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Desvendando a crise política no Brasil.

Como chegamos até aqui e


até onde podemos ir? O passado e o futuro da crise: elementos políticos,
econômicos, jurídicos e sociais

Introdução – Antecedentes da Crise: Como o Brasil chegou ao


segundo Impeachment em menos de 20 anos?

A conjuntura política brasileira atual não é de fácil compreensão. Aliás, já


se disse, em frase que é atribuída ao poeta e compositor Antonio Carlos Jobim,
que o Brasil não é para principiantes. Não tem sido. Apreender em sua
integralidade a cena política atual exige um olhar fluído. Exige que
reaprendamos a olhar sob o risco de não capturarmos todos os detalhes da
fotografia e pior, sob o risco de tomarmos a foto, pelo filme. Isso em razão do
fato elementar de que os fatos continuam a desdobrar-se, e, em uma
velocidade vertiginosa.
Objetivo do artigo:
Conteúdo do artigo
Hipótese do artigo:
Conclusões do artigo:

Há inúmeras variáveis em jogo e é difícil apontar qual delas é a mais


relevante: investigações da operação lava jato deflagradas pela polícia federal
que tem posto a descoberto a sistemática de financiamento eleitoral irregular
adotado pelos partidos políticos; crise econômica internacional; queda preço
das commodities e do petróleo; decisões equivocadas que teriam sido tomadas
pelos governistas; polarização da política partidária; acirramento das disputas
eleitorais; conflagração de um “terceiro turno eleitoral”. Estes alguns dos
fenômenos causantes da atual crise política, econômica, institucional e social
em que se vê mergulhado o Brasil na quadra atual. É difícil afirmar qual deles é
o mais relevante. Evidentemente a soma ou a interpolação de todos estes
elementos tem implicação na conjuntura atual. Mas há dois fatores políticos em
especial, quais sejam: a polarização política, e o financiamento de campanhas
eleitorais.
Financiamento Eleitoral

O financiamento de campanhas eleitorais é um assunto central para o


desenvolvimento das democracias, não por acaso o financiamento estatal tem
ganhado relevância nas novas democracias emergentes (BIEZEN, 2003). O
dinheiro é importante porque possibilita a organização partidária e campanhas
eleitorais responsáveis por fazer chegar aos cidadãos informações sobre
partidos e candidatos concorrentes às instâncias decisórias presentes na
democracia (JACOBSON, 1978, BIEZEN, 2003). Em um dos mais recentes e
completos trabalhos sobre o custo das eleições no Brasil, Bruno W. Speck
demonstra que as doações têm origem e destinos concentrados: “a política é
financiada por poucos atores, e as empresas são responsáveis por mais da
metade do volume dos recursos, provenientes de um grupo muito restrito de
doadores” (2012, p. 75). Além disso o pesquisador sustenta que campanhas
majoritárias custam menos que proporcionais na União e nos Estados; que em
termos de receita para Deputados Estatuais e Federais “eleitos receberam
várias vezes o valor médio dos demais concorrentes” (p. 67); e que 18 mil
empresas doam recursos no Brasil, sendo que mais de 50% das doações
situam-se na faixa de R$ 1 mil a R$ 100 mil, 2 mil empresas doam mais do que
R$ 100 mil, e apenas 64 empresas doaram mais do que R$ 10 milhões. Entre
as razões para o crescimento dos custos da campanhas Speck (2010)
compartilha a visão de que há uma crescente profissionalização das
campanhas, incluindo modernas técnicas de pesquisa e marketing, mas
também, a necessária mobilização dos simpatizantes, que tem se tornado parte
dos serviços contratados.
O dilema do financiamento tem sido o calcanhar de aquiles das
democracias. No caso brasileiro se alguém acredita que a operação Lava Jato
é a responsável pela crise, então, indiretamente está referindo-se ao
financiamento eleitoral. Já que tal investigação tem no seu núcleo recursos da
Petrobrás e de Empreiteiras privadas que dirigiam parcelas dos recursos de
contratos para financiamento de candidatos e partidos. Como contrapartida,
tais empresas seriam beneficiárias de vultosos contratos com a Petrobrás1. Um
processo que pode remontar ao início da refundação democrática depois do
impeachment de Collor em 19922.
De outro lado, para entender a crise atual, é possível afirmar que todas
as variáveis citadas acima, tem em causa a polarização, ainda que
indiretamente. Isto porque com exceção da polarização, que atinge níveis
inéditos, todas as outras variáveis já estiveram presentes em momentos
anteriores sem que tivessem deflagrado crises tais como a atual3. Por esta
razão este trabalho se furtará a desenvolver as implicações do financiamento
eleitoral, principalmente diante do problema do caixa 2, que vem sido colocado
a descoberto pela Operação Lava Jato e que traz o elemento da
imponderabilidade, diante da absoluta impossibilidade de conhecer os
montantes financeiros envolvidos.

A polarização política

A polarização estende seus efeitos para todas as searas. A resposta ao


pedido de impeachment, por exemplo, torna-se refém também desta
polarização que como uma onda colhe a todos. Porque todos são partícipes do

