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ISBN 85-263-0255-8

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Todos os direitos reservados. Copyright © 2000 para a língua portuguesa da Casa
Publicadora das Assembléias de Deus. Aprovado pelo Conselho de Doutrina.

Título do original em inglês: Healing Hurts That Sabotage Tbe Sou,


VICTOR BOOK5 1825 College Avenue Wheaton, Illinois 60187
Primeira edição em inglês: 1995
Tradução: Luís Aron de Macedo

Preparação dos originais: Geremias do Couto


Revisào: Alexandre Coelho
Capa: Eduardo Souza
Projeto gráfico e editoração Rodrigo Fernandes

CDD: 248 Práticas religiosas


e

ISBN: 85-263-0255-8

Casa Publicadora das Assembléias de Deus


Caixa Postal 331
20001 e970,
Rio de Janeiro, RJ, Brasil

1a edição/2000
Ao Gru~o ae A~oio Nova t~~eran~al da rir~t
nvan~elkal rree (nurcnl em fullerton l Califórnial
eao Gru~o ae A~oio livre ~ara t~colnerl
Qa Ho~ ~na~el, em Henno~a

Beacnl (alifórnia.
GoSTARÍAMOS DE AGRADECER:

A Earl, cujas palavras e silêncio ajudaram a criar um


ambiente tranqüilo e seguro, e à minha família que, mesmo
através dos períodos difíceis da vida, não deixou de reafirmar
o seu amor por num.
-Curt

A meu marido Greg e aos meus filhos jeff e ]anae, que


passaram juntos comigo por esse processo de exame de
consciência e me incentivaram enquanto vivia, falava e
sonhava com este livro.
-Jan

l I i. ! • i i I i J i .• I ,... L .I, l I . I l. ü. L l ... 1,.1 .. ~ IJ J~11


Sumário

Parte I - A Hora da Verdade


1. Revelando Quem Somos 9
2. O Progresso de Três Peregrinos 18
3. Perguntas nas Encruzilhadas da Vida 31

Parte n - Curando as Feridas da Alma


4. A Desvantagem de Sermos Humanos 47
5. Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento 62
6. O Modo como as Famílias Tendem a Ser 78
7. Papéis que Desenvolvemos na Infância 94
8. Lutando para Sermos Adultos 108
9. Amortecendo a Dor 125
10. Visão Espiritual Embaçada 140

Pdrtem - MeDi JD'aCurar~Feridas daAhna


11. A Vida sob Exame 157
12. Ouvindo-nos a Nós Mesmos 170
13. Precisamos das Pessoas 179
14. Admitindo Quem Somos 190
15. Criando Lugares Seguros 204
Parte IV - Ferramentas para Formar o
Poder de Recuperação
16. Movendo-se em Direção À Estabilidade 218
17. Construindo Relacionamentos Seguros 229
18. Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual 248
19. Restauradores Feridos como Líderes de Igreja 261
Apêndice A - O que É um Grupo de Apoio e
como Começar um? 270

Apêndice B - Recursos para Grupos de Apoio 282


Apêndice C - O que É Recuperação e como Ela
Ajuda? 289
Notas .......................................... ~ oi ,. • • .. .. .. .. .. .. .. .. 301

~ • I. L I J I I I , II 1_• • . ~i.l i,Ll' ,.1 illi j l • ~ Ifi . . . . ~ liJI.i·1


I CAPtruLo UM I
Revelando Quem Somos

o que você diria aos crentes que:

• Estudam a Bíblia e oram regularmente, mas ainda lutam


com períodos de tristeza que não conseguem explicar?
• Sentem-se distantes de Deus ou ficam ressentidos com
Ele quando nada que fazem dá certo?
• Sentem-se culpados porque, ainda que tenham "a
resposta" em Cristo, ela parece não lhes ser eficaz?

Esses vales vazios da vida cristã podem tornar-se em negras


noites para a alma, quando nos questionamos sobre a chance de
Deus ainda poder nos ver. Entretanto, Ele muitas vezes arromba
essas profundezas e nos leva a lugares completamente amplos e
abertos, nos quais descobrimos que é muito mais importante
conhecer a Jesus do que simplesmente freqüentar os cultos, ler um
livro devocional ou ouvir um programa evangélico pelo rádio. Esses
momentos reveladores da verdade nos forçam a mostrar partes de
nós mesmos que ninguém viu. Nós as apresentamos a Jesus, temendo
que Ele possa não agradar-se do que vê, mas -longe disso - Ele
nos toma pela mão e nos acompanha em um período no qual
examinamos nossa vida à luz da graça e misericórdia de Deus.
lO/Curando as Feridas da Abna

Neste livro, nós nos oferecemos a você, leitor. Fizemos mais


do que pesquisar o assunto - Curt como conselheiro matrimonial
e familiar; jan como jornalista e professora da Palavra de Deus
- nós o vivemos, à medida que ambos dirigimos grupos nos
quais as pessoas também encontraram um lugar seguro para si
mesmas. Como companheiros de jornada, apresentamos a seguir
nossas histórias.

AJornada de Curt
Estava a ponto de entrar numa faculdade de pós-graduação para
cumprir o que pensava ser a vontade de Deus para a minha
vida: trabalhar como conselheiro familiar. Numa noite, enquanto
conversava com um amigo, senti meu coração bater mais forte.
Minha mente começou a correr em disparada, como se eu tivesse
ingerido algum tipo de droga que me lançou para o hiperespaço.
Senti meu corpo apertado, meu rosto ficou tenso e minhas mãos
tremiam. Tentei sair porque estava transpirando bastante. Pensei
que estivesse morrendo ou ficando louco. Será que era uma
experiência extracorpórea? Será que isso nunca iria acabar?
De repente parou. Mas a partir de então, retornava com
freqüência. Lutei para entender o que estava acontecendo comigo.
Afinal, estava tentando viver uma vida saudável. Freqüentava a
igreja, cantava no coral, lia a Bíblia e orava regularmente.
Depois de o médico ter investigado meu caso à procura de
possíveis causas físicas para tais sintomas, concluiu que
provavelmente eu estava tendo ataques de pânico. Tinha medo
de contar isso aos crentes, imaginando que eles pensariam que
eu possuía algum distúrbio mental. Então passei a espiritualizar
o problema. Imaginei que tivesse algum terrível pecado em
minha vida, e assim pedi perdão. Ficava a ouvir programas
evangélicos pelo rádio o tempo todo, a fim de me tornar mais
espiritual. Seguia os conselhos das pessoas que me diziam para
"declarar a vitória", mas todas as vezes a vitória se esquivava
de mim.

L II 11, .. ".L ,.,1,. ',I II.~ I j ,I ,'L· • Illiij·1


Revelando Quem Somos / 11

Sentia-me completamente só. Parecia que ninguém


incluindo Deus - poderia atingir meu interior para acalmar a
loucura que havia ali. Eu não tinha respostas - só perguntas -
e já estava desistindo da esperança de que um dia pudesse obter
de novo o controle de mim. Fiquei assim por três anos, em \~
pesquisa da alma - lágrimas, medo, oração, pensamentos
suicidas, relacionamentos rompidos e conselhos de amigos bem-
intencionados.
Acabei indo a um conselheiro cristão possuidor de
discernimento, que fez perguntas sobre a minha infância. Quanto
mais falávamos, mais eu percebia que essas crises nervosas eram
devido à dor recalcada de haver crescido num lar em que havia
problemas relacionados com o alcoolismo. Eu sabia que meus
pais lutavam contra o álcool, mas pensava que tivesse deixado
isso para trás e sido poupado dessa dor. Na verdade, acreditava
que justamente por causa das dificuldades que passara na infância,
eu era mais forte e mais experimentado em lidar com qualquer
coisa ou qualquer um na vida. Era este o meu pensamento: Não
posso estar tendo ataques de pânico! Essas coisas só acontecem
com os outros, não comigo!
Assim que passei a freqüentar grupos de apoio e
aconselhamento, dei-me conta do quão vulnerável e humano eu
realmente era. Percebi, para meu inteiro alívio, que não estava
só. Havia outras pessoas que também tiveram experiências
semelhantes às minhas, mesmo que não tivessem crescido numa
família com problemas com o álcool. Falei sobre meus
sentimentos de crescer, de sentir-me responsável por tomar conta
emocionalmente de minha mãe e sobre como isso me afeta até
hoje. Que alívio ao saber que esses ataques não significavam
que eu estava louco. Só representavam velhos padrões que
precisavam de atenção e reajustes.
Durante esses ataques, passei a aproximar-me dos outros em
vez de me isolar. Às vezes, telefonava para as pessoas e falava
tão bem quanto podia. Por mais doloroso que fossem os ataques,
12 I Curando as Feridas da Alma

eventualmente comecei a sentir que Deus me amava. Ele estava


permitindo que a dor viesse à tona para que fosse dissipada.
Minha confiança era que Ele sabia até onde eu estava preparado
para lembrar-me.
Mesmo depois de vários anos, esses ataques ainda ocorrem
às vezes. Considero-os como aviso de que estou me isolando e
que preciso falar com alguém sobre o problema. Eles me
mostram que estou de novo tentando ser muitas coisas para
muitas pessoas.

AJornada de jan
Imagine por um momento uma jovem excepcionalmente
brilhante, esposa de pastor, que dá estudos bíblicos, é responsável
pelos adolescentes, canta um contralto sofrível no coral da igreja
e oferece conselhos práticos. Essa era eu. Certo dia, uma líder
do ministério feminino me disse: "Você tem muitas
responsabilidades nas mãos! Sem dúvida, você intimida as
esposas dos outros pastores do ministério".
Imagine também uma esposa e mãe exigente e impaciente,
que não consegue se agüentar. Essa também era eu. Eu sabia
que essas duas pessoas existiam, mas não tinha a menor idéia
do que fazer com qualquer uma delas. Não gostava de ser duas
pessoas, mas nada parecia ajudar. Sentia-me tão desesperada
que, às vezes, cheguei a ponderar meios de acabar com a vida.
Queria a todo custo ser a mesma pessoa o tampo todo, mas
lutava para saber por que não conseguia.
O que mais me confundia era o fato de as minhas intenções
serem boas. Amava a Deus e adorava servi-lo, mas não suportava
as pessoas por muito tempo. Queria ser gentil e amável, mas era
como se um terrível fantasma me perseguisse e me forçasse a
ser alguém que eu não queria ser. Não sabia como resolver os
problemas ou como trabalhar meus sentimentos. Só sabia chorar
e berrar.

• I •.
I "li
Revelando Quem Somos / 13

Esse dilema se manteve em ponto de ebulição até que meu


marido me disse que me odiava e planejava me deixar. Naquela
tarde quente de domingo, ele fez uma lista de dez críticas que,
numa manhã, eu lhe tinha lançado antes que saísse para trabalhar.
Enquanto o ouvia, sabia que ele tinha razão. Também sabia que
pedir perdão não seria suficiente dessa vez. Eu tinha de mudar.
Comecei a comer sem controle, esforçando-me para abafar a
dor. Afinal de contas, a comida sempre fora minha melhor
companheira, mas agora era minha única amiga. Por fim, passei
a freqüentar um grupo de apoio para pessoas com distúrbios
relacionados ao ato de comer. Esse grupo se reunia numa igreja
muito longe de casa, mas foi ali que encontrei um grupo de
crentes que não tinham medo de admitir o quão longe da glória
de Deus haviam estado e o quanto sofreram por causa disso. No
início, odiei tal honestidade! Depois passei a apreciá-la. Eles
compreendiam o que significava ser duas pessoas, algo que não
gostavam de ser. Todos os participantes do grupo entenderam
que, como eles, eu comia porque estava com raiva ou com pena
de mim mesma.
No andar de baixo do saguão onde meu grupo de apoio se
reunia, havia outro grupo para "filhos adultos de famílias com
disfunção" - sabe lá Deus o que isso significava. Certa noite,
entrei furtivamente numa dessas reuniões e descobri que o que
eles diziam sobre si mesmos também se ajustava a mim. Eu
criava o caos em todo o lugar onde ia. Tentava controlar tudo ao
meu redor para me proteger, para evitar jamais ser ferida por
quem quer que fosse. Nunca antes havia reconhecido essas
tendências em mim, mas depois de ouvir os participantes do
grupo falarem de si mesmos, percebi que essas tendências
também eram verdadeiras para mim.
Ao me reconhecer nos outros, fui capaz de admitir meus
erros. Descobri que eu tinha uma compulsão em querer agradar
as outras pessoas (o que explicava a personalidade de jovem
excepcionalmente brilhante), mas fervia por dentro, com a raiva
· 14 / Curando as Feridas da Alma

causada pelas feridas que nem imaginava ter (o que explicava a


personalidade exigente, impaciente e desvairada). Quando vi
esses companheiros lutadores aceitarem e até rirem de nossos
erros comuns, senti uma confiança crescente que Deus me amava
a despeito de eu ter muitas falhas.
Então me voltei para Deus, falando com mais ousadia do
que nunca. Passei dias e noites citando em alta voz aqueles
vindicativos salmos que encontrei escondidos em minha
Bíblia. Quantas vezes me sentei nas lápides do cemitério
que estava do outro lado da rua de casa e chorava. Ainda
que estivesse mudando rapidamente, meu casamento não
estava. Meu marido passara do ódio para a indiferença. Foi
então que um dia voltei-me para Deus numa lápide, dizendo:
"Mesmo que ele me deixe, sou grata por aquilo que estou
aprendendo de ti".
Pouco tempo depois, meu marido também começou a
freqüentar um grupo de apoio. Ali ele pôs para fora toda a sua
frustração e raiva - sentimentos que pastores supostamente
não têm, certo? Levou anos para que o nosso casamento fosse
restaurado, o que me especializou mais nas ferramentas dadas
por Deus para trabalhar minha raiva e tristeza. Agora vejo que
meu quebrantamento é o meu maior bem, porque faz com que
eu me volte para Deus e viva na sua graça. Essa jornada tem me
dado a oportunidade de experimentar um pouco da união com
Deus e estimulado meu apetite por Ele, a ponto de estar mais
faminta de Deus do que nunca.
Este livro trata do viver a vida cristã sob análise e dos
períodos problemáticos que nos levam aos caminhos do exame
de consciência. Acabamos de descrever os períodos caóticos
do modo como nós os vivemos. Talvez você esteja passando
por seus próprios períodos caóticos. Tudo que antes dava
certo para você dá errado agora. Uma voz distante e
perturbadora no seu interior fica perguntando se Deus o
abandonou.

I I, l L l. i ,.t.L 11, tI, ,


Revelando Quem Somos /15

Quando estamos passando por esse tipo de luta, a melhor


atitude a tomarmos é examinar os padrões estabelecidos no
passado, na maioria das vezes no período da infância, os quais
formamos para nos proteger. Sem perceber, podemos ter criado
máscaras para nos guardar de sermos feridos. Tais máscaras
também bloqueiam a vulnerabilidade necessária para nos
entregarmos a Deus e nos relacionarmos com as outras pessoas.
Nosso propósito ao escrever este livro é ficar ao seu lado em
suas lutas, para contar alguns testemunhos que o ajudarão a se
ver como você é e para acompanhá-lo através desse processo
de exame de consciência. Não é nossa intenção inseri-lo num
círculo sem fim de auto-melhoramento cristão, nem queremos
persuadi-lo a esmiuçar o modo como você foi criado. Nosso
desejo é contar as Boas-Novas de que Deus está presente, não
apenas na vida do crente dinâmico, mas também naquele que
está ferido e frustrado: "Não esmagará a cana quebrada e não
apagará o morrão que fumega, até que faça triunfar o juízo" (Mt
12.20). Queremos fazer parte no processo de remoção de barreiras
e obstáculos entre você e as pessoas de sua relação, de maneira
que você vislumbre a cura disponível no Reino de Deus.
Queremos desembaraçar o caminho entre você e Deus, de modo
que possa ter um relacionamento mais autêntico com Ele.
Contamos parte de cada uma de nossas jornadas pessoais, e
continuaremos a contar mais sobre nós mesmos e sobre a vida
de outras pessoas. Acreditamos que as histórias da vida real são
ferramentas poderosas na mudança de atitudes. Trocamos nomes
e, às vezes, camuflamos detalhes porque desejamos ter
privacidade o bastante para dizer a verdade, reduzindo ao máximo
as informações que pudessem ser comprometedoras de alguma
forma. Também quisemos manter o anonimato daqueles que,
com suas vidas, nos ajudaram a montar a estrutura deste livro.
Ambos ficamos surpresos ao descobrir o quanto o nosso modo
autoprotetor de pensar, sentir e nos comportar está enraizado na
forma como reagimos ao crescer. Ainda que as famílias façam o
16 / Curando as Feridas da Alma

melhor que podem para ficar longe da rejeição, culpa, isolamento


e ódio de nossa cultura, quase todas são contaminadas por essas
circunstâncias. Portanto, ainda que verdadeiramente falemos
sobre tendências nas famílias, não estamos culpando nossos pais.
Todos os pais carregam enorme responsabilidade e não há
ninguém que cumpra suas obrigações tão bem quanto gostaria.
As Partes I e 11 deste livro conduzem ao caminho do exame
de consciência, com testemunhos e insights sobre os padrões
que as pessoas desenvolvem na infância e os mantêm na fase
adulta. À medida que você for lendo acerca do modo como as
crianças desenvolvem máscaras, pode ser que tenha um vislumbre
da dor e do ódio enterrados dentro de si mesmo. Também há a
possibilidade de você identificar falhas em sua vida, as quais
não gostaria de saber. Muitas vezes, essas percepções não são
fáceis de processar e talvez seja tentado a desistir, por ser esta
uma experiência que esquadrinha a psique humana, e de maneira
muito profunda. Mas a confusão e o questionamento fazem parte
da jornada deste livro, à medida que você aprende a tornar-se
sensível a Deus e a libertar-se da autodefesa construída no
passado.
A Parte IH descreve os meios necessários para que você se
examine à luz das informações já obtidas. Pedimos que esteja
disposto a ouvir seus mais profundos clamores, mas também
que busque a ajuda de Deus através de um amigo ou grupo com
o qual possa discutir essas idéias. E finalmente, na Parte IV,
apresentaremos os recursos para a formação de uma fé com
capacidade de restauração rápida, a fim de ajudá-lo a recuperar-
se das dificuldades e a sentir-se adequadamente capacitado com
o amor incondicional de Deus.
Cada capítulo termina com perguntas que a maioria das
pessoas faz sobre essa jornada. Esperamos que as respostas
esclareçam quaisquer dúvidas que você possa ter sobre algum
ponto argumentativo do capítulo. Também incluímos algumas
perguntas para sua reflexão pessoal, na tentativa de ajudá-lo a

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. I I l k I ~ J J I I I I·,. I I
Revelando Quem Somos / 17

aplicar em sua vida oconteúdo apresentado no capítulo. Essas


perguntas também são ideais para estudo em grupo e, por isso,
insistimos que você debata essas questões com um amigo ou
num grupo.
Nota especialatodo aquelequedeixou defreqüentaraigreja:
Nós, os autores deste livro, quando iniciamos esse processo,
"
estávamos aponto de nos incluir nessa fileira. Eramos cristãos
apáticos, líderes extenuados, que não acreditavam mais que a
igreja tivesse meios de satisfazer nossas necessidades espirituais.
Tínhamos.uma compreensão errada de Deus eestávamos
cansados de tanto tentar entendê-lo. Se você se sente assim,
oramos para que Deus reacenda sua fé nEle eoajude aencontrar
um lugar seguro para curar suas feridas,
ICAPÍTIJLo DOIs I
OProgresso de Três Peregrinos

À medida que a luz de Deus fica perscrutando as áreas de nossa


vida e começamos a examinar os cantos escuros e os lugares
ocultos, descobrimos que há companheiros dispostos a virem
conosco nessa viagem. Que alívio saber de outras pessoas que,
embora exteriormente aparentem estar contentes e demonstrem
ter auto-suficiência em suas vidas, na verdade estão lutando
implacavelmente em sua busca por desenvolver um
relacionamento mais autêntico com Deus. Enquanto falam de
suas histórias e responsabilidades, suas experiências tornam-se
parte da luz de Deus e trazem revelações importantes, de modo
que possamos ver mais claramente nossos próprios meios de
cura. Eis as histórias de três peregrinos dessa jornada.

Ajornada de Susanna
Ao cair daquele crepúsculo, quando minha amiga e eu nos
sentamos em sua cama e ela passou a falar sobre o amor, a
alegria e a paz que recebemos ao aceitar Jesus, eu soube que
era isso que desejava. Além do mais, receberia a vida eterna.
Como ela podia saber - não podia - que na noite anterior
eu tinha feito planos para cometer suicídio? Se tivesse levado a

• ., ~ l J I lL «
o Progresso de Três Peregrinos / 19

cabo minhas intenções, ela e todo o mundo teriam estado a


perguntar-se como a ganhadora do prêmio "A Pessoa mais
Provável de Ser Bem-Sucedida na Vida" e uma das candidatas à
"Rainha de Bem-Vinda ao Lar" poderia ter dado fim à própria
vida?
Quando ela falou sobre o quanto não merecemos o amor de
Deus, concordei. Oramos juntas e aceitei]esus. Então me joguei
na cama dela e chorei por um longo tempo.
Alguns meses depois, me joguei em minha cama e chorei.
Todos os meus velhos sentimentos de caos e ódio reapareceram.
Senti-me de novo vazia e solitária. "Será que eu era salva?",
perguntava-me. "Talvez eu devesse ir diante do altar outra vez
neste culto da mocidade". Fui, mas não reacendeu aqueles
primeiros sentimentos de paz e alegria. Isso só podia ser uma
coisa: eu tinha desapontado a Deus ou incitado sua ira. Talvez
eu não fosse pessoa boa o suficiente para ser sua filha.
De acordo com minhas próprias experiências em casa, porém,
sabia como fazer as pessoas me amarem. Eu faria com que Deus
me amasse. Seria uma pessoa boa, trabalharia bastante e ajudaria
a qualquer um que precisasse.
Tomar conta das pessoas sempre tinha preenchido o meu
vazio existencial. Quando minha mãe divorciou-se de meu pai e
expulsou-o de casa, eu visitava-o todos os dias em seu
apartamento, onde o encontrava bêbado. Muitas vezes ele não
tinha nada para comer, de modo que eu surrupiava alguma
comida de nossa casa para a dele.
Mais tarde, quando me tornei missionária, pensei: "Será que
Deus não ficará alegre com meu sacrifício? Como pode Ele não
me amar por isso?" Trabalhar num orfanato no Quênia preenchia
meu vazio, mas sempre que via uma criança solitária e
machucada, via-me a mim mesma como criança e chorava. Meus
bem-intencionados amigos cristãos me exortavam: "Ore mais,
leia mais a Bíblia e confie que Deus satisfará todas as suas
necessidades". Foi o que fiz, mas me senti pior. Tinha medo de
20 / Curando as Feridas da Alma

contar aos meus amigos que suas sugestões não estavam dando
certo. Podia ser que não me considerassem uma crente espiritual.
Decidi que a resposta para meu problema seria trabalhar num
país de condições ainda mais difíceis, por isso alistei-me para ir
a uma nação hindu, onde qualquer um que fosse pego tentando
converter alguém receberia uma sentença de sete anos de prisão.
Ser mártir era duplamente atrativo para mim: faria Deus ficar
orgulhoso de mim e, por tabela, eu morreria também, o que
aliviaria a constante dor emocional que ficava indo e vindo.
Depois de três anos, uma doença forçou-me o retorno para
os Estados Unidos. Fiquei tão deprimida que fui parar no escritório
de um conselheiro cristão.
"Como era sua vida em casa, na sua infância?", perguntou-me ele.
"Meu pai é alcoólatra, mas no meu caso isso é uma
vantagem", expliquei. "Sou mais forte e tenho mais compaixão
para com as pessoas por causa de minha formação. Diferente
de outras pessoas, tenho facilidade em me adaptar a qualquer
situação, porque nunca soube o que iria acontecer quando
crescesse" .
O conselheiro sorriu e calmamente passou a explicar-me como
uma família, onde um de seus membros tem problemas com a
bebida, desenvolve maior probabilidade de aumentar a tendência
de nossa cultura à rejeição, culpa, ódio e isolamento. Concluiu
dizendo que minha depressão estava enraizada nessas tendências.
Fiquei olhando fixamente para ele, boquiaberta. Parecia-me
que estava falando grego. Não dava para acreditar. Então, deu-
me o endereço de uma reunião de grupo de apoio numa igreja
ali perto e sugeriu que eu fosse.
A reunião me chocou. Pessoas que pareciam tão unidas e
tinham tanto conhecimento das Escrituras sentiam-se tão
desanimadas como eu. Enquanto contavam suas histórias, chorei.
Mesmo não tendo parado de chorar, ninguém agiu como se eu
tivesse feito algo de errado ou fosse uma tola. Após o
encerramento, várias pessoas vieram falar comigo.

..... L .... ~ I I J j~ I J ,~ I I I, ui:. I II 111: I


o Progresso de Três Peregrinos / 21

Participei de outras reuniões, chorando em todas as primeiras


seis. Nelas descobri que não precisava mais fingir ser
"supercrente". Podia ser exatamente quem eu era e continuar
sendo amada. Sentia-me como se estivesse numa família.
Na sétima reunião, admiti que tinha usado o campo missionário
como fuga, por não saber como lidar com a vida. Fui "salvar o
mundo" - da mesma forma que fora salvar meu pai. Pensei que
os participantes do grupo ficariam horrorizados com essas
palavras, mas apenas sorriram e acenaram com a cabeça em
concordância. Eles me entendiam. Através dessa compreensão e
aceitação, comecei a sentir a aceitação de Deus por mim. Passei
a dizer a Deus como realmente me sentia. Não precisava mais
fazer alguma coisa para que Ele me amasse.
Depois de algum tempo, foi tentador fingir ser maravilhosa
de novo. Agora, percebo que relacionar-se com Deus e acreditar
que Ele me ama do jeito que sou se trata de um processo que
dura a vida inteira. Em cada mudança por que passo na vida,
parece que tenho de rever onde estive para poder lembrar-me
das verdades que Deus me ama e trabalha em mim.

AJornada de Matt
"É porque você finge que está tudo bem", desafiou-me Marcia,
minha irmã. "Posso ver a dor em seus olhos. O tremor em sua
voz. Você está nervoso".
Não soube que resposta dar a minha irmã. Tínhamos acabado
de ter uma conversa séria a respeito do meu medo mais do que
o normal de encontrar-me com uma garota.
Ela abrandou a voz e disse: "Matt, vejo esse medo em você,
porque também sou assim. Mas não temos de agir dessa maneira.
Não temos de viver para agradar as pessoas".
Não gostei do que ela disse, nem do que era mostrado.
"Confie em mim", disse ela gentilmente. "Tenho sido a causa
de grandes problemas em meu casamento, porque não falo com
22 / Curando as Feridas da Alma

franqueza sobre mim mesma. Quer você acredite ou não, as


coisas funcionam melhor quando expresso o que penso e o que
sinto. É então que meu marido me entende e juntos lidamos
com as coisas, pouco a pouco e com dificuldade. Você também
esconde o que pensa e o que sente".
Eu sabia que Marcia pensava que meu problema de
relacionamento com garotas vinha de raízes mais profundas, mas
não tinha certeza. Minha vida profissional também era um
problema. Havia trabalhado em diversas companhias publicitárias
cristãs, mas nunca me firmara em nenhuma. Andava de emprego
em emprego. Tinha falta de confiança e vivia sem rumo na vida.
Meu medo era aproximar-me das pessoas. Não era fácil fazer
amizades. Quando criança, fui ensinado que se você se aproxima
demais das pessoas, elas se afastam ou lhe mandam embora.
Lembro-me de quando tinha seis anos e sentia-me confuso
sobre a razão de não poder mais morar em casa. Devido ao fato
de meus pais serem missionários no Paquistão, fui para um
internato. Várias vezes nós, meninos do primário, recebíamos
uma surra dos garotos do 2.° Grau no mesmo dormitório. Desde
então, tenho medo de pessoas que sejam mais velhas do que eu
ou que estejam em posição de autoridade sobre mim.
Voltar ao internato pela segunda vez foi ainda pior. Depois
de viver por um ano com minha família - que estava de licença
- uma professora do internato confundiu minha tristeza com
preguiça, e várias vezes enviou-me ao gabinete do diretor.
Quantas e quantas vezes escrevi 500 frases como forma de
punição. No final do ano, ela recomendou que eu repetisse a
série e meus pais resolveram confiar no julgamento dela. Isso
confirmou minhas suspeitas de que eu não era um rapaz muito
inteligente.
No ano seguinte, minhas notas melhoraram dramaticamente,
mas os garotos começaram a me chamar de "palerma". Um deles,
que também tinha se saído mal, não ficava para trás e dizia:
"Você não pode falar comigo, porque você é burro", sempre

.d. li. 1 ; . I I L> 1 I J ,. I .... J., hll I


o Progresso de Três Peregrinos / 23

que eu o vencia numa brincadeira com bola. Em toda a escola,


eu era o único que estava um ano atrasado em relação aos demais
e nunca me esqueci disso.
As férias também eram constrangedoras. Quando meus pais
queriam que eu me levantasse e lesse um versículo da Bíblia na
igreja que nos sustentava, um medo tomava conta de mim.
Quando cresci, aprendi a passar pela vida representando
personagens. Era como se eu pertencesse ao mundo artístico.
Podia manter as pessoas a distância agindo como se fora alguma
outra pessoa.
Minha mãe queria ser conhecida como missionária
responsável, que fazia seu trabalho com eficiência e precisão.
Ela mantinha a casa impecavelmente limpa. Tenho certeza de
que ela não se sentia dessa maneira, mas eu sempre tinha o
sentimento de que todas as coisas pequenas com as quais ela se
preocupava eram mais importantes do que os sentimentos de
seus filhos. Ela fazia um barulhão se estivesse atrasada, porque
dava má impressão. Sempre me sentia tenso todas as vezes que
nossa família saía junta.
À medida que os anos passaram, aprendi a manter certa
distância entre mim e meus pais. Todos os anos, era tão doloroso
estar com eles para depois, no outono, voltar ao internato, que
coloquei em minha mente nunca aproximar-me deles. Quando
voltei aos Estados Unidos para cursar a universidade, continuei
a manter as pessoas a distância. A interação que há em pequenos
grupos me ameaçava. Não ia a estudos bíblicos, a menos que
conhecesse todos muito bem e confiasse neles.
Quando meus pais anunciaram que planejavam voltar
definitivamente para os Estados Unidos, Marcia insistiu que eu
me preparasse. Busquei aconselhamento e freqüentei grupos
de apoio, mas me sentia constrangido. Entretanto, em uma dessas
reuniões, disse a Gil, um dos participantes do grupo, que sua
história lembrava a minha. Acabamos ficando no estacionamento
conversando por horas, enquanto contava minha experiência.
24 / Curando as Feridas da Alma

Nunca tinha sido tão sincero em toda a minha vida. Tinha


medo de falar nas reuniões, então chegava atrasado e ficava
conversando com Gil até tarde. Suas experiências eram diferentes
das minhas, mas ele tinha aquele mesmo sentimento de que
ninguém queria ser seu amigo de verdade.
Quando no decorrer da semana aconteciam coisas que me
deixavam arrasado, eu lidava com elas da melhor forma que
podia, e então Gil e eu falávamos a respeito depois da reunião.
Às vezes, saíamos para jantar. No meio da refeição, Gil parava e
me perguntava: "Como você se sentiu? Você quer mesmo ignorar
aquela garota? Na sua opinião, o que exatamente incomodou
seu patrão?" Suas perguntas me ajudavam a sair da tremenda
confusão mental em que eu vivia. Tentava entender o que sentia
e os motivos. Quando ele tinha lutas, prestava contas
voluntariamente a mim, dizendo: "Vou me esforçar para tentar
não impressionar meu patrão, certo?" Na semana seguinte, eu
lhe perguntava como tinha se saído.
Quando meus pais chegaram, manifestaram sua preocupação
por eu ainda não ter me casado e por nem imaginar o que ia
fazer com minha vida.
"Você precisa de uma família. Você precisa de uma vida
profissional. O que há de errado com você?", perguntavam-me.
Marcia tentava explicar a situação pela qual nós dois estávamos
passando. Sentei-me um pouco atrás, sentindo-me protegido de
meus pais e desejando que Marcia se calasse, mas sabia que ela
estava dizendo a verdade.
Minha mãe ficava dizendo: "Não me fale mais sobre esse
assunto". Meus pais nos advertiam sobre ficar dando ouvidos a
psicólogos. Eu tentava argumentar que isso também dizia respeito
à minha vida espiritual, mas era difícil eles ouvirem. Minha mãe
falou finalmente sobre seus sentimentos de abandono, pois
quando tinha apenas seis anos, sua mãe a deixara com um tio.
Vi que meus pais também tinham suas próprias mágoas e, talvez,
estivessem encobrindo-as com muito trabalho.

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o Progresso de Três Peregrinos / 25

Quando cheguei a casa, telefonei para Gil e saímos para dar


uma volta. Admiti que, quando entrei no internato, senti-me
abandonado por Deus. Fiz muita força para não chorar, mas
veio como uma avalanche. Chorar me ajudou muito, mais do
que qualquer outra coisa, no sentido de trabalhar meus
sentimentos de abandono e insegurança. Hoje não fico me
martirizando todo o tempo. Estou mais inclinado a aceitar as
outras pessoas porque sei o quanto elas lutam na vida. Já não
me sinto preso na armadilha da depressão, porque sei que sou
aceito mesmo quando estou com raiva ou aborrecido.

AJornada de Donna
"Na infância, como era sua vida em casa?", perguntou-me o
meu patrão.
Fiquei ofendida. Tudo o que fiz foi pedir seu conselho sobre
um problema com meu filho adolescente, e agora ele, um pastor,
estava insinuando que eu vinha de uma família que tinha
problemas.
"Por que pergunta?", repliquei, mantendo meus modos
habitualmente calmos e diplomáticos de secretária de igreja.
"Porque muitos dos sentimentos que você descreve se
enquadram muito bem com o livro que estou lendo, que trata
da maneira como as pessoas que crescem em famílias com
problemas ligados ao álcool reagem à vida".
"Isso é bobagem", disse, menosprezando-o com um sorriso
polido. "Meus pais não eram alcoólatras. Disso não há a menor
dúvida". Comecei a perder a paciência. Sabia do que ele estava
falando porque lhe datilografara alguns textos.
À medida que o dia gradualmente passava, comecei a
lembrar-me de meu pai falando do quanto meu avô costumava
beber. Mais tarde, enquanto tirava algumas cópias na
copiadora, inquiri meu pastor/patrão/amigo: "Será que eu seria
afetada de alguma maneira se meu avô bebesse muito?"
26 / Curando as Feridas da Alma

Ele respondeu que era possível, dependendo do modo


como meu pai reagira em sua criação. "Oh não!" pensei. "Lá
vamos nós nos enredar na psicologia!"
Quando perguntei o que isso significava, disse que se meu
pai imitasse as atitudes erradas de seu pai (mesmo que meu pai
não bebesse), eu poderia ter herdado essas tendências.
Sentei à minha mesa e peguei o material que tinha
datilografado. Pensei nos problemas com meu filho. Percebi que
se pensasse friamente, o material me descrevia: buscando
aprovação, julgando-me sem misericórdia e lutando com
relacionamentos íntimos. Entretanto, esse não era o "eu" que
meus amigos da igreja conheciam. Eles me conheciam como
eficiente funcionária, que rapidamente entendia todo o projeto,
nunca errava na datilografia e sempre ficava além do horário de
trabalho para concluir suas tarefas. Nunca imaginavam que,
quando chegava em casa, eu ainda estava tão ligada ao trabalho
que tudo quanto meu marido ou filho dissesse não me acalmava.
A simples pergunta de meu marido: "Tem camisa limpa?", era
uma ofensa para mim. Muitas vezes, ele mesmo lavava as roupas
para evitar me provocar.
Mas eu nunca estava em paz. Constantemente ficava com
raiva do meu marido e do meu filho, e sentia-me desanimada
com isso. Parecia que não importava o quanto tentasse, a
felicidade e o contentamento eram apenas temporários. Nunca
seria aquela crente extremamente fervorosa que desejava ser.
Naquele dia no escritório, comecei a me perguntar se meu
pai se sentia da mesma maneira que eu. Ele era filho único,
abandonado em sua infância por sua mãe. Fora criado por uma
avó severa e seu pai alcoólatra.
Papai podia ser cordial, gentil e carinhoso a maior parte do
tempo, mas sempre explodia sem nenhuma razão aparente. Podia
ser quando ele estivesse falando comigo gentilmente, tendo à
mão um copo de chá gelado, e mamãe perguntasse: "Por que
você não me preparou um copo de chá gelado também?" Aí ele
o Progresso de Três Peregrinos / 27

começaria a gritar. Tinha medo e me sentia insegura sobre o


que, de um momento para o outro, ele iria fazer.
Mamãe também era filha única. Fora criada num lar de amor,
mas cheio de restrições e normas. Tinha de andar na linha todo o
tempo e era dessa forma que tratava meu irmão e eu. Cedo aprendi
que se eu retrucasse, poderia receber um tapa ou ter a boca lavada
com sabão. Aprendi que não era certo expressar meus verdadeiros
sentimentos - somente o que era aceitável para os outros.
Quando fiquei adulta, descarregava minha raiva em meu
marido e no meu filho. Agia do mesmíssimo modo que meu pai
- praguejando, batendo portas, proferindo afrontas sarcásticas.
Tudo era tão irônico. Tinha prometido a Deus que nunca trataria
meu filho do jeito como meus pais me trataram, mas fazia
exatamente o mesmo. Disciplinava meu filho injustamente e dava
ordens absurdas e sem razão. Essa era a única maneira que
sabia de ser mãe.
Depois do trabalho daquele dia, li os livros que o pastor me
recomendou e até passei a freqüentar um grupo de apoio. Depois
da primeira reunião, disse a meu marido: "Essas pessoas são um
bando de choramingonas", mas na semana seguinte, voltei.
Percebi que elas não estavam se lamentando; apenas eram mais
francas do que a maioria das pessoas da igreja. Essa honestidade
e aceitação me atraiu até que me tornei uma delas, compartilhado
meu verdadeiro eu.
Depois de vários anos olhando somente para mim mesma,
descobri maneiras mais apropriadas de expressar a raiva. Aprendi
a não querer controlar tanto as outras pessoas. Outro dia, meu
filho, agora com 22 anos, pediu-me pela primeira vez um
conselho, porque hoje ele sabe que receberá uma opinião simples
e imparcial em vez de um sermão.
Meu temperamento mudou radicalmente. Hoje é raro ficar
furiosa com alguém ou por alguma coisa. Consigo reagir às
pessoas ao meu redor baseada no que estão me dizendo, e não
como reflexo dos meus próprios sentimentos.
28 / Curando as Feridas da Alma

Deixei meu emprego de secretária da igreja porque meu


marido e eu concordamos que eu precisava de tempo para
conhecer a mim mesma. Agora que deixei cair a máscara de
"crente perfeita", gosto de ir à igreja e já estou trabalhando
novamente lá como secretária. Desta vez é diferente. Tenho mais
calma porque não preciso ser sempre perfeita. Faço o melhor
que posso, mas certos dias não consigo fazer tudo.
Estou fazendo experiências com minha honestidade. Outro
dia, minha mãe estava reclamando das explosões de raiva de
papai. "Alguma vez já disse a papai como a senhora se sente
quando ele se comporta assim?", perguntei.
"Não. Ele não gostaria de saber", respondeu ela, com surpresa.
Insisti: "Se a senhora passar a lhe dizer em que situações ele
faz a senhora se sentir constrangida, talvez pare. Diga-lhe que a
senhora não vai mais tolerar esse tipo de comportamento".
Minha mãe ficou me olhando fixamente.
"Sei disso, mamãe, porque era assim que eu agia. Quando
estamos preocupados, papai e eu nos comportamos como o
vovô, o que não é nem um pouco conveniente".
Minha mãe pareceu ter ficado ofendida e não respondeu nada.
Contudo, ocasionalmente tem trazido o assunto à baila ao longo
deste último ano. Deixei a porta aberta.
Também falei com papai naquele dia. Fiquei surpreso ao notar
o quanto ele era vulnerável. Então passou a falar de sua infância.
Enquanto o ouvia, fazia de vez em quando uma pergunta. Ficamos
conversando por tanto tempo que perdemos as reservas que
tínhamos para o jantar. Hoje, tenho compaixão de minha mãe e
de meu pai. Fizeram o melhor que podiam com o que sabiam.
Essa busca da cura interior tornou-se muito mais do que isso.
Representou uma descoberta de Deus e do seu amor por mim.
Ao tomarmos conhecimento das histórias dessas pessoas,
temos a confirmação de que não somos loucos ou de que nos
falta espiritualidade. Até missionários e o corpo de funcionários
de uma igreja lutam com um lado negro - ninguém foge à

I J • I I." j J ,. I , ~ I .... ~. J J ~ t. J
o Progresso de Três Peregrinos / 29

regra. À medida que ouvimos nossos companheiros peregrinos


falarem sobre si mesmos, torna mais fácil a tarefa de deixarmos
nossos pensamentos e sentimentos mais profundos virem à tona
- aquelas coisas que nos fazem sentir menos do que nada,
menos do que crentes, menos do que humanos. Passamos a
acreditar que Deus conhece esses pensamentos e sentimentos
secretos, e que Ele quer trabalhar em nós para nos curar e libertar,
para nos ajudar no relacionamento com as outras pessoas de
maneira verdadeira e honesta, e para nos convencer de que
somos amados por Ele.

Reflexão Pessoal

Talvez essas histórias tenham levantado algumas questões


em seu coração sobre a sua vida. Reserve alguns minutos
para orar a sós a Deus. Peça que Ele revele qualquer coisa
que você precise saber ou confessar sobre si mesmo. Depois
responda, tão honestamente quanto possível, as seguintes
perguntas.

• Com quem você mais se identifica: com Susanna, com


Matt ou com Donna? Com o quê exatamente você se
relaciona?

• Se você pudesse mudar só uma coisa na família em que foi


criado, o que seria? Por quê?

• O que você mais gostaria de dizer aos seus pais hoje, mas
talvez não se sinta à vontade para dizê-lo?
30 / Curando as Feridas da Alma

• Se seus pais pudessem mudar uma única circunstância a


respeito dos anos em que você foi criado, o que você acha
que escolheriam?

• De que maneira Deus estava tomando conta de você


quando criança?

• Que tipo de assunto você e sua família evitam falar?

• Dentre as pessoas de sua casa, em quem você mais confiava?

• Com quais sentimentos sua família se sentia pouco à


vontade?

• Se você tem uma pessoa amiga com quem possa


compartilhar as respostas dadas aqui, quem é?

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ICAPtruLo TRfs I
Perguntas nas Encruzilhadas da Vtda

o que devo fazer para me sentir amado?


O que devo fazer para me sentir valorizado?
Todos acreditamos que essas são questões de crucial
importância para a vida humana. Muitos ficam frente a frente
consigo mesmos poucas vezes na vida, quando então fazem a si
próprios essas perguntas.
Tais momentos geralmente ocorrem quando as pessoas
percebem que a opção de vida que escolheram já não continua
trazendo satisfação. "Vou me casare então serei amado ", pensam.
Só que o casamento em si não proporciona o amor profundo e
duradouro de que necessitam - ou pode ser que o casamento
nem mesmo dure. O trabalho que antes gerava esses valores de
vida, hoje pode ser vazio de significado, ou os filhos que outrora
davam sentido à vida podem estar vivendo em outra cidade.
Quando essas questões - "O que devo fazer para me sentir
amado? O que devo fazer para me sentir valorizado?" - não
são devidamente respondidas, encontramo-nos a fazer
investigações por conta própria. É quando envidamos esforços
para nos aproximar das pessoas, mas não conseguimos.
Queremos fazer com que as circunstâncias trabalhem a nosso
favor, mas fracassamos. Desejamos ser ajudados por Deus, mas
32 / Curando as Feridas da Alma

parece que não alcançamos nada. Até suspeitamos que os outros


crentes conheçam alguma fórmula secreta que desconhecemos.
Alguns deixam que esses questionamentos fiquem a corroê-
los durante anos, como uma coceira irritante, até que se achem
preparados para enfrentar uma jornada de exame de consciência,
tal como a que descrevemos neste livro. Para outros, desencadeia-
se uma dolorosa crise. Se chegam ao ponto de reconhecer que
tal crise é como um expediente que os despertará para a realidade
desses questionamentos, fazem uma profunda introspecção em
si mesmos. Se não, pode ser que fiquem procurando um culpado
pela crise que atravessam, o que fará com que nunca venham a
encarar seus verdadeiros motivos e padrões de conduta.

Fases de Despertamentos
Para muitos, é como se a dor e a frustração do passado muito
bem ocultas estivessem constantemente enchendo, pouco a
pouco, um tanque de contenção. De repente, o tanque explode,
talvez de uma das seguintes maneiras:

Divórcio
Alguns ficam surpresos com o próprio divórcio. "Sempre soube
que o meu casamento precisava de ajuda", dizem. "Mas por que
será que minha esposa repentinamente quis sair da relação?
Quando foi que o nosso relacionamento se deteriorou até esse
ponto? Por que num dia ela estava contente, e no outro
plenamente decidida a largar mão de tudo? O que foi que só eu
não vi?"
Enquanto isso, ela desabafa com o pastor: "Em casa, ele é
uma pessoa diferente. Eu o amo, mas não consigo mais viver
com ele. Por muitos anos tenho suportado seu mau humor, mas
hoje estou farta".
Em outras vezes, um cônjuge sairá de casa, dizendo: "Estou
cansado de estar casado com alguém que não conheço. Às vezes,

I I ,'', I I, II • ..... L 011. I I , I" 11. Li. ~ J •• c i " L .. I IJ ~I" I


Perguntas nas Encruzilhadas da Vida / 33

ele se afasta de mim; em outras, fica na defensiva. Eu poderia


até dizer: 'Tudo bem se eu te estrangular?', e receberia como
resposta:· 'Tanto faz'. Recuso-me a ser ignorado pelo resto da
vida. Para mim, chega! Não espero consertar as coisas - não
quero que nada fique consertado. Só quero ser livre".

Comportamentos compulsivos
Quando não nos sentimos bem acerca de nós mesmos, qualquer
.coisa - até uma coisa boa - torna-se um tipo de vício, quando
é usado para servir de estímulo ao nosso esmorecido amor-
próprio. O que começa como um inocente impulso de querer
parecer decente numa roupa de banho, converte-se num sério
distúrbio alimentar. Tomar alguns goles de cerveja constitui-se
na única maneira possível de relaxar. Algumas pessoas podem
dar-se conta de que estão gastando dinheiro em demasia, lendo
pornografia ou furtando qualquer produto de pouco valor de
alguma loja, sempre que se sentem tristes ou aborrecidos, ou
porque necessitam de uma pequena recompensa.
Às quatro e meia da tarde era a melhor hora do dia para Rick.
Depois de responder os anúncios de emprego encontrados no
jornal, finalmente poderia se plantar em frente da televisão para
assistir aos jogos de basquetebol. Em dias particularmente
deprimentes, ia com amigos a uma pizzaria para assistir os jogos
pelo telão.
A partir daí, assistir televisão tornou-se uma constante fuga.
Começou então a assistir filmes tarde da noite e a dormir no dia
seguinte. O pouco dinheiro que de vez em quando ganhava era
gasto em livros e vídeos, ao invés de servir para amenizar as
dificuldades financeiras da família. A poltrona em frente à 1V
passou a ser o único lugar onde ele realmente queria estar, e era
ali que sempre ficava. Estava cônscio de que usava a televisão
como subterfúgio, mas não tinha a mínima idéia do que fazer a
respeito. Não se surpreendeu quando a esposa, Linda, confrontou-
o: "Às vezes, fico me perguntando se você realmente está
34 / Curando as Feridas da Alma

procurando emprego. Parece que você não faz outra coisa a não
ser assistir televisão".
"Não posso pagar as contas", respondeu-lhe Rick. "Não consigo
arranjar emprego. Se eu estivesse empregado, então seria errado
agir como ajo. Assisto televisão para me ajudar a esquecer de
tudo".
"Mas você acaba esquecendo de mim, dos garotos e de suas
responsabilidades, até da sua saúde", desafiou Linda. "Você nem
sequer vai ao médico".
"É uma fuga", explicou Rick. "Sei que você vai me perguntar
como é que poderei achar emprego desse jeito. Sei que não terei
nada a dizer e que minha resposta parecerá sem sentido. Sinto-
me tão mal que mal posso encarar você. É mais fácil olhar a
televisão" .
O problema de Rick piorou antes que melhorasse. Levou muito
tempo para que se conscientizasse de que sua dependência da
televisão e da leitura de livros era um sinal de haver alguma coisa
errada dentro dele. Sua dor interna era enorme, não só pelo fato
de estar procurando emprego, mas também porque estava
mascarando o sentimento de nunca ser bom o suficiente. Vozes
do passado vinham para assombrá-lo - "Você nunca se esforça!
Você é preguiçoso! Sempre se envolve em dificuldades!" Era o
que lhe, diziam quando estava no 2° grau, mas nunca havia
procurado saber se tais declarações eram verdadeiras ou não.

Fracasso no emprego
Às vezes, quando as pessoas perdem uma promoção ou até o
emprego, é porque os sentimentos do passado começam a
adentrar no ambiente de trabalho. Talvez não estejam tendo o
destaque que deveriam ter. Ou, pelo contrário, pode ser que
estejam sobrepujando os outros no esforço de tentar alcançar
metas, mas de qualquer forma tais indivíduos são incapazes de
lidar com o próprio temperamento, sobretudo no que diz respeito
°
ao pessoal necessário para atingir sucesso no trabalho. Quando
Perguntas nas Encruzilhadas da Vida / 35

são despedidos, dizem que não sabem como é que aquele ramo
de atividade ou o antigo patrão conseguirá obter sucesso sem
eles. Ou talvez suspirem de alívio por ter fracassado, porque o
sucesso estava exaurindo suas forças físicas e emocionais.

Doenças
Hoje em dia, alguns médicos dão a seus pacientes questionários
acerca do histórico familiar, porque muitas das doenças (talvez
80%) estão relacionadas com o estresse.' Ele aumenta a
susceptibilidade do corpo a alergias, asma, erupções cutâneas,
artrite, câncer, infecções, problemas na articulação da mandíbula,
doenças do sistema imunológico e as colagenoses, que é a
denominação geral de algumas doenças em que existem áreas de
degeneração de tecido colágeno, como o lúpus eritematoso. Alguns
sintomas, como dores de cabeça, constipação, diarréia, tensão
muscular e insônia, podem ser avisos de que algo está errado.
Atualmente, os médicos recomendam grupos de apoio e
terapia quando suspeitam que a doença do paciente tenha origens
em estresses do passado. Por exemplo: no tratamento da anorexia,
os médicos indicam grupos de apoio e terapia para toda a família,
porque só o tratamento médico em si não basta.

Distúrbio de Estresse Pós-Traumático (PT5D)


Na maioria das vezes, o PTSD (nome mais usado, por ser a sigla
em inglês) está mais associado com os veteranos da Guerra do
Vietnã, que têm repetidas lembranças (flashbacks) de horríveis
experiências vividas no campo de batalha. Recordam nitidamente
os lugares, os sons e o cheiro da batalha, não apenas quando
sonham, mas também quando estão acordados. Alguns adultos
sofrem de PTSD quando se lembram de algum acontecimento
traumático ocorrido na infância que tenha sido recalcado por
muito tempo. Tentam esquecer as "guerras" da infância, mas a
dor permanece.
36 / Curando as Feridas da Alma

Síndrome do pânico
A síndrome do pânico é a resposta física à dor que já não se
consegue mais reprimir. De repente, a pessoa experimenta
palpitações no coração, falta de ar, tontura, transpiração ou vômito.
Os pensamentos surgem à mente numa seqüência muito mais rápida
do que se possa lidar com eles. Por exemplo, os agorafóbicos
(pessoas que têm medo mórbido e angustiante de estar em lugares
públicos ou situações que, física ou psicologicamente, apresentem
saída difícil) muitas vezes experimentam ataques de pânico em
espaços abertos, sobretudo se for um lugar onde esteja abarrotado
de gente. Quando o paciente da síndrome do pânico passa por
situações parecidas com aquelas ocorridas em seu passado, o corpo
reproduz a mesma dor e impotência nessa forma exterior.

o Desejo Impaciente
Para alguns, o tanque de contenção cheio de dores e frustrações
ocultas não explode, mas vagarosamente começa a vazar, a ponto
de essas pessoas descobrirem que estão caminhando sobre um solo
que nãolhes fornece a sustentação necessária para o viver quotidiano.

Depressão de baixo grau


Os depressivos não se sentem seguros com a vida, como se a
emoção por ela tivesse acabado. Já não estão mais tão
interessados nas pessoas ou nos projetos, razão pela qual seus
empregos e relacionamentos com os outros geralmente
apresentam algumas arestas. Além disso, sua comunhão com
Deus em oração e o estudo da Palavra parecem não estar mais
dando certo.

Tristeza profunda
Períodos de tristeza profunda freqüentemente ocorrem em
adultos que, quando crianças, por alguma razão ficaram com

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Perguntas nas Encmzilbadas da Vida / 37

grande ódio. Essa raiva ferve dentro deles e parece não haver
solução para isso. Às vezes, direcionam essa ira para o interior
de si mesmos e tornam-se profundamente deprimidos. Essa "raiva
congelada" está profundamente enterrada dentro deles e pode
ser difícil reconhecê-la e tratá-la.

Brigas inexplicáveis com os membros da familia


Aqueles que sempre davam-se muito bem com pais, filhos ou
parentes, agora percebem que esses membros da família
simplesmente os ignoram ou reclamam demais deles. Só pelo
fato de deixar a toalha no chão do banheiro ou por não arrumar
a bagunça do quarto, é motivo de incômodo para essas pessoas
como nunca antes. Ao invés de não falar nada, não podem
deixar de dizer algo. Os membros da família percebem que
não conseguem fazer qualquer coisa que seja agradável ou
aceitável.

Incapacidade de terminar o que começou


Nada chega até o fim. Prazos de entrega são desrespeitados,
promessas não são cumpridas e princípios éticos, que uma vez
pautavam a vida, hoje são violados. Até a própria consciência
dessas pessoas não fica para trás, dizendo: "É este o tipo de
pessoa que desejo ser?" Não gostam nenhum pouco do modo
como estão se comportando, mas não encontram forças ou
coragem para mudar.

Sentindo-se como se estivesse "tapeando" a vida


A apatia transforma-se em incômodo, à medida que as pessoas
participam de reuniões e atividades que odeiam e elogiam os
outros por qualidades que nem mesmo respeitam.
Pensamentos e ações parecem camuflagens para os
verdadeiros desejos. É óbvio que não estão fazendo o que
gostariam de fazer.
38/ Curando as Feridas da Alma

Engolidos pela Crise


Saímo-nos surpreendentemente bem ao ignorar esse
descontentamento e até descartamos a crise, mas se damos uma
parada para pensar, somos apanhados por ela. Férias sem uma
conveniente estruturação do tempo pode se tornar num desastre.
Quando amigos ou parentes nos vêm visitar, podemos fazer um
balanço de nós mesmos em relação a eles e não gostar do
resultado. Períodos de afastamento do trabalho trazem de volta
velhos sentimentos de solidão e demérito. Encontramo-nos tendo
os mesmos sentimentos do menino que costumava se deitar na
cama e ficar olhando fixamente para o teto, especulando: "O
que será de mim?"
Essas insurreições emocionais são às vezes disparadas pelos
períodos de transição entre as fases da vida, os quais para a
maioria das pessoas em nossa cultura ocidental surgem a cada
dez ou quinze anos aproximadamente. Nessas encruzilhadas,
reavaliamos as escolhas que fizemos e ponderamos se os
resultados condizem com a nossa expectativa. Perguntamos: "O
que é que realmente dou ao meu cônjuge, filhos, igreja, amigos,
trabalho, comunidade - e a mim mesmo? O que obtenho deles
- e de mim? De que forma vivo à altura das minhas obrigações
(profissão, casamento, filhos)? Faço as mudanças e ajustes
necessários?" Se essas questões estão nos incomodando, então é
melhor irmos em frente e também encararmos de vez aquelas
perguntas de vital importância: "O que devo fazer para me sentir
amado? O, que devo fazer para me sentir valorizado?"
Esses períodos de transição criam um cenário para intensas
investigações da alma, as quais ocorrem em três etapas:

• Antigos valores são deixados para atrás;


• Novos valores são escolhidos;
• Esforços são empregados para fazer com que os novos
valores dêem certo.

I I, I I 0.1 • I ; ~
Perguntas nas Encruzilhadas da Vida / 39

Se não temos facilidade em nos comunicar ou nos falta a


autoconfiança para fazermos as mudanças que julgamos
necessárias, pode ser que venhamos a cair em desespero. Foi
o que Matt fez quando ficou mudando de emprego (Capítulo
2). Pior ainda se nos encontramos numa situação insustentável
(emprego humilhante, casamento cheio de abusos) e não
temos a menor idéia de onde acharemos forças e coragem
para mudar.
Vez por outra, as pessoas reagem fazendo mudanças em quase
tudo. Trocam de profissão, deixam o cônjuge, levantam um muro
entre elas e os filhos, abandonam grupos dos quais há anos
fazem parte, param de ir à igreja ou começam a freqüentá-la.
Procuram por uma nova e boa colocação na vida, desenvolvendo
habilidades novas, estabelecendo uma base familiar diferente e
tornando-se membro importante de um grupo que prezam. Não
obstante ficam frustradas se não obtêm avanços nas novas
escolhas que fizeram, pensando: "O que há comigo? Por que
não consigo fazer as coisas que os outros fazem? Será que tenho
coragem de romper os laços que me prendem ao trabalho ou
grupo social que pertenço e tentar formar outros?"
As etapas da vida adulta foram muito bem descritas pelo
especialista em desenvolvimento da fase adulta, Dr. Daniel
Levinson." É nos seus vinte e poucos anos que o indivíduo adulto
faz suas primeiras escolhas em relação à profissão, casamento,
amizade, valores de vida e sonhos. Essas escolhas podem se
assemelhar com as escolhas da família. Por exemplo: se a família
era crente, ele também é. Se o pai ou a mãe tinham determinada
profissão, como médico ou encanador, pode ser que ele vá pelo
mesmo caminho. Ou talvez decida que as escolhas feitas pela
farru1ia eram impróprias e opte por um rumo totalmente oposto.
"Meus pais eram preguiçosos, por isso me empenharei em
trabalhar bastante. Meus pais davam pouca importância à
educação, mas eu vou para a universidade".
40 / Curando as Feridas da Alma

Depois desta primeira escolha, ainda ocorrem pelo menos quatro


transições, nas quais os adultos fazem uma reavaliação de suas vidas.

• As primeiras escolhas são mudadas (28-33).


• Transição de meia-idade (40-45).
• Transição no meio dafase adulta (50-55).
• Transição tardia adulta (60-65).

