Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Sistema Criminal
Modernas Tendências do Sistema Criminal
Semestral
ISSN 2177 - 4811
1. Direito penal - Periódicos. I. FAE Centro Universitário
CDD 341.5
Os artigos publicados na Revista Justiça e Sistema Criminal são de inteira responsabilidade de seus autores. As
opiniões neles emitidas não representam, necessariamente, pontos de vista da FAE Centro Universitário.
A Revista Justiça e Sistema Criminal tem periodicidade semestral e está disponível em www.sistemacriminal.org.
Endereço para correspondência:
FAE Centro Universitário
Rua 24 de Maio, 135 – 800230-080 – Curitiba – PR – Tel.: (41) 2105-4098.
Apresentação
O Direito Penal e a Vida Humana: um Debate em Torno da Legitimação dos Tipos Penais
Incriminadores que Protegem o Bem Jurídico Vida
(José Roberto Wanderley de Castro) _________________________________________________________ 215
RESUMO
Tradicionalmente, o fundamento sobre o qual se estrutura o sistema penal se situou na
concepção da ação, da norma ou da imputação do comportamento ao sujeito conforme
a regra jurídica. O edifício sistemático se construiria sobre uma destas bases previamente
concebida e assentada. Na presente investigação se questiona que o método na elaboração
do sistema atue deste modo. A função ideológica que se atribui ao Direito Penal determina o
objeto eleito para desenvolver sua elaboração dogmática. Em outros casos, uma sistemática,
já perfilada técnica e ideologicamente, muda de objeto para alcançar uma maior coerência
e consistência. Ambas assertivas são corroboradas analisando distintas metodologias na
evolução do Direito Penal. E assim fica referendado nos modelos considerados: a teoria
imperativa ou da dupla função da norma penal, as concepções final ou significativa da
ação, e as propostas funcionalistas psicológicas ou sociológicas.
Palavras-chave: Direito Penal. Dogmática Penal. Política Criminal. Ação Penal. Norma
Penal. Imputação Objetiva.
ABSTRACT
Traditionally, the foundation on which structure the penal system was compiled was the
concept of action, or rule, or charge for subjective behavior according to the rule of law.
The systematic building is build on one of these previously designed bases and seated. In
this investigation is questioned the method in preparing the system to act in this way. The
ideological function which assigns criminal law determines the object chosen to develop
its dogmatic development. In other cases, a systematic, profiled and technique already
ideologically, change of object to achieve greater coherence and consistency. Both probes
are confirmed by analyzing distinct methodologies in the evolution of criminal law. And
so is countersigned in the models considered: imperative or theory of the dual function of
criminal standard, the final or signify conceptions of action, and psychological or sociological
functionalists proposals.
Keywords: Criminal Law. Criminal Dogmatics. Criminal Policy. Criminal Action. Criminal
Rules. Objective Charge.
1
Catedrático de Direito Penal da Universidade de Valência (Espanha). Tradução de Paulo César Busato.
Ao longo do presente trabalho, será exposto, com toda a brevidade que seja
possível, alguns modelos metodológicos com o fim de destacar a relação existente entre
a configuração da Ciência jurídico-penal, os componentes básicos que integram o direito
Penal à mesma tarefa que se assinala a este setor do ordenamento jurídico. Pretende-se,
pois, colocar em conexão a função do Direito Penal, o objeto do Direito Penal, metodologia
e sistemática no Direito Penal. Também queria destacar alguns aspectos ideológicos que
em certa medida explicam esse conjunto de vinculações. Mas essa reflexão ideológica
ficará mais nitidamente expressa no último tópico deste trabalho.
Foi destacado por um número considerável de autores que o edifício sistemático
desenhado pelas diferentes concepções penais se apoia frequentemente no conceito prévio
de norma penal da qual se parte, ou no de ação. Aqui queria, sem rechaçar esta ideia, lançar
também argumentos a favor da afirmação inversa: isto é, que as concepções da regra jurídico-
-penal e da conduta criminal foram de igual forma tributárias das conotações sistemáticas
derivadas da Teoria do Delito e da própria função que se assinala ao Direito Penal.
Ou seja, com alguns exemplos de construções sistemáticas, pretendo mostrar
na evolução das diferentes concepções teóricas como jogam os diversos elementos
fundamentais das mesmas em atenção aos fins que se outorga ao sistema penal. A norma
jurídica ou o conceito de ação podem ser o pressuposto teórico fundamental sobre o qual
se estrutura a Teoria Jurídica do Delito em uma época determinada. Mas essas mesmas
instituições aparecem, em diferente contexto histórico, já não como pedra angular do
edifício sistemático, mas como consequência de uma estrutura teórica previamente
elaborada. E estas mudanças de posição tão relevantes são fomentadas notavelmente
pelos fins que se assinala ao Direito Penal, que não são alheios à influência do pensamento
político de cada época. Vamos ver alguns exemplos.
Começarei com a análise da norma jurídica em suas relações com o Direito Penal. E
vou referir-me agora especialmente à concepção imperativa da norma penal, continuando
depois com a teoria da dupla função. Este tópico finalizará com uma exposição de um
sistema de Direito Penal que se fundamenta na tese da motivação da norma.
A concepção imperativa, em seus postulados originais, parte da premissa de que o
ordenamento jurídico se integra por manifestações de vontade do legislador que se impõem
2
JESCHECK, Hans Heinrich. Lehrbuch des Strafrechts: Allgemeiner Teil. 4. ed. Berlin: Duncker &
Humblot, 1988. p. 200.
3
“É claro que todos os imperativos têm uma determinada validade, à qual se dirigem, pois estes, de fato,
não querem ser outra coisa além da expressão de uma vontade, que dirige sua lança não, ou não ao
menos, contra o mero submetido, mas essencialmente contra outro e sempre de alguma forma contra
alguém determinado”. BIERLING, Ernst Rudolph. Juristische Prinzipienlehre. Tomo I. Nova reimpressão
da edição aparecida entre 1894 e 1917; Aalen: Scientia Verlag, 1961. p. 26 e 27.
4
THON, August. Rechtsnorm und subjektives Recht. Nova reimpressão da edição de Weimar 1878. Aalen:
Scientia Verlag, 1964.
5
BIERLING, Ernst Rudolph. Zur Kritik der Juristiche Grundbegriffen. Reimpressão da edição de Gotha,
1877-1883, Aalen: Scientia Verlag, 1965.
6
Merkel concebeu o injusto como lesão do direito, ou seja, como rebelião contra o poder espiritual do
Direito. Por sua vez, a violação do direito como infração do poder espiritual pressupõe a capacidade de
imputação do homem, de tal forma que só os capazes de ação podem ser culpáveis. Por outro lado, em
sua concepção o injusto e a culpabilidade ainda não encontram uma clara distinção. MERKEL, Adolf.
Kriminalistische Abhandlungen. Tomo I. Leipzig: Breitkopf und Härtel, 1867. p. 5ss. Vide, a respeito, a
exposição de ROXIN, Claus. Strafrecht. Allgemeiner Teil. Tomo I. München: Beck, 1992. p. 199, n. 91.
7
A respeito, JESCHECK, op. cit., p. 213, nota 20. Na Alemanha é possível citar como autores que admitem
esta concepção da norma penal, entre outros, Engisch, H. Mayer, Armin Kaufmann, Stratenwerth, Welzel
o Zippelius.
8
“Com frequência tampouco querem aparecer externamente como tal as proibições e as ordens do direito
e se tem que determinar de forma indireta a partir de suas consequências com as que se ameaça para o
caso de sua infração. Conceitualmente, portanto, existe em toda proposição jurídica um imperativo, um
praeceptum legis, ou, como hoje estamos obrigados a dizer, uma norma”. THON, op. cit., p. 2 e 3.
9
BUSTOS RAMIREZ, Juan. Introducción al Derecho penal. Bogotá: Temis 1986. p. 46. Esta ideia foi
modernamente desenvolvida por Engisch: “[...] Tanto as disposições legais conceituais como também as
permissões somente são, portanto, proposições dependentes. Estas só tem sentido em relação a imperativos
que as esclarecem ou as limitam, como, visto passivamente, esses imperativos só podem chegar a
completar-se tendo em mente os esclarecimentos por meio das definições legais e os limites, tanto através
de permissões como por certas exceções” ENGISCH, Karl. Einführung in das jusistische Denken. 7. ed.
Stuttgart; Berlin, Köln e Mainz: Kohlhammer, 1977. p. 23.
10
JESCHECK, Hans Heinrich. Tratado de Derecho penal: parte general. Tomo I. Trad. da 3. ed., adicionada
e anotada por MUÑOZ CONDE, Francisco e MIR PUIG, Santiago. Barcelona: Bosch, 1981. p. 320.
11
JESCHECK, Ibidem. MIR PUIG, Santiago. Introducción a las bases del Derecho Penal. Barcelona: Bosch,
1976. p. 57.
12
Porém, nem para todos os autores, a norma de determinação se identifica com imperativo. Neste sentido
Larenz diferencia entre ordem e determinação. A primeira se dirigiria à vontade do destinatário para
ordenar ou proibir algo, a segunda se dirigiria a uma comunidade indeterminada e ampla de pessoas e viria
representado como uma pretensão de validade geral. A este segundo caso corresponderiam disposições
como esta que assinala que a capacidade jurídica da pessoa começa com o nascimento. LARENZ, Karl.
Der Rechtssatz als Bestimmungssatz. Festschrift für Karl ENGISCH zum 70. Geburtstag. Frankfurt am
Mainz: Klostermann, 1969. p. 155.
13
Entretanto, assinalou Bacigalupo que se bem o conceito de norma penal influiu nas distintas formulações
da teoria do delito, hoje em dia não existe uma relação necessária entre concepção da norma penal e
estrutura da infração punível. BACIGALUPO, Enrique. La función del concepto de norma en la dogmática
penal. Estudios de derecho penal en homenaje al Profesor Luis Jimenez de Asua. Monográfico da Revista
de la Facultad de derecho de la Universidad Complutense de Madrid, Madrid, n. 11, 1986. p. 73 e 74.
14
MIR PUIG, Santigo. op. cit., p. 58.
15
Sobre as consequências derivadas da formulação original da concepção imperativa da norma na
antijuridicidade e na culpabilidade; BACIGALUPO, op. cit., p. 64.
16
Se bem que é certo que na formulação inicial de Thon a norma se dirige também ao incapaz de ação na medida
em que este pode cometer um fato antijurídico, nos ulteriores desenvolvimentos, especialmente no de Hold
von Ferneck, a ordem só tem como destinatários aos imputáveis. Com efeito, se a imputação subjetiva consistia
desde Von Liszt na normal determinabilidade conforme motivos, o imperativo não se poderia dirigir a alguém
que carecia das condições básicas para dirigir sua conduta conforme uma norma cujo sentido era incapaz de
compreender. Daí que antijuridicidade e injusto se voltem de novo a confundir. Neste sentido, HOLD VON
FERNECK, Alexander. Die Rechtswidrigkeit. Tomo I, Jena: Fischer, 1903. p. 98ss.
17
Neste sentido, BACIGALUPO, op. cit., p. 64 e 65.
18
Esta mudança de concepção na teoria del delito se observa já em uma época anterior no próprio Von Liszt.
Na 3ª edição de seu tratado (Berlin e Leipzig, 1888) o autor alemão estrutura claramente o injusto com
base na concepção imperativa da norma, e, por exemplo, a antijuridicidade a entende como um ataque
dirigido contra o ordenamento jurídico, contra a força vinculante que impõem as ordens e as proibições
que o próprio estabelece (p. 131 e 132). Na 4ª edição desta mesma obra (Berlin, 1891) já não se diz tão
somente que a antijuridicidade suponha o ataque ao ordenamento jurídico ou a desobediência a suas
ordens e proibições. Se segue mantendo que o injusto consiste em um menoscabo ou lesão do Direito, uma
infração de preceitos estatais, mas o mais importante é que pela primeira vez assinala o professor alemão,
dentro do tópico da antijuridicidade, que todo delito compreende um ataque a interesses protegidos
juridicamente, e que tal ataque consiste bem na lesão de um bem jurídico ou bem em sua colocação em
perigo (p. 145). Mais ainda, no marco do injusto, o imperativo fica deslocado a um segundo plano como
se depreende das seguintes palavras: ‘Todo ataque ao bem juridicamente protegido é, em si mesmo,
antijurídico, sem que isto requeira uma especial proibição do ordenamento jurídico. O conceito de bem
jurídico encerra em si mesmo necessariamente a proibição de toda perturbação” (p. 145).
De igual forma, no plano da culpabilidade se observa uma importante mudança. Na terceira edição esta
fida relegada à pura capacidade biopsíquica de imputação e a suas formas (o dolo e a culpa). A capacidade
de imputação se define assim como um estado normal de determinabilidade conforme motivos (p. 150).
Na quarta edição se introduz novos elementos definidores da culpabilidade em correspondência com uma
melhor distinção realizada no plano da antijuridicidade. Define-se a culpabilidade (coisa que não ocorre
na anterior edição) e se diz, por exemplo: “Culpabilidade é responsabilidade pelo resultado causado
através de um movimento corporal voluntario”. Também se assinala que a capacidade de culpabilidade é a
capacidade para ser responsável por uma ação antijurídica. O aspecto pessoal e subjetivo da culpabilidade
frente à objetivização da antijuridicidade se acentua quando nesta edição aparece como pressuposto da
responsabilidade jurídico-penal a determinabilidade da vontade através da própria conduta e pessoalidade
do sujeito derivada do conjunto de representações que a conformam, da religião, da moral, do Direito,
inteligência, cultura, etc.(pág. 160).
19
Uma exposição sobre este ponto em ROXIN, op. cit., p. 199, n. 92.
20
NAGLER, Johannes. Der heutige Stand der Lehre von der Rechtwidrigkeit. Festschrift für Karl Binding
zum 4. juni 1911. Reimpressão da edição de Leipzig, 1911. Aalen: Scientia Verlag, 1974. p. 213ss.
21
GOLDSCHMIDT, James. Der Notstand, ein Schuldproblem. Österreichische Zeitschrift für Strafrecht,
Wien, p. 129ss, 1913.
22
A tese de Goldschmidt está muito próxima à de Mezger. A diferença fundamental se encontra em que para
este último autor, a norma de determinação deriva da norma de valoração, enquanto que naquele uma
norma se encontra junto à outra. MEZGER, Edmund. Tratado de Derecho penal. Traduzido e revisado
por Arturo Rodriguez Muñoz. Madrid: Editora Revista de Derecho Privado, 1955, p. 346, n. 6.
23
Uma valoração da posição de Goldschmidt em relação ao que representa o desvalor de ação e o desvalor
de resultado se encontra em ZIELINSKY, Diethart. Handlungs- und Erfolgsunwert im Unrechtsbegriff.
Berlin: Duncker und Humblot, 1973, p. 22 e 23.
24
MEZGER, Edmund. Die subjektiven Unrechtselemente. Der Gerichtssaal, Stuttgart, n. 89, p. 207ss, 1924.
Mas, como é evidente, uma norma que só seja concebida como juízo de valor não
pode deixar de ser nada mais do que uma declaração de boas intenções. A norma tem
também pretensão de eficácia, ainda que venha dirigida à afirmação e à manutenção real
dos valores que protege o próprio Direito. A tese da norma como norma de determinação
não é abandonada, mas trasladada a um segundo plano, pois o próprio conceito que
encerra a mesma obriga à necessária referência do destinatário da norma. Dirá então
Mezger que enquanto que o ordenamento jurídico é um complexo de normas que como
tal (ou seja, como integrantes desse ordenamento jurídico) só podem ser concebidas sem
destinatário algum; a realização e colocação em prática desse conjunto normativo só pode
ser levada a cabo através dos imperativos, ordens e proibições, que não se identificam
diretamente com a norma, mas somente são levadas em consideração a partir de suas
consequências como o meio necessário para sua imposição ou colocação em prática.
25
Ibid., p. 218.
26
Ibid., p. 240 e 241.
27
MEZGER, op. cit., p. 245.
28
Idem.
29
Em VON LISZT, Frank; SCHMIDT, Eberhard. Lehrbuch des Deutschen Strafrechts, Tomo I. Berlin e Leipzig:
de Gruyter, 1932. p. 174.
30
“Se então nós fazemos frente na ‘antijuridicidade objetiva’ e na ‘juridicidade objetiva’ ao direito em sua
função como norma de valoração, de igual forma terá que interessar-nos ainda mais dentro da teoria da
culpabilidade em sua função como norma de determinação”. SCHMIDT, op. cit., p. 176. no mesmo sentido,
MEZGER, op. cit., p. 343: “...o deslinde conceitual entre a norma jurídica como norma de valoração que
se dirige ‘a todos’ e a norma de dever como norma de determinação que se dirige ‘só’ ao pessoalmente
obrigado, torna possível, em consequência, o necessário e claro contraste entre os dois pressupostos básicos
do delito, entre a antijuridicidade objetiva e a reprovabilidade pessoal”.
31
GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. ¿Tiene un futuro la Dogmática jurídicopenal? Estudios de Derecho pe-
nal. Madrid: Tecnos, 1976. p. 64 ess. Existem posteriores edições desta obra, nas quais também estão
contidos este e outros artigos que mencionaremos ulteriormente. Mas, dado que o conteúdo dos mesmos
não variou, seguiremos citando a primeira edição.
32
GIMBERNAT ORDEIG, op. cit., p. 70 e 71.
33
GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. El sistema de Derecho penal en la actualidad. Estudios de Derecho penal.
Madrid: Tecnos, 1976. p. 94. Em outra passagem deste mesmo trabalho o autor assinala: “Sabemos já em
que consiste e qual é o tipo penal. Consiste na descrição da conduta proibida e seu fim é o de motivar _
mediante a ameaça com uma pena _ para que tal conduta não se cometa”.
34
Ibid., p. 95.
35
Ibid., p. 97 e 98, n. 40.
36
GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. Introducción a la Parte general del Derecho penal español. Madrid:
Universidad Complutense, 1979. p. 34.
37
GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. Estado de necesidad: un problema de antijuridicidad. Estudios de Derecho
penal. Madrid: Tecnos, 1976. p. 116ss.
38
Ibid., p. 114ss.
39
São muitas as passagens na obra de Gimbernat nas quais diretamente se conectam fins da pena e
culpabilidade, fundamentalmente em atenção a critérios de necessidade de pena. Trazemos à colação uma
das tantas referências a respeito: “Desde o ponto de vista da manutenção da ordem social, proceder com
uma pena frente aos enfermos mentais e menores é intolerável e abusivo porque é também desnecessário:
pois que seu comportamento delitivo fique impune não diminui em nada o caráter inibitório geral das
proibições penais” (GIMBERNAT ORDEIG, E. ¿Tiene un futuro la dogmática... cit., p. 77).
40
GIMBERNAT ORDEIG, E. Introducción a la Parte general del Derecho penal... cit., p. 69ss.
41
GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. Sobre los conceptos de omisión y comportamiento. ADPCP, núm. XL
(1987); p. 579 ess., 587. Não obstante, tampouco se pode confundir este conceito com o de ação definido
causalmente em sentido estrito, pois como o mesmo autor assinala, em sua tese renuncia ao requisito
conceitual da voluntariedade porque não está em condições de abarcar os comportamentos automatizados
nem falidos. Outra diferença fundamental reside em que se considera ausência de comportamento quando,
ainda existindo essa voluntariedade, não há um condicionamento físico do próprio comportamento. Assim,
não havia omissão “quando por incapacidade do sujeito ou pelos dados objetivos da situação era fisicamente
impossível a execução de um movimento”. p. 606. Em relação ao conceito de ação de Gimbernat e sua
proposição geral do Direito Penal, BORJA JIMÉNEZ, Emiliano. Funcionalismo y acción. Tres ejemplos en
las contribuciones de JAKOBS, ROXIN e GIMBERNAT. Estudios penales y criminológicos, XIV. Santiago
de Compostela, p. 9-61, 1994.
42
WELZEL, Hans. Naturalismus und Wertphilosophie im Strafrecht. Mannheim-Leipzig-Berlin: Dt. Druck-
und Verlagshaus, 1935. p. 64ss.
43
ROXIN, op. cit., p. 112, n. 17. Sobre os pressupostos filosóficos da doutrina da ação final, é importante tomar
em consideração as próprias apreciações de WELZEL, Hans. Das neue Bild des Strafrechtssystems. 4. ed.
Göttingen: Schwartz, 1961. p. IX-XII. Existe versão castelhana El nuevo sistema de Derecho penal. Una
introducción a la doctrina da acción finalista. Trad. e notas de José Cerezo Mir. Barcelona: Ariel, 1964.
44
SCHÜNEMANN, Bernd. Einführung in das strafrechtliche Systemdenken. Grundfragen des modernen
Strafrechtssystems. Berlin-New York: de Gruyter, 1984. p. 34. Existe tradução ao castelhano: El sistema
moderno del derecho penal: cuestiones fundamentales. Traduzido por SILVA SANCHEZ, Jesús María.
Madrid, 1991. Segundo este autor, a concepção de Welzel representa, dentro do âmbito filosófico-jurídico,
um compromisso entre o direito natural e o relativismo valorativo.
45
A concepção metodológica de Welzel se pode resumir em umas poucas linhas, tomando palavras do
próprio autor: “O ordenamento jurídico determina por si mesmo que elementos ontológicos quer
valorar e vincular a eles consequências jurídicas. Mas não pode modificar os elementos mesmos, se
os acolhe nos tipos. Pode designá-los com palavras, destacar seus caracteres, mas eles mesmos são o
elemento individual, material, que constitui a base de toda valoração jurídica possível. Os tipos só podem
«refletir» este material ontológico, previamente dado, descreve-lo linguística e conceitualmente, mas o
conteúdo dos «reflexos» linguísticos e conceituais pode ser só destacado mediante uma compreensão
penetrante da estrutura essencial, ontológica do elemento material mesmo. Disso se deduz para a
metodologia, que a Ciência do Direito penal tem que partir sempre, sem dúvida, do tipo [...] mas tem
que transcender logo do tipo e descender à esfera ontológica, previamente dada, para compreender
o conteúdo das definições e para... compreender também corretamente as valorações jurídicas [...]
Este método, «vinculado ao ser ou às coisas»... que constitui um dos aspectos essenciais da doutrina
da ação finalista, deveria ser designado con a palavra «ontológico», sem que com isso se optasse por
um sistema ontológico determinado” (El nuevo sistema del Derecho penal... cit., p. 13 e 14). Sobre
toda a problemática proposta em relação às estruturas lógico-objetivas na Espanha, cf. CEREZO MIR,
José. La polémica en torno a la doctrina da acción finalista en la Ciencia del Derecho penal española.
Problemas fundamentales del Derecho penal. Madrid: Tecnos, 1982. p. 105ss.
46
Dizia Hartmann: “A pessoa, enquanto configura e transforma seus desejos em fins, e realiza estes valendo-se
dos meios previstos para isso, dirige o suceder real ao desejado, e precisamente este dirigir mediante a inserção
dos próprios componentes determinativos é a «ação». A respeito, o grande trabalho de RODRIGUEZ MUÑOZ,
José Arturo. La doctrina da acción finalista. 2. ed. Valencia: Tirant lo blanch, 1978. p. 84. Ainda que exista
grande similitude entre os pontos filosóficos de Hartmann e os pressupostos da doutrina da ação de WELZEL,
este mesmo autor nega a influencia daquele (El nuevo sistema de Derecho penal... cit., p. 12 e 13).
47
RODRIGUEZ MUÑOZ, op. cit., p. 85.
48
WELZEL, Hans: Das deutsche Strafrecht in seinen Grunzügen. Berlin: de Gruyter, 1949. p. 20ss. Tomamos
a tradução e a citação de RODRIGUEZ MUÑOZ, op. cit, p. 32 e 33.
49
Idem.
50
WELZEL, Hans. Derecho Penal Alemán. Parte general. 11 ed. Traduzida por BUSTOS RAMIREZ, Juan e
YAÑEZ PEREZ, Sergio. Santiago de Chile: Editorial Jurídica de Chile, 1970. p. 79.
51
WELZEL, op. cit., p. 92.
52
Assim se expressa BUSTOS RAMIREZ, op. cit., p. 183.
53
Esta parece ser a opinião de BUSTOS RAMIREZ, op. cit., p. 184.
54
“Neste ‘poder em lugar disso’ do autor a respeito da configuração de sua vontade antijurídica, reside
a essência da culpabilidade; ali está fundamentada a reprovação pessoal que se formula no juízo de
culpabilidade ao autor por sua conduta antijurídica. A teoria da culpabilidade tem que expor os pressupostos
pelos quais se reprova ao autor a conduta antijurídica”. WELZEL, op. cit., p. 197.
55
Ibid., p. 216.
56
Ibid., p. 221.
57
Ibid., p. 248.
58
A respeito, a exposição de AMELUNG, Knut. Rechtsgüterschutz und Schutz der Gesellschaft. Frankfurt:
Athenäum, 1972. p. 350ss. RUDOLPHI, Hans Joachim. Die verschiedenen Aspekte des Rechtsgutsbegriffs.
Festschrift für Richard M. Honig. Göttingen: Scharwtz, 1970. p. 151ss. Um resumo dos pressupostos
que guiam este pensamento em meu trabalho El bien jurídico protegido en el delito de allanamiento de
morada. Estudios Jurídicos en Memoria del Prof. Dr. D. José Ramón Casabó Ruiz. Vol. I. Valencia: Tirant
lo blanch, 1998. p. 247ss.
59
PARSONS, Talcott. The social system. 4. ed. New York: Free Press, 1968. LUHMANN, Niklas. Zweckbegriff
und Systemrationalität. Tübingen: Mohr Siebeck, 1973. Do mesmo, Rechtssoziologie, 2 Tomos.
Hamburgo: Rowohlt, 1972. Uma completa referência bibliográfica e análise sobre seus pressupostos em
MIR PUIG, op. cit., p. 295ss. LUZON PEÑA, Diego Manuel. Medición de la pena y sustitutivos penales.
Madrid: Instituto de Criminología de la Universidad Complutense , 1979. p. 9ss.
60
JAKOBS, Günther. Strafrecht. Allgemeiner Teil. 2. ed. Berlin-New York: de Gruyter, 1991. p. 6ss, n. 4ss,
expresamente en notas 7 e 8. Esta mesma proposta foi antecipada em seu trabalho Schuld und Prävention.
Tübingen: Mohr, 1976. p. 9ss. Uma clara, concisa e completa exposição em SILVA SÁNCHEZ, Jesús María.
Aproximación al Derecho Penal contemporáneo. Barcelona: Bosch, 1992. p. 69ss, n. 4ss.
61
Tese fundamental da qual parte a obra de AMELUNG, op. cit., p. 351.
62
Neste sentido, e expondo alguns exemplos, SCHÜNEMANN, op. cit., p. 54, n. 133.
63
JAKOBS, Günther. La imputación objetiva en Derecho Penal. Estudio preliminar de CANCIO MELIÁ,
M./SUÁREZ GONZÁLEZ, C. Trad. Manuel Cancio Meliá. Madrid: Civitas, 1996. p. 62. Estes autores, e
especialmente o primeiro, contribuíram notavelmente à difusão da obra do autor alemão na maioria dos
países de fala hispana, e daí que suas apreciações sempre tenham que ser tomadas muito a sério por seu
valioso conhecimento da complicada estrutura dogmática deste grande penalista.
64
“Com o dito creio que fica claro o que é objetivo na imputação objetiva do comportamento: se imputa
as desviações a respeito daquelas expectativas que se referem ao portador de um rol. Não são decisivas
as capacidades de quem atua, apenas as de um portador de rol, referindo-se a denominação ‘rol’ a um
sistema de posições definidas de modo normativo; ocupado por indivíduos intercambiáveis; trata-se,
portanto, de uma instituição que se orienta em atenção a pessoas”. JAKOBS, op. cit. p. 97.
65
JAKOBS, Günther. El concepto jurídico-penal de acción. Conferencia proferida no CEU de Madrid en maio
de 1992. Traduzida por Manuel Cancio Meliá. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, Centro de
Investigaciones de Derecho Penal y Filosofía del Derecho, 1996. p. 14. Do mesmo, Strafrecht. Allgemeiner
Teil... cit., p. 136ss, n. 20ss.
66
JAKOBS, Günther. Der strafrechtliche Handlungsbegriff: Kleine Studie. München: Beck, 1992. p. 33 e
34. Tomo aqui vários parágrafos de forma quase literal para expressar mais genuinamente o pensamento
do autor.
