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A GESTÃO DOMOCRÁTICA DO PROCESSO NOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

PROCESSUAIS: UM ESTUDO A PARTIR DO PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO.

Edênia Maria Cordeiro Karam1

RESUMO

O Processo deve ser visto, acima de tudo, como justo. Para tanto, temos que, um dos maiores
desafios da jurisdição processual brasileira nesse sentido, está na organização equilibrada de
sua formalidade, assim compreendida como a delimitação de poderes, faculdades e deveres dos
sujeitos processuais, na formação de uma verdadeira “comunidade de trabalho2”. Nesse cenário,
o artigo debate acerca da gestão democrática do processo nos negócios jurídicos processuais,
cujo resultado seria o produto da atividade entre juiz e partes numa dinâmica em que lhes é
permitido estabelecer convenções sobre ônus probatório, poderes, faculdades e deveres
processuais, inclusive, para adequarem o procedimento de acordo com as especificidades da
demanda ajuizada. Para uma melhor didática, o artigo foi dividido em três etapas: num primeiro
momento buscou-se discorrer sobre o modelo de processo colaborativo e a eficácia normativa
das convenções nos negócios jurídicos processuais. Já num segundo momento, o trabalho
descreve a configuração desses negócios jurídicos, ou seja, natureza jurídica, momento e
conteúdo, bem como sobre os limites e controle por parte do Estado-Juiz. Por fim, traçou-se
breves comentários sobre a (in)possibilidade de aplicação de convenções processuais em outros
ramos do direito, bem como sobre as críticas doutrinárias ao princípio da cooperação.

Palavras-chave: Negócio Jurídico Processual. Princípio da Cooperação. Processo Democrático.


Controle Jurisdicional.

1 Graduanda em Direito Processual Civil pela Universidade de Fortaleza- UNIFOR e pós-graduada em


Direito Público pela UNICE ENSINO SUPERIOR – IESF INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DE
FORTALEZA.
2
A expressão é de José Carlos Barbosa Moreira, “O Problema da ‘Divisão do Trabalho’ entre Juiz e Partes:
Aspectos Terminológicos”, Temas de Direito Processual. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 35/44, Quarta Série
2

THE WILL OF THE PARTIES AS A SOURCE OF PROCEDURAL STANDARDS IN


PROCEDURAL LEGAL BUSINESS: A STUDY FROM THE DEMOCRATIC
MANAGEMENT OF THE PROCESS AND THE PRINCIPLE OF COOPERATION.

ABSTRACT

The Process must be seen, above all, as fair. Therefore, one of the major challenges of Brazilian
procedural jurisdiction in this sense is the balanced organization of its formality, understood
as the delimitation of powers, faculties and duties of procedural subjects, in the formation of a
true "work community" . In this scenario, the article discusses the democratic management of
the process in the juridical procedures, whose result would be the product of the activity
between judge and parties in a dynamic of collaboration. For a better didactic, the article was
divided into three stages: at first, we sought to discuss the model of collaborative process and
the normative effectiveness of conventions in the juridical procedures. Already in a second
moment, the work describes the configuration of these legal transactions, that is, legal nature,
moment and content, as well as on the limits and control by the State Judge. Finally, brief
comments were made on the (in) possibility of applying procedural conventions in other
branches of law, as well as on doctrinal criticisms of the principle of cooperation.

Keywords: Business Legal Process. Procedural Flexibility. Principle of Cooperation.


Jurisdictional control. Democratic Process.
3

1 Introdução

Pontes de Miranda define o Negócio Jurídico Processual como sendo o ato jurídico, cujo
suporte fático tem como um dos elementos essenciais a manifestação da vontade, com o poder
de criar, modificar ou extinguir direitos, pretensões, ações ou exceções, tendo como pressuposto
deste poder o autorregramento da vontade3.

Nesse sentido, o Direito Processual Civil trouxe à virtude acadêmica a reflexão sobre a
autonomia da vontade das partes para fazerem convenções processuais. A questão gira em torno
de se saber quais regras podem ser flexibilizadas e em que consiste o papel do Juiz na
configuração desse negócio jurídico. Dentre vários pontos relevantes sobre o tema, é de suma
importância entendermos sua classificação, limites, condições de validade, além do papel do
Juiz no controle das convenções processuais no contexto do processo cooperativo.

Festejado por muitos e criticado por outros, o negócio jurídico processual não é tema
pacífico na doutrina brasileira4. Para os que festejam, trata-se de incremento dado pelo
legislador ao papel da autonomia da vontade das partes, no que diz respeito às suas posições
processuais e à construção do procedimento. Dentre eles, destaca-se Fredie Didier, para quem
o prestígio da autonomia da vontade das partes, cujo fundamento é a liberdade, é um dos
principais direitos fundamentais previstos no art. 5° da Constituição Federal. Já para os que
criticam, como Cândido Rangel Dinamarco e Alexandre Câmara, não é possível considerar a
existência de negócios jurídicos processuais, pois os efeitos dos atos processuais resultariam
sempre da lei ou da intervenção judicial para que se produza, e não da vontade das partes5

Essas convenções processuais não são uma total novidade no sistema atual. Sabe-se que
o negócio Jurídico no CPC de 1973 já era possível, pois previa várias disposições, fazendo com
que a vontade das partes fosse considerada, por exemplo: a) o foro de eleição, com
determinação no art. 111, que veio repetido no art. 73, do novo CPC; b) a suspensão do processo
com disposição no art. 313, que permitia às partes suspender o processo por até seis meses, para

3
MIRANDA, Pontes de. Trotado de direito privado. Tomo 03. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Campinas:
Bookseller, 2000, p. 29.
4
TARTUCE, Flávio. Negócio jurídico processual em contratos de consumo. Disponível em:
<http://genjuridico.com.br/2018/01/03/negocio-juridico-processual-em-contrato-de-consumo> Acesso em: 07
de junho de 2018.
5
Dentre outros, refutam a existência da figura do negócio jurídico processual: DINAMARCO, Cândido Rangel.
Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, 6. Ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 464; CÂMARA, Alexandre
Freitas. Lições de direito processual civil, v. 1, 16. Ed, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 248.
4

tentarem de acordo, além de muitas outras. Enfim, não se pode falar que o acordo não tinha
relevância no antigo código, mas que ele tinha uma relevância diminuída, isso porque exigia-
se expressa previsão legal, ou seja, exigia-se tipicidade; lei que autorizasse as partes usar a
vontade como forma de dar regramento ao processo.

Nesse cenário, o CPC/2015 reforçou o exercício dessa autonomia da vontade e


autorregramento das partes ao prever, através de cláusula expressa, a permissão para a
convenção desses negócios jurídicos, através de um processo cooperativo, na medida em que
ampliou a participação de todos os envolvidos no litígio. De acordo com Elpídio Donizete, o
que a doutrina brasileira fez foi importar do Direito europeu o princípio da cooperação- ou da
colaboração-, segundo o qual o “processo seria o produto da atividade cooperativa triangular-
entre o juiz e as partes”6.

Essa dinâmica requer um juiz ativo no centro da controvérsia e a participação ativa das
partes, no sentido de tornar o processo um meio apto para alcançar a justa aplicação do
ordenamento jurídico ao caso concreto. Como se vê, as convenções processuais abarcam um
campo amplo, pois não existe um rol taxativo de permissões. Em razão disso, faz-se necessário
uma atuação mais rígida do magistrado nos casos em que as partes possam vir a cometer
excessos durante o curso do processo.

A novidade no CPC de 2015 foi a autorização legal para que as partes negociem, não
somente nos termos do CPC - cuja convenção será típica -, mas, também, em convenções
criadas por elas mesmas, sem forma, tempo ou modo previstos expressamente em Lei – que são
as convenções atípicas. A permissão veio através de uma cláusula geral, uma regra geral
prevista no Art. 190, estabelecendo que as partes podem convencionar mudança no
procedimento e deliberar sobre seus poderes, ônus, direitos e obrigações.

