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/2013
http://dx.doi.org/10.5007/2175-8042.2013v25n40p192
Resumo
O objetivo deste texto é realizar uma discussão acerca do objeto de estudo da educação
física (EF). Essa questão tem sido tratada dentro de marcos científicos, filosóficos e
políticos que divergem profundamente uns dos outros. Através da perspectiva materialista
histórica e dialética, defendemos a cultura corporal como objeto de estudo da EF em
oposição às proposições idealistas sistematizadas nas perspectivas do movimento
humano e da cultura corporal de movimento. Para tal empreendimento, estabelecemos
um debate com autores e autoras de significativa expressão e que contribuíram para a
elaboração desta temática em suas produções.
1 Doutor em Ciências do Movimento Humano pela UFRGS. Professor Adjunto da Escola de Educação Física
daUniversidade Federal de Pelotas, Pelotas/Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: gfrizzo2@gmail.com
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a ela [matéria]. Não houve, não há e não cultura corporal de movimento - dizem
pode haver matéria sem movimento, nem respeito à desconexão com a realidade con-
movimento sem matéria” (CHEPTULIN, creta, na medida em que tratam de signos,
1982, p. 162). sentidos e significados que são externaliza-
Esta questão, portanto, se refere à dos à atividade prática objetivada ou são
compreensão de historicidade implicada subjetivamente idealizados num sentido de
na cultura entendida como a produção linguagem através do movimento e não da
das condições objetivas e subjetivas de atividade que a produz e a transforma. De
existência do ser humano, em que “há um sujeito que se comunica mas que não
um acervo de conhecimento socialmente estabelece relações históricas e concretas
construído e historicamente determinado às suas indagações dotadas de sentido
a partir de atividades que materializam as individualizados.
relações múltiplas entre as experiências Quando Bracht (2007, p. 54) apre-
ideológicas, políticas, sociais e os sentidos senta que “o desafio parece-me ser: nem
estéticos, lúdicos, agonísticos, competitivos movimento sem pensamento, nem movi-
ou outros, em dependência das motivações mento e pensamento, mas sim, movimen-
do homem” (ESCOBAR, 2009, p.130). En- topensamento” [grifos do autor], refere-se
tender a cultura corporal como uma parte a uma ideia de prática reflexiva onde a
de toda cultura do ser humano e esta como reflexão sobre a ação depende das expe-
objeto de estudo da EF ainda pode parecer riências do sujeito e encerra-se em um
muito amplo, por isso a necessidade de es- pragmatismo reflexivo individual, que tem
tabelecer as suas bases de fundamentação. precedência sobre a ação concreta. Em
Até porque, o ser humano oposição a esta perspectiva, Souza (2009)
acredita que a história da humanidade é
[…] não nasceu praticando esporte, um processo cultural e “nesse processo, o
muito menos relacionando esporte com
conhecimento não nasce e acaba com o su-
saúde, mas adquiriu, pelo trabalho, pe-
las atividades, as condições de produzir jeito. Ao contrário, toda experiência de um
e reproduzir seu modo de vida onde as indivíduo é transmitida aos outros, criando
relações esporte e saúde foram se con- um interminável processo de acumulação,
solidando. Essa construção passa pelas
no qual se adquire o novo, conservando-se
relações do homem com a natureza e
com os outros homens na manutenção o antigo” (SOUZA, 2009, p. 82), ou seja, os
da vida humana. Aí se constrói a cultura sentidos e significados da cultura (tanto da
corporal – jogos, esportes, dança, ginás- experiência como da reflexão) não “nascem
tica, lutas e outras formas que tratamos
e morrem” com cada sujeito individualmen-
pedagogicamente na escola (TAFFA-
REL, 2009, p. 163). te, mas se consolidam e se transformam no
conjunto da humanidade que coloca em
O idealismo presente nestas pers- movimento os sentidos e significados da
pectivas - do movimento humano e da atividade humana.
2 A categoria da atividade, dentro da psicologia, foi elaborada por Aleksei Leontiev, que desenvolveu seus estudos
junto à escola soviética de psicologia (assim como, Vigotski e Luria).
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Educação Física deverá dirigir-se para os daquilo que identifica como problema a
sujeitos que-se-movimentam (o aluno na partir de um diálogo com seu contexto”
escola, o cliente na Academia, o atleta no (MARTINS, 2010, p. 21-22).
Clube...), e valorizá-los como produtores Ainda nesta mesma perspectiva
de significações e conhecimentos” (BETTI, de que signos são “qualquer coisa”, Betti
2007, p. 214). Ao direcionar sua atenção (2007, p. 211) chama a atenção que “o
para os sujeitos “que-se-movimentam” na se-movimentar é sempre uma resposta
prática pedagógica há uma centralidade do sujeito ou uma pergunta ao mundo (às
na subjetividade construída a partir de coisas e às pessoas), é nesse intervalo que
signos que, segundo caracteriza o autor: se localiza a produção de signos – a lingua-
gem” [grifos meus]. Em uma perspectiva
“é qualquer coisa - um sentimento, uma
materialista e dialética se entende que não
emoção, uma sensação sonora, táctil, um
é o movimento que produz a linguagem,
gesto, um traço, uma palavra, um ritmo...
