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03/09/2019 Andrea Tonacci e a invenção do cinema - Revista Bravo!

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Andrea Tonacci e a invenção do cinema


Andrei Reina
Dec 17, 2016 · 5 min read

Andrea Tonacci em 2009 (Foto: Juliana Vasconcelos)

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03/09/2019 Andrea Tonacci e a invenção do cinema - Revista Bravo! - Medium

No apagar das luzes de um ano que começou levando Ettore Scola, o cinema se
despede de um de seus mais inventivos diretores. Andrea Tonacci faleceu na tarde de
sexta-feira (16), em função de um câncer no pâncreas. Autor de uma filmografia única,
composta por poucos mas substantivos títulos ao longo de seus quase 50 anos de
atividade, Tonacci era um espírito crítico e independente. As tentativas de classificar
seu cinema pode apenas aludir à inquietação criativa permanente que o acompanhava:
seus filmes são marginais em relação ao mercado e experimentais do ponto de vista
formal, produtos de um verdadeiro “cinema de invenção” (nas palavras de Jairo
Ferreira).

O italiano radicado no Brasil começou sua carreira associado ao chamado Cinema


Marginal. Em 1966, fotografou Documentário, curta-metragem de Rogério Sganzerla,
seu amigo de colégio. Sganzerla, no mesmo ano, fez a montagem de Olho por Olho,
estreia de Tonacci. No curta, um grupo de cinco jovens perambula de carro pela cidade
à procura do que possa aplacar o tédio: ouvem rock, leem jornal e, eventualmente,
armam uma emboscada para dar uma sova num desconhecido. A raiva juvenil era uma
expressão da ausência de alternativas vislumbradas num contexto de exceção, dois
anos após o golpe militar.

Em seu filme seguinte, Blá-Blá-Blá, Tonacci faz uma investigação pormenorizada do


discurso de uma autoridade diante do microfone. Nos 30 minutos do média-metragem,
o personagem interpretado por Paulo Gracindo tenta justificar medidas autoritárias
elencando citações de autores diversos — que vão de Castelo Branco e Hitler a Buda e
Jesus Cristo. O filme, de 1968, pode ser lido também como registro do momento em
que a ditadura se radicalizava, com o AI-5, e da impossibilidade de saída para a crise no
interior da política. Em entrevista à Revista Contracampo, Tonacci disse que “a idéia do
filme não é fazer um discurso político consequente, é mostrar a inconsequência da
retórica do discurso político, que é igual em qualquer lugar”.

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Andrea Tonacci e Paulo Cesar Pereio durante as lmagens de “Bang Bang”

Em Bang Bang (1970), seu primeiro longa-metragem, é todo o discurso


cinematográfico que é posto em xeque. Partindo de uma história policial menor, com
intrigas e perseguições, Tonacci acaba por montar um verdadeiro enigma. Uma figura
vivida por Paulo Cesar Pereio — que, em uma das cenas mais conhecidas, canta a valsa
“Eu Sonhei Que Tu Estavas Tão Linda” vestido de cueca, máscara de macaco e óculos
escuros — é perseguida por uma trupe de tipos estranhos. Uma cena não desemboca
logicamente na seguinte, o que obriga o espectador a sustar sua expectativa e a
valorizar as sequências em si mesmas, com os detalhes visuais e narrativos que
comportam: “cada instante de fala, gesto, ruído e ambiente adquire uma
responsabilidade dramática decisiva”, sugeriu Paulo Emilio Salles Gomes em uma
crítica publicada no Jornal da Tarde, em 1973. A ideia original era que as sequências do
filme fossem projetadas de forma aleatória, uma vez que o conjunto formado por elas
independe de ordem preestabelecida. Esta espécie de Rayuela cinematográfica só não
foi possível porque numeraram o rolo na ordem que hoje se conhece. Ignorado pelos
exibidores nacionais, Bang Bang ficou restrito a cineclubes, apesar de ter sido escolhido
para a Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes.

