Sei sulla pagina 1di 29

Carta de Edificação

Irmã

Cecília Maria da Santa Face


(5 de dezembro 1973 – 23 de junho 2016)

A única coisa que te peço é que não exageres e digas a verdade


(12 de junho, ao ver sua Priora escrevendo uma crônica a todos os amigos da comunidade)
Ao nosso Padre Geral Saverio, aos nossos irmãos e
irmãs tão amados por nossa Irmã Cecília Maria,
dedicamos esta carta, pedindo-lhes que lembrem dela
em suas orações.
No Advento do ano de 2015, a Igreja abriu as portas de par em par, dando início ao
Ano Jubilar da Misericórdia. Nossa comunidade preparou os cartões de Natal com as palavras
de Zacarias:“Graças à ternura e misericórdia de nosso Deus, que nos vai trazer do alto a visita
do Sol nascente”(Lc 1, 78).

O que não sabíamos era que essa Palavra se cumpriria e se faria realidade no seio de
nossa comunidade. Três dias após o início do Ano Jubilar, nossa Irmã Cecília Maria é
inesperadamente visitada por uma enfermidade grave, que seis meses depois – em 23 de junho
de 2016 – culminaria com sua Páscoa.

SUA VIDA ANTES DE ENTRAR NO CARMELO

(Vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=L9NFmvTD5gw)

Cecília Maria nasceu em 5 de dezembro de 1973, do casamento de Maria Teresa


Bosch e de Santiago Sánchez Sorondo. Nasceu em San Martín de los Andes, província de
Neuquén, em plena mudança da família, pois o pai era militar e estava partindo para seu novo
destino, Buenos Aires. Era a segunda de dez irmãos e a mais velha das mulheres; por isso,
sempre teve uma ascendência sobre toda a família.

Era uma criança muito alegre e risonha. Quando começou a andar (demorou muito
tempo, porque era muito preguiçosa), tornou-se um pequeno “demônio”: muito caladinha,
sempre alegre e sorridente, não deixava de fazer bagunça. Com uma pequena cadeira a seu
lado, ia a todos os lugares... Um dia ficou intoxicada com alguns remédios que conseguiu
alcançar. Esteve em estado grave, em terapia intensiva durante uma noite inteira, mas o
Senhor quis deixá-la viver....

Passados alguns anos, já tinha vários irmãozinhos que, naturalmente, começaram a


brigar. Quando seus irmãos homens a enganavam nos jogos de mesa ou brigavam, dizendo-
lhe: “porca gorda!”,enfurecia-se e se defendia. Dividia o quarto com sua irmã quase gêmea
(11 meses mais nova), fazendo-a ficar com raiva em mais de uma ocasião por ser
desorganizada em sua escrivaninha e por perder coisas. No entanto, era dócil e capaz de pedir
desculpas quando ficava com raiva. Quando se comportava mal ou era insolente, sua mãe
deixava-lhe cartinhas debaixo do travesseiro e propunha-lhe um desafio.

Na escola, era muito estudiosa e, à medida que ia crescendo, fazia mais amigas.

Um dia, na casa da avó, em Buenos Aires, estava brincando com suas primas de jogar
laranja na rua. A primeira a conseguir que a laranja fosse amassada por um carro seria a
vencedora. Viu que não era tão fácil como parecia: a laranja rolava debaixo dos carros, mas
continuava intacta, o que estava ficando chato. Então fez sinal para um motorista de ônibus.
Este parou e ela lhe pediu que passasse por cima da laranja. Suas primas não podiam acreditar
no que estava fazendo; o motorista acelerou, irritado, e a laranja permaneceu intacta ... Ceci,
com sua cara travessa, abriu os olhos com aquele sorriso, como se dissesse: “O que há de
errado?” É que ela sempre pressupunha que as pessoas fossem boas, por isso não as temia.
Isso a ajudava a ser muito sincera e dizer o que pensava; às vezes, acabava sendo
“imprudente".

Aos 16 anos, a família foi transferida para Rio Mayo, Província de Chubut; para uma
adolescente, era como ir ao fim do mundo. Era um lugar inóspito por seu clima desértico, com
fortes ventos. No entanto, Ceci, que tinha tanta vida própria, soube aproveitar bem. Decidiu
fazer uma pequena horta entre pedras e ventos, o que era como plantar batatas na lua.Com sua
tenacidade, porém, conseguiu cultivar algumas alfaces. À força de muito regar, teve êxito,
apesar de os irmãos rirem de seus esforços. Fez-se muito amiga de uma colega de classe, filha
de uma família indígena, que falava muito pouco, mas Ceci se entendia bem com ela. Morava
num vilarejo ao final da aldeia, e Ceci ia sem problemas levar aos irmãos dessa amiga as
roupas que os seus irmãos já não usavam. A família gostava muito dela. Ceci convidava-a
muitas vezes à sua casa e, ao cabo de dois anos, tiveram que partir para um novo destino.Essa
amiga (que morreu dois anos depois) não parou deescrever a ela e a toda a família, movida
pela imensa gratidão que sentia por eles.

Já em Buenos Aires, cursou o 5º ano do ensino médio em uma escola católica. Não lhe
custou nada a adaptação no que diz respeito à relação
com os professores e alunos; imediatamente conquistou
todos os seus colegas. Estes lembram-se de sua discrição,
não se importando com a moda. Era muito simples,
franca e natural; era ela mesma, sem fingir o contrário.
Sempre tinha uma observação a fazer, às vezes de um
modo “inconveniente”, do qual normalmente se dava
conta e reparava como podia, sempre pedindo desculpas
se tivesse agido com indiscrição ou passado da conta.
Deus se serviu de um professor de teologia que, através
de suas aulas, a fez conhecer e amar Santa Teresa de
Jesus, despertando nela uma crescente sede de intimidade
com Cristo e o desejo de consagrar-se a Ele. Sua avó,
talvez adivinhando seus desejos, deu-lhe de presente uma
viagem à Europa, pensando que assim a dissuadiria. O
certo é que naquela viagem, estando no mosteiro da
Dois dias antes de ingressar em nossa
Encarnação de Ávila, sentiu fortemente o chamado ao
comunidade.
Carmelo.

Vídeo : https://www.youtube.com/watch?v=4YW8NoQpw0Y.

Após o retorno, tentou estudar para exercer alguma profissão e, passado ano e meio, entrou no
Carmelo de Corpus Christi, em Buenos Aires. Ali permaneceu cinco meses. Gostava de lá,
mas não se sentia em seu lugar. Saiu, com toda a dor e obscuridade de sua alma, pensando que
o Carmelo tinha sido uma ilusão sua, não um chamado verdadeiro. No entanto, apesar de
todos os esforços, não conseguia esquecê-lo e, com o conselho e orientação de seu diretor
espiritual – um frade carmelita –, pediu para ser admitida em nossa comunidade de Santa Fe,
que na realidade sempre a atraíra. Mas teve que esperar, já que nós e seus pais lhe pedimos
que fizesse um curso antes. Escolheu o de Enfermagem. Após 3 anos, com o diploma na mão,
entrou no dia 8 de dezembro de 1997, com seus 24 anos recém-completados.

POSTULADO

Quando ingressou, havia uma postulante e uma noviça. Integrou- se com facilidade ao
pequeno grupo e, de maneira simples e sem fazer barulho, era a que unia as Irmãs. Tinha o
dom de reconciliar as pessoas com uma palavra, um gesto, uma piada... Sua piedade era algo
muito natural, como sua respiração.

NOVICIADO

Em 20 de Junho de 1998,
recebeu o hábito da Virgem. Sua
inclinação para o Carmelo deveu-se em
grande parte ao fato de que ela queria
ser da Virgem e que “o Carmelo é todo
de Maria”. Um ano depois, em 5 de
junho de 1999, fazia sua profissão de
votos temporários de obediência,
castidade e pobreza, por três anos. E
como frequentemente acontece no
Carmelo, após o tempo do “primeiro
amor”, começa para ela o tempo
do“combate espiritual”, no qual surgem suas dificuldades e lutas.

Era obediente, mas ao mesmo tempo manifestava sem rodeios toda a rebelião que
muitas coisas ou circunstâncias lhe causavam. Sendo impulsiva, sofreu devido ao seu
temperamento, mas não deixava de lutar para corrigir-se das reações de raiva e cólera. Lutou
corpo a corpo com seus limites, trilhando um caminho de humildade sem possíveis evasões,
pois suas limitações eram sempre expostas, dado o seu caráter simples, sem duplicidade. Era
extremamente distraída, não com as pessoas, mas com as coisas e trabalhos. Certa vez, estava
preparando o presépio de Natal no oratório do noviciado e a chamaram. Desceu
imediatamente, sem perceber que deixava acesas as pequenas luzes que estava arrumando,
encostando em vários papéis (embora tivessem explicado que isso era muito perigoso por
causa do calor de Santa Fe). Depois de um tempo, começou um verdadeiro incêndio, que só
por Deus não atingiu o telhado da capela, todo de madeira... Reconheceu e assumiu a
responsabilidade pelos danos e começou a remodelar as imagens que haviam sido queimadas.

Durante o noviciado, o calor excessivo deixava-a de mau humor. Para ajudá-la,


ocorreu a outra noviça dizer-lhe um dia, depois da sesta: “Não se sinta mal... Eu procuro
pensar que é inverno e não vejo a hora de chegar à colação para tomar uma sopa bem quente e
dormir com uns cobertores bem grossos depois da recreação! Pensando nisso, não sinto
calor!” Irmã Cecília Maria olhou-a com seriedade e surpresa ao mesmo tempo; ao dar-se
conta de sua “ironia", deu uma gargalhada, levando as mãos à boca para não perturbar o
silêncio.
Mostrava-se com simplicidade. Quando se falava de alguma enfermidade, quase
sempre lhe pedíamos que a explicasse para nós com detalhes, por ser enfermeira, e o fazia
com toda simplicidade e verdade.

