Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
RESUMO:
Na presente pesquisa desenvolvemos reflexões sobre a análise linguística como proposta para
o ensino da gramática na escola, já que as duas últimas décadas do século XX constituíram
um período de crítica sistemática à gramática tradicional e ao seu ensino. Este artigo tem
como objetivo apontar a diferença que há entre um ensino voltado para a prática de análise
linguística e o ensino gramatical. Além disso, pretendemos apresentar propostas concretas
para um trabalho profícuo da análise linguística na escola. Do ponto de vista metodológico,
desenvolvemos uma revisão bibliográfica de cunho exploratório com base em autores como
Travaglia (2002), Koch (2006), Possenti (1996), Bagno (1994), entre outros. Desenvolvemos,
também, uma pesquisa documental para apresentarmos algumas propostas para a prática de
análise linguística nas aulas de Língua Portuguesa, mostrando que é possível propor uma
forma de ensino de gramática produtiva e pertinente para o aluno, que vise ao
desenvolvimento de sua competência comunicativa.
ABSTRACT:
The present work develops some reflections on linguistic analysis as a proposal for grammar
teaching in the schools, since the last two decades of the twentieth century were a period of
continued criticism towards mainstream grammar and its teaching. This paper is aimed at
pointing out the differences between linguistics-oriented and grammar-oriented teaching.
Besides, concrete proposals are aimed to be presented for effective work based on linguistic
analysis in the schools. Regarding methodology, exploratory documental research was carried
out, based on authors such as Travaglia (2002), Koch (2006), Possenti (1996) and Bagno
(1994), among others. Documental research was also developed so as to allow for some
1
Graduada em Pedagogia na Faculdade Metodista Granbery. E-mail: Giovanna_callian@hotmail.com
2
Doutoranda em Letras e mestra em Letras pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Professora de Língua
Portuguesa da Faculdade Metodista Granbery. Pesquisadora do grupo FALE da Faced/UFJF. E-mail:
laurabot@hotmail.com
proposals for the practice of linguistic analysis in the Portuguese language classes, showing
that it is possible to propose a productive and convenient approach to grammar teaching
aimed at developing communicative competence.
1 INTRODUÇÃO
O ensino de gramática nas aulas de Português como língua materna tem gerado
acirrados debates e questões desafiadoras para os professores de Língua Portuguesa e para
todos aqueles que estão envolvidos no processo educacional. Encontramos aqueles que
defendem o seu ensino, pois trata-se de salvaguardar uma tradição da sua língua, e ainda
acreditam que o ensino da gramática preserva a identidade linguística do seu país; e os que
não veem o porquê do seu ensino, alegando inconsistências teóricas e inadequação da teoria
gramatical à realidade linguística dos alunos.
3
Uma grande polêmica relacionada a um livro didático (Por uma vida melhor, da
coleção Viver, Aprender) destinado aos alunos da Educação de Jovens e Adultos, fez a
Associação Brasileira de Linguística – ABRALIN – vir a público manifestar-se em defesa dos
linguistas. Várias críticas foram feitas a respeito do livro, que, diga-se, foi aprovado pelo
Programa Nacional do Livro Didático – PNLD – e acata as orientações dos Parâmetros
Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, doravante PCN-LP, em relação à concepção de
língua/linguagem que vigoram há muito tempo.
Portanto, as críticas feitas ao livro mostram a ignorância e alienação da mídia quanto
aos fatos da língua e acabaram colocando em evidência o que mais os linguistas se preocupam
em combater: o preconceito linguístico.
Em tal episódio ficou evidente que as pessoas que fizeram as críticas não leram o
livro. Fazendo uma análise da página tão criticada pela mídia em geral, podemos perceber
que o livro defende o ensino da norma culta e das outras variedades, desde que esteja de
acordo com o contexto específico. O que se tentou ressaltar na obra é que cada padrão exigido
numa situação comunicativa tem formas adequadas e inadequadas de expressão do idioma, e
não de certo e errado.
3
O livro foi acusado de defender o ensino do “português errado” por considerar como objeto de estudo as
variantes linguísticas menos prestigiadas socialmente.
