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Programa de Educação

Continuada a Distância

Curso de
Plantas Psicoativas: Uma
Abordagem Farmacológica
Ligia Moreiras Sena

Aluno:

EAD - Educação a Distância


Parceria entre Portal Educação e Sites Associados
Curso de
Plantas Psicoativas: Uma
Abordagem Farmacológica
Ligia Moreiras Sena

MÓDULO I

Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para
este Programa de Educação Continuada, é proibida qualquer forma de comercialização do
mesmo. Os créditos do conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos
na bibliografia consultada.

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Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores
SUMÁRIO

MÓDULO I

1. Introdução Geral
2. Introdução ao Estudo das Plantas Calmantes
3. Introdução ao Estudo das Plantas Estimulantes
4. Introdução ao Estudo das Plantas Alucinógenas
5. Considerações Gerais
6. Bibliografia Consultada

MÓDULO II

1. Maracujá (Passiflora sp)


a. Nome científico
b. Nomes populares
c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Usos populares e efeitos popularmente relatados
f. Dados químicos e farmacológicos
2. Melissa (Melissa officinalis)
a. Nome científico
b. Nomes populares
c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Usos populares e efeitos popularmente relatados
f. Dados químicos e farmacológicos
3. Valeriana (Valeriana officinalis)
a. Nome científico
b. Nomes populares

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c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Usos populares e efeitos popularmente relatados
f. Dados químicos e farmacológicos
4. Bibliografia Consultada

MÓDULO III

1. Café (Coffea arabica)


a. Nome científico
b. Nomes populares
c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Dados químicos e farmacológicos
2. Erva-Mate (Ilex paraguariensis)
a. Nome científico
b. Nomes populares
c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Dados químicos e farmacológicos
3. Guaraná (Paullinia cupana)
a. Nome científico
b. Nomes populares
c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Dados químicos e farmacológicos
4. Bibliografia Consultada

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MÓDULO IV

1. Maconha (Cannabis sp)


a. Nome científico
b. Nomes populares
c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Usos populares e efeitos popularmente relatados
f. Dados químicos e farmacológicos
2. Coca (Erythroxylon coca)
a. Nome científico
b. Nomes populares
c. Informações botânicas
d. Histórico
e. Usos populares e efeitos popularmente relatados
f. Dados químicos e farmacológicos
g. Considerações adicionais
3. Ayahuasca
a. Histórico
b. Nomes científicos e populares
c. Informações botânicas
d. Dados químicos e farmacológicos
4. Bibliografia Consultada

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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS PLANTAS PSICOATIVAS

1. INTRODUÇÃO GERAL

Alguma discussão pode surgir a respeito da expressão utilizada nesta


apostila, “plantas psicoativas”, em função de existir muita polêmica a respeito do
assunto. Da mesma forma, algumas pessoas podem se sentir um tanto
desconfortáveis com a expressão, uma vez que o senso comum considera, à
primeira vista, as plantas psicoativas como sendo drogas de abuso e, portanto,
combatidas pela legislação que regulamenta o uso de entorpecentes, o classificando
como crime. Essa polêmica a respeito do termo surge em função de várias
terminologias serem utilizadas em diferentes situações, sem uma análise criteriosa.
Portanto, nesta apostila são consideradas as definições da Organização Mundial de
Saúde (OMS), de forma a esclarecer - a conotação pretendida com o uso do termo
“plantas psicoativas”.
De acordo com a OMS, uma “droga psicoativa” possui como característica a
capacidade de alterar o comportamento e os processos cognitivos; esses efeitos
sobre o comportamento e a cognição são causados, portanto, por meio de
alterações do funcionamento normal do sistema nervoso central. Já a definição de
“droga psicotrópica”, ainda segundo a OMS, considera basicamente o mesmo
conceito empregado para droga psicoativa; no entanto, inclui um elemento
importante: drogas psicotrópicas, além de agirem sobre o comportamento e sobre os
processos cognitivos, possuem também uma importante propriedade reforçadora, ou
seja, elas causam efeitos que reforçam a continuidade do uso, o que pode levar a
pessoa ao vício em função do uso repetido.
Portanto, para os efeitos desta apostila, plantas psicoativas são aquelas
espécies vegetais que, de alguma forma, interferem em processos relacionados à
atividade mental, ao comportamento (como o controle das emoções ou a regulação
do sono, por exemplo), ao humor e a processos cognitivos, como aprendizagem e
memória. Muitas discussões têm sido conduzidas a respeito da terminologia mais

