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Coming Attractions

Série Katie 3
Robin Jones Gunn
Importante
Este livro foi traduzido e digitalizado com o único objetivo de proporcionar literatura
cristã de qualidade para os leitores. É proibida a reprodução deste conteúdo com fins
lucrativos.

Esperamos que todos os que foram abençoados por este livro venham adquiri-lo tão
logo seja publicado oficialmente no Brasil.

Tenham uma boa leitura e que o Senhor os abençoe.


Capítulo 1
Katie checou o horário no seu celular e colocou o capuz de sua blusa sobre seu
cabelo ruivo dançante. A parte mais alta da Universidade Rancho Corona poderia ser
surpreendentemente fria nessa época do ano. Especialmente quando os ventos
chegavam.

Vamos lá, Rick. Onde você tá? Demais essa sua idéia romântica de se encontrar
aqui às nove. São 9:15, e eu estou congelando.

Digitando uma terceira mensagem de texto para seu alto, moreno, e atrasado
namorado, Katie apertou Enviar e olhou a sua volta. Outro casal tinha se aconchegado
confortavelmente no banco onde Rick tinha combinado de se encontrar com Katie. Ela
ficou em pé ao lado do banco, debaixo da fileira de palmeiras dançantes. Até mesmo
seus decorativos pisca-piscas de luzes brancas pareciam estar tremendo com o vento
frio.

Katie tossiu. Sua garganta estava doendo mais do que quando ela estava jantando
na cafeteria, onde ela encheu sua tigela com sopa, molho de maçã e dois copos de
suco de laranja.

Eu não consigo Rick, você vai ter que vir ao meu dormitório se quiser me ver hoje à
noite. Está muito frio aqui fora.

Começando a caminhar de volta para a parte mais baixa do campus, Katie mandou
outra mensagem para Rick enquanto caminhava. Não era típico de Rick deixá-la
esperando, e muito menos não responder suas mensagens. Ele era organizado e
eficiente e...

O celular dela tocou.

- Ei, não fique brava. A voz de Rick saiu alta. Dava pra perceber que ele estava no
viva-voz, o que significava que ele estava em seu novo carro. Eu deixei meu telefone
no café e tive que voltar pra buscá-lo. Eu estou na estrada agora. Sinto muito, Katie. Eu
consigo chegar aí em meia hora.

Katie ignorou o pedido de desculpa. Ela tinha ouvido um pouco demais daquelas
desculpas ultimamente. Três meses atrás Rick e seu irmão foram presenteados com a
oportunidade de abrir não um, mas dois novos cafés. Desde então, Rick tem estado
"na estrada."

- Vamos remarcar pra outro dia, Rick. Eu estou...

- Não, não podemos remarcar. É dia dos namorados!


Ah, jura? Ela teria expandido seu sarcasmo, mas sua cabeça estava latejando.
Como é que um pequeno desconforto na sua garganta podia aumentar tão rápido a
ponto de fazê-la sentir como se estivesse engolindo um punhado de lâminas?

A voz dele "amaciou":

- Eu tenho uma coisa pra você.

- Eu já recebi as flores. Elas são lindas. Obrigada, Rick. Você realmente não precisa
me dar mais nada.

Katie estava sentindo um desconforto familiar em relação ao desequilíbrio no


quesito presentear que existia no relacionamento deles desde que eles oficialmente
começaram a namorar no verão passado. Rick gostava de presentear. Katie também. O
problema era que ela raramente conseguia mostrar sua afeição através de presentes,
já Rick sim. Ela se sentia infinitamente atrás no departamento dos presentes.

- Eu quero te dar o presente essa noite. Por favor, Katie. Não fique brava comigo.
Eu estou me esforçando.

- Eu não estou brava. Sério. Eu não me sinto bem. Estava muito frio e ventando
muito lá em cima no campus, por isso eu estou voltando pro meu quarto. Além do
mais, outro casal estava no nosso banco.

- Isso não é problema. Você já está no dormitório? Eu te encontro lá. A gente pode
ir comer alguma coisa.

Katie sabia que era melhor não argumentar com Rick quando ele tinha sua cabeça
feita em relação a algo, ela passou o celular para a outra orelha e disse:

- Eu realmente não estou com fome. Eu acho que estou gripada.

- Ouça, eu consigo chegar aí em quinze minutos. Vinte no máximo. Tome alguns


comprimidos pra resfriado e beba um pouco de suco de laranja. Eu subo até o Crown
Hall e te ligo quando eu chegar ao estacionamento. Daí a gente decide o que faz.

Katie desligou, já sabendo o que ela iria querer fazer quando ele ligasse mais
tarde. Seria a mesma coisa que ela queria fazer agora: se enrolar num cobertor
quentinho e dormir.

Mais da metade das meninas do seu andar tinham sido acometidas, nesse ano,
com essa variação da gripe.1 Alguns dias atrás Katie tinha falado sobre como sua tática
de prevenção tinha funcionado esse ano. Ela passara as três últimas semanas bebendo

1
Olha a gripe suína, minhas genteeeees.
porções de chás de erva e ingerindo bastante vitamina C. Seu sistema imunológico
estava protegido contra o ataque.

Pelo menos, ela achou que estava. O jeito como ela se sentia agora estava forte
demais pra que qualquer xícara de chá pudesse consertar. E ela estava incomodada
com o fato de que Rick não podia deixá-la ficar doente em paz.

Quando ela entrou no Crown Hall, ela evitou olhar para qualquer casal sentado no
lobby e foi em direção ao quarto de Nicole. Sua amiga Nicole era a outra assistente dos
residentes que dividia com Katie a responsabilidade de zelar pelo bem-estar das
cinquenta e quatro estudantes no andar delas. Katie sabia que ela iria precisar de
alguém para cobrir suas horas caso o vírus ficasse de vez no seu corpo.

Batendo na porta semicerrada de Nicole, Katie empurrou-a e anunciou:

- Adivinha o que eu ganhei?

- Oh! Então você ganhou? Deixa eu ver! Nicole pulou em direção a Katie.

- O que você está fazendo? Katie se afastou. Eu ganhei uma gripe. E eu não acho
que você queira ficar perto de mim.

- Oh! Pega de surpresa, Nicole congelou. Ela, nervosamente, colocou seu cabelo
escuro atrás da orelha enquanto seu rosto foi ficando rosado.

- Qual o problema?

- Nada não. Nicole voltou pra sua cama, do outro lado do quarto. Eu só... Ei, sinto
muito por ouvir que você não está se sentindo bem.

- Não tanto quanto eu sinto. Por quanto tempo você ficou gripada?

- Quase duas semanas.

- Eu não posso ficar doente esse tempo todo.

- Se Deus quiser você não vai ficar.

- É, se Deus quiser. Você pode cobrir meu horário pra mim amanhã às 2:30?

- Claro. Nicole estava sentada, tentando mandar pra longe o olhar ‘leia-nas-
entrelinhas’ que estivera em seu rosto minutos antes.

- Tem certeza que você está bem?

- Eu? Sim, estou bem. Espero que você melhore.

Katie concordou com a cabeça lentamente e saiu. Seu quarto no fim do corredor
parecia estar a quilômetros de distância.
Apesar de ser noite "open-dorm"2, a fila de portas fechadas parecia indicar que a
maioria das mulheres no Crown Hall tinha saído aquela noite. Ou isso ou elas estavam
confinadas assistindo filmes românticos com suas companheiras de quarto e dizendo
umas as outras que o próximo Dia dos Namorados seria diferente pra elas. Elas teriam
algum lugar pra ir e alguém maravilhoso para ir com elas.

Ou muitas deles poderiam estar convalescendo com essa mesma gripe.

Katie parou em frente ao Mural do Beijo que estava de frente para seu quarto. O
mural tinha sido decorado no começo do ano letivo com uma linda variedade de fotos
de beijos inocentes. Juntamente com as fotos havia versículos e poemas daquela
expressão que traz esperança ao coração de toda mulher independente da sua idade -
um beijo.

Katie destrancou a porta de seu quarto e pensou em como, por tantos anos, ela
tinha esperado e sonhado em ter um relacionamento com um homem que a trouxesse
flores e a beijasse no Dia dos Namorados. Agora ela tinha exatamente o que ela
desejara. Mas não era exatamente como ela pensou que seria.

As coisas com Rick estavam tranquilas. Melhor que tranquilas. As coisas estavam
boas. Tinham estado boas por meses. No Natal Rick e Katie concordaram em deixar o
relacionamento deles seguir seu curso no último semestre de Katie na faculdade. Uma
vez que ela se formasse, ambos estariam mais seguros para descobrir as respostas
para perguntas como "E agora?". Por enquanto, eles concordaram que estavam
contentes com o status deles de "Felizes-quase-pra-sempre".

Katie mergulhou em sua cama desarrumada e soltou um resmungo de


autocomiseração. Um pensamento flutuou em seu nublado cérebro. Com o que Nicole
estava tão empolgada?

Puxando seu celular do bolso de sua blusa de frio, ela continuou deitada em sua
cama e ligou para Nicole.

- Então, o que você sabe que eu não sei?

- O que eu sei sobre o quê? A voz de Nicole estava alta.

Katie notou o nervosismo dela.

- Por que você pulou pra cima de mim quando eu entrei no seu quarto?

Silêncio.

- Nicole, por favor. Você disse, 'Deixa eu ver'. Ver o quê? O que eu deveria ter?

2
Open-dorm; noite em que se poderia receber visita de pessoas de fora no dormitório.
- Katie, eu pensei que você e Rick tinham saído pra jantar hoje à noite e...

- Não, eu não o vi hora nenhuma hoje.

- Não?

- Não.

- Mas é Dia dos Namorados.

- Ah, jura? Eu nem tinha percebido. Katie tossiu.

- Você realmente está mal.

- Não mude de assunto, Nicole. Você sabe alguma coisa. Eu sei que você sabe.

Durante os dois últimos meses, Nicole esteve com a mãe de Rick, trabalhando na
decoração dos cafés. Como resultado, Nicole normalmente sabia mais do que estava
acontecendo com Rick do que a própria Katie.

- Nicole, me conte. Por favor.

- Ai, Katie. Eu tô me sentindo péssima!

- Você está se sentindo péssima? Sou eu que estou doente aqui.

- Eu não posso dizer nada. Não posso mesmo. Desculpa.

Uma pausa se seguiu até que Katie arregalou os olhos e levantou a cabeça.

- Não me diga que é um anel. Sério, Nicole. Não me diga que Rick comprou um
anel pra mim. A tosse começou de novo.

- Katie, eu...

- Um anel de noivado? Katie lentamente ajustou sua postura. Ele me comprou um


anel de noivado? Você tem que me contar Nicole. Ele comprou?

Silêncio.

Katie mergulhou de novo na cama.

- Ele me comprou um anel, não foi? Eu não acredito. Por que ele faria isso?

- Katie, não é... você só... ah, que horrível!

- Conte-me tudo.

- Apenas espere até vocês se verem. Tudo vai fazer sentido.


- É, eu poderia fazer isso. Ou você poderia me contar tudo que você sabe agora
mesmo e acabar com esse suspense. Você sabe como eu odeio surpresas. Só me conte
Nicole. A gente faz disso nosso pequeno segredo.

Antes mesmo de Nicole responder, Katie sabia que sua amiga nunca concordaria
com tal aliança. Nicole era pura demais de coração e muito bem educada em seus
princípios de integridade. Entretanto, Katie estava incomodada com o fato de que
Nicole tinha uma aliança nisso tudo. Nicole compartilhava um segredo com Rick e com
a mãe dele, algo que Katie não podia dizer que já experimentara.

- De verdade, Katie, você vai ficar feliz por eu não ter dito nada. Apenas espere.
Tudo vai fazer sentido quando você ver o Rick.

Se Katie não estivesse se sentindo tão péssima, ela teria continuado com a
conversa até que ela pudesse obter, pelo menos, algumas dicas de Nicole. Ao invés
disso, ela desistiu e desligou. Olhando para o teto, ela tossiu novamente.

Rick Doyle, você não estava planejando me pedir em casamento no Dia dos
Namorados. Quero dizer, fala sério, Rick. Dia dos Namorados? O que aconteceu com o
"vamos esperar até eu me formar pra decidirmos o que vamos fazer?" E se eu não
gostar do anel que você escolheu? Alguma vez, você já pensou nisso? Você
provavelmente comprou um diamante enorme, e eu não quero...

O celular dela tocou. Ela achou que o toque era o mesmo que ela tinha escolhido
pra Nicole, então ela respondeu com um...

- Mudou de idéia, hein? Fale rápido porque eu estou morrendo aqui.

- Você recebeu?

Ela afastou o telefone do ouvido e viu na tela o nome do companheiro de quarto


de Rick, Eli. Katie tinha esquecido que ela mudara o toque dele também. Ela teria que
mudar de novo. Era muito parecido com o de Nicole.

- Você recebeu?

- Recebi o quê? Ela perguntou impacientemente. O anel? Você também tá nessa?


Nicole não me deu nenhum detalhe, então vá em frente. Bota tudo pra fora. Eu
prometo que vou fazer cara de surpresa.

- Eu não faço idéia do que você está falando. Eu tô ligando pra saber se você
recebeu o email do meu pai com as notícias do Quênia.

Uma das coisas que Katie admirava em Eli era a discrição dele. Ele não ter falado
nada sobre os comentários dela com relação ao anel era algo típico dele. Se ele
soubesse algum detalhe, ele certamente não diria nadinha a Katie ou a qualquer outra
pessoa se Rick o tivesse pedido pra não contar.

Nos últimos meses, Katie e Eli estiveram trabalhando num levantamento de


fundos em prol de água limpa para a África. O pai de Eli cuidava de tudo em Nairobi e
mantinha Katie informada de como o dinheiro estava sendo distribuído. Durante a
correspondência entre os três, Katie começara a apreciar a determinação de Eli. Ele era
muito parecido com Rick nesse aspecto. Tirando o fato de que, com Eli, Katie não
sentia o mesmo tipo de agressividade que estava agarrado ao temperamento de Rick.

- A última vez que chequei meu email hoje foi pela manhã. Eu tô doente, Eli. Estou
gripada.

- Você já tomou alguma coisa?

- Não. Bem, chá e porção extra de vitamina C por um mês, mas acho que não foi
suficiente.

- Sua garganta está doendo?

- Sim.

- Febre?

- Sim, Dr. Eli. Eu tenho todos os usuais sintomas. Eu preciso dormir um pouco. Eu
tenho que responder o email hoje à noite, ou posso esperar até amanhã?

- Você não tem que responder. São boas notícias. Meu pai conseguiu acertar os
últimos detalhes para os poços no Sudão. Nós não vamos precisar levantar mais
dinheiro. O processo já pode começar semana que vem.

- Que ótima notícia.

- Eu vou deixar você dormir.

- É, dormir vai me fazer bem. Minha cabeça tá parecendo uma bola de boliche.

- Se cuida, Katie.

- Tá bom. Ela fechou o telefone e fechou os olhos.

O Bom e velho Eli. Nove meses atrás, quando ela o viu pela primeira vez no
casamento de sua melhor amiga, Katie o achou estranho e o nomeou "Cara do
Cavanhaque." O seu jeito intenso de encarar as pessoas a dava nos nervos. Então, Eli
se mudou para o apartamento de Rick, e agora ela o considerava um de seus amigos
mais próximos. Ela sentiria saudades dele quando ele se mudasse de volta para o
Quênia depois da formatura deles.
Eli cresceu na África, onde seus pais eram missionários. Em alguns aspectos, Katie
achava que ele nunca conseguiu trazer todo seu coração para a Califórnia quando ele
veio para a Rancho Corona a fim de terminar seus estudos. Parte dele parecia estar
sempre em algum outro lugar. No safári, talvez.

Katie pressionou sua mão aberta em sua garganta e tentou descobrir se ela estava
inchada. Ela rolou de um lado pro outro pra ver se conseguia achar uma posição mais
confortável. Vestir seu pijama ajudaria a ficar mais confortável, mas ela não queria se
levantar.

Eu odeio ficar doente.

Seu celular tocou de novo. Dessa vez era Rick. Numa voz "meiga", ele tentou
coagi-la a encontrá-lo no estacionamento para que eles pudessem sair pra comer.

- Eu estarei aí no campus em cinco minutos, Katie. Nós vamos algum lugar que
serve sopa. Sopa de galinha. O que você acha?

- Rick, sério, eu... estou... doente. De verdade.

- Então vou até aí te ver. É 'open-dorm' hoje à noite, não é?

- Rick, você estará se expondo a alguém que é uma gripe ambulante, zumbindo
como vivas e virais abelhas da gripe.

Ele riu.

- Você não pode estar tão doente. Você ainda está engraçada.

- Eu não estou engraçada, Rick. Eu estou tossindo, e espirrando e... bem, ainda não
estou espirrando, mas eu sinto que vou espirrar.

- Katie, docinho...

- Docinho?

Rick nunca a tinha chamado de "docinho" antes. Pelo menos não que ela
lembrasse. Era uma tentativa de brincar com o comentário dela sobre abelhas virais?

Ele ignorou a pergunta dela e continuou:

- Ouça, eu não me importo se você está doente. Eu quero te ver assim mesmo. Eu
tenho algo pra te dar, e estou determinado a te dar isso hoje à noite.

- Bem, eu tenho algo que eu poderia te dar, e eu estou determinada a não te dar
isso hoje à noite. Se chama duas semanas de confinamento, Rick. Esse é o pior
momento pra você...
Ela quase disse "me pedir em casamento", mas ele a interrompeu. Sua voz saiu
alta e firme:

- Katie, eu vou aí te ver. Eu estarei aí em quatro minutos, cinco no máximo. Por


que você não faz um gargarejo ou toma algum xarope pra tosse ou algo do tipo? Eu
estou chegando, então abra a janela e deixe que todas as abelhas bacterianas saiam.
Ou o que quer que você as tenha chamado. Abelhas virais. Não importa. Eu estou
quase aí.

Ele desligou. Katie continuou olhando pro telefone.

Abra a janela? Gargarejar? Ele realmente disse essas coisas pra mim?

Ela não conseguia se mexer. Sua cabeça de cinquenta quilos parecia que tinha se
enfiado permanentemente em sua fronha da Pequena Sereia.

Rick, o que você está fazendo? Se você entrar aqui e me pedir em casamento, você
vai arruinar com tudo.
Capítulo 2
Katie conseguira lidar com uma variedade de desafios na vida, mas esse dilema a
estava incomodando. Se Rick entrasse em seu quarto, se ajoelhasse, e segurasse para
o alto uma caixa de jóia, o que ela iria dizer? Qual seria sua resposta sincera, vinda do
fundo de seu coração? Ela não sabia.

Desde os tempos de escola Katie sonhara em estar com o Rick. Quando ele a
convidou pra sair há quase um ano e meio atrás, Katie ousou acreditar que seu sonho
se tornara realidade. Tudo que ela sempre quis era ser a namorada de Rick Doyle.
Agora que esse sonho tinha se tornado real, casar com Rick era o próximo sonho.

Só que nesse momento, com sua cabeça latejando, Katie não se sentia pronta pra
esse sonho. Eles deveriam esperar até que ela se formasse. Foi o que eles
combinaram. Tudo que restava eram doze semanas de aula. Doze semanas de aula e
sua mente estaria livre pra pensar sobre o que viria em seguida e quando e como e
onde ela e Rick poderiam se casar.

Ela não estava pronta pra pensar em nada disso agora. Ano passado ela assistiu
sua companheira de quarto e melhor amiga, Cris, percorrer seu último semestre
depois de ter ficado noiva, e Katie sabia que ela não queria colocar aquele tipo de
pressão sobre si mesma. Não com sua exigente posição de assistente dos residentes.
Não com a quantidade de aulas desse último semestre. E especialmente não com essa
horrível gripe que a estava derrubando.

Uma batida soou na porta.

- Vá embora. Aqui é a casa da febre amarela. Entrou, morreu.

Rick, ou quem quer que fosse, ignorou o aviso dela, abriu a porta vagarosamente,
e fez uns barulhos meio abafados.

Katie abriu os olhos e virou sua cabeça em direção à porta.

- Eli?

Ele segurava uma sacola de papel.

- Eu comprei algumas coisas para sua gripe. Eu vou deixar aqui em cima da sua
cômoda.

- Não, traz aqui. Ela levantou sua mão fracamente, como uma princesa pedindo
ajuda.

Eli não hesitou. Ele caminhou pelo quarto e tirou o vidro de remédio da sacola.
- Você já tomou desse antes? Você só tem que abrir a boca, apontar o spray pra
sua garganta e borrifar três ou quatro vezes.

Katie pegou o vidro da mão de Eli e cuidadosamente seguiu as instruções dele.

- Hmm. Cereja. Ela borrifou mais uma vez. Obrigada, Eli.

Ele tirou uma caixa de comprimidos para gripe da sacola.

- Esses, eu acho que você tem que tomar só um. Ele passou o olho no verso da
caixa enquanto a abria. É, um a cada quatro horas. E não opere máquinas pesadas.

- Não vou esquecer isso. Katie pegou o comprimido de Eli e engoliu-o, usando mais
duas borrifadas do xarope ao invés de água.

- Aqui. Eli tirou o último item da sacola. Uma garrafa de água de forma peculiar.

- Ei, minha preferida! Como você sabia que eu gosto de água glacial da Nova
Zelândia?

- Eu só vejo você comprar dessa no posto de gasolina que o Joseph trabalha. Eu


comprei duas garrafas. Onde você quer que eu coloque a outra?

- Na minha mesa, perto das flores. Você vai ter que arredar as flores. Elas são um
pouco demais, você não acha? Eu vivo falando com o Rick que ele exagera nas flores.
Uma única papoula. É o que eu falo pra ele. Uma única papoula é tudo que eu preciso.
Talvez você consiga convencê-lo disso.

Eli não comentou. Ele virou para Katie e ela sorriu pra ele.

Seu bagunçado e naturalmente castanho e cacheado cabelo vinha crescendo


desproporcionalmente pelos últimos meses e o fazia parecer mais com o aventureiro
rapaz que Katie tinha descoberto que ele era. No começo do ano ele manteve seu
cabelo curto e suas conversas com ela curtas. Curtas e estranhas de um jeito bem
particular.

Assim que Katie conheceu Eli, ela percebeu que a única coisa curta nele era o
nome. E até isso era maior do que ele permitia que os outros o chamassem. Elias Tiago
Lorenzo cresceu num campo missionário na África e escondia uma biblioteca de
histórias incontadas sob um comportamento acima de qualquer suspeita. Histórias
sobre andar a espreita de leões, lanças feitas à mão, e danças em volta de fogueiras
tribais. Ele vestia um uniforme cinza na maior parte do tempo, como agora por
exemplo. Seu trabalho de segurança no campus era gastar horas dirigindo um velho
carro de golfe pelo planalto onde a Rancho Corona foi construída. Eli pegava os
horários que ninguém mais queria.
Se Katie tivesse algo de que se arrepender nos últimos meses, seria o fato de que
seus consistentes esforços em juntar Eli e Nicole tinham falhado. Katie não podia
entender por que. Ela achava Nicole maravilhosa. Ela achava Eli fantástico. Por que os
dois não viam um no outro o que ela via neles?

- Eu vou indo. Eli aproximou-se da cama de Katie, fechou os olhos e levantou


ambas as mãos.

- O que você está fazendo? Encenando uma cena do Rei Leão?

- Shhh. Eu estou orando por você.

- Orando por mim? Ok, claro, contanto que não seja como nos filmes onde eles
dão a extrema unção aos pacientes moribundos.

Ele não respondeu. Ao invés disso, com as palmas das mãos para os céus, como
uma criança que tenta alcançar algo, ele falou com uma voz calma e constante,
pedindo a Deus que curasse Katie, que a confortasse, que desse ao corpo dela a força
de que ela precisava.

Katie foi tão pega de surpresa pela atitude de Eli que não fechou os olhos. Pelo
contrário, ela ficou olhando o rosto dele, sentindo seu atribulado espírito se acalmar
enquanto ele orava. Parecia que ele sentia cada palavra antes de falá-la. Ele não estava
só repetindo um monte de frases. Ele estava mesmo falando com seu Pai celestial, e o
que ele estava dizendo soava exatamente como se alguém estivesse pedindo seu mui
estimado amigo por um favor especial.

A garganta de Katie apertou. Não por causa do inchaço provocado pelo vírus. Esse
aperto veio de lágrimas que foram “inchando” antes de chegarem a seus olhos. Ela não
lembrava a última vez que tinha orado com aquele mesmo tipo de proximidade de
Deus. Ela sabia o que era ter intimidade com Cristo, mas só agora ela percebeu o como
ela tinha estado longe dessa intimidade nos últimos meses. Aqui estava ela, à beira da
graduação numa faculdade cristã; ainda assim, se ela tivesse que dar uma nota para
seu relacionamento com o Senhor numa escala de zero a dez, ela daria um dois. Talvez
dois e meio.

Pegando carona no “amém” de Eli, Katie adicionou seu “obrigada” com uma voz
calma.

Eli balançou a cabeça concordando de um jeito humilde e começou a se preparar


pra sair, mas Katie ergueu sua mão. Não no estilo princesa, mas como uma amiga
erguendo a mão para apertar a mão de outro amigo. Eli parou e desajeitadamente
pegou a mão dela e deu um leve aperto de consolo. Ela nunca tinha percebido as mãos
ásperas, de carpinteiro que ele tinha.
- Ei, Katie disse, ainda segurando a mão dele, você não faz idéia de como eu
precisava disso. E eu não estou falando apenas do spray de cereja. Quando você orou,
eu…

Antes que pudesse terminar sua frase, sua porta semicerrada abriu-se
bruscamente, e a passos largos Rick entrou com outro enorme buquê de rosas
vermelhas, anunciando:

- Seu namorado está finalmente aqui.

Eli rapidamente soltou a mão de Katie.

- Eli? O que você está fazendo aqui?

- Eu trouxe alguns remédios pra gripe da Katie. Eu tenho que voltar ao trabalho.
Nos vemos mais tarde. Eli saiu rapidamente.

Rick encurvou o corpo para trás e olhou corredor abaixo, assistindo Eli ir embora.
Olhando de volta para Katie, Rick disse:

- O que estava acontecendo aqui?

- Como ele disse, ele veio me trazer uns remédios, e eu o estava agradecendo.

- Agradecendo pelos comprimidos pra gripe?

- É, e também por ele ter orado por mim. Enquanto ele estava orando, eu percebi
como eu tenho estado…

- É por isso que ele estava segurando sua mão? Ele estava orando por você?

Katie engoliu a saliva e sentiu sua garganta inflamada. Ela pegou o vidro de spray e
borrifou mais uma vez em sua boca enquanto saía fora da resposta de um jeito fácil,
apenas balançando a cabeça em afirmação.

Rick já estava com a cabeça em outra coisa, mexendo na mesa dela.

- Você tem outro vaso, não tem? Essas flores precisam de água.

- Tem um na prateleira de cima do meu closet, mas você não pode simplesmente
colocar essas rosas junto com o outro buquê?

Rick alcançou a prateleira do alto com facilidade e enfiou as rosas no vaso.


Carregando-as até a mesa, ele pegou a garrafa de água que Eli tinha deixado lá e
desenroscou a tampa.

- Não! Katie gritou em protesto, e sua voz falhou.

- Que foi?
- Não essa água. É minha água da Nova Zelândia.

Rick olhou pra ela como se ela estivesse falando outra língua.

Katie levou a mão à sua garganta. Doía pra falar.

- Rick, não use essa água. É sério.

- Tá bom. Eu volto logo.

Ele pegou as rosas e saiu do quarto a passos largos com o vaso vazio na mão.

Katie fechou os olhos, e colocou a mão na testa. Seus ouvidos latejavam. Ela
pensou em como ela gostava muito mais do “jeito namorado de ser” de Eli do que o
gesto arrojado de Rick em trazer mais um buquê, não que ninguém a tivesse pedido
pra comparar.

Ela era grata por seu namorado se importar com ela o suficiente a ponto de trazer
mais flores. Ela sabia, graças a uma conversa que ela tivera com Cris, que era assim
que Rick demonstrava seu carinho. Katie aprendeu a “receber e ser grata” ao invés de
tentar mudar Rick e seus modos de se expressar. Era assim que Rick fazia as coisas. Se
ela amava Rick, e ela amava, então ela precisava amar as coisas que ele fazia por ela e
o jeito como ele as fazia.

Katie sentiu uma única e nada bem vinda lágrima sair do canto do seu olho direito
e rolar bochecha abaixo. Ela não podia suportar o modo como ela se sentia agora. Ela
queria que Eli voltasse e orasse por ela. Só que dessa vez ela queria que ele fizesse
uma oração mais longa e mais intensa, então ela poderia fechar os olhos e de alguma
forma seu coração retornaria àquele mesmo ritmo de proximidade de Deus que ela
ouvira na voz de Eli.

Rick voltou nesse exato momento com o vaso cheio de água. Ele empurrou as
rosas pra dentro do vaso.

- Nicole disse pra você avisá-la caso precise de algo.

- Ok. Obrigada e obrigada pelas flores.

- De nada. Rick puxou a cadeira que estava debaixo da mesa e sentou de frente
pra ela.

Katie o ofereceu um “fraco” sorriso. Ela podia imaginar como o rosto dela estava
amarrotado. Rick estava bonito. Ele sempre estava bonito. Os olhos cor de chocolate
dele estavam postos nela.

- Como você está se sentindo?


- Gripada. Eu realmente não quero passar isso pra você, Rick.

- Eu sei. Mas, Katie, eu realmente quero te dar uma coisa.

Sem avisar, Rick puxou uma pequena caixa de jóia do bolso de sua jaqueta de
couro.

Katie apoiou-se em um cotovelo, arrumando sua postura, e mesmo sentindo-se


meio grogue, ela estava pronta pra protestar.

- Na verdade, Rick disse, recuando a caixa de jóia, Eu devo explicar algo primeiro.

- É, explicar, por exemplo, por que nós não estamos esperando até que eu me
forme pra fazermos isso? E por que você não poderia me deixar ficar doente e me
recuperar? Quero dizer, quem se importa se é um estúpido Dia dos Namorados? Esse é
um péssimo jeito de pedir em casamento.

Rick recostou na cadeira, com cara de assustado.

- Pedir em casamento? Você achou que eu ia te pedir em casamento?

Katie não se mexeu. Ela não piscou. Ela tinha entendido tudo errado?

Em voz baixa, ela disse:

- Sim.

Levantando-se da cadeira, Rick marchou em direção à porta. Por um instante,


Katie pensou que ele iria sair, assim, sem nenhuma explicação sobre o que estava
acontecendo. Ele virou e voltou para o lado da cama dela, com o rosto vermelho.

- Por que você faz isso, Katie? Por quê? Eu nunca entendi isso em você. Você solta
as coisas nos piores momentos possíveis. Você sabe que você faz isso, não sabe? Tudo
está indo ótimo, e então você solta algo inoportuno e tudo é… Rick chutou a perna da
cadeira – não forte o suficiente para derrubá-la, mas o suficiente para fazer a cadeira
cambalear e para fazer as emoções de Katie cambalearem.

- Desculpa. Eu só… Eu não sei. Eu pensei…

- Você pensou que eu ia te pedir em casamento. Por que você pensou isso?

Katie tossiu de novo. Ela desviou o olhar e cobriu sua boca.

- Sabe de uma coisa? Vamos deixar isso pra lá. Você não está se sentindo bem.
Está tarde. Rick esfregou a nuca e disse em voz mais baixa, Você estava certa. A gente
deveria ter remarcado isso.
Katie engoliu de novo e sentiu como se estivesse engolindo pregos. Ela não disse
nada.

- Eu vou indo. A gente pode se encontrar outra hora.

- Não, fica. Katie juntou todas as forças que ainda restavam e tentou sorrir. Você
correu pra chegar aqui. Fique e converse comigo um pouquinho. Vamos começar de
novo. Conte-me sobre o café. Como está indo tudo?

Rick arrastou os pés e falou algumas coisas sobre como o eletricista teve que
trocar toda a fiação da cozinha no café em Redlands. Assim que o assunto foi
rendendo, ele retornou à cadeira, e Katie tentou se sentir confortável. Ela sentiu frio e
trouxe seus cobertores até o queixo enquanto Rick falava.

Rick se inclinou pra frente e alisou a beira do lençol amarrotado. De um jeito


estranho parecia que ele a estava “arrumando”.

- Eu sinto muito por você estar doente, Katie. Eu acho que nunca te vi tão doente
assim. Eu achei que você iria se sentir melhor depois que voltasse para o seu quarto.
Está frio hoje à noite. Eu peço desculpas de novo por fazer você me esperar lá no alto
do campus.

- Tudo bem.

- Você quer que eu te traga alguma coisa? Eu posso te fazer um chá.

Apesar de chá cair bem pra ela naquele momento, ela disse:

- Não, está tudo bem.

- Tem certeza? Eu sinto como se devesse fazer algo.

- Tá bem. Eu vou querer um pouco de chá, então. Minha chaleira elétrica está no
chão, em cima daqueles livros. Tem uns chás na caixa ao lado. Eu não faço a menor
idéia de onde minhas xícaras estão.

Enquanto Katie assistia, Rick ia pelas pilhas de bagunça e projetos e amontoados


de roupas sujas para plugar a chaleira na tomada e preparar o chá pra ela. De alguma
forma, aquela visão era dolorosa pra ela. Essa era a vida dela. Isso era a quão sua
fragmentada e vergonhosamente desorganizada vida estava naquele momento.

E ali estava Rick. Determinado Rick, tentando achar um caminho para cumprir seus
objetivos sem ser jogado para fora dos trilhos, a despeito de todos os obstáculos.

Ela tinha que dar um ‘A’ para aquele homem pelo esforço dele. Nada tinha sido
fácil ou conveniente no relacionamento deles pelos últimos meses. Ainda assim, de
alguma forma, mais graças a Rick, eles tinham conseguido cultivar tempo um com o
outro e avançarem como casal. Katie tinha se convencido de que essa era uma boa
preparação para os dois, caso eles acabassem se casando. Era assim que eles viveriam.
Rick, sempre o homem numa missão bem determinada; Katie sempre uma mulher com
uma missão menos determinada, mas ainda assim, numa missão. Rick era uma linha
reta. Katie era uma curva. Se eles conseguissem ser eles mesmos e continuassem
encontrando maneiras de entrelaçar suas vidas e agendas, Katie tinha ótimas
esperanças para eles como casal.

Quando Rick localizou uma xícara limpa e conseguiu fazer o chá, Katie já estava
achando quase impossível manter os olhos abertos. O comprimido pra gripe estava
começando a fazer efeito.

- Prontinho. Senta, Katie, pra que você possa beber o chá.

Ela tomou um gole e queimou a língua.

- Precisa esfriar.

Rick pegou a xícara dela e colocou na beirada da mesa.

- Você está quase dormindo, né?

- Tô.

- Ok. Bem, é melhor eu ir então. Eu te ligo amanhã. Ele inclinou sobre ela e deu um
beijo rápido na têmpora dela. Feliz dia dos namorados.

- Feliz dia dos namorados pra você também. Katie assistia enquanto ele caminhava
pelo quarto e abria a porta. As pálpebras dela estavam super pesadas.

- Rick?

Ele parou.

- Obrigada por vir, e me desculpe por ter falado as coisas do jeito que eu falei.

- Não se preocupe.

Katie pôde ouvi-lo dar um suspiro.

- A gente pode conversar sobre isso depois, ele adicionou.

Katie não tinha energia pra dizer nem mais uma palavra. Ela sentia como se não
pudesse lembrar o que realmente aconteceu naquela noite e o que ela tinha
imaginado na sua cabeça de vento.
Capítulo 3
- Por quanto tempo você ficou gripada?

Cris, a melhor amiga de Katie, estava sentada de frente pra ela no Café Ninho da
Pomba. A mesa que elas estavam sentadas era uma mesa familiar pra elas. Foi aqui,
nesse mesmo café que Rick e seu irmão abriram há quase um ano e meio atrás, que o
marido de Cris, Ted, a pediu em casamento. Foi aqui também, enquanto Cris, Ted e
toda a gangue estavam sentados nessa mesma mesa, que Rick saiu da cozinha e
surpreendeu a todos, já que ninguém sabia que ele estava trabalhando de gerente ali.
Daquela noite em diante, Rick e Katie tinham estado juntos.

Quando Rick ofereceu um trabalho a Katie no Ninho da Pomba, ela aceitou e


trabalhou o máximo de horas que pôde, não apenas aperfeiçoando suas habilidades
em fazer enrolados de peru, bacon e abacate3, mas também aperfeiçoando seu
relacionamento com Rick. Cris trabalhava na livraria adjacente, A Arca. Essa era uma
daquelas raras tardes, quando Katie conseguia achar tempo suficiente pra encontrar
com Cris na pausa pro almoço.

- Eu fiquei gripada duas semanas, como todo mundo, Katie disse. Entretanto eu só
fiquei de cama quatro ou cinco dias. Eu tenho certeza que minha gripe ainda estava
contagiosa quando eu voltei às aulas, mas, sério, eu não posso perder nada nessas
próximas dez semanas. Eu estou nos “finalmentes” do meu curso, rumo à colação de
grau, e nenhuma gripe aborrecida vai me parar. Além do mais, eu estou certa de que
todo mundo no campus teve essa gripe muito antes de eu ter. Como sempre, eu, a
retardatária. Não foi disso que sua tia me chamou uma vez?

Cris deu de ombros.

- Eu não sei do que minha tia te chamou. Eu tenho praticado esquecer tudo que a
tia Marta fala assim que eu posso. Quem se importa com o que ela disse sobre você?
Eu quero ouvir o que Rick disse. O que aconteceu depois que ele foi embora do seu
quarto naquela noite?

- Nada. Eu só encontrei com ele uma vez depois do Dia dos Namorados. A gente
conversa todo dia pelo telefone e por mensagem de texto, mas ele não tocou no
assunto. Eu tenho pensado muito nisso desde aquela noite – aquela noite febril e
estranha – e eu estou pronta pra dizer sim pra ele, qualquer que seja o cenário que ele
invente pra me pedir em casamento.

Cris levantou as sobrancelhas.

3
Alguém mais ficou com nojo desse enrolado de peru, bacon e abacate? Pois é, o povo aqui nos EUA
tem uma coisa com comida com abacate que é uma nojeira. Tem gente que gosta, eu não!
- Sério?

Seus distintos olhos azul-esverdeados expressaram a pergunta que Katie sabia que
Cris queria perguntar.

- Sim. Eu o amo. Eu sei que amo. Eu acho que nós poderíamos lidar com todos os
desafios que parecem vir de encontro ao nosso relacionamento. Nós temos trabalhado
no nosso relacionamento por um ano e meio já. Eu acho que nós podemos entrar em
sintonia muito mais facilmente depois que eu me formar e depois que ele abrir o café.

Cris não concordou, nem discordou. Ela olhou para Katie e silenciosamente
beliscou sua salada Toscana. Então ele segurou o garfo no alto, no meio do caminho
entre o prato e seus lábios fechados, uma laranja no espeto esperava pela atenção
dela.

- Que foi? Você não acha que nós estamos prontos?

Cris engoliu sua comida antes de colocar o garfo no prato.

- Não sei.

- Não sabe o quê?

- Eu não sei como responder perguntas sobre você e Rick. Eu não o vejo há meses,
mesmo morando no mesmo prédio que ele. Eu não vejo vocês dois juntos desde a
festa do Natal, e aquela noite foi louca. Não serei eu quem vai dar um aval de
confirmação para o relacionamento de vocês.

- Eu não estou procurando um aval. Katie franziu a testa, irritada por sua melhor
amiga não estar demonstrando nenhuma empolgação.

Quando Cris estava há poucos passos de ficar noiva, Katie tinha certeza de que ela
tinha sido bastante compreensiva e empolgada. Pelo menos ela achava que sim. Agora
parecia que fazia tanto tempo. Foi há apenas um ano?

Cris chegou mais perto de Katie, diminuiu o tom de voz, olhando Katie nos olhos:

- Tudo que estou dizendo é que casamento é uma coisa difícil. Mais difícil do que
eu pensei que seria. Especialmente quando os dois estão trabalhando o tempo todo e
não podem se ver o suficiente para terminar uma conversa. Se houvesse um jeito de
vocês dois se estabilizarem um pouco mais financeiramente também ajudaria. É tudo
que tenho a dizer. Se você pode esperar um pouco, espere.

