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Resumo
O contexto da pesquisa é uma escola de ensino fundamental e médio da cidade de Ponta
Grossa/PR, tem como objetivo refletir sobre a construção da identidade de raça e o
letramento racial crítico. As identidades se constroem na relação do sujeito com o
mundo (HALL, 2009; MOITA LOPES, 2009), desse modo, trabalhar com o letramento
racial crítico (FERREIRA, 2009, 2012, 2014) nas escolas é fundamental para a
construção da identidade de raça. Pensando na sociedade atual, que apesar de existirem
inúmeras políticas afirmativas voltadas a diminuir o preconceito, ainda temos muitos
casos de preconceito e exclusão, assim sendo, tem se pensado em medidas para
corroborar com estas políticas. Para chegar a possíveis respostas ao objetivo, foi
proposta a realização de relatos para os alunos dos 9º anos com o seguinte tema: Como
me dei conta de que o racismo existe? As análises destes relatos apontam para a
necessidade de inclusão do letramento racial crítico no contexto escolar, evidencia-se
que o letramento racial crítico pode contribuir para efetivação da Lei 10.639/03,
colaborando para diminuir o preconceito, o racismo e a exclusão, além de contribuir
para uma formação identitária construída pelo empoderamento que o letramento racial
crítico proporciona.
0. Introdução
[..] as pessoas preferem adotar uma estratégia de não encarar o problema, ou seja, de não
interagir ou falar sobre o assunto. A estratégia de não encarar a questão tem outros
desdobramentos, pois parece que os professores deixam de compreender como a ideia de
racismo é construída e quem se beneficia com o racismo. (FERREIRA, 2010, p. 09).
É preciso, primeiramente, perceber que vivemos numa sociedade que esteve por
muito tempo sob o mito da democracia racial, ou seja, com a ideia de que no Brasil não
havia racismo e por isso não fomos ensinados a “ler” o que está implícito em textos
verbais e não verbais relacionados ao preconceito e ao racismo e, assim, se não tivermos
o letramento para perceber isso, podemos reforçar o preconceito. Pennycook (2010),
pensa que temos que começar a assumir projetos morais e políticos, precisamos nos
preocupar com as desigualdades múltiplas e manifestadas pelas sociedades e pelo
mundo em que vivemos, é necessário se engajar num trabalho crítico que não é fácil, no
entanto é essencial.
Eu diria que essa relutância também pode impedi-los de discutir assuntos que dizem
respeito a seu próprio interesse, como as ações afirmativas, a baixa porcentagem de
pessoas negras que entram na universidade, o baixo número de pessoas negras em cargos
de liderança e a falta de representação de profissionais negros em todas as escalas sociais,
etc. (FERREIRA, 2012, p. 196 – 197)
A identidade é algo que se constrói nas práticas sociais. Ela não existe sem as
ações do sujeito, são representações que se constituem nas práticas discursivas com o
outro. Nesse sentido, os questionamentos e as reflexões permitem que as identidades
sejam reconstruídas, reforçando as afirmações de Ferreira (2012), a respeito da
importância da escola trabalhar com o letramento racial crítico.
Moita Lopes (2002), e Hall (2009), compartilham da ideia de fragmentação do
individuo, que já não sabe quem é. Moita Lopes (2002) fala da instituição escolar como
lugar privilegiado para a construção das identidades. Ainda afirma que como vivemos
num mundo de discursos e atividades, muitas vezes as identidades são contraditórias e
fragmentadas.
As diferenças, para o autor, ainda são tratadas na escola como naturais e não
como fruto de um processo de construção sociodiscursiva. Assim a escola se cala diante
da exclusão, quando deveria construir discursos emancipatórios. O autor propõe que nas
aulas de línguas sejam reconstruídas as identidades, para ele as identidades emergem do
discurso, portanto são construídas. Ninguém nasce racista, torna-se racista, portanto o
papel da escola é fundamental na construção de identidades.
Ferreira (2012) afirma que no Brasil as pessoas se autoidentificarem como
morenas é uma das maneiras mais comuns dentre as 136 existentes. Mas, por que essa
preferência? Para a autora, devido ao preconceito existente no Brasil, há a tendência em
“embranquecer” a cor de sua pele, demonstrando assim, o desejo de não ser negro para
que possa ser aceito. A autora afirma que é preciso falar dos aspectos positivos da
história dos negros brasileiros, de sua luta pela liberdade e igualdade como cidadãos. A
história que é contada não aborda esses aspectos.
Dessa forma, é importante que a escola faça o seu papel de colaboração na
construção de uma identidade positiva para a população negra, como sugere a Lei
Federal nº 10.639/2003.
Com a teoria Racial Crítica, para Ferreira (2006), os padrões raciais e culturais
sistêmicos que operam nas escolas se tornam mais visíveis, desafiando a afirmação de
não ver cor, a opressão racial e também pode dar suporte a quem experiencia o racismo,
enfim, essa abordagem empodera quem dela se utiliza. O “contar histórias” faz parte das
estratégias dessa abordagem.
Para esta pesquisa foi realizada uma atividade em sala de aula sugerida no
Curso: Narrativas Autobiográficas e Formação de Professores sobre Identidades Sociais
de Raça, Gênero e Classe, ministrada pela professora Aparecida Ferreira. A atividade
tem o objetivo de identificar se as(os) alunas(os) têm consciência da presença do
racismo em situações da vida cotidiana delas(es). Primeiramente foi apresentada uma
tabela com a percentagem de negros e brancos que frequentam as universidades, de
acordo com uma pesquisa do IBGE. Foi muito intrigante a fala do aluno Leandro ao
perceber que pardos e pretos ficavam na mesma classificação, “então eu sou negro!?