1
Em um cenário normal, empreiteiras concorreriam entre si, em licitações, para conseguir os contratos
da Petrobras, e a estatal contrataria a empresa que aceitasse fazer a obra pelo menor preço. Neste caso, as
empreiteiras se cartelizaram em um “clube” para substituir uma concorrência real por uma concorrência
aparente. Os preços oferecidos à Petrobras eram calculados e ajustados em reuniões secretas nas quais se
definia quem ganharia o contrato e qual seria o preço, inflado em benefício privado e em prejuízo dos
cofres da estatal. O cartel tinha até um regulamento, que simulava regras de um campeonato de futebol,
para definir como as obras seriam distribuídas. Para disfarçar o crime, o registro escrito da distribuição de
obras era feito, por vezes, como se fosse a distribuição de prêmios de um bingo. Informações disponíveis
no sítio do MPF na internet: http://lavajato.mpf.mp.br/. Acesso em 08 de abril de 2016.
2
Pedro Baruscp, ex-gerente-executivo de Engenharia da Petrobrás firmou acordo para devolver aos
cofres públicos 97 milhões de dólares, desviados, segundo o próprio delator, a partir de 1997, ainda no
primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, período em que o pagamento de propina teria
começado. À força-tarefa Barusco declarou que ao longo do tempo o esquema teria se aperfeiçoado, e nos
últimos anos corresponderia a entre 1% e 2% do valor total dos contratos. Disponível em:
http://www.cartacapital.com.br/revista/858/o-fiel-delator-2710.html. Acesso em 08 de abril de 2016.
3
No exato momento em que se escreve este texto a declaração de algumas lideranças políticas pode
fornecer uma ideia da gravidade da crise. Segundo notícia veiculada no Jornal o Estadão online do dia 04
de abril de 2016, o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) afirmou no plenário do Senado que o Vice-
Presidente Michel Temer disse a ele que não gostaria de assumir o governo na atual conjuntura política e
econômica “com o impeachment ou sem o impeachment”. “Michel Temer me ligou a uma semana
dizendo ‘Raupp. Eu não quero ser presidente da republica em uma situação dessas’. Repito, ele disse
‘Raupp, eu não quero ser presidente numa situação dessas porque, com o impeachment ou sem o
impeachment, isso não vai acabar bem”’. Disponível em
http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,senador-do-pmdb-propoe-eleicoes-gerais-em-
outubro,10000024778. Acesso em 04 de abril de 2016.
processo democrático: Juristas, Jornalistas, Cientistas Políticos, Médicos,
Engenheiros, Pedreiros, Motoristas de Caminhão, são todos cidadãos. É
improvável que na conjuntura atual alguém consiga dar uma resposta a
legalidade do impeachment completamente isenta. Esta é uma das questões
que divide a todos, inclusive a juristas. Tomem-se os juristas mais gabaritados,
os ministros do STF, por exemplo: Os ministros Celso de Melo4, e Dias Toffoli5
tem reiterado que a hipótese do impeachment está prevista na Constituição,
por isso não seria golpe. Já o ministro Marco Aurélio6, entrando no mérito da
questão, tem defendido a tese de que embora o procedimento esteja previsto
na Constituição, não haveria no caso atual elementos concretos que
autorizassem o impeachment. Por isso, na opinião do renomado jurista, “sem
fato jurídico o impeachment transparece como golpe”. Para a Associação de
Juízes para a Democracia7 também não haveria elementos que autorizassem a
abertura do processo de impeachment, pois o fato de haver previsão na lei
para tal, não significa que qualquer motivo possa ser alegado para deflagrá-lo.
Já para a OAB – Ordem dos Advogados do Brasil8 o impeachment não
somente é considerado como medida jurídica cabível como a entidade
apresentou sua própria versão do pedido de impedimento protocolado na
Câmara de Deputados.
Contudo, a questão é, mais uma vez, demasiado complexa, pois, para
além dos elementos jurídicos há que se atentar para os possíveis
desdobramentos políticos do impeachment, para a perturbação à estabilidade
política que eventualmente poderia trazer. Os efeitos de um impeachment mal
fundado, sob duvidosa fundamentação jurídica, podem ser nefastos para o
país.

4
Disponível em http://g1.globo.com/politica/noticia/2016/03/em-video-celso-de-mello-diz-que-
impeachment-e-instrumento-legitimo.html. Acesso em 04 de abril de 2016.
5
O ministro Dias Toffoli manifestou sua posição para a imprensa como foi largamente divulgado.
Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/03/1753547-ministro-dias-toffoli-afirma-que-
processo-de-impeachment-nao-e-golpe.shtml. Acesso em 04 de abril de 2016.
6
Disponível em http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,ministro-do-stf-indica-que-sem-fato-juridico-
impeachment-transparece-como-golpe,10000023871. Acesso em 04 de abril de 2016.
7
A entidade divulgou nota ainda em 2015. Disponível
http://ajd.org.br/documentos_ver.php?idConteudo=193. Acesso em 05 de abril de 2016.
8
A OAB além de se manifestar de forma favorável protocolou pedido de impeachment contra a
presidente da república no dia 28 de março de 2016, conforme divulgado no sitio eletrônico da própria
entidade: http://www.oab.org.br/noticia/29423/oab-protocola-pedido-de-impeachment-da-presidente-da-
republica. Acesso em 28 de março de 2016. Ironicamente o presidente da Câmara não inclui o pedido no
pedido de impeachment em andamento por entender que a medida seria protelatória do pedido já em
análise na casa.
Veja-se o exemplo de Honduras ou do Paraguai, onde o impedimento de
Fernando Lugo deu-se no prazo recorde de 24 horas. Este caso foi
considerado ilegal inclusive pelas cortes internacionais gerando crise
diplomática com países do MERCOSUL que não reconheceram o novo
governo.
É possível fazer uma comparação na seara do direito penal para que se
entenda a questão. O fato de existir a previsão do crime de furto na legislação
de um país não significa que um processo para apuração de um furto possa ser
aberto sem que existam provas ou fortes evidências de que o indivíduo tenha
praticado o crime. Assim, o fato de existir a previsão do impeachment na
Constituição, não significa que este processo possa ser aberto sem que
existam fundamentos jurídicos concretos para tal. A opinião dos juristas é
absolutamente dividida a respeito da existência destes fundamentos no que se
refere às assim chamadas “pedaladas” fiscais que ensejaram a abertura do
pedido de impeachment.
Os efeitos da crise política há muito tem transbordado o congresso e os
círculos mais fechados do poder. A crise ganhou as ruas. É possível afirmar
que há dois grupos em franco embate político hoje no Brasil: contra e pró-
governo. Uma divisão clara da sociedade. Sem dúvida, a polarização do
processo eleitoral levou a isso. Mas é preciso que se diga que essa polarização
não é uma coisa que descobrimos ontem.

Afinal o que engendrou a crise?

Vários estudos (LIMONGI & CORTEZ, 2010, MENEGUELLO, 2010,


AMARAL; BRAGA & RIBEIRO9, 2012, FREITAS, 2015) têm demonstrado que a
polarização política entre PT e PSDB é antiga. Sua presença pode ser notada
desde o primeiro embate entre PT e PSDB ainda nas eleições de 1994, quando
FHC sagrou-se vencedor. Para Amaral, Braga e Ribeiro

9
AMARAL, Oswaldo; BRAGA, Maria do Socorro Souza; RIBEIRO, Pedro floriano. El sistema de
partidos en brasil: estabilidad e institucionalización. Trabajo presentadi en el VI Congreso
latinoamericano de Ciencia Política (ALACIP). Quito, 12 a 14 de junio de 2012. In: CD do 6º
Congresso Latino-Americano de Ciência Política. Quito: Alacip-Flacso, 2012.
A partir de estas elecciones generales de 1994, la dinámica del
sistema pasaría a estar polarizada alrededor de dos grandes
bloques políticos: uno de centro-derecha, liderado por el PSDB,
y teniendo como socio principal al PFL/DEM, y otro liderado por
el PT, y poseyendo como aliados principales al PSB, PDT y PC
do B. Dichos bloques estuvieron en lados opuestos en las
elecciones de 1998 (reelección de Cardoso), 2002 (elección de
Lula), 2006 (reelección de Lula) y 2010 (elección de Dilma
Rousseff), liderando también a las bancadas de gobierno y
oposición en el Congreso Nacional durante todo el período –
con las otras fuerzas políticas relevantes, como PMDB, PTB y
PPB/PP (ex PDS), casi siempre adhiriendo a los gobiernos,
tanto del PT como del PSDB. Esta polarización poco a poco se
fue extendiendo a otros niveles y disputas, transformándose en
una característica fundamental del actual período democrático.
(p. 8)

