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“Um juízo de reprovação sobre o sujeito (quem é reprovado), que tem por objeto a
realização do tipo de injusto (o que é reprovado) e por fundamento (a) a capacidade geral
de saber o que faz; (b) o conhecimento concreto que permite ao sujeito saber realmente o
que faz e (c) a normalidade das circunstâncias do fato que confere ao sujeito o poder de
não fazer o que faz (porque é reprovado).”
A culpabilidade deve ser aferida a partir do fato, e não do autor. Isso se chama culpabilidade
do fato. Isso porque o que se reprova é a conduta praticada pelo ser humano, tendo como base a
sua capacidade de escolher o que fazer, ou seja, que caminho seguir no caso concreto.
1Veja bem: a culpabilidade é sim uma reprovação da pessoa, mas não acerca de suas características pessoais
como forma de seleção penal dos réus, mas sim acerca da reprovação que recai sobre suas condições de se
definir perante a prática ou não da conduta criminosa. Isso é de extrema relevância, pois a culpabilidade,
na teoria tripartida do crime, é o único elemento que versa sobre a pessoa humana. Caso o Direito Penal
prescindisse da culpabilidade, não haveria um instituto específico que versasse sobre a reprovação da pessoa,
e o homem, em vez de ser considerado como destinatário do próprio fim do Direito Penal, seria posto em
segundo plano, pois nenhum conceito versaria diretamente sobre ele.
Direito Penal - Culpabilidade
b) Limite da pena (art. 29: cada um é punido nos limites da sua culpabilidade);
a) Livre arbítrio;
b) Determinismo
De acordo com o livre-arbítrio, o homem é moralmente livre para fazer suas escolhas. O
fundamento da responsabilidade penal está na responsabilidade moral do indivíduo, sendo que esta
tem por base o livre arbítrio. 1
Esse livre arbítrio é que serve de justificação às penas que se impõem aos delinquentes como
um castigo merecido, pela ação criminosa e livremente voluntária.
O meio social pode exercer influência ou mesmo determinar a prática de uma infração penal.
Contudo, nem todas as pessoas que convivem nesse mesmo meio social se deixam influenciar e,
com isso, resistem à prática de crimes.
A culpabilidade, de acordo com a teoria tripartite por nós adotada, é um substrato do crime,
um dos elementos que o compõem.
Direito Penal - Culpabilidade
Para a teoria bipartite, adotada por parte dos doutrinadores de São Paulo, como Mirabete,
Delmanto e Damásio, o crime é composto apenas de fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade
um mero pressuposto da aplicação da pena.
2. TEORIAS DA CULPABILIDADE
Os principais apontamentos contrários que podem ser feitos à teoria psicológica são relativos à
inexigibilidade de conduta diversa e à culpa inconsciente. Quanto à primeira, o dolo está presente,
mas o resultado não é imputado ao agente porque não podia, naquela situação, agir de outro modo. 2
No que concerne à segunda, não existe previsão do resultado, faltando, portanto, o vínculo
psicológico entre o autor e o fato.
IMPUTABILIDADE (pressuposto)
DOLO OU CULPA (espécies)
2 Por que neokantismo? Pois criticou duramente a concepção neutra da tipicidade preconizada pelo
causalismo, sublinhando o aspecto valorativo do tipo legal. O tipo não descreve uma conduta neutra, mas sim
uma conduta valorada negativamente pelo legislador (o matar alguém não é neutro, é algo valorativamente
negativo). O tipo penal não é objetivo e neutro, é objetivo e valorativo, ao mesmo tempo.
Direito Penal - Culpabilidade
1. Imputabilidade;
Assim, essa teoria, diferentemente da teoria psicológica, já conseguiu explicar por que, v.g.,
a conduta do agente que age compelido por ordem de superior hierárquico não deveria ser punida.
Entretanto, continuou mantendo o dolo e a culpa como um elemento psicológico dissociado da
conduta, como um elo entre a conduta do agente e o resultado lesivo. Por isso que é psicológico-
normativa: psicológico: mantém o dolo ainda como elemento natural, que deve ser extraído como
elo entre o sujeito e o resultado; normativo: traz à norma jurídica as hipóteses em que a conduta é
ou não conforme ao direito.
2.3. TEORIA NORMATIVA PURA: nasceu com a teoria finalista da ação (na qual a culpa e o dolo
integram a conduta), desenvolvida por Hans Welzel, em 1930. Para ele, o dolo e a culpa não
poderiam estar na culpabilidade, deixando a ação humana sem seu elemento fundamental, que é a
intencionalidade. Assim, essa teoria deslocou-os para o fato típico (logo, retirando do dolo e da culpa
qualquer carga normativa), passando a culpabilidade a ser elemento puramente normativo
(consistente na reprovabilidade da conduta do agente), sem qualquer juízo de valor não jurídico.
Além disso, retirou a consciência da ilicitude do dolo, o qual é somente a vontade de um resultado e
a consciência do que se faz, e não a consciência de que o que se faz é antijurídico, errado. Somente
se pode dirigir um juízo de culpabilidade ao autor quando este pode conhecer o injusto
(imputabilidade + potencial consciência da ilicitude) e adequar o seu proceder de acordo com
Direito Penal - Culpabilidade
- imputabilidade - imputabilidade 4
- exigibilidade de conduta diversa - exigibilidade de conduta diversa
- culpa ou dolo (vontade e consciência atual da potencial consciência da ilicitude
ilicitude)
Na teoria normativa pura o erro de proibição pode ser inevitável, que isenta o agente de
pena (neste caso o agente não tem consciência nem atual, nem potencial da ilicitude) ou evitável,
que diminui a pena (não tem consciência atual da ilicitude, mas tem consciência potencial). A teoria
normativa pura contenta-se com a consciência potencial, ausente somente no erro inevitável.
2.4. TEORIA LIMITADA: Na teoria limitada, a culpabilidade é composta pelos mesmos elementos
que integram a teoria normativa pura. É mera variante da teoria normativa pura.
1. Descriminantes de fato: Tratadas como erro de tipo (CP, art. 20, § 1.º)
3. CONCEPÇÕES DE CULPABILIDADE
“O juízo de desvalor da culpabilidade é de base normativa, mas deve admitir espaço para
o desenvolvimento de análise mais aprimorada sobre o particular ambiente social no qual o
fato crime produziu, e a decisão judicial produzirá efeitos relevantes, considerando-se,
fundamentalmente, a estrita necessidade de aplicação da pena.” (Fernando Galvão) 6
Liga-se ao conceito social da ação, que procurou ser uma via intermediária entre o causalismo
e o finalismo. Na década de 1930, Eb. Schimidt entende que ao Direito Penal interessa somente o
sentido social da ação. Critica o conceito final de ação, sustentando que este determina o sentido da
ação de forma extremamente unilateral em função da vontade individual, correndo o risco de se
esquecer o desvalor do resultado. Eb. Schimidt definiu ação como “uma conduta arbitrária para com
o mundo social externo”. Com Maihofer, afasta-se do naturalismo → “ação é todo comportamento
objetivamente dominável dirigido a um resultado social objetivamente previsível.”
Welzel criticou esse conceito, afirmando que se tratava de uma doutrina, preconizada por
Mezger, de imputação objetiva do resultado (segundo a qual, nem todo resultado causado é
imputável à ação do agente, pois fundamenta-se no incremento do risco e no fim de proteção à
norma), semelhante à teoria da causalidade adequada (segundo a qual, causa é a condição mais
adequada para produzir o resultado).
O funcionalismo critica o finalismo, por este permitir que a ênfase no elemento volitivo possa
permitir a punição de tentativas completamente inofensivas. Também, a existência empírica da culpa
e da omissão culposa não podem ser explicadas através da finalidade. Roxin propugna que a decisão
político-criminal ultrapasse a ideia meramente retributiva, atentando para o que é preventivamente
necessário.
A culpabilidade não teria necessariamente que trazer consigo a imposição de uma pena. A
análise sistêmica permite novo marco teórico à ideia de legitimação ao castigo. A pena desempenha 7
uma FUNÇÃO para o bom funcionamento do sistema. Não há mais objetivos “retributivos” de
prevenção geral e especial que lhe foram atribuídos pela dogmática tradicional. O funcionalismo
sustenta que a pena aclara e atualiza exemplarmente a vigência efetiva de valores violados pelo
delinquente, reforça a convicção coletiva em relação à transcendência desses valores; fomenta e
dissemina os mecanismos de integração e de solidariedade social frente ao infrator e devolve ao
“cidadão honesto” sua confiança no sistema.
Por mais que Roxin seja claramente contra o Direito Penal Simbólico e defenda a
subsidiariedade do Direito Penal, críticos como Alessandro Baratta acreditam que possa ocorrer um
reforço à concepção simbólica do delito e da pena e que esta construção teórica apresenta vocação
conservadora inclinada a legitimar o status quo em função de critérios de política criminal
empregados.