Era muito rápida para dar sua opinião diante do que acontecia, quer gostassem ou não.
Por exemplo, nos ensaios de canto, quando estávamos aprendendo algum, não demorava a dar
a sua opinião. Desde que ingressou, sempre aderiu ao que era resolvido comunitariamente,
embora às vezes protestasse ou se sentisse chateada. Sua simplicidade muitas vezes a fez
experimentar seus limites e fraquezas nos atritos diários com as Irmãs, devido às
“imprudências” no que dizia ou fazia.

Custava-lhe assumir seus limites, fraquezas e falhas, e isso levava-a a ficar com raiva
de si mesma ou a pedir perdão com muita frequência. Tinha uma vontade forte, mas ver-se tão
imperfeita lhe causava sofrimento e, diante das contínuas e repetidas tentativas de procurar
superar-se, só experimentava frustração, o que lhe dava desânimo e tristeza.

Sentia-se incapaz e inútil para realizar certos trabalhos. Havia uma conoviça muito
habilidosa e criativa, o que aumentou seu sentimento de não poder nem valer nada. No
entanto, soube pedir-lhe ajuda e, pouco a pouco, começou a desenvolver sua criatividade,
chegando a modelar imagens de cerâmica muito bonitas, como a de uma bela cena da fuga
para o Egito.

Mostrava-se muito entusiasmada com a formação que recebia. Havia nela uma busca
sincera e constante de tudo o que a ajudasse no caminho de união com Deus. Em suas lutas e
dificuldades, era aberta a pedir ajuda, ouvindo atentamente e esforçando-se para seguir os
conselhos que lhe davam. No entanto, também experimentou a dificuldade de expressar-se
com seus superiores, reconhecia sua falta de liberdade interior para isso. A tensão que lhe
causavam seu desejo e sua incapacidade de atingir o coração do outro – e que, ao mesmo
tempo, constituía seu verdadeiro dom –, foi para ela uma purificação. Seu incrível dom de
empatia foi posto a dura prova.

Quando chegou o tempo de sua profissão solene, decidiu-se


comunitariamente prorrogar por mais um ano seus votos temporários,
por ver que ela precisava de mais tempo para amadurecer em alguns
aspectos. Esse atraso foi um cálice amargo para a nossa Irmã. Ela
sofreu e foi sincera em expressar seu descontentamento, que todas
vimos, mas ao mesmo tempo acolheu-o com espírito de fé, sem
semear suspeitas e divisões na comunidade. Em tempos de tentação,
mostrava-se aberta, viva e humana, tomando sempre o cuidado de
nunca falar mal de ninguém.

Logo depois, sofreu a perda dolorosa de sua avó materna e do


pai, que tinha 53 anos. No ano seguinte, em 7 de junho de 2003,
chegou o grande dia de seu desposório com Cristo. Pouco antes, em
uma carta à família, havia escrito que Jesus lhe pedia para renunciar,
por Amor a Ele, ao que ela mais amava no mundo: “Minha família e meus irmãos”.
APÓS A PROFISSÃO SOLENE

Durante esses anos no Carmelo, ela tinha uma vontade a toda prova, em seu constante
desejo de responder ao Senhor. Era tenaz e perseverante em praticar a virtude em meio às
frequentes quedas e fraquezas que lhe sucediam na vida comunitária. Essas ocasiões
introduziram-na no lento e cansativo caminho da humildade. Vez ou outra, viam-na pedindo
perdão, reconhecendo suas fortes reações impulsivas diante do que a incomodava ou tirava de
seus esquemas. No entanto, nunca guardou rancor ou ressentimento para com as Irmãs da
comunidade.

No trabalho, continuava tendo dificuldades, como quando lhe confiaram a enfermaria.


Tínhamos quatro Irmãs idosas bastante limitadas; embora outras Irmãs a ajudassem, custava-
lhe a disponibilidade incondicional que implica a atenção a um paciente. Depois, arrependia-
se ao ver que seu egoísmo tinha prevalecido... Todavia, seus bons propósitos duravam pouco,
porque apoiava-se mais no esforço de sua vontade que no reconhecimento humilde de seus
limites. Tudo isso lhe causava desgaste e cansaço, razão pela qual a Priora decidiu trocá-la de
ofício, coisa que lhe custou muito no início: significava ter que tocar seus limites, e isso lhe
doía. No entanto, soube tirar proveito das humilhações, não cruzando os braços e retomando
com renovado entusiasmo seu caminho humilde.

A Irmã Cecília Maria era calorosa, próxima e acolhedora. Tinha grande habilidade
com pessoas, grande capacidade de relacionamento, interessando-se sempre pelas pessoas.
Era muito solícita com as pessoas com quem se encontrava e se preocupava quando via uma
Irmã sofrendo. Era uma verdadeira irmã. Mesmo que estivesse passando por um momento
difícil, nunca se isolava. Tinha uma necessidade própria e vital de compartilhar-se com o
outro. Desse modo, nos trabalhos, que sempre empreendia com outra pessoa, mostrava não
apenas a sua própria riqueza, mas a do outro. Não era nada autorreferencial nas coisas que
fazia.

Lutava contra sua ansiedade de concluir logo algum trabalho ou com a falta de
flexibilidade diante de uma mudança de planos ou contra a tendência a irritar-se com alguma
Irmã, por ter respondido mal ou não viver como desejava seu coração. Já doente no hospital,
confidenciou a um irmão: “Meu grande pecado era sempre fazer o que eu queria, meus
caprichos... Algumas vezes fiquei com a cara tão amarrada, que tive medo de mim mesma”. O
contraste entre o ideal do que queria ser e o que realmente era provocava-lhe tensão e
ansiedade. Buscando canalizá-la, expressou à priora o desejo de aprender a tocar algum
instrumento, no que foi incentivada. Começa suas primeiras aulas de violino, demonstrando
incrível força de vontade e tenacidade para aprender, dia a dia, a tocar esse instrumento
difícil. No início, o som parecia um trem que todas nós escutávamos milhares de vezes! Mas
valeu a pena, porque logo começou a tocar na liturgia, aprimorando-a e embelezando-a.

No entanto, continuavam suas lutas com o seu temperamento: “Senti todos os dias
como que uma repugnância em ser generosa, em aceitar as contrariedades. Senti raiva por
dentro e protestei por fora”. Pouco a pouco, foi encontrando seu caminho – o caminho da
doce obediência, como gostava de dizer –, o caminho da transfiguração que a levou a aceitar
humildemente suas próprias limitações e reconciliar-se com elas. Chegou a encontrar Cristo
precisamente aí. O retiro anual do ano de 2012 marcou o antes e o depois em sua vida.

ACUSAÇÃO DE SI MESMA

O desejo de viver a experiência de sua própria fraqueza na humildade foi


introduzindo-a cada vez mais no caminho da “acusação de si mesma”. Com os anos, foi
adquirindo a sabedoria de enfrentar e ser responsável pelas dificuldades que atravessava.
Aprendeu precisamente que são os fatores externos, que tantas vezes nos colocam à prova, os
que realmente nos "moldam", tirando o melhor ou o pior de nós mesmos, ajudando-nos no
conhecimento próprio. Essa "sabedoria" era algo que trazia, que tinha a peito e que cultivou
cada vez mais, até encontrá-la claramente expressa no que Doroteu de Gaza denomina “a
acusação de si mesmo”. Foi como encontrar a forma de seu sapato! Mas isso foi nos últimos
anos de sua vida. Esse crescimento revelou-se em suas relações com as Prioras, que notavam
como ela se centrava cada vez mais em suas próprias falhas e deixava de olhar as dos outros.
Era cada vez mais atenta à sua própria responsabilidade nos conflitos que tinha, até chegar ao
ponto, em seus últimos dois anos, de nunca autojustificar-se.

DISCRIÇÃO

Sua maneira de ser, tão próxima e empática, levou-a a dizer as coisas de um modo
frontal, sem respeito humano, sempre buscando o bem do outro. Foi sempre muito sincera
nesse ponto, sem se importar com “o que dirão”. Falava coisas “sem filtro”, o que às vezes a
levou a ser imprudente ou incompreendida. Embora sofresse quando lhe apontavam que tinha
sido imprudente em algo que havia dito, sua sinceridade sem duplicidade e seu desejo de fazer
o bem se lhe impunham. Manteve esse traço de personalidade até ao final de sua vida. Já
hospitalizada, quase sem poder falar, continuou a ser “imprudente” em seu ardente desejo de
ajudar a todos que se aproximavam dela. Nos últimos anos de sua vida, mostrou-se totalmente
reconciliada e em paz com esse “defeito”. No último triênio, sua Priora comentou que
hesitava em colocá-la na roda, porque a Santa Madre pede que a rodeira tenha caridade e
discrição. Dirigindo-se à Irmã, disse-lhe: “Tens caridade, mas discrição, zero. Reconheces?”
E ela, com naturalidade e serenidade, respondeu: “totalmente”. Essa resposta foi o suficiente
para confirmar à Priora que poderia colocá-la como rodeira. Anos antes, ter-se-ia justificado,
pedindo uma nova oportunidade. Isso tornou possível que, sendo imprudente por natureza,
alcançasse a virtude da “discrição”, a mãe das virtudes, assim como a docilidade e a
transparência, abrindo-se e descobrindo seus "pensamentos" ou “movimentos” a quem a
guiava.

