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O documento discute litíase renal ou "pedra nos rins", incluindo suas causas, tipos de cálculos renais, fatores de risco e epidemiologia. Litíase renal é causada por uma variedade de fatores que aumentam a concentração de solutos na urina, como baixa ingestão de água ou dietas ricas em sal. Existem diversos tipos de cálculos renais dependendo de sua composição química, sendo o mais comum o de oxalato de cálcio. A incidência é maior em adultos do sexo masculino em países
O documento discute litíase renal ou "pedra nos rins", incluindo suas causas, tipos de cálculos renais, fatores de risco e epidemiologia. Litíase renal é causada por uma variedade de fatores que aumentam a concentração de solutos na urina, como baixa ingestão de água ou dietas ricas em sal. Existem diversos tipos de cálculos renais dependendo de sua composição química, sendo o mais comum o de oxalato de cálcio. A incidência é maior em adultos do sexo masculino em países
O documento discute litíase renal ou "pedra nos rins", incluindo suas causas, tipos de cálculos renais, fatores de risco e epidemiologia. Litíase renal é causada por uma variedade de fatores que aumentam a concentração de solutos na urina, como baixa ingestão de água ou dietas ricas em sal. Existem diversos tipos de cálculos renais dependendo de sua composição química, sendo o mais comum o de oxalato de cálcio. A incidência é maior em adultos do sexo masculino em países
Distribuição por frequência dos tipos de cálculos renais de acordo
PROBLEMA 04: “PIOR DOR DA MINHA VIDA”. com a composição química OBJ 01) CARACTERIZAR NEFROLITÍASE. Litíase ou calculose renal, ou ainda, popularmente, “pedra nos rins” são concreções de cristais formadas no trato urinário. A rigor, esse termo não aporta em si um diagnóstico completo. A semelhança de outros termos, como artrite, edema ou febre, litíase renal, implica uma lista considerável de causas subjacentes. Logo, quando o médico faz o diagnóstico de litíase renal, ele deve ter em mente a necessidade de completar a investigação, descobrindo a condição ou doença, que é a sua verdadeira causa. Existem diversas formas de apresentação clínica da litíase renal, variando desde efêmeros episódios de cólica renal sem maiores consequências, até casos associados a grave infecção do trato urinário (ITU) ou obstrução crônica do trato urinário que podem FATORES ASSOCIADOS AO DESENVOLVIMENTO DE LITÍASE RENAL levar a perda definitiva da função renal. Dessa forma, o Diversos fatores podem contribuir para a gênese da litíase renal. tratamento da litíase renal deve não somente se restringir ao Em termos gerais, são associados fatores que causam maior tratamento da crise de cólica renal aguda ou, quando indicado, à concentração da urina, seja por redução de solvente (p. ex., baixa remoção do cálculo das vias urinárias. A adoção de medidas ingestão de água) ou por aumento da concentração de solutos (p. clínicas diagnósticas e terapêuticas para impedir a progressão e a ex., dieta rica em sal e proteínas, hipercalciúria). recorrência dessa condição clínica é de suma importância. A anamnese cuidadosa pode revelar informações valiosas, EPIDEMIOLOGIA expondo outros fatores relacionados à litíase renal. Ela deve Incidência, prevalência e recorrência incluir o interrogatório sobre hábitos alimentares, profissão, Litíase renal é uma das doenças mais comuns do trato urinário, cirurgias, hábitos intestinais, antecedentes familiares de doença apresentando elevadas taxas de incidência, prevalência e renal, inclusive litíase renal. Não raro, doenças sistêmicas podem recorrência. cursar com litíase renal, como é o caso de gota, Estima-se em 0,5% a incidência anual de litíase na população geral hiperparatireoidismo, diabete melito, síndrome metabólica, de regiões como a América do Norte e a Europa, sendo relatado acidose tubular renal e síndromes genéticas, como hiperoxalúria nas últimas décadas taxas de até 5,2% em regiões dos EUA. Tem primária, doença celíaca, cistinúria e rins policísticos. O uso de pico de incidência entre 20 e 50 anos de idade, sendo mais medicamentos deve ser ativamente pesquisado. Por exemplo, frequente na etnia caucasoide e no sexo masculino (3H/1M). fármacos muitas vezes considerados pelos pacientes como Estima-se que 10 a 25% dos adultos apresentarão ao menos um suplementos alimentares, como o ácido ascórbico (associado ao episódio sintomático de litíase renal até os 70 anos de idade. aumento de oxalato na urina), diuréticos ou vitamina D (levando a Sua prevalência geral é estimada em torno de 12%, sendo maior hipercalciúria), podem estar associados à litíase renal. em adultos do sexo masculino. É mais comum de ser observada em países desenvolvidos, provavelmente pela maior frequência de hábitos alimentares que incluem elevado consumo de sal e proteínas de origem animal. Também é encontrada com elevada frequência em regiões de clima quente. As explicações para essa observação seriam o aumento da concentração urinária em razão da maior perda insensível de água e do aumento da calciúria por causa da maior exposição da pele à luz solar, com consequente aumento da síntese de vitamina D. As taxas de recorrência após um primeiro episódio de litíase atingem até 50% em 5 anos. Fatores ligados ao elevado risco de recorrência são: primeiro episódio com idade baixa, história familiar positiva, litíase associada à ITU ou a outra doença subjacente.