67
JAKOBS: El concepto jurídico-penal de acción... cit., p. 20 e 21.
68
JAKOBS, Günther. El principio de culpabilidad. Conferência proferida na Facultad de direito da
Universidad Complutense de Madrid en maio de 1992. Trad. Manuel Cancio Meliá. Madrid: Civitas,
p. 29. Também em Schuld und Prävention. Tübingen: Mohr, 1976. p. 31 (Als der die Schuld leitend
bestimmende Zweck erwies sich hierbei die Stabilisierung des durch das deliktische Verhalten gestörten
Ordnungsverhaltens [...])
Em que pese as distâncias existentes entre mestre e discípulo, entre Welzel e Jakobs, o
paralelismo em sua estrutura metodológica resulta, a todas luzes, evidente. Para aquele, missão
69
Ibid., p. 39.
70
Ibid., p. 34. Em outra passagem assinala, em consonância com o expressado no texto, que a prevenção
geral não se entende no sentido de intimidação, mas não de exercício da confiança no Direito: “Dies ist
Generalprävention nicht im Sinne von Abschreckung, sondern von Einübung in Rechtstreu”. (Schuld und
Prävention... cit.; p. 10). Também em Strafrecht. Allgemeiner Teil... cit., p. 13, n. 15.
71
“Sair da garrafa implica neste caso liberar-se dessa confusão. O delito não é um objeto real e, por
conseguinte, à estrutura do sistema não corresponde nenhuma estrutura objetiva. E a dogmática não
é uma classe de ciência mas um modo de argumentar ao redor de uns tópicos que não são mais que
determinações do que entendemos por ação e do que entendemos por norma, e do processo em virtude
do qual podemos julgar as ações desde as normas jurídicas”. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos
del sistema penal. Valencia: Tirant lo blanch, 1996. p. 482.
72
VIVES ANTÓN, op. cit., p. 245ss. Desde esta perspectiva, a ação como significado atribuído socialmente
_ juridicamente _ a certos movimentos corporais ou a certa ausência deles, tende a objetivar-se. Tal
objetivização da ação se produz mediante seu reconhecimento nas regras sociais. Ao longo de toda sua
obra, o autor insiste na ideia de que em matéria de ação não estamos ante processo físico algum, mas
ante casos de interpretação da conduta pública, isto é, de compreensão do seu sentido.
73
Não podemos explicar agora todas as derivações sistemáticas da original proposta do autor. Assim, se
distingue entre aparência de ação e tipo de ação. Este último conceito adquire relevância preeminente
no sistema penal. “As ações não resultam, pois, inteligíveis por referências a estruturas objetivas (físicas
ou lógicas) situadas fora delas, mas sobre a base de que se entrelaçam em práticas, em plexos regulares
de interação que determinam o sentido. Com base no papel que jogam nesses plexos podemos falar de
diferentes tipos de ação. E tais tipos de ação _ que não são mais que a expressão das diferentes funções
sociais _ constituem o dado primário de nosso conhecimento da ação [...] Assim, pois, cabe afirmar, em
consequência, que a ação típica é o constituiens real do tipo de delito e o tipo de ação seu primeiro
constituens lógico”. VIVES ANTÓN, op. cit., p. 266.
74
Não se nega que a capacidade da ação exija certa possibilidade de criar intenções e vontades, mas ao
contrário a determinação da ação mesma não só depende da intenção mas do código social estabelecido
mediante o qual se extrai seu sentido e significado. E o próprio exame do querer do agente não se subtrai
a este requisito assinalado de submissão a regras externas. VIVES ANTÓN, op. cit., p. 214.
75
“Em consequência, para determinar se uma ação é ou não intencional havemos de atender, não a
inverificáveis processos mentais, a desejos e propósitos, mas a se na ação realizada se põe ou não de
manifesto um compromisso de atuar do autor. Esse compromisso não é senão a imagem da relação que une
a intenção a seu objeto (a ação) com a “dureza do dever ser lógico”. Deste modo, a intenção, inacessível
como processo psicológico, se mostra em uma dupla dimensão normativa. Em primeiro termo, nas regras
que a identificam e a tornam possível e cognoscível e; em segundo lugar, na relação entre o autor e a ação:
através do significado de seus atos, das competências que cabe atribuir-lhe, e do entramado dos estados
intencionais que se plasmam em sua vida imputamos, _ ou não _ uma determinada intenção ao autor”.
VIVES ANTÓN, op. cit., p. 232 e 233.
76
Ibid., p. 257: “Se isso é assim, os elementos subjetivos devem configurar-se e ser entendidos não como
processos internos semelhantes aos físicos _ como coisas que ocorrem no fundo da alma _, mas como
momentos da ação, como componentes de um sentido exteriorizado, de algo que não é _ nem pode ser
_ secreto”.
77
Ibid., p. 310. O autor assinala que estabelecer critérios universais que recorrem a fundamentos naturalísticos,
valorativos ou mistos para a temática da adscrição ao tipo nos delitos de resultado, é um erro. E seria um
erro porque definitivamente a adscrição típica nesta classe de delitos não teria porque ser diferente do resto.
Não há que recorrer a teorias científicas para estabelecer a relação causal do resultado com relação à ação
porque se nos apresentem uma série de casos que a encerram seria uma dificuldade. Seria melhor tratar de
resolver estes casos com atenção à interpretação geral da ação dentro do tipo de ação. Por isso não é nas
teorias da relação de causalidade onde se deve pôr o acento, mas nos critérios gerais de interpretação, nas
práticas, no precedente, na criação de regras hermenêuticas que nos ofereçam possibilidades de certeza
jurídica. É que em última instancia o resultado não se encontraria fora da ação, mas na própria ação.
78
VIVES ANTÓN, op. cit., p. 272: “E o que não parece, ao contrário, metodologicamente correto é edificar
um sistema sobre uma categoria básica multiforme e sobrecarregada. Pois ao tipo de injusto, tal e como o
concebe hoje a doutrina, pertencem momentos da configuração da ação que não tem mais sentido que
delimitar sua relevância penal (ou sua específica relevância penal); outros nos quais reside a lesividade do
ato; e finalmente outros nos que radica sua contrariedade ao dever. Assim as coisas, a teoria do delito se
converteu na teoria do injusto, de categoria básica passou a ser categoria hegemônica, na qual ulteriormente
se distinguem estratos diversos (tipo objetivo e tipo subjetivo). E cabe afirmar que essa distinção ulterior
nem sempre se leva a cabo com critérios valorativamente unívocos nem funcionalmente úteis”.
79
Esta forte normativização de toda a teoria do delito já se podia perceber na obra elaborada junto com o
Professor Cobo Del Rosal. Os mencionados autores partiam de um pressuposto metodológico totalmente
deontológico, ou seja, “[...] a análise da infração não adotará uma configuração que tome como eixo a
estrutura real do atuar humano constitutivo de delito, mas atenderá primariamente à diversificação do
juízo normativo em virtude do qual um fato da vida social passa a ser qualificado como delito pelas leis
penais”. Em consequência, “a estrutura do delito ficará assim dividida, essencialmente, em duas partes:
uma, relativa ao juízo de antijuridicidade na qual se determina se o fato é ou não contrário ao direito de
modo relevante para a lei penal e outra, relativa ao juízo de culpabilidade, na qual se determina se o fato
tipicamente antijurídico é pessoalmente reprovável ao seu autor”. COBO DEL ROSAL, Manuel; VIVES
ANTÓN, Tomás Salvador: Derecho penal. Parte general. 3. ed. Valencia: Tirant lo blanch, 1990. p. 210.
80
VIVES ANTÓN, op. cit., p. 484ss. A apresentação do sistema proposto percorre o seguinte caminho: em
primeiro lugar se fala da pretensão de validade da norma penal, que por sua vez se subdivide em várias
pretensões. Dentro desta subdivisão encontramos a pretensão de relevância, e aqui é preciso determinar a
existência de um tipo de ação, nos termos definidos, e que seja um tipo de ação lesiva, isto é, que ponha
em perigo ou lesione um bem jurídico determinado. A pretensão de validade se desdobra em um segundo
momento que o autor denomina pretensão de ilicitude, isto é, que ademais de encontrar-nos ante um tipo
de ação lesiva deve consistir em uma realização do proibido ou não realização do ordenado, ou seja, há de
contrariar a norma entendida como diretiva de conduta. A ação que concorre com o dolo ou a imprudência
será em si mesma já, ilícita. Esta ilicitude pode ser excluída pelas leis permissivas que outorguem um direito
ou permissão forte (causas de justificação), ou se limitem a tolerar a ação estabelecendo um permissão
fraca (escusas ou causas de exclusão da responsabilidade pelo fato). O terceiro momento é constituído
pela pretensão de reprovação. O juízo de reprovação é necessário para tomar em consideração o autor
como ser racional, e não como mero objeto. A estrutura da pretensão de reprovação viria determinada pela
imputabilidade e pelo conhecimento da ilicitude (que tenha atuado conhecendo ou podendo conhecer o
significado antijurídico de sua ação). A pretensão de reprovação se ventila no juízo de culpabilidade, que
junto com a pretensão de relevância e de ilicitude esgotam o conteúdo “material” da infração. O último
momento da pretensão de validade vem determinado pela necessidade de pena, que a nível abstrato
entra em jogo quando tiveram lugar as três pretensões anteriores. Aquela, porém, ficará excluída no caso
concreto quando se demonstre que a pena resulta desnecessária, o que é o mesmo que dizer que toda
imposição de pena inútil é por sua vez, imposição injusta.
81
Em um de seus artigos mais próximos no tempo a esta obra Fundamentos del sistema penal (VIVES ANTÓN,
T. S. Principios penales y dogmática penal. Estudios sobre el Código penal de 1995. Estudios de Derecho
Judicial. Madrid: Escuela Judicial del CGPJ, 1996. p. 39ss.), o autor sublinha o seguinte: “O princípio de
legalidade e as construções dogmáticas entram em conflito quando estas, em vez de ater-se ao texto da lei,
o deformam ou esgotam desde categorias materiais. O recurso a criterios materiais é, desde logo, legítimo
e, às vezes, pode ser útil. Mas deve respeitar “o livro de figuras” escrito pelo legislador” (p. 70 e 71).
82
São várias as passagens nas quais se pode perceber este constante rechaço pela utilização do modelo “cientificista”
na dogmática penal. “Pois bem, o que aqui se propõe é justamente um câmbio de método. Igualmente ao
significado das palavras, o das ações não depende de objetos da mente _ acerca dos quais nada podemos
saber _, mas de práticas sociais. E não se desentranha mediante a estratégia científica, mas, principalmente,
mediante a estratégia intencional. O significado social _ objetivado em regras e práticas _ é o que dá sentido
às ações. E assim como a estratégia científica pressupõe certa uniformidade da natureza, a estratégia intencional
pressupõe certa estabilidade dessas regras e práticas, de modo que se essa estabilidade baixasse mais além de
um mínimo, deixaríamos de entender-nos com as palavras e não poderíamos saber o que significam as ações”
(p. 247). “Pois fora da lógica não há um ‘saber’ que exclua o erro. E como a lógica não diz nada do mundo,
tanto nos tribunais como na ciência temo de nos conformar com um saber menos forte, ou seja, temos que
renunciar ao conhecimento irrefutável e operar com a certeza prática” (p. 248). E, finalmente: “Se consegui
meu propósito, sequer minimamente, terá ficado claro porque a dogmática penal não pode ser ciência; a saber,
porque não trata de como temos que conceber o mundo, mas de como temos que atuar nele. Percorreu-se
os caminhos pelos que transitaram as diversas dogmáticas penais e, com eles, ficaram assinalados os limites da
razão teórica no campo do Direito penal. Se algo ficou comprovado é que a autocompreensão cientificista,
que tão frequentemente acompanha o que fazer da dogmática, não é senão um véu que oculta aos olhos do
penalista o objetivo de sua reflexão. Essa reflexão (se o dito até agora tem algum sentido) deve inscrever-se no
discurso da razão prática, por difuso e débil que seja. E, se isso é assim, o futuro da dogmática não reside em
nenhuma classe de aperfeiçoamento científico, mas naquela forma de aperfeiçoamento que sirva para realizar
mais e melhor a função de Carta Magna que von Liszt atribuía ao Direito Penal” (p. 488).
83
“[...] a dogmática penal equivocou, em minha opinião, em suas pretensões. A pretensão de retidão ou
correção (de justiça) que naturalmente deveria acompanhar suas formulações conceituais, foi substituída,
mais ou menos perceptivelmente, por uma pretensão de verdade. Esta confusão de pretensões é, sem
dúvida, uma fonte de erros” VIVES ANTÓN, op. cit., p. 481.
84
Também a liberdade está agora presente em toda a formulação conceitual. Esta, como capacidade de
escolha, é pressuposto da própria ação: “[...] sem liberdade não há ação, nem razões, nem maneira alguma
de conceber o mundo: ou não há linguagem, nem regras, nem significado nem ação”. VIVES ANTÓN,
op. cit., p. 320. E como capacidade de determinação se encontra na base da pretensão de reprovação da
norma, que requer a afirmação do poder atuar de outro modo.
85
Creio conveniente apontar uma passagem, a qual já recorri parcialmente, e na qual se põe claramente
de manifesto essa relação entre ação, norma jurídica, sistema penal e fim do Direito Penal, e que gira em
torno ao valor justiça: “E a dogmática não é uma classe de ciência mas um modo de argumentar ao redor
de uns tópicos que não são senão determinações do que entendemos por ação e do que entendemos por
norma, e do processo em virtude do qual podemos julgar as ações desde as normas jurídicas e aos valores
que as normas jurídicas servem de veículo. Sempre podemos aludir para caracterizar esses valores dos
que a norma pretende ser expressão, à justiça. E desde logo a justiça é valor central de todo ordenamento.
Mas sua materialização deve satisfazer outros requisitos: segurança jurídica, liberdade, eficácia, utilidade,
etc. que não são senão aspectos parciais da ideia central de justiça que o ordenamento jurídico pretende
instaurar” VIVES ANTÓN, op. cit., p. 482.
86
Frente a uma opinião bastante generalizada na doutrina penal alemã, que interpretou a obra de Welzel como
um enfrentamento ideológico ao Direito Penal autoritário da época nacional-socialista; Frommel entende
que os fundamentos do sistema do citado autor pretenderam legitimar com uma metodologia distinta o
pensamento político do poder nacional-socialista: “O direito penal sempre reflete a imagem da sociedade
à qual serve e não pode prescindir das necessidades pré-jurídicas que reclamam o castigo. Vistas assim as
coisas, o ‘Direito penal da vontade’ e a fundamentação filosófico-valorativa que Welzel propugnava em
1935, não eram mais que as últimas consequências de um clima político-criminal que reclamava ‘maior
dureza’, ignorando as consequências que estas posturas podiam ter. Haverá quem considere que, em todo
caso, estas consequências não incumbem ao ‘jurista’”. FROMMEL, Monika. Los orígenes ideológicos da
teoría final da acción de Welzel. Traducido por MUÑOZ CONDE, Francisco. ADPCP, Madrid, n. XLII, p.
p. 631 e 632, 1989..
87
ROXIN, Claus. Strafrecht. Allgemeiner Teil. Tomo I. Grundlagen der Aufbau der Verbrechenslehre. 3. ed.
Munich: Beck, 1997. p. 158ss.
AMELUNG, Knut. Rechtsgüterschutz und Schutz der Gesellschaft. Frankfurt: Athenäum, 1972.
BACIGALUPO, Enrique. La función del concepto de norma en la dogmática penal: estudios
de derecho penal en homenaje al Profesor Luis Jimenez de Asua. Revista de la Facultad de
Derecho de la Universidad Complutense de Madrid, Madrid, n. 11, p. 73-74, 1986.
BIERLING, Ernst Rudolph. Juristische Prinzipienlehre. Tomo I. Aalen: Scientia, 1961. v. 1. p. 26-
27. [Nova reimpressão da edição aparecida entre 1894 e 1917].
_____. Zur Kritik der Juristiche Grundbegriffen. Aalen: Scientia, 1965. [Reimpressão da edição
de Gotha, 1877-1883].
BORJA JIMÉNEZ, Emiliano. El bien jurídico protegido en el delito de allanamiento de morada.
Estudios Jurídicos en Memoria del Prof. Dr. D. José Ramón Casabó Ruiz. Valencia: Universidad
de Valencia. Instiututo de Criminologia, 1998. v.1.
_____. Funcionalismo y acción. Tres ejemplos en las contribuciones de JAKOBS, ROXIN e GIMBERNAT.
Estudios Penales y Criminológicos, Santiago de Compostela, n. 17, p. 7-62, 1993-1994.
BUSTOS RAMIREZ, Juan. Introducción al derecho penal. Bogotá: Temis, 1986.
CANCIO MELIÁ, M.; SUÁREZ GONZÁLEZ, C. Estudio preliminar. In: JAKOBS, G. La imputación
objetiva en derecho penal. Trad. Manuel Cancio Meliá. Madrid: Civitas, 1996.
CEREZO MIR, José. La polémica en torno a la doctrina da acción finalista en la ciencia del
derecho penal española: problemas fundamentales del derecho penal. Madrid: Tecnos [c1982].
COBO DEL ROSAL, Manuel; VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Derecho penal: parte general.
3. ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 1990.
ENGISCH, Karl. Einführung in das jusistische Denken. 7. Aufl. Stuttgart: Kohlhmmer, 1977.
FROMMEL, Monika. Los orígenes ideológicos da teoría final da acción de Welzel. Traducido por
MUÑOZ CONDE, Francisco. ADPCP, Madrid, n. XLII, 1989.
GIMBERNAT ORDEIG, Enrique. Estado de necesidad: un problema de antijirididad. In:___________.
Estudios de derecho penal. Madrid: Civitas, 1976
_____. Estudios de derecho penal. Madrid: Civitas, 1976.
_____. Introducción a la parte general del derecho penal español. Madrid: Universidad
Complutense. Facultad de Derecho, 1979.
_____. El sistema de derecho penal en la actualidad. In: Estudios de derecho penal. Madrid:
Civitas, 1976.
_____. Sobre los conceptos de omisión y comportamiento. Anuario de Derecho Penal y
Ciencias Penales, v.40, n. 3, p. 573-608, set./dez. 1987.
_____. ¿Tiene un futuro la dogmática jurídico penal? In: _____. Estudios de derecho penal.
Madrid: Civitas, 1976.
_____. ¿ Tiene un futuro la dogmática jurídico penal? Bogotá: Temis, 1983.
RESUMEN
El Derecho penal antiterrorista español es, por razones históricas, uno de los más extensos
e intensos de Occidente, y, más allá de ello, cuenta con una amplia historia aplicativa en
los tribunales. Por ello, en los últimos años el ordenamiento español apenas ha recibido
estímulos de la evolución internacional de regulación del terrorismo producida a partir de los
ataques del 11.9.2001; en particular, la DM 2002 no tuvo repercusión alguna en la regulación
española. Sin embargo, en el marco de la reforma habida en 2010, el legislador español ha
tomado la DM 2008 como excusa para ampliar aún más – haciendo la regulación difícilmente
aplicable – el alcance de determinadas infracciones periféricas, en materia de colaboración
(adoctrinamiento), financiación y propaganda. El resultado es una regulación muy ambigua,
técnicamente defectuosa y que supera en varios puntos los límites del régimen constitucional.
Palabras Clave: Delitos de Terrorismo en el CP Español. Derecho Penal de la Unión Europea
(Decisiones Marco 2002 y 2008). Reforma del CP Español de 2010. Delitos de Preparación
y de Organización en la Nueva Regulación.
ABSTRACT
The Spanish anti-terrorist criminal law is, for historical reasons, one of the largest and
most intense of the West, and, beyond that, has an extensive applicative story in case law.
Therefore, in recent years the Spanish criminal law didn’t change because of the international
developments produced after the terrorist attacks of 9/11/2011; in particular, the European
Union 2002 FD had no impact on the Spanish regulation. However, in the context of the
reform given in 2010, the Spanish legislator has taken the 2008 FD as an excuse to further
expand the regulation amplifying the scope of certain peripheral offenses for collaboration
(indoctrination), financing and propaganda. The result is a very ambiguous regulation,
technically flawed and at several points exceeding the limits of a constitutional regime under
the rule of law.
Keywords: Terrorism offenses in Spanish Criminal Code. Criminal Law of the European
Union (Framework Decisions 2002 and 2008). Spanish reform 2010. Precursor Crimes and
Collaboration Crimes of Terrorism in the New Regulation.
1
Professor catedrático de Direito penal da Universidad Autónoma de Madrid. Advogado.
2
Determinadas conductas próximas a la colaboración, a la apología y a la provocación, intentando
aprehender fenómenos como las páginas web radicales, las prédicas incendiarias de determinados clérigos
o la asistencia a cursos de entrenamiento en campos ubicados en Pakistán, fenómenos que han generado
una intensa atención y polémica en diversos países europeos, especialmente, por no estar aprehendidas
jurídico-penalmente algunas de estas conductas; vid. por todos CANO PAÑOS, Miguel Ángel. Los delitos
de terrorismo en el Código Penal español después de la reforma de 2010. La Ley Penal: revista de derecho
penal, procesal y penitenciario, n. 86, p. 2, 2011.
3
Cfr. sobre este instrumento sólo ASÚA BATARRITA, en: LH Lidón, p. 57ss.; ha sido sustituido por una
Convención, en la misma línea que la anterior, aprobada en Varsovia con fecha de 16.5.2005.
4
Cfr. la descripción de esta situación en el marco de las discusiones en las Naciones Unidas respecto del actual
proyecto de Convenio general de terrorismo en GARCÍA RIVAS, RGDP, n. 4, p. 7, 2005. En todo caso, las
cosas han cambiado mucho en este ámbito después de la implosión del bloque socialista en Europa (cfr. al
respecto ASÚA BATARRITA, en: LH Lidón, p. 44 ss.; CALAMITA REMEZAL, Mario. Análisis de la legislación
penal antiterrorista. Madrid: Colex, 2008. p. 28 ss.); respecto de la situación anterior, vid. sólo LÓPEZ
GARRIDO, Diego. Terrorismo, política y derecho: la legislación antiterrorista en España, Reino Unido,
República Federal de Alemania, Italia y Francia. Madrid: Alianza, 1987. p. 12ss.; TERRADILLOS BASOCO,
Juan. Terrorismo y derecho: comentario a las LL.OO. 3 y 4/1988, de reforma del Código Penal y de la Ley
de Enjuiciamiento Criminal. Madrid: Tecnos, 1988. p. 49ss.
5
Y tampoco parece que la decisión del Tribunal Internacional para el Líbano de 2011 de afirmar que el
Derecho penal internacional consuetudinario conoce ya un delito de terrorismo vaya a poder consolidarse;
vid. KIRSCH, Stefan; OEHMICHEN, Anna. Die Erfindung von Terrorismus als Völkerrechtsverbrechen durch
den Sondergerichtshof für den Libanon, en: ZIS 10/2011, p. 800ss.
1.2 LA DM 2002
6
Destacan la especificidad simbólica de las repercusiones de estos atentados, entre otros muchos, CHOCQUET,
Christian. Le terrorisme est-il une menace de défense?, Culture & Conflicts, n. 44, p. 1 2001. JAKOBS,
Günther. Terroristen als Personen im Recht? In: JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Derecho penal
del enemigo. 2. ed. Madrid: Thomson Civitas, 2006. p. 41; FARALDO CABANA, Patricia. Un derecho penal
de enemigos para los integrantes de organizaciones criminales: la Ley Orgánica 7/2003, de 30 de junio, de
medidas de reforma para el cumplimiento íntegro y efectivo de las penas. In: ______ (Dir.). BRANDARIZ
GARCÍA, José Ángel; PUENTE ABA, Luz María (Coord.). Nuevos retos del derecho penal en la era de la
globalización. Valencia: Tirant lo Blanch, 2004. p. 302; MUÑOZ CONDE, Francisco. El nuevo derecho penal
autoritario. In: LOSANO, Mario G.; MUÑOZ CONDE, Francisco (Coord.). El Derecho ante la globalización
y el terrorismo. ‘cedant arma togae’. Actas del Coloquio internacional Humboldt, Montevideo, abril 2003,
2004. p. 167ss.; RAMOS VÁZQUEZ, José Antonio. Símbolos y enemigos: algunas reflexiones acerca de la nueva
lucha antiterrorista. In: PÉREZ ALVAREZ, Fernando (Ed.). Serta in memoriam Alexandri Baratta. Salamanca:
Universidad de Salamanca, 2004. p. 1430ss.; SCHEERER, Sebastian. Die Zukunft des Terrorismus: drei
Szenarien. Lüneburg: zu Klampen, 2002. p. 59ss.; COBO DEL ROSAL, : idem, PE2, p. 65; GONZÁLEZ CUSSAC,
José Luis. El Derecho Penal frente al terrorismo. Cuestiones y perspectivas. In: GÓMEZ COLOMER, Juan Luis;
GONZÁLEZ CUSSAC, José Luis (Coord.). Terrorismo y proceso penal acusatorio. Valencia: Tirant lo Blanch,
2006. p. 79ss.; vid. también la información en ÁLVAREZ CONDE, Enrique; GONZÁLEZ, Hortensia. Legislación
antiterrorista comparada después de los atentados del 11 de septiembre y su incidencia en el ejercicio de
los derechos fundamentales. Análisis (ARI), n. 7, 2006. Disponível em: <http://www.realinstitutoelcano.org/
analisis/891/891_Alvarezcondegonzalez.pdf>. Acesso em: 30 out. 2014. y HOLMES, Stephen. The matador’s
cape: America’s reckless response to terror. Cambridge: Cambridge University, 2007. p. 20ss., 40ss., 45ss.
7
Cfr. sólo BASSIOUNI, M. Cherif (ed.). La cooperazione internazionale per la prevenzione e la repressione
della criminalitá organizzata e del terrorismo. Milano: Giuffrè, 2005.
8
Vid. sólo GARCÍA RIVAS, RGDP. n. 4 , nov. 2005.
También se prevé la sanción para los directivos del grupo terrorista y los
participantes. Se sanciona en el art. 4 la inducción, complicidad y tentativa, y en el art.
5 se solicita que los Estados castiguen estas acciones con penas efectivas, proporcionadas
y disuasorias.
En el art. 1 k) se fija el concepto de organización:
“[…] A los efectos del presente apartado, se entenderá por grupo terrorista todo grupo
estructurado de más de dos personas, establecido durante cierto tiempo, que actúe de manera
concertada con el fin de cometer actos terroristas. Por grupo estructurado se entenderá un
grupo no formado fortuitamente para la comisión inmediata de un acto terrorista sin que
sea necesario que se haya asignado a sus miembros funciones formalmente definidas, ni que
haya continuidad en la condición de miembro o una estructura desarrollada [...]
9
La selección de estos tres países a modo de muestra no sólo viene determinada por la importancia de
su cultura jurídica y su gran peso dentro de la UE, sino porque son aquellos países de nuestro entorno
(jurídico-continental) en los que (aunque sin alcanzar los niveles de España) se ha registrado mayor actividad
terrorista. Después de los atentados del 11.9.2001, muchos países de Occidente han creado ex novo o
han ampliado su legislación criminal en materia de terrorismo; información sucinta aparece en ÁLVAREZ
CONDE; GONZÁLEZ, op. cit.; interesante resulta también el informe (por el punto de vista global (práctico
y normativo) adoptado) emitido por el Ministro de Asuntos Exteriores británico Straw en octubre de 2005,
referido a diversos países; respecto de Gran Bretaña, vid. p. 311ss., 318ss.; CANCIO MELIÁ, Manuel;
PETZSCHE, Anneke. Terrorism as a criminal offence. In: MASFERRER, Aniceto: WALKER, Clive (Ed.).
Counter-terrorism, human rights and the rule of law: crossing legal boundaries in defence of the State.
