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| E-ISSN 1808-2599 |

Espetáculo e performatividade
em Na Captura dos Friedmans1
Cristina Teixeira Vieira de Melo

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Resumo 1 Elogios e denúncias à montagem
A partir da contraposição entre vários depoimentos,
a montagem de Na Captura dos Friedmans (2003)
No ano de seu lançamento, o filme de estreia
põe em dúvida os procedimentos utilizados pela
justiça e pela mídia para criminalizar Arnold e Jesse do diretor norte-americano Andrew Jarecki,

Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação | E-compós, Brasília, v.18, n.2, maio/ago. 2015.
Friedman, acusados de abuso sexual contra menores
Na Captura dos Friedmans (2003), foi indicado
em Great Neck, EUA, em 1988. O documentário
recebeu elogios da crítica justamente por valorizar ao Oscar de melhor documentário e ganhou
a ambiguidade narrativa. No entanto, buscamos o Grande Prêmio do Júri do Sundance Film
mostrar que a montagem fragmentada se alinha à
ideia de espetáculo, procedimento estilístico que, Festival. Até hoje, são 18 prêmios acumulados.
do ponto de vista político, se contrapõe à abertura
de sentidos e à heterogeneidade de vozes que o
A ideia inicial de Jarecki era fazer um
filme mobiliza. Também chamamos a atenção para o
caráter performático de boa parte das imagens, pois documentário sobre o palhaço mais famoso de
ele permite que sentidos e sujeitos se desloquem de
Nova York. À medida que foi investigando o passado
lugares preconcebidos.
de seu personagem, descobriu que David Friedman
Palavras-Chave
Montagem. Espetáculo. Performatividade. era o filho mais velho de Arnold Friedman e irmão
de Jesse Friedman, esses dois últimos acusados
de abuso sexual de menores em Great Neck, Long
Island, EUA, em 1988. Então, o diretor decidiu
resgatar essa história entrevistando alguns de
seus personagens principais2.

Fora as entrevistas, a narrativa de Na Captura


dos Friedmans é constituída por uma enorme

Cristina Teixeira Vieira de Melo quantidade e variedade de imagens de arquivo.


| cristinateixeiravm@gmail.com Entre estas, estão presentes imagens concebidas
Doutora em Linguística IEL/UNICAMP. Professora do Departamento
e da Pós-Graduação em Comunicação Social da UFPE. desde a sua origem para circularem publicamente,
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outras que, inicialmente, teriam sua circulação de arquivo. Como afirmam diversos autores, o
restrita às investigações policiais, e ainda aquelas procedimento que caracteriza os filmes de arquivo
limitadas à esfera da vida privada dos Friedmans. é a montagem.
Na primeira categoria, figuram materiais
Fotografias ou imagens em movimento dizem
imagéticos das TVs norte-americanas sobre a muito pouco antes de serem montadas, antes
cobertura do caso. Na segunda, as fotografias de serem colocadas em relação com outros
elementos — outras imagens e temporalida-
da polícia sobre a investigação. Na terceira,
des, outros textos e depoimentos. Isoladas as
estão presentes não apenas os retratos e os imagens dizem muito pouco sobre a história e a
memória; são frágeis, inexatas, confusas; reve-
filmes de família dos Friedmans – com as
lam e enganam, são, de fato, insuficientes para 2/17
tradicionais imagens de festas de aniversário, desvendar o passado. É preciso, justamente,
eventos comemorativos e registro de férias – trabalhá-las “do interior”, descrever relações,
estabelecer séries, imaginar, pensar, interrogar,
como também, para espanto do espectador, desmontá-las e remontá-las, relacionando-as a
as gravações em áudio de Jesse e o videodiário outros tempos, outras imagens, outras histórias

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e memórias. (LINS et all, 2011, p.56)
de David dos desentendimentos e acusações
mútuas da família ocorridos durante o período
de averiguação e julgamento do suposto crime. Na maior parte das vezes, a montagem de Na
Captura dos Friedmans faz um uso conservador
Ao filmar os momentos de sofrimento, tristeza e das imagens de arquivo, pois elas funcionam como
dor vividos por si próprio, por seus pais e irmãos, mera ilustração daquilo que está sendo dito pelo
David produziu uma espécie de crônica audiovisual entrevistado. Por exemplo, quando Elaine fala que
da crise que se abateu sobre o clã. Seu videodiário os Friedmans eram “uma boa família de classe
funciona na direção oposta dos tradicionais filmes média, com estudo”, são exibidas fotografias de
de família, local de memória que geralmente opera toda a família reunida (pai, mãe e filhos) posando
como lócus de felicidade e alegria. harmoniosamente para a câmera. Quando o
promotor público Joseph Onorato diz que no dia
Na Captura dos Friedmans é, portanto, da prisão de Arnold, quando David chegou em
construído a partir de entrevistas e imagens casa, todos puderam saber que ele trabalhava