De lá pra cá os dois partidos voltaram a medir forças em 1998, 2002,


2006, 2010 e finalmente em 2014. Nestas eleições, ambos os partidos
continuaram a controlar a maioria dos votos. Obtiveram 84,8% em 1998, 69,6%
em 2002, 90,2% em 2006, e 79,5% em 2010. (FREITAS, 2015, p. 35). Além
disso, esta polarização não se restringe à arena nacional. Seus efeitos também
podem ser sentidos em contextos subnacionais, nos municípios e nas eleições
dos Estados.
A polarização da disputa presidencial foi transplantada aos
estados. PT e PSDB também são os mais fortes contendores
nas eleições para governador. Recebem mais votos e
controlam mais governos do que os demais. Quando não estão
presentes, são representados por seus aliados históricos, PSB
e DEM respectivamente, ou por uma aliança circunstancial com
o PMDB (LIMONGI & CORTEZ, 2010, p. 36 apud FREITAS, p.
41).

Então, qual a relação da polarização com a crise política? Na eleição


presidencial de 2014 tivemos o resultado eleitoral mais apertado dos últimos
tempos. O gráfico abaixo permite concluir que em toda a história democrática
pós constituinte de 1988 somente em duas ocasiões a diferença de votos entre
o vencedor e o derrotado foi tão estreita: em 1989 e em 2014. Nos demais
pleitos o vencedor sempre gozou de uma certa margem de votos em relação
ao candidato opositor. As maiores margens foram aquelas conquistadas por
Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em 1994 e por Lula (PT) na sua primeira
eleição em 2002. Respectivamente com diferenças de 27,24% e 22,54%.
Sendo que Lula amealhou o maior contingente de votos em 2002, gozando de
uma maioria e um apoio do eleitorado mais folgado.
Tabela 1 - Resultados Eleições Presidenciais Brasil pós Constituição
Federal de 1988

PSDB * PT

61,27 60,82
56,05
53,03 * 54,28 53,06 51,64
46,97 48,36
43,95
38,73 39,17

31,71
27,04

1989 1994 1998 2002 2006 2010 2014

Fonte: Elaborado pelo autor com base em dados do TSE.


* A única eleição em que a polarização eleitoral não se deu com o PSDB foi a eleição de 1989
quando o PT disputou o segundo turno com o PRN de Collor.
Em 1989 o candidato Fernando Collor de Melo (PRN) elegeu-se com
uma diferença de apenas 6% dos votos válidos, amealhando 53,03% contra
46,97 de seu rival Lula (PT). Desta forma o governo que iniciaria em 1990
enfrentaria uma massa de 42,9 milhões de eleitores (somando votos contrários
e abstenções) que não votaram em Collor. Ele se elegera contabilizando o voto
de 35 milhões de eleitores. Pode-se dizer que governaria sem o voto da
maioria da população.
Em 2014 novamente o resultado eleitoral revelaria uma pequena
margem de votos separando a candidata vitoriosa do candidato derrotado nas
urnas. O percentual de diferença da candidata Dilma Rousseff sobre o seu
adversário desta vez seria ainda menor do que em 1989, com uma vantagem
que se resumiu a 3,28% dos votos apurados. Além disso, a campanha eleitoral
foi uma das mais encarniçadas de que se teve notícia. Foi lugar comum nos
noticiários de cunho político durante o período de campanha eleitoral o
assombro com o “baixo nível” do debate político. Foi no debate eleitoral que
surgiram as primeiras denuncias sobre a Petrobras, críticas ao Aeroporto que
teria sido construído em terras particulares da família de Aécio Neves na
cidade de Claudio (MG), o penteado de Marina Silva10, e a constatação de que
o aparelho excretor não se destina à reprodução11. Estes foram alguns dos
temas que dão alguma idéia da agenda de debates que pautou a campanha
eleitoral. Tal resultado legou uma frustração muito grande em muita gente.
Mais da metade do eleitorado do país se somadas as abstenções12.
Este cenário garantiu a vitoria eleitoral. Mas legou um cenário em que a
construção da legitimidade política passaria a ser tarefa de primeira ordem. Ao
que tudo indica a presidente sabia que teria dificuldades para governar. Logo
depois do resultado seu discurso foi um discurso conciliatório e com convite

10
http://noticias.terra.com.br/eleicoes/propagandaearma/blog/2014/10/19/a-musa-marina-silva-e-o-
factoide-dos-cabelos-soltos/
11
O candidato Levi Fidelix (PRTB) durante debate pré-eleitoral transmitido pela Rede Record usou
expressões como "dois iguais não fazem filho" e "aparelho excretor não reproduz" ao se referir a casais
homossexuais. Posteriormente veio a ser condenado judicialmente pelo conteúdo homofóbico das
declarações. Disponível em: http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2015/03/levy-fidelix-e-condenado-
a-pagar-r-1-milhao-por-declaracoes-homofobicas-4719469.html. Acesso em 10 de abril de 2016.
12
Mesmo sabendo que parte das abstenções além de votos brancos e nulos e eleitores faltantes é
composta por eleitores falecidos ou ausentes não atualizados pelo TSE esta contabilidade não deixa de se
aplicável.
para o diálogo e união13. Ocorreu que ela não se mostrou uma grande oradora,
e tampouco demonstrou habilidade política para construir essa unidade. Se
fosse o PSDB o vencedor das eleições a tarefa seria a mesma: buscar a
legitimidade que as urnas não deram. Contudo, somente um governo altamente
populista e carismático seria capaz de buscar uma convergência ampla. Note-
se ainda que essa polarização nas eleições de 2014 era tamanha que apenas
uma semana depois do resultado das eleições, já no 1º de novembro, se
organizaram os primeiros protestos pela deposição da presidente14 (FOLHA
SP- 01/11/2014).
Daí ao cenário de crise em que se instaurou o segundo pedido de
impeachment da história no Brasil deu-se apenas uma sucessão de fatos em
que a Operação Lava Jato deflagrada ainda em 2013 opera não mais do que
como catalisadora. Veja-se que a metáfora não é despropositada. Ela catalisa,
isto é, acelera a queima. Mas não á a responsável pela combustão ou não atua
como o motor da crise. A hipótese aqui defendida é que o motor, a força
propulsora, estava presente desde a promulgação do resultado eleitoral: a
polarização elevada a níveis dramáticos com o resultado eleitoral mais
apertado da história do Brasil, em que a eleição se decidiu pelos votos que
caberiam em alguns dos menores estados da federação no Brasil [Pouco mais
de 3.4 milhões de votos].
Não há coincidências na história ou na política. Os elementos que
deflagram o impedimento de Collor em 1989 estão presentes em 2014.
Evidentemente, há importantes diferenças que provavelmente vão alterar,
como já alteraram, não só o andamento do processo de impeachment, como os
dias que se seguirão à sua chancela ou à sua desaprovação em plenário. As
diferenças residem basicamente na musculatura e no acúmulo político do PT.