Enquanto isso, fundamentando o referido artigo, têm-se os princípios do devido


processo legal, contraditório, da boa-fé processual, donde decorre o Princípio da Cooperação.
Todo esse conjunto de regras e princípios visa organizar e definir o modo como o processo será
estruturado com o propósito de que seja rápido, justo e eficaz.

Esse modelo redimensiona o contraditório, incluindo o Juiz, no rol dos sujeitos que
dialogam no processo. Isso porque, após o advento do CPC de 2015, o princípio da cooperação

6
DONIZETTI Elpídio. Disponível em:< https://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/121940196/principio-da-
cooperacao-ou-da-colaboracao-arts-5-e-10-do-projeto-do-novo-cpc> Acesso em: 07 de junho de 2018.
5

passou a caracterizar-se pelo redimensionamento do princípio do contraditório – que inclui o


Estado-juiz como sujeito do diálogo processual e não como um espectador do duelo entre as
partes.
Não obstante, a sua participação foi acentuada para vivificação do diálogo e da
comunicação entre os participantes na lide, administrando as ideias de cada um, valorizando a
contestação das partes como instrumento ao aprimoramento de sua decisão. Em vista disso, o
contraditório não mais é uma regra formal de validade, como o foi durante toda a vigência do
CPC de 1973, uma vez que é valorizado no Novo CPC, como um eficiente meio indispensável
ao esmero da decisão judicial.
Nesse contexto, temos que a nossa pretensão de estudo sobre esse tema foi a de reunir
esforços para propiciar acesso aos textos qualificados que apresentem, como elemento comum,
a análise sobre a importância do processo cooperativo, com o propósito de entender como se
dará essa dinâmica de cooperação proposta pelo Novo Código de Processo Civil.

Por oportuno, ressalta-se que não se buscou aqui esgotar todo o assunto, haja vista ser
um campo vasto a ser explorado, o que, por si só, jamais se conseguiria exaurir neste artigo.

2 A cooperação como princípio no processo colaborativo

Em um Estado Democrático de Direito, o modelo cooperativo parece ser o mais


adequado. Agir de forma colaborativa significa uma conduta proativa. É um fazer quando o
agente poderia, simplesmente, se omitir. A cooperação vem prevista no art. 6º do novo Código,
inserto no capítulo “Das Normas Fundamentais do Processo Civil”, estabelecendo que “todos
os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável,
decisão de mérito justa e efetiva”.

Dierle Nunes descreve o modelo de processo cooperativo/participativo como uma de


técnica de construção de um processo civil democrático, no qual as partes são vistas como uma
comunidade de trabalho, onde as tarefas são distribuídas conforme a convenção estipulada entre
as partes.7

7
NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008, p. 215. Neste mesmo
sentido, ZANETI Jr., Hermes. Processo constitucional, cit., p. 60-61.
6

Certamente que nessa comunidade de trabalho surgirão deveres de condutas, tanto para
as partes, quanto para o Julgador. O direito processual moderno, defende-se a ideia de que o
Juiz assumirá uma posição de igualdade com as partes durante a condução do processo - uma
vez que não lhes ignora o papel. Ele dialoga com elas e ainda mantém o controle nos tratos e
cumprimento dos acordos. No entanto, ao proferir a sentença, mostra-se em uma posição de
autoridade competente para decidir.8

Nota-se que a preocupação dos juristas atuais é o de proporcionar às partes a


oportunidade do diálogo e participação; ao Magistrado o dever de prestar esclarecimentos,
auxiliar as partes na superação de dificuldades que as impeçam de exercer direitos e faculdades
ou de cumprir ônus ou deveres processuais. Em conclusão, entendemos que a decisão judicial
no processo colaborativo é fruto da defesa de pontos de vista contrários, como sempre o é, mas
a organização processual tende a avançar com o propósito de implantar um processo
democrático, participativo, em que as partes têm uma maior flexibilidade para adapta-lo às suas
necessidades.

2.1 Eficácia normativa do princípio da cooperação


O Princípio da Cooperação possui eficácia normativa direta, independentemente de
regras que o delimite e/ou esclareça o seu conteúdo, ou para que imponha deveres e obrigações
aos sujeitos do processo9. Tem como uma de suas finalidades promover um processo justo, que
é o cooperativo, onde se faz uma divisão do trabalho10entre seus participantes, e pela
colaboração do Juiz com as partes. Nas palavras de Fredie Didier, essa eficácia normativa
independe de regras jurídicas expressas. Além disso, ela garante sanções às condutas que são
contrárias à obtenção do Estado de Coisas e impede que atos contrários à dignidade da justiça
venham a ser praticados, colocando em risco a não satisfação plena do direito, ao qual o
princípio da cooperação busca promover e tutelar11.

8
MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil, cit., p. 102-103.
9
DIDIER Fredie. Disponível em :
<https://www.academia.edu/1771108/Os_tr%C3%AAs_modelos_de_direito_processual> Acesso em: 07 de
junho de 2018.
10
A expressão é de José Carlos Barbosa Moreira, “O Problema da ‘Divisão do Trabalho’ entre Juiz e Partes:
Aspectos Terminológicos”, Temas de Direito Processual. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 35/44, Quarta Série.
Também nesse sentido: SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2ª ed. Lisboa: Lex,
1997, p. 62.
11
DIDIER Jr., Fredie Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e
processo de conhecimento. Salvador: Ed. Juspodivm, 2015. p. 127.
7

Em razão disso, Princípio da Cooperação caracteriza-se como uma norma


imediatamente finalística, que vem a ser aquela que estabelece um fim a ser seguido, um
objetivo juridicamente relevante a ser atingido. Consequentemente estabelece um estado de
coisas para cuja realização é necessária a adoção de determinados comportamentos12.

Esses comportamentos baseados no princípio da cooperação envolve uma atuação


transparente e sincera que se estabelece entre juiz, partes e procuradores, quando da
comunicação e identificação dos pontos que realmente reclamam uma decisão judicial e
daqueles nos quais as partes, por conta própria, podem chegar a um consenso.

Nesse ponto, merece destaque o papel dos advogados uma vez que, além dos deveres
em relação a seus clientes, também exercem um papel de “Agentes da Corte”, o que exige uma
atuação sincera e colaborativa com o exercício da jurisdição. Assim sendo, é fundamental o
papel que exerce o princípio da cooperação para delimitar uma atuação ética e proba por parte
do advogado, reconhecido, na própria Constituição Federal de 1988, como “indispensável à
administração da justiça”.

Por oportuno, cabe ressaltar, que o objetivo da cooperação não é fazer com que as partes
concordem em tudo, não é isso. O objetivo da cooperação visa resolver os conflitos
desnecessários mediante um consenso entre as partes e limitar a intervenção do Juiz apenas
àqueles casos nos quais ela seria absolutamente necessária.

Outro ponto relevante é acerca das dúvidas e discussões em saber quais são as
consequências da inobservância do dever de cooperação. A pergunta é: mas quais os tipos de
comportamentos podem ser considerados cooperativos e quais indicam uma recusa da parte ou
de seu advogado em cooperar? A nosso ver, é muito arriscado afirmar que de um dever geral
de cooperação surja sansões punitivas não previstas em Lei, especialmente tendo em vista a
ausência de uma definição precisa se este dever é uma realidade ou está em vias de se tornar. O
risco de que isso dê origem a arbítrios por parte do Magistrado é uma realidade. Imagine-se,
então, o Juiz diante da discricionariedade em ter que aplicar sanções às condutas tipificadas

12
Humberto Ávila conceitua os princípios como normas imediatamente finalísticas, primariamente
prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se exige a
avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida
como necessária à sua promoção. São, portanto, normas que estabelecem um objetivo a ser alcançado (um fim
juridicamente relevante a ser atingido), sendo imediatamente finalísticas (estabelecem um estado de coisas
para cuja realização é necessária a adoção de determinados comportamentos). ÁVILA, Humberto. Teoria dos
princípios. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 78-90.
8

como atos de improbidade processual. Por certo, surgirão problemas futuros; pensamos que
seria interessante que o próprio texto legal tivesse trazido parâmetros ou hipóteses
autorizadoras, a fim de evitar atos desnecessários.