COMPOSIÇÃO DOS CÁLCULOS RENAIS
Diversos solutos presentes na urina, como sódio, cálcio, ácido úrico, oxalato, assim como restos celulares e até mesmo metabólitos de medicamentos podem se cristalizar, dando origem aos cálculos renais. A deposição desses cristais orgânicos ou FISIOPATOLOGIA E CAUSAS DE LITÍASE RENAL inorgânicos, amalgamados ou não a proteínas, pode aumentar Mecanismos gerais isoladamente (cálculo de composição única) ou pode haver A formação de cálculos é o resultado da ocorrência isolada ou em associação de diversos tipos de cristais (cálculo misto). conjunto dos seguintes mecanismos: O cálculo mais comum é o composto por cálcio, na forma de A. Aumento na concentração urinária de solutos. oxalato de cálcio (mono ou di-hidratado), seguido por estruvita, B. Diminuição de inibidores da cristalização. ácido úrico e cistina. C. Formação de cálculos associada a bactérias produtoras de presença de ácido úrico na urina pode ainda facilitar o urease. desenvolvimento de cálculos por meio de um terceiro mecanismo: D. Formação da placa de Randall. a formação de complexos com inibidores da cristalização, como E. Outras condições promotoras da formação de cálculos. mucopolissacarídeos. O entendimento desses mecanismos constitui a base das ações Embora a hiperuricosúria seja por si só litogênica, nem todos os diagnósticas e terapêuticas atualmente disponíveis. portadores de cálculos de ácido úrico apresentam uma excreção urinária excessiva desse composto. É possível a formação de Aumento na concentração urinária de solutos cálculos de ácido úrico puro na presença de taxas normais de Em geral, ocorre em razão de baixa ingestão de água, que é excreção de ácido úrico. Isso ocorre em pacientes com pH urinário refletida por meio do volume urinário reduzido e coloração ácido em torno de 5. amarelo-escuro da urina ou, mais especificamente, por meio da A hiperoxalúria é decorrente de uma produção e/ou absorção análise da urina que revela elevação da densidade e osmolaridade intestinal aumentada de oxalato. Este, por não ser catabolizado, urinárias. Em outras situações, o volume urinário é relativamente deve necessariamente ser eliminado por excreção renal. Três tipos adequado, mas por conta de um distúrbio metabólico ou dieta de anomalia podem resultar em hiperoxalúria: inadequada (p. ex., ingestão excessiva de purinas) ocorre aumento A. Deficiências enzimáticas, de origem genética, que aumentam a da concentração urinária de solutos. Em pacientes com litíase taxa de formação de oxalato. renal, é bastante comum encontrarmos a associação dos fatores B. Doenças intestinais associadas a má-absorção de gorduras, baixa ingestão de água e hipercalciúria primária, levando ao como a doença de Crohn, doença celíaca, cirurgias bariátricas, que aumento na concentração de solutos na urina. acabam resultando em um aumento na capacidade intestinal de Alguns desses solutos, como o sódio, a ureia e a creatinina, absorver oxalato. mantêm-se em solução mesmo que sua concentração urinária C. Consumo exagerado de alimentos contendo oxalato, como atinja valores elevados. Outros, como sais de cálcio, são pouco espinafre, beterraba, chocolates, chá preto, entre outros, ou solúveis em água e tendem a formar precipitados sólidos. Até 50% precursores do oxalato, como o ácido ascórbico, principalmente dos casos de litíase renal apresentam hipercalciúria como uma das quando ingerido em altas doses como "complemento dietético". causas principais. A cistinúria é uma doença rara, com herança de padrão A hipercalciúria idiopática é traduzida por um defeito na autossômico recessivo, na qual há um grave defeito na reabsorção reabsorção tubular renal ou por absorção intestinal aumentada de tubular da cistina e de vários outros aminoácidos. Embora as cálcio. Nesses casos, geralmente os níveis de cálcio sérico e do mutações genéticas responsáveis pelo defeito de transporte hormônio da paratireoide (PTH) não sofrem alterações. Digno de tenham sido determinadas, não foram ainda elucidadas as razões nota, a reabsorção tubular de cálcio pode estar diminuída mesmo pelas quais as taxas de excreção desses aminoácidos são tão altas. na ausência de um defeito tubular renal. Por exemplo, quando a Quase todos os aminoácidos cujo transporte está alterado na taxa de ingestão de sódio é excessiva, ocorre maior excreção renal cistinúria são altamente solúveis e não tendem a formar desse íon, a fim de manter o seu balanço. Como a reabsorção precipitados. A cistina, no entanto, tem solubilidade limitada e tubular de cálcio segue estreitamente a de sódio, a excreção de forma cálculos com facilidade, especialmente em condições de pH cálcio também aumenta, dando origem a hipercalciúria, ácido. Os cálculos assim formados são radiopacos em decorrência indistinguível da hipercalciúria idiopática. Esse mecanismo da presença de enxofre na molécula de cistina, tendem a crescer constitui a base para uma das medidas adotadas na terapêutica da por agregação e podem adquirir grandes dimensões, provocando nefrolitíase: a limitação da ingestão de sódio. obstrução urinária grave, semelhante à observada com cálculos de A hipercalciúria também pode ser devida a outras causas, como o estruvita. Por conta da baixa prevalência da cistinúria, os cálculos hiperparatireoidismo primário (que cursa com aumento do cálcio de cistina representam menos de 1 % do total de cálculos e PTH séricos), imobilização prolongada, neoplasias e doenças urinários. No entanto, essa porcentagem é bem maior quando granulomatosas (p. ex., sarcoidose). Independentemente do consideramos apenas os pacientes pediátricos, nos quais mecanismo, o excesso de cálcio na urina pode levar à formação de predominam as causas hereditárias de nefrolitíase. precipitados. Nesses precipitados, o cálcio pode estar associado aos ânions fosfato (presente na maioria dos alimentos) e oxalato Diminuição de inibidores da cristalização (endógeno ou exógeno). A deficiência de inibidores de precipitação de solutos, como Outros exemplos de aumento da concentração de solutos na urina citrato, magnésio e macromoléculas (proteína de Tamm-Horsfall, implicados na gênese de cálculos são a