13
Em lugar de ampliar divergências, de criar um fosso, tenho forte esperança que a energia mobilizadora
tenha preparado um bom terreno para a construção e pontes. O calor liberar no fragor da disputa pode e
deve agora ser transformado em energia construtiva de um novo momento no Brasil. Com a força desse
sentimento mobilizador, é possível encontrar pontos em comum e construir com eles uma primeira base
de entendimento para fazermos o país avançar. Algumas vezes na história, os resultados apertados
produziram mudanças mais fortes e rápidas do que as vitórias amplas. É essa a minha esperança. Ou
melhor, a minha certeza do que vai ocorrer a partir de agora no Brasil. Minhas primeiras palavras são de
chamamento da base e da união. Nas democracias maduras, união não significa ação monolítica.
Pressupõe abertura e disposição para o diálogo. Essa presidente está disposta ao diálogo, e esse é meu
primeiro compromisso no segundo mandato: o diálogo. Disponível: http://oglobo.globo.com/brasil/leia-
integra-do-discurso-de-dilma-rousseff-14369830. Acesso em 09 de abril de 2016.
14
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/30082-protesto-pede-impeachment-de-dilma
Que não encontra parâmetro no PRN de Collor. O PRN fora um partido criado
poucos meses antes das eleições e sem nenhuma base de apoio social. O PT
sempre gozou de estoques sociais de apoio na sociedade. (Citar Carreirão,
2016, Amaral e Meneguello, 201215). Além disso, o PT viveu um período
suficiente sob a égide do presidencialismo de coalização (cittar AMARAL) para
saber que os apoios precisam ser construídos e é necessário formar um sólida
base no parlamento, a contrário do PRN de Collor, que descuidou dessa
necessidade.
Para Danilo Martuscelli uma das componentes da crise que deflagrou o
Impeachment de Collor é o isolamento político em que o presidente se colocou,
“Quando Sarney deixou a Presidência da República em 1990, o número de
cadeiras ministeriais era quinze. Collor, ao assumir o poder, promoveu uma
redução considerável neste número para nove postos ministeriais
(MENEGUELLO, 1998)” Além disso, entre 1990 e 1991, o governo Collor
representava apenas 28% das cadeiras do Congresso nacional. Dos nove
ministérios apenas três eram preenchidos por partidos políticos
(MENEGUELLO, 1998). “Como resultado desse processo, o governo caiu no
isolamento político” 16.

Efeitos da crise na sociedade

Há uma tradição de estudos que têm buscado explicar o comportamento


do eleitor. Há certo consenso (CARREIRÃO; BORBA & RIBEIRO, 2011) de que
pelo menos duas hipóteses explicativas trazem acertos sobre os mecanismos
de identificação partidária nos eleitores. A chamada escola de Michigan para a

15
Raquel Meneguelo destaca que “Desde seu surgimento, seu desenvolvimento organizacional foi
notável. De seu primeiro experimento eleitoral em 1982 às eleições gerais de 2010, a bancada de
deputados federais cresceu de 8 para 88, de 13 deputados estaduais no país para 149, de 1 Senador eleito
em 1990 para 13 Senadores. Ao nível local, seu crescimento foi ainda mais destacado: de 2 prefeituras
conquistadas em 1982 o partido passou a governar 558 municípios em 2008, e de 118 cadeiras de
vereadores no país, passou a 4.162 na última eleição local. Em 25 anos, o partido construiu bases
organizativas capazes de apresentar à disputa eleitoral mais de 35 mil candidatos no país em eleições
locais, e mais de 1.200 candidatos em eleições gerais”. (MENEGUELO, Raquel. O impacto do PT no
sistema partidário: alinhamentos, arranjos políticos e movimentação de elites em torno do eixo petista.
Paper preparado para o Workshop The PT from Lula to Dilma: Explaining Change in the Brazilian
Worker’s Party. Brazilian Studies Programme, University of Oxford, 27 de Janeiro de 2012. P. 2)
16
Conforme MARTUSCELLI, Danilo Enrico. A transição para o Neoliberalismo e a crise do Governo
Collor. In BOITO Jr, Armando; GALVAO. Andreia. Politica e Classes Sociais no Brasil dos anos 2000.
São Paulo: Alameda. 2012, p. 39.
qual a identificação se originaria de uma adesão de base psicológica aos
partidos. Tratar-se-ia de uma identidade forjada em bases afetivas
(FIGUEIREDO, 1991, p. 37). E a teoria da escolha racional, segundo a qual a
identificação partidária é explicada a partir do papel desempenhado pelos
partidos para os eleitores. Partidos seriam atalhos cognitivos. Os partidos (e as
ideologias políticas) são referencias que os eleitores usam para diminuir custos
de obtenção e processamento das informações políticas necessárias para sua
tomada de decisão (DOWNS, 1957). De forma geral, para Balbachevsky e
Speck17 a identificação partidária pode ser entendida como “uma construção
abstrata, que descreve uma predisposição dos cidadãos para criar um senso
de identidade com algum partido, e, em função disso, seguir as posições
sustentadas por esse partido em diferentes questões e valores”. A identificação
partidária seria, portanto, “uma informação sintética e econômica que é
utilizada pelo eleitor para lidar com futuros incertos, e pode mudar ao longo do
tempo, caso a avaliação do eleitor sobre os partidos mude18.
Partindo da concepção de Identificação Partidária próxima à da Escola
de Michigan, na perspectiva de que, após formada a IP, os eleitores “vejam a
política sob a ótica do partido com que se identificam” Yan de Souza Carreirão,
Julian Borba e Ednaldo Ribeiro verificaram que os sentimentos partidários têm
influência nas atitudes dos eleitores. A relação de causalidade ali pressuposta
é a de que as identificações partidárias influenciam opiniões e atitudes dos
eleitores. Segundo os autores “cerca de dois terços dos eleitores manifestam
algum tipo de sentimento em relação aos dois partidos brasileiros mais
importantes (PT e PSDB)19.
A chegada do PT à Presidência da República gerou mudanças em
termos das bases sociais e no próprio sistema de crenças do eleitorado
(VEIGA, 2007; CARREIRÃO, 2008, apud CARREIRÂO; BORBA & RIBEIRO,
2011; AMARAL? MENEGUELO, 201220). Estas mudanças levaram a

