecho a la vivienda como acontece en otros
ordenamientos jurídicos con este derecho social.
La Ley de la Vivienda, No 65 de 1988, reconoce el derecho a una
vivienda en el artículo 2 y define que se ejercerá en la forma y bajo los
requisitos que establece la Ley.
A continuación establece que será legítimo tener, además de la
de ocupación permanente, la propiedad de otra vivienda ubicada en
zona destinada al descanso o veraneo. Fuera de esa posibilidad, de la
señalada para los agricultores pequeños y cooperativistas y de los casos
de viviendas vinculadas, ninguna persona tendrá derecho a poseer más
de una vivienda.
Restringe el derecho de propiedad sobre la vivienda de ocupación
permanente solo a una vivienda principio establecido en la Ley de

395
reforma urbana de 14 de octubre de 1960, y que ha subsistido hasta
la fecha, junto a ello a se admite la propiedad sobre una vivienda de
ocupación temporal, o sea de descanso o veraneo, y la posesión de otras
en calidad de arrendatarios, en el supuesto de las viviendas vinculadas
y medios básicos.4
Esta norma responde al principio de especialidad y rige de
manera particular el régimen de los bienes inmuebles urbanos,
conformado con una amplia gama de normativa complementaria de
carácter administrativo el derecho inmobiliario cubano. Este corpus
legislativo no ha establecido regulaciones jurídicas expresas para definir
conceptualmente tal derecho, ni la vivienda o morada, empleando el
concepto de ocupación para delimitar entre uno u otro tipo de vivienda.

4 Espinosa Jiménez M. y Hernández Martínez R.: 2009, “Ley general de la


Vivienda, anotada y concordada, con las disposiciones complementariasdel Instituto Nacional de la
Vivienda, las provenientes del Consejode Gobierno del Tribunal Supremo Popular y las sentenciasde
la Sala de la Especialidad del propio máximo órgano de justicia, así como comentada con criterios
de la doctrina científica”, Ediciones ONBC, 1era Ed., La Habana, p.25: Del análisis del
artículo 1 de la Ley de Reforma Urbana, de fecha 14 de octubre de 1960,24 podemos
interpretar que se refiere al derecho a poseer una vivienda, pero creemos que es una
expresión revolucionaria del derecho que franquea la ley para la familia cubana y la
forma en que se hará efectivo ese derecho, basado esencialmente en que es considerado
un derecho imprescriptible e inalienable del ser humano; no existiendo expresión
ni prohibición en esta norma sobre la posibilidad de poseer más de una vivienda en
propiedad por una misma persona. Es de significar que esta propia Ley estableció que
aquellos inmuebles que estuvieran desocupados al momento de su promulgación serían
transferidos a las personas que señalaran los consejos de la Reforma Urbana, mediante
compraventa, excluyendo de ello a los inmuebles situados en las playas, balnearios,
lugares de veraneo, de turismo, descanso y aquellos destinados a que sus propietarios
los ocuparan como vivienda temporal La LRU proclamó el derecho de toda familia a
una vivienda decorosa (a.1) y comenzó a hacerlo efectivo con la expropiación forzosa
de determinados inmuebles (viviendas arrendadas y no ocupadas por su propietario,
viviendas ocupadas por personas no arrendatarias distintas del propietario, si este era
dueño de más de una) y la estipulación inmediata de un contrato de compraventa sobre
ellos a favor de las personas que hasta esa fecha los ocupaban.

396
Se toma como punto de partida el concepto de la ocupación como una
de los presupuestos más importantes de esta materia. Para determinar
el régimen jurídico de la vivienda de ocupación permanente y la de
ocupación temporal se parte del hecho físico probado de la residencia
permanente en un determinado inmueble donde el sujeto desarrolla
las necesidades cotidianas de la vida, que le sirve de morada de manera
permanente y estable lo que debe probar por todos los medios posibles en
derecho, concepto diferente del domicilio y la residencia, constituyendo
el primero parte del estado civil de la persona, demostrado mediante el
documento de identidad.
De otro lado, la definición de la vivienda de descanso o veraneo
depende del acto de destino de su titular pues no es obligatoria su
inscripción en oficinas administrativas a tales efectos, es el propietario
quien determina el cariz de la vivienda sin que pueda intervenir autoridad
alguna en esta determinación, ubicándose usualmente en balnearios o
playas.5La jurisprudencia cubana en esta materia se ha pronunciado
sobre el concepto de vivienda de descanso veraneo coincidiendo en
conferirle primacía a la destinación que de la misma haga el titular.6

5 El Acuerdo No. 131, de fecha 14 de abril de 1964, dictado por el Consejo


Superior de la Reforma Urbana, estableció que a los fines del cumplimiento del artículo
4 de la Ley de Reforma Urbana, de 14 de octubre de 1960, ninguna persona podrá tener
en propiedad, a fin de utilizarla para sí temporalmente o cederla en uso, más de una
cabaña, apartamento o casa en lugar de veraneo, balneario o lugar de descanso
6 Sentencia No. 1067, de fecha 15 de agosto de 2001, dictada por la Sala de
lo Civil y de lo Administrativo del Tribunal Supremo, la cual razona “... que si con
anterioridad el inmueble era considerado por todos los herederos como de veraneo o
descanso, lo cierto es que perdió tal concepto por la voluntad propia de su titular, al
consentir la ocupación permanente de su hermano antes del fallecimiento y por tanto es
a quien le correspondía el reconocimiento del derecho a la transferencia de la propiedad
de la vivienda (...)”.

397
El censo de población y vivienda realizado en Cuba en 2012,
7contiene dentro de sus metodologías determinadasdefiniciones censales

dentro de las que resulta válido analizar la que contiene de la vivienda


que califica como “El recinto estructuralmente separado e independiente
que, por la forma en que fue construido, reconstruido, transformado o
adaptado, está concebido para ser habitado por personas o, aunque no
fuese así, constituye la residencia habitual de alguien en el momento
censal. Como excepción, no se consideran viviendas los recintos que, a
pesar de estar concebidos inicialmente para habitación humana, en el
momento censal están dedicados totalmente a otros fines (por ejemplo,
los que estén siendo usados exclusivamente como locales).
Un recinto se considera separado si está rodeado por paredes,
muros, tapias, vallas..., se encuentra cubierto por techo, y permite que
una persona, o un grupo de personas, se aíslen de otras, con el fin de
preparar y consumir sus alimentos, dormir y protegerse contra las
inclemencias del tiempo y del medio ambiente.
Se considera independiente si tiene acceso directo desde la calle
o terreno público o privado, común o particular, o bien desde cualquier
escalera, pasillo, corredor..., es decir, siempre que los ocupantes de
la vivienda puedan entrar o salir de ella sin pasar por ningún recinto
ocupado por otras personas.
Esta definición asume algunos elementos de los contenidos
en la Resolución 11 de 2006, Procedimiento para otorgar licencias o
autorizaciones de construcción y certificados de habitable”, que
define los parámetros de vivienda adecuada identificando en la
Disposición vigésimo primera: acceso independiente; al menos tres
locales: habitación, baño y cocina; superficie útil mínima de 25 metros
cuadrados; y los demás requisitos establecidos en la ley.

