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A Psicologia da Educação

na formação docente

Ligia de Carvalho Abões Vercelli


Mestre em Educação – Uninove;
Docente na pós-graduação lato-sensu
em Psicopedagogia – Uninove.
São Paulo – SP [Brasil]
ligia@uninove.br

Pretende-se, com este artigo, apresentar três aspectos que têm


sido discutidos pelos pesquisadores que estudam a Psicologia da
Educação e que têm contribuído para o ensino dessa disciplina
nos cursos de formação de professores: a concepção de homem, a
multiplicidade de correntes teóricas que integram essa disciplina
e a relação entre teoria e prática pedagógica.

Palavras-chave: Complexidade. Formação de professores.


Psicologia da Educação.

Dialogia, São Paulo, v. 7, n. 2, p. 223-233, 2008. Artigos

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1 Introdução 2 Concepção de homem

A interlocução entre psicologia e educação há O primeiro aspecto refere-se à forma de con-


muito tempo é tema de debates entre os profissio- ceber o ser humano. Para elucidar essa questão, é
nais que trabalham com formação de professores necessário recorrer à história da Psicologia.
e buscam, na disciplina Psicologia da Educação, No século XIX, a burguesia moderna ganha
contribuições relativas ao desenvolvimento e ao importância como classe social, e as transforma-
processo ensino/aprendizagem para o fazer pe- ções decorrentes dessa ascensão passam a refletir na
dagógico. A literatura especializada aponta que ciência e na Psicologia. Assim, enfatizam-se a razão
os conhecimentos psicológicos contribuem para a e a liberdade do homem, características que possi-
prática educativa e que essa disciplina deve fazer bilitariam a transformação do mundo objetivo. A
parte do currículo básico das licenciaturas. ênfase no próprio homem também contribuiu para
Neste artigo, serão apresentados três aspec- o crescimento da burguesia cedendo lugar a uma
ciência com base na razão.
tos cuja avaliação pelos docentes que ministram
Surge, dessa forma, a ciência moderna: expe-
a disciplina Psicologia da Educação nos cursos de
rimental, empírica e quantitativa. Além disso, Bock
formação de professores julgamos importante: a
(2002) ressalta outras características também de-
concepção de homem, a multiplicidade de corren-
terminantes da ciência do século XIX: é positivista,
tes teóricas que integram a disciplina e a relação
porque se baseia no observável; racionalista, porque
entre teoria e prática pedagógica.
enfatiza a razão como possibilidade de descobrir
Acredita-se que discutir a concepção de
as leis da natureza; mecanicista, porque tem como
homem com o aluno em formação poderá levá-lo
base a idéia do funcionamento regular do mundo;
a perceber-se como sujeito concreto, produto das
associacionista, porque acredita que as idéias se or-
relações sociais, e que suas capacidades individu-
ganizam na mente por meio de associações, produ-
ais não são dadas apenas pela natureza, mas cons-
zindo o conhecimento; atomista, por acreditar que a
truídas na relação com o contexto histórico. Ao
organização das partes forma o todo, e determinis-
estudar as diversas concepções teóricas, é possível ta, por pensar o mundo como um conjunto de fenô-
que o aluno apreenda, de maneira abrangente, os menos de causa e efeito que podem ser descobertos
conteúdos desenvolvidos na disciplina Psicologia pela razão humana. Com base nessas concepções,
da Educação, tendo em vista que cada abordagem Wundt, em 1875, caracterizou a psicologia como
poderá contribuir para que adquira uma visão ciência que tinha um objeto próprio: a experiência
mais ampla e crítica da disciplina, sem desvincu- consciente. Segundo Bock (2002, p. 16),
lar-se da realidade social. Quanto à relação entre
teoria e prática, entendemos que, ao abordar as di- […] Wundt reconhecia o caráter básico
ferentes correntes teóricas, deve-se levar em consi- dos elementos da consciência (atomis-
deração a realidade das escolas, possibilitando que mo), mas se diferenciava do associacio-
o futuro professor traga para discussão elementos nismo por pensar a consciência como
de sua prática cotidiana. processo ativo na organização de seu