17
BALBACHEVSKY, Elizabeth; SPECK, Bruno Wilhelm. Quando o Partidarismo pesa na decisão
eleitoral? 2016, p. 4.
18
CARREIRÃO; BORBA e RIBEIRO, 2011, P. 338
19
CARREIRÃO; BORBA e RIBEIRO, 2011, P. 342.
20
MENEGUELO, Raquel. O impacto do PT no sistema partidário: alinhamentos, arranjos políticos e
movimentação de elites em torno do eixo petista. Paper preparado para o Workshop The PT from Lula
to Dilma: Explaining Change in the Brazilian Worker’s Party. Brazilian Studies Programme,
University of Oxford, 27 de Janeiro de 2012
polarização que habita os ciclos mais fechados do poder para o seio de boa
parte da população. Tradicionalmente, o PT foi o partido que logrou os maiores
níveis de filiação e identificação partidária no Brasil
PMDB, con más de dos millones de afiliados, y PT son
ciertamente las agrupaciones con las mayores cantidades de
miembros – siendo que, para este último, los datos de la tabla
son los más confiables entre los grandes partidos, ya que el PT
ejerce un control rígido en los registros de su afiliación. En
términos generales, se constata una situación de estabilidad en
el nivel de afiliación: alrededor de un 10% del electorado,
llegando a casi 14 millones de miembros en 2010. Es un valor
bastante elevado, sobre todo si lo comparamos con las tasas
en declive verificadas en los sistemas europeos desde la
década de 1980: en el inicio del siglo, sólo Austria y Finlandia
tenían niveles comparables de afiliación (Scarrow y Gezgor,
2010). (...) El partido [PT] lidera las preferencias desde 1999,
cuando superó al PMDB, y representa aproximadamente la
mitad del total de la identificación desde 2003, primer año del
gobierno de Lula (con la excepción del período entre2005 y
2007, cuando la agremiación sufrió los efectos de escándalos
21
seguidos de corrupción).

Contudo, a polarização política, somada a identificação partidária tal


como identificada por Carreirão, Borba e Ribeiro (2011), levou a uma paulatina
rejeição em relação ao PT variando de 21,8% em 2002, 26,7% em 2006 e
19,8% em 2010. Só houve um declínio dos sentimentos positivos em relação
ao partido em 2006. Ainda assim os dados mais atuais apontam para o
crescimento do sentimento anti-petista, conforme livro ainda a ser publicado
“Partidarismo, Antipartidarismo e Comportamento do Voto no Brasil” de David
Samuels e Cesar Zucco Jr22. Os antipetistas puros saltaram de 7,49% do
eleitorado em 1997 para 11,44% em 2014. Número maior do que a soma de
pessoas que declaram preferência por PMDB e PSDB23.
Ao mesmo tempo, segundo Carreirão, Borba e Ribeiro (2011), a
rejeição diminui bastante entre 2006 e 2010. Em relação ao PSDB “os
percentuais de rejeição foram de 33,8% em 2002, 34,3% em 2006 e 30% em

21
AMARAL, Oswaldo; BRAGA, Maria do Socorro Souza; RIBEIRO, Pedro floriano. El sistema de
partidos en brasil: estabilidad e institucionalización. Trabajo presentadi en el VI Congreso
latinoamericano de Ciencia Política (ALACIP). Quito, 12 a 14 de junio de 2012. In: CD do 6º
Congresso Latino-Americano de Ciência Política. Quito: Alacip-Flacso, 2012
22
SAMUELS, David; ZUCCO Jr, Cesar. Partisans, Anti-Partisans, and Non-Partisans: Voter Behavior in
Brazil (with Cesar Zucco). Under contract with Cambridge University Press. Paper in Progress.
23
Dados do trabalho de Samuels e Zuccor Jr, publicados pela imprensa, disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/02/1741508-numero-de-eleitores-anti-pt-cresce-no-pais-
aponta-estudo.shtml. Acesso em 110 de abril de 2016.
2010. Ou seja, a rejeição ao PSDB foi sempre maior do que em relação ao PT,
inclusive em 2006.” Além disso, os autores concluem que

Há algumas diferenças interessantes de atitudes relativas a


temas políticos relevantes entre eleitores que manifestam
sentimentos em relação aos dois principais partidos brasileiros
(no que se refere a seu papel estruturador das disputas
presidenciais) e, segundo, que esses sentimentos estão, ainda,
24
fortemente associados ao voto para presidente” .
Ocorreu que essa identificação ganhou contornos dramáticos. Mais uma
vez, catalizados por uma das etapas da Operação Lava Jata. Desta vez, a 22ª
etapa da Operação, intitulada “Triplo X25”, que buscava apurar o possível
envolvimento do ex-presidente Lula com um apartamento Triplex em edifício na
praia do Guarujá, cuja propriedade lhe era atribuída. Tal etapa foi deflagrada
com a determinação da condução coercitiva do ex-presidente.
Imaginava-se que a condução coercitiva fosse soar como a prisão do
maior líder político do PT jogando por terra os planos políticos para as eleições
de 2018, mas, curiosamente, a habilidade pessoal do ex-presidente, e o
enorme carisma de que ele prova ser ainda possuidor26, inverteu a situação. O
resultado foi a inesperada rearticulação e mobilização de setores da esquerda
que até então assistiam acuados ao desenrolar dos fatos. De outro lado, dias
depois a tentativa do governo de conduzi-lo ao planalto27, malograda com o

