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,

LOUIS FAVOREU

Professor da Faculdade de Direito e Ciência Política de Aix-Marseille.


Diretor do Grupo-de Estudos e Pesquisas sobre a Justiça Constitucional

I
\
(CNRS UBA o. 1392)

ASC
c
ORTES
ONSTITUCIONAIS

Introdução à edição brasileira


..C/dudia latedo
Lujz Moreira.

Tradução
Dunia Marinho Silva

111
LANDY
E o I TO "Ã

Título original:
Les Cours COlIstitlltidllllclles
@2004,Prcsses U,Iiversitaires de Fmnce
Tradução:
DI/nia Marinho Silva
Revisão da tradução:
Clárldia Toledo
Luiz Moreira
Coordenação editorial:
Vi/ma Maria da Silva
Capa:
Camila Mesquita
Editor; SUMÁRIO
.................. A1/tollio Da/JieIAbreu.
Produção:
Kleber Kolltl
Editoração;
ETCetem Editom de Livros e Revistas Lida.
FOlles: (01/) 3825-3504 / 3826-4945
Fax: (01 J) 3826-7770
e tcetcra@etcctemeditOTa.co1l1.br Introdução para a edição brasileira 9
Introdução 15
D"dos Internacionais de Cunlogação na Publicação' (CIP)
. (Câmara BrJsilcira do Livro, sr, Brasil)
Favoreu, Louis CAl'fTULO I -As CORTES CONSTITUCIONAIS:
As (Cortes constitudonais J Louis Fuvoreu ; 17
O MODELO EUROPEU DE JUSTiÇA CONSTITUCIONAL
traduçiio Dun;" Marinho Sih-".- são Paulo:
Lnlldy Editora, 2004. 1. A escolha do modelo europeu 18
Titulo originnl Cours constitucionnelles.
2. As características do modelo europeu 27
nibliogrnfi".

I. Direito comparado 2. Tribunais


Çb~stltucionais,... Europn L Titulo.
CAPfTULO' 11-A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRfACA 41
04-1.619 CDU-342.56 (4) 1. Composição e funcionam~~to .' 42.
fndíc~s pnrn cntálogo sislemático:
I. Europa': Cortes constitucionais: Direito 2. Atribuições 45
wlISlituçionnJ 342.56 (4)
2. [urop"; Tribun;>is constitucionnis : Direito
3. Jut,-isprudê,ncia 52
constitu.cionnl 342.56 (4)
4. Influência sobre a ordem jurídica e política 55

Direitos reservados para a língua portuguesa

CAPfTULO IJI-O TRll3UNAL CONSTITUCIONAL FEDERAL

ALEMÁO 59
LANDY 1. Composição e funcionamento 59
Landy Livraria Editora e Distribuidora LIda.
Alameda Jaú, 1.791 - te!. e fax: (11) 3081-4169 (tronco-chave) 2. Atribuições 63
CEP 01420-002 - São Paulo, SP, Brasil
la ndy@landy.com.br
3. Jurisprudência 73
www.landy.com.br 4. Influência sobre a ordem jurídica e política 75
2004

.,
,
CAPfTULO IV -A CORTE CONSTITUCIONAL ITALIANA 77

1. Composição e funcionamento 77
2. Atribuições 80
3. Jurisprudência 88
4. Influência sobre a ordem jurídica c política 90

CAPfTULO V-O CONSELHO CONSTITUCIONAL FRANCt:S 93


1. Composição e funcionamento 93
lNTRODUçAo
2. Atribuições 95
PARA A EDiÇÃO BRASILEIRA
3. Jurisprudência 99
4. Influência sobre a ordem jurídica e política 101
Cldudia Toledoc-,
Luiz Moreira (o.)
CAPfTULO VI - O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ESPANHOL 103

1. Composição e funcionamento 103

2. Atribuições 106 livro deste eminente constitucionalista francês faz um estu-


3. Jurisprudência
4. Influência sobre a ordem jurídica e política'
li O
111 O do comparado entre as principais
européias - Áustria, Alemanha,
tugal, Bélgica -, de modo a evidenciar-lhes
Corres Constitucionaisl
Itália, França, Espanha,
a comp.osição, o funciona-
Por-

mento, os tipos de controle de constítucionalt'dade, as atribuições, a in-


CAPfTULO VII - O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL PORTUGU!?S 113
fluênc"'ia da jurisprudência constitucional sobre a ordem jurídica e
"L Composição 114
polític~ n~cional de cada país .
. 2. Atribuições 114 . O .modelo europeu de justiça éonstitucional funda-se no controle
de é0nstituciona~idade concentrado preventivo e repressivo (ou a priori
CAPfTULO VIII -A CORTE DE ARBITRAGEM. BELGA 1-19. e i:l posteriori, para usar a terminologia de Favoreu), diversamente do
modelo estadunidense, marcado pelo controle difUso.
1. Composição. . 11.9
Co.m base nessa distinção, o autor explicita a expansão do mo-
2. Atribuições 120
delo de justiça constitucional da Europa Ocidental para a Europa
3. Procedimento 121
Centro-Oriental, bem como para a Ásia e África. Declara a coexis-
4. Jurisprudência 122

Cláudia Toledo é professora do Curso de Direito da Escola Superior Dom Helder


CAPfTULO IX-As OUTRAS CORTES 123
Câmara, Belo Horizonte.
1. k Cortes Constitucionais da Europa Central e Oriental 123 Luiz Moreira é Professor e Coordenador de Graduação do Curso de Direito da Escola
Superior Dom Helder Câmara, Belo Horizonte.
2. As outras Cortes Européias 127 1. Corus Constitucionais e Tribunais Constitucionais são usados como sinônimos pelo
3. As Cortes Constitucionais fora da Europa 129 autor.
tência dos modelos europeu e estadunidense na América Latina, conl cional, pela qual se passa a reconhecer a normatividade deprincípios e
a junção do controle de constitucionalidade concentrado e difuso, dos valores neles contidos.
ctiando o que considera um modelo suL-americano, cujas características Kelsen4 foi imprescindível para a criação do modelo europeu de
comuns ainda não fOram definidas. No Peru, por exemplo, instaurou-se Tribunal Constitucional, tendo sido seu o projeto da Constituição da
o TribunaL Constitucional em 1996, ao passo que, no Chile, embora Áustria de 1920, institucionalizadora de um modelo de justiça cons-
denomine-se a Corte de Constitucional, assume ela função mais pró- ti tucional diverso do modelo estadunidense.
xirn.aà de uma Corte Suprema. Não há, portanto, controle difuso na Europa. remetendo os tri-
Não menciona o autor especificamente o sistema brasileiro, bunais ordinários os processos em que se levanta qualquer questão
que tem o Supremo Tribunal Federal como a corte responsável pelo constitucional à Corte. Suas decisões têm efeito erga omnes.
controle concentrado de constitucionalidade, vigorando no Brasil À Corte Constitucional compete não apenas solucionar confli-
tanlhém o controle difUso, por via de exceção. SOluente em' Portu- tos entte'"jüúsdiç'õ'es'''c'aütóddades 'adriiÍúi'sffa:tiVas"
ou a constitucio-
gal e no Brasil há, dentre os ordenamentos jurídicos citados, ação nalidade de tratados internacionais, nlaS precipuaOlente julgar as ofen-
de inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva sas aos direitos fUndamentais, direitos máximos constitucionalmente
norma constitucional. garantidos.5
A Corte Constitucional nlais antiga da Europa é a da Áustria. Na Alemanha e na Espanha há um procedimento específico res-
No entanto, durante a Segunda Guerra Mundial, suas atividades fo- ponsável pelo maior número dos processos constitucionais nesses
ram interronlpidas, sonlel1te sendo retomadas em 1945.2 A instaura-
países, denominado respectivamente recurso constitucional e recurso
ção da justiça constitucional na Alemanha e na Itália, beITIcomo sua
de amparo. São instrumentos, processuais pelos quais o indivíduo que
disseminação européia na segunda metade do século passado se de-
se sentir violado pelos poderes públicos em seus direitosfundamentais
veu, como sabido, às razões históricas das experiências nazista e fas-
requer diretamente ao Tribunal Constitucional sua proteção, após
cista, reveladoras da possibilidade de arbítrio dos poderes legislativo e
esgotados todos os possíveis recursos.6
executivo na elaboração e aplicação de leis votadas conforme maiorias
parlamentares circunstanciais, em detrimento de qualquer limite às
suas decisões. A ausência de controle sobre as leis gerou grave descren-
4. Professor de Direito na Universidade de Viena, foi o primeiro rl!/ator permanente da
ça nos juízes ordinários. Cone, após t~r si~o nomeado membro, em 1921.
- É a partir de eiltão cfue sürgeái as.nciçõe~;depróeesso ejurisdição 5. Sobre o tema,.cC ,a obra brasileira de OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Processo e
!Jerml!nêut~i:a na tutela peiuJI dos di1:eitos jimdamentais. Belo Horizonte: Del Rey,
constitucionaL.3 Diver:samente da hermenêutica clássica voltada para a
2004. O au-tor, sob a.perspe'ctiva da hermenêutica, compreende o ordenamento
interpretação exegétic~ e positivista qas normas"iJiftaconsiititcionaú; jurídico como um sistema normfltivo~ cujo desdobramento proassualmenteelaborado
destacadan1.ente, dos cá.digos, .desenvolve-se a hermenêutica "Constitu- conduz'à 'Supra-assunção entre direitos e garantias fundamentais como justificação
q,a 'intervenção estatal.
6. 'A Alemanha destaca-se pela salvaguarda dos direitos fundamentais. Como cita
Favoreu, nesse país "os direitos fundamentais formam uma ordem jurídica objetiva
2. Assim como na Áusttia, as Cottes da Itália, Alemanha, França, Portugal, Espanha, que deve ser interpretada não como uma série de garantias pontuais, mas como
Bélgica também só foram restabelecidas após 1948, algumas só apresentando sua for- um sistemtl coaente e completo de valores que visa à proteção da dignidade da pessoa
ma atual após a década de 70. Já na Europa do Leste ~ exceto na Polônia -, as Corres humana e o seu livre desenvolvimento" (grifas acrescidos). O rol c amplitude dos
Constitucionais só foram instaladas após 1989, com a queda do regime soviético. direitos garantidos variam de acordo com o Estado, a despeito da tendência de sua
3. No direita brasileiro, cf. sobre o tema SAMPAIO, José Adércio Leite. A Constúuição proteção em número crescente - na Bélgica, por exemplo, são garantidos, em prin-
reinventada pela jurisdição cOllStitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. O autor cípio, apenas o direito de liberdade de ensino e direito de igualdade (direito este,
empreende estudo de direito comparado, examina o surgimento e a evolução da aliás. protegido em todos os países). O recurso de amparo espanhol, apesar de se
jurisdição constitucional, registrando as diversas formas, estruturas e competências assemelhar essencialrnente ao recurso constitucional alemão, é mais restrito, não se
que assume hoje. dirigindo contra ato legislativo.

10 AS CORTES CONSTITUCIONAIS INTROOUC;ÃO [,J\R/\ A t::DIC;ÃO I3RA$ILt::IRA 11


,
Na França~ há controvérsia se o Conselho Constitucional fun"- A justificativa dada pelos o'rdenamentos jurídicos europeus à
cionaria mesmo como uma Corte Constitucional, já que não faz o escolha política dos juízes do Tribunal Constitucional é a da necessi-
controle concentrado repressivo de leis, mas apenas o preventivo e ain- dade de garantia da legitimidade de seus lnembros, já que não são os
da assim, apenas das leis orgânicas e leis ordinárias, não julgando leis juízes eleitos pelo voto popular. Entretanto, como familiar à realidade
nacionais. Trata-se de.Estado unitário, com bastante menos compe- brasileira, o reverso dessa situação é a negociação de interesses exclu-
tência do Conselho Constitucional do que comparativamente a Esta- sivamente partiddrios, com urna disputa de poder no parlamento que,
dos Federativos, corno a Alemanha. Entretanto, Favoreu afirma sua muitas vezes, não é tanto voltada à satisfação do interesse coletivo,
qualidade de Tribunal Constitucional por suas decisões nas matérias como se pressupõe.
citadas terem efeito erga omnes e por existir o controle a posteriori dos Dois fatores se destacam na estrutura dos Tribunais Constitu-
textos ..de__
~aráter legislativo que podem ser delegados à Corte Constitu- cionais europeus, em contraposição à realidade brasileira:
cional, relativos à divisão das competências entre lei e regulamento - a) o destaque dado aos professores universitários, membros nomeados
algumas matérias são reservadas ao Legislativo e outras dependem do para a Corte por exigência constitucional na maioria dos Estados;?
poder regulamentar.
b) a existência de mandato para o exercício dos juízes nas atividades
Já as Cortes Constitucionais da Europa Central e OrientaL ti-
na justiça constitucional.
veram seu número quase decuplicado no início dos anos 1990; ao
Tribunal Constitucional da Polônia e à Corte Constitucional da A riqueza das informações citadas, além das inúmeras outras
Hungria acrescentaram-se as Cortes Constitucionais da Albânia, contidas neste livro do excelso constitucionalista francês Louis Favoreu,
Bulgária, Çroácia, República Tcheca, Romênia, Rússia, Sérvia, transforma-o em obra de leitura imprescindível para o desenvolvi-
Eslováquia, dentre outras, sendo progressivamente criadas Corte~: mento científico brasileiro no
que diz respeito ao cOf1:hecimento e
em outros dos países da ex-União Soviética. Todavia, como men- aperfeiçoamento de sua justiça constitucional, cuja relevância eviden-
cion'a Favoreu, difícil ainda se faz alcançar os meSlnos resultados cia-se cada vez mais na proteção e garantia dos direitos jündamentais,
das Cortes da Europa Ocidental, pois os membros escolhidos para estatutos maiores da democracia e do Estado de Direito.
seus Tribunais Constitucionais pertencem às elites existentes no. re-
gime anterior, permanecendo a ideologia e os posicionamentó-s.ainda
muito próximos deste.
Há procedimento de triagem em todas as jurisdições constitu-
cionais, com a composição de uma comissão de número r.cduzido de
juízes (normalmente, três) para d"ecidirda adequação ou não das at-
güições em seus fundamentos constitucionais.
A composição das Cortes Constitucionais é basicamente a mesma
em todos os Estados, seja da Europa Ocidental, Central, Oriental, seja
da Ásia, África ou América Latina. Eln média, há de nove a doze
juízes nos Tribunais Constitucionais, com presidente e vice-presidente.
Os juízes permanecem em exercício de suas funções até geralmente os
setenta anos. A indicação é política, notadamente do Parlamento, ha-
vendo, em alguns países, a escolha também de juízes de carreira dos
tribunais inferiores para a integração da justiça constitucional. 7. Na Áustria. por exemplo, o rt:/atorP7Tman~ntr' é um proftssor.

lNTRODUC;ÁO PARA A EDI<;ÂO BRASILEIRA 13


12 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
,

INTRODUÇÃO

desenvolvimento da justiça constitucional é certamente o

O
podemos
acontecimento
ropeu da segunda
lnais conceber
mais marcante
metade
do Direito
do século
um sistema constitucional
xx.
constitucional
Atualmente
que não dê lugar
eu-
não

a essa instituição c, na Europa, todas as novas Constituições prevêem


a existência de uma Corte Constitucional.
Entretanto, mesmo que a maior parte das Cortes Constitucio-
nais situem-se efetivamente na Europa, mais precisam.ente na Eu-:
ropa continental, esta nova, forma de justiça constitucional surgiu
na Alnérica Latina e na Ásia, após instalar-se também na África.
Portanto, se existe um "[nadelo europeu" de justiça constitucional,
como há um "modelo esracluniciense", é evidente que esses dois
n1.odelos podem ser aplicados em outros sistemas além daqueles que
-lhes deram origem. . -. . ... .. ... .

A noção de Corte Constitucional será estudada no capítulo 1.


Todavia. convém. explicar desde já que uma C~ri-econstitÚciontil'd ü;na
jurisdição criada par.a. conhecer especial e exclusivamente o contenciósiJ
constitucional, situada jàra do aparelho constitucional ordinário e inde-
pendente deste e dos poderes públicos. Urna Corte Suprema ou um Tri-
bunal Supremo. Oll mesmo a Câmara Constitucional de unla Corte
Suprema, podem ser jurisdições constitucionais. Contudo, .como ve-
remos, -pouco importa que esta ou aquela Corte Constitucional seja
fornlalmente denominada "Conselho", "Tribunal" ou mesmo "Corte
Suprema Constitucional". desde que corresponda à definição que
acabamos de esboçar e que será explicada mais adiante.
I
A história das Cortes Constitucionais não é longa, pois realmente
teve início em 1920, com a criação da Corte Constitucional da
Tchecoslováquia (Constituição de 29 de feveteiro de 1920) e a da
Alta Corte Constitucional da Áustria (Constituição de 10 de outubro
de 1920). A Espanha republicana seguiu esse movimento, criando
em' sua Constituição de 1931 um Tribunal das Garantias Constitu-
cionais que durou até a ascensão de Franco. A segunda onda situa-se
após a Segunda Guerra Mundial, quando, após o restabelecimento
da Corte austríaca em 1945, foram instituídas a Corte Constitucio-
nal italiana. em 1948, e o Tribunal Constitucional FedeJ;"al,ªlçrn,~9.,... CAPÍ.TULO I
em 1949, aos quais podemos acrescentar a criação, alguns anos mais
tarde. das Cortes Constitucionais da Turquia (1961) e Iugoslávia
(1963). A criação do Conselho Constitucional de França, em 1959, AS CORTES CONSTITUCIONAIS:
deve ser situada nesse movimento, mesmo que na origem não pare-
O MODELO EUROPEU
cesse ter as mesmas finalidades. A terceira onda manifestou-se nos
anos 1970, com a criação dos Tribunais Constitucionais de Portugal DE JUSTI~A CONSTITUCIONAL
(Constituição de 1976, revista em 1982), Espanha (Constituição de
1978) e também. em certa medida, a Corte EspecialSuperior da Grécia
(1975); movimento que s~ propagou na Bélgica, com a Corte de
Arbitragem (1983) que teve grande desenvolvimento na Europa .do
Leste: Polônia (1985), Hungria (1989), Romênia, Bulgária (1991), MODELO europeu, que possui atualmente uns trinta exelTI-
Albânia e República Tcheca (1992), Lituânia (1993), Eslovênia
(1994), Rússia (1995) e Armênia (1996).
.Apc?? .l;lffi capítulo que expõe o que é o modelo europeu, i11.1s-
O.
pIos, n~o teria existido sem Kelsen. Com seus trabalhos e
seu projeto da Constituição da Áustria de 1920. o mestre.de
Viena preparou um novo modelo de justiça constituci~~ál opósro
trado peIas 'Cortes Constitucionais,. ~erão estudadas cada u~a. ,das ao modelo estadunidense. •
prir:tc~paisCortes at':lais. s~~do a~'outras Cortes'lembradas no úl.ti"': . No sistema estadunidense. a justiça constitucional é c~nfiada ao
mo capítulo. .. . . . .' . c~n!unto do a?arelho jurisdicional e não se distingue:da justiça orcli-
nana, na medIda em que os litígios, de qualquer natureza, são julga-
dos
. pelos mesmos tribunais e nas mesmas condiço-esA . dI.mensao
. - cons-
i
\
_
titucional pode estar presente em todos os litígios e não necessita de
tratamento
. especial'. não há' propnamente contencIOSO
. constitucional
aS~lm ~omo não existe contencioso administrativo ou judicial, nã~
ha, pOIS,. o.enhuma razão para distinguir as questões levadas perante o
mesmo JUIZ.

