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PROFECIAS

GÊNESE DA II OBRA ............................................................................................................................................... 1

I. O PORVIR DO MUNDO ...................................................................................................................................... 12

II. O PENSAMENTO E A VONTADE DA HISTÓRIA ....................................................................................... 18

III. AS TRÊS REVOLUÇÕES E A TERCEIRA IDÉIA ....................................................................................... 24

IV. OS TEMPOS SAO CHEGADOS. A SALVAÇÃO DO MUNDO .................................................................. 32

V. A FUNÇÃO HISTÓRICA DO BRASIL NO MUNDO ..................................................................................... 38

VI. O APOCALIPSE (1a Parte) ............................................................................................................................... 43

VII. O APOCALIPSE (2a Parte) .............................................................................................................................. 49

VIII. NOSTRADAMUS, MALAQUIAS, ASTROLOGIA, AS PIRÂMIDES, DANIEL ................................... 55

Vida e Obra de Pietro Ubaldi (Sinopse)....................................................................................página de fundo


Pietro Ubaldi PROFECIAS 1
Nestes três anos, tenho visto a mão de Deus trabalhando
PROFECIAS junto a mim, realizando uma serie de milagres, uns após outros.
Contra qualquer probabilidade ou possibilidade humana, tenho
GÊNESE DA II OBRA visto o bem triunfar. Tenho visto e tenho tocado com as mãos.
Agora, já não é mais possível duvidar. Já tenho as provas, estou
Estou escrevendo em terra brasileira, em São Vicente, sua certo do futuro. Sobre elas levantar-se-á a nova construção,
“célula mater”, no Natal de 1955, três anos após haver desem- obra de Cristo. E as forças do mal nada poderão contra ela.
barcado, a 8 de dezembro de 1952, nesta minha nova pátria. E o Não se trata de qualquer fé nebulosa ou fantástica, mas de
faço às vésperas do lançamento de uma segunda obra, de doze uma férrea crença, porque racional e experimentalmente constru-
volumes qual a primeira, nova obra que pode ser denominada ída sobre fatos. Procedamos, pois, sem delongas, a seu exame.
brasileira, em relação à anterior que foi a italiana. O desenvolvimento lógico das forças de minha vida segue
À guisa de conclusão desta, bem como ponto de ligação um ritmo – em períodos de vinte anos – que começou aos meus
com a II Obra, resumimos em seu 1 o volume, Comentários, cinco anos, quando ingressei na escola primária.
uma série de documentos que, encerrando a I Obra, também No meu primeiro período de vinte anos, dos 5 aos 25, for-
abre as portas à segunda. mei meu corpo físico de adulto e, na escola, aprendi a mecânica
Agora, aqui se explica a gênese desta II Obra. Narrarei, as- do conhecimento (mas não o conhecimento), isto é, aprendi a
sim, eu mesmo, este primeiro período de minha história brasi- estudar por minha conta. Por fim, formei-me em Direito.
leira, uma vez que minha vida é conhecida publicamente só até No final de cada período de minha vida, ao iniciar-se o
1951, quando foi escrita. seguinte, sobrevém algo de diferente, qual seja uma viagem
Devo explicar tudo isso para que se possa compreender, e, logo após, uma mudança de ambiente. Esse movimento,
além de todos os comentários e juízos feitos a respeito do meu que pode ser dividido em três fases, preenche exatamente o
trabalho e dos acontecimentos nestes meus primeiros três anos espaço de três anos.
brasileiros, o verdadeiro significado de tudo, observando em Nascido em agosto de 1886, ingressei no curso primário em
profundidade. Devo fazer compreender o sentido desses fatos, outubro de 1891. Ao término do 1 o período, em junho de 1910,
que passou despercebido a muitos, embora sua grande impor- encerrava meu curso jurídico, com 24 anos de idade. No verão
tância. Isso porque, nestes três anos de requintado sofrimento de 1911, aos 25 anos, fiz uma viagem aos Estados Unidos da
pelo assalto das forças do mal, não somente o bem venceu, mas América e em agosto de 1912 casei-me, aos 26 anos.
essa vitória nos colocou ante os olhos as provas evidentes de Iniciou-se, assim, o 2o período, que vai dos 25 aos 45 anos.
que minha missão no Brasil é verdadeira. Deixei o lar paterno e tive que defrontar o mundo, iniciando
E, realmente, nesse período foram lançados os alicerces uma vida diversa, de responsabilidade e de luta, mas interior-
dessa missão e o edifício começa agora a elevar-se. mente de sofrimento e de profunda maturação espiritual.
Poderei também, destarte, explicar o aparecimento desta II No 3o período, que decorre dos 45 aos 65 anos, repetem-
Obra, que agora é apresentada ao público brasileiro, bem como se, a uma distância de vinte anos, os mesmos movimentos.
suas características e significação. Aos meus 44 anos, em 1930, obtive por concurso a cátedra de
Trata-se, portanto, de esclarecimentos necessários nesta no- professor de Inglês nos ginásios e liceus do Estado Italiano.
va e grande mudança de minha vida, em que se inicia um perí- Em setembro, nos fins do verão de 1931 – final do meu 45 o
odo de realização prática no Brasil, após o período teórico itali- ano – viajei para a distante Sicília, iniciando meu primeiro
ano, quando somente escrevi livros (I Obra). ano de magistério. Um ano depois, em setembro de 1932, aos
No volume precedente, Comentários, com que se inicia a 46 anos, transferi-me definitivamente para Gubbio, onde per-
presente II Obra, foi lançado um olhar retrospectivo para a his- maneci vinte anos. Isso significou outra viagem, após aprova-
tória da I Obra, italiana. Nesta introdução à II Obra, lançamos, ção em novo concurso, trazendo nova mudança de ambiente,
ao contrário, um olhar para nosso futuro trabalho, demarcando que iria perdurar por 20 anos. Após a maturação espiritual do
as novas posições sobre as quais edificaremos o novo edifício. período precedente, ao iniciar-se esse 3o período, eu havia ce-
Exporemos o problema com inteligência e bondade, sem dido a outros minhas riquezas e me pusera a ganhar a vida
rancores (como fazem geralmente os vencidos), antes, com a com meu trabalho. Foi nesse intervalo de tempo, na Sicília,
generosidade do vencedor. Estudá-lo-emos racionalmente, que surgiu o fenômeno inspirativo, desenvolvido posterior-
sem animosidade, para demonstrar aos incrédulos, e também mente em Gubbio, onde nasceu quase toda a I Obra, já publi-
aos mais fervorosos adeptos de qualquer religião, que Deus é, cada. Período de solidão, de trabalho e de introspecção, em
na verdade, onipresente e operante também na Terra e que que se deu a produção conceptual dos livros.
Sua lei é verdadeira. Tive que narrar tudo isso, a fim de dar a conhecer o despon-
Damos a palavra aos fatos. Eles demonstram que o bem é tar e o desenvolvimento do período atual.
realmente mais forte e sabe vencer todos os obstáculos da mal- Já se iniciou o 4o e último período de minha vida. Na Pás-
dade. O objetivo é oferecer uma útil lição moral. coa de 1950, aos meus 64 anos, Sua Voz me disse, como já ve-
Este trabalho será realizado em duas fases. A primeira, remos, que a ordem era minha mudança para o Brasil, onde de-
mais breve, representada pelo presente capítulo, para explicar veria cumprir uma missão. Era um novo trabalho, uma nova
o caso vivido e suas consequências. Posteriormente, uma se- transformação, como a realização posterior de um novo exame.
gunda, mais ampla, com a finalidade de demonstrar e desen- No verão de 1951, aos 65 anos, surge o motivo da viagem, e
volver, sobre bases experimentais, a teoria da defesa através eu realizo a primeira série de conferências no Brasil.
do método evangélico da não resistência e da luta conduzida Um ano depois reaparece o motivo da mudança, e em 1952,
sem armas humanas, mas tão somente com o poder do conhe- aos meus 66 anos, fixo residência no Brasil, com minha família,
cimento e da bondade. Esta segunda fase será desenvolvida no em caráter definitivo.
volume A Grande Batalha. Uma tão evidente regularidade rítmica no desenvolvimento
Dos choques sofridos grandes ensinamentos obtive. Apenas, do fenômeno torna quase certa a hipótese de que ele deva con-
para cumprir minha missão, tive que descer do terreno teórico tinuar a desenvolver-se, sob a mesma lei e o mesmo ritmo,
de simples escritor para o terreno prático das realizações. E, se igualmente no futuro.
agora estou escrevendo sobre o assunto, é tão-somente para Já conhecemos três períodos de minha vida, isto é, três
comunicar conhecimentos que podem ser úteis aos outros. quartas partes do fenômeno. Assim sendo, temos motivos pa-
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o
ra admitir que o último período – ou o 4 do fenômeno – de- estiveres cansado e sem forças, abandona-te a mim, e eu traba-
verá continuar a desenvolver-se conforme a mesma lei que lharei por ti. Não te preocupes por tua família. Também ela será
até agora guiou seu movimento. socorrida e resguardada de todo perigo. Não te dei provas até
Deveremos, portanto, aceitar que me espera no Brasil um hoje de minha presença ativa e contínua nesse sentido? Por que
novo período de vinte anos, completando-se assim minha mis- haveria de abandonar-te agora? Vencerás. Este é o meu aviso,
são. Na verdade, meus hábitos tiveram que sofrer aqui uma ra- nesta minha Páscoa da Ressurreição de 1950!
dical mudança. E, havendo eu, precisamente nessa ocasião, “No volume que bem denominaste Cristo, Eu te espero para
terminado meu tempo de serviço no magistério, encontrava-me falar-te. Tu, que transpões os tempos com a tua missão, agora
livre, podendo afastar-me definitivamente da Itália. começarás a ressurgir e, aos poucos, continuarás a subir na minha
Examinando em profundidade minha vida, percebi nela um alegria e na vitória de teu encargo. Alegra-te, Pedro, porque ago-
desenvolvimento lógico de termos sucessivos, que se apoiam ra ressurges na minha ressurreição, e as forças do mal não preva-
um sobre o outro, ordenadamente. Qual conclusão lógica de to- lecerão. Vai e anuncia ao mundo a minha nova civilização do es-
do o desenvolvimento, surge este último período, de realização pírito. Esta é a minha determinação de hoje, Páscoa de 1950”.
prática da missão, completando o edifício. Incrédulo, não admiti que pudesse acontecer o que então pa-
A conclusão é que o atual 4o e último período de minha vida recia irrealizável.
– de divulgação ativa e realização prática – deverá durar até os Esperei a confirmação dos acontecimentos, para que me
meus 85 anos, após o que será possível minha desencarnação. fosse possível obedecer. E, contra todas as probabilidades hu-
Desse modo, meu trabalho deverá continuar aqui no Brasil até manas, o prodígio sobreveio. Em julho de 1951 voava para o
1971. E, mais exatamente, caso se repitam os movimentos pre- Brasil, onde permaneci cinco meses. Havia realmente começa-
cedentes, aos meus 84 anos, isto é, em 1970, deverá acontecer, do minha missão no mundo.
após nova ascensão e transformação, a subida a um novo de- Nesse período de realização prática, as coisas aconteciam
grau; aos meus 85 anos, em 1971, a separação do corpo físico; sempre assim: primeiramente chegava o aviso ou ordem de Sua
e aos 86 anos, depois dessa nova grande viagem, nova mudança Voz. Parecendo-me algo de impossível efetivação, esperava eu
de ambiente e trabalho, com minha transferência definitiva para os acontecimentos. E eis que sobrevinham fatos sobre fatos, a
outra forma de vida espiritual. tornarem fácil o incrível. Então, era-me possível obedecer.
Não sabemos, com certeza, se isso acontecerá. Certo é, no Observe-se também outro acontecimento. Estas palavras,
entanto, que esta é a tendência do fenômeno. A harmonia destes que agora se estão transformando em realidade, foram anteri-
ritmos não embarga uma certa elasticidade deles, e pode acon- ormente pronunciadas em uma “visão” a mim concernente, que
tecer também que, no final do processo, retorne o período quin- significa um olhar profético mais amplo sobre o desenvolvi-
quenal do início, os primeiros cinco anos da infância, a serem mento desta minha missão. Essa visão faz parte do volume A
utilizados, então, como repouso final. Nova Civilização do Terceiro Milênio, concluído em 1945 e
Está enquadrada, desse modo, no plano geral de minha vida, publicado na Itália em 1949. Ali, às palavras acima transcritas,
a fase do meu trabalho atual. Temos assim quatro períodos de su- Sua Voz acrescentou: “Vai. Eu te precedo. Segue-me”.
cessão lógica, cada um preparando o seguinte, culminando neste Apresento agora aos céticos esta questão. É possível autos-
atual, que é de conclusão, estimulado e sustentado pelos anterio- sugestionar-se com essas vozes, que poderiam ser produto do
res. Representa tudo isso a razão pela qual nasci neste mundo, o subconsciente ou de ilusão psíquica. Por isso, eu deveria espe-
escopo de minha vida, termo lógico do meu atual destino. rar a confirmação dos fatos. Quando, porém, depois do anúncio
Temos, por conseguinte, quatro períodos: de diretivas e acontecimentos aparentemente irrealizáveis na
1o período: formação exterior, física e cultural – dos 5 aos ocasião, os acontecimentos, que certamente não posso coman-
25 anos, isto é, de 1891 a 1911. dar, começam por si mesmos a dispor-se em ordem, convergin-
2o período: maturação interior, espiritual, na dor – dos 25 do para o mesmo fim, em direção à plena realização do que en-
aos 45 anos, isto é, de 1911 a 1931. tão parecia utópico, quando tudo isso acontece, como eu mes-
3o período: primeira manifestação espiritual (fenômeno ins- mo vi, pergunto se é lícito falar de autossugestão, ou se é possí-
pirativo e produção conceptual dos livros) – dos 45 aos 65 anos, vel admitir que essa autossugestão possa ter o poder de movi-
isto é, de 1931 a 1951 (período do magistério em Gubbio). mentar coisas do mundo exterior e coordenar, para um fim de-
4o período: realização concreta da missão – dos 65 aos 85 terminado, os atos de muitas pessoas.
anos, isto é, de 1951 a 1971 (período brasileiro). Acrescente-se que essas pessoas são muitas, desconheci-
◘ ◘ ◘ das umas das outras, ignorando o objetivo pelo qual traba-
Observemos agora, mais de perto, os mais próximos antece- lham; pessoas independentes de mim, que frequentemente não
dentes de minha transferência para o Brasil, expondo o como e conheço e sobre as quais não posso nem quero influir. Entre-
o porquê me encontro atualmente aqui. tanto essas pessoas trabalham harmonicamente, coordenadas
O primeiro aviso de tão grande mudança me foi dado quan- na direção de uma única meta, que torna real a ordem que me
do isso parecia absolutamente irrealizável, na Páscoa de 1950, fora anunciada, quando seu cumprimento a todos parecia im-
ano em que despontava a primeira alvorada do III Milênio, cujo possível. E cada uma dessas pessoas aparece no momento
sol nascerá em 2.000. Foi quando Sua Voz, na manhã de do- exato, ajustada ao particular trabalho que deve executar. Apa-
mingo, na hora em que Cristo ressuscitou, me disse, textual- rece inesperadamente, não procurada por mim, faz o que deve
mente, estas palavras claríssimas e fortes: “Vai ao Brasil. A ho- fazer e depois desaparece para sempre.
ra chegou. Esta é a hora em que se cumpre a tua missão. Vai! A inteligência que tudo dirige para o objetivo que me fora
Ou agora ou nunca mais!”. preanunciado, independente de mim, não está nessas pessoas,
Acrescentou, logo após, respondendo às minhas dúvidas e porquanto cada uma delas leva a efeito seu pequeno serviço, ig-
fortificando-me: “Vai! Outros continentes te esperam. Não per- norando o plano geral, em que todas, no entanto, tomam parte.
cebes a convergência nessa direção de todas as forças de teu A presença de tal inteligência não pode ser negada, pois
destino? Está escrito: irás e vencerás. Vai, filho meu, pois não tenho presenciado fatos que seriam inexplicáveis sem ela. E
podes imobilizar um impulso que se completa após vinte anos. não somente eu, mas muitos céticos também os viram e não
Serás arremessado e não poderás parar enquanto não atingires o puderam negar.
alvo. Tudo está preparado e nada te faltará até o fim. Não te- Não podemos senão perguntar, diante do que temos visto,
mas. Confia em mim que te tenho protegido sempre. Quando onde se encontra a causa de tais efeitos. Estes são indiscutivel-
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mente inteligentes. A sua causa deve ser, por conseguinte, Estava preocupado em face das novas e inesperadas pers-
também inteligente. pectivas que se abriam diante de mim. Aceitava-as no espírito
Então a presença de uma mente que dirige e uma vontade de obediência, como sempre. Como poderia, no entanto, cum-
que comanda se tornam evidentes, como única hipótese capaz prir no Brasil uma tão ampla missão?
de nos de tudo uma explicação, que de outro modo nos faltaria. Foi então que Sua Voz me disse, entre as suas mensagens, es-
E, se a causa não se encontra nos seres humanos em ação, tas palavras, inacreditáveis para mim no momento: “O mundo vi-
isso quer dizer que ela deve estar localizada em um outro rá a teu encontro e te ajudará em tudo o que te for necessário”.
mundo, que escapa aos nossos sentidos e também dirige o Era a promessa da ajuda material indispensável ao cumpri-
nosso mundo visível. mento da missão. A essa promessa me refiro porque, depois,
Os seres humanos que vemos em atividade são, destarte, prodigiosamente, ela jamais malogrou, e de nada senti carência,
apenas instrumentos, movidos por impulsos não-terrenos. Aos nunca. Por ela se explicam os fatos que agora são expostos.
efeitos visíveis, que claramente percebemos, não podemos dei- Esta minha missão já havia sido anunciada em suas linhas
xar de atribuir uma causa. Dessa rigorosa lógica não se pode sa- gerais, e seu desenvolvimento foi descrito na “visão” acima re-
ir senão atribuindo a esses efeitos uma causa situada em outros ferida, no livro A Nova Civilização do Terceiro Milênio.
ambientes além do nosso, material e já conhecido. Agora, porém, tudo se concretiza. Não mais somente ideias
Os fatos, portanto, nos provam, neste nosso caso, a presença
gerais, mas um desencadear de acontecimentos. E tudo era
de forças espirituais que dirigem os movimentos, meus e de ou-
anunciado de modo objetivo e pormenorizado, pois era chegada
trem, necessários ao cumprimento de minha missão.
a hora de enfrentar a realização prática. Passava-se das palavras
Em resumo, temos: 1o) o pré-aviso ou ordem para algo que,
aos fatos. E tudo haveria de acontecer depois.
no momento, não parece realizável; 2o) a distribuição dos acon-
tecimentos em posições coordenadas para a realização desse ◘ ◘ ◘
aviso preliminar ou ordem; 3o) sua plena efetivação, sem que eu Eis que, logo após, surge uma segunda e mais precisa con-
haja pensado ou agido com esse objetivo, mas apenas procura- firmação. Na noite de 17 de agosto de 1951, em Pedro Leopol-
do obedecer; 4o) a superação de todos os obstáculos, pois o po- do, Minas Gerais, estava eu sentado à mesa, em frente ao famo-
der dessa inteligência e vontade dirigente é tão grande, que so Chico Xavier. Doze pessoas estavam presentes. Enquanto
sempre vence qualquer barreira. Assim sendo, não se pode ex- ele escrevia uma mensagem de São Francisco de Assis, eu me
plicar tudo isso, quer em seu aspecto profético, quer em sua fei- senti, inesperadamente, impulsionado a escrever uma outra, de
ção prodigiosa, senão vendo em tudo a mão de Deus. igual conteúdo e concordante nos conceitos, como foi posteri-
Quis relatar todas essas coisas com o fito de fazer compre- ormente verificado por muitos.
ender que as diretivas de meu trabalho não partem de mim e As duas “Mensagens” foram depois publicadas e considera-
muito menos podem ser dadas por qualquer criatura humana. das autênticas. Devemos, assim, aceitar suas palavras.
Nesta missão, tanto eu quanto aqueles que de mim se apro- A mensagem de Sua Voz me dizia: “Hoje é chegada a hora,
ximam para nela colaborar não podemos deixar de ser, todos e Eu te digo: Ergue-te e trabalha. Eis que se inicia uma nova fa-
nós, senão instrumentos dessa inteligência e vontade superior se de tua missão na Terra e, precisamente, no Brasil... O Brasil
que tudo quer e guia. é verdadeiramente a terra escolhida para berço desta nova e
Desse modo se entende claramente como os elementos es- grande ideia que redimirá o mundo. Agora, a tua missão é
tranhos que se aproximam desta obra apenas para sujeitá-la a acompanhá-la com tua presença e desenvolvê-la com a ação, de
seus fins particulares, são imediata e facilmente afastados do forma concreta. Todos os recursos te serão proporcionados...
campo de trabalho por aquele mesmo poder dirigente. Tudo já está determinado, e nada pode ser interrompido... As
Deus os chama. Se são honestos e obedientes, permane- forças do bem são mais poderosas e têm de vencer... Pedro,
cem. De outra forma, alguns são tão-somente utilizados para a confio-te esta nova terra, o Brasil, a terra que deves cultivar.
Obra, enquanto seguem suas miragens pessoais, que as forças Trabalho imenso, mas terás imensos auxílios. Estou contigo, e
superiores permitem apareçam ante seus olhos, pois não há as forças do mal não prevalecerão...”.
outro meio de fazê-los agir, visto que sem uma finalidade ego- A mensagem recebida por Chico confirmou-a com estas pa-
ísta nada fariam. Assim, estes últimos acabam realizando um lavras: “Não te detenhas. Caminha! ... Ilumina a estrada, bus-
labor útil para a missão, mas completamente diferente daquele cando a lâmpada do Mestre, que jamais nos faltou. Avança...
que desejariam e acreditariam poder realizar para vantagem Cristo em nós, conosco, por nós e em nosso favor, é o cristia-
pessoal. Executam, dessa maneira, um trabalho de que nada nismo que precisamos reviver à frente das tempestades, de cu-
entendem. Ao terminá-lo, são naturalmente afastados, por- jas trevas nascerá o esplendor do III Milênio...”
quanto, objetivando tão-só fins egoístas, transformam-se em
Para quem crê nas mensagens mediúnicas, tudo isso deverá
obstáculos e, por isso, são eliminados, a fim de que somente o
verificar-se. Para quem não as aceita, existe a prova dos fatos,
bem seja vencedor, como é lei nas obras de Deus.
que mostram, como veremos, estarem essas mensagens se
Aí também se vê a aplicação de um princípio geral, segundo
cumprindo com total precisão.
o qual as forças malignas acabam por trabalhar sempre em fa-
vor das forças do bem. Desse modo, acompanhando o mesmo pensamento, conti-
Expusemos tudo isso para que se possa compreender melhor nua sempre a série de pré-avisos e ordens, dando-se em seguida
os acontecimentos que agora vamos narrar. a sua exata execução.
◘ ◘ ◘ A missão preanunciada é, como se verifica, sempre mais e
Com esses pré-avisos e ordens, Sua Voz acompanhava meu mais confirmada com palavras e mantida pelos fatos, que a vão
trabalho, para guiar-me e sustentar-me. guiando para sua plena realização.
Um outro contato importante aconteceu em 1951, aqui no ◘ ◘ ◘
Brasil. Na noite de 6 de agosto desse ano, momentos antes Terminada a serie de conferências, de norte a sul deste
de encaminhar-me para o Teatro Municipal de São Paulo, a imenso Brasil, descia eu em Roma, do avião proveniente do
fim de realizar uma conferencia, recolhi-me no silêncio do Rio de Janeiro, na véspera do Natal de 1951.
meu quarto. Percebi claramente que estava chegando a uma Na Páscoa do ano seguinte, 1952, em Assis, junto ao túmulo
nova curva do meu destino. Iniciava-se para mim uma nova de São Francisco, Sua Voz me disse: “Prepara-te. Viajarás
vida, pública, após o precedente vintênio de introspecção e com toda a tua família no final deste ano. O próximo Natal
silêncio na solidão de Gubbio. passarás no Brasil. É como se tudo já tivesse acontecido”.
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Pronto a obedecer, como sempre, esperei que os aconteci- Agora, diferentemente, deveria habituar-me a viver numa
mentos tornassem possível o que, então, parecia irrealizável. casa aonde qualquer pessoa poderia chegar, a qualquer hora,
Não é fácil para alguém quase septuagenário e, além disso, sem com pleno direito de ser recebida e escutada. Considere-se ain-
recursos transferir-se com a família – esposa, filha e duas crian- da o clima cálido e a alimentação completamente diversa. Urgia
ças – para um outro hemisfério. Só por um prodígio poderia isso também o indispensável trabalho de dominar o novo idioma,
acontecer. A verdade, no entanto, é que o prodígio aconteceu. sem o que não seria possível o necessário relacionamento, para
Aqueles que depois, aqui no Brasil, me reprovaram por ha- compreender e ser compreendido.
ver cometido essa imprudência, quase loucura (como disseram), A tudo isso acrescentando-se o grave dever de sustentar e
de transferir-me com toda a família para cá, não conhecem o defender uma família, cujo único sustentáculo era eu.
poder irresistível das ordens espirituais nem sabem da impossi- Chegara ao Brasil cansadíssimo da viagem de 1951 e dos
bilidade de se desobedecer a essas forças do Alto, às quais acei- preparativos da transferência para cá, em 1952. Confiante, so-
tei ligar-me incondicionalmente. nhava lançar-me nos braços dos amigos que já conhecia e entre
Em 1952, ano de exaustiva preparação para a viagem, pude eles viver em paz, para escrever meus livros.
observar uma série contínua de prodígios. Pessoas cépticas tam- Desenrolaram-se as coisas, porém, diferentemente. Sobre-
bém os testemunharam e tiveram de reconhecê-los como tais. veio, ao contrário, uma nova prova, bem dura para mim. Agora,
Citarei apenas um. Faltavam quinze dias para a partida do reconheço que ela despontou não somente conforme a lógica do
navio, quando, inesperadamente, surgiram imprevisíveis difi- desenvolvimento de meu destino, mas foi sobretudo útil.
culdades de alguns documentos para o passaporte, dificuldades E isso por duas razões: 1a) para amadurecer ainda mais mi-
que não seriam superadas antes de três meses. Circulava, de- nha personalidade, coisa necessária à minha renovação em um
sesperançado, de uma repartição para outra, quando minha filha ambiente novo, com vistas ao empreendimento de um trabalho
me disse que aquele era um momento apropriado para que diverso; 2a) para lançar as bases de minha missão com um
acontecesse um milagre, caso contrário teríamos que adiar a vi- exemplo vivido, manifesto a todos, em que varias pessoas hou-
agem, e ninguém saberia para quando. Isto porque enormes di- vessem tomado parte, um exemplo que não deixasse dúvidas
ficuldades haveriam de surgir com o adiamento, uma vez que, sobre a natureza da Obra.
assim, a viagem só poderia ser realizada em pleno inverno, en- É este o lado mais importante do problema, por encerrar
frentando frio e neve. E o milagre aconteceu. um grande conteúdo moral. É para mostrar isso, é para paten-
Aparentemente por acaso, encontrei naquelas repartições tear o íntimo valor dos acontecimentos espiritualmente con-
um ex-aluno, advogado, que era justamente o secretário da pes- siderados, é para realizar uma obra de bem que estou escre-
soa de quem dependia o caso, e tudo foi facilmente conseguido vendo estas coisas.
e resolvido em apenas três dias. E foi nesse sentido do bem que Cristo quis este exemplo, a
Assim sendo, viajei na ocasião programada, saindo de Gê- fim de que a missão, no início de sua fase pública de realização,
nova em fins de novembro. Por ocasião do embarque, Sua Voz lançasse, com fatos positivos e verdadeiros, seus sólidos fun-
me disse: “Eu mesmo guiarei o navio. Será uma travessia es- damentos na realidade experimentada e concreta.
plêndida, calmíssima, sem tempestades. Isso te provará minha Não espere o leitor uma crônica pormenorizada de tais
presença, que luzirá na proa; serei o timoneiro de tua nave”. acontecimentos, com nomes e lugares. O escopo deste escrito
E assim realmente sucedeu. O pessoal de bordo confessou não é uma defesa minha, nem uma reação pessoal. Não estou
que raramente havia visto uma travessia tão tranquila. escrevendo para me queixar ou para acusar, mas sim para estu-
Durante a viagem, a proa, muitas vezes, estava na direção dar como funciona a vontade de Deus. Não me interessam as
sul. Avançava majestosa através do Atlântico imenso. E toda razões ou desrazões, nem os pontos de vista humanos.
vez que dela me aproximava, percebia à frente da nave a pre- Ao contrário, extasio-me na contemplação dos planos de
sença luminosa de Cristo, que a guiava para os mares lumino- Deus através dos maravilhosos caminhos do bem, atônito diante
sos do sul, na direção da imensa terra do futuro, o Brasil. E Ele da sabedoria com que vi sua realização. Aqui não aparecerão,
me dizia: “Não temas. Estou contigo. A nave segue a trilha da portanto, as vãs palavras divulgadas a respeito deste caso. Este
minha vontade. Confia-te a mim – vencerás”. é tão-somente um trabalho construtivo, desejoso de demonstrar
A 8 de dezembro de 1952, desembarcava em Santos, onde como o bem é mais forte e, ao remate de tudo, só ele triunfa.
permaneceria definitivamente, residindo naquela mesma praia Esta tese, apenas esboçada aqui, será desenvolvida poste-
onde o Padre Anchieta havia vivido. Tudo havia acontecido riormente, com base nos ensinamentos nascidos das provas
com exatidão, e o Natal de 1952, como me havia sido predito, destes três anos, no 3 o volume da 1 a Trilogia da II Obra, A
foi passado no Brasil. Grande Batalha.
◘ ◘ ◘ Queremos neste capítulo introdutório, bem como nesse pró-
Nesse momento começa minha história brasileira, que já ximo livro, demonstrar o significado e o poder do método da
completou seu terceiro ano. não-resistência defendido no Evangelho; mostrar a técnica do
Esse período representa uma parte interessantíssima no de- seu funcionamento e como, sabendo-se usá-lo, ele representa a
senvolvimento do meu destino. Assinala meu ingresso na vida mais poderosa arma para vencer todas as batalhas, também na
pública, depois de vinte anos de preparação nos solitários silên- Terra, também em nosso triste mundo de astúcias e violências.
cios de Gubbio. Buscarei, desde já, levar para o terreno realístico das lutas
Até então, havia realizado um trabalho de maturação interi- humanas que tenho vivido neste período, vencendo com este sis-
or e de pensamento. Agora, ao invés, deveria viver à disposição tema, essa arrojadíssima tese do Evangelho, que nenhuma pes-
de todos, sem refúgios de silêncio para me concentrar. Um soa tida como prática leva em conta, mas que os acontecimentos
mundo em que já não era possível pensar. destes anos me autorizam a expor aos olhos do mundo cético.
Eu, que jamais havia falado em público, nem mesmo em ita- Daí sua grande importância e daí também convir explicá-los
liano, tive que me tornar um pouco orador, usando a língua por- e entendê-los em seu profundo conteúdo.
tuguesa, e viver viajando de contínuo, sem sossego. Esses fatos concretos, através dos quais foi feita a justiça
Estava acostumado a uma vida solitária, de meditação, nu- de Deus pela Sua própria mão, sem qualquer influência mi-
ma casa aonde ninguém ia, podendo eu, desse modo, dispor ab- nha, premiando ou punindo; esses fatos, repito, fizeram des-
solutamente de meu tempo, abstraindo-me, horas e horas, em pontar uma nova obra, esta que aqui é apresentada. Esses
elevações do pensamento e perdendo contato com o mundo. acontecimentos constituíram o ponto de partida para a 1 a Tri-
Pietro Ubaldi PROFECIAS 5
logia, bem como seu motivo fundamental. E ainda, com gra- to trabalhava realmente, sustentando-me; que eu era impulsio-
ves choques, recompuseram minha personalidade e deram um nado e defendido por forças espirituais (que depois demonstra-
novo endereço ao meu pensamento, naturalmente indispensá- ram seu poder) e, consequentemente, ninguém tinha o poder de
vel para escrever uma nova obra. impedir meu trabalho.
Importa que eu mesmo, que conheço os fatos, os narre sob Assim sendo, quem quer que desejasse utilizar-me para ou-
sua verdadeira luz espiritual. A coisa que mais me abalou, e tros objetivos seus – já que não é possível dominar quem deve
certamente impressionará também o leitor inteligente, foi ver, obedecer a Cristo, único chefe – seria afastado, como realmente
além dos pontos de vista particulares, partidários e utilitários, a depois sucedeu.
maravilhosa presença de Cristo, que tudo guiou, sem que eu o Muitos se aproximaram de mim não para colaborar, mas de-
soubesse, a fim de que Seu pobre instrumento pudesse resistir a sejando utilizar minha vinda ao Brasil para finalidades outras,
tudo e a todos, atingindo insolitamente a vitória. que nada tinham a ver com meu trabalho, antes dificultando-o,
Assim pude, com razão, concluir uma conferência na “Ra- fazendo-me perder tempo e arredando-me da verdadeira estrada.
dio Progresso” de São Paulo, na noite de 6 de agosto de 1955: Mensagens e escritos já conhecidos e publicados falavam
“...Cristo esteve sempre presente e atuante junto a mim claramente e eram suficientes para esclarecer tudo. Entretanto
nesta luta e me salvou. Tenho provas positivas de que assim não foram compreendidos. Com essa finalidade, quis advertir
sucedeu e que isso é real. Esses prodígios são para mim um a quem deveria ter sido o primeiro a compreender, com uma
testemunho seguro de que minha missão é verdadeira e vem da carta datada de 19 de janeiro de 1955, tomando posição defi-
parte de Deus, pois de outro modo não seria assim ajudado. nitiva e preanunciando as consequências. Dessa carta trans-
Milagres como estes não acontecem todo dia e não podem ser crevo aqui as conclusões:
realizados pelos homens. “Ao Brasil, a que dou os anos mais maduros de minha vida,
“Este trabalho não é fantasia. Minha crença é férrea, por- peço, na condição de pobre que sou, o mínimo de recursos ne-
que está concretizada em fatos. As teorias podem ser discuti- cessários para uma vida humana. Acreditei haver vindo para o
das, mas todos compreendem os fatos. Além dos livros, estava Brasil a fim de realizar um trabalho espiritual, e não para cui-
no plano de Deus um exemplo sólido de manifestação das for- dar de negócios. Já perdi, desse modo, dois anos preciosos, que
ças espirituais também no plano do mundo prático; um exem- não voltarão. O fato de que minha missão esteja sendo utiliza-
plo através do qual Cristo desse provas de Sua presença e po- da por alguns em favor de interesses particulares deve cessar
der, permitindo a um instrumento Seu, pobre, desprovido de completamente. O escândalo que ameaça tornar-se público é
quaisquer recursos humanos, vencer todos os obstáculos susci- que a luta pela obtenção de direitos autorais e meios de subsis-
tados por seres poderosos e organizados, para confirmar que a tência, bem como, devido a promessas não cumpridas, por uma
missão é legítima e que nenhum homem tem o poder de sustar indispensável casa para morar, me paralisa no cumprimento de
o que é da vontade de Deus. minha missão. Quem, com isso, tenta deter uma obra de Cristo
“Esta é a grande lição moral que devemos aprender desta lu- assume uma tremenda responsabilidade. Embora não se creia
ta e dos meus sofrimentos. Valeu a pena sofrer, pois os sofri- nela, a verdade é que existe uma lei.
mentos deram seus frutos. Cristo avança, Cristo vence. Nin- “Também eu tenho assumido e assumo minhas responsabi-
guém pode interromper Sua caminhada triunfal aqui na Brasil. lidades diante de Cristo e do Brasil. Cristo está vendo que o de-
“Este é um bom exemplo para todas as religiões e agrupa- sempenho de minha missão não depende de mim e responsabi-
mentos. É uma verdade que pode trazer benefícios sem distin- lizará aqueles que são culpados desse descumprimento. E não
ções, com absoluta imparcialidade e universalidade, que são as nos esqueçamos de que Cristo, além de bom, é poderoso e ja-
duas palavras de minha bandeira. Significam elas: perdoar, mais permitirá à liberdade humana obstruir seus planos. Sendo
abraçar e fazer o bem a todos. estes de alcance histórico, todos as obstáculos serão esmigalha-
“Minha conclusão, despedindo-me hoje de meus caros ami- dos. Isso Sua Voz me pede, neste momento, para afirmar, soli-
gos brasileiros, não é somente de gratidão e amor, mas acima citando ainda que esta carta seja conservada, a fim de que, reli-
de tudo de alegria, e não de tristeza. Não estou aqui para mani- da daqui a alguns anos, seja possível compreender, com as pro-
festar mágoas, nem para condenar ninguém, mas para alegrar- vas dos fatos que virão, o grave significado destas palavras.
me, junto aos bons, com a vitória de Cristo. Se os anos de 1953 “O meu dever é entregar aos espiritistas – porque no Brasil
e 1954 foram anos de luta e sofrimento para mim, este 1955 re- foram eles os primeiros a vir ao meu encontro – assim como a
presenta o início do desenvolvimento de uma missão no Brasil. todos os homens honestos e de boa vontade uma obra ainda
Saio desta luta muito cansado. Lutar durante o dia, cheio de em seu início, cujos planos o mundo ainda não conhece, mas
preocupações, e escrever livros à noite, sozinho, num país no- que me vêm sendo revelados dia a dia. Agora começa o ver-
vo, esgotaria um jovem de vinte anos. dadeira trabalho. Tenho necessidade de amigos que me auxili-
“Se fisicamente está cansado este homem de sessenta e em, e não de especuladores que me utilizem em favor de seus
nove anos que vos está falando, sua alma não se cansou. E interesses. Estas pessoas, é ordem de Sua Voz, devem se dis-
ele quer viver ainda, tão-só para fazer doação total de si tanciar da Obra. Considerando que atrás de mim está Cristo, a
mesmo – mente e coração – a este seu grande e bom amigo, Quem obedeço, esta ordem é acompanhada de invencíveis re-
que é o povo brasileiro”. cursos sobre-humanos para vencer. Neste caso, os engenhos
◘ ◘ ◘ humanos, as astúcias do mundo são o mesmo que lutar com a
Assim começou minha vida brasileira. Bem depressa perce- espada contra a bomba atômica.
bi, entretanto, que me faltavam duas coisas absolutamente ne- “Nestes dois anos, cada um, com suas ações, definiu e jul-
cessárias para quem quer cumprir uma missão: independência gou a si mesmo diante de Deus, colocando-se, portanto, na po-
espiritual e independência econômica. Noutras palavras, num sição desejada em face da Obra. E o mundo também observa.
país plenamente livre, faltava-me a liberdade. É evidente, toda- Eu vivo sob refletores no palco do mundo. Quem de mim se
via, que quem deve obedecer a Deus não pode obedecer aos aproxima é visto sob os mesmos refletores. Também no hemis-
homens. Quem é instrumento do Alto não pode ser instrumento fério norte, a Europa e os Estados Unidos nos olham. E tudo o
de interesses e escopos humanos. que acontece é escrito no livro de Deus, e não se apaga mais.
O erro elementar de alguns companheiros do meu ambiente “Somos todos chamados a colaborar numa obra imensa. Eu
de 1953/1954, que era o mesmo de 1951, foi não haverem não passo de um pobre instrumento que necessita da coopera-
compreendido que minha missão era verdadeira; que nela Cris- ção de outras instrumentos. É chegada a hora de nos colocar-
6 PROFECIAS Pietro Ubaldi
mos a trabalhar, tomando cada um a sua posição exata e bem regularmente, sem pressa, com a calma das coisas eternas, sem
definida. A mensagem de Sua Voz, dada em Pedro Leopoldo, jamais um mínimo engano, me deixavam atônito.
em agosto de 1951, deve tornar-se realidade. Ninguém poderá O acaso poderá favorecer-nos uma vez. Mas o que caracte-
alterar os planos de Cristo. Ninguém poderá detê-los. Hoje, o riza o acaso é, sobretudo, a falta de inteligência e de coordena-
Brasil foi escolhido. Espera-se agora se aceitará ou não. Um ção constante de movimentos com vistas a um fim determina-
novo exército, porém, já se está formando, pois no Brasil as do. O acaso nos poderá fazer vencer uma vez, mas a sorte, re-
almas boas e sinceras são muitíssimas. pentinamente, nos abandona.
“Esta carta objetiva declarar que em 1955 se inicia uma nova Não podia explicar a mim mesmo esta série contínua de
fase, de maior desenvolvimento do plano da missão. Tudo o que prodígios, a não ser pela presença de uma inteligência que tudo
foi feito até agora foi tão-somente uma preparação. Resolvamos guiasse. Assim Cristo tudo comandava e todos vencia.
rapidamente este absurdo a que o mundo está assistindo, isto é, O meu estado de espírito, diante desse ambiente humano, da
que uma obra como esta possa estar à disposição dos interesses primitiva confiança absoluta teve de transformar-se em descon-
de um editor ou do proprietário de uma casa, e nos ponhamos fiança. Comecei a olhar para trás dos bastidores e me arrimei
todos a trabalhar quais instrumentos da mesma obra. O impulso desesperadamente a Cristo, meu único amigo.
já foi dado, o terreno é virgem e fértil. Unamo-nos sob a mesma De forma cristã e fraternal foi dito de mim e dos meus tudo o
bandeira de Cristo, que é o único e verdadeiro senhor desta obra. que se pode inventar de mais calunioso e inverossímil. Embora
“Estas são as diretivas que, neste momento, Sua Voz me de- se dissesse o contrário, na verdade eu não pedia riquezas, porque
termina transmitir, chamando-nos a todos novamente, em face bem sabia não ter nenhum direito a elas. Entretanto pedia, por
da gravidade desta hora”. saber que tinha direito a isso, a palavra sincera do amigo, e não
A resposta que obtive só se refere à parte prática da carta, aquela névoa que me fazia perder o senso da realidade, impe-
de conteúdo econômico, revelando até surpresa pelo fato de dindo-me de prover às minhas necessidades e defender-me.
minha transferência para o Brasil. Nada me foi respondido Sua Voz continuava a amparar-me, avisando-me que bem
quanto à parte espiritual, a mais importante. depressa tudo se transformaria. Eu esperava, obedecendo. E eis
Foi exatamente por prever que a carta não seria compreen- que, de um conjunto de pequenos prodígios, movendo-se su-
dida que se recomendou, como acima está dito, que ela fosse cessiva e coordenadamente na direção de um mesmo objetivo,
conservada, para que, em releitura posterior, fosse entendida nasceu o prodígio maior do afastamento dos amigos da primei-
em face da prova dos fatos que, então, haveriam de confirmá-la. ra hora e o despontar, sob a orientação do Alto, de outros auxí-
A única resposta que obtive foi, assim, o meu arrasamento. lios e novos amigos.
Destarte, ao invés dos auxílios esperadas, encontrei obstá- Vou citar apenas dois desses prodígios menores. Quando,
culos. E pesados obstáculos, pesadíssimos para mim, sozinho, em julho de 1954, me foram cortados os víveres, ou seja, a in-
sem recursos, em país estrangeiro. No entanto todos eles foram dispensável parcela mensal que recebia do editor para viver,
superados. fruto de meu trabalho, nesses mesmos dias caía do céu um
Enquanto, em plena obediência, aceitava as provas das mãos equivalente auxílio, não previsto nem solicitado.
de Deus, a Sua presença me acompanhava, resolvendo tudo. Outra prodígio. Em fevereiro de 1955, no dia 13, um do-
Que eu haja podido não só resistir mas ainda vencer, foi mingo, fui notificado da supressão das parcelas mensais acima
um fato tão prodigioso, que até os crentes duvidaram, che- referidas. Pude finalmente certificar-me de que os prometidos
gando a imaginar uma coisa que eu jamais poderia sonhar, is- auxílios dos amigos falharam. Na segunda-feira 14, o oficial de
to é, que eu houvesse premeditado friamente ardilosíssimos justiça bateu à minha porta com a notificação judicial para de-
planos diabólicos. socupar o apartamento. O ataque desfechava seus golpes deci-
◘ ◘ ◘ sivos, que deveriam derrubar-me, atirando-me à rua, sem meios
Tudo se desdobrava assim... Surgia o obstáculo. Era como para viver. Nessas horas, a minha vida e a de minha família es-
se um muro se elevasse em meio do caminho. Impossível avan- tavam suspensas por um único fio: minha fé em Cristo. Éramos
çar. O terreno se tornava escorregadio, sem apoio firme para os defendidos tão-somente pelas potências espirituais. E elas ven-
pés. Mistérios, equívocos, mal-entendidos, promessas tranquili- ceram. Nesse mesmo dia, de muito longe, sem que nada hou-
zadoras que não se realizavam, esperanças de ajuda que depois vesse pedido, chegou a ajuda para comprar um novo aparta-
se dissipavam, uma atmosfera enganosa de neblinas e miragens, mento, isto é, o dinheiro exato para isso, nem mais nem menos.
um mundo de coisas vagas e inalcançáveis, de palavras cari- Qualquer um poderia pensar que eu houvesse projetado tudo is-
nhosas, afáveis, fraternas, mas vazias, inconsistentes e sem re- so. A verdade, porém, é que eu não planejei nada, e tudo foi um
sultado. Era o mórbido envolvimento do polvo, era o sonho en- miraculoso auxílio de Deus. Como, porém, poderiam admitir
venenado dos entorpecentes, a alucinação em que não se con- esse amparo aqueles que não acreditavam em Deus?
segue mais manter o senso da realidade. Fui, assim, prodigiosamente salvo de golpes duríssimos e
Nesse mundo singular de coisas evanescentes, onde as pala- muito bem calculados pela outra parte para eliminar qualquer
vras assumiam os mais estranhos significados, menos o verda- possibilidade de vitória. Fui salvo contra todas as probabilidades
deiro, nesse mundo de realidade fugaz, somente Sua Voz, fir- humanas, sobre as quais as pessoas práticas firmam suas bases.
me, me advertia sempre: “Tranquiliza-te. Aquele muro cairá. O Salvo pelo socorro das forças espirituais, forças essas ignoradas
obstáculo será superado”. E me preanunciava os acontecimen- completamente por essas pessoas, como o demonstraram.
tos de modo claro e exato, como ninguém o fazia. Diferente- A ilação moral é que a Providência de Deus não é uma ideia
mente de todas as promessas humanas, as Suas se realizavam. vã; muito ao contrário, funciona verdadeiramente, desde que se
Realmente, depois o obstáculo era vencido: o muro tombava. verifiquem as condições necessárias ao seu exercício.
Isso acontecia após circunstâncias imprevistas, não provo- Além de sentir que esse amparo é justo, trazendo vitória,
cadas por mim, mas surgidas espontaneamente, no momento dando um sinal de aprovação de Deus, como se Ele mesmo qui-
preciso, proporcionadas ao objetivo e de natureza capaz de su- sesse subscrever os acontecimentos, devemos observar ainda
perar as dificuldades. um outro fato. Os elementos humanos que desejavam desvirtuar
Observando, verificava que realmente uma inteligência su- a missão, submetendo-a a seus objetivos particulares, puderam
perior comandava tudo, pois eu não poderia saber tanto, não ver, sem a mínima intervenção do instrumento, que tudo perdo-
possuía recursos para poder vencer, nem dirigia de fato meus ou, a derrocada de seus planos e interesses. E isso na forma e
movimentos. Aquelas contínuas vitórias sobre todas as coisas, medida com que haviam procurado sufocar e demolir a Obra.
Pietro Ubaldi PROFECIAS 7
Os atingidos sabem – porque, na verdade, assim aconteceu Cada fenômeno tem sua lei, e nenhum mecanismo pode fun-
com eles – que tudo isso é real, embora não cheguem ainda a cionar senão de acordo com as normas impostas por sua nature-
ver no caso a mão de Deus. E a reação da Lei não se deterá en- za. Todos compreendem que, à força de pancadas, não se pode
quanto tudo o que por eles foi praticado contra ela não tenha si- fazer trabalhar um relógio de precisão nem fazer funcionar um
do compensado e, como querem as forças do bem, que tudo rádio. Se não se seguirem determinadas normas, o instrumento
comandam, até que eles hajam aprendido a lição. não obedece. Não é problema de querer ou não querer.
Como é possível crer que Deus permita que se possa abusar Ora, uma pessoa que escreve por inspiração, assim como
dos ideais e das coisas santas, pelos quais tantos sofrem e se sa- acontece com os artistas ou com quem quer que elabore um tra-
crificam? No entanto esses princípios morais são difundidos e balho original de pensamento, é um instrumento delicadíssimo,
pregados em toda parte, por todas as religiões! Importa com- que sente os efeitos de todas as condições ambientais.
preender que a falta não foi cometida contra mim, que nada va- Não se pode impedir que esse instrumento, pela sua pró-
lho nem mereço defesa; foi contra Deus, contra os princípios pria sensibilidade, registre todas os choques que lhe cheguem
fundamentais de Sua lei. do exterior. Além disso, esses choques a ele transmitidos são
E meu perdão não pode ter a força de impedir a reação da- amplificados pela sua hipersensibilidade e, assim, imprimem-
quela lei. Como pode quem faz uso diariamente desses precei- se na obra que o instrumento produz, nela deixando vestígios
tos ignorar que eles se realizam depois, de fato? profundos. Acontece o mesmo que na radiotransmissão, onde
À vista disso, fui obrigado a publicar avisos na imprensa (e as descargas atmosféricas, que o ouvido humano não poderia
todos os leram), tendo por fim acabar, tanto quanto poderia fa- por si só perceber, transtornam a audição até ao ponto de não
zê-lo, com o sistema de recolhimento de donativos, cuja prove- se ouvir coisa alguma.
niência desconhecia, fundos esses nominalmente destinados a Nesses dois anos, 1953 e 1954, o ambiente estava tão satura-
ajudar-me. Significavam eles, para mim, um peso de responsa- do de distúrbios psíquicos, a atmosfera espiritual se tornara de tal
bilidade moral, embora não me trouxessem, no oceano de pala- modo sufocadora, as vibrações dominantes se manifestavam com
vras destinadas a saciar-me, qualquer sustento que me permitis- tão grande potência destrutiva, que se tornou impossível ouvir e
se cumprir o trabalho de minha missão. registrar uma voz tão sutil como a que devia trazer a lume o livro
◘ ◘ ◘ Cristo. Principiei-a, mas a necessidade de defesa me lançou na
Afastemo-nos, contudo, desse mar de tristezas e dirijamo- peleja, e nela foram absorvidos meu tempo e minhas energias.
nos para praias mais luminosas. Foi necessário abandonar a recepção, que, em tal ambiente, so-
Toda prova tem seu fim, toda paixão deve derramar-se na freria deformações tão pavorosas, que representaria não uma ex-
pressão, mas uma violação do pensamento transmitido.
ressurreição.
Disseram que eu era vítima de ondas barônticas. Mas essas
No requintado tormento de dois anos, havia sida pago o tri-
ondas eram representadas justamente pelo ambiente em que eu
buto de ingresso na nova terra. O batismo de dor recebido as-
caíra. A isso se deve o fato de não haver sido escrito até agora o
semelhava-se a uma investidura do Alto, dando-me direito ao
volume Cristo.
cumprimento da missão, confirmando-a. Nessa profunda mace-
Assim, a I Obra foi interrompida por esse embate inicial. Is-
ração interior, sazonara em mim uma nova personalidade, não
so era inevitável. Nesse período, a missão transformou-se e o
mais mística como em Gubbio, mas de luta no mundo, para ne-
instrumento, habituado a uma atmosfera de solidão e silêncio,
le estabelecer o Evangelho com a evidência dos fatos.
deveria descer ao turbilhão infernal do mundo, porquanto aqui
Se, tudo isso, para quem não compreendia a Lei, violando-a,
se completaria a última fase da missão, com sua atuação vivida.
traduzia-se em destruição, para mim, que havia sofrido para vi- Ele se arriscou a, no mínimo, paralisar seu trabalho, sem poder
ver a Lei, resultava em construção. produzir mais nada. E isso teria acontecido, se não fosse a pro-
Em 1955 houve a “mudança da guarda”, isto é, um outro teção das forças do Alto, que haviam previsto tudo e velavam.
grupo de amigos substituiu o antigo, novos amigos que me tes- De permeio, estava a vontade de Deus, e contra esta nada po-
temunharam a grande bondade do povo brasileiro, em que dem as forças do mal. Ao contrário, elas são utilizadas a serviço
sempre confiei. do bem e, neste caso, concorreram para produzir uma nova ma-
Desta maneira, afastaram-se os elementos negativos que fa- turação do instrumento.
ziam parte do grupo de 1951. A eles, nada mais se pedia. Ape- A dor sempre pode produzir um fruto, sempre pode ser um
nas que não fizessem deter a Obra. Nenhum ressentimento, ne- mal a fecundar um bem.
nhuma reação. Somente Deus sabe e julga; devemos, portanto, Perigo haveria se os homens práticos, que conhecem o
em tudo, confiar-nos a Ele. mundo e sorriem dos sonhadores do ideal, conseguissem des-
O que aconteceu foi tão-somente um ato de legítima defesa, truir tudo e, assim, estancassem a fonte para sempre. Os que di-
para que a missão pudesse cumprir-se, já que ninguém tinha o zem conhecer a vida não compreendem que, para um instru-
direito nem deveria ter o poder de sustar a Obra, pela qual eu mento poder ser utilizado e frutificar, é indispensável lhe sejam
havia sacrificado tudo. concedidas, pela menos, condições de sobrevivência. O espírito
Iniciou-se então, em 1955, o trabalho livre, em que não é algo delicado, que, para poder exercer sua função, deve ser
mais os homens, mas somente Cristo dirigia. Nesse ano foram tratado com inteligência, sinceridade e bondade: bondade subs-
lançadas as bases concretas da missão. Em 1956, começara a tancial, e não apenas de boas maneiras.
elevar-se a nova construção sobre esses fundamentos. Nesse O instrumento, em tais mãos, ter-se-ia arruinado definiti-
período, na verdade, foram escritos os três volumes da 1 a Tri- vamente, se não existissem as leis da vida a protegê-lo. Mas
logia da II Obra. ele não parou de trabalhar, não se deixou destruir. A vida rea-
Estou aqui no Brasil não para desfrutar a vida ou para re- giu nele, e ele se pôs a funcionar de outra maneira. Resistiu,
pousar, mas para cumprir minha missão, ultima consequência não desejou morrer e, para sobreviver, adaptou-se, transfor-
dos primeiros pactos solenes assumidos na Sicília, em 1932. mando-se. Sua atividade, em vista disso, tornou-se diferente, e
Estou aqui para prestar contas do meu trabalho, explicando não seu trabalho foi encaminhado para outra direção. E, assim, de
só as dificuldades superadas, mas também o esforço realizado um mal nasceu um bem, e ele se renovou.
em tão duras condições. Exporei como nasceu a II Obra e o O instrumento recebeu em cheio o abalo e o absorveu em
que aconteceu com a primeira, a fim de nos orientarmos em profundidade. Assim sendo, pelos sábios processos da técnica
face dos acontecimentos e fixar os aspectos característicos des- da vida, o choque se contraverteu, reemergindo transformado
se período de minha vida. em bem. A personalidade do instrumento modificou-se.
8 PROFECIAS Pietro Ubaldi
Se, quando sob a tempestade, não teve condições para pro- Certamente tudo, inclusive esse transe, continuou a ser guia-
duzir o que estava programado, sua produção não cessou, mas do por Deus, com sabedoria e com objetivos benfazejos, que no
tomou rumo diverso, navegando em outros mares, em busca de futuro se revelarão mais claramente. É um fato a grande utilida-
novos horizontes. de moral deste exemplo que o Evangelho nos quis dar da exce-
Daí nasceu uma nova obra, desenvolvendo um novo tema, lência de seus métodos de combate, que, no desdobramento des-
com um estilo novo, sólido, terreno, positivo para os práticos, te caso, provaram ser superiores, vencendo os do mundo. O
um estilo de batalha, adaptado ao mundo, em que a missão deve Evangelho desejou dar-nos uma prova de força, da sua força, pa-
agora cumprir-se. ra que ele seja finalmente tomado em consideração pelo mundo.
Nasceu a II Obra, cujos quatro primeiros volumes, escritos Tenho a satisfação de verificar que, no fundo, esse montante
num ímpeto, nestes primeiros três anos brasileiros, agora apre- de dificuldades não me fez perder tempo, algo, pelo menos para
sentamos. Desse modo, a 1a Trilogia já está completa, enfren- mim, tão precioso, que não me é licito desprezá-lo. Tive a ale-
tando os problemas mais palpitantes da atualidade, com a pala- gria de comprovar que dos obstáculos interpostos Deus não só
vra concebida como ação, para construir na Terra, com as pe- fez surgir novas criações, mas sobretudo possibilitou a confir-
dras das provas evidentes, o novo edifício do Evangelho vivido mação viva e experimental das teorias sustentadas nos livros,
e da nova civilização da III Milênio. teorias que, após a vitória experimental nesta prova de fogo e
◘ ◘ ◘ de resistência ao choque dos fatos, adquiriram agora um valor
Que aconteceu, então, à I Obra? Ela estacionou no décimo positivo imensamente maior.
volume. Não pôde ser concluída. O estado de ânimo de que ela Cristo velava e à Sua presença devo esses tão esplendidos
nasceu foi detido. Permaneceu como que congelado. Entretanto resultados, atingidos em ocasiões realmente difíceis. Comprovei
não morreu, apenas refugiou-se em estratos mais profundos, que Ele não descia tão-somente como conceito nos livros, senão
esperando emergir de novo, um dia, quando findarem os gelos também como ação na vida, para que fosse compreendido.
do inverno e ressurgir a primavera. O prodígio consistiu em se haver extraído tanto bem de tan-
É assim que a vida se defende. A I Obra ficou como uma to mal, sem que ninguém tivesse conseguido destruir a missão.
semente sob o solo, à espera de renascer. Nada se perdeu. Por Ao contrário, das investidas dos rivais em contenda, visando a
certo, o reinício foi somente adiado. E, se um dia o instrumento posse do instrumento para planos particulares, nasceu uma nova
conseguir novamente modelar um ambiente de paz e confiança, obra. Foi, na verdade, maravilhoso que nenhum desses planos
então poderá nascer o livro Cristo. São necessários, entretanto, tivesse conseguido o objetivo desejado. Realmente, o único a
fatos novos, impressões que, num sentido contrário, corrijam os atingir uma finalidade foi aquele dirigido por Cristo, que tudo
precedentes; são necessárias mudanças estáveis, que deem tem- guiava. E aquelas pessoas acima referidas, como já disse, só ob-
po para o instrumento curar-se dos choques recebidos e lhe ga- tiveram como resultado, por si mesmas, o próprio prejuízo e o
rantam a tranquilidade e a confiança necessárias para que tais
afastamento deste trabalho.
livros de sublimação espiritual possam ser escritos.