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adequada, discussões essas que se tornam acaloradas e muitas vezes não
produtivas. Optou-se por utilizar a expressão “planta psicoativa”, nesta apostila, com
o sentido mencionado na primeira definição da OMS, apresentado no início deste
tópico. Com o objetivo de evidenciar seus efeitos sobre o funcionamento ordinário da
mente, do comportamento e de processos cognitivos, bem como de compreender os
mecanismos pelos quais produz tais efeitos.
Essas plantas, que de alguma forma alteram o funcionamento da mente,
fascinam os seres humanos desde os primórdios da história. Na grande maioria das
culturas, em muitos pontos diferentes do globo, chegam mesmo a ser consideradas
de um ponto de vista místico, com significado impregnado de crenças e
superstições, dotadas de uma conotação mágica e muitas vezes utilizadas em rituais
religiosos. Pode-se até mesmo falar, sem correr o risco de cair em exageros, que
muitas sociedades consideradas tradicionais tiveram sua estrutura sócio-cultural
construída e fortalecida sobre relações surgidas e/ou moldadas em torno do uso de
determinadas espécies vegetais dotadas de propriedades psicoativas. É o que pode
ser observado quando se toma como exemplo a relação existente entre os povos
dos altiplanos andinos e a coca, ou entre os índios norte-americanos (com sua Igreja
Nativa Americana) e o peiote, entre tantos outros exemplos. Nessas sociedades, a
organização social pode ter sido influenciada pelo conhecimento que determinados
indivíduos possuem sobre as plantas, em especial sobre as plantas psicoativas.
Muitos são os nomes que esses indivíduos podem ter; seja considerado (a) um (a)
curandeiro (a), um (a) erveiro (a), um (a) pajé ou um (a) xamã, entre outros nomes. É
incontestável seu profundo e vasto conhecimento a respeito do uso e das condições
associadas ao uso dessas plantas, podendo mesmo ser considerados como
verdadeiros “bancos de dados” tradicionais do conhecimento associado a plantas.
Como ocorre com outras categorias de plantas, o conhecimento sobre as espécies
vegetais psicoativas foi sendo transmitido ao longo das gerações diretamente de um
indivíduo a outro, principalmente por uma tradição oral de transmissão.
Uma vez que a transmissão oral do conhecimento não deixa registros, muito
pode ter sido perdido a respeito do conhecimento sobre inúmeras espécies vegetais
psicoativas, bem como muito ainda pode vir a se perder. Considerando o acelerado

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processo de modernização em que se encontra um grande número de comunidades
no mundo todo. Agricultores e caçador-coletores de algumas sociedades possuíam,
e ainda possuem um papel importante no conhecimento dessas espécies vegetais;
no entanto, o bruto do conhecimento sobre as plantas psicoativas, na maioria das
vezes, está em indivíduos que dominam a arte da cura, do contato com o sagrado,
que são considerados sábios e detentores de dons especiais. Como afirma o
professor Luiz Claudio Di Stasi, importante pesquisador brasileiro na área do estudo
das plantas medicinais utilizadas por comunidades tradicionais, o conhecimento das
virtudes de espécies vegetais pode realmente ser considerado como a arte dos
benzedores, dos curandeiros e dos Xamãs. A qual, por sua vez, foi herdada dos
magos e feiticeiros do passado 1 . Tal afirmação se torna ainda mais precisa quando
se trata de plantas dotadas de propriedades psicoativas.
Há quem se arrisque a afirmar que o uso de plantas psicoativas data de
épocas específicas, remetendo ao antigo uso desses recursos vegetais. No entanto,
a ancestralidade do uso dessas plantas é tão remota que torna qualquer estimativa
aleatória e nos faz crer que seu uso, na verdade, tenha acompanhado toda a história
humana. Achados arqueológicos sugerem que muitas espécies psicoativas já
tenham sido empregadas pelos homens, e seus ancestrais, em tempos pré-
históricos, e com uma distribuição geográfica de uso muito ampla. Outras evidências
históricas, além de comprovar a remota origem de sua utilização, ainda confirmam
sua grande importância dentro do contexto sócio-cultural em determinadas
comunidades. Assim, uma espécie vegetal psicoativa poderia simultaneamente ser
utilizada como alimento, para fins de proteção, para facilitar processos de caça e
pesca, como um instrumento de comunicação, utilizada em adornos associados a
contextos culturais ou hierárquicos da sociedade e, freqüentemente, empregada em
rituais de cura. O fato é que parece ser muito provável que as plantas psicoativas
tenham acompanhado o homem ao longo de sua trajetória neste planeta. Ou que os
homens tenham acompanhado – e até mesmo seguido – as plantas psicoativas.

1
A autora se refere ao professor Luiz Claudio Di Stasi, no Capítulo 1 - Arte, ciência e magia, de seu livro
Plantas Medicinais: Arte e Ciência – Um guia de estudo interdisciplinar.

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Portanto, um questionamento que pode ser feito a partir do conhecimento de
que ambos, homens e espécies vegetais, talvez tenham caminhado juntos em seus
percursos evolutivos e que é, no mínimo, intrigante é o seguinte:
- “O que fez com que as plantas psicoativas fossem tão importantes para os
homens e seus ancestrais?”
Ou ainda, de um ponto de vista evolutivo, outro questionamento pode
aparecer:
- “Existe algum motivo especial pelo qual os homens tenham optado por usar
determinadas espécies psicoativas, a despeito de suas potencialidades tóxicas?”.
Essas questões não possuem respostas óbvias e as tentativas de respondê-
las têm sido alvo de muita polêmica. A importância da discussão, entretanto, parece
não se chegar a um consenso na resposta, antes compreender os processos nos
quais podem ter contribuído para que o conhecimento sobre o uso de espécies
vegetais psicoativas não tenha desaparecido ao longo dos séculos. E que, pelo
contrário, esteja sendo cada vez mais discutido em diferentes meios e por diferentes
formas, é o que parece ser mais importante.
Assim como o estudo das plantas bioativas, de uma forma geral, o estudo
das plantas psicoativas é caracterizado por ser uma área absolutamente
interdisciplinar – ou pelo menos deveria ser – envolvendo antropólogos, ecólogos,
botânicos, agrônomos, químicos, farmacologistas, entre outros profissionais. Com o
intuito de compreender, da forma mais abrangente possível, o que representa a
planta tanto em termos de significado sócio-cultural quanto em termos biológicos.
Dessa forma, uma única espécie vegetal pode gerar uma infinidade de informações,
tais como:
- o contexto social e cultural no qual ela é empregada por diferentes
comunidades: se o uso é ritualizado, se existem hierarquias desenvolvidas com base
no seu manejo, o papel que a espécie possui na cosmologia da sociedade, se é
igualmente manipulada por homens e por mulheres, a forma como a comunidade vê
aquele recurso, entre outros tantos fatores;
- as lendas e mitos que cercam seus usos e efeitos;

