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x1
^ DE
DIREITO NATURAL
6
Obras editadas pela Livraria Industrial de J. Walfredo
de Medeiros, â rua do Barão da Victoria n. 7
i
DF.
DIREITO NATURAL
SOBItE
R E C IF E
DF
J. WALFREUO de MEDEIROS
RUA 1)0 BARÃO DA VICTORIA N. 7
18S«>
PROLOGO
Publicando o presente livro repeliremos o que dissemos no
principio do Prologo de nossas Preleceòes de Direito Publico
Universal dadas á luz no anno de 1871.- .<não leni elle a pre-
tençiSo de ser um tratado de Direito Natural, nem tão pouco
a de ensinar alguma cousa aos sábios ou simplesmente aos ho
mens já formados n’esta sciencia.»
Na verdadç nada tem esta nossa obra, de transcendental,
nem se aprofunda ella nas altas e muitas vezes abstrusas regiões
da metaphysica da sciencia jurídica; é nada mais. nem menos
do que uma exposição resumida, c tanto quanto nos IVi pos
sível clara e metliodica das noções mais elementares do Direito
Natural ou pliilosophico, acompanhada da discussão e soluções
do mesmo modo caracterisadas das questões mais importantes
que esta sciencia encerra, e que mais se costuma suscitar na
escola.
Çntre ellas, si a algumas liga-se apenas um interesse pu
ramente lheorico, ainda assim não menos digno de toda a at-
tenção, outras são de utilidade iinminenlemente pratica e da-
quellas que tem frequente e importantíssima applitnçào aos
problemas que a jurisprudência social é chamada lodos os dias
a resolver. Taes sejam de uma c outra ordem : as da reali
dade de um principio superior do juslo, fundamento de toda
a sciencia do Direito; a da dislineção entre o Direito Natural
e a Moral-, a da imprescriptibilidade c inalienabilidade dos di
reitos innatos; a do fundamento jurídico da propriedade irn-
mediata, e da desigualdade do dominió entre os homens; a do
uso innoxio da cousa alheia, e a do direito de necessidade;
a da origem da força obrigatória dos pactos ; a da legitimidade,
por Direito Natural, dos direitos de testar, e de sucecssfio legi
tima ; a da indissolubilidade do matrimonio, e da legitimidade
do divorcio ante aquellc Direito, além de outras independentes
dVstas, ou que lhes são mais ou menos connexas.
fCstas nossas l.irçfíes são a reprodiiceão apenas mais ri su-
VI
O Autuou.
/
SECÇÍO PRIMEIRA
3
§§ I _ :t
* UU OVUDpiauuCfl 11113.
0 homem sem o freio snlntnr indUn __ . .
nas do pao a iillio, <1« superior a inferior e vice versa, nom ans
rasos ern que se trata de um direito alheio já ollendido e da ne
cessidade do reparar-so a lesao. O pae tem, por exemplo,
o dever juridico positivo de alimentar seu lillio, o cidadão o de
obedecer a autoridade constituída; e para ser-se justo com
aquelle cujo direito sc oITendeu nflo hasta a simples abstenção,
pois que esta seria a continuação da ofienta, c tanto mais ng-
gravada quanto mais prolongada fosse.
Kstas excepçôcs não prejudicam, entretanto, aquella regra,
porque a primeira vem propriamente de que nas relações a que
rlla se refere, o dever náo ó só juridico, mas ao mesmo tempo
moral ; e. a segunda de alguin modo confirma até a mesma regra,
desde que nos casos que a constituem, eila náo tem realmente
outro fim senão determinar o restabelecimento do oITendido no
estado em que lhe basta o simples dever negativo dos mais ;
sendo que demais, em todo o caso, os direitos se consideram
antes de tudo independontemenle de suas violações possíveis.
Dos princípios que acima expendemos, e que salvas aquellas
cxcepções, sán os mesmos que nos ensina o Compendio, ácerca
da negatividado do dever juridico, dcduifm-sc as diversas pro
posições, que clic nos apresenta no seu § (>.", como enunciados
d’esse mesmo dever . « Omitte todas as acções que pódent of
fender ajusta liberdade dos mais ;>• náo trates aos outros como
meios para teus fins arbitrários ;» deixa n cada um o que c seu ;*
« náo perturbes o direito alheio ; » náo leses n ninguém ; •>assim
como nquclla que nos propõe Kanl : » obra de modo que tua
vontade possa ser sempre considerada como um principio de
legislação universal ; » e ainda outras equivalentes, que se po
deria formular. Proposições, que embora náo so enunciem
todas em termos negativos, contém, entretanto, implicitamente
a negatividado geral do dever juridico que consagram, ou que
não sendo todas negativas na expressão, o são vírlunlmrntc no
seu fundo, e a essa fôrma pódem ser reduzidas sem alteração do
seu contexto e valor. ,
Accrca d’essas diversas proposições ou maximas, e de quaes-
quer outras semelhantes, podemos, comtudn, repetir conside
rações analogas ás que já fizemos em rclaçáo ás consignadas
no § 4.“ do C.ompcndio. Todas cilas rccominendam o respeito
ao dever juridico, mas não bastam para fazer conhecer-se em
que elle consista. Todas cilas sáo boas e produzirão salutares
cfieilos na sociedade humana, sob a condição porém,de nos ins
truirmos ante a luz da razão esclarecida e de uma consciência
recla, sobre o que é que realmente oITende ajusta liberdade dos
mais, a sna personalidade, a sua sociabilidade, a sua proprie-
dade, ou quaesquer outros direitos se u s$ ou em que consistam
as suas lesões para as evitarmos.
Todas ellas, em summa, devem ser acceitas e proclamadas,
porque procuram estabelecer regras geraes da couducla hu
mana destinadas a pòr limites racionaes a liberdade arbitraria
de cada indivíduo a bem de todos, e que u’isto consiste, em ul
tima analyse, como já vimos, o objeelo proprio, o fim ultimo da
lei suprema do Direito ou da justiça.
K’ isto realmente uma necessidade tão imperiosa, tão uni
versal e protundamenle sentida, qutí os proprios que muitas
vezes não hesitam em menosprezar aquella lei quando tratam
de satisfazer suas paixões ou interesses, são os primeiros a in-
vocal-a em favor de seus direitos reaes ou suppostos.
Aquelles mesmos que a infringem, ou que desprezam as
maximas em (pie se traduzem os seus preceitos, ou o dever que
ellas impõem, hem longe estão de aunuirem a que se as desco
nheça ou postergue contra elles. Ninguém acceita como nor
ma commuin da couducla humana os seus proprios actos ar
bitrários, quando pretende estabelecer o modo de procedimento
que os mais devem observar a seu respeito. A idéa do justo,
que é um tormento paru o coração dos mãos, porque a todos os
momentos lhes exproba.o crime, e lhes aponta a punição que
elles merecem, ú no entretanto por elles mesmos ávidamente
abraçada como uma Divindade propicia e salvadora contra as
ameaças ou ataques alheios. O assassino não quer ser assassi
nado, nem o ladrão quer ser roubado, e tanto um como outro
jámais verão actos de justiça ou legítimos nas tentativas ou ag-
gressões de alguém contra a sua existência, ou na subtraeçáo do
que reahnente lhes pertença ou deva ser seu.
Provam, na verdade, estas considerações, como nos diz
o Compendio no seu § não só que taes entes procedem ir
racional e iujustamenle, mas ainda, accreseeutareinos nós, que
elles ICm a convicção intima da sua irracionalidade e injustiça,
embora os seus mãos instiuctos ou sentimentos pervertidos os
levem em sentido contrario.
linalmonte, o que já dissemos c repetiremos : que
u lealulade c a universalidade, a clareza e o vigor do principio
( o jxisto, não pódein ser abalados por maiores que sejam os
desvarios da ignorância ou da perversidade humana quanto
a sua concepção ou quanto á sua pratica.
L i a c3 i l o n i
§ § 8 -1 1
z~r
§§ 12 — 15
,íéi
L IO C A C V
§§ 10 — 17
§§ 18 — 20
O
38
SECÇÃO PRIMEIRA
LIGKa3ÃO VTI
§§ 21 - 22
L I C 3oà 0 I X
§§ 25 — 33
autoS^^
eai também, e com igual procedência, para o mesmo fim a seu
respeito ? Os meros accidentes, a diversidade de aptidões par
ticulares que de facto os desigualam ou as suas condições exte
riores, não alteram a sua essencia commum ; sâo para issu in-
suflicientes ; não dão a qualquer por mais favorecido que seja
sob aquella relação, pela natureza ou pela fortuna, mais ou me
lhores direitos absolutos do que a qualquer outro.