1   Uma primeira versão deste trabalho foi apresentada no XIII Encontro Anual da Socine, realizado em São Paulo no ano de
2009. Agradeço aos professores Laécio Ricardo Aquino e Cid Vasconcelos a leitura generosa e as sugestões feitas que muito
ampliaram a análise aqui empreendida.
2   Ao todo, são 18 entrevistados: Elaine Friedman, mulher de Arnold Friedman; David e Jesse Friedman, respectivamente, o filho
mais velho e o mais novo de Arnold; Howard Friedman, irmão de Arnold; Jack Fallin, parceiro de Howard; John McDermott,
inspetor do correio que interceptou uma revista pornográfica endereçada a Arnold; três detetives da divisão de crimes sexuais:
Frances Galasso, Anthony Sgueglia e Lloyd Doppman; Joseph Onorato, promotor público; Scott Banks, assistente judiciário;
Abbey Boklan, juíza do caso; Debbie Nathan, jornalista investigativa; Jerry Bernstein, advogado de Arnold; Peter Panaro,
advogado de Jesse; Judd Maltin, melhor amigo de Jesse na escola e ex-aluno das aulas de computação de Arnold; Ron
Georgalis, outro ex-aluno. Mais três ex-alunos e um pai de ex-aluno dão depoimentos, mas nenhum deles é identificado pelo
nome. O filho do meio de Arnold, Seth Friedman, não quis dar entrevista.
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com entretenimento infantil, aparece na tela a revelam-se desejosos (no entanto, incapazes)
imagem de David vestido de palhaço durante uma de conhecer “a verdade”. O documentário aponta
apresentação de rua. Quando Elaine e Howard para este terreno movediço das incertezas
comentam sobre a irmã falecida de Arnold, um históricas e memorialísticas, das possíveis
filme caseiro em preto e branco da irmã dançando é “verdades inventadas”, dos conflitos entre os
apresentado. Percebe-se que, nestas ocasiões, o uso diferentes pontos de vista de quem narra e, em
que o documentário faz das imagens avizinha-se meio a esse contexto, da dificuldade de se chegar
da forma como, frequentemente, a televisão opera, à “verdade”, como evidenciam os depoimentos a
ou seja, aproximando todo visível ao dizível; mais seguir selecionados:
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do que isso, fazendo com que a função do visível
Eu me lembro de ter sido pressionado pelos in-
reduza-se a “tornar evidente” o que se diz. vestigadores. Num certo momento desmoronei
e comecei a chorar. Quando comecei a dizer as
coisas a eles, dizia a mim mesmo: “Não é ver-
Apesar desta operação de edição relativamente

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dade”. Dizia a mim mesmo: “Fale isso, pois só
simplista entre texto verbal e imagem, foi justo em assim se livrará deles”. (Ex-aluno do curso de
computação de Arnold)
função da montagem que o documentário recebeu
inúmeros elogios. Segundo a crítica, através da Meus pais me mandaram para terapia. Através
da hipnose lembrei-me de coisas que já tinha
costura sagaz dos vários depoimentos – que ora
enterrado e pude falar sobre elas. (Ex-aluno do
se alinhavam, ora se contrapunham, o diretor teria curso de computação de Arnold)

conseguido pôr em questão os procedimentos Peter Penero estava convencido de que meu pai
utilizados para culpabilizar Arnold e Jesse3, sem, havia me molestado sexualmente. E nada que
eu dissesse o fazia mudar de ideia. Ele apare-
com isso, inocentá-los por inteiro ou fornecer
ceu com esta estratégia. Peter Penero inventou
certezas com relação ao ocorrido. A pergunta uma história e me disse: “Se disser isso será
bom pra você”. (Jesse sobre os procedimentos
“Em quem você acredita?”, presente na abertura
de seu advogado para defendê-lo)
da versão em DVD, corrobora essa avaliação e
Todos queriam que eu dissesse: “Ele não fez”.
deixa claro que cabe ao espectador julgar os
Eu não podia fazer isso. Eu dizia “Eu não sei”. E
acontecimentos. De fato, o público chega ao não sabia mesmo. Eles queriam que eu mentis-
se e dissesse “não fez”, eu acreditasse ou não.
final do filme sem conhecer “a verdade” sobre os
[...] Eu só queria dizer a verdade. E essa era a
fatos – sem ter acesso a uma espécie de veredicto verdade: eu não sabia. (Elaine, sobre as dúvidas
emitido pelo diretor. Um dos méritos da película é e crenças familiares a respeito do que realmen-
te teria acontecido entre seu marido e os alunos
exatamente mostrar que “a verdade” é algo difícil das aulas particulares de computação)
de se obter. Os próprios envolvidos na história

3   O documentário mostra que os acusados foram julgados e considerados culpados essencialmente em função das revistas
pornográficas encontradas na casa dos Friedmans e dos testemunhos das crianças que frequentavam as aulas de Arnold,
e não a partir de evidências físicas ou de alguma prova mais concreta. Nesse contexto, o filme põe em dúvida o próprio
procedimento adotado pela polícia ao entrevistar as crianças, que incluía a hipnose.
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Sei que meu irmão disse que fazia coisas comigo e as diferentes opiniões dos entrevistados a respeito
quando era criança. Não me lembro de nada. Não
tenho nenhuma recordação de estar gritando,
do que ocorreu, bem como sobre a identidade
chorando ou tentando fugir ou infeliz. (Howard, “verdadeira” dos acusados. O documentário mostra
sobre a suposição de que seu irmão Arnold man-
como a posição que cada entrevistado ocupa/ocupou
teve relações sexuais com ele durante a infância)
na história condiciona a opinião que tem sobre o fato
As falas anteriores transcritas trazem à tona o e sobre quem eram Arnold e Jesse.
eterno dilema entre mentir e dizer a verdade.
Indicam o fato de que, mesmo diante de um Nessa conjuntura, um mérito do filme é chamar
testemunho, situação em que se crê que aquele a atenção para o equívoco que é tentar reduzir
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que testemunha falará a verdade, ao invés de a identidade de uma pessoa a uma categoria
mentir e enganar, essa possibilidade está sempre única, estanque e excludente. Desta forma, o
presente. Os depoimentos sugerem que a história documentário opõe-se àquelas biografias que
construída pela justiça e pela mídia a respeito do abordam a vida de alguém como se esta fosse