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- os nomes populares que recebe, os quais variam amplamente de uma
região para outra;
- sua nomenclatura científica: o nome científico que foi dado à espécie e que
permite identificá-la, corretamente, em qualquer lugar do mundo, ou que pelo menos
facilite a correta identificação;
- os dados botânicos e agronômicos da espécie: suas características visuais
e microscópicas, flores, colorações, tamanho da planta, climas nos quais se
desenvolve as condições de cultivo, entre outros aspectos;
- as formas como as diferentes populações a utilizam tradicionalmente: para
quais finalidades, em que circunstâncias, para quais quadros de saúde, como se dá
o preparo, a quantidade que é utilizada, quais partes são utilizadas;
- a composição química de suas partes: quais substâncias estão presentes
nas partes que são utilizadas, as quais classes químicas pertencem, de que forma
extraí-las, como otimizar a obtenção de uma maior quantidade dessas substâncias,
entre outros fatores;
- a farmacologia dessas plantas: como agem no organismo, de que forma,
por quais mecanismos, envolvendo quais sistemas orgânicos, produzindo quais
efeitos adversos e efeitos positivos;
- entre outras classes de informações que podem ser obtidas por meio do
estudo de uma espécie vegetal psicoativa.
Nesse contexto, se faz necessária a colaboração de um grande número de
profissionais, com as mais variadas formações acadêmicas, e a boa integração entre
eles é que ajudará na maior compreensão da importância de uma planta psicoativa
em um amplo contexto.
Especificamente com relação à situação brasileira, o estudo das plantas
psicoativas, ganha uma importância ainda maior. Isso se deve a diversos fatores:
- à composição biológica, ou seja, à complexa diversidade biológica
existente no Brasil, que faz com que seja considerado o primeiro em número de
espécies vegetais no mundo, verdadeiro banco genético de espécies;
- ao grande número de espécies vegetais endêmicas, que existem somente
em território brasileiro;

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- à existência de biomas tão diferentes e ricos em variedade biológica
vegetal, tais como a Mata Atlântica, os Campos Sulinos, o Pantanal, o Cerrado, a
Caatinga e a Amazônia;
- e, tão importante quanto à grande diversidade cultural, proveniente da tão
grande diversidade étnica. Um país de índios, colonizado por portugueses, povoado
por descendentes de africanos, imigrantes italianos, espanhóis, asiáticos; um país
onde convivem comunidades indígenas, remanescentes de quilombos, comunidades
de pescadores, populações ribeirinhas, comunidades agro-extrativistas, entre tantos
outros componentes do belo quadro multiétnico brasileiro.
A questão da grande diversidade de povos e de origens acaba sendo tão
importante quanto à própria diversidade biológica existente no país. Se pensarmos
que a cada grupo étnico originário das terras brasileiras se somou um sem número
de influências de outros povos, dos mais diferentes lugares do mundo, teremos uma
pequena noção da real riqueza etnobotânica resultante. Uma fonte inesgotável de
conhecimentos a respeito, inclusive, do uso de plantas que alteram o funcionamento
da mente.
Apenas a título de exemplo, em um estudo recém-divulgado e realizado por
um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo e liderado pela
pesquisadora Eliana Rodrigues. Foram investigadas quais plantas com possíveis
ações sobre o sistema nervoso central eram utilizadas popularmente no Brasil, a
partir de fontes históricas dos séculos XVI ao XIX. As autoras utilizaram como fonte
da pesquisa livros históricos encontrados em instituições brasileiras reconhecidas,
tais como: as bibliotecas da Universidade de São Paulo e do Instituto Botânico do
Estado de São Paulo, e pesquisaram quais plantas eram mencionadas nesses livros
como sendo popularmente utilizadas por seus efeitos sobre o sistema nervoso
central. Os resultados divulgados neste estudo são muito interessantes: as
pesquisadoras encontraram 93 plantas mencionadas por seus efeitos centrais,
inclusive espécies amplamente conhecidas no Brasil, tais como o caju (Anacardium
occidentale), a mandioca (Manihot utilissima), o guaraná (Paullinia sp) e o cacau
(Theobroma sp). Dessas 93 plantas, 34 espécies eram nativas do Brasil, ou seja,
mais de 35% do total de plantas mencionadas, o que dá uma ligeira idéia da