. O modelo europeu é muit o d.llerente.


c O contenclOSOconstitu-
. .
cIOnal:que distinguimos do contencioso ordinário. é da competência
exclusIva de um Tribunal especialmente constituído para esse fim e
i
I
16 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
li
:

I'
)

que pode estabelecer preceitos, sem que possamos falar propriamente por Edouard Lambert, cuja obra célebre! veio paradoxalmente ali-
de litígios, por meio da provocação desse Tribunal pelas autoridades mentar o debate e reforçar a corrente favorável à adoção do sistema
políticas ou jurisdicionais e até mesmo por particulares, com decisões estadunidense, apesar de ter denunciado com vigor o risco do gover-
que têm efeito absoluto de coisa julgada. no dos juízes. Paradoxo para o qual o decano Hauriou deu uma ex-
Os europeus aceitaram o desafio magistralmente expresso por plicação que, contraditoriamente. mostra as razões do fracasso do
Tocquevile em 1835: implante:2

Os estadunidcnses ... confiaram a seus tribunais um imenso poder Neste vigoroso estudo, que não está isento de paixão, o autor (E.
político; mas, obrigando-os a não atacarem as leis senão por meios Lambert), que se nega a concluir, mostra que teme a introdução
judiciais, diminuíram bastante os perigos desse poder".
dessa prática em França; mas, em seu próprio trabalho e na rica
"Se o juiz pudesse atacar as leis de maneira teórica e geral, se pu-
exposição apresentada, encontramos os argumentos necessáriospara
desse tomar a iniciativa de censurar o legislador, entraria estrepi-
""""'refu-ra:c"$'C'us
temores e ver claramente que, se nos Estados Unidos
tosamente na cena política; tornando-se campeão ou adversário
o controle da constitucionalidade degenerou em um Governo dos
de um partido, teria chamado todas as paixões que dividem o país
juízes, foi devido à ausência de regime administrativo c porque
a tomar parte da luta. Mas, quando o juiz ataca uma lei em um
essa ausência impede o juiz de fechar-se no contencioso: acidente
debate anônimo e em uma aplicação particular, esconde em pane
que não devem temer os países que possuem regime administrativo.
a importância do ataque aos olhos do público. Sua sentença não
tem outro objetivo senão o de proteger um interesse individual; a
lei só é atacada por acaso. Ora, veremos que a existência de um "regime administrativo" _
no que diz respeito a uma dualidade de jurisdições - é uma das razões
do fracasso do implante.
L A ESCOLHA DO MODELO EUROPEU
b) Na Alemanha, sob o regime da Constituição de Weimar, os
Corno os europeus puderam adotar o sistema que envolvia um juízes ordinários, autorizados pelo artigo 102 da Constituição, acei-
confronto direto e aberto com o legislador, quando o respeito a este taram verificar a constitucionalidade formal das leis a partir de uma
havia-lhes impedido, no século XIX e começo do século xx, de adotar decisão do Tribunal do Reich de 4 de novembro de 1925; entretanto
o sistema estadunidense, aparent~mente menos atentatório aos direi- não ousaram formular regras sobre a constitucionalidade da lei e prin-
tos dó, Parlamento? cipalmente sobre a proteção dos direitos fundamentais. Desse modo"
não se opuseram a «numerosas violações da ordem constitucional que
1. A rej.eição do moddp,.esta4u,nidense -'A 'maioria d~s paí- foram cometidas ben1 cedo pelo Parlamento".3 Essa experiência im-
ses atualmente dotada de um Tribunal Constitucional, ficaran1, em' peliu os reformadores, após a guerra, a voltar às teorias de Kelsen que
'u~ certo momento, tentados a ~dot~r"a s'istema.estadunidense e fi-: tinham sido afastadas em proveito das de C. Schmitt.

nalmente o rejeitaram - se n~o aberta ao menos implicitamente. Al- c) Na Itália, a tentativa feita após a guerra, antes da criação da
guns países europeus, no entanto,_adotaram sistemas de justiça cons:, Corte Constitucional, resultou em fracasso. Como ressaltam
titucional próximos do n1odelo estadunidense (Grécia, Dinamarca, Cappelletti e Cohen, esse período foi dominado pela forre resistência

Suécia, Noruega).

A) As tentativas de implantação do modelo estadunidense - a) 1. Le Gouvernement desjuges Cf la lutte contn lalégislation sociale allX Étau-Unis, Paris,
1921-
Na França, a discussão foi lançada por um comunicado de Larnaude
2. Prtcis de droitconstitutionnel, 1929, p. 272.
à Sociedade de Legislação Comparada, em 1902, e principalmente 3. Béguin, 1982, p. 18.

18 AS CORTES CONSTITUCtONAIS
AS CORTES CONSTITUCIONAIS, O MODELO éUROPEU._ 19
daqueles que dificilmente se adaptam a uma nova concepção do di- A "fraqueza e a timidez do juiz de modelo continental" se expli-
cam pelo seu estatuto de magistrado de "carreirà', sem "investidura
reito e da justiça, e os juízes ordinários "fizeram um trabalho muito
democrática", como o juiz estadunidense, e sem dúvida também pelo
pobre quanto à interpretação de uma Constituição tão programática
fato de que, na Alemanha, Itália, França, Espanha e Grécia, ele não
e progressistà' .4
esteve ao abrigo de depurações e de outras medidas coercitivas em
Em qualquer hipótese, na Assembléia Constituinte, a tese dos
períodos excepcionais.
partidários do modelo kelseniano prevaleceu.
c) A ausência de unidade de jurisdição é uma outra explicação
complementar. De fato, ao contrário da opinião de Hauriou, a
B)A explicação do fracasso do "implante" - a) A sacralização da
dualidade ou a pluralidade de jurisdições (ver acima) não é uma ga-
lei é uma primeira explicação. A partir da Revolução de 1789, ao
rantia para o sucesso do implante mas, ao contrário, um fator de
longo do século XIX e início do século xx, o dogma rousseauniano da
fracasso. O sistema de tipo estadunidense só funciori'a-'he'iTi'"onde'"h;t'
infalibilidade da lei se impôs e raramente foi posto em dúvida. O
unidade de jurisdição, isto é, nos Estados Unidos e nos países com
reino do Direito era o reino da lei: "O conceito de legitimidade ...
common law, porque nestes países não há separação entre os
coincide com o de legalidade, isto é. com a conformidade das ativi- contenciosos e a dimensão constitucional pode estar presente em to-
dades públicas e privadas com as leis votadas pelo Parlamento. O
dos os processos, sem necessitar um tratamento à parte e sem risco de
"direito"(jus, law, diritto, derecho, Recht) é cada vez mais identificado chegar a divergências de opinião sobre a constitucionalidade dos tex-
com as leis do Parlamento (Lex, statute, legge, tey, Gesetz)". 5 Mas, como tos fundarnentais. A justiça constitucional não se divide; ora ela é
diz Kelsen,6 "se admitirmos que a lei é todo o Direito, a regularidade difusa, mas no centro de um aparelho jurisdicional único, encabeçado
equivalente à legalidade, não há evidência de que possamos estender por uma única Corte Suprerna; ora ela é concentrada nas mãos de
mais a noção de regularidade". uma jurisdição constitucional única.
Nos Estados Unidos a Constituição é sagrada; na Europa é a lei A contraprova é-fornecida pelo exem,plo grego. A Constituição de
que é sagrada. 1975 convida expressamente os tribunais a "não aplicarem uma lei cujo
b) A incapacidade do juiz ordindrio de exercer a justiça consti- conteúdo é contrário à Constituição": os tribunais administrativos ten-
tucional é outra razão que ~. Cappelletti trouxe à luz? do à testa o Conselho de Estado; os tribunais judiciários dep~ndendo
da Corte de Cassação; a Corte de Contas e outros tribúnais não "de-
Os juízes da Europa continental são em geral magistrados de
pen"dendo de ordens precedentes, podem exercer um, ~o~i:r;le "da
carreira, pouéo aptos a assumir um trabalho de controle" da~ le'i~",
trabalho que, como" veremos, é inevitavelmente criativo e que constitucionalidade das leis, ievantandú de ~fício a inco~stituciúnali~
vai muito além suas funções tradicionais de simples "fntérprt;tes e dade em"úm 'proces~o civll,"pe~al.oü administrativo."Normal~e~te a
fiéis servidores das leis. A própria interpretação das nor,mas cons- questão subirá às jurisdições superiores epodemos"imaginar um confli-
titucionais e especialmente do núcleo central destas, que é a De- to de decisões entre estas diferentes jurisdições. (Esta üão é apenas uma
claração dos Direitos Fundamentais ou Bit! of Rights, é normal- hipótese, pois, em 1985, o Conselho de Estado c a Corre de Cassaçfio
mente muito diferente da interpretação das leis ordinárias; ela assumiram posições diferentes sobre a constitucionalidade da lei relativa
não se coaduna com a tradicional fraqueza e timidez do juiz de ao ensino superior.) Para resolver tais problemas a Constituição previu
modelo continental. uma Corte especial, superior, cujas atribuições surpreendentemente se
parecem com as de uma Corte Constitucional!8

4. Comparativ~ COnJtitutional Law, 1979, p. 14.


5. M_ Cappelletti. Rapport général, coHoque d'Uppsala.
8. Ver Spiliotopoulos" Judicial review of legisla tive aos in Greece, "úrnple Law Quarterly,
6. ROP, 1928, p. 199.
v. 56, nO 2; p. 463-562.
7. In Cours cOnJtitutionneifts, p" 463.

AS CORTES CONSTITUCIONAIS, O MOOJZLO EUROPEU"" 21


20 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
Podemos também mencionar, no mesmo sentido. o precedente
d) A insuficiente rigidez da Constituição pode ser considerada
do "júri constitucional" de Sieyes, na França, e O Tribunal das garan-
também como outra causa da rejeição do modelo estadunidense em
tias constitucionais da II República. na Espanha.
alguns países europeus de entre-guerras. Isto é explicitado por Carré
b) Mais próximas, outras razões podem ser apontadas. Em pri-
Malberg, com relação à França da IlI. República:'
meiro lugar, as terríveis lições das experiências nazista e fascista que
Na América, a decisão da justiça que declara uma lei inconstitu- são a causa imediata da criação das Corres Constitucionais na Ale-
cional tem como efeito erguer, contra a vontade do legislativo assim manha e na Itália e do restabelecimento da Corte austríaca. Foi tam-
desrespeitada, uma barreira que se torna intransponível para ele,
bém a vontade de fundar uma verdadeira democracia, após os perío-
considerando que o legislativo é impotente para modificar sozi-
dos de ditadura. que sem dúvida explica a criação dos Tribunais espa-
nho a Constituição ... Entre nós, ao contrário, se o Parlamento
chocar-se com uma declaração jurisdicional de inconstitucionali- nhol e português. Nos diversos casos, se escolhemos o modelo
dade, poderá, sem grande dificuldade, vencer essa resistência: as kelseniano em vez do modelo estadunidense é porque, acima das coo::".
maiorias parlamentares que adoraram a lei suspensa por uma.sen- trovérsias doutrinárias do período que precedeu a guerra, não temos
tença judicial devem, para fazer prevalecer sua vontade, confirmar mais confiança nos juízes ordinários. Além disso. não temos mais
na Assembléia Nacional a decisão ou medida que tomaram pri- medo de ferir a soberania do legislador. pois o legislador falhou em
meiro por simples via legislativa... Nessas condições, é provdvel que
sua missão; mostrou que podia ser opressor e fez surgir a necessidade
(a autoridade judicidria) hesite muito em recusar a aplicação das leis
por causa da inconstitucionalidade. de defender-se dele também.

Podemos constatar que na Alemanha de Weimar, as leis vota- B) Razões teóricas - A construção de Hans Ke1sen,exposta em
das pela maioria prevista no artigo 76 da Constituição permitiam. seu estudo de 1928 e na tese de seu discípulo, Charles Eisenrnann,
"derrogar materialmente" o texto constitucional em detrimento da parece hoje espantosamente moderna ..Kelsen e Eisenrnann demonstra-
proteção dos direitos fundamentais; e urll dos comentadores auto- ram que a instituição de um Tribunal Constitucional, encarregado
rizados da Constituição da épocalo "felicitou-se pela pouca rigidez principalmente de controlar a constitucionalidade das leis. estavaper-
da Constituição" .11
feitamente de acordo com a teoria da separação dos poderes. Por isso
foram suprimidos os últimos obstáculos.
2. A ad0c?0 do modelo kelseni~no - O sucesso do modelo a) Segundo KeLsen,antes de mais nada, devendo a Constituição
ke1seniano após a Segunda Guerra Mundia.l deve-se a váriãs causas ser 'a ~;;~~~ .f";'~da~.ental, isto é, da qual deco.rrem todas as outras,
que reconhecemos na maioria dos países que o adotaram. convém "assegurar-lhe a maior estabilidad~_possíyel»,tor~a:ndo sua
revisão difícil; ~stando. dar~ que à ~oção .de..Co.nstituição deve .ser
A) Razões históricas - a) Elas podem ser invocadas de iníclO entendida em sentido amplo., pois. <IasConstituisões modernas .~on-:
pela Alemanha e Áustria. De faro, nesses dois países, a idéia de um têm não somente regras sobre os órgãos e o. proc::::esso legislativo,
Tribunal do Império com atribuições de uma Corte Constitucional, mas também um catálogo de direitos fundamentais dos indivíduo;
ao menos no que se refere aos litígios federais, foi expressa desde ou liberdades individuais ... A Constituição não é portanto uni~a-
1848 e realizada, ao menos na Áustria, em 1867. mente uma regra de procedimento, é também uma regra de fundo".
A garantia da Constituição repousa principalmente sobre a possibi-
lidade de anulação dos atos que lhe são contrários, mas nunca "deve
9. La /oi, (xpmsion d~ la volonté ginirak. 1931, p. 128. ser confiada a anulação dos atos irregulares ao próprio órgão que os
10. G. Anschün. criou", uma vez que:
11. Segundo Béguin, op. cit., p. 18.