Salvas, por tanto, as subordinações individuaes estabeleci
das pela propria natureza humana, como a de filho a pae, e as
sociaes de súbdito ao poder publico, que também mais ou me
nos directamente d’ellase derivam, ou da necessidade da exis
tência e progresso da sociedade, nenhum homem por acto de
autoridade propria, e mesmo em nome dc quaesquer conside
rações por mais attendiveis que pareçam, póde legitimamente
collocar-se para com outro na posição de superior, ou assumir
sobre elle tal império que a sua pessoa lhe fique presa ou avas
salada. A escravisação de qualquer homem ou raça de homens
ainda a titulo de melhorar a sua sorte, ou de civilisal-os, é,cumo
já vimos, um crime contra a natureza. '
O império do homem sobre o homem não é mesmo juridi
camente possível mediante utn pacto. K' certo que cada indi
víduo póde contractai’ com outro os seus serviços, e sujeitar-se
a prestar-lh’os de um modo mais ou menos extenso e duradouro,
duque son seu proprio interesse póde ser ò juiz : mas isto. como
já dissemos com o Sr. Ahrens, por meio de suas acções que não
comprometiam a sua personalidade inteira. Por esse meio póde
qualquer pòr-se cm uma tal ou qual dependencia de outro •
e até a vida social não ó senão uma sujeição continua e em todos
os sentidos do homem ao homem ; mas sujeição cm ambos os
casos razoavel c nuo arbitraria, filha da propria natureza do
homem e da sociedade, e não do capricho ou da prepotência
individual ; sujeição que em vez de anniquiiar a legitima inde
pendência de cada um ,ao contrario a suppOe, a confirma, a con
solida, e torna urna realidade.
Paclúa-sc, e é indispensável d consecução dos fins rneio-
naes e moraes do homem, que este pactue a prestação de seus
serviços, c que cada um lire d’elles as grandes vantagens que
d’isso lhe podem provir. Mas ninguém póde vnlidamente pac
tuar a sua propria escravidão, c menos ainda póde alguém im-
pôr-lh’a por esse ou por qualquer outro titulo. Aquelle que tal
cousa pactuasse, ainda quando não estipulasse expressamente
a clausula de" poder rehaver cm qualquer tempo a sua indepen
dência, nem por isso ficaria inliibido de fazel-o. Não nos pa
rece, pois, acccilavel a idéa do Compendio admitlindo como pos
sível o império do homem sobre o homem em virtude de pactos
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de reiiuucia da própria independencia, si por esta se entendo
o direito absoluto de que tratamos ; ao passo que tomado o im pé
rio no sentido em que elle o toma na nota ao § 25 de que nos oc
cupâmes, não só é o mesmo legitimo quando estabelecido por pac
tos, mas ainda em muitos casos sem a intervenção d’estes, como
acontece a respeito d’aquelles indivíduos que não estão no uso
e gozo perfeito de suas faculdades -, ou quando elle nasce das
subordinações naturaes dos homens entre si, ou para com a so
ciedade em que vivem, á que já á pouco nos referimos.
Em ultima analyse, o império do homem sobre o homem
exerce-se muitas vezes sem necessidade de contractos, e sem
prejuizo ou quebra de seu direito absoluto de independência;
c este em nenhum caso, nem mesmo por meio de contractos,
pódeser renunciado ou perdido, mas apenas modificado no sen
exercício, e dirigido em suas applicações.
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§§ 25 — 33
§§ 25 — 33
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uma varie—
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07
necessidades dc sua natureza, que lhe seria impossível encon
trar em outra parte.
Pretendcr-se-hu que não tenha os verdadeiros caractere«
dc um direito essa contribuição em que para seus com modos
e benefícios o homem põe a natureza m aterial'! I)ir-se-ha que
Isso não passa de um facto sem fundamento nos princípios da
justiça absoluta, o que só subsiste porque todos são interessados
ern reconhecel-o ? V isto, porém, responde-se cabalmente, já
com as razões que, havemos de produzir mais adiante, e já com
as observações que lizemos sabre o § 24 do tlompendio, e que
agora procuraremos completar.
Dissemos então, que se cie um lado as cousas exteriores
e physicassáo elementos indispensáveis á vida e, a lodos os des
envolvimentos do homem, e de outro, só este tem o poder de
extrahir cfellas os variadíssimos e importantes resultados para
que cilas são próprias ■,si eltas não tem préstimo para si mesmo,
c tem -n’o immcnso e imprescindível para aquelle-, si tudo, em
surnma, as denuncias como meros instrumentos ou meios, e não
pódem sel-o senão do homem ; é claro que devem legllimamente
serv irá satisfação das justas e naturaes necessidades d 'c ste ;
que foram postas pelo C.reador ao alcance de sua mão, senão
unicamente para serem convertidas em seu uso, ao menos ne
cessariamente também para isso. De outra sorte, nem a exis
tência das cousas teria explicação plausível, nem a do homem
possibilidade de manter-se, ou este a de desempenhar as exigên
cias de seu destino. A natureza d'nquella3 não teria »’esse caso
razão de ser tal, nem a haveria para terem as pessoas os fins que
sua organisação atlesla.
Si o homem, (lnalmente, não tivesse o direito tle apropriar-se
das cousas do mundo externo, que o cercam, c que pódem ser
dc facto por elle possuídas e desfruetadas, seria escravo cVelIas :
si não podesse dominar a matéria.seria seu ludibrio e sua victima.
Não obstante, porém, a evidencia d'esta verdade, não tem
cila escapado inteira ao máo humor do alguns philosophos ou
á furia de certos reformadores. A propriedade territorial, so
bretudo, tem sido alvo de seus ataques ou declamações. Itous-
seau pretende que c o primeiro hcfmem que ousou fechar um
terreno e cultival-o,e disse—isto é »icu.lbi um inimigo do ge-
upro humano, que se devia exterminal-o, e que a terra não c dc
^ n in g u é m , n seus fruetos são de todos. » 1‘rudhon mais calhe -
gorica e modernamente proclamou que «a propriedade e um
roubo.»
Mas poder-sc-ha, com razão, pôr cm duvida a legitima pro
priedade da terra, ou pensar que ella podia e devèra permane*
cor indelhndamente na posse commum de todos os homens?
Não; a terra, ao contrario, é e deve ser o principal objeclo da
apropriação (los homens, e da sua legitima posse exclusiva -, pois
que é ella a fonte primeira de todas as producçõos mais neces
sárias á sua vida, e da maior parte das matérias sobre que se
exerce a sua legitima actividade. A superficie do globo não po
deria pertencer em commum a todos os seus habitantes, já por
que de facto c isso impraticável, já porque realmente ella se
presta a ser possuída exclusivamente por partes que cada um
póde guardar e ulilisar sem damno ou perda dos mais ; e já final
mente porque quando mesmo tal communliào não fosse uma
chiméra, Importaria a cslerilisnção geral da terra, e a miséria
humana. Só dividida entre muitos cm propriedade exclusiva,
póde esta abrir o seu seio fecundo ás explorações da intelligen-
cia e do trabalho dos homens, prestar-se a Iodas as evoluções,
que lhe dão valor e desenvolvimento, e derramar entre estes com
profusão os seus magníficos tbesouros.
A formação dos primeiros núcleos de população, e pelo
progresso (l’estes a orgauisaçno dos Estados, da sociedade civil,
suppõem necessariamente a morada fixa do homem, a sua sub
sistência segura, e estímulos e garantias reaes para as produc
ções du sua actividade; r. nada d’islo seria possível sem a pro
priedade do sólo. Sem esta seria a humanidade reduzida a pouco
mais que o bruto ; e o exemplo lemos,de algum modo, nas tri
bus selvagens que possuem em commum as brenhas onde erram,
e cuja industria consiste em pouco mais do que erguer ou abaixar
a mão para colher os fruetos ou as raizes agrestes de que ali
mentam a misera existência.
Mas os que pensam que a terra não póde ser propriedade
exclusiva de ninguém, deveriam para serem consequentes con
cluir, que também os seus fruetos a ninguém pódem pertencer
de modo algum, em vez de declararem que elles são de todos.
Com effeito, negada a propriedade da terra, por que titulo aquel-
les selvagens ou qualquer homem se apropriaria já d’esses fruc-
tos espontâneos da natureza, já de quaesqner outros objectos
d ella ? 1‘orquc razão em tal caso esses fruetos e só elles, de
vem ser de quem primeiro os colha ? O titulo pelo qual alguém
legitnnamente os faz seus é o mesmo que o autorisa a apro
priar-se exclusivamente de tal ou tal porção do sólo.