Cheltenham: E. Elgar, 2013., y directamente la Terrorism Act del año 2006; sobre las modificaciones en
muy diversos puntos de la legislación en los EE.UU. conocida – a través de un acrónimo alambicado –
como USA Patriot Act informan, por ejemplo, VERVAELE, John A. E. La legislación antiterrorista en Estados
Unidos. ¿Inter arma silent leges? Buenos Aires: Estudios del Puerto, 2007. p. 25ss. y passim; SALAS, en:
GÓMEZ COLOMER; GONZÁLEZ CUSSAC, Op. cit., p. 255ss.; WONG, Kam C. The USA patriot act: a
policy of alienation. Michigan Journal of Race & Law, n.12 , p. 161-202, 2006.; sobre esta legislación desde
el prisma sociológico de la excepcionalidad, cfr. SAN MARTÍN SEGURA, David. La excepción material
y los contornos de lo ordinario: a propósito de la USA Patriot Act. In: PUENTE ABA, Luz María. (Dir.).;
ZAPICO BARBEITIO, Monica; RODRÍGUEZ MORO, Luiz (Coord.). Criminalidad organizada, terrorismo
e inmigración: retos contemporáneos de la política criminal. Granada: Comares, 2008. p. 339ss., 349ss.
10
Vid. sólo FÜRST, Martin. Grundlagen und Grenzen der §§ 129, 129a StGB. Zu Umfang und Notwendigkeit
der Vorverlagerung des Strafrechtsschutzes bei der Bekämpfung krimineller und terroristischer Vereinigungen.
Frankfurt: Peter Lang, 1989. OSTENDORF, Heribert. Comentario a los §§ 123ss. In: KINDHÄUSER, Urs;
NEUMANN, Ulfrid; PAEFFGEN, Hans-Ullrich (Ed.). Nomos–Kommentar Strafgesetzbuch. 2. Aufl. Baden-
Baden: Nomos, 2005. v. 1. § 129a; PERRON, In: GÓMEZ GÓMEZ COLOMER; GONZÁLEZ CUSSAC,
op. cit., p. 239ss.
11
Vid., por ejemplo, MALABAT, Valérie. Droit pénal spécial. Paris: Dalloz, 2005. n. 865ss.; VÉRON, Michel.
Droit pénal spécial. 11ème. éd. Paris: Dalloz, 2006, n. 521ss.
12
MALABAT, Op. cit., n. 868ss.; VÉRON, Op. cit., n. 522 lo denomina “acto terrorista por referencia”..
13
Sobre la regulación vid. sólo RESTA, Federica. Enemigos y criminales: las lógicas del control. In: CANCIO
MELIÁ, Manuel; GÓMEZ-JARA DÍEZ, Carlos. Derecho penal del enemigo: el discurso penal de la exclusión.
Madrid: Edisofer, 2006. v. 2. p. 735ss., 752ss.; y VIGANÒ, Francesco. Terrorismo, guerra e sistema penale.
Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale, Milano, v. 49, p. 648-703, abr./jun. 2006.
14
La Suprema Corte (Cass., Sezione Seconda Penale, n. 24994, 25.5.–19.7.2006) ha proclamado la tolleranza
zero frente a las organizaciones próximas a Al Qaida, considerando que la mera “adhesión ideológica” al
ideario yihadista más una ideación más o menos difusa basta para la condena.
15
Momento en el que la regulación de excepción “se ‘cronifica’” (ROLDÁN BARBERO, Horacio. Los GRAPO:
un estudio criminológico. Granada: Comares, 2008. p. 122).
16
LAMARCA PÉREZ, Carmen. Tratamiento jurídico del terrorismo. Madrid: Ministerio de Justicia, 1985, p. 708.
17
En este sentido, la regulación actual hunde sus raíces en la LO 3/1988, que (re)incorporó las infracciones
de terrorismo al CP TR 1973.
18
Y las reformas habidas desde 1995 que han afectado a las infracciones de terrorismo no alteran la
estructura general de la sección; en el plano de la definición típica, hay que señalar, como antes se decía,
la introducción de las conductas de manifestación del (actual) art. 578 CP y la reformulación del art. 577
CP, además de las nuevas figuras incorporadas en la LO 5/2010 a las que después se aludirá.
19
Vid. CANCIO MELIÁ, Manuel. Derecho penal del enemigo y delitos de terrorismo. Algunas consideraciones
sobre la regulación de las infracciones en materia de terrorismo en el Código penal español después de la
LO 7/2000. Jueces para la Democracia, n. 44, p. 19-26., jul. 2002.
20
Vid. sólo FARALDO CABANA, op. cit., p. 299ss.
21
La fase de “despolitización” anterior de estas infracciones se inició en el peculiar contexto de la transición
española, en 1978 (L 82/1978); vid. al respecto sólo SOLA DUEÑAS, Angel de. Delitos de terrorismo y
tenencia de explosivos (sección segunda del capítulo VIII del título XVIII del libro II de la Propuesta de
Anteproyecto de nuevo Código penal de 1983. In: Documentación Jurídica 37/40, Monográfico dedicado
a la PANCP, vol. 2 (1983), p. 1224 ss., pp. 1221 y ss., con un criterio muy vacilante: en el breve período
de funcionamiento de la L 82/1982, se gestaba el PLOCP, que volvía a la opción por la incorporación de
una sección expresamente dedicada a los delitos de terrorismo, al igual que posteriormente la PANCP (vid.
DE SOLA DUEÑAS, op. cit., p. 1.223, 1.232ss.); vid. también, en sentido crítico, LAMARCA PÉREZ, op.
cit., p. 162ss.; GARCÍA SAN PEDRO, José. Terrorismo: aspectos criminológicos y legales. Madrid, Centro
de estudios judiciales, 1993. p. 220ss.; ASÚA BATARRITA, en: LH Lidón, p. 71ss.
22
También aquí ocupa el ordenamiento español una posición de vanguardia; decía ya, por ejemplo,
GÓMEZ BENÍTEZ (CPC 16 [1982], p. 64) que “[e]s precisamente en el terreno del adelantamiento del
momento punitivo, es decir, de la punición de los actos preparatorios y en la proliferación de categorías
de ‘partícipes’… en donde la ‘política penal del orden público’ se muestra más ilimitada en España”.
23
Contempla, por lo tanto, las tres modalidades específicas de reacción frente a formas organizadas de
criminalidad que identifica SILVA SÁNCHEZ, Jesus Maria. In: L. H. Ruiz Antón, p. 1.069ss. como posibles:
infracciones específicas, agravación de infracciones comunes y la pertenencia a la organización en sí misma.
Las cosas fueron muy distintas respecto de la segunda DM, aprobada en el año
200825: invocando de modo prácticamente exclusivo la norma europea, la amplia reforma
que introduce la Ley Orgánica 5/2010 en el ordenamiento penal español afectó también
a los delitos de terrorismo26, y ello en tres ámbitos:
por un lado, se produce una reubicación de algunas de las infracciones – debida a
24
SAN 36/2005 (secc. 3ª) 26.9.2005.
25
Vid. sobre lo que sigue también CANO PAÑOS, op. cit., II. ss. y ya CANCIO MELIÁ, Manuel. The Reform of
Spain’s Antiterrorist Criminal Law and the 2008 Framework Decision. In: GALLI, Francesca; WEYENBERGH,
Anne (Ed.). EU counter-terrorism offences: what impact on national legislation and case-law? Brussels: Ed.
de l’Université Libre de Bruxelles, 2012., p. 99ss.
26
Vid. una primera aproximación a este sector de la reforma en CANCIO MELIÁ, 1997, op. cit., p. 521ss.;
sintéticamente, CANCIO MELIÁ, Manuel. Delitos de terrorismo. In: MOLINA FERNÁNDEZ, Fernando
(Coord.). Memento Penal 2011. Francis Lefebvre: Madrid, 2011, n.m. 18.959, 18.982, 19.015, 19.035ss.,
19.050, 19.080.
a) Cambio de ubicación
La profunda reordenación de los delitos de organización que la reforma llevó a
cabo afecta también, como no podía ser de otro modo – el terrorismo es la forma más
27
Sobre su aplicación a los delitos de terrorismo – en relación con el AP 2008 – cfr. el completo análisis crítico
de SANTANA VEGA, Dulce María. La pena de libertad vigilada en delitos de terrorismo. Estudios penales y
criminológicos, n. 29, 2009, p. 447 ss., pp. 447 ss., 474 ss.; vid. también CANO PAÑOS, Op. cit., VII.1.
28
Vid. sólo id., VII.2.
29
Vid., por ejemplo, también en este sentido MUÑOZ CONDE, PE18, p. 921ss.; SÁNCHEZ GARCÍA DE
PAZ, Isabel. GÓMEZ TOMILLO, Manuel (Dir.). Comentarios al Código penal. Valencia: Tirant lo Blanch,
2010. p. 1936ss.
30
Vid. la argumentación en CANCIO MELIÁ, Los delitos de terrorismo, p. 77ss., 80ss.; IDEM, EN DÍAZ-
MAROTO VILLAREJO, JULIO. Estudios, p. 668ss.
31
Cfr. CANCIO MELIÁ, 2010b, Op. cit. p. 194ss.
32
Vid. el análisis de ese comportamiento típico en CANCIO MELIÁ, L. H. Mir Puig, p. 987ss.; IDEM, FS
Puppe, p. 1.449ss.
33
CANCIO MELIÁ, 2010b, Op. cit., p. 212ss.
34
Vid. también CANO PAÑOS, op. cit., III., con ulteriores referencias; LLOBET ANGLÍ, Mariona. Delitos de
terrorismo. ORTIZ DE URBINA GIMENO, Iñigo (Coord.). Memento Experto Reforma Penal 2010. Madrid,
2010. (n.m. 6.039) considera inconstitucional esta interpretación.
35
STS 25.6.1990.
36
Vid. también CANO PAÑOS, Op. cit., III., y la DA 1ª LO 5/2010, que extiende la eliminación – aspecto
olvidado en el AP– a los preceptos no afectados por la reforma.
37
Cfr. STC 199/1987; STS 2/1998 (29.7.1998); vid. también STS 1127/2002 (17.7.2002); 1541/2004
(30.12.2004); 556/2006 (31.5.2006); en detalle, CANCIO MELIÁ, Manuel. Los delitos de terrorismo:
estructura típica e injusto. Madrid: Reus, 2010a., p. 162ss., con ulteriores referencias.
38
Ibid., p. 154ss., 167ss., 176ss.; IDEM, L. H. Gimbernat Ordeig t. II, p. 1.879ss., con ulteriores referencias.
39
Preámbulo, XXIX, párrafo segundo.
6 COLABORACIÓN
40
CANCIO MELIÁ, 2010a, Op. cit., p. 157, p. 158ss., 161.
41
Preámbulo, XXIX, párrafo tercero.
42
Vid., por ejemplo, SAN 36/2005 (secc. 3ª) 26.9.2005; 6/2007 (secc. 1ª) 7.2.2007).
43
CANCIO MELIÁ, 2010a, Op. cit., p. 161.
44
Vid. CANCIO MELIÁ, Manuel. Die Mitgliedschaft in einer terroristischen Organisation im spanischen
Strafrecht. In: PAEFFGEN, Hans-Ullrich et al. (Ed.). Strafrechtswissenschaft als Analyse und Konstruktion.
Festschrift für Ingeborg Puppe zum 70. Geburtstag, 2011. p. 668ss.
45
Así también GARCÍA ALBERO, Ramón. La reforma de los delitos de terrorismo, arts. 572, 573, 574, 575, 576,
576 bis, 577, 578, 579 CP. In: QUINTERO OLIVARES, Gonzalo (Dir.). La reforma penal de 2010: análisis y
comentarios. Navarra; Aranzadi: Thomson Reuters, 2010, p. 376; LLOBET ANGLÍ, Op. cit., n.m. 6.106.
46
Vid., por ejemplo, STS 800/2006 (13.7.2006); 16.2.1999; AAN (secc. 4ª) 8.2.2001; cfr. CANCIO MELIÁ,
Manuel. Los límites de una regulación maximalista: el delito de colaboración con organización terrorista en el
Código penal español. In: CUERDA RIEZU, Antonio; JIMÉNEZ GARCÍA, Francisco (Dir.). Nuevos desafíos del
derecho penal internacional: terrorismo, crímenes internacionales y derechos fundamentales. Madrid: Tecnos,
2009. p. 76ss.; CANCIO MELIÁ, 2010a, op. cit., p. 229ss., 248ss., con ulteriores referencias.
47
Así también LLOBET ANGLÍ, Op. cit., n.m. 6.110ss.
48
En esta línea también MUÑOZ CONDE, PE18, p. 929 ss.; VIVES ANTÓN, Tomás S.; CARBONELL MATEU,
Juan Carlos. Organizaciones y grupos criminales. In: VIVES ANTÓN, Tomás S. et al. Derecho penal: parte
especial. 3. ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 2010. p. 792ss.
49
Preámbulo, XXIX, párrafo cuarto.
50
Así también GARCÍA ALBERO, Op. cit., p. 374ss.
51
Preámbulo, XXIX, párrafo cuarto.
52
Nótese que, de nuevo, se ignora ostensiblemente la doctrina sentada en la STC 136/1999, en la que se declaró
inconstitucional, por desproporcionada, la inclusión en el delito de colaboración con organización terrorista de
comportamientos muy diversos en un mismo marco penal; vid. LLOBET ANGLÍ, op. cit., n.m. 6115.
53
Así también MUÑOZ CONDE, PE18, p. 930.
54
Vid. en detalle CANCIO MELIÁ, 2010a, Op. cit., p. 256ss.
55
Así también GARCÍA ALBERO, Op. cit., p. 377.
7 DELITO DE PROPAGANDA
56
Vid. también LLOBET ANGLÍ, Op. cit., n.m. 6.139.
57
CANCIO MELIÁ, 2010a, Op. cit., p. 248ss., con ulteriores referencias.
58
En palabras de VIVES ANTÓN; CARBONELL MATEU; MIRA BENAVENT, op. cit., p. 795, se castigan “actos
preparatorios de actos preparatorios”.
59
García Albero, La reforma, p. 377, denomina a la figura “provocación impropia”.
60
Vid. los esfuerzos de delimitación de LLOBET ANGLÍ, op. cit., n.m. 6.177ss.
61
Vid. también la enmienda nº 217 en el Senado (Grupo Parlamentario Entesa Catalana de Progrés): “mera
adhesión ideológica”, “delito de opinión que excede claramente del castigo de actos preparatorios”.
62
Así también MUÑOZ CONDE, PE18, p. 935.
63
Preámbulo, XXIX, párrafo cuarto.
64
Así también GARCÍA ALBERO, op. cit., p. 377; PORTILLA CONTRERAS, Guillermo. La reforma de los actos
preparatorios y favorecimiento de delitos de terrorismo, art. 579 CP. In: QUINTERO OLIVARES, Gonzalo (Dir.).
La reforma penal de 2010: análisis y comentarios. Navarra; Aranzadi: Thomson Reuters, 2010. p. 381.
65
En este sentido también la enmienda nº 5 en el Senado (Sampol i Mas PSM-EN).
CONCLUSIONES
66
Preámbulo, XXIX, párrafo cuarto.
67
Vid. sólo CANCIO MELIÁ, 2010a, Op. cit., pp. 62ss., 72ss., 77, con ulteriores referencias.
68
CANCIO MELIÁ, F. S. Jakobs, p. 27ss., 48ss.; CANCIO MELIÁ, Manuel. El injusto de los delitos de organización:
peligro y significado. Revista Regional de Derecho Penal, n. 8, nov. 2007, p. 22ss., 40ss.; logra una sintética y
clara descripción de las diversas opciones de fundamentación SÁNCHEZ GARCÍA DE PAZ, op. cit. p. 1.922ss..
69
O, en palabras del Preámbulo de la LO 5/2010: estas infracciones atentan “directamente contra la base de
la democracia” (XVII, párrafo cuarto), respecto de los delitos de organización comunes, o, respecto de los
delitos de terrorismo, suponen “la mayor amenaza para el Estado de Derecho” (XXIX, párrafo tercero)..
70
Así ya CANCIO MELIÁ, Manuel. A las disposiciones transitorias 1ª a 6ª. In: RODRÍGUEZ MOURULLO,
GONZALO (Dir.).; JORGE BARREIRO, Agustín. Comentarios al Código penal. Madrid: Civitas, 1997. p.
1.272ss., 1285, 1385; SÁNCHEZ GARCÍA DE PAZ, Op. cit., p. 1923, con ulteriores referencias.
71
Preámbulo (XXIX, primera frase).
72
A título de ejemplo cabe mencionar que la transposición de la DM en Alemania (un país con un Derecho
penal antiterrorista que cabe calificar de severo), operada mediante la introducción en 2009 de los nuevos §§
89a, 89b y 91 StGB – que ha generado en la doctrina de ese país una reacción muy crítica: así, por ejemplo,
habla el autor de la monografía de referencia en la materia de que la reforma supone la “bienvenida a
Absurdistán”, ZÖLLER, GA 11/2010, pp. 607 ss. con ulteriores referencias – supone aprehender conductas
que ya se consideraban incluidas en España en los arts. 576 o 579 (vid. también sobre la reforma en aquel país
GAZEAS/GROSSE-WILDE/KIEßLING, NStZ 2009, p. 593 ss.; ampliamente PETZSCHE, Die CANCIO MELIÁ,
Manuel. A las disposiciones transitorias 1ª a 6ª. In: RODRÍGUEZ MOURULLO GONZALO (Dir.); JORGE
BARREIRO, Agustín. Comentarios al Código penal. Madrid: Civitas, 1997. strafrechtliche Bekämpfung).
El Derecho de la UE como coartada, pero con ignorancia provinciana del Derecho comparado.
David Garland1
Tradução de Leandro Ayres França2
RESUMO
Neste artigo é explicado o método de escrever uma “história do presente”, de Michel
Foucault, junto com seus objetivos críticos e suas diferenças quanto à historiografia
convencional. Também é discutida a mudança de Foucault de um estilo de pesquisa
e análise históricas concebido como “arqueologia” para um estilo entendido como
“genealogia”, demonstrando-se como a história do presente implementa a investigação
genealógica e a revelação de conflitos e contextos encobertos como um meio de reavaliar o
valor de fenômenos contemporâneos. O artigo destaca as observações críticas de fenômenos
atuais a partir dos quais começa uma história do presente, prestando particular atenção
ao conceito de “dispositivo” de Foucault e seu método de problematização. As análises
feitas por Foucault do Panóptico de Bentham, das origens disciplinares da prisão moderna
e da tecnologia da confissão são discutidas a título de ilustração.
Palavras-chave: Foucault. História do Presente. Genealogia. Arqueologia. Dispositivo.
Problematização.
1
PhD em Estudos Sócio-Jurídicos pela University of Edinburgh. Doutor honoris causa pela Free University
of Brussels. Mestre em Criminologia pela University of Sheffield. Em 2012, a American Society of
Criminology lhe conferiu o Edwin H. Sutherland Prize por suas excelentes contribuições à teoria e à pesquisa
criminológicas. Autor de diversos livros premiados, dentre os quais Punishment and Welfare: A History of
Penal Strategies (1985); Punishment and Modern Society: A Study in Social Theory (1990); The Culture
of Control: Crime and Social Order in Contemporary Society (2001); e Peculiar Institution: America’s
Death Penalty in an Age of Abolition (2010), nos quais se reconhece sua distinta abordagem sociológica
no estudo das instituições jurídicas. Editado em português, encontra-se disponível A Cultura do Controle:
Crime e Ordem Social na Sociedade Contemporânea, publicado em 2008 pela Editora Revan. É professor
de Sociologia da New York University School of Law.
2
Doutorando e Mestre em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Advogado criminalista. Pesquisador do Grupo de Pesquisa Modernas Tendências do Sistema Criminal.
Mais informações disponíveis em <www.ayresfranca.com>. Tradução: revista por Noyelle Neumann das
Neves. Nota do Tradutor: No caso de textos republicados em língua portuguesa, utilizaram-se colchetes
para as referências, datas e páginas das traduções. Optou-se pela transcrição das citações que se encontram
disponíveis nas edições já traduzidas para o português; em casos de textos não traduzidos, as citações
foram traduzidas e adaptadas pelo tradutor, a partir das publicações utilizadas pelo autor (em inglês).
Michel Foucault certa vez comentou que ele preferia evitar citação, discussão e
reconhecimento elaborados de autores cujas ideias tinham influenciado seu trabalho.3 Ao
invés de citar as obras de Marx, Kant, Nietzsche ou Althusser e explicar como suas ideias
correspondiam a (ou se diferenciavam de) suas próprias, ele simplesmente utilizava os
instrumentos conceituais que esses escritores forneceram, frequentemente transformando-
os no processo. “Quanto a mim, eu prefiro utilizar os escritores dos quais gosto. O único
tributo válido a pensamentos como o de Nietzsche é precisamente utilizá-lo, deformá-lo,
fazê-lo gemer e protestar” (FOUCAULT, 1980, p. 53-54).
Comparado às normas acadêmicas comuns de citação e referência acadêmicas,
isso, tal como muito mais na oeuvre de Foucault, poderia ser visto como levemente
escandaloso. Mas é mais esclarecedor pensar nisso como um aspecto da abordagem
definitivamente pragmática de Foucault ao desenvolvimento teórico e ao uso de conceitos.
Essa abordagem levou-o a considerar “teoria” como uma caixa com ferramentas úteis,
cada instrumento conceitual projetado como um meio de trabalhar em problemas
específicos e de promover certas investigações e não como um fim intelectual em si
ou como um tijolo para um grande edifício teórico. Uma consequência dessa atitude
pragmática é que não há “teoria foucaultiana” que surja da oeuvre de Foucault: nenhum
sistema teórico já pronto que possa ser “aplicado” por outros. No lugar disso, o que
Foucault nos disponibiliza é uma série de análises bastante específicas e precisamente
teorizadas, cada uma mobilizando uma metodologia personalizada projetada para tratar
um problema teoricamente definido a partir de um ângulo estratégico de investigação.
Essa mesma abordagem resolutiva de problema – juntamente com a extraordinária
fertilidade do pensamento de Foucault – é o que o levou a desenvolver novos (ou
extensivamente revisados) conceitos para cada novo projeto em que ele embarcou e
para cada novo tipo de fenômenos que ele procurou explicar.
Tomemos por exemplo o conceito de poder. Ainda que questões de poder tenham
sido um interesse recorrente por todo o seu corpo de trabalho, desde Folie et Deraison:
Histoire de la folie a l’age classique, de 1961, até Le Souci de soi, de 1984, as conceituações
que ele mobilizou apresentaram uma tendência distinta de desenvolvimento e evolução.
3
“Frequentemente eu cito conceitos, textos e frases de Marx, mas sem me sentir obrigado a adicionar a
etiqueta de autenticidade de uma nota de rodapé com uma frase laudatória para acompanhar a citação”
e, depois, na mesma entrevista: “Eu prefiro permanecer calado quanto a Nietzsche” (FOUCAULT 1980,
p. 52-53).
4
Para uma visão geral, ver os excertos colhidos em Foucault (2000).
5
cf. Gary Gutting: “A peculiaridade de Foucault como um historiador do pensamento repousa menos em
sua invenção de novos métodos do que em sua vontade de empregar quaisquer que sejam os métodos
que pareçam necessários por sua matéria específica” (GUTTING, 2006, p. 14).
6
Para tentativas de se escrever uma “história do presente” no que diz respeito à criminologia e à pena, ver
Garland (1992; 1994; [2008]; 2010), Rose (1999) e Harcourt (2011).
7
O trabalho de Foucault tem sido um tema de muita controvérsia e considerável mal-entendido entre
historiadores: ver Megill (1987) e Goldstein (1994). Uma notável exceção é o colega de Foucault no Collège
de France, o historiador Paul Veyne. Vide a entusiástica e esclarecida discussão sobre o método histórico
de Foucault em Veyne ([2009]).
8
Para outras análises, ver Roth (1981) e Poster (1987/1988). Ver também History of the Present: A Journal
of Critical History, disponível em: <www.historyofthepresent.org>.
9
Em 1967, Foucault falou de suas histórias como compromissos diagnósticos com o presente: “Ao tentar
fazer um diagnóstico do presente no qual vivemos, nós podemos isolar como já pertencentes ao passado
certas tendências que ainda são consideradas contemporâneas [...]”, apud Williams (2005).
10
No início da década de 1970, Foucault estava ativo no Groupe Information sur les Prisons (GIP) e ele
atribuiu alguns dos insights de “Vigiar e Punir” a essa experiência. Ver também Foucault (1974). No entanto,
a maioria dos temas desenvolvidos neste livro já está presente, até certo ponto, em trabalhos anteriores,
como “História da Loucura na Idade Clássica” e “O Nascimento da Clínica” (FOUCAULT, [2010]; [2008a]).
2 ARQUEOLOGIA
11
NT: No texto original, Garland refere as datas das primeiras traduções em inglês: “The Birth of the Clinic:
An Archaeology of Medical Perception” (1973); “The Order of Things: An Archaeology of the Human
Sciences” (1970) e “The Archaeology of Knowledge” (1972).
12
Ver Foucault ([1999b, p. 122]), onde ele escreve: “A história do dispositivo da sexualidade, assim como se
desenvolveu a partir da época clássica, pode valer como arqueologia da psicanálise”.
13
Sobre o a priori histórico, ou “a história daquilo que torna necessário uma certa forma de pensamento”,
Foucault, apud Megill (1979:459). Foucault utiliza o termo “epistemes” por todo “As palavras e as coisas
“e o discute brevemente em “A arqueologia do saber”.
14
A aula inaugural de Foucault no Collège de France já havia anunciado esta mudança ([1999a]). Ver também
“Nietzsche, a genealogia e a história”, que data do mesmo ano (reeditada em Foucault [1984]).
15
Em 1975, Foucault diz “se eu quisesse ser pretensioso, eu daria ‘a genealogia da moral’ como o título geral
ao que estou fazendo” (FOUCAULT 1980, p. 15).
3 GENEALOGIA
16
“[...] pois não há princípio mais importante para toda ciência histórica do que este, [...] o de que a causa da
gênese de uma coisa e a sua utilidade final, a sua efetiva utilização e inserção em um sistema de finalidades,
diferem toto coelo [totalmente]; de que algo existente, que de algum modo chegou a se realizar, é sempre
reinterpretado para novos fins, requisitado de maneira nova, transformado e redirecionado para urna nova
utilidade, por um poder que lhe é superior [...]” (Nietzsche [2007, p. 65-66]).
17
Ver Dean (1994).
18
A noção de Foucault sobre uma “superfície de emergência” descreve o conjunto de condições históricas a
partir das quais emergem práticas específicas. Assim, por exemplo, as penitenciárias modernas formaram a
superfície de emergência para a ciência da criminologia e o ensino clínico foi a superfície de emergência
que tornou possível a moderna medicina positiva.
19
Foucault ([2002]) trata do primeiro. Garland (2010) trata do segundo. Ian Hacking (1990) implementa um
método similar de análise histórica no intuito de dar sentido a conceitos filosóficos que, em nossas discussões
contemporâneas, parecem opacos ou ininteligíveis. Sua hipótese – que deve tanto a Wittgenstein quanto
a Foucault – é de que muitos de nossos enigmas filosóficos são o resultado de mudanças históricas, em
significado e contexto: somente ao traçar seu desenvolvimento genealógico nós podemos dar sentido a
esses enigmas contemporâneos. Ver também Skinner (2010) sobre o conceito do estado e dos complicados
processos históricos por meio dos quais ele se desenvolveu ao longo do tempo.
20
Como observa Robert Castel (1994, p. 252), numa discussão sobre o método genealógico de Foucault: “O
direito de escolher os materiais de alguém e de os reorientar à luz de um assunto atual, de os dispor em
categorias diferentes, por exemplo – não é uma permissão para reescrever a história. Cometer equívocos
históricos, que podem ser entendidos como afirmações sobre a história que um historiador poderia refutar,
não é um direito”.
21
Ver Megill (1979, p. 492).
Ao projeto de Jeremy Bentham para uma prisão panóptica (uma casa de inspeção
anular com celas abertas e iluminadas à contraluz, dispostas num perímetro circular em
torno de uma torre de vigilância central), primeiramente publicado na última década do
século XVIII, é dado um lugar central na explicação de Foucault.22 “Vigiar e Punir” trata o
Panóptico como o modelo, o projeto programático, não só para as penitenciárias do final
do século XVIII e início do século XIX, mas para a prisão moderna como tal – e, certamente,
para a moderna sociedade “panóptica”, em geral. Na análise de Foucault, o projeto do
Panóptico de Bentham é um elemento histórico de significado sem paralelo.