◘ ◘ ◘
No momento, a I Obra é como um navio emperrado num
A barreira já foi ultrapassada, e em 1956 poderemos apre-
banco de areia, à espera de que o destino lhe envie os ventos
sentar os quatro volumes da II Obra, que são:
que o desencalhem. Por enquanto, o espírito sofreu uma contra-
1o volume: Comentários (Introdução à II Obra)
ção para seu interior, negando-se a manifestações externas. Fe-
I Trilogia:
charam-se as portas para aquela categoria de conceitos, e tudo
2o volume: Profecias (O Futuro do Mundo)
se cala. Até que mude o ambiente, nada aparecerá nem será dito
sobre aquele tema. Numa ambiência qual a destes três últimos 3o volume: Problemas Atuais
anos, o pensamento conexo a Cristo não pode surgir. 4o volume: A Grande Batalha
Acusações mútuas são inúteis. Estabelecidas as causas, as Seguir-se-á a II Trilogia, já em preparação. São até agora
consequências são fatais. Absurdo pretender que a água não ge- quase mil paginas, penoso trabalho realizado sempre à noite,
le a zero grau. Seria necessário não levá-la a essa temperatura. porquanto, durante o dia, ressoava furiosa a tempestade já
Seria preciso não provocar as causas. Uma vez atingido aquele acima narrada.
ponto, a água não pode senão congelar-se. Esta II Obra será toda revista por mim em sua tradução para o
É indispensável inteligência para compreender a delicadeza português, de modo que eu mesmo possa assegurar-me de sua fi-
do instrumento, a fim de não prejudicá-lo. Todavia tal poder de delidade e exatidão. Não conhecendo até pouco tempo o portu-
intuição não se encontra no selvagem plano biológico da luta guês, nenhum controle do gênero me foi possível para a I Obra.
pela seleção e vitória do mais forte. Daí ser fatal o choque, e A II Obra, em boa apresentação gráfica, como a primeira,
assim tem acontecido todas as vezes que um ideal desce à Ter- deverá ser oferecida a um custo unitário relativamente inferior
ra para nela ser implantado. No entanto ele representa o maior ao da outra. Tanto quanto lutei para que meu nome não servisse
estímulo à evolução. de pretexto para recolhimentos de fundos ou negócios, assim o
Os não-sensibilizados não percebem essas coisas, e tudo faço agora, a fim de que meus livros não se tornem mercadoria,
permanece sob a defesa única das sabias leis da vida, que eles permanecendo o mais possível independentes de tudo o que se-
também provam desconhecer. É elementar e evidente que, se ja transação comercial.
desejamos realizar um serviço útil, não podemos usar mal ou Com isso procurarei não só oferecer edições que se benefi-
danificar o mecanismo que lhe é próprio, devemos, antes, dis- ciaram de meu cuidado pessoal, mas ainda continuarei minha
pensar-lhe cuidados, considerando suas exigências naturais, luta contra o dinheiro, que é o maior inimigo de todas as ver-
conforme as leis que o regem. Se, por excesso de exigências dadeiras obras espirituais. Devo fazer declarações importantes
ou por avidez, não se considera essa realidade, desseca-se a sobre o assunto. Nestes anos, foi dito, entre outras coisas, que
fonte. Com tal psicologia podem surgir mártires, mas destrói- eu desejava enriquecer-me. Tenho absoluta necessidade, para
se o trabalhador e sua produção. poder viver e, desse modo, realizar meu trabalho, de uma casa
Se ficou, desse modo, paralisada a I Obra, não foi contudo para morar e de meios materiais para subsistência própria e da
impedido o cumprimento da missão, assunto que pertence a família. Jamais, porém, desejei a riqueza, pois não posso per-
Deus e sobre o qual os homens não têm qualquer poder. der meu tempo a defendê-la. É inegável que a independência
Aconteceu, em consequência, que a trajetória do trabalho so- econômica me é necessária, pois sem ela eu cairia num estado
freu tão-só uma mudança de direção, imposta pelo imprevisto de escravidão em que seria impossível meu trabalho. Obtida
de novas pressões. essa independência indispensável, o resto é para mim tão-só
Pietro Ubaldi PROFECIAS 9
uma condição para o meu trabalho; resto que me pesa, tanto Meu trabalho não é impor ideias, mas tão-somente oferecê-
que já o rejeitei na Itália. las, difundindo-as com os livros e a palavra, para o bem do
Estou despendendo a metade de meu tempo e minhas ener- próximo. Não é procurar proveitos pessoais, egoisticamente,
gias em viagens para proferir conferências. É um penoso esfor- como em geral o fazem os que buscam o poder. Ao revés, é
ço para mim, mas o faço sem qualquer remuneração material. oferecer vantagens imparcialmente a todos, sem sombra alguma
Como posso continuar a fazê-lo, e tudo o mais que devo fazer, de sectarismo; é fazer com que as mentes, habituadas pelas suas
se não encontrar recursos para viver? É absurdo que a humana infelizes experiências a desconfiar, compreendam que essas
avidez de tudo desfrutar me prive até do que me é imprescindí- ideias que ofereço são realmente uma vantagem.
vel para cumprir minha missão pelo bem dos outros. Com esse objetivo, percorro todos os caminhos: da razão e
A essa acusação de que eu queira enriquecer-me respondo da ciência, do coração e da fé, finalizando com a via do exem-
agora, oferecendo boas edições dos livros e, ao mesmo tempo, plo, como no caso atual.
acessíveis às condições de todos, eliminando lucros inúteis. Esse oferecimento imparcial quer dizer que sou amigo de
Respondo ainda, recordando as palavras que escrevi no volume todos, contanto que sejam justos, qualquer que sejam suas reli-
Ascese Mística, publicado na Itália em 1939 e no Brasil em giões ou ideias. Significa também que não posso permanecer
1954, em seu capítulo “Minha Posição”, onde defini minha mis- fechado em nenhum grupo de caráter exclusivista e sectário.
são qual hoje se está desenvolvendo. Àqueles princípios ali ex- Desde que, em qualquer grupo, me seja pedido condenar al-
postos tenho permanecido fiel. Quase vinte anos depois, aquelas gum ponto de vista honesto e diferente, só porque diverso do
afirmações provaram ser verdadeiras. Peço ao leitor que queira seu, como imposição aos outros, desse momento em diante não
conhecer minhas ideias sobre esse assunto o favor de reler todo posso pertencer àquele grupo.
aquele capítulo. Aqui transcrevo somente este trecho: “Nada ◘ ◘ ◘
quero possuir. Tudo é dirigido tão-somente pela força do espíri- Esclarecidos estes pontos fundamentais, peço um favor aos
to. (...) Por isso não quero nem casas, nem sedes, nem cargos, meus leitores e amigos brasileiros.
nem toda a pestilência das organizações humanas; nada que pos- Peço-lhes isentar-me de qualquer forma de glória e honrari-
sa arrastar os baixos instintos e estimular as sempre rápidas res- as, que me privam de tempo e energias preciosas e ainda repre-
postas dos inferiores impulsos do homem comum; nenhuma fe- sentam um peso que agrava o meu trabalho.
tidez de dinheiro, que tanto atrai os ávidos e sombrios adulado- Rogo-lhes cercar-me de seu afeto, que me alimenta. Peço-
res. Estes fogem, graças a Deus, em face de um prato onde não lhes contribuir, cada um como lhe for possível, para formar e
há senão fadiga, dor, paixão de espírito. Esta é a minha seguran- manter em torno de mim aquela atmosfera de paz e confiança
ça. (...) Esta é a minha força diante do mundo...”. que me é necessária para continuar escrevendo e cumprir minha
missão nesta minha nova pátria, à qual me dedico inteiramente.
Repito hoje, ante o caso atual, as mesmas declarações. Dese-
Rogo àqueles que desejam utilizar-me para seus fins e van-
jo, portanto, que se compreenda claramente e sem equívocos meu
tagens pessoais, àqueles a quem meu trabalho não agrada, supli-
método: não procurar jamais dinheiro, nunca pedi-lo, jamais or-
co-lhes, repito, tenham compaixão de mim e me concedam paz.
ganizar qualquer tipo de propaganda, comissões ou coisas seme-
É grande meu cansaço e estou grandemente sobrecarrega-
lhantes, com o objetivo de conseguir recursos financeiros. Quem,
do de muitos deveres em benefício do próximo. Não é justo
pois, faz isso em meu nome o faz sem meu consentimento, contra
que sejam desperdiçados meu tempo e minhas energias em
minha vontade, com perigo e risco para si mesmo.
coisas inúteis, que não sejam para o bem dos outros. Meu tra-
Devemos compreender que a obra para a qual trabalho de-
balho não prejudica a ninguém, é inofensivo, faz todo o bem
pende de Cristo, que não tem necessidade alguma de dinheiro.
que pode, não agride a ninguém, abraça a todos, quer a todos
Se dele precisasse, somente a Ele mesmo competiria inspirar a ser útil. Por que combatê-lo? Já não apresentei aqui provas su-
quem devesse trazê-lo. Considerando-se o assunto em apreço, o ficientes de que ele tem a ajuda de Cristo? Não é assim inútil
dinheiro, mesmo quando deva chegar, por absoluta necessidade, opor-se a ele, já que não se pode ir contra a vontade de Deus?
não deve jamais ser solicitado, mas somente enviado pelo Alto. Ao contrário, não nos tomamos de encanto diante da maravi-
Aqui me encontro, não para fazer negócios, à maneira de lhosa harmonia e da beleza de Suas obras?
tantos, mas para dar, vivendo um exemplo de que as forças es- Por que procurar limitar meu trabalho, concebendo-o so-
pirituais são verdadeiramente as mais fortes. E posso afirmar mente em função de grupos particulares? Porque desejar vê-lo
perante Deus: toda vez que me chegaram às mãos quaisquer tão-somente em relação a categorias já existentes, onde ele não
meios indispensáveis à sobrevivência, sempre e somente o fo- cabe? Ou a princípios e interesses particulares, a que o univer-
ram dessa maneira. sal jamais poderá reduzir-se? Por que desejar, à fina força, que
Por isso, quando me foi imprescindível possuir alguma coi- ele seja uma parte de outros edifícios já construídos, fora dos
sa em meu nome para realizar meu trabalho, nunca recorri à hi- quais não é permitido viver, não se admitindo que a verdade
pocrisia de esconder o fato sob o anonimato ou de modo impes- possa existir fora deles?
soal, entrincheirando-me atrás de pessoas ou instituições para Por que não acabar, para o bem geral, de uma vez para
não aparecer. sempre com essa intolerância de todos contra todos, em que
Desejo elucidar ainda outra coisa. Contrariamente ao que todos se igualam?
possam imaginar, não desejo jamais ser chefe de coisa alguma, E por que me ser atribuído, como o mais imperdoável dos
em sentido material ou espiritual. Aceitarei apenas honestos defeitos, esta minha ausência de espírito sectarista?
companheiros de trabalho, mas nunca discípulos menores so- Por que não procurar ser verdadeiramente fraterno? Parece
bre os quais exerça qualquer autoridade. É que eu vivo numa que o homem é absolutamente imaturo para compreender um
ordem de ideias em que o domínio sobre o próximo é absolu- pensamento universal que ultrapasse os restritos círculos de seu
tamente inútil. Diferentemente, os agrupamentos humanos pre- pequeno mundo. O dogmatismo, o farisaísmo, o sectarismo
cisam submeter seus associados ao comando de um só, que di- tendem sempre a reaparecer em todos os grupos, qual caracte-
rija com disciplina para manter uma ordem imposta, sem a rística humana de todos os tempos e lugares.
qual tudo se desagregaria. No meu caso, é a Lei que tudo man- A singela narrativa feita, o método seguido e as provas dos
tém, e não a imposição humana. E essa lei tudo dirige interi- fatos que se deram nos parecem suficientes para nos convencer
ormente, usando uma disciplina da qual ninguém pode fugir, de que caminhamos na estrada da verdade. Sem um particular
porquanto qualquer infração, sem que qualquer chefe a impo- auxílio de Deus não se explicam os acontecimentos relatados. E
nha de fora, acarreta inexorável pena. auxílio quer dizer aprovação.
10 PROFECIAS Pietro Ubaldi
Não se pode negar, neste caso, a presença de um plano pre- Eis aí o busílis do problema, para o qual tão-somente cha-
estabelecido, que se vai desenvolvendo em movimentos coorde- mamos agora a atenção do leitor, pois ele resume o caso atual,
nados, em direção a um fim preciso. Como negar, diante de tais merecendo um particular e adequado estudo, quando será de-
fatos, a presença de uma inteligência superior que dirige tudo? senvolvido. E isso será feito num outro volume, A Grande Ba-
Não posso negar meu assombro, nascido dessa sensação da talha, último da 1a Trilogia desta II Obra. Nesse livro, voltare-
contínua presença de uma força e inteligência que, não sendo mos a nos encontrar para cuidar em profundidade de tão excep-
minhas, só posso atribuir a poderes espirituais superiores, que cional assunto. Baseando-me na experiência destes meus três
têm Deus como chefe. Se não sou eu a dirigir e se tudo caminha anos brasileiros, nele poderei descrever esta nova e poderosa
com uma sapiência que não possuo, quem dirige então? Ade- estratégia, bem pouco conhecida no mundo: a não-resistência
mais, os resultados estão aí. Diante deles, ponho-me a pensar, pregada pelo Evangelho. Será, assim, dada conclusiva solução
procurando explicá-los. Mas como explicá-los de outro modo? ao presente problema. Explicaremos como, perdoando e aman-
Existe o fato positivo da vitória. Sem um auxílio extra- do, pode-se vencer muito melhor do que agredindo e odiando.
humano, de que modo entendê-la? Há também o fato positivo Veremos também as poderosas forças que a Lei possui de re-
da construção que está surgindo, lenta mas constante, indepen- serva a favor de quem a cumpre. Dessa forma, desenvolvere-
dentemente de forças humanas, por um poder que lhes é superi- mos os conceitos de A Grande Síntese, Cap. XLII – “A Nossa
or. Forças humanas não bastam para interpretar o fato, nem Meta, a Nova Lei”, onde se diz: “Não existe senão uma defesa:
conseguem obstruí-lo. Por que forças, então, é sustentado tal o abandono de todas as armas”, Cap. XC – “A Guerra, a Ética
trabalho, situado além dos poderes e engenhos do homem? Internacional”, e ainda o Cap. XCI – “A Lei Social do Evange-
Como se compreende uma vitória obtida justamente quando fui lho”, onde parcialmente se desenvolve o referido tema, de mo-
despejado em terra estrangeira, sozinho, por aqueles que eram do especial nos aspectos social, político e individual.
minha única esperança? Como explicar essa fragilidade dos re- O homem moderno conhece bem pouco da técnica das rea-
cursos e astúcias humanas para vencer uma criatura inerme, ções da Lei. Tem apenas uma vaga ideia fideísta desse fenôme-
desprovida de tudo, que não arquiteta planos, não se defende no, cuja mecânica as religiões realmente não lhe explicam. Por
nem agride, mas perdoa? De que couraça foi ele revestido para isso, nele permanece o instinto que o leva a admirar o vencedor.
tornar-se assim invulnerável? De que invisível arma foi ele do- Não conhecendo, todavia, o fenômeno, que pertence a outros
tado para conseguir vencer numa luta assim tão desigual? planos de vida, que lhe escapam, só lhe resta um supersticioso
Com ceticismo não se explicam esses acontecimentos. E, no temor que o desconhecido sempre inspira.
mínimo, não se pode deixar de vê-los, porque eles são reais. Ele percebe confusamente que existe qualquer coisa que se
Como não há de nascer, pois, a dúvida, até nas mentes mais cé- lhe esquiva, qualquer coisa também poderosa, que, por isso
ticas, de que o instrumento não esteja sozinho? De que, junto de- mesmo, também pode prejudicá-lo muito. Para ele, o homem
le, opere alguma força, embora desconhecida dos que descreem? espiritual é um enigma. Enxerga-o armado de forças espirituais
Se pelos efeitos é que se determina a natureza da causa, essa desconhecidas, sobre as quais não tem poder. Nasce-lhe então a
força deve ser inteligente e poderosa. O tipo dos movimentos dúvida: aquele estranho homem que sabe vencer é realmente
que vemos nos indica a espécie do motor de que derivam. mais poderoso, porque auxiliado enquanto estiver unido ao Al-
O mundo não enxerga essa arma, não sabe de que é feita, to? E nós, que queríamos utilizá-lo somente para nós mesmos,
nem como funciona. Nosso mundo vive no plano biológico por que não o compreendemos? E se assim é, que reações pode-
caótico, onde o melhor é aquele que oprime pela força ou pela rão atingir-nos agora, vindas daquele misterioso mundo espiri-
astúcia, e não no plano orgânico, em que todos cooperam den- tual que nós violamos?
tro da ordem da Lei. O problema torna-se então vivo, pois não se manifesta tão-
É difícil explicar aos seres de um plano de evolução os só por demonstrações racionais, mas pela alegria ou dor, pela
princípios vigentes num plano mais alto. No nível humano, a vitória ou derrota de seres vivos. Aqui, a Lei se transforma em
luta pela vida nos habituou de tal modo à desconfiança, que, exemplo e lição prática.
mesmo quando se expõe sinceramente uma verdade, a primeira Foi isso que aconteceu nesses três anos. E aconteceu para
reação é de que ela seja uma mentira. Estas minhas sinceras oferecer um exemplo, assegurando-nos da presença de Deus e
explanações podem, assim, ser consideradas uma astúcia re- dando-nos uma prova da legitimidade da missão. É também
quintada e inédita. uma advertência para os céticos e uma evidente manifestação
Será, realmente, bem difícil fazer compreender a natureza e da Lei, para que todos sintam sua existência e funcionamento.
as funções da não-resistência, essa arma de que o Evangelho Significa ainda a afirmação da invulnerabilidade das obras de
nos fala há dois mil anos, mas que bem poucos usam na reali- Deus e, portanto, da impotência diante delas de quem quer que
dade, porque ela não funciona em mãos comuns e desaparece procure destruí-las.
ante os olhos dos homens práticos, na direção de planos de vida São muitas as lições que este caso nos oferece, sobrelevan-
desconhecidos por eles. do-se a maior delas: quem faz o bem o faz a si mesmo, assim
O instinto, entretanto, fareja qualquer coisa sobre o assun- como quem faz o mal o faz a si próprio.
to. Todas as vezes que existe algo que interessa à vida, sobre- Este caso aqui descrito tem o profundo significado de ser
tudo ameaça ou perigo, ela tem a intuição do fato, embora um dos infinitos momentos da universal luta do mal contra o
sem percebê-lo bem. bem, em que este sai triunfante, pois esta é a lei.
Neste caso em exame há luta e vitória, duas coisas que fa- Dessa luta cósmica, este é apenas um caso particular, que
zem parte da vida, mesmo em seus planos inferiores, e que, acontece conosco todos os dias, aplicando-se nele as normas
portanto, todos compreendem. Quando se verifica uma vitória, do caso geral. Assistimos aqui ao combate de forças opostas,
todos procuram saber quais eram as armas usadas pelo triunfa- de dois diversos tipos biológicos, de dois planos de evolução.
dor porque isso lhes interessa, pois também querem vencer. O E o resultado é que o mais evoluído vence, demonstrando que
tipo humano comum fica, então, perplexo ao verificar, no caso as forças do espírito, porque mais avançadas, são mais fortes
de uma vitória qual a de que falamos, a ausência de armas dele que as da matéria.
conhecidas, como as que todos usam, acreditando serem elas as A Divina Providência intervém e a cada injusto prejuízo, so-
únicas que conduzem ao êxito. frido por quem não o merece, proporciona a justa compensação
Os céticos dizem então: que tipo de lutador é este, que ven- equivalente, firmemente protegendo quem obedece à Lei, a ex-
ce dessa maneira, desarmado e sem fazer guerra? pensas de quem a violou.
Pietro Ubaldi PROFECIAS 11
Vemos, desse modo, funcionar na Terra a lei de planos despreza qual um fraco. Contudo, quando vê que este outro,
mais altos, segundo a qual triunfa não o mais forte ou mais as- que não possui nem usa armas humanas, não apenas vence mas
tucioso, mas sim o mais justo. Noutros termos, a lei segundo a também, depois, não abusa da vitória, como é costume, então
qual vence o mais prepotente e egoísta na desordem, é substi- percebe a evidente diferença. E todos perguntam como foi pos-
tuída pela lei que concede vitória ao homem orgânico e reto, sível isso ter acontecido, qual é a chave desse mistério, quais
dentro da harmonia da ordem. Em lugar da lei da força é esta- são os novos e insuspeitos princípios e forças que possibilita-
belecida a lei do mérito. ram tal prodígio.
Dada a dificuldade de fazer sentir e admitir e presença real Desse modo, buscando uma interpretação, de que os céticos
e operante de Deus entre nós, os cérebros humanos, habitua- também sentem necessidade, eles são involuntariamente atraí-
dos à astúcia, são levados a ver em tal sucesso a maior de to- dos para aquela estrada em que deverão, mais cedo ou mais tar-
das. O valor deste caso é haver oferecido uma lição no próprio de, encontrar-se com a Lei.
terreno das confusões humanas, onde tanta gente se movimen- Começa-se, então, a compreender a possibilidade de existir
ta, ou seja, em um ambiente repleto de atividades e mais aces- um outro biótipo de forte, que, embora humanamente desar-
sível à sua percepção. mado, tem mais força do que os fortes do atual plano evolutivo
Como pode, de outro modo, a Lei fazer-se compreender por humano; um forte que assim o é, embora pessoalmente frágil,
quem só acredita na força e na esperteza, e não na ordem, den- por ser uma célula de unidades orgânicas mais complexas e
tro da qual ela tudo regula? De forma diferente, não seria pos- mais vastas, de que o tipo humano comum se acha excluído
sível introduzir, em cérebros que estão condicionados à ideia de pelo seu egoísmo.
luta e que não admitem outra coisa, o conceito do funcionamen- Este tipo humano só pode contar, para sua defesa, com suas
to orgânico do universo, do qual o homem faz parte, sendo-lhe pobres forças individuais, ao passo que o outro tem a protegê-lo
vantajoso saber coordenar-se dentro desse organismo, ao invés o poder de todo o organismo de que é parte, isto é, os princípios
de rebelar-se para impor-se. da lei de Deus, da qual ele se faz um instrumento.
Para persuadir essas almas – acostumadas a respeitar so- A descida desses exemplos à Terra concorre para a efetiva-
mente o vencedor, porque este deu provas de ser o mais forte – ção de um primeiro esforço no sentido de alcançar outra área de
o que mais pode ajudá-las senão um exemplo vivo de triunfo? uma lei superior, apropriada a um plano biológico mais evoluí-
Era necessário, pois, para atingir esse escopo, que as forças es- do, em que a seleção tende a produzir outro biótipo.
pirituais do bem descessem, produzindo efeitos até no campo Principia-se a admirar, desde então, também na Terra, um ou-
dos problemas materiais, pois somente assim sua presença seria tro modelo de vencedor, um outro tipo de força, não material,
percebida e sua importância valorizada. mas sim espiritual; feita não de prepotência, mas sim de bondade.
Num mundo onde só se estima a força, era preciso que o Admirar-se-á esse modelo e chegar-se-á a amá-lo, pois nele
Evangelho desse uma prova de força. Para fazer-se entender, se ama a própria vantagem que ele representa, dado que é um
deveria usar a linguagem da vitória no terreno das coisas mate- amigo, e não um inimigo, no caminho do próximo.
riais, que todos compreendem. Sua generosidade permite aos vencidos lançar-se nos seus
Importava vencer honestamente, sem as armas e sagacidades braços, com plena confiança.
humanas, para depois utilizar a vitória como fator de ajuda e O homem comum, tipo predominante da maioria, haverá
educação. Antes de ser generoso e bom, era preciso haver dado de apreciar nele não o forte que vence e oprime, fazendo-se
provas de ser forte, vencendo, porque coisa alguma é muito res- temer como inimigo, porém, e é o que mais o atrai, o forte que
peitada no mundo, nem mesmo a virtude, quando diz respeito ajuda, não esmaga, sustenta, não usufrui malignamente a vitó-
aos vencidos ou aos fracos. Estes – é o que se pensa – natural- ria, antes a utiliza para produzir bons frutos e, por isso, faz-se
mente devem ser bons para o próximo, pois não tem força para amar como um amigo.
fazer o mal; e os vencidos devem curvar-se diante de todos. A vida, em seu utilitarismo, luta por libertar-se da pressão
Ver, entretanto, um forte – um vencedor – que não se apro- do egoísmo que, se defende o indivíduo, pesa sobre todos; es-
veita dessa sua primazia para esmagar o semelhante, isto é re- força-se por alcançar essas formas superiores, que a protegem
almente uma admirável exceção. Só a bondade do homem po- muito mais, subtraindo-a do estado de luta e insegurança, que é
deroso é considerada virtude digna de apreço, pois a do fraco é seu doloroso estado atual.
tida como fruto da necessidade e do cálculo. Na atual forma A vida chegará, desta maneira, através do labor da evolu-
mental humana, resultado de seu passado e filha de seu atual ção, a produzir outro biótipo de forte vencedor, o forte genero-
nível evolutivo, a base do valor está sempre na força. so e orgânico, que usa sua vitória para o bem de todos, vendo
As coisas espirituais, por essa razão, se querem ser estima- na coletividade seus próprios irmãos.
das no mundo, devem aparecer, antes de tudo, vitoriosas pelo À força de repetir-se por milênios a palavra fraternidade; à
seu poder. O povo pedia milagres a Cristo porque neles via uma força da pregação do Evangelho e, sobretudo, à força de sofrer
prova de força e de poder. E Cristo, embora contra Sua vonta- todos os prejuízos da egoística vitória dos fortes, essa ideia
de, teve de realizá-los, pois, para o povo, eram eles a primeiro mais humana acabará por fixar-se no seio da humanidade. E o
condição da fé e do respeito. homem encontrará forças para rebelar-se contra as formas infe-
O mundo deseja honestidade e justiça, mas honestidade e riores da existência, abandonando-as, depois de as haver sofri-
justiça que possam vencer. Quer ainda que essa vitória seja do por tantos milênios.
aplicada em benefício dos outros e que o vencedor seja genero- Nosso semelhante, então, deixará de ser um adversário e um
so. Todos compreendem e prezam, porque lhes é vantajosa, es- perigo, tornando-se um irmão e um auxílio.
sa magnânima vitória, licitamente atingida e não usada pelo A sociedade humana deixará de ser dirigida por uma or-
vencedor para esmagar o próximo. Este, pelo instinto de subir, dem baseada na disciplina da força e do medo, passando a
admira o vencedor, ansiando imitá-lo. No seu egoísmo, entre- uma ordenação assentada em convicta disciplina de amor. En-
tanto, está muito cansado dos inúmeros abusos que tem sido tão, assim como foi mudada a concepção de Deus, que passou
obrigado a sofrer, de todos e sempre, da parte dos vencedores. da ideia mosaica de um chefe forte, desapiedado e vingativo à
Eis porque aprova e aceita, quando, em lugar das tristes vitórias atual, de um Deus amigo, que nos ama com justiça, também
do mundo, ele vê descer do céu um tipo tão oposto de triunfo. se modificará, paralelamente, a concepção das relações huma-
O mundo acha natural que alguém inerme, como quer o nas, que não mais estará baseada sobre o egoísmo separatista
Evangelho, ponha-se a rastejar aos pés dos fortes e, por isso, o do mais forte, mas sim alicerçada num altruísmo em que todos
12 PROFECIAS Pietro Ubaldi
se compreendem, coordenando-se organicamente para maior usufruir todas as defesas e dispor de todas as forças e poderes
proveito coletivo. que, de direito, pertencem aos seres daquele plano.
O vencedor mais forte, nesse caso, não será temido, mas Para entrar no círculo de tais humanidades e desses planos
amado, e sua vitória será estável, porque não se fundamenta na superiores de vida, a estrada aberta a todos é viver a Lei.
opressão, que está sempre a oscilar ante as reações de revolta, A consequência prática, compreensível também neste mun-
mas na colaboração, que concilia em utilidade geral as ativida- do, é que a Lei não defende quem não a segue: para este não
des e os interesses de todos. existe a Divina Providência. Ele é, portanto, deixado às suas
Eis, num breve resumo, a teoria geral do nosso caso. Obser- próprias forças, já que, pelo seu sentimento egoísta, ele mesmo
vando, em profundidade, diariamente, minha vida e a vida dos desejou isolar-se do organismo de forças espirituais que gover-
outros, tenho podido dispor, durante meio século, de um campo na o universo com bondade e justiça.
de observação e de um laboratório experimental para o estudo Esta é a triste sorte dos involuídos que ainda não querem
positivo dos fenômenos morais. participar da ordem divina.
As precedentes afirmações firmam-se, portanto, nas mesmas Ainda outra consequência prática, repetimos: a Lei defende
bases objetivas e experimentais que servem de apoio à ciência quem a segue, de modo que, como resultado, ninguém é tão
e, se concordam com as teorias gerais desenvolvidas na Obra, bem defendido quanto o justo.
aqui as confirmam com fatos, provando-os através do método Esta, que parece a maior das utopias, é a ousadíssima tese,
da observação e da experiência. Enquanto as teorias gerais fo- aqui apenas esboçada, que sustentaremos no volume A Gran-
ram obtidas por intuição, através do método dedutivo, descen- de Batalha. Nele demonstraremos que o mais elevado sistema,
do, pois, do geral para o particular, esta é uma confirmação que o melhor meio de vencer na luta pela vida, é o sistema da reti-
as atinge por um caminho oposto, porquanto as alcança, ao con- dão do Evangelho.
trário, partindo do particular dos fatos. São Vicente, Natal de 1955
Aí estão os fundamentos que descem até às raízes da Lei e
sobre os quais se apoia e começa a elevar-se nossa atual cons- I. O PORVIR DO MUNDO
trução nesta nova terra brasileira.
Aqui, a missão se iniciou com essa prova de força, descida Estas paginas foram escritas em 1953. Era indispensável es-
dos planos espirituais, para convencer também os céticos. Cristo clarecer que foi esse o ponto de vista, ou seja, o centro da pers-
quis, desse modo, manifestar Sua presença, confundindo os mé- pectiva, no tempo, para os acontecimentos de que tratamos e
todos humanos, vencendo com o sistema oposto do Evangelho. que, hoje, são futuros. Passará o tempo, e então o tempo os
Isso não só nos confirma o passado mas também empenha o achará passados, e seu centro de perspectiva será diferente.
futuro, dando-nos garantia do êxito final. Tudo isso prova que a Demos com precisão o ano porque, neste caso, a visão desceu
missão continuará a desenvolver-se até o fim, porque as forças para a intuição na dimensão tempo, na qual se desenvolve o
do mal podem desafiar, mas nunca vencer os planos do céu. conteúdo da mesma. Quisemos, outrossim, traduzi-la nos ter-
Em termos mais amplos, esta é uma prova de que o Evange- mos racionais correntes, como são usados e aceitos pela forma
lho é verdadeiro e que se pode venturosamente triunfar com seu mental moderna. Dessa forma, mais se concretizou a visão, en-
sistema da não resistência. couraçada na lógica. Em outras palavras, tornou-se prática,
O que é certo é que Cristo não nos ofertou essa nova prova acessível à psicologia do homem que age na Terra. A fim de
para minha glória, mas tão-somente para glória Sua e do Seu que a visão se adapte melhor a essa psicologia, que não admite
Evangelho. A grande dádiva que Cristo quis fazer-nos foi um sonhos, apresentamo-la aqui, apesar de descer ela de outros
caso vivido, para nos proporcionar a demonstração concreta de planos de consciência, como uma simples hipótese, sem nada
que o Evangelho, também quando é trazido aos entrechoques mais pretender; hipótese passada ao crivo do raciocínio, que lhe
de nosso dia-a-dia, nada tem de utópico, antes, representa uma poderá controlar a realização, quando os acontecimentos, hoje
real utilidade prática. futuros, terão ficado atrás, no passado.
Na difícil arte de vencer, supremo sonho de todos os viven- Para sermos práticos, digamos logo que é inútil iludir-se,
tes, é demonstrada assim a superioridade do método evangélico acreditando em ideologias. Se quisermos caminhar em terreno
sobre todos os outros. E é maravilhoso ver, como neste caso, sólido, temos que nos ater às leis biológicas. E as leis da vida
que ele se revela plenamente eficaz, mesmo se praticado de são bem diversas das teorias abstratas que os pensadores dese-
modo individual no seio de uma sociedade não-evoluída. jariam aplicar à pele dos povos, para forçar os acontecimentos
Esse método pode ser, portanto, usado vantajosamente históricos. A história tem sua inteligência própria, já o dissemos
por cada pessoa, que pode fazê-lo funcionar por si própria, alhures e o demonstraremos melhor nestes capítulos. O que di-
mesmo antes que ele venha a ser compreendido e usado pela remos é a lógica dos princípios do sistema que até aqui foi de-
coletividade. senvolvido. Não trabalhamos, pois, com fantasias. A história
A muitos poderá parecer que essa renovação dependa da re- tem suas leis, seus grandes ciclos, seus períodos menores, seus
ciprocidade, não podendo ser alcançada senão coletivamente. círculos de força, seus motivos dominantes, que tendem a repe-
Ao contrário, este caso nos mostra como o ingresso a supe- tir-se, ainda que em planos diversos. A história passa e repassa
riores planos de vida está aberto a todos, de modo geral. Mas, pelos mesmos pontos, repisa a mesma estrada, volta aos mes-
logicamente, também a cada um, de maneira pessoal, desde que mos pontos críticos, encontrando os mesmos perigos, desmoro-
esteja preparado para alcançá-los. namentos, dores, reações e ressurreições. Assim, em última
São estes os alicerces sobre os quais se elevará o novo edi- analise, a história, em seus motivos formais, pode parecer sem-
fício. A grande verdade que este caso nos ensina – e isso seria pre a mesma, ainda que não idêntica.
muito útil compreender – é que a Lei defende quem a segue, Mas há uma outra história, a verdadeira, que não é enverni-
mesmo que a criatura se encontre isolada de todo o universo. zada de idealismos, nem feita para uso exclusivo do vencedor,
Para isso não é necessário que o estado orgânico superior já para legalizar como direito e justiça, diante de Deus e dos ho-
tenha sido atingido por toda a raça humana. mens, sua primeira violência e extorsão, de que nasce depois,
Existem humanidades superiores que já vivem nesse estado como arranjo, qualquer direito. A realidade que se encontra atrás
orgânico. O indivíduo, alcançada sua maturação, passa automa- das compilações artificiais da história é sempre aquela produzi-
ticamente a fazer parte delas. E quem nelas ingressa, embora da pelo choque de egoísmos de indivíduos ou classes sociais, ou
esteja materialmente vivendo no ambiente terrestre, passa a povos e nações, que todos querem viver. Esta realidade de subs-
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tância, que é a da luta pela vida, gosta, para atingir os próprios expansão bélica, a que se prendem para sua divulgação. Assim
fins dessa luta, de esconder-se e revestir-se de ideologias, de é que se realiza uma estranha contradição, na qual os princí-
princípios teóricos, que assim permanecem enquanto essa mes- pios tão proclamados de Liberdade, Igualdade e Fraternidade
ma realidade ache vantajoso encobrir-se com tais mantos fictí- aplicaram-se como invasão a mão armada, na submissão de
cios. Dessa forma, eles vão e vêm, desmoronam e ressurgem outros povos, numa tentativa de domínio sobre toda a Europa.
transformados, passando sempre como verdades absolutas e Não é exatamente isso que está fazendo no mundo a Revolu-
continuamente se contradizendo, num círculo vicioso absurdo, ção Russa, em nome da justiça econômica? Aquela foi a pri-
porque bem diferente é a verdadeira linha da história. Uma é a meira aplicação dos princípios da Revolução Francesa. Depois,
história feita pelo homem, outra a história feita por Deus, e esta a reação da Santa Aliança cancelou tudo, e pareceu que tudo
também contém, acima da luta pela vida, os grandes idealismos tivesse voltado a seu lugar, com as nações retornando às suas
que devem ser alcançados. Mas estes não correspondem às ideo- fronteiras. Servira então a revolução apenas para fazer guerras
logias e programas proclamados pelo homem com o intuito de e dar pasto ao imperialismo napoleônico?
esconder sua luta para viver. Por isso acharemos a história um Não. A história verdadeira trabalhara em outro sentido.
modelo de absurdos, um discurso sem pé nem cabeça, se a Através de todo esse tumulto de contradições, o trabalho real
olharmos superficialmente, tal qual se acha escrita nos livros; no fora o lançamento de novos princípios, de uma semente da qual
entanto, se a olharmos em profundidade, em sua realidade subs- nasceram os governos representativos, a liberdade política, os
tancial, acharemos um modelo de lógica, uma admirável coor- Estados nacionais, etc. Essa semente começou a se desenvolver
denação de acontecimentos, dirigidos a metas precisas. devagarinho, e foi necessário um século para que pudesse fruti-
Assim, a Revolução Francesa mata um rei para criar um im- ficar; isso porque a revolução lançara mas não realizara as no-
perador, isso enquanto proclamava o povo como soberano. Des- vas ideias, e construir de fato um novo modelo de vida é obra
truiu assim uma aristocracia para fazer outra. Desse modo, os de povos e de séculos, já o dissemos.
franceses, cansados de um longo período de paz sob os últimos Assim, cada passo tivera sua função lógica, em cadeia. A
reis, preferiram ir morrer nas sangrentas lutas napoleônicas e, revolução, como sempre, tivera apenas uma função negativa, de
tendo assassinado o inerme rei Luís XVI, tomando-o por tirano, limpar o terreno, para destruir o velho, a fim de em seu lugar
deixaram-se matar pelo grande guerreiro Napoleão. Vista assim, poder ser construído o novo. E, enquanto destruía, a revolução
do lado de fora, a história é um absurdo. Mas, se a observarmos afirmou os novos princípios, mas sem fixá-los. Napoleão divul-
mais profundamente, nisto tudo veremos uma velha e geral lei gou-os, e só como meio de divulgação ele e seu imperialismo
biológica, isto é, que a árvore, como o animal e o homem, quan- foram aceitos pela história. Tanto é verdade, que, atingido esse
do viveram sua maturidade e deram seu fruto, têm que acabar, seu objetivo, a história rejeitou tudo, e nada restou do imperia-
pois que a vida esgotou, nessa forma de vida, as energias que lhe lismo. Assim, a morte de Luís XVI foi necessária, para que pu-
destinara e, para que a vida possa continuar, deve renovar-se desse com ele morrer o velho sistema e ficar desimpedido o ter-
num novo ser, que é o filho do velho que morre e do qual deve reno político. A revolução foi indispensável para proclamar as
continuar a obra. Assim, mesmo agindo como inovador, esse fi- novas ideias. Napoleão e o imperialismo, para divulgá-las. O
lho será sempre o filho, que repete e continua o tipo biológico trabalho de um século e de vários povos, para assimilá-las e fi-
do pai. Fará as mesmas coisas que ele, pois não tem outros mo- xá-las em formas concretas e particulares, que bem se distanci-
delos diante dos olhos; contudo não as fará idênticas, mas sem- am das originais. Como se vê, a história verdadeira agiu com
pre com alguma deslocação, mais evoluídas. Não é fácil fabricar um rígido processo lógico, numa espécie de encadeamento de
modelos novos; isto é um trabalho de um povo e de um século. proposições que, embora conceituais, expressaram-se na forma
Luís XIV criara um modelo de Estado, e a Europa o assimilara. concreta dos fatos, já que os fatos são as palavras e as proposi-
Para todos, essa era a psicologia política dos tempos. Napoleão, ções da linguagem da história.
filho da revolução e continuador do poder real que havia sido ◘ ◘ ◘
suprimido, só podia reportar-se àquele modelo e revivê-lo, e o Apliquemos agora tudo isso ao atual momento histórico, pa-
seu será um poder tanto ou mais absoluto que os precedentes, ra compreender quais são – além das formas exteriores aparentes
exercido em nome da revolução e aceito como legítimo, se bem – o caminho real e os objetivos da história presente e do futuro
que em total contradição com os princípios donde se originara. próximo. Referimo-nos à Revolução Francesa e ao imperialismo
Mas ele foi aceito, porque correspondia às leis biológicas, isto é, napoleônico, porque hoje estamos num período de revolução e
a uma utilidade e necessidade para a vida da França naquela ho- imperialismo. É no ciclo de desenvolvimento das revoluções
ra; aceito e reconhecido como legítimo, porque o poder de Na- que atua a série de proposições que acima examinamos, ou seja:
poleão satisfazia a maior necessidade da revolução naquele esgotamento do velho sistema; revolução para abatê-lo e lançar
momento, que era de vencer subjugando os povos, para lhes in- a ideia de um mais evoluído; guerras de conquista para defendê-
culcar e impor seus próprios princípios inovadores. lo; imperialismo da nação revolucionária para dominar outros
Este é apenas um exemplo em que vemos, sob teorias e apa- povos, submetendo-os a si com violência, assim como o macho
rências formais, uma realidade totalmente diversa. A vida é prá- fecunda a fêmea; esgotamento das guerras; fim do imperialismo,
tica, tem um utilitarismo imediato; e as ideologias, mesmo sen- já inútil como tal, logo que se tenham atingido os objetivos da
do utilitárias, o são a longo prazo e de forma vaga e incerta. Por divulgação; isolacionismo da nação que iniciou a revolução e li-
trás das ideologias há a luta de classes, há o espírito gregário, quidação de suas conquistas imperialistas; assimilação secular
há a concepção egoística do poder – pura exploração em bene- da ideia da revolução, adaptada aos vários povos, mas de uma
fício próprio, em dano do povo explorado, e com razão, ao me- forma despersonalizada, em que se esquece o país de origem,
nos neste nosso plano animal, porque aqui esta é a lei para os que já se tornou inútil ao progresso. Isso tudo não é a regra de
ignorantes e ineptos, a favor dos mais hábeis e fortes. um caso ou período, mas o desenvolvimento da lógica que está
Prossigamos observando o que faz a verdadeira história, na inteligência da história. Podemos então tomá-lo como lei ge-
nesse período que citamos. Mostra-nos ela, após a Revolução ral, estabelecida por uma repetição constante do mesmo proces-
Francesa, o período napoleônico, feito de guerras e imperia- so racional, quando a história torna a percorrer as mesmas pas-
lismo; ou seja, mostra-nos que as revoluções não se preocupam sagens e estão em jogo as mesmas forças. A lógica das coisas
absolutamente em realizar de imediato os ideais pelos quais se nos autoriza, pois, a aplicar ao momento atual a mesma lei.
lançaram à luta, mas antes, mesmo se representam uma explo- Assim, a Revolução Russa e suas consequências estão en-
são de princípios novos, estes se concretizam, de início, numa feixadas dentro desta lei. Também a Revolução Francesa teve
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suas ideologias, mas permanece sempre a mesma substância em novo Napoleão entre os generais vencedores, mais populares, o
cada caso: o desenvolvimento das proposições lógicas dessa lei. que se evitou até agora. Mas isto não poderá impedir que a
Dá-nos ela então, mesmo no caso atual da Revolução Russa, Rússia fique ligada ao imperialismo.
um caminho traçado. É isto que temos perto de nós, como atual É esse o anel da cadeia de proposições de acordo com as
realização histórica. O conteúdo das ideologias diz respeito a quais se desenrola a Revolução Russa; é este o atual ponto de
outros séculos, pois não se improvisa um modelo de vida social seu caminho. A série das proposições acima examinadas verifi-
novo em poucos anos e o mundo ainda vive nos velhos siste- cou-se certamente na Revolução Francesa e vem se desenvol-
mas, os únicos que até agora foram assimilados. Mais tarde, as vendo na Revolução Russa. O processo é tão inevitável, que as
ideologias se transferirão a outros povos, que as adaptarão a si, ideologias a ele se devem adaptar, mesmo que com isto se con-
naquilo que lhes sirva, talvez até esquecendo sua origem russa, tradigam. Explica-se, assim, porque o comunismo se afastou
já longínqua no tempo. É esse um trabalho longo e profundo, tanto do seu modelo original – a ponto de chegar a praticar de
que só a inteligência da história conhece, um trabalho que os fato os mesmos atos do imperialismo czarista, tão condenado
homens de hoje não conhecem e de que se não dão conta. Eles pela revolução – mas continua imperturbavelmente a sua mar-
estão ligados aos acontecimentos históricos imediatos, que re- cha. Os maiores teóricos do comunismo, como Carlos Marx,
presentam o desenvolvimento daquelas proposições que se de- Frederico Engels e Lenine, consideraram aquele imperialismo
vem exprimir na forma concreta dos fatos. como o pior inimigo da revolução. No entanto, através de todos
Postas à parte, pois, as ideologias, vejamos quais são, ao os regimes, continua imperturbável o sonho pan-eslavista do
contrário, os termos consecutivos que seguiu e terá que seguir czarismo. Sempre o nacionalismo e o racismo estão no fundo e
no porvir a Revolução Russa. Como se vê, pela resolução des- além de todas as aparências; este é o constante e secular sonho
ses problemas, ao invés de fazer apelo à inteligência e muito de todos os povos, motivo e força dominante da história. Sonho
menos à bondade humana, apoiamo-nos sobretudo na inteligên- reforçado pela revolução, que só pode desenvolver-se e firmar-
cia de Deus, que alhures demonstramos estar presente na histó- se na conquista. Dessa forma, ainda que as originárias teorias
ria. Foi essa inteligência que quis a lei da evolução e a impõe. comunistas negassem tudo isso, a realidade biológica, que elas
Se não fosse impulsionado por Deus a cada passo, bem pouco não levavam em conta, venceu-as, e elas se transformaram e a
realizaria o homem. Observemos como acontece isso. ela se adaptaram. O que reina sempre, acima das ideologias e
No caso atual, os termos do processo são: esgotamento do formas de governo, o que permanece acima dos acontecimen-
velho sistema, que era o regime czarista, cansado e em putre- tos, é a realidade biológica, representada neste caso pelos ins-
fação, como aquele de Luís XVI; Revolução russa que o der- tintos expansionistas de um povo. Triunfa assim o imperialismo
rubou, a ele se substituindo e lançando uma ideia nova; guerra eslavo, o mesmo dos czares, hoje posto em prática pelos filhos
de conquista, já em parte realizada, e assimilação dos estados da revolução, contra as teorias dos fundadores dela, que são
satélites – atual período em que estamos. O termo sucessivo, censurados e purgados nos pontos em que combatem o imperia-
na lógica do processo, é uma nova guerra de conquista para lismo czarista, o mesmo que o atual.
difundir a ideologia. Esta fase está atuando como guerra fria, E é essa fatalidade do expansionismo revolucionário, na
como penetração política do partido em outros Estados, com realidade imperialista pan-eslavista, que se manifesta hoje na
propaganda, etc. Mas o processo, evidentemente, foi lançado guerra fria, com a invasão de outros Estados sob a forma de
e não pode ser paralisado. A ideologia não pode permanecer partidos comunistas, isto é, quintas-colunas russas, na propa-
teórica. Há, no fenômeno, um lógico e fatal desenvolvimento ganda pela paz, ou seja, pelo desarmamento do próprio inimigo,
de forças que não podem parar. Um trem a correr não pode re- enquanto cada um se prepara na mesma corrida do armamen-
troceder. Estamos às portas do período do imperialismo napo- tismo. Inevitável desenvolvimento de forças comprimidas, onde
leônico, necessário para difundir a ideia. Divulgada esta, te- todas hoje tendem a explodir amanhã em guerra aberta, porque,
remos a exaustão das guerras, o fim de um imperialismo e de na natureza, cada força tende a atingir sua expansão e cada con-
suas conquistas já agora inúteis à história, com o afastamento flito a concluir-se, resolvendo-se no choque.
da Rússia e, por fim, a assimilação secular da ideologia do Eis o que nos diz a lógica a que está preso o desencadear-se
comunismo de um modo despersonalizado e independente da dos acontecimentos. Contradições, se olharmos superficial-
Rússia, de uma forma temperada, transformada, diferente e mente, mas profunda lógica da história em seu desenvolvimen-
adaptada a cada povo de per si. Só assim a história, a única to. O que os homens dizem e fazem corresponde a outras exi-
consciente e sábia, atinge seu verdadeiro fim: o progresso gências, como a luta de classes e de raças e da experiência para
humano, utilizando ora isto ora aquilo, rejeitando o que não aprender; corresponde a interesses pequenos, pessoais e imedi-
serve a seus objetivos. Recordemos o que alhures demonstra- atos, que ignoram os grandes objetivos da história. É natural,
mos, ou seja, que para a vida não vale o indivíduo, mesmo então, que tudo tenda a deformar a lógica do plano substancial
que seja um povo, mas apenas sua função biológica. da história e assim, no particular, só apareça um círculo vicio-
Hoje, portanto, a Rússia está chamada aos primeiros planos so de contradições. Dessa forma, compreendemos porque aí
da história para realizar esse trabalho. Terminado ele, seus tudo pareça ilógico. Não é, pois, neste terreno de fatos exterio-
grandes chefes poderão ter o fim de Napoleão, e a Rússia, co- res que poderemos achar a lógica. Então eis o que achamos nos
mo a França, regressará mais ou menos ao que era antes – a fatos. As revoluções, quase todas feitas em nome da liberdade,
menos que aconteça algo de pior: terem seus chefes o fim de resolvem-se mais tarde num regime mais duro, porque mais
Hitler ou Mussolini, e a Rússia o fim da Alemanha. Dada a ló- jovem e, portanto, mais forte que o precedente, mais velho e
gica do procedimento, está hoje a Rússia ligada ao imperialis- cansado. Assim, uma revolução como a russa, feita para a rea-
mo por novas guerras de conquista. Só continuando o avanço – lização da justiça social, que recorda e continua os princípios
pois esse é seu princípio e seu plano – poderá considerar-se vi- da Revolução Francesa, torna-se, como aquela o foi em outra
toriosa a revolução, poderá justificar-se o comunismo russo época, invasão bélica e imperialismo, submetendo outros po-
tanto no interior como no exterior. Doutra forma, se não reali- vos, para impor o pan-eslavismo. Substitui-se ao velho capita-
zar a conquista programada, terá que declarar-se falido. É mui- lismo privado outro capitalismo, o de Estado, de que se apro-
to perigoso basear-se no princípio de ou conquistar o mundo veita, como sempre, a classe que manda, só porque venceu na
ou morrer. As revoluções, aliás, são uma explosão renovadora luta pelo poder. Substitui-se à velha classe aristocrática outra
da vida e não podem desenvolver-se senão com guerras de aristocracia de burocratas, e é entre ela que se seleciona e
conquista. Sentiu-se na Rússia o perigo do nascimento de um emerge o ditador supremo, como emergira das massas popula-
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res, lutando, aquela mesma classe. Falta a forma pessoal napo- apressada imitação da pseudocivilização materialista europeia,
leônica, a aventura bonapartista, mas a ditadura, o imperialis- mas sem os melhores e mais poderosos valores: os espirituais.
mo e o pan-eslavismo já estão em ação. Estes têm grande peso biológico, e a Rússia pagará caro tê-los
Em tudo isso, vemos aparecer os velhos motivos da histó- ignorado. Seu programa representa teoricamente a justiça eco-
ria, o férreo substrato biológico, que é coisa bem diferente das nômica da sociedade. Mas, na prática, é outra coisa. O regime
ideologias proclamadas. Achamo-nos, então, apenas diante de capitalista da propriedade estabilizada em forma jurídica, na
um novo capítulo da luta entre eslavismo e germanismo, entre ordem social da lei, representa um grau muito mais avançado
Rússia e Europa, diante de uma tendência à repetição das inva- do que sua fase de formação, que é o furto. Ora, nos fatos, o
sões bárbaras contra Roma, logo que a Europa de sinais de en- método da violência, usado pelo comunismo, atrasa a sociedade
fraquecimento. É sempre o mesmo motivo dos povos menos até à fase pré-legal caótica da conquista dos bens com o furto e
evoluídos, que saltam em cima dos mais civilizados logo que a agressão, e é esta na realidade a verdadeira psicologia das
estes não saibam mais dominar, mantendo a própria superiori- massas comunistas, que ignoram qualquer ideal, mas estão bem
dade. Dessa forma, aparecem no lugar das ideologias os ver- cônscias de seu interesse imediato. Dessa forma, na prática, o
dadeiros impulsos biológicos em ação, a rivalidade de homens, ideal da justiça social se reduz ao assalto a quem tem, só para
de classes, de raças, empenhados todos na mesma luta pela vi- substituí-lo nessa posição, a fim de fixá-la logo após, quando a
da. Em seu atual nível de evolução na Terra, essa luta corres- tenha conquistado, em sua fase legal de propriedade juridica-
ponde bem pouco a conceitos ideais, que só servem para es- mente garantida, sem o que não é possível desfrutá-la. Para a
conder a realidade. Afirmamo-lo para todos os povos e todos massa desencadeada ao assalto, é inconcebível qualquer outro
os ideais. Assim, sob o pretexto de combater o capitalismo pa- móvel que não seja o de atingir a melhoria própria, estabilizada
ra libertar dele o mundo, refaz-se o velho jogo expansionista com a propriedade individual.
de um povo a expensas de outros. Dessa forma, para que se re- Além disso, o fato de que os chefes sobressaem apenas pela
alize a ideologia russa da justiça social, a vítima será a Europa, astúcia e pela violência e de que o comando seja exercido com
caso não queira unir-se para defender-se. o método do terror, revela um estado de involução. Só a passi-
◘ ◘ ◘ vidade do povo russo e o costume atávico à resignação, fixada
Neste ponto podemos ver o panorama geral de todo o pro- nas massas por uma escravidão secular, podem permitir isso. Só
cesso evolutivo dos acontecimentos, processo que é formado um estado primitivo de inconsciência coletiva, de desorganiza-
por três correntes: ção social, de controle deficiente por parte da opinião pública,
1o) As ideologias teóricas, que no princípio são apenas as podem tornar possível que homens com o tipo biológico que
sementes, cujo desenvolvimento em ato é protelado a outros têm seus chefes permaneçam nos postos de comando. Os chefes
tempos. têm os povos que merecem, e os povos têm os chefes que me-
2o) O férreo substrato da realidade biológica, em que ho- recem. Esses exemplos definem um povo, e só podem aparecer
mens e povos lutam pela vida, sendo este o seu trabalho, o úni- em certos níveis biológicos. Esses homens só podem vencer em
co que conhecem e desejam. tais ambientes porque só aí tudo está proporcionado e adaptado
3o) A obra substancial e subterrânea da história, que cami- a eles, permitindo-lhes exercerem uma função, e esta é a única
nha como uma cadeia de proposições lógicas, para conseguir a razão pela qual a vida os deixa nesse posto. Só aí podem eles
atuação da evolução, realizando as ideologias, trabalho desco- vencer, porque só aí eles são os melhores. Mas, entre povos
nhecido ao homem, que o executa sem conhecê-lo, enquanto, mais evoluídos, eles seriam os piores e talvez até expulsos.
movido por interesses e objetivos menores, avança desordena- Quando a seleção biológica de um chefe ocorre por meio da vi-
damente por um caminho torto, cheio de contradições. olência e do terror, não podemos dizer que esse povo seja evo-
Vimos o que resulta do choque contrastante dessas três cor- luído e civilizado e que tenha o direito de ensinar qualquer coi-
rentes. Cá em baixo, no particular, domina a segunda, mas, no sa aos outros. A vida jamais poderá confiar a tal povo missões
alto, ainda que pareça longínqua, a terceira é sempre ativa. Vol- sociais senão na mesma ordem de seu plano, assim como não
tando ao caso da Rússia e do comunismo, observemos agora se pode confiar a determinado tipo biológico missões superiores
este terceiro aspecto lhe oferece possibilidades de vitória. Na às que ele possa executar. Entre outros povos, o melhor, mesmo
realidade, a expansão do comunismo resolve-se na expansão es- que não seja um santo, é o mais inteligente, dinâmico e genial.
lava. Perguntamo-nos então: possui a Rússia características bio- Como se poderia, de um plano inferior, dirigir um superior?
lógicas que, diante das leis da vida, justifiquem e autorizem sua Sem dúvida, a astúcia e a mentira são mal de todo o mundo.
expansão sobre outros povos? Sem falar de ideologia, houve Mas é preciso verificar em que porcentagem entram na escolha
povos dominadores e colonizadores, como Roma diante da Eu- e qual dose delas podem suportar os povos em seus chefes.
ropa de então, e como a Europa diante das Américas e do mun- Além do mais, é difícil admitir – e disso a história não nos
do. Quando um povo possui qualidades adequadas para saber dá exemplo – que um povo involuído possa subir de um salto a
exercer uma função de comando, a vida lhe confia, e esta pode- graus superiores de civilização, aqueles que, segundo as leis da
ria ser uma justificativa para o expansionismo russo. Mas pos- vida, são os únicos que dão direito ao domínio sobre outros po-
sui o povo russo tais qualidades, que justifiquem seu pan- vos para civilizá-los cada vez mais. Sem essa superioridade,
eslavismo? Se as tivesse, teria pleno direito à expansão e justi- que é valor intrínseco só conquistável à própria custa, com es-
ficaria seu imperialismo. Mas se não as tem, só poderá repetir a forço de milênios, a vida não concede posição de domínio nem
aventura napoleônica, reduzindo-se a nada, ainda que vença, as deixa por muito tempo nas mãos de quem as usurpa. Sabe-
como a França, mas além disso com o perigo de ser destruída mos que a vida só concede direitos e poderes aos que são dig-
pelas bombas atômicas. Ai de quem se arrisca a uma prova que nos de desempenhar uma real função biológica, segundo seus
não pode superar. A vida o pune com a liquidação. Para vencer objetivos. Ora, um povo que quer lançar uma ideia no mundo e
e ter direito ao domínio, é mister possuir superiores valores bio- faz do imperialismo, que é o domínio de uma raça sobre outras,
lógicos de inteligência e técnica. pretendendo ser mestra delas, deveria antes fazer um exame de
Ora, a Rússia viveu até ontem de imitação, à margem da ci- consciência para calcular os próprios valores, porquanto, mais
vilização europeia. Como pode tornar-se hoje mestra do mun- tarde, terá que prestar contas às inexoráveis leis da vida. Se não
do? Como pode a vida colocá-la à vanguarda do progresso? possuir esses valores, está destinado à falência e, se acaso igno-
Onde estão suas excepcionais qualidades que lhe garantam tão ra essas leis, ainda assim pagará da mesma maneira, para
importante função biológica? Sua atual civilização é uma aprender a conhecê-las.
16 PROFECIAS Pietro Ubaldi
Então, se hoje a história chama a Rússia, que função poderá formou uma consciência capaz de compreendê-la e mantê-la
confiar-lhe, proporcionada e condicionada às suas capacidades, por convicção espontânea. Na prática há uma só verdade polí-
se não de destruição? É o duro trabalho de varrer o terreno, para tico-social: a do vencedor. Não é a ideia que vale, vale apenas
que, desimpedido, possam sobre ele surgir novas construções. a ideia que vence. Hoje, todos olham para o comunismo por-
Isso foi confiado aos bárbaros germânicos, contra Roma, para que a Rússia venceu e é forte. Por isso a França teve que ser
que, liquidada sua civilização pagã, pudesse surgir a civilização forte e vencer no período napoleônico, porque, sem força nem
cristã. E esse trabalho ingrato foi também confiado, na Revolu- vitória, as ideias da revolução não teriam interessado a nin-
ção Francesa, aos involuídos, aos mais ferozes e violentos. E guém. Se a Rússia perder, o comunismo se despedaçará nos
não pode negar-se que na Rússia domine a violência. Com efei- fragmentos que sobrarem dos vários Estados em que penetrou.
to, não é esse o elemento escolhido, em todo o mundo, para as O que conta é vencer. Se Hitler tivesse vencido, sua ideia seria
atividades comunistas? O que nos revela esse método de andar hoje a verdade na Europa, e a verdade política alemã seria a
à procura da miséria, até mesmo provocando-a talvez, não para única verdadeira. E vencer é problema de meios bélicos. Mas
ajudar os deserdados, mas para excitá-los à violência, subver- os vitoriosos foram a Rússia e os Estados Unidos, e hoje, no
tendo a ordem? Não se trata aqui de uma ação benéfica, cons- mundo, só existem essas duas verdades deles, as dos vencedo-
trutiva, mas de uma atividade corrosiva, desagregante, uma res. Desse modo, através dos séculos, tivemos varias verdades,
função de assalto contra tudo o que manifeste sinais de fraque- a romana, a francesa, a inglesa, etc., de acordo com quem triun-
za, de putrefação, de ruína, com a finalidade de limpar e destru- fava. Quando um povo vence, estabelece e impõe sua verdade,
ir os poderes enfraquecidos, lançando contra eles as massas feita por ele em benefício próprio. Ele faz tudo o que fazem to-
mais rebeladas pela miséria. Isto recorda e repete, no plano so- dos os grupos humanos, ou seja, declara-se da parte de Deus e
cial, o assalto dos micróbios patogênicos, que submetem os in- do direito, condenando todos os outros. Qualquer homem, só ou
divíduos doentes e fracos a uma prova da qual ele sairá ou cu- em grupo, diz sempre: só eu tenho razão. Temos assim tantas
rado e forte, ou então morto. Somente essa função de depuração verdades políticas, religiosas, filosóficas, sociais, etc. Se cada
biológica dos povos cansados é que a vida sábia pode confiar à um tivesse a sua, mas sem condenar as outras, tudo iria bem.