Evidentemente, que o dever de cooperação no processo assegura uma proteção


qualificada ao ativismo do juiz, que deve ser razoável, proporcional, estimulado e ao mesmo
tempo conciliado com o ativismo das partes, para que atenda à finalidade social do processo
moderno13. Logo, a eficácia normativa do princípio da cooperação é suficiente para suprir a
inexistência de regras de condutas e/ou comportamentos, e com isso garantir o meio para se
obter o fim almejado, o processo cooperativo14.

2.2 O princípio da cooperação como ferramenta de norma processual


A regra do velho brocardo iura novit curia (o Juiz conhece o direito) ou do mihi factum
dabo tibi ius (dá-me os fatos, que eu te darei o direito) é muito peculiar, uma vez que o
Magistrado detém um poder discricionário para empregar técnicas de interpretações baseadas
em seu convencimento; baseadas em uma compreensão daquilo que ele acha ser o certo, já que
pôde apreciar livremente as provas colhidas pelas partes e sobre elas tecer seu juízo de valor.

Porém, essa regra pode reverter-se em um constrangimento ou mesmo em uma pressão


moral às partes, quer seja em decorrência de uma provável deficiência no emprego das normas
processuais ou até mesmo por falta de uma aplicabilidade correta no emprego das técnicas que
usará para interpretação de regras e princípios. Desse modo, peca, muitas vezes, o Juiz, ao falhar
no momento em que se vê frente à necessidade de fazer uma ponderação entre dois princípios,
ou mesmo ao lançar mão de procedimentos autoritários, quando se encontra frente à colisão
entre duas ou mais regras aplicáveis.

Em contextos como esses, o princípio da cooperação põe-se em evidência como


ferramenta de norma processual. Para entendermos melhor a temática, exemplificaremos com
a seguinte situação hipotética: o autor de uma ação faz um pedido com base em uma lei A. Por
outro lado, a outra parte alegou que essa lei A não se aplicaria ao caso em questão, e sim, a lei
B. O Juiz, por sua vez, possui entendimento divergente e está convencido da questão com base

13
DONIZETTI Elpídio. Disponível em:<https://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/121940196/principio-da-
cooperacao-ou-da-colaboracao-arts-5-e-10-do-projeto-do-novo-cpc> Acesso em: 07 de junho de 2018.
14
DIDIER Fredie. Disponível em:
<https://www.academia.edu/1771108/Os_tr%C3%AAs_modelos_de_direito_processual> Acesso em: 07 de
junho de 2018.
9

em uma terceira lei, a C, que não foi, sequer, hipoteticamente discutida pelas partes e com base
nela proferiu a seguinte decisão: “essa lei apontada pelo autor como fundamento do seu pedido
é inconstitucional, portanto, julgo improcedente a demanda”.

Em situações como essa, o princípio da cooperação impõe ao órgão jurisdicional que


submeta essa nova abordagem à discussão das partes, sob pena de estar ferindo o contraditório,
o exercício democrático da jurisdição e o princípio da não supressa. Essa é a inteligência do art.
9º CPC/2015.

Ao vislumbrar casos assim, Carlos Alberto de Oliveira muito bem definiu o Princípio
da Cooperação, ao descrevê-lo como um instrumento de democracia processual apto a impedir
sentenças judiciais legalistas e imotivadas que impedem a correta e justa aplicação do direito15.
Porquanto, ao juiz só é dado decidir sem a participação das partes em situações
excepcionais, como para evitar um dano irreparável ao resultado útil do processo, por exemplo:
admite-se que o Juiz decida, liminarmente, sem a oitiva da parte contrária (inaudita altera pars),
para conceder tutela provisória de urgência (art. 300, §2o, CPC); para decidir sobre concessão
de tutela de evidência (arts. 311, II e III, CPC); para determinar a expedição do mandado
monitório, na ação monitória (art. 701, CPC); e em várias outras situações em que haja perigo.
Logo, não haverá violação ao princípio do contraditório em hipóteses como essas, ainda
que o Juiz decida sem ouvir a parte contrária, muito embora, necessariamente, ele precise
justificar sua decisão posteriormente à parte contrária, em respeito ao princípio da cooperação.

2.3 A cooperação do Amicus curiae


Um outro exemplo de uma grande e importante aplicação do processo colaborativo no
novo Código de Processo Civil mostra-se por meio da cooperação de amicus curiae - instituto
que ganhou previsão legal no artigo 138, do CPC/2015. Como se vê, a participação de uma
pessoa alheia ao processo permite a efetivação de um contraditório diferente do contraditório
tradicional, à medida que se mostra ainda mais visível a necessidade de interação do Juiz com
outras pessoas que vão atuar de alguma forma no processo, em busca de uma mais completa

15
(...) autêntica garantia de democratização do processo, a impedir que o órgão judicial e a aplicação da regra
iura novit curia redundem em instrumento de opressão e autoritarismo, servindo às vezes a um mal explicado
tecnicismo, com obstrução à efetiva e correta aplicação do direito e à justiça do caso. CARLOS Alberto Álvaro
de Oliveira. Garantia do contraditório. In: Garantias constitucionais do processo civil. 1999
10

aproximação na definição dos temas e matérias que deverão ser, necessariamente, enfrentados
pelo magistrado ao julgar o objeto litigioso16.

Ademais, pode-se dizer, ainda, que o princípio da colaboração também aumentará o


coeficiente de legitimidade das decisões dos Tribunais Superiores, e, por conseguinte,
propiciará discussões qualificadas, cuja presunção são para que melhores argumentos venham
à tona e implementem um contraditório fluente, que afastará, de certo, a famigerada situação
dos processos repetitivos.

3 Classificação dos negócios processuais

O novo CPC flexibilizou a participação voluntária das partes, no que toca ao


procedimento, ao prevê uma cláusula geral de negócio jurídico processual, numa visão
neoliberalista processual, para mitigar um hiperpublicismo previsto no Art. 190 do CPC17. Essa
cláusula, poderá, inclusive, colocar o Brasil na vanguarda da construção do conteúdo e da
aplicação prática da cooperação18.
De certo, o processo civil brasileiro não é mais regulado somente pela lei, mas também
pela vontade das partes. Em vista disso, temos que as convenções processuais, por ato
voluntário das partes, revestem-se de força normativa cogente, transformando-se em
verdadeiras normas processuais que vinculam as negociações. Esses negócios processuais são
classificados pela doutrina sob vários aspectos, a saber:

3.1 Sob o aspecto legal: negociação típica ou atípica


O processo deve ser adequado à realidade das partes e pode-se dizer que o procedimento
previsto em lei, para determinado processo, deve atender às finalidades do direito tutelado. O
procedimento sofre, assim, influência das peculiaridades do direito material. Nos termos do Art.
190, caput, do Novo CPC, as partes podem estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo

16
CASSIO Scarpinella Bueno. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático. 2006. p. 56
17
Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015- Código de Processo Civil. Art. 190. Versando o processo sobre direitos
que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento
para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres
processuais, antes ou durante o processo.
18
Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume 15. Janeiro a junho de 2015. Periódico Semestral da
Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ. Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. Disponível
em: <www.redp.com.br> ISSN 1982-7636 PP 240-267.
11

às especificidades da causa. Logo, os negócios jurídicos processuais podem ser divididos,


quanto à previsão legal, em típicos e atípicos.