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conteúdo pela força de vontade. Concebia no interior do próprio fenômeno, não avançaremos
o indivíduo ao mesmo tempo como cria- na sua compreensão […]”
tura e como criador […] Partindo desse pressuposto, entendemos que
a teoria da complexidade, com ênfase em Edgar
Como Wundt não dispunha de instrumen- Morin (2003a), apresenta uma perspectiva crítica
tos metodológicos para resolver as contradições do para a compreensão do fenômeno psicológico, pois
homem apontadas pelas diferentes correntes, propôs rompe com o pensamento linear e com os processos
duas psicologias, uma experimental e outra social, que fragmentam o conhecimento; opõe-se aos me-
para solucionar a separação entre “[…] natural canismos reducionistas, incorporando as diferentes
e social; autonomias e determinação; interno e formas de pensar; considera as influências do meio
externo […]” (BOCK, 2002, p. 16). externo e interno; enfrenta a incerteza e a contradi-
Os seguidores de Wundt escolheram uma das ção e propõe uma concepção de homem trinitário,
extremidades dessa dicotomia. Titchener entendeu o da qual compartilhamos. Para Morin (2003b), se
pensarmos a sociedade e o sujeito de maneira deter-
homem dotado de uma estrutura capaz de fazer que
minista, este desaparecerá.
a experiência se torne consciente; James enxergava-
O autor propõe uma definição de sujeito, par-
o como um organismo que se adapta a determinado
tindo de uma base “bio-lógica”, e, para isso, admite
ambiente; o comportamentalismo o concebia como
que a idéia de autonomia é inseparável da de auto-
resultado de condicionamentos, a Gestalt deu ênfase
organização. Para Morin, a autonomia depende
às experiências vividas pelo ser humano e a psicaná-
do meio em que o homem está inserido, seja ele
lise valorizou forças desconhecidas e não domina-
biológico, cultural ou social. Afirma que os seres
das, mas que também constituem o homem.
humanos, como culturais e sociais, só podem “[…]
Todas essas abordagens tentaram compre-
ser autônomos a partir de uma dependência original
ender o ser humano e sua relação no mundo, mas
em relação à cultura, em relação a uma língua, em
nenhuma delas superou o mecanicismo, que en-
relação a um saber […]” (2003b, p. 118).
tendia o homem como uma máquina dotada de Também explica que, para entender o con-
funcionamento próprio, e o determinismo, por su- ceito de sujeito, é necessário compreender o de in-
bentender causas e efeitos que observamos. divíduo. Ressalta que, na história do pensamento
As diferenças entre essas perspectivas teóricas biológico, houve duas tendências contrárias. Para
ocorrem quando contrabalançamos os dois lados: uma, a única realidade é o indivíduo; para a outra,
“interno/externo; psíquico/orgânico; comporta- a espécie. Morin salienta que as duas noções são
mento/vivências subjetivas; natural/social; autono- complementares. O indivíduo é, ao mesmo tempo,
mia/determinação”. Ao enfatizar-se apenas um dos produto e produtor. Nesse sentido, afirma:
lados, não é possível compreender o fenômeno psico-
lógico, pois fica sempre faltando o seu oposto. Bock […] Assim também, quando se conside-
(2002, p. 17) afirma que “[…] esses elementos são ra o fenômeno social, são as interações
a contradição presente do fenômeno psicológico; en- entre indivíduos que produzem a socie-
quanto não assumirmos esse movimento existente dade; mas a sociedade, com sua cultura,