AS CORTES CONSTITUCIONAIS: o MODELO EUROPEU ... 23

[:
" 22 AS CORTES CONSTITUCIONAIS

I,
o órgão legislativo considera-se,
na realidade, um criador livre do Essa construção desagradava entretanto à doutrina francesa que,
Direito e não um órgão de aplicação do Direico, ligado à Consti- sendo favorável à justiça constitucional, escolhia o sistema estadu-
tuição, quando na verdade o é apenas teoricamente, ainda que em nidense. porque se recusar a aplicar uma lei (com autoridade relativa
medida relativamen~e restrita. Não é portanto com o Parlamento de coisa julgada) não era considerado um atentado- à separação dos
que podemos contar para conseguir sua subordinação à Consti-
poderes. Ao que Eisenman respondia, dirigindo-se principalmente
tuição. É a um órgão diferente dele, independente dele, e conse-
a Duguit. Hauriou e ]eze:J3
qüentemente também a uma autoridade estatal, que é preciso en-
carregar da anulação dos atos inconstitucionais - isto é, uma ju- Não há, entre os dois sistemas examinados, uma diferença de
risdição ou tribunal constitucional. qualidade, mas simplesmente a diferença - de grau - de uma
anulação relativa ou limitada para uma anulação absoluta ou
P?_4._~.~
b) Duas objeções__ .._s~~_
_ ..f.~~~~s~..~~.tesi~.~<::~.a:
ele seria in- definitiva ... Podemos admitir que o Conselho de Estado não
compatível com a soberania do Parlamento e contrário à separação perceba que, quando se recusa a anular um ato que lhe é subme-
dos poderes. tido, ele administra, e que não administra quando anula uma
À primeira objeção, após ter observado "que não pode tratar-se decisão administrativa individual? Que ele legifera - do ponto de
da soberania de um órgão estatal especial, a soberania pertencente no vista material - quando anula um regulamento? Não é curioso
encontrar entre teóricos tão eminentes do Direito público esta
máximo à própria ordem estatal", Kelsen responde que "a legislação é
adesão - instantânea - ao dogma civilista da autoridade relativa
inteiramente subordinada à Constituição. como a justiça e a admi-
da coisa julgada?
nistração o são à legislação", e se. "contrariando essavisão. continuar-
mos afirmando a incompatibilidade da justiça constitucional com a
soberania do legislador, é simplesmente para dissimular o desejo do Podemos acrescentar que atualInente considera-se, na maior p~.~te
poder político, que se exprilue no órgão legislativo.de não se deixar- dos países que adotaram o modelo kelseniano (ver infra), que a juris-
em patente contradição com o Direito positivo - limitar pelas nor- dição constitucional situa-se fora dos três poderes dos quais ela é en-
mas da Constituição". Não saberíamos qualificar melhor a atitude carregada de fazer respeitar as respectivas atribuições. Desde então o
daqueles que reclamam a inscauração do Estado de Direito, mas re- problema não fài mais colocado.
cusam sua aplicação ao legis.lado-r. Pois. como diz Charles Eisenmann
nas últimas linhas de sua tese: "puas ~oluçõesoferecem-se e somente C) Razões instituàonais ou políticas O decano Hauriou -já
""7

dúás: deixar a~.legisladór o cuidado de.respeitar a Constituição ou dizia em 1929: "Percebemos a necessidade de controlar os parla-
confiaf";;l.osjÚÍzes o cuidado de .assegurar-o respeito a ela. Entre as mentos porque sua legislação. emudecida pelas paixões--eleitorais.
duas ê prec.isoes'colher.A ~scolha pode ser duvidosa?". tornou-se uma perigosa ameaça para as liberdades" .14 Essa"nec~ssi-
À seguúda obj~ç_ão,sabef"0.os que .Kelsen opõe sua célebre teoria dade tornou-se imperiosa quando os regimes parlamentaristas. ou
do "(egis~adornegativo"-.segundo a qual certamente "anular uma lei semi-parlamentaristas evoluíram para o sistema no qual se exerce, sem
é impor uma norma ger:a1".todavia a diferença essencial entre a con- limites. um poder majoritário composto pela Inaioria parlamentar li-
fecção e a simples anulação das leis é que a "livre criação". que carac- gada a um governo estável e monolítico, às vezes.reforçado por um
teriza a primeira, falta à segunda, pois. diferente da atividade do chefe de Estado eleito. da mesma tendência. Em face do bloco majo-
legislador (positivo). "a atividade do legislador negativo, na jurisdi- ritário. a oposição tem necessidade de proteção, e a própria maioria
ção constitucional. é totalmente determinada pela Constituição" .12

13. Tese, p. 107.


14. Prtcis, 2a ed., p. 636.
12. P. 226.

AS CORTES CONSTITUCIONAIS: O MODELO EUROPEU .. 25


24 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
;.
tem necessidade de um contrapeso, uma vez que. caso contrário, não lI. AS CARACTERÍSTICAS DO MODELO
estaremos mais em um regime parlamentarista. A onipotência de um EUROPEU
poder majoritário estável e homogêneo fez surgir a necessidade de
As Cortes Constitucionais apresentam características con1uns que
uma justiça constitucional nos regimes parlamentaristas ou semi-par- permitem identificá-las, mas, além desses traços comuns, elas têm
larnentat;"istaseuropeus de tipo continental. Isto foi expresso, por exem- particulari~ades que correspondem ao meio institucional e sociológico
plo, a respeito da Alemanha Federal: "O desaparecimento na ~rática em que se Inserem.
da responsabilidade parlamentar do governo faz com que o Tnbunal
Constitucional Federal seja levado cada vez mais a assumir essa fun- 1. As características comuns das Cortes Constitucionais
ção, a fiUl de garantir - um contro Ie eLetivo
c - do governo " . 15 No mesmo
Faremos aqui um "retrato-modelo" da Corte Constitucional.
sentido manifestaram-se outros autores com relação à Áustria 16 e à
Es"F;ariha:;- Quàfitó"ã:"Ptánçá; o fenômeno é evidente e explica por que, A) As diversas condições da existência - a) Um contexto
sob a V República, os partidos de esquerda, tradicionalmente hostis à institucionaLejurídico particular. Atualmente, as Cortes Constitucio-
justiça constitucional, tenham se convertido a ela quando estavam na nais são implantadas nos Estados dotados de um regime parlamenta-
oposição, face a uma maioria estável e poderosa. rista (Alemanha Federal, Itália, Espanha, Bélgica) ou semi-parlamen-
O Parlamento "pode fazer mal" e, em seu seio, a maioria pode tarista (França, Áustria, Portugal) nos quais é aplicado um sistema de
oprimir. De fato, ao contrário dos Estados Unidos, nao ~á ~ai: sepa- dualidade ou de pluralidade de jurisdições e de ordens jurídicas: a
ração de poderes em razão do monolitismo do bloco maJo.ntárlO~a~- Itália, a França, a Áustria, a Bélgica, Portugal e a Espanha têm duas
lamentar-governo. Finalmente, como explica M. BurmeIster, o JUIZ espécies de jurisdição (administrativa e judiciária) e a Alemanha Fede-
constitucional deve intervir <tafim de garantir um controle efetivo do ral, cinco. Quanto à Grécia, se a Corte Especial Superior torna-se
governo". Nos sistemas europeus hostis ao exerCÍcioda)ustiça consti- progressivamente urna Corte Constitucional, deve-se à existência de
tucional pelos tribunais ordinários, a evolução do regIme parlamen- dois ou três graus de jurisdição. Basta enviar àquela que estiver acima.
, tarista para um "regime majoritário" terminou conferindo uma imu- b) Um ordenamento constitucional. A justiça constitucional é
i,- nidade jurisdicional às ações do Governo, na medida em que elas confiada a uma Corte ou Tribunal Constitucional "independente de
I-
tomam a forma de projetos de leis, votados sem pestanejar por uma qualquer outra autoridade estatal".lS A condição para essa indepen-
dência é a existência de um' ordenamento constitucional da Corte,
maioria parlamentar "submissa".
O caso italiano é apenas uma aparente exceção. Se não há que defina a organizáção, ófuÍ1cíeínamento e .as.atrÍbi..iiç6'es,
colocan-
. ~aiori~ estável e coerente na Itália, também não há uma "verda- do-os fora do alcance dos poderes públicos que a Corte está encarre-
gada de controlar: Isto .supõe portanto a inscriç'ão.das disposiç6~s.
deira alternância" e, portanto, os mesmos partidos repartem o
necessárias na própria .Const-ituição, assim como a autonomia
poder no seio do governo, dentro de um quadro conhecido como
estatutária administrativa e financeira da instituição e garantias de
contrattuaLizzazione. Sendo o Parlamento muito fraco para frustrar
independência para os seus membros.
escolhas decisivas, tudo é negociável, e o papel da Corte é evitar os
Qualquer instituição, cuja existência, funcionamento ou .atri-
excessos de contrattuaLizzazione que poderiam influir em detrimen-
buições arrisquem-se a serem desprezados pelo legislador ou pelo go-
to daqueles que não participam dele.17
verno, não pode ser considerada como uma Corte Constitucional,
nem como Uma jurisdição constitucional.

15. Burmeister, Rappon au Colloque de SCfasbourg. maio de 1982.


16. Ver observaçáo em ROP, 1984, n. S, p.1180-1181.
18. Kdsen.
17. Zagrcbe1sky. ROP. 1984, p. 1181.

AS CORTES CONSTITUCIONAIS: O MODELO EUROPEU.. 27


26 AS CORTES CONSTITUCIONAIS

i
I
c) Um monopólio do contencioso constitucional. A justiça consti- "um lugar adequado para os juristas profissionais", não obstantc, sua
tucional é concentrada nas mãos de uma jurisdição especialmente fórmula indicava que "o lugar adequado" não era exclusivo e admitia
formada para tanto e que goza de um Inonopólio nesse domínio: o que pudesse ser dos não-especialistas ao lado dos "especialistas", pois
que significa que os juízes ordinários não podem conhecer do estes poderiam "dedicar-se muito mais às considerações puramente
técnicas, porque sua consciência política ficaria desimpedida, devido
contencioso reservado à Corte Constitucional.
Assim sendo, é evidente que o contencioso constitucional, cujo à colaboração dos membros escolhidos para defender interesses espe-
cificamente políticos". 20
julgamento é objeto de um monopólio reservado à Corte, não tem o
mesmo conteúdo eIn cada caso. todavia comporta, ao menos, o A designação feita pelas autoridades poIícicas pressupõe uma liber-
contencioso da constitucionalidade das leis. dade de escolha. Já foi mostrad021 que essa intervenção das autori-
EiseIlIuann. como Ke1sen.demonstra que é esta a razão de ser da A~,~~,~
dades pol.í.~i~:1:S?J()_ng_e ...l;l,rr:t_.<:lefeit?,.
~.'.~
. ()..<??~.t,r.~~~0,~.
uma qua-
lidade, na medida em que esse tipo de indicação reforça .~'~.~ legici-
justiça constitucional; não há justiça constitucional sem a necessidade
midade e aproxima o sistema europeu do sistema estadunidense:
de confrontar os atos do legislador nacional com a Constituição. Os "Essa diferença importante (a não eleição dos juizes) entre os mun-
outros setores do contencioso constitucional podem ser encaminhados dos da civil faw e da common law foi, se não abolida, ao menos
para o setor principal: por exemplo, como sugeria Marcel Waline, em recentemente atenuada, principalmente pelo criador (...) das Cor-
1928, o contencioso de verificação dos poderes dos membros das as- tes Consticucionais, cujos juizes são na maioria pessoas eleitas ou
sembléias parlamentares podem ser incluídos no contencioso constitu- designadas politicamente" Y Nesse sentido, veremos que Kelsen,
após mencionar os modos de recrutamemo possiveis (principalmente
cional; até n1esmo, como diz Kelsen, "é talvez oportuno. nq caso, fazer
a eleição pelo Parlamento e a indicação pelo chefe de Estado, ou a
do Tribunal Constitucional uma Alta Corte de Justiça, encarregada de combinação de ambas), acha "preferível aceitar essa participação
19
julgar os ministros acusados, um Tribunal Central dos Conflitos OU legitima na formação do tribunal, do que uma influência oculta e
atribuir-lhe outras competências para poupar a instituição de jurisdi- conseqüentemente não controlável pelos partidos polfticos".
ções especiais". Mas todas estas atribuições não são essenciais como o
controle da edição dos atos fUndamentais, das leis nacionais e dos trata- Se compararmos a composição real das diversas Cortes Consti-
dos. O monopólio deveater-seprincipalmente a este último contencioso. tucionais no presente momento,23 constataremos que há muit~s se-
d) A indicação de juízes não magistrados pelas autoridades polí- melhanças: as autoridades políticas,. quaisquer que sejam, des~igna-
ticas. As Cort~s Constitucionais •.ao contrário-.das jurisdições ordiná.., ram juízes próximos ou des.tacados por suas tendências polític~s; de
rias, não são compostas por magistrados de.carreira, que ~1cançaram f~to. na Alem~nha, na I.tália,ria Espanha, na França ou na Áustria, os
seu posto por meio de profP,oçõ.esregulares e progrcssivas.A indicação dois ou tf'ês principais pa~tidbs políticos dividem as escolhas entre si,
dos membros das Cortes nã~..obedece aos cri.tér~?stradicionais, o que mesmo.quando, como'.naAlemanha ou na Espanha, tentou-se tomar
os distingue das jurisdições ordinárias (ainda que possam existir, no precauçõ.espar~ e~itá-Io;além disso1 as origens dos membros são muito
seio das jurisdições ordinárias, indicações que não correspondem aos parecidas, tendo coino característica principal a grande proporção
critérios tradicionais, por exemplo, o Conselho de Estado Francês, de professores universitários. Neste ponto, podemos observar que
por ocasião das indicações para o turno cxterior), os juízes não são não é por acaso que, nos países considerados, a independência dos
professores universitários é maior do que a dos magistrados.
necessariamente magistrados; podem ser escolhidos também entre os
professoresde Direito., advogados. funcionários, como na França, onde
não é mister que scjam juristas. Kelsen recomendava que fosse criado 20. Op. ciô., p. 227.
21. Cf. RDP. 1984, n. 5, p. 1147.
22. Cappelletti. Cours constitutionneLJes. p. 478.
23. Ver o quadro nas páginas seguintes.
19. Op. cit .• p. 234.

AS CORTES CONSTITUCIONAIS, O MODELO EUROPEU .. 29


28 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
)

QUADRO COMPARATIVO DAS REGRAS DE COMPOSIÇÃO


DAS CORTES CONSTITUCIONAIS EU ROPÉIAS

Autoridades que Autoridades Duração limites de Renovação Qualidades Funções politicas


Número Autoridades que
designam o presidente que designam o do mandato idade dos do mandato universitárias fncompativeis
d, designam os membros
vice-presidente membros ou profissionais
membros
exigidas dos membros

Presidente da Federação Presidente da Até completar Mâximo de Ser juiz, funcionário Ministro
Corte 14 (e 6 Presidente da Federaçi:io por
por proposição do Federação por 70 anos de idade 70 anos ou professor
ConstitucionaL supLentes) proposição: ParLamentar
Governo Federal proposição do universitário
Austriaca - do Governo Federal (8) Agente ou empregado
Governo Federal (8 membros)
- do Conselho NacionaL (3) de um partido político
Ser jurista
- do ConseLho Federal (3)

Corte
ConstitucionaL
,. 8undestag (8) Bundestag e Bundesrat
sucessivamente
Bundestag
Bundesrat
e 12 anos (de acordo
com as disposições
40 anos no
mínimo
Não Ser magistrado federaL
supremo (6 membros)
Ministro
Parlamentar {da Federação
Bundesrat (8) ...........
dO"-i1it.-'4- 'da '"lei' '(fé" 'ijÓ"'anos no .......
sucessivamente Preencher as ou de um Land)
ALemã 12 de março de máximo condições para ser
1951) Quatquer função pública
juiz alemão o, privada

A própria Corte 9 anos (de acordo Nenhum Não S" magistrado, ParLamentar
Corte 15 Presidente d(l Republica (5)
com as disposições professor de direito
Const1tudonal Parlamento (5) Conselheiro regionaL
do art. • do Lei ou advogado
Italiana Magistraturas Supremas (5) constitucionaL de QuaLquer outra função
21 de novembro púbLica ou privada
d, 1967)

Presidente da RepúbLica 9 anos (de acordo Nenhum Não (de acordo Nenhuma Ministro
Conselho 9 Presidente da Repúbtica (3)
com as disposições com
Constitucional Presidente da Assembléia do art. 2 do "'
disposições do
ParLamentar
Francês NacionaL (3) Decreto 58-1067) ort. 2 do Membro do Conselho
Presidente do Senado (3) Decreto 58-1057) Econõmico e Social
Dirigente de um Partido
Politico

O Rei por proposiçào O Rei por 9 anos (de acordo Nenhum Não (de acordo Ser jurista (magistrado, Parlamentar
Tribunal 12 Rei por proposiçao:
do próprio TribunaL proposiçào do com o art. 2 da com o art. 1. professor ou Função poLítica ou
Constitucional - do Congresso (4) lei de 3 de
próprio TribunaL da lei de 2 de advogado)
Espanhol administrativa em niveL de
- do Senado (4) outubro d, 197.9) outubro d,
i - do governo (2) 1979)
Estado ou das
Comunidades Autónomas
t .. .:. do' Cons'eLho GeraL
Judici~rio (2)
Função de direção de um

I
partido poLitico, sindicato,
associaçào e empregado
desses organismos

,O próprio TribunaL Q próprio Tribunal' 5 anos Nenhum Sim Ser juiz (pelo menos Ministro
Tribunal 13 Assembléia da' RepúbLica
(10) 6 anos) ou jurista ParLamentar
Constitucional
Português Cooptação (13) Oualquer funçào púbLica
o, privada
I Nem dirigente nem membro
de um partido poLitico
.

