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“Res Furtiva”

I– Por sua extraordinária concisão e majestade, a língua latina foi a


que preferiram os velhos autores para difundir suas obras jurídicas e
literárias. Nela foi também que se perpetuaram os aforismos de
Direito.
Ainda hoje, nenhum livro jurídico se edita, que não contenha
frases ou locuções próprias da língua de Cícero.
E nada há que alegar contra esse costume, exceto quando as
citações, por mui frequentes e copiosas, venham a prejudicar a
primeira qualidade de quem escreve — a clareza —, ou a ferir o
preceito legal que obriga ao uso de nosso idioma vernáculo nas
petições, sentenças e arrazoados forenses(1).
É certo que isso de alguém pejar de latinismos um texto escrito
em linguagem inculca para logo pedantaria; será por igual fazer tábua
rasa do brocardo de que todo excesso desvirtua, o que a antiguidade
clássica resumia na parêmia: “Est modus in rebus”.
Mas, desde que venha a ponto a expressão latina e se empregue
com parcimônia, tem lá sua graça e vale por excelente recurso de
estilo.
Onde todo escritor deve extremar-se em desvelo é no guardar
fidelidade ao elemento gráfico ou material das expressões latinas de
que acerte utilizar-se. Tal advertência fizeram-na sempre os mestres,
como a prevenir não se pusessem a circular moedas falsas ao lado das
verdadeiras, de ouro de puríssimo quilate.

II – A leitura (de livros jurídicos, profanos e de autos de processo)


tem-nos deparado ocasião de anotar certas faltas em que geralmente
caímos os que escrevemos, por dever do ofício ou por mero prazer
intelectual.
A primeira lição para os que se proponham adornar suas
páginas literárias com as flores do Lácio é não acentuar graficamente a
vogal tônica das palavras. Por exemplo: “data maxima venia” (e não “data
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máxima vênia”), “ex officio” (e não “ex offício”), “ad judicia” (e não “ad
judícia”), “in dubio pro reo” (e não “in dúbio pro réo”), “in limine” (e não “in
límine”), etc.
Outra regra, muito para observar quando se escreverem
vocábulos latinos, é a que manda abolir o hífen (ou traço-de-união),
que o não há em latim: “habeas corpus” (e não “habeas-corpus”), “ex positis”,
“lato sensu”, “stricto sensu”, “ab initio”, “ex vi legis”, etc.
Algumas vozes, de uso corrente na linguagem do foro,
aparecem muitas vezes estropiadas: “mellius” (por “melius”, com um “l”
só), “oportuno tempore” (por “opportuno tempore”, com dois “pês”), “in
memorian” (por “in memoriam”, com “m”), “animus caluniandi” (por “animus
calumniandi”, com “mn”), etc.
Tem-se visto a fórmula “rei furtivae” como se o plural de “res
furtiva”(2). Trata-se de engano; o certo é, no plural, “res furtivae” (coisas
subtraídas: furtadas ou roubadas).

III – Ainda se reputem simples erros de impressão, máculas a que


livro algum está imune(3), tais inexatidões costumam abater o
esplendor que circunda a edição de certos livros.
A expressão “reformatio in mellius” (em vez de “melius”, com um
“l”), topamo-la em Damásio E. de Jesus (Código de Processo Penal Anotado,
1996, 17a. ed., p. 423); “animus caluniandi” (em vez de “calumniandi”), em
Celso Delmanto (“in memoriam”) e Roberto Delmanto (Código Penal
Comentado, 5a. ed., p. 276).
Foi muito de estudo que nomeamos estes egrégios autores. Suas
obras são as que, na atualidade, sobre todas, granjeiam a afeição dos
cultores do Direito Processual Penal e do Direito Penal. Levem-nos
pois à paciência os tenhamos individuado, que a seus prestantíssimos
livros quadram estas elegantes palavras de nosso Matias Aires: “Nas
sombras não há que distinguir, na luz qualquer alteração é reparável”(4).
Mas, dado o caso que houvera aí mais que toscanejos de
revisores, “ad argumentandum tantum”, facilmente os confortara a
cláusula escusativa universal: “Errare humanum est”.
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“Vale”!

Notas

(1) Em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso do


vernáculo (art. 156 do Cód. Proc. Civil). Cai a lanço o episódio que
narra Moura Bittencourt: “Conta-se, por exemplo, com verdade ou
malícia, que certo tribunal devia manifestar-se sobre a sentença de um
magistrado inferior. Estava ela vazada em muitas páginas, nas quais
havia mais citações em alemão do que considerações em português. Não
era possível criticar-se o acerto da fundamentação. Dizem que a Corte não
encontrou outra saída senão converter o julgamento em diligência para
que o juiz traduzisse seu escrito” (O Juiz, 1966, p. 292).
(2) E pois que falamos da “res furtiva” e das “res furtivae”, será bem
dizer algo do autor do furto: o ladrão. Chamou-lhe Plauto “homo
trium litterarum”. Em vulgar: homem das três letras, porque tantas
são, em latim, as de “fur”, que significa ladrão (Cf. Arthur
Rezende, Frases e Curiosidades Latinas, 1955, p. 283). Larápio,
sinônimo de ladrão, esse conta com etimologia curiosa, a
fiarmo-nos da seguinte notícia que traz o citado autor: “Dizem
ter existido em Roma um pretor venal, cujas sentenças eram sempre a
favor do litigante que melhor pagava. Chamava-se Lucius Antonius
Ruffus Appius, e sua rubrica era: L.A.R. Appius. O povo o chamava
Larappius, palavra que se tornou sinônimo de gatuno” (Idem, ibidem, p.
358).
(3) De que seja o erro partilha comum dos mortais prova-o que
farte a anedota daquele revisor, profissional exímio, o qual
passou ano inteiro a corrigir as provas de certo livro que, ao
cabo, saiu à luz com o aviso: “Este livro não contém erata”.
(“Transeat!”).
(4) Reflexões sobre a Vaidade dos Homens, 1752, p. 156.

Carlos Biasotti
Desembargador aposentado do TJSP e ex-presidente da Acrimesp

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