Tyler enfrentou sua primeira luta de transição quando tinha


trinta anos:

Formei-me aos 24 anos em treinamento ministerial. Sempre


tive meu coração voltado para a obra do Senhor; desejando
senn-lo como pastor de igreja. Casei-me com uma mulher
que conheci na faculdade, quando juntos participávamos
no ministério de evangelização de crianças. Desde a
primeira vez que a vi, ela se apossou do meu coração.
Fomos morar em outra cidade afim de juntos abrirmos uma
igreja só com a cara e a coragem. Num curto espaço de
tempo tivemos trêsfilhos e nossa igreja cresceu rapidamente.
Em apenas alguns anos, mudamos de um prédio com lojas
na frente para imensas instalações próprias.
Então algo estranho começou a acontecer. Contava apenas
com trinta anos, mas sentia-me como se não tivesse mais
nenhuma força. Parecia que pouco importava grandes coisas
acontecerem na igreja ou o quanto minha esposa me amasse;
osgrandiososfeitos de sucessojá não me impressionavam. Certo
dia, encontrava-me numa reunião com o ministério da igreja,
quando o líder da mocidade, que nunca antes tinha me
incomodado, irritou-meprofundamente. Era o tipo de sujeito
que sempre lançava mão de ditos mordazes, mas nessedia em
particular não podia mais suportar seus comentários
sarcásticos. Estava a ponto de explodir; mas me contive. Fui

,~L .I I I ••• 11, u d l. • I "\. ~ I IJ hl i I . •,


Perguntas nas Encruzilhadas da Vida / 41

para casa aquela noite, mas o sentimento não melhorou em


nada. Quando estava entrando na garagem, escorreguei num
dos skates do meu filho e caí, batendo direto com as costas no
chão. Leoaruei-me.fui atrás do menino e pela primeira vez lhe
dei um tapa no rosto. O olhar de medo estampado em seus
olhos é algo que nunca esquecerei. Normalmente não sou
violento e não podia acreditar que estivesse me comportando
daquele jeito. O que é que estava acontecendo comigo?

Muitas pessoas pensam que a solução para sua revolta é casar


com outra pessoa, arranjar um emprego diferente ou se mudar
para outra cidade. O problema é que levamos a nós mesmos (e
a nossa velha bagagem) junto com a gente. Para verdadeiramente
encararmos uma crise e retirarmos à força tudo o que é bom,
podemos e devemos reapreciar o passado e examinar nossas
suposições e peculiaridades de vida há muito tempo assumidas.
"Como devo viver a vida? Deixando de lado o que meus pais
fizeram ou disseram? E de que forma eu reagiria a isso? Como
posso ter um relacionamento autêntico com Deus? O que é que
Deus tem posto em meu coração que só eu posso fazer? É hora
de repensarmos velhas suposições e buscarmos a verdade.
Quando fazemos isso, novamente damos de encontro àquelas
conhecidas perguntas de. vital importância: "O que devo fazer
para me sentir amado? O que devo fazer para me sentir valorizado?"
As respostas a esses questionamentos estão num relacionamento
com Deus, mas cada um de nós tem de pôr em prática esse
relacionamento de forma tal que as respostas tornem-se reais para
nós. Isso pode acontecer numa crise, ou à medida que longos
anos de lenta revolta e ódio nos levem àquele primoroso momento
em que examinaremos os padrões de nosso procedimento e os
motivos que os impulsiona. É então que, diante de Deus,
apresentaremos essas informações acerca de nós mesmos e
cultivaremos o relacionamento num nível mais profundo com Ele.
42 / Curando as Feridas da Alma

A crise ou o desejo impaciente que nos serviu de impedimento


para o sucesso, agora torna-se numa auto-estrada em direção ao
desenvolvimento de uma fé e um viver mais honesto.
Temos tendência de protelar a jornada, ignorando os sinais
de advertência que indicam que nem tudo vai bem com nossa
alma. Se tivermos a coragem e o apoio da ajuda de Deus,
podemos avançar escolhendo crescer, em vez de desperdiçar
anos de energia, fingindo que estamos bem. Começamos
investigando as raízes de nossos conflitos e vendo que esse não
é um problema novo. É tão velho quanto Adão e Eva.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Todo esse exame de consciência parece avassalador.
Devo esperar?
R Tudo a seu tempo. Siga seu próprio passo. Não se isole.
Fale com as pessoas. Se necessário, busque ajuda
profissional. Ore a respeito e peça que Deus lhe mostre
o que você precisa saber.

P E se eu estiver bem no meio de um desses períodos de


transição, pronto a desistir de minha profissão ou do
meu casamento?
R Se você estiver confuso e emocionalmente
sobrecarregado, faça o mínimo de mudanças possíveis.
Reserve um tempo para fazer um exame de si mesmo e
então saberá mais acerca de quem você é, de suas
escolhas e da vontade de Deus para a sua vida.

P Cresci num lar evangélico, mas tenho questionado o


que aprendi em termos de crenças e comportamentos.
O que há comigo?
R Isso pode acontecer em qualquer idade, mas ocorre com
mais freqüência logo após os vinte anos. Essa separação

I J l .• ,.
1'1'
Perguntas nas EncnlziJhadas da Vida / 43

sadia dos pais faz parte do desenvolvimento normal do ser


humano. Entretanto, causa estresse, porque talvez pensemos
que deveriamos ser como nossos pais. Agir em meio a essa
situação difícil envolve de~r Deus nos ajudar a classificar
o que cremos e o que não cremos, e em quem devemos
nos tomar, independentemente de nossos pais. Muitas vezes,
nos vemos abraçando os valores positivos de nossos pais,
mas escolhemos mudar os procedimentos e a maneira de
encararmos a vida que não deram muito certo para nós.

P E se eu já tiver pensado em cometer suicídio?


R Se você tiver intenções suicidas ou fortes sentimentos
suicidas, busque ajuda profissional imediatamente. Ligue
para um telefone de ajuda. Descubra centros de
aconselhamento em sua cidade ou instituições municipais
onde tratem de pacientes ambulatoriais. Fique em contato
com as pessoas. Fale com alguém de sua confiança. Leve
com você um número de telefone de ajuda.
Vale lembrar que "sentimentos suicidas" não são
incomuns e que são diferentes das "intenções suicidas".
Os sentimentos suicidas em geral são um forte desejo
de fugir, enquanto que as intenções suicidas significam
que a pessoa pode já ter planejado o suicídio em detalhes
e não pretende buscar ajuda.
Se o tratamento ambulatorial não trouxer resultados,
não tenha medo em ser hospitalizado. Depois que a
crise passar, o tratamento ambulatorial e a terapia de
grupo provavelmente satisfarão suas necessidades.
Na maioria das vezes os sentimentos suicidas indicam
que a dor de nosso passado é muito grande e que nosso
desejo é fugir. Contudo, a melhor escolha, se estivermos
preparados, é iniciarmos a jornada passo a passo, porque
as coisas realmente vão melhorar.
44 / Curando.as Feridas da Alma

Reflexão Pessoal

Responda as perguntas a seguir o mais honestamente possível.


Mas antes faça uma breve oração a Deus, pedindo que Ele
revele qualquer coisa que você precise saber.

• Das crises relacionadas neste capítulo, pela qual você já passou:


divórcio, comportamentos compulsivos, fracasso no emprego,
doenças, distúrbio de estresse pás-traumático, síndromedo pânico?

• Você já passou por algum destes problemas mais sutis:


depressão de baixo grau, tristeza profunda, brigas inexplicáveis
com os membros da farru1ia, incapacidade de terminar o que
começou, sentindo-se como se estivesse "tapeando" a vida?
Neste caso, de que maneira você age quando está nessa
situação?

• Como você se reavaliou nessas transições?

• O que você mais gostaria que tivesse acontecido em sua


vida com relação a estas áreas de escolha: profissão,
casamento e relacionamento com Deus?

• O que você está fazendo para tornar realidade as escolhas


feitas?

• I,.L I _I r, I ' ~~
ICAPhlJw QuATIlO I
ADesvantagem de Sermos Humanos

A incapacidade de sermos o crente que gostaríamos de ser não


é enfermidade psicológica recente. Ela é conhecida como
Síndrome da Incredulidade Crônica. É um problema universal
para a humanidade. Floresce quando fingimos que não existe e
dá onde quer que seja plantado. O jardim é a raça humana, e a
estação própria para o crescimento começou com a queda da
humanidade.
Adão e Eva experimentaram o doloroso arrependimento e
acabaram com as esperanças que muitos hoje sentem falta. O.
que poderia ter sido mais decadente e humilhante do que serem
banidos do jardim do Éden? O que poderia ter sido mais
vergonhoso para eles, como pais, do que ter um dos seus filhos
assassinado pelo outro, como Caim que matou Abel?
Depois da queda, Adão e Eva descobriram que espinhos e
cardos cresciam não apenas no solo, mas também entre eles.
Parte da maldição relacionava-se com o fato de que tentariam
controlar um ao outro: "O teu desejo será para o teu marido, e
ele te dominará" (Gn 3.16). Podemos apenas imaginar o quão
desvalorizados se sentiram quando a maldição trouxe tumulto e
desordem em áreas de importância que forneciam dignidade
48 / Curando as Feridasda Alma

pessoal: ganhar a vida (lavrar a terra) e dar à luz filhos (Gn 3.16-
19). Esta primeira família da história foi se desintegrando à medida
que seus membros reagiram com negação, culpa, isolamento e
atos de ira. Por muitas gerações essas quatro tendências têm
sido transmitidas às famílias da terra até penetrar em cada lar e
em cada cultura.

Negação
"Escondeu-se Adão e sua mulher da presença do Senhor
neus:
Temos a tendência a pensar que a maioria dos problemas da
vida é como soluços - se os ignorarmos por bastante tempo,
passam. Essa atitude pode transformar-se em negação - agindo
como se os acontecimentos penosos nunca tivessem ocorrido,
fingindo estar tudo bem quando não está. O comportamento de
Adão e Eva ilustra três regras básicas para a negação,' as quais
os levou ao fracasso e ao desapontamento.

.Não fale
Depois que nossos primeiros pais desobedeceram a Deus
comendo da árvore da ciência do bem e do mal, nenhum dos
dois buscou a Deus em arrependimento e contrição. Não se
aproximaram de Deus como filhos que confiam no que seus
pais fazem, dizendo: "Veja o que fizemos. Estamos arrependidos.
E agora, o que vamos fazer?" Em vez disso, esconderam-se (Gn
3.8). Quando Deus os confrontou, não admitiram culpa ou
pediram perdão.

Não confie
Quando a serpente disse que Adão e Eva não morreriam se
comessem da árvore da ciência do bem e do mal, ela contradisse
as palavras de Deus (Gn 3.4,5). Adão e Eva acreditaram na

I I l.li. I II I i l. ~L ld,; ," 11.. I I . I .'1, ~ I 1,111'


A Desvantagem de sermos Humanos / 49

serpente ao invés de crerem em Deus, o único que lhes havia


dado todas as razões para que confiassem nEle. Suas necessidades
haviam sido satisfeitas por Ele e, no jardim, Deus freqüentemente
conversava com o casal. Nem ao menos inquiriram Deus acerca
da declaração da serpente, assim como um filho que confia no
pai, perguntaria: "Mas pai, você não disse...?"

Não sinta
Ainda que Adão e Eva possam ter ficado extremamente tristes,
nada foi registrado na Bíblia. Nem está escrito que eles tenham
apelado a Deus para que os deixasse ficar no jardim. O único
sentimento mencionado é o medo de Adão: "Ouvi a tua voz
soar no jardim, e temi, porque estava nu, e escondi-me" (Gn

Não fale! Não confie! Não sinta!


50 / Curando as Feridas da Alma

3.10). Mesmo assim, parece que Adão estava tentando justificar


seu comportamento, sem admitir o medo.
Então Adão e Eva se ocuparam com uma pretensa solução
- coser folhas de figueira para fazer um avental, o que
subseqüentemente foi substituído por Deus (Gn 3.7,21). Da
mesma forma, muitas vezes nos ocupamos com "soluções"
inadequadas e temporárias, quando temos medo de enfrentar
os sentimentos que nos dominam. É mais fácil comprar um
presente para alguém que magoamos do que pedir desculpas. É
mais fácil pôr em ordem as cadeiras para um estudo bíblico, do
que nos sentarmos e confessarmos nossos pecados a Deus.
A negação parece ser um mecanismo apropriado para
contornar os problemas, mas fique ciente de que tem três lados:
o bom, o mal e o feio.

o bom
A negação parece ser expediente útil para as crianças, à medida
que as ajuda momentaneamente a não fazer caso das experiências
dolorosas. As que foram abusadas física ou sexualmente agem
no sentido de bloquear a lembrança da memória. Na realidade,
essas experiências ficam armazenadas no subconsciente, que se
torna um tipo de tanque de contenção para a dor. Talvez Deus
em sua misericórdia permita esse retardamento na reação, porque
as crianças não estão preparadas para enfrentar a dor. Essa ferida
permanece dormente até que, como adultos amadurecidos,
possam confrontá-la e tratá-la.
Mesmo nas circunstâncias mais costumeiras, as crianças são
encorajadas a negar seus sentimentos, quando lhes é dito: "Não
pareça tão triste!" ou "Mantenha a cabeça erguida!" Pode ser até
que tenhamos sido moldados no tipo de "criança boazinha",
que sempre se esforça o bastante para ser elogiada pelos pais e
professores - "Como você é uma criança boa!" Se, quando
crianças, aprendemos a fazer o necessário para parecermos bons

., . ,~~ .li j I 11. .... j J ;. J ; L .... l .1JlJ..i


A Desvantagem de sermos Humanos /51

aos olhos das outras pessoas - fingindo estar contentes,


ocultando a raiva - quando adultos continuaremos a usar essa
máscara de "criança boazinha", escondendo problemas
matrimoniais, dificuldades financeiras e sonhos desfeitos.
Esse tipo de negação é erroneamente considerado como algo
bom. Por exemplo, Susanna (Capítulo 2) disse que era uma
pessoa melhor e mais forte, por causa dos problemas de infância.
Crentes bem-intencionados sancionam a negação ao citarem
Romanos 8.28: "E sabemos que todas as coisas contribuem
juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles
que são chamados por seu decreto". Com esse versículo querem
dizer que deveríamos recusar encarar as feridas do passado e a
forma como elas sabotam nossa vida com Deus. Entretanto, esse
versículo nos encoraja a enfrentarmos a realidade da vida, porque
Deus pode agir no meio de toda essa grande dor a fim de nos
transformar conforme à imagem de seu Filho. Jan nos conta
como ela foi levada a entender isso:

Como estudante universitária trabalhando no centro de


Nova York, meus companheiros e eu dávamos muitos
testemunhospelas mas eparticipávamos de estudos biblicos
em apartamentos. Sentia-me emocionada em poderfalar
do amor de Jesus num lugar onde havia tantos corações
feridos.
Depois de mais ou menos um mês, o grupo recebeu a
visita de uma missionária, que na primeira oportunidade
puxou-me para um canto para falar comigo.
"[an, sinto que você tem algumas feridas em seu
passado, não é mesmo?"
"Sim, é verdade ", respondi. "Passei por vários períodos
de depressão quando era adolescente, mas hoje está tudo
acabado. Estou cursando um seminário bíblico".
"Pode ser", sorriu ela. "Minba esperança é que você
possa demonstrar suasferidas um pouco maisfacilmente.
52 / Curando as Feridas da Alma

Tire-as do esconderijo de sua alma. Deixe que as pessoas


saibam que você está ferida e que Deus está com você em
meio a tudo isso. Não finja que Deus torna tudo fácil".
Fiquei completamente confusa pelo que ela disse, mas
não dei resposta.
Depois disso, percebi quefIqUei mais quieta e ouvia mais as
pessoas. Parecia que eu estava melborrdacionada com OS' outros.
Quo.ndo recordo esses momentos, entendo que essafoi a primeira
de muitas outras indicações de que a melhor maneira de
comunicar o amor de Deus não é minimizar a dor da vida,
mas invocar a presença de Deus em meio ao problema.

Ornai
A negação perde suas características boas quando os adultos
teimam em bloquear as experiências dolorosas e a armazená-
las no tanque de contenção do subconsciente. Por exemplo, o
esposo de Donna (Capítulo 2) disse-lhe repetidas vezes que a
maneira crítica de ela reagir a situações adversas estava matando-
o por dentro. Ela demonstrou ter boa vontade quando orou a
respeito por um ou dois dias, quando ocorreu outra crise na
qual ela deu vazão à raiva criticando-o.

o feio
Quando os adultos continuam a ignorar a verdade acerca do
que sentem, o tanque de contenção do subconsciente fica tão
cheio de feridas, que começa a vazar na forma de crises e
desejos impacientes. Encarar as dores é tarefa difícil e envolve
examinar padrões e papéis desempenhados na infância e
levados para a fase adulta. Não é fácil admitir esses erros,
achar perdão e desenvolver novos padrões. Não nos sentimos
bem ao fazer essas coisas, mas é bom para nós. Fornece-nos
acesso para vivermos diante de Deus e do mundo de maneira
mais autêntica.

• J,.L I i • .i.L. JI" j I I I, I'" 1 j ,~ ; : ~ • .là 1 I I li.. i


A Desvantagem de Sermos Humanos / 53

Sair desse estado de negação é difícil porque vivemos em


graus de percepção. Por um ou dois minutos vemos claramente
nossos destrutivos padrões de comportamento, para então
deslizarmos outra vez para o nível em que nos vemos como
"crianças boazinhas". Ou talvez a crise passe, de modo que
esquecemos o problema e continuamos em frente.

Culpa
''Foi culpa dela) SENHOR Deus ".
Adão lançou a culpa dos seus pecados em Eva. Eva culpou a
serpente e a primeira cadeia de culpas se formou (Gn 3.12,13).
Ambos tentaram parecer bons aos olhos de Deus - como se as
pessoas pudessem manipular a opinião de Deus a respeito de si
mesmas. A tendência humana de nos desvencilharmos de
qualquer responsabilidade está em ação quando dizemos:

• Eu não estaria desse jeito se ...


• Se você não tivesse me dito isso, então...
• Não posso deixar. de ser o que sou, porque...

Às vezes as pessoas revertem o fluxo da culpa e julgam-se


sem a menor piedade. Talvez seja culpa minha, pensam, ainda
que a lógica diga que não. Para muitos, a culpa se torna um
modo de vida, de maneira que quando ocorre uma crise, estão
muito mais preocupados em descobrir de quem é a culpa do
que em resolver a crise.

Isolamento
"Temi) porque estava nu) e escondi-me ".
Quando Adão e Eva ouviram que Deus andava no jardim,
esconderam-se, ao invés de irem andar com Ele (Gn 3.8-10).
Isolaram-se de Deus, deixando de buscar o seu conforto, que
era (e é) mais do que capaz de dá-lo. .
54 / Curando as Feridas da Alma

É como se a humanidade se confinasse numa solitária. A fim


de mantermos aquela máscara de "criança boazinha", não
podemos deixar que as pessoas conheçam nossos pensamentos
e sentimentos imperfeitos. Esse isolamento infligido a nós
mesmos nos faz sentir solitários.
O isolamento é normal para aqueles que foram criados em
lares onde os pais não se expressavam aberta e honestamente.
Contato franco e genuíno com os outros parece ser tentador,
mas também é perigoso porque, quando crianças, foram
ensinados a guardar os sentimentos para si. Quando ficam
adultos, aproximar-se dos outros é experiência constrangedora,
senão dolorosa. Pode ser que sintam que as pessoas procuram
manter distância deles ou os rejeitem, mesmo quando não estão
agindo assim. Quando ficam familiarizados com pessoas que
tenham facilidade em expressar sentimentos, eles se afastam,
ou talvez até venham a sabotar amizades potencialmente francas,
maltratando essas pessoas para irem embora.

Atos de Ira
"Irou-se Caim fortemente e descaiu-lhe o. seu semblante".
Quando o sacrifício de Caim não foi tão aceitável como o do
seu irmão Abel, Caim zangou-se. Deus reconheceu os
sentimentos normais de raiva que Caim sentia, mas exortou-o a
fazer o que era certo (Gn 4.6,7) - que preparasse outro sacrifício.
Mas em vez disso, Caim matou seu irmão (Gn 4.1-9), preferindo
agir de acordo com sua raiva.
O sucesso das outras pessoas pode ser ameaçador e até o
convençe de que você nunca será bom o suficiente. Se você abriga
esse tipo de pensamento, fica com raiva e permite que a ira se
manifeste em explosões inadequadas. Se tem acessos de raiva,
como Caim, talvez chegue a mentir para encobri-los. Quando lhe
foi perguntado onde estava Abel, Caim mentiu a Deus: "Não sei",
respondeu ele. "Sou eu guardador do meu innão?" (Gn 4.9).

• I, .... ~ I • , I I, li. • I ,.I , I ~ ..... J I j Ji t I


A Desvantagem de Sermos Humanos / 55

Se você está desabituado a maneiras apropriadas de expressar


raiva, pode, em vez disso:

• Ferver de raiva bem quietinho, de modo que ninguém


suspeite que você está com ódio.
• Provocar uma briga de maneira tal a manipular a família,
os colegas de trabalho e os amigos para que pensem
ser eles os raivosos.
• Despejar a raiva imediatamente dentro do tanque interno
de contenção e se esforçar para ser uma pessoa legal.

A última opção é freqüentemente chamada de autocontrole,


mas é um tipo de negação. A ira não foi descartada, só disfarçada.

Onde Aprendemos essas Reações


A negação, a culpa, o isolamento e os atos de ira são reações
provenientes de várias fontes. Primeiro, como já vimos, parece
ser parte da maneira como a humanidade reage à vida, uma
parte da tendência natural do homem a pecar. Ninguém ensinou
Adão, Eva ou Caim a negar, culpar, se isolar ou agir com raiva.
Desde a queda, temos herdado a desvantagem da "natureza
pecaminosa", que precisa ser reeducada a fim de agir segundo
os procedimentos de comunhão com Deus.
E como se isso não bastasse, quase todas as culturas
promovem a negação, a culpa, o isolamento e as reações de ira.
Elas, como segunda influência, colocam em evidência essas
reações da seguinte maneira.

Negação
Livros e seminários nos incentivam a impressionar as pessoas
com pouca consideração ao que acontece em nosso interior.
Dizem-nos para empregarmos nossos melhores esforços em
qualquer coisa, ainda que os outros saiam feridos e sofram.
56 / Curando as Feridas da Alma

Culpa
Nassa cultura nos ensina que nada está resolvido até que
tenhamos achado um culpado. O baderneiro real das brigas do
pátio da escola (como se houvesse apenas um) deve ser
descoberto e devidamente punido. Quando ocorre um desastre
de avião, o público fica obcecado em saber de quem foi a culpa.
Enquanto as companhias de aviação avaliam a culpa a fim de
evitar outros acidentes, o público procura um bode expiatório.

Isolamento
Com o aumento da facilidade dos meios de transporte, muitos
sentem-se solitários e sem um lugar ao qual pertencer. Não temos
histórias de relacionamentos de amizade envolvendo nossos
vizinhos ou irmãos da igreja. Ao invés de confiarmos naqueles
que nos fazem vizinhança, os desconhecemos. Mesmo as pessoas
que têm muitos amigos e que fazem parte de diversos grupos,
podem vir a descobrir que não são verdadeiramente próximos
de ninguém.

Atos de ira expressos de maneira ríspida e detestável


Somos ensinados que a maneira de nos sentirmos melhor depois
de termos sido fechados por outro motorista é dando uma
fechada nele também, ainda que isso signifique arriscar a vida e
um carro novo. Trabalhar a ira com métodos já comprovados
pelo tempo, que são escrever um diário, orar ou falar com um
amigo, não é o que vemos retratado e glorificado nos filmes.
A terceira influência, além de nossa tendência humana a pecar
e de nossa cultura, é a família na qual fomos criados. Isso faz
sentido à medida que compreendemos que a família é um
microcosmo de nossa cultura e também um lugar particular o
suficiente para permitir que nossa tendência a pecar se manifeste
em sua inteireza. Pode ser difícil aceitar os erros no

I J L" I' , li , ..... L .ai. L. IJ ü. I 1 .• I L i .a I 1i Jll, J


A Desvantagem de Sermos Humanos / 57

comportamento de nossos pais, mas eles são seres humanos


normalmente imperfeitos, que apesar de terem feito o melhor
que puderam, não nos educaram de forma adequada. E se um
dia formos pais, também não seremos pais que eduquem os
filhos de maneira adequada. Por exemplo, mesmo os pais com
a melhor das intenções são distraídos por doença ou divórcio,
não dando aos filhos o amor e a atenção de que necessitam. Ou
talvez transmitam noções culturais de um Deus que age como
um pai imoral e manipulador, ou como um pai distante e frio.
Se crescemos numa família como essa, hoje temos uma visão
distorcida de Deus e encontramos dificuldade em nos
relacionarmos com Ele. Visto que quase toda família precisa
trabalhar mais no que se refere à capacidade de se relacionar
uns com os outros, a maioria de nós tem falta da capacidade
mínima necessária de formar relacionamentos baseados no amor
e no comprometimento mútuo.
David Seamands descreve essa reação em cadeia em seu
livro Healing for Damaged Emotions (Cura para Emoções
Feridas):

Começando com o primeiropecado de Adão e Eva, foi posto


em movimento uma reação em cadeia no que tange à
imperfeição de serpai, mediante erros, ignorância e ações
mal orientadas, e o pior de tudo) através do amor
condicional."

Esta reação em cadeia pode ser parte da punição que os


filhos recebem pelos pecados dos pais até a terceira e quarta
geração (Dt 5.9). Muitas vezes o pecado atinge circunstantes
inocentes e, nesse caso, o pecado dos pais é visitado sobre
os filhos e netos. Contudo, isso não significa que estejamos
destinados a ser visitados pelo pecado. Deuteronômio 5.10
acrescenta que Deus faz "misericórdia em milhares [de
gerações] aos que [o] amam e guardam os [seus]
58 / Curando as Feridas da Alma

mandamentos". Amar a Deus e permitir que Ele nos transforme


pode fazer a diferença.

Derrotando a Força da Maldição


O espectro destas três influências - a cultura, a criação e a
tendência humana a pecar - põe em desvantagem nosso
crescimento. Ainda que amemos a Deus, essas influências podem
estar nos oprimindo. O apóstolo Paulo sentiu profundamente o
peso disso, quando escreveu: "Eu sei que em mim, isto é, na
minha carne, não habita bem algum; e, com efeito, o querer
está em mim, mas não consigo realizar o bem" (Rm 7.18).
Para nos livrar dessas influências, podemos examinar quem
SOITlOS e como nos tornamos assim. Admitimos quem somos,
entregamo-lo a Deus e permitimos que Ele forme novos padrões
em nós. Essa jornada é, em sua essência, espiritual. É um processo
que nos torna uma pessoa íntegra, que se relaciona com Deus
como alguém amoroso que é. É pôr em ordem os níveis de
teologia que temos absorvido e examinar o amor de Deus que
ainda não absorvemos. É ir a Deus e descobrir que só Ele pode
responder aquelas perguntas de vital importância: "O que devo
fazer para me sentir amado? O que devo fazer para me sentir
valorizado?" É compreendê-lo quando diz: "Você não precisa
fazer nada. Eu já fiz tudo. Venha a mim e fique comigo'.'. O
resultado desse processo é a liberdade para podermos obedecer
a Cristo ao 8.32), à medida que abandonamos as pecaminosas
"obras da carne" e crescemos no "fruto do Espírito" (vide GI
5.22,23).
Faz tempo que muitos de nós não pensamos na infância que
tivemos. Talvez tenhamos bloqueado as lembranças tristes e
reforçado as boas. Contudo, as pessoas são a soma de suas
experiências, e os sentimentos de infância jazem presos dentro
de muitos de nós, dizendo-nos sempre o que fazer, ainda que
não percebamos. A forma mais simples de fazer isso é examinar

I 1- 0.1 ~ l ..1 . J • • ..... L J I J1J I


A Desvantagem de Sermos Humanos / 59

como foi o nosso desenvolvimento na família em que crescemos


(Capítulos 5 a' 7) e os padrões que formamos como adultos
(Capítulos 8 alO).

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Vocês estão dizendo que devemos culpar nossos paispor
nossos problemas?
R Não examinamos o passado com o objetivo de lançar a
culpa em nossos pais. Fazemo-lo para localizar com
precisão nossos padrões destrutivos e nos livrar deles.
Não obstante, alguns leitores podem ficar na defensiva
em relação às suas famílias, mas considerando que todos
temos pecado e destituídos estamos,da glória de Deus,
que família está imune das tendências pecaminosas? À
medida que as pessoas perscrutam a alma, o Espírito
Santo lhes revela o que precisam saber. É importante
estarmos abertos para que Deus nos mostre os assuntos
que Ele quer revelar.
Culpar os pais é inútil, porque a maioria dos pais tem boas
intenções em seus esforços de educar os ftlhos. Os pais
foram afetados por sua própria natureza pecaminosa, cultura
e criação. Muitos pais fazem heróicas tentativas em retirar
de si essas influências, e muito pouco deixam passar em
termos de negação, culpa, isolamento e ira. Por conseguinte,
nossos conflitos não são tão sérios como poderiam ter sido.

P Mas não devemos esquecer as coisas quepara trás ficam


e avançarpara as que estão diante de nós? CPp 3.13)
R Esse versículo não está dizendo para enterrarmos as
feridas do passado, mas fala-nos sobre como Paulo
colocou para trás de si seu passado de glória como
líder hebreu de elite, e como aprendeu a ser discípulo
humilde. Ele até ousou tornar-se um proscrito na política
60 / Curando as Feridas da Alm.a

religiosa - poderíamos dizer que Paulo não estava mais


interessado em usar a máscara de "criança boazinha".
Negar que alguém nos feriu não é o mesmo que perdoar
a ferida, muito embora há os que prefiram substituir a
negação pelo perdão. Para perdoar alguém, precisamos
saber qual foi a ofensa. O perdão faz parte do processo
de cura, como foi descrito pelo profeta]eremias: "Curam
a ferida da filha do meu povo levianamente, dizendo:
Paz, paz; quando não há paz" (Jr 6.14), ou seja, não se
pode curar uma ferida apenas dizendo que ela não existe!

P Quando a ira é apropriada?


R O pecado não está em nos irarmos, mas na amargura
e ações que se originam de uma ira descontrolada.
Quando deixamos "o sol se pôr sobre nossa ira", é
porque não a temos apresentado diante de Deus. Em
sua presença, podemos ver melhor se nossa ira
procede de uma fonte apropriada (por exemplo, a
dureza do coração dos outros, Me 3.5), ou de fonte
imprópria (por exemplo, nosso ciúme, Gn 4.1-8).
Então, avaliamos como expressar a ira. Tratar de forma
rude, sobretudo com aqueles que não estão
envolvidos na questão, é atitude. inadequada.
Podemos aprender a expressar nossa ira de maneira
apropriada e a desabafá-la, usando as ferramentas
apreseritadas no Capítulo 15.

P Deus não é poderoso o suficiente para curar-nos sem


termos de vasculhar o passado?
R Sim, Deus é aquEle que sara poderosamente as nossas
aflições e doenças. Em alguns casos, Ele decide fazê-
lo instantaneamente, mas na grande maioria das vezes
prefere trabalhar em nós, ensinando-nos e
transformando-nos segundo a sua semelhança, através

,, .. l li. J
A Desvantagem de Sermos Humanos / 61

de um processo mais lento. Essa última abordagem


nos é benéfica, porque a experiência nos ensina a
conhecer melhor Jesus e a praticar as habilidades do
perdão.

Reflexão Pessoal

Responda as perguntas a seguir o mais honestamente possível.


Faça antes uma breve oração a Deus, pedindo que Ele revele
qualquer coisa que você precise saber.

• Que assuntos sua família evitava falar quando você era


criança?

• Em quem você mais confiava em sua família? Em quem


você menos confiava?

• Com quais sentimentos sua família não se sentia confortável?

• Olhe algumas fotos suas quando criança. Que expressão


está em sua face? Você era uma criança feliz? Como você
era quando estava pensativo? O que você mais gostava de
fazer quando criança? Você costumava fazer bolinhas de
sabão? Brincava de soldado? (Guarde as fotos para uso
posterior.)

• Se você tem uma pessoa amiga com quem possa


compartilhar as respostas dadas aqui, quem é?
I CAPhuo CINco I
Padrões que Bloqueiam
Nosso Crescimento

Em um mundo ideal, as crianças cresceriam recebendo o amor de


que necessitam em cada momento da vida. Durante as crises, pais,
avós ou professores ficariam a sós com elas, dizendo-lhes o que
precisariam saber e as teriam no colo o tempo que fosse necessário.
Na realidade, contudo, não há nenhum pai ou mãe que satisfaça
plenamente as necessidades que toda criança tem de se sentir amada
e segura. É fácil interpretar mal as crianças, dar muita importância
as suas pequenas dificuldades e nunca suspeitar o que as amedronta.
Muitos pais fazem o melhor que podem, mas têm de dar atenção a
problemas financeiros ou tratar de suas dificuldades conjugais.
Outros imitam a severidade com que foram criados, apesar de
desejarem com todas as forças fazer o contrário.
Jesus mostrou a infância ideal, na qual as crianças se sentem
seguras e amadas, quando as reuniu em torno de si e as abençoou
(Mc 10.13-16). No momento em que os discípulos tentaram afastá-
las, Jesus ordenou que as trouxessem. O Mestre deu sua total
atenção só para elas, ouviu-as e tocou-as. Deixou que colocassem
suas mãozinhas sujas em sua túnica. Com essas ações estava
dizendo aos discípulos que as crianças são pessoas preciosas e
dignas do seu tempo. Como o melhor pai que qualquer um
Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento /63

poderia imaginar, Ele interveio em defesa das crianças e filtrou


os aspectos negativos de nossa cultura.
Presume-se em nossa cultura que, se as crianças não são
surradas, não passam fome ou não são molestadas, estão bem.
Muitos de nós não estamos bem, considerando o quanto
precisamos de reafirmação no mais íntimo de nós mesmos. "O
que devo fazer para me sentir amado?" Alguns de nós encontram
respostas a essa pergunta fazendo qualquer coisa que agrade os
outros ou que chame a atenção. Esse tipo de comportamento
trabalha contra nossas metas como seguidores de Jesus.
O primeiro passo para nos livrar desse comportamento
destrutivo é examinar nossa criação e procurar por padrões de
negação, culpa, isolamento e reações de ira. Essas quatro reações
sào as mais evidentes em famílias com esses padrões.

Adulto com Tendência a Ser "Nenê Rei"


O membro da família - seja pai, màe ou outro adulto - que age
como se fosse o rei, que dirige a família e força os outros a
atenderem seus desejos, pode ser chamado de "nenê rei". Ainda
que essa pessoa seja adulta, seus atos são como os de uma
criancinha que impõe aos outros sua vontade. Essas "criancinhas"
perturbam a família inteira se não recebem o que querem (atenção,
autoridade ou mesmo simpatia), ou se não têm acesso a qualquer
coisa que satisfaça seus impulsos (emprego, dinheiro ou álcool).
O outro cônjuge e os filhos colocam as necessidades daquele pai,
mãe ou adulto acima das suas próprias. Em um grau ou outro, os
pais ou adultos que agem como "nenês reis" dominam os outros
membros da família. Também pode acontecer que eles nem sequer
se vejam assim, porque de vez em quando saem do seu jeito de
ser para compensar o comportamento infantil, comprando
presentes, fazendo amabilidades e sendo divertidos.
Este papel do "nenê rei" pode ter-se desenvolvido" ao longo
de algumas gerações. Talvez a avó fingisse estar doente quando
64 / Curando as Feridas da Alma

não conseguia o que queria. Ou o avô mandasse todo o mundo


calar a boca nos momentos de tensão entre a família. Agindo
assim, mantinham sob controle os familiares. Esse·
comportamento controlador passa para a geração seguinte,
quando os filhos (hoje o seu pai ou mãe) tornam-se pais que
abusam da autoridade ou que são viciados em trabalho.
Muitos pais "nenês reis" são alcoólatras, ainda que os filhos
não percebam, porque o álcool é grandemente usado em nossa

Nenê rei: membro da familia que age como rei

.• 1 -11 I, . I I " • J . ~ I , ~ ~ J I J Ji.i. J


Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento / 65

sociedade. A psicóloga Cláudia Black não se deu conta de que


seu pai era alcoólatra até que se matriculou num curso sobre
alcoolismo como parte de sua formação acadêmica. É certo que
ele bebia, só que ela não tinha notado com que regularidade.
Uma entre três famílias relata maus tratos devido ao álcool por
um dos membros da família,' e a Dra. Black supõe que 400/0 das
pessoas criadas em lares com casos envolvendo álcool não fazem
idéia de que a mãe ou o pai eram então alcoólatras.ê O alcoolismo
pode atingir várias gerações. A família de Donna, a secretária da
igreja, cuja história foi relatada no Capítulo 2, ilustra isso. O pai
de Donna, filho de alcoólatra, não bebia, mas adotava o
comportamento alcoólatra de "ne nê rei" do seu pai.
Conseqüentemente, Donna adotou-o também.
Os pais "nenês reis" que não são alcoólatras geralmente
dependem de algo para satisfazer seus impulsos, como o açúcar,
o sal, a cafeína, o cigarro (substâncias), ou trabalham sem descanso,
oferecem-se como voluntários nas atividades da igreja, gastam
dinheiro demais, assistem televisão, participam de jogos de azar,
servem-se de material pornográfico ou têm casos amorosos
(atividades). Por exemplo, alguns pais "nenês reis" são viciados
em raiva. Os pais de Eric eram ardentes freqüentadores da igreja,
mas tinham acessos de raiva nos momentos mais imprevisíveis. A
caminho do templo poderiam ter uma enorme discussão, gritar
com as crianças e culpá-las por problemas sem relação alguma
com elas. Então, quando entravam no estacionamento, calavam-
se. Cumprimentavam os amigos com um aceno e sorriam enquanto
desembarcavam do carro. Eric nunca sabia o que esperar desses
pais viciados em raiva.
Em algumas famílias, a situação "nenê rei" é involuntariamente
criada pelo divórcio, enfermidade ou doença mental. A vida
familiar gira em torno de cuidar de uma mãe ou pai solitário ou
que esteja sofrendo de doença crônica. Os filhos não recebem a
educação de que precisam, mas espera-se que ajam como pessoas .
bem-educadas.
66 / Curando as Feridas da Alma

Os Cuidadores
Na família com um "nenê rei", o outro cônjuge e os filhos o
suportam e chegam até a mimá-lo. São os cuidadores de "sua
majestade", que aceitam como recompensa o fato de serem vistos
como os "bonzinhos" da família. São eles que dão um jeito nas
coisas, negociam com o "nenê rei" e instigam qualquer mentira
ou atitude dissimulada necessária para evitar incomodá-lo.
Eis como tipicamente se sente o cônjuge que assume a
responsabilidade de cuidar do outro:

Amo meu esposo, mas não consigo suportá-lo. Elemantém


nossa famüia em tal alvoroço, que é minha responsabilidade
tranqüilizar todo o mundo. Finjo que isso não me incomoda
e ajudo as crianças a atravessar o transtorno.
Antes que ele chegue em casa, juntamos depressa as coisas
que estejam fora do lugar e nos certificamos de que sua
espreguiçadeira esteja exatamente na posição certa e livre de
brinquedos. Então, depois que elese senta, andamos na ponta
dos pés quando nos aproximamos. Tentoproteger meusfilhos
fazendo com que não tragam amigos para dentro de casa.
Elesficariam envergonhados seseu pai e eu brigássemos, ou se
elecomeçassea berrarpara quefizessem de novo seus afazeres.
Às vezes fico me perguntando se esses acessos de raiva
não seriam culpa minha. Se eu fosse uma dona de casa
mais eficiente ou uma amante melhor, suas necessidades
seriam devidamente atendidas. Em outras ocasiões, percebo
que ele é um homem maravilhoso e fico contente por estar
agüentando. Quando ele estáfeliz, estamosfelizes. Quando
ele está infeliz, estamos infelizes.
Os filhos percebem e aceitam as deixas do pai ou mãe que
cuida do "nenê rei" e logo a família inteira está fazendo de tudo
para agradá-lo e protegê-lo. Entretanto, em outro nível de percepção,
os cônjuges que tomam para si tal responsabilidade não gostam de

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Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento / 67

ser controlados pelo "nenê rei" e se desforram, tentando controlar


os ftlhos. "Pare de implicar agora mesmo ou você se tomará como
seu pai", pode ser o que digam aos filhos que estejam envolvidos
nas brigas normais de infância.
Para fugir da cansativa rotina de cuidar do "nenê rei", os cônjuges
protetores freqüentemente se fecham em suas próprias fantasias. Pode
ser que se entupam de comida, televisão ou livros de romance, o que
faz com que mergulhem em devaneios e não estejam inteiramente
presentes para os filhos. Eventuahnente tomam-se viciados em estresse
e atraídos por situações de trabalho e amizades, nas quais a desordem
e a confusão são uma condição pennanente. As pessoas lhes
perguntam: "Por que você continua trabalhando naquele lugar
horroroso?" Ou: "Por que você deixa seu amigo tratá-lo desse jeito?"
Agem assim, porque o caos se tornou normal para eles e prosperam
nessa situação. Quando os pais ficam previamente ocupados desta
forma, os filhos não recebem a atenção adequada de nenhum deles.
Ser cuidador - aquele que toma para si a responsabilidade de
cuidar do outro - significa acreditar que, se nos esforçarmos
bastante em algo ou com alguém, poderemos consertá-los. jan viu
isto acontecer com ela mesma:

Quando decidimos fazer um acampamento com algumas


crianças citadinas de nossa vizinhança, escolhi ensinar o
grupo de estudantes do ginásio, porque eram os mais
difíceis. Trabalhei duro para criarplanos de aula criativos
e divertidos, mas havia dois meninos que não cooperavam
de jeito nenhum. Não havia o que fizesse para atingi-los.
Todos os dias tinha de separá-los do grupo, o que partia
meu coração, porque desejava muito alcançá-los.
Culpava-mepor isso, mesmo depois que um dos conselheiros
que conhecia muito bem aqueles garotos, veio me dizer: "Nunca
lhe ocorreu que eles simplesmente não sabem como se
comportar?Não é culpa sua. Vai levarmais do que uma semana
de acampamento para alcançá-los". Suas palavras soaram
68 / curando as Feridas da Alma

como uma heresia para mim. Se ao menos eu tivesse orado


mais, se ao menos eu tivesse feito melhores planos de aula,
hoje as coisas não estariam melhores?
Dediquei-me tão inteiramente a esses garotos, que
durante aquela semana não me reuni com os outros
conselheiros à noite. Ficava com os garotos o tempo todo.
Pela quinta-feira à noite, desabei. Sentei-me lá fora, no
escuro, chorando e olhandopara o refeitorio, onde os outros
conselheiros passavam horas agradáveis e se animavam
mutuamente. 'Por que eu era tão dura comigo mesma?",
perguntava-me. Passariam mais dez anos, sempre tentando
tirar mais de mim mesma, antes que começasse a
compreender que eu era uma cuidadora. Só então percebi
que ainda que minhas intenções fossem boas, o servir se
relacionava comigo e à maneira como eu podia ajudar os
outros, e não ao fato de eu ser um instrumento de Deus.

Pode ser um choque para aqueles de nós que são cuidadores,


quando descobrem que a nossa visão a respeito de nós mesmos é
a de "pequenos messias". Além daquela nossa encantadora parte
que ama a beleza, a ordem e a perfeição, e que deseja ardentemente
ajudar e corrigir os outros, temos a tendência a acreditar que
possuímos o poder de mudar atitudes e comportamentos, se formos
inteligentes o suficiente e espirituais o bastante.

Pais com Péssimo Relacionamento Matrimonial


Todo casal deste mundo se esforça para construir um casamento
baseado no amor, mas os pais que adotam os papéis de "nenê
rei" ou de seu cuidador descobrem que a jornada é ainda mais
árdua. Pela razão de não se encorajarem verdadeiramente um
ao outro e de não se edificarem mutuamente, passam
pouquíssimo tempo desfrutando de mútua companhia - tempo
que tenha algum significado real. Quando estão juntos, ou brigam

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Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento / 69

ou pacificamente convivem num estado de "guerra fria". Em


ambos os casos, os pais estão emocionalmente separados, se
não legalmente divorciados.
Para compensar esse péssimo relacionamento matrimonial, muitas
vezes os cônjuges usam outras pessoas para satisfazer suas
necessidades. A mãe pode apoiar-se em sua mãe ou filha, ao invés
de buscar o companheirismo no esposo. Se o marido precisa reafrrmar
seu amor-próprio, pode ser que busque o amor e reconhecimento
de sua filha, irmã ou secretária. Os filhos que são usados dessa
maneira pelos pais sentem-se inadequadamente importantes, porque
só estão preenchendo as brechas no relacionamento do casal. Em
geral, essa atitude divide ainda mais os pais. Eis um exemplo típico:

Lisa queria plantar um jardim, mas seu esposo Ralph não


estava nem um pouco empolgado com o assunto. Quando
Jeft, o filho adolescente, chegou em casa vindo da escola,
ela lhe disse o quanto seu pai não estava sendo nada
cooperativo, como sempre. Será que Je.ffpoderia ajudá-la
a plantar as mudas de tomate que ela comprou?
JefJficou ali avaliando a decisão. Olhou para a bola de
basquetebol em suas mãos - tinha planejado jogar com os
amigos. Se bem que aindapoderia dizer que sua. mãeprecisava
da ajuda dele e, além do mais, ela sempre lhe dava dinheiro
quando precisava. Ela o defendia, quando estava em
dificuldades com o pai. Jeffjogou a bola para o lado e foi
ajudá-la.
Quando Ralph chegou a casa, Lisa lançou-lhe em rosto
quefeff 'pôde" ajudá-la. Ralph sófezuma expressão de desdém.
Jeff se sentiu mau pelo fato de sua mãe tê-lo usado daquela
maneira, mas de qualquer forma ele e seu pai sentiam-se a
quilôrnetros de distância um do outro - que importava se seu
pai gostasse disso ou não?
Jeffsofria nas mãos de ambos. Seu pai o ignorava e sua mãe
dependia dele para obter apoio como se ela fosse uma esposa.
70 / Curando as Feridas da Alma

Jeffsentia que tinha uma dioida para com a mãe, visto que ela
construirá sua existência ao redor dele. Considerando que
nenhum dos'pais dava atenção às necessidades deJeff, eleestava,
em certo sentido, criando-se sozinho.

Estes papéis inadequados também forçam os filhos a ser um


tipo de pára-choque ou intermediário para os pais. Talvez seu pai
lhe disse coisas que desejava levar ao conhecimento de sua mãe
e imaginou que você contaria a ela. Esse tipo de comunicação
indireta vira hábito entre todos os membros da família. Mesmo
depois que os filhos ficam adultos, isso continua. Hoje sua mãe
lhe diz como sua irmã deveria arranjar emprego. Sua mãe espera
que você fale com ela. Embora seja comum essa atitude ser tomada
com o fim de evitar ferir os sentimentos dos outros, mal-entendidos
são criados e a comunicação é sufocada. Tal procedimento
sobrecarrega espectadores inocentes com informações (em geral
negativas) que eles não precisam saber.
Famílias nas quais os pais constantemente se esforçam para
criar e manter vínculos entre si ilustram o slogan: "A melhor
coisa que um pai pode fazer por seus filhos é amar a mãe deles" .
O pai e a mãe comunicam-se diretamente um com o outro,
tentam satisfazer as necessidades de cada um e juntos se dedicam
em atender as necessidades dos filhos. Pela razão de darem os
pais apoio um ao outro, ambos podem se empenhar no sentido
de estar plenamente disponíveis para os filhos.
Quando os filhos dessas famílias tornam-se adultos e casam-
se, imitam as habilidades necessárias para desenvolver um
casamento comunicativo e confiante. Pelo fato de terem os
filhos observado os pais resolvendo os problemas e rindo juntos,
foram "treinados" no caminho que devem seguir sem ao menos
perceberem. Quando os filhos de pais com péssimos vínculos
no matrimônio tornam-se adultos e casam-se, falta-lhes este
treino. Mesmo quando são espertos o suficiente para tentar
agir de modo diferente em relação aos pais, na maioria das
Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento / 71

vezes acabam imitando-os, porque não aprenderam a falar,


confiar ou sentir.

Modelos de Papéis Inadequados


Pais que assumem o papel de "nenê rei" ou o de cuidador agem
infantilmente - fazendo beicinho, manipulando as pessoas,
tendo acessos de raiva - e assim os filhos tornam-se adultos
pensando que esse procedimento infantil é apropriado para
adultos. Quando surge um comportamento maduro na família,
freqüentemente são os filhos que o apresentam. É comum a
reversão de papéis. Os filhos confortam e acalmam os pais.
Com a idade de dez anos, Tim começou a resgatar sua mãe:

Certo dia, minha mãe estava deitada em nosso velho


divã verde, chorando, quando disse: "Tim, eu vou me
matar".
"Não, mãe, não!", pleiteei.
"Por que não?", perguntou ela.
Eu só tinha dez anos e não sabia o que dizer. Olhei
pelo vão da porta da cozinha. A porta do forno estava
aberta e pensei numa razão que fazia sentido para mim:
"Porque a senhora fez uma deliciosa pizza. Tem bastante
daquele queijo gostoso ".
Ela sorriu. Ficou mais um pouco deitada, depois
levantou-se e foi preparar o jantar. Consegui ajudá-la! Foi
o que pensei. Senti que tinha poderes que poderiam evitar
o suicídio de minha mãe.
Quando fiquei adulto, percebi que minha missão era
cuidar das pessoas, como tinhafeito com minha mãe. Tornei-
mepastor, sem a menor indicação de estar dando ouvidos à
voz da minha infância sofrida, que me dizia para tomar
conta dos outros. Em minha mente eu só queria ajudar as
pessoas.
72 / Curando as Feridas da Alma

Quando minha mãe ficava deprimida) às vezes eu mexia


com ela e tentava fazer com que risse. Por um pouco) ela se
sentia melhor. Em outras ocasiões) ainda continuava
deprimida. Então tinha a sensação de terfracassado. Não havia
me esforçado o bastante. Não fui inteligente o bastante.
Eventualmente percebi que seus problemas eram por
culpa minha. A culpapermeava minha alma. Mesmo depois
de ter-me entregado paraJesus) na adolescência) ainda me
sentia culpado diante de Deus. Senti que tinha de cumprir
minha missão liderando) ensinando e cantando. Tinha de
fazer tudo por obrigação. Minha preocupação era que
estivesse perdendo a salvação.

Desta forma, a infância de Tim determinou o padrão para a


sua vida. Como pastor, dedicava a vida a ouvir as pessoas e
oferecer soluções oportunas. Sentia-se culpado quando as coisas
não davam certo na igreja.
Uma conseqüência da reversão de papéis é que as crianças
tornam-se adultas muito rapidamente. Não lhes é permitido ser
crianças. Tim é muito amado em sua igreja por sua empatia no
aconselhamento pastoral. "Comecei aconselhando minha mãe
aos sete anos de idade. Depois tornei-me o conselheiro ouvinte
para todos os meus amigos adolescentes. Não admira que tenha
me tornado pastor". Contudo, as más notícias para Tim é que,
como pastor jovem, ele já está derrotado. Não importa o quanto
se esforce para ajudar as pessoas, ele sente que nunca foi
realmente bem-sucedido.

Você Pode Estar Querendo Saber...

P A Bíblia diz que devemos seruir uns aos outros (C/5.l3)


e ser mutuamente benignos e misericordiosos (Ef 4.32).
Não é o que faz o cônjuge cuidador?

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padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento / 73

R O cônjuge cuidador realiza as ações exteriores do serviço,


mas na maioria das vezes os motivos interiores são
distorcidos. O serviço de caráter cristão e a interação
proveniente de um coração compassivo são motivados
pelo amor desinteressado, no qual nos perguntamos como
podemos servir melhor os outros. O cônjuge cuidador
fica procurando meios de pacificar o "nenê rei", para que
ambos possam ter mais paz em suas vidas. Ceder ao brigão
não é ajudá-lo. O amor verdadeiramente desinteressado
corre riscos para confrontar de modo gentil o "nenê rei"
no que diz respeito ao seu comportamento.
O cônjuge cuidador também permite que o "nenê rei"
se aproveite dele, dessa maneira estafando-o,
estressando-o e debilitando-o. É da vontade de Deus
que deixemos que os outros nos explorem desse jeito?
O apóstolo Paulo não fez cerimônia quando afirmou:
"Pois sois sofredores, se alguém vos põe em servidão,
se alguém vos devora, se alguém vos apanha, se alguém
se exalta, se alguém vos fere no rosto" (2 Co 11.20).

P A co-dependência é termo muito usado hoje em dia. O


que significa?
R A co-dependência significa cuidar dos outros de modo que
suas necessidades se tomem mais importantes do que as
minhas. Pode parecer uma ação proveniente do amor
desinteressado, mas na grande maioria das vezes provém da
convicção de que não sou importante o suficiente para Deus,
para mim mesmo ou para a outra pessoa, a fim de que eu
venha a cuidar de minhas próprias necessidades. Muitas vezes
não estão em vista as necessidades da outra pessoa, só os
desejos dela. Por exemplo, uma esposa co-dependente fica
nervosa, porque seu esposo quer o jantar servido às sete em
ponto. Ela precisa ir ao médico, mas não chegará a casa a
tempo de preparar o jantar. Assim sacrifica a necessidade
74 / Curando as Feridas da Alma

legítima de ir ao médico para atender uma exigência de pôr


o jantar em determinada hora. A questão primária para o co-
dependente não é: E as minhas necessidades?, mas: Como
Deus tenciona que eu satisfaça as necessidades dos outros e
que as minhas necessidades sejam satisfeitas?

P Se alguém se comporta como "nenê rei" e bebe, essa


pessoa é alcoólatra?
R É difícil dizer, porque muitos alcoólatras são "crianças
boazinhas", mostrando uma imagem respeitável que
nossa cultura não associa ao alcoolismo. Pelo fato de
não caírem bêbados pelas ruas, supomos que não têm
problema com o álcool. Não obstante, o alcoolismo
aflige 18 milhões de pessoas nos Estados Unidos" e
aproximadamente 28 milhões de americanos são filhos
de pais alcoólatras, estando 7 milhões deles com idade
abaixo dos 18 anos.' No Brasil, as estatísticas são muito
parecidas. A história de Gretchen ilustra como é fácil
não perceber que um dos pais é alcoólatra:

Alguns amigos da faculdadefreqüentavam reuniões de grupo de


apoioparafilbos adultos de alcoólatras. Quando me contaram suas
histórias a respeito de pais bêbados dando vexame em festas de
aniversário, agradeci a DeusjXJrque meuspais não eram alcoólatras.
Em dado momento, disseram que estavam se conscientizando
de que os filhos de alcoólatras muitas vezes criam confusão aonde
quer que vão. Explicaram que não é a intenção deles agir assim,
mas desde a infância estão tão acostumados ao caos, que
constantemente vivem a causar problemas. Pensei no quão
verdadeiro era isso para mim. Gosto de chocar as pessoas, de
fazer as coisas parecerem piores do que realmente são. Se estou
me dando bem com um namorado, logo começo uma briga só
para dar um pouquinho de ação e drama à relação. É como se
eu fosse viciada em causar alvoroço.

I i i. l ~
Padrões que Bloqueiam. Nosso Crescimento / 75

Enquanto falavam, queria sumir na cadeira. Nunca antes


alguém havia diagnosticado meu problema assim tão claramente.
Sentia como se um imenso holofote estivessefocalizado só em mim.
Seria essa a razão de haver tantos problemas em meus
relacionamentos?
Dei uma' desculpa qualquer e saí. Minha mente funcionava
a mil. Tinha absoluta certeza de que meu pai não era alcoólatra.
Ele bebia cerueja, mas nunca havia bebido nada mais forte do
que isso. Tinha o costumedeficarem bares, mas era um homem
brilhante, havendo conseguido diversos cargos com altos salários.
É verdade que foi despedido do seu último emprego por haver
perdido a paciência diversas vezes.
Mais tarde, naquele mesmo dia, disse a meus amigos que os
acompanharia em sua reunião, "porque só assim não ficaria
aborrecida quando falassem dela". Lá encontrei um panfleto
com um questionário elaboradopela Universidade[obns Hopkins,
o qual ajuda as pessoas a verificar se são alcoólatras. Respondi
as vinte perguntas do ponto de vista de meu pai. O resultado foi
"9", contagem muito além do número que indica que "você
definitivamente tem problema com o álcool".
Procurei me lembrar mais acerca dos fatos relacionados a
sua bebida. Raramente o tinha visto bêbado, mas falava a
respeito da bebida o tempo todo. Não podíamos ir a lugar
nenhum sem que não bebesse ou que não ficasse ansioso por
uma cerveja. Nunca deixávamos de ter cerveja no porta-malas
do carro. Fico chocada ao pensar que elepoderia ser alcoólatra.
Julgava que pessoas trajadas de terno e gravata não tivessem
problemas sérios.

Reflexão Pessoal
Responda as perguntas a seguir o mais honestamente possível.
Mas antes faça uma breve oração a Deus, pedindo que Ele
revele qualquer coisa que você precise saber.
76 / Curando as Feridas da Alma

• Se você tivesse sido uma das crianças que Jesus colocou


no colo, o que teria perguntado a Ele?

• Se houve um "nenê rei" em sua família, que parte do


comportamento dessa pessoa você mais temia? De que
maneira você reage às pessoas que hoje trazem a sua
memória aquele membro da família?

• Que medidas você tomaria para começar a descobrir se


suas boas obras nascem do desejo de querer servir
desinteressadamente, ou se são provenientes do papel do
cuidador, motivado com a intenção de manter a paz ou de
se sentir bem consigo mesmo?

• Se foi parte da sua expenencia cuidar de um dos seus


pais, de que maneira você acha que isto o afeta hoje?

• Escolha uma ou duas das perguntas acima e compartilhe


as respostas com um amigo de confiança. Se você não
se lembra de nenhum, ore para que Deus aproxime
alguém de você - alguém com quem possa discutir as
respostas dadas a estas perguntas reflexivas. Ou talvez
você faça parte de um grupo - um grupo de estudo,
díscipulado ou de apoio - no qual possa compartilhar
suas respostas.

o questionário mencionado por Gretchen tem o título de


"Você é alcoólatras?" e contém o seguinte:

I,. lã j I J I; IiJ
Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento / 77

A .- .-

VOCE E ALCOOIATRA? SIM NÃO

1. Você falta ao serviço por causa da bebida?


2. A bebida está tornando sua vida em casa um inferno?
3. Você bebe porque é tímido?
4. A bebida está afetando sua reputação?
5. Alguma vez já sentiu remorso por estar bebendo?
6. Já passou por dificuldades financeiras por causa da
bebida?
7. Quando você bebe, procura companheiros sem reputação
e ambientes ruins?
8. A bebida faz com que você se descuide do bem-estar
de sua família?
9. Sua ambição de vida caiu desde que você passou
a beber?
10. Você tem de beber em determinada hora do dia?
11. Você tem desejo de beber na manhã seguinte?
12. A bebida faz com que você amenize as dificuldades?
13. Sua eficiência como ser humano caiu desde que você
passou a beber?
14. A bebida põe em risco o seu emprego?
15. Você bebe para fugir das preocupações ou dificuldades?
16. Você bebe sozinho?
17. Alguma vez já teve uma compLeta perda de memória
como resultado da bebida?
18. Seu médico já o tratou da bebida?
19. Você bebe para aumentar a autoconfiança?
20. Alguma vez já esteve mim hospital ou numa instituição
por causa da bebida?

