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Direito Penal - Culpabilidade

1. CONCEITO E ASPECTOS CORRELATOS

Culpabilidade é o juízo de reprovabilidade sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo


agente, que, podendo se comportar conforme o Direito, optou por se comportar contrariamente.

De acordo com Juarez Cirino dos Santos, a culpabilidade é:

“Um juízo de reprovação sobre o sujeito (quem é reprovado), que tem por objeto a
realização do tipo de injusto (o que é reprovado) e por fundamento (a) a capacidade geral
de saber o que faz; (b) o conhecimento concreto que permite ao sujeito saber realmente o
que faz e (c) a normalidade das circunstâncias do fato que confere ao sujeito o poder de
não fazer o que faz (porque é reprovado).”

A culpabilidade deve ser aferida a partir do fato, e não do autor. Isso se chama culpabilidade
do fato. Isso porque o que se reprova é a conduta praticada pelo ser humano, tendo como base a
sua capacidade de escolher o que fazer, ou seja, que caminho seguir no caso concreto.

Isso se contrapõe à culpabilidade do autor, baseada na reprovação da personalidade da


pessoa1, tendo como critério limitativo seu caráter e personalidade e, de forma indireta, sua conduta 0
de vida.

Cezar Roberto Bitencourt atribuiu ao conceito de culpabilidade três sentidos. No primeiro, o


autor fala da culpabilidade como fundamento da pena, na qual não há pena sem culpabilidade,
devendo ser exigido os três elementos do conceito dogmático de culpabilidade para que a pena seja
devidamente aplicada.

Em segundo lugar, o autor fala da culpabilidade como elemento da determinação da pena.


Neste sentido, a culpabilidade atua como limite da pena e não como fundamento desta. Assim,
impede que a pena seja aplicada de maneira desproporcional ao sujeito, ou seja, nem aquém nem
além.

1Veja bem: a culpabilidade é sim uma reprovação da pessoa, mas não acerca de suas características pessoais
como forma de seleção penal dos réus, mas sim acerca da reprovação que recai sobre suas condições de se
definir perante a prática ou não da conduta criminosa. Isso é de extrema relevância, pois a culpabilidade,
na teoria tripartida do crime, é o único elemento que versa sobre a pessoa humana. Caso o Direito Penal
prescindisse da culpabilidade, não haveria um instituto específico que versasse sobre a reprovação da pessoa,
e o homem, em vez de ser considerado como destinatário do próprio fim do Direito Penal, seria posto em
segundo plano, pois nenhum conceito versaria diretamente sobre ele.
Direito Penal - Culpabilidade

E o terceiro e último sentido empregado por Bitencourt é da culpabilidade como conceito


contrário à responsabilidade objetiva, na qual nenhum sujeito será penalizado por um resultado
imprevisível sem dolo ou culpa.

Logo, pode-se dizer que a culpabilidade tem três funções:

a) Um dos fundamentos da pena (sem culpabilidade não há pena);

b) Limite da pena (art. 29: cada um é punido nos limites da sua culpabilidade);

c) Fator de graduação da pena (art. 59).

Existem duas teorias que fundamentam a culpabilidade:

a) Livre arbítrio;

b) Determinismo

De acordo com o livre-arbítrio, o homem é moralmente livre para fazer suas escolhas. O
fundamento da responsabilidade penal está na responsabilidade moral do indivíduo, sendo que esta
tem por base o livre arbítrio. 1
Esse livre arbítrio é que serve de justificação às penas que se impõem aos delinquentes como
um castigo merecido, pela ação criminosa e livremente voluntária.

Para o determinismo o homem não é dotado desse poder soberano de liberdade de


escolha, mas sim fatores internos ou externos podem influenciá-lo na prática da infração penal. A
vontade não é livre, mas francamente determinada por esses motivos de ordem biológica, física e
social (“o homem é o resultado do meio”).

O meio social pode exercer influência ou mesmo determinar a prática de uma infração penal.
Contudo, nem todas as pessoas que convivem nesse mesmo meio social se deixam influenciar e,
com isso, resistem à prática de crimes.

A culpabilidade é individual. Todos os fatos, internos e externos, devem ser considerados a


fim de se apurar se o agente, nas condições em que se encontrava, podia agir de outro modo.

A culpabilidade, de acordo com a teoria tripartite por nós adotada, é um substrato do crime,
um dos elementos que o compõem.
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Para a teoria bipartite, adotada por parte dos doutrinadores de São Paulo, como Mirabete,
Delmanto e Damásio, o crime é composto apenas de fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade
um mero pressuposto da aplicação da pena.

AS EXCLUDENTES DE CULPABILIDADE SE CHAMAM DIRIMENTES EXCULPANTES.

2. TEORIAS DA CULPABILIDADE

2.1. TEORIA PSICOLÓGICA DA CULPABILIDADE OU SISTEMA CAUSAL-NATURALISTA OU


SISTEMA CLÁSSICO: adotada no sistema naturalista ou causal da ação (no qual o dolo e a culpa
integram a culpabilidade), preconizado por Von Liszt e Beling, no final do séc. XIX. Para essa teoria,
culpabilidade é um liame psicológico que se estabelece entre a conduta e o resultado, por meio
do dolo ou da culpa. O dolo, nessa teoria, é normativo, pois contém a consciência da ilicitude. A
imputabilidade, na qualidade de pressuposto da culpabilidade, e não seu elemento, precede em
análise o dolo e a culpa.

Os principais apontamentos contrários que podem ser feitos à teoria psicológica são relativos à
inexigibilidade de conduta diversa e à culpa inconsciente. Quanto à primeira, o dolo está presente,
mas o resultado não é imputado ao agente porque não podia, naquela situação, agir de outro modo. 2
No que concerne à segunda, não existe previsão do resultado, faltando, portanto, o vínculo
psicológico entre o autor e o fato.

CULPABILIDADE NA TEORIA PSICOLÓGICA

IMPUTABILIDADE (pressuposto)
DOLO OU CULPA (espécies)

2.2. TEORIA PSICOLÓGICO-NORMATIVA OU NORMATIVA OU SISTEMA NEOCLÁSSICO OU


METODOLOGIA NEOKANTISTA2: desenvolvida por Reinhard Frank, em 1907, a culpabilidade teria
outro pressuposto, a exigibilidade de conduta diversa. O dolo e a culpa seriam elementos da
culpabilidade, embora não suficientes. De mera relação psicológica entre o agente e o fato, a
culpabilidade passou a constituir-se de um juízo de censura ou reprovação pessoal, com base
em elementos psiconormativos. Isso porque poderia, v.g., haver dolo sem que a conduta fosse
censurável por não haver culpabilidade. Assim, seriam elementos da culpabilidade:

2 Por que neokantismo? Pois criticou duramente a concepção neutra da tipicidade preconizada pelo
causalismo, sublinhando o aspecto valorativo do tipo legal. O tipo não descreve uma conduta neutra, mas sim
uma conduta valorada negativamente pelo legislador (o matar alguém não é neutro, é algo valorativamente
negativo). O tipo penal não é objetivo e neutro, é objetivo e valorativo, ao mesmo tempo.
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1. Imputabilidade;

2. Elemento psicológico-normativo (dolo ou culpa);

3. Exigibilidade de conduta conforme ao Direito.

Assim, essa teoria, diferentemente da teoria psicológica, já conseguiu explicar por que, v.g.,
a conduta do agente que age compelido por ordem de superior hierárquico não deveria ser punida.
Entretanto, continuou mantendo o dolo e a culpa como um elemento psicológico dissociado da
conduta, como um elo entre a conduta do agente e o resultado lesivo. Por isso que é psicológico-
normativa: psicológico: mantém o dolo ainda como elemento natural, que deve ser extraído como
elo entre o sujeito e o resultado; normativo: traz à norma jurídica as hipóteses em que a conduta é
ou não conforme ao direito.

A culpabilidade deixa de ser um fenômeno puramente natural, de cunho psicológico, pois a


ela se atribui um novo elemento, estritamente normativo, inicialmente chamado de normalidade das
circunstâncias concomitantes, e, posteriormente, de motivação normal, atualmente definido como
exigibilidade de conduta diversa.

O conceito de culpabilidade assume um perfil complexo, constituído por elementos 3


naturalísticos (vínculo psicológico, representado pelo dolo ou pela culpa) e normativos (exigibilidade
de conduta diversa). Nesse sentido, a culpabilidade pode ser definida como o juízo de
reprovabilidade que recai sobre o autor de um fato típico e ilícito que poderia ter sido evitado.

CULPABILIDADE NA TEORIA PSICOLÓGICO-NORMATIVA


IMPUTABILIDADE (elemento)
DOLO OU CULPA (elemento)
EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA (elemento)

2.3. TEORIA NORMATIVA PURA: nasceu com a teoria finalista da ação (na qual a culpa e o dolo
integram a conduta), desenvolvida por Hans Welzel, em 1930. Para ele, o dolo e a culpa não
poderiam estar na culpabilidade, deixando a ação humana sem seu elemento fundamental, que é a
intencionalidade. Assim, essa teoria deslocou-os para o fato típico (logo, retirando do dolo e da culpa
qualquer carga normativa), passando a culpabilidade a ser elemento puramente normativo
(consistente na reprovabilidade da conduta do agente), sem qualquer juízo de valor não jurídico.
Além disso, retirou a consciência da ilicitude do dolo, o qual é somente a vontade de um resultado e
a consciência do que se faz, e não a consciência de que o que se faz é antijurídico, errado. Somente
se pode dirigir um juízo de culpabilidade ao autor quando este pode conhecer o injusto
(imputabilidade + potencial consciência da ilicitude) e adequar o seu proceder de acordo com
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esse conhecimento (exigibilidade de conduta diversa). São elementos da culpabilidade, que


devem estar presentes concomitantemente:

1. Imputabilidade: capacidade individual do agente para delinquir;

2. Possibilidade de conhecimento da ilicitude do fato: o sujeito, ao tempo da conduta, deve


poder alcançar seu caráter ilícito.

3. Exigibilidade de conduta diversa: ou exigibilidade de atuação conforme a lei. Na verdade,


dos três elementos este é o mais importante. É o chamado elemento material, e é o elemento que
resume, em linhas gerais, o que é a culpabilidade. É mesmo até possível dizer que este elemento
abrange os outros, de uma certa maneira. Trata-se da possibilidade fática de se exigir, perante uma
situação concreta, que a pessoa tivesse adotado outro comportamento que não aquele considerado
criminoso. Se não tivesse possibilidade, não há culpabilidade. Se tivesse, há, a qual poderá ser plena
ou acentuada.

TEORIA PSICOLÓGICA NORMATIVA TEORIA NORMATIVA PURA


Culpabilidade: Culpabilidade

- imputabilidade - imputabilidade 4
- exigibilidade de conduta diversa - exigibilidade de conduta diversa
- culpa ou dolo (vontade e consciência atual da potencial consciência da ilicitude
ilicitude)

QUESTÃO DE CONCURSO: Qual a repercussão prática da consciência deixar de ser atual,


passando a ser potencial, ou seja, da teoria psicológica normativa para a teoria normativa pura no
que diz respeito ao erro de proibição?

Na teoria normativa pura o erro de proibição pode ser inevitável, que isenta o agente de
pena (neste caso o agente não tem consciência nem atual, nem potencial da ilicitude) ou evitável,
que diminui a pena (não tem consciência atual da ilicitude, mas tem consciência potencial). A teoria
normativa pura contenta-se com a consciência potencial, ausente somente no erro inevitável.

Já para a teoria psicológico-normativa, o erro de proibição, seja inevitável ou evitável,


isentava o agente de pena. Isso porque esta teoria exigia consciência atual, sendo que em todo erro,
para ela, não havia consciência atual, logo sempre isentava de pena.

Assim, a teoria psicológico-normativa, exigindo consciência atual da ilicitude, sempre


isenta o agente de pena no erro de proibição, pois, evitável ou inevitável o erro, não há
consciência atual da proibição.
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2.4. TEORIA LIMITADA: Na teoria limitada, a culpabilidade é composta pelos mesmos elementos
que integram a teoria normativa pura. É mera variante da teoria normativa pura.

A distinção entre tais teorias repousa unicamente no tratamento dispensado às


descriminantes putativas. De acordo com a teoria normativa pura, as descriminantes putativas
sempre caracterizam erro de proibição. Por sua vez, para a teoria limitada, as descriminantes
putativas são divididas em dois blocos:

1. Descriminantes de fato: Tratadas como erro de tipo (CP, art. 20, § 1.º)

2. Descriminantes de direito: Disciplinadas como erro de proibição (CP, art. 21).

O CP acolheu a teoria limitada.

Teoria extremada da Teoria limitada da


Teoria psicológica da Teoria psicológica
culpabilidade culpabilidade
culpabilidade normativa
(normativa pura) (CP ADOTOU)
Tem base causalista Tem base Tem base finalista Tem base finalista
neokantista
Tem como Tem como Ela tem como elementos Tem como elementos a
pressuposto a pressupostos: a imputabilidade, imputabilidade, a
imputabilidade imputabilidade, a exigibilidade de exigibilidade de conduta 5
exigibilidade de conduta diversa e diversa, consciência
conduta diversa, consciência potencial da potencial da ilicitude.
culpa ou dolo ilicitude.
(vontade e
consciência atual da
ilicitude)
Tem como espécies Dolo e culpa migram para <=Idem
dolo e culpa (se o fato típico, não se
trabalha com dolo e encontrando mais na
culpa aqui como culpabilidade.
espécies da
culpabilidade)
Esta teoria A única diferença da
aperfeiçoou a teoria anterior é natureza
anterior ao trazer jurídica já vista. Reside
outros pressupostos, na natureza jurídica do
trazendo o dolo e a artigo 20, § 1 do CP.
culpa como
elementos
Esse é o dolo O dolo que integra o fato Igual
constituído de típico aqui é constituído
consciência, vontade só de consciência e
e elemento normativo vontade. É o chamado
chamado consciência dolo natural.
ATUAL da ilicitude: é
o dolo normativo
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O elemento normativo Igual


saiu do dolo e foi para
culpabilidade, porém não
mais atual e sim
potencial.
Aqui diz que a natureza Aqui diz que é erro de
jurídica é erro de tipo.
proibição.
ADOTADA PELO
BRASIL, CONFORME
EXPOSIÇÃO DE
MOTIVOS DO CP

3. CONCEPÇÕES DE CULPABILIDADE

3.1. CONCEPÇÃO NORMATIVO-SOCIAL DA CULPABILIDADE

Busca um fundamento social, antes que psicológico para a culpabilidade. A culpabilidade


deve expressar a responsabilidade social do autor do fato punível.

“O juízo de desvalor da culpabilidade é de base normativa, mas deve admitir espaço para
o desenvolvimento de análise mais aprimorada sobre o particular ambiente social no qual o
fato crime produziu, e a decisão judicial produzirá efeitos relevantes, considerando-se,
fundamentalmente, a estrita necessidade de aplicação da pena.” (Fernando Galvão) 6
Liga-se ao conceito social da ação, que procurou ser uma via intermediária entre o causalismo
e o finalismo. Na década de 1930, Eb. Schimidt entende que ao Direito Penal interessa somente o
sentido social da ação. Critica o conceito final de ação, sustentando que este determina o sentido da
ação de forma extremamente unilateral em função da vontade individual, correndo o risco de se
esquecer o desvalor do resultado. Eb. Schimidt definiu ação como “uma conduta arbitrária para com
o mundo social externo”. Com Maihofer, afasta-se do naturalismo → “ação é todo comportamento
objetivamente dominável dirigido a um resultado social objetivamente previsível.”

Welzel criticou esse conceito, afirmando que se tratava de uma doutrina, preconizada por
Mezger, de imputação objetiva do resultado (segundo a qual, nem todo resultado causado é
imputável à ação do agente, pois fundamenta-se no incremento do risco e no fim de proteção à
norma), semelhante à teoria da causalidade adequada (segundo a qual, causa é a condição mais
adequada para produzir o resultado).

3.2. CONCEPÇÃO FUNCIONAL DA CULPABILIDADE

Advém da teoria sociológico-jurídica alemã moderna – Teoria Sistêmica da Prevenção


Integradora.
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Günther Jakobs e Claus Roxin, contemporaneamente, defendem uma concepção


funcionalista para a culpabilidade. As necessidades de prevenção integradora determinam os
pressupostos da reprovação jurídico-penal. A responsabilidade penal é consequência da intolerância
social ao comportamento do agente. A causa de responsabilidade reside no déficit de fidelidade
ao Direito. A pena é o instrumento por meio do qual se estabiliza a ordem jurídica que foi abalada
pela conduta do autor que se comportou com defeito de motivação. A CAPACIDADE PARA REAGIR
DIANTE DAS EXIGÊNCIAS NORMATIVAS AUTORIZA O JUÍZO DE REPROVAÇÃO, SENDO
CERTO QUE TODA NORMA INCRIMINADORA CUMPRE FUNÇÃO DE ESTÍMULO À NÃO
REALIZAÇÃO DE CONDUTAS CONSIDERADAS SOCIALMENTE INDESEJADAS.