Rússia, função que nasce quando uma civilização muito madura No entanto cada um é dogmático e absolutista e combate todos
– como a de Luís XVI, liquidada pela Revolução Francesa – os outros, justificando-se disso, pois, para ele, as outras são o
deve ceder lugar a outra mais jovem, em que a vida se renove, erro. Segundo ele, só ele é o bem, todos os outros são o mal.
para continuar a subir. Desse modo, o valor e a superioridade É assim que nasce cada ordem nova, filha da desordem e do
da Rússia seriam apenas relativos, isto é, dados pela fraqueza e esmagamento; nascem a paz, o direito, as artes, as ciências, o
inferioridade da Europa cansada. progresso, dando o tom a um período histórico. Os resultados
Com o que acima expusemos, procuramos compreender e da agressividade, que normalmente é delinquência, legitimam-
explicar a atual e futura situação mundial, em suas razões se; a glória do triunfo cura tudo; os ministros de Deus na Terra
mais profundas, seguindo a lógica que nos foi dada pelas leis aprovam e abençoam; fixam-se as novas posições até que uma
da vida. Neste escrito, está sendo utilizado, para a compreen- nova guerra ou revolução derrube tudo. Esta é a florescência
são do momento histórico atual e futuro, todo o trabalho de das tempestades sociais, um progredir de ordens a nascer, cada
orientação realizado nos nossos volumes precedentes, onde uma das ruínas da precedente, cada vez mais perfeitas, repetin-
expusemos a filosofia do funcionamento orgânico do univer- do assim o processo de rearmonização do universo, que, da
so. Por isso nossas conclusões têm, por trás de si, todo um sis- mesma forma, parte do caos para voltar a Deus. É esse o cami-
tema filosófico e, se bem que tenham sido obtidas pelo méto- nho da vida, lógico e justificado, diferentemente das palavras
do da intuição, foram submetidas a controle racional. Ainda dos homens, que não o são.
que as ofereçamos como hipótese, derivaram-se de uma con- Continuemos a observar os fatos mais próximos, a realidade
cepção universal, e nosso tempo, com seus acontecimentos, biológica, que é tão diversa das aparências, sempre escondida
está logicamente situado dentro de uma visão cósmica. Procu- na substância dos fatos. Na realidade, a vitória do proletariado
ramos, assim, prever o futuro por meio de um trabalho de ori- no mundo inteiro significaria hoje o domínio de Moscou em to-
entação, seguindo as linhas da lógica, que forçosamente está do o mundo, como a vitória de Cristo em todo o mundo pode
na história e no pensamento de Deus. significar o domínio do Vaticano no mundo inteiro. Recorde-
◘ ◘ ◘ mos que, no fundo, o protestantismo nasceu sobretudo pela luta
Falta-nos agora apenas completar o quadro com algumas de raças. E, assim como hoje poucos combatem o Cristo, mas
observações particulares e práticas, especialmente em relação muitos combatem os padres que se proclamam ministros Dele,
ao futuro desdobrar-se dos acontecimentos. Todos os povos também poucos combatem a justiça social do comunismo, mas
que aspiram ao domínio proclamam a paz, mas a paz própria, muitos combatem o bolchevismo russo, que se proclama minis-
sob seu comando. E, para conseguir essa paz, eles fazem a tro daquela justiça. Assim, tudo é luta, porque, na Terra, as
guerra. Defendem uma nova ordem, mas uma ordem em que ideias universais, supranacionais e de superação não existem na
eles mandam e os outros servem, e, para obtê-la, subvertem e prática; ao contrário, tudo está personificado nos homens, que,
assaltam para destruir a ordem precedente, que não é a deles. por trás dos ideais, fazem um trabalho muito diferente, ou seja,
Apresentam-se sempre como libertadores, ainda que os povos lutam por sua própria vida. Esta é a realidade biológica. Imagi-
invadidos não desejem absolutamente ser libertados. Mas, des- nemos que, num quarto cheio de objetos pequenos para nosso
sa forma, os invasores, camuflando-se de libertadores, podem uso, venha habitar uma multidão de insetos. Eles utilizarão tudo
libertar-se melhor do próprio inimigo, vencer e sujeitar o povo para si mesmos, transformando-os para outros objetivos, usan-
invadido. É divertido observar esse jogo de contradições entre do-os como esconderijos e trincheiras, como meios de ataque e
o que se diz e o que se faz, jogo de ilusões psíquicas, cujas ra- defesa, para a luta de vida e de morte, que é sua principal ocu-
zões já vimos. Tudo isso porque, por trás do que se diz, está pação. Assim, as religiões e os ideais, na Terra, são transforma-
agindo a dura realidade biológica, que fala e age muito dife- dos e utilizados pelos homens, que, antes de tudo, lutam para
rentemente. Por aí se vê quanto podem valer as bandeiras hu- viver, valendo-se de esconderijos e trincheiras, meios de ataque
manas e quanta luta feroz pela vida se realiza atrás delas. Na e defesa, na luta pela vida, que é sua ocupação primordial. Só
prática, pela realidade biológica no plano de evolução animal os ingênuos podem deixar de ver essa dura realidade por trás de
do homem, cada ordem só pode estabelecer-se e manter-se tantas bandeiras desfraldadas e acreditar que se possa viver de
com a força, imposta por um dominador, já que ainda não se ideais. Estes, para atuarem na Terra, têm que dar contas à reali-
Pietro Ubaldi PROFECIAS 17
dade biológica, que muitas vezes é bestial. Quando acusamos entre os dois rivais para a superioridade técnica, que é hoje a
em nome da virtude, será que somos sinceros e verdadeiramen- condição para conquistar o mundo.
te acusamos pela virtude, ou será porque ela limita a expansão A fatalidade do embate aparece a nós oferecida pela consta-
do próximo e disso se aproveita nosso egoísmo expansionista? tação, já feita, de que as revoluções estão presas àquele ciclo já
Assim é que se prega sem crer. É assim que, na Terra, os ideais observado no período napoleônico. O fascismo e o nazismo, fi-
aparecem sobretudo como mentira. lhos de revoluções, iniciaram o mesmo ciclo, com a mesma lei,
◘ ◘ ◘ e caíram vítimas dela, como Napoleão. Vimos que revolução,
Concluamos, lançando um olhar no futuro do mundo. Se expansionismo, imperialismo e guerra são anéis da mesma ca-
quisermos compreender quais são os móveis que fazem cami- deia. Além disso, as ditaduras, como a da Rússia, absolutas e
nhar os homens na história, teremos que olhar por trás das ban- sem controle, não têm o freio da opinião pública, que pode ser
deiras e das ideologias, para a supradita realidade biológica, que usado pela consciência do povo, para deter ou ao menos retar-
é a verdade da vida na Terra. Verdade dura, mas verdadeira, que dar decisões pessoais e precipitadas. Ora, diante de uma Rússia
como tal permanece para quem olhe profundamente, ainda que, assim, tornada tão poderosa, formou-se logo, por lei de equilí-
na luta, ela goste de ocultar-se atrás de verdades fictícias e apa- brio, o antagonista proporcionado. Esse seu processo de desen-
rentes. É verdade que a história obedece em suas grandes linhas volvimento a leva pois, fatalmente, em sua aventura imperialis-
ao pensamento diretivo de Deus, imanente na história. Mas o ta, a combater o contraimperialismo dos Estados Unidos. As-
homem obedece a isso inconscientemente, pois só conhece o sim, os dois imperialismos, pan-eslavismo e pan-americanismo,
particular em que está imerso, em que se realiza não o progresso terão que se enfrentar amanhã, explodindo numa guerra aberta,
do mundo – que é confiado a mãos bem diversas – mas a expe- para com isso resolver a guerra fria, que já se processa. Nesse
rimentação do homem para amadurecer sua evolução. ínterim, os dois centros procuram agrupar em torno a si o maior
Dado isso, é fácil ver o egoísmo de nação, que é a realidade número de Estados satélites. É contínua a pressão dos dois cen-
biológica que se esconde sob as ideologias comunistas. Quem tros, e não se vê como se possa impedir a maturação da revolu-
conhece o homem e a vida jamais poderá acreditar nos procla- ção bolchevista até o seu período imperialista de conquista ati-
mados sentimentos de amor ao próximo, nem na procura de um va, com a guerra aberta pelo domínio do mundo. Se esse domí-
bem-estar que não seja o próprio. Provam-no os métodos usa- nio mundial é o programa do comunismo russo, como poderá
dos, pois o método é o que revela a verdadeira intenção de quem ele deter-se agora sem renegar a si mesmo? E como poderá não
age. Se o comunismo tem a grande função histórica de lançar e tentar, por coerência, se isto está em seu plano programado, a
de impor com a violência o princípio da justiça social a um conquista real do mundo, passando, logo que o possa, da atual
mundo surdo, isto é obra do pensamento diretivo da história, que guerra latente a uma guerra aberta de conquista?
quer o progresso do mundo. Mas a psicologia dos homens en- Se o campo de batalha será a Europa ou a Ásia, é só questão
carregados desse trabalho é movida por interesses bem diversos, de estratégia. É fato, porém, que a Europa perdeu seu poder e
racistas, expansionistas, imperialistas. Eles querem crescer e são autonomia. Suas colônias chegaram à maioridade e, com isso, se
utilizados no trabalho de destruição das velhas estruturas, para o tornam independentes. A Europa precisa hoje apoiar-se em Es-
lançamento de uma ideia evangélica, da qual seus métodos se tados mais fortes e mais armados, já que seus exércitos e sua
revelam imensamente afastados. Os homens da Rússia seguem preparação bélica estão inadequados hoje para resistir sozinhos a
os costumeiros e atávicos instintos humanos, onde estão fecha- um assalto de nações mais poderosas. Iniciou-se assim a liqui-
dos devido ao seu grau de involução biológica. Segundo sua na- dação, como potências mundiais, das várias nações da Europa,
tureza, eles aí experimentam sua vida. Ponhamos agora de lado que fica dessa forma reduzida a uma posição subordinada à de-
as grandes linhas da história e o modo pelo qual esta utiliza os fesa que lhe é oferecida por outras nações. A Europa está tor-
homens para objetivos que eles mesmos desconhecem. Obser- nando-se domínio alheio. Ela é disputada pelas duas grandes po-
vemo-los, ao contrário, no modo particular de sua ação, segundo tências, que não só buscam apoderar-se dela como, por outros
as realidades biológicas em que se movem. Nesta posição, a psi- métodos, já a invadiram e a possuem em parte, uma ajudando-a
cologia da história salvadora e construtiva do progresso está e protegendo-a, outra penetrando-a como partido político.
longe. Temos ao invés uma psicologia particular, egoísta, desa- Para tudo isso haveria uma só defesa: a unificação. Mas ne-
piedada, feita de lutas, de golpes e contragolpes, em que se joga nhum dos dois países rivais parece querê-la, porque uma Euro-
duro, em que se termina ou com a vitória, tendo por prêmio a pa unida formaria uma terceira grande potência, com quem de-
vida, ou com a derrota, tendo por castigo a morte. pois teriam que fazer contas. E a própria Europa parece não sa-
Neste terreno, Rússia e Estados Unidos são dois centros de ber superar os velhos rancores e divisões nacionalistas. A pres-
egoísmos desenfreados, dois imperialismos rivais até à morte, são que a ameaça russa exercita neste sentido é forte e verda-
pela conquista do domínio do mundo. As ideologias não têm deiramente benéfica, porque a impele realmente para a forma-
influência. Esta é a realidade biológica. Os princípios procla- ção de uma nova grande unidade, o que é indiscutivelmente um
mados são apenas mantos que a escondem, são propaganda pa- progresso, mesmo que, na ideologia russa, esteja previsto tudo,
ra conquistar prosélitos. Cada um dos dois enaltece seu pro- menos essa realização, a qual, entretanto, está nos planos da
grama como o mais belo, mas ambos fazem a mesma coisa. história. Contudo, por mais obstáculos que encontre e por mais
Posto isto, a tendência a um choque é um fato; o choque é ex- difícil que isto seja, não há outra solução, se a Europa não qui-
tremamente provável, e a ameaça pende sobre o mundo. O que ser acabar como escrava, submetida a um ou outro dos dois
refreia os dois é o medo recíproco, daí sua corrida aos arma- grandes imperialismos. São estas as forças em contraste no ter-
mentos, não obstante a contínua propaganda da paz, justamen- reno da velha Europa. Cada uma das nações é atacada em sua
te porque eles só acreditam em sua própria força. Eles se espi- autonomia e teme perder sua independência, que não quer ver
onam, e tão logo um deles tenha a certeza da própria superiori- sacrificada. É esse separativismo egoísta, essa rivalidade que
dade e da inferioridade do outro, estará pronto a saltar-lhe em divide, o perigo que hoje faz a Europa fraca e pode amanhã tor-
cima para liquidá-lo. Então, entre os dois colossais pacifistas ná-la escrava. Não há dúvida de que ser reduzido a um objeto
há questão apenas de preparação. São as grandes fábricas ame- disputado por outros, que brigam para dominá-la, significa ter
ricanas que, por terem superioridade técnica e produção bélica, perdido o primado do mundo e encaminhar-se para a liquida-
detém a Rússia em seu caminho para a Europa. Sem isto, nada ção. Não se acha hoje a Europa nas mesmas condições em que
mais a deteria e a Europa sofreria uma invasão, sendo subme- se achava a antiga Roma, no fim de seu império? Mesmo no ca-
tida a um domínio eslavo em nome da justiça social. Daí a luta so em que chegue a unificar-se, conseguirá ela ressurgir, ou sua
18 PROFECIAS Pietro Ubaldi
civilização já está em liquidação, com as invasões bárbaras às eles já foram demonstrados e colocados com lógica. A pesqui-
portas, tal como ocorreu à antiga Roma? E poderá a Europa, sa histórica que aqui realizamos, sobretudo projetada no futu-
mesmo unificada, resistir à pressão proveniente dos dois impe- ro, é dirigida, pois, com método positivo, racionalmente con-
rialismos que a disputam, mais primitivos porém também mais trolado, ao longo do fio do desenvolvimento de um processo
jovens do que ela, que já esgotou seu papel histórico imperialis- lógico. Só isso nos podia dar garantia de seriedade, permitindo
ta e colonizador, como dominadora do mundo? a maior aproximação possível do verdadeiro terreno dos acon-
Como se vê, no terreno do particular, temos muitas forças tecimentos históricos. Não desejamos, portanto, realizar aqui
contrastantes em ação, ligadas ao seu desenvolvimento lógico. trabalho de adivinhação, nem dar prova de faculdades proféti-
De um lado a Revolução Russa, que hoje funciona como motor cas. Isso exorbitaria de nosso propósito, que é conseguir a ori-
propulsor da história de nosso tempo, revolução que já desem- entação e a previsão mais provável dos acontecimentos futu-
bocou no imperialismo, a que está ligada para firmar-se, sem o ros, com os meios mais positivos. Se nos guia a intuição profé-
que faliria; de outro lado, contra esta nova potência, opõe-se tica, isto é o que menos deixamos transparecer aqui. Por isso,
como equilíbrio o contraimperialismo Norte-Americano e a em vez de uma linguagem simbólica, usamos aquela simples e
unificação europeia e de todas as nações menores, para sua de- clara da vida cotidiana. Temos a segurança dos princípios ge-
fesa comum. Essas forças opostas tendem a embater-se, para se rais, que aplicamos e tomamos como guia em nossa pesquisa
resolverem no choque, englobando atrás de si as forças meno- histórica. Mas, quando descemos ao particular, preferimos fa-
res. É esse o trabalho dos homens, em que eles experimentam lar de probabilidade, em vez de esconder o pensamento numa
sua própria vida, seguindo seus instintos e as leis da realidade linguagem sibilina, simbólica e de sentido figurado, que parece
biológica de seu plano de evolução. Acima de tudo isso, há os feita para dizer sem dizer, escrita em função de uma chave ex-
grandes planos, segundo os quais a inteligência da história uti- plicativa, à mercê dos intérpretes. Essa necessidade, para al-
lizará todos esses acontecimentos particulares para atingir ou- gumas previsões, de ter que recorrer a uma intervenção póstu-
tros objetivos, como a unificação de nações em grandes unida- ma de especialistas na arte de resolver enigmas, não pode fazer
des coletivas, a destruição do velho para plantar a novo, a afir- parte de um trabalho positivo. A indagação do futuro, nos de-
mação no mundo do princípio da justiça social, a liquidação de vidos limites e até certo ponto, pode ser feita também por via
todas as guerras e dos governos agressivos e violentos, quando racional, à qual é indispensável recorrer sempre, para controlar
eles já tiverem cumprido sua função destrutiva, hoje útil. os resultados da própria faculdade de intuição, os quais, se to-
Assim, neste duplo binário, caminha a história. Há o traba- mados levianamente e sem discussão, podem muitas vezes se
lho do homem, necessário a ele para aprender, e também o tra- confundir com a pura fantasia. Contra esse perigo, em que é
balho de Deus, que dirige a história. Há em baixo um mundo fácil cair, estamos sempre em guarda.
de velhacarias, onde se combate ferozmente a dura luta pela Nossa força nesta pesquisa consiste em ter atrás de nós um
vida, e há na alto um mundo de sabedoria e bondade, em que caminho já percorrido em muitos volumes, em que foi estuda-
Deus guia os acontecimentos, canalizando-os para o bem, se- do o funcionamento das leis que guiam o ser em todos os cam-
gundo a linha da evolução. Duas atividades paralelas entrela- pos. Nossa força consiste em poder hoje localizar esta nossa
çadas, que se interpenetram e, na realidade, fundem-se para re- indagação histórica no seio de um sistema de que ela faz parte;
alizar uma só obra: o progresso do mundo, guiado por Deus e consiste em poder, portanto, dar uma explicação lógica de cada
executado pelo esforço do homem. Este pode lutar, sofrer, er- conclusão nossa, obtida em função da solução já conseguida de
rar, expiar, mas não pode dirigir, porque não sabe. É necessária tantos outros problemas. Só assim podemos fazer descer a ins-
a experimentação humana para que o homem possa aprender e piração no terreno racional de todos, tornando-a compreensível
assim progredir, mas é indispensável também um guia inteli- a todos. Nossa força consiste em permanecer sempre unitários
gente e sábio, para poder canalizar todo esse esforço para alvos e unidos aos princípios universais, mesmo quando descemos
precisos e benéficos, sem o que não se realizaria o progresso. nas particularidades dos acontecimentos históricos no tempo.
E é lei que o progresso se realize. Parecemos, por exemplo, estar muito longe, neste volume, dos
O dinamismo de nosso século é produzido pela Revolução princípios de teologia do volume Deus e Universo, no entanto
Russa, assim como o do século passado foi representado pela nos movemos na mesma ordem de ideias, e nossas conclusões
Revolução Francesa. Cada revolução é uma explosão, uma atuais são apenas consequência daquelas longínquas premissas
erupção vulcânica das forças da vida, que irrompem e, depois, cósmicas. O todo permanece uma verdade una, seja tratemos
são assimiladas durante um século de história. Também a Re- da queda dos anjos ou da redenção de Cristo, seja tratemos,
volução Francesa destruiu um mundo, para que se reedificasse como aqui, da atual hora histórica e do futuro próximo do
outro. Assim a Revolução Russa desempenhará a função de mundo. Essa unidade de pensamento e de visão nos dá potên-
destruir um mundo, para que se passa reedificar outro melhor. cia, porque nos achamos diante de uma construção conceptual
É dessa forma, através desse trabalho imenso, onde se chocam em que cada parte se escora e se confirma na outra, e todas
forças cegas e forças inteligentes – tremendo embate guiado pe- juntas reforçam a mesma verdade. Atrás de cada afirmação
la potência do espírito – que é elaborado o terreno e são amadu- ecoam muitas afirmações paralelas, coordenadas num só bloco,
recidos homens e acontecimentos, para que possa nascer na organicamente colocadas numa lógica única. Não se pode tirar
Terra a nova civilização do III Milênio. uma pedra sem que desmorone todo o edifício. Mas como fa-
zê-lo desmoronar, quando a razão nos diz que cada pedra está
II. O PENSAMENTO E A VONTADE DA HISTÓRIA em seu lugar certo e cada conclusão resolve harmônica e orga-
nicamente um problema que, doutra forma, permaneceria inso-
Procuremos compreender ainda melhor, neste capítulo, a lúvel? A mente que uma vez compreendeu estas explicações
afirmação do precedente, confirmando-o com novas considera- das coisas, não sabe mais renunciar à sua satisfação e jamais
ções, que nos permitam completar a observação de outros pon- poderia decidir-se a recair na ignorância e no caos.
tos de vista. Anteponhamos, então, alguns esclarecimentos de Dessa forma, se este livro é um livro de inspiração proféti-
caráter geral. ca, é também um trabalho de aplicação dos princípios científi-
Já vê o leitor que, nesta obra, não expomos cegamente os cos, espirituais, sociais e teológicos dos nossos volumes prece-
resultados de uma intuição profética, mas que procuramos, so- dentes, princípios transportados para um terreno muito diverso,
bretudo, fazer uma construção racional, de índole histórica, o histórico. Tudo isso dá ao processo inspirativo, aqui dirigido
com base em princípios gerais, deduzidos de um sistema onde no sentido profético, a força de método. Disciplinar racional-
Pietro Ubaldi PROFECIAS 19
mente um fenômeno tão desusado e incontrolável em seu fun- Retomemos agora a observação de nosso momento históri-
cionamento, pode ser uma conquista útil para facilitar sua com- co. Parece-nos fora de dúvida, e consequência lógica de quanto
preensão e aperfeiçoamento, para torná-lo acessível a um maior dissemos acima, a existência real de uma onda histórica. É ela
número de pessoas, para torná-lo mais positivo e, assim, solidi- que exprime as oscilações do pensamento diretivo da história.
ficado pelos controles, que em geral faltam. Fazer profecia po- Deve-se a ela a valorização e o aproveitamento dos chefes diri-
sitiva; manobrar a intuição, colocando-a sob controle, admitin- gentes. Desse modo, ela eleva ou rebaixa os homens, como se
do nas próprias capacidades perceptivas supranormais a possi- fora o pedestal dos chefes. Esse pedestal pode ser tão alto, que
bilidade de erro, mas circundando-o racionalmente para elimi- ajude um pigmeu a parecer um gigante; e pode ser tão baixo,
ná-lo o mais possível; enquadrar tudo num método que procede que faça um gigante parecer um pigmeu. Em grande parte, são
a fio de lógica, não é trabalho inútil. E isto queremos fazer aqui. as forças do destino de um homem ou de um povo que lançam e
Em verdade, a razão e a lógica não são suficientes, sozinhas, valorizam homens e acontecimentos, forças mais poderosas que
para prever o futuro, que só a inspiração pode atingir. Mas po- a vontade e que o valor de cada um. Mas, precisemos.
dem elas ser de enorme auxílio para escolher, controlar, elimi- Se quisermos julgar com equanimidade e equilíbrio, deve-
nar, comparar e até prever, dado que não podemos excluir uma mos dizer não só que a onda histórica é o pedestal capaz de
lógica na sucessão dos acontecimentos históricos. Enfim, fazer destacar e aproveitar um valor que, sem isso, permaneceria in-
da inspiração também um método de indagação do futuro, pode visível na sombra, mas também que, para se ter um grande
dar ao presente estudo não só um valor contingente, em função homem na história, não basta um pedestal que erga um tolo,
do atual momento histórico, mas também um valor independen- mas é necessário, outrossim, contar com um homem de valor,
te disso. Em outros termos, este volume pode servir não só pa- que saiba dignamente obrar sobre esse pedestal. Com efeito, a
ra prever o futuro que nos aguarda, em função do nosso pre- história, da mesma forma que deixou à sombra homens de va-
sente e do nosso passado, mas ainda para prever qualquer futu- lor, também ergueu às culminâncias nulidades, com o resulta-
ro, mesmo partindo de pontos de vista diversos, situados em do único de assim fazer aparecer bem alto e evidente a sua mi-
outros momentos históricos. O sistema que aqui aplicamos ao séria. A vida produz na massa tal riqueza de tipos, que tem
momento histórico atual poderá, mudadas as condições de fato, sempre à mão para escolher tudo de que necessita para cada
ser aplicado a outros momentos históricos, porque, mesmo função histórica. É possível mesmo que sua sabedoria chegue
mudando as posições, permanecem imutáveis os princípios ge- ao ponto de produzir, com antecipação, os homens que mais
rais com que elas são analisadas em relação ao seu futuro. De tarde lhe servirão na hora apropriada.
tal modo que, mesmo se as previsões deste escrito não se veri- Poderá parecer estranha a alguns esta nossa fé numa dire-
ficassem, ou apenas se verificassem em parte ou de forma dife- ção inteligente, por parte de uma mente superior, presente nos
rente, ficará positivo o trabalho do estudo de um método de acontecimentos históricos. Mas é evidente que também não
pesquisa histórica, baseado na intuição e controlado pela razão. podemos absolutamente acreditar que o caminho da história
Isto poderá ser útil em posteriores pesquisas, sobretudo pela seja abandonado às diretrizes conflitantes de cada um, pois,
possibilidade de aperfeiçoamento do método, que poderia le- abandonados a si mesmos, apenas gerariam o caos. Como não
var-nos a resultados mais perfeitos. há caos nos fatos, é porque, apesar de tudo, a história caminha
Outra razão nos induz a nos apegarmos à lógica, mesmo na- e o mundo evolve. Tudo isso, dado que corresponde a um pla-
vegando em pleno processo inspirativo. Segundo o que já cons- no inteligente e orgânico, não pode ser trabalho do homem,
tatamos, o funcionamento orgânico do universo corresponde a que se propõe objetivos totalmente diferentes, pessoais, e não
um processo lógico, que é a Lei, a qual exprime o pensamento coletivos. Quem seria então o autor disso? É essa vontade su-
de Deus. E a história humana é apenas um capítulo do desen- perior que escolhe os homens adequados, utiliza-os, enquadra-
volvimento do livro do ser, em que atua o divino pensamento. os num trabalho que eles não veem, mas executam, e os dispõe
A história, pois, não só obedece a uma inteligência dirigente, num desenho que só aparece depois, visto de longe. É assim
mas também exprime o desenrolar-se de um processo lógico. que eles acabam fazendo o que não tinham intenção de fazer,
Não achamos nenhum fenômeno que não obedeça a uma lei; começando para um lado e terminando no lado oposto. Dessa
não podemos admitir, portanto, que o fenômeno histórico, prin- forma, eles pensam que vencem e dominam por si mesmos,
cipal caminho da evolução humana, caminhe agitando-se no mas, ao contrário, lutam com o destino, representado no terre-
caos, sem possuir a sua própria lei. Devem existir metas preci- no social pela vontade da história, que os comanda. O homem
sas. E, quando conhecemos a lei de desenvolvimento e a mar- luta por si mesmo, mas é a onda histórica, ao invés, que o ar-
cha de um processo lógico, mesmo que parcialmente e apenas rasta para onde ela quer e só ela sabe. Quem compreendeu isso
no seu início, poderemos, por força da lógica, deduzir sua con- tem a sensação tremenda da presença viva de Deus na história;
tinuação e sua conclusão, pelo menos muito provavelmente, até um Deus que respeita a liberdade do indivíduo, mas jamais lhe
atingir aquelas metas. Há uma trajetória de desenvolvimento permite ultrapassar o limite que lhe foi designado e alterar as-
em todos os fenômenos, inclusive nos históricos; há um anda- sim Seus planos. Que se tornam, então, os grandes homens
mento que exprime a lei que o individua, estabelece sua nature- comparados com isso? Eles podem seguir, livres e responsá-
za, traça seu caminho. Nossa tarefa aqui consiste em captar por veis, a própria vontade, mas são escolhidos e lançados de tal
inspiração o fio da lógica do pensamento diretivo da história, modo que seu rendimento social e sua função histórica atuem
sobretudo o de hoje, que é o que mais nos interessa, para depois de acordo com a vontade dirigente de Deus. Sua atividade pes-
desenvolvê-lo analiticamente, nos pormenores. Ora, cada lógica soal está subordinada aos objetivos da vida, em relação ao
tem que ser um processo de desenvolvimento obrigatório ao grande organismo coletivo, de que eles são células. Dessa for-
longo de seu próprio caminho, tal como foi iniciado, que deve, ma, tudo se reduz, em ultima análise, a um instrumento mais
segundo suas características no trecho conhecido, indicar-nos ou menos perfeito e obediente, sempre guiado por Deus. Em
sua continuação e conclusão, mesmo no trecho a nós desconhe- nossa imperfeição humana, onde domina a liberdade, que só
cido. É assim que nossa pequena lógica humana, aderindo à pode ser filha do relativo, tudo desce do mundo divino do ab-
grande lógica de Deus, que não pode deixar de ser lógico, pode- soluto, onde tudo é perfeito e, portanto, determinístico.
rá chegar à compreensão de Seu pensamento e vontade, pre- A história adquire, então, significado bem diverso quando a
vendo assim, somente para nos fazermos Seus instrumentos de vemos não na ação de cada homem, mas sim no conjunto de
bem, os acontecimentos futuros. suas atividades, todas elas ligadas, sem que eles o percebam,
◘ ◘ ◘ ao plano universal que rege a evolução vida. Então, aos nossos
20 PROFECIAS Pietro Ubaldi
olhos, a história resultará não mais feita pela ação de cada che- isso vencido devem pagar depois. Quando as revoluções sur-
fe, nem pelos acontecimentos de massa, com seus elementos gem e abatem a ordem precedente, trata-se sempre do saldo
exteriormente desconexos, mas apenas pelo fio condutor de devedor de uma velha conta, feita de abusos e injustiças,
todas essas atividades e acontecimentos. Somente este fio pode mesmo se tudo estava protegido legalmente e enquadrado
dar um significado lógico à história, que lhe assinala o desen- numa ordem jurídica. A justiça formal e apenas aparente não
volvimento. Só assim poderemos compreender o pensamento pode ser suficiente para sustentar com estabilidade as posi-
diretivo da história; só assim poderemos compreender o por- ções sociais. Há outra justiça substancial na vontade diretiva
quê da sucessão dos fatos, sua conexão e a meta a que tendem. de Deus. E quando, pelo próprio egoísmo, não se a leva em
Só assim é possível, num terreno de pesquisa racional, prever conta, caindo-se no abuso, o edifício da ordem vigente rui e
os acontecimentos futuros. não haverá força humana que consiga sustê-lo.
A história, a quem nós agora, com base no que dissemos Hoje, a burguesia capitalista – que, na Revolução Francesa,
acima, já atribuímos uma personalidade, pode querer as revolu- suplantou a aristocracia de então, para substituir a injustiça dos
ções, quando elas forem necessárias para o progresso. As clas- privilégios pela justiça da igualdade e liberdade – vem come-
ses dominantes, com a finalidade de garantir para si definitiva- tendo as mesmas injustiças (que agora paga) daquela aristocra-
mente as vantagens conquistadas, recorrem à legalidade, disci- cia, permitindo assim o nascimento do comunismo, que se sub-
plinando-as juridicamente como direito, no próprio sistema de leva de novo em prol da justiça, ao menos teoricamente, mas
ordem, crendo, com isso, que podem incorporar permanente- comete na prática os mesmos erros, que igualmente terá de pa-
mente aquelas vantagens. Dessa forma, desejariam parar a his- gar. Assim se explica a divulgação dessas doutrinas, sejam elas
tória, apenas para favorecer sua egoística vantagem. Acontece, aplicadas como o forem, e isso porque elas respondem a um
então, que a onda histórica, avolumando-se nas massas e er- novo impulso da vontade da história em direção da justiça. Se a
guendo-se, despedaça essa resistência e, para liquidar as posi- burguesia tivesse usado justiça na distribuição da riqueza, se
ções que não se desprendem dos homens, acaba por matá-los. É não houvesse repetido com a centralização capitalista os erros
constrangida a isso porque os homens querem amarrar a si da aristocracia francesa, hoje as ideias comunistas não teriam
mesmos, de forma indissolúvel, suas posições. Para destruí-las, achado nada que destruir, nenhuma justiça para impor, nenhum
eles devem forçosamente ser mortos, pois estão a elas ligados terreno sobre o qual prosperar. Essa é a lógica da história: os er-
de tal forma, que não podem ser arrancados. Não há outro ros se pagam. Leis iguais para todos: tanto para os homens da
meio. Se eles assumissem posições destacáveis de suas pessoas, ordem, que se servem dela com vantagem só para si e desvan-
isso não seria necessário. Mas julgam que dessa forma conquis- tagem para os excluídos, como para os homens da revolução,
tariam posições mais estáveis e definitivas, provocando assim que assaltam essa ordem com a violência, para substitui-la por
sua própria destruição, ao invés de uma simples separação, pois uma nova ordem, mas apenas em vantagem própria. Tudo isso
a onda histórica não pode deter-se. Se a aristocracia francesa porque, acima do louco egoísmo, em que os homens de todos
não estivesse amarrada, como seu rei, a seus direitos e pudesse os regimes se identificam, há uma vontade superior, mais inte-
ter sido separada deles, não teria sido necessário seu extermí- ligente e poderosa, que dirige os acontecimentos e faz caminhar
nio. Mas, ao contrário, estava tudo tão solidamente enlaçado à a história em sentido evolutivo. Tudo, assim, está enquadrado
cadeia hereditária, que queria ser eterno. Só um extermínio po- no mesmo processo lógico, os homens da ordem e os homens
dia quebrar tal cadeia. E o absolutismo dos dominadores punha da revolução, e todos juntos sofrem, cada um a seu turno, ora
os revolucionários na posição de rebeldes contra a ordem cons- passivos, ora ativos, o mesmo processo de purificação. Haveria
tituída, de delinquentes contra a lei. Daí proveio que, logo que um único sistema para livrar-se disso: já ser puros. Se o homem
estes tomaram posição – a posição dos outros – a vitória, des- fosse tão inteligente, que compreendesse qual é a vontade de
truindo o inimigo, foi questão de vida ou de morte. Houve me- Deus a seu respeito – seja como indivíduo, seja como coletivi-
do e perigo real. Não havia escapatória. Ou matar ou morrer. E, dade – e fosse tão bom, que a aceitasse e seguisse, tudo seria
para não morrer, matar. Um dos dois tinha que morrer: ou a re- perfeito e decorreria tranquilamente, sem necessidade dessas
volução com seus homens, ou o regime monárquico e sua aris- intervenções cirúrgicas e de tão dolorosos corretivos. Mas o
tocracia. Isso é uma verdade para qualquer revolução ou mu- homem é um ser decaído. As razões teológicas do volume Deus
dança de governo e, portanto, interessa também à hora atual. E e Universo dão-nos a explicação da ignorância humana e da ne-
é por isso que, a cada mudança de governo, ocorre a depuração, cessidade de reconquistar a sabedoria, tornando a subir, na dor
isto é, a liquidação dos supérstites do regime precedente, depois e no erro, a estrada da perfeição. Deriva justamente dessa posi-
que foram liquidados o chefe e a classe dirigente. É medo e pe- ção do homem a necessidade de uma direção superior e inteli-
rigo real. É questão de vida ou de morte – destruir o inimigo até gente do caminho da história, que, de outra forma, não teria
o último de seus sobreviventes. rumo, como um navio sem piloto.
Tudo isso poderia ser evitado se os indivíduos compreen- O homem constrói edifícios sociais em ordens sucessivas,
dessem a história e estivessem prontos a desprender-se de suas que, ruindo um após outro, ressurgem em outro mais evoluído e
posições, quando ela o exige. E seria ainda melhor se eles, pelo perfeito. Se a ordem precedente fosse perfeita e justa, não have-
fato de não desempenharem sua função histórica para o bem e ria necessidade de revoluções para destruí-la e sobrepujá-la com
progresso coletivo, não se colocassem nas condições de forçar outra nova. São elas assim necessárias e têm um valor negativo
a história a exigi-lo. É essa sua incompreensão que constrange enquanto destroem e varrem o terreno, mas, ao mesmo tempo,
a história a forçar as posições, que eles, em seu egoísmo cego, possuem um valor positivo enquanto semeiam o novo, que nas-
quereriam deter em seu próprio e exclusivo beneficio, esque- cerá depois. Quando, na vida dos povos, se apresenta a necessi-
cendo que a vida deve progredir e que esta é a irrefreável von- dade dessa renovação, a sociedade entra num estado febril, e o
tade da história. É por isso que reis, chefes e classes dirigentes pensamento e a vontade diretiva da história realizam a operação
são assassinados e violentamente liquidados, com uma feroci- cirúrgica. Entram em ação numerosas forças, muitas vezes em
dade que não seria necessária, se todos, tanto os homens do conflito. Os instrumentos são os mesmos homens que, inimigos
novo como os do antigo regime, compreendessem o trabalho entre si, castigam-se mutuamente. Se a lógica da história exige
que lhes pede a historia e soubessem executá-lo, obedecendo a uma revolução, ela lhe abre as portas e a convida a entrar no
ela, de pleno acordo entre si. Porém, em sua ignorância, não corpo do velho regime. Da mesma forma que os micróbios pa-
sabem agir assim, mas apenas matar-se, num círculo vicioso togênicos no corpo humano, a revolução também testa a resis-
de perseguições e delitos, onde aqueles que acreditam ter com tência e o valor daquele regime, de tal modo que ele, se ainda
Pietro Ubaldi PROFECIAS 21
está forte, resiste e vive, mas, se está fraco, então perece e é des- que ela é a mais forte, e quem não se conforma com ela, seguin-
truído. A vida não quer os fracos e submete ao assalto tanto os do sua correnteza, soçobra. Deveriam os chefes procurar, antes
indivíduos como os povos, para que só os mais fortes sobrevi- de tudo, compreender se a vontade da história está com eles; de-
vam. Nos alicerces da política estão as leis fundamentais da vi- veriam evitar engajar-se numa luta contra a vontade da história,
da. É assim que esta, da mesma maneira que oferece a fraqueza pois jamais poderão vencer essa batalha, dado que o oponente é
orgânica de um indivíduo como um convite aos assaltos dos mi- infinitamente mais poderoso e inteligente que qualquer homem.
cróbios patogênicos, também oferece a fraqueza de um orga- E, quando uma revolução é necessária e, portanto, imposta pela
nismo social-político como convite aos assaltos das revoluções. vontade da história, os chefes da velha ordem deveriam compre-
É um fato que, nas revoluções, achamos muitas vezes, na endê-lo e retirar-se espontaneamente, sem opor inúteis resistên-
defesa do antigo regime, um rei-fantoche. Existe, nos planos da cias, que só podem levá-los a epílogos de sangue. Quantas dores
história, quase que uma proporção entre a fraqueza do organis- e quantos danos poderiam ser evitados para todos, nas vidas dos
mo que deve ser destruído e o poder caudaloso da nova onda, indivíduos e das sociedades, se a conduta humana fosse guiada
que deve destruí-lo. Há uma sábia dosagem de forças nos dois com mais inteligência! Aqui, também temos que concluir como
impulsos opostos, para que a nova ordem, que deve vencer, te- acima: o homem é um decaído. E as razões teológicas do volu-
nha sua tarefa facilitada, quando esta faz parte dos planos da me Deus e Universo nos dão a explicação da ignorância humana
história. Se a Revolução Francesa tivesse tido diante de si um e da necessidade de reconquistar a sabedoria, tornando a subir,
Luís XIV, não o teria derrubado. Se a revolução comunista ti- no erro e na dor, o caminho da perfeição.
vesse achado pela frente um Pedro, o Grande, ou uma Catarina ◘ ◘ ◘
da Rússia, não teria vencido. Mas, ao contrário, acharam-se, au- Baseando-nos nos princípios acima expostos, procuremos
tomaticamente, numa fácil posição de superioridade diante do agora compreender a natureza e a posição da onda histórica que
inepto Luís XVI e do manso Czar Nicolau. A vida ajuda todos domina hoje o mundo, aquela que poderia ser chamada a onda
os homens e movimentos que têm uma função biológica e deixa que carreia homens e acontecimentos. Quais são as característi-
sem defesa os que não a têm. E também pode ser função bioló- cas do nosso tempo e, sobretudo, das classes e povos dirigen-
gica a liquidação de uma classe social dominante ou de um re- tes? Seus métodos e concepções dominantes revelam sua natu-
gime, quando não mais correspondem à utilidade da vida e se reza. São práticos, utilitários, filhos de uma concepção materia-
fizer necessária sua eliminação para os objetivos da evolução. lista da vida. A arte, a música, a literatura e a pintura contempo-
Nos equilíbrios biológicos, até o assalto patogênico tem uma râneas, tudo o que pode exprimir o que é a alma e sua elevação,
função. Qualquer pessoa pode verificar, mesmo em sua vida in- apresenta-se negativo, isto é, não caminha em subida, mas em
dividual privada, que algumas coisas querem acontecer, e ou- descida; não é construção, mas destruição de valores. Espiritu-
tras não, como se houvera nelas uma vontade que resiste à nos- almente, o mundo considerado civilizado está em fase de disso-
sa e é independente dela, ou seja, obedece a outras diretrizes, lução. Não nascem mais os gigantes do pensamento e, quando
que não são as nossas, que nós desejaríamos impor. nascem, ou se adaptam ou morrem. A simplicidade, que é a
As revoluções nascem de um punhado de aventureiros, situ- forma das grandes horas e dos homens e povos que têm algo de
ados fora da lei, que assaltam o colosso da ordem já constituída. importante a dizer, já desapareceu. A madureza da civilização
Quem ajuda e determina uma tão inexplicável vitória numa luta europeia já avançou até ao bizantinismo vazio, até à sutilização
tão desigual? Poder-se-ia objetar que é a fraqueza do chefe ou complicada, sem conteúdo real. A civilização adiantada demais
do regime que determina uma revolução. Mas houve muitos traz um excessivo aperfeiçoamento da forma, em dano do con-
reis e governos fracos, sem que por isso tenham surgido revolu- teúdo. Assim, os gregos não podiam compreender a simplici-
ções. Para que eclodam, é necessário não somente essa fraqueza dade retilínea de um São Paulo, que falava no areópago. A ma-
da velha ordem, mas também a força nascente da nova. Para turação excessiva se torna, em dado momento, putrefação, e o
que haja renovação, é indispensável esse encontro de posições fruto maduro demais não nutre, mas envenena. A simplicidade,
opostas. Podem existir governos fraquíssimos, que por ninguém que é a primeira qualidade da verdadeira grandeza, não existe
são assaltados, porque a história, nessa ocasião, nada tem para mais na época atual, está perdida atrás de cerebralismos artifi-
renovar. Podem aparecer, também, ideias novas que se chocam ciais, atrás de uma riqueza e complexidade de formas que pro-
contra um governo forte que as sufoca. Nestes dois casos, a re- cura esconder o vazio interior e a tristeza de uma produção es-
volução não nasce. Mas, quando a hora renovadora de uma re- piritual que nada diz à alma. O simplismo na arte é artifício, o
volução soou e a história quer e está pronta para dar um passo seu primitivismo é fingimento. As próprias palavras não têm
adiante, subindo mais um degrau da evolução, quem é que pro- mais seu simples significado ordinário e só se tornam acessí-
porciona tudo, ou seja, a fraqueza decrépita do velho regime e a veis em seus valores recônditos e enigmáticos, sob os quais
inaptidão do chefe, de um lado, e, do outro, o juvenil poder das nada existe, para uma classe de iniciados.
ideias e forças renovadoras e a capacidade revolucionária dos De nada adianta verberar tudo isso. Podemos apenas cons-
assaltantes? Quem é que, nessas horas trágicas, em que se re- tatar que é essa a psicologia dominante, que é essa a corrente
nova a vida dos povos, dá um impulso a um lado e paralisa as em que caminha a maioria. É assim o homem de hoje, e essa é
resistências que, no outro, poderiam detê-lo? Se o velho regime sua estrada. Quem pode detê-lo? Esta é a fase do mundo civili-
ainda tem em mãos todas as rédeas do comando, como é que, zado de hoje, a onda que domina o mundo. Ela é o resultado de
naquelas mãos, elas não funcionam mais? Que nova força sutil processos milenários. Como lutar agora contra essa onda histó-
é essa que, de fato, a imprensa paga não pode criar, que mina rica? Não lembra ela a corrente que dominava o Império Ro-
tudo interiormente e pela qual a velha máquina não funciona mano nos tempos de Cristo, quando ninguém mais acreditava
mais, o exército não obedece, o dinheiro não serve, tudo se re- nos deuses? Ou o ambiente da vazia e madura civilização da
bela e a opinião pública se orienta por si mesma? aristocracia francesa, à véspera da revolução? Não é o materia-
Quem governa os povos deveria conhecer esses imponderá- lismo religioso, tal como o capitalismo egoísta de hoje, essen-
veis, que, sem dúvida, são leis inteligentes, forças vivas. Falam cialmente o mesmo de então, e não cometeu e comete os mes-
por meio do subconsciente das massas e as constrangem a agir. mos erros? E contra este último, não se está levantando, em
Deveriam compreendê-las os chefes, quando elas se põem em dimensões proporcionais aos novos tempos, uma revolução
ação e, ao invés de impor sua personalidade, deveriam antes semelhante, da parte de todos os deserdados do mundo, que se
procurar compreender o momento histórico, para obedecer à preparam para o assalto com os mesmos métodos destrutivos e
vontade da história, em lugar de querer impor-se a ela. Isso por- violentos da Revolução Francesa?
22 PROFECIAS Pietro Ubaldi
Ao invés de fazer um sermão, já agora inútil, ou de profeti- Estas ainda são realizações remotas. No entanto, hoje, o atual
zar a desgraça aos cegos e chorar sobre o futuro do mundo, pre- progresso técnico nos prepara para elas e nos abre o caminho. O
ferimos analisar o fenômeno, para demonstrar nossas conclu- mundo necessita de cada vez menos ferocidade e mais inteligên-
sões pela lógica. E isto especialmente porque a racionalidade é cia, que é, sem dúvida, um meio para chegar à bondade. E a má-
uma das qualidades do espírito em que o mundo de hoje ainda quina não está contra essa transformação. A própria guerra está
acredita. Hoje admiram-se mais os grandes matemáticos do que cada vez mais se tornando um problema de produção industrial e
os santos, mais os cientistas que fazem descobertas do que os técnica e, cada vez menos, um problema de ódio pessoal contra
homens bons e puros que amam o próximo. As potências da ci- um inimigo, que muitas vezes é hoje desconhecido e contra o
vilização só destilam hoje os valores da intelectualidade. Até a qual não se nutre nenhum sentimento. Essa eliminação do ódio
arte, o coração e o sentimento se tornam cerebrais. feroz e sanguinário já é algum progresso, considerando-se o que
Não se tem mais fé nos valores do espírito, mas apenas no é o homem, que assim, ao menos, fica constrangido, na guerra,
progresso técnico. Acredita-se cada vez mais na máquina. No não tanto à ferocidade, hoje cada vez mais inútil, quanto ao traba-
entanto o progresso material se paga com carências espirituais, lho cerebral de dirigir sua máquina de guerra. Não se poderia
as hipertrofias nos equilíbrios da vida implicam corresponden- pretender hoje maior progresso. Além disso, o homem que, com
tes atrofias. O progresso técnico é, não resta dúvida, uma gran- a guerra mecânica, mata gente que ele não conhece, pode con-
de conquista. Quando, porém, para obter essa conquista, atrofi- vencer-se mais facilmente da estupidez da guerra do que aquele
am-se os recursos espirituais do homem, isso significa que ela que tem que matar um inimigo vizinho para defender a própria
nos custa a perda da luz das grandes diretivas, o que nos deixa esposa e os filhos. Mas isso não é tudo, pois cada vez mais nos
perdidos, sem guia no caminho da vida. Quando a análise, mãe aproxima do fim das guerras o fato de que a técnica nos leva a tal
da técnica, supera a síntese, o homem, desorientado, não pode poder destrutivo, que não se poderá fazê-la sem que todos fiquem
caminhar senão por tentativas, ao acaso. E, de fato, ele caminha aniquilados. Como se vê, a onda histórica que agora carreia ho-
por tentativas, sem uma perspectiva clara de seu futuro. Mas mens e acontecimentos, se por um lado está destruindo, por outro
nem por isso a vida não se extravia, pois já vimos que a história lado está hoje semeando para o futuro. E, de fato, desenvolve a
é sábia por si mesma e não necessita, em absoluto, da ajuda da inteligência para chegar àquela sua forma superior, que é a bon-
inteligência do homem para progredir. É inútil, pois, pregar e dade. Com a máquina, liberta-nos da escravidão material e eleva
advertir. Esta é a corrente do mundo de hoje: destrucionismo. É o nível da vida; com a técnica bélica superdestrutiva, prepara-se
essa a onda histórica presente. Mas esta é apenas sua fase atual. para tornar impossíveis no futuro as guerras. Assim, sem sabê-lo,
Destruição que ela necessita para desimpedir o terreno para as guiado pelo pensamento e pela vontade da história, o mundo está
construções novas. Estas virão amanhã, quando o homem, após lançando as bases das novas construções do porvir.
lutas e guerras, já não será o mesmo que é hoje e caminhará em Se a fase atual da onda histórica é destrucionismo, não de-
outra corrente, levado por diferente onda histórica. Cada coisa vemos ficar pessimistas por isso. Ao contrário, é justamente es-
está em seu lugar e só pode chegar quando for seu tempo. Des- sa fase de destruição que preludia a sucessiva, de reconstrução,
truir hoje para construir amanhã. Já vimos que a destruição do que é também de compensação e de equilíbrio. Podemos até ver
mundo atual é uma função confiada aos povos menos evoluí- diretamente, na atual fase de destrucionismo, uma prova do ad-
dos, porque só eles poderiam realizá-la. E a reconstrução será vento próximo de uma nova civilização, como uma sua fase
feita amanhã, por gente diferente, com psicologia e princípios preparatória. Assim nos parece, seguindo a lógica do pensa-
pelos quais não se interessa o mundo atual. mento da história. Ela caminha por compensação de contrários,
Cada coisa está em seu lugar. Não desprezemos o pro- que se completam e equilibram em sua complementaridade, in-
gresso técnico. Ele é uma conquista, não só porque nos liber- tegrando-se reciprocamente, de modo que, da oscilação, resulta
ta das necessidades materiais, mas também porque desenvol- um único caminho de subida. Hoje não se trata apenas do ato de
ve algumas qualidades do espírito, como a inteligência. Ve- lançar, como vimos há pouco, algumas sementes novas no ter-
em alguns na máquina o instrumento de uma nova escravi- reno da maturação dos povos, mas trata-se também de um total
dão. Mas o homem teve sempre que lutar pela vida, e esta é e complexo movimento de forças, que estão prontas a ajudar
uma forma de luta muito menos pesada que as primitivas. essas maturações, assim como as estações, o terreno, as chuvas
Viver numa oficina, amarrado a uma máquina, ou num escri- o calor e tantos outros agentes concorrem todos para o desen-
tório, preso a um trabalho monótono, é muito menos duro volvimento de nossas sementeiras agrícolas. É toda uma onda
que lutar contra as feras e os agentes naturais, nossos inimi- que carreia homens, povos e acontecimentos, constituindo uma
gos. Entretanto, pode parecer que isso atrofie as qualidades reação que, depois de um período de descida e desmoronamen-
de iniciativa e livre criação individual. Mas isto transforma o to de valores, como o atual, deve realizar-se num período de as-
indivíduo, de um ser isolado contra todos, numa célula social, censão e reconstrução de valores. Sem essa compensação, a his-
que aprende a viver num organismo coletivo. Além disso, lu- tória não seria mais construtiva. E, se o foi sempre, como pode-
tar com uma máquina requer muito mais qualidades de racio- ria hoje não sê-lo mais, especialmente numa hora tão apocalíp-
cínio e inteligência, muito menos prepotência e ferocidade, tica, tão pejada de sementes, impulsos e motivos novos, e ao
do que lutar contra o homem para assaltá-lo ou contra um mesmo tempo tão revolucionária e destruidora?
animal para domesticá-lo. A máquina é honesta, não tem uma Para compreender tudo isso, procuremos penetrar mais fun-
vontade egoística, rebelde à nossa, e nos dá o que lhe dermos. do no pensamento da história. A história humana é apenas um
Ela obedece não ao mais prepotente, mas ao mais inteligente. capítulo do desenvolvimento da vida, e esta é apenas um mo-
A máquina fará desaparecer o dominador pela força e levará o mento do processo cósmico, que se acha agora, para nós, em
homem a uma forma diferente de seleção, não a do mais forte fase evolutiva. Esta é a lei do ser em nosso universo atual:
ou do mais astuto, mas do mais inteligente. O progresso técni- evolver. Tudo ocorre em função dessa necessidade: o amor, a
co imporá a necessidade de desenvolver essa qualidade supe- reprodução, a seleção, a morte, a caducidade de todas as coisas,
rior, dado que, na luta pela vida, já se poderá vencer por esse a natureza relativa de nosso contingente em evolução, a instabi-
novo caminho. Em outros termos, será possível resolver o lidade de todas as posições humanas, nossa contínua insatisfa-
problema de vencer e viver não pelos caminhos da força ou da ção etc. É assim que se explica o fato, aparentemente estranho,
astúcia, mas pelos caminhos da inteligência, proporcionando de que a vida nutre-se de morte, alimentando-se de destruição.
ao homem o domínio sobre as forças da natureza, que, subme- Isto porque destruição é meio de renovação, e renovação é con-
tidas a ele, poderão garantir-lhe a vida. dição necessária para a evolução, suprema tendência do ser.
Pietro Ubaldi PROFECIAS 23
Compreendida essa lei geral, situada na lógica do pensa- Na verdade, isso tudo poderia e deveria realizar-se sem vio-
mento diretivo de Deus, é fácil compreender a lei particular, lência, e assim ocorrerá numa humanidade mais civilizada. Se a
segundo a qual a história se desenvolve, produzindo as revolu- atual ainda não o é, isto se dá justamente porque ela está lutan-
ções. Com efeito, é por meio das revoluções que a história cos- do e sofrendo para tornar-se tal. A história, que guia tudo, con-
tuma gerar o que é novo, como se o tirasse da destruição do ve- fia, vez por vez, aos povos mais aptos essas funções renovado-
lho. Na realidade, isto é devido ao fato de que a vida é tão exu- ras. Primeiro, deixa os povos num sono aparente, em que ocorre
berante de germens, que está sempre pronta, logo que se forma a subterrânea maturação. Um dia, então, eles explodem, para
um pouco de espaço vazio, para invadi-lo e enchê-lo. Nesse depois voltar ao repouso. A natureza, em sua sábia economia,
sentido, a destruição é criativa para a vida, pois lhe permite a poupa suas forças e não repete um impulso inútil. Coube ao po-
expansão. Quem compreendeu a inexaurível fecundidade da vi- vo francês a primeira renovação, agora é a vez do povo russo.
da, que deriva do impulso do Deus imanente, presente em todas Realizado o esforço, este também readormecerá, como aquele o
as partes, em cada fenômeno ou acontecimento, não pode dei- fez. O fenômeno atual da Rússia comunista representa o des-
xar de admirar tudo isso. A história caminha carregada de ger- pertar de um povo primitivo, rico de energias elementares e po-
mens, dotados de uma fantástica potência para se desenvolver, derosas, aptas sobretudo à função da destruição, para colocar
e os lança a mancheias, ora aqui ora ali, com a prodigalidade em prova a resistência da civilização europeia. Pode comparar-
inerente à imensa riqueza da vida, aguardando que a maturação se isto a um assalto de micróbios patogênicos contra o velho
dos homens os conduza à compreensão, único limite para a fe- organismo desta civilização. Funções mais complexas não po-
cundação, e os torne instrumentos de realização, para permitir o dem ser confiadas a povos primitivos, muito próximos ainda do
desenvolvimento destas sementes. estado caótico primordial, rico de imensas energias, mas ainda
Que são, pois, as revoluções? Por mais que os homens se não disciplinado pelo poder da inteligência, que é fruto de lon-
esforcem em fixar, no direito e em ordens particulares, as suas ga e laboriosa evolução. Por isso, na lógica do pensamento de
posições, verifica-se o fato de serem elas sucessivamente des- Deus, ignorado pela nova Rússia, não podem ser confiadas a ela
manteladas pelas revoluções ou guerras, que são o único meio senão funções destrutivas, próprias das explosões de caos de um
para renovar o velho e, assim, alcançar novas construções. As poder involuído e satânico. E tanto mais porque essa dolorosa
revoluções e as guerras – dois elementos afins e conexos – são, intervenção cirúrgica foi atraída pelas culpas da Europa e da
pois, o verdadeiro motor da história, seu aspecto dinâmico, os América do Norte, que, com suas próprias mãos, quiseram cons-
períodos de marcha; ao passo que a paz, as ordens constituídas, truir uma Rússia forte e inimiga, como uma vergasta para seu
a legalidade, representam os períodos de estase da história, seu próprio castigo. Há nisto uma trágica e cega obediência a um
aspecto estático, as fases de assimilação e repouso. No entanto destino de justiça, que todos têm de aceitar, porque está no pen-
os acomodados perguntam por que essa necessidade de guer-
samento de Deus e na vontade da história, não importando que
ras? Por que essa instabilidade, esse esforço de renovação con-
os homens queiram ou não queiram admiti-lo e sabê-lo. A tão
tínua? A resposta foi dada em nosso volume Deus e Universo,
astuta política sempre esqueceu o peso enorme que tem o fator
onde se explica que o homem é um decaído e, por esta razão,
moral, mesmo no campo social, e quem não liga importância a
está preso à necessidade de evolver. E como se pode evolver,
isso ainda não sabe que pode cometer erros gravíssimos, pelos
isto é, passar de formas inferiores a mais complexas e perfeitas,
quais indivíduos e povos devem depois pagar duramente.
senão através da dor da destruição e da fadiga da reconstrução?
