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O Brasil, como nação, se proclama a única democracia racial do mundo, e grande parte
do mundo a vê e respeita como tal.
Através da era da escravidão, de 1530 a 1888, o Brasil levou a cabo uma política de
liquidação sistemática dos africanos.
Desde a abolição legal da escravidão, em 1888, até agora, essa política tem sido levada
avante por meio de mecanismos bem definidos de opressão, mantendo a supremacia
branca isenta de ameaças neste país.
Durante a escravidão, a opressão aos africanos era tão flagrante que mereceu pouca
atenção aqui; eram considerados sub-umanos e forçados a viver na imundície, miséria e
degradação de seu status social. Isso significa negligência médica e higiênica,
desnutrição, sujeição e abuso sexual.
Essa opressão física e econômica resultou na degradação mental e cultural do escravo,
como todos estamos familiarizados. Depois da abolição, os senhores, principalmente os
possuidores das plantações de café nos estados do Sul, recusaram-se a empregar os
negros livres como trabalhadores, dando preferência aos imigrantes europeus brancos.
Essa atitude era endossada pela teoria supostamente científica e sociológica, que
fornecia suporte intelectual vital à política da classe dominante.
“O meu argumento é que a futura vitória na luta pela vida entre nós pertencerá aos
brancos”. O escritor José Veríssimo anotou: “Como nos asseguram os etnógrafos, e
como pode ser confirmado ao primeiro olhar, a mistura de raças está facilitando o
prevalecimento da raça superior aqui.
Estes conceitos racistas também contam com o apoio religioso: mesmo a igreja católica
sustentava que os negros sofriam de “sangue infectado”. A natureza gritantemente racista
das estruturas políticas do poder não é difícil de discernir; durante a administração de
Getúlio Vargas, a 18 de setembro de 1945, através do Decreto-Lei nº 7967, o governo
regulamentava a entrada de imigrantes de acordo com “A necessidade de preservar e
desenvolver a composição étnica da população – as características mais desejáveis de
sua antecedência européia”.
Neste pretensioso conceito de “democracia racial”, apenas um dos elementos raciais tem
qualquer direito ou poder: o branco.
Na verdade, tudo isso acontece com uma aura de subterfúgios a fim de diluir o seu
significado e fazê-lo extensivamente superficial.
Para esta cultura identificada com o branco, o homem folclorizado é o homem natural,
que não tem história, nem projetos ou problemas: tem só sua alienação, sua privação de
identidade; sua única identidade é sua alienação.
Uma vez que matéria prima é uma não identidade esperando para tomar forma, pode-se
dizer que o folclore negro é a matéria prima que o branco manipula e da qual se
beneficia.
O papel do escravo negro foi crucial para os começos da história e economia política em
um país fundado, como Brasil, sobre o imperialismo parasitário
Uma vez que a importação de escravos visava unicamente o lucro, estes estavam
subordinados a uma ideologia que os rotulava de subhumanos ou infra humanos e eram
relegados a um papel na sociedade que correspondia puramente a sua função na
economia de mercado: uma fonte de trabalho. Não havia nenhuma consideração para os
africanos como seres humanos com famílias. A proporção de mulheres para homens
importados estava próxima de 1:5, e mesmo as poucas mulheres que vinham da África
eram impedidas pela força de estabelecer qualquer estrutura familiar estável. Com efeito,
a exploração sexual da mulher negra é uma das mais flagrantes ilustrações do caráter
libidinoso, indolente, avaro da classe dominante portuguesa. O costume de manter
mulheres negras como prostitutas com finalidade de lucro era comum entre estes
senhores, não eram só libidinosos, mas também adeptos da mais vulgar cafetinagem.
O Brasil herdou a estrutura de família patriarcal de Portugal; e o preço dessa herança foi
pago pela mulher negra, e não só durante a escravidão. Mesmo hoje, a mulher negra, por
causa de sua pobreza e falta de status social, é presa fácil e vulnerável da agressão do
homem branco. Fato este que foi corajosamente denunciado no manifesto das mulheres
negras brasileiras, unidas em um congresso nacional na Associação Brasileira de
Imprensa, Rio de Janeiro, 1975.
O crime sexual da violência, cometido contra a mulher negra pelo macho branco, foi
perpetuado através das gerações pelos seus próprios filhos mulatos, que herdaram o
precário prestígio de seus pais e continuaram a explorar a mulher negra. Em uma
tentativa de aliviar sua própria culpa nesta exploração sexual, a classe dirigente
proclamou o mulato como a chave da solução do problema racial: o começo da
liquidação da raça negra e o branqueamento da população brasileira. Mas, apesar de
qualquer aparente vantagem de status social, a posição do mulato é na realidade
equivalente à do negro: o mulato sofre o mesmo desprezo, discriminação e preconceito
na sociedade branca.
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