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caso Friedman é cheia de incertezas e fabulações. uma sucessão coordenada de etapas e os sujeitos
O que se pode concluir deste contexto, como desempenhassem, a cada momento, apenas
nos ensinam vários autores, é o fato de que a uma função/papel social. No caso de Arnold,
memória e a história não devem ser concebidas por exemplo, a película mostra que é impossível
de maneira linear e homogênea. Ao contrário, reduzi-lo à figura de bom pai e professor respeitável
ambas são espaços de conflitos, de polêmicas, de ou a de um monstro pedófilo. O filme sugere que
contradiscursos e deslocamentos. No seu texto essas características não são necessariamente
“Sobre as teses da história”, Benjamin (1985, excludentes. Nesse sentido, os depoimentos
p.224) afirma que “articular historicamente o dos próprios filhos sobre o pai, por vezes, se
passado não significa conhecê-lo ‘tal como ele mostram nuançados:
propriamente foi’. Significa apoderar-se de uma
Continuo achando que conhecia bem meu pai.
lembrança tal como ela cintila num instante de Não acho que só porque havia coisas em sua
perigo”. Esta afirmação de Benjamin nos permite vida que eram secretas ou vergonhosas signifi-
que que o pai que eu conhecia e as coisas que
perceber que, no jogo entre as fantasias e a razão
sabia sobre ele não fossem verdadeiras. (Jesse)
apaziguadora, os envolvidos no caso Friedman
foram criando suas “sobrevivências”. Meu pai era muito bom, quero dizer... pode ser
que não fosse o melhor pai, mas tinha estudado
na Universidade de Columbia... (David)
Observa-se que a disputa pela memória e pela
verdade envolvendo as personagens do filme é
acentuada pela montagem, que, aos poucos, vai Uma das falas finais do documentário é um
mostrando as incongruências e contradições do caso diálogo ocorrido entre David e seu pai um dia
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antes do julgamento de Arnold. David pergunta a história é objeto de uma construção cujo lugar
Arnold: “Fale sobre sua vida pessoal?”, ao que ele não é o tempo homogêneo e vazio, mas um
responde: “É pessoal”. Trata-se de uma conversa tempo saturado de ‘agoras’”. Isso fica evidente
inicialmente registrada pela câmera de David em Na Captura dos Friedmans, que se coloca
para seu videodiário. O diretor Andrew Jarecki como contraponto a maior parte das narrativas
se apropriou desta passagem e inseriu-a bem ao midiáticas que, por sua vez, costumam enquadrar
final do documentário. Tal posicionamento deixa fatos e pessoas, investindo em sínteses ou em
entrever que, mesmo após tantas informações relatos parciais, amparados em relações de causa
veiculadas no filme a respeito de Arnold, há coisas e efeito. Ou seja, o filme seria o outro lado da
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que permanecem impenetráveis. moeda da informação-espetáculo.

Vale ressaltar a dupla leitura que a inserção desta No entanto, afastando-nos desse julgamento,
fala final provoca. Ela pode sinalizar a permanência defendemos que a posição ocupada por Na

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do filme no terreno da ambiguidade, indicando que Captura dos Friedmans difere do que parece
uma trajetória de vida é sempre mais complexa sugerir sua intricada tessitura de fontes
do que qualquer perfil delineado em um filme e heterogêneas. Baseando-nos em Comolli (2007),
que, diante desta complexidade, não adianta o buscamos mostrar como, ao operar com uma
desejo de querer avançar mais, pois existe um
seqüência de planos rápidos em cujo elã se mes-
limite em que as lentes não podem ou não devem clam materiais, registros e estilos heterogêneos:
alcançar. Por outro lado, para um observador menos lá e cá, gag e seriedade, hoje e ontem, drama
e comédia, fotos e documentos, páthos e ironia,
criterioso, esta fala pode suscitar um quase-
arquivos diversos, bugigangas e terror, publici-
veredicto do diretor, ao ilustrar que o pai, diante dades televisivas, vídeos de segurança etc. Essa
mistura é atraente. O jogo do heterogêneo num
da câmera familiar do filho, insiste em manter
filme é sempre um desafio. Mas – e principal-
sigilos, segredos, suscitando a velha blague de que mente em um filme – nenhum jogo é gratuito. O
“quem não deve não teme” – em outros termos, ao sentido do jogo é, aqui, o de reduzir a alteridade
(do mundo) à familiaridade (do espetáculo). Toda
se esquivar da pergunta, é como se a montagem essa matéria abundante e de um polimorfismo
sugerisse que Arnold pode estar devendo. em expansão é reduzida unicamente ao short
cut. O efeito é de uma grande uniformidade. Tudo
se equivale. O espetáculo está em toda a parte; o
Apesar desta possível segunda leitura situar real, em nenhuma. (COMOLLI, 2007, p.15).
Arnold no terreno da culpa, é indiscutível que
a montagem de Jarecki corrobora a tese de que Se, por um lado, o documentário valoriza a
é impossível se olhar a história e a memória de ambiguidade ou a abertura de sentidos ao
forma transparente, linear. Mais uma vez, cabe entrelaçar vozes plurais, sem impor conclusões
lembrar o que diz Benjamin (1985, p.229): “a finais, por outro, ele, de certa forma, mantém-se
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ligado ao espetacular quando faz uso de algumas cada um congela na tela para depois se prosseguir
estratégias de linguagem que alteram nossa fruição: com as cenas de família. Tal procedimento simula
uma trilha sonora de caráter melodramático, a abertura de filmes ficcionais em que, ao lado
procedimentos de desaceleração das imagens e uma da imagem do ator, lê-se “estrelado por...”. Assim,
montagem que investe em planos curtos. fica indicada, na própria materialidade fílmica, a
ideia de que aquelas pessoas, ao tomarem parte
Porém, antes de falar deste caráter “espetacular” do documentário, viram personagens, com toda
da montagem, tecemos considerações sobre carga ficcionalizante que isso implica. O jogo entre
as imagens performáticas de Na Captura dos trilha sonora e imagem assinala esse poder que o
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Friedmans, pois elas são um ponto forte do filme tem de, transformando-os em personagens
documentário, condicionando as redes de sentido de si mesmos, modificar-lhes a vida. “O filme me
possíveis de serem construídas. transformará em um grande astro”, diz a música
de abertura. A letra insinua, inclusive, a armadilha