7 “Definiciones censales básicas”, Censo de población 2012, www.onei.cu, p.22,


consultado 12 de septiembre de 2015

398
Total de unidades
Viviendas particulares

de alojamiento

colectividades
Locales de
trabajo
Ocupadas por residentes
Cuba

total desocupadas
Por
permanentes temporales
temporadas
388590 388242 373456 11367 9399 4249 2992 84

La tabla que se anexa a continuación muestra el total de viviendas


ocupadas en Cuba, por conceptos de ocupación, predominando las
ocupadas permanente que representa un 96,10 % del total de inmuebles,
con una alta tasa de ocupación, solo se ocupa por residentes temporales
y por temporadas un 0,53 % y en locales de y trabajo y otros inmuebles
pertenecientes al estado están ocupadas solo un 0,07%.8
El promedio de personas por unidades de alojamiento es de de
2,87 personas por cada una, índice menor que el del 2002, cuando esta
cifra se fijó en 3,16, momento en que el total de unidades de alojamiento
era menor: 3 millones 534 mil 327.

3. La propiedad sobre la vivienda, régimen jurídico.

La propiedad, desde el punto de vista jurídico, es un derecho


subjetivo que confiere a su titular un grupo de facultades de uso, disfrute
y disposición en relación con un bien, el propietario de la cosa ejerce
sus facultades sobre esta proyectando un deber de respeto frente a
terceros, eficacia erga omnes, los que no pueden interferir en su campo
de actuación como titular.

8
Censo Nacional de población y viviendas, 2012,TablaV.1Unidades de alojamiento,
por tipos y situación de ocupación de la vivienda, www.onei.cu, consultado 2 de
octubre de 2015

399
La propiedad viene consagrada en cada ordenamiento jurídico
desde la propia Constitución. En Cuba, si bien la Carta Magna
no define la propiedad, si deja sentada las formas de propiedad
reconocidas dentro del país: la propiedad estatal socialista de todo el
pueblo, la de los agricultores pequeños, la propiedad cooperativa, la
propiedad personal, la propiedad de las organizaciones políticas y de
masas y sociales y la propiedad de las empresas mixtas, sociedades y
asociaciones económicas.
Estas formas de propiedad son reguladas también por el Código
Civil cubano de 1987, pero este si hace un intento por conceptualizar
la propiedad cuando en su artículo 129 establece que “La propiedad
confiere a su titular la posesión, uso, disfrute y disposición de los bienes,
conforme a su destino socioeconómico”, sin embargo, más que establecer
un concepto lo que hace el Código es regular el contenido del derecho
de propiedad. La posesión, uso, disfrute y disposición son facultades
o poderes atribuidos al titular del bien para que pueda satisfacer sus
necesidades económicas o espirituales.
Más adelante el propio artículo establece que estos poderes sobre
el bien deben ser ejercidos conforme con el destino socioeconómico
que estos tengan, llegando aquí a un nuevo concepto típico del derecho
moderno y sobre todo del derecho socialista, donde la propiedad va más
allá de la persona del propietario y de la satisfacción de sus intereses
individuales, para llegar a satisfacer los intereses de la sociedad en
su conjunto. La función social a la que están sometido los bienes ha
fundamentado la política que se ha seguido en el país en relación con
la vivienda. Desde los inicios de la Revolución, y como producto de la
deplorable situación de la vivienda que existía en el país antes de 1959,
donde solo la minoría tenía una vivienda habitable como morada, se
adoptó como uno de los principales objetivos del gobierno revolucionario
garantizar una vivienda decorosa a los cubanos.

400
La importancia que ha concedido el Estado cubano a la vivienda
se ha visto reflejada en gran variedad de normas legales. La Ley de
Reforma Urbana de 1960, daba los primeros pasos hacia la resolución
del problema habitacional en el país, proclamando el derecho que
tenía toda familia a una vivienda decorosa y eliminando la figura del
casateniente. La Ley dispuso la expropiación de aquellas viviendas que
se encontraban arrendadas por su propietario sin que este las ocupara,
con el arrendatario ocupante de la vivienda expropiada se pactaba un
contrato de compraventa mediante el cual adquiría la propiedad de
la vivienda. La Ley de Reforma Urbana le entregó la propiedad de la
vivienda en manos de quien la necesitaba y no de quien la utilizaba como
medio de enriquecimiento y explotación ajena.
Posterior a la Ley de Reforma Urbana entra en vigor la primera
Ley en materia de viviendas, Ley General de la Vivienda de 1984, la que
a su vez fue derogada por la actual Ley 65, “Ley General de la Vivienda”,
que entró en vigor el 1988 y ha sido modificada en varias ocasiones. De
acuerdo con el cuerpo de esta Ley, la mayoría de las viviendas en Cuba
se encuentran insertadas en dos formas de propiedad fundamentales la
propiedad estatal socialista de todo el pueblo y la propiedad personal.
La Ley 65, en el artículo 37 reconoce la propiedad del Estado sobre
las viviendas que este construya, queden disponibles por no existir
personas con derecho a ocuparlas y las que adquiera de sus propietarios
por sucesión inter vivos o mortis causa, sin perjuicio de aquellas que
pueda adquirir por otras causas. La importancia de este artículo radica
en la posibilidad de la transferencia de la propiedad de las viviendas
estatales a las personas naturales seleccionadas para ocuparlas como
residencia permanente. Las vías para la adquisición de esta propiedad
se encuentran en la misma ley, una de ellas es por medio del contrato
de compraventa a plazos donde el comprador se constituye deudor del
Estado, hasta tanto termine de pagar el precio legal de la vivienda en

401
las mensualidades fijadas para ello. También prevé la Ley el contrato
de arrendamiento con opción de compra, donde la persona natural será
considerada arrendatario y pagará las mensualidades por la ocupación
de la vivienda. Una vez dicha persona haya pagado la suma ascendiente
al precio legal de la vivienda, tendrá el derecho de adquirir la propiedad
de la misma.
Otra vía que ha buscado el estado para la transferencia de la
propiedad de la viviendas es a través del régimen de viviendas vinculadas
o medios básicos, estas viviendas son asignadas por el Estado a
entidades estatales, civiles o militares, a cooperativas agropecuarias, a
organizaciones políticas, sociales o de masas, con el objetivo de asegurar
su fuerza de trabajo, según dispone el artículo 61 de la Ley 65. Estas
empresas conciertan un contrato de arrendamiento de la vivienda con
sus trabajadores que en el caso de las viviendas vinculadas tendrán
el derecho de adquirir su propiedad al término del contrato si han
cumplido los demás requisitos exigidos para ello.
En el 2014 se implementa la Resolución No. V-002/2014
“Reglamento de Viviendas Vinculadas y Medios Básicos”, dicha
resolución deroga el anterior reglamento e introduce varias
modificaciones, incluyendo una flexibilización en los requisitos exigidos
para obtener la propiedad de la vivienda vinculada. En un primer
momento era necesario que el trabajador se encontrara laborando en
la entidad por 20 años para poder adquirir la propiedad de la vivienda
vinculada que ocupaba, además de haber cumplido el pago de todas las
mensualidades en concepto de arrendamiento, con el nuevo Reglamento
se reduce el término de vinculación laboral y ocupación de la vivienda a
15 años, manteniéndose el resto de las exigencias.
La otra forma de propiedad donde se inserta la vivienda es la
propiedad personal, el régimen jurídico de la vivienda de propiedad
personal, se encuentra regulado en la propia Ley 65. En algún momento, la