Muitos estudos apontam que, se o aluno toma consciência do modo como ele fala, tem
ele melhores condições de se apropriar da regra e usá-la quando for necessário, porém a
tentativa de aproximar essa variedade popular da forma padrão tem sido considerada uma
audácia.
É fato que a língua está sempre sofrendo modificações. Formas linguísticas podem
perder ou ganhar prestígio e até mesmo desaparecer. Além disso, todas as línguas apresentam
variedades. A linguística demonstra que nenhuma língua fica ameaçada, ou será desvalorizada
por aceitar, como corretas, determinadas formas de falar que não estão presentes nos
compêndios gramaticais.
Defender uma coisa não significa combater outra, como já disse o professor Marcos
Bagno, e o papel da escola é dar acesso a todas as variedades existentes, ficando a cargo da
linguística descrever esses fenômenos, ajudando a entender melhor o funcionamento das
línguas, dando respaldo ao processo de ensino.
Entende-se que o que os professores de Língua Portuguesa vêm fazendo em sala de
aula acaba afastando a língua da realidade social do indivíduo, tornando-se algo artificial e
sem significado.
Em virtude disso, a gramática tornou-se um problema na vida dos professores. Com as
reiteradas críticas feitas a ela, os professores acabam ficando sem saber o que fazer; muitos,
ao tentar inovar, acabam não fazendo nada que seja significante para a vida dos alunos. O
professor deve ampliar sua concepção sobre o que é língua e fazer uma real integração na
estrutura do seu ensino.
Diante de tantos resultados insatisfatórios da ênfase nas aulas de gramática, somos
convidados a refletir sobre essa prática e a adotar uma nova metodologia que privilegie as
habilidades de leitura e escrita. Assim, a proposta da prática de análise linguística em
contraposição ao ensino da gramática tradicional vem ganhando cada vez mais espaço nas
aulas de Língua Portuguesa. Este artigo busca, pois, refletir sobre as práticas de análise
linguística e, dessa forma, apresentar propostas didáticas para torná-las concretas na escola.
Nessa perspectiva, Bagno (2003) afirma que a língua classificada como materna é
muito diferente da norma padrão tradicional. Segundo o autor, ela é um português vivo,
dinâmico, que está presente na nossa sociedade multifacetada.
A discussão que gira em torno desses termos é tão acirrada que até mesmo os próprios
linguistas, procurando ser o mais criteriosos possível, acabam cometendo alguns deslizes e se
deixam levar por certas ambiguidades contidas nesses termos. Assim, norma padrão é aquela
idealizada; um exemplo são os registros de algumas gramáticas normativas. Norma culta é
aquela usada por uma comunidade linguística; um exemplo são os registros do projeto NURC
(Projeto da Norma Urbana Oral Culta) 4.
De acordo com Antunes (2007), um dos desafios do ensino da língua portuguesa tem
sido a dificuldade de saber qual linguagem usar em determinadas situações, e, além disso,
saber identificar os diferentes níveis de formalidade. Muitos saem das escolas sem saber
interpretar textos e sem saber expressar-se fora das situações a que estão acostumados.
Segundo a autora, as escolas consolidaram o uso de uma gramática equivocada, que reduz a
língua, não oferecendo uma compreensão mais ampla, mais relevante, do que sejam os usos
da linguagem na vida das pessoas.
Para os estudiosos da língua, isso acontece porque o padrão é ensinado como se fosse
uma verdade inabalável e, a partir disso, a noção de erro passa a ser social, ou seja, só falam
errado aquelas pessoas de classes desprestigiadas.