Si e illegitima a propriedade da terra deve sel-o, por iguaes o
motivos, a de quaesqner de seus produetos. Si não me ó licito
fazer meu um pedaço de terreno que posso eíTecÜvamentB guardar
e cultivar sem damno real de alguém, e por estricta necessidade
da minha propria existência, como e porque poderia excluir os
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'»ais da apropriação (3 uso de seus fnielos ? A popriedadc exclu
siva da te m só póile, pois, serrepellida siippouclo-.se a idea da
propriedade em si mesma absolutarnente inadmissível perante
o Direito ; de modo que aquelles que a atacam reduzem o genero
humano á sorte miseranda dc Tanlalo no meio dos maravilhosos
dons da natureza som poder tocal-os. Póde-sc por ventura con-
eeber o homem absolutarnente sem a propriedadu dc cousa al
gum a1 c sobre ijue rccabiria ella, excluída a torra e seus fructos,
quando as próprias producçües da inteljigencia e da actividade
humana as suppõem como maleria?
Si todas as planícies, valles, e montes do gloho estivessem
sempre cobertos de fructos nutrientes e deliciosos; ou antes si
por toda a sua superfície os homens achassem a comida feita,
promplo o vestuário, construídas commodas habitações ao seu
dispôr; ou emfnnao alcance de sua mão e da melhor espeeie, tudo
quanto tosse necessário para satisfazer ás suas necessidades e le
gitimas aspirações ; de certo seria escusado atlribuir-se-lho um
<Jiieito de propriedade ou dominio exclusivo, sobre qualquer
cousa. Com razão diz \ oltaire, •>si ha alguma ilha onde a na
tureza prodigalise todos os alimentos e todo o necessário, sem
trabalho, vamos viver ahi longe do montão informe de nossas
leis : mas desde que a tivermos povoado, será preciso vollarmos
ao meu e ao leu, e a estas leis que são muitas vezes péssimas,
mas que não se podem dispensar.»
Desde, porém, que as cousas não são assim, nem podem
sel-o, e claro que o direito de aequisição e uso exclusivos de
quaesquer objeetos da natureza inclusive a terra, e principal
mente ella, não pode deixar de ser reconhecido como um dos
mais incontestáveis do homem.
iodo o genero humano tem aliás, c sempre teve esta inli
ma convicção e na conformidade d’ella procede c procedeu em
todos os tempos, sem a menor duvida ou variação. « FJIe re
conhece-se, diz p Sr. Ahrens, senhor e proprietário da superfície
do globo; a relação em que clle está para com os objeetos irn-
pessoaes da creação é a tio possuidor para cousa possuída.» Do
que entretanto «si não se devo, segundo o pensamento do mes
mo aulhor, concluir para a idéa pantheisla que absorve o ho
mem e todos os seus direitos na humanidade e acaba n’aquella
communbão dos bens que combatemos, lambem não se deve
concluir para a theoria individualista, que fazendo cada homem
proprietário de tudo aquillo de que póde apropriar-se, destróu
os laços que o prendem á humanidade, e o torna um ente isolado
o egoísta.»
Na verdade nenhuma d'estas conclusões seria legitima ou ac-
TO
ccUavel; pois que pretender-se regular a acquisiçüo das cousas
entre os homens, já pela sua simples qualidade de homens, já
pelo arbítrio ou torças de cada um. seria anniquilnr-se, tornan
do-o impossível,ou abandonar-se ádesordem, esse importantís
simo direito.
Mais adiante trataremos do titulo e modo porque a ac.qui-
siçS-o das çousas nullius realmente se effeelua, segundo o Di
reito, das condições de seu reconhecimento o permanência,
isto é, da sua occupaçâo, apprchensào, aposse de que falia o Com
pendio no § 29, e dos seus limites racionaes; assim como, por
conncxão, do modo e titulo, das condições e limites reaes da
- acquisiçiio das cousas já a outros pertencentes.
§§ 21 - 22.
4
[>P O IRl II
Hl ililr 85
Digitalizado pelo Projeto Memória Académica da FDR UFPE
DOS D I R E I T O S A D Q U I R I D O S
ARTIGO PRIMEIRO
D a a c q u is iç à o i m m e d ia ta
CAPITULO I
L IC K a3 A O Z 7
§§ 39 — 43
§§ 44 — lí)
§ 51 .
a razão nos diz que. nem tudo de que cada homem pódé eíFecti-
vamente apropriar-se, ou cuja posse e assignalamenlo póde
realisar, será legilimamenle conversível ao seu privativo domí
nio ; diz-nos lambem que uma vez adquiridas as cousas, com
os requisitos que o Direito exige, não c mais necessário para
manter-se legitimamente o domitiio das mesmas, que o possui
dor exerça sobre ellas a sua posse de um modo real e constante,
ou que de facto e immediatamente as tenha sob o seu poder ou
acção material. Não póde. por tauto, repetimol-o, ser este
poder o unico e verdadeiro limite da occupação das cousas.
Devemos, por conseguinte, fazer consistir a justa medida
d’esta, a regra que a modere em sua realisação, no conjuncto
de todas as necessidades legitimas do homem, quér ellas sejam
corporeas. quér intellectnaes, e quér moraes, ou de qualquer
cspecie, próprias de sua essencial organisaçâo, e uma vez que
sejam reaes, não ilcticias, ou consistentes em pretenções i n
admissíveis em Direilo ; necessidades que possam ser satisfeitas
sem o (Tensa de igual dircitq de outrem, ou de sua natural ca
pacidade de adquiril-o ; isto é, sem frustar-se os effeitos ju rí
dicos d'esta capacidade dos mais invocando-se em favor da pre
ferencia própria, sobre tal ou tal cousa, um titulo diverso como
principio, ou semelhante como facto, aos que poderão estes al-
legnr igualmenle em relação á mesma.
Tal é, cmfim, o justo limite da occupação das cousas, se
gundo o Direito Natural absoluto, e apenas n'esses termos é pos
sível indical-o, sendo que só a lei civil, conforme os casos oc-
enrrentes ou hypotlieticamenlo concebidos, póde (ixal-os com
precisão, no sentido de reduzir a proporções racionaes ou con
venientes, quaesquer pretenções exageradas de aequisição por
aquelle meio.
Compreliende-se entretanto que aquelle limite da aequisi
ção immcdiata das cousas nullius, que se deriva, em geral, de
um titulo que é camimim a todos os homens, que como princi
pio só póde ser desigualado até certo ponto, e como facto sbb
certas condições, que a sua realidade presuppõe, não póde ser
applicado á propriedade depois de constituída a cousa definiti
vamente no dominio pleno e exclusivo de alguém, que na qua
lidade de seu dono póde usar, gozar e dispôr d'ella, transmit-
tindo-a a outros a titulo oneroso ou gratuito, de onde necessa
riamente resultará que a mesma propriedade mais ou menos se
accumulu nas mãos de uns, retirando-se das de, outros.
E’ com elFoito, evidente quanto a esta especie de aequisi
ção e propriedade, que ella ba de ir sempre por sua natureza
e condições, muito além d’aqnelle limite sem sahir do terreno
I.V F.
I 14
(ia justiça ; que cada homem sem ultrapassar os seus direitos ;
e antes no exercício natural d’elles, póde ser legitimo dono de ,
muitas cousas adquiridas por tal modo, em bora se as repute, ou
realm enle sejam demasiadas ou supérfluas para a satisfação
de quaesquer necessidades ou mesmo phantasias d’aquelle que
as adquire.
1’óde-se pois dizer, que figurando-se os homens, por hypo
thèse, em um estado primitivo ou anterior ao facto,da occupa-
çâo das cousas n u lliu s, ou á transform ação da propriedade ori
ginaria em propriedade m ediata, aquella occupação seria legi
tima emquanlo recahisse cm objectos susceptíveis d’ella, real- | ‘
mente adequados á satisfação de quaesquer necessidades verda
deiras e proprias da dupla natureza hum ana -, até onde fosse
possivel a cada indivíduo guardal-os e defendel-os pela forma
e meios que a lei juridica prescreve ; e sómenle n ’isso e até ahi.
Ao passo que em relação á propriedade adquirida pelos modos
secundários, ainda quando em sua origem proceda ella de um a
occupação, cuja regularidade é impossível verificar-se, o Oi- •■
reilo, quér Natural, quér civil, não póde deixar de acceital-a em
seu actual estado e dc gnrantil-a em toda a sua real latitude. Os
seus limites são indefiníveis ; elles são determ inados pelas pro
prias evoluções em que consistem o seu uso, gozo, c disposição
■entre os homens.
LIG Í3A
9 Ò ZIZ
§§ 52 — 53
16 r.
L I 0 C J5 A 0 Z .Z .