I TOTAL

Se você respondeu sim a qualquer uma das perguntas, é forte


indicação de que pode ter algum problema com o álcool. Se você
marcou sim a duas das perguntas, tem claras tendências para o
alcoolismo. Se você assinalou sim a três ou mais perguntas, você
definitivamente tem um problema com o álcool. Em qualquer
circunstância, a melhor atitude é nunca fazer uso de bebida
alcoólica.
ICAPÍ1lJLO SFlS I
oModo como as Famílias Tendem aSer

Praticamente em toda igreja há uma fanu1ia considerada importante


e de destaque. É óbvio que essa farru1ia não tem problemas. Mas
ao refletir sobre o quanto as fanu1ias dos gigantes da fé lutaram
(tanto Abraão quanto Isaque ofereceram suas esposas aos monarcas
egípcios), podemos inferir que até a melhor das famílias também
comete erros. As seguintes características familiares ilustram o que
acontece quando as pessoas reagem fortemente com negação, culpa,
isolamento e atitudes cheias de ira para se protegerem.

Disciplina e Amor Inconsistentes


Se os pais não estiverem bem atentos, os filhos podem quebrar
a mesma regra dois dias seguidos e serem punidos num dia e
ignorados no outro. O que era bom na terça-feira, é ruim na
quarta-feira. Por nunca saberem como os pais irão reagir,
sempre que os filhos entram em casa logo verificam em que
nível se encontra o indicador de tensão. Tony nos conta sua
• A •

expenencia:

Minha mãe estava nertosa aquele dia, mas eu não sabia.


Como a maioria das crianças de nove anos, eu não podia

I·' .~
o Modo como as Famílias Tendem a Ser / 79

deixar que uma cremosa panela de calda de chocolate


endurecesse no balcão sem provar um pouco. Assim,
rapidamente passei o dedo num cantinho da panela,
enquanto minha mãe estava procurando algo na
geladeira.
Ela virou-se de repente e gritou: "Tony, quantas vezes
tenho de dizer para você não fazer isso?" Então puxou
meu cabelo com bastante força.
Fiquei ali atordoado. Meu rosto ardia e meu couro
cabeludo latejava. Corri para o quarto. Sabia que não
merecia tão dura punição.
Uma hora mais tarde, papai veio falar comigo: «Você
precisa entender que sua mãe está sob muita pressão. Não
seja tão duro com ela. Tente não aborrecê-la".
Mesmo sendo criança, tinha consciência de que minha
mãe estava errada por ter-me puxado o cabelo. Sabia que
papai não devia tê-la desculpado eposto a responsabilidade
em mim para compreendê-la. Era minha mãe que devia
ter-se desculpado. No entanto, comopoderia reclamar? Meu
pai e minha mãe eram o pastor e a esposa.
Às vezes meus pais eram pessoas agradáveis, mas eu
nunca podia saber o que irritava minha mãe. Em outro
dia, se eu tivesse enchido o dedo de calda de chocolate, ela
poderia ter rido e mexido meu cabelo.

Em nossa cultura, você mostra amor baseado na maneira


como se sente naquele momento, e não na consistência ou no
compromisso. Se as vidas dos pais vão bem, ou os filhos agem
de modo a orgulhá-los, demonstram amor pelos filhos. Se os
pais estão preocupados ou os filhos não obedecem, os pais
ficam absortos ou distantes. Nesse cenário, os filhos sentem-se
inseguros e não sabem o que pode acontecer. Se os pais só dão
atenção às suas próprias dificuldades emocionais, este amor e
disciplina inconsistentes geram um modo de vida instável.
80 / Curando as Feridas da Alma

Todavia, o amor e a disciplina estáveis são sinais da quase


perfeição, marca da qual os pais, de vez em quando, ficam aquém.
Em famílias que vivem próximas dessa meta, os filhos sabem esperar
conseqüências razoáveis pelos comportamentos errados e confiam
que os pais sejam justos. Estes aceitam os erros dos filhos e
comunicam que os amam, não importando o que aconteça. Então
a família inteira pode pôr as coisas em ordem e continuar vivendo.

Sentimentos Expressados de Maneira Inadequada


Enquanto alguns pais mantêm os sentimentos sob rígido controle,
outros expressam as emoções descomedidamente. Louvam em
excesso (apreciando além da conta o fato de o filho do vizinho
apanhar o jornal para os pais) ou criticam ferrenhamente (dando
sermões na família inteira durante dias e dias, só porque uma
ferramenta foi deixada na chuva). Essa atitude é transportada
para o relacionamento dos filhos com Deus. Estes o imaginam
como tendo as mesmas oscilações extremas de humor.
Explosões imprevisíveis de raiva assustama família inteira, incluindo
o cônjuge ofendido. Os membros da família desenvolvem um nível
de comportamento tão invariável que, quando alguém arrisca expressar
sentimentos profundos, suas palavras ou são ignoradas ou negadas,
com a declaração: "Não fique triste. Não é nada",
As crianças precisam expressar seus sentimentos, sobretudo
os de medo. Do contrário, sentem-se desesperançadas de que
algum dia suas necessidades sejam satisfeitas, vindo a cair em
pequenos furtos, a ficar só assistindo televisão ou a ingerir drogas.
Visto que "a esperança demorada enfraquece o coração" (Pv
13.12), elas enfrentam o desespero e a depressão como adultos,
mas não sabem por quê.

Fronteiras Violadas
Às vezes os pais invadem o espaço dos filhos e tomam conta
do seu mundo. Constroem a vida ao redor dos filhos e ficam
o Modo como as Famílias Tendem. a Ser / 81

emaranhados nos relacionamentos deles. À medida que os


filhos crescem, os pais não conseguem lhes dar liberdade
para viverem a própria vida. Os pais de Ruth Ann nunca
deixaram de controlá-la, por isso ela luta para encontrar sua
independência:

Tenho pedido à minha mãe que me dê umpouco de espaço.


Ela sempre me telefona para me dar conselhos - fique
com esse emprego, compre aquele sofá, mude para uma
casa mais perto. O que realmente me incomoda é que às
vezes vou mesmo pedir seus conselhos. Quando não o faço,
me pego pensando: ("E agora, o que é que mamãe me diria
para eu fazer?"
Dependo demais dos meus pais. Ano passado sofri um
acidente e meu carro foi rebocado para um posto de
gasolina. Não contei nada aos meus pais, porque estava
tentando ser independente, mas também não chamei a
companhia de seguros. Não conseguia imaginar o que
devia fazer - meus pais sempre tinham feito tudo por
mim. Além disso, tinham me dado a entrada para comprar
o carro (e, é claro, escolhido o carro também). O que iriam
dizer acerca dós prejuízos?
Finalmente, deram-se conta de que eu estava andando
de ônibus e me perguntaram sobre o carro. Imediatamente
meu pai chamou a companhia de seguros e foi ao posto de
gasolina para verificar o carro. Odeio ter de admitir que me
senti aliviada. Assusta-me pensar que subconscientemente
adiei fazer qualquer coisa, porque sabia que se esperasse
bastante tempo meuspais se encarregariam de tudopor mim.

Esta violação de fronteiras acontece por diversas razões. Uma


delas é que os pais têm pouco senso do propósito de vida dado
por Deus para cada ser humano, e tentam viver por meio dos
filhos. Sentem-se tão famintos de relacionamentos em que haja
82 / Curando as Feridas da Alma

verdadeiro significado, que procuram estreitar demais os laços


com os filhos. Arriscam todas as fichas emocionais neles.
Alguns pais violam as fronteiras dos filhos abusando deles
física ou sexualmente. (Uma em cada três mulheres e um em
cada cinco homens, nos EUA, foram abusados sexualmente.')
Depois de pouco tempo, essas crianças aceitam como normal o
fato de serem vítimas e esperam que os outros as tratem dessa
maneira desprezível. É comum tornarem-se alvos de professores
e dos brigões da escola, que sutilmente violam os limites da
sexualidade de suas presas com conduta e linguajar impróprios.
Os filhos, cujas fronteiras tenham sido freqüentemente
violadas quando crianças, ao tornarem-se adultos entram em
dificuldades, deixando que os outros decidam por eles e
escolham seus amigos. Não sabem como ser responsáveis e
independentes. Na maioria das vezes essas pessoas sentem
atração por igrejas autoritárias, que dizem aos membros
exatamente como devem comportar-se.
Outros que tenham sido envolvidos em situações difíceis
pelos próprios pais reagem desenvolvendo fronteiras rígidas
em demasia. Por não quererem jamais que eles sejam violados
outra vez, erguem espessos muros de granito ao redor de si
mesmos. Não deixam que ninguém entre em suas vidas para
travar relacionamentos, para influenciá-los ou para cuidar deles.
Essa violação de fronteiras, assim como as outras tendências
estudadas neste capítulo, ficam longe do modelo bíblico, que
exorta os pais a compreender os limites dos filhos e a respeitá-
los. Paulo advertiu os pais (o que evidentemente também se
aplica àqueles que cuidam de crianças) a não provocar ou irritar
os filhos, "para que não percam o ânimo" (Ef 6.4; Cl 3.21). Este
cuidado sadio os impede de imporem-se autoritariamente sobre
os filhos. Os pais que procuram ir em direção a essas metas
respeitam a privacidade dos filhos e batem na porta do quarto
antes de entrar. Querem o melhor para os filhos, mas não vivem
por meio deles.

l 1.1.11 I
o Modo como as Famílias Tendem a Ser / 83

Falta de Comunicação
"Não se fala sobre esse assunto em nossa casa", é a declaração
que comumente se aplica a conversas sobre sexo, dinheiro ou a
verdadeira causa da doença que matou a vovó. Se os filhos
fazem perguntas a respeito desses assuntos, é lhes dito que não
precisam saber das respostas. O filho encontra a mãe chorando
no quarto, mas ela lhe diz que não há nada de errado. Tias e
tios podem estar vivendo num asilo ou um irmão ou irmã pode
ter morrido no parto, mas nada disso é contado às crianças. Os
pais sempre estão tentando protegê-las, mas isso traz como
conseqüência a negação, porque elas sentem que há uma tristeza
no ar e consideram-se a causa.
Manter tantos assuntos às ocultas significa que as
conversas são cheias de códigos e significados secretos. As
pessoas tendem a falar passiva ou agressivamente, mas sem
convencer.

Comunicação Comunicação Comunicação


Passiva Agressiva Convincente

Você não diz Você diz aos gritos Você expressa


nada sobre aquilo aquilo que deseja ou necessidades e
que precisa ou precisa. desejos de maneira
deseja. calma e direta.

Uma comunicação franca e honesta ensina os filhos a falar a


verdade em amor (Ef 4.15). Eles sabem que mesmo quando não
têm sentimentos bons em relação aos outros, podem falar
abertamente sem serem repreendidos. Podem fazer perguntas e
observações de maneira gentil. Os filhos percebem que os pais
admitem os erros, mesmo que fiquem vulneráveis ao fazê-lo.
Isso ajuda os filhos a saber que também podem errar e continuar
vivendo.
84 / Curando as Feridas da Alma

Mentalidade de Sistema Fechado


Em famílias de "sistema aberto", os filhos se aproximam das
pessoas. Convidam outras crianças para brincar e têm amigos
adultos, como o líder do grupo da mocidade ou o chefe dos
escoteiros. Os pais não têm nada a esconder e seu permanente
desejo é crescer como pessoas. Para usar um termo do estudo
da biologia celular, a família age como "membrana
semipermeável" com idéias novas e saudáveis entrando e saindo.
Quando as famílias exibem mentalidade de "sistema fechado",
nunca dão boas-vindas à chegada de novas informações ou
idéias. As crianças sabem pelo exemplo que vêem nos pais que
não devem se aproximar de ninguém, sobretudo de adultos que
não sejam da família. Os pais teimam em persistir com o que
sempre acreditaram e não querem nem ouvir falar em livros ou
grupos que tratam da paternidade. Esse sistema fechado também
significa que as famílias têm o cuidado de não deixar que as
informações saiam. Guardam os segredos sobre o último drama
familiar ou acerca de comportamentos pouco comuns dos pais.

Tensão
O palco para um desenvolvimento capenga é formado na
infância, se os pais "nenês reis" se enclausurarem em suas
próprias tensões e deixarem de tratar os filhos com carinho.
Mesmo sendo pequeninos, os bebês captam as tensas mensagens
emocionais. Essa tensão, por sua vez, rouba das crianças as
tendências infantis de serem inquietas, brincalhonas e curiosas.
É como se deixassem de fazer os cursos básicos da vida -
Jardim I e Jardim II - e fossem empurradas prematuramente
para a fase adulta. Uma maneira de dissimular essa tensão é agir
como "crianças boazinhas".
Quando esses bebês tornam-se adultos, sobejam em
nervosismos. Empenham-se em agradar os outros e parecer
perfeitos. Tentam agir da maneira como acham que os adultos

.. I I.. • I ~ I l ... J I I I,J I


o Modo como as Famílias Tendem a Ser / 85

agem, mas acabam por ter de falsificar as emoções. Sobra pouco


tempo e energia para buscar a Deus.

Baixa Auto-Estima
Às vezes as crianças estão irritadas ou amarguradas, porque os
pais não as afirmam e elas nunca experimentam senso de
realização. Um pai pode até advertir o filho que recebeu alguma
distinção na escola: "Agora, não deixe que isso te suba à cabeça,
certo?" Alguns, todavia, depreciam ou criticam os filhos, porque
pensam que isto fará com que se esforcem mais. Não percebem
que aquelas pequenas palavras de encorajamento - "Bom
trabalho!" - são as peças que formarão o senso de realização
da criança. Sem isso, tornar-se-á um adulto sem a confiança
necessária para cumprir as metas e os sonhos que Deus colocou
em seu coração.
Outras vezes, as crianças desenvolvem um baixo conceito de
si mesmas, porque os pais nunca dizem nada. Eles permanecem
distantes, porque estão muito envolvidos em seus próprios
problemas ou porque não se sentem confiantes como pais. Não
sabem como abraçar ou disciplinar os filhos e têm medo de
cometer erros, por isso não tentam. Ainda há os que não se
prendem aos filhos, porque estes não estão entre as primeiras
prioridades de suas vidas. Os filhos praticamente se criam
sozinhos.
Se o humor dos pais varia excessivamente, do mesmo modo
é inconstante o desejo dos filhos em atingir um fim proposto.
Danielle recorda que sua infância - e sua auto-estima - eram
cheias de altos e baixos:

Quando meu pai estava trabalhando e minha mãe estava


feliz, eu conseguiafazerdissertações na escola ou competir
na equipe de ginástica. Tinha confiança e me esforçava
bastante. Quando meupai estava mau humorado e minha
86 / Curando as Feridas da Alma

mãe chorava bastante, minha atitude mudava. Não


telefonava para minhas amigas nem estudava muito.
Procurava por qualquer motivo para sair de casa. Muitas
vezes pegava minha bicicleta e saía pedalando pelos
campos. O vento soprava em meu rosto e secava as
lágrimas. Na maiorparte do tempo, eu sentia que era duas
pessoas diferentes. Às vezes, era expansiva e
despreocupada; em outras, arredia e cansada. Desejava
crescer logo e ir embora.
Quando fui estudar numa universidade de outra
região, a princípio tive medo, mas depois comecei a
conversar com as pessoas e a me envolver. Meus professores
e supervisores raramente me repreendiam, mas quando o
faziam, eram calmos. Pela primeira vez me sentia como
uma pessoa viva e comunicativa.

Isto não quer dizer que a auto-estima para o crente esteja


baseada em suas próprias realizações. Nossa auto-estima
está fundamentada no imutável amor de Deus por nós. A
resposta para aquela pergunta de vital importância - O
que devo jazer para me sentir amado? - é nada. Nós já
somos amados por Deus, mas é complicado transmitir isto
para uma criança, porque ela quer ver e tocar os braços de
Deus. Adultos que agem com consistência e amor tornam
as coisas mais fáceis.

Desenvolvimentos Atrasados
Crescer numa família cheia de desavenças pode afetar o
desenvolvimento emocional, intelectual e social. Por exemplo,
crianças criadas em famílias alcoólatras apresentam maiores
problemas relacionados à disposição de espírito, conformismo,
relacionamentos, capacidade de liderança e estabilidade
emocional.' Outros estudos mostram um aumento da depressão,"
o Modo como as Famílias Tendem a Ser / 87

hiperatividade," agressão," vaidade' e dificuldades legais quando


crianças e adultos. 7
O estresse também dificulta as crianças a alcançar seu
potencial intelectual. Em recente estudo sobre como o estresse
afeta o cérebro, pesquisadores descobriram que submetendo
ratos por longos períodos de tempo a hormônios associados ao
estresse, ocorreu uma atuação contrária à habilidade cerebral
de aprender e lembrar," Isto pode explicar a razão porque as
crianças não conseguem se concentrar quando os pais estão
discutindo. Param de fazer a lição de matemática para escutar.
Sobre o que será que estão discutindo desta vez?, perguntam-se.
Será que vão se divorciar? E se isto acontecer, ficarei com a mãe
ou com o pai? Ficam tão absortas em seus pensamentos, que
não aprendem os princípios matemáticos fundamentais para o
bimestre seguinte.
O estresse também afeta a maneira como a personalidade
das crianças se desenvolve. Por exemplo, o psicanalista Erik
Erikson observou que as crianças se especializam em aprender
certas áreas de desenvolvimento durante fases específicas da
vida. Eis uma versão simplificada de como essas áreas e fases se
correspondern.?

FASES DA VIDA ÁREAS DE DESENVOLVIMENTO


Positivas Negativas
Bebê (0-2) Confiança Falta de Confiança
Infância (2-4) Autonomia Vergonha & Dúvida
]uniores (5-7) Iniciativa Culpa
Pré-Adolescência (8-12) Indústria Inferioridade
Adolescência (13-22) Identidade Alienação

É possível que, quando as crianças passem por traumas


durante uma dessas fases da vida, não desenvolvam a
correspondente área de desenvolvimento de maneira tão
88 / Curando as Feridas da Alma

completa quanto deveriam. Se quando você tinha seis anos


ocorreu uma crise temporária em sua família (o pai de sua mãe
morreu e ela se retirou para chorar a dor por mais ou menos um
ano), pode ser que você tenha falta de iniciativa. Dependendo
da época em que ocorreram as experiências negativas em sua
infância, talvez - em um grau ou outro - você sinta falta de:

• Confiança (de confiar na integridade, capacidade e boa


vontade dos outros).
• Autonomia (de sentir-se confortavelmente independente).
• Iniciativa (de tornar-se iniciador de fatos).
• Indústria (de trabalhar com afinco, de terminar o que
começou).
• Identidade (de sentir o que sabe e de gostar de quem é).

Estas áreas de desenvolvimento também afetam nossa vida


espiritual. Como podemos desenvolver um progressivo
relacionamento com Deus, se é difícil confiar em alguém? Como
podemos evitar concordar com a multidão, quando nosso senso
de autonomia é pequeno? Como podemos falar com um amigo
acerca de Deus, quando temos uma iniciativa atrofiada? Como
podemos terminar o que começamos, quando nosso senso de
indústria não está desenvolvido? Como podemos buscar a Deus
na escolha de uma profissão ou de um cônjuge, sem termos
senso de identidade? Deus está interessado em que aprendamos
estas áreas de desenvolvimento, porque fazem parte do modo
como nos relacionamos com Ele, com as outras pessoas e com
o mundo. A história de Carolyn ilustra isto:

Carolyn está lutando para salvar seu casamento. Ela quer


confiar no marido, mas ele sente que a mulher hesita e
questiona os seus motivos constantemente. Quando
Carolyn discutiu isto com seu conselheiro, elelheperguntou
acerca de sua infância. Carolyn recordou que quando

.;J.l .1.. L , . ,.1 11, li _L J ,.,. ~ i~~i .. ~ IdlLl


o Modo como as Famílias Tendem a Ser / 89

era criança, seus pais se divorciaram. Então ela foi


questionar sua mãe e descobriu que naquela época sua
mãe e seu pai discutiam bastante. O subseqüente
tratamento silencioso que eles impuseram um ao outro foi
também estendido para a filha.
O terapeuta de Carolyn obseruou que esta poderia ser
uma das várias razões porque Carolyn desenvolveu um
senso de confiança limitado e inconsistente. Como uma
flor recém-aberta que tenha sido pisada, assim Carolyn
continuou a crescer, mas estavaferida. Outras experiências
ocorridas durante seu crescimento também a ensinaram
a não confiar, até que hoje, como adulta, seu senso de
confiança é limitado. Ela quer fazer com que seu
casamento dê certo, mas é um trabalho por demais grande,
por causa de sua constante falta de confiança.

Identificar áreas de conflito não é licença para culpar os pais,


mas serve para encontrarmos lugar onde possamos começar a
buscar a cura de Deus para nossas vidas.

Vislumbres da Graça
Um sistema familiar aberto permite que os filhos tenham um
visl umbre de como as outras famílias vivem. As crianças ficam
chocadas quando vão pernoitar na casa de amigos e descobrem
que as outras famílias falam e riem. Mal conseguem entender
um mundo que seja assim tão genuinamente cheio de paz ou
divertimento. Freqüentemente procuram passar mais tempo com
esses amigos para descobrir que há fronteiras mais adequadas
na vida - aquilo que é pessoal demais, aquilo que é ofensivo.
Outras vezes, as crianças ficam por algum tempo com a família
de um parente ou de um vizinho, que as leva para passear e as
recebe em casa. Quando as crianças experimentam esta interação
familiar sadia, têm a vontade despertada para fazer as coisas de
90 / Curando as Feridas da Alma

modo diferente. Iniciam seus comentários mais ou menos assim:


"Quando eu crescer, vou ser como..." Mal sabem que seus corpos
e mentes já estão configurados, de modo que provavelmente
repetirão os mesmos procedimentos que aprenderam com suas
famílias, a menos que se submetam a um processo de exame de
consciência e aprendam novas ferramentas para se entregar a Deus.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Se não sou nem um pouco parecido com minha mãe ou
pai "nenê rei", então nada disso me afeta, certo?
R A maioria de nós tenta ser o oposto de nossa mãe ou pai
"nenê rei". Pode ser que não tenhamos os mesmos
comportamentos exteriores (temperamento esquentado, tom
exigente de voz), todavia ainda temos os mesmos impulsos
interiores, a mesma tristeza e a mesma raiva, que mantemos
seguramente ocultos debaixo de uma conduta mais calma.
Ou, ao invés de sermos criticas e autoritários, reagimos sendo
fracos e permissivos. O sistema familiar afeta todos os seus
membros, embora cada um reaja de maneira diferente, segundo
sua personalidade e os papéis que lhe são deixados pata exercer
na família (vide o Capítulo 7). É como se estivéssemos mudando
de lugar no Titanic -tcx:los fazemos parte do mesmo problema,
só que de uma perspectiva diferente.

P Fico frustrado com meus filhos. Será que isto significa


que tenho um problema?
R É normal haver dias bons e dias maus em relação aos
filhos. Ninguém é perfeito. O que importa é a freqüência
e a severidade da ira. Você é um pai ou mãe que
disciplina dando conseqüências, em vez de ventilar a
ira? Quando os pais realmente agem com ira, mas depois
admitem o erro, mostram aos filhos como enfrentar os
erros e, em geral, ganham o respeito deles.

II.k j I
o Modo como as Famílias Tendem a Ser / 91

P Meus pais não me elogiavam nem me incentivavam. De


que forma isto pode estar me afetando hoje?
R As crianças desenvolvem iniciativa e indústria quando
são elogiadas naquilo que fazem certo e quando não são
ridicularizadas quando cometem erros. Em nossa cultura,
os pais tendem a criticar os filhos quando erram. Os pais
refletem o amor de Deus quando incentivam os filhos,
quer tenham sido bem-sucedidos, quer não. Isto os ensina
que o importante é tentar, e não ganhar ou perder.
A falta de incentivo na infância nos afeta quando adultos,
porque somos muito severos julgando-nos a nós
mesmos. Tornamo-nos perfeccionistas, tentando provar
que somos bons o bastante. Em vez disso, devemos
construir relacionamentos nos quais sejamos aceitos e
possamos errar sem ser condenados.

P E se eu não me lembrar de nada sobre minha infância?


R Uma maneira de começar é observar crianças
brincando. Vá a um parque e veja como as crianças
são simples, deixam ser ensinadas e mostram
confiança. Pense: Qual é a minha primeira lembrança
positiva? E a minha primeira lembrança negativa? Eu
tinha um animal de estimação? De que sons eu me
lembro?
É importante não fazer isto sozinho. Mostre suas fotos
de infância para os outros e conte-lhes como você era.
(Se sua infância foi particularmente dolorosa, talvez você
precise de um terapeuta para ajudá-lo a lidar com os
temores que surgem.) Dentro do coração daquela criança
da foto existem grandes esperanças e talvez até
qualidades florescentes que foram reprimidas. Se foi
Deus que as plantou, Ele pode ajudá-lo a recuperá-las
outra vez.
92 / Curando as Feridas da Alma

Reflexão Pessoal
Responda as perguntas a seguir o mais honestamente
possível. Mas antes faça uma breve oração a Deus, pedindo
que Ele revele qualquer coisa que você precise saber. Se
você estiver participando de um grupo ou estiver
compartilhando as respostas com um amigo, escolha as
perguntas que você se sente mais confortável para responder
em grupo.

• Na sua opinião, você acha que tem tendência a ser passivo,


agressivo ou convincente? (Veja o quadro na seção "Falta
de Comunicação".) Talvez você se comporte de maneira
diferente em situações diferentes.

• Nomeie uma situação na qual você gostaria de ser mais


convincente - declarando suas necessidades e desejos de
maneira calma e direta.

• Escreva um ou dois parágrafos sobre como você acha que


as pessoas reagiriam nessa situação. (Talvez você queira
comprar um diário ou arranjar um caderno velho onde
possa escrever seus pensamentos.)

• Às vezes você sente que Deus tem mudanças de humor?


Como você acha que esta resposta se relaciona com sua
vida e o modo como você foi criado em família?

'Ll .oi j J • I J _,~ j J .loiII&. l J, JIJ I


oModo como as Famillas Tendem aSer / 93

• Fora de sua família, quais foram as pessoas adultas que


mais influenciaram sua vida - para bem ou para mal? De
que maneira ajudaram ou prejudicaram odesenvolvimento
de sua confiança, independência, iniciativa, indústria ou
senso de identidade?


• Com que tipo de pessoa você se sente mais à vontade?
Por que você acha que isso é assim? Será que não tem
nada a ver com sua infância?

• Olhe algumas fotos suas quando criança. (Pegue as mesmas


que usou no Capítulo 4.) Você vê qualidades florescentes
colocadas por Deus e que por alguma razão possam ter
sido reprimidas? Peça que Deus lhe mostre aquelas áreas
em sua vida que por muito tempo não foram aproveitadas.
I CAPínJLo SETE I
Papéis que Desenvolvemos na Infância

Os membros da família Wells são os pilares da igreja. Nunca


perdem um culto e sempre estão dispostos a ajudar. O pai é
carteiro de tez avermelhada e faz parte da mesa diretora da
igreja. A mãe, alta e ereta, é professora e todos os anos dirige a
Escola Bíblica de Férias.
Muito embora tenham os mesmos valores e os dois sejam
interessados na igreja, não são afáveis um com o outro. A mãe
freqüentemente faz objeções às decisões tomadas na igreja e
diz ao pai como mudá-las. "Não quero causar desavenças", é o
que ele lhe responde na maioria das vezes, mas então, só para
contentá-la, dá algumas alfinetadas nas reuniões.
Sua filha mais velha, Melissa, segue o exemplo da mãe. Limpa
a casa todos os sábados e ensina na Escola Dominical desde os
doze anos. Melissa tira excelentes notas no colégio e ocupa um
cargo público no corpo discente. É ela que cuida dos irmãos
quando os pais vão aos cultos à noite.
David, o segundo filho, nunca gostou de ir à escola. Nâo
gosta de Melissa e lhe diz que ela age como uma velha. David
faz piadas das calorosas discussões que se ouvem atrás da porta
do quarto dos pais. Sente repugnância pela obediência cega do
Papéis que Desenvolvemos na Infância / 95

pai à mãe. Alguns anos atrás os amigos de David começaram a


usar roupas características de gangues de rua e facas. David fez
o mesmo - parecia uma boa maneira de ser ele mesmo. Isto
causa confrontações com os pais, mas ele gosta dessas brigas.
"Pelo menos eles tiram a máscara de crentes", diz David.
Cindy, a outra filha, também ouve todo o tumulto atrás das portas
fechadas, mas deixa passar. Todo o mundo diz que Cindy é tímida e
meiga, mas ela não tem muitos amigos. Nunca está cercada pelas
poucas amiguinhas, porque a mãe é muito controladora. A maior
parte do tempo Cindy fica no quarto, pintando. Uma vez chegou a
exigir um cachorrinho, mas a mãe não deixou, porque segundo ela
os cachorros são barulhentos e fazem bagunça. O pai deu à Cindy
um canário, o qual ela trata como criança e o mantém no quarto.
Gary, o mais novo, vê as feridas ricocheteando de um lado
para o outro entre a mãe, o pai e David, e faz o que pode para
melhorar as coisas. Quase sempre procura defender o pai e,
naquela ocasião em que este falou de divórcio, Gary passou a
noite procurando dissuadi-lo. Gary gosta de passear de carro só
com o pai, porque assim têm a chance de conversar.
Os filhos procuram meios de receber a atenção dos pais (ou de
evitar a atenção negativa) e, sem o perceberem, estão desenvolvendo
um papel na família. Isto lhes dá um senso de consistênda, previsibilidade
e segurança. Lamentavelmente, na grande maioria das vezes ficam presos
a esse papel e, quando adultos, tomam-se pessoas de quem não gostam
muito. Os filhos dos Wells adotaram os seguintes papéis.'

o Responsável
Em meio ao caos, eu me esforçarei ao máximo, e
assim as pessoas me amarão.

Seja como for, o filho mais velho é na maioria das vezes o


responsável, mas numa família cheia de negação, culpa;
isolamento e explosões de ira, torna-se duas vezes mais. Também
96 / Curando as Feridas da Alma

chamado de "o herói", o filho responsável toma conta dos irmãos


mais novos, como Melissa faz. Às vezes chegam até a tomar
conta dos pais. Com dez anos de idade, aconchegam o pai
alcoólatra na cama ou fazem o almoço para toda a família.
Entre as tarefas comuns do dia-a-dia desses filhos
responsáveis, incluem-se tirar 10 nas provas, ajudar o professor
depois da aula e cuidar da lavagem da roupa quando chegam a
casa. Os pais têm orgulho por são "filhos que não dão problema",
em virtude do comportamento maduro. Se famílias como os
Wells são advertidas a buscar aconselhamento, objetam: "Como
você pode dizer que há problemas em nossa família? Olhe para
Melissa. É uma aluna exemplar, que só tira notas altas. É líder
de torcida. Freqüenta os cultos, participa das atividades da igreja.
Uma família com problemas teria uma filha igual a ela?"
Quando os filhos responsáveis tornam-se adultos, pode ser
que não queiram constituir família. Suzanne, a filha responsável
em uma família alcoólatra, ajudou a criar duas irmãs mais novas
(ambas ficaram grávidas na adolescência) e um Irmão mais novo,
que cometeu suicídio. Antes de se casar, advertiu seu noivo:
"Não quero ter filhos. Já criei três e eles se deram mau na vida".
No local de trabalho, os filhos responsáveis adultos são bem-
sucedidos, mas sentem-se inseguros. Talvez sejam rígidos e
controladores com muito pouca percepção interior da razão de
fazerem o que fazem. Alguém tem de organizar o mundo,
pensam. E serei eu. Tragicamente, tomam para si a
responsabilidade e passam a vida inteira se provando.

o Criador de Casos
Em meio ao caos, eu serei o problema, e
assim as pessoas me notarão.

Estas crianças comportam-se mal e exteriorizam as aflições


internas da família. Por conseguinte, é freqüente serem elas o

tl • ...L .lI.ll. 1.L1 ILI.i- ~ ~ t, li Id~ ,I0Il. L 11ÜI,~ I. > .~


Papéis que Desenvolvemos na Infância / 97

problema em consideração, quando a família parte em busca de


aconselhamento. Pelo fato de a família Wells encarar David como
o problema e de não compreender tratar-se da família que está
com problemas, este papel também é chamado de "bode
expiatório". Quando o conselheiro pergunta à família Wells como
é uma típica noite em casa, David vai direto ao ponto da questão,
dizendo que ninguém pode falar o que realmente pensa ou
sente. Não admira que esta criança seja considerada a ovelha
negra da família.
A família não se dá conta de que as crianças criadoras de
casos, que saem de casa, recusam-se a comer, ficam grávidas ou
destroem o carro, agem assim por causa do desejo de serem
reconhecidos, amados e aceitos pelos pais. Como todo o mundo,
querem saber o que tem de ser feito para se sentirem amadas. A.
conclusão que chegam é que não é possível obter atenção
positiva, de modo que se envolvem em dificuldades, achando
que a atenção negativa acalmará a ânsia que sentem.

Compreender os papéis que desempenhamos em nossa família ajuda-nos a


descobrir a razão de tratarmos os outros da maneira como o fazemos.
98 / Curando as Feridas da Alma

Quando atingem a idade adulta, os filhos criadores de casos


freqüentemente ficam viciados em emoção. Vão de um
relacionamento para o outro sem se comprometerem com ninguém.
Aborrecem-se com facilidade e não gostam de controlar os impulsos
ou de esperar por nada. Têm simpatia por ambientes novos e
sujeitos a variações, por isso ficam mudando periodicamente de
um lugar para o outro, sem nunca encontrar um lar.

A baixa tolerância às frustrações dos filhos criadores de casos


é a característica que os torna destrutivos. De todos os filhos,
são os mais prováveis de serem alcoólatras ou dependentes de
drogas. Não obstante, são os que têm as melhores chances de
trabalhar o passado, porque não tomaram parte na negação da
família. Identificam os problemas e buscam ajuda.

o Ajustador
Em meio ao caos, eu me desligarei das pessoas, e
assim não me incomodarão.

Algumas crianças são feridas tantas vezes na infância que nunca


mais se arriscam a nada. Fazem ajustes em suas expectativas
por terem aprendido que não conseguirão satisfazer suas
necessidades. "Por que tentar?", é o lema delas.
Os filhos ajustadores geralmente se distanciam da família com
o fim de se tornarem a criança "perdida". Na família Wells, Cindy
se afasta ficando no quarto e brincando com o canário. Também
é hábil em desenhar, um passatempo que vem bem a calhar
porque lhe oferece um mundo com o qual pode lidar. Mesmo
na presença da família, ela está ausente, e nunca dá atenção às
subjacentes correntes cheias de tensão que a cercam. Para todos,
ela é invisível.
Quando os ajustadores ficam adultos, é difícil para eles
viverem com outras pessoas e se sentirem seguros. Pode ser

J J. j, , I II • I • J .iJl;1L L .. , I ,I II li. I J •• .1 i.l; .. I Jdlti I., il~


Papéis que Desenvolvemos na Infância / 99

que permaneçam sem se envolverem com ninguém. Passaram


tanto tempo alheios a tudo, que é difícil voltar atrás e continuarem
se sentindo satisfeitos.
Na maioria das vezes, os ajustadores reproduzem o ambiente
familiar e se casam com alguém que mantenha suas vidas em
alvoroço. Se a situação ficar muito complicada, fazem o que
sempre fizeram: saem. Isto pode significar ir de casamento em
casamento, ou de igreja em igreja ou de emprego em emprego,
sempre procurando um lugar que os faça se sentirem satisfeitos.

o Apaziguador
Em meio ao caos, eu farei com que as pessoas se sintam melhor,
assim irão me amar.

Os filhos apaziguadores agem como consoladores, juízes e até


conselheiros matrimoniais. São hipersensíveis aos sentimentos
dos outros e compreendem bem as pessoas. Tentam resolver os
problemas, como Gary. Quando a mãe fica aborrecida com o
pai, Gary ouve suas queixas e depois pleiteia diante dela a causa
do pai. Seu papel de apaziguador tornou-se tão digno de
confiança que os outros membros da família levam até ele seus
problemas.
Alguns apaziguadores "resolvem" os problemas da família
fazendo com que riam. Esta versão de apaziguador é chamada
de "mascote" ou o "palhaço da família". Quando a família Wells
está passando por problemas realmente difíceis, Gary entretém
a mãe e as irmãs propondo maneiras ridículas de tirar o lixo da
cozinha. Se David tem um de seus acessos de raiva, Gary distrai
a família contando uma história engraçada que aconteceu na
escola.
Quando ficam adultos, é freqüente tornarem-se cuidadores.
Deixam-se ser levados pelos outros e sacrificam-se a ponto de
negligenciar as próprias necessidades. Há os que confiam tanto
100 / Curando as Feridas da Alma

nos apaziguadores·que muitas vezes os culpam quando as coisas


saem erradas. "Foi o que você me disse para fazer e não deu
certo!", reclamam. Então o magnânimo apaziguador se culpa.
Pode ser que lamentem a situação, mas pouco fazem a
respeito, porque pensam que esta é a sua sorte na vida. Caso
envolvam-se em relacionamentos nos quais as pessoas queiram
satisfazer-lhes as necessidades, sentem-se deslocados. Chegam
até a sair desses relacionamentos sadios, porque não conseguem
se ajustar.
Três destes quatro papéis são "crianças boazinhas", o que
explica porque muitas famílias com tendências subjacentes a
negar, culpar, isolar-se e irar-se parecem ser o contrário. Os
responsáveis mantêm a paz, os ajustadores encontram sua própria
paz e os apaziguadores negociam a paz, enquanto que os
criadores de casos perturbam a paz.
Estes três papéis de "crianças boazinhas" também são
susceptíveis de perfeccionismo. O responsável, quando adulto, é
obcecado em fazer com perfeição o tipo de coisas que fazia quando
criança - obter sucesso na escola (trabalho), manter a casa
arrumada, cuidar dos filhos. Os apaziguadores se martirizam
quando não conseguem curar as feridas de todo o mundo. Os
ajustadores não têm tanta preocupação com o perfeccionismo,
exceto no que diz respeito às suas áreas de fuga. Cindy, por
exemplo, tem de fazer todos os desenhos com absoluta perfeição,
senão ela os rasga. Os atletas sempre têm de alcançar determinados
metas, sempre têm de marcar um ponto ou um gol.

Descobrindo o Verdadeiro Eu
Compreender os papéis que desempenhamos na infância e ainda
desempenhamos hoje ajuda-nos a descobrir por que tratamos
as pessoas deste ou daquele modo e por que interpretamos mal
os propósitos de Deus para nós, se tais propósitos entram em
conflito com o nosso papel. Os criadores de casos não fazem

.• I I i I I, II , . . . . . . .L kl" ;,' .11.11. I . j IIh .. I Illil,


Papéis que Desenvolvemos na Infância / 101

ajustes nem tentam ser responsáveis. Os apaziguadores e os


ajustadores não exteriorizam seus sentimentos e desejos.

Descubra que Papel- ou Papéis - Você Desempenha


Pode ser que, você imagine adaptar-se primeiramente a
determinado papel e, em segundo lugar, a outro. Algumas
crianças, principalmente os filhos únicos, chegam a absorver
um pouco de cada um dos papéis ou fazem uso de dois ao
mesmo tempo. john, cujo pai exercia a medicina, era o filho
responsável em casa, na igreja e com certo grupo de amigos na
escola. Mas havia outro tipo de amigos na escola com os quais
desempenhava o papel de criador de casos, ingerindo drogas.
Sua família nunca descobriu seu segredo. Cresceu, tornando-se
adulto responsável com "cara de santo", mas nutria um desejo
secreto por pornografia como maneira de chamar a atenção.
E se você não se lembra que papel desempenhou? A princípio,
pode não ser tão óbvio. Ouça as histórias que sua família lhe
conta. Talvez você identifique os papéis desempenhados pelos
seus irmãos e então poderá ver-se a si mesmo. Descobrir o
papel que você desempenhou poderá chocá-lo. É parecido com
ouvir pela primeira vez o som de sua voz gravada numa fita de
áudio. Esse sou eu?, você pergunta.

Determine como você ainda está desempenhando seu papel


A conclusão lógica é que após os filhos crescerem e saírem de
casa, deixarão de desempenhar os papéis desenvolvidos na
infância, porque não precisarão mais deles. Mas não é bem assim
que as coisas acontecem.
Como adultos, usamos nosso papel de infância no trabalho,
na igreja e em nossas famílias. As novas situações da vida podem
não exigir isso de nós, mas nos sentimos satisfeitos no
desempenho desses papéis. Temos esculpido tão bem estes
102/ Curando as Feridas da Alma

nichos para nós mesmos, que ficamos presos neles. Veja como
Dan fez isso:

Há quinze anos) meu pai quase morreu de cirrose hepática.


Minhas três irmãs mais velhas e eu ficamos sentados ao seu
lado por muitas horas no hospital. Ele mal conseguia vencer a
provação. Durante toda essa situação penosa) eu) um
apaziguador, agi como o conselheiro dafamilia. Ouvia minhas
irmãs. Reafirmei a confiança de uma delas) dizendo-lhe que
não havia decepcionadopapai. Disse à outra o quanto sesaíra
bem ao tomarconta de mim. Encorajeia mais nova mostrando-
lhe todas as suas grandes qualidades) que eram como as de
papai. Depois me dei osparabénsporestardemonstrando tanto
cuidado e carinho) embora me sentisse tão mal.
Depois que minhas irmãs e eu levamos nosso pai para
casa) elas pareceram ter paz) mas eu me sentia inquieto
por dentro. Fui ao ginásio ejoguei basquetebol com extremo
rigor. A transpiração me escorria pelas costas e minhas
meias estavam ensopadas de suor. Com para o chuveiro.
Sozinho) meus sentimentos me venceram. O que seria
sepapai tivesse morrido? Sentia tanto medo e tanta solidão.
Chorei desconsoladamente como nunca antes fizera na
vida. O ruído do chuveiro mal encobria meu pranto.
Sentia-me da mesma maneira que me sentia quando
menino) sabendo que meu pai estava se matando com a
bebida. Não havia nada que eu pudesse fazer então; não
havia nada que eu pudesse fazer hoje.
Também chorava por mim mesmo. Onde estavam
minhas irmãs quando precisava delas? Como sempre) nem
desconfiavam que eu estavaferido por dentro) porque não
conseguia compartilhar minha dor com elas. Queriafalar
com elas e dizer o quanto estava amedrontado) mas não
podia. Não era esse o meu papel- eu era apaziguador.

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Papéis que Desenvolvemos na Infância / 103

Tinha de sofrer sozinho. Foi então quepercebi que o papel


de apaziguador estava me colocando num estilo de vida
solitário demais para suportar.

Nossos papéis também estorvam nossos relacionamentos. Não


podemos parar de desempenhar nosso papel com nosso cônjuge
e amigos. Os responsáveis freqüentemente não deixam que o
cônjuge leve a parte da carga que lhe cabe. Os criadores de
casos querem que o cônjuge leve tudo. Os ajustadores não falam
sobre seus problemas com os amigos e os apaziguadores tentam
resolver os problemas dos amigos com soluções simplistas.

Questione suas tendências a gostar de determinado papel nas


situações do dia-a-dia
Ao invés de agirmos com o piloto automático sempre ligado em
nossos papéis, podemos estabelecer contínuas conversações com
Deus. Devemos lhe perguntar se estamos nos comportando de
determinada maneira, porque é Ele quem nos dirige, ou porque
é assim que nosso papel nos manda fazer.

• O responsável deve perguntar a Deus: Estou ajudando


esta pessoa, porque tu) meu Deus) estás me dirigindo a
agir assim? Ou porque esta situação me dá a fama de
que preciso para me sentir amado?
• O criador de casos tem de perguntar a Deus: Estou
criandoproblemas no trabalho) porque tu tens me levado
a ver que alguém precisa trazer à baila essesproblemas?
Ou porque sei que chamará a atenção das pessoas?
• O ajustador necessita perguntar a Deus: Estou me esquivando
desta amizade, porque tu tens me mostrado como esta pessoa
está prejudicando o meu reiacionamenio contigo? Ou porque
estou morrendo de medopore;tarmeaproxirnandodealguém?
104 / Curando as Feridas da Alma

• O apaziguador precisa perguntar a Deus: Estou ouvindo


com simpatia esta pessoa) porque Tu me colocaste no
caminho dela para ser seu amigo? Ou porque "ajudar"
as pessoas me faz sentir importante?

Compreender o papel que desenvolvemos na infância é um


processo que dura a vida inteira, pois temos de buscar a vontade
de Deus para nossa vida e fazer escolhas diferentes em termos de
comportamento. Podemos até fazer algumas provas,
desempenhando em determinadas situações um papel diferente
do nosso, para depois ficarmos esperando se Deus nos mostra o
que nos é mais apropriado. Tão logo identifiquemos o
comportamento de nosso papel, devemos voltar e corrigi-lo. Por
mais difícil que tenha sido para Dan, quando chegou em casa
chamou a irmã mais velha e lhe disse o quão repassado de mágoa
se sentia em relação ao pai. Fez isto, porque sabia que ela era a
filha responsável da família, e que, portanto, compreenderia melhor
do que as outras irmãs o quanto se esforçara em tomar conta das
pessoas. Também sabia que ela não entenderia tudo o que estava
dizendo, mas foi um passo importante o fato de sair de seu papel
de apaziguador ao compartilhar sua dor com outra pessoa.
À medida que cada um de nós descobre nosso verdadeiro eu,
passamos a pensar de maneira diferente: Em meio aosproblemas,
pedirei a Deus que me mostre como me comportar em cada tipo
de situação e depoispedirei sua ajuda para obedecer.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P As crianças nunca mudam de papéis?
R Os papéis podem mudar à medida que as crianças
crescem. Nos anos de infância, você desempenha um
papel e depois, na adolescência, pode desempenhar
outro. Quando o responsável sai de casa, outro pode
preencher o lugar vago.

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Papéis que Desenvolve:m.os na Inf"ancia / 105

P Acho que minha chefe é responsâoel e apaziguadora, e estou


farta da maneira como ela cuida de mim. O quefaço?
R Com a maior serenidade possível, exerça sua independência.
Quando ela insistir em lhe dizer como determinada coisa
tem de ser feita, diga: "Isto funciona muito bem com você,
mas acho que posso fazer um trabalho melhor de outra
maneira". Se ela fizer sugestões e oferecer conselhos sobre
sua vida pessoal, diga: "Agradeço sua preocupação. Estou
considerando outras possibilidades, mas também levarei
em conta o que você acaba de me dizer". Pela razão de
você compreender um pouco da armadilha em que ela se
encontra no desempenho de seu papel, você está melhor
preparado para orar por ela. Isto também traz algum consolo
à sua frustração.

P O que há de errado em serperfeccionista?


R Esforçar-se para fazer o melhor pode ser algo desejável.
Como o apóstolo Paulo, prosseguimos "para °
alvo,
pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo
Jesus" (Fp 3.14). A questão não são os atos, mas os
motivos e os impulsos. O motivo correto para fazermos
o melhor que pudermos é o nosso amor a Deus. Nossos
atos tornam-se perfeccionistas no momento em que
não sabemos como lidar com nossos erros. Se não
fazemos com perfeição, não seremos amados por nós
mesmos ou por Deus. Nisso há pouco espaço para
erros. Quando erramos, não conseguimos nos
recuperar, porque já não nos sentimos mais amados
_quando cometemos erros. Também estaremos sendo
perfeccionistas, quando nossos esforços tornam-se uma
questão de orgulho. Em algum lugar dentro de nós
ecoa o pensamento: Sempre faço as coisas certas. As
pessoas me respeitam, porque faço as coisas certas e
assim por diante.
106 / Curando as Feridas da Alma

P De que maneira aquieto minha tendência a


desempenhar meu papel e tento ouvir melhor a Deus?
R Quando desligamos o piloto automático do
comportamento ditado pelo nosso papel, toda situação
torna-se uma oportunidade para buscarmos a Deus e
obedecê-lo. À medida que pomos de lado as ações e
palavras que nosso papel nos manda fazer, podemos
obter um senso de quietude. Neste contexto, é mais fácil
sentirmos a direção de Deus quando fazemos escolhas.
Essa serenidade pode ser difícil de se conseguir. Jan descobriu
que seu papel era tão autoritário, que fez o seguinte:

Certa feita) assim que me ouvi falar num grupo de apoio,


fiquei ciente de quão displicentemente eu dava conselhos e quão
facilmente criticava as pessoas. Eu era ferrenha apaziguadora.
Não sei de onde, peguei a idéia de quepor trinta dias não tentaria
dar conselhos ou oferecer minha opinião a ninguém, só para
ver o que aconteceria. Declarei minha intenção ao grupo e até
me responsabilizei diante de todos.
O mês seguinte foi tenebroso. Contive-me de dar conselhos e
criticar, mas ainda assim ouvia as palavras em minha mente.
Muitas vezes saí para ficar sozinha, colocar em ordem esses
pensamentos e apresentá-los diante de Deus. Será que realmente
teria ajudado aquelapessoa, se eu lhe tivesse apresentado minhas
observações? Era o que freqüentemente perguntava para Deus.
Todavia, o fato que mais me surpreendeufoi que em meu silêncio
exterior descobri que escutava as pessoas com muito mais
atenção. Ganhei maior empatia delas.
Sempre acreditei que um dospropósitos de Deus para a minha
vida foi encorajar as pessoas, mas agora vejo que, ao invés de me
ajudar, meu procedimento de apaziguadora me atrapalhou. Sentia
a compulsão de resolver os problemas de todo o mundo - ao
menos até a próxima terça-feira - e verdadeiramente não tinha
um ouvido pronto para ouvir como hoje tenho.

J •• lo ~ I i l ~ .' 011. I, I i I , i Li I~, lJ. I J >, ,.. ur , • ~ lJ JI.,~


Papéis que Desenvolvemos na Infância / 107

Reflexão Pessoal

Responda as perguntas a seguir o mais honestamente possível.


Mas antes faça uma breve oração a Deus, pedindo que Ele
revele qualquer coisa que você precise saber. Se você estiver
participando de um grupo ou estiver compartilhando as
respostas com um amigo, escolha as perguntas que você se
sente mais confortável para responder em grupo.

• Que papel ou papéis parecem familiares a você?

• De que maneira você diria que seu papel tem servido de estorvo
em seus relacionamentos? No seu lugar de trabalho? Com Deus?

• De que forma você reage consigo mesmo quando erra?


Marque o ponto em que você se situa em cada uma das
linhas contínuas abaixo.

Forte impaciência Gentil paciência


Uma crise para Um problema
ser amainada para ser resolvido

• Que medidas você poderia tomar para pôr de lado seu


papel, de modo que possa ir em busca dos propósitos de
Deus para a sua vida?
I CAPínJLo OITO I
Lutando para Sermos Adultos

Você consegue imaginar-se fazendo uma escrivaninha sem ter


martelo, chave de fenda ou sequer um serrote? Ou suponha
que precise fazer um bolo, mas não tenha batedeira, farinha
ou ovos? E mais, imagine que em ambos os casos não seja
possível comprar o que esteja faltando. Você precisa improvisar
com o que tem.
Impossível!, você protesta. Não tenho as ferramentas ou os
ingredientes certos!
Quando nos tornamos adultos, enfrentamos situação crítica
semelhante. Não estamos inteiramente preparados para a vida
adulta. ]uan, por exemplo, teve boa educação e hoje e sempre
está empregado com excelente salário, mas não consegue
lidar com as críticas que recebe em seus exames de
desempenho. Por isso, perambula de emprego em emprego.
Esforça-se em ser espirituoso e compra as roupas certas,
esperando atrair uma esposa, mas não consegue se abrir com
os outros revelando seus temores e dúvidas. Vai à igreja e
freqüenta estudos bíblicos, mas falta em sua fé algo que não
consegue explicar.
a que foi semeado na infância amadurece na fase adulta:

J I . lo.. 1.1 II L •..•.. ~~ 'di" I il 1111-.1 I.,j 1,1 16 Ililill


Lutando Para Sermos Adultos / 109

INFÂNCIA FASE ADULTA


Negação gera desconfiança
Culpa gera autocondenação
Isolamento gera alienação
Repetidos
atos de ira geram tensão

Desconfiança, 'autocondenação, alienação e tensão forçam


as pessoas a se colocar em certa posição onde consideram-se
protegidas. Nessa situação, a vulnerabilidade em relação a Deus
e outras pessoas parece ser uma meta inalcançável.

Desconfiança
Nossa cultura procura incentivar as pessoas a fingir ser aquilo
que não são. O funcionário do serviço ao consumidor pergunta:
"Posso ajudá-lo?", quando de preferência não desejaria ajudar. Os
anúncios tentam nos persuadir que, para termos todas as respostas,
podemos confiar nos políticos, médicos ou em conselheiros com
espírito de iniciativa. Mas eles, em geral, não têm a resposta. Se
você acrescentar todas essas influências aos padrões de negação
desenvolvidos na infância, verá que a desconfiança é gerada. As
pessoas se protegem através dos seguintes meios:

Reagindo exageradamente ante circunstâncias incontrolâueis'


Saber que há um novo supervisor no trabalho ou tomar
conhecimento do diagnóstico de uma doença que quase ninguém
conhece, pode ser o sinal para supormos que o pior vai acontecer.
A flexibilidade parece impossível. Alguns de nós acham que os
relacionamentos são intratáveis e ingovernáveis, de modo que
nos tornamos verdadeiros comandos de ataque. Se alguém nos
ataca verbalmente, defendemo-nos com agressões verbais de
surpresa ou com manobras evasivas.
110 / Curando as Feridas da Alma

A necessidade de controlar é alimentada pelo desejo de nos


proteger. Se fomos feridos no passado - tal como o sentimento
de ser abandonado por um grupo social ou de ser rejeitado
num relacionamento amoroso - queremos evitar a qualquer
preço ser feridos outra vez. Usamos nossos papéis para controlar
as pessoas, apaziguando o brigão ou desligando-nos daquele
que nos ignora. É frustrante perceber que não importa o quanto
nos esforcemos, não conseguiremos fazer com que tudo dê certo.
Não podemos fazer com que o cônjuge, os filhos, o chefe ou o
empregado façam de boa vontade o que queremos que façam.

Mentindo quando seria fácil dizer a verdade


Embora as Escrituras claramente afirmem que é errado mentir,
torcer a verdade parece ser bom expediente para aqueles que
mentem com a finalidade de se protegerem do pai, mãe ou
adulto "nenê rei". Quando ficam adultos, mentem para ficar
fora de dificuldades ou as exageram para chamar a atenção. As
pessoas com a máscara de "criança ultraboazinha" chegam a
exagerar seus problemas, com o propósito de impressionar os
outros, mostrando a rapidez com que os resolvem.
Keisha nos dá um exemplo de como é difícil uma
comunicação aberta e franca:

Enquanto visitava uma amiga, fiquei sozinha no antigo


quarto de sua irmã e achei um belo cachecol cor-de-rosa,
o qual obviamente tinha deixado quando se mudara há
alguns anos. Sabia que o cachecol cairia bem com um
vestido que acabara de comprar, por isso coloquei-o em
minha bolsa. Meu pensamento era perguntar mais tarde
à minha amiga se poderia ficar com ele.
Contudo, tivemedo.Em minha infância, tentava não deixar
meu pai irritado efazia de tudo para não incomodar minha
mãe, por isso não estavaacostumada apediras coisas. Ensaiei

I I ,.i. ~ • I
Lutando Para Sermos Adultos / 111

o que ela me responderia: «Tenho deperguntar à minha irmã.


Faço isto e depois entro em contato com você". Então me sentiria
rejeitada. Ou talvez dissesse: "Issa coisa velha? Pegue". Apesar
de minha amiga ser umapessoa generosa e otimista, nãopude
arriscar nem ao menos a mais leve sombra de rejeição.

Tomando decisões com base em capricho ou intensa análise


Se você não tem confiança em si mesmo para tomar decisões
sábias, vai aos extremos para tomá-las. Um deles é tomar decisões
com base em capricho e depois lamentá-las. Após longo namoro,
Sandra rompeu com seu namorado por causa de alguns dias de
sentimentos confusos. Não pensou bem antes de decidir, porque
examinar os sentimentos é difícil, e explicá-los mais difícil ainda.
Tentou desculpar-se, mas não deu certo.
Depois de se darem mal por serem impulsivos, alguns vão ao
extremo oposto e tornam-se muito analíticos. Pensam e repensam
as decisões, fazendo malabarismos entre o desejo de agradar, a
autocrítica e a super-responsabilidade. Sentem-se estressados por
passarem repetidamente de um item para o outro em suas mentes.
Trabalhar a desconfiança envolve entregar a Deus o medo
que temos das pessoas e a necessidade que sentimos de nos
proteger. Isto emana da compreensão de que Deus não nos
abandonou e que nos protegerá. Ao mesmo tempo, aprendemos
a confiar em algumas pessoas o suficiente para dizer-lhes o que
sentimos, o que desejamos, o que pensamos. É um grande alívio
poder depender um pouquinho dos outros sem ter de resolver
tudo sozinho.

Autocondenação
Julgando-nos sem piedade

Como somos nossos piores críticos, aos outros damos uma


chance, mas a nós não. Quando nos criticamos desse jeito,
112 /Curando as Feridas da Alma

esperamos e até imaginamos que os outros também façam o


mesmo. Brent começou a se condenar quando era criança:

Quando participava de jogos e brincadeiras com os outros


garotos da vizinhança e-na escola, ficava muito ocupado
me julgando para poder me divertir. Preocupava-me um
bocado o fato de sergordo e como aspessoas me julgariam.
Se na aula de Educação Física subíssemos um morro
correndo, não me concentrava em alcançar o topo, porque
estava mais preocupado em como os colegas atrás de mim
me veriam. Se ouvisse alguma risada, supunha que
estivessem rindo de mim. Se alguém inesperada e
casualmente me abordasse, dando-me gentis tapinhas nas
costas, não ouvia o que estivesse dizendo, porque tinha
certeza de que estavafazendo troça de mim. Mesmo hoje,
quandojá não sou mais gordo, ainda mepreocupo se tenho
a aparência cena para as pessoas e se elas não estão
caçoando de mim.

Alguns crentes acreditam erroneamente que ser duros consigo


mesmos é a chave para se tornarem pessoas melhores. Pelo
contrário, a severidade freqüentemente diminui qualquer crença
que o crente possa ter de que Deus venha a usá-lo. Em geral, isto
se traduz em julgar os outros sem piedade também. Pode ser que
eu não fale nada sobre o quão descuidado está o .gramado do
vizinho ou o quanto seus filhos são mal-educados, mas noto cada
detalhe e o guardo em minha mente, para posterior julgamento.

Procurando Aprovação e Auto-aflrmação


Todo esse implacável julgamento deixa as pessoas em constante
necessidade de se auto-afirmarem. Os adultos freqüentemente
transferem essa necessidade de aprovação dos pais para o amigo,
o cônjuge, o dirigente da igreja ou o patrão. Esse ardente desejo

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Lutando Para Sermos Adultos / 113

nos torna peritos em entender as pessoas. Quando crianças,


talvez tenhamos estudado o rosto da mãe ou pai "nenê rei" - o
movimento dos olhos, o tremor dos lábios - de modo que hoje
percebemos detalhes que escapam aos outros. Podemos - ou
achamos que podemos - dizer o que as pessoas estão pensando
apenas pela expressão de seus rostos. A ânsia por auto-afirmação
nos deixa abertos a considerar a opinião de todo o mundo,
menos a de Deus, que prova nossos corações.