Assim, a história confia a vários povos, no momento mais
Num universo cuja lei fundamental é a evolução, não se pode
adequado para eles e para a vida de todos, uma dada tarefa na
parar: é necessário caminhar sempre. Existir quer dizer cami-
evolução da humanidade; funções aparentemente negativas,
nhar. Quem para é sobrepujado pela corrente da vida e se esteri-
liza. A vida é percurso, renovação, criação contínua; não teme mas, em substância, positivas, de experimentação e reconstru-
destruições; ao contrário, precisa delas. Em sua imensa fecun- ção de civilizações exaustas, de reequilíbrios de acordo com a
didade, a destruição lhe é necessária para desimpedir o terreno justiça, de eliminações de classes dirigentes ineptas e parasitá-
e aí semear de novo, para progredir. rias, de reações curativas de abusos, de fecundas reconstitui-
Não nos alarmemos. O mundo é assim. Guerras e revolu- ções demográficas, preenchendo vazios em cada campo e re-
ções representam seu impulso vital, que nada perde na destrui- forçando fraquezas. Parece que a história manifesta, na direção
ção. Nada pode perder porque suas raízes prendem-se em Deus, da vida dos povos, a mesma sabedoria que a natureza manifes-
fonte inexaurível e indestrutível. Na destruição, a vida parece ta na direção da vida de nossos organismos físicos, estabele-
tornar-se mais viva, porque, logo que se verifica uma falha, ela cendo uma contínua ação materna, benéfica, protetora, com-
rapidamente a corrige. Isto também no terreno social, tal como pensadora e curadora, sempre atenta em fazer triunfar a vida.
acontece nos organismos celulares. Com efeito, as carnificinas Não age a história da mesma forma que a mãe-natureza? Não é
das guerras reativam a fecundidade genética dos povos. Há co- a mesma lei de Deus que vigia tudo e, com sua imanência, aju-
nexão entre vida e morte, dois fenômenos de compensação. As- da o todo criado no duro caminho da subida até Ele? Não é o
sim existe uma afinidade entre amor e revolução. Ambos são mesmo princípio e a mesma potência da vida, por meio do qual
uma luta para vencer, um meio para criar, uma manifestação de tudo germina sempre e floresce?
juventude e virilidade, e, no estado natural, ocorrem numa at- A destruição poderá assustar o indivíduo, mas a vida não
mosfera de violência e destruição. São duas manifestações de pode preocupar-se com isso, porque, no conjunto, a destruição
potência renovadora, e todos lhe saem ao encontro, porque isso não é estéril. Nenhum ato da vida jamais é estéril, nem mesmo
interessa sumamente à vida, que nelas se reaviva e dinamiza. a destruição. No âmago da morte está a vida. Por isso a des-
Os povos que despertam fazem revolução e guerra. Os povos truição é um ato de administração normal, apenas um meio de
fracos e cansados as sofrem de seus vizinhos. Para os indiví- renovação. A vida é eterna, é principio divino, portanto nada
duos, como para os povos, a lei é a mesma. O povo ou a classe tem que temer. Bastaria haver compreendido esta grande ver-
social mais fraca, tal como a mulher, ficam vencidos e fecun- dade para que fosse obrigatório admitir a indestrutibilidade de
dados, recebem e assimilam. É, pois, lei da vida que ocorram nosso ser e a impossibilidade, para a morte, de matar qualquer
desordens com as revoluções e guerras, para construir uma no- ser vivente. O próprio Cristo nos disse que quem procurar con-
va ordem das ruínas da antiga. É lei da vida um periódico des- servar sua vida perdê-la-á, e quem a der ganhá-la-á. Não po-
pertar para executar o esforço de fazer um novo passo à frente demos viver se nos conservarmos apegados apenas à forma,
na evolução. É lei da vida o contraste entre tempestade e bo- mas somente se mergulharmos na grande corrente ascensional
nança, como também o é a expansão vital dos povos fortes. do ser, onde está Deus, a inexaurível fonte de tudo. Até mesmo
24 PROFECIAS Pietro Ubaldi
Cristo, que realizou a maior das revoluções, seguiu essa lei, sacudir o jugo dos poderes constituídos, edificados sobre os re-
pela qual a destruição é uma premissa necessária para a re- sultados das insurreições precedentes, já velhas e superadas,
construção. Assim, Ele teve que se oferecer em holocausto so- mas também para colocar no lugar daqueles outros governos,
bre a cruz. Eis porque o sacrifício tem um poder criador, a re- que sejam baseados em concepções mais vastas e livres, onde
núncia pode construir num plano mais alto, a dor nos amadu- seja cada vez menor o número de pessoas que sofra o peso da
rece e a morte é lei de vida. Bastaria compreender este princí- escravidão e da limitação, e cada vez maior o número dos que
pio universal para compreender a necessidade absoluta da pai- gozam a liberdade, a dignidade e os direitos da vida civil. Eis
xão e da morte de Cristo para a evolução do mundo. aí, então, o fio que liga as duas revoluções, a francesa e a russa.
Neste capítulo, quisemos observar como funciona o pen- Em substância, são apenas dois degraus do mesmo processo
samento e a vontade da história, primeiramente em sentido evolutivo. Sua verdadeira força genética, o impulso que as de-
geral e, depois, observando no pormenor a natureza da onda terminou, estava no âmago da história, ou seja, era um amadu-
histórica que guia os homens e os acontecimentos na hora recimento da vida social que se formara através de longa elabo-
atual. Tudo isso para concluir que a tendência atual à destrui- ração psicológica dos povos. A ideia preexistente à sua mani-
ção, que existe em todos os campos, e o estado de revolução festação nos fatos é a causa e a substância das revoluções. O
e de guerra em que se acha o mundo representam justamente resto é execução quase mecânica.
o índice mais evidente de que haverá uma reação comple- Essa ideia era uma dinamite comprimida no terreno, prestes
mentar, necessária para a reconstrução de amanhã; eles cons- a explodir, porque já pronta e completa. Esperava apenas uma
tituem a fase preparatória, após a descida, para a subida da chama mínima que a acendesse. Essa chama podia aparecer e
onda histórica, cuja vontade é que chegue e se realize a nova acender a revolução pouco antes ou pouco depois, aqui ou ali,
civilização do III Milênio. não importa. Às diretrizes da história não importam esses pe-
quenos afastamentos de tempo e espaço, pois nada mudam no
III. AS TRÊS REVOLUÇÕES E A TERCEIRA IDÉIA essencial, mas somente as modalidades da execução. Quando
tudo estava intimamente maduro, a pressão invisível começou a
Para compreender ainda melhor os princípios expostos nos tomar forma nos fatos, pois só estes são visíveis a todos e podem
capítulos precedentes, façamos uma aplicação deles (que é puro fixar o pensamento da história na realidade concreta. Então essa
controle) aos acontecimentos de nosso tempo, ou seja, obser- pressão interior começou a experimentar o ambiente, à procura
vemo-los concomitantemente de dois pontos de vista: o huma- do ponto de menor resistência, a fim de abrir uma brecha para
no e o das verdadeiras diretivas, dadas pelo pensamento e pela explodir. E achou-a na França, com o inepto Luís XVI e sua cor-
vontade da história. te corrompida e podre; achou-a na Rússia, com o fraco Czar Ni-
Vimos o que são as revoluções. A história recente e con- colau e sua aristocracia, incapaz e atrasada, expostos pelos resul-
temporânea nos ofereceu dois grandes fenômenos desse gênero: tados da guerra europeia de 1914-1918. Mas estes são pormeno-
a Revolução Francesa e a Russa. Colocadas em sua realidade res históricos. É verdade que a França de então, como a Rússia
concreta, na perspectiva de espaço e de tempo, a partir de posi- de hoje, eram o terreno mais propício para a manifestação do fe-
ções e condições de desenvolvimento desiguais, diferentes nas nômeno. Mas, se essas condições tivesse aparecido alhures,
formas, nos objetivos e nas populações em que atuaram, essas alhures se teriam desenrolado as duas revoluções; se a ocasião
duas revoluções, ainda que semelhantes, podem parecer dois se tivesse apresentado em outro momento, elas teriam aguardado
fenômenos separados, e não duas fases do mesmo fenômeno. e se teriam manifestado em outro momento.
No entanto assim é na unidade do pensamento diretivo da histó- Isso tudo nos faz compreender que, nestas duas revoluções,
ria, onde a única realização a executar é a evolução, ou seja, a a França e a Rússia são dois efeitos, e não duas causas; dois ce-
ascensão do homem para formas de vida mais livres, mais or- nários históricos, dois elementos absolutamente não necessá-
gânicas, mais evoluídas. Este é o impulso biológico incessante rios, que deram seu colorido ao fenômeno histórico somente
que nasce da essência profunda da vida, aspirando subir para por motivos contingentes. Por isso, em sua substância, as duas
regressar à perfeição em Deus. revoluções podem muito bem ser destacadas da França e da
A incondicional supremacia do mais forte e, portanto, os go- Rússia e ficar colocadas em seu verdadeiro sentido, que é de
vernos absolutos, a organização social filha da guerra, baseada movimento mundial, não pertencente apenas a um povo, como
no domínio e exploração dos povos vencidos, e até a instituição monopólio seu, mas a toda a humanidade. A substância era a
da escravidão foram nos primeiros tempos uma necessidade bio- ideia, que é universal, e o que a manifestou foi ter ela atingido
lógica, proporcionada ao grau de involução da humanidade, da seu amadurecimento. O feto estava desenvolvido e tinha que
qual nada mais se podia pretender. E a história nada mais pedia. nascer, não importava onde. As próprias ideias da Revolução
Por isso deixou funcionar essas formas de vida, as quais, entre- Francesa ferviam na América do Norte e em todo o mundo oci-
tanto, com a evolução, tornavam-se cada vez menos adequadas e dental. Se não houvesse essa preparação do mundo de então pa-
aceitáveis. Havia no âmago um trabalho intenso de amadureci- ra aceitá-las, teria sido inútil a revolução, porque ninguém a te-
mento, escondido e silencioso, que a história oficial vê e registra ria compreendido, impedindo que ela pudesse difundir-se e,
só quando ele aparece visível do lado de fora, no momento de muito menos, frutificar. Então ela, não tendo uma tarefa segun-
suas explosões. É a esse trabalho intenso que se deve a ascensão do a lógica da história, não poderia ter ocorrido. Tanto é verda-
contínua das classes inferiores, que querem evolver, tomando o de que, enquanto a França voltava à monarquia, e a Europa à
lugar das superiores, logo que estas tenham esgotado sua função Santa Aliança, os Estados Unidos se apoderavam das novas
de vanguarda do progresso. Isto pertence a todos, e todos têm di- ideias e as punham totalmente em prática. De tal forma que se
reito a isto. Todos tomam parte nisto, cada um com sua função poderia dizer que a Revolução Francesa serviu mais para os Es-
particular, por meio de sua realização pessoal. O verdadeiro fio tados Unidos do que para a própria França. Esta, como a Rús-
condutor do longo caminho da história é um irrefreável e instin- sia, teve sua função como lança-projéteis. Interessa apenas o
tivo anelo de liberdade, liberdade a que todos aspiram, que todos projétil, que é acompanhado em seu caminho e na sua chegada,
os governos prometem e em que toda a humanidade concorda e ao passo que o aparelho que o lançou é esquecido, uma vez que
espera, porque exprime a superação da inferioridade e a liberta- perdeu toda a sua importância histórica para o progresso da
ção da prisão em que caiu o homem, como vimos. humanidade, tendo com isso esgotado sua função.
Assim, as revoluções, que são os períodos mais ativos da Também as duas revoluções tiveram como ponto de partida
história e mais criadores, renascem continuamente, não só para e causa determinante um estado de escravidão. Em ambas hou-
Pietro Ubaldi PROFECIAS 25
ve igual esforço de libertação de condições de vida que não uma libertação progressiva do homem, para alcançar formas de
eram mais aceitáveis pela natureza humana, dado o contraste do vida mais elevadas em todos os sentidos. As aristocracias cami-
nível atingido pelas classes dominantes em comparação com o nham adiante, como antenas exploradoras, criando os modelos, e
resto do povo. Se bem que as classes mais elevadas jamais pen- as massas, ávidas por imitá-las, as invejam e se põem a lutar pa-
sem nisso, elas realizam contudo uma obra de educação, pois ra tirá-las do poder e substituí-las na experiência das novas for-
mostram, com seu regime de vida, às classes mais pobres, que mas da vida. Através desse jogo de forças e impulsos, desenvol-
as observam atentamente, as formas de existência mais apura- ve-se a mecânica da evolução. O motivo dominante, a direção
das, que, por lei de evolução, os deserdados querem avidamente do caminho, os primeiros móveis, são sempre os mesmos: liber-
imitar. Tudo isso faz parte da mecânica da ascensão, que come- tar-se da inferioridade, para subir. Subir em todos os campos.
ça das bases materiais, para que destas suba às espirituais. Começa-se das conquistas mais elementares. Libertar-se da es-
Quando as classes dirigentes formarem uma aristocracia de es- cravidão, para atingir a liberdade física: não viver mais acorren-
pírito, a imitação das inferiores tomará essa outra direção. Mas tados. A Revolução Francesa quis conquistar a liberdade políti-
nem aquelas nem estas estão hoje maduras para poder fazer tan- ca, a igualdade de direitos, suprimindo os privilégios e as clas-
to, e cada coisa vem a seu tempo. ses. Todos iguais diante da lei, que deve ser igual para todos, e
Na Rússia, como na França, o ponto de partida da revolução não mais leis separadas de acordo com a situação social. E isto
foi um estado de feudalismo, com classes sociais separadas em já foi muito para aquela época. Mas deixou em pé a desigualda-
compartimentos estanques, hereditariamente fixadas para sem- de econômica e formou uma aristocracia diferente, detentora do
pre, inacessíveis por baixo, com privilégios próprios, com um dinheiro, e uma nova classe, a burguesia. Sentiu-se, então, a ne-
poder central absoluto e a escravidão nos estados sociais inferi- cessidade de aperfeiçoar mais a conquista da liberdade, comple-
ores, sem possibilidade de redenção: uma gaiola de ferro sem tando-a sob outros aspectos, ainda não realizados. E nasceu a
porta de saída senão pela explosão. Só uma revolução podia sa- Revolução Russa, para conquistar a liberdade econômica.
cudir esse jugo, libertar dessa prisão. Assim, os componentes ◘ ◘ ◘
da classe aristocrática foram chamados tiranos, e a revolta con- Mais tarde, veremos como esse caminho poderá continuar e
tra eles surgiu como um ato de justiça, ao passo que antes, até onde poderá chegar. Mas, antes, observemos de perto o fe-
quando ainda não havia sido atingido este novo amadurecimen- nômeno russo, para compreender seu significado. Embora tenha
to, o mesmo ato de revolta teria sido considerado o maior cri- a Rússia efetuado um grande passo à frente, ao menos como po-
me. O autor de um atentado inócuo à pessoa de Luís XV foi es- tência industrial, dado o ponto zero de sua partida, representado
quartejado com grande pompa e concurso do povo. Luís XVI pelo sistema feudal czarista absolutamente medieval, ainda as-
foi guilhotinado diante de todos, e ninguém reagiu. Por isso as sim a Rússia, nos trinta anos aproximados do governo comunis-
despesas com a construção de Versalhes, feitas por Luís XIV e ta, por mais que tenha querido correr nesse sentido, está longe
pagas pela França, não excitaram nenhuma revolta, enquanto as de ter atingido o nível de vida e de cultura das civilizações oci-
outras, muito menores, feitas por Maria Antonieta, pareceram dentais. Mas, o que é pior ainda, nem sequer atingiu a realização
um esbanjamento escandaloso. A razão é que Luís XIV desem- que se propusera, da proclamada liberdade econômica. Neste
penhava a função social de criar um modelo de vida mais apu- sentido, se o comunismo atraiu as massas – porque o programa
rado, antes desconhecido, um modelo que as cortes europeias da justiça social e dos melhoramentos econômicos corresponde
imitaram e que o povo olhava para aprender a elevar um pouco ao instinto daquela ascensão que a vida quer agora realizar – sua
mais alto o nível da vida civil. Quando, com efeito, a corte de experimentação no entanto foi até hoje infrutífera e isto o desa-
Luís XV e Luís XVI serviram-se dele só para gozo egoístico, creditou diante dos mais inteligentes, mais aptos a compreender
todos gritaram que era escândalo, e só pararam quando conse- o logro de uma exploração de necessidades e instintos.
guiram suprimi-lo e abrir uma estrada para que eles mesmos, Mas ainda há outro fato. A distância entre o ponto de partida
substituindo-se a eles, pudessem imitá-los. da Revolução Russa – o feudalismo, superado na Europa havia
Se os pontos de partida foram os mesmos para as duas re- muito – e seu ponto de chegada – uma ideologia que presume
voluções, semelhantes também devem ser o ponto de chegada, um amadurecimento ainda raro no mundo – significa justamente
ou seja, a expansão da ideia nova no mundo, com a formação que não se pode realizar na Rússia o verdadeiro comunismo,
de novas correntes diretivas da vida social, desprendida do pa- nascido aí apenas para emigrar para outros países, onde ele pos-
ís em que nasceu, país que perde seu domínio, porque a ideia sa transformar-se e civilizar-se. Da forma como ele é hoje na
se torna de todos. E a ideia, como semente lançada ao vento, Rússia, nenhum povo ocidental jamais o aceitará, senão à força
chega longe e frutifica nem se sabe onde, mas exatamente ali e transitoriamente. E a natureza do povo é coisa que nenhum
onde se lhe apresenta o terreno propício, enquanto, na pátria exército e nenhum domínio podem vencer. Pode-se matar os
da revolução, só permanecerá a honra de ligar seu nome às chefes, destruir o poder, escravizar as massas, transplantar cida-
páginas da história por meio dela. Se assim foi para a França, des inteiras, mas não se consegue matar um povo, insuperável
é lógico e provável que será assim também para a Rússia. E a barreira demográfica, que permanece em pé, para continuar de
ideia comunista, como uma semente levada longe pelo vento, acordo com sua natureza. Ora, os povos ocidentais lutaram du-
não se sabe aonde chegará e germinará, numa forma que tal- rante séculos para conquistar a liberdade política e, custe o que
vez em nada recorde sua origem russa. custar, não estão dispostos a renunciar a ela. Eles fizeram a Re-
A ideia é universal, pertence à humanidade. Se o povo, só volução Francesa, que a Rússia não quer levar em conta; sofre-
porque foi escolhido como instrumento para o arremesso, acre- ram para galgar esse degrau, e isso é fruto seu, inalienável. O
dita que a ideia seja sua, será posto de lado quando não mais comunismo russo, acreditando levianamente que pode transplan-
servir aos objetivos da vida. O que vale no pensamento da histó- tar-se no Ocidente, não sabe a que reações se expõe, quando as
ria, que dirige o mundo, é a ideia e seu desenvolvimento, e não massas descobrirem a mentira das promessas feitas e, ao invés
as acidentalidades contingentes de sua manifestação e de seu de- da liberdade econômica e da elevação do nível de vida, acha-
senrolar-se. Em seu progresso, a história tem seus planos prees- rem-se diante de um sistema de dominação escravista. O próprio
tabelecidos e, para sua execução, vai escolhendo em seu cami- instinto de ascender, que agora impulsiona as massas a aceitar o
nho no tempo os elementos prontos e adequados que aos poucos comunismo, quando se vir traído, fará as mesmas massas se le-
vai achando. Ora, a ideia central que, em seu desenvolvimento, vantarem enfurecidas contra os que as traíram. Elas reagem e
constitui o fio condutor da história – aquilo que liga uma revolu- corrigem, mediante contrarrevoluções, os erros daqueles que
ção à outra – é o supracitado princípio da liberdade, ou seja, de executaram suas revoluções e as continuam não no sentido erra-
26 PROFECIAS Pietro Ubaldi
do que eles quiseram, só para seu desfrute egoístico, mas sim no é subverter a ordem só possa ter funções destrutivas, enquanto
sentido construtivo, derrubando o que eles fizeram e endireitan- que as construtivas são confiadas a outros povos. E também é
do-as na direção benéfica, como quer a Lei, que dirige tudo. natural, como ocorre em todas as revoluções, que sejam depois
Na Rússia é diferente. Lá, as massas jamais conheceram li- eliminados, sob os impulsos da vida, os elementos da desor-
berdade política e estão habituadas e treinadas há séculos à es- dem. Estes, neste caso, são representados pelo regime soviético
cravidão, hábito que o Ocidente já perdeu. Na passagem do re- russo. Com efeito, a vida não admite desordem senão como fa-
gime czarista ao comunista, permaneceu o mesmo fundo escra- se de transição e com objetivo de progresso. Resulta de tudo is-
vista, inadmissível alhures, mas tradicional na Rússia. Se lá o so, também, que os verdadeiros objetivos do fenômeno russo
cidadão não goza de liberdade política, ele não se queixa muito, não estão na Rússia e que o comunismo deverá transferir-se da-
porque jamais a teve, portanto nada perdeu. Mas é diferente quele país para alhures e transformar-se. Diz-nos isso a lógica
quando o comunismo sai daquela terra e pretende implantar-se do pensamento da história, que não funciona fechado num dado
alhures. As nações ocidentais também querem a libertação eco- lugar ou tempo, apenas a serviço de determinado povo, mas se
nômica. Mas, quando percebem quanto ela lhes custaria com o desenvolve por longuíssimos ciclos, em todo o mundo.
comunismo, isto é, a perda de uma liberdade mais fundamental O problema da expansão ideológica de uma doutrina é muito
e necessária; quando veem que o proclamado bem-estar se re- árduo, porque deve considerar a história e a psicologia de cada
duz, de fato, a uma forma de escravidão e que, assim, para ter povo, se quiser penetrar em seu âmago. E isso constitui uma bar-
um aperfeiçoamento de liberdade, esta seria completamente reira à expansão do comunismo soviético tal qual ele é hoje,
perdida, então essas nações só podem rebelar-se. Até hoje, tudo pois não pode evitar de ser russo. Então precisa considerar as di-
vai bem, enquanto só se trabalha com promessas, pela propa- ferenças e, logicamente, as resistências étnicas. Observemos o
ganda, e a realidade russa está longe. Mas o que ocorreria se as fenômeno particularmente em relação à raça latina, que tem uma
ideias passassem aos fatos e esta realidade entrasse verdadei- história e qualidades tão diferentes daquelas dos povos nórdicos.
ramente em casa? E, de fato, é justamente este o ponto fraco do O sistema da força bruta e do terrorismo não poderia resistir por
comunismo soviético: a ameaça que está iminente sobre os po- muito tempo em contato com a inteligência e o espírito indivi-
vos, contra a qual se insurgem as reações. As massas inconsci- dualista de independência dos latinos, frutos de milênios de ela-
entes, presas dos demagogos, compreenderão isso amanhã à sua boração, que os povos nórdicos não viveram. Enquanto estes
custa, se forem dominadas pelo novo regime. constituem de imediato um chefe, ao qual depois obedecem ce-
O ponto forte, contudo, é a beleza teórica do programa. No gamente, os latinos possuem uma autonomia de julgamento que
fundo, ele é o Evangelho de Cristo, mas só em teoria, porque, os torna rebeldes à obediência. Por isso os nórdicos, sobretudo
na prática, o método da violência e da escravização da indivi- os alemães, parecem-nos organizados e disciplinados, e os lati-
dualidade humana o subverte. Contudo, certamente, não é esse nos desorganizados e indisciplinados. Consideremos um exem-
lado evangélico que seduz as massas. O que de fato as impres- plo clássico. Um alemão, antes de agir, reflete muito e organiza
siona é a autorização – primeiro passo da legalização – para um plano estudado em todos os pormenores, mas depois o exe-
apoderar-se dos bens de quem quer que seja. Mas que se possa cuta teimosamente até ao fim, mesmo se, mudadas as circuns-
destruir o instinto da propriedade somente com danos aos ou- tâncias de ambiente, ele se torna suicida e absurdo. Pode-se
tros, acreditando que depois ela possa ficar de pé apenas em chamar a isso coerência, tenacidade, fidelidade. O italiano, en-
benefício próprio e só então pacífica, porque protegida pelas tretanto, não faz plano algum, mas estabelece um a cada passo,
leis – condição necessária para poder gozar o fruto de qualquer de acordo com as circunstâncias, e o abandona logo que este não
furto – é tão grande utopia, que só os ingênuos e primitivos lhe seja mais útil, para então organizar outro melhor. Pode-se
podem acreditar nisso. Por esta razão os sonhos de vitória do chamar a isso incoerência, volubilidade, infidelidade. Mas, para
proletariado se expõem a terminar sob escravização aos pés do a mentalidade italiana, o primeiro sistema parece simplesmente
capitalismo do Estado. Quanto terão que sofrer ainda as mas- estúpido. E o é especialmente na guerra, que parte do princípio
sas antes de aprender a compreender, por si mesmas, o que é de que o mais forte tem o direito de esmagar o mais fraco. Não
possível e o que é impossível, o que é verdadeiramente direito pode, portanto, pretender dar-nos lições de moral.
e o que é promessa irrealizável. Mas também as massas tem os A razão dessa coerência, tenacidade, fidelidade, disciplina e
chefes que merecem. Com efeito, ouvem os demagogos, que as organicidade na ação alemã é a falta de uma inteligência de in-
enganam, e os ouvem porque a promessa, ainda que não venha divíduo isolado, embora exista uma inteligência como coletivi-
a se realizar, é bela e agradável. Cristo, que disse a pura mas dade. Acontece, assim, que o alemão obedece muito mais por
dura verdade, foi crucificado. princípio, por respeito ou por temor, do que por convicção. O
◘ ◘ ◘ italiano obedece apenas se está convencido. Parece rebelde,
Como terminará o fenômeno comunista russo? Embora jus- porque só aceita o que quer. Afora o caso da coação pela força,
tamente provocado em seu nascimento pelo acumular-se de sé- em que não se pode falar de obediência, ele jamais obedece ce-
culos de injustiças e opressões, como na Revolução Francesa, o gamente, mas examina, discute a ordem, quer colocar-se, ao
fenômeno russo no entanto – por seus excessos em sentido menos psicologicamente, no mesmo nível de seu chefe. É por
oposto; por seu materialismo, que o faz ignorar vitais leis bio- isso também que o alemão pensa, age e funciona sobretudo co-
lógicas; pela supressão da individualidade; por sua violência; letivamente. Ao passo que o italiano pensa, age e funciona iso-
pelo seu absolutismo, que suprime justamente aquela liberdade lada e individualmente, coisa que o alemão custa para fazer. O
por ele proclamada, que a vida quer conquistar – contém em si instinto alemão é o grupo, o instinto italiano é a independência.
os germes de sua própria destruição. Se a vida permite tudo is- Do sistema alemão, de funcionar o grupo sob um chefe, obede-
so, é sem dúvida com o fim de utilizá-lo para outros objetivos cido cegamente, em perfeita disciplina, deriva o fato de que, se
seus, porém mais tarde irá apressar-se em destruir tudo o que é o chefe é inteligente, a fidelíssima máquina funciona com per-
antivital. Pode-se subjugar com a força, oprimir, escravizar, feição, e o pastor poderá conduzir suas ovelhas aonde quiser.
destruir, mas tudo tem um limite, e quem se coloca contra as Mas, se o chefe é desassisado, todas as ovelhas o seguirão até
leis da vida está perdido. E o que se pode conseguir com uma ao fundo do precipício, fidelissimamente, e se deixarão matar
tentativa contrária de dar um passo atrás, justamente quando a por ele. Vimos isto na última guerra. Os italianos, ao contrário,
vida quer dar um passo à frente? Absolutamente nada, exceto se o chefe é inepto, todos o percebem imediatamente, porque
ser liquidado e arrastado pelas forças da vida, que são as mais ele é observado e controlado por todos continuamente, e a re-
poderosas. É natural que um regime cuja proposta, fora de casa, volta é imediata, o chefe é liquidado, e o reajuste, sem pastor, é
Pietro Ubaldi PROFECIAS 27
pronto, porque cada ovelha sabe, mais ou menos, agir também É lei universal de equilíbrio que, tão logo se defina um novo
como pastor. Nenhuma delas será jamais tão simples, que siga impulso em determinada direção, surja o paralelo contraimpul-
alguém sem juízo até o fim, para deixar-se matar por ele. so que o equilibre. Assim, nascido o grande capitalismo norte-
Por isso é diferentíssimo o modo de se comportar dos dois americano, surge-lhe contra o comunismo russo. E, surgido es-
tipos biológicos nas mesmas circunstâncias. Os alemães preve- te, o capitalismo americano reagiu, fortificando-se e armando-
em tudo, mas ao primeiro obstáculo ou revés, não tendo capa- se. Assim a grandeza gera inimigos e o assalto fortifica o ad-
cidade para se recuperar, em vez de contornar a dificuldade, pa- versário. Determinou-se então a luta entre capital e trabalho,
ram diante dela, detêm-se para derrubá-la, batem com a cabeça definiram-se as recíprocas posições e direitos, preparando-se
e, se não conseguem sobrepujá-la, morrem ali mesmo. Os itali- para resolver seus contrastes. Existem as classes sociais do ca-
anos, diante do obstáculo que lhes fecha o caminho, acham cem pital e as do trabalho. Mas trabalho é apenas o capital em for-
outros, transformam-se, mimetizam-se, emborcam as situações, mação, enquanto o capital é o extrato concentrado do fruto do
convencem-se de que, sem dúvida, queriam andar em direção trabalho. Um precisa do outro. No entanto, ao invés de colabo-
oposta e deixam o obstáculo para trás. Tudo isso pode parecer rar, lutam para sobrepor-se. Se cada um permanecesse em seu
ilógico, incoerente, falso e mentiroso, mas salva a vida, que lugar, tudo daria seu devido fruto. Mas, ao contrário, eles gos-
quer e deve ser tão elástica, que saiba adaptar-se a tudo, contan- tam de trabalhar para destruir-se mutuamente. O resultado é a
to que retome o caminho e continue, que é o mais importante. paralisação de ambos. Afiam-se as armas: o capital explorando
Isto tudo é apenas um exemplo, que se pode ampliar aos com salários baixos, o trabalho rebelando-se com as greves.
povos nórdicos de um lado e à raça latina do outro. Ora, a ex- Nesse ponto chega o comunismo. Os demagogos se aproveitam
pansão comunista tem que levar em conta as diferenças étnicas, disso, os operários alimentam esperança e a coisa se mantém e
que representam uma barreira mais forte do que a cortina de caminha assim. Os trabalhadores gritam que o capital rende
ferro. Do confronto entre dois tipos biológicos tão diferentes, cem vezes mais que seu trabalho e chamam a isso exploração.
quem levaria a pior? Que pode fazer o coletivismo russo, em Mas também é verdade que o capital representa a inteligência,
que o indivíduo desaparece (o que só é possível na Rússia), que, biologicamente, vale muito mais que o trabalho manual,
posto em contato com o superindividualismo latino, conquista portanto pode ser justa uma compensação maior. No entanto é
biológica que jamais abdicará de seu trono? E uma civilização
verdade que a cobiça, muitas vezes, cresce com a riqueza e que
mais primitiva, como a russa, não se arrisca a ser absorvida por
esta nem sempre é conquistada com o trabalho, mas muito fre-
uma civilização mais madura? Nos embates de massas, as resis-
quentemente apenas com golpes de sorte, senão pior.
tências étnicas representam as forças primordiais e irrefreáveis
De fato, discute-se muito na teoria, acreditando-se nos sis-
da vida, cujas reações é difícil deter.
temas. Mas as raízes do problema descem até ao terreno moral.
Por isso tudo e dado que a vida hoje aceita e quer pôr em
Na realidade, nem o capital nem o trabalho são culpados disso,
prática a ideia da justiça econômica, porque esta se encontra na
mas sim o homem, esteja ele de um ou de outro lado. É o
linha de seu desenvolvimento, deduz-se que essa ideia só po-
derá emigrar de seu berço quando despida de todas as superes- mesmo homem, com os mesmos instintos egoísticos, que faz
truturas russo-soviéticas. A tarefa da Rússia, portanto, é dife- mau uso de tudo. Com esse tipo biológico, dará maus resulta-
rente do que se pensa. Sem dúvida, esse povo despertou de um dos qualquer sistema econômico, de modo que o comunismo,
sono secular. Poderá ajudar a Ásia a despertar. Mas o primeiro arauto da justiça econômica, nada resolve, como nada resolveu
é negócio interno, o segundo é fenômeno de imperialismo, em na Rússia, onde permanece a opressão e a injustiça de antes. O
que o comunismo não entra. O verdadeiro merecimento da capital é uma força, tal como a máquina. Enquanto não nascer
Rússia de hoje é haver imposto, com suas formas violentas, à o homem superior, que saiba ser senhor deles, pelo bem, e não
atenção do mundo o problema da justiça econômica, que assim servo, por sua cupidez, nem um nem outra libertarão o homem,
teve que ser tomado em consideração, a sério, em escala bem mas irão ao invés torná-lo cada vez mais escravo. Dessa forma,
ampla. Ainda que tudo isto não estivesse nos planos do comu- o capital, em vez de ser considerado ajuda benéfica, é tido co-
nismo, todavia foi seu efeito mais importante. Assim, a Rússia mo meio de exploração, capaz de congelar a riqueza em pou-
teve o merecimento de haver despertado os que dormiam, os cas mãos e fechar o caminho ao trabalhador. É necessária uma
que há dois mil anos dormiam sobre o Evangelho. Acordou-os nova consciência colaboracionista, um modo totalmente dife-
com um forte solavanco, com uma ameaça que todos compre- rente de conceber a vida, não baseado no interesse individual
endem. Parece que o homem só compreende o que se lhe apre- ou de classe, com prejuízo dos outros, mas num utilitarismo
senta sob forma de batalha. Quem mais ouvia as brandas e es- tão vasto, que abarque todos. Isto, porém, faz parte de outra
tereotipadas palavras do Evangelho, há vinte séculos repetido revolução, que o homem fará amanhã, quando estiver mais
mecanicamente? Mas o assalto é coisa diferente; assusta, atin- maduro. O problema é bem diferente daquele que é equaciona-
ge os interesses. Então, apresentam-se as defesas, estuda-se do hoje. Os sistemas sozinhos não resolvem. São produtos
uma estratégia e, com isso, o problema se torna vivo e atual. humanos, com finalidade de experiência, portanto podem tam-
Este é o merecimento da Rússia: ter denunciado as injustiças bém servir de meio para resolver. Mas não representam a solu-
econômicas do mundo, havê-lo colocado em posição de réu e ção, que depende das atitudes da alma, porque a raiz de cada
tê-lo coagido a um exame de consciência. Dessa forma, hoje, ato e sua forma dependem da motivação.
entre as nações não comunistas, mesmo no seio do cristianis- Esse elemento moral é um princípio de ordem, ao qual se
mo, existe uma nobre porfia de beneficência, não tanto por prende o pensamento da história, muito diferente do pensamento
amor aos pobres, mas para chegar primeiro a conquistá-los e do homem, que acredita dirigir tudo. Olhemos a primeira guerra
assim afastá-los do enquadramento comunista, com que a Rús- europeia de 1914 a 1918. A Alemanha queria conquistar espaço
sia hoje está pacificamente penetrando nos outros países, des- e domínios, mas, ao invés disso, gerou um filho completamente
frutando, com seu pleno absolutismo, a liberdade das demo- diferente: o comunismo na Rússia. Seu pai foi um alemão: Car-
cracias e do sistema eletivo, para vencer guerras de invasão, los Marx. A Alemanha impulsionou a divulgação de suas ideias
sem o risco de realizá-las. Ter imposto ao mundo essa corrida na Rússia, com o auxílio de Lenine. Hoje, a Alemanha sofre o
à realização da justiça social é o maior mérito da Rússia de ho- jugo comunista russo. Outro fato. A Europa e a América do
je, é a verdadeira forma de expansão comunista, a única em Norte, ajudando a Rússia a vencer, criaram um inimigo e uma
que poderá permanecer algo. Esta, porém, é a expansão da ameaça permanente. Eis como acabam os cálculos das astúcias
ideia da justiça social, e não a do comunismo russo. humanas. A história, ao contrário, segue outro pensamento,
◘ ◘ ◘ cumprindo uma justiça que faz recair o mal nas costas de quem
28 PROFECIAS Pietro Ubaldi
o cometeu. Este princípio, que vimos em prática nas revoluções, O sistema liberal tem, além disso, outro defeito. Se é adianta-
ao devorarem seus próprios filhos, e que vemos ainda hoje reali- do no terreno da liberdade política, é no entanto atrasado no as-
zar-se na Rússia, nos leva à conclusão de que também os Esta- pecto da liberdade econômica, problema que, enfrentado e des-
dos Unidos deveriam pagar, recebendo em suas cidades tantas fraldado em cheio pelos países comunistas, embora atrasados no
bombas quantas lançaram na Europa, e isso, naturalmente, tam- campo da liberdade política, é quase ignorado pelas democracias,
bém para efeito benéfico de libertação para eles. em que esta liberdade pode resultar na outra de livremente mor-
◘ ◘ ◘ rer de fome. É assim que, enquanto as democracias acusam de
O que nos está reservado, pois, no futuro, segundo o recôndi- escravismo o regime comunista, este, intitulando-se protetor dos
to pensamento da história na direção dos acontecimentos huma- pobres e paladino da justiça, prometendo, ainda que só com pala-
nos? Retomemos o conceito de onde partimos neste capítulo e vras, o bem-estar, que é aquilo a que as massas mais aspiram,
que é seu “leitmotiv”. O fio condutor do longo caminho da his- pôde conquistar adesões que a concessão do direito do voto está
tória é um irrefreável e instintivo anelo à liberdade. Exprime o bem longe de obter. Ao povo interessa mais resolver o problema
superamento da inferioridade e a libertação da prisão em que de sua vida material do que o de sua vida política. O primeiro re-
caiu o homem. Ora, de que forma poderá continuar a manifestar- presenta uma realidade concreta, que cada um vive de perto. O
se esse impulso da vida? Em outros termos, na cadeia progressi- segundo produz frutos remotos, coletivos, em que o indivíduo
va das revoluções, que funções e finalidades terá a próxima? desaparece; frutos problemáticos, porque entregues em confiança
Conquistada a liberdade política com a Revolução Francesa, a a homens nem sempre conhecidos de perto, em que se tem uma
econômica com a divulgação dos princípios sociais impostos ao fé relativa. Isto porque, desde que o mundo é mundo, parece que
mundo pelo comunismo (excluída a Rússia e seus métodos), a vontade dos homens de governo têm sido fazer convergir numa
concluída a grande revolução técnica operada pela ciência, com só direção a atividade educadora dos povos, ensinando-lhes com
suas últimas conquistas sobre o tempo e o espaço (libertação do o exemplo – que é o que mais persuade – a má-fé dos governan-
limite) e com a máquina (libertação do trabalho material), qual tes, por um hábito próprio inveterado, que considera o poder não
outra liberdade poderá o homem procurar conquistar? como função social e missão, mas como meio de exploração em
A grande palavra das democracias, colocada em oposição prol do benefício único egoístico e pessoal dos chefes.
à da justiça econômica, proclamada pelo comunismo, é: Li- Como se vê, o maior defeito não está tanto no sistema ou
berdade. Estamos nos antípodas da concepção totalitária. Mas forma de governo, mas no valor mesquinho dos homens que o
ambos os sistemas tem seus defeitos. Deixemos de lado os ocupam. Quando só se dispõe, para construir um edifício, de
programas teóricos de justiça econômica ou de liberdade, para lama mole, é inútil escolher e mudar projetos. Qualquer que se-
olharmos a sua substância, que está por baixo deles. De um ja o plano de construção, a casa ruirá. Isto não significa, entre-
lado, os sistemas totalitários – filhos, embora degenerados, tanto, que não se possa construir um bom governo também com
dos sistemas de comando por investidura divina, ainda que, o sistema do poder absoluto, desde que se tivesse um grande
agora, Deus seja eliminado deles – exercem um poder absolu- homem como chefe. Às vezes, a natureza os gera, e isto poderia
to, a mais antiga e primitiva forma de poder, partindo do pres- chamar-se um verdadeiro caso de investidura divina. Um ho-
suposto de que o chefe possui uma verdade indiscutível, por- mem de grande valor pode dar sua característica ao seu século,
que ele é superior e não erra. Na realidade, isto é apenas uma e, se for dirigido por uma consciência superior e pelo senso de
tentativa de justificação teórica, para cobrir a crua realidade, missão, o poder absoluto poderá ficar em suas mãos, sem peri-
que é o domínio do mais forte que venceu. Segue-se daí que go de abusos e com benefício de todos. Mas também é verdade
os princípios proclamados são obrigatórios para todos, todas que, ao menos teoricamente, o poder deveria descer do Alto, de
as consciências estão amarradas a eles e têm que aceitá-los uma verdadeira aristocracia do espírito, isto é, de homens supe-
pela imposição. Sistema primitivo, o mesmo das teocracias, riores, biologicamente selecionados, para que possuíssem eles
necessário nas primeiras fases mais involuídas da humanida- as mais altas qualidades da estirpe, verdadeiros antecipadores
de, quando o indivíduo ainda não tinha uma personalidade au- da evolução e, portanto, os mais aptos a guiar e educar, que é a
tônoma, nem capacidade de justiça. Sistema ótimo, se o chefe verdadeira tarefa do poder. E é verdade também que o sistema
e a classe dirigente fossem verdadeiramente perfeitos. Mas o da representação pela escolha eleitoral, por parte das massas,
são eles na prática? Sem dúvida, a verdade deveria descer do eleva a juízes e árbitros todos os elementos da nação, inclusive
Alto, mas existirá de fato uma aristocracia superior, uma elite os inconscientes, os rebeldes à ordem, os indesejáveis. Não se
biológica capaz de personificar esta função de captar e repre- pode dizer que basta ser a maioria para representar o verdadeiro
sentar uma verdade que desce do Alto? Ou tudo isso, na reali- e o justo, para ter razão e poder melhor realizar. A demagogia,
dade, é apenas uma pretensão teórica? a mecânica eleitoral, a psicologia do momento, podem criar
Por outro lado, o sistema das democracias, embora repre- maiorias de valor mínimo para o bem coletivo. Então o sistema
sentando uma fase mais avançada de vida, com formas mais li- eleitoral só é justificável como meio de expressão de tendên-
vres de convivência social, presume maior consciência e auto- cias, quaisquer que sejam elas, porque podem manifestar-se li-
nomia pessoal, superior capacidade de julgamento, necessária vremente e lutar; ou então como expressão de correntes de pen-
para dirigir a nova liberdade, mais vasta. É necessária uma samento, formadas no subconsciente coletivo ou psique da
consciência política para saber usar o direito do voto. É indis- massa, que, inconscientemente, exprimiria o que o pensamento
pensável uma maturação e educação que não se improvisam. da história exige ser feito naquele momento. Mas esta última
Com efeito, o povo russo, que não viveu a Revolução Francesa justificação faria do cidadão votante uma célula ignara, trans-
e não lhe assimilou os frutos, permaneceu sob o mesmo poder portada pelas correntes coletivas, que seriam as únicas que ver-
absoluto, pouco importando que agora o chefe supremo esteja dadeiramente exerceriam o voto.
vestido de vermelho. Tantas liberdades não podem ser concedi- Dados estes defeitos do sistema parlamentar, perguntamo-
das aos povos menos evoluídos, para quem um governo absolu- nos então por que neste caso não preferir o poder absoluto? Se-
to pode ser uma necessidade. Mas também no Ocidente, as rá, porém, que existem homens superiores que justifiquem esse
massas, em parte, não estão preparadas para usar desse novo método, dando a superioridade deles garantia de bom uso do
poder a elas concedido. Entretanto praticá-lo já é um meio para mesmo? Não! São raríssimas as exceções. Eis então qual é a
aprender a usá-lo. E, enquanto o povo não aprender, é lógico função do sistema representativo: suprir as deficiências de um
que ele também suporte as perdas, sendo explorado pelos de- indivíduo com um sistema de controle, para, com uma defini-
magogos e depois sofrendo as consequências. ção de atribuições, impedir os abusos e, através da multiplica-
Pietro Ubaldi PROFECIAS 29
ção dos detentores do poder, evitar os erros, conseguindo com rosa de Cristo e se transformará ainda mais, até atingir a livre
isso ao menos uma compensação para eles ou até mesmo sua adesão de homens convictos, por haverem compreendido a
eliminação. Então devemos considerar o sistema representati- bondade e a sabedoria da lei de Deus.
vo não como um sistema que possa resolver tudo, em vista do O grande problema para as democracias situa-se na escolha
que hoje é o homem, mas como um sistema que possa suprir dos dirigentes, de uma elite do pensamento e da ação, a quem
melhor as naturais deficiências da natureza humana. A dificul- confiar as delicadas e difíceis funções de comando. O clássico
dade consiste em procurar suprir estas deficiências com a qua- sistema das aristocracias fechadas, animadas apenas pelo ego-
lidade do sistema, de tal modo que se possa construir um mé- ísmo de classe, atentas apenas a desfrutar as vantagens das po-
todo em cujo enquadramento se consiga fazer funcionar até sições conquistadas – a caminho do esgotamento, por falta de
nulidades. Isto é o máximo que se pode pedir a um sistema. elementos renovadores de fora de seu estreito círculo – está
Mas seu valor sozinho jamais será suficiente para fazer tudo e bem longe de resolver o problema. Infelizmente, é o grau de
nunca poderá substituir-se ao valor intrínseco da matéria- evolução da maioria que forma as correntes diretivas impostas
prima: o homem, que é e permanecerá sempre o elemento fun- também aos dirigentes. Não se deve acreditar que os governos
damental de toda construção política e social. possam tudo. Eles, pelo fato de serem apenas uma das forças
Considerando, portanto, que o homem, em geral, é levado a que governam, têm que prestar contas a todas as outras. Pode-
abusar do poder em seu favor e em favor de seu grupo, os sis- rão ser o cérebro, mas de certo não são os membros, o ambiente
temas totalitários são praticamente inaceitáveis hoje. Para se social ou o momento histórico. Podem ser a parte melhor da
conseguir um dano menor, obtendo uma aproximação menos máquina, mas esta pode não segui-los. Eles mesmos, portanto,
remota de um Estado perfeito, só há hoje o sistema representa- devem compreender não só o que esta pode dar-lhes, mas tam-
tivo. Com efeito, ele traz a vantagem de respeitar o indivíduo. bém se ela sabe, é capaz e até onde pode obedecer.
Assim, enquanto os sistemas totalitários procuram invadir até a Daí a necessidade de uma certa afinidade entre chefe e po-
alma dos cidadãos, impondo-lhes pensar de determinado modo vo. Este, para seguir aquele e obedecer-lhe, deve considerá-lo,
e acreditar em determinada verdade, os sistemas democráticos sem dúvida, mais evoluído que ele, porque só assim sente sua
respeitam a individualidade, pedindo ao cidadão apenas a reali- superioridade, mas, ao mesmo tempo, não muito distante de si,
zação de um mínimo ético, isto é, daquilo que é indispensável porque então não o compreenderia mais. É necessário que o
para a convivência social e a manutenção da ordem na vida co- chefe saiba ter os pés em terra, na realidade de todos, mesmo se
letiva. Assim, aqueles sistemas deixam o indivíduo livre em sua isto implicar algum defeito, que é, aliás, aquilo que o aproxima
fé e em seus pensamentos, enquanto essa liberdade não prejudi- da compreensão das massas. Estas, em seu atual grau evolutivo,
car outros ou for motivo de desordens. O enquadramento é mui- exigem, antes de tudo, uma manifestação de vontade e de força,
to menos coercitivo e restritivo, e a liberdade muito mais exten- pois isto lhes dá a sensação do pastor capaz também de defen-
sa. O que se condena nos estados totalitários é justamente o re- der seu rebanho. Um santo, um homem apenas de grande enge-
gime policial, o sistema terrorizante, a sufocação da liberdade, nho, sem as qualidades de um dominador para se impor, seria
a supressão de toda iniciativa pessoal, a quase completa aboli- rapidamente liquidado. Na mentalidade de muitos, é especial-
ção do indivíduo, reduzido a máquina de produção no funcio- mente o chicote que incute respeito e é particularmente o poder
namento do Estado. Tal disciplina poderá representar um futuro material que gera a estima. Há uma harmonia de equilíbrios na
Estado mais perfeito, como foi alcançado por algumas socieda- vida, segundo a qual os povos têm os chefes que merecem e os
des animais, por exemplo as abelhas. Mas isto pressupõe uma chefes têm o povo que merecem.
elaboração biológica precedente, longa e dirigida a uma especi- Diante desse problema da escolha dos governantes, de cuja
alização de funções e à sua coordenação, realizações para as solução parece depender tudo, observemos que, não obstante,
quais a vida está agora apenas preparando o homem. Essa dis- ele tem uma importância relativa. Acreditam os homens que
ciplina formará o superior mundo coletivo do futuro, mas pre- são eles que guiam os acontecimentos, no entanto fazem isto
sume que a adesão a ele seja livre, como resultado de haver si- apenas em parte; acreditam que sejam os chefes que decidem a
do atingida a consciência de sua utilidade, numa forma que, se sorte de uma nação, contudo são, muitas vezes, apenas forças
é vantajosa para todos, não suprime contudo a personalidade do concomitantes. O que verdadeiramente dirige tudo é a inteli-
indivíduo nem seu rendimento. Sem essa adesão espontânea, gência da história. Para quem já compreendeu isto, as formas
incorporada à própria natureza, essa disciplina constitui uma de governo e o problema da escolha têm valor relativo. Na prá-
agressão à vida e um atentado às suas manifestações e rendi- tica, nos fatos, esta escolha, qualquer que seja a forma de go-
mento, tornando-se então contraproducente. verno, é realizada da mesma forma, por seleção do mais adap-
As democracias têm a grande vantagem de deixar a vida tado e por eliminação dos rivais. E, quando um chefe não cor-
manifestar-se livremente, desenvolver-se e formar-se segundo responde mais à sua função, qualquer que seja a forma de go-
suas leis, e não conforme a vontade de um só homem, que verno, as leis da vida livram-se igualmente dele, liquidando-o,
apresenta a probabilidade de não ser um fiel intérprete daque- pois este não lhes serve mais para seus objetivos. As formas de
las leis, mas somente uma expressão de sua egoística vontade liquidá-lo poderão mudar, mas o princípio permanece. A von-
de domínio. Entretanto o absolutismo pode ser suportável e até tade da história manda mais que os chefes e, sempre visando
mais adequado aos povos imaturos, que não saberiam usar a seus objetivos, escolhe-os, confia-lhes tarefas e os tira do posto.
liberdade, porque não só estão privados ainda da indispensável Esta verdade fundamental permanece verdadeira em qualquer
consciência para saber usá-la bem, mas também habituados a regime. Portanto, em substância, o problema da escolha dos di-
viver apenas na escravidão. É natural que, quanto mais involu- rigentes é mais um problema da vida do que um problema do
ído estiver um povo, tanto mais é necessária a força para diri- sistema representativo. Muda a forma, mas a substância perma-
gi-lo e tanto menos liberdade se lhe pode conceder. É sua ma- nece a mesma em qualquer regime. Quando soou a hora de ser
turação evolutiva que leva o homem dos regimes de absolutis- posto de lado um chefe, não há regime totalitário, absoluto ou
mo e força à disciplina jurídica dos direitos e deveres de cada policial que o salve. Se for necessário, será afastado por morte
um, até atingir a livre aceitação por compreensão e adesão, violenta ou por revolução, em vez de sê-lo pela falta de maioria
sem mais necessidade de leis coletivas, realizando a evolução, de votos, mas será afastado da mesma maneira. Temos de nos
que aparece em todas as manifestações do ser humano, políti- convencer da relatividade de todos os regimes, sistemas e ex-
cas, sociais e também religiosas. O poder absoluto e despótico pedientes humanos diante da sábia direção de Deus. Temos de
do Deus de Moisés pôde, assim, transformar-se na ordem amo- nos convencer também que, quando um homem é necessário ao
30 PROFECIAS Pietro Ubaldi
momento histórico, estando apto a desempenhar uma função vi- da segue são diferentes dos humanos. Quando algo está escrito
tal ou missão, e ele a aceita, a vontade da história, para alcançar no livro da Lei, qualquer milagre tem que acontecer, e é lógico
seus objetivos, achará o modo de fazer chegar, qualquer que se- que a utopia se realize. No momento em que iniciou a guerra,
ja o regime escolhido, esse homem ao devido lugar, para dar não parecia utopia que a Alemanha a perdesse? Há cem anos
cumprimento à sua missão necessária, como o quer o história. não era utopia o rádio? A utopia existe nas aparências exteriores,
◘ ◘ ◘ que são os únicos elementos que, em geral, a razão humana leva
Observemos, em seu significado, a Revolução Francesa e em consideração, mas não o é na lógica da história.
depois a Russa. Vimos que o fio condutor que as liga e as guia Falar de uma nova civilização do espírito poderá parecer
numa direção única é a conquista gradual da liberdade, segundo hoje uma loucura, diante da ameaça do colosso russo que
a evolução atingida pelo povos. E é justamente levando em adumbra o mundo. No entanto o colosso tem os pés de barro.
conta este conceito acima exposto, do domínio da vontade da Parece senhor, mas está acorrentado ao seu sistema, que não é
história, que podemos prever qual será o novo passo a frente o comunismo, mas a violência e o terror, pelos quais, na Rús-
que ela vai querer que seja dado pela humanidade no caminho sia, todos sofrem e tremem, desde o chefe supremo até ao úl-
da conquista dessa liberdade. Com a igualdade, a Revolução timo cidadão. A grande ideia da justiça social, nas mãos de
Francesa aboliu os privilégios e deu ao mundo a liberdade polí- outro povo e lançada com outros sistemas, já teria conquista-
tica. Com a justiça, a Revolução Russa combate os abusos da do o mundo. Mas essa ideia, fechada naquele sistema, não po-
riqueza e dará ao mundo a liberdade econômica. Se o caminho de frutificar, porquanto aquele sistema significa autodestrui-
da história é um processo de libertação, que vai da escravidão ção. Uma autodestruição por causa do sistema errado e de
para uma liberdade cada vez maior, de que tipo poderá ser a li- quem o utilizou, mas não pela ideia em si. Esta, embora obri-
berdade que a nova revolução irá querer conquistar? A lógica, gada a nascer na Rússia, pois só assim, vestida de violência,
que forçosamente está no desenvolvimento do pensamento dire- podia destruir, abandonará seu duro berço e a terra materna,
tivo da história, dar-nos-á a resposta. para crescer e caminhar pelo mundo. Não há necessidade,
A terceira revolução já começou. As revoluções podem levar pois, de agredir a Rússia. Se não for destruído pelos outros,
até séculos de preparação. O progresso técnico da ciência está será o próprio comunismo soviético que matará o comunismo
preparando as bases materiais em que se apoiará a nova liberda- soviético. E, uma vez eliminada esta sua forma e seu sistema
de. São elas a superação dos limites de espaço e tempo e a liber- de terror, o comunismo invadirá o mundo. Mas talvez, então,
tação do homem do trabalho material, por meio da máquina. A chamar-se-á simplesmente Evangelho.
nova conquista da liberdade elevar-se-á sobre as já realizadas Vimos que o processo lógico da história tende à construção
pelas duas precedentes: a liberdade política e a econômica. O do edifício de todas as liberdades. Estas, porém, só podem ser
homem ficará livre da ideia fixa da preocupação econômica e conquistadas sucessivamente, assim como os pavimentos de
será servido pela máquina, acionada pela energia atômica. Mas uma casa só podem ser construídos um após outro. Sobre a li-
poderá ele, chegando a esse ponto, deter-se e dormir sobre os berdade política eleva-se a econômica, e sobre esta, a liberdade
louros? Não. A vida não pode parar e, com estes novos meios, do espírito. Esta última será a conquista maior, resultado de um
que se movem de novos pontos de partida, ela continuará a esforço maior, realizado por necessidade imposta pelas circuns-
avançar por novas estradas, ainda não exploradas. Uma vez do- tâncias de uma curva da história e desejado pelo pensamento di-
minado o planeta, eliminadas as guerras, alcançadas a ordem e a retivo dela. As três revoluções não estão desvinculadas, mas re-
paz num governo mundial único e sistematizado a serviço do presentam o mesmo esforço continuado, para alcançar uma li-
homem o ambiente externo, será iniciada a penetração no mun- bertação cada vez mais completa das sempre mais estreitas for-
do do imponderável, do supersensório, onde jazem inexploradas mas de escravidão a que o homem se prendeu com sua descida
as minas do espírito, os continentes do mundo interior, as forças ao longo do caminho involutivo. Se este foi um caminho de en-
mais sutis, penetrantes e poderosas do ser. A revolução será pa- carceramento, o atual progresso é um processo para desvenci-
cífica, mas será a maior e a mais decisiva, porque deslocará o lhar-se. A primeira fase, involutiva, leva o ser a se precipitar na
eixo em torno do qual gira o pensamento humano, porque ela limitação, a segunda, evolutiva, o conduz a se evadir de lá. É por
ocorrerá na profundidade, mais próxima da substância das coi- isso que o homem anseia ascender, de liberdade em liberdade,
sas, e, avizinhando-se da fonte primeira do ser, que está no espí- porque esta é a lei de sua evolução. A próxima curva da história
rito, transformará nossas formas de vida individual e social. só pode, pois, oferecer-nos uma nova e mais alta libertação de
O edifício da liberdade ira elevando-se, assim, cada vez todas as escravidões. Trata-se de uma ascensão progressiva, que
mais alto. As faculdades de raciocínio, que se vão sempre mais recorda o desabrochar de uma flor, para chegar cada vez mais
afirmando em larga escala nas mentes do mundo civilizado, já perto do espírito e da substância; é uma reconquista gradual da
preparam o homem, mesmo no fundo da decadência atual, para liberdade completa, já possuída no ato da primeira criação, co-
que possa compreender claramente as verdades que até agora mo ser perfeito, e perdida por vontade de revolta.
só foram reveladas, mas permaneceram escondidas nos misté- Observemos os degraus desta ascensão. O liberalismo das
rios. E o homem poderá ser religioso por compreensão direta, e democracias, filho da Revolução Francesa, deu-nos a liberdade
não apenas pela fé. A revolução é complexa, com mil aspectos, política. O comunismo, filho da Revolução Russa, desvencilha-
repercussões e consequências práticas. Realizar-se-á na pro- do do absolutismo e totalitarismo russo, dar-nos-á a liberdade
fundidade da alma e acontecerá porque os tempos estão madu- econômica, na pacifica forma evangélica. Alguma outra nação,
ros, pois a vida quer subir ainda e não poderá ser detida. Após que ninguém hoje repara no mundo, mas que de certo está ama-
as duas últimas revoluções, a liberdade foi conquistada em to- durecendo em silêncio, dará ao homem a consciência de si
das as direções, menos nesta, que é a única em que ainda não mesmo e a liberdade espiritual. Como em todas as revoluções,
se desenvolveu. Se o progresso, que é lei fatal, quiser continu- começa lentamente a acumular-se a pressão interior, que explora
ar, só poderá seguir esse caminho. Tendo sido conquistadas as o ambiente à procura do ponto de menor resistência, para depois
outras formas de liberdade, só há este outro tipo, para continu- abrir uma brecha e explodir como manifestação exterior, a única
ar a inevitável ascese da evolução. coisa que depois é percebida pelos homens. O pensamento da
Utopia? Mas que utopia maior que esse contínuo desenvol- história dirige os movimentos, canaliza o esforço e ajuda a ex-
vimento do ser e seu progresso em direção a formas de vida plosão, preparando os acontecimentos úteis ao objetivo. O bom
mais altas? No entanto esta utopia está se realizando permanen- êxito de uma revolução é o resultado de mil forças, que têm de
temente no tempo. Os critérios que o pensamento diretivo da vi- ser coordenadas numa orquestração perfeita. Este trabalho não
Pietro Ubaldi PROFECIAS 31
pode ser feito pelo homem, que ignora tudo isso, mas só pelo esta terceira e, sem querê-lo, estão trabalhando concordemente
pensamento e pela vontade da história. Haverá, pois, o concurso para seu advento, pois estabelecem as bases da justiça econô-
de acontecimentos históricos que, mudando as atuais condições mica e da liberdade, necessárias para que, sobre elas, possa ele-
do mundo, tornarão possível o que hoje parece utopia. var-se a superior construção da terceira ideia. Esta destilará o
Qual será a nação escolhida? A vontade da história, sendo que de melhor houver no comunismo e nas democracias e, nes-
um momento da lei de Deus, respeita o princípio universal de te plano mais alto, fundirá as duas ideias, hoje rivais, libertan-
liberdade. Prepara, pois, ajuda e oferece, mas não obriga. Com do-se dos defeitos de ambas. Assim, só a terceira ideia poderá
efeito, uma não-aceitação da missão que deve realizar esse pas- resolver equitativamente tais conflitos, vistos até hoje apenas
so à frente, produziria apenas um atraso ou uma deslocação to- unilateralmente e, por isso, ainda insolúveis. Ela poderá então
pográfica, porém, mais cedo ou mais tarde, o fenômeno se veri- irmanar os inimigos capital e trabalho, sem que o primeiro ex-
ficaria da mesma maneira. Já o afirmamos a propósito das ou- plore o segundo, e sem que o segundo explore o primeiro. Des-
tras revoluções. A nação escolhida será, pois, aquela que, sa forma, ela respeitará as conquistas milenárias da civilização,
achando-se em condições adequadas, receber o oferecimento; levando-as mais adiante, sem destruí-las, ou seja, respeitará a
será aquela que, mais tarde, quiser aceitar esse oferecimento e propriedade e a família, a individualidade e sua inteira iniciati-
também souber pô-lo em prática. Se tudo isso se realizar, essa va, mas exigirá que tudo seja feito em favor especialmente dos
nação terá a glória de ter feito o mundo dar um passo à frente. deserdados, com um princípio superior de retidão, que é o úni-
Depois disso, a ideia, onde quer que tenha nascido, desligar-se- co capaz de melhorar estas instituições no seu principal e per-
á de seu berço, deixando uma gloriosa mãe, e caminhará pelo manente defeito de não estarem voltadas para um bom uso. O
mundo, porque pertencerá ao mundo. que importa é eliminar esse defeito.