ESCUTA

Durante algum tempo, nas reuniões e recreações da comunidade, expressava sua


opinião impulsivamente, sem pensar muito, utilizando muitas palavras e comprometendo-se.
Com o passar do tempo, foi cultivando cada vez mais a escuta, e isso ficou evidente em seu
modo de participar: escutava atentamente a opinião de cada Irmã, às vezes tirando seu
caderninho do bolso e fazendo anotações. Esperava o final, quando todas já haviam
manifestado sua opinião, para expressar-se com muita serenidade e equilíbrio, usando poucas
palavras.
Tirava proveito concreto de cada curso, retiro ou pessoa que passava, para além das
ideias que tivessem. Também nisso o seu crescimento progressivo foi notável.

Quando ingressou em nossa comunidade, deparou-se com uma disciplina monástica


que, sem ter a intenção, era bastante rígida, vertical e quase sem diálogo comunitário, que
acentuou seu modo de ser um tanto esquemático, devido à insegurança, minando a qualidade
natural que tinha de se aproximar do outro sem suspeitas ou preconceitos. O crescimento
comunitário, que se deu no caminho do diálogo, ajudou-a a desenvolver o dom que tinha de
acolher o outro em sua diferença: qualidade que se tornou notória pouco antes de sua
enfermidade. Nesse caminho de diálogo comunitário, foi decisiva a atitude de ler e comentar
os escritos de nossa Santa Madre a partir da vida concreta de cada uma, que nos ajudou muito
a conhecer-nos e acolher-nos mutuamente.

OBEDIÊNCIA

Muitos ficaram impressionados com a alegria de nossa Irmã durante sua enfermidade.
Estando no hospital, revelou seu segredo para um de seus irmãos: “A alegria é um dom do
Espírito Santo. Eu nunca me propus ter alegria ... Penso que, para que Deus faça Sua obra
em ti, tu deves começar a escutá-lo e obedecer-lhe. Ouvir e obedecer é a mesma coisa. A
alegria é um dom que nos vem do Alto. A obediência nos torna mais ternos, humildes,
transparentes e todas aquelas coisas boas que vêm do alto”.

Seu caminho de obediência foi um caminho de crescimento na fidelidade às pequenas


luzes do Espírito Santo, que às vezes são tão íntimas, que parecem nada ou que dá no mesmo
fazer uma coisa ou outra. A obediência que ela trilhou foi uma “disposição interior” que não
tinha nada a ver com um cumprimento – cumpro e minto – ou um estar de bem com seus
superiores. Por trás de seu desejo de obedecer estava seu desejo de aguçar o ouvido para estar
atenta às inspirações do Senhor, às suas mediações. A primeira mediação foi sua própria
carne, sua frágil humanidade, sua irresistível necessidade de ser amada. Quanto mais
reconhecia essa necessidade, revelando-a, sem reclamações, ia reconciliando-se com ela. Essa
forte experiência de tocar a fundo suas limitações ajudou-a a crescer em brandura, mansidão e
docilidade, para acolher com docilidade as adversidades da vida quotidiana.

Pouco antes de sua


enfermidade, o Carmelo de Azul, da
Província de Buenos Aires, estava
em processo de supressão. Era o mês
de novembro e pediram-nos uma
Irmã para o trabalho mais duro e
intensivo das últimas três semanas
antes do fechamento definitivo.
Várias Irmãs de nossa comunidade
No Carmelo de Azul, com Irmãs dos Carmelos ofereceram-se para esse serviço, mas
de La Pampa e Pueblo Esther.
a priora perguntou à Irmã Cecília
Maria se estaria disposta a ir. Ela, que não tinha se oferecido, mostrou sua disponibilidade,
embora se sentisse totalmente incapaz, manifestando não só à Priora, mas a todas, que havia
outras Irmãs mais competentes para realizar essa tarefa delicada. Em nenhum momento
colocou como obstáculo as feridas que tinha em sua boca desde a Semana Santa, das quais
todas nós estávamos conscientes.

Tudo isso foi preparando-a para acolher a visita de Deus em sua enfermidade com uma
atitude obediente e de fé. Esse caminho de humilde aceitação de sua humanidade levou-a a ir
ganhando a capacidade de entregar-se, como demonstrou no Carmelo de Azul. Nessas três
semanas, trabalhou intensamente, sem descanso, apesar de o problema de sua boca começar a
tornar-se cada vez mais visível em sua dificuldade para falar e comer. Numa dessas noites em
Azul, ofereceu-se para ficar à espera de uma Irmã que deveria chegar de madrugada e que,
afinal, não chegou. Sua dedicação passava despercebida, ninguém podia suspeitar o heroísmo
que escondia. Ao final de novembro, retornou à nossa comunidade, e foi então que o
problema de sua boca começou a se manifestar abertamente, com dores intensas.

SUA ENFERMIDADE

Durante esses meses, ela havia feito várias consultas médicas a respeito de suas feridas
e, aparentemente, não eram nada de importante. Em seu retorno de Azul, foi ao dentista

(crônica de 11 de dezembro:

https://drive.google.com/file/d/0BxqAyKyUYOEyc1I0bTdzamFnNkE/view?usp=sharing),

que, ao ver sua língua enrijecida, imediatamente a encaminhou para um especialista de cabeça
e pescoço. O médico, após examiná-la, disse-lhe: “Eu sei que vocês rezam pelos outros, se
oferecem pelos demais, se ocupam dos outros... Mas vou te pedir um grande favor: agora vais
cuidar de ti”. Ordenou-lhe com urgência uma tomografia computadorizada da língua e do
pescoço. Ela, ao ver a ordem médica, percebeu que o diagnóstico dizia CA da língua (câncer
de língua). Seus olhos encheram-se de lágrimas. Em seguida, reanimou-se e disse para a
benfeitora que a acompanhava: “Quanta coisa para oferecer .... Pensar que meu tio tem
câncer e está sofrendo muito”. Chegando ao convento e adentrando a porta da clausura, não
podíamos acreditar, porém ela disse, com um rosto que irradiava grande paz e entrega: “O
Senhor me escolheu e eu disse ‘FIAT’. Não posso fazer mais nada”.

A tomografia detectou um tumor na base da língua e num gânglio do pescoço. Desde o


início, propôs-se “tirar suco da sua língua”, como nos dizia. Preferiu dar a notícia
primeiramente ao irmão mais frágil, “para que se faça forte”, e conseguiu ajudá-lo. Depois de
um tempo, falou com outra de suas irmãs de sangue, que recebeu a notícia com lágrimas, as
quais desapareceram diante do bom humor, da alegria de Ceci e da maneira de ser tão humana
e normal que a caracterizava.

Cada vez que nos encontrávamos, ela se deixava abraçar e beijar, e era ela que, com
sua paz e sorriso, nos sustentava e levantava. Ao mesmo tempo, demonstrava o amor que
tinha por nós com abraços, palavras e gestos. Naqueles dias, escreveu uma carta para todos:
“Eu não sei se estou no ar, mas apesar da dor, que já se vai anunciando mais e mais e que me
tira bastante o sono, sinto-me agora animada e contente. Suponho que virão momentos de um
pouco de escuridão e desespero, mas não estou sozinha, poderemos juntos seguir o Cordeiro”
(carta de 17 de dezembro de 2016).
Poucos dias antes da biópsia, organizou uma reunião para
que se fundasse um grupo pró-vida aqui em Santa Fe, que nasceu
no mesmo dia da biópsia. Após esta, em 22 de dezembro, o
médico informou que o tumor tinha 10 centímetros e aconselhou
que o tratamento fosse em Buenos Aires, dada a complexidade do
caso, devido ao tamanho e localização. Comprometia o centro da
fala e a deglutição: o nervo trigeminal e grande parte dos nervos
da cabeça. Sua família, que vivia em Buenos Aires, foi de grande
ajuda e companhia em todo os momentos. Seu desejo de ser
tratada em Santa Fe foi o primeiro grande desprendimento que
Deus lhe pediu. Em meio à dor da pós-biópsia, a sós com a Priora,
pediu-lhe que rezasse o terço e citava intenções muito específicas,
Dia da biópsia
acrescentando: “Em ação de graças”. A Priora perguntou: “Por
tudo?” –“Sim, por tudo”.

Já em Buenos Aires, na primeira consulta, os médicos decidiram fazer um tratamento


de quimioterapia e radioterapia no Hospital Austral, já que uma cirurgia seria muito arriscada.
As revisões causavam-lhe grande dor. Eram impressionantes a integridade, a paz e o completo
abandono com que recebia os relatórios nada animadores. Com seu sorriso inalterável,
interessava-se sempre por todos e por cada um dos que a rodeavam. Vendo sua priora chorar,
disse-lhe, abraçando-a: “Não deixes de desfrutar de cada um desses momentos, não estás
vendo a obra de Deus em tudo isso? Minha Madre, só cabe a ação de graças”. Ao voltar a
Santa Fe, para esperar a vez e sentindo-se aliviada de sua dor por uma nova medicação,
escrevia a uma de suas irmãs de sangue: “SINTO-ME NA GLÓRIA, feliz por estar em meu
convento com minhas irmãs. Aproveito minha meia língua o quanto posso, muitos
telefonemas (a Priora tinha lhe pedido que atendesse a todos os que se interessavam por sua
saúde), coisas que têm que aproveitar para dizer, algumas me vêm em minhas orações da
noite, quando não posso dormir... mas me fazem bem esses momentos, porque sinto que
recupero minhas forças enquanto estou com o Senhor. É curioso. E, no dia seguinte, apesar
do arsenal de remédios que tomo, não me arrasto para nada, mas estou dormindo mais
horas. Bem, em conclusão, estou muito bem, que fiquem tranquilos; só que falo cada dia pior.
E à tarde, a minha língua se trava, o que é uma calamidade... mas ainda não deixo de falar....
inibição zero, e pareço pior que um fanhoso! Acontece que agora todas vêm me vem pedir
conselhos, eu as ponho para correr e lhes digo que todas ficaram loucas... Porém, se me
dizem como estão, termino dizendo-
lhes alguma coisa... Como sou tão
cara de pau e amo-as tanto!”

