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A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
SOCIAL CORPORATIVA
(Work Paper)
Setembro de 2008
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Inicio este ensaio com uma grande ousadia. A ousadia de comentar algumas
idéias de três dos mais brilhantes teóricos da sociologia e filosofia, Max Weber,
Jürgen Habermas e Alberto Guerreiro Ramos que, de uma forma ou outra, tem
influenciado uma conceituada vertente de estudos organizacionais no Brasil. Para
atenuar este desafio cabe esclarecer que não se pretende contrapor suas idéias,
mas erigir algumas possibilidades de problematização aplicadas ao contexto
empresarial, enfatizando a racionalidade administrativa e do que entendemos que
se possa esperar das organizações para a construção de uma sociedade que
qualifique as condições de existência dos indivíduos.
O presente texto discute esta temática tendo como referência teórica a
denominada teoria crítica que tem como premissa a oposição ao positivismo lógico
e considera que a sociedade de mercado não é algo natural, ou seja, nem sempre
a sociedade se organizou deste modo e não necessariamente este deva ser o
modelo final de organização. Neste contexto a teoria crítica tem como elemento
fundamental a questão da emancipação e os fatores que tem inibido este processo
na sociedade contemporânea. É uma abordagem que busca, mais do que
descrever a realidade administrativa, contribuir para a construção de outras
referências de convívio que possam contribuir para que se avance nos processos
de emancipação individuais. Para tanto, em termos metodológicos, ela adota uma
postura de “crítica” que se baseia, conforme, Falcão Vieira e Caldas (2006, pg.60),
no seguinte postulado:
“... é impossível mostrar as coisas como realmente são, senão a partir da perspectiva de como
elas deveriam ser. Na verdade, o “dever ser” se refere às possibilidades não realizadas pelo mundo
social. Não tem caráter utópico, mas analisa o que o mundo poderia ter de melhor se suas
potencialidades se realizassem. A identificação das potencialidades permite entender mais
claramente como o mundo funciona e, dessa forma, identificar os obstáculos à realização das suas
potencialidades”.
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O que não significa que as organizações não tenham um amplo campo para promover a
humanização das relações de trabalho sem comprometer sua função precípua.
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- Qual o modelo de racionalidade que se pode esperar e aceitar nos contexto social
e empresarial?
industrial focada no mercado. Esta influência está clara quando o autor (1989, pg. 8)
comenta que:
substancial do bem alcançado uma contribuição sua. Ser abandonado a seus próprios
recursos prenuncia um medo paralisante do risco e do fracasso, sem direito a apelação
ou desistência. Esse não pode ser o significado real de liberdade; e se a liberdade
realmente existente, a liberdade oferecida, significar tudo isso, ela não pode ser nem a
garantia da felicidade, nem um objetivo digno de luta”
relações de produção2. Com isto o ambiente de trabalho tem seu caráter opressor
minimizado, ao menos em relação à situação anterior, embora ainda possam ser
observadas situações que induzam a auto-alienação ou a coisificação como
estratégia de equilíbrio psicológico do indivíduo na organização. Cabe, entretanto
observar que cada vez mais estas atividades não intensivas em conhecimento têm
seu peso relativo e número de profissionais reduzido pelo avanço tecnológico que
substitui, geralmente com mais eficiência econômica, o trabalho humano direto
finalizando em termos históricos o período taylorista-fordista.