402
propiedad de los particulares sobre la vivienda a la luz del ordenamiento
jurídico cubano, ha sido fuertemente criticada. Como se había referido
con anterioridad la propiedad sobre un bien supone para su titular las
facultades de uso, disfrute y disposición, poderes que incluye el Código
Civil cubano en su artículo 129. Sin embargo en materia de viviendas
hasta hace poco la facultad de disposición de la vivienda se encontró
limitada en más de un sentido. Los principales negocios jurídicos por los
cuales los propietarios pueden disponer de su vivienda son los contratos
de compraventa, donación y permuta, antes del 2011, las tres formas de
disposición se encontraban fuertemente restringidas por la Ley General
del Vivienda.
La compraventa entre particulares, se encontraba regulada en el
texto original de la Ley 65 aunque sujeta a la autorización del Estado,
lo que resultaba afín con lo establecido en el Código Civil sobre la
función social de los bienes; sin embargo con posteriores modificaciones
a la Ley se desconoció totalmente el contrato entre los particulares
previendo solo la compraventa a favor del Estado, la decisión estuvo
basada en el principio de que la vivienda no debe constituirse un medio
de explotación entre los hombres y de enriquecimiento de unos a costa
de las necesidades de otro, sobre ello afirma VEGA VEGA, JUAN “… la
vivienda como objeto de propiedad personal no se destina a servir de
mercancía, no se destina a ser instrumento de lucro o enriquecimiento
de nadie, sino que se propone satisfacer una de las necesidades más
profundas del hombre, la necesidad habitacional. La vivienda en el
socialismo no es para vivir de ella sino para vivir en ella...’’. Sin embargo
esta medida constituyó un retroceso en materia inmobiliaria pues la
compraventa de los particulares era otra de las posibles soluciones
al problema habitacional de país. Bajo esta regulación los actos de
compraventas de viviendas entre particulares se constituían ilegales
y por lo tanto sujeto a la pérdida de la vivienda y del dinero obtenido

403
con la venta, cuestión establecida en la Disposición Especial Séptima
de esta Ley.
También la permuta y donación, aunque no tan drásticamente,
estaban sujetas a limitaciones. En el primer caso la permuta debía
ser autorizada por el Director Municipal de la Vivienda y en cuanto
a la donación de viviendas se encontraban restringidas las personas a
favor de las cuales se podía hacer el traspaso del bien, contemplando
solo a familiares hasta el cuarto grado de consanguinidad, cónyuges y
convivientes en el inmueble.
A partir del 2011 se implementaron nuevas modificaciones que han
ido de la mano con el perfeccionamiento del modelo económico del país
por lo que se ha consolidado cada vez más la propiedad sobre la vivienda.
Con el Decreto Ley 288 Modificativo de la Ley No. 65, de 23 de diciembre
de 1988, “Ley General de la Vivienda”, se contribuye a la solución del
problema habitacional en el país flexibilizándose los actos de trasmisión
de la vivienda sobre todo con la autorización de la compraventa de
viviendas entre particulares, la posibilidad de permutar sin requerirse
ninguna autorización para ello, así como la posibilidad de establecer el
contrato de donación con cualquier persona sin determinación de grado
de parentesco o alguna otra restricción. Todas estas modificaciones
han seguido la tendencia a la consolidación del derecho de propiedad,
minimizando las restricciones a las facultades del propietario.

4. La posesión sobre la vivienda, breve caracterización

La posesión es un concepto, que a partir de la posición que asume


el Código civil, Ley 59 de 1987, se encuentra permeado de una tendencia
objetiva que demanda la presencia de una causa legitima y por ende el
título posesorio justificado para considerar a un sujeto como poseedor
de un bien, así el artículo 196 de esta norma establece que se considera

404
poseedor de un bien a quien tiene el poder de hecho sobre un bien
fundado en causa legitima, por lo que se excluye el concepto posesorio
de tenedor del bien, que deba desproveído de la legitimación para
reclamar el bien, ni obtener tutela de suderecho, pues el que esté bajo
esta condición queda desestimado.
A este tenor la posesión posee dos elementos: poder dehecho, que
constituye el elemento material que implica la aprehensiónfísica del bien,
es el corpus possesionis, que no resulta suficiente sin la causa legitima
que constituye el elemento normativo de la posesión, en concordancia
con la posición seguida por este código aprovecha los títulos adquisitivos
que legitiman al poseedor en el uso y disfrute del bien, de tal suerte
que el usufructuario, el superficiario, el arrendatario, el comodatario, el
depositario, o el acreedor pignoraticio son poseedores.
La vivienda en Cuba se encuentra sujeta a un régimen posesorio
peculiar que parte de la relación contractual establecida por medio
del contrato de arrendamiento, donde el Estado posee la condición de
arrendador y por ende titular del inmueble y las personas naturales
la de arrendatarios del mismo, este título posesorio está regulado
en los artículos 49 y siguientes de la LGV, y establece los casos por
lo que se puede acceder a esta variante de ocupación del inmueble
estatal, así se definen: a) Las viviendas destinadas al ejercicio
de una actividad profesional o asignadas a órganos, organismos,
organizaciones, sociedades, asociaciones o cualquier otra entidad para
el desenvolvimiento de su actividad. b) las viviendas que construya
el Estado o queden disponibles a su favor en zonas declaradas de
alta significación para el turismo; c) los locales de propiedad estatal
no asignados a entidades; y d) las viviendas que por otras causas se
considere conveniente o necesario no asignarlas en propiedad.
Ello entraña un régimen general de arrendamiento, este es un
tipo de contrato por el cual una parte se obliga a proporcionar a otra

405
el goce de una cosa mueble o inmueble, de conformidad con el destino
económico de la cosa y con el interés de un precio, su naturaleza es
la de ser un contrato oneroso, consensual, bilateral, sinalagmático,
conmutativo y de tracto sucesivo.
Es el contrato de arrendamiento, un contrato traslativo no del
dominio, que sigue en poder del dueño de la cosa, sino del uso o goce de
la misma, que pasa, en virtud de contrato, a poder del arrendatario, que
adquiere de esta forma la posesión inmediata de la cosa, manteniendo el
arrendador la posesión mediata. La causa del contrato de arrendamiento,
para el arrendatario, es precisamente obtener la posesión inmediata,
el goce directo y útil de la cosa. Para el arrendador, el percibir la
contraprestación pactada y en nuestro medio, dada la función social de
la vivienda, además, podemos adicionar la satisfacción de la necesidad
básica de habitación del hombre y protección de la familia.9
Cuando el arrendatario accede a una vivienda, a través de este
tipo de relación contractual con el Estado, persigue como finalidad su
ocupación con el abono del precio correspondiente, con lo que establece
con la toma de posesión del bien un poder de hecho, poseyendo un título
que lo legitima ante el titular principal actuando en nombre propio
y ajena por cuenta del dueño, y adquiere un conjunto de facultades
similares a las que le confiere esta norma al propietario de la vivienda
personal, tales como la determinación libre de e convivientes, el derecho
a permutar, la cesión de derechos, entre otros, si bien posee limitaciones
en la facultad dispositiva lo que resulta de su carencia de la condición de
dueño, que debe autorizar tales actos dispositivos para los que carece
de autonomía.
El contrato de arrendamiento regulado en el artículo 389 del
Código Civil, es un contrato temporal e implica la cesión del uso y