Até compLetar 40 anos Ter sido durante ParLamentar


Corte de 12 Rei numa Lista apresentada
aLternadamente "peLo
Cada grupo Lingüistico
designa um presidente 70 anos de idade mínimo "' 5 anos aLto Juiz
Arbitragem
Senado e Câmara dos Cada presidente fica um 70 anos no magistrado ou
Belga Oualque'r função ou cargo
Representantes máximo parLamentar
ano (sucessivamente) público

30 AS CORTES CONSTITUCIONAIS: O MODELO EUROPEU. 31


AS CORTES CONSTITUCIONAIS
,
função do legislador. Como diz UIn especialista, "a impossibilidade de
e) Uma verdadeira jurisdição - Para garantir a qualidade da
Corte Constitucional é preciso também que a instituição seja uma os órgãos (encarregados do controle da constitucionalidade) introdu-
zirem modificações no texto que lhes é submetido, diferencia (...)
verdadeira jurisdição.
claramente a função legislativa da função de controle" .24
Mesmo assim é preciso esclarecer que ela deve ser considerada
de acordo com as características das jurisdições constitucionais, e não JJ Uma jurisdição fira do aparelhojurisdicional. Esta é a dife-
rença fundamental entre un1a Corte Suprema e uma Corte Constitu-
conforme as definições do Direito privado ou do Direito administra-
cional: enquanto a primeira está necessariamente - daí seu nome -
tivo. Em qualquer hipótese, não importam as múltiplas variações so-
colocada no cume de um edifício jurisdicional, a segunda está locali-
bre o ten1a da natureza político-jurisdicional, jurídico-política, ou
não jurisdicional das jurisdições constitucionais, pois definitivamente zada fora de todo aparelho jurisdicional. Como observa V. Crisafulli
a propósito da Corte italiana, ela "não entra na ordem judiciária,
.....A p_r~.~~,~()
d_~,~:-:,l.h~,.l.l,ITl_.n_o:~~~.:.
e já que em Direito
comparado são con-
nem na organização jurisdicional no sentido mais amplo do termo: ...
sideradas como jurisdições, por que teimar em recusar-lhe esse
A Corte Constitucional... fica fora dos poderes estatais tradicional-
predicado? Além disso, recusar essa denominação por razões de com-
posição, de modo de designação dos membros ou de funcionamento, mente conhecidos; ela fonna utn Poder independente cujo papel con-
siste em assegurar o respeito à Constituição em todos os domínios". 25
equivale a recusar todas, inclusive a Corte Suprema estadunidense,
Isto é válido para todos os sistemas estudados, pois, como taIubém
uma vez que ela apresenta características semelhantes, principalmen-
destacou Kelsen, 'o órgão encarregado de fazer respeitar a Constitui-
te em sua composição.
ção não pode ser assimilado por um dos poderes que ele controla.
Isso é válido evidentemente para o Conselho Constitucional Fran- Todavia, se organican1ente ele tem uma total independência, fun-
cês, pois, nem em sua composição, nem em suas atribuições, cionalmente podem existir relações: assim é com os procedimentos
tampouco em seu funcionamento, ele difere das outras Cortes.
de remessa dos Tribunais ordinários à Corte Constitucional, e tam-
Não podemos alegar nem a frouxidão das regras de recrutamento,
bém dos procedimentos do tipo amparo espanhol ou do recurso cons-
nem a politização das designações, pois sua composição real é muito
semelhante à das outras cortes, tampouco o caráter obrigatório de
titucional alemão, que permitem encaminhar decisões jurisdicionais
alguns controles, ou a ausência do caráter contraditório no seu à Corte Constitucional por violação dos direitos fundamentais. O
procedimento, nem o fato de que ela estabelece regras às veze.<; sistelna francês é o único que não permite estas ligações entre juízes
ultra petita, já que as várias Cortes estudadas (alemã, italiana, aus- ordinários. e o juiz constitucional. (ex~eto excepcio'nalmente. em
tríaca ou espanhola) vão muito mais longe, apoderando-se de ofí- matéria eleitoral).
cio da constitucionalidade de algumas leis (ver infra), sequer o
caráter preventivo do controle das leis, pois as mesmas Cortes o B) A competência c;(:ntraIcomum: o cpntrole (concentrado) da
praticam de fato, sem verem contestado seu caráter jurisdicional.
constitucionalidade das leis - Não há justiça constitucional, e portanto
Corte Constitucional, sem esta competência central que é o controle
D.efinitivamente, o que importa é que a Corte Constitucional
da constitucionalidade das leis, isto é, a submissão da vontade do Par-
afirme o Direito com autoridade de coisa julgada e que suas declara-
lamento à vontade da norma jurídica, quer trate-se de uma regra for-
ções de inconstitucionalidade possam terminar em anulações com
mal ou de Ulua regra substancial. Exceto no caso das leis nacionais,
efeito erga omnes. Em compensação, quando à Corte cabe apenas
quase não há dificuldade em obter essa submissão ao Direito e não
devolver a lei ao Parlamento, sem poder anulá-la, podemos duvidar
que se trate de uma verdadeira jurisdição; não obstante, ao contrário,
quando ela pode oficialmente reescrever a lei e substituir os disposi- 24. Rubio Llorenre, Li: contrôle de la constitutionnalit! des lois, p. 53.
25. ROP, 1968, p. 130.
tivos legislativos por seus próprios dispositivos, ela exerce então a

AS CORTES CONSTITUCIONAIS: O MODELO EUROI'E.U., 33


32 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
há necessidade de um Tribunal Constitucional Superior. ocupando o controle concentrado por remessa dos autos pela jurisdiç..=io
na ordem jurídica e po/(tica o lugar mais alto (acima aré dos poderes inferior surge COJnocontrole privilegiado. Não estarlamos desse modo
públicos cstatais) para controlar os regulaJTIentos da administração. nos aproximando da tradição estadunidense? Várias constatações po-
até JTIcsmoas leis provinciais ou locais. Todavia. estas últimas compe- dem limitar um pouco o alcance dessa primeira conclusão. Primeira-
tências podem ser vinculadas às jurisdições principais. conlO na mente. esse ripa de controle é Jlluito pouco utilizado na Alemanha,
Espanha, na Alemanha ou na Itália (para os atos legislativos não esta- Áustria c Espanha. pois há poucas remessas dos Tribunais ordinários
tais) e na Áustria (para os regulamentos administrativos). O verda- a prop6sito das leis; porém. em compensação, ele é muito utilizado
deiro problema para UJna Corte Constitucional reside no faro de que na Itália. Não seria taJubém um contencioso objetivo, na medida em
ela pode corrigir. até anular. as escolhas políticas fundamentais feitas que o processo incidente escapa às partes e a decisão tomada no re-
pelo legislador, representante da vontade geral. curso tem efeito erga omnes? Além disso. o verdadeiro requerente no
a) As formas de controle são aparentemente muito diversas. con- processo constitucional. na Itália. não é o juiz a qu.o. ou seja. uma
tudo. podemos agrupá-los ClTI. torno das noções de controle concen- autoridade pública?
trado por via de ação c controle concentrado por remessa do processo Restam então três tipos de recursos difíceis de classificar: o recur-
pelos tribunais inferiores à Corre Constitucional, ou de contcncioso so constitucional alemão, o amparo espanhol e o recurso contra os
objetivo e contencioso subjetivo. atos administrativos perante a Corte austrlaca. Nestes três casos. nota-
O contencioso concentrado por via de ação é essencialmente reJTIOSque o problenla da constitucionalidade de uma lei pode ser
aquele que é acionado pelas autoridades políticas; pouco iJnporra se levado perante a Corte por iniciativa da pr6pria Corte que o recebe de
ele foi a p rio ri ou a posteriori. pois se trata sempre de um contencioso ofício a partir do caso particular (ver infra). Na Áustria, por exenlplo,
objetivo. de um processo relativo a unl ato. à lei. Que o controle
essa faculdade é ITIuito l~sada pois. em 1982.60% dos casos de con-
seja feito antes ou depois da promulgação é indiferente. pois a lei
trole da constitucionalidade das leis foram assim introduzidos. Do
existe desde o instante que é votada e a pronlulgação nada lhe acres-
mesmo modo. o Tribunal alemão reconh"ece o seu direito não apenas
centa.26 Aliás, o controle prévio existe perante os Tribunais Consti-
de levantar de ofício a inconstitucionalidade de uma lei, por ocasião
tucionais alemão, italiano. espanhol. austríaco e português. uma
de UITIrecurso fornlulado contra um ato administrativo ou jurisdicional.
vez que essas Corres exercem UJn controle jurisdicional não apenas
mas ainda de escolher. entre as questões, aquelas que serão objeco de
a posuriori. mas também quando elas. ~statuem a priori. Portanto,
um verdadeiro julgalllento. Assim, chegamos à conclusão de que o
quer sejam provocadas a priori ou a post.eriori, pelas minorias parla-
.. reçurso ~onsritu~"ional pre~nche uma "função objct.iva": a de permitir
mentares ou pela autoridade do Es'tadQ. ~s Cortes asseguram esse
ao "juiz constitucional cada vez que achar útil.. ..a~s.cgur~ra <~"tLia1iza-
tipo de controle preconi7 ... 'ldo por Kelsen, que é de r."ltOUI11controle
ção' c o desenvolvimento sistemático "do Direito constitucional".27
de interesse para a ordein constitucional. No entanto. se olharmos
bj Do ponto de vista da.sfimf{i~s'd.o (Çt;Jn.trou'daconsti~lcio"nali-"
de perto. percebereJnos que quase somente a França conhece hoje
cúzde das leis, o problema é saber s~ o aspecto objetivo pn;:valecesol?rc.
esse tipo de controle correspondente ao esquema inicial: de fato, na
o aspecto subjetivo: este controle, não importandb a forma ou o pro-
Alemanha, Áustria e Itália ele ocupa UITIlugar bem Jnenor eJll rela-
cedimento utilizado. é pouco usado para dar satisfação diretalnente
ção ao volume da atividade geral da Corre; quanto à Espanha e
aos indivíduos. Sua justificativa,: e portanto sua legitimidade. consiste
Portugal, a tendência é a J11CSll1a.
principalnlente enl preencher um certO número de funções de cará-
ter geral, absolutamente indispensáveis para o bom funcionamento
26. " ... basta que as CAmaras tenham decidido adotar um textO pua que sua legislação
esteja perfeita do ponto de vista dos efeitos abrigat6rias que d:l. foi destinada a pro-
duzir" (Carré de M:l.lberg. p. 147-148). 27. Béguin. p. 123.

34 AS CORTES CONSTITUCIONAIS AS CORTES CONSTITVCIONAIS: O MODELO EUROPEU .. 35


")

das instituições em U01 Estado moderno, e tambétn para a pram.oção 2. As particularidades de cada UIna das Cortes Constitu-

e a proteção dos direitos fundamentais. cionais - "Não podemos ... propor uma solução uniforme para todas
A proteção dos direitos fundamentais contra o legislador é eviden- as Constituições possíveis: a organização da jurisdição constitucional
temente a primeira das funções, pois apenas a Corte Constitucional, deverá moldar-se às particularidades de cada uma delas." Esta sábia
nos sistemas do tipo europeu, pode assumir essa tarefa. Os juízes ordi- advertência de Kelsen foi observada na preparação dos diversos siste-
nários - como, por exemplo, o Conselho de Estado na França - podem mas de justiça constitucional, pois, além dos traços comuns acima
assumir essa função até mesmo em relação aos atos administrativos mais analisados, cada um tem suas particularidades.
importantes, todavia SOlnente o juiz constitucional pode fazê-lo em re-
lação aos atos do legislador. Nos países dotados de uma Corte Consti- A) A <especialidade" de cada Corte - Se compararmos a ativida-
..~.çª,.éess~..flç,~~
tucional, a construção j~ri~'p-r1,lcl~!}.ç:i,al_firrl1a..cl.a -p()r. ... de real das diversas Cortes Constitucionais, constataremos que, aci-
ma das definições textuais de suas atribuições, cada uma tem uma
o controle da constitucionalidade das leis exerce outras funções
conexas: contribui para a pacificação da vida política, ~segurando otientação privilegiada que a caracteriza.
à oposição um meio de fazer com que a maioria respeite os limi- Assim, incontestavelmente na Alemanha, é o recurso constitu-
tes constitucionais; garante a regulação e a autenticação das mu- cional que ocupa um lugar quase exclusivo já que, por exemplo, em
danças e das alternâncias políticas, evitando um grande retrocesso
1994, de 5.324 novos casos levados perante o Tribunal Constitucional
capaz de romper o equilíbrio constitucional, canalizando a onda
das reformas da nova maioria; reforça a coesão da sociedade polí- Federal, 4.855, ou seja, 91,12°/0, eram recursos constitucionais. Isto
tica, como nos Estados Unidos. Finalmente, há uma função de se explica pelo fato de que a questão dos direitos fundamentais é
adaptação da Constituição e dos textos constitucionais, princi- essencial na Alemanha. Há também o fato de que um recurso apre-
palmente nos casos em que a rigidez da Constituição opõe-se a sentado provoca um afluxo de casos. Na Itália, a atividade principal
revisões muito freqüentes.
é o controle das leis em questões remetidas pelos Tribunais ordinários;
de 594 decisões proferidas em 1994, 493, ou seja, 83%, .foram re-
c) As técnicas de controle da constitucionalidade das leis ten-
metidas pelo juiz ordinário. Na Áustria é por meio do contencioso
dem a aproximar-se, principa!Inente no que se refere ao conteúdo e
de constitucionalidade dos atQ~.administrativos, que representa mais
ao alcance das decisões.
ou menos 800/0 dos casos julgados ou apresentadqs em 1994, que.se.
As jurisdições alemã, italian~, a"usrcíacae francesa tendem a usar pode questionar a constitucionalidade de uma lei mais facilmente
.técnicas que permitem control::~.ra fegislação sem chocar-se com o do que por recurso direto. Na Espanha foi o recurso de ampara. que
legislador. Mais do ,que anular pura e simplesmente, o juiz consti-
representou 870/0 dos casos julgados em 1994; o sucesso deste pro-
tucional prcfeie declarar conforme reservas e preparar uma série de
fórmulas e.procedimentos para possibilitar o alcance dos mesmos cedimento explica-se pela dúvida dos jurisdicionados 'quanto à ca-
resultados. Mesr~1.oconfrontado 'com o problema da invocação pacidade dos juízes ordinários espanhóis de fazer prevalecer os prin-
quase sistemácic.a da violação do princípio da igualdade, o juiz cípios constitucionais. Na França, a tônica é sobre o desenvolvi-
constitucional está pronto para elaborar uma jurisptudência cada
mento do controle da constitucionalidade das leis submetidas ao
vez mais complexa, destinada a evitar um controle da racionalidade
da ação legislativa e conseqüentemente, a oportunidade desta ação. Parlamento, mesmo que outros contenciosos (principalmente elei-
O enfrentamento legislador-juiz constitucional requer, da pane torais) sejam importantes. Por outro lado, o respeito às regras consti-
deste último, a elaboração de uma jurisprudência cada ve:z mais tucionais pela Administração ou pelos Tribunais é assegurado pelos
refinada, que lhe exigirá atenção especial. Ora, para algumas Cor- juízes ordinários submetidos à autoridade do Conselho de Estado e
tes Constitucionais, isso não é possível porque estio assoberbadas
da Corte de Cassação.
POt outros contenciosos.

AS CORTES CONSTITUCIONAIS: o MODELO EUROPEU .. 37


36 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
,
B) As principais tendências da evolução das Cortes - As hipóte- c) O problema gera! é portanto o seguinte: como canalizar a
ses que seguem devem ser verificadas, mas nao podemos deixar de onda crescente dos recursos e fazer com que as causas mais impor-
ficar surpresos com o número de tendências, mesmo que elas condu- tantes sejam julgadas em prazos razoáveis e com as garantias neces-
zam a conclusões paradoxais. sárias? Em muitos países estão previstas refànnas e algumas delas
a) Do controle da constítucionafídade das Leisou controle da apli- foram postas em vigor (por exemplo, na Áustria em 1984 e na
cação das leis. Definitivamente, hoje, três Cortes Constitucionais pare- Espanha em 1989).
cem-se cada vez mais com "super Cortes de Cassação": alemã, italiana Isso deveria levar a uma reflexão mais aprofundada daqueles
e espanhola. De fato, o recurso constitucional alemão é dirigido prin- que, na França, propõem uma abertura maior aos recursos, a fim de
cipalmente contra decisões judiciais e muitas vezes aparece como um torná-los mais "democráticos": o exelnplo italiano aconselha prudência
terceiro ou quarto grau de jurisdição. A remessa- feita pelo juiz a quo quanto à introdução de outras formas de controle pelos Tribunais; os
..italiano faz com que cada vez mais, a Corte Constitucional julgue exemplos alemão e espanhol caminham .na mesma direção, no que
causas civis, penais, administrativas. O amparo espanhol é usado so- se refere ao recurso individual.
bretudo contra decisões judiciais. No essencial,essasCortes dedicam-se
ao exame de ações ordinárias, das quais devem extrair e examinar as
questões constitucionais: assim, como pudemos constatar por ocasiao
, de uma mesa redonda internacional,28 na Alemanha e na Itália os juízes
!
constitucionais dedicam-se principalmente a um controle da
I "microconstitucionalidade": "passamos do controle da constituciona-
\
11
lidade para o controle da aplicação das leis".29Será esta realmente sua
""+ função? Não haverá aí uma espécie de "desvio" da funçao original?
Comparando, os juízes franceses.e austríacos exercem uma fun-
ção mais próxima da que é prevista originalmente pelo modelo aus-
tríaco ou kelseniano.
b) Uma outra tendência muito clara, relacionada diretamente
com a precedente, é a que consiste em fazer um'~. "filtragem" dos
recursos apresentados em número crescente a cada ano, na Alema-
nha, Itália, Áustria e Espanha. Por intermédio de comissões de três
juízes, com formações específicas ou de outra;s procedências, chega-
mos à situação em que a grande maioria 'das causas não é julgada pela
Corte, nas formas exigidas para um julgamento constitucional, po-
rém por pronunciamentos da Corte, em um procedimento sumário.
Isto relativiza muito claramente "as vantagens", habitualmente des-
critas, dos recursos e do acesso direto ou indireto dos indivíduos às
Cortes Constitucionais.