O funcionalismo critica o finalismo, por este permitir que a ênfase no elemento volitivo possa
permitir a punição de tentativas completamente inofensivas. Também, a existência empírica da culpa
e da omissão culposa não podem ser explicadas através da finalidade. Roxin propugna que a decisão
político-criminal ultrapasse a ideia meramente retributiva, atentando para o que é preventivamente
necessário.

A culpabilidade não teria necessariamente que trazer consigo a imposição de uma pena. A
análise sistêmica permite novo marco teórico à ideia de legitimação ao castigo. A pena desempenha 7
uma FUNÇÃO para o bom funcionamento do sistema. Não há mais objetivos “retributivos” de
prevenção geral e especial que lhe foram atribuídos pela dogmática tradicional. O funcionalismo
sustenta que a pena aclara e atualiza exemplarmente a vigência efetiva de valores violados pelo
delinquente, reforça a convicção coletiva em relação à transcendência desses valores; fomenta e
dissemina os mecanismos de integração e de solidariedade social frente ao infrator e devolve ao
“cidadão honesto” sua confiança no sistema.

Virtude dessa corrente de pensamento: propugna a normalidade ao delito, sua


inextirpabilidade, sem necessidade de invocar patologias individuais ou complexos conflitos sociais.

CRÍTICAS: a) pode implementar flexíveis valorações político-criminais, permitindo arbítrio


estatal e enfraquecimento de garantias; b) concepção indeterminada; c) é estranha ao direito positivo
ou à sua dogmática ou sistemática.

Por mais que Roxin seja claramente contra o Direito Penal Simbólico e defenda a
subsidiariedade do Direito Penal, críticos como Alessandro Baratta acreditam que possa ocorrer um
reforço à concepção simbólica do delito e da pena e que esta construção teórica apresenta vocação
conservadora inclinada a legitimar o status quo em função de critérios de política criminal
empregados.
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3.3. A CONCEPÇÃO DE CULPABILIDADE DE HASSEMER

A construção de Hassemer acerca do conceito de culpabilidade parte da observação crítica


de suas principais fragilidades. Em primeiro lugar identifica o autor que o tradicional conceito de
culpabilidade travestido em princípio desvia a corresponsabilidade da sociedade sobre o
delito, deixando-a tão somente ao indivíduo, em quem se manifesta uma suposta maldade geral.
Em segundo, devemos reconhecer que ainda hoje utilizamos um conceito híbrido de culpabilidade
moral e culpabilidade jurídica, e que apesar dos esforços destinados, a culpabilidade jurídica nada
mais é do que um modo deficitário da moral.

Por fim, resta também evidente um desequilíbrio entre lei penal e culpabilidade em muitos
casos concretos, nos quais a demonstração de falta de culpabilidade gera consequências muito mais
graves que a pena poderia gerar, como se vê, por exemplo, com a imposição de medidas de
segurança.

Desta maneira parece indiscutível que tanto um conceito abrangente de culpabilidade como
sua expressão principiológica estejam sofrendo uma progressiva erosão diante dos desafios atuais
colocados ao Direito Penal, em especial a obtenção de consequências positivas. Dentre os penalistas
já se admite que a culpabilidade não seja discutida em torno da “liberdade de vontade” ou da
8
capacidade de atuar de modo distinto, e sim a partir das finalidades de prevenção geral e especial.

Para postular uma revisão do conceito, Hassemer identifica cinco dimensões da


culpabilidade. Começando pela imputação subjetiva, devemos ter presente que a culpabilidade
possibilita uma vinculação entre um acontecer injusto / fato injusto e uma pessoa atuante. Propõe,
de plano, um segundo aspecto, que é a Responsabilidade como um critério de aperfeiçoamento da
imputação subjetiva pelo conceito de domínio do fato, ou ainda da possibilidade de governar o
acontecer lesivo.

No que diz respeito à diferenciação de graus de participação interna, reforça sua particular
função de valoração entre distintos graus de responsabilidade que vão desde a imprudência
inconsciente até a comissão intencional de um delito. E sobretudo no tocante aos atores, vítima e o
autor do delito, que também modificam a valoração dos graus de participação interna.

Quanto à vítima, é necessário reconhecer que a partir de sua perspectiva pode-se se sentir o
dano causado de diferentes modos, ou seja, quem atua dolosamente produz um dano maior que
aquele que atua imprudentemente, ainda que seja do ponto de vista social pessoal e não médico-
empírico. Delitos que se realizam na presença do autor e da vítima encerram uma vexação social e
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pessoal da vítima. O exemplo de um delito de estupro expressa bem que mais que as lesões físicas
produzidas, se produz uma séria violação à dignidade da vítima.

Quanto ao autor, desempenham especial papel os chamados delitos sem vítimas, pois nestes
também quem atua dolosamente ameaça em maior grau a vigência da norma e ao mesmo tempo a
ordem jurídica. Enquanto do autor imprudente espera-se maior cautela em suas ações no futuro, do
autor que agiu com dolo espera-se sua “conversão normativa, sua mudança de atitude frente às
normas”. Por exemplo, o terrorista que realiza um sequestro busca um ataque à ordem estatal e
jurídica.

A quarta dimensão refere-se à proporcionalidade para a adequação das penas, que acaba
sendo uma decorrência das anteriores: possibilitar a imputação subjetiva, diferenciar graus de
participação interna são tarefas que o direito penal cumpre não por um mero interesse acadêmico,
senão por buscar fundamentar e medir uma consequência jurídico-penal que possa ser qualificada
como justa.

Vale dizer que a proporção das sanções jurídico-penais se depreende justamente da


aceitação de diferentes graus de participação, ou seja, a diferenciação que o conceito de
culpabilidade produz é o que concretiza o princípio da proporcionalidade, sem, contudo, perdermos 9
de vista que outros elementos interagem como critérios de proporcionalidade, como é o caso da
lesão ao bem jurídico protegido.

Por último, a reprovação pode ser entendida como uma dimensão central do conceito
de culpabilidade. E pressupõe um conjunto de elementos que Hassemer descreve detalhadamente.
São eles: a Liberdade de Vontade como um elemento observável no processo penal que avalia e
mensura as limitações materiais da liberdade do acusado, ou seja, os indicadores de déficit de
liberdade. De outra parte, a vida cotidiana há de ser considerada, uma vez que nela se constrói os
conceitos de reprovação ou desculpa. Todavia, a ponderação de que não existe uma vida cotidiana
e sim normas grupais de referência e estilos de conduta com diferenças relevantes de reprovação e
desculpa também pode desempenhar um papel relevante de exemplaridade para o Direito, é dizer,
a cultura cotidiana pode ensinar a cultura do direito de que devemos ser mais cuidadosos com as
reprovações, que podemos cogitar de evitá-las, ou esquecê-las. De modo geral, o Direito sempre
manteve um distanciamento da cultura cotidiana; o desafio, entretanto, não é traduzi-la ao pé da
letra, e sim na medida do factível transformar as formas humanas em formas institucionais de
elaboração formalizada de conflitos.

Outro elemento da reprovação que não pode ser ignorado está presente no que Hassemer
chama de TEORIA DO BODE EXPIATÓRIO. A reprovação decorrente da culpabilidade faz com que
Direito Penal - Culpabilidade

a sociedade afetada pelo mal o projete sobre a pessoa individual, que deve ser afastada ou expulsa.
Este mecanismo pode oferecer uma explicação melhor de porque a reinserção social do delinquente
é algo tão difícil de ser alcançado.

O autor defende que a eliminação da reprovação do conceito de culpabilidade, embora não


pudesse extinguir com tal mecanismo psicossociológico, poderia evitar sua intensificação. Ademais,
pondera que a reprovação já não cumpre a função de limitação das penas, e tampouco funciona
como justificação do direito penal, pois que o direito penal sempre terá uma justificação ético-social
que não se encontra no âmbito individual, ou na culpabilidade do indivíduo. A justificação se encontra
na força do direito penal para elaborar os conflitos mais graves.

É importante perceber que Hassemer, ao descrever as dimensões da culpabilidade e todos


os elementos que a compõem, acaba por desvendar sua utilização como mecanismo de intimidação
e tratamento. O juízo de culpabilidade tal qual hoje elaboramos restringe-se à verificação de em que
medida a ação de um sujeito afronta o ordenamento jurídico, e se o mesmo sujeito é ou não objeto
de tratamento.

Critica veementemente que a culpabilidade sirva para definir o que se pode fazer
racionalmente com uma pessoa, quando deveria servir para definir a responsabilidade. Ao propor 10
um conceito de Responsabilidade, propõe que a atenção dispensada pelo Direito dirija-se a avaliar
se o sujeito era responsável por sua ação típica e antijurídica, e não esteja voltada aos objetivos
político-criminais de futuro. A responsabilidade desde sua perspectiva é um juízo que aponta ao
passado e não ao futuro.

Portanto, de acordo com Hassemer, a delimitação da responsabilidade e de seus distintos


graus importa como fundamento e princípio de ajuste para a proporcionalidade da sanção penal.
Conceitos deixados à margem pelas concepções preventiva e funcionalista.

3.4. A CONCEPÇÃO DE CULPABILIDADE DE MUÑOZ CONDE

O primeiro aspecto de elevada importância na posição de Muñoz Conde está na superação


de um conceito de culpabilidade fundado na possibilidade de agir de modo distinto. Para ele,
as normas penais se dirigem a indivíduos capazes de motivarem-se em seus comportamentos pelos
mandatos normativos. A diferença é marcante na medida em que substitui a lógica de que os
indivíduos possam eleger entre várias formas de agir pela de que é a norma penal que motiva,
através de seus mandatos ou proibições, que os indivíduos, por exemplo, se abstenham de
determinada conduta em face da ameaça de pena.
Direito Penal - Culpabilidade

Configura desta forma um conceito material de culpabilidade, cujo fundamento descansa


sobre as faculdades que permitam ao ser humano participar com seus pares e, portanto, em
condições de igualdade em uma vida pacífica e justamente organizada. Em outras palavras, a
motivabilidade ou capacidade de motivação para Muñoz Conde é a capacidade para reagir
frente às exigências normativas, sendo que tais exigências ou expectativas se estruturam à luz de
necessidades preventivas, e vale-se das lições de Mir Puig:

“O fundamento da culpabilidade não pode derivar-se , sin más (apenas), da natureza das
coisas, como crê a concepção tradicional – não cabe castigo ao inculpável porque não pode
atuar de outro modo – e perigosamente como dá a entender a teoria da motivação normativa
– não cabe castigo ao inculpável porque não pode ser motivado em absoluto pela norma -;
é imprescindível introduzir um momento normativo essencial (...) em um Estado Social e
Democrático de Direito não se considera justo levar o desejo de prevenção até o castigo a
quem atua sem culpabilidade”.

Refere-se, portanto, aos limites que necessidades preventivas podem impor às penas, do
ponto de vista da prevenção geral e especial. A prevenção geral se revela no ato de determinação
da pena, e a especial, por sua vez, na definição ao caso concreto da resposta adequada à
ressocialização ou ao menos a não dessocialização do delinquente.

Podemos incorrer em dois equívocos acerca da posição de Muñoz Conde: de que se remete 11
ao conceito puramente funcionalista de Jakobs, ao admitir que as exigências normativas são fixadas
socialmente através de uma normativa concreta, ou ainda que defende um caráter essencialmente
preventivo tal qual Roxin para a culpabilidade. Nem uma, nem outra.

Em primeiro lugar, sua concepção de culpabilidade se desenvolve em referência aos demais,


é dizer, não se trata de um fenômeno individual isolado. Tampouco a culpabilidade traduz uma
qualidade da ação individual; é uma característica que se lhe atribui para poder imputar a alguém.
Disto decorre importante reconhecer que a definição do que é culpável e não culpável é uma opção
de política criminal que determinado Estado elege.

Não se trata de uma visão funcional da culpabilidade porque mesmo partindo da função
motivadora da norma penal, Muñoz Conde combina à frustração das expectativas normativas uma
dimensão social como fundamento da culpabilidade, que impõe avaliar a utilidade da pena em face
da motivação individual e do papel social do indivíduo. Prepondera sobre a busca de fidelidade ao
Direito, um juízo de utilidade da pena, ou seja, a pena não deve ser aplicada a qualquer custo, mesmo
sendo inútil e desnecessária apenas para reforçar a confiança no sistema.

Por outro lado, não compartilha da separação proposta por Roxin entre dogmática jurídico-
penal e política criminal, ou substituição da culpabilidade por responsabilidade, pois considera as
mesmas fragilidades conceituais em ambos os casos.
Direito Penal - Culpabilidade

A máxima preventiva em Roxin padece de um deslize. Não é a culpabilidade que oferece o


limite máximo para a imposição da pena, e sim o princípio de legalidade, que fixa os limites dentro
dos quais pode mover-se o arbítrio judicial. E tão somente no marco do limite legal pré-estabelecido
podem ser discutidas as necessidades preventivas. Demonstra-se inequívoca a relação entre
dogmática e política criminal, favorecendo que se desmistifique o direito penal preventivo, dado que
tem o potencial de conferir legitimidade e eficácia político-criminal às normas penais.

3.5. A CULPABILIDADE PELA CONDUTA DE VIDA, POR “INIMIZADE COM O DIREITO”,


CULPABILIDADE DO AUTOR, PELO CARÁTER OU PELA PERSONALIDADE

A visão de culpabilidade pela condução de vida, inserta nas cláusulas "cegueira jurídica" ou
"inimizade com o direito", foi inaugurada por Mezger e introduziu no direito penal, nas palavras de
Assis Toledo, a possibilidade de condenação do agente não por aquilo que ele faz, mas por aquilo
que ele é, daí derivando, em linha reta, um discutível e pouco seguro direito penal do autor (Princípios
Básicos de Direito Penal).

Exemplo desta possibilidade é fornecido por Zaffaroni:

"O sujeito de maus hábitos os terá adquirido por freqüentar tabernas e prostíbulos; esta 12
conduta é claramente atípica, mas quando a ele se reprova sua "condução de vida", que
desemboca num homicídio, estaremos reprovando sua conduta anterior de freqüentar
tabernas e prostíbulos, isto é, a reprovação da conduta de vida é a reprovação de
condutas anteriores atípicas, que o juiz considera contrárias à ética (quando na
realidade podem ser contrárias apenas a seus próprios valores subjetivos). A
culpabilidade pela conduta de vida é o mais claro expediente para burlar a vigência absoluta
do princípio da reserva e estender a culpabilidade em função de uma "actio inmoral in
causa", por meio da qual se pode chegar a reprovar os atos mais íntimos do indivíduo"
(Manual de Direito Penal Brasileiro, pág. 612).

Zaffaroni e Pierangeli não veem como é possível fazer uma combinação de reprovação pelo
ato e pela conduta de vida, porque ou a ação é reprovada na circunstância concreta em que atuou,
ou o sujeito é por ela reprovado como resultado de sua conduta de vida; qualquer pretensão de
combinar ambas as reprovações não pode conduzir a outro resultado senão o de cair na segunda,
isto é, em uma culpabilidade de autor, chamada em nossos dias de "culpabilidade pela conduta de
vida".

4. TEORIAS QUE EXPLICAM OS ERROS DE TIPO E ERROS DE PROIBIÇÃO

a) Teoria extremada ou estrita da culpabilidade: ela parte da reelaboração dos conceitos de


dolo e de culpabilidade, empreendida pela teoria finalista. Por esta, o dolo deixaria de ser um
elemento normativo, passando a fazer parte da conduta, enquanto a consciência da ilicitude seria
um elemento normativo, figurando na culpabilidade. PARA A TEORIA EXTREMADA, TODO E
Direito Penal - Culpabilidade

QUALQUER ERRO QUE RECAIA SOBRE UMA CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO É ERRO DE


PROIBIÇÃO, TENHA O ERRO RECAÍDO SOBRE UMA SITUAÇÃO DE FATO, SOBRE A
EXISTÊNCIA OU MESMO SOBRE OS LIMITES DE UMA CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO. Por ela,
sempre se aplicaria o art. 21.

b) Teoria limitada da culpabilidade: assim como a outra, situa o dolo no tipo penal e a
consciência da ilicitude na culpabilidade. Apresenta, entretanto, divergências quando o erro recai
sobre as chamadas causas de justificação (excludentes de ilicitudes). Para ela, se o erro recai sobre
os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, há erro de tipo permissivo, que exclui o dolo
e, se inevitável, a culpa. Se recai sobre a existência ou abrangência da causa de justificação, há erro
de proibição, que exclui a culpabilidade. PARA ESTA TEORIA SE APLICA O ART. 20, § 1º
QUANDO A CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO RECAI SOBRE SITUAÇÃO DE FATO, E O 21, QUANDO
RECAI NA EXISTÊNCIA OU NOS LIMITES DA CAUSA DE JUSTIFICAÇÃO.