- Nós estamos indo bem financeiramente.

A expressão de Cris deixou claro que ela não concordava.


- Katie, você nem tem um carro.4

- Eu sei, mas eu vou comprar um. Eu estou esperando.

- Esperando o quê? Dinheiro cair do céu? Eu não quero ser pessimista, mas essa é
a mesma coisa que Ted e eu dissemos há mais de um ano, e aqui estamos nós, ainda
dividindo um carro. É muito caro, ainda mais com o seguro.5

- Eu tenho o dinheiro.

Cris olhou pra Katie como se não estivesse acreditando nela.

- Eu tenho o dinheiro, Katie repetiu. Eu queria te contar. Só que nunca houve uma
boa oportunidade, e pra ser honesta, eu não tenho certeza de que essa é a hora certa.
Mas aqui vai. Minha tia avó faleceu e me deixou algum dinheiro. Está guardado na
minha poupança no banco.

Com um giro da sua cabeça, o cabelo cor de noz moscada de Cris caiu pro lado.

- Sua tia avó faleceu? Eu não me lembro de ter ouvido falar disso. Quando ela
faleceu?

- Ano passado. Na primavera, eu acho. Eu não lembro. É tudo muito estranho,


mas... bem vinda à minha vida. Ela queria que o dinheiro fosse pra alguém da família
que estivesse fazendo faculdade, e acredite ou não, eu fui a única pessoa que o
advogado conseguiu encontrar.

- Katie, isso é incrível! Mas sinto muito pela sua tia avó.

- Eu sei. Eu nunca a conheci, é isso que faz de tudo ainda mais estranho.

- Eu não acredito que você não me contou nada disso.

- Eu queria ter contado. Eu recebi o dinheiro no outono passado e planejei investir


um pouco do dinheiro num carro, mas minha agenda estava ocupada, e desde que o
Buguinho deu seu último suspiro, eu desenvolvi o hábito de pedir caronas. Acabou
virando uma boa maneira de eu ter tempo pra conversar com as pessoas. Eu guardei o
dinheiro e continuei pegando carros emprestados ou pedindo caronas.

Cris reclinou na cadeira.

4
No Brasil, ter carro não é algo essencial quando se casa. O importante é ter um teto e dinheiro pra
comida. Tem ônibus em todo lugar. Mas nos EUA não tem transporte público em todo lugar, por isso,
eles dão tanta importância pra carro. E praticamente todo mundo que tem carteira de motorista na
família tem um carro separado.
5
Nos EUA, seguro de carro não é opcional igual no Brasil. Todo carro tem que ter seguro, se não tiver,
você não consegue nem tirar carteira, já que aqui, os exames de direção são feitos no carro da própria
pessoa e pra fazer o exame, ela precisa provar que o carro tem seguro.
- Você nunca pára de me surpreender. Eu tenho a sensação de que você e eu
estaremos nos nossos noventa anos de idade, sentadas em cadeiras de balanço, sem
um único dente na boca, e você vai aparecer com algum fato significante que eu nunca
soube sobre você.

Katie deu outra mordida em sua pizza de abacaxi e bacon canadense, pensando no
tanto que ela deveria contar pra Cris sobre a herança. Os detalhes eram ainda mais
surpreendentes do que ela tinha revelado. A diretora dos residentes de Katie, Julia, era
a única que sabia que Katie, secretamente, usara parte do dinheiro para iniciar um
levantamento de fundos em prol de água limpa na África.

Katie também tinha usado parte do dinheiro para abençoar um dos estudantes
internacionais da universidade. O nome dele é Joseph, e ele é amigo de Eli. A esposa e
filha de Joseph estavam morando numa vila em Gana, oeste da África, enquanto
Joseph completava seus estudos na Califórnia. Katie mudou tudo ao fazer com que elas
se juntassem a Joseph na Rancho Corona e morassem com ele no apartamento para os
estudantes casados.

Cris inclinou-se pra frente.

- E as mensalidades da faculdade? Quero dizer, eu concordo que transporte é


essencial, e já que foi te dado esse dinheiro, um carro seria uma ótima maneira de
gastar sua herança. Mas você considerou investir um pouco do dinheiro na quitação
das suas mensalidades pra que você não fique com uma grande dívida quando se
formar?

Katie escolheu suas palavras cuidadosamente. Ela já tinha pago todas as suas
mensalidades e iria se formar sem débito nenhum. Ela também, anonimamente, pagou
as mensalidades de Eli. Ela sabia que queria ajudar outro estudante, e Eli parecia ser
um bom candidato, já que ele estava trabalhando muito durante o ano assim como
Katie. O serviço dos estudantes cuidou de todos os detalhes, e Eli nunca mencionou ter
recebido o dinheiro, Katie também nunca comentou nada. Doar em segredo
preencheu uma parte de Katie que ela nunca soube que estivera vazia.

Para esclarecer sua situação financeira para Cris, tudo que ela disse foi:

- Eu tenho minha dívida com a faculdade sob controle. Comprar um carro é minha
prioridade número um.

- A minha também, disse Cris pensativamente.

Katie colocou seu canudinho nos lábios numa tentativa de manter sua boca
ocupada e acabar não soltando nada.
O plano original de Katie era levar Cris pra comprar um carro, e, como uma grande
surpresa, comprar dois carros. Um pra ela e um pra Cris. Ela não tinha pesquisado o
preço de nenhum carro usado ainda, mas ela estava confiante de que poderia
aumentar seu orçamento e comprar dois carros usados, ao invés de um novo.

Sentada de frente pra Cris, Katie teve uma sensação de que haveria uma pressão
muito grande no relacionamento delas se Katie a desse um carro. Cris estava
acostumada a receber presentes de seus riquíssimos tios, mas Katie assistira como o
peso desses presentes afetaram o relacionamento de Cris com sua tia. Não que um
carro usado como presente fosse, necessariamente, estragar a amizade entre Cris e
Katie, mas ela percebeu o quão estranho isso seria. As pessoas iriam descobrir que ela
tinha recebido uma bolada de dinheiro. Muito mais dinheiro do que ela revelara, mas,
ainda assim, ficaria claro que ela tinha recebido dinheiro suficiente pra comprar dois
carros. Isso por si só já era extraordinário o suficiente pras pessoas começarem a fazer
perguntas. Rick ainda não sabia de nada sobre o dinheiro. Como ele encararia isso
tudo? Ela não tinha pensado no quão complicado isso poderia ser.

- Você está bem? Cris sacudiu a mão na frente do rosto de Katie. Você ficou quieta
de repente.

- Desculpa. Meu cérebro resolveu dar um passeio. Ele voltou agora. O que a gente
estava conversando?

- Você estava falando que vai comprar um carro.

- É, eu vou. Você quer ir comigo?

- Claro. Você sabe quando o Rick vai estar disponível?

- Rick? Por quê?

- Eu achei que você fosse querer incluí-lo no processo. É um grande investimento.


Quero dizer, se vocês estão próximos de ficarem noivos, colaborar numa decisão como
um carro parece ser uma coisa normal a se fazer.

- Eu posso perguntá-lo. Mas não sei. Dezembro passado, quando ele estava
procurando por um carro novo, eu só fui com ele na primeira vez. Nos primeiros três
minutos, eu percebi que ele e o pai dele viam essa experiência como algo entre pai e
filho. Depois disso eu não me convidei mais pra ir. Ele gosta mesmo do carro que ele
comprou, o que é bom, considerando a quantidade de horas que ele passa morando
nesse carro. Mas eu tenho saudades do Mustang.

- Ele ainda tem o Mustang, não tem?

- Tem. Ele o deixou na garagem dos pais dele. Mas ele não planeja dirigi-lo mais.
Ele me disse que eu podia pegá-lo emprestado a hora que eu quisesse, mas eu nunca
senti que isso fosse certo. Eu me sinto mais confortável pegando o carro do Eli ou o da
Nicole. Entretanto, eu tenho que dizer, aquele Mustang tem muitas memórias. Eu
amava aquele carro. Era um clássico. Um grande de símbolo de quem Rick era no
ensino médio, sabe?

Cris sorriu.

- É, você sabe. Eu sei que você sabe. Colocando sua bebida sobre a mesa, Katie
disse:

- Ah, Cris, as estradas que nós já viajamos juntas, minha amiga.

- E as muitas que ainda temos por viajar... no seu carro novo!

- Eu estou planejando comprar um carro usado.

- Mesmo assim, vai ser novo pra você. Cris checou a hora no seu celular. Eu tenho
que voltar ao trabalho. Me avise quando você quiser ir sair pra olhar carros, e eu irei
com você. Ah, e a Trícia me perguntou se eu poderia cuidar do bebê Daniel pra eles. Se
você tiver tempo, você quer vir comigo?

- Eu posso ser persuadida a ir.

- Eu cuido do Daniel. Você pode usar o tempo pra estudar. Eu pensei que seria
divertido a gente dirigir até Calrsbad juntas e talvez caminhar na praia depois.

- Parece perfeito agora. Especialmente porque o tempo está esquentando. Eu


adoraria ir com você. Me avise sobre os detalhes e eu vou checar minhas horas de
trabalho. Eu devo um monte de horas a Nicole, já que ela cobriu pra mim enquanto eu
estava doente. O bom é que ela é muito generosa.

Cris levantou, deu um rápido abraço em Katie, e voltou para a livraria que ficava
ao lado do restaurante no mesmo complexo.

Retornando ao estacionamento, Katie escorregou no banco do motorista do carro


de Nicole e fechou a porta. Ela discou o número da tia Marta e esperou ela atender.
Quando o correio de voz respondeu, Katie desligou. Ela não queria deixar uma
mensagem. Para falar a verdade, ela não queria falar com tia Marta. O tio de Cris, Bob,
era com quem ela queria falar.

Katie achou o número do tio Bob em seu celular, apertou o botão “ligar”, e
“raspou” a garganta. O calmo tio de Cris atendeu no segundo toque. A primeira coisa
que Katie perguntou foi se tia Marta estava por perto.

- Não. Ela saiu pra almoçar com umas amigas no clube. Você quer o número dela?

- Não, eu queria falar com você.


- Claro. Que foi?

- Eu preciso da sua ajuda com algo que pode ser um pouquinho complicado.

- Sem problema. O que eu posso fazer?

Katie amava o tio Bob quase o mesmo tanto que ela tinha certeza que Cris o
amava. Aquele homem tinha um grande caráter e se importava com as pessoas. Ela
tinha certeza que podia confiar nele e falou sobre seu ainda incompleto plano de
comprar um carro para Cris e Ted.

- Deixa eu ver se entendi, tio Bob disse. Você quer me dar dinheiro para comprar
um carro novo para Cris e Ted, mas quer que eles achem que fui eu quem dei o
dinheiro.

- Isso. Mas é um carro usado, não um novo.

- Certo. Um carro usado.

- Você pode me ajudar a fazer isso?

- Na verdade, não. Não posso.

Essa não era a resposta que Katie esperava.

- Por que não?

Tio Bob gargalhou.

- Isso seria desonesto.

O semblante de Katie entristeceu. Por um momento ela desejou ter tentado falar
com tia Marta sobre o plano. Katie tinha certeza que tia Marta não teria nenhum
problema em esconder, mudar, ou enfeitar a verdade. Pra ser sincera, Marta era
dotada com tais atributos.

- Eu não estou te pedindo para mentir. Eu só não quero que eles saibam que o
dinheiro veio de mim.

- E por que não? Eles apreciariam saber a verdade. Conte a Cris e Ted que sua tia
te deixou um dinheiro, e você quer usá-lo pra comprar um carro pra eles. É limpo e
honesto. Sem mistérios a serem encobertos.

- Eu ia fazer isso, mas daí eu pensei que seria complicado demais quando outras
pessoas descobrissem que eu tenho todo esse dinheiro. Até agora só duas pessoas
sabem que eu recebi uma herança. Cris é uma dessas pessoas, mas ela não sabe muito.
- Katie, ouça, não é da conta de ninguém quanto dinheiro você tem ou o que você
decide fazer com ele. Lembre disso.

Katie pensou ter ouvido a voz de tio Bob intensificar na última frase. Quando o
assunto era dinheiro e escolha em como gastá-lo, Bob era uma espécie de autoridade.
Se ele estava dizendo que ela deveria ser sincera e não encobrir nada, ela sabia que
deveria ouvi-lo.

- O que você acha de fazermos isso: Você pensa em como quer lidar com a
informação com Cris e Ted. Eu vou dar uma olhada em alguns carros. Eu te mantenho
informada, e você me mantém informado?

- Ok. Mas tem mais uma coisa.

- Manda.

- Você pode dar uma olhada em dois carros usados?

- Dois?

- É, eu preciso de um. Meu carro morreu outono passado. Eu tenho procrastinado


a inevitável compra de um por muito tempo.

- Como você tem se locomovido?

- Eu tenho amigos generosos. Uma deles, Nicole, conseguiu me incluir no seguro


do carro dela. Nós temos compartilhado o carro dela pelos últimos meses. Tem
funcionado muito bem, mas já é hora de eu comprar um carro pra mim.

- Eu posso te ajudar com isso. Sem problema.

- Obrigada. Eu vou continuar te mantendo informado, como você disse.

Antes de eles desligarem, tio Bob amorosamente concluiu a conversa deles:

- Você me dá orgulho, Katie, você sabia disso? Você me deixa orgulhoso.

Katie engasgou. Ela nunca esperou que ele dissesse algo assim. Aquelas eram
palavras que uma moça deveria ouvir de seu pai, mas Katie não conseguia se lembrar
de alguma vez ter ouvido isso de seu pai. Ouvir essas palavras vindas de tio Bob tinha
quase o mesmo significado pra ela.

Quase.
Capítulo 4
Assim que Katie desligou, ela dirigiu rumo ao posto de gasolina para encher o
tanque do carro de Nicole. Dirigindo de volta pela montanha que subia até o campus
da Rancho Corona, Katie tentou organizar mentalmente sua pilha de coisas pra fazer
pelo restante daquele dia. Ela estava de plantão na mesa principal aquela tarde por
três horas e esperava que o turno fosse tranquilo, porque ela planejava trabalhar em
um grande projeto que deveria ser entregue na próxima semana e que ela nem tinha
começado. Ela também tinha uma reunião obrigatória com a equipe de ARs às sete.
Katie não fazia idéia de quando ela encontraria tempo para escrever seu já atrasado
trabalho para sua aula de estudos interculturais. Ela também estava atrasada para a
entrega de três resumos das tarefas de leitura que deveriam ter sido entregues
enquanto ela estava doente.

- Eu nunca vou conseguir terminar isso tudo.

Para se distrair, ela colocou o telefone no viva-voz e ligou para Rick.

- Ei. Adivinha quem está com saudades de você e mal pode esperar pra te ver esse
fim de semana?

- Ei, você. Adivinha.

- Não. Eu não vou adivinhar nada. Primeiro você vai ter que adivinhar quem sente
saudades de você e mal pode esperar pra te ver.

- Katie.

Ela não soube dizer se ele estava falando o nome como a resposta à adivinhação
ou com uma ponta de frustração na voz. Não importava. Ela continuou jogando seu
jogo.

- Resposta certa. Agora é a sua vez. O que você quer que eu adivinhe?

- Nós conseguimos a liberação do café em Redlands. A inauguração será dia 27 de


abril. Ele soou animado, mas Katie estava bem certa de que ele já tinha contado isso
pra ela antes.

- Legal.

- Mais que legal. Isso vai mudar tudo. Nós conseguimos essa localização na hora
certa. O que você acha de eu buscá-la sábado de manhã bem cedo e nós viermos
passar o dia aqui?
Katie hesitou. Essa não era exatamente a idéia dela do que o tão esperado
encontro deles seria.

- Eu devo ter que levar alguns trabalhos da faculdade comigo.

- Sem problema. A fiação já está toda pronta. Traga seu laptop. A máquina de café
expresso deve ser instalada sexta-feira à tarde, daí eu te preparo alguma coisa gostosa
enquanto você estuda. Está ficando mesmo muito bom, Katie. A Nicole fez um ótimo
trabalho na seleção de cores. Ela te contou que conseguiu usar o projeto do design do
interior daqui, em um dos trabalhos finais do curso dela? Ela recebeu um ‘A’.

- Eu soube que ela estava tentando conseguir créditos por todo o trabalho que ela
fez com sua mãe. Que ótimo. Você vai estar aqui na cidade hoje à noite? Você quer dar
uma passada aqui? Eu estou de plantão das quatro às sete. A gente poderia sair pra
jantar depois. Ah, espere; eu acho que tenho uma reunião depois.

- Eu não ia poder ir mesmo, Katie. Muita coisa está acontecendo aqui agora. Eu
estou com saudades de você. As coisas têm estado loucas demais por tempo demais.

- Eu sei. Nós já estamos quase na linha de chegada.

- Eu sei, Rick disse. 27 de abril está quase aí.

- 16 de maio está quase aí também.

- O que tem dia 16 de maio?

Ela não soube dizer se Rick estava fingindo só pra provocá-la.

- Deixe-me ver, 16 de maio... 16 de maio... O que será? Alguma coisa está


acontecendo dia 16 de maio. Ah, é! Katie Weldon vai se formar no dia 16 de maio.

- Você achou que eu me esqueci?

- Eu acho que o jeito como sua vida está indo ultimamente, você precisa ser
relembrado das coisas. Constantemente. Isso é inegociável, a propósito. Você tem que
estar lá, Rick. É o-bri-ga-tó-rio. Entendeu? Obrigatório.

- Katie, relaxe. Eu entendi. Não se preocupe. Eu pretendo estar lá.

Ela sabia que teria se sentido mais tranquila se a escolha das palavras dele tivesse
sido “Eu estarei lá”, mas ela precisava deixar pra lá. Mais de uma vez ela falara com
Rick que ele, Ted, e Cris seriam seus únicos familiares naquele dia, os únicos a ficarem
de pé por ela. Ele sabia o quão importante isso era pra ela.

Rick tinha garantido pra ela que iria levar os pais dele e possivelmente o irmão
dele, Josh, o qual estava tão envolvido quanto Rick na inauguração dos novos cafés.
Katie tinha boas razões para ficar desconfiada da exigente agenda de Rick. Só pra
garantir, ela pensou em convidar Bob e Marta. Por que não? Tio Bob tinha acabado de
falar que estava orgulhoso dela. Ele poderia vir assisti-la receber seu diploma e ficar
orgulhoso dela no dia 16 de maio também, não podia?

Duas semanas se passaram até que Katie conseguiu achar tempo para ligar para
tio Bob para checar projeto do carro e também para dar os detalhes sobre sua
formatura. Katie sabia que o calendário social de Marta requereria aviso prévio em
qualquer evento que exigisse significante esforço. E com tia Marta, quase tudo
envolvia mais esforços da parte dela do que era realmente necessário.

Durante aquelas duas semanas, Katie sentiu-se como um hamster numa roleta
dentro de sua gaiola, correndo, correndo, mas não chegando a lugar algum. Ela foi à
todas as suas aulas, à duas reuniões dos ARs, e ainda conseguiu cumprir seus horários
de trabalho. Isso era mais do que ela tinha conseguido fazer no último mês. Em média,
ela estava dormindo menos que cinco horas toda noite, mas ela ainda sentia que não
conseguiu cumprir todo o trabalho que tinha que fazer.

Depois da última aula de Katie na sexta-feira à tarde, ela rumou para o Crown Hall
para seu plantão de duas horas. Assim que ela estivesse livre, ela planejava correr pro
chuveiro e vestir qualquer coisa limpa que ela pudesse encontrar em sua pilha de
roupas no seu quarto. Ela e Rick tinham finalmente conseguido marcar um encontro de
verdade, e, se tudo fosse bem, ela estaria pronta exatamente às 6:30, quando ele iria
buscá-la.

Julia, a diretora dos residentes de Katie, estava esperando por ela quando Katie
entrou no escritório que ficava no andar do lobby do Crown Hall. Ela puxou Katie para
um canto e perguntou:

- Você tem algum tempo livre amanhã de manhã?

- Amanhã?

- Por volta das oito. Pode ser? Você ainda não entregou seus formulários de
fevereiro. Eu sei que você estava doente. Nós podemos trabalhar nisso juntas. Vai
levar apenas uma hora.

Katie não sabia como ela poderia encaixar uma hora em sua agenda. Ela sabia que
tinha que fazer isso. Talvez tentar sair para jantar com Rick hoje à noite fosse uma má
idéia. Ela tinha muito trabalho pra fazer esse fim de semana.

O que eu estou pensando? Eu não vejo o Rick há séculos. É claro que eu tenho que
vê-lo hoje à noite.

- Mais pro fim da semana dá pra você?


- Claro. Me mande um email com seus melhores horários livres e nós vamos dar
um jeito.

Sentando-se em sua cadeira, Katie pegou seu laptop e imediatamente começou a


trabalhar em umas pesquisas que ela precisava pro seu projeto final para a aula de
moderna cultura asiática. Quando ela trocou sua especialização para humanas no
começo do seu último ano, ela não tinha muita idéia do que acabaria fazendo com
esse diploma. Mas fazia muito mais sentido pra ela do que botânica. Com humanas,
ela gostava da variedade de aulas que conectavam com seu interesse em pessoas,
comunicação, e culturas.

No entanto, Katie sabia, se fosse pra ser completamente honesta, que ela estava
mais interessada em se formar do que em quê ela estava se formando. Ela não
admitiria isso pra ninguém, mas seu objetivo tinha sido apenas terminar a faculdade.
Em quê ela estava se formando era apenas a cereja do bolo. Se ela conseguisse manter
o ritmo nessa última volta até a linha de chegada, então, qualquer coisa podia
acontecer.

A imaginação de Katie deu lugar a imagem de estar vestida em um elegante e


branco vestido de noiva, segurando uma simples, solitária papoula da Califórnia como
seu buquê. Ela viu a si mesma caminhando pelo corredor da igreja, seu rosto
brilhando, seus passos lentos e certos. Em seu sonho acordada ela via seu casamento
acontecer num lugar aberto, no alto do campus, exatamente como o casamento de
Cris e Ted em maio do ano passado. O clima estava perfeito. Os convidados estavam
todos sorridentes.

Ela olhou pra baixo e se alegrou em ver que estava descalça debaixo daquele
exuberante vestido. Isso explicava seu perfeito equilíbrio e passos calmos. Ela estava
feliz. Em seu mais natural habitat.

Katie imaginou a música tocando. Violões. Não, não violões. Violinos. Sim, violinos.
Muitos violinos e um violoncelo. E borboletas. Centenas de delicadas, vibrantes,
douradas borboletas a rodeavam enquanto ela dava seus pequenos passos adiante.

Ela imaginou levantando seus olhos em direção ao altar, debaixo de um arco


enlaçado por flores, um pastor estava sorrindo, segurando uma Bíblia com as duas
mãos na frente de seu corpo. Agora era o momento. Ela iria virar e olhar para o rosto
de seu amado. Pela expressão dele enquanto olhava pra ela, ela sabia que ele estava
impressionado com a beleza de noiva dela. Lentamente lançando seu olhar sonhador
para a direita, Katie respirou fundo e...

- Ei, você!
Aquela voz grave a trouxe de volta ao presente. O cara da manutenção, um
homem de meia idade e acima do peso, usando um boné rasgado de baseball dos
Dodgers estava em pé ao lado da janela.

- É, nós recebemos um chamado por causa de uma janela quebrada.

- Quê?

- Uma janela quebrada, ele repetiu.

- Ok. Hmm, alguém te falou o número do quarto?

- Sei não. Eles falaram pra checar no lobby.

Katie folheou os papéis na mesa e encontrou um formulário com a letra de Nicole.

- Aqui está. É no primeiro andar. Eu vou com você.

Katie colocou uma placa que dizia, “Volto logo,” e caminhou até o quarto 118 sem
falar nada. Katie bateu três vezes na porta. Quando ninguém respondeu, ela bateu de
novo e gritou dizendo que ela era uma assistente dos residentes e que iria abrir a porta
e entrar. Usando a chave mestra, Katie abriu a porta e ficou impressionada com a visão
que teve.

O quarto estava uma zona de desastre. Roupas, livros, sapatos, cobertores e caixas
de pizza vazias estavam todos amontoados, como se estivessem planejando seu
próximo movimento. A janela da esquerda estava quebrada. Estilhaços de vidro
quebrado estavam espalhados pela cama, mesa, e pelas roupas amarrotadas. No meio
do quarto, no chão, estava uma grande pedra. Katie sabia que era melhor deixar a
evidência exatamente onde estava.

O homem da manutenção disse:

- Parece que alguém revirou e saqueou esse lugar. Eu vou checar as medidas e
voltar com o vidro.

Enquanto ele tirava sua fita métrica, Katie ficou de pé de um lado do quarto, seus
pensamentos estavam nas moças que moravam nesse quarto. Elas nem deviam saber
o que tinha acontecido. Talvez o quarto delas tivesse sido arrombado. Ou talvez uma
delas tivesse quebrado o vidro. De qualquer forma, Katie estava feliz por isso não ter
acontecido no andar dela. Ela tinha muito a fazer e não gostaria nada de ter que fazer
um relatório sobre uma confusão dessas.

O outro pensamento que permaneceu na mente de Katie enquanto ela olhava em


volta do quarto foi o de como ela se sentiria se a pedra tivesse sido jogada na janela do
seu quarto e ela tivesse que deixar alguém entrar nele. Por pior que esse quarto
estivesse, Katie sabia que o dela ainda estava pior. E ninguém tinha saqueado nada. Ela
- e apenas ela - era a responsável pela bagunça. Ela nunca estava lá, então todas as
pilhas de desorganização tinham apenas crescido em seu estado de petrificação. Se
alguém visse como ela estava vivendo, ela ficaria horrorizada. Enquanto Katie voltava
ao lobby com o cara da manutenção, ela decidiu que iria fazer o que fosse preciso pra
lavar suas roupas, e limpar seu quarto esse fim de semana.

De volta ao escritório principal, Katie retornou à sua pesquisa e se manteve


ocupada por quase uma hora e meia, antes de Nicole aparecer e parar pra conversar.
Nicole tinha todos os detalhes sobre a janela quebrada e contou-os à Katie.

- Os caras que nos contaram disseram que era pra ser uma batidinha de leve na
janela pra ver se tinha alguém lá. Eles disseram que fizeram ‘uma má escolha no
tamanho da pedrinha’.

- Vou te falar que não era nenhuma pedrinha. E vou te falar mais uma coisa que
você vai ficar feliz em ouvir, Senhorita e Princesa Super Organizada.

- Não me chame disso, Nicole disse com uma pequena expressão de tristeza em
sua super lisa pele.

- Tá bom. Desculpa. O negócio é o seguinte. Eu vi o quão bagunçado o quarto 118


estava, e isso tocou bem no fundo do meu coração – você sabe o que quero dizer?
Bem aqui. Eu senti.

- Sentiu o quê?

- A necessidade de limpar meu quarto.

- Sério?

- Sim, sério. Eu acho que você é a única no campus que sabe o quão assustador
meu quarto se tornou. Eu devo precisar de uma escavadeira e uma super lata de lixo,
mas eu estou determinada a tirar o lixo tóxico do meu quarto esse fim de semana.

- Que bom. Nicole olhou para seu relógio. Você quer ir começando?

- Por quê? O que você está sugerindo?

- Eu poderia pegar sua última hora de trabalho. Eu tenho muito trabalho a fazer.
Posso fazer aqui. Você disse que não tem tido muito movimento por aqui. Assim você
poderia começar o projeto limpeza.

- Isso, começar logo antes que eu mude de idéia ou me distraia, certo?

Nicole sorriu seu doce sorriso.


- A oferta ainda tá de pé. O que você quiser...

- Eu aceito. Você é muito legal comigo.

- Eu sei.

Nicole ficou de pé ao lado da mesa enquanto Katie se inclinou para desplugar o


cabo do seu laptop. Escondida debaixo da mesa, Katie não viu a pessoa que caminhou
em direção à janela.

Nicole cumprimentou quem quer que fosse com uma extra empolgação.

- Ei. Oi. Como você está? Bom te ver.

- Bom te ver também. Como vai? Você está ótima, a propósito.

Katie reconheceu a profundidade daquela voz. Seu coração fez uma pequena
dança saltitante. Ele está adiantado!

Katie levantou sua cabeça rapidamente.

- Katie? Rick olhou surpreso. O que você está fazendo aí embaixo?

- Desplugando meu laptop. O que você está fazendo aí?

- Tentando te fazer uma surpresa. Eu sabia que você estava de plantão, e pensei
que eu poderia vir mais cedo. Eu tenho algumas ligações pra fazer, mas achei que eu
poderia ficar aqui com você até que você estivesse livre.

- Sério? Katie sentiu uma inebriante felicidade. Na verdade, ela queria mesmo
limpar seu quarto antes que seu amontoado de roupas se tornasse inflamável. Ela
também pretendia tomar um banho e receber Rick arrumada e limpinha. Não toda
desmazelada como agora.

- Eu estava falando pra Katie agora mesmo que eu cobriria a hora dela aqui. Nicole
disse.

- Que ótimo. Obrigada, Nicki. Rick deu um grande sorriso pra Nicole.

Katie repetiu o apelido que Rick escolhera.

- Nicki?

Rick tinha a fama de arrumar apelido pras pessoas. Tristemente, suas tentativas de
dar um apelido pra Katie tinham falhado. Essa era a primeira vez que ela o tinha
ouvido usar o meloso “Nicki” para se referir a Nicole.

- Combina, você não acha? Rick voltou seu sorriso em direção a Katie.
Nicole entrou na conversa com uma explicação mais detalhada:

- O pai de Rick me chamou assim umas semanas atrás. Eu falei pro Rick que eu
gostei porque meu pai me chamava de Nicki quando eu era criança. Quase ninguém
me chama assim mais.

- Nicki. Katie tentou ver como o novo nome soava.

Nicole gargalhou.

- Sua expressão diz tudo, Katie. Eu sei como você se sente a respeito. Não se
preocupe. Você não tem que me chamar de Nicki.

- Que bom. Nicole combina mais com você, eu acho. Ela juntou suas coisas.

- Rick, você se importa de esperar por mim uns dez minutos?

- Depois de todo tempo que você esperou por mim? Claro que não. Você precisa
se trocar? Ele pareceu perceber sua roupa amassada, incluindo sua não-tão-limpa-
camisa e seu favorito par de sandálias de tiras de couro desfiadas.

- Sim, eu preciso me trocar. Definitivamente. Trocar mais coisas do que apenas


minha aparência para o encontro dessa noite. Mas no momento, essa é a única coisa
que vou fazer agora. Você se importa de me esperar? Mesmo?

Ela já estava do lado de fora do escritório, em pé de frente pra ele. Rick estava
bonito. Ele sempre estava bonito. E cheiroso também.

O sorriso dele “amaciou” enquanto ele olhava para Katie.

- Eu estarei bem aqui esperando por você. Não importa quanto tempo demore. Eu
não vou a lugar algum sem você.

Ah Rick, você continua sendo o rei da fala mansa.

As palavras carinhosas dele para Katie a impulsionaram pelo corredor, até seu
quarto, para o chuveiro e para fora dele em tempo recorde. Ela desejou ter algo
bonito, novo e limpo esperando por ela em seu closet que ela pudesse vestir. Ela
queria estar bonita para Rick. Ela queria que ele se derretesse um pouquinho cada vez
que ele a visse, do jeito que ela se derretia um pouquinho cada vez que ela o via.

Suas escolhas eram limitadas, entretanto, Jeans ou jeans. Uma blusa branca que
precisava ser passada ou um suéter preto com um decote em V. O suéter venceu,
mesmo essa sendo uma tarde de calor. Ela subiu as mangas, levantou o suéter e
borrifou em sua barriga uma loção corporal de kiwi-coco-lima no caso de ela transpirar
até a morte. Pelo menos, o cheiro seria de frutas enquanto ela se derretia de tanto
suar.
Alisando seu suéter de volta em seu corpo, Katie notou uma linha solta de um
lado. Ela deu um puxão na linha e um buraco de mais ou menos um centímetro
apareceu.

- Fala sério! Só pode ser brincadeira.

Ela tirou o suéter pra ver o tamanho do estrago, e o buraco continuou a desfiar.
Frustrada, ela pegou seu telefone e ligou para Nicole.

- Estou desesperada. Por favor, me diga que eu posso pegar emprestada qualquer
coisa no seu closet.

- Claro que pode. Fique a vontade pra pegar sapatos e acessórios também. O que
você quiser.

- Você é um amor. Salvou minha vida. Obrigada, Nicole. Diga a Rick que eu estou
quase pronta.

- Falo sim. Não precisa ter pressa. Ele está me contando dos detalhes do café.

Katie se apressou assim mesmo. Ela usou a chave mestra para entrar no quarto de
Nicole e passou o olho nas blusas lindas e limpas que estavam penduradas no closet
organizado de Nicole. Depois de experimentar duas blusas diferentes, ela escolheu a
primeira.

Antes de ela correr de volta pro seu quarto, Katie viu um par de sapatos pretos
estilosos. Nicole dissera que ela podia pegar sapatos emprestados também. Katie
experimentou e achou que eles caíram super bem com sua calça jeans. Vendo-se por
vários ângulos no espelho de corpo inteiro de Nicole, Katie achou que essa era a
melhor combinação de roupas que ela tinha vestido no semestre inteiro. Ela
definitivamente precisava sair pra comprar roupas com Nicole como sua consultora.

Com os sapatos na mão, Katie correu de volta para seu quarto e terminou de se
aprontar. Seu cabelo não precisou de muito trabalho. Ela o balançou duas vezes e
deixou seus sedosos fios ruivos se assentarem em sua maneira feliz e usual.
Maquiagem seria um quê a mais. Ela abriu seu tubo de rímel e pensou, Quando foi a
última vez que eu abri isso?

Seus olhos bateram num colar de pedra verde que tinha estado enrolado num
canto, em cima de sua cômoda por tanto tempo quanto o rímel tinha permanecido
fechado. Rick a presenteara com o colar meses atrás. Ela não tinha muita certeza do
porquê. Ele disse que viu o colar quando ele estava no Arizona e a cor dele o lembrou
dos olhos dela. Verde, mas mudava de acordo com a luz. Ou algo do tipo. Katie nunca
foi de usar muitos acessórios. Essa noite, no entanto, ela ficou feliz por ter notado o
colar. Rick iria gostar de vê-la usando o colar.
Katie calçou os sapatos de salto pretos e deu uma última olhada no espelho antes
de descer correndo pelo corredor. Foi quando ela percebeu que andar rápido nos
sapatos de Nicole era um desafio. Uma moça não corria num salto desse. Ela teria que
ir devagar. Não importava. Rick disse que ele não iria a lugar nenhum. Ele disse que
estaria esperando por ela.
Capítulo 5
Fazendo sua grande entrada no saguão do Crown hall, Katie não estava surpresa
ao ver que Rick estava falando ao celular e tinha se esticado em um dos sofás. Ele
passava muito tempo no telefone. A cabeça dele estava virada para outro lado, então
ele não notou sua chegada.

Katie sentou-se casualmente no braço do sofá e esperou que ele a notasse. Rick
virou-se para olhar para ela, e quando ele fez isso, aconteceu. Katie recebeu o olhar
que ela tanto esperava de Rick, o olhar de ruguinhas-no-canto-dos-olhos que faziam
com que seus lábios formassem um sorriso que deixava claro que ele tinha visto,
realmente tinha visto ela. Katie queria marcar este momento, ela o tinha esperado
desde que estava no colegial. Ela tinha certeza que depois de todo esse tempo Rick
Doyle finalmente tinha percebido que estava apaixonado por ela. Finalmente, isso
estava realmente acontecendo. Ela via nos olhos dele, ela via na expressão dele. Nunca
mais ela iria questionar se o coração dele estava na sua direção. Porque estava, ela
sabia disso.

Rick imediatamente terminou a ligação, fechou o telefone, e deu uma longa


olhada em Katie. Tudo que ele disse foi:

- Oi.

Katie amou que “oi” foi a única palavra que saiu de sua boca. Ela respondeu com
um “Oi” igualmente pequeno.

Rick pegou a mão dela.

- Você está maravilhosa.

- Obrigada, essa blusa é da Nicole, ela contou que eu liguei pra cá agora a pouco
em desespero?

- Não. Ei, senta aqui Ele arredou para que ela pudesse sentar ao seu lado no sofá.
Katie se acomodou embaixo de seu braço que a esperava. Ele a envolveu com os dois
braços e a puxou para perto de si.

- Eu senti sua falta.

- Não tanto quanto eu senti a sua.

Rick beijou a ponta do seu nariz. Ela se aconchegou perto dele, não muito
confortável com a idéia de ele a beijar muito ali no saguão do dormitório. Não que ela
não quisesse que ele a beijasse. E muito. Mas ela tinha a impressão que as pessoas a
estavam observando, e as expressões de afeição que ela e Rick tinham eram coisas
particulares.

- Então, aonde você quer ir comer? Katie deu um pulinho para mudar o sentido da
conversa por agora.

Rick a beijou de novo, dessa vez no lado da sua cabeça. Ele abaixou a sua cabeça e
com sua mão livre levantou o queixo de Katie em sua direção, a fim de beijá-la nos
lábios. Ela ansiosamente recebeu o beijo, mas ainda tinha aquela impressão de que os
outros alunos estavam olhando para ela.

Rick a beijou mais uma vez nos lábios, dessa vez com mais firmeza. Ele se afastou
levemente e falou bem baixinho:

- Já te disse o quanto senti sua falta?

- Sim, você disse. Katie estava surpresa que se sentia agitada com a persistente
atenção de Rick.

Eles já não tinham falado o quanto sentiam falta um do outro? Porque ele estava
tão concentrado em ser aconchegante e beijoqueiro agora? A sua aparência toda
arrumada o tinha afetado tanto assim? O braço de Rick continuava ao redor do ombro
de Katie. Ele a puxou para si.

- Eu senti falta de te segurar assim. Eu senti falta de estar com você. Você está
cheirando muito bem. Ele a beijou de novo.

Agora Katie estava definitivamente desconfortável. Ela não estava acostumada


com o Rick agindo desse jeito com ela, ou avançando assim com suas expressões ou
afeições. Katie sabia que Rick era um “lover-boy”, assim como ela sabia que ele tinha
fala mansa.

A relação deles, na maior parte, nos últimos meses, tinha sido mais no sentido
divertido e carinhoso. Eles até tinham se segurado para não se beijarem até depois
que eles estivessem namorando oficialmente por quase um ano. Eles nunca tiveram
uma “sessão de beijos longos”.6

Mas Katie suspeitava que era isso que iriam fazer se estivessem sozinhos. Ela
recebeu outro beijo dele antes de puxar sua cabeça para trás e dar
um sorriso ao invés de um beijo.

- Ei...

- Ei. Ele repetiu como um eco.

6
Do original: “Make-out session”, eu acho que essa tradução passa bem a idéia dessa expressão
- Nos devíamos decidir o que vamos fazer hoje a noite. Você sabe aonde quer ir
pra comer?

- Qualquer lugar, você escolhe.

As próximas horas foram uma continuação da relação gangorra de Katie e Rick,


onde a gangorra sempre descia pro lado de Katie. Isso também não era normal.
Katie se sentia com o poder repentinamente dado a ela. Como se ela fosse a pessoa
com o controle remoto na mão e ninguém reclamava de suas escolhas. Isso nunca
aconteceu.

Ela escolheu aonde eles iriam jantar- Um restaurante italiano não-tão-chique - e


aonde eles iriam depois para comer a sobremesa- Uma loja de sorvetes – E que música
eles ouviram no carro do Rick na ida de volta pra Rancho Corona. Durante toda a noite
Katie preencheu a conversa com detalhes sobre o que estava acontecendo nos
dormitórios e sobre suas aulas. Geralmente era Rick que tinha várias novidades sobre
seus cafés. Hoje ele falava: “O que mais está acontecendo?” e “Você não tem idéia do
quanto fica bonita quando fala rápido assim”.