Em resposta à argumentação de Foucault, historiadores têm levantado uma série
de objeções. Como uma questão de fato histórico, salientam eles, a prisão projetada por
Bentham jamais foi construída porque o governo britânico considerou-a impraticável
e excessivamente cara. Eles insistem que Bentham quase faliu em seus esforços para
realizar seu plano, que seu projeto radical foi raramente copiado por construtores de
prisões em outros lugares, e que, em geral, Foucault dá demasiada importância ao que
os contemporâneos de Bentham consideraram como um projeto excêntrico que acabou
em fracasso23. Contudo, essas críticas – ainda que bastante válidas em seus próprios
termos – perdem o ponto. De fato, há um tipo de equívoco categórico em tratar o estudo
de Foucault como um trabalho de pesquisa histórica convencional que simplesmente
acrescenta ao que já sabemos da historiografia prisional existente, quando, em verdade,
o tratamento dos materiais históricos feito por Foucault é completamente diferente em
seu enquadramento e sua intenção.
O objetivo de Foucault não é a preocupação padrão dos historiadores de estabelecer
o significado e a sorte do projeto de Bentham, como compreendido dentro de seu contexto
social e intelectual original. Em vez disso, seu propósito é demonstrar o papel que o
Panóptico desempenhou em formatar nosso presente. Como insiste Foucault, na história
22
Bentham 1843 [2008].
23
Ver Sempel (1993), Perrot (1980) e Himmelfarb (1968). Para uma interessante discussão, ver Smith (2008).
O significado e a importância que Foucault atribui aos seus objetos de estudo (nesse
caso, o Panóptico, mas seu tratamento da tecnologia de confissão em sua “História da
Sexualidade I” levanta as mesmas questões) não são aqueles do período histórico nos quais
essas práticas emergiram primeiro, porém, enfaticamente, aqueles do presente. Tais práticas
podem ter sido marginais na vida social e política dos séculos XVII e XVIII, mas Foucault
considera-as como absolutamente centrais às genealogias e ao funcionamento de regimes
de poder-saber que operam no presente.24 Para Foucault, os princípios de observação e
individualização, visibilidade e disciplina, poder e saber contidos no projeto de Bentham
oferecem uma rede de inteligibilidade para compreender como o poder opera em nossa
sociedade atual. O historiador do presente não comete o pecado do anacronismo ao ler
o presente sobre o passado. Antes, ele ou ela está comprometido com o projeto histórico-
crítico de identificar traços do passado (lutas de poder, formas de controle, alianças e
associações históricas) e sua operação contínua hoje.25
24
Ver Castel (1994, p. 240) para uma discussão sobre a prática de “problematização” de Foucault.
25
“A maioria dos tópicos que ele analisa era constituída de fatos periféricos e relativamente menores na
época antiga; ele os escolheu devido a seus intereses atuais e porque estes tópicos mais tarde, até certo
ponto, se confundiram com formas de poder” (Dreyfus e Rabinow [1995, p. 133]).
Um segundo exemplo dos efeitos produzidos por uma “história do presente” pode ser
visto na distinta explicação de Foucault sobre os processos genealógicos que deram origem
à prisão moderna. Estudos históricos convencionais sempre admitiram que as origens do
movimento penitenciário do final do século XVIII podem ser traçadas às ideias penológicas dos
reformadores do período iluminista, tais como Beccaria, Mably, Le Peletier, e Servan, ou então
à influência de instituições custodiais do início da era moderna, como a holandesa Rasphuis,
a inglesa Bridewell e a prisão do Vaticano (ver, por exemplo, Morris e Rothman [1995]). No
entanto, a interpretação de Foucault das origens históricas rompe com essas explicações
padrões e as põe em xeque. Primeiro, ele demonstra que as propostas reformadoras dos
ideólogos da época ilustrada não eram, de modo geral, voltadas à construção de prisões e
penitenciárias. Ao contrário, a maioria dos reformadores viam o aprisionamento com grande
suspeita, preferindo sanções não privativas de liberdade, como multas, ou trabalhos públicos,
ou outras penalidades “análogas” destinadas a educar os espectadores ao punir infratores
de maneiras que espelhassem os crimes que eles cometeram. E ele insiste que, antes de sua
extraordinária expansão no final do século XVIII, a prisão
“não era, com se imagina, um castigo que já estivesse solidamente instalado no sistema
penal, logo abaixo da pena de morte, e que teria naturalmente ocupado o lugar deixado
vago pelo desaparecimento dos suplícios. Na realidade a prisão [...] tinha apenas uma
posição restrita e marginal no sistema das penas” (FOUCAULT [2002, p. 97]).
26
A história do movimento contra a penologia correcional é, evidentemente, muito mais complexa, e a crítica
de Foucault foi apenas uma entre muitas. Para um relato mais completo, ver Garland ([2008]).
E eis como ele descreve o dispositivo específico que governa nossa atual experiência
do sexo:
A sexualidade é o nome que pode se dar a um dispositivo histórico: não à realidade
subterrânea que se apreende com dificuldade, mas à grande rede da superfície em que a
estimulação dos corpos, a intensificação dos prazeres, a incitação ao discurso, a formação
dos conhecimentos, o reforço dos controles e das resistências encadeiam-se uns aos outros,
segundo algumas grandes estratégias de saber e de poder. ([FOUCAULT, 1999b, p. 100]).
27
Em “Vigiar e Punir”, o dispositivo que Foucault identifica é o “atual complexo científico-judiciário onde
o poder de punir se apoia, recebe suas justificações e suas regras, estende seus efeitos e mascara sua
exorbitante singularidade” (2002, p. [23]), e a questão que ele coloca é: por que a época moderna adota
tão entusiasticamente a prisão quando, como uma instituição correcional, ela sempre foi um fracasso?
BENTHAM, Jeremy. Panopticon: or, The Inspection House Containing the Idea of a New
Principle of Construction Applicable to Any Sort of Establishment, in Which Persons of Any
Description Are to Be Kept Under Inspection. In: The Works of Jeremy Bentham. Edinburgh:
William Tait, 1843. v. 4. [BENTHAM, Jeremy. O panóptico. Trad. Tomaz Tadeu da Silva. 2. ed.
Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
CASTEL, Robert. Problematization and Reading History. In: GOLDSTEIN, Jan (Ed.). Foucault and
the writing of history. Oxford: Blackwell, 1994.
DEAN, Mitchell. Critical and effective histories: Foucault’s methods and historical sociology.
London: Routledge, 1994.
DREYFUS, Hubert; RABINOW, Paul. Michel Foucault: beyond structuralism and hermeneutics.
Chicago: University of Chicago Press, 1982. [DREYFUS, Hubert; RABINOW, Paul. Michel
Foucault: uma trajetória filosófica (para além do estruturalismo e da hermenêutica). Trad. Vera
Porto Carrero. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.]
FOUCAULT, Michel. Madness and civilization. London: Tavistock, 1967. [FOUCAULT, Michel.
História da loucura na Idade Clássica. Trad. José Teixeira Coelho Netto. 9. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2010.]
_____. The order of things: an archaeology of the human sciences. London: Tavistock,
1970. [FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas.
Trad. Salma Tannus Muchail. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.]
_____. L’ordre du discours. Paris: Gallimard, 1971. [FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso:
aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. Trad. Laura Fraga
de Almeida Sampaio. 5. ed. São Paulo: Edições Loyola, 1999a.]
_____. The archaeology of knowledge. London: Tavistock, 1972. [FOUCAULT, Michel.
A arqueologia do saber. Trad. Luiz Felipe Baeta Neves. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2008.]
_____. Birth of the clinic: an archaeology of medical perception. London: Tavistock, 1973.
[FOUCAULT, Michel. O nascimento da clínica. Trad. Roberto Machado. 6. ed. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2008a.]
_____. Michel Foucault on Attica: An Interview. Telos. n. 19, 1974. p. 154-161.
_____. Discipline and punishment: the birth of the prison. Transl. Alan Sheridan. New York:
Pantheon, 1977. [FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel
Ramalhete. 25. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.]
_____. Power and Sex: An Interview with Michel Foucault. Telos. n. 32, 1977a. p. 152-161.
_____. The history of sexuality: an introduction. Transl. Robert Hurley. New York: Pantheon
Books, 1978. v. 1. [FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber.
Trad. Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. 13. ed. Rio de Janeiro:
Graal, 1999b.]
ABSTRACT
The article aims to show that some interpretations of commission by omission violate the
principle of legality to extend responsability far away from where the standard would allow.
Commission by omission is based on an equivalence of meaning between the omission
and the actions described in the active verbs of different Tatbestand. The determining
factor in deciding whether someone has killed is not whether we have a omission or active
action but whether, from the point of view of meaning, we can say that he killed, which
means, that death is attributable, understood this term as attribution the realization of that
particular sense. However, a sector of the doctrine and jurisprudence consider that what
matters is that it is materially equivalent behaviors regardless of what the person says. Thus
the “Tatbestand” is shredded and replaced by the particular valuation of each performer, so
everyone seems to deserve the same consequence. This implies a violation of the principle of
legality and, therefore, is to traspass the constitutional limits of the commission by omission.
Keywords: Action. Commission by omission. The meaningful conception of action.
Imputation criteria: constitucional limits. Principle of legality
1
Profesora titular de derecho penal Universitat Jaume I (Castellón).
2
Vid. además de la obra del propio Vives que aparece en la relación de sus publicaciones, las valiosas
aportaciones de JIMENEZ REDONDO, M. Estudio preliminar. In: VIVES ANTÓN, T. S. Fundamentos del
sistema penal: acción significativa y derechos constitucionales. 2. ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 2011.
p. 33-98; MARTÍNEZ-BUJÁN, PÉREZ, C. La concepción significativa de la acción de T. S. Vives y sus
correspondencias sistemáticas con las concepciones teleológico-funcionales del delito. Revista Electrónica
de Ciencia Penal y Criminología, Granada, v. 1, n. 2, p. 1-13, 1999. Disponível em: <http://criminet.
ugr.es/recpc/recpc>; del mismo autor: Acción, norma y libertad de acción en un nuevo sistema penal.
In: GARCÍA VALDÉS, C. y otros (Coord.). Estudios penales en homenaje a Enrique Gimbernat. Madrid:
Edisofer, 2008. p. 1.237ss.; RAMOS VÁZQUEZ, J. A. Concepción significativa de la acción y teoría jurídica
del delito. Valencia: Tirant lo Blanch, Valencia, 2008. Un interesante desarrollo de las pretensiones de
validez específicas en .ORTS BERENGUER, E.; GONZÁLEZ CUSSAC, J. L. Compendio de derecho penal:
parte general e especial. Valencia: Tirant lo Blanch, 2004.
De cuanto se lleva dicho se deduce sin dificultad cuáles son esas consecuencias
prácticas a que conducen las pretensiones dogmáticas de conceptualización. La cuestión
es que éstas no son una especie de juego intelectual al que la doctrina se entrega, sino
que impregnan las decisiones de nuestros tribunales, cada vez, por cierto, más inclinados
3
SCHÜNEMANN, Bernd. El llamado delito de omisión impropia o la comisión por omisión: GARCÍA
VALDÉS, C. y otros (Coord.). Estudios penales en homenaje a Enrique Gimbernat. Madrid: Edisofer,
2008. p. 1.626.
4
Me interesa insistir en la responsabilidad de la dogmática porque lo cierto es que por la vanidad de ser únicos
eliminamos cualquier posibilidad de consenso, creando un universo de teorías que sustituyen a otras teorías
que pronto se verán desplazadas por otras que no son ni más ni menos convincentes pero sí son nuevas.
Los jueces se han limitado a seguir nuestro ejemplo, sin reparar _ eso sí _ en que la impredecibilidad de sus
decisiones tiene en la libertad del ciudadano un impacto del que carecen las diferentes opciones dogmáticas
5
VIVES ANTÓN, Tomás S.; COBO DEL ROSAL, Manuel. Derecho penal: parte general. 5. ed. Valencia: Tirant
lo Blanch, 1999. p. 386.
6
No obstante, no puedo ocuparme de separar las propuestas de mi maestro de otras que se le asemejan
o más bien parecen asemejársele. Si que diré, sin embargo que en el fondo de algunas propuestas que
coinciden en concebir acción y omisión como expresión de sentido sigue latiendo la idea de la acción
positiva como movimiento corporal. Eso explica que justamente para ejemplificar la inesencialidad del
sustrato, algunos llamen acción al hecho de acelerar y atropellar a un peatón y omisión al de no pisar el
freno y atropellarlo igualmente, pese a que, como es obvio, la acción es atropellar a un peatón y frenar y
acelerar no son sino concreciones o momentos de esa acción que es de la que derivamos el significado.
• Por otra parte, conviene no desconocer que bajo apariencias similares pueden ocultarse concepciones
distintas (cfr. vg la interesante propuesta de BUSATO, P. C. Derecho penal y acción significativa. Valencia:
Tirant lo Blanch, 2007, y su reformulación de la acción como valoración de un sustrato) o diametralmente
opuestas. Eso último es, a mi modo de ver, lo que acontece, por limitarme a un caso evidente, entre la
propuesta de Vives y ALCÁCER GUIRAO, R. Como cometer delitos con silencio: notas para un análisis
del lenguaje de la responsabilidad. In: TOLEDO Y UBIETO, E. O; GURDIEL SIERRA, M.; CORTÉS
BECHIARELLI, Emílio (Coord.). Estudios penales en recuerdo del profesor Ruiz Antón. Valencia: Tirant
lo Blahch, 2004. p. 21-54 . Pese a que este último autor se empeñe en emparentarlas (p. 38, nota 73),
lo cierto es que las separa una importante diferencia de planteamiento porque, sin duda, los autores
hablan del significado en sentidos muy distintos (sobre las concepciones del significado, vid la acertada
exposición que VIVES ANTON ofrece en sus Fundamentos, p. 208ss). Por lo demás, es evidente que
si Alcacer hubiera entendido bien la propuesta de Vives nunca hubiera caido en la tentación de decir
que aquél “otorga una excesiva relevancia al lenguaje cotidiano como canon de interpretación […]”,
dejando caer que lo que defiende es sustituir “la construcción de criterios de imputación dogmáticos
por una aproximación intuitiva a los términos de la ley” (p. 51). Con ello, entre otras cosas, se sugiere
que la concepción de Vives es algo así como una simple remisión a los usos lingüísticos del lenguaje
cotidiano, sin advertir la sustancial diferencia que media entre semejante cosa y la apelación al uso
común del lenguaje, que, desde luego, ni se reduce a un mero enunciado lingüístico (ya que es obvio
que de las meras palabras como simple enunciado lingüístico no emana el significado), ni, desde luego,
excluye los usos especializados en la medida en que éstos contribuyen a fijar el significado en el ámbito
específico al que se refieren. Por lo demás, Vives no discute que el lenguaje tenga _ como tiene _ zonas de
penumbra. La diferencia con lo que otros proponen es el férreo convencimiento de que lo más garantista
es salvar esas zonas de penumbra con prácticas de uso uniformes. Ese es el único cometido legítimo
de los criterios de interpretación: servir como criterios de uso que alumbren esas zonas de penumbra.
7
Si nos fijamos, esta confusión que subyace en algunos planteamientos de la omisión no es distinta de la
que se advierte en una extendida concepción de la autoría. En ambos casos, un importante sector de la
doctrina ha renunciado a responder a la pregunta de quien realizó la conducta _ activa u omisiva _ y la ha
sustituido por la de quién es el responsable. Para ello nada mejor que utilizar la infracción del deber como
momento general de la autoria y banalizar la diferencia entre acción y omisión, sustituyéndolas por las ideas
de competencias de autorganización y competencia institucional. Para construir la autoría con esos mimbres
lo esencial es determinar la competencia, esto es, analizar si puede imputarse a alguien la infracción del
deber. En virtud de tal razonamiento, la competencia precede a la determinación de si se realizó la acción
o la omisión. Así se entiende que acabe por banalizarse la diferencia entre la acción y la omisión, pues, a fin
de cuentas, no es su realización lo que determina la autoria. Vid un inteligente análisis crítico sobre el modo
en que tradicionalmente se ha planteado el problema de quién puede ser tenido por autor, en GÓRRIZ,
E. El concepto de autor en derecho penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2008, con prólogo de Vives. (vid.
especialmente, apartado 5).
Pese a lo que el título pudiera sugerir, advierto ya al lector de que bajo el mismo no
se esconde un vano empeño por reconsiderar cuantas formulaciones se han hecho de la
comisión por omisión con el fin de limitar su alcance. Por una parte, esa sería una empresa
abocada al fracaso dado el breve espacio de que se dispone. Pero sobre todo, sería inútil al
objetivo que aquí se persigue que no es en modo alguno hacer ni una exégesis del art. 11
CP, ni enjuiciar el conjunto de las que se han hecho.9 Lo que se pretende es poner sobre
la mesa las razones que, a mi modo de ver, convierten en ilegítimos determinados modos
8
“Acción y omisión: tres notas a un status quaestionis”, en Estudios penales en recuerdo del profesor Ruíz
Antón, cit., p. 1.113ss. Sobre la posición que reduce acción y omisión a una mera delimitación de naturaleza
técnica y, por ende, califica de superficial su diferencia, vid. por todos JAKOBS, G. La competencia por
organización en el delito de omisión: consideraciones sobre la superficialidad de la distinción entre comisión
y omisión”. In:____. Estudios de derecho penal. Madrid: Civitas, 1997, JAKOBS, G. La imputación penal
de la acción y de la omisión. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 1996 .
9
No se vea, pues, en la omisión de referencias bibliográficas obligadas en un estudio de esa otra naturaleza
nada que pueda parecerse al desprecio intelectual o a la ignorancia.
10
Sobre tal cuestión, Thomas. Leviatán: la materia,forma y poder de un estado eclesiastico y civil. Tradução
de Carlos Melllizo. Madrid: Alianza, 1989. Segunda parte, caps. 27-28. VIVES, El ius puniendi y sus límites
constitucionales, Tol 817272.
11
Creo que acierta SILVA SANCHEZ cuando dice que lo mejor hubiera sido incluso no decir nada (COBO
DEL ROSAL, Manuel; VIVES ANTON, Tomás S. Derecho penal: parte general 5. ed. corr. y aum. Valencia:
Tirant lo Blanch, 1999. p. 457ss) porque lo cierto es que la introducción de la clàusula en lugar de generar
certeza ha creado inseguridad, por lo que el balance desde una perspectiva constitucional no puede ser
positivo (Cfr. S. Huerta TOCILDO, S. Principales novedades de los delitos de omisión en el Código
penal de 1995. Valencia: Tirant lo Blanch, 1997, p. 47ss).
12
Comentarios al Código penal, op. cit., p. 526 y VIVES ANTON, T .S.; MANZANARES SAMAN IEGO, J.
L. (Dir.). Principios constitucionales y dogmàtica penal. In: ____.____. Estudios sobre el Código penal
de 1995, Madrid: Consejo General Del Poder Judiciario, 1996. p. 50. Así puede entenderse mejor que
la posición de garante sea un momento constitutivo de la equivalencia porque si quien omite no está en
posición de garantía es imposible entender que su omisión equivale a la causación y, del mismo modo, esa
perspectiva evidencia muy claramente por qué ciertas clases de posición de garante no permiten afirmar
la comisión por omisión. Por ello, aunque en ocasiones se aluda a la lógica de la equivalencia, a la lógica
lingüística y a la lógica del deber, esa triple referencia no puede llevarnos a creer que se trata de lógicas
enfrentadas, lo que indudablemente no son
13
Por mucho que valorativamente la conducta pueda merecer desde una perspectiva social un reproche
idéntico al que resultaría de haberse alcanzado el resultado a través de una conducta activa. En suma,
como bien ha defendido Silva en diversos lugares, en el art. 11 no tienen cabida las llamadas omisiones
de gravedad intermedia, que, en su caso, habrá que residenciar en las llamadas, en la atinada terminología
del mismo autor, omisiones puras de garante. Claro esta, sin embargo, que si resulta que el legislador no
ha previsto una cualificación del tipo de omisión pura que permita sancionar más gravemente el caso en
cuestión, lo que no podemos es imponer nuestra valoración frente a lo que dice la ley (Vid. el trascendental
VIVES ANTON, T. S. El delito de omisión: concepto y sistema. Barcelona: Bosch, 1986. p. 344ss., así como
posteriores trabajos suyos que abundan en la misma idea, vg., además de los ya cit. SILVA SANCHEZ, J.
M. El nuevo Código penal: cinco cuestiones fundamentales, Barcelona:Bosch, 1997. p. 70ss).
14
Vid. vg. SSTS 15/04/1997 (Tol 407.627), 26/06/2000 (Tol 272.745), 22/01/2001(imputando también la
tentativa de homicidio, Tol 130.154,) 31/10/2002 (Tol 229.918). Esa vinculación bàsica entre autoría y
acción se rompe también en los casos en que se condena al garante como coautor por omisión de delitos
contra la libertad sexual de menores realizados por terceros o en los supuestos de abusos a menores ante
la pasividad de los padres o de uno de ellos (vid, vg, la STS 10/10/2006, donde, además, se les impone
una pena superior a la que corresponde al autor material de los hechos, Tol 1.009.754).
15
Pensemos, vg, en la interpretación que en ocasiones se hace del término “resultado” o, para ser más exactos,
de la fórmula que el art. 11 emplea: “delitos que consistan en la producción de un resultado”. Nótese que lo
que el legislador ha pretendido ha sido solventar lo que, acertadamente o no, se ha considerado siempre que
era la problemática específica de la comisión por omisión, esto es, la referida a la causalidad material de la
omisión. Si por “delitos que consistan en la producción de un resultado” hubiera que entender cualquier tipo
de resultado, desaparece el problema (o, pseudoproblema, cuestión en la que no se va a entrar), puesto que
también la omisión puede “causarlos” y, por ende, pierde sentido cualquier tipo de previsión expresa. No es
que a la doctrina se le escape que todo ello obliga a desterrar concepciones amplias del término “resultado”,
con la consiguiente reducción del ámbito de la comisión por omisión. Lo curioso es que, incluso quienes
dicen manejar un concepto restrictivo de resultado, acaban por aceptar la comisión por omisión en hipótesis
en las que en modo alguno puede decirse que estemos ante una conducta descrita en el tipo por referencia
a la modificación del mundo exterior que la misma provoca (y de ahí que la equivalencia se establezca entre
la no evitación de ese resultado y su causación). Paradigmática por muchas razones la STS 25/03/2004 (Tol
448.588): inducción por omisión de un delito de inducción al abandono del domicilio familiar.
Lo mismo cabe decir, por ir terminando, del modo en que se solventan las dudas que versan sobre la posición
de garante o sobre su contenido y límites. La feliz expresión con que Gimbernat se refiriera a los miembros
de la familia como “focos de peligro andantes” (ADPCP, 1994, III, p. 58) para criticar evidentes excesos me
parece que expresa muy gráficamente cómo también por esa vía nos hemos ido apartando de la equivalencia
lingüística para ampliar la comisión por omisión en contra del reo. La cuestión es que la clase y el número
de “focos de peligro” aumenta de manera alarmante hasta el punto de que alguna sentencia imputa en
comisión por omisión un delito de tráfico de drogas al padre por ser el titular del domicilio donde su hija
traficaba con esas sustancias (STS 7/12/2000, Tol 117.354, cfr., vg, con la STS 29/01/2008, Tol 1.292.773,
que paladinamente afirma que “una posición de garante de esta naturaleza no cuenta con el menor respaldo
legal”, FJ12 o STS 12/06/2008, Tol 1.347.092, con ulteriores citas). Vid asimismo STS 28/05/2004 (Tol 452.890):
garante obligado a evitar el resultado es el amigo de la víctima por ser esa amistad el motivo por el que ella
accedió a acudir al domicilio de un tercero que la agredió sexualmente; STS 28/02/2007 (Tol 1.049.920):
responsabilidad en comisión por omisión del delito de homicidio por el hecho de haber sido quien dio pie
al enfrentamiento entre la víctima y el autor material de los golpes que le produjeron la muerte. Como es
obvio, la crítica no se opone a la posibilidad, según el caso, de exigir responsabilidad por otros conceptos.
Sobre el particular resulta de singular interés la obra de. Lascuraín SANCHEZ, J. A. Los delitos de omisión:
fundamento de los deberes de garantía. Madrid: Civitas, 2002.
16
Sobre tal cuestión, vid, vg, los pareceres de RODRÍGUEZ MESA, J. La atribución de responsabilidad en
comisión por omisión. Cizur Menor (Navarra): Thompson Aranzadi, 2005. p. 91ss), HUERTA TOCILGO,
S. Principales,novedades de los delitos de omisión en el código penal de 1995. Valencia: Tirant lo
Blanche, 1997. cit., p. 34ss) o el propio VIVES ANTON, T. S. Comentarios al Código Penal, op. cit, cap.
1, p. 529. Cfr., por todos, Silva SANCHEZ, J. M. Comentarios al código penal, op. cit , v. 1, p. 462ss)
17
Vid nota 2.
18
Entre otras, las siguientes: en primer lugar, el hecho de que los padres adoptaran todo un conjunto de medidas
dirigidas a evitar la muerte. Así, no sólo trasladaron a su hijo a diversos hospitales y lo sometieron a cuidados
médicos, sino que buscaron en todo momento tratamientos alternativos “siendo su deseo- según el hecho
probado- que el niño hubiera permanecido hospitalizado hasta localizar al nuevo especialista médico”,
actuaciones todas ellas que parecen contradecir el significado que el TS atribuyó a su conducta. En segundo
lugar, los padres nunca se opusieron a la actuación de los poderes públicos para salvaguardar la vida del menor
e incluso acataron desde el primer momento la decisión judicial que autorizaba la primera transfusión, siendo
los médicos quienes rechazaron realizarla, desechando la utilización de algún procedimiento anestésico que
la hubiera hecho posible pese a la abierta negativa del niño. Por último, hay que subrayar las circunstancias
referentes a la oposición del menor, pues, con independencia de que ésta no vinculase a los padres por no
constar el grado de madurez del mismo, se trata de un extremo que resulta trascendente a otros efectos.
Concretamente, a la hora de pronunciarse sobre la posible eficacia salvífica de la conducta omitida, cuestión
que el TS ventila dándola por supuesta y, por si lo anterior no bastara, combinando esa presunción con el
criterio del incremento de la situación de peligro para la vida que supuso lo que califica _ contraviniendo los
hechos probados _ como “oposición” al tratamiento transfusional. Frente a lo anterior, lo menos que puede
decirse es que resulta harto discutible que la actuación suasoria de los padres fuera eficaz a los efectos que
se pretendían, toda vez que se trataba de una persona de trece años que _ según los hechos probados _
rechazaba “consciente y seriamente la realización de una transfusión en su persona”, hasta el punto de
que, cuando le iba a ser practicada tras la primera autorización judicial, “la rechazó con auténtico terror,
reaccionando agitada y violentamente en un estado de gran excitación”, sin que el personal sanitario lograra,
pese a intentarlo repetidas veces, que la aceptase. Ante ese estado de cosas resulta inadmisible concluir que
la omisión en la que los acusados incurrieron _ no convencer al menor para que aceptase la transfusión _
equivale a la causación de la muerte en el sentido del texto de la ley.
19
No es casual que el propio TC, haciendo uso de las facultades concedidas por el art. 84 LOTC, dictase
una providencia a fin de que las partes alegasen lo que estimasen pertinente “sobre la relevancia que,
para la decisión del recurso de amparo, pudiera tener lo dispuesto en el art. 25.1 CE” (antecedente 9).
Modestamente entiendo que las partes no entendieron el planteamiento y por ello desaprovecharon la
oportunidad que se les brindaba, lo que tal vez explica la parquedad argumental con que el TC declaró
igualmente vulnerado el principio de legalidad sin entrar a hacer un pronunciamiento más expreso (FJ 16).
20
“El ius puniendi y sus límites...”, cit.
21
Sobre la imposibilidad de identificar el seguimiento de reglas con la interpretación, vid. WITTGENSTEIN,
L. Investigaciones filosóficas: n. 198 y 202. Tradução de A.García Suárez y U. Moulines. Barcelona:
Crítica, 1988; VIVES ANTÓN, Tomás S. Principio de legalidad, interpretación de la ley y dogmàtica penal.
In: DÍAZ Y GARCÍA CONLLEDO, M.;GARCÍA AMADO, J. A.(Coord.) Estudios de filosofía del derecho
penal., Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2006. p. 304ss; del mismo, prólogo a la obra de
RAMOS VÁZQUEZ, cit., p. 24.
22
Vid las consideraciones que sobre el particular realiza VIVES ANTON a partir de un aparato bibliográfico que
no puedo aspirar a manejar mejor que él (además de lo dicho en los Fundamentos..., cit., singularmente en
p. 213ss, vid el más reciente “Reexamen del dolo. In: MUÑOZ CONDE, F. (Coord.). Problemas actuales
del derecho penal y la criminología: estudios en memoria de la Profesora Dra. María del Mar Díaz Pita.