Nos anos seguintes, Tonacci fez filmagens de grupos de teatro, shows — como o de
Miles Davis no Theatro Municipal de São Paulo, em 1974 — e filmes institucionais,
quase sempre em formatos alternativos. Pioneiro no uso de vídeo portátil no Brasil,
passou a documentar, no final dos anos 70, culturas indígenas, em filmes como Os
Arara e Conversas no Maranhão, num esforço ao mesmo tempo etnográfico e político,
como evidenciado pelo título do projeto A Visão dos Vencidos. Com a ajuda de uma
bolsa Guggenheim, viajou pela América Latina e do Norte registrando diferentes
comunidades indígenas no raro formato ½ polegada, a fim de contar a história do
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continente da perspectiva dos descobertos. Nestas excursões, Tonacci tinha a


preocupação de desmistificar o gesto cinematográfico à tribo, explicando aos nativos os
recursos de filmagem.

É esta experiência que desemboca em Serras da Desordem, sua obra-prima de 2006 que
levou 10 anos, quatro versões de roteiro e 140 horas de filmagens — preto e branco em
35 mm, e digital colorido — para ser finalizado. É somente a partir deste filme que
Tonacci passa a receber um reconhecimento maior no país, tanto das gerações mais
novas quanto de premiações consagradas — o longa levou as categorias de melhor
filme, diretor e fotografia no Festival de Gramado daquele ano.

Carapirú e Andrea Tonacci durante as lmagens de “Serras da Desordem”

O filme conta a história do massacre da tribo Awa-Guajá do ponto de vista de um de


seus sobreviventes, o índio Carapirú. Borrando as fronteiras entre o documentário e
ficção, o personagem principal é interpretado pelo próprio índio, que reencena a sua
história. Ao deslocar o ponto de vista narrativo para Carapirú, Tonacci acabou por
descobrir um outro país e um outro cinema. Por um lado, descortinou de forma
perturbadora as consequências da marcha do progresso: trens, aviões e armas
interrompem o tempo, o cotidiano e a vida dos nativos. Por outro, Tonacci não se limita
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a se esconder por trás da câmera como um diretor isento: inscreve-se na cena e aparece
conversando com atores — como quem avisa que o que se vê na tela é também artifício,
feito com a interferência do homem branco e suas invenções. Ao tornar explícitas as
contradições de sua feitura, Serras da Desordem informa o espectador daquilo que o
filósofo Walter Benjamin advertira: “Nunca há um documento da cultura que não seja,
ao mesmo tempo, um documento da barbárie”.

O último filme de Andrea Tonacci, Já Visto Jamais Visto, foi finalizado em 2014, mas
sua história começa muito antes. Recuperando cenas antigas que não utilizou, restos de
projetos descontinuados, filmagens caseiras entre amigos e família, o diretor organizou
— junto com a montadora Cristina Amaral, sua parceira também em Serras da
Desordem — uma espécie de mosaico poético-afetivo. O filme é ao mesmo tempo uma
construção de memória particular e manifesto do cinema que o diretor defendia. Em
uma das cenas, Tonacci lê para a câmera um trecho de O Desprezo, de Alberto Moravia
— que virou filme nas mãos de Jean-Luc Godard — em que se critica o cinema feito nos
moldes industriais, caracterizado pelo italiano como um “estupro do engenho”.

Como antes já chamara a atenção para os aspectos formais de sua arte, agora Tonacci
discute o próprio modo de produção cinematográfico. O trecho lido sai em defesa de
relações não-comerciais entre produtores: “Que o diretor e os colaboradores estejam
ligados já em precedência, de mútua estima e amizade e que por, em suma, o trabalho
se desenvolva naquelas condições ideais que possam verificar-se em qualquer atividade
humana, porquanto ingrata”. E conclui: “Mas estas favoráveis combinações são raras,
como de fato são raros os bons filmes”. Assim como são raros, poderíamos acrescentar,
cineastas como Andrea Tonacci.

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