Esta transformação não ocorre somente pelo incremento tecnológico na
empresa, mas essencialmente pela elevação da capacidade de consumo da
população, de um comportamento mais individualista que gera a necessidade da
produção de produtos ergonomicamente aderentes as expectativas de extratos de
consumidores e que possuem um ciclo de vida extremamente curto. Este processo,
denominado por alguns de toyotista, força as empresas a operarem em um
processo permanente de inovação que faz surgir um novo profissional, o
trabalhador do conhecimento. Este novo agente assume uma participação relativa
de destaque nos processos de produção da sociedade da informação por ter a
capacidade de agregar valor aos produtos pelo gerenciamento dos novos fatores de
produção baseados em tecnologia intensiva. Neste cenário surge uma nova
questão: até que ponto, em uma economia onde a inovação e a criatividade são os
elementos essenciais de competitividade, o sistema conduz deliberadamente a
processos de alienação no ambiente do trabalho? Provavelmente nestes casos a
alienação, se é que este é o melhor termo, não se dê no contexto do mundo do
trabalho aos moldes da sociedade industrial, mas ocorra a partir do mercado onde
sujeitos são avaliados e envolvidos em todas as dimensões de sua personalidade,
em função de seu potencial de consumo material e cultural3.
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Especificamente no campo trabalhista alguns exemplos são o reconhecimento dos sindicatos, a
redução da jornada de trabalho, o direito a férias e 13 salário e a definição do salário mínimo, para
mencionar alguns.
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Fontenelle (2007, pg.142), explicita o consumo cultural ao afirmar que “... em que pesem as
inúmeras definições de cultura que povoam os diversos campos do conhecimento, pelo menos há
uma idéia compartilhada entre esses campos de que a cultura seria a forma através da qual os
homens expressam suas experiências vividas e seus significados. Ela estaria ancorada, portanto, em
sentimentos, valores, crenças, rituais partilhados em comunidades locais, regionais ou nacionais
oriundos de histórias e experiências reais de vida que se refletem nas artes plásticas, na música, na
dança, na comida, nos filmes, nos textos impressos, etc. Mas, quando empacotadas para consumo,
essas formas culturais perdem seu sentido original e se apresentam como simulacros de
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termo será aqui utilizado como a coerência entre a ação social e o modo como seu
ator consegue fundamentá-la e justificá-la sem cair em contradição a partir de seus
próprios argumentos. Em Hobbes (1999, pg. 51) o conceito de razão é definido
como “... o cálculo (adição e subtração) das conseqüências de nomes gerais
estabelecidos para marcar e significar nossos pensamentos. Digo marcar quando
calculamos para nós próprios, e significar quando demonstramos ou aprovamos
nossos cálculos para os outros homens”4. Obviamente este conceito não busca
qualquer vínculo com os aspectos valorativos de uma decisão e ação, não se
relaciona com aspectos considerados corretos ou não por uma determinada
comunidade, mas envolve apenas a coerência intrínseca entre a ação e sua
justificativa.
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Grifos do original.
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Fica evidente nas palavras de Max Weber que na ação racional motivada
pela convicção em valores, o agente delega a responsabilidade sobre a coerência e
os vínculos de sua ação com resultados aos valores que o guiaram na ação. Não
existe uma preocupação em cotejar os desdobramentos de suas iniciativas sobre as
outras pessoas visto que isto já está equacionado na crença valorativa a que o
agente se vinculou, logo, ele não avalia ou se sente responsável com os resultados
provocados, apenas busca coerência com seus valores.
Já na ação racional referente a fins o agente social está conscientemente
comprometido, responsabilizado, pela relação meios e fins/resultados gerados. O
agente assume para si a avaliação das conseqüências e decide pela
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anteriormente, a análise é inversa. Se alguma crítica à ação deve ser feita esta é
dirigida à razão orientada por valores visto que é bastante discutível, principalmente
no campo administrativo, quais valores poderiam ser considerados legítimos e
emancipatórios, principalmente se, conforme apresentado por Weber (2004),
caberiam a estes valores, responsabilizar-se pela conseqüência dos atos do agente
organizacional.
Tratemos agora da dimensão ética originada destes dois conceitos que
Ramos (1983) denominou de ética da responsabilidade e ética da convicção e que
estariam implícitos nos conceitos anteriormente comentados. A ética da convicção
subjacente a razão valorativa, por basear-se estruturalmente em um conjunto de
valores e princípios, tem caráter essencialmente normativo com um enfoque que
poderia ser denominado de pré-kantiano, pois opera com referências pré-
estabelecidas e aparentemente não considera o imperativo categórico da
universalidade da aplicação de uma ação moral como fundamento de análise na
formação dos juízos morais.