Já falamos bastante alhures, e não é mister voltar a explicar A culpa não está nas formas, e sim na má vontade que as
a natureza desta nova transformação. Ela pode ser chamada de anima. Acreditar que seja possível essa transformação parece
nova civilização do III Milênio, ou de advento do Reino de loucura, quando olhamos em torno e vemos o homem de hoje.
Deus. É a demonstração e a prática do Evangelho, o que impli- Mas, há cem anos, o voo também parecia loucura. E o futuro
ca já haver terminado a conquista das duas liberdades menores, não pertence aos conservadores e repetidores do passado, mas
a política e a econômica, para alcançar a liberdade que só um sim aos pioneiros corajosos, que racionalmente sabem preparar
ser consciente pode possuir. Esta só pode nascer com base na as realizações dos grandes sonhos da humanidade. Que signifi-
aplicação de um comunismo entendido como justiça social, tal cado teria – posto que certamente não é estúpido e inútil – esse
como foi ditada pelo Evangelho. Esta é a consequência lógica jogo de nascer, viver e morrer, através de tantos esforços e tanta
das duas conquistas precedentes. Dissemos acima que a ideia dor, se não fosse para ascender, evolvendo para o que é me-
da justiça social já teria conquistado o mundo se fosse lançada lhor? Até agora, o rei do planeta, vencedor de todas as outras
com outros sistemas. A nação escolhida, portanto, terá que co- espécies, é ainda um ser meio-homem e meio-animal, que fun-
meçar a pô-la em prática e lançá-la livre do absolutismo e do ciona em grande parte por instinto, como os animais, e ainda
totalitarismo russo. Só em tais bases de verdadeira justiça soci- não sabe exatamente porque nasce, vive, sofre e morre; um ser
al, sem escravidão nem terrorismo, poderá ser iniciada a tercei- que não tem conhecimento exato das leis e do porquê da vida e
ra revolução. Não nos espantemos com esta palavra, pois ela não sabe obrar conscientemente, por convicção, mas apenas por
também pode aplicar-se à obra de Cristo, que foi a revolução coação, por medo, por imitação ou por fé.
mais pacífica e, no entanto, a mais profunda. As armas e a im- A conquista desta nova liberdade exige a formação dessa
posição à força atuam no exterior, na superfície, por coação, nova consciência, porque, de outra forma, tornar-se-ia descon-
com resultados efêmeros, porque não penetram a alma, onde es- trolada licença, cheia de abusos perigosos. Tal liberdade signi-
tá a raiz de toda a nossa atividade. Trata-se aqui, ao contrário, fica que o homem, até agora criança, guiado pela revelação e
de uma revolução interior, em profundidade, uma revolução de pelas religiões, por leis civis e sanções, enquadrado assim, for-
sistema, que leva à adesão espontânea por livre convicção. çosamente, numa ordem moral e social, terá agora que cami-
Assim como o mundo passou da injustiça dos privilégios nhar por si mesmo, guiado por sua livre-autonomia de julga-
de classe à justiça das igualdades políticas, e está passando da mento, por uma orientação não mais imposta de fora, mas que
injustiça da concentração econômica à justiça de uma distri- nasce conscientemente do íntimo. No entanto, para atingir isto,
buição mais equitativa dos bens, também passará da escravi- torna-se indispensável uma nova consciência, que só pode nas-
dão do trabalho material à libertação dele com a máquina e cer a partir do conhecimento. Isto significa ter uma visão bem
com a ciência (domínio sobre as forças da natureza), depois clara de todos os problemas, haver resolvido todos os mistérios,
passará da ignorância ao conhecimento e, por fim, do conhe- conhecer os bastidores espirituais que estão por trás dos fenô-
cimento à bondade. Muitos, hoje, praticam o mal, sobretudo menos, descobrir o pensamento da Lei, que tudo dirige, sentir
porque ignoram a grande vantagem para si mesmos de fazer o Deus imanente e conformar-se totalmente à Sua vontade. A fa-
bem, ignoram o lado utilitário da retidão em todos os campos. se da ordem imposta com a força já está quase superada. Há de
O mundo não conhece ainda hoje a técnica deste novo utilita- nascer uma ordem livre, filha da convicção de quem tudo com-
rismo e comete erros contínuos, que ele vai pagando. É este preendeu. Esta é a nova liberdade que temos que conquistar. O
caminho de esclarecimento racional a estrada mestra para che- mundo está materialmente feito. Torna-se mister fazer o ho-
gar à ordem, dada pela retidão; esta é a via que o mundo, por mem sem o que, não é possível progresso ulterior.
haver conquistado qualidades racionais mais desenvolvidas, Trata-se de um trabalho imenso. A Ásia e a Europa deram
está hoje mais apto a percorrer. Disto nascerá uma convicção seu fruto. Cabe às jovens Américas empreender este novo cami-
clara, como a de quem tudo viu e verificou, convicção que será nho. As velhas civilizações oferecem seus frutos de milênios de
muito mais forte e poderosa na ação do que um ato de fé, às lutas e dores, sem o que nada se cria, para que hoje frutifiquem
escuras. A fé é uma necessidade de uma humanidade infantil nas terras virgens, com elementos mais jovens e virgens. A na-
ainda, mas não poderá mais bastar para satisfazer uma huma- ção que acolher esta ideia, a terceira ideia, e a fizer sua, será
nidade que está tornando-se adulta. grande na história. Será a nação que quiser transformar em insti-
O mundo está debatendo-se hoje entre as duas ideias: a jus- tuições e vida social vivida os princípios da lei de Deus, não só
tiça social pregada pelo comunismo e a liberdade proclamada entrevista pela fé, mas claramente explicada e racionalmente
pelas democracias. Mas eis que surge a terceira ideia. Sem sa- demonstrada, até o fim. Para se iniciar isso, é necessário um gê-
bê-lo, as duas precedentes são instrumento de preparação para nero de elite ou classe dirigente bem diferente daquele que se
32 PROFECIAS Pietro Ubaldi
procura escolher nas filas do povo com os sistemas eleitorais vi- saber usá-la sem dano para si. E que faria o homem, senão
gentes. Trata-se de uma aristocracia do espírito, em que se en- constantes desastres contra si mesmo, se a Lei não soubesse tu-
contrem e unam-se os tipos biológicos que já chegaram ao ama- do por ele e não o guiasse, mesmo à força, a cada passo?
durecimento, dispersos hoje pelo mundo. Sua tarefa é formar o É assim que a história só concede novas liberdades aos po-
modelo das novas formas de existência. Nestas conquistas, a vi- vos na proporção da maturidade que eles atingiram. Poderiam
da primeiro lança para o alto um pequeno grupo selecionado, ter todas as liberdades, mas o que estabelece a medida dessas
como antena de exploração, qual primeira tentativa de antecipa- concessões é somente o seu nível de evolução. Assim elas são
ção da evolução. Este é o primeiro passo da revolução em sua acessíveis apenas por graus, e as revoluções só podem conquis-
fase manifesta, que sucede à fase subterrânea de incubação. O tar estavelmente aquelas liberdades que os povos poderão usar
primeiro grupo dos mais valentes forma a nova corrente, na mais tarde. As outras, para as quais não se está maduro, mesmo
qual, aos poucos, por imitação, em certas condições mais favo- se adquiridas por alguns momentos, são rapidamente perdidas.
ráveis de ambiente, segue atrelado depois o peso-morto das Sobe-se, por isso, pouco a pouco. O caso limite desta subida é
massas. Mas o impulso dinamizante está antes de tudo na vonta- dado pelo ser a quem podem ser concedidas todas as liberdades,
de da história, que, através dessa aristocracia de novos intérpre- porque ele conquistou o conhecimento completo da Lei e, por-
tes e executores, sempre transmite esse impulso ao elemento tanto, está em grau de compreender o dano que a si mesmo cau-
passivo, formado pela matéria inerte das maiorias. saria se dela abusasse, não havendo mais assim perigo de abu-
Desta vez, não será mais a aristocracia dos privilégios, en- so. Então, já absolutamente livre, funde-se espontaneamente
carregada de criar um tipo mais requintado, nem a aristocracia com o determinismo da Lei e faz a vontade de Deus ser sua
burguesa do capitalismo, encarregada de criar a industrialização vontade. Em outros termos, o ser, alcançando novamente a per-
e o poder econômico, mas sim a aristocracia da inteligência, feição, supera todo o separatismo, toda diferença entre si pró-
que compreendeu o tremendo poder do pensamento, a aristo- prio e a Lei, pois o máximo grau de liberdade coincide com o
cracia da bondade, não somente como produto do coração, mas grau de obediência máxima, na ordem perfeita. Este é o ponto
também da mente que compreendeu o grande rendimento utili- final do caminho que vai do caos até Deus.
tário da retidão na vida individual e coletiva. Dado, porém, que
a vida é sempre luta contra algum inimigo que obstaculiza a IV. OS TEMPOS SAO CHEGADOS.
emancipação, desta vez o inimigo que iremos confrontar não A SALVAÇÃO DO MUNDO1
será mais o nosso semelhante, e sim a nossa própria natureza
animalesca, para superá-la e vencê-la. Como se vê, não se trata Digníssimas autoridades,
de guerra contra ninguém, mas apenas contra as inferiores leis Senhoras e senhores.
da vida, que ainda sobrevivem no homem e devem ser sobrepu- Meus amigos:
jadas por ele. Eis a nova conquista, a emancipação da animali- “Os tempos são chegados”, é o tema que vamos desenvolver
dade, ou seja, um requintamento de vida, não só na forma de fi- nesta palestra.
dalguia exterior, mas na substância, que é uma atitude psicoló- “Os tempos são chegados”. E este, meus amigos, é o tema
gica de compreensão para com o próximo, de ordem na vida que me foi apontado por inspiração do Alto, desde a primeira
social, de bondade para com todos os seres. das Grandes Mensagens de Sua Voz, no Natal de 1931.
Embora tudo isso possa parecer utopia, não há outro futuro, Embora eu apenas tivesse chegado ao Brasil, na minha pri-
se quisermos que haja verdadeiro progresso. Esta é a nova or- meira visita, em 1951, no meu sexagésimo quinto ano, esta
dem do mundo. Somente assim será possível alcançar a elimina- grande terra já estava marcada, desde minha mocidade, no meu
ção de tantos atritos sociais, que custam tantas dores, e conse- destino, tanto que a minha tese de formatura em Direito, foi um
guir novo aperfeiçoamento das relações civis, com mais precisa livro sobre o Brasil. Eu sentia como que uma atração instintiva
e justa coordenação em sentido orgânico, para melhor convivên- e irresistível por este país, até que, em dezembro de 1952, por
cia de todos. Está nas leis da vida esta necessidade de termos fatos imprevisíveis para mim e mais poderosos que minha von-
uma coordenação cada vez mais perfeita. É fatal que o mundo se tade, milagrosamente vencendo todas as dificuldades, aqui che-
encaminhe para a formação de unidades sempre mais vastas e guei definitivamente com a família, para trabalhar e dar o me-
compactas. A luta futura será contra tudo o que é antissocial, lhor fruto da minha vida, até à morte.
contra quem queira resistir a essas novas formações, que são ins- Para melhor compreender, releiamos juntos alguns trechos
tinto humano, necessidade da vida e representam o mais vanta- da Mensagem do Natal de 1931, que nos oferece o tema fun-
joso e utilitário sistema de rendimento da atividade humana. damental que aqui iremos desenvolvendo. Cada um fica livre
Mas, para alcançar esse grau mais evoluído de bem-estar, de aceitar ou não a origem sobrenatural desta mensagem, mas o
em que devem desaparecer todas as opressões e coações, e ter fato positivo, que faz pensar haver ai há um poder que não é
direito a esta muito mais ampla liberdade, é necessário formar- meu, é que ela, embora eu fosse desconhecido, espalhou-se por
se novo sentido de autodisciplina interior, caso contrário a nova si mesma pelo mundo, alcançando desde a Europa, as Américas
liberdade se transformaria em licença e abuso e, ao invés de do Norte e do Sul, os países árabes e a Ásia até a Indochina,
conduzir a uma nova ordem, constituir-se-ia em elemento de atingindo um milhão de exemplares.
desordem. Cada superação de limites traz um afrouxamento de Era a Noite de Natal de 1931, e eu estava desanimado pelos
freios e implica, portanto, a necessidade da formação de uma demasiados sofrimentos, quando eu, como se um relâmpago me
nova consciência, que sirva, somente ela, de freio à nova liber- colhesse desprevenido, escrevi tremendo estas palavras:
dade. Trata-se de uma deslocação da função constritiva e prote- “No silencio da noite santa, escuta-me. Põe de lado todo o
tora, que parte da condição coativa, onde é imposta do exterior saber e tuas recordações; põe-te de parte e esquece tudo. Aban-
e tem de ser suportada à força, para alcançar uma forma livre, dona-te à minha voz, inerte, vazio, no nada, no mais completo
imposta pelo íntimo e aceita porque se lhe compreenderam as silêncio do espaço e do tempo. Neste vazio, ouve minha voz
vantagens. Deve subsistir sempre uma norma, sem o que a li- que te diz: Ergue-te, e fala: Sou eu.
berdade se tornaria licença. Apesar do homem ansiar mais por “(...) Falo hoje a todos os justos da Terra e os chamo de to-
esta do que por aquela, buscando, quando se fala de liberdade, das as partes do mundo, a fim de unificarem suas aspirações e
compreendê-la como licença, há a sabedoria da Lei, que supre a
loucura do homem, não lhe concedendo acesso a novas liberda- 1
Este capítulo foi proferido pelo autor como conferência nas princi-
des, enquanto ele não tiver formado uma consciência capaz de pais capitais do Brasil (N. do T.).
Pietro Ubaldi PROFECIAS 33
preces numa oblata que se eleve ao céu. Que nenhuma barreira Cristo ainda está esperando ser tomado a sério depois de
de religião, de nacionalidade ou de raça os divida, porque não dois mil anos. Os santos hoje são poucos, e as multidões se-
está longe o dia em que somente uma será a divisão entre os guem outro caminho. O homem, na sua ignorância, acredita er-
homens: justos e injustos. roneamente que a paciência misericordiosa de Deus seja a sua
“A divisão está no íntimo da consciência, e não no vosso própria vitória. Neste ponto, a humanidade se encontra no ca-
aspecto exterior, visível (...). Minha palavra é universal (...). minho da descida. A multidão é ignorante e obstinada, e se faz
Uma grande transformação se aproxima para a vida do mundo. forte pelo número. Tendo ela tomado demasiada velocidade na
“(...) Tal como a última molécula de gelo faz desmoronar o descida, sempre mais difícil se torna retomar o caminho da su-
iceberg gigantesco, assim também de uma centelha qualquer bida. Agora chegamos a um ponto em que, nem mesmo com
surgirá o incêndio (...). uma explicação racional, apoiada na lógica e na ciência, não é
“A destruição, porém, é necessária. Haverá destruição somen- mais possível obter a verdadeira compreensão. A destruição,
te do que é forma, incrustação, cristalização, de tudo o que deve então, se faz necessária, visto que aquele que quer parar o pro-
desaparecer, para que permaneça apenas a ideia, que sintetiza o gresso da vida, por esta mesma vida será destruído, pois a Lei
valor das coisas... Grande mal, condição de um bem maior. quer que ele avance, por isso ela afasta todos os obstáculos.
“Depois disto, a humanidade, purificada, mais leve, mais Seja como for, o fenômeno deve ser resolvido. As forças
selecionada por haver perdido seus piores elementos, reunir- progridem e devem realizar-se de alguma forma. Não há outro
se-á em torno dos desconhecidos que hoje sofrem e semeiam caminho que não seja o do aceleramento. Que os maus, como
em silêncio, e retomará renovada o caminho da ascensão. Uma fala o Apocalipse, tornem-se cada vez piores, e os bons, cada
nova era começará”. vez melhores, de modo que seja possível separar sempre mais
◘ ◘ ◘ uns dos outros, e a justiça se cumpra. Neste ponto, a solução
Assim falou a primeira mensagem de Sua Voz, do Natal não mais se pode encontrar voltando para trás, mas somente no
de 1931. Já expliquei num artigo, “Princípios”, em 1952 2, que choque violento entre as forças do mal e as do bem, pelo fato
as religiões tem três fases: a primeira, a mais antiga, é a terro- de que já estamos na guerra e não podemos chegar ao fim senão
rista, feita por um Deus vingativo, que se faz obedecer inexo- como vencedores ou como vencidos. Chegou a hora do grande
ravelmente, punindo com a lei de talião. A segunda, mais re- julgamento, em que se terá de fazer a prestação de contas.
cente, é a ético-jurídica. Feita de uma codificação de normas Aqueles que mais dificilmente poderão ser salvos são os astu-
de vida. É este evolver da natureza humana inferior que pode tos, os poderosos, que são os maiores responsáveis, por terem
permitir uma manifestação de Deus, fazendo transparecer ca- eles nas mãos os meios de direção da riqueza e do poder.
da vez mais Sua Bondade. Os dirigentes, desorientados pela falta duma concepção ca-
Somente hoje a maturação pode permitir, sem o perigo de paz de resolver os problemas da vida, percebem esta corrida em
abusos, antes temíveis, a passagem à terceira fase, de compre- direção ao abismo e desejariam descobrir meios práticos de sal-
ensão, em que as religiões são livres e convictas, tornando-se vação. Infelizmente, porém, no repertório econômico, político e
cada vez mais de forma, onde lutam os interesses, em substân- social deles, não existem tais meios para evitar estes golpes.
cia, que é Amor. Todo o sistema vigente está errado. Ele se baseia na força. E
Hoje se passa da segunda à terceira fase. Penetra-se na ninguém pode impedir que quem use da espada, por ela pereça.
fase do amor. Não mais luta entre rivais, mas colaboração de O nosso mundo somente confia na força e, portanto, não pode
irmãos.
merecer a intervenção de poderes superiores para a sua defesa.
Brevemente o mundo se organizará sobre um princípio úni-
Ao contrário, ele os renega com seus atos. E quem não tem se-
co. Este, no entanto, não será dado por um imperialismo religi-
não a força não pode prescindir dela.
oso, através da vitória de uma religião que, por absolutismo, se
Ela leva à destruição, porque o choque é inevitável. Ele é
imponha a todas as outras. Não é por este caminho que se che-
uma consequência necessária e fatal do sistema hoje vigente no
gará à unidade, ou seja, a um só rebanho e a um só pastor.
mundo, que fica assim inexoravelmente preso na sua própria
O único pastor será o Cristo, e o único rebanho será forma-
armadilha, sem possibilidade de saída. Tudo isso é consequên-
do por uma humanidade em que as varias religiões não se com-
cia do grau de involução em que o homem atual se acha, porque
batam e não se condenem reciprocamente, mas, ao contrário, se
ainda se encontra no plano semianimal.
compreendam e coordenem, fazendo dos homens, todos eles, fi-
lhos diante de um único Deus, um só Deus, pai de todos. Quantas vozes espirituais se levantaram, quantos mártires se
◘ ◘ ◘ sacrificaram para que o mundo evolvesse! Mas o homem conti-
O mundo materialista de hoje, na realidade vivida, desinte- nua pertencendo ao plano biológico do animal. Por isso ele de-
ressou-se do Cristo. Mas repudiar o Evangelho significa não ve aceitar as duras leis deste plano. Uma vez que, neste ponto,
aceitar a lei de um plano biológico mais evoluído e recusar-se ele já demonstrou não querer evolver, a maioria, que pertence a
a progredir e civilizar-se. Ir contra as leis da vida, querer pará- este tipo biológico, deverá ser afastada do planeta, de modo que
las no seu caminho de ascensão, significa ser atingido por suas este possa progredir por intermédio dos poucos evoluídos, que
terríveis reações. E esta foi a terrível encruzilhada em que a pertencem a um plano biológico mais alto.
humanidade quis cair! Tudo isso acontece automaticamente, porque a concórdia e a
Cristo não é somente um fato histórico ou fenômeno religi- organização são condições dos evoluídos, enquanto que o sepa-
oso, é o mais alto acontecimento biológico do planeta, aconte- ratismo, a luta e a desorganização são qualidades dos involuídos.
cimento perante o qual deverá prestar contas a humanidade, De modo que estes, pela sua própria natureza e sistema, são gui-
que nunca poderá fugir às leis da vida. Cristo deixou-se sacri- ados para serem eliminados, exterminando-se uns aos outros.
ficar para nos dar a verdade. Acreditou-se tê-Lo destruído, ma- Não é fato que o mundo continua se armando porque acredita
tando-O; tê-Lo afastado, negando-O. Mas o espírito, a verdade mais nas armas? O que pode acontecer num mundo feito assim,
e as leis da vida não se podem destruir. Cristo faz parte do fe- senão destruição; quando, com o sistema vigente de força, os
nômeno vida e não pode morrer. Ele está vivo e sempre vivo problemas não podem mais ser resolvidos senão pela força;
estará entre nós, presente e operante como força viva. Nin- quando não há nenhum outro modo para sobreviver, senão cons-
guém pode parar a Sua ação. tituindo-se como o mais forte, porque, ao primeiro sinal de fra-
queza de uma das partes, a outra estará pronta ao assalto para
2
Explicaremos melhor no princípio do cap. VII, a respeito do destruir? Não é esta a lei de muitos de nossos atos? Hoje o mun-
Apocalipse (N do A.). do é uma gigantesca corrida de lutadores egoístas, cada um pro-
34 PROFECIAS Pietro Ubaldi
curando aproveitar o máximo possível do seu próximo. A me- avidez, ele cria a sua miséria; com o seu orgulho, a sua humi-
lhor habilidade nos negócios e na política é, muitas vezes, julga- lhação; com a sua prepotência, a sua derrota. Trata-se de uma
da ser aquela de saber enganar e espoliar o próximo. Os métodos lei de causa e efeito, de continuidade e de equilíbrio, que fica
modernos são muitas vezes uma sobrevivência dos antigos mo- confirmada por todas as outras leis que a sustentam e que são
dos de pilhagem, de rapinas, de destruição dos fracos. por nós conhecidas no mundo físico e dinâmico. Esta teoria é a
Pois bem, há, entretanto, uma lei de progresso, que nos im- que mais concorda com tais leis. Ela poderia renovar o mundo.
pulsiona para a civilização, o que significa que é preciso aca- Hoje o homem está enlouquecido pelo sucesso, que faz consis-
bar com tudo isso, até serem afastados todos aqueles que de- tir seu valor na aquisição e no acúmulo da riqueza, sem dar im-
monstraram não serem capazes de ascender a esta forma de vi- portância aos meios usados. Vencer é o grande sonho, seja da
da. E estes seres não estão isolados somente numa nação parti- maneira que for, pois o vencedor é sempre admirado.
cular, mas em todas as nações do mundo. Não há uns poucos Mas no Alto há uma lei de justiça inexorável. Os débitos
inocentes, nem uns poucos culpados. A culpa está distribuída devem ser pagos; quem faz o mal receberá o mal; quem faz o
por toda a parte, de modo que mais ou menos, muitos deverão bem fará jus a ele. Podemos semear livremente, mas, depois, o
pagá-la, e o próprio sistema deles os levará a um recíproco fruto será fatalmente nosso. Então, para que serve o triunfo
choque fatal, para serem destruídos uns pelos outros, sejam efêmero do mais forte contra o mais fraco? Que ficou de defini-
eles vencedores ou vencidos. tivo de todos os triunfos registrados pela história?
O mundo, na prática, não acredita em Deus. Os fatos é que Tudo isto serve apenas para fazer da Terra um inferno, um
valem. Faz-se muita questão de ortodoxia de princípios, mas teatro de guerras, sem paz e segurança para ninguém, e também
pouca daquilo que mais importa, isto é, de retidão nas obras. O para chegar à dor, que é a grande mestra que nos ensina a não
mundo não leva em conta que existe uma lei, embora conhe- errar mais. Quem esmaga será esmagado. Quem furta para en-
cendo-a, e, às vezes, esquece que o passado, o presente e o fu- riquecer, empobrece. Quem faz sofrer o próximo deverá depois
turo estão fatalmente ligados por todos nós, que assim recolhe- pagar a ele a sua dívida com a sua própria dor.
mos a cada momento as consequências de nossos atos. Assim, o É loucura procurar enriquecer e vencer sem critério de justi-
mundo não toma conhecimento de que nós, com todos nossos ça. Assim, construímos o nosso próprio destino, de pobreza ou
pensamentos e atos, semeamos o nosso futuro de alegria ou de de vencidos, com o qual tudo pagaremos. Deste modo, o mundo
dor, não toma conhecimento da absoluta fatalidade das conse- segue um método irracional, contraproducente, antiutilitário.
quências, seja de prêmio ou de pagamento. Deste modo, a soci- Quem sabe com que desprezo nos julgarão nossos futuros des-
edade humana está toda ligada por uma série de liames, que não cendentes civilizados. Enriquecer sem dar o valor correspon-
são aqueles que os homens julgam ser, constituído somente de dente do próprio trabalho significa empobrecer. Num mundo
relações jurídicas ou de parentesco físico. Há também uma rede mais inteligente se procuraria o próprio bem-estar ganhando le-
de relações cármicas, de débitos e créditos, que nos vinculam gitimamente, sem endividar-se com o ganho ilegítimo. Ao con-
uns aos outros e são os mais importantes. As proteções jurídicas trário, dever-se-ia procurar créditos, pagando do seu próprio pa-
e aquelas baseadas na astúcia e na força ficam na superfície, trimônio ao próximo e tornando-se útil à sociedade. Em cada
não sendo suficientes para nos defender da fatal reação da Lei. caso, nunca adquirir sem dar um valor equivalente. Direito de
O que vale é o efeito das causas que colocamos em movimento. todos à vida, mas a todos o dever do trabalho! Deste, pedir so-
Quem ganha indebitamente também fica devedor e, por conse- mente a justa recompensa, que é obrigação da parte de quem
guinte, terá que pagar, e poder legal ou humano algum poderá tem nas mãos o capital e a direção. Este é verdadeiro funda-
impedir isto. Quem foi injustamente explorado torna-se credor mento das leis econômicas, e não a luta. E os vencedores, por-
e fará jus à sua compensação. Quando se constituem relações que são mais fortes e inteligentes, têm o dever de educar e aju-
desta natureza no destino de vários indivíduos, os liames per- dar os mais fracos, e não o direito de esmagá-los e explorá-los.
manecem até que as contas sejam quitadas, entregando a cada A humanidade deveria compreender que os problemas não
um aquilo que for de seu direito. Assim, o vencedor que acredi- podem ser resolvidos com a força ou com a astúcia, mas so-
tou ter triunfado deverá cair aos pés do vencido. Se o homem mente com a justiça; compreender que o vencedor se endivida
pudesse compreender uma lei assim tão simples, toda a estrutu- perante o vencido, devendo pagar a este o preço do mesmo
ra social tornar-se-ia diferente. esmagamento que causar. O escravo tornar-se-á um dia dono
O homem atual, muitas vezes, acredita ser inteligente de seu patrão, que por sua vez será seu escravo. Só assim, am-
quando consegue defraudar a lei de Deus. Mas como pode bos poderão compreender a lição. No seu ataque contra o cris-
acreditar que seja possível defraudar as leis da vida? Isso é tianismo, Nietzsche, o criador do tipo biológico do super-
loucura. Porém o homem é míope e ignorante. Ele fica satisfei- homem do egoísmo e da prepotência, evoluído ao contrário, is-
to com o sucesso imediato. E depois? Para a grande maioria is- to é, herói da involução, viu no Sermão da Montanha uma ex-
to é uma neblina de mistério. O sucesso imediato o deixa acre- pressão de revolta dos renegados, dos fracos e vencidos, contra
ditar ter conseguido enganar o próximo e a Lei, entretanto ele o poder vencedor. Assim Nietzsche demonstra nada ter com-
somente conseguiu enganar a si mesmo. Olhando para os ou- preendido dos profundos equilíbrios que aquele discurso ex-
tros somente por fora, ele acredita não haver justiça no mundo, pressa. O erro está em acreditar que tudo isto seja verdadeiro
por ver os maus triunfarem e os justos serem esmagados. Mas só porque assim falou o Cristo e assim o repete uma religião, e
ignora que a vida continua e que não se pode julgar somente crer, por conseguinte, que, lutando contra esta mesma religião,
pelo breve espaço de uma vida terrena. ela e o Cristo possam ser destruídos. Ao contrário, tudo isto es-
Então, depois, nós vemos nascer tantos desventurados e tá escrito na lei da vida e faz parte de uma ordem universal in-
não sabemos porque! Assim, aquele que acreditou vencer, pe- violável, que nós podemos compreender e devemos admitir
lo contrário, perdeu e, acreditando enganar o próximo, não não somente pelos caminhos da fé, mas também pelos rumos
enganou senão a si mesmo. Podemos falar assim, não porque positivos da razão e da ciência.
nos baseamos sobre a doutrina desta ou daquela escola, mas Os materialistas deveriam compreender, com os meios da
porque estas conclusões foram obtidas através da observação sua própria psicologia positiva, esta moral biológica, que faz
dos fatos e conduzidas na forma científica positiva, como te- parte de leis universais de compensação e de equilíbrio. O futu-
mos alhures demonstrado. ro da evolução biológica, conforme já comentamos alhures, não
Assim o homem em sua loucura vai criando para si um des- se pode verificar senão através da espiritualização. Por que,
tino de dor. Ele é o arquiteto do seu próprio futuro. Com a sua apesar de sua desenvolvida inteligência, eles não compreendem
Pietro Ubaldi PROFECIAS 35
esta moral biológica positiva? É porque o materialismo ateu re- destes termos sucessivos! Dada a natureza do homem atual e o
presenta, perante o futuro, que pertence ao espírito, o passado poder sem precedentes de suas forças, que neste momento his-
involuído, que resiste ao progresso e no qual sobrevive a ani- tórico estão nas mãos desse tipo biológico, não podem ser atin-
malidade, com os seus instintos, que ensinam a vencer com a gidos outros resultados. Não se pode alterar o desenvolvimento
força e com a astúcia. Mas quem vive assim vive nas trevas, de um encadeamento lógico, do mesmo modo que não se pode
pois a verdade lhe escapa. Dessa forma, recusando-se a com- torcer o desenvolvimento de um processo matemático.
preender, ele, para não ver, arranca de si mesmo os olhos e tor- ◘ ◘ ◘
na-se escravo da ignorância, expondo-se, pois, a duras lições. O momento histórico atual é muito grave. Ele está tornando-
Deste modo, a humanidade quis fazer para si mesma um desti- se cada dia mais grave. Somos chegados à plenitude dos tem-
no de punição, que representa a reação reconstrutiva dos equilí- pos. Pregações foram feitas muitas, avisos foram dados, mas o
brios da Lei, para corrigir os erros do passado. É por isso que as mundo continuou pelo seu caminho sem prestar ouvidos. Nesta
forças do mal agora estão livres e ativas, porque ele vem a fun- hora, não é mais tempo de palavras e avisos, mas de ação. É
cionar quando tem que cumprir uma destruição para expurgar. preciso enfrentar os acontecimentos.
Neste ponto, não é mais possível que o conselho e a palavra Os homens continuam a fazer seus negócios e, embora nas
possam ajudar, porque o homem caiu sob o poder de forças in- palavras digam o contrário, na prática eles dão provas de serem
feriores, que devem cumprir sua tarefa de eliminação, para que ateus, não importa a qual religião ou fé eles pertençam. Em to-
depois sejam finalmente afastadas. dos os grupos, a maioria acredita só na força material, nas ar-
Na atual equação das forças do mundo, a resultante é so- mas, no poder do dinheiro. E logo chegará o tempo em que as
mente uma: destruição. Será possível introduzir nesta equação armas servirão apenas para exterminar uns aos outros, ricos e
novos valores, quantidades, ou forças que modifiquem os re- pobres, patrões e empregados, vencedores e vencidos. Tempo
sultados? Esta nova força poderia ser a inteligência diretriz chegará em que ter dinheiro de nada adiantará, porque, no des-
duma grande nação, que tivesse a capacidade de compreender fazimento do conjunto social, acabará toda confiança em qual-
e o poder para atuar. quer pessoa e não será possível ficar forte como poder político,
porque ninguém obedecerá mais a ninguém.
Poderia este novo fato eliminar, ou pelo menos retardar a
É justo que um mundo bem polido nas ideias, mas, em subs-
destruição? Mas, para que a avalanche que está desmoronando
tância, feito de um egoísmo sem limites e de um ateísmo desor-
possa voltar atrás, retomando novamente o caminho da subida,
ganizador, ou seja, de um individualismo separatista contra a
precisaria uma ideia forte e um mundo singelo, que soubesse
ordem da lei de Deus, acabe por cair no abismo do caos.
acreditar nisso. Ao contrário, a este mundo falta confiança, e
Neste ponto, isto é fatal. Isto é o efeito de causas que a hu-
todos, mais ou menos, percebem a aproximação do perigo, co-
manidade livremente estabeleceu nos séculos passados. A liber-
mo um destino fatal. Vive-se como aventureiros, pressentindo-
dade humana não chega ao ponto de modificar a Lei e evadir-se
se um desastre inevitável. O mundo se agarra desesperadamente do princípio de causa e efeito, que nos liga às consequências das
aos meios materiais e ao poder das armas. Mas será verdadei- nossas ações do passado. Assim o homem quis e assim será.
ramente este que trará a destruição! O mundo acumula armas Assim falou a Mensagem de Natal, em 1931:
para se defender, mas estas servirão para sua própria destruição. “Um grande batismo de dor é necessário, a fim de que a
E nós não temos confiança senão na força, porque todas as humanidade recupere o equilíbrio, livremente violado: grande
crenças enfraqueceram-se. O momento é terrível, pois o homem mal, condição de um bem maior”.
tem nas mãos um poder de destruição imenso, mas sem possuir A Lei deixa ao homem o livre-arbítrio só o quanto necessita
a disciplina moral necessária para fazer disso bom uso. Que po- para estabelecer as causas, mas não para fugir aos efeitos. A Lei
deremos nós esperar do futuro, quando estes poderes são dirigi- somente lhe faculta liberdade dentro de tais limites, e apenas
dos por esta psicologia? para que ele possa experimentar entre a verdade e o erro, a fim
Poderia Deus fazer um milagre? Mas os milagres não po- de aprender e assim realizar por ele mesmo a sua subida. Esta
dem acontecer contra a lógica e a justiça da Lei, que é o próprio oscilação do livre-arbítrio está sempre contida nos limites do
pensamento de Deus. Quando temos culpas para pagar, preci- contingente humano, e ao homem nunca é permitido transpô-
samos pagá-las. É preciso ter merecido esta ajuda particular que los. Isto quer dizer que o homem é livre para semear desordem
se chama milagre. Mas é certo também que esta ajuda não des- e destruição na sua própria vida, mas não tem o poder de fazê-
ce para defender interesses egoísticos. As forças espirituais lo na ordem da Lei, que é inviolável. De outro modo, a igno-
funcionam, mas somente nas mãos dos santos. Elas não descem rância e a prepotência humana teriam trazido, há muito tempo,
para se realizar nos planos mais involuídos, que as afastam e fi- anarquia ao mundo todo.
cam abandonados ao poder das próprias forças involuídas. As Verifica-se, assim, o fato de que, nas grandes linhas da his-
duas maiores potências do planeta procuram eliminar-se uma a tória e da evolução, fatalmente manda a Lei, de modo que o
outra, para atingir o domínio absoluto, porém elas se destruirão homem tem somente poder limitado e relativo, não lhe sendo
reciprocamente, e assim far-se-á o expurgo com um banho de possível parar o progresso. Assim, não é o homem mas sim a
dor, preço da redenção, sem o qual não se pode subir a um pla- Lei quem manda, quer e, por último, acaba por se impor com
no biológico mais alto; será o choque necessário, sem o qual seu impulso íntimo e tenaz, para que a evolução se cumpra. A
também não se pode atingir a renovação integral. Lei não pode ser enganada nem parada. Ela permite desvios
No plano onde reina a lei da seleção do mais forte, é impos- momentâneos, atrasos e adiantamentos, mas seu cumprimento é
sível evitar o choque entre esses dois mais poderosos do mun- fatal. O homem que quiser aproveitar-se da própria liberdade
do, porque este choque é que resolverá quem é o mais forte, is- para se rebelar contra a Lei indefinidamente, será eliminado.
to é, aquele a quem, conforme a lei vigente da animalidade, Os místicos percebem por intuição e aqueles que raciocinam
pertence a vitória. Não se pode escapar a esta lei do tipo bioló- sabem, por intermédio duma lógica fatal, da qual analisam o
gico atual. Mas, se este choque com as armas atômicas moder- desenvolvimento, que agora a humanidade está correndo gran-
nas significa destruição, esta será então inevitável para ambos des perigos, ainda que, no final, a destruição possa ser utilizada
os contendores. Outra razão ainda para que isso tenha que se para depois se reconstruir melhor e mais alto. Ninguém poderá
realizar é porque este é o único meio de cumprir o expurgo ne- impedir que se cumpra a vontade da Lei. Os homens práticos
cessário para que o progresso, que é fatal, possa verificar-se e podem gritar que isto é utopia. Mas aqui operam elementos im-
uma nova civilização possa surgir, agora que os tempos estão ponderáveis, que eles ignoram.
amadurecidos. Não se pode quebrar o encadeamento lógico ◘ ◘ ◘
36 PROFECIAS Pietro Ubaldi
Os homens práticos não compreenderam o que está aconte- tar-se-á contra seu dono, que o criou, mas não soube dominá-lo
cendo agora, no atual momento histórico. Acreditam que, por in- para os fins a que se destinou e que a vida exige. A própria má-
termédio do progresso científico e mecânico, eles possam apo- quina acabará, assim, por escravizar o dono, que abdicou seus
derar-se das forças da natureza para escravizá-las aos seus fins. poderes de direção. E o que acontece numa casa, quando o che-
Mas não compreendem que a natureza é muito mais inteligente fe não a dirige mais e aparece então o criado para substituí-lo
que o homem e que este deve a sua vida a esta sabedoria, que ele nas funções diretivas? Dá-se uma degradação, um retrocesso
não possui. Então acontece que, quando o homem faz mau uso até ao plano evolutivo do criado, que assim nivela tudo na pró-
dos poderes entregues em suas mãos para que, livremente expe- pria inferioridade. Esta é uma lei da vida, e segundo ela, quan-
rimentando, possa evolver e os utiliza para atingir somente o seu do quem está mais no alto se enfraquece, os inferiores surgem
próprio gozo egoístico, aquela inteligência da natureza revolta- para mandar. Então o criado torna-se patrão, e este o criado da-
se, porque a sua sabedoria não quer que a Lei seja violada. quele; o instrumento torna-se diretor, e este o seu instrumento.
E, de fato, é exatamente isso o que está acontecendo, e é Se o homem não souber reagir, dominando espiritualmente os
somente assim que podemos explicá-lo. A ciência acabou, as- seus novos poderes, ele ficará preso às suas novas exigências
sim, por construir, com a bomba atômica, o meio para destruir a mecânicas e, quanto mais ele se deixar prender, tanto menos se-
humanidade. Isto vem nos provar que a orientação materialista rá para ele possível desprender-se e voltar a ser o senhor.
de nosso tempo nos deu uma ciência errada desde o começo e, A máquina, mesmo parecendo viva, é inerte e cega. Ela po-
por conseguinte, não podia chegar a outras conclusões. Aquela de, com a mesma indiferença, tanto nos proteger a vida como
orientação é o micróbio do egoísmo, que é o câncer do destru- nos trazer a morte. Ela repete e multiplica o impulso recebido
cionismo. E a vida, quando vê que está sendo traída em sua fi- pela vontade e inteligência do homem, mas nada inicia por si
nalidade mais importante, que é evolver, revolta-se e destrói tu- própria. Nada possui da consciência espiritual do homem; é
do o que a impede neste caminho. amoral e pode fazer indiferentemente o bem ou o mal, confor-
O homem deve compreender que ele se acha perante uma me o impulso que o homem lhe der. A máquina não sabe man-
inteligência e uma lógica que têm suas leis invioláveis. A na- ter-se viva sozinha, não tem assimilação ou recâmbio, mas so-
tureza não quer o tipo biológico do homem que está engor- mente a autonomia que lhe foi dada pelo impulso recebido, e
dando no bem-estar, servido pela máquina. Logo que atinge para assim que este se esgota. Quando, pelo funcionamento, ela
um bem-estar de sobra, a natureza o utiliza para aumentar a restitui todo o alento animador que recebeu do homem, volta a
população, de modo que ele produza fruto – não como gozo, ser o que ela era antes: matéria morta, inerte. A máquina não
mas para dar vida a um número maior de seres – ou então de- evolui. Se bem dirigida, ela pode representar uma ajuda à evo-
sencadeia guerras e revoluções, para que aquele bem-estar lução humana; se mal dirigida, pode tornar-se um empecilho. A
sirva para destruir o velho e construir o novo, evolvendo. A máquina não é vida e não ascende sozinha. Ela é apenas um es-
natureza quer que o homem cumpra o trabalho do seu próprio pelho da inteligência do homem, que a criou. Ele pode fazê-la
progresso. É por isso que, quando o homem quer fazer uso er- funcionar em harmonia com a ordem universal, então a vida a
rado dos segredos que arrancou à natureza, é possível que es- sustentará. Mas o homem, que é livre, também pode fazê-la
ta, para destruir os frutos de tais descobertas, venha a exter- funcionar contra esta ordem, então a vida destruirá a máquina.
minar a humanidade que as tem feito, infligindo-lhe uma lição No primeiro caso, temos muitos instrumentos úteis: o carro, o
tão poderosa, que esta volte ao caminho certo e não mais de- avião, o radio, etc. No segundo, temos as máquinas de guerra e,
seje iniciar novamente semelhantes aventuras. Explica-se as- em primeiro plano, a bomba de hidrogênio.
sim como a ciência moderna, em razão de se ter colocado a A conclusão destas afirmações é que, pela sua própria natu-
serviço do egoísmo, que tudo quer explorar para seu gozo, reza, a nossa civilização mecânica propende sempre mais para a
sem mais altos fins espirituais e morais, chegou a produzir, supressão dos valores morais – que, ao contrário, deveriam ser
como resultado seu, somente o fruto da destruição. cultivados para nos dirigirem – e tende a regredir, por conse-
Isto nos prova claramente que, para a vida, são da maior guinte, à autodestruição, porque a vida elimina tudo o que ope-
importância os valores morais. Descuidar deles significa errar ra contra ela. Eis como se explica o fato de, numa hora assim
nos seus pontos mais fundamentais e ter de pagar por isso de- apocalíptica, presenciarmos uma fatal derrocada espiritual e
pois, até o último ceitil. Acontece, então, que a vida se revolta e moral neste terreno das funções diretivas. Eis porque, hoje, a
procura, com a sua sabedoria, destruir o que se desenvolve ne- humanidade mostra uma tão grande inconsciência.
gativamente, em sentido contrário aos valores do espírito, como Perante tão terríveis perspectivas, o homem prefere continu-
no caso do estabelecimento de um bem-estar material sem fun- ar com seus ridículos e velhos jogos, aturdindo-se nos gozos
ção de evolução, pois esta deve ser primeiro espiritual em nossa para esquecer, amontoando dinheiro, fabricando armas e bus-
atual fase. Então, a sabedoria da vida, para nosso bem, nos im- cando tornar-se politicamente poderoso,. Velhos expedientes,
pede o passo e nos para no caminho errado. Aqui, a natureza que não salvaram a humanidade nem impediram o desencade-
opera como nas doenças físicas: procura isolar a zona infectada, amento da tempestade nas horas trágicas das grandes voltas da
circunscrevendo-a, e, se não o consegue, destrói o doente, para história. Tudo será inútil. Ficará somente uma defesa: ser con-
que ele recomece a vida num outro organismo. forme a Lei, isto é, ser justo. Isto porque, como fala a citada
Contudo, mesmo antes de chegar a estas últimas conse- mensagem, “não está longe o dia em que somente uma será a
quências, o homem já se arrisca a ser dominado pela máquina. divisão entre os homens: justos e injustos”.
Ele corre o perigo de que este novo ser, criado por suas próprias ◘ ◘ ◘
mãos, tome predomínio sobre ele, não como simples convivên- Deve ser aplicada agora, no plano universal exposto neste
cia em simbiose, mas a máquina como dona e o homem como quadro, a nossa ação positiva neste nosso tempo. Entramos no
seu criado. Isto porque o homem quer fazer dela somente um terreno prático.
meio a serviço da própria preguiça, abdicando ao mando diretor A maioria humana, ateia na substância, está misturada com
do seu “eu” espiritual superior. A diferença parece sutil, mas é uma minoria de crentes. Aparentemente, entretanto, os homens
profunda. O homem quer ser dono da máquina. Mas o dono não estão agrupados de outro modo, isto é, por religiões, seitas,
deve ser o “eu” inferior, material, egoísta e involuído do ho- crenças, fés etc. Em nosso mundo, repara-se muito nestas dis-
mem, mas sim o seu espírito, para atingir fins espirituais supe- tinções exteriores, porque elas encerram interesses humanos, e
riores. Diferença cheia de consequências, porque, se não fizer- pouca atenção se dá àquela já mencionada distinção de subs-
mos assim, o instrumento máquina, em lugar de criado, revol- tância, entre justos e injustos. A muitos interessa declarar-se
Pietro Ubaldi PROFECIAS 37
membros de um determinado grupo, porque aí acham defesa e seu tempo. Nunca se pode esquecer que, na Terra, vivemos
vantagens. A poucos, porém, interessa conhecer a verdade e em um nível biológico perto da animalidade, onde predomina
vivê-la honestamente. a lei da luta pela seleção do mais forte, lei esta que fala pode-
Acontece, entretanto, que cada grupo está ocupado em lutar rosa nos instintos fundamentais da nossa vida e, por conse-
contra o grupo vizinho, sob a bandeira de uma sua verdade guinte, invade tudo, reaparecendo, mais ou menos oculta, não
particular, sem interessar-se por ela em si mesma, mas somen- só no fundo de todas as nossas comuns manifestações huma-
te como meio de luta, para obter vantagem da própria supre- nas, como também nas religiosas e espirituais. Por isso, para
macia terrena. Assim, poucos se preocupam com aquela outra não provocar esta luta de autodefesa, é preciso respeitar todas
distinção, não de forma mas de substância, não de grupo mas as autoridades terrenas e nunca procurar conquistar poder
de justiça e retidão. humano algum, que neste caso não interessa.
O erro está em cuidar do que é menos importante, sem olhar A salvação não se baseia sobre nenhuma força terrena, nem
para o que é o mais urgente e necessário. As leis da vida, que sobre qualquer dos meios de agressão e defesa atualmente usa-
toleram este erro desde séculos, exigem, na atual volta históri- dos, mais compreensíveis pelo homem. As armas devem ser in-
ca, que ele seja corrigido, impondo o triunfo dos valores subs- teriores: a bondade e a justiça. No caminho desta salvação, será
tanciais. Chegou assim a hora histórica, e os tempos estão ama- o primeiro e, neste exército, será o mais bem armado aquele
durecidos, porque o limite suportável, permitido pela elastici- que tiver mais bondade e menos astúcia humana; aquele que for
dade da Lei, foi superado. Eis então que, no momento em que o o mais justo, o menos egoísta; aquele que possuir as bem-
cataclismo apocalíptico está pronto para desencadear-se sobre o aventuranças do Sermão da Montanha, que finalmente deverá
mundo, poucos pensam substancialmente em se defender ou, tornar-se realidade vivida.
pelo menos, fazem isso de uma maneira leviana e em vão. O primeiro trabalho a fazer é ajudarem-se uns aos outros,
Amontoar riquezas, poderes, armas, será inútil; em nada adian- ajudar os justos a reconhecerem-se, encontrarem-se e reunirem-
tará. E poucos, em nosso mundo, que está para ruir, pensam se, sem discriminar raças ou religiões. Isto servirá para consti-
que a única maneira para se salvar é ser honesto. E a punição, tuir um primeiro núcleo de justos, prontos não somente a pre-
que é justiça, pois isto foi merecido, está exatamente na incapa- gar, mas também a praticar o Evangelho; formar um primeiro
cidade de compreender que este é o único caminho para a sal- grupo daqueles que poderão ser salvos por tê-lo merecido com
vação. Esta incapacidade chega justamente porque aqueles que uma vida exemplar; estabelecer um primeiro centro de atração
não o merecem não devem ser salvos. para a constituição da nova civilização do III Milênio. Trata-se,
Que se pode fazer então? Dirigir-se a esta ou aquela religião em outras palavras, de preparar, ante o quadro apocalíptico da
ou grupo é inútil. Aqui não se trata de defender os interesses de iminência de uma destruição mundial, uma arca de salvação pa-
uma particular organização humana, para uma supremacia de ra os tipos biológicos que, pelo grau do índex de inteligência,
grupo, o que não adianta neste grave momento histórico, peran- bondade e retidão, demonstrem ser mais evoluídos e, por isso,
te tão universais ameaças. Juntar-se a este ou àquele grupo sig- mais adaptados para representar a elite de hoje e a semente de
nificaria fechar-se lá, junto com honestos e desonestos, numa um futuro melhor.
verdade particular a ele, esquecendo as universais leis da vida e Eles já existem hoje, mas estão escondidos, porque, geral-
a positiva e férrea realidade biológica. A hora é trágica, e não mente humildes, estão afastados e espalhados, subjugados pe-
há tempo a perder. Aqui urge fazer um trabalho completamente los menos escrupulosos e mais prepotentes. Assim, a parte me-
diferente, mas não um trabalho para atingir supremacias de lhor da sociedade humana fica inutilizada, constituindo aquilo
grupos ou vitória sobre o próximo, e sim de salvação. que está menos valorizado no mundo. Mas, apesar disso, o fu-
É certo que cada um procurará salvar-se como melhor pu- turo deverá ser melhor e, por isso, deverá ser confiado aos me-
der compreender e fazer. Mas somente quem conhece a Lei, a lhores. Os homens práticos sorrirão céticos de tudo isso, que,
hora histórica e os imponderáveis agora em ação poderá sal- para eles, conhecedores do mundo, é absoluta utopia. Mas
var-se, porque só ele saberá como agir inteligentemente e também é verdade que o mundo construído por eles ameaça, a
oportunamente. É justo que, em virtude de sua incapacidade de cada momento, desmoronar sobre eles mesmos. Além disso,
compreender, os rebeldes fiquem sujeitos à ordem divina e, as- ninguém tem o poder de parar o fatal progresso da vida. A his-
sim, não sejam salvos, pois não merecem. Por outro lado, Deus tória dos últimos tempos nos mostra quanto é fraca a sagacida-
iluminará os justos, que lutaram e sofreram por Ele, para que de humana e como forças imponderáveis podem ter um incrí-
eles sejam salvos. vel poder de destruição em todos os planos e aspectos huma-
Prepara-se hoje, destarte, fatalmente a seleção anunciada em nos. Se a cada dia fica mais evidente que esta sagacidade não
1931, na primeira mensagem de Sua Voz. Assim, os justos de resolve, torna-se lógico pensar que a vida, uma vez que não
qualquer religião ou raça estarão de um lado, e os injustos do quer e não pode morrer, procure novos caminhos de salvação
outro. Isto porque chegou a hora em que os involuídos serão onde os velhos métodos fracassaram e faça novas tentativas
expulsos para ambientes extraterrestres, proporcionados e adap- numa direção diferente, usando outros princípios.
tados a eles, onde poderão viver de acordo com seu baixo nível Já tomamos conhecimento da hora histórica atual e do plano
de vida, libertando assim o planeta de sua imunda presença, de Deus a respeito. Investigando por caminhos intuitivos, raci-
porque ele deve progredir de agora em diante, para tornar-se a onalmente controlados, foi mister concluir que deverá aconte-
pátria de uma humanidade mais evoluída. cer o que temos anunciado. Uma apocalíptica destruição está
◘ ◘ ◘ aproximando-se dentro desta segunda metade do nosso século.
Depois de termos esclarecido estes princípios gerais, o Fazer uma tentativa para salvar o que é possível não pode ser
problema agora é a sua atuação prática. Que devemos fazer condenável e representa um dever daqueles que compreende-
então? Constituirmo-nos representantes do Alto significa to- ram o momento histórico. É lógico também uma tentativa com
mar sobre nós mesmos poder e autoridade, o que pode ser en- princípios diferentes daqueles do mundo, que nada até agora
tendido, no regime humano da luta pela vida, como conquista conseguiram resolver. E fazer tudo isso baseando-se em regras
de domínio pessoal e provocar no instinto dos excluídos a re- mais amplas e poderosas, que estão contidas na Lei, que tudo
beldia. Abre-se, então, o caminho das rivalidades e inimiza- regula, oferece maiores probabilidades de sucesso.
des, sobretudo para quem já possui este domínio e não quer Nos conceitos gerais não há dúvida. Mas cada ideia, logo
perdê-lo, pois foi conquistado e mantido através de muitas lu- que chega ao contato com a realidade da vida, isto é, com as
tas. Assim aconteceu quando Cristo afrontou os sacerdotes do forças inferiores, encontra-se com dificuldades. Neste caso, po-
38 PROFECIAS Pietro Ubaldi
dem falir os homens que primeiro lançaram esta ideia. Os cha- se deve selecionar, é o mais justo, o homem da unidade orgâ-
mados podem não compreender ou não responder. Então a ideia nica da humanidade, e não o individualista egoísta, desagrega-
renascerá em outra parte, com outros homens que serão chama- dor de toda a sociedade.
dos, e assim por diante, até que ela se realize. Hoje, esta oferta Estes homens evoluídos, que não brigam para dominar nem
é feita pelo Alto ao Brasil. Se ele compreender, a salvação será condenam em nome de Deus, mas vencem o mal com a não re-
primeiramente sua. Quem deseja ter uma missão deve mostrar- sistência, que é a estratégia do imponderável, proclamada pelo
se digno dela. Nenhuma conquista pode ser atingida senão pelo Evangelho, hoje desconhecida no mundo, surgirão de todas as
nosso esforço. Se ainda não é possível conhecer antecipada- partes e reconhecer-se-ão uns aos outros. Que eles, uns aos ou-
mente o valor exato desta incógnita da equação, é possível, po- tros, abram os braços fraternalmente. O passaporte para entrar
rém, conhecer os outros elementos, isto é, o que nos espera no nesta nova terra do futuro está escrito com singelas palavras de
amanhã, e nos resta o dever de tentar uma salvação, pois a aju- honestidade na alma de cada um, que podem ser lidas na testa e
da de Deus não faltará para aqueles que procurarem realizá-la. nos olhos, que não podem mentir. Quem neste terreno procura
◘ ◘ ◘ enganar, engana-se a si mesmo.
Restrinjamos agora ainda mais nossas vistas, para melhor Este é o plano de trabalho para os homens de boa vontade,
concretizar as ideias no terreno prático. quaisquer que eles sejam.
O estandarte é Cristo. O programa é o Evangelho. Os prin- Repetimos que este plano é demasiado grande para ser con-
cípios são: imparcialidade e universalidade. Por isso, procurar a fiado às forças humanas. E de fato é assim. Mas isto não nos
verdade feita antes de tudo de honestidade e bondade, reconhe- autoriza a ficar preguiçosos. Aqui, a direção será, sobretudo,
cendo-a onde quer que ela esteja e nunca condenando-a “a prio- das leis da vida, às quais estarão subordinados aqueles homens,
ri”, só porque ela pertence a outros grupos. O fim é a unifica- que saberão interpretá-las, não pretendendo eles dirigir e man-
ção, não para constituir um poder central que se imponha, mas dar, mas sim tornar-se humildes e obedientes instrumentos da
para formar um acordo entre pessoas diferentes também na fé e vontade de Deus. Por isso eles não dirigem ou mandam, mas
religião, mas que ficam unidas na simples filosofia da retidão, obedecem; não planejam, mas fazem parte dum plano. É lógico
pelo liame que une todos os sinceros e honestos. Num mundo que um trabalho desta magnitude não possa ser dirigido e sus-
de guerras de todos os gêneros, de todos contra todos, a quali- tentado senão pelo pensamento e vontade de Deus.
dade mais urgente a aprender é a aceitação de todos os pontos Concluímos com as palavras da já referida Mensagem do
de vista, inclusive daqueles contrários, num absoluto respeito Natal, de 1931, de “Sua Voz”:
por toda ideia não prejudicial, porque esta é sempre sustentada “Depois disso, a humanidade, purificada, mais leve, mais se-
por um nosso semelhante, aprendendo assim a arte da convi- lecionada por haver perdido seus piores elementos, reunir-se-á
vência, que constitui o alicerce da paz e da vida civilizada. em torno dos desconhecidos que hoje sofrem e semeiam em si-
A consequência positiva está em ajudar-se um ao outro fra- lêncio, e retomará, renovada, o caminho da ascensão. Uma nova
ternalmente, sobretudo na hora do perigo. Ao mesmo tempo, era começará: o espírito terá o domínio, e não mais a matéria,
são afastados os agressivos, intolerantes, polemistas, que pos- que será reduzida ao cativeiro. Então, aprendereis a ver-nos e
suem o instinto da luta pelo próprio domínio. Estes representam escutar-nos; desceremos em multidão e conhecereis a Verdade”.
o velho tipo biológico, que no novo milênio será eliminado.
