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Fundamentos Históricos,

Teóricos e Metodológicos
do Serviço Social
Autora: Profa. Luciana Helena Mariano Lopes
Colaboradoras: Profa. Glaucia Aquino
Profa. Amarilis Tudella Nanias
Profa. Daniela Emilena Santiago
Professora conteudista: Luciana Helena Mariano Lopes

Luciana Helena Mariano Lopes é nascida em Sorocaba, assistente social graduada pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo no ano de 2006. Atuante e com ampla experiência na área de serviço social, com ênfase
em política social e políticas públicas – assistência social, na qual atua desde sua formação. É pós-graduada em
direitos sociais e competências profissionais pela Universidade de Brasília. Atualmente é professora assistente
na Universidade Paulista – UNIP Sorocaba no curso de Serviço Social, onde leciona as disciplinas de Avaliação
do Trabalho Profissional e Serviço Social e Políticas Públicas. Para mais, consultar a plataforma Lattes: <http://
lattes.cnpq.br/7880171849200009>.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

L864 Lopes, Luciana Helena Mariano Lopes

Fundamentos Históricos, Teóricos e Metodológicos do Serviço


Social. / Luciana Helena Mariano Lopes. São Paulo: Editora Sol, 2011.
108 p. il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos


e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XVII, n. 2-011/11,
ISSN 1517-9230.

1.História do serviço social 2.Assistente social 3.Questão social


I.Título

CDU 361.01

U500.90 – 19

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor

Prof. Fábio Romeu de Carvalho


Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças

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Vice-Reitora de Unidades Universitárias

Prof. Dr. Yugo Okida


Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa

Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez


Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Leandro Freitas
Sumário
Fundamentos Históricos Teóricos e
Metodológicos do Serviço Social

Unidade I
1 O ASSISTENCIALISMO........................................................................................................................................9
1.1 Conceito.......................................................................................................................................................9
1.2 As primeiras formas de assistencialismo no Brasil...................................................................11
1.3 Formas de assistencialismo............................................................................................................... 12
2 A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL......................................................................................................................... 14
2.1 As fases da Revolução Industrial.................................................................................................... 17
2.2 O processo de modernização pós Revolução Industrial........................................................ 17
2.3 O advento do capitalismo.................................................................................................................. 18
2.4 Capitalismo monopolista e o serviço social............................................................................... 21
2.5 A divisão social do trabalho: introdução ao pensamento de Karl Marx......................... 21
2.6 As relações sociais e o serviço social dentro do sistema capitalista................................ 24
3 OS FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO
SERVIÇO SOCIAL: AS PROTOFORMAS DO SERVIÇO SOCIAL - UMA BREVE
ANÁLISE HISTÓRICA............................................................................................................................................ 28
3.1 O surgimento do serviço social no Brasil.................................................................................... 31
4 A INFLUÊNCIA DA IGREJA NA GÊNESE DO SERVIÇO SOCIAL......................................................... 36
4.1 A influência norte-americana: o funcionalismo e o
serviço social de caso, grupo e comunidade..................................................................................... 40

Unidade II
5 O SERVIÇO SOCIAL A PARTIR DA DÉCADA DE 1930.......................................................................... 47
5.1 O serviço social na década de 1940: os congressos de serviço social
e sua influência no perfil profissional.................................................................................................. 50
5.2 O serviço social a partir dos anos 1950: rumo a uma renovação crítica....................... 54
5.3 A década de 1960 e sua influência no serviço social brasileiro......................................... 56
6 TRAÇOS DO PROCESSO DE RENOVAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL..................................................... 61
6.1 Araxá: a afirmação da perspectiva modernizadora................................................................. 64
6.2 Teresópolis: a cristalização da perspectiva modernizadora................................................. 66
6.3 O método de Belo Horizonte: intenção de ruptura................................................................ 68
Unidade III
7 A RENOVAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL........................................................................................................ 74
7.1 O movimento de reconceituação do serviço social................................................................. 76
8 O SERVIÇO SOCIAL PÓS ANOS 1980: VIVÊNCIAS DA RENOVAÇÃO CRÍTICA............................ 81
8.1 O serviço social e os anos 1990: consolidação da renovação crítica............................... 86
8.2 O serviço social na cena contemporânea.................................................................................... 90
APRESENTAÇÃO

Prezado aluno,

O objetivo deste livro‑texto é oferecer ao aluno material de apoio para o acompanhamento da


disciplina Fundamentos Históricos, Teóricos e Metodológicos. Esta matéria será a sua primeira
aproximação com o curso escolhido e pretende estabelecer parâmetros para a compreensão da profissão
no seu contexto sócio histórico.

A disciplina pretende proporcionar a apreensão crítica em relação ao surgimento da


profissão de serviço social a partir do contexto decorrente da reprodução das relações sociais
- perspectiva capital e trabalho, em particular a partir da Revolução Industrial. Objetiva-se
explicitar, no que se refere à herança do serviço social, as práticas assistencialistas advindas da
influência europeia e norte-americana, num contexto marcado pelas lutas de classes, ditadura
na América Latina, tendo seu momento de reconceituação e renovação a partir do acirramento
do conflito entre as classes.

O serviço social, sob a influência das ciências sociais, reconceitua-se e através de uma reflexão
teórica que revê seus paradigmas e parte para a regulamentação da profissão, definindo seus espaços
na sociedade contemporânea.

Iniciamos revendo a questão do assistencialismo no Brasil, suas práticas e formas de organização,


sua influência nas políticas públicas e como estas, através da distribuição de renda desigual, contribuem
para a manutenção da acumulação capitalista – o capital na mão de poucos.

INTRODUÇÃO

Qual a função de Fundamentos Históricos, Teóricos e Metodológicos? Pois é, esta deve ser a grande
pergunta que paira neste primeiro contato com o curso de Serviço Social.

Fundamentos são premissas, embasamentos para uma compreensão, para uma ação. São históricos,
pois a profissão de serviço social é parte integrante de um processo histórico, fruto de determinantes
que permearam a história. São Teóricos porque dizem respeito aos primórdios do embasamento teórico
para a ação do assistente social. São metodológicos, pois se referem a métodos, a uma metodologia
de ação, à prática de serviço social. Enfim, os fundamentos históricos, teóricos e metodológicos do
serviço social têm por objetivo esclarecer a origem do serviço social, origem essa localizada dentro da
sociedade em expansão nos anos 30 do século XX, com o advento e desenvolvimento do capitalismo,
marcada pela divisão entre as classes sociais e, por consequência, pelas lutas de uma classe – a classe
trabalhadora – por sua sobrevivência e defesa de seus direitos de cidadania.

As condições que propiciaram esse emergir do serviço social, sua profissionalização, remetem à
crescente intervenção do Estado nos processos de regulação e reprodução social, por meio das políticas
sociais públicas que buscavam dar novas respostas a problemas antigos – as expressões da questão
social. Foi o contexto de enfrentamento da questão social pelo Estado e empresariado, com o apoio da
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Igreja Católica, que conduziu à institucionalização e legitimação do serviço social profissional, porém
sob uma visão da situação de pobreza como ameaça à ordem ou caso de polícia.

As primeiras iniciativas de organização da profissão vinculam-se ao protagonismo de grupos


sociais majoritariamente femininos, participantes do movimento católico leigo e responsáveis
pela ação social da Igreja Católica junto aos segmentos mais vulnerabilizados e empobrecidos da
classe operária, especialmente crianças e mulheres.

A Igreja Católica teve importância singular na configuração da identidade que marca a gênese do serviço
social no Brasil, sendo responsável pelo seu ideário, pelo inicial e incipiente campo de ação, pelas agências de
formação dos primeiros assistentes sociais. As primeiras escolas de serviço social do país, fundadas em São Paulo
e Rio de Janeiro, respectivamente em 1936 e 1937, organizaram-se sob forte influência europeia, especialmente
franco-belga, países nos quais foram formadas as pioneiras do serviço social. As bases da formação, inspiradas
na doutrina social católica (tomismo) e na tradição positivista, assentavam-se em uma ótica psicologizante e
de individualização dos problemas sociais, que tendia a buscar as especificidades da questão social na esfera
ético‑moral, reforçando o substrato liberal de que o destino pessoal é de responsabilidade do próprio indivíduo.

Serão introduzidas as primeiras expressões sociais de desigualdade que necessitavam de respostas


junto à população. Tais ações visavam sanar as mazelas sociais, pois a pobreza, em seus primórdios, era
vista como uma disfunção social, um caso de polícia que necessitava de ações emergenciais mesmo que
desprofissionalizadas.

O assistencialismo surgiu desde os primórdios da sociedade, nos primeiros agrupamentos sociais, como
uma forma de resposta às expressões da pobreza, ao desemprego, à questão da criança e de outros segmentos.

A pobreza ocorre no mundo todo e, em especial, em nossa realidade brasileira, pois a própria
colonização brasileira já expressava a desigualdade social e a necessidade de ações assistencialistas;
a riqueza era privada e para poucos e se fazia necessário executar ações assistenciais para abarcar os
empregados dos senhores de terra. Com a evolução de nossa sociedade, essa prática não só mudou como
era efetuada de modos e maneiras diferentes, por meio de ações assistenciais da Igreja, instituições
sociais, ações caritativas.

Em seguida, abordaremos a Revolução Industrial e seus impactos na sociedade contemporânea. A


Revolução Industrial teve início na segunda metade do século XVIII, na Inglaterra, aonde veio modificar
os modos e meios de industrialização.

O trabalho deixava de ser manual e rudimentar passando a ser técnico e mecânico. A revolução foi
dividida em três fases distintas.

Contemplaremos, ainda, o advento do capitalismo como modo de organização societária e sua


influência no serviço social. Nesse sistema, as relações se dão entre duas classes distintas: os que
possuem os meios de produção e aqueles que necessitam vender sua força de trabalho. Introduz‑se o
pensamento de Karl Marx, cujas ideias e ideais expressam que as relações entre estas classes distintas
produzem muito mais que riqueza e mercadorias: produz desigualdades sociais.
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FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Unidade I
1 O ASSISTENCIALISMO

1.1 Conceito

O conceito de assistencialismo estabelece uma linha tênue com o conceito de assistência, podendo
muitas vezes esses ser confundidos ou mesclados.

O assistencialismo teve seu início em torno de 3000 a.C., quando era praticado no mundo antigo
pelas confrarias, em especial as “Confrarias do Deserto”.

Em algumas de suas expressões, o assistencialismo é agregado a uma dimensão espiritual.

O assistencialismo é visto como uma técnica voluntária e espontânea de doação, ajuda ou favor às
populações menos favorecidas, uma ação filantrópica, na qual se procura proporcionar uma vinculação
dos assistidos aos que realizaram tal benfeitoria sob o sentimento de gratidão, vínculo e tutela. Ao ser
desenvolvido pelo Estado, suas ações visam à retribuição por parte dos assistidos, perdendo a intenção
de ser um direito, devendo ser retribuído eleitoralmente.

O assistencialismo parte de uma concepção do senso comum, sem profissionalização, para o qual as
ações tidas como de “assistência” não são compreendidas ou entendidas como um direito social e um
dever do Estado, mas sim como uma prática paternalista e burocrática, reduzindo os serviços e ações
prestadas a repasses e concessões apenas. Essa ação não é percebida muitas vezes pelos indivíduos,
pois eles se veem como um objeto de determinada ação e não mais como seres sociais, dotados de
capacidades e valores.

As ações assistenciais expressam, portanto, uma forma de acessar um determinado bem, expressão
da benesse, através da doação intencional, que estabelece uma relação que apresenta duas pessoas
ou partes distintas: um doador e um receptor. Essa relação, mesmo que permeada de boas intenções,
acarreta a dependência, pois a relação de apadrinhamento pressupõe uma dívida, um devedor que
mesmo em longo prazo deverá pagar sua dívida.

Em síntese, nas práticas assistenciais, a necessidade se constitui em um objeto de ajuda, em uma


dificuldade a ser eliminada, num problema a ser resolvido, sem finalidade.

Esse conceito busca justificar a criação de serviços e instituições, pois se verifica na ajuda a melhor
forma de realizar certa benfeitoria. Tem-se como instituições criadas durante esse período as casas de
apoio, asilos, albergues, orfanatos; criadas como forma de eliminar algumas demandas sociais por meio
de ações do Estado ou mesmo dos serviços ou instituições privadas, sem apresentarem o caráter de
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Unidade I

dever ou de inclusão, apenas como forma e meio de apaziguar situações que demonstravam alguma
disfunção a ordem social vigente.