Sendo leais, mesmo àqueles que nos ferem

Os adultos criados num lar em que um dos pais era "nenê rei"
ou cuidador descobrem que são extremamente leais a qualquer
pessoa que, na opinião deles, seja cuidadora. Isto pode significar
a permanência em relacionamentos péssimos e situações de
emprego difíceis, quando outros não ficariam. A história de
Belinda fala sobre este problema:

Onde quer que eu trabalhe, as pessoas ficam pegando


no meu pé. Meu chefe pragueja contra mim e me manda
encontrar coisas que ele acha que perdi. Quando as
encontro e fica óbvio que foi ele quem as perdeu, não se
desculpa. Simplesmente diz: {~h, ótimo ",
Já me disseram que eu pedisse demissão. Mas não posso
deixar o emprego, porquefico pensando que posso mudá-
lo, que sou uma boa influência para ele. Algo dentro de
mim me impulsiona a suportara situação, não importando
o quão irremediável pareça.
O mesmo se dá com meu pai. Quando nos falamos por
telefone, permito que elefale coisas a meu respeito que não
são verdadeiras - alguns exageros, certas insinuações.
Outro dia, quando afirmou peremptoriamente algo
descomunal sobre mim, me defendi. Ficou bravo e bateu o
114 / Curando as Feridas da Alma

telefone. Senti-me culpada por uma semana. Quase lhe


telefoneipara me desculpar, e só não o fiz porque prometi
ao meu grupo de apoio que não o faria. Estou me
habituando com a idéia de que um dia venha a lhe dizer:
"Não permito que vocêfale comigo desse jeito".

Livrar-nos da autocondenação significa dar uma chance a


nós mesmos. Valorizamos nosso progresso, por mais lento que
seja. Dar ênfase ao grande amor de Deus por nós e ao que Ele
nos leva a fazer ajuda-nos a nos preocupar menos em querer
agradar os outros. Então procuramos por relacionamentos e
condições de trabalho nos quais sejamos tratados com justiça e
respeito.

Alienação
Sentindo-nos inferiores aos outros
Alguma vez você já teve a sensação de que todo o mundo
conhece os segredos de sua vida? Às vezes parece que os outros
têm uma vida divertida e sabem o que estão fazendo, enquanto
que você "perambulá" pela vida. Em outros momentos, parece
que todos estão entendendo a graça de uma piada, mas você
não. Bem no fundo, você talvez sinta o medo de que seja o
motivo da piada.
Se, quando criança, os adultos se comunicavam com você
através de palavras, ações ou expressões faciais indicando que
as outras coisas eram mais importantes do que você, pode ser
que interiormente acredite não ter muito valor, ainda que nunca
tenha dito isso em voz alta. Talvez esses adultos não tivessem
essa pretensão, mas sentiam-se frustrados, pressionados ou
desesperados em suas próprias circunstâncias difíceis. Quando
a falta de valorização se torna um sentimento familiar, a vergonha
nos assalta mesmo quando cometemos erros pequenos. Essa
vergonha pode nos levar a manter certa distância das pessoas,

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Lutando Para Sermos Adultos /115

de modo que os outros pensam que somos esnobes, quando na


realidade estamos com medo deles e, por isso, nos sentimos
constrangidos.
Para algumas pessoas, essa vergonha provém do comportamento
embaraçoso dos pais. Às vezes não é intencional, porque os pais
podem ter vindo de outra cultura. Outras vezes, surge da inclinação
que as pessoas têm para a ira, ou para a perfeição ou para o álcool.
Carlos nos fala sobre o sentir-se inferior aos outros:

Estava jogando bem num dos meus jogos de basquetebol


no colégio, quando vi meu pai entrando. Ele é uma
pessoa realmente inteligente, mas também é opinioso e
se a borrefacilmente nos jogos. Podia dizerpela maneira
como andava que estava de mal humor. Esperei que se
sentasse e ficasse quieto, mas não foi o que fez. Fiquei
observando-o para me certificar de que ele não iria me
envergonhar na frente dos meus amigos. Não me dei
conta do quão nervoso me encontrava até que errei um
lance fácil.
Meu paigritou algo e olhei ao redorpara verse aspessoas
reconheceriam que ele era meu pai. Tenteificar olhando só
para frente e jogar, mas não podia me concentrar.
Finalmente, disse ao treinador que não me sentia bem e
que queria sair. Não podia suportar a pressão de me
preocupar se meu pai iria me envergonhar ou não. Esse
tipo de coisa aconteceu tantas vezes que ainda fico tenso,
quando desconfio que alguémpossa me envergonhar. Nunca
me senti como uma pessoa comum.

Lutando com relacionamentos mais íntimos


Ter amigos ou ser casado não garante necessariamente que
tenhamos deixado que alguém conheça nosso interior. Muitos
de nós usam tão bem aquela máscara da "criança boazinha",
116/ Curando as Feridas da Alma

que os outros pensam nos conhecer. Quando se dão conta de


que não nos abrimos com eles, sentem-se ludibriados. Maureen
nem mesmo percebia estar-se fechando:

Carol e eu éramos boas amigas - pelo menos era o que eu


pensava. Eu vivia na casa dela o tempo todo. Aspessoas na igreja
brincavam com a gente, dizendo que érarnosgêmeas. Fosse qual
fosse o empreendimento que Carol estilx!sse desemoloendo, todo o
mundo sabia que eu também estava enwlvida.
Certa noite, Carol me chamou e me contou sobre um
problema que estava tendo com o marido. Lembrei-lhe que
meu esposo e eu também tínhamospassadopela mesma coisa
e disse-lhe que sua fé em Deus a ajudaria. Depois disso,
distanciou-se de mim, pelo que me senti magoada. Quando
nos sentamos para esclarecer as coisas, ela explicou que
sempre se sentia como se eu lhe respondesse com chavões, ao
invés de lhe mostrar meu verdadeiro eu. Nunca falava sobre
meus problemas com ela até que estivessem resolvidos. Com
isso eu sempreparecia estarpor cima. ((Você não é autêntica
e não me sinto à vontade ao seu lado J: disse-me ela.
Como poderia dizer a Carol que a maiorparte do tempo
me sentia ferida por dentro? Por que não podia confiar a
essa amiga minhas ansiedades mais secretas?Nunca imaginei
que ela quisesse isso de mim. Nenhuma outra pessoa jamais
tinha me escutado ou querido ficar tão próxima de mim.
Quando criança, todos esperavam que eu cozinhasse e não
incomodasse ninguém. Quando me tornei adulta, sempre
foi maisfácil mefechar um pouquinho.

A experiência de Maureen é comum. Ela aprendeu a agir


como se fosse próxima a Carol, mas ao mesmo tempo permanecia
distante dela. Ficou surpresa quando a amiga lhe disse aquilo,
porque a maioria das pessoas não se importava que ela guardasse
para si seus verdadeiros sentimentos e opiniões. Além disso,

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Lutando Para Sermos Adultos / 117

Maureen, uma apaziguadora, sempre recebia suas pequenas


recompensas nos relacionamentos que mantinha para ajudar os
outros. Ela deixava tudo de lado para ouvir os infortúnios das
pessoas e dar conselhos. "As pessoas pensavam que éramos
chegadas, porque eu as ajudava", diz Maureen. "Mas toda essa
pseudo-intimidade me protegia de ter de revelar meus
verdadeiros temores e dúvidas".

Temendo o abandono
Não é preciso que você tenha sido deixado à porta de uma casa
quando bebê, para se sentir abandonado. Com a queda de Adão
e Eva no jardim do Éden, veio um sentimento de abandono que
não é satisfeito até que cheguemos ao céu. Aqui na terra, as
pessoas com quem nos importamos têm seus próprios problemas
e, às vezes, sem o perceberem, elas nos abandonam
emocionalmente. Quando precisamos de alguém para nos apoiar,
ou para nos dar uma palavra amiga, não encontramos ninguém.
Por isso, quanto mais acontecem esses-abandonos, mais profundo
se torna o sentimento de que seremos esquecidos, de que
ninguém virá em nosso auxílio quando precisarmos.
Se o medo de sermos abandonados for muito forte, pode ser
que nos apeguemos àqueles que amamos a ponto de os
sufocarmos. Margaret nos conta sua perspectiva:

Sempre procurei a ajuda de todos que conheço para


resolver meus problemas. Telefonava para as pessoas e
depois voltava a ligar. Nos namoros que tive, não dava o
menor espaço para os meus namorados, porque tinha
muito medo que me deixassem.
A verdade é que tenho medo que todo o mundo me
deixe. Lembro-me de meuspais/alando de divórcio o tempo
todo. Preocupava-me em como nos arranjaríamos se
mamãe nos deixasse. Ou será que ela nos levaria junto?
118 / Curando as Feridas da Alma

Onde conseguiriamos dinheiro para viver? Esses


pensamentos ficavam passando e repassando em minha
mente. Cheguei a imaginar o que aconteceria se eu tivesse
de tomar conta da família. O que é que eu faria se, ao
voltar para casa, descobrisse que minha mãe tinha ido
embora?Acabei cortando relaçõescom minha avó, porque
meu pai disse que ela era a causa dosproblemas de minha
mãe. Ficamos sem vê-la por cinco anos. Até certo ponto,
ela tinha sido a influência estabilizadora em nossas vidas.
Levou algum tempo até que eu aprendesse a me apoiar
nas pessoas sem nocauteá-las. Tive de aprender a passar
mais tempo com Deus, a lidar dia a dia com todos os meus
medos interiores. Estou aprendendo que os relacionamentos
têm a ver com o dar a outras pessoas, ao invés de usá-las
para obtermos o que precisamos.

Outras vezes, o medo de sermos abandonados faz com que


limitemos a profundidade de nossos relacionamentos. Craig, por
exemplo, guarda seus problemas só para si. Aprendeu a agir assim
quando criança, quando voltava para casa e a encontrava vazia.
Depois que seus pais chegavam, eles nunca falavam abertamente
sobre os problemas, assim ele nunca sabia de nada. Esta tendência
a sermos extremamente independentes estende-se até a Deus. Ainda
que Craig dê estudos bíblicos, declara: "Não confio em Deus de
todo o coração. Escondo esta desconfiança e ajo como se a vida
estivesse passando por mim. Minha vida espiritual atingiu um platô
- estou insensível às coisas espirituais".
Para nos livrarmos da alienação é necessário que nos arrastemos
para fora de nosso casulo e procuremos pessoas de confiança,
que nos deixarão falar a respeito de nossas dúvidas e sentimentos
sem nos condenar. Podemos encontrá-las na igreja, a qual foi
criada por Deus para atuar como os braços, as pernas e os ombros
do corpo de Cristo. É verdade que essas pessoas poderão nos
desapontar, mais isto não significa que tudo esteja perdido. Quanto

J J ,,,. I II , I. II .L. ·,~l .1\ I • . II 11, LI I I ;. II t, .. I 1I Id J I'L ...


Lutando Para Sermos Adultos / 119

mais formos aprendendo a confiar nas pessoas aqui na terra,


mais confiaremos em Deus que nunca nos desapontará, deixando
de suspeitar que Ele um dia venha nos faltar.

Tensão
A ira e hostilidade em nossa cultura nos dizem que é sábio estarmos
sempre alertas. Você nunca sabe quando será atrevidamente
abordado na rua. Alguns de nós protegem-se emocionalmente
agindo como se todo acontecimento fosse uma catástrofe em
potencial e, depois, ficam agradavelmente deliciados quando as
coisas dão certo. A tensão se apresenta das seguintes maneiras.

Trabalhando para se divertir


A tensão pode ser uma atitude padrão para as crianças que
ficavam na varanda fazendo bolinhas de sabão, até que ouvissem
a discussão começar em casa. Então, ou ficavam por ali, com
medo, escutando as brigas, ou corriam para um canto do quintal
para não ouvir nada.
Hoje nossa cultura não tem o mínimo senso do que é diversão, por
isso trabalha para se divertir. Vamos bem longe em busca de
divertimento. Não podemos simplesmente ir a um lago perto da cidade;
não é divertido, a menos que seja um balneário numa ilha. Mesmo
assim, a diversão de alguma forma não nos parece correta. Presume-
se que, para desfrutarmos de férias reahnente divertidas, tenhamos de
ver em quatro dias cada árvore e buraco enlameado. Ou conferir e
marcar com um visto os itens que um guia turistico nos mostra.

Levando-nos muito a sério


Julgar-nos sem piedade pode levar-nos a ser ultra-sensíveis às
críticas. Até uma pequena crítica já basta para nos abater. Eis
um exemplo de como jan levava a vida muito a sério, mesmo
quando criança:
120 / Curando as Feridas da Alma

Quando eu estava na 4. a série, fui pega conversando com


minha amiga Rhonda, quando devíamos estarestudando.
Senti-me culpada, porque gostava muito de minha
professora e queria agradá-la.
A professora nos corrigiu de maneira gentil, mas foi
difícil aceitar. Rhonda riu.
Quando a professora disse: "Pelo menos Rhonda achou
graça, enquanto jan olhou para mim como se tivesse visto
umfantasma", a turma toda riu, mas eu não.
Fiquei confusa. Não era uma coisa horrível ser pega
conversando? Por que Rhonda riu? Não devíamos
demonstrar arrependimento, quando estamos errados?
Mais de vinte anos depois ainda me lembro do quão
aborrecida e envergonhada fiquei. Queria ser alegre e
despreocupada como Rhonda, mas simplesmente não
conseguia. Agora percebo que a professoraficou triste por
eu haver demonstrado tanta dificuldade em aceitar a
repreensão. Ela tentou me animar.
Hoje ainda estou aprendendo a não levar muito a sério
meus erros. Fiquei maravilhada com uma amiga que riu
quando se esqueceu das palavras do hino especial que
cantava na igreja. A congregação chegou a rir com ela.
Há poucos anos, eu provavelmente teria chorado no
púlpito. Hoje conseguiria ir em frente e chorar depois.
Algum dia espero ser capaz de rir de mim mesma como
e/afez.

o perigo de levarmos a vida muito a sério é que passamos a


ver a nós mesmos e a cada uma de nossas ações como de suma
importância para o universo. Na ampla e global perspectiva da
vida, Deus está no controle de tudo e nossos erros e dificuldades
não são tão catastróficos: "Porque a nossa leve e momentânea
tribulação produz para nós um peso eterno de glória mui
excelente, não atentando nós nas coisas que se vêem, mas nas

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Lutando Para Sermos Adultos / 121

que se não vêem; porque as que se vêem são temporárias, e as


que se não vêem são eternas" (2 Co 4.17,18).

Agindo irresponsavelmente ou super-responsavelmente


Quando as crianças crescem em lares onde os adultos não lhes
dão atenção, pode ser que não terminem as lições de casa ou
outras atividades extracurriculares. Quando ficam adultos, talvez
venham a ter dificuldades em empreender projetos do começo
ao fim ou os adiem até o último momento. As coisas só funcionam
bem quando alguém os vigia.
Alguns reagem fortemente a essa irresponsabilidade,
tornando-se super-responsáveis. Prometem que vão mudar e
passam das medidas para o provarem. O papel super-
responsável torna-se conveniente, porque pode ser difícil
confiar nos outros para ir até o fim de um empreendimento. Se
ambos os extremos lhe parecem familiares, você não está
sozinho. Muitas vezes ficamos indo de um extremo ao outro,
um dia nos comportando super-responsavelmente e no outro,
irresponsavelmente.

Criando caos aonde quer que estejamos


Se tivemos uma infância na qual era comum haver brigas e
discussões, uma vida cheia de problemas nos parece normal.
Quando adulto, você prospera em meio ao caos e se dá bem
em situações difíceis. Quando as coisas vão bem demais, você
não se sente à vontade. Aqueles que foram criados dessa maneira,
freqüentemente relatam não marcar encontros com pessoas
"certinhas" porque não sentem muita atração por elas. São
"viciados em drama" e às vezes chegam até a criar histórias
dramáticas para impressionar as pessoas.
Abrir mão da tensão significa ensaiar meios de não apertar o
botão do pânico em situações que recriam nossos sentimentos
122 / Curando as Feridas da Alma

do passado. Conseguimos nos soltar e nos tornar mais alegres,


quando nos abrimos com aqueles que compreendem nossa
tensão, que até riem do quão tensos estão. Cultivamos nosso
lado brincalhão e esperançoso, que não se incomoda com o
que as outras pessoas pensam, aquela parte de nós que pode
tornar-se totalmente absorta em brincadeiras e atividades criativas.
Deixamos de lado os níveis dos sofisticados "tenho de". Ao
permutarmos a sofisticação por simplicidade e a máscara de
"criança boazinha" por autenticidade, nos libertamos para
explorar e desfrutar a vida. Então podemos relaxar e abandonar
nosso desejo de correria - a adrenalina do caos.

Você Pode Estar Querendo Saber...

P O que há de tão errado em querer estar no controle? O


domínio próprio não é um aspecto do fruto do Espírito?
CGI 5.22,23.)
R O domínio próprio Cou temperança) é útil, mas quando
as pessoas tentam controlar o que não está dentro do seu
controle - se vai haver uma inundação, se as pessoas
vão gostar ou não de nós, se os filhos vão tomar as decisões
certas quando estiverem longe de casa - assumem uma
função que é única e exclusivamente de Deus. Muitas
vezes esta preocupação em querer controlar tudo perturba .
nossa paz de espírito (E se...?). Ou talvez a usemos para
manipular os outros. Trabalhamos com tanto afmco para
controlar o meio em que vivemos, que já não entregamos
mais as circunstâncias, as pessoas e os problemas a Deus.

P Se é esperado que os crentes confiem nos outros mais do


que em si mesmos, não está certo nos sentirmos inferiores?
R Somos ordenados a, humildemente, considerar os outros
superiores a nós mesmos CFp 2.3), Mas fazemos isto porque

I, , ,I I i oj. j J ,~ i, I .. ~ 1,1 Jlj i


Lutando Para Sermos Adultos / 123

seguimos o exemplo de Jesus Cristo, que voluntariamente


aniquilou-se a si mesmo, ainda que soubesse ser o Filho
de Deus CFp 2.6-11). Ele não morreu na cruz, porque
pensava não ter muito valor ou porque aquele dia Deus
tinha mais o que fazer. Para espelharmos a verdade deste
texto bíblico, precisamos compreender o quão grande é a
nossa auto-estima aos olhos de Deus - seus filhos, por
quem Ele deu seu Filho, seu rebanho, seus sacerdotes.
Pela ótica dessa posição honrosa, aprendemos a exprimir
o amor de Jesus e a abandonar nossa paixão pelo conforto,
nosso apego por atenção, nosso ardente desejo de sermos
servidos.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

• Que tipo de mudanças ou conjunto de circunstâncias em


sua vida são mais difíceis para você? Que parte dessa situação
está dentro do seu controle? Que parte não está?

• Quando é mais difícil dizer a verdade? A quem? O que há


nessa pessoa ou situação que torna difícil dizer a verdade?

• Você tem a tendência a ser mais impulsivo ou mais analítico?

• Quando você é mais duro consigo mesmo? De quem você


124 / Curando as Feridas da Alma

mais gostaria de ter aprovação ou reafirmação? O que há


nessa pessoa que faz com que você queira agradá-la?

• Você é daqueles que gostam de ficar distantes das pessoas


ou é dos que preferem se aproximar delas rapidamente?

• Que meios drásticos as pessoas empregam para ter


momentos de diversão?

• Em que áreas da sua vida você leva as coisas muito a sério?

I I .... .....L "LI"'LI lJ.ltj;~,." ~J.ii .. ~Ijül-i


ICAPtruw NOVE I
Amortecendo aDor

Se retemos uma quantidade significativa de tensão e frustração


em nosso tanque de contenção, desenvolvemos ao longo dos
anos diversos expedientes com o fim de controlar tais
sentimentos. Procedimentos inocentes (ou não tão inocentes
assim) tornam-se nosso "jeitinho", por assim dizer, e passamos a
depender deles. A história de Tom nos conta como ele amorteceu
seus sentimentos negativos:

Quando comecei a cursar o colegial, meuspais me deram


três calças depoliéster, estilo boca de sino. Uma era verde,
outra marrom e a outra, azul-marinho. Todas muito
curtas. Quandoperguntei sepoderiam me dar uns jeans,
minha mãe respondeu: "Você tem as calças mais bonitas
que há. Por que não as usa?"
Minha mãe era mulher dominadora e não pude fazer
com que compreendesse minha situação. Sentia-me
culpado, porque erafilho depastor e queriaparecer como
meusamigos da escola. Por mais que tentasse não consegui
usar aquelas calças, de modo que, dia sim, dia não, usava
um dos doisjeans velhos que eu tinha. Então, meus amigos
126 / Curando as Feridas da Alma

faziam caçoadas de mim por eu usar sempre as mesmas


calças. Mesmo assim, era melhor do que usar aquelas
"calças de varar rio cheio".
Mais ou menos por essa época, tornei-me obcecado por
luxúria. Como não conseguia obter materialpornográfico,
deliciava-me pesquisar as revistas femininas em busca de
mulheres que estivessem com pouca roupa. Sentia tanta
culpa quepraticava um tipo de ritual de masturbação auto-
torturante. Mas isso não aliviava a culpa ou a dor. Aos
treze anos, molestei sexualmente uma criança de dois anos.
Meu pai falou com um psicólogo e me disse: "Sua irmã
também passou por um incidente sirnilar". Então,
abandonei tal procedimento.
Aos dezesseis anos, comecei a praticar bulimia. Comia
três pratos de comida, vomitava e depois comia a
sobremesa. Corria oitenta quilômetros por semana. Todos
na minhafamília tinham excesso de peso e eu não queria
ser como eles. Depois de dez anos vivendo assim, percebi
que meus hábitos estavam prejudicando meu corpo, pelo
que tentei canalizar este frenesi no trabalho. Deixei de
vomitar, mas ainda assim me sentia péssimo. Tornara-me
respeitávelpai defamilia e honrado líder em minha igreja,
na esperança de camuflar a dor ao seruir os outros.
À medida que falava com minha esposa a respeito da
depressão constante, comecei a notar o quanto fui ferido na
infância que vivi. Nunca tinha me dado conta de que estava
usando todos esses subterfúgios com o objetivo de amortecer
o que sentia e esquecer o passado. Na terapia e em grupos de
apoio, encarava os sentimentos de infância e os deixava ir.
Percebi o quanto imitara as inclinações de meus país em
relação à comida e ao trabalho. Meus pais sempreprecisavam
estar comendo algum doce e nunca se descontraíam. Nos
feriados, não era incomum queparticipassem de torneios de
monopólio que duravam quinze horas.'

.1- J1.., I I I. , J . ~ , . , ...... j l j j ," I


Amortecendo a Dor / 127

Ainda faço parte em um grupo de apoio para tratar de


hábitos sexuais e estou aprendendo a lidar com meus
sentimentos em vez de me refugiar na luxúria. Tanto
minha vida profissional quanto meu casamento estão
começando a florescer. Estou me conscientizando de que
não preciso agradar as pessoas. Posso ser eu mesmo - e
as pessoas podem até gostar mais de mim por isso.

Em sua procura por expedientes para amortecer os


sentimentos, Tom tentou sexo, comida e trabalho, mas nada
disso adiantou. Como muitos cristãos, ele passou de largo pelos
tabus da igreja: alcoolismo e drogas.
Quase todo tipo de substância ou comportamento pode
tornar-se em vício, incluindo a nicotina, cafeína, religião,
relacionamentos, sexo, comer, fazer exercícios, gastar dinheiro,
jogos de azar ou assistir televisão. Muitas compulsões parecem
inocentes. A mãe lê romances para preencher o vazio de sua
vida. O pai faz artesanalmente alguma mobília para casa ou fica
na garagem trabalhando no carro, com o propósito de esconder-
se de uma família que fala a respeito de sentimentos. Cedo ou
tarde encontram-se presos no que é chamado de ciclo vicioso:
Preocupação: penso sobre isso; aguardo ansiosamentepor isso.
Ritualismo: faço preparativos para isso, pensando: esta tarde
todos estarão fora e assim terei tempo para... ou: vou precisar
disto (certa substância, determinada comida etc.) para mais tarde,
quando eu...
Comportamento compulsivo: extravaso a obsessão em ações
e atitudes, e me sinto bem por um pouco. Só que essa sensação
de bem-estar é cada vez menor, até que dura por não mais que
alguns segundos.
Culpa: Sinto-me culpado por ter agido como agi. Para atenuar
esses sentimentos ruins, retorno à preocupação.
Se um dos pais era viciado em certa substância ou comportava-
se de determinada maneira, pode ser que acabemos imitando
128 / Curando as Feridas da Alma

esse procedimento ou talvez tentemos por todos os meios evitar


agir como eles - somente para descobrirmos que fazemos
exatamente o mesmo. Ainda que a manifestação específica seja
diferente, o impulso em querer amortecer os sentimentos
negativos é o mesmo.
O impulso é uma força poderosa, a qual ninguém presta
muita atenção. Primeira Timóteo 6.10 descreve o impulso de
maneira precisa, dizendo que não é o dinheiro, por exemplo, a
raiz de toda espécie de males, mas "o amor do dinheiro". Da
mesma forma, o amor da comida, o amor do álcool, o amor do
trabalho faz surgir todo tipo de mau comportamento. Na raiz
desse impulso estão a mágoa e o ódio resultantes da decepção
das respostas dadas àquelas perguntas de crucial importância
- O que devo fazer para me sentir amado? O que devo fazer
para me sentir valorizado?

Comida
Compulsão em comer e fazer dietas
Comer compulsivamente é usar a comida e O ato de comer
como um agente calmante, assim como os alcoólatras usam
o álcool. Os comedores compulsivos gastam muito tempo e
energias pensando e lidando com comida (e corncndol).
Anseiam ardentemente por comer, sobretudo quando estão
sozinhos. Pode ser que comam salada quando se encontram
com um amigo para almoçar, mas logo após se separarem
atacam firme no sorvete. Alguns chamam essa compulsão
em comer de "o pecado dos crentes", porque com as comidas
caseiras servidas na igreja, os eventos destinados a angariar
fundos e os encontros sociais para degustar sorvete, é difícil
evitar não comer.
Considerando que as revistas, os filmes e a televisão nos
passam a mensagem de que ser magro é tornar-se atraente, as
pessoas sentem-se compelidas a emagrecer. A compulsão em

III J'
Amortecendo a Dor / 129

comer demais, para logo em seguida emagrecer, cria o efeito


ioiô, típico das compulões.'

Procurando amor em todos os lugares errados

Distúrbios relacionados com comida


As pessoas com bulimia comem grandes quantidades de comida,
em geral "comidas proibidas", e em seguida purgam-se a si
mesmas vomitando o que comeram, fazendo exercício demais
ou tomando laxantes. Outras atenuam a dor passando fome. Os
anoréxicos ficam exultantes com sentimentos de inanição e
controle. Geralmente vêem-se a si mesmos como indivíduos
gordos, não importando o quão magros estejam. Muitos
presumem que a bulimia e a anorexia são distúrbios
130 / Curando as Feridas da Alma

característicos apenas das adolescentes, mas isto não é verdade.


Homens e mulheres de todas as idades servem-se destes
distúrbios para controlar peso e sentir-se bem com a vida.

A Mídia
Assistir televisão por horas a fio e ler livros nos quais as fantasias
se realizam, parecem proporcionar satisfação quando a vida é
por demais estressante para ser enfrentada.

À medida que seu casamento desmoronava, Laura lia


romances sem parar. "Que mal faz? Costumava me
perguntar", nos conta Laura hoje. "Não era literatura
pornográfica. Não estava assistindo televisão - estava
expandindo minha mente. Enquanto estava, por exemplo,
fazendo sopa, conseguia devorar alguns preciosos
capítulos. Quando amigos crentes me diziam que esses
livros eram lixo, minha resposta era: 'Pelo menos não estou
dormindo com homens como fazem uma porção de
mulheres que conheço '. "
Laura parou de ler romances no dia em que, ao voltar
para casa, encontrou o esposo fazendo as malas. "O jógo
tinha acabado e tive de canalizar minhas energias em
restaurar o relacionamento com meu marido. A vida não
era como nesses romances. Na vida real, o herói estava
saindo de cena e eu, a mocinha, estava triste. E não havia
nenhum escritor de romance para dar jeito na situação".

Trabalho
Ser viciado em trabalhar não é amar o trabalho pesado; é trabalhar
compulsivamente por razões que pouco têm a ver com trabalho. As
pessoas tomam-se viciadas em prcxiutividade porque precisam sentir-
se úteis, precisam ter o controle de algo ou porque precisam ter a
sensação de que realizaram alguma coisa para sentir-se valorizadas.

".L • I ,. J I j; ~ •
Amortecendo a Dor / 131

Os pais de Tom eram "viciados em fazer negócios". Seu pai


era pastor e trabalhava oitenta horas por semana para ser
exatamente o que sua congregação queria que fosse. Começou
prometendo à esposa que estaria em casa às 9 da noite. Mas
não conseguiu cumprir porque descobriu que o tempo voa
quando se usa o trabalho como expediente para se sentir bem
consigo mesmo. Ainda que soubesse estar colocando a família
em uma situação estressante, continuou agindo assim.
Alguns viciados em trabalho também são perfeccionistas. Não
conseguem pôr-se à vontade e absolutamente não toleram falhas.
São impulsionados pelo desejo de serem "bons o suficiente" e
suas breves vitórias são seus "pontos altos".

Viciados em "Coisas Boas"


Quando temos necessidades interiores, quase qualquer coisa
pode nos servir de muleta, como Kathleen acabou descobrindo:

Depois de dar à luz a meu segundofilho) passei a dormir


mais do que o habitual, porque me sentia cansada. À
medida que o tempo passava) percebi que estava distante
do meu esposo (que é pastor) e confusa por toda a
balbúrdia na igreja. Queria fugir de tudo) por isso
dormia tanto quanto podia. Era tão delicioso dormir-
sem bebês chorando) sem telefones tocando. Aguardava
com ansiedade pela hora do dia em que tirava um
cochilo e irritava-me se não podia me valer desse direito.
Deixei de orar - passei a dormir para esquecer meus
problemas.

A tarefa normal de possuir e adquirir coisas pode tornar-se


em obsessão. Não fazemos compras até o último momento, mas
acabamos nos preocupando com aquele próximo item à venda,
dando uma olhada nos catálogos em busca de pechinchas.
132 / Curando as Feridas da Alma

Quando Dean tentou limitar sua compra de livros, descobriu


que pedir livros emprestados não lhe dava a boa sensação que
sentia quando os comprava. Seu prazer estava em possuir os
livros, exibi-los e dar a impressão de que era uma pessoa bem
informada. Tinha certeza de que nunca precisaria de certos livros
que estavam na prateleira.

Dependência Religiosa
Todos os tipos de crenças têm seus viciados em religião, mas
vamos examinar como este vício se manifesta nos círculos cristãos.

Viciado em ser voluntário


Os viciados em igreja ficam envolvidos com igreja tantos dias
da semana quantos possíveis. Ausentes dela sentem-se como se
estivessem fora do seu ambiente familiar e perdem a identidade.
Podem até se afastar dos amigos, parentes e cônjuge que não
estejam hiperenvolvidos do modo como eles estão. Seu desejo
sempre foi o de passar por "santos" e o trabalho constante na
igreja lhes mostrou como atingir esse alvo. Na história a seguir,
Charlie descreve seus sentimentos:

Sinto-me culpado se não participo de cada um dos eventos


da igreja. Outro dia tive de faltar a uma reunião de
liderança para comparecer à graduação escolar de meu
filho e me senti culpado! Lidero um estudo bíblico no meio
da semana e nunca tive depedir que alguém me substituísse,
pouco importando o quão doente me encontrasse. Não quero
que o pastorpense que não tenho compromisso. Não quero
que ninguém pergunte: "Então, onde está o Charlie?"

o excesso de envolvimento nas atividades da igreja é


especialmente sutil porque é fácil camuflar o desejo de parecer
Amortecendo a Dor / 133

santo com o desejo sincero de servir a Deus. As pessoas


hiperenvolvidas são populares, amadas, admiradas, mas em casa
a família se pergunta: "Onde está papai? Onde está minha
esposa?" Como você argumentaria com alguém que está dando
a vida para Deus? Fazer coisas importantes pode ser uma péssima
escolha com o objetivo de sentir-se amado e valorizado.

Viciado em se sentir sempre "nas alturas"


Aqueles que almejam estar sempre "nas alturas", em termos religiosos,
buscam por experiências novas, melhores e mais excitantes com o
fim de ajudá-los a manter ou reaver emoções intensas. Para criar este
fervor, talvez passem muito tempo dedicando-se às atividades da
igreja, falando a respeito de novos discernimentos bíblicos ou ouvindo
programas cristãos pelo rádio ou assistindo-os pela televisão. V1Sto
que estar "nas alturas" no que tange à religião satisfaz as emoções,
mas não o espírito interior, faz-se necessário cada vez mais o exercído
desta atividade frenética para manter-se sempre no "alto" das
sensações. No fim, a pessoa desaba.

Viciado em ser radical


Muitas das pessoas religiosas viciadas em perfeccionismo
cresceram em lares de autoridade rígida, onde não havia
concessões mútuas. Quando eram crianças, queriam soltar pipa
ou construir um forte, mas seus pais não consideravam tais
atividades espirituais, razão pela qual não as permitiam.
Hoje, quando já são adultos, levam a doutrina e os costumes
ao extremo. Toda área da vida torna-se absolutamente boa ou
má. Sentem-se culpados quando se engajam em atividades que
aprenderam como erradas, mesmo quando já não acreditam mais
que o sejam. Mantêm uma fachada de perfeição e não ousam
admitir seu medo, culpa e raiva. Recusam-se a dar ouvidos aos
questionamentos próprios das "crises de fé", típicas dos
134 / Curando as Feridas da Alma

adolescentes, como por exemplo: "Como posso ter certeza de


que Deus existe?"

Viciado em determinado líder proeminente


Alguma vez você já conversou com alguém que no meio da
conversa sempre está dizendo: "Meu pastor disse que ...'', ou
que freqüentemente cita uma celebridade religiosa? Pois na
maioria das vezes trata-se de pessoa que sente falta de
relacionamentos mais estreitos com os outros e, por isso, está a
procura de alguém que satisfaça essa necessidade. O dano é
ainda maior se tal líder proeminente tem o hábito de motivar
seus seguidores através da humilhação, tachando-os de cristãos
de segunda classe, e até mediante ameaças de perda da salvação.
Seguidores que permanecem leais a um líder que os humilha
vêm freqüentemente de famílias autoritárias e, por conseguinte,
sentem-se bem em ser mandadas. Aqueles provenientes de
fanu1ias em que a crença em alguma coisa não era tão importante,
podem se tornar dedicados a um líder por acreditarem que
finalmente encontraram a força não encontrada em seus pais.
Nada do que foi dito aqui significa que todos os crentes que vão
à igreja, lêem a Bíblia e oram diversas vezes por dia sejam viciados.
Alguém já disse: "Você nunca pode obter muito de Deus", e isto é
verdade. O problema é que os viciados em religião não buscam a
Deus. O que lhes interessa são as altas emoções, o farisaísmo ou as
formas extremas de controle. Os crentes verdadeiramente devotados
a Deus confiam nEle como o Autor de tudo o que há e procuram ter
um relacionamento mais profundo com Ele.

Dependência Química
Álcool
Ainda que o indivíduo não chegue ao ponto de ficar embriagado,
a dependência do álcool evidencia-se em fazer o que for

, . , ~ I i .
, 1,1. oi. j .
Amortecendo a Dor / 135

necessano para não faltar ao encontro de sexta-feira à noite


para beber. Esses momentos tornam-se em recompensa por uma
semana inteira de trabalho e são uma maneira de amortecer a
frustração da existência vazia.
Estudos comprovam que os filhos adultos de pais alcoólatras têm
quatro vezes mais tendência a tomar-se dependentes de substâncias
químicas do que aqueles que não foram criados em famílias com
problemas com álcool," Enquanto os pesquisadores procuram por
algum vínculo genético, a conexão com o comportamento é óbvia
- os pais alcoólatras dão o exemplo quando se voltam às substâncias
químicas para contentar necessidades não satisfeitas.

Drogas
Tecnicamente falando, a nicotina, o açúcar e a cafeína são drogas,
porque, ao serem consumidas, alteram a estrutura ou função do
corpo. Produzem sensações de euforia e depressão no corpo da
maioria das pessoas. Tornam-se em compulsão quando são
usadas regularmente para controlar a dor, dar energia ou relaxar.
Os remédios prescritos com o propósito de aliviar a dor física
chegam a viciar quando são usados para mascarar a dor
emocional. O "viciado" vai então de médico em médico, em
busca de mais um alívio rápido. Mesmo as drogas ilegais são
mais comuns em círculos cristãos nos EUA do que se imagina.
As crianças nascidas nos anos 60, na época dos hippies que
fumavam maconha, hoje são homens feitos que usam terno e
gravata e em casa têm momentos de descontração praticando o
mesmo hábito. Certa mulher queixava-se de seu marido:

Estou tentandofazer com que meu esposo se interesse mais


pela igreja. Até que, por fim, concordou em me
acompanhar ao culto e lá encontramos um casal de que
ele gostou. Sem demora os convidamos para nos visitar e
- quem diria? Meu marido e o homem fumaram
136 / Curando as Feridas da Alma

maconha. A mulher e euficamos nauseadas e indignadas.


Ao invés de se ajudarem mutuamente, estes homensfaziam
comparações entre seus cachimbosfavoritos e as misturas
mais gostosas. Senti-me tão desencorajada.

Dependência Sexual
De acordo com o psicólogo Patrick Carnes,3 o amortecimento
da dor por meio da atividade sexual ocorre em três níveis.
Nível Um: Masturbação, repetidos relacionamentos
promíscuos, pornografia e shows de strip-tease, prostituição e
homossexualidade.
Nível Dois: Exibicionismo, voyeurismo, telefonemas obscenos
e liberdades.
Nível Três: Molestamentos, incesto, estupro, violência sexual.
Muitos viciados em sexo foram abusados sexualmente quando
crianças. Em sua solidão e alienação, revivem essas experiências
traumáticas. As boas notícias são que há cada vez mais
conselheiros especializando-se nesse campo de estudo e mais
literatura que aborda com propriedade o tema.

Renunciando os Impulsos
Nosso propósito é ajudá-lo a examinar os artifícios que você
usa para se proteger e, por isso, este capítulo foi designado a
investigar seus pensamentos. Muitos livros excelentes e grupos
de apoio oferecem ajuda no que tange aos tópicos abordados
aqui. Apresentamos a seguir algumas perguntas que o auxiliarão
a determinar se o seu comportamento é compulsivo ou não:

• Esta atividade me dá a falsa sensação de bem-estar,


orgulho ou poder?
• Esta atividade está me prejudicando de alguma forma?
Magôo as pessoas ou não dou muita atenção a elas por
causa desta atividade?
Amortecendo a Dor / 137

• Esta atividade encaixa-se com o citado ciclo vicioso:


preocupação, ritualismo, extravasamento da obsessão,
culpa?

Aqueles que responderam afirmativamente podem estar se


fiando em comportamentos que são prejudiciais a si mesmos ou
a outras pessoas. A solução óbvia, mas de curta duração, é
simplesmente parar de comportar-se assim. Alguns, através de
ferrenho autodomínio, são bem-sucedidos neste intento, mas
em geral este expediente força as pessoas a esconder as feridas
ao invés de encará-las. Também aumenta a falsa noção da força
pessoal, o que lhes deixa no ponto para outras derrotas.
Os melhores métodos de tratamento abrangem uma
combinação entre relacionar-se com os outros e relacionar-se
com Deus, como os processos e ferramentas que iremos
descrever nos capítulos a seguir. Reprimir exteriormente os
comportamentos nunca é o suficiente. Os comportamentos são
movidos pelas feridas interiores, que devem ser encaradas - e
curadas.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P E se meu amigo) filho ou cônjuge for viciado? O que
faço?
R Pouco podemos fazer por um amigo ou parente que
seja viciado até que estejam desesperados o suficiente
para fazerem algo por si próprios. Contudo, devemos
nos aplicar e estabelecer limites mais claros, de maneira
que seus vícios não nos prejudiquem. Investigando nossos
motivos e examinando nosso passado, estaremos não
apenas dando um exemplo que provavelmente será
notado, mas também nos tornando mais compassivos e
abertos. Talvez haja maior probabilidade de virem falar
conosco, à medida que vamos deixando de insistir em
138 / Curando as Feridas da Alma

nossas maneiras "certinhas" de resolver a situação e


passemos a oferecer vislumbres do infalível amor de Deus.

P Se meuspais são alcoólatras} isto significa que eu também


vou ser?
R Certas influências estão trabalhando contra você. Ao
longo dos anos você tem visto seus pais amenizarem as
mágoas através da bebida, e a maioria de nós, queiramos
ou não, acaba imitando o comportamento de nossos
pais. Não obstante, estudos revelam que algumas
pessoas têm certa predisposição genética ao alcoolismo,
o que significa que os genes dessas pessoas são
propensos para essa direção, de modo que há grande
probabilidade de que desejem o álcool. Este pode ser o
seu caso.
Ter pais alcoólatras não significa que você está
inexoravelmente predestinado a ser alcoólatra.
Entretanto, pode significar que o seu nível de saciedade
é maior, isto é, que se torna necessária a ingestão de
mais álcool para que você fique bêbado, ou que você
queira beber até ficar embriagado. Esta predisposição
serve-lhe de advertência quanto aos malefícios do álcool,
sobretudo se você está lidando com a dor emocional.

Reflexão Pessoal
Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe
as respostas com um grupo ou amigo.

• Temos a impressão de que grande parte das pessoas em


nossa cultura ocidental é dependente de algo. Na sua opinião,
qual é o vício mais comum entre seus amigos ou em sua família?

I • i. ~ I I I ' , I, i .. L j L f .1 J;I. J I .• w.. I I L ~ f'_ I


Amortecendo aDor / 139

• O que você faz para abandonar um mau hábito? Quando é


que você se sente solitário? Oque você faz para se animar?

• Faça o autoteste a seguir e julgue se a atividade


mencionada por você na resposta auma das perguntas acima
trata-se ou não de compulsão. Esta atividade me dá afalsa
sensação de bem-esat, orgulho oupoder? Esta atividade está
me prejudicando de alguma forma? Magôo as pessoas ou
não dou muita atenção a elas por causa desta atividade?
Esta atividade encaíxa-se com o citado ciclo vicioso,'
preocupação, ritualismo, extravasamento da obsessão e
culpa?

• Com quem você poderia conversar que também esteja lutando


com este tipo de comportamento?
I CAPíruLO DFl I
Visão Espiritual Embaçada

Como você vê Deus? Alguma vez já o viu como:

• Um Papai Noel, que nos recompensa somente quando


somos bonzinhos?
• Um destacado Senhor do Tempo, que nunca está
disponível?
• Um carcereiro cósmico, que observa cada um dos nossos
movimentos?
• A Bruxa Malvada do Oeste (do Mágico de Oz), que saiu
para nos pegar?
• Uma vovó lamurienta, que esfrega as mãos e nos diz
para sermos bonzinhos?
• Um amigo apenas nos bons tempos, que sempre nos
abandona quando a doença ou as dificuldades
escurecem a nossa vida?

Faz tempo que nossa cultura tem perpetuado a mentira de


que Deus ama somente as pessoas boas - portanto, seja
bonzinho! Com esta visão distorcida, as crianças freqüentemente
concluem que Deus as amará mais se tirarem "dez" nas provas,

I ...... •• I I j l , I...lL j J .. ,I jj, J I" ~ _ I •• , &Ll l.J h 1. I


Visão Espiritual Embaçada / 141

arrumarem o quarto e escovarem os dentes. As crianças olham


para os pais, a quem percebem ser pessoas todo-poderosas,
com o intuito de formar uma idéia de como é Deus. Se os pais
são sensíveis e passam algum tempo em sua companhia, vêem
Deus como alguém que as ouve e se interessa por elas. Se
estiverem muito ocupados e ausentes, talvez presumam que
Deus também está muito ocupado para atendê-las.
Por causa destas influências dos pais e de nossa cultura, os
adultos muitas vezes fazem comparações de Deus da mesma
forma como reagem com a vida - através das obscurecidas
lentes da desconfiança, autocondenação, alienação e tensão.
Depois de anos interagindo com o Altíssimo desta maneira, é
difícil passar a acreditar na verdade bíblica de que Ele nos ama
independente de tudo e anseia nos perdoar, quando pecamos.
Em seu livro Healing ofMemories (Cura das Memórias), David
Seamands ressalta o quanto as feridas de nosso passado podem
distorcer a visão que temos de Deus pelas seguintes maneiras. 1

Como você vê Deus?


142/ Curando as Feridas da Alma

,
COMO DEUS REALMENTE E A MANEIRA COMO O VEMOS
Amoroso e prestativo Irado e indiferente
Bom e misericordioso Intratável e inflexivel
Inabalável e confiável Imprevisivel e indigno de confiança
Graça incondicional Aprovação condicional
Presente e acessivel Ausente quando precisamos dEle.
Doador de coisas boas Tira-nos as coisas boas,
"desmancha-prazeres"
Sustenta-nos e satisfaz nossa Critico e antipático
necessidade de auto-afirmação
Acolhe-nos Rejeita-nos
Santo, justo e imparcial Iniquo, injusto e parcial

A maioria dos crentes jamais afirmaria ver Deus como está


descrito na coluna da direita porque a Bíblia diz que Ele nos
ama. Trata-se de uma distorção declarar que Deus é amor, mesmo
que não o sintamos. As frases comuns apresentadas a seguir
denotam uma visão tirânica de Deus:

• Deus deve estar aborrecido comigo.


• Engraçado - deve ser porque pequei, não é?
• Onde está Deus quando você precisa dEle?
• Hoje fui repreendido por Deus com dureza.

Esta última declaração faz eco aos ditos espirituosos que


fazemos a respeito de Deus atingir com um raio as pessoas que
o desobedecem. Será que somos mais sinceros em nossa crença
em Deus quando fazemos pilhérias do que jamais admitiríamos
em uma conversa séria e franca? Veja como jan lutou com esta
visão tirânica

• I I. J, ~ Il.d., '1 &1 j,J..1


Visão Espiritual Embaçada / 143

Todas as vezes em que algo saía errado, sentia-me como


se Deus estivesse meperseguindo, como se Ele estivesse irado
comigo. Isto acontecia até com coisas tão triviais como o
ralo entupido ou guardar os formulários do seguro em
lugar errado, pois tinha a sensação de que Deus estava
trabalhando contra mim. Diante de cada experiência
negativa que passava, meu coração ia ficando cada vez
mais duro. Cheguei a desenvolver uma índole agressiva,
esperando por problemas a todo instante.
A piorparte disso é que em minha mente eu sabia que
Deus não era assim. Durante anos ministrei estudos
bíblicos e escrevi dúzias de lições para escolas bíblicas.
Nessas ocasiões, pesquisava as Escrituras em busca de
passagens quefalassem sobre o amor de Deus e as estudava
repetidamente. Esforçava-me tanto para fazer com que
meu coração acreditasse nessas afirmações, mas
continuava a agir como se Deusfosse um tirano avarento
e punidor. Poderia ter ganhado facílmente um debate
intelectual defendendo o amor de Deus, mas bem nofundo
do meu ser eu sentia que Ele estava me azucrinando.

Crentes "Bonzinhos"
Se você cresceu numa respeitável família cristã com um pai ou
mãe "nenê rei", a distorção relacionada com Deus pode ser
ainda maior. Talvez você tenha sentido que a igreja aprovou
esse comportamento egoísta, mesmo que seus pais
desconhecessem o quão radical era tal procedimento. Isto só
serviu para confirmar seus piores temores de que a igreja era
exatamente como sua família: um lugar inseguro para falar,
confiar ou sentir.
Não obstante a dimensão dessa distorção, o resultado é que
agimos como se Deus não fosse alguém com quem
verdadeiramente pudéssemos falar, confiar ou sentir. Quando
144 / Curando as Feridas da Alma

lemos os Salmos, não nos damos conta do quão seguro Davi se


sentia ao revelar seus sentimentos a Deus mediante declarações
esquisitas. Quando ouvimos falar de Moisés diante da sarça
ardente, não percebemos a sua segurança em falar com Deus,
podendo até apresentar desculpas. Quando lemos que josué
pediu a Deus que fizesse o sol "parar", deixamos de notar como
o sucessor de Moisés confiava em Deus e que tal confiança
dizia respeito a Deus intervir dessa maneira inusitada em
benefício de Israel (SI 35; Êx 3.1---4.17; js 10.12).
Essa tendência a dizer uma coisa e crer em outra cria distorções
no modo como interpretamos as Escrituras. É como se
estivéssemos tão entrincheirados na desconfiança,
autocondenação, alienação e tensão, que tais condições levantam
barreiras aos nossos pensamentos com o conseqüente
congestionamento de trânsito entre nossas mentes e nossos
corações. Grande parte de nossa jornada de exame de consciência
consiste em fazer passar as verdades acerca de Deus por essa
via congestionada e colocá-las em nossos corações.

Distorcendo as Escrituras
Sendo bonzinho

As Boas-Novas tornam-se em Más-Novas, quando a Bíblia é


interpretada com o sentido de que os crentes não têm méritos
ou que eles têm de se esforçar incansavelmente para agradar a
Deus. Isto encoraja as pessoas a fazer com Deus o jogo da
bajulação, ao invés de se entregar a Ele. Deus está pronto a
levar o peso de nossa obediência, abrangendo até nossas feridas
e erros: "Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos,
e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de
mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis
descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave e °
meu fardo é leve" (Mt 11.28-30).

I. I I .; I-.lÕL J I • I J. Ji J I I. ~ • J.;', .... ~ I ~ ~ 111 I


Visão Espiritual Embaçada / 145

Limpando a reputação dos santos


Os crentes de hoje nunca chamariam a maioria dos heróis da
Bíblia para trabalhar no escritório de suas igrejas. Paulo - um
assassino em massa? Davi - um adúltero e homicida? Jacó/
Israel - um enganador que extorquiu do próprio irmão algo
que por direito pertencia a este? Abraão e Isaque - homens
que ofereceram suas esposas para serem usadas sexualmente
com o fim de salvar a própria pele? Estes seres humanos normais
que amavam a Deus foram limpos a ponto de perdermos de
vista o quanto sua pecaminosidade os torna exemplos acessíveis
para nós. O pecado descarado que cometeram também toma
ridículo nossos esforços em parecer bonzinhos. Temos acreditado
erroneamente que a Bíblia é um livro que trata dos seres humanos
sendo transformados em pessoas boas, quando na verdade as
Escrituras são um testemunho da bondade e graça de Deus.
Expurgar as figuras bíblicas de suas características
desagradáveis ou indesejáveis contribui para o sentimento de
que temos de ser falsos para sermos bons cristãos. Na realidade,
as personagens bíblicas eram pessoas reais e a vida que tiveram
dão esperança até às áreas mais sombrias de nós mesmos.

"Amarás o teu próximo"


Este versículo tem sido mal interpretado. Quer-se subentender que
devemos ser cuidadores, atendendo os caprichos das pessoas que
nos prejudicam. Entretanto, o amor agape pode ser inflexível tanto
quanto paciente. Observamos no Antigo Testamento que Deus
amava a nação de Israel, ainda que o povo adorasse ídolos e fizesse
sacrifícios humanos. O Senhor, mediante os profetas que enviava,
dava-lhes muitas oportunidades de arrependimento. Não obstante,
Deus não se deixou escarnecer quando Israel ignorou seus avisos.
O Reino do Norte foi disperso para sempre e o Reino do Sul,
apenas um pouco menos mau do que o do Norte, foi levado em
cativeiro, tendo mais tarde retomado para sua terra natal.
146/ Curando as Feridas da Alma

Amar o próximo significa imitar a maneira como Deus age.


Ele não é apenas paciente e amoroso, mas também resoluto e
discernente: "Cada um de nós agrade ao seu próximo no que é
bom para edificação" (Rm 15.2, ênfase nossa). Não faz nenhum
bem a um pai, mãe, amigo ou cônjuge "nenê rei" deixar que
continuem falando conosco de maneira ferina. Estaremos amando
uns aos outros e edificando-nos mutuamente, quando estivermos
"seguindo a verdade em caridade [amor]" (Ef 4.15). "Amo você,
papai, mas não é possível que fale comigo desse jeito".

Alegria e paz Instantâneas


Para aqueles que têm a tendência a ficar nervosos ou deprimidos,
os versículos a seguir são próprios para uma interpretação errônea:

Regozijai-vos [alegrai-VOS}; sempre} no Senhor; outra


vez digo: regozijai-vos. Não estejais inquietos por coisa
alguma; antes, as vossas petições sejam em tudo
conhecidas diante de Deus; pela oração e súplicas} com
ação de graças. Ea paz de Deus} que excede todo o
entendimento, guardará os vossos corações e os vossos
sentimentos em Cristojesus. Quanto ao mais; irmãos, tudo
o que é verdadeiro, tudo o que é honesto; tudo o que é
justo; tudo o que é puro, tudo o que é amável} tudo o que
é de boa/ama} se há alguma virtude, e se há algum louuor;
nisso pensai (Fp 4.4} 6-8).

Curt compreendia estes versículos como um tíquete de rápido


acesso à alegria. Mas depois ficava ofendido porque pareciam
tão impossíveis de ser vividos:

Nunca senti vontade de me alegrar. É difícil se alegrar


quando você não viu essa qualidade em exibição na sua
família. Ficava imaginando se não havia um segredopara

I_.L j I l I It J I. W. l ILl,'.1
Visão Espiritual Embaçada / 147

essa alegria. Talvez, se eu fizesse a coisa certa da maneira


certa, pudesse me alegrar e ter paz.
Quando comecei a enfrentar os problemas da vida, a
situação ficou pior. Sentia que a expressão: "Nisso [nessas
coisas positivas] pensai" significava que se eu abafasse a
dor do meu passado e ignorasse minha criação, eu me
sentiria bem. Já tinha tentado outras vezes - chama-se
negação - e não tinha dado certo. Isto me lembrava de
um pai que surra o filho injustamente e depois lhe diz:
(~ora sorria ". Eu tinha consciência de que era encarando
minhas feridas que me ajudaria a melhorar. Então por
que a Bíblia dizia o contrário? Por que "a paz que vai
além de todo o entendimento" estavafora do meu alcance?

Alegria e paz são cápsulas de ação retardante, e não estimulantes


instantâneos. Alegrar-se no Senhor não é o mesmo que "estar por cima".
Pode ocorrer em meio às aflições, exatamente como se deu com Paulo
ao escrever estas palavras na prisão. Aprendemos que amando a Deus
e concentrando nossa atenção nEle podemos louvá-lo, mesmo quando
tudo ao redor indique não haver mais esperança. Uma maneira eficaz
de concentrar nossa atenção em "tudo o que é verdadeiro" (Fp 4.8), é
enfrentarmos as feridas do passado de modo que PJSSaffiOS continuar
nos concentrando nas coisas positivas, "que são amáveis".

Fórmulas legalistas
Como mestres da autocondenação, servimo-nos de versículos
bíblicos para nos martirizar. jan costumava se sentir culpada,
quando lia a passagem de Filipenses citada há pouco:

"Regozijai-oos sempre no Senhor" era uma realização que


estava muito distante de mim. Tratava-se de "cristianismo
avançado ", reseruado apenasparapessoas especiais, o que
significava que eu era uma cristã de segunda classe.
148/ Curando as Feridas da Alma

Grande era meu desespero. A depressão tinha pairado sobre


mim durante minha vida toda e não supunha que algum
dia pudesse me alegrar sempre no Senhor.
Estava tão desesperada por paz que transformei os
versículos 6 e 7 numa fórmula espiritual:
Passo 1: Esforce-se bastante em se alegrar. Passo 2: Ore.
Passo 3: Espere que a paz caia no seu colo. Era parecido
com os procedimentos para limpeza da pele: Espalhe o
produto sobre a pele, deixe secarpor dez minutos, enxágüe
e sua pele ficará perfeita. Parece tolice ter agido assim,
mas isto era normal para mim, visto já ter lido dezenas de
livros que apresentam soluções rápidas, procedimentos
passo a passo e que tratam da auto-ajuda.
À medida que fui me inteirando de meios de ventilar
minhas feridas e raiva, essa depressão diária foi se
dissipando. Ainda não me alegro sempre no Senhor, mas
já experimentei este sentimento. Sem que eu perceba, a
alegria e a paz de Deus acercam-se cada vez mais de mim
e substituem o caos interior. De conversas com crentes mais
amadurecidos, percebi que até eles têm dificuldades em se
alegrar no Senhor. Novamente, estava me julgando sem
misericórdia.
Deixei de usar as Escrituras como uma vara espiritual
própria para autoflagelação. É muito mais fácil crescer
em Deus, descansar em sua paz, quando eu não estiver
clamando tanto por isso. Estou confiando em Deus para
que Ele trabalhe em minha vida, ao invés de sentir-me
_movida a adquirir o que algumas pessoas chamariam de
"sucesso espiritual".