Para Katie, toda essa atenção focada nela era maravilhosa, como se fosse vindo de
um mundo alternativo. Essa simplesmente não era a maneira que as coisas geralmente
funcionavam com ela e o Rick. É assim que parece pro Rick estar realmente
apaixonado por mim? 7

Katie sentiu um estranho nervosismo com esse pensamento. Convencer Rick a


decidir que ele era louco por ela foi uma meta que ela estabeleceu durante quase
metade da sua vida. Mas o que você faz quando uma meta, que demorou tanto para
ser alcançada, acontece? Pela sugestão de Katie, Rick dirigiu até a parte de cima do
campus. Ele estacionou o carro e disse a Katie para esperar. Ela ficou no banco do
passageiro enquanto Rick corria ao redor do carro para abrir a porta, oferecendo sua
mão para ajudá-la a sair. Os sapato de salto preto que tinha pegado emprestado de
Nicole faziam seus pés tremerem no cascalho.

- Eu tenho uma nova simpatia pela Cinderela agora, da pra ver como ela perdeu o
sapato. Katie segurou o braço de Rick enquanto tentava firmar seus passos. Na
verdade, Cinderela não está sozinha nessa história de perder o sapato, o meu saiu
quando eu tropecei nesse estacionamento no último mês de maio, no casamento do
Ted e da Cris, você se lembra?

- Não, quando foi que você perdeu o sapato? Rick a embrulhou com seus braços,
firmando seus passos.

7
Não sei se me fiz entender direito, o original é: Is this what it feels like for Rick to be truly in Love with
me?
- Quando eu estava correndo atrás da limousine, logo após que eu descobri a
brincadeira que você e o Douglas fizeram com Ted e Cris.

- Ah é.

Katie sabia que Rick não se lembrava disso. Agora que estava pensando, foi o Eli
que ficou de olho nela aquele dia. Foi ele que pegou o arranjo de flores de madrinha
que ela estava usando no cabelo. Aquele que disse que ela tinha perdido a aureola. E
ai ele começou a andar com as flores amassadas penduradas no retrovisor da sua
velha Toyota. Ele disse que isso lembrava a ele de orar. Rick e Katie foram em direção a
um dos bancos embaixo das palmeiras. Assim que eles sentaram, Rick a beijou. Katie
se jogou pra trás e olhou para ele antes que ele pudesse a puxar de novo para mais um
beijo.

- O que está acontecendo? Você está tipo, super gentil e ultra delicado hoje.

Rick sorriu, o mesmo sorriso apaixonado que ele tinha dado a ela mais cedo,
quando ela chegou no saguão do Crown Hall.

- Eu tenho algo que estou esperando pra te dar. Rick tirou do seu bolso uma
pequena caixa de jóia.

Katie prendeu a respiração. É agora? Agora? Não! Eu não estou pronta. Eu achei
que estava, mas não estou. Por favor Rick! Ainda não! Rick não ficou de joelhos. Ele
continuou sentado no banco ao lado de Katie e deu para ela a caixinha de jóia. Quando
ela estava com a caixa nas mãos ela percebeu que a caixa era muito grande para um
anel e muito fina também.

- O que é isso?

- Abra e você vai ver.

Katie abriu a caixa. A única luz perto deles vinha de umas luzinhas brancas
piscantes que estavam ao redor das palmeiras. Ela tinha certeza que o tesouro dentro
da caixa era uma jóia, mas ela não conseguia saber o que era. Levemente fazendo a
forma do que poderia ser um pequeno medalhão, ela disse:

- Você ganhou uma medalha de ouro nas olimpíadas e nem se importou em me


contar?

- Não, e não estrague esse momento tentando ser engraçada.

- Estragar o que? Eu não consigo adivinhar o que é isso.

- É um broche.
Rick fez a declaração com tanta finalidade que Katie sabia que a identidade do
objeto deveria ter sido obvia para ela. Mas ainda não era. Sua dúvida aumentava...

Um broche? O que exatamente é um broche?

Rick retirou o pedaço de jóia da caixa e ergueu-a para que Katie pudesse ver como
as pedras inseridas nele piscavam na luz fraca. O broche parecia uma explosão
redonda de raios dourados com muitas pedrinhas que pareciam piscar para ela.

- Isso pertencia a minha avó. A voz de Rick ficou macia novamente. Ela deu para
minha mãe. Um pouco antes do dia dos namorados minha mãe me perguntou se eu
gostaria de tê-lo para transformá-lo em algo para você.

- Então era isso que você ia me dar no dia dos namorados?

- Sim, eu planejava te fazer uma surpresa, mas ai eu percebi que não conseguiria
desenhar nada e mandar fazer a tempo do dia dos namorados. Então eu pensei que
podia ter dar nesse dia, e você poderia pensar no que gostaria de fazer com ele. Eu
estou te dando agora, quando você decidir o que quer fazer você me dá e eu mando
fazer a tempo do dia da formatura. Não será uma surpresa, mas será algo que você
goste, e isso é mais importante.

- Rick, você não tem que me dar isso, era da sua avó, é muito valioso.

- É exatamente por isso que eu quero te dar. Ele colocou o broche de volta no
algodão dentro da caixa e colocou-a nas mãos de Katie.

- Isso é importante para mim, para nós. Eu estava querendo te dar uma jóia desde
que nós nos tornamos um casal. Mas é só que com o dinheiro estando tão curto por
causa do café que vamos abrir, eu não consegui separar dinheiro suficiente para
comprar nada de valor. Quando minha mãe me deu esse broche, isso significou muito
para mim. Por isso que eu estava tão ansioso para te ver no dia dos namorados. Esse
broche significava que eu tinha algo a oferecer sabe? Eu poderia usar isso para fazer
uma jóia para você, e você poderia usar algo melhor do que esse simples colar que eu
te dei.

- Eu gosto do meu colar. Katie tocou a pedra verde no final da corrente.

- Eu queria ter dar algo melhor. Rick se inclinou e passou os dedos pela ponta dos
cabelos dela. Algo que represente a importância do nosso relacionamento. Nós
fizemos tudo certo Katie. Isso esta funcionando. Nosso relacionamento eu quero dizer.
Nós ficamos bem juntos. Eu queria ter algo que você pudesse usar o tempo todo que
simbolizasse o nosso sucesso.

Um sorriso surgiu dos lábios fechados de Katie. Ela sabia o que Rick queria dizer,
mas a sua escolha de palavras parecia engraçada para ela. O coração dele estava
definitivamente no lugar certo. Ela só nunca esperava que Rick Doyle a apresentasse
com um broche antigo e falasse que queria que isso simbolizasse o sucesso do seu
relacionamento.

- O que? Rick se inclinou para ela, tentando ler o significado de sua expressão de
contentamento.

- Isso é muito doce Rick, é mesmo, eu não sei o que dizer.

- Diga que esta feliz que eu sou o seu namorado e que você vai decidir até semana
que vem o que você quer fazer com o broche para eu mandar fazer a tempo da
formatura.

- Tudo bem, eu estou feliz que você e meu namorado e eu vou decidir assim que
puder.

- Ótimo, e se você precisar de ajuda, a Nicki talvez tenha algumas idéias.

Katie se inclinou para trás, ela ainda não estava acostumada a ouvir a Nicole sendo
chamada de “Nicki”.

- Ela já viu isso, não viu? Você mostrou para ela o broche?

- Não, ela só sabia por que minha mãe contou para ela. Eu queria que você visse
primeiro.

Katie se inclinou e deu um beijo na bochecha dele.

- Obrigada Rick, é muito amável da sua parte. Eu vou pensar em uma sugestão
assim que puder. E me desculpe pelo o dia dos namorados, e sobre a minha confusão
sobre o que estava acontecendo.

- Não precisa se desculpar. Ele a beijou antes que ela pudesse protestar de novo.
Se inclinando para trás e colocando suas mãos nas dele, Rick disse:

- Você se lembra do que você disse no ultimo natal?

- Você quer dizer sobre o eggnog da sua mãe? Eu disse que já me desculpei com
ela sobre isso. Eu não percebi que ela estava na sala ao lado da cozinha quando eu
cuspi tudo na pia. Eu não pensei...

- Não Katie, não e sobre o eggnog. Sobre nós. Você se lembra o que disse sobre o
nosso relacionamento?

- Não tenho certeza, o que eu disse?

- Alguns dias depois do natal nos estávamos no meu carro, não lembro aonde
estávamos indo, mas a gente estava conversando sobre como a gente passaria por
esse ultimo semestre. Os meses do outono tinham sido intensos para nos dois, comigo
trabalhando nos dois cafés e você com sua posição de A.R. e mudando de curso no seu
ultimo ano. Você se lembra?

- Mais ou menos.

- Eu estava dizendo como eu não achava que muita coisa ia mudar para nós nos
próximos meses, porque eu ainda estaria ocupado com os cafés e você ocupada com a
faculdade. Ai você disse:

- Então, nós vamos ter que aprender a viver ‘felizes-quase-para-sempre’.

- Ah é, eu me lembro de ter dito isso sim

- Bom, então isso será a nossa pulseira de ‘felizes-quase-para-sempre’, ou pode


ser um colar, ou o que você quiser que seja.

Ele a beijou de novo, e dessa vez foi como se até o seu beijo tivesse sido com a
intenção de simbolizar o relacionamento deles. Foi intencional e demorado.

Katie se puxou para trás. Rick tentou beijá-la de novo, mas ela disse:

- A gente provavelmente deveria voltar lá pra baixo.

-Nós vamos, daqui a um minuto. Rick envolveu seus dois braços ao redor de Katie
e falou em seu ouvido:

- Nos estamos quase lá. Você sabe disso, não sabe? Só mais algumas semanas.

Katie definitivamente teria se derretido se as palavras que Rick disse no seu


ouvido naquele momento tivessem sido “Eu te amo”. Essas são as palavras que ela
esperava ouvir.

Mas por agora o seu sussurrado “quase lá” parecia a um passo de um pedido de
casamento. Ela se aconchegou no calor do seu abraço e encostou sua cabeça no peito
dele.

Rick a segurou por um bom tempo. Ela conseguia ouvir seu coração batendo e
sentia o calor de sua respiração continua na sua cabeça. Os olhos dela estavam
abertos, sem piscar, como se ela estivesse tentando se concentrar para ver o seu
futuro. Katie olhou para a escuridão da noite ao redor deles e pensou consigo mesma
se “era isso”.

Eu vou me casar com esse homem? Eu realmente estou em casa? Porque eu sinto
como se tivesse algo faltando? O que poderia estar faltando? É isso que eu sempre
quis. Rick acabou de falar. Nós estamos quase lá. Todos os nossos desejos tão
procurados se tornarão realidade. Eu amo ele. Eu sei que amo.
- Rick?

- Hmm?

- Você esta ouvindo alguma música?

- Música? Rick parou um segundo antes de responder. Não.

Katie fechou seus olhos lentamente tentando ouvir o som do violino na sua
imaginação.

- Por quê? Você está?

- Não.

Ele se levantou do banco, empregou todo o jeito profundo de cavalheirismo que


era parte do que fazia Rick Doyle ser Rick Doyle, e gentilmente a puxou para ajudá-la a
ficar em pé.

- Então porque perguntou?

Katie permaneceu com a sua mão entrelaçada na dele.

- Nenhum motivo, estava só pensando

Rick riu:

- Acho que você já assistiu muitas comedias românticas.

- Provavelmente.

Ele deu um aperto na sua mão.

- Esse é o nosso romance Katie. Nós estamos escrevendo o roteiro. Você e eu, não
um roteirista qualquer de Hollywood.

- Então eu acho que deveria ficar ligada para saber as próximas atrações.

- Sim, você saberá, seja paciente.

- Eu estou sendo.

- Eu sei, eu também estou.


Capítulo 6
Quando Katie mostrou o broche à Nicole na manhã seguinte na lavanderia, ela
tinha quase certeza de que queria transformar as pedras em uma pulseira.

- O que você acha?

Katie escorou na máquina de lavar onde uma enorme trouxa de roupas dela
estava finalmente sendo lavada. As duas tinham se levantado cedo para um café da
manhã com a equipe de ARs às sete da manhã daquele sábado. Katie estava tão cheia
de energia depois daquela reunião que pediu a Nicole para ajudá-la a limpar seu
quarto. Em quarenta minutos as duas tinham feito um admirável progresso.

Nicole tirou um dos lençóis limpos de Katie da secadora.

- É lindo.

- É, lençóis limpos são os melhores, não são? Katie levou o lençol que Nicole tinha
jogado pra ela ao nariz e sentiu o cheiro de lavanda e gardênia vindo do tecido.

- Eu quis dizer que o broche é lindo.

- Ah. Sim. É, ele é lindo. Tenho certeza que é muito valioso. Só que é algo que eu
nunca usaria. Rick deixou claro que quer que eu o use, independente do que eu decida
em quê eu quero transformá-lo. Eu não sou muito de usar jóias, você sabe. Eu acho
que pulseira é a decisão mais segura. Ou colar. Não sei. Eu estou indecisa entre um ou
outro.

- Estou certa de que o quer que você decida vai ficar ótimo.

Nicole segurou uma das pontas do lençol, e Katie pegou a outra ponta. As duas
dobraram bem o lençol, o que, para Katie, parecia inútil, já que ela iria colocá-lo de
novo na cama.

- Nicole, é pra você ter uma opinião sobre isso. Rick disse que era pra eu te
perguntar o que você faria.

- Ele disse?

- Disse. Então, se ele tivesse dado o broche pra você, o que você faria com ele?

Nicole apertou os lábios e focou o olhar na porta aberta da secadora e não em


Katie.

- Eu deixaria o broche como ele é. E encontraria um jeito único de usá-lo.

- Como? No cabelo?
- Talvez. Nicole olhou para seu telefone e mandou uma mensagem para alguém
que tinha acabado de ligar pra ela.

- Posso te perguntar uma coisa? Katie se impulsionou pra sentar em cima da


secadora.

- Você acha que eu e Rick combinamos?

Os olhos de Nicole flamejaram em Katie enquanto o restante de seu corpo não se


moveu. Ela parecia estar estudando a expressão de Katie.

- Por que você tá perguntando isso?

- Não sei. Às vezes eu me pergunto se Rick e eu fomos mesmo feitos um pro outro.
E outras vezes é como se todos os meus sonhos estivessem se tornando realidade bem
na minha frente.

- É assim que você se sente em relação a ele agora? Que seu sonho está se
tornando realidade?

- Sim, claro. Eu acho. Quero dizer, sim. Com certeza. Katie pulou da secadora e
andou de um lado para o outro. É que eu nunca estive assim, tão perto de alguém.
Bem, com exceção do Michael no colégio, mas não era a mesma coisa. O Rick é tão
carinhoso, e tudo está indo bem. Muito bem. Eu acho que estou enlouquecendo.
Como é que o nome daquele negócio; quando você não quer arruinar algo, mas acaba
arruinando tudo?

Nicole ainda não se movia. Apenas seus olhos escuros continuavam fixos em Katie
enquanto essa andava pra lá e pra cá.

- Você quer dizer auto-sabotagem?

- Isso. Katie estalou os dedos. É isso que tá acontecendo comigo. Eu estou


considerando auto-sabotar nosso relacionamento, não estou? Por que eu faria isso? Eu
só posso ser louca.

Nicole franziu a testa, e voltou o olhar para a tela de seu telefone.

- Eu tenho que ir, ela disse calmamente. Te vejo mais tarde.

- É, te vejo mais tarde. Obrigada de novo pela ajuda com meu quarto e as roupas e
tudo. Você é a melhor, Nicole.

Nicole já estava do lado de fora quando Katie disse a última frase. Ela checou a
segunda secadora, que tinha acabado de parar de rodar enquanto ela andava de um
lado pro outro na lavanderia. A calça jeans dela ainda estava úmida, por isso ela
colocou a máquina pra funcionar por mais vinte minutos e retornou com seus lençóis
com cheiro de flores-primaveris ao seu quarto limpo.

O telefone celular dela vibrou, e Katie estava feliz por ver que a ligação era de tio
Bob.

- Ei, eu estava me perguntando quando eu ouviria notícias suas.

- Eu acho que você vai entender melhor o motivo da espera quando vir o que eu
tenho pra você com relação ao carro. Quando você acha que pode vir aqui pra esses
lados?

- Não sei. Talvez hoje mais pro fim da tarde. A Cris me chamou pra ajudá-la a
cuidar do bebê do Douglas e da Trícia. É provável que nós possamos ir aí depois. Eu
tenho que confirmar com a Cris. Dá mais de uma hora da casa do Douglas em Carlsbad
até a sua casa, não é?

- No mínimo uma hora.

- Então eu acho que nós podemos chegar aí lá pelas sete da noite. Seria muito
tarde?

Katie ouviu uma voz ao fundo, e Bob acrescentou:

- A Marta disse que vocês deveriam passar a noite aqui com a gente. O tempo está
ótimo. Ela disse... Espera. Aqui, ela mesma vai falar.

Um minuto depois Katie ouviu a voz estridente da tia de Cris no telefone.

- Vocês precisam de um momento de amigas. Era isso que eu estava tentando


explicar ao Robert. Vem pra cá e passe a noite. Nós três teremos todo o dia de amanhã
para passarmos juntas.

- É mesmo muito generoso da sua parte, mas eu não sei se...

- Eu vou levar vocês duas pra fazer compras e almoçar, Marta rapidamente
prometeu. Por minha conta. Faz muito tempo que eu não mimo vocês. Nós estamos
devendo umas as outras um tempo juntas.

Desde quando a tia Marta me considera uma de suas “meninas” e me leva pra
fazer compras? Essa é a técnica dela com a Cris. Eu nunca estive na lista de pessoas
favoritas da Marta. O que está acontecendo?

- Eu preciso ligar pra Cris pra ver se ela pode ficar fora tanto tempo assim. Eu
tenho muita coisa pra estudar, e eu preciso fazer um trabalho esse fim de semana.
- Você pode fazê-lo aqui, não pode? Nós redecoramos o andar de cima
recentemente. A Cris te contou? O quarto de hóspedes está duas vezes maior. Tem um
mesa e uma cadeira colocadas bem debaixo da janela onde você pode estudar, e Cris e
eu podemos ir às compras e trazer algo pra você. O que você me diz?

Katie não sabia o que fazer com o comentário de Marta. Tudo que Katie sabia era
que se ela pretendia ter algum trabalho feito nesse fim de semana, ela deveria
permanecer trancada em seu quarto.

- Ah, aqui. O Robert quer te falar algo agora.

- Ligue pra gente quando você puder, Katie.

- Ok. Obrigada. Ligo sim.

Ela pôde ouvir a voz de Marta ao fundo antes de Bob desligar.

- Você não está desligando, né?

Katie sorriu enquanto ligava para Cris. A possibilidade de ir até a casa de Bob e
Marta em Newport Beach era bem tentadora. Assistir os dois terem um
relacionamento tão bem sucedido apesar de terem personalidades tão diferentes era
divertido. Ainda assim, Katie sabia que se ela fosse, ela iria fazer zero de dever.
Entretanto, quando ela seria convidada à casa de Marta de novo? Já fazia um ano
desde que Katie tinha ido lá. Bob sempre se certificava de que eles tinham abundância
de coisas deliciosas para comer. Katie só estava escalada para trabalhar na segunda.
Mesmo assim, ela não deveria ir.

Por outro lado, ela tinha pedido Bob para ajudá-la a encontrar um carro, e era essa
a razão pela qual ela estava indo em primeiro lugar. Fazia sentido passar a noite já que
seria, pelo menos, duas horas e meia dirigindo de volta à faculdade. Três horas, se o
tráfego do fim de semana estivesse pesado. Entretanto, se ela fosse honesta consigo
mesma, ela não precisava comprar um carro até o fim do ano letivo. O melhor uso de
seu tempo agora seria diminuir o ritmo, focar nas aulas, terminar seus trabalhos logo,
trabalhar as horas extras que ela tinha acumulado quando ela estava doente, e botar
seus encontros com Julia em dia. Cris não precisava que Katie fosse com ela pra cuidar
do bebê Daniel. Qualquer que fosse a oferta que Bob tivesse conseguido no novo carro
dela, outra oferta apareceria. Ela deveria se trancar em seu quarto e trabalhar o
máximo que pudesse com seu tempo livre disponível.

Seria a sábia, sensata, e responsável coisa a se fazer com o restante do fim de


semana. E era isso que ela deveria dizer à Cris.

Duas horas mais tarde, com seus sacos de dormir embrulhados no porta-malas do
Volvo de Cris, Katie e Cris dirigiram morro abaixo da Universidade Rancho Corona.
Eu não deveria estar fazendo isso. Mas nós já estamos a caminho, e não vou
mudar de idéia. Uma vez que eu decidi fazer uma coisa, eu sigo em frente. Mesmo que
isso exija muita luta interior antes de eu decidir.

- Então, me explique porque nós estamos indo para casa dos meus tios depois de
cuidar do Daniel? Não ficou muito clara pra mim essa parte na nossa conversa pelo
telefone.

- Sua tia nos convidou. E como eu disse, eu pedi seu tio para ficar de olho em um
carro pra mim, e aparentemente ele encontrou um.

Katie pegou um livro em sua mochila aos seus pés.

- Eu vou ficar anti-social agora. Eu preciso mesmo usar um pouco desse tempo de
viagem para terminar minha leitura. Se eu conseguir terminar tudo que eu preciso
nesse fim de semana, eu tenho certeza que vou ganhar o Prêmio de Mulher
Multifuncional do Ano. Você não vai querer que eu perca, não é mesmo?

- Não, de jeito nenhum. Eu já sei que você pode fazer tudo. Você é ótima nisso.
Você conquista seus objetivos, qualquer que sejam eles. Ninguém te impede de fazer
isso.

Cris hesitou e então acrescentou:

- Por favor, não se ofenda, mas pela última vez, eu só quero ser aquela doce voz
na sua cabeça que te dá uma permissão.

- Permissão pra quê?

- Pra mudar de idéia se você quiser.

Katie não soube por que as palavras calmamente ditas por Cris penetraram tão
fundo em seu interior. Talvez porque Cris era a uma das poucas pessoas para qual
Katie sentia que não precisa provar quem ela era. Cris conhecia Katie mais do que
qualquer outra pessoa. Muito mais que Rick sabe sobre ela. E Cris sempre aceitou
Katie por quem ela era, o quê ela era, e onde ela estava durante um período particular
de sua vida. Cris era o creme e o açúcar da xícara de chá de Katie. Ela era tudo que
uma melhor amiga deveria ser. 8

E ela estava dando à Katie, a liberdade de mudar de idéia. De admitir que ela não
estava fazendo uma boa escolha. De dar meia volta e voltar para o dormitório.

8
Aaaah, alguém mais achou lindo o jeito que a Katie falou da Cris? Meus olhos encheram d’água. Mais
do que em qualquer momento dela com o Rick.
- Não, é isso que eu quero fazer, Katie disse. Você dirige. Eu leio. Você cuida do
bebê. Eu faço meu trabalho. Você dirige até a casa dos seus tios. Eu durmo no
confortável quarto de hóspedes e como a deliciosa comida deles. Vai dar tudo certo.

Um sorriso surgiu no rosto de Cris.

- Por que você está com esse sorrisinho aí?

- Não estou com sorrisinho nenhum. Estou lembrando. Lembrando do que eu


passei há um ano quando eu estava no seu lugar, tentando terminar meu último
semestre e planejar um casamento em cima disso tudo.

- Bem, eu não estou planejando um casamento. Eu não consigo nem planejar uma
pulseira.

- Planejar o quê?”

O livro de Katie permaneceu fechado enquanto ela colocava Cris em dia dos
detalhes sobre Rick e o encontro beijoqueiro e carinhoso deles na noite anterior. Katie
descreveu o broche, o símbolo do relacionamento ‘quase-felizes-para-sempre’ deles e
então pulou pr’aquela mesma conversa de certezas-incertezas que ela teve com Nicole
de manhã na lavanderia.

- É como se eu estivesse sabotando a mim mesma, não é? Por que eu faria uma
coisa dessas?

- É como se suas emoções estivessem naquelas roletas humanas dos parques de


diversão.9

- Achei que você ia falar que minhas emoções estavam numa montanha-russa.

- Não. Montanhas-russas vão pra cima e pra baixo. Você está no seu último
semestre de faculdade e envolvida num sério relacionamento. Eu diria que suas
emoções estão mais numa grande roleta. Você sabe, aqueles grandes brinquedos onde
você gira num grande círculo e vai pra cima e pra baixo tudo de uma vez.

- Eu sei o que é uma roleta humana.

- Então dê a si mesma bastante misericórdia, como você me deu ano passado.


Você esqueceu como era impossível conviver comigo?

- Eu não me lembro de você ser impossível de conviver.

9
Não encontrei um nome só pra traduzir esse brinquedo. O nome em inglês é Tilt-a-Whirl. Ta aí uma
foto. http://www.fotosearch.com/CSP031/k0310854/
- Bem, eu me lembro. Com uma mão no volante, Cris estendeu a outra mão e deu
um tapinha confortador no ombro de Katie. Tente não se pressionar demais. O Rick
não está te pressionando. Apenas deixe as coisas girarem por si só e chegarem a uma
conclusão natural.

- Agora você está falando igual ao Eli.

- Estou?

- Está, eu estava conversando com ele há umas semanas atrás sobre onde eu vou
morar depois que eu me formar, e ele disse que eu deveria ir pra África.

Cris gargalhou.

- Eu acho que ele estava falando meio sério. Ele disse que eu deveria experimentar
um novo círculo de vida antes que eu me case, e ele acha que eu experimentaria isso
se fosse pra África.

- Ele não disse ‘círculo de vida’ mesmo, né?

- Eu acho que foi isso que ele disse. Ou tirei isso do Rei Leão? Minhas referências
africanas devem estar se misturando. Deve ser o efeito da roleta humana que você
estava falando. Eli disse que minha mente é cheia de linhas curvilíneas que ficam
girando, e quando uma linha se cruza com outra, eu nunca sei quando uma linha parou
e onde a outra começou.10

- Eli disse isso, hein?

Katie acenou com a cabeça.

- Ele é um rapaz observador.

- É, é sim.

Katie abriu seu livro e fez um esforço pra encontrar onde tinha parado de ler mais
cedo naquela semana. Parecia que uma de suas linhas curvilíneas tinha cruzado com
outra, e agora seus pensamentos estavam em terras distantes, onde girafas galopavam
e leões repousavam.

- Você acha que eu deveria ir ao Quênia?

Cris olhou pra ela e de volta pra estrada.


10
Esse ‘círculo da vida’ de que a Katie está falando é o nome de uma música do filme ‘O Rei Leão’.
Aquela música que toca quando o Simba é apresentado ao reino animal pelo babuíno. Ta aí o clipe da
música em inglês: http://www.youtube.com/watch?v=vX07j9SDFcc
- Quando? Por quê?

-Eu acho que essa idéia de ir pra África me fascina um pouco.

Cris gargalhou.

- Eu acho que acabei de descobrir uma coisa. Katie se ergueu, ajeitando sua
posição e balançou vagarosamente a cabeça. Eu não quero perder uma aventura, não
é? É isso, não é mesmo? Eu estou questionando os meus sentimentos pelo Rick porque
eu tenho medo de que eu perca algo se ele e eu seguirmos em frente e ficarmos
noivos em breve. Só pode ser esse o motivo pelo qual eu fico hesitante. Eu sei como
será a vida com ele. Rick é uma linha reta contra todas as minhas linhas curvilíneas. Ele
estabelece um objetivo e corre atrás dele.

- Você também.

- Eu sei, mas eu amo ter a liberdade de escolher um novo objetivo a cada quinze
minutos. Rick escolhe um objetivo e fica com ele por meses. Anos.

- Isso é uma grande qualidade de liderança.

Katie acenou positivamente com a cabeça.

- Sim, mas nós ainda somos jovens. Há muito lá fora pra se ver. Você não se
lembra de como foi ótimo alguns verões atrás quando você, Ted e eu viajamos pela
Europa?

Uma expressão sonhadora tomou conta do rosto de Cris.

- Eu penso muito naquela viagem. As coisas eram tão simples naquela época. Eu
sei que eu reclamei enquanto nós estávamos viajando, mas agora eu penso em como
isso foi uma das melhores coisas que Ted e eu fizemos juntos antes de nos casarmos.
Eu amei estar com ele, e com você, e compartilhar tantas experiências maravilhosas
juntos.

Katie se inclinou pra frente.

- É exatamente isso que estou dizendo. Eu quero ter uma experiência dessas com
o Rick antes de nos casarmos. Ou, bem, se nós nos casarmos. Antes de noivarmos, pelo
menos. Eu quero experimentar coisas novas com ele. Ele e eu estamos enfiados na
mesma rotina o nosso relacionamento inteiro.

Katie cruzou os braços e reclinou no banco do carro, contente e convencida.

- Está resolvido. Rick e eu vamos pra África.

- E como exatamente você acha que Rick vai aceitar essa idéia?
Katie não respondeu imediatamente.

- Eu posso convencê-lo. Ele verá assim que eu explicar porque nós precisamos ter
esse tipo de experiência. Nós iremos depois que eu me formar, depois que o café abrir.
Só por uma semana ou duas. Nós iremos com o Eli quando ele for. Vai ser tipo quando
nós fomos à Europa e o Antônio viajou com a gente na Itália e nos levou até a casa dos
pais dele. Se nós formos com o Eli, ele pode nos mostrar tudo. Essa será a coisa mais
importante e definidora que Rick e eu já fizemos juntos. Eu estou pensando aqui
quando será que nós precisamos tomar nossas vacinas contra tifóide. Em breve,
acredito eu. Eu acho que o Eli disse que nós precisamos tomar vacinas contra febre
amarela também.

- Eita, Katie! Antes que você se imunize contra todas essas doenças tropicais, você
não acha que deveria falar com o Rick sobre isso?

- Como eu disse, eu vou convencê-lo. Qual o melhor momento pra ir do que nesse
verão?

Os argumentos de Cris pareciam ter acabado. Katie tirou vantagem do silêncio


dela pra seguir uma maravilhosamente longa e curvilínea linha em sua mente que
continha muitas informações sobre a África, Quênia, e projeto de água limpa que o pai
de Eli estava envolvido. Depois de trabalhar tão perto de Eli no levantamento de
fundos, Katie sabia muito mais sobre a África do que ela tinha percebido. Ela contou
pra Cris como o dinheiro estava tornando possível que pesados maquinários fossem
levados até vilarejos remotos onde as pessoas estavam morrendo por falta de água
limpa. Novos poços estavam sendo cavados. Vilas inteiras estavam se tornando
saudáveis depois de anos perdendo pessoas por causa de disenteria e outras doenças.

- Eli disse que o versículo sobre oferecer um copo de água fria no nome de Jesus
está acontecendo, literalmente, por causa desses poços, e crianças que estavam à
beira da morte agora estão ficando saudáveis. Escolas estão começando, e há colheita
em áreas que antes eram áridas. É um mundo totalmente novo lá, Cris. Muito precisa
ser feito para ajudar. Você pode imaginar como seria ótimo se Rick e eu pudéssemos ir
depois que eu me formasse e passássemos um mês lá só pra ajudar?

- Então agora passou de uma semana pra um mês?

- Ou o verão inteiro. Eu acho que seria incrível. A melhor coisa que nós já fizemos.
A gente sempre pode arrumar um lugar pra morar, e ele sempre pode abrir outro café.
Mas isso! Uma chance de ir à África – isso seria demais.

Cris não respondeu.

A imaginação de Katie rodopiou em meio às possibilidades. Ela se sentiu mais feliz


do que já se sentira em muito tempo.
- Nós podemos fazer isso. Não vai ser tão difícil arranjar tudo. Eu deveria mandar
uma mensagem para Eli para descobrir o dia que ele vai embora. Nós três poderíamos
pegar o mesmo vôo.

- Katie, você tem certeza que quer fazer isso sem primeiro dar a chance ao Rick de
expressar a opinião dele?

- Eu não vou contar a Eli que nós estamos indo; só vou colher informações. Seus
dedos tinham terminado de escrever a mensagem e estavam prontos para apertar o
Enviar.

Com um olhar para Cris, ela disse:

- Por que você tá me olhando com essa cara de brava? Você acha que eu estou
indo rápido demais?

- Eu acho que você embarcou numa linha bem curvilínea, e ela está te levando
numa direção muito louca.

- É, mas por que não? Katie colocou seu telefone no colo. Eu quero fazer isso, Cris.
Tem algo de errado comigo em preferir ir a um vilarejo africano depois que eu me
formar ao invés de sair pra comprar um anel de noivado e um vestido de noiva?

- Não, não há nada de errado com você, Katie. Nada mesmo.

- Mas você acha que eu deveria ir mais devagar. Dar um passo de cada vez.

- Um passo de cada vez é sempre uma boa coisa a se fazer.

- Tá bom. Katie deletou a mensagem para Eli. Eu vou falar com Rick primeiro. E
agora eu suponho que você vai me dizer que eu deveria orar sobre isso tudo.

- Isso também é sempre uma boa coisa a se fazer.

Katie voltou a se focar em seu livro enquanto Cris dirigia. Ela sabia que deveria
orar, mas ela não estava pronta pra falar com Deus sobre isso. Ainda não.
Capítulo 7
Katie acabou não estudando durante o restante da viagem até Carlsbad e até a
charmosa casa na praia onde Douglas e Trícia moravam. A distância dera à Katie tempo
para “esticar” suas linhas curvilíneas de pensamento e colocá-las em organizadas e
retas fileiras. Pelo menos, naquele momento, eles pareciam ser organizados e “retos”
pensamentos. Quando seus pensamentos estavam esticados daquela forma, eles
pareciam estar dormentes. Adormecidos. Incapazes de girarem pela sua imaginação.

Katie sentiu como se toda a animação tinha sumido. Era coisa demais pra se
pensar naquele momento.

Douglas as recebeu na porta e envolveu Cris em seus braços e depois Katie, dando
as boas vindas a elas com um caloroso e firme abraço. Katie tinha se esquecido do
quão maravilhoso era receber um abraço de Douglas. Ela sentiu um sorriso surgindo
dentro de seu espírito quando ela entrou na casa de Douglas e Trícia. Essa casa
continha vívidas memórias da noite em que Cris e Ted ficaram noivos. Isso foi quando
e Katie e Rick se reencontraram, conversando a noite toda e trabalhando lado a lado
na manhã seguinte ao fazerem omeletes para todos. As alegres sensações dos
momentos iniciais de se apaixonar estavam flutuando pelo ar enquanto ela olhava a
sua volta e se lembrava de sentar no sofá com Rick, trocando sorrisos e sentindo as
primeiras flores brotarem depois de um longo inverno de esperanças escondidas.

Nota a si mesma: Você deve estar louca por pensar em ir à África. O que você tem
aqui com o Rick é tudo que você sempre quis. Lembra?

Trícia entrou na sala de estar e seu rosto em formato de coração estava corado.

- É muito bom ver vocês duas! Obrigada por fazerem isso por nós.

O bebê Daniel estava nos braços dela, timidamente encolhendo o queixo e se


agarrando à Trícia.

- Ele está enorme! Katie falou. Qual a idade dele?

- Quase nove meses. Dá pra acreditar? Qual foi a última vez que você o viu?

- Não lembro, mas ele era bem miudinho, Katie falou. Ele dormia a maior parte do
tempo.

- Aqueles dias se foram, Douglas disse. Agora ele está ativo o tempo todo, não é
mesmo, Dani boy?

O loirinho Daniel virou-se e olhou para Katie e timidamente se enrolou de volta


em sua mamãe.
- Eu estava tentando o colocar pra dormir, Trícia disse. Mas eu acho que ele sabe
que tem algo acontecendo.

Cris esticou as mãos e sorriu. Com uma voz mansinha ela disse:

- Você me deixa te carregar? Vem cá.

Levou alguns minutos, mas Daniel decidiu quebrar o gelo e deixar Cris pegá-lo dos
braços de Trícia.

- Você tem jeito com crianças, Katie disse brincando.

- Tem mesmo, Douglas concordou. Da última vez que ela e Ted estiveram aqui,
Daniel quis que ela o segurasse o tempo todo. Ei, é melhor que nós saiamos enquanto
podemos. Todas as informações estão no balcão da cozinha. Nós planejamos estar de
volta por volta das quatro.

- Está ótimo, Cris disse. Divirtam-se. Nós ficaremos bem aqui.

Cris caminhou até a cozinha com Daniel nos braços e foi até pia enquanto Douglas
e Trícia saíam pela porta da frente. Katie assistia enquanto Cris apontava para alguns
pequenos objetos no peitoril da janela acima da pia e falava com Daniel em voz baixa.

- Você é mesmo natural com crianças, Katie disse.

- Eu aprendi bastante no ano em que trabalhei no orfanato na Suíça. Crianças só


querem se sentir seguras. Não é, Daniel? Você lembra de mim, não lembra? Ah, você é
tão lindo. Você faz idéia do quão lindo você é? Você, definitivamente, tem os olhos da
sua mamãe.

- Enquanto vocês dois ficam aí nessa seção guti-guti, eu vou pegar minha mochila
do carro e fazer meu trabalho. Katie abriu a porta da frente bruscamente,
acidentalmente deixando a “tela” da porta bater. Ela se encolheu. Um segundo depois
ela ouviu Daniel gritar.

Ops. Isso não é bom.

As três horas seguintes se tornaram o tempo mais difícil de estudo que Katie se
lembrava de ter tido. Mais tarde ela admitiu que deveria ter desistido e só ajudado Cris
a manter Daniel entretido. Ele não dormiu, como Trícia disse no bilhete que poderia
acontecer. Ele estava feliz e interessado em brincar uma hora, depois ele queria
engatinhar até a parede onde o laptop de Katie estava plugado. Quando Cris o
impedia, ele gritava.

- Eu não fazia idéia de que crianças poderiam ser tão cansativas, Katie declarou
quando Douglas e Trícia retornaram. Como vocês agüentam? Quero dizer, ele é
adorável, mas você tem que vigiá-lo a cada minuto. Ele manteve Cris ocupada o tempo
todo.

- Eu não liguei nem um pouco, Cris disse. Ele foi perfeito. Não foi, Dani boy?

Trícia deu um abraço em Cris.

- Você vai ser uma ótima mãe. Vocês duas serão.

Katie não conseguia se ver como mãe. Pelo menos não em breve. Ela se
perguntava se Ted e Cris estavam pensando em começar uma família. Fazia um tempo
desde que ela conversara com Cris sobre detalhes mais pessoais de seu casamento
com Ted. Ele estava trabalhando como pastor dos jovens na igreja deles e parecia estar
ocupado o tempo todo. Katie não se lembrava da última vez que o viu.

Ela teria que colocar a conversa em dia com Cris assim que botassem o pé na
estrada no caminho para a casa de Bob e Marta em Newport Beach.

Ao invés de irem embora logo, elas ficaram um pouco conversando com Douglas e
Trícia, que tinham usado o tempo fora para procurar por uma casa nova. A pequena
casa deles estava pequena demais agora que Daniel estava crescendo e Douglas estava
trabalhando meio período em casa em consultoria de projetos para negócio de
investimentos financeiros que um parente dele o tinha arranjado.

- Algum progresso na questão da casa? Cris perguntou.

- Não, Trícia disse. Nós temos uma idéia melhor do que nós não queremos e o que
não podemos comprar. Não acho que vamos mudar tão cedo. Nós teremos que ser
mais criativos com o espaço que temos aqui.

- Rick foi esperto de ter comprado os dois cafés naquela época. Douglas falou. Ele
me colocou em dia dos acontecimentos há algumas semanas, e eu tenho que dizer, ele
foi mesmo muito inteligente nesse negócio. Ele e o irmão estão esperando ganhar um
bocado de dinheiro.

- É isso que ele me diz, Katie disse.

- Sabe, eu estava pensando um dia desses sobre quando Rick, Ted, e eu dividimos
um apartamento nos nossos dias na UC San Diego. Quanto tempo tem isso? Cinco
anos? Não, tem que ser pelo menos seis. Enfim, é muito massa ver como as coisas
estão agora, não é?

Katie sorriu. Ela não apenas tinha se esquecido do jeito todo-envolvente, caloroso,
e firme que Douglas abraçava, mas ela também tinha se esquecido que massa era a
palavra favorita dele.
- É, e falando em massa, quem iria um dia adivinhar que seria eu que ficaria com o
Rick?

- Eu que não! Douglas soltou. “Você é a última pessoa em quem eu teria...

Trícia lançou um olhar pra ele que o fez retroceder.