§§ 54 — 55
§ 50
455
d’aquelle que a transforma, c ainda assim mediante as necessá
rias indemnisações, em .todos os mais essa transformação do
que não éseu„do que pertencia a outrem, embora a simples ti
tulo de occupação anterior, não só não dá direito algum ao trans
formador, mas até o constitue um usurpador, um criminoso.
E’ o que nos dizem os sãos princípios do Direito, e o pro
prio bom senso, contra o qual não valem os systemas, por mais
engenhosos ou seduetores que pareçam.
C U ’lTljCO U
, L IC Ga îiO -JL7LZZ
§§ 57 — tv2 , -
«
hem observa o Compendio, não se confunde propriamente com
o direito natural que tem o homem de apossar-se das cousas,
o qual precede.ao mesmo dominio, nem se confunde lambem
com o simples aclo da apprclicnsão inicial das mesmas, isto é,
com o acto material por onde aqucllc direito começa a realisar-
se externamente. Consiste essa posse no direito que tem, e deve
ter o dono de um objecto de retel-o cm seu poder de um modo
exclusivo c permanente, de conseíval-o sob a sua acção, quer
material, quér. virtualmente, de maneira ã poder dar-lhe em
qualquer tempo ou quando hem lhe convenha qualquer applica-
ção ou destino.
L)a posse assim considerada nascem, como nos diz ainda
o Compendio, para o dono da cousa, os Irez seguintes direitos
1.“ o de excluir a qualquer outrem de igual posse da mesma
cousa, ou de qualquer de suas parles ; o que . realmente assim
deve ser. visto'que a posse não exclusiva c de todo incompatível
com a idea, e çom os direitos qiA onstitucm o verdadeiro domí
nio. Não seria verdadeiramente nosso aquillo sobre quo outros
pudessem exercer, embora em concorrência com noseo, actos
de senhorio ou de proprietário ; — 2.° o direito de preservar
a cousa de toda a acção dos mais, e por conseguinte, de guai-
dul-á,escondei-a, rodeal-a de quaesquer outras precauções para
que só elle a lenha em seu poder, e impeça os mais de ter n ella
, ou no seu uso qualquer participação. Sem isto seria lambem
incompleto ou impossível o exclusivismo que ú proprio do do
mínio. Para ter-se o direito pleno de rcler-sc alguma cousa em
seu poder, é indispensável, sem duvida, 1er-se a iaeiildade de
empregar esses ou quaesquer outros meios ou actos adequados
a prevenir que ella veuluv a cahir no poder de outrem ; c .1.“ cm
ílm', o direito de recobrar o dono a’cousa quando outrem a rete
nha sem o seu consentimento. Sem istu c evidente ainda que
o dominio. como o lemos dclinido, não teria realidade alguma ;
elle seria vão depile que só subsistisse em quanto o seu«,objecto
se achasse realmeole rias mão de seu dono. F.m vez de um di
reito, tal supposto dominio n’essas condições, seria antes uma
provocação constante aos ataques e arbítrio dos mais.
Em summa; reter a cousa de um modo permanente, ex
cluir os mais do direito de relel-a,c rcliavel-a o seu dono quando
subtraliida ou separada de sua pessoa ou patrimônio, tacs são
os diversos direitos particulares que constituem a posse, pri
meiro elemento do dominio.
0 segundo dos direitos contidos u’este, consistente na tacui-
dade de usar da cousa, que d’elle é objecto, decompõe-se, por
sua vez, nos seguintes : — l.° o dc servir-se d’ella aqucllc que
18 F , ■
I
158
a tem para quaesquer fuis, que llie convenha e forno lhe con
venha , e 2.° o de usufruil-a propriamente, mi de perceber os seus
Iructos ; direitos estes que comprehendem ode desfrüctara cousa
por si mesmo, o de alugal-a, de emprestal-a, de hypothécable
ou de ohrigal-a de qualquer outro modo ; c o mesmo a respeito
de seus productos.
O dono da cousa póde, com effeito, e deve 1er a faculdade
de praticar env relação a mesma todos esses aetos, a de abster-
se de qualquer d'elles, e com maioria de razão, a de vedal-os
aos mais.
Como bem observa o Compendio na primeira de suas notas
a este paragrapho o uso da cousa por seu dono é justo, ainda
quando elle possa ser incommodo a outrem. K’ possivel em al
guns casos, que o uso natural e legitimo d’aqnilto que é nosso
traga a outrem alguma desvantagem : mas isto não póde ser
razão panique este uso nos seiaimpedido. Não póde sel-o com
justiça em quanto não offenda»rectamenle direitos d'este pre
existentes, incontestáveis, ou que por algum principio jurídico
devam ser por nquellc respeitados, ou ao d’elle, preferidos.
A estes diversos direitos constitutivos do uso e gozo da cousa
accrescenla o Compendio no § 59, a faculdade de alineal-a ;
»nas esta entra mais propriamente na ordem dos direitas de que
trata o mesmo Compendio no paragraplio seguinte.
Occupa-se elle n’este paragraphe* do direito que tem o dono
da cousa dc‘ dispor d’ella, ou de sua substancia ; direito que
constitue a terceira cspccie d’elles contida no dominio. Decoin-
poe-se esse direito nos seguintes : — 1.»o de transformar aquelle
as cousas.que lhe pertençam do modo que lhe parecer conve
niente aos usosou vantngensque d’ellas possa tirar,transformação
n <i qual também não ha oulro limite fora da sua vontade livre,
senão aquelles a que ba pouco alludimos; pelo que póde cila ir
ale ao ponto d’elle alteral-as de modo que se tornem inteira—
incote diversas do que eram antes ; — 2.» o direito de alienar
a cousa propria a titulo oiieroso ou gratuito, com ou sem cou-
1 1toes dando-a, li ocando-a, venderido-á, etc. l>e outra sorte
‘í 1 C0,1Síl na° Scria 0 ''»minio, mas uma simples
• n, nen iU uso 1uet.° i — 3 a o direito de consumir ou destruir
6 ,,ue se '' donoi e deve ®6r isto, com etleito, um di
reito d este, uma vez que consumir ou destruir aquellas não õ,
cm ul ima analyse, senão o mesmo facto de usar d’ellus. embora
jazendo desapparecer a sua substancia, ou antes, senão trans
tormal-as, embora d'e um modo mais radical.
, Quanto á ju i.meira das sobreditas faculdades nenhuma duvi-
ca se ollcrcce, puis que trata-se de cousas que se suppoe destina-
Jas por natureza a ser consumidas, o que só assim pódcm ser
usadas ; quanto, poYém, á segunda, ha qtiem pretenda limita-a
de modo inadmissível. Ò proprio Compendio na sua nota a este
paragraphe diz-nos que « destruir as cousas por mero capricho,
com quanto não seja uma. acção injusta, é com tudo immoral,
porque Deus creou as' cousas para usarmos d’eltas e não para
as destruirmos; e porque destruindo-as ofVeiidemos a Dcus,e nos
privamos dos meios de cumprir nossos deveres para cumnosco,
e os de beneficeneia para com os mais.» São, porém, inaceei-
taveis estas idéas. 1’rimeiramente, destruir as cousas que po
dem ser para nós ohjecto de dominio, não é propriamente aii-
niquilal-as ; c em segundo lugar o que então destruímos não é
propriamente o que foi creado por Deus, mas pelo nosso traba
lho, ou pelo de outrem que legilimamente adquirimos ; é apenas
a forma sob que existia actuaímoiilc a -cousa, e que passou a ser
outra. D’esta asserção 'se poderá quando muito exceptuar as
çousas ou seres dotados de. vida, que nos pertençam ; pois que
destruindo-as fazemos, com eífoito, desapparccer alguma cousa
creada não pelos homens, mas pelo aiithor da Natureza ; e sere
mos então immoraes, si o fizermos .sem a justificação da neces
sidade.
Fora d’estes casos a destruição de quaesquer outras cousas
por seu dono não póde de modo algum ulfcnder a Divindade.
Não se comprchendc como esta possa realmenle ser ofiemiida
pela destruição mesmo caprichosa de um prédio ou lavoura
nossa. O que. não nos é pmnitlklo é destruir o que é nosso en
volvendo n’essa destruição damno ou lesão a algum direito
alheio. Despeitado este, é licito a cada um destruir o que lhe
pertença, sem (pie se possa objectai1 a isso com a impossibili
dade em que o seu dono venha a aehar-sc de cumprir os deveres
que tem para comsigo ou de beneficiar aos mais, l’ois que,
mesmo segundo a Moral, os deveres de cada um para comsigo
não suppõem necessariamente a condição de proprietário ; e nem
por ella é alguém obrigado a fazer-se ou a conservar-se proprie
tário para melhor cumprir esses deveres ou os de benelleencia.