Qualquer passagem bíblica pode servir de fórmula legalista


para aqueles que estão em grande necessidade. Muitos agem
como se algumas afirmações fossem quase palavras mágicas,
especialmente as expressões: "Seja feita a tua vontade", ou: "Em
Visão Espiritual Embaçada / 149

nome de Jesus". Supõe-se que se estas frases forem anexadas


ao final da oração, a vontade de Deus automaticamente
concederá o pedido. Em vez disso, essas expressões referem-se
a um relacionamento crescente com Deus, no qual o crente
passa a conhecê-lo, a buscá-lo e a obedecer suas palavras. É
então que o crente tem alguma percepção de qual seja a vontade
de Deus e está ávido por evitar agir de maneira que não seja
consistente com o nome e a conduta de Jesus.

justiça instantânea
Outra idéia escriturística que pode nos confundir é o ser a "nova
criatura" em Cristo. Segunda Coríntios 5.17 diz: "Assim que, se
alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já
passaram; eis que tudo se fez novo". Cristãos bem-intencionados
sugerem que esta Escritura significa estarmos libertos de nossa
natureza pecaminosa,. da influência decorrida de nossa cultura
e de tudo o que tenha acontecido no passado.
Tornar-se nova criatura em Cristo não é um processo
instantâneo. Este procedimento demorado está descrito em João
8.32: "E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará". O Dr.
Lawrence Richards, mestre da Bíblia, faz um comentário sobre
este versículo: "Conhecer a verdade não é compreendê-la
intelectualmente, mas vivenciá-la. Conhecer a verdade não é
concentrar nossas atenções em um conjunto do conhecimentos,
mas viver em contato com a realidade como Deus a conhece"."
Esta experiência de viver na realidade de Deus é algo no
qual crescemos, à medida que vamos desenvolvendo nosso
relacionamento com Ele. Uma pequena parte desse processo
abrange romper com a negação e admitir o quanto nosso
passado nos afetou. Quanto mais formos crescendo em nosso
entendimento de que Deus nos ama e nos transforma, tanto
mais livres estaremos para nos tornar novas criaturas em
Cristo.
150 / Curando as Feridas da Alma

Promessas quebradas
Alguma vez você já olhou com suspeita os versículos bíblicos
que prometem a proteção de Deus? Talvez você tenha
questionado versículos como estes: "Porque aos seus anjos dará
ordem a teu respeito, para te guardarem em todos os teus
caminhos. Eles te sustentarão nas suas mãos, para que não
tropeces com o teu pé em pedra" (SI 91.11,12). Alguns já
pensaram consigo mesmos: Se estes versículos fossem de fato
verdadeiros, um adulto que na infância tenha sido abusado
sexualmente poderia perguntar: "Onde estavam esses anjos
quando precisei deles? Por que minha infância foi tão cheia de
temores?"
Estes versículos estão nos dizendo que Deus fornece proteção
angélica em certas ocasiões. Aqui não há a promessa de que os
crentes nunca terão problemas ou que nunca irão sofrer
injustamente (o que muitas vezes queremos que signifiquem).
Se estes versículos realmente prometessem proteção total, não
haveria um crente sequer que tropeçasse em pedra alguma! Esta
conclusão é não somente ridícula, mas também sabemos que
muitos dos cristãos primitivos foram perseguidos (At 8.1-3) e ao
menos um apóstolo, Tiago, foi decapitado (At 12.2).
Parte de nosso problema com versículos como os do Salmo
91.11,12 é querermos saber por que Deus faz o que faz. Isto faz
parte do esforço humano em entender Deus e suas decisões, o
que não é um objetivo recomendável ou prático. "Porque os
meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os
vossos caminhos, os meus caminhos, diz o SENHOR. Porque,
assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os
meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os
meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos"
(Is 55.8,9). Deus sabe de tudo, nós não, e ficamos frustrados
nessa tentativa (Is 40.13). Em vez disso, nossa meta deveria ser
aceitar Deus, buscar conhecê-lo e amá-lo. Esse conhecimento
Visão Espiritual Embaçada / 151

limitado é o que chamamos de fé. À medida que formos agindo


assim, encontraremos paz mesmo em assuntos que não
entendemos. Pode ser que às vezes ainda questionemos Deus,
como certamente o salmista o fez, mas estaremos fazendo isso
com o propósito de conhecê-lo e amá-lo.
Quando parecer que Deus não cumpriu sua promessa em
relação a nós, é sábio examinarmos a força que nos atrai para a
passagem bíblica. Estamos procurando saber o que o texto
realmente diz ou estamos buscando desesperadamente colocar
promessas na boca de Deus para que Ele as cumpra? Será que
não estamos querendo fazer Deus à nossa imagem?
Os exemplos de textos bíblicos acima facilmente mal
interpretados mostram o quanto afunilamos nossa teologia
pelas experiências que vivenciamos. À medida que formos
nos conscientizando sobre o quanto temos encarado a vida
através de um vidro embaçado, poderemos então limpá-lo e
reexaminar o intento das Escrituras. Passamos, portanto, a
compreender cada versículo no contexto de outras passagens
bíblicas e deixamos de .nos martirizar com textos de prova
isolados.
Quando entendemos as Escrituras mais claramente, parte de
nossa luta é atenuada. Talvez tenhamos nos esforçado em seguir
tudo o que era dito nos púlpitos, porque queríamos nos entregar
inteiramente a Deus. Não obstante, nossos sentimentos estavam
tão distantes das idéias expostas ali que a obediência parecia
impossível.
Por fim, entendemos e aceitamos mais da realidade como
Deus a conhece:

• Deus nos ama e nos declara "bons";


• Seu amor por nós não está baseado em nossa obediência
perfeita ou firmado em padrões do cristianismo cultural;
• Ele nos capacita a amarmos as pessoas de maneira correta
e saudável;
152 / Curando as Feridas da Alma

• Ele conhece nossos pensamentos - mesmo os maus -


e trabalha em nós para nos fazer crescer;
• Ele cumpre todas as promessas, mesmo quando não
entendemos como Ele as está cumprindo.

Com esse entendimento, é mais fácil deixar de ser um estorvo


nos caminhos de Deus e nos tomar um cooperador com Ele, à
medida que nos ajuda a crescer.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Como posso formar imagens corretas de Deus?
R Medite e reflita em passagens bíblicas que retratem o
amor de Deus. As parábolas são úteis, porque as histórias
têm o poder de abrir caminho por meio daquele
congestionamento de trânsito entre a mente e o coração,
quando os fatos não conseguem passar. As parábolas
nos ajudam a "conhecer" a verdade, vivenciando-a
vicariamente através das vidas das personagens descritas
por Jesus. Eis algumas parábolas que enfatizam o amor
de Deus:

• A parábola dos lavradores maus, na qual é ressaltada


a persistência do proprietário da vinha (Mt 21.33-41);
• O pastor na parábola da ovelha perdida, que arriscou
tudo para encontrá-la (Lc 15.3-7);
• O pai do filho pródigo, que, para conseguir ver o
filho quando ainda estava longe, deve ter-se aplicado
com esmero em ficar de olho no caminho (Lc
15.20,22). Assim como este pai, Deus nos abençoa
inteiramente quando vamos até Ele (Lc 15.11-32).

P Ainda que eu fale com Deus, não me sinto próximo a


Ele. O que devo fazer?

I.~L .. ~ ~ 11 ... J i;. r .; I; II ... ~ II 111. J


Visão Espiritual Embaçada / 153

R Quando nos sentimos famintos de amor, pode ser que


tentemos usar Deus como um meio de obter os
sentimentos bons que ansiamos. Por isso, estaremos
nos ajudando se mudarmos nossos objetivos. Nosso alvo
é união com Deus, conhecê-lo e entrar em um
relacionamento com Ele, e não apenas ter um banho
de sensações boas e cheias de amor. Se perseguirmos
essa meta de conhecer Deus e fazer sua vontade, os
sentimentos que tanto almejamos virão com certeza.
Também é sábio considerar que podemos estar sentindo
a proximidade de Deus, sem necessariamente sentirmo-
nos tocados por dentro.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

• Qual expressão ou versículo bíblico - se houver - tomou-se


uma fórmula para você? Se você não se lembra de nenhum, peça
que Deus lhe mostre nestes próximos dias qualquer passagem
bíblica que você esteja vendo de maneira rígida e legalista.

• De que maneira você reage a este versículo? "Vede quão


grande caridade [amor] nos tem concedido o Pai: que fôssemos
chamados filhos de Deus" (1 Jo 3.1).

• Que qualidade (ou qualidades) na coluna da direita do


quadro apresentado a seguir descreve a maneira como você
154 / Curando as Feridas da Alma

às vezes vê Deus? O que aconteceu para fazer com que você


se sentisse assim?

COMO DEUS REALMENTE É A MANEIRA COMO O VEMOS


Amoroso e prestativo Irado e indiferente

Bom e misericordioso Intratável e inflexível

Inabalável e confiável Imprevisivel e indigno de confiança

Graça incondicional Aprovação condicional

Presente e acessivel Ausente quando precisamos dEle

Doador de coisas boas Tira-nos as coisas boas,

"desmancha-prazeres"

Sustenta-nos e satisfaz nossa Critico e antipático

necessidade de auto-afirmação

Acolhe-nos Rejeita-nos

Santo, justo e imparcial Iniquo, injusto e parcial

• Circule a qualidade da coluna da esquerda do quadro acima


que retrata uma característica de Deus que você precisa
assimilar com mais profundidade.

• O imutável e infalível amor de Deus é mencionado muitas


vezes na Bíblia (principalmente nos Salmos). Nos próximos
dias, leia cinco ou dez salmos por dia, sublinhando as palavras
que falam desse amor e meditando nas passagens.
t
I CAPÍ11JLO ONzE I
AVida sob Exame

Começo a semana com a melhor das intenções,


determinada a ser uma cristã contente e obediente. Então,
algo parece envenenar minhas atividades e
relacionamentos - tento me livrar, mas sinto como se
estivesse presa. É como se tivesse um eu verdadeiro (que
sabe como realmente me sinto) e um eu "igreja" (que tenta
sentir como penso que devo me sentir) e estes dois eus
competem entre si. Ajo com alegria, enquanto que por
dentro o eu real grita.
- um apontamento do diário de jan

Se por algum momento você age feliz, quando por dentro se sente
miserável, você entende o que significa ter um eu verdadeiro e um eu
"igreja". Pode ser que você tenha ignorado seu eu real por tanto tempo,
que parece não existir mais. Para sermos verdadeiros com Deus e com
os outros, temos de nos familiarizar de novo com o eu real.

Vivendo Conscientemente
Quando o eu verdadeiro fica soterrado por muito tempo, as
pessoas esquecem como viver a vida conscientemente. Elas se
158 / Curando as Feridas da Alma

mantêm no piloto automático, sem nem ao menos pensar em


suas palavras ou ações. Vivem a vida como vítimas, reagindo
aos acontecimentos de acordo com a necessidade de defesa
própria. Em vez de buscar a vontade e a sabedoria de Deus
para determinada situação, interagem com os outros baseadas
em seus contumazes papéis familiares (o responsável, o criador
de casos, o ajustador, o apaziguador).
Quando as pessoas põem de lado seus verdadeiros
pensamentos e sentimentos, é comum imitarem os outros que
parecem saber o que elas pensam e sentem - celebridades, líderes
de igreja, amigos. Enquanto papagueiam o que lhes foi dito, tais
indivíduos podem estar acreditando intensamente no oposto.
Quando falam aos vizinhos que a igreja é um lugar acolhedor,
onde são valorizados, às vezes acreditam que ninguém na igreja
os conhece, quanto menos os valoriza. Repetem a verdade que
Deus os ama, mas por vezes acreditam que Deus não se importa.
Não cogitam os assuntos a fim de resolvê-los, porque estão
acostumados a deixar que os outros façam seu julgamento por
eles. Talvez até tenham medo de explorar o que crêem.
Quando você vive desse jeito por bastante tempo, apresenta
eus diferentes para pessoas diferentes, baseado no que o momento
requer. Você imagina que quando as pessoas perguntam "Como
vai?", elas querem que você diga que está tudo bem e, então,
você diz assim. Se você lhes dissesse que vai mal, elas ficariam
chocadas. Nas orações, você chega a imitar palavras e ações que
considera cristãs, em vez de levar seus verdadeiros pensamentos
e sentimentos a Deus e pedir-lhe que trabalhe com você. Depois
de algum tempo, a vida carece de autenticidade.
Se seguirmos a rotina contínua de não pensar, confiar ou sentir,
nos fechamos para as pessoas que amamos e insensibilizamos
nossa relação com Deus. Pelo fato de não nos relacionarmos
verdadeiramente com as pessoas, não nos sentimos culpados em
usá-las, sobretudo se elas nos usam. As pessoas que amamos
podem não fazer idéia alguma de como realmente nos sentimos,
A Vida sob Exame / 159

porque nos esforçamos em fazer o mínimo de perturbação possível.


Isso pode até resultar em viver a vida quase inconscientemente:
ficando num trabalho que detestamos; cedendo ante as exigências
dos outros; indo à igreja, mas desligando-nos do ambiente. Pam
achou-se vivendo desta maneira:

Na faculdade, namorei um rapaz por quatro anos. Todo


o mundo presumia que iríamos nos casar - menos eu.
Não conseguia ser honesta com ele e lhe dizer que não era
o homem com quem queria me casar. Chegara a essa
conclusão depois de alguns meses de namoro, mas eu
simplesmente não conseguia lhe contar. Em todos aqueles
anos na faculdade, dizia-lhe o que ele queria ouvir-
que era um grande sujeito e que no futuro juntosfaríamos
muitas coisas maravilhosas. Nunca disse que me casaria
com ele, mas também nunca disse que não.
Deixei que essa situação se arrastasse até a formatura,
quando ele mepressionou sobre quando nos casaríamos. Não
conseguia me encarar. Não era minha intenção feri-lo. Não
pretendia enganá-lo, mas ofiz. Numa carta, expliquei-lhe meus
sentimentos da melhormaneira quepude. Naquele dia, quando
escrevi tudo o que sentia, pudeperceber que eu tinha vivido a
vida tomando decisões que lamentei, fazendo promessas que
não podia cumprir e fazendo escolhas para evitar a dor.
Meses de oração, conversa e exame de consciência
fizeram-me olhar meu passado. Meu pai tinha deixado
minha mãe e irmãs por tantas vezes. Tinha medo de que
se eu assumisse um compromisso, o mesmo acabasse me
acontecendo. Nunca quis ser abandonada, ficar sozinha
como minha mãe. Estava vivendo minha vida presa à
vida dela. Mesmo que tivesse chegado a esse entendimento,
nunca poderia tê-lo explicado a meu namorado. Sou
ajustadora; não causo perturbações. Porque vivi sem
pensar, feri esse homem que tanto estimava.
160 / Curando as Feridas da Alma

Desligar o piloto automático e viver conscientemente parece


dar muito trabalho. Teríamos de examinar nossas vidas, motivos,
crenças e ações. Teríamos de atacar as dúvidas que dizem: Eu
sou assim. Não consigo me comportar de outra maneira. Teríamos
de deixar de ser vítimas de nosso passado e crer que Deus pode
nos dar um futuro melhor.
Pela graça de Deus, podemos desejar fazer o que é necessário
para vivermos com autenticidade, manifestando a intenção de
termos comunhão com Ele e deixá-lo nos transformar segundo
sua semelhança. Podemos admitir que por dentro ainda somos
crianças - tentando encontrar amor, aprovação e estima.
Podemos lamentar que nossa intenção causou danos em nós e
nos outros e desviou os propósitos de Deus para nossa vida.
Para vivermos conscientemente temos de ouvir a nós mesmos,
avaliar o que ouvimos levando em conta a obra de Deus em
nossa vida e agir de acordo com essa reflexão. Então
descobriremos o que significa estar envolvido com a vida,
fazendo o máximo para este momento, não focalizado no ontem
ou no amanhã.

A Vida sob Exame


Para vivermos na verdade, devemos estar dispostos a passar por
rigoroso exame de consciência, dizendo: "Examina-me, SENHOR,
e prova-me; esquadrinha a minha mente e o meu coração" (SI
26.2). Também examinarmos como nos relacionamos com as
outras pessoas, especialmente as do Corpo de Cristo (1 Co
11.28,29). Ao ver a nós mesmos com a graça infinita de Deus,
ficamos cientes de nossos motivos e nos fazemos estas perguntas:

• Como me sinto?
• O que penso?
• O que fareü

\;1_ .. I, I, ~ , • • • w.. J I l j,., I


A Vida sob Exame / 161

Como Me Sinto?
Se você se manteve no piloto automático por muitos anos, esta pergunta
JXXie ser difícil de responder. Talvez você não esteja acostumado a
perceber os sentimentos e não faça idéia de como o é. Ou você JXXie
ter vivido sob o dever de ser "completamente feliz o tempo todo" e
sentir que está muito distante desta meta, de fonna que não dá a
:mínima ao que sente. Se durante anos sufocou seus sentimentos, este
é o momento de pedir a Deus que os mostre e ajude você a identificá-
los. Apresentamos a seguir uma lista de sentimentos comuns a fím de
ajudá-lo a identificar o que acontece em seu interior.

aborrecido aflito agreSSIVO


aliviado ansioso arrogante
cauteloso chocado ciumento
confiante confuso crítico
culpado desapontado desconsolado
descrente desculpador determinado
enfurecido entediado estúpido
exasperado exausto extasiado
feliz frustrado horrorizado
indiferente
. .
invejoso magoado
medroso obstinado ofendido
otimista pensativo retraído
solitário tímido travesso
triste

Assim que identificamos o sentimento (sobretudo a tristeza,


raiva, cobiça ou rancor), talvez sejamos tentados a pensar: Não
se sinta assim! Precisamos ser um pouco clementes conosco e
nos imaginar com nossos sentimentos por alguns instantes. Este
não é o momento certo para analisá-los, mas apenas para
reconhecê-los. É como se tivéssemos de fechar a porta contra a
negação, que parece mais ou menos assim:
162 / Curando as Feridas da Alma

Fiz uma coisa estúpida. Risque o que acabei de dizer. Minha


mãe me dissepara não chamar ninguém de estúpido, então
não devo pensar assim. Mas é assim que me sinto!
Sou teimoso e rebelde, com vontade de dar um soco na
boca daquele cara. Sei que este não é um sentimento muito
cristão, mas é como me sinto!
Tenho ciúme dela. Não deveria ter, sei que é tolice,
mas é verdade. Vou me sentar aqui, sentir meu ciúme
e admiti-lo para mim.

Quando for descobrir sentimentos, é proveitoso usar várias


ferramentas como escrever um diário, conversar com um amigo
ou orar sobre isso em algum lugar reservado. Nesses lugares
privados, podemos falar alto, dizer tudo o que sentimos e
retorquir como ilustram os pensamentos acima. (O Capítulo 15
descreve estas ferramentas com mais detalhes.)

o Que Penso?
Logo que sabemos o que sentimos, recuamos e procuramos a
razão para o sentimento e o que ele tem a ver com nosso
comportamento. Estou furioso por causa do que alguém me
disse no telefone hoje de manhã? Sou obstinado porque sempre
quero ter razão? Sou tímido porque no trabalho me afasto dos
outros, o que faz parte do meu papel familiar de ajustador?
Depois que nos imaginamos em nossos sentimentos e os ligamos
com nosso comportamento, podemos fazer aquela pergunta que nossa
cultura é rápida em fazer: Como este sentimento se enquadra com a
realidade? É útil reprisar o evento em nossas mentes a fim de nos
assegurar de que estamos nos lembrando como de fato aconteceu, e
não relatando de maneira parcial e injusta. Tendemos a torcer os fatos
- mesmo aqueles que aconteceram há um segundo. Por exemplo, se
penso que todo o mundo que me olha torto está bravo comigo, posso
chegar à conclusão de que alguém está com raiva de mim.

, .. ~ • I I I, , I .~L .. L J I I j~ I I W. I Il JliL i
A Vida sob Exame / 163

À medida que reprisamos o evento, devemos perguntar:


Minha reação foi apropriada? Fiz algo que prooocasse a reação
dessa pessoa? Será que eu estava desempenhando um contumaz
papel familiar? Baseado em meu histórico, de que forma isto se
ajusta com a minha tendência a me comportar? Tem base em
alguma interpretação equivocada ou defeito de caráter-
preguiça, rabugice, egoísmo? É vantajoso fazer estas perguntas
com um amigo de confiança ou num grupo, porque pensar em
voz alta nos ajuda a manter correta nossa perspectiva. Um amigo
pode dizer: Sim, ela parecia brava com você, mas pode ser que
seja uma reação a você e ao modo como você lida com a situação.
Saber se nossos sentimentos se enquadram com a realidade pode
ser confuso. Um dos recursos mais simples para pôr as coisas em
ordem é a Oração por Serenidade: Deus, concede-me a serenidade
para aceitar as coisas que nãoposso mudar, a coragem para mudar
as coisas que posso mudar e a sabedoria para saber a diferença?
Esta oração nos mostra que há duas categorias de pessoas e situações:

• Aquelas que posso controlar até certo ponto;


• Aquelas sobre as quais tenho pouco ou nenhum controle.

A segunda categoria é, sem dúvida, a maior porque temos


pouco controle sobre grande parte deste mundo. Em vez de
nos torturarmos acerca de pessoas e circunstâncias que não
podemos controlar, podemos entregá-las a Deus juntamente
com nosso desejo de controlá-las. Com relação àquelas coisas
sobre as quais temos controle, fazemos o melhor que podemos
um dia de cada vez.

o Que Farei?
O que a verdade exige que você faça para ir até ao fim sem
fraquejar? Às vezes temos de pedir mais .informação. Por exemplo,
se você não está certo de ter interpretado alguém de maneira
164 / Curando as Feridas da Alma

errônea, diga: "Não tenho certeza se entendo tudo o que está


acontecendo. Você está bravo comigo?"
Logo que tenha informação o sufidente, considere quais são as
opções. Você deve se desculpar? Ou, caso desculpar-se venha a piorar
as coisas, não seria melhor ter mais cuidado? Como responder de
maneira diferente da próxima vez] Como agir fora de seu papel familiar?
No início, este processo pode ser difícil, porque nossa reação
automática a qualquer dilema na vida é nos proteger negando
sentimentos, culpando os outros, isolando-nos das pessoas ou reagindo
com raiva (quer seja em explosões óbvias ou em manipulação oculta).
Quanto mais experimentamos a graça de Deus, mais honestos somos
com Ele, chegando até a confessar-lhe coisas como:

• Menti, porque tive medo de que as pessoas não


gostassem de mim se viessem a saber da verdade.
• Exagerei hoje acerca de quantas voltas corri, porque
quero que as pessoas me admirem.
• Comprei aquela camisa nova para ter boa aparência,
porque me sinto tão deslocado em comparação com o
colega com quem trabalho. A verdade é que ele me faz
lembrar meu irmão, que sempre tirava vantagem de
mim e, dessa forma, compito com ele.

Quanto mais freqüentemente falarmos com honestidade


conosco, mais fácil fica. Por exemplo, quando Glenda pegou o
carro e saiu pela rua, cortando a frente dos outros, ela pensou:
Estou me tornando uma mulher muito louca - que será que °
vai acontecer? Ela fez três perguntas:

Como me sinto?
Com ódio! Para mim é dificil admitir a raiva, porque minhas
irmãs não mostram a raiva que sentem. Mas eu estoufervendo!
Preciso expressar esta raiva, mas estou sozinha no carro, não

, . '- I • I I 1, i .• L J j , I... J I ~ " UI. j. I II J. I


A Vida sob Exame / 165

há ninguém com quemfalar o que sinto. Vou falar com Deus


(ainda que os outrospensem que estou louca), mas não vou
mais liberarminha raiva na maneira como dirijo.

o que penso?
Comecei a sentir raiva quando saí do trabalho. O que
aconteceu lá? Será que estou com raiva porque meu chefe
me ignorou, embora eu tivesse feito um trabalho excelente
para oprojeto?Pensei que isto nãofosse me aborrecer, mas
baseado no modo como estou dirigindo, estou com ódio
de algo e acho que é isso.
Este é um padrão para mim? Sim. Freqüentemente fico
com raiva quando aspessoas me ignoram - especialmente
os homens. Por que ajo assim? Costumava ficar com raiva,
quando meu pai me ignorava. Hoje manipulo os homens
para chamar a atenção ou obter a aprovação que perdi.
Como é que isso se enquadra com a realidade? Meu pai
me ignorava, é verdade, mas agora entendo que ele tinha
seus próprios problemas. Ele administrava dois negócios,
suas campanhaspolíticas e seu programa de rádio. Talvez
estivesseprovando a si mesmo que era melhor do que o pai
dele. Falei com ele sobre a sua infância e a minha epercebo
que ele me amava tanto quanto podia.
Não sei o que meu paipensa de mim agora. Entretanto,
ao refletir sobre isso, ele conta aos seus amigos sobre o
meu trabalho e o quanto estou me saindo bem. Minha
ânsia para que meu pai me notasse pode explicar minha
necessidade insaciável de ser notada. Sempre faço coisas
que me envergonham apenas para chamar a atenção.

o quefarei?
Preciso falar com alguém sobre isso. Vou chamar minha
amiga que luta com seus sentimentos sobre o pai dela.
166 / Curando as Feridas da Alma

Vou admitir minha necessidade inextinguível de ser


notada. (Não será um momento em que me orgulharei')
Irei lhe pedir que ore a Deus para me ajudar a achar um
modo de entender que sou amada e notada por Ele. Verei
o que ela estáfazendo a esse respeito.

Complicado? Logo que nos acostumarmos a ouvir nosso eu


verdadeiro, não será tão complicado quanto parece. Com prática
e a ajuda de Deus, fica automático. Os processos de pensamento
de Glenda levaram apenas alguns minutos. Trata-se de preço
baixo a pagar para nos capacitar a responder às pessoas de
modo autêntico e apropriado, a agir sem explodir, a finalmente
ver a vontade de Deus realizada em nosso caráter.
Mas isto é tão deprimente, dirão alguns. Quem é que vai querer
ver todas essas coisas negativas sobre si mesmo? Parece um teste e
eu odeiotestes! É verdade, esse tipo de exame de consciência descrito
aqui é um teste, mas passar ou ser reprovado não é a questão. Na
realidade, todos somos reprovados em testes como este: "Todos
pecaram e destituídos estão da glória de Deus" (Rm 3.23). Não se
preocupe em conseguir boas notas ou passar no exame. Este mais
parece um teste para diagnóstico. Nossa meta é nos ver com mais
clareza. Então poderemos entregar os resultados ao Único que tem
poder para nos transformar. Nessa entrega, pedimos a Deus que
nos mostre o que Ele quer que façamos para trabalhar esses
resultados. Por exemplo, Glenda acreditavaque precisava conversar
com uma amigasobre seus sentimentos. Pouco importando o quanto
nos sintamos mal por não passarmos no teste, o resultado é bom:
Deus, que nos ama, ajuda-nos a nos ver com mais nitidez.
À medida que nossa habilidade em ouvir melhora, talvez
venhamos a descobrir que ignoramos mensagens úteis que nosso
eu verdadeiro nos enviava, porque presumíamos ser pessoas
egoístas ou preguiçosas. À medida que Kerry ouvia-se a si mesma,
descobriu todos os tipos de motivos:

1 i I •• 1, .1 ~ I ,. '; I " iLIl 1 .1111.,1


j • lo. I. I I .L
A Vida sob Exam.e / 167

Eu devia ir a uma reunião do comitê, mas tive aquela


sensação de não querer ir. Minha consciência obediente
(bem treinada como a filha responsável da família) me
falou: Vá de qualquer maneira. Você é uma dessas pessoas
que sempre aparece. Você não é preguiçosa como os outros.
Então, por alguns instantes, ouvi o sentimento
supostamente preguiçoso dizer: Essas reuniões não estão
ajudando ninguém!
Perguntei-me se isso era verdade. Era uma reunião
infrutífera? Tinha eu, salvadora como sou, me vendido a
uma causa perdida? Refleti um pouco sobre as reuniões e
concluí que elas faziam algum bem.
Mesmo assim, sentia-me relutante em ir. Será que era
preguiça? Não, eu estava cansada. Estava exausta e
precisava de descanso. Sabia que esta era uma
possibilidade, porque tenho a tendência a ignorar a
necessidade do meu corpo em descansar. Então resolvi sair
mais cedo do trabalho com o propósito de ir para casa e
descansar antes da reunião.
Isso me ajudou muito, mas enquanto me arrumava
para ir à reunião, ainda me sentia relutante. A face da
presidente do comitê dardejou em minha mente. Era isso!
Eu tinhaficado irritada com ela em uma ou duas reuniões,
mas enterrara o fato. Tinha falado com ela rispidamente
da mesma maneira que ainda retruco à minha mãe
perfeccionista. Por quanto tempo ainda vou me deixar ser
dirigida por minhas reações a meus pais?
Telefonei para uma amiga e conversamos por alguns
minutos sobre o comportamento da presidente. Falamos
sobre como eu poderia responder com firmeza, mas sem
deixar de sergentil, quando ela mefazia exigências. Senti-
me muito melhorporque estava fazendo a coisa certa indo
à reunião, mas também porque estava prestando atenção
168 / Curando as Feridas da Alma

a meus pensamentos e sentimentos. Enquanto dirigia o


carro até à reunião, cheguei a orarpela presidente!

Processo Diário
Sentimentos fortes são apenas uma situação na qual este exame
de consciência acontece. Ao término do dia, podemos refletir no
modo como interagimos com os outros. Também podemos pedir
a Deus que nos mostre nosso progresso: Em que momento do dia
fiquei calmo, quando costumava ficar agitado? Quando foi que
esqueci de minha costumeira obsessão por mim e ouvi alguém,
genuinamente absoruendo as palavras que a outra pessoa dizia?
Não vemos este processo como repreensão de Deus, mas
como estágios suaves no modo como Ele nos transforma.
Entendemos que Deus é como o pai na parábola do filho pródigo,
que por anos esperou que seu filho voltasse - não para
repreendê-lo, mas para sair correndo ao encontro do rapaz
arrependido e saudá-lo (Lc 15.20). Toda vez que descobrimos
uma verdade desagradável sobre nós, recebemos esta
conscientização com gratidão e caímos nos braços do Pai.
Gentilmente a entregamos enquanto Deus trabalha em nós. À
medida que assim damos atenção a nós mesmos, vivemos com
mais autenticidade diante de Deus e das outras pessoas.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Este tipo de exame de consciência não é terrivelmente
desagradável?
R A idéia de fazer exame de consciência é desagradável
para alguns cristãos, porque às vezes os versículos bíblicos
que tratam do assunto foram mal interpretados, com o
sentido de que os cristãos constantemente devem se
maltratar pelos seus pecados. Na verdade, o exame de
consciência nem sempre precisa ser doloroso. Podemos
ser tolerantes, sabendo que Deus conhece nossas faltas

, .. I, I •L ,I, ~ , w. I I.i
A Vida sob Exame / 169

melhor que nós e, mesmo assim, escolheu nos amar


tremendamente. É por isso que o exame de consciência e
a confissão são portais para a graça e a misericórdia. Deus
já conhece nossos motivos e ações e nos ama
incondicionalmente. "Agora, nenhuma condenação há para
os que estão em Cristo Jesus" (Rm 8.1), foi o que escreveu
o apóstolo Paulo, ex-assassino em massa de cristãos. Fazer
exame de consciência é uma oportunidade de nos ver
pelos olhos de Deus com a graça dEle e permitir que Ele
abra as comportas do amor, de forma que sua cura lave
nossas feridas.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

• Se você escolhesse viver a vida no piloto automático, onde


estaria daqui a vinte anos?

• Você já passou por um período de rigoroso exame de


consciência antes? Como é que foi?

• Recorde uma experiência recente que o deixou confuso e


trabalhe com estas perguntas:

• Como me sinto? Ansioso? Aborrecido? Esperançoso? Outra


coisa?
I CAPÍTIJLo DOZE I
Ouvindo-nos aNós Mesmos

À medida que ganhamos prática em nos examinar, ficamos mais


sensíveis aos nossos pensamentos íntimos. Podemos ouvir os
clamores de angústia e raiva que por muito tempo foram
abafados. Temos uma escolha: bloqueá-los, ou ouvi-los na paz
da presença de Deus.

Clamores Internos
Nossos pensamentos mais íntimos podem parecer tolos e
egocêntricos, mas não são mais estranhos do que os clamores
angustiados dos salmistas. Às vezes seus clamores faziam sentido;
às vezes, não. Em algumas ocasiões, eram bonitos e poéticos;
em outras, eram cheios de vingança e autopiedade. Enquanto
que por vergonha escondemos nossos mais profundos clamores,
os salmistas dirigiam esses clamores a Deus. Os judeus julgaram
apropriado incluir estes salmos extremamente emocionais e às
vezes severos em seu hinário de adoração, fato que confunde
muitos cristãos hoje em dia.
Alguns de nossos clamores interiores são pueris, refletindo a
humildade e franqueza das crianças, qualidades que Jesus nos
aconselhou buscar: "Se não vos converterdes e não vos fizerdes

I, .1 I ~ ... I I. I . , .; llII. 1.1 111 J


Ouvindo-nos a Nós Mesmos / 171

como crianças, de modo algum entrareis no Reino dos céus.


Portanto, aquele que se tornar humilde como esta criança, esse
é o maior no Reino dos céus" (Mt 18.3,4). Ironicamente, Jesus
falou estas palavras aos discípulos quando eles estavam se
comportando como crianças - discutindo sobre quem seria o
maior no Reino dos Céus. Enquanto saciavam seus clamores
internos por fama (O que tenho defazerpara me sentir estimado?
Ser notadoõ, Jesus exortou-lhes a que honrassem as atitudes
pueris da humildade, simplicidade e confiança.
Passamos um mal bocado para ouvir os verdadeiros gritos
que partem de nosso interior e admiti-los. Entre outras coisas, é
porque arranjamos muitos "deves" e ficamos envernizados com
muita sofisticação espiritual. Quando nos tornamos crianças o
bastante para sermos confiados, inocentes e completamente
entregues a um pai que acredita em nós, podemos ser honestos o
suficiente para pedir a Deus que nos ajude a nos sentir amados.
Talvez você se identifique com estes clamores dos salmistas e
profetas.

POR FAVOR, CUIDE DE MIM! POR FAVOR, ME PROTEJA!


POR FAVOR, PROVE QUE VOCE'" ME AMA!

Na angústia, invoquei ao SENHOR;


e clamei ao meu Deus;
desde o seu templo ouviu a minha voz
e aos seus ouvidos chegou o meu clamorperante a suaface.
Enviou desde o alto e me tomou;
tirou-me das muitas águas.
Livrou-me do meu inimigo forte
e dos que me aborreciam, pois eram 11UlÍ5poderosos do que eu.
Trouxe-me para um lugar espaçoso;
livrou-me, porque tinha prazer em mim.
Salmo 18.6,16,17,19
172/ Curando as Feridas da Alma

POR FAVOR, DIVIRTA-SE COMIGO! POR FAVOR, TENHA


PRAZER EM MIM! POR FAVOR, DELEITE-SE EM MIM! Deus chega
até nós como um pai de amor, que embala o filho:

o SENHOR, teu Deus, está no meio de ti,


poderoso para te salvar;
ele se deleitará em ti com alegria;
calar-se-á por seu amor,
regozijar-se-á em ti com júbilo.
Sofonias 3.17

POR FAVOR, ENXUGUE AS MINHAS LÁGRIMAS.

Já se consumiram os meus olhos com lágrimas,


turbada está a minha alma,
O meu coração se derramou pela terra...
Os meus olhos choram e não cessam,
porque não há descanso,
até que o Senhor atente e veja desde os céus.
Lamentações de Jeremias 2.11; 3.49,50

PORFAVOR, FAÇA ALGO ESPECIAL PARA ME DISTINGUIR DOS


oumos E MOSTRE O QUANTO SOU IMPORTANTE PARA VOCÊ.
Preparas uma mesa perante mim
na presença dos meus inimigos,
unges a minha cabeça com óleo,
o meu cálice trasborda.
Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão
todos os dias da minha vida;
e habitarei na Casa do SENHOR por longos dias.
Salmo 23.5,6

I I.". ~ I I I I I. i J. I, I.d .A. ,I I • .1. I L a.I. .L _. I .1 r I., Li'" I Ili i Il j~&i ~ I oH.
Ouvindo-nos a Nós Mesmos / 173

ALGUMA COISA ESTÁ ERRADA E ALGUÉM DEVE FAZER


ALGO A RESPEITO!

Desperta! Por que dormes, Senhor?


Acorda! Não nos rejeites para sempre!
A nossa alma está abatida até ao pó;
o nosso corpo, curuado até ao chão.
Levanta-te em nosso auxílio
e resgata-nos por amor das tuas misericórdias.
Salmo 44.23,25,26

Quando temos a liberdade de expressar estes clamores


angustiantes a Deus no calor de nosso exame de consciência,
obtemos maior senso do indefectível amor de Deus por nós. Os
versículos que lemos tornam-se mais do que uma realidade:
"Com amor eterno te amei; também com amável benignidade te
atraí" Or 31.3).
Ainda que Deus use outras pessoas para ajudar a satisfazer
nossa necessidade de amor, parte do que significa seguir a
Jesus é desenvolver um relacionamento com Ele, no qual o
buscamos para satisfazer estas necessidades. Tarefa
negligenciada em nossa jornada espiritual é usar as ferramentas
necessárias para entender que:

• Deus nos ama, mesmo quando não nos sentimos amados;


• Deus faz tudo o que é necessário para cuidar de nós,
mesmo quando um ente querido morre ou somos
despedidos;
• Deus tem prazer em estar conosco;
• Deus nos escolhe abençoando-nos de maneiras
singulares, o que mostra o quanto Ele deseja satisfazer
as nossas necessidades e desejos.
174 / Curando as Feridas da Alma

Clamores Infantis
Embora Deus, como nosso Pai, nos encoraje a irmos a Ele com
nossos clamores infantis, estes também exigem atenção. Se formos
honestos conosco mesmos, verificaremos que tais clamores podem
ser egoístas. Às vezes, nos preocupamos com nossas necessidades
e não com as metas que Deus tem em mente para nós.
Alguns de nossossentimentos reais parecem infantis, porque refletem
a impaciência de crianças que nunca aprenderam a adiar a satisfação.
Queremos o que queremos quando o queremos. Talvez tenhamos
tirado essa atitude de nossa cultura, que é impaciente com o fracasso,
ou de um pai ou mãe que exigiu demais: "Arrume de novo a cama e
desta vez faça direito!" Hoje, quando adultos, ficamos horrorizados ao
sentirestas atitudes de "nenê rei" explodirem dentro de nós. Tentamos
encobri-las com o eu "igreja" e fingimos ser uma criança boazinha,
que se comporta com toda a perfeiçãoe respeitabilidade de um fariseu.
Podemos manter o "nenê rei" cuidadosamente em segredo até que,
de repente, um assunto particularrnente doloroso surge no trabalho
ou na reunião ministerial da igreja e então explcx:limos. As pessoas
nos olham com surpresa e se perguntam o que aconteceu.
Nosso lado "nenê rei" está em ação quando nossos clamores
mais profundos se assemelham a estes.

Farei qualquer coisa para que as pessoas me amem


A parte infantil do eu verdadeiro perderá setenta quilos para
conquistar um cônjuge e depois os recuperará sem pensar no
quanto foi desonesto. Podemos exagerar, mentir ou recorrer à
cirurgia plástica para obter a admiração dos outros.

Farei qualquer coisa para que as pessoas me notem


Podem ser atos óbvios como vestir-se de maneira a dar na vista
e fazer comentários apressados, ou ações mais sutis, como fazer
pilhéria sempre que estamos diante da congregação na igreja.

I II I • J I j rl, 11 , I j., I '" 1& I 111110 I I ' .~


Ouvindo-nos a Nós Mesmos / 175

Farei qualquer coisa para que alguém cuide de mim


Se enfermidade e problemas físicos são meios para fazer com
que os outros cuidem de nós, podemos consultar um médico
que diagnosticará algo que pareça bastante traumático.

Explorarei ao máximo o lado divertido de toda situação


Festas e amigos que gostam de diversão não são considerados
dons celebradores de Deus, mas objetos a serem manipulados
para uma fuga da realidade. Se estamos em profunda dor,
podemos dizer sentenças espirituosas que ridicularizam os outros,
porque faremos o que for preciso para ter a sensação de que
estamos nos divertindo.
Quando nos comportamos deste modo, estamos usando as
pessoas para conseguir o que queremos e elas se tornam nossas
vítimas. É como se tivéssemos um saco furado de necessidades
que não foram satisfeitas quando crianças ou que são advindas
de um cônjuge que nos deixou. Assim, agora nós sentimos no
direito de pegar tudo o que pudermos para fazer com que nossa
necessidade de amor e atenção seja satisfeita.
Pelo fato de estes clamores soarem tão egoístas os reprimimos.
Mas quando o tanque de contenção fica muito cheio, vaza e nos
tornamos passivos-agressivos. Isto quer dizer que procuramos
maneiras sem conexão para expressar nossa frustração. Por
exemplo, um marido que está cansado da crítica da esposa pode
criticar cada atividade dela, porque sabe que a põe em polvorosa.
Nenhum dos dois suspeita que a indolência dele é simplesmente
sua raiva fluindo às ocultas.
Às vezes nossos pensamentos imitam um pai ou mãe "nenê
rei" - só que com muito mais severidade. Podemos ralhar
conosco mesmos e dizer: "Idiota", ou nos aviltar: "Você é pior
d o que ... "
Se alguém gravasse nossas palavras, ficaríamos horrorizados
com a aspereza de nossa voz. Sara, que foi física e sexualmente
176 / Curando as Feridas da Alma

abusada quando criança, tinha o costume de bater-se em si


mesma e gritar: Não! Não! Não! Estava tão habituada a esse tipo
de tratamento, que o infligia a si mesma.
Quando começamos a ouvir nosso eu verdadeiro, é importante
não favorecer nossas tendências de "nenê rei": "Não useis da
liberdade para dar ocasião à carne [natureza pecaminosa]" (GI
5.13a). Em vez disso, tornamo-nos pais sábios e sustentadores
daquele nosso lado "nenê rei" que luta com a mentalidade
"primeiro eu". Examinamos nossos motivos: Será que tenho de
estar com a razão o tempo todo? Tenho de fazer com que as
coisas saiam a meu modo? Sou manípulador?
Ouvimo-nos a nós mesmos com paciência, imitando o Filho
que punha crianças no colo e as ouvia contar suas histórias. Falamos
com Ele, confiamos nEle e lhe dizemos o que realmente sentimos.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Não é atitude egoísta tanta atenção em mim?
R Se não olharmos para nós mesmos, seremos, sem
perceber, vítimas de nosso passado. Da mesma maneira
que temos de arrancar as ervas daninhas para que as
plantas cresçam, assim Deus esvazia a dor para deixar
a cura entrar.
Talvez alguns tentem transformar esta jornada numa
obcecada fixação pelo eu em suas necessidades pessoais,
mas é um processo de auto-esvaziamento para aqueles
que a usam para buscar a Deus. No silêncio rico, vemo-
nos quem realmente somos e ouvimos os motivos que
nos impulsionam. Ouvimos as vozes conflitantes, os
motivos contraditórios, o sussurro ensurdecedor: Faça
tudo que for preciso para sentir-se amado. Faça tudo
para chamar a atenção.
A pergunta primária nesta jornada não é: "E as minhas
necessidades?", mas "O que está dentro de mim e como

~ I I I li • ,I." , I" I "', ~ I IIII~I


Ouvindo-nos a Nós Mesmos / 177

Deus quer moldá-lo?" Este processo seria egocêntrico


se a meta fosse autoglorificar-nos, isto é, mostrar-nos
como pessoas que se parecem tranqüilas e confiantes
de forma que os outros nos observem. Muitas vezes
aqueles que procuram tornar-se um "eu melhor" agem
assim para se proteger de sofrimento futuro. Para o
cristão, tornar-se um eu melhor ou proteger-se não é
a meta. Nosso objetivo é buscar a Deus e encontrar
comunhão com Ele. Então mostraremos e
comunicaremos por palavra e ação o fruto do Espírito.

P O quanto é semelhante esta idéia de ouvir nossos clamores


internos de angústia dos conceitos de "criança interior"?
R É semelhante no sentido de que Deus nos incentiva a
olharmos para o centro de nossos motivos. Ele até nos
chama de seus filhos, e o somos, porque ansiamos por
perfeição, a qual encontramos em Deus, nosso Pai.
O termo "criança interior" não se originou com o
movimento da Nova Era, mas tem sido usado por
psicólogos desde a década de 1930, especialmente pelo
Dr. Hugh Missildine.! Refere-se, usualmente, ao intelecto
e emoções. Como cristãos, acreditamos que o interior
inclui nosso espírito também, porque afeta o modo como
vemos Deus. A comunidade da Nova Era usa muitos
termos psicológicos e espirituais, mas isso não contamina
as palavras em si. Se o termo é proveitoso, use-o.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com uin grupo ou amigo.

• Algum dos clamores mais profundos apresentados a seguir


traz algo à sua lembrança? Nesse caso, marque o quadradinho.
178 / Curando as Feridas da Alma

D Por favor, cuide de mim! Por favor, me proteja! Por


favor, prove que você me ama!
O Por favor, divina-se comigo! Por favor, tenha prazer
em mim! Por favor, deleite-se em mim!
D Por favor, enxugue as minhas lágrimas!
D Porfavor, faça algo especial que me distinga dos outros
e mostre o quanto sou importante para você!
D Alguma coisa está errada e alguém deve fazer algo a
respeito.'

• Se você marcou algum destes quadradinhos, volte e faça a


oração do Salmo apropriado mencionado neste capítulo.
Escreva a resposta que você sente que Deus está lhe dando
enquanto ora.

• Com qual dos clamores a seguir você se identifica mais?


Farei qualquer coisa para que as pessoas me amem.
Enganarei as pessoas para levá-las a cuidar de mim.
Explorarei ao máximo o lado divertido de toda situação.
Farei qualquer coisa para que as pessoas me notem.

• Que outros clamores você identifica em você e nas pessoas de


sua convivência quando elas se comportam como "nenê rei"?

• De que forma qualquer um dos textos bíblicos que aparecem


neste capítulo responde a esse clamor interior? (Se nenhum
versículo responder, peça a Deus que lhe mostre uma
passagem bíblica que responda ao clamor.)

'"~ j"j,. , ,.,.1 ~.,Il,~ . , I,. I "1' l' I 11111<1 I' ~II
ICmo TRflE I
Precisamos das Pessoas

Ouvir os clamores interiores e identificá-los com audácia como


descrito no último capítulo pode ser difícil. Fato de grande ajuda
nesse processo é ouvir outras pessoas que têm procurado
conscientizar-se dos seus próprios motivos interiores. Muitas
vezes elas exprimem em palavras os clamores interiores que
ouvimos dentro de nós, mas que não os nomeamos por nos
faltar a clareza ou a coragem para explorá-los.
Por esta razão, se você deixar de ler este livro neste momento
e não fizer nada com os conceitos e insigbts apresentados,
provavelmente muito pouco mudará em sua vida. Por quê?
Porque precisamos das outras pessoas não só para nos ajudar a
nos ver, mas também para encontrar a cura. Se nossas lutas
dizem respeito a relacionamentos, assim ocorrerá nossa cura. A
cura vem ao encontrarmos uma comunidade, que pode ser
definida como qualquer lugar onde nos associamos com outras
pessoas em propósito comum. Na comunidade, pomos em prática
novos comportamentos e mudamos a maneira como nos
relacionamos com os outros. Criamos e desenvolvemos relações
que refletem o amor e a graça de Deus _. qualidades nas quais
nos sentimos livres para falar, confiar e sentir.
180 / Curando as Feridas da Alma

A idéia de que a cura requer comunidade pode soar estranha,


porque muitas pessoas acreditam que saber de um fato capacita
o indivíduo a mudar de comportamento. Só ouvir uma nova
introspecção não transforma a capacidade do indivíduo em
obedecer a Deus, porque o espírito humano não é como um
computador que pode ser reprogramado. A verdade é que somos
mais do que nossos cérebros - somos sentimentos, desejos,
espírito, corpo. Sozinhos não conseguimos pensar em ser
melhores cristãos. Não podemos apenas ler um princípio de
retidão e então agir de acordo. Pelo contrário, a simples leitura
dos fatos pode produzir uma culpabilidade paralisante.
Precisamos meditar neles e absorvê-los em nossos corações.
Precisamos de um lugar seguro para refletirmos sobre estes fatos
e a forma como eles afetam cada parte de nosso ser, inclusive
nossos sentimentos, desejos, espírito e corpo.

Encontrando Lugares de Comunidade


Mas se nos isolamos e tendemos a não confiar nas pessoas,
como acharemos comunidade? Idealmente, encontraremos uma
comunidade apoiadora dentro de nossa igreja local, mas alguns
aprenderam a ser bastante precavidos em tais ambientes.
Lamentavelmente, às vezes parece que onde estiverem dois ou
três reunidos - mesmo em nome de Jesus - há julgamento e
fofoca no meio deles. Não obstante, em amizades ou grupos
dentro da igreja em geral podemos encontrar lugares seguros
para nos curar da negação, culpa, isolamento e atos de ira. Esta
comunidade pode ter muitas formatos.
Uma amizade, na qual duas pessoas se dedicam uma à outra
e se reúnem regularmente, pode ser uma comunidade segura.
Certos tipos de relacionamentos de mentor que estejam
baseados em crescimento espiritual (embora não necessariamente
visando a aquisição de habilidades ministeriais) funcionam bem
como comunidade. Em tempos passados, os cristãos tinham

I .• L- 01. ~ , I 1.1 j,J.1


Precisamos das Pessoas /181

diretores ou companheiros espirituais que os ouviam e faziam


perguntas.
Grupos pequenos, como grupos de apoio, grupos de
discipulado, grupos de estudo bíblico e equipes ministeriais
trabalham bem quando o enfoque é a formação de caráter. Eles
imitam uma família apoiadora e fornecem situações seguras nas
quais as pessoas trabalham suas lutas interiores e falhas de caráter.
Nem toda amizade, relacionamento de mentor ou grupo pequeno
pode proporcionar comunidade. Os participantes precisam construir
na relação as seguintes qualidades de comunidade.

Segurança
A confidência - não contar a ninguém o que ouvimos
assegura-nos que podemos revelar nossos piores segredos
pessoais sem vê-los divulgados alhures. A confiança não se
desenvolve a menos que todos os comentários sejam mantidos
em segredo.
Ouvir com segurança também envolve nos ouvirmos uns aos
outros até o fím, sem nos fixarmos uns nos outros. Não damos
opiniões ou fazemos minissermões. Temos o cuidado de nos
concentrar em verdadeiramente ouvir a pessoa e não em dar
conselhos. Podemos contar como Deus trabalhou em nossas vidas,
mas não oferecemos métodos práticos a ninguém. O Espírito Santo
convence as pessoas sem que alguém diga: "Você é crente. Você não
pode se sentir assim". Alguns grupos praticam o ouvir com segurança
seguindo a regra de "não interromper" (ninguém se manifesta durante
o tempo reservado para a pessoa falar). Esta rotina também ajuda
aqueles que ouvem, sobretudo se são pessoas que desempenham o
papel de cuidador (Capítulo 5) ou o de apaziguador (Capítulo 7).
Elas aprendem a ouvir os outros respeitosamente.
A segurança de tais relacionamentos e grupos permite-nos
experienciar sentimentos que há muito enterramos. No papel
familiar do ajustador (veja o Capítulo 7), Anita nunca ficava
182 / Curando as Feridas da Alma

brava, ainda que vivesse com um marido controlador e dois


filhos adolescentes rebeldes. Na segurança de um grupo de apoio,
Anita sentiu raiva pela primeira vez:

Vários integrantes do grupo falaram sobre o quão


asperamente seuspaís lhesfalavam quando eram crianças.
Fiquei pensando: Qual é o problema deles? Por que não
ignoraram?
Então alguém repetiu a frase exata que meu pai dizia
e dei um sonoro suspiro. Isto não era habitual, porque sou
pessoa quieta. Todo o mundo me olhou com surpresa.
O líder disse: "Anita, quer ser a próxima?"
Fiquei em silêncio por alguns minutos. Sentia como se
pinhas estivessem crescendo em minha garganta e não
poderia ter falado mesmo que quisesse. As lágrimas
começaram a rolar.
Então fechei a mão em punho e com suavidade bati em
meu joelho. "Porque meupaifalava comigo daquele jeito?",
disparei. "Eu era uma menina tão boa, tão comportada.
Nunca lhe retruquei como minha irmã fazia". Não
conseguia parar de chorar e ninguém dísse nadapor vários
minutos.
Nunca antes havia agido daquela maneira no grupo.
Depois da reunião várias pessoas vieram falar comigo e
me confortar. Em certos momentos, apreciei o conforto que
deram e o saboreei. Em outros, odiei e quase saí correndo.
Fiz força para ficar sentada enquanto me incentivavam.
Era assustador ficar com raiva. Era assustador ser
incentivada.

o comportamento de Anita pode não parecer um


comportamento irado se compararmos com expressões de raiva
mais verbais, porém, para a doce, sorridente e ajustadora Anita,
era raiva. Depois, naquela noite, ela relembrou mais fatos de
Precisamos das Pessoas /183

sua infância. Quando se perrrutiu lembrar ser abusada


sexualmente, seus pés começaram a bater forte. A raiva lhe era
tão alienígena que seu corpo reagiu. No fim, estava quebrando
as regras não escritas da família: não fale alto, não deixe que os
outros a incentivem e não fique com raiva. Ela sabia que para
consumir essa raiva precisava falar sobre o assunto na reunião
da semana seguinte com o grupo. Anita continua:

Eu sabia que não ia conseguirfalar em voz alta como os


outros, por isso escrevi um diário que mantive escondido.
Na semana seguinte, li o diário. Quando terminei, comecei
a chorar e a mulher ao meu lado colocou o braço em torno
de mim. Sempre tinha sentido repugnância ao ser tocada,
mas naquela noite aconcheguei a cabeça no pescoço dela
e chorei por vários minutos.
Este foi o ponto da virada. Pouco a pouco, comecei a
confiar nas pessoas. Conseguia dizer o que pensava sem
medo de ser criticada, podia deixar alguém me abraçar
sem odiar o ato.

Honestidade
Muitas das conversas feitas antes e depois do horário dos cultos
dizem respeito às últimas notícias, ao tempo e às variedades:
"Assistiu aquele programa ontem?", ou: "Gosto do seu vestido
novo". Todos achamos difícil falar sobre nossa fé e sentimentos.
Fazer comentários sobre confusão e raiva pode ser interessante,
mas às vezes nos parece chocante e ofensivo. As histórias das
pessoas desafiam nossa rotina mental - estamos nos debatendo
com o mesmo assunto que nos choca? Curt fala a respeito de uma
de suas primeiras experiências num grupo de apoio:

Tudo ia bem quando o sujeito ao meu lado (que chamarei


de Darrell) disse: "Odeio Deus".
184 / Curando as Feridas da Alma

Fiquei chocado! Contudo, ninguém mais fez muita


conta do caso e~ sendo apaziguador, sorri para Darrell.
Pelo menos é honesto, pensei.
Também fiquei intrigado com a situação. Estávamos
lá sentados em cadeiras pertencentes à igreja, numa sala
de aula da igreja e este sujeito disse que odiava Deus.
Secretamente eu sentira esse mesmo tipo de raiva de Deus,
mas nunca tinha admitido a ninguém - muito menos
no recinto de uma igreja! Puxa vida, este sujeito tem
coragem, refleti.
Próximo do fim do seu período de compartilhamento,
Darrell desfez-se em lágrimas. Explicou que sentia que
Deus - na forma de seus pais - nunca tinha se
achegado a ele.
"Meus pais eram muito frios", disse ele. "Nunca me
disseram que me amavam. Sentia-me só e abandonado.
Davam-me dinheiro e tudo de que precisasse, mas nunca
me abraçaram ou me tocaram. Eu não era uma criança
má. Não era justo que me ignorassem".
Vi que algo grandioso estava acontecendo. Tratava-se
de pessoas honestas que estavam declarando sentimentos
honestos e encontrando aceitação da parte de outros
cristãos. Quando chegou a minha vez, murmurei que
talvez eu também tivesse sentido raiva de Deus. '~s vezes
não entendo o modo como Elefaz as coisas", disse ao grupo.
Divagueipor alguns minutos até que me lembrei do texto
biblico que diz que ninguém entende a mente de Deus.
[uQuem pode conhecer a mente do Deus Eterno? Quem é
capaz de lhe dar conselhos?" (Is 40.13, BLlP)} Enquanto
falava, algo aconteceu. Sentia uma sensação de alívio.
Estava com um pouco menos de raiva e comecei a pensar
quepoderia aceitar o fato de eu não entender Deus. Estefoi
o começo de um relacionamento mais genuíno com Ele.

. .. ~ I I I ., I........ j li ,J a ;; ~ I , ., LIiL 1.I j, I, I


Precisamos das Pessoas / 185

Darrell poderia ter facilmente negado a raiva que sentia de


Deus e se desviado da fé. Em vez disso, encontrou um lugar para
falar sobre seus sentimentos. Ele queria estar perto de Deus e
esta confissão foi o primeiro passo para entender que Deus o
amava. (Não estamos defendendo um desrespeito a Deus, mas é
importante enfrentar sentimentos ofensivos, de forma que nossa
relação com Deus possa ser curada.) Pela razão de Curt ter
entendido este processo, também tratou do mesmo problema.
Rememorando os fatos, Curt ficou atordoado pela atitude do grupo:

Os integrantes do grupo não agiram como se Darrellfosse


pior do que eles, pelo fato de Darrell haver dito que estava
furioso com Deus. Cada um se concentrou em suaspróprias
circunstâncias pessoais. Esta honestidade e aceitação
criaram um lugar no qual todos podiam falar, confiar e
sentir. As pessoas se sentiam valorizadas e privilegiadas
em ouvir os outros confessarem os problemas que tinham.

Você consegue imaginar o quão transtornados os integrantes


de muitos grupos pequenos ficariam se alguém como Darrell
dissesse que odeia Deus? O medo de Darrell era que as pessoas
lhe respondessem: "Orarei por você", ou: "Vamos falar com o
pastor", ou até: "Isto é diabólico. Declare a vitória!" Por isso que
na igreja Darrell mantinha-se em silêncio a esse respeito. Quantos
domingos ele se sentou no banco da igreja pensando que iria
explodir se não clamasse a Deus. Darrell precisava de seus
companheiros cristãos para que ouvissem a ferida dele e
reagissem com o incondicional amor de Deus. Se eles tivessem
se apressado em oferecer chavões sobre orar um pouco mais e
ler mais a Bíblia, teria sido como uma enfermeira de face
impassível que coloca Band-Aid num paciente ferido com graves
ferimentos a faca. Todos precisamos mais do que bandagem,
precisamos de ternura e reconhecimento de nossas feridas.
186 / Curando as Feridas da Alma

A honestidade infiltrá-se pelos muros da negação e isolamento


que construímos à nossa volta e nos ajuda a formar laços de amizade
estreita com as pessoas. A maioria de nós tem deixado poucas
pessoas (e certamente Deus não é uma delas) passarem de nossos
muros. Quando falamos sobre assuntos mais sérios, aprendemos o
que é intimidade, porque arriscamos a deixar ir nosso medo de
sermos abandonados. À medida que o medo diminui, também é
mais fácil arriscar estabelecer comunhão com Deus.
Aqueles que experimentam tal honestidade freqüentemente
ficam presos a ela - não por causa do drama, mas por causa da
cura que traz. O coração se sente revigorado, porque vemos
Deus trabalhando em nossa vida. Percebemos que Ele pode
substituir esses sentimentos loucos por um profundo e
permanente amor e confiança nEle. Ao nos unir, temos os
recursos para mostrar amor e aceitação de forma que imite o
amor de nosso Pai.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Atualmente não pertenço a nenhuma igreja. O quefaço
para encontrar esse senso de comunidade?
R Primeiro, fique em contato com pessoas que você já
conhece. Amigos chegados do passado podem ser úteis,
mesmo que isso signifique viajar ou fazer telefonemas
interurbanos. Depois apresente a Deus em oração este
pedido de comunidade e mantenha-se alerta, enquanto
permanece em sua busca intensa de um amigo ou grupo.
Visite grupos pequenos nas igrejas e, se desejar, um grupo
de apoio de algum tipo (AA, por exemplo). Não seria
incomum encontrar cristãos lá. Enquanto espia ao redor,
fique de antena ligada. Preste atenção a comentários que
fazem a pessoa se sentir segura. Convide essa pessoa ou
mesmo várias para tomar café depois de um culto ou
reunião e conversem por algum tempo.

i.Jr.L ... L J. I .•.• u.


Prec~amos das Pessoas /189

I Escreva uma oração, declarando sua maior necessidade de


encontrar comunidade.

I Se você não achou um grupo ou pessoa com quem


compartilliar as respostas aalgumas dessas perguntas, por
favor ore aDeus para que oajude aencontrar esse lugar
seguro. Depois, aborde uma pessoa ou participe de um grupo
para ver se esta éaresposta de Deus.
ICAPÍTULO QuATORZE I
Admitindo Quem Somos

A declaração freqüentemente feita - "A igreja não é hotel para


os santos, mas hospital para os pecadores" - sugere o quanto
tendemos a nos comportar como crianças boazinhas na igreja.
Esta atitude rouba da igreja o senso de comunidade. O senso de
comunidade (a sensação de verdadeiramente fazer parte de algo)
desenvolve-se a partir da capacidade de revelar sentimentos
que não foram higienizados e, ainda assim, encontrar aceitação.
Confessar nossas faltas aos outros ensina-nos a falar, confiar e
sentir. Isto nos leva à cura, como promete a Palavra: "Confessai
as vossas culpas [faltas, pecados] uns aos outros e orai uns pelos
outros, para que sareis; a oração feita por um justo pode muito
em seus efeitos" (Tg 5.16).
Este tipo de honestidade era comum nos grupos pequenos
da Igreja Primitiva: "As células da primitiva Igreja cristã eram
formadas por pequenos grupos de pessoas que se reuniam
regularmente - em geral às ocultas. A ordem do culto era, em
primeiro lugar, auto-revelação e confissão de pecado. [. ..] A isto
seguia-se o apropriado anúncio da penitência, pedidos de perdão
e planos para fazer restituição. Um período final de
companheirismo (koinonia) amigável encerrava a reunião".'