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importância do Brasil como banco de espécies vegetais, especificamente de
espécies vegetais psicoativas.
Outro ponto importante a se considerar quando se trata do estudo de plantas
psicoativas, bem como de todas as demais espécies vegetais bioativas, é a falsa
crença, muitas vezes nutrida por uma mídia apelativa e equivocada, de que as
plantas não causam efeitos adversos, por serem de fonte natural. Frases como
“pode usar que não tem problema, é natural”, “o que é natural é bom”, “se bem não
faz, mal não vai fazer”, ou ainda, a pior delas, “não tem compostos químicos, é
natural”, a despeito de serem grandes falácias, são muito mais ditas com relação às
plantas do que se poderia imaginar. É importante ressaltar que as plantas podem ser
tão tóxicas e tão perigosas quanto os compostos de origem sintética, quando mal
utilizadas ou utilizadas de forma equivocada. Neste contexto, um trabalho divulgado
em 2005 apresenta uma lista de efeitos adversos que podem ocorrer em virtude do
uso de determinadas espécies vegetais, tais como fotodermatite pelo uso da erva-
de-São-João ou da angélica (Hypericum perforatum e Angelica archangelica,
respectivamente), distúrbios hepáticos pelo uso do mate (Ilex paraguariensis) ou
desconforto abdominal pelo uso de sene (Cassia augustifolia), entre outros efeitos.
Outra pesquisa, dessa vez realizada em 1999, também confirma a
necessidade de uma atitude parcimoniosa com relação ao uso de plantas bioativas.
Esse estudo apresenta o número de casos, óbitos e letalidade por agentes tóxicos
registrados em centros de controle de intoxicações humanas no Brasil, de 1993 a
1996. Os autores do trabalho afirmam que, nesses três anos, foram registrados
5.862 casos de intoxicações causadas pelo uso de plantas, sendo que, em 31 dos
casos, o paciente veio a óbito, o que fornece um índice de letalidade (porcentagem
de óbito) de 0,53%. Quando comparado ao gigantesco número de 57.548 casos de
intoxicações causadas por medicamentos convencionais, as intoxicações por plantas
podem parecer irrelevantes. No entanto, se for considerado que, deste total de
intoxicações por medicamentos, foram registrados 266 óbitos decorrentes, com um
índice de letalidade de 0,46%, portanto menor do que o índice de letalidade por
intoxicações com plantas, tem-se um claro quadro da situação. Ou seja, o uso de
plantas por suas propriedades bioativas deve ser feito com o mesmo cuidado e a

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mesma parcimônia que deve ser dedicada a qualquer outro tipo de composto
bioativo sintético, visando à manutenção da integridade física do organismo.

2. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS PLANTAS CALMANTES

Diferentes nomes populares são dados àquelas espécies vegetais utilizadas


como calmantes: tranqüilizantes, sedativas, plantas “que dão sono”, que
“assossegam”, que “acalmam crianças”, entre muitas outras denominações
populares. A despeito da grande variedade de nomes, uma coisa elas têm em
comum: são utilizadas em condições de agitação nervosa ou psicomotora, de
angústia, de desconforto associado a algum tipo de nervosismo, e seu uso, assim
como outras categorias de plantas medicinais, remonta às origens dos grupos
sociais e desde que a espécie humana passou a reconhecer sintomas e associá-los
a doenças.
A importância associada ao estudo das plantas medicinais é
multidimensional: contribui para a continuidade do saber tradicional associado ao
uso de espécies vegetais para tratar diferentes condições de saúde; contribui para a
preservação dos recursos genéticos vegetais representados por tais espécies;
representa uma fonte de conhecimento e práticas farmacológicas que se perpetuam
há gerações, entre outros fatores tão ou mais importantes. Dentro do amplo
conhecimento tradicional sobre plantas empregadas para tratar condições de saúde,
aquelas que são utilizadas para acalmar as pessoas possuem um lugar especial,
tanto em função da grande diversidade de espécies empregadas para este fim
quanto em função da vasta quantidade de quadros de saúde associados,
implicitamente, ao termo “acalmar”. O que a medicina ocidental sistematizou,
classificou ou subdividiu em diferentes categorias de doenças, a cultura popular
pode considerar como sendo uma entidade única. Assim, enquanto o padrão médico
ocidental dá diferentes nomes ao que considera como sendo diferentes coisas, o
saber médico tradicional pode chamar de uma coisa só, ou variações de um mesmo
quadro, como é o caso da finalidade do uso das “plantas calmantes”.

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Em comunidades tradicionais não são utilizados com freqüência termos
como ansiedade generalizada, síndrome do pânico, distúrbio bipolar, depressão,
transtorno do estresse pós-traumático ou epilepsias de diferentes tipos. Esses são
quadros ou síndromes que englobam sintomas característicos e que foram
categorizados pela medicina ocidental. No entanto, embora o saber médico
tradicional não reconheça fundamentalmente tais categorias, conhecem, e muito
bem, cada um de seus sintomas característicos. Dessa forma, podem não usar com
freqüência o termo “ansiedade generalizada”, mas já sabiam tratar sintomas de
“angústia”, “aperto-no-peito”, “nervosismo”, “agitação”, muito antes do surgimento da
medicina ocidental. Podem não usar o termo “insônia”, mas possuem muitos
remédios vegetais para “falta de sono à noite” ou “sono que não vem”. O termo
“epilepsia” pode também não ser muito usado, mas possuem remédios utilizados há
muitas gerações para tratar “ataques de criança”, “ataques de cabeça” ou “ataques
de espíritos”, alguns nomes populares pelas quais as epilepsias são conhecidas em
determinadas comunidades tradicionais.
Portanto, as plantas calmantes fazem parte do berço da medicina, como
esta é entendida hoje, e por muitos séculos representaram o único meio de tratar
condições que traziam algum tipo de desconforto aos indivíduos. E tal conhecimento
mostra-se tão arraigado, mesmo na cultura tecnológica dos dias atuais, que não há
uma só pessoa que não saiba dizer ao menos um nome de planta utilizada para
acalmar. Caso esse fato pareça inverossímil, faça o teste: procure um amigo e peça-
o para dizer um nome de uma planta usada para acalmar. E mais: o número de
plantas diferentes que aparecerão será, muito provavelmente, proporcional ao
número de pessoas interrogadas.
Muitas plantas têm sido utilizadas para combater, inclusive, os sintomas
relacionados ao estresse em função de suas habilidades de agir no sistema nervoso,
ou de induzir estados de relaxamento e tranqüilidade. Outras plantas agem
relaxando a tensão muscular, o que por si só já representa uma fonte de alívio, e
outras ainda ajudam a eliminar dores de cabeça, também causadas por situações
estressantes ou auxiliam a dormir. Conseqüentemente, muitos desses remédios
vegetais considerados calmantes auxiliam a combater, ou diminuir, diversos