3.1.1 Negócios processuais típicos:


São aqueles negócios processuais expressamente previstos em lei. Eles podem ser
divididos em três pequenos grupos: bilaterais, unilaterais e plurilaterais.

3.1.1.1 Típicos bilaterais


Nestes negócios, há uma convergência de vontades, em prol da modificação do
procedimento, por exemplo, nas mais variadas espécies de contratos, as partes podem
convencionar qual o local que elegerão como foro para futuras ações, caso ocorram. Igualmente,
as partes também poderão decidir suspender o processo durante seis meses, art. 313. Podem
ainda estipular sobre quem recairá o ônus da prova, art. 373, ou mesmo estabelecer o que cada
um deve provar sob pena de indeferimento da inicial. Não obstante, os parágrafos do Art. 373
apontam que essa convenção não pode tornar impossível a produção de provas por uma das
partes, porque caso isso aconteça, o juiz irá declarar a nulidade da convecção processual típica
bilateral.

Além destes, podemos ainda citar a convenção de arbitragem, com previsão no art. 485,
e na Lei 9.307/06 - Lei de Arbitragem, art. 3º. As partes, desde que capazes, e desde que se
trate de direito patrimonial disponível, podem convencionar, desde logo, que serão julgadas por
um particular e não pelo Estado-Juiz. Enfim, estas são características de convenções bilaterais
típicas.

3.1.1.2 Típicos unilaterais


Nestes negócios não há necessidade de uma convergência de vontades, bastando que
uma das partes manifeste sua vontade, para que o negócio jurídico processual, típico,
aperfeiçoe-se, por exemplo, desistência do recurso, art. 998; reconhecimento jurídico do
pedido, art. 487, III, “a”; renúncia ao recurso, art. 999, etc.

3.1.1.3 Típicos plurilaterais


Estes são aqueles que, para operar os seus efeitos, não dependem somente da
concordância das partes, mas também de terceiros, por exemplo, sucessão pelo alienante ou
cedente pelo adquirente ou cessionário da coisa litigiosa, art. 109; calendarização, art. 191.
Sobre a calendarização, pode-se dizer que é exemplo de um negócio jurídico polêmico na
doutrina, já que acham que essa é uma norma incompatível com a realidade brasileira. De todo
12

modo, críticas à parte, esse é um negócio jurídico típico plurilateral, pois depende de
concordância das partes e do juiz. A grande polêmica gira em torne de saber se o Juiz, nesse
caso, tem vontade no processo, ou se ele deixa as partes deliberarem e simplesmente homologa.
Em algumas concepções, sim, a vontade do juiz integra a das partes, pois há aqui um
juízo de conveniência e oportunidade da vara. Contudo, há quem discorde, como Antônio
Passos Cabral, professor do Rio de Janeiro, que estuda profundamente essa questão. Ele afirma
que esse não é um negócio plurilateral e sim bilateral, pois o juiz só homologa se ele concordar.
Portanto, a vontade do juiz não integraria a das partes19.

3.1.2. Negócios processuais atípicos:

São aqueles sem previsão legal expressa. Essa é a grande novidade do CPC 2015. Nesse
ponto, o CPC inovou profundamente, através da criação de uma cláusula geral de negócio
processual, Art. 190, ao estabelecer que, além de todas as hipóteses de convenção típicas,
bilaterais, unilaterais e plurilaterais, o CPC permite que as partes convencionem sobre qualquer
outro tema, dentre outros: divisão de sucumbência, proibição de denunciação à lide, cláusula
de paz - muito presente no direito norte-americano -, por vez, as partes estipulam uma cláusula
estabelecendo que qualquer conflito ocorrido não ensejará qualquer ajuizamento de ação de um
contra o outro, se elas não passarem por três seções de mediação extraprocessual. Cria-se,
assim, uma condição para o ajuizamento no judiciário, não uma vedação, pois se o fizesse, seria
inconstitucional.

Contudo, merece destaque o fato de que, quando se fala em convenções típicas


bilaterais, vê-se que, nesse caso, a convenção será, literalmente, bilateral. Assim, percebe-se
que neste caso, o art. 190 estabelece a convenção somente entre as duas partes, não unilateral,
nem plurilateral, pois nesses casos dependem de tipicidade.

3.2 Momentos das convenções processuais atípicas


A atipicidade dos negócios processuais é possível a qualquer tipo de negócio entre as
partes ou entre estas e o juiz. O Código de Processo Civil prevê, em seu Art. 190, última parte,
que as partes poderão convencionar, antes ou durante o processo.

19
CABRAL, Antônio do Passo. Convenções processuais. Salvador: Juspodivm, 2016. p. 254
13

3.2.1 Pré-processuais
As cláusulas convencionadas em momentos pré-processuais guardam semelhança com
a arbitragem. Isso porque a convenção poderá ser elaborada por meio de uma cláusula
contratual ou por meio de instrumento em apenso, celebrado antes ou depois ao contrato
principal. Assim, as partes podem convencionar cláusulas a serem respeitadas no futuro, caso
haja uma demanda entre elas, por exemplo: podem convencionar que não caberá agravo de
instrumento das decisões interlocutórias; podem fazer um acordo de rateio de despesas
processuais, ou ainda acordo para limitar número de testemunhas, dentre muitas outras.

3.2.2 Processuais
Durante o curso do processo, as partes podem celebrar acordos e protocolá-los em juízo.
Podem celebrar, ainda, na presença do juiz, oralmente, durante a audiência de instrução e
julgamento, ou na presença do conciliador ou mediador por ocasião da audiência prevista no
Art. 334.

Nesse momento, as partes podem convencionar, por termo no processo, que o prazo
para contestar de 15 dias, previsto nos Art. 334 e 335, passará a ser de 45 dias, a partir da
audiência e conciliação, ou reduzi-lo para 5 dias. O juiz, com base no art. 139, VI, em sua
prerrogativa de flexibilização judicial, só pode aumentar prazos, mas as partes, com base no
Art. 190, podem reduzi-los sem problema nenhum, se quiserem.

3.3 Conteúdo das convenções processuais atípicas previstas no art. 190


Quanto ao conteúdo, as partes poderão pactuar sobre direitos que admitam
autocomposição, na forma da lei, que as permitam participarem do desenvolvimento do
processo e, assim, ajustá-lo ao procedimento e às peculiaridades do caso concreto.

3.3.1 Convenção sobre procedimento.


O Art. 190, 1ª parte permite que as partes possam diminuir prazos, mudar a forma da
prática dos atos, invertê-las, realizar as citações e intimações por outro modo etc. Acerca dessa
liberdade de negociação, posiciona-se Daniel Amorim Assumpção:

Ao criar a correlação, mudança procedimental-especificidades da causa, o


legislador, entretanto, não consagrou a vontade livre das partes, mas sim uma vontade
justificada, condicionada a uma adequação procedimental que atenda a eventuais
peculiaridades do caso concreto20.

20
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil: v. único. 8. ed. Salvador: JusPodivm,
2016, p. 321
14

Cumpre esclarecer, entretanto, que essa faculdade nas alterações do procedimento não
implica em uma adoção de liberdade das formas procedimentais, indistintamente, que não
obedece a uma ordem legal pré-estabelecida. Ao contrário, nesse contexto, o que se observa é
a possibilidade de se adaptar as regras legalmente fixadas pelas partes às peculiaridades da
causa, ou seja, ao objeto do processo.

3.3.2 Convecções sobre situação jurídica na relação jurídica processual


As convenções podem versar sobre ônus da prova, poderes, faculdades e deveres
processuais. O Art. 190, 2ª parte, por exemplo, permite que as partes possam convencionar que,
aquela que perder, pagará para o outro, além das custas e sucumbência, uma multa de 20%.