28. Annuaire internationa/ de jusáa constitutionm/ú, 1985. vaI. 1, 1987. p. 111-12 L


29. Observações de Zagrcbelsky e Froman.

38 AS CORTES CONSTITUCIONAIS AS CORTES CONSTITUCIONAIS: O MODELO EUROPEU... 39


")

CAPJTUL-o. ..ll

A COR TE CONSTITUCIONAL
AUSTRÍACA

"
E
A MAIS ANTIGA das Cortes Constitucionais e a que criou o
modelo que inspirou as outras Cortes instituídas na Euro-
pa. Podemos considerar que ela tem um predecessor: o Tri-
bunal do Império (Reichsgericht) criado pela Constituição de 21 de
dezembro de 1867 e ao qual ~s cidadãos podiam apresentar recursos
pela violação de seus direitos constit.ucio~ais. garantidos; direitos, aliás,
enumerados.na Constituição e qúe s"ã.oainda hoje a base do controle
.da:-.coristit~t:ionalidade. e001 a"queda da monarq~ia, uma lei da As-
sembléia Nac~onal Proyisofia? de 25 de janeir.o dc"1919. substituiu o
. Tribunal do Império e.u~a nov:a lei, de 14.clé setembro de 1919.
atribuiu à J\lta Corre Constitucionai assIm criada? poder de verifi-
car, antes da publicação, a conformidade das leis-votadas pelas assem-
bléias provinciais, mediante recurso do Governo Federal, no prazo de
14 dias a contar da comunicação (obrigatória) dos textos feita pelo
governo provisório. Quando julgasse necessário, a Alta Corte Consti-
tucional suspendia a aplicação da lei e tinha um mês para apresentar
novo estatuto. A Constituição de 10 de outubro de 1920 veio dar,
à jurisdição constitucional, sua forma definitiva. Um de seus princi-
pais inspiradores foi Hans Kelsen, professor de Direito Público e de
)

Filosofia do Direito da Universidade de Viena, que se tornou o pri- que pode indicar uma Inaioria de membros à Corte Constitucional".l
meiro relator permanente da Corte, após ter sido nomeado como Entretanto, devemos notar que, em virtude de um pacto tácito entre
membro, em 1921. A estrutura e a organização da Corte foram mo- os dois principais partidos, estabelece-se geralmente um equilíbrio.
dificadas e01 1925 e em 1929 (esta última reforma provocou a saída Uma vez nonleados, os juízes permanecem na função aré completa-
de Kelsen). Fechada durante o golpe de Estado de 1933, ela foÍ subs- rem setenta anos.
tituída, com a nova Constituição de 1934, por uma "Corte Federal"
(que reunia as competências das antigas Corte Constitucional e Cor- B) Para ser nomeado juiz titular ou suplente da Corte Constitu-
cional, é preciso ter «completado os estudos de direito e ter exercido
te Administrativa). A Corte foi suprimida em 13 de março de 1938,
ao menos por dez anos uma profissão para a qual o término desses
após a ocupação da Áustria pela Alemanha. Foi restabelecida pela Lei
estudos é exigido". 2
Constitucional de 12 de outubro de 1945, que introduziu na Cons-
As nomeações feitas por proposição do Governo.FederaLsão sub-
..ütüiçã6J)fbVisória o artigo 48.
metidas a condições mais estritas do que as feitas por proposição das
assembléias. De fato, «esses membros devem ser escolhidos entre os
1. COMPOSI<:;ÃO E FUNCIONAMENTO juízes, os funcionários da administração e os professores das Faculda-
des de Direito e de ciência política das universidades".3
1. COluposição - A corte compõe-se de um Presidente, de
um vice-Presidente, de 12 juízes titulares e de seis juízes suplentes. Se examinarmos a composição efetiva da Corte em 1992, consta-
taremos que dela fazem parte: entre os titulares, seis professores de
Direito, três advogados, um juiz (Corre Suprema), quatro funcio-
A) Entre 1920 e 1929, os nlagistrados da Corte Constitucional
nários; entre os suplentes, três professores de Direito, um juiz, um
eram designados na proporção de metade pelo Conselho Nacional e advogado e um funcionário (aposentado). Portanto, no toral de
m.etade pelo Conselho Federal. A partir de 1929, o poder de nomea- vinte membros (titulares ou suplentes) há nove professores de
ção pertence ao Presidente da Federação por proposição: do Governo Direito (eritre eles o presidente), dois juízes, quatro advogados e
, Federal para o Presidente, o vice-Presidente, seis juízes titulares e três cinco funcionários. O relator permanente é um professor.
iI
"~I'
juízes suplentes; do Conselho Nacional, para três juízes titulares e
C) As funções de membro da C.0rte Constitucional são incompa-
dois juízes suplentes; do Conselho Federal. para três juízes titulares e
tíveis c~m as 4e J?~"~~ro dO,G()yerno,Fe4~.ralou de um governo de
um juiz suplente.
Land [esrado], do Conselho Nacional, do Conselho Federal ou de..
Quando o Conselho Nacional ou o Conselho Federal precisam
«qua~quer outro órgão de representação em g~.r:~r'~.'O~~~.rcíci9das
fazer indicações para preencher uma vaga, elaboram uma ~istade três
funções de' Presidente e de Vice-Presidente da Corte. dur~nte os
nomes, entre os quais o Presidente da Federação pode teoricamente
quatro"anos' de seu ~aiidato, impede sua designação pa"ra'"as'as-
escolher. mas é sempre nomeado o primeiro da lista.
sembléias locais. Há também incompatibilidade entre as funções de
Assim. podemos dizer que o Conselho Nacional e o Conselho
membro da Corte Constitucional e as de representante ou assalariado
Federal nomeiam três membros cada um. Podemos notar que o go-
de partidos políticos.4
verno, ao indicar sozinho oito membros titulares. entre os quais o
Presidente e o vice-Presidente - a maioria do poder - pode orientar a
composição da Corte no sentido que lhe for favorável: <'De acordo 1. F. Ermacora, Cours constitucionn~li~s, p. 190.
2. Constituição, art. 147, aI. 3.
com a prática adotada, a indicação dos juízes obedece a regras políti-
3. Constituição. art. 147, aI. 2.
cas, e é o partido político que tem responsabilidades governamentais 4. Constituição. art. 147, al. 4.

42 AS CORTES CONSTITUCIONAIS A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRÍACA 43


As outras funções, principalmente privadas, são compatíveis com A Corte não é permanente. Ela tem quatro sessões por ano, com a
as de juiz conscirucionaL Exceto os funcionários, que devem ser duração de três ou quatro semanas (março, junho, setembro, de-
colocados na qualidade de "inativos",os outros membros continuam zembro). Isto se explica pelo fato de que os juízes exercem sua
exercendo suas profissões. Esta regulamentação data de uma época função apenas acessoriamente.8 As audiências são püblicas e as
"em que o número de casos a serem decididos era ainda insignifi- partes podem fazer-se representar por utn advogado. As decisões
cante";5 atualmente, tendo em vista o aumento do número de re- são preparadas pelos relatores gerais, eleitos pela Corte. A Corte
cursos, esta regulamentação atrapalha o trabalho da Corte. deCide com a presença da maioria dos membros presentes; em
caso de empate o voto do Presidente é preponderante. A delibera-
O) A remuneraçãodosjuízes constitucionais «éconsideravelmente ção e o voto são tomados a portas fechadas. Os votos não são
.mais elevada do que a dos juízes ordinários":6 o Presidente recebe publicados e as opiniões dissidentes ou individuais não são anteci-
166%, o Vice-Presidente e os relatores permanentes, 138%, e os ou- padas. Em caso de urgência há sessões extraordinárias.
'C'on's"elhü
tros membros, 830/0da remuneração de urri""dc"p"litad'ü.""aü Para algumas decisões que requerem um quorum de apenas quatto
juízes (ao invés dos oito normalmente exigidos), estabeleceu-se a
Nacional. Os membros suplentes são pagos por sessão.
prática chamada de "pequeno Senado" (ou câmara), não prevista
para os textos mais importantes. Após 1984, a Corte pôde renun-
E) Os membros da Corte Constitucional são nomeados por tem-
ciar à audiência pública para algumas questões e decidir a portas
po ilimitado: eles permanecem na função até 31 de dezembro do fechadas. Atualmente, a sessão plenária pública está reservada às
ano "em que completam 70 anos". 7 Portanto, a duração de seu questões que tenham uma imporrância política especial.
mandato pode ser muito variável; por exemplo, em 1983, um Pre-
sidente que havia sido nomeado membro da Corte 25 anos antes, e B) Os meios de que dispõe a Corte não são negligenciáveis - Sua
dois outros juízes, tinham que ficar mais de 30 anos na Corte, ou administração, entretanto, depende de fato da chancelaria federal: os
seja, até mais ou menos 201 O! Certamente é uma garantia de inde- funcionários são nomeados pelo chanceler e o orçamento é incluído
pe~dência, pois os juízes, não podendo ser demitidos de suas fun- no quadro do orçamento anual da Federação pelo Conselho NaCio-
ções a não ser pela própria Corte, estão protegidos das pressões; nal. De acordo com M. Ermacora, "nos últimos anos houve conflitos
contudo isto acarreta alguns problemas, principalmente se conside- políticos a respeito dessas questões; os Presidentes da Corte A"~n~i-
rarmos que dez dos 14 juízes titulares permaneceriam ainda na Corte nistrativa e da Cone Constitucional protes~aram porque a admll11S-
até o final do século xx. tração técnica das Cortes depende de um ,órgão governamentafçuja
imparcialidade é posta em dúvida".')
. "2. ,Fllncionam~~tó ..- Apesa~ do g~and~ número de "questões
,que lhe s~o encaminhadas, o.modo de funcionamento da Cor~e não
11. A TRIBUIC;ÕES
mudo~ m~it~. Isto tra~ alguns problefi.1as."
1. As outras atribuições além do controle da constitucionali-
A) A Corte não decide, em princípio, se não estiver completa, dade das leis e dos tratados.
devendo as decisões ser tomadas pelos 14 juízes. Mas, na prática, seu
fu~cionamento é diferente. A) A Corte éprimeiramente um alto tribunal eleitoral- De fato,
ela julga o contencioso das principais eleições políticas, administrati-

5. Ohlinger, op. dt.


6. Ohlinger. 8" Ohlinger.
7. Constituição, art. 147, aI. G. 9. Cours constitucionnellu, p. 191.

A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRÍACA


45
44 AS CORTE.S CONSTITUCIONAIS
vas e profissionais: eleição dos deputados para o Conselho Nacional, federal: o controle preventivo das leis, exercidounicalnente em relação
membros das Assenlbléias dos Lander [estados], dos Conselhos das às regras de separação das competências legislativasentre Federação
comunas, do presidente da Federação, dos executivos dos Linder, e Lander.
dos executivos comunais. A Corte também recebe o contencioso das
eleições para os organismos profissionais representativos que têm a D) A Corte Constitucional é também Corte Administrativa,
faculdade de criar seus estatutos. O contencioso eleitoral não parece na medida em que ela pode conhecer do contencioso dos atos ad-
entretanto muito abundante: umas quinze questões por ano, por exem- ministrativos. Estas atribuições podem surpreender, pois há uma
plo, em 1950, 1960 e 1970; em 1994, dezoito casos .julgados, mas Alta Corte Administrativa igualmente competente para conhecer
nenhum quanto ao mérito. dos recursos contra os atos administrativos. Todavia, teoricamente,
A Corte também é competente para apreciar a regularidade das a concorrência só existe no primeiro caso, pois, no segundo, a Cor-
"iniciativas populares" ou os referendos. 10 te'.Constitucional somente é competente para julgar ofensas aos di-
reitos constitucionalmente garantidos, enquanto a Alta Corte Admi-
B) A Corte austríaca é conseqüentemente um Tribunal dos
nistrativa o é para as ofensas aos direitos legalmente garantidos. De
conflitos.11
fato, mesmo nesta última hipótese há concorrência, uma vez que os
Ela pode julgar os conflitos entre as jurisdições e as autoridades direitos lesados podenl ser duplanlente garantidos, de modo que às
administrativas; entre a Cone Administrativa e as outras jurisdi- vezes haverá duplo recurso.
ções (aí compreendida a própria Corte Constitucional); entre as Esse contencioso foi, até 1991, O mais numeroso que a Corte
jurisdições ordinárias e as outras jurisdições; entre as autoridades
recebeu: assim, em 1989, de 2.096 decisões proferidas, 1.535, ou
administrativas da Federação e dos Lander; entre a Corte de Con-
seja, em torno de 73%, foram baseadas no artigo 144, e 400 decisões
tas e os governos. Tr.ara-se aqui do que chamamos de conflitos
positivos ou negativos. nos artigos 139 e 140, ou seja, 190/0 apenas. Foi feita uma reforma
nesse mesmo ano: a contar de 10 de janeiro de 1991, o controle dos
Essas questões não são muito numerosas; foram nove em 1994. atos de coerção do poder público pelas autoridades administrativas
pertence aos Tribunais Administrativos, nos Lander, com direito de
C) A Corte é evidentemente também uma Corte ou um Tribu- apelação somente perante a Corte Constitucional. Isto não impeçliu
. . nal fidenil; úú seja, encarregada de z~.l~rpelo equilíbrio federal.. que em 1994 esse contencioso representasse 800/0 do conjunto .

Ela pode .dirimir, cQofli.tos.currc ~ federação.c os .Lander, o~ ~~tre.


E) A Corte Constitucional possui atribuições que, na França,
os Lander: conflitos positivos, se hóuver reivindicação simultânea
de competências; c~nflicos negativos se, .ao contrário, nenhuma pertencem à Alta Corte de Justiça. Em virtude dos artigos 142 e 143 da
entidade quiser declarar-se compecente: Constituição, a responsabilidade "jurídica" ou penal dos órgãos supe-
riores da Federação (presidente, membros do governo) ou dos Uinder
Há, finalmente, uma atribuição da Corre, introduzida ~a Cons- pode ser questionada perante a Corte Constitucional, por iniciativa
tituição de 1925,12 que se refere à função da arbitragem em âmbito das assembléias, e resultar na perda da função ou em uma condenação
penal. Desde 1945 esse procedimento só foi usado uma vez.

10. Constituição, art. 141, aI. 2.


F) A Corte pode conhecer também algumas ações sobre
11. Constituição, art. 138 e 126.
12. Art. 138-2 e 126 a. responsabilidade.

46 AS CORTES CONSTITUCIONAIS A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRiACA 47


Corte Suprema de Justiça foram habilitadas para enviar, à Corte
2. O controle da constitucionalidade das leis - Na origem,
Constitucional, as questões de constitucionalidade levantadas sobre
isto é, na Constituição de 1920, o direito de pedir a tutela constitu-
as leis .que deviam aplicar. Essa faculdade foi utilizada principal-
cional pertencia ao Governo Federal correra as leis provinciais, e aos
mente pela Corte Administrativa e bem menos pela Corte Supre-
governos provinciais contra as leis federais; além disso, por iniciativa
ma. Desde 1975 as jurisdições de recurso têm a mesma faculdade.
de Kelsen, então conselheiro do chanceler Renner, estava previsto
Em 1994 foram feitas 92 remessas (núrnero em crescimento), das
que a Corte não se manifestaria de ofício sobre a constitucionalidade
quais 35 pela Corte Administrativa, 48 pelas jurisdições ordinárias
de uma lei, se essa lei devesse servir de base a uma de suas decisões.
e nove pelas Câmaras independentes do contencioso administrativo.
Revisões constitucionais permitiram instituir, em 1925, um controle
preventivo; em 1929, foi instituído um controle constitucional, re-
Acesso pelos parlamentares. Desde 1975 um terço dos Deputados
do Conselho Nacional pode contestar a constitucionalidade de urna
servado à Corte Administrativa e à Corte Suprema de Justiça, que foi
lei perante a Corte Constitucional. A mesm'a-""faculdacle trreco"i-iheCi~
estendido, em 1975, às Cortes de Apelação assinl. como aos parla-
da pela Constituição de um Land ao terço dos deputados da Dieta
mentares e aos indivíduos.
desse Land.
A) O controle a priori - Nos termos do artigo 138, alínea 2,
É necessário dizer que na Áustria as cadeiras das duas câmaras
do Parlamento, assirn, como das Dietas provinciais, dividem-se qua-
da Constituição, "a Corte Constitucional decide, a pedido do go-
verno federal ou de um governo do Land, se um ato legislativo ou se igualmente entre os dois grandes partidos (Partido Popular e
Partido Socialista), ainda que dois outros partidos (Partido Liberal e
administrativo é da competência da Federação ou dos Lander". Esta
os Verdes) comecem a ter uma representação significativa. O Parti?o
atribuição da Corte é exercida em relação a projetos de lei, de regu-
Popular e o Partido Socialista têm, portanto, ao menos um terço das
lamentos - ou de outros atos administrativos - ainda não votados
cadeiras. Esse 'procedimento pennite ao "partido que não faz parte
pelas assembléias ou publicados pelas autoridades administrativas.
A decisão da Corre, baseada nesse procedimento, é publicada no da maioria governamental exercer o controle de uma lei votada pela
,
i, Boletim das Leis Federais e tem a mesma força obrigatória da norma maioria, através da Corte Constitucional".13 Isso vem ao encontro
do que já escrevia Kelsen em 1928, quando estabelecia como fun-
constitucional. De 1925 a 1933, sete sentenças foram proferidas, e 60,
Ii de 1949 aréo final de 1990.
ção da Justiça Constitucional a proteção das minorias parlamentares:
."No que se refere ... aos 'recursos contra as ~eis, se~.á.'extremamente
li i B) O controle a posteriori - a) Os modos de acesso: Controle importante
ficàdá'.db'
conceder'o d.ire~to 'de ,apresentá-lo
P:arlárriento". T3;nto mais que a Justiça
a uma minoria.quali-;-
C~nsiit~cional...
'", II pelos governos provinciais. Desde o início, os governo~ provinciais de.-
, feriram à Corte o controle da constitucionalidade das ,leis federais .(0 devc necessariamentc ~ervir, nas ..democr"aéias' parlamentares, à pr~-
Governo Federal podia agir da mesma forma a respeito das leis pro- teção das minorias" .14 .

vinciais). Tratava-se ora de fazer respeitar as regras relativas à divisão De 1976 a 1983,os Depurados do Conselho Nacional recoÍTe-
das competências entre Federações e Lander [estados], ora de regras ram cinco vezes à Corte e obtiveram ganho de causa uma vez; ~o~ve

substantivas. De fato, não parece que atualmente esse tipo de compe- a ação de uma Dieta provincial (a de Burgenland) que fracassou;
, I

I tência seja muito importante: em 1980, por exemplo, dois recursos uma 'outra foi bem sucedida em 1990.
"

contra as leis federais (de um total de 106) tiveram corno autores


governos provinciais.
Acesso pelas jurisdições. A reforma que Charles Eisennann dese- 13. Ohlinger.
14. RDP, 1928, p. 247.
java em 1928 foi realizada em 1929: a Corte Administrativa e a