Não sabia.” Percebemos através do discurso revelando o espanto do aluno ao lançar seu
olhar para a questão racial, tomando conhecimento que pelo IBGE, ele se classifica
como negro, foi uma descoberta para ele. Ele seria um dos alunos que diria “Não sou
negro, sou moreno”? Como nas várias afirmações de alunos ao serem chamados para
serem fotografados para a exposição do Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro
de 2014? Adotamos aqui a concepção de raça de acordo com Nilma Lino Gomes “as
raças são, na realidade, construções sociais, políticas e culturais produzidas nas relações
sociais e de poder ao longo do processo histórico. Não significam, de forma alguma, um
dado da natureza. É do contexto da cultura que nós aprendemos a enxergar as raças”.
(GOMES, 2005, p. 49).
Nessa perspectiva, podemos concluir que o que causou o espanto no aluno
Leandro foi não se considerar negro. Ser negro é muito mais que ter o fenótipo racial
negro. É se sentir negro, se identificar como tal, conforme explica a autora acima.
No entanto, no relato de Carmem (negra), fica evidente que desde muito cedo ela
se deu conta da questão racial, pensou sobre isso, sofreu com isso.
Me dei conta de que o racismo existia quando eu fui para a escola na 1ª série e a
professora falou que era para eu ficar na última carteira para não contaminar os outros
alunos, e toda vez que eu ia falar ou perguntar alguma coisa ela nem dava bola ou
mandava eu ficar quieta, porque negro não precisava saber de nada porque não iriam
conseguir emprego de nenhum jeito.
Observamos nesse relato que a menina negra foi discriminada pela primeira vez
pela própria professora.
Vivi um fato de racismo quando tinha 10 anos e estava jogando videogame on line e
apareceu um cara da Espanha, que perdeu para mim e ficou bravo. Quando ele viu que eu
estava jogando do Brasil, começou a me xingar de macaco, king kong, ticão e mais coisas
que tive que bloqueá-lo para ele parar de mandar mensagens ofensivas.
O aluno Bernardo comenta que “Me dei conta de que o racismo existe quando
minha mãe me contou que quando seu pai foi em um restaurante comprar 3 marmitex, e
por causa da sua cor escura, os funcionários disseram para ele: „Os restos de comida era
depois do almoço‟”.
Carol, (branca) esclarece que
Me dei conta de que o racismo existe quando fui fazer compras em um mercado e reparei
que todos os funcionários tinham a pele clara. Indignada, perguntei ao meu tio que
trabalhava lá o porquê de não vermos nenhuma pessoa com pele escura e ele relatou que
só eram escolhidas pessoas brancas porque a dona não gostava de pessoas com pele
escura.
A aluna Amanda, (branca) comenta: “uma vez eu fui ao mercado com minha
amiga, ela era negra e os seguranças ficavam nos seguindo, acho que ele estava
pensando que nós iríamos roubar algo ou não iríamos ter dinheiro para pagar.”
A aluna Franciely, (branca), relata: “meu padrasto, que é moreno, sempre que
passa em uma blits é barrado pelos policiais.” Eliane, (branca) comenta, “Os negros não
têm os mesmos direitos que brancos. Na minha escola (particular) tinha um menino que
não tinha amigos pela cor de sua pele.” Nesses relatos podemos confirmar que tanto
alunos negros quanto alunos brancos estão mergulhados em situações onde o racismo
emerge de forma, às vezes até brutal.
A questão do silêncio escolar sobre o racismo é uma forma de manutenção das
diferenças. “Entretanto, este silêncio não é em si mesmo uma ausência de discurso, mas
um discurso em que o não dito ganha significados ambíguos ou se estabelece em
relação apenas a uma das partes da relação racial.” (SILVA JR, 2002, p. 49-50). Desse
modo, é importante que ocorra um movimento de toda a sociedade em virtude de dizer
NÃO a esse silêncio, é preciso ter discursos que garantam a voz e a visibilidade da
população.
Miranda (2015, p. 156-157) afirma que “há uma tendência problemática em
torno do discurso do „somos todos iguais‟, pois tal discurso não percebe que pode
acabar reproduzindo concepções discriminatórias sobre as diferenças, que na história
mundial legitimaram a violência e as desigualdades”.
Rodrigo (branco) traz no relato essa ideia de igualdade. “Somos todos iguais.
Toda pessoa que for ofendida por conta de sua cor tem que correr atrás de seus
direitos”. O aluno repete a frase “Somos todos iguais.”, no entanto reconhece que há
diferença, portanto não somos todos iguais, pois para se ter direitos iguais é preciso que
aquele que se sente discriminado lute pelos seus direitos, revelando que há
desigualdade.
Para finalizar, trago um excerto do relato do aluno Noel (negro): “Espero da
escola um bom resultado. A escola representa tudo para a gente, pois sem ela não somos
capazes de arrumar um bom emprego e crescer na vida.” Conforme Brasil (2006),
incluir a dimensão da diversidade étnico cultural criticamente no cotidiano escolar,
integrar saberes, dentre outras ações, pode criar possibilidades para que alunos como
Noel possam contar com um mundo menos excludente, onde tenham a possibilidade de
ter oportunidades, mas conforme Munanga (2012, p. 03), só as leis não bastam, “tem
que educar também”.
5. Considerações finais
Referências
MUNANGA, K.. Nosso racismo é um crime perfeito. Revista Fórum [versão online]
n, v. 2, 2009.
SILVA JR., Hédio. Discriminação Racial nas Escolas – entre a lei e as práticas
sociais. UNESCO 2002. Edição publicada pelo Escritório da UNESCO no Brasil.
Brasília, 2002.