4
O Projeto NURC, como passou a ser chamado, no Brasil, teve, desde o seu início, em 1970, o objetivo de
caracterizar a modalidade culta da língua falada nesses centros urbanos, adotando-se, para isso, critérios
rigorosos que assegurassem o controle de variáveis e permitissem o confronto de dados. Esse projeto visa ao
estudo da fala culta, média, habitual, através de uma documentação sonora capaz de fornecer dados precisos
sobre a nossa língua, respeitadas as diferenças culturais de cada região. Procurou-se, desde o início, deixar claro
que não se tratava de estudar uma norma imposta segundo critérios externos de correção e de valoração
subjetiva, mas sim de estudar a pluralidade de linguística objetivamente comprovada no uso oral. Fonte:
http://www.letras.ufrj.br/nurc-rj
No dizer de Travaglia (2002), toda essa discussão nos leva a ressaltar uma questão
muito importante para o ensino de língua materna: o modo como os professores concebem a
língua e a linguagem irá refletir na estrutura do seu trabalho com a linguagem. Autores como
Koch (1996) e Travaglia (2002) adotam como concepção de linguagem aquela que se baseia
no processo de interação, ou seja, a linguagem é vista pela produção de efeitos de sentido
entre interlocutores que interagem como sujeitos e ocupam lugares sociais. Citando Bakhtin
(1997) para essa concepção:
Mas afinal, o que é gramática? E o que seria saber gramática? Travaglia (2002) define
três concepções sobre o conceito de gramática. A primeira concebe a gramática como um
manual de regras do bom uso da língua para aqueles que querem falar e escrever bem.
Organizada por especialistas que se baseiam no uso da língua consagrado pelos bons
escritores, essa concepção acaba ignorando características próprias da língua oral, gerando
vários tipos de preconceitos linguísticos.
Nesse sentido, conforme sustenta Antunes (2007), essa gramática não trata a realidade
da língua, ela representa o falar social mais aceito, criando usos linguisticamente considerados
melhores que outros, advindo de razões puramente sociais, definindo como fala errada
exatamente a fala da classe social que não tem prestígio.
A segunda concepção de gramática apresentada por Travaglia (2002) é aquela que faz
uma descrição da estrutura e do funcionamento da língua, de sua forma e função; é conhecida
como gramática descritiva. As regras a serem seguidas são aquelas que os falantes utilizam na
construção real da comunicação, privilegiando a descrição da língua oral, propondo uma
homogeneidade do sistema linguístico, abstraindo a língua de seu contexto.
A terceira concepção de gramática, ainda de acordo com Travaglia (2002), é aquela
que considera as variedades da língua que estão de acordo com a situação de interação
comunicativa. A gramática é vista como um conjunto de regras de que o falante se apropriou
naturalmente.
Esses conceitos sobre gramática deixam clara a existência de pelo menos três tipos de
gramática entre tantos outros que poderíamos citar. Entretanto vamos nos deter nos quatro
tipos mais conhecidos e utilizados.
O primeiro é a gramática normativa, que, no dizer de Travaglia (2002), é aquela que
estuda os fatos da norma padrão. Tem como foco a modalidade escrita da língua, dando pouca
importância, ou quase nenhuma, à variedade oral. A gramática normativa apresenta e dita as
normas do falar e escrever bem, e o que deve ou não ser utilizado na língua. Ela regula o uso
da língua na sociedade e consolidou apenas uma variedade como válida e verdadeira.
Essa visão de gramática tem raiz no importante papel da escrita, que, segundo Miranda
(2006), foi um dos fatores necessários ao surgimento das ciências da linguagem. Em outras
palavras, a escrita acabou por transformar a fala do indivíduo em objeto estável e algo a ser
resolvido, pois grande era o número de variedades linguísticas.
Ainda contemplando Travaglia (2002), os critérios de qualidade utilizados pela
gramática normativa, na maioria das vezes, são problemáticos e não dão importância à
realidade linguística. No entanto, o autor afirma que a gramática normativa tem sua
importância e que às vezes é necessário utilizá-la para que o aluno desenvolva sua
competência comunicativa de forma que ele saiba utilizar adequadamente também a variedade
de prestígio da língua. Porém, deve-se estar atento ao seu ensino, a fim de evitar a formação
de preconceitos e criar uma resistência ao ensino do português, inculcando nos alunos a ideia
de que o português é uma língua muito difícil.
Assim, baseando-se nesse tipo de gramática, o ensino da língua ganha o foco
prescritivo, que, segundo Travaglia (2002), leva o aluno a substituir suas convicções sobre a
língua, consideradas erradas e inaceitáveis, por outras, consideradas aceitáveis e corretas. Esse
tipo de ensino só visa ao trabalho com a variedade escrita culta, interferindo nas habilidades
linguísticas existentes, e tem como objetivo a correção formal da linguagem.