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suas normas retroage sobre os indivíduos com Morin (2003a, p. 52), o homem é um “[…] ser
humanos e os produz enquanto indi- plenamente biológico, mas, se não dispusesse plena-
víduos sociais dotados de uma cultura. mente da cultura, seria um primata do mais baixo
(MORIN, 2003b, p. 119). nível.” O autor assim exprime: “[…] A sociedade vive
para o indivíduo, o qual vive para a sociedade; a socie-
Petraglia (1995), citando Morin, ressalta que dade e o indivíduo vivem para a espécie, que vive para
cada indivíduo é único em sua anatomia, fisiologia, o indivíduo e para a sociedade […] todo desenvolvi-
comportamento, inteligência. É essa individualida- mento verdadeiramente humano significa o desen-
de que o distingue dos demais. Sujeito é o “eu”, pois volvimento conjunto das autonomias individuais, das
é capaz de posicionar-se no centro do mundo, ocu- participações comunitárias e do sentimento de per-
pando seu próprio espaço. Aponta que a concepção tencer à espécie humana”, (MORIN, 2003a, p. 54-5).
de homem de Morin é complexa, então esse “eu” Para Morin (2003a), o homem integral é
precisa relacionar-se com o ‘tu’, pois ambos fazem dotado de sabedoria e de loucura. É o homem sapiens-
parte do mundo. demens, que possui suas possibilidades e limitações.
Assim, o sujeito manifesta-se com o mundo, é Petraglia (2001, p. 25), citando Morin, escreve:
auto-organizador, capaz de transformar-se sempre.
Nesse sentido, relata a autora, “[…] essa capacidade […] Essa concepção explica o ser humano
pressupõe outras características fundamentais para o que concentra em si a ambigüidade e a
desenvolvimento do processo auto-organizador, como incerteza, entre o cérebro e o ambiente, a
autonomia, individualidade, incerteza, ambigüidade objetividade e a subjetividade e o real e o
e complexidade” (PETRAGLIA, 1995, p. 58). imaginário. No homem e na mulher, na
A noção de sujeito proposta por Morin, segundo criança e no adulto estão presentes a afe-
Petraglia (1995), revela-se ao mesmo tempo subjetiva tividade, a inteligência, o sonho, a alegria,
e biológica e não pode ser restringida a uma concep- a tristeza, a fantasia, o acerto, o erro, a
ção humanista, nem metafísica e, muito menos, anti- ubris, entendida aqui como o excesso e o
metafísica, mas compreende a junção de todas elas. desmedido, enfim, todos os aspectos que
Ao abordar a concepção de homem, Morin por si fazem parte da história humana.
(2003a) busca compreender “que a unidade é múl-
tipla e que o múltiplo é uno”. Salienta que o ser Visto dessa forma, concordamos que temos
humano possui uma unidade genética comum a de levar em consideração que as autonomias indi-
todos e uma identidade cultural parecida comum viduais não são oferecidas apenas pela natureza,
ao seu meio. Dessa forma, a cada situação o ser mas também construídas na relação com o mundo
humano age de forma semelhante à sua cultura e físico e social. Sob essa perspectiva, deixaremos de
expressa sua afetividade de forma única. ter uma concepção de homem com base somente na
O autor ressalta que o homem possui três na- natureza humana e passaremos a enxergar e enten-
turezas inseparáveis: em primeiro lugar, somos in- der a condição humana.
divíduos; em segundo, pertencemos à espécie homo Morin (2003a) salienta que o entendimento
sapiens; em terceiro, somos seres sociais. De acordo da condição humana é um dos buracos negros que