4 Limites dos negócios jurídicos

Certamente, o maior desafio dos negócios jurídicos processuais é estabelecer os limites.


A vontade das partes vale muito no novo CPC, mas o processo não deixou de ser público; ele
continua sendo, para a maioria da doutrina brasileira, instrumento através do qual o Estado
exerce a jurisdição; instrumento em que o autor exerce o direito de ação, e instrumento que o
réu exerce o direito de defesa. Assim, havendo convenções processuais, convém saber quais
são os limites e as condições de validade e eficácia desses negócios jurídicos, que podem ser
divididas em duas partes: condições gerais e específicas:

4.1 Condições gerais


As condições gerais são as mesmas do direito civil, ou seja, do direito material.
Aplicam-se em qualquer negócio jurídico, inclusive ao processual. As capacidades genéricas
das partes são: agente capaz, objeto lícito e moral, forma prevista ou não proibida em lei e o
respeito à autonomia das vontades das partes.

4.1.1 Agente capaz.

O art. 104, I, do Código Civil, aduz que quem celebra negócio jurídico tem que ser
humano. Somente este é sujeito de direito e obrigações. Quando o Código Civil estabelece a
capacidade genérica das partes, ele aponta, no art. 190, que as partes podem dispor sobre os
seus poderes, deveres e ônus, ou seja, para que elas possam celebrar negócio processual, a parte
15

precisa ser o titular do dever, do poder, da obrigação. Em outras palavras, além de ser humano,
a parte somente pode dispor do que é dela. Ao contrário disso, porém, as partes não podem
convencionar que o juiz irá sentenciar em inglês, pois esse é um dever dele (Juiz) e não delas.
Ou, ainda, não se pode convencionar que não haverá assistência no processo, pois este é um
direito de terceiros. Sobre o tema, cabe transcrever o enunciado da ENFAM, sobre negociação
voluntária no processo, o que aduz:

A regra do art. 190 do CPC/2015 não autoriza às partes a celebração de negócios


jurídicos processuais atípicos que afetem poderes e deveres do juiz, tais como os que:
a) limitem seus poderes de instrução ou de sanção à litigância ímproba; b) subtraiam
do Estado/juiz o controle da legitimidade das partes ou do ingresso de Amicus Curiae;
c) introduzam novas hipóteses de recorribilidade, de rescisória ou de sustentação oral
não previstas em lei; d) estipulem o julgamento do conflito com base em lei diversa
da nacional vigente; e e) estabeleçam prioridade de julgamento não prevista em lei.

4.1.2 Objeto lícito e moral.

Os Artigos. 104, II, e 2.035 do Código Civil e art. 21, §2º, da Lei de Arbitragem,
impedem algumas convenções materiais, e, por tabela, processuais, que contrariem preceitos
de ordem pública, para assegurar a função da propriedade dos contratos. Por exemplo, existe
uma regra prevista no art. 21, da Lei de Arbitragem, que estabelece não ser possível fazer a
arbitragem, sem a preservação do conteúdo mínimo do processo constitucional.

Esse mesmo preceito do art. 21 aplica-se nas convenções processuais. Assim, pode-se
convencionar sobre muitas coisas, mas não se pode afastar por convenção processual as
garantias constitucionais do processo, pois, caso isso seja feito, surgirá uma convenção de um
objeto ilícito, e, como tal, ineficaz. Pode-se citar, como exemplo, a convenção que desrespeite
o juiz natural, a que não obediência ao devido processo legal, sem contraditório. Sobre o tema,
estabelece o enunciado da ENFAM nº 37, que serão nulas, por ilicitude do objeto, as
convenções processuais que violem as garantias constitucionais do processo, tais como as que:
a) autorizem o uso de prova ilícita; b) limitem a publicidade do processo para além das hipóteses
expressamente previstas em lei; c) modifiquem o regime de competência absoluta; e d)
dispensem o dever de motivação.

4.1.3 Forma prevista ou não proibida em lei

Para a existência do um negócio, basta que a vontade se manifeste de forma livre,


expressando-se por escrito, verbalmente, gestualmente ou mesmo pelo silêncio. A aplicação
integrativa do art. 63, §1º do CPC e art. 4º, §1º, da Lei de Arbitragem prevê as manifestações
16

de forma escrita ou reduzida a termo. Sobre o tema, temos que a doutrina se divide quanto a
possibilidade de se estabelecer cláusulas orais antes do processo. Isso porque, caso seja ajustada
cláusula oral em convenção pré-processual, admitida esta, a parte pode negar que convencionou
a cláusula ajustada.

Nesta questão, a doutrina tem duas posições, a saber: a) para Cabral, a forma é livre.
Pode ter convenção oral nas convenções processuais ou pré-processuais; b) Para Gaia, a
convenção pré-processual há de ser necessariamente escrita, para evitar que se tenha que provar
se a convenção houve ou não.

Para resolver o empasse, o enunciado da ENFAM nº 39, orienta no sentido de que, não
é válida convenção pré-processual oral (art. 4º, § 1º, da Lei n. 9.307/1996 e 63, § 1º, do
CPC/2015). Assim, vê-se que as cláusulas pré-processuais devem ser escritas para sua validade
e eficácia.

4.1.4 Respeito à autonomia das vontades das partes

A autonomia das vontades deve ser respeitada. No Art. 190, parágrafo único, do CPC
há previsão de tutela pelo Juiz que controlará a validade do negócio jurídico entre as partes e
deverá recusar a aplicação da convenção nos casos de nulidade - simulação, por exemplo -, nos
casos de inserção abusiva nos contratos de adesão, ou nos casos em que uma das partes esteja
em uma manifesta situação de vulnerabilidade em relação a outra parte. Logo, vemos uma
preocupação do legislador em preservar a autonomia das partes, devendo o Juiz, somente a
posteriori, controlar as convenções em casos de vícios que causem sua nulidade.

4.2 Condições específicas


As condições específicas de limites aplicam-se aos negócios jurídicos processuais
típicos que admitam a autocomposição. Para adequá-las às especificidades da causa, as partes
podem convencionar mudanças sobre ônus da prova, poderes, faculdades e deveres processuais,
antes ou durante o processo, conforme inteligência do Art. 190, caput, CPC.

4.2.1 Capacidade para as convenções processuais.

Para que possam convencionar negócios jurídicos, determina a lei que o agente deve ser
plenamente capaz. A partir da palavra “plenamente”, observa-se na doutrina duas posições para
17

definir essa plenitude, a saber: a) Para Fredie Didier Júnior21, a palavra “plenamente” não
significa nada. Para o mestre, o incapaz poderá celebrar negócios jurídicos, desde que
representado, em caso de incapacidade absoluta ou assistido, se relativamente incapaz. Com
esse pensamento também corrobora Daniel Amorim Assumpção.22

No entanto, para outros estudiosos do assunto, como Juiz e Professor Fernando


Gajardoni, a palavra “plenamente” é sinônimo de “absolutamente”. Sendo assim, para o
doutrinador, a pessoa absolutamente ou relativamente incapaz, ainda que representado ou
assistido, não poderá celebrar convenção processual. Segundo o autor, chega-se a essa
conclusão observando-se interpretações de um parâmetro mais próximo da Lei de Arbitragem,
qual seja, o Art. 2º, no qual extrai-se não serem admitidas convenções processuais por quem
não for absolutamente capaz. Logo, não cabe convenção por curador, representante ou
assistente. Somente a própria pessoa, titular, capaz, pode celebrar convenção23.

Em complemento, o Professor faz uma observação importante ao dizer que o Juiz


“jamais irá declarar a nulidade da convenção, ainda que ilegal, caso não haja prejuízo para o
incapaz”. Nesse caso, vale a máxima do Código de Processo Civil de que “não se decreta a
nulidade quando não há prejuízo- pás de nullité sans grief-, e completa que sua opinião está
bem acompanhada pelo Enunciado 38 da ENFAM24, ao prescrever que, somente as partes
absolutamente capazes podem celebrar convenção pré-processual atípica com fulcro nos Arts.
190 e 191 do CPC/2015.