Deve-se, portanto, ajudar a nascer e, quando já existam, reunir V. A FUNÇÃO HISTÓRICA DO BRASIL NO MUNDO
e proteger os exemplares evoluídos, que serão os cidadãos do
novo mundo. Estes, congregando-se e defendendo-se recipro- “As grandes ideias formam os grandes povos. Um povo só é
camente, poderão melhor atravessar o cataclismo e sobreviver. grande quando chega a realizar uma grande e santa missão no
Assim, o mundo de amanhã, depois da destruição, achará não mundo”.
somente uma doutrina teórica nos livros, mas também um mo- Giuseppe Mazzini
delo de vida já vivido por alguns, uma semente para o desen-
volvimento de um novo tipo de civilização. “Este Brasil está destinado a ser, industrialmente, um dos mais
Hoje, em nosso mundo social, este tipo biológico parece es- importantes fatores do desenvolvimento futuro do mundo”.
tar condenado a ser eliminado. Talvez as novas gerações olhem Zweig
com vergonha o homem atual, este antepassado deles que sub-
jugava os bons, julgando-os fracos, e somente respeitava a for- É natural que, neste volume, escrito no Brasil, devamos ocu-
ça, desprezando o homem de bem e justo. A vida quer subir a par-nos de modo especial também deste grande país e dos pro-
formas mais civilizadas e, para progredir, favorece quem luta blemas mundiais vistos em função dele. É natural que, quem es-
para subir, contra os obstáculos oferecidos pelos involuídos, creve, assuma a psicologia do país em que se acha e olhe os
que querem permanecer atrasados. E, na vida, está escrita a lei problemas também desse ponto de vista. O ponto de vista em re-
da evolução, que está na vontade e no pensamento de Deus. É lação a um país em particular não é uma preconcebida determi-
preciso superar a atual fase de tolice, em que os povos racioci- nação de chegar a certas conclusões, em função de interesses
nam matando-se entre si e o homem quer fazer do seu planeta particulares ou em defesa de orientações particulares, mas é
um inferno. Ao velho mundo da animalidade deve-se contrapor sempre uma visão objetiva de realidades que pertencem a todos.
um mundo mais refinado de espiritualidade; à força bruta deve- Qual é a função histórica do Brasil no mundo, especialmen-
se contrapor a mais poderosa força da inteligência e da bonda- te em relação à esperada nova civilização do III Milênio? Obvi-
de, sustentada pelos recursos do mundo espiritual, que, para amente, não é uma hipótese, mas um fato positivo que o Hemis-
quem os conhece e sabe aplicá-los, não são utopia. fério Norte é um armazém de bombas atômicas, e é evidente
Chegou a hora de cumprir esta grande obra. Ela é demasia- que elas não são construídas por pura curiosidade científica. Os
do gigantesca para que um homem sozinho possa cumpri-la. Estados Unidos e a Rússia estão armando-se cada vez mais e,
Mas poderão realizá-la, unidos, os bons, com a ajuda de Deus. naturalmente, não é para se abraçarem. O medo de uma luta pe-
Terá direito a salvação quem quiser trabalhar neste sentido, co- rigosa e tremendamente destrutiva para todos os retém. Mas
laborando com a vida, no seu esforço para construir um ho- também os atrai a miragem do domínio do mundo, prêmio de
mem mais evoluído, ajudando-o a superar a sua atávica feroci- sua vitória. A guerra fria já está em ação. Sem dúvida, os mean-
dade e a estupidez da lei animal da luta e seleção do mais pre- dros da política são tão tenebrosos, a imprensa é tão obediente a
potente, para chegar a uma lei mais alta, na qual o melhor, que quem manda e a quem paga, e costuma-se, no círculo vicioso
Pietro Ubaldi PROFECIAS 39
dos interesses, dar ao público tanta propaganda e tão pouca ver- oficial de pacifismo, é o que faz menos campanhas publicitárias
dade, que é possível que haja talvez outra realidade sob estas com esse escopo. O Brasil é assim, pacifista até o âmago, e o é
aparências geralmente aceitas. No entanto estes são os fatos. naturalmente, sem precisar parecê-lo muito, porque o é. Ora, se
Mesmo se a Rússia, com seu sistema de expansão de ideologias, aplicarmos a esta nação os conceitos acima expostos, podere-
chegasse a realizar seu objetivo de submeter outros países, ao mos dizer que, nesta direção do pacifismo, o Brasil personifica
entrar nestes pela porta da representação parlamentar de partido, uma força em ação, segundo a vontade de Deus e da história. A
jamais seriam conseguidas por este meio a paz e a ordem. consequência disto é que ele é protegido pela vida, que lhe ofe-
Entretanto parece que há um fato certo: a hora é apocalípti- recerá os meios para que a realização desta função ou missão de
ca e o terreno norte está minado. Ora, a primeira grande riqueza pacifismo realmente se complete. E dissemos acima sobre o
e potência do Brasil é estar em outro hemisfério, longe de tudo poder que dispõe quem tenha uma função biológica, porque é a
isso. Este fato lhe garante, ao menos, não ser objeto de ataques própria vida que dele faz o instrumento das próprias realiza-
e teatro de guerras, sorte que a Europa, os Estados Unidos e a ções. É ela própria que age nele, naquele sentido e momento
Rússia estão bem longe de ter. Além disso, o Brasil não precisa determinado, cedendo-lhe seus poderes dentro desses limites. O
de expansões nem imperialismo, porque seu território já é vasto fato é que, se a vida oferece uma função biológica, então depois
como um império e só espera ser povoado. Não tem, pois, ra- dá os meios e prepara os acontecimentos para que ela seja exe-
zões de rivalidade com nenhum país. É, finalmente, um lugar cutada, dado que as palavras da linguagem da vida são os fatos.
em que há espaço para todos, onde não há necessidade de guer- É fácil deduzir as consequências de tudo isso. As previsões dos
ras para conquistar um lugar ao sol e não é necessário garantir- cálculos e astúcias políticas não trabalham neste terreno, igno-
se contra vizinhos perigosos que andem atrás de espaço, dado ram essas forças, que elas consideram estar contidas no desco-
que para todos há lugar de sobra. Acha-se, pois, o Brasil em nhecido imponderável. Mas nós falamos aqui em termos de ra-
condições pacificas naturais, e é esta a sua posição natural no ciocínio, fazendo apelo à lógica das coisas, para que ficasse
mundo. Que os Estados Unidos e a Rússia preguem a paz, eles compreensível e manifestasse suas notas características a pre-
que se estão armando cada vez mais, é coisa que não tem senti- sença desse imponderável que aqui aparece.
do, senão o de querer desarmar o próprio antagonista e captar o O Brasil acha-se, portanto, numa posição particular de privi-
favor das massas, esfaimadas de tranquilidade. Um verdadeiro légio, embora ainda em forma não manifesta, porque é uma rea-
sentido de pacifismo não pode vir do Hemisfério Norte, mas lização de amanhã, ou seja, acha-se com uma grande riqueza
apenas desta grande terra da América do Sul. A função históri- em estado latente, à espera de ser explorada e utilizada em be-
ca do Brasil no mundo só pode ser, portanto, neste nosso tem- nefício de todos. Uma mina de caráter espiritual, que aguarda o
po, uma função de paz. Esta é a sua posição atual no pensamen- trabalho dos homens que, com sua boa vontade, poderão dela
to da história, esta é a missão que lhe foi por ela confiada. As tirar proveito para a expansão da vida, da mesma forma que fa-
circunstancias, com efeito, enquadram hoje o Brasil nesta posi- rão com tantas outras riquezas ainda inexploradas no Brasil. Es-
ção, como num destino, expresso pelas condições de fato. ta é a Lei. A vida quer expandir-se. Esta é sua vontade irrefreá-
Compreendamos bem este conceito. De acordo com o que vel. Por isso concede missões, funções, meios e circunstâncias
dissemos antes, no capítulo “O Pensamento e a Vontade da adequadas, para que se realize esta sua vontade.
história”, é esta que, com uma inteligência e sabedoria que o Eis a atual posição do Brasil na história. A vida lhe oferece
homem não tem, confia determinadas funções históricas a ho- uma função a executar, que faz parte de seu plano de expansão
mens e povos por ela escolhidos, utilizando-se deles segundo e de evolução do planeta. É um oferecimento para a investidura
sua natureza e capacidade. Num sentido mais vasto, é a vida de uma grande missão. Cabe agora ao povo brasileiro corres-
que atribui aos indivíduos e povos mais aptos determinada ponder ao oferecimento, compreendendo-o e aceitando-o. Os
função biológica. Se o fenômeno pode ser expresso assim em momentos históricos jamais se repetem idênticos, e esses ofere-
termos científicos, também o pode em termos religiosos, di- cimentos não são feitos duas vezes. Perdida uma oportunidade,
zendo que Deus confia uma missão. Dizer que se executa uma ela não volta mais. Cabe, além disso, ao povo brasileiro com-
função biológica, ou que se tem uma missão confiada por preender que a natureza desta missão é manter-se na linha do
Deus, ou que se faz a Sua vontade, é tudo a mesma coisa. Ora, pacifismo, isto é, que a função biológica que a vida confia ao
de tudo o que foi dito em nossos volumes precedentes, resulta Brasil é função de paz e amor. Segue-se daí que, se esta é a
que aquele que se acha nessas condições, virá a personificar vontade da história e se o Brasil quiser caminhar nessa direção,
uma força em ação no funcionamento orgânico do universo, aceitando a missão, ser-lhe-ão concedidos todos os auxílios;
tornando-se assim um operário executor do plano divino, que mas, se ao contrário, o Brasil colocar-se, como primordial posi-
dirige o evolver das coisas. Ele se acha, então, protegido pela ção, no terreno da força bélica ou como potência ávida de su-
vida, que lhe oferece os meios para completar de fato a reali- premacia, então a vida lhe retirará todos os auxílios, e assim tu-
zação da sua função ou missão. Por isso, num dos capítulos do será perdido, no sentido de que a função e a missão lhe serão
precedentes, pudemos dizer que a vida ajuda os homens e mo- tiradas, e a oportunidade de exercer um papel mundial se esfu-
vimentos que têm uma função biológica, mas deixa indefesos mará. Quem vai de encontro à vontade da história é cortado de
os que não a têm. Disto pode-se compreender quanto poder suas fontes vitais e não recebe mais ajuda.
dispõem o homem ou o povo que tenha uma função biológica Ora, tudo isso corresponde perfeitamente às condições atu-
ou uma missão. É a própria vida que o investe de seus poderes, ais do Brasil, constituindo um estado de fato já existente, em
que, embora concedidos apenas onde e na medida em que que nada é preciso se fazer para prepará-lo. Esta concordância
Deus o queira, são meios ilimitados por sua própria natureza. E automática entre o que é a realidade atual e a natureza da mis-
isto, na prática, chama-se sorte ou destino, pelo que se vê ho- são oferecida, confirma a verdade de nosso raciocínio. Assumir
mens comuns lançados subitamente aos primeiros planos da hoje o Brasil, no mundo, uma função diferente, seria coisa de
história. Diga-se o mesmo para os povos. difícil realização. Seria bem estranho um Brasil imperialista e
Ora, o Brasil, como no-lo indicam as condições de fato, per- expansionista, se já de per si é maior que um império e não
sonifica essa função biológica ou missão de pacifismo no mun- chega a povoar sua própria terra ilimitada. Seria bem estranho
do. Quem é verdadeiramente honesto não vai a cada passo um Brasil que quisesse levantar-se como grande potência mili-
apregoando que é honesto. Os não-honestos é que procuram es- tar, quando não tem inimigos próximos para combater. Seria
conder seu rosto verdadeiro e defender-se. Assim, o povo ver- bem estranho que um país, definido como coração do mundo e
dadeiramente pacífico e pacifista é o que menos se faz paladino pátria do Evangelho, assumisse a posição de fazer guerras de
40 PROFECIAS Pietro Ubaldi
conquista ou de defesa, sem absolutamente necessitar delas. É tenha inadiável necessidade de um refúgio, em que possa achar
claro, pois, que a função histórica do Brasil no mundo só pode paz, de uma terra em que não viva o ódio ou o interesse, mas o
ser abraçar a humanidade com o seu amor, em seu imenso terri- amor. Quem sabe se a luta entre as ideologias armadas de
tório, à espera de ser povoado. Deixemos aos povos do Hemis- bombas atômicas não se resolverá num desastre tão grande no
fério Norte outras funções a executar no organismo social do Hemisfério Norte, que os povos devam fugir de lá em massa,
mundo. Deixemos à Ásia a função metafísica, à Europa as fun- especialmente da Europa, que está mais ameaçada? E quem
ções cerebrais do mundo, à Rússia a função revolucionária e sabe se esse impulso não exercitará uma pressão desesperada
destrutiva, à América do Norte a função econômica da riqueza, sobre as portas do Brasil, tão forte que as faça ceder e opere
e assim por diante, e reconheçamos que a função histórica do uma imigração em massa de milhões de europeus? Assim o
Brasil é bondade, tolerância, amor. Brasil se preencheria rapidamente de frutos mais carregados de
Se olharmos o mapa do mundo, acharemos uma distribui- dinamismo e de inteligência, produto da milenária elaboração
ção de qualidades e funções correspondentes, diversas e com- da velha civilização europeia, que, já tendo vivido tantas expe-
plementares, como num organismo único. Este, na Terra, está riências, funcionária como semente selecionada que se trans-
em formação e se chama humanidade. O Brasil acha-se na po- planta para um terreno virgem, a fim de fecundá-lo. Tudo isto
sição oposta à Rússia, e é estranho que a essa oposição geográ- na linha das maiores probabilidades. Então, a função do Brasil
fica, quase nos antípodas, corresponda também uma oposição seria não só receber e abraçar, mas também, com seus princí-
de muitas outras qualidades fundamentais. E pode ser instruti- pios de liberdade, hospitalidade e bondade, amalgamar todas
vo observar-se isto. Não se trata somente de oposição geográ- as raças, como já está fazendo, assimilando-as em sua nova
fica, mas também climática, ideológica, política, moral etc. terra. Os povos novos se fazem com a fusão, não com o racis-
Ambas as terras imensas, o Brasil irrompe quase ilimitado in- mo, e a fusão se faz com o amor.
teriormente, tal como a Rússia na Sibéria, mas em posições Tudo parece pronto para estas novas realizações. O Brasil
emborcadas, aquele em direção ao calor do Equador, esta em possui território imenso, cheio de riquezas incalculáveis, que só
direção aos gelos dos polos. A Rússia é país de regime policial esperam a mão do homem para ser valorizadas. Maior muitas
de coação, de menor liberdade do mundo, com ideologia única vezes que cada país da Europa, fértil e com um clima que torna
obrigatória. O Brasil é o país da máxima liberdade, em que to- fácil a vida, pode conter mais de 500 milhões de habitantes, e
das as ideologias, suportáveis com o mínimo de ética e de or- tem hoje apenas a décima parte. E o mundo da velha civilização
dem indispensáveis, são toleradas. A Rússia é abertamente europeia se acha justamente em condições opostas, de superpo-
ateia e materialista. O Brasil é crente e espiritualista, qualquer pulação e de pressão demográfica, à procura de um espaço vi-
que seja a religião que se professe. A Rússia é país bélico por tal. Dois impulsos opostos, que convergem para a mesma solu-
excelência, formado na revolução violenta; só sabe fazer guer- ção. A civilização emigrou do Egito para a Grécia, da Grécia
ra e preparar-se para a guerra, para conquistar tudo. O Brasil é para Roma, de Roma para a Europa e da Europa para as Améri-
país pacífico por excelência, que não pensa absolutamente em cas. A raça anglo-saxônica criou a civilização do dólar nos Es-
fazer guerra a ninguém. A Rússia é imperialista e expansionis- tados Unidos. Por que a raça latina, herdeira de Roma, não po-
ta. O Brasil tem tanto para expandir-se internamente, que não deria criar a civilização do Evangelho no Brasil?
precisa transpor seus limites à busca de impérios. A Rússia é o Existe ainda uma razão de caráter moral, que também é para
centro maior do comunismo. O Brasil é o ponto de maior rare- a história uma força poderosa, mesmo que a política não as leve
fação dele, pois é um dos poucos países em que, ao menos ofi- em conta. E esta razão pode ter maior valor hoje, porque esta é
cialmente, não há representantes do partido comunista. Poderá a hora do juízo, a hora apocalíptica, em que será liquidado um
ser apenas casual uma tão perfeita coincidência de opostos? velho mundo indigno, para que nasça outro melhor. Ora, a
Então poderemos concluir também que, se a função da Rússia América do Sul é inocente de vítimas de guerra, e a raça latina
é destruir com a religião do ódio, a função do Brasil poderá ser é inocente da criação e do uso da bomba atômica. Esta inocên-
a de criar com a religião do amor. cia, diante da justiça de Deus, imanente nas leis da vida, forma
Não é esse, com efeito, o temperamento deste país, em que uma base e um direito de ser salvo. Tudo, pois, parece concor-
pacificamente se misturam todas as raças, com seu sentimenta- dar para uma missão do Brasil no mundo, que o faça, em gran-
lismo tolerante, com seu espírito antiexclusivista e antirracis- de parte, herdeiro especialmente da civilização latina.
ta? Estas qualidades espontâneas, que já achamos existindo de O Brasil é a terra clássica das fusões de raças, é o “melting-
fato, correspondem perfeitamente à missão que deve ter o Bra- pot” em que tudo se mistura. E sabemos que a natureza se rege-
sil e a provam. Tudo concorda em cheio. É natural que a histó- nera na fusão de tipos diversos, ao passo que o princípio racista
ria escolha, para cada determinada tarefa, os indivíduos dota- isolacionista é antivital. Isto é provado pelo esgotamento das
dos das qualidades mais adequadas para executá-las, justamen- aristocracias muito puras e selecionadas. E já se pode dizer que
te porque a vida quer realizar, alcançando o terreno prático, to- todas as nações do mundo tenham, hoje, seus representantes no
dos os seus objetivos. E o Brasil pode fazer-se representante da Brasil. Este, dessa forma, já as concentra todas em síntese, co-
vontade da vida no terreno da bondade e do amor. Este é um mo modelos, num todo que as funde juntamente numa raça no-
setor vazio no equilíbrio de todas as funções do organismo so- va, que pode ser chamada a síntese de todas as outras. Por isso,
cial da humanidade, e que outro povo poderia preenchê-lo? o Brasil, com este seu universalismo, que o coloca nos antípo-
Não digo que não haja outros povos bons no mundo. Mas estão das das cisões nacionalistas europeias, está apto a ser o berço
empenhados em outros trabalhos. Muitas vezes é exatamente de uma nova civilização, cujo primordial caráter será a univer-
pelo fato de serem melhores que estão mais sujeitos às opres- salidade. O mundo caminha hoje para as grandes unidades, e os
sões e às dores, porque na humanidade há também os encarre- patriotismos, em sentido exclusivista e agressivo, da velha Eu-
gados da expiação e da prova do sofrimento. ropa, tendem hoje a ser rapidamente liquidados pelas leis da vi-
Tudo o que diz respeito ao Brasil parece feito sob medida, da, porque são contraproducentes para seus objetivos evoluti-
com o propósito de torná-lo apto para essa função. Trata-se, so- vos. Nisto o Brasil, ainda tão jovem, encontra-se mais adianta-
bretudo, de amar, de abrir os braços evangelicamente. São tan- do do que a Europa dividida e belicosa, adiantado numa ideia
tas as ideologias propagadas no mundo... Por que deve parecer mais vasta, de nacionalidade cosmopolita, em que todas as na-
tão absurda esta de um Evangelho verdadeiramente vivido? cionalidades se fundem sob o mesmo céu. Por este motivo, o
Abrir os braços ao mundo. E pode acontecer que o mundo Brasil é mais apto do que a velha Europa a realizar uma ideia,
amanhã, com a infernal destruição que hoje se está preparando, que é a ideia do futuro, uma unidade livre, constituída não de
Pietro Ubaldi PROFECIAS 41
satélites submetidos à força, mas de fusão demográfica, a única necessários os povos como o Brasil, encarregados da função da
que resiste no tempo e forma os povos novos. coesão e unificação. A vida, que tem de ser completa, precisa
Mas outras qualidades ainda possui o Brasil, para desempe- de tudo isso. Portanto ela confia às nações o desempenho de
nhar a função histórica que a vida lhe oferece. É ele um país jo- funções biológicas, que são verdadeiras missões históricas. Es-
vem. O fato de não estar carregado de milênios de história, isto tas adquirem hoje uma importância muito maior, porque a sele-
é, de lutas e de dores, de fadigas pelas conquistas de tantos va- ção biológica se apresta a tomar formas mais evoluídas, que,
lores de todo o gênero, o torna mais ágil. E a história do Brasil, em vez de levar à vitória do mais forte no plano material, como
assim como ocorre para os jovens, está mais no futuro que no aquelas tradicionais do mundo animal, tendem, ao contrário, a
passado. Este povo tem a vantagem de poder colher, ainda em produzir o biótipo mais inteligente e, por suas qualidades de
idade juvenil, os produtos de uma longa civilização, prontos pa- sentimento, mais adequado a confraternizar, ou seja, aquele que
ra o uso, já confeccionados pela Europa, que, tendo de criá-los sabe viver socialmente. A inteligência é o caminho para chegar
por si mesma, suportou e sente, já velha, o cansaço produzido a compreender a utilidade individual e coletiva de ser bom e
por tal esforço. É uma vantagem poder dispor de tais meios, honesto, e o sentimento é a estrada mestra para alcançar essa
porque isso lhe permite enfrentar a vida provido com maior ri- fusão de almas, sem o que não poderão surgir os futuros orga-
queza de recursos. Com a técnica moderna, derruba-se a flores- nismos das grandes coletividades sociais.
ta virgem, transformando-a em cidades habitadas e civilizadas, O europeu que chega ao Brasil pela primeira vez, trazendo
muito mais facilmente do que com os meios primitivos de nos- consigo sua mentalidade europeia, não pode compreender mui-
sos avós. E tudo isso é mais fácil quando esses meios são utili- tas coisas, porque seus pontos de referência são diferentes. Ele,
zados pela força dos jovens. O Brasil é jovem. O ponto de che- que provém de uma terra em que tudo tem uma longa história,
gada da civilização europeia é, para ele, um ponto de partida. por ter vivido muito e estar maduro e adulto há muito tempo,
Ele começa sua vida com os recursos mais adiantados da civili- não pode compreender de imediato um país jovem, que lhe pa-
zação: o arranha-céu, o automóvel, o avião, o rádio, a televisão; rece terreno inculto e deserto porque, estando tudo aí no estado
novos meios que, acham nesta terra o espaço livre, ao passo de gérmen, nada nasceu nem cresceu ainda. No entanto à planta
que, na Europa, devem ser sobrepostos aos meios mais velhos, madura resta apenas envelhecer e morrer, e às sementes só falta
que estavam em plena eficiência dantes e que, em determinada desenvolver-se. Aos jovens pertencem a vida e o futuro. O que
época, constituíram a base da civilização. mais importa é o amanhã. É neste amanhã que deve ser olhada
Diga-se o mesmo para as ideias. O Brasil é terreno desim- e compreendida a grandeza do Brasil, um amanhã que para a
pedido e pronto para assimilar o que é novo. Na Europa, tudo Europa só pode ser, ao contrário, velhice e decadência.
está cristalizado, cada ideia já foi fixada na vida em formas Sem dúvida, o europeu traz em si um requinte que o leva a
concretas, que constituem hoje uma barreira ao que é novo e olhar do alto uma terra que, na Europa, é muito pouco conheci-
criam um obstáculo a cada passo. Sua filosofia tem todo o re- da, tanto que é considerada de tipo colonial. Apenas aqueles
quinte do sofisma e do bizantinismo, enquanto que a vida nova que se fixam um pouco e procurem olhar menos superficial-
pulsa com ideias simples, fortes e grandes. Quem tem este gê- mente as coisas, podem ver o que há sob essas aparências; po-
nero de ideias não pode encontrar terreno propício numa Euro- dem então observar como, no requinte da civilização europeia,
pa que está entregue a todos os requintes da decadência. Isto nem tudo seja ouro que reluz e haja também um reverso da me-
somente é possível em países novos, que, ao contrário, estão dalha. A madureza europeia pode significar também cristaliza-
esfaimados dessas ideias, porque sentem que elas são vitais. A ção senil, uma carga de superestruturas que bloqueiam a evolu-
Europa é a arvore carregada de frutos e sementes, à espera que ção, o esgotamento de forças vitais. Estas refervem, emergindo
o vento os carregue para longe, para frutificar em terras vir- sempre do mais elementar, que está ávido de subir, enquanto
gens. Eles penetrarão nos povos novos, que os olham com ad- quem já chegou gosta de repousar sobre o esforço realizado e,
miração e anseiam beber-lhes o pensamento, a civilização, a como os velhos, dormir sobre as próprias conquistas. De fato, é
vida madura, que fecunde sua vida nova. Talvez venha a ser a provável que a grande Europa, mãe e mestra do mundo moder-
Europa, bem cedo, o que foi a Grécia derrotada diante de Ro- no, já tenha esgotado sua tarefa e suas forças. O requinte pode
ma: vencida e mestra. E a nova luz virá ainda de Roma, sem- então exprimir velhice, e o estado primitivo pode significar vi-
pre viva no pensamento do mundo. da, não no passado, mas sim no futuro.
Mas a grande qualidade do Brasil, aquela que estabelece sua Há, todavia, mais coisas no reverso da medalha. Requinte e
função vital, é o sentimento, o coração. Nesta terra estão as raí- madureza de pensamento são, muitas vezes, ausência de virgin-
zes daquela expansividade de afetos, a qualidade humana mais dade de espírito, isto é, qualidades contraproducentes para o de-
apta a sublimar-se mais tarde, através da evolução, no amor senvolvimento diante do futuro. A mentalidade europeia, com o
evangélico. Aqui, até o feroz comunismo russo é idealizado e passar e repassar em revista todos os seus valores, destruindo-
concebido como programa de justiça social, tornando-se até os e reconstruindo-os para ascender, de controle em controle,
cristão, formas inconcebíveis na sua realidade russa. Tudo aqui, em busca de verdades cada vez mais exatas, tornou-se hipercrí-
até mesmo as piores coisas, procura tornar-se bom, porque cada tica, tanto que assumiu difusamente a psicologia do filósofo
biótipo transforma e adapta tudo ao próprio temperamento. que, após haver tudo examinado e discutido, só sabe ser cético
O poderio bélico e o econômico, por mais que evoluam, de tudo. O próprio catolicismo não pode deixar de ficar preso
partem de uma semente de natureza muito diversa e jamais po- na vastidão e no poderio deste ciclo histórico e, embora formal
derão transformar-se em amor evangélico. Os senhores do ouro e teoricamente intacto, está de fato naufragando na realidade
e do poder bélico poderão sorrir de tudo isto. Mas a vida é feita das almas. Chegou-se assim, na prática, a um estado difuso de
de tal forma, que não pode ser construída apenas com estes dois ateísmo, que assume, nos que se dizem crentes, uma forma de
meios. Assim como cada corpo humano precisa não apenas do materialismo religioso, ou seja, de religião materialista, em que,
ventre para digerir, da inteligência para dirigir-se e dos braços na forma ortodoxa intacta, a chama da espiritualidade está apa-
para trabalhar e defender-se, mas também do coração para amar gada. Por muitas razões, assim, entre as quais as duas últimas
e proteger, cada família, além do pai, que luta, ganha e coman- guerras, pelo exemplo da ferocidade e pelo estado de necessi-
da, também necessita da mãe, que gera e cria no amor, da mes- dade que se lhe seguiu, está ainda vigorando nas almas, sob a
ma forma que a humanidade necessita de povos que represen- formalidade do cristianismo, uma religião de egoísmo e de cál-
tem, em seu grande organismo, esta nobre função de bondade e culo. Quem está de fora segue, sem ambages, a religião do
de amor, de proteção e de conservação. Na humanidade, são ódio, quando isso é necessário para sobreviver.
42 PROFECIAS Pietro Ubaldi
Sem dúvida a cultura, a crítica de tudo, desenvolveu a inte- tarde, com a evolução, todas as sublimações deste primeiro e
ligência e tornou mais requintados os métodos de luta, fazendo- grosseiro movimento de expansão altruísta, que aos poucos se
os mais sutis e terríveis. Por isso as massas cresceram em des- irá cada vez mais desmaterializando, até ao amor dos pais pe-
confiança e astúcia, e não em bondade. Sua agressividade tor- los filhos, do homem evangélico ao próximo, do filantropo à
nou-se organizada, racionalizada, científica. Sim, a crítica e a humanidade, do místico à Divindade.
cultura destruíram as trevas da ignorância, mas assim ficou Resumamos, neste terreno, a posição do Brasil diante da Eu-
apenas a razão, fria calculadora dos egoísticos interesses mate- ropa, num quadro de conjunto, expondo qualidades e defeitos de
riais. Este é o positivismo do mundo civilizado de hoje. O po- ambos os lados. O Brasil, primitivo, simples, espontâneo, de boa
der criador, representado por um aporte de fé, com esperança fé, tendente à confiança, de alma infantil, acreditando em Deus e
no futuro, parece perdido neste mundo cinzento de ceticismo, no futuro, ainda não experimentado pelos golpes das guerras du-
agarrado, sem esperança, apenas à vantagem que pode oferecer ríssimas e da iminente ameaça de uma terceira, não prostrado
o minuto que foge. Perdeu-se, assim, de fato, todo o sentido por milênios de luta; alma virgem, quente, entusiasta, ávida de
verdadeiro de religiosidade, embora quase todos se declarem assimilar, rica de sentimento, substancialmente religiosa, com
homogeneamente católicos apostólicos romanos, ao menos na disposições e tendências místicas, num ambiente de vida simples
Itália, ou protestantes e católicos alhures, mas todos igualmente que, suavizando a luta, induz à bondade e à tolerância; alma
cristãos. Na prática, as massas adoram o deus dinheiro e só nele exuberante e expansiva, generosa como a dos jovens, tendente,
creem firmemente. Muitas belas práticas formais sobrevivem, pois, a confraternizar e a fundir-se no próximo. Tipo biológico
mas domina na maioria a indiferença, havendo desaparecido capaz de infinitos desenvolvimentos, apto a retomar o caminho
todo o sentido de verdadeira espiritualidade. da fé no estado de êxtase virginal em que se encontravam os
O Brasil acha-se em condições opostas. Antes de tudo, o primeiros cristãos, hoje já no terreno de mais vasta base científi-
temperamento é menos frio, menos fechado, mais expansivo. Na ca e racional, que a mente moderna atingiu e pode oferecer. Tu-
Europa, poucos se abraçam em público, mesmo entre os íntimos, do no estado da semente que quer e tem fome de crescer, tudo
e todas as expressões de afeto são controladas e sopesadas. No enquadrado numa fase histórica de desenvolvimento do mundo,
Brasil, a luta menos dura e a virgindade maior de espírito ainda para um novo tipo de civilização, no amadurecimento dos tem-
mantém abertas as portas da alma, sem sufocar as manifestações pos, e diante da vontade da vida de fazer um grande salto à fren-
dos próprios sentimentos, pela desconfiança necessária aos po- te. Eis que, diante dos grandes problemas do século, principal-
vos mais experimentados pela calamidade inimiga. O tipo bio- mente o da justiça econômica e da confraternização e coopera-
lógico do Brasil é levado mais à religião espontânea, numa ex- ção para poder viver e trabalhar concordemente nas grandes
pansão livre de amor e de fé, do que a uma religião já rigida- unidades coletivas que a história quer fazer nascer agora, há
mente codificada, em que o pensamento e o sentimento perma- muito mais probabilidades que os saiba resolver um povo que
necem enregelados nas formas. Ora, este primitivo estado espiri- amorosamente os enfrenta com o coração do que o resto do
tual incandescente, ainda que, pelo europeu, possa ser olhado mundo, que só sabe enfrentá-los com a força do dinheiro ou das
com um sorriso de compaixão, é o estado mais apto aos futuros armas e exércitos. Estas qualidades, a tendência à religiosidade,
desenvolvimentos. Aqui, as almas são virgens e receptivas e po- a virgindade de alma, que significa terreno livre para novos de-
de criar-se o novo. Na Europa, só se pode continuar a elaborar o senvolvimentos, representam uma capacidade de progresso nas
velho, refinando-o sempre mais em sutilezas capilares, ficando crenças religiosas, ao qual vemos tão frequentemente corres-
tudo fechado nas velhas barreiras construídas pelos séculos. ponder, na história da humanidade, um progresso social.
Assim, não há no Brasil apenas um estado de sentimenta- Do outro lado, a Europa, madura, complexa, hipercrítica,
lismo dominante, que suaviza os homens, mas prevalece tam- cética e desconfiada, sem fé em Deus e no futuro, envenenada
bém uma disposição à religiosidade e ao misticismo. Este é um pela ferocidade de duas guerras e cansada do trabalho de civili-
povo religioso por excelência, esse é seu tipo biológico. Não zar o mundo; alma que já navegou por todos os mares do co-
importa que as religiões e as formas sejam muitas. Encontram- nhecimento, fria, reflexa, autocontrolada, farta de saber, que
se no Brasil quase todas as religiões do mundo, vivendo juntas desbarata tudo com a análise até chegar ao ceticismo, carregada
na mesma terra. Na Europa, pode-se dizer que há apenas uma demais de coisas velhas e privada de espaço livre para o que é
religião, tão afins são as duas dominantes, catolicismo e pro- novo; temperamento positivo e, portanto, egoísta, calculista,
testantismo, ambas cristãs. Entretanto não há muita disposição nada generoso, como os velhos em geral, constrangida a isso
espontânea à espiritualidade, e o biótipo místico não domina por uma vida mais difícil e dura, pela falta de espaço e pela
em absoluto. Quem, pela primeira vez, chega ao Brasil fica es- pressão demográfica; alma tornada por tudo isso exacerbada,
candalizado com a macumba, com tantas superstições, assim fechada e desconfiada, essencialmente materialista, utilitária,
como com o carnaval do Rio de Janeiro. Pois bem, estes são os levada ao absolutismo e a intransigência, a um individualismo
graus mais ínfimos da tendência à religiosidade, ao misticismo, separatista, que repele a espontânea confraternização. Tipo bio-
ao amor. Estamos muito em baixo, mas o germe já existe. E, se lógico saturado, incapaz de renovações substanciais, mas ape-
existe, ele pode ser guiado e desenvolvido. Na Europa, mais nas de aperfeiçoamentos cada vez mais sutis, na base das gran-
puritana, porém não mais casta; mais formalmente religiosa e des estradas já fixadas pela raça, por assimilação de milênios.
disciplinada, porém não mais crente, não existe esse gérmen, e Tudo maduro e só restando envelhecer, no vasto mundo que, ao
nada pode ser desenvolvido. Que futuro se pode dar a uma re- contrário, procura novos caminhos e elementos jovens para
ligião mecânica, sem grandes aportes de fé, a uma alma fria- percorrê-los. Lá, uma floresta de grandes árvores; no Brasil, um
mente calculista, sem grandes ímpetos de paixão? Os grandes campo fértil, carregado de sementes. Na floresta tudo está feito;
santos surgiram mais frequentemente dos grandes pecadores não se pode nem semear nem colher; e aí se anda com dificul-
passionais do que dos frios e ortodoxos pensadores. No Brasil dade. A alma adulta é individualista, à maneira de grossos tron-
há o estado passional, que, embora no estado caótico, represen- cos eretos, e o resultado é o separatismo. Tudo está dividido, é
ta a matéria prima da fé, da religiosidade, do misticismo. Con- rival, incrédulo até ao materialismo religioso. A fé em qualquer
dena-se justamente a sexualidade quando é animalesca, entre- coisa que não seja útil no presente está em decadência.
tanto ela representa a primeira porta, embora a mais baixa, pela Vejamos um só exemplo. Na catolicíssima Itália, centro do
qual começa a alma a irromper do egoísmo frígido (natural- catolicismo, em cinco anos, até às eleições de 1953, os comu-
mente calculador e que acumula para si, sexualmente neutro) nistas aumentaram de um milhão e meio. A Igreja de Roma
para dar de si mesmo aos outros. Por esta porta passarão mais condenou severamente, até com a excomunhão, a doutrina
Pietro Ubaldi PROFECIAS 43
ateu-materialista. Pois bem, o comunismo, com isso, não foi aparências do momento. Esta que fazemos é uma visão remota e
absolutamente contido e continuou a progredir. Mais de nove de conjunto, e não um trabalho de análise do pormenor, em que
milhões de adultos não fizeram caso da condenação da Igreja. vivem os homens políticos. Colocamo-nos, aqui, em contato
Em 1953, nove milhões e meio de adultos, isto é, uma pessoa com os grandes movimentos da vida do mundo, e não com o jo-
em cada três era declaradamente materialista. Isto quer dizer go dos partidos, nem com as competições humanas.
que o cristianismo, embora se tenha tornado, com a democra- No quadro de síntese que pusemos sob os olhos do leitor,
cia Cristã na Itália, além de religião, um partido político, não vimos que a onda histórica, que exprime a vontade da vida, vai
pôde deter a expansão dos princípios materialistas e nada con- nesta direção e faz, a esta nação, seu oferecimento. Trata-se de
segue contra eles. Suas reações servem, assim, mais para desa- aceitar e compreender, de se colocar na corrente que a história
creditá-lo, demonstrando sua impotência, do que para alcançar quer seguir. Mas um homem ou um povo pouco podem sozi-
seu objetivo. Um terço da população adulta, que é o que conta nhos, e nada podem contra a história. Porém, se a onda que os
na catolicíssima Itália, onde oficialmente todos são católicos e leva é favorável, Deus está com eles e as imensas forças da vida
onde está o centro do catolicismo, é ateia. E dos outros dois estão à sua disposição, tornando-se possível para eles alcançar
terços, quantos creem verdadeiramente? Sua conduta faria crer até o inacreditável. As qualidades que o Brasil possui não são
que também a maioria deles seja ateia. apenas aprovadas pelo novo rumo dos tempos, mas também são
O materialismo é, então, uma corrente coletiva que arrasta aproveitadas, porque a vida, hoje, precisa justamente delas. É
todos, contra a qual, agora, uma Igreja reduzida à forma e vazia provável que, brevemente, o mundo se ache com uma necessi-
de espiritualidade profunda e convicta, ao menos no conjunto, já dade tão premente de paz e de bondade, que se valorizem de
não mais pode lutar para vencer. Os homens da Igreja podem di- modo extraordinário os poucos lugares em que seja possível
zer: Deus está conosco. Mas, se sabemos que Cristo está apenas encontrá-las. E o Brasil poderá ser o primeiro entre estes. É
com sua Igreja espiritual, como poderemos estar seguros de que provável que os conflitos do Hemisfério Norte terminem com
Ele permaneça com aqueles homens, se eles não seguem seus grandes destruições, depois das quais a vida terá imperiosa ne-
ditames? Perdida dessa forma a força maior, que é a espiritual, cessidade, para sua reconstituição, de paz, amor, compreensão e
que defesa lhes sobrará? Então, eles cairão no grande curso da colaboração, num lugar tranquilo, onde possa repousar e reco-
corrente geral, até que ocorra uma renovação radical, com a vol- meçar sobre essas bases. A carência crescente desses elementos
ta ao espírito. Isto porque tudo se reduz a um grande fenômeno e a progressiva elevação da procura, os valorizará cada vez
biológico, que não se pode realizar com os retoques da reforma, mais, tornando-os procurados e preciosos. A humanidade, traí-
mas só por meio de grandes agitações políticas e sociais, que da pela força e pela riqueza, únicos valores em que acreditou,
limpem e renovem radicalmente, refazendo-se tudo desde a raiz. enregelada por um egoísmo do qual só terá recebido desolação,
Pesa sobre a Europa toda uma vingança comum da história, pre- procurará, para não morrer, um sentimento de bondade que lhe
parada longamente nos séculos, e que atinge agora sua fase cul- permita viver com mais calor e que termine de uma vez com as
minante. Representa um determinismo histórico comum a todos, lutas. Eis a grande função histórica do Brasil, se este souber
porque foi preparada concordemente por toda a Europa, não preparar-se desde já; eis sua missão, se ele quiser desempenhá-
obstante a diversidade de línguas e raças, todo ele convergindo la amanhã, pois que a história está pronta para confiar-lha.
para o estado atual. O Brasil terá outros defeitos, mas é inocente Podemos dizer, então, que o Brasil poderá ser a sede da
dessas culpas, próprias de quem teve a responsabilidade de guiar primeira realização da terceira ideia, que funde num todo o que
intelectual e espiritualmente o mundo; sua história não se fez e há de melhor nas duas atualmente em luta mortal, ou seja, a li-
ainda se fará; não há, pois, diante da Lei, violações cometidas, berdade dum lado e a justiça econômica do outro, no amor
nem portanto reações a sofrer ou débitos a pagar. evangélico, sem o que nada é aplicável em paz, nem pode dar
Então, a qual desses dois grupos étnicos pertence o futuro? fruto algum. Isso tudo é possível, porque, como diz Victor Hu-
Diante dos grandes problemas do século – a justiça econômica go, “há uma coisa mais poderosa que todos os exércitos: é uma
e a confraternização para poder conviver e colaborar nas novas ideia cujo tempo tenha chegado”. Então, poderemos dizer que o
grande unidades coletivas – qual dos dois grupos étnicos é mais Brasil poderá ser verdadeiramente o berço da nova civilização
apto e se acha mais preparado espiritualmente para resolver tu- do espírito e do Evangelho, da nova civilização do III Milênio.
do isto e chegar a uma conclusão que não seja a destruição de
meio mundo, por meio de guerras exterminadoras? VI. O APOCALIPSE (1A PARTE)
Não queremos aqui impor conclusão alguma. Procuramos
apenas expor dados reais, para que o leitor os utilize livremente Nos capítulos precedentes, observamos nosso mundo atual
e possa concluir por si, como melhor quiser. Mas o certo é que, e o caminho da historia no sentido analítico, olhando os acon-
salvo erro ou omissão, parece que estes dados querem concluir a tecimentos no pormenor e de perto. Agora nossa visão dilata-
favor do Brasil. Tudo isso nos aparece nas condições dos fatos se em campos mais vastos, onde observaremos o caminho da
escritos na onda da história, onda que carreia homens e aconte- história em suas grandes linhas mestras. Contemplaremos
cimentos, como explicamos acima. Sem dúvida, a vontade de quadros mais amplos, em que permanecerão situados e orien-
um povo sozinho, embora com a maior boa vontade, não poderia tados os menores e mais próximos dos capítulos precedentes.
criar a natureza da onda histórica num determinado momento, Caminharemos, assim, por etapas, partindo das coisas peque-
nem sua posição dentro dela. Cada nação se acha aí situada em nas e vizinhas para as grandes e remotas, a fim de iluminar
condições diversas, com diferentes funções, de acordo com o cada vez mais o argumento, contemplando-o, dessa forma,
desenvolvimento das proposições lógicas do pensamento pro- sempre de diversos mirantes.
gressivo da vida. O que mais pesa a esse respeito é a vontade da Os capítulos anteriores terminam apoiando o conceito da
história, é o momento, é o desenrolar dos acontecimentos. Ora, nova civilização do III Milênio. É neste conceito, a cujas por-
tudo está a favor do Brasil, para que, secundando os impulsos da tas nos levaram aqueles capítulos, que se dilata nossa visão.
história – que oferece, mas jamais coage – possa ele desempe- Nossa precedente pesquisa histórica se enriquece agora de no-
nhar esta sua função e missão. Esta convergência de circunstân- vos elementos, até tornar-se a imensa orquestração cósmica,
cias favoráveis demonstra que, efetivamente, a história faz hoje em que se agitam os destinos do mundo, a ruína e o renasci-
ao Brasil este oferecimento, e, para que isto se torne sua função mento da civilização e a luta apocalíptica entre o bem e o mal.
histórica e missão, realizando-se mais tarde na ação, basta que o E quanto mais virmos as coisas em suas grandes linhas, tanto
Brasil a aceite e a queira. Não nos detenhamos nas condições e mais veremos nelas presente e operante aquele pensamento di-
44 PROFECIAS Pietro Ubaldi
vino, que afirmamos ser o princípio diretivo que preside ao de- ção relativa a nós, dada pelo transformismo, condição necessá-
senvolvimento da história. Acharemos assim, neste capítulo e ria da evolução, que é a nossa lei.
nos seguintes, sempre novas confirmações dos princípios que Para compreender melhor como se move o homem num
dirigiram nossa pesquisa nos anteriores. mundo de conceitos filhos do relativo e próprios apenas às suas
As observações feitas até aqui nos levaram a concluir pelo condições, mas que não valem mais se sairmos delas, observe-
advento de uma nova civilização, para cuja preparação está vol- mos também a relatividade do conceito do “nada”. Ele só tem
tada toda a presente obra. Procuraremos, cada vez mais, expli- valor em relação às nossas posições e se dissipa quando estas
car e aprofundar este conceito, que parece utopia. Observá-lo- são superadas. Até o fato de que, em nosso plano, sua concepção
emos agora, entretanto, não como nos capítulos precedentes, só seja possível como um contraste entre o ser e o não-ser, prova
em sua atual preparação histórica, nem, como no volume sobre que ele é o resultado de uma cisão da unidade originária, é um
a “Nova Civilização”3, em seu conteúdo e em seus princípios efeito da queda. No absoluto, estes conceitos relativos não ca-
diretivos, mas sim no pensamento profético, captado e transmi- bem, e tudo simplesmente “é”. Aí, tudo é unidade. O conceito de
tido a nós pelas grandes antenas humanas que antecipam o futu- “nada” só pode aparecer no dualismo, efeito da queda, pelo que
ro. Procuraremos assim, na intuição alheia, a confirmação da tudo só pode existir na forma do ser ou do não-ser, ou seja, ape-
nossa, pedindo luzes a todos, para confirmar mais ainda nossa nas perceptível como contraposição ao seu contrário. A negação
certeza. Interrogaremos, por isso, o Apocalipse e outras profe- em oposição à afirmação nasceu com a revolta, pois que em
cias mais antigas, como as de Daniel, e também as mais recen- Deus não pode haver negação. No absoluto não há possibilidade
tes, como as de Malaquias e Nostradamus, auscultando também do não-ser, do nascer e morrer, do vir-a-existir por criação, que é
a astrologia e a voz das Pirâmides do Egito, para ver se todas um conceito relativo e só pode significar transformação de um
concordam conosco a respeito da proximidade do grande acon- estado precedente, o qual, por ser diferente em relação ao novo,
tecimento da nova civilização do III Milênio. chama-se de nada. Eis aí então, que o nada é outro conceito que
◘ ◘ ◘ só vale para a nossa relatividade e que desaparece no absurdo,
O primeiro problema que enfrentamos, ao penetrarmos no logo que se supere esta posição. No fim do caminho evolutivo,
mundo das profecias, é o da possibilidade lógica da previsão do com o regresso do ser a Deus, vimos, no volume Deus e Univer-
futuro. Será verdadeiramente possível conhecê-lo antecipada- so, que o não-ser será reabsorvido no ser e o dualismo na unida-
mente? E como isto se realiza? Nossa tarefa consiste em expli- de, desaparecerá o “nada”, assim como o tempo, a concatenação
car tudo, pois temos de admitir que é muito mais sólido o co- ...causa-efeito, efeito-causa..., a sucessão dos acontecimentos, a
nhecimento dos fenômenos racionalmente demonstrados e que incerteza da escolha e nosso mundo do relativo. Mas este uni-
este é o melhor meio para fazer um exame analítico deles. Ora, verso não quebrado, no estado integral, uno, em que tudo é coe-
é logicamente possível prever o futuro. Vejamos as razões. Elas xistente e presente, sem tempo, sem o nada, perfeito e determi-
não faltam no sistema até agora seguido nestes volumes. nístico, já existe acima do nosso, à espera de tornar a se unir
Já explicamos alhures (no volume Problemas do Futuro, com o nosso, uma vez terminado o caminho evolutivo.
Cap. XI – “Livre Arbítrio e Determinismo”, e no volume Ora, quanto mais o ser se avizinha, pela evolução, desse es-
Deus e Universo) que a liberdade de escolha só pode existir tado de reintegração no estado originário, mais seu modo de
num estado de imperfeição e ignorância, como é o humano, ao existir se identifica com esse estado, que tem todas as qualida-
passo que, nos planos superiores de perfeição e sabedoria, es- des que vimos. Entre estas, ao problema proposto interessam
sa incerteza de oscilações em busca do melhor caminho torna- primordialmente a contemporaneidade e o determinismo. Os
se absurdo e não tem mais razão de existir, dado que o melhor termos do problema são dois: de um lado, um plano superior do
já é conhecido e, portanto, alcançado imediatamente, não ha- ser, em que essas qualidades são realidade; do outro, um plano
vendo mais a necessidade de experiências para evolver. Há inferior, em que elas não são realidade, havendo, entretanto,
dois mundos opostos: o relativo e o absoluto. O primeiro in- possibilidade de se aproximar delas por evolução. A solução do
certo e, portanto, oscilante, em que não se pode prever o ama- problema da previsão do futuro está justamente nessa possibili-
nhã; o segundo perfeito e, portanto, determinístico, em que dade, pela qual o ser pode, por evolução, aproximar-se destas
tudo é sempre visível e previsível. Há conceitos e atitudes regiões superiores, de unidade, concomitância e determinismo,
psicológicas que aceitamos como axiomáticos, porque eles atingindo zonas onde o futuro é presente e nada mais pode
são naturais em nós. Eles são parte integrante de nosso mundo acontecer senão uma só coisa: a melhor.
e de nossa psique, no entanto perdem seu valor tão logo saia- Não se diga, no entanto, que os dois mundos são separados e
mos daí. Em outros termos, os conceitos do relativo, segundo estranhos. As qualidades do sistema perfeito permaneceram no
os quais está plasmada nossa atual mente e natureza, não va- âmago do sistema imperfeito; o mundo superior, ainda que se
lem mais no reino do absoluto. Este, por sua vez, pelo fato de corrompendo, projeta-se no inferior, e ambos continuaram co-
ser perfeito, só pode ser, portanto, determinístico. municando-se. Só por isso é possível que o segundo possa puri-
Estabelecida esta qualidade determinística do absoluto, im- ficar-se, até voltar à perfeição de origem. No universo decaído,
posta pela lógica, teremos que admitir, como consequência ne- Deus permaneceu em seu aspecto imanente. Se a evolução é
cessária de sua perfeição – qualidade de que não pode prescin- uma realidade e significa passagem de um plano inferior a um
dir – que naquele plano tudo é previsível. Mas o é também por mais alto, isto quer dizer que eles estão ligados. Assim, a estrada
outro motivo. O absoluto, como vimos no volume Deus e Uni- para atingir a previsão do futuro está traçada, significando que o
verso, após a queda do Sistema, decaiu na dimensão tempo, em fenômeno é possível. Para alcançá-lo, é necessário apenas um
que o estado imóvel de existir se transforma numa série de elemento: o homem evoluído, ou seja, aperfeiçoado tanto psí-
momentos sucessivos, tomados na corrida do tornar-se, para quica como espiritualmente, que saiba pensar não só pelos mei-
que se realize o caminho da evolução. O absoluto não fica cin- os racionais normais, mas também pela inspiração e intuição, e
dido pelo tempo que passa, mas simplesmente “é”, sem tornar- possa assim perceber os planos mais altos, acima do normal re-
se, livre da concatenação: ...causa-efeito, efeito-causa... Então, lativo. E os profetas representam justamente esse tipo biológico
ele é totalmente concomitante, todo presente, todo visível. Nos- de antenas sensibilizadas pela evolução. Os verdadeiros profetas
sa divisão entre passado, presente e futuro é apenas uma posi- são também gênios e santos. Na profecia, o homem se aproxima
das esferas superiores, onde não há tempo e que, por sua perfei-
3
Sétimo volume da 1a Obra, II Trilogia – A Nova Civilização do ção, são naturalmente determinísticas. Mas, onde não existe o
Terceiro Milênio (N. do A.). tempo, tudo é presente; os acontecimentos não aparecem cindi-
Pietro Ubaldi PROFECIAS 45
dos na sucessão que os devora, ligados por uma cadeia de causa- nossa curiosidade ou nos fazer organizar defesas contra rea-
lidades. Onde tudo é determinístico, o futuro não pode ser um ções merecidas e, portanto, necessárias.
mistério. É assim que a profecia é possível, porque, quanto mais Se são essas as características da profecia, o problema de
se sobe para o ápice e para a unificação, tanto mais se pensa e se sua função é outro, quando a visão desce à Terra e é comunica-
obra com perfeição, isto é, deterministicamente. da aos homens. Sua tarefa aqui é avisar, para que os maus se
A profecia é, portanto, logicamente possível, sendo um ato encaminhem para o bem e para que os bons ai permaneçam
de inspiração. Quanto mais ascendemos na direção das grandes com fé e paciência. O objetivo das profecias na Terra é indicar
linhas da história, menos elas obedecem ao capricho humano, o cumprimento da Lei e convidar o homem a segui-la de bom
porque mais nos avizinhamos dos grandes planos da Lei, e mais ânimo, se não quiser sofrer tremendos desastres. É natural, pois,
esta comanda e se manifesta evidente em sua natureza, que é que essas profecias se recusem à exploração que o homem quer
determinística. Para melhor compreensão, referir-nos-emos a fazer delas, ou seja, não queiram fornecer informações e revelar
um fenômeno paralelo, conhecido também na física atômica. O o futuro, para que esse conhecimento não seja utilizado contra o
movimento de cada uma das moléculas num gás não pode ser bem, isto é, para fazer a própria vontade e ter bom êxito nos
previsto, porque é livre e irregular. Podem mover-se devagar ou próprios intentos até na guerra contra Deus. Das profecias, en-
rapidamente, em qualquer direção. Mas o choque de bilhões de tão, não devemos esperar o que não podem nem devem dar-nos,
moléculas de gás, contra determinada superfície, produz um ou seja, informações para dominar os acontecimentos, para es-
impulso constante que obedece a leis simples e bem definidas. capar ao determinismo da Lei, que deve premiar-nos ou punir-
Num universo dirigido por uma lei única e unitária, é lógico nos como merecemos. Por isso, se uma profecia tiver que dizer:
que ocorra a mesma coisa com os seres vivos; e assim no-lo “acontecerá isto ou aquilo”, procurará logo retrair-se, cobrindo-
mostram, com efeito, as estatísticas. As ações de cada homem se de véus, porque, ainda que deva e queira avisar, deve, ao
são livres e irregulares e, portanto, não podem ser previstas. mesmo tempo, impedir que as forças do mal – ignorantes, por-
Mas a conduta de grande número deles, por longos períodos de que involuídas – o saibam e disso se aproveitem para organizar
tempo, representa um fenômeno de massa, completamente dife- melhor suas batalhas contra o bem. É natural, portanto, que
rente, que obedece a leis bem definidas, portanto pode ser co- muitos fiquem desiludidos das profecias e se desinteressem de-
nhecido antecipadamente, desde que conheçamos aquelas leis. las. Mas as profecias não querem de fato dizer tudo o que o
Não fora isso verdade, ao menos com certa aproximação, e não homem desejaria; elas se recusam a ser exploradas pelo mal;
poderiam existir e funcionar as companhias de seguros. estão já prevenidas para impedir este mau uso que delas se de-
Outra referência. A liberdade de cada homem pode compa- sejaria fazer. Às forças do mal, que espiam essas luzes caídas
rar-se à de peixes em movimento nas águas de um rio. Quando do céu, tentando descobrir os desígnios divinos, só para melhor
pudermos conhecer o caminho do rio, o que corresponde a leis zombar e escapar deles, ou contrastá-los, respondem as profeci-
simples, saberemos também o caminho obrigatório de todos os as: “não, nada sabereis”. Tudo o que do céu cai na Terra tem
peixes livres que estão lá dentro. Então, quanto mais nos afas- que estar prevenido contra o mau uso que se consegue fazer de
tarmos do pormenor e de uma visão analítica das coisas, ou se- tudo em nosso mundo. Quantos olhos espiam; quantos ouvidos
ja, quanto mais concebermos por sínteses, que é o processo da tentam escutar estas intuições do futuro. Que vantagem poder
intuição, tanto mais nos aproximaremos do determinismo da conhecê-lo por antecipação, para defender-se melhor. Ouvem-
Lei. Quanto mais inspirado é o profeta, melhor poderá perce- nas os bons, para ter coragem e perseverar, mas escutam-nas
ber as linhas da história, a natureza e os movimentos da grande também os levianos, por curiosidade, e as escutam, sobretudo,
onda que carreia homens e acontecimentos. A liberdade do in- os maus, para reforçar-se no mal.
divíduo é uma oscilação menor, que permanece e é sentida por Ora, vimos que, no Alto, em suas grandes linhas, o futuro é
ele como livre arbítrio, e de fato o é, porém, na multidão, de- determinístico e, portanto, não pode ser perturbado em sua atua-
saparece, para dar lugar a uma lei diferente, maior, universal e ção pelo pequeno poder da liberdade humana, que tem fim com-
de síntese, lei que o indivíduo, imerso na análise e no porme- pletamente diverso, isto é, experimentar e estabelecer as respon-
nor, vendo apenas a si mesmo, não percebe, mas que o profeta, sabilidades, porque as ações entram no campo da fatalidade e do
com olhos de longo alcance, vê, podendo dessa forma prever destino logo que livremente realizadas. Quem interroga as pro-
os acontecimentos. Ele descuida da oscilação menor, que faz fecias só para saber o futuro e, então, pôr-se a lutar contra a Lei,
parte apenas da observação microscópica dos indivíduos e lhes deveria antes interrogar a si mesmo para ver qual sua posição
é indispensável para sua experiência e consequente evolução. diante da Lei, a posição que ele livremente quis tomar com suas
Por isso o profeta, com a observação macroscópica de síntese, obras. Quando a profecia desce à Terra, trazendo consigo as no-
mantém-se nas altas zonas das grandes linhas dos aconteci- tícias de outro mundo, ela vem chocar-se com uma realidade to-
mentos históricos, pois, quanto mais descer e se avizinhar do talmente diversa. Então o estado determinístico dos planos supe-
contingente dos pormenores, tanto mais lhe escapará o deter- riores, situados acima do tempo e do transformismo evolutivo,
minismo da Lei e mais estará sujeito ao arbítrio do indivíduo, entra em contato com aquele estado de incerteza da escolha, que
numa zona imprevisível. Daí deriva o fato da profecia nos apa- nós chamamos livre-arbítrio. Neste ponto, o problema filosófico
recer como algo que desce de outros planos, o que leva a uma do contraste entre o livre-arbítrio e o determinismo torna-se vi-
deslocação de pontos de vista e de valores, que desorienta a vo, atual, porque é o contato real entre duas forças e posições
psicologia normal, ávida, ao contrário, de elementos particula- opostas. E, se já resolvemos, teoricamente e em linhas gerais
res e positivos, adequados especialmente ao seu mundo. Assim (veja Problemas do Futuro, Cap. XI – “Livre Arbítrio e Deter-
explica-se também porque pode acontecer que, na visão permi- minismo”) esse problema, agora o argumento das profecias nos
tida pela contemporaneidade dos planos superiores, às vezes se oferece uma confirmação e aplicação do mesmo.
misture, como no Apocalipse, a normal sucessão dos aconte- Tudo está enquadrado dentro de limites. O homem, que gos-
cimentos que depois se projetarão na Terra, em forma de su- taria de conhecer o porvir dos acontecimentos para modificá-
cessão no tempo. É por isso que, nas profecias, falta com fre- los, deveria, ao invés, compreender que seu modo de ser, sua
quência a precisão do tempo, aquilo que mais gostaríamos de forma particular de vida, baseada na chamada liberdade, não
saber. Dela, ao invés, emergem mais os elementos morais, pode alcançar os céus, reino das profecias; deveria compreen-
porque, no plano do qual descem as profecias, eles são funda- der que sua liberdade não pode ultrapassar os confins do campo
mentais, e as profecias descem para transmiti-los ao nosso. As- humano de ação, não pode ultrapassar o limite e entrar no cam-
sim, seu objetivo é converter ao bem, mais do que satisfazer po da Lei, onde reina o determinismo do absoluto. Os dois
46 PROFECIAS Pietro Ubaldi
campos são diferentes: num domina o desenrolar-se obrigatório lo, pois haveria o perigo de tentar ser adivinho e cair no fantás-
das grandes linhas, no outro a incerteza da pequena oscilação tico. Enfim, ajudar-nos-emos com o raciocínio, apoiar-nos-
do livre-arbítrio humano. Um campo não pode entrar no outro, emos na lógica do sistema e na própria inspiração que no-lo
embora, nas profecias, cheguem a se tocar e ir além, pois o deu. Procuraremos, com estes meios, coordenados para enfren-
mais alto penetra no inferior, e a este é concedido olhar aquele. tar o mistério, chegar à visão mais demonstrada e exata possível
Cada um dos dois campos tem que ficar com suas leis. Assim, do futuro que nos aguarda a todos. É nosso dever indagá-lo, é
uma profecia muito exata e evidente, seja em relação ao futuro necessário conhecê-lo, para nos prepararmos melhor para ele,
próximo ou longínquo, viria alterar a liberdade humana, intro- bem longe de qualquer sentimento de vã curiosidade.
duzindo nela novos elementos de decisão e perturbando o cál- Outro motivo ainda nos levou a nos aproximarmos do
culo das responsabilidades. A profecia não tem o objetivo de Apocalipse, o que fizemos após terminar a primeira serie dos
nos tranquilizar para que possamos nos entregar melhor às nos- volumes4, depois de haver aí exposto e demonstrado todo o sis-
sas comodidades, nem de nos poupar o esforço de vigiar e estar tema, justamente porque não só o Apocalipse se enquadra per-
prontos, agindo sempre bem. Explica-se assim aquela lingua- feitamente nele, mas também porque o confirma plenamente,
gem sibilina com que a profecia parece gostar de esconder seu dando-nos uma nova prova de sua verdade. Achamos no Apo-
pensamento, justamente aí onde mais se desejaria saber. Dessa calipse o princípio da liberdade e da responsabilidade. Daí a
forma, quando se anuncia como certo um acontecimento, es- sanção final, consequência do segundo princípio, após a longa
conde-se o tempo de sua realização, e tudo fica encoberto num luta, que é a consequência do primeiro. Mostra-nos o Apoca-
simbolismo de difícil interpretação. lipse que o caos é transitório e que no âmago dele está a ordem
◘ ◘ ◘ de Deus, em quem tudo tem de acabar, resolvendo-se nele.