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sintomas relacionados ao estresse, incluindo fadiga, insônia, ansiedade e
nervosismo.
As plantas calmantes descritas nessa apostila (maracujá, Passiflora sp;
melissa, Melissa officinalis; e valeriana, Valeriana officinalis) não se referem apenas
a plantas freqüentemente utilizadas por diferentes comunidades no mundo todo.
Referem-se também a plantas cujos efeitos relatados pelas populações já foram, ou
continuam sendo, estudados em diferentes laboratórios de pesquisa. A fim de
elucidar quais princípios ativos estão associados aos seus tão conhecidos efeitos,
ou a fim de produzir medicamentos, baseados nos conhecimentos tradicionais, que
possam representar um novo tratamento a diferentes condições de saúde mental,
tais como os transtornos de ansiedade ou outras condições associadas ao
funcionamento cerebral.

3. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS PLANTAS ESTIMULANTES

A medicina popular tradicional conta com uma infinidade de espécies


vegetais que são utilizadas em função de suas propriedades estimulantes, ou seja,
que agem promovendo uma maior ativação do sistema nervoso central e,
conseqüentemente, contribuem para manter o organismo mais alerta, estimulado,
com maior resistência e vigor. Popularmente, são conhecidas por diferentes nomes:
tônicas, estimulantes, revigorantes, fortificantes, entre outras designações.
Em uma época em que se discutem muitos aspectos do modo de vida dito
“estressante”, as pessoas estão fazendo uso dessas plantas com freqüência cada
vez maior, quer seja para aumentar sua produção individual, para conseguir realizar
as inúmeras tarefas necessárias ou mesmo para aumentar suas capacidades
cognitivas (memória e atenção, por exemplo). As plantas estimulantes são utilizadas
tanto para melhorar a resistência e diminuir o cansaço quanto para diversos outros
aspectos, tais como combater os sinais do envelhecimento, melhorar o desempenho
sexual, combater o estresse e também para combater o sobrepeso/obesidade,
finalidade esta última muito divulgada nos tempos atuais. Em função dessa grande
diversidade de usos, muitas espécies vegetais estimulantes têm sido empregadas há

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muitos séculos. E, fazem parte do cotidiano e da rotina de milhares de pessoas ao
redor do mundo, como é o caso do café (Coffea arabica), do cacau (Theobroma
cacao) e de muitos tipos de chás estimulantes. Essas espécies não só movimentam
um mercado de milhões de dólares como, historicamente, contribuíram para a
formação de muitas sociedades, o que torna fácil compreender sua acentuada
importância sócio-econômica. Atualmente, o número de bebidas energéticas
disponíveis no mercado só tem aumentado. Essas bebidas possuem, em sua
composição, extratos de espécies vegetais ou constituintes químicos derivados das
mesmas, como é o caso da cafeína, composto bioativo primeiramente isolado do
café, do guaraná (Paullinia cupana), do ginseng (Panax ginseng), do chá-verde
(Camellia sinensis), da cola (Cola sp), da erva-mate (Ilex paraguariensis), entre
outras espécies.
Entre o final da década de 40 e início da década de 50, um pesquisador
russo de nome Nikolai Lazarev, ao estudar algumas espécies vegetais estimulantes
russas, criou o termo “adaptógeno” para designar plantas cujos efeitos, como o
próprio nome diz, auxiliariam os indivíduos a se adaptar a determinadas situações,
geralmente estressantes. Essas plantas, consideradas por Lazarev como
adaptógenos, seriam capazes de aumentar o estado de resistência do indivíduo
frente a situações de estresse, melhorar sua capacidade cognitiva, diminuir os
déficits cognitivos decorrentes do envelhecimento, aumentar a disposição, entre
outros fatores. Ou seja, à primeira vista, seria apenas uma nova denominação para
aquelas plantas, já tradicionalmente conhecidas, como estimulantes. No entanto, o
conceito de adaptógeno criado por Lazarev envolve uma atividade biológica mais
abrangente, considerando principalmente três condições: a) a planta deve produzir
aumento da resistência de forma não-específica, ou seja, relativa a todo o organismo
e não apenas a um único sistema orgânico; b) sua ação deve promover a
normalização de algum estado patológico presente no organismo; e, c) seus efeitos
não devem causar nenhum dano e nem alterar desnecessariamente o
funcionamento do organismo. Levando em consideração esses três critérios, é
possível perceber que qualquer planta estimulante não pode, arbitrariamente, ser
considerada um adaptógeno. Tanto porque, para que seja assim considerada, ela