Direito Penal - Culpabilidade
Por fim, resta também evidente um desequilíbrio entre lei penal e culpabilidade em muitos
casos concretos, nos quais a demonstração de falta de culpabilidade gera consequências muito mais
graves que a pena poderia gerar, como se vê, por exemplo, com a imposição de medidas de
segurança.
Desta maneira parece indiscutível que tanto um conceito abrangente de culpabilidade como
sua expressão principiológica estejam sofrendo uma progressiva erosão diante dos desafios atuais
colocados ao Direito Penal, em especial a obtenção de consequências positivas. Dentre os penalistas
já se admite que a culpabilidade não seja discutida em torno da “liberdade de vontade” ou da
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capacidade de atuar de modo distinto, e sim a partir das finalidades de prevenção geral e especial.
No que diz respeito à diferenciação de graus de participação interna, reforça sua particular
função de valoração entre distintos graus de responsabilidade que vão desde a imprudência
inconsciente até a comissão intencional de um delito. E sobretudo no tocante aos atores, vítima e o
autor do delito, que também modificam a valoração dos graus de participação interna.
Quanto à vítima, é necessário reconhecer que a partir de sua perspectiva pode-se se sentir o
dano causado de diferentes modos, ou seja, quem atua dolosamente produz um dano maior que
aquele que atua imprudentemente, ainda que seja do ponto de vista social pessoal e não médico-
empírico. Delitos que se realizam na presença do autor e da vítima encerram uma vexação social e
Direito Penal - Culpabilidade
pessoal da vítima. O exemplo de um delito de estupro expressa bem que mais que as lesões físicas
produzidas, se produz uma séria violação à dignidade da vítima.
Quanto ao autor, desempenham especial papel os chamados delitos sem vítimas, pois nestes
também quem atua dolosamente ameaça em maior grau a vigência da norma e ao mesmo tempo a
ordem jurídica. Enquanto do autor imprudente espera-se maior cautela em suas ações no futuro, do
autor que agiu com dolo espera-se sua “conversão normativa, sua mudança de atitude frente às
normas”. Por exemplo, o terrorista que realiza um sequestro busca um ataque à ordem estatal e
jurídica.
A quarta dimensão refere-se à proporcionalidade para a adequação das penas, que acaba
sendo uma decorrência das anteriores: possibilitar a imputação subjetiva, diferenciar graus de
participação interna são tarefas que o direito penal cumpre não por um mero interesse acadêmico,
senão por buscar fundamentar e medir uma consequência jurídico-penal que possa ser qualificada
como justa.
Por último, a reprovação pode ser entendida como uma dimensão central do conceito
de culpabilidade. E pressupõe um conjunto de elementos que Hassemer descreve detalhadamente.
São eles: a Liberdade de Vontade como um elemento observável no processo penal que avalia e
mensura as limitações materiais da liberdade do acusado, ou seja, os indicadores de déficit de
liberdade. De outra parte, a vida cotidiana há de ser considerada, uma vez que nela se constrói os
conceitos de reprovação ou desculpa. Todavia, a ponderação de que não existe uma vida cotidiana
e sim normas grupais de referência e estilos de conduta com diferenças relevantes de reprovação e
desculpa também pode desempenhar um papel relevante de exemplaridade para o Direito, é dizer,
a cultura cotidiana pode ensinar a cultura do direito de que devemos ser mais cuidadosos com as
reprovações, que podemos cogitar de evitá-las, ou esquecê-las. De modo geral, o Direito sempre
manteve um distanciamento da cultura cotidiana; o desafio, entretanto, não é traduzi-la ao pé da
letra, e sim na medida do factível transformar as formas humanas em formas institucionais de
elaboração formalizada de conflitos.
Outro elemento da reprovação que não pode ser ignorado está presente no que Hassemer
chama de TEORIA DO BODE EXPIATÓRIO. A reprovação decorrente da culpabilidade faz com que
Direito Penal - Culpabilidade
a sociedade afetada pelo mal o projete sobre a pessoa individual, que deve ser afastada ou expulsa.
Este mecanismo pode oferecer uma explicação melhor de porque a reinserção social do delinquente
é algo tão difícil de ser alcançado.
Critica veementemente que a culpabilidade sirva para definir o que se pode fazer
racionalmente com uma pessoa, quando deveria servir para definir a responsabilidade. Ao propor 10
um conceito de Responsabilidade, propõe que a atenção dispensada pelo Direito dirija-se a avaliar
se o sujeito era responsável por sua ação típica e antijurídica, e não esteja voltada aos objetivos
político-criminais de futuro. A responsabilidade desde sua perspectiva é um juízo que aponta ao
passado e não ao futuro.
“O fundamento da culpabilidade não pode derivar-se , sin más (apenas), da natureza das
coisas, como crê a concepção tradicional – não cabe castigo ao inculpável porque não pode
atuar de outro modo – e perigosamente como dá a entender a teoria da motivação normativa
– não cabe castigo ao inculpável porque não pode ser motivado em absoluto pela norma -;
é imprescindível introduzir um momento normativo essencial (...) em um Estado Social e
Democrático de Direito não se considera justo levar o desejo de prevenção até o castigo a
quem atua sem culpabilidade”.
Refere-se, portanto, aos limites que necessidades preventivas podem impor às penas, do
ponto de vista da prevenção geral e especial. A prevenção geral se revela no ato de determinação
da pena, e a especial, por sua vez, na definição ao caso concreto da resposta adequada à
ressocialização ou ao menos a não dessocialização do delinquente.
Podemos incorrer em dois equívocos acerca da posição de Muñoz Conde: de que se remete 11
ao conceito puramente funcionalista de Jakobs, ao admitir que as exigências normativas são fixadas
socialmente através de uma normativa concreta, ou ainda que defende um caráter essencialmente
preventivo tal qual Roxin para a culpabilidade. Nem uma, nem outra.
Não se trata de uma visão funcional da culpabilidade porque mesmo partindo da função
motivadora da norma penal, Muñoz Conde combina à frustração das expectativas normativas uma
dimensão social como fundamento da culpabilidade, que impõe avaliar a utilidade da pena em face
da motivação individual e do papel social do indivíduo. Prepondera sobre a busca de fidelidade ao
Direito, um juízo de utilidade da pena, ou seja, a pena não deve ser aplicada a qualquer custo, mesmo
sendo inútil e desnecessária apenas para reforçar a confiança no sistema.
Por outro lado, não compartilha da separação proposta por Roxin entre dogmática jurídico-
penal e política criminal, ou substituição da culpabilidade por responsabilidade, pois considera as
mesmas fragilidades conceituais em ambos os casos.
Direito Penal - Culpabilidade
A visão de culpabilidade pela condução de vida, inserta nas cláusulas "cegueira jurídica" ou
"inimizade com o direito", foi inaugurada por Mezger e introduziu no direito penal, nas palavras de
Assis Toledo, a possibilidade de condenação do agente não por aquilo que ele faz, mas por aquilo
que ele é, daí derivando, em linha reta, um discutível e pouco seguro direito penal do autor (Princípios
Básicos de Direito Penal).
"O sujeito de maus hábitos os terá adquirido por freqüentar tabernas e prostíbulos; esta 12
conduta é claramente atípica, mas quando a ele se reprova sua "condução de vida", que
desemboca num homicídio, estaremos reprovando sua conduta anterior de freqüentar
tabernas e prostíbulos, isto é, a reprovação da conduta de vida é a reprovação de
condutas anteriores atípicas, que o juiz considera contrárias à ética (quando na
realidade podem ser contrárias apenas a seus próprios valores subjetivos). A
culpabilidade pela conduta de vida é o mais claro expediente para burlar a vigência absoluta
do princípio da reserva e estender a culpabilidade em função de uma "actio inmoral in
causa", por meio da qual se pode chegar a reprovar os atos mais íntimos do indivíduo"
(Manual de Direito Penal Brasileiro, pág. 612).
Zaffaroni e Pierangeli não veem como é possível fazer uma combinação de reprovação pelo
ato e pela conduta de vida, porque ou a ação é reprovada na circunstância concreta em que atuou,
ou o sujeito é por ela reprovado como resultado de sua conduta de vida; qualquer pretensão de
combinar ambas as reprovações não pode conduzir a outro resultado senão o de cair na segunda,
isto é, em uma culpabilidade de autor, chamada em nossos dias de "culpabilidade pela conduta de
vida".
b) Teoria limitada da culpabilidade: assim como a outra, situa o dolo no tipo penal e a
consciência da ilicitude na culpabilidade. Apresenta, entretanto, divergências quando o erro recai
sobre as chamadas causas de justificação (excludentes de ilicitudes). Para ela, se o erro recai sobre
os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, há erro de tipo permissivo, que exclui o dolo
e, se inevitável, a culpa. Se recai sobre a existência ou abrangência da causa de justificação, há erro
de proibição, que exclui a culpabilidade. PARA ESTA TEORIA SE APLICA O ART. 20, § 1º
QUANDO A CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO RECAI SOBRE SITUAÇÃO DE FATO, E O 21, QUANDO
RECAI NA EXISTÊNCIA OU NOS LIMITES DA CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO.
