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Porém, nas últimas décadas, depois da virada ontológica protagonizada por Stuart
Hall, os estudos pós-coloniais e decoloniais vêm trazendo conceitos que ajudem a
pensar os processos de colonização a que foram impostos as populações subalternas no
projeto colônial e como essas populações desenvolveram seus modos de vida sob o jugo
do colonizador. Nesse sentido, a produção dos estudos decoloniais e as novas tentativas
da produção de uma ciência que parta também da subjetividade de sujeitos subalternos
têm apresentado perspectivas transformadoras acerca das questões étnico-raciais e de
gênero, principalmente para países pós-coloniais, onde elas têm um peso fundamental
na formação histórica e social.
Concordando com essa visão, Ribeiro (2017) diz que quando se refere a lugar de
fala, não estamos falando necessariamente de indivíduos, mas deles inseridos no seu
contexto social, que permitem ou não o reconhecimento e acesso a cidadania. “Seria
principalmente um debate estrutural” (RIBEIRO, 2017. p.61).
Linda Alcoff demonstra que a questão do lugar de fala é um debate muito atual no
meio acadêmico, que tem suscitado diversas polêmicas e diferentes posições: desde a
rejeição da possibilidade de falar pelo Outro, a posições que entendem o conceito de
lugar de fala mais como qualitativo, do que como exclusivo.
Por não estar alienado a esse debate, quando comecei a pensar esse texto o primeiro
problema que me ocorreu foi: “como vou escrever um texto sobre intelectualidade
feminina negra no Candomblé, sendo um homem branco?”. E aqui, como reforça
Djamila Ribeiro, não se trata (apenas) de uma questão individual, mas de uma questão
estrutural. É possível produzir conhecimento que não reforce as opressões sofridas por
mulheres negras fazendo parte do grupo social que as subjugou por séculos?
A resposta não está dada e terá que ser construída ao longo do debate, mas por uma
questão de clareza metodológica e concordando com a importância do conceito de lugar
de fala trazido pelas autoras, que sinto a necessidade de me narrar, de forma breve.
3 – Pós-colonialismo e decolonialidade
Essa tendência crítica a colonialidade foi uma marca dos estudos pós-coloniais, a de
interceder pelo colonizado nas suas análises. Porém, a partir da década de 90, com o
surgimento do Grupo Latino-Americano de Estudos Subalternos nos EUA, começou a
se desenhar o que viriam a ficar conhecidos como estudos decoloniais. A sua diferença
para o pós-colonialismo, mais ligado aos estudos asiáticos, foi uma intensa crítica a
matriz teórica que estava sendo utilizada, uma matriz europeia (ROSEVICS, 2017.
p.190). As divergências teóricas acabaram desagregando o grupo, dos quais alguns
membros viriam formar, mais tarde, o Grupo Modernidade/Colonialidade, que no final
dos anos 90 e no início dos anos 2000 produziu diversos seminários e publicações
focadas nas problemáticas pós-coloniais, mas pensadas num novo contexto, da
emancipação do próprio pensamento das matrizes europeias.
Outro conceito caro aos deocloniais foi o de colonialidade do poder, cunhado por
Alberto Quijano, em 1989(BALLESTRIN, 2013. p.100). Para Quijano a colonialidade
foi peça chave para o desenvolvimento da modernidade, tendo o capitalismo colonial
moderno utilizado, principalmente, três eixos de classificação para sua formação: raça,
gênero e trabalho. É através dessas três linhas que as relações de exploração, dominação
e conflito foram ordenadas e hierarquizadas (Quijano, 2000, p. 342).
4 – Candomblé e decolonialidade
Por isso, outra importante contribuição que os estudos decoloniais podem trazer é a
valorização da produção intelectual dessas mulheres. Não apenas em termos de
mercado, pois fica claro que o capitalismo cada vez mais se apropria dos discursos
decoloniais e das lutas de grupos subalternos para lucrar, mas a valorização de suas
práticas antes mesmo delas serem avalizadas pela academia. Um exemplo disso é o
lançamento das produções literárias de Iyalorixás como Mãe Stella de Oxóssi ou Mãe
Beata de Iemanjá.
5 – Conclusão
Com isso não quero dizer que os estudos decoloniais trarão a solução para todos os
problemas que viveram e vivem as mulheres negras de Candomblé. Creio que aqui o
exercício é mais de buscarmos novas formas de escuta, do que de soluções.
Entendermos com quais conceitos essas mulheres estão trabalhando sua própria história
e do grupo social do qual fazem parte.
Isso dizer que todos os outros que não fizerem parte desses grupos estão
desautorizados a falar sobre isso, se fosse o caso eu nem estaria escrevendo esse texto,
mas significa que aqueles que advogam por um compromisso decolonial na sua escrita
têm por dever a interlocução e o debate com a produção intelectual dessas mulheres.