4.2.2 Convenções processuais e autocomposição.

Ainda que Direito não seja patrimonial, disponível, as partes podem celebrar convenção,
desde que o direito em litígio admita a solução por autocomposição. Não obstante, o Art. 190

21
DIDIER Jr., Fredie Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e
processo de conhecimento. Salvador: Ed. JusPodivm, 2015. v. I. p. 385.
22
(...) a parte precisa ter capacidade de estar em juízo, de forma que mesmo aquelas que são incapazes no
plano material, ganham capacidade processual ao estarem devidamente representadas. Se a capacidade for a
processual, todo e qualquer sujeito processual poderá celebrar o negócio jurídico ora analisado, já que todos
devem ter capacidade de estar em juízo no caso concreto. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de
direito processual civil: v. único. 8. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 589.

23
GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, Andre; OLIVEIRA JR., Zulmar Duarte. Teoria Geral
do Processo: comentários ao CPC/2015. 2ª ed. São Paulo: Método, 2018, p. 683-688.
24
Anunciados ENFAM: disponível em:
<Https://www.enfam.jus.br/wp-content/uploads/2015/09/enunciados-vers%c3%83o-definitiva-.pdf> Acesso
em: 08 de junho de 2018.
18

do CPC compreende o que a doutrina denomina de “cláusula geral de negociação processual”,


ou “cláusula geral de atipicidade dos negócios processuais”, ou ainda de “cláusula geral de
convencionalidade”. A regra trata de um requisito objetivo de validade, mas frise-se, o direito
pode ser indisponível, contanto que admita autocomposição. Nesse contexto, é o enunciado
135, do Fórum Permanente de Processualistas Civis, para determinar que a indisponibilidade
do direito material não impede, por si só, a celebração do negócio jurídico25.

Isso é o que acontece nos casos, por exemplo, nas ações de alimentos ou ainda nas ações
que envolvam reconhecimento de paternidade. Nestas, o estado da pessoa é indisponível, mas
o réu pode reconhecer que é pai da criança. Naquelas, o direito aos alimentos é indisponível,
mas as partes podem fazer acordo quanto ao valor. Vê-se que, em ambas, as partes fazem uma
convenção processual com direitos indisponíveis que admitem autocomposição.

Em síntese, para que os negócios jurídicos sejam válidos, as convenções devem


necessariamente respeitar as seguintes regras: (i) serem celebradas por pessoas absolutamente
capazes; (ii) possuir objeto lícito; (iii) observar forma prevista ou não proibida por lei, conforme
estabelecidas nos Arts. 104, 166 e 167, do Código Civil; (iv) sua convenção processual dar-se-
á somente sobre direitos que admitam autocomposição.

Caso haja desrespeito a quaisquer destes requisitos, o Juiz poderá decretar a nulidade do
negócio processual, de ofício, nos termos do parágrafo único do art. 190 do novo CPC.

4 O papel do Magistrado no controle das convenções processuais

O Juiz é o fiscal da validade dos negócios jurídicos processuais atípicos. Nesse sentido,
ele exercerá o controle sobre as convenções processuais típicas e atípicas. A polêmica gira em
torno de saber em qual momento esse controle deverá ser feito e em quais circunstâncias eles
necessitam de homologação.

25
ENFAM. Enunciado nº 135. (Art. 190) A indisponibilidade do direito material não impede, por si só, a
celebração de negócio jurídico processual. Disponível em:<https://www.enfam.jus.br/?s=enunciados> Acesso
em: 08 de junho de 2018.
19

O parágrafo único do Art. 190 traz a ideia de que as partes podem celebrar negócio
jurídico antes ou durante o processo. Em razão disso, discute-se se nas convenções celebradas
em momentos pré-processuais haveria a necessidade de serem homologadas pelo Juiz.

É preciso lembrar, que os negócios jurídicos processuais, típicos ou atípicos, em regra,


não dependem de homologação. Nesse sentido, foi aprovado o enunciado n. 133 do Fórum
Permanente de Processualistas Civis26, nos seguintes termos: “Salvo nos casos expressamente
previstos em lei, os negócios processuais do art. 190 não dependem de homologação judicial”.

O tema homologação das convenções processuais causou uma discussão na doutrina. O


assunto chegou ao Superior Tribunal de Justiça- STJ e no REsp nº 1184151/MS27, a 3ª Turma
decidiu é necessário romper com a ideia de que todas as lides devem passar pela chancela do
Poder Judiciário, ainda que solucionadas extrajudicialmente.

Além do mais, o art. 190 e os demais dispositivos que preveem negócios processuais
típicos devem ser interpretados em conjunto com o Art. 200 do CPC/2015, segundo o qual os
atos negociais das partes produzem efeitos imediatamente, desde o momento da sua prática,
salvo expressa disposição – legal ou convencional – em contrário.

Na opinião de Antônio do Passo Cabral, “submeter toda e qualquer convenção


processual (inclusive as prévias) a controle judiciário seria certamente inconcebível”. Para o
doutrinador, o Juiz deve valorizar a eficácia dos documentos produzidos pelas partes,
fortalecendo o acordo, sem que haja a necessidade de sempre e para tudo, uma chancela
judicial28.

Diante disso, da exegese do parágrafo único se extrai a informação clara de que o Juiz,
de ofício ou a requerimento, controlará a validade das convenções feitas pelas partes, a
posteriori, e somente recusará sua aplicação nos casos de nulidade absoluta nas hipóteses de
inserção de cláusula abusiva em contrato de adesão e nas ações em que alguma das partes
encontre-se em manifesta situação de vulnerabilidade.

26
Disponível em:<http://fpprocessualistascivis.blogspot.com/2017/05/carta-de-florianopolis.html>Acesso em:
08 de junho de 2018
27
Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 1184151 MS 2010/0039028-6 - Inteiro Teor
https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21276956/recurso-especial-resp-1184151-ms-2010-0039028-6-
stj/inteiro-teor-21276957?ref=juris-tabs
28
CABRAL, Antônio do Passo. Convenções Processuais. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 232.
20

Somente para complementar o raciocínio, convém comentar que, de acordo com o Art.
278 do CPC, as nulidades relativas submetem-se à preclusão e não são reconhecias de ofício.
Isso significa dizer que a anulabilidade deve ser arguida pela parte lesada em momento oportuno
pois, findo o prazo, o magistrado já não mais poderá invalidar o acordo feito com esse
fundamento. Ressalta-se, porém, que o juiz certamente não está impedido de alertar as partes
acerca do provável vício, o que deverá fazê-lo, evitando assim discussões posteriores.

6 Aplicação de convenções em outros ramos do Direito

As convenções processuais estão presentes em outros ramos do Direitos nos quais


admitem autocomposição. Abaixo relacionamos, apenas a título de curiosidade, alguns
posicionamentos acerca da possibilidade de convecções processuais em casos específicos, por
exemplo:

 O Estado pode fazer convenção processual? Sim, desde que haja lei autorizando a
autocomposição. Há alguns Estados e Municípios que autorizam seus procuradores a
convencionarem sobre alguns assuntos específicos. Não havendo lei, fica proibido a
convenção processual, já que o Poder Público só poderá fazer aquilo que estiver
permitido em lei. A recente Portaria 33/2018, Art. 38, autoriza expressamente a Fazenda
Pública a celebrar negócios processuais, com vistas a promover o recebimento do
crédito29.
 Em convenções coletivas, o Ministério Público pode celebrar convenções processuais?
Sim. A resolução 118/2014 do Conselho Nacional do Ministério Público estimula as
convenções processuais30. Nos Termos de ajustamento de Condutas - TAC feito pelo
Ministério Público com base no Art. 9º da Lei de Ação Civil Pública, observa-se um
reconhecimento jurídico do pedido, razão pela qual é perfeitamente possível a
convenção processual pelo Parquet.