A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRÍACA 49


48 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
:I
, ,
r

Acesso pelos indivlduos- Desde 1975 os indivíduos podem con- A explicação brilhante de Eisemmann (1928) continua válida
testar a constitucionalidade de uma lei federal com a condição de ainda hoje e mostra a importância da faculdade conferida à Corte
que seus direitos tenham sido violados pela lei em questão e que que pode, de fato, por ocasião do exerdcio de suas diversas atribui~
esta lei seja aplicável sem a intervenção de uma decisão judicial ou ções, levantar de ofício a inconstitucionalidade da lei.
de uma decisão administrativa.
Como ressalta Olinger, Kelsen percebeu a importância da
Na prática, enquanto há de 20 a 30 recursos de indivíduos por
adjunção constitucional que ele tinha sugerido: os indivíduos podem
ano (20 em 1981,30 em 1982), no período de 1976-1983 a Corte
assim, indiretamente c desde o início, pedir o exame da constitucio-
Constitucional só admitiu o recebimento dos recursos individuais
nalidade de uma lei, apresentando perante a Corte Constitucional
em 15 casos. Veremos entretanto que, em 1990, três anulações fo-
um tecurso contra um ato administrativo, em razão de ter sido prati-
ram obtidas e que, em 1994, houve 102 pedidos a esse título, dos
cado com base numa lei inconstitucional. A reforma de 1975 adotou
quais apenas um obteve a anulação. a respeito de uma lei de 1980
essa orientação.
que previa a existência de uma só comunidade cultural israelita por
comuna. Nesses diferentes casos não há prazo para a provocação da O resultado é que definitivamente a própria Corte, entre as ques-
Corte. Em compensação, a Corte tem o prazo de um mês para jul- tões que lhe são submetidas, escolhe aquelas que parecem, na oca-
gar, mas "na medida do possível". Na prática, este prazo não é res- sião, necessitar de um julgamento relativo à constitucionalidade de
peitado. Mas, como vimos, houve 102 recursos em 1994. uma lei. Constataremos que esse contencioso é importante, uma vez
Acesso de ofício pela Corte. Desde a sua origem, a Corte tem o que em 1982, dos 106 casos relativos à constitucionalidade de uma
poder de examinar de ofício a constitucionalidade de uma lei, desde lei, 60 resultaram de um controle de ofício (44 em 1988 e 207 em
que essa lei deva servir de base para uma decisão e que existam 1989). Isso significa que essa é a principal via do controle da consti-
dúvidas sobre sua constitucionalidade. tucionalidade das leis na Áustria.
Uma lei pode servir de base para um julgamento da Corte, ime- b) A decisão da Corte e gUS eftitos. A Corte, em princípio, só
diata ou mediatamente. Imediatamente se ela deve aplicar-se à julga nos limites dos pedidos dos requerentes: ela não pode pronun-
espécie pendente de julgamento, a qualquer título - jurisdição ciar-se ultra petita. Isso é válido mesmo quando é levantada de ofício
administrativaespecial,15Tribunaldos Conflitos,16TribunalElei- a inconstitucionalidade de uma lei ou de uma disposição legislativa.
toral,17ou ainda, Juri~diçãoRepressiva.la Mediatamente, quan~ De fato, é muito difícil para a Corre respeitar essas regras; principal- .'
do a soluçãoda que"stãoque formao objeto imediatodo debate-.
'mente quando-anulações parciais mudam_o sentido da lei. Ne~te úl-
regularidadede um ato.administrativoou de uma norma geral-
timo caso, ela poderá dar um prazo para 'olegislado~ .refazersua lei: A
dependa da validadeda n~rmasuperior na qual se baseia.É, por
exemplo, o caso:de um particular que supõe que uma décisão . revisão constitucional dé"1975 deu..:lheo pod~r de julgar ultr.a.petita
administrativa viola seus direitos constitucionalmente garanti- caso a lei tenha sido. feit<:L
por -um.órgão )egislativo.'incompeten't~ ou
i:,,' dos, porque foi tomada em cumprimento de uma lei inconstitu- tenha sido publicada de forma irregular.
ciona(l9... ou ainda quando é argüida a irregularidade de um Se a Corte decretar a anulação da lei atacada ou de alguns de
'I regulamentofeito com base em uma lei inconsticucionapo
"
seus dispositivos, as conseqüências dessa decisão são cuidadosamente
explicadas pela Constituição. O princípio é o da não-retroati~idade
15. Aet.137.
16. Art.138.
da decisão anulatória: a lei cessa de ter efeitos na data da sua publi-
17. Art.141. cação no Boletim das Leis Federais, todavia ela conserva seus efeitos
1'1' 18. Art.143.
anteriores e continua a vigorar quanto aos fatos produzidos antes
I 19.
20.
Art.144.
Art.139. da sentença.

50 AS CORTES CONSTITUCIONAIS A CORTE CONSTtTUCIONAL AUSTRiACA 51


)

A Cone pode também decidir retardar os efeitos da decisão de 2. O princípio da legalidade - De acordo com esse princípio,
anulação no prazo máximo de um ano: o prazo concedido deixará expresso no artigo 18, alínea I", da Constituição, a atividade admi-
tempo ao legislador para refazer sua lei. Contudo, passado esse prazo, nistrativa do Estado somente pode ser exercida em conformidade às
a lei não deverá mais ser aplicada.21 "Na prática. esse grande poder Leis. Isso obriga o legislador a propor regras precisas e só deixar ao
da Corte de organizar o efeito temporário de suas decisões verificou- regulamento, que deve evidentemente ser um, regulamento de aplica-
se muito eficaz. É baseado no fato de que a anulação de urna lei é, do ção das leis, o mínimo de explicações a serem dadas.
ponto de vista formal, uma função legislativa. Assim Kelsen qualifi- A Corte é explícita nesse sentido. desde 1923:
cou a Corte Constitucional de "legislador negativo". 22
Para que possamos falar de regulamento complementar de unla
Lei, é preciso que esta disponha não apenas que medidas podem
IH. JURISPRUDÊNCIA
ser tomadas - o que seria uma simples delegação de competência-
Não se trata de expor aqui quase 60 anos de jurisprudência. mas quais medidas devem ser tomadas, cuja regulamentação do
detalhe ela deixa ao regulamento ... É preciso que possamos perce-
Procuraremos principalmente fazer um apanhado.
ber na lei... todos os elementos essenciais da regulamentação pre-
tendida.. (sem dúvida) o limite entre a delegação legislativa e a
1. O Estado e as coletividades que o compõem.
disposição concreta nem sempre é evidente. É a Corte que deve
decidir se estamos diante de uma ou de outra espécie.
A) No que se refere às relações entre as Federações e os Lander, três
atribuições da Corte podem ser fontes de jurisprudência: o julga-
Assim, por exemplo. a Corte anulou, em 1958. un"la disposição
ll"lento dos conflitos negativos ou positivos de atribuições entre Fede-
legislativa que previa que o Ministro Federal do Comércio estava au-
ração e Lander, o controle preventivo da constitucionalidade dos pro-
torizado a subordinar o exercício de algumas profissões à expedição
a posteriori das Leis Federais e provinciais de
jetos de lei e o controle
de uma licença, através de regulamento. se o interesse público o exi-
iniciativa Não,há muitas decisões ligadas à prin"leira
dos governos.
gisse expressamente.23 Tarnbém foi anulada uma disposição legislativa
atribuição. Em compensação. quanto à segunda (controle preventi-
que previa que, em caso de oferta de terrenos para construção, 15 a
vo), podemos contar umas 60 decisões, e quanto à terceira, com uma
20% da superfície deviarTI ser cedidos gratuitamente à comuna (a
centena de decisões de,anulação de disposições legislativas, o que prova
cidade de Viena) poi 'serem de "necessidade pública". Nos dois casos,
uma grande atividade ~a Corte nessa área.
a noção de in"teresse O~l de necessidade pareceu muito viga 'à Corte.
B)" No que se refere'ao Estatuto Constitucional das Comunas, a Nos anos 1950, a Corte aplicou o mesmo raciocínio aos atos ad-
existência de"uma jurisprudência abundante da Corte explica-se pelo ministrativos individuais, anulando várias disposições "legislativas que
fàto de qué,~ C~ilstituição "contém dispositivos muito detalhados re1ati- não se adaptavam a essa exigência. Assim, em 1966. da"declatóu in:..
"vos à organização das cO'munas, às suas relações com a Federação e os constitucional uma disposição legislativa que. após detalhar as condi-
Lander e às suas competências exclusivas, que são exercidas sob o ções nas quais podia ser concedida a licença de exploração de um cine-
controle das outras autoridades. Uma revisão constitucional, de 1962, ma. acrescentava que quem preenchesse essas condições não tinha um
reforçou esta autonomia que a Corre protege contra possíveis ata- direito subjetivo à obtenção dessa licença, pois isso significava conceder
ques, entre estes os do Legislador Federal. Foi assim que a Corte de- um poder discricionário muito grande à autoridade administrativa.24
cretou umas 20 anulações de disposições legislativas nessa área. Ocorreram 83 anulações por essa razão, de -1946 a 1980.

21. Art. 140, aI. 5, da Constituição. 23. 21 de junho de 1958, Slg 3360.
22. Ohlinger. 24. 17 de março de 1966, Slg 524.

52 AS COR.TES CONSTITUCIONAIS A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRÍACA 53


I ~ I'
I ':
I
, diferenças legais. ele estabeleceantes uma relação entre as diferen-
3. A prorcçIio aos Direitos Fundamentais - Essa proteção é
ças criadas pela lei e as diferenças criadas pela realidade social e
assegurada contra as Leis (federais e provinciais) e os atos adminis- exige um certo grau de equilíbrio entre os dois domlnios. A di~
trativos; em compensação, não há, como na Alemanha ou na mensão das diferenç:\ssociaisdevecorresponder às diferenç."\S exis.
Espanha, proteção contra os atos jurisdicionais. Duas questões de- tentes na realidade social. mas não perfeitamente. uma vez que o
venl ser examinadas: legislador pode ter a intenção legítima de mudar a realidadesocial
de algum modo.27
A) O probúma das normas de reftrência e a definição dos Di-
rdtos Fundamt:ntais - No Direito Constitucional austríaco, é me-
I o problema é que a avaliação feira pelo Legislador (às vezes com
nos importante a' proteção aos direitos fundamentais do que aos
direicos garantidos pela Constituição. c a Corre Constitucional en-
! uma pequena maioria) pode ser corrigida pela avaliação feita pelo
Juiz Constitucional, o que leva a Corte a definir critérios objetivos e
tende por direitos garanridos'''-~os'-direitos'subjetivos dos 'particulares I a deixar uma margem de manobra bcm grande ao Legislador. Caso
que são instituídos por unla disposição de direito objetivo de or- contrário. parecerá dar razão à minoria contra a maioria.
dem constitucional". 2S Uma ourra função do prindpio de igualdade é "corrigir as falhas
OS beneficiários dos direitos fundamentais são os cidadãos aus- de uma lei que são mais uma conseqüência de avaliações políticas
tríacos; mas uma evolução tende a aproximar direitos do homen1 e diferentes do que negligência e imprevisão do Legislador". Trata-se
direitos do cidadão. com exceção do princípio da igualdade, cuja in- dos casos cm que os efeitos jurldicos da legislação adotada dependem
vocação é reservada aos cidadãos. Podem também ser consideradas, do acaso ou da realização de condições facilmente «manipuláveis".
como beneficiárias. as pessoas jurídicas de direito privado. mas a dis-
cussão continua aberta para as de direito público.
IV. INFLUÊNCIA SOBRE A ORDEM JURÍDICA E
POLÍTICA
~ B) Os Direitos Fundamentais protegidos - a) A proteção dos di-
I
",'
:I,', I .
reitos ~ libcrdatÚs cldssicas é muito parecida à assegurada em outros
países dotados de uma justiça constituciona1.2G Em compensação,
con10 foi dito acima, a enumeração dos direitos econômicos e sociais
protegidos é muito mais curta; '~as isso é co~pcnsado pela impor-
1. A influência sobre a ordem jurídica - As regras constitu-
cionais iInpõem-se incontestavelmente ao Legislador (federal e pro-
vincial) e às autoridades adqlinistrativas. que não podem criar o

I,~
'I

", >I.
tância da jUrlsprudência .relari~a-áQ princípio dc igualdade.
..' .b) . Se nos basearmos si'mpks!Jl"rotc ~as causas de anulação. pro-
'"rit.inci~dáspor violação dos direitos fundamcntai~ pelo legislador, entre
. Direito ou aplicá-lo senão em função das normas. de ordem consti- .
tucional. Os Direitos Fundamentais, principalmente. são considera-
dos como dirctamente aplicáveis à administração. a( compreendidos'
~:' 1946 c 1979" constatarem~s a esmagadora 'preponderância da viola- os decorrentes da Convenção Européia dos Direitos do Homem. En-
" ção do pri'ndpio deig;'aldade Como causa de anulação: 121 casos em tretanto. a Corte Constitucional não dispõe sobre a possibaidade de
,11: 142. ou seja, quase nove casos em dez .. controlar o respeito aos direitos fundamentais pelas jurisdições ordi-
. '. nárias. pois não há recurso que permita deferir um ato jurisdicional

:l ~ que, na realidade, o princípio de igualdade é interpretado pela


Corre, "como uma injunção geral à obj~tividtukde uma disposi-
ção legal... o princIpio da igualdade não implica interdição das
por violação dos direitos fundamentais. :t.
portanto, dos próprios Tri-
bunais e, acima deles. das COrtes Supremas da ordem judiciária e da
ordem administrativa. o dever de zelar pelo respeito à Constituição.

25. Ohlinger.
26. Ver rd:uório Ohlinger ao Colóquio de Aix. 1981.
27. Ohlingcr. 1982. p. 382.

A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRíACA 5S


S4 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
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I",i
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li\
,
De fato "os tribunais inclinam-se a resolver os problemas jurídicos Primeirarnente, assegura a defesa dos direitos da oposição ou da mi-

que lhes são colocados com a ajuda do Direito Civil ou do Direito noria parlamentar "forçando a maioria a respeitar estritamente a Cons-

Penal, sem recorrer diretamente ao Direito Constltucional".28 tituição Ce)compensando a disparidade de poder entre a maioria e a
Aliás, no Direito austríaco não há (o que em Direito aletnão cha- minoria". o que facilita à oposição a reconquista do poder.30 A seguir,
mamos a DrittuJirkung) efeito direto dos direitos fundamentais nas ela protege as minorias sociológicas ou políticas que não são suficien-
relações entre particulares: os direitos fundamentais são unicamente temente representadas ou não o são de forma alguma, o que com-

invocáveis contra o Estado, como decidiu a Corte Constitucional pensa a dominação e a monopolização do debate político pelas gran-

em questões recentes e principalmente em uma sentença de 1974.29 des formações. Finalmente, controlando a objetividade ou a precisão

Em uma outra decisão relativa ao direito à reunião, a Corte decidiu das leis, a Corte contríbui para racionalizar o processo de elaboração

que a ameaça de uma manifestação contra uma réunião não justifica das normas e para corrigir __
()_~
__
ciefeit.os resultantes do rno~opólio da
decisão política pei~'~'
g'~a~des partido~~.. .... _..........
..... . ..
a proibição dessa reunião, pois um particular não deve poder limitar
a liberdade de reunião de outro. Há alguns anos a Corte interpreta - para grande desgosto dos
partidos políticos - de maneira muito mais extensiva suas atribuições

2. A influência sobre a ordem política é reconhecida há mui- em matéria de proteção dos direitos fundamentais. Sua jurisprudência

to tempo, mas ela é maior ou menor de acotdo com a situação tornou-se mais "política" e isto desencadeou um debate com muitas

política. repercussões na opinião pública.


Questionada no início, nos anos 1920, quando era ainda profun-
do ° sentimento da soberania parlamentar, a Justiça Constitucional
não é mais cohtestada pela classe política: a melhor prova é que a
revisão constitucional de 1975, que aumentou consideravelmente a
competência da Corte, foi aprovada por unanilnidade pelas duas
Assembléias do Parlamento. É verdade que sua influência tem cres-
cido nos últimos 15 a.nos, como veremos. No tempo da "grande
coalisão", isto é, entre 1945 e. 1966, os d?is gra~des partidos eram
aliado.s e o governo dispunha sempre.da.maioria de dois terços no
Conselho Nacional, o que permitia "neutralizar" as decisões da Corte
Constitucional, mudand<,? a Constituiçã? quantas vezes fosse- neces~
sário. A partir de_.1966, em.compensação, as maiorias são
mono partidárias, com o contrapeso, a partir de 1983, de uma "pe-
q uena" coalisão entre o Partido Socialista e o Partido Liberal: o pa-
pel da Corte tornou-se então importante, pois ela foi obrigada a
tomar posição sobre questões politicamente muito controvertidas,
principalmente quando a oposição combatia esta ou aquela lei .no
momento de sua votação. Hoje a Corte preenche uma tripla função.

28. Ohlinger, 1982, p. 358.


29. VsSlg 7.400. 30. Ohlinger, 1983.

A CORTE CONSTITUCIONAL AUSTRíACA 57


56 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
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I
CAPITULO 111
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I; I
o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

f FEDERAL ALEMÃO

I
l
I'

II
I'
I
I
,A JURISDIÇÃOconstitucional foi criada na Alemanha Federal
pela Lei Fundamental de 8 de maio de 1949.
Depois de demonstrada a incapacidade do legislador. na
época do nacional-socialismo, de proteger os direitos fundamentais,
os constituintes de 1949 adotaram o r:nodelo kelsen.iano, criando um
Tribunal Çonstitucional dotado de a~pla c'ompetência. Este Tribunal
foi cri~do,pela ~í de 12 de março de -1951 e começou a funcionar
..e~ s.etenibrodo mesmo ano.
Além 'dessa" várias C~:>rte:S_
Co'nstitucionais ,foram instaladas nos
Linder, entre ,1947 e 1955,exceto asde Schleswig-Holstein e de
Berlim;- cinco ,novas Cortes foram criadas nos Lander da ex-Alema-
nha do Leste.