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2 Performatividade e que pode ser para a família Friedman expor a si
experiência da memória mesma e sua intimidade no documentário: “Espero
que vocês venham me ver no filme. Então, saberei
Ao mostrar Jesse e Arnold Friedman encenando que terão visto o maior idiota que jamais teve um
a si mesmos, respectivamente, nos papéis de grande sucesso”. Aliás, vale frisar que, diante do
entrevistador e entrevistado, a sequência inicial de trauma e esfacelamento familiar já conhecido pelo
Na Captura dos Friedmans não só dá a conhecer diretor, o uso de tal trilha não deixa de ser um
os protagonistas, como sintetiza o caráter teatral pouco cruel e perverso.
e performático que prevalece em vários momentos
do documentário. Aliás, o caráter de encenação, Tomando como referência os filmes de família que
de teatralização do filme é ressaltado de forma serviram de base para o documentário, pode-se
bastante autorreferencial em toda a sequência que afirmar com toda a segurança que os Friedmans
constitui, por assim dizer, o seu prólogo. Enquanto eram acostumados a performar a si mesmos para
a canção de abertura diz: “vão me colocar em um suas câmeras caseiras. São muitas as imagens
filme, vão me transformar em um grande astro, de arquivo da família em que encenam para a
e tudo o que eu devo fazer é interpretar com câmera. E, para além das costumeiras imagens
naturalidade”, trechos em super-8 de filmes de dos filmes domésticos em que se registram
família dos Friedmans aparecem enquadrados sob o aniversários, nascimentos, viagens, os Friedmans
fundo de uma tela negra. Arnold, Elaine, David, Seth inventavam cenas e histórias inteiras, bastante
e Jesse, nesta sequência, são identificados por uma sofisticadas, para serem filmadas. Era comum os
legenda que surge no momento em que a imagem de membros da família entrevistarem uns aos outros,
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como evidencia a cena inicial do documentário já David – É culpado?

comentada neste artigo. Jesse – Nunca toquei numa criança.

David – Fez o que disseram?


Seguindo essa paixão familiar pelo registro em
Jesse – Nunca toquei numa criança. Nunca vi
imagens, David resolveu realizar seu videodiário meu pai tocar numa criança.
e filmar a família durante o julgamento de
Seth – Mas você deve ter feito algo.
Arnold e Jesse. Entre esse material, encontra-
David – Certamente algo aconteceu. Tem que
se uma série de cenas performáticas. Chamam ser verdade.
bastante atenção aquelas em que, no meio do
Seth – A polícia diz que é verdade.
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desentendimento e do caos em que estavam vivendo,
Jesse – Nada aconteceu na minha presença.
a família age de maneira irônica e/ou cômica.
E deve ter sido insignificante, pois nenhuma
criança disse nada.

Um dia antes de Arnold ir para a prisão, David Seth – Mas a polícia mentiu?

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anunciava o nome dos familiares que estavam em
Jesse – Cale-se, Seth!
sua casa à medida que os filmava. Quando focaliza
seu pai, Arnold olha para a câmera e, fazendo um
gesto como se indicasse uma inscrição no peito, Esse e outros diálogos presentes no filme,
pronuncia: “Número 4753206”, em alusão a um especialmente porque acontecem na frente de
código presidiário. Em outro momento, Arnold uma câmera caseira, borram a fronteira entre
fala para a câmera: “Eu ainda estou aqui. Talvez cena e vida, entre situação vivida e encenada.
não por muito tempo, mas ainda estou aqui”. Goffman (2004) propõe que performar é
A autoironia e o sarcasmo são evidentes. Nessa estabelecer um pacto não só com o outro, mas
mesma noite, pai e filhos dançam mambo na frente consigo mesmo a partir de uma ética e de uma
da câmera, todos enfeitados com adereços. (micro) política. Para o autor, encenar significa
ficcionalizar, estabelecer temporariamente
Em outra ocasião, os três irmãos estão no carro algum tipo de pacto com o outro, obliterar
a caminho do tribunal para o julgamento de Jesse questões, propor pequenas ficções.
quando travam um diálogo em que simulam uma
sabatina policial contra Jesse, insinuando que ele, Não é difícil supor que performances como as
de fato, abusou sexualmente de crianças e deve relatadas anteriormente funcionavam como uma
ser culpado das acusações que lhe são feitas. espécie de catarse. Há vários depoimentos nos
vídeos de família que sinalizam certos momentos
Seth – Você é molestador de crianças?
de teatralização, como uma estratégia de
Jesse – Não.
suspender o “real”.
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Fizemos aquilo para nos distrair. Não neces- A decisão de Jesse e David de registrar em áudio
sariamente para distrair o Jesse. Acho que ele
estava mais tranquilo do que nós. (David)
e vídeo a intimidade de sua família em situações
em que reinavam acusações verbais mútuas,
Tentávamos manter um clima normal em relação desintegração e desentendimento constituía
a jantarmos, pagarmos as contas... mas era qua-
um risco. Sem sombra de dúvida, um dos
se que surreal. Acho que nenhum de nós tinha
noção do que estava acontecendo, ou o que está- principais questionamentos que o filme suscita é,
vamos fazendo, ou onde aquilo ia acabar. (Jesse)
primeiramente, entender por quais motivos eles
tomaram tais atitudes. Depois, por que decidiram
O certo é que, diante do contexto situacional ceder tais registros ao diretor Andrew Jarecki
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vivido pelos Friedmans, os gracejos, as ironias, sabendo da posterior veiculação de tais cenas para
os sarcasmos consigo próprios, a performance um público amplo e irrestrito? Enfim, por que levar
histriônica para a câmera causam inquietação e para a tela de cinema um trauma familiar que diz
incompreensão. Alguns entrevistados de Jarecki respeito a um emaranhado de acontecimentos