- Quero dizer, quem imaginaria que vocês dois seriam os últimos de nós a se
casarem? Você é a maçã do topo, Katie. O Rick é um homem abençoado… Quero dizer,
isso é, se vocês dois estão chegando perto de... anunciar algo em particular...

- Douglas, você pode parar a hora que você quiser, Katie disse.

- Que bom. Eu não devia ter me metido nesse assunto, né? Falei mais que a língua.

Katie sorriu. Ela gostava de Douglas. Ela sempre gostou. Quando o assunto era
falar mais que a língua, no passado, Katie era quem, freqüentemente, ia fundo nessas
conversas, e Douglas era quem a oferecia um pára-quedas. Era bom, na verdade, estar
do outro lado agora, era ela quem estava amortecendo a queda dessa vez.

- Mudando de assunto, Trícia disse, pegando um caminhãozinho de brinquedo e


entregando a Daniel, o que a equipe da igreja decidiu com relação a posição de Ted?
Eles vão manter o trabalho dele em tempo integral?

- Do que vocês estão falando? Katie perguntou.

- Eu não te contei ainda, mas Ted descobriu semana passada que a igreja está
cortando pessoal, e ele é a última pessoa que eles admitiram. Eles devem cortar
algumas horas dele e pedirem pra ele trabalhar meio horário. Mas eles ainda não
pediram.

- Meio horário? Como é que o Ted poderia fazer tudo que ele faz em meio
horário? Se eles tivessem que fazer alguma coisa, seria contratar um assistente para
ajudá-lo.

Cris deu de ombros.

- Eles estão passando por um tempo difícil na igreja no momento. Até agora, Ted
ainda está empregado. Nós veremos o que acontece, entretanto.

Katie não fazia idéia de que algo fora do normal estava acontecendo na igreja.
Mas também, ela só ia à igreja aos domingos de manhã, e mesmo assim, não era todo
domingo. Essa era uma rotina desde o semestre passado que Katie planejava mudar
assim que terminasse a faculdade.

Por falar nisso, ela se lembrou de uma conversa que teve com Ted uns meses
atrás. Ela tinha falado com ele que assim que o verão chegasse, ela poderia se
voluntariar para as programações com o grupo de jovens, assim como ajudar nos
domingos e com os eventos.

Eu acho que não vou ser de muita ajuda para Ted se eu for pra África nesse verão.
Se ele tiver que trabalhar meio horário, ele vai precisar de mais ajuda que nunca.

Douglas, Cris e Trícia continuaram conversando, mas a atenção de Katie voou para
outro lugar. Ela se perguntava se as mesmas borboletas no estômago que ela sentiu
quando pensou pela primeira vez em viajar pra África continuariam lá se ela ajudasse
Ted com o grupo de jovens. Era a expectativa de estar livre da faculdade e dos estudos
que estava impulsionando Katie a se apressar para fazer novos planos?

Há uma coisa que eu sei com certeza. Meu julgamento a respeito de qualquer
assunto não é confiável. Katie confessou seus sentimentos de incerteza à Cris
enquanto elas dirigiam na Interestadual 5 para Newport Beach.

- É o stress, não é? Eu acho que preciso tomar uma vitamina pra diminuir o stress.
Você pode parar na primeira farmácia que encontrar? Talvez eu precise de mais cálcio
também. Minhas unhas não têm crescido quase nada o semestre inteiro. Leite tem
muito cálcio, não tem? Pega a próxima saída, pode ser?

- O que você quer? Vitaminas ou leite?

- Eu estava pensando mais em um milkshake. Eu pago. Quando foi a última vez


que você teve um concentrado, calórico, feliz milkshake de baunilha?

- Chocolate, Cris a corrigiu. Se eu vou beber esse tanto de calorias, será,


definitivamente, chocolate. E você está certa. Tem muito tempo. Vamos encontrar um
lugar que sirva milkshake antes de chegarmos à casa dos meus tios e a Tia Marta me
coloque numa dieta de soja pelo restante da nossa estadia.

- Tia Marta não faria isso!

Cris gargalhou.

- Você não conhece minha tia. O primeiro verão que eu fiquei com eles, eu desci
para tomar café numa manhã, e o tio Bob estava fazendo waffles...

- Ooh, waffles. Agora eu fiquei com fome. Katie cruzou os braços sobre seu tronco.

Mesmo depois de Trícia ter tido que elas podiam se sentir á vontade para comer o
que quisessem, tanto Cris quando Katie acharam meio engraçado assaltar a quase
vazia geladeira deles.

- Então, meu tio me serviu um waffle quentinho, cheio de manteiga derretida em


cada quadradinho e a quantidade certa de cobertura.
- Para! Você está me torturando!

- Foi exatamente assim que eu me senti quando minha tia entrou na cozinha e
gritou estridentemente. Imagina você, eu só tinha quinze anos e pesava, pelo menos,
cinco quilos a menos do que peso hoje. Eu estava pronta para dar minha primeira e
deliciosa mordida, mas Marta...

- Ooh, eu adoro quando você a chama assim! Isso ta ficando bom!

- Minha tia Marta vem marchando na cozinha, arranca o garfo das minhas
desejosas mãozinhas, e bate algo horrível e nojento, mas decididamente nutritivo no
liquidificador. Ela me diz o que uma mocinha deveria beber no café da manhã se
quisesse ter cabelos sedosos e pele limpa, ou qualquer coisa assim.

- Você bebeu?

Um sorriso malicioso surgiu no rosto de Cris.

- Não. Eu derramei na pia – na frente do meu tio, sem mais. Eu me senti a


adolescente mais rebelde na face da Terra! Daí eu comi o máximo de waffles que
consegui enfiar na minha boca.

Katie caiu na gargalhada.

- Eu acho que nunca ouvi essa história. Isso é um clássico.

- É, é sim. Eu estou feliz por nós estarmos indo lá hoje á noite. Eu preciso me sentir
jovem de novo.

- E talvez um pouquinho rebelde?

Cris ironizou uma expressão de choque.

- Rebelde? Ah, sim, com certeza! O que deveríamos fazer? Deixar nossas toalhas
molhadas no chão do banheiro? Colocar nossos pés sobre a mesa? Não, já sei. Nós
vamos fazer waffles hoje á noite. Com cobertura e creme de chantilly.

- Você está demais, hein? Nada de fazer waffle pra mim. Não depois do desastre
da pipoca de microondas na cozinha da sua casa no outono passado.

- Eu quase me esqueci disso. Cris acionou a seta do carro, preparando para virar o
carro em direção a um restaurante fast-food. Eu aposto que eles tem milkshakes aqui.
O que você acha?

- Eu acho que nós vamos nos presentear com grandes milkshakes. E batata frita.
Nós podemos mergulhar nossas fritas no milkshake.
Cris dirigiu o carro até o drive-through e esperou a voz da atendente surgir no
auto-falante.

- Nós vamos querer dois milkshakes de chocolate e uma batata frita grande.

- Não, um milkshake de baunilha, Katie mudou de idéia. Um de baunilha e um de


chocolate. E duas batatas fritas.

- Mais alguma coisa?

- Não.

- Ah, olha, cachorros-quentes de chili e queijo! Katie estava passando o olho no


menu. E anéis de cebola. Eu estou ficando com muita fome.

- O total da sua compra estará na janela. A atendente disse.

Elas dirigiram mais pra frente e rapidamente receberam duas cheias sacolas de
comida. A atendente as informou o total, e era muito mais do que o esperado.

- Eu acho que está errado, Cris disse. Nós devemos ter recebido a comida de outro
cliente. Nós pedimos um milkshake grande de baunilha, um de chocolate, e duas
batatas fritas grandes.

A atendente checou o pedido.

- Certo, e você também pediu dois cachorros-quentes e anéis de cebola.

- Não, nós não pedimos isso, Katie disse. Eu só estava dizendo ‘Olha, eles tem
cachorros-quentes de chili e anéis de cebola.’ Viu o que aconteceu? Eu só estava
comentando o que vocês tem no menu, caso eu queira algum dia.

A atendente olhou tão confusa que Katie disse, Deixa pra lá. Aqui, eu pago. Nós
vamos levar tudo. Ela entregou mais dinheiro do que o valor total da compra para a
atendente. Pode ficar com o troco. E tenha um bom dia.

- Obrigada! A moça aparentou muito agradecida.

Cris dirigiu para fora do lugar e disse:

- O que nós vamos fazer com toda essa comida?

Katie pegou a sacola e puxou uma batata frita.

- Acho que vamos ter que comer. Você quer que coloque o canudinho no seu
milkshake pra você?

- Sim, obrigada. Cris escorregou sua mão dentro da sacola e puxou algumas
batatas fritas. Estão quentes. Nada como uma boa e quente batata frita.
As duas amigas comeram durante todo o caminho até Newport Beach. Mesmo
elas estando super famintas quando saíram de Carlsbad, as duas se sentiram
desconfortavelmente cheias quando Cris estacionou seu Volvo na estreita área de
estacionamento perto da casa da praia de Bob e Marta.

- Eu estou com vontade de dar um super arroto agora. Katie levou a mão á boca.

- Não se atreva! Você tem que ter modos aqui, Katie. Você sabe disso, né?

- Sim, claro que eu sei. E se nós entrarmos primeiro, dissermos oi, e depois
voltarmos para buscar nossas bolsas? Daí eu posso arrotar em particular.

- Boa idéia.

Elas caminharam pelo familiar caminho que levava até a porta da casa de Bob e
Marta. Cris bateu na porta educadamente. Um barulho abafado de um arroto escapou
dos lábios fechados de Katie.

- Katie! Cris sussurrou.

- Ei, eu estava com a boca fechada. Você deveria estar feliz por isso.

- Bem, mantenha sua boca fechada para que nenhuma surpresa resolva escapar
de novo.

Bem nessa hora a porta abriu com um empurrão. Tanto Katie como Cris abriram
suas bocas e praticamente em uníssono puxaram o ar com força, surpresas, causando-
lhes soluços.

Em pé, frente a elas, estavam duas surpresas.


Capítulo 8
- Ted!

- Rick!

- O quê é que – hic – vocês estão fazendo aqui? Katie falou em meio a soluços.

Rick e Ted pareciam bem satisfeitos com a surpresa.

- Surpreendendo vocês duas, Ted disse.

- E conseguiram, Cris disse com outro soluço. Agora vocês têm que nos assustar
pra que esses soluços – hic – parem.

- Sério mesmo. Katie pressionou sua bochecha no peito de Rick e recebeu um


grande abraço dele enquanto Cris e Ted deram um beijo enlaçado por um soluço.

- Por que vocês estão soluçando? O que vocês duas estavam fazendo? Rick
perguntou.

- Só estávamos comendo.

Ted diminuiu o tom de voz:

- Sua tia não vai gostar disso. Ela fez reservas para o jantar, e aparentemente
vocês estão atrasadas.

- Atrasadas? Cris e Katie se olharam e soluçaram de novo, seguindo de uma


gargalhada conjunta.

- Nós não sabíamos que deveríamos estar aqui num horário determinado, Cris
disse.

- Cris, querida, é você? A voz estridente de tia Marta chamou da sala de estar.

Rick levou um dedo aos seus lábios e ofereceu um sorriso caloroso à Katie.

- Ela tem planos. Acho melhor nós só concordarmos.

- Existe alguma possibilidade de vocês dois serem parte do plano dela? Katie
perguntou.

- Ela ligou e perguntou se nós poderíamos vir e fazer uma surpresa pra vocês.

- Por quê? Cris perguntou. O que ela está aprontando?

- Não faço idéia. Entre, e nós descobriremos.


- Eu preciso tirar minha bolsa de dentro – hic – do carro. Cris disse.

- Eu pego pra você, Rick ofereceu.

- Eu vou com você, Katie disse. Ela e Rick caminharam de mãos dadas uns poucos
metros da porta da frente até que Katie sentiu uma necessidade incontrolável de
arrotar. Ela colocou a mão sobre sua boca e tentou silenciar o “intrometido”.

Rick se virou e olhou pra ela enquanto o barulho do arroto abafado saía de trás de
seus lábios fechados.

- Você tá bem?

Katie balançou a cabeça afirmativamente, mas não ousou abrir a boca. Ela se
sentia muito melhor. Seus soluços também tinham acabado.

A primeira coisa que Rick comentou quando eles abriram a porta do carro foi o
inconfundível cheiro de fast food.

- O que vocês duas estavam comendo?

Cachorros quentes e milkshakes. E anéis de cebola e batatas fritas. Mas os


cachorros quentes e os anéis de cebola não foram idéia nossa.

- Quê?

- Nada. Deixa pra lá. As bolsas estão no porta-malas. Então, como você conseguiu
uma folga pra vir aqui? Eu estou impressionada.

- Você está feliz por eu ter vindo?

- Sim, claro. Muito feliz. Eu pensei que passaria meu tempo aqui trabalhando em
projetos da faculdade, mas isso é muito melhor. Vai ser muito mais divertido estar com
você.

- E comprar um carro. Rick acrescentou.

- Oh, o tio Bob te contou?

- A Marta contou. Rick fechou o porta-malas, pegou as bolsas dela e ficou de pé na


frente de Katie com uma expressão não-muito-feliz no rosto.

- Por que você não me contou, Katie?

- Contei o quê?

- Que você estava pronta pra comprar um carro.


- Eu sabia que você estava ocupado. Eu liguei pro tio Bob há um tempo e perguntei
se ele podia me ajudar.

- Eu não estou tão ocupado que eu não possa estar aqui pra você em momentos
como esse. Eu quero te ajudar em decisões importantes. Você sabe disso, não sabe?

- A Cris disse que eu deveria ter te contado. É que eu fiquei tão ocupada, e pra ser
sincera, eu não achei que você se importaria.

- Não é que eu me importe, é seu carro e seu dinheiro. Mas eu não entendo.

- Não entende o quê?

- Primeiro, onde você conseguiu o dinheiro pra comprar um carro, e segundo, por
que você não me contou?

- Contar sobre o dinheiro ou sobre comprar um carro?

- Os dois.

- Bem, eu… eu, hmm…

Rick estava impaciente, de pé segurando as bolsas.

- Nós podemos ir lá dentro, daí eu te conto a história toda? É meio longa.

A expressão de Rick deixou claro que ele não gostou da idéia. Katie sabia que seria
impossível ter uma conversa particular com Rick assim que eles estivessem lá dentro
com tia Marta comandando o show.

- Ok, eu vou te contar. Na verdade, não é assim tão complicado. Eu provavelmente


compliquei mais do que realmente é. Katie transferiu seu peso para o outro pé.

- Eu tinha uma tia avó que faleceu, e ela me deixou um dinheiro. Eu decidi usar
parte dele para comprar um carro novo. Bem, na verdade, um carro usado, mas será
novo pra mim.

Rick inclinou a cabeça para um lado e olhou bem pra Katie. Mesmo quando ele
ficava nervoso, ele era lindo. Seu cabelo escuro estava maior que o usual e caía sobre
sua testa de um jeito que parecia que ele estava pronto para uma aventura, apesar de
Katie saber que a idéia dele de aventura seriam reuniões com um banqueiro, um
corretor de imóveis e um fornecedor, tudo na mesma tarde.

A pergunta seguinte de Rick veio lenta:

- Quando?

- Quando eu vou comprar o carro? Amanhã, se tudo der certo.


- Não, Katie. Quando sua tia avó faleceu?

- Não sei. Quase um ano atrás, eu acho. Eu nunca a conheci. Eu não sabia do
dinheiro até que minha mãe me encaminhou a carta do advogado. Isso foi no outono
passado.

- Você nunca me contou isso.

- Bem, muita coisa estava acontecendo naquela época. Sabe a Julia, minha
diretora dos residentes? Ela me ajudou a resolver tudo. Falando nisso, Rick, você
lembra aquele dia no outono passado quando você e Josh estavam no banco
resolvendo uma questão do empréstimo, e eu estava lá com a Julia?

- Lembro.

- Aquele foi o dia que eu recebi o dinheiro e depositei no banco.

- E você não me contou até hoje? Por quê?

- Tinha muita... tinha... eu não sei. É que pareceu mais fácil não dar tanta
importância pra isso.

Rick colocou as bolsas no chão e as mãos nos quadris. Katie não gostou dessa
postura de Rick. Ela nunca gostou. Essa era a postura ‘vou-agir-como-se-fosse-seu-
patrão-agora’. Ela nunca reagira bem a momentos como esse quando ela trabalhava
pra ele no Ninho da Pomba.

- Katie, exatamente qual a quantia que sua tia te deixou?

- Ela era minha tia avó, na verdade.

- Por favor, não começa. Não tente fugir do assunto. Só me diga. Eu acredito ter o
direito de saber quando minha namorada herda uma quantia substancial de dinheiro.
Eu te contaria se eu tivesse herdado dinheiro. Quanto foi?

- Eu não quero te contar. Katie se sentiu desafiada e irritada pela abordagem de


Rick.

- Você não quer me contar? Por quê?

- Foi muito. Podemos deixar assim?

- O que é muito? Você está falando de dez mil dólares? Vinte? Trinta?

Katie manteve seus lábios fechados enquanto Rick continuava a aumentar os


números. Quando ele chegou a cem mil dólares e a expressão dela ainda não tinha
mudado, Rick jogou os braços para o alto e virou-se para longe dela.
Andando em círculos ele gritou:

- Katie, você só pode estar brincando comigo! Você herdou mais de cem mil
dólares?

- Eu não estou dizendo isso.

- Seus lábios podem não estar dizendo, mas seu rosto está me dizendo tudo. Rick
pausou, analisando-a mais de perto.

- Foi mais de cem mil, não foi? Foi mais de duzentos mil?

Quando a expressão de Katie ainda não mudara, Rick colocou ambas as mãos no
alto de sua cabeça e berrou:

- Eu não posso acreditar nisso!

O coração de Katie estava batendo de raiva de Rick por pressioná-la quando ela
tinha deixado claro que não queria falar sobre isso agora.

- Você está me dizendo que estava sentada em mais dinheiro do que Josh e eu
precisávamos para nossos fundos iniciais para os cafés, mas você nunca me contou.
Você nunca nos ofereceu um empréstimo para que nós não tivéssemos que vender
nossas almas para o banco por causa dos juros altos. Por que você acha que eu estou
tentando fazer desses cafés um sucesso financeiro? Você não está vendo a
importância do que nós precisamos para o nosso futuro juntos, Katie? Eu não acredito
nisso. Eu não acredito que você escondeu isso de mim!

Uma dúzia de respostas afiadas estava pronta pra sair, na ponta de seu ânimo
quente, mas surpreendentemente Katie as manteve dentro de si. Por uma vez na vida,
ela deu pra trás. Ela sabia que poderia arruinar tudo se soltasse a resposta errada para
Rick.

Ao invés de palavras quentes fluindo de sua boca, lágrimas frias fluíram com toda
força de seus olhos.

Rick olhou pra ela sob a luz fraca da rua e mudou sua expressão. Ele foi de Rick
Furioso para Rick Neutro. Katie sabia que ele quase nunca a vira chorar. Ela não era
muito de chorar, especialmente perto dele. Agora as lágrimas estavam fluindo tão
rapidamente que a visão dela tinha ficado embaçada. Um som surgiu em sua garganta,
e ela abriu os lábios apenas o suficiente para deixar o “trêmulo” e desesperado som
escapar.

- Eu não entendo, Rick disse calmamente. O que aconteceu com nosso


relacionamento, Katie? Nós estávamos fazendo tudo certo. Quando é que você deixou
de confiar em mim? O que mais você não me contou? O que eu devo fazer com isso
tudo? A voz dele aumentou. Especialmente porque nem agora você quer me contar.
Por que você não me conta a quantia? O que é que eu fiz a você durante esse um ano
e meio que poderia ter feito você esconder algo tão significante assim de mim? Por
que você não confia em mim?

- Eu confio em você sim! Katie gritou. Tudo que eu estou pedindo é que você
confie em mim e não fique insistindo pra eu te contar!

- Se você confiasse em mim, isso não seria um problema. Nós não estaríamos
tendo essa discussão. Especialmente agora, quando todos estão lá dentro esperando
por nós, e nós deveríamos estar tendo um ótimo tempo juntos.

- Eu não posso acreditar nisso, Katie. Tudo que você tinha que fazer era me contar.

- Então tá! Ela sabia que tinha trocado uma marcha interna dentro de si e estava
indo rumo a uma resposta “crua”. Apesar de ela ter dito a si mesma que jamais
revelaria a alguém a quantia que recebera, ela “cuspiu” a resposta na cara de Rick e
pegou sua bolsa e marchou em direção a casa.

Rick correu apressadamente atrás dela e a pegou pelo braço. A expressão no rosto
dele era uma mistura de deleite e surpresa, sombreada pela fúria ainda presente.

- É por isso que eu nunca te contei, Katie disse em voz baixa.

- Esse olhar bem aí. Eu nunca quis que você me olhasse assim.

- Assim como?

- Como uma grande e suculenta costela de porco, quando você já está sem comer
há uma semana.

Rick se afastou. Ele afrouxou sua mão do braço de Katie.

- Não fale assim de mim, Katie. Eu não sou assim.

- Eu não quero que ninguém saiba, Rick. Estou falando sério. Ninguém! Não é da
conta deles. Se eu um dia descobrir que você contou a alguém...

- Katie, querida, relaxe. Ele tentou abraçá-la, mas ela se afastou e ficou imóvel.
Todas as lágrimas dela tinham acabado. Seu maxilar estava firme. Ela queria gritar e
marchar dali para ficar sozinha tempo suficiente para se acalmar. Essa era a pior
sensação do mundo.

- Eu não vou contar a ninguém. Você tem minha palavra. Mas, Katie, você tem que
saber que eu não sou qualquer um. Sou eu. Seu namorado. Em breve seu noivo.
Katie sentiu seu rosto franzir involuntariamente quando ele disse “noivo”. Era a
primeira vez que ele usara o termo com todas as letras.

- Eu não sou apenas qualquer um, ele repetiu.

Katie afirmou com a cabeça lentamente. Algo dentro dela “amaciou” um


pouquinho. Silenciosamente ela admitiu que deveria ter contado a Rick. Mesmo se ela
não quisesse revelar a quantia, ela poderia ter controlado a informação ao invés de
ignorar o assunto, colocando-se em risco a uma revelação desse tipo que acabara de
ocorrer. Ela poderia ter lidado com a coisa muito melhor. Rick era seu namorado e, de
acordo com ele, em breve seu noivo. Ela deveria ter contado a ele.

- Desculpe-me, ela sussurrou.

Os braços fortes de Rick estavam em volta dela nesse momento.

- Desculpe-me também. Eu não queria ter ficado nervoso desse jeito.

- Tudo bem. Eu não deveria ter escondido isso de você. Você é meu namorado.

Rick se afastou e repetiu:

- Sim, eu sou. Eu sou seu namorado.

Um caloroso, carinhoso olhar por ela surgiu nos olhos dele e andou até seus
lábios, onde um sorriso se desenrolou enquanto ele acrescentou:

- Mas não por muito tempo. E ele a beijou.

Katie não gostou do beijo. Ela não estava pronta para beijar e ficar de
agarramento. Ela preferia ter esperado até que suas emoções tivessem se acalmado e
seu coração tivesse voltado a bater num ritmo menos ansioso.

Rick a beijou pela segunda vez, mas ela quase não respondeu ao beijo.

- Aqui, deixe-me levar a bagagem pra você. Eu vou voltar até o carro e pegar a
outra.

- Eu vou lá pra dentro, Katie disse.

- Eu te encontro lá. E Katie? Vamos deixar isso de lado por agora, ok? Nós
podemos conversar mais tarde. Eu não quero que nada arruíne nosso momento
juntos.

Ela concordou com a cabeça, mas em seu interior, ela sentia que tudo já estava
arruinado.
Assim que ela colocou o pé dentro da casa, Cris foi ao encontro dela com um olhar
preocupado.

- Tudo bem?

Katie tinha certeza de que Cris tinha visto pelo vidro da porta da frente o que
estava acontecendo do lado de fora.

Afirmando com a cabeça, ela disse:

- Eu preciso usar o banheiro.

Ela ficou no banheiro do andar de baixo mais tempo que o necessário. Ela sabia
que os outros estavam esperando por ela. Tia Marta ficaria nervosa pela frustração de
seus planos para o jantar. Rick estaria estranho. Ele sempre ficava estranho quando
assumia o jeito Rick Neutro. Ela preferia quando Rick estava ou furioso ou galanteador
ou cheio de graça. O temperamento controlado e morno que ele tinha desenvolvido
não estava presente na vida dele quando ela tinha uma paixonite aguda por ele nos
tempos de colégio. Ela gostava de saber a que pé ela estava com ele. Mesmo na longa
época quando Katie era a mascote da escola e Rick nunca dava bola pra ela, pelo
menos ela sabia o que ele pensava dela.

A única sensação que Katie não se importou em experimentar na discussão com


Rick foi a sensação de derreter o coração pela esperança que veio quando Rick disse
“noivo”. Ele a estava levando a sério, levando a sério o futuro deles. Claro que ele
gostaria de saber sobre o dinheiro e de ser chamado para participar das decisões dela
sobre o que fazer com a herança.

- Eu tenho pensado no individual, ela sussurrou para seu reflexo no espelho do


banheiro. Se Rick e eu vamos nos casar eu preciso pensar em ‘nós’.

Uma batida soou na porta. Era leve demais pra ser a tia Marta batendo. Só podia
ser a Cris.

- Katie, tem certeza de que você está bem?

Katie abriu a porta e ofereceu um sorriso totalmente recuperado à sua melhor


amiga.

- Meu estômago...

- Oh, meu também, Cris sussurrou.

- Está tudo bem com Rick?

- Sim, nós estamos bem.


- Minha tia mudou a reserva. É em vinte minutos. Ela está determinada que nós
todos vamos jantar em um restaurante italiano em particular. Eu disse a ela que eu e
você já comemos. Tio Bob sugeriu que nós pedíssemos algumas pizzas e comêssemos
aqui. Mas você conhece minha tia; ela nem deu idéia.

- Está bem. Eu estou pronta pra ir. Você precisa entrar aqui?

- Preciso. Diga a todos que eu estarei pronto em um minuto.

- Katie respirou fundo e andou calmamente pela casa bem decorada, indo rumo à
sala de estar, onde ela sabia que todos estariam reunidos.

- Desculpe-me por atrasar a festa.

Ela encarou tia Marta e fez uma meia reverência como se ela fosse uma realeza.
Isso não fazia parte, em nada, da natureza de Katie, mas ela tinha estado perto da tia
de Cris tempo suficiente para saber que se ela não assumisse seus modos reais, as
coisas poderiam ir mal rapidamente. Depois do que tinha acabado de acontecer com
Rick, ela estava determinada a não sabotar a noite.

Marta, a pequena mulher de cabelos escuros em seus cinqüenta anos, deu um


olhar de perdão a Katie. Marta estava vestida num figurino muito melhor do que o
resto deles, mas isso era como as coisas eram normalmente. Seu cabelo, maquiagem,
e unhas estavam perfeitos.

Tio Bob levantou-se do sofá de couro e deu um abraço de lado em Katie.

- Ótimo ter você de volta aqui, Katie. Rick foi em frente e colocou sua bolsa no
quarto de hóspedes em caso de precisar tirar algo dela.

Katie evitara olhar nos olhos de Rick quando ela entrou na sala. Ela olhou pra ele
agora, e ele a ofereceu um sorriso constante e afirmador. Ele parecia inabalado pelo
momento chato que eles tinham passado dez minutos atrás.

Katie, no entanto, ainda se sentia profundamente abalada. Mais abalada do que


ela queria admitir para qualquer um, principalmente pra ela mesma.
Capítulo 9
Uma vez que todos eles seis estavam sentados no restaurante sob a luz âmbar,
Marta voltou ao seu típico eu estiloso. O dono do restaurante veio até a mesa e
cumprimentou Bob e Marta pelo nome. Marta apresentou os jovens ao redor da mesa
e tratou a reunião como se fosse aniversário dela e todos os seus filhos adultos tinham
vindo para casa vê-la.

Ambas, Katie e Cris pediram pequenas saladas. Rick e Ted compensaram pelas
moças e foram com tudo. Katie mal conseguia olhar para o prato cheio de lasanha de
Ted ou assistir Tio Bob usar a ponta de seu garfo para furar sua berinjela com
parmesão.

Durante a maior parte do jantar Marta encheu Rick de perguntas sobre os cafés.
Ele falou até de mais detalhes do que Katie sabia. Então veio a pergunta decisiva. Veio
de Marta junto com um sorriso malicioso enquanto Bob pagava a conta.

- Então, vocês ainda não nos deram qualquer informação sobre a novidade que
todos nós estamos esperando ouvir.

Marta olhou para Katie e então de volta para Rick.

- Vocês dois já escolheram a data? Casamentos no outono são sempre tão lindos.
Fim do outono. Depois que todo aquele desprezível calor dos ventos de Santa Ana
diminui. Antes de novembro talvez. O que daria a vocês sete meses de planejamento.
Quase oito. Cris e Ted me deram apenas seis meses para ajudar a planejar o
casamento deles.

Já que Bob e Marta não tiveram filhos, eles estavam vitalmente envolvidos na vida
de Cris. Agora parecia que Marta esperava ter a mesma espécie de influência sobre o
futuro de Katie e Rick.

Katie falou alto:

- Nós ainda não estamos lá, Marta.

Marta piscou para o comentário de Katie e voltou sua cabeça para Rick como se
ele pudesse dar uma resposta diferente da de Katie.

- Nós continuamos no estágio do ‘felizes-quase-pra-sempre’. Rick voltou-se para


Katie e lhe deu uma piscadela.

-Estágio do ‘felizes-quase-pra-sempre’? Marta repetiu. O que isso significa?

- Significa que eles estão indo com calma e descobrindo as coisas por conta
própria. O tom de Bob enfatizou as palavras por conta própria.
Audaz, Marta voltou-se para Katie.

- Você sabe, não sabe, Katie querida, que quando o tempo chegar, Robert e eu
queremos que você conte conosco para qualquer coisa? Qualquer coisa mesmo. Nós
esperamos que você dois pensem em nós como seus próprios tios. Nós iríamos amar
estar envolvidos nos seus planos.

- Obrigado Marta, Bob. Rick deu a cada um deles um aceno com a cabeça.

- Isso significa muito para nós.

Como ninguém mais na mesa respondeu ao comentário de Rick, ele adicionou:

- Não é, Katie?

Embora Katie não se sentisse particularmente animada e confortável com o modo


como isto estava indo, ela apreciava o suporte.

- Sim, o apoio de vocês significa muito.

Então ela relembrou Bob e Marta de que ela esperava que eles fossem à
formatura dela. Possivelmente, a isca do tópico da graduação dela poderia distrair
Marta do ainda não anunciado noivado de Rick e Katie e da não marcada data do
casamento.

Bob deu um sorriso para Katie e respondeu:

- Nós estaremos lá por você, Katie. Eu já tenho a sua formatura no meu calendário.

- Certifique-se de adicionar 27 de Abril ao seu calendário. Rick disse. Essa é a data


da inauguração do café de Redlands.

Marta pareceu menos entusiasmada com a inauguração do café de Rick. Ela


levantou-se da cadeira, indicando que era hora de ir embora.

- Eu pensei que vocês jovens talvez se divertissem com uma pequena caminhada.
Isso é agradável para todos?

Ninguém protestou. Todos eles pareciam saber que não tinha importância se a
idéia era agradável para eles. Marta estava no comando.

Rick pegou a mão de Katie enquanto o grupo passeava pela área a céu aberto do
shopping onde o restaurante italiano estava localizado. O sul da Califórnia estava
mostrando sem nenhuma vergonha seu clima suave, do mesmo jeito que uma criança
de três anos mostra seu novo vestido com um rodopio. O ar estava quente e
calmo. Katie pegou um jasmim estrela que crescia livremente nas áreas abertas ao
longo da praça.
- Que noite bonita.

Rick lentamente puxou Katie para junto dele. Ele a beijou.

- Qual o motivo desse beijo?

Rick deu a ela um exagerado olhar brincalhão.

- Numa noite como essa, eu preciso de um motivo?

- Eu suponho que não. Ela deu um leve aperto na mão dele, e eles continuaram
andando.

Mesmo com o beijo doce, o ar perfumado e bonito da noite, Katie não se sentia
muito bem. Suas emoções estavam na superfície, como um machucado que ela sabia
que não deveria cutucar.

No fundo da sua mente, seu plano original de trabalhar duro no seu dever escolar
num cantinho calmo do quarto de hóspedes de Bob e Marta foi por água abaixo. Em
vez disso, eles estavam em um tour naquela noite e ela tinha certeza que amanhã seria
a mesma coisa.

- Sabe, talvez isso foi uma má ideia, Katie murmurou.

- O que foi uma má ideia?

- Ter vindo pra cá esse fim de semana. Eu tenho muita coisa pra fazer. Você
também tem. Eu estou muito atrasada com tudo. Eu não sei no que eu estava
pensando quando concordei em vir aqui para passar a noite.

- Ei. Rick parou de andar e levantou o queixo dela com a mão.

- O que aconteceu com a Katie que sempre está dizendo coisas como, ‘vai nessa’ e
‘viva o momento’? O que aconteceu com a Katie que faz tudo no impulso?

- Eu vou te dizer o que aconteceu com ela. Ela começou o último semestre da
faculdade.

- E ela já está quase no fim de seu último semestre da faculdade.

- Quase. Mas eu tenho muita coisa pra fazer.

- Relaxe, Katie. Quando foi a última vez que você e eu tivemos uma chance para
apenas estar juntos e ter um tempo de lazer?

- Eu não sei. Há muito tempo. Natal, talvez?

- E ainda assim estávamos na correria. Ouça, não foi fácil eu ter conseguido tirar
todo esse tempo de folga para que nós pudéssemos estar juntos.
- Eu sei. Obrigada, Rick.

Katie deu um aperto na mão dele, e eles apertaram o passo para recuperar o
atraso em relação aos outros. Ela ainda não podia mudar a realidade de que, mesmo
sabendo que sair do campus para o fim de semana foi uma má escolha, ela tinha
escolhido fazê-lo.

Uma coisa ela sabia com certeza. Ela era a única que poderia ser responsabilizada
por suas escolhas. Por um breve momento, ela se perguntava que outras más escolhas
ela poderia ter feito nos últimos tempos.

- Você sabe, é provavelmente uma coisa boa eu ainda não ter decidido o que fazer
com o broche da sua avó.

- Por que você diz isso?

- Eu não acho que eu tenha feito boas decisões ultimamente. Eu acho que isso
tudo é stress. Você se sente desse modo também? Parece que não dá uma trégua.

- Eu sei. É como minha vida é agora também. Não para. Mas isso tudo é por boas
razões. As coisas vão mudar logo.

- Eu vou acreditar nisso quando eu vir.

Rick puxou-a para mais perto em um abraço de lado.

- O que quer que você faça, Katie, não venha com distúrbios hormonais pra cima
de mim, ok?

Ela se afastou e deu-lhe um olhar confuso. Ela não sabia dizer pela expressão dele
se o comentário era sério ou se ele estava tentando implicar com ela. Ela escolheu
acreditar que ele estava implicando com ela e brincou:

- E você me promete não dar uma de machão sabe-tudo. Especialmente quando


tratarmos de escolher carros amanhã.

Eles estavam no estacionamento. Ted e Cris decidiram ir de carro com Bob e


Marta, deixando Rick e Katie sozinhos no carro de Rick. Rick saiu da parte coberta do
estacionamento e como quem não quer nada, disse

- Então, fora comprar um novo carro amanhã, o que você está pensando em fazer
com o dinheiro?

- Um carro usado.

Rick olhou para ela.

- Por que não um novo?


- Eu quero um usado. Não muito velho. Baixa quilometragem e tudo isso. Esse é o
melhor caminho economicamente falando.

- Ok.

Como Katie não respondeu a primeira questão, ele perguntou mais uma vez:

- Nenhuma outra coisa você está pensando em comprar?

- Não.

- Ah, vamos Katie, não faça isso.

- Fazer o quê?

- Esse jogo de respostas monossilábicas. Esse não é o modo como você e eu nos
comunicamos. Fale comigo. Eu quero saber o que você está pensando sobre a herança.

Ela soltou um suspiro longo, baixo.

- Eu não estou pronta para discutir tudo isso, Rick.

- Por que não? A irritação em sua voz aumentou.

Eu apenas não quero. Preciso pensar um pouco mais nessas coisas.

- Eu sei que você precisa pensar mais. Isso é exatamente o que eu estou dizendo.
Você tem muitas decisões pra tomar. O tom de Rick amoleceu. Tudo que eu estou
dizendo é que eu quero ser alguém que ajude você a pensar sobre tudo, só isso. Eu
estou errado em querer isso para o nosso relacionamento?

- Eu não sei, provavelmente não.

Ele esperou que o semáforo mudasse de cor para fazer sua próxima pergunta:

- Você vê alguma razão em particular do porquê é tão difícil pra você falar disso
comigo? Quero dizer, você me vê de alguma maneira não estando do seu lado ou te
atrapalhando de alguma forma?

- Não.

- Então que foi? O que está te incomodando? Por que nós não podemos falar
sobre isso?

Katie deu a primeira resposta que veio a sua mente.

- Eu acho que você não vai gostar das minhas escolhas.

Rick deixou escapar uma gargalhada com ronco que não era típica dele.
- Por que eu não iria gostar das suas escolhas?

- Porque não. Katie sabia se Rick descobrisse que ela já tinha gastado mais da
metade do dinheiro em coisas como pagamento de faculdade e água limpa para a
campanha da África que ela e Eli tinham começado, ele iria enlouquecer. Além disso,
uma grande quantidade tinha sido gasta no começo do ano quando ela pagou seus
impostos.

De todo seu coração, ela desejou não o ter contado a quantia da herança.

- Eu vejo as coisas assim, Rick, se você e eu vamos mesmo relaxar e curtir a


companhia um do outro hoje à noite e amanhã, então eu te digo que você tem que
deixar esse assunto da herança de lado. Só isso, deixe de lado. Eu prometo conversar
sobre tudo quando as coisas estiverem mais claras na minha mente. Por agora, não é
uma boa idéia conversar sobre isso.

Pelo jeito que o rosto dele mudou com seu maxilar apontado pra frente em sinal
de frustração, Katie sabia que Rick não gostou da declaração dela. Em seu rosto havia
uma pequena expressão de recuo, e então ele disse com uma voz branda:

- Se é assim que você quer que seja.

Katie recostou no banco e encarou o pára-brisa. Ela disse aos seus ombros que
relaxassem. Nenhum dos dois falou durante a pequena viagem até a casa de Bob e
Marta. Quando eles saíram do carro, Cris e Ted estavam rindo de algo e com
expressões de quem tinha compartilhado um passeio agradável.

- Nós temos cheesecake.11

Bob disse para eles assim que Rick e Katie entraram na casa com o restante do
grupo:

- Vocês estão prontos para a sobremesa?

- Claro, disse Rick. Você precisa de alguma ajuda na cozinha?

- Não necessariamente. Embora você fique bem confortável na cozinha, se eu me


lembro bem.

- Ele é um ótimo cozinheiro, Katie disse. Por falar nisso, você deveria deixar Rick
fazer omeletes pra todos amanhã pela manhã. Isto é, se você não se importa em
deixar seu fogão nas mãos de um gênio.

11
Cheesecake é uma espécie de pudim à base de queijo.
Rick deu a Katie um olhar confuso, como se ele não pudesse distinguir se ela o
estava elogiando ou zombando dele. Ela percebeu que estava exagerando. O elogio foi
uma super compensação pela a linha tênue de tensão que ainda pairava entre eles
como uma corda bamba. Durante toda a noite nenhum deles ousou atravessar aquela
corda bamba da comunicação sem se escorregar e cair na rede de segurança debaixo
da corda. Aquela rede de segurança era a longevidade do relacionamento deles. Eles
tinham balançado entre discussões e conversas tensas muitas vezes. Katie acreditava
que eles podiam passar por isso de novo.

Infelizmente, isso não aconteceu. Pelas duas horas seguintes, tudo que Rick ou
Katie disseram foi interpretado erroneamente não apenas um pelo outro, mas
também por Marta. No momento em que Katie subiu para o andar de cima para o
recentemente redecorado quarto de hóspedes, Katie estava com vontade de chorar.
Isso não era, de forma alguma, típico dela.