Desses assistidos esperava-se a submissão e dependência, a sua não articulação ou organização, era
pretendida apenas sua dominação e subordinação.

Alguns filósofos da antiguidade, tais como Aristóteles, Platão, Sêneca e Cícero, refletiram sobre as
ações assistencialistas e, através de seus estudos verificaram a necessidade de propor uma racionalização
a essas ações

São Tomás de Aquino (1224-1274) organizou a doutrina cristã, situando a caridade como um de
seus pilares.

No século XVII, São Vicente de Paulo, na França, trouxe de volta o modelo de confraria para o
assistencialismo.

Com a Revolução Francesa, a base da assistência foi deslocada, sendo posicionada como um direito
do cidadão e um dever de todos de prestá-la.

Os teóricos clássicos (séculos XVII e XVIII) acreditavam que os homens são movidos por paixões que
provocam desejos materiais que poderiam possibilitar conflitos entre eles. Consideravam que o poder
não nascia do homem e sim de Deus e, portanto, a vontade divina deveria ser a base de todos os direitos.
Nessa concepção, surge a necessidade do Estado controlar e atender ao bem comum.

Os clássicos consideravam que o homem vive em competição pela honra e pela dignidade, está em
constante processo de comparação e sempre se julga mais capaz de exercer o poder público do que os
que estão no poder. Essas concepções geram conflitos que podem ameaçar a paz

Da Idade Média até o século XIX, a assistência era encarada como forma de controlar a pobreza
e de ratificar a sujeição. A assistência aqui é o assistencialismo, pois ainda havia um confusão
entre estes conceitos.

Lembrete

Assistência: política pública.

Assistencialismo: caridade, doação.

Essa busca de acesso aos bens de consumo coloca o indivíduo em constante conflito entre o espaço
que ocupa na sociedade e o que deseja alcançar, provocando uma busca por acumulação de bens. Tal
comportamento pode ter por consequência imediata o aumento da violência, a complacência com a
guerra e a morte.

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FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

O sistema capitalista implica convivência constante com a distribuição de renda desigual e a moral
judaico-cristã de caridade e distribuição de bens. Essa contradição é abrandada pela representação
coletiva de que, se o indivíduo se esforçar, terá condições de acumular bens e melhorar sua condição
social, implicando uma busca constante de bens materiais, que acirra o espírito competitivo, necessário
à manutenção do sistema.

Nesse contexto, o assistencialismo surge como uma possibilidade de abrandar conflitos, uma vez
que desperta o sentimento de gratidão. A relação de benemerência vincula o assistido ao benemérito,
seja ele público ou privado, abrandando assim os conflitos, uma vez que o indivíduo passa a perceber o
explorador como benfeitor. Tal prática dificulta a percepção das políticas de assistência como um direito
do cidadão e um dever do Estado.

1.2 As primeiras formas de assistencialismo no Brasil

A história do assistencialismo no Brasil se confunde com a própria organização


do estado brasileiro, ao nos reportamos com a primeira organização
geográfica, as capitanias hereditárias, verificamos que, conforme um decreto
de Dom João III, o rei de Portugal estabeleceu que o Brasil fosse dividido
em quinze grandes áreas geográficas que seriam administradas por doze
famílias portuguesas e que estas terras continuariam a pertencer a Portugal.
Além disso, essas famílias teriam direitos, amplos poderes e poucos deveres,
e, em contrapartida, o rei teria a garantia da colonização sem precisar fazer
investimentos, já que sua maior preocupação era com o comércio nas Índias.
Através deste processo, garantir-se-ia a submissão à coroa portuguesa
(COSTA; MELO, 1997).

Por outro lado, a população nativa brasileira jamais teria direito a qualquer terra. Os senhores
feudais, que eram donos absolutos da terra e de tudo que ela produzisse, ofereciam favores aos
trabalhadores das terras, o que era considerado como caridade e não como uma forma de trabalho.

O assistencialismo continua durante o período da escravidão, quando os senhores tinham poder absoluto
sobre os escravos, sendo estes sua propriedade privada. Utilizava-se de meios como a prática religiosa
obrigatória, por meio da qual os escravos frequentavam as capelas e eram obrigados a servir a fé religiosa
católica. Tal atitude era apresentada como uma forma de justificar o direito às torturas e aos maus-tratos. Os
escravos eram obrigados a se adequar à realidade de seus senhores, apropriando-se de sua cultura, hábitos,
crença e religião. Apesar de não serem remunerados por suas atividades, os escravos muitas vezes recebiam
presentes, que eram importantes para preservação da imagem de bondade dos patrões.

O processo não foi diferente nas relações de produção agrícola, em que imigrantes e nativos eram
explorados, não recebiam salários dignos e tinham vinculação de consumo na própria fazenda. Para manter
esta situação, os detentores do poder pagavam o salário, que mal dava para os empregados manterem-se,
forneciam crédito como uma forma de preocupação e assistência, além de relações de apadrinhamento
que causavam dependência e falsa sensação de aceitação do empregado no seio da família do patrão.
Essas situações e esses pequenos presentes serviam para abrandar conflitos e revoltas trabalhistas.
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Unidade I

As práticas assistencialistas, mesmo com a evolução do contexto histórico brasileiro, continuaram.

Já no início do processo de industrialização, exatamente no governo de Getúlio Vargas, manobras


assistencialistas permeavam a administração, vista a ampliação da classe trabalhadora devido a essa
mesma industrialização. Nesse período, foram criadas as legislações trabalhistas, pois se verificou que
não se poderia atenuar os conflitos sociais apenas pela a força. Criou-se desse modo, um pacto, pacto
de natureza populista, com uma mentalidade de direito. O direito , nesse caso, era expresso através da
doação de bens e benefícios, a fim de evitar a revolta dos trabalhadores.

Esse pacto consistia na oferta gratuita de direitos trabalhistas em troca da passividade dos
trabalhadores enquanto classe, impedindo a luta por direitos, abafando suas lutas, além de passar
a imagem de Getúlio como um presidente comprometido com o povo. Porém, esse pacto, mesmo
na forma de uma política ou legislação, não rompia com o caráter assistencialista impresso nessas
ações, pois elas nada mais eram do que uma forma de atenuar os conflitos entre as classes sociais.

Acredita-se que uma das mais expressivas formas de assistencialismo expressas no Brasil se deu
a partir da criação, em 1942, da Legião Brasileira de Assistência – LBA, no governo Vargas, sob a
influencia de Darcy Vargas e com uma roupagem do primeiro damismo, sendo o primeiro damismo a
institucionalização do assistencialismo na figura da mulher do governante.

Tal ação assistencialista perdura até os dias atuais, porem com uma nova feição. Tem-se em todo
Brasil os “Fundos de Solidariedade” que nada mais são do que uma LBA sob uma nova roupagem. Os
Fundos proporcionam, até os dias de hoje – mesmo com todo o evoluir das políticas sociais publicas –,
o assistencialismo nu e cru. Muitas instituições políticas e partidárias se utilizam desse como forma de
arrebanhar votos, voltando às velhas práticas.

Com esse breve relato histórico, percebemos que o assistencialismo no Brasil sempre foi utilizado
como forma de abafar os conflitos entre explorados e exploradores, servindo para mascarar situações
precárias de trabalho e acúmulo de capital nas mãos de poucos.

Questão para reflexão:

Na sua concepção, quanto às ações efetivas nos dias atuais, você acredita que as atividades
desenvolvidas ainda são de caráter assistencialista ou já têm um cunho mais assistencial sob a ótica do
direito e da cidadania?

1.3 Formas de assistencialismo

Historicamente, as primeiras formas de assistencialismo observadas eram estabelecidas pelas igrejas,


como um dever moral, fundamentadas sob a ótica da ajuda e da solidariedade.

A Igreja Católica foi à instituição religiosa que mais se destacou nas ações assistencialistas.
Ao assumir esse papel, desenvolvia práticas humanistas e voluntárias a fim de abafar possíveis
conflitos sociais. Tais práticas podem ser notadas em diferentes contextos, como no caso dos
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FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

asilos, internatos e orfanatos para crianças e jovens, hospitais, ou em equipamentos de segregação


social, como os hospícios, leprosários ou os dispensários de tuberculose.

Marca com forma ou expressão do assistencialismo a filantropia. A filantropia é entendida como


uma prática humanitária na qual se realiza a doação – material ou em espécie – como forma de
desenvolvimento de um trabalho social. Ela é encarada como uma forma de desenvolver e promover
uma mudança social sem a intervenção do Estado.

São expressões ainda do assistencialismo, a solidariedade, a caridade, o apadrinhamento, a


benemerência, como também, o primeiro damismo, por meio de ações das primeiras-damas em fundos
sociais de solidariedade.

Expressa-se também como forma de assistencialismo, a assistência dispensada por algumas


instituições e organizações, desprofissionalizadas e com caráter apenas caritativo.

Podem-se exemplificar algumas ações assistencialistas em nosso cotidiano, como a doação de roupas
e brinquedos através de campanhas; doação de sopa para pessoas em situação de rua; apadrinhamento
de crianças e idosos em períodos específicos; entre outras.

Observam-se hoje diferentes grupos assistencialistas distribuindo alimentos nas ruas, garantindo a
subsistência dos indivíduos nas vias públicas, sem se aliarem à cobrança de políticas de inserção desses
indivíduos nas ações em atividade nos municípios e nos estados; ou, ainda, programas governamentais
de transferência de renda que não conseguem prever, a médio ou longo prazo, capacitações para o
trabalho, ou expectativa de inserção em programas de geração de emprego, perpetuando programas de
distribuição de cestas básicas, roupas etc.

Verifica-se que tais ações, que permearam e ainda permeiam a sociedade brasileira, confundem-se,
muitas vezes, com as políticas sociais e as políticas públicas, com a assistência social, que é um direito e
um dever do Estado, visto que muitas das vezes, tais ações ainda são enxergadas com um caráter de não
direito. Essas práticas dificultam, ainda, a implantação e implementação de políticas públicas, a inclusão
social, o protagonismo dos sujeitos sociais e o resgate de cidadania dos segmentos vulnerabilizados, pois
são enxergadas apenas como uma prática em si e não como uma política de acesso aos mínimos sociais.

Lembrete

Assistencialismo: prática voluntarista, de caridade e solidariedade. Já


assistência social é um direito e um dever do Estado.

Questão para reflexão:

Qual a sua opinião sobre o assistencialismo?

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Unidade I

2 A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

Figura 1 – Workmen Leaving Platt’s Works, Oldham 20th August 1900.

A Revolução Industrial teve início na segunda metade do século XVIII, na Inglaterra, com a transição da
manufatura e cultura artesanal para a mecanização dos sistemas de produção, encerrando a transição entre
feudalismo e capitalismo, a fase de acumulação primitiva de capitais e de preponderância do capital mercantil
sobre a produção. Completou ainda o movimento da revolução burguesa iniciada na Inglaterra no século XVII.

Esse período passou a ser considerado a Idade Moderna, definida como a busca de alternativas para
melhorar a produção de mercadorias. O crescimento populacional incentivou a burguesia detentora do
capital, na época, a buscar maior produção a menores custos.

Salienta-se que este século possuía várias particularidades. Foi um século marcado pelo grande
avanço tecnológico nos meios de transportes, com a invenção da locomotiva e dos trens a vapor; o
advento das máquinas. Com as máquinas a vapor, principalmente os gigantes teares, revolucionou-se o
modo de produzir, substituindo o homem nas suas funcionalidades.

Não foram só os avanços tecnológicos que marcaram esse século, mas sim os reflexos que esses
avanços proporcionavam à sociedade. A baixa nos custos das mercadorias acelerava o ritmo de produção,
fazia crescer, na mesma escala, o desemprego e a insatisfação.

O trabalhador passou a ser considerado também como máquina, passível de regulagem e ajustes.

Ao se substituir as ferramentas por máquinas, substituindo o ser humano e sua energia pela energia
gerada por uma máquina, configurou-se a Revolução Industrial, processo esse que veio a revolucionar a
história através da evolução que ele imprimiu – revolução e evolução tecnológica.
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FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

As primeiras expressões do desenvolvimento da produção industrial tiveram início na Idade Média,


com o desenvolvimento da manufatura, através de atividades de cunho doméstico e artesanal.

A manufatura, mencionando-a dentro desse contexto, era resultante do processo de ampliação


da produção e do consumo de determinadas mercadorias, pela qual o pequeno produtor, nesse caso
o artesão, a fim ampliar e aumentar a produção, introduziu-se nos modos de produção industrial
realizando, domesticamente, uma parte da produção. Logo após esse fato, vendo que eram insuficientes
essas relações de partilha, surgiram as primeiras fábricas.