O fato praticado com erro invencível, inevitável ou escusável afastaria o injusto típico (por
falta de dolo), e não a culpabilidade. 13
Não seria punível a participação de alguém que contribui para um crime praticado junto a
pessoa que age com erro sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, já que, pela
teoria da acessoriedade limitada por nós adotada, somente pode-se punir o partícipe se o autor tiver
praticado, ao menos, um fato típico e ilícito.
5. A COCULPABILIDADE
A coculpabilidade tem origem nos escritos de Jean Paul Marat. Essa teoria afirma que o
Estado é corresponsável pelos atos das pessoas, na medida em que não proporciona
oportunidades iguais para todos. Essa teoria considera, no juízo de reprovabilidade, a concreta
experiência social dos réus, as oportunidades que se lhes depararam e a assistência que lhes foi
ministrada em vida. Em certa medida, a coculpabilidade “faz sentar no banco dos réus, ao lado dos
mesmos, a sociedade”. Essa teoria aparentemente foi parcialmente adotada, pela atenuante
genérica prevista no art. 66 do Código Penal.
Essa teoria é criticada por atrelar a criminalidade à pobreza, o que é sabidamente errado (vide
crimes de colarinho branco).
Direito Penal - Culpabilidade
A segunda vertente se revela na tipificação de condutas que só podem ser praticadas por
pessoas marginalizadas. Exemplos disto são os artigos 59 (vadiagem) e 60 (mendicância – revogado
pela Lei 11.983/2009), da Lei de Contravenções Penais. Dispõe o artigo 59: Entregar-se alguém
habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios
bastantes de subsistência, ou prover à própria subsistência mediante ocupação ilícita: Pena - prisão
simples, de quinze dias a três meses.
Assim, pode-se definir a coculpabilidade às avessas como o fenômeno jurídico pelo qual o
Direito Penal atua de forma mais rígida justamente para com aqueles que tiveram menos
oportunidades, enquanto concede benefícios àqueles que tinham, ao menos em tese, todas
as condições sociais e pessoais de observar a lei.
Trata-se de uma teoria desenvolvida por Zaffaroni. Quem conta com alta vulnerabilidade (de
sofrer a incidência do direito penal) - e esse é o caso de quem não tem instrução, status, família,
diploma, condições de pagar advogado etc.- teria sua culpabilidade reduzida. Ao contrário, aquele
que desfruta de baixa vulnerabilidade teria mais intensa culpabilidade.
punidos. Isso marca uma verdadeira “seleção” do criminoso punido, marcada pela escolha daqueles
mais “vulneráveis” à atuação da criminalização, ou seja, que possuem baixas defesas perante o
poder punitivo, seja por conta de estereótipos, ou pela realização de ilícitos de fácil detecção.
Veja que ambas as teorias carregam em si uma alta dose de determinismo, ou seja, defendem
que o homem é produto do meio em que vive.
De acordo com a Concepção Normativa da Culpabilidade, ela é composta por três elementos
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normativos.
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
que emana do intelecto do agente; não obstante, é objetivamente analisada no caso concreto pelo
legislador, já que ele terá como material para aferir a culpabilidade os dados e informações sobre o
agente.
O Código Penal, no art. 26, adota o critério geral de imputabilidade para todas as
pessoas, o qual depende do somatório de fatores de ordem biológica, quais sejam: é
imputável aquele que não tem doença mental nem tem o desenvolvimento mental incompleto
ou retardado. Soma-se isso a um dado de natureza psicológica, qual seja: a doença ou o
desenvolvimento mental incompleto ou retardado não pode ter tirado, por completo, a
capacidade autodeterminar-se, ou de entender o caráter ilícito do fato.
Logo, conforme explicado adiante, foi adotado o critério biopsicológico PARA DEFINIR
NÃO A IMPUTABILIDADE, COISA QUE O CÓDIGO PENAL NÃO FAZ, mas sim a
inimputabilidade.
Porém, não se deve esquecer de que o réu tem direito subjetivo de não ser submetido
compulsoriamente a exame de sanidade mental, pois o incidente de insanidade mental é
instituto jurídico que foi pensado em favor da defesa. Nesse sentido, veja-se julgado do STF:
1. No Código Penal Militar, assim como no Código Penal, adotou-se o critério biopsicológico
para a análise da inimputabilidade do acusado.
5. Ordem concedida.
(HC 133078, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 06/09/2016,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-202 DIVULG 21-09-2016 PUBLIC 22-09-2016)
São causas que excluem a imputabilidade do agente (o inimputável deve ser sumariamente
absolvido, salvo se doente mental):
Deve ser provada por exame pericial. Há, pois, três requisitos, de acordo com esse critério,
para que reste demonstrada a inimputabilidade:
O tratamento da pessoa com transtorno mental deve ser realizado no interesse exclusivo de
beneficiar sua saúde. O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do
paciente em seu meio.
A condição de índio não integrado não gera presunção de incapacidade penal. Esta condição
depende do grau de assimilação dos valores sociais, a ser revelado pelo exame pericial. Destarte,
dependendo da conclusão da perícia, o silvícola pode ser IMPUTÁVEL, se integrado à vida em
sociedade; SEMI-IMPUTÁVEL, no caso de estar dividido entre o convívio na tribo e na sociedade e
INIMPUTÁVEL, quando completamente incapaz de viver em sociedade, desconhecendo as regras
que lhe são inerentes.
Fora as situações do art. 26, também têm que se falar, primeiramente, que o art. 27 do Código
Penal dispõe sobre a menoridade penal e estipula que o menor de dezoito anos é inimputável. Ao
fazê-lo, não explica que é inimputável porque se presume o déficit psicológico-biológico.
Simplesmente fixa esse critério etário. 19
Daí alguns autores afirmarem que, neste caso, o critério biopsicológico foi substituído por um
critério puramente biológico. Identificada a menoridade ao tempo da ação, não há alternativa que
não o reconhecimento da inimputabilidade. Portanto, não pode responder por atos na esfera
penal, a despeito de poder e dever fazê-lo na esfera própria, que é a esfera infracional. Os atos
infracionais são processados não junto ao Juízo Criminal, mas sim ao Juízo da Infância e da
Juventude, o qual não é inspirado por um regime de censura penal.
Tanto é assim que as consequências advindas da ação nunca receberão nome de pena, ou
de medida de segurança. Recebem o nome de medidas sócio educativas, o que revela que, pelo
menos em teoria, a finalidade que inspira a imposição, por exemplo, de internação de um menor em
um estabelecimento próprio para adolescentes, tem como objetivo educá-lo. Nunca castigá-lo.
O art. 228 da CR/88 é cláusula pétrea, portanto, imutável nas hipóteses de redução ou
extinção de direitos fundamentais (ou seja, cláusula pétrea só pode ser alterada para aumentar
garantias) = LFG. É a corrente que prevalece no meio jurídico.
Direito Penal - Culpabilidade
O art. 228 não é cláusula pétrea, podendo ser alterado para se reduzir a maioridade penal
Defendida por Capez, Pacelli.
Pela teoria da actio libera in causa, nos casos de embriaguez, as condições gerais do autor
da ação terão de ser analisadas não no momento da prática do fato, mas sim no momento
anterior àquele em que ele se colocou no estado de embriaguez. 20
A teoria da actio libera in causa defende que o ato delitivo revestido de inconsciência deve
ser punido quando decorre de ato antecedente que foi livre na vontade, transferindo-se para
esse momento anterior a constatação da imputabilidade do agente. A teoria é aplicada “aos
casos em que alguém, no estado de não imputabilidade, é causador, por ação ou omissão, de algum
resultado punível, tendo se colocado naquele estado, ou propositadamente, com a intenção de
produzir o evento lesivo, ou sem essa intenção, mas tendo previsto a possibilidade do resultado, ou,
ainda, quando a podia ou devia prever.”
Caso a embriaguez seja patológica, por dependência química, o agente será equiparado ao
doente mental, excluindo a sua imputabilidade.
O STJ entende que se aplica a teoria da actio libera in causa mesmo nos delitos em que
se exige dolo específico:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ARTS. 140, § 3º, E 141, III, AMBOS
DO CP. INJÚRIA QUALIFICADA. DOLO ESPECÍFICO. NECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO. PRESENÇA DE ANIMUS INJURIANDI. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA.
IRRELEVÂNCIA. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESPECIAL. SÚMULA
7/STJ. MANUTENÇÃO DO DECISUM A QUO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. STF.