hiperuricosúria, a nefrocalcina, entre outros), é fator importante na gênese dos hiperoxalúria e a cistinúria. cálculos urinários. Essas substâncias em concentrações adequadas A hiperuricosúria aumenta o risco de desenvolver cálculos evitam a precipitação de solutos. compostos por ácido úrico. É o que ocorre em alguns pacientes A mais importante delas é o ânion citrato presente em diversos com gota, naqueles que ingerem uma dieta rica em purinas, nos alimentos. De fato, a hipocitratúria é um dos fatores de risco mais portadores de certas deficiências enzimáticas ou ainda em importantes para a formação de cálculos urinários. O citrato tem pacientes com certos tipos de neoplasias durante períodos de lise afinidade relativamente alta pelo cálcio, mas, diferentemente do tumoral. São três os mecanismos básicos por meio dos quais uma oxalato e do fosfato, não forma precipitados com o cálcio e sim excreção aumentada de ácido úrico pode levar à formação de complexos solúveis. A ligação do citrato com o cálcio tem assim o cálculos. O mais evidente deles é, sem dúvida, a formação direta efeito de subtrair da solução urinária íons cálcio, que de outra de cristais. Um segundo mecanismo possível de formação de forma poderiam precipitar com fosfato ou com oxalato. cálculos é a nucleação: a formação de pequenos agregados que Outro elemento de defesa contra a formação de cálculos urinários serve de base para a precipitação de outros sais, principalmente é o íon magnésio. O magnésio tende a formar complexos solúveis oxalato e fosfato de cálcio, formando um cálculo misto. A com o oxalato, retirando este último da solução, embora a afinidade dessa ligação seja baixa. O magnésio pode também A nucleação marca o início do processo de formação de um inibir a absorção intestinal de oxalato, reduzindo, portanto, sua cálculo renal e em geral ocorre quando a urina está supersaturada excreção urinária. Sabe-se que pacientes com baixa excreção com cristaloides contendo íons livres. Esses íons livres combinam- urinária de magnésio apresentam risco relativamente elevado de se de forma homogênea (íons similares, formando um cristal desenvolver nefrolitíase. específico) ou heterogênea (íons distintos e outras substâncias Algumas substâncias, como os pirofosfatos, glicosaminoglicanos e urinárias, como restos de células epiteliais, formando um cristal nefrocalcina, além da proteína de Tamm-Horsfall, produzida e dissimilar). Por exemplo, cristais de oxalato de cálcio podem se excretada nos túbulos renais, também exercem um efeito nuclear ao redor de cristais de ácido úrico, formando uma protetor contra o desenvolvimento de cálculos urinários. Esses nucleação heterogênea. compostos agem dificultando a agregação de íons como cálcio e A seguir, vários pequenos cristais começam a se ligar, constituindo oxalato, impedindo sua precipitação. a fase denominada de agregação. Com a manutenção de fatores que propiciam esse processo, ocorre o crescimento do cálculo. Formação de cálculos por bactérias que produzem urease Outro mecanismo que causa a formação de cálculos é ligado a CAUSAS DE LITÍASE RENAL bactérias que produzem urease (p. ex., Proteus sp., Klebsiella sp., Serratia sp., Pseudomonas sp., Ureaplasma sp. e Citrobacter sp.). A urease resulta na formação de íons amônia e pH urinário alcalino, facilitando assim a combinação de cristais de fosfato com amônia, magnésio e cálcio. Esses compostos se precipitam e formam o cálculo de estruvita. Esse tipo de cálculo apresenta crescimento rápido e é conhecido também com a denominação de cálculo "coraliforme", por ocupar a pelve e os cálices renais, originando um formato semelhante a corais marinhos. Em princípio, a Escherichia coli, bactéria frequentemente encontrada na infecção do trato urinário, não é produtora de urease.
Formação da placa de Randall
A placa de Randall é definida como concreções de fosfato de cálcio recobrindo o uroepitélio da pelve dos cálices renais. Acredita-se que sua origem se dê a partir dos ramos finos das alças de Henle, nos quais cristais de fosfato de cálcio são precipitados e sofrem protrusão, por meio do interstício, até o uroepitélio. Nessa região, formam placas que servirão como nicho para a agregação de outros cristais e crescimento de cálculos. Outra hipótese sobre a gênese das placas de Randall foi proposta por Stoller et al., que relacionaram o processo de aterosclerose e lesão dos vasa recta como origem dessas placas.
Outras condições promotoras da formação de cálculos
Atuando como fator promotor, destaca-se o pH urinário alcalino. Em pH ácido, o fosfato de cálcio é muito mais solúvel do que em pH neutro ou alcalino. Desse modo, a formação de cálculos de FORMAS CLÍNICAS DE APRESENTAÇÃO, DIAGNÓSTICO E fosfato de cálcio em urina ácida é difícil, especialmente se a TRATAMENTO DA LITÍASE RENAL excreção de citrato estiver em níveis adequados. Quando a urina A litíase renal pode apresentar-se de diferentes maneiras. se torna persistentemente alcalina, como ocorre nas deficiências Contudo, o paciente apresentará sinais e sintomas que podem ser de acidificação urinária ou ITU, observa-se o efeito oposto, a agrupados em três grupos: precipitação de fosfato de cálcio. A. Manifestações causadas pelo próprio cálculo. A precipitação de oxalato de cálcio é pouco influenciada pelo pH B. Manifestações decorrentes de complicações causadas pelos urinário e, portanto, continua a ocorrer mesmo que a urina esteja cálculos renais. ácida. Consequentemente, a maior parte dos cálculos urinários C. Manifestações relativas a doença subjacente que predispõe a contém oxalato de cálcio, enquanto a formação de cálculos puros litíase renal. de fosfato de cálcio é mais rara e, em geral, restrita àquelas Outra forma de abordar as apresentações clínicas da litíase renal é situações em que o pH da urina mantém-se persistentemente baseada no local que o paciente procura assistência (i. e., no neutro ou alcalino. pronto-socorro ou ambulatório). Em geral, no pronto-socorro, o paciente apresenta-se com cólica renal aguda, associada ou não a Etapas de formação do cálculo renal hematúria macroscópica, obstrução do trato urinário, ou com Como resultado da ação isolada