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precisa ter sido intensamente estudada para a verificação de seus efeitos sobre
diferentes sistemas orgânicos, porque deve ser desprovida de qualquer efeito tóxico.
De forma simplista, é possível afirmar que uma planta considerada um adaptógeno
pode ser considerada também uma planta estimulante, mas que o inverso não é
verdadeiro – nem toda planta estimulante atua como um adaptógeno. De qualquer
forma, é importante mencionar essa questão da terminologia, a qual vem sendo
utilizada com maior freqüência no Brasil.
Com relação à constituição química das plantas estimulantes, grande parte
delas (entre as quais já mencionadas aqui) possui algo em comum: a presença de
compostos classificados quimicamente como metilxantinas. As metilxantinas são
compostos que podem se comportar tanto como ácidos quanto como bases e
ocorrem em mais de 50 espécies vegetais. Alguns pesquisadores as consideram
como sendo alcalóides do tipo purínicos, embora exista alguma discussão a
respeito. As metilxantinas mais conhecidas e de maior ocorrência em espécies
vegetais são a cafeína, a teobromina e a teofilina. Do ponto de vista farmacológico,
apresentam uma ampla gama de ações biológicas, em diferentes sistemas
orgânicos; algumas delas são, inclusive, empregadas atualmente no tratamento de
distúrbios respiratórios, como é o caso da teofilina. Sua ação sobre o sistema
nervoso central é pronunciada: agem aumentando a disponibilidade de
neurotransmissores catecolaminérgicos (principalmente dopamina e noradrenalina)
eles atuam como antagonistas de receptores de adenosina (acelerando o
metabolismo neuronal), entre outros mecanismos de ação ainda não totalmente
esclarecidos.
As espécies vegetais estimulantes apresentadas nesta apostila (café, Coffea
arabica; erva-mate, Ilex paraguariensis; e guaraná, Paullinia cupana) foram
escolhidas por dois motivos principais: primeiro, por serem espécies amplamente
utilizadas pela população brasileira em função de suas propriedades estimulantes,
em diferentes regiões brasileiras. E, em segundo lugar, e não menos importante, por
serem espécies que, de alguma forma, caracterizam o folclore, a cultura e a
sociedade brasileira em diferentes aspectos, além de movimentarem um grande
volume financeiro. Em função de todas elas apresentarem usos e efeitos

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popularmente relatados muito semelhantes – como tônico, estimulante, para
combater o cansaço e a fraqueza, para recuperar o vigor e a força, contra
esgotamento mental, entre outros usos relacionados às suas propriedades
estimulantes – não será incluído o tópico USOS POPULARES E EFEITOS
POPULARMENTE RELATADOS que será incluído nos demais módulos (Plantas
Calmantes e Plantas Alucinógenas), a fim de evitar conteúdos repetitivos.

4. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS PLANTAS ALUCINÓGENAS

Na literatura científica, freqüentemente se encontra a expressão “plantas


psicoativas” como sinonímia para “plantas alucinógenas”. No entanto, é de suma
importância uma breve distinção entre as duas expressões. Embora as plantas
alucinógenas sejam plantas psicoativas, uma vez que atuam alterando estados
mentais modulados pelo funcionamento do sistema nervoso central, nem toda planta
psicoativa atua como planta alucinógena. Existe um grande número de plantas que
atuam modificando aspectos da fisiologia do sistema nervoso central sem,
entretanto, produzir alucinações. Mas, afinal, o que são alucinógenos? O que são
alucinações? Muitas definições são propostas para ambos os termos, na
dependência da área de estudo, e o objetivo desta apostila não é discutir a
pertinência de cada definição. Portanto, a definição aqui apresentada nada mais é
do que uma entre várias, e não tem a pretensão de negar as demais; apenas se
mostra mais coerente com o contexto das informações apresentadas.
Alucinações podem ser consideradas como experiências individuais
baseadas na percepção de algo que “não está lá” realmente. A despeito de ser a
percepção de algo que não está presente para os demais, para a pessoa que a
vivencia pode ser tão real quanto ela mesma. As alucinações podem estar presentes
em condições médicas ou ser induzidas por outras situações, entre as quais figuram
as substâncias alucinógenas. Quando associadas a condições médicas, muitas
vezes são chamadas de “psicoses” ou de “quadros psicóticos”, quando o indivíduo
afirma ter a percepção de algo que não é real, como ouvir sons que não estão sendo
produzidos, ter percepções táteis sem origem real, sentir cheiros que não estão

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presentes, entre outras percepções ausentes de objeto. Uma das doenças
caracterizadas pela presença constante de alucinações é conhecida por
esquizofrenia.
Como mencionado, as alucinações podem ser induzidas por outras
situações que não são decorrentes de uma condição médica, ou seja, ocorrem em
indivíduos fisicamente sadios. Uma destas situações é o uso de substâncias
alucinógenas. Alucinógena, portanto, pode ser considerada uma substância capaz
de produzir percepções sem objetos, de alterar o sentido de tempo, de produzir
distorções dos sentidos, tal como conhecemos, e de alterar a organização racional
do pensamento. As substâncias alucinógenas podem ser naturalmente produzidas
por fungos, plantas ou animais ou, ainda, ser sintetizadas artificialmente em
laboratório. O estudo das plantas produtoras de substâncias alucinógenas,
especificamente, tem aumentado vertiginosamente nas últimas décadas por
diferentes razões, e muitos estudiosos da área consideram que os principais motivos
para esse grande aumento do interesse devem-se aos seguintes fatores:
a) Em função dos alucinógenos representarem uma “porta de entrada”
para a compreensão dos intricados processos da mente, uma vez que seus efeitos
afetam grande número de funções mentais humanas;
b) Em virtude de representarem potencialidades terapêuticas, ou seja, de
serem compostos bioativos que poderiam hipoteticamente atuar como
medicamentos;
c) Considerando que o uso de substâncias alucinógenas produz um
quadro muito semelhante aos dos quadros psicóticos presentes em condições
médicas, o estudo do mecanismo de ação dessas substâncias poderia lançar luz à
fisiopatologia de tais condições;
d) Em função do consumo de tais substâncias aumentarem
progressivamente com o passar dos anos.
A essa lista deveria ser acrescentado, embora não o seja com freqüência, o
fato de que essas plantas representam um meio importante para o conhecimento e
entendimento de relações sociais e culturais. Nas quais se desenvolvem em muitas
comunidades as quais possuem como elemento importante de seu contexto cultural