Ramos (1983, pg. 44), como pode ser visto na afirmação a seguir, não ignora
que as empresas possuem uma dinâmica que condiciona seu comportamento à
ética da responsabilidade:
transformação organizacional. É provável que isto não seja possível, pois não
obstante a empresa ser parte integrante e com grande potencial epistemológico de
definição de uma percepção de sociedade ela possui uma finalidade clara que é a
articulação de fatores de produção no intuito de executar sua missão a partir de um
negócio previamente definido. Acreditar que seja possível conduzir uma revolução
social de amplo espectro no seio organizacional a revelia do sistema social externo
é uma temeridade que compromete diretamente os interesses dos investidores.
Estes últimos, não obstante os discursos românticos veiculados na mídia, não
teriam qualquer escrúpulo em redirecionar seus recursos para alternativas
empresariais mais rentáveis que mantivessem uma coerência entre missão, negócio
e não transgredissem os limites institucionalizados pelo Estado ou sociedade.
Poder-se-ia afirmar que é uma ilusão, se o termo mais adequado não fosse
irresponsabilidade, buscar transformar a sociedade a partir de movimentos no
interior das empresas envolvendo iniciativas isoladas, alheias a seu objeto e sem
sustentabilidade econômica, pois o mercado tem sido impassível em sua lógica
instituída, punindo implacavelmente aquelas organizações que ignorarem os
princípios funcionais6deste mercado. Contudo, talvez o desafio esteja em, não
ignorando este foco funcionalista do mercado, limitar o grau de funcionalismo no
interior da organização que mesmo tendo que se manter fiel a meta de execução
efetiva de sua missão com autonomia econômica, pode efetuá-lo buscando
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Para a definição do conceito de funcionalismo utiliza-se o modelo multiparadigmático apresentado
por Burrel e Morgan (1979) onde a categoria “Funcionalismo” seria derivada do Positivismo. Esta
qualificação efetuada pelos autores decorre da interpretação de Comte que afirmaria que, as
ciências biológicas desempenhariam o papel de fazer a transição dos métodos das ciências naturais
para as ciências sociais. Dessa maneira, ele lançou as bases para a abordagem funcionalista nas
ciências sociais que utilizam analogias mecânicas e orgânicas para explicar estruturas e processos
dentro de uma perspectiva holística. Apoiado nas idéias de Comte e Darwin, Herbert Spencer vê a
sociologia como o estudo da evolução, traçando paralelos entre sociedade e organismo. A sociedade
seria um sistema auto-regulado que poderia ser entendido por intermédio do estudo de seus vários
elementos ou órgãos e pela maneira como eles se inter-relacionam. A evolução – que ele também
denomina de progresso – se dá por processos de integração crescentes e diferenciação. Durkheim
utiliza os mesmos métodos de Comte e Spencer e acrescenta ser importante analisar não apenas a
estrutura e as funções, mas também as causas dos eventos; não apenas estudar a utilidade e o
papel de um fato, mas por quê ocorre. Sua sociologia se desenvolve dentro da ótica da regulação,
sendo sua preocupação a noção de solidariedade. Segundo Burrell e Morgan (1979), a abordagem
funcionalista deriva, em grande medida, da obra de Alfred Marshall, Max Weber, Vilfredo Pareto,
George Herbert Mead e William James. Segundo os paradigmas de Burrell e Morgan (1979), embora
possa haver inúmeras possíveis correntes teóricas e metodológicas dentro do paradigma
funcionalista em Administração, todas buscam explicar, de maneira racional, o status quo, a ordem e
a integração sociais, o consenso, a solidariedade e assim por diante. Pressupõem uma sociedade
regulada e buscam relações que garantam a manutenção dessa ordem.
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O progresso técnico envolve o interesse em dominar a natureza para fins instrumentais e dela
dispor, planejando, interferindo e otimizando desempenho e produtividade.