ou associada dos mecanismos infecção do trato urinário (ITU). No ambulatório, o paciente descritos, a formação de cálculos segue duas etapas principais: apresenta-se com litíase renal como achado ocasional de exame nucleação e agregação. de rotina, para investigação de hematúria microscópica ou de disfunção renal crônica. Litíase renal no pronto-socorro outras condições que simulam cálculos renais, como cálculos em No pronto-socorro, o médico que atende o paciente com suspeita vias biliares, calcificação de linfonodos mesentéricos, calcificações de litíase renal deve estar focado em primeiro lugar na pancreáticas, calcificações renais e flebólitos. Cálculos de tamanho confirmação da hipótese diagnóstica; segundo, deve-se responder reduzido, ou sobrepostos a estruturas ósseas podem não ser às seguintes questões: Existe obstrução do trato urinário? Existe visualizados. infecção associada? Existe disfunção renal associada? Simultaneamente à procura dessas respostas, o tratamento da cólica renal aguda deve ser instituído para controle dos sintomas. A investigação dos mecanismos que propiciaram a formação do cálculo geralmente é realizada após a alta, no ambulatório. As manifestações clínicas são variáveis, dependendo do tamanho e do número de cálculos, da localização e do grau de obstrução. As formas mais comuns de apresentação no pronto-socorro são A USG de rins e vias urinárias pode detectar não somente a cólica renal aguda e hematúria, sendo a ITU e a lesão renal aguda presença de cálculos, mas também a ocorrência de dilatação encontradas com menor frequência. O paciente pode referir pielocalicial, o que sugere obstrução. Todos os cálculos podem ser antecedentes pessoais ou familiares de litíase ou também pode visualizados por ultrassonografia, mas certas regiões do trajeto do apresentar alguns fatores de risco que vão facilitar o diagnóstico. ureter podem ser de difícil acesso para avaliação. Constitui-se um A apresentação clássica é a cólica renal, cujo mecanismo bom teste de screening para gestantes por não usar radiação. Tem desencadeante é a obstrução, em geral aguda, do fluxo urinário boa sensibilidade para o diagnóstico de obstrução do trato que gera aumento da pressão intraluminal e distensão da cápsula urinário. renal, acompanhada da contração da musculatura ureteral. A A tomografia computadorizada helicoidal (TC-h) atualmente é o cólica renal caracteriza-se por dor importante no flanco ou região teste de escolha por apresentar alta sensibilidade e lombar, com irradiação para bexiga, testículos ou grandes lábios, especificidade, mas nem todos os serviços de emergência dispõem podendo ser acompanhada de hematúria macroscópica, disúria, do exame. Note-se que o uso de modalidades combinadas - náuseas e vômitos. Um quadro de íleo-paralítico pode se radiografia simples de abdome e USG - parece apresentar desenvolver; por vezes a dor é tão intensa que mimetiza quadro resultados semelhantes em termos diagnósticos quando de abdome agudo, como causado por úlceras perfuradas, comparados ao uso isolado de TC-h. apendicite aguda, diverticulite aguda e dissecção de aorta, que, Na grande maioria das vezes a TC-h não necessita do uso de aliás, são importantes diagnósticos diferenciais que devem ser contraste intravenoso. O uso de contraste pode ser necessário, descartados. por exemplo, na suspeita de cálculos de indinavir, que são Cabe lembrar que existem outras causas de cólica ureteral, como radiolucentes e podem causar mínimos sinais de obstrução. por coágulos e na necrose de papila renal. Disúria também é um Em geral, a TC-h permite detectar não só o cálculo, mas também o sintoma associado comumente relatado. Oligúria ou anúria ponto e o grau de obstrução. Tem a vantagem adicional de não podem estar presentes nos casos de obstrução parcial ou total, necessitar de preparo intestinal para sua realização e a respectivamente, embora exista uma parcela de pacientes desvantagem do custo, exposição a radiação e disponibilidade assintomáticos, mesmo com obstrução ao fluxo urinário. restrita. Ao exame físico, o paciente pode encontrar-se com fácies de dor, Geralmente, um episódio agudo de cólica renal pode ser pálido, taquicárdico, às vezes hipertenso. A febre pode manejado de forma conservadora com medicações intravenosas. acompanhar os casos de litíase renal associada a infecção urinária. O controle da dor pode ser realizado com anti-inflamatórios não A punho-percussão da região costovertebral (Giordano) pode ser hormonais (AINH) e às vezes com drogas mais potentes, como dolorosa. Para o diagnóstico diferencial de dor abdominal causada meperidina e morfina. Os AINH também agem diminuindo o por dissecção de aorta, é importante aferir a pressão e o pulso nos edema e o processo inflamatório local. quatro membros para detecção de assimetrias. A ausculta da Antiespasmódicos ureterais, como brometo de n- região da aorta abdominal e da projeção das artérias renais pode butilescopolamina, também podem ser empregados. Embora o revelar a presença de sopros nos casos de dissecção da aorta. uso de AINH traga benefícios na cólica renal aguda, deve-se Diante de uma história clínica e exame físico compatíveis com lembrar que pode diminuir a filtração glomerular e agravar uma litíase renal, solicitam-se exames subsidiários como: hemograma disfunção renal preexistente, além do risco de sangramentos completo, ureia, creatinina, potássio e urina tipo 1. A presença de digestivos. hematúria pode refletir a passagem do cálculo pelas vias urinárias. Quando há suspeita clínica de cálculo de ácido úrico puro, Leucocitúria, às vezes com nitrito positivo e bactérias, sugere confirmada por exames de imagem (p. ex., não detectado à infecção urinária, que poderá ser confirmada posteriormente com radiografia simples de abdome por ser radiolucente, porém, a urocultura. A elevação de ureia, creatinina e potássio pode detectado à USG), pode-se alcalinizar a urina com citrato de sugerir obstrução do trato urinário, aguda ou crônica. potássio com o intuito de dissolver o cálculo. Vale lembrar que Os exames de imagem são fundamentais para a confirmação do essa conduta deve ser feita com cautela, pois