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relembraram precisamente o quanto estranharam duros, difíceis e sombrios de suas vidas (a
o comportamento performático de Jesse no dia de acusação de abuso sexual impetrada a Arnold
seu julgamento: e Jesse, a desintegração da família, a prisão de
Jesse, o suicídio de Arnold)?
E no dia que foi feita a declaração, Jesse dança-
va e cantava nos degraus do tribunal, enquanto
era filmado pelos dois irmãos. (Frances Galasso) O próprio David fala no documentário que tem
medo que as pessoas descubram seu passado.
Eles estavam tirando fotos. Alguém me avisou
Ele diz: “Ninguém com quem trabalho sabe sobre
e olhamos pela janela. Achei aquilo muito es-
tranho. Ele estava prestes a passar 6 a 18 anos isso. Apenas a insinuação de algo assim pode
na prisão e fazia uma performance teatral nos
acabar com a carreira de alguém. Estou sempre
degraus do tribunal. (Anthony Sgueglia)
com medo que isto aconteça”. Mesmo assim, ele
cede não só seu videodiário a Jarecki como fotos e
Comolli afirma que estar onde o outro não filmes de família, além de dar entrevistas ao diretor.
espera que alguém esteja é ao mesmo tempo
artimanha e ingenuidade, no “duplo sentido 3 Entre o trauma e a possibilidade de
da palavra ‘tela’ – o que expõe e o que esconde” uma nova cena enunciativa
(2008, p. 91). O videodiário de David parece
operar justo dessa forma, ou seja, ao criar uma Talvez a explicação para tornar pública as imagens
cena enunciativa inesperada, ao mesmo tempo e a história da família esteja justamente no fato
em que produz “imagens em excesso”, esconde, de as narrativas presentes no filme dizerem
silencia, desvia o olhar. respeito a traumas individuais e coletivos. David
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levanta a hipótese de que começou a gravar as criança estirando a língua para a câmera. Como
imagens da família em seu videodiário para não ele é o único integrante do clã que se recusa a
ter que lembrar, para jogá-las no esquecimento participar do documentário, pode-se interpretar
(“Possivelmente gravei o vídeo para não ter que que, também no filme, ele incorpora o papel de
me lembrar. É uma possibilidade. Porque não me “rebelde” ao colocar-se em uma posição contrária
lembro de nada fora do vídeo. É como quando aos demais que concordam em falar. Há ainda um
tiram foto de você ainda menino, lembra-se do trecho do videodiário de David em que Elaine está
momento ou só da foto na parede?”). Há em David sendo acusada pelos filhos de não apoiar Arnold,
a vontade de esquecer, de apagar da memória um após exclamar que sua mãe está sendo “estúpida”,
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acontecimento que causa dor e sofrimento, mas ouve-se Seth afirmar: “Eu não quero falar sobre
um passado traumático não cansa de invadir isso”. Ou seja, o documentário mostra um material
o presente de cada um. Assim, “o presente se de arquivo em que Seth já aparece revelando a
paralisa e fica amarrado à presença crescente de vontade de não falar, de não discutir sobre o caso,

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um passado que não passa, que não conseguimos de silenciar sobre o assunto.
elaborar, um passado que é uma imagem viva e
incessantemente reatualizada, um tipo de imagem Mesmo aqueles que desejam ou aceitam participar
que convida a um grande projeto de resgate” do documentário, nem sempre se mostram afeitos
(SCHOLLAMMER, 2013, p.321). a tudo falar4; há ocasiões em que os entrevistados
preferem o silêncio, se negam a responder às
Com seu documentário, Jarecki possibilita aos questões de Jarecki. E o documentário deixa à
Friedmans uma espécie de rememoração catártica, mostra alguns destes momentos. Aos 4m34s de
uma oportunidade de se criar uma nova cena filme, Elaine declina da iniciativa de discorrer
enunciativa para o caso que envolveu a família. sobre Arnold. Logo em seguida, aos 5m20s, David
É verdade que nem todos do núcleo familiar se nega a conversar sobre a relação de seus pais à
compartilham desta vontade. Seth Friedman, por época da morte de Arnold:
exemplo, decide não participar do documentário.
Não faço tanta questão de falar sobre o pai
Sua imagem só aparece quando fotografias e dele... você sabe, nós nos divorciamos... e [...]
vídeos são exibidos e ele pode ser visto ao lado de Mas o pai dele... ele. Eu realmente não quero
falar sobre isso. (Elaine)
outros membros da família. Curioso perceber que,
logo no início da película, sua mãe o classifica Jarecki – Mas no final ele não estava com
sua mãe?
como “rebelde”. No momento em que ela fala
David – Ele não estava com ela no final.
isso, Seth aparece em um filme de família quando

4   Há também aqueles que falam, mas preferem esconder suas identidades. Nestes casos, os depoimentos são dados de forma
a esconder o rosto dos entrevistados.
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Jarecki – Quando eles decidiram se separar? os sistemas de dominação, mas aquilo por que,
Muito antes dele morrer? pelo que se luta, o poder do qual nos queremos
apoderar” (FOUCAULT, 2007, p.10).
David – Alguns anos antes dele morrer. [...] Há
muita coisa que... bem... sei lá. Há algumas
coisas sobre as quais eu não quero falar... Quando o diretor Andrew Jarecki reencontra o
videodiário de David, ele se depara não apenas com
Mas mesmo confinando certas coisas ao segredo ou o sofrimento do clã surpreendentemente registrado
negando-se a falar sobre elas, parte dos integrantes em imagens, mas também com o desejo de alguns
da família, em especial David, desejava fazer circular integrantes da família (em especial, David) de
publicamente outros discursos sobre o acontecido resgatar e reestabelecer a felicidade outrora
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além daqueles da polícia, da Justiça e da mídia. estampada nas fotografias e nos filmes
da família. Lissovsky (2011, p.11) afirma
David inaugura o seu videodiário dizendo para que “todo ‘achado’ em uma imagem de arquivo
câmera: “Bem, isso é particular e se não for Eu, é um olhar correspondido que atravessa as

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você não deveria estar vendo isso, porque isso é eras, o reencontro de um porvir que o passado
algo muito particular entre Eu e Eu. É algo entre sonhara – que somente nossos próprios sonhos
Eu no agora e Eu no futuro. Então desligue. Não de futuro permitem perceber”. Nesse contexto, o
assista isso. É privado”. Resta ponderar, como documentário se apresenta como uma possibilidade
propõe Ricardo (2011), se, diante de uma câmera, de olhar para as imagens do passado no “futuro
a privacidade ainda é um valor pertinente ou se do pretérito” (LISSOVSKY, 2011). Uma espécie de
entrar em cena, qualquer que seja a intenção que memória dinâmica, ao mesmo tempo em que reitera
presida a produção da imagem, implica sempre um “isso foi”, aponta para um “poderia ter sido”. É o
em uma abdicação da intimidade. que mostram os depoimentos captados pela câmera
amadora de David, retomados pelo documentário:
A nosso ver, ao registrar os desentendimentos,
Se o julgamento fosse adiado por 3 anos, em 3
as acusações, a desintegração da família, enfim, anos eu sairia vitorioso. Mas, no momento, se o
tudo o que se passava na esfera íntima de sua julgamento fosse em 2 semanas, eu perderia. É
o que achamos e é o que aconteceria. (Jesse)
casa durante o julgamento de seu pai e irmão mais
novo, David já anunciava o desejo de ser porta-voz
Sem papai no caso [...] Quem iria acreditar que
de outro discurso. eu sodomizei alguns meninos? (Jesse)