Cada indivíduo os tem, e deve cumprir, apenas segundo as con
dições em que se ache collocado, quér seja pelo acaso, ou for
tuna, qnér seja por aclos dependentes de sua vontade que não
contrariem a justiça. A doutrina do Compendio, na citada
nota, levada ás suas ultimas e lógicas consequências dá em re
sultados de lodo inadmissíveis. Por quanto, si ti immoral aqyelle
qué destróe uma cousa sua, que poderia converter (imbeneficio
dos necessitados, immoral deve ser todo o rico ou proprietário,
ou miles immoral deve ser toda a riqueza, desde qucaquelle que
MO
a possue, tendo meios demasiados para a satisfação de, suas ne
cessidades communs, não a distribue com os pobres ; desde, em-
fim, que cada um não procure nivelar as soas' posscs com as
de todos os mais por acto espontâneo. Seria isto a subversão
social pelo communismo.
Aquelle, pois, que entende dever destruir tal ou tal cotisa
sua, ou porque encliergue n’issu alguma utilidade que escape
aos mais e de que só elle é juiz, ou rnesmo por méro capricho,
nenhuma offensa faz, quer ;i lei do justo, quer á lei moral.
Quapdo muito, si o seu acto é de tal naturesta ou revestido de
tacs circunstancias, que de nenhum modo possa ser explicado,
poderá o seu author ser considerado um predigo, um maniaco,
nu um louco, c p’este caso cumpre á lei social, ou a quem pôr
hircilo fôr para isso competente, providenciar como convenha.
Em quarto lugar, finalmentc. contém-se no dominio, o di
reito de abandonar a cousa de que se é dono, direito que não
solfre cnntestaçao desde que, como temos mostrado, o dono de
uma cousa pôde^ dispor d'ella, como lhe apraza, póde alienal-a,
consumil-a e até destruil-a. Eóra absurdo impedir-se ao pro
prietário a faculdade de abandonar alguma cousa, que não lhe
conviesse mais conservar na sua posse o dominio. Ninguém
póde ser obrigado a usar de uru dircilo, o qual c essencialmentc
uma Iacuidade que a lei lhe garante em sua \ aniagem, mas que
mio lhe póde ser imposta em seu detrimento. Salvos apenas
os casos em que esse abandono ollende directamcntc direito
alheio que deva ser respeitado ou preferido, em todos os mais
e licito ao dono dc uma cousa abandonal-a quando queira no
todo pu envparfe.
Àccrescenta o Compendio qué o dono de,uma cousa, alem
de podel-a abandonar absolutamente, póde também cedel-a
a outrent no lodo ou algum dos seus direitos principaes ou deri
vados do seu dominio sobre a mesma, o que é ainda incontésiavel
desde que isso não é senão o mesmo direito de alienal-a no todo
ou em parte, de que acabapios de tratar, e que alli tinha o seu
lugar mais proprio. *
, dominio de. que ternos fallado ó o dominio pleno a que se
re eieo .ompendio no principio do §61, dominio no qual os di-
veisos direitos que o constituem competem todos c em toda
a sua extensão a uma uuica pessoa physica ou moral, não tendo
ern qualquer d elles outra pessoa parte alguma. Mas segundo
nos diz o mesmo Compendio na continuação do citado para
graphe, o dominio póde ser lambem menos pleno, e limitado.
Elle e menos pleno quando os principaes direitos que o consti
tuem estão divididos, compelindo o direito á substancia da
\
cousa a uma pessoa, c a outra o direito á posse e uso da mesma,
o .que se verilica nos casos de emphyteusis, afdrnmenlo perpe
tuo, etc. O dominio do primeiro chama-se dominio directo, e o
do segundo dominio u lll; e,como se vò, nenhum d’elles é com
pleto em relação á cousa. O senhorio directo póde dispòr do
seu direito sobre esta, aljcnal-o de qualquer modo a outrem ;
mas o senhorio util conserva sempre o seu cm relação á sua
posse e uso da mesma, mediante o encargo do pagamento do
litro estabelecido. Este póde igualmente alienar o seu direito
a outrem, com a obrigação, porém, de dar a preferencia ao se
nhorio directo, se elle o quizer. Quando o dominio directo
e o util, por qualquer motivo, se reunem na mão de qualquer
d’aquelles, ou na de um terceiro, o dominio se consolida, e tor
na-se pleno.
O dominio é simplesmente limitado, como nos diz o Com
pendio, quando alguém tem sobre uma cousa algum direito que
restringe a liberdade do senhor da mesma, como seja um di
reito de penhor, de hypothecate servidão ; ou como cm rela
ção ao uso das aguas de um rio que atravessa differenles pro
priedades agricolas, o direito dos donos das propriedades supe
riores á respeito dos inferiores. Aquelles não podem desvial-as
para seu unico uso, ou utilisal-as exclusiva men te, si cilas são
necessárias aos mais, epódrm servir-lhes sem seu damno.
Ainda de outro modo póde ser limitado o dominio, tal
seja nos casos em que, em vez de ser elle singular ou de uma só
pessoa, competa a diversos; o que constitue a co-propricdade,
ou corulomino de que traia o Compendio no § (5-2. Este dá-se
quando dilTerenlcs indivíduos tem parte em uma só cousa indi
vidual, ou indivisa •, estabelece-se, como nos diz o mesmo Com
pendio, ou pela oceupação simultânea de uma cousa nnllius, ou
por consentimento ^ivre,,gratuito ou oneroso de seu primeiro
dono unico ; ou, accrescenlaremos nós, por outros meios inde
pendentes de tal consentimento, em virtude, de alguma razão
jurídica que a isso o obrigue.
K’ claro que o condomino não póde ser cm tudo regulado
pelas mesmas regras do dominio singular. Quando a cousa
é de um só, póde esto usar c dispòr d’e)la com toda a plenitude
dos direitos que constituem o dominio; desde, porém, que
outros tem os mesmos nu quaesquer outros direitos sobre a mes
ma cousa, cada um d'elles, por maior que seja a sua parle n’ella,
não póde legitimamenle exercer a respeito do todo, sem an
il uen cia dos mais, todos aquelles direitos.
O direito exclusivo á posse e uso cie lai cousa não reside
então em cada um dos condoininos tomados separadamente?
mas no seu conjuncto ; pois, como nos diz ainda o Compendio,
« do dominio assim estabelecido resulta uma communhão çm
que o direito década um é restringido pelo dos mais.»
O que em consequência d’este direito póde cada um justa
mente pretender, é apenas uma parte proporcional nos seus
productos; e quanto á substancia da cousa cm si, a faculdade
de dispor indeterminadamenle da sua quota parte da mesma.
Communs e proporcionaes devem ser igualmente quaesquer
omis ou despezas de conservação ou utilisação da cousa; e sua
administração, quanto possível, de accórdo entre os interes
sados - •
. O condomino, como se vê, é um grande omis para a pro
priedade, é contra a sua essência, é um entrave que só por in
declinável necessidade se póde Supportai- n’ella ; deve, pois
cada um dos consenhores ter o direito de pedir a divisão do
objecto commum ; e quando essa divisão seja impossível, o de
pedir que tal objecto seja consignado todo a um só d’elles, que
reponha aos mais o valor das partes respectivas; ou que seja
o mesmo vendido e repartido o seu preço na proporção d’estas.
Com quanto o Direito Natural forneça tle um, modo geral
as regras que acabamos dc indicar ralativas a esta matéria com-
prehende-se facilmente que ella só póde ser bem regulada cm
seus detalhes pela lei civil. •
FACULDADE
DE DIREITO
LICOAO
9 Z Z III
% §§ G3 — 65
LIOOÃO
' o Z Z IT
§§.06 — 72'
/
L ia Coà C Z Z T
§§ 72 - 76
2t F.
LÏCK3A0 Z Z T I
§§ 77 — 78 ,
§§ 7 8 - 7 ! )
§§ 80 — 85
I
|t
AUT1C0 SEGUKDO
Da acquisiçâo mediata
CAPITULO I
' • ir. |.
DOS PACTOS EM fíERAC
LiaOAO
o ZZXZ
§§ SG — 87
(3(1) I" o enso de que trata o Compendio na noia ao § JO, e que aqui
vem mais nproposito.
21 F.
180
Si feita e acceita a promessa fosse licito a qualquer dos pac-
triantes retirar a sua declaração, sol> tacs pretextos, ou altri-
buir-lhe significação diversa da que foi realmente manifestada,
nenhum pacto jamais se póderia considerar feito ; pois que a sua
execução ficaria dependente do bel-prazer ou má fé d’aquelles
que, depois de lcl-o celebrado, quizessem eximir-se ás suas pro
prias estipulações.
