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Vicissitudes de uma Herança

(Trecho)

Alexei Bueno
in O Patrimônio Construído As 100 mais belas edificações do Brasil

Descoberto pelos portugueses no último ano do século XV, ou seja, apenas


dois anos depois da triunfal chegada de Vasco da Gama a Calicute, resolvendo o
grande problema geocomercial da Europa daquele momento, o caminho marítimo
para o Oriente, é normal que o território onde viria a existir o Brasil - a "Terra
Santa Cruz pouco sabida", ou a "parte também com o pau vermelho nota", nas
duas menções que a ele fez Camões - levantasse uma atenção muito relativa da
Metrópole, no apogeu de sua expansão para leste. O que interessava era a Índia,
a carreira da Índia, onde tantas vidas se perderam e algumas fortunas se fizeram,
depois a China, e depois Cipango, o Japão. A deusa, no dizer de Oliveira Marins,
era a pimenta, e perante ela pouca coisa apareceria. Na avidez da conquista, na
fúria imperialista sem seguidor de Alfonso de Albuquerque, o terrível, no sonho do
enriquecimento fácil tão bem descrito por Diogo do Couto n' O soldado prático, na
escassa população do Reino para manter tão vasto Império, já se sentiam todos
os germes da decadência, essa implacável decadência que sombre-ou de maneira
genial todo o canto de glórias e patriotismo de Os Lusíadas.
Se compararmos, de fato, os monumentos erguidos em Goa nos primeiros
anos desse século XVI com o vazio quase total dos primórdios e a modéstia do
que se ergueu a partir da década de 1530 no Brasil, perceberemos com clareza
quão lenta foi a percepção da importância da nova colônia para o Reino, até que a
decadência do Oriente e a marcha implacável dos ciclos econômicos - do simples
extrativismo costeiro do pau-brasil até a fabulosa expansão açucareira,
culminando no século XVIII com a vertiginosa corrida ao ouro e aos diamantes -
fizessem do Brasil a nova índia para Portugal, o novo território de expansão, e,
finalmente, mais tarde, o baluarte econômico do Reino, transformando-se por fim,
com a fuga da família real em 1807 e a sua chegada no ano seguinte, em sede do
próprio Reino. A estranha, desconhecida e pouco prezada terra de Santa Cruz foi
assumindo passo a passo maior importância nas preocupações da Metrópole, e a
isso não podem ter sido estranhas as tentativas de invasão, a francesa no século
XVI e a holandesa, longa e realizada, no século XVII, durante a extrema
decadência do Reino reincorporado à coroa de Espanha depois da loucura de
Alcácer-Quibir e da melancólica morte do Cardeal D. Henrique.
Desses primeiros anos nada restou, exceção feita aos padrões de descoberta
plantados em pontos diversos do litoral, destacadamente, por motivos óbvios, o
de Porto Seguro. Esses toscos monólitos em pedra portuguesa, gastos pelas
intempéries e estampando geralmente as quinas e a cruz de Cristo em suas faces,
são de fato os primeiros monumentos materiais de uma civilização européia no
Brasil, merecedores da justa veneração que os cerca.
Do período inicial, nos primeiros núcleos fundados, São Vicente em 1532,
Olinda e Igaraçu em 1535, Salvador em 1549, São Paulo em 1554, Rio de Janeiro
em 1565, sobreviveram uns poucos resquícios, especialmente de arquitetura
militar ou religiosa, pois da civil praticamente nada restou do primeiro século,
exceção feita às poderosas ruínas da Casa da Torre de Garcia d'Ávila, ponto de
expansão pecuária por grande parte do sertão nordestino. Se boa parte das
primeiras construções erguidas em nosso território foi de taipa de pilão e
cobertura de palha, essas tiveram existência efêmera, as paliçadas sendo
substituídas por mais eficazes muralhas de pedra e cal, as pequenas capelas
reconstruídas em alvenaria e depois substituídas por igrejas, e assim por diante.
Desde esse primeiro momento, no entanto, uma dicotomia, que teria grande
duração, ficou marcada.
No litoral, com a maior abundância de pedra e de concheiros - muitos deles
sambaquis, restos da ocupação humana primitiva que pareciam ser comuns em
toda a costa - para a fabricação da cal, predominou uma arquitetura de alvenaria
de pedra, enquanto no interior, especialmente em Piratininga, de onde se
espalharia pelos sertões do Brasil através das bandeiras e monções, estabeleceu-
se uma arquitetura do barro, taipa de pilão, sobretudo, mas também adobe,
técnicas construtivas que seriam dominantes em São Paulo até o século XIX, daí
passando para Minas Gerais - em que a abundância de rocha e a prosperidade
econômica logo fizeram com que a arquitetura em alvenaria prevalecesse - e para
as regiões do planalto e do extremo oeste, Goiás e depois Mato Grosso, onde o
segundo sistema foi de grande duração.
A história dessas primeiras relíquias edificadas no Brasil é, portanto, uma
história condicionada a alguns fatores importantes: a lentidão do início da
colonização, o caráter provisório ou passível de ampliação das primeiras
construções e também, obviamente, o vandalismo em tempos modernos, que
destruiu alguns dos mais importantes remanescentes desse período. Grosso
modo, quase todos os edifícios sobreviventes do primeiro século sofreram uma ou
outra alteração, pois tiveram mais tempo que os outros para passarem por isso,
mas sem às vezes alterar o seu caráter arquitetônico.
Da arquitetura religiosa, merecem destaque algumas das igrejas com
residência anexa jesuíta, como os veneráveis exemplares de Reritiba e Nova
Almeida do Espírito Santo, assim como, no que se refere às igrejas de colégio, a
de Nossa Senhora da Graça, em Olinda. Igreja também de aldeamento, com toda
a feição da época e precioso retábulo da passagem do XVI para o XVII, é a de São
Lourenço dos Índios, em Niterói. No que diz respeito às igrejas de conjuntos
conventuais, muitas vezes, pela própria ocupação contínua, muito restauradas,
lembraríamos a do extinto convento do Carmo, em Olinda. Finalmente, das
matrizes ou capelas das vilas, a famosa igreja de São Cosme e São Damião de
Igaraçu, a igreja matriz de Nossa Senhora das Neves na ilha da Maré, a igreja da
Misericórdia em Porto Seguro, e umas poucas outras.

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