9 Espinosa Jiménez M. y Hernández Martínez R.: 2009,obcit, pág.58

406
disfrute del bien por un determinado tiempo, sin embargo en el caso de
esta clase de compraventa no se produce la fijación del plazo elemento
esencial e este contrato tratándose de una vivienda el elemento real del
contrato, que se establece por el estado con la finalidad de dotar a una
familia de una viviend, garantizándole seguridad jurídica y estabilidad
en la misma, dando solución a una problemática social como lo es la
necesidad de solventar la problemática del déficit habitacional en el
país, tal modalidad del contrato de arrendamiento aunque no constituye
la trasmisión completa del derecho de propiedad si implica un amplio
marco de atribuciones, lo que determine la consideración de que esta
modalidad arrendaticia quepa concebirla como una derecho obligacional
con trascendencia real, poseyendo incluso la protección registral.
Existen otras modalidades de arrendamiento que parten del
proceso de transferencia de la propiedad concebido para los titulares de
viviendas en concepto de ocupantes legítimos y usufructuarios onerosos,
conceptos legales, que parten de la Ley de Reforma urbana supramentada
y continuaron en la Ley 48 de 1984, primera ley de la vivienda. La Ley
65 de 1988, concedió el derecho a su adquisición en propiedad, toda
vez que tales inmuebles eran propiedad del Estado, y en estos residían
estos sujetos, este proceso se denominó de transferencia de la propiedad
sobre inmuebles, para el mismo se estableció un plazo de caducidad,
transcurrido el cual si las personas titulares no hacían efectivo el derecho
pasaban al concepto de arrendatarios, de esta manera quedaron bajo el
auspicio de esta regulación solo dos conceptos de titularidad sobre la
vivienda: propietarios y arrendatarios. Las disposiciones transitorias
decimoprimera y décimo segunda para los usufructuarios onerosos y
ocupantes legítimosrespectivamente, definieron el tratamiento a dar a
estos sujetos.
Con ello pasaron al régimen del arrendamiento quienes no
procuraron la trasferencia de la propiedad.

407
En el año 2003, con el Decreto-Ley No.233, de fecha 2 de Julio
del 2003, modificativo de la citada Ley No 65/88, Ley General de la
Viviendase introduce la modificación de la Ley General de la Vivienda
que autoriza nuevamente el proceso de transferencia de la propiedad
a quienesestuvieran en la situación antes descrita, así la disposición
transitoria primera dispone “que las personas que estén ocupando
viviendas en concepto de usufructuarios onerosos u ocupantes legítimos
al momento de promulgarse el presente Decreto-Ley podrán, en cualquier
momento, solicitar ante las direcciones municipales de la Vivienda que
les sea transferida su propiedad, para lo que será requisito indispensable
encontrarse al día en el pago de dicho inmueble.
Igualmente podrán optar por la propiedad todas las personas
o sus herederos que fueron declarados arrendatarios de las viviendas
que ocupan por acudir a las direcciones municipales de la Vivienda
con posterioridad al mes de febrero del año mil novecientos noventa
y uno. En este precepto se evidencia la clara voluntad política de
garantizar el tránsito a la propiedad de la vivienda y la tendencia a la
consolidación del derecho de propiedad. La Resolución 14 de 2006 del
Instituto Nacional de la Vivienda, reglamentó el procedimiento para
hacer efectivo este derecho.
Otra modalidad de arrendamiento es el que se produce entre
personas naturales regulado en el artículo 74 de la Ley General de la
Vivienda, modificado por el Decreto Ley 322 de 2014, este establece
que: “Los propietarios de viviendas podrán arrendar, al amparo de lo
establecido en la legislación civil común, su vivienda, habitaciones con
servicio sanitario propio o sin él, y espacios incluidos en la descripción de
esta, siempre que esté en correspondencia con las regulaciones urbanas
y territoriales vigentes, mediante precio libremente concertado, y previa
autorización de la Dirección Municipal de Trabajo correspondiente.

408
2.- No podrán arrendarse viviendas, habitaciones y espacios a:
a) Representantes de organizaciones, firmas, entidades o países
extranjeros acreditados en el territorio nacional; y b) personas
jurídicas.
Queda prohibido el subarrendamiento y la cesión de uso de
viviendas, habitaciones o espacios.
El arrendamiento de viviendas y habitaciones tiene como fin el
hospedaje, y pueden ser arrendados a personas para la realización de
actividades por cuenta propia, conforme la legislación vigente.”
Este precepto contentiva de esta modalidad del contrato de
arrendamiento para quien conforme a la legislación especial tenga la
condición de trabajador por cuenta propia y en consecuencia labore en
la actividad de arrendatario de habitaciones y espacios, tal modalidad
contractual se establece con fines de hospedaje, este es un contrato
de servicios regulado en el CC en los artículos 438 y siguientes, lo
que implica la temporalidad de la ocupación, el mero uso del bien en
un período breve, recibiendo el usuario la prestación de un servicio
de alojamiento en condiciones apropiada de comodidad, higiene y
seguridad, teniendo este derecho solo el uso de las habitaciones sin
otras atribuciones ni facultades derivados del contrato, lo que no se
corresponde con el contrato enunciado en la LGV, que debería estar
concebido de acuerdo con los fines de la Ley para resolver una necesidad
habitacional, amparado en un negocio jurídico, como justa facultad
dispositiva del titular, por ello consideramos que se desnaturaliza este
contrato y su falta de concordancia con los fines de la ley y el objeto
del contrato que se pretende. En virtud de este se constituyen los
hostales y hospederías que proliferan en el entorno citadino con los
cambios del modelo económico que han incentivado esta modalidad de
emprendimiento individual a lo que se agrega su destinación también
a otras actividades económicas y no precisamente la de habitar el bien.

409
No obstante debe hacerse la salvedad que en determinados
casos también se produce el mero contrato de arrendamiento en las
condiciones previstas en el código civil solo que circunscrito a las
atribuciones previstas en la norma donde uno posee la condición de
propietaria y el otro de arrendatario, en concordancia con la regulación
que de este contrato hace el código civil,

5. Conclusiones

Los derechos patrimoniales sobre la vivienda en Cuba se centran


en dos variantes esenciales la propiedad estatal y personal y la posesión
por medio de los contratos de arrendamiento, derechos que revisten
características especiales tomando en cuenta el objeto sobre el que se
constituyen que es la vivienda y su contenido que resulta su utilización
con fines de morada y persigue por ende una finalidad habitacional
permanente o temporal de la vivienda.
Existe una tendencia marcada en diversas etapas a partir de
1987 de propiciar la transferencia de la propiedad de la vivienda del
Estado a los particulares por medio de figuras contractuales que
han permitido la consolidación de la propiedad superando el estado
posesorio, asimismo se evidencia la voluntad estatal de incentivar y
autorizar el trafico inmobiliario con los cambios del modelo económico
y social cubano que ha permitido la autorización de negocios jurídicos
sobre la vivienda dando acceso con ello a quienes la necesitan, lo que
resulta positivo al determinar el cese de prohibiciones y restricciones
que lastraban el derecho de propiedad y los arrendamientos en los que
se ejercía la posesión.