Saiba mais

Para conhecer ainda mais assistam o filme


Tempos Modernos. Dir. de Charles Spencer Chaplin, 87 minutos, 1936.

Com o surgimento dessas, uma nova relação se introduzia, a relação de trabalho e de assalariamento.
A produtividade aumentava em longa escala, sendo fruto dessa divisão, chamada de divisão social
e técnica do trabalho, que delimitava papeis, aumentava a produção e reduzia a participação do
trabalhador em todas as etapas da confecção da mercadoria.

No período de maquinofatura – trabalho realizado já por máquinas – o trabalhador passou a ser


regido pelo tempo e funcionamento da máquina, quando a gerência de seu próprio corpo era realizada
por alguém fora dele. É nessa “coisificação” e “desumanização” do trabalho que a Revolução Industrial
se consolidava.

A particularidade da Revolução Industrial ocorre exatamente na Inglaterra porque, nesse período,


ela vivia uma situação privilegiada, pois possuía grandes reservas de carvão mineral em seu subsolo,
fonte de energia para movimentar máquinas, como também grandes reservas de minério de ferro,
principal matéria-prima utilizada nesse período. Era privilegiada, também, no contingente de mão
de obra disponível, motivada pelo processo do êxodo rural para os centros urbanos, o que ampliou o
mercado consumidor inglês.

A Inglaterra industrializou-se cerca de um século antes das outras nações, pois contava com
particularidades que a favoreciam. O grande acúmulo de capital, de mão de obra e matéria-prima
vinham a privilegiar sua ascensão enquanto nação industrializada e evoluída tecnologicamente.

Outro fator relevante era o modelo de Estado, pois a Inglaterra convivia, desde 1688, com a Revolução
Gloriosa, um modelo de estado liberal. Essa particularidade fazia com que a Inglaterra vivenciasse esse
modelo estatal um século antes da Revolução Francesa.

A Revolução Industrial poderia também ser chamada de Revolução fabril, pois uma de suas
características era a concentração dos trabalhadores em fábricas. Essa característica produzia uma
separação, que se pode dizer uma separação entre classes sociais, aspecto esse particular ao trabalho
15
Unidade I

em si – o trabalho, desde essa época, é caracterizado como elemento de fundação para as relações,
separando o capital dos meios de produção (instalações, máquinas, matéria-prima) do trabalho.

A Revolução alcançava patamares que iam além do chão da fábrica. A evolução gerada por esta
proporcionava o desenvolvimento.

Mesmo com o desenvolvimento das cidades, a vida dos que vivenciavam essa realidade não acompanhava
o ritmo das engrenagens das máquinas. A situação para os camponeses e artesãos era difícil, vivenciando
uma realidade que não evoluía, só involuia. A partir das ideias advindas da Revolução Francesa, as classes
dominantes procuraram “apaziguar” os ânimos, pois verificavam que outro tipo de revolução poderia surgir
e acabar com seus sonhos dourados e enriquecedores. Para tal, criou-se a Lei Speenhamland, que garantia
subsistência mínima ao homem incapaz de se sustentar pela ausência do trabalho.

Lembrete

A Lei Speenhamland, ou Lei dos Pobres simplesmente, foi implantada na


Grã Bretanha, na qual eram garantidos, através de ações de proteção social,
mínimos sociais por parte do Estado.

Em consequência desse aumento da produção, cresceu a concorrência que ameaçava o capital.


Para tanto, foi encontrada uma solução: a formação de cartéis e associações, que originou o
capitalismo monopolista.

Surgiram, nesse contexto, as grandes corporações, que objetivavam o agrupamento do capital e


garantiam sua expansão com muito mais impacto. A administração passa dos capitalistas individuais
para setores administrativos que são responsabilizados pela circulação do capital, da força de trabalho
e sua mercantilização.

A necessidade de aumentar o consumo para fazer girar a produção trouxe a proposta de


expandir o mercado para dentro da vida familiar, que até então se autogeria em suas necessidades
de alimentação e vestuário. O capitalismo começou a industrializar alimentos e vestuários, o que
levou à dependência toda a vida social. Para tanto, desprezou a capacidade de produzir os alimentos
e objetos necessários para a vida cotidiana (cultura de subsistência) no contexto doméstico, e
supervalorizou a capacidade de consumir os produtos oferecidos no mercado.

As fábricas do início da Revolução Industrial eram insalubres e priorizavam a produção, sem considerar
a necessidade de preservação das condições de vida e de trabalho da classe trabalhadora. Os salários
eram baixos e ocorria a contratação de mão de obra infantil e feminina, com jornadas que chegavam a
dezoito horas diárias. Funcionavam em ambientes com péssima iluminação, abafados e sujos.

Os trabalhadores, incluindo mulheres e crianças, eram sujeitados a castigos físicos, não possuíam
direitos trabalhistas ou qualquer outro benefício. Por outro lado, a situação de desemprego gerava uma
condição de extrema precariedade, levando o trabalhador a aceitar as péssimas condições de trabalho.
16
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Mesmo com um sistema que gerava a dependência pelo medo da perda do trabalho, ocorreram
muitas manifestações de denúncia e revolta para que fossem suscitadas mudanças nas condições de
trabalho. Uma das mais expressivas manifestações ocorridas nesta época foi o Ludismo, uma forma de
manifestação e expressão por parte dos trabalhadores que consistia na quebra de máquinas. Os ludistas
invadiam fábricas e destruíam seus equipamentos como forma de protesto e revolta pela situação em
que viviam.

Também foram consequências do processo de Revolução Industrial a poluição ambiental e sonora, o


êxodo rural, além do desemprego, que ainda é um problema nos dias atuais. 

Questão para reflexão:

Com o advento da máquina, ocorreu uma desumanização do ser, ou seja, o trabalho que se apresenta
como categoria fundante do ser social representa agora sua alienação. Nos dias atuais, você ainda
verifica essa desumanização nas expressões e formas de trabalho?

2.1 As fases da Revolução Industrial

A Revolução Industrial, mesmo sendo um movimento único, tomou em seu evoluir rumos
diferenciados que podem dividi-la em fases.

A primeira fase da Revolução Industrial aconteceu entre os anos de 1760 a 1850. Nesses anos a
Inglaterra, primeira a aderir a esse novo modelo produtivo, liderava todo o processo de industrialização.
As particularidades expressas pelo seu desenvolvimento técnico-científico foram significativas, pois ela
foi terreno das primeiras máquinas confeccionadas em ferro e que utilizavam o vapor como força motriz.

Já a segunda fase se iniciava logo na década de 1850, marcada pela aceleração do processo de
industrialização, uso de novas tecnologias e matérias primas, descoberta de novas fontes de energia,
entre outros.

A terceira fase da Revolução industrial ocorreu logo após a Segunda Grande guerra, quando a
economia internacional começava a passar por profundas transformações. Essa nova fase apresenta
processos tecnológicos decorrentes de uma integração física entre ciência e produção, também chamada
de revolução tecnocientífica.

2.2 O processo de modernização pós Revolução Industrial

O processo de modernização ocorrido pós Revolução industrial acelerava o ritmo da produção industrial.

Marcaram esse contexto o boom de inovações tecnológicas, a evolução no processo de transformação


da matéria-prima, uso de máquinas mais evoluídas e automáticas, com menor uso da força humana.

A evolução nem sempre gera uma apropriação completa por parte de todos os partícipes desse
processo. Com a aceleração do processo evolutivo dos modos de produção, pensava-se em modos de se
17
Unidade I

obter mais lucro e gastar menos. Para tal, um reordenamento geral foi elaborado e estabelecido, no qual
os trabalhadores passavam por um processo de especialização de sua mão de obra, pela qual só tinham
responsabilidade e domínio sob uma única parte do processo industrial, não tendo mais ciência do valor
da riqueza por eles produzida. Isso gerava lucro.

O trabalhador passava agora a ser assalariado, vendendo sua força de trabalho; porém seu salário nem
sempre condizia com o que ele produzia. Essa mudança só pôde ser concretizada pelo modelo de sociedade
– dividida em classes distintas – e pelo controle que essas tinham do processo de produção da economia.

Com essa divisão de tarefas e papeis, o controle e acesso à matéria-prima eram monopolizados, o
que favorecia a burguesia.

Durante o século XX, outros pensamentos permearam o sistema capitalista. As ideias do


industriário Henry Ford e do engenheiro Frederick Winslow Taylor vieram a somar à “evolução”
industrial. Com uma metodologia que otimizava o tempo e tinha como premissa a eficiência do
processo produtivo, agilizava-se as respostas que essas teriam para o mercado e consequentemente,
o lucro seria maior.

Diz-se que vivenciamos atualmente uma quarta Revolução industrial.

Em diferentes países, o processo de modernidade não parou; a cada dia o avanço tecnológico
substitui a necessidade de mão de obra trabalhadora e exige um nível de especialização dessa mão de
obra nem sempre disponível para atender as demandas.

Nessa nova relação de trabalho, a mão de obra excedente vê-se obrigada a buscar novas vias para
subsistir, subalternizando as condições de produção e de trabalho.

A família perde a capacidade de suprir suas necessidades mínimas e básicas de subsistir, sofrendo um
enfraquecimento, demandando uma atuação do Estado, que tem uma função reguladora das relações sociais.

O Estado, a serviço do capitalismo, cria equipamentos sociais e regulatórios que enquadram e


fragmentam as relações sociais. Seus aparatos servem, também, como modo de alienação e submissão.

Na expansão do capitalismo, novas necessidades e novos serviços surgem para responder às demandas
da vida capitalista, e a cada necessidade um serviço é oferecido, num processo de mercantilização de
todas as ações da vida dos indivíduos.

2.3 O advento do capitalismo

O sistema capitalista surgiu e concretizou-se como sistema econômico durante o século XVI, com as
práticas industriais e mercantis no continente europeu.

Como modo de produção, o capitalismo passou a se assentar em relações sociais de produção


capitalista, marcadas fundamentalmente pela compra e venda da força de trabalho.
18
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Esse sistema relaciona-se com a produção. A produção é uma atividade social na qual
se estabelece a cooperação entre os homens, porém essa relação depende do nível dos meios
de produção. Ela ainda reproduz a condição de existência humana através de meios materiais:
produção social = relação social.

O capital é o determinante de todo processo de vida e suas relações. Ele pode ser expresso por
mercadorias e dinheiro. O capital, portanto, se expressa sob a forma de mercadorias: meios de produção
e meios de vida necessários para a reprodução da força de trabalho.

Entende-se por mercadoria um objeto útil, que tem uma utilidade dentro do processo reprodutivo,
com valor de uso, com uma grandeza social. É sabido que nem toda mercadoria é capital.

O capital é propriedade do capitalista, como também o trabalho – força de trabalho vendida ao


empregador pela classe trabalhadora. O capitalista monopoliza os meios de produção e de subsistência.

Toda relação existente no capitalismo supõe uma condição de assalariamento. A condição de


assalariamento é intimamente ligada à venda da força de trabalho do proletariado. Esta é trocada por
valores, mesmo estes sendo diferentes do que os trabalhadores realmente deveriam receber – aí que
está a criação do antagonismo e da desigualdade, pois nessa relação é extraída a mais-valia, que não é
apropriada por aqueles que estão do outro lado da esteira.

A história do capitalismo é a história das classes sociais, o elemento definidor do capitalismo, seu
traço distintivo é a posse, de maneira privada, dos meios de produção por uma só classe e a exploração
da força de trabalho daqueles que não a detém.

Lembrete

A sociedade capitalista é a expressão histórica do desenvolvimento


social e, portanto, necessária à expansão das forças produtivas do trabalho.

Considerando seu processo de desenvolvimento, pode-se dividir o capitalismo em três fases:


capitalismo comercial, industrial e financeiro.

A primeira fase do desenvolvimento do capitalismo em muitas literaturas é confundida com a


Revolução Industrial. Essa fase é caracterizada pelo grande desenvolvimento tecnológico que veio a
fomentar a evolução da indústria.- mecanização, divisão do trabalho, especialização da mão de obra.

A I Guerra Mundial influenciou fortemente o sistema capitalista. O mercado internacional se


restringiu, a moeda ficava defasada, entre outras alterações.

É no berço da estruturação do capitalismo, após a Segunda Guerra Mundial - 1945, que surge o
serviço social, vinculado às políticas sociais estatais, como o agente de implementação dessas políticas.

19
Unidade I

Importante ressaltar que as políticas sociais, embora em sua maioria representem conquistas das
classes trabalhadoras, passaram a serem instrumentos de intervenção estatal a serviço do projeto
hegemônico do capital, garantindo a manutenção do sistema vigente e abrandando conflitos entre o
capital e o trabalho.

