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A política econômica governo FHC não pode ser analisada tal como faríamos em
qualquer outro governo, trata-se um momento de transição estrutural da economia brasileira,
por um lado, altera-se a orientação geral do padrão de atuação estatal, antes o crescimento
econômico seria induzido pela garantia da demanda, caberia ao Estado intervir no mercado de
modo a assegurar a demanda aos agentes econômicos, tanto de forma direto como empresário,
substituindo o setor privado, quanto de maneira indireta através de subsídios e proteções a
determinados setores. Esse padrão é abandonado na direção de um Estado que induza a oferta,
o Estado muda seu padrão de atuação estatal creditando o desenvolvimento ao setor privado,
retirando subsídios fiscais, proteções tarifárias e demais políticas protecionistas no intuito de
aumentar a concorrência com a entrada do maior número de ofertas na economia.
Os economistas ortodoxos são os mais ferrenhos defensores do legado da era
FHC, para estes, mais importante que os resultados macroeconômicos em termos de produto e
emprego, bastantes pífios por sinal, são as mudanças estruturais promovidas pelas políticas
econômicas, as principais: a abertura da economia e mudança no padrão de atuação estatal.
Por isso, antes de apresentar os resultados da política econômica, vejamos brevemente as
ideias dos seus formuladores.
Segundo Franco (1998), o Brasil havia ficado fora nos anos 1980 da torrente de
investimentos direto externo proveniente da globalização por conta do excesso de
protecionismo da economia brasileira, na insistência de manter o modelo de substituição de
importações (SI). O modelo SI era desastroso para a economia, pois, (i) diminuía a
produtividade, por conta, do excesso de protecionismo, que restringia a competitividade; (ii)
aumentava a concentração de renda, pois a poupança forçada era retirada dos salários, seja por
fundos parafiscais como o PIS-PASEP, seja através da inflação decorrente da frouxidão da
política monetária; (iii) decorrente do excesso de protecionismo, o modelo punia os
consumidores e beneficiava as empresas oligopolistas, que tinham lucros extraordinários na
falta de competição. Estes três fatores combinados necessariamente levavam a estagnação do
investimento, da produtividade e a inflação. O único meio de combinar distribuição de renda,
crescimento econômico e a competitividade era o aumento da produtividade.
Para tanto, defende as mudanças estruturais que estavam sendo realizadas pelo
governo FHC, estas tinham como foco principal o aumento da produtividade, que seria
resultado da modernização da economia brasileira, entendida como a adoção de novas
tecnologias de produção e novos métodos organizacionais do trabalho. A condição para a
retomada do crescimento da economia brasileira era aumentar o grau de abertura, que atrairia
investimento externo, mas este tem como pré-condição a manutenção da estabilidade
macroeconômica legada pelo Plano Real.
Nesse sentido, não podemos enxergar o Plano Real apenas como um plano
deflacionário que tinha como objetivo apagar a memória inflacionária na conversão para uma
nova moeda. O Plano era muito mais que isso, tratava-se de adesão brasileira, até então
rebelde, aos preceitos neoliberais do Consenso de Washington. Williamson (1992) formulador
do Consenso, defende dez elementos de mudanças, na qual segundo Filgueiras (2012) seis
deles são os mais importantes: (i) reforma fiscal que ampliasse a base de incidência dos
tributos, de modo que o Estado não deveria mais se financiar por meio do imposto
inflacionário. Essa reforma teria como objetivo manter uma forte disciplina fiscal buscando a
redução dos déficits orçamentários para gerar superávits primários robustos e estruturais; (ii),
prioridade dos gastos públicos, propondo redirecionamento dos gastos para áreas políticas
sensíveis (subsídios, defesa, máquina administrativa) para melhorar a distribuição de renda
como saúde, educação e infraestrutura. (iii) política cambial deveria sofrer uma dolarização
direta ou indireta, com a valorização da moeda nacional, com uma política monetária passiva.
(iv) liberalização comercial e financeira, com a desproteção dos mercados nacionais, que
traria investimentos estrangeiros para que os países periféricos pudessem se inserir
competitivamente na globalização; (v) privatizações e desregulamentação da atividade
econômica para aumentar a competição no cenário nacional e abater a divida de curto prazo
dos governos endividados; (vi) defesa da propriedade intelectual e a necessidade de um
elevado nível de proteção a propriedade da indústria, através da concessão de monopólios
para as empresas patenteadas. Com esse receituário o Brasil voltaria a receber capitais
estrangeiros, bastando segui-lo. “Dessa forma, ingressar-se-ia no melhor dos mundos, isto é,
um ambiente de inflação baixa, crescimento e uma adequada inserção (competitiva) na
economia mundial globalizada.” (Idem, P.97).