410
Bibliografía

Derecho Civil Español, Derechos Reales, Tomo III, vol. I, 7ª ed.,


albaladejo, m.:
Ed. Bosch, Barcelona, 1991.
______: Derecho Civil Español T. II, Derecho de Obligaciones, 10ª ed., Ed. Bosch,
Barcelona, 1997
asua gonzález, c. i.: Manual de Derecho Civil. Derecho de Obligaciones.
Responsabilidad Civil, teoría General del contrato, Ed. Marcial Pons, Madrid, 1996
bonet ramon, f.: Compendio de Derecho Civil, 1ª ed., Ed. Revista de Derecho
Privado, Madrid, 1959
borrell soler, a. m.: El dominio según el Código civil español,1ª, Ed. Bosch,
Barcelona, 1948
canton blanco, l.: Conferencias de propiedad y otros derechos reales, (s.e.), La
Habana, 1982;
______: Protección al derecho de propiedad y otros derechos reales, Ed. ENPES,
Departamento de textos y materiales didácticos de la Universidad de la
Habana, Ciudad de la Habana, 1983
“ El nuevo Código Civil, recuentos y reflexiones”, Revista
clavijo aguilera, f.:
Cubana de Derecho, octubre-diciembre, 1991, No4,, Unión Nacional de
Juristas de Cuba
clemente de diego, f.: Curso elemental de Derecho Común y Foral, tomo III, Ed.
Revista de Derecho Privado, Madrid, 1923
clemente diaz, t.: Derecho Civil, Parte general, tomo II, parte primera, Ed. Pueblo
y Educación, La Habana, 1982
Censo Nacional de población y viviendas, 2012
,TablaV.1Unidadesdealojamiento, por tipos y situación de ocupación de la
vivienda, www.onei.cu, consultado 2 de octubre de 2015
davalos fernÁndez, r.: La Nueva Ley General de la Vivienda, Ed. Ciencias Sociales,
La Habana, 1990
diez- picazo, l. y gullon ballesteros, a.: Sistema de Derecho Civil, Vol. I, 8ª ed, Ed.
TECNOS, Madrid, 1994

411
______:Sistema de Derecho Civil, Vol II, 3ª ed., Ed TECNOS, Madrid, 1982
______: Sistema de Derecho Civil, Vol. III, 5ª ed., Ed. TECNOS, Madrid, 1990
diez-picazo, l.: Estudios sobre jurisprudencia civil, Ed. Marcial Pons, Vol. I,
Madrid, 1981
Espinosa Jiménez M. y Hernández Martínez R.: 2009, “Ley general de la Vivienda,
anotada y concordada, con las disposiciones complementarias del Instituto Nacional de
la Vivienda, las provenientes del Consejo de Gobierno del Tribunal Supremo Popular y las
sentencias de la Sala de la Especialidad del propio máximo órgano de justicia,
así como comentada con criterios de la doctrina científica”, Ediciones ONBC, 1era Ed.,
La Habana
Hernandez gil, a.: Las relaciones de vecindad en el Código civil, 1ª ed, Ed. Real
Academia de legislación y jurisprudencia, Madrid, 1988
______ y alvarez cienfuegos: “La propiedad en el ordenamiento
constitucional”, edición electrónica, Cuadernos de Derecho judicial, No
C-946, España, 1994
______: Obras Completas, tomo 4, Derechos reales, Derecho de Sucesiones, 1ª ed.,
Ed. Real Academia de legislación y jurisprudencia, Madrid, 1989,
S/A, Nuevas políticas para la vivienda: elementos principales, www.
cubadebate.cu, 22 de enero de 2015, consultado 20 de septiembre de 2015

412
PROPRIEDADE E POSSE: NO LIMITE DA FUNÇÃO

Daniele Regina Pontes1


Gabriel Schulman2
Stefania Poeta Pontes 3

1. Brasil: nos marcos da propriedade

No Brasil, o direito moderno de propriedade foi oficialmente


declarado na Constituição do Império, em 18244. Previa o texto da

1 Doutora em Direito pela UFPR. Professora do Programa de Pós-graduação/


Mestrado em Planejamento Urbano perla UFPR. Coordenadora dos Cursos de Pós-
graduação em Direito à Cidade e Gestão Urbana e Direitos Humanos e Desenvolvimento
da Universidade Positivo/Ambiens Sociedade Cooperativa. Professora de Direito da
Universidade Positivo. Sócia cooperada da Ambiens Sociedade Cooperativa.
2 Doutorando em Direito pela UERJ. Coordenador do Programa de Pós-
graduação em Direito Imobiliário da Universidade Positivo. Professor de Direito da
Universidade Positivo. Advogado.
3 Mestranda em Sociologia pela UFPR. Professora do Curso de Especialização
em Direito à Cidade e Gestão Urbana da Universidade Positivo/Ambiens Sociedade
Cooperativa. Sociacooperada da Ambiens Sociedade Cooperativa.
4 “Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos
Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é
garantida pela Constituição do Imperio [...]”. BRASIL, Constituição do Império.

413
legislação, a consagração das mudanças ocorridas na Europa e o seu
respectivo apelo ao aprisionamento da terra no lugar do sistema
escravocrata que já dava sinais de seu esgotamento institucional, mesmo
sob os protestos de parte considerável da elite, que se valia da mão de
obra escrava para garantir seu status econômico, político e simbólico na
estrutura do Estado existente e, ainda, naquele que se formava.
Na conturbada “ordem” de posses, tradicionais ou garantidas
pela força ou pela ausência de interesses de cunho econômico relevante,
a propriedade, sem a necessidade de estar conjugada à posse direta
ou à posse viva, apareceu como mais uma forma de violência, mas,
com características diferentes, pois, especialmente institucional
e burocratizada, não deixava tão explícita a aquisição pela via da
usurpação e da produção de títulos não coincidentes com os próprios
bens, com suas características ou com os seus reais possuidores.
Sustentou o modelo proprietário, a segurança e a legalidade
forjada no papel produzido no aparato privado com reconhecimento
estatal. Os registros públicos, dotados de fé pública, conferiam ao
titular do direito, toda a gama de poderes absolutos sobre o bem terra,
conjugando a disposição e o uso ou o não uso no direito subjetivo desse
mesmo titular.
Com isso, a terra foi aprisionada e as fronteiras de suas respectivas
parcelas permitiram que o seu “senhor” ali impusesse o seu interesse com
quase nenhum ou nenhum controle externo. A terra que se apresentava
como medida de possibilidade de vida passava a servir apenas àquele
que pudesse demonstrar a titularidade, pouco importando a origem do
respectivo título. Na pretensão universal e individualizante de reduzir
a terra à propriedade, a dimensão transindividual e coletiva dos bens da
natureza foi abolida.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.


htm>. Acessado em: 12/02/2016.

414
Sem dúvida, reproduziu-se na titulação a apropriação que já se
configurava na força. E, nessa lógica, foram produzidos títulos que em
nada coincidiam com a realidade da posse e, se a desigualdade na prática
já estava posta, agora ela se materializava no acesso rigorosamente
seletivo da política e da burocracia.
Assim, foi usada a terra tantas vezes como moeda de troca, como
prêmio e como privilégio. O Estado, a Igreja e a oligarquia agrária
fundaram um sistema em que a dúvida recaía sempre sobre o estado
possessório, tido como precário e incerto5 e em que a propriedade se
apresentava como dado certo, inconteste e digno de legitimidade.
Pois bem, dada a propriedade com ou sem posse, as várias espécies
de divisões e de fronteiras foram estabelecidas. O parcelamento era
medida importante na construção do valor econômico dos bens e de
sua exploração. Nesse sentido, algumas divisões motivadas por vários
fenômenos ocorreram e, dentre elas a fragmentação entre campo e cidade
e, depois, entre rural e urbano. Assim, dividida, porém concentrada, a
propriedade se instalou como sistema de aquisição, de divisão, de troca.
Ganhou complexidade e possibilidade de fazer render e valorizar, pelo
Estado e pelas mãos de terceiros-possuidores, cada porção, hectare e
metro quadrado para o proprietário.
Não tardou a aparecer no Brasil, especialmente no século XX,
significativos questionamentos sobre os rumos assumidos por essa
forma de apropriação. Evidentemente, a influência de novos tempos
no velho continente fazia eco nos debates internos e, consideradas as
perspectivas desenvolvimentistas anunciadas a partir da década de 1930,
a industrialização e a urbanização acabaram por reforçar a perspectiva
relacionada à necessidade de se estabelecer algum controle sobre as
formas de apropriação.