1
r. COMPOSIC;ÃO E FUNCIONAMENTO

1. Composição - O Tribunal Constitucional compõe-se de


dezesseis membros, com um Presidente e um vice-Presidente, dividi-
dos em duas Câmaras ou "Senados" com oito membros cada um.
)

Apesar de todas essas precauções, destinadas a lilnitar a influência


A) Trêsjuízes de cada câmara, ou seis no total, devem ser Juízes dos partidos, a repartição das vagas é feita na realidade por acordo
Federais, isto é, magistrados que pertenceram, durante pelo menos entre os dois partidos, e os Juízes possuem uma ligação política cla-
três anos, a uma das cinco jurisdições superiores da Federação (Corte ra, mesmo Juuito antes da carta do partido CDU ou SPD. Como
de Cassação, Tribunal Administrativo Federal, Supren"la Corte Fede- disse M. Fromont, aplica-se o sistema austríaco da proporz entre as
ral em luatéria fiscal, Tribunal Federal do Trabalho, Cone Federal de duas grandes entidades e nem os liberais nem os verdes têm assento
Arbitragem Social). Os outros cinco juízes de cada câmara - ou dez no Tribunal Constitucional. Em 1984, esperaram-se quatro vacân-
no (otal _ "deVCIU ser escolhidos entre pessoas COIU idade superior a cias para fazer uma espécie de package, o que facilitou as negocia-
40 anos, que possuam os diplomas exigidos para exercer as funções ções entre CDU e SPD, que fizeram acordo a respeito da sucessão à
de luagistrado (ou seja, na prática, entre personalidades políticas ou presidência em três. anos.
.._º=<;Ü~-exames
~.Il.iy_e.~~_i_~,~.ri_~.~_.<:9.r.n._-º~ de Direito)". I Quanto à composição sociológica, o Tribunal Constitucional Fe-
deral não difere Ill.uiro das outras Corres Constitucionais. Obser-

II
B) De acordo com a Constituição,2 "metade dos melubros do vamos o mesmo grande comparecimento de professores de Direi-
Tribunal ConstitucionalFederal é eleita pelo Bundestag [Câmara dos to e de advogados. Os políticos não estão excluídos e podemos
Deputados], metade pelo Bundesrat [Senado]. notar, curiosamente, que o Presidente do Tribunal Constitucional
Federal, até 1983, J. Benda, era um antigo Ministro do Interior, o
As modalidades de designação foram fixadas em textos específicos
que também era o caso, como sabemos, de seu homólogo francês
e pela prática. Primeiramente, a escolha pelas duas assembléias é
na meslna época.
feita a partir de listas elaboradas pelo Ministério da Justiça, con-
tendo, de um lado, os nomes de todos os Juízes Federais que pre-
enchem. as condições exigidas, e de outro, "os nomes de todos os
I
! C) A média da idade é nitidamente menos elevada. De fato,
cada juiz é eleito para um m.andato de 12 anos, mas o limite da
postulantes que são apresentados por um grupo parlamentar do r
Bundestag, Governo Federal e governos dos Uinder". 3 A partir idade é fixado enl 68 anos completos. O mandato não é renovável e
~
somente a assembléia plenária da Corte pode autorizar unia apo-

I
dessas listas, cada assembléia escolhe de acordo com as diferentes
modalidades. No Bundesrat, os Juízes são eleitos através de escru- sentadoria antecipada ou destituição em caso de faltas graves' aos
tínio direto e devem contar com a maioria dos dois terços (ou 34 deveres. ou de atos que acarre.~em y.ma. peria .pri.vativa da .liberdade
votos dos 50). No Bundestag elege-se primeiro, através de repre- de mais de seis meses.4 Eles não podem exercer outras fúnções,
sentação proporcional e para o período da legislatura, os 12 gran-
!! exceto os professores ..un~versitários, autorizados a c,ontinuar k;:çio.-:-
...
des eleitores que escolhem os juízes por maioria de dois terços.
Para cada uma das duas Câmaras da Corte, Bundestag e Bundesrat
, nando,
em primeiro
com a condição
plano. ..
de. p'~r sua atividade
..
de juiz conscitucional
.
elegem, cada um, quatro juízes, ist~ é, duas vezes quatro juízes, ~
assim divididos: dois Juízes Federais e dois Juízes não federais para
uma Câmara, e um Juiz federal e três Juízes não federais para a I 2. Funcionamento - A) A divisão do Tribunal em duas câma-
outra câmara. Finalmente, Presidente e vice-Presidente são elerros
nas mesmas condições, tanto pelo Bundestag como pelo Bundesrat, Ií ras é bem marcada.
em uma determinada
De fato, cada juiz é eleito para ocupar
câmara e não há possibilidade
um lug~r
de troca; álém
e devem pertencer a câmaras diferentes. disso, cada câmª-ra é presidida pelo Presidente ou pelo vice-Presiden-
i
te; enfiIn, a cada uma é atribuída uma função específica (embora

1. Fromam e Rieg. 4. Art. 105, at. 1 e 2, da lei sobre a Corte Constitucional.


2. Art. 94, alo 1.
3. Béguin.
61
O TR.IBUNAL CONSTITUCIONAL FEDERAL AL£MÃO

60 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
~llj:
rlil
I J haja tendência para atenuar essa especificidade). Tanto isso é verdade
I, que essas câmaras «formam praticamente dois tribunais distintos". 5
V~remosentretanto que a quase totalidade dos casos julgados
peIo Tnbunal são de outras modalidades: assim, os recursos constitu-
As atribuiçóes conferidas às seções de três juízes, criadas em 1985,
cionais, que representam perto de 980/0das demandas, são examina-
dentro de cada câmara, tendem a aumentar.
dos por seções de três juízes que, em mais de 99% dos casos, decidi-
ram rejeitá-los em 1994.
B) O Tribunal Constitucional goza de uma total autonomia no
plano administrativo e financeiro. Ele não depende do Ministério da
Ir. ATRIBUIÇÕES
Justiça para seus quadros; seu orçamento é separado dos demais ór-
gãos constitucionais. Conforme a tradição alemã. segundo a qual "as 1. As outras atribuições além do controle da constitucionali_
jurisdições supremas não se situam na mesma cidade que as assem- dade das leis.
..bléiase-o-governo"f--QTribunaJ.Const-itucional têm sede em KarIsruhe.
A) O Tribunal Constitucional é Tribunal Eleitoral mas somente
C) O procedimento adotado perante o Tribunal Constitucional em caso de apelo.
é regido pela lei de 12 de março de 1951 (modificado em 12 de
De fato, o Bundestag é competente para verificar os poderes de
dezembro de 1985 e 2 de agosto de 1993), pela aplicação do artigo
seus membros e pode também declarar a perda do mandato des-
94 da Constituição. Todavia, como esta lei só contém princípios. re-
tes;Bmas a decisão do Bundestag pode ser encaminhada ao Tribu-
corre-se também aos Códigos de Processo Civil e Penal e ao Regi- nal Constitucional, no prazo de um mês, por aquele cuja eleição é
mento Interno da Corte. contestada, por um eleitor cuja demanda foi rejeitada pelo
Bundestag (se mais de 100 eleitores se juntarem a ele), por um
o procedimento é escrito e oral... Mas, após 1963, não há au-
grupo parlamentar ou mais de um décimo dos membros do
diência oral se todas as partes renunciarem a ela. Além disso. em
Bundeuag. De fato, a atividade do Tribunal Constitucional nesse
matéria de controle concentrado por meio de remessas dos Tri-
campo é mais fraca, pois, em 39 anos, só proferiu 60 sentenças
bunais das normas, o Tribunal pode decidir que não haverá au- em matéria eleitoral.
diência. "De fato, a maior parte das decisões são tomadas sem
. audiência oral."7 A Corte conduz o procedimento e ordena as
B) A fúnção do Tribunal Constitucional como Alta Corte de Jus-
.medidas de instrução necessárias. Em cada câmara, seis juízes
tiça ou como Tribu,?al repressivo é ~in~a .IT.l~i.s
ár~ua. .
pelo menos (de oito) devem estar presentes e as decisões são (0-
m~das pcfa maioria dos juízes presentes; o voto do Presidente De acordo com o artigo 61 d.a Constituição, o Bundesrat pode
não é preponderante no caso de empate. Apenas a declaração de acusar o Presidente da República Federal por violação volunt:1ria
inco~stitucionalidade de um partido político exige a maioria de da Lei Fundamental ou de!-1maoutra lei.federal.,'Mas esse dispo-
'~ois'~erços. Após 1970 os votos são tomados um a um, as opi- sitivo nunca foi aplicado. Acontece o mesmo com a ação contra os
niões di~sidentes são declaradas e sua publicação é deixada a cri- Juízes federais.
tério. de seus autores. O exemplo estadunidense foi adotado, mas O Tribunal Constitucional pode declarar a perda dos direitos fun-
não sem alguma resistência. damentais, a pedido do Governo Federal, do Bundestag ou do
governo de um Land, contra "qualquer abuso da liberdade de ex-
pressão, principalmente da liberdade de imprensa, de ensino, de
5. Fromont e Rieg. reunião, de associaÇão,de sigilo de correspondência, do correio e
6. Idem.
7. Idem.
8. Art. 41 da Constituição.

62 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL FEDERAL ALEMÃO 63
,
das telecomunicações, da propriedade ou do direito de asilo por Houve 43 decisões a esse título, de 1951 a 1990, das quais 19
lurar contra a liberdade e a democracia .. ".9 Duas decisões foram antes de 1975 e 24 depois.
tomadas com esse fundamento, UInaantes de 1970, outra em 1974.
E) O controle da qualidade e do sentido das nonnas constitui
Enfim, a pedido do Bundestag, do Bundesrat ou do Governo uma competência especial do Tribunal Constitucional desde que esse
Federal, o Tribunal Constitucional pode decidir a interdição de um controle não termine anulando uma norma.
partido polírico por violação dos princípios da Lei Fundamental. 10
De 1951 a 1992, o Tribunal Constitucional proferiu duas decisões: Num primeiro caso, o Tribunal pode ser provocado por uma
autoridade pública (Bundestag, Bundesrat, Governo Federal de
em 23 de outubro de 1952 ele declarou inconstitucional o Partido
um Land) ou também pelo Juiz ordinário, antes de aplicar o
Nacional Socialista e, em 17 de outubro de 1956, o P?-rtido Comu-
texto,- quando--o-problema que se coloca é saber se uma regra de
nista Alemão.
Direito, editada antes da Constituiçao, continua a ser aplicada
como norma jurídica federal ou como norma jurídica dos Lander.
C) Como Corte federa!, o Tribunal Constitucional julga litígios No segundo caso, o juiz ordinário pode interpelar o Tribunal
entre a Federação e os Liinder, assim como entre os Liinder. II Constitucional "em caso de dúvidas se uma regra de Direito
internacional faz parte do Direito federal e se ela cria direta-
Trata-se principalmente de resolver conflitos de competência c isto
mente direitos e deveres para os particulares". Finalmente, "se o
nem sempre é fácil, pois, na Alemanha Federal como na Áustria, o
entrelaçamento das competências é uma realidade. O Tribunal Tribunal Constitucional de um Land, por ocasião da interpre-
Constitucional é provocado ora pelo Governo Federal, ora pelos tação da Lei Fundamental, quiser derrogar uma decisão do
governos dos Lãnder. O número de recursos não é elevado: um Tribunal Constitucional Federal ou da Corte Constitucional de
total de 37 decisões de 1951 a 1990. um outro Land, ele deve submeter a questão ao Tribunal Cons-
titucional Federal".
O) O julgamento dos conflitos entre órgãos constitucionais da
Federação é confiado ao Tribunal Constitucional, pelo artigo 93, par. F) O <recursoconstitucionar e o pape! do Tribunal Constitucional
1, aI. 1, da Constitu"ição. como Corte Administrativa e 'superCorte de Cassação': O recurso consti-
"~ucíonalfoi previsto pela lei de 12 de março de 1951, sobre o Tribunal
o Juiz Cónstirucióna1-exerce amplamente sua c?mpetência nesse
Co~stituc~onal, depois foi constitucionalizado pela Revisão Consti-
campo, pois entende por "órgãos constitucionais" não smnente' o
Presidente da Federação, o Governo -Federal,"asduas d~aras, mas
1 "tucional de 29 de janeiro de 1969, como indica o artigo 93, parágra-
também, em algumas hipóteses, os "grup,?syarláinentares,_ ós de"- fo 1.'\ alínea 4 "a" da Constituição: "qualquer pessoa que sentir-se
""putados e os partidos políticos.l2" Entret~nto, s6 pode haver juris- lesada pelos poderes públicos em seus direitos fundamentais" pode
diçao se houver uma verdadeira discordância entre doÍs órgãos apresentar um Recurso Constitucional. Isto tem em vista os prej uízos
sobre a interpretação de um dispositivo da Constituição e sua apli-
cação em um caso determinado. Segundo a lei de 12 de março de
1951, o recurso deve ser apresentado no prazo de seis meses.
I causados pelos atos administrativos, regulamentares ou individuais, os_
atos iurisdicionais e as leis. De fato, os atos administrativos, e princi-

i
I
palmente os atos jurisdicionais,
contencioso levado à Corte.
representam a maior parte do

9.
lO.
lI.
Constituição, art. 18.
Constituição, art. lI.
Constituição, art. 93, par. I, aI. 3 e 4.
I
!
Assim, efetivamente, "o Recurso Constitucional preenche duas
grandes funções: a primeira, em casos extremos, permite aos indiví-
i duos ~cionar o controle da constitucionalidade de uma lei; a segunda,
ll. Promant e Rieg.

o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL rJ::.DJ::.RAL ALEMÂO 65


64 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
mil
'1'11.
,
','I
I' ,,' mais freqüente, permite aos indivíduos contestar a constitucionalidade Estado, em várias ocasiões, recusou-se a promulgar Ulna lei, não houve
do julgalnento de um Tribunal superior" .13 até então nenhuma decisão por parte de outro órgão constitucional.
c) Finalmente, a entrada em vigor de uma lei pode ser retardada
A maioria dos recursos constitucionais são apresentados contra
julgamentos de Tribunais federais, "e, portamo, contra as senten- até a sentença do Tribunal Constitucional, se esta suspender sua exe-
iI: ças geralmente de terceira instância". 14 "O Tribunal torna-se as- cução por um despacho provisório. Assim, a lei sobre a interrupção
sim uma espécie de jurisdição superior. encarregada de impor uma voluntária da gravidez, votada em 18 de junho de 1974 e promulga-
interpretação uniforme das regras constitucionais ao conjunto dos da no dia 21, teve sua entrada em vigor diferida no mesmo dia pelo
Tribunais superiores alemães, o que lhe permite exercer urna in- despacho provisório do Tribunal Constitucional, julgando o pedido
fluência decisiva sobre o conjunto do Direito alemão, aí compre- do governo do Land de Baden-Württemberg, e foi anulada, sem nunca
endidos o Direito Civil e o Direito Penal."15
ter entrado em vigor, pela sentença de 25 de fevereiro de 1975. Do
mesmo modo, em 1977, o Tribunal suspendeu a aplicação da emen-
2. O controle da constit~'~iona1idade
das leis e dos,tratados
da à lei sobre o serviço militar e o serviço civil, a pedido do grupo
parlamentar CDVICSU e dos governos de três Liinder. Em 1983 sus-
A) O controLepreventivo - Ao contrário do que geralmente se
pendeu a aplicação da lei sobre o recenseamento e esta lei nunca
afirma, há um controle preventivo das leis na Alelnanha Federal. Ele
entrou em vigor. Finalmente, em 17 de outubro de 1990, ela orde-
se verifica principalmente em três hipóteses:
nou a suspensão provisória da lei sobre as eleições pan-alemãs.
a) Imediatamente, uma lei que aprova um tratado pode ser en-
caminhada ao Tribunal Constitucional, antes de sua promulgação,
B) O controle a posteriori - a) O controle concentrado repressivo
em virtude de uma jurisprudência firmada em 1952, em um julga-
por via de ação pode ser acionado contra uma lei (federal) pelo gover-
mento que rejeitou um requerimento do SPD contra o tratado que
no de um Land ou por um terço dos membros do Bundestag.
crioü o CED.16 Trata-se de um controle concentrado preventivo das
Esse controle pode ser acionado contra todas as categorias de leis,
normas; o requerimento pode ser apresentado pelos governadores dos
aí compreendidas as constitucionais, tanro do ponto de vista da forma
Ldnder ou pelo terço dos membros do Bundestag. Foi assim que a
como de conteúdo: assim, a norma constitucional de 27 de junho de
constitucionalidade da lei que aprovou o tratado assinado entre a
196B, que modificava o artigo 10 da Lei Fundamental, foi submetida
RFA [República Federal da A1emanhaJe a ROA [RepúbliCa Democrá-
ao Tribunal Constitucional. A prerrog-ài:l.va parlamentar de ingresso
tica da Alemanha), votada em 25 de mài.ode 1973, foi questionada
em juízo não é de fácil utilização e exclui, por exemplo, outro partido
em 28 de m~ió de 1973, pelo Land da Baviera.
que não seja um dos dois maiores: os liberais e os verdes estão portanto
..b) Em ~aÚria de.litígios entre órgãoscomtimcionais ~ possível o
excluídos dessa garantia; foi por isto que, no momento da grande
contrq!e.a prior/da lei, .~asoo Presidente da República 'recuse-sea pro-
coalisão CDU-SPD (de 1966 a 1969), a minoria ou a oposição não dis-
mulgar uma lei e u~ outro órgão c9nstitucional, conttário a esta recu-
punham dessa faculdade. Certamente os governos dos Ldnder podem
sa, acione o Tribunal Constitucional:- este deverá então pronunciar-se
provocar o Tribunal, mas dependem dos dois grandes partidos.
sobre a constitucionalidade da lei, antes de examinar a .co~stitucionali-
dade dos motivos da recusa da promulgação. De fato, se o chefe de De 1951 a 1990 - sem que seja possível distinguir emre leis fede-
rais e leis dos Liinder - houve 106 requerimentos (entre os quais
pouquíssimos por parte de parlamentares) e 60 decisões. É relati.-
13. Idem.
14. Schlaich. 1982. p. 132. vamente pouco, em comparação com a França; mas é preciso le-
15. Fromont e Rieg, p. 104. var em consideração outros motivos de ajuizamento muito mais
IG. Béguin, p. 75. numerosos.