Antes de partir, quis que tirássemos


uma foto todas juntas para poder levá-
la e que gravássemos o canto "Na Cruz
está a vida", de nossaSanta Madre, que
ela tanto amava. VÍDEO:

https://drive.google.com/file/d/1lOiY3oUGE1BbDNIafPqMrAhqkHBmOdx7/view?usp=shari
ng
Transferiu-se ao Carmelo de
Lisieux, em Buenos Aires, por dois
meses, acompanhada de sua Priora e,
quando foi necessário, de outra Irmã, só
que de nossa comunidade. Também
ajudou a cuidar dela, especialmente à
noite, sua irmã religiosa, vinte anos mais
jovem que ela, a quem suas superioras
Com as Irmãs de Lisieux
designaram com essa finalidade para
Buenos Aires por seis meses. Antes de iniciar o tratamento de radioterapia e quimioterapia,
foi colocado um botão de gastrostomia em 21 de janeiro, devido à sua grande dificuldade para
comer. Estando hospitalizada, ela contraiu pneumonia devido à aspiração brônquica. Como
estava com muitas dores, as visitas foram restringidas. Chegou um homem a quem ela havia
ligado, porque queria conhecê-lo, já que ele não acreditava na vida contemplativa de clausura.
Quis atender essa pessoa, apesar de sua condição. Ao entrar, o homem olhou para seu rosto de
felicidade, de paz e de alegria, e sentiu como se estivesse vendo alguém que não estava doente
e que estava feliz. Ela deu-lhe a bênção e ele saiu chorando, impressionado pelo modo como a
felicidade e a dor podem ser compatíveis em alguém. Saiu com outra impressão sobre o que
ele pensava.

A todos (médicos, enfermeiros, assistentes, faxineiros), distribuía medalhas e


estampas. E saíam emocionados, dizendo que ela lhes transmitia muita paz.

Em 25 de janeiro, foi informada de que não poderia ingerir mais nada pela boca, o que
lhe custou muitas lágrimas na frente de todos os médicos presentes. Resistia a esse momento
que tinha chegado. Sua primeira reação foi de angústia e tristeza, porém seu segredo foi que
não se fechou nelas, mas, com coração aberto, entregou a Jesus essa angústia, essa dor, sem
forçar nada, mas aceitando o que estava vivendo e sentindo. No dia seguinte, pediu perdão aos
médicos que haviam presenciado sua reação. E a todas as pessoas que entravam em sua sala
contava, achando graça, o que havia acontecido, expondo abertamente sua fragilidade. E
dizia: “Já está oferecido”, sem protestos, nem queixas, nem lágrimas, alcançando tal
liberdade interior, que não só podíamos deixar-lhe à vista a água e a comida, mas também
perguntava o que tínhamos comido, que lhe contássemos com todos os detalhes. Um dia,
acordou muito feliz, comentando: “À noite, sonhei que estava comendo uns sanduíches de
presunto e queijo e que estavam deliciosos!” Por isso, soube aconselhar os que atravessavam
esses estados: “Jesus carregou tua angústia. Quando voltares a sentir angústia, não tenhas
medo, não tens que querer fugir. Tens que ficar aí, dizendo: ‘Jesus, eu confio em Vós’. E o
diabo também se aproveita, porque nos faz crer que esses momentos nunca passarão”.

Sempre foi muito realista com a sua enfermidade e estimava os médicos que, vendo-a
com tanta alegria, diziam-lhe toda a verdade do que ia acontecer, porque assim ajudavam-na a
preparar-se. Por essa razão, considerava-os “muito humanos”.

Em uma de suas primeiras sessões de radioterapia, disseram-lhe que lhe faria bem um
caramelo ácido para depois da sessão, razão pela qual havia uma cesta de doces na recepção.
Ela os viu e disse: “Que legal isso!” E guardou-o no bolso. Quando saiu, começou a tirar a
embalagem, mas sua irmã religiosa lhe disse que não podia. “Tem certeza? Disseram-me que
podia”. “Não, Ceci, tu não podes”. E deixou escapar um suave “Está bem”, sereno e
conformado... humilde e obediente, enrolou-o e devolveu- o à cesta.

O tratamento causou mais feridas em sua boca: doía-lhe não somente a língua, mas o
palato, deixando-a incapaz de mover a língua e dar um beijo, mas continuava com seu sorriso.
A missa diária do convento foi ficando cheia com sua grande família, que queria acompanhá-
la, embora não pudesse vê-la. A princípio, após a missa, recebia alguns deles por um
momento, apesar das dores intensas.

Vivia o aqui e o agora, sentindo sua impotência e incapacidade, assumindo-as, sem


fugir da realidade. Isso lhe dava a força vital que a levou a entregar-se completamente ao
trabalho de confecção de casulas.

No final de fevereiro, na metade do tratamento, sofreu a morte de três pessoas muito


queridas, entre elas seu tio paterno e padrinho, o que lhe causou grande abatimento, chorando
muito num momento de alívio, no qual sofreu por não ter podido se despedir. Estava
fisicamente muito sofrida, quase não podia falar, com bronquite, vômitos, catarro etc. Tudo se
complicava e afetava a alimentação e hidratação por gastrostomia. Por causa desse estado,
suspenderam-lhe a quarta quimioterapia. Nesse momento encontrava-se acompanhando-a uma
de nossas Irmãs, que sentia medo diante da morte e das doenças graves. Irmã Cecília Maria
dissera-lhe, antes de iniciar o tratamento: “Quando estiver no meu pior momento, quero que
sejas tu a acompanhar-me”, para ajudá-la a superar seus medos. E a Providência quis que
fosse essa mesma Irmã a assisti-la em sua morte.

Na última semana do
tratamento, antes da separação,
quisemos compartilhar uma recreação
teresiana com as Irmãs que nos
hospedavam, já que nesses dias Irmã
Cecília Maria não estava presente.
Ensaiamos em sua sala durante a
manhã, para distraí-la. Ela, que não
tinha tocado seu violino durante todo o
tratamento (apoiava-o na área do
tumor, agora irradiada), com o desejo
de alegrar a comunidade e fazendo um grande
esforço, tocou-o, enquanto cantávamos: "Na
Cruz está a vida e o consolo".

Resistiu a todo o tratamento de


radioterapia e, em 19 de março, após a missa
de ação de graças, na qual sua grande família a
acompanhou, retornou a Santa Fe para viver a
Semana Santa cercada por suas Irmãs. Os
médicos deram-lhe dois meses de “férias”, até
ver os resultados do tratamento.

Poucos dias depois de chegar, apresentou um quadro de bronquite e febre; para pesar
de todas, tivemos que interná-la em Santa Fe no dia 24, Sábado Santo. Ela confidenciou, com
lágrimas, a uma Irmã: “Não posso mais”. Durante a internação, estando muito fraca e cansada
(teve uma pneumonia), acolhia a todos com um grande sorriso. Visitaram-na os seminaristas,
interessando-se muito por eles. Certa vez, à meia-noite, veio uma enfermeira que, vendo-a,
disse sentir tanta paz, que lhe deu vontade de chorar sem parar. Olhava-a e chorava,
confessando que estava muito afastada da Igreja, contando-lhe seus problemas familiares e
dizendo que se fazia de forte, carregando tudo sozinha. Irmã Cecília Maria, deixando de lado
sua dor na boca, disse-lhe que não precisava guardar tantas coisas em seu coração, porque iria
adoecer, que tinha que saber perdoar e não carregar cruzes que Deus não lhe pedia: “Deus não
nos quer tristes. Acontece-me que, quando dói a minha
boca, toda a minha vida gira em torno dela, e parece que é
a única coisa no mundo, porém temos que aprender a dar a
cada coisa o seu lugar... é um exemplo bobo, porque as
dores do coração não são como as do corpo. O mais
importante para ter paz, gozo e alegria é estarmos muito
unidos a Jesus. Eu sei que a paz que tenho não é minha paz,
mas a paz de Jesus; não é minha alegria, mas a alegria de
Jesus. É que, se todos vivemos unidos a Ele, nós nos
tornamos outros Cristos”. A enfermeira sorria e chorava ao
mesmo tempo, e disse-lhe: “Eu vim para cuidar de ti e...”
Irmã Cecília, com o último fio de voz, disse: “É que somos No Sanatório Garay, preparando
irmãos, certo? Nós nos ajudamos”. A enfermeira se uma injeção para sua irmã, que
estaba cuidando dela.
despediu, muito agradecida, e saiu com um terço, que
rezava todos os dias. Quando veio a bioquímica, Ceci aconselhou-a em seu namoro, dizendo-
lhe: “Pelo amor que tens a ele, casa-te e convida-me para o casamento”. “Sabes que ontem
mesmo estava contando ao meu noivo que, toda vez que eu entro para colher sangue, me
encho de tanta paz, que depois preciso espalhá-la pelas outras salas”.

O Padre capelão levava-lhe a Comunhão todos os dias e, encontrando-se com sua


família, que tinha vindo de Buenos Aires para acompanhá-la, disse: “Estou impressionado
com o amor que se tem em tua família, deves dar graças a Deus pela família que tens”. Irmã
Cecília respondeu: “Amor de cima e amor dos lados (sorria e fazia sinais), cercada e mimada
por todos. Quão grande e maior obrigação. Não sei se é a palavra, porém quando alguém
recebe muito desde criança, tem uma responsabilidade maior em relação ao seu próximo, de
dar mais, certo?” Depois de um tempo, na ação de graças da Comunhão, disse à sua irmã
religiosa: “Que grande mistério é a vocação, não? Deus toma nosso barro, molda-nos de um
lado e do outro, e faz a Sua obra”.