Nesse contexto, surge a primeira contradição do trabalho técnico do assistente social: a necessidade
de reprodução do sistema, garantindo os interesses do capital em contraponto à luta dos trabalhadores
pela conquista e defesa de direitos. Tal contradição coloca ao profissional a necessidade de uma opção
política, inserida nas contradições entre as classes e na disputa por interesses.

Saiba mais

Para se aprofundar sobre o capitalismo não deixem de assistir:

Capitalismo: Uma História de Amor. Dir. Michael Moore, 120 minutos,


2009.

Evolução do sistema capitalista

1. Capitalismo – crescimento econômico de 1945-73;


2. Produção: fordista/taylorista – produção em massa;
3. Reprodução: keynesianismo – sistema de regulação social;
4. Distribuição: cadeia de lucro;
5. Consumo: consumo em massa.

Pós-73 – Crise do capitalismo (crise estrutural)

1. Superprodução;
2. Hiperinflação;
3. Crise do petróleo;
4. Queda da taxa de lucro.

Fases do capitalismo:

• Capitalismo mercantilista: colonialismo, constituição de um Estado-nação, que controlava e


promovia o acesso aos direitos civis. Sua ideologia era liberal.

20
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

• Capitalismo liberal ou concorrencial (final do século XVIII): esse foi resultado da Revolução
Industrial e teve duas subfases: uma que se iniciou em 1848 como o advento da máquina a
vapor e outra de se iniciou a partir de 1873. As ligações comerciais entre os subsistemas centrais
e periféricos – puramente econômicas e não monopolistas. Consolidação Estado-nação e dos
direitos políticos. O liberalismo é tido como visão de mundo e coloca o Estado à margem das
atividades econômicas.

• Capitalismo organizado: final do século XIX.

• Capitalismo desorganizado: final da década de 1960.

Questão para reflexão:

O que vem a ser o sistema capitalista? No Brasil, você observa a presença desse modelo econômico?

2.4 Capitalismo monopolista e o serviço social

O sistema capitalista apresenta-se em sua fase monopolista, expressa-se através de massivos


investimentos da região central até sua periferia. Denomina-se, também, como neocapitalismo ou
simplesmente neocolonialismo.
Sua maior característica se mostra através das relações de dominação e dependência.

Seu ápice ocorreu no pós Segunda Guerra Mundial, com o avanço da constituição do Estado-nação
nos subsistemas periféricos.

A ideologia que imperava era de pós-liberalismo.

O capitalismo se dividiu em duas subfases:

a. Clássica: com o esgotamento da expansão advinda da primeira revolução tecnológica.


b. Capitalismo tardio: terceira revolução tecnológica (1940-45). Teve uma crescente automação e regulação
eletrônica da produção, como também uma internacionalização e centralização do capital. Advém um
espírito individualista e a competição sem limites que dá lugar à fé na ciência e na técnica.

O serviço social entra nessas nuances do desenvolvimento econômico, como parte acessória do
sistema capitalista.

2.5 A divisão social do trabalho: introdução ao pensamento de Karl Marx

O marxismo se baseia no materialismo e no socialismo científico, constituindo, ao mesmo tempo,


uma teoria geral e o programa dos movimentos operários, tendo suas bases de ação nestes movimentos,
porque eles unem a teoria à prática.

21
Unidade I

Karl Marx com sua teoria – muitos chamam de método de Marx – desvenda as leis do desenvolvimento
do capitalismo, revelando que para cada época ou contexto histórico, um modelo de produção é
vivenciado e, por consequência, um sistema de poder é estabelecido. Para ele, as relações existentes no
sistema capitalista de produção estabeleciam relações de poder tais, que pela apropriação dos meios e
modo de produção eram vivenciadas relações entre classes antagônicas.

Figura 2 – Karl Marx, 1875.

Marx pauta sua teoria nas relações oriundas do trabalho, estabelecendo este como motor das demais
relações sociais. Identifica também as relações de produção que iniciam e introduzem as relações sociais.

A relação fundamental do capitalismo tinha por base o assalariamento. Através desta relação,
um contrato era firmado entre o empregador e o trabalhador, contrato esse com objetivos
distintos. Era estabelecido que o trabalhador vendesse sua força de trabalho ao empregador e em
troca desta era-lhe pago um salário. Essa era sua mercadoria dentro desta relação de mercado

O capitalista pagaria aos trabalhadores um salário em troca do seu trabalho. O trabalho era
desenvolvido, porém o valor pago por esse não condizia com as horas que eram disponibilizadas ao
empregador, ou seja, dentro dessa relação de compra e venda, o capitalista retirava maior proveito e
ainda lucrava com este trabalho excedente e não pago.

Para Marx, o trabalho humano é único que o diferencia das demais espécies, segundo sua ação com
a natureza. Todo trabalho operado pelo homem tem uma intencionalidade previamente elaborada, ou
seja, ele elabora um processo de trabalho, com o uso consciente e racional da natureza e a compreensão
dessa intencionalidade processual.

O trabalho envolve um ato criativo que vai além da atividade instintiva. Além de transformar o objeto
que está sendo elaborado, ele também se transforma numa busca por aperfeiçoamento. Cria novas
possibilidades de ação, possibilitando uma socialização desse conhecimento apreendido para outros
indivíduos, que poderão reproduzir o trabalho ou propor novas formas de executá-lo, independentemente
de o terem criado.
22
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Essa força de trabalho, segundo Marx, como base na relação capitalista de produção, é vendida
para um empregador que possui os meios de produção. Tal relação implica três fatores anteriores: a
separação da força de trabalho dos meios de produção, o desejo dos trabalhadores de vender sua força
de trabalho e do empregador de utilizar esse trabalho, acumulando capital.

Segundo o marxismo, o capitalismo encerra a contradição fundamental entre o caráter social da


produção e o caráter privado da apropriação, que forma a base para o antagonismo de classes.

Entende-se por caráter social da produção, a divisão técnica do trabalho, na qual há a organização
do trabalhador no interior da fábrica e a delimitação de tarefas e funções. A atuação imposta aos
trabalhadores imprime uma atuação solidária e coordenada. Mesmo se falando de um caráter social da
produção, o produto do trabalho não se revela com um produto social, pois a propriedade é privada do
capitalista e nem sempre a mercadoria é uma mercadoria social e com valor de uso ou valor de troca. O
produto do trabalho social, portanto, se incorpora a essa propriedade privada.

Marx descreve o valor de uso e o valor de troca no modo produtivo como quando um objeto, útil a
alguém, passa a possuir um valor de uso, uma utilidade dentro desse contexto relacional, pois o que se
vê é que essa utilidade que o torna valorativa ao uso.

O processo de organização das comunidades implica uma base de divisão do trabalho elaborado por
diferentes indivíduos. Os processos de trabalho para a criação dos produtos eram responsabilidade de
cada indivíduo da comunidade, e muitas habilidades eram desenvolvidas por todos para a manutenção
da vida, ou seja, para a reprodução social do trabalho.

O capitalismo se apropria do trabalho e dá a ele um valor de troca; todavia, essa troca demonstra que
o capitalista, detentor dos meios de produção, o organiza, enquanto a realização desse trabalho decorre
do conhecimento do trabalhador. A diferença entre o custo real da mercadoria (matéria-prima e custo
da força de trabalho) e o custo ofertado no mercado, que permite a acumulação de capital pelo detentor
dos meios de produção, é denominado por Marx como mais-valia.

Esse valor advém do tempo trabalhado e refere-se ao momento em que o


trabalhador tem seu valor de uso enquanto força de trabalho utilizada por
mais tempo do que o necessário para a sua reprodução social. (...)

Num primeiro momento, essa mais-valia limitava-se à extensão da jornada


de trabalho, ao que se chama de mais-valia absoluta. Com o avanço
tecnológico e a possibilidade de produzir mais em tempo menor, esse valor
excedente apropriado pelo capitalista refere-se à mais-valia relativa (MARX;
ENGELS, 1952).

A divisão social do trabalho imposta pelo capitalismo inicia-se com os sistemas de cooperativas
pelos quais os trabalhadores são aglomerados e as vantagens da utilização em massa da força de
trabalho são visíveis.

23
Unidade I

As pequenas oficinas são substituídas por grandes salões, onde todos trabalham, revelando que a
associação entre os homens os torna mais produtivos, propiciando um aumento ainda maior de acúmulo
de capital.

A centralização do trabalho em um único local possibilitou uma melhor observação de seu processo,
essencial para o controle do trabalho por parte do capitalista. Surgem novas demandas para esse
controle, como serviços de supervisão, entre outros, para manutenção da ordem na produção, utilizando
coerção, violência e castigo no interior das fábricas. Essas medidas ainda teriam de ser ampliadas para
dar conta do processo de industrialização que estava em curso.

A divisão social do trabalho efetiva-se pela distribuição das tarefas entre os diversos trabalhadores, para
que esses, especializados em um dado fazer, sejam mais rápidos e, com isso, aumentem a produtividade
sem ter a compreensão de todo o processo de trabalho, mecanizando as ações e impedindo o processo
de criatividade. Cabe ao trabalhador saber apenas o necessário para cumprir suas tarefas.

O capitalismo substitui o saber em troca de uma automação da mão de obra fragmentada, criada de
acordo com as necessidades do capital.

Esse processo deu origem à Revolução Industrial, que utilizou as máquinas para tornar mais barato o
custo de produção dos bens e possibilitou a diminuição da jornada de trabalho e o aumento ainda maior
da produção, sem o correspondente aumento de salário, propiciando assim um aumento do acúmulo de
capital pelos detentores dos meios de produção.

Segundo Marx, o sistema capitalista não garante meios de subsistência a todos os membros da sociedade.
Pelo contrário, é condição do sistema a existência de uma massa de trabalhadores desempregados, que
ele chamou de exército industrial de reserva, cuja função é controlar, pela própria disponibilidade, as
reivindicações operárias.

Questão para reflexão:

Segundo sua apreensão quanto ao texto, você acredita ter a divisão do trabalho um caráter social?

2.6 As relações sociais e o serviço social dentro do sistema capitalista

O serviço social como profissão inserida na divisão social do trabalho tem algumas singularidades
no seu “fazer profissional”.

O estudo da profissão de serviço social procura seu significado dentro da sociedade capitalista, ou
seja, através de sua compreensão. A reprodução das relações sociais é a reprodução da totalidade do
processo social, a reprodução de determinado modo de vida, ou seja, o modo de como são produzidas e
reproduzidas as relações sociais na sociedade.

O trabalho apresenta-se como base da vida social, ou seja, é por ele e através dele que o homem se
relaciona consigo mesmo e com o meio, utilizando de sua racionalidade para apropriar-se dos recursos
24
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

naturais. O homem é impulsionado por necessidades básicas e vitais na manutenção de suas existenciais,
dessas necessidades surgem outras, formando um conjunto de relações sociais, fazendo-o um ser social e
histórico dentro desse processo. Assim, o homem realiza sua práxis, atividade na qual ele transforma a si
e o meio, ação na matéria, criando uma nova realidade humanizada, cuja forma privilegiada é o trabalho.

Lembrete

A práxis relaciona-se a uma atividade prática de transformação. Esse


conceito surgiu de modo aprimorado por Karl Marx. Para Marx, a práxis é
uma atividade humana, prática e crítica que nasce na relação do homem
com a natureza.

Segundo Marx, o primeiro ato histórico pelo qual podemos distinguir os homens dos demais animais
não é o de pensar, mas o de começar a produzir os seus meios de vida.

No processo de trabalho, os homens criam determinadas relações entre eles, relações essas
chamadas de relações de produção, pelas quais desenvolvem suas capacidades produtivas através da
força desempenhada por seu trabalho, constituindo o modo de produção. Esse nível de produção é que
constitui os diferentes tipos de classes sociais.

São as relações de produção que determinam a divisão das classes sociais, segundo suas condições
materiais: os que detêm os meios de produção e aqueles que vendem sua força de trabalho.

Para Marx, é por meio do trabalho, atividade intencional e racional, com finalidade, que o
homem transforma a natureza a fim de obter a realização de suas satisfações. Nessa relação há uma
mútua transformação, pois ao apropriar-se do recurso natural, o homem transforma a natureza e a
si mesmo. É essa ação intencional e racional que diferencia os homens dos animais, como também
a consciência e a religião.