No entanto, como mostra o Filgueiras (2000) os resultados são bem diferentes
daquelas pensados pelos formuladores:
Nesse final dos anos 90, a sequência que tem se observado é seguinte: abertura
comercial e financeira e valorização do câmbio, seguidos inicialmente de queda da
inflação, crescimento da produção e do emprego e entrada de capitais estrangeiros
especulativos. Posteriormente, enormes déficits na balança comercial e na conta de
transações correntes, seguidos de mais valorização da moeda nacional e elevação
das taxas de juros. Finalmente, uma profunda recessão, precedida pela fuga de
capitais especulativos, crise cambial e retorno da inflação. (Idem)
No Brasil, a trajetória da economia não escapou a essa sequência, o que se observou ao longo
dos governos FHC foi uma economia oscilante em movimentos de Stop and go, isto é,
retomada do crescimento seguidas de quedas bruscas ocasionadas por algum choque exógeno,
o que determinou taxas de crescimento medíocres, na média dos dois governos 2,35% do PIB.
De acordo com Filgueiras (2000) nunca antes a política economia havia sido tão reflexa das
adversidades da economia mundial como no modelo econômico do Plano Real.
Para melhor compreender o tripé macroeconômico dos governos FHC, a tabela abaixo ilustra
os eixos e mudança do primeiro para o segundo mandato.
Política Fiscal - Esforços de reforma - Ajuste fiscal voltado para a
estrutural e patrimonial do geração de superávits
setor público, com a primários, baseado em
apresentação de propostas aumento de receitas e redução
legislativas e privatização. de despesas, com maior
- Introdução de medidas de ênfase nas primeiras.
controle das finanças dos - Fadiga reformista, embora
governos estaduais e propostas importantes tenham
municipais, com efeito sido implementadas (LRF,
estrutural, mas resultado fator previdenciário.).
não-imediatos.
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Esse caráter dúbio inclusive aparece nas divergências dos pesquisadores sobre o tema. Enquanto, Boito (1999) e Bianchi
(2010) acentuam mais o caráter crítico do movimento; Diniz (2010) os enxergam como um movimento de apoio maciço do
empresariado as políticas adotadas pelo governo.
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Boito (1999) modifica os termos, mas não o conteúdo, chama de neoliberais radicais, e os liberais-desenvolvimentistas de
neoliberais moderados.
entanto, esse desenvolvimentismo limitado pelo molde liberal apenas vê com bons
olhos formas bem delimitadas de intervenção do Estado no sistema produtivo.
Os estudiosos do movimento político empresarial (Diniz, 2010; Boito,1999; Bianchi, 2010)
concordam que este movimento crítico as políticas neoliberais radicais, não propunha a
substituição do modelo neoliberal, mas criticavam certos pontos, permanecendo fiéis ao
governo, inclusive apoiando a reeleição de FHC. O governo cede em algumas questões
setoriais, com o devido cuidado de não contrariar a fração hegemônica no bloco no poder.
No segundo mandato, os industriais chegam ao final da década de 1990 em oposição aberta ao
governo. A eleição para a presidência da Fiesp em 1998 tendo como vencedor Horácio Lafer
Piva muda o discurso dominante do antigo presidente da entidade. Segundo ele: “Tornou-se
possível no Brasil proteger a moeda, e, ao mesmo tempo, defender a indústria, o emprego e a
atividade econômica” (PIVA, 1998 apud Bianchi, 2010, p. 255).
Um novo ciclo de mobilização empresarial se sucedeu à posse de Lafer Piva. Os
industriais paulistas protestaram contra as taxas de juros, reivindicaram a
desvalorização do real e demandaram a criação de Ministério do Desenvolvimento.
Sofreram derrotas, mas também marcaram pontos a seu favor, como a criação do
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comercio e a nomeação de Celso Lafer,
primo do presidente da Fiesp, para o cargo, no qual permaneceu até julho de 1999.
Surpreendentemente, a Fiesp parecia despertar do coma e ocupava novamente um
ponto importante na política nacional. (Bianchi, 2010, p. 255)
Quais são os motivos do renascimento dos industriais na política nacional? Neste momento da
pesquisa ainda não é possível afirmar, mas temos algumas hipóteses. O ponto que nos parece
crucial foi o anúncio do aprofundamento da política neoliberal para o segundo mandato. Neste
sentido, a crise cambial de 1998, demarca o renascimento político da entidade, pois a crise
veio no coração das críticas anteriores – o câmbio valorizado. Este gerou efeitos negativos
para a popularidade do presidente, sua aprovação às vésperas da eleição, em setembro de
1998, segundo o Datafolha era de 43% de aprovação e 17% de rejeição cai em junho do ano
seguinte para 16% sua aprovação e 44% sua rejeição. Os industriais como fração ideológica, e
que, portanto, mantém a função de ser o maior elo entre a classe dominante e os dominados,
souberam aproveitar a fragilidade do presidente reeleito, passaram a defender mais
abertamente mudanças em prol do emprego e do crescimento, condicionadas ao abandono das
políticas neoliberais radicais. Um segundo motivo foi a perca do ímpeto reformista do
governo, sobretudo, nas privatizações, que diminuíram de ritmo e ainda criou facilidades para
investidores estrangeiros, ocasionando um salto na participação do capital estrangeiro (Citar
dado do doutorado sobre privatização). Ainda é necessário explorar com maior profundidade
este segundo ponto, mas até o momento nos parece que a agenda de privatizações era um
ponto significativo para o apoio empresarial à política econômica.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc20069915.htm
http://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2002/12/1222326-fhc-encerra-
mandato-com-reprovacao-maior-do-que-aprovacao.shtml