o discurso – como a psicanálise nos mostrou


– não é simplesmente aquilo que manifesta
Na mesma linha de funcionamento dessas imagens
(ou oculta) o desejo; é, também, aquilo que é de arquivo, que revelam perspectivas de futuro
o objeto de desejo; e visto que – isto a histó-
guardadas no passado, alguns depoimentos
ria não cessa de nos ensinar – o discurso não
é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou realizados no presente da filmagem olham
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retrospectivamente para esse passado e revivem o e colocá-la na temporalidade da narrativa


que, à época, imaginava-se como um futuro desejável. fílmica, a história tem um fim. Não há mais
surpresas. No filme, o futuro deixa de ser incerto
Meu pai me perguntou o que deveria fazer. Eu
poderia ter dito para o meu pai: “Quero que saia
e ameaçador. Após tantas turbulências, tantas
daqui e vá a julgamento e não se declare cul- experiências traumáticas, a catástrofe do
pado. Mas eu disse para ele tomar a decisão.
passado aparece redimida na tela. Uma legenda
Lembro de me sentir realmente como um garo-
to. Olhar para o meu pai e dizer para ele: Papai, “Epílogo” anuncia este tempo de redenção e
eu, você sabe, eu quero que você seja meu pai.
reconciliação. A sequência de cenas que vemos
Teria sido um orgulho se tivesse dito: “Elaine,
não me declararei culpado. Iremos a julgamen- surgir é a seguinte: a) no deck de uma praia com
to”. Mas não foi isso que aconteceu.” (Jesse) 11/17
o pôr do sol ao fundo, Howard, irmão de Arnold,
Se meu pai pudesse se confessar para mim que aparece ao lado de seu companheiro Jack e
alguma vez fez alguma coisa e foi assim que
da cadela Mona; b) David, vestido de palhaço,
tudo começou, tudo teria mais sentido. [...] uma
forma de explicar o inexplicável. (Jesse) surge animando uma festa infantil; c) Elaine e

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seu novo marido caminham pelo jardim de sua
Imploramos para ele que nos dissesse se tinha
acontecido algo para poder explicar como se ar- casa, chamada “Lacúna Pacífica”; d) a lápide de
mou todo esse caos. É a única forma de explicar
Arnold é focalizada e nela pode-se ler a inscrição
como isso pode ter acontecido. (David)
“Bom pai, professor dedicado, pianista, físico,
Não devia ter terminado assim. As pessoas deviam
gatão de praia” (nesse momento, também somos
tomar conhecimento de que tudo isso não teve
sentido e nós voltaríamos à normalidade. (David) informados que Jesse ganhou US$ 250.000 do
seguro de seu pai); e) David e Jesse se abraçam
A última fala de David anteriormente transcrita na frente da prisão no dia em que Jesse ganha
deixa explícito não só o desejo de um futuro outro, a liberdade; f) Jesse vai ao encontro de Elaine,
mas a crença na possibilidade de que realmente bate na porta e diz: “Serviço de quarto... Pediu um
poderia ter sido outro. O que o documentário de filho? Me procuravas?”, depois os dois se abraçam.
Andrew Jarecki faz é indicar algumas brechas, Nada mais redentor do que um final desse tipo.
algumas fissuras no passado que permitem Talvez, para os Friedmans, a maior potência do
enxergar essas possibilidades de outra(s) filme resida justo nesse tempo apaziguado.
história(s). A nosso ver, não por acaso essa fala
é inserida nos minutos finais do filme, logo na Ao encadear imagens de arquivo e depoimentos,
sequência vem o chamado “Epílogo”, insinuando Na Captura dos Friedmans insere em um mesmo
o que poderia ter sido outro final da narrativa. espaço discursivo, ou seja, no filme, personagens
e tempos narrativos diferenciados, criando através
Ao retirar a história da família Friedman do desse entrecruzamento de vozes uma nova cena
tempo temido e incerto da realidade histórica para o caso Friedman. A partir desse novo jogo de
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forças propiciado pelo documentário, o espectador curtos resulta em uma montagem excessivamente
é levado a se questionar sobre “a verdade” e a fragmentada5, a qual aproxima toda a
experimentar esse futuro do pretérito do qual multiplicidade antes referida à familiaridade
falamos antes. do espetáculo. Comolli propõe que o modelo
dessa montagem é o clipe e o modelo exemplar,
Essa é uma dimensão política importante do filme, o gesto do zapping. Impaciência, precipitação
mas a análise do político não deve se encerrar aí. e volatilidade permeiam esse tipo de montagem
Como bem coloca Guimarães (2011, p.34), “não se nomeada por ele de “espetacular” e que implica
trata apenas de reconhecer enunciados políticos
não continuar no lugar, numa duração, numa 12/17
em jogo, mas de investigar de perto a fabricação cena, num cenário, numa idéia, num tema, num
estética do filme, seus procedimentos de mise- motivo, numa reflexão, num argumento, mas ir
e vir, começar e terminar. Mas também: chocar
en-scène e de montagem particulares, buscando
com cortes repetidos, impor afirmações, mul-
revelar, nessa busca, seus modos próprios – tiplicar as imagens-choque, fragmentar as pe-