3. Nos termos do art. 28, II, do Código Penal, é cediço que a embriaguez voluntária
ou culposa do agente não exclui a culpabilidade, sendo ele responsável pelos
seus atos mesmo que, ao tempo da ação ou da omissão, era inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento. Aplica-se a teoria da actio libera in causa, ou seja, considera-se
imputável quem se coloca em estado de inconsciência ou de incapacidade de
autocontrole, de forma dolosa ou culposa, e, nessa situação, comete delito.
(AgInt no REsp 1548520/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA,
julgado em 07/06/2016, DJe 22/06/2016)
Trata-se de uma absolvição imprópria, porque gerará sanção penal da espécie medida de
segurança. Entretanto, se ele for semi-imputável, não haverá absolvição imprópria, e sim
condenação, com a aplicação de causa de diminuição de pena, conforme será visto no próximo
tópico.
Obs.: art. 28, I do CP prevê que a emoção e a paixão não excluem a imputabilidade penal.
Emoção e paixão
I - a emoção ou a paixão;
Direito Penal - Culpabilidade
Assim, o Código Penal prevê situações no art. 28 com o objetivo de evidenciar aquilo que já
é de todo lógico. Ou seja, ninguém poderá se beneficiar, e ser por isso considerado inimputável,
se praticou um crime motivado por sentimentos que integram a normalidade psíquica da
média dos indivíduos. Daí o Código Penal afirmar no art. 28, inciso I, que a emoção e a paixão não
excluem imputabilidade penal, porque tais sentimentos integram a normalidade psíquica da
população em geral.
Apesar de não excluir a imputabilidade penal, entretanto, a emoção pode ser uma atenuante
(art. 65, III do CP) ou privilégio (art. 121, § 1º, CP).
A paixão, dependendo do grau, pode ser equiparada a doença mental. É a paixão patológica.
Logo, o agente pratica um fato típico, ilícito e culpável, mas sua culpabilidade é reduzida. Ele
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será condenado, e não absolvido impropriamente, como ocorre com os inimputáveis.
A redução da pena deve ser orientada pela intensidade da perturbação mental ou pela
graduação do menor desenvolvimento mental do acusado.
Se a pessoa foi submetida a Júri, deve haver quesito específico sobre a sua semi-
imputabilidade a ser votado pelo Conselho de Sentença.
A. CRITÉRIO BIOLÓGICO
(desenvolvimento mental incompleto ou retardado) previsto em lei, sem que fosse necessário
saber se, juntamente com o déficit biológico, teria ou não o agente a capacidade de
compreender o ilícito do fato.
Não foi o sistema adotado pelo Código Penal, pelo menos em linhas gerais.
B. CRITÉRIO PSICOLÓGICO
Era o sistema adotado pelo Código Criminal do Império Brasileiro de 1830. Pelo sistema
psicológico, a pessoa seria responsável e, portanto, imputável sempre que nela se constatasse
maturidade suficiente para compreender que a situação era contra a ordem jurídica e quais seriam
as consequências advindas da ação.
Pelo sistema psicológico, então, seria necessário avaliar o grau de maturidade de cada
indivíduo para, diante de um crime praticado por este, saber se ele detinha ou não detinha
condições psicológicas para entender e querer o injusto como obra ilícita, independentemente
de qualquer dado biológico, ou seja, independentemente de saber se ele era ou não era portador de
Direito Penal - Culpabilidade
doença mental; independentemente de saber se ele tinha ou não tinha algum tipo de retardo, de
desenvolvimento mental incompleto. E independentemente da idade.
Para esse sistema, pouco importa se o indivíduo apresenta ou não alguma deficiência mental.
Será inimputável ao se mostrar incapacitado de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se
de acordo com esse entendimento. Seu inconveniente é abrir espaço para o desmedido arbítrio do
julgador.
Alguns países da common law até hoje utilizam esse critério para definir a imputabilidade. Por
isso que volta e meia se vê nos Estados Unidos adolescentes de 13 ou 14 anos sendo condenados
criminalmente por homicídio. Porque se verifica que, a despeito da pouca idade, no momento
em que praticaram a ação elas tinham plena consciência dos seus atos. Já tinham capacidade
de entender que aquele ato era um ato ilícito e, por isso, deveriam responder pelo mesmo, a despeito
de terem pouca idade e não serem portadores de doença mental de espécie alguma. Isso,
evidentemente, provém de um estudo detalhado, laudo pericial feito com todo cuidado para verificar
se a pessoa tinha ou não tinha condição para tanto.
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Resulta da fusão dos dois anteriores: é inimputável quem, ao tempo da conduta, apresenta
um problema mental, e, em razão disso, não possui capacidade para entender o caráter ilícito do fato
e determinar-se de acordo com esse entendimento. Esse sistema conjuga as atuações do magistrado
e do perito
Mas a deficiência biológica sozinha não é suficiente para definir a inimputabilidade, pois além
deste fator é preciso constatar um segundo, que é cumulativo e que resulta do primeiro: é o déficit
de caráter psicológico. Essa deficiência psicológica se explica pelo fato de o indivíduo irresponsável,
inimputável, não compreender que a conduta injusta praticada por ele era ilícita. A doença mental,
ou o desenvolvimento mental incompleto ou retardado, são tão intensos a ponto de terem retirado do
agente essa compreensão de que aquilo que ele fazia era contra a ordem jurídica. Ele não entendeu
o caráter ilícito do fato, ele não tem capacidade de internalizar isso.
Ou esse fator de deficiência psicológica se manifesta de uma outra forma, que são aquelas
formas em que ele até sabe. A doença mental, ou o desenvolvimento mental incompleto ou retardado,
não foram tão fortes a ponto de retirar dele a compreensão do ilícito. Ele compreende, mas não
consegue se determinar de acordo com esse entendimento. Ele internaliza que aquelas ações são
contra a ordem jurídica, mas não consegue que as suas ações, na prática, respeitem a essa
compreensão psíquica que têm.
26
Exemplo: sujeito acometido de cleptomania. Ele sabe que subtrair patrimônio alheio é contra
a ordem jurídica. Ele compreende o caráter ilícito da subtração. A despeito de tê-lo feito, não
consegue se controlar em razão dessa deficiência biológica. Essa deficiência biológica não lhe retira
o caráter de compreensão, mas sim o de se comportar de acordo com essa compreensão, ou seja,
retira-lhe sua determinação, sua vontade.
As deficiências biológicas mais graves são tão intensas a ponto de retirar o caráter de
compreensão do ilícito. Aquelas menos graves não retiram, mas podem afetar a capacidade
de autodeterminação. É necessário conjugar, para que alguém seja inimputável no sistema
biopsicológico adotado pelo Código Penal, essas duas deficiências. Tem que se constatar
que aquele sujeito é portador de uma doença diagnosticada (doença mental), ou portador de
um grau de desenvolvimento mental incompleto, ou retardado. E que tal doença mental, ou
tal desenvolvimento mental incompleto ou retardado, foi o fator que desaguou na afetação
psicológica.
Pode ser que o déficit de caráter biológico tenha se manifestado ao tempo da ação, ou da
omissão, mas não de forma a retirar completamente a capacidade de entender o ilícito e de
determinar-se de acordo com esse entendimento, caso em que a doença mental somente diminui o
grau de compreensão da ilicitude e o grau de autodeterminação.
É possível dizer ali que houve uma sugestão para que ele realizasse a ação. Mas não
se poderá dizer que a ação foi realizada em um cenário jurídico onde não restou pelo menos
um resquício de livre arbítrio. Nesses casos a solução proposta pelo Código Penal não é a de
responsabilidade penal plena, mas a de responsabilidade diluída, prevista no parágrafo único3
do art. 26, chamada de semi-imputabilidade.
A regra do Código Penal é que na inimputabilidade, art. 26, caput, não haja pena. Porque
pelo sistema que foi adotado pelo Código Penal, chamado de sistema vicariante, aplica-se pena ou 27
medida de segurança, não as duas juntas. Também foi uma inovação do Código Penal de 84,
porque o Código Penal de 40 previa um sistema diferente chamado de sistema do duplo
binário, segundo o qual a pessoa, por um mesmo ato, poderia receber pena e medida de segurança
conjuntamente.
Então a consequência advinda do reconhecimento de que uma pessoa que realizou o injusto
é inimputável, segundo o art. 26 do Código Penal, é de que ela não poderá ser apenada, porque não
é capaz de sofrer um juízo de censura, um juízo de reprovação. Falta-lhe culpabilidade, porque falta
imputabilidade. Consequência: ela vai receber uma medida de segurança prevista nos arts. 96, 97 e
98 do Código Penal.