Valencia: Tirant lo Blanch, 2008. p. 375ss.
23
Con ellas, el Tribunal Constitucional vino a poner fin a una época de ampulosas declaraciones y déficit
aplicativo y abrió otra de control más intenso, en la cual las exigencias de la legalidad ya no se detienen en
la constatación de que la subsunción realizada no es ajena al significado posible de los términos empleados
por la norma aplicada, sino que se extienden a la imprevisibilidad de la decisión para sus destinatarios”
(STC 137/1997 FJ 7º). Esa doctrina constitucional obliga a cerrar el paso a cualquier decisión judicial
que, explícita o implícitamente, se asiente sobre una libertad interpretativa que haga ineficaz la garantía
representada por la previsibilidad (sobre cuyo verdadero alcance queda, por cierto, mucho por decir, vid.,
vg, STEDH Pessino contra Francia, 10 de octubre de 2006, Tol 996612).
Comienza Vives uno de sus artículos más recientes diciendo que “la presunción
de inocencia es la clave de bóveda del sistema de garantías en materia penal”, cuyo
contenido básico “es una regla de juicio, según la cual nadie puede ser condenado a un
castigo a menos que su culpabilidad resulte probada, más allá de toda duda razonable,
tras un proceso justo”.24
No creo que nadie discuta que esto es así con independencia de la modalidad de
conducta que se juzgue. Lo que sucede es que tal vez los términos en que se ha planteado
la vigencia de la presunción de inocencia en la comisión por omisión no son del todo
adecuados. Baste pensar en el modo en que tradicionalmente se plantea la llamada prueba
del nexo causal entre la conducta omitida y el resultado, un extremo que prácticamente
ha monopolizado la discusión acerca de la efectividad del derecho constitucional que nos
ocupa en el ámbito de la comisión por omisión.
A) La prueba del nexo causal como paradigma
Sin duda, la doctrina es consciente del debilitamiento que en esta sede padece la
presunción de inocencia y, de hecho, entre los nuestros son muchos los que han criticado
la tendencia a dar por probada la eficacia salvífica de la conducta omitida, reivindicando
por ello para la omisión impropia un modelo de prueba de la causalidad que se pretendía
más riguroso. Los esfuerzos dogmáticos empleados en tal tarea son en verdad ingentes.
Frente a la tradicional fórmula de la “seguridad rayana en la certeza” se alzan las voces de
quienes reclaman “seguridad absoluta” a la hora de decidir si la conducta omitida hubiera
evitado el resultado. A tal efecto, se arbitran criterios distintos, desde el incremento o la no
disminución del riesgo hasta la no estabilización o desestabilización de un foco de peligro
preexistente, con la pretensión de que sea la aplicación de esos criterios lo que ponga fin
a la incerteza que en la práctica rodea la determinación de la causalidad en la omisión.
La cuestión es si esas concepciones logran de verdad superar al modelo que atacan o si,
por el contrario, incurren en los mismos defectos que aquél.
En este sentido, lo primero que Vives objetaría es, según creo, el hecho de que,
al igual que cuando se aborda la causalidad en la conducta activa, se pretenda resolver
la cuestión desde una perspectiva que se autoconsidera científica, a partir de criterios
24
“VIVES ANTON, T. S. Más allá de toda duda razonable, Teoría y derecho, n. 2, p. 167, 2007.
y que, por otra parte, no hay nada que obligue a determinar esta exigencia del tipo de
manera distinta a cómo determinamos la concurrencia del resto. Por consiguiente, para
estimar concurrente la relación causal debe ser suficiente con poder afirmar más allá
de toda duda razonable que una conducta es causa del resultado. Esa es la conclusión
a la que llegan muchos de quienes comparten la preocupación por la quiebra que
la presunción de inocencia experimenta en la omisión impropia. La diferencia es el
camino que cada uno sigue para llegar a ella. La cuestión es decidirse por aquél que
25
La propia imposibilidad de construir un concepto general de acción se opone a la posibilidad de elaborar
una categoría general de causa. Es más, operar con un concepto general de causalidad es, como Vives ha
dicho, incompatible con el principio de legalidad en la medida en que distorsiona lo único que a la luz de
aquél es importante: la determinación del significado de las palabras de la ley, lo que remite el concepto
de causa al seno de las diferentes acciones (vid Fundamentos, cit., p. 301ss, Principio de legalidad…,
cit. p. 311ss y Derecho penal, cit, p. 419).
26
La propia teoría de la imputación objetiva se pierde en una maraña de criterios que no generan seguridad
alguna y demuestran de manera palmaria la inutilidad del intento de resolver el problema con criterios
generales.
27
Fundamentos, cit., p. 306.
28
VIVES Anton. Más allá de toda duda, cit., p. 171.
29
La enjundia del tema exigiría entrar en el debate sobre cuándo nos hallamos ante una creencia racionalmente
garantizada o en la ardua polémica relativa a los usos que se han hecho de los términos “verdad” y
“verdadero”. Sin embargo, el lector gana si le remito a cuanto sobre esto ha dicho el Prf. Vives y me
limito a subrayar la futilidad de perderse en interminables debates sobre las supuestas diferencias entre
la causalidad omisiva y la causalidad activa y la imperiosa necesidad de centrarse en reclamar el mismo
estandar probatorio que exigimos cuando de una conducta activa se trata
30
Más allá de toda duda, cit., p. 183.
31
Para ello no estaría de más volver los ojos hacia Italia y prestar atención a cuanto dijeron las Sezioni
Unite en la conocida como sentencia Franzese (SU 10 julio 2002, dep. 11 septiembre 2002, n. 30328,
en Cassazione penale, 2002, p. 3643ss) ¿No es tal vez momento ya de decir _ como se dijo en Franzese
(FJ 4º, 6º y 11º.2) que criterios como el del incremento del riesgo (o su no disminución) no tienen cabida
en nuestro sistema constitucional? La trascendencia práctica que ello puede tener en todos los ámbitos
pero muy especialmente en el de la responsabilidad médica resulta incuestionable. Sobre el alcance y
trascendencia de Franzese se han escrito rios de tinta pero baste citar el inteligente artículo de F. Stella,
“Etica e racionalità del processo penale nella recente sentenza sulla causalità delle Sezioni Unite della
Suprema Corte di Cassazione, en Rivista italiana di diritto e procedura penale, n. 2, p. 767ss. (de entre los
comentarios al Código, destaca en este punto el Codice penale commentato coordinado por E. DOLCINI,
E.; MARINUCI, G. Codice penale commentato. Vicenza: Ipsoa, 2006. p. 309-368.
32
Las tres cuestiones que dan título al epígrafe están, como es obvio, íntimamente vinculadas y exigirían
un tratamiento conjunto. Aqui no se dispone de espacio pero no quería renunciar a poner tal cosa de
manifiesto. El problema de la participación omisiva y el nefasto efecto que el art. 11 CP ha tenido en el
tratamiento que nuestra jurisprudencia le depara exigiría un estudio independiente. Déjeseme decir al
menos que ese es un problema que no puede resolverse desde el art. 11 sino desde los correspondientes
tipos, graduando, como es lógico, la responsbilidad en función de la concreta aportación a la ejecución
del mismo (vid. la interesante y reciente aportación de PORTILLA CONTRERAS, G. Complicidad omisiva
de garantes en delitos omisivos. In: GARCIA VALDEZ, G. y otros (coord.) Estudios penales en homenaje
a E. Gimbernat, cit., p. 1519ss).
33
La anterior sentencia desestimaba así el recurso interpuesto contra la dictada por la Sala de lo Penal de
la Audiencia Nacional el 23 de diciembre de 1992, puesto que, si bien entendió que no existía prueba
sobre la participación activa del recurrente en el tráfico, sí podía sostenerse una condena por omisión.
No lo entendió así el Tribunal Constitucional, quien anuló las referidas sentencias por estimar que ambas
habían incurrido en una vulneración de la presunción de inocencia: la primera por estimar probada la
participación activa y la segunda por presumir que el acusado conocía las actividades delictivas que venían
realizándose en su bar
34
Más allá de toda duda..., cit., p. 182.
35
Por ello, no resulta procedente exigir “un principio de prueba de que el omitente intentó, por lo menos,
cumplir con su deber de impedir la lesión del bien jurídico que debía garantizar”, ni es correcto achacar al
TC que excedió los límites de su jurisdicción (J. M. Zugaldía, en Presunción de inocencia y subsunción,
Aranzadi BIB 2000/768).
36
Más allá de toda duda…, cit., p. 184.
Gracias, Tomás, por estos veinte años, que lo son todo cuando se ha tenido la fortuna de poderlos
pasar a tu lado.
ALCÁCER GUIRAO, Rafael. Cómo cometer delitos con el silencio. In: TOLEDO, O. et
al. (Coord.). Estudios penales en recuerdo del profesor Ruíz Antón. Valencia: Tirant lo
Blanch, 2004.
BUSATO, Paulo César. Derecho penal y acción significativa. Valencia: Tirant lo Blanch, 2007.
COBO DEL ROSAL, Manuel; VIVES ANTON, Tomás S. Derecho penal: parte general. 5. ed.
corr. y aum. Valencia: Tirant lo Blanch, 1999.
DOLCINI, Emilio; MARINUCCI, Giorgio. Codice penale commentato. Vicenza: Ipsoa, 2006.
GÓRRIZ ROYO, Elena. El concepto de autor en derecho penal. Valencia: Tirant lo
Blanch, 2008.
HOBBES, Thomas. Leviatán: la materia,forma y poder de un estado eclesiastico y civil. Trad. de
Carlos Melllizo. Madrid: Alianza Editorial, 1989.
HUERTA TOCILDO, Suzana. Principales novedades de los delitos de omisión en el Código
penal de 1995. Valencia: Tirant lo Blanch, 1997.
JAKOBS, Günther. Acción y omisión: tres notas a un status quaestionis. In: TOLEDO, O. et al (Coord.).
Estudios penales en recuerdo del profesor Ruíz Antón. Valencia: Tirant lo Blanch, 2004.
JAKOBS, Günther. Estudios de derecho penal. Madrid: Civitas, 1997.
_____. La imputación penal de la acción y de la omisión. Bogotá: Ed. Universidad Externado
de Colombia, 1996.
JIMENEZ REDONDO, M. Estudio preliminar. In: VIVES ANTÓN, T. S. Fundamentos del sistema
penal: acción significativa y derechos constitucionales. 2. ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 2011.
LASCURAÍN SÁNCHEZ, Juan Antonio. Los delitos de omisión: fundamento de los deberes de
garantía. Madrid: Civitas, 2002.
MARTÍNEZ-BUJÁN PÉREZ, Carlos. Acción, norma y libertad de acción en un nuevo sistema
penal. In: GARCÍA VALDÉS et al. (Coord.). Estudios penales en homenaje a Enrique
Gimbernat. Madrid: Edisofer, 2008.
_____. La concepción significativa de la acción de T. S. Vives y sus correspondencias sistemáticas
con las concepciones teleológico-funcionales del delito. Revista Electrónica de Ciencia Penal y
Criminología, Granada, v. 1, n. 2, p. 1-13, 1999.
ORTS BERENGUER, Enrique; GONZÁLEZ CUSSAC, José Luiz. Compendio de derecho penal.
Valencia: Tirant lo Blanch, 2004.
PORTILLA CONTRERAS, Guillermo. Complicidad omisiva de garantes en delitos omisivos. In:
GARCÍA VALDÉS et al (Coord.). Estudios penales en homenaje a Enrique Gimbernat. Madrid:
Edisofer, 2008.
RAMOS VÁZQUEZ, José Antonio. Concepción significativa de la acción y teoría jurídica del
delito. Valencia: Tirant lo Blanch, 2008.
RESUMO
O presente artigo, ao analisar o Direito Penal do Inimigo, na obra polêmica de Günther
Jakobs de mesmo título, traz como contraponto a visão filosófica do professor italiano
Giorgio Agamben, autor de diversas obras, dentre as quais, “Homo Sacer” e o “Estado de
Exceção”. Realizou-se pesquisa na literatura jurídica sobre os argumentos jurídico-penais
que refutam o Feidstrafrecht, ao tratar o terrorista como “não pessoa”, criando a dualidade
com o cidadão, pessoa amparada pelos direitos humanos. A conclusão desenhada implica
que tal conceituação é grave, pois fere o Estado Democrático de Direto, com uma Política
Criminal que se refletiu para outros países, com maior ou menor intensidade.
Palavras-Chave: Terrorismo. Direito Penal do Inimigo. Giorgio Agamben. Günther Jakobs.
ABSTRACT
This paper aims to make an analysis of the Günther Jakobs polemical work entitled Enemy’s
Criminal Law, in an opposite perspective retrieved from Giorgio Agamben view, specifically
from his several works on state of exception, among which the “Homo Sacer”. In the use of the
juridical literature we try to show what arguments can be held against the Feidstrafrecht, as the
duality between the terrorists treatment as non-person in comparison with the regular citizen’s
protection, the person with human rights assured. At the end we look at the criminal policy
influenced by this dichotomy as a serious danger to the democratic state of law, a real and in
movement threat spread, in bigger or smaller intensity, among legal systems around the world.
Keywords: Terrorism. Enemy’s Criminal Law. Giorgio Agamben. Günther Jakobs.
1
Doutorando pela Universidad de Buenos Aires. Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Federal
de Pernambuco. Especialista em Docência do Ensino Superior pela Faculdade Maurício de Nassau – PE.
Professor de graduação e pós-graduação no Centro Universitário Maurício de Nassau. Advogado. Membro
de Comissão da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Pernambuco.
2
Doutor em Filosofia Contemporânea. Professor adjunto B da Universidade Estadual da Paraíba.
3
DELMAS-MARTY, M. Direito penal do inumano. Trad. Renata Reverendo Vidal Kawano Nagamine. Belo
Horizonte: Fórum, 2014. (Coleção Fórum de Direitos Humanos, v. 6). A autora diferencia “o ‘direito penal
do inimigo’, inspirado no direito penal nacional, em que se prega a ‘guerra contra o crime’ e seria adaptado
ao aspecto quantitativo; diferentemente do ‘direito penal do inumano’, que simboliza o paradigma do
crime contra a humanidade, responderia melhor ao critério qualitativo”.
4
SOUTO, C.; SOUTO, S. Sociologia do direito: uma visão substantiva. Porto Alegre: S. A. Fabris, 1997. p. 17.
5
JAKOBS, G. Direito penal do inimigo. Organização e introdução Luiz Moreira e Eugênio Pacelli de
Oliveira. Tradução dos originais em alemão: Gercélia Batista de Oliveira Mendes. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2008.
6
AGAMBEN, G. Homo sacer: v. 1: o poder soberano e a vida nua. Trad. de Henrique Burigo. 2. ed. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2010.
7
AMBOS, K. Os terroristas também têm direitos: Bin Laden não devia ter sido executado – nem mesmo em
um conflito armado. Trad. do alemão por Pablo Rodrigo Alflen, com revisão do autor. Boletim IBCCRIM,
São Paulo, v. 19, n. 223, p. 2, jun. 2011. Publicado originariamente em Frankfurter Allgemeine Zeitung,
p. 6, 5 maio 2011.
8
BINDING, K.; HOCHE, A. La licencia para la aniquilación de la vida sin valor de vida. Introducción de
Eugenio Raúl Zaffaroni. Traducido por: Bautista Serigós. 1. ed. Buenos Aires: Ediar, 2009. (Colección El
penalismo olvidado). p. 7; cf. também p. 47.
9
AGAMBEN, G. Estado de exceção. Trad. Iraci D. Poleti. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2004. p. 14.
10
AGAMBEN, G. Estado de exceção. Trad. Iraci D. Poleti. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2004. p. 14-15, 38.
Estamos diante do homo sacer a que tanto se refere Giorgio Agamben, como
bem nos expõe Paulo César Busato “aquele que é considerado tão impuro que fica fora
da jurisdição humana, cuja morte não se traduz, sequer, em homicídio a quem o poder
soberano aplica a vida nua, ou seja, as regras destituídas de qualquer limite ou direito”.12
11
BAUMAN, Z. Globalização: as consequências humanas. Trad. de Marcos Penchel. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1999.
Traz o referido autor a seguinte referência ao modelo prisional americano, tipo Pelican Bay, na Califórnia, “à
primeira vista, o projeto de Pelican Bay parece uma versão atualizada, super high-tech e sofisticada do Panóptico,
a suprema encarnação do sonho de Bentham de controle total, através da vigilância total. Um segundo olhar
revela, no entanto, a superficialidade da primeira impressão” (p. 116). Mais adiante fulmina: “Se os campos de
concentração serviram como laboratórios de uma sociedade totalitária nos quais foram explorados os limites da
submissão e servidão e se as casas de correção panópticas serviram como laboratórios da sociedade industrial nos
quais foram experimentados os limites da rotinização da ação humana, a prisão de Pelican Bay é um laboratório
da sociedade ‘globalizada’ (ou ‘ planetária’, nos termos de Alberto Melucci) no qual são testadas as técnicas de
confinamento espacial do lixo e do refugo da globalização e explorados os seus limites” (p. 121).
12
BUSATO, P. C. Thomas Hobbes penalista. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. (Coleção por que ler os clássicos
v. 2) p. 119. Quanto à Agamben temos sua obra Homo Sacer: v. 1: o poder soberano e a vida nu. Trad.
Henrique Burigo. 2. ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. “A vida insacrificável e, todavia, matável, é
a vida sacra” p. 84. “[...] Soberana é a esfera na qual se pode matar sem cometer homicídio e sem celebrar
um sacrifício, e sacra, isto é, matável e insacrificável, é a vida que foi capturada nesta esfera” (p. 85).
Após uma palestra de Günther Jakobs na Conferência do Milênio em Berlim, este conceito
levantou muita poeira não só na Alemanha, mas também nas regiões de língua portuguesa
e espanhola. Em 1999, não era a primeira vez que Jakobs empregava o conceito. Em
1985, utilizou-o numa palestra de Frankfurt, que recebeu muito menos publicidade, no
Seminário sobre Direito Penal. Mais primeiramente: o que deve entender sob o conceito
“direito penal do inimigo”, e que posição adotar? “Direito penal do inimigo” é um direito
penal por meio do qual se confronta não os seus cidadãos, mas seus inimigos. Em que
isto se faz visível? Primeiramente, tomando-se a lei concretamente – o código penal e a
13
VERVAELE, J. A. E. La legislación antiterrorista em Estados Unidos: ¿Inter arma silent leges? Ciudad
Autonoma de Buenos Aires: Del Puerto, 2007.
14
BICUDO, T. V. Por que punir? Teoria geral da pena. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 166.
15
PRITTWITZ, C. O direito penal entre direito penal do risco e direito penal do inimigo: tendências
atuais em direito penal e política criminal. Trad. Helga Sabotta de Araújo e Carina Quito. Artigo n. 37.
Direito Penal, v. 2. Organizadores: Alberto Silva Franco, Guilherme de Souza Nucci. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2010. p. 915-927. Há, ainda, publicação na Revista Brasileira de Ciências Criminais (RBCCRIM)
n. 47, mar./abr. 2004. Para se aprofundar ler Günther Jakobs: Direito penal do inimigo. Organização e
introdução: Luiz Moreira, Eugênio Pacelli de Oliveira. Tradução dos originais em alemão: Gercélia Batista
de Oliveira Mendes. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. Criticando tal teoria, por todos, ler ZAFFARONI,
Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. Trad. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2007.
Falar, em direito penal do inimigo, pode levar a criação, claro que de forma crítica
a teoria criada por Jakobs, de Roque de Brito Alves, de um direito penal amigo, que aduz:
16
BUSATO, P. C. Thomas Hobbes penalista. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. (Coleção por que ler os
clássicos v. 2). p. 121.Traz, ainda, o referido autor, na mesma página, “Não é à toa que a proposta de
um Direito penal do inimigo encontra-se perfeitamente ajustada à política criminal estadunidense do
Século XX, que pode ser sintetizada nos Patriot Acts, que condensam a postura de subversão da ordem
instituída, justificada pela necessidade de combater um inimigo. A situação de estabelecimento do Estado
de exceção como regra pode ser vista na ordem militar promulgada pelo presidente dos Estados Unidos
em 13 de novembro de 2001, confirmada pelo USA Patriot Act de 26 de outubro de 2001, autorizando
coisas como o infinite dentention para não cidadãos acusados de terrorismo. Outrossim, esta situação
concreta, se é que pode encontrar coincidências com um modelo de Direito penal do inimigo, tem suas
raízes não em um modelo contratual, de pacto, mas sim em uma imposição de um Estado de exceção.
Ademais, quando identificada a realidade a um modelo teórico, este último, por muito que pretenda ser
explicativo ou descritivo, sempre comporá uma espécie de legitimação daquele”.
17
ALVES, R. de B. O direito penal amigo. Opinião: Diário de Pernambuco, Recife, Caderno. A, p. 11, 13
dez, 2009.
18
BARATTA, A. Criminologia crítica e crítica do direito penal: introdução à sociologia do direito penal. 3.
ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002. (Coleção Pensamento Criminológico, n. 1). p. 22.
Das ist ein sehr bedenklicher Gedanke, der eine Tendenz zum Totalitarismus aufweist. Es
ist ein fundamentals Prinzip des Rechtsstaats, dass alle Menschen vor dem Gesetz gleich
sind. Ein Staat, der dieses Prinzip aufgibt, ist kein Rechtsstaat mehr.
Eine nähere Auseinandersetzung mit der Lehre von Jakobs ist aber deshalb nicht
möglich, weil dieser sich bisher nicht näher dazu geäussert hat, weche Möglichkeiten der
Rechtseinschränkung er dem Staat gegenüber ‘Feinden’ einräumen will”.20
19
Em tradução livre, temos: “O problema está localizado na interface (ponto de contato) entre três sistemas:
sistema jurídico, sistema científico e sistema político. A maioria dos autores não separa bem enquanto eu
tento argumentar rigidamente dentro do sistema científico”.
20
Em tradução livre, temos: “Eu não concordo com nada disso. Isso é uma idéia do Professor de Bonn Jakobs
que quer tirar os direitos civis do delinqüente como terrorista tratando como inimigos os que como acusados
teriam direito. Pelo menos quer conceber ao Estado o direito de criar tal direito penal do inimigo, é um
pensamento que suscita cuidado, pois demonstra uma tendência, para o totalitarismo. É um princípio
fundamental do Estado de Direito que todos os homens são iguais perante a lei. Um Estado que abre mão
desse princípio não é mais um Estado de Direito”.
Informou ainda que, atualmente, 70% dos presos nas cadeias da América Latina não
estão condenados, mas em prisão preventiva. São os presos por via das dúvidas. É o
direito processual gerando o direito penal do inimigo”. Concluiu declarando que para a
fortificação do Estado de Direito, a arma ideológica que temos não pode admitir a ideia
de um inimigo. Essa ideia é própria do Estado de Polícia, e nossa função jurídica é conter
esforços cujo intento seja a quebra da contenção do Estado de Direito.21
De fato, a legislação brasileira em matéria penal e processual penal refletiu nos anos
de 1990 uma política criminal de recrudescimento, extremamente punitivista e derivada
da opinião pública, exemplos claros são as leis n.º 8072/90 (Lei dos Crimes Hediondos)22
e lei nº 9034/95 (Lei da Criminalidade Organizada), ou seja, o Direito Penal, servindo de
panaceia para problemas sociais seríssimos, pois mais fácil alterar-se um artigo de lei que
informar bem e educar a sociedade, daí a profusão de leis penais simbólicas.23
É este Direito Penal simbólico que observa com sagacidade Gabriel Ignácio Anitua:
As políticas penais que os diversos governos da atualidade implementam têm uma
função simbólica declarada de impor os valores morais tradicionais. Para isso, é utilizada
a ferramenta tradicional de reprimir e, ao mesmo tempo, construir subjetividades.24
É neste sentido que aduz Marco Antônio Nahum “Há muito vivemos um vendaval
repressivo, fruto de emoções e demagogias irresponsáveis”25, fomentado pelo discurso
repressivo das instâncias de controle, gerando uma política criminal do terror.
21
Disponível em <http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2734649/eugenio-raul-zaffaroni-e-condecorado-na-
oab-df>. Acesso em: 11 jun. 2011.
22
FRANÇA, L. A. Governando através do crime: anotações sobre o tragicômico fenômeno da lei dos crimes
hediondos. In: FRANÇA, L. A. (Org.); BUSATO, P. C. (Coord.). Tipo: Inimigo. Curitiba: FAE Centro
Universitário, 2011. p. 73-95. Doutrina, ainda, de forma lúcida e crítica: “O tragicômico fenômeno da
Lei dos Crimes Hediondos é o caso mais emblemático deste país de uma lei extremamente punitivista,
derivada da opinião pública, estruturada em plena verborragia jurídica, criada única e exclusivamente
como um (péssimo) instrumento de administração pública. Eis a referência ao passo inaugural de uma
nova arte de se governar no Brasil, fundada no crime, na urgência e na exceção”.
23
BUSATO, P. C. O outro como inimigo: um discurso punitivo de exclusão. IN: MUÑOZ CONDE, F. Crítica
ao direito penal do inimigo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. Doutrina que: “No entanto, erra quem
pensa que só agora estamos diante de uma situação de emergência, ignorando toda a espiral de violência
fomentada pelo próprio discurso repressivo das instâncias de controle que desde há muito vêm utilizando
o Direito penal como resposta à demanda por segurança”.
24
ANITUA, G. I. Histórias dos pensamentos criminológicos. Trad. de Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro:
Revan : Instituto Carioca de Criminologia, 2008. p. 802.
25
NAHUM, M. A. R. A repressão ao crime, e o antiterrorismo. Boletim do IBCCRIM, São Paulo, v. 11, n.
128, jul. 2003.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não é demais lembrar o que com propriedade doutrina Prittwitz com invulgar clareza:
O dano que Jakobs causou com suas reflexões e seu conceito de direito penal do inimigo
é visível. Regimes autoritários adotarão entusiasmados a legitimação filosoficamente
altissonante do direito penal e processual contrário ao Estado de Direito. Mas também
na discussão na Alemanha ele pode ser responsabilizado por quebrar o tabu de destruir
desnecessariamente os limites pelo menos em tese indiscutíveis entre direito penal
e guerra. Vêm à mente paralelos com a discussão havida no ano passado – e que os
juristas alemães consideravam quase impossível – sobre a possibilidade de eventualmente
empregar até mesmo a tortura em determinados casos excepcionais.27
26
ANITUA, G. I. Histórias dos pensamentos criminológicos. Trad. de Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro:
Revan: Instituto Carioca de Criminologia, 2008. p. 838.
27
PRITTWITZ, C. O direito penal entre direito penal do risco e direito penal do inimigo: tendências atuais em
direito penal e política criminal. In: FRANCO, A. S.; NUCCI, G. de S. (Org.). Direito penal: Artigo n. 37.
Trad. Helga Sabotta de Araújo, Carina Quito, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. v. 2. p. 915-927.
28
FERRAJOLI, L. Democracia e garantismo. Prólogo Miguel Carbonell. In: El derecho penal del enemigo y La
disolución del derecho penal. Traducción de Perfecto Andrés Ibáñez. 2. ed. España: Trotta, 2010. p. 234-
250. Há, ainda, referência sobre o texto do Constitucionalista português: José Joaquim Gomes Canotilho.
Estudos sobre direitos fundamentais. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais; Coimbra: Coimbra Editora,
2008. p. 240, “O Estado de direito não conhece amigos nem inimigos, mas só inocentes e culpados”.
29
XAVIER, E. D. Biopoder, biopolítica e o paradigma do estado de exceção. In: PABLO E. S. (Org.). IX Jornadas
Nacionales de Filosofia y Ciencias Políticas. 1. ed. Mar del Plata: Universidad Nacional de Mar del Plata,
2009, v. 1, p. 111-145.
Contudo, não se pode relegar o que coloca Robert Philippe sobre a questão criminal
e as tendências criminalizantes oriundas do seio social, dizendo que: “[...] o peso das modas
e dos lugares comuns faz-se sentir sobre tudo no que diz respeito ao crime”.31 Dito isto,
pergunta-se: será que os Estados Unidos retornarão a assim proceder, como nos ensinaram
num passado não tão remoto, a respeitar e garantir os direitos humanos? Sabemos que
atualmente são os Estados Unidos os maiores violadores destes direitos, humanos, tão caros
conseguidos com o sacrifício de muitos. Como evitar que o Estado, responsável pela guarda
da ordem jurídica, desrespeite essa ordem em sua mais enraizada norma fundamental, os
mais básicos direitos do homem? Não há resposta do próprio Estado para essa pergunta,
todos e qualquer um podem ser reduzidos ao homo sacer.