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precisam ser superados. Ele afirma que o homem também a unidade. De acordo com Morin (2003a),
não pode ser visto de forma fragmentada, ou seja, a diversidade engloba também os aspectos psíqui-
é, ao mesmo tempo, físico, biológico, psíquico, cul- cos, afetivos, intelectuais e sociais, que precisam ser
tural, social e histórico. Nesse contexto, apesar de contemplados para que o homem não seja reduzido
ser múltiplo, é parte de uma unidade. Isso significa apenas a aspectos biológicos.
que o ser humano possui os elementos genéticos e Acreditamos que esse olhar reducionista pode
culturais de nossa diversidade; portanto, temos de ser um dos fatores responsáveis pela psicologização
enxergá-lo como tal. ainda existente em nossas escolas. A culpa pelo fra-
Para Morin (2005, p. 19), o ser humano é casso escolar recai sobre o aluno e suas famílias.
“[…]100% biológico e 100% cultural […] carrega A disciplina Psicologia da Educação busca abordar
a herança genética e, ao mesmo tempo, o “imprin- com os futuros professores este homem complexo
ting” e a norma de uma cultura.” Ressalta que os para evitar que nossas crianças sejam rotuladas e
humanos são marcados pelo imprinting cultural encaminhadas aos diferentes profissionais da saúde,
desde o nascimento, a princípio pela família, depois muitas vezes sem necessidade alguma.
pela escola, em seguida pela universidade e, por
último, pela vida profissional.
Segundo Morin (2003a, p. 47), “[…] inter- 3 Multiplicidade das concepções
rogar nossa condição humana implica questionar teóricas
primeiro nossa posição no mundo […]” levantan-
do questões como: quem somos? De onde viemos? O segundo aspecto importante que deve ser
Onde estamos? Para onde vamos? Para isso temos destacado no ensino da Psicologia da Educação na
de reconhecer não só nossa identidade terrena formação de professores diz respeito à multiplicida-
física e biológica, mas também psicológica, socio- de de concepções teóricas que discutem os processos
lógica e cultural. Para o autor, se somos natureza, de ensino e aprendizagem e de desenvolvimento.
somos também cultura; se somos indivíduos, somos A partir do século XX, mais precisamente em
também sociedade. Assim, aprender a condição 1910, surgem as teorias psicológicas que subsidiam
humana requer a inclusão do homem na realidade a educação passam a nortear novas concepções de
social. educação que, por sua vez, influenciam as práticas
Concordamos que a disciplina Psicologia da pedagógicas. Nessa época, dava-se ênfase na teoria da
Educação é uma ferramenta importante na forma- Gestalt, apoiada nos estudos de Koffka, Wertheimer
ção docente, pois é também por meio dos conheci- e Kohler, seguida pela behaviorista. Em seguida pela
mentos psicológicos que o futuro professor terá uma teoria de Ausubel, de Bruner, de Rogers, de Piaget, de
visão de como ocorrem os processos de ensino, de Wallon, de Vygotsky e psicanálise freudiana.
aprendizagem e de desenvolvimento, fundamentais Apesar das controvérsias existentes entre a
a quem se propõe trabalhar com crianças e jovens. psicologia e a educação, os conhecimentos produ-
No entanto, entendemos que, quando ensi- zidos pela psicologia estavam dirigidos aos proces-
namos Psicologia da Educação, não podemos des- sos do desenvolvimento e da aprendizagem, visando
considerar a diversidade humana, sem esquecer intervir no cotidiano escolar. Assim, interessava à