A acomodação na hora de dormir ficou um pouco estranha. Marta insistiu que Cris
e Katie ficassem com o quarto de hóspedes do andar de cima enquanto Ted foi
acomodado no sofá da sala da família e Rick foi relegado com o colchão de ar no chão
da sala de estar. Foi como se eles estivessem de volta aos anos de colégio.

- Você e Ted deveriam estar dormindo juntos nessa cama, Katie disse uma vez que
ela e Cris estavam sob os limpos lençóis da cama de hóspedes.

- Eu ficaria mais confortável no colchão de ar do que Rick. Ted deveria estar aqui,
Rick deveria estar no sofá na sala, e eu no colchão de ar.

Ao invés de responder à objeção de Katie, Cris disse:

- Ei, ouça, pelo que quer que você e Rick estejam passando agora, eu sei que é
frustrante e confuso, mas eu acredito que vai dar tudo certo, Katie. Você não tem que
me contar o que é, mas eu sei que as coisas estão instáveis pra vocês. Eu orei por
vocês a tarde toda.

Katie não respondeu. Ela encarou o teto no quarto escuro e ouviu ao fraco, mas
estável quebrar das ondas do oceano enquanto a antiga melodia do mar flutuava pela
janela meio aberta do quarto. Apesar de Katie saber que poderia contar qualquer coisa
a Cris e que sua melhor amiga ficaria acordada com ela a noite toda se necessário para
conversar sobre os sentimentos de Katie, ela não quis conversar. Novamente, isso não
era, de forma alguma, típico dela. Ela não sabia o que estava acontecendo com ela.

- Obrigada, Cris, ela sussurrou depois de uma pausa que não trouxe paz alguma.

- Durma bem.

- Você também, minha amiga e tesouro peculiar.


As palavras de Cris deslizaram pela superfície do conturbado coração de Katie
como uma pedrinha bem lançada. Cada lugar que o sentimento tocou produziu um
pequeno, expansível círculo, empurrando-a para um estado de nervosismo. Agora,
nada dentro dela parecia estável.

Em alguns minutos, Katie sabia, pela respiração calma de Cris que ela tinha
adormecido. Durante os anos delas como colegas de quarto na faculdade, Katie podia
identificar o som do sono de Cris. Ela também sabia o quão profundo Cris podia ir ao
seu estado de dormência uma vez que ela mergulhava na terra dos sonhos.

Mesmo exausta, Katie se manteve acordada, seus olhos fixos nas fracas sombras
do outro lado do quarto, causadas pela fraca luz do banheiro adjacente. Ao invés do
som das ondas a acalentarem ao sono, parece que o efeito foi oposto. Com cada
enrolar e desenrolar das ondas, Katie orava:

O que é isso, Deus? Você está tentando me dizer algo? O quê? Toda essa
instabilidade são só emoções normais, hormônios, ou o quê? Eu estou perdendo
alguma coisa? Eu estou ficando paranóica, não estou? Eu odeio me sentir instável
assim. Qual é meu problema?

Cris se mexeu em seu sono e virou para Katie. A mão de Cris caiu no braço de
Katie. Ela se achegou mais perto, recostando a cabeça no ombro de Katie.

- Ei, eu não sou o Ted, Katie murmurou.

Cris não se moveu. Ela continuou sua respiração tranqüila com sua bochecha
gentilmente descansando no ombro de Katie e sua mão no antebraço dela.

Você e Ted dormem juntos.

O pensamento teve um efeito estranho sobre Katie. Claro que ela sabia que Cris e
Ted dormiam juntos. Aquela intimidade entre eles como marido e mulher era uma
parte óbvia do que tinha mudado depois que eles se casaram.

Entretanto, esse tipo de conexão próxima e aconchegante entre eles toda noite
era algo que Katie nunca tinha pensado muito a respeito. Como é que seria ir pra cama
toda noite e ter o homem que você ama bem ali do seu lado, respirando pacificamente
e te recebendo em seus braços? Katie podia enxergar Cris e Ted dormindo desse jeito
toda noite. Próximos, aconchegados, e invisivelmente ligados pra sempre no coração.

Assim que esse pensamento veio até ela, Katie sentiu sua garganta apertar. Como
se uma luz clara e constante tivesse, de repente, acendido dentro de sua cabeça, ela
pôde ver, de verdade, qual o problema com suas emoções e, mais profundamente,
com seu espírito. Isso não era hormonal. Isso era real no nível mais profundo. A velha,
impulsiva Katie estava de volta. Ela sabia o que estava errado. Ela sabia o que ela
precisava fazer. E ela sabia que precisava fazer agora.
Capítulo 10
- Rick? Katie ajoelhou-se do lado do colchão de ar que seu namorado estava
dormindo. Ela colocou a mão em seu ombro e delicadamente o sacudiu. Rick, acorda.

Ele se mexeu e murmurando algumas palavras emboladas disse:

- Qual o problema?

- Eu preciso falar com você.

Rick se virou e inspirou profundamente.

- Katie?

- Sim, sou eu. Eu preciso falar com você.

- Agora?

- Sim. Eu preciso falar com você agora.

- Que horas são?

- Eu não sei. Nós podemos ir até a cozinha?

- Até a cozinha? Por quê? Ele se apoiou em seu cotovelo e piscou para ela no
cômodo mal iluminado. O que é, Katie? Qual é o problema?

- Nós.

- O quê?

- Por favor, levante. Vamos conversar na cozinha. Por favor.

Por todos os grunhidos e suspiros pesados que Rick deu, Katie estava consciente
de que ele não estava feliz com sua chamada de emergência a meia-noite.

- Isso não pode esperar até de manhã? Ele a seguiu até a cozinha.

- Não, eu não acho que isso possa esperar. Eu sinto muito ser tão dramática e
acordar você e tudo mais, mas eu não podia esperar. Eu percebi uma coisa, e eu sabia
que tinha de falar com você imediatamente.

Eles entraram na cozinha e Katie acendeu a luz. A claridade deixou os dois


momentaneamente cegos. Ela puxou o banquinho embaixo do balcão e se sentou. Rick
se sentou em um banco ao lado dela. O cabelo dele estava grudado de um jeito
engraçado do lado que ele tinha dormido, e seu rosto estava amarrotado com uma
expressão desagradável.
- O que foi, Katie? É o dinheiro?

Ela ficou surpresa que a herança foi a primeira coisa que passou pela mente dele.
Mas então, novamente, ela não ficou surpresa.

- Não, não é o dinheiro. Somos nós. Nosso relacionamento.

- O que tem nosso relacionamento?

- Nós não estamos unidos no coração, Rick. Sua voz saiu embargada e cheia de dor
esclarecendo o que ela sentiu quando a revelação lhe veio alguns momentos atrás.

- Que raios você está falando?

- Você e eu - nós - isso não é mais uma boa idéia. Nós não somos feitos um para o
outro. Precisamos ver as coisas como elas são e chamá-las de um dia. Ou um ano. Ou,
na verdade, ou metade da minha vida. É o que foi, e agora acabou.

Ela sentiu um aperto na garganta. Isso era mais difícil de dizer do que ela
esperava. Mas também, isso não foi algo que ela planejou ou jamais esperou dizer.

Uma expressão de raiva veio sobre a face de Rick.

- Katie, o que você está fazendo?

- Eu estou... Eu estou terminando.

- Não, você não está, ele falou rapidamente.

- Sim, eu estou! Eu estou terminando com você, Rick Doyle.

- Não, não está. Ele balançou a cabeça e rugiu, Nós não estamos terminando,
Katie. Isso não vai acontecer.

- Sim, isso vai acontecer. Está acontecendo agora. Eu estou terminando porque eu
acabei de perceber. Você e eu já fomos o mais longe que nossos corações podem nos
levar. É isso. Nós não estamos unidos no coração e eu acho que jamais estaremos.

Rick se levantou e, com as mãos nos quadris, se pôs de pé na frente de Katie.

- Isso é loucura. Você é louca. Você sabe o que está fazendo? Você está acabando
com o fim de semana. Arruinando completamente tudo. É o estresse, não é?

- Não, não é estresse.

- Eu acho que é. Por que mais você faria isso? Eu acho que você está deixando o
estresse da faculdade te afetar. É só a faculdade. Você nunca mais vai usar essas coisas
sobre as quais está fazendo trabalhos. Tudo que você tem que fazer é sobreviver a
essas últimas semanas sem fazer nada idiota, e você vai se formar e então...
- É, e então o quê?

- Você vem trabalhar pra mim.

Katie se afastou atordoada.

- Quê? Trabalhar pra você?

Ela achou que ele diria “Depois da sua formatura, vamos noivar.” Ou “Vamos
planejar nossa vida juntos.” A resposta dele confirmou tudo que as borboletas nos
estômago de Katie disseram a ela lá em cima na escuridão do quarto de hóspedes.

- Eu não vou trabalhar pra você, Rick. Eu não vou voltar para o Café.

- Por que não?

- Porque não é o que eu quero fazer.

Ele se elevou pra cima dela, franzindo a testa.

- Desde quando você decidiu isso?

- Desde sempre. Nós nunca falamos que eu trabalharia pra você. Você inventou
isso. Eu nunca te disse que eu queria fazer isso.

- Mas você fez no último verão.

- Aquilo já foi. Isso é agora.

- Ok, tudo bem. Não venha trabalhar no café. Mas se você não trabalhar pra mim,
o que você quer fazer?

Katie disse firmemente:

- Eu quero ir para a África.

Rick olhou pra ela como se ele não fizesse idéia de quem era esta mulher que
estava na frente dele.

- Na verdade, eu queria que nós dois fôssemos à África.

- Do que você está falando? Eu jamais vou para a África. Jamais. Nunca. Sob
nenhuma circunstância. Você ouviu o Eli falar sobre a África. Porque você quer ir lá?

Katie estendeu as mãos pra cima e disse:

- É exatamente disso que eu estou falando. É óbvio. Nós não estamos unidos no
coração, Rick. Você não vê?

Ele cruzou os braços, mantendo as mãos fechadas e disse:


- Eu...você...você sabe o quê mais? Eu acho que nós dois deveríamos voltar a
dormir e começar de novo pela manhã. Isso é um pesadelo. Você está saindo de um
pesadelo, Katie. É isso que é. Algum tipo de pesadelo de estresse induzido ou excesso
de hormônios. Isso é loucura. Você está louca.

- Não, eu não estou.

Rick elevou sua voz e sua estatura:

- Nós não estamos terminando, Katie.

Katie manteve o olhar fixo no dele e disse com firmeza:

- Sim, nós estamos.

- Não, nós não estamos.

Ela se levantou e com os ombros para trás e queixo para cima deu a ele uma
expressão determinada:

- Eu estou terminando com você, aqui e agora. Isso não tem nada a ver com os
meus hormônios. Isso está em meu coração e eu não vou mudar de idéia. Amanhã de
manhã nós ainda estaremos terminados. E eu sei que apesar de estar furioso comigo
você verá que isso é o certo. É verdade. Isso é o mais longe que iremos Rick.

Rick não se mexeu. Ele a olhava com uma grande raiva. O Rick neutro não
retornou como de costume quando eles discutiam. Ao invés disso, Katie estava
olhando para o verdadeiro Rick. Ele estava furioso, e deveria estar. Ela gostava mais
dele assim, fiel as suas emoções. Ela sabia que era mil por cento verdadeira com o seu
coração e suas emoções. Isso é certo.

Rick passou por Katie e saiu da cozinha, deixando-a sozinha no balcão com todas
as luzes acesas. Ela sentou no banco da cozinha e ficou ali por um bom tempo,
deixando a realidade do que tinha acontecida imergisse nela. Seu coração estava
acelerado e suas mãos estavam tremendo. Ela Seus pés descalços estavam formigando
por causa do chão frio.

Katie olhou para o relógio do micro-ondas. Os números digitais verdes marcavam


1:11. Um doloroso nó se deu na garganta de Katie. Um desfile de memórias veio a ela
dos momentos que passou com Rick em cozinhas. Foi na cozinha de Douglas e Trícia
que começaram a flertar e onde teve início esse longo relacionamento. A cozinha do
Ninho da Pomba tinha sido lugar de vários momentos para eles – a maioria bons
momentos. E na cozinha do apartamento do Rick foi onde Katie o desafiou a expressar
seus sentimentos por ela e demonstrá-los, beijando-a.
Ela e Rick compartilharam muitas coisas da vida juntos. Teria ela feito a coisa certa
terminando com ele? Ela achava que sim, mas ao mesmo tempo ela percebeu que o
modo como havia dado a notícia sobre sua decisão não foi justa com ele. Ele não
estava preparado pra isso. Ela poderia ter esperado. Eles poderiam ter feito isso de um
jeito diferente. Mas se ela tivesse esperado, ela tinha a sensação de que teria se
convencido a não fazê-lo.

A sensibilidade de Katie por como Rick estava se sentindo pairou sobre ela com a
intensidade de uma forte batida do coração. Ela o amava. Ela sabia que amava. Ela
nunca quis magoá-lo.

- Sinto muito, Rick. Ela sussurrou tão baixinho que as palavras não chegaram aos
seus ouvidos, no entanto elas eram sinceras. O que eu fiz?

Com uma ansiedade crescente dentro dela para tentar consertar as coisas, Katie
começou a andar de um lado para outro. E se eu for até a sala de estar e me
desculpar? Eu diria a ele que ainda acho que nós deveríamos terminar, mas percebi
que não manejei bem a situação e sinto muito por tê-lo magoado. E a propósito, Rick,
ainda amo você, apesar de saber que não devemos ficar juntos mais.

Não, eu não posso fazer isso.

Katie mordeu a cutícula de seu polegar tentando, em vão, pensar em uma saída
para tudo isso. Mas a única maneira de fazer tudo melhor seria ir ao outro cômodo e
voltar atrás em tudo. Ela sabia que se ela se desculpasse de verdade, Rick a perdoaria e
a aceitaria de volta. Ele a envolveria com os seus braços e a sensação de paz pela
proximidade dele, seu toque, sua voz profunda iriam fazê-la se sentir feliz. Mas por
quanto tempo? Uma lágrima rolou pelo seu rosto.

Realmente este é o fim. Está tudo acabado entre nós. Está mesmo.

Um conjunto de lágrimas saiu das profundezas do coração de Katie e jorraram


pelo seu rosto. Com elas veio a dor, a certeza de que isso era o certo. Tudo o que ela
disse ao Rick era verdade. Isso era o mais longe quanto eles poderiam ir. Ela pode ter
priorizado a verdade e não ter tido compaixão. Mas ela sabia que não podia fazer nada
pra mudar a situação – além de um elaborado pedido de desculpas e um apaixonado
apelo de reconciliação. E ela sabia que não podia fazer isso.

Seu relacionamento com Rick Doyle estava acabado.

Apagando as luzes da cozinha, Katie voltou para o quarto de hóspedes do modo


mais quieto possível e voltou para a cama. A guerra interna continuou. Ela tentou mais
uma vez imaginar um cenário em que ela desceria as escadas e acordaria Rick de novo.
Eles poderiam conversar sobre isso? Ele veria que ela estava certa? Ele concordaria em
serem bons amigos e a ajudaria a comprar os carros amanhã? Não, essa não era a hora
para aquela conversa.

Um arrepio correu até as pernas dela enquanto ela esfregava os pés frios um no
outro, tentando aquecê-los. Dormir parecia ser a única resposta certa para qualquer
coisa nesse momento.

Katie pôde sentir alívio. A respiração ritmada de Cris fez com que Katie
relembrasse tudo – Rick, o relacionamento deles, seu futuro, todas suas tensas
emoções. Sentiu seu espírito cansado mergulhar no descanso que há muito escapara
dela. Sob cobertura de um abençoado sono, Katie deixou-se ir.

Quando ela acordou, ela sabia pela quantidade de luz do sol que entrava na sala
que parte da manhã já se fora. O lado de Cris na cama estava vazio e a casa estava
quieta. Katie ficou em silêncio sem se mexer. Sua mente revisava sistematicamente o
drama que ela tinha iniciado no meio da noite.

Eu terminei com Rick.

Um aperto contraiu sua garganta e uma sensação desconfortável caiu sobre seu
estômago. Mas ela sentia seu coração estranhamente calmo.

Pai, eu fiz a coisa certa? Fiz, não fiz? Eu não deveria mudar de idéia, deveria?

A estranha sensação de paz permaneceu.

- Isso é estranho. Isso é estranho demais. Eu não deveria sentir essa calma,
deveria? A menos que seja você, Deus. É você? É isso que eu deveria estar sentindo
agora?

Katie sentou-se e olhou ao redor da sala vazia. Por alguma razão ela sentia Deus
perto dela. Ela se perguntou se Rick sentia como ela. Ele teria chegado às mesmas
conclusões durante a noite? Será que ele já contou para os outros? Como seria o resto
do dia? Rick ainda a ajudaria a comprar um carro ou ele estaria no caminho de volta
para o Café?

Katie sabia que estragara todo o fim de semana, justamente como Rick tinha dito.
Ela também sabia que não poderia passar o dia de hoje todo fingindo que tudo estava
bem com o namoro deles. Não, não depois dessa revelação que ela teve no meio da
noite. Nada do que ela tinha feito tinha sido fácil ou atencioso com o Rick, mas de
alguma maneira ela sabia que estava certa.

Pressionando os pés no chão, Katie foi com passos rápidos tomar banho, se vestiu
e desceu as escadas.
A casa estava quieta. Não tinha ninguém na sala. O colchão de ar em que Rick
dormiu estava guardado. O jornal de domingo e duas canecas de café restaram sobre a
mesa de café. Katie foi até a cozinha e encontrou Marta na pia lavando um cacho de
uvas vermelhas.

- Olá.

Marta olhou ao redor. Em um movimento rápido ela desligou a água, colocou as


uvas no balcão e secou as mãos com uma toalha.

- Bem, finalmente! Você certamente teve um sono extravagante.

Katie ignorou a farpa vinda do comentário de Marta e perguntou:

- Onde está todo mundo?

Marta olhou para Katie como se a resposta fosse obvia.

- Rick foi embora ao meio da noite. Eu encontrei um bilhete dele na mesa de café
se desculpando pelo inconveniente. Nós supomos que seja uma emergência com o
Café. Que decepção ele ter ido embora e arruinado esse tempo para vocês dois. Ele
realmente precisava estar aqui para ajudá-la a escolher o seu novo carro.

Katie sentiu um aperto dos dentes e uma tristeza que apertava o estômago.

- Claro que Bob, Ted e Cris foram à igreja. Seu tom de voz revelou o quanto ela
desaprovava essa escolha. A Cris disse que tentou te acordar, mas você nem se mexeu.

Katie concordou.

Eu creio que o quarto de visitas é o cômodo mais silencioso na casa. Agora que o
redecoramos é silencioso como um Oasis, não é? Eu te mostrei o que fizemos no
quarto de casal? Acho que você não estava aqui ontem à noite quando levei Ted e Cris
lá em cima para mostrá-los. Venha comigo. Vou te mostrar agora.

De um jeito louco Katie estava feliz por estar com a tia Marta. Ela não pensou na
possibilidade do Rick ir embora no meio da noite mas ela não o culpava. Ela sabia que
teria feito a mesma coisa se estivesse no lugar dele. Katie também ficou aliviada
porque ninguém sabia o verdadeiro motivo de o Rick ter ido embora. Era melhor desse
jeito.

Típico do Rick Doyle. Modos acima de tudo sempre. A mãe dele o educou muito
bem. Sinto que deveria ligar pra ele. O que eu deveria dizer? Não, não ligue ainda. É
melhor esperar. Eu não deveria ligar pra ele. Nós precisamos de tempo e espaço para
digerir tudo.
Katie seguiu Marta até o andar de cima para ver a suíte máster redecorada. Marta
conversou durante todo o percurso, mas Katie se desligou de modo a deixar espaço
para todos os pensamentos e sentimentos da madrugada.

Se ninguém sabe que o Rick e eu terminamos no meio da noite, eu imagino se


conseguiria manter isso em segredo o resto do dia. Tenho um carro para comprar, um
trabalho pra fazer e uma longa estrada de volta a faculdade. Seria fantástico se eu
pudesse fazer tudo isso sem me perder em minhas emoções. Fiz a coisa certa em
terminar com o Rick. Sei que fiz. Não fiz? Isso está sendo mais difícil do que eu
imaginava. Eu não pensei nisso direito, pensei? Deveria ligar pra ele. Não. Bem, talvez
depois. No caminho de casa.

Katie entrou na suíte que estava decorada com um elaborado estilo Mediterrâneo
com as cortinas balançando como ondas na brisa do fim da manhã.

- Está lindo, Marta.

Marta continuou a apresentação, falando de detalhes enquanto Katie fazia


apropriados ‘oohs’ e ‘aahs’. Intimamente, Katie estava em outro lugar. Um lugar de
linhas curvilíneas. E naquele lugar, ela estava tentando organizar um plano de como os
próximos dias precisavam ser “alinhados”.

Ela sabia que Rick e ela acabariam tendo uma longa conversa antes de a semana
findar. Ele era um mestre na arte de demitir pessoas que trabalharam no Ninho da
Pomba. Ele era bom com encerramentos e gostava de checar tarefas não finalizadas de
sua lista contínua. Apesar de Katie não ser uma tarefa, ela era uma grande parte da
vida dele e tinha sido por um bom tempo. Eles precisariam de tempo para uma
extensa conversa. Katie queria mais alguns dias para alinhar suas linhas curvilíneas
antes daquela conversa.

Marta convidou Katie para se juntar a ela em sua nova e expandida varanda que
se expandia da suíte máster até as portas francesas. Duas elaboradas espreguiçadeiras
com almofadas azuis extra grossas esperando por elas.

- Esse é um dos meus lugares favoritos da casa.

Marta se esticou em uma das espreguiçadeiras. Um guarda sol de lona colocado


em um suporte fixo entre as espreguiçadeiras providenciava sombra. Ali, acima do
parapeito estava uma expansiva vista de Newport Beach. A areia cor de caramelo se
expandia em todas as direções, salpicada apenas por postos de salva-vidas
estrategicamente colocados e banhistas de fim de semana. Além da areia, o oceano
cinza azulado se espalhava como um cobertor enrugado por todo o horizonte. Acima, o
sol do fim da manhã lançava seus raios dourados sobre a praia sem cobrar nada.

- É lindo isso aqui, Katie disse.


É sim, não é? Eu vivo dizendo ao Robert que nós deveríamos nos mudar, mas
então um dia como esse aparece, e eu me encontro bem contente aqui na minha
varanda. Ela esticou o braço como que mostrando a praia e oceano diante deles. Katie
achou que Marta parecia que iria começar a cantar melodia de uma ópera.

- Eu acho que vou fazer uma caminhada, Katie disse antes que Marta tivesse a
chance de continuar. Quando você acha que Bob e os outros estarão de volta?

Marta olhou no relógio.

- Em uma hora. Talvez menos. Eu fiz reservas para nós almoçarmos juntos.

- Claro que você fez.

Katie percebeu o pensamento que tinha saído de sua cabeça. Com um sorriso sem
graça, ela rapidamente adicionou:

- Você é sempre cuidadosa conosco nesse sentido. Eu estarei de volta em menos


de uma hora.

Com um tom levemente magoado, Marta disse:

- Leve seu telefone. Eu digo ao Robert pra te ligar quando eles voltarem.

Katie saiu antes que sua boca a colocasse em mais problemas.

Qual o problema comigo? Eu não quero ser insensível com as outras pessoas. Só
porque eu penso algo, não quer dizer que eu tenho abrir a boca. Eu tenho que
trabalhar nisso.

Pegando seu celular juntamente com seus óculos escuros, ela saiu rumo à praia.
Com suas sandálias em uma mão e o celular na outra, ela afundou seus pés descalços
na areia fria.

Alguns bons momentos aconteceram nessa praia. Katie sabia que Cris tinha muito
mais lembranças em volta de fogueiras e pela orla do mar do que ela, mas suas
lembranças eram ótimas também. Douglas tentara convencê-la uma vez de que um
tubarão estava atrás dela na água. Antônio se divertira provocando-a no dia que eles
estiveram aqui. Ela e Cris caminharam e conversaram na beira da água no entardecer
sob o por do sol e compartilharam os sonhos delas para o futuro uma com a outra. O
que Katie mais se lembrava era que Rick tinha sido aquele pedacinho de sonho no
fundo de sua mente. Ele sempre foi o cara do ‘e se’. E agora o ‘e se’ tinha se tornado o
‘e foi’.

Katie fixou os olhos na expansão azul esverdeada e piscou de volta as embaçadas


nuvens de lágrimas que sobressaíram sem serem convidadas. Ela desejou que Cris
estivesse com ela agora. Sua eterna amiga a ajudaria a entender tudo que ela estava
sentindo.

Ajeitando-se na areia, Katie respirou fundo e se virou para seu verdadeiro Eterno
Amigo. Aquele que prometeu nunca deixá-la ou abandoná-la.

Ao menos você e eu estamos ligados no coração, não estamos, Deus? Sim,


estamos. Você e eu, Senhor. Então vá em frente e me diga: Eu sou um trem
descarrilado ou estou nos trilhos certos? Eu fiz disso tudo uma grande bagunça? O Rick
vai ficar bem? É assim que a vida é? Enrolada e bagunçada? Nada pra mim parece ser
fácil ou claro. É normal para alguém que está sinceramente tentando te seguir de todo
o coração terminar em tanta bagunça o tempo todo?

Bem nessa hora, seu celular vibrou. Ela assumiu ser o Bob a estar ligando para ela
para dizer que eles já estavam de volta. Katie se entristeceu porque sua conversa de
coração pra coração com Deus havia sido interrompida.

Sem olhar para o identificador de chamada, ela respondeu com:

- Já estou a caminho de volta pra casa agora mesmo.

A voz de Eli respondeu:

- Katie, você está bem?

- Oh, Eli. Oi. Eu pensei que fosse outra pessoa. Sim, estou bem. Eu não sei se o Rick
está, entretanto. O quê ele te contou? Eu tenho certeza que ele ainda está bem
chateado. Eu queria ter sido mais…

- Katie, Eli a interrompeu, Eu não estou entendendo.

- Você falou com o Rick, certo?

- Não, não falo com ele desde quinta-feira à tarde.

- Oh. Ela passou o celular para o outro ouvido. Espere, então por que você
perguntou se eu estava bem?

- Eu deixei alguns recados no seu telefone e te mandei mensagens. Você recebeu?

- Não. Eu não olhei. Eram sobre o quê?

- Eu, hm, eu achei que tinha algo de errado. Que algo tinha acontecido.

- Quando?

- Noite passada. Eu senti um desejo muito forte de orar por você.


- Sentiu?

- Sim. Eu orei por um tempo e então...

- Eli, quando você esteve orando por mim? Que horas na noite?

- Foi em algum momento entre meia noite e uma hora. Meu coração estava bem
pesado por você.

Katie estava um pouco assustada e um pouco maravilhada ao mesmo tempo.

- Katie, você ainda está aí?

- Sim. Eu só não consigo acreditar que Deus te acordou para orar por mim no meio
da noite.

- Então você está bem?

Katie respirou fundo o ar fresco do oceano antes de falar as palavras em voz alta
para alguém pela primeira vez.

- Eu... Eu terminei com o Rick.


Capítulo 11
Cinco dias depois que Katie contou a Eli sobre seu término com Rick, ela estava de
pé, próxima a Eli no estacionamento do Crown Hall. Eles estavam ali praticamente lado
a lado, examinando seu novo-usado carro. O carrinho de golfe da segurança do
campus que Eli usava estava há alguns metros de distância. Ele desligou o motor e
pulou pra fora do carrinho quando viu Katie saindo do carro dela.

- Então, você vai nomear esse ‘Buguinho 2’? Eli perguntou.

- Não, só existiu um Buguinho. Katie passou o seu polegar em cima de um


arranhão branco de seu Subaru Outback. [1] O carro verde bem escuro tinha um
formato retangular de um pequeno carro esportivo [2]. Esse tá mais pra Jeepinho.

- Nós tínhamos um Jeep quando eu era pequeno.

- E como você o chamava?

Eli deu um sorriso torto.

- Do mesmo nome que chamávamos todos os veículos no vilarejo. ‘Carro’. Desse


jeito tudo que nós tínhamos que fazer quando queríamos ir a algum lugar era chamar,
‘Aqui, Carro. Vem, Carro’. O primeiro que estivesse milagrosamente funcionando no
momento viria correndo.

- Que bonitinho, Katie disse. Ela sorriu para Eli e caminhou mais uma vez em volta
de seu carro. Eu poderia chamá-lo de ‘Mini viajante’.

- Viajante Verde? Eli sugeriu.

Katie pensou mais um pouco, e o nome veio.

- Trevo! Ele é verde como um trevo. Trevo, o mini-viajante. Eu gostei. O que você
acha?

- Eu acho que você é a única pessoa que eu conheço que coloca nomes nos carros.

Katie voltou sua atenção para Eli. Seu cabelo castanho e anelado crescendo dava a
ele um ar de ‘livre-como-o-vento’ e ‘selvagem-como-o-mar’. Esse visual caiu bem nele.

Katie estava quase falando pra ele o quão bonito seu cabelo estava, mas, de
repente, ela ficou sem jeito. Essa era a primeira vez que ela conversara com Eli desde a
conversa deles no telefone na praia, e ela sabia que tinha se aberto demais para ele na
ligação.
Ela sabia que naquela hora ela melhor que ela tivesse confidenciado seus
profundos sentimentos pessoais à Cris. Mas naquele momento, quando ela precisou
de um amigo, Eli era quem estava lá pra ela enquanto ela sentava sozinha na praia. Ele
ouviu tudo que ela tinha pra botar pra fora, e então ele disse que iria orar por ela e por
Rick.

- O Rick já te disse alguma coisa? Katie perguntou.

- Não. Nós estivemos juntos no apartamento algumas vezes, mas ele não tocou no
assunto, e nem eu. Eu acho que seria bom que você contasse a ele que me contou
sobre o término de vocês. Eu não quero que ele sinta que foi pego de surpresa.

- É, você tá certo. Eu vou contar da próxima vez que nós conversarmos. Ele me
mandou flores ontem. Tem sido bem mais difícil do que eu pensei que seria.

- Você ainda tem certeza de que tomou a decisão certa?

- Sim. Katie concordou com a cabeça e olhou para as chaves na sua mão. Eu sei
que foi a decisão certa. A hora e o jeito como eu falei não foram legais, mas, sim, eu
ainda acho Rick e eu fomos o mais longe que nossos corações nos levariam. Eu sei
disso.

- Você precisa conversar com ele.

- Eu sei.

Eli ficou em pé ao lado dela, sem dizer nada. De novo ela notou a cicatriz em
forma de “L” do lado do pescoço dele. Ela sempre se perguntara se Eli tinha feito uma
cirurgia na garganta ou se a cicatriz era de alguma coisa casual como cair sobre um
caminhãozinho de brinquedo quando criança.

- Você sabe o que realmente tem sido estranho? Katie perguntou. Depois que eu
conversei com você quando eu estava na praia, eu decidi não dizer nada a ninguém até
que Rick e eu tenhamos uma chance de conversar sobre isso um pouco mais, e eu não
falei sobre isso com ninguém.

- Você não contou ao Ted e à Cris?

- Não. Não houve oportunidade. A Marta nos empurrou para uma grande refeição
no iate clube, uma mistura de café da manhã com almoço, e aí o Ted voltou pra casa
da praia pra surfar. Marta e Cris foram fazer compras. Acabou que só o tio Bob e eu
fomos olhar os carros, o que funcionou bem porque eu acabei comprando só um.

Eli sorriu.

- Você só comprou um? Quantos carros você estava planejando comprar?


Katie percebeu que ela quase tinha falado demais. Seu plano de surpreender Cris e
Ted ao comprar um carro para eles tinha se desmantelado enquanto ela estava com o
tio Bob. O calmo e sereno tio de Cris convenceu Katie de concentrar em sua própria
necessidade por um carro e esperar depois que ela se formasse para seguir sua idéia
de abençoar Cris e Ted com um carro.

Respondendo Eli honestamente, mas deixando que seu sarcasmo transparecesse


um pouco, Katie disse:

- Ah, eu pensei em começar com dois carros assim que eu recebesse meu
pagamento. Quero dizer, que melhor maneira de afogar as mágoas depois de um
término do que comprar uns carros?

Ao invés de rir da piada, Eli estendeu o braço e passou o dedo na linha do maxilar
dela. O breve e amoroso toque fez o coração de Katie balançar inesperadamente.

- Vai ficar tudo bem, Katie. Você vai ficar bem. O Rick vai ficar bem.

- Eu sei, ela disse suavemente.

Ela podia sentir seu rosto ficar rosado.

- Você precisa abrir seu coração para outras possibilidades.

Seu olhar estava fixo nela de um jeito que aludia afeição.

Quando Katie viu Eli pela primeira vez, ela tinha rapidamente percebido que uma
de suas características peculiares era o jeito como ele encarava as pessoas
curiosamente sem perceber o quanto isso era irritante e rude. Esse olhar não era como
seu velho jeito de encarar. Esse era um olhar de compaixão vindo do coração de um
amigo preocupado.

Katie tentou esconder seus sentimentos falando rapidamente:

- Se por outras possibilidades você esteja se referindo a procurar por um novo


namorado ao meu redor, você pode parar bem aí. Eu te falo agora mesmo que isso não
vai acontecer. Eu não quero saber de relacionamentos por um tempo. Um bom tempo.
Você não me conhece, mas eu sou famosa por causas das minhas declarações sobre
deixar essa de garotos pra lá. Mas dessa vez eu estou falando sério.

- Eu te conheço, Katie, Eli replicou em voz baixa, mas firme.

- Não, você não me conhece. Não nessa área. Eu sempre saio de paixonites
complicadas e digo que vou focar no Senhor e consertar com meu coração com Ele.
Mas dessa vez eu realmente sinto como se meu coração estivesse certo com Deus.
Então, se por acaso você estava tentando dizer que eu deveria estar aberta a outras
possibilidades porque você está pensando em me convidar para um encontro só por
caridade para me deixar feliz, não se incomode, porque eu não iria com você.

- Na verdade, eu quis dizer se abrir para outras possibilidades com relação ao que
vai fazer depois que você se formar.

- Ah.

- Mas obrigada pela dica sutil em relação aos seus sentimentos sobre nunca sair
comigo. Eli deu a ela outro de seus sorrisos tortos e subiu de volta no carrinho da
segurança.

- Não leve o que eu acabei dizer tão pro lado pessoal.

- Eu quase nunca levo. Ele ligou o carro e se foi, e ela o assistiu virar a esquina.

Eli Lorenzo, você é uma peça única dos esforços criativos de Deus no mundo dos
homens, isso eu te falo.

Katie se dirigiu até o Crown Hall, tentando entender o que Eli tinha acabado de
tentar comunicar por entre as linhas. Era possível que ele estivesse interessado nela?
Por que ele estaria?

Qual foi a frase que o Rick usou no verão passado? O Rick disse que o Eli me
achava memorável. Foi isso? Não, não era memorável. Inesquecível. É, foi isso. Eli disse
a Rick que eu era inesquecível. Por quê?

Ela relembrou as muitas conversas que ela e Eli tinham compartilhado desde o
último outono, quando ela foi ao deserto com ele uma noite para assistir uma chuva
de meteoros. Eles trabalharam lado a lado por semanas no projeto de levantamento
de fundos em prol da água limpa. Katie aprendera muito sobre Eli e sua infância na
África. Ele não tinha sido nada mais que um amigo pra ela. Pelo menos, era assim que
ela o via, uma vez que ela passara por cima da estranheza de estar perto dele. Um
amigo que não fazia questão de manter em segredo que ele orava por ela. A oração,
ela estava certa, era um hábito que ele deve ter desenvolvido durante sua infância
missionária.

Pegando o elevador rumo ao terceiro andar, Katie seguiu até o apartamento de


Julia. Ela facilmente deixou os pensamentos em Eli de lado. Ela tinha muito para
colocar em dia com Julia e um monte de papéis atrasados para entregar. Essa era a
primeira chance que ela tivera de encontrar com Julia depois de continuamente
arrumar pretextos para não marcar um encontro.

A porta do apartamento de Julia estava alguns centímetros aberta, Katie tomou


isso como um sinal para entrar até que ela ouviu vozes de lá de dentro. Recuando, ela
pretendia ouvir apenas tempo suficiente para determinar se a conversa era pessoal.
Ela reconheceu a voz de Nicole e se sentiu confiante de que o que quer que ela
estivesse contando a Julia, Nicole acabaria contando a Katie.

Katie estava quase entrando quando ela percebeu que Nicole estava chorando.
Katie hesitou, percebendo que ela poderia estar interrompendo alguma coisa.

- Não tem nada a ver com ela, Nicole disse. Sou eu. Ela não sabe como eu me sinto
e quão horríveis tem sido esses últimos meses toda vez que eu estou perto dele. Eu
realmente tenho tentado morrer pra mim mesma, como você me disse, mas isso está
me matando. Eu sei que está errado, mas eu não consigo me livrar desses sentimentos
pelo Rick.

Katie congelou. Rick! Sentimentos pelo Rick!

- Eu jamais faria algo para machucar a Katie. Ela é uma das minhas amigas mais
próximas.

Os pés de Katie pareciam estar colados no chão.

- Você tentou ficar menos perto do Rick? Julia perguntou.

- Sim. Mas aí ele aparece aqui pra ver a Katie e…

- O Rick te deu alguma indicação de que ele possa estar interessado em você? Ele
paquera você ou dá em cima de você de alguma forma?

Katie mal podia respirar.

- Não, o Rick não me paquera. Ele é legal comigo, mas eu não acredito que seja
muito diferente da maneira como ele é legal com outras pessoas.

- Você acha que todo o interesse é da sua parte, então?

- Sim, tenho certeza disso. O interesse é todo da minha parte. Eu gostaria de poder
me livrar disso. O Rick ama a Katie. Isso é óbvio. Eu não sei como eu não consigo enfiar
isso na minha cabeça e seguir em frente.

- Porque seu coração está envolvido nisso. Você abriu seu coração para a
possibilidade de amar, e, portanto seu coração não está obedecendo às ordens da sua
cabeça nesse quesito.

Katie sabia que ela precisava sair dali, mas ela não conseguia se mover.

-Então eu preciso fechar meu coração? É isso? Eu me sinto uma idiota por deixar
esses sentimentos continuarem por tanto tempo. Eu realmente tentei não sentir o que
eu sinto, mas não adianta.
- Você não tem que entender o que está acontecendo, Nicole, mas você precisa
confrontar isso, e por isso que eu estou feliz por você estar me contando tudo isso.

- Me diga o que fazer.

Katie podia ouvir Nicole chorando. Parte dela queria entrar correndo na sala,
agarrar Nicole e dizer, “Ele está livre, Nicole! Ele é todo seu! Você pode correr atrás do
Rick agora. Eu não estou mais em cena.” Mas outra parte dela queria entrar lá e se pôr
na frente de Nicole, sacudindo seu punho e gritando, “Como você se atreve a deixar
seu coração derreter pra cima do meu namorado sabendo que o nosso
relacionamento era sério!”

Katie sentiu seu estômago enjoado. A última coisa que ela queria fazer agora era
ter um encontro de avaliação com Julia. Ela sabia que não podia ser encontrada ali
parada no corredor ouvindo a conversa delas.

Com rápidos e rasteiros passos, Katie deu meia volta e voltou para o elevador. Ela
apertou o botão do térreo e saiu no lobby, onde um número de estudantes estava
reunido nos sofás.

Talitha, uma das outras ARs, chamou Katie pela janela aberta do escritório da
frente. Katie se virou e diminuiu o passo apenas tempo suficiente para apontar em
direção à porta e dizer:

- Tenho que correr.

- Isso chegou pra você, Talitha chamou de novo, apontando para um buquê de
flores mistas amarelas e azuis.

Katie inclinou a cabeça para trás e deixou escapar um suspiro. Rick, já chega de
flores! Eu não sou mais sua namorada!

Ela acenou para Talitha como que dizendo, “Fica pra você.”

Apressando-se para o estacionamento e para a confortável e acalentadora solidão


de seu carro, Katie entrou, fechou a porta, e pegou seu telefone.

Depois de pensar nas suas opções, ela finalmente enviou uma mensagem para
Julia, se desculpando por estar atrasada e perguntando se elas poderiam se encontrar
outra hora.