Em que pese, recente projeto que pretende tipificar o crime de terrorismo (PLS
n. 499/2013) e a Lei de Organização Criminosa n. 12.850/201332 fazer menção ao
terrorismo e organizações terroristas internacionais, art. 1º, §2º, inc. II da referida lei, não
parece adequado nos moldes em que o projeto citado pretende, além de demonstrar
um expansionismo penal desnecessário. Peca novamente o legislador, em não “dialogar”
com o jurista, porém em discussão que não pretenda ferir os princípios da legalidade,
taxatividade, sendo por demais abertos, poderia-se pensar em um tipo de terrorismo nos
moldes que as recentes legislações penais trazem.
30
RABINOVICH-BERKMAN, R. El concepto de persona ¿Ha devenido innecesario? (¿O acaso inconveniente?).
[s.l.], [s.ed.], [s.d.].
31
ROBERT, P. Sociologia do crime. Trad. Luis Alberto Salon Peretti. Petrópolis: Vozes, 2007. p. 9.
32
BITENCOURT, C. R.; BUSATO, P. C. Comentários à lei de organização criminosa: lei 12.850/2013. São
Paulo: Saraiva, 2014. p. 37. Que aduz: “[...] A despeito de não haver terrorismo em território brasileiro,
deve-se observar que o texto legal não fala em crime, mas em atos terroristas, aliás talvez até pela inexistência
de legislação específica sobre o tema”.
AGAMBEN, G. Estado de exceção. Trad. Iraci D. Poleti. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2004.
______. Homo sacer: v. 1 – Poder soberano e a vida nua. Trad. Henrique Burigo. 2. ed. Belo
Horizonte: Editora UFMG, 2010.
ALVES, R. de B. O direito penal amigo. Opinião. Diário de Pernambuco, Recife, Caderno A,
p. 11, 13 maio 2009.
AMBOS, K. Os terroristas também têm direitos: Bin Laden não devia ter sido executado – nem
mesmo em um conflito armado. Artigo publicado originariamente em Frankfurter Allgemeine
Zeitung, 5 maio 2011, p. 6. Trad. do alemão por Pablo Rodrigo Alflen. Boletim IBCCRIM, São
Paulo, v. 19, n. 223, p. 2-3, jun. 2011.
ANITUA, G. I. Histórias dos pensamentos criminológicos. Trad. Sérgio Lamarão. Rio de
Janeiro: Revan, Instituto Carioca de Criminologia, 2008.
BARATTA, A. Criminologia crítica e crítica do direito penal: introdução à sociologia do direito
penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002 (Coleção Pensamento Criminológico, n. 1).
BAUMAN, Z. Globalização: as consequências humanas. Trad. Marcos Penchel. Rio de Janeiro: J.
Zahar, 1999.
BICUDO, T. V. Por que punir? Teoria geral da pena. São Paulo: Saraiva, 2010.
BINDING, K; HOCHE, A. La licencia para la aniquilación de la vida sin valor de vida.
Introducción de Eugenio Raúl Zaffaroni. Traducido por: Bautista Serigós. 1. ed. Buenos Aires:
Ediar, 2009. (Colección El penalismo olvidado).
BITENCOURT, C. R; BUSATO, P. C. Comentários à lei de organização criminosa: lei
12.850/2013. São Paulo: Saraiva, 2014.
BUSATO, P. C. O inimigo em Hobbes: crítica à justificação filosófica em Jakobs ao direito penal
do inimigo. In: Thomas Hobbes penalista. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. (Coleção por que
ler os clássicos, v. 2).
______. O outro como inimigo: um discurso punitivo de exclusão. In: BUSATO, P. C.; MUÑOZ
CONDE, F F. Crítica ao direito penal do inimigo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 155-257.
CANOTILHO, J. J. G. Estudos sobre direitos fundamentais. 1. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais; Coimbra: Coimbra Editora, 2008.
DELMAS-MARTY, M. Direito penal do inumano. Trad. Renata Reverendo Vidal Kawano
Nagamine. Belo Horizonte: Fórum, 2014. (Coleção Fórum de Direitos Humanos, v. 6).
EUGENIO Raúl Zaffaroni é condecorado na OAB/DF. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.
br/noticias/2734649/eugenio-raul-zaffaroni-e-condecorado-na-oab-df>. Acesso em: 11 jun. 2011.
FERRAJOLI, L. Democracia y garantismo. Prólogo Miguel Carbonell. In: ______. El derecho
penal del enemigo y La disolución del derecho penal. Traducción de Perfecto Andrés Ibáñez.
2. ed. Madrid: Trotta, 2010. p. 234-250.
RESUMO
O presente artigo constrói-se a partir da análise do direito à inviolabilidade domiciliar e
suas peculiaridades, cujos fundamentos jurídicos emergem da importância de se tutelar
a privatividade humana em face das intervenções estatais. Nesse sentido, abordam-se
suas rotineiras violações pelos órgãos policiais, muitas vezes convalidadas por frágeis
argumentações.
Palavras-chave: Inviolabilidade Domiciliar. Privatividade. Casa. Flagrante; Mandado de
Busca.
ABSTRACT
The present article is constructed from the analysis of domicile inviolability and its
peculiarities, from which legal grounds emerges from the importance of protecting the
human privacy in the face of state intervention. Accordingly, in this approach we observe
the routine violation by law enforcement, which are often carried by weak arguments.
Keywords: Inviolability of the home. Privacy. Home. Flagrant. Search Warrant.
1
Especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo curso Luiz Carlos/Opet. Especialista em Ciências
Criminais pela Universidade Tuiuti do Paraná. Advogado.
2
Packard apud Paulo José da Costa Jr. O direito de estar só: a tutela penal da intimidade. 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007. p. 19.
3
Boyd V. United States, 116 U.S. 616, 626. apud Florida v. Jardines, n. 11-564. p. 6.
4
SILVA JR., W. N. da. Curso de direito processual penal: teoria (constitucional) do processo penal. Rio de
Janeiro: Renovar, 2008.
2 CONCEITO DE DOMICÍLIO
5
ARROYO, S. C. Inviolabilidad del domicilio. p. 2; ALCALÁ, H. N. El derecho a la privacidad y a la intimidad
em el ordenamiento jurídico chileno. In: Ius et praxis, v. 4, n. 2, 1998.
6
“A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do
morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou durante o dia,
por determinação judicial”.
7
Significante utilizada por nosso Constituinte, a despeito da similitude para fins de proteção conforme
se verá.
8
CASTANHO, L. G. G. de C. Processo penal e Constituição: princípios constitucionais do processo
penal. p. 89.
9
De forma semelhante, Gomes Canotilho afirma que domicílio é uma “projecção espacial da própria
pessoa [...]. Tendo em conta o sentido constitucional deste direito tem de se entender por domicílio desde
logo o local onde se habita, a habitação, seja permanente seja eventual, seja principal ou secundária. Por
isso, ele não pode equivaler ao sentido civilístico, que restringe o domicílio à residência habitual (mas
certamente incluindo também as habitações precárias, como tendas, roulottes, embarcações), abrangendo
também a residência ocasional (como o quarto do hotel) ou ainda os locais de trabalho (escritórios etc.);
dada a sua função constitucional, esta garantia deve estender-se quer ao domicílio voluntário geral quer
ao domicílio profissional (Código Civil, arts. 82º e 83º). A proteção do domicílio é também extensível à
sede das pessoas coletivas”. CANOTILHO, J. J. G. apud CUPELLO, L. P. de F. Direito penal e processual
penal luso-brasileiro. Breves reflexões. p. 97, destacou-se.
10
TUCCI, R. L. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro: 4. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011.
11
MENDES, G. F. Curso de direito constitucional. p. 480.
12
López Menudo, de modo muito didático, identificou círculos concêntricos de proteção domiciliar:
“Sintetizando lo expuesto, cabe concluir distinguiendo las distintas situaciones a modo de tres circulos
concéntricos. En el más interno se hallaria el domicilio constitucional – no obstante, más amplio que
qualquier otro domicilio tradicional – caracterizado por tratarse de un lugar cerrado, afecto a la vida
privada y que comporta un ius excludendi alios, incluida la Administración Pública. El círculo intermedio
comprendería todo lugar cerrado, ostentando su titutlar un derecho de exclusión de terceros; y el problema
consiste en si este derecho es oponible o no frente a la Administración, que es la cuestión que aquí estamos
analizando. Por último, el circulo exterior encuentra protegido, como derecho de propriedad, por la ley
civil o penal pero al que puede acceder libremente la Administración, pues lo contrario haria a ésta de
pero condición que a cualquier particular”. LÓPEZ MENUDO, F. La intervención del juez para la defensa
del domicilio y también de la propiedad? p. 21.
In this context also, it may not always be possible to draw precise distinctions, since
activities which are related to a profession or business may well be conducted from a
person’s private residence and activities which are not related may well be carried on
in an officer or commercial premises. A narrow interpretation of the words “home” and
“domicile” could therefore give rise to the same risk of inequality of treatment as a narrow
interpretation of the notion of “private life” (see paragraph 29 above).
13
Nesse, o rel. Ministro Celso de Mello afirmou que “Para os fins da proteção jurídica que se refere o art. 5º,
XI, da Constituição da República, o conceito normativo de ‘casa’, revela-se abrangente e, por estender-se
a qualquer compartimento privado não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (CP,
art. 150, §4º, III), compreende, observada essa específica limitação espacial (área interna não acessível
ao público), os escritórios profissionais, inclusive os de contabilidade, ‘embora sem conexão com a casa
de moradia propriamente dita’ (Nelson Hungria). Doutrina. Precedentes” p. 2, HC 93.050-6 RJ, Rel. Min.
Celso de Mello, 2ª Turma. In: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processual Penal. Habeas Corpus nº
93050-6. Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, 31 jan. 2008.
14
8.1. “Everyone has the right to respect for his private and family life, his home and his correspondence”
8.2. “There shall be no interference by a public authority with the exercise of this right except such as is
in accordance with the law and is necessary in a democratic society in the interests of national security,
public safety or the economic well-being of the country, for the prevention of disorder or crime, for the
protection of health or morals, or for the protection of the rights and freedoms of others”.
15
“The Court does not consider it possible or necessary to attempt an exhaustive definition of the notion ‘private
life’. However, it would be too restrictive to limit the notion to an ‘inner circle’ in which the individual may
live his own personal life as he chooses and to exclude therefrom entirely the outside world not encompassed
within that circle. Respect for private life must also comprise to a certain degree the right to establish and
develop relationships with other human beings”. Niemietz v. Germany judgement, ECHR 1991, § 29.
16
Niemietz v. Germany Judgment, ECHR 1991, § 30 e 31.
17
CASTANHO de CARVALHO. Processo Penal e Constituição... p. 89.
18
NAVAS SÁNCHEZ, M. del M. Inviolabilidad o intimidad domiciliaria? A propósito de la jurisprudencia
constitucional sobre el derecho fundamental a la inviolabilidad del comicilio. Revista de Derecho Político,
n. 81, Mayo/Ago. 2011.
19
Alcalá explica que “las acciones privadas internas están constituidas por los comportamietos o conductas
íntimas o inmanentes que principian y concluyen en el sujeto que los realiza, no trascendiendo de este,
comprendiendo los hechos o actos realizados en absoluta privacidad o de los que nadie puede percatarse”.
Continua o autor fazendo referências a decisões da Corte Suprema Argentina: “La jurisprudencia de la
Corte Suprema Argentina ha determinado en los casos ‘Bazterrica’ (Fallos, 308; 1412) y ‘Ponzetti de
Balbin’ (fallos, 306; 1982), que el Estado debe concretar ‘la protección de la privacidad comenzando por
no entrometerse en ella, respetando el área de inmunidad de toda persona”. ALCALÁ, H. N. El derecho
a la privacidad y a la intimidad en el ordenamiento jurídico chileno. Ius et praxis, v. 4, n. 2, 1998.
20
MENDES. Curso de direito constitucional... p. 480. No mesmo sentido, Silva afirma que “[...] a Constituição
está reconhecendo que o homem tem direito fundamental a um lugar em que, só ou com sua família, gozará
de uma esfera jurídica privada e íntima, que terá que ser respeitada como sagrada manifestação da pessoa
humana.” SILVA, L. J. A. da. Curso de Direito Constitucional positivo; 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
21
Navas Sánchez explica que o fundamento está diretamente ligado ao âmbito de proteção: “En efecto, en
la medida en el fundamento prevalente de este derecho es la libertad y autodeterminación del indivíduo,
necessarios a su vez para el libre desarrollo de su personalidad, la delimitacion del domicilio inviolable
vendrá dado por su relación com tal noción”. NAVAS SANCHEZ, M. del M. Inviolabilidad o intimidad
domiciliaria?
22
COSTA JR., P. J. da. O direito de estar só: tutela penal da intimidade. 4. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2007.
23
Costa Jr. explica porque é correto falar privatividade no lugar de privacidade: “a expressão exata, em bom
vernáculo, é privatividade, que vem de privativo. E não privacidade, que é péssimo português e bom
anglicismo (vem de privacy)”. O direito de estar só... p. 17.
24
COSTA JR. O direito de estar só... p. 23.
25
CUPELLO. Direito penal e processual penal... p. 131.
26
MUÑOZ CONDE, F. Valoración de las grabaciones audiovisuales em el proceso penal. 2. ed. Buenos
Aires: Hammurabi, 2007. p. 54.
27
MIRANDA, J; MEDEIROS, R. Constituição portuguesa anotada. Coimbra: Coimbra Editora, 2005. v. 1.
28
REALE, M. apud CUPELLO. Direito penal e processual penal... p. 132.
29
MUÑOZ CONDE, F. Valoración de las grabaciones... p. 57.
30
MUÑOZ CONDE, F. Valoración de las grabaciones... p. 57.
31
FLORIDA V. J., nº 11-564. p. 4. A decisão trata de um caso em que policiais utilizaram um cachorro
farejador para descobrir se havia drogas na casa de um suspeito. Após liberarem o cachorro para adentrar
na propriedade e demonstrar que havia drogas, os policiais solicitaram um mandado de busca, o qual ao ser
cumprido ocasionou na apreensão de quantidades de maconha. Importante destacar que em voto conjunto
o Juiz Kagan consignou que a questão em debate era “easy case easy twice over” (p. 5, voto conjunto).
32
“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
33
NAVAS SANCHEZ. Inviolabilidad o intimidad domiciliaria?...
34
BIGLINO CAMPOS apud NAVAS SANCHÉZ. Inviolabilidad o intimidad domiciliaria?...
35
SILVA JR. Curso de direito processual penal... p. 620ss.
36
SILVA JR. Curso de direito processual penal... p. 620ss.
37
CASTANHO DE CARVALHO. Processo penal e Constituição… p. 74.
38
Cinquenta anos de jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão. p. 686.
39
Bem lembra Rosa que “embora seja uma prática rotineira a violação da casa de pessoas pobres, porque a
polícia não entra assim em moradores das classes ditas altas, não se pode continuar tolerando a arbitrariedade”.
ROSA, A. M. da. Tráfico e flagrante: apreensão da droga sem mandado. Uma prática (in)tolerável?
40
TOSCANO JR., R. A inviolabilidade do lar e a dimensão (in)constitucional do flagrante oriundo
exclusivamente de denúncia anônima.
41
Muitas vezes ignorando que a conduta melhor se enquadra em tipos que sequer autorizam o aprisionamento,
como é o caso do previsto no art. 28 da lei. 11.343/2006.
42
Sempre importante destacar que a frieza dos autos passa ao largo da brutalidade com que são realizadas as
abordagens, buscas pessoais e domiciliares. Veja-se a sábia reflexão de, segundo o qual “O que distingue o
mal burocraticamente administrado e realizado não é tanto sua banalidade (particularmente se comparado
com os males que costumavam assombrar as sociedades antes de se inventarem a burocracia moderna e
seu ‘gerenciamento científico do trabalho’), mas a sua racionalidade”. BAUMAN, Z. Medo líquido. Rio
de Janeiro: Zahar, 2008. p. 85.
43
TOSCANO JR. A inviolabilidade do lar...
44
É possível fazer um paralelo com a crítica feita por Coutinho àqueles que defendem o (falacioso) princípio
da verdade material: “sem embargo, isto é possível porque se mantém vivo – e mantém-se mesmo! –, no
imaginário coletivo, a ameaça do inimigo, do contrário, do invasor, ou quem se prestar a tanto; sem embargo,
no limite, cria-se um ‘bode expiatório’ (em sociedades autoritárias) [...]”. COUTINHO, J. N. M. de. Introdução
aos princípios do Direito Processual penal brasileiro. Separata ITEC, ano 1, n. 4, jan./mar. 2000.
45
TOSCANO JR., R. Sobre o fio da navalha: a justiça criminal entre a eficiência e os direitos fundamentais.
46
Cinquenta anos de Jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal Alemão. p. 686.
47
TOSCANO JR. A inviolabilidade do lar... p. 10.
48
AMBOS, K. Las prohibiciones de utilización de pruebas em el proceso penal alemán – fundamentación
teórica y sistematización. p. 40.
49
AMBOS. Las prohibiciones de utilización... p. 40.
50
ZAFFARONI, E. R. et. al. Direito penal brasileiro: teoria geral do direito penal. 2. ed. Rio de Janeiro:
Revan, 2003.
51
OLIVEIRA, E. P. de. Processo e hermenêutica na tutela penal dos direitos fundamentais. 3. ed. São
Paulo: Atlas, 2012. p. 152.
52
AGUIAR apud CABEZUDO BAJO. La restricción... p. 190.
53
CABEZUDO BAJO. La restricción de los derechos fundamentales... p. 194.
54
CABEZUDO BAJO cita dentre outras medidas “tales como reserva de ley organica, la garantia del contenido
esencial, la motivación de la limitación del derecho, el cumplimiento del principio de proporcionalidad
o el ‘mayor valor’ de los derechos”. La restricción... p. 221.
55
CABEZUDO BAJO. La restricción... p. 222.
56
AVOLIO, L. F. T. Provas ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 5. ed.
São Paulo. Revista dos Tribunais, 2012. p. 41.
57
Cinquenta anos de jurisprudência... p. 686.
58
STS apud MORALES MUÑOZ. Diligencias de investigacion en el proceso penal: La diligencia de entrada
y registro. Tercer presupuesto: autorizacion judicial. Procedimiento para su práctica. Efectos de las entradas
y registros domiciliarios inconstitucionales. p. 11.
59
Conforme se verifica do inc. XI do art. 5º, as outras hipóteses são consentimento válido do morador,
desastre, prestação de socorro ou durante o dia por determinação judicial.
60
TORNAGHI, H. apud CARVALHO. Processo penal e constituição... p. 91.
61
Conforme esclarece Zaffaroni, “el principio pro homine es próprio del derecho internacional de los derechos
humanos e impone que em la duda se decida siempre em el sentido más garantizador del derecho de que
se trate”. Proceso penal y derechos humanos: código, principios y realidad.
62
A CF determina, em seu art. 5º, §1º, que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm
aplicação imediata”.
63
STS apud MORALES MUÑOZ. Diligencias de investigación: Registro Domiciliario. Cuestiones generales
y consentimiento titular. Situaciones de flagrancia. p. 20.
64
MARTÍN MORALES, R. Entrada en domicilio por causa de delito flagrante. Revista electrónica de ciencia
penal y criminologia. p. 3.
65
KARAM, M. L. Liberdade, intimidade, informação e expressão. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 38.
66
Em sentido contrário, baseado em Lima afirma que “por flagrante delito deve-se entender qualquer hipótese
de flagrante, e não somente o flagrante próprio, ‘pois o constituinte não poderia ignorar todos os casos
de flagrante restringindo-se somente ao primeiro deles’”. LIMA, M. P. Curso de processo penal. 4. ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. v. 2. Também neste sentido, Lopes Jr. sustenta que “havendo flagrante
delito (art. 302 do CPP), poderá a autoridade policial ingressar na casa e proceder à busca dos elementos
probatórios necessários”. Direito Processual penal... p. 699.
O CPP dispõe no art. 303 que, quanto aos crimes permanentes, “entende-se o
agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência”, redação que tem causado
interpretações equivocadas por parte da doutrina e jurisprudência.
Com efeito, parcela significativa da doutrina tem afirmado que nos crimes
permanentes, a situação de flagrância é – também – permanente (independentemente
da forma como foi diagnosticada), de modo que os órgãos policiais estariam autorizados
a proceder a buscas e apreensões, bem como a realizar prisões, independentemente da
existência de mandado judicial ou do consentimento do morador. Isso porque, segundo
boa parcela da doutrina, o crime permanente se amoldaria sem restrições à situação do
art. 302, I do CPP, ou seja, estaria o agente permanentemente praticando o crime. Nesse
sentido, Nucci sustenta que “por uma questão de bom senso, cabe prisão em flagrante a
qualquer momento. Nem precisa existir o art. 303, pois o art. 302, I, resolve o problema”.67
Da mesma forma, Flávio Gomes afirma que “uma das hipóteses que a Constituição
Federal autoriza ingressar em casa alheia sem ordem de juiz reside justamente no
flagrante”68, declarando ainda que não importa se a droga encontrada seja destinada
ao consumo próprio ou ao tráfico, pois em ambas as hipóteses a invasão do domicílio
é autorizada.
Apoiados nesses entendimentos ou em outros semelhantes, os Tribunais têm
decidido, quase que pacificamente, que “não se pode olvidar que nos casos de flagrante
de crimes permanentes, como o tratado no presente writ, é permitido o ingresso na
residência do acusado sem ordem judicial, com ou sem o seu consentimento [...]”.69 Ou
que “o tráfico de drogas é delito permanente, podendo a autoridade policial ingressar
no interior do domicílio do agente, a qualquer hora do dia ou da noite para fazer cessar
a prática criminosa e apreender a substância entorpecente que nele for encontrada”.70
67
Apud RHC 39.530-PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, disponibilizado no dje em 19/09/2013.
68
GOMES, L.F. et. al. Lei de Drogas Comentada: artigo por artigo. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
69
RHC 39.530-PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, disponibilizado no dje em 19/09/2013.
70
HC 222.173-DF, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, disponibilizado no dje em 01/12/2011. p. 6.
Por outro lado, não se pode confundir a prisão em flagrante do acusado com o flagrante
delito de que trata a ressalva do art. 5º, XI, da Constituição:
XI – a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar
socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.
Isso porque, a primeira define-se como uma medida de autodefesa da sociedade,
consubstanciada na privação da liberdade de locomoção daquele que é surpreendido em
situação de flagrância, a ser executada independentemente de prévia autorização judicial
(CF, art. 5º, LXI). Já o segundo compreende uma característica do próprio delito, é a infração
que está “queimando”, que está sendo cometida ou acabou de acontecer, que autoriza a
prisão do agente mesmo sem autorização judicial em virtude da certeza visual do crime.
Assim, a apreensão das drogas na residência do acusado revela a “certeza visual”
mencionada acima. E a materialidade e a autoria do crime estão, por conseguinte,
plenamente comprovadas como se verá a seguir.
Daí porque, entendo, a ação policial foi legal. A Constituição Federal não fala em prisão
em flagrante, mas em flagrante delito, ou seja, a prisão do agente, naquele momento,
não alterava a situação.71
71
Apelação Criminal 1.016.120-5, rel. Des. Rogerio Kanayama, 3ª Câmara Criminal.
72
Importante salientar, conforme Coutinho, que a lei possui limites linguísticos de interpretação: “Daí que,
como parece primário, o que se delimita ao Poder Judiciário é a verificação da adequação possível, ou seja,
se a norma criada pelo interprete não escapa da regra e, assim, do raio de alcance da estrutura linguística
do enunciado, das suas palavras. Destarte, não pode – e não deve – o Poder Judiciário (porque abusivo,
dado extrapolar suas atribuições), em reconhecendo como correta a adequação possível, impor outra, de
sua lavra, quiçá por a entender mais justa, ou por bondade, ou por capricho ou outro fundamento. Isto seria
decisionismo (Ferrajoli) e interessa pouco à democracia porque se não pode definir, senão pela cabeça do
autor, aquilo que seria o justo, o bondoso, o caprichoso ou qualquer outro atributo utilizado. COUTINHO,
J. N. de M. Dogmática e limites linguísticos da lei. Diálogos constitucionais: direito, neoliberalismo e
desenvolvimento em países periféricos. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 232.
73
Como magistralmente leciona Miranda: “A eficácia da justiça é também um valor que deve ser perseguido,
mas porque numa sociedade livre os fins nunca justificam os meios, só é aceitável quando alcançada
lealmente, pelo engenho e arte, nunca pela força bruta, pelo artifício ou pela mentira, que degradam
quem os sofre, mas não menos quem os usa” Constituição Portuguesa… p. 361.
74
ROSA, A. M. da. Guia compacto de processo penal conforme a teoria dos jogos. 2. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2014.
75
People of the Philippines vs Armando Compacion y Surposa. G.R. Nº 124442, July 20, 2011.
76
People of the Philippines vs Armando Compacion y Surposa. G.R. Nº 124442, July 20, 2011.
77
OLIVEIRA. Processo e hermenêutica... p. 157.
78
“A los efectos de lo dispuesto en el párrafo anterior, será causa legítima para la entrada y registro en
domicílio por delito flagrante el conocimiento fundado por parte de las Fuerzas y Cuerpos de Seguridad
que le lleve a la constancia de que se esta cometiendo o se acaba de cometer alguno de los delitos que,
em materia de drogas tóxicas, estupefacientes o sustancias psicotópicas, castiga el Código Penal, siempre
que la urgente intervención de los agentes sea necesaria para impedir la consumación del delito, la huida
del delincuente o la desaparición de los efectos o instrumentos del delito”.
79
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 98.
80
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 111.
81
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 122ss.
82
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 123.
Que, a partir da noção de flagrante delito, a Constituição não retirou dos órgãos
policiais a possibilidade de entrar nos domicílios, senão que a considerou uma hipótese
excepcional, em que as circunstâncias em que se mostra o delito justificam uma imediata
intervenção; que a norma impugnada mostra uma amplitude e indeterminação incompatível
com a Constituição porquanto “conhecimento fundado” e “certeza” não integram um
conhecimento ou percepção evidente – vão além do que é essencial ou nuclear para
situação de flagrância – e que, por conseguinte, tais termos permitem entrada e buscas
domiciliares baseados em “conjecturas o en sospechas que nunca, por sí mismas, bastarían
para configurar una situación de flagrancia”84; que pelo fato de as expressões serem ambíguas
e indeterminadas, conferem ao flagrante um alcance que a Constituição não permite,
acrescentando que a interpretação e aplicação legislativa dos conceitos constitucionais
definidores dos âmbitos de liberdade é tarefa por demais delicada, em cujo cumprimento
não pode o legislador diminuir ou relativizar o rigor dos enunciados constitucionais que
estabeleçam garantias, nem mesmo criar margens de incerteza sobre seu modo de afetação,
uma vez que “la eficacia en la persecución del delito, cuya legitimidad es incuestionable,
no puede imponerse, sin embargo, a costa de los derechos y libertades fundamentales”85.
Quanto à terceira, afirmou que a Constituição não estabeleceu diferenciações
entre os tipos de delito, que ao se apresentarem em estado de flagrância podem ocasionar
a busca domiciliar. Pelo contrário, que toda hipótese de flagrante delito, qualquer que
seja a infração penal, pode autorizar a entrada forçosa no domicílio por parte dos órgãos
policiais; e que, por mais que a Constituição não tenha singularizado hipóteses delitivas
para aplicação de um conceito ad hoc de flagrância, não é menos certo que a noção geral
de delito flagrante requeira uma prestação jurisdicional sempre atenta às singularidades
do caso concreto “y que bien puede el legislador anticipar en sus normas essa precision
o concreción, para ilícitos determinados”86, desde que tal delimitação respeite a garantia
disposta no art. 18.2 da Constituição, isto é, o conceito constitucional de flagrante.
83
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 123.
84
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 124.
85
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 124.
86
Sentencia 341/1993, de 18 de novembro de 1993. BOE 295. p. 124.