Consequências da adoção da teoria limitada da culpabilidade (adotada pelo Brasil,


exposição de motivos do CP, item 17)

O fato praticado com erro invencível, inevitável ou escusável afastaria o injusto típico (por
falta de dolo), e não a culpabilidade. 13

Não seria punível a participação de alguém que contribui para um crime praticado junto a
pessoa que age com erro sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, já que, pela
teoria da acessoriedade limitada por nós adotada, somente pode-se punir o partícipe se o autor tiver
praticado, ao menos, um fato típico e ilícito.

A tentativa não seria punível, já que excluído o dolo.

5. A COCULPABILIDADE

A coculpabilidade tem origem nos escritos de Jean Paul Marat. Essa teoria afirma que o
Estado é corresponsável pelos atos das pessoas, na medida em que não proporciona
oportunidades iguais para todos. Essa teoria considera, no juízo de reprovabilidade, a concreta
experiência social dos réus, as oportunidades que se lhes depararam e a assistência que lhes foi
ministrada em vida. Em certa medida, a coculpabilidade “faz sentar no banco dos réus, ao lado dos
mesmos, a sociedade”. Essa teoria aparentemente foi parcialmente adotada, pela atenuante
genérica prevista no art. 66 do Código Penal.

Essa teoria é criticada por atrelar a criminalidade à pobreza, o que é sabidamente errado (vide
crimes de colarinho branco).
Direito Penal - Culpabilidade

5.1. COCULPABILIDADE ÀS AVESSAS

Se o nome da teoria é “coculpabilidade às avessas”, presume-se que deva tratar de algo


inverso ao conceito de coculpabilidade. E é justamente isso!

A primeira perspectiva de que trata a teoria da coculpabilidade às avessas se traduz no


abrandamento à sanção de delitos praticados por pessoa com alto poder econômico e social, como
no caso dos crimes de colarinho branco (crimes contra a ordem econômica e tributária). Exemplo
prático disto no Brasil é a extinção da punibilidade pelo pagamento da dívida nos crimes contra a
ordem tributária.

A segunda vertente se revela na tipificação de condutas que só podem ser praticadas por
pessoas marginalizadas. Exemplos disto são os artigos 59 (vadiagem) e 60 (mendicância – revogado
pela Lei 11.983/2009), da Lei de Contravenções Penais. Dispõe o artigo 59: Entregar-se alguém
habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios
bastantes de subsistência, ou prover à própria subsistência mediante ocupação ilícita: Pena - prisão
simples, de quinze dias a três meses.

Percebam que se trata de um crime discriminatório, direcionado justamente às pessoas que 14


a coculpabilidade busca resguardar.

Assim, pode-se definir a coculpabilidade às avessas como o fenômeno jurídico pelo qual o
Direito Penal atua de forma mais rígida justamente para com aqueles que tiveram menos
oportunidades, enquanto concede benefícios àqueles que tinham, ao menos em tese, todas
as condições sociais e pessoais de observar a lei.

6. A VULNERABILIDADE (CULPABILIDADE PELA VULNERABILIDADE)

Trata-se de uma teoria desenvolvida por Zaffaroni. Quem conta com alta vulnerabilidade (de
sofrer a incidência do direito penal) - e esse é o caso de quem não tem instrução, status, família,
diploma, condições de pagar advogado etc.- teria sua culpabilidade reduzida. Ao contrário, aquele
que desfruta de baixa vulnerabilidade teria mais intensa culpabilidade.

A criminalização é o processo de seleção de quem será submetido às penas. A primária


consiste na elaboração da lei penal, e a secundária deve ser executada por agências de
criminalização (polícia, MP, judiciário, e agentes penitenciários). Como as agências não possuem
estrutura para realizar a criminalização completa, acabam realizando uma pequena parcela, de sorte
que surge a chamada cifra oculta ou negra da criminalidade (cifra dourada, nos crimes do
colarinho branco), consubstanciada na diferença entre os crimes que ocorrem e os que são
Direito Penal - Culpabilidade

punidos. Isso marca uma verdadeira “seleção” do criminoso punido, marcada pela escolha daqueles
mais “vulneráveis” à atuação da criminalização, ou seja, que possuem baixas defesas perante o
poder punitivo, seja por conta de estereótipos, ou pela realização de ilícitos de fácil detecção.

Para evitar o processo citado, foi desenvolvida a teoria da culpabilidade pela


vulnerabilidade, que recomenda a observância do estado de vulnerabilidade na aferição da
culpabilidade. Por exemplo, se A comete um crime, mas é pobre, socialmente excluído, e
desempregado, a reprovabilidade de sua conduta será menor.

A vulnerabilidade se distingue da coculpabilidade por não considerar apenas o aspecto


econômico como influenciador da potencialidade delitiva do indivíduo, mas levar em conta vários
outros fatores.

Veja que ambas as teorias carregam em si uma alta dose de determinismo, ou seja, defendem
que o homem é produto do meio em que vive.

7. ELEMENTOS NORMATIVOS DA CULPABILIDADE

De acordo com a Concepção Normativa da Culpabilidade, ela é composta por três elementos
15
normativos.

7.1. IMPUTABILIDADE OU CAPACIDADE DE CULPABILIDADE

A imputabilidade penal, primeiro elemento da culpabilidade, consiste na plena


capacidade de culpabilidade, entendida como CAPACIDADE DE ENTENDER E QUERER, e, por
isso mesmo, capacidade de ser responsável no âmbito penal. Esta capacidade de entender e de
querer (o resultado penalmente vedado) compreendem dois aspectos, o cognitivo e o volitivo.
Ambos são considerados pela definição do art. 26 do Código Penal.

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Em outra definição, trata-se da liberdade e faculdade intelectiva de se comportar de maneira


contrária ao Direito, tendo como consequência a possibilidade de se imputar o fato típico e ilícito ao
agente.

É a capacidade de imputação, possibilidade de se atribuir a alguém a responsabilidade


pela prática de uma infração penal. A imputabilidade é o conjunto de condições pessoais que
conferem ao sujeito ativo a capacidade de discernimento e compreensão, para entender seus
atos e determinar-se conforme esse entendimento. Veja que se trata de algo estritamente subjetivo,
Direito Penal - Culpabilidade

que emana do intelecto do agente; não obstante, é objetivamente analisada no caso concreto pelo
legislador, já que ele terá como material para aferir a culpabilidade os dados e informações sobre o
agente.

São elementos da imputabilidade (Bettiol):

a) Capacidade de entender o caráter ilícito do fato (elemento intelectual ou cognitivo): é a


capacidade de o agente compreender as proibições ou determinações jurídicas do fato, ainda que
não conheça o tipo penal. É o saber que o fato é errado. Por exemplo, em casos de psicopatias
gravíssimas, o sujeito homicida não tem agregado em seu pensamento a concepção mental de que
matar alguém é errado. Não há nele o sentimento de remorso, ou de culpa, ou de pena, ou de
consideração pela vida humana.

b) Capacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento (elemento volitivo): o


agente deve ter capacidade de avaliar seus motivos (capacidade mental) e de avaliar a possibilidade
de consequências penais para si. Nisso que consiste a determinação, no discernimento mental que
leve à livre decisão criminosa por parte do agente. Por exemplo, o agente pode ser um
cleptomaníaco: ele sabe que furtar é errado, que subtrair coisa alheia móvel é social e penalmente
reprovável. Porém, ele simplesmente não consegue se conter em decorrência de sua enfermidade, 16
nele não há o “querer” necessário e suficiente para lhe impedir de praticar o ato.

ELEMENTO VOLITIVO (ENTENDER) e/ou ELEMENTO INTELECTIVO (DETERMINAR-SE)

O Código Penal, no art. 26, adota o critério geral de imputabilidade para todas as
pessoas, o qual depende do somatório de fatores de ordem biológica, quais sejam: é
imputável aquele que não tem doença mental nem tem o desenvolvimento mental incompleto
ou retardado. Soma-se isso a um dado de natureza psicológica, qual seja: a doença ou o
desenvolvimento mental incompleto ou retardado não pode ter tirado, por completo, a
capacidade autodeterminar-se, ou de entender o caráter ilícito do fato.

Logo, conforme explicado adiante, foi adotado o critério biopsicológico PARA DEFINIR
NÃO A IMPUTABILIDADE, COISA QUE O CÓDIGO PENAL NÃO FAZ, mas sim a
inimputabilidade.

Excepcionalmente, entretanto, foi adotado o sistema biológico no tocante aos menores de 18


anos (CF, art. 228, e CP, art. 27), bem como o sistema psicológico, em relação à embriaguez
completa proveniente de caso fortuito ou força maior (CP, art. 28, § 1.º).
Direito Penal - Culpabilidade

IMPORTANTE: compete ao juiz decidir se será cabível ou não o exame de sanidade


mental para avaliar a imputabilidade do sujeito; não se trata de um direito subjetivo do réu.
Isso decorre da lógica de que o magistrado pode indeferir os pedidos considerados impertinentes ou
manifestamente protelatórios. Nesse sentido:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA.


INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. NÃO OBRIGATORIEDADE. VIA ELEITA
INADEQUADA PARA AFERIR A NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DA PERÍCIA.

1. O exame a que se refere o art. 149 do Código de Processo Penal é imprescindível


apenas quando houver dúvida fundada a respeito da higidez mental do acusado,
tanto em razão da superveniência de enfermidade no curso do processo ou pela
presença de indícios plausíveis de que, ao tempo dos fatos, era incapaz de entender
o caráter ilícito da conduta ou determinar-se de acordo com esse entendimento.

2. O Juiz que presidiu o feito não detectou qualquer anormalidade no interrogatório do


acusado, ou mesmo durante a instrução processual, a fim de justificar a instauração do
incidente de sanidade mental, sendo certo que somente após a confirmação da pronúncia
a defesa alegou ser o paciente portador de suposta enfermidade.

3. Não se vislumbra ilegalidade no acórdão hostilizado que, de maneira fundamentada,


confirmou a decisão de primeiro grau e entendeu inexistir qualquer suspeita a respeito da
perturbação mental do paciente. Assim, a inversão do decidido demandaria o exame
aprofundado de matéria fático-probatória, inviável na via estreita do habeas corpus.
17
4. Ordem denegada.

(HC 60977/ES, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 25/10/2011,


DJe 14/11/2011)

Porém, não se deve esquecer de que o réu tem direito subjetivo de não ser submetido
compulsoriamente a exame de sanidade mental, pois o incidente de insanidade mental é
instituto jurídico que foi pensado em favor da defesa. Nesse sentido, veja-se julgado do STF:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. ALEGAÇÃO


DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL DECORRENTE DA DETERMINAÇÃO DE EXAME DE
INSANIDADE MENTAL. LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO. ORDEM CONCEDIDA.

1. No Código Penal Militar, assim como no Código Penal, adotou-se o critério biopsicológico
para a análise da inimputabilidade do acusado.

2. A circunstância de o agente ter doença mental provisória ou definitiva, ou


desenvolvimento mental incompleto ou retardado (critério biológico), não é suficiente para
ser considerado penalmente inimputável sem análise específica dessa condição para
aplicação da legislação penal.

3. Havendo dúvida sobre a imputabilidade, é indispensável verificar-se, por procedimento


médico realizado no incidente de insanidade mental, se, ao tempo da ação ou da omissão,
o agente era totalmente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento (critério psicológico).
Direito Penal - Culpabilidade

4. O incidente de insanidade mental, que subsidiará o juiz na decisão sobre a


culpabilidade ou não do réu, é prova pericial constituída em favor da defesa, não
sendo possível determiná-la compulsoriamente quando a defesa se opõe.

5. Ordem concedida.

(HC 133078, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 06/09/2016,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-202 DIVULG 21-09-2016 PUBLIC 22-09-2016)

7.1.1. EXCLUDENTES DE IMPUTABILIDADE – CAUSAS DE INIMPUTABILIDADE

São causas que excluem a imputabilidade do agente (o inimputável deve ser sumariamente
absolvido, salvo se doente mental):

a) Quem, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao


tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato (art. 26):
critério biopsicológico.

Deve ser provada por exame pericial. Há, pois, três requisitos, de acordo com esse critério,
para que reste demonstrada a inimputabilidade:

(i) Causal: existência de doença mental ou de desenvolvimento mental incompleto ou 18


retardado, que são as causas previstas em Lei;

(ii) Cronológico: existência do item anterior ao tempo da ação ou omissão delituosa;

(iii) Consequencial: perda da capacidade de entender e querer; estar o agente inteiramente


incapaz de entender o caráter ilícito do fato, ou de se determinar de acordo com esse entendimento.

Evidenciada a inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou


retardado, a sentença será absolutória imprópria, sendo aplicada apenas medida de segurança (há
juízo de periculosidade, não culpabilidade), conforme a regra do art. 96 e art. 97, CP. O prazo mínimo
será de 01 a 03 anos para medida de segurança, e prevalece que não há prazo máximo, devendo
se estender até que haja recuperação do inimputável. A constitucionalidade dessa ausência de prazo
máximo já foi questionada. O STF entende que não pode superar 30 anos, e o STJ entende que o
prazo máximo deve ser igual à pena máxima do crime cometido.

Os inimputáveis (e também semi-imputáveis) poderão ter a internação provisória decretada


em caso de crimes praticados com violência ou grave ameaça (art. 319, CPP), havendo risco de
reiteração.
Direito Penal - Culpabilidade

O tratamento da pessoa com transtorno mental deve ser realizado no interesse exclusivo de
beneficiar sua saúde. O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do
paciente em seu meio.

A condição de índio não integrado não gera presunção de incapacidade penal. Esta condição
depende do grau de assimilação dos valores sociais, a ser revelado pelo exame pericial. Destarte,
dependendo da conclusão da perícia, o silvícola pode ser IMPUTÁVEL, se integrado à vida em
sociedade; SEMI-IMPUTÁVEL, no caso de estar dividido entre o convívio na tribo e na sociedade e
INIMPUTÁVEL, quando completamente incapaz de viver em sociedade, desconhecendo as regras
que lhe são inerentes.

b) O menor de 18 anos ao tempo da ação ou omissão (art. 27): critério biológico.

Fora as situações do art. 26, também têm que se falar, primeiramente, que o art. 27 do Código
Penal dispõe sobre a menoridade penal e estipula que o menor de dezoito anos é inimputável. Ao
fazê-lo, não explica que é inimputável porque se presume o déficit psicológico-biológico.
Simplesmente fixa esse critério etário. 19
Daí alguns autores afirmarem que, neste caso, o critério biopsicológico foi substituído por um
critério puramente biológico. Identificada a menoridade ao tempo da ação, não há alternativa que
não o reconhecimento da inimputabilidade. Portanto, não pode responder por atos na esfera
penal, a despeito de poder e dever fazê-lo na esfera própria, que é a esfera infracional. Os atos
infracionais são processados não junto ao Juízo Criminal, mas sim ao Juízo da Infância e da
Juventude, o qual não é inspirado por um regime de censura penal.

Tanto é assim que as consequências advindas da ação nunca receberão nome de pena, ou
de medida de segurança. Recebem o nome de medidas sócio educativas, o que revela que, pelo
menos em teoria, a finalidade que inspira a imposição, por exemplo, de internação de um menor em
um estabelecimento próprio para adolescentes, tem como objetivo educá-lo. Nunca castigá-lo.

A menoridade pode ser alterada no Brasil? Há duas correntes sobre o assunto:

1ª corrente: Brasil não pode reduzir a capacidade penal

O art. 228 da CR/88 é cláusula pétrea, portanto, imutável nas hipóteses de redução ou
extinção de direitos fundamentais (ou seja, cláusula pétrea só pode ser alterada para aumentar
garantias) = LFG. É a corrente que prevalece no meio jurídico.
Direito Penal - Culpabilidade

2ª corrente: Brasil pode reduzir a capacidade penal

O art. 228 não é cláusula pétrea, podendo ser alterado para se reduzir a maioridade penal
Defendida por Capez, Pacelli.

c) A pessoa completamente embriagada de forma involuntária, por caso fortuito ou força


maior (art. 28, § 1º): a embriaguez é a intoxicação aguda e transitória provocada pelo álcool ou
substância de efeitos análogos. Caso a embriaguez seja acidental, mas incompleta, a pena será
reduzida de 1/3 a 2/3 (art. 28, § 2º).