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Embora não vinculada a Escola de Frankfurt, um boa definição deste quadro é apresentado por
Souza Santos (2000, pg.230) quando apresenta as possibilidades de superação desta realidade pela
teoria crítica ao afirmar que ”A análise crítica do que existe assenta no pressuposto de que a
existência não esgota as possibilidades da existência e que portanto há alternativas susceptíveis de
superar o que é criticável no que existe”
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Deve-se ressalvar que isto não significa que atitudes como o diálogo, a transparência, a verdade e
até a participação ampla no processo decisório não devam ou possam compor o cenário
administrativo. Isto, entretanto nada tem a ver com a teoria de Habermas pois constitui simples
recorte de alguns poucos elementos de sua proposta bem mais complexa.
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“... Isto nos leva a inferir que a legitimidade do processo produtivo ou administrativo
somente existiria quando os atores envolvidos no processo – subordinados e superiores
hierárquicos, administrados e administradores, negociassem dialogicamente a maneira
como os resultados seriam alcançados. Conseqüentemente, o processo decisório seria
democratizado à medida que os participantes defendessem suas razões com base no
melhor argumento”.
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Segundo Bedin, 2002, pg.23-24, o processo de constituição do indivíduo surge “...das culturas
clássica e judaico-cristã (...) pois um dos ensinamentos básicos desta tradição é que cada cristão é
um indivíduo em relação a Deus”. Este indivíduo entretanto ainda refere-se a um individualismo fora-
do-mundo pois surge de uma relação com o divino. Apesar disto, o processo de transformação para
um individualismo-no-mundo também emerge da cultura cristã a partir de três eventos
determinantes: a conversão do cristianismo como religião tolerada por Constantino no século IV,
tornando a igreja mais mundana. O segundo evento ocorre no século VIII quando ocorre o
rompimento do papa Leão III com Bizâncio “...e a conseqüente afirmação do poder espiritual sobre o
poder terreno. Este fato deu aos papas, a partir de então, uma função política e obrigou os indivíduos
cristãos a se envolverem de maneira mais direta com este mundo”. O terceiro fato que consolida o
individualismo neste mundo ocorre no século XVI com a reformadores protestante que “...afirmavam
que o indivíduo é auto-suficiente em sua relação com Deus e que, portanto, não precisa de
intermediários”.
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“a) o nível de aumentos em complexidade sistêmica só pode ser elevado pela introdução
de um novo mecanismo sistêmico;
b) esse novo mecanismo, entretanto, deve ser institucionalizado, isto é, tem que estar
apoiado sobre o mundo-da-vida;
c) essa institucionalização de um novo nível de diferenciação sistêmica requer a
reconstrução da regulação moral-legal (isto é, consensual) dos conflitos do domínio
institucional nuclear”.
GOVERNANÇA CORPORATIVA
Institucionalização
oriunda da
Sociedade Responsabilidade
Social
REGRAMENTO LEGAL Corporativa
Institucionalização
oriunda do meio
empresarial SUSTENTABILIDADE ECONÔMICA
MISSÃO/NEGÓCIO DA EMPRESA
SOCIEDADE
Figura 01: O Processo de Institucionalização da Responsabilidade Social Corporativa
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Entende-se por sustentabilidade econômica a capacidade autônoma da organização em gerar
rendas suficientes para cobrir seus custos de operação, reprodução de seus fatores de produção e
remuneração dos provedores de capital.
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BIBLIOGRAFIA
HABERMAS, J., La lógica de lãs ciências sociales. Madrid: Editorial Tecnos SA,
1988.
PIZZI, J., O conteúdo moral do agir comunicativo. São Leopoldo: Editora Unisinos,
2005.
PRIEB, S., O trabalho a beira do abismo: uma crítica marxista à tese do fim da
centralidade do trabalho. Ijuí: Editora Unijuí, 2005.
SROUR, R.H., Poder, cultura e ética nas organizações: o desafio das formas de
gestão. Rio de Janeiro: Esevier, 2005.