I ... L j . L .L I I J.... J j, ~ I I r, W. I J 1 ~ll; I


Admitindo Quem Somos / 191

Entretanto confessar nossas faltas ou pecados uns aos outros


não é muito falado ou colocado em prática na Igreja dos dias de
hoje. O que precisamos fazer para que a confissão funcione
entre os crentes?

Encontrando Ouvintes de Confiança


Pelo fato de vermos tão pouca confissão, não estamos certos de
como fazê-lo. Confissão é simplesmente contar a outrem sobre
uma falta, pensamento ou sentimento do qual não nos
orgulhamos. Quando corretamente compreendido, pode ser
integrado em grupos de estudo bíblico, grupos de discipulado e
relacionamentos que parecem seguros. Com freqüência
reservamos tempo para oração nestes grupos; também podemos
reservar tempo para declarar comportamentos e atitudes pelos
quais gostaríamos de prestar contas.
Quando procuramos pessoas com quem possamos formar
este tipo de comunidade, os princípios expostos no capítulo
anterior são aplicáveis: confidência, honestidade e humildade.
Pessoas de confiança ouvem sem bancar o pregador ou o
psicólogo de divã. Tais indivíduos estão cientes de suas próprias
imperfeições, entendendo que eles têm o potencial de amanhã
cometerem o mesmo erro que você confessa hoje.
Quando chegam a falar, agem mais como um líder de torcida
do que um executor. Por outro lado, não maneiram nossas faltas:
"Todo o mundo faz isso de vez em quando". Eles crêem no
poder de Deus para mudar.
Você encontra pessoas de confiança servindo-se de um dos
seguintes métodos.

Procure honestidade e fé
Quando Cynthia descobriu que seu marido de vinte anos tinha
sido secretamente bissexual, ela o odiou. Cynthia precisou
192 / Curando as Feridas da Alma

confessar esse ódio e prometer trabalhar o sentimento, mas não


conhecia ninguém que pudesse lidar com tal notícia sensacional.
Ela escolheu sua líder de estudos bíblicos, Martha, por duas
razões. Primeira, Martha sempre admitia seus defeitos ao grupo.
Seguindo, Martha orava muito. Cynthia sabia que Martha podia
ajudá-la a confiar no poder de Deus.

Teste as águas
Revele algo menos importante e veja como as pessoas reagem.
Quando Patty participou pela primeira vez de um grupo de
apoio, ela não acreditava que as pessoas viessem a aceitá-la.
Assim, mencionou o quanto se sentia mal por ter gritado com
os filhos na manhã daquele dia, e observou o comportamento
dos membros do grupo. Eles não sabiam, mas ela estava testando-
os. Eles "passaram" no teste de diversas maneiras. Uma delas foi
que quando as pessoas falavam, mencionando suas dificuldades
com determinado problema, o que pensavam que fosse a origem
dele e o que estavam fazendo a respeito. Ela também reparou
que depois da reunião, ninguém disse: "Patty, se você ler este
livro..." Antes que saísse, ela e outra mãe concordaram em orar
uma pela outra e falar por telefone com o intuito de encorajarem-
se mutuamente.

Recorde os comentários prévios


Quando Bob e a esposa se divorciaram, eles sumiram da igreja.
Quando um casal da igreja convidou Bob para jantar, ele contou
sua história e seus erros na dissolução do casamento. Bob disse-
lhes que sabia serem eles de confiança, porque numa conversa
vários anos atrás, a esposa disse que a afligia ao ver as pessoas
serem tão duras com os amigos divorciados que já estavam feridos.
O crescimento cristão é muito importante para ser insensível
às pessoas e desperdiçar tempo sendo fraudes espirituais. É muito

J 11 lll. I
Admitindo Quem Somos / 193

melhor procurarmos ouvintes de confiança e nos fixarmos no


caminho do crescimento.

Reconhecendo a Culpa
Outra razão para não admitirmos facilmente nossos erros é que
a culpa não tem boa impressão. Também pode ser difícil entender
exatamente de que sentir-se culpado. Aqueles de nós que são
cuidadores presumem que muito do que acontece é nossa culpa.
Ao admitir nossos erros, precisamos assumir a responsabilidade
pelo que fizemos de errado e não nos preocuparmos com o
restante. Limpo meu lado da rua, por assim dizer, mas não posso
limpar o lado da rua da outra pessoa. Por exemplo, se alguém
se irrita com você, você é responsável pelo modo como vai
reagir. Se você responde sem ser rude (embora com firmeza),
não tem de assumir a responsabilidade pela outra pessoa ter-se
irritado. Se você implicou com ela até que se irritou, precisa
admitir que foi insistente e se desculpar. Contudo, você não é
responsável pelo fato de ela ter se irritado.
Assumir a responsabilidade pelo que não fizemos é falsa
culpa. A verdadeira culpa nos fala o que realmente fizemos de
errado e pelo que precisamos pedir perdão. A falsa culpa (ou
vergonha) é o desprezível sentimento que nos diz que somos
totalmente errados. Explica-se com pensamentos como: Eu não
apenas cometi um erro, eu sou o erro, se algo sai errado, devo
ser a causa. Além de pôr a pique a nossa auto-estima, a falsa
culpa aguça o papel da verdadeira culpa. Se estamos tomados
pela vergonha, não somos convencidos pela verdadeira culpa,
nem a confessamos e pedimos perdão. Não há suspensão
temporária da execução da sentença por vergonha.
Quando confessamos, tratamos da parte pela qual somos
culpados. Se não estamos certos de qual seja, podemos falar
sobre a situação com um amigo e pedir a Deus que nos mostre
nossa parte. Então confessamos nossa falta sem mencionar a
194 / .Curando as Feridas da Alma

falta da outra parte. Deixamos isso no lado da rua da outra


pessoa para que esta a limpe.

Prestação de Contas
Uma vantagem preciosa em confessar nossas faltas a alguém
que confiamos é que existe uma suave prestação de contas.
Confessamos em alto e bom som que o exagero de nossas
realizações mencionadas no currículo, que nos xingamos de
"burro" por derrubar a caneta, que mantemos a distância a pessoa
que amamos porque tememos ser abandonados por ela. Ainda
que o ouvinte de nossa confissão nos aceite, pensamos duas
vezes antes de repetir o erro. Agora temos um companheiro em
nossa jornada espiritual com quem podemos contar. Também é
razoável supor que não confessaríamos esta mesma falta outra
vez à mesma pessoa ou grupo. Sentimos o leve dever de prestar
contas a eles.
Podemos até escolher prestar contas a uma pessoa ou grupo:
"Se me sentir fraco ... ligarei para você". Quando queremos prestar
contas, é sensato propor medidas razoáveis e práticas para
vencermos comportamentos. Charlotte conta sua história:

Sentia-me atraída por um homem casado e, embora me


envergonhasse, não conseguia parar de pensar. Então
confessei meu sentimento a uma amiga mentora, Helen.
Ela me ouviu e admitiu que algumas vezes lutara com o
mesmo problema.
Então Helen disse: "O que você vaifazer a esse respeito?"
"Tenho de parar de fantasiar", respondi.
"Isso é possível no momento?", Helen me perguntou.
Admiti que não.
{(Você acha que ajudaria substituir a fantasia por outra
atividade?", perguntou Helen. Depois acrescentou: "Tentei
orarpelo homem em vez defantasiar com ele! Tinha certeza

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Admitindo Quem Somos / 195

de que não conseguiria fazer as duas coisas ao mesmo


tempo!"
Gostei da idéia e conversamos sobre qual seria a origem
de tal atração. Imaginamos que poderia ser minhas
dificuldades matrimoniais. Meu marido e eu estávamos.
trabalhando nossa relação, mas não me sentia amada a
maiorparte do tempo.
"Que tal se, quando me sentir inclinada a fantasiar,
eu pensasse no quanto Deus me ama?", perguntei a Helen.
Ela achou que era uma boa idéia e pude ouvi-la folhear a
Bíblia. Finalmente, ela me deu um versículopara meditar:
"Deus me ama e se agrada de mim" (uma adaptação do
SI 147.11). Concordei em relatar a Helen meu progresso a
cada dois dias e ela concordou em orar por mim. Depois
de mais ou menos uma semana, as fantasias pararam, o
que me ajudou a trabalhar meu casamento.

A conversa de Charlotte e Helen ajudou Charlotte JX>r várias razões:

• Helen ouviu Charlotte sem fazer julgamentos.


• Helen admitiu ter passado pela mesma tentação.
• Helen ofereceu uma sugestão sem insistir que Charlotte
a aceitasse. Esta atitude liberou Charlotte para usar a
sugestão como trampolim a fim de buscar a direção de
Deus sobre o que daria mais certo para ela.
• A meta de Charlotte era admissível e alcançável. Ela
não prometeu parar de fantasiar, só redirecionar seus
pensamentos.
• Charlotte prometeu manter Helen informada, e esta
concordou em orar por ela.

A conversa delas ilustra bem a mutualidade da confissão e o


modo como a comunidade cristã proporciona um hospital para
os pecadores e, às vezes, até uma unidade de terapia intensiva.
196 / curando as Feridas da Alma

Como a Confissão na Comunidade Ajuda


A confissão nos ajuda a entender as mensagens que enviamos
para nós mesmos
À medida que examinamos porque fazemos o que fazemos, cenas
do passado reprisam em nossa mente. Não estamos nem mesmo
cientes de como reagimos a certas pessoas que se comportam de
maneira similar a nossos pais. Quando falamos sobre isso num
ambiente de relação segura, estes dados vêm à luz e podem ser
mais facilmente entregues a Deus. Isto nos ajuda a encarar nosso
eu verdadeiro, encontrar a cura e fazer melhores escolhas com
base no que verdadeiramente pensamos e sentimos.

A confissão alivia a ansiedade


Assim que esses sentimentos estão patentes, não nos sentimos tão
presos a eles. Pela razão de o segredo ser parte do que lhes toma
tão subjugantes, o ato de revelá-los reduz a ansiedade e a solidão.

A confissão nos capacita


Pelo fato de termos revelado o segredo e encontrado aceitação,
o comportamento, sentimento ou situação feitos às ocultas
perdem seu poderoso controle sobre nós. Foi assustador
alimentar dúvidas secretas sobre Deus estar cuidando de nós ou
não, ter medo de que nunca acharíamos aprovação ou afirmação
e sentir raiva secreta de que a vida é tão decepcionante.
Queremos abalar esses sentimentos ocultos. Saber que outras
pessoas também experimentam tais estados afetivos nos liberta
para examiná-los e trabalhá-los com Deus.

A confissão pode instigar afeto apropriado


Revelar nosso verdadeiro eu pode nos remeter ao abraço de
um bom amigo em quem podemos confiar. Os amigos,

j 1..Il. . ~ ~ I I " 11" • I.~ Li I • ..I .11. li , I i" I 'o "~I, » I li II~I '
Admitindo Quem Somos / 197

mentores e integrantes de grupos de apoio, podem ser estes


braços físicos de Deus, fazendo-nos saber que somos amados
e valorizados .:

A confissão nos ajuda a fixar limites ao nenê rei em nós


Ouvimo-nos a nós mesmos falar e descobrimos nossa
impaciência: Aquele integrante do grupo é chato. Por que
ele não cala a boca? Parece realmente ríspido, não? Às vezes
provamos e damos nova redação às nossas emoções
extremas. Tive vontade da matá-la - não, não quis dizer
isso - ela só me irritou. Pelo fato de ouvirmos nossas
palavras faladas em voz alta, é mais fácil reformular os dados.
Podemos reconhecer nossa emoção, trocando de: A
reclamação dele me deixa furioso, para: Tenho a tendência
a ficar irritado com as pessoas que reclamam muito.
Tentamos oferecer aos outros a mesma graça e misericórdia
que estamos recebendo da relação segura.
Mesmo com todos estes benefícios, o dever de prestar contas
aterroriza a maioria de nós. No começo parece terrível. Nas
primeiras vezes que você confessa uma falta a alguém, parece
que um vulcão está em erupção dentro de você. Depois de
algum tempo, assemelha-se mais a uma picada de agulha. Não
é praticamente nada em comparação com o tremendo alívio
que se segue. Depois que você se acostuma a ter uma
consciência limpa, um segredo sempre irá ferir mais do que a
confissão.

Medos Que Nos Detêm


É normal sentir medo ao revelar erros e mágoas. Mesmo quando
confessamos somente a pessoas de confiança que sabemos que
vão nos aceitar e manter nossas palavras em segredo, ficamos a
pensar.
198 / Curando as Feridas da Alma

Medo da mágoa
Avançamos lentamente, sendo pacientes com o que podemos
revelar. Talvez tenhamos de nos reassegurar repetidas vezes que
sobreviveremos.

Medo da rejeição
O grande medo ao confessarmos uma falta, sentimento oculto ou
hábito asqueroso é que o ouvinte venha a ter menos respeito por
nós. Contudo, muitos têm os mesmos sentimentos que nós e se
sentem aliviados ao descobrir que os outros têm as mesmas falhas
de caráter. Temos a crença errônea de que os outros levam suas
vidas em ordem e só nós que não. Quanto mais transparentes
formos, mais provável será que as pessoas confiem em nós.
A rejeição é inevitável. Nós a enfrentamos admitindo nossa
mágoa. Quando falamos com alguém a esse respeito,
conseguimos ver o que fizemos de errado ou, talvez, que a
avaliação daquele que nos rejeitou não foi precisa. Além disso,
ainda temos a reafirmação daqueles em quem estamos
aprendendo a confiar.
jan nos conta como o fato de ser ouvinte crítica a condenou:

Vários anos atrás, uma mulher confessou, envergonhada,


a um grupo de apoio que ela gritou com a professora de
sua filha. Eu não disse nada, masfiquei pensando o quão
imatura foi aquela mulher. No dia seguinte, a professora
de meu filho foi injusta com ele, como havia sido duas
outras vezes. Quando me dei conta, estava segurando o
telefone, pronta para chamar a professora e o diretor, e
sentia-me tão furiosa queprovavelmente teria gritado com
a professora.
Então me lembrei da mulher do grupo e pensei: Estou
fazendo a mesma coisa pela qual eu a critiquei. Falarei, mas
pela graça de Deus! Moderei o que eu disseao diretor efizemos

• l LO i l. ÜI , j _i ,. ~ • I. I W; l J I lL&. 1
Admitindo Quem Somos / 199

algumprogresso na solução doproblema. Depois do telefonema]


oreipormim efXJr ela eprometi solenemente não ser tão crítica.
Quando me sinto crítica em relação a alguém] repetidamente
me lembro daquela mulher e deixo de julgar.

Medo das lembranças


Aqueles que sofreram abuso físico ou sexual freqüentemente
bloqueiam sentimentos, porque temem que se lembrarão dos
eventos traumáticos que tentam esquecer. Algumas vítimas que
sofreram abusos bloqueiam lembranças específicas de infância
com o intuito de se protegerem. Por isso, quando as lembranças
vêm, tais indivíduos podem ficar em frangalhos. Alguns se lembram
apenas de cheiros ou sons, mas sonhos ou conversas trazem de
volta mais lembranças. Mesmo assim, muitos não estão certos se
o que lembram é a verdade, ainda que recordem detalhes vívidos
e se lembram deles enquanto estão plenamente despertos. Temos
de confiar que Deus nos ajudará a lembrar o que nossa mente
consciente está preparada para enfrentar no momento certo.
Mesmo as pessoas que não foram abusadas freqüentemente
bloqueiam traumas de infância. Um sentimento simples vêm à
tona e nos subjuga, e não sabemos por quê. Quando adulta,
Candace visitou seus pais a quem ela não via há vários anos:

Meus pais imaginaram que eu dormiria no mesmo quarto


em que dormi quando adolescente. Quandofiquei sozinha
naquele quarto] todos aqueles antigos sentimentos de
depressão e desesperança me dominaram. Passei a lembrar
que me sentava no chão do meu quarto de adolescente e
ouvia meus pais discutirem] pensando que nunca
encontraria paz. Nessas situações costumava ligar o som
para não ouvir nada.
Muito embora hoje seja adulta] dormi agarrada ao
travesseiro durante a noite. Eu já estava preocupada com
200 / Curando as Feridas da Alma

meu trabalho e estar em meu antigo quarto me fez sentir


mais insegura do que nunca. Na noite seguinte dei uma
desculpa para ficar em outro quarto.
Esta experiência me ajudou, porque eu vinha negando
minha infância. Continuava insistindo a um grupo que
participopor causa da minha bulimia, que minha infância
não tinha sido tão ruim assim. Agora vejo que me sentia
desesperada quando adolescente. Aquele desespero alimenta
minha atualfissura por magreza e aceitação dos outros.

É preciso coragem para suportar a ferida de algumas


lembranças. Quando aceitamos o desafio, descobrimos que Deus
pode nos sustentar e nos amar tanto quanto Ele estivesse nos
envolvendo fisicamente em seus braços e nos amando. Ele não
quer que fiquemos trancados para sempre no armário.

Ouvindo as Confissões dos Outros


Quando os amigos confessam suas falhas ou os integrantes de
grupos despejam desgraças descomedidas, às vezes nos sentimos
honrados por sermos considerados dignos de confiança o bastante
para ouvir a confissão deles. Enquanto os outros falam sobre seu
time preferido, aqueles de nós em comunidades de fé e segurança
permitem que as pessoas revelem seus problemas. Foi assim que
jan sentiu-se honrada por ouvir a confissão de alguém:

Certo dia uma amiga solteira que havia se mudado da


cidade, telefonou-me aos prantos. Fiquei ouvindo,
enquanto ela gaguejava e lutava para falar. Finalmente
saiu: ela estava solitária e tinha dormido com um homem.
Em lugar de interrompê-la ou tentar solucionar o
problema (como antigamente tinha sido meu costume),
permaneci quieta. Pelo fato de ela ter um compromisso
sério com Cristo, eu sabia que ela estava arrependida e

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Admitindo Quem Somos / 201

completamente triste. Depois de ter desabafado a história,


falamos sobre o quanto Deus a amava e que somente Ele
poderia satisfazer a necessidade dela de amor naquela
cidade distante. Conversamos sobre como ela poderia evitar
cair nesse problema outra vez. Depois oramos juntas.
Depois que desligamos, agradeci a Deus pelo telefonema:
Agradeci-lhe porque outrora aquela mulher tinha ouvido
muitas das minhas confissões. Dei-lhe graças por ela ter
me procurado com esta confissão, em vez de escondê-la.
Agradeci-lhepela honra de ser a ouvinte daquela confissão
e orei por ela. Também fui-lhe grato pelas muitas pessoas
que Ele tinha colocado em meu caminho, que tinham
ouvido minhas confissões e estabelecido tal exemplo da
graça e misericórdia de Deus para mim.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Em que a confissão é diferente de desabafar nossos
problemas com as pessoas?
R Revelar nosso eu verdadeiro aos outros assemelha-se a
desabafar nossos problemas, porque sentimos alívio
tremendo. Se o ouvinte é alguém com experiência
semelhante, também sentimos comunidade com ele, o
que minora nosso isolamento. A maior diferença entre
confissão e desabafo é que a confissão traz em seu
bojo a meta de crescer e amadurecer em Cristo. É uma
questão de declarar: "Isto é o que sou hoje, mas quero
ser o que Deus quer que eu seja".
Os mentores e amigos sensatos podem até perguntar:
"O que você vai fazer a esse respeito?" Não se trata de
pressionar para que você proponha uma fórmula, mas
plantar uma semente de busca de cura. Quando as
pessoas apenas desabafam seus problemas, estão
procurando simpatia, mas não cura. Nessa situação não
202 / Curando as Feridas da Alma

há busca da vontade de Deus para a solução do


problema.

P A Bíblia afirma claramente queJesus é o único Mediador


entre Deus e os homens. A confissão de pecados às
pessoas não as coloca no lugar de Cristo?
R Os cristãos recebem de Deus perdão de pecados por
meio de Jesus Cristo, o único Mediador: "Há um só
Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus
Cristo, homem, o qual se deu a si mesmo em preço de
redenção por todos, para servir de. testemunho a seu
tempo" (1 Tm 2.5,6). Este capítulo não trata de como
recebemos perdão por intermédio de Cristo (muito
embora esteja implícito), mas de como Deus nos cura:
"Confessai as vossas culpas [faltas, pecados] uns aos
outros e orai uns pelos outros, para que sareis; a oração
feita por um justo pode muito em seus efeitos" (Tg
').16). O relar-ionarnento recíproco de cristãos que
confessam seus pecados uns aos outros elimina a idéia
de que qualquer pessoa seja maior do que a outra aos
olhos de Deus. Idealmente, aqueles que ouvem nossa
confissão são os mesmos cujas faltas conhecemos bem,
porque eles confessaram seus pecados para nós.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

• Qual é a sua resposta a este versículo? "Confessai as vossas


culpas [faltas, pecados] uns aos outros e orai uns pelos
outros, para que sareis; a oração feita por um justo pode
muito em seus efeitos" (Tg 5.16) .

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Admitindo Quem Somos / 203

•Quem você considera digno de confiança obastante para


confessar suas faltas? Oque faz com que oconsidere de
confiança? Como oabordaria?

• Descreva um momento em que se sentiu aliviado ao


descobrir que havia outra pessoa que cometeu omesmo
1\

erro que voce.

•Quais são os seus medos acerca da confissão eprestação


de contas? Com quem você conversaria sobre eles?
ICAPtruto QUINZE I
Criando Lugares Seguros

Imagine uma pessoa sentada próxima a um lago lendo a Bíblia


com as sobrancelhas enrugadas e as mãos apertadas. Não
parece alguém absorto em exame de consciência? Realmente
acontece em tal cenário, mas quando se torna um padrão de
vida pode acontecer em reuniões ministeriais caóticas ou na
cozinha cortando legumes. Ouvir a voz de Deus é uma
aventura para qualquer hora. Apresentamos descrições de
alguns recursos comuns para uso na exploração e expressão
de sentimentos e motivos, destinados a ver como eles se
enquadram com a realidade e a qual vontade de Deus está
relacionada a eles.

Soltando-se nos Lugares Seguros


Pelo fato de nossa cultura ver o isolamento como desperdício
de tempo, muitas pessoas preenchem suas noites e fins de
semana livres com atividades várias. Contudo, o exame de
consciência requer isolamento, que proporciona situações
seguras para interagimos com Deus, servindo-nos destes
recursos.

"I I .. l , j J 1 i ., I j I.". 1.11 L, I • . ,,,',. rl oi , I,.. I . rr r • • .. I 11hl. I


Criando Lugares Seguros / 205

Chorando livremente
Embora as lágrimas sejam tabu em nossa cultura de individualistas
fortes e rudes, a humildade do exame de consciência nos
proporciona a liberdade de chorar. Nossa cultura diz que chorar
significa que somos fracos, instáveis e pessoas sem controle, mas
na realidade chorar dá força e estabilidade, à medida que
abandonamos as frustrações. Pesquisadores que estudam o choro
descobriram que as lágrimas são um dos sistemas do controle de
excreção do corpo, o que explica porque chorar nos liberta da
tensão e nos impede de passar dos limites. 1 Um bom choro libera
a pressão de nosso tanque de contenção e permite que a mágoa,
a raiva e o medo escapem. Quebra a intensidade de nosso trabalho
de exame de consciência e até alivia enxaquecas e tensões
musculares. Chorar é um passo preliminar para rir e confiar.
Com freqüência as lágrimas são um sinal de que nossos
sentimentos estão revivendo outra vez. São boas para a alma, porque
podem ser orações - as orações mais honestas que muitos de nós
jamais fizemos. Expressam sentimentos que não podemos exprimir.
Enquanto muitos preferem chorar em particular, compartilhar
lágrimas pode ser como um perfume. Sua fragrância curativa
alcança outros que também são tocados e libertos. As lágrimas
que derramamos sozinhos na presença de Deus celebram nosso
reatamento com Ele, caso tenhamos nos distanciado.

Escrevendo um diário
Diários são lugares seguros para confessar e trabalhar as respostas
às perguntas: "Como me sinto? O que penso? O que farei?" Na
privacidade de um diário admitimos nossos verdadeiros
sentimentos. Por não haver ninguém a ofender, falamos com
honestidade. Podemos até desejar endereçar todo ou parte do
diário a Deus. Considerando que nossos pensamentos estão
escritos, podemos relê-los para verificar se culpamos alguém ou
206 / curando as Feridas da Alma

negamos sentimentos. Então podemos dar nova redação à frase


que escrevemos até que já não estejamos culpando ninguém.
Quanto mais honestos formos num diário, mais genuíno será
nosso relacionamento com Deus. Este excerto do diário de Curt
ilustra o ponto:

Hoje me encontrei com Terry. Admira-me o quanto ele


parecia deprimido com tantas coisas intricadas que
estavam acontecendo em sua vida na última vez que nos
vimos. Lembro-me de terpensado: Que bom que a minha
vida vai melhor do que a dele! Agora as posições se
inverteram. Sou eu que estou enfrentando lutas e é ele
que está me ajudando. Meu Deus, ainda continuo a
aprender fatos sobre a humildade e a verdadeira
amizade. Espero não ter de aprender de novo - mas
provavelmente terei!

Muitas pessoas desistem de escrever um diário, porque se


prendem a muitas minúcias. A gramática num diário pode ser
confusa e a caligrafia, mero rabisco, mas os sentimentos são
honestos. Embora alguns façam apontamentos no diário todos
os dias, podemos fazê-lo quando necessário, o que pode ser
semanalmente, quinzenalmente ou mensalmente. Qualquer que
seja a periodicidade, ficamos atentos aos momentos em que
sentimos o desejo de confessar, lamentar, regozijar, entregar como
ocasiões certas para escrever o diário.
Muitos acham proveitoso escrever um diário num lugar
especial, como em sua cadeira favorita ou num banco do jardim.
Estudos sugerem que quanto mais especial for o lugar, melhor:
"Tente achar um lugar onde você sabe que não será interrompido
ou incomodado por sons, visões ou cheiros indesejados", diz o
Dr. James Pennebaker, em seu livro Opening Up Tbe Healing
Power 01 Confiding in Others (Abrindo o Poder Curativo de
Confiar nas Pessoas)? Se você acha que alguém será tentado a

• J L i J I I 11.. . I.U LI I . , , .•1 .1110. I,. I , "I, ,li' I Illltl


Criando Lugares Seguros / 207

olhar seu diário, mantenha-o numa gaveta ou pasta fechada a


chave.

Oração como Modo de Vida


Ainda que as listas de pedidos sejam úteis na oração, também
podemos desfrutar da simplicidade de orar todo o dia. Entramos
e saímos da oração à medida que o dia avança diante de nós,
gozando o amor, conforto e convicção de Deus que nunca nos
abandona. Esperar a vez no consultório médico é a oportunidade
de nos ligarmos outra vez com nossa maior fonte de amor e
afirmação. A conversa com um amigo é a chance de entregar tal
pessoa a Deus.
Nosso padrão de exame de consciência nos ajuda a
aprender a ficar quieto diante de Deus. Podemos meditar
num versículo da Bíblia ou nos ver como participantes numa
passagem dos evangelhos. Esperamos em silêncio que estas
verdades nos impregnem enquanto nos colocamos na
presença de Deus com esta pergunta: "O que é que tu queres
me dizer com esta passagem, Senhor?" Não nos preocupamos
se a resposta não aparecer num outdoor em nossas mentes.
Aguardamos a resposta em meio aos acontecimentos comuns
da vida cotidiana.

Oração no Espírito
É erro presumir que a oração é uma pequena oferta de palavras
bem escolhidas. Porquanto esse tipo de oração seja valioso,
também o são as orações que fazem pouco sentido para os
outros. Considere Ana, cujas palavras eram tão inarticuladas e
os gestos tão exagerados, que o sacerdote Eli, do Antigo
Testamento, a confundiu com uma bêbada. Como ela, podemos
encontrar alívio em derramar a nossa alma perante o Senhor (1
Sm 1. 15b). Podemos revelar nossos sentimentos repulsivos e
conclusões forçadas.
20S / Curando as Feridas da Alma

Sabemos que estamos em boa companhia, porque o rei Davi


do Antigo Testamento também fez o mesmo. Muitos dos Salmos
começam com sessões de depressão, dúvida e até vingança (SI
6.6; 31.1; 55.15), mas terminam com louvor. Podemos copiar
este padrão, arengando com Deus, de forma que em sua presença
possamos examinar nossos motivos e sentimentos amargos. Este
método nos dá a sensação de que Deus nos vê além de nosso
comportamento infantil, filhos dEle que precisam de sua graça.
Mas isto não é ato irreverente? Se Deus não ficou ofendido
quando Davi expressou sentimentos honestos e até permitiu
que as palavras de Davi fossem incorporadas no cânon das Santas
Escrituras, sem dúvida podemos ser igualmente honestos.
Uma forma incomum de oração no espírito é escrever uma
carta de confrontação às pessoas que magoaram você. Rabisque
algumas palavras, leia-as para Deus, mas não remeta a carta. Se
sentir o desejo de enviar uma carta desta forma, peça a Deus
que lhe mostre o que dizer exatamente.

Tendo Prazer em Deus


Cante o amor de Deus
Muitos hinos, músicas e simples carinhos de infância reafirmam-
nos que Deus nos ama. Cantar "Jesus me ama" fala-nos que
também somos os "pequeninos" que pertencem a Jesus. Tudo
bem que sejamos fracos, porque Ele é forte. Este corinho, como
muitos outros, nos ajudam a entender que Deus nos reafirma,
nos ama e nos sustenta em nossas frustrações e sofrimentos.
Se em nossa igreja usufruímos de um relacionamento ou grupo
de pessoas em quem confiamos, temos a alegria adicional de
cantarmos juntos no culto congregacional e reconhecermos como
certas frases (por exemplo, que falam da confiança ou do amor
de Deus) coincidem com o que dissemos quando nos reunimos.
Em certa conferência que reunia pequenos grupos de

I oi ••. , i II I .,
Criando Lugares Seguros I 209

compartilhamento, 800 pessoas deram-se as mãos e cantaram:


"Jesus me ama". Como adultos que buscam a Deus, absorvemos
a verdade daquele carinho de um modo novo. Muitos foram
comovidos às lágrimas quando alguém disse que, pela primeira
vez, sentia que Jesus estava abraçando e amando seu eu
verdadeiro, que somente Ele conhecia.

Faça do culto de adoração parte importante de sua vida


Se temos imaginado Deus como tirano, podemos corrigir nossa
visão apreciando hinos e corinhos que enfatizam a grandeza
de Deus, seu amor, seu perdão. A adoração é poderoso veículo
para negarmos a vergonha que temos sentido. Ela nos faz ir
além do nível cognitivo da compreensão e nos ajuda a crer em
nossos corações que Deus é um Pai capaz e poderoso. Para
alguns, a adoração expressiva significa cantar mais carinhos
no carro ou no chuveiro. Esses momentos particulares de
adoração ajudam-nos a gostar ainda mais dos cultos de adoração
. .
na igreja.

Retrate o amor de Deus


Personalizando os Salmos, podemos figurativamente engatinhar
no colo de Deus e fazer com que Ele nos abrace e nos embale
num sono gostoso:

Enviou desde o alto e me tomou;


tirou-me das muitas águas.
Trouxe-me para um lugar espaçoso;
livrou-me, porque tinha prazer em mim.
Salmo 18.16,19

Este é outro veículo que jan usa para retratar o amor de


Deus por ela:
210 / Curando as Feridas da Alma

Certo especialista em desenvolvimento de crianças


aconselhou-me a comprar para minha filha um quadro
de Jesus segurando uma criança no colo, de forma que
minha filha entendesse que Deus a ama. No quadro que
comprei, Jesus está tocando na criança com muita
suavidade e sua mão está atrás da cabeça dela. Suaface
barbuda roça a face da criança, que tem um ar tranqüilo.
Às vezes quando cometo erros ou me sinto só, pego este
quadro da parede do quarto de minhafilha, levo-o comigo
ao trabalho e coloco-o atrás do monitor do meu
computador. Ao longo do dia, olho o quadro e me imagino
ser a criança. Medito sobre como Deus me ama da mesma
maneira e me conforta.

Buscas criativas
Cindy não se considera artista, mas na solidão do seu divórcio,
ela fazia esboços de quadros, quando teve o impulso de comprar
um romance. Muitas vezes ela desenhou uma mulher sentada
numa cadeira, num canto, sozinha. "Ainda que me sentisse
completamente só, tentei retratar a verdade através da lapisada
de uma névoa ao redor da mulher para representar Deus. Isto
me ajudou a ver que Deus me ama e tem um propósito para
mim. Preciso saber disso".

Lidando com o Sofrimento e a Frustração


Quando ouvimos nossos sentimentos e fazemos todo o exame
de consciência que nos é possível, talvez ainda nos sintamos
infelizes. Sabemos o suficiente para não jogar esse tormento
nos outros, mas como ventilar esses sentimentos sem ferir as
pessoas que amamos? Servindo-nos regularmente de fugas
saudáveis em nossas vidas. Entre elas incluem-se atividades físicas
como andar, correr, patinar, fazer exercícios aeróbios ou jogar

I ;,\L J, ~ ~
Criando Lugares seguros / 211

bola. (Em dias particularmente estressantes, ajuda aplicar alguns


fortes golpes num saco de couro para treinamento de pugilista,
jogar travesseiros ou gritar com um travesseiro na boca.) Para
outros, as belas artes provêem fuga útil. Tocar piano ou violão
ajuda a dar livre expansão à nossa frustração. Olhar um livro de
reproduções de pinturas famosas, ler poesias ou folhear um
livro de figuras para crianças podem calar no fundo da alma,
proporcionando libertação e certeza.

Sirva de Coração Sincero


À medida que identificamos como agimos para apaziguar as
pessoas ou chamar a atenção para nós, podemos reexaminar o
nosso servir. Se nossos motivos para certas formas de serviço
são interesseiros e parece que não podemos realinhá-Ios, então
precisamos abrir mão dessa área de serviço e achar um que
Deus coloque em nosso coração. Então estaremos livres para
descobrir o que significa servir uns aos outros pelo amor (GI
5.13). Parece muito difícil? Quando reconhecermos a cutucada
do nosso ego por atenção, saberemos a diferença entre isso e o
toque de Deus tangendo forte em nossos corações. jan conta
esta história sobre essas lutas decisivas dentro de nós:

Certa noite, enquanto arrumava as cadeiras para dirigir


um grupo de apoio em minha igreja, comecei a meperguntar
se alguém notava que eu comparecia fielmente todas as
noites de quarta-feira para dirigir este grupo. Então me
lembrei de que na última comissão diretora da igreja, nosso
grupo fora omitido da lista de ministérios! Foi o bastante.
Resolvi escrever uma nota ao pastor dizendo-lhe algo a
respeito e deixando com ele. Começaria com: "Enquanto
eu estava aqui dirigindo o grupo de apoio nas noites de
quarta-feira... " Isto o lembraria de que nosso grupo existia
e que eu nãofaltava uma noite sequerpara liderar o grupo.
212 / Curando as Feridas da Alma

Quase escrevi a nota. Então vi minha companheira de


liderança estacionando o carro e pensei na forma como
ela havia mepedidopara começar o grupo. Tinha resistido
no começo, temerosa de que eu estava voltando à minha
antiga abordagem de vida: "Desculpe, enquanto estou
salvando o mundo". Mas continuei lhefalando no quanto
um grupo tinha me ajudado, então ela me pediu que
começasse um que ela me ajudaria.
Olhei minha amiga vindo pela calçada e as cadeiras
vazias que logo estariam ocupadas compessoas confessando
seus mais profundos medos. "Não posso escrever a nota ':
disse em voz alta a Deus. Eu sabia que tinha começado o
grupo porque Deus me levara a fazê-lo. Era do meu
conhecimento que Ele estava usando o grupo para ajudar
às pessoas, como também à minha amiga e a mim. Pediria
à secretáriapara ter certeza de que fôssemos incluídos na
próxima comissão diretora, mas eu não podia manchar
este seroiço com meu velho padrão de precisar ser notada.

Alguns que estão entrando nesta jornada de exame de


consciência desistem, porque sentem qi .e não são dignos de
servir. A verdade é que pessoas feridas no processo de cura
estão bem equipadas para servir. Elas estão no processo de
encarar seus motivos mais profundos e remover clamores egoístas
interiores. Estão aprendendo a ouvir mais claramente o clamor
de Deus dentro delas e estão preparadas para segui-lo.

Brinque
Use objetos de estimação da infância
Em certa ocasião, participantes do grupo de apoio ao qual Curt
pertencia traziam ursinhos de pelúcia às reuniões. A princípio,
os outros participantes acharam um tanto estranho. Curt
finalmente falou com elas a esse respeito.

j 1.1. I II l "
Criando Lugares Seguros / 213

Não sabia O que dizer às mulheres que traziam seus ursinhos de


pelúcia, entãoperguntei: "Qual é o nome dele?" Tinham nomes
mimosos. Alguns desses bichinhos de pano tinham vinte anos e
traziam ao pescoçofitas oermelbas esfarrapados ou tinham só
um olho. Sentia-me envergonhado fXJr essas mulheres- eram
minhasamigas. Não podiam deixares ursinhos no corroi; pensei.
No fim percebi que havia algo de especial nisso. Quando
essas mulheresfalavam no grupo sobre a criação que tiveram,
seus ursinhos depelúcia as ajudavam a falar. Parece engraçado,
mas era como se elas segurassem os ursinhos de pelúcia como
e/esgostariam de serpegos. Depois que superei a oergonba,percebi
que estava com ciúmes, porque elas tiveram tanta facilidade
em voltar ao seu método de infância de obter consolo. Também
quis saber o que me ajudaria a fazer a mesma coisa.

Gratifique-se com brincadeiras de infância


À medida que liberamos a tensão que permeia nossa vida,
podemos nos encantar com atividades que gostávamos de fazer
quando crianças, como subir em árvores, brincar de ioiô ou
desenhar com canetas coloridas. As brincadeiras de infância
provêem o equilíbrio necessário entre a diversão e o horário
exigente da vida. Isto é especialmente importante durante
intensos períodos de exame de consciência. Precisamos de
descanso do trabalho duro de pisar no freio de nossos padrões
de comportamento, trabalhar neles longa e penosamente para
fazê-los parar e mudar de direção. Podemos nos recompensar
com "tempo de manutenção" nas brincadeiras de infância.

Ajuda Profíssíonal
Aqueles que em relação aos seus sentimentos procuram ser
transparentes, mas não têm um sistema de apoio fidedigno,
podem precisar de ajuda profissional para entender os efeitos
214 / Curando as Feridas da Alma

da criação que tiveram. Isto é especialmente verdade se você


está lidando com raiva excessiva e lembranças reprimidas de
abuso físico ou sexual. Os terapeutas são treinados para criar
um ambiente seguro para o eu verdadeiro questionar, lamentar
ou ficar com raiva. Eles ajudam as pessoas a monitorar e controlar
. .
a ira numa cnse.
Os terapeutas também ajudam numa crise, porque sabem
identificar distúrbios físicos, lesões psicológicas profundas ou
intenções suicidas verdadeiras. Alguns acham que investir tempo
e dinheiro em terapia torna-os mais responsáveis e impede-os
de negar que têm um problema.
O aconselhamento proporciona a atenção individual que
alguns não receberam enquanto cresciam. Esta é a chance de
receberem a atenção concentrada de outra pessoa, de serem
plenamente ouvidos. Aqueles que nunca confiaram em ninguém
sabem que num terapeuta eles têm alguém que está legalmente
preso à confidência.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Não é contraproducente para meus filhos me verem
chorar?
R Nossas lágrimas podem fazer com que o cônjuge, filhos
ou amigos sintam-se constrangidos, porque talvez
suponham que nossa tristeza é por culpa deles ou que
eles tenham de nos ajudar. É sensato explicar-lhes que
nosso choro não tem nada a ver com o comportamento
deles, mas é um desabafo positivo de sentimentos tristes.
Trata-se de um modelo salutar para crianças. Para
abrandar a ansiedade daqueles que nos cercam,
podemos chorar em particular.

P Como escolho um conselheiro?


R Obtenha recomendações de amigos, participantes de

. , . ~ I I I , IJ· li • I I I 111. j li IIL I


Criando Lugares Seguros / 215

grupos de apoio e centros de aconselhamento em igrejas.


Procure um conselheiro que seja crente dedicado e
trabalhe seus problemas de infância. Confira também
as licenças e as credenciais do conselheiro.
Quando encontrar um possível candidato, marque uma
consulta. Para entender a abordagem de tratamento
desse profissional, pergunte: "Como você trabalha para
que os pacientes superem problemas como os que eu
tenho?" Faça perguntas também sobre seu treinamento
específico, experiências anteriores e especializações
(pós-graduação).
A maioria das pessoas prefere um terapeuta com quem
"se dêem bem". Veja se você se sente à vontade com a
personalidade, idade, sexo, estado civil e preferência
denominacional dele. Quando estamos trabalhando a dor
de determinado trauma, como abuso, talvez prefrramos
um terapeuta que trabalhou os mesmos problemas.
O sexo do terapeuta é importante para muitos padentes. Se
você quer trabalhar problemas relacionados à seu pai, ajuda
ter um terapeuta do sexo masculino. Mas talvez você não
esteja preparado para isso, caso tenha sido abusado por seu
pai. Em tal conjuntura, uma terapeuta pcxleria ser melhor.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.
• O que você acha a respeito de chorar livremente? Escrever
um diário?

• Em que momentos e lugares incomuns você ora? Em quais


outros momentos ou lugares você poderia desfrutar da
216 / Curando as Feridas da Alma

presença de Deus, embora ao mesmo tempo esteja


envolvido em alguma atividade?

• De que você brincava quando era criança? Você ainda


brinca destas coisas hoje? Em caso negativo, não gostaria
de voltar a brincar?

• De que fugas salutares você se serve atualmente? (Falar


com um amigo, andar, correr, patinar, fazer exercícios
aeróbios, andar de bicicleta, golpear um saco de couro
para pugilista, jogar travesseiros, tocar um instrumento
musical, olhar um livro de arte, ler um livro de poesia.)
Relacione outras fugas que você poderia tentar.

• Compre algo que você gostava na infância - uma corda


de pular, um jogo de canetas coloridas, até um trem de
brinquedo. Reserve algum tempo para se divertir. Escreva
um comentário sobre suas experiências com isso.

• I .t.. • I ~ I I I .. ~ • ; ;." I .a lo ,. l J . I J...., , ~ I ~. i", 116. J. i II J, I


ICAPíruLo OEzEssFJS I \

Movendo-se em Direção AEstabilidade

Pontos altos e baixos são normais em nosso caminho de


crescimento cristão, sobretudo quando somos corajosos e
honestos o bastante para olhar nosso eu verdadeiro. Num dia
somos pacientes com uma pessoa problemática, no outro,
mordazes. O movimento global é para cima, ainda que às vezes
sejamos vencidos e recorramos aos antigos comportamentos.

Cristãos com Poder de Recuperação


A qualidade que separava os heróis bíblicos das outras figuras
bíblicas era que a sua fé dava-lhes a resistência para voltar.
Pedro negou Jesus três vezes e sentiu enorme culpa, mas
procurou o Mestre e recebeu perdão. Judas traiu Jesus, sentiu
enorme culpa e foi enforcar-se. Pedro e os outros heróis bíblicos
não eram perfeitos, mas continuaram interagindo com Deus,
mesmo quando tinham errado. Se pudermos dar mais resistência
à nossa fé, seremos capazes de suportar a pressão e nos recuperar
dos revezes.
Algumas pessoas têm mais capacidade de recuperação do
que outras devido a personalidades individuais, experiências
vividas e configuração biológica e fisiológica. Contudo, o poder

L I J. l.:.I.l J l .L II.,L, J l, J .... J II jLl,1


Movendo-se em Direção À Estabilidade / 219

de rápida recuperação pode ser formado no caráter, quando as


pessoas aprendem a lidar com as dificuldades da vida. Percorrer
a jornada que estamos descrevendo neste livro forma esse poder
e capacidade de recuperação rápida, porque é mais fácil voltar
dos pontos de tensão da vida se desenvolvermos relações mais
autênticas com Deus e com as pessoas.

Perigos Potenciais na Jornada


Quando conhecemos nossos padrões do passado, é mais fácil
reconhecer armadilhas potenciais e nos preparar para elas. Eis
algumas a considerar.

Exaustão física
Durante tempos de estresse, o corpo fica exaurido de energias.
Renovamos nossos corpos mediante as horas de sono adequadas
e os efeitos curativos de chorar, rir e fazer exercícios. Se queremos
nos levar muito a sério, precisamos rir às gargalhadas e perder a
compostura completamente.
Ao primeiro sinal de crise ou transição de vida, checamos
nosso equilíbrio - estamos nos cuidando e usando nossas
ferramentas? Nos dias em que parece não fazermos nada direito,
devemos responder quatro perguntas decisivas: "Estou com fome?
Com raiva? Solitário? Ou cansado?" Foi assim que Ileana se cuidou:

Eu já estava brava com uma colega de trabalho, por ela


ter implicado com meu chefe, dizendo que eu não estava
cumprindo minha parte da carga de trabalho. Então,
minha amiga Letitia me telefonou cancelando nosso
encontro de almoço. Sua desculpa era válida - tinha de
ir a casa para dar uma olhada na filha doente. Letitia
disse que sentia muito e eu sabia que sua razão para
cancelar o almoço era válida, mas mesmo assim me sentia
abandonada. Vejam só, pensei, ninguém mesmo quer ser
220 / Curando as Feridas da Alm.a

minha amiga. Não pude me livrar da raiva e da solidão.


Decidi que sairiapara tomar um sorvete durante minha
hora do almoço - compraria um daqueles sundaes
enormes. Então me sentiria bem.
Foi aí que me lembrei daquelas quatro perguntas
decisivas. Não admira que eu quisesse me empanturrar.
Estava com raiva de minha colega de trabalho e solitária,
querendo uma companhia amiga.
Vamos pôr as coisas em ordem, raciocinei. O que posso
fazer para que minhas necessidades sejam legitimamente
satisfeitas? Primeiro, falei com meu chefe e corrigi o que
minha colega de trabalho disse. (Meu chefe já tinha
suspeitado da uerdade.) Depois telefoneipara Letitia e disse:
USei que você precisa dar uma olhada em sua filha, mas
posso ir no carro junto com você? Este é um daqueles dias
em quepreciso da companhia de uma amiga". Para Letitia
estava tudo bem e assim passamos bons momentos juntas.

Presos na raiva
A raiva pode ser motivadora, sobretudo quando nos força a
sair da negação. Mas quando reprisamos em nossas mentes os
eventos do passado e ficamos presos a eles, nossa raiva nos
usa em vez de a usarmos. Então nos desesperamos e sentimos
que Deus não pode nos ajudar a vencer os sentimentos e
padrões destrutivos. Agarrarmo-nos à raiva reduz a velocidade
de nosso progresso, porque colocamos nela a energia que
deveria ser canalizada na busca de Deus (Ef 4.26,31). Para
evitarmos essa situação, devemos expressar nossa raiva de
maneira segura, chorando, escrevendo um diário, fazendo
exercícios, gritando onde seja seguro fazê-lo, conversando com
um amigo compreensivo, escrevendo cartas sem as enviar -
o que quer que nos ajude a trabalhar nossa raiva sem prejudicar
os outros.

. I I .... j • I I .. ~ L oi , .. lolL J,.l. I J.. , I i ~. r, J, 1& J l! ~l.l J


Movendo-se em Direção À Estabilidade / 221

Platôs de medo
Se precisamos dar um passo à frente, mas nos acovardamos, é
provável que fiquemos sentados à beira da estrada de nossa
jornada. Talvez seja hora de sermos afirmativos em um
relacionamento, perdoar o amigo, enfrentar hábitos de gastos
incontroláveis, mas isto parece muito difícil. Quando usamos
nossas ferramentas para trabalhar a coragem de assumir o risco
necessário, quebramos a inércia do platô.

Culpando a Família
Vivendo a vida cheia de "Se minha mãe não tivesse..." e "É
culpa do meu irmão que hoje eu...", nos impede de assumirmos
a responsabilidade pessoal por nosso crescimento. Esta atitude
nos encarcera na amargura e na imaturidade.
Além disso, culpar os pais é injusto, porque eles muitas vezes
agiram bem, apesar da cultura e criação que tiveram. Se
soubéssemos os dilemas que enfrentaram quando crianças,
ficaríamos surpreendidos com o quanto se deram bem na vida.
Com freqüência os alcoólatras recuperados falam em reuniões
dos Alcoólicos Anônimos sobre o quanto tentaram ser bons pais,
mas o quanto foram mal sucedidos. Amam os filhos e o seu
desejo é eles tivessem recebido melhor educação (o que é um
sentimento familiar a todos os pais). Quiçá estes pensamentos
também sejam os pensamentos de seus pais. Isto não apaga os
efeitos do comportamento deles em nós, como adultos, mas
significa na verdade que a culpa não lhes é adequada.
No empenho de fazer a coisa certa, os crentes podem se
obrigar a perdoar os pais. Mas esta atitude contra-explode, porque
a raiva volta. Essa situação ajuda a ver o perdão como uma
meta e um processo. Reconhecemos que estamos no processo
de perdão, quando pedimos a Deus que nos ajude a alcançar a
meta do perdão. Pomo-nos em direção à essa meta e entendemos
que o perdão é, muitas vezes, um subproduto de trabalhar os
222 / Curando as Feridas da Alma

sentimentos e a raiva reprimidos. Depois de termos agido assim,


sabemos que estamos perdoando e que o perdão vem do fundo
do coração. Nesse entretempo, flutuamos entre a raiva e a
aceitação. Estas são as experiências de Glenn:

No Dia de Ação de Graças, meuspais colocaram oito garrafas


de vinho na mesa, embora soubessem que meus irmãos
bebessem muito. Em vez de ficar meperguntando quando é
que elesaprenderiam.finalmente aceitei o fato. Elesnão estão
interessados em mudar e eu não vou mudá-los.
Às vezes não me saio tão bem assim. Nossa família
tem o hábito de usar a culpa e a vergonha sutis para
fazer com que nos conformemos com os desejos da
família. Depois de algum tempo não consigo suportar
a situação e dou uma desculpa para ir embora. Não
quero ser indelicado, por isso prefiro sair do que me
zangar.

Aceitar os pais significa que deixamos de tentar mudá-los. Se


eles são viciados em trabalho ou em irar-se, fazemos pouco
bem em tentar persuadi-los a tratar desses problemas. (Não
obstante, uma intervenção formal feita pela família inteira nos
pais .alcoólatras ou viciados em drogas, com a ajuda de um
profissional, é um esforço que vale a pena.)
Faríamos bem em nos colocar diante de Deus num lugar
retirado e avaliar estas perguntas:

• Estou bem adiantado na estrada do perdão - tanto


quanto poderia estar neste momento?
• Estou sinceramente orando por meus pais e desejando
o melhor de Deus para eles - amor, alegria, paz,
paciência etc.?
• Reconheço o quanto eles lutaram na vida e os obstáculos
que superaram?

. .. ., , I ....L JI l l
Movendo-se em Direção À Estabilidade / 223

Talvez nada de espetacular nos aconteça nesses momentos


de meditação, mas pouco a pouco Deus nos move mais para
frente no caminho do perdão. À medida que nossa aceitação de
nossos pais aumenta, exploramos a possibilidade de ter um novo
relacionamento com eles. Não esperamos que sejam o superpai
ou a supermãe, pois são pessoas normais que lutam com as
dificuldades da vida. Também são pessoas com quem temos
muito em comum, pessoas que amamos.

Reuniões informais de família


Os feriados são dias alegres para algumas pessoas, mas muitas
outras sentem-se sós e tristes nesses períodos (chamados por
alguns de "tristezas festivas"). Se você está mudando o modo
como se relaciona com as pessoas, pode ser assustador encarar
uma reunião informal com a família. Novos padrões de
relacionamento com as pessoas podem confundir e até alienar
os parentes. É como se você estivesse cantando uma nova canção
e eles não gostassem do estilo.
Considere cada convite com cuidado. Talvez você queira
permanecer neutro até que tenha tempo para refletir sobre o
assunto. Sua meta é ser a mesma pessoa o tempo todo, falar
e agir como verdadeiramente é, mas também considerar o
que seria a atitude mais gentil e simpática a fazer. Permita
que Deus o conduza neste processo de pensamento,
perguntando:

• Quero fazer isso?


• Estou preparado para ser meu eu verdadeiro com estas
pessoas ou reverterei aos meus antigos padrões?
• Estou me envergonhando com isso?
• Tenho outros compromissos que sejam mais importantes
para esse mesmo período de tempo?
• Há uma terceira opção - um meio-termo, talvez?
224 / Curando as Feridas da Alma

Quando estamos tendo lutas com um parente particularmente


dominante, pode ser que fiquemos até um ano ausentes das reuniões
de família. Maggie faltou ao jantar do Dia de Ação de Graças da
família, porque sabia que seu tio estaria lá. Ele a abusara quando
criança e ela estava com muito raiva dele para vê-lo sem dar um
escândalo. Dennis nunca tinha criado coragem para falar aos pais
que ele não gostava de dirigir várias horas até a casa deles para
depois ver seus filhos sendo afastados dos presentes na manhã
de Natal. Ele finalmente o disse e seus pais ficaram chateados. Mas
pela ocasião em que ele e a família visitaram os pais uma semana
depois, eles também tinham descoberto que gostaram de prolongar
as comemorações natalinas. Às vezes ajuda conversar com um
amigo, como fez Carla:

Meu pai telefonou para dizer que queria me visitar- ele


atéjá tinha comprado as passagens. Planejava ficar duas
semanas! O que eu poderia fazer?
Disse-lhe quepreasaoa terseeu teria tempo. Desuguei e telefonei
em seguida.para Gaü, minhaamiga. GaiJ mefez algumasperguntas
com gentileza. 'Você quer tê-lo? Pode lidar com a situação?"
"Sim, mas não por duas semanas."
"Por quanto tempo você quer vê-lo?", perguntou Gail.
"Uns dois dias é o tempo que posso dar. "
((Você pode sugerir que ele fique só por dois dias? Você
poderia dizer-lhe que dois dias são mais adequados para
você. Você não precisa se explicar. "
Foi o que fiz e a visita correu bem. Amo meu pai, mas
ainda não sei como reagir a ele. Normalmente eu o deixo me
conduzir, mas esta curta visitafoi ótima experiênciapara nós.

Falando com as Pessoas Interessadas


Cuidado com os conselheiros bem-intencionados, mas
desinformados, que contam a versão deles do que Deus quer

I ,~I, I l I J " w. J Illi. J


Movendo-se em Direção À Estabilidade / 225

que você faça. Sem saber nada acerca da sua luta, distanciamento
de Deus ou emoções reprimidas, eles podem pressioná-lo a
esquecer o passado, assumir o controle de sua vida e ir em
frente antes que você esteja preparado. Por isso, se continuarem
pressionando-o, diga: "Estou trabalhando em algumas questões
de minha vida que estão me ajudando a me entender melhor".
A prestimosidade é a medida do quanto dizer. Se falar com os
pais ajuda de algum modo o seu relacionamento com eles, considere
a opção. Jeanette queria falar com seus pais, mas não sabia como.
Ela foi falando com eles um pouco de cada" vez. Quando eram
insistentes em pedir que ela os ajudasse, mas ao mesmo tempo não
pedia aos outros filhos, ela explicava: "Vou ajudar, mas, mãe, eu não
sou a salvadora da família. Os outros filhos desta família também
pcx:lem ajudar". Quando sua mãe tentou fazer com que ela falasse
com seu irmão para que este se reconciliasse com a esposa, Jeanette
disse: "Eu não sou mais a mediadora entre a senhora e ele. Se quer
lhe dizer algo, telefone para ele e diga". Ela amava muito sua mãe e
achava difícil dizer-lhe estas coisas, mas descobriu que respirar fundo
e usar um tom de voz gentil ajudava imensamente.
Algumas pessoas, especialmente aquelas que foram física ou
sexualmente abusadas, acham que é importante confrontar os pais
sobre os comportamentos passados. Motivos para agir dessa maneira
podem ser difíceis de determinar. Às vezes tal ação é feita com
sutis sentimentos de vingança: Eles meferiram, agora eu vou feri-
los. Procurar vingança mostra que estamos presos na raiva e não
nos concentrando no nosso lado da ma. Precisamos perguntar: Por
que estou fazendo isso? O que espero obter com isso?
Aqueles que são de famílias nas quais os problemas foram
particularmente discretos, também podem achar que a
confrontação é proveitosa, embora seja um pouco mais difícil.
Talvez a família fosse publicamente respeitada e admirada, ou
uma criança foi abusada por um dos pais, mas ninguém o admitiu.
Isto ajuda o indivíduo a sair da negação e acreditar que ele
precisa examinar o passado.
226 / Curando as Feridas da Alma

Se você acredita que falar com sua família causará mais


desavença com que possa lidar, talvez seja vantajoso falar com
alguém além dos pais, como tias, tios ou avós que sejam pessoas
mais abertas. O ponto importante é falar a verdade e validá-la.
Também é possível confrontar os pais indiretamente. Alguns
escrevem seus pensamentos num diário ou mesmo numa carta,
mas nunca a envia. Outros confrontam seus pais contando a um
grupo de apoio o que gostariam de dizer-lhes. Mesmo que os
pais não estejam presentes, a raiva é liberada, a verdade é
revelada e a pessoa está a um passo mais perto da cura.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Por que hoje em dia há tanta conversa sobre ser vítima?
R Aqueles que ao longo da vida só conheceram lutas,
culpam-se com freqüência por tudo o que acontece. Pode
ser um alívio entender que eles não foram responsáveis
por tudo, mas que foram vítimas de situações difíceis e
reagiram da melhor maneira que puderam.
Como adultos conscientes e informados, eles têm
opções. A melhor escolha é assumir a responsabilidade
por seus comportamentos, buscando o modo de Deus
curar. Isto significa que não importa se os assuntos
discutidos neste livro sejam às vezes dolorosos de serem
examinados. Eles, mesmo assim, os examinam. Tais
pessoas recusam-se a ser vítimas.
Permanecer vítima significa permanecer com raiva, com
culpa, isolado e preso aos erros do passado. A pessoa
com poder de recuperação rápida supera o passado,
examinando-o, assim como a seus efeitos, e aprendendo
novas maneiras de reagir.

P Se os meus pais já faleceram} ainda preciso ver como o


passado me afeta? Que diferença faz?
Movendo-se em Direção À Estabilidade / 227

R A morte de ambos ou de um dos pais não diminui o


efeito que a criação teve em você quando criança, mas
cria desafios extras como adultos. Nossa cultura tende
a venerar as pessoas que morreram, por isso pode ser
que você se sinta culpado por pensar nos pais falecidos
sob aspecto desfavorável. Os irmãos podem ficar
particularmente ressentidos com seu exame do passado,
porque eles exaltaram seus pais e reprogramaram as
lembranças que têm deles. Permita-se trabalhar a raiva
e a mágoa que você sente. Com o tempo, você terá
mais paz do que nunca com sua memória paterna.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

• Você se mostra mais irritadiço quando está com fome,


com raiva, só ou cansado? Nesse caso, qual lhe parece
mais difícil?

• Tente descrever uma época em que você esteve preso na


raiva.

• Como você está lidando com as reuniões informais de


família atualmente?