em casos de ITU diagnóstico de litíase. A radiografia simples de abdome pode ser associada e em pacientes com cálculos de estruvita o quadro útil no contexto de emergência, embora a falta de preparo clínico pode ser agravado. intestinal seja um fator limitante. Qualquer opacificação nas áreas O paciente com episódio de cólica renal aguda não deve ser hiper- de projeção dos rins, ureteres e bexiga, em contexto clínico hidratado, pois isso gera aumento do fluxo urinário e elevação da pertinente, deve ser atribuída a cálculos radiopacos. A maioria dos pressão intratubular, o que pode causar ainda mais dor. Por outro cálculos são radiopacos, o que permite ao médico com relativa lado, pacientes que se apresentam desidratados em razão de experiência confirmar o diagnóstico. É preciso estar atento a vômitos ou impossibilidade de ingestão de líquidos pela dor osteoporose, ITU, idade inferior a 20 anos ou gota necessitam de intensa, pode-se usar solução fisiológica a 0,9% intravenosa para uma investigação completa. hidratação. A investigação começa com anamnese e exame físico. A anamnese O paciente deverá ser internado em casos de litíase renal com ITU deve ser dirigida no sentido de encontrar uma etiologia sistêmica associada (suspeitada por febre, leucocitose, disúria, leucocitúria, para litíase, abordar aspectos dietéticos, atividade profissional ou nitrito e bactérias na urina tipo 1). Em geral, inicia-se recreativa do paciente, uso de medicamentos, além da história antibioticoterapia empírica (p. ex., ceftriaxona 1,0 g a cada 12/12 familiar. Por exemplo, uma síndrome disabsortiva manifesta por horas), com colheita prévia de urocultura. diarreia, cólicas abdominais e perda de peso pode corresponder a Outras indicações de internação hospitalar são a dor de difícil doença de Crohn, que está relacionada com litíase renal por controle, hematúria macroscópica intensa e obstrução do trato oxalato. urinário (com ou sem disfunção renal). Nesses casos, deve-se Pacientes com história de crise de gota e tofos gotosos ao exame consultar o médico urologista para avaliar a possibilidade de físico podem possuir litíase por ácido úrico. A presença de sonda remoção do cálculo ainda durante o episódio agudo ou outras vesical de demora deve ser valorizada por sua relação com ITU e medidas pertinentes. Na presença de hematúria macroscópica, cálculos de estruvita. deve-se considerar a suspensão do uso de medicamentos como Dados como o número de cálculos, envolvimento de um ou ambos varfarina, ácido acetilsalicílico, heparina e derivados, além de rins, frequência dos episódios de cólica renal, idade de solicitar a dosagem de plaquetas e coagulograma. Às vezes, faz-se aparecimento do primeiro episódio e a presença de ITU são necessário a sondagem vesical de demora, de irrigação com importantes, pois ajudam a caracterizar o processo e podem solução fisiológica 0,9% fria (15oC) para reduzir a formação de orientar o diagnóstico e o tratamento. Também merece atenção coágulos e a consequente obstrução do trato urinário. especial o aparecimento de cálculos em crianças ou jovens que Uma parte dos pacientes que se apresentam ao pronto-socorro deve ser sempre investigado, pois nessas faixas etárias podem ser com cólica renal aguda não apresentam as complicações descritas encontrados cálculos de cistina e oxalato em decorrência da e melhoram rapidamente com o manejo conservador (i.c., hiperoxalose primária. analgesia, anti-inflamatórios, antiespasmódicos e orientações O histórico de intervenções urológicas e a resposta a esses gerais). Estudos demonstram que pacientes acompanhados por procedimentos podem sugerir a composição do cálculo. Cálculos especialistas frequentemente têm as taxas de recorrência de cistina, por exemplo, não respondem bem a litotripsia. Outro reduzidas, motivo pelo qual deve-se referenciar ao nefrologista o dado interessante é a recorrência de litíase em um mesmo rim, o paciente após um episódio de cólica renal aguda. que pode nos sugerir alguma má-formação congênita, como Nesse período do tratamento não se deve orientar o consumo estenose de junção ureteropielocalicial (JUP) ou megacálice. excessivo de água, pois a hiper-hidratação nessa fase pode O interrogatório alimentar deve incluir a quantidade e o tipo de precipitar novo episódio doloroso. Deve-se orientar o paciente a líquido ingerido ao longo do dia, o consumo de sódio, proteínas e guardar os cálculos eliminados para posterior análise, se purinas, além do uso de suplementos alimentares e condimentos. necessário. É frequente o paciente referir que não consome muito sal, mas às vezes o faz de forma indireta, por meio do consumo de alimentos Litíase renal no ambulatório industrializados com alto teor de sódio como embutidos (salsicha, No consultório, o médico geralmente receberá pacientes com salame, presunto), conservas (azeitonas, picles), entre outros. litíase renal por conta dos seguintes motivos: após um episódio Novamente, o uso de medicamentos deve ser questionado, já que agudo de cólica renal, diagnóstico de litíase em achado de exame alguns podem estar envolvidos na gênese de cálculos. Entre eles, de rotina, após a eliminação espontânea de cálculo, nos casos de os mais comuns são: diuréticos de alça e vitamina D investigação de hematúria ou ainda na investigação de (hipercalciúria), salicilatos, indinavir, aciclovir, triantereno, insuficiência renal. sulfadiazina, probenicide, acetazolamida e anfotericina B Nesse contexto, a atenção deve ser concentrada em: (associados com nefrocalcinose). A. Diagnosticar a causa da formação dos cálculos (i. e., condição Exames bioquímicos gerais devem ser colhidos para investigação, e/ou doença subjacente propiciadora). sendo eles: hemograma, sódio, potássio, cloro, pH e bicarbonato, B. Definir se existe indicação de remoção do cálculo. ureia e creatinina, ácido úrico, cálcio e fósforo. Com relação ao C. Considerar a presença de má-formação do trato urinário que cálcio, quando esse estiver elevado ou no limite superior do valor predisponha a formação de cálculos (principalmente quando a de referência, devemos pensar nos diagnósticos diferenciais de doença é recorrente