Como tínhamos estampas de Jesus Misericordioso, cuja festa era no dia seguinte,
propôs a uma de nossas Irmãs que estava cuidando dela que visitasse os outros doentes e
distribuísse as imagens. Saíram com todo o aparato de alimentação, toda a comida, soro etc. A
companheira hesitou em entrar num quarto de homens, porque não estavam muito vestidos.
No entanto, Ceci arrastou-a, sem hesitação, e entrou. Participou do diálogo apenas
cumprimentando e com seu sorriso. Um dos pacientes permanecia em silêncio e, graças a
algumas perguntas, contou-lhes que tinha um tumor na cabeça. Imediatamente, Irmã Cecília
Maria exclamou, pegando-o pela mão: “Meu irmão!”, com o que o diálogo se tornou mais
profundo. Foram a várias salas e voltaram, por causa de seu grande cansaço. De regresso, suas
irmãs casadas de Buenos Aires chegaram e ela lhes disse: “Tenho minha língua partida, estou
com muitas dores e cheia de catarro”. Mesmo assim, conversou com elas toda aquela tarde
acerca do sangue que corria em suas veias. Sentiam-se unidas por sensações comuns, que
foram batizadas de “leão na jaula”. E compartilhava com elas o caminho por onde o Senhor a
tinha conduzido: “É mais fácil conhecer alguém quando as misérias ficam expostas, porque
se pode experimentar e viver a humilhação e depois, com humildade, pedir perdão. Por outro
lado, quando alguém, por natureza, tende a se guardar e se esconder, como se nada tivesse
acontecido, corre o risco de ficar doente e deixar de ver. Isso torna difícil o verdadeiro
conhecimento de si mesmo e, assim, não se pode experimentar a Misericórdia de Deus, que é
deixar-nos amar por Ele em nossa fraquez, e deixar que Ele faça sua obra em nós”.
Concluíram com Vésperas e, ao chegar às intenções livres, ela pediu pela organização pró-
vida que se estava fundando em Santa Fe e concluiu com os braços levantados e com um
grande sorriso, dizendo em voz alta: “E viva o câncer!”, por três vezes. Depois de um tempo,
sua Madre priora chegou e disse que não lhe dariam alta no dia seguinte, que era o Domingo
da Misericórdia. Irmã Cecília, abraçada à sua Madre priora, como manso cordeiro, sem
queixas, apenas expressou seu descontentamento em tom suave e calmo: “Bem... aqui presa
me deixas... primeiro voltaria no
sábado, depois no domingo, agora na
segunda-feira, depois será terça,
quarta, quinta, sem Páscoa e sem festa
de Misericórdia... bom... Nossa Madre,
não acredito em mais nada”. Sorria. A
Madre lhe respondeu: “Que grande
festa, filha da minha alma, viver a
Misericórdia no hospital. Pensa, minha
filha, quantas almas vais poder ajudar daqui com a tua oferta”. E ela respondeu: “Presa,
presa!!! Tu me deixas...” A Madre lhe disse que também ela sofria e que não lhe dissera isto:
“... e deixa-me, mamãe, dizer-te o que sinto, porque, se não compartilho aqui contigo, onde o
farei?” No dia seguinte, Domingo da Misericórdia, acordou cheia de dores na boca, com tosse
e catarro, somado ao desânimo de permanecer ali. Todavia, nesse dia, mais do que nunca, pôs
de lado suas dores, deu à faxineira uma grande estampa de Jesus Misericordioso. Dentro de
alguns minutos, eram várias faxineiras e enfermeiras de outros setores que vinham para
cumprimentar e reclamar suas estampas. Ela, apontando para o Coração de Jesus, dizia-lhes:
“Aqui, no Coração de Jesus, de onde sai água e sangue, em seu peito, estamos todos nós:
estamos tu, teus filhos, tua família, a Igreja, dali Ele nos abraça e cuida de nós”.

Na segunda-feira, retorna ao seu amado Carmelo. Depois de alguns dias, quis que lhe
diminuíssem as drogas para a dor, para não ficar sonolenta o tempo todo, mas a dor aumentou.
Era sua escolha, que foi respeitada. Tinha grande desejo de que o tratamento feito desse
resultado. Tentou tomar café com leite, que ela apreciava muito, o que demorou uma hora,
pela dor que lhe causava; no entanto, estava feliz. Porém, ao fazer o teste de deglutição, não
deu certo e teve que voltar a não ingerir nada pela boca. Foi uma decepção para ela. Nesse
mesmo dia, numa reunião comunitária de ressonância da Palavra de Deus, compartilhou do
mais profundo de seu coraçãoa sua oração: “Obrigada, Pai, porque posso entregar-te algo
que eu nunca teria escolhido: não comer nem beber mais...”

Participava de todas as recreações, ia ao refeitório com sua seringa de comida e, na


medida do possível, assistia à Liturgia das Horas, em silêncio. Todas as tardes, embora
estivesse com dores e sem coragem de levantar-se depois de sesta, ia com grande entusiasmo
com a Irmã que vinha buscá-la para fazer uma casula. “Isso me faz esquecer – dizia – por um
momento a minha língua”.

O dia da consagração do nosso altar e da nossa capela se aproximava e estávamos


muito conscientes de que o altar do nosso coração e o altar de pedra formavam um único altar.
Foi por isso que pedimos ao bispo que fosse num dia em que estivéssemos todas, era a nossa
única condição. O que Deus nos dava para entregar, a ela e a nós, era sua enfermidade, na
qual desde o princípio ela se sentiu identificada com Cristo Cordeiro, que obedeceu até à
morte e morte de Cruz. O símbolo disso foi um pergaminho, no qual novamente oferecemos
nossas vidas consagradas ao Senhor, escrito por ela e assinado por todas, e que foi colocado
no interior do altar, junto com as relíquias dos mártires. O dia escolhido foi 30 de abril (vídeo:
https://www.youtube.com/watch?v=FBE2CHf6DnM).

Dois dias antes, uma protuberância na língua tornou-se perceptível e um aumento de


dor, insuportável em alguns momentos. Ela, que estava lutando para diminuir os analgésicos,
chegou ao limite de suas forças. Apoiando-se ao peito de sua priora, reclinou a cabeça como
um manso cordeiro, reconhecendo que a enfermidade
continuava progredindo, e entregando-se em obediência, com
liberdade e abandono. Apesar de aumentar a dose dos
analgésicos, estava com muitas dores no dia da consagração do
altar. Participou tocando o violino, enquanto cantávamos “As
Bodas do Cordeiro”.

No dia seguinte, decidiu-se adiantar a viagem para


3 de maio
Buenos Aires. Havia uma única mensagem de todos os médicos
Retorno a Santa Fe que a viram: que não hesitasse em tomar todo o necessário para
controlar a dor. E regressou muito feliz por poder voltar em
breve.

Como o volume continuasse a


crescer rapidamente, na semana retornou a
Buenos Aires, sem poder regressar mais à
sua comunidade. Já na capital, decidiu-se
fazer uma nova biópsia, em vista de uma
possível cirurgia. Quis fazer uma
interconsulta com um especialista em
medicina alternativa. Irmã Cecília Maria Com a comunidade de Santa Teresa (Buenos Aires)
queria ouvi-lo, mas o que mais a
impulsionava era que estava perto do Carmelo de Santa Teresa, das Constituições de 90: “E
quero aproveitar para ir visitá-las e cumprimentá-las” (já tinha estado pela primeira vez em
janeiro e prometera voltar). Durante a visita, chamou a atenção das Irmãs o seu total
conhecimento e aceitação da enfermidade; sua serenidade e alegria, como se não estivesse
acontecendo nada; seu senso de humor; a fortaleza, que a fazia irradiar certa majestade; e sua
grandeza de alma, combinada com uma grande simplicidade. Todas sentiram-se amadas e
conhecidas por ela. Estavam impressionadas pelo modo como ela se doava a cada uma,
mesmo às recém-conhecidas. Sua capacidade de amizade e comunicação eram notórias,
despertavam a confiança. Quanto à obediência, as Irmãs perceberam sua maneira de se
relacionar com sua Priora: a familiaridade, a confiança filial, juntamente com o respeito e o
espírito sobrenatural. Entenderam como se pode conjugar o humano e o sobrenatural na
obediência, quando não se busca a si mesmo. Transmitiu-lhes em particular seu desejo e
entusiasmo pela unidade e fraternidade entre todos os Carmelos de nossa pátria, o espírito de
comunhão. Por outro lado, no Carmelo em que se estava hospedando, das Constituições de
91, o legado que sua passagem pela comunidade deixou foi o de trabalhar pela unidade da
Ordem. Era algo que tinha muito em seu coração e que, por isso, a contagiava.

Após a visita, foi à consulta alternativa, que seria supostamente para aliviar a dor.
Submeteu-se a um laser, que durou mais de uma hora de dor intensa. Ao finalizar, o doutor
ofereceu-lhe uma injeção de ozônio, ao que ela respondeu mansamente: “Já que estamos no
baile, vamos continuar bailando”. Contudo, deu um grito asfixiado e que fez sangrar a língua.
Já de volta ao Carmelo, sua Madre priora comentou com ela: “Como foi tremendo o que
tiveste que passar hoje!" E ela respondeu: "Viste que estamos na semana da unidade dos
cristãos?”

Nos dias que antecederam a nova biópsia, um sacerdote amigo que vinha de Roma
passou para visitá-la. Trazia um terço que o Papa tirou do seu bolso para dar de presente a ela
e entregou-lho, dizendo: “Dou-te este terço para que rezes por mim, porque necessito muito e
te peço que ofereças teus sofrimentos por mim”.