Quem entra em embriaguez não acidental (decorrente de sua própria conduta)


voluntária ou culposa e comete crime, mesmo que em estado de completa embriaguez,
responde pelos atos praticados, já que era livre para decidir se se embriagaria ou não (teoria
da actio libera in causa). Além disso, caso a embriaguez tenha sido preordenada, além de não
excluir a imputabilidade, é considerada agravante genérica (art. 61, II, “i”).

Pela teoria da actio libera in causa, nos casos de embriaguez, as condições gerais do autor
da ação terão de ser analisadas não no momento da prática do fato, mas sim no momento
anterior àquele em que ele se colocou no estado de embriaguez. 20
A teoria da actio libera in causa defende que o ato delitivo revestido de inconsciência deve
ser punido quando decorre de ato antecedente que foi livre na vontade, transferindo-se para
esse momento anterior a constatação da imputabilidade do agente. A teoria é aplicada “aos
casos em que alguém, no estado de não imputabilidade, é causador, por ação ou omissão, de algum
resultado punível, tendo se colocado naquele estado, ou propositadamente, com a intenção de
produzir o evento lesivo, ou sem essa intenção, mas tendo previsto a possibilidade do resultado, ou,
ainda, quando a podia ou devia prever.”

Caso a embriaguez seja patológica, por dependência química, o agente será equiparado ao
doente mental, excluindo a sua imputabilidade.

O STJ entende que se aplica a teoria da actio libera in causa mesmo nos delitos em que
se exige dolo específico:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ARTS. 140, § 3º, E 141, III, AMBOS
DO CP. INJÚRIA QUALIFICADA. DOLO ESPECÍFICO. NECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO. PRESENÇA DE ANIMUS INJURIANDI. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA.
IRRELEVÂNCIA. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESPECIAL. SÚMULA
7/STJ. MANUTENÇÃO DO DECISUM A QUO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. STF.

1. Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal, para a configuração dos crimes


previstos nos arts. 139 e 140, ambos do Código Penal - difamação e injúria -, é
Direito Penal - Culpabilidade

necessária a presença do elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo específico, que


é a intenção de ofender a honra alheia.

2. As instâncias ordinárias, soberanas na análise dos fatos e provas, entenderam


que as expressões utilizadas pela ré demonstram a presença do animus injuriandi,
não havendo falar em ausência de dolo específico.

3. Nos termos do art. 28, II, do Código Penal, é cediço que a embriaguez voluntária
ou culposa do agente não exclui a culpabilidade, sendo ele responsável pelos
seus atos mesmo que, ao tempo da ação ou da omissão, era inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento. Aplica-se a teoria da actio libera in causa, ou seja, considera-se
imputável quem se coloca em estado de inconsciência ou de incapacidade de
autocontrole, de forma dolosa ou culposa, e, nessa situação, comete delito.

4. O pleito de absolvição por ausência de dolo específico importa o reexame de fatos e


provas, providência inadmissível em sede de recurso especial, nos termos da Súmula
7/STJ.

5. A violação de preceitos, dispositivos ou princípios constitucionais revela-se


quaestio afeta à competência do Supremo Tribunal Federal, provocado pela via do
extraordinário; motivo pelo qual não se pode conhecer do recurso nesse aspecto, em
função do disposto no art. 105, III, da Constituição Federal.

6. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na


insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada.
21
7. Agravo regimental improvido.

(AgInt no REsp 1548520/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA,
julgado em 07/06/2016, DJe 22/06/2016)

Quanto à origem da embriaguez Quanto ao grau de embriaguez

Acidental: se divide em: Completa: quando retira a capacidade de


Proveniente de caso fortuito entendimento e autodeterminação no
Quando o agente desconhece o efeito momento da conduta. Exclui a culpabilidade.
inebriante da substância que ingere Incompleta: quando apenas diminui a
Proveniente de força maior capacidade de entendimento e
Quando o agente é obrigado a ingerir a autodeterminação no momento da conduta.
substância. Ex.: (Damásio) pessoa andando Diminui a culpabilidade, sendo causa de
cai no tonel de pinga e mata o segurança. diminuição de pena.
Na jurisprudência há um exemplo melhor:
uma pessoa foi sequestrada e foi mantida
bêbada em cativeiro; conseguiu fugir nesse
estado, pegou um carro e atropelou um
pedestre.
Exclui a imputabilidade quando completa (§
1º); quando incompleta, apenas reduz pena
(§ 2º).
Não acidental: Também pode ser completa ou incompleta
Direito Penal - Culpabilidade

Voluntária: quando o agente quer se


embriagar
Culposa: decorre de negligência; não
queria se embriagar, mas aconteceu
Não exclui imputabilidade
Doentia: é a embriaguez patológica. É Também pode ser completa (equipara-se ao art.
equiparada a uma doença mental. 26, caput) ou incompleta (equipara-se ao art. 26,
Só exclui a imputabilidade se completa (art. parágrafo único)
26, caput)
Preordenada: a embriaguez é meio para a Também pode ser completa ou incompleta
prática do crime.
Não exclui a imputabilidade
É agravante genérica

DESACATO (ART. 331 DO CP). EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA. IMPUTABILIDADE.

Evidenciada a ingestão voluntária de bebida alcoólica, culminando em desacato, não se


exclui a imputabilidade do agente (art. 28, II, CP), pois a embriaguez somente isenta de
pena quando resultante de caso fortuito ou força maior (art. 28, § 1º, CP). Unânime. (TRF1,
4T, Ap 2005.42.00.002208-4/RR, rel. Des. Federal Mário César Ribeiro, em 29/08/2011.)

O doente mental é processado? 22


Sim, o doente mental é processado. É o único caso em que o fato não é crime e o juiz não
pode rejeitar a denúncia. O juiz recebe a denúncia, o doente mental é julgado e, em seguida,
absolvido (porque não há crime) e lhe será imposta medida de segurança.

Trata-se de uma absolvição imprópria, porque gerará sanção penal da espécie medida de
segurança. Entretanto, se ele for semi-imputável, não haverá absolvição imprópria, e sim
condenação, com a aplicação de causa de diminuição de pena, conforme será visto no próximo
tópico.

A emoção e paixão excluem a culpabilidade?

Obs.: art. 28, I do CP prevê que a emoção e a paixão não excluem a imputabilidade penal.

Emoção é um estado súbito e passageiro. Paixão é um sentimento crônico e duradouro.

Emoção e paixão

Art. 28 - Não excluem a imputabilidade penal:

I - a emoção ou a paixão;
Direito Penal - Culpabilidade

Assim, o Código Penal prevê situações no art. 28 com o objetivo de evidenciar aquilo que já
é de todo lógico. Ou seja, ninguém poderá se beneficiar, e ser por isso considerado inimputável,
se praticou um crime motivado por sentimentos que integram a normalidade psíquica da
média dos indivíduos. Daí o Código Penal afirmar no art. 28, inciso I, que a emoção e a paixão não
excluem imputabilidade penal, porque tais sentimentos integram a normalidade psíquica da
população em geral.

Apesar de não excluir a imputabilidade penal, entretanto, a emoção pode ser uma atenuante
(art. 65, III do CP) ou privilégio (art. 121, § 1º, CP).

A paixão, dependendo do grau, pode ser equiparada a doença mental. É a paixão patológica.

7.1.2. SEMI-IMPUTABILIDADE (ART. 26, P. ÚNICO)

A semi-imputabilidade é causa de diminuição de pena, de um terço a dois terços, para


aquele que, “em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto
ou retardado, não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se
de acordo com esse entendimento”.

Logo, o agente pratica um fato típico, ilícito e culpável, mas sua culpabilidade é reduzida. Ele
23
será condenado, e não absolvido impropriamente, como ocorre com os inimputáveis.

A redução da pena deve ser orientada pela intensidade da perturbação mental ou pela
graduação do menor desenvolvimento mental do acusado.

O juiz poderá substituir a PPL por internação em hospital psiquiátrico ou tratamento


ambulatorial, nos termos do art. 97 do CP.

Se a pessoa foi submetida a Júri, deve haver quesito específico sobre a sua semi-
imputabilidade a ser votado pelo Conselho de Sentença.

7.1.3. OS SISTEMAS OU CRITÉRIOS DE AFERIÇÃO DA INIMPUTABILIDADE

Temos os seguintes critérios:

A. CRITÉRIO BIOLÓGICO

Leva-se em conta a causa e não o efeito da inimputabilidade. Condiciona a imputabilidade à


inexistência de um déficit biológico no agente, tal como uma doença mental, desenvolvimento mental
deficiente e transtornos psíquicos momentâneos. O importante é que, pelo critério biológico, a
inimputabilidade estaria vinculada, tão somente, à constatação do déficit biológico
Direito Penal - Culpabilidade

(desenvolvimento mental incompleto ou retardado) previsto em lei, sem que fosse necessário
saber se, juntamente com o déficit biológico, teria ou não o agente a capacidade de
compreender o ilícito do fato.

Basta, para a inimputabilidade, a presença de um problema mental, representado por uma


doença mental, ou então por desenvolvimento mental incompleto ou retardado. É irrelevante tenha
o sujeito se mostrado lúcido ao tempo da prática da infração penal para entender o caráter ilícito do
fato e determinar-se de acordo com esse entendimento. Esse sistema atribui demasiado valor ao
laudo pericial.

Repetindo: encontrando-se o agente numa das situações legais, é inimputável.

ESSA RETIRADA DA COMPREENSÃO DO ILÍCITO DO FATO, NESTE ÂMBITO DO


SISTEMA BIOLÓGICO, SERIA PRESUMIDA.

Não foi o sistema adotado pelo Código Penal, pelo menos em linhas gerais.

No Brasil, somente se aceita o critério biológico fundado na idade do autor no momento do


fato. É o critério adotado como exceção no Código Penal, já que somente se aplica quando
reconhecida a menoridade. Logo, em relação ao menor, basta constatar a idade. Não interessa saber 24
se tinha maturidade suficiente no momento da conduta.

B. CRITÉRIO PSICOLÓGICO

Era o sistema adotado pelo Código Criminal do Império Brasileiro de 1830. Pelo sistema
psicológico, a pessoa seria responsável e, portanto, imputável sempre que nela se constatasse
maturidade suficiente para compreender que a situação era contra a ordem jurídica e quais seriam
as consequências advindas da ação.

De acordo com o critério psicológico, a inimputabilidade é verificada no momento em que o


crime é cometido, sendo considerado inimputável aquele que age sem consciência, ou seja,
sem a representação exata da realidade. Considera apenas se o agente, ao tempo da conduta, tinha
capacidade de entendimento e autodeterminação, pouco importando eventual incapacidade mental.

Pelo sistema psicológico, então, seria necessário avaliar o grau de maturidade de cada
indivíduo para, diante de um crime praticado por este, saber se ele detinha ou não detinha
condições psicológicas para entender e querer o injusto como obra ilícita, independentemente
de qualquer dado biológico, ou seja, independentemente de saber se ele era ou não era portador de
Direito Penal - Culpabilidade

doença mental; independentemente de saber se ele tinha ou não tinha algum tipo de retardo, de
desenvolvimento mental incompleto. E independentemente da idade.

Para esse sistema, pouco importa se o indivíduo apresenta ou não alguma deficiência mental.
Será inimputável ao se mostrar incapacitado de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se
de acordo com esse entendimento. Seu inconveniente é abrir espaço para o desmedido arbítrio do
julgador.

Alguns países da common law até hoje utilizam esse critério para definir a imputabilidade. Por
isso que volta e meia se vê nos Estados Unidos adolescentes de 13 ou 14 anos sendo condenados
criminalmente por homicídio. Porque se verifica que, a despeito da pouca idade, no momento
em que praticaram a ação elas tinham plena consciência dos seus atos. Já tinham capacidade
de entender que aquele ato era um ato ilícito e, por isso, deveriam responder pelo mesmo, a despeito
de terem pouca idade e não serem portadores de doença mental de espécie alguma. Isso,
evidentemente, provém de um estudo detalhado, laudo pericial feito com todo cuidado para verificar
se a pessoa tinha ou não tinha condição para tanto.

Essa teoria não foi adotada no Brasil de forma pura.


25
C. CRITÉRIO BIOPSICOLÓGICO, HÍBRIDO OU MISTO

O terceiro sistema propugnado pela doutrina e eventualmente incorporado pela legislação


para definir quando uma pessoa é ou não responsável pelos atos é o sistema adotado pelo Código
Penal, chamado biopsicológico. O art. 26 deixa clara a adoção desse critério.

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Resulta da fusão dos dois anteriores: é inimputável quem, ao tempo da conduta, apresenta
um problema mental, e, em razão disso, não possui capacidade para entender o caráter ilícito do fato
e determinar-se de acordo com esse entendimento. Esse sistema conjuga as atuações do magistrado
e do perito

Segundo o sistema biopsicológico, a responsabilidade penal do indivíduo resultaria da soma


de dois fatores. O primeiro fator é a necessidade de se constatar em um indivíduo tido como
irresponsável, incapaz, inimputável, um déficit de caráter biológico. Sem ele, ninguém é inimputável.
No caso do art. 26, esse déficit de caráter biológico se caracteriza pela detecção de que esse
indivíduo é portador de uma doença mental ou de um desenvolvimento mental incompleto ou
retardado.
Direito Penal - Culpabilidade

Mas a deficiência biológica sozinha não é suficiente para definir a inimputabilidade, pois além
deste fator é preciso constatar um segundo, que é cumulativo e que resulta do primeiro: é o déficit
de caráter psicológico. Essa deficiência psicológica se explica pelo fato de o indivíduo irresponsável,
inimputável, não compreender que a conduta injusta praticada por ele era ilícita. A doença mental,
ou o desenvolvimento mental incompleto ou retardado, são tão intensos a ponto de terem retirado do
agente essa compreensão de que aquilo que ele fazia era contra a ordem jurídica. Ele não entendeu
o caráter ilícito do fato, ele não tem capacidade de internalizar isso.

Critério Desenvolvimento mental incompleto ou retardado


CRITÉRIO
biológico
BIOPSICOLÓGICO
Critério Inteira incapacidade de entender o caráter ilícito do fato e de
psicológico determinar-se de acordo com esse entendimento

Ou esse fator de deficiência psicológica se manifesta de uma outra forma, que são aquelas
formas em que ele até sabe. A doença mental, ou o desenvolvimento mental incompleto ou retardado,
não foram tão fortes a ponto de retirar dele a compreensão do ilícito. Ele compreende, mas não
consegue se determinar de acordo com esse entendimento. Ele internaliza que aquelas ações são
contra a ordem jurídica, mas não consegue que as suas ações, na prática, respeitem a essa
compreensão psíquica que têm.
26
Exemplo: sujeito acometido de cleptomania. Ele sabe que subtrair patrimônio alheio é contra
a ordem jurídica. Ele compreende o caráter ilícito da subtração. A despeito de tê-lo feito, não
consegue se controlar em razão dessa deficiência biológica. Essa deficiência biológica não lhe retira
o caráter de compreensão, mas sim o de se comportar de acordo com essa compreensão, ou seja,
retira-lhe sua determinação, sua vontade.

As deficiências biológicas mais graves são tão intensas a ponto de retirar o caráter de
compreensão do ilícito. Aquelas menos graves não retiram, mas podem afetar a capacidade
de autodeterminação. É necessário conjugar, para que alguém seja inimputável no sistema
biopsicológico adotado pelo Código Penal, essas duas deficiências. Tem que se constatar
que aquele sujeito é portador de uma doença diagnosticada (doença mental), ou portador de
um grau de desenvolvimento mental incompleto, ou retardado. E que tal doença mental, ou
tal desenvolvimento mental incompleto ou retardado, foi o fator que desaguou na afetação
psicológica.

Quando tal acontece, E QUANDO TUDO ISSO ACONTECE AO TEMPO DA AÇÃO OU DA


OMISSÃO, como disposto no art. 26 do Código Penal, é possível dizer que o agente não pode
responder por aquela ação que praticou sob tais circunstâncias. O comportamento dele não
pode ser censurado.
Direito Penal - Culpabilidade

Pode ser que o déficit de caráter biológico tenha se manifestado ao tempo da ação, ou da
omissão, mas não de forma a retirar completamente a capacidade de entender o ilícito e de
determinar-se de acordo com esse entendimento, caso em que a doença mental somente diminui o
grau de compreensão da ilicitude e o grau de autodeterminação.