Através do trabalho, também através das relações sociais que se iniciam os modos de vida social,
as ideias, as concepções de mundo, criam-se novas necessidades, os valores, uma vez que mesmo
com a produção de objetos inanimados por esses homens, seus instrumentos de trabalho, seus
modos de vida, proporcionam que eles também produzam novas capacidades e qualidades humanas,
humanizando e criando novas necessidades.

A teoria social de Marx inaugura uma ontologia social e coloca as bases para a compreensão da
totalidade histórica da ordem burguesa.

A ontologia do ser social tem um vínculo com a realidade histórica, buscando reproduzir a dinâmica feita
pela história segundo seu conhecimento, não desprezando a totalidade em nenhuma de suas dimensões.

Revelou-se que não é possível um conhecimento teórico neutro, uma ciência neutra. Associou-se a
perspectiva de classe às teorias a fim de entender a realidade para depois revolucioná-la.
25
Unidade I

Marx não separa a teoria do método, ou a teoria e a realidade, elaborando uma analise intelectual e
teórica do conteúdo revolucionário.

O método dialético de Marx é revolucionário, entender e criticar o modo de produção capitalista e os


antagonismos existentes, visando à sua superação. Sua dialética reconhece a negatividade do processo
histórico e sua totalidade, fazendo uma analise econômica e política da relação entre capital e trabalho
dentro do modo de produção capitalista.

A crítica que a teoria social de Marx estabelece é ontológica, pois desvenda o processo de
desumanização do ser social dentro da ordem burguesa, dentro da categoria fundante que é o trabalho
e seu processo histórico nesta realidade social.

O método de Marx fundamenta-se na perspectiva de totalidade, suas dimensões constitutivas e


o processo de reprodução histórica, busca entender as mudanças dentro do processo, os fenômenos
da sociedade capitalista e suas funções, apreender a legalidade da ordem burguesa e as formulações
teóricas, expressando o movimento da própria realidade sócio histórica.

Lembrete

O contexto que se insere esta perspectiva apresentava como mudanças


socioculturais são:
Economia: Revolução Industrial.

Política: rompimento com o absolutismo e consolidação do estado moderno.

Ideologia e cultura: ideais Iluministas.

Modernidade: Revolução Industrial e Revolução Francesa.

O serviço social na Europa e nos Estados Unidos aparece vinculado à expansão do capitalismo
monopolista como forma de garantir a reprodução desse sistema e das relações sociais que davam suporte
ao trabalho alienado. O Estado passou a incorporar o trabalho do assistente social na implementação de
políticas sociais que objetivavam atenuar os conflitos entre o capital e o trabalho, e combater a ameaça
das ideias comunistas entre as classes subalternas.

Tal contexto sociopolítico de centralização e intervenção estatal na condução de políticas econômicas


e sociais evidencia as expressões da questão social como matéria-prima do serviço social, sua base e
primeira linha de ação, justificando sua relevância na constituição de seu espaço profissional dentro da
divisão social e técnica do trabalho.

O serviço social, inscrito na divisão social e técnica do trabalho, dentro do processo de reprodução
das relações sociais, aparece como uma alternativa auxiliar do Estado através de serviços sociais. É uma

26
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

expressão do trabalho coletivo através das relações antagônicas geradas pelo capital. Nesta perspectiva,
o serviço social apresenta-se como mediador dos serviços sociais estabelecidos pelo Estado, partícipe do
processo de reprodução das relações sociais, partícipe desse processo social.

As maiores áreas de atuação do serviço social nessa gênese se pronunciavam pela prestação
dos serviços sociais, na garantia mínima de sobrevivência, como complementação salarial, salário
indireto aos trabalhadores; subsidiando sua reprodução física, intelectual e espiritual, como também
de sua família. É a garantia do aumento da produtividade e da subordinação do trabalhador, pela
manutenção do exército industrial de reserva – EIR, a competitividade, institucionalizando a pobreza
e mantendo a “paz social”.

Os serviços sociais são expressão dos direitos sociais do cidadão, embora sejam ministrados e
ofertados por intermédio das relações de trabalho ou na cessão de seu trabalho. Esses são expressão da
divisão riqueza socialmente produzida – ou parte dela – sob a forma de rendimentos.

Em resumo, é um direito do trabalhador, reconhecido pelo próprio capital, que se torna um meio de
reforço do paternalismo do Estado e da retomada do coronelismo.

Com o crescimento das demandas por bens e serviço dirigidas ao Estado pela classe trabalhadora,
abriu-se um novo mercado de trabalho no campo das políticas sociais, onde o assistente social atuaria
como executor de programas sociais.

Nesta unidade, será apresentado, no que se refere à gênese do serviço social, um contexto mais geral
e mundial.

O serviço social – contexto geral – surgiu sob forte influência norte-americana do modelo de
caso, grupo e comunidade, sob a influência do pensamento de Mary Elly Richmond. Já no Brasil, sua
implantação se dá no decorrer de um processo histórico iniciado a partir dos anos de 1920-30.

O surgimento das primeiras manifestações da institucionalização do serviço social pela Igreja se deu
com a criação do Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo – CEAS, em 1932, com o incentivo e
controle da Igreja Católica. Destacam-se como as instituições mais importantes para o surgimento do
serviço social além do CEAS: a Legião Brasileira de Assistência (1942), o Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (1942) e o Serviço Social da Indústria (1946).

Apresentou-se uma emergência da profissionalização do serviço social por meio da intervenção do


Estado, mobilizado pela Igreja Católica.

Correntes filosóficas também se puseram a influenciar o serviço social: tomismo, neotomismo,


positivismo, conservadorismo, marxismo, funcionalismo americano, marcaram uma evolução das
protoformas profissionais.

O contexto histórico brasileiro também influenciou a profissionalização, assunto esse iniciado nesta
unidade a fim de introduzir sua concretização nas próximas unidades.
27
Unidade I

3 OS FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO


SERVIÇO SOCIAL: AS PROTOFORMAS DO SERVIÇO SOCIAL - UMA BREVE
ANÁLISE HISTÓRICA

Figura 3 – Símbolo da profissão de serviço social

O serviço social surgiu decorrente da divisão social e técnica do trabalho, afirmando-se como uma
profissão dentro da sociedade, dotada de uma dimensão teórico-metodológica e técnico-operativa,
indissociada das ordens éticas e políticas. Ele surgiu enquanto profissão no contexto do desenvolvimento
capitalista e do agravamento da questão social. Porém, para localizá-lo, faz-se necessário compreender
esse contexto histórico de sua institucionalização, como também as influências teóricas que permearam
sua gênese.

O serviço social iniciou seu embasamento teórico com a influência norte-americana do modelo de
caso, grupo e comunidade, sob a influência do pensamento de Mary Ellen Richmond.

Nesse principio, a ação profissional, sob a ótica do ideário de Richmond, inscreve uma metodologia
pautada numa análise médica das expressões da questão social, na qual essas expressões eram
passiveis de diagnóstico e tratamento como uma “doença”. Essa análise era verificada com um método
genérico, enfatizando o sistema cliente e a situação social problema e estabelecia uma relação entre a
individualidade e o meio social.

Sua primeira influencia foi dos ideários de Florence Nightingale, no ano de 1851 na Inglaterra,
percussora da profissão de enfermagem, onde ela estabelecia como objetivo de seus primeiros cursos
o preparo de visitadoras domiciliares, pelo qual concebia a tarefa assistencial como reintegradora e
reformadora do caráter.

O primeiro “Curso de Formação de Visitadores Sociais Voluntários“, realizado pela Sociedade de


Organização da Caridade da Inglaterra, ocorreu em Londres, em 1893.

Na América do Norte, as discussões sobre a formação profissional dos trabalhadores da assistência


ocorreram na Conferência de Caridade e Correção em Toronto no ano de 1897. Nela, Mary Richmond,
que participava da Sociedade de Organização da Caridade de Baltimore, propôs a criação de uma escola
para o ensino de Filantropia Aplicada.
28
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Ao pronunciar-se em uma palestra, Richmond assinalou a necessidade de se criar uma escola para a
formação de assistentes sociais.

Mary Richmond introduziu um método no qual se realiza o estudo ou levantamento de dados


sobre a situação, diagnosticando o problema social, avaliado logo em seguida e, por fim, estabelecendo
um tratamento. Visualizava o inquérito como um instrumento de fundamental importância para a
realização do diagnóstico social e, posteriormente, do tratamento, pois acreditava que só através do
ensino especializado poder-se-ia obter a necessária qualificação para realizá-lo. Essa metodologia é
denominada como “Metodologia do Caso Social Individual”.

Lembrete

Metodologia do Caso Social Individual: conjunto de métodos que


desenvolvem a personalidade, através de um diagnóstico social, que,
ao ser sistematizado, proporciona o reajustando conscientemente e
individualmente o homem ao seu meio.

Richmond define uma personalidade social, através da ação de evidência social, como ponto
de partida para a construção das bases teóricas da prática profissional. Define, também, uma nova
concepção para o ser social, sendo este produto das relações intrínsecas entre a personalidade e o meio,
podendo explicar o caso social como um fenômeno de totalidade.

Ela teve a primeira iniciativa em institucionalizar a prática do serviço social, pois verificou que as ações
caritativas não eram mais suficientes para atender às reivindicações da classe operária e de outros setores da
população. Identificou tais ações como formas de intervenção desumanizadora da instituição e da população.

Lembrete

A primeira intenção de “virada” do assistencialismo para assistência.

Assim, no ano de 1897, ela propôs a fundação de uma escola de filantropia aplicada, transmitindo
caráter profissional aos serviços sociais até então executados.

Em 1898, a New York Charity Organization Society levaria o ideário inicial de Mary Richmond.

A primeira escola de serviço social foi fundada em Amsterdã, no ano de 1899, o Instituto de Treinamento
em Serviço Social, com um curso de apenas dois anos, composto de matérias como conhecimentos
sociológicos gerais, problemas socioeconômicos, legislação e treinamento prático supervisionado em
diferentes campos do serviço social.

Já em 1904, o curso mantido pela New York Charity Organization Society adquire a forma de curso
de apenas um ano de duração, ministrado pela Escola de Filantropia de Nova York, a primeira escola de
29
Unidade I

serviço social dos Estados Unidos. Posteriormente, essa escola se tornaria a Escola de Serviço Social da
Universidade de Columbia.

Na América do Norte, segundo Silva, o serviço social, especialmente o de caso, deve a Mary Richmond
seu conteúdo lógico e coerência interna. Lá se sustenta a prática na necessidade de se individualizar a
assistência tanto no diagnóstico como no tratamento, abrangendo o estudo de caso, seu diagnóstico
e tratamento, com uma prática sistemática e técnica. Tal prática se orientava pela concepção de uma
sociedade estruturada, que necessita apenas de reformas e ajustes, nas quais a ação profissional era
individualista, com o predomínio da autoajuda, reflexo do processo político americano, a ascensão do
sistema capitalista.

Em 1917, Richmond tentou racionalizar essa assistência, dando-lhe uma visão “terapêutica”, que
considera a questão social como uma doença que necessita de diagnostico e de tratamento a partir do
indivíduo.
No ano de 1918, a Escola de Filantropia passou a se denominar “Escola de Serviço Social” e Mary
Richmond ocupou a cadeira de docente em Serviço Social de Casos.

O serviço social como profissão moderna começou a ser sistematizado com a contribuição de
Richmond a partir do voluntariado assistencialista, por meio de sua teorização do diagnóstico social
das situações-problema. É fruto de dois fatores: a situação da sociedade segundo seu contexto
(industrialização e ascensão da classe proletária) e o desafio de oferecer respostas.

Desde essa primeira sistematização elaborada por ela, o serviço social reflete uma perspectiva genérica
de intervenção, tendo em vista a mudança social, por meio da qual deu-se aos assistentes sociais o
desafio de trabalhar para uma comunidade à qual faltavam recursos sociais, utilizando argumentos
oferecidos pelos casos.

Já em 1922, a prática do assistente social, suas teorias, seus objetivos, convergiam pra uma ideia
central: o desenvolvimento da personalidade. Entendia-se, nesse contexto, que o caso social nada mais
era do que processo de desenvolvimento da personalidade através de ajustamentos conscientemente
efetuados de indivíduo a indivíduo, do homem para com o seu meio social.

No diagnóstico social estabelecido nessa época, deveria haver uma descrição das dificuldades, uma
lista dos fatores causais que se relacionassem com as dificuldades, uma enumeração dos elementos
disponíveis e dos riscos que devem ser reconhecidos com o tratamento.

O serviço social na América Latina sofreu forte influência europeia e norte-americana. A primeira
escola de serviço social na América Latina surgiu no Chile no ano de 1925, criada pelo Dr Alejandro Del Río.