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educação dispor dos conhecimentos psicológicos […] pluralidade teórica é importante na
para utilizá-los na prática educativa. Nesse contexto, formação, pois, nela subsiste a contra-
cada teoria trouxe conhecimentos importantes para dição, a possibilidade de crítica e de su-
a área educacional, com implicações nos processos peração; a contextualização histórica e
de ensino e de aprendizagem escolar que não podem epistemológica das teorias amparada na
ser desconsideradas. reflexão consciência-mundo, supõe o em-
Saisi (2003) salienta que as diferentes con- basamento crítico necessário à coerência
cepções teóricas ensinadas pelos formadores de edu- na pluralidade e desta em relação ao pro-
cadores na disciplina Psicologia da Educação são pósito de uma educação cidadã.
relevantes para o processo de formação e devem ser
trabalhadas com os alunos na sua globalidade, pois Apesar de admitir que a pluralidade teórica
cada uma delas traz contribuições efetivas à prática é essencial na formação do professor, trazendo
pedagógica. Nesse sentido, ressalta: contribuições para a prática educativa, a autora
deixa claro que não se deve fazer uma “miscelâ-
Não transmiti-las significa informar par- nea epistemológica”, mas tratar de forma crítica
cialmente o aluno sobre o assunto. É da os conhecimentos produzidos pela Psicologia da
função do docente de toda e qualquer dis- Educação. Complementa ressaltando que o futuro
ciplina o compromisso de apresentar o fe- professor deve saber “[…] em que condições his-
nômeno, objeto de estudo, de modo fiel às tóricas aquele conhecimento foi produzido, ‘a que’
suas características, para que a apreensão ou ‘a quem’ ele serve e como pode ser utilizado
desse conhecimento pelo aluno se dê em para interpretar e interferir na prática pedagógica
bases as mais próximas possíveis do real […]” (LAROCCA, 1999, p. 20).
[…] (SAISI, 2003, p. 88). Para a autora, essa pluralidade teórica levanta
três pontos que merecem reflexão. O primeiro é que
A autora complementa salientando que, essa diversidade surgiu com o nascimento da disci-
ao apresentarmos as diferentes abordagens plina; portanto, negá-la equivale a desconsiderar a
da ciência psicológica, divididas por correntes construção histórica do conhecimento psicológico.
apoiadas no contexto social, estaremos contri- O segundo, citando Gabby Jr. (1999, p. 23), é que não
buindo para que o futuro professor forme uma existe psicologia, e sim ‘psicologias’; assim, “cada
concepção geral de ciência, pois esta tem por teoria psicológica constitui o seu objeto de maneira
“[…] pressuposto um conhecimento provisório, diferente”. O terceiro refere-se ao referencial que
inacabado, questionável e limitado, no sentido de deve amparar a prática pedagógica do professor. Se o
explicar apenas parte da realidade e consistir tão formador de professores privilegiar uma abordagem
somente em instrumentos relativos pelos quais em detrimento da outra, o futuro professor não terá
são feitas apreensões aproximadas da realidade acesso à totalidade dos conhecimentos produzidos, e
[…]” (SAISI, 2003, p. 88). esta não é tarefa das instituições superiores.
Larocca (1999, p. 138) também defende a Souza e Kramer (1991) ressaltam que muitas
idéia de que a vezes os profissionais não têm clareza das teorias

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que podem ajudá-los em determinada situação. resolver os problemas educacionais […]
Elas salientam que as interpretações feitas pelos di- menos contribuições efetivas estarão
ferentes profissionais sobre as diversas situações que sendo dadas a uma educação democrá-
vivem no cotidiano dependem não só dos conheci- tica e, portanto, de qualidade. É crucial
mentos adquiridos na área, mas também da história que os professores tenham acesso ao
de vida e experiência profissional de cada um. Nessa conhecimento produzido nos vários
perspectiva, as autoras apontam que “[…] é fala- campos, mas é preciso dimensionar esse
ciosa a busca de um conhecimento mais acabado, conhecimento na provisoriedade que o
verdadeiro ou inquestionável: ao procurá-lo, o que caracteriza, superando modismos apres-
provavelmente encontramos será um conhecimento sados, classificações levianas da prática
cristalizado, mofado e aprisionador […]” (SOUZA; escolar e propostas de mudanças rápidas
KRAMER, 1991, p. 70). e superficiais. Do contrário, mais uma
Entendemos que não devemos abandonar vez gato será comprado por lebre e, no-
descobertas científicas importantes, seja de Piaget,
vamente, a criança e o professor serão
Wallon ou Skinner, pois cada um deles vivenciou
responsabilizados pelo fracasso. (SOUZA;
momentos históricos diversos, trazendo contribui-
KRAMER, 1991, p. 70).
ções diferentes que nos ajudam a pensar a reali-
dade com que nos defrontamos diariamente. Nesse
Apesar dessas observações, as autoras res-
aspecto, agir opondo-se ou ocultando os conheci-
saltam que muitas concepções, de acordo com o
mentos seria o mesmo que negar a história.
momento, têm sido priorizadas nas propostas edu-
Acreditamos que nenhuma abordagem des-
cacionais. Complementam, afirmando que esse fato
qualifica a outra, e sim apresenta meios para que
aconteceu com Piaget e ocorre atualmente com
os professores possam trabalhar de acordo com
Vygotsky. Nesse sentido, ressaltam:
as questões que a realidade impõe a cada novo
momento, indicando novas formas de ver e enten-
Não se podem desconsiderar as contri-
der o mundo e o homem.
Se uma teoria não é a chegada nem a solução, buições de Piaget, da mesma forma que