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o uso de plantas psicoativas alucinógenas. Pensar que o interesse pelo tema só é
justificável em termos de que “pode auxiliar a modernidade”, seja na compreensão
do funcionamento cerebral seja na produção de novos medicamentos, é uma visão
excessivamente utilitarista e reduz sua relevância e seu caráter multidisciplinar.
Os seres humanos descobriram que algumas espécies vegetais eram
capazes de alterar a percepção ordinária da mente nos primórdios de sua história, e
mantêm sua utilização até os dias de hoje. Com relação a isso, dois
questionamentos interessantes, resgatados da Introdução Geral desta apostila,
podem ser feitos. Primeiro, o que fez com que as plantas alucinógenas fossem tão
importantes para os homens e seus ancestrais, a ponto dessa utilização ter
sobrevivido até os dias de hoje? Segundo, existe, de um ponto de vista evolutivo,
algum motivo especial pelo qual os homens tenham optado por usar determinadas
espécies alucinógenas, a despeito de suas potencialidades tóxicas? Muitas
hipóteses têm sido formuladas na tentativa de responder a tais questionamentos.
Considerando sempre que representam apenas hipóteses, uma vez que muito
dificilmente os processos históricos podem ser incontestavelmente comprovados,
duas hipóteses para a manutenção do uso de espécies alucinógenas chamam a
atenção.
Uma dessas hipóteses foi formulada recentemente por R. J. Sullivan, do
Departamento de Antropologia da Universidade de Auckland, na Nova Zelândia, e
por E. H. Hagen, do Departamento de Antropologia da Universidade da Califórnia em
Santa Bárbara, nos Estados Unidos, os quais consideram as expressões:
“psicoativos” e “alucinógenos” como sendo sinônimos. De forma bastante resumida,
essa hipótese sugere que os seres humanos tenham compartilhado uma relação co-
evolucionária com as plantas psicotrópicas que data de milhões de anos. Os autores
afirmam que essa relação co-evolucionária se evidencia, tanto pelas muitas
adaptações químicas e ecológicas que os mamíferos desenvolveram para
metabolizar substâncias vegetais psicotrópicas (tais como o sistema de
metabolização hepática), quanto pela estrutura química de compostos vegetais de
defesa (os alcalóides, muitos deles dotados de propriedades alucinógenas). Os
quais se desenvolveram no sentido de mimetizar a estrutura, e interferir na função,

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dos neurotransmissores de mamíferos. Segundo os autores, duas situações podem
ter pressionado essa relação co-evolucionária: a restrição alimentar sofrida por
homens primitivos, que comprometia sua provisão orgânica de aminoácidos
essenciais à síntese de neurotransmissores e os levava a buscar por plantas
dotadas de substâncias análogas, e ao fato dessas substâncias vegetais auxiliarem
na modulação do estresse. Dessa forma, o consumo de substâncias alucinógenas
vegetais, além de prevenir a depleção monoaminérgica, permitia que seus
consumidores tolerassem melhor o estresse causado por condições ambientais
aversivas.
Uma segunda explicação, que não diz respeito a um grupo específico de
autores e, sim, a uma linha de pensamento bastante difundida, considera o papel
religioso ou místico do uso das plantas alucinógenas. Deste ponto de vista, algumas
civilizações, ao ingerir, aplicar ou fumar plantas contendo substâncias alucinógenas,
teriam atribuído às alterações da percepção observadas a formas de contato
espiritual, a deuses, a poderes sagrados e/ou a forças da natureza. Desta maneira,
muitas crenças místicas, religiosas e ritualísticas teriam surgido com base no uso de
espécies vegetais alucinógenas, o que teria contribuído para a manutenção do seu
uso, desta vez não por pressão biológica, mas em função da cultura e da religião. As
duas hipóteses mencionadas, apesar de muito diferentes em sua essência – uma
vez que uma parte do ponto de vista biológico e a outra do ponto de vista cultural –,
não se mostram incompatíveis nem excludentes e, hipoteticamente, podem mesmo
ter ocorrido conjuntamente, ou aliadas a uma série de outros fatores. Inegável é a
ancestralidade do conhecimento humano sobre as espécies vegetais alucinógenas.
No final da década de 60 e início da década de 70 houve uma grande
expansão da curiosidade a respeito de espécies vegetais alucinógenas em todo o
ocidente, em função principalmente do movimento de contracultura, que ganhava
força e se disseminava principalmente entre os jovens da época. Aliado a esse
movimento, o lançamento dos livros do escritor e antropólogo Carlos Castañeda
(The Teachings of Don Juan - a Yaqui way of knowledge, de 1968; A Separate
Reality, de 1971, e Journey to Ixtlan - Lessons of Don Juan, de 1973, lançados no
Brasil com os títulos A Erva do Diabo, Uma Estranha Realidade e Viagem a Ixtlan,