É possível dizer ali que houve uma sugestão para que ele realizasse a ação. Mas não
se poderá dizer que a ação foi realizada em um cenário jurídico onde não restou pelo menos
um resquício de livre arbítrio. Nesses casos a solução proposta pelo Código Penal não é a de
responsabilidade penal plena, mas a de responsabilidade diluída, prevista no parágrafo único3
do art. 26, chamada de semi-imputabilidade.

Portanto, a inimputabilidade, caput do art. 26, se distingue da semi-imputabilidade,


parágrafo único do art. 26, em razão de uma supressão da capacidade psicológica de entender
o ilícito e de autodeterminar-se de acordo com esse entendimento. Quando há a supressão
dessa capacidade psicológica, há a inimputabilidade. Quando há a mera diminuição, há a
semi-imputabilidade.

A regra do Código Penal é que na inimputabilidade, art. 26, caput, não haja pena. Porque
pelo sistema que foi adotado pelo Código Penal, chamado de sistema vicariante, aplica-se pena ou 27
medida de segurança, não as duas juntas. Também foi uma inovação do Código Penal de 84,
porque o Código Penal de 40 previa um sistema diferente chamado de sistema do duplo
binário, segundo o qual a pessoa, por um mesmo ato, poderia receber pena e medida de segurança
conjuntamente.

Então a consequência advinda do reconhecimento de que uma pessoa que realizou o injusto
é inimputável, segundo o art. 26 do Código Penal, é de que ela não poderá ser apenada, porque não
é capaz de sofrer um juízo de censura, um juízo de reprovação. Falta-lhe culpabilidade, porque falta
imputabilidade. Consequência: ela vai receber uma medida de segurança prevista nos arts. 96, 97 e
98 do Código Penal.

Já a solução que o Código Penal propõe e prevê para os casos em que a pessoa, a
despeito de ser acometida de doença mental, tinha algum resquício de compreensão do ilícito
do fato praticado, e por isso é tida como semi-imputável, é de que ela seja censurada pela
ação. Ela será, portanto, apenada. Só que nesse caso a pena, obrigatoriamente, terá que ser
diminuída. O QUE É EVIDENTE, PORQUE A PENA DEVE GUARDAR UMA

3Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de
saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender
o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Direito Penal - Culpabilidade

PROPORCIONALIDADE COM O GRAU DE CULPABILIDADE. Se a imputabilidade é diminuída,


a culpabilidade também o é. E se a culpabilidade é diminuída, a pena também terá que ser.

Daí o art. 26, parágrafo único, prever uma diminuição de pena obrigatória para o semi-
imputável. Só que a título excepcional, nessas hipóteses de semi-imputabilidade, o Código Penal
admite que um Juiz identifique, em casos concretos, situações em que seja mais interessante à
sociedade tratar o semi-imputável do que o punir.

QUANDO O JUIZ FIZER ESSA PONDERAÇÃO, TERÁ QUE, PRIMEIRO, PROFERIR UMA
SENTENÇA CONDENATÓRIA, PORQUE A SENTENÇA ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA (que
absolve, mas aplica a medida de segurança) SÓ É CABÍVEL PARA O INIMPUTÁVEL.

Mas, para o semi-imputável, o Código Penal prevê que o Juiz prolate uma sentença
condenatória e aplique a pena diminuída, tal como previsto no art. 26, parágrafo único. E, depois de
tê-lo feito, substitua essa pena que ele já aplicou na própria sentença condenatória, por uma medida
de segurança. E isto é previsto no art. 98 do Código Penal. É a substituição da pena por uma
medida de segurança, para um caso de semi-imputabilidade.

Veja-se que, neste caso, a medida de segurança vem como medida substitutiva de pena. 28
Portanto ela vem no bojo de uma sentença condenatória. Ao contrário do que ocorre com o
inimputável, aonde a medida de segurança vem no bojo de uma sentença absolutória.

O Brasil adotou, como regra, a teoria biopsicológica, e como exceção, a teoria


biológica.

Causa de inimputabilidade Sistema adotado

Anomalia psíquica (art. 26) Biopsicológico


Menoridade (art. 27) Biológico
Embriaguez (art. 28, § 1º) Biopsicológico

Síntese: para que seja considerado inimputável não basta que o agente seja portador de
doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado. É necessário que, em
consequência desse estado, seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato (elemento
intelectivo) e de determinar-se de acordo com esse entendimento (elemento volitivo), numa relação
de causa e efeito.

7.2. POTENCIAL CONSCIÊNCIA SOBRE A ILICITUDE DO FATO


Direito Penal - Culpabilidade

A potencial consciência da ilicitude se manifesta pela possibilidade do agente, em função da


cultura, de questões morais, sociais e éticas, saber que aquilo que pratica é ilícito, contrário ao
ordenamento jurídico, ainda que não em sentido técnico, mas apenas intuitivo. Ele não precisa
conhecer a lei para tanto (não precisa pensar “será que minha conduta está tipificada no Código
Penal ou em leis extravagantes?”, não precisa nem mesmo saber que existe tipo penal e Código
Penal etc.), deve apenas fazer um juízo de valor e, por ele, saberá se sua conduta é ou não ilícita.

O conhecimento da ilicitude consiste na possibilidade de o agente conhecer o caráter ilícito


da sua ação. Não se exige que o sujeito conheça realmente a ilicitude da sua ação, BASTA A
POSSIBILIDADE DE CONHECER.

Daí usualmente a doutrina denominar tal elemento integrante da culpabilidade de potencial


conhecimento da ilicitude, pois não se exige um real conhecimento. Basta demonstrar que o sujeito
podia conhecer a ilicitude da conduta praticada, para que se possa afirmar que ele é dotado de
culpabilidade.

A primeira coisa a ser mencionada a respeito deste elemento é a necessária distinção


entre ele e a chamada ignorantia juris. Ou seja, DISTINGUIR ENTRE O CONHECIMENTO DA
ILICITUDE E O CONHECIMENTO DA LEI. A culpabilidade está a depender do conhecimento 29
potencial da ilicitude. Não depende, de maneira alguma, que o agente conheça a lei penal
definidora do caráter ilícito da conduta.

São várias as razões que levam a essa conclusão. A primeira e mais óbvia delas é que SE
A CULPABILIDADE DE ALGUÉM ESTIVESSE A DEPENDER DE QUE ESSA PESSOA, NO
MOMENTO EM QUE PRATICASSE O ATO, CONHECESSE A LEI QUE O INCRIMINASSE, SÓ
UMA REDUZIDA PARCELA DA POPULAÇÃO PODERIA SER RESPONSABILIZADA POR
CRIMES. O que, evidentemente, já faria cair por terra a pretensão de toda a norma, que é uma
pretensão de generalidade e de aplicar-se indistintamente a todos, de forma a reger a vida
comunitária.

Segundo: isto também acabaria por fazer com que praticamente só pessoas versadas em
Direito, ou pelo menos com algum conhecimento jurídico, pudessem ser responsabilizadas pela
maioria dos crimes. Daí o Código Penal afirmar que o fato de o sujeito desconhecer a lei, mas
conhecer, ainda que em nível potencial, a ilicitude, faz com que ele seja responsabilizado pelo crime.
E O MÁXIMO QUE SE PODE EXTRAIR DE TAL SITUAÇÃO É UMA DIMINUIÇÃO DA PENA,
PORQUE O DESCONHECIMENTO DA LEI, A CHAMADA IGNORANTIA JURIS, É UMA
CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE, À LUZ DO ART. 65 DO CÓDIGO PENAL. E TÃO SOMENTE
ATENUANTE.
Direito Penal - Culpabilidade

O que exclui a responsabilidade penal, o que exclui a culpabilidade, é a falta da


possibilidade de conhecer o ilícito. Como a pessoa conhece o caráter ilícito, sem conhecer a
lei? É fácil demonstrar isso. O processo de inserção de uma pessoa em uma sociedade não é
um processo instantâneo. Ele é um processo gradual de inserção aos valores que regem a
sociedade. Desde tenra idade vão sendo incutidos valores os quais o sujeito deve preservar
e respeitar45.

Os valores vão sendo inseridos por aquilo que a criminologia chama de INSTÂNCIAS
FORMAIS DE CONTROLE (escola, religião, família etc.). As instituições da sociedade vão se
incumbindo de inserir esses valores e preservá-los nos membros da sociedade. Pode ser que
depois, ao cabo do seu processo de educação, algumas dessas pessoas sigam o rumo
jurídico, outras não. Mas essas que não seguiram a carreira jurídica, não poderão alegar que
não sabiam que não poderiam violar o patrimônio alheio, ou violar a integridade física alheia,
e assim por diante.

E evidentemente, novos valores vão sendo integrados ao longo desses processos, ao longo
do avanço das sociedades. Por exemplo, atualmente, vários valores já são parte desse processo de
integração que há alguns anos atrás não eram, notadamente a importância de se preservar o meio 30

4 A ilicitude é um juízo de valor negativo sobre a conduta, que a qualifica como contrária ao Direito. A
consciência da ilicitude será sempre presente quando o indivíduo conseguir valorar negativamente sua
conduta, isto é, puder representá-la como injusta, má, proibida, em consideração a todos os valores de conduta
humana existentes na sociedade (moral, religião etc.). A isso Mezger dá o nome de valoração paralela na
esfera do profano. A consciência da ilicitude pode ser atual ou potencial; a atual é a que se faz presente na
mente do sujeito no curso intelectivo de sua conduta; a potencial é a que não se faz presente, mas é exigível
do agente em face de um juízo de comparação com uma pessoa normal.
5 Ainda sobre a valoração paralela na esfera do profano: na esfera penal, é inviável supor que o indivíduo

detenha conhecimento especializado ou jurídico. Obviamente, em relação à culpabilidade, no que se refere ao


potencial conhecimento da ilicitude, não se pode exigir o que é inalcançável pelo homem médio, sendo esse o
critério mais difundido para a pesquisa do real sentido do potencial conhecimento da ilicitude. Contudo, como
bem coloca Zaffaroni “não se pode exigir de o mesmo grau de compreensão da antijuridicidade. Há casos em
que a exigência é maior do que em outros. Isto depende do esforço que o sujeito devesse fazer para
compreender- internalizar- a norma. Circunstâncias pessoais e sociais, ou mesmo uma combinação de ambas,
nos revelarão o grau de esforço do sujeito, que estará sempre em relação inversa com a reprovabilidade:
quanto maior for o esforço que o sujeito deva fazer para internalizar a norma, menor será a reprovabilidade da
conduta”... E continua o referido doutrinador: ”A doutrina é unânime na afirmação de que não se requer um
conhecimento ou possibilidade de conhecimento da lei em si, o que não ocorre de forma efetiva nem mesmo
entre os juristas. O que se requer é a possibilidade do conhecimento, denominada valoração paralela na esfera
do profano, que é a possibilidade de conhecimento análogo ao efetivamente requerido a respeito dos
elementos normativos do tipo” (Manual de Direito Penal Brasileiro, 4ed, p.620-622). Segundo Mezger, chega-
se ao conceito de consciência de antijuridicidade através de uma valoração paralela na esfera do profano. Para
o penalista alemão, o profano é o extrajurídico, dessarte se o agente conseguir, v.g., através de normas
sociais, morais, religiosas, apreender o desvalor de sua conduta, ele terá a consciência da antijuricidade
(BRANDÃO, Cláudio. Introdução ao direito penal: análise do sistema penal à luz do princípio da legalidade,
2005, p. 147-149)
Direito Penal - Culpabilidade

ambiente, o patrimônio cultural etc. A sociedade foi evoluindo e, com essa evolução, novos valores
vão sendo integrados a esse rol de direitos mínimos.

Logo, esses que não seguiram a carreira jurídica provavelmente não conhecem os meandros
da lei penal e os detalhes do tipo de furto, do tipo de roubo, do tipo de estelionato, e assim por diante.
Mas certamente conhecem a ilicitude desses atos, sabem que é errado, e é isso que basta. Portanto,
o desconhecimento da Lei não isenta ninguém de pena. E é essa frase emblemática que abre
o art. 21, que trata do erro de proibição, consequência advinda da falta de conhecimento da
ilicitude.

Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se


inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.

É bem verdade que, a despeito dessa frase emblemática do art. 21, em algumas situações
excepcionais, a doutrina vem hodiernamente questionando seu caráter absoluto, de que o
desconhecimento da lei nunca se pode escusar.

De fato, quanto aos bens jurídicos que compõem o núcleo essencial do Direito Penal é
fácil dizer que o conhecimento da ilicitude independe do sujeito conhecer a lei. Basta, para
evidenciar esse conhecimento da ilicitude, demonstrar que o sujeito é integrado à sociedade, 31
não foi educado na selva.

Ao se conseguir demonstrar que o sujeito é integrado à sociedade já está por si só


demonstrado que ele recebeu as mensagens das instâncias formais de controle, que tinha que
respeitar esses valores essenciais. E na época em que essa distinção surgiu, os técnicos de Direito
Penal, basicamente, se limitavam a respeitar esses valores. Os tipos penais eram tipos penais que
integravam aquele Direito Penal que hoje se diz primário, tradicional.

MAS HOJE HÁ O DIREITO PENAL DITO SECUNDÁRIO, QUE É O QUE SE OCUPA DA


TUTELA DE VALORES INDIVISÍVEIS, DE BENS SUPRAINDIVIDUAS, DE DIFÍCIL
COMPREENSÃO PARA A MÉDIA DA SOCIEDADE. E nem todos esses bens, ou necessidade de
respeitá-los, já foram incorporados aos valores ensinados pelas instâncias de controle formais. Ou
seja, essas instâncias formais de controle, as quais se incumbem de transmitir a necessidade de
preservação desses bens, evidentemente tem um atraso entre o advento de uma Lei penal que tutela
esse bem e a difusão da necessidade de respeitá-lo.

Isso acaba fazendo com que seja possível vislumbrar casos em que, a despeito da lei penal
existir, a necessidade de respeitar o valor por ela tutelado só surja com o conhecimento da lei. Por
exemplo: o que dizer de uma pessoa com pouquíssimo grau de instrução, que não sabe ler, quando
Direito Penal - Culpabilidade

chamada a responder pelo crime de estocar carvão mineral que consegue obter nas cercanias do
local, sem autorização da autoridade competente?

Isso é um crime ambiental, definido na Lei nº 9.605/98: armazenar carvão mineral, sem
autorização da autoridade competente. Será que pelo simples fato de o agente integrar aquela
sociedade faz com que seja possível afirmar que ele conhece o ilícito? Ou será que o conhecimento
do ilícito estaria a depender do fato de ele conhecer a lei ambiental?

Daí porque alguns autores, entre os quais Juarez Cirino, aqui no Brasil, ao analisar
essa frase emblemática que inaugura o art. 21, dizem que ela há de ser interpretada à luz do
Princípio da Culpabilidade. Pois, do contrário, seria o Princípio da Culpabilidade se
adequando à lei, quando o correto seria a lei se adequar ao Princípio da Culpabilidade.

Tudo isso para tratar desses casos em que, pelas razões apontadas, não é possível
divisar com clareza tão absoluta a diferença entre o conhecimento da ilicitude e o
conhecimento da Lei, o que só aconteceria em casos excepcionalíssimos.

A exclusão do conhecimento da ilicitude resulta no erro de proibição, o qual pode


isentar de pena, para o caso de ser invencível, ou seja, insuperável, não resultante de 32
6
negligência de avaliação, ou pode diminuir a pena, no caso de ser vencível , quando fosse
dado ao agente adentrar ao conhecimento da ilicitude, superar esse desconhecimento, se
tivesse adotado as cautelas mínimas para o caso.

Esse erro de proibição que resulta na exclusão da culpabilidade pode ser compreendido sob
duas formas diferentes, a depender da corrente que se adote:

a) Corrente majoritária: entende que a exclusão da culpabilidade, pelo erro de proibição, só


se dá quando o sujeito desconhece a antijuridicidade material7 da sua ação, isto é, não sabe que
aquilo que fez, à época, era contrário à ordem jurídica de uma maneira geral.

b) Corrente minoritária: já uma segunda corrente entende que a caracterização da aprovação


jurídico penal do fato, depende não somente do conhecimento da antijuridicidade material dele, mas
também do conhecimento a respeito da ameaça penal da realização do fato8.

6 Erro vencível também é chamado de erro culposo.


7 Antijuridicidade material é a questão da contrariedade a valores; antijuridicidade formal possui caráter técnico,
expresso nos tipos penais.
8 Ou seja, o sujeito tem que saber que sua conduta dotada de desvalor é passível de punição, que pode dela

advir uma consequência, independentemente de conhecer o tipo penal ou/e a pena cominada.
Direito Penal - Culpabilidade

Essa segunda tese, então, sustenta que a desaprovação penal de uma conduta depende de
duas situações, quais sejam: o fato de o agente conhecer que essa conduta era contrária a ordem
jurídica e saber que, por ser contrária a ordem jurídica, ao praticá-la, estaria sujeito a uma pena.