mas o ponto de partida para resolver um problema, não se pode difundir a obra ou o pensa-
não é possível apresentá-las aos alunos como “recei- mento de Vygotsky como se fosse a única
tas prontas”, pois corre-se o risco de cair em modis- e última palavra dita sobre o desenvol-
mos que, em vez de ajudar, acabam prejudicando e vimento infantil e sobre o trabalho com
confundindo ainda mais os futuros docentes. Foi o a criança. Não devemos, nesse sentido,
que aconteceu recentemente com o construtivismo1. repetir com Vygotsky, nos anos 90, o que
foi feito com a obra de Piaget nos anos 70
Quanto mais as universidades e os siste- […]. Simultaneamente, não podemos
mas de ensino confundirem as cabeças menosprezar agora o trabalho de Piaget,
dos professores com teorias redentoras, nem ‘jogá-lo fora com a água do banho’
supostamente dotadas de capacidade de […] (SOUZA; KRAMER, 1991, p. 70).

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Concordamos com as idéias das autoras Sadalla et al. (2002) retomam a idéia de que
de que, se quisermos contribuir na formação de esse modo de formação é chamado de modelo de ra-
futuros professores críticos, não deveremos optar por cionalidade técnica, pois o professor põe em prática
abordar apenas um referencial, e sim trabalhar com os conhecimentos aprendidos. Nesse sentido, o
a multiplicidade que a própria ciência oferece, pois estágio não é considerado espaço de vivência, e sim
cada corrente elabora diferentes explicações para a para o futuro professor aplicar seus conhecimentos
complexa dinâmica vivida nas escolas. técnicos. Esse modelo, de acordo com as autoras, fez
Quando o professor elogia um aluno por um com que as licenciaturas ficassem desacreditadas.
comportamento adequado ou o pune por não ter Salientam que, atualmente, existe um novo modelo
feito as tarefas, está utilizando conceitos do beha- de formação – o de racionalidade prática – que
viorismo. Quando avalia as necessidades de cada oferece ao professor autonomia para refletir sobre
um e considera a realidade da escola onde trabalha, sua prática e tomar decisões. Esse modelo, porém,
acaba privilegiando a prática, o que também não
utiliza-se da psicologia sócio-histórica, e ao elaborar
favorece a formação do aluno.
as atividades avaliando o que o aluno pode ser capaz
Visto dessa forma, Sadalla et al. (2002, p. 69)
de fazer, vale-se da teoria piagetiana. Portanto, des-
ressaltam que “[…] o que se ensina é uma Psicologia
considerá-las seria negar aquilo que a ciência pro-
abstrata e modeladora que não consegue de maneira
duziu e produz para a humanidade.
eficaz estabelecer a ponte entre modelos explicativos
e o concreto vivido […]” As autoras complementam,
ressaltando que os alunos entendem as teorias, mas
4 Relação entre teoria e prática
não conseguem pô-las em prática. Dessa forma, a
Psicologia da Educação pouco colabora para a for-
O terceiro aspecto importante a ser discutido
mação do futuro profissional.
pelos docentes da disciplina Psicologia da Educação
Qual a solução encontrada pelos pesquisadores
na formação de professores refere-se à forma como os
da área para articular teoria e prática na Psicologia
conhecimentos adquiridos por meio das concepções
da Educação? Sadalla et al. (2002) mostram que,
teóricas apontadas podem ser trabalhados na prática. diante dessa necessidade, a Psicologia da Educação
Sadalla et al. (2002) e Freitas (2000) salientam só fará a articulação no momento em que penetrar
que a crítica à dicotomia entre teoria e prática se deve na realidade, em diálogo com a prática que o pro-
ao formato das licenciaturas que persiste desde sua fessor vivencia no seu fazer pedagógico. Assim, nos
criação, no fim da década de 1930, com a fundação cursos de formação de professores, deve-se ir além
das faculdades de filosofia. Esse fato decorre da estru- de uma abordagem teórica, apoiando-se em uma
tura das licenciaturas, que funcionavam com base abordagem teórico-prática. As autoras salientam
na fórmula 3+1: nos três primeiros anos de curso, que isso só será possível se quem ensina Psicologia
os alunos aprendiam os conteúdos das matérias que da Educação penetrar na realidade educacional,
iriam lecionar depois de formados e, somente no dialogando com a prática que cada professor viven-
último ano, tinham acesso às disciplinas pedagógi- cia no seu dia-a-dia. Nesse sentido, Sadalla et al.
cas, entre as quais a Psicologia da Educação. (2002) comentam que