Nesses mesmos dias, Irmã Cecília Maria confidenciava à sua irmã religiosa: “Quando
estava rezando a via-sacra, na terceira queda, eu sempre pedia a graça de ser forte em minha
fraqueza... Creio que Deus me concedeu essa graça, mostrou- me minhas limitações,
ensinou-me a amá-las e, pela doce obediência, levou-me por seu caminho... por isso, agora
posso aceitar e oferecer de novo estas novas
limitações, porque Jesus me pede para não
comer, não falar ... A graça que Lhe peço é a
alegria, a alegria profunda”.

No dia 19 de maio, foi submetida a uma


nova biópsia, com risco de sair com uma
traqueostomia. Enquanto esperavam, antes de
entrar na sala de cirurgia, sua Madre priora lhe
perguntou: “Se tivesses que dizer uma só palavra,
o que dirias?” Ela respondeu: “Jesus, eu confio
19 de maio: rumo à internação
em Vós”. Entrou cheia de paz. Saiu da rebiópsia
com muitas dores. Esta causou-lhe como resultado um tumor ativo, que tinha tomado toda a
língua. Nesse estado, no qual não podia “nem pensar nem rezar”, como costumava descrever,
fizeram-lhe ouvir a gravação de uma mensagem do Papa para ela. As Irmãs do Carmelo de
Lisieux,que a hospedavam, tinham recebido uma ligação do Papa e pediram-lhe algumas
palavras para a Irmã Cecilia Maria: “Olá, Cecília, estou perto de ti, sei o que estás passando, o
momento da cruz, mas eu também sei a paz interior que tens e o oferecimento que estás
fazendo pela Igreja. Que seja o que o Senhor quiser, o que Ele quer é sempre o melhor, não
é? Então,que cada dia estejas na Vontade de Deus. Acompanho-te com minha oração e minha
bênção. E tu, reza um pouco por mim, um pouquinho. Eu te amo muito”. Ouviu tudo com um
sorriso e depois virou seu rosto com dor intensa.

Com a rebiópsia, dois caminhos se abriram: uma grande cirurgia ou cuidados


paliativos. Ela pediu que não a
deixássemos sozinha em sua decisão.
Com serenidade, escutou a opinião de
cada médico envolvido e, com grande
paz interior, desistiu da cirurgia,
dizendo: “Parece-me que Deus não
quer tanta agressão”. Aqui começou o
tratamento com gotejamento de
morfina. E, num dia em que o médico
de cuidados paliativos nos explicou como se desencadearia tudo, de volta e já sem esperança,
nós tropeçamos com nossa Irmã, que vinha pelo corredor com a morfina na mão e um rosto
sorridente, disposta a sair e passear pelos jardins do hospital. Vendo-a, nossa alma retornou ao
corpo.

Tudo estava pronto para voltar a Santa Fe e poder morrer lá. No dia anterior, ela
contraiu uma pneumonia e precisou continuar hospitalizada. A febre fazia piorar a dor, mas
isso não a impedia de estar atenta aos demais. Nesse dia, já muito cansada e cheia de dores,
preparava-se para descansar. A noiva de um médico apareceu. Apenas escutou a sua voz, quis
que a deixassem entrar e tiveram uma conversa, como se não sentisse dor. Recebeu-a,
tomando-a pelas mãos. A noiva, também médica, disse-lhe: “Meu noivo me disse que eu tinha
que te conhecer, que transmites muita paz”. Irmã Cecília Maria fazia sinais com as mãos em
direção ao céu: “Isso é de Deus, não é meu”. A noiva abriu seu coração, confidenciando-lhe o
que a incomodava. Entre outras coisas, Irmã Cecilia lhe disse: “Faz algum curso de culinária,
pensa na maternidade... ele é um tesouro, percebe-se que te ama muito, pensa em formar uma
família”. A noiva chorava e aprovava, sem desviar o olhar dela, como se estivesse
maravilhada. “Tu és muito carinhosa, teu noivo me contou, redobra tua ternura e ajuda-o.
certo?” A noiva, totalmente emocionada, aprovava tudo, e Irmã Cecília Maria, com o último
fio de voz, disse-lhe: “O mais importante para estar sempre em paz é a missa, a confissão, o
terço ... ajuda-o nisso”. E terminaram com um grande abraço: “Já gosto de ti como se
fôssemos amigas, e eu não teconheço”. A jovem saiu da sala emocionadíssima. E assim foram
aparecendo outras noivas de médicos, até mesmo as enfermeiras de outros andares
aguardavam sua vez para poder conhecê-la e experimentar a paz que ela irradiava e
comunicava.
Chegado a esse ponto, ao contrair uma nova pneumonia por aspiração brônquica, viu-
se a necessidade da traqueostomia, com a qual concordou livremente, sendo que era o que
mais temia no início da enfermidade. O médico de
paliativos, enquanto falava com ela sobre o assunto, dizia-
lhe: “Vão ser muitos dias de hospitalizaçãoe nunca mais vais
falar coisa alguma”. Ao que ela respondeu: “Mal posso já
fazê-lo, vai me custar, mas é inevitável; sinto, já não vou
falar muito tempo mais de qualquer maneira”. Ele, então, a
aconselhou: “Tens que começar a mover-te, porque muito
tempo na cama não vai te fazer bem”. Ela respondeu, com
um sorriso travesso: “Já estive vendo pela janela outros
lugares para passear”. Após esse diálogo, o capelão do
hospital celebrou uma missa em seu quarto. A Priora
entoou: “Vamos ao Senhor cantando hinos de alegria”. E
Irmã Cecilia Maria cantou junto! Na última música – Madre
del Carmelo – confundiram a letra, ficando o canto cortado, e foi ela quem continuou a letra,
e todas puderam retomar o canto. Sendo tão concreta como sempre, foi a única que teve a
ideia de socorrer o padre, que tinha respingado toda a sua batina ao querer guardar as velas.
Ela o fez aproximar-se e começou a esfregá-la, muito concentrada.

No dia 31 de maio, festa da Visitação, pôde ir à Missa na capela em cadeira de rodas.


No dia seguinte, um homem se aproximou da Priora e de sua irmã religiosa e lhes disse:
“Desculpem-me, mas ontem, olhando para essa Irmã, vi nela o rosto radiante da noiva que
está se preparando para a vinda do Noivo; e, quando a vi comungar, recordei o Cântico dos
Cânticos (foi a leitura da festa da Visitação). Causou-me tanta impressão, que estive
comentando à noite com minha família e também com meus colegas de trabalho. Perdoem-
me, mas isso é o quevi e senti necessidade de dizer-lhes”.

Enquanto aguardava a traqueostomia, contraiu uma nova pneumonia. Com isso,


hesitaram em fazê-la, algo que a contrariou num primeiro momento, já que sempre lhe custou
que mudassem os planos. Mas imediatamente disse: “O que Deus quiser. Aliás, não há que
pensar tanto nas coisas, SÓ NAS DE HOJE”.

Na véspera da traqueostomia,
todos os sobrinhos da Irmã Cecília
Maria, com sua irmã religiosa à frente,
organizaram para ela uma surpresa no
jardim, que ela viu da janela: cartazes
segurados por cada sobrinho e que
formavam as palavras, CECI, NÓS TE
AMAMOS MUITO, e muitos balões
lançados ao céu
(https://www.youtube.com/watch?v=WpdYe-suROI&t=41s). Enquanto contemplava o
espetáculo, divertiu-se como uma criança, apesar de sua condição deteriorada. Acabava de
pedir um pouco mais de morfina, e assim ficou saudando com os braços para o alto, como se
nada estivesse acontecendo. Um dos médicos mandou uma mensagem que dizia: “Nunca, em
dez anos de hospital, vi algo semelhante”. E muitos perguntavam se havia um aniversário aqui
ou o quê. Toda a família foi à capela, rezando e cantando.

Em 2 de junho fizeram-lhe a traqueostomia.


Antes de entrar, sua priora perguntou-lhe quais seriam
suas últimas palavras, e ela respondeu: “Pai, estou em
tuas mãos. Jesus, em Vós confio”. À sua mãe, escreveu:
“Não se preocupe comigo; no máximo, meu pescoço vai
doer um pouco”. Naquela noite, permaneceu imóvel,
para não causar a tosse que o menor movimento lhe
provocava, com os olhos fixos no Cristo que estava
pendurado diante dela. Seu olhar tranquilo e seu sorriso
revelavam uma grande paz, que comovia a todos nós.
Seu rosto estava distendido, mas notava-se que estava
sofrendo. Quando lhe perguntaram: “Dói, incomoda,
assusta?”, escreveu: “Dói-me um pouco, deixa-me
desconfortável e me assusta, mas é normal”. Quando
precisava de uma dose extra de morfina, sempre se
fixava a hora e, se estivesse perto da troca de plantão, esperava a nova enfermeira. Nunca
queria incomodar ninguém.

Uma das consequências da traqueostomia foram as aspirações, que a acompanharam


até ao fim. Eram muito traumáticas para ela, porque experimentava a asfixia. Foram
agravadas pelo líquido nos pulmões, que apareceu alguns dias depois e culminou com outra
cirurgia do pulmão em 8 de junho.

Antes de submeter-se a essa nova intervenção, quis ouvir todos os médicos


envolvidos, os quais, acercando-se de sua sala, expressavam sua opinião em nossa presença e
na de sua família. O cirurgião – que, tendo visto as imagens, desistira da operação –, chocado
por vê-la tão cheia de vida, mudou de ideia.