5 Nesse sentido, o Código Civil de 1916 tornava evidentes as dúvidas sobre a


posse e a certeza sobre a propriedade.

415
Exemplos desse movimento podem ser vistos nas legislações que
previram o congelamento dos aluguéis, o tombamento de bens históricos
e o início dos movimentos de defesa de bens ambientais. Sem dúvida, o
campo já apresentava intensas manifestações sobre as injustiças causadas
com pequenos agricultores e colonos e com as populações tradicionais,
porém, mesmo diante de legislação de reforma agrária, em 1964, uma
pretensa construção sobre função social da propriedade vai se tornar
mais estruturada apenas após a Constituição de 1988 que, em seu texto,
com a democratização, previu uma propriedade geradora de direitos e de
deveres e estabeleceu, claramente, a propriedade funcionalizada.
Mas o que significaria uma propriedade funcionalizada quando
considerado o histórico do tratamento definido para esse instituto? Mais
do que isso, estava a propriedade configurada como direito fundamental
em meios a outros direitos, tal como a vida e a liberdade?
Assim, dada a manutenção do direito proprietário, que permaneceu
mitificando a propriedade e questionando a posse direta, mesmo diante
de todas as evidências da legitimidade de seu aproveitamento, de que
modo a função apareceu como garantidora de uma perspectiva um tanto
mais transindividual do que a do modelo adotado? Ao que parece, dada
a manutenção da propriedade nos termos em que ficou estabelecida no
texto constitucional, pouco mudança ocorreu na prática.
A propriedade é, em si, o limite não só da funcionalização, mas
de qualquer meio de garantir justiça social. Se sobre o uso ainda é
possível questionar a função, sobre a acumulação, tal questionamento
na legislação pouco aparece.
Se a figura do latifúndio por extensão encontra lugar no Estatuto
da Terra, a figura do vazio urbano surgirá só muito mais recentemente
e o seu tratamento ainda dá mostras da sua debilidade, tal como ocorre
no campo, com a concentração de imóveis rurais e a naturalização de
usos convencionais voltados à produção de commodities.

416
2. A função e o bem público

No âmbito privado e no público, a propriedade foi preenchida


com as novas construções sociais e de produção. E mesmo a propriedade
pública ganhou defesas típicas de propriedade privada6.
Os espaços públicos ganham novos sentidos, especialmente
nas cidades. Ruas, praças, praias, bens ambientais, bens históricos,
são adaptados aos interesses proprietários. Todos esses bens não
desaparecem do elenco de bens públicos porque são funcionais ao
sentido de território e cidade que se busca constituir, o que significa dizer
que a funcionalização, ainda que comumente defendida como avanço
no sentido transindividual da propriedade, pode servir ao seu avesso,
promovendo certa servidão do espaço público aos condicionamentos
dos interesses proprietários privados.
A rua, por exemplo, que podia se apresentar como território
do encontro, da contemplação, da observação, do movimento, da
expressão passa a ser compreendida como o local da passagem, da
circulação e, descrevendo essa perspectiva, Lefebvre, afirma que a rua
deixou de possuir valor de uso e passou a ter apenas valor de troca, e
as consequências dessa mudança de estrutura foram “a extinção da
vida, a redução da ‘cidade’ a dormitório, a aberrante funcionalização da
existência”7. Não se ocupa a rua, passa-se pela rua.
A funcionalização é, portanto, preenchida com determinado
conteúdo e mesmo o espaço público pode ser compreendido como o lugar
da troca meramente econômica ou que permite tal troca, seja pela via do
trabalho, seja mediante a compra, venda ou permuta de mercadorias, de

6 As ações de despejo de população pobre de áreas públicas é exemplo dessa


compreensão sobre a titularidade do bem público.
7 LEFEBVRE, Henry. A Revolução Urbana. São Paulo: Centauro, 2001a. p. 27.

417
qualquer modo, a troca que aqui se pretende é sempre, em última instância,
o reflexo da condicionante econômica. A terra e a vida são separadas.
Assim, as cidades seguem um modelo comum em que se parcelam,
dividem, demarcam e separam as áreas para que elas tenham uma única
função que é constituída como “função da própria função”. A divisão
entre áreas demonstra isso, ainda que a justificativa geral busque inserir
o controle sobre a geração de incomodidades como justificativa para
a definição de fronteiras de uso do espaço, a incomodidade coincide
com tudo aquilo que não contribui para o espaço da propriedade
moderna, voltada ao sentido da troca ou do uso instrumental para
a troca econômica. Nesse sentido, considerando ainda as ruas, estas
se transformam em lugares de passagem rápida que ligam pontos,
condicionando cada vez mais, por exemplo, o uso dos veículos em
oposição e confronto com o espaço de pedestres. Nesse contexto,
mesmo as calçadas ou passeios cedem espaço para o asfalto. A área
verde é mantida verde se agregar valor econômico, caso não, pode ser
sumariamente suprimida em prol da indústria, da mineração ou de
qualquer outra exploração.
Nessa lógica são produzidos os planos que definem objetivamente
os critérios de aproveitamento de bens, de modo que se possa calcular
ou reconhecer a funcionalização dos espaços. Esses planos8 criam zonas
especializadas na cidade, separam as funções produtivas e reprodutivas
determinando as atividades que serão realizadas em cada uma, num
ideal de organização da vida com características racionais e funcionais
que limitam e enclausuram as ações individuais e coletivas no espaço e
no tempo de ocupação de cada área, além de segregar espacialmente as
classes e os diferentes grupos.

8 De acordo com a Constituição de 1988 e com o Estatuto da Cidade, cabe aos


planos a definição referente ao conteúdo da funcionalização dos bens.

418
Assim, o espaço público só é público na medida em que atende
aos interesses da valorização e utilização das áreas privadas que se
configuram como propriedades acumuladas e que, por tal forma de
apropriação, definem o destino da tal funcionalização.
De qualquer modo, tal situação não está absolutamente clara e,
especialmente no “espaço” do Direito, a ideia de privatização é tão aguda
que a defesa da funcionalização parece ser, ainda, um caminho melhor
do que o da garantia do absoluto interesse dos grandes proprietários que
submetem à área pública aos seus interesses privados, mantendo-a como
pública, de modo a garantir as “externalidades” do seu uso privativo no
escoamento do “uso” do bem estatal.