A primeira escola de serviço social na Europa foi criada em Amsterdã, Holanda, no ano de 1899. Alice
Salomon iniciou em Berlim cursos para agentes sociais que acabaram por dar origem à primeira escola
alemã em 1908.

Em 1908, fundou-se na Inglaterra a primeira escola de serviço social.


30
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Em Paris, uma escola de serviço social foi criada no ano de 1911, de orientação católica e outra de
orientação protestante, em 1913.

Serviço social de casos: segundo Mary Richmond é um tratamento prolongado e intensivo, que
ao mesmo tempo permite o exame crítico de nossos métodos e exige que seja praticado por pessoas
competentes. É um conjunto de métodos que desenvolvem a personalidade, reajustando conscientemente
e individualmente o homem a seu meio social. Sua linguagem é permeada por termos médicos visto que
sua influência teórica bebia nas teorias da enfermagem.

3.1 O surgimento do serviço social no Brasil

A implantação do serviço social deu-se no decorrer de um processo histórico iniciado a partir dos
anos de 1920-30.

No Brasil, a economia, que desde a segunda metade do século XIX até os anos 1930 se caracterizava
por um modelo agroexportador, passa a adotar, na Era Vargas, um modelo industrial, de substituição
de importação, modelo urbano-industrial. A mudança do sistema agrário-comercial para o industrial
produziu profundas alterações sociais, principalmente com a mudança do estilo de vida rural para um
urbano-industrial, levando à crescente urbanização, fenômeno esse que só faz agravar problemas e
conflitos sociais, solicitando ações das instâncias majoritárias.

É um período de crescimento da classe trabalhadora, como também de sua condição de classe


explorada e de sua mobilização e organização, através da intensificação das lutas por melhores condições
de vida e de trabalho. Todavia, tais lutas são encaradas pela classe dominante como ameaça a seus
interesses e como desorganização social e moral.

É, portanto, nesse contexto, década de 1920-1930, que o Brasil vivia um período marcado pelo
aprofundamento do modelo de Estado intervencionista, sob a égide do capitalismo monopolista
internacional, e por uma política nacional que privilegiava o crescimento industrial. O desenvolvimento
material desencadeava a expansão do proletariado e a necessidade de respostas, de uma política de
controle que absorvesse esse segmento.

A gênese do serviço social brasileiro localiza-se a partir desse contexto histórico e político, no qual a
sociedade encontrava-se nos anos 1930, em uma conjuntura marcada pelo desenvolvimento capitalista,
pelo conflitos de classes, pelo crescimento da classe trabalhadora, quando se travava uma luta contra
a exploração da mão de obra dessa classe e pela defesa de seus direitos e cidadania, para intervir nos
problemas das sequelas da questão social.

A historia da condição de existência da classe trabalhadora, sua marginalização, o pauperismo,


põem-se como terreno fértil para a atuação profissional, pois a esses grupos excluídos só se dava o
direito à resignação.

No ano de 1925 é criado o Conselho Nacional do Trabalho, porém com a nova Constituição ele se extinguiu.

31
Unidade I

O processo de profissionalização e legitimação do serviço social encontrava-se articulado ao


crescimento das instituições socioassistenciais estatais, que surgiram a partir da década de 1940.

O Brasil, na década de 1920, vivia o período da Primeira República marcado por ações fortemente
repressoras. A repressão policial, peculiar da Primeira República, apresentava o fracasso do plano da
burguesia em conter avanço do movimento operário, necessitava de mecanismos mais sólidos para
combater as contradições sociais. É aí que se evidencia ser necessária a intervenção do Estado.

No Brasil, o desenvolvimento material – inicio do período do “boom” do desenvolvimento


econômico – desencadeou a expansão do proletariado urbano, reforçada pela migração interna, o que
criou a necessidade política de controlar e absorver esses segmentos sociais. Segundo Iamamoto, o
Estado procurou incorporar as reivindicações da classe trabalhadora nacional, ampliando a base de
reconhecimento legal da “cidadania”, do proletariado e dos direitos sociais por meio da criação de
legislações sociais. Em seguida, buscou um profissional capaz de apresentar respostas, aprimorando-se
e apropriando-se das técnicas do serviço social norte-americano.

Ainda segundo Iamamoto, dentro das instituições mais importantes para o surgimento do
serviço social podemos destacar: o Conselho Nacional de Serviço Social (1938), a Legião Brasileira
de Assistência (1942), o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (1942) e o Serviço Social da
Indústria (1946). A criação de tais instituições tem como pano de fundo um período na história
do Brasil marcado pelo aprofundamento do modelo de Estado intervencionista sob a égide do
capitalismo monopolista internacional e de uma política econômica nacional que privilegiou o
crescimento da industrialização.

Lembrete

Um importante marco nesse contexto começou em 1940, quando foi


decretado o imposto sindical, o salário mínimo e o Serviço de Alimentação
da Previdência Social. Já em 1943, foi promulgada a Consolidação das Leis
Trabalhistas – CLT.

A profissionalização do serviço social, mesmo que inicialmente estivesse intimamente ligada às


questões do assistencialismo, não se relacionava à evolução da ajuda, à racionalização da filantropia,
nem à organização da caridade. Sua vinculação referenda a dinâmica da ordem monopólica, mesmo com
suas primeiras ações desenvolvidas tendo cunho religioso, filantrópico e assistencial; diga-se assistencial,
mas com um caráter assistencialista e de benemerência, desenvolvido por meio da solidariedade social,
porém ainda hipossuficiente. Tinham um caráter missionário, de apostolado social, justificando sua
ideologia com a Doutrina Social da Igreja.

Sob essa perspectiva, tinha como característica essencial à doutrina social da Igreja de substituir
a análise da realidade e a prática social pelo o enfrentamento das expressões da questão social por
valores, exigências, por uma apreensão moral dos fenômenos sociais.

32
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Para isso deu-se a emergência de sua institucionalização, devido à progressiva intervenção do Estado
nos processos de regulação da vida social.

Lembrete

Emergência da profissionalização do serviço social: intervenção do


Estado, mobilizado pela Igreja Católica.

As condições para a profissionalização do serviço social decorrem da institucionalização e legitimação


de seu valor dentro da sociedade, mobilizado pela ação do Estado e do empresariado, com o suporte da
Igreja Católica, na perspectiva de enfrentar as primeiras expressões da questão social.

No Brasil, até 1930, a pobreza não era vista como uma expressão da questão social, pelo contrário,
todas as expressões dela eram tratadas como “casos de polícia” e resolvidas através de meios repressivos.
Dessa forma, a pobreza era tratada como disfunção individual – uma doença que poderia ter tratamento
ou um caso que poderia ser resolvido.

A questão social só passa a ser objeto de intervenção por parte do Estado com a instituição das
políticas sociais, porém com ações fragmentadas e parcializadas.

Desse modo, a questão social é atacada nas suas expressões, desvinculadas do contexto social que é
o elemento que gera suas expressões – antagonismo entre as classes e desigualdade social.

A primeira grande ação de regulação da assistência social no país ocorreu a partir da instalação do
Conselho Nacional de Serviço Social – CNSS - criado em 1938.

O surgimento das primeiras manifestações da institucionalização do serviço social pela Igreja ocorreu
com a criação do Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo – CEAS, em 1932, com o incentivo e
controle da Igreja Católica.

O CEAS tinha como objetivo central promover a formação de seus membros através do estudo da
doutrina social da Igreja. A partir desse “estudo doutrinário” as ações eram fundamentadas, visando à
eficiência na ação e atuação dos trabalhadores sociais.

No ano de 1933 intensificaram-se as ações da CEAS, com sua participação na Liga Eleitoral Católica,
através de campanhas de alistamento de eleitores e proselitismo, e no ano de 1934, o CEAS organizou
a primeira “Semana de Ação Católica”, na qual promovia a defesa dos princípios religiosos e morais
católicos. Nesse mesmo ano, o CEAS fundou quatro centros operários.

Os centros operários tinham por objetivos atrair as mulheres operárias a fim de que as sócias e propagandistas
buscassem, através da ministração de aulas de trabalhos manuais, conferências e conselhos, entrar em contato
com a classe operária com a finalidade de estudá-la e despertar seu interesse pelos problemas de classe, além de
desenvolver seu associativismo. Estes centros são vistos como uma etapa intermediária para o trabalho social em si.
33
Unidade I

Nessa perspectiva, seu início oficial dá-se a partir do “Curso Intensivo de Formação Social para
Moças”, promovido pelas Cônegas de Santo Agostinho, ao qual fora convidada Mlle. Adèle de Loneux da
Escola Católica de serviço social de Bruxelas. Ao findar esse curso, elaborou-se o 1º Relatório do CEAS, o
qual expressava a necessidade de se promover uma formação doutrinária e aprofundar o conhecimento
dos problemas sociais para melhoria na atuação dos trabalhadores sociais.

Em 1936, através dos esforços desenvolvidos por esse grupo, é fundada a Escola de Serviço Social de
São Paulo, a primeira desse gênero a existir no Brasil. Inicia-se, portanto, uma nova etapa na prática da
assistência social, e mais importante ainda, para a Igreja, que redefiniria seu papel dentro da sociedade.

A primeira Escola de Serviço Social tinha por finalidade oferecer uma formação social através
do conhecimento das questões e dos problemas sociais, preparando seus profissionais para atuarem
nos vários campos da ação social, nas obras de assistência, nos serviços de proteção à infância, nas
organizações operárias e familiares.

Com a ida das brasileiras Maria Kiel e Albertina Ramos à Bélgica, as primeiras a receberem formação
na área na Escola de Serviço Social de Bruxelas, consolida-se a fundação, portanto.

O serviço social brasileiro nasce, portanto, atrelado às ações sociais de alguns grupos, em especial
os vinculado às práticas religiosas da Igreja Católica, na assistência aos pobres e desamparados, de
modo voluntarista, caritativo e filantrópico, de caráter positivista-funcionalista, como uma forma de
recuperar seu poder através da institucionalização da profissão do assistente social.

Nesse contexto, imprime-se na profissão uma abordagem da “questão social” como um problema
moral e religioso, visando a uma intervenção que prioriza  a formação da família e do indivíduo para
solução de seus problemas e atendimento de suas necessidades materiais, morais e sociais. A caridade
vira atividade assistencial e de prestação de serviços sociais pelo Estado.

Foi no contexto de enfrentamento da questão social pelo Estado, com o apoio da iniciativa particular
de alguns grupos e da Igreja Católica, que se conduziu a institucionalização e legitimação do serviço
social como profissão, em um cenário em que a pobreza é vista como ameaça à ordem burguesa. Porém,
mesmo com essa abrangência e abertura, as primeiras iniciativas de organização da profissão estavam
ligadas a grupos sociais participantes do movimento católico leigo e responsáveis pela ação social da
Igreja Católica.

Evidencia-se nessa mesma época a idealização da vocação natural feminina no estabelecer de


atividades educativas e caridosas, cabendo à mulher a preservação da ordem moral e social.

O serviço social surgiu atrelado ao ideário e à doutrina social da Igreja Católica, de modo voluntário e
caritativo. Vê-se a presença do assistencialismo aí e a feminização da profissão impressa desde sua gênese.

Era exigido um perfil mínimo para matricular-se: além de ser do sexo feminino, ser íntegra, devota,
altruísta, ter senso prático, desprendimento, modéstia, simplicidade, comunicabilidade, bom humor,
calma, sociabilidade, trato fácil e espontâneo, saber conquistar a simpatia, saber influenciar e convencer.
34
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Exigia-se, perfil ainda:

• 18 anos completos e menos de 40 anos;


• comprovação de conclusão do curso secundário;
• apresentação de referências de três pessoas idôneas;
• submissão a exame médico. A candidata deveria possuir boa saúde, não ter defeitos físicos, e
alguns historiadores até relatam a necessidade de comprovação da castidade e virgindade.

As características exigidas transitavam entre características humanísticas e de vocação, referenciando


a fé. A vocação no servir ao próximo como a Si mesmo, despojando-se de si mesma.

É na consolidação da sociedade burguesa que surge o serviço social, com sua base sustentada no
modelo de Estado burguês. Verificou-se, nesse momento, a intervenção do Estado nos processos de
regulação e reprodução social, por meio das políticas sociais públicas.

O serviço social no Brasil, até a primeira metade da década de 1940, por receber apoio e orientação
da Escola de Serviço Social da Europa, e por ter como referência a Igreja Católica, tem uma forte
influência europeia vinculada ao pensamento conservador.