Tanto essa gramática quanto esse tipo de ensino tornaram-se alvo de questionamentos
e reiteradas críticas devido as suas inconsistências teóricas. As ciências linguísticas passaram
a afirmar que tal modelo, centrado na variedade padrão era insuficiente para desenvolver as
competências discursivas dos alunos e propuseram outros modelos de gramática, além da
construção de novos referenciais teóricos para o trabalho pedagógico com a língua materna.
O segundo tipo de gramática é a teórica. Conforme define Travaglia (2002), a
gramática teórica é uma sistematização da língua que busca explicitar sua estrutura,
constituição e funcionamento. É construída a partir das teorias e modelos da ciência
linguística. Essa gramática se apropria dos elementos das gramáticas descritivas e de parte da
descrição que aparece nas gramáticas normativas. Pode ser entendida como “uma explicitação
do mecanismo dominado pelo falante que lhe possibilita usar a língua” (TRAVAGLIA, 2002,
p. 33).
Nessa perspectiva, o autor faz uma consideração muito pertinente, chamando a
atenção para não confundirmos a gramática teórica com a normativa, como frequentemente é
observado. Segundo o autor, a gramática normativa tem caráter “legislativo”, designando o
que é certo e o que é errado, enquanto a teórica é mais um recurso a ser utilizado nas aulas
para ajudar a desenvolver a competência comunicativa, auxiliando o aluno a pensar
cientificamente a realidade linguística. A gramática teórica não é a metalinguagem pura, sem
objetivo; ao contrário, trabalha essa perspectiva, auxiliando no desenvolvimento da
competência comunicativa do aluno.
O terceiro tipo é a gramática reflexiva. De acordo com Soares (1979), essa gramática
surge da “reflexão com base no conhecimento intuitivo dos mecanismos da língua e será
usada para o domínio consciente de uma língua que o aluno já domina inconscientemente”.
Entretanto, Travaglia (2002) vai mais além e afirma que a reflexão deve atuar também para o
domínio de uma variante linguística que o aluno ainda não conhece.
Essa gramática tem como objetivo levar o aluno a conhecer a estrutura, o
funcionamento, a forma e a função da língua, e ainda possibilitar ao aluno pensar, desenvolver
o raciocínio científico, para que possa fazer uma análise sistemática dos fatos e fenômenos
que vai encontrar na sociedade.
O quarto tipo é a gramática de uso. Especialistas como Travaglia (2002, p.111) e
Possenti (1996) definem a gramática de uso como “implícita”, estando diretamente ligada à
gramática internalizada do falante. É, segundo os autores, um conjunto de regras dominado
pelo falante que lhe permite o uso normal da língua, habilitando-o a falar e ser compreendido.
Tem como finalidade a internalização de regras e princípios de uso da língua, sem descrever
seus elementos, para que o falante possa utilizar esses recursos em situações concretas e
específicas de interação comunicativa.
O trabalho com essa gramática pode ser feito de diversas maneiras. Dentre elas,
Travaglia (2002) aponta o trabalho voltado para a produção oral e escrita dos alunos, que
permite a análise dos diferentes tipos de registros, das diferentes variedades linguísticas,
familiarizando o falante com esses aspectos, para que esse saiba quando é adequado ou não
utilizar uma forma ou outra de falar.
Um fato relevante apontado por Travaglia (2002) é a suposição de que o aluno, já
possuindo a variedade coloquial, deve ser direcionado ao aprendizado da variedade culta.
Porém, deve-se estar atento ao fato de que o aluno não domina elementos de outras variedades
e que estas precisam ser trabalhadas, pois assim ele terá à sua disposição um maior número de
recursos da língua.
O autor faz uma crítica, embora breve, mas muito pertinente, aos livros didáticos, que,
de acordo com ele, trazem exercícios isolados sobre um fato da língua, mas não propõem uma
automatização dos seus usos e recursos. Além disso, os livros didáticos apresentam a língua
de forma fragmentada, cabendo ao professor orientar seu trabalho para os fatos linguísticos de
uma forma sistemática que vá ao encontro das necessidades dos seus alunos.