24
De acordo com os autores “Os resultados de nossa pesquisa indicam que, em 2010, os sentimentos
partidários (em especial os sentimentos de identificação com PT e PSDB) estavam relacionados, sim, com
atitudes e comportamentos, porém a intensidade com que os sentimentos afetavam atitudes (caso seja esse
o sentido da relação causal entre as variáveis) era bem menor que a intensidade com que eles afetavam o
comportamento político (decisão do voto)23. Vimos que sentimentos positivos em relação ao PT
estiveram relacionados positivamente com adesão à democracia, defesa de um papel maior para o Estado,
igualitarismo e aceitação à censura em determinadas situações. Já sentimentos positivos relativos ao
PSDB estiveram associados negativamente à adesão à (e preferência pela) democracia, ao estatismo e
positivamente com igualitarismo e aceitação da repressão e censura. Quanto ao indicador de sentimentos
partidários que agrega o conjunto de sentimentos positivos e negativos relativos ao PT e ao PSDB
simultaneamente, apresentou associações negativas com adesão à (e preferência por) democracia,
estatismo, e igualitarismo. Ou seja, à medida que passamos dos eleitores com preferência pelo PT e
rejeição ao PSDB (simultaneamente) para os eleitores com preferência pelo PSDB e rejeição pelo PT
(simultaneamente), diminui a adesão à democracia, o apreço por atitudes igualitárias e por uma maior
intervenção do estado na economia.(CARREIRÂO, Yan de Souza; BORBA, Julian. RIBEIRO, Ednaldo.
Sentimentos partidários e atitudes políticas entre os brasileiros. OPINIÃO PÚBLICA, Campinas, vol.
17, nº 2, Novembro, 2011, p.362).
25
Citar por que etc
26
Pesquisas publicadas pelo Instituto Data Folha colocam o ex-Presidente Lula como o candidato favorito
em qualquer cenário nas eleições presidenciais de 2018. Disponível:
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/04/1759342-lula-e-marina-lideram-corrida-para-2018-
tucanos-despencam.shtml. Acesso em 10 de abril de 2016.
27
citar
vazamento de escutas telefônicas28, acirrou ainda mais o clima da turma que
torcia pelo impeachment. Em suma, a polarização política que estava
circunscrita aos universos mais estritos do poder e dos políticos profissionais
rompeu esse núcleo e passou a contagiar como uma onda avassaladora a toda
a população gerando grande exasperação nos ânimos. Essa exasperação,
contudo, tem lavado muitos a perguntar se há excessos nos grupos de
manifestantes.
Para afirmar a existência de excessos, teríamos que perguntar: vamos
usar a régua de quem para medir? Então talvez não seja o caso de tratar as
manifestações de “abusivas”. Mas certamente cabe chamar a atenção para o
clima de torcida organizada instalado nas discussões políticas. Entre as
torcidas não há diálogo. Não há debate político. Vence quem grita mais alto,
bate o tambor [ou as panelas com mais vigor] ou leva mais torcedores para os
estádios. Isto não é muito promissor em termos de frutos para o exercício
democrático neste tipo de confronto.
A filósofa Hannah Arendt preocupada com os abusos dos regimes
totalitários diz o seguinte sobre os confrontos políticos:

O ser político, o viver numa polis, significa que tudo era decidido
mediante palavras e persuasão, e não através da força ou violência.
Para os gregos, forçar alguém mediante violência, ordenar ao invés
de persuadir, eram modos pré-políticos de lidar com as pessoas,
29
típicos da vida fora da polis. Somente a pura violência é muda .

Vivemos tempos, que, por mais paradoxal que possa parecer,


constituem a negação da política nestes termos em que ela depende
eminentemente do debate e da constituição de uma esfera publica que
estamos longe de formar.
A pauta de debates, se é que existe, é dramaticamente reduzida. Uns
marcham contra o golpe, e outros negam-lhe pedindo o impeachment. A
questão da corrupção figura em segundo plano. Principalmente depois da
divulgação de uma lista vazada da Operação Lava Jato que envolveria cerca
de 200 políticos30. A partir daí passou a haver uma percepção geral de que

28
citar
29
ARENDT, Hannah. A condição humana. 11 ed. Forense Universitária, 2010. P. 34
30
A notícia com a lista divulgada pode ser acessada no link que segue, embora o Juiz Sergio Moro tenha
determinado o seu sigilo horas depois de seu vazamento.
http://fernandorodrigues.blogosfera.uol.com.br/2016/03/23/documentos-da-odebrecht-listam-mais-de-
200-politicos-e-valores-recebidos/. Acesso em 10 de abril de 2016.
todos os partidos estavam envolvidos nos esquemas de financiamento eleitoral
denunciados pela Lava-jato. O efeito disso consistiu no estreitamento dos
discursos e na aceleração do processo de impeachment. Houve o inédito
funcionamento da câmara de deputados durante um fim de semana para
vencer os prazos e votar o impedimento até o dia previsto 16/04 (domingo).
Mais uma vez, a lava jato catalisa, acelera a queima do governo.

Cenários pós Impeachment – O Day After

É temerário buscar fazer qualquer previsão para os dias que devem


seguir-se à votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Pode-se
quando muito, imaginar os desdobramentos em diferentes cenários.
O que é bastante certo é que esse enfrentamento político atual no Brasil
está longe de levar a sociedade a uma nova ditadura, como alguns se atrevem
a vaticinar. Contudo é importante notar que o processo atual guarda muitas
semelhanças com as ameaças a democracia experimentados no Brasil durante
os governos de Getúlio Vargas, 1953-1954, e Goulart (1963-1964). São
processos que guardadas as proporções e as diferenças do tempo histórico,
poderiam estar em curso no Brasil atual.
Os resultados deste processo, porém, não necessariamente demandam
um cenário de interrupção democrática, com golpe militar, ou algo parecido, o
que parece realmente muitíssimo improvável. Os novos tempos, e a atual
conformação política estrutural, contudo, permitem que profundas reformas tais
como a trabalhista e previdenciária e até mesmo reformas que reduzam as
possibilidades de participação política democrática possam ser levadas a bom
termo sob a batuta de partidos e grupos conservadores em vertiginoso ascenso
político atual. Vemos já no curso atual algumas medidas legislativas que
causam certa estranheza a valores republicanos tais como a permissão para
retirada de aviso sobre a presença de transgênicos ou agrotóxicos em
alimentos. A quem isso interessa?
Por mais que as pessoas não admitam, diferentemente do que ocorreu
em junho de 2013, e da mesma forma como ocorreu nas diretas já em 1984 e
no fora Collor em 1992, os protagonistas do enfrentamento atual são os
partidos políticos. São eles que deflagram as mobilizações de direita e
esquerda, e são eles quem catalisam os resultados no parlamento.
Imaginar um cenário futuro depende muito do comportamento que a
crise pode gerar principalmente entre os mais jovens. Estariam dispostos a
volta a folhear os livros de história e garimpar informação também em outros
canais de mídia além dos tradicionais? Estão dispostos a assumir o fazer
político como preocupação cotidiana, engajada? Do contrário, pode-se
imaginar nada mais além de uma grande tragédia, do ponto de vista das
possibilidades emancipatórias que estes movimentos poderiam trazer em seu
núcleo.
O debate político, sem dúvida, tem muito a avançar. Esse é um retrato
da juventude de nossa democracia. Vivemos dois curtos períodos democráticos
no Brasil: 1945 a 1964 e agora desde 1985. Então os brasileiros estão
aprendendo a conviver com a democracia. O que parece faltar primordialmente
é a constituição do diálogo entre os diferentes grupos. E para que este diálogo
ocorra é fundamental a capacidade de leitura dos fenômenos atuais. Tem uma
coisa que de forma geral as pessoas tem dificuldade de compreender. O que é
política. Política é de forma crua tudo aquilo que homens fazem para limitar o
exercício do poder. Isto com o pressuposto de que todo homem é corruptível.
Todos. Como já dissera Madison considerado um dos pais da constituição
americana “Mas o que é o governo senão um dos maiores reflexos da natureza
humana? Se os homens fossem anjos, não haveria necessidade de governo.
Se os homens fossem governados por anjos, não haveria necessidade de
controles externos ou internos”. Os brasileiros ainda procuram por “salvadores
da pátria”.Por heróis que possam extrair-lhes quase que milagrosamente da
crise.
Esta não é uma característica trivial. O sociólogo José Murilo de
Carvalho já escrevera que no Brasil “a pirâmide dos direitos foi colocada de
cabeça para baixo”
A cronologia e a lógica da sequencia descrita por Marshall
foram invertidas no Brasil. Aqui, primeiro vieram os direitos
sociais, implantados em período de supressão dos direitos
políticos e de redução dos direitos civis por um ditador que se
tornou popular [Vargas]. Depois vieram os direitos políticos, de
maneira também bizarra. A maior extensão do direito do voto
deu-se em outro período ditatorial, em que órgãos de
representação política foram transformados em peça
decorativa do regime (...). Na sequência inglesa, havia uma
lógica que reforçava a convicção democrática. As liberdades
políticas vieram primeiro, garantidas por um Judiciário cada vez
mais independente do Executivo. Com base no exercício das
liberdades expandiram-se os direitos políticos consolidados
pelos partidos e pelo legislativo31.