Observação

A primeira grande instituição de assistência social no Brasil foi a Legião


Brasileira de Assistência – LBA - marcada pela presença das mulheres na
mobilização para apoio ao “esforço de guerra”.

Esta relação entre a assistência social com o sentimento patriótico foi implementada quando Darcy Vargas,
a esposa do presidente Getúlio Vargas, reuniu as senhoras da sociedade para acarinhar pracinhas brasileiros
da FEB – Força Expedicionária Brasileira – combatentes da II Guerra Mundial, com cigarros e chocolates e
instalou a Legião Brasileira de Assistência – LBA. A ideia de legião era a de um corpo de luta em campo, ação.

Dessa forma, compreende-se que o intuito inicial da LBA era atuar como uma legião, como um
corpo em ação numa luta em campo.

A LBA assegura sua presidência às primeiras damas da República, imprimindo dessa forma a marca do
primeiro damismo junto à assistência social, estendendo sua ação às famílias, atendendo na ocorrência
de calamidades com ações pontuais, urgentes e fragmentadas.

O serviço social brasileiro surge, portanto, com um caráter conservador, ligado à atividade assistencial.

A profissão é reconhecida legalmente como profissão liberal pelo Ministério do Trabalho pela portaria
nº 35 de 19 de abril de 1949.
35
Unidade I

4 A INFLUÊNCIA DA IGREJA NA GÊNESE DO SERVIÇO SOCIAL

A Igreja Católica teve grande importância na profissionalização e na identidade das primeiras


expressões do serviço social no Brasil. Nessa gênese, a Igreja era responsável pelo aporte teórico –
mesmo que hipossuficiente e de caráter missionário – e também pela formação profissional.

As primeiras escolas de serviço social do país, fundadas em São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente
em 1936 e 1937, organizaram-se sob forte influência europeia, especialmente franco-belga.

A base da formação para o serviço social era inspirada na Doutrina Social Católica, que tinha
na psicologia sua maior influência. Com base nisso, a formação era permeada por características
que psicologizavam e individualizavam os problemas sociais, colocando como prioridade o
enquadramento do indivíduo ao sistema – sistema imutável – através do enquadramento ético-moral
e da responsabilidade individual.

O serviço social surgiu como um departamento especializado da Ação Social da Igreja Católica,
embasado por sua doutrina social, que buscava, à época, restaurar seu prestígio e poder na sociedade
republicana brasileira através de um projeto de recristianização da sociedade, e, também, por meio da
iniciativa de movimentos laicos oriundos das classes dominantes, também vinculados a si.

Referente à orientação do pensamento à ação profissional do serviço social nessa gênese, mereciam
destaque as influências da doutrina social da Igreja, do ideário franco-belga de ação social e do
pensamento de São Tomás de Aquino (séc. XII): tomismo. Outra influência de pensamento se instaurou
no fim do século XIX. Jacques Maritain na França e o Cardeal Marcier na Bélgica retornam ao pensamento
tomista e instalam o neotomismo como corrente e filosofia de pensamento.

Surge o serviço social como um prolongamento da ação social católica, adotando como pressuposto
teórico sua linha mais tradicional e ortodoxa.

Neste sentido, com as pregações e diretrizes, exige-se uma recatolização da nação e que a Igreja
assuma a questão social.

O chamado conservadorismo romântico aparece já na gênese do serviço social. Denominado como


serviço social tradicional, o conservadorismo romântico está intimamente ligado ao pensamento e à
tradição católica europeia - franco-belga.

Além da concepção moral anti-histórica, o conservadorismo romântico também se enquadra na


concepção de história que entende as diferenças sociais como expressão dos desígnios de Deus e que,
portanto, elas não seriam passíveis de qualquer tipo de questionamento.

Essa concepção entende que o homem busca a perfeição e conceitua a dignidade da pessoa humana
como sendo o exercício para a perfeição, para elevar-se acima da materialidade.

36
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Assim, se introduz o conceito de que as desigualdades levariam os menos favorecidos a alcançar,


com maior facilidade, a perfeição, e, portanto, a verdadeira felicidade, não está neste mundo, mas no
reino dos céus.

A perspectiva conservadora perdurou até meados da década de 1960, década essa marcada pelo
questionamento das bases de influência, pelos debates e questionamentos da profissão – inicio do
Movimento de Reconceituação que será estudado mais adiante.

Em síntese, é sob a influência do pensamento da Igreja Católica que o serviço social brasileiro iniciou
sua fundamentação, tendo um posicionamento humanista e conservador. Nos postulados filosóficos
tomistas e neotomistas que marcaram o serviço social, introduziu-se a noção de dignidade da pessoa
humana; sua perfeição, sua capacidade de desenvolver potencialidades; a sociabilidade natural do
homem, como um ser social e político; a compreensão da sociedade como união dos homens para
realizar o bem e a necessidade da autoridade para cuidar da justiça geral.

No que se refere à doutrina social da Igreja merecem destaque, nesse contexto, as encíclicas “Rerum
Novarum” do Papa Leão XIII de 1891 e a “Quadragésimo Anno”, de Pio XI de 1931, comemorando 40
anos da “Rerum Novarum”, que tratava a questão social sob uma ótica antiliberal e antissocialista.

A “questão social”, nesse momento, era vista a partir do pensamento social da Igreja: questão moral,
conjunto de problemas sob a responsabilidade individual dos sujeitos.

Num contexto mais geral, em especial na América Latina, o pensamento católico também influenciava
a gênese da profissão, porém outras correntes e filosofias engendravam a formulação da profissão nesse
começo. Um grande exemplo dessas outras influências ocorreu no serviço social chileno e argentino,
nos quais se somava a ao pensamento católico o racionalismo higienista, influência do movimento de
médicos higienistas. Esse movimento tinha como finalidade fomentar e exigir a intervenção estatal
sobre as expressões da questão social, como também a criação de uma forma de assistência social e de
um programa preventivo nas áreas sanitária, social e moral.

As particularidades da criação ocorreram justamente em São Paulo , em virtude do contexto político-


ideológico em curso à época – momento pós-crise, recuperação do poder local do Estado.

A visão do serviço social nesse período era marcada pela adaptação do indivíduo ao meio e do meio
ao indivíduo, sob a orientação de restaurar normalizar.

O serviço social – também chamado por muitos como serviço social católico nessa gênese – aliou-
se ao movimento de higiene mental. Uma característica dessa aliança é a introdução de disciplinas na
grade curricular do serviço social. Verifica-se essa influência nas escolas de São Paulo e Rio de Janeiro,
com um conteúdo médico.

O pensamento social da Igreja Católica, fortemente conservador, que influenciava o serviço social nesse
inicio, começa, a partir dos anos de 1940, a buscar sua tecnificação a fim de adquirir um embasamento
teórico-metodológico que melhor respondesse à qualificação técnica de sua prática e à sua modernização.
37
Unidade I

Nesse sentido, sob a influência norte-americana, permeia a matriz positivista e com uma análise
funcionalista da situação, em sua apreensão manipuladora, instrumental e imediata do ser social.

Com o surgimento das ciências sociais e sua consequente fragmentação, a qual consolidou a criação
da sociologia na escola norte-americana de serviço social, que influenciou o serviço social brasileiro,
com as elaborações de Mary Richmond; é qualificado o exercício do assistente social como uma ciência
social sintética aplicada, que intervém de maneira prático-empírica.

Nessa linha, as relações sociais dos indivíduos eram abordadas no plano de suas vivências imediatas,
como fatos, como dados, que se apresentam em sua objetividade e imediaticidade.

A primeira influência de pensamento na gênese do serviço social deu-se a partir da doutrina social
da Igreja, de cunho conservador.

Saiba mais

Para aprofundar-se quanto este assunto, ler:

Iamamoto, Marilda Vilela. Relações sociais e o serviço social no Brasil:


esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 15. ed. São Paulo:
Cortez, 2003.

O serviço social sofre, portanto, a influência do positivismo. Uma das grandes expressões do método
positivista é o francês Auguste Comte (1798-1857) Comte, em seu método, atribuía fatores humanos
para as explicações de diversos assuntos. Tal atitude contrariava a razão, a teologia e a metafísica,
forçava o trabalho com as relações de modo aparente, evoluindo dentro do já contido e buscando a
regularidade, as abstrações e as relações invariáveis.

A matriz positivista ofereceu uma compreensão imediatista das relações sociais e do ser social,
restringindo-se ao verificável, à experimentação e à fragmentação do homem e da sociedade.
Não eram oferecidas possibilidades de mudança, senão dentro da ordem estabelecida, pelo ajuste
a ela. Tinha uma orientação funcionalista, prática, um perfil manipulador e de ajustamento,
sob a ótica de padrões de eficiência, com uma ação mais burocrática, sem apropriação ou
aprofundamento teórico.

Nela, a forma de pensamento e experiência prática é resultado do movimento contrário aos avanços
da modernidade, com ações de restauração e preservação da ordem capitalista.

Comte acreditava ainda que tal estrutura social existe de maneira estática, não suscetível a mudanças,
e que o homem convive com essa estrutura na busca constante de melhorar sua condição, facilitando
assim sua inserção na mesma.

38
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

A perspectiva positivista, por trabalhar com o aparente e com o verificável, tem uma visão restrita
dos fatos, pois analisa-os apenas no âmbito do verificável, da experimentação e da fragmentação,
demonstrando uma relação estática deles, sem mudanças, senão dentro da ordem estabelecida,
voltando-se antes para ajustes e conservação.

Essa moral positivista serve para atenuar os conflitos e reforçar o sistema de filantropia estabelecido.
As possibilidades de transformação da sociedade a partir dos movimentos sociais são ignoradas. A
sociedade é pensada como uma grande engrenagem e os indivíduos como parte dessa engrenagem;
quando surge um fato social que ameaça seu funcionamento, este deve ser trabalhado como disfuncional
e ajustado para garantir a volta ao funcionamento perfeito dessa engrenagem.

A filosofia básica do positivismo é a lei universal, a evolução, um processo segundo o qual o homem
deve se adaptar ao meio, considerando as diferenças entre funções e capacidades, sempre numa
perspectiva de adequação do homem à sociedade.

As relações sociais são hierarquizadas: os mais capazes devem governar os segmentos inferiores,
considerados incapazes de se autogerirem.

Apesar do doutrinarismo e conservadorismo não se constituírem como teorias sociais, foi a


primeira orientação de visão de mundo que conduziu o serviço social para sua elaboração de uma
visão de mundo.

O positivismo de Augusto Comte encontra-se fundamentado na Lei dos Três Estados, que pode ser
sintetizada pela afirmação de que todas as ciências e o espírito humano como um todo se desenvolvem
através de três fases distintas:

• estado teológico em que o espírito humano explica os fenômenos por meio das vontades divinas
ou agentes sobrenaturais;

• estado metafísico, onde os fenômenos são explicados por meio de forças ou entidades ocultas e
abstratas, como o princípio vital; e

• estado positivo, no qual os fenômenos se explicam de forma científica, utilizando-se a experiência


sensível. O estado positivo seria então um último estágio de evolução da sociedade.

O positivismo teve fortes influências no Brasil. O exemplo mais comum é a frase que esta escrita em
nossa bandeira: “Ordem e Progresso”. Esse trecho foi extraído da frase comtiana: “O amor por princípio, à
ordem por base, o progresso por fim”. Essa frase vem expressa uma sociedade fraterna, justa e progressista.

Destaca-se no cotidiano as seguintes medidas republicanas sob a influência do positivismo:

• a bandeira republicana com o seu dístico ordem e progresso;

• a separação da igreja e do estado;

39
Unidade I

• o decreto dos feriados; e

• o casamento civil.

Com a ascensão da sociedade burguesa no século XIX e o consequente aparecimento de classes


sociais, a burguesia (classe social dominante) necessitava de um profissional que cuidasse da área social,
assistindo e garantindo o controle da classe proletária.

4.1 A influência norte-americana: o funcionalismo e o serviço social de caso,


grupo e comunidade

Em meados da década de 1940, a influência franco-belga que marcava a gênese do serviço social
cedeu o lugar à influência norte-americana. A partir da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos
apresentaram-se como nação hegemônica nas relações com os países europeus, tendo como objetivo a
concretização de seu interesse pelo uso dos países da América Latina. Esse fato intensificou a influência
norte-americana no serviço social brasileiro.

Porém é só na Conferência Nacional do Serviço Social, ocorrida em 1941, que se concretizou e teve
início esse intercâmbio, com a oferta pelos Estados Unidos – diga-se investida – para que os assistentes
sociais fossem até lá fazer cursos, ofertando bolsas de estudos aos assistentes sociais brasileiros.