3. As expressões da funcionalização no discurso jurídico

O Código de 1916 deixava evidente a feição patrimonialista e


privatista adotada no ordenamento jurídico brasileiro. Desconstruir
aquela ordem de coisas não era tarefa fácil e o discurso da função
social da propriedade rompia com discursos e perspectivas de feição
absolutista da propriedade por seu titular.
Nesse sentido, não foram ou não são poucos os autores que veem
no discurso sobre o conteúdo da propriedade funcionalizada ou na
defesa de limitações sobre os usos respectivos dos bens, uma forma
de controlar o apetite voraz dos proprietários, especialmente daqueles
que sequer fazem uso indireto dos imóveis, pela via da posse paralela,
com a cessão do uso ou do aproveitamento de bens por terceiros,
caracterizados pela onerosidade ou mesmo pela disposição gratuita
do bem aos possuidores diretos.
Na explicação de José Afonso da Silva, esse sentido da
funcionalização fica bastante evidenciado:

419
Enfim, a função social manifesta-se na própria configuração estrutural
do direito de propriedade, pondo-se concretamente como elemento
qualificante na predeterminação dos modos de aquisição, gozo e
utilização dos bens. Por isso que se conclui que o direito de propriedade
não pode mais ser tido como um direito individual. A inserção do
princípio da função social, sem impedir a existência da instituição,
modifica a sua natureza.9

Tal mudança na natureza do instituto encontraria respaldo na


ideia presente no âmbito externo, público que todas as propriedades
apresentam ou que todos os bens apresentam. Haveria, portanto,
o reconhecimento de um conteúdo transindividual intrínseco a
constituição da propriedade e essa leitura seria verificável no próprio
texto constitucional, nas várias referências ao cumprimento da função
social e ambiental dos bens, o que extrapolaria a leitura meramente
econômica da propriedade.
De qualquer modo, essa questão estaria restrita à definição relativa
ao uso ou aproveitamento do bem e não a sua titularidade.
Mas, além da qualificação do instituto da propriedade, outra
questão é enfrentada, a que versa sobre o conteúdo das várias espécies
de propriedades. De acordo com Silva

A Constituição, aliás, consagra a tese – que se desenvolveu especialmente


na doutrina italiana – segundo a qual a propriedade não constitui uma
única, mas várias instituições diferenciadas, em correlação com os
diversos tipos de bens e de titularidades, de onde ser cabível falar não
em “propriedade”, mas em “propriedades”.10

9 SILVA, José Afonso. Direito Urbanístico brasileiro. 4 ed. São Paulo: Malheiros,
2006. p. 76-77.
10 SILVA, José Afonso. Direito Urbanístico brasileiro. 4. ed. São Paulo: Malheiros,
2006. p. 74.

420
Todas essas questões emergem como mudanças estruturais do
instituto jurídico da propriedade. Assim, é possível dizer que, de fato
é estabelecida uma nova leitura, a questão consiste em saber em que
medida essa leitura altera a apreciação prática do direito de modo a
estabelecer novo estado de coisas.
Essa situação reflete demandas da sociedade que tendem a
pressionar os modelos vigentes estabelecidos no direito e, quando não
é possível simplesmente fazer desaparecer um determinado instituto,
restauram seu vigor a partir de um novo conteúdo ou de novos conteúdos.
Mas, é necessário dizer, que há um conteúdo principal que dá sentido
ao teor da mudança e esse pode ser explicitado pelo reconhecimento da
expressão “social” no cumprimento da função. A propriedade é, portanto,
um conceito relacional, que não pode se apresentar como impeditivo
de manutenção da vida ou como elemento segregador de sociabilidade.
Como afirma Jacques Alfonsin, a propriedade perde a sua
característica de direito-poder, para se reconfigurar como um dever que
deve estar pautado na efetivação dos direitos humanos, sociais e coletivos.

Parece lícito sustentar-se, então, que o direito, enquanto estrutura


decorrente de uma norma, como o é o da propriedade sobre o bem
terra, não cumpre a sua função social, se não reconhece reciprocidade
– quanto maior o poder e a liberdade que ele autoriza, tanto maior
a responsabilidade devida aos outros, particularmente aos direitos
humanos fundamentais que esses outros titulam.11

Assim, o proprietário é, pelo menos em tese, chamado a participar


dos resultados referentes às conseqüências da sua ação ou omissão e
existe legítima possibilidade de controle, o que ainda não se confunde
com efetivo controle, tendo em vista as condições objetivas de se fazer

11 ALFONSIN, 2003, p. 173

421
valer o sentido ou os sentidos do cumprimento das funções sociais da
propriedade. Em relação a isso, pode se verificar seguidamente com que
profunda ironia os poderes do Estado tratam a efetivação dessa norma
constitucional. Nesse sentido, segue Alfonsin

A complexidade inerente à resposta satisfatória do problema é de tal


ordem que, não raro, ela é descartada por saídas artificiais do tipo que a
prorrogue para sempre, como ocorre, por exemplo, com toda a opinião
doutrinária e jurisprudencial que somente reconhece a função social da
propriedade se ela for aceita como “programática”.12

Assim, oscilam os discursos, entre reconhecer a função social


como medida urgente de possibilidade de coexistência, de afirmá-la
como intenção, de questioná-la como limite ou mesmo de negá-la ante
o direito individual e absoluto.

4. A entrega da posse direta onerosa como justificativa


de funcionalização

No âmbito das reflexões acerca da função social da propriedade


é lugar comum a exposição da perspectiva interna e externa,13 as quais
respectivamente preconizam a função como imanente à propriedade ou
como um aspecto exterior, estranho, o qual em último sentido cercearia
o exercício do proprietário.
A função social tomada como limite externo alinha-se a uma
mentalidade que defende a propriedade como um direito, se não absoluto,
ao menos superior. Para tanto, procura construir e difundir uma episteme

12 ALFONSIN, 2003, p. 173


13 TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. v. I. 2. ed. rev. atual. São Paulo:
Renovar, 2001. p. 269.

422
que traça uma verdadeira linha imaginária14 entre o público e privado e
procura esquecer que a posse antecedeu a propriedade como forma de
apropriação dos bens.15
Essa leitura permite suporte a uma quantidade enorme de
institutos que separam propriedade e posse direta, desde que o bem
seja utilizado, inclusive criando estatutos novos para o mesmo bem
e dissociando os seus vários usos entre vários possuidores, mas não,
necessariamente, entre vários proprietários. Esses novos institutos
encontram guarida na superseparação que permite o desdobramento
possessório no mesmo bem. O instituto da locação e seus vários possíveis
desdobramentos contemporâneos, aos direitos reais sobre coisas alheias,
passando pelo direito de superfície, pelas formas de propriedade
resolúvel, pelas garantias com bens imóveis, tudo convém ao discurso
relativo ao uso dos bens e, portanto, de cumprimento de função social
da propriedade, mesmo quando o acesso a esses institutos é bastante
restrito a determinados possuidores.
Tome-se como exemplo a defesa do “aproveitamento racional do
solo”. Logicamente não há como se concebê-lo, sem simultaneamente
admitir-se a utilização, inclusive econômica, o que não significa que
se deve tomá-la como um poder ilimitado, absoluto, desvinculado de
quaisquer limites. É que o sentido estático de propriedade, tomado
apenas em seu sentido estrutural (como direito subjetivo), não é apto a
inteira compreensão do instituto, que inserido em concreto, é colocado
em movimento, assume caráter dinâmico, passando a ser avaliado em

14 Figura a dicotomia público/privado como linha imaginária a delimitar a


cartografia epistemológica – mas também jurídica, econômica, social – como se fosse
possível com traços retos delimitar os contornos do real.
15
FACHIN, Luiz Edson. A função social da posse e a propriedade contemporânea.
Uma perspectiva da usucapião imobiliária rural. Porto Alegre: Sergio Fabris, 1988. p. 13.