sempre em um mesmo rim ou parte do hiperparatireoidismo primário, neoplasias e sarcoidose, além do ureter). uso de medicações como vitamina D. Em caso de obstrução do trato urinário, mesmo quando unilateral A combinação de acidose metabólica com pH urinário alcalino ou de longa data, deve-se programar a desobstrução do trato pode sugerir acidose tubular renal que está associada à urinário no menor tempo possível. nefrolitíase e à nefrocalcinose. Pacientes adultos com fatores de risco clássicos que São importantes exames como urina I, urocultura e urina de 24 experimentaram um primeiro episódio de cólica renal aguda, sem horas com dosagens de sódio, potássio, creatinina, ácido úrico, disfunção renal ou ITU associadas, de fácil manejo clínico, não magnésio, cálcio, citrato e oxalato. No exame de urina I, a necessitam de investigação extensa. Por outro lado, pacientes densidade elevada pode refletir urna urina concentrada por baixa com alto risco de recorrência (meia-idade, homens brancos e com ingestão de líquidos. O pH elevado é encontrado nos pacientes história familiar), aqueles com cálculos compostos de cistina, com cálculo de estruvita ou fosfato de cálcio, enquanto pH baixo ácido úrico, fosfato de cálcio ou estruvita, estados de diarreia pode ser encontrado naqueles com litíase por ácido úrico ou crônica ou má absorção, fraturas ósseas patológicas ou oxalato de cálcio. Na análise do sedimento urinário, cristais hexagonais são altamente sugestivos de cistinúria. Em pacientes com suspeita de cálculos de estruvita Combinado à radiografia de abdome simples, o USG tem (principalmente aqueles com história de infecção do trato sensibilidade de 78% para identificação de cálculo urinário urinário, pH urinário acima de 6,5, bactérias na urina I), deve-se obstrutivo. solicitar urocultura com identificação do agente, mesmo que a A TC-h é bastante utilizada, principalmente nos casos em que o contagem de colônias for inferior a 100.000 unidades por mililitro, USG e a radiografia simples não identificaram o local da porque a produção de urease pode ocorrer com contagens de obstrução, ou para auxílio na programação de uma intervenção bactérias mais baixas. urológica. A TC-h tem a vantagem de detectar uma dilatação do A coleta de urina de 24 horas deve ser realizada em mais de uma sistema urinário sem o uso de contraste. É muito útil em delimitar ocasião (em geral 3 vezes, com o paciente fora da crise de cólica órgãos pélvicos (bexiga e próstata), bem como demonstrar renal aguda) e com o paciente consumindo sua dieta habitual. Ele anormalidades (distensão ou obstrução de bexiga) secundárias ao deve ser instruído no dia da coleta a desprezar a primeira micção aumento da próstata. A TC-h é excelente para determinar causas matinal e, a partir de então, guardar todo o volume urinário até o intrínsecas, com sensibilidade para litíase ureteral de 100%, e dia seguinte, incluindo a primeira micção desse dia. Para assegurar extrínsecas de obstrução, como fibrose retroperitoneal, que todo o volume foi coletado, pode-se dosar a creatinina linfadenopatia e hematoma. Esse exame também pode detectar urinária de 24 horas. Valores inferiores a 20 mg/kg para homens e patologias extraurinárias e estabelecer causas de dor não 15 mg/kg para mulheres sugerem coleta incompleta. Faz-se urogenitais. exceção a essa regra pacientes idosos, mal nutridos ou aqueles A urografia intravenosa está indicada nos casos de suspeita de com pouca massa muscular, associada a menor produção obstrução do trato urinário superior em pacientes com função endógena de creatinina. renal normal, não alérgicos ao contraste e mulheres não Duas informações adicionais importantes podem ser obtidas com gestantes. Esse exame pode fornecer dados anatômicos e a coleta de urina de 24 horas: volume urinário e sódio urinário. funcionais, particularmente do ureter, e a localização da Com esses dados podemos estimar a quantidade de água ingerida obstrução. Por conta da nefrotoxicidade do material utilizado para e a quantidade de sódio consumida pelo paciente, já que o contraste, especialmente em pacientes de alto risco como metabolismo do sódio encontra-se em balanço. Por exemplo, uma diabéticos e renais crônicos, esse exame tem sido substituído por dosagem de sódio de 308 mEq em 24 horas significa uma ingestão outros exames complementares como USG e TC-h. Porém, por de 18 gramas de sódio (17 mEq de sódio = 1 grama de sódio) (i. e., conta da alta capacidade de detectar o local da obstrução em uma um valor bastante elevado que contribui para a elevação da significativa porção de casos e da capacidade de descrever a calciúria). anatomia do trato urinário, ele ainda continua sendo um método Os valores de referência para as dosagens de urina de 24 horas se útil para o diagnóstico. prestam não só para o diagnóstico do distúrbio metabólico, mas A renografia isotópica e com diurético apresenta 90% de também para controle do tratamento. sensibilidade para realizar o diagnóstico de obstrução do trato As amostras de urina de 24 horas devem ser colhidas em frascos urinário superior. É também altamente específica, embora a com conservante ácido para cálcio, oxalato e citrato, e dilatação da pelve renal ou do ureter em razão de causas não conservante alcalino para ácido úrico, para evitar a precipitação obstrutivas pode resultar em diagnóstico falso-positivo. Não tem dos sais. utilidade na urgência, pois demanda tempo e não faz diagnóstico Todo paciente deve ser instruído a guardar os cálculos expelidos, etiológico. quando possível, para posterior análise; as chances de A renografia isotópica e com diurético é utilizada para diferenciar recuperação do cálculo estão aumentadas durante um episódio de a dilatação com obstrução da dilatação sem obstrução. Após a cólica ureteral ou após procedimentos urológicos como a infusão do agente radioisotópico, é administrado um diurético de litotripsia e a retirada do cálculo por via endourológica. A análise alça (furosemida). No caso de dilatação com obstrução, após a do cálculo pode trazer subsídio adicional para definir a administração do diurético não ocorre aumento da excreção anormalidade metabólica