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Nas aulas de Psicologia Educacional os Salientamos que se deve tomar cuidado para
alunos devem aprender e refletir acerca que as discussões das vivências dos alunos não se
das condições em que se apropriam dos limitem apenas ao senso comum, o que acaba por
conhecimentos científicos psicológicos; desprivilegiar qualquer área do conhecimento. Elas
se deparar com situações que promo- precisam estar atreladas às teorias e ser trabalhadas
vam a intervenção e criatividade do pro- com base em dados científicos.
fessor; ter consciência das implicações Azzi et al. (2002, p. 195) ressaltam que, se tra-
das abordagens que estão aprendendo; balharmos apenas de forma teórica, sem conexão
e, ainda, ter conhecimento das estrutu- com a realidade, dificilmente o futuro professor
ras e dos contextos que compartilha a conseguirá estabelecer relações. Nesse sentido, sa-
partir da contribuição de determinadas lientam as autoras:
teorias (p. 75).
[…] É preciso que durante o processo de
Ao proporem a articulação entre teoria formação o aluno tenha oportunidade de
e prática, Pereira et al. (2002, p. 189) sugerem trabalhar com questões originadas dos
“[…] que os cursos de formação devem contem- problemas propostos pela realidade edu-
plar situações didáticas em que os futuros pro- cacional, promovendo a problematização
fessores tenham a oportunidade de mobilizar dessa realidade e buscando, nas teoriza-
conhecimentos de diferentes naturezas e oriun- ções da Psicologia e de outras áreas do
dos de diferentes experiências […]” conhecimento, explicações para análise e
Concordamos com os autores porque, como discussão de algumas soluções que esses
docentes, também percebemos que, quando arti- problemas impõem.
cularmos a realidade educacional dos discentes
com os conhecimentos psicológicos tratados, ela Para Libâneo (2004, p. 89), os cursos de li-
se reveste de sentido, propiciando a participação cenciatura devem integrar os conteúdos ensinados
da maioria dos alunos. Percebemos que essa ar- nas diferentes disciplinas com situações da prática,
ticulação ocorre principalmente com aqueles que para que os futuros professores, ao se defrontarem
já atuam na educação básica, pois vivenciam no com os problemas, busquem soluções com a ajuda
cotidiano situações que foram elucidadas pelos da teoria. Para ele, “[…] a prática é a referência
teóricos estudados. da teoria; a teoria, o nutriente de uma prática de
Muitas vezes, alunos trazem problematiza- melhor qualidade.” A esse respeito, Azzi e Batista
ções e vivências do cotidiano para a sala de aula, (2000, p. 156) salientam que
o que contribui muito para o entendimento das
teorias psicológicas. Acreditamos que essas ex- A articulação teoria e prática no proces-
periências devam ser valorizadas e discutidas, so de formação docente é possível […] a
pois constituem excelente recurso pedagógico e prática, mesmo que apreendida a partir de
servem de apontamentos para aqueles que ainda alguns fragmentos, seja um fio condutor
não são docentes. para a construção da teorização, compre-