Nesses momentos, era ela que dominava a situação, mostrando ser uma mulher de
grande decisão, autodeterminação, reflexão e serenidade. Nela se uniam a docilidade externa a
uma grande força interior; e, embora a Priora fosse sua conselheira e mãe espiritual, era ela
que decidia. Estava claro que falava com Jesus a cada etapa. Temia duas coisas com essa
intervenção: a dor e não poder voltar a Santa Fe. Na missa desse dia, havia oferecido pela
primeira vez o sacrifício de não retornar à nossa comunidade, algo que custava tanto a ela
quanto a nós. Nesse dia, a leitura do Ofício Divino foi tirada da epístola aos Filipenses:
"Tenham os mesmos sentimentos de Jesus Cristo... que obedeceu, e obedeceu até à morte da
cruz". Essas palavras, que a haviam orientado desde o início da doença, foram as que a
fizeram ver claramente que Deus lhe pedia essa cirurgia, permanecendo muito tranquila
depois de tomar a decisão. Jesus escolhia para ela o caminho da sua Cruz e ela aceitou-a em
sua totalidade.
No dia 7, à noite, houve uma reunião
virtual com sua comunidade, como fazíamos
com frequência. Nesse dia, saudavam-na
especialmente por ser o aniversário de sua
profissão solene e a véspera de sua cirurgia,
que todas apoiávamos, embora significasse
não poder retornar mais à nossa comunidade.
Foi então que uma Irmã lhe disse: “Tudo
está oferecido”, com o que ela começou a
chorar. Outra Irmã, vendo-a chorar,disse-lhe:
“Ceci, quanto amas a nossa Comunidade!”;
isso a fez chorar mais ainda. Para consolá-la, todas cantaram para ela a canção de Natal: “Não
chores mais, vida minha”. Foi um momento intenso de alívio para nossa Irmã, que começava
a despedir-se da perspectiva de poder voltar à sua comunidade.

Desejava viver intensamente até o fim; 8 de junho : com o


por isso, no mesmo dia da cirurgia, pediu ao seu fisioterapeuta
fisioterapeuta: “Disseram-me que se pode
aprender a falar um pouco com a
traqueostomia, poderias ensinar-me?” Embora
a traqueostomia a impedisse de falar,
comunicava-se com os olhos e mantinha seus
diálogos escrevendo em seu caderno. As
respostas eram muito concretas e simples,
algumas muito profundas, mas ao mesmo tempo
muito precisas e tão quotidianas, simples. A
simplicidade do humilde, do confiante, da criança ... Assim, confidenciava à sua madre priora:
“Deve-se ser humano até ao fundo, para encontrar-se com Cristo. Eu encontrei o Cristo na
minha fraqueza”. Sua Priora perguntou-lhe: “O que tu queres dizer com fraqueza?” Ao que
ela respondeu: “É cair e levantar-me novamente, aceitando a minha pobreza”.

Essa cirurgia aliviou-a no princípio, reduzindo sua asfixia por causa do excesso de
catarro. Saiu com dois tubos de drenagem. Sangue e água
fluiriam de seu lado permanentemente, até sua morte, o que lhe
causou uma sede ardente e insaciável.

Ao sair, enviou esta mensagem ao tio sacerdote em


Roma: “Obrigada, obrigada, suas orações e as de todos têm
chegado até mim... Minha jaculatória era: ‘Jesus, Filho de
Deus, meu Salvador, te amo’ ou algo parecido”. Sua notável
melhora durou pouco. Outra vez tosse, secreções, aspirações
contínuas, noites agitadas e difíceis, que a deixavam exausta.
Numa dessas noites, fazendo a uma de suas enfermeiras o gesto
carmelitano de “Deus te pague!”, ela adormeceu.
Dois dias após a cirurgia, o cirurgião aconselhou-a a levantar-se e andar pela sala. Ela
imediatamente pediu permissão para poder ir à missa, o que foi concedido. Mas como movê-
la numa cadeira de rodas com tantos tubos, cabos,
alimentação, oxigênio e morfina? A Irmã que a
acompanhava olhava admirada, mas insistia que
continuasse o caminho sem medo. Colocou seu novo
véu, já que, por causa da traqueostomia, não podia
usar touca. Ela o havia moldado com tempo e pedido
o tecido indicado, pois, como dizia, gracejando:
“Sim, é verdade, a vaidade é a última coisa que se
perde”. Já com tudo pronto, depois de uma longa
preparação, saíram da sala. Diante da admiração das
enfermeiras, que a olhavam sem acreditar, fazendo
sinais uma para a outra para que vissem tal
espetáculo, pôde chegar à missa: “Eu me senti muito
ouvida, porque consegui alcançar o Evangelho”.

O cirurgião recomendou-lhe
que fizesse exercícios para respirar
plenamente com os pulmões,
levantando os braços. Fez isso todos os
dias, com um esforço incrível, até três
dias antes de morrer.

Aproveitando o conselho para


caminhar, saiu a passear pelos jardins
com a cadeira de rodas e todo o aparato
necessário. A Providência quis que toda a sua família retornasse do enterro de um de seus tios
e fosse ao Hospital. Habitualmente, nem todos podiam vê-la e, sem planejar, todos se
encontraram, acompanhando-a em seu passeio.

https://drive.google.com/file/d/1T8AZgKuk46wcZY0tS8EitFspX7XwWpB1/view?usp=shari
ng

No dia seguinte, 16 de junho, o cirurgião do pulmão informou que havia encontrado


ali uma massa tumoral. Foi um diálogo intenso, no qual Irmã Cecília Maria escutava tudo com
grande paz e lucidez. Ela devia tomar uma decisão diante das possibilidades que lhe foram
apresentadas e, com clareza e equilíbrio, acabou respondendo: “Jesus me pede o caminho
mais longo...”, ou seja, continuar com os tubos de drenagem, com a secreta esperança de que
pudessem tirá-los e, com isso, pudesse retornar a Santa Fe.

Quando todos se retiraram, ficou a sós com sua priora e, vendo todo o pesar de sua
humanidade, escreveu com uma certa angústia em seu olhar: “Isso parece eterno”. E
manteve-se em profundo silêncio, com os olhos fechados. Nesse momento, entrou um
fisioterapeuta que despertava nela toda a sua maternidade, porque crescera sem mãe. Ficou
olhando-a em silêncio. Quando ela abriu os olhos e o viu, sorriu-lhe de orelha a orelha e,
pegando seu caderno, escreveu: “Sempre me sinto contente quando te vejo”. No dia seguinte,
quando ele voltou, esforçando-se muito, saiu da cama muito determinada, com todos os seus
tubos, e foi direto para uma mesinha onde havia alguns biscoitos. Separando-os em duas
bandejas, embrulhou uma e entregou-lhe, fazendo sinais para compartilhá-lo com seus
companheiros.

Seu sorriso continuava intacto, apesar do cansaço e da fraqueza. Não saturava bem o
oxigênio e a alimentação diminuiu, já que à noite tinha vômitos por causa dos catarros, e
tampavam-lhe a traqueostomia, o que lhe dava medo, porque despertava de repente asfixiada,
e não apreciava a ideia de morrer assim. No entanto, não deixava de fazer seus exercícios
respiratórios com um esforço heroico, sempre dócil ao conselho dos médicos. Além disso, a
sede que sentia levou-a a passar ela mesma a seringa de água, lutando com tenacidade contra
o tremor de suas mãos.

Vendo que sua partida estava próxima e que definitivamente não voltaria à sua
comunidade de Santa Fe, graças ao oferecimento e disponibilidade de dois de seus irmãos,
esta deslocou-se em dois grupos no sábado, 18 de junho, para o Hospital de Buenos Aires,
para poder despedir-se da Irmã.

Nesse dia, tínhamos agendado uma missa surpresa para o meio-dia. Seria celebrada
pelo Delegado Geral dos Carmelitas da Argentina, com a presença de duas Irmãs da
Associação Nossa Senhora de Luján do Carmelo de San Juan, que estavam participando de
um curso de formação permanente, e o grupo de nossas irmãs da Comunidade que estava
chegando.

Foi todo um desafio manter essa surpresa em segredo e convencê-la a não desperdiçar
suas forças levantando-se antes do meio-dia. Mas Irmã Cecília Maria, em meio ao seu estado
deteriorado, saiu da cama e, lutando contra o sono, permaneceu sentada. Sua irmã religiosa,
que a acompanhava, disse-lhe para deitar-se. E ela lhe respondeu com sinais: “Primeiro
fazemos o desjejum, depois rezamos Laudes, depois os exercícios e depois para a cama”.
Enquanto rezavam Laudes, sua madre priora entrou e, vendo-a sentada, disse-lhe que era
conveniente que ela fosse para a cama se quisesse ir à missa ao meio-dia. Sem fazer qualquer
sinal, nem mesmo terminar as Laudes, foi para a cama como um cordeirinho dócil.

Logo nossas irmãs da Comunidade acabaram de chegar. Irmã Cecília Maria abriu seus
grandes olhos com o sorriso mais radiante do que nunca. Olhava-as e, segurando a cabeça,
começou a fazer sinais de "Estão loucas!" Cada uma a abraçava, enquanto a Madre entoava o
Magnificat, e o resto já não pôde continuar, eram muitas emoções. Irmã Cecília Maria
levantava os braços, olhava de um lado para o outro e sorria, feliz.
E as Irmãs, apontando para seu irmão, que as tinha trazido: “Foi
ele!” E ela o olhava com gratidão e imenso carinho.

Logo todas saímos com a Irmã Cecília Maria para a missa


na capela. Juntamente com toda a sua família reunida, a outra parte
da surpresa esperava por ela. Ela havia oferecido sua doença pela
unidade do Carmelo. A Eucaristia nos agregava e reunia.

Com o Padre Delegado Geral


Vídeo: https://drive.google.com/file/d/1Ozf648iLDudX3jA5h1-a7A60Z-
FhGc5B/view?usp=sharing

Nessa mesma tarde, apareceram de surpresa nossas irmãs do Carmelo de Lisieux, que
a acolheram durante esses meses. Ela, pegando seu caderno, comovida, escreveu-lhes:
“Sempre uma ternura, uma surpresa... Abri os olhos às 11 horas da manhã e apareciam todas
as monjas de Santa Fe... e agora abro os olhos à noite e aparecem todas as monjas de Lisieux,
além de Topi” (Irmã do Carmelo de San Juan). Uma Irmã apontou que não tinham vindo
“todas”, porém ela escreveu: “Para mim, não falta nenhuma, no meu coração estão todas!
Quanto as amo, Deus as abençoe!”