Como bem observa o Compendio no §88,si aquella decla
ração concorde das vontades dos pactuantes não bastasse para
firmar a sua obrigação e direito recíprocos, não bastaria até
o eííectivo cumprimento do pacto pela propria tradicção do seu
objeeto ; isto é, ainda mesmo depois de executados ou começa
dos a executar-se, deveriam os pactos reputar-se sujeitos a ser
suspensos ou revogados. (21)
E’ possivel,sem duvida, que em algum caso o promittente
ou o acceitante tenha legitima exccpção para não cumprir
o pacto feito, ou para recobrar a cousa já entregue ; mas então
sera o caso de pacto nullo ou rescindivel, por Direito ; o que em
vxz de atacar o principio estabelecido, ao contrario, o confirma.
E si, ante o Direito positivo, pactos embora perfeitos e acaba
dos pelo simples mutuo consenso dos pactuantes, ficam alguma
vez sem elTeito, por haver-se algum d’estes arrependido da pro
messa antes dc sua execução, não é de certo porque perante
o Direito Natural absoluto não tenham elles tod*o o vigor; mas
sómente porque nem sempre são os mesmos feitos de modo que
se possa bem provar, na conformidade d’aquelle, contra a parte
remissa, a realidade de sua celebração, e o theor e força de suas
estipulações.
_ A regra de que da promessa se origina a possibilidade ju
rídica para o promissario dc adquirir o objebto do pacto, ó,
pois, invariável; pelo que parcce-nos que sem razão pretende
o Compendio fazer-lhe excepção na segunda de suas notas ao
paragrapho de que traiamos ; e o que elle ahi indica como tal,
não o é realmente, e sim méra excepção á regra volenti non
ln)u>'ia a que elle ahi allude, e (pie não tem conveniente ap-
plicação á questão vertente.
Mesmo nos casos por elle figurados na primeira parte d’essa
§§ 95 — 100 (23)
V
20 0
LXCOio
a
2 1 Z Z I1
§§ 101 — 110
'
Do direito pessoal, c do direito real resultantes dos pactos,
e si este depende da tradicção do objcclo. — Da inter
pretação dos pactos.
r
CAPITULO II
■LICClO
9 Z ZZIV
§§ 116— 12Ó
§§ 126 — i36
30 f.
ligçúLo zrzrzrrz
§§ 136 — 139
241
tbeüeu a prestar-lhe ; e 11’esse direito se comprebende igual
mente o de prevenir a sua ausência, e de ir procural-o quando
se cvada, para forçal-o já ao trabalho promettido, já d îndem-
nisaçdo que lhe deva pela sua falta de exacçào no cumprimento
do seu contracto.
1 Que estes direitos do locatario sejam tambem pessoaes con-
cebc-se perfeitamente ; pelo que não pódem elles ser transferi
dos a outrem, ou ser o locador obrigado ap re sta ra terceiro
com quem ndo conlractou, os serviços que prometleu aquelle.
Entretanto um mestre de obras que se comprometlesse com al
guém a construir-lhe um prédio, e lhe désse principio, não fica
ria exonerado da obrigação dc concluil-o pela morte d'aquelle
com quem pessoalmente a contraclou ; do mesmo modo que os
successores d’este não o seriam da obrigação de fazer effeclivo
o seu contracto ou d e indemuisar seus prejuízos dando-o por
findo. N’estes casos, pois, e n’outros semelhantes, deve solTror
exceiição aquella regra, o que quer dizer, em ultima analyse,
que ella não é applicavel aos casos em que o serviço estipulado
refere-se a uma obra ou trahalho, que já concluído ou come
çado não pôde ser abandonado ao locador nem por elle retido,
sem pnejuízo d’elle ou do locatario.
Os direitos e obrigações do locador e do locatario de ser
viços são reeiprocos como os dos pacluantes em qualquer espe-
cie de pacto.
Sem fallarmos, portanto, do direito que tem o primeiro de
praticar todas as acções, e de applicar-so a todos os misteres
que não prejudiquem o cumprimento das obrigações que Con-
trahio, é claro que tem o de exigir a retribuição ajustada pelo
seu trabalho, quér este tenha já sido rcalmentc executado, quér
esteja o mesmo prompto e seja apto para preslal-o, ainda que
, o locatario por qualquer motivo não queira mais ulilisar-so
d’elle. Quando por esta ou por qualquer outra razão imputá
vel ao locatario o contracto deva ficar sem efieito, c o mesmo
pelo menos obrigado a responder ao locador pelos prejuízos que
assim lhe cause.
Finalmcnte o contracto de locação c conducção de servi
ços acaba pelos mesmos modos ou nos mesmos casos em que
linda o de locação e conducção de cousas, que já expendemos,
e especialmente nos casos seguintes: — l.° quando se acha
concluído o trabalho estipulado; — 2.“ pela morte do locador
ou do locatario, salvo aos successores d’aquelle o direito á re
tribuição dos serviços já por elle prestados, e aos d’este a ex-
oepçàô relativa aos casos que acima indicámos.
31 F.
l i o 3a lc z z z v ii
§§ HO — H 3
CAPITULO I
• L ic c3ílo z l :
§§ 151 — 159
I i
L ia Od o z l i:
§§ 159— 1GG
I
281
effeilo, á uma Direção ou Gerencia individual ou collectiva,
que as representa, obra em seu nome, c as dirige. •
O simples facto de confiar-se tal poderá um ou mais mem
bros de uma sociedade, diz-nos com razão o Compendio no seu
158, não torna a mesma desigual: porque por essa concessão,
c nos termos em que deve ella ser feita, não se confere áquelles
o que se pode chamar propriamente império■ Assim é real
mente desde que esse poder deve ser por áquelles exercido como
uma simples delegação em vista do interesse eomrnum, do mo
do e dentro dos limites que lhe devem ter sido assignados por
accôrdo de todos, e sob a suaimmediata inspecção.
A própria sociedade civil ou listado onde isto em grande
parle não passa de uma ficção legal, não é na sua essencia urna
sociedade desigual, quando os seus poderes públicos são expres
samente declarados delegações da Nação, c pelo meebanismo de
sua organisação e funeções, ao menos cm algum sentido e até
certo ponto, se imprime de facto esse caracter no seu exercido.
Nesta sociedade é certamente muito mais difficil, do que
em qualquer outra pouco numerosa e do fim particular, fazer-
se eiíecliva a igualdade legal dc seus membros, ou dos direitos
sociaes, quando os encarregados daquellc poder abusam d elle
ou quando algum ou alguns de seus membros o usurpam, alas
não é menos certo que ern taes casos, e sobre tudo nelles, os
membros de qualquer sociedade em que isso aconteça, tem o di
reito decbamal-osa estrictascontas; nas sociedades particula
res pelos meios que o Direito e o Estado por seus tribunaes lhes
fornecem : e neste, na insufficiencia de outros menos desastro
sos, até pela revolução, ultima ralio dos povos opprimidos con
tra os seus tyrannos. , , .
Entendem alinrns autbores (29), que do mesmo modo que a
toda sociedade competem poderes que tem seus símiles nos
poderes legilativo c executivo do Estado ou sociedade civil, tem
lambem qualquer sociedade um poder semelhante ao judiciai m;
c fazem-no consistir em uma faculdade ou competência da mes-
nia para lixar os direitos e obrigações dos respectivos soeios
nas suas relações privadas, que si não inimediata ao menos rne-
diatamente interessem ao lim social. Mas esta idea nos pare
ce demasiadamente subtil, e o simile que ella estabelece muito
forçado para podermos aeceilal-o, e alé para com elle nos oo-
cuparinos mais detidamente.
/
LIGÇJÃO Z L I I I
l ‘ i ■
§§ 1G7 — 1G9
L I G Gs à C Z L T T
38 f.
LIO O A C Z L V
. § § 1 7 3 — 174
II . , ‘
500
logia, a qnal por uma cxperiencia longa c até vulgar, não dis
tante a opinião ullimamcnte emittida por um aulhor- de nola
(31) mostra-nos que ellas dão ordinariamente em resultado uma
próle bastarda, e o progressivo enfesamento da cspecie. .
l)c tudo o que até aqui temos expendido acerca da forma
ção da sociedade matrimonial, vè-se que realmente são, em
geral, applicaveis á esta as regras fundamentacs de todo o pacto,
salvo, quanto á algumas, certas modificações proprias da espe
, cialidade d’aque.Uà união ; e serve isto para confirmar o que nos
‘ diz o Compendio na nota segunda ao paragrapbo do que nos
occupamos, isto é, que o'matrimonio é, com effeito, um con
tracto. Ahrens diz que elle reveste realmente a fôrma de uma
convenção, porque funda-se no amor reciproco dos esposos,
que só estes pódem declarar, e com elle a sua vontade de uni
rem-se, e que só mediante esta declaração mutua c espontânea,
e em virtude d'ella, póde a sua união real e validamenlc elfec-
tuar-se.