423
seu emprego concreto, no qual deverá encontrar sua legitimidade, ou
o repúdio.
O grande giro está em exigir que a propriedade não esteja suspensa
no ar, mas tal como os outros direitos, tenha seu exercício tutelado, na
medida de seu “merecimento de tutela”. Nas palavras de Perlingieri,
a “função se apresenta como causa de legitimação ou de justificação
das intervenções legislativas, que devem sempre ser submetidas a um
controle de conformidade com a Constituição”.16
Na legislação brasileira foram erigidos diversos instrumentos
para fomentar o mercado imobiliário. Verifica-se no Brasil o incremento
do mercado de títulos imobiliários e operações interessantes como sale
leaseback, built to suit, CRI.17
Em comum, tais mecanismos revelam a criatividade negocial, a
utilização econômica dos bens imóveis, bem como a “possibilidade de
harmonização” de interesses proprietários e não proprietários. Nesse
sentido, se constrói a ideia de que é superada a “visão estreita” que
considera a função social como inimiga do lucro, quando o que está
em questão não é nem um tipo de negação às atividades econômicas.
A chave reside na atenção ao arredor, porque o proprietário não está
isolado. Nessa toada, é preciso focar os efeitos colaterais do mau

16 PERLINGIERI, Pietro. O Direito Civil na Legalidade Constitucional. (Trad.


Maria Cristina de Cicco). Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 945.
17 No sale leaseback promove-se venda atrelada a contrato de locação, em que
o vendedor assumirá o papel de locatário, e o adquirente de comprador. O built to suit
constitui modalidade de locação não residencial de imóvel sob medida, isto é, no qual o
locador oferece imóvel segundo as características especificadas pelo locatário (compra,
constrói, reforma, ajusta). Os certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI) constituem
título de renda fixa vinculado a créditos imobiliários (tais como contraprestações de
compra de imóveis ou pagamento de aluguel) emitido por sociedades securitizadoras e
negociados no mercado.

424
uso de recursos escassos, dos prejuízos ao ambiente, da proteção da
sociodiversidade cultural.
Para ilustrar a composição de interesses sociais e econômicos,
tomem-se como exemplos a outorga onerosa e a transferência do direito
de construir. Trata-se de instrumentos que acenam para a “proteção da
organização do espaço urbano”, com flexibilidade apta à dinâmica da
atividade imobiliária.
Na outorga onerosa, também chamada de solo criado, autoriza-
se a construir para além do coeficiente de aproveitamento básico,
com contrapartida em área ou financeira, com finalidade vinculada
às hipóteses do art. 26, inc. I a X do Estatuto das Cidades, tais como
implantação de equipamentos urbanos e comunitários, a criação de
espaços públicos de lazer e áreas verdes.
No segundo instituto, a transferência do direito de construir,
permite-se ao proprietário que sofre alguma restrição – por exemplo,
em virtude de preservação ambiental, paisagística, histórica, cultural,
implementação de equipamentos urbanos ou regularização fundiária –
receber potencial construtivo que pode ser utilizado em outro espaço
determinado pela Administração Pública e até mesmo negociado para
o mesmo fim.
Fácil concluir que os mecanismos dos quais se tratou brevemente
forçam a imagem de uma propriedade funcionalizada que dá conta
de interesses transindividuais quando, em verdade, apenas projetam
em outro discurso elementos que são razoáveis do ponto de vista dos
próprios proprietários. É uma funcionalização que valoriza os usos
de interesse particular com ares de garantia de interesse público ou
transindividual. O que significa dizer que a funcionalização mascara,
pelo reforço “positivo” ao simbólico aproveitamento do imóvel, o mesmo
proprietário moderno que fazia valer os seus interesses.

425
5. Considerações Finais

A apropriação dos bens pelo homem é um dado que perpassa


toda história da humanidade, mas a forma dessa apropriação dos bens é
particular, considerados o tempo e o espaço dados em um determinado
modo de produção e de acordo com Paolo Grossi, para o direito, de
acordo com uma determinada mentalidade18. A história da apropriação
de bens na Modernidade e a regulação pelo Direito é a do primado do
indivíduo que se torna fonte e finalidade de todo o direito, mas não de
qualquer indivíduo.
A propriedade sofre uma mudança em seu conteúdo com o
entendimento que ela é necessariamente complexa, que comporta
mais de um estatuto e que a sua leitura deve ser contextualizada e,
portanto, relativizada.19
Mas, ainda que essa pluripropriedade pretenda uma mudança
pela via da funcionalização, não se pode afirmar que se trata exatamente
de um avanço dentro da estrutura a que está exposta a apropriação
de bens. Pode ser ela também, o véu que cobre a manutenção de um
superindividualismo e universalismo sem base isonômica de sustentação
e, como permanece, de acumulação, pois a terra continua sendo
acumulada pelos mesmos grupos que a aprisionaram pela via da força,
depois do registro e agora, talvez, com o auxílio da funcionalização, pela

18 Para o autor, a leitura do direito sobre o instituto da propriedade revela


para além da determinação econômica uma leitura sobre a valoração desse instituto.
Nesse sentido, Grossi explica o significado de mentalidade da seguinte forma “(...) a
mentalidade é aquele complexo de valores circulantes em uma área espacial e temporal
capaz, pela sua vitalidade, de superar a diáspora de fatos episódios espalhados e de
constituir o tecido conectivo escondido e constante daquela área (...)”, cf. GROSSI,
Paolo. História da propriedade e outros ensaios. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
19 TEPEDINO, Gustavo. Contornos constitucionais da propriedade privada.
In: Temas de Direito Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. (p. 269-277).

426
via da sua instrumentalização, pelos instrumentos que “permitem” o seu
“melhor” aproveitamento público, coletivo, transindividual e até, difuso.
A funcionalização é discurso que pode servir a dois senhores,
àqueles que podem figurar na categoria restrita de grandes proprietários
e àqueles que podem acessar os mesmos bens na qualidade de
“qualificados” possuidores.

REFERÊNCIAS

ALFONSIN, Jacques Távora. O acesso à terra como conteúdo de direitos humanos à


alimentação e à moradia. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2003.
FACHIN, Luiz Edson. Teoria Crítica do Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar,
2000.
_____. A função social da posse e a propriedade contemporânea. Uma perspectiva da
usucapião imobiliária rural. Porto Alegre: Sergio Fabris, 1988.
GROSSI, Paolo. A formação do jurista e a exigência de um hodierno
“repensamento” epistemológico. In: Revista da Faculdade de Direito da
Universidade Federal do Paraná, v. 40. Curitiba: SER/UFPR, 2004, p. 5-25.
LEFEBVRE, Henry. A Revolução Urbana. São Paulo: Centauro, 2001a.
PERLINGIERI, Pietro. O Direito Civil na Legalidade Constitucional. (Trad. Maria
Cristina de Cicco). Rio de Janeiro: Renovar, 2008.
SILVA, José Afonso. Direito urbanístico brasileiro. 4 ed. São Paulo: Malheiros,
2006.
TEPEDINO, Gustavo. Contornos constitucionais da propriedade privada. In:
_____. Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

427
Este livro foi composto em Californian FB e Corbel e
impresso em papel Pólen Soft 70g/m2.
Capa em papel Cartão Supremo 250g/m2.
Tiragem: 300 exemplares.
429

Potrebbero piacerti anche