87
MARTÍN MORALES, R. Entrada en domicilio opr causa de delito flagrante. Revista electrónica de Ciencia
Penal y Criminologian, n .1-2, p. 3.
88
ROSA. Guia compacto de processo penal... p. 116.
89
“[...] sem dúvida um mecanismo fundamental dessa distribuição desigual da criminalidade são os estereótipos
de autores e vítimas que, tecidos por variáveis geralmente associadas aos pobres (baixo status social, cor
etc.), torna-os mais vulneráveis à criminalização […]. A clientela do sistema penal é constituída de pobres
(minoria criminal) não porque tenha uma maior tendência a delinquir mas precisamente porque tem
maiores chances de serem criminalizados e etiquetados como delinquentes. As possibilidades (chances) de
resultar etiquetado, com as graves consequências que isto implica, se encontram desigualmente distribuídas
de acordo com as leis de um second code constituído especialmente por uma imagem estereotipada e
preconceituosa da criminalidade”. ANDRADE, V. R. P. de. Sistema penal máximo x cidadania mínima:
códigos de violência na era da globalização. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 53ss.
90
TOSCANO JR. A inviolabilidade do lar...
91
BAUMAN, Z. Vigilância líquida: diálogos com David Lyon. Rio de Janeiro: Zahar: 2013. p. 58.
92
BAUMAN, Z. Medo líquido... p. 193.
93
BAUMAN, Z. Vigilância líquida... p. 99.
94
“A técnica volkisch (ou popularesca) consiste em alimentar e reforçar os piores preconceitos para estimular
publicamente a identificação do inimigo da vez”. ZAFFARONI, E. R. O inimigo no direito penal. 2. ed. Rio
de Janeiro: Revan, 2007. p. 57
95
BAUMAN, Z. Medo líquido... p. 160.
96
BAUMAN, Z. Vidas desperdiçadas. Rio de Janeiro: Zahar, 2005. p. 44.
97
BAUMAN, Z. Vidas desperdiçadas. p. 108.
CONCLUSÃO
98
BAUMAN, Z. Confiança e medo na cidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2009. p. 41.
99
ZAFFARONI. Direito penal brasileiro... p. 201.
100
ZAFFARONI. Direito penal brasileiro... p. 243.
101
BAUMAN, Z. Vigilância líquida. p. 80.
102
PACELLI DE OLIVEIRA. Curso de processo penal...
103
Mesmo que este seja aplicada de forma totalmente divergente e manipulada daquela que é aplicada no
direito americano ou europeu.
104
ROSA. Guia compacto de processo penal... p. 70.
RESUMO
Este artigo analisa a gestão da exclusão por parte do sistema penal a partir da emergência da
crise financeira. Demonstra a redução da população carcerária em alguns países europeus
e o crescimento da população reclusa em países latino-americanos. Tem-se como hipótese
a influência do princípio da escassez para a redução da quantidade de presos na Europa
e a não incidência de referido princípio para a gestão da penalidade na América Latina.
Palavras-chave: Gestão da penalidade. Análise econômica da punição. Grande Recessão.
Princípio da escassez.
ABSTRACT
The paper analyses the penal management of social exclusion since the onset of the Great
Recession. It examines the reduction of prison population in some European jurisdictions
and the growth of prison population in South American countries. The paper regards that
the current European situation may be influenced by the scarcity of public resources, and
that this criterion has no remarkable influence on the management of penality in the South
American case.
Keywords: Management of penality. Economic analysis of punishment. Great Recession.
Principle of scarce resources.
1
Professor titular de Direito Penal da Universidade da Coruña, Espanha.
2
Professor de Direito Penal e Criminologia do Instituto de Criminologia e Política Criminal (ICPC), Brasil,
Faculdade de Direito de Francisco Beltrão (CESUL) e Centro Universitário Autônomo do Brasil (UniBrasil).
Parece seguro que o que tem sido chamado de Great Recession (Grande Recessão)
abriu um novo tempo, que afeta de maneira muito relevante todas as áreas da vida da
comunidade, pelo menos naqueles territórios que estão no epicentro da crise. Quer se
entenda, de acordo com alguma literatura autorizada (ARRIGHI, 2007), que estamos no
início de um novo ciclo de acumulação capitalista global, quer se atribua ao fenômeno
um significado menos histórico, não há dúvida de que a Grande Recessão é realmente um
evento, com toda a densidade semântica do conceito.
Como parece óbvio, o campo dos crimes e das penas não pode ser imune aos
efeitos desse evento. De fato, a Grande Recessão levanta questões de óbvia relevância
para o campo. Certamente uma delas é a referência à crise de legitimidade dos processos
de criminalização tradicionais em conexão com o debate sobre o dano social (BERNAL
et al., 2012). Colocado de forma sintética, pode-se questionar qual é o significado de
um sistema penal que persegue e pune constantemente comportamentos de nocividade
claramente limitada (p. ex., pequenos crimes contra a propriedade), em um momento
em que a crise, cuja gênese não se encontra apenas em comportamentos de risco, mas
em condutas ilícitas e _ formal e materialmente _ criminosas, destrói as expectativas de
vida de dezenas de milhões de pessoas. Isso deve ser suficiente para refletir sobre a base
real dos pressupostos que tinham sido o sustento narrativo do modelo punitivo moderno.
Além disso, a Grande Recessão produz uma segunda transformação do sistema penal
contemporâneo, talvez ainda mais inesperada do que a última: a penetração precipitada
dentro dele de algo frequentemente tão estranho a este componente da soberania como
a noção de escassez. O tempo da crise tem incentivado a atenção coletiva a textos
econômicos, clássicos e contemporâneos. Em consonância com isso, também a etapa do
sistema punitivo que estamos vivendo recomenda atenção a este tipo de literatura. No
entanto, não é momento para sugerir uma releitura de textos da tradição da Economia
política da pena, senão de uma obra, em princípio, tão longe de qualquer tradição crítica
como o artigo seminal de Becker (1968) sobre a Análise econômica do crime e da punição
(AED). Neste texto, o economista neoclássico da Universidade de Chicago sugere uma
metodologia radicalmente utilitária para analisar de jeito normativo a operação do sistema
penal. Como consequência disso, o autor conclui que, como sociedade, devemos considerar
em que ponto a perseguição penal gera mais custos do que benefícios e, portanto, qual
margem de impunidade devemos admitir coletivamente (BECKER, 1968).
GRÁFICO 1 - Evolução da população carcerária espanhola total, por trimestres, de 2007 a 2014
3
Forero e Jiménez (2013) destacam em particular que a criminalidade não aumentou desde o início da
crise. Os autores apresentam como possíveis explicações a redução das penas para o tráfico de drogas na
reforma de 2010 e o crescimento da substituição da prisão para estrangeiros por expulsão. Rodríguez e
Larrauri (2012), entretanto, mostram que a criminalidade em geral tem diminuído desde o início da crise.
Em qualquer caso, se assim for, a situação espanhola não seria excepcional. Uma
evolução semelhante parece ter ocorrido no último período no caso dos EUA. No que se
refere à evolução dos países europeus, percebem-se os seguintes dados em referência a
alguns deles, particularmente aqueles que experimentaram a crise de maneira mais aguda:
TABELA 4 - Evolução das taxas de população penitenciária em diversos países europeus, 2007-2014
(taxa por 100.000 habitantes)
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Chipre 106 104 111 112 106 108 ----- -----
França 100 104 103 103 111 100 102
Alemanha 94 91 89 88 87 85 77 81
Grécia 100 110 98 106 110 112 120 -----
Irlanda 80 85 88 97 93 94 89 82
Itália 78 96 107 113 111 112 105 88
Portugal 109 101 104 109 120 129 137 136
Reino Unido 145 151 150 152 151 151 147 147
FONTE: SPACE I, Council of Europe (2007-2012); ICPS (2013-2014)
4
No entanto, esta tendência foi parcialmente compensada pela manutenção, no mesmo período, das
deportações de imigrantes criminosos (de 7591 em 2009 para 7582 em 2013), o que certamente é uma
das razões para o declínio da população carcerária.
Taxa de
População População Total
população
População submetida submetida população
Ano penitenciária
penitenciária à liberdade à liberdade submetida ao
(por 100.000
vigiada condicional controle penal
habitantes)
2007 2298 758 4293’2 826’1 7337’9
2008 2308’4 756 4270’9 828’2 7312’4
2009 2291’9 744 4204 819’3 7232’8
2010 2266’8 730 4055’5 840’7 7076’2
2011 2239’8 716 3971’4 853’9 6977’7
2012 2228’4 707 3942’8 851’2 6937’6
FONTE: Sourcebook of Criminal Justice Statistics (www.albany.edu); Bureau of Justice Statistics (bjs.ojp.usdoj.gov)
Talvez o mais surpreendente seja que este desenvolvimento recente havia sido
previsto por vários autores, antes mesmo de se materializar em termos estatísticos (BECKETT;
SASSON, 2004; TONRY, 2004; WACQUANT, 2004).5 A revisão da literatura permite analisar
quais foram as razões subjacentes a esta mutação, marginalizando qualquer explicação
simplista ligada mecanicamente às tendências de aumento e/ou redução da criminalidade. A
este respeito, a emergente contração do sistema penal dos EUA parece ter sido influenciada
por três diferentes tipos de fatores. Primeiro, a diminuição da importância atribuída à
questão do crime pela sociedade americana (LYNCH, 2008; PRATT, 2007) _ determinada
em parte pelas taxas de crime inferiores em relação ao passado (BECKETT; SASSON, 2004;
PRATT, 2006; SIMON; HANEY-LOPEZ; FRAMPTON, 2008) _ apesar da sobrevivência de
atitudes punitivas na população (PRATT, 2006; WESTERN, 2006). Certamente, a redução
da preocupação social com o crime guarda relação com a acentuação de outros medos
5
Expressaram opinião em contrário, entre outros, Pratt (2006) e Western (2006).
No Brasil, a população carcerária não deixou de crescer. Talvez por ainda não estar
em um período de recessão. Mas parece que não é por conta disso. Embora no Brasil não
sejam dirigidos os recursos necessários para o sistema prisional, a população carcerária não
deixa de crescer pelo fato de não existir uma cultura de respeito aos direitos fundamentais
do preso (condenado ou provisório). A democracia brasileira é muito recente e uma cultura
de respeito aos direitos humanos ainda está para ser desenvolvida. E isso se deve ao modelo
econômico neoliberal, que funciona mais como um modelo epistemológico, orientado
pela eficiência (e não eficácia) do que como uma forma de organização da economia.
6
Lea e Hallsworth (2012) mencionam a emergente adoção de medidas semelhantes no contexto britânico.
7
A mesma circunstância foi mencionada em relação à evolução recente no sistema penal britânico (KARSTEDT,
2013; PITTS, 2012; REINER, 2012), assim como em outros países europeus (KARSTEDT, 2013).
8
Karstedt (2013) indica que a evolução no contexto da crise evidencia que o neoliberalismo não precisa
necessariamente levar a uma permanente expansão do sistema penal.
ANITUA, G. I. Historias de los pensamientos criminológicos. Buenos Aires: Del Puerto, 2005.
BAVA, S. C. As muitas violências. In: Editorial do Le Monde diplomatique Brasil, São Paulo,
n. 37, ago. 2010.
BECKER, G. Crime and punishment: an economic approach. The Journal of Political Economy,
Chicago, III., v. 76, n. 2, p. 169-217, 1968.
BECKETT, K.; SASSON, T. The politics of injustice: crime and punishment in America. 2nd. ed.
Thousand Oaks, Calif.: Sage, 2004.
BERNAL, C. et al. Estudio preliminar. In: W. Morrison, Criminología, civilización y nuevo orden
mundial. Barcelona: Anthropos, 2012. p. XXV-LIV.
BROWN, M. The culture of punishment: prison, society, and spectacle. New York: New York
University Press, 2009.
CAMPBELL, M. Is the pendulum swinging? Crime, punishment and the potential for reform in
the USA. Punishment & Society, London, v. 12, n. 2, p. 216-219, 2010.
CAVADINO, M.; DIGNAN, J. Penal systems: a comparative approach. London: Sage, 2006.
CHRISTIE, N. La industria del control del delito. Buenos Aires: Del Puerto, 1993.
CLEAR, T. R. The great penal experiment: lessons for social justice. In: FRAMPTON, M. L.;
HANEY-LOPEZ, I.; SIMON, J. (Ed.). After the war on crime. New York: New York University
Press, 2008. p. 81-94.
FORERO, A.; JIMÉNEZ, D. La cárcel española en (la) crisis: mano dura y escasez. ¿Hacia la
esquizofrenia punitiva? 2013. Em impressão.
GOTTSCHALK, M. The carceral state and the politics of punishment. In: SIMON J.; SPARKS, R.
(Ed.). The Sage handbook of punishment and society, London: Sage, 2013. p. 205-241.
HARCOURT, B. E. The illusion of free markets: punishment and the myth of natural order.
Cambridge: Harvard University Press, 2011.
HOLLEMAN, H. et al. The Penal State in an Age of Crisis. Monthly Review, New York, v. 61, n.1,
June 2009. Disponível em: <www.monthlyreview.org>. Acesso em: 24 jun. 2014.
KARSTEDT, S. Never waste a good crisis! Criminology in Europe, n.1, p. 5-11, 2013.
KOULISH, R. E. Immigration and American democracy: subverting the rule of law. New York:
Routledge, 2010.
LEA, J.; HALLSWORTH, S. Bringing the state back in: understanding neoliberal security. In:
SQUIRES, P.; LEA, J. (Ed.). Criminalisation and advanced marginality: critically exploring the
work of Loïc Wacquant. Bristol: The Policy Press, 2012. p. 19-39.
LYNCH, M. The Contemporary penal subject(-s). In: FRAMPTON, M. L.; HANEY-LOPEZ, I.;
SIMON, J. (Ed.). After the war on crime: race, democracy, and a new reconstruction. New York:
New York University Press, 2008. p. 89-105.
PITTS, J. The third time as farce: whatever happened to the penal state?. In: SQUIRES, P.; LEA, J.
(Ed.). Criminalisation and advanced marginality. Bristol: The Policy Press, 2012. p. 61-84.
RE, L. Carcere e globalizzazione: il boom penitenziario negli Stati Uniti e in Europa. Bari:
Laterza, 2006.
REINER, R. Political economy and criminology: the return of the repressed. In: HALL S.;
WINLOW, S. (eds.). New directions in criminological theory. London: Routledge, 2012.
p. 30-51.
RODRÍGUEZ, J.; LARRAURI, E. Economic crisis, crime, and prison in Spain. In: Criminology in
Europe, n. 2., p. 10-13, 2012.
SIMON, J.; HANEY-LOPEZ, I.; FRAMPTON, M. L. Introduction. In: FRAMPTON, M. L.; HANEY-
LOPEZ, I.; SIMON, J. (eds.). after the war on crime. New York: New York University Press, 2008.
p. 1-20.
TONRY, M. Thinking about crime. New York: Oxford University Press, 2004.
WALMSLEY, R. World prison population list. 9th ed. ICPS, 2011. <Disponível em: www.idcr.
org.uk>. Acesso em: 20 jun. 2014.
WESTERN, B. Punishment and inequality in America. New York: Russell Sage Foundation, 2006.
ZAFFARONI, E. R. Em busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal. Rio
de Janeiro: Revan, 1991.
_____. A palavra dos mortos - Conferências de criminologia cautelar. São Paulo: Saraiva, 2012.
RESUMO
O presente artigo busca empreender o paradigma funcionalista introduzido pelas teorias
pós-finalistas, trazendo a lume o novo contexto do qual não é dado ao cientista jurídico-
-penal da alvorada do milênio se esquivar: a necessidade da interdisciplinaridade em
matéria jurídica e, ademais, da multidimensionalidade das categorias dogmáticas de direito
penal, em especial, o delito culposo.
Palavras-chave: Direito Penal. Interdisciplinaridade. Imputação Objetiva. Crime culposo.
Complexidade.
ABSTRACT
This article analyzes the functionalist paradigm introduced by post-finalists theories,
exploring the new context that should not be abandoned by the criminal scientist: the need
of interdisciplinarity in legal matters and, moreover, the multidimensionality of criminal
dogmatic categories, in particular the negligent crimes.
Keywords: Criminal Law. Interdisciplinarity. Objective imputation. Negligent crime.
Complexity.
1
Doutoranda em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Mestra
em Direito Empresarial e Cidadania, na linha de pesquisa Direito Penal Econômico, pelo Centro Universitário
Curitiba. Integrante do Grupo de Pesquisa em Direito Penal Econômico do Centro Universitário Curitiba e
do Grupo Modernas Tendências do Sistema Criminal. Professora universitária e advogada.
Por não raras vezes, a ciência do direito penal, afeita a referibilidades empíricas,
não se deixou falsear e, ao contrário, refugiou-se em abstrações que, fundadas no universo
ôntico, fecha-se em uma metafísica conceitual. Ocorre que, deixando de enfrentar
problemas concretos, ainda que apegada à ontologia das coisas, a ciência do direito penal
afasta-se do que deva ser, incorrendo, assim, em um reducionismo epistemológico que,
neste artigo, refutar-se-á. No caminho da complexidade, que, aqui é considerado como
imposição contemporânea, abre-se um leque de novas dimensões sociais e políticas que,
por meio do contributo da interdisciplinaridade e da afeição a critérios axiológicos é capaz
de lidar com o novo que se apresenta. O presente artigo visa tratar do ajuste axiológico-
-normativo, imposto com a contribuição da política criminal à dogmática penal atual por
meio da adoção de critérios de imputação objetiva.
A reflexão de Morin bem serve para ilustrar o momento histórico havido no último
quarto do século passado, que trouxe consequências e uma nova abordagem nos estudos
de direito penal.
Desde a Revolução Francesa e os ganhos do Iluminismo, considerados marcos na
evolução social humana e na formação do Estado de Direito que até hoje conhecemos,
o homem tratou de elevar e preservar seus direitos contra o Estado “Leviatã” e obteve
êxito, a partir da criação das bases que iriam formular toda a estrutura do Direito, e
consequentemente, do direito penal. Essas bases estariam sustentadas e expressas em seu
último (e primeiro grau) pelo princípio de legalidade.
Passava o direito penal a expressar-se através de um sistema de imputação
formulado a partir do que exigisse a norma. O Iluminismo implicou em uma valorização
do indivíduo, própria de sua época, e ilustrada pela fórmula cartesiana clássica do “penso,
logo existo” ou cogito, ergo sum (DESCARTES, 1638). O princípio de legalidade torna-se
o instrumento máximo do direito penal, desmistificando a ideia segundo a qual devesse
constituir um instrumento a favor do Estado.
2
O termo autopoiesis, originado na década de 1970 pelos estudos de Biologia e Filosofia, possui origem grega
e significa autocriação, ou seja, a capacidade de determinados seres vivos reproduzirem-se e manterem-se
por si só. O termo foi introduzido na linguagem sociológica contemporânea a partir do construtivismo
radical, que tem Niklas Luhmann como exemplo. E, pode-se dizer, introduzido na literatura jurídica com
a obra de Gunther Teubner, que refuta a transformação do direito positivo em um sistema autopoiético.
TEUBNER, G. O direito como sistema autopoiético. Lisboa: Caloste Gulbenkian, 1999.
As exigências que se depositam sobre o direito penal cambiam a todo tempo e, por
isso mesmo, por ser um dos ramos da ciência jurídica que mais influem (senão o que
mais) na vida cotidiana social e, por ser o instrumento mais invasivo de controle social,
suas bases devem estar fincadas em um ambiente sólido e eficaz. O direito penal, quando
amparado, por perseverança e acuidade, pelas outras ciências do saber, faz destes inter-
relacionamentos, algo realmente produtivo. Hassemer (2004), em artigo escrito sobre
a autocompreensão da ciência penal frente às exigências de seu tempo, acertadamente
conduz o direito penal a um pensamento complexo:
Proibir e sancionar são também um ato político, um meio público para a compreensão
normativa sobre nossos interesses, assim como são a fronteira da liberdade. A fascinação
privada e política que a ciência do direito penal desperta supõe uma carga e reduz a ênfase
de sua função de chamada e garantia da liberdade científica (HASSEMER, 2004, p. 24-25).
3
O termo “contratos sociais” é utilizado, com frequência e a priori por Jakobs, quando esclarece que, desde
sempre (desde Adão e Eva) a humanidade deve ter em conta todas as consequências desses possíveis
“contatos”. JAKOBS, G. A imputação objetiva no direito penal. Trad. André Luís Callegari. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2000. p. 14.
4
O sociólogo Manuel Castells refere-se à chamada “sociedade em rede” para definir a sociedade do
novo século, econômica e socialmente dinâmica e interligada pela nova era da informação. Segundo
ele, “a economia global se caracteriza hoje pelo fluxo e troca quase instantânea de informação, capital
e comunicação cultural”, o que se reflete na aceleração, cada vez maior, do r ritmo das descobertas
e de suas aplicações. CASTELLS, M. A sociedade em rede: v. 1 - A era da informação: economia,
sociedade e cultura. Trad. Roneide Venancio Majer. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
Essa estrutura global deve ser representada exatamente pela função do direito
penal que, a depender da posição que se adote, variará. Isso porque, do estabelecimento
de missões5 ao sistema jurídico-penal, a proposta do funcionalismo é, conforme as
palavras de Guaragni (2009), “fazer os conceitos renderem de forma otimizada quanto ao
cumprimento de suas finalidades sistêmicas”, isto é, à luz dos critérios político-criminais
sempre preocupados com os ideais de justiça, revisitam-se alguns conceitos clássicos da
teoria do delito, como por exemplo, o da tipicidade (e, consequentemente, a culpa stricto
sensu), com vistas à melhor solução dos problemas práticos vislumbrados. Vale a transcrição
da lição de Luís Greco (1997), para quem o funcionalismo nada mais é que a remodulação
5
Conforme salientado por Busato, o emprego do termo “missão” é mais vantajoso que o termo “função” para
refletir o plano do dever ser. Segundo o autor, “no campo do direito penal, o termo ‘função’ corresponde
aos efeitos objetivamente reais, ainda que não desejados, da aplicação concreta do sistema jurídico-
-penal. Por isso, parece mais adequada a utilização do termo ‘missões’ para denominar as consequências
desejadas e buscadas pelo sistema penal.” BUSATO, P. C. O risco e a imputação objetiva. In: BUSATO,
P. C. (Org.). Teoria do delito. Curitiba: Juruá, 2012. (Série Direito penal baseado em casos). p. 64.
6
Sabe-se que o tema da imputação objetiva não é, necessariamente, novo no ambiente jurídico-penal, vez
que criada por Larenz para o direito civil e trazida por Hönig para o direito penal, porém restava abandonado
diante o sistema jurídico racionalista antecedente às teorias pós-finalistas. A este respeito, Busato adverte que
“ao contrário do que eventualmente se pode pensar, o tema da imputação objetiva não é exatamente um
assunto novo, nem muito menos fruto de concepções modernas sobre a teoria do delito, ainda que tenha
lugar nelas, o que enseja que alguns autores comentem a existência de uma ‘moderna teoria da imputação
objetiva’, em oposição a uma formulação ‘antiga’, para qualificá-la de algum modo. Não nos parece existir,
com efeito uma ‘nova teoria da imputação objetiva’, mas sim novas concepções sobre as categorias delitivas,
o que conduz à releitura de vários tópicos, entre eles, a parte objetiva da imputação”. BUSATO, P. C. Fatos
e mitos sobre a imputação objetiva. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 4. Retrocedendo ainda mais
no tempo, Jakobs relembra que “desde o primeiro episódio conhecido na história da humanidade sobre a
violação de uma norma (que remonta a Adão e Eva), se transluz – ainda que de maneira não muito intensa –
um problema de imputação objetiva”. JAKOBS, G. A imputação objetiva no direito penal. Trad. André Luís
Callegari. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 13. A respeito, ainda, do tema da imputação objetiva,
é bastante considerável a doutrina brasileira que trate, com cautela, do tema: BUSATO, P. C. Fatos e mitos
sobre a imputação objetiva. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008 (autor, é realmente necessário repetir esta
referência na nota de roda pé); GALVÃO, F. Imputação objetiva. 2. ed. Belo Horizonte: Mandamentos,
2002; PREUSSLER, G. de S. Aplicação da teoria da imputação objetiva no injusto negligente. Porto Alegre:
S. A. Fabris, 2006; CAMARGO, A. L. C. Imputação objetiva e direito penal brasileiro. São Paulo: Livraria
Paulista, 2002. E, sob a organização de André Luís Callegari e Nereu José Giacomolli: PEÑARANDA RAMOS,
E.; SUÁREZ GONZÁLEZ, C.; CANCIO MELIÁ, M. A fundamentação normativa da tipicidade no novo sistema
de direito penal. In: Um novo sistema do direito penal: considerações sobre a teoria de Günther Jakobs.
Barueri, São Paulo: Manole, 2003.
7
Na contramão do preconizado por Jakobs, tem-se Kaufmann, que nega que a imputação objetiva e
também se aplique como “teoria do tipo aos delitos dolosos, alegando, dentre outras razões, que ‘está
estampado na testa que provêm do crime culposo”. KAUFMANN, A. (1977) apud FEIJÓO SÁNCHEZ,
B. Teoria da imputação objetiva. Estudo crítico e valorativo sobre os fundamentos dogmáticos e sobre a
teoria da imputação objetiva. Trad. Nereu José Giacomolli. Barueri, São Paulo: Manole, 2003. p. 5.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
8
Há várias conceituações funcionais na literatura atual, a destacar, além de Roxin, Jakobs e Frisch: Enrique
Bacigalupo (1984), Francisco Muñoz Conde (2002) e Tomás Salvador Vives Antón (1996).
TAVARES, J. Teoria do crime culposo. Prefácio de Claus Roxin. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
VILANOVA, L. Escritos jurídicos e filosóficos. São Paulo: Axis Mundi, IBET, 2003. v. 1.
RESUMO
A teoria do delito do século XIX, enclausurada em postulados positivistas, tem passado por duras
mutações a partir de paradigmas que renovam os pressupostos conceituais que outrora lhe deram
sustentação. A teoria causalista, que compreendia a ação enquanto simples modificação mecânica
do mundo exterior, resguardando o foro meramente interno, e que dimensionava o dolo no estrato
da culpabilidade, revelou uma série de inconsistências teórico-práticas – notadamente no âmbito
das condutas omissivas – que a teoria finalista, deslocando o dolo para o tipo e introduzindo o
axioma de que toda ação é intencionalmente dirigida a um resultado, intentou resolver. Ocorre que
ambas, causalista e finalista, consideram o dolo como uma realidade ontológica, isto é, um dado
eminentemente psicológico que compete ao jurista identificar – o que dá azo a uma discricionariedade
extremada na medida em que, sendo um processo interno do indivíduo, não há como se afirmar
categoricamente quando o sujeito terá ou não conhecimento sobre o risco de produção do dano.
A superação destes obstáculos epistemológicos se dá com a teoria significativa da ação do jurista
espanhol Vives Antón que, ao prescrever ao dolo uma existência valorativa (axiológica), o toma como
um compromisso para atuar lesivamente a partir de critérios normativos.
Palavras-chave: Dolo. Imprudência. Causalismo. Finalismo. Ação significativa.
RESUMEN
La teoría del delito del siglo XIX, enclaustrada en los postulados positivistas, han pasado a través de
mutaciones de los paradigmas que renuevan los supuestos conceptuales que una vez le dieron apoyo.
La teoría causalista de von Liszt, que entendía la acción como simple modificación mecánica del mundo
exterior, resguardando el foro puramente interno, y en que el dolo integrava el estrato de la culpabilidad,
reveló una serie de inconsistencias teóricas y prácticas – sobre todo en conductas omissivas – que la
teoría finalista de Welzel, cambiando el dolo para el tipo y añadiendo el axioma de que toda acción se
dirige intencionalmente a un resultado, intentó resolver. Ocurre que tanto causalista y finalista, tienen
el dolo como una realidad ontológica, es decir, un carácter eminentemente psicológico que compite a
el jurista identificar - lo que da lugar a una discreción extrema ya que, al ser un proceso interno de la
persona, no hay manera de afirmar categóricamente cuando el sujeto tiene o no conocimiento sobre el
riesgo de producción de daño. La superación de estos obstáculos epistemológicos ocurre con la teoría
de la acción significativa del jurista español Vives Antón que, al prescribir al dolo una realidad valorada
(axiológica), lo toma como un compromiso para actuar lesivamente desde criterios normativos.
Palabras claves: Dolo. Imprudencia. Causalismo. Finalismo. Acción significativa.