subjacente e orientar o tratamento. urinária do radioisótopo. Com relação aos exames de imagem para diagnóstico e Finalmente, em posse desses dados de anamnese e exame físico, acompanhamento de tratamento, geralmente utilizam-se USG, exames laboratoriais de sangue e urina, exames de imagem e radiografia simples de abdome, TC-h, urografia excretora e a análise do cálculo, o médico pode determinar a programação renografia isotópica com diurético. terapêutica geral e individualizada para cada distúrbio metabólico Quando há suspeita de obstrução urinária, o USG deve ser subjacente. realizado, pois apresenta alta sensibilidade (90%) e especificidade Muitas vezes, o paciente apresenta mais de um distúrbio para o diagnóstico de hidronefrose. Além disso, é um exame não metabólico associado, por exemplo, hipercalciúria e hipocitratúria, invasivo, de baixo custo e pode ser repetido frequentemente ou hipercalciúria e hiperuricosúria. Nesses casos, o tratamento mesmo em pacientes com insuficiência renal aguda. deve ser dirigido para todos os distúrbios encontrados. O USG pode determinar o tamanho e a forma dos rins, a presença de dilatação na pelve e nos cálices e demonstrar o afilamento do córtex em casos de hidronefrose grave. Note-se que a medida do espessamento do parênquima renal serve como um marcador indireto da duração da obstrução. Quando a espessura do parênquima renal está reduzida, indica obstrução de longa duração. Porém, existem relatos de recuperação parcial da função renal após a desobstrução, mesmo naquelas de longa data. hiperuricosúria) deve ser restrito a 0,8 a 1,2 g de proteína animal por quilograma de peso do paciente a cada dia. O metabolismo de certos aminoácidos pode gerar a produção de íons sulfato, o que causa a liberação de íons cálcio pouco solúveis na urina. A ingestão de proteína animal também aumenta a carga filtrada de cálcio, levando a hipercalciúria, além de causar acidose metabólica e reduzir o pH urinário. Isso diminui a excreção de citrato urinário, aumenta a uricosúria e propicia a formação de cálculos de ácido úrico. A recomendação atual para ingestão de cálcio deve ser em torno de 800 a 1200 mg por dia para pacientes com litíase renal. A restrição do consumo de cálcio em pacientes com litíase no passado era um equivoco comum. Atualmente, sabe-se que não deve haver restrição de cálcio, nem mesmo naqueles pacientes com hipercalciúria. O estudo de Curhan et al. demonstrou que a incidência de formação de cálculos em homens saudáveis foi 34% menor entre aqueles com elevada ingestão de cálcio (> 1,3 g/dia), comparado com pacientes com ingestão inferior a 0,5 g/dia. A explicação para esse fato é que a falta de cálcio no lúmen intestinal leva a um aumento da absorção de oxalato, levando a hiperoxalúria secundária. Pacientes que apresentam hiperuricosúria devem restringir o consumo de alimentos com alto teor de purinas, como miúdos e Entre as orientações dietéticas gerais, deve-se incluir a vísceras, frutos do mar, sardinha, bacon, bacalhau, espinafre, recomendação de ingestão de líquidos, predominantemente água, couve-flor, feijões e aspargos. Nem todos os pacientes com para resultar em um volume urinário entre 2 a 2,5 L por dia. Essa hiperuricosúria vão apresentar cálculos de ácido úrico. No medida reduz a concentração urinária de solutos e a cristalização. entanto, naqueles com biperuricosúria e com litíase por ácido A ingestão de suco de laranja ou limão ajuda a aumentar a úrico, pode-se alcalinizar o pH urinário, visto que o ácido úrico excreção urinária de citrato. O consumo moderado de café, chá ou torna-se mais solúvel em um pH urinário em torno de 6,5 - 7. Com vinho parece reduzir o risco de litíase em mulheres. Atividade o uso de citrato de potássio (p. ex., Litocid*) (que também leva a física regular pode reduzir a formação de cálculos renais, embora alcalinização urinária), podemos não só prevenir a formação de o mecanismo exato não seja compreendido. novos cálculos, como causar a dissolução de cálculos já existentes. A restrição do consumo de sal reduz a excreção urinária de cálcio Pode-se iniciar com doses em torno de 40-50 mmoL dia em doses e deve ser encorajada em pacientes com hipercalciúria, porém o fracionadas e posteriormente titular a dose para atingir um pH seu valor ideal não é exatamente conhecido. Em pacientes urinário em torno de 6,5 a 7. Não devemos alcalinizar a urina hipertensos, recomenda-se uma ingestão de sal inferior a 5 g por acima desses valores para não causar a precipitação de fosfato de dia, e acredita-se que esse nível de ingestão deve ser compatível cálcio. com um hábito saudável aplicável à maioria dos pacientes com Em situações de catabolismo celular intenso que causam aumento litíase renal. do nível de ácido úrico sanguíneo (p. ex., neoplasias A cada consulta o médico pode monitorar o consumo de sal por hematológicas, síndrome de lise tumoral), podemos prescrever meio da dosagem de sódio urinário em 24 horas, além de reforçar alopurinol na dose inicial de 100 mg por dia. Deve-se lembrar que a importância dessa medida. O consumo de alimentos estados de diarreia crônica devem ser investigados e tratados industrializados com alto teor de sódio deve ser evitado. Entre porque causam depleção de bicarbonato e, consequentemente, esses alimentos destacam-se: mostarda, shoyu, extrato de redução do pH urinário, propiciando a formação de cálculos de tomate, conservas de milho, azeitonas, palmito, embutidos como ácido úrico e fosfato de cálcio. mortadela e salame, alimentos conservados na salmoura como Todo paciente com litíase renal deve ter os níveis de citrato bacalhau e carne seca e temperos prontos. urinário de 24 horas aferido em mais de uma ocasião. Estão Ainda em relação aos pacientes com hipercalciúria, o uso de indicados medicamentos como citrato de potássio, além de diuréticos tiazídicos, como a hidroclorotiazida (dose inicial de 12,5 alimentos ricos em citrato, como sucos de laranja ou limão. mg/dia), ou a clortalidona (dose inicial de 25 mg/dia) pode reduzir Às vezes, é comum identificarmos pacientes portadores de a calciúria. O paciente deve ser orientado a aumentar o consumo hipocitratúria