 Qual é a diferença prática entre uma e outra corrente?

A concepção, visão do conhecimento da ilicitude, e da exclusão da culpabilidade por


falta dele. A primeira corrente tradicional, por dizer que a desaprovação penal do fato
independe de o agente saber que há uma ameaça de pena se praticá-lo, depende tão somente
de ele saber que a conduta que praticou era contrária a ordem jurídica, independente dele
saber se estava ou não sujeito a uma pena.

Para essa primeira corrente, então, por dispensar o conhecimento da ameaça penal, qual
será o tratamento jurídico, por exemplo, decorrente do fato de o agente praticar uma ação sob o
manto de uma escusa absolutória? A escusa absolutória interfere em quê? Culpabilidade?

Por exemplo, o filho que subtrai, sem violência e grave ameaça, o patrimônio do pai, responde
por furto? Não. Por quê? Porque existe um dispositivo no Código Penal, o qual diz que, nos crimes
praticados sem violência e grave ameaça, o filho não responde por violar o patrimônio do pai, e vice-
33
versa.

Pergunta-se: tal acontece porque o filho não dispõe de culpabilidade? Não. A escusa
absolutória não interfere na existência da culpabilidade, ela interfere na existência da
punibilidade. Culpabilidade há, o que não há é ameaça de pena. Por quê? Porque a Lei penal,
dentro de um critério de escolha política, entendeu que não era conveniente impor pena em
tais circunstâncias, que deverão ser resolvidas no âmbito da família.

Para a primeira corrente, os casos em que o sujeito desconhece a existência de ameaça


penal à sua conduta são casos que deverão ser resolvidos fora do erro de proibição, seguindo regras
próprias, se o legislador as previr, como é o caso do exemplo anterior. O legislador previu. E se não
tivesse previsto? Se não tivesse previsto, ele iria responder por crime normalmente, ainda que
pensasse “Ah, mas é patrimônio do meu pai. Então pensei que estava autorizado a fazê-lo”. Se a lei
penal não dispôs nesse sentido, essa suposição dele não o lavaria a benefício algum, não poderia
ser tratada como erro de proibição para a primeira tese.

Já para a segunda tese, que é defendida por Gunther Jakobs e Enrique Bacigalupo, o
tema do erro de proibição abarcaria situações em que o sujeito erre sobre o caráter ilícito da
conduta praticada, supondo-a lícita, e também quando o sujeito desconhecesse a existência
de ameaça de pena. Ou seja, erro sobre a punibilidade, segundo eles, também deveria ser
Direito Penal - Culpabilidade

tratado à luz do erro de proibição. Trata-se de uma tese minoritária, que não tem de ser
seguida em concurso.

Dúvida sobre a desaprovação jurídico penal da conduta:

Essa dúvida do agente pode recair sobre a própria consciência dos fatos, da situação de fato
praticada. Por exemplo: o agente não sabe se determinado telefone é dele, mas, mesmo assim, o
leva para casa, por se parecer muito com o dele. A dúvida se resolve à luz da consideração da
existência de um dolo eventual ou não.

Não é disso que se trata aqui. Estamos a tratar da dúvida sobre o próprio caráter ilícito da
ação. E aí duas correntes vão se instaurar quando a dúvida recai sobre a consciência da
antijuridicidade da ação. Isto é, o sujeito pratica uma ação tendo dúvida sobre ser ela lícita, ou não.

Exemplo: O sujeito está a preencher a sua declaração do imposto de renda. Recorda-se de


uma verba que recebeu ao longo daquele exercício financeiro, e tem dúvida se aquela verba é ou
não é uma verba sob a qual incide a tributação. Deixa de inseri-la como rendimento tributável.

Chamado a responder pelo crime de sonegação fiscal, diz que tinha essa dúvida. “Olha
realmente eu fiquei na dúvida aqui, mas entendi que não fosse o caso de declarar”. Se ele 34
fosse tão sincero a ponto de falar, tal como aconteceu a situação, seria o caso de se
reconhecer em seu favor o erro de proibição?

A corrente tradicional afirma que não, porque a dúvida sobre o caráter ilícito da ação
deve ser dissipada pelo agente com base em dever que toda a pessoa que vive em sociedade
tem, que é o DEVER DE INFORMAR-SE

Quando o agente não procurou dissipar suas dúvidas, atuou sob o que Mezger chamava de
cegueira jurídica. Ou seja, talvez, no momento da ação, o agente até não soubesse, mas podia saber.
A possibilidade de conhecer o ilícito se fez presente, e é isso que basta. O DEVER DE
INFORMAÇÃO É O QUE ESTÁ POR TRÁS DO RECONHECIMENTO DO CARÁTER MERAMENTE
POTENCIAL DA ILICITUDE. ESSA É A TESE AMPLAMENTE DOMINANTE PARA TAIS
SITUAÇÕES.

Para essa mesma situação, ou seja, casos em que o agente pratica uma conduta ilícita, mas,
no momento em que o fez, tinha dúvida séria sobre a ilicitude, há uma segunda tese, que é a tese
capitaneada por Jakobs, que sustenta que, nesses casos, o correto seria reconhecer o erro de
proibição vencível. Ou seja, aplicar a pena, mas diminuída. Não adotar para fins de concurso.
Direito Penal - Culpabilidade

7.2.1. O ERRO DE PROIBIÇÃO

Erro de proibição não se confunde com erro de tipo. O erro de tipo ocorre quanto a alguma
circunstância fática. Os erros de proibição estão ligados ao direito, ao conhecimento ou não da
realidade do que pratica o agente, determinado por algum engano justificável que recai sobre o juízo
pessoal de licitude ou ilicitude do fato. O agente atua conscientemente, sem errar sobre as
circunstâncias fáticas que o cercam, apesar de as avaliar mal, de supor ter, perante o caso,
um direito que na verdade inexiste.

Cezar Roberto Bitencourt leciona que o erro de proibição “é o que incide sobre a ilicitude
de um comportamento. O agente supõe, por erro, ser lícita a sua conduta. O objeto do erro
não é, pois, nem a lei, nem o fato, mas a ilicitude, isto é, a contrariedade do fato em relação à
lei.”

O agente não pensa errado avaliando o direito aplicável à espécie, mas erra na avaliação do
desvalor de sua conduta, desvalor esse advindo das instâncias formais de controle social. Ele
entende bem o fato que pratica, mas o pratica com a tranquila consciência de que atua
desprovido de ilicitude material.
35
Erro de proibição é hipótese que exclui a culpabilidade do agente, por interferir diretamente
no elemento da culpabilidade “potencial consciência da ilicitude”. Porém, essa exclusão somente
ocorrerá se o erro for invencível ou escusável. Se vencível (ou culposo), ou seja, se o agente tivesse
agido com um pouco mais de cuidado, considera-se uma causa de diminuição de pena.

Existem três espécies de erro de proibição:

a) Erro de proibição direto (art. 21): ocorre quando o erro do agente recai sobre o conteúdo
proibitivo de uma norma penal, não acreditando o agente que face ao conteúdo, significado ou
amplitude da norma, realiza uma conduta proibida. O sujeito não sabe que a conduta que praticou
era típica. O erro recai sobre a própria tipicidade da ação ou omissão praticada. No momento
em que agiu, ele desconhecia o caráter típico, isto é, a proibição em si. É muito improvável
que surja, na prática jurídica, o reconhecimento desta espécie de erro de proibição (direto),
em algum crime previsto no Código Penal, visto que ao Código foram reservados os crimes
mais cotidianos, cujo desvalor são ensinados no dia a dia da sociedade. Exemplo de erro de
proibição seria o do estrangeiro que tenta sair do Brasil portando vinte mil dólares em uma pochete,
sem regular declaração. Trata-se de crime contra o SFN (evasão de divisas) no Brasil. Porém, no
país dele pode não ser, seja porque o valor era baixo, seja porque não há proibição de deixar o país
Direito Penal - Culpabilidade

levando dinheiro. Assim, nenhum erro houve na situação fática, ele sabia exatamente o que estava
fazendo, mas não conhecia a proibição jurídica interna.

b) Erro de proibição indireto ou erro de permissão ou excesso exculpante (art. 21): aqui há
uma suposição equivocada da existência de uma causa de justificação, ou seja, de exclusão da
ilicitude, que o ordenamento não prevê ou que até prevê, mas em limites mais restritos do que o que
era imaginado pelo agente. É exemplo de erro de proibição o agente que está sendo roubado e, no
exercício da legítima defesa, reage e espanca o roubador até a beira da morte, por acreditar que
está agindo legitimamente, amparado pelo direito. Outro exemplo seria de um professor de uma
tradicional cidade interiorana que, supondo estar no exercício regular de direito, usa moderadamente
palmatória para disciplinar seus alunos.

c) Erro mandamental (art. 21): é o erro que recai sobre mandamentos contidos nos crimes
omissivos, sejam eles próprios ou impróprios. Ocorre, v.g., quando uma pessoa vê outra se
afogando, mas não faz nada por acreditar que não estava obrigada a tal (erro sobre a condição de
garante); ou quando o médico deixa de atender paciente em seu intervalo por achar que não tem o
dever jurídico para tal.

O erro de proibição excluirá a culpabilidade se for inevitável ou escusável, em que o 36


agente não tinha como conhecer a ilicitude do fato, em face do caso concreto. No entanto, se
for evitável ou inescusável, aquele em que o agente desconhece o fato ilícito, embora com
condições de saber que contrariava o ordenamento jurídico, poderá diminuir a pena de um
sexto a um terço (art. 21) (porque a culpabilidade será menor).

7.2.2. ERRO DE VIGÊNCIA, ERRO DE EFICÁCIA E ERRO DE PUNIBILIDADE

a) Erro de vigência: caracteriza-se pelo desconhecimento, por parte do autor do fato, de que
uma determinada norma jurídica já está em vigor no ordenamento jurídico. A avaliação que o autor
do fato desenvolve não considera a vigência da norma na ordem jurídica e, por isso, não percebe a
ilicitude de seu comportamento. É considerado erro de vigência por incidir sobre normas permissivas,
proibitivas ou mandamentais. Em alguns casos, o erro de vigência pode ser irrelevante, como no
caso em que o fato já era considerado ilícito, sendo que a nova norma apenas agrava a pena.
Evidentemente que ele responderá de acordo com a norma vigente à época do fato, se mais benéfica.

Erro de vigência é espécie de erro de proibição, já que o agente erra quanto ao direito,
acreditando piamente que a lei penal incriminadora não está em vigor.
Direito Penal - Culpabilidade

b) Erro de eficácia: verifica-se quando o autor do fato acredita que determinada norma jurídica
não está mais produzindo efeitos, por ter perdido eficácia pela entrada em vigor de outra norma de
categoria superior ou de uma disposição constitucional. Também é espécie de erro de proibição,
visto que o erro recai sobre situações jurídicas, sobre a existência de normas proibitivas;

c) Erro de punibilidade: o autor do fato percebe que sua conduta é ilícita, mas acredita não
haver previsão legal para a aplicação da pena criminal para o caso. Essa modalidade de erro
somente tem aplicação para as normas proibitivas e constitui sempre hipótese de erro inescusável
que autoriza a aplicação da pena reduzida. É exemplo de erro de punibilidade o indivíduo acreditar
que a violação de direito autoral materializada em cópia de programa de computador seja ilícito que
repercute efeitos apenas no âmbito do Direito Civil, sem considerar a previsão criminalizadora do art.
12 da Lei nº 9.609/98.

7.3. EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA

A exigibilidade de conduta diversa é, ao lado da imputabilidade e do potencial conhecimento


da ilicitude do fato, um dos elementos do juízo de reprovação a que se denomina culpabilidade.
Diante de circunstâncias fáticas normais, a conduta do agente torna-se reprovável quando o mesmo
poderia agir de forma diversa, mas não o faz. Todavia, quando as circunstâncias fáticas atingem
37
certo grau de anormalidade, a ser verificado em cada caso concreto, pode-se chegar à conclusão de
que ao sujeito não restara outra opção senão optar pelo comportamento adotado. Nesses casos,
deixa-se de reprová-lo, diante da anormalidade dos fatos, dizendo-se que lhe era inexigível conduta
diversa. A inexigibilidade de conduta diversa, pois, é uma excludente da culpabilidade.

Também chamado de “exigibilidade de conduta conforme a lei” ou “poder de atuar de outro


modo”, é o elemento material da culpabilidade. Na verdade, ele resume o que é a culpabilidade,
sobre o que a culpabilidade se fundamenta. A conduta de alguém que pratica um injusto penal (fato
típico e ilícito) pode ser reprovada pela ordem jurídica somente quando se consiga caracterizar que
o autor da ação poderia ter respeitado a lei, sem sacrifícios exagerados.

Só se pode reprovar o comportamento contrário à norma que tenha sido praticado sob
condições fáticas nas quais se poderia exigir da pessoa que respeitasse a lei. Uma das
condições para que se possa punir alguém é que esse alguém desrespeite a lei. Ao trilhar esse
caminho, surge a possibilidade de reprovação, de recriminação. E, consequentemente, de imposição
da pena.

A reprovação jurídico-penal da conduta, portanto, depende DE SE CONSEGUIR


DEMONSTRAR QUE A ALTERNATIVA DO RESPEITO À LEI ERA UMA ALTERNATIVA
Direito Penal - Culpabilidade

POSSÍVEL DE SER SEGUIDA PELO AGENTE que, ao não optar por tal alternativa, tem que ser
punido. Logo, a própria ideia de reprovabilidade da conduta, a própria ideia de culpabilidade surge
dessa opção em não respeitar a lei penal.

Essa opção depende da análise das circunstâncias fáticas em que o agente realizou a
conduta ilícita.

Por exemplo, seria impensável supor que o Direito pudesse reprovar o comportamento de um
mendigo que vive na rua e, nesta condição, faz as suas necessidades em locais públicos. Chamado
a responder pelo fato de praticar um ato obsceno em local público, alega: mas esse local público é o
local onde eu vivo. Não se nega o caráter ilícito, inconveniente e desagradável do fato em si. Agora,
será que na condição em que ele se encontrava a alternativa de seguir a Lei era uma alternativa
viável?

É impossível dizer que haja uma situação sem alternativa. Alternativa sempre existirá. São
comuns algumas decisões negando inexigibilidade de conduta diversa, com o argumento de que
existia alternativa ao agente. A questão é: a alternativa que existia, que implicava no cumprimento
da lei, era viável? Ou só um louco, suicida ou um herói iriam trilhá-la? Se a resposta for: não, só uma
pessoa excepcional, para o bem ou para o mal, iria trilhar essa opção que era de respeito à lei, então 38
o caso é de inexigibilidade de conduta diversa.

7.3.1. HIPÓTESES LEGAIS DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE POR INEXIGIBILIDADE DE


CONDUTA DIVERSA (ART. 22, CP)

No caso brasileiro, a Lei penal prevê duas hipóteses de exclusão legal da culpabilidade por
falta de exigibilidade de conduta diversa, que é o art. 22 do Código Penal, o qual prevê a coação
moral irresistível, e a obediência hierárquica.

Art. 22 - Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não
manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.

A coação moral irresistível, evidentemente, não se confunde com a vis absoluta, que é a
coação física irresistível, causa esta excludente de conduta.

a) Coação moral irresistível (vis compulsiva): a coação moral irresistível é aquela de que o
coacto não pode subtrair-se, restando apenas sucumbir ante o decreto (ameaça) ilegal. Nesse caso,
o mal prometido pode se dirigir ao próprio coagido ou a terceira pessoa ligada a ele. Assim, a coação
tem de ser moral + irresistível. O caso concreto dirá. Caso a coação moral seja resistível, pode-se
atenuar a pena (art. 65, III, c do CP).
Direito Penal - Culpabilidade

Exemplo: um gerente de um banco tem a sua família mantida refém em sua casa e, sob tal
condição, é obrigado a se dirigir ao banco, antes da sua abertura, e de lá retirar valores e entregar
aos meliantes que estão em sua casa. Chamado a responder por essa subtração, não seria
adequado, uma vez comprovada a situação de fato, impor a ele uma pena, visto que sua conduta
não foi reprovável. Do contrário, se estaria considerando que o correto seria ele submeter a risco de
vida sua família, e respeitar o Código Penal que dispõe sobre o crime patrimonial. Será que seria
uma opção viável para a normalidade das pessoas que, nessas condições, expusesse a risco de
vida seus familiares, em prol do respeito ao Direito Penal? Evidentemente que não.