1
Mestrando em Direito na linha de pesquisa “Direito, Poder e Controle” pela Universidade Federal do
Paraná (UFPR). Este artigo foi desenvolvido por ocasião da disciplina Novas Tendências do Sistema Penal
ministrada pelo professor Paulo Cesar Busato no primeiro semestre de 2014.
2
WITTGENSTEIN, L. Tractatus Logico-Philosophicus. Trad. de Luiz Henrique Lopes dos Santos. 3. ed. São
Paulo: EDUSP, 2001.
3
Apud WEINBERG, S. Os limites da explicação científica. Folha de São Paulo, São Paulo, Caderno Mais!
p. 7-12, 24 jun. 2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2406200107.htm>.
Acesso: 25 out. 2014.
4
FREITAS, R. de B. A. P. As condições da pesquisa científica em direito penal. Revista Verba Juris, v. 6, n.
6, 2007. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/vj/article/view/14871>. Acesso: 26 mar.
2014. p. 363.
5
Ibidem, p. 388.
6
Apud HASSEMER, W. Persona, mundo y responsabilidad. Valencia: Tirant Lo Blanch, 1999. p. 130.
O dano requerido por certos delitos (furto, roubo, agressão sexual) não pode
ser produzido sem uma ação humana intencional, por acidente, o que não objeta a
possibilidade da ocorrência de erro. Só se estará diante de um acidente quando o resultado
também possa ocorrer sem intervenção humana. Para que exista imprudência, e não
mero caso fortuito, é necessário que a conduta do sujeito implique um risco substancial e
injustificável de produção do dano relevante. Se por erro um farmacêutico coloca o rótulo
de refrigerante numa garrafa que contém uma substância tóxica, mas a deixa dentro do
vasilhame e não exposta na prateleira, se alguém subtrai e ingere o líquido da referida
garrafa, ainda que conduta do farmacêutico tenha provocado um risco substancial, será
justificável porque a possibilidade de que alguém viesse a ingeri-lo seria mínima.
A fórmula de Learned Hand define a imprudência como assunção de um risco
não razoável, o que equivale a dizer risco não justificável ao se comparar os benefícios
7
Apud BARBERÁ, G. P. El dolo eventual: Hacia el abandono de la idea de dolo como estado mental. Buenos
Aires: Hammurabi, 2011. p. 623.
8
Ibidem, p. 625.
9
FLETCHER, G. Conceptos básicos de derecho penal. Valencia: Tirant Lo Blanch, 1997. p. 175.
10
Ibidem, p. 177.
11
Ibidem, p. 192.
12
Apud DIAZ PITA, M. M. A presumida inexistência do elemento volitivo no dolo e sua impossibilidade
de normativização. In: BUSATO, P. (Org.). Dolo e direito penal: modernas tendências. São Paulo: Atlas,
2014. p. 6.
13
Ibid., p. 7.
14
CABRAL, R. L. F. O elemento volitivo do dolo: uma contribuição da filosofia da linguagem de Wittgenstein
e da teoria da ação significativa. In: BUSATO, P. (Org.). Dolo e direito penal: modernas tendências. São
Paulo: Atlas, 2014. p. 121.
15
Apud BUJÁN PÉREZ, op. cit., p. 48.
16
Ibid., p. 48.
17
JAKOBS, G. Derecho penal: parte general. Trad. Joaquín Cuello Contreras e José Luis Serra González de
Murillo. Madrid: Marcial Pons, 1997.
18
Apud CABRAL, op. cit., p. 123.
19
Apud BUSATO, 2014, p. 50.
20
Apud BUSATO, ibid., p. 51.
21
Ibidem, p. 124.
22
HASSEMER, op. cit., p. 141.
23
BUSATO, 2014, p. 64.
24
Apud BUSATO, ibid., p. 9.
25
Ibid.
26
Apud BUSATO, ibid., p. 129.
27
BUJÁN PÉREZ, op. cit., p. 30.
28
ROXIN, C. Derecho penal: parte general. Madrid: Civitas, 1997. p. 417.
29
Ibid., p. 37.
30
DIAZ PITA, op. cit., p. 13.
31
BUJÁN PÉREZ, op. cit., p. 46.
32
Cf. FRISCH, W. Comportamiento típico e imputación del resultado. Trad. Joaquín Cuello Contreras e
José Luis Serrano González de Murillo. Madrid: Marcial Pons, 2004.
33
BUJÁN PÉREZ, op. cit., p. 41.
34
Apud BARBERÁ, op. cit., p. 592
35
HASSEMER, op. cit., p. 148.
36
Ibidem, p. 597.
37
BARBERÁ, op. cit., p. 598.
38
Apud BARBERA, ibid., p. 586.
39
Ibid., p. 592.
40
RÁGUÉS I VALLÈS, R. El dolo y su prueba en el proceso penal. Barcelona: J.M. Bosch Editor, 1999. p. 352.
41
Apud BUSATO, 2014, p. 17.
42
HASSEMER, op. cit., p. 133.
43
CIRINO DOS SANTOS, J. A moderna teoria do fato punível. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
44
BITENCOURT, C. R. Tratado de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2013. v. 1.
45
BUSATO, 2014, p. 60.
46
ROXIN, op. cit., p. 425.
Em relação ao dolo eventual, sua distinção do dolo direto não se situa no âmbito do
elemento volitivo, e sim do cognitivo, isto é, na capacidade de fazer previsões (domínio de
uma técnica). É essa linha que segue o Bundesgerichtshof (BGH), Tribunal de Justiça Federal
da Alemanha, segundo o qual a produção do resultado, que constitui o elemento decisivo
de diferenciação entre o dolo eventual e a imprudência consciente, não significa que ele
corresponda aos desejos íntimos do sujeito, posto haver a possibilidade de dolo eventual
mesmo quando o sujeito não deseja a realização do dano. Desta forma, o indivíduo, apesar
de tudo, aprova tal resultado quando, em atenção ao objetivo perseguido, é dizer, desde
que não possa alcançar de outra maneira seu objetivo, se resigna também a que sua ação
produza o resultado em si indesejado e, portanto, o quer caso se produza.49
47
ROXIN, 1997, p. 426.
48
Apud BUSATO, 2014, p. 61.
49
ROXIN, 1997, p. 430.
BARBERÁ, G. P. El dolo eventual: hacia el abandono de la idea de dolo como estado mental.
Buenos Aires: Hammurabi, 2011.
BUSATO, P. (Org.). Dolo e direito penal: modernas tendências. São Paulo: Atlas, 2014.
FLETCHER, G. Conceptos básicos de derecho penal. Valencia: Tirant Lo Blanch, 1997.
FREITAS, R. de B. A. P. As condições da pesquisa científica em direito penal. Revista Verba Juris,
v. 6, n. 6. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/vj/article/view/14871>.
Acesso em: 26 mar 2014.
HASSEMER, W. Persona, mundo y responsabilidad. Valencia: Tirant Lo Blanch, 1999.
RÁGUÉS I VALLÈS, R. El dolo y su prueba en el proceso penal. Barcelona: J. M. Bosch 1999.
ROXIN, C. Derecho penal: parte general. Madrid: Civitas, 1997.
WEINBERG, S. Os limites da explicação científica. Folha de São Paulo, São Paulo, Caderno
Mais! p. 7-12, 24 jun. 2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/
fs2406200107.htm>. Acesso: 25 out. 2014.
THE CRIMINAL LAW AND HUMAN LIFE: A DEBATE AROUND THE LEGITIMATION
OF CRIMINAL ACTS THAT PROTECTS THE HUMAN LIFE.
RESUMO
O presente artigo é fruto da análise do impacto para a dogmática penal da proteção da vida.
Foram escolhidos como delimitação da pesquisa os tipos penais que têm como bem jurídico
a vida. Dentre estes tipos penais foram abordados os seguintes temas: eutanásia e aborto, por
serem alvos de discursos muito contraditórios dentro do sistema dogmático. Como metodologia,
buscou-se apresentar como o discurso da dogmática clássica constrói a justificação para a
existência da incriminação do aborto e da eutanásia ou sua abolição. Depois, analisa-se o
discurso atual e a ausência de argumentos científicos para justificar a permanência desses
tipos penais.
ABSTRACT
This article is the result of analysis of the impact to the criminal dogmatic of protecting life.
Was chosen as delimitation of the research, the criminal acts that have as well legal life. Among
these criminal acts, the following issues were addressed: euthanasia, and abortion because they
are targets of more contradictory discourses within the dogmatic system. As methodology, we
sought to present itself as the classic dogmatic discourse builds the justification for its existence
from the criminality of abortion and euthanasia or its abolition. Then we analyze the current
discourse and the lack of scientific arguments to justify the permanence of these criminal acts.
1
Doutorando em Direito Penal (Teoria da Antijuricidade e Retórica da Proteção Penal) pela Universidade
Federal de Pernambuco. Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Católica de Pernambuco
(2007). Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (2000). Atualmente é Professor
da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do São Francisco- FACESF, do Centro Universitário Maurício de
Nassau e da Escola de Advocacia Ruy Antunes da OAB/PE. Membro do Grupo de Pesquisa em Fundamentos
e Métodos do Pragmatismo: uma abordagem interdisciplinar dos fenômenos jurídicos - UFPE; e Membro
do Grupo de Pesquisa em Modernas Tendências do Sistema Criminal - FAE. Advogado militante na área
de Direito Criminal.
2
ALIMENA, Bernardino. Introdução ao direito penal. Trad. Maria Fernanda de Carvalho Bottallo. São
Paulo: Rideel, 2007. p.09.
3
Deve-se aqui fazer uma distinção entre punição e pena (a punição enquanto gênero do qual a pena
é espécie). Será considerado neste trabalho a ideia de que a pena é oriunda de um sistema racional e
proporcional da aplicação de uma norma ou costume.
4
DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa: o sistema totêmico na Austrália. Trad. Paulo
Neves. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 171.
5
AGAMBEN, Giorgio. Profanações. Trad. Selvino José Assman. São Paulo: Boitempo, 2007. p. 65.
6
AGAMBEN, Giorgio. Profanações. Trad. Selvino José Assman. São Paulo: Boitempo, 2007. p. 65-66.
7
AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer. Trad. Henrique Burigo. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002. p.23.
8
AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer. Trad. Henrique Burigo. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002, p.24.
9
Neste ponto, esclarece o autor “Em toda verdadeira democracia, a magistratura não é uma vantagem,
mas uma carga onerosa que não se pode justamente impor a um particular mais que a um outro. Apenas
a lei pode impor esta carga àquele sobre o qual a sorte recair. Pois então, a condição sendo igual para
todos, e a escolha não dependendo de nenhuma vontade humana, não há aplicação particular que altere
a universalidade da lei” (ROUSSEAU, 1981, p. 133).
10
BECCARIA, Cesare. Dei delitti e delle pene. Disponível em: <http://www.letteraturaitaliana.net/pdf/
Volume_7/t157.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2014.
11
Tradução livre de “La prima conseguenza di questi principii è che le sole leggi possono decretar le pene
su i delitti, e quest’autorità non può risedere che presso il legislatore, che rappresenta tutta la società unita
per un contratto sociale”.
12
Afirma, precisamente: “Hoy ya no compartimos, por cierto, la fe racionalista con que Carrara creía poder
aprehender los princípios inmutables de la razón que presiden la teoría del delito, y nos deiaría perpleios
quien quisiese proponer de nuevo la rígida contraposición hecho por Carrara entre la autoridade de la ley
y la verdad que desciende de la naturaleza de las cosas y a la cual debe dirigirse el tratamiento teórico del
derecho penal” (BARATTA, 2004, p. 30).
13
SOLER, Sebastian. Derecho penal argentino. Buenos Aires: Tipográfica Editora Argentina, 1992. p. 134-141.
14
FERRI, Eurico. Delinquente e responsabilidade penal. Trad. Fernanda Lobo. São Paulo: Rideel, 2006. p. 114.
15
FERRI, Eurico. Delinquente e responsabilidade penal. Trad. Fernanda Lobo. São Paulo: Rideel, 2006. p.117.
16
Defende Ferri que “A periculosidade do criminoso constitui, portanto, o critério (subjetivo) fundamental
que vai substituindo o critério clássico (objetivo) da entidade do crime” (2006, p.119).
17
BARATTA, Alessandro. Criminología crítica y crítica del derecho penal: introducción a la sociología
jurídico penal. Buenos Aires: Siglo Veintiuno, 2004. p. 36-37.
18
HASSEMER, Winfried. Por qué no debe suprimirse el derecho penal. Mexico: Instituto Nacional de
Ciencias Penales, 2003. p. 7-9.
19
HASSEMER, Winfried. Por qué no debe suprimirse el derecho penal. Mexico: Instituto Nacional de
Ciencias Penales, 2003. p. 16.
20
A determinação de penas passa por um processo cíclico, e Hassemer defende que “Las penas, expresaba a
finales del siglo antepasado el reconocido autor Emile Durkheim, tuvieron que ser creadas: hay determinadas
infracciones a normas, comportamientos socialmente desviados, indicaba él, y son estas infracciones a las
normas contra las que no sólo tenemos que luchar, sino también, en un sentido bastante complejo, tenemos
que recibir con agrado, pues brindan a nuestra sociedad opciones de vida; mantienen, por así decirlo,
la proporcionalidad en el baile, pero sobre todo nos brindan la posibilidad de reafirmar continuamente
nuestras normas, crear y cuidar la conscience collective, es decir, nuestra conciencia general y común.”
(2003, p.18).
21
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 421.
22
Zaffaroni mostra o despreparo da Dogmática Penal e seu distanciamento da realidade e afirma que “En la
criminología de nuestros días es corriente la descripción de la operatividad real de los sistemas penales em
términos que nada tienen que ver con la forma en que los discursos jurídico-penales presuponen que operan,
es decir, que la programación normativa se basa sobre una ‘realidad’ que no existe y el conjunto de agencias
que debiera llevnr a cabo esa programación opera en forma completamente diferente”(1998, p.16).
23
ZAFFARONI, Eugénio Raúl. En busca de las penas perdidas: deslegitimacion y dogmatica juridico-penal.
Buenos Aires: EDIAR, 1998. p. 16.
24
SOLER, Sebastian. Derecho penal argentino. Buenos Aires: Tipográfica Editora Argentina, 1992. p. 157.
25
Sebastian Solen mostra que “Ya se han visto las formas directas o encubiertas que a través de los tiempos han
sido utilizadas para derogar o desvirtuar al principio de legalidad. Pues bien, idéntica finalidad derogatoria
conlleva la tesis sentada por la Corte Suprema de Justicia de la Nación en la causa ‘Valenzuela, Juan’ del
24 de septiembre de 1947 (Fallos, t. 208, p. 562) cuando admitió la validez de los decretos leyes en
materia penal, pues ellos eran ley en sentido material y debían ser aceptados en tanto fueran anteriores a
la comisión del delito” (1992, p. 153).
26
ZAFFARONI, Eugénio Raúl. En busca de las penas perdidas: deslegitimacion y dogmatica juridico-penal.
Buenos Aires: EDIAR, 1998. p. 20.
27
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 33.
28
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 34.
29
BACIGALUPO, Enrique. Pincipios contitucionales de derecho penal. Buenos Aires: Hammurabi, 1999. p. 47.
30
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 35.
31
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral. v. 1: Introdução, norma penal, fato punível. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 176.
32
HASSEMER, Winfried. Introdução aos fundamentos do direito penal. Trad. Pablo Rodrigo Alflen da Silva.
Porto Alegre: S. A. F., 2005. p. 25.
33
Neste ponto, salutar à definição de Zaffaroni sobre sistema penal, afirma-se: “Chamamos de ‘sistema Penal’
ao controle punitivo institucionalizado, que na prática abarca a partir de quando se detecta ou supõe
detectar-se uma suspeita de delito até que se impõe e executa uma pena, pressupondo uma atividade
normativa que cria a lei que institucionaliza o procedimento, a atuação dos funcionários e define os casos
e condições para essa atuação” (2011, p. 69).
34
NAUCKE, Walfgang. Introdução à parte especial do direito penal. 5 ed. Trad. e notas de Augusto Silva
Dias. Lisboa: A.A.F.D.L., 1989. p. 22-23. Extracto de Strafrecht- aine Einführung
Esse argumento social serviu como base para a incriminação do auxílio, instigação
e induzimento ao suicídio no ocidente. No auxílio, instigação e induzimento ao suicídio,
a vida é maculada de forma indireta, já que a vítima será seu próprio carrasco.
Dentro da Teoria do Delito, o princípio da proporcionalidade tem como parâmetro
o bem jurídico tutelado, bem como a reprovação da conduta in abstrato. Por esta razão, a
eutanásia, enquanto uma morte provocada por terceiro, mesmo por meio da justificativa
de evitar a continuidade de uma situação não reversível e que provoca situação contrária
à dignidade da pessoa humana, ainda assim encontra a legitimação de sua incriminação
na sociedade e uma função na aplicação de uma pena: a garantia do monopólio estatal
sobre o domínio da vida.
O discurso dogmático clássico se propunha a ser um discurso científico, mas
fica evidente seu caráter político. A valoração do plano normativo depende dos valores
sociopolíticos do aplicador. Desse modo, a incriminação primária se torna política e
depende da eleição de bens jurídicos que devem ser tutelados.
35
NAUCKE, Walfgang. Introdução à parte especial do direito penal. 5 ed. Trad. e notas de Augusto Silva
Dias. Lisboa: A.A.F.D.L., 1989. p. 23. Extracto de Strafrecht- aine Einführung.
36
HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. Rio de Janeiro: Forense,
1979. v. 5. p. 25.
O homicídio tem por objeto o homem, isto é, o ser vivo nascido da mulher. Nascer quer
dizer ter existência própria fora do seio materno. É está a circunstância característica
que distingue o homicídio do principal caso do aborto. A existência independente não
data somente do momento em que se opera completa separação entre a criança e a
mãe, tampouco remonta ao começo dos movimentos de expulsão (dores do parto),
mas começa com a cessação da respiração placentária do feto e com a possibilidade
da respiração pelos pulmões (*) (a). Todo ser vivo nascido da mulher é homem, ainda o
chamado monstro (b) (o ser vivo de formação irregular), quer a continuação da vida seja
impossível (monstrum no sentido estricto), quer não (os gêmeos siameses). A viabilidade
não é condição necessária; um recém-nascido inviável pode ser objeto de homicídio,
como o pode ser um velho in extremis37 (LISZT, 1899, p. 7).
37
LIST, Franz von. Tratado de direito penal alemão. Trad. José Hygino Duarte Pereira. Rio de Janeiro: F.
BRIGUIET, 1899b. v. 1. p. 07.
38
LÔBO, Paulo. Direito civil: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 101-102.
39
LIST, Franz von. Tratado de direito penal alemão. Trad. José Hygino Duarte Pereira. Rio de Janeiro: F.
BRIGUIET & C. Editores, 1899a, v. 1. p. 47.
40
Pessina (apud HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. Rio de
Janeiro: Forense, 1979. v. 5. p. 9).
41
Cita-se o artigo do Médico Drauzio Varella que descreve que “A septicemia resultante da presença de restos
infectados na cavidade uterina é causa de morte frequente entre as mulheres brasileiras em idade fértil.
Para ter ideia, embora os números sejam difíceis de estimar, se contarmos apenas os casos de adolescentes
atendidas pelo SUS para tratamento das complicações de abortamentos no período de 1993 a 1998, o
número ultrapassou 50 mil. Entre elas, 3.000 meninas de dez a quatorze anos.” (2014).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não há uma conclusão fácil. O direito penal possui uma dogmática cujo discurso
foi construído no século XIX e que perde sua capacidade de justificar a aplicação de
punições. A real função da dogmática penal é avaliar quando os tipos penais devem
existir e quando devem ser abolidos. O discurso dessa dogmática é uma construção
histórica e preceitua que a racionalidade seja a ferramenta para buscar quais condutas
humanas devem ser incriminadas.
A incriminação deveria ser fruto de um processo racional; os preceitos da
dogmática penal limitariam o conteúdo das leis penais e, se assim não fosse, ao menos
a sua aplicação.
No que se refere ao bem jurídico vida, o discurso construído no passado
perde força frente ao aumento da complexidade das sociedades. A consequência é a
relativização desmedida do discurso dogmático e a busca pela justificação utilitarista
dos Estados, que tem como base apenas a contingência política, alienada totalmente às
teorias da dogmática penal.
Tal crise é agravada pela descientificação da política criminal, que passa a atender
os anseios de panorama construído por informações midiáticas e que não corresponde
à realidade.
O processo de criminalização primária e o processo de descriminalização passam
pelos procedimentos, já que ambos estão no nascimento e na morte da norma. O
processo de criminalização e descriminalização é (ou deve ser) a síntese do confronto
entre o discurso dogmático e os valores sociopolíticos da sociedade.
A eutanásia hoje é justificada por um bem jurídico novo no discurso da dogmática
penal: a dignidade da pessoa humana. Argumenta-se que ninguém pode ser obrigado a
sofrer, física ou psicologicamente, e assim o término da vida seria justificado. É quase uma
forma de estado de necessidade invertido, em que o perigo atual não seria externo, mas
42
LINS, Letícia. Ministro da Saúde contesta dados da ONU sobre abortos no Brasil. Disponível em:
<http://oglobo.globo.com/brasil/ministro-da-saude-contesta-dados-da-onu-sobre-abortos-no-brasil-
4019839#ixzz365VorlYK>. Acesso em: 14 maio 2014.
AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer. Trad. Henrique Burigo. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.
_____. Profanações. Trad. Selvino José Assman. São Paulo: Boitempo, 2007.
ALIMENA, Bernardino. Introdução ao direito penal. Trad. Maria Fernanda de Carvalho Bottallo.
São Paulo: Rideel, 2007.
BACIGALUPO, Enrique. Pincipios contitucionales de derecho penal. Buenos Aires:
Hammurabi, 1999.
BARATTA, Alessandro. Criminología crítica y crítica del derecho penal: introducción a la
sociología jurídico penal. Buenos Aires: Siglo Veintiuno, 2004.
BECCARIA, Cesare. Dei delitti e delle pene. Disponível em: <http://www.letteraturaitaliana.net/
pdf/Volume_7/t157.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2014.
BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral. v. 1: introdução, norma penal, fato punível. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
_____. A Perigosidade criminal. Recife: Faculdade de Direito do Recife, 1937
DURKHEIM, Émile. As Formas elementares da vida religiosa: o sistema totêmico na Austrália.
Trad. Paulo Neves. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2014.
FERRI, Eurico. Delinquente e responsabilidade penal. Trad. Fernanda Lobo. São Paulo: Rideel,
2006.
HASSEMER, Winfried. Introdução aos fundamentos do direito penal. Trad. Pablo Rodrigo
Alflen da Silva. Porto Alegre: S. A. Fabris, 2005.
_____. Por qué no debe suprimirse el Derecho Penal. Mexico: Instituto Nacional de Ciencias
Penales, 2003.
HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. Rio de Janeiro:
Forense, 1979. v. 5.
LINS, Letícia. Ministro da Saúde contesta dados da ONU sobre abortos no Brasil. Disponível
em: <http://oglobo.globo.com/brasil/ministro-da-saude-contesta-dados-da-onu-sobre-abortos-
no-brasil-4019839#ixzz365VorlYK>. Acesso em: 14 mai. 2014.
LÔBO, Paulo. Direito civil: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2012.
NAUCKE, Wolfgang. Introdução à parte especial do direito penal. 5. ed. Trad. e notas de
Augusto Silva Dias. Lisboa: A.A.F.D.L., 1989. Extracto de: Strafrecht- aine Einführung.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social e discursos sobre a economia política. Trad.
Márcio Pugliesi, Norberto de Paula Lima. São Paulo: Hemus, 1981.
(JAMES GOLDSCHMIDT)
Michelangelo Corsetti1
1
Mestre e Especialista em Ciências Criminais pela PUC RS. Professor de Direito Penal e Processo Penal da
Universidade de Caxias do Sul. Advogado Criminalista.
II
III
O autor segue, na terceira parte da obra, destacando o fato de que Frank alegava
que a culpabilidade era um conceito possível de graduação. Quanto a isso, afirma que
não havia necessidade alguma de qualquer explicação em relação ao dolo no sentido
psicológico, isto é, como previsão do resultado, pois este não seria suscetível de graduação.
Entretanto, isso seria diferente no tratamento da culpa, pois nela encontra-se o elemento
normativo da violação de um dever de cuidado. Por tal razão fala-se em culpa “leve”
ou “grave”. O interesse da comunidade jurídica em não ser violado ou ameaçado um
bem jurídico traduz-se nas representações de valoração de seus componentes e, deste
modo, influi na determinação da gravidade da culpabilidade. Quanto mais graves forem
Histórico e missão
A Revista Justiça e Sistema Criminal é um espaço para divulgação da produção científica
e acadêmica de temas relativos ao sistema criminal, compreendendo aspectos relacionados tanto
ao Direito e ao Processo Penal quanto à Criminologia, à Política Criminal, à Sociologia Jurídico-
-Penal e à Filosofia do Direito Penal, que visa principalmente difundir modernas tendências das
áreas referidas, em sentido crítico e evolutivo.
Os temas principais estão vinculados ao desenvolvimento dos trabalhos do Grupo
de Estudos Modernas Tendências do Sistema Criminal, que reúne pesquisadores de diversas
universidades e acadêmicos de graduação e pós-graduação da FAE Centro Universitário. Entre
nossos leitores, encontram-se professores, alunos de graduação e pós-graduação, profissionais
da área jurídica e consultores de empresas públicas e privadas.
Objetivo
O objetivo da Revista Justiça e Sistema Criminal é promover a publicação de temas
relacionados ao Direito e ao Processo Penal quanto à Criminologia, à Política Criminal, à Sociologia
Jurídico-Penal e à Filosofia do Direito Penal.
Pretende-se contribuir para o desenvolvimento teórico do modelo de controle social
criminal a partir da difusão de ideias modernas e críticas que ajudem na construção de um perfil
humanista do sistema criminal.
Assim, será dada prioridade à publicação de artigos que, além de inéditos, nacional e
internacionalmente, tratem de temas contemporâneos relacionados com a matéria criminal e
que tenham perfil preferencialmente crítico.
Orientação editorial
Os trabalhos selecionados pela Revista Justiça e Sistema Criminal serão aqueles que
melhor se adequem às linhas de pesquisa desenvolvidas pelo Grupo de Estudos Modernas
Tendências do Sistema Criminal, acessíveis pela plataforma de grupos de pesquisa do CNPq.
Os trabalhos podem versar tanto sobre análises teóricas quanto experiências da práxis
jurídica, resultantes de estudos de casos ou pesquisas direcionadas que exemplifiquem ou tragam
experiências, fundamentadas teoricamente e que contribuam com o debate estimulado pelo
objetivo da revista.
Enfatiza-se a necessidade de os autores respeitarem as normas estabelecidas nas Notas para
Colaboradores. Os trabalhos serão publicados de acordo com a ordem de aprovação.
Focos
O principal requisito para publicação na Revista Justiça e Sistema Criminal consiste em
que o artigo represente, de fato, contribuição científica. Tal requisito pode ser desdobrado nos
seguintes tópicos:
– O tema tratado deve ser relevante e pertinente ao contexto e ao momento e,
preferencialmente, pertencer à orientação editorial.
Escopo
A Revista Justiça e Sistema Criminal tem interesse na publicação de artigos de
desenvolvimento teórico e prático forense.
Os artigos de desenvolvimento teórico devem ser sustentados por ampla pesquisa
bibliográfica e devem propor novos modelos e interpretações para aspectos relacionados ao
sistema criminal.
Os trabalhos empíricos devem fazer avançar o conhecimento na área, por meio
de pesquisas metodologicamente bem fundamentadas, criteriosamente conduzidas e
adequadamente analisadas.
Permuta
A Revista Justiça Criminal faz permuta com as principais faculdades e universidades do
Brasil, da Espanha, da Argentina e da Nicarágua.
Envio de artigos
Os artigos deverão ser encaminhados para:
FAE Centro Universitário - Grupo de Pesquisas Modernas Tendências do Sistema Criminal
Rua 24 de Maio, 135
80230-080 Curitiba -PR
E-mail disponível no site www.sistemacriminal.org
Fone: (41) 2105-4098 - Fax: (41) 2105-4195
Agradecemos o seu interesse pela Revista Justiça e Sistema Criminal e esperamos tê-lo(a)
como colaborador(a) frequente.