A inversão da pirâmide dos direitos no Brasil explica, segundo Carvalho,


a excessiva valorização do Poder Executivo. Diante do fato de que os direitos
sociais foram implantados em períodos ditatoriais, com o legislativo atrofiado,
criou-se a imagem, para a maioria da população, da centralidade do executivo.
Este fascínio por um executivo forte é que teria engendrado a vitória do
presidencialismo sobre o parlamentarismo no Plebiscito de 1993 no Brasil.
Outra consequência dessa centralidade atribuída pela população ao
Poder Executivo é o repúdio ao poder legislativo e seus titulares. Para
Carvalho, no Brasil “As eleições legislativas sempre despertam menor interesse
do que as do Executivo. (...) Nunca houve no Brasil reação popular contra o
fechamento do Congresso. (...) O desprestígio generalizado dos políticos
perante a população é mais acentuado quando se trata de vereadores,
deputados e senadores”32
Por fim, ligada à preferência pelo Executivo, está a busca por um
Messias Político, por um salvador da pátria.

Como a experiência de governo democrático tem sido curta e


os problemas sociais têm persistido e mesmo se agravado,
cresce também a impaciência popular com o funcionamento
geralmente mais lento do mecanismo democrático de decisão.
Daí a busca por soluções mais rápidas por meio de lideranças
carismáticas e messiânicas. Pelo menos três dos cinco
presidentes eleitos pelo voto popular após 1945, Getulio
Vargas, Jânio Quadros, e Fernando Collor, possuíam traços
33
messiânicos .

Pode-se estar a viver-se no Brasil dias em que os eleitores frustram-se


na tentativa de encontrar tal líder. Como consequência agem como que
cegados diante de determinados fatos. Tem se tornado comum mesmo entre
estudiosos a comparação de que se vive no Brasil um verdadeiro Fla-Flu. Um

31
CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo caminho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira. 2002, p. 221.
32
CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo caminho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira. 2002p. 221
33
Idem, p. 221.
clima de defesa beligerante de posições a qualquer preço. Ou seja, um cenário
em que os cidadãos eleitores agem mais ou menos como torcedores de
futebol. O problema é que o torcedor faz vistas grossas em tudo que diga
respeito ao time adversário. Isto não é saudável para a democracia, para as
instituições democráticas. O eleitor não deveria ser um torcedor. Porque nas
democracias a ele, e somente a ele é que cabe o papel de juiz final. A seguir,
ensaiamos alguns cenários nos principais objetos das reformes estruturantes
pelas quais pode passar o Brasil nos próximos anos.

As reformas: Trabalhista, Previdenciária, Tributária. A Proteção


Social corre perigo?

É preciso ressaltar que a crise, o portanto também o processo de


impeachment, a partir da argumentação que até aqui apresentamos, é
resultado da profunda polarização política que teve lugar no Brasil desde a
reabertura democrática em 1988 e com especial acento nas eleições de 1994,
quando as eleições presidenciais foram concomitantes com eleições para
Governador, e para o Congresso.
Assim, pode-se concluir que os dias que seguiram-se às eleições de
2014 até o impeachment, consagraram um verdadeiro “terceiro turno eleitoral”.
Este é um fato. Consequência de que o resultado político não foi aceito por
uma boa parcela da população e dos atores políticos, como já salientado
acima. O que engendrou uma profunda crise de legitimidade
. Esse cenário pode ser interpretado a luz do célebre cientista político
norte americano Robert Dahl, que diz que a democracia parte da premissa de
que todo e qualquer ator ou grupo político opta por reprimir ou tolerar seus
adversários com base no método de mero cálculo (racional) de custos, que
pode ser traduzido da seguinte forma: Quanto mais baixos custos de tolerância
dos adversários, então haveria um governo mais seguro; E, quanto mais altos
custos supressão, então haveria uma oposição mais segura. Pode-se pensar
que Dahl diria que o inverso também é verdadeiro.
Assim, na conjuntura atual parece estar a custar muito caro a
permanência do PT por mais um governo, principalmente com a sombra de
uma candidatura de Lula em 2018 que levaria a um ciclo [impensável há alguns
anos] de mais de 20 anos de governo Petista. Ou seja, este seria o grande
fator responsável pela excessiva polarização a que chegou o Brasil em 2014 e
de onde ainda não saiu. Por fim, se há um acordo de que a crise é política.
Somente a política pode tirar o Brasil dela
Depois que sair dela vai ter que enfrentar as reformas há muito pautadas
e que deixaram o Brasil em uma encruzilhada a partir da segunda eleição de
Dilma Roussef: Aprofundar algumas das mudanças acumuladas por mais de
uma década de Lulismo34, ou adaptar-se ao cenário de escassez resultante da
crise do capitalismo que se instaurou desde 2008, com uma recidiva importante
em 2011 e de onde não há sinais claros de que a economia internacional possa
sair no curto prazo. Ou seja, a encruzilhada brasileira é contrastada com a
apresentação das exigências de austeridade fiscal diante dos feitos
acumulados pelo Lulismo no que tange à relativa proteção social possível pela
versão desenvolvimentista que o PT conferiu ao seu governo nos últimos
quatorze anos (2002-2016).
A tese defendida por Singer, poderia ser resumida a tentativa de articular
as seguintes hipóteses:a) O lulismo é fruto, ou originador, de um deslocamento
do subproletariado como fração de classe - Hipótese que deságua na
comparação entre o lulismo e o bonapartismo de "O Dezoito Brumário" de
Marx. b) O estado sob o lulismo empreendeu um modelo de "arbitragem" entre
as classes fundamentais, buscando o eterno ponto de equilíbrio, sem
confrontar a ordem, que poder-se ia comparar ao modelo rooseveltiano; c) as
mudanças do modelo podem ser entendidas como um reformismo fraco; d) o
lulismo substituiu a velha polarização esquerda/direita por uma nova
polarização entre ricos e pobres.
Tomando emprestada a gramática de Singer para compreender a
realidade brasileira, pode-se dizer que o futuro do Brasil e o encamimnhamento
que será dado à principais reformas em pauta depende de saber que forças