Já a solução que o Código Penal propõe e prevê para os casos em que a pessoa, a
despeito de ser acometida de doença mental, tinha algum resquício de compreensão do ilícito
do fato praticado, e por isso é tida como semi-imputável, é de que ela seja censurada pela
ação. Ela será, portanto, apenada. Só que nesse caso a pena, obrigatoriamente, terá que ser
diminuída. O QUE É EVIDENTE, PORQUE A PENA DEVE GUARDAR UMA
3Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de
saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender
o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Direito Penal - Culpabilidade
Daí o art. 26, parágrafo único, prever uma diminuição de pena obrigatória para o semi-
imputável. Só que a título excepcional, nessas hipóteses de semi-imputabilidade, o Código Penal
admite que um Juiz identifique, em casos concretos, situações em que seja mais interessante à
sociedade tratar o semi-imputável do que o punir.
QUANDO O JUIZ FIZER ESSA PONDERAÇÃO, TERÁ QUE, PRIMEIRO, PROFERIR UMA
SENTENÇA CONDENATÓRIA, PORQUE A SENTENÇA ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA (que
absolve, mas aplica a medida de segurança) SÓ É CABÍVEL PARA O INIMPUTÁVEL.
Mas, para o semi-imputável, o Código Penal prevê que o Juiz prolate uma sentença
condenatória e aplique a pena diminuída, tal como previsto no art. 26, parágrafo único. E, depois de
tê-lo feito, substitua essa pena que ele já aplicou na própria sentença condenatória, por uma medida
de segurança. E isto é previsto no art. 98 do Código Penal. É a substituição da pena por uma
medida de segurança, para um caso de semi-imputabilidade.
Veja-se que, neste caso, a medida de segurança vem como medida substitutiva de pena. 28
Portanto ela vem no bojo de uma sentença condenatória. Ao contrário do que ocorre com o
inimputável, aonde a medida de segurança vem no bojo de uma sentença absolutória.
Síntese: para que seja considerado inimputável não basta que o agente seja portador de
doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado. É necessário que, em
consequência desse estado, seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato (elemento
intelectivo) e de determinar-se de acordo com esse entendimento (elemento volitivo), numa relação
de causa e efeito.
São várias as razões que levam a essa conclusão. A primeira e mais óbvia delas é que SE
A CULPABILIDADE DE ALGUÉM ESTIVESSE A DEPENDER DE QUE ESSA PESSOA, NO
MOMENTO EM QUE PRATICASSE O ATO, CONHECESSE A LEI QUE O INCRIMINASSE, SÓ
UMA REDUZIDA PARCELA DA POPULAÇÃO PODERIA SER RESPONSABILIZADA POR
CRIMES. O que, evidentemente, já faria cair por terra a pretensão de toda a norma, que é uma
pretensão de generalidade e de aplicar-se indistintamente a todos, de forma a reger a vida
comunitária.
Segundo: isto também acabaria por fazer com que praticamente só pessoas versadas em
Direito, ou pelo menos com algum conhecimento jurídico, pudessem ser responsabilizadas pela
maioria dos crimes. Daí o Código Penal afirmar que o fato de o sujeito desconhecer a lei, mas
conhecer, ainda que em nível potencial, a ilicitude, faz com que ele seja responsabilizado pelo crime.
E O MÁXIMO QUE SE PODE EXTRAIR DE TAL SITUAÇÃO É UMA DIMINUIÇÃO DA PENA,
PORQUE O DESCONHECIMENTO DA LEI, A CHAMADA IGNORANTIA JURIS, É UMA
CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE, À LUZ DO ART. 65 DO CÓDIGO PENAL. E TÃO SOMENTE
ATENUANTE.
Direito Penal - Culpabilidade
Os valores vão sendo inseridos por aquilo que a criminologia chama de INSTÂNCIAS
FORMAIS DE CONTROLE (escola, religião, família etc.). As instituições da sociedade vão se
incumbindo de inserir esses valores e preservá-los nos membros da sociedade. Pode ser que
depois, ao cabo do seu processo de educação, algumas dessas pessoas sigam o rumo
jurídico, outras não. Mas essas que não seguiram a carreira jurídica, não poderão alegar que
não sabiam que não poderiam violar o patrimônio alheio, ou violar a integridade física alheia,
e assim por diante.
E evidentemente, novos valores vão sendo integrados ao longo desses processos, ao longo
do avanço das sociedades. Por exemplo, atualmente, vários valores já são parte desse processo de
integração que há alguns anos atrás não eram, notadamente a importância de se preservar o meio 30
4 A ilicitude é um juízo de valor negativo sobre a conduta, que a qualifica como contrária ao Direito. A
consciência da ilicitude será sempre presente quando o indivíduo conseguir valorar negativamente sua
conduta, isto é, puder representá-la como injusta, má, proibida, em consideração a todos os valores de conduta
humana existentes na sociedade (moral, religião etc.). A isso Mezger dá o nome de valoração paralela na
esfera do profano. A consciência da ilicitude pode ser atual ou potencial; a atual é a que se faz presente na
mente do sujeito no curso intelectivo de sua conduta; a potencial é a que não se faz presente, mas é exigível
do agente em face de um juízo de comparação com uma pessoa normal.
5 Ainda sobre a valoração paralela na esfera do profano: na esfera penal, é inviável supor que o indivíduo
ambiente, o patrimônio cultural etc. A sociedade foi evoluindo e, com essa evolução, novos valores
vão sendo integrados a esse rol de direitos mínimos.
Logo, esses que não seguiram a carreira jurídica provavelmente não conhecem os meandros
da lei penal e os detalhes do tipo de furto, do tipo de roubo, do tipo de estelionato, e assim por diante.
Mas certamente conhecem a ilicitude desses atos, sabem que é errado, e é isso que basta. Portanto,
o desconhecimento da Lei não isenta ninguém de pena. E é essa frase emblemática que abre
o art. 21, que trata do erro de proibição, consequência advinda da falta de conhecimento da
ilicitude.
É bem verdade que, a despeito dessa frase emblemática do art. 21, em algumas situações
excepcionais, a doutrina vem hodiernamente questionando seu caráter absoluto, de que o
desconhecimento da lei nunca se pode escusar.
De fato, quanto aos bens jurídicos que compõem o núcleo essencial do Direito Penal é
fácil dizer que o conhecimento da ilicitude independe do sujeito conhecer a lei. Basta, para
evidenciar esse conhecimento da ilicitude, demonstrar que o sujeito é integrado à sociedade, 31
não foi educado na selva.
Isso acaba fazendo com que seja possível vislumbrar casos em que, a despeito da lei penal
existir, a necessidade de respeitar o valor por ela tutelado só surja com o conhecimento da lei. Por
exemplo: o que dizer de uma pessoa com pouquíssimo grau de instrução, que não sabe ler, quando
Direito Penal - Culpabilidade
chamada a responder pelo crime de estocar carvão mineral que consegue obter nas cercanias do
local, sem autorização da autoridade competente?
Isso é um crime ambiental, definido na Lei nº 9.605/98: armazenar carvão mineral, sem
autorização da autoridade competente. Será que pelo simples fato de o agente integrar aquela
sociedade faz com que seja possível afirmar que ele conhece o ilícito? Ou será que o conhecimento
do ilícito estaria a depender do fato de ele conhecer a lei ambiental?
Daí porque alguns autores, entre os quais Juarez Cirino, aqui no Brasil, ao analisar
essa frase emblemática que inaugura o art. 21, dizem que ela há de ser interpretada à luz do
Princípio da Culpabilidade. Pois, do contrário, seria o Princípio da Culpabilidade se
adequando à lei, quando o correto seria a lei se adequar ao Princípio da Culpabilidade.
Tudo isso para tratar desses casos em que, pelas razões apontadas, não é possível
divisar com clareza tão absoluta a diferença entre o conhecimento da ilicitude e o
conhecimento da Lei, o que só aconteceria em casos excepcionalíssimos.
Esse erro de proibição que resulta na exclusão da culpabilidade pode ser compreendido sob
duas formas diferentes, a depender da corrente que se adote:
advir uma consequência, independentemente de conhecer o tipo penal ou/e a pena cominada.
Direito Penal - Culpabilidade
Essa segunda tese, então, sustenta que a desaprovação penal de uma conduta depende de
duas situações, quais sejam: o fato de o agente conhecer que essa conduta era contrária a ordem
jurídica e saber que, por ser contrária a ordem jurídica, ao praticá-la, estaria sujeito a uma pena.
Para essa primeira corrente, então, por dispensar o conhecimento da ameaça penal, qual
será o tratamento jurídico, por exemplo, decorrente do fato de o agente praticar uma ação sob o
manto de uma escusa absolutória? A escusa absolutória interfere em quê? Culpabilidade?
Por exemplo, o filho que subtrai, sem violência e grave ameaça, o patrimônio do pai, responde
por furto? Não. Por quê? Porque existe um dispositivo no Código Penal, o qual diz que, nos crimes
praticados sem violência e grave ameaça, o filho não responde por violar o patrimônio do pai, e vice-
33
versa.