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endendo os diferentes cenários das expli- necessidade, pois o que ainda prevalece é a visão
cações psicológicas e seus impactos na fragmentada de homem como se ele fosse constitu-
prática psicológica. ído apenas por fatores biológicos e não se leva em
consideração, em muitos casos, os demais aspectos
Acreditamos que detectar a limitação que que compõem o ser humano.
a Psicologia da Educação apresenta quanto à di- No que se refere à multiplicidade teórica das
cotomia teoria e prática seja fundamental, porém correntes psicológicas, entendemos que o discente
sabemos que as soluções não virão de imediato e deve aprender as diferentes teorias, pois cada enfoque
que cada um de nós tem sua parte a cumprir nesse teórico oferece subsídios para a prática pedagógica.
processo. Uma vez detectadas, essas limitações ser- No entanto, para entendimento dos refe-
virão de mola propulsora para que nós, psicólogos, renciais da psicologia faz-se necessária que seja
pesquisadores e professores da disciplina, reflitamos articulada com a prática, caso contrário, o dis-
sobre elas, para poder, na medida do possível e da cente não entende o porquê dos conceitos e, como
realidade na qual atuamos, transformar nossa ação utilizá-los no cotidiano escolar. Problematizando
pedagógica. Sob esse ponto de vista, comungamos a realidade e discutindo situações que ocorrem no
das idéias de Pereira, Almeida e Azzi (2002, p. 198), cotidiano, a teoria faz sentido e os conceitos são
ao afirmarem que melhor apreendidos.

O professor aprende a ser professor refle-


tindo sobre sua prática, problematizan-
The educational psychology
do-a, distinguindo as dificuldades que in teacher training
ela apresenta, pensando alternativas de In this article, it is intended to present three aspects
solução, observando as reações dos alunos. that have been argued by the researchers that study
Só com um trabalho que tem em vista um Educational Psychology, which have contributed
with the education of this discipline in the courses
ensino problematizador que o futuro pro-
of training of teachers: the conception of human,
fessor tem a oportunidade de trabalhar a
the multiplicity of theoretical chain that integrates
integração entre teoria e prática ao longo this discipline, and the relation between theory and
da sua formação. pedagogical practice.

Key words: Complexity. Educational Psychology.


Teacher’s training.
5 Considerações finais

Neste texto destacaram-se três aspectos que Nota


julgamos importantes apresentar principalmente
àqueles que ministram a disciplina Psicologia da 1 “Teoria que implica ter uma prática pedagógica
com base não apenas na simples transmissão do
Educação. Nossa prática clínica aponta que nossas
conhecimento […] mas tratar a prática pedagógica
crianças e jovens são encaminhados para psico- como uma investigação, como uma experimentação”
terapia e/ou atendimento psicopedagógico sem (MACEDO, 2002, p. 36).

Dialogia, São Paulo, v. 7, n. 2, p. 223-233, 2008.

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recebido em jul. 2008 / aprovado em nov. 2008

Para referenciar este texto:


VERCELLI, L. de C. A. A Psicologia da Educação na
formação docente. Dialogia, São Paulo, v. 7, n. 2,
p. 223-233, 2008.

Dialogia, São Paulo, v. 7, n. 2, p. 223-233, 2008. Artigos

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