34
De acordo com Andre Singer o lulismo engendrou um deslocamento de classes que o PT teria se
tornado o "Partido dos Pobres" (2012, p. 34, 117) e de que o Bolsa Família e outras estratégias de
transferência de renda (crédito consignado, valorização do salário mínimo, controle inflacionário) foram
centrais para o sucesso do lulismo, apesar de vozes discordantes - Samuels, Hunder e Power (2012, p.
104).
(SINGER, Andre. Os sentidos do lulismo – reforma gradual e pacto conservador - São Paulo:
Companhia das Letras, 2012.)
políticas sairão fortalecidas e com o domínio político hegemônico no cenário
pós impeachment (com a sua aprovação ou não).
Se as forças políticas conservadoras saírem fortalecidas desse processo
então pode-se supor que as reformas (citar projetos) devem caminhar no
sentido de atendimento a uma agenda que privilegie medidas de austeridade e
recuo nas principais garantias sociais inscritas na legislação atual.
Se as forças que realinharem em torno do PT poder-se-ia apostar na
continuidade do Lulismo, convivendo agora com uma cenário econômico
desfavorável (citar entrevista Singer)
Dado que as forças que atualmente tem logrado hegemonia no
Parlamento (trabalho citado Mara Telles), que tem uma das composições mais
conservadoras dos últimos tempos e os limites econômicos a uma eventual
continuidade do lulismo poderíamos afirmar que os caminhos das reformas no
Brasil devem mesmo atender aos apelos do Mercado e chamada austeridade
econômica é que deve marcar o passo e o ritmo das reformas que o pais tem a
descortinar em seu horizonte próximo. No final e ao cabo cabe perguntar,
afinal, quem tem a guarda da soberania no Brasil atual se como já escrevera
Carl Schmit, soberano é quem define o estado de exceção.
Por fim considerando a forma como a cidadania foi constituída no Brasil
cabe retormar o poeta e compositor Vinicios de Moraes “o Brasil não é para
principiantes” e arrematar com outra “O Brasil é de cabeça para baixo e, se
você disser que é de cabeça para baixo, eles o põem de cabeça para baixo,
para você ver que está de cabeça para cima."

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL, Oswaldo; BRAGA, Maria do Socorro Souza; RIBEIRO, Pedro floriano. El sistema de
partidos en brasil: estabilidad e institucionalización. Trabajo presentadi en el VI Congreso
latinoamericano de Ciencia Política (ALACIP). Quito, 12 a 14 de junio de 2012. In: CD do 6º
Congresso Latino-Americano de Ciência Política. Quito: Alacip-Flacso, 2012.

CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil. O longo caminho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira. 2002, p. 221.

CARREIRÂO, Yan de Souza; BORBA, Julian. RIBEIRO, Ednaldo. Sentimentos partidários e atitudes
políticas entre os brasileiros. OPINIÃO PÚBLICA, Campinas, vol. 17, nº 2, Novembro, 2011, p.333-
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BIEZEN, Ingrid Van. Political Parties in New Democracies. Party Organization in
Southern and East-Central Europe. New York: Palgrave Macmillan. 2003.

(LIMONGI & CORTEZ, 2010, p. 36 apud FREITAS, 2015, p. 41).

MENEGUELLO, 2010

MENEGUELO, Raquel. O impacto do PT no sistema partidário: alinhamentos, arranjos políticos e


movimentação de elites em torno do eixo petista. Paper preparado para o Workshop The PT from Lula
to Dilma: Explaining Change in the Brazilian Worker’s Party. Brazilian Studies Programme,
University of Oxford, 27 de Janeiro de 2012

JACOBSON, Gary C. The Effects of Campaign Spending in Congressional


Election. The American Political Science Review, Vol. 72, No. 2, (Jun., 1978), pp.
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FREITAS, Vitor Sandes. ......

SAMUELS, David; ZUCCO Jr, Cesar. Partisans, Anti-Partisans, and Non-Partisans: Voter Behavior in
Brazil (with Cesar Zucco). Under contract with Cambridge University Press.

SAMUELS, David. Financiamento de Campanha e Eleições no Brasil: O que podemos


aprender com o “caixa um” e propostas de reforma. In: Reforma Política e
Cidadania. Organizadores: Maria Victória Benevides, Fábio Kerche, Paulo Vannuchi –
1. ed. - São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003, pp. 364- 391.

Reformas:
Política
Previdência
Trabalhista
Tributária

Incluir: soberania limitada governo Dilma- Carl Schmitd “Soberano é


quem pode determinar o estado de exceção.” Soberania sitiada:
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/04/1757916-secretario-geral-da-oea-
diz-que-nao-ha-fundamento-para-impeachment.shtml

Pensar:
A música é o silencio entre as notas. A política nunca cala. É a negação
do silencio. A imposição do diálogo, do discurso, do debate.

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/04/1759342-lula-e-marina-
lideram-corrida-para-2018-tucanos-despencam.shtml

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/04/1759340-maioria-quer-que-
dilma-e-temer-saiam-mostra-pesquisa-datafolha.shtml?cmpid=compfb

http://verborragio.blogspot.com.br/2015/05/reforma-politica-cunha-vs-
nicolau-e.html

Fonte: Pesquisa Data Folha realizada entre os dias 7 e 8 de abril de 2016, com 2779
entrevistados em 170 municípios. A margem de erro é de 2 pontos percentuais, para mais ou
para menos. Disponível: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/04/1759340-maioria-quer-
que-dilma-e-temer-saiam-mostra-pesquisa-datafolha.shtml?cmpid=compfb. Acesso em 10 de
abril de 2016.

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