Vídeo:https://drive.google.com/file/d/1p3zAIJpAn2rLcZXpvKYri3cOmFlvSXrJ/view?usp=s
haring

No domingo, 19, veio o segundo grupo de nossas irmãs de Santa Fe. Dessa vez, a Missa foi na
sala, pois irmã Cecília Maria estava exausta de tanta agitação e emoção.

Vídeo:
https://drive.google.com/file/d/1ZovHjYdrVIPacWoJUvpvrbpeiAnK6q9W/view?usp=sharing

Dentro de algumas horas nossas Irmãs voltaram para Santa Fe, tinham se despedido
dela nesta terra. Nessa mesma noite, escreveu: “Não sei quando irei ao Paraíso, porém é
verdade que eu gostaria de ir primeiro a Santa Fe”.

Depois rezamos o terço e ela colocou a intenção: “pela unidade dos cristãos, pela
unidade do Carmelo e para que toda a Igreja seja o berço da verdade, ternura e misericórdia,
para quem dela necessita”.

No dia seguinte, 20 de junho, veio o médico de Com o médico de paliativos


tratamentos paliativos e teve uma conversa intensa com ela,
com aquela proximidade que sempre haviam tido, pela
grande confiança que lhe inspirava. Num dado momento, ele
lhe perguntou se ela falava com Jesus sobre o assunto de sua
morte. A Irmã escreveu: “Teríamos que conversar mais
sobre isso, mas não o fazemos”. Quando o médico se retirou,
ela escreveu, mostrando-o à sua priora, com um grande
sorriso: “Estava pensando como queria que fosse meu
funeral. Primeiro, um pouco de forte oração e depois uma
grande festa para todos.
Não se esqueçam de rezar,
muito menos de celebrar”.

Estando a sós com sua madre priora por um


momento, ela leu a passagem de II Coríntios 3, 17-18.
Depois de copiar o versículo 18 – Mas todos nós, com rosto
descoberto, refletindo como um espelho a glória do Senhor,
somos transformados de glória em glória na mesma imagem,
como pelo Espírito do Senhor –, com grande dificuldade,
pediu que voltassem a ler a parte que faz referência à liberdade, e assim transcreveu: “Ora, o
Senhor é o Espírito; e onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade”.

Nessa noite, sua madre priora e a Irmã “V” ficaram para acompanhá-la. A partir dessa
noite, duas ficariam para cuidar dela. Vendo que o fim estava próximo e que a Irmã Maria
Cecília ainda estava lúcida, não estava plenamente consciente da iminência de sua partida, a
Madre priora queria dizer-lhe, sabendo que ela nunca quis que se ocultasse nada. Esperou o
momento oportuno. À meia-noite, entrou a enfermeira, que a despertou. Ao retirar-se esta, sua
priora, abraçando-a, sussurrou-lhe ao ouvido: “Minha queridíssima filha, Jesus está à porta, já
vem buscar-te, tu és a noiva radiante de beleza, adornada com suas joias e com ouro de Ofir
(segundo os Santos Padres, é a caridade) e Ele já quer desposar-se contigo para sempre. Ele te
ama muito, já não pode esperar mais! As bodas do Cordeiro estão se aproximando, tu és a sua
esposa que já está preparada... Tua
família está disposta à entrega e
também nossa comunidade”. Ela lhe
escreveu: “Não saias nenhum momento,
não me deixes sozinha”. Enquanto a
abraçava muito forte, sua Madre priora
começou a cantar o Cântico dos
Cânticos: “Levanta-te, amiga minha,
levanta-te e vem, o inverno passou, as
chuvas se foram. As flores brotam na
terra, chega o momento de cantar. Levanta-te, levanta-te, deixa-me ouvir tua voz”. Até que
seus braços foram deslizando, e adormeceu ...

Na manhã seguinte, a primeira coisa que escreveu à sua madre priora foi: “Totus tuus”.
Nesse momento, entrou uma faxineira, que exclamou: “Que rosto radiante tens hoje!” Depois
entrou um médico, que perguntou como ela estava, ao que escreveu: “De dia não encontro
alívio, se desperto me encontro com minha dor, à noite...”

À hora da sesta, Irmã Cecília Maria, com a mesma Irmã que a acompanhava, rezou o
Ofício de Leituras de São Luís Gonzaga. A Irmã recordava-lhe o quanto a havia ajudado
quando, estando juntas na enfermaria, haviam assistido à morte de duas de nossas Irmãs
idosas, encorajando-a a não ter
medo e dizendo que iriam para o
Céu. E perguntou-lhe: “Hoje,
como estás te sentindo?” E, escrevendo a palavra “Como”,
desenhou uma linha reta marcada e remarcada que termina
com a palavra “Céu”.

Nessa noite, ela teve momentos em que a falta de


oxigênio a inquietava. Às vezes, queria retirar a
traqueostomia, a via central e a gastrostomia. Rezamos o
terço da Divina Misericórdia e algumas jaculatórias, às quais
ela respondia com os lábios: “Eu confio em Vós”. Dormia
sempre sentada (durante esses 6 meses) e não encontrávamos
21 de junho com um amigo
do pessoal do Hospital
uma posição confortável para sua cabeça e pescoço durante esse mês de internação. Mas
nunca se queixou de nada. De madrugada, quis escrever alguma coisa e não se entendia o que
escrevia. Esteve por um longo tempo concentrada, depois foi ficando claro: “Embora não o
vejamos, Ele está, Jesus”. Pediu que rezassem o terço.

Começava seu último dia. Acordou sorridente. Quando conseguia descansar um


pouco, seu sorriso permanecia, era o seu jeito de se comunicar. Ao meio-dia chegaram as
irmãs dos Carmelos de Luján e Neuquén, que estavam no curso de formação. Reconheceu
aquela que já conhecia e, no estado extremo em que se encontrava, não perdeu o sorriso,
falava com o seu rosto.

Vídeo:

https://drive.google.com/file/d/1zWnPjsZlrtN-_UaoixRsuFrOHYf5lhyX/view?usp=sharing

Depois que saíram, Irmã “V” segurou-lhe as mãos e, quando se inclinou para ela,
apareceu a Cruz que temos no hábito. Ela cravou os olhos e começou a acariciá-la com muita
ternura. Isso deu a oportunidade de entabular um diálogo com ela: “Querida Ceci, quando
fores com Jesus para o Céu, darás muito trabalho”. Ela sorria. Acrescentou: “Que noviciado
nos levou a fazer todo este tempo, à Madre, à tua irmã Maria da Ternura e a mim!” Ela, atenta
a cada palavra, sorria. E continuou: “Agora foste para mim Madre, Mestra de Noviças...que te
parece que é importante na formação do Noviciado?” Ela a tomou pelos ombros e começou a
abraçá-la com muita ternura, pelo espaço de alguns minutos, como uma mãe muito terna e
doce. E depois, olhando-a nos olhos, eu lhe disse: “Mas, Ceci, também não te parece que tens
que fazer correções, fazendo o movimento de puxar as orelhas”. Ela assentiu com o sinal de
fazer "chacha" com a mão. Mas depois continuou, dando-lhe outro abraço cheio de ternura,
dando a entender de imediato que, para a formação, é necessário a combinação de ternura e
firmeza... mas, na realidade, esse abraço já era uma despedida.

Seu estado ia agravando-se e a medicação não respondia satisfatoriamente.


Aproximadamente às 20:00h, num momento de tranquilidade, o padre capelão entrou.
Momento providencial para receber a Comunhão com o Sangue de Cristo, numa pequena
gota, como sempre fazia. Depois de comungar, com um imenso esforço, levantou-se da cama
e atirou-se nos braços do padre, apoiando sua cabeça no ombro. Ele gentilmente a recostou
outra vez. Toda a nossa comunidade presenciou esse momento por Skype. As Irmãs só
desejavam vê-la, ela dirigiu-lhes um olhar e acariciou-as na tela. Em seguida, rezamos juntas
Completas, um coro era Santa Fe, o outro coro eram todas as que a acompanhavam. Deram-
lhe outra dose de morfina e ela dormiu. Todavia, despertou desconfortavelmente, fazendo
esforços ao respirar. Isso se repetia por não responder à medicação. Por volta da meia-noite
começaram a passar a medicação por gotejamento, que era para começar a sedação e evitar a
sensação de asfixia e a inquietação. Essa noite, ela foi cuidada pela Irmã “V” e por sua irmã
de sangue, Maria. Ficaram ajoelhadas ao seu lado, segurando suas mãos, cantando e rezando.
Sua mãe, que a acompanhou todos os dias, não conseguiu chegar para os últimos momentos.
Enquanto isso, a Irmã “V” sussurrava-lhe ao ouvido: “Ceci, já está chegando o Esposo”. Às
03:45h, a respiração ficou muito pausada e entrecortada, até que, com uma forte respiração,
entregou o espírito.
Nós a vestimos com seu hábito e capa e a levamos para a capela do hospital, onde a
primeira missa de corpo presente foi celebrada excepcionalmente. O padre capelão começou o
que parecia que ia ser uma grande homilia e, depois de algumas palavras, sua voz ficou
entrecortada. Após um momento de silêncio, concluiu: “Peçamos a esta virgem prudente que
encha nossas lâmpadas de óleo...”

Comunidade das Carmelitas Descalças de Santa Fe(Argentina)

carmelosf@gmail.com

Facebook/carmelosantafeargentina

P.S.: esta carta foi escrita com as recordações e testemunhos recebidos

Potrebbero piacerti anche