Batucando seu dedo no volante, Katie tentou pensar em como ela reagiria da
próxima vez que visse Nicole. Como a Nicole pôde carregar esses sentimentos pelo
Rick e ainda ser legal na minha frente?
Enquanto Katie dissecava os últimos meses, ela viu o comportamento de Nicole
perto dela e de Rick sob uma luz diferente. Ao invés de procurar evidências para
convencer sua amiga de ser duas caras, Katie percebeu que Nicole tinha sido ela
mesma o tempo todo. Ela realmente tinha reprimido seus sentimentos por Rick.

Isso fez Katie se perguntar: Será que Rick reprimiu sentimentos por Nicole?
Os dois combinavam muito mais que Rick e Katie. Nicole merecia Rick, e ele
certamente era digno da Nicole.

Por que eu não vi isso antes? A Nicole realmente manteve seus sentimentos sob
controle. Mas também, essa é a Nicole.

Katie estava tendo dificuldade em manter sua fúria original pela confissão de
Nicole. Nicole não tinha feito nada de inapropriado. Pelo menos, nada que Katie sabia.
Nicole não tentara chamar a atenção de Rick pra ela.

O celular de Katie vibrou. A mensagem que Julia retornou dizia, “VENHA AGORA”.

Enchendo suas bochechas enquanto ela expirava profundamente, Katie


murmurou:

- Isso não vai ser nada bom.

Antes que ela pudesse responder a mensagem, outra mensagem chegou. Era de
Rick.

“PODEMOS CONVERSAR?”

Katie respondeu Rick primeiro. “CLARO. QUANDO?”

“AGORA. EU ESTOU AQUI EM CIMA NO CAMPUS.”

Ela parou, orou, e então engoliu suas emoções antes de responder Rick e depois
Julia.

Para Rick, a resposta foi, “CLARO. TE ENCONTRO NO BANQUINHO.”

Para Julia ela escreveu, “DESCULPA. ESTOU INDO PARA UM ENCONTRO


IMPORTANTE. AMANHÃ?”

Então ela desligou seu telefone, colocou a chave na ignição, e dirigiu para a o
estacionamento na parte mais alta do campus. O que quer que acontecesse em
seguida, Katie tinha a sensação de que se lembraria pelo resto de sua vida.
Capítulo 12
O estacionamento de cascalho na parte alta do campus tinha apenas oito carros
quando Katie estacionou e foi em direção à calçada. Ela estava feliz por não haver
muitas pessoas ao redor. Isso significava que Rick e ela poderiam ter essa conversa de
forma privada. Ela tinha vacilado muito no final de semana anterior; dessa vez a
comunicação deles deveria ser clara. Em suas estimativas, ambos tinham que chegar à
mesma conclusão.

Rick estava esperando, sentado no banco. Ele não olhou para Katie enquanto
ela se aproximava.

Esse era o banco “deles”, um lugar onde os dois haviam sentado e se abraçado
em várias ocasiões. Ela pensou em como eles tinham sentado lá e assistido o por do sol
atrás da Ilha Catalina. Eles se beijaram enquanto o céu resplandecia uma vívida sombra
alaranjada. Rick disse que estava orgulhoso deles. Orgulhoso do relacionamento deles.

Nessa tarde o céu estava denso com fumaça e neblina. Em um dia como esse,
levava uma boa dose de imaginação para acreditar que o vasto Oceano Pacífico
poderia ser visto dessa parte no topo da grande mesa. O espírito de Katie sentia a
mesma densidade e neblina. Ela não podia imaginar que qualquer relacionamento com
Rick poderia ser mantido depois dessa conversa.

Sentando-se no banco, Katie fitou a vista densa e esfumaçada, esperando que


Rick falasse primeiro.

- Diga-me alguma coisa, Rick disse.

Katie examinou o perfil forte dele.

- Eu repassei mentalmente cada pedacinho do nosso relacionamento e eu não


entendo porque você disse aquelas coisas no sábado à noite. Ele se voltou para ela.
Seus olhos estavam vermelhos.

Rick esteve chorando?

Ela pensou que já tivesse chorado tudo, mas à medida que ela olhava nos olhos
dele, uma nova leva de lágrimas se ajuntou.

- Nós fizemos tudo certo, Katie.

- Eu sei.

Matava-a vê-lo assim. Alguma coisa dentro dela gritava. Apenas abrace-o! Vá
até ele. Deixe ele colocar o braço à sua volta. Você pode fazer tudo voltar a ser como
antes. Você não tem que sentir essa dor.
Rick mudou de posição e fez outra pergunta:

- Eu tenho que perguntar, por mais que eu não queira saber. Você tem que me
contar, Katie. Há outra pessoa?

- Não! Rick, não!

- Foi o dinheiro, então?

Katie piscou.

- O dinheiro? O que você quer dizer?

- Você estava chateada comigo no sábado por pressioná-la sobre a herança?

- Não, a herança não tem nada a ver com isso. Nunca teve. Isso é outra coisa.

- Então me ajude a entender, Katie. Eu não entendo o que está acontecendo.


Especialmente enquanto você está sentada aqui, olhando pra mim desse jeito.

- Que jeito? As palavras dela saíram sufocadas.

- Como se você se sentisse tão arrasada com isso tudo como eu estou.

A segunda leva de lágrimas de Katie saiu como uma tempestade. Ela sabia que
tinha que dizer a ele a verdade.

- É porque eu te amo, Rick. Eu te amo.

A expressão dele se dissolveu e ele avançou para a mão dela. Katie não a
afastou. Rick levou a mão fria dela aos lábios dele. Ele beijou as juntas dos dedos dela
e então abaixou a mão dela, mas continuou segurando-a firme.

- Eu sei que nós podemos fazer dar certo, Katie. Nós seguimos todas as regras.
Eu fiz um grande investimento no nosso relacionamento. Não é hora de pular fora.
Você tem que entender isso. Você obviamente se sente do mesmo jeito.

- Rick, só porque eu te amo não quer dizer que...

A mandíbula dele apertou. Lágrimas rolaram dos cantos dos olhos cor de
chocolate dele. A voz dele era quase um sussurro.

- Nós podemos fazer dar certo.

Afastando-se lentamente, Katie tentou com todas as suas forças continuar


falando o que ela sabia que era verdade.

- Rick, ouça. Você tem que me ouvir. Fazer alguma coisa funcionar ou fazer um
grande investimento, como você diz, não é a mesma coisa que estar unido no coração.
- Mas você acabou de dizer que me ama. Você sabe que me ama, Katie.

Katie lamentou suas palavras. Elas eram verdadeiras, mas nesse momento
aquela verdade em particular não a estava libertando. Ela deixou a mão de Rick e
exalou como se a conexão entre eles tivesse sido liberada.

Sentindo um pouco de força, ela disse:

- O nosso relacionamento como um casal foi tão longe quanto poderia, Rick. Se
você for honesto consigo mesmo, eu sei que você vai concordar.

Ele respirou profundamente. “Eu concordo com você, Katie.

Katie sentiu um banho de alívio vindo a ela. Finalmente! Aceitação.

Rick sentou ereto. Ele parecia mais sintonizado com o que Katie estava dizendo
e não tão arrasado mais.

- Eu sei – Rick limpou a garganta – não é exatamente assim que eu pensei que
essa parte do nosso relacionamento seria.

- Eu sei. Nem eu.

- Mas você está certa. Nós não podíamos ir do jeito que estávamos.

Katie concordou e esperou que Rick fosse voltar ao seu jeito galanteador agora.
Ele precisava marcar o final do relacionamento com as suas usuais força e confiança.
Ela não queria perder tudo o que eles tinham compartilhado. Não a amizade. Não as
memórias. Não todos os bons momentos. Ela queria que eles seguissem em frente dali
em diante.

- Eu não posso dizer que eu gostei do jeito que as coisas aconteceram no


sábado, Rick disse.

- Eu sei. Eu sinto muito por ter sido tão insensível e jogado as coisas na sua cara
no meio da noite.

- Tudo bem. Você estava sendo honesta. Você é assim, Katie. É como você faz
as coisas. Eu aceito isso em você. Eu pensei que eu estivesse levando as coisas no
ritmo certo para nós, mas talvez eu devesse ter-nos trazido a esse ponto mais cedo.

- Isso não importa agora. Katie se sentiu aliviada que pudessem conversar sobre
o relacionamento deles objetivamente.

- Você está certa. Não importa agora. O que importa é o que vai acontecer
depois.

- Concordo.
Rick deu a ela um olhar cheio de todo vigor selvagem que ele exibia no campo
de futebol quando eles estavam no ensino médio. O queixo dele estava rígido e firme.
Estreitando o olhar, ele deslizou do banco e se abaixou em um joelho.

- Katie, eu te amo.

Ela congelou.

O quê? Agora? Agora que você me diz isso? Rick, o que você está fazendo?

Rick avançou para o bolso da jaqueta e tirou a caixa de um anel. Ele abriu a
caixa e com palavras firmes, disse:

- Esse também era da minha avó. Eu precisava ajustar o tamanho para você,
mas eu estava esperando até...

Katie pôs-se de pé num salto e gritou:

- Rick, não. Não!

Ele olhou perdido e confuso, preso ali de joelho com um diamante solitário em
sua mão.

- Katie, eu ainda não fiz o pedido.

- Então não faça. Por favor!

Com seu coração batendo forte, Katie agarrou Rick pela mão e o colocou de pé.

- Escute, você tem que ouvir o que eu estou dizendo. Nós terminamos! Você e
eu ainda estamos terminados.

Rick franziu a testa.

- Eu pensei que você estivesse tentando me motivar.

- Tentando te motivar?

Eu pensei que você estivesse triste porque Marta perguntou se nós já tínhamos
marcado uma data.

- Não!

- Então você não estava usando o rompimento como uma ameaça para
conseguir um pedido de casamento?

- Eu não posso acreditar que você acabou de me perguntar isso. Não! Eu não
estava ameaçando você. Eu nunca faria isso. O que eu disse sábado à noite não foi um
falso ultimato. Eu nunca tentei forçar você a dizer que me ama. Eu nunca o
pressionaria a ponto de você pensar que a única opção fosse um pedido de
casamento. Você não sabe que eu não sou assim?

Ele se afastou. A mandíbula dele se apertou.

- Eu não sei como você é mais, Katie. Eu realmente não sei. O jeito que você
vinha agindo não faz sentido para mim. Sua mente é um enigma. Como eu deveria
saber o que está acontecendo com você?

- É isso que eu estou tentando te falar! Você e eu não mais somos bons juntos.
Não para algo mais duradouro. Nós estamos em extremos diferentes. Nossas
habilidades de comunicação estão terríveis. Nossos objetivos de vida são opostos.
Nossos corações podem estar no lugar certo, mas nós definitivamente não estamos
indo para a mesma direção. Você não percebe?

Quanto mais firme ela tentava ser, mais rígida a mandíbula do Rick ficava. Katie
sabia que ele devia estar se sentindo tanto humilhado como frustrado. Nada que ela
fizesse poderia suavizar as coisas.

Por um breve momento, Katie considerou lançar sua carta na manga e contar a
Rick como Nicole se sentia com relação a ele. Mas isso não ajudaria agora. E seria trair
a confidência de Nicole à Julia. Uma confidência que Katie não deveria ter ouvido.

Por uma vez em toda sua vida, Katie manteve sua boca fechada. Seu coração
estava pulando e sua adrenalina estava pulsando, mas seus lábios não estavam se
movendo.

Rick levou os seus ombros pra trás. As linhas ao longo da sua testa estavam
apertadas. Sua boca fazia uma linha pequena e fina. Katie conhecia aquele olhar. Rick
estava furioso.

- Sabe o que é? Estou cheio disso. Tudo isso. Você e eu estamos terminados,
Katie. É óbvio que nós não estamos seguindo na mesma direção.

O queixo de Katie caiu. Ela queria rebater com, “Alô! O que você acha que eu
estava tentando te dizer?”

Em vez disso, ela deixou as palavras de término virem dos lábios de Rick para
que ele ficasse com elas. Ela notou que ele tinha guardado a caixa com o anel de volta
no bolso da sua jaqueta como se o tesouro nunca tivesse sido revelado.

- Realmente me chateia muito que nós tenhamos terminado desse jeito, Katie.
Você não tem idéia de como...

Ele parecia picar suas palavras finais em metades e tragá-las, ardentes e


inteiras, em vez de cuspi-las em Katie.
- Nós terminamos.

Com movimentos bruscos, Rick passou por ela e fez a sua saída.

- Rick, espere!

Ele continuou caminhando, rápido e determinado.

- Rick!

Ele não diminuiu por um momento.

Katie se recusou a correr atrás dele. Ela sentia uma fúria crescendo dentro dela
por ser ele a sair marchando e marcar o relacionamento deles com essa memória final.
Em vez de chamar por ele pela terceira vez, Katie o deixou ir. Esse era o Rick. O
verdadeiro Rick. Ela havia dito que queria que ele fosse verdadeiro consigo mesmo e
não o Rick sufocado que perdera todo o seu fogo. Se ele queria fazer uma grande
saída, deixe.

Afundando no banco e encarando a tigela de sopa de fumaça no vale abaixo,


Katie tentou decidir o que fazer. Isso é terrível. Por mais certo que isso seja, é terrível.
Esfregando a testa, ela franziu-a. A raiva dela pela saída do Rick tinha chamejado e se
queimado rapidamente. Tudo o que ela queria agora era estar perto de uma amiga.
Uma verdadeira, eterna amiga.

Cris.

Katie levou algum tempo para chegar à livraria A Arca onde Cris trabalhava. O
tráfego do início da noite estava pesado e um dos semáforos não estava funcionando.

Só para ter certeza de que Cris estava no trabalho, Katie telefonou para A Arca.
Para sua surpresa, a mãe de Rick atendeu ao telefone. Os Doyle eram donos do café e
da livraria, mas a mãe do Rick já não administrava mais a livraria.

- Katie, ótimo você ter ligado bem agora.

- Eu liguei para A Arca, não liguei?”

- Sim, eu já estava saindo, mas ninguém mais estava disponível para atender ao
telefone. Ouça, eu estou planejando uma recepção de formatura na nossa casa e eu
quero encomendar os convites essa semana. Você sabe quantas pessoas você quer
convidar?

- Convidar? Não entendi.

- Eu pensei que o Rick tivesse comentado com você.

- Na verdade, Rick e eu...


- Não importa. Deixe-me lhe dizer o que eu estava pensando. Já que você,
Nicole e Eli estão se formando este ano, eu pensei que poderíamos oferecer uma festa
na nossa casa para todas as famílias e amigos.

- Hmm, eu não acho que essa seja uma idéia tão boa. Quero dizer, obrigada por
pensar em fazer isso, mas...

- Katie, você sabe que é impossível me convencer a não fazer uma festa. Eu já
organizei os detalhes com Nicole e a mãe dela. Agora, você tem uma idéia de quantos
convites você vai querer? Eu posso ajudar a endereçar e enviá-los para você, se você
quiser. Isso tiraria um pouco da pressão de você, o que eu suponho que seria bem útil
agora.

- Você não tem idéia, Katie murmurou.

- Bom. Ok, bem, me mande um e-mail e me informe quantas pessoas você quer
convidar. Eu realmente estou procurando ter todos em nossa casa. Tirando do Dia de
Ação de Graças e o Natal, nós quase não temos nos divertido desde que nos mudamos
para cá. Vai ser maravilhoso.

Após uma pausa embaraçosa, Katie encontrou palavras suficientes para dizer:

- Cris está aí?

- Não, ela e Ted saíram há mais ou menos meia hora.

- Ok. Obrigada. Katie desligou e pressionou o nome de Cris no telefone.

Ted respondeu.

- Cris está aí? Parecia ser a única frase que Katie conseguia falar sem explodir
seu cérebro já super desgastado.

- Ela está bem aqui, mas o médico acabou de chegar. Você quer que ela te ligue
de volta?

Katie encontrou o resto de suas palavras rapidamente.

- Médico? Está tudo bem? O que aconteceu? Onde vocês estão? Vocês estão no
hospital?

- Não, nós estamos na Clínica River Rock. Eu vou dizer a ela que te ligue de
volta, Katie. Ted desligou antes que Katie pudesse golpeá-lo com ainda mais perguntas.

No semáforo seguinte, Katie virou à esquerda e dirigiu para a Clínica River Rock.
Seu coração estava pulando de novo. Ela estava certa que esse era o restinho de
adrenalina que o seu pobre corpo poderia produzir em um dia.
Por que Cris estaria no médico? Ela não está grávida, está? É por isso que Ted
foi com ela? Para descobrir se ela está grávida? Por que o Ted não podia apenas me
dizer, se fosse esse o caso? Por que ele é sempre tão desligado?

- Homens! Katie gritou pela janela aberta do seu carro enquanto ela dirigia pela
auto-estrada. Vocês me deixam loucos! Todos vocês!
Capítulo 13
Às 6:45 daquela noite, chegando ao fim de um dos dias mais cheios de emoção da
vida de Katie, ela encontrou consolo temporário em um grande Chimichanga na Casa
de Pedro.

Ted e Cris se sentaram na frente dela no quiosque enquanto os três desfrutavam


de uma grande cesta de tortillas mornas. Katie resumiu a última semana de sua vida
para eles.

Cris inclinou a cabeça.

- Então o Rick foi embora com o anel no bolso e nada ficou resolvido?

- Não. Quero dizer, sim, ele foi embora, mas nada ficou sem ser resolvido. Tudo o
que foi dito precisava ser dito. Nós terminamos.

- E quanto à Nicole? Cris perguntou.

- Eu não sei o que vai acontecer agora. Mas, vocês dois, vocês têm que me
prometer que não vão dizer nada pro Rick sobre a Nicole. Quero dizer, se houver
alguma possibilidade deles ficarem juntos, eu acho que isso vai encontrar um jeito de
vir à tona.

Katie recostou na cadeira e apertou seu copo de água gelada na testa.

- Eu estou mesmo cheia de todo esse drama. Entende o que eu estou dizendo?
Quando eu olho atrás para os últimos dez anos da minha vida, eu fico envergonhada
com quão impulsivamente eu agi.

- Você quer dizer, como dirigir até a clínica River Rock e pular em cima de nós
quando nós saímos rumo à sala de espera? Ted perguntou com um sorriso.

- Estou contente por seus dias impulsivos terem acabado.

- Aquilo foi diferente. Alguém, que eu não vou dizer o nome, desligou o telefone
antes de compartilhar o simples detalhe que a sua esposa estava tendo uma verruga
retirada das costas. Minha imaginação foi um pouco longe.

- Não era nada sério, Katie, Cris disse.

O garçom colocou um grande prato de tacos de peixe na frente de Ted e um prato


de enchiladas12 de queijo na frente de Cris. O monstruoso chimichanga veio até Katie.
Ela deu uma grande mordida e deixou o queijo quente e a carne moída ajudarem-na a

12
Enchilada é uma panqueca de milho mexicana, muito condimentada, recheada de carne de vaca,
feijões ou frango e que leva por cima molho de piripíri e queijo ralado.
liberar suas emoções. Ela percebeu que tudo o que havia comido aquele dia fora meio
bagel13 com geléia de morango pela manhã. O resto do dia foi agitado para ela.
Comida era uma coisa maravilhosa.

- A parte que eu perdi, Ted disse, foi porque você decidiu romper com o Rick. O
que aconteceu sábado à noite?

- Eu não sei. Eu estava lá deitada e, de repente, eu sabia que nós estávamos


acabados. Eu não poderia ir mais longe em meu relacionamento com o Rick. A ficha
caiu quando eu percebi como você e a Cris dormem juntos.

Ted se sentou um pouco mais reto e olhou para Cris com um olhar meio tímido e
meio divertido.

- O que você andou contando a ela?

- Nada pessoal. O rosto de Cris ficou vermelho.

- Não se preocupe, Ted. Todos os seus segredos estão a salvo com ela. Eu não me
referia a esse tipo de dormir junto. O que eu estava pensando sobre sábado à noite foi
como os seus corações estão conectados. Vocês vão para casa se encontrar todas as
noites, mas vocês, na verdade, só estão em casa quando estão nos braços um do
outro. Você entende o que eu quero dizer? Vocês combinam. Cada parte do
relacionamento de vocês se encaixa.

Cris deu a Ted um caloroso sorriso de ‘você-é-o-meu-amado’.

Ted beijou sua esposa e sorriu ternamente.

- Vocês dois são uma gracinha. Eu já disse isso alguma vez?

Cris deu a ela um sorriso contente, e Katie sentiu uma tristeza aguda sobre a
realidade de que ela e Rick estavam realmente, verdadeiramente terminados.

- Eu não posso deixar que isso me ponha pra baixo, Katie disse mais para si própria
do que para Cris e Ted. Acabou. Rick e eu estamos terminados. E eu estou realmente
exausta, sabe? Agora eu preciso focar minha energia na faculdade. Eu estou correndo
contra o tempo. Estou muito atrasada nas minhas matérias. Tudo o que eu preciso
fazer nas próximas cinco semanas é terminar a faculdade.

Assim que Katie mordeu outro pedaço, Ted disse:

- E depois?

13
Bagel é um produto de pão tradicionalmente feito de massa de farinha de trigo fermentada, na forma
de um anel, feito sob-medida à mão e que primeiro é fervido em água e depois cozido.
Ela deu de ombros e continuou mastigando, usando a comida como uma boa
desculpa para não responder.

- Nós podemos ter uma vaga na livraria, Cris disse. Eu não sei se você iria querer
trabalhar lá, mas um dos rapazes disse que não vai continuar depois que terminar a
faculdade.

Katie não tinha interesse em trabalhar na Arca, apesar de que seria divertido estar
com Cris todos os dias. Pensar na Arca lembrou a ela do que a mãe de Rick disse
quando Katie ligou mais cedo, procurando por Cris.

- Isso me leva a outro dilema. A mãe do Rick está planejando uma grande festa
para nós três.

- Vocês três? Ted perguntou.

- Nicole, Eli e eu. Nós três que vamos nos formar. Tenho certeza que ela vai
cancelar assim que o Rick contar que nós terminamos.

- E se ela não cancelar? E se ela ainda quiser dar uma festa? Cris perguntou.

- Seria um pouco estranho, você não acha?

- Não necessariamente. Não com a mãe do Rick. Katie, tente olhar para a figura
como um todo. Se ela ainda quiser dar uma festa para todos vocês, pense em sua
amizade com Nicole, Eli e até mesmo com Rick. Não tome sua decisão baseando-se
apenas no que aconteceu esta semana.

Cris apertou o lado do garfo em uma das enchiladas e tirou um pequeno pedaço.
Antes de colocá-lo na boca, ela disse:

- Você é uma mulher de opções. Você pode fazer o que você quiser.

Katie mordeu seu chimichanga. Parecia surreal que aqueles três estivessem
sentados ali, discutindo sua vida nos termos de ‘figura como um todo’ e como ela era
uma mulher de opções. Ela não sabia se esperava que Ted e Cris ficassem mais
surpresos pelo o rompimento, mas alguma coisa parecia estar fora do lugar. Nenhum
deles parecia tão preocupado quanto ela pensou que eles ficariam. Afastando seu
prato, Katie olhou para Cris e então para Ted.

- Vocês sabiam que eu e o Rick iríamos terminar?

- Não, Cris disse.

- Nenhum de vocês parece muito surpreso. Katie pegou a sua água e tomou um
longo gole enquanto seus amigos trocavam olhares. Eles não disseram nada.
- Qual é o problema? Vocês estavam mantendo encontros de oração secretos com
Eli para que eu e Rick rompêssemos?

- Claro que não, Ted disse.

- Então o que vocês estão pensando sobre isso tudo? Me dêem algum retorno
aqui. Está difícil pra mim decifrar vocês.

Ted olhou para Katie com simpatia em seus olhos azul-prateados.

- Eu acho que você está ouvindo o Senhor e seguindo o que acredita que ele está
te falando. É o caminho da vida, Katie. Permanecer ouvindo e permanecer seguindo
para onde quer que ele guie você.

- É isso o que você pensa também? Katie perguntou para Cris.

- Sim. E, Katie, eu estou triste por você e Rick terem terminado. Pode não parecer,
mas eu sinto muito por você. Ela avançou por sobre a mesa e apertou o braço de Katie.
Eu acho que você está lidando muito bem com tudo isso.

- Obrigada.

- Eu quero que você acabe com um cara que veja quem você realmente é, a
verdadeira Katie. Alguém que te dê bastante espaço para esse seu espírito livre e ao
mesmo tempo te encoraje a estar centralizada em Cristo.

- E você não via isso acontecendo quando eu estava com Rick?

- Algumas vezes, Ted disse. Com um sorriso ele adicionou, Vocês certamente
tiveram seus momentos.

As emoções de Katie se tornaram saudosas.

- É, nós tivemos.

Ela deu um olhar cansado para seu prato que estava pela metade.

- Eu não posso acreditar nisso, mas eu estou cheia. Eu estava planejando comer
essa coisa inteira.

- Você e Eli são as duas únicas pessoas que eu conheço que consideram uma
vitória pessoal conseguir comer um desse inteiro, Ted disse.

- Eu já vi você comer um inteiro, Cris disse para Ted.

- Mas eu não levo isso como um desafio. Eu só gosto de comer.

Por alguma razão, o comentário do Ted relacionando-a com Eli pegou Katie. Ela
não sabia por que, mas ela sentia como se uma linha extremamente esticada dentro
dela, estivesse prestes a arrebentar. Se ele ficasse lá mais um minuto, o que ela faria
em seguida não seria bonito.

- Sabe o que é? Eu tenho que ir. Katie lançou sua parte do dinheiro na mesa. Não
levem isso para o lado pessoal, mas eu estou morta. Falo com vocês mais tarde.

- Você está bem? Cris perguntou.

- Não. Eu não estou. Mas eu vou ficar. Espero.

Katie deslizou para fora do quiosque e captou o olhar de Ted.

A expressão dele era calma e estranhamente tranqüilizadora. Com seu gesto típico
de levantar o queixo, ele disse:

- Até mais, Katie.

- Até mais.

Abastecida apenas o suficiente pelas suas sete mordidas no chimichanga gigante


da Casa de Pedro e pela necessidade de liberar a intensidade das suas emoções, Katie
dirigiu direto pela planície até a Rancho Corona. Ela estacionou o carro, caminhou para
dentro do Crown Hall, foi diretamente ao quarto de Nicole e bateu.

Nenhuma resposta. Ela bateu de novo.

- Nicole, é a Katie.

A porta abriu, e Nicole ofereceu a Katie um sorriso apertado e casualmente disse:

- E aí?

- Preciso conversar com você.

- Oh. Bem, eu estava na verdade tentando terminar um...

- Eu sei; eu também. Mas eu preciso conversar com você agora.

Nicole ficou de lado, deixando Katie entrar, fechando a porta, e então foi para
cima da cama e apanhou seu telefone celular.

- Eu vou ter que te ligar de volta... Claro... Ok, eu vou. Você também. Tchau.

Nicole sentou na cama enquanto Katie se acomodava na cadeira ao lado onde ela
normalmente sentava para conversas longas e vagarosas. Esta noite ela estava
determinada a manter a conversa curta.

- É o seguinte, Katie começou. Eu não queria, mas eu estava do lado de fora da


porta de Julia hoje mais cedo e ouvi o que você estava falando com ela.
O rosto de Nicole ficou pálido. Seus lábios se abriram, mas nenhuma palavra veio.

- Não diga nada, por favor. Apenas ouça. Eu sei que este não é um jeito muito bom
de comunicar, mas parece ser o único jeito que sou capaz de expressar meus
verdadeiros sentimentos esta semana. Nicole, você é uma grande amiga. Você sempre
foi uma grande amiga. Eu nunca senti como se você estivesse tentando roubar o Rick
de mim, então eu não sinto que você tenha que explicar nada disso. Eu sei como é
amá-lo. Eu soube como é durante um longo tempo. E eu suponho que eu vou
continuar me sentindo desse jeito por um tempo ainda maior.

Nicole estava chorando em silêncio.

Katie continuou, sem saber se essa era uma rota sábia ou não. Tudo o que ela
sabia era que ela iria explodir se tivesse que viver no mesmo andar com Nicole e não
poder levantar esse assunto.

- Então aqui está a outra parte que você já deve ou não saber. Eu terminei com
Rick.

A mão de Nicole voou para a sua boca.

- Katie!

- Não foi por sua causa. Eu terminei com ele sábado à noite. Não estava
totalmente acertado, eu suponho, então Rick terminou comigo esta tarde. Nós
terminamos. De verdade. Sim, eu estou um pouco confusa, mas eu estou bem. Eu acho
que Rick está bem também. Ou, pelo menos, ele vai ficar. Ele não sabe como você se
sente com relação a ele. Bem, talvez ele saiba, apenas do jeito que os garotos sabem
esse tipo de coisas a respeito das garotas, mas ele está agindo como se não soubesse,
sabe?

Nicole avançou para um lenço. Ela parecia uma bagunça emocional.

- É isso. Eu não sei o que vai acontecer agora, mas você tem a minha benção. Eu
não vou dizer nada ao Rick. Você nunca mais precisa falar comigo sobre essa conversa
se você não quiser. Eu estou exausta. Se alguém precisar de mim para os negócios
oficiais do andar, eu vou estar no meu quarto tentando descobrir uma forma de fazer
o impossível e finalizar tudo antes da formatura.

Katie se levantou e foi para a porta. Ela parou antes de sair.

- Sabe qual a maior surpresa nisso tudo? A verdade pode ser muito crua às vezes.
E aqui está a verdade que eu aprendi. É possível amar alguém, e eu quero dizer amar
realmente, e acabar não passando o resto da sua vida com ele. Não é estranho? É
como uma antítese de todos os contos de fadas que nós ouvimos. Mas é a verdade.
Um claro pensamento veio a ela.

- Sabe, eu suponho que eu agora saiba um pouquinho como Deus se sente. Uau, é
um sentimento horrível.

Com mais um último pensamento, Katie ofereceu a Nicole uma expressão


simpática.

- Desculpe entregar tudo isso sem muita delicadeza. Mas você vai ficar bem. Você
vai. Não importa o que aconteça.

Nicole permaneceu sentada imóvel na sua cama, piscando através de uma


inundação de lágrimas. Ela acenou e Katie saiu.

Três mulheres pararam Katie enquanto ela fazia o caminho até o seu quarto no
fim do corredor. Duas delas queriam detalhes sobre a Festa de Primavera, o evento
social de todos os dormitórios que estava marcado para a penúltima semana de abril.
Uma delas só queria conversar.

Katie escutou ausente por mais ou menos quatro minutos e então disse.

- Nós podemos terminar essa conversa um pouco mais tarde? Eu realmente tenho
que ir ao banheiro.

Era verdade. Mas assim que Katie se isolou na cabine do banheiro, ela não queria
sair. Ela não queria encarar ninguém no andar. Ela não queria redigir nenhum artigo,
nem queria ir à aula segunda feira e pedir por outra semana em um de seus projetos
que já estava atrasado. Não tinha jeito de ela terminar nada. Ela estava exausta.
Mente, corpo e alma. Exausta.
Capítulo 14
O alarme do celular de Katie despertou as 8:00 da manhã do sábado, forçando ela
a se levantar da cama depois de menos de cinco horas de sono. Ela tropeçou na
bagunça de seu quarto procurando algo para vestir e bateu o dedo do pé na cadeira da
mesa. Pulando pra cima e pra baixo num pé só ela não queria nada mais do que atirar-
se de volta na cama e dormir por mais uma semana. Mas Julia tinha procurado por ela
na noite passada, e insistiu para agendar a conversa delas, há muito esperada, para
esta manhã. Exausta e com os olhos e a mente embaçados, Katie não estava olhando
para frente, para todas as palavras que ela teria que travar com Julia e para a sua vida
virada.

Puxando um par de jeans amarrotado, um moletom, e sandálias de dedo, Katie


pôs os cabelos em um clipe. A cabeça dela doía.

- É melhor não ficar doente, isso é tudo que eu posso dizer. Por favor, Deus,
apenas mais algumas semanas. Então... bem, eu não sei o que vai ser então, mas com
certeza será mais conveniente ficar doente.

Katie parou no banheiro no seu caminho para o hall e sentiu admiração por Cris.
Como ela tinha administrado o ultimo ano da graduação e se casado uma semana
depois estava além da compreensão de Katie. Ela tinha certeza de que ela não tinha
sido suficientemente útil ou compreensiva para a amiga no momento. Agora ela sabia
muito bem o que era como estar na reta final. Julia estava esperando por ela no lobby
com um ‘sorriso-maior-que-o-normal’.

- Você parece que precisa de um pouco de café.

- Sim, uns 12 copos do mais forte que você puder encontrar.

- Você quer dirigir, ou pode ser eu?

- Melhor você. Não trouxe minha carteira.

- Isso é conveniente. Coisa boa eu ter dito que estava pagando. Julia abriu a porta
para Katie e seguiu-a para fora no dia novo e brilhante.

- A chuva da noite passada realmente deixou tudo limpo e novo.

Katie bocejou.

- Choveu?

- Você devia estava numa caverna, não era?


Pior do que isso. Mais como um coma. Tem certeza de que quer conversar comigo
essa manhã? Eu já sei minha pontuação de AR final desse ano.

- Não você não sabe. E sim que quero conversar com você. Estamos fora há muito
tempo.

Julia abriu a porta do carro para Katie. Ela rastejou e enrolou-se na lateral, como
se ela fosse voltar a dormir.

Julia riu.

- Eu vou acordá-la quando chegarmos lá, e você pode me responder a minha longa
lista de questões. Daqui até o coffe shop, tudo que você tem a fazer é ouvir. Eu tenho
algo para lhe dizer.

Os olhos de Katie ficaram fechados por menos de 10 segundos. O que Julia disse
fez Katie abrir os olhos instantaneamente.

- Eu vou me casar.

Sentada, Katie falou impetuosamente:

- Com quem? Trent?

Julia puxou-se para trás, atordoada.

- Como você sabe sobre Trent?

- Você me falou sobre ele a alguns meses atrás.

- Eu disse? O que foi que eu disse a você?

- Você disse que estava apaixonada por ele quando vocês eram estudantes aqui no
Rancho. Mas você obviamente não terminou com ele. O que você disse ficou comigo
porque você disse que continuava tendo sentimentos por ele, pois o amor não vai
embora apenas porque pessoas vão embora. Alguma coisa como isso. Eu me lembrei
do que você disse. Eu também perguntei se ele tinha casado com outra, e você disse
que não.

Lágrimas se formaram no canto dos olhos de Júlia e escorriam pelo seu rosto
enquanto ela dirigia na descida do morro.

- Oh, não. Eu disse alguma coisa errada, não disse?

- Tudo bem. Realmente. Eu esqueci que tinha falado sobre o Trent pra você.

- Então você não vai se casar com o Trent.

- Não, eu vou me casar com John Ambrose.


- Porque esse nome me parece familiar?

Katie estalou os dedos e ficou sentada todo caminho no seu assento.

- Dr. Ambrose? Você está brincando comigo? Eu estava na classe dele de história
do Velho Testamento há alguns anos atrás logo após sua esposa faleceu. Ele é o cara
mais legal. E aquela voz! Eu adorava quando ele lia as Escrituras para nós em sala de
aula como uma bênção. Mas espere. Quando isso tudo aconteceu? Quando você
encontrou tempo para se apaixonar por um professor do Rancho Corona? Julia sorriu.

- Ano passado. Ele fez a oração de encerramento da conferência de missões na


capela, e eu apenas abri os meus olhos depois que ele disse ‘amem’ e eu não sei, meu
coração estava voltado para ele.

- Isso é tão lindo. Então o que aconteceu?

- John demorou um pouco mais para me descobrir, mas quando ele fez isso, foi
tudo muito rápido. Vamos nos casar logo que as aulas terminarem. Vamos ter tempo
para espremer uma lua – de - mel antes que ele tenha que voltar para os cursos de
verão.

- Wow! Julia, eu estou tão feliz por você.

- Obrigado. Estou estática. Nós dois estamos. Escolhemos manter nosso


relacionamento oculto por um bom tempo, e agora que estamos namorando
oficialmente, eu estou praticamente tonta.

- Do jeito que você deveria estar! Isto mostrará aquele velho Trent, huh?

A expressão de Julia mudou de um sorriso rosado de amor para uma triste


sombra.

- Eu fiz de novo, não fiz? Desculpe-me. Eu simplesmente não sei quando manter o
bico fechado.

Julia parecia estar pensando por um momento antes de entrar com o carro no
estacionamento de uma loja de ferramentas.

- Porque você parou aqui? Eles vedem café em lojas de ferramentas agora?

- Não. Julia desligou o carro e virou-se no banco para encarar Katie. Eu quero
conversar com você sobre o Trent.

- Você não precisa fazer isso.


- Não, eu acho que preciso sim. Nada do que eu te digo é informação que circula
no campus, certo? John sabe, é claro, e quando Craig me contratou como diretora
residente, ele sabia. Agora eu quero que você saiba.

Katie não estava preparada para entrar na intimidade de Júlia daquela maneira.
Ela desejava que ela não tivesse sumido com os comentários sobre Trent e teria
apenas que deixar Julia manter os segredos dela.

- Trent e eu namoramos por alguns meses depois que terminamos o colégio. Nós
fomos praticar esqui aquático no Lago Tahoe com alguns amigos naquele verão, e
Trent se machucou seriamente em um acidente com outro barco, quando ele estava
esquiando. Ele teve que ser levado para o hospital e ficou em coma.

Nesta altura da conversa, Julia falava normalmente. Quando foi pra próxima parte
da história, sua voz ficou baixa, e suas palavras eram estendidas, como se causasse dor
pronúncia-las.

- Trent perdeu sua perna direita e ficou em coma por 2 semanas..

- Que coisa horrível!!

Julia continuou sem receber a simpatia de Katie.

- Quando saiu do coma, ele não era o mesmo. Ele não lembrava quem eu era. Eu
me mudei para poder ficar perto dele e ajudar na fisioterapia e na longa recuperação.
Ele fez por aproximadamente 3 meses, e então ele simplesmente desistiu, eu acho. O
médico disse que o dano no seu cérebro foi maior do que se pensava a princípio. Dois
anos após o acidente, Trent continuava sem me reconhecer.

- Oh, Julia.

- Ele morreu a três anos atrás de um aneurisma.

Elas duas ficaram em silêncio por alguns momentos antes que Katie falasse de
novo.

- Por isso você me disse que o amor não vai embora apenas por que pessoas vão
embora.

Julia acenou com cabeça e pegou um tecido de uma caixa no banco traseiro de seu
carro.

- Você pode realmente amar alguém mas não ficar com ele para sempre.

Katie tinha dito a mesma coisa quando ela estava no quarto de Nicole no dia
anterior.
Julia acenou de novo.

- O amor é misterioso. Ele pode ser irremediável e também doloroso.

- Eu concordo com mais do que você pode imaginar. Cris falou sobre como o amor
verdadeiro é um comprometimento incondicional com uma pessoa imperfeita é mais
do que isso, porém, não é? Amor tem que ser aceitar o que é verdadeiro e ir além.

Julia inclinou a cabeça.

- Eu estou certa em achar que você tem feito algum credito extra ultimamente
estudando o amor?

- Sim, mas que não quero falar sobre mim ainda. Continue com a sua história de
amor.

- Eu não sei o que mais dizer. Eu tenho que acreditar que você tem que ser
corajoso para sobreviver ao verdadeiro amor. Tanto John quanto eu passamos por
alguns vales profundos, escuros. John disse que toda a dor e trevas que nos
experimentamos fez o nosso amor um pelo outro muito mais poderoso e altamente
valorizado. Eu concordo com ele. Nós não vamos ser do tipo de casal que discute sobre
as pequenas coisas. Nos sabemos que isto é um presente, ter um ao outro e nos sentir
como nos sentimos.

- Isso é tão incrível, Julia. Tão lindo. Eu não sei se eu tenho as palavras certas pra
te dizer como eu estou feliz por você. Por vocês dois. Isso parece uma grande ‘coisa-
de-Deus’.

Julia deu a Katie um grande sorriso.

- Você já disse que tudo bem. Obrigada, Katie.

- Ouvir a sua história me dá esperança.

- Esperança é a coisa com penas em poleiros na alma, que canta a música sem
palavras e nunca pára em todas.