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quenas frases, fazer brilhar toda uma explosão
e singulares – de invenção política”. Portanto,
de planos curtos, de planos-clipe, jogar com os
precisamos escavar ainda mais as estratégias efeitos de montagem como numa plataforma de
mobilizadas pela película, a fim de compreender jogo ultra-rápido. (COMOLLI, 2007, p.15)

que algo no documentário claudica e nos confina


a experiências estéticas já conhecidas ligadas à Comolli enxerga nesse tipo de montagem uma
esfera do espetáculo e do melodrama. violência contra a liberdade do personagem e
do espectador. Do ponto de vista da personagem,
4 Virando a montagem ao avesso o tempo de sua inscrição na cena corresponde
ao tempo de sua construção identitária. Ou seja,
Em Na Captura dos Friedmans, há uma a temporalidade é crucial para a performance
estratégia de montagem que vai de encontro de uma pessoa que “encena” a si mesma para um
à heterogeneidade de vozes que o diálogo diretor e para um futuro espectador. Encenação
dissensual construído pelo documentário abriga. deve ser entendida aqui na perspectiva de
As diferentes vozes discursivas, os variados tipos Goffman (2004), para quem o sujeito em situação
de imagem (de álbuns e filmes de família, da TV e de interação social age de maneira semelhante
do próprio doc), as distintas temporalidades (do a um ator de teatro, construindo uma personagem
presente da filmagem ou do passado – imagens de de si com a finalidade de influenciar seu
arquivo), tudo isso recebe o mesmo tratamento na interlocutor. Ao realizar um corte no plano, seja no
montagem. A profusão de planos exageradamente momento da filmagem ou na etapa da montagem,

4   É difícil um plano de mais de 30 segundos em Na Captura dos Friedmans. A duração média de um plano é de 10 segundos.
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um diretor pode retirar da personagem a potência um modo único de fazer documentário. Um


de aparecer na cena da forma como lhe convém. documentário com potência política não é somente
aquele feito de planos longos abertos à entrega/
Do lado do espectador, Comolli afirma que, a partir adensamento do personagem à cena. Mas, no caso
do momento que percebe que a palavra filmada foi de Na Captura dos Friedmans, tendo em vista
cortada, quer seja em função de uma censura ou a complexidade da história e os afetos díspares
da simples seleção de certas passagens, ele deixa entre os familiares, talvez as alteridades abordadas
de acreditar na autonomia daquele que fala, isto é, pudessem construir de si um painel mais livre e
em sua dimensão de personagem. rico, em vez de serem alvo de operação de subtração
13/17
orquestrada pelo diretor; do ponto de vista do
A montagem espetacular, ao pressupor que espectador, uma montagem menos vertiginosa
o mundo é lento e o espectador apressado, contribuiria também para afastar o filme do
aligeira ações e falas. O efeito é uma “estética da espetáculo, para corroborar sua proposta de investir

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abreviação” (COMOLLI, 2007). O espectador é na abertura de sentidos e, sobretudo, para engajá-lo
convidado a desfrutar de um prazer que o diminui. em outra experiência de cinema e de tempo, distante
Dele é demandado menos tempo, menos trabalho, daquela proporcionada pela grande mídia.
menos engajamento. De forma contrária, um plano
que dura, a princípio, pesa sobre o espectador A montagem de Na Captura dos Friedmans,
como um constrangimento, e porque dura, esse no entanto, oferece ao espectador apenas
plano se abre à presença desse mesmo espectador trechos curtos dos depoimentos filmados. Muitas
que pode habitá-lo com sua fantasia ou pode dele vezes, quando se insinua um embaraço qualquer, há
se evadir (COMOLLI, 2007). Sobre a importância um corte no plano e ficamos sem saber se o que veio
da duração de um plano, o documentarista na sequência foi uma breve hesitação, uma pausa
Eduardo Coutinho (2008, p.70) afirma: ligeira, um silêncio prolongado ou mesmo uma
negação da personagem de continuar conversando.
Não me interessa o plano curto. Eu quero a
dimensão temporal das coisas. Às vezes uma
pessoa fala, e é cinco, três minutos, e é isso 5 O duplo funcionamento da montagem
mesmo. Tem uma densidade, tem progressão,
ela hesita, volta para trás. Isso é inadmissível na
televisão. As pessoas têm um tempo, têm uma Em uma primeira visada, Na Captura dos
memória, têm um passado, mas para isso vir à
Friedmans se distancia da verdade construída
tona tem uma temporalidade, que precisa estar
nos planos, na edição. pelo discurso jornalístico à época em que os
fatos aconteceram e, se não chega a transformar
Cabe ressaltar que as observações de Comolli as identidades construídas pela mídia a respeito
e Coutinho são importantes, mas não delimitam dos acusados, consegue ao menos nuançá-
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las. No jogo ziguezagueante das entrevistas, o ao espetáculo (que tudo transforma e esvazia).
espectador é levado a “acreditar, não acreditar Como bem escrevem Caixeta e Guimarães no
mais, voltar a acreditar” (COMOLLI, 2007). prefácio de “Ver e Poder”: “... deveríamos filmar
Diferentemente das verdades objetivas fornecidas não para ‘capturar’ [...] o corpo e o pensamento do
pelo discurso midiático, o documentário se outro (filmado), mas sim para transformá-lo e nos
coloca no lugar em que as crenças e as verdades transformar” (2008, p.41).
são colocadas em dúvida. Nesse contexto, o
espectador vivencia uma crise. Ao adotar uma narrativa melodramática e
pulverizar os planos, o documentário Na Captura
14/17
No entanto, um segundo olhar para o filme dos Friedmans sequestra do sujeito filmado um
permite evidenciar um outro funcionamento da porvir e também nega ao espectador uma nova
montagem que, ao entrecortar os depoimentos experiência com as imagens em movimento, ambos
e aligeirar as falas, se alia ao que Comolli são expropriados de uma certa transformação de

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chama de “cinema-espetáculo”. Desta forma, o si. Assim, o jogo do heterogêneo proporcionado
documentário se coloca em um lugar no mínimo pelas entrevistas e imagens de arquivo fica
ambíguo: por um lado, o diretor intenciona uma reduzido à familiaridade do espetáculo.
abertura de sentido; por outro, os cortes nos
planos dão pistas de uma vontade de poder e Referências
de controle que oferece ao espectador apenas BENJAMIN, Walter. “Sobre o conceito de história”. In:
aquilo que foi selecionado como “as melhores Obras escolhidas. Vol. 1. Magia e técnica, arte e

passagens”. Assim, o diretor exerce seu controle política. Ensaios sobre literatura e história da
cultura. São Paulo: Brasiliense, p. 222-232, 1985.
não apenas sobre o corpo e a fala das pessoas
filmadas, mas também sobre o espectador, CAIXETA, Rubem e GUIMARÃES, César. Pela distinção
entre ficção e documentário, provisoriamente. In: Ver
aprisionado a um tempo de fruição já conhecido.
e poder - A inocência perdida: cinema, televisão,
Esse aspecto autoritário da montagem se faz ficção, documentário. Belo Horizonte: Editora
notar no regime frenético da edição. UFMG, p.32-49, 2008.