Travaglia (2002) sustenta que a gramática de uso proporciona um ensino produtivo,
que busca ampliar o uso da língua de maneira mais eficiente. Segundo o autor, o objetivo é
valorizar os recursos que o indivíduo possui, sem interferir nas habilidades já adquiridas, para
que o falante possa, sempre que necessário, saber adequar-se às diversas situações
comunicativas.
Para o estudioso, essa gramática é a mais adequada para desenvolver a competência
comunicativa do falante. Entretanto, o autor acredita que essas gramáticas – uso, reflexiva,
teórica e normativa – não são excludentes, pelo contrário, elas podem ser trabalhadas em
conjunto, desde que estejam de acordo com os objetivos didáticos propostos. O que não deve
ser feito é hipervalorizar a gramática normativa em detrimento das outras, como vem
acontecendo, causando prejuízos na formação do aluno em termos de conhecimento
linguístico. Assim, na próxima seção, para entendermos esse processo que estigmatiza
determinados falares e nos aproximarms mais da realidade linguística do português brasileiro,
achamos pertinente apresentar algumas ideias sobre as variedades linguísticas, mostrando
como elas constituem-se.
Assim, devemos acabar com essa ideia de caracterizar uma fala ou dialeto como certo
ou errado e substituir por critérios de adequabilidade e aceitabilidade.
Essa questão da variedade linguística esbarra no ensino da gramática, pois muitos
estudiosos acreditam que para saber falar uma língua, é preciso saber a gramática com todas
as suas regras de cor. No entanto, todos nós, mesmo sem nunca ter ido à escola, temos noção
de muitas regras, que são internalizadas conforme nosso desenvolvimento no meio em que
vivemos. Os falantes da língua materna possuem um saber bastante abrangente sobre ela, pois
são capazes de formular frases complexas e fazer interpretações coerentes de textos. Mais
importante que o conhecimento gramatical é o conhecimento necessário para falar
efetivamente a língua.
O que se observa, segundo Bortoni-Ricardo (2006), é que os professores estão cada
vez mais perdidos e não sabem como agir diante dessas variedades, nem como livrar-se do
tradicional ensino gramatical. Na mesma perspectiva, Bagno (1994) afirma que não há
utilidade alguma nesse tradicionalismo se o objetivo for formar um usuário competente da
língua culta. Diante desse impasse, os docentes acabam tomando determinadas atitudes que
não contribuem para ampliar a competência comunicativa do aluno.
Para auxiliar essa insegurança do professor, Bortoni-Ricardo (2004) sugere, como
estratégia didática, duas posições que o docente pode vir a adotar: identificar e conscientizar-
se dessa diferença. Para isso, é necessário que o professor esteja atento à fala do aluno e que
conheça as regras que regem a variante padrão da língua. Assim, poderá intervir no momento
mais adequado, conscientizando-o para que ele possa monitorar-se.
Bagno (1994) também sugere que os professores redirecionem sua metodologia para
descobrir novas maneiras de tornar os alunos usuários competentes da língua, elevando o que
ele chama de “auto-estima linguística” (1994, p. 115). Dessa forma, eles se sentem mais
seguros com relação ao uso da língua, e não meros reprodutores de teorias gramaticais.
Conforme sustenta o autor, a língua é viva e dinâmica, não está pronta e acabada, como nos é
apresentada pela gramática tradicional.
Bagno (1994) e Possenti (1996) apontam uma questão muito relevante para que se
rompa com essa visão preconceituosa de que um dialeto é melhor que o outro. Segundo os
autores, é necessário uma reavaliação da noção que temos de erro para uma melhor orientação
do trabalho.
Possenti (1996) argumenta que temos tendência a considerar como erro as formas que
distinguem os falantes, pois elas destoam. De fato, há “erros” que chocam e outros que não
chocam mais, porque são usados por um grupo de mais prestígio. O importante é saber que a
diferença entre o que o indivíduo sabe sobre a sua língua e o que lhe falta para aprender o
padrão é bem pequena. As semelhanças são muito maiores que as diferenças. Análises feitas a
respeito disso revelam que: os alunos acertam mais do que erram; os erros em geral são
hipóteses significativas (se não é reconhecido pela comunidade dos falantes, são
abandonados); os erros são sempre os mesmos; e o número de erros é maior que os tipos de
erros.