66 AS CORTES CONSTITUCIONAIS
o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL FEDERAL ALEMÃO 67

,
1,1
Deve-se observar que normalmente o requerimento visa a obter difuso: a remessa é decidida pelo juiz independentemente das con-
a anulação. Contt:do a autoridade requerente pode também pedir a c!usóes das partes; o Tribunal Constitucional "não é obrigado a
confirmação da validade da lei e de sua aplicabilidade; neste caso, ela limitar seu exame aos dispositivos para os quais o juiz do mérito
pede anulação";2o a decisão de anulação tem efeito erga omnes.
pede a intervenção do Tribunal para obrigar a autoridade governa-
Todavia, a instância perante a Corte Constitucional é subsidiária
mental ou administrativa a aplicar a lei.
e extingue-se com a instância principal.
b) O controle por meio de remessas dos Tribunais. O artigo 100
.1

da Constituição prevê quatro casos de remessa, entre os quais apenas


" c) O recurso constitucional (de iniciativa dos indivíduos). Se a
um refere-se às leis federais. Isto demonstra ainda o escasso número
afronta aos direitos do requerente vem diretamente da lei, o recurso
de recursos (lO recursos em 1990,23/24 em 1994).
pode ser levado ao Tribunal Constitucional, sem outra obrigação a
Entretanto, a questão da inconstitucionalidade de lima lei pode não ser respeitar o prazo de um ano, a contar da entrada em vigor da
ser, como na Itália, levantada perante qualquer Tribunal e é este lei. Se a afronta aos direitos do requerente revelar-se no momento da
Tribunal que deve decidir sobre a remessa ao Tribunal -Constitu- aplicação da lei, pelo administrador ou pelo juiz, o recurso deve ser
cional, independentemente da conclusão das partesY Todavia, só apresentado no prazo de um mês, a contar da publicação da decisão
cabe remessa para as leis posteriores à Constituição, pois os Tribu-
ou de sua notificação ao requerente; mas esse recurso não poderá ser
nais têm a obrigação de apreciar a validade e a aplicabilidade das
recebido se as vias legais não se tiverem esgotado previamente. De
leis pré-constitucionais; ainda que o Tribunal Constitucional ad-
fato, "o esgotamento das vias normais de direito multiplica as chances
mita que se essasleis foram modificadas, mesmo parcialmente, após
1949, elas são assimiláveis às novas leis. Desse modo, a Corte consi- de ver o contencioso dos direitos fundamentais <lavadocom esponja'
derou que a remessa podia ser feita a propósito da compatibilidade pelo procedimento do controle por meio de remessas dos Tribunais
dos regulamentos comunitários com os direitos fundamentais. 18 das normas",21 pois os juízes, dos diversos graus, são obrigados a en-
Uma lei declarada inconsti(Ucionai é anulada retroativamente, erga viar à Corte Constitucional os feitos onde houver inconstitucionali-
omnes, e a decisão deve ser publicada no Diário Oficial. dade da lei. Há entretanto alguns abrandamentos a essa regra de es-
Antes de 1956, somente os tribunais superiores podiam remeter a gotamento das vias de recurso, principalmente quando sabemos de
questão diretamente ao Tribunal Constitucional; os outros Tribu-
antemão que o recurso 'tem poucas chances ou ainda «quando trat~r-
nais só podiam fazê-lo por intermédi9 dós Tribunais Superiores;
se de:uma que~tã~ de int~t:'~~se geral ou se o demandant~ puder sof;:er
disso resultou uma filtragem das reme"ssas,principalment~ pela
. um gta"v~e-inevitável prejuízo se o caso for enviado. aos ju.ízes "de
Primeira Câmara Civil da Corte de Justiç~ Federal, que se erigiu
em Câmara Constitucional. Todos os Tribunais foram autorizados direito comum". 22
.i
a provocar o Tribunal Constitucional após 1956 e, atualmente,
Modificado em 1985, para pe.rmitir às seções de três juízes pro-
a quase totalidade das remessas são feitas pelos jufzes ordinários e
nunciar-se positivamente (salvo sobre as leis), o proce.dimento
apenas 4% pelos tribunais federais.19 Após a reforma de 2 de agosto
de seleção dos recursos individuais foi reformado pela lei de 2 de
de 1993, uma seção de três juízes pode indeferir a remessa.
agosto de 1993, que estende_ainda_os_poderes das seções (maior
Além da qualificação de controle concentrado por remessa dos
obrigação de motivação f<;>rmal,competência originária para a
autos pelos tribunais inferiores, constataremos que há muitos ele-
rejeição, aumento dos motivos para o não-recebimenco, regula-
mentos objetivos que sugerem uma semelhança com o controle
mentos das leis).

17. Are. 80, aI. 3, da lei sobre a Corte Constitucional. 20. Béguin, 1982, p. 102.
18. 29 de maio de 1974, RDP, 1976, p. 197. 21. Idem, p. 115_
19. Schlaich, 123. 22. Lei Te, par. 90, aI. 2.

"'i
68 AS CORTES CONSTITUCIONAIS o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL FEDERAL ALEMÃO 69
. ,,
o requerente deve ter sido lesado em um de seus direitos funda- evoluir o direito constitucional". 24 Além disso, o Tribunal não está
mentais, enumerados nos primeiros artigos da Constituição ou nos vinculado às conclusões dos requerentes, quer o controle tenha sido
artigos 20, alíneas 4, 33, 38, 101, 103 e 104. Mas esra enumeração provocado por um tribunal por remessa (controle incidental), por
não limita realmente o recebimento dos recursos, pois o Tribunal Cons- um órgão político (controle por ação) ou por um particular (recurso
titucional considera que "os d.ireitos fundamentais formam uma 0[- constitucional), o que demonstra bem o caráter objetivo do
dem jurídica objetiva que deve ser interpretada não como uma série de contencioso de constitucionalidade das leis, qualquer que seja o modo
garantias pontuais, mas corno um sistema coerente e completo de va- de ingresso em juíZO.25 A Corre pode também levantar de ofício a
,' , '

lores que visa à proteção da dignidade da pessoa humana e o seu livre inconstitucionalidade de urna lei. desde que o litígio que lhe é sub-
, '
desenvolvimento".23 Em último caso, portanto, o recurso constitucio- metido, por via de recurso, contra um ato administrativo ou
nal pode invocar a violação de outros dispositivos da Constituição. jurisdicional, pressuponha a aplicação dessa lei (ver supra). Final-
mente ela pode, de ofício, avocar um,.despacho__ provisório.
Não há necessidade de enumerar os recursos diretos e indiretos
contra as leis federais. Para ser exato, seria preciso acrescentar os
b) Normalmente a constatação da inconstitucionalidade de um

I"', casos em que o Tribunal Constitucional Federal levanta de ofício dispositivo legislativo deve resultar na sua anulação; mas, cada vez mais
'i
" a inconstitucionalidade da lei, pois na ocasião de um recurso diri- hesitante diante das conseqüências dessa decisão, a Corte Constitu-
, ti "
gido contra um ato administrativo ou um julgamento, ela própria cional tem recorrido a outros métodos.
!' pode examinar a regularidade da lei que serve de fundamento a
['I
esses atos. Não podemos efetivamente ter uma idéia do alcance A Corre pode declarar a anulação da lei, mas essa anulação terá um
l'j efeito retroativo. fu conseqüências podem ser muito graves, tra-
I real do recurso direto no controle das leis federais. O que pode-
mos dizer é que, considerando um pequeno número de recursos tando-se de um controle a posteriori, exercido sobre leis em vigor
'li "

declarados admissíveis, esse alcance não deve ser muito grande: às vezes por muitos anos e tendo gerado uma multidão de atos
~
I,
'
em 1983, por exemplo, houve em torno de 3.000 recursos, mas
secundários. É por esse motivo que a lei sobre o Tribunal corrige
somente uma centena de ~ecisões; destas 100 decisões deve-se esse efeito retroativo, dispondo que, exceto nos julgamentos em
"

deduzir todos os casos que não se referem a atos administrativos matéria penal que podem provocar uma reabertura do processo,
ou julgamentos, questões que são, de longe, as mais numerosas. "as decisões baseadas em uma norma declarada nula..., mas que
não podem mais ser objeto de contestação, subsistem..." .26 De fato,
:'1 mesmo com essas correções, o juiz-con-stitucional hesita em fazer
A importância do cOJ:1troledas leis, de iniciativa .dos -parricula...
I1
res, é portanto relativa: sem dúvida uma ou duas dezena; de decisões
po~ ano e ainda menos anulações ou iny~idações.
T
,
anulaçge~: observamos, por exe.mplo,que.de 1951 até o final dos
anos--r970, n~o ho.uve mais do que,cinco Casosde'anulação total
de leiS27,e mesmo os casos de anulação parcial não são muito numc-
.rosos. Qu~ certas .deci~ões,.dítas'''de anulação parcial qualitativa",
.
O) A decisão da Corte e seus efeitos - O Tribunal Constitucio- consistem; sem amputar.o texto, em decl<l.-rarque a,lei é nula na
nal Federal exerce poderes consideráveis na apreciação da constitu- medida em qu~ ela se aplica a "umasituação; assim, por exemplo,
cionalidade das leis. uma legislaçãosobre o transpor~ede pessoasé declaradanula quanto
a) Antes de mais nada ele não se sente obrigado a julgar a fun-
do todos os recursos e realiza uma triagem entre os casos: "t a própria
Corte que escolhe alguns casos quando percebe que é necessário fazer
24. Schlaich, 1982, p. 207.
25. Béguin, 1982, p. 60, 102, 123.
26. Art. 79.
23. Béguin, p. 128. 27. Béguin, 1982, p. 169.

I,
, I
, 70 AS CORTES CONSTITUCIONAIS o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL fEDERAL ALEMÃO 71
, ,

, I

LI
"

aos táxis e aos carros de aluguel, mas continua válida para os lII. JURISPRUDÊNCIA
outros meios de transporte.
Após sua criação, em 1951, o Tribunal Constitucional Federal
A partir de 1955 o Tribunal adotou uma omra técnica, visando
a evitar a anulação pura e simples praticada por outras Cortes entregou um número enorme de decisões: 85.432 (fim de 1994).
Consrirucionais: a técnica da interpretação confOrme. A lei é Todavia, é preciso observar que, deste total, mais de 93% (ou 79.
mantida em vigor com a condição de que sua interpretação seja 687) foram tomadas, não pelo tribunal, mas por comissões de três
conforme àquela dada pelo juiz constitucional. Todavia, essa téc- juízes.
nica só é utiliZada "se o sentido e a finalidade da lei são respeira-
dos";zS caso contrário a Corte Constitucional renuncia a ela. De 1. A jurisprudência eleitoral tem, parece, uma importância
fato, o uso dessa técnica é cada vez mais freqüente na jurispru-
muito linlitada: houve apenas 60 decisões de 1951 a 1992. É verdade
dência constitucional alemã, como em outras jurisprudências, e
preenche a mesma função desras.: A-iriierpreraçio conforme se que a Corte Constitucional é aqui apenas juízo de apelação.
mosua, com mais freqüência, como uma operação de retificação
normativa que permitiria aparar as 'arestas' da produção 2. No que se refere ao equilíbrio entre a Federação e os Liinder,
normativa sem desprezar a lei. O juiz apura a inconstitucionali- o Tribunal Constitucional tem, com sua jurisprudência, freado a ten-
dade e ele mesmo retifica a norma viciada, forjando a solução de dência centralizadora da Federação e principalmente dificultado as
direito positivo aplicável."29 intervenções desta nos setores de competência dos Liinder.
A partir de 1958, o Tribunal Constitucional criou uma variante
à declaração de nulidade: a declaração de inconstitucionalidade
3. A jurisprudência relativa aos direitos fundamentais
sem a subs.eqüente anulação. Esta inovação foi consagrada pela
lei sobre o Tribunal Constitucional de 1970,3Cl e teve um nítido
. desenvolvimento ~ partir desse momento.)l A técnica é utilizada A) Os diversos direitos fUndamentais - a) Convém, antes de mais
em quase todos os casos em que há ofensa ao princípio de igual- nada, observar que os direitos econômicos e sociais nao figuram na lista
dade ou a outro direito fundamental correlato com o princípio dos direitos fundamentais constitucionalmente protegidos, e isto:p9r-
da igualdade. que os autores da Constituição de 1949 "tiveram consciência da,difi-
Última técnica: -a anulação diferida. Trata-se do caso em que a lei culdade de concebê-los conlO verdadeiros di,,"~itos subjetivos oponíveis
não é inconstitucional na origem, mas tor~a-se progressivamente
ao Estado".33 Todavia, está inscrito na leI fundamental "o pri~cípio
inconstit':lcional em vir.tude da ev?luçãa:40s fatos ou do direito: a
do Estado social",34 princípio cujo significado evoluiu.
Corte Con.stitucional não anula a lei, mas auibui-Ihe .precarieda-
.de,.indicando ao'legislador que ela.é somente provisoriamentecons-
b) O Tribunal Constitucional teve oportunidade de interpretar
titucional; 'por razó~s expiicadas nos -motivos,orclenando-o modi- os principais dispositivos da Constituição relativos aos direitos fun-
. fiC"ara lei e .dando-Ihe às veze~ u.m prazp fi>=;o.Qefin.itivamente, damentais, ou seja, principalnlentc os artigos 2 a 18 da Lei Funda-
"podemos pergu~tar-nos se "essatécnica não é a expressão de urna mentaL que dizem respeito, como foi dito acima, às liberdades clássi-
tendência que procura um modo de .intervenção semelhante, por cas: liberdade de expressão, de religião, de ensino, de reunião, de as-
natureza, a um conuole de tipo preventivo".32 sociação, de circulação. de escolha de profissão etc. Não cabe aqui
expor de maneira detalhada essa jurisprudência.35

28. Idem, p. 191.


29. Idem, p. 207.
30. Are. 31, aI. 2. 33. Fromont e Rieg, 11,p. 23.
31. Dez declarações de inconstitucionalidade, de 1966 a 1970, e 20 de 1971 a 1975. 34. Principalmente no art. 20.
32. Béguin. 35. Ver, nesse sentido, H.G. Rüpp, 1982.
=

=: 72 AS CORTE.S CONSTITUCIONAIS
o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL FEDERAL ALEMÃO 73
. :'i c) No que se refere mais diretamente ao princípio de igualdade, IV. INFLUÊNCIA SOBRE A ORDEM JURÍDICA E
sabemos que ele é invocado com muita freqüência, mas que "os re- POLÍTICA
cursos constitucionais e as remessas dos tribunais que se baseiam
unicamente em uma violaçao do princípio geral de igualdade somen- A influência da jurisprudência do Tribunal Constitucional so-
te sao admitidos em um número de casos relativamente pequenos". 36 bre a ordem jurídica e política é considerável, a ponto de dizerem
Na República Federal da Alemanha, como em outros lugares, o gran- habitualmente que, na Alemanha Federal, até mesmo acima do 'Esta-
do de direito, fica o Estado dos juízes. Isto levantou, há algum tem-
de desafio é preservar o poder discricionário do legislador, evitando
po, a questão dos limites dos poderes dos juízes constitucionais.
uma aplicação muito estrita do princípio de igualdade; pois se o prin-
cípio geral de igualdade obriga o legislador "a tratar de maneira.idên-
1. A influência sobre a ordem jurídica - A influência sobre a
tica situações idênticas e de maneira diferente, de acordo com sua
ordem jurídica resulta da conjunção de dois fenômenos ou meca[oLis-
car~'7.t~:r.[!,.çi,ç<l;
,.PJ:".qpXi~,
...~.~.~~ªÇ9~!?
..çl.~f~J;"~[lJ_ç,s
.•_.Qr:i.en
tando-se constan te-
mos: a função objetiva dos direitos fundamentais e o controle exercIdo
mente pela idéia de justiça",3? a questão de saber quais situações de
pela Corte Constitucional quanto ao respeito pelos tribunais ordiná-
fato podem ser consideradas idênticas "pode ser objeto de respostas
rios por sua interpretação dos textos constitucionais.
diferentes, de acordo com a ótica ~ política. econômica, social ou
cultural - na qual nos colocamos".38 De fato. o Tribunal Constitu-
A) Os direitos fUndamentais não são somente direitos subjeti-
cional considera que há violação ao princípio da igualdade se ele não
vos, suscetíveis de ser invocados pelos particulares contra o Estado.
encontrar justificação razoável para a discriminação, neste caso ele
Eles também têm uma função objetiva como sistema de valor impos-
procede a um controle das medidas "arbitrárias". Isso provocou, há
to ao legislador, ao juiz e ao administrador.
alguns anos, vivas críticas de alguns juristas alemães, acusando o Tri-
bunal Constitucional de substituir o legislador.39
B) Mas a influência dos direitos fundamentais e da jurisprudên-
cia que os interpreta seria menos forte se não houvesse um mecanis-
B) Beneficidrios e limites - a) Os dire£tos fUndamentais são
lTIO que permitisse torná-la efetiva. De fato, o Tribunal Constitucio-
invocáveis pelos cidadãos. Todavia, os estrangeiros gozam igualmente
nal pode assegurar o respeito às suas decisões, graças ao controle por
da proteção de um certo número de direitos fundamentais e a juris-
meio de r:emessasdos Tribunais das normas e sobretudo ao recurso
prudência da Corte Constitucional estendeu progressivamente essa
constii:'ticionaL que permite a todos submet,er ~.d~ ~u~ga~ent.o~.?'?'.
proteção,"e.m~ora.se conservando sempre restritiva quanto ao princí-
decisões administrativas que desprezem suas interpretações ou juris-
pio da igualdade. A p~9teção é extensiva às pessoas jurídicas de direi-
prudência'. Disso resulta uma grande unidade na interpretação dos
to privado e, em alguns casos, de direito público.
textos constitucionais e, particularmente, daqueles relativos aos direi-
b) Os direitosfundamentais possuem limites que podem resultar
tos fundamentais .
..ora da Constituição, ora da lei ordinária, sendo certo que alguns direi-
e
tos (liberdade de religião de opinião, da arte e da ciência, de reunião C) Conseqüentemente, apenetração das regrasconstitucionais nos
e direito de asilo) só pqde~ ser restringidos pela Lei Fundamental. diferentes ramos do Direito é bastante facilitada.
A questão que se impõe é saber se os direitos fundamentais
podem surtir efeito não somente nas relações dos particulares com
36. H. G. Rüpp, p. 257. o Estado, mas também nas relações entre os particulares. Isto não
37. E 3, 58, 135.
38. H. G. Rüpp, p. 256.
foi expressamente consagrado pelo Tribunal Constitucional mas
39. Béguio, 1982, p. 131, 0.1. parece evidente, na medida em que os direitos fundamentais são

74 AS CORTES CONSTITUCIONAIS O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL FEDERAL ALEMÃO 75

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