CAPTURING FRIEDMANS. Direção: Andrew Jarecki.


Neste momento, é interessante pensar um Produção: Andrew Jarecki e Marc Smerling. Edição:
dos efeitos de sentido que o próprio título do Richard Hankin. Diretor de Fotografia: Adolfo Doring.
Música: Andrea Morricone. Produzido por HBO e
documentário provoca. Capturing Friedman (em
Magnólia. 2003.
português, “Na captura de”) não soa como algo
COMOLLI, Jean Louis. Algumas notas em torno da
aberto à alteridade supostamente visada pelo
montagem. In: Devires. Belo Horizonte, v.4, n.2,
diretor. Capturar é o oposto de libertar e liberar p.12-41, 2007.
sentidos. A prática da “captura” é pertinente
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________ . Elogio do cine-monstro. In: Ver e poder


- A inocência perdida: cinema, televisão, ficção,
documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, p.90-95,
2008.

COUTINHO, Eduardo. O silêncio depois de uma fala é a


coisa mais linda que há. In: Eduardo Coutinho. Felipe
Bragança (org). Rio de Janeiro: Beco do Azougue, p.66-
79, 2008.

FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. 15ª ed. São


Paulo: Edições Loyola. 2007.
15/17
GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida
cotidiana. 12ª ed. Petrópolis: Vozes, 2004.

GUIMARÃES, Victor. A intermitência política do


documentário L.A.P.A, entre o consenso e o dissenso.

Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação | E-compós, Brasília, v.18, n.2, maio/ago. 2015.
In: Devires, Belo Horizonte, v.8, n.2, p. 28-47, 2011.

LINS, Consuelo; REZENDE, Luiz Augusto; FRANÇA,


Andrea. A noção de documento e a apropriação de
imagens de arquivo no documentário ensaístico
contemporâneo. In: Revista Galáxia. São Paulo, n. 21,
p. 54-67, jun. 2011.

LISSOVSKY, Mauricio. Dez proposições acerca do


futuro da fotografia. In: FACOM. n. 23. p.4-15,1º.
semestre de 2011.

RICARDO, Laécio. O documentário e o enigma da


alteridade. In: Pacific: textos para debate. p.19-28, 2001.

SCHOLLAMMER, Karl Erik. Cena do crime: violência


e realismo no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro:
José Olympio. 2013.
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Spectacle and performativity Espectáculo y performatividad en


in Capturing Friedmans A la Captura de los Friedmans
Abstract Resumen
From the contraposition of various statements, the A partir de la contraposición entre varios testimonios,
montage of the documentary Capturing Friedmans el montaje de A la Captura de los Friedmans (2003)
(2003) brings into question the procedures used by pone en duda los procedimientos utilizados por la
the justice system and the media to criminalize Arnold justiça e por los medios para criminalizar Arnold y
and Jesse Friedman, accused of child molestation Jesse Friedman, acusados de abuso sexual contra
in Great Neck, USA, in 1988. The movie received menores en Great Neck, EUA, en 1988. El documental
innumerous compliments from critics because it recibió elogios de la crítica justamente por valorar
valued the ambiguous narrative. Nevertheless, we la ambigüidad narrativa. Sin embargo, buscamos 16/17
aim to demonstrate that the fragmented montage is mostrar que el montaje fragmentado se vincula a
aligned with the idea of spectacle, stylistic procedure la idea de espectáculo, procedimiento estilístico
that, from a political point of view, is opposed to que, del punto de vista político, se contrapone a la
the opening of senses and heterogeneity of voices apertura de sentidos y a la heterogeneidad de voces
mobilized in the documentary. It is also in our interest que el film moviliza. También llamamos la atención

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to draw attention to the performative character of para el carácter performático de buena parte de sus
most of the scenes, because it allow senses and imágenes, pues estas permiten que sentidos y sujetos
subjects to move away from preconceived places. se aparten de lugares preconcebidos.

Keywords Palabras clave


Montage. Spectacle. Performativity. Montaje. Espectáculo. Performatividad.

Recebido em: Aceito em:


30 de julho de 2015 06 de agosto de 2015
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A revista E-Compós é a publicação científica em formato eletrônico Revista da Associação Nacional dos Programas
da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em de Pós-Graduação em Comunicação.
Comunicação (Compós). Lançada em 2004, tem como principal Brasília, v.18, n.2, maio/ago. 2015.
finalidade difundir a produção acadêmica de pesquisadores da área A identificação das edições, a partir de 2008,
de Comunicação, inseridos em instituições do Brasil e do exterior. passa a ser volume anual com três números.
Indexada por Latindex | www.latindex.unam.mx

CONSELHO EDITORIAL Itania Maria Mota Gomes, Universidade Federal da Bahia, Brasil
Janice Caiafa, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
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Ana Carolina Damboriarena Escosteguy, Pontifícia Universidade José Luiz Aidar Prado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil
Católica do Rio Grande do Sul, Brasil Kati Caetano, Universidade Tuiuti do Paraná, Brasil
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17/17
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André Luiz Martins Lemos, Universidade Federal da Bahia, Brasil Luíza Mônica Assis da Silva, Universidade de Caxias do Sul, Brasil
Andrea França, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil Luciana Miranda Costa, Universidade Federal do Pará, Brasil
Antonio Carlos Hohlfeldt, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande Malena Segura Contrera, Universidade Paulista, Brasil
do Sul, Brasil Marcel Vieira Barreto Silva, Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Arthur Ituassu, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil Maria Ogécia Drigo, Universidade de Sorocaba, Brasil
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Ângela Freire Prysthon, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil Maria Clotilde Perez Rodrigues, Universidade de São Paulo, Brasil
César Geraldo Guimarães, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Maria das Graças Pinto Coelho, Universidade Federal do Rio Grande
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