Sobre a coação moral irresistível, entendeu o STJ recentemente:

RECURSO ESPECIAL. PENAL. ART. 14, CAPUT, DA LEI 10.826/2003. VIGIA. PORTE
ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO EM VIA PÚBLICA. DETERMINAÇÃO
PELO EMPREGADOR. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA POR COAÇÃO
MORAL IRRESISTÍVEL. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE NÃO CARACTERIZADA.
RELAÇÃO DE SUBORDINAÇÃO RESTRITA AO LOCAL E HORÁRIO DE TRABALHO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica em classificar o crime do art. 14 da Lei
10.826/2003 como de mera conduta e de perigo abstrato. Para realizá-lo, então, basta
incorrer dolosamente na ação proibida, ou melhor, praticar os verbos que constituem o
núcleo do tipo somados ao respectivo elemento normativo. Precedentes.
2. O recorrido foi preso em flagrante enquanto portava ilegalmente arma de fogo de
uso permitido, municiada, em via pública, no percurso entre o trabalho de "vigia" e
sua residência, após o término do expediente laboral.
39
3. No caso, não parece aceitável admitir que o recorrido estivesse sob influência de
coação moral irresistível, até porque, quando praticou a conduta proibida, estava fora
do horário e de seu ambiente de trabalho, livre, portanto, da relação de subordinação
que o obrigava a portar arma de fogo de modo ilegal, conforme conclusão do Tribunal
a quo. Sob esse prisma, não há porque supor a indução do comportamento delitivo
por força externa determinante, infligida pelo empregador do recorrido. A verdade é
que não há espaço para aplicação da regra disposta no art. 22 do CP.
4. A relação de subordinação, como elemento do contrato de trabalho, não justifica
comportamento contrário ao Direito fora dos limites do contexto laboral.
5. A inexigibilidade de conduta diversa somente funciona como causa de exclusão
da culpabilidade quando proceder de forma contrária à lei se mostrar como única
alternativa possível diante de determinada situação.
6. Ademais, não é possível confundir "a atividade exercida pelo réu (vigia) com a de um
vigilante (profissional contratado por estabelecimentos financeiros ou por empresa
especializada em prestação de serviços de vigilância e transporte de valores), cuja
categoria é regulamentada pela Lei nº 7.102/83, ao qual é assegurado o direito de portar
armas de fogo, quando em efetivo exercício da profissão" (REsp 1221960/SP, Rel. Ministro
OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 22/02/2011, DJe 09/03/2011).
7. Recurso especial provido para restabelecer a sentença penal condenatória.
(REsp 1456633/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA,
julgado em 05/04/2016, DJe 13/04/2016)

b) Estrito cumprimento de ordem de superior hierárquico não manifestamente ilegal: nesse


caso, exige-se que o superior hierárquico seja competente, não podendo a excludente ser invocada
se não o for. Ordem de superior hierárquico é a manifestação de vontade do titular de uma
FUNÇÃO PÚBLICA a um funcionário que lhe é subordinado, seja essa função civil ou militar,
Direito Penal - Culpabilidade

no sentido de que realize uma conduta. Não abrange a superioridade hierárquica familiar, privada ou
eclesiástica, as quais muitas vezes serão causas de exclusão da culpabilidade em função de coação
moral irresistível. Entretanto, a própria lei penal prevê, ao dispor sobre essa exclusão de
culpabilidade, que ordens manifestamente ilegais não podem ser cumpridas. Quando o
superior hierárquico, seja ele no campo civil, seja ele no campo militar, der ao seu subordinado uma
ordem que claramente se revela contrária à lei penal, é dado como obrigado ao subordinado recusar
o seu cumprimento. E, se não o fizer, será coautor do crime, ainda que nessa condição também
venha a ter sua pena diminuída por força do mesmo art. 65, inciso III, alínea c, que prevê, em
tais hipóteses, uma circunstância atenuante genérica.

Sinteticamente, são requisitos para o reconhecimento do estrito cumprimento de dever legal:

a) Que a ordem não seja manifestamente ilegal, isto é, que não seja claramente contrária ao
direito;

b) Oriunda de superior hierárquico em exercício de função pública, civil ou militar;

c) Que o cumpridor da ordem se atenha aos limites da ordem.

7.3.2. ADENDOS SOBRE A EXIGIBILIDADE DA CONDUTA DIVERSA


40

Qual a consequência de se reconhecer uma coação irresistível?

Só é punível o autor da coação (autor mediato).

Ex.: A coagiu de forma irresistível B a matar C. B irá alegar coação moral irresistível. A vai
responder pelo crime cometido por B na condição de autor mediato. Responderá apenas por
homicídio? Não! Será homicídio mais tortura: art. 1º, I, 'b', da Lei de Tortura (Lei 9.455/97). Concurso
material (primeiro a tortura - se ele matar mesmo, homicídio). A será autor imediato da tortura e autor
mediato do homicídio.

Existe coação moral irresistível da sociedade?

A sociedade não pode delinquir, pois onde ela existe, aí está também o direito. Assim, a
coação irresistível há que partir de uma pessoa ou de um grupo, nunca da sociedade.

Qual a consequência de se reconhecer que o agente praticou o fato por obediência


hierárquica?

Somente é punível o autor da ordem.


Direito Penal - Culpabilidade

O que acontece na hipótese de a ordem ser claramente ilegal?

Os dois respondem pelo crime, mas o subordinado tem direito a uma atenuante de
pena, já que cumpria uma ordem

O que acontece na hipótese de a ordem ser legal?

Estrito cumprimento de dever legal. Ninguém responde pelo crime.

O que acontece na hipótese de a ordem não ser manifestamente ilegal?

O superior irá responder pelo crime e o subordinado não é culpável.

É a defesa do massacre do Carandiru.

8. EXISTÊNCIA DE CAUSAS SUPRALEGAIS DE EXCLUSÃO DA


CULPABILIDADE

Existem causas supralegais de exclusão da culpabilidade? E se existem, elas se estabelecem


com base na falta de qual dos seus elementos?
41
Primeiramente, vamos responder a segunda parte: seria possível reconhecer uma causa
supralegal de exclusão da imputabilidade? Alguém poderia ser dado como inimputável fora dos casos
previstos em lei? Não, pois cabe ao legislador dispor sobre a imputabilidade penal, dentro do
exercício da sua legítima vontade política.

LOGO, NÃO É DADO AO JUIZ CONSIDERAR OUTROS CASOS DE INIMPUTABILIDADE


QUE NÃO SE ENQUADRAM NOS CASOS PREVISTOS EM LEI. Não há causa supralegal de
exclusão da culpabilidade que se estabeleça sobre a imputabilidade.

De igual maneira, não será dado ao Juiz, reconhecer erro de proibição fora dos casos
em que a lei prevê. O erro de proibição depende do enquadramento jurídico penal do fato, à luz de
uma norma legal.

DOS TRÊS ELEMENTOS DE CULPABILIDADE, O ÚNICO QUE ADMITE A SUA


EXCLUSÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI É A EXIGIBILIDADE DE ATUAÇÃO
CONFORME AO DIREITO, por razões óbvias. Dos três elementos, ele é o único de caráter material.
Logo, a fundamentação de todos os casos de exculpação supralegal sempre se dá com base na
impossibilidade de atuação conforme a lei, conforme ao direito.
Direito Penal - Culpabilidade

Sempre que o respeito à norma penal for uma opção inviável ao cidadão comum, a
despeito de não existir uma exculpante específica no ordenamento jurídico penal, será
possível ao Judiciário reconhecer a falta de culpabilidade. Sempre que a situação fática em
que praticada a ação típica retirar do cidadão a possibilidade de escolha, dentro de parâmetros
razoáveis, o Judiciário deve reconhecer a exculpação.

O próprio STJ e o STF entendem que existem outras causas de exclusão de


culpabilidade além das expressamente previstas, argumentando que A EXIGIBILIDADE DE
CONDUTA DIVERSA É UM VERDADEIRO PRINCÍPIO GERAL DA CULPABILIDADE. Inclusive,
contrariaria frontalmente o pensamento finalista a punição do inevitável.

Nesse sentido age em relação aos crimes financeiros:

Ementa: PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO


INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA (ART. 168, § 1º, I, DO CP). ELEMENTO SUBJETIVO DO
TIPO. DOLO ESPECÍFICO. NÃO EXIGÊNCIA. PRECÁRIA CONDIÇÃO FINANCEIRA DA
EMPRESA. NÃO COMPROVAÇÃO. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE.
INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. INAPLICABILIDADE. ORDEM DENEGADA.

1. O crime de apropriação indébita previdenciária exige apenas “a demonstração do dolo


genérico, sendo dispensável um especial fim de agir, conhecido como animus rem sibi
habendi (a intenção de ter a coisa para si). Assim como ocorre quanto ao delito de 42
apropriação indébita previdenciária, o elemento subjetivo animador da conduta típica do
crime de sonegação de contribuição previdenciária é o dolo genérico, consistente na
intenção de concretizar a evasão tributária” (AP 516, Plenário, Relator o Ministro Ayres
Britto, DJe de 20.09.11).

2. A inexigibilidade de conduta diversa consistente na precária condição financeira


da empresa, quando extrema ao ponto de não restar alternativa socialmente menos
danosa do que o não recolhimento das contribuições previdenciárias, pode ser
admitida como causa supralegal de exclusão da culpabilidade do agente. Precedente:
AP 516, Plenário, Relator o Ministro Ayres Britto, DJe de 20.09.11.

3. Deveras, a análise da precariedade, ou não, da condição econômica da empresa


demanda o revolvimento do conjunto fático probatório, inviável na via do habeas corpus.
Destarte a ausência de comprovação nas instâncias ordinárias das dificuldades econômicas
enfrentadas pela empresa impede a exclusão da culpabilidade do agente em razão da
aplicação do instituto da inexigibilidade de conduta diversa. Precedentes: HC 98.272,
Segunda Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJe de 16.10.09; RHC 86.072, Primeira
Turma, Relator o Ministro Eros Grau, DJ de 28.10.05)

4. In casu, o paciente deixou de repassar à Previdência Social as contribuições descontadas


de seus empregados no período compreendido entre março de 1999 e janeiro de 2000.
Destarte, foi condenado a 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime aberto, e
ao pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, pela prática do crime previsto no artigo 168-A,
§ 1º, inciso I, do Código Penal (apropriação indébita previdenciária) e a pena privativa de
liberdade foi substituída por duas reprimendas restritivas de direito.

5. A defesa, ao não comprovar que empresa administrada pelo paciente passava por
dificuldades financeiras que a impossibilitavam de cumprir a obrigação de repassar à
Direito Penal - Culpabilidade

Previdência Social os valores referentes às contribuições descontadas de seus


empregados, não se desincumbiu de conjugar do quadro fático-jurídico o dolo específico.
6. Ordem denegada.

(HC 113418, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 24/09/2013,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-206 DIVULG 16-10-2013 PUBLIC 17-10-2013)

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA


PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 619 DO CPP. AUSÊNCIA DE
PROVAS PARA CONDENAÇÃO NO MONTANTE AUFERIDO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA
7/STJ. DOLO GENÉRICO. ALEGAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS. ÔNUS
PROBATÓRIO DA DEFESA. CONTINUIDADE DELITIVA. AUMENTO JUSTIFICADO
PELO NÚMERO DE INFRAÇÕES COMETIDAS. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE
CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. Não existe violação ao art. 619 do CPP quando o Tribunal de origem pronuncia-se de
forma clara e precisa sobre a questão posta nos autos, assentando-se em fundamentos
suficientes para embasar a decisão.

2. A alegação de ausência de prova para a condenação no montante de R$ 46.582,72 exige


a incursão no contexto fático-probatório dos autos, defesa em sede de recurso especial,
nos termos da Súmula 7/STJ.

3. O crime de apropriação indébita previdenciária tem sido entendido como crime omissivo
próprio (ou omissivo puro), isto é, aquele em que não se exige necessariamente nenhum
resultado naturalístico, esgotando-se o tipo subjetivo apenas na transgressão da norma
incriminadora, no dolo genérico, sem necessidade de comprovação do fim especial de agir,
43
ou dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de ter a coisa para si (animus
rem sibi habendi).

4. A impossibilidade de repasse das contribuições previdenciárias em decorrência de


crise financeira da empresa constitui, em tese, CAUSA SUPRALEGAL DE EXCLUSÃO
DA CULPABILIDADE – inexigibilidade de conduta diversa –, e, para que reste
configurada, é necessário que o julgador verifique a sua plausibilidade, de acordo
com os fatos concretos revelados nos autos, não bastando para tal a referência a
meros indícios de insolvência da sociedade.

[...]

(STJ, REsp 1.113.735/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA,
julgado em 02/03/2010, DJe 29/03/2010)

DIREITO PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. PESCULATO-DESVIO. ASSUNÇÃO DE


OBRIGAÇÃO NO ÚLTIMO ANO DE MANDATO. 1. Se o acusado, consciente e
voluntariamente, se apropria de verbas cuja detenção se dá em razão do cargo que ocupa
e se as emprega em finalidade diversa daquelas a que se destinam, pratica o delito de
peculato-desvio, desimportante não tenha o desvio se dado em proveito próprio. 2. No caso
sob exame, o Município é mero depositário das contribuições, descontadas dos
contracheques de seus servidores para pagamento de empréstimos consignados, as quais
pertencem ao Banco. 3. Por outro lado, ao impedir a quitação das obrigações, o gestor
ordena ou autoriza assunção de obrigação. No caso dos autos, sem adimpli-la no mesmo
Direito Penal - Culpabilidade

exercício financeiro, nem deixar receita para quitação no ano seguinte, nos termos do artigo
359-C, do Código Penal. 4. Nada obstante a crise financeira por que passava o
Município, a contratação de pessoal e os repasses voluntários a instituições não
governamentais, impedem a configuração da dirimente de inexigibilidade de conduta
diversa, a afastar o juízo de reprovação penal da conduta. 4. Pretensão punitiva julgada
procedente para condenar o acusado pela prática dos crimes previstos nos arts. 312, caput,
e 359-C, na forma dos arts. 29, 71 e 70, todos do Código Penal.
(STF, AP 916, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em
17/05/2016, DJe-207 DIVULG 27-09-2016 PUBLIC 28-09-2016)

8.1. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA COMO CAUSA SUPRALEGAL DE EXCLUSÃO


DA CULPABILIDADE

Obs.: fragmentos extraídos do artigo “Inexigibilidade de conduta diversa como causa


supralegal de exclusão da culpabilidade”, publicado por Juliana Bonilha S. Fenato, em
https://julianafenato.jusbrasil.com.br/artigos/326172116/inexigibilidade-de-conduta-diversa-
como-causa-supralegal-de-exclusao-da-culpabilidade.

Este Instituto teve suas origens nos tribunais alemães, na época do Reich e surgiu a partir
44
de uma decisão de um tribunal e não de estudos doutrinários, como ocorre com a maioria das teses
inovadoras do direito.

Giuseppe Bettiol, em sua obra, traz o conceito e a necessidade da existência da


inexigibilidade de conduta diversa como causa de exclusão da culpabilidade, dizendo:

Para que uma ação possa dizer-se culpável, não basta que um sujeito capaz tenha previsto
e querido um determinado evento lesivo, mas é necessário que a sua vontade tenha
podido determinar-se normalmente rumo à ação: tal determinação normal não pode
ser exigida quando as condições de fato em que o indivíduo atuar forem de tal ordem
que tornem impossível ou muito difícil a formação de um querer imune de defeitos.
Quando se admite, por exemplo, que em virtude da força maior seja impossível a imputação
de um fato a um sujeito capaz, mesmo que tenha agido conscientemente, reconhece-se
que no embasamento do juízo de culpabilidade encontra-se o princípio de que tal juízo deve
ser excluído quando a vontade não puder determinar normalmente à ação, o que pode
ocorrer tanto por um vício que incida sobre a representação das consequências da própria
ação quanto sobre a livre determinação da própria ação. Numa concepção normativa, a
culpabilidade desparece todas as vezes em que – dadas as condições do autor – não se
possa ‘exigir’ do sujeito agente um comportamento diverso daquele efetivamente adotado.