• Alguém em sua vida está pressionando você a evoluir-se


de maneira constante e a mudar depressa? Nesse caso,
como você reage a essa pessoa?
228 / Curando as Feridas da Alma

• Escreva em seu diário algo que você gostaria de dizer a


seus pais, mas não tem certeza se eles aceitarão se for dito
pessoalmente. Depois de o fazer, leia a Deus o que escreveu
e ore por seus pais. Se desejar, leia-o diante de um grupo.

. .. II , i .. L j i .I • I J. iI; ; j I ~. • l • ; I iLII. I J~ Jj I. J
ICAPíruLo DF1f$[ffi I
Construindo Relacionamentos Seguros

Quando amigos e vizinhos nos perguntam: "Como vai?", em


geral respondemos: "Bem", pouco importando como nos
sentimos. Ou: "Muito bem, obrigado. Não poderia estar melhor!",
quando por dentro nos sentimos um trapo. Se fôssemos honestos,

B (baqueado) E (emotivo) M (medroso)


230 / Curando as Feridas da Alma

isto é O que queríamos dizer quando respondemos que estamos


"bem":
Alguns dizem que estão bem, quando na verdade sentem-se
frustrados ou confusos, porque pensam que os cristãos sempre
devem estar por cima. Donna, a secretária de igreja que
apresentamos no Capítulo 2, confessa que tinha uma vida dupla:
sua "identidade diurna" e sua "identidade noturna":

No trabalho) nunca permitia que as pessoas soubessem que eu


estava chateada. Se tivesse de ficar até mais tarde) agia
alegremente a esse respeito. Era em casa queextravasava minha
raiva reprimida) porque eu sabia que meu marido não me
abandonaria. Gritava com meufilho e com meu marido e até
jogava coisas neles. As pessoas da igreja ficaram chocadas
quando lhesfalei sobre meu comportamento explosivo em casa.
HojepercelxJ que minha identidade noturna era minha válvula
de escape. Tinha de "me comportar como uma louca nem algum
lugar, pela razão de ter-me sentido preterida no âmago do
meu ser. Empenhava-me por agradar muitas pessoas. No
processo de pedir amor, alienava as pessoas que mais amava.

À medida que ficamos mais honestos com Deus, tomamo-nos


mais autênticos. Tentamos ser a mesma pessoa o tempo todo - no
trabalho, na comunidade, na igreja e na família. Tal comportamento
pode ser difícil se formos camaleões, mudando de cor de acordo
com o lugar onde estamos e com quem estamos. Este processo de
aprender a dizer o que realmente pensamos e sentimos permite que
as pessoas nos conheçam e saibam o que esperar de nós, de forma
que podemos construir relacionamentos seguros.

Mantendo-me no Meu Lado da Rua


Uma das principais questões na construção de
relacionamentos seguros e honestos é ter um senso adequado

I.IoL ,. l " I j ,. ..... ~ I .I


Construindo Relacionamentos Seguros / 231

do quanto os outros podem opinar sobre nossa vida. Quando


crianças, podemos ter formado padrões de ficar muito isolados
ou muito necessitados de atenção com base no modo como
fomos tratados. Hoje, quando adultos, essas rotinas nos são tão
comuns que é tentador continuar ou reagir a tais padrões em
vez de fazer escolhas mais sensatas.
Por exemplo, os adultos que foram criados numa casa na
qual tiveram pouca intimidade com os pais, geralmente
continuam persistindo em manter os outros a distância. Não
esperam jamais criar laços sociais com ninguém, por isso
conservam as pessoas de fora, resignados de que nunca serão
importantes a alguém. Rejeitam o amor, o interesse ou conselho
sábio, porque têm medo de sentirem-se abandonados novamente.
Nos seus poucos relacionamentos, não confiam facilmente a
menos que estejam no controle. Constroem muros de granito
entre eles e as pessoas.
De outro lado, há os que deixam muitas pessoas
opinarem na vida deles. Não conseguem fazer uma escolha
senão depois de terem pedido a opinião de cinco pessoas,
porque consideram os outros mais inteligentes e mais
sábios. Seus limites são tão permeáveis quanto um aramado.
Na infância, seus pais tomaram muitas decisões por eles e
lhes impuseram seus desejos, de forma que hoje estão
emaranhados com os pais.
Contudo, às vezes os adultos não dão prosseguimento ao
que aprenderam na infância, mas reagem e vão para o lado
oposto. Aqueles que levantaram muros de granito sentem
profunda solidão e tentam satisfazer suas necessidades de
atenção com quem quer que seja, tanto quanto puderem.
Não conseguem o bastante das pessoas. Aqueles que foram
criados num ambiente emaranhado cansam-se de consultar
as pessoas. Querem sua privacidade e erguem muros de
granito em volta de si mesmos para manterem os outros de
fora.
232 / Curando as Feridas da Alma

PADRÃo DA CONTINUANDO REAGINDO AO


INFÂNCIA COM o PADRÃo PADRÃo

Sentiram-se distantes Permanecem distantes Procuram muita


dos pais. das pessoas. atenção das pessoas.

Sentiram-se Procuram muita Mantêm-se distantes


emaranhados com os atenção das pessoas. das pessoas.
pais,

A tarefa então é fazer novas e equilibradas escolhas de limite.


Se isso requer habilidades e discernimentos que não ternos,
começamos por entender o padrão desenvolvido na infância, e
se o mantemos ou reagimos a ele. O quadro acima pode ser útil.
Se você não tem certeza de onde se enquadra, faça estas
perguntas:

• Você se abre com poucas ou com muitas pessoas?


• É mais provável que você se afaste das pessoas ou as
use?
• Se você comete erros e faz escolhas, porque não procura
o conselho ou apoio de alguém?
• Se você comete erros, porque não sabe pensar por si
mesmo?

Se você acha que fica indo de um lado para o outro entre


ficar distante e estar emaranhado, você não o único. Quando
trabalhamos nas questões de limite, podemos estar ora de um
lado, ora de outro, até que tenhamos a sensação do ponto certo.
Ter limites equilibrados significa que desenvolvemos uma idéia
realista de onde nossos interesses começam e terminam. Não
permitimos que as outras pessoas tenham autoridade sobre
nossos interesses e não temos autoridade sobre os delas. Meu

I I" I II I J I •• lulL "I i I J,." , I.. I "-li liL ~ II Üll


Construindo Relacionam.entos Seguros / 233

crescimento é minha responsabilidade, e estou tão ocupado nisso


que vou lhe deixar cuidar do seu crescimento. Limpo meu lado
da rua e você limpa o seu. Não traspasso o seu lado em assuntos
particulares a menos que você me convide e, nesse caso, o faço
com muita polidez. Fico de prontidão quando você traspassa o
meu lado e, de maneira cortês, procuro restabelecer minha
responsabilidade e autoridade sobre o meu lado da rua.
Uma das melhores maneiras de desenvolver limites adequados
é estar em meio a indivíduos que respeitam limites. Eles não
oferecem conselhos não solicitados, mas fazem perguntas como:
"Que tal esta opção? O que você realmente acha sobre...?" Se
nos contam suas experiências, lembram que Deus pode estar
trabalhando diferente da forma em que trabalhou neles.
Se no passado você pediu conselhos a muitas ou a poucas
pessoas, pode ser que não seja experimentado para saber quem
está habilitado para lhe dar conselhos. Pergunte-se a si mesmo:

• Eu respeito esta pessoa?


• Esta pessoa tem relacionamentos longos que dão
credibilidade em se dar bem com os outros?
• Esta pessoa teve experiências semelhantes?
• Esta pessoa parece enxergar por baixo da superfície
dos motivos e dos sentimentos?

Precisamos reconhecer o bom conselho quando o recebermos,


e ser desconfiados daqueles que são convencidos o bastante
para pensar que sabem exatamente o que Deus quer para nós.
Com freqüência esta é uma camuflagem sutil (tão sutil que eles
não percebem) de querer controlar as pessoas (porque seus
limites não são adequados). Eles podem nos pressionar, dizendo:
"O que você precisa fazer é ... Todos sabem que..." Às vezes
atraímos esta situação pela nossa inabilidade de tomar decisões.
Se passamos a infância com os outros nos dizendo o que fazer,
temos dificuldade em tomar decisões e estimulamos a ingerência
234 / Curando as Feridas da Alma

dos outros. Donna nos conta como está aprendendo a reagir às


pessoas que violam os limites dela:

Ainda fico brava quando alguém me faz uma pergunta


muito pessoal ou sugere o que devo ou não fazer. Eu me
policio imediatamente. Ensaio em minha mente que minhas
decisões são minhas e que não sou obrigada a explicá-las
aos outros. Mantenho em mente que a invasão dos meus
limites feita por essas pessoas é errada e que está cena eu
fixar-lhes limites. Posso escolhernão responder às perguntas,
talvez dizendo: "Não acho quepossofalar sobre isso agora".

Se uma pergunta é muito pessoal, temos a liberdade de dizer:


"Não me sinto à vontade com essa pergunta", ou: "Isso é assunto
particular", ou ainda mudar de assunto. Se alguém teima em
nos dizer o que devemos ou não fazer, podemos reivindicar
que essa é nossa decisão, dizendo: "Vou considerar o que você
disse e orarei sobre isso".
À medida que trabalhamos para construir relacionamentos
seguros, precisamos considerar se violamos os limites dos outros.
É fácil fazer isto com a melhor das intenções. Por exemplo, jane
diz a Susie: "Não tenho sido emocionalmente honesta e Deus
quer que eu seja mais honesta em relação aos meus problemas.
Acho que você precisa fazer o mesmo". Mas jane não percebe
que Susie está aprendendo a ser reservada. Susie é uma dessas
pessoas que revela seu passado a todos que encontra. jane
presume que o melhor para ela é melhor para Susie. Ela podia,
talvez, fazer a sugestão e depois ouvir a resposta de Susie, mas
dizer-lhe o que deve fazer é violar os limites da outra.
O ponto chave é o respeito. Respeitamos os outros,
respeitamos a nós mesmos e respeitamos as maneiras diferentes
de Deus trabalhar nas pessoas. Ele pode curá-lo de uma maneira
e curar-me de outra. Devemos nos manter longe de atitudes
que anunciam:

. 'I I J, i.Ii • j j ,I.. • i • .... ~ I ~ ll"', I


Construindo Relacionamentos Seguros / 235

• Sei o que é certo para o seu crescimento espiritual.


• Sei o que a Bíblia diz que você deve fazer.
• Sou o representante de Deus para falar com você.

Às vezes, Deus nos fala por intermédio de outra pessoa, como o


oportuno conselho de Marcia, a irmã de Matt (Capítulo 2). Se alguém
nos dá um conselho, devemos agradecer e explicar que submeteremos
o conselho a Deus para obter mais discernimento. Então esperamos
e vemos se o conselho se ajusta a tudo o que Deus está nos ensinando
em nossa caminhada. Por outro lado, se acreditamos que temos
conselhos importantes para alguém, devemos honrar os limites dessa
pessoa primeiro examinando cuidadosamente nossos motivos diante
de Deus. Se tivermos dúvida, sempre é melhor esperar do que se
apressar. Temos de tentar não fazer nada em palavra ou inflexão de
voz que venha a diminuir ou fazer calar o ouvinte.
O respeito vem da humildade. Devemos estar dispostos a dizer:

• Aceito que, assim como todas as pessoas do mundo,


você é humano com muitas limitações.
• Entendo que provavelmente há alguma ferida por trás
do que você está fazendo.
• Não sou Deus e não sei pelo que você passou.

Sendo a Mesma Pessoa o Tempo Todo


Ainda que o fato de nos examinarmos nos leve para um
relacionamento melhor com Deus, nem sempre ajuda todos os
nossos relacionamentos. Nossa maneira franca e honesta de falar
sobre Deus e nossos problemas pode fazer com que os outros
se sintam pouco à vontade conosco. Esta é uma experiência
que jan tem passado repetidamente:

Não era um bom dia nem era um mal dia. Assim que entrei na
igreja,Jenniferme disse: "Oi.fan! Como vai?"Ela acenou e sorriu.
236 / Curando as Feridas da Alma

Dei minha resposta habitual, a qual era verdadeira:


(~tou indo".
"Etudoi", disse ela, enquanto me olhava chocada.
Pude perceber que havia perdido alguns pontos no
quadro de espiritualidade de jennifer; mas eu não ligava.
Abandonar minha persona de 'filba boazinha na igreja JJ

libertou-me para ser mais genuína com as pessoas.


Assim, olhei para [ennifer; sorri e disse: "Sim, isso é
tudo". E, pensei, Deus me ama enquanto estou indo.

Se pusemos de lado a necessidade de sermos cristãos


"bonzinhos", talvez não nos demos tão bem com aqueles que
acreditam que o otimismo radioso é sinal de espiritualidade.
Ainda que estes sejam nossos irmãos e irmãs e embora não
saibam que lutas enfrentamos, podemos estar presentes para
eles. Em nossas posições de trabalho, como responsáveis pelo
berçário, coralistas ou professores da Escola Dominical, unimo-
nos com aqueles que estão feridos e lhes permitimos tirar as
máscaras sem questionar a fé que professam. Ser a mesma pessoa
o tempo inteiro pode significar que temos de considerar os
seguintes ajustes de atitude:

Abandone o seu eu "igreja"


É o nosso eu "igreja" que finge não estar com raiva e apaga os
comentários de nosso discurso, os quais pensamos que vão
incomodar os outros. Teste-se por alguns dias e ouça os
pensamentos que você não ousa verbalizar a ninguém. Não
posso dizer isso. Soa tão mundano. Esta edição promove uma
impostura de dupla personalidade, do eu "igreja" e do eu
verdadeiro.
Como cristãos autênticos, temos pensamentos irados e
imaginamos maneiras calmas e não ameaçadoras de ventilá-los.
Tentamos evitar dizer uma coisa quando sentimos o oposto.

II •. ,., • I~l I.. J , . , "di "I,,~, II i· 'HI lIlo 111111,1


Construindo Relacionamentos seguros / 237

Quando alguém pergunta: "Corno vai?", não mentimos e não


dizemos que estamos bem quando não estamos. Dizemos a
verdade, que pode ser: "Estou crescendo; às vezes não é fácil",
ou: "Hoje, sinto a força de Deus, mas passei por alguns tempos
difíceis". A recompensa por sermos honestos, contudo calmos,
é que encontramos a serenidade procurada.
Também podemos querer fazer experiências desafiando
gentilmente as pessoas para que abandonem seus eus "igrejas",
perguntando: "Diga-me: Como você realmente está?" Alguns
talvez extravasem a frustração que sentem e até a raiva da vida.
Outros podem começar a chorar.

Entenda que toda pessoa fere de algum modo


O mundo está cheio de pessoas que escondem suas mágoas atrás
de uma fachada cuidadosa. Estas "feridas ocultas" têm cicatrizes
emocionais e podem se servir de máscaras. Nós, mais do que
todos, podemos ser pacientes com este tipo de negação, porque
já o experimentamos. Se devemos "limpar nosso lado da rua"
nesse assunto, podemos orar por aqueles que magoam e pedir a
Deus que nos mostre se e como Ele deseja nos usar na vida
dessas pessoas.

Espere distanciamento de alguns


Quando somos honestos sobre nossas feridas e faltas, esta atitude
pode fazer com que alguns indivíduos nos evitem. Talvez não sintam
a necessidade ou tenham a habilidade de falar, confiar ou sentir tão
profundamente quanto nós. Contudo, isso não quer dizer que eles
não sejam amados ternamente por Deus. Tratamos com respeito e
os admiramos por muitas outras razões. Contudo, podem não ser
estas as pessoas de confiança para fazermos nossas confissões.
Também podemos tentar entender o medo que sentem. Por
um ano, nós dois (Curt e jan) quisemos participar de grupos de
238 / Curando as Feridas da Alma

apoio ligados à igreja, mas não conseguimos, porque tínhamos


medo. O que os crentes pensarão de um terapeuta crente que
teve ataques depânico?Acerca da esposa de um pastor que estava
com raiva de Deus? Assim que ficamos desesperados, fomos
finalmente participar desses grupos, mas durante meses não
revelamos nossas posições aos nossos grupos até que nos
sentimos seguros.

Reconheça que nenhum filho de Deus é mais "merecedor"


do que o outro
Muitos de nós têm servido na igreja na esperança de provar que
somos merecedores do amor de Deus. Podemos até alimentar o
sentimento secreto de que Deus ama mais aqueles que servem
mais do que nós. Veja como Dawn se comportou quando veio a
entender que todas as pessoas são preciosas aos olhos de Deus:

Eu costumava me oferecer como voluntária para tudo.


Liderava o culto das crianças, mesmo que por natureza
não fosse organizadora. Cantava no coral efazia pãopara
os cafés da manhã continentais.
Logo que derrubei minha imagem de filha boazinha,
vi que estava tentando ganhar o amor de Deus. Sentia-me
inferior às outras pessoas da igreja que davam mais
dinheiro do que eu, que organizavam os eventos com tanta
eficiência. Sentia que Deus tinha de amá-las mais do que
me amava. Percebi que foi assim que meus pais nos
trataram comofilhos. Quem/azia mais era mais amado.
Durante anos, fui a ajustadora e nunca me salientava
como minha irmã, a responsável. Quando fiquei adulta,
tentei desempenhar o papel dela para provar que eu
finalmente havia crescido.
Agora me dou conta do quão absurdo era isso. Acredito
que Deus me ama como a filha que Ele criou e que está me

~ ~ I I ; , .I: L l " I .. ~ Ji. " .. . .r L 11., • j.J ., l.l-Jf .. I UlLl,J .


Construindo Relacionam.entos Seguros / 239

conduzindo tão rápido quanto posso seguir. Hoje estou


interessada num ministério para adolescentes grávidas e
encontrei uma hábil amiga organizadorapara me ajudar.
Deixei o coral e a comissão de educação, o que desapontou
algumaspessoas. Contudo, pelaprimeira vez estou seguindo
o caminho que sinto ser o que Deus traçou para mim, em
vez de dizer sim a tudo o que me pedem para fazer.

Desenvolva a capacidade de não se deixar ofender


por críticas ou insultos
À medida que aprendemos a não nos levar muito a sério,
conseguimos pôr de lado comentários ou afrontas que os outros
nos fazem. Muitos têm tanto a fazer que já não sobra a energia
para nos atormentar intencionalmente. Quando agem assim, na
maioria das vezes estão reagindo às suas próprias feridas e de
acordo com seus papéis familiares.
Isto não significa que enterramos situações nocivas. Nós as
ventilamos em lugares seguros como um diário ou pequeno
grupo confidencial (sem dizer o nome da pessoa). Em tais casos,
entendemos se precisamos confrontar tais situações ou
desconsiderá-las. O que esta pessoafaz está nosferindo ou apenas
nos irritando? A confrontação é apropriada ou útil?

Construindo Comunidade no Casamento


Normalmente escolhemos com quem nos casamos, porque
gostamos do eu exterior ou da imagem de "criança boazinha"
da outra pessoa. Podemos ter tido somente alguns vislumbres
do eu verdadeiro da outra pessoa, porque compartilhar
pensamentos e sentimentos desagradáveis não é o modo
culturalmente aceito para atrair um companheiro. Isso quer dizer
que muitos casamentos consistem em duas "crianças boazinhas",
cada uma mascarando um eu verdadeiro incivilizado e talvez
necessitado e infantil. Não leva muito tempo para que o eu
240 / Curando as Feridas da Alma

verdadeiro infantil de cada um apareça, assim que a segurança


do matrimônio é estabelecida. Cada cônjuge quer o consolo e a
preocupação do outro.
Num relacionamento em crescimento, o consolo circula entre
ambos os lados. Quando somente um compartilha as feridas, o
relacionamento fica empacado. Os casais vão ao conselheiro
matrimonial e dizem: "Por que me casei com ele? Por que não vi
que ela não passa de uma pessoa que gosta das coisas sendo
feitas do seu jeito?" É importante vir a conhecer e aceitar as
necessidades e os piores comportamentos da outra pessoa. Como
esta pessoa se comporta quando está ávida de afirmação e
fazendo aquelas perguntas importantes: O que tenho de fazer
para me sentir amada? Para me sentir valorizada?
Os cônjuges freqüentemente esperam que o outro satisfaça
as necessidades que os pais não satisfizeram. julie sabia que ela
estava fazendo isso. Seu pai nunca manteve um emprego fixo,
por isso ela procurou um marido que fosse trabalhador ambicioso
e implacável. Seu marido, Mark, odiava como a sua mãe
diariamente gritava com ele na infância, assim achou em julíe
uma esposa quieta e acalentadora para protegê-lo. Pouco
importava que julie e Mark não tivessem nada em comum entre
si. Eles reagiram tão fortemente contra seus respectivos pais,
que não casaram tão sabiamente quanto poderiam.
Outras vezes, não sabemos quão drásticas são nossas
necessidades até que entremos no casamento. Muitos de nós
sentem-se desesperadamente necessitados por dentro, porque
temem o abandono. Isto toma forma de muitas maneiras e foi
assim que aconteceu com Ann:

Quando Steve me disse que planejava ir ao cinema com os


amigos} me senti rejeitada. Mas não querendo ser um
estorvo} agi como se nada estivesse errado.
Naquela noite} depois que Steve saiu} lembrei-me do
abandono que sentira quando meu pai ia beber. Quando

• I I. • ~. J J I I " II I ...... l<fi 1,,11, , .,.; ... 11.11, , I, I , "', Il1o I 1I11~1
Construindo Relacionamentos Seguros / 241

eu tinha onze anos, alguém tentou arrombar nossa casa.


Minha mãe e eu acendemos todas as luzes da casa e
pegamos um taco de beisebol. Ficamos sentadas no chão
do corredor, próximas ao telefone, até que a polícia chegou.
Não fazíamos idéia de onde meu pai estava. Quando ele
chegou em casa, nós lhefalamos sobre o ocorrido e ele deu
de ombros.
E se alguém tentar arrombar a casar, ficava pensando.
Steve estavafora quando eu maisprecisava dele. Em minha
mente, confrontava Steve com as ocasiões em que não
estava presente quando precisei dele. De fato, não eram
tão dramáticas, mas meus sentimentos de abandono
estavam em ação e não pude fazê-los parar. Finalmente,
fui para cama cedo com a esperança de que me sentiria
melhor no dia seguinte.
Mas não me senti. Querendo me desforrar de Steve por
"ter-me abandonado", convideiparajantar uma de minhas
colegas de trabalho de quem Steve não gostava. Quando
ela chegou e Steve ficou aborrecido, fingi consternação e
perguntei: "Não lhe falei que ela vinha jantar?"

Ann sabia que seus sentimentos de abandono eram


injustificados, mas parece que ela não conseguia deixar de senti-
los. Seus sentimentos ganharam e ela descobriu um modo de
vingar-se de Steve, convidando a colega de trabalho para jantar.
Era muito arriscado confiar em Steve, confiar em Deus para
cuidar de Steve e confiar que ela sobreviveria se Steve nunca
voltasse.
Para que casamentos e amizades dêem certo, precisamos estar
dispostos a ouvir nossos clamores internos e admitir que um
cônjuge tem apenas um papel limitado na satisfação desses
clamores. É Deus, em última instância, quem nos satisfaz, embora
às vezes Ele use as pessoas que nos cercam. Devemos trabalhar
em nós para podermos contar a um cônjuge quais são os nossos
242 / Curando as Feridas da Alma

mais profundos medos, pelo que estamos lutando na vida, o que


nos faz sentir amados. Esse cônjuge sozinho não pode satisfazer
tais necessidades, mas pode cooperar com Deus para que nossas
necessidades sejam satisfeitas tanto quanto o cônjuge é capaz.
Outro dilema enfrentado no casamento é que, embora
procuremos um cônjuge que não seja como nosso pai ou mãe
"nenê rei" ou cuidador, é comum no final das contas nos casarmos
com alguém como aquela pessoa. Isto está refletido pelo modo
como os filhos de alcoólatras se casam com alguém que é, em
essência, abusador.' Pelo fato de estarem os filhos acostumados ao
caos e os "nenês reis" estarem habituados a receber cuidados, eles
subconscientemente buscam tais relacionamentos familiares. A
melhor maneira de evitar esses dilemas é começarmos nossa jornada
de exame de consciência antes de escolhermos um cônjuge.
Se você se casou sem o benefício do exame de consciência,
ore a fim de que ambos tenham forças para apoiar um ao outro
e espere que vocês dois façam o exame que cada um precisa. À
medida que você fica mais experimentado em ouvir-se,
provavelmente reconhecerá que, sem saber, tem estabelecido
papéis no casamento que limitam seu crescimento espiritual e o
modo como você pode ajudar o outro. Apresentamos a seguir
alguns papéis comuns que os cônjuges adotam sem
conscientemente escolhê-los. 2

Serei o pai, você o filho.


Serei o inteligente, você o burro.
Serei o trabalhador, você aquele que se diverte.
Serei o responsável, você pode ser o irresponsável.
Serei aquele que tem saúde, você pode ser o doente.
Serei o líder, você pode ser o liderado.
Serei o déspota, você pode ser a vítima.
Serei o decidido, você pode ser o hesitante.
Serei aquele que recebe, você pode ser o doador.
Terei razão, você sempre estará errado.

I ... 1: "~1 I J.... • I ~ i I, .... I J J J L J, J


Construindo Relacionamentos Seguros / 243

Serei aquele que tem cultura, você pode ser o inculto.


Serei amigável, você pode ser o distante.
Serei o protetor, você o protegido.
Serei exigente, você pode ser flexível.
Serei sensível, você pode ser o bruto.

Parte do exame de consciência envolve conscientizar-se


destes papéis e então renegociá-los em condições diferentes.
Talvez tenhamos de admitir o papel que representamos e
expressar o desejo de mudar. Claro que não podemos mudar
o comportamento do cônjuge, por isso nossa mudança
confundirá o relacionamento. Pode ser que precisemos dizer
pacientemente: "Não estou mais contente em ser o pai
designado em nosso relacionamento, por isso você terá de
cuidar desse assunto sozinho", ou: "Já não me vejo como o
cônjuge burro neste relacionamento e isto é o que penso que
devo fazer". Cabe a nós ter paciência e orar com fervor, se
depois de tantos anos formos nós que estamos mudando os
papéis no relacionamento.

Você Pode Estar Querendo Saber..•


P Vocês deram a entender que muitos que freqüentam a
igreja estão superando os problemas discutidos aqui. Por
que as coisas são assím?
R Se limitarmos a discussão ao exame dos efeitos da
criação somente nas famílias com problemas ligados ao
alcoolismo, considere isto: a entidade americana Focus
on the Family recebeu tantos pedidos sobre o tópico
dos efeitos da criação na família com problemas
relacionados ao álcool, que em novembro de 1988
fizeram o primeiro programa de rádio sobre o assunto,
tendo-o repetido várias vezes. A partir daquela data,
eles têm recebido mais pedidos dos ouvintes sobre esse
244 / Curando as Feridas da Alma

tópico do que sobre qualquer outro. Entre essa audiência


orientada à família com valores tradicionais, esses
problemas do passado estavam aparecendo. Considere
então quantas pessoas mais podem reagir à infância
que tiveram por terem crescido em famílias com
problemas não relacionados ao álcool.
A taxa na qual os grupos de apoio cristãos estão
aumentando é mais uma indicação de que as pessoas
que freqüentam igrejas estão se submetendo a esse
processo de exame de consciência. Da resposta àquele
programa de rádio, o Grupo de Apoio Nova Esperança,
da First Evangelical Free Church, em Fullerton, Califórnia,
começou a compilar uma lista de grupos de apoio
existentes nos Estados Unidos, e até agora já foram
enumerados mais de 2.000. A Overcomers Outreacb,
rede de grupos de apoio cristãos para pessoas que lidam
com vícios, tem mais de 1.000 grupos de apoio.

P E se eu tiver um relacionamento com alguém que vem


de família cujo pai ou mãe é um furioso "nenê rei" e
um cuidador?
R É importante fazer as seguintes perguntas:
1. A pessoa reconhece a dinâmica da famüia em que vive?
Em caso negativo, incentive-a a ler um livro sobre esse
assunto ou participar de um grupo de apoio. A pessoa
pode insistir que não é nada parecida com o pai ou
mãe "nenê rei" ou pai ou mãe cuidadora, mas é bem
provável que ela não entenda quanto estrago o passado
pode causar, nem o seu potencial em arruinar
relacionamentos futuros.
2. A pessoa mostra boa vontade em investigar como seu
passado pode estar afetando sua vida hoje? Se não, a
pessoa pode ser vítima de orgulho próprio e armadilha
potencial para você. Estar comprometido com um

, .. I II I , I L •. I .... L ".1 J • 11., Üo • ~.j J. 1;. L i fIL ~ 11 ÜJ. J


Construindo Relacionamentos Seguros / 245

relacionamento envolve fazer qualquer tarefa que seja


preciso para aprender a expressar necessidades e fixar
limites. Caso a pessoa não entenda as necessidades do
seu eu verdadeiro, provavelmente esperará que você
satisfaça-lhe as necessidades, se você vir a se casar com
ela. É óbvio que isto não seria justo, porque ninguém
pode satisfazer as necessidades internas da outra pessoa.
3. Tem certeza de que não procurou a pessoa, porque
subconscientemente estava procurando alguém quefosse
"nenê rei" ou cuidador? Ainda que nossa mente
consciente discorde, a maioria de nós procura duplicar o
caráter do relacionamento de nossos pais. Examine seus
motivos e necessidades. O relacionamento é caracterizado
por sincera comunicação de sentimentos ou por cuidado,
tensão e violação de limites? Você estaria saindo com
esta pessoa caso se sentisse mais seguro no amor de
Deus e em sua auto-estima? Idealmente, a resposta a
estas perguntas seria sim, mas agora você tem de ver se
a pessoa examinará a questões da infância dela.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

• Você diria que em seus piores momentos é mais provável


que seus limites sejam feitos de granito (distantes, não
deixando ninguém entrar) ou de aramado (emaranhados,
convidando os outros a ter muito o que dizer sobre sua vida)?
Marque o ponto em que você se situa nesta linha contínua.

Granito Aramado
246 / Curando as Feridas da Alma

• Qual é o seu maior medo em relação a limites?

• Você acha que, quando criança, seus limites eram


emaranhados, distantes ou equilibrados?

• Como adulto, você:

Continuou com a mesma luta no que tange a limites?

Reagiu e escolheu o estilo oposto?

Encontrou limites equilibrados?

• Que mudanças você precisaria fazer para ter limites mais


equilibrados?

• Quem você conhece que é bom em dar conselhos sem


lhe dizer o que fazer?

• Suponha por um momento que você tenha um eu "igreja".


Que comportamentos ou palavras teria de deixar para
abandonar esse eu "igreja", pouco importando se os
comportamentos e as palavras são de pequena monta? Como
você acha que as pessoas reagiriam? Durante esta semana,
tente fazer uma coisa pequena na igreja para abandonar
algum comportamento eu "igreja" e escreva a reação das
pessoas.
Construindo Relacionamentos Seguros / 247

• Se você é casado ou está namorando alguém, faça um "x"


ao lado dos papéis que você alistou acima, os quais você
e seu cônjuge (ou futuro consorte) às vezes representam.

• O que fez com que você ou ambos assumissem tais papéis?

• O que o ajudará a deixar de desempenhar esse papel? O


que ajudará o seu cônjuge (ou futuro consorte)?

• O quanto você se sentirá tranqüilo sem aquele papel?

• Quando seria aocasião favorável para discutir estas coisas


com seu cônjuge ou futuro consorte?
ICAPtruLo DEzOITO I
Mitos que Sabotam oCrescimento Espiritual

Se quisermos ver Deus claramente e ter um relacionamento


autêntico com Ele, temos de trabalhar para manter limpas as
janelas que foram embaçadas por nossa natureza pecadora, nossa
cultura e nosso passado. Aprendemos a nos desfazer de imagens
nebulosas e obscuras de Deus e de interpretações errôneas das
Escrituras que estrangulam nossa fé.
Na forma de mitos, fizemos uma lista de algumas dessas
interpretações errôneas. A princípio tais interpretações parecem
corretas, porque foram baseadas em núcleos da verdade, mas
depois foram contaminadas com a idéia de que a negação, a
culpa e o isolamento são úteis e que a ira de Deus fervilha sob
a superfície, esperando o momento oportuno para nos pegar
cometendo um erro. Nós as redigimos no esforço de esclarecê-
las, mas elas aparecem em versões mais sutis.
MITO: Manter-me crente resolve os meus problemas.
VERDADE: Manter-se crente salva, mas não isenta o indivíduo
do sofrimento ou mesmo das dores das feridas do passado.
Muitos de nós aceitaram a Jesus, quando a vida não ia tão
bem e estávamos procurando uma solução. Podemos ter ouvido
alguém dizer: 'Jesus é a resposta", e por isso pensamos em
"tentar". Neste sentido, o cristianismo tomou-se poção mágica

I I ... a. .1 II I .,
Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual / 249

de pouco valor para resolver problemas. É semelhante ao


pensamento mágico de nossa cultura de que o modo de resolver
os problemas é comprar uma casa nova, casar com outra pessoa
ou mudar de cidade. Esta abordagem de "solução simplista"
contra-explode com a fé, quando as pessoas descobrem que a
vida cristã não é fácil. Talvez fiquem desiludidas e vejam o
cristianismo como mais uma coisa que não deu certo. Pode ser
assustador pensar: Nem mesmo Deus pode me ajudar.

A abordagem de solução simplista é conhecida por contra-explodir!

A conclusão lógica deste mito é que deve ser por falta de fé


que os cristãos passam por lutas. Talvez você conheça alguém
em sua igreja que perdeu o emprego, foi fisicamente ferido
num acidente de carro e recebeu diagnóstico de uma doença
crônica - e então você ficou a se perguntar: Por que todas essas
coisas ruins aconteceram com ele? Contudo, sabemos que a fé
não resulta numa vida sem problemas, por causa de exemplos
250 / Curando as Feridas da Alma

como Jeremias, o profeta do Antigo Testamento, que se atolou


na lama de uma cisterna às mãos de maus governantes de judá
(Ir 38.6); Paulo, que suportou o espinho na carne (2 Co 12.7-
10); Jesus, que sofreu imensamente na cruz. Deus permite a dor
e o sofrimento e, embora às vezes Ele forneça solução aos
problemas, é mais comum Ele andar conosco através dessas
dificuldades.
MITO: Os crentes têm a vitória sobre o pecado, porque °
pecado é um problema apenas para aqueles cuja fé é fraca.
VERDADE: Todos os crentes lutam com o pecado.
Este mito diz às pessoas que vençam (na verdade, neguem)
o pecado, louvando a Deus, reivindicando a vitória e tendo
uma atitude de gratidão. Olhar o passado é procedimento
desnecessário, porque as dificuldades cessarão se você crê com
bastante tenacidade. Aqueles que agem de acordo com este
mito são forçados a ser mais do que vencedores e perfeccionistas
para provar a fé que têm.
Ainda que Deus seja o Médico por excelência, nem sempre
cura as pessoas ou alivia suas lutas com o pecado. Os crentes
ao longo da Bíblia lutaram com o pecado, inclusive o apóstolo
Paulo, que descreveu sua luta como uma "batalha" (Rm 7.23) na
qual ele combatia: "Eu sei que em mim, isto é, na minha carne,
não habita bem algum; e, com efeito, o querer está em mim,
mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem que
quero, mas o mal que não quero, esse faço. Ora, se eu faço o
que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em
mim" (Rm 7.18-20).
MITO: Os crentes devem vigiar suas emoções.
VERDADE: Devemos experimentar os sentimentos que Deus
nos deu e levá-los a Ele, sobretudo quando não os entendemos.
Ao mesmo tempo que precisamos examinar nossas emoções,
algumas pessoas suspeitam delas e falam de disciplinar, esbofetear
ou controlar as emoções, se verdadeiramente queremos seguir a
Deus. Curt experimentou esta situação deste modo.

1, i .. L .. j J ,I I.
Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual /251

Quando eu era novo na fé, os crentes me disseram: "Curt,


não preste atenção às suas emoções. Ignore esses
sentimentos e faça o que Deus quer que você faça". Abri
meu coração a um crente que bateu em sua Bíblia e disse:
"Isso é apenas um sentimento. O que diz a Bíblia?" Ele me
falou que dar ouvidos aos meus sentimentos me colocaria
em dificuldades. Assim ignorei meus sentimentos, o que
não foi difícil - minha família tinha me ensinado a
mesma coisa.

Deus criou os sentimentos. Ele é um ser de plenos


sentimentos e expressa raiva (In 4.1), mágoa (Os 11.1-4) e
alegria (Ne 8.10). Grande parte da Bíblia fala sobre
sentimentos, especialmente na poesia e profecia do Antigo
Testamento. O rei Davi, um homem segundo o coração de
Deus (1 Sm 13.14), sentia a força de suas emoções e as
entregava a Deus. Podemos fazer a mesma coisa e lutar
abertamente com os sentimentos:

o meu coração está dorido dentro de mim,


e terrores de morte sobre mim caíram.
Temor e tremor me sobrevêm;
e o horror me cobriu.
Mas eu invocarei a Deus,
e o SENHOR me salvará.
De tarde, e de manhã, e ao meio-dia, orarei;
e clamarei, e ele me ouvirá a minha voz.
Salmo 55.4,5,16,17

Podar nossos sentimentos extirpa parte de quem somos. Isola


nossa vida emocional de nossa fé e reforça a brecha entre o
nosso eu verdadeiro e o nosso eu "igreja". É mais sábio lidar
com os sentimentos, mesmo com os mais desagradáveis, por
meio da nossa fé.
252 / Curando as Feridas da Alma

MITO: Ore e leia mais a Bíblia, e assim você crescerá


espiritualmente.
VERDADE: Chegamos ao conhecimento de Deus por
intermédio destas duas ferramentas importantes, como também
de outras.
Embora a oração e o estudo da Bíblia sejam duas ferramentas
essenciais do crente, há outras ferramentas que nos forçam a
sair de nosso isolamento. Jesus discipulou os apóstolos passando
tempo com eles, falando com eles, fazendo perguntas e até
contando histórias. O discipulado não é um exercício solo. Nas
amizades, relacionamentos de mentor e grupos pequenos,
ouvimos as experiências dos outros, confessamos nossas faltas
e sentimos o amor de Deus. Isto nos ensina a confiar em Deus
e a confiar nas pessoas.
N a adoração nos relacionamos com Deus como o Criador
poderoso que não nos abandona. A adoração ajuda a expressar
de volta a Deus as verdades bíblicas de maneira pessoal.
Cantamos e falamos diretamente com Deus, exprimindo
pensamentos que podem não encontrar vazão em nossas orações.
MITO: O serviço cristão significa concordar em fazer toda
tarefa que o pastor me pede para fazer.
VERDADE: Servos apáticos se dão por razões erradas,
prejudicando-se a si mesmos e aos outros.
Por que é tão difícil dizer não ao pastor sem sentir um pouco
de culpa? Em algum lugar, o serviço cristão recebeu a seguinte
definição: Ato de fazer qualquer coisa que a igreja precisa que
façamos. Perdemos o senso de pedir a Deus que nos mostre o
que Ele pôs em nossos corações com os dons que Ele nos deu.
Os assuntos não resolvidos do passado nos tornam propícios
a esse tipo de desvio do bom senso no servir. Muitos de nós,
que foram crianças boazinhas, assumem a obra ministerial de
forma a podermos nos esconder de nossa sensação de
insuficiência. Em um nível mais profundo da consciência,
esperamos que nosso serviço nos faça sentir "bastante bem",

, I • I II L .; ~ I oI'Ii.~ ~ , ,~
) J. J "- I , I L 11 , I I .l ..... I Itlll,1
Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual / 253

mas a coisa não funciona assim. A auto-estima não está baseada


no serviço, mas no infalível amor de Deus por nós. Se
dependemos de nosso desempenho como servos cristãos para
nos fazer sentir bem conosco mesmos, até fracassos pequenos
ficam maiores do que a vida. Podemos até ficar desestimulados
e apáticos. Jan nos conta como ela descobriu isso:

Como esposa de pastor, eu ensinava na Escola Dominical,


trabalhava no grupo da mocidade, cantava no coral,
tocava piano e fazia qualquer outro trabalho que
encontrasse. Fazia isto em parte porque amava a Deus e
queria servi-lo. Em outro nível, estava procurando um
modo de me sentir um sucesso na vida, a fim de compensar
minha sensação de incapacidade. À medida que minhas
responsabilidades aumentavam e meu serviço não
produzia os resultados pelos quais eu esperara, fiquei
desanimada e apática. Questionei com Deus sobre o motivo
de Ele permitir que eufracassasse.
Durante minha jornada de exame de consciência,
descobri que eu verdadeiramente era uma pessoa
derrotada. Conscientizei-me de que eu era um "nenê rei"
(exigindo sucesso de Deus para sustentar minha lânguida
auto-estima) e uma cuidadora (sacrificando-me por todo
o mundo, porque eu queria ser amada e notada). Distingui.
uma raiva oculta dentro de mim, que gerava um impulso
para corrigir as pessoas em vez de ajudá-las. Vi que os
outros precisavam de ajuda em lugar de confiarem em
mim. Percebi que eu simulara seruir mesmo quando não
tinha tempo, porque inconscientemente acreditava que se
trabalhasse para Deus, Ele me amaria mais.
Saí de quase todos os cargos na igreja e pedi a Deus
que me mostrasse como Ele queria me usar. Enquanto
esperava, sentia-me inclinada a seguir alguns meios de
seruiço que nunca antes tinha considerado. Um era ajudar
254 / Curando as Feridas da Alma

os outros que estavam tão derrotados quanto eu e, assim,


comecei a liderar um grupo de apoio. Em vez de estar na
frente, à vista de todos, eu me enfurnava numa sala dos
fundos com pessoas que alguns da igreja chamavam de
"osperdedores". Contudo, pelofato de eu estar trabalhando
em deixar Deus satisfazer minhas necessidades de ser
amada e valorizada, sentia-me contente em estar
escondida no bolso de trás de Deus, seruindo num lugar
onde ninguém me notava.

Quando servimos, precisamos permitir que Deus fale conosco.


Estou fazendo isto para impressionar alguém ou buscar
recompensas exteriores? Estou usando isto para me sentir bem
comigo mesmo ou para bloquear a voz de Deus, quepede que eu
mude meu eu interior?
Deus permite que nossos corações sejam partidos por muitas
coisas que estão à nossa volta e, às vezes, esse trauma torna-se
uma chamada para fazermos algo para ajudar. Quando tal
acontece, nâo nos apressamos em ajeitar as circunstâncias.
Pedimos a Deus que nos mostre nosso papel. Ficamos satisfeitos
em esperar nEle e deixar que direcione nosso caminho.
Procuramos outros que tenham a mesma paixão e oramos pela
direção de Deus. Quando o caminho está definido e nosso eu é
posto de lado, estamos prontos para servir numa maneira que
glorifique a Deus e satisfaça o senso de propósito que Ele pôs
dentro de nós.
MITO: Continue crendo e as dúvidas desaparecerão.
VERDADE: Dúvidas (ou "crises de fé") são parte normal da
fé e podem ser entregues a Deus enquanto esperamos pela
resposta dEle.
Enquanto no passado nos sentimos emocional ou fisicamente
abandonados, hoje podemos estar infestados por dúvidas sobre
Deus. Não estamos cientes de questões que rosnam sob a
superfície até que a calamidade aconteça. Deus nos guarda

J II jLi. J I .. j
Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual /255

mesmo?A Escritura é deveras a verdade? Por que existe tamanha


diferença entre o que eu leio na Bíblia - "Deus é amor" em 1
João 4.16- e o que eu sinto? Será que eu creio verdadeiramente
no que os outros crentes crêem, ou eu disse isso apenas para
agradar um cônjuge ou um líder de mocidade?
Se você expõe estas dúvidas num estudo bíblico, alguns
podem se sentir incomodados, porque julgam que as dúvidas
são somente para os incrédulos. Há os que podem questionar
sua fé, enquanto outros lhe dizem que você está sob o ataque
de Satanás. Porquanto seja verdade que nosso inimigo espiritual
inspire dúvidas em nós, ele também inspira o medo que nos
impede de tratar delas. Em Efésios 6.10-18, a grande passagem
da guerra espiritual, a palavra mais usada é "firmes" (Ef
6.11,13,14). Se considerarmos que "estar firmes" (Ef 6.11) é a
nossa meta na guerra espiritual, perceberemos o benefício de
levarmos nossas dúvidas a Deus, de modo que nos tempos de
dificuldades Ele fortaleça nossa fé.
Muitas personagens bíblicas "estavam firmes" contra o diabo,
e ao mesmo tempo trabalhavam as dúvidas. O profeta Habacuque
fez a Deus perguntas difíceis, porque via a nação israelita indo
para a destruição. Deus não o repreendeu, mas respondeu as
perguntas. Permanecemos firmes quando exploramos nossas
dúvidas de maneira tal a não denegrirmos Deus, mas a admitirmos
nossa falta de entendimento. Trabalhar as dúvidas nos ensina a
esperar em Deus, a encontrar companhia nEle, mesmo quando
não fazemos idéia do que está acontecendo, e experimentar a
maravilha e a surpresa de nos entregar a um Deus que é grande
o bastante para nos amar em toda a nossa humanidade. É por
isso que é sábio achar um ou dois cristãos que nos ouçam
expressar nossas crises de fé e nos ajudem a trabalhá-las. Curt
nos conta suas experiências em processar as dúvidas:

Ao longo de minha vida cristã, sempre confessei que Deus


me amava. Em minha mente eu cria que Deus era real,
256 / Curando as Feridas da Alma

mas secretamente meperguntavapor que um Deus de amor


não me protegera do caos que fora minha infância. Era
umafé dividida - reivindicava a vitória em Cristo, mas
tinha dúvidas secretas.
Assim que falei com um pastor sobre minhas dúvidas,
ele me perguntou se eu tinha um relacionamento
verdadeiro com Deus. Ele disse que eu devia estar
abrigando algum pecado em minha vida. Quando falei
com outro cristão, ela me deu um livro sobre oração que
absolutamente não tinha nada a ver com minha questão.
No fundo do meu ser, comecei a pensar que não havia
resposta para o meu problema.
Depois disso, mantive-me silencioso sobre minhas
dúvidas e condenava-me por tê-las. Quanto mais culpado
me sentia, menos orava ou servia na igreja. Falar com
Deus só me fazia sentirpior.
Mesmo depois de ter concluído meu grau de mestrado
em Psicologia e de estar trabalhando como terapeuta,
ainda sentia que algo estavajaltando. Quando comecei a
ter ataques de pânico e consultei um terapeuta cristão,
reconheci que duvidava de Deus. Na segurança de um
grupo de apoio ligado à igreja, admiti que eu sentia que
as promessas de Deus eram vazias e que não se aplicavam
para mim. Outras pessoas admitiram as mesmas lutas e
juntos choramos. Alguns até gritaram. Foi quando fiquei
sabendo que eu não estava só.
Depoisdessa experiência, deixei de me condenar, o que
me ajudou a chegar mais a Deus. Através do amor e da
aceitação de outras pessoas, entendi a graça de Deus num
nível mais profundo. Isso abriu um mundo novo de quem
eu era em Cristo.

MITO: A culpa é ferramenta de Deus para me fazer sentir


bem.

I I Il. I II I li J, a l~~ j,.I.1 ,.~, 'IL ... t.J J.I!I! .. i 11J1J;J I ~Jj
Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual / 257

VERDADE: A culpa saudável, equilibrada com o amor


incondicional, estimula nossa consciência. A vergonha pode nos
incapacitar.
A culpa é útil quando mexe com nossa consciência se dizemos
uma mentira ou falamos rispidamente com alguém. Essa culpa
pode nos impulsionar a admitir nossas faltas e pedir a Deus que
nos mostre o que precisamos fazer para deixar que Ele transforme
mais nossa vida. A culpa não produz este tipo de fruto, a menos
que também estejamos convencidos de que somos amados,
porque o amor nos capacita com a esperança e nos diz que se
confessarmos nossos pecados, Deus nos perdoará (1 jo 1.9). A
culpa, em si, não traz esperança.
Quando não há amor, acreditamos que somos não apenas
desesperançados, mas também desprezíveis. Afundamo-nos na
vergonha, o que nos faz perguntar por que devemos lutar. Isto
não estimula o crescimento espiritual, mas o abafa.
Os mitos expostos acima simbolizam a atitude geral da
vergonha religiosa entre alguns cristãos. Esta vergonha
contamina os acontecimentos corriqueiros, como também os
bons presentes de Deus: divertir-se é mau, ter problemas é
mau, ser uma pessoa ativa sexualmente é mau, estar doente é
mau, ser muito rico é mau, ser muito pobre é mau. H. L.
Mencken delineou este tipo de fé: "... o obsessivo medo de
que alguém, em algum lugar, possa ser feliz". 1 Esta fé promove
regras costumeiras como estas:

• Pessoas fortes não choram.


• Pessoas espirituais sempre são controladas.
• Pessoas inteligentes não fazem perguntas.

Os opostos é que são de fato verdadeiros. As pessoas são


mais fortes quando choram; amadurecem espiritualmente quando
entregam o controle a Deus; a sabedoria nos faz ver as falácias
e possíveis conseqüências.
258 / Curando as Feridas da Alma

Se esquecermos as visões distorcidas da humanidade de um


Deus que culpa e envergonha, veremos Deus como um Pai
amoroso cheio de graça. Deus faz tudo o que é necessário para
nos mostrar que nos ama, como a mulher que examina
cuidadosamente o chão de palha da cabana palestina procurando
a moeda perdida. Ela acendeu a candeia, varreu a casa e procurou
a moeda diligentemente. Ela possuía nove outras moedas, mas
esmerou-se ao máximo para achar a décima. Quando a achou,
deu uma festa (Lc 15.8-10). Este é o quadro de Deus que
precisamos entender e nunca esquecer.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Se sou "nova criatura em Cristo (2 Co 5.1 7), nao
JJ

significa que já venci o pecado?


R Cristo comprou nossa redenção e posição no céu e agora
temos o poder do Espírito Santo para nos capacitar (Jo
14.17; 16.13,15). Contudo, isso não tira nossa natureza
pecaminosa e não cancela os padrões que
desenvolvemos quando éramos crianças e adolescentes.
Considere os líderes da Igreja Primitiva, muitos dos quais
andaram com Jesus e receberam o Espírito Santo no
Pentecostes. Eles lutaram com o pecado do preconceito
racial (provavelmente uma influência da cultura deles)
com "grande contenda" acerca dos gentios na Igreja (At
15.7). Todos que estão neste lado do céu lutam com o
pecado.

P Por que algumas pessoas se excedem ao expressar


sentimentos quando examinam seu eu verdadeiro?
R Sentimentos enterrados ficam presos por tantos anos
que podem estourar como uma represa rompida. Temos
um exemplo no modo como Matt chorou
incontrolavelmente depois que falou com seus pais

j ~... ~ ~ I I •I 11,', -. • I.. k 1. .1', , ,,', • . iI.·~ , I, j. n;, .. IIIH"I


Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual / 259

(Capítulo 2). Se não temos o hábito de expressar


. sentimentos, podemos nos sentir vencidos por nunca
termos expressado sentimentos que são tão fortes. Pelo
fato de não ser fácil expressar sentimentos de modo
discreto, quando temos algo difícil a dizer, talvez ajude
escrevermos as palavras exatas e considerarmos nosso
tom de voz. Este procedimento nos dá a chance de
considerar o impacto de nossas palavras e repensar o
que vamos dizer. Meu choro vai piorar as coisas,
porque no passado esta pessoa era manipulada pelas
lágrimas ou talvez fique intimidada por elas?
Isto não quer dizer que devemos "vivenciar nossos
sentimentos", fazendo tudo o que eles nos ditarem.
Ouvimos nossos sentimentos, encaramos a verdade que
eles nos falam e descartamos a mentira.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

Qual destes mitos alistados adiante você acha que causa


problemas para os crentes?

- Ficar crente resolve todos os meus problemas.


- Os crentes têm a vitória sobre o pecado, porque
o pecado é um problema apenas para aqueles cuja
fé é fraca.
- Os crentes devem vigiar suas emoções.
- Ore e leia mais a Bíblia, e assim você crescerá
espiritualmente.
260 / Curando as Feridas da Alma

- O serviço cristão significa concordar em fazer toda


tarefa que o pastor me pede para fazer.
- Continue crendo e as dúvidas desaparecerão.
- A culpa é ferramenta de Deus para me fazer sentir
bem.

• Dê um exemplo de como estes mitos lhe causaram


problemas.

• Há um ou mais mitos que você gostaria de acrescentar a


esta lista?
• Qual seria o seu maior proveito ao entender a verdade
desses mitos?

. I I. ,. j" J II I oI
ICAPíruLo DEZENOVE I
Restauradores Feridos como Líderes de Igreja

Antes que você pule este capítulo, considere por um momento o


seu potencial como líder em sua igreja. Se você levou em conta o
exame de consciência apresentado, você possui uma autenticidade
que as pessoas notarão. Além disso, ser líder significa simplesmente
que alguém o respeita. A pessoa com quem você serve na comissão
de finanças, ou no berçário, ou seu colega de trabalho respeita
você mais do que imagina. Seus filhos, sobrinhas, sobrinhos ou
netos o observam de perto, mesmo que você ache que eles não
o notam. À medida que você estiver lendo este capítulo, considere
o papel que Deus reservou no Reino dEle para você.

Formando Pessoas
Como líder, você pode dar o tom da vulnerabilidade das seguintes
maneiras.

Agregue novos crentes antes que eles desenvolvam um eu


"igreja" e um eu verdadeiro
Que igreja não ficou curiosa em saber mais informações sobre a
porta giratória que na frente traz as pessoas e na parte de trás
livra-se delas? Por que os novos crentes se desviam? Entre outras
262 / Curando as Feridas da Alma

razões, porque os novos crentes não desenvolveram um eu


"igreja" e, assim, eles vêem claramente a discrepância entre quem
eles realmente são e como se espera que ajam. Os novos crentes
precisam, sobretudo, examinar suas visões distorcidas de Deus,
suas dúvidas e motivos. Precisam de relacionamentos nos quais
possam ser honestos acerca dos seus velhos comportamentos,
especialmente os compulsivos. Essas lutas raramente são
abordadas na classe dos novos-convertidos.

Não incentive as pessoas a serem "crianças boazinhas"


Olhe pela lente do seu coração àqueles na igreja que pareçam
muito bons. Toda essa perfeição pode estar escondendo profunda
dor interna que eles imaginam que afastaria você, caso você
soubesse. Se isto for verdade, pode ser que tenham escondido a
dor tão profundamente que eles nem mesmo sabem que existe.
Ore por eles e compartilhe as lutas que você têm. Talvez Deus
o use para melhorar a vida dessas pessoas.

Forme amizades e grupos pequenos nos quais as pessoas


possam fazer um examine honesto de si mesmas
Peça a Deus que lhe mostre as avenidas mais promissoras para
compartilhar sua vulnerabilidade com as pessoas. Você poderia
se reunir semanalmente com um membro da igreja que passa
por grandes lutas ou começar um grupo de apoio (veja Apêndice
A). Estes esforços ajudarão sua igreja, porque quando as pessoas
estão dispostas a fazer o trabalho de exame de consciência, o
relacionamento delas com Deus cresce.

Recomende profissionais quando necessário


Se sua igreja não tem uma lista de terapeutas cristãos e grupos
de apoio na região, você pode criar um. É triste dizer, mas a
história a seguir acontece em algumas igrejas:

~ I . .L . I I I l "
Restauradores Feridos como Líderes de Igreja / 263

jessica enfrentava lutas com a bulimia. Elafreqüentava o


estudo bíblico semanal da igreja e seus amigos cristãos
repetidamente oravam por ela. Quis ir a um terapeuta,
mas eles lhe disseram que o aconselhamento era perda de
tempo. Passou quatro anos lutando desta maneira, dizendo
ao grupo: "Eu já teria me matado, se não tivesse filhos
para criar".
Por fim, jessica ficou tão deprimida que perdeu o
emprego. Solicitou ajuda governamental e a assistente
social insistiu quefosse consultar um psiquiatra na clínica
do município. Seus amigos da igreja lhe disseram que não
fosse, mas ela estava tão desesperada que foi.
Depois de examinar fessica, o psiquiatra explicou que
os anos em que passara depressiva tinham-lhe causado
severo desequilíbrio químico. O psiquiatra quis medicar
jessica para equilibrar as substâncias químicas do corpo
dela, de modo que pudesse enfrentar a vida com os
necessários recursosfisiológicos. Nesse entretempo, ela fazia
terapia e participava de um grupo de apoio com a
finalidade de reconhecer as causas da depressão.
jessica concordou em tomar os remédios, mas decidiu
não contar aos seus amigos da igreja. A depressão diminui
e, assim, jessica examinou as razões por trás da bulimia e
as questões do seu passado. O psiquiatra gradualmentefoi
retirando os medicamentos e jessica continuou
examinando o passado e o que precisava fazer. Demorou
tempo, mas ela arranjou emprego e começou a enfrentar
a vida com mais força do que nunca.

Para Evitar as Interpretações Errôneas


Ensine e lidere com transparência
Quando estiver preparando uma apresentação pedagógica,
considere os mitos mostrados no capítulo anterior e pergunte-
264 / Curando as Feridas da Alma

se se a lição reforça algum deles. Use exemplos que tratam das


tentações comuns (como a sexualidade) ou que tentam agradar
e impressionar os outros.
Se você recruta obreiros ou voluntários, não poupe esforços
para evitar apelar a atitudes de pessoas cuidadoras. Pergunte:
"Deus está movendo você a fazer isso?", em lugar de dizer: "A
igreja precisa de você e você é o único que pode fazê-lo". Ajude
as pessoas a atuarem dentro dos dons espirituais que receberam
de Deus e nas causas que lhes tocam o coração.

Reconheça a luta da vida cristã


Examine as lições que você ensina e o seu aconselhamento
subliminar para ver se eles reconhecem que os cristãos passam
por lutas. Um bom teste é perguntar-se como uma adolescente,
que está sendo molestada pelo padrasto, reagiria ao que você
planeja dizer. Faça a si mesmo perguntas como:

• Estou dando respostas eloqüentes e clichês cristãos?


• Mostro empatia pela dor das outras pessoas?
• Equilibro com o amor de Deus sua ordem de obedecer?
• Relaciono as pessoas com os recursos disponíveis em
nossa igreja?
• Oro posteriormente com as pessoas que passam lutas,
em vez de apenas oferecer chavões?

Nas lições e devocionais do Dia das Mães e do Dia dos Pais,


os oradores precisam admitir suas lutas pessoais como pais e
reconhecer que muitos adultos na congregação estão lutando
com lembranças de pais que os abusaram. Uma das partes mais
eficazes de uma lição ou conselho é como a pessoa errou e o
que ela fez para se consertar.
Faça mais perguntas do que dê conselhos. Se você suspeita
que alguém encontra-se preso na raiva ou na culpa, pergunte:

j I..... I II l II
Restauradores Feridos como Líderes de Igreja / 265

"Qual é o proximo passo que você precisa dar?" Isto mostra


paciência, mas também dá direção.

Espere que aqueles que se recuperam de compulsões sejam


comunicadores audazes e sem cerimônia
Certo líder de grupo que se reúne em casa para momentos de
companheirismo relatou que não gostou quando integrantes de
grupo de apoio para pessoas com comportamento compulsivo
participaram do seu pequeno grupo. "Eles despejam todos os
seus sentimentos desagradáveis em todo o mundo", disse ele.
"Falam sobre como têm raiva disso e daquilo. Eles nos
envergonham - especialmente os novos participantes".
Estas situações são momentos ideais para modelar a
honestidade e a aceitação e orar pela pessoa que enfrenta lutas.
Os visitantes freqüentemente seguem o comportamento do líder.
Se o líder ficar envergonhado, o visitante também ficará. Se o
líder for gentil, não obstante, firme, o visitante respeitará a
sensibilidade do líder e a honestidade do grupo.