A influência norte-americana se deu no período da gênese da profissão do serviço social, teve


influência importante, como já assinalado, Mary Richmond; com suas as ideias da filantropia científica
ela incorporava as teorias estrutural-funcionalistas e as metodologias de intervenção, especificamente
os métodos de serviço social de caso, serviço social de grupo, organização de comunidade e,
posteriormente, desenvolvimento de comunidade. Soma-se a este contexto, o ideal de democracia e
justiça social pregado por Jane Addams.

A partir de 1945, o serviço social assumiu o modelo funcional implantado pelos Estados Unidos e se
afastou do doutrinarismo da Igreja Católica que predominava nos fins da década de 30 e no início da
década de 40.

As teorias de caso, grupo e comunidade compuseram, portanto, a tríade metodológica que


orientava o serviço social na busca da integração do homem ao meio social em que vivia. Esse
estreitamento das relações entre Brasil-EUA repercutiu no serviço social através da intensificação
de intercâmbios de assistentes sociais brasileiros que buscavam a ampliação de seus estudos
naquele país.

Nesse período, a ênfase na formação profissional ainda estava sustentada na visão terapêutica e
na concepção de que a questão social era um desajustamento social. Com essa influência americana,
emergia a perspectiva funcionalista, aliada ao neotomismo cristão, que teve como consequência o
reforço da postura terapêutica, tratamento das feridas sociais, nas linhas da psicologia e da psiquiatria
da época, levando em conta os desajustamentos sociais.

40
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Esse modelo de formação profissional sustenta sua interpretação do desenvolvimento como


resultante das capacidades individuais e culturais, a partir de numa visão harmônica da sociedade,
concentrando-se no estudo do comportamento dos indivíduos, tendo o empirismo como tendência
dominante, em que a atuação profissional exigiria ênfase na instrumentalização técnica, com a
valorização do método, deslocando-se o eixo teórico de influência do neotomismo para pressupostos
funcionalistas da sociologia.

O serviço social de caso, o serviço social de grupo e a organização da comunidade são baseados na
arte e na ciência das relações humanas, isto é, nas relações de pessoa a pessoa. Têm sua centralidade da
noção de relações humanas para o serviço social tradicional.

Pautando-se por uma ação racional no enfrentamento dos problemas sociais, tem grande importância
à sistematização das atividades na prática profissional, como o plantão, a triagem, acompanhamentos,
aconselhamentos, distribuição de auxílios, socialização através dos grupos e engajamento em equipes
multiprofissionais.

Há também uma forte influência da psicologia e da psiquiatria, psicologizando as relações sociais.

O que era imperativo no serviço social de caso era o relacionamento profissional, no qual o caso
social era verificado como um processo psicossocial, isto é, uma situação-problema na qual fatores
objetivos da situação de vida do cliente não se separam dos fatores subjetivos (seu comportamento e
suas emoções). Essa perspectiva viabilizava uma visão mais global do ser humano para a época, pois um
caso social era um fato humano, cotidiano e de realidade, que era permeado por fatores econômicos,
físicos, mentais, emocionais e sociais, atuando em maior ou menor intensidade, internos e externos,
entrelaçados entre si.

Ele é, então, um método de ajuda baseado num corpo de conhecimentos, na compreensão do cliente
dos seus problemas, e no emprego de técnicas aplicadas – ajudar as pessoas a ajudarem-se a si próprias.

O método do serviço social com casos desencadeia, na prática, um processo no qual pode-se
distinguir cinco momentos fundamentais:

1. indagação ou recolha de dados;

2. estudo;

3. diagnóstico;

4. ordenada aplicação temporal de soluções (tratamento/intervenção)‫;‏‬

5. finalização.

O serviço social de grupo utiliza-se da abordagem grupal das situações sociais problema, identificando
seus aspectos significativos. Essa abordagem está muito ligada à educação.
41
Unidade I

Identificava-se enquanto atribuição do assistente social:

• proceder ao levantamento das situações sociais significativas, através de atendimento individual


com líderes formais e informais da comunidade e de pesquisas;

• levar ao conhecimento da equipe os problemas sociais que surgirem como prioridade na população
atendida, apresentando sugestões para intervenção;
• planejar, executar e coordenar atividade a nível grupal.

O funcionalismo, uma expressão de influência positivista, é compreendido através da explicitação


de aspectos da sociedade em termos de funções realizadas por instituições e suas consequências para
sociedade como um todo. É uma corrente sociológica associada à obra de Émile Durkheim1.

Para o funcionalismo, eram valorizados:

• humanismo na orientação da realidade;

• universalidade dos valores, aplicados e aplicáveis em qualquer realidade social;

• neutralidade ideológica e prática apolítica – passividade;

• procedimentos distintos entre o profissional e população, valorizando os conhecimentos técnico-


científicos e desprezando os valores da população;

• a técnica do profissional, que tinha papel importante para orientar as ações e decisões da
população;

• uma concepção abstrata de sociedade, equilibrada e harmônica, regida por uma ordem funcional,
na qual cada membro deve contribuir para seu funcionamento social;

• uma sociedade estratificada em classes sociais integrante do sistema social;

• ordem moral que proporcionaria a harmonia social, com a regulamentação e adequação dos
indivíduos;

• visão de Estado interventor e mediador.

1
Para o sociólogo Emile Durkheim (1858-1917), os fenômenos sociais deveriam ser explicados por técnicas sociais
também. Ele interpretava a sociedade através de uma análise que recorria a fatos internos e externos do homem, relacionada
ao estudo do fato social, que apresenta características específicas: exterioridade e a coercitividade. Para ele a sociedade era
estruturada em pilares e interpretada pelo fato social. O fato social é exterior, na medida em que existe antes do próprio
indivíduo, e coercitivo, na medida em que a sociedade impõe tais postulados, sem o consentimento prévio do indivíduo.
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FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

Resumo

O assistencialismo surgiu a partir da iniciativa de grupos particulares,


desde os primórdios da humanidade. Muitas de suas ações estão ligadas
a uma dimensão espiritual, como iniciativa de grupos religiosos a fim de
abrandar conflitos ou disseminar a fé.

A Revolução Industrial teve como fases a do artesanato, da manufatura


e da mecanização.

O processo de industrialização exigiu o desenvolvimento e, por


consequência, o investimento.

A Revolução Industrial, mesmo com um caráter que marcava mais


negativamente do que positivamente a sociedade, proporcionou:

• urbanização, devido ao êxodo rural – transformação de uma


sociedade rural para a sociedade industrial;

• mecanização;

• desenvolvimento industrial;

• desenvolvimento dos meios de transportes e comunicações;

• expansão do sistema capitalista.

A Revolução Industrial dividiu-se em três fases, com uma suposição da


existência de uma quarta fase.

O sistema capitalista, em seu desenvolvimento mundial, tem


como características:

1. Estrutura de propriedade, predominando a propriedade privada.

2. Relação de trabalho com a presença do trabalho assalariado.

3. Objetivo de obtenção de lucro, não importando seus reflexos.

4. Meios de troca, sendo o mais expressivo o dinheiro, que facilitava


o comércio.

43
Unidade I

5. Funcionamento da economia: os agentes econômicos realizam


investimentos guiados pela lei da oferta e da procura. Investem com
o objetivo de conseguir a maior rentabilidade.

6.
As relações sociais são relações de desigualdade social,
principalmente nos países subdesenvolvidos, ficando a maior parte
da renda com poucos.

A partir da Revolução Industrial, novos impactos sociais se evidenciam,


pois as mudanças que esta proporcionou trouxeram novas expressões de
pobreza, o que exigiu ações que fossem além do assistencialismo.

Nesse sentido, o contexto histórico influencia o sistema econômico,


sistema capitalista, pelo movimento da economia, a qual organiza a
sociedade e influencia a historia do serviço social desde sua gênese.

Desde seu início, o serviço social sofre influência externa e interna de


correntes filosóficas e de pensamento. A primeira foi a Igreja Católica que
colocava um caráter missionário para o assistente social. Soma-se a essa o
pensamento norte-americano de Mary Elly Richmond. Outras influências
como o tomismo, o neotomismo, o funcionalismo americano, como o
estudo de caso, grupo e comunidade, a fenomenologia, o positivismo, o
conservadorismo, o marxismo permearam a atuação do assistente social
nestas seis décadas de existência da profissão.

Exercícios

Questão 1. O termo “assistencialismo” é utilizado por diversos autores, dentre os quais podemos
citar Martinelli (2006), e faz referência a uma série de práticas desenvolvidas que possuem como
característica o fato de serem realizadas concessões, doações a um segmento mais empobrecido da
sociedade. Ainda recorrendo a Martinelli (2006), a autora exemplifica a prática do assistencialismo
citando as Confrarias do Deserto que teriam surgido no ano 3.000 a.C. e que se caracterizavam
pela doação oferecida, por voluntários, às pessoas que iriam realizar a travessia do deserto. Essas e
outras ações podem servir de exemplo à compreensão do assistencialismo, que é uma prática tão
antiga quanto a própria humanidade. Partindo dessas considerações, e repensando o conceito de
“assistencialismo”, podemos inferir que:

I- trata-se de um fenômeno em que os sentimentos de vínculo e gratidão são reforçados;

II- enfraquece a concepção de direito social, posto que as concessões são consideradas como “caridade”;

III- reforça a importância dos cidadãos exigirem seus direitos sociais;


44
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL

IV- estimula a participação social dos cidadãos por meio das organizações sociais e políticas;

V- é orientado por uma prática pautada no voluntarismo.

Estão corretas as alternativas:

A) II, III e IV.

B) I,II e IV.

C) I, II e V.

D) III,IV e V.

E) I,II e III.

Resposta correta: alternativa C.

Análise das afirmativas:

I) Afirmativa correta.

Justificativa: o termo assistencialismo nos remete às práticas que têm seu início na antiguidade, e que se
caracterizam pela concessão de bens em prol de um segmento. Como tal, essa prática reforça os sentimentos
de gratidão e de vínculo estabelecido porque as concessões são compreendidas como atos de caridade.

II) Afirmativa correta.

Justificativa: a afirmativa II está correta porque o assistencialismo se caracteriza por enfraquecer as


concepções de direito e, embora possua uma gênese antiga, ainda influencia a política social contemporânea.
Nesse sentido, o assistencialismo converte a noção de direito social em caridade, como se as concessões
fossem baseadas na “boa fé” do Estado, quando na verdade representam um direito constitucional.

III) Afirmativa incorreta.

Justificativa: a assertiva III destaca que o assistencialismo reforça a concepção de direito social,
mas sabemos que ações assistencialistas tendem a enfraquecer a concepção do direito, porque estão
relacionadas à caridade e à doação.

IV) Afirmativa incorreta.

Justificativa: a assertiva IV afirma que o assistencialismo estimula a participação social das pessoas
via organizações sociais e políticas; isso não acontece pois a prática “assistencialista” tem a finalidade
de reforçar a situação social constituída e não prima pela emancipação política dos sujeitos.
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Unidade I

V) Afirmativa correta.

Justificativa: essa afirmativa está correta ao destacar que o assistencialismo é pautado no trabalho
voluntário porque, entendido como prática de caridade, seus operadores atuam de forma voluntária,
sem remuneração, conhecimento específico ou formação necessária.

Questão 2. Aguiar (1995), recorrendo ao trabalho de Nadir Kfouri, destaca a concepção atribuída
ao serviço social de caso como método de intervenção utilizado pelos assistentes sociais no início da
constituição da profissão. Essa concepção é descrita da seguinte forma: “[...]o serviço social de casos,
dentro de uma concepção cristã, tem por princípio primeiro o respeito à personalidade do cliente,
enquanto este é uma pessoa e dotado de um destino sobrenatural. Logo, enquanto ser inteligente, livre
e detentor de uma alma espiritual e destinado a uma transcendência da ordem temporal” (p.62). Tendo
por referência o texto acima, podemos afirmar que o método de intervenção de serviço social de casos:

A) Compreende o indivíduo com recorrência a influência religiosa, ignorando a personalidade do


ser humano.

B) Compreende o indivíduo com recorrência a influência religiosa, ressaltando a personalidade do


ser humano.

C) É fortemente influenciado pelo cristianismo, mas contempla a sociedade de uma forma a


percebê‑la como resultado do desenvolvimento do sistema capitalista.

D) Foi transplantado dos Estados Unidos, mas por ter em Mary Richmond a principal expoente, não
encontrou assento entre os assistentes sociais brasileiros.

E) Contém a predominância de práticas que não são focadas no indivíduo, mas voltadas a constituição
da sociedade de classes.

Resolução desta questão na Plataforma.

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