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respectivamente), aumentou ainda mais não só o interesse quanto a curiosidade
sobre o tema. Nesses livros, principalmente no primeiro, o autor faz uma longa
narrativa, descrevendo rituais realizados por um feiticeiro da etnia indígena Yaqui, do
deserto mexicano. O qual utilizava espécies vegetais e um cogumelo como forma de
enxergar o mundo e seus mistérios da forma como ele realmente seria, e não da
forma como aprendemos e/ou fomos condicionados a compreendê-lo. A despeito
das polêmicas sobre a veracidade ou não das experiências relatadas por Carlos
Castañeda, o fato é que a publicação dos livros aguçou ainda mais a curiosidade
das pessoas a respeito das plantas alucinógenas.
Muitas espécies de plantas e fungos podem produzir como parte integrante
de suas funções metabólicas, diferentes substâncias com propriedades
alucinógenas, a grande maioria delas na forma de alcalóides. Alcalóides são
substâncias produzidas também por vegetais e considerados uma das classes de
metabólitos secundários, ou seja, substâncias que geralmente não estão envolvidas
em funções fisiológicas vitais das plantas e que são produzidas secundariamente a
partir de outras substâncias as quais, essas sim, estão envolvidas em processos
vegetais vitais. De forma geral, são aquelas substâncias cujo nome termina no sufixo
“ina”, tais como a cocaína (presente em espécies vegetais, principalmente em
Erythroxylon coca), a dimetiltriptamina (presente em vários gêneros vegetais, tais
como Anadenanthera, Psychotria ou Mimosa, por exemplo), a cafeína, a teobromina,
a teofilina (as três últimas já mencionadas na Introdução ao Estudo de Plantas
Estimulantes), entre outras substâncias também consideradas alcalóides. Dois
pontos, no entanto, são importantes mencionar. O primeiro é que, embora a maioria
dos compostos vegetais alucinógenos pertença à classe dos alcalóides, nem todos
os alcalóides possuem propriedades alucinógenas. E, em segundo lugar, é
importante lembrar que determinados alcalóides podem ser considerados
estimulantes ou alucinógenos na dependência da dose, embora o limite entre essas
duas categorias de efeitos seja consideravelmente tênue.
Embora as espécies vegetais alucinógenas sejam amplamente encontradas
em diferentes regiões do globo, muitas delas encontram maior facilidade de
adaptação em climas tropicais e temperados. Em virtude de tal característica, a

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América Central e a América Latina se destacam como verdadeiras fontes de grande
número dessas espécies vegetais. Estima-se que, só nessas regiões, existam mais
de 90 espécies vegetais utilizadas popularmente em função de suas propriedades
alucinógenas. Essa grande disponibilidade natural de espécies psicoativas talvez
ajude a explicar, pelo menos em parte, a predominância do uso de plantas em
função de seus efeitos sobre o sistema nervoso central, especialmente entre
comunidades descendentes de africanos e em comunidades indígenas brasileiras.
As quais utilizam tais espécies vegetais principalmente associadas a contextos
religiosos e/ou rituais.
Tendo em vista as considerações aqui mencionadas, o objetivo principal do
módulo sobre plantas alucinógenas desta apostila é apresentar informações a
respeito de algumas espécies vegetais consideradas alucinógenas. O critério de
escolha de tais espécies em detrimento de outras se deve tanto à disponibilidade de
informações científicas quanto ao contexto de uso. Assim, serão discutidos aspectos
referentes a duas espécies alucinógenas associadas a um contexto de amplo uso
social vinculado a ostensivas proibições legais (maconha, Cannabis sp, e coca,
Erythroxylon coca), bem como outras espécies associadas a um contexto cultural de
uso (Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis – uma das combinações empregadas
no preparo da ayahuasca). É importante enfatizar que os aspectos referentes à
legislação que regulamenta o uso ou a proibição de tais espécies vegetais não serão
aqui tratados, uma vez que a intenção principal da apostila é discutir informações
nas quais se encontram disponíveis atualmente na literatura científica e não discutir
aspectos legais.

5. CONSIDERAÇÕES GERAIS

Considerando os pontos apresentados nesta Introdução, a presente apostila


visa apresentar informações a respeito de algumas espécies vegetais utilizadas
tradicionalmente em função de suas propriedades psicoativas. O tema será
desenvolvido em quatro Módulos:

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Módulo I – Introdução ao Estudo das Plantas Psicoativas
Módulo II – Plantas Calmantes
Módulo III – Plantas Estimulantes
Módulo IV – Plantas Alucinógenas

Em cada módulo, são apresentadas algumas informações a respeito de


determinadas espécies vegetais utilizadas por populações tradicionais em função de
suas propriedades psicoativas. A escolha das espécies vegetais apresentadas se
fez de acordo com dois critérios: a freqüência de uso pela população brasileira e a
quantidade de informações já divulgadas a respeito de suas propriedades
psicoativas, ou da relevância de tais informações. Muitas outras plantas, tão ou mais
importantes do que as aqui apresentadas, são utilizadas por suas propriedades
psicoativas; no entanto, por não ser o objetivo desta apostila tratar do assunto
exaustivamente e, sim, apresentar uma visão geral sobre algumas das plantas
utilizadas popularmente por seus efeitos psicoativos, a autora considera, para o
momento, o critério de escolha das espécies vegetais, acima apresentado,
adequado.
Sobre cada uma das plantas aqui mencionadas, serão tratados os seguintes
tópicos:

- Nome científico;
- Nomes populares;
- Panorama histórico;
- Informações botânicas;
- Usos populares;
- Dados químicos e farmacológicos;
- Outras considerações, quando necessárias.

Todas as informações aqui apresentadas são baseadas em fontes científicas


e rigorosas, as quais estão listadas na Bibliografia Consultada, apresentada ao final
de cada módulo; no entanto, a autora procurou adaptar ao máximo a linguagem

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impregnada de jargões técnicos dos meios acadêmicos com a finalidade de tornar a
leitura e o aprendizado agradável, fácil e interessante.

----------FIM DO MÓDULO I -----------

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