Essa proposta é muito importante, pois muda o modo como os professores devem
tratar os erros dos alunos. Sabemos que a marcação de erros traz um valor simbólico aos
alunos, e talvez essa nova perspectiva oriente o modo do professor lidar com isso,
modificando, dessa maneira, positivamente, o desempenho do aluno.
Como ressalta Bagno (1994), “ensinar bem é ensinar para o bem”, respeitando e
valorizando o conhecimento do aluno (BAGNO, 1994, p.145).
No dizer de Bagno, muito do que é considerado erro de português não passa de um
desvio ortográfico, o que não tem nada haver com a língua, pois são conhecimentos
diferentes. Além disso, “todo falante nativo de uma língua é um falante plenamente
competente dessa língua... capaz de discernir intuitivamente se um enunciado obedece ou não
às regras de funcionamento da língua” (BAGNO, 1994, p.24).
Portanto, segundo o estudioso, os professores tendem a chamar de erro qualquer
manifestação linguística que esteja em desacordo com a gramática normativa. O que não
procede, pois, como observamos, ninguém comete erros de português ao falar sua própria
língua.
Para Bagno (1994), o combate ao preconceito linguístico deve começar na
conscientização e aceitação de que não existem erros de português, e sim diferenças de uso
que fogem à gramática normativa; isso devido ao fato de que a língua, dinâmica como é, está
sempre seguindo seu processo evolutivo.
Assim, o domínio efetivo de uma língua nada tem haver com o domínio de uma
metalinguagem técnica; o tradicionalismo criado em torno do ensino da gramática é um
grande obstáculo a ser superado. Diante de tantas dúvidas sobre o que deve ser tratado no
ensino da língua portuguesa e do despreparo dos professores, e para que esse ensino não
continue apresentando-se cheio de lacunas, criou-se um documento que orienta a prática
docente, trazendo diversas contribuições para o ensino da língua portuguesa, os PCN, ponto
de discussão da próxima subseção.
Diante de tudo o que já foi discutido, podemos afirmar que a prática convencional de
ensino da gramática não faz mais sentido quando o objetivo é formar alunos linguisticamente
competentes. Em virtude disso, iremos apresentar propostas para uma prática de reflexão
linguística desejável, a análise linguística, baseada nos estudos de Mendonça (2006).
De acordo com seus esclarecimentos, o termo análise linguística foi criado por
Geraldi, em 1984, para denominar uma nova perspectiva de reflexão sobre a língua, em
oposição ao ensino tradicional.
A análise linguística aparece como uma alternativa didática para dar suporte às
práticas de leitura e produção de textos, possibilitando uma reflexão ativa e consciente dos
fenômenos gramaticais, textuais e discursivos.
De acordo com Mendonça (2006, p. 205):
[...] O termo análise linguística [...] surgiu para denominar uma nova
perspectiva de reflexão sobre o sistema linguístico e sobre os usos da língua,
com vistas ao tratamento escolar dos fenômenos gramaticais, textuais e
discursivos para se contrapor ao ensino tradicional de gramática, para firmar
um novo espaço, relativo a uma nova prática pedagógica [...]
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola
Editorial, 2003.
______. Muito além da gramática: por um ensino de línguas sem pedras no
caminho. São Paulo: Parábola, 2007.
BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: Estética da Criação Verbal. 2 ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1997.
BAGNO, Marcos. A Norma Oculta: Língua & Poder na sociedade Brasileira. 2 ed. São
Paulo: Parábola Editorial, 2003.
______. Preconceito linguístico; o que é, como se faz. 27 ed. São Paulo: Loyola, 1994.
FARACO, Carlos Alberto. Norma culta brasileira: desatando alguns nós. São Paulo:
Parábola, 2008.
MENDONÇA, Márcia. Análise linguística no ensino médio: um novo olhar, um outro objeto.
In: BUNZEN, Clecio; MENDONÇA, Márcia. Português no ensino Médio e formação do
professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p. 109-226.
NEVES, Maria Helena Moura. A gramática na escola. São Paulo: Contexto, 2002.
PERINI, Mário Alberto. Gramática descritiva do português. 2 ed. São Paulo: Ática, 1996.
POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. 8 ed. Campinas, São Paulo:
Mercado de Letras, 1996.