29
"Art. 38 da Portaria 33/2018 da PGFN. O Procurador da Fazenda Nacional poderá celebrar Negócio Jurídico
Processual visando a recuperação dos débitos em tempo razoável ou obtenção de garantias em dinheiro,
isoladamente ou em conjunto com bens idôneos a serem substituídos em prazo determinado, inclusive mediante
penhora de faturamento, observado o procedimento disposto no regulamento expedido pela Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional".
30
"Art. 15 da Resolução 118/2014 do CNMP. As convenções processuais são recomendadas toda vez que o
procedimento deva ser adaptado ou flexibilizado para permitir a adequada e efetiva tutela jurisdicional aos
interesses materiais subjacentes, bem assim para resguardar âmbito de proteção dos direitos fundamentais
processuais.
21

 O consumidor pode celebrar convenções processuais? Sim. O direito conferido ao


consumidor não é indisponível, restando apenas o cuidado com os contratos de adesão.
Isso porque, caso haja uma inserção abusiva, a mesma deve ser afastada pelo Juiz ao
declarar a nulidade. Não havendo cláusulas abusivas, não há impedimento nenhum para
que o consumidor possa celebrar TAC.
 Pode haver convenções processuais em Direitos Trabalhistas? O tema encontra certa
polêmica na doutrina e jurisprudência. Há uma Resolução Trabalhista, qual seja,
203/2016 do TST, que em seu Art. 2º, II entende não ser aplicável o Art. 190 ao processo
do trabalho, por haver uma presunção absoluta de hipossuficiência do trabalhador. No
entanto, recentemente, a Terceira Turma do TST, no julgamento do Recurso de Revista
0147300-49.2012.5.13.000431, com acórdão publicado em 27/10/2017, considerou
válida a convenção processual atípica para autorizar o uso de prova emprestada.
 Não há qualquer obstáculo em se celebrar negócio processual atípico nas demandas que
envolvem Sindicatos e o Ministério Público do Trabalho - MPT ou da União- MPU. De
certo que, entre estes sujeitos, não há desigualdades na relação jurídica processual.

Por fim, somente a título de complementação, queremos pontuar que é notória a


divergência doutrinária e jurisprudencial sobre os limites para o manejo do negócio processual
atípico. Para amenizar o problema, o Fórum Permanente de Processualistas Civis 32 – FPPC
traçou algumas hipóteses interessantes para a aplicação do artigo 190 do CPC/15. Já a Escola

31
"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. NULIDADE POR NEGATIVA DE
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. (...) ademais, improcede a alegação de prática de falso testemunho a inquinar de
nula a prova uma vez que houve negócio processual, pois, as partes dispensaram a oitiva de testemunhas e
concordaram com a juntada da ata do dia 09.04.2013, extraída dos autos do processo nº 1221/2012-3, a ser
utilizada como prova emprestada. Assim, não poderia a parte inquinar de nula a decisão, por suposta alegação
de falso testemunho, se ela mesma fez negócio processual no sentido de que a Ata do processo em epígrafe
fosse utilizada no presente processo como prova emprestada. Incólume o art. 93, IX, da CR/88.
32
"São admissíveis os seguintes negócios processuais, dentre outros: pacto de impenhorabilidade, acordo de
ampliação de prazos das partes de qualquer natureza, acordo de rateio de despesas processuais, dispensa
consensual de assistente técnico, acordo para retirar o efeito suspensivo de recurso, acordo para não promover
execução provisória; pacto de mediação ou conciliação extrajudicial prévia obrigatória, inclusive com a correlata
previsão de exclusão da audiência de conciliação ou de mediação prevista no art. 334; pacto de exclusão
contratual da audiência de conciliação ou de mediação prevista no art. 334; pacto de disponibilização prévia de
documentação (pacto de disclosure), inclusive com estipulação de sanção negocial, sem prejuízo de medidas
coercitivas, mandamentais, sub-rogatórias ou indutivas; previsão de meios alternativos de comunicação das
partes entre si; acordo de produção antecipada de prova; a escolha consensual de depositário-administrador no
caso do art. 866; convenção que permita a presença da parte contrária no decorrer da colheita de depoimento
pessoal. (Grupo: Negócio Processual; redação revista no III FPPC- RIO, no V FPPC-Vitória e no VI FPPC-Curitiba)".
22

Nacional de Formação e Aperfeiçoamento dos Magistrados33, por sua vez, já destacou hipóteses
em que o uso do artigo 190 do CPC/15 não seria autorizado.

7 Críticas ao princípio da cooperação

É consenso que o Princípio da Cooperação é constitucional, haja vista dar o direito de


influenciar na construção dos provimentos jurisdicionais, o que implica em dizer que ele é
corolário dos princípios do contraditório e ampla defesa. Entretanto, ele sofre algumas críticas
por parte de uns poucos doutrinadores, como Lênio Streck, por exemplo.

O renomado Professor, em seu livro “Verdade e Consenso”, ed. Lumen Juris, faz uma
séria crítica ao advento da “era dos princípios constitucionais”, que segundo ele, é o fenômeno
caracterizado pelo “panprincipiologismo”- emprego generalizado do vocábulo “princípio” para
designar standarts interpretativos, originários de construções pragmaticistas, verdadeiros
axiomas com pretensões dedutivas34. Para ele, a cooperação processual é um arranjo previsto
no novo CPC, uma vez que se trata de “algo que não se encaixa bem com o que diz a
Constituição e sua principiologia”, pois “cooperação não é princípio35”.

33
"A regra do art. 190 do CPC/2015 não autoriza às partes a celebração de negócios jurídicos processuais atípicos
que afetem poderes e deveres do juiz, tais como os que: a) limitem seus poderes de instrução ou de sanção à
litigância ímproba; b) subtraiam do Estado/juiz o controle da legitimidade das partes ou do ingresso de amicus
curiae; c) introduzam novas hipóteses de recorribilidade, de rescisória ou de sustentação oral não previstas em
lei; d) estipulem o julgamento do conflito com base em lei diversa da nacional vigente; e e) estabeleçam
prioridade de julgamento não prevista em lei. São nulas, por ilicitude do objeto, as convenções processuais que
violem as garantias constitucionais do processo, tais como as que: a) autorizem o uso de prova ilícita; b) limitem
a publicidade do processo para além das hipóteses expressamente previstas em lei; c) modifiquem o regime de
competência absoluta; e d) dispensem o dever de motivação. Somente partes absolutamente capazes podem
celebrar convenção pré-processual atípica (arts. 190 e 191 do CPC/2015).
34
A ‘cooperação processual’ não é um princípio; não está dotada de densidade normativa; as regras que tratam
dos procedimentos processuais não adquirem espessura ontológica, face à incidência desse standard. Dito de
outro modo, a ‘cooperação processual’ – nos moldes que vem sendo propalada – ‘vale’ tanto quanto dizer que
todo o processo deve ter instrumentalidade ou que o processo deve ser tempestivo ou que as partes devem ter
boa-fé. Sem o caráter deontológico, o standard não passa de elemento que ‘ornamenta’ e fornece ‘adereços’ à
argumentação. Pode funcionar no plano performativo do direito. Mas, à evidencia, não como ‘deve ser’.
STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas: da possibilidade à
necessidade de respostas em direito. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 485-534.
35
Disponível em:<https://www.conjur.com.br/2014-dez-23/cooperacao-processual-cpc-incompativel-
constituicao#author>Acesso em: 08 de junho de 2018.
23

De acordo com o autor, a previsão contida no art. 6º do CPC de que “todos os sujeitos
do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito
justa e efetiva”, não seria propriamente um direito das partes, mas seria também deveres
impostos a elas. Isso porque, segundo ele, o legislador, de modo engenhoso, depositou sobre as
costas dos jurisdicionados o peso da responsabilidade que compete ao Estado, em prestar
decisões justas, eficientes e tempestivas. Se for sim, caso a parte queira obter decisões com essa
qualidade, deverá cooperar com o juiz e ainda com a parte adversa. A isso ele chamou de
“Katchanga Processual36”.