Nota Especial para Pastores


Recentemente, um orador pediu a uma audiência de 800 pastores
a erguer a mão quem tivesse pais ou avós alcoólicos.
Aproximadamente 75% dos pastores ergueram a mão. Em seguida
ele perguntou se eles tinham considerado o quanto isso poderia
estar afetando-os, e só alguns ergueram a mão.' Isto faz sentido
quando você avalia que os "apaziguadores" e os "responsáveis"
gostam de tomar conta das pessoas. Ser preciso nos faz sentir
amados e valorizados. Pode ser atitude que nos afirma quando
ouvimos as pessoas dizerem: "Você me ajudou muito em meu
problema". Elogios sobre lições de estudo da Bíblia preenchem
esses buracos de auto-estima. Claro que não é por isso que as
pessoas se tornam pastores. Você é pastor, porque ama a Deus,
266 / Curando as Feridas da Alma

mas sem intenso exame de consciência você não terá idéia de


outros fatores envolvidos.

Mágoas ocultas
Pastores que são "crianças boazinhas" têm de esconder suas
mágoas mais profundas. Se não tomarem cuidado, elas aparecem
em comentários sarcásticos feitos durante os anúncios no
domingo ou mediante técnicas direcionadas a incitar a vergonha
para recrutar uma equipe de limpeza. Às vezes, o lado da pessoa
que imita o pai ou mãe "nenê rei" pode ter autoridade absoluta
sobre os membros da igreja; em outros momentos, o lado pai
ou mãe cuidadora pode querer agradar a todos.

Ensinamentos filtrados
Até os pastores que se empenham para ser eruditos ou imparciais
descobrem que eles filtram os ensinamentos bíblicos através de
suas experiências pessoais. Se tais experiências estiverem repletas
de negação, culpa, isolamento e reações iradas, a congregação
sentirá os resultados. Quando os pastores não entendem suas
distorções acerca de Deus e dos mitos culturais, eles podem estar
emitindo a verdade de maneira parcial e injusta para o povo.

Igrejas doentes
As características alistadas nos Capítulos 4 e 5 também aplicam-se
a igrejas. Sem se dar conta, um pastor pode estar reforçando na
igreja as mesmas tendências que existiam na família na qual ele
foi criado. Talvez você queira fazer estas perguntas aos seus líderes:
"Os limites das famílias individuais são ultrapassados pela liderança
da igreja? As pessoas confiam uma na outra? Há reforço consistente?
Os sentimentos sempre são expressos e, nesse caso, o são de
maneira apropriada? Sua igreja é um sistema aberto ou fechado?
Idéias novas e pensadores independentes são bem-vindos?"

, I • I II I • I,., • I.... ,.,,1,1. ",," 'lj,Il." II I,' "li '. I IJH~I


Restauradores Feridos como Líderes de Igreja / 267

Os pastores que têm trabalhado o processo de exame de


consciência podem tornar-se "restauradores feridos", que não
envergonham as pessoas, porque estão cientes dos seus próprios
erros. Ensinam, mas também estão aprendendo a ouvir. Este é
um exemplo de um pastor que hoje é um restaurador ferido:

Brian tinha sido pastorpor doze anos e estava a ponto de


desistir. Diariamente ele lutava com pornografia. Depois
de ter suspeitado que um membro da igreja o flagrou
entrando numa livraria para adultos, foi ver um
conselheiro. Ele disse ao conselheiro que planejava deixar
o ministério, porque sentia-se um completo fracasso.
Durante a terceira sessão, acabou confessando que estava
tendo um caso.
À medida que Brian e o terapeuta falavam sobre o
passado do pastor, Brian descreveu seu pai que era um
trabalhador compulsivo. Era raro ele estarem casa e Brian
sentia-se emocionalmente separado do pai. Brian cobriu
o rosto com as mãos e disse: "Tenho pregado sobre o fogo
do inferno e a perdição, porque tenho estado com muita
raiva de meu pai. Por anos tenho aconselhado as pessoas
e dito-lhes que todos os seus problemas são resultados do
pecado que cometeram. Costumava dizer: 'Se você ler mais
a Bíblia e orar, receberá a cura '. Eu era mais duro com as
pessoas que tinham lutas com problemas sexuais, porque
era esse o meu problema ".
Depois de muito trabalho no aconselhamento e
participando de grupos dos Sexólicos Anônimos, Brian
encarou seu comportamento viciado. Ele trabalhou seu
matrimônio, que foi restaurado. Abriu vários grupos de
apoio em sua igreja e então veio o avivamento.
Numa reunião de liderança, Brian contou aos líderes
o que havía lhe acontecido. "Tinha tanto medo de confessar
isso, porquepensava que eles me excluiriam ou no mínimo
268 / Curando as Feridas da Alma

caçoariam de mim", diz Brian. "Eles me amaram e me


aceitaram) assim assumi risco ainda maior. Numa noite
de domingo contei minha história à congregação. Estava
petrificado, mas tudo correu bem. Até virou um culto de
cura e libertação) no qual centenas de pessoas vinham à
frente confessando suas compulsões. Foi a coisa mais
emocionante que jamais vi no ministério".

Os resultados da liderança vulnerável são empolgantes. Os


crentes se sentem livres para lidar com suas crises de fé. Eles
levam as cargas uns dos outros (GI6.2) e estimulam-se a amar e
fazer boas obras (Hb 10.24).
Se Deus lidera assim, incentive as pessoas a andar por este
vale da vulnerabilidade. Explique que a igreja gostaria de ajudar
os crentes a entender que Deus é a resposta às perguntas
importantes feitas pela maioria das pessoas: O que tenho defazer
para me sentir amado? O que tenho de fazer para me sentir
valorizado?
Desafie as pessoas a verem como elas se protegem com suas
máscaras de requinte. Compartilhe as experiências que você
tem no desenvolvimento de ferramentas de comunicação e
relacionamento mais estreito com as pessoas. Nossa oração é
que você saia deste vale andando cada vez mais no caminho
espiritual, vários passos mais perto de Deus, com muito mais
probabilidade de ser conformado à imagem dEle.

Reflexão Pessoal

Escolha três ou quatro destas perguntas a seguir e compartilhe


as respostas com um grupo ou amigo.

• Por que você acha que os restauradores feridos são mais


adequados em certas ocasiões?

I 1 .. , J J I l JI I j. "' '" • I~~ • ,I , 'i, ,,'I' . . , jl I·, i 'i' " I 111i~1


Restauradores Feridos como lideres de Igreja / 269

• Que precauções você ofereceria aos restauradores feridos


que atuam como líderes?

• De que maneira aigreja local incentiva as pessoas aserem


"crentes bonzinhos"? Como podemos evitar isso?

• Paulo escreveu à igreja de Corinto: "E [lesusl disse-me: A


minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa
na fraqueza. De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas
fraquezas, para que em mim habite o poder de Cristo" (2
Co 12.9). De que forma a declaração de Paulo se aplica a
este Capítulo?

• Componha uma oração ideal para um líder de igreja e


faça essa oração a Deus.
ApÊNDICE A
,
Oque Eum Grupo de Apoio ecomo Começo um?

Se as igrejas são hospitais para os pecadores em vez de hotéis


para os santos, os grupos de apoio são a unidade de terapia
intensiva. Um grupo de apoio proporciona o ambiente seguro
no qual as pessoas podem falar sobre sentimentos e experiências,
pouco importando o quão ruins sejam.
Para esclarecer este propósito, entendamos o que não é um
grupo de apoio:

• Não é um estudo bíblico, embora as Escrituras possam


ser usadas.
• Não é terapia de grupo, embora possa haver interação.
• Não é uma sessão de reclamações, embora feridas sejam
compartilhadas.
• Não é um novo arranjo do passado, embora os
acontecimentos passados possam estar relacionados.
• Não é uma cena emocional, embora alguns participantes
possam chorar ou ficar com raiva.

Cuidado para Não Querer Resolver os Problemas dos Outros


Pelo fato de o cristianismo ser "o caminho, a verdade e a vida"
e os crentes conhecerem o valor de ajudar as pessoas, é fácil
querer resolver os problemas uns dos outros. Se você ouve muitos
sermões e lê muitos livros, tem a propensão a pensar que pode
resolver os problemas das pessoas. Às vezes, essa prestimosidade

j 1.... I II I ,I II I. , . I..k L l j • . . ,;". ,ILII..· •... I,I I,,,,..... Itllil'l


Apêndice A / 271

se transforma em sentimentos grandiosos de que temos a solução


de quase todos os problemas. jan descobriu que isto é verdadeiro:

Tinha estado a ensinar a Bíblia por muitos anos, quando


comecei a participar de um grupo de apoio. Naqueles
anos, prestara muitos aconselhamentos de divã e as
pessoas sempre me agradeciam por tê-las ajudado tanto.
Imaginava que eu era bastante boa nisso.
Gostei como o grupo de apoio me ajudou a me
entender, mas a princípio odiei por não me permitir
ajudar os outros. Flagrava-me pensando que se essa
pessoa lesse certo livro de auto-ajuda, ficaria bem. Toda
vez que alguém falava sobre um problema, eu queria
interromper e dizer-lhe sobre um versículo da Bíblia que
resolveria o caso. A regra de "não interromper"! me
deixava louca. No fim colocava a mão na boca para me
lembrar de ficar quieta e escutar.
Aprendi algumas coisas espantosas com isto.
Primeiro, aprendi que eu era uma criança sabe-tudo e
responsável/apaziguadora. Eu honestamente pensava
que podia resolver os problemas das pessoas do meu
grupo. Então caí em mim: se ler esses livros pudesse
mudar as pessoas, por que tê-los lido não me mudou? Se
eu tinha tantas respostas, por que estava tão
desanimada? Nunca tinha trabalhado meus problemas
e era o que precisava fazer. No grupo de apoio observava
os outros cuidadosamente, enquanto, semana após
semana, trabalhavam seus problemas, até que comecei
afazer o mesmo comigo.
Quando me concentrava no que as pessoas do meu
grupo de apoio estavam dizendo, em vez de planejar o
que queria dizer no meu tempo de falar, fui tocada por
suas vidas. Nunca tantas pessoas me influenciaram para
mudar minha vida com tão pouca intenção de jazê-lo.
272 / Curando as Feridas da Alma

Jan teria perdido tudo isso se não tivesse obedecido a regra-


padrão do grupo de apoio: "Não tente dar respostas simplistas
aos problemas dos outros". Esta é a maior dificuldade que os
cristãos de longa data têm de lidar nos grupos de apoio. Aqui
estão algumas dicas, se você sempre quer dar respostas simplistas
aos problemas das pessoas.

• Lembramos que nosso trabalho como participante do


grupo de apoio é nos examinar tão honestamente quanto
possível e dizer o que descobrimos sobre nós mesmos.
• Não usamos o tempo que nos é dado para falar com o
propósito de dar idéias aos outros, mesmo que seja de
maneira sutil.
• As pessoas recebem afirmação com ações, e não com
palavras. Depois da reunião, nós as abraçamos ou
oramos com elas, mas não oferecemos nenhum destes
atos como modo de "solução simplista". É tentador bater
de leve na mão da pessoa e dizer: "Você se sente bem
agora, não é mesmo?" Não, ela não se sente. Vai levar
algum tempo para trabalhar o problema.
• Se as pessoas nos pedem conselhos depois da reunião,
podemos contar-lhes o que deu certo para nós, mas não
garantimos que dará certo para quem quer que seja.

Formato Típico de Grupo de Apoio


O seguinte formato de grupo de apoio tem sido usado em igrejas
de tamanho pequeno a médio, que têm um grupo de apoio
geral. Use este formato, adapte-o ou desenvolva seu próprio
material. Se sua igreja não dispõe de assistência a crianças, exclua
o número 4.

1. O líder se apresenta e dá as boas-vindas ao grupo.


2. O grupo repete a "Oração por Serenidade":

. j I." J II I ,I 11. t, , .loIk I ,j I . • ",,',. "1,11',,. I., I , ; .. , ~ . I 1111"1 .


Apêndice A / 273

Deus, concede-me a serenidade para aceitar as coisas


que não posso mudar, a coragem para mudar as coisas
que posso mudar e a sabedoria para saber a diferença.
- Reinhold Niebuhr

3. Voluntários do grupo lêem em voz alta as seções


apresentadas nos Apêndices A e C denominadas: Por
que um Grupo de Apoio?, O Problema, A Meta, Os Doze
Passos e Ferramentas para Recuperação.
4. O líder faz a coleta de dinheiro e explica que uma
contribuição de cinqüenta centavos ou um real ajuda
os pais com a assistência a crianças.
5. O líder apresenta o tópico (raiva, humildade,
autopiedade, um dos Doze Passos ou uma das
tendências mostradas no Capítulo 8), compartilhando
um exemplo pessoal de sua vida.
6. O líder lê as Normas para Compartilbarnento entre o
Grupo. Se há um ou dois novos participantes, o líder
pode pedir que todos os participantes do grupo se
apresentem. Depois pergunta: "Quem gostaria de
começar?" O líder conclui o período de
compartilhamento (aproximadamente dez minutos antes
de acabar).
7. O líder pede que os participantes do grupo compartilhem
algum progresso que fizeram ou qualquer coisa que
gostariam de prestar contas.
8. Os participantes do grupo ficam em pé, dão-se as mãos
e a reunião é encerrada com um corinho.
9. Peça que cada um cumprimente ou abrace pelo menos
duas pessoas antes de ir embora (se você e elas se
sentirem à vontade com isso).
10. O líder pede que os participantes do grupo o ajudem
a guardar as cadeiras.
274 / Curando as Feridas da Alma

Por que um Grupo de Apoio?


Este grupo é para:

• Aqueles de nós que estão presos em algum sentimento.


• Aqueles de nós que não conseguem entender os filhos.
• Aqueles de nós que se sentem emaranhados num
divórcio.
• Aqueles de nós que estão chateados com pessoas
relacionadas ao trabalho.
• Aqueles de nós que estão tentando vencer hábitos que
detestam.

Servimos vários grupos de pessoas:

• Aqueles que estão estressados e sentindo a tensão de


situações de trabalho e relacionamentos aparentemente
impossíveis.
• Aqueles que passam por momentos de crise, como
divórcio, morte ou desavenças com o cônjuge ou filhos.
• Aqueles que desejam resolver assuntos ou questões
familiares do passado mediante comportamentos que
envenenam seus relacionamentos.
• Aqueles com hábitos compulsivos, como comer demais,
bulimia, gastar dinheiro ou alcoolismo.

Em meio a esses problemas, podemos ter pensamentos que


chocam muitas pessoas, sobretudo os crentes. Talvez até
acabemos nos perguntando aquelas verdadeiras questões da
vida:

• Quem é Deus?
• Ele me ama?
• Se Ele me ama, como foi que isso pôde acontecer?

I J ,_.. , ~ L J..L , i • .... J L I Il ~IL I


• l. _ I ..." ., I ~ .
Apêndice A / 275

Pela aceitação das outras pessoas do grupo, descobrimos


mais uma vez que somos verdadeiramente amados por Deus,
nosso Pai celeste. Se desejarmos, podemos nos impor o dever
de prestar contas de nossa vida ao grupo, com a finalidade
de redirecionar nossos comportamentos doentios entregando-
os a Deus.
Um grupo de apoio não é uma sala de aula, embora
informações possam ser dadas. Não é um estudo bíblico, embora
a Bíblia seja a autoridade máxima no que diz respeito à verdade.
Não é uma sessão de reclamações, embora os participantes
possam "lavar a roupa suja". Não é terapia de grupo, embora
realmente trabalhemos as experiências. Não é uma sessão de
cura, embora peçamos a Deus que nos dê a esperança que tão
intensamente precisamos.

o Problema
Quer estejamos enterrados em crises ou infestados por hábitos
doentios, podemos nos achar fazendo e dizendo coisas que
nunca pensamos ser capazes. Sentimentos de raiva, decepção e
medo surgem e não sabemos como tratar deles.
Ainda que gostássemos de reclamar, culpar e colocar a culpa
nos outros, não o fazemos. Ao invés disso, optamos olhar dentro
de nós mesmos e admitir nossos hábitos e padrões doentios de
nos relacionar com as pessoas, e até a nossa decepção com
Deus.
Temos ludibriado muitos dos nossos sentimentos e, às vezes,
encontramos dificuldade em sentir ou expressar emoções
negativas, porque elas doem muito. Também pode ser difícil
expressar os sentimentos positivos, como alegria ou felicidade.
Deslizamos pela vida seguindo estas três regras não escritas:
Não fale, não confie, não sinta.
Às vezes nos identificamos com uma ou mais destas
tendências:
276 / Curando as Feridas da Alma

Desconfiança
• Reagindo exageradamente ante circunstâncias
incontroláveis.
• Mentindo, quando seria fácil dizer a verdade.
• Tomando decisões com base em capricho ou intensa
análise.

Autocondenação
• Julgando-nos sem piedade.
• Procurando aprovação e auto-afirmação.
• Sendo leais, mesmo àqueles que nos ferem.

Alienação
• Sentindo-nos inferiores aos outros.
• Lutando com relacionamentos mais íntimos.
• Temendo sermos abandonados.
• Sentindo-nos menos adequados do que os outros.

Tensão
• Trabalhando para nos divertir.
• Levando-nos muito a sério.
• Agindo irresponsavelmente ou super-responsavelmente.
• Criando caos aonde quer que estejamos.

A Meta
Estamos aprendendo a ver Deus, nosso Pai celeste, como o
Iniciador de nossa nova vida. Ele nos dirige para uma vida de
inteireza e cura do passado. Aprendemos que não precisamos
ser governados pelas crises ou ficar presos pelo passado.
Estas são algumas metas a escolher:

I.AL • ,I I •• 1 .1.. Ui. I i 1 • .LlÕ ~ I llBL.1


Apêndice A / 277

• Entregar a Deus nossas dores e padrões de negação,


culpa, isolamento e raiva, sabendo que só Ele pode dar
uma nova direção à nossa vida.
• Examinar como nossos comportamentos atuais podem
estar enraizados em nossa falta de compreensão de que
Deus nos ama e nos valoriza.
• Perdoar os pais e entregá-los a Deus.
• Separar de tudo ou de todos com quem estejamos
obcecados: nossas necessidades, nosso cônjuge, nossos
filhos, nossos pais, nossos amigos.
• Amar a nós mesmos e às outras pessoas, embora esta
atitude possa tomar a forma de "amor firme".
• Aprender que o verdadeiro amor não pode existir sem
a dimensão da justiça - em outras palavras, podemos
amar alguém e ainda pedir que ele nos respeite.
• Reconhecer nossos sentimentos e expressá-los de
maneiras saudáveis.
• Entregar a Deus nossa falsa culpa e ficar livres da
vergonha que tem nos mantido presos.
• Deixar de nos ver como alguém que pode resolver os
problemas dos outros e tomar conta deles - estas são
atribuições exclusivas de Deus.

Formato do Grupo de Apoio Nova Esperança


O Grupo de Apoio Nova Esperança, da First Evangelical Free
Church, em Fullerton, Califórnia, tem um bem elaborado
programa de grupo de apoio, um dos quais é aparelhado para
Filhos Adultos de Famílias com Disfunção (FAFD) , o que até
certo ponto inclui a todos nós. Este grupo desenvolveu o seguinte
formato de grupo de apoio, o qual você tem toda a liberdade
para usar ou adaptar, como desejar.
a Grupo de Apoio Nova Esperança reúne-se pela manhã e à
noite. As reuniões duram uma hora e meia.
278 / Curando as Feridas da Alma

Parte 1 - Abertura (25 minutos)


1. O líder daquela reunião se apresenta e dá as boas-
vindas ao grupo.
2. O grupo repete a Oração por Serenidade:

Deus, concede-me a serenidade para aceitar as coisas


que não posso mudar, a coragem para mudar as coisas
que posso mudar e a sabedoria para saber a diferença.
Vivendo um dia de cada vez, desfrutando um momento
de cada vez, aceitando o sofrimento como um caminhopara
a paz; encarando, comoJesusfez, este mundopecador como
ele é e não como eu gostaria que fosse, confiando que tu
consertarás todas as coisas se eu as entregar à tua vontade;
de forma que nesta vida eu seja razoavelmente feliz, e na
outra, supremamente feliz contigo para sempre. Amém.
- Reinhold Niebuhr

3. Voluntários do grupo lêem o material similar às seções


O Problema e A Meta (veja as seções acima), a maior
parte está no folheto do Grupo de Apoio Nova
Esperança.
4. O líder faz alguns anúncios e dá um testemunho
pequeno. A reunião é dispensada, dando cinco minutos
para formar grupos pequenos.

Parte 2 - Grupos pequenos (60 minutos)


Os líderes lêem as regras para debate em grupos pequenos.

Regras para debate em grupos pequenos


1. Quando um participante do grupo está falando, por
favor deixe que ele termine o que está dizendo sem
fazer interrupções.
Apêndice A / 279

2. Não sugira soluções aos problemas. Devemos ouvir,


apoiar e ser apoiados uns pelos outros no grupo e não
dar conselhos. Por favor, guarde suas perguntas para
depois que o grupo for dispensado.
3. Use a primeira pessoa do singular "Eu", em vez de
"nós", "eles" ou "você/vocês". Isto nos ajuda a assumir
a responsabilidade por nossos sentimentos e aceitá-los
como válidos. Exemplos: "Eu acredito que... ", em lugar
de "Dizem..." "Fiquei com raiva... ", em vez de "Ela me
deixou com raiva".
4. Fale por não mais que cinco minutos, a fim de que as
outras pessoas do grupo tenham a chance de falar.
5. Tente falar do coração tão honestamente quanto possa.
No grupo, não há nenhum inconveniente em chorar,
rir, ficar com raiva. Tais comportamentos não recebem
censura dos outros participantes.
6. O que é compartilhado e quem você vê no grupo é para ficar
no grupo e não deve ser compartilhado com mais ninguém.

Dentre os grupos apresentados mais adiante, as pessoas


escolhem em qual participar. Freqüentar e concluir o Programa
para Novos Participantes é condição prévia para participar dos
outros grupos. Os líderes dos grupos de Novos Participantes
lêem as seguintes regras.

Novos participantes (6 semanas)


Semanas 1 a 3: Os visitantes são inteirados dos problemas
dos Filhos Adultos de Famílias com Disfunção (FAFD) através
de um vídeo dividido em três partes, produzido pelo Grupo de
Apoio Nova Esperança. O vídeo mostra participantes de grupos
compartilhando suas experiências e o pastor Dave Carder
explicando como Deus está em todo esse processo. Cada semana
abrange um segmento do vídeo e, então, os participantes se
280 / Curando as Feridas da Alma

dividem em grupos de dez para compartilhar suas reações ou


fazer perguntas.
Semanas 4 a 6· Os auxiliares passam uma semana cada
apresentando os quatro papéis dos FAFD, as três regras não escritas
(não fale, não confie, não sinta) e as caracteristicas de ordem de
nascimento. Uma vez mais, os participantes se dividem em grupos de
dez para compartilhar suas reações ou fazer perguntas. (Material para
as Semanas 4 a 6 pode ser encontrado no Capítulo 8 deste livro.)

Quinze características (grupos abertos - em andamento)


Estes grupos de cerca de dez pessoas discutem as características
dos filhos adultos de famílias alcoólatras ou com disfunção que
usam as normas dos Doze Passos Cristãos. É um grupo "aberto"
no sentido de que qualquer um que freqüentou o grupo dos
Novos Participantes pode participar deste, e não requer um
compromisso de freqüência constante.

Treze características (grupos fechados - 13 semanas)


Estes grupos fechados de debate são limitados a um número de
pessoas que decidem se comprometer a trabalharem juntas por
um período específico de tempo. A cada semana estes grupos
discutem uma das treze características, que são similares à lista
apresentada no Capítulo 8 deste livro.

Estudo em doze passos (grupos fechados - 16 semanas)


Estes grupos de debate, que freqüentemente são prescritos, usam
as normas dos Doze Passos. Este programa leva dezesseis
semanas, em vez de doze, porque alguns dos passos,
especialmente o Passo Quatro, requer mais de uma semana para
ser executado. Este grupo também tem um formato de vinte e
oito semanas para um estudo mais comedido dos passos.

I I IL I II I J I J.. ... 11d~ J j, • • ., I I" ii , j j .I _. ,. i , IIIL I J 1 11I. 1 J..•. lljj


Apêndice A / 281

Administrando O Grupo de Apoio Nova Esperança


Treinamento dos auxiliares
Estas sessões de oito semanas são feitas antes das reuniões regulares.
Os voluntários que desejam liderar grupos pequenos têm de participar
do Grupo de Apoio Nova Esperança e ter participado por no mínimo
vinte semanas. Eles são treinados para lidar com as situações de
grupo de apoio e não para agir como terapeutas ou professores. Os
auxiliares são "companheiros de viagem", que continuam trabalhando
em sua própria recuperação e ajudam os grupos a não deixar de
serem um lugar seguro.

Conselho do Grupo de Apoio Nova Esperança


O Conselho do Grupo de Apoio Nova Esperança consiste em
cinco voluntários que se dividem nas responsabilidades de
ordenar os materiais, organizar o local das reuniões e a limpeza,
preparar o lanche, designar os testemunhos e os que dão as
boas-vindas, lidar com o dinheiro e administrar o livro-caixa.
Os membros servem por treze semanas. Foram originalmente
escolhidos pelo líder do ministério, mas agora seus substitutos
os aguardam e os mandatos são escalonáveis.

Recursos
Hoje, o Grupo de Apoio Nova Esperança oferece recursos como o
Vídeo Nova Esperança, um manual de treinamento dos auxiliares, guias
de estudo característicos e uma lista intemadonal de grupos de apoio
de filhos adultos cristãos de famílias com disfunção. Solidte produtos ou
tabela de preços por este endereço, escrevendo em inglês para:

New Hope Support Group - First Evangelical Free Church


2801 North Brea Boulevard
Fullerton, CA 92635-2799 Estados Unidos
Telefone: 00-1 (714) 529-5544
ApÊNDICE 8
Recursos para oGrupo de Apoio

Se desejar dar início a um grupo de apoio em sua igreja,


considere contatar as organizações relacionadas abaixo.
Algumas oferecem materiais impressos, enquanto outras
proporcionam seminários e conferências. Para mais informações
sobre grupos de apoio, entre em contato com a entidade Self-
Help Clearinghouse, pelo telefone: 00-1 (201) 625-7101; TTD:
00-1 (201) 625-9053, Estados Unidos.

Redes e Centros Cristãos


Alcoholics for Christ
Michael O' Keefe, Coordenador de Programa
1316 North Campbell Road
Royal Oaks, MI 48067
Estados Unidos
00-1 (880) 441-7877
Rede de grupos de apoio (incluindo Filhos Adultos de
Alcoólatras), materiais impressos e treinamento de liderança.

Confident Kids
Linda Kondracki, Diretora Executiva
721 West Whittier Boulevard, Suite H
La Habra, CA 90631
Estados Unidos
00-1 (310) 697-6201

j J, lo- I ~ I I • , ~ I d , " I ...L j I J ., ,I. dil. j; J 1.J Iii. J l L j Li. ~


Apêndice B / 283

Rede de grupos de apoio, materiais impressos, treinamento


de liderança.

ELEEO Ministries, Incorporated


Bill and Pat Elam
1229 Rita Avenue
St. Charles, lL 60174
Estados Unidos
00-1 (708) 584-0460
Rede de grupos de apoio, conferências, treinamento de
auxiliares e materiais impressos.

Free to Care Ministries


P. O. Box 1491
Placentia, CA 92070-9491
Estados Unidos
00-1 (714) 528-5413
Câmara de compensação para conselheiros, seminários, vídeos,
treinamento de liderançapara sobreviventes degrupos de abuso sexual.

ICL Renewed Life Services


Vernon Bittner, Diretor Executivo
P. O. Box 47482
Plymouth, MN 55447
Estados Unidos
00-1 (612) 593-1791
Rede de grupos de apoio, materiais impressos e treinamento
de liderança.

National Association for Christian Recovery


P. O. Box 11095
Whittier, CA 90603
Estados Unidos
00-1 (310) 697-6201
284/ Curando as Feridas da Alma

Conferência, revista, seminários, rede clerical, rede


profissional de saúde mental, diretório de recursos.

Overcomers of Brevard, Incorporated


Ron Ross, Diretor Executivo
4235 Mt. Sterling Avenue
Titusville, FL 32780
Estados Unidos
00-1 (407) 264-0757
Rede de grupos de apoio e treinamento de liderança.

Overcomers Outreach, Incorporated


judy Turnbull, Diretora
2290 West Whittier Boulevard
La Habra, CA 90631
Estados Unidos
00-1 (310) 697-3994
Rede de âmbito nacional de grupos de apoio e materiais
impressos.

Rapha, Incorporated
12700 North Featherwood 250
Houston, TX 77034
Estados Unidos
00-1 (880) 383-4673
Rede de grupos de apoio, materiais impressos e treinamento
de liderança.

Rancho Capistrano
Beth Funk, Diretora
28251 Camino Capistrano
San juan Capistrano, CA 92675
Estados Unidos
00-1 (714) 347-7864

j I.... I i I I l" • I.iiL ' .. 1 I . ..~i, ..• iL M.., , , ~ I ~. fJ·', ,.... ~ lIU"~
Apêndice B / 287

00-1 (602) 277-7991


Rede de grupos de apoio e informaçao impressa.

Emotions Anonymous
P. O. Box 4245
St. Paul, MN 55104
Estados Unidos
00-1 (612) 647-9712
Rede de grupos de apoio e informaçao impressa.

National Association for Children of Alcoholics


P. o. Box 3216
Torrance, CA 90510
Estados Unidos
00-1 (310) 534-1815
Rede de grupos de apoio e informação impressa.

N arcotics Anonymous World Service Office


16155 Wyandotte Street
Van Nuys, CA 91406
Estados Unidos
00-1 (818) 780-3951
Rede de grupos de apoio e informaçao impressa.

Overeaters Anonymous
P. O. Box 92870
Los Angeles, CA 90009
Estados Unidos
00-1 (213) 542-8363
Rede de grupos de apoio e informaçao impressa.

Workaholícs Anonymous
P. O. Box 289
288/ Curando as Feridas da Alma

Menlo Park, CA ~q~~b·~l~~


Es~do~ Unidos
~~·1 ()1~) ~)~.)~~4
Reae ae ~ru~o~ ae a~oio ein orma~ào im~re~a,
, ApÊNDICE C
Oque ERecuperação ecomo Ela Ajuda?

As atitudes e abordagens dos grupos de Doze Passos, como os


Alcoólicos Anônimos, receberam o nome de "recuperação".
Grande parte da filosofia dos AA está enraizada nas Escrituras,
porque Bill Wilson, co-fundador dos AA, baseou-se em fontes
religiosas, algumas das quais cristãs.
No decorrer dos anos, o modelo dos AA tomou-se o mais
eficiente método para- tratamento do alcoolismo e, de acordo com
a revista Newsweek, "há nos Estados Unidos L.,] poucos, se os há,
centros de tratamento para pessoas com problemas relacionados
ao álcool que não enviam seus pacientes de ambulatório para os
AA".l Os indivíduos com outras compulsões descobriram que os
métodos dos AA também dão resultado para eles e, por isso, hoje
existem muitos grupos de Doze Passos, inclusive os Comilões
Anônimos, os Devedores Anônimos, a Saúde Emocional Anônima
e outros. Os grupos denominados Filhos Adultos de Alcoólatras
(FAA) também passaram a seguir este padrão. Alguns descobriram
que as tendências dos FAA ajustavam-se bem a eles, embora não
tivessem sido criados em famílias com problemas de alcoolismo.
Foram informalmente chamados de "Filhos Adultos de Famílias
com Disfunção" e freqüentemente participam de reuniões dos Co-
Dependentes Anônimos. (Vide Apêndice B.)
Acreditamos que os grupos dos Doze Passos são bem-
sucedidos, porque proporcionam lugares seguros através de sua
aceitação e rigorosa honestidade.
290 / Curando as Feridas da Alma

o que a Recuperação Tem a Oferecer para os Crentes?


Alguns crentes alimentam suspeitas sobre a recuperação, achando
que não tem conexão com a fé e a obediência, enquanto outros
têm usado os princípios de base cristã dos AA para enfrentar os
percalços de percurso em seus relacionamentos com Deus. Estes
são alguns dos distintivos cristãos da recuperação (referências
bíblicas não incluídas aqui acham-se depois de cada um dos Doze
Passos neste Apêndice):

Os pecados de nossospais nos afetam


Diferente dos humanistas, os cristãos crêem que todos pecaram
(Rrn 3.23). Quando os pais pecam, afeta os filhos (Dt 5.9)0). À
medida que os cristãos crescem espiritualmente, também podem
continuar imitando as tendências caídas que viram em seus pais
enquanto estavam crescendo. Grupos de recuperação fornecem
lugar seguro para expressar dor e raiva e para começar a
abandonar tais tendências.

Exame de consciência regular


Compor, sem medo, um inventário moral, escrever uma lista
das pessoas que ferimos e fazer reparações a elas (reiterados
conceitos existentes nos Doze Passos) vão direto ao centro do
comportamento protetor e de hábitos de gerenciamento de
mágoas. O calor e a aceitação de um grupo de apoio ajudam os
participantes a examinar suas falhas de caráter (falta de amor,
alegria, paz etc.) com a graça de Deus.

Confessar pecados e assumir o dever de prestar contas aos


outros facilitam a cura
Os distintivos da recuperação de admitir falhas de caráter a
um mentor ou a um grupo que tenha assumido o compromisso

I. i I I, J. ..L j ... I •
Apêndice C / 291

à confidência são importantes elementos de fé e seguem o


conceito cristão de discipulado.

Ter pensamentos corretos não é o bastante


Se ter pensamentos corretos mudasse as pessoas, Deus teria
ficado satisfeito só com os Dez Mandamentos dados a Moisés.
Foi preciso mais para que o mundo tivesse um relacionamento
com o Filho de Deus, que dá amor, perdão e direção. Deus
ofereceu a verdade na forma deste relacionamento, porque as
pessoas mudam à medida que interagem com as outras e não
quando se isolam. A Igreja funciona como família na qual
absorvemos a verdade. O movimento dos Doze Passos reconhece
que as pessoas carecem umas das outras e precisam trabalhar as
verdades falando sobre elas.

Disciplinas espirituais fornecem um caminho


para conhecer Deus
Os Doze Passos falam de meditação e contato consciente com
Deus (praticar a presença de Deus) - distintivas disciplinas
espirituais. Os participantes são incentivados a usar as ferramentas
que há muito tempo foram honradas nas tradições cristãs:
confissão, prestação de contas, reunião regular, discipulado
(apadrinhamento), composição de um diário, oração, restituição
(fazer reparações), leitura das Escrituras e de outras literaturas
apropriadas.

Pequena História de Recuperação


Numa era de especialistas, os leigos levam vantagem
Ao longo da história, as pessoas têm se reunido para ouvir, falar
e resolver problemas. Caçadores trocaram histórias ao redor de
fogueiras de acampamento; mães falaram sobre seus
292 / Curando as Feridas da Alma

discernimentos enquanto lavavam roupa no rio. À medida que


o conhecimento se tornou mais especializado, presumiu-se que
somente os especialistas em certas áreas de estudo poderiam
ajudar as pessoas. Antes que a entidade dos Alcoólicos Anônimos
fosse criada em 1935, os especialistas propuseram várias soluções
para o alcoolismo, mas nada funcionou.

• Médicos especialistas medicaram o alcoolismo com


drogas para parar o ato físico de beber.
• Os psicólogos ajudaram os alcoólatras a solucionar
problemas, para que não sentissem a necessidade de
beber. Isto não "curou" os alcoólatras, porque eles
tinham formado hábitos duradouros de usar o álcool
para aliviar a dor.
• Os especialistas religiosos (os pastores) exortaram os
alcoólicos a clamarem a Deus para miraculosamente
pararem de querer beber álcool. Alguns foram curados,
mas muitos não.'

Isto deixou pessoas como Bill Wilson, corretor de títulos da


bolsa de Nova York, e o doutor Bob Smith, médico de Akron,
sentindo-se sem esperança. No fim, Bill deixou de beber mediante
uma experiência espiritual que teve depois de se reunir com
um amigo médico. Não obstante, quando Bill foi a Akron a
negócios, sentiu a necessidade de beber, assim usou o método
que tinha usado em Nova York: falou com outro alcoólatra.
Esse era o doutor Bob, que na ocasião também ficou sóbrio, e
ambos começaram a visitar os alcoólatras num hospital local.
Esses alcoólatras deram início a um grupo de recuperação em
Akron e, depois, em Nova York.'
Bill Wilson e os primeiros grupos desenvolveram os Doze
Passos como caminho espiritual para a recuperação (veja mais
adiante). A progressão dos Doze Passos é eficaz, porque combina
todas as três abordagens: Física - os alcoólatras assumem o
Apêndice C / 293

compromisso de prestar contas ao grupo a fim de não beberem


só um dia de cada vez; psicológica - os alcoólatras lidam com
falhas de caráter e questões subjacentes, e os AA, como grupo
de apoio, reforçam aqueles que permanecem sóbrios e aceitam
os alcoólatras praticantes, contanto que desejem melhorar;
espiritual - os alcoólatras desistem de tentar se controlar e, ao
invés disso, entregam-se a um poder superior; eles reconhecem
que o ato de beber é resultado de suas falhas de caráter e passam
a identificar tais defeitos e fazer reparações.
Estes leigos pioneiros serviram-se de várias ferramentas, como
o anonimato e a confidência (mencionados nas Doze Tradições)
para garantir o necessário ambiente confiável, a fim de que os
alcoólicos fossem honestos.

Os Doze Passos
Quando os membros dos grupos dos Doze Passos falam sobre
"trabalhar um programa", referem-se a pôr em prática os Doze
Passos dos AA. Relacionamos abaixo os Doze Passos dos
Alcoólicos Anônimos, reformulados pelo Grupo de Apoio Nova
Esperança para os Filhos Adultos de Família com Disfunção.

Passo 1 - Admitimos que éramos impotentes diante de nossa


separação de Deus- que tínhamosperdido o domínio sobre nossas
vidas. (A redação original dos AA diz; "impotentes perante o álcool".)
Referência bíblica: "Eu sei que em mim, isto é, na minha carne
[natureza pecaminosa], não habita bem algum; e, com efeito, o
querer está em mim, mas não consigo realizar o bem" (Rm 7.18).

A idéia de impotência é difícil para as pessoas, porque elas


acreditam que estão no comando de si mesmas e do ambiente
que as cerca. O individualismo inflexível de nossa cultura e a
ética do sucesso dizem que todo aquele que se esforça o bastante
vence. Este primeiro passo pede que os participantes sejam
294 / Curando as Feridas da Alma

humildes o suficiente para reconhecer que há forças maiores


que eles.

Passo 2 - Viemos a acreditar que um poder superior a nós


mesmos poderia devolver-nos à sanidade. Referência bíblica:
"Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer com o
efetuar, segundo a sua boa vontade" CFp 2.13).

Este passo admite que o homem sozinho não pode se ajudar,


mas que necessita confiar num poder superior.

Passo 3 - Decidimos entregar nossa vontade e nossa vida


aos cuidados de Deus; na forma em que o concebíamos.
Referência bíblica: "Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de
Deus, que apresenteis o vosso corpo em sacrifício vivo, santo e
agradável a Deus, que é o vosso culto racional" CRm 12.1).

Este passo descreve a entrega a Deus. É freqüente estes três


primeiros passos serem abreviados: 1) Eu não posso, 2) Deus
pode, 3) eu permito que Ele me ajude.

Passo 4 - Fizemos minucioso e destemido inventário moral de


nósmesmos. Referência bíblica: "Esquadrinhemos os nossoscaminhos,
experimentemo-los e voltemos para o SENHOR" (Lm 3.40).

Num inventário de Doze Passos, os partidpantes perscrutam suas


vidas procurando defeitos de caráter em simesmos, mas não em outros.

Passo 5- Admitimos perante Deus; perante nós mesmos e


perante outro ser humano) a natureza exata de nossas falhas.
Referência bíblica: "Confessai as vossas culpas [falhas] uns aos
outros e orai uns pelos outros, para que sareis" CTg 5.16a).
A confissão a Deus e aos outros ajuda os participantes a
saber e dizer a verdade sobre si mesmos.

• J ... j II l .• 11', • L.~j.l • . ,,' ."I.Il. 1.1 I . ,,,' ~ I tlli~1


Apêndice C / 295

Passo 6- Prontificamo-nos inteiramente a deixar que Deus


removesse todos esses defeitos de caráter. Referência bíblica:
"Humilhai-vos perante o Senhor, e ele vos exaltará" (Tg 4.10).

Assim que os participantes reconhecem seus defeitos de


caráter (Passo 5), eles vão adiante, mostrando a disposição em
mudar (Passo 6).

Passo 7 - Humildemente rogamos a Ele que nos livrasse


das nossas imperfeições. Referência bíblica: "Se confessarmos
os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados
e nos purificar de toda injustiça" (1 jo 1.9).

Os participantes descobrem que sua disposição em mudar é


tão forte que pedem a Deus que os mude.

Passo 8 - Fizemos uma relação de todas as pessoas a quem


tínhamos prejudicado e nos dispusemos a reparar os danos a elas
causados. Referência bíblica: "Como vós quereis que os homens
vos façam, da mesma maneira fazei-lhes vós também" (Lc 6.31).

Os participantes assumem a responsabilidade pessoal por suas


ações, confessam erros e encontram maneiras de fazer reparação.

Passo 9 - Fizemos reparações diretas dos danos causados


a tais pessoas, sempre que possível, salvo quando fazê-lo
significasse prejudicá-las ou a outrem. Referência bíblica:
"Portanto, se trouxeres a tua oferta ao altar e aí te lembrares de
que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa ali diante do
altar a tua oferta, e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão, e
depois vem, e apresenta a tua oferta" (Mt 5.23,24).

Passo 10 - Continuamos fazendo o inventário pessoal e,


quando estávamos errados, nós o admitíamos prontamente.
296 / Curando as Feridas da Alma

Referência bíblica: "Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe


que não caia" (1 Co 10.12).

o exame de consciência é um processo para toda a vida.

Passo 11- Procuramos, através da oração e da meditação,


melhorar nosso contato consciente com Deus, na forma em que
o concebíamos, rogando apenas o conhecimento da sua vontade
em relação a nós eforças para realizar essa vontade. Referência
bíblica: "A palavra de Cristo habite em vós abundantemente"
(CI 3.16a).

o comportamento inconstante requer contato pessoal com


Deus.

Passo 12- Tendo experimentado um despertar espiritual,


graças a esses passos, procuramos transmitir essa mensagem
aos alcoólatras e praticar esses princípios em todas as nossas
atividades. Referência bíblica: "Irmãos, se algum homem
chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois
espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão,
olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado"
(GI6.1).

As Doze Tradições
Algumas das Doze Tradições que os AA e outros grupos de
Doze Passos usam transferem diretamente para um grupo de
apoio ligado à igreja. Outros não o fazem, porque muitas igrejas
exigem que um líder designado seja responsável perante a igreja.
Estas tradições revelam o espírito no qual a organização dos
Alcoólicos Anônimos foi desenvolvida e mostra como evitou
ficar emaranhada em qualquer propósito que não seja a
recuperação dos alcoólatras.

• t ., I ..L j I • I Iii I I ~,i • , ; J.Il I lJ li 1; J ]".111


Apêndice C / 297

Um - O nosso bem-estar comum deve estar em primeiro


lugar; a recuperação individual depende da unidade dos AA.
Dois - Somente uma autoridade preside, em última análise,
o nosso propósito comum: um Deus amantíssimo, que se
manifesta em nossa consciência coletiva. Nossos líderes são
apenas servidores de confiança; não têm poderes para governar.
Três - Para ser membro dos AA o único requisito é o desejo
de abandonar a bebida.
Quatro - Cada grupo deve ser autônomo, salvo em assuntos
que digam respeito a outros grupos ou aos AA em seu conjunto.
Cinco - Cada grupo é animado de um único propósito
primordial: transmitir sua mensagem ao alcoólatra que ainda sofre.
Seis - Nenhum grupo dos AA jamais deve sancionar,
financiar ou emprestar o nome dos AA a qualquer sociedade
parecida ou empreendimento alheio à Irmandade, para que
problemas de dinheiro, propriedade e prestígio não nos afastem
de nosso propósito primordial.
Sete - Todos os grupos dos AA devem ser absolutamente
auto-suficientes, rejeitando quaisquer doações de fora.
Oito - Os AA jamais devem ter caráter profissional, embora
nossos centros de serviços possam contratar pessoal especializado.
Nove - Os AA nunca devem se organizar como tal; podemos,
porém, criar juntas ou comitês de serviços diretamente
responsáveis perante aqueles a quem prestam serviços.
Dez - Os AA não opinam sobre questões alheias à
Irmandade; portanto, o nome dos AA jamais deve aparecer em
controvérsias públicas.
Onze - Nossas relações com o público baseiam-se na atração
em vez da promoção; na imprensa, no rádio e nos filmes cabe-
nos sempre preservar o anonimato pessoal.
Doze - O anonimato é o alicerce espiritual de todas as
nossas tradições, lembrando-nos sempre da necessidade de
colocar os princípios acima das personalidades.'
298 / Curando as Feridas da Alma

Pelo fato de os grupos de apoio relacionados a igrejas não


seguirem todas estas Doze Tradições, não são grupos de Doze
Passos no mais puro sentido da tradição dos AA. Os verdadeiros
grupos de Doze Passos não têm líder. Os grupos podem se
reunir nas dependências de uma igreja, mas nunca são afiliados
a qualquer igreja.

Você Pode Estar Querendo Saber...


P Os Alcoólicos Anônimos são uma organização cristã?
R Os Alcoólicos Anônimos não são uma organização
distintamente cristã. A expressão "Poder superior"
originalmente dizia respeito a Deus,' mas esta linguagem
inclusiva também atraía os agnóstícos." Eventualmente
os judeus, hindus, muçulmanos e budistas uniram-se à
organização," o que alegrou os autores do livro
Alcoólicos Anônimos (também chamado Livro Azul),
porque eles queriam que os alcoólatras de todas as
crenças se recuperassem. O Livro Azul está salpicado
com as palavras "Deus", "fé" e "espiritual", mas a fé em
Cristo não é mencionada. A organização dos AA é
espiritual no sentido de lembrar aos alcoólatras que
permitam a participação da natureza espiritual na
recuperação do alcoolismo, mas o propósito do grupo
é ajudá-los a encontrar sobriedade e não uma fé
específica.
As diversas tradições cristãs reagiram diferentemente
em relação aos AA. Quando o Livro Azul foi publicado,
o clérigo Dr. Harry Emerson Fosdick o revisou com
aprovação." Hoje algumas igrejas favorecem os grupos
de Doze Passos, tanto que se dão ao trabalho de permitir
que as reuniões dos Doze Passos sejam feitas em suas
instalações. Por outro lado, alguns cristãos dissolveram
as reuniões dos Doze Passos por considerarem da "Nova

. ( 1 ~ I J I I l "J II I J J.. f." IM, ~ li hi. I


Apêndice C / 299

Era" e asseveram que o "Poder Superior" é Satanás. Em


anos recentes, os ateus levantaram objeções aos AA,
afirmando que a sobriedade e a espiritualidade não têm
nada a ver entre si. Eles formaram sua própria rede de
grupos denominada Organizações Seculares para a
Sobriedade (OSS).

P Posso falar sobre minha fé nas reuniões regulares dos


Doze Passos?
R Porquanto a maioria das reuniões dos Doze Passos é
secular, significando que não mantêm nenhuma ligação
religiosa, não é incomum alguém em uma reunião chamar
seu "Poder superior" de Jesus Cristo. Alguns que
participam desses grupos têm dito que não gostam
quando os crentes "agem como se a organização dos AA
fosse uma igreja". (Tecnicamente, esta é uma interrupção,
mas é defendida como mero compartilhamento de
sentimentos.) Reuniões diferentes variam grandemente
em termos de caráter. Os crentes podem e realmente
encontram apoio em reuniões seculares dos Doze Passos.

Os Doze Passos
1. Admitimos que éramos impotentes perante o álcool - que tínhamos
perdido o domínio sobre nossas vidas.
2. Viemos a acreditar que um Poder Superior a nós mesmos poderia
devolver-nos à sanidade.
3. Decidimos entregar nossa vontade e nossa vida aos cuidados de Deus,
na forma em que o concebíamos.
4. Fizemos minucioso e destemido inventário moral de nós mesmos.
5. Admitimos perante Deus, perante nós mesmos e perante outro ser
humano, a natureza exata de nossas falhas.
6. Prontificamo-nos inteiramente a deixar que Deus removesse todos
esses defeitos de caráter.
7. Humildemente rogamos a Ele que nos livrasse de nossas imperfeições.
8. Fizemos uma relação de todas as pessoas a quem tínhamos prejudicado
e nos dispusemos a reparar os danos a elas causados.
300 / Curando as Feridas da Alma

9. Fizemos reparações diretas dos danos causados a tais pessoas, sempre


que possível, salvo quando fazê-lo significasse prejudicá-las ou a outrem.
10. Continuamos fazendo o inventário pessoal e, quando estávamos
errados, nós o admitíamos prontamente.
11. Procuramos, através da oração e da meditação, melhorar nosso contato
consciente com Deus, na forma em que o concebíamos, rogando apenas o
conhecimento de sua vontade em relação a nós e forças para realizar essa
vontade.
12. Tendo experimentado um despertar espiritual, graças a esses passos,
procuramos transmitir essa mensagem aos alcóolatras e praticar esses
princípios em todas as nossas atividades.

Os Doze Passos foram reimpressos e adaptados com


permissão dos Serviços Mundiais dos Alcoólicos Anônimos. A
permissão dada para reimprimir e adaptar os Doze Passos não
significa que os AA revisaram ou aprovaram o conteúdo desta
publicação, nem que os AA concordam com as opiniões
expressas aqui. Os Alcoólicos Anônimos é um programa de
recuperação do alcoolismo. O uso dos Doze Passos com relação
a programas e atividades que foram moldados segundo o formato
dos AA, mas que tratam de outros problemas, também não possui
qualquer implicação aqui.

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NOTAS

Capítulo 3 - Perguntas nas Encruzilhadas da Vida


1. Esta é observação informal proferida pelo Dr. Willard Hawkins
proveniente de sua experiência médica particular com a Harbor Family
Practice, em Fullerton, Califórnia.
2. Daniel]. Levinson com Charlotte N. Darrow, Edward B. Klein, Maria
H. Levinson e Braxton McKee, The Seasons of a Man's Life (Nova York:
Ballantine Books, 1978), pp. 57-62.

Capítulo 4 - A Desvantagem de Sermos Humanos


1. "Não fale, não confie, não sinta" são três regras popularizadas por
Cláudia Black em seu livro It Will Never Happen to Me (Denver, Colorado:
M.A.C. Printing & Publications Divisíon, 1982), capo 3, pp. 31-52.
2. David Seamands, Healing for Damaged Emotions (Wheaton, Illinóis.
Victor Books, 1989), p. 69.

Capítulo 5 - Padrões que Bloqueiam Nosso Crescimento


1. "National Association for Children of Alcoholics'', National Association
for Children of Alcoholics (South Laguna, Califórnia: NACoA).
2. "Children of Alcoholics Battle Trauma as Adults", LosAngeles Times,
24 de setembro de 1985, seção V.
3. "Gene Associated with Alcoholism Identified", UCLA News, 17 de
abril de 1990.
4. "National Association far Children of Alcoholics'', National Association
for Children of Alcoholics (South Laguna, Califórnia: NACoA).

Capítulo 6 - O Modo como as Famílias Tendem a Ser


1. Informação obtida em entrevista com jan Frank, autora de Door of
Hope e When VictimsMany. [Os dadas dizem respeito aos Estados Unidos.
(N. do T.)]
2. M. L. Kammeier, "Adolescents From Families With and Without
Alcohol Problems", QuarterlyJournal ofStudies on Alcobol, vol. 32 (1971),
pp. 364-72.
302 / Curando as Feridas da Alma

3. I. Nylander, "Children Of Almholic Fathers", Aaa Paediamca, vol. 49, fi 01 (lçW),


pp.I-I34.
4. J. R Monison e M. A Steward, "A Family Study of the Hyperactive Syndrome",
BiologialJ Psycbiaay, voI. 3 (1971), pp. 189-95; e D. P. Cantwell, "Psychiatric TIlness in the
Families afHyperaetive Chíkíren", Ardnoes cfGeneralIsydnatry, voI. 2:7 (1972), pp. 414-
17.
5. E. W. Fine, L. W. Yudin, J. Holmes e S. Heinemann, "Behavioral Disorders in
Children W1th Parenta! Alcoholism", Annals cftbe New Y01kAcademyofSciences, voI. 23
(976), pp. 507-17.
6.J. F. Melachlan, R L mIldennan e S. Thoman, "AStudy afTeenagersW1thAlcoholic
Parents", Donuood Institute Researdi Monograph, voI. 3 (1973); P. A O'Gorman, "Self-
Concept, Locus on Control, and Perception af Fat.her in AdoIescents From Homes W1th
anel Wtthout Severe Drinking Problems" (tese de Mestrado em Filosofia, FordhamUniversity,
1975); J. Hughes, "AdoIescent Children af Alcoholic Parents and the Relationship of
Alateen to These Children",joumaJ ofConsulJing and Oinical Psychology, voI. 45, fi 05
(977), pp. 946, 947; e D. W Goodwin, F. Schulsinger, L. Herrnansen, S. B. Guze,
''Psychopathology in Adopted and Nonadopted Daughters of Almholics", Ardnoes of
GeneralPsychiatry, vol, 34 (977), pp. 1005-9.
7.J. Hughes, "Adolescent Children ofAlcoholic Parents and the Relationship of Alateen
to These Children",journal ofConsulJing and aínicalPsychology, vol. 45, 0.0 5 (1977),
pp. 946, 947; D. Miller e M. ]ang, "Children of Alcoholics: A Twenty-Year lDngitudinal
Study", Sa:íalW01kReseLlrchandAt6trads, vol. 13 (1977), pp. 23--29; M. E. Chafetz, H. T
Blane e M. J. Hill, "Children of Alcoholics: Observations in a Child Guidance Clinic",
QuarterlyjoumalofStudiesonAlcohol, voI. 31 (1971), pp. 687-98.
8. 'Why Stress Makes You Stupid", M Magazine (Maio de 1988), p. 72.
9. Erik Eríkson, CbildhoodandSociety(Nova York: W. W Norton, 1%3), pp. 247-73.

Capítulo 7 - Papéis que Assumimos na Infância


1. Estes papéis foram observados e nomeados por Cláudia
Black em seu livro It Will Never Happen to Me (Mac
Publishing, 1982). Sharon Wegscheider-Cruse, em sua obra
Another Chance: Hope and Health for the Alcoholic Family
(Science & Behavior Books, Incorporated, 1989), usa outros
nomes para papéis similares, os quais também foram
incluídos neste livro.
Capítulo 8 - Lutando para Sermos Adultos
1. janet Geringer Woititz deu origem a estas características específicas
em seu livro intitulado Struggle for Intímacy (Pompano Beach, Flórida:

I L • l, ,.J.:J.ilJlli
Notas / 303

Health Communications, 1985), pp. 85-98. Aqui dispusemos tais


características em ordem diferente e acrescentamos nossos próprios
comentários.

Capítulo 9 - Amortecendo a Dor


1. Para outras informações acerca deste problema, vide os livros Wben
Food Is Your Best Friend e Surrendering Hunger, escritos por jan johnson
(Harper: São Francisco, 1993).
2. D. W. Goodwin, F. Schulsinger, L. Hermansen, S. B. Guze e G. Winokur,
Archives of General Psychiatry, voI. 28 (1973), pp. 238-43.
3. Patrick Carnes, Out ofthe Shadows (Mineápolis, Mínnesota. CompCare
Publications, 1983), pp. 26-47.

Capítulo 10 - Visão Espiritual Embaçada


1. David Seamands, Healing ofMemories (Wheaton, Illínóis: Victor Books,
1985), pp. 98, 99.
2. Lawrence O. Richards, Tbe Teacher's Commentary (Wheaton, Illinóis:
Victor Books, 1988), p. 729.

Capítulo 11 - A Vida sob Exame


1. Oração popularmente atribuída a Reinhold Niebuhr.

Capítulo 12 - Ouvindo-nos a Nós Mesmos


1. Hugh Missildine, médico, Your Inner Child of the Past (Nova York:
Simon & Schuster, 1963), pp. 1-50.

Capítulo 13 - Precisamos das Pessoas


1. A Bíblia na Linguagem de Hoje. (N. do T.)

Capítulo 14 - Admitindo quem somos


1. Karl Merminger, Wbatewr Became qfSin? (Nova Yotk: Hawthorne, 1972), p. 25.

Capítulo 15 - Criando Lugares Seguros


1. Samuel A. Schreiner Jr., "Why Do We Cry?", Reader's Digest, Fevereiro
de 1987, p. 141.
2. james Pennebaker, Opening Up tbe Healing Power of Confiding in
Otbers (Nova York: Avon Books, 1990), p. 50.
304 / Curando as Feridas da Alma

Capítulo 17 - Construindo Relacionamentos Seguros


1. Deborah Helen Krois, "Children of Alcoholics" (Tese de Mestrado em
Filosofia, Universidade de Biola, 1987), p. 32.
2. Roger L. Gould, médico, Formations Growth and Change in Adult
Life (Nova York: Simon & Schuster, 1978), 279.

Capítulo 18 - Mitos que Sabotam o Crescimento Espiritual


1. jon Winokur, editor, Tbe Portable Curmudgeon (Nova York: New
American Library, 1987), capa externa.

Capítulo 19 - Restauradores Feridos como Líderes de


Igreja
1. jon Winokur, editor, Tbe Portable Curmudgeon (Nova York: New
American Library, 1987), capa externa.

Apêndice A-O que É um Grupo de Apoio e como Começo Um?


1. A regra de "não interromper" significa que os participantes não podem
se interromper uns aos outros, corrigir os outros ou aconselhar-se
mutuamente.

Apêndice C - O que É Recuperação e como Ela ajuda?


1. Charles Leershen et al., "Unire and Conquer", Newsweek, 5 de fevereiro
de 1990, p. 55.
2. Estamos em débito com o psicólogo doutor Earl Henslin por seu
estudo do movimento dos Alcoólicos Anônimos e por estas observações.
3. Fatos retirados do "Foreword to Second Editíon", in: Alcoholics
Anonymous (Nova York: Alcoholics Anonymous World Services, 1976), pp.
xv-xxi.
4. Alcoholics Anonymous (Nova York: Alcoholics Anonymous World
Services, 1976), p. 564.
5. "We Agnostics" , in: Alcoholícs Anonymous (Nova York: Alcoholics
Anonymous World Services, 1976), p. 45.
6. "We Agnostics", in: Alcoholícs Anonymous (Nova York: Alcoholics
Anonymous World Services, 1976), p. 44.
7. "Foreword to Second Edition", in: Alcoholics Anonymous (Nova York:
Alcoholics Anonymous World Serviccs, 1976), p. xx.
8. "Foreword to Second Edition", in: Alcoholícs A nonymous (Nova York:
Alcoholics Anonymous World Services, 1976), pp. xvii, xviii.

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