mas sim, a atividade que engendra toda
- que represente outra coisa, para alguém,
uma série de relações complexas entre o
sob certos aspectos e de alguma maneira”
ser que age e as motivações que o levam
(BETTI, 2007, p. 211). a agir e produzir novas formas para a sua
Na configuração da ação pedagógi- existência, em que a linguagem surge a
ca “com” a cultura corporal de movimento partir de necessidades historicamente de-
observa-se uma passagem dos aspectos marcadas e não simplesmente pelo fato de
lógicos (dos conteúdos da cultura corporal) que o sujeito faz “perguntas ao mundo” ao
para os aspectos psicológicos (motivação, se movimentar. Pressupondo que a criança
conscientização, incentivo). Deslocando o resolvendo seus problemas a aprendizagem
eixo do processo educativo do professorado estará garantida, pois está associada a uma
para o alunado, do esforço para o interesse, noção de individualismo da aprendizagem e
da disciplina para a espontaneidade, da da aplicação imediata daquilo que aprende
direção do professorado para a iniciativa do (respostas às suas perguntas). Um pragma-
alunado, de uma pedagogia de inspiração tismo em que o conhecimento só tem valor
filosófica centrada na ciência da lógica para se tem utilidade prática, seja como uma
uma pedagogia de inspiração experimental técnica ou seja como um problema que
(SAVIANI, 2007), onde a ideia chave é que individualmente deva ser resolvido. Não
a criança deve ser estimulada a aprender importando a a apropriação do conheci-
pois seu desenvolvimento cognitivo basear- mento historicizado cuja acumulação é base
-se-á nas experiências individuais cuja para a produção de novos conhecimentos.
Ou ainda, nos apoiando em Palafox (1993,
subjetividade se descola da objetividade
p.31), “o mundo, portanto, para o idealista,
de apreensão do real, bastando criar um
é “seu mundo”, e sua tendência, a medida
ambiente significativamente adequado para
de toda e qualquer realidade”.
a criança aprender, onde a ênfase recai
Resguardadas as diferenças aponta-
nas aprendizagens que o alunado “realiza
das anteriormente em relação às perspec-
a partir de si mesmo, no respeito às suas
tivas do movimento humano e da cultura
necessidades e motivações e nos limites corporal de movimento, a mesma crítica
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linguagem só nasce, como a consciência, ou seja, o real seria uma convenção de dis-
da necessidade, da necessidade orgânica do cursos e significados que dariam sentido a
intercâmbio com outros homens”. sua existência e aquilo que está fora da lin-
Embora constituintes do mesmo guagem (não tem discurso ou significado) é
processo, gesto (movimento do corpo ou inconcebível pois não foi interpretado pelo
de parte dele no espaço) e linguagem se ser humano em textos, palavras ou discur-
diferenciam exatamente pelas relações sos. Deslocando a centralidade do objeto e
que estabelecem no conjunto da atividade das “coisas” representadas na consciência
prática, como lembra Escobar para a linguagem e as palavras. A agenda
pós-moderna apresenta a ideia de que todos
As ações que ele realiza, e que podem os discursos são absolutamente válidos para
ser vistas de fora, não podem ser redu- explicarem a realidade, independentemente
zidas à simples repetição de movimen- do critério da verdade, quaisquer relatos
tos de flexão, extensão, torção, adução,
abdução e outras, porque a atividade particulares tornam-se explicações válidas
humana é um complexo de ação, pen- (GAMBOA, 2009). Ou seja, há um recuo
samento e emoção desencadeado por da teoria como explicação do real, como
objetivos que não se colocam de fora articulação dos nexos e determinações do
(ESCOBAR, 2009, p.128).
concreto no pensamento, impossibilitando
o conhecimento científico como unidade
Nesta centralidade da linguagem, entre o sujeito e o objeto, entre teoria e
as perspectivas pós-estruturalistas tratam prática, entre explicação e transformação.
de explicar as manifestações da cultura Dificultando, inclusive, conceber qual é o
como elementos discursivos que precedem objeto de estudo da EF, qual a razão de ser
e determinam a atividade prática, o real. deste fenômeno material.
Como mencionam Neira e Nunes (2011,
p. 676) de que a “crise da modernidade
(e do sujeito da modernidade) e o pós- CONSIDERAÇÕES FINAIS
-modernismo abriram as portas para que a
linguagem fosse vista como possibilidade Dentro dos limites de apresentação
explicativa dos fenômenos naturais e das mais aprofundada sobre as questões idea-
ações humanas”. Cujos autores advogam listas e materialistas neste texto, buscamos
na defesa dos Estudos Culturais para a EF apontar as elaborações idealistas sistemati-
que “têm início em meio ao debate pós- zadas que defendem o movimento humano
-moderno, sobretudo na percepção do fim e a cultura corporal de movimento, seja
das grandes narrativas que constituíram o nos dualismos entre mente e corpo, sujeito
projeto moderno e a radicalização do papel e objeto, tempo e espaço, presentes na
da linguagem na definição da realidade” proposição do movimento humano de Ma-
(NEIRA; NUNES, 2011, p. 676). nuel Sérgio (1987), seja na centralidade do
O chamado “giro linguístico” da papel da linguagem, da subjetividade e dos
pós-modernidade, representou uma signifi- discursos como constituidores da realidade
cativa mudança no sentido de fundar as suas nas perspectivas fenomenológicas de Betti
bases idealistas e antirrealistas na adoção da (2007) e dos estudos culturais de Neira e
linguagem como fundamento da realidade, Nunes (2011).
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Abstract
The aim of this paper is to conduct a discussion about the object of study of physical
education (PE). This issue has been addressed within frameworks scientific, philosophical
and political differ greatly from each other. Through historical and dialectical materialist
perspective, we defend the bodily culture as an object of study of EF as opposed to
idealistic outlook systematized the perspectives of human movement and the culture
of bodily movement. For this project, we do a debate with authors from meaningful
expression and contributed to the elaboration of this theme in their productions.