Pergunta-se: tal acontece porque o filho não dispõe de culpabilidade? Não. A escusa
absolutória não interfere na existência da culpabilidade, ela interfere na existência da
punibilidade. Culpabilidade há, o que não há é ameaça de pena. Por quê? Porque a Lei penal,
dentro de um critério de escolha política, entendeu que não era conveniente impor pena em
tais circunstâncias, que deverão ser resolvidas no âmbito da família.
Já para a segunda tese, que é defendida por Gunther Jakobs e Enrique Bacigalupo, o
tema do erro de proibição abarcaria situações em que o sujeito erre sobre o caráter ilícito da
conduta praticada, supondo-a lícita, e também quando o sujeito desconhecesse a existência
de ameaça de pena. Ou seja, erro sobre a punibilidade, segundo eles, também deveria ser
Direito Penal - Culpabilidade
tratado à luz do erro de proibição. Trata-se de uma tese minoritária, que não tem de ser
seguida em concurso.
Essa dúvida do agente pode recair sobre a própria consciência dos fatos, da situação de fato
praticada. Por exemplo: o agente não sabe se determinado telefone é dele, mas, mesmo assim, o
leva para casa, por se parecer muito com o dele. A dúvida se resolve à luz da consideração da
existência de um dolo eventual ou não.
Não é disso que se trata aqui. Estamos a tratar da dúvida sobre o próprio caráter ilícito da
ação. E aí duas correntes vão se instaurar quando a dúvida recai sobre a consciência da
antijuridicidade da ação. Isto é, o sujeito pratica uma ação tendo dúvida sobre ser ela lícita, ou não.
Chamado a responder pelo crime de sonegação fiscal, diz que tinha essa dúvida. “Olha
realmente eu fiquei na dúvida aqui, mas entendi que não fosse o caso de declarar”. Se ele 34
fosse tão sincero a ponto de falar, tal como aconteceu a situação, seria o caso de se
reconhecer em seu favor o erro de proibição?
A corrente tradicional afirma que não, porque a dúvida sobre o caráter ilícito da ação
deve ser dissipada pelo agente com base em dever que toda a pessoa que vive em sociedade
tem, que é o DEVER DE INFORMAR-SE
Quando o agente não procurou dissipar suas dúvidas, atuou sob o que Mezger chamava de
cegueira jurídica. Ou seja, talvez, no momento da ação, o agente até não soubesse, mas podia saber.
A possibilidade de conhecer o ilícito se fez presente, e é isso que basta. O DEVER DE
INFORMAÇÃO É O QUE ESTÁ POR TRÁS DO RECONHECIMENTO DO CARÁTER MERAMENTE
POTENCIAL DA ILICITUDE. ESSA É A TESE AMPLAMENTE DOMINANTE PARA TAIS
SITUAÇÕES.
Para essa mesma situação, ou seja, casos em que o agente pratica uma conduta ilícita, mas,
no momento em que o fez, tinha dúvida séria sobre a ilicitude, há uma segunda tese, que é a tese
capitaneada por Jakobs, que sustenta que, nesses casos, o correto seria reconhecer o erro de
proibição vencível. Ou seja, aplicar a pena, mas diminuída. Não adotar para fins de concurso.
Direito Penal - Culpabilidade
Erro de proibição não se confunde com erro de tipo. O erro de tipo ocorre quanto a alguma
circunstância fática. Os erros de proibição estão ligados ao direito, ao conhecimento ou não da
realidade do que pratica o agente, determinado por algum engano justificável que recai sobre o juízo
pessoal de licitude ou ilicitude do fato. O agente atua conscientemente, sem errar sobre as
circunstâncias fáticas que o cercam, apesar de as avaliar mal, de supor ter, perante o caso,
um direito que na verdade inexiste.
Cezar Roberto Bitencourt leciona que o erro de proibição “é o que incide sobre a ilicitude
de um comportamento. O agente supõe, por erro, ser lícita a sua conduta. O objeto do erro
não é, pois, nem a lei, nem o fato, mas a ilicitude, isto é, a contrariedade do fato em relação à
lei.”
O agente não pensa errado avaliando o direito aplicável à espécie, mas erra na avaliação do
desvalor de sua conduta, desvalor esse advindo das instâncias formais de controle social. Ele
entende bem o fato que pratica, mas o pratica com a tranquila consciência de que atua
desprovido de ilicitude material.
35
Erro de proibição é hipótese que exclui a culpabilidade do agente, por interferir diretamente
no elemento da culpabilidade “potencial consciência da ilicitude”. Porém, essa exclusão somente
ocorrerá se o erro for invencível ou escusável. Se vencível (ou culposo), ou seja, se o agente tivesse
agido com um pouco mais de cuidado, considera-se uma causa de diminuição de pena.
a) Erro de proibição direto (art. 21): ocorre quando o erro do agente recai sobre o conteúdo
proibitivo de uma norma penal, não acreditando o agente que face ao conteúdo, significado ou
amplitude da norma, realiza uma conduta proibida. O sujeito não sabe que a conduta que praticou
era típica. O erro recai sobre a própria tipicidade da ação ou omissão praticada. No momento
em que agiu, ele desconhecia o caráter típico, isto é, a proibição em si. É muito improvável
que surja, na prática jurídica, o reconhecimento desta espécie de erro de proibição (direto),
em algum crime previsto no Código Penal, visto que ao Código foram reservados os crimes
mais cotidianos, cujo desvalor são ensinados no dia a dia da sociedade. Exemplo de erro de
proibição seria o do estrangeiro que tenta sair do Brasil portando vinte mil dólares em uma pochete,
sem regular declaração. Trata-se de crime contra o SFN (evasão de divisas) no Brasil. Porém, no
país dele pode não ser, seja porque o valor era baixo, seja porque não há proibição de deixar o país
Direito Penal - Culpabilidade
levando dinheiro. Assim, nenhum erro houve na situação fática, ele sabia exatamente o que estava
fazendo, mas não conhecia a proibição jurídica interna.
b) Erro de proibição indireto ou erro de permissão ou excesso exculpante (art. 21): aqui há
uma suposição equivocada da existência de uma causa de justificação, ou seja, de exclusão da
ilicitude, que o ordenamento não prevê ou que até prevê, mas em limites mais restritos do que o que
era imaginado pelo agente. É exemplo de erro de proibição o agente que está sendo roubado e, no
exercício da legítima defesa, reage e espanca o roubador até a beira da morte, por acreditar que
está agindo legitimamente, amparado pelo direito. Outro exemplo seria de um professor de uma
tradicional cidade interiorana que, supondo estar no exercício regular de direito, usa moderadamente
palmatória para disciplinar seus alunos.
c) Erro mandamental (art. 21): é o erro que recai sobre mandamentos contidos nos crimes
omissivos, sejam eles próprios ou impróprios. Ocorre, v.g., quando uma pessoa vê outra se
afogando, mas não faz nada por acreditar que não estava obrigada a tal (erro sobre a condição de
garante); ou quando o médico deixa de atender paciente em seu intervalo por achar que não tem o
dever jurídico para tal.
a) Erro de vigência: caracteriza-se pelo desconhecimento, por parte do autor do fato, de que
uma determinada norma jurídica já está em vigor no ordenamento jurídico. A avaliação que o autor
do fato desenvolve não considera a vigência da norma na ordem jurídica e, por isso, não percebe a
ilicitude de seu comportamento. É considerado erro de vigência por incidir sobre normas permissivas,
proibitivas ou mandamentais. Em alguns casos, o erro de vigência pode ser irrelevante, como no
caso em que o fato já era considerado ilícito, sendo que a nova norma apenas agrava a pena.
Evidentemente que ele responderá de acordo com a norma vigente à época do fato, se mais benéfica.
Erro de vigência é espécie de erro de proibição, já que o agente erra quanto ao direito,
acreditando piamente que a lei penal incriminadora não está em vigor.
Direito Penal - Culpabilidade
b) Erro de eficácia: verifica-se quando o autor do fato acredita que determinada norma jurídica
não está mais produzindo efeitos, por ter perdido eficácia pela entrada em vigor de outra norma de
categoria superior ou de uma disposição constitucional. Também é espécie de erro de proibição,
visto que o erro recai sobre situações jurídicas, sobre a existência de normas proibitivas;
c) Erro de punibilidade: o autor do fato percebe que sua conduta é ilícita, mas acredita não
haver previsão legal para a aplicação da pena criminal para o caso. Essa modalidade de erro
somente tem aplicação para as normas proibitivas e constitui sempre hipótese de erro inescusável
que autoriza a aplicação da pena reduzida. É exemplo de erro de punibilidade o indivíduo acreditar
que a violação de direito autoral materializada em cópia de programa de computador seja ilícito que
repercute efeitos apenas no âmbito do Direito Civil, sem considerar a previsão criminalizadora do art.
12 da Lei nº 9.609/98.