A especialidade ou differença d’este contracto cm relação
aos mais, está em que, como já lemos dito, em qualquer outro
tanto depende do mutuo consenso dos contractantes a sua for
mação corno o seu acabamento, ao passo que a subsistência
(l aquelle depois de formado é uma consequência neccssaria de
sua propria celebração, e independente da liberdade dos que
o pontrabem ; e d’alii também as dillérenças que temos notado
em algumas de suas regras.
Nascem do matrimonio certas obrigações e direitos corre
lativos e fundamentaes entre os conjuges, já concernentes ás
suas pessoas, já aos seus bens, c já finalmente á sua autoridade
na familiu. ,1
Entre essas obrigações dos conjuges relativas as suas pes
soas. sobresalicm as que o Compendio indica no seu § 174
a saber: a de sua mutua fidelidade, o a de sua cohabitaçao.
Sendo o amor essencialmente exclusivo, sendo o fundamento
do matrimonio, e da ramifia, o laço que liga intimamenU os
dous conjuges n’essa unidade sublime, que segundo a expressão
i
LIOOAO XLVI
§§ 175 — 177
mas d'ulii imo resulta para estes uni poder, que leria de excr-
cer-se arbitrariamente solire tîllios já em idade de completo
desenvolvimento de razão, e no uso pleno de suas faculdades
moraes e intellectuaes. »
iNão é preciso, cerlamenle, grande esforço para compre-
bender se, quér a extincçào do poder parental pela maioridade
dos (lllios, mua vcz ipie esta faz cessar a sua vazão de ser, quér
a continuação do dever de amor e veneração filial além do mes
mo, uma vez que cila não rompe, nem pôde romper os laços
íiaturaes que em todo o sentido e em todo tempo ligam os paes
e os filhos. São cousas essas perfoilameute compatíveis, e qual
quer d’ellas indispensável, e imposta pela natureza. Tão in
concebível é essa rotura completa das relações liliaes e pater
nas ainda depois da emancipação dos filhos, como a continua
ção indefinida ou perpetua da sujeição d’este’ áquelles. Qual
quer d’eslas idéas é uma concepção irracional, e absurda.
Mas si da maioridade dos filhos resulta legitimnmente, em
regra, a emancipação d estes, não quer isto comtudo dizer, que
a simples idade, em que naturalmente se presume a sua capaci
dade de reger-se por si, importe ipso faclo, serem os mesmos
desligados do poder parental. A sua emancipação é, em todo
o caso, subordinada á sua real capacidade ; um idiota jamais
Sc emancipa, e o proprio filho que embora ern idade e condi
ções para isso, de facto continua sob o teclo e economia pa
terna, com razão é, ao menos pelo Direito Civil, considerado
sujeito áquelle poder.
O periodo da minoridade dos filhos divide-se commummente
e.m duas partes, o da impuberdade, e o da puberdade d’estes, as
quaes também só pelo Direito Positivo pódem ser precisamente
determinadas,; n’elle se conta, ordinariamente, o primeiro até
a idade dc 12 annos para o sexo femenino, cate aos l ! para
o masculino, e o segundo d’abi em diante.
Mas a tlifferença característica d’estas duas secções na idade
dos filhos será tal que. motorise a doutrina, que nos expende
o Compendio no seu citado § 182 e nota respectiva, de que não
lia sociedade entre os paes e os filhos cotnprehendidos na-pri-
meira, nias sómente com os que tenham entrado na segunda,
sob o lundamento de que os lilhôs durante a impuberdade não
pódem prestar o seu consentimento á mesma?
Não pensamos assim : e o proprio Compendio na parte
final d’aquella sua nota como que deslróe aquella razão, pois
declara, que sendo a sociedade parental urna sociedade neces
sária dispensa o.consenso dos púberes, quando estes não o pres
tam ou o recusam. Ora, si isto acontece até nos casos em que
Digitalizado pelo Projeto Memória Acadêmica da FDR - UFPE
su iigura esla recusa, não deve com mais razão dar-se quando
esta não se vcrilica jior impossível da parte dos impúberes ?
Mas n que é liquido é que o lillio menor, quer púbere quer
impúbere, não pôde prestar ou recusar o seu consentimento no
grêmio da família ã cousa alguma, e si para haver sociedade
parental fosse elle preciso, ou si não fosse esta tuna socie
dade independente d'elle, não existiria a mesma entre os paes
o, qualquer d’essas duas classes de lillios, desde que os proprios
púberes não lém capacidade jurídica para dal-o ou negal-o.
A sociedade parental existe, pois, quer com os lillios pú
beres, quer com os impúberes, os quaes de Direito são em tudo
iguaes; e existe com uns c outros, porque é cila tão necessária
a respeito de uns como de outros, e assenta respectivamente
a quaesqiier d’elles sobre os mesmos fundamentos. í?i os-im
púberes não lhe prestam a sua annueucia, porque o não púdciu
de facto, a natureza o snpprc ; e si os púberes rcalmçntn o re
cusam, lambem sem pmlel-o juridicamente, a mçsma natureza
os força. Voluntária ou não, livre ou obrigada, ha entre os paes
e os filhos, seja qual fôr a idade d’estes, a troca reciproca de
zelo e protecção dc uma parte, de respeito c obediência de
outra, de amor e oíílcios de toda a espeeie de ambas, en eom-
munhão.cm tudo o que constitue o laço e a vida da familin.
Si tudo isto assim disposto pela lei natural eque a própria
sensibilidade e a razão filial confirmam e adoptant, ou antes
exigem imperiosamente, não dá á união entre os paes e os filhos
um caracter perfeitamente social:'si para isto é necessário
o consentimento deliberado e expresso d’estes, então também
não é uma verdadeira sociedade o listado, a humanidade ainda
menos, e a propria união conjugal deixa de sel-o : pois que de
pois de formada não depende mais a sua existência «lo consen
timento dos conjuges. ,
Si o consentimento é, em geral, necessário para a mrinn-
ção e subsistência du uma sociedade; algumas lia, emntudo,
que por sua natureza e caracter o dispensam para esla ou para
aquella, porque são uma e outra consequências dc princípios
ou de instituições anteriores e superiores ã vontade dos que as
formam ; e a sociedade parental está n’esse caso, como uinco-
rollario natural da familia.
Esses authorcs; pois, que o Compendio cila na referida
nota e em cuja autoridade elle apoia a sua opinião, sustentam
uma’doutrina que não nos parece acceitavel, e isso por não le
rem na devida conta a natureza e cffeitos espeeines d aquella
sociedade, ou os da união conjugal.
-L IC 3 Ã C Z L - Z
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(31) Por necessidade da melhor dedu cçáo de nossas explicações
invertemos ainda a ordem dos paragraph os db Compendio n’esta licção.
que por oiilros molivos venham os pacs, conforme o figura
o Compendio no § 180, a achar-se em circuinstanciaa de não
poder,em exercel-o por si mesmos; casos em que, incontesta
velmente, devem elles 1er o direito de encarregar de seu exer
cício a outrem, que para isso julguem idonco, e em que con
fiem, a menos que o seu impedimento não seja de tal natureza
que para isso os inhabilité, segundo o Direito.
Cumpre, porém, imdagarmos si aquclla, faculdade dos
pacs deve ainda, ou do mesmo modo, caber-lhes por occasião
de sua morte, ou para fazer-se elfecliva depois d’esta, caso
a que o Compendio allude no seu citado paragrapho ; mas sem
discutir esta questão, que consiste em saber-se si por Direito
Natural são admissíveis a tutela e curatel a dos filhos instituídos
pelos paes por.acto de ulliina vontade, ou em icslamenlo.
Para nós que temos sustentado a faculdade de testar, e de
successáo legitima por aquelle Direito, a questão é simples e esta
implicitamente resolvida no sentido allirmatiyo ; para o Com
pendio, porém, que áquelle respeito pensa de outro modo, dr-
vèra ser a solução da mesma em sentido contrario ; e islo de
certo, o embaraçaria grandemente.
Com effeito, é difiicil negar-se a competência dos pacs
para aquelle fim, ou repellir-se do Direito Natural aquellas es
pécies de tutela e curatela, que são, sem duvida, as mais na-
turaes, as mais respeitáveis, e que antes de quuesqucr faclus
em contrario, se devem reputar as mais profícuas aos filhos ;
razões pelas quaes realínenle todas as legislações dos povos
mais adiantados não só as consagram, mas até dão-lhes deci
dida preferencia sobre as de qualquer outra origem.