persistente. Nesses pacientes é necessário usar de alimentos com potássio, com o intuito de prevenir a citrato de potássio por vários anos. Pode-se iniciar com doses em hipocalemia, além da recomendação de dosar o nível sérico de tomo de 40 a 50 mmoL/dia em doses fracionadas, com o intuito potássio após 10 dias do início do tratamento com diurético de aumentar a citratúria para além de 320 mg/24 horas. A tiazídico. Além disso, é recomendável para os pacientes com monitorização dos níveis séricos de potássio durante o tratamento hipercalciúria idiopática a investigação de osteopenia e é recomendada. osteoporose por meio da realização da densitometria óssea, visto Pacientes com hiperoxalúria devem ser orientados a restringir o que essas complicações são passiveis de tratamento específico. consumo de alimentos com oxalato, como espinafre, beterraba, Existem evidências de que o consumo de proteínas por alguns chocolate, chá preto etc. O consumo de cálcio deve ser de 1000 grupos de pacientes (principalmente os com hipercalciúria ou mg por dia para garantir um melhor balanço na absorção intestinal entre cálcio e oxalato. Carbonato de cálcio, 250 a 500 mg 2 vezes por dia às refeições, pode ser empregado para quelar o oxalato intestinal. Suplementos de magnésio e piridoxina podem beneficiar alguns pacientes. Deve-se considerar a suspensão de suplementos alimentares contendo a vitamina C. Em casos de doenças intestinais inflamatórias que cursam com o aumento da absorção de oxalato, o tratamento específico pode melhorar o quadro. Assim, dieta sem glúten na doença celíaca ou o tratamento da doença de Crohn podem controlar a formação de cálculos. Em casos de hiperoxalúria primária, o emprego de ortofosfato também é uma opção terapêutica. Nesses pacientes com doença renal crônica progressiva, o transplante hepático e/ou renal pode ser necessário. Pacientes com cálculos de estruvita requerem uma abordagem clínica e cirúrgica agressivas, com indicação precoce da remoção do cálculo. Antibióticos específicos para a bactéria isolada na urocultura são essenciais tanto para redução do crescimento, Por outro lado, o tratamento urológico da litíase renal não está como na prevenção de formação de novos cálculos. Em certas indicado em todos os casos. Por exemplo, cálculos de até 4 mm situações, faz-se necessário uso prolongado de antimicrobianos em trajeto ureteral apresentam probabilidade acima de 80% de até a erradicação da bactéria isolada; algumas vezes, as bactérias serem eliminados espontaneamente. Por outro lado, às vezes a permanecem no interstício do cálculo, e mesmo com as intervenção urológica é necessária com cálculos de apenas 5 mm, uroculturas negativas o tratamento pode prolongar-se por mais 3 a depender da localização desse no trato urinário, ou se há dor meses. intratável ou infecção concomitante. Às vezes, opta-se por Pacientes com cálculos de cistina, além da grande ingestão de aguardar a liberação espontânea do cálculo, com base em líquidos com o intuito de reduzir a concentração urinária de tamanho, localização e ausência de complicações importantes. Se cistina abaixo do seu limite de solubilidade (cerca de 243 mg/L), mesmo após 2 a 4 semanas não houve eliminação do cálculo, esse podem se beneficiar do uso de drogas como a D-penicilamina paciente deve ser encaminhado ao urologista para a remoção do (dose inicial de 250 mg por dia), a tiopronina, que se liga à cistina cálculo das vias urinárias. e diminui a saturação urinária da cistina. O captopril, um dos mais Como técnica mais empregada, a LECO consiste em sessões de comuns inibidores da enzima conversora de angiotensina, pode cerca de 30 minutos sob analgesia e anestesia, em que 1500 a ser efetivo por levar a formação de compostos thiol-cisteína, que 2000 ondas de choque (energia eletromagnética ou piezoelétrica) são cerca de 200 vezes mais solúveis que a cistina. A alcalinização são aplicadas em direção ao cálculo. O número de sessões urinária com citrato de potássio também pode ser empregada. depende do tamanho, composição e número de cálculos. As complicações mais comuns são hemorragias, hematomas, Tratamento urológico da litíase renal infecção e arritmias. Esse tratamento visa à remoção do cálculo das vias urinárias ou A nefrolitotomia percutânea é uma técnica que pode ser usada desobstrução e, eventualmente a correção das más-formações em pacientes com cálculos maiores de 3 cm ou coraliformes, anatômicas implicadas na gênese do cálculo (p. ex., a correção de cálculos difíceis de serem pulverizados pela LECO (p. ex., cálculos estenose da JUP). Atualmente, as técnicas de remoção de cálculos de cistina), cálculos localizados no polo renal inferior por conta da incluem: litotripsia extracorpórea por ondas de choque (LECO), dificuldade de drenagem dos fragmentos quando empregado a ureteroscopia, nefrolitotomia percutânea e cirurgia aberta. A LECO e em pacientes com obesidade mórbida. Complicações como nefrolitotomia percutânea é a técnica preferida por alguns sepse, hemorragia, lesão intestinal ou esplênica podem ocorrer. urologistas em casos de obstrução aguda com infecção associada Em relação à localização dos cálculos, de maneira geral, cálculos por causa do menor risco de desenvolvimento de sepse e pela coraliformes são submetidos a nefrolitotomia percutânea mais possibilidade de anestesia local. LECO; os cálculos caliciais e ureterais superiores com diâmetro Quando indicada a remoção do cálculo, em 78% dos casos a LECO superior a 6 mm com litotripsia; e os cálculos em ureter distal com é a técnica de escolha. Em cerca de 20% dos casos, o cálculo pode ureteroscopia ou litotripsia. ser removido por ureteroscopia, e em menos de 2% dos casos são Nos cálculos de estruvita, a abordagem urológica pode ser mais empregadas as técnicas de nefrolitotomia percutânea e cirurgia precoce e liberal no sentido de sua indicação, e cálculos até 2 cm aberta. respondem bem a LECO, enquanto cálculos maiores necessitam ser abordados por meio de nefrolitotomia percutânea, seguidos ou não de LECO. Atenção se faz ao excluir ITU ou pelo menos controlar o processo infeccioso com antibióticos antes de procedimentos urológicos.