- Eu amei isso! Você não fez isso agora, fez?

- Não, isso é de um poema de Emily Dickinson

- Você está falando da Emily do nosso andar? Uma que toca violão? Eu sabia que
ela escrevia musicas. Ela escreve poemas também?

- Não, eu estou falando de Emily Dickinson, a poeta. Por volta de 1800? Centenas
de pequenos poemas publicados depois que ela morreu?
- Acho que eu deveria saber, certo? Quer dizer, estou quase formada na
faculdade. Eu acho que deveria ser bem versada em artes, literatura, ciências,
humanidades, e...

- E os eternos mistérios do amor, Julia acrescentou com um sorriso.

- Também.

- Então vamos começar. Diga-me tudo que você sabe sobre os eternos mistérios
do amor.

- Dói.

- Ah, então eu acho que você e eu temos algumas coisas a dizer sobre isso.

- Sim, eu acho que nós temos.

Julia e Katie começaram sua conversa multifacetada no carro enquanto


estacionavam em frente à loja de ferragens. Cerca de quarenta minutos depois,
quando Julia já tinha uma visão bastante completa do último mês de vida de Katie, ela
ligou o motor.

- Você vai me levar para a fazenda porca agora? Katie perguntou.

- Não, eu preciso de café antes de ouvir qualquer outra coisa.

Katie voltou a falar de Julia e os planos para o casamento dela enquanto ela dirigia
mais algumas milhas pela rodovia. Ela pensou em como era ótimo que Julia e John iam
fazer a cerimônia no prado do campus superior onde Cris e Ted tinham se casado em
Maio passado.

O que Katie não achou que foi ótimo foi o lugar que Julia escolheu para elas
tomarem café. Bella Barista. Esse era um lugar que Katie e Rick tinham visitado muitas
vezes. Na primeira visita, Katie iniciou uma divertida tradição de beijar Rick no rosto
quando estavam no caixa. Logo que Julia e Katie caminharam para dentro do Bella
Barista e um turbilhão de fragrância de café fresquinho veio sobre elas, Katie começou
a chorar. Mas ela manteve-se firme e apoiou ela mesma enquanto estavam no caixa.

Não pense no Rick. Não pense no Rick. Não pense no Rick.

- Você sabe o que você quer? Julia perguntou.

- Eli.

Julia olhou para ela, divertida e surpresa. Katie olhou de volta, atordoada, e disse:

- O que foi que você acabou de me perguntar?


- Uma pergunta melhor seria, o que você acabou de me responder?

- Chá. Eu estava tentando pedir um chá. Katie voltou-se para a jovem mulher atrás
do balcão e disse:

- Eu quero um chá quente. Grande. E com um desses rolos de canela.

Julia pagou, e elas duas foram para uma mesa de canto.

- Bem, isso foi bastante revelador.

- O que? O top da menina? Eu sei. Hello! Deixe um pouco para a imaginação.

- Katie, eu me referia a você dizendo que queria o Eli.

- Eu não disse isso.

Julia tomou um gole longo e lento de seu latte.14

- Eu estava tentando dizer que eu queria chá. ‘Chá’ 15 soa como ‘Eli’, eu acho,
quando você não dormiu o bastante. É o som de e longo. ‘Chaaa’. ‘Eeeeli’.16 Entende?

Julia continuava corada, e com um olhar composto quando ela mordiscou um


canto do rolo de canela de Katie.

- Você sabe, minha mãe costumava dizer que ela cresceu para se aproveitar a
TPM.

Katie fez uma carreta.

- O que isso tem a ver com nada?

- Ela disse que, nesses dias do mês as suas emoções estavam mais vulneráveis e
mais rústicas. Foi quando ela descobriu que as palavras que saiam da sua boca
estavam mais próximas de seus pensamentos e sentimentos reais. Ela não tinha os
filtros usuais quando seus hormônios estavam no auge.

- Você está dizendo que meus hormônios estão no auge? Você fala como Rick. Eu
já lhe disse que essa relação se foi. Se você sabe o que é bom pra você, você não vai
me trazer para fora através dos meus hormônios. Ou nas minhas habilidades verbais,
quando eu estou pedindo um chá ou estou privada do sono.

14
Latte é uma bebida de café expresso, ou chocolate concentrado, com uma quantidade generosa de
espuma de leite no topo.
15
Em português não faz sentido, mas em inglês a palavra usada para chá é ‘Tea’ Por isso a Katie diz isso.
É um trocadilho, que só tem sentido no inglês.
16
A palavra ‘Tea’ soa como ‘Tii’, então para nós seria como o som de ‘i’ longo, e não de ‘e’ como a Katie
fala... ‘Tiiiii’, ‘Eliii’ ... viram?
Julia não parecia ver o humor nos comentários de Katie. Com uma expressão
simples ela disse:

- Katie, você quer ouvir a minha opinião?

- Sim, é claro.

- Eu acho que você fez um trabalho fantástico de navegação em tudo isso. Tudo
isso. Incluindo o modo como você foi diretamente para Nicole, mas não disse nada
para Rick. Eu concordo com a Cris. Você deve olhar para a grande figura de todo este
ano e aceitar o convite para a festa de formatura na casa dos Doyle.

- Se a mãe do Rick ainda me quiser lá.

- Eu acho que ela ainda quer. Essa é a sua comunidade. Esse é o seu povo. A mãe
do Rick é uma das mulheres da sua vida. Você precisa estar conectada aos seus círculos
de relacionamento nesse importante momento da sua vida.

Katie soprou o seu chá numa tentativa de esfriá-lo um pouco.

- Você acha que eu deveria ter esperado? Quer dizer antes de acabar com o Rick.
Você acha que eu deveria apenas ter enrolado durante formatura e a festa e qualquer
outra coisa, e então, e depois que toda a atenção estivesse fora de nós, eu terminaria
com ele?

- Não.

Katie esperou por mais palavras.

- É isso? Não? Você acha que eu fiz a coisa certa?

- Eu acho. O que você fez foi confuso, sim. Mas foi honesto, e se tem uma coisa
que eu sei sobre você, Katie, é que você não tem nada de falsa. E não posso ver como
você poderia ter mantido seu relacionamento com o Rick depois que o seu coração
mudou em relação a ele. Você fez a coisa certa. Além disso, e se você tivesse
continuado junto dele fingindo todo o caminho para a festa de formatura, e todo
mundo estivesse lá e, em seguida Rick pedisse você em casamento na frente de todos?

Katie ficou séria instantaneamente.

- Teria sido trágico.

- Eu não estou dizendo que ele ia fazer isso.

- Mas este, definitivamente, é o modo como ele faz as coisas. A inauguração do


Café em Redlands estava marcada para o dia 27 de Abril, mas eu recebi um e-mail
genérico da empresa do Rick dizendo que a inauguração tinha sida adiada para o dia
25 de Maio, ou alguma coisa assim. Senti o tempo todo que ele estava esperando até
depois da inauguração do Café para concentrar a sua atenção no nosso
relacionamento. Ele não ia me pedir em casamento até que o café estivesse fora de
sua lista. Então ele iria criar um novo cronograma para nós. É como o cérebro dele
trabalha. Um objetivo por vez. Eu, eu estou em todo o lugar o tempo todo.

- Fale-me sobre as suas aulas e como as cosias estão parecendo pra você agora
nesses momentos turbulentos.

- Desastroso. Próxima questão.

Julia pegou um caderno e o abriu em uma página em branco.

- Eu sei como você se sente sobre listas e horários, mas eu vou pedir-lhe para pôr
de lado esses sentimentos negativos para a próxima meia-hora. Você precisa de um
plano de ataque, e eu sou apenas a pessoa a te dar um.

Pelos próximos 25 minutos, Julia ajudou Katie a percorrer um cronograma passo-


a-passo para concluir seu trabalho nas poucas semanas restantes Para surpresa de
Katie, o processo foi muito menos doloroso do que ela pensou que seria. Do mesmo
ponto de vista a historia de amor de Julia e John deu esperança a Katie para a sua
futura vida amorosa, e o plano na frente dela lhe deu esperança de que ela conclua
tudo o que foi exigido antes do dia de sua formatura. Julia puxou a papelada
necessária para Katie completar a sua posição como AR, juntas elas organizaram a lista
de responsabilidades de Katie e Nicole para a Festa da Primavera.

- Eu não posso acreditar que esse ano tá quase no fim.

- Não comece a falar nada agora. disse Julia. Espere até estarmos na ultima
semana. Quando eu ouvir os estudantes ficando nostálgicos antes de estarmos no
ultimo mês de aulas, isso é como ouvirmos musicas de Natal no dia depois do
Halloween. Nós não estamos lá ainda.

Katie olhou para a lista na frente dela.

- Obrigada por me ajudar a pensar em tudo isso. É muito.

- Sim, isso é. Mas você fez isso, Katie.

- Quer saber? Eu acredito em você.

Elas saíram do Bella Barista, e Katie percebeu que ela realmente acreditava nela.
Ela acreditava que não só poderia realizar toda a lista de trabalho e responsabilidades
de classe, mas ela também poderia encontrar o caminho de volta para o outro lado de
seus relacionamentos com Rick e Nicole.
- O que você vai dizer para Nicole? Katie perguntou para Julia enquanto elas
voltaram a colina de volta para o Rancho Corona.

- Dizer sobre o que? As responsabilidades dela para a Festa da Primavera?

- Não, sobre o Rick.

- Nada. Por quê?

- Você não sente que deveria dizer a ela que ela pode ligar pra ele ou talvez
convidá-lo para a Festa da Primavera

Julia olhou surpresa.

- Porque eu deveria dizer algo assim para ela?

- Eu não sei. Você é a DR dela.

Katie, isso seria como eu dizer para você ligar para o Eli e convidá-lo para a Festa
da Primavera. Porque eu deveria fazer alguma coisa assim? Você é capaz de tomar as
suas próprias decisões a respeito da sua vida amorosa, como você deixou claro no seu
relacionamento com o Rick. Quer dizer, quem sou eu, além de sua DR, para tentar
ajudar você a ver tudo o que você tem em comum com o Eli Lorenzo? Porque eu
deveria encher você de evidencias obvias do interesse do rapaz por você? O que seria
a ponto de lembrá-la da maneira perfeita que vocês dois funcionam na arrecadação de
fundos para a água para África? Por que eu faria isso?

- Sim, por que você faria isso?

- Exatamente. E porque eu deveria relembrar você do que aconteceu quando você


ficou gripada e Eli trouxe remédios para você no Dia dos Namorados? Para não falar da
água glacial da Nova Zelândia.

- Eu falei pra você sobre a água glacial da Nova Zelândia?

- Sim, você disse. Você me falou quando eu estava visitando você quando você
estava doente. Se eu me lembro direito, tudo que você queria era falar sobre o Eli e
como ele orou por você.

- E como ele me disse para não operar máquinas pesadas. Katie sentiu suas
defesas baixarem.

- Apenas preste atenção ao que Deus está fazendo, Katie. Isso é tudo que estou
dizendo. Apenas preste atenção e responda apropriadamente.
Capítulo 15
Depois do café com Júlia, Katie com uma organização incomum afixou em seu
quarto sua longa lista de afazeres e sistematicamente deu baixa nela. Ao invés de
colocar um ‘ok’ na frente no item para marcá-lo como concluído, Katie se atrapalhou
um pouco. Às vezes ela riscava o item. Às vezes ela desenhava uma carinha feliz ou um
girassol na frente do item. Ela tinha outros planos para alguns deles, como o seu
grande projeto de fim de curso. Quando ela finalmente o terminasse, ela planejou
escrever “ALELUIA!” na frente do item.

Focada em sua lista, Katie evitava longas conversas com qualquer pessoa a não ser
com as mulheres do seu andar. Ela só interagiu com outros estudantes que vieram a
sua mesa quando ela estava de plantão e alguns amigos aqui e ali que a paravam
enquanto ela caminhava no campus em direção as aulas. Pesando seu rendimento,
Katie tinha de admitir que em uma semana, sob a pressão eliminar da sua lista, ela
conseguiu o dobro do que ela esperava. Ela sentiu uma pontada de dor súbita quando
entrou atrasada no salão do Crown Hall na sexta-feira à tarde e percebeu que o fim de
semana estava ali. Durante um ano e meio seu primeiro pensamento para cada fim de
semana era como ela podia ajustar seu tempo para encontrar o Rick ou pelo menos
reservar um tempo para uma longa conversa com ele pelo telefone.

Os pensamentos sobre Rick a derrubaram da onda de sucesso que a rondava em


função da sua lista de realizações. Ironicamente a lista que a fazia sentia tão feliz era o
mesmo tipo de diferença que a manteve em desacordo com Rick. Ela agora sentia que
o compreendia um pouco melhor. Eliminar itens da lista poderia ser um estímulo
natural.

Katie parou em frente à mesa para checar sua escala nas atividades de AR para o
fim de semana. Jordan, um dos AR’s dos andares masculinos, estava de plantão. Ele
entregou para Katie a lista antes dela pedir.

- Como você sabia? Ela disse.

- Você é previsível. Ei, você e a Nicole descobriram a decoração de amanhã noite


para a Festa da Primavera?

- Julia delegou a coisa toda para Nicole. Eu estou encarregada dos jogos.

- O que você vai propor?

- Twister.17 Eu peguei 20 deles no Galpão da Economia algum tempo atrás. Nós os


dividiremos em equipes. Craig vai passar filmando enquanto todo mundo está

17
Twister é aquele jogo que tem um tabuleiro grande com bolinhas coloridas e as pessoas ficam se
contorcendo pra colocar as mãos e os pés nas cores certas. Não sei direito como funciona.
torcendo e, em seguida, alguns rapazes vão editar o vídeo enquanto nós comemos. O
grande final será assistir a gravação.

- Katie, você sabe que é uma festa formal, né? Como você vai convencer as
mulheres a jogar Twister em trajes formais?

- Não é formal.

- É sim.

- Não, não é. Quem te falou que é formal? Não é um baile, é uma festa. Sua
informação está errada.

- Acho que é você que está enganada. Você não estava na reunião da equipe,
quando discutimos os detalhes. Eu não sei onde você pegou sua informação, mas te
digo que está errada: é formal.

Katie soltou um ‘Aff!’ e dirigiu-se ao seu andar. Nicole saberia.

As duas tiveram três encontros neutros desde que Katie fez o grande anúncio de
que ouviu parte da conversa de Nicole e Julia. Um dos encontros foi no banheiro e os
outros dois quando se cruzaram no campus. Em cada uma das circunstâncias ambos
estavam em movimento quando uma viu a outra. Isso significa que elas podiam andar
e trocar um amigável ’olá’ sem que ninguém ao redor soubesse do trauma que tinham
atravessado.

Como Katie se aproximou da porta de Nicole, ela estava certa de que ambas
tiveram tempo para amadurecer e pensar a respeito do assunto. Provavelmente seria
bom agora se elas sentassem para conversar outra vez. Com uma leve batidinha na
porta entreaberta de Nicole, Katie disse:

- Sou eu. Tudo bem se eu entrar?

Antes que Nicole pudesse responder, a porta se abriu, e lá estava Rick.

O coração de Katie acelerou. Ela parou em seus olhos castanhos e sentiu como se
por um momento o tempo tivesse parado. Então ela piscou e ela estava no outro lado
do conto de fadas. Ela realmente não estava mais apaixonada por ele. Ela ainda o
amava como amigo para sempre do fundo da sua alma, mas ela sabia – de alguma
forma sabia – que ela realmente não estava mais apaixonada por ele.

- Uau, ela disse baixinho.

Eu não estou mais apaixonada por você, Rick Doyle.

O rosto dele estava vermelho e os dentes cerrados.


- Eu estava de saída.

- Você não tem que ir. Katie olhou através de Rick e percebeu que Nicole não
estava na sala.

- Onde está Nicole?

- Como eu iria saber? O rapaz da recepção disse que era horário de visitas nos
dormitórios, então eu entrei e deixei a caixa em sua mesa. Sua caixa está perto da sua
porta. Rick soou como um robô.

- Minha caixa?

- Convites para sua festa de formatura.

- É mesmo. A festa de formatura. Rick, você tem certeza que sua mãe ainda quer
fazer isso? Quero dizer, ela sabe que você e eu...

- Ela sabe.

- E ela ainda quer que eu vá?

- A festa está marcada. Ela mandou pra você uma caixa de convites. Parece que ela
ainda quer que você vá. Rick foi saindo.

- Rick, espere.

Ele parou, mas não olhou para Katie.

- Você está bem?

- Que tipo de pergunta é essa?

- Uma pergunta sincera. O tom de Katie combinava com a irritação dele. E aqui
está outra pergunta sincera. Como você se sente sobre minha ida a festa de formatura
em sua casa? Porque se você não está confortável com minha ida, eu não vou.

- Não é minha casa. É a casa dos meus pais.

- Mas você estará lá, certo?

- Eu estarei lá.

Katie queria se aproximar e tocar seu ombro de um jeito simpático e amigável. Ela
percebeu que estava mais a frente no processo de fim de namoro do que Rick estava.
Ele não estava se movendo em direção a porta e continuava sem olhar pra ela.

- Ei, Rick, escuta. Katie abaixou seu tom de voz.


- Você não tem que dizer nada, Katie. Sério. Eu acho que tanto você quanto eu já
dissemos praticamente tudo o que poderíamos dizer.

- Exceto que quero dizer que sinto muito, Rick. Sinto muito por... Katie começou a
despedaçar. Eu só sinto muito, Rick.

Os ombros dele pareciam mais relaxados e sua expressão em direção a Katie se


tornou mais simpática.

- Você não tem que dizer nada, Katie.

- Eu sinto que deveria dizer alguma coisa. Eu só não sei o que dizer.

Rick passou os dedos por seu cabelo escuro.

- Olha, Katie, eu tenho pensado muito esta semana sobre nós. Sobre você. Acho
que pensei mais sobre você essa semana do que em todo nosso relacionamento.

O coração de Katie bateu mais rápido. Ele vai dizer que tem esperança de nós
voltarmos?

- Quanto mais eu pensava sobre você, mais eu vi porque você chegou à conclusão
que você chegou. Acho que é isso porque eu estava pensando sobre você. Somente
sobre você. Não sobre nós. Não sobre mim. Não sobre como você caberia em minha
vida. Eu pensava sobre você, seus sonhos e metas e sua personalidade. Foi aí que eu
soube que tinha que concordar. Você e eu não seríamos bons juntos a longo prazo.

- Mas como namorada e namorado fomos muito bons juntos.

- Eu também pensava assim.

Eles ficaram sem jeito por um momento, olhando um para o outro e em seguida
desviando o olhar. No passado esse era o momento quando eles deviam se abraçar ou
beijar ou ambos. Agora eles só mexiam os pés. Katie fez o primeiro movimento e sorriu
pra ele.

- Eu amei ser sua namorada, Rick Doyle.

Rick sorriu de volta. Era um ótimo sorriso. Como os que Katie lembrava ao longo
dos anos quando Rick era verdadeiramente ele. Se ele estava sendo, desagradável ou
afetuoso, sincero ou legal. Esse era o seu melhor sorriso.

- Eu estou contente por ter me encontrado com você, Katie.

- Eu também. Ei, você deveria vir a Festa de Primavera amanhã à noite.

- É uma festa de casais?


- Na verdade, não. Você sabe como são essas festas da faculdade. As pessoas vêm
juntas, mas não como casais de verdade. Você deveria vir. Só venha. Sete horas, aqui
no salão.

- É uma festa casual, certo?

- Essa é uma coisa que não tenho certeza. Ouvi rumores que era semi-formal. Foi
isso que vim perguntar a Nicole. Posso te avisar assim que eu descobrir como será.

Rick assentiu lentamente.

- Isso seria bom.

Katie assentiu e repentinamente sentiu uma vontadezinha de chorar, mas ela não
chorou.

Rick se virou para ir quando Katie se lembrou de mais uma coisa.

- Oh, eu vi o e-mail sobre o atraso na abertura do Café. Está tudo bem?

- Nós tivemos um atraso na entrega do forno de pizza e arrumar a parte em uma


das paredes. Faz sentido atrasar a abertura mais um mês. Apesar disso, tudo mais está
indo bem. Estou tratando da mudança de apartamento para primeiro de junho.

- Você está mudando?

- Eu estava esperando até... bem, você sabe... até eu ver como nossos planos se
encaixariam. Mas decidi essa semana seguir em frente e fazer a mudança. Eu
realmente gosto do que faço, Katie.

- Eu sei que você gosta. É o que você foi criado para fazer.

- Assim como você foi criada para correr atrás de aventuras até que elas peguem
você.

Katie abriu um enorme sorriso. Alguém jamais a descreveu com tanta precisão.

- Sim, isso é o que eu fui criada para fazer.

- Você não foi feita pra linha de montagem de sanduíches do Subway. Você pode
fazer isso, mas não satisfaz seu coração.

Agora Katie sabia que iria chorar. Era a primeira vez que Rick mostrava que
realmente entendia como ela era.

- Obrigada, Rick.

Ele deu a ela uma outra peculiaridade, um sorriso maduro.


- Tenho que dar o crédito para o Eli por denominar isso.

- Denominar o que? Katie piscou deixando as lágrimas escorrerem.

- Denominar o sentimento que vem de estar perto de você. É extraordinário. Você,


Katie Weldon, é inesquecível.

Rick se virou e caminhava pelo corredor. Katie o observava ir. Se sempre há um


caminho bom ou caminho certo para terminar com um de seus amigos eternos, é este.
Finalmente.

Limpando suas lágrimas com as costas das mãos e respirando profundamente,


Katie começou a ir. Ela estava focada a fechar a porta da Nicole e quando estava
prestes a fazê-lo ouviu alguém sussurrando seu nome.

Katie congelou. Ela ouviu mais perto. Eu ouvi alguma coisa? Não, tem que ser
minha imaginação, certo?

- Katie! O sussurro veio novamente, mais alto dessa vez.

Voltando para o quarto de Nicole, Katie andava na ponta dos pés em cima do
tapete.

Ela passou para a cama e olhou ao redor para o lado da janela. Lá no chão estava
uma coisa grande debaixo de um cobertor com apenas o nariz e um par de olhos a
espreitar o lado de fora.
Capítulo 16
- Nicole, o quê você está fazendo? Você estava aí o tempo todo enquanto Rick e
eu conversávamos?

- Ele já foi? Nicole empurrou a coberta e deixou que seu rosto aparecesse.

- Já.

- Você pode fechar a porta?

Katie foi até a porta e a empurrou firmemente. Se ela não estivesse tão
incomodada com o fato de que Nicole tinha ouvido cada detalhe da conversa sincera
dela com Rick, ela teria achado engraçado Nicole ter fingido de morta atrás da cama.
Quando Nicole levantou, Katie poderia ver por que ela se escondeu. Ela só estava de
roupas íntimas.

- Eu esqueci que era sexta-feira de dormitório aberto. Minha porta estava alguns
centímetros aberta, como normalmente. Eu ouvi uma forte batida e então a voz de
Rick, e eu não sabia o que fazer. Eu me enfiei atrás da cama e torci para que ele não
me visse. Ah, Katie, me perdoe por ter ouvido a conversa de vocês. Não foi por querer.

Nicole vestiu seu short que estava na beira da cama junto com uma blusa de
algodão de capuz. Ela puxou o capuz para cima da cabeça como um monge
arrependido.

- Eu sinto muito.

A frustração de Katie derreteu. Ela sabia o que era ouvir uma conversa
acidentalmente.

- Não se preocupe, Nicole.

De pé, as duas se encontravam há alguns centímetros de distância, olhando uma


para a outra e depois desviando o olhar. Depois de um minuto e meio de
estranhamento, Nicole disse:

- Você tem tempo para conversar?

- Claro.

Mesmo Katie sabendo o quê ela disse, ela não se sentia preparada para uma
conversa de coração para coração com Nicole. Ao invés de se afundar na cadeira de
Nicole, Katie permaneceu de pé.
- Na verdade, Nicole disse, olhando para longe. Eu preciso me encontrar com
alguém em alguns minutos. Eu devo estar atrasada. Quantas horas são? Sabe o quê
mais? Você e eu podemos conversar outra hora. Eu deveria ir.

Nicole não estava agindo com seu jeito gracioso e calmo. Ela estava agindo mais
como Katie – na correria, nunca certa de que horas são ou de onde ela deveria estar.

- Ok, claro. Nós podemos conversar mais tarde. Eu estarei no meu quarto a noite
toda estudando. Eu tenho plantão na mesa da frente amanhã de manhã.

- Ah, e é casual.

- O que é casual?

- A Festa da Primavera. Eu não sei quem lhe falou que era formal.

- Foi o Jordan, o grande cabeça dura está sentado lá na mesa da frente, agora
mesmo, avisando todo mundo que a festa é formal.

- Eu vou falar com ele agora e pedir que ele envie um email geral. Nicole se dirigiu
até a porta.

Katie a seguiu.

- Se você precisar de ajuda com a decoração, eu terei tempo amanhã à tarde.

- Está bem. Julia delegou essa função pra mim.

- Eu sei. Mas eu posso ajudar. Katie se aproximou e tocou o ombro de Nicole antes
de sair.

- Ouça, você e eu não temos que fazer isso. Nós não temos que fingir nada. Eu não
posso dizer que sou fã do que acabou de acontecer e como você ouviu tudo, mas você
também ainda está frustrada comigo por ter ouvido o quê você contou à Julia. As
cartas estão na mesa agora. Por que nós não encontramos um jeito de seguir em
frente a partir de agora?

Nicole parecia querer chorar. A propósito, ela parecia ter derramado uma grande
quantidade de lágrimas ultimamente. Os olhos dela estavam inchados, e ela não usava
maquiagem alguma, o que não era típico dela.

- Eu preciso de um pouco mais de tempo, Katie.

- Tempo pra quê? Para decidir se você vai me perdoar por ter ouvido sua
conversa?

- Não, eu não guardo essa mágoa contra você.


- Então, tempo pra quê?

Nicole se virou para Katie com uma expressão séria.

- Tempo para descobrir como agir perto de você e do Rick.

- Eu posso ajudar você com isso. Não ‘aja’. Apenas seja você. Seja a maravilhosa e
doce Nicole que tem sido minha amiga por todo o ano. Nada mudou entre mim e você,
Nicole. Você não me traiu, nem nada disso. E com o Rick, apenas seja você mesma. Ele
vai despertar um dia desses e perceber a graça que você é.

As lágrimas de Nicole estavam derramando silenciosamente. Ela parecia duvidosa


das palavras de Katie.

- Ei, você e eu sabemos que os homens são mais devagar para perceber essas
coisas que as mulheres. Ele vai chegar lá. Dê tempo a ele.

- Katie, como você pode ser tão aberta em relação a isso tudo? Se eu fosse você,
eu estaria devastada. Eu me odiaria. Eu não estaria falando comigo agora.

Katie deu de ombros.

- É apenas a maneira como eu enxergo as coisas.

- Você e Rick tinham um relacionamento muito próximo. Quero dizer, mesmo aqui
no fim, ele está abraçando você e lhe dizendo o quão maravilhosa você é.

- Confie em mim, Rick e eu tivemos alguns momentos tensos antes que


chegássemos aqui. E muitas lágrimas. Você não viu as outras conversas, o que é bom.
Está tudo bem, Nicole. Como eu disse semana passada, você tem a minha benção. Eu
disse que não iria contar nada a ele, e não vou. Mas não reprima seus sentimentos
verdadeiros. Apenas seja você. Veja o que Deus faz e siga a partir disso.

Nicole envolveu seus braços em volta de Katie e chorou mansamente no ombro


dela. Katie, que sentia que já tinha chegado ao fim com todas as lágrimas que ela
queria ver ou sentir ou chorar pela próxima década, deu um tapinha confortador nas
costas de Nicole.

- Está tudo bem. Vá em frente, chore. Todo esse drama antes da formatura. Quão
inteligente nós somos? Você já ouviu sobre Emily Dickens, a propósito?

Nicole recuou e lançou um estranho olhar para Katie.

- Você está falando da Em do outro lado do corredor?

- Não, a poetisa.

- Ah, Emily Dickinson. Sim, já ouvi falar dela.


- Eu pensei que fosse Dickens.

- Você, provavelmente estava pensando em Charles Dickens.

- Que seja. Emily ‘qualquer-que-seja-o-sobrenome-dela’ escreveu um poema


sobre esperança. Eu não consigo recitá-lo como Julia, mas você deveria pedi-la que o
recitasse pra você. É lindo. E encorajador. E eu acho que isso nem importa já que eu
nem sei recitar o poema. Mas você sabia que Julia vai se casar?

Os olhos de Nicole se arregalaram.

- Ok, obviamente você não sabia. Por que eu abri minha boca?

Nicole disse:

- Não, eu sabia, mas eu pensei que não fosse pra dizer nada. Ela me pediu para
cuidar das flores do casamento.

- Oh, que legal. Eles vão se casar no alto da colina do campus.

- Eu sei. Vai ser lindo. Nicole tirou o capuz de sua cabeça e limpou suas últimas
lágrimas.

- Katie, você tem certeza de que está bem com o fato de que seu relacionamento
com Rick acabou?

- Sim. Katie tentou fazer com que a sinceridade que ela sentia, transparecesse em
seus olhos.

- Você é maravilhosa, Katie.

- Você também, Nicole. E como eu lhe disse, é só uma questão de tempo até que
Rick perceba isso. Ele vai estar na Festa da Primavera amanhã à noite; então, vista seu
‘suéter-pega-rapaz’.

- Meu ‘suéter-pega-rapaz’?

- É, você sabe, aquele preto lindo. Você o veste com sua calça jeans e qualquer um
dos pares de sua maravilhosa coleção de sapatos e, eu tenho certeza de que você vai
capturar um rapaz antes de a noite acabar. Não, deixe-me corrigir. Você vai capturar
um homem. Um homem de Deus.

Nicole deu um rápido e final abraço em Katie e um grande sorriso. Katie desceu
até seu quarto e encontrou a caixa de convites ao lado da porta, onde Rick a deixou.
Ela destrancou a porta, entrou, e dei uma boa olhada na bagunça. A bagunça era o
porquê de ela ter trancado a porta. Ao contrário de Nicole, o quarto de Katie nunca
estava pronto para companhias repentinas.
Decidindo tentar a tática que Julia sugeriu durante o encontro delas no café Bella
Barista no último sábado, Katie armou o alarme no seu telefone para daqui vinte
minutos. Ela trabalharia contra o relógio. Ela conseguiria limpar seu quarto em vinte
minutos?

Para sua surpresa, a limpeza cronometrada funcionou. A Cris jamais acreditaria no


que eu fiz. O ano passado teria sido tão diferente pra nós se eu tivesse conseguido
implementar esse pequeno truque.

Desligando o alarme de seu celular, Katie mandou uma mensagem de texto para
Cris contando da pequena vitória. Pouco depois a resposta de Cris veio:

“QUE BOM! BIÓPSIA BENIGNA, A PROPÓSITO.”

Katie pensou por um minuto. Então ela se lembrou da ida de Cris ao médico e da
verruga que ela havia removido.

“VIVA!”

Katie escreveu de volta.

“VOCÊ TÁ BEM?”

“MELHOR QUE BEM.”

Então, ao invés de escrever o resto da mensagem, ela ligou pra dar a Cris um
breve resumo do que tinha acontecido desde a Casa de Pedro. Katie terminou dizendo
que iria enviar um convite a Cris e Ted para a festa de formatura na casa dos pais de
Rick.

- Espero que você mande um para seus pais também, Cris disse.

- Mandarei.

- E para seus irmãos.

- Eu continuo sabendo apenas onde um dos meus irmãos está.

- Então mande um pra ele.

- Tá. Eu estou em paz com bastantes coisas ultimamente, incluindo o fato de que
eu tenho que seguir com aquilo que eu tenho e não me preocupar com o que eu não
tenho. Quero dizer, eu ainda oro pelo Larry, mas eu não posso fazer nada a respeito do
sumiço dele e sem deixar contato algum com ninguém da família. Eu sei que Deus está
cuidando dele, onde quer que ele esteja.

- Isso deve ser difícil, Katie.


- E é. Mas eu não posso consertar nada, né?

- Falando em consertar coisas, você nunca vai adivinhar o que nós compramos
ontem.

- O quê?

- Um micro-ondas novo. Finalmente. Por que você não vem aqui amanhã à noite e
traz algumas das suas pipocas de bazar de garagem? Vamos ver se conseguimos botar
fogo nesse também.

- Muito engraçado. Tarde demais, de qualquer jeito. Eu joguei fora toda a comida
que comprei em bazares de garagem. Eu estou falando, eu sou uma mulher mudada,
sentada em um dormitório limpo com uma trouxa de roupas fazendo um pequeno
cha-cha na máquina de lavar.

- Então você está livre para jantar hoje?

- Você não disse nada sobre jantar. O que vocês vão comer?

- Não sei ainda. O Ted deve estar em casa em meia hora. Por que você não vem?
Nós podemos terminar a conversa que começamos na Casa de Pedro.

- Eu posso ir aí ao invés de jantar na cafeteria. A propósito, eu posso passar na


Casa de Pedro no caminho e comprar uns chimichangas.

- E dois tacos de peixe, Cris acrescentou. O Ted gosta de tacos de peixe.

- O Ted é um taco de peixe, Katie brincou.

- Por causa desse comentário, agora você tem que trazer quatro tacos de peixe e
peça que eles acrescentem coentro.

- Tá bom! Continue assim, Sra. Mulher Casada Mandona. Eu estarei aí em meia


hora com comida mais que suficiente pra nós três comermos, então é bom que você
esteja com a mesa posta.

- Vou fazer isso nesse minuto. Até daqui a pouco.

Katie entrou em ação. Com a melhor das intenções, ela agarrou seu laptop e a
caixa de convites para que pudesse endereçá-los na casa de Cris, se surgisse a
oportunidade.

Precisamente trinta e quatro minutos mais tarde, Katie chegou à porta do


apartamento de Cris e Ted com itens demais nas mãos para bater. Ao invés disso, ela
chutou a porta e gritou:

- Surpresa!
Ted abriu a porta e resgatou as sacolas de comida que estavam balançando no
braço dela.

- Oh, isso mesmo, pegue os tacos. Não salve o laptop ou os convites chiques. Em
todo caso, salve as baleias!

Do canto, veio outro par de mãos ajudantes buscando pela caixa de convites,
assim como a alça da bolsa que carregava o laptop. As mãos pertenciam a Eli. Katie
sorriu-lhe generosamente. Então ela se virou para Cris e lançou-lhe um olhar ‘você-
está-brincando-comigo’?

Cris parecia orgulhosa de si mesma. Ela aproximou-se de Katie e sussurrou:

- Você disse, ao telefone, que estava trazendo mais comida que três pessoas
poderiam comer.

Katie deu um olhar exageradamente zangado pra Cris, mas a verdade é que ela
tinha quase esperado isso. E por que não? Era ela quem estava tentando juntar Rick e
Nicole. Por que seus amigos não tentaram juntá-la a Eli? Eles queriam mostrar
bondade a ela, e ela sabia que estaria ecoando essa bondade se ela entrasse no plano.
Contanto que Eli permanecesse do seu jeito legal, ninguém se machucaria. Por
enquanto, ela estava feliz por estar com seus amigos que a amavam, estavam
preocupados com ela, e que faziam o mesmo por Eli. Essa era sua galera. Julia disse
isso semana passada. Esse era o círculo de Katie. A comunidade dela.

Ela deveria relaxar e partir o pão com eles em boa comunhão. Ou nesse caso,
partir os burritos.
Capítulo 17
- E isso? Katie disse, segurando um garfo enquanto se sentava de frente para Eli na
delicada mesa de cozinha de Cris e Ted. Na frente deles havia uma bagunça de sobras
de embalagens de comida.

- Tenedor. Ted falou a resposta antes que Eli tivesse chance.

- Oh, cara, eu sabia essa, Eli disse.

- Bobeou, dançou. Ted ganhou de novo. Katie se inclinou na cadeira e se sentiu


contentemente cheia do chimichanga grande que ela tinha dividido com Cris.

- O Ted definitivamente lembra mais palavras em espanhol do que você, Eli. O quê
vocês dois fizeram todo o tempo em que viveram na Espanha, além de não aprender
espanhol?

- Surfamos, Ted disse.

- Nós fizemos mais do que isso quando eu estive lá com vocês, garotos. Cris limpou
um pouco da bagunça na mesa.

- Você sabe como essas viagens missionárias são, Katie. Você estava na Irlanda
quando nós três estávamos na Espanha, mas nós estávamos fazendo o mesmo tipo de
trabalho missionário com as crianças da vizinhança nos encontros ao ar livre. Eli fez
muito com os garotos mais velhos. Ele também guiou a maioria dos devocionais
matutinos com o grupo.

Katie olhou para Eli. Ela não estava surpresa com as competências missionárias ou
que ele guiasse os devocionais. Ela o tinha ouvido falar na capela, e ele tinha uma
presença imponente. As palavras dele eram firmes e intensas, do mesmo modo que
seu hábito de encarar quando Katie o conheceu. Nenhuma dessas partes da
informação a surpreendeu. Mas outra parte era surpreendente.

- Você surfa?

- Eu tento.

- Ele surfa, Ted respondeu por ele. E ele arrasa no futebol.

Katie deveria ter adivinhado que Eli era bom no futebol de suas conversas
anteriores, quando ele havia contado sobre jogar futebol onde cresceu na África.

- E você? Eli perguntou a Katie. Você surfa?

- Ah, essa resposta seria não. Embora eu não devesse dizer isso. Uma vez eu
consegui, de fato, ficar de pé em uma prancha.
- Você fez mais do que isso. Eu vi você pegar umas ondas aquele dia em Newport
Beach quando o Douglas pediu a Trícia em casamento, Cris disse.

- Suponho que eu tenha pegado umas ondas. Mas não é o suficiente para que eu
sonhe em pegar as grandes ondas de Waimea, como o Ted fez. Oh, e o Douglas
também me ensinou bodysurf e eu posso me manter em uma prancha Boogie.

- O que é mais do que nós podemos dizer da Cris, Ted provocou, inclinando-se e
colocando seu braço ao redor do pescoço da sua esposa. Ele a chegou para mais perto
e a beijou no lado da cabeça, enquanto ela assumia uma expressão exageradamente
emburrada.

- Não que eu não tenha tentado. Várias vezes. Minhas habilidades de coordenação
em esportes sempre estiveram um pouco em falta. Você não, Katie. Você era uma
estrela do softball. E lembra a viagem de barco para o Lago Shasta que fizemos com
meus tios? Você foi a estrela do esqui aquático também.

- Esquiar na água é divertido. Na neve também, mas... Algum dia nós vamos
esquecer nossa viagem de esqui no ensino médio?

- Nunca. Cris fez parecer que a lembrança era dolorida.

Katie gargalhou.

- Nós duas estávamos muito engraçadas naquela viagem. Super desajeitadas.

- Isso porque a loja que alugava os esquis nos deu os esquis errados. Os que nós
tínhamos eram longos demais para iniciantes.

Katie voltou-se para Eli.

- Pelo menos é esta a história que nós resolvemos levar adiante. Quero dizer, eu
ouvi de iniciantes dando de cara na neve, mas a Cris aqui deu de cara com o instrutor
de esqui.

- Eu acho que nunca ouvi essa história. Ted segurava a sua querida esposa pelo
pulso e olhava como se não fosse deixá-la sair. O instrutor de esqui, hein?

- Ele era bonitinho também, Katie acrescentou.

- Eu tenho certeza que você ouviu essa história, Ted. Você só escolheu esquecer o
fiasco, assim como eu tenho tentado esquecer. Quem trouxe isso à tona, a propósito?

Katie levantou a mão.

- Yo. Mas você entrou na conversa, Sra. Gatinha Inocente. Então, porque Katie
estava bem no meio de um fogo cruzado, ela acrescentou, Repare que eu disse
“gatinha” e não “gata”, como em Sr. Tropeço, o gato esquisito do universo alternativo
de todas as coisas nojentas.

Cris deu a Katie um olhar de cala-o-bico.

- Alguém quer mais alguma coisa pra beber? Eu acho que nós temos um pouco de
suco de laranja.

- Eu vou querer mais água, Eli disse. Obrigado.

- Ei, o que foi que aconteceu com o gato nojento? Ted perguntou.

- Nicole o atropelou, Katie brincou.