Após haver compreendido, nas linhas gerais, o significado Mostra-nos como funciona a Lei em sua reação, que é elástica
e a natureza do ato profético, ocupemo-nos agora do Apocalip- e, só depois de longa paciência, explode irrefreável. Mostra-
se. A interpretação do simbolismo com que se exprime esse nos a ignorância do mal, que tripudia, acreditando-se vence-
grande livro, tentou muitas mentes, algumas delas movidas pe- dor, enquanto é de fato apenas tolerado pela grande bondade
la curiosidade e pela mentalidade de adivinho. É natural, então, de Deus. Mas assim, a todos é dado tempo para assumir livre-
que elas se tenham perdido no emaranhamento dos pormeno- mente as próprias responsabilidades, que são as únicas que po-
res, ou tenham chegado às mais contraditórias interpretações, dem justificar depois a inexorabilidade da sanção. Há propor-
produzindo apenas discordantes círculos viciosos de fantasia. ção entre esta dura inexorabilidade e a longa espera, cumulada
É inútil querer enfrentar esse livro sem antes ter conhecido e prodigamente de boas ocasiões e advertências para voltar ao
resolvido os grandes problemas da vida e da história. Inútil en- bom caminho. É dado tempo, assim, ao mal para desempenhar
frentá-lo com olhos míopes, diretamente, por análises, sem sa- suas funções destrutivas a serviço do bem, para a vitória deste
ber antes olhar de longe, bem orientado pela visão panorâmica na prova purificadora dos bons.
de síntese. A interpretação do Apocalipse não pode ser jogo de Indica-nos o Apocalipse que há na Lei um princípio de
adivinhos, mas só trabalho de intuição e, ao mesmo tempo, ra- equilíbrio que estabelece um limite para o mal, controla seu
ciocínio filosófico profundo. desenvolvimento e o detém quando a medida está esgotada.
Muitas interpretações foram feitas com objetivo preconce- Esta profecia nos faz assistir esse lento esgotamento da medi-
bido, de modo que, ao invés de representar obra de pesquisa, da, enquanto Deus olha sem pressa, pois os artífices do mal
representam uma tentativa de servir-se da autoridade desse li- não podem escapar à justiça, que põe tudo em ordem. Lendo-o,
vro, para fazê-lo pronunciar, e assim valorizar, a condenação sentimos a cada passo o inútil esforço dos rebeldes e a inexo-
dos próprios inimigos, provando o lado bom da causa do pró- rabilidade do destino, que é a Lei nas mãos de Deus. As águas
prio grupo e a segurança de seu triunfo. Dessa maneira, são ob- sobem, sobem afogando tudo, os bons de pouca fé tremem
tidas as mais opostas demonstrações e conclusões, com a mes- aterrorizados, os maus gritam vitória, e os olhos de Deus estão
ma precisão de cálculos e surpreendente coincidência de fatos. abertos sobre tudo e tudo veem. Mas quem tem fé, quem sabe,
Ora, é certo que o Apocalipse não foi escrito a serviço particu- porque tem conhecido as leis de Deus, não teme a espera. Tu-
lar de ninguém, nem para alimentar antagonismos de um grupo do é jogo de ilusões da nossa dimensão tempo, tudo escapa no
contra outros. Ao contrário, poderemos dizer que, dado seu ca- irreal, amarrado nesta sua corrida a um presente que jamais se
ráter universal, quanto mais impessoal for sua interpretação, detém. E as forças do mal, em vão, agarram-se às crinas desse
tanto mais terá probabilidade de se aproximar da verdade. cavalo em fuga, porque nenhum edifício estável pode constru-
Procuraremos, então, fazer aqui uma pesquisa lógica do ir-se nesta corrida sobre as areias movediças do transformismo
Apocalipse, observando como seu pensamento concorda com o da evolução, mas só na alta zona do espírito, em mais elevadas
pensamento da lei de Deus, dirigente da vida e da história, ori- dimensões, onde as tempestades do tempo se acalmam. O mal,
entando-nos com os princípios gerais dessa lei, que foram até porém, é força decaída; repele e renega o espírito, permane-
aqui expostos em nossos livros. A pesquisa será imparcial, por- cendo desesperadamente preso à matéria e à sua forma. Traz
que não temos teses particulares a defender para o triunfo ou assim, em si mesmo, em sua própria natureza, a sua própria
justificação de ninguém. Nosso único interesse é compreender a condenação, como ele mesmo a quis.
hora histórica atual e seus futuros desenvolvimentos, para poder O Apocalipse nos faz ver o lento amadurecimento subterrâ-
delinear a aproximação e a natureza da nova civilização do III neo dos grandes fenômenos cósmicos, descobrindo-lhes as ori-
Milênio. Por isso, pediremos apoio também a outras profecias, gens até no campo moral e nos mostrando assim a unidade do
para que a concordância das vozes mais diversas, mesmo da- todo, em que todos os fenômenos estão coligados nos mesmos
quelas escritas sobre os restos das mais antigas civilizações, princípios. Num perfeito jogo de equilíbrios, acumulam-se em
possa trazer uma confirmação positiva de nossas intuições. Pe- silêncio os impulsos reativos, subindo cada vez mais, até à ex-
dimos a todas essas fontes uma ajuda, para compreender o pre- plosão final, que é, ao mesmo tempo, o resultado de um cálculo
sente momento histórico, gigantesco e tremendo, e, com isso, a de forças e um ato de justiça, fenômeno físico de elementos de-
sorte do mundo. Procuraremos, então, entender o simbolismo sencadeados e fenômeno moral de punição dos culpados, terrifi-
dessas profecias nos termos claros da psicologia moderna, cante fim do mundo e afirmação do reino do espírito, desespero
mesmo nos limitando às linhas gerais, se esta é a condição de
maior certeza. Basta-nos, aliás, uma visão de conjunto, mas 4
Referência à 1a série da Obra de Pietro Ubaldi, também chamada
bem consolidada; nada mais queremos, e seria imprudente pedi- I Obra (N. da E.).
Pietro Ubaldi PROFECIAS 47
de morte para os maus e vitória de vida para os bons. O mal nossa obra, porque ele a convalida em todos os seus princípios
avança afoito entre os olhares amedrontados dos bons, e as for- e a confirma, especialmente em sua conclusão e seu objetivo,
ças reativas se acumulam em seu seio, o corroem, minam-no e o que é a nova civilização do III Milênio.
esgotam até fazê-lo ruir. Confortem-se os bons, porque, se tudo Chegamos hoje ao momento em que o determinismo da Lei
isso ocorre sem ser visto e se aos ouvidos físicos só chegam os toma em mãos as rédeas da história e impõe suas diretrizes. Es-
gritos de vitória dos maus, esta atividade secreta é obra de Deus, tamos, pois, no momento em que se manifesta a vontade de
que, estando no centro, só pode obrar no centro das coisas e, só Deus, querendo entrar diretamente em ação. Ainda que Sua
no último instante, aparece nas manifestações exteriores da for- existência seja negada pelo mundo, Deus quer igualmente sal-
ma. O mal está neste outro polo e não vê o que Deus realiza em vá-lo neste momento, em que se acumularam tantos erros dos
silêncio, no íntimo. O mal acredita nos rumores fictícios do pla- homens e tudo ameaça ruína. Estamos, pois, na plenitude dos
no físico, nos triunfos efêmeros do mundo, e os toma equivoca- tempos. Nos volumes anteriores, estudamos a estrutura da Lei.
damente como vitórias. Mas quem vê essa obra de Deus, que Agora a vemos entrar em ação, porque ela não é teoria abstrata,
jamais se detém, presente em todos os lugares, sente este intu- mas sim a própria vida, que quer realizar-se entre nós. A elasti-
mescimento de impulsos vingadores em favor do bem, contra o cidade da Lei tem um limite, e suas forças, comprimidas pela
mal, e, mesmo que isso possa parecer aquiescência passiva e desobediência dos homens – deixados livres por Deus, chefe e
quase consentimento, fica aterrorizado por essa calma e ausência dirigente – romperão os diques da divina misericórdia, semean-
de reações de que se prevalecem os maus, pois tudo isso dá um do a destruição nas fileiras do mal rebelde. É a hora do juízo e
sentimento de lenta sufocação, prelúdio de morte fatal. E o mal, da justiça. Deus, esquecido e negado, reaparece terrível sobre
rebelde e cego, avança para sua ruína, desprezando em sua com- os horizontes da história e manifesta-se em ação. Sua paciência
plicada astúcia a invencível sabedoria da sincera simplicidade, e Sua misericórdia, embora possam parecer ilimitadas, não po-
método retilíneo dos bons, que seguem a Deus. dem ser traídas indefinidamente; e ai do homem que confunde
Todas essas coisas, que já ilustramos longamente nos vo- essa espera da Lei – que só por compaixão apraza a reação –
lumes precedentes e fazem parte da lógica do sistema, temos a com a ausência de um princípio divino, dirigente e senhor do
alegria de achá-las agora, inesperadamente, no Apocalipse, mundo. Ai dele, porque este princípio, após longa espera, em
antes desconhecido por nós. A gigantesca luta entre o bem e o que os homens se acomodam, pensando que são eles os vence-
mal só pode ser explicada com a teoria da ruína ou queda dos dores e senhores do mundo, reage para restabelecer o equilíbrio
anjos, como mostramos no volume anterior, Deus e Universo. e explode com uma violência tanto maior quanto mais demora-
O Apocalipse é a história da volta, representa o caminho da damente tiver sido violada e comprimida.
ascensão, dividido em episódios de lutas e conquistas, até à Após haver estudado nos volumes precedentes a estrutura
meta. Esta profecia confirma os conceitos dos precedentes ca- e o funcionamento da Lei, estudamos agora, aqui, seu aspecto
pítulos a respeito do pensamento e da vontade da história, faz histórico, neste nosso tempo, que é a hora de sua realização.
deles, como nós, uma coisa viva, pensante, inteligente; mos- Foi dito e repetido que, até hoje, o Evangelho jamais foi apli-
tra-nos que o verdadeiro senhor dos acontecimentos é Deus, cado na Terra; que o anunciado Reino de Deus é ainda sonho
que o verdadeiro guia deles é Sua lei; sobretudo nos confirma remoto; que, se tivéssemos que nos ater aos fatos, a vinda de
nossa precedente interpretação da hora histórica atual, avan- Cristo à Terra teria sido quase inútil. Mas será possível que a
çando num mar tempestuoso para mais altos destinos. Lampe- realização da Boa Nova jamais deva chegar? Com efeito, o
ja no Apocalipse o grande conceito da real chegada do Reino mundo hoje, com suas religiões, é substancialmente materia-
de Deus à Terra, conceito que é o da nova civilização do III lista. A concepção espiritual da vida é utopia hoje, está fora
Milênio. O Apocalipse confirma o significado profundo da da realidade vivida. Entretanto ninguém pode acreditar que a
vinda de Cristo à Terra, e reforça as conclusões do Evangelho, vinda de Cristo à Terra possa ter sido frustrada em seus prin-
em torno do qual gira a presente obra. cipais objetivos. O fato é que o Evangelho representa uma re-
Pode parecer que o estilo violento de batalha do Apocalipse volução biológica, e esta não pode realizar-se toda em 2.000
não se possa conciliar com o estilo pacífico do Evangelho. No anos. Mas qual das ideias nascidas no mundo atingiu imedia-
entanto os dois livros se elevam sobre o mesmo conceito. Só tamente sua plena realização? Cada ideia nova é um impulso
que, no Evangelho, estamos no terreno dos princípios altos e inserido na corrente espiritual da vida, e esta já é uma força
celestes, ao passo que, no Apocalipse, estamos no campo da que resiste por inércia, tendendo a conservar sua trajetória
luta por sua realização na Terra. Aqui desencadeia-se, para os precedente. Após haver sido lançada a nova ideia, ela é espa-
surdos ao apelo do amor, a reação da justiça de Deus. Se os lhada e, com isto, funde-se com outras ideias, sendo alterada
maus quisessem fazer mau uso do amor de Deus, nem por isso e, às vezes, até renegada, para mais tarde ressurgir transfor-
a Lei poderia ficar violada para sempre. Achamo-nos diante de mada, mas já assimilada em parte. Assim, primeiramente dez
duas fases do mesmo pensamento. O Evangelho é a Boa Nova ou vinte por cento, aqui mais, ali menos. É bem pouco, mas
aos homens de boa vontade, para que a Lei se cumpra por esta porcentagem já se fixa na raça, que a adapta a si, ao seu
compreensão, espontaneamente. No Apocalipse, a Lei “deve” tipo e às suas necessidades. Será talvez uma adaptação, mas,
cumprir-se, impondo-se com a força. O Evangelho é a voz do ao menos em parte, a ideia tornou-se realidade.
céu, proferida por um anjo vestido de bondade, que se dá aos Ao cristianismo ocorreu o mesmo. Terá realizado uma por-
homens por amor. O Apocalipse é um drama que se desenrola centagem mínima, mas a realizou. Mais do que isso, em 2.000
no inferno terrestre, reino de Satanás. O Evangelho anuncia o anos, a natureza humana não podia assimilar. Por isso certas
Reino de Deus. O Apocalipse narra a luta para implantá-lo na ideias, como o inferno, e certos fatos, como as guerras santas, o
Terra. O Evangelho termina com o sacrifício de Cristo para a poder temporal e as formas materiais do rito foram mais cria-
salvação dos bons. O Apocalipse termina com a vitória de ções e exigências dos tempos, sendo responsável por isso o grau
Cristo e a condenação dos maus. Assim, Evangelho e Apoca- involuído da maioria humana, do que propriamente criação e
lipse concordam, indicando dois caminhos diferentes para al- responsabilidade de dirigentes piores que a mediania. Isto acon-
cançar a mesma vitória do bem. O Apocalipse nos mostra que tece em todos os campos, e é culpa da natureza humana, muito
chegamos à plenitude dos tempos, à hora da realização daquela preguiçosa para evoluir. Assim, por exemplo, o farisaísmo e o
Boa Nova; diz-nos que o Reino de Deus, anunciado pelo jesuitismo são qualidades que todos os homens podem ter. Não
Evangelho, não será sempre uma utopia e está verdadeiramente inculpemos, portanto, um grupo particular, se ele tem os defeitos
às portas. Por isso o Apocalipse é fundamental também para da natureza humana. Esta é a nossa velocidade de assimilação, o
48 PROFECIAS Pietro Ubaldi
passo lento de nossa caminhada ascensional. Nestas condições, lio. E Deus lhes estende o braço de Seu poder e os reergue para
o cristianismo teve que se limitar à função da conservação dos o Alto. Esta é a hora da justiça. Fecham-se as portas da miseri-
princípios, à defesa do patrimônio recebido. Explica-se, assim, córdia, o porvir se detém, o caminho da evolução para e se con-
ainda que não se justifique, sua intransigência e seu dogmatis- clui. Fixam-se então as posições que cada um conquistou no
mo. Mas, com isso, não queremos dizer que a caminhada se de- longo caminhar, e são feitas as contas, para cada um, segundo o
tenha e que o cristianismo possa ficar cristalizado na imobilida- que lhe cabe de direito, por suas obras. É a hora do juízo.
de. Se hoje os superficiais podem ter a impressão da falência de O Apocalipse fala de plenitude dos tempos. Estamos hoje
Cristo, nem por isso a partida está perdida e a vida se detém. O nessa plenitude dos tempos. Deus se exprime no pensamento e
Apocalipse nos fala justamente deste amanhã, em que ocorrerá a na vontade da história, que tudo arrasta como uma onda e se
realização do Reino de Deus na Terra. impõe aos homens e aos acontecimentos, pendendo como um
Se o Evangelho tem fins didáticos e se, pelo caminho do destino ameaçador sobre o mundo, porque a medida de suas
amor, quer ensinar aos homens a viver, propondo o próprio iniquidades está cheia e esta é a hora de prestar contas. Vive-
Cristo como exemplo vivo e modelo para alcançar o Reino de mos em tempos apocalípticos, em que a Lei deve cumprir-se.
Deus, o Apocalipse traça a história da realização desse Reino, Por muitos séculos Cristo esperou a realização de seu Evange-
fazendo ressaltar, pelo caminho das ameaças, a inflexibilidade lho. O Reino de Deus tem de chegar, custe o que custar. Não é
final da justiça de Deus, mostrando-nos Cristo também em seu concedido ao homem o poder de tornar vã a vinda de Cristo
aspecto de poder e triunfo. Só assim o quadro estará completo, sobre a Terra. O drama do Apocalipse é nosso, deste nosso
quando resultar da fusão de seus dois elementos complementa- tempo. As forças do mal chegaram até diante do trono de Deus
res: Evangelho e Apocalipse. Se o Evangelho nos traça a linha e, orgulhosas disso, seguras de vencê-Lo, lançam o último ata-
de conduta, deixando-nos livres de aceitá-la ou não, o Apoca- que contra Ele. O olho de Deus, sempre aberto, observa e ain-
lipse entra na história e narra as vicissitudes da realização na da espera. Mas a hora de Sua cobrança está próxima, porque
Terra daquele novo reino, que foi anunciado no Evangelho. chegamos à madureza do tempo, e o Deus invencível se prepa-
Delineia-se assim o desenrolar-se daquela luta cósmica, entre o ra para Seu triunfo. Ele é sempre o centro de tudo e, no meio
bem e o mal, em que se concretizam os mais altos destinos da da grande batalha, tem em mão o cetro de comando, para que o
vida, e dessa luta o Apocalipse nos prevê e garante o desfecho. bem vença e os bons triunfem.
Nele, a linguagem amorável do Evangelho transmuda-se na pa- Achamos, hoje, no Apocalipse, uma tremenda ameaça para
lavra trágica e violenta, porque exprime uma força que se er- os maus e uma grande promessa para os bons. Já vimos, no vo-
gue como espada flamejante, para derrotar definitivamente o lume Deus e Universo, que a destruição final dos primeiros, se
furibundo assalto das forças do mal. O Apocalipse se move não se converterem ao bem, faz parte integrante do próprio Sis-
num terreno de batalha, a maior do universo, aquela empenha- tema. Está, portanto, garantida a vitória dos segundos. Ela é a
da entre Deus e Satanás, na qual Deus vence. O mal deve ser vitória de Deus. O fim do mal significa também o fim da dor, e
destruído, mas ele está armadíssimo e resiste com todos os outra saída não pode haver no extremo da caminhada. Relegar
meios. Este é o maior drama do ser, em que tomam parte céu e Satanás e os maus num inferno eterno não é ato digno de Deus,
terra, fundidos na mesma tempestade e no mesmo desenvolvi- pois não podemos admitir que Sua criação possa ter, nem mes-
mento lógico. Agita-se o mundo das causas primeiras, que mo apenas em parte, um fim tão desgraçado. A esta sua destrui-
movimentam seus exércitos, constituídos de poderes imponde- ção final o Apocalipse alude, como veremos (Ap. XX: 14-15),
ráveis, que tomam forma no desencadeamento de elementos quando nos fala da segunda morte, para todos os que não foram
destruidores, manifestação da rebelião de Satanás. A estes con- achados escritos no livro da vida (Deus e o Bem).
trapõem-se outros exércitos, constituídos de potências espiritu- De outro lado, para os bons, o Apocalipse conclui com sua
ais, o braço direito de Deus, com que Ele fulmina os maus, re- felicidade e triunfo nos céus, numa exultação de aleluias diante
beldes à Sua ordem. A evolução não é tranquila ascensão pací- do trono de Deus. Esta é a inevitável solução do conflito, ine-
fica, mas luta cruenta, em que Satanás se empenha a fundo pa- vitável porque está implícita no determinismo, que, como vi-
ra permanecer rebelde e não ser destruído. mos, está implícito na perfeição da Lei. Ora, saibam os bons,
Entoa-se assim, entre o céu e a terra, uma orquestração de para seu conforto e esperança, que, quando tudo tiver sido feito
poder cósmico. Debatem-se na Terra exércitos de homens e para salvar os maus, estes, livres por sua própria natureza, se
demônios, guiados por formas monstruosas. Mas outros exérci- quiserem ainda permanecer rebeldes, serão destruídos. Então
tos lutam no céu, feitos de Anjos. As forças do bem e do mal se os bons triunfarão. Este é o conforto que o Apocalipse traz aos
medem, e só Deus, o supremo comandante, dirige a batalha. A bons. E saibam os maus que, se eles persistirem na revolta, es-
luta abarca o universo, transcende do plano físico ao plano mo- pantosas provas os esperarão, até que sejam eliminados. Este é
ral, e deste aos mais altos planos espirituais. Treme todo o edi- o aviso que o Apocalipse traz para os maus. Isto tem a função
fício do cosmos, sacudido desde os alicerces. O pensamento de de confortar os bons, para que tenham coragem e perseverem,
Deus, relampejante, guia a ação; Sua vontade emite centelhas e de avisar aos maus para que invertam a rota. São oferecidos
de cósmico poder, que, exprimindo Sua ação na batalha, cinti- assim, a cada um, todos os meios para subir até ao bem. O
lam e ferem, ora aqui ora ali, descendo até ao espaço e tempo, Apocalipse, então, se pode parecer um livro duro, de ameaças
em nosso mundo concreto, e fulminando os rebeldes. As falan- com a férrea realização da Lei, é, ao invés, um livro imparcial
ges celestes movem os elementos num desencadear terrificante, de justiça, porque, se a prova que ele prediz é uma solução trá-
em resposta à deflagração das forças do mal sobre a Terra. A gica para os maus, ela é contudo, para os bons, apenas um de-
humanidade está presa entre dois fogos, sem escapatória, fugi- serto de sofrimentos que tem de ser atravessado, para se atingir
tiva, destruída. É a hora do Juízo, a hora em que será feita justi- a inefável alegria de reviver em Deus.
ça. O mal já se aproveitou muito, e tanto se orgulhou disso, Confortem-se, pois, os bons, porque, se hoje vivemos nos
como de uma vitória sua, que ousou subir os degraus do trono duros tempos apocalípticos, eles têm do seu lado este grande li-
de Deus e desafiá-lo face a face. A medida está cheia. Uma vro, hoje, como nunca, atual, que os sustentará nas provas, com
bondade ulterior não é compatível com a ordem e o bem. A or- a visão das grandes metas que devem ser alcançadas. E consti-
dem tem de ser reconstituída, para não se acabar no caos. Os tui uma maravilha da ordem que tudo rege, que o mesmo cata-
bons, esmagados, vilipendiados e atormentados, devem ser re- clismo, enviado por Deus à Terra, possa servir para sanar e re-
erguidos à sua dignidade de filhos de Deus. Eles lutaram e de- organizar tudo – como agente de depuração do mundo, dos
ram seu sangue para reascender e, portanto, mereceram o auxí- maus, que assim são eliminados do terreno que eles infectavam
Pietro Ubaldi PROFECIAS 49
– e, ao mesmo tempo, oferecer uma prova para maior purifica- manidade torne a achar o equilíbrio que livremente violou;
ção dos bons, a fim de que possam eles, mais cedo e melhor, grande mal, condição de um bem maior.
tornar-se aptos a ascender aos planos mais felizes da vida. A “Depois a humanidade, purificada, mais leve, mais selecio-
Terra, com o homem qual é hoje, não pode ser lugar de paraíso, nada por ter perdido seus piores elementos, agrupar-se-á em tor-
tão involuído é seu ambiente. Felizes os que a consideram ape- no dos desconhecidos que hoje sofrem e semeiam em silêncio e
nas como um purgatório, para purificar-se e subir! Os bons, recomeçará, renovada, o caminho ascensional. Começará uma
portanto, nada têm a temer dos tremendos presságios do Apoca- nova era, em que dominará o espírito, e não mais a matéria, que
lipse, porque estes não lhes dizem respeito, mas só aos maus. estará reduzida à escravidão. Então aprendereis a ver-nos e ou-
Embora estejam todos misturados, juntos, Deus saberá executar vir-nos; nós desceremos em multidão e vós vereis a verdade”.
a delicada operação cirúrgica de separar os maus, salvando os ◘ ◘ ◘
bons. Estes, até exultem, porque o Apocalipse lhes recorda que, Para facilitar sua compreensão, poderemos dividir o Apoca-
por mais que na Terra reine e pareça vencer o mal, o bem é rei lipse em três partes.
do universo; que por mais cruenta que seja a luta entre Deus e A 1a parte contém avisos às sete igrejas da Ásia Menor e
Satanás, Deus é o mais forte e estes bons vencerão com Ele. abrange os três primeiros capítulos do Apocalipse.
Recorda-lhes que o dia da destruição dos maus será o dia da A 2a parte descreve a grande luta entre o bem e o mal, até à
ressurreição para os bons; que por mais que domine na Terra a chegada do prometido Reino de Deus. Este é o trecho maior do
injustiça e a desordem, há planos de vida muito mais altos, em Apocalipse, o que mais se relaciona conosco, porque toca nosso
que reina a justiça e a ordem, aonde os bons, purificando-se na tempo e o futuro próximo. Vai do capítulo IV ao XIX.
dor, chegarão. Recorda-lhes que, no fim, cada um receberá se- A 3a parte refere-se a um futuro remoto, até ao juízo final, e
gundo seu merecimento, e não de acordo com sua prepotência; vai do capítulo XX ao XXII, que é o fim.
que o verdadeiro senhor não é o homem, mas Deus; que, por Antes de ouvirmos o Apocalipse, orientemo-nos. O cami-
trás da história, está Sua sabedoria, que salva tudo do egoísmo nho da evolução do pensamento religioso humano pode dividir-
humano. Recorda-lhes que a tão invocada justiça virá e reparará se em três etapas ou idades:
todos os erros; que a tão procurada verdade surgirá e varrerá 1a idade: Deus como senhor. É a idade anterior a Cristo.
para sempre todas as mentiras. Temos um Deus forte, terrível, guerreiro, vingativo, ciumento,
Se aqui na Terra tudo é imperfeição, no Alto estão os planos protetor apenas de seu povo. É o Deus dos exércitos. Deve-se-
perfeitos de Deus. O sistema da Lei, feita de bondade, dirige tu- Lhe obediência servil, só pelo medo que inspira, sem compre-
do, e nada lhe pode escapar. Em nenhum outro livro sente-se ensão nem amor, por desapiedada lei de talião. Época violenta e
tanto, como no Apocalipse, a bondade férrea de Deus, que, no feroz, em que o homem, em seu estado involuído de egocen-
momento oportuno, impõe justiça; a Sua invencível potência, trismo estreito e de dura insensibilidade, não podia responder
que faz a ordem ser respeitada; a presença de Deus – gigantesca senão pelo egoísmo, interesse ou temor de seu prejuízo, seguin-
como na hora da criação – que retoma em suas mãos as rédeas do seus instintos de guerra, e não sabia obedecer, mas só com-
do universo, não mais para lhe dar o primeiro impulso, mas para preendia a força e o comando absoluto do mais forte. E só por
concluir a longa caminhada seguida e julgar. A luta cósmica en- isso Deus é respeitado, apenas porque é o mais forte e, como
tre o bem e o mal chega ao seu epílogo e se resolve na vitória de tal, tem o poder de punir. Não fora o mais forte, todos se revol-
Deus sobre todas as forças, que são assim reconduzidas do caos tariam contra Ele. Amor e compreensão ainda não nasceram na
à Sua ordem. Os problemas primeiros e últimos se reúnem na alma humana. Os povos não podem compreender senão a obe-
mesma solução. A última palavra do tema cósmico é o trovão do diência cega, pela força e pelo terror.
poder de Deus, é o lampejo de Seu pensamento triunfante. As- 2a idade: Deus Pai. É a idade depois de Cristo até hoje. Te-
sim a sinfonia se realiza. Sua orquestração é um perfeito proces- mos um Deus bom e mais pacífico, mais universal. Deve-se-
so lógico, em que se desenvolve o funcionamento orgânico do Lhe obediência filial, por amor e fé. Ele pune não por vingança,
universo, no transformismo evolutivo até aos planos mais altos, mas por justiça e para ensinar; conhece a bondade, a misericór-
lá onde a vida é vitória do espírito, com o triunfo final do bem. dia e a providência do pai para com seus filhos. Ele aproxima-
se de nós em compreensão e amor, conceitos que dantes eram
VII. O APOCALIPSE (2A PARTE) ignorados. Foi isto possível pela maior evolução humana, pelo
que se pode fazer apelo ao sentimento e ao coração, forças an-
Examinemos agora, mais de perto, o texto do Apocalipse. tes desconhecidas, apenas latentes, e só hoje chamadas a agir.
Lendo-o segundo o espírito, mais do que segundo a letra, ve- Pode apelar-se também para a cultura e a inteligência, e surge
remos seu verdadeiro pensamento, que é claro em suas gran- uma doutrina, uma teologia, uma reorganização filosófica.
des linhas. Esse pensamento é o mesmo da primeira mensa- Época também da codificação, trabalho destinado particular-
gem espiritual, do Natal de 1931, com que se iniciou nossa I mente para defesa e conservação das verdades reveladas. Mas
Obra. Com o Apocalipse, que apenas agora conhecemos, veri- também época de mistérios, quando se deve crer sem explica-
ficamos que ele nos repete o mesmo pensamento central que ções racionais; época dos dogmas, da disciplina obrigada do
vimos desenvolvendo desde aquela mensagem até agora, pen- pensamento, sem o que, sendo o homem o que é, não manteria
samento do qual esta grande profecia nos dá a mais clara con- a ordem. Ele não sabe ainda guiar-se de per si, por livre com-
firmação. Transcrevemos a Mensagem de Natal, outra vez ci- preensão, e necessita de uma coação, ainda que apenas moral,
tada em parte no Cap. IV: para não se perder na anarquia.
“...O homem será dominado por uma tão alargada sensação 3a idade: Deus em nós. É a idade do Reino de Deus na Ter-
de orgulho e força, que se trairá... ra, da nova civilização do III Milênio, a civilização do espírito.
“...Vejo uma elevação da tensão, lenta mas constante, que Deus sai dos templos fechados e revela-se presente em cada
preludiará o inevitável estouro do raio. A explosão é a última alma pura. Temos um Deus amigo, com quem nos unimos em
consequência de todo o movimento... Em outras ocasiões, os colaboração, porque compreendemos que fazer Sua vontade
cataclismos da história podiam ficar circunscritos, mas agora... significa nossa felicidade. Ao nos fundirmos nele, Ele se torna
“A destruição é necessária, mas será apenas destruição do mais do que vizinho a nós, porque em nós, pela evolução,
que é forma, incrustação, cristalização, de tudo que deve cair, ocorre um despertar em que adquirimos a consciência de que
para que fique apenas o conceito, que resume o valor das coi- Ele está em nós e de que nós estamos nele. Desaparecem não só
sas. Um grande batismo de dores é necessário para que a hu- as coações da força da 1a idade, mas também as morais da 2a
50 PROFECIAS Pietro Ubaldi
idade, porque o homem progrediu e tornou-se capaz de guiar-se idênticas palavras, às vezes repetidas no mesmo ponto de seu
a si mesmo, por livre compreensão, sem necessidade de cons- ciclo, autorizam-nos a entender estes quatro símbolos como ex-
trangimentos para que a ordem seja mantida. A disciplina é li- pressão diversa, segundo vários mirantes, dos mesmos aconte-
vre, feita apenas de inteligência e amor, porque o homem com- cimentos. Quisemos, por isso, emparelhar selos, prodígios,
preendeu. Caem os mistérios e os dogmas de fé, porque sensibi- trombetas e taças, para ler neles os mesmos fatos, mais bem
lidade, cultura e inteligência estão mais desenvolvidas no ho- demonstrados em aspectos diferentes.
mem, que pode intuir a verdade diretamente, por si, e sentir a Imaginemos o Apóstolo João, que já pousara a cabeça no pei-
presença de Deus, ou pelo menos entender, por meios racionais, to de Jesus e o vira morrer, imaginemo-lo velho, após uma vida
as verdades, que são todas claramente demonstradas, porque a de ação e paixão, orando a Deus de joelhos, diante das florestas
época dos véus e das exclusões iniciáticas já está terminada. Es- da ilha de Patmos, com a cabeleira desgrenhada pelos ventos do
ta será a época da luz do espírito, do conhecimento, da obedi- mar e a alma presa na tempestade imensa das vicissitudes do
ência livre, porque convicta. Por evolução, o Reino de Deus mundo. Arrebatado na imensa visão, supera o tempo e o espaço e
nascerá em nós como um despertar. Deus, então, não pune projeta seu olhar fulgurante no futuro. Olham-no os céus lumino-
mais, pois cada homem se corrige a si mesmo, pela necessidade sos do Oriente fantástico e, mais no alto, o olho de Deus, diante
de harmonizar-se com a Lei, único lugar onde reside a felicida- ao qual ele treme e se inclina, ora, humilha-se e se incendeia.
de. Época da liberdade consciente, da disciplina espontânea, da Ouve então uma voz que lhe diz: “O que vires, escreve-o num li-
convicta adesão à ordem de Deus. vro...”. E ele viu e narrou: “... e vi, e depois disso, vi...”.
Esta ascensão é lógica, como também é lógico o desenvol- Começa assim o Apocalipse. Abrem-se os céus. “Eu sou o
vimento de uma semente. Assim passa-se do terror da primeira Alfa e o Ômega, diz o Senhor Deus, o que é, foi e será o Oni-
idade, à fé da segunda e ao conhecimento da terceira; passa-se potente”. Eis que aparece a visão do trono de Deus, diante do
de um regime de força, a um de amor e, enfim, a um de inteli- qual se eleva o cântico: “Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus,
gência e espiritualidade. É um processo de libertação progressi- o Onipotente...”. João vê, na direita d'Aquele que estava senta-
va, que só pode realizar-se quando a evolução humana permite. do sobre o trono, um livro fechado e selado com sete selos. O
Tudo é função dela. As religiões não podem ser nem mais altas Divino Cordeiro toma-o da mão direita d'Aquele que estava
nem mais livres do que é a natureza humana, que abaixa tudo, sentado sobre o trono e o abre, rompendo um selo após o ou-
até o conhecimento de Deus, ao seu nível. Este último salto pa- tro. João olha e conta.
ra a espiritualização é o grande acontecimento que nos aguarda Assim, após este prelúdio poderoso, começa a desenrolar-se
no fim deste milênio e na alvorada do terceiro, é o grande acon- a história espiritual do mundo. Soam as sete trombetas, apare-
tecimento da instauração, na Terra, do Reino de Deus. É isto, cem visões terrificantes e monstros espantosos, rasgam-se os
justamente, o que nos anuncia o Apocalipse. céus, de onde chove destruição, e sete anjos derramam sobre a
◘ ◘ ◘ Terra as sete taças da ira de Deus, aniquilando os exércitos do
Comecemos, então, o exame da segunda parte do Apocalip- mal. No entanto os bons têm paciência, são escolhidos, reúnem-
se. Nos primeiros dois milênios, a obra de Cristo na Terra foi se e, enquanto ruem todas as suntuosas construções de Satanás,
uma fase preparatória para o próximo advento: o Reino de cantam por fim sua vitória no céu. Cristo, chefiando-os, triunfa,
Deus. Nesta fase realizam-se três processos: 1o) a experimenta- e Satanás é acorrentado. Verdadeiramente, as portas do inferno
ção biológica dos novos princípios do Evangelho, para que a não prevalecerão. Desenrola-se a ação ao mesmo tempo na terra
vida, evoluindo, consiga aos poucos aprendê-los e, ao menos e no céu, que se fundem num único drama. E é este seu epílogo
em uma pequena parte, adaptar-se a eles; 2o) a assimilação, para feliz: após uma luta apocalíptica, um final cósmico em que
que esses princípios novos começassem, com a repetição e a lampeja a potência vingativa de Deus. Se o livro é terrificante
técnica dos automatismos, a fixar-se um pouco nos instintos; em suas vicissitudes e pode parecer uma cruel e desapiedada
3o) a conservação do patrimônio espiritual herdado, para que as mensagem da ira de Deus, ele narra, na realidade, a história da
verdades reveladas pudessem, através das tempestades dos sé- salvação do mundo por aquela inteligência que guia tudo e se
culos, chegar intactas aos novos tempos. Desta fase preparató- impõe à multidão humana. Esta, desesperadamente, luta para
ria passa-se hoje à realização do Evangelho. Se, com a penetra- destruir tudo e perder-se, enquanto é da absoluta vontade de
ção deste na vida, pouco se fez em 2.000 anos, ele continua, en- Deus que tudo seja reconstruído.
tretanto, a amadurecer nas almas, prosseguindo em sua obra de Mas sigamos as vicissitudes mais de perto. Os selos são
elaboração interior, para que o mundo ressurja na aurora do III abertos um a um. E eis que aparecem os quatro famosos cava-
Milênio, tal como Cristo ressurgiu na aurora do terceiro dia. los do Apocalipse. Primeiro o cavalo branco; depois, no selo
Mas esta vitória dos seguidores, nos quais se personifica o seguinte, o vermelho; depois o negro e, enfim, o pálido ou ver-
pensamento de Cristo na Terra, não é pacífica. Pelo contrário, é de amarelado, quando se rompe o quarto selo. As personagens
uma luta gigantesca, que, no entanto, é apenas o momento ter- começam a aparecer em cena, mas ainda não agem, deixando-
restre de uma batalha cósmica, em que se agita e treme o univer- se apenas identificar por suas notas características. A tempesta-
so. É luta de Satanás contra Deus. O Apocalipse narra-nos suas de ainda não explodiu, e tudo está à espera. A estas quatro figu-
vicissitudes. Eis o esquema geral. Até certo momento, Deus olha ras foram dadas as mais diversas interpretações. Tentemos uma
e espera, deixando o homem livre para experimentar, a fim de também nós, mas tendo presente que, neste ponto, saímos do
que aprenda. Esta é a livre ação dos homens contra Deus (os terreno sólido da certeza, para entrar no das probabilidades.
primeiros 4 selos). Há depois a ação oposta dos amigos de Deus Ofereceremos, pois, tudo como hipótese, porque assim exige a
(5o e 6o selos). E, finalmente, há a ação direta de Deus, que, sa- mentalidade moderna. Contudo teremos em conta todas as ra-
turada a medida, intervém diretamente, de forma breve e instan- zões positivas que corroborem essa hipótese.
tânea. “Está feito”, diz o Apocalipse. O reino de Satanás foi des- Para conseguir melhor nosso intento, faremos, como disse-
truído, e Deus venceu. Esta é, nas grandes linhas, o plano da 2a mos acima, um paralelo entre estes quatro primeiros selos e os
parte do Apocalipse, de que agora nos ocupamos. correspondentes prodígios, isto é, entre o Cap. VI (1 a 8) e os
Tudo isto é expresso com 4 símbolos maiores: os selos, as Cap. XII e XIII inteiros do Apocalipse. Referiremos, mais par-
trombetas, os prodígios e as taças da ira de Deus. Esses símbo- ticularmente, à mesma primeira personagem, tudo o que se re-
los, cada um em número de sete, exprimem o desenrolar-se da laciona com o cavalo branco do 1o selo e o dragão do primeiro
ação da grande batalha. O mesmo ritmo com que avançam es- prodígio (Cap. XII). Depois referiremos à segunda personagem
ses símbolos, as várias concordâncias em seu conteúdo, e até as o que se diz do cavalo vermelho do segundo selo e da besta que
Pietro Ubaldi PROFECIAS 51
saiu do mar (Cap. XIII, 1 a 10). Enfim, referiremos à terceira Com efeito, não foi o recente poderio da Rússia devido ao
personagem o que se diz do cavalo pálido do quarto selo e da apoio inglês (dragão), que depois convenceu os Estados Unidos
besta que saiu da terra (Cap. XIII, 11 a 18). O terceiro selo (ca- a fazer o mesmo? Seguiu-se a fé fanática das massas pela ideo-
valo negro) nós explicaremos mais tarde, porque o deixamos logia comunista, e todos adoraram os vencedores: materialismo,
para o fim. Estes dois ciclos nos parecem paralelos, e sua fun- Inglaterra, Rússia. O texto prossegue: “...E abriu sua boca blas-
ção nos indicará melhor a personagem. No fim deste seu pri- femando contra Deus, blasfemando Seu nome ... e lhe foi dada
meiro período, em ambos os casos, entram igualmente em cena faculdade de fazer guerra aos santos e de vencê-los...”. O ate-
os bons, cantando hosanas diante do trono de Deus, e no segun- ísmo russo é conhecido e bem assim sua campanha antirreligio-
do caso é repetido o número exato, 144.000 dos escolhidos, sa. Importante que, depois de ter dito: “...e lhe foi dada facul-
como no primeiro. Tudo isso dá a impressão de que se trata do dade de agir por 42 meses...”5, vem a conclusão: “...se alguém
mesmo acontecimento, narrado em duas formas diferentes. tem ouvidos, que ouça. Se alguém prender alguém, acabará
Sem entrar em pormenores, coincidências e razões, que ca- preso; se matar à espada, será fatalmente morto à espada...”.
da um pode achar e analisar por si, daremos ao cavalo branco o Eis, pois, como deverá acabar a Rússia: na autodestruição. Este
valor de símbolo do imperialismo inglês; ao cavalo vermelho, conceito faz parte da Lei e do sistema ilustrado nos volumes an-
da Rússia soviética; ao cavalo negro, da Alemanha de Hitler; e teriores, conceito amplamente explicado alhures. “Quem usa a
ao cavalo pálido, dos Estados Unidos da América. Esta inter- espada, perecerá pela espada”, norma evangélica que é lei de
pretação tem a vantagem de referir-se ao momento histórico vida, que nenhuma força humana poderá deter. O Apocalipse
atual, que é o que mais nos interessa. Vejamos agora, nos selos, conclui: “...Aqui estão o sofrimento e a fé dos santos”. Os bons,
as quatro personagens em pé, até à última guerra mundial. Nos pois, tenham coragem, que o mal não pode absolutamente ven-
prodígios, o ponto de vista seria em relação ao nosso atual pre- cer. Existe a justiça de Deus, e ninguém pode detê-la.
sente, em que o cavalo negro ou a Alemanha do Eixo desapare- Observemos agora as qualidades do 3o prodígio, ou seja, da
ceu, porque caiu e foi aniquilado. Só permanecem de pé os ou- besta que saiu da terra (Ap. XIII, 11 a 18), para ver como con-
tros três, isto é, Inglaterra, Rússia e Estados Unidos, que acha- cordam com as do mesmo personagem, isto é, os Estados Uni-
mos nos rês prodígios, na forma de dragão, da besta que saiu do dos da América, expressas no 4o selo ou cavalo pálido. Vimos
mar e da besta que saiu da terra. Estas três potências são hoje as que o cavalo negro do 3o selo, ou Alemanha, desapareceu da
senhoras do mundo e guiam os acontecimentos. cena política do mundo. Essa besta é outra forma de materia-
Para justificar esta individuação, trabalho que nos levaria a lismo, que sai do poder da terra, riquezas do solo e indústrias.
um exame muito detalhado das características particulares dos Diz o texto: “...e falava como o dragão...”, ou seja, a mesma
símbolos que representam essas personagens, basta apenas re- língua inglesa; “...e todo o poder da primeira besta, ela o exerci-
cordarmos que o dragão é poderoso, no entanto se arrasta como tava diante dela...”, e apresenta já realizados, de fato, os sonhos
serpente, que é o símbolo da astúcia enganadora. A besta repre- de bem-estar do comunismo russo. “...E fez que a terra e seus
senta claramente a animalidade involuída, em antítese com o habitantes louvassem a primeira besta, de que fora sanada a
espírito, aquela para a qual apela o materialismo moderno, que chaga mortal...”. Foi pelo auxílio dos Estados Unidos que a
se baseia apenas no bem-estar do corpo. As duas personagens Rússia se tornou vitoriosa e grande. “...E fez prodígios grandio-
são apenas duas bestas diversas, isto é, duas formas de materia- sos, tanto que fez descer fogo do céu sobre a terra...”. Eis as
lismo idênticas na substância, pois apegam-se apenas às coisas fortalezas voadoras, as bombas atômicas, as novas descobertas
da Terra, única finalidade da vida. Tudo isso em antítese ao rei- científicas. “...E fará que ninguém possa comprar nem vender,
no do espírito, em que se apreciam outros valores. se não tiver a marca, ou seja, o nome da besta e o número de
Para justificar a individuação paralela correspondente ao seu nome...”. Isto é, domínio completo do dólar sobre tudo. O
dragão (Cap. XII), isto é, o cavalo branco ou Inglaterra, recor- capítulo conclui com o famoso número 666. Calculando-se se-
demos as palavras que a respeito desse cavalo diz o Apocalip- gundo o alfabeto hebraico, esse número diz Nero. Mais tarde,
se: “... lhe foi dada uma coroa, e saiu como vencedor, para foi dada a essa cifra, segundo os casos, o significado de uma
vencer”. Para a primeira besta, ou cavalo vermelho, ou Rússia quantidade de personagens históricas. Talvez seja um número
soviética, diz o Apocalipse: “... foi-lhe dado poder de tirar a simbólico, para dizer que muitas personagens igualmente más
paz da Terra, de tal forma que os homens se matassem uns aos se apresentarão até ao fim da história. Mas tudo isso é trabalho
outros, e lhe foi dada uma grande espada”. Para o cavalo ne- para adivinhos, terreno em que não podemos entrar.
gro, ou a Alemanha do Eixo, o Apocalipse fala de medida e ◘ ◘ ◘
limitação de víveres, como na última guerra bem se experi- Neste ponto, ocorre, em ambos os ciclos, uma mudança de
mentou. Para a segunda besta ou cavalo pálido, os Estados cena. Até aqui, assistimos a descrição de personagens em suas
Unidos, fala o Apocalipse de morte e destruição, e estas foram características e feitos passados. Agora temos um entreato, em
lançadas sobre a Europa a mancheias. Além disso, a corres- que entram em cena as personagens das fileiras opostas, os sol-
pondência das cores, vermelha para a Rússia e negra para o dados de Deus. Abre-se o 5o selo. Os bons apelam para que se
Eixo, são evidentes. Os Estados Unidos aparecem também no faça justiça, e lhes é respondido que ainda fiquem quietos por
último, no 4o selo, como apareceram na última guerra. breve tempo, até que seja completado o número de seus irmãos
Observemos, agora, as qualidades do 2o prodígio, isto é, da sacrificados. Ao abrir-se o 6o selo, inicia-se a preparação espiri-
besta que saiu do mar (Ap. XIII, 1 a 10) para ver se concordam tual dos soldados de Deus, para contrabalançar a preparação
com as da mesma personagem, ou seja, a Rússia Soviética, ex- material de Seus inimigos. Isto é necessário, porque se aproxi-
pressa no 2o selo ou cavalo vermelho. Besta quer dizer materia- mam as grandes provas, que explodirão ao abrir-se do 7o selo.
lismo, como vimos, e o mar significa os povos, nações, línguas Temos uma breve pausa, antes de desencadear-se a grande tem-
(Ap. XVII, 15). Depois, o texto diz: “...e vi uma de suas cabeças pestade. Tudo faz pensar que esta pausa seja a hora presente. É
como ferida de morte; mas sua chaga mortal foi curada”. Isto um momento de espera em que as forças contrárias se prepa-
poderia significar a salvação de um grande golpe que ameaçou a ram, medem-se, tomam o impulso para lançar-se uma contra a
Rússia, como em Stalingrado. E o texto acrescenta: “...e lhe deu outra. Deus olha e espera, deixa-nos realizar todas as nossas
o dragão seu poder e seu trono, e grande poder... E toda a Terra experiências, que pretendem dispensá-lo. Os maus movem-se
ficou arrebatada de admiração pela besta. E adoraram o dragão,
porque dera autoridade à besta e adoraram a besta dizendo: 5
Este período é repetido no Apocalipse, XI, 2, com as palavras:
Quem é semelhante à besta e quem pode concorrer com ela?...”. “... calcarão aos pés a cidade santa por 42 meses”. (N. do A.)
52 PROFECIAS Pietro Ubaldi
afoitos à conquista do mundo, e caminham para sua destruição. das quatro vozes (Ap. XIV, 6 a 13), há ainda um prolongamen-
Os bons oram, tremem, esperam. Deus olha, deixa todos livres, to de espera com novos anúncios. E outro anjo grita ao divino
mas tudo se escreve no livro da vida, do qual nada mais se apa- justiceiro que aparece sobre uma nuvem: “...Apanha tua foice e
ga e no qual todo o mal se paga e todo bem frutifica. A Lei não ceifa, pois chegou a hora de ceifar, porque a colheita da terra já
tem pressa, pois o tempo não pode detê-la e nada pode escapar está seca”. Outro anjo grita: “...Apanha tua foice afiada e colhe
à sua sanção. Este exame que estamos fazendo do Apocalipse e os cachos da vinha da terra, porque suas uvas estão maduras...”.
de sua orientação interessa-nos, sobretudo, porque parece dizer Então, à semelhança dos 7 anjos com as trombetas, aparecem
respeito ao nosso presente, dando-nos uma chave para conhecer outros 7 anjos com as sete taças de ouro cheias da ira de Deus.
nosso futuro próximo. Estamos num período de parada, em que Mas também aqui, como na outra narração, antes que se passe à
o homem continua suas loucuras, sem saber que a espada de ação, eleva-se um cântico a Deus (Ap. XV, 1 e seguintes), glo-
Dámocles lhe pende sobre a cabeça. Um nervosismo dominante rificando-O e adorando-O. Todas as nações se prostrarão diante
revela-nos que o instinto sente vagamente a aproximação da dele, porque manifestou Seu juízo. É a hora de prestar contas.
tremenda reação da Lei. Ninguém mais tem fé no amanhã, tão Os 7 anjos tomam as 7 taças. Enche-se o santuário de Deus da
prenhe de ameaças é o presente. Com o 7o selo, iniciar-se-á, fumaça de Sua glória e de Seu poder, e ninguém poderá entrar
com efeito, a série dos castigos, porque estamos próximos da aí até que tenham sido derramadas as 7 taças. É o momento so-
hora em que Deus, após já haver esperado bastante e ter esgo- lene em que realmente começa a desencadear-se a justiça divi-
tado os oferecimentos de salvação, terá de intervir para que vol- na, como para as 7 trombetas. Derramar-se-ão, sem interrupção
te a ordem e seja feita a justiça. sobre a Terra, as 7 taças da ira de Deus, e, a cada taça, seguir-
Na abertura do 6o selo, vemos, portanto, duas manifestações se-á um flagelo sem escapatória, numa tempestade gigantesca,
opostas. Os maus desencadearam uma grande guerra. Obra de- até à 7a taça. Tudo foi merecido. As taças são esvaziadas sobre
les, e não ainda a de Deus. Paralelamente, são escolhidos os a terra, sobre o mar, depois sobre os rios e as fontes, depois so-
bons, para formar o contraexército dos filhos de Deus. A tem- bre o sol, sobre o trono da besta e no próprio ar. Tudo torna-se
pestade procurada pelos maus toma o aspecto de um cataclismo sangue e fogo; seca, arde, adoece e rui numa queda universal. À
natural: “...E todos se esconderam nas cavernas e rochas das sétima taça, aqui também, a ação se detém, como na sétima
montanhas...”. Esta é a última tentativa para salvar-se das in- trombeta, e uma grande voz sai do Santuário, do lado do trono
cursões aéreas, que desta vez serão atômicas. De outro lado, dizendo: “Está feito”. Tudo é claro, conclusivo, inimigos de
são retidos por um anjo os ventos, para que permaneçam tran- Deus não existem mais, o drama está completo com a vitória de
quilos e nenhum dano causem, enquanto não estejam marcados Deus, o reino de Satanás foi destruído, aponta a alvorada do
nas frontes com o selo, os servos de Deus. E o número desses novo Reino de Deus. Este momento, expresso pela palavra:
escolhidos será 144.000. (Sendo este número dado por “Esta feito”, corresponde ao 7o toque da trombeta, que anuncia:
12x12x1000=144.000, e representando o número sagrado ple- “O reino do mundo passou ao nosso Senhor e a Seu Cristo, e
nário, pode significar grande multidão). Forma-se, pois, multi- Ele reinará nos séculos dos séculos”.
dão inumerável, de todas as raças, povos e línguas, diante do ◘ ◘ ◘
trono de Deus, multidão daqueles que vinham da grande tribu- Esta poderia ser uma interpretação do conceito central do
lação; e Deus estenderá sobre eles Sua tenda. Apocalipse, sobrevoando sobre os pormenores, mas apanhando
Esta cena acha sua correspondência naquela descrita em to- claramente o que há de mais importante, que se referiria de
do o Cap. XIV do Apocalipse, que segue o 3 o prodígio, da besta modo impressionante aos nossos tempos. É admissível, tam-
que saiu da terra, como vimos. Achamos aqui os mesmos bém, que numa revelação profética, proveniente, por inspira-
144.000 marcados na fronte. Repete-se a cena do cântico diante ção, de dimensões superiores, a sucessão no tempo possa ter
do trono. Estes são os escolhidos do exército de Deus. Continua sido dada de modo pouco exato em nosso plano de vida, jus-
o paralelismo num prolongamento de repouso. O Cap. XIV tamente porque o profeta não pode deixar de perceber tudo
continua com os anúncios feitos pelas quatro vozes de anjos. como num estado de concomitância. Explica-se, assim, certa
São os últimos acontecimentos antes da catástrofe: “...Temei a mistura de pormenores e a repetição da mesma visão, como
Deus, porque chegou a hora do Seu juízo... Quem adora a besta que projetada em dois tempos diferentes, que, à primeira vista,
e sua imagem e traz seu sinal na fronte ou na mão, beberá o vi- poderiam nos parecer sucessivas. De qualquer modo, apresen-
nho da ira de Deus, que está pronto no cálice de Sua ira...”. tamos tudo isto ao leitor moderno positivo apenas como hipó-
Termina aqui o entreato. Continuemos a observar as duas tese, que ele poderá controlar e também não aceitar. Mas esta
narrações em paralelo. Na primeira delas, chegamos finalmente nos pareceu a maior aproximação hoje possível de uma inter-
à abertura do 7o selo. Então houve um grande silêncio no céu. E pretação, racionalmente conduzida, do Apocalipse aos tempos
foram dadas sete trombetas a sete anjos. Enquanto eles se pre- atuais. Sozinha, esta afirmação talvez não fosse suficiente para
param para tocar as trombetas, eleva-se de um turíbulo de ouro explicá-los. Mas a corroboraremos com as previsões de outras
o incenso diante do trono, com as orações dos santos, e sobe a profecias e das Pirâmides. E, quando virmos tudo concordar,
fumaça do incenso com suas orações até Deus. É o momento permanecendo logicamente enquadrado no sistema até agora
solene em que começa o desencadear-se da justiça divina. To- explicado da Lei, estas afirmações serão mais aceitáveis, mes-
carão agora, sem interrupção, as sete trombetas, e, a cada toque, mo para o homem positivo moderno.
seguir-se-á um flagelo, sem escapatória, numa tempestade pa- A substância do raciocínio é simples e, nestes livros 6, foi
vorosa, até o 7o toque. Então, tudo muda e, assim como na aber- dita e repetida. Tudo é dirigido por uma lei que representa o
tura do sétimo selo explodirá o cataclismo (as sete trombetas), pensamento de Deus. Assim, além da pequena liberdade hu-
tudo se acalma ao 7o toque, e o 7o anjo e outras vozes anunci- mana, existe um determinismo inteligente histórico, que guia
am: “O reino do mundo passou ao Senhor nosso e ao Seu Cris- os acontecimentos. O homem hoje tomou a posição de Satanás,
to, e Ele reinará pelos séculos dos séculos”. Eleva-se uma ora- rebelde à Lei. É natural que o sistema lhe caia em cima. Expli-
ção: “Agradecemos-Te, Senhor Deus onipotente, porque assu- camo-lo no volume Deus e Universo. Dada sua orientação, o
miste Teu grande poder e começaste a reinar... veio Tua ira... e homem hoje se acha na posição de abandonado por Deus, que,
o momento de premiar Teus servos... e de destruir os destruido- no entanto, respeita a sua liberdade, não o força, mas se retrai.
res da Terra” (Ap. XI, 15 a 18). E diz: “Quereis experimentar a força? Experimentai-a. Mas
Observemos outra narração paralela. Também aqui terminou o
6
entreato e explode a catástrofe. Após as últimas advertências Referência aos livros da I Obra de Pietro Ubaldi (N. do T.).