Assim, é certo dizer que a inexigibilidade de conduta diversa nada mais é do que o
agente, mesmo atuando de forma a violar uma norma jurídica expressa, não ter outra opção
de conduta naquela situação de fato, não gerando, portanto, reprovabilidade no que tange ao
âmago social.
Direito Penal - Culpabilidade

Temos como exemplos indispensáveis para o estudo as situações narradas por Odin
Americano, que ocorreram na Alemanha, no começo do século XX e que, como afirma Cleber
Masson, foram os primeiros acontecimentos que tiveram como consequência o reconhecimento da
inexigibilidade de conduta diversa como dirimente da culpabilidade:

a) Cavalo bravio: o proprietário de um cavalo indócil ordenou ao cocheiro que o montasse e


saísse a serviço. O cocheiro, prevendo a possibilidade de um acidente se o animal disparasse, quis
resistir à ordem. O dono ameaçou de dispensa caso não cumprisse o mandado. O cocheiro, então,
obedeceu e, uma vez na rua, o animal tomou-lhe as rédeas e causou lesões em um transeunte. O
tribunal alemão absolveu o cocheiro sob o fundamento de que, se houve previsibilidade do evento,
não seria justo, todavia, exigir-se outro procedimento do agente. Sua recusa em sair com o animal
importaria a perda do emprego, logo a prática da ação perigosa não foi culposa, mercê da
inexigibilidade de outro comportamento.

b) Parteira dos filhos de mineradores: a empresa exploradora de uma mina acordou com
seus empregados que, no dia do parto da esposa de um operário, este ficaria dispensado do serviço,
sem prejuízo de seus salários. Os operários solicitaram da parteira encarregada dos partos, no caso
de nascimento verificado em domingo, declarasse no Registro Civil que o parto se verificara em dia 45
de serviço, ameaçando-se de não procurar seu mister se não os atendesse. Temerosa de ficar sem
trabalho, a parteira acabou em situação difícil, por atender à exigência, e tornou-se autora de uma
série de declarações falsas no Registro de Nascimento. Foi absolvida, por inexigibilidade de conduta
diversa.

Nos casos expostos, e sobre a inexigibilidade de conduta diversa, vemos que os autores
cometem fatos típicos e ilícitos, nos quais persiste a antijuridicidade, porém, naquelas circunstâncias,
os atos não podiam ser censurados, pois não se exigia dos autores que agissem conforme o Direito.

A exigibilidade das normas jurídicas, conforme diz Santos, não é cega, está condicionada a
um conjunto de determinações que regem a vida social, as quais os legisladores não conseguem
prever.

“Como vemos, pode o aplicador simplesmente adequar o fato à norma positiva e trazer uma
solução injusta ao caso concreto.”

8.1.1. HIPÓTESES ESPECÍFICAS DE INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA

Não é pacífica a aceitação das causas supralegais, sob o pressuposto de enfraquecer a


eficácia da prevenção geral do direito penal. Nada obstante, diante da impossibilidade de o legislador
prever todas as hipóteses de exclusão, a maioria da doutrina as aceita.
Direito Penal - Culpabilidade

Em seguida, serão verificadas as principais hipóteses de inexigibilidade de outra conduta


como causa supralegal de exclusão da culpabilidade:

a) Estado de necessidade exculpante: ocorre o estado de necessidade quando colidem


bem jurídicos, e um deles acaba sendo sacrificado para salvar o outro. É exemplo clássico o caso
de dois náufragos que disputam uma tábua que suporta apenas uma pessoa e um náufrago
mata o outro. Há um sacrifício de valores iguais. Aqui, verifica-se um perigo atual, não causado
por nenhum dos agentes. Segundo Capez,

Quando o bem destruído for de valor igual ou maior que o preservado, o estado de
necessidade continuará existindo, mas como circunstância de exclusão da culpabilidade,
como modalidade supralegal de exigibilidade de conduta diversa (é o que a teoria chama
de estado de necessidade exculpante).

Para explicar o instituto há duas teorias. A teoria unitária diz que existe o estado de
necessidade apenas como causa de excludente de ilicitude, para sacrificar bem jurídico de menor
valor para salvar o de maior ou de igual valor. Já a teoria diferenciadora admite o estado de
necessidade como excludente de ilicitude quando houver sacrifício de valores menores para salvar
valores maiores e o estado de necessidade como excludente de culpabilidade para sacrifício de
valores iguais ou maiores, desde que inexigível outro comportamento. 46
b) Excesso de legítima defesa exculpante: para se configurar excesso de legitima defesa
é necessário que haja todos os requisitos da legitima defesa, porém tem que haver o emprego de
meios necessários imoderados, ou seja, não se manter dentro dos limites do permitido em lei em
relação à própria defesa.

Assim é a visão de Alberto Silva Franco sobre o tema:

[...] a locução excesso exculpante define bem a matéria que se abriga sob sua área de
abrangência. Trata-se da ocorrência de um excesso, na reação defensiva, que não é, por
suas peculiaridades, reprovável, ou melhor, merecedor de apenação. Não se cuida de
excesso culposo porque, neste, o excesso deriva da falta do dever objetivo de cuidado
enquanto que, naquele, há um excesso resultante de medo, surpresa ou de perturbação de
ânimo. É evidente que o excesso exculpante pressupõe uma agressão real, atual ou
iminente, e injusta, isto é, com todas as características de uma ação ofensiva. A resposta
deve no entanto, ser havida como excessiva e tal excesso não é devido a uma postura
dolosa ou culposa mas a uma atitude emocional do agredido.

Aqui é o caso da exculpação por excesso quando o agente não consegue controlar
seus atos, seja por fatores emocionais, psicológicos, levando em conta que houve uma
perturbação do ânimo e que no momento da ação agiu com discernimento impróprio e
imoderado.
Direito Penal - Culpabilidade

c) Legítima defesa provocada: “Entende-se em legítima defesa quem, usando


moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou
de outrem” (art. 25, CP). Desta forma, em uma situação na qual provoca-se a agressão, com
insultos, ofensas ou desafios, a jurisprudência entende que não há legitimidade para uma
reação de defesa, e que o agente provocador deve ser punido.

Mas a doutrina questiona este entendimento dizendo que caso o provocador possa desviar
a ação de defesa do agredido, não há exculpação; se isto for impossível, o provocador não
será punido por sua reação, pela inexigibilidade de conduta diversa diante da agressão do
provocado.

Segundo os ensinamentos de Santos:

[...] se o provocador pode desviar a ação de defesa do agredido (por exemplo, fugindo do
local), não há exculpação; se o provocador não pode desviar a ação de defesa provocada,
então seria possível admitir a exculpação do agressor por ações inevitáveis de defesa,
porque o Estado não pode exigir de ninguém a renúncia ao direito de viver, nem criar
situações sem saída, em que as alternativas são ou deixar-se matar ou sofrer pena rigorosa.

d) Cláusula de consciência: conforme assevera o mesmo autor:


47
Assim, o fato de consciência constitui a experiência existencial de um sentimento
interior de obrigação incondicional, cujo conteúdo não pode ser valorado como certo
ou errado pelo juiz, que deve verificar, exclusivamente, a correspondência entre
decisão exterior e mandamentos morais da personalidade.

Nos termos do art. 5º, VI, da CF, é garantida a liberdade de crença e de consciência. Essa
liberdade possui limites, não se devendo afrontar outros direitos fundamentais individuais ou
coletivos.

Ocorre no caso de não aceitação de transfusão de sangue. O conteúdo dessas cláusulas não
deve ser valorado como certo ou errado pelo juiz, que deve verificar apenas a correspondência entre
a decisão exterior e os mandamentos morais da personalidade.

e) Conflito de deveres: configura-se quando há um conflito entre deveres jurídicos e ordens


legítimas da mesma natureza. Para melhor explicar essa excludente, vejamos um exemplo: chegam
ao hospital, ao mesmo tempo, dois doentes que precisam de tratamento com um determinado
aparelho, porém só existe um único aparelho destinado a salvar a vida de um dos pacientes,
assim é evidente que só um deles pode ser submetido ao tratamento; conforme o art. 36 do
Código Penal, e sendo perigo idêntico para ambos os doentes, o comportamento do médico
que ministrar o tratamento somente para um deles e deixar o outro morrer será lícito.
Direito Penal - Culpabilidade

Tem como fundamento a escolha do mal menor. Ocorre também quando o funcionário de
uma empresa deixa de repassar as contribuições previdenciárias em virtude da precária situação da
empresa. O TRF4 já admitiu essa causa de inexigibilidade, desde que (i) sejam graves as
dificuldades, e (ii) haja extremo esforço dos controladores, inclusive com sacrifício de bens pessoais.

f) Desobediência civil: é um fato que objetiva mudar o ordenamento, que tende a ser mais
construtor do que destruidor. Esta ação ocorre, logicamente, em última instância. Consiste em atos
de rebeldia com a finalidade de mostrar publicamente a injustiça da lei e induzir o legislador a
modificá-la. Admitida como exculpante apenas se fundada na proteção de direitos fundamentais e
se o dano for juridicamente irrelevante. Acontece na hipótese de bloqueio de estradas, ou mesmo
nas ocupações por parte do MST.

Nessa hipótese, embora muitas vezes o agente pratique ato típico e ilícito, o mesmo não
deverá ser punido pela falta de interesse do Estado na responsabilização do indivíduo. Nos dizeres
de Santos:

[...] a exculpação se baseia na existência objetiva de injusto mínimo, e na existência


subjetiva de motivação pública ou coletiva relevante, ou, alternativamente, na
desnecessidade de punição, porque os autores não são criminosos – portanto, a pena não
pode ser retributiva e, além disso, a solução de conflitos sociais não pode ser obtida pelas 48
funções de prevenção especial e geral atribuídas à pena criminal.

O cidadão tem o poder de participar da criação e modificação das leis, no que tange ao
seu interesse, assim conclui-se que a sociedade detém a soberania popular.

ELEMENTO DA CULPABILIDADE COMPOSIÇÃO DO ELEMENTO EXCLUDENTE DO ELEMENTO


Menoridade ao tempo da ação;
Capacidade de entender o Embriaguez completa e
caráter ilícito do fato involuntária;
(elemento intelectual); Quem, por doença mental ou
Imputabilidade Capacidade de se desenvolvimento mental
determinar conforme esse incompleto ou retardado, era, ao
entendimento (elemento tempo da ação ou omissão,
volitivo). inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato.
Possibilidade do agente, por
sua vivência, saber que o
Erro de proibição direto;
Potencial consciência da seu agir foi contrário ao
Erro de proibição indireto;
ilicitude direito (ainda que
Erro mandamental.
desconheça o
ordenamento).
Coação moral irresistível;
Exigibilidade de conduta Efetiva possibilidade de agir Ordem de superior hierárquico
diversa conforme o direito. não manifestamente ilegal;
Causas supralegais.
Direito Penal - Culpabilidade

9. CULPABILIDADE E ERRO DE PROIBIÇÃO – TABELA SÍNTESE

TEORIAS/CRITÉRIOS/CONCEITOS NO DIREITO PENAL


ERROS E CULPABILIDADE CULPABILIDADE
Teoria extremada ou estrita da culpabilidade: ELEMENTOS: imputabilidade: capacidade de
todo e qualquer erro que recaia sobre uma entender o caráter ilícito do fato (elemento
causa de justificação é erro de proibição, tenha intelectual ou cognitivo, saber que o fato é
o erro recaído sobre uma situação de fato, errado, independentemente de conhecer a Lei);
sobre a existência ou mesmo sobre os limites Capacidade de determinar-se de acordo com
de uma causa de justificação. Por ela, sempre esse entendimento (elemento volitivo, ter
se aplicaria o art. 21. discernimento mental que permita a livre
Teoria limitada da culpabilidade: se o erro decisão criminosa por parte do agente)
recai sobre os pressupostos fáticos de uma Exigibilidade de conduta diversa: elemento
causa de justificação, há erro de tipo material da culpabilidade. Só se pode reprovar
permissivo. Se recai sobre a existência ou o comportamento contrário à norma que tenha
abrangência da causa de justificação, há erro sido praticado sob condições fáticas nas quais
de proibição. Aquele excluiria o dolo, não poderia se exigir da pessoa que respeitasse a
permitindo nem mesmo a punição pelo tipo Lei.
culposo e não permanecendo a culpabilidade. Potencial conhecimento da ilicitude:
Esta excluiria a culpabilidade. Por ela, se possibilidade do agente, em função da cultura,
aplicaria o art. 20, § 1º quando a causa de de questões morais, sociais e éticas, saber que
justificação recai sobre situação de fato e o 21, aquilo que pratica é ilícito, contrário ao
quando sobre a existência ou os limites da ordenamento jurídico. Não se há confundir
causa de justificação. desconhecimento da ilicitude com ignorantia 49
juris, do direito. Esta é uma atenuante genérica.
Aquele decorre da falta de valores que
deveriam ser incorporados pelas instâncias
formais de controle (v.g, escola, religião,
família). O agente inserto na sociedade tem o
dever de se informar.
EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE POR ERRO DE
CRITÉRIOS DE AFERIÇÃO DA IMPUTABILIDADE
PROIBIÇÃO
Biológico: a inimputabilidade estaria vinculada, Pode ser compreendido sob duas formas
tão somente, à constatação do déficit biológico diferentes, a depender da corrente que se
previsto em Lei, sem que fosse necessário adote: corrente majoritária: entende que a
saber se, juntamente com ele, teria ou não o exclusão da culpabilidade pelo erro de proibição
agente a capacidade de compreender o ilícito só se dá quando o sujeito desconhece a
do fato. A falta de compreensão seria antijuridicidade material da sua ação.
presumida. É adotado como exceção, no caso Antijuridicidade material é a questão da
do menor. contrariedade a valores; antijuridicidade formal
Psicológico: a pessoa seria responsável e, possui caráter técnico, expresso nos tipos
portanto, imputável sempre que se constatasse penais. Corrente minoritária: entende que a
nela condições suficientes para compreender caracterização da aprovação jurídico penal do
primeiro que a situação era contra a ordem fato depende não somente do conhecimento
jurídica e, segundo, quais seriam as da antijuridicidade material dele, mas
consequências advindas da ação. Essa também do conhecimento a respeito da
condição deveria ser analisada no momento ameaça penal decorrente da realização do
do crime. Brasil não adotou esse critério. fato. Ou seja, o sujeito tem que saber que sua
Biopsicológico, híbrido ou misto: art. 26, CP. conduta, além de dotada de desvalor, é
soma de dois fatores: necessidade de se passível de punição, que pode dela advir uma
constatar que um indivíduo é irresponsável,
Direito Penal - Culpabilidade

incapaz, inimputável (déficit de caráter consequência, independentemente de conhecer


biológico) + incapacidade de entender o caráter o tipo penal ou/e a pena cominada.
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo
com esse entendimento. Os dois fatores devem
ocorrer no momento da conduta.
ESPÉCIES DE ERROS DE PROIBIÇÃO HIPÓTESES DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE
Erro de proibição direto (art. 21): erro do Por inimputabilidade: Menoridade ao tempo
agente recai sobre o conteúdo proibitivo de uma da ação; Embriaguez completa e involuntária;
norma penal, não acreditando o agente que Quem, por doença mental ou desenvolvimento
face o conteúdo, significado ou amplitude da mental incompleto ou retardado, era, ao tempo
norma, realiza uma conduta proibida. Não há da ação ou omissão, inteiramente incapaz de
erro sobre fatos, o agente simplesmente entender o caráter ilícito do fato.
acredita que a conduta não é criminosa. Por falta de potencial conhecimento da
Erro de proibição indireto ou erro de ilicitude: erros de proibição escusáveis ou
permissão ou excesso exculpante (art. 21): justificáveis.
suposição equivocada da existência de uma Por inexigibilidade de conduta diversa:
causa de justificação, ou seja, de exclusão da Coação moral irresistível (vis compulsiva);
ilicitude, que o ordenamento não prevê ou que Estrito cumprimento de ordem de superior
até prevê, mas em limites mais restritos do que hierárquico não manifestamente ilegal; causas
o que era imaginado pelo agente. supralegais de exclusão da culpabilidade.
Erro mandamental (art. 21): recai sobre As causas supralegais somente podem ser
mandamentos contidos nos crimes omissivos, reconhecidas no último elemento
sejam eles próprios ou impróprios. (inexigibilidade...), visto que não é dado ao juiz
Subespécies de erros de proibição: Erro de reconhecer outras causas de inimputabilidade
vigência: desconhecimento por parte do agente fora as previstas em Lei, nem outros casos de
de que uma determinada norma jurídica já está potencial desconhecimento da ilicitude.
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em vigor no ordenamento jurídico; Erro de O próprio STJ entende que existem outras
eficácia: agente acredita que determinada causas de exclusão de culpabilidade além das
norma jurídica não está mais produzindo expressamente previstas, argumentando que a
efeitos, por ter perdido eficácia pela entrada em exigibilidade de conduta diversa é um
vigor de outra norma de categoria superior ou verdadeiro princípio geral da culpabilidade.
de uma disposição constitucional; Erro de
punibilidade: agente percebe que sua conduta
é ilícita, mas acredita não haver previsão legal
para a aplicação da pena criminal para o caso.

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