Na visão do autor supracitado, trata-se de uma ironia, pois não se concebe que parte e
contraparte cooperarem entre si, de mãos dadas, a fim de alcançarem uma paz social.
Ironicamente, ele escreve que o Novo CPC apostou em Rousseau, no homem bom!
Afirma, por conseguinte, que o legislador pecou ao tornar manifesta essa cooperação, pois
referido texto legislativo está desacoplado da realidade e espelha uma visão idealista e
irrefletida daquilo que se dá na arena processual, onde as partes querem, acima de tudo, alcançar
um resultado satisfatório em suas pretensões.

Ademais, afirma ainda Lênio Streck, que o juiz, encontrando apoio nessa cooperação,
atuará solapando37 a ampla defesa das partes, interferindo nas liberdades que elas e seus
advogados detêm, para eleger argumentações e estratégias que melhor atendam aos seus
interesses. A exemplo disso, cita a possibilidade de quebra de certos deveres de sigilo ou
confidencialidade, ou ainda a possibilidade de o juiz suprir insuficiências ou imprecisões ao
expor a matéria de fato alegada pelas partes, ou nas hipóteses de decisões que suprimem
obstáculos procedimentais à prolação da decisão de mérito. Enfim, para ele, o legislador
aventurou-se numa seara que deveria ser exclusiva da doutrina38.

Diante desse cenário, meditando nas palavras do Jurista, nos sobreveio o desejo de
questionar: no diálogo com as partes, até onde o Juiz pode avançar ou qual o limite que deve
ser respeitado por ele?

Lênio Streck tem a resposta. Ele relacionou quais os deveres que o órgão julgador tem
para com as partes, e pontuou: “o que passar disso, poderá fazer com que o Juiz incorra em um

36
Disponível em:<https://www.conjur.com.br/2014-dez-23/cooperacao-processual-cpc-incompativel-
constituicao#author>Acesso em: 08 de junho de 2018.
37
Idem
38
idem
24

grande risco de vir a ser um contraditor, causando perdas ou danos às bases que sustentam o
Estado Democrático de Direito39. Esse deveres são : i) cumprir com dever de esclarecimento;
ii) prevenir as partes do perigo de frustração de seus pedidos pelo uso inadequado do processo
(dever de prevenção); iii) consultar as partes antes de decidir sobre qualquer questão, ainda que
de ordem pública, assegurando a influência de suas manifestações na formação dos provimentos
(dever de consulta); e iv) auxiliar as partes na superação de dificuldades que as impeçam de
exercer direitos e faculdades ou de cumprir ônus ou deveres processuais (dever de auxílio) .

Enfim, vê-se que a discussão sobre a cooperação não é de hoje. Ela gira em torno da
exigência que se faz para que as partes cooperem ou colaborem entre si. Para os autores, isso é
ir muito além dos limites traçados para o exercício da advocacia, pois cada parte já tem seu
papel definido e concorrem, à sua maneira, para a formação da instrução processual comum 40.

De nossa parte, em que pese o respeito que temos aos pensamentos contrários,
comungamos com a tese pela qual se defende que a cooperação, enquanto princípio, é uma
grande ferramenta nas mãos do aplicador do direito. Em nossa opinião, é fundamental
instrumento axiológico que irá servir de base para estabelecer as diretrizes nas convenções
processuais. Ademais, o princípio da cooperação é uma importantíssima ferramenta na
condução dos negócios jurídicos processuais, por exemplo, ora suprindo a falta de regras
expressa em lei, ora organizando o papel das partes e do juiz na conformação do processo41.

E mais, quanto à crítica que ele (Lênio) faz sobre uso inadequado uso do princípio pelo
Juiz, entendemos que a atuação isolada de um juiz não deve servir de paradigma para
pensamentos pejorativos, haja vista entendermos que grande parcela da magistratura brasileira
é formada por juízes competentes, que tem como compromisso maior, a prestação de uma
decisão justa, efetiva e tempestiva, inclusive, transparente e verdadeira.

39
A cooperação processual do novo CPC é incompatível com a Constituição Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2014-dez-23/cooperacao-processual-cpc-incompativel-constituicao#author>
Acesso em: 08 de junho de 2018.
40
STRECK, Lenio Luiz; MOTTA, Francisco José Borges. Um debate com (e sobre) o formalismo-valorativo de Daniel
Mitidiero, ou "colaboração no processo civil" é um princípio? In: Revista de Processo, v. 213, 2012. p. 13.
41
Nesse sentido: SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito
constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 623-624; NERY JR., Nelson. Princípios do processo na
Constituição federal, processo civil, penal e administrativo. 11 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 39;
25

Conclusão

No decorrer de nossa pesquisa, observamos que o Direito Processual Civil sofreu grande
avanço em seu efeito integrador, uma vez que deu uma nova disposição normativa ao
ordenamento jurídico, estreitando condutas que a Constituição Federal diz como devem ser
praticadas. Assim, podemos observar que a maior parte da doutrina brasileira se posiciona
confiante no incremento da flexibilização das regras trazidas pelo Novo Código de Processo
Civil e que, se adequadamente implementadas, poderá colocar o Brasil na vanguarda da
construção do conteúdo e da aplicação prática da cooperação processual.
Em virtude disso, vimos que essa é, indiscutivelmente, uma ferramenta eficaz para que
as partes possam, através da cooperação, firmar acordos e convenções, antes e durante o
processo, quanto a vários procedimentos que assim julgarem mais adequados ao seu caso
concreto. Por conseguinte, entende-se que o Juiz controlará a validade das convenções feitas
pelas partes, a posteriori, e somente recusará sua aplicação nos casos de nulidade absoluta nas
hipóteses de inserção de cláusula abusiva em contrato de adesão e nas ações em que alguma
das partes encontre-se em manifesta situação de vulnerabilidade.
Como resultado, pôde-se perceber que o Princípio da Cooperação fundamenta-se na
participação dos sujeitos ao processo que, cooperando entre si, veem a possibilidade de obter
um processo célere, justo e eficaz. Em síntese, essas são características que complementam o
Estado Democrático e dá, não só ao Direito Processual Civil, como em outros ramos do direito,
um instrumento de significativo valor à justiça e traz grandes benefícios na busca da tutela
judicial mais adequada e efetiva.
Em conclusão, em que pese existir afirmações de que cooperação não é princípio, nós
não comungamos com esse pensamento. Ao contrário, entendemos que esse pensamento está
equivocado e que parte de uma doutrina minoritária, isolada, que viu no princípio da cooperação
algo utópico, sem consistência. Assim sendo, entendemos que essa maior participação que
agora as partes têm no processo, trará a elas maior segurança de que terão uma decisão mais
célere e justa. Portanto, caberá aos operadores do direito, Juízes, Partes, Ministério Público,
Servidores, Terceiros Interessados e, em especial, aos advogados, fazer desse novo instrumento
o sucesso das convenções no contexto do modelo processual colaborativo positivado.
26

Referências

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constitucionais do processo civil. 1999
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DIDIER Jr. Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil,
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de 2015. In: Revista Brasileira de Advocacia, vol. 1, ano 1. Flávio Luiz Yarshell (coord.). São
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formalismo-valorativo de Daniel Mitidiero, ou "colaboração no processo civil" é um
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TAVARES, João Paulo Lordelo Guimarães. Da admissibilidade dos negócios jurídicos
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