Só se pode reprovar o comportamento contrário à norma que tenha sido praticado sob
condições fáticas nas quais se poderia exigir da pessoa que respeitasse a lei. Uma das
condições para que se possa punir alguém é que esse alguém desrespeite a lei. Ao trilhar esse
caminho, surge a possibilidade de reprovação, de recriminação. E, consequentemente, de imposição
da pena.
POSSÍVEL DE SER SEGUIDA PELO AGENTE que, ao não optar por tal alternativa, tem que ser
punido. Logo, a própria ideia de reprovabilidade da conduta, a própria ideia de culpabilidade surge
dessa opção em não respeitar a lei penal.
Essa opção depende da análise das circunstâncias fáticas em que o agente realizou a
conduta ilícita.
Por exemplo, seria impensável supor que o Direito pudesse reprovar o comportamento de um
mendigo que vive na rua e, nesta condição, faz as suas necessidades em locais públicos. Chamado
a responder pelo fato de praticar um ato obsceno em local público, alega: mas esse local público é o
local onde eu vivo. Não se nega o caráter ilícito, inconveniente e desagradável do fato em si. Agora,
será que na condição em que ele se encontrava a alternativa de seguir a Lei era uma alternativa
viável?
É impossível dizer que haja uma situação sem alternativa. Alternativa sempre existirá. São
comuns algumas decisões negando inexigibilidade de conduta diversa, com o argumento de que
existia alternativa ao agente. A questão é: a alternativa que existia, que implicava no cumprimento
da lei, era viável? Ou só um louco, suicida ou um herói iriam trilhá-la? Se a resposta for: não, só uma
pessoa excepcional, para o bem ou para o mal, iria trilhar essa opção que era de respeito à lei, então 38
o caso é de inexigibilidade de conduta diversa.
No caso brasileiro, a Lei penal prevê duas hipóteses de exclusão legal da culpabilidade por
falta de exigibilidade de conduta diversa, que é o art. 22 do Código Penal, o qual prevê a coação
moral irresistível, e a obediência hierárquica.
Art. 22 - Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não
manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.
A coação moral irresistível, evidentemente, não se confunde com a vis absoluta, que é a
coação física irresistível, causa esta excludente de conduta.
a) Coação moral irresistível (vis compulsiva): a coação moral irresistível é aquela de que o
coacto não pode subtrair-se, restando apenas sucumbir ante o decreto (ameaça) ilegal. Nesse caso,
o mal prometido pode se dirigir ao próprio coagido ou a terceira pessoa ligada a ele. Assim, a coação
tem de ser moral + irresistível. O caso concreto dirá. Caso a coação moral seja resistível, pode-se
atenuar a pena (art. 65, III, c do CP).
Direito Penal - Culpabilidade
Exemplo: um gerente de um banco tem a sua família mantida refém em sua casa e, sob tal
condição, é obrigado a se dirigir ao banco, antes da sua abertura, e de lá retirar valores e entregar
aos meliantes que estão em sua casa. Chamado a responder por essa subtração, não seria
adequado, uma vez comprovada a situação de fato, impor a ele uma pena, visto que sua conduta
não foi reprovável. Do contrário, se estaria considerando que o correto seria ele submeter a risco de
vida sua família, e respeitar o Código Penal que dispõe sobre o crime patrimonial. Será que seria
uma opção viável para a normalidade das pessoas que, nessas condições, expusesse a risco de
vida seus familiares, em prol do respeito ao Direito Penal? Evidentemente que não.
RECURSO ESPECIAL. PENAL. ART. 14, CAPUT, DA LEI 10.826/2003. VIGIA. PORTE
ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO EM VIA PÚBLICA. DETERMINAÇÃO
PELO EMPREGADOR. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA POR COAÇÃO
MORAL IRRESISTÍVEL. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE NÃO CARACTERIZADA.
RELAÇÃO DE SUBORDINAÇÃO RESTRITA AO LOCAL E HORÁRIO DE TRABALHO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica em classificar o crime do art. 14 da Lei
10.826/2003 como de mera conduta e de perigo abstrato. Para realizá-lo, então, basta
incorrer dolosamente na ação proibida, ou melhor, praticar os verbos que constituem o
núcleo do tipo somados ao respectivo elemento normativo. Precedentes.
2. O recorrido foi preso em flagrante enquanto portava ilegalmente arma de fogo de
uso permitido, municiada, em via pública, no percurso entre o trabalho de "vigia" e
sua residência, após o término do expediente laboral.
39
3. No caso, não parece aceitável admitir que o recorrido estivesse sob influência de
coação moral irresistível, até porque, quando praticou a conduta proibida, estava fora
do horário e de seu ambiente de trabalho, livre, portanto, da relação de subordinação
que o obrigava a portar arma de fogo de modo ilegal, conforme conclusão do Tribunal
a quo. Sob esse prisma, não há porque supor a indução do comportamento delitivo
por força externa determinante, infligida pelo empregador do recorrido. A verdade é
que não há espaço para aplicação da regra disposta no art. 22 do CP.
4. A relação de subordinação, como elemento do contrato de trabalho, não justifica
comportamento contrário ao Direito fora dos limites do contexto laboral.
5. A inexigibilidade de conduta diversa somente funciona como causa de exclusão
da culpabilidade quando proceder de forma contrária à lei se mostrar como única
alternativa possível diante de determinada situação.
6. Ademais, não é possível confundir "a atividade exercida pelo réu (vigia) com a de um
vigilante (profissional contratado por estabelecimentos financeiros ou por empresa
especializada em prestação de serviços de vigilância e transporte de valores), cuja
categoria é regulamentada pela Lei nº 7.102/83, ao qual é assegurado o direito de portar
armas de fogo, quando em efetivo exercício da profissão" (REsp 1221960/SP, Rel. Ministro
OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 22/02/2011, DJe 09/03/2011).
7. Recurso especial provido para restabelecer a sentença penal condenatória.
(REsp 1456633/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA,
julgado em 05/04/2016, DJe 13/04/2016)
no sentido de que realize uma conduta. Não abrange a superioridade hierárquica familiar, privada ou
eclesiástica, as quais muitas vezes serão causas de exclusão da culpabilidade em função de coação
moral irresistível. Entretanto, a própria lei penal prevê, ao dispor sobre essa exclusão de
culpabilidade, que ordens manifestamente ilegais não podem ser cumpridas. Quando o
superior hierárquico, seja ele no campo civil, seja ele no campo militar, der ao seu subordinado uma
ordem que claramente se revela contrária à lei penal, é dado como obrigado ao subordinado recusar
o seu cumprimento. E, se não o fizer, será coautor do crime, ainda que nessa condição também
venha a ter sua pena diminuída por força do mesmo art. 65, inciso III, alínea c, que prevê, em
tais hipóteses, uma circunstância atenuante genérica.
a) Que a ordem não seja manifestamente ilegal, isto é, que não seja claramente contrária ao
direito;
Ex.: A coagiu de forma irresistível B a matar C. B irá alegar coação moral irresistível. A vai
responder pelo crime cometido por B na condição de autor mediato. Responderá apenas por
homicídio? Não! Será homicídio mais tortura: art. 1º, I, 'b', da Lei de Tortura (Lei 9.455/97). Concurso
material (primeiro a tortura - se ele matar mesmo, homicídio). A será autor imediato da tortura e autor
mediato do homicídio.
A sociedade não pode delinquir, pois onde ela existe, aí está também o direito. Assim, a
coação irresistível há que partir de uma pessoa ou de um grupo, nunca da sociedade.
Os dois respondem pelo crime, mas o subordinado tem direito a uma atenuante de
pena, já que cumpria uma ordem
De igual maneira, não será dado ao Juiz, reconhecer erro de proibição fora dos casos
em que a lei prevê. O erro de proibição depende do enquadramento jurídico penal do fato, à luz de
uma norma legal.
Sempre que o respeito à norma penal for uma opção inviável ao cidadão comum, a
despeito de não existir uma exculpante específica no ordenamento jurídico penal, será
possível ao Judiciário reconhecer a falta de culpabilidade. Sempre que a situação fática em
que praticada a ação típica retirar do cidadão a possibilidade de escolha, dentro de parâmetros
razoáveis, o Judiciário deve reconhecer a exculpação.
5. A defesa, ao não comprovar que empresa administrada pelo paciente passava por
dificuldades financeiras que a impossibilitavam de cumprir a obrigação de repassar à
Direito Penal - Culpabilidade
(HC 113418, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 24/09/2013,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-206 DIVULG 16-10-2013 PUBLIC 17-10-2013)
1. Não existe violação ao art. 619 do CPP quando o Tribunal de origem pronuncia-se de
forma clara e precisa sobre a questão posta nos autos, assentando-se em fundamentos
suficientes para embasar a decisão.