Pietro Ubaldi PROFECIAS 53
avisei-vos de que, quem usa a espada, perecerá pela espada. examinado. Se nela alguns veem a Igreja, ou até mesmo a Vir-
Credes nos exércitos e nas armas? Provai-as. Não quereis o gem Maria, na outra veem a Grande Babilônia, mãe das prosti-
amor evangélico e só concordais numa coisa: na mentira, no tutas, ou a Roma de Nero, das 7 colinas e 7 imperadores (de
egoísmo, no trair-vos todos uns aos outros. Pagareis todos jun- Nero e Domiciano), outros veem o paganismo corrupto, outros
tos. A punição, realizá-la-eis vós mesmos, porque a trazeis em o materialismo de nossos tempos, outros, como diz o Apocalip-
vós. Matar-vos-eis reciprocamente, porque a isso vos leva vos- se, a riquíssima rainha dos mares, isto é, a Inglaterra protestan-
so próprio sistema. Quereis fazer do poder não uma função de te, vestida de trabalhismo e em conúbio com a besta. Mas, en-
vida e uma missão, mas um meio para esmagar indivíduos e quanto alguns católicos preferem ver aí o protestantismo, al-
povos? Fazei-o. Experimentai, experimentai. Sois livres. As- guns protestantes aí veem a Igreja de Roma, que lhes parece
sim vos massacrareis todos, mas, já que não sabeis aprender de haver traído a missão de Cristo a ela confiada. Para outros, a
outro modo e é preciso aprender, ireis à dura escola que esco- grande prostituta é a Europa. Olhando seu mapa virado, a partir
lhestes”. Este raciocínio lemo-lo idêntico no Apocalipse, de do Nordeste, seu perfil sobre os mares pode dar a impressão de
modo que ele parece escrito de propósito para nosso tempo. E, uma mulher sentada sobre a Rússia, que representaria a besta
se parece feroz e sem piedade, não exprime, todavia, senão a vermelha, como diz o Apocalipse, sobre a qual está sentada a
exata consequência da livre mas louca conduta humana, no grande prostituta. O braço direito seria a Itália, e com ele parece
seio de uma lei cujas reações são fatais. segurar um cálice (a Sicília), ao passo que o braço esquerdo se-
Estamos agora no termo do período experimental da Lei, ria a Inglaterra, a cabeça a Espanha, e o chapéu, Portugal. E
momento em que Deus já esperou bastante; as experiências Roma estaria no meio do braço direito. O Cap. XVII, que fala
humanas fazem-se cada vez mais desastrosas, e agora por de- da prostituta, termina com este esclarecimento: “...As águas que
mais, tornando inevitável uma intervenção superior para detê- viste, onde está sentada a meretriz, são povos e multidões e na-
las. O limite de elasticidade da Lei está quase sendo superado, ções e línguas...”. E a Rússia teria justamente a tarefa sinistra
quebram-se suas colunas protetoras e o sistema – como já ocor- de devorar a civilização europeia. Esta interpretação provém,
reu no princípio, com a revolta de Satanás – desaba sobre os re- naturalmente, de escritores do lado americano do Atlântico,
beldes, que soçobram no caos por eles mesmos gerado na or- porque todos gostam de colocar o próximo nos erros e nos cas-
dem de Deus. Soa então a hora do juízo, fazem-se as contas, pa- tigos, mas jamais a si mesmos.
ra que cada um tenha segundo suas obras e merecimentos. A Sem dúvida, em nosso tempo, a ciência conseguiu conquis-
esperada realização do Evangelho na Terra não deve ser frus- tas inauditas. O automóvel, o rádio, a televisão, o domínio do
trada por mais tempo; a perversidade e a malícia humanas não ar, a descoberta da energia atômica, e até a previsão de uma
podem mais ter, por longo espaço, o poder de tornar quase inú- possibilidade de explorações interplanetárias, representam uma
til a vinda de Cristo à Terra. A Igreja desempenhou sua missão tal conquista sobre as forças da natureza, que não se pode ima-
de conservar sua preciosa bagagem, arrastando-a após si, atra- ginar mais até onde possa chegar o homem. Há muitos elemen-
vés da tenebrosa época dos dois milênios. Hoje é mister reali- tos materiais para sustentar modos de vida absolutamente no-
zar. No Terceiro Milênio, tal como Cristo no terceiro dia, é pre- vos, num tipo de civilização de formas hoje incríveis. Os ele-
ciso ressurgir. Não basta a exceção dos santos. O Evangelho mentos-base para uma transformação radical de conceitos e há-
deve apossar-se e penetrar a vida do homem, tem que inserir-se bitos já estão em prática. Os fundamentos científicos e práticos
nas instituições sociais. Tudo nos diz que estamos na plenitude de uma nova civilização já foram lançados com um entusiasmo
dos tempos. Já foram feitos bastantes anúncios e avisos. Esta- sem precedentes, na conquista do tempo e do espaço, os dois
mos justamente nas pausas, ou entreatos, que agora estudamos grandes obstáculos ao livre movimento do homem. Sem dúvi-
no Apocalipse e que precedem o desencadeamento da tempes- da, estas conquistas materiais reagirão também sobre o estado
tade. Quando se abrirá o 7o selo e tocarão as trombetas ou, en- psíquico e espiritual da humanidade, ajudando-a a evolver.
tão, se derramarão as 7 taças da ira de Deus? E que pode o ho- Mas, infelizmente, esse aumento de poderes é uma arma de
mem sozinho contra a grande Inteligência que dirige a história dois gumes, porque, se não for acompanhado por um desenvol-
e a vida? O certo é que, se, nos planos superiores, foi reconhe- vimento paralelo de consciência no terreno moral, pode repre-
cida a necessidade de uma intervenção direta de forças sobre- sentar um novo poder imenso de destruição, colocado nas mãos
humanas e se foi decidido executá-la, ninguém poderá detê-la. de um inconsciente que, em sua inexperiência, não sabe que uso
Então a história disporá de tais forças, que poderão realizar o possa disso fazer. Com a descoberta da energia atômica, o ho-
que hoje nos parece inacreditável – a purificação da humanida- mem não se deu conta ainda de onde pôs as mãos, ou seja, de
de, custe o que custar, isto é, a formação de novas correntes de haver penetrado tão próximo à substância das coisas, a ponto de
pensamento e de diferentes tipos biológicos dominantes, que se apossar da técnica da criação. Assim seus poderes cresceram
tomarão posse no seio de uma nova civilização do espírito, no sem medida, e se ele pode tirar vantagens proporcionais para seu
III Milênio. O que está fora de dúvida é que, acima das forças bem, pode também sofrer dano, para seu mal. E é tão grande o
do mundo físico conhecido pela ciência, há um mundo de for- novo poder, que lhe pode escapar das mãos inexperientes, sem
ças que ela ainda ignora. Também está fora de dúvida que o que lhe seja possível mais controlá-lo depois. E que dizer quan-
homem é uma pequenina formiga, agarrada a um grão de poeira do esse poder não está, hoje, nas mãos dos sábios, mas de go-
cósmica, e nada pode contra essas forças. E é, outrossim, fora vernantes que, por sua própria posição, estão enredados nas tris-
de dúvida que nós não podemos negar a priori a possibilidade tes artes da política? Que dizer quando se sabe que esse poder
de acontecer em nosso tempo tudo o que o Apocalipse prediz. está à mercê do egoísmo, do ódio, do interesse, do desencadear
Como negar, mesmo cientificamente, que não pode haver rela- das mais baixas paixões? Que garantia de sabedoria podem ter, a
ção entre forças morais e físicas? E quem pode dizer que a hu- esse respeito, governantes que só chegaram ao poder suprimindo
manidade não esteja cometendo erros no terreno espiritual? os próprios rivais e mantendo-o com o terror? Se essa é a psico-
Como afirmar que os poderes do pensamento não dirijam o logia dos senhores dessas forças, pesa verdadeiramente sobre o
mundo? E então, aos céticos, poderemos dizer: “E se tudo o que mundo uma espada de Dámocles, suspensa por um cabelo.
afirma o Apocalipse fosse verdadeiro?”. Se esse cabelo arrebenta, é a guerra. E a guerra de hoje tem
A visão da grande prostituta (Ap. XVII) é apenas um co- as seguintes características: 1o) ameaça todos, mesmo os civis.
mentário e uma determinação de toda a visão. Esta mulher é a É pois, também, guerra de nervos, é perigo e terror para todos;
contraposição daquela vestida de sol, com uma coroa de doze 2o) morrem todos, indistintamente, mesmo os inermes, numa
estrelas, contra a qual luta o dragão do primeiro prodígio, acima hecatombe comum; 3o) é guerra em três dimensões; 4o) é guerra
54 PROFECIAS Pietro Ubaldi
de todos os povos, porque mesmo os longínquos não- vida, foi lançado no lago de fogo” (Ap. XX – 14 e 15). Há,
beligerantes se ressentem e saem dela com algum dano ou so- pois, uma absoluta destruição final, em que são anulados tam-
frimento; 5o) é guerra de extermínio total, de aniquilamento, bém a morte e o inferno, uma segunda morte, última e definiti-
sem escapatória, em extensões vastíssimas. va, onde são precipitados todos os que não foram achados escri-
Se arrebenta o cabelo da espada, ela cairá na cabeça da hu- tos no livro da vida. E a vida é Deus. Então isto significa que
manidade. Essas condições são catastroficamente ameaçadoras aqueles não eram da parte de Deus e do bem. Eles são elimina-
e jamais se verificaram na história do mundo. Não serão estes dos do sistema, anulados mesmo como espíritos. Esta não é a
os sinais indicadores da plenitude dos tempos, como dizem as habitual morte do corpo, não é a normal decadência de todas as
profecias? Mas elas também dizem outra coisa: “Ora, quando coisas, para renovar-se e evoluir. Não é a costumeira morte
estas coisas começarem a acontecer, olhai para o alto e levantai temporária, de que tudo ressurge. Esta é a segunda morte, a de-
vossas cabeças, porque vossa redenção está próxima... Quando finitiva: a morte do espírito7.
virdes acontecer estas coisas, sabereis que o Reino de Deus está Chegamos ao limite da Lei, à hora em que o ciclo involu-
próximo” (Lucas XXI, 28 e 31). Então esses sinais prenuncia- ção-evolução se fecha com o regresso a Deus, a cadeia das re-
dores de acontecimentos espantosos também anunciam outra encarnações termina, a caminhada da ascensão – concedida por
coisa: a plenitude dos tempos, no sentido de que deve chegar à Deus ao ser decaído para ele redimir-se – está completa, a pos-
Terra o Reino de Deus, isto é, deve realizar-se o novo modo de sibilidade de erro e a necessidade da expiação cessam. Está na
viver no tipo da civilização do III Milênio. Estamos, portanto, lógica do sistema que a experiência não possa ser procrastinada
verdadeiramente na época extraordinária da qual falam as pro- até ao infinito, que o ser não possa ter à sua disposição a mise-
fecias, que culmina numa transformação radical do mundo. ricordiosa elasticidade da Lei e a paciência de Deus para sem-
Mas há ainda outro fato indicador, outro sinal dos tempos: é pre. Dentro da ordem que tudo dirige, seria um absurdo inad-
a queda dos mistérios. Estes, aos poucos, são todos explicados e missível que se concedesse à liberdade humana a capacidade de
aclarados pela ciência. Então poderemos repetir as palavras de sobrepor-se à Lei e substituir-se a ela, ultrapassando os limites
S. Paulo na Epístola aos Hebreus (X – 26, 27 e 31): “Se peca- das próprias funções – somente em razão das quais é admitida a
mos voluntariamente, após ter conhecimento da verdade, não liberdade – e subvertendo eternamente aquela ordem. Deve
há mais sacrifício pelos pecados, mas uma espantosa expectati- chegar a hora em que termina o tempo máximo concedido para
va do juízo... É coisa espantosa cair nas mãos do Deus vivo”. que o caminho da evolução tenha sido percorrido por aqueles
Quando tudo estiver esclarecido e evidente, quem não quiser que o quiseram percorrer; o tempo em que todos os auxílios já
aceitar as verdades do espírito e obedecer à Lei, não poderá foram dados e todas as possibilidades se esgotaram; a hora em
mais achar misericórdia, porque não a merece. que são feitas as contas e ficam de fora aqueles que, mesmo
Poderão mudar e ser imprecisos os pormenores das previ- tendo podido, absolutamente não quiseram redimir-se. Então,
sões políticas, mas é certo que o povo, grupo ou instituição que tudo está terminado, pois o processo evolutivo atingiu sua con-
tiver pecado terá de pagar. Esta é a inevitável lei . Cada um po- clusão. Detém-se assim o tornar-se fenomênico; cada fenômeno
de deleitar-se em fazer exame de consciência de outrem, antes não se prende mais ao seguinte e alcança finalmente sua última
que de si mesmo, mas a Lei permanece a mesma. É inútil ter e definitiva fase, resolvendo-se na estase, porque o processo do
poder terreno, se há injustiça no espírito. Esse poder não poderá vir a ser se esgotou e não há mais anéis no encadeamento cau-
defender-nos e ruirá diante da Lei, que quer justiça. Assim con- sa-efeito. Então, para o transformismo no tempo, termina toda
clui o Apocalipse, no Cap. XVIII: “Ai, ai da grande cidade, Ba- possibilidade de recuperação e a escola se fecha.
bilônia, a cidade forte! Num momento chegou o juízo!... Num Já então, por não terem mais sentido nem objetivo, acabam
momento, sua magnificência ficou reduzida a um deserto! Ale- a morte, a dor, os estados de castigo, o inferno. Esgotado o pa-
grai-vos sobre ela, ó céus, e vós santos e apóstolos e profetas, rêntese da revolta e da desordem, tudo tem que voltar ao estado
porque vos fez justiça Deus, com Sua condenação!”. perfeito da originária felicidade, como Deus quis sua criação. O
Paralela a essa ruína do mal, corresponde o triunfo nos céus ciclo da queda e ascensão está todo percorrido; quem quis re-
(Ap. – XIX). A ruína na Terra foi completa. A voz de uma mul- dimir-se alcançou sua salvação e, mesmo tendo errado, apren-
tidão imensa se eleva gritando: “...Aleluia. O Senhor fez justi- deu a grande lição do bem e do mal. Quem não quis redimir-se
ça... Louvai nosso Deus!... porque o Senhor Deus começou a – dado que ninguém pode ser constrangido e que o rebelde não
reinar”. Chegamos ao epílogo, que é a vitória de Cristo. Satanás poderia permanecer indefinidamente aí e corromper o sistema –
é acorrentado. Pode finalmente realizar-se na Terra o anunciado vem a ser definitivamente expulso, com o aniquilamento de seu
Reino de Deus. Tudo isto é de uma lógica constringente. Não é eu. Então é lógico que tudo o que, num universo decaído, era
possível que o bem fique vencido pelo mal; que Deus seja sub- necessário para permitir o retorno a Deus – todos os instrumen-
metido por Satanás; que a missão de Cristo na Terra naufrague tos úteis para realizar a obra de reconstrução – não tendo mais
assim, sem nenhum resultado. O próprio sistema da Lei tem objetivo de bem nem razão de existir, seja eliminado, da mesma
uma lógica e, se algo assim acontecesse, todo ele ruiria, o que forma que se tiram de um edifício construído os andaimes que
seria uma ruína muito mais fragorosa e desastrosa do que a foram necessários para executar os trabalhos.
queda das potências do mal, como a descrita no Apocalipse, Deus só pode ser vencedor absoluto e não poderia sê-lo com
pois, se estas ruírem, permanecem a salvação e a vida na ordem inimigos acorrentados, que eternamente clamassem contra Ele a
divina, mas, se a Lei ruir, isto é, se o sistema de Deus e do bem voz de sua maldição, intentando uma revolta. Numa ordem per-
cair, resta apenas a destruição de tudo, com a precipitação de- feita, como deve ser a obra divina, a lógica impõe não só a ab-
finitiva do universo no caos. soluta vitória de Deus, mas também a completa impossibilidade
O grande drama do Apocalipse está em seu epílogo, no fe- da dissonância de vozes rebeldes, ainda que afastadas. Isto sig-
chamento de sua terceira parte, com a grandiosa cena da ressur- nificaria a presença, no próprio seio de Deus, de um tumor ma-
reição dos mortos e do Juízo Universal. Satanás, então, está de- ligno à espera de arrebentar, pois Deus é o todo, de onde nada
finitivamente derrotado. Diante do trono de Deus comparecem se pode tirar porque recairia em Deus. E, se nenhuma coisa po-
os mortos. Abre-se o livro da vida, em que tudo está escrito, e de existir fora de Deus, que é o todo, como poderia ficar em
cada um é julgado segundo suas obras. O mar entrega os seus Deus uma zona de anti-Deus? Além disso, num universo em
mortos. A morte e o inferno entregam seus mortos. Depois “...a
morte e o inferno foram lançados no lago de fogo; esta é a se- 7
Isto foi explicado no volume Deus e Universo, que aqui o Apocalipse
gunda morte. E aquele que não foi achado escrito no livro da confirma (N. do A.).
Pietro Ubaldi PROFECIAS 55
que só achamos fenômenos que tendem a resolver-se, o fato da do-se mutuamente, corrijam os erros através de uma compen-
sobrevivência eterna de individuações personalizadas das for- sação. No absoluto, porém, um Deus que não fosse senhor e
ças do mal seria o único fenômeno que permaneceria incomple- vencedor incondicional seria um absurdo. Por isso o extermí-
to, sem conclusão, tanto no sentido positivo, de vitória, como nio do mal deve ser completo até às raízes do ser, no ponto em
no sentido negativo, de derrota absoluta e definitiva. Mas este que se diz: “eu sou”, de modo que o mal não possa mais levan-
fenômeno, assim como todos os outros, está inserido no trans- tar-se. O tempo das lutas deve terminar sem a possibilidade de
formismo universal, ou tornar-se evolutivo, não havendo, por- volta. Nem as cinzas do incêndio destruidor do mal devem
tanto, razão para que ele se comporte diferentemente. permanecer para recordar esse triste passado, porque até esse
Não sabemos explicar essa concepção da sobrevivência do mínimo resquício inquinaria e tornaria incompleta a perfeição
mal em forma de prisão, senão como uma projeção antropo- do Absoluto, a que tudo regressa no fim. Sobreviverão somen-
mórfica do relativo no absoluto, produto da psicologia humana te os puros que assim permanecerem e os decaídos que se puri-
transportada para um mundo que ela não pode alcançar. Essa ficarem, todos então em igual estado de pureza.
concepção pertence à miséria das vitórias humanas, caducas e Com isto, o Apocalipse dá uma nova confirmação das teori-
encadeadas a novas derrotas. Encontrando-se no vir-a-ser, é as do volume Deus e Universo. No Apocalipse, tornamos a
concepção filha do transformismo e está fechada dentro desse achar todos os motivos do Sistema: a revolta originária, que se
limite, além do qual não tem mais sentido e não pode subsistir, perpetua nos maus, o dualismo bem-mal, Deus-Satanás, a des-
pois aí se resolvem e cessam o tornar-se e o transformismo. É truição final do mal e o triunfo total de Deus. O Apocalipse nar-
preciso compreender que, ultrapassado esse limite, entra-se no ra o caminho do ser rebelde que volta a Deus, concluindo com a
absoluto, no imóvel perfeito, onde todos os conceitos e pontos vitória final do Sistema sobre o Anti-Sistema. Se a ascese se
de referência do nosso relativo, fundamentados no tornar-se desenvolve numa grande luta, na qual Deus permite ao mal
em busca da perfeição, caem. Nesse mundo superior, é lógico agir, a fim de que sejam oferecidas a ele todas as oportunidades
que não podem subsistir nossas concepções. As vitórias do ab- para, com a experimentação, subir ao bem; se o Apocalipse po-
soluto não podem ser iguais às do relativo. Os triunfos de de parecer aos maus um livro de terror, porque afirma condena-
Deus, diferentemente dos nossos, só podem ser absolutos, re- ção inexorável, ele é, no entanto, um livro de justiça para todos
solutivos e definitivos, sem possibilidade de reações e continu- e constitui para os bons uma mensagem de alegria, porque ex-
ações de luta. Assim, dado que a vitória de Deus é absoluta, o prime o desenrolar-se do processo evolutivo do mundo, até à
inimigo, no fim, não deve existir mais. A mera existência dele, reconquista da felicidade originária, até ao triunfo absoluto dos
mesmo que acorrentado, seria não só uma perturbadora sobre- bons no bem e na glória de Deus.
vivência de desordem mas também, por menor que fosse, uma
vitória e testemunho da revolta, ainda que latente; seria a exis- VIII. NOSTRADAMUS, MALAQUIAS, ASTROLOGIA,
tência da vontade de negação num sistema afirmativo, uma AS PIRÂMIDES, DANIEL
prova de imperfeição e, portanto, de obra incompleta. É neces-
sário que, no fim, as individuações das forças do mal, se quise- “Não desprezeis as profecias: examinai tudo. Retende o que
rem permanecer assim, devam ser desintegradas como perso- for bom”.
nalidade própria, para que a divina substância espiritual que a S. Paulo, I Epístola aos Tessalonicenses, V: 20-21.
constitui possa abandoná-la e canalizar-se na corrente oposta
do bem, o vencedor absoluto. É assim que aquele “eu sou”, Vejamos agora o que nos dizem, em relação aos nossos
como diz e nos confirma aqui o Apocalipse, chega a não exis- tempos, alguns profetas mais conhecidos. Michel Nostradamus
tir mais na segunda morte, vendo-se anulado até mesmo como nasceu em Provença (França), em 1503. Dele temos um milhar
espírito. Não há solução mais lógica do que esta, porque racio- de profecias, em dez centúrias, que começaram a ser publicadas
nalmente conclui segundo os princípios do sistema; mais cabal em 1555. Muitas delas foram logo se realizando, dando fama a
e definitiva, porque resolve tudo para sempre; mais harmônica, seu autor. Embora não use muito a simbologia, como no Apo-
equilibrada e justa, porque os negadores de Deus, que é vida, calipse, o texto aparece obscuro e o sentido velado. Isto porque,
são na morte negados por Deus. Não há solução mais grave e para os homens, além de não ser bom saber o futuro, também
conclusiva, no entanto também mais piedosa, porque é a única pode ser perigoso conhecê-lo. Eles querem ter êxito em seus in-
compatível com a bondade de Deus, que não quer ser cruel tentos, não toleram oposições de mau augúrio e, acreditando
nem vingar-se, pois Seu único escopo é a felicidade do ser e poder com isso deter o destino, perseguem e até, se puderem,
Seu princípio fundamental é o amor. suprimem o profeta que lhes anuncia sua derrota.
Assim conclui também o Apocalipse. A destruição final do Estas famosas centúrias astrológicas começaram a ser es-
mal e das individuações que o personificam já havia sido por critas em 1547 e chegam a predizer até o ano 2001. Interes-
nós sustentada nos volumes precedentes. Agora voltamos a ela sam, pois, também aos nossos tempos. Se bem que o cálculo
com esta nova confirmação, depois que o longo caminho as- dos anos seja feito com uma contagem diferente da nossa, o es-
censional através destas obras nos levou a um conhecimento tabelecimento das datas foi possível com base em cálculos as-
mais profundo e a um amadurecimento mais avançado. Vemos trológicos, de acordo com o Zodíaco, medindo as posições dos
agora, plenamente, a férrea lógica e a absoluta necessidade planetas e constelações. Ora, sem entrar no emaranhado dos
deste conceito, pois, se, no final, permanecesse no universo a pormenores, estes últimos 50 anos de nosso milênio são anun-
menor partícula ou traço de mal e da dor que lhe está ligada, a ciados nessa profecia como dramáticos: guerras, invasões, re-
criação ficaria inquinada e sua perfeição arruinada, tornando- voluções internas e perseguições religiosas. Entrariam em ação
se manchada e falida a grande obra de Deus, numa forma in- vários Anticristos. Virá uma ideologia horrenda, e a Igreja de
conciliável com o conceito de Divindade, que só pode ser per- Roma será perseguida. Na Itália dominará um chefe vermelho
feita. Em Deus não há lugar para o incompleto e para o relati- e um falso papa. O verdadeiro fugirá, talvez o “Pastor et Nau-
vo, pois tudo Nele deve ser completo e absoluto, até mesmo a ta”, de Malaquias. A Europa estará à mercê das guerras e da
vitória sobre o mal. O governo do universo é e deve ser totali- desordem e assistirá ao fim da Inglaterra. Em 1999 haverá a úl-
tário e absoluto, porque está nas mãos de um ser perfeito. Tais tima invasão asiática. O Anticristo é uma força, é a doutrina
governos, na Terra, são inadmissíveis, porque não existe o ateu-materialista, a ideia anticristã, que na história vai sendo
homem perfeito, condição que se procura remediar com a mul- personificada em vários indivíduos, mas com as mesmas fina-
tiplicação do número de dirigentes, para que estes, controlan- lidades, tal como no Apocalipse. Essa força está contra toda
56 PROFECIAS Pietro Ubaldi
concepção espiritual, que ela quer destruir. Seu método é a de- formações hoje incríveis e impossíveis, ou seja, mudanças radi-
sordem, seu objetivo é desorganizar tudo, sua verdadeira meta cais daquelas condições atrasadas que, no entanto, são hoje ine-
é o caos. São os princípios de Satanás. As forças do mal estão vitáveis devido ao grau ainda involuído da maioria.
claramente individuadas. Chega-se, assim, com vários perío- ◘ ◘ ◘
dos e episódios, ao fim do século. Com esse dramático final, Também Ana Catarina Emmerich diz que, 50 ou 60 anos
terminam as profecias de Nostradamus. antes de 2.000, Lúcifer seria posto em liberdade durante aquele
◘ ◘ ◘ tempo. Mais ou menos, anunciam as mesmas coisas as revela-
Muito mais antigo que Nostradamus é o monge irlandês ções de La Salette, publicadas em 1870. Mas observemos o que
Malaquias, nascido em 1094. Ficou famoso por ter compilado diz o Zodíaco. Não é absurda a teoria das correspondências psi-
um “Lignum Vitae”, em que se acha um elenco de cento e onze cocósmicas, tanto para os indivíduos como para os povos. Não
pontífices, desde o papa Celestino II (1143) até ao último papa, se pode excluir, a priori, a possibilidade de uma astrologia
Pedro II, o Romano. Cada papa é definido não pelo nome, mas mundial, que defina o horóscopo, não de indivíduos, mas da
por um dístico característico, que os individua pelo tempera- humanidade, fixando os acontecimentos históricos em relação
mento, posição histórica e feitos mais notáveis. Achamos assim aos movimentos e posições estelares e planetárias. Sem dúvida
delineados também os mais recentes e os próximos futuros: existem harmonias no universo, ressoando umas nas outras, em
Pio IX – Crux de Cruce; Leão XIII – Lumen in coelo; Pio ritmos de ondas e retornos, que são o pulsar harmônico do pen-
X – Ignis ardens; Benedito XV – Religio depopulata; Pio XI – samento da Lei. Tudo o que existe faz parte de um grande or-
Fides intrepida; Pio XII – Pastor Angelicus, o papa atual. ganismo, onde a ordem reina e cada parte, como no corpo hu-
Teremos, depois, os últimos seis da cristandade: mano, está em seu lugar, com sua função determinada. Ora, o
1 – Pastor et nauta; 2 – Flos florum; 3 – De medietate Zodíaco nos anuncia, para as proximidades de 2.000, o fim da
lunae; 4 – De labore solis; 5 – De gloria olivae; 6 – Petrus época colocada sob o signo do Peixe e o ingresso na era de
Romanus.8 Aquário, e já vivemos sob a influência de sua aproximação.
Pastor et nauta talvez signifique viagens e proveniência de Cada signo do Zodíaco é geralmente terminado com o caos, de
longe. Flos florum pode significar um reflorescimento de ho- onde surge novo tipo de vida, que parece renovar-se assim.
mens bons, tal como uma leva de mártires, ou seja, ao invés de Quem pode dizer se as subterrâneas maturações biológicas não
vitória do bem, perseguição. De medietate lunae mostra-nos a querem produzir hoje um ser mais evoluído e que o ser atual se-
Igreja dilacerada por um cisma, um antipapa, como já dizia ja apenas o último produto de uma era em decadência? Isto é
Nostradamus, isto é, tempos muitos difíceis. De labore solis, menos absurdo hoje do que já o foram, há cem anos, o avião, o
trabalho quer dizer esforço e sol significa verdade, ou seja, tra- rádio e a televisão. Quem sabe se, nas leis da vida, tudo isto já
balho forte para fazer triunfar a verdade, esforço de que tam- não esteja escrito e, no mistério de seus inexauríveis recursos,
bém nos fala Nostradamus. De gloria olivae, a oliveira é o já não esteja germinando em segredo uma nova sensibilização
símbolo da paz. Mas será essa calma que precede o furacão, ou psicoespiritual, pela qual deverão mudar nossas formas de vida
talvez a realização da conversão dos judeus ao Cristianismo, individual e social? A história tem suas curvas! Como excluir a
predita por S. Paulo? Petrus Romanus, o dístico completo diz: priori que esta não seja uma delas? E, se justamente o nasci-
“na última perseguição à sagrada Igreja romana, reinará Pedro mento de um novo tipo biológico assim for necessário para que
Romano, que apascentará o rebanho entre muitas tribulações; se possa realizar na Terra o esperado Reino de Deus, como pro-
passadas estas, a cidade das sete colinas será destruída e o tre- ibir à vida que isto aconteça? Não é lógico que, num organismo
mendo juiz julgará o povo”. universal, a vida trabalhe harmonicamente, do plano físico ao
O último pontífice seria, pois, Pedro II, o único que traz o psíquico, com as forças espirituais das religiões?
nome daquele que depois foi chamado o primeiro. Faltariam seis O fim deste século está dominado por um conflito astrológi-
papas para chegar ao final dos tempos. Pode-se calcular que ca- co entre dois planetas: Saturno, conservador e tradicionalista, e
da papa, em média, governe 9 anos. O tempo pode ser suficiente Urano, inovador e revolucionário. Conflito, pois, entre as ten-
para contê-los, dado que faltam quase 50 anos para 2000. Ape- dências negativas, destruidoras e materialistas daquele, e as ten-
nas cerca de meio século nos separariam de Pedro II e do fim do dências positivas, construtoras e espirituais deste. Violência de
papado. E, aqui também, tudo coincide com o Apocalipse. um lado, bondade do outro. O fim de nosso signo de Peixes é
Acrescente-se ainda uma estranha coincidência: na basílica de bastante atingido por contrastes e muito atribulado, mas o futu-
São Paulo, em Roma, onde se encontram os medalhões de todos ro, sob o próximo signo de Aquário, apresenta-se com caracteres
os papas até hoje, há espaço vazio para apenas mais seis. E isto benignos, opostos ao precedente. O momento é grave e está sa-
coincide com a profecia de Malaquias. De tudo isto valeram-se turado de grandes forças em conflito, é perigoso e até mesmo
os inimigos do cristianismo para prognosticar o fim do papado. doloroso, mas rico de imensos recursos e possibilidades futuras.
Mas isto não quer dizer fim da Igreja, assim como fim do mun- Esta hora não é de paz, mas de tempestade, da mesma forma que
do não significa fim de tudo, mas apenas nascimento de um é também a hora dos grandes homens, dos grandes rasgos e es-
mundo diferente. Pode perfeitamente mudar a forma da organi- forços, das grandes criações. “Durch stum empor” (elevar-se
zação eclesiástica ou desaparecer totalmente, numa civilização através da tempestade), dizia Beethoven. É verdadeiramente a
mais espiritualizada. Neste sentido, termina a “Visão”, que está ruína de uma época, o fim de um mundo, para dele fazer outro
no centro do volume A Nova Civilização do Terceiro Milênio9. melhor; o fim de um tempo, para recomeçar um novo tempo.
Então, não podíamos saber destas coincidências. Sem dúvida “Este é o século em que se estabelecerá o Reino de Deus na Ter-
que a frase: “Haverá um só rebanho e um só pastor”, não pode ra”, escreveu Bahá'u'lláh, o profeta filho do Irã (1817-1892). Te-
significar um imperialismo religioso sob um chefe terreno, mas remos cinquenta anos de lutas e de esforços, e em 2.000 surgirá
apenas uma fusão de almas sob Cristo, supremo chefe espiritual. a aurora da nova civilização do espírito, para o III Milênio.
Em uma nova civilização, de tipo espiritual, é lógico que especi- ◘ ◘ ◘
almente a religião se espiritualize e que se possam realizar trans- Ouçamos agora os estudiosos das Pirâmides. A Esfinge
maior que se conhece, com 60 metros de altura, surge na pla-
8
Como o presente livro foi escrito em 1953, podemos hoje (1998) atua- nície de El Giza, no Baixo Egito, entre as pirâmides de Quéops
lizar esta lista: Pastor et Nauta: João XXIII, Flos Florum: Paulo VI, De e de Quéfren, como que a guardar um grande segredo. São três
medietate lunae: João Paulo I, De labore solis: João Paulo II (N. da E.). as Pirâmides: de Quéops, de Quéfren e de Miquerino, e a pri-
9
Volume 7 das Obras Completas de Pietro Ubaldi. (N. da E.) meira, a maior, pode definir-se como um livro de pedra, onde
Pietro Ubaldi PROFECIAS 57
está escrita a história da humanidade. Parece, com efeito, que exprime Deus, a mente dirigente do universo E o conjunto 4 e 3
aquela pirâmide não foi apenas túmulo de um rei, mas que, por forma o 7, número mítico. Também ele parece exprimir o ritmo
meio dela, os antigos egípcios quiseram revelar aos porvindou- de outra lei. São sete os dias da semana, as notas musicais, as
ros o futuro, transmitindo-nos, numa linguagem de pedra e cores do arco-íris, as virtudes, os pecados, os selos, os anjos com
com medidas simbólicas, correspondentes a futuras datas his- as trombetas, as taças da ira divina no Apocalipse etc.
tóricas, uma mensagem que se refere a nós, nos tempos atuais. Assim, já no seu exterior, a pirâmide de Quéops parece cheia
Interessa-nos, pois, procurar compreender essa mensagem, pe- de simbolismos. Mas é em seu interior que o pensamento dos
la qual os sacerdotes e astrólogos que dirigiram a construção grandes sacerdotes do Egito, que idealizaram o monumento, foi
quiseram imprimir na pedra uma expressão geométrica do de- mais completo. Na fachada norte da pirâmide, no 16o degrau, há
terminismo histórico da Lei. Os egiptólogos acreditam que es- uma entrada que leva a um corredor descendente. Este se divide,
sa pirâmide tenha sido construída entre 2.500 a 3.000 anos an- depois, em outros corredores, ascendentes, descendentes e hori-
tes de Cristo. A última data da mensagem escrita é o ano zontais, que terminam em várias câmaras. Não há inscrições. As
2.001. Estão, pois, previstos, desde época bem remota, os pedras são tão unidas, sem argamassa, que é impossível introdu-
acontecimentos hodiernos e os precedentes. zir entre elas a lâmina de um canivete. Do comprimento, altura,
Seriam os egípcios sábios o bastante para abarcar com um inclinação e número de degraus na estrutura dos corredores e
olhar 5.000 anos de história e prever a tanta distância de tem- câmaras, pode-se calcular o significado profético que essas me-
po? Parece que sim. Eles conheciam tanto as leis como os lados didas indicam. Elas correspondem às datas principais da história
ocultos da vida, que escapam à nossa ciência positiva. E tam- da humanidade. A altura do corredor significa o desenvolvimen-
bém eram cientistas no sentido moderno. Essa pirâmide está si- to da humanidade: quando é alto, traça um período de progresso;
tuada, com a máxima aproximação possível, no ponto central quando é baixo, uma fase de descida.
da massa global terrestre. Revela a distância mínima exata do O corredor descendente de entrada, após breve trecho, divi-
Sol à Terra e o diâmetro polar de nosso planeta. Sua orientação de-se em dois: um ascendente e outro descendente. De acordo
Norte-Sul é exata. É o primeiro meridiano, mais perfeito que o com o Livro dos Mortos, este primeiro trecho representaria um
de Paris ou de Greenwich, porque atravessa o máximo de con- período de preparação da humanidade, desde a época da cons-
tinentes e o mínimo de mares, separando em duas partes iguais trução da pirâmide, até ao ponto desta primeira bifurcação, que
a terra habitada do globo. A pirâmide exprime o ano sideral, o exprime o êxodo dos hebreus. O corredor descendente seguinte,
valor exato de π: 3,1416, o valor de nosso metro linear, as posi- que termina em uma câmara debaixo da terra, significa a degra-
ções e os ciclos das estrelas, etc. Não é, portanto, absurdo que dação do homem, que, recusando-se a cumprir o esforço da
os egípcios, conhecendo então tudo isto, pudessem conhecer evolução, decai cada vez mais na matéria, o fim reservado às
também o desenvolvimento dos ciclos históricos. Estudando as forças do mal, como já vimos. A câmara subterrânea onde ter-
pirâmides, conclui-se que seus construtores conheciam também mina este corredor fica muito abaixo dos alicerces e está cons-
os períodos da civilização egípcia, hebraica e cristã. truída de cabeça para baixo: o teto é liso e o pavimento é de pe-
A pirâmide de Quéops tem 137 metros de altura. Tinha um dra vermelha. Segundo o Livro dos Mortos, isto significa a
revestimento de calcário claro, que a fazia resplandecer ao sol. eterna subversão dos valores, porquanto, revoltando-se contra
Foram necessários 10 anos para construir os alicerces e 20 para Deus, caminha-se e acaba-se de cabeça para baixo.
levantar a pirâmide. Trabalharam nela 100.000 homens, renova- Sigamos agora o corredor ascendente. Ele vai desde o êxodo
dos de três em três meses. Calcula-se que, para construí-la, fo- de Israel até uma segunda bifurcação, que exprime o nascimen-
ram empregados mais de dois milhões e meio de metros cúbicos to de Cristo e representa o início da espiritualidade. Neste pon-
de calcário, com o peso total de seis milhões e meio de tonela- to, inicia-se em frente o corredor horizontal, que vai até à câma-
das. Esta pirâmide não tem ponta. Na Bíblia, há muitas referên- ra da rainha, e um pouco mais no alto, num ponto a pequena
cias à ponta da pirâmide, à pedra angular, como símbolo do distância mais adiante, que assinala o ano da morte de Cristo,
Messias. Ele teria vindo, teria lançado sua mensagem moral, 33 DC, abre-se para cima a Grande Galeria, com 50 metros de
mas os homens não o teriam ouvido. Assim, os construtores não comprimento e quase 9 metros de altura, que leva à câmara do
puseram ponta na pirâmide de Quéops. As outras têm ponta. rei. Esta galeria assinala um período de progresso, devido à luz
A mensagem desta pirâmide fica mais compreensível se do cristianismo e da ciência. O salto para o alto coincide com a
comparada com o Livro dos Mortos. Com efeito, este e aquela crucificação de Cristo. Este corredor termina com os nossos
mensagem foram os maiores documentos que nos transmitiu a tempos e chegaria justamente a agosto de 1914, isto é, à I Guer-
Antiguidade egípcia. Há neles uma fundamental identidade de ra Mundial. Neste ponto, a mensagem torna-se mais pormeno-
conceitos. Agora, penetremos na pirâmide, em sua estrutura in- rizada, indicando a plenitude dos tempos em que se realiza. No
terior de câmaras e corredores, para ler a mensagem geométrico- fim do grande corredor, temos com efeito um degrau na abóba-
astronômica, dirigida aos povos futuros. O conjunto externo já da, onde esta se abaixa. Para passar por aí, é mister curvar-se.
no-la anuncia na forma do monumento. Há uma lei quaternária Este é o primeiro abaixamento, depois do qual o corredor se le-
que dirige o mundo. Pode-se dizer que toda a vida, em cada fe- vanta novamente, o que significa uma retomada do progresso.
nômeno, obedece a um ciclo de quatro fases: nascimento, de- Depois, o corredor se abaixa mais uma vez, sendo novamente
senvolvimento, madureza e fim. Tudo o que acontece deve ter o necessário inclinar-se para passar por ele. De acordo com o Li-
momento da gênese, da subida, da plenitude e, por fim, do esgo- vro dos Mortos, este seria o período de caos, da descida ao ma-
tamento e morte. Isto ocorre no desenvolvimento tanto de uma terialismo, como ocorre em nosso tempo. Após uma retomada,
tempestade meteorológica, como de uma civilização; tanto no temos então uma segunda queda, que corresponde à segunda
dia (manhã, meio-dia, tarde e noite), como nas quatro estações passagem baixa. Conforme o “Livro dos Mortos”, a segunda
do ano e nos quatro períodos da vida humana (infância, juventu- passagem baixa significa a humilhação final. Este seria um pe-
de, madureza e velhice). Também a evolução de nosso planeta ríodo de Anticristos. Segundo Nostradamus, ocorreria isto ao
foi dividida pelos geólogos em 4 épocas, da primária à quaterná- tempo do sexto, sétimo e oitavo Anticristos, que iria de 1966 a
ria. Esta lei geral está expressa no quadrado da base, sobre o 1996, com o que se fecharia a história do mundo cristão. Santa
qual se eleva a pirâmide em suas quatro faces. Mas cada uma Hildegarda o coloca entre 1955 e 1980; Ana Catarina Emme-
delas é um triângulo, ou seja, 3, que é número perfeito. Assim, rich, por volta de 1960; Holzhauser fala de um só, e o dá como
os quatro tempos da vida material completam-se com os três nascido em 1950; Solovíen, em 1954; a Grande Pirâmide, com
momentos do espírito (Trindade), e o todo se une no vértice, que as medidas deste corredor, anunciaria o nascimento do Anti-
58 PROFECIAS Pietro Ubaldi
cristo em 1936. Mas isto pode significar também um princípio, elementos componentes dos vários reinos, não estará expri-
uma ideologia. Chega-se assim à câmara do rei, uma vasta sa- mindo em termos mais genéricos os flagelos destruidores do
la, com 10 metros de comprimento, 5 de largura e 5 de altura, mundo atual, expressos pelo Apocalipse? Que mais pode ser a
sem ornamentos, com um sarcófago aberto, de granito verme- estátua com pés de ferro e barro, senão a humanidade, que pre-
lho. Também no Livro dos Mortos, o túmulo aberto na câmara tende amparar-se na matéria, ao invés de fazê-lo no espírito? E
do rei está no último capítulo. Aqui termina a mensagem, ou o que será a pedra que fere esta humanidade, senão a mão de
seja, no ano 2.001, a ultima data da pirâmide, fim do velho Deus, que fere o homem pelo seu cego materialismo? Mas tu-
mundo e início de uma nova era. do desaparecerá como a pragana ao vento. Esta é a queda da
◘ ◘ ◘ Babilônia do Apocalipse, da Grande Babilônia, mãe das forni-
Mas há outra voz que também nos chega de longe no tempo. cações e das abominações da Terra. E a pedra que ferirá a está-
É o profeta Daniel, que explica a Nabucodonosor, rei da Babilô- tua se tornará uma grande montanha e encherá toda a Terra. É
nia, o seu sonho, revelando o que deve ocorrer no fim dos tem- a vitória de Cristo, o triunfo final de Deus sobre as forças do
pos. E eis a visão da grande estátua, cuja cabeça é de ouro fino, mal. Mais pormenorizado, porque mais próximo, o Apocalipse
o peito e os braços de prata, o ventre de cobre, as pernas de ferro repete o mesmo motivo.
e os pés em parte de ferro e em parte de barro. Então, uma pedra ◘ ◘ ◘
feriu a estátua nos pés, que eram de ferro e de barro, e os fez em Eis, então, que o profeta Daniel nos traz uma nova confirma-
pedaços. Junto, também foram feitos em pedaços o ferro, o bar- ção, que evoca e reforça as precedentes. Tudo concorda: o Apo-
ro, o cobre, a prata e o ouro, que se tornaram como a pragana calipse, Nostradamus, Malaquias, a Astrologia, as Pirâmides, o
das eiras de estio, e o vento os levou, de sorte que não se achou profeta Daniel, assim como nossas pesquisas racionais e a lógica
lugar para eles. A pedra que feriu a imagem tornou-se uma do sistema em que elas se baseiam. E quem sabe quantas outras
grande montanha e encheu a terra toda (Daniel – II, 26 a 35). concordâncias poderão ser descobertas ainda? Tudo, em concor-
O próprio Daniel explica o significado do sonho. O rei de dância, nos diz que estamos nos tempos apocalípticos. Quem
Babilônia, Nabucodonosor, é a cabeça de ouro da estátua. Sur- pode afirmar que forças extra-humanas não queiram hoje inter-
girá depois um reino mais baixo, de menor valor, que é o peito vir na história? Quem o poderia impedir? O que dizer, quando
de prata, depois um terceiro, que é o ventre de cobre, a seguir tantos argumentos lógicos e históricos e tantas vozes diversas
um quarto, duro como ferro, que é representado pelas pernas de convergem para este mesmo ponto? Os ciclos históricos se repe-
ferro. O fato de que, a seguir, os pés sejam em parte de ferro e tem, no entanto contêm em seus movimentos tantos fatores im-
em parte de barro, significa que aquele reino estará dividido, previsíveis para o cálculo das probabilidades imediatas, que de
sendo duro numa parte e fraco na outra. As partes não poderão nada poderemos admirar-nos. Da vida e da obra de Cristo os po-
unir-se entre si, assim como o ferro não pode misturar-se com o líticos e homens de ação de seu tempo nem se aperceberam.
barro. Nos dias desse reino, Deus fará surgir outro reino, que Vivemos em tempo de grande amadurecimento no bem e no
jamais será destruído em toda a eternidade. Ele despedaçará e mal, de grandes mutações. Tudo isso nos explica e nos indica a
consumirá todos aqueles reinos, mas ele mesmo durará eterna- possibilidade de uma intervenção direta do pensamento e da
mente (Daniel – II, 36 a 45). vontade da história na direção dos destinos da humanidade.
Muitos estão de acordo em ver, na cabeça de ouro, o reino Quando esta é tão louca, que traspassa o limite, arriscando per-
da Babilônia; no peito, o da Pérsia, como o reino de prata; no der-se, Deus acorre para a salvação de todos. A presença de
ventre, o da Grécia, como o reino de cobre; nas pernas, o de uma lógica e, portanto, de um pensamento diretivo na história,
Roma, como o reino de ferro. Há uma descida ao longo das vá- nós o vimos racionalmente, não é uma fantasia. Um sistema
rias partes do corpo, em paralelo a uma descida no valor do completo, desenvolvido em nossos volumes precedentes, con-
material que compõe as partes. Depois, esse reino será dividi- verge para este conceito e reforça esta tese. Deus é tudo e opera
do, ou seja, o império romano entre Roma e Bizâncio, império também na história. Basta que Deus se retire do mundo, para
que, por mais tentativas que se fizessem (Carlos Magno, Napo- que ele caia nas mãos das forças inferiores, ávidas de cisão;
leão) jamais se reuniu. Os vários fragmentos não puderam, de forças satânicas, que se manifestam lançando-se umas contra as
fato, juntar-se novamente, assim como o ferro não pode mistu- outras. É a destruição de todas. E agora a humanidade está nes-
rar-se com o barro. É assim a Europa até hoje, em parte dura, se caminho. Quando a medida das maldades estiver saturada, o
em parte fraca. Nos dias desse reino, quando as coisas se acha- homem ficará abandonado. A intervenção de Deus agora apare-
rem nessas condições, o profeta Daniel continua: “Deus fará ce como negativa, porque o homem, enceguecido na revolta,
surgir um reino que jamais, na eternidade, será destruído. Ele realiza ele mesmo, com suas mãos, sobre sua carne, a operação
despedaçará e consumirá todos aqueles reinos, mas ele mesmo cirúrgica de sua depuração. Suprimido o amor evangélico, úni-
durará eternamente”. Não parece esta a mesma visão do Apo- co que dá espírito de paz, só resta a guerra de todos contra to-
calipse, mas vista de mais longe? E qual poderá ser esse novo dos. Mas, após este indispensável período de autodestruição
reino, que consumirá todos os outros e durará eternamente, se- humana, virá a fase reconstrutiva, em que Deus se manifestará
não o Reino de Deus, anunciado pelo Evangelho? Só ele, sen- de forma positiva, não como abandono às forças inferiores para
do de origem divina e de natureza espiritual, poderá permane- demolição do velho e do estragado, mas como atividade criado-
cer sem ser destruído e durar eternamente. E não significará ra da nova civilização do espírito.
essa intervenção direta de Deus aquela já por nós mencionada Achamo-nos hoje na fase de contraste entre o velho mundo –
manifestação do pensamento e da vontade da história, arras- bem enraizado nas realidades concretas, materialista, teimosa-
tando como uma onda homens e acontecimentos para a conse- mente agarrado à Terra e lutando para impor-se e sobreviver – e
cução dos fins preestabelecidos no determinismo da Lei, que o novo mundo em formação, espiritual, sustentado pelos impul-
agora empunha as rédeas da humanidade? sos da vida, que caminha pela vontade da história, pelo comando
Então, diz o profeta Daniel, uma pedra feriu a estátua nos da Lei, pela presença de Deus. Este novo mundo, que representa
pés, que eram de ferro e barro, e os despedaçou. E juntos fo- o porvir da evolução, está em luta para sobrepor-se ao velho
ram despedaçados o ferro, o barro, o cobre, a prata e o ouro, mundo, que representa o passado e que a vida, a história e pró-
que se tornaram como a pragana das eiras de estio, carregadas pria lei de Deus repelem, porque tudo deve subir. O atual mo-
pelo vento, e não se achou mais nenhum lugar para eles. A pe- mento histórico é a expressão viva de uma fase decisiva na luta
dra que feriu a estátua torna-se um grande monte e ocupa toda entre o bem e o mal, em torno da qual gira a história do mundo.
a Terra (Daniel – II, 34 e 35). O despedaçamento de todos os É a luta de Deus contra Satanás, como a descrita no Apocalipse.
Pietro Ubaldi PROFECIAS 59
É a luta dos Anticristos e cataclismos, como nos dizem os finalmente um mundo onde se caminhará pelas estradas da jus-
videntes. É um amontoar-se de civilizações e de eras, como nos tiça, e não mais pelas da prepotência! Este é um anseio instinti-
revelam as constelações e planetas. É a história da humanidade, vo, que está no coração do homem; é um sonho milenar da hu-
como no-la narram as pirâmides e como no-la resume a visão do manidade. E o que é instinto e fala irresistivelmente, partindo
profeta Daniel. Mudam as imagens e os pormenores dos aconte- do coração, tem uma significação biológica, é uma ânsia vital
cimentos e das datas, mas permanece um fundo idêntico. Os que terá que realizar-se. Cristo, que, na primeira vez, veio em
pormenores não interessam a nós. O que nos interessa é ter corpo, para amar e semear, voltará em espírito, para julgar e
achado o grande fio condutor da história e ver que, no conjunto, ceifar, a fim de que o rebelde impenitente seja expulso, as for-
todas estas visões, ainda que diferentes nas formas, concordam ças do mal sejam liquidadas e os bons, que tanto sofrem, sejam
e sobrepõem-se, reforçando-se assim umas às outras. finalmente chamados à plenitude de vida. Estes sofrem, contu-
Antes de ouvir estas vozes, interrogamos a história e a lógi- do estão protegidos e amanhã vencerão. Os rebeldes creem que
ca dos fatos e obtivemos a mesma resposta. Toda essa conver- vencem, mas perderão. Os primeiros constroem em silêncio,
gência de elementos históricos, de vozes e de raciocínios, con- nos valores imperecíveis do espírito. Os segundos constroem às
firma-nos na segurança que já nos fora dada pela intuição, de avessas, com estardalhaço, nos valores falsos da matéria, e ter-
que, sejam quais forem os pormenores do processo, alcançare- minam destruindo a si mesmos. Mas todos juntos colaboram,
mos nesta segunda metade do século XX a plenitude dos tem- assim, sob a direção de Deus, e é Sua vontade que se chegue
pos. Vivemos num período apocalíptico, em que o mundo passa agora à realização da nova civilização do III Milênio, que re-
de uma civilização que desmorona a uma nova que surge. A presenta na Terra o advento do Reino de Deus.
primeira parte do trabalho foi confiada às nações destruidoras, a
segunda caberá às reconstrutoras. Mas todas obedecem ao FIM
mesmo princípio diretivo, e quer este princípio que se realize
O MISSIONÁRIO
Vida e Obra de Na primeira semana de setembro de 1931, depois da grande decisão fran-
ciscana, Cristo novamente lhe apareceu e, desta vez, acompanhado de São

Pietro Ubaldi Francisco de Assis. Um à direita e outro à esquerda, fizeram companhia a Pie-
tro Ubaldi durante vinte minutos, em sua caminhada matinal, na estrada de
Colle Umberto. Estava, portanto, confirmada sua posição.
Em 25 de dezembro de 1931, chegou-lhe de improviso a primeira mensa-
(Sinopse) gem, a Mensagem de Natal. Por intuição ele sentiu: estava aí o início de sua
missão. Outras Mensagens surgiram em novas oportunidades. Todas com a
mesma linguagem e conteúdo divino.
O HOMEM No verão de 1932, começou a escrever A Grande Síntese, a qual só termi-
nou em 23 de agosto de 1935, às 23h00min horas (local). Esse livro, com cem
Pietro Ubaldi, filho de Sante Ubaldi e Lavínia Alleori Ubaldi, nasceu em capítulos, escrito em quatro verões sucessivos, foi traduzido para vários idio-
18 de agosto de 1886, às 20:30 horas (local). Ele escolheu os pais e a cidade mas. Somente no Brasil, já alcançou quinze edições. Grandes escritores do
onde iria nascer, Foligno, Província de Perúgia (capital da Úmbria). Foligno fi- mundo inteiro opinaram favoravelmente sobre A Grande Síntese. Ainda outros
ca situada a 18 km de Assis, cidade natal de São Francisco de Assis. Até hoje, compêndios, verdadeiros mananciais de sabedoria cristã, surgiram nos anos se-
as cidades franciscanas guardam o mesmo misticismo legado à Terra pelo guintes, completando os dez volumes escritos na Itália:
grande poverelo de Assis, que viveu para Cristo, renunciando os bens materiais 01) Grandes Mensagens
e os prazeres deste mundo. 02) A Grande Síntese - Síntese e Solução dos Problemas da Ciência e do Espírito
Pietro Ubaldi sentiu desde a sua infância uma poderosa inclinação pelo
03) As Noúres - Técnica e Recepção das Correntes de Pensamento
franciscanismo e pela Boa Nova de Cristo. Não foi compreendido, nem poderia
sê-lo, porque seus pais viviam felizes com a riqueza e com o conforto proporci- 04) Ascese Mística
onado por ela. A Sra. Lavínia era descendente da nobreza italiana, única herdei- 05) História de Um Homem
ra do título e de uma enorme fortuna, inclusive do Palácio Alleori Ubaldi. As- 06) Fragmentos de Pensamento e de Paixão
sim, Pietro Alleori Ubaldi foi educado com os rigores de uma vida palaciana. 07) A Nova Civilização do Terceiro Milênio
Não pode ser fácil a um legítimo franciscano viver num palácio. Naturalmen- 08) Problemas do Futuro
te, ele sentiu-se deslocado naquele ambiente, expatriado de seu mundo espiritual. 09) Ascensões Humanas
A disciplina no palácio, ele aceitou-a facilmente. Todos deveriam seguir a orien- 10) Deus e Universo
tação dos pais e obedecer-lhes em tudo, até na religião. Tinham de ser católicos
Com este último livro, Pietro Ubaldi completou sua visão teológica, além
praticantes dos atos religiosos, realizados na capela da Imaculada Conceição, no
de profundos ensinamentos no campo da ciência e da filosofia. A Grande Sínte-
interior do palácio. Pietro Ubaldi foi sempre obediente aos pais, aos professores, à
se e Deus e Universo formam um tratado teológico completo, que se encontra
família e, em sua vida missionária, a Cristo. Nem todas as obrigações palacianas
ampliado, esclarecido mais pormenorizadamente, em outros volumes escritos
lhe agradavam, mas ele as cumpriu até à sua total libertação. A primeira liberdade
na Itália e no Brasil, a segunda pátria de Ubaldi.
se deu aos cinco anos, quando solicitou de sua mãe que o mandasse à escola, e
O Brasil é a terra escolhida para ser o berço espiritual da nova civiliza-
aquela bondosa senhora atendeu o pedido do filho. A segunda liberdade, verdadei-
ção do Terceiro Milênio. Aqui vivem diferentes povos, irmanados, indepen-
ro desabrochamento espiritual, aconteceu no ginásio, ao ouvir do professor de ci-
dentes de raças ou religiões que professem. Ora, Pietro Ubaldi exerceu um
ência a palavra “evolução”. Outra grande liberdade para o seu espírito foi com a
ministério imparcial e universal, e nenhum país seria tão adaptado à sua mis-
leitura de livros sobre a imortalidade da alma e reencarnação, tornando-se reen-
são quanto a nossa pátria. Por isso o destino quis trazê-lo para cá e aqui com-
carnacionista aos vinte e seis anos. Daí por diante, os dois mundos, material e es-
pletar sua tarefa missionária.
piritual, começaram a fundir-se num só. A vida na Terra não poderia ter outra fi-
Nesta terra do Cruzeiro do Sul, ele esteve em 1951 e realizou dezenas de
nalidade, além daquelas de servir a Cristo e ser útil aos homens.
conferências de Norte a Sul, de Leste a Oeste. Em oito de dezembro do ano se-
Pietro Ubaldi formou-se em Direito (profissão escolhida pelos pais, mas ja-
guinte, desembarcaram, no porto de Santos, Pietro Ubaldi acompanhado da es-
mais exercida por ele) e Música (oferecimento, também, de seus genitores), fez-se
posa, filha e duas netas (Maria Antonieta e Maria Adelaide), atendendo a um
poliglota, autodidata, falando fluentemente inglês, francês, alemão, espanhol, por-
convite de amigos de São Paulo para vir morar neste imenso país. É oportuno
tuguês e conhecendo bem o latim; mergulhou nas diferentes correntes filosóficas e
lembrar que Ubaldi renunciou aos bens materiais, mas não aos deveres para
religiosas, destacando-se como um grande pensador cristão em pleno Século XX.
com a família, que se tornou pobre porque o administrador, primo de sua espo-
Ele era um homem de uma cultura invejável, o que muito lhe facilitou o cumpri-
sa, dilapidou toda a riqueza entregue a ele para gerencia-la.
mento da missão. A sua tese de formatura na Universidade de Roma foi sobre A
Em 1953, Pietro Ubaldi retornou à sua missão apostolar, continuou a re-
Emigração Transatlântica, Especialmente para o Brasil, muito elogiada pela ban-
cepção dos livros e recebeu a última Mensagem, Mensagem da Nova Era, em
ca examinadora e publicada num volume de 266 páginas pela Editora Ermano
São Vicente, no edifício “Iguaçu”, na Av. Manoel de Nóbrega, 686 – apto. 92.
Loescher Cia. Logo após a defesa dessa tese, o Sr. Sante Ubaldi lhe deu como
Dois anos depois, transferiu-se com a família para o Edifício “Nova Era” (coin-
prêmio uma viagem aos Estados Unidos, durante seis meses.
cidência, nada tem haver com a Mensagem escrita no edifício anterior), Praça
Pietro Ubaldi casou-se com vinte e cinco anos, a conselho dos pais, que es-
22 de janeiro, 531 – apto. 90. Em seu quarto, naquele apartamento, ele comple-
colheram para ele uma jovem rica e bonita, possuidora de muitas virtudes e fina
tou a sua missão. Escreveu em São Vicente a segunda parte da Obra, chamada
educação. Como recompensa pela aceitação da escolha, seu pai transferiu para
brasileira, porque escrita no Brasil, composta por:
o casal um patrimônio igual àquele trazido pela Senhora Maria Antonieta Sol-
11) Profecias
fanelli Ubaldi. Este era, agora, o nome da jovem esposa. O casamento não esta-
va nos planos de Ubaldi, somente justificável porque fazia parte de seu destino. 12) Comentários
Ele girava em torno de outros objetivos: o Evangelho e os ideais franciscanos. 13) Problemas Atuais
Mesmo assim, do casal Maria Antonieta e Pietro Ubaldi nasceram três filhos: 14) O Sistema - Gênese e Estrutura do Universo
Vicenzina (desencarnada aos dois anos de idade, em 1919), Franco (morto em 15) A Grande Batalha
1942, na Segunda Guerra Mundial) e Agnese (falecida em S. Paulo - 1975). 16) Evolução e Evangelho
Aos poucos, Pietro Ubaldi foi abandonando a riqueza, deixando-a por con- 17) A Lei de Deus
ta do administrador de confiança da família. Após dezesseis anos de enlace ma- 18) A Técnica Funcional da Lei de Deus
trimonial, em 1927, por ocasião da desencarnação de seu pai, ele fez o voto de
19) Queda e Salvação
pobreza, transferindo à família a parte dos bens que lhe pertencia. Aprovando
aquele gesto de amor ao Evangelho, Cristo lhe apareceu. Isso para ele foi a 20) Princípios de Uma Nova Ética
maior confirmação à atitude tão acertada. Em 1931, com 45 anos, Pietro Ubaldi 21) A Descida dos Ideais
assumiu uma nova postura, estarrecedora para seus familiares: a renúncia fran- 22) Um Destino Seguindo Cristo
ciscana. Daquele ano em diante, iria viver com o suor do seu rosto e renunciava 23) Pensamentos
todo o conforto proporcionado pela família e pela riqueza material existente. 24) Cristo
Fez concurso para professor de inglês, foi aprovado e nomeado para o Liceu São Vicente (SP), célula mater. do Brasil, foi a terceira cidade natal de Pie-
Tomaso Campailla, em Módica, Sicilia – região situada no extremo sul da Itália tro Ubaldi. Aquela cidade praiana tem um longo passado na história de nossa
– onde trabalhou somente um ano letivo. Em 1932 fez outro concurso e foi pátria, desde José de Anchieta e Manoel da Nóbrega até o autor de A Grande
transferido para a Escola Média Estadual Otaviano Nelli, em Gúbio, ao norte da Síntese, que viveu ali o seu último período de vinte anos. Pietro Ubaldi, o Men-
Itália, mais próximo da família. Nessa urbe, também franciscana, ele trabalhou sageiro de Cristo, previu o dia e o ano do término de sua Obra, Natal de 1971,
durante vinte anos e fez dela a sua segunda cidade natal, vivendo num quarto com dezesseis anos de antecedência. Ainda profetizou que sua morte acontece-
humilde de uma casa pequena e pobre (pensão do casal Norina-Alfredo Pagani ria logo depois dessa data. Tudo confirmado. Ele desencarnou no hospital São
– Rua del Flurne, 4), situada na encosta da montanha. José, quarto No 5, às 00h30min horas, em 29 de fevereiro de 1972. Saber quan-
A vida de Pietro teve quatro períodos distintos (v. livro Profecias – “Gêne- do vai morrer e esperar com alegria a chegada da irmã morte, é privilégio de
se da II Obra”): dos 5 aos 25 anos  formação; 25 aos 45 anos  maturação in- poucos... O arauto da nova civilização do espírito foi um homem privilegiado.
terior, espiritual, na dor; dos 45 aos 65 anos  Obra Italiana (produção concep- A leitura das obras de Pietro Ubaldi descortina outros horizontes para uma
tual); dos 65 aos 85 anos  Obra Brasileira (realização concreta da missão). nova concepção de vida.

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