Ü Compendio alludindo á morte do pae escapa á discussão
d’aquella questão figurando a sobrevivência da mão, á qual fã/,
passar o poder parental, o que na verdade, é justo ; assim como
que esse poder deve em todo ocaso compelira esta, quando
o pae é incerto.
.São, com efieilo, incontestáveis estes principies, e não só
os acceitamoB plenamenle, irms até niais adiante deduziremos
d’elles argumento contra a doutrina do mesmo Compêndio re
lativa á primasia, qúe elle attribue aos paes sobre as mães no
poder parenlal.
Depois dos limites d’este quanto ao tempo de sua duração,
temos de expôr os que sc referem á sua legitima extensão.
D'elles trata o Compendio no seu § 1811.
Estes limites derivam-se ainda, já em geral da propria na
tureza humana, origem primaria de todas as relações existentes
8 2 0
I
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se-llie os argumentos e considerações com que já refutamos,
ou reduzimos ás suas reaes proporções jurídicas, o supposto
império marital.
Foi também por uma idea errônea sobre as relações mu
tuas dos esposos e sobre os seus respectivos direitos na familia,
que as leis primitivas de lioma despojaram a mulher do poder
parental, c. não só a puzeram sob a tutela permanente do ma
rido, mas até sob o sou direito absoluto de vida e morte -, e que
ainda hoje na maior parte dos paizes do Oriente jaz a esposa
na inferioridade e na escravidão.
Nos codigos dos povos modernos mais adiantados, com
quanto ainda se attribua uma parte mais importante do poder
parental ao marido, com tudo é isso dentro de limites racio-
naes, e convenientes ficando sempre salva á esposa sobre os
filhos uma grande somma de autoridade que a natureza lhe
confere, que suas proprias funeções na familia exigem, e que
nenhuma legislação civil lhe pode recusar.
Segundo o Direito Natural, si dilïereuça existe no poder
parental entre o pae e a mãe, vem ella mais da desigualdade
(1’aquellas funeções dos mesmos, do quede desigualdade de sua
condição jurídica. .
Deve, por conseguinte a primasia cm tal poder. (|úe o Com
pendio confere ao marido ser entendida n’estes lermos -, o isto
tanto mais quanto elle proprio com razão estabeleceu, como
já vimos, no seu § 186, que morto o pae aquelle passa integral
mente á mãe, e que compele até exclusivamente a esta, quando
o pae é incerto ; o que importa reconhecer a natural capaci-
Vlade da mulher ou da esposa para o exercício do mesmo.
Si dos princípios que acabamos de expòr resulta a igual
dade jurídica dos conjuges na familia ; cdos mais que anteriòr-
mçnte temos exposto, deduz-se a cojnmunhãó familiar entre
elles e os filhos -, deduz-se ainda para estes, de uns e outros,
não só o direito de successão legitima, e todos os mais corre
lativos ás obrigações paternas, que já precedentemenle temos
demonstrado, mas também a igualdade jurídica dos mesmos
filhos em todos os sentidos, e especialmente em relação á par
tilha dos bens de seus paes por morte d’estes, salvos os efTeitos
da faculdade de testar livremente sobre alguma parto limitada
d’aquelles qne a lei social julgue justo conceder-lhes.
Não ba, de certo, razão para admittir-se, e são evidente
mente contrarias á natureza e á igualdade da familia, certas
instituições anômalas, que caracterisam as legislaçães da maior
parte dos povos antigos, que são ainda as dc alguns semi-har-
baros, e de que notam-se até vestígios nos codigos ou costumes
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I
550
de succéder a seu pa& ou mâe nos bons (|uo a estes forem pro-
prios; mas não o de concorrer coin os llllios legítimos nascidos
do matrimonio posterior de qualquer d’aquelles, na successào
dos bens que devem constituir o património da familia por elle
formada.
■Outra questão não menos importante nasce d’acjuella, tal
é a de saber-se, si a qualidade de Gllio da espeeic a que nos re
ferimos depende do reconhecimenlo voluntário de seu pae ou
ináe, ou si lhe compele igualmente o direito de proval-u ém
falta d’isso ou contra a vAntade de qualquer d’estes.
Si o direito que atlribuimos a taes filhos é real e lhes vòm
da nalnreza, como pensamos, parece--nos indubitável que lhes
devo pertencer também, como condição de sua realidade, o de
demonslralrO mesmo n’estes últimos casos, e quér se trate de
patéhiidade, quér de maternidade. Si quanto a esta não se of-
ferece grande duvida á applicaçáò de tal direito, quanto úquella
não nos parece sufiicientc a razão que de ordinário se lhe op-
põe, das inconveniências ou escândalos a que podem dar lugar
as pesquizas e revelações que isso importe. Por mais atlendi-
vel que tal nllegação seja, não pódc, em todo o caso, justificar
o sacrjficiu de um direito nutural.
Km somma, perante a natureza, e por conseguinte perante
o Direito Natural, os filhos a que «Iludimos tanto o são como
os legítimos; e si não se póde dizer que a sua condição juridica
c a mesma d’estes quando em concurso com elles, ou quanto
a certas relações que só pódem nascer da familia constituída
pelo matrimonio, com tudo incontestavelmente o é quanto
a todas ns.mais a que, e até onde pódem ser applicaveis os di
reitos e obrigações naluracs entre paes e filhos, e particular
mente a respeito da suecessão «Postes nos bens d’aquelles, com
a restricção que acima indicámos.
Quanto á matéria ao § 187, diremos apenas, que não con
sideramos os criados ou fâmulos como membros da familia;
que são elles ahi figuras muito secundarias, e nem se póde dizer
fine haja entre elíes e esta um fini còmrmun, mesmo esse lim
remoto de que nos falia o Compendio. Não é, de certo, o bem
da tumilia que o criado tem em vista quando lhe aluga os seus
serviços ; nem é esse o interesse que ahi o leva ou retém, mas
o percebimento de seu salarie. Nenhuma parte, em summa,
tem elle, propriamente, na sociedade familiar onde existe ; outro
e de diversa natureza é o pacto que o liga a familia.
/
N
71
REATA
PAG. LINH AS KlltlOS KMRJfUAS
/
0 nenhuma
12 nem uma
11 3 porém (siippriwa-ffí)
11 12 moral: moral, ou politipo ;
J1 42 ante a luz antes á luz
19 3 qíie acçào que a acção
25 5 e S. cada familia cada sociedade ou famí
lia ' ■
35 15 legislador legista
55 20 restrictas reslrictivas
92 3 naquella 11’aquglle
93 18 caridade, caridade, (c accrcsccn•
le.-sc) I'ara 0 cliristão
deve ser isto tanto
mais evidente quanto
70 10 no § 29 nos §§ 42 0 seguintes
71 2 §§2 1 —22 §§ 25 — 33
80 5 conjecturas eonjuncturas
84 2 § § 39—83 §§ 39 — 38
94 1 5 realmenle relativamente
97 27 condicções a'que condições que
102 7 ullius nullius
117 22 mas mais
122 20 conseguil-a conseguil-o ,
123 35 em os seus sem os seus *
141 23
142
e j condomino condomínio
174 39 séria severa,
184 9 suas sua
215 8 cousa causa
\
p a í ;. l in iu s KIII)os EMENDAS
/,
PAG. LINHAS EIÎHOS EMENDA?
4
DAS
PACS.
frologo............................................................................. v
PAUS.
I.icçÃo xxxix. — §§ 1 49 i 50. — Continuação: 2." do
direito de successãn legitima............ ................... 257
I icção xo. — §§ 149 150. — Continuação: do direito
de successão legitima ; conciliarão do mesmo corn
o direito de testar............................................................. 264
P A R R T E II
d ir e ito p r iv a d o s o c ia l
• ■ . '
I.icçÃo xli. — §§ 151 — 159. — Sociedade; diversas
especies d’esla : princípios grraes que as regulam ;
direitos e obrigações fundnmentaes internas so-
c ia e s ; direito da sociedade de estabelecer suas leis
ou regras..................................... .......................... 271
I.icçÃo xi.ii. — §§ 159 — i6G. — Çontinuação : do di
reito da sociedade de estabelecer suas leis ou re
- gras; do modo de sua deliberação ; direito de as
fazer observar; do império, e seus caracteres........ 278
Cicção xi.tii.— §§ 167 — 169. - Dos limiteà do impé
rio. — Direitos sociaes externos. — Modo porque
acabam as sociedades...................................................... 285