3. O crime de apropriação indébita previdenciária tem sido entendido como crime omissivo
próprio (ou omissivo puro), isto é, aquele em que não se exige necessariamente nenhum
resultado naturalístico, esgotando-se o tipo subjetivo apenas na transgressão da norma
incriminadora, no dolo genérico, sem necessidade de comprovação do fim especial de agir,
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ou dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de ter a coisa para si (animus
rem sibi habendi).
[...]
(STJ, REsp 1.113.735/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA,
julgado em 02/03/2010, DJe 29/03/2010)
exercício financeiro, nem deixar receita para quitação no ano seguinte, nos termos do artigo
359-C, do Código Penal. 4. Nada obstante a crise financeira por que passava o
Município, a contratação de pessoal e os repasses voluntários a instituições não
governamentais, impedem a configuração da dirimente de inexigibilidade de conduta
diversa, a afastar o juízo de reprovação penal da conduta. 4. Pretensão punitiva julgada
procedente para condenar o acusado pela prática dos crimes previstos nos arts. 312, caput,
e 359-C, na forma dos arts. 29, 71 e 70, todos do Código Penal.
(STF, AP 916, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em
17/05/2016, DJe-207 DIVULG 27-09-2016 PUBLIC 28-09-2016)
Este Instituto teve suas origens nos tribunais alemães, na época do Reich e surgiu a partir
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de uma decisão de um tribunal e não de estudos doutrinários, como ocorre com a maioria das teses
inovadoras do direito.
Para que uma ação possa dizer-se culpável, não basta que um sujeito capaz tenha previsto
e querido um determinado evento lesivo, mas é necessário que a sua vontade tenha
podido determinar-se normalmente rumo à ação: tal determinação normal não pode
ser exigida quando as condições de fato em que o indivíduo atuar forem de tal ordem
que tornem impossível ou muito difícil a formação de um querer imune de defeitos.
Quando se admite, por exemplo, que em virtude da força maior seja impossível a imputação
de um fato a um sujeito capaz, mesmo que tenha agido conscientemente, reconhece-se
que no embasamento do juízo de culpabilidade encontra-se o princípio de que tal juízo deve
ser excluído quando a vontade não puder determinar normalmente à ação, o que pode
ocorrer tanto por um vício que incida sobre a representação das consequências da própria
ação quanto sobre a livre determinação da própria ação. Numa concepção normativa, a
culpabilidade desparece todas as vezes em que – dadas as condições do autor – não se
possa ‘exigir’ do sujeito agente um comportamento diverso daquele efetivamente adotado.
Assim, é certo dizer que a inexigibilidade de conduta diversa nada mais é do que o
agente, mesmo atuando de forma a violar uma norma jurídica expressa, não ter outra opção
de conduta naquela situação de fato, não gerando, portanto, reprovabilidade no que tange ao
âmago social.
Direito Penal - Culpabilidade
Temos como exemplos indispensáveis para o estudo as situações narradas por Odin
Americano, que ocorreram na Alemanha, no começo do século XX e que, como afirma Cleber
Masson, foram os primeiros acontecimentos que tiveram como consequência o reconhecimento da
inexigibilidade de conduta diversa como dirimente da culpabilidade:
b) Parteira dos filhos de mineradores: a empresa exploradora de uma mina acordou com
seus empregados que, no dia do parto da esposa de um operário, este ficaria dispensado do serviço,
sem prejuízo de seus salários. Os operários solicitaram da parteira encarregada dos partos, no caso
de nascimento verificado em domingo, declarasse no Registro Civil que o parto se verificara em dia 45
de serviço, ameaçando-se de não procurar seu mister se não os atendesse. Temerosa de ficar sem
trabalho, a parteira acabou em situação difícil, por atender à exigência, e tornou-se autora de uma
série de declarações falsas no Registro de Nascimento. Foi absolvida, por inexigibilidade de conduta
diversa.
Nos casos expostos, e sobre a inexigibilidade de conduta diversa, vemos que os autores
cometem fatos típicos e ilícitos, nos quais persiste a antijuridicidade, porém, naquelas circunstâncias,
os atos não podiam ser censurados, pois não se exigia dos autores que agissem conforme o Direito.
A exigibilidade das normas jurídicas, conforme diz Santos, não é cega, está condicionada a
um conjunto de determinações que regem a vida social, as quais os legisladores não conseguem
prever.
“Como vemos, pode o aplicador simplesmente adequar o fato à norma positiva e trazer uma
solução injusta ao caso concreto.”
Quando o bem destruído for de valor igual ou maior que o preservado, o estado de
necessidade continuará existindo, mas como circunstância de exclusão da culpabilidade,
como modalidade supralegal de exigibilidade de conduta diversa (é o que a teoria chama
de estado de necessidade exculpante).
Para explicar o instituto há duas teorias. A teoria unitária diz que existe o estado de
necessidade apenas como causa de excludente de ilicitude, para sacrificar bem jurídico de menor
valor para salvar o de maior ou de igual valor. Já a teoria diferenciadora admite o estado de
necessidade como excludente de ilicitude quando houver sacrifício de valores menores para salvar
valores maiores e o estado de necessidade como excludente de culpabilidade para sacrifício de
valores iguais ou maiores, desde que inexigível outro comportamento. 46
b) Excesso de legítima defesa exculpante: para se configurar excesso de legitima defesa
é necessário que haja todos os requisitos da legitima defesa, porém tem que haver o emprego de
meios necessários imoderados, ou seja, não se manter dentro dos limites do permitido em lei em
relação à própria defesa.
[...] a locução excesso exculpante define bem a matéria que se abriga sob sua área de
abrangência. Trata-se da ocorrência de um excesso, na reação defensiva, que não é, por
suas peculiaridades, reprovável, ou melhor, merecedor de apenação. Não se cuida de
excesso culposo porque, neste, o excesso deriva da falta do dever objetivo de cuidado
enquanto que, naquele, há um excesso resultante de medo, surpresa ou de perturbação de
ânimo. É evidente que o excesso exculpante pressupõe uma agressão real, atual ou
iminente, e injusta, isto é, com todas as características de uma ação ofensiva. A resposta
deve no entanto, ser havida como excessiva e tal excesso não é devido a uma postura
dolosa ou culposa mas a uma atitude emocional do agredido.
Aqui é o caso da exculpação por excesso quando o agente não consegue controlar
seus atos, seja por fatores emocionais, psicológicos, levando em conta que houve uma
perturbação do ânimo e que no momento da ação agiu com discernimento impróprio e
imoderado.
Direito Penal - Culpabilidade
Mas a doutrina questiona este entendimento dizendo que caso o provocador possa desviar
a ação de defesa do agredido, não há exculpação; se isto for impossível, o provocador não
será punido por sua reação, pela inexigibilidade de conduta diversa diante da agressão do
provocado.
[...] se o provocador pode desviar a ação de defesa do agredido (por exemplo, fugindo do
local), não há exculpação; se o provocador não pode desviar a ação de defesa provocada,
então seria possível admitir a exculpação do agressor por ações inevitáveis de defesa,
porque o Estado não pode exigir de ninguém a renúncia ao direito de viver, nem criar
situações sem saída, em que as alternativas são ou deixar-se matar ou sofrer pena rigorosa.
Nos termos do art. 5º, VI, da CF, é garantida a liberdade de crença e de consciência. Essa
liberdade possui limites, não se devendo afrontar outros direitos fundamentais individuais ou
coletivos.
Ocorre no caso de não aceitação de transfusão de sangue. O conteúdo dessas cláusulas não
deve ser valorado como certo ou errado pelo juiz, que deve verificar apenas a correspondência entre
a decisão exterior e os mandamentos morais da personalidade.
Tem como fundamento a escolha do mal menor. Ocorre também quando o funcionário de
uma empresa deixa de repassar as contribuições previdenciárias em virtude da precária situação da
empresa. O TRF4 já admitiu essa causa de inexigibilidade, desde que (i) sejam graves as
dificuldades, e (ii) haja extremo esforço dos controladores, inclusive com sacrifício de bens pessoais.
f) Desobediência civil: é um fato que objetiva mudar o ordenamento, que tende a ser mais
construtor do que destruidor. Esta ação ocorre, logicamente, em última instância. Consiste em atos
de rebeldia com a finalidade de mostrar publicamente a injustiça da lei e induzir o legislador a
modificá-la. Admitida como exculpante apenas se fundada na proteção de direitos fundamentais e
se o dano for juridicamente irrelevante. Acontece na hipótese de bloqueio de estradas, ou mesmo
nas ocupações por parte do MST.
Nessa hipótese, embora muitas vezes o agente pratique ato típico e ilícito, o mesmo não
deverá ser punido pela falta de interesse do Estado na responsabilização do indivíduo. Nos dizeres
de Santos:
O cidadão tem o poder de participar da criação e modificação das leis, no que tange ao
seu interesse, assim conclui-se que a sociedade detém a soberania popular.