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03/09/2019 Andrea Tonacci e a invenção do cinema - Revista Bravo! - Medium
No apagar das luzes de um ano que começou levando Ettore Scola, o cinema se
despede de um de seus mais inventivos diretores. Andrea Tonacci faleceu na tarde de
sexta-feira (16), em função de um câncer no pâncreas. Autor de uma filmografia única,
composta por poucos mas substantivos títulos ao longo de seus quase 50 anos de
atividade, Tonacci era um espírito crítico e independente. As tentativas de classificar
seu cinema pode apenas aludir à inquietação criativa permanente que o acompanhava:
seus filmes são marginais em relação ao mercado e experimentais do ponto de vista
formal, produtos de um verdadeiro “cinema de invenção” (nas palavras de Jairo
Ferreira).
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03/09/2019 Andrea Tonacci e a invenção do cinema - Revista Bravo! - Medium
Nos anos seguintes, Tonacci fez filmagens de grupos de teatro, shows — como o de
Miles Davis no Theatro Municipal de São Paulo, em 1974 — e filmes institucionais,
quase sempre em formatos alternativos. Pioneiro no uso de vídeo portátil no Brasil,
passou a documentar, no final dos anos 70, culturas indígenas, em filmes como Os
Arara e Conversas no Maranhão, num esforço ao mesmo tempo etnográfico e político,
como evidenciado pelo título do projeto A Visão dos Vencidos. Com a ajuda de uma
bolsa Guggenheim, viajou pela América Latina e do Norte registrando diferentes
comunidades indígenas no raro formato ½ polegada, a fim de contar a história do
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03/09/2019 Andrea Tonacci e a invenção do cinema - Revista Bravo! - Medium
É esta experiência que desemboca em Serras da Desordem, sua obra-prima de 2006 que
levou 10 anos, quatro versões de roteiro e 140 horas de filmagens — preto e branco em
35 mm, e digital colorido — para ser finalizado. É somente a partir deste filme que
Tonacci passa a receber um reconhecimento maior no país, tanto das gerações mais
novas quanto de premiações consagradas — o longa levou as categorias de melhor
filme, diretor e fotografia no Festival de Gramado daquele ano.
a se esconder por trás da câmera como um diretor isento: inscreve-se na cena e aparece
conversando com atores — como quem avisa que o que se vê na tela é também artifício,
feito com a interferência do homem branco e suas invenções. Ao tornar explícitas as
contradições de sua feitura, Serras da Desordem informa o espectador daquilo que o
filósofo Walter Benjamin advertira: “Nunca há um documento da cultura que não seja,
ao mesmo tempo, um documento da barbárie”.
O último filme de Andrea Tonacci, Já Visto Jamais Visto, foi finalizado em 2014, mas
sua história começa muito antes. Recuperando cenas antigas que não utilizou, restos de
projetos descontinuados, filmagens caseiras entre amigos e família, o diretor organizou
— junto com a montadora Cristina Amaral, sua parceira também em Serras da
Desordem — uma espécie de mosaico poético-afetivo. O filme é ao mesmo tempo uma
construção de memória particular e manifesto do cinema que o diretor defendia. Em
uma das cenas, Tonacci lê para a câmera um trecho de O Desprezo, de Alberto Moravia
— que virou filme nas mãos de Jean-Luc Godard — em que se critica o cinema feito nos
moldes industriais, caracterizado pelo italiano como um “estupro do engenho”.
Como antes já chamara a atenção para os aspectos formais de sua arte, agora Tonacci
discute o próprio modo de produção cinematográfico. O trecho lido sai em defesa de
relações não-comerciais entre produtores: “Que o diretor e os colaboradores estejam
ligados já em precedência, de mútua estima e amizade e que por, em suma, o trabalho
se desenvolva naquelas condições ideais que possam verificar-se em qualquer atividade
humana, porquanto ingrata”. E conclui: “Mas estas favoráveis combinações são raras,
como de fato são raros os bons filmes”. Assim como são raros, poderíamos acrescentar,
cineastas como Andrea Tonacci.
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