- O gato já estava morto, Eli acrescentou. A Nicole só passou por cima dele no
estacionamento. Foi no outono passado.

- Ah, sim, eu me lembro de ter ouvido isso. Ted falou por cima do seu ombro para
Cris na cozinha. E eu me lembro de ouvir sobre o instrutor de esqui boa pinta. E as
barras de chocolate. Vocês não venderam barras de chocolate pra arrecadar dinheiro?

- Tentamos vender barras de chocolate, Katie o corrigiu. Meu suprimento


misteriosamente deixou a minha caixa e, mais tarde, apareceu no meu estômago. Foi
uma coisa estranha. A propósito, você tem algum chá, Cris?

Cris abriu o armário e tirou uma caixa com uma variedade de pacotinhos de chá.

- Eu tenho Earl Grey, English Breakfast e alguma coisa de laranja. Não dá pra ler o
rótulo.

Eli se levantou.

- Eu tenho um pouco de chá Queniano no meu apartamento. Querem que eu


traga mais alguma coisa?

- Sim. Traga o Rick. Diga a ele para descer com você se ele estiver sentado lá sem
fazer nada, Katie disse.

Cris, Ted e Eli lançaram olhares surpresos uns aos outros, como dardos voando
pela sala. Então eles olharam para Katie, como se não fosse para ela ter notado o
turbilhão de olhares.

- Ouçam. Katie jogou os ombros para trás e falou com um coração limpo. Rick e eu
conversamos sobre tudo isso. Várias vezes. Nós estamos bem. Nós queremos que a
amizade entre nós continue, o que é, obviamente, uma boa escolha, já que nós dois
estamos no mesmo círculo. Eu o convidei para a Festa da Primavera no Crown Hall
amanhã à noite e eu acho que ele vai. Ninguém tem que ficar pisando em ovos.
Ninguém tem que ficar se perguntando quem pode estar no mesmo ambiente com
quem. Nós estamos bem.

- Rick não está em casa, Eli disse. Pelo menos ele não estava mais cedo. Mas se ele
estiver lá agora, eu vou falar para ele descer.

- Ótimo. Quando mais cedo todos nós encontramos um jeito de ficarmos normal,
o que quer que seja isso, melhor. Tudo o que nós temos que fazer é sermos nós
mesmos. Sermos ‘nós’. Foi isso que eu falei pra Nicole também.

Outra rodada de dardos de olhares voou pela sala.

- Ok, eu volto logo. Enquanto Eli, que estava usando shorts, saiu pela porta, Katie
notou como as panturrilhas dele eram definidas. Ele tinha o tipo físico de um jogador
de futebol. Nem um grama de gordura nele. Bom, exceto, talvez a gordura do
chimichanga que ele traçou quase sozinho, com um pouco de ajuda de Ted. Katie
ficara impressionada.

- Tem certeza que você está bem com Rick? A pergunta não era incomum, mas
Katie achou incomum que fosse Ted a perguntar.

Ela sorriu e acenou com a cabeça.

- Eu realmente estou indo bem com tudo isso. Eu acho que o Rick também. Pelo
menos ele parecia estar algumas horas atrás. É louco, não é? Metade da minha vida
sonhando em estar com ele, um ano e meio flutuando nesse sonho, mas agora eu sinto
como se eu estivesse acordada. Desperta. Deus tem a minha atenção. Eu estou
totalmente voltada para ele. Eu estou em paz. Estou mesmo.

Ted sorriu para Katie. Ele tinha os olhos de um azul tão claro. Cris usava descrevê-
los como “azuis prateados gritantes”. Onde quer que Katie olhasse na expressão plena
de Ted, aqueles honestos olhos azuis pareciam olhar para dentro da parte mais
verdadeira dela. Ela não podia imaginar Ted algum dia falando algo que não fosse a
verdade a ela.

Ele avançou sobre a mesa e colocou a mão na dela.

- Faze-me saber o caminho que devo seguir, porque a ti levanto a minha alma.
Ensina-me a fazer a tua vontade, pois és o meu Deus.

- Que versículo lindo. De onde é?

- Salmo 143:8 e 10. Gostou?

Katie acenou com a cabeça.

- Então é seu. De graça. Leve.


Katie sorriu. Essa parte da personalidade de Ted costumava irritar Cris nos
primeiros anos em que estavam juntos. Katie, também, nem sempre foi louca pela
sintonia altamente espiritual dele, mas com o passar dos anos, ela veio a amar essa
dimensão dele. Ele havia levado um bocado da palavra de Deus para dentro do seu
coração, e ela residia ali para ele pegar quando precisasse. Ele parecia ter um ouvido
aberto para uma perspectiva eterna e espiritual da vida, e via a vida daquele ângulo
primeiro, antes de olhar do jeito que todas as outras pessoas olhavam.

Uma parte profundamente resolvida de Katie sentiu uma felicidade não dita sobre
o seu coração se alinhando com o que ela sabia que Ted estava lhe dizendo. Ela
realmente tinha crescido espiritualmente nos últimos anos. O seu relacionamento com
Rick tinha alguma coisa a ver com isso, mas a maior parte da mudança tinha vindo
porque Katie havia redirecionado seus pensamentos. Ou talvez fosse mais preciso dizer
que Deus estava redirecionando os pensamentos dela.

Tudo o que ela sabia era que ela se sentia mais em casa dentro de sua própria pele
do que sempre esteve até agora. Ela também sentia que o Senhor estava mais em casa
no coração dela do que sempre esteve até agora.

Cris colocou uma caneca vazia na frente de Katie e outra no lugar de Eli.

- Você vai convidar o Eli para a Festa da Primavera também?

- Não, por quê?

- Você convidou o Rick.

- É diferente.

- Eli deve gostar de ir a uma festa de fim de ano. Como ele não mora no
dormitório, ele não participa de nenhum desses programas divertidos.

- Você está tentando dar uma de mãe dele, Cris? Vocês são patéticos. Vocês
sabem disso, não sabem? Eu não vou voltar minha atenção para o Eli. Eu vou me
formar. É o meu único objetivo. Além do mais, o Eli irá partir para a África assim que a
faculdade terminar. Devo lembrá-la, Cris, como você detestava seu relacionamento à
distância com Ted no ano que você passou na Suíça?

- Eli adiou o retorno para a África, Ted disse.

- Por quê? Um grupo está indo da Rancho para ajudar o pai dele, nesse verão, com
o projeto de limpeza da água. Eu pensei que ele fosse querer estar na África enquanto
eles estiverem lá.

- Ele disse que tinha alguma coisa acontecendo aqui com um membro da família.
- Eu não sabia que ele tinha familiares aqui.

Cris deu de ombros e retornou para sua cadeira perto de Ted.

- Talvez ele queira dizer alguém em sua família de consideração.

Katie sabia o que Cris queria dizer com isso. Katie também tinha uma família “de
consideração” de amigos que preenchiam o lugar dos parentes de sangue que não
estavam interessados em se manter conectados nos feriados e datas especiais.

- Independente, Katie disse, retornando ao ponto. Não importa quanto tempo ele
planeje ficar aqui neste verão. Eu não estou à procura de um novo namorado. Ok?
Então nós podemos terminar essa discussão agora? Eu estou precisando muito mais de
amigos e vou aproveitar todos os bons momentos que eu puder. Mas nós podemos
eliminar essas tentativas desastrosas que vocês dois estão fazendo para me juntar com
o Eli? Isso não vai funcionar.

Ted tinha um sorriso divertido em seu rosto enquanto ele chegava mais perto e
entrelaçava seus dedos com os de Cris.

- Você pode correr, mas você não pode se esconder, Katie. O amor vai te alcançar,
e quando ele fizer isso, você vai se render completamente. Confie em mim nisso. Eu
dou ao Rick bastante crédito pela maneira como ele direcionou o relacionamento de
vocês e planejou cada passo. Mas o amor nem sempre pode ser rigidamente
planejado.

Katie tinha se sentido com o coração leve durante toda a noite, mas agora ela
estava irritada. O Ted pensava que ela não tinha amado o Rick? Ele não entendeu onde
seu coração esteve nos últimos dezoito meses? Ela não estava correndo de nada. Ela
estava correndo atrás do seu objetivo. O objetivo de se formar.

Quando Katie não respondeu ao comentário de Ted, Cris deu um leve aperto na
mão de Ted.

- Acho que seu comentário foi um pouco forte demais, Ted.

Ele olhou surpreso e se virou para Katie. Foi? Eu feri seus sentimentos?

- Não. Ela encorajou a si mesma e tentou reparar a pequena rachadura na sua


armadura sentimental. Eu acho que eu aprendi, ou pelo menos, estou aprendendo,
uma ou duas coisas sobre o amor.

Então, para tentar trazer o tom harmonioso da noite de volta, ela disse:

- Eu continuo tentando mostrar pra vocês que eu não sou tão desastrada como
vocês acham que eu sou.
- Nós não achamos você desastrada, Cris disse.

Ted entrou no meio.

- Não era nisso que eu queria chegar com o que eu disse.

Felizmente Eli voltou na hora, e a conversa mudou para o chá e a caixa de convites
da festa de formatura que ele trouxe com ele.

- O Rick não estava em casa. Ele deixou isso pra mim ontem e me contou sobre a
festa e os planos da mãe dele. O único problema é que eu só consigo pensar em
poucas pessoas pra convidar. Você quer pegar o resto, Katie?

- Eu também tenho muitos. E o Joseph e a Shiloh? Você os convidou?

- Sim.

- Que bom. Eu estava mesmo esperando que eles fossem.

Eli se situou na cozinha de Cris e Ted e, sentindo-se em casa, ele preparou o chá.

- Todo mundo quer?

- Eu não, Ted disse.

- Eu quero um pouco, Cris disse. Você pode usar a chaleira branca aí no balcão.
Diga-me de novo que tipo de chá é esse.

- É do Quênia. Veio de uma plantação de chá administrada por uns conhecidos


nossos. É perto de Nairobi. Um lugar montanhoso lindo. Bem alto. Bem verde.

- Mudei de idéia. Ted se levantou e pegou uma xícara do escorredor de copos. Eu


vou experimentar um pouco do seu chá queniano.

Katie estava assistindo Eli. Ela não sabia se era a luz por sobre a cabeça dele, mas
pela maneira como ele estava virado em direção a eles, a cicatriz em forma de L de
cabeça pra baixo no pescoço dele parecia estar mais evidente.

- Eli, essa cicatriz no seu pescoço é do quê?

Eli parou de derramar a água fervendo na chaleira de Cris. Por um instante, ele
pareceu ter congelado no lugar. Katie olhou para Ted e Cris buscando alguma pista.
Assim que ela viu a expressão de Ted, ela percebeu que tinha falado demais.

- Sabe o quê mais? Eu estou suspeitando que eu não deveria ter aberto a boca. Eu
retiro o que disse. Aqui vai uma pergunta diferente. Você viu algum filme bom esses
dias?
Como Eli não respondeu imediatamente, Katie se virou para Cris em busca de
suporte.

- E vocês dois? Algo que possam me recomendar?

Nem Ted e nem Cris compraram a idéia de Katie de mudar de assunto. Os dois,
sentados à mesa, olhavam para Eli. Katie não soube dizer se a atenção deles era uma
indicação de que eles já sabiam da história e estavam esperando para ver se Eli
contaria a Katie, ou se eles não sabiam. Será que Ted e Cris estavam tão curiosos
quanto ela, mas nenhum deles perguntou sobre isso antes?

Eli pegou a tampa da chaleira de Cris e a colocou no lugar. Carregando a chaleira


até a mesa e pondo-a no centro desta, ele pôs, também, uma peneira.

- É melhor se você deixar descansar pra pegar sabor por uns quatro minutos, ele
disse. Isso permite que as folhas do chá se abram totalmente e liberem o sabor. Mas,
você já sabe disso tudo, Katie.

Katie, que amava chá, afirmou com a cabeça.

- Quatro minutos, ela repetiu.

- Você tem leite, Cris?

- Claro.

Ela pulou da cadeira, mas Eli disse:

- Eu posso pegar. Ele retornou ao quieto grupo na mesa da cozinha e colocou, sem
cerimônia, a caixa de leite ao lado da chaleira.

- Eu estou quase certa de que minha tia e meu tio virão para a formatura. Cris
disse, incluindo Eli e Katie no comentário dela.

- Se você lhes enviar um convite para a festa, eu acredito que eles iriam amar vir.

Katie afirmou com a cabeça novamente. Ela tinha o endereço de Bob e Marta e ela
já tinha planejado mandar-lhes um convite. Parecia inútil adicionar algum comentário
sobre a festa ou os convites. Esse assunto não iria dar em nada. A pergunta pendente
de Katie tinha envolvido todos eles. Ela desejou poder pensar em algo, qualquer coisa
para levá-los à serenidade de uma conversa diferente.

- Eu também gostaria de saber, Ted disse. A afirmação dele pairou no ar,


esperando que Eli a pegasse.
Eli permaneceu quieto. Deixando a afirmação lá, descansando, como estava.
Depois de um longo momento, Eli respirou fundo, mas ainda não falou nada. Seu olhar
estava fixo na chaleira no centro da mesa.

Katie se compadeceu dele. Ela sabia muito bem o que era ser o alvo quando Ted
cismava com um assunto. Nem dez minutos atrás, Katie sentiu estar na mesma
situação, enquanto ele tentava convencê-la de que o amor estava à procura dela e que
iria capturá-la. A longevidade da amizade deles deu a Katie o sentimento de que ela
poderia dar o fora do comentário de Ted.

Sem falar, Eli pegou a chaleira e a peneira e serviu cada um deles, despejando o
chá quente no copo deles. Katie assistia com reverência a maneira como Eli lidava com
essa cerimônia que representava a simplicidade da amizade pra ela. Ela podia ver que
as folhas do chá tinham aberto durante os quatro minutos que ficaram de molho. A
água virou chá. Sua inconfundível e rica, mas delicada fragrância subiu e os envolveu.

- Eu tinha onze anos, Eli disse em voz baixa.

Katie sabia que o que estava prestes a abrir nessa mesa era uma parte profunda e
intensa da vida e do coração de Eli. Parte dela queria sair dali. Ela queria sair agora e
não ouvir o que Eli estava prestes a dizer. Isso porque seu instinto dizia que essa
comunhão nessa reunião de amigos não seria nem delicada e nem de boa fragrância.
Mas seria verdadeira. E a verdade tem um jeito de permanecer no coração por um
longo tempo.
Capítulo 18

- Nós vivemos em Zaire, Eli contava sua história em tom contínuo enquanto
terminava de se servir de chá. Nossa casa era dentro do posto de saúde.

Katie sentiu um flash dentro da sua cabeça e se lembrou de uma coisa que Eli
tinha dito no jantar de ação de graças, quando eles estavam jantando na casa dos
Doyle. Ele disse que o seu aniversário favorito foi quando ele tinha 9 anos e choveu
naquele dia, depois de um longo período de seca. A escola liberou os alunos que
viviam na área do posto de saúde e todas as crianças corriam na chuva e dançavam na
lama. A Imagem dessa historia tinha se fixado em Katie, ela a tinha guardado como
uma de suas fotos virtuais favoritas da África.

Eli continuou com sua história:

- Nossa família estava relativamente segura no posto missionário. Nós vivíamos


bem ao lado das instalações médicas. As pessoas das vilas vinham ao posto todo dia.
Individuais de tribos em guerra colocavam suas diferenças de lado e vinham todos ao
mesmo local para tratamento.

Ele olhou para Katie e depois para o Ted.

- Era para eu estar na escola, mas eu estava me sentindo mal, então a professora
me mandou pra casa já que ela sabia que a minha mãe estaria em casa nesse dia. Ela
mandou um bilhete comigo, eu li ele, mesmo sabendo que eu não deveria. O bilhete
dizia que se eu estivesse fingindo estar doente, minha mãe deveria me mandar de
volta imediatamente.

Cris sorriu gentilmente.

- Eu entrei na casa, que era pequena, mas umas das casas mais fortemente
estruturadas no complexo. Eu chamei pela minha mãe, mas ela não respondeu. Eu
pensei que ela devia estar nos fundos estendendo a roupa no varal ou no jardim de
vegetais. Ela ama cultivar cenouras e tomates

Eli fez uma pausa. Ele direcionava seu olhar para xícara de chá na sua frente que
ainda não bebera.

- Minha mãe não estava no jardim. Ela estava no quarto. E um homem... um


homem de outra vila... queria violentá-la.

A quietude que pairou sobre eles parecia trazer os seus corações mais perto um
do outro. Katie sentiu que os seus pulsos estavam todos batendo em um audível
uníssono.
- Eu corri até ele. Eu não sabia o que estava fazendo, mas eu pulei nas costas dele
e... ele tinha uma faca. Eli parou ali.

Katie se sentia mal em muitos níveis diferentes. Pelo jeito como Eli ponderava
cada palavra antes de dizê-la, estava claro que ele não havia contado essa história para
muitas pessoas no passado. Ela desejava não ter feito a pergunta que o levou a contá-
los essa historia. Katie também se sentiu mal pelo que pensou sobre Eli a primeira vez
que o conheceu em maio do ano passado, quando ela o viu no casamento de Ted e
Cris. Quando ela notou a cicatriz em forma de L invertido, Katie havia feito um dos seus
famosos comentários para si mesma e falou que o L era de “Perdedor” 18. Oh, mas
como ela estava errada.

- Sua mãe estava… bem? Cris perguntou.

- Mais ou menos, ele havia cortado a garganta dela também. Aí ele correu pra fora
porque uma mulher da nossa vila havia entrado na sua casa bem na hora. Se ela não
tivesse entrado... Um cirurgião que estava visitando a vila estava lá naquele dia, e ele
pode ajudar eu e minha mãe na mesma hora, algo incrível de acontecer naquela
clínica. Minha mãe precisava de mais pontos. Para mim, o problema foi o corte, era
fundo e muito perto da minha jugular Menos de um centímetro, o cirurgião disse.

Katie mal conseguia respirar. Ela não podia se imaginar passando por uma
situação dessas.

- Nós dois contraímos infecções depois disso. O posto não tinha os antibióticos
certos, mas eles eventualmente conseguiam o que a gente precisava.... então nós
ficamos por lá.

- Nossa Eli. A voz do Ted estava apertada de emoção. Você e a sua mãe….

- Eu sei. Eli disse rapidamente. Deus tinha a sua mão nas nossas vidas. Nós
sabemos disso.

Obviamente Eli havia convivido com Ted tempo suficiente para saber a sua visão
sobre o lado espiritual de qualquer situação. Não havia nenhum traço de irritação no
comentário de Eli. Katie não tinha nada pra falar. Ela esperou que Eli olhasse em sua
direção para que ela pudesse oferecer um olhar que expressava a sua sincera simpatia.
Ele olhou ao redor da mesa brevemente.

- Eu não gosto muito de falar sobre isso.

Cris, Ted e Katie todos concordaram com um aceno de cabeça.

18
Em inglês perdedor é Loser.
- Na verdade, além de vocês três, meu tio é o único com que eu já conversei sobre
isso. Ele é irmão da minha mãe, então é claro que ele ficou sabendo de tudo quando
aconteceu.

O rumo das palavras de Eli estava melhorando, agora que a história já tinha
passado pela parte difícil e estava chegando a uma parte mais feliz.

- Meu tio foi quem me convenceu a vir para Rancho Corona. Quando nós nos
mudamos de Zaire para Nairóbi, eu acho que meus pais perceberam que estando em
uma cidade grande eu conseguiria não ser mais tão afastado e hesitante com as
pessoas. Eu não tenho certeza do porque eles achavam isso, mas meu tio me disse
várias vezes que eu precisava experimentar uma vida fora da África, foi por isso que eu
entrei para o projeto de divulgação de missões na Espanha, foi a primeira possibilidade
que me apareceu, então eu fui. Foi bom, e ter vindo aqui para estudar tem sido muito
bom. Mas eu não sei se o meu tio realmente entende que você pode sair da sua casa e
morar em outro lugar, mas quando você ama algum lugar, ele nunca sai de você.

Ted concordou.

- Eu me sinto assim com relação ao Havaí.

- Então você acha que sempre vai morar na África? Cris perguntou.

- Eu não sei. Eli entrelaçou seus dedos ao redor da caneca cheia até a borda do chá
que ele ainda não havia bebido e que agora estava frio.

- Já que eu já contei tudo isso pra vocês mesmo, então eu acho que devo falar
mais uma coisa também. Algo que eu quero falar a muito tempo. Ted, eu queria te
agradecer por me incluir na sua vida. Desde quando eu cheguei aqui você tem sido um
amigo sólido para mim. Eu agradeço por você ter me conectado com o Rick e arranjado
para eu virar morar nesse prédio. Tem sido bom.

- Aonde você morava antes de vir morar com o Rick? Katie perguntou. Você não
morava nos dormitórios, morava?

- Não, eu morava com o meu tio. Isso funcionou bem no verão passado, mas eu já
estava pronto para me mudar para outro lugar. E Katie, eu gostaria de te agradecer por
me convidar para aquela noite de pizza no outono passado. Eu não sei se você se
lembra que me deu algumas dicas de etiqueta naquele dia, mas eu realmente sou
muito agradecido por elas, o que você me disse ajudou muito.
Katie definitivamente se lembrava como ela tinha rapidamente ajudado o Eli em
questão de “meios socialmente aceitáveis de se entrar em um grupo” como não
encarar alguém.19

Ela se sentiu mal agora por ter sido crítica do comportamento áspero que ele
tinha. O cara estava lidando com muitas coisas. “Choque cultural assim como tentar se
enturmar no campus e ainda trabalhando como segurança do campus”.

- Se nós estamos começando uma ‘hora das revelações da verdade’ então eu


tenho algumas para te dizer Eli.

Katie tomou um gole do seu chá para tomar coragem.

- Eu tenho que me desculpar por ter sido tão grosseira com você, eu sei que fui
mais de uma vez.

Eli estava voltando a ter sua expressão bem-humorada de sempre. Ele


calmamente disse:

- Você esta falando da primeira semana de aula, quando eu te dei uma multa?

Katie franziu as sobrancelhas.

- Ah é, eu tinha me esquecido disso. Não, eu não acho que quero me desculpar


por ter gritado com você no estacionamento. Eu acho que você devia ter tido um
pouco mais de graça comigo.

- Eu acho que você deveria ter me prestado um pouco mais de respeito.

- Por quê? Porque você estava usando um uniforme e parecendo um segurança


machão? Eu vou te dizer uma coisa, se os poderosos lá da Rancho quiserem que os
seus seguranças sejam tratados com um pouco mais de respeito, então eles precisam
fazer alguma coisa sobre aqueles carrinhos de golfe velhos. Não, fala sério! Aqueles
carrinhos parecem carros rejeitos pelos palhaços do circo. Desse jeito você poderia até
por uma buzina bem barulhenta e pendurar uns balões na parte de trás.

- Uns babuínos? Cris disse, segurando uma risada.

- Não, eu disse balões. Não babuínos.

- Eu ouvi babuínos.20

- Eu também. Disse Ted.

- Ah, mas você sempre fica no lado dela. O que você me ouviu disse Eli?

19
No sentido, encarar seria como olhar fixadamente pra alguém. Só pra não deixar dúvidas...
20
Em inglês, babuínos é ‘baboons’, e balões é ‘ballons’, daí a confusão de palavras.
- Eu poderia dizer um ou outro. Que tal se eu disser que ouvi balões só pra
empatar?

- Obrigada. Eu não sei o que está acontecendo ultimamente. Julia também não me
entendeu outro dia quando eu estava tentando dizer a palavra chá.

- E o que você disse ao invés de chá? Eli perguntou.

Katie lembrou-se de repente do incidente que aconteceu no Bella Barista e


abaixou os olhos.

- Foi só alguma coisa doida. Eu não sei o que está acontecendo como meu cérebro.
Excesso de estudo, eu acho.

- Não é pra estender esse assunto nem nada, Eli disse, voltando para seu assunto
anterior. Mas eu gostaria de terminar de agradecer a vocês três por me ajudar a achar
um lugar aqui na Califórnia e na Rancho.

- Sem problema, cara Ted estendeu sua mão por cima da mesa e lhe deu um forte
aperto de mão, do tipo que os homens dão, quando apertão o pulso um do outro.

- Cris, e eu estamos aqui para você a qualquer hora. Você sabe disso, não sabe?

- Sei sim, obrigado.

Parecia um bom momento para Katie repetir os sentimentos de Ted e falar para o
Eli que ele podia contar com ela também. A qualquer hora. Katie não sabia ao certo o
que dizer. A sua visão do Eli tinha inclinado em uma nova direção, mas ela não queria
indicar que tinha um ponto fraco e vulnerável em seu coração por ele.

Ao invés de adicionar palavras para renovar sua fidelidade a sua amizade com Eli,
Katie tomou outro gole do seu chá e disse:

- Esse chá é bom mesmo. Obrigada por trazer ele pra cá e dividido com a gente.

- A qualquer hora.

Katie compadeceu-se levemente e adicionou:

- E, Eli, eu realmente quero dizer isso mais do que vai soar, mas eu agradeço a
você por ter contado sobre a sua vida para nós. Eu não consigo imaginar como pode
ter sido tudo isso para você. Ou para sua mãe. Isso pode ser uma pergunta muito
pessoal, então você não tem que responder, mas você teve algum aconselhamento?
Quero dizer, você já resolveu tudo isso internamente?
- Isso é parte do motivo pela qual meu tio queria que eu viesse para cá. Ele
conseguiu um conselheiro e pagou ele para mim. Eu comecei no verão passado e fui
nele durante 6 meses. Então sim, eu acho que já resolvi tudo isso. 21

Katie estava impressionada com o quanto que Eli estava sendo aberto.
O silencio pairou sobre a mesa por um momento antes de Eli falar:

- A parte que mais me ajudou durante o aconselhamento foi admitir que eu era
uma vítima, uma vítima da graça.

Nenhum deles respondeu de imediato.

Ted recostou-se na cadeira e concordou com a cabeça.

- Uma vítima da graça. Isso é intenso. Mas é verdade, não é? Todos nós somos
vítimas da graça. Normalmente nós não pedimos para que coisas boas aconteçam
conosco. Nós não sabemos o que está vindo. Nós certamente não merecemos toda a
bondade e amor que Deus nós dá, mas Ele continua derramando essas coisas em nós.
Isso é forte, Eli. Ao invés de ser uma vítima do mal, você vê a mão de Deus em tudo e
se chama de vítima da graça. Eu vou me lembrar dessa.

- Eu amo essa frase, Cris disse, realmente altera todo o sentido de você se ver
como uma vítima desamparada e impotente de todas as coisas ruins que acontecem
na vida.

Eli concordou:

- Uma vez eu reformulei isso dessa maneira, eu comecei a sentir de novo, sabe
como? Eu tinha me fechado em tantos sentidos, e eu acho que o aconselhamento me
ajudou a por meu coração de volta no caminho com Deus. Eu não sei como explicar. Eu
só sei que me sinto como uma pessoa totalmente diferente agora.

Katie se sentiu mal de novo por ter sido tão julgadora sobre Eli o Eli no verão e
outono passado. Aqui estava ele, passando por tanta coisa, e Katie o estava tratando
como se ele fosse a sua idéia de um rapaz americano comum, que tinha vindo de uma
vida confortável, de um lar de classe média e que estudava em escola particular e
ganhava o que queria de natal. Ela desejava que pudesse fazer esse ano todo de novo.
Não que ela quisesse ter de novo sua relação com Rick, ou mudar alguma coisa nela,
não queria também refazer seu ano de aulas e de trabalho como R.A. Todas essas
coisas do ano foram boas. Até mesmo o término com Rick parecia a coisa certa a fazer.
O que não estava certo foi o jeito que ela julgava Eli e o manteve a distancia por tanto
tempo.

21
No livro está escrito conselheiro, mas eu acredito que seja um psicólogo mesmo.
Katie decidiu ali, na mesa de cozinha de Cris e Ted, que ela seria mais gentil com as
pessoas, especialmente as pessoas que ela não sabia por que estavam agindo do jeito
que estavam. Ela definitivamente iria tratar o Eli com muito mais carinho e respeito de
agora em diante.

Seu compromisso pessoal de mostrar a Eli mais carinho e respeito foi posto á
prova na noite seguinte quando ele apareceu no Spring Fling sem ser convidado. Ele
chegou na Lobby de Crown Hall com o Rick.

Katie acenou para os dois, mas percebeu que estava feliz de não poder ir até lá
para cumprimentá-los, pois ela estava “trabalhando” com a Nicole e era a responsável
por fazer a festa acontecer. Ela se sentiu um pouco desconfortável e insegura sobre o
que disser para qualquer um dos dois.

A sua ideia de passar as caixas de Twister para os times estava funcionando bem,
até que todos os grupos abriram suas caixas e perceberam que o motivo deles estarem
tão baratos no Bargain Barn (loja que a Katie comprou os jogos) era devido aos
giradores.22 Alguns deles não giravam, e alguns estavam sem a setinha.

- Atenção todo mundo. Katie gritou a multidão inquieta. Quando eles não
responderam, Katie deu um assobio estridente. Isso capturou a atenção deles.
Quantos de vocês não conseguem fazer seus giradores funcionar?

Todos os grupos responderam que os seus giradores não funcionavam. Katie


estava quase dizendo para todos desistirem do jogo, ir direto para a comida e chamar
aquilo de uma festa. Mas antes que ela pudesse fazer isso, Nicole apareceu do seu
lado, assim como ela esteve durante todo o ano letivo.

- Anuncie as combinações. Nicole disse a Katie. Como um grande jogo de bingo.


Você fala a combinação e todos os grupos fazem os mesmo movimentos ao mesmo
tempo.

- Ótima idéia! Ok, todo mundo, nós temos um plano B, graças a nossa destemida e
fabulosa Nicole. Vamos fazer o seguinte... Katie deu uma olhada nas regras do jogo,
confiscou um dos giradores defeituosos, para lhe lembrar das cores e disse para todo
mundo. Que os jogos comecem.

Nos primeiros minutos todo mundo conseguiu fazer as combinações faladas pro
Katie com facilidade. Assim que uma pessoa caia, a próxima na fila entrava no seu
lugar, exatamente na mesma posição que a outra estava. De onde ela estava, em cima
de uma das mesas de café, Katie viu todo mundo estava se misturando bem.

Aí ela resolveu apimentar um pouco o jogo e disse:


22
Não sei como chamar isso, é aquela tabela em forma de bola quem tem uma seta e várias cores, aí
você gira e vê que cor tem que por a mão ou pé.
- Orelha direita no verde.

- Orelha? Todos perguntaram.

- Sim, orelha, vai!

O nível de barulho aumentou um pouco, com os times tentando decidir quem


tinha realmente caído e quem estava só tentando colocar sua orelha no chão

- Tudo bem, esqueça as orelhas, cotovelo esquerdo no azul. Quer fazer? Você vai
ser a pessoa que fala as combinações. Todos te ouvem Eli.

- Isso foi na capela.

- E daí? Aqui. Ela empurrou o girador nas mãos dele e gritou para os jogadores: Se
preparem para uma grande surpresa, meus amigos twistados23, Eli Lorenzo é o seu
novo líder. Vai nessa Eli.

A sua voz saiu agradável, alta e autoritária, não parecia gritada, mandona e chiada
como a de Katie estava ficando. Eli regulou o passo do jogo para que ele andasse mais
rápido, coisa que os jogadores gostaram, pois assim eles não ficariam com câimbra nos
músculos enquanto esperavam a próxima combinação. Eli iniciou a animação da festa,
pelo ponto de vista de Katie.

Ela foi até o sistema de som e ligou de novo a música. Quando todos estavam
esperando no lobby ás 7 da noite, Nicole deixou a musica tocando para que todos
sentissem que isso era uma festa de verdade e não só uma desculpa para aqueles que
queriam escapar dos estudos. Nicole também havia colocado uma faixa que dizia
“Spring Fling” e tinha decorado a área com margaridas gerberas de cores vibrantes, a
flor favorita de Nicole.

Katie ajustou o volume da música de modo que não competisse com o Eli, mas alta
o bastante para trazer de volta a sensação de festa. Nicole chegou para Katie e disse:

- Ótima idéia de ligar a musica outra vez, eu acho que está funcionando.

- Sim, graças ao Eli. A propósito, eu notei que você veio com o ‘suéter-agarra-
rapaz’. Boa escolha. Suas maravilhas já funcionaram?

- Nem um pouquinho. Eu fui até ele para dizer oi quando ele chegou, ele me disse
oi e perguntou se eu achava que a cor no banheiro masculino do café era muito
escura.

23
No inglês, twisted, que significada retorcido, mas como ela quis fazer uma brincadeira com o nome do
jogo, ficou twistados em português.
- Foi só sobre isso que ele conversou com você? Tinta do banheiro masculino? Ele
é pode ser muito sem noção às vezes.

Nicole parecia um pouco perdida, mas a pitada de desilusão logo desapareceu.

- Não tem problema Katie, eu conversei mais com a Julia sobre isso, e eu estou
bem. Desde quando ela orou comigo, eu me senti resolvida. Pelo menos mais resolvida
do que eu tenho estado nos últimos meses.

Katie sabia que Nicole estava mudando para frases mais genéricas porque Carley,
uma das garotas do nosso andar, estava agora perto das duas. Carley tinha um
histórico de ser divisionista e terminantemente ornery.24 Nicole foi inteligente em não
revelar nenhum detalhe específico, especialmente sobre Rick, quando era possível que
a Carley pudesse ouvir.

Katie e Nicole voltaram a atenção ao grupo. As coisas estavam indo muito melhor
com o Eli do que tinham ido quando Katie estava na direção. Katie não foi a única que
notou a melhora. Rick foi até onde Katie e Nicole estavam e disse:

- Você pode me falar agora se quiser.

- Falar o que? Katie perguntou.

- Falar que está feliz que eu tenha trago o Eli. Falar que eu salvei a festa porque fiz
ele vir. Qualquer coisa parecida com isso é aceitável.

Arregalando os olhos e fazendo uma cara de bonequinha brincalhona, Katie


entrou no seu estado divertido e flertante com Rick, do mesmo jeito que ela
costumava ser durante os tempos de escola. Com uma voz super melosa e animada ela
disse:

- Oh, muito obrigada Rick Doyle. Você é tão maravilhoso. Eu não sei o que faria
sem você. Você é meu herói.

A última frase inesperadamente ficou presa na garganta de Katie.

Ela e Rick trocaram olhares. Uma última pontada de dor e perda parecia que
circulava por entre o coração dos dois. Ela também viu isso na expressão de Rick.

Katie e Cris tinham a muito tempo desafiado uma a outra a “esperar por um herói”
quando se tratava de suas vidas amorosas. Cris tinha esperado por Ted, e ele
definitivamente era o herói dela.

24
Gente, eu não achei nenhuma tradução para isso.
Katie havia esperado por Rick por muito tempo. E enquanto ele realmente tinha se
transformado em um herói, ele não era o seu herói. Katie não conseguia engolir. Ela
piscou rapidamente e se virou para o lado.

- Nicole, você pode tomar conta de tudo por aqui não pode? Eu...... Eu já volto.
Capítulo 19
Uma semana e meia depois, quando Katie encontrou Julia para outra de suas
reuniões de avaliação, ela esperava receber uma bronca por ter abandonado a Festa
da Primavera e não ter voltado para terminar a sua parte da programação. Nicole tinha
coberto lindamente, e ninguém no evento soube que Katie devia fechar a noite,
entregando aos alunos escolhidos, prêmios engraçados de fim de ano.

Quando Katie pisou na sala de Júlia, ela baixou o queixo em uma postura humilde.

- Vá em frente. Manda ver. Eu aguento.

- O que você esta fazendo? Julia perguntou.

- Estou me arrependendo por ter abandonado a Festa da Primavera.

- Não se preocupe com isso, Katie. Nicole me disse o que aconteceu e eu entendi.
Você teve um momento do coração com Rick, e você precisava resolver isso naquela
hora.

- Um momento do coração? Sim, eu acho que é exatamente o que era. Onde você
ouviu isso?

- Da Nicole. Eu também ouvi dos outros como Nicole cobriu lindamente sua
ausência. Eles disseram que tiveram um bom momento. Então não se preocupe sobre
ter se ausentado. O evento foi um grande sucesso. Eu que devia estar arrependida por
não estar lá com você.

- Você nos falou antes que tinha um grande jantar da faculdade. Claro que você
precisava estar lá com John. Nicole e eu entendemos, então não precisa se desculpar.

A expressão de Julia se iluminou.

- Falando em John, casamento e damas de honra. John e eu estamos cada um com


apenas um padrinho e madrinha em nosso casamento, e eu gostaria que você fosse
minha dama de honra.

- Eu?

- Sim, você.

- Por que eu? Quero dizer, eu fico honrada em ser sua dama de honra, mas você
tem certeza?

- Sim, com certeza. Eu tenho pensado muito sobre isso. John e eu conversamos
muitas vezes sobre isso, e eu gostaria que você fosse a pessoa que esteja lá comigo.
Parte da razão é porque a maioria dos meus amigos mais próximos estiveram comigo
durante todos os anos, durante tudo que eu passei com Trent. Eles eram ótimos
amigos e me apoiaram. Mas estão relacionados à minha primeira história de amor.
Nenhum deles faz parte dessa minha jornada em que me apaixonei por John. Nós
mantivemos tudo muito discreto e particular.

Katie podia ver porque Julia tinha mantido as coisas assim. Notícias de uma DR e
um professor juntos poderiam dar legalidade para muitos rumores, não importa
quanta integridade estivesse presente no relacionamento deles.

- Outra razão é porque eu quero que você faça parte dessa nova etapa da minha
vida do mesmo modo que você me tornou parte da sua ao me confidenciar sobre a
herança. Eu acho que todo o processo colocou você e eu na vida uma da outra de uma
forma intensa. Eu me sinto muito conectada a você, Katie.

- Eu sei, eu me sinto do mesmo jeito. Durante todo ano, Julia, mais do que com só
com as coisas da herança, você tem estado comigo nos momentos certos.

- E agora eu quero ter você comigo.

- Você tem. Como eu disse. Vou ficar honrada em ser sua mulher de honra.

- Bom. Eu gosto disso: mulher de honra em vez de dama de honra.

- Eu sei, huh? Esse é um titulo melhor. Vamos começar uma revolução e mudar
esses termos fora de moda. Quem quer ser uma dama? Isso sempre me fez pensar na
música de Natal com o 'oito damas a ordenhar’. Sério, quem precisa de uma imagem
dessa em mente num casamento?

- Eu nunca tinha pensado nisso antes, mas obrigada por colocar essa imagem na
minha mente. Eu tenho certeza que isso vai vir a minha mente agora sempre que eu
ouvir o termo dama de honra.

- Não se nós tivermos sucesso na nossa missão de fazer todas as noivas chamarem
sua primeira madrinha de ‘mulher de honra’. Ou mesmo ‘melhor mulher’. Porque não?
O noivo chama seu padrinho mais importante de seu 'melhor homem'. Porque a noiva
não pode ter uma melhor mulher? 25

- Eu gosto do termo mulher de honra. Esse é, agora oficialmente, seu papel no


nosso casamento. Isto é um sim definitivo, então?

25
Em casamentos estado-unidenses, as noivas chamam suas madrinhas de 'bridesmaids' (damas-da-
noiva) e a dama-da-noiva principal, na maioria das vezes, a melhor amiga da noiva, é chamada de 'maid
of honor'. O noivo também possui padrinhos, chamados de 'groomsman' (homens-do-noivo) e o
homem-do-noivo principal, na maioria das vezes, o melhor amigo do noivo, é chamado de 'best man'
(melhor homem). As funções da maid of honor e do best man são, entre outras, ajudar os noivos a
organizar o casamento. O best man, por exemplo, é o responsável por guardar as alianças para o noivo e
entregá-las a ele no momento da troca de alianças.
- Sim, definitivamente, sim. Eu sou a sua mulher de honra. Katie se curvou
levemente. Diga os detalhes.

- Ok, primeiramente, é melhor eu perguntar o que você decidiu fazer depois da


sua formatura?

- Eu não sei exatamente. Encontrar um emprego em algum lugar e fazer alguma


coisa. Eu pensei que eu poderia me mudar para o apartamento de Rick e Eli.

Julia olhou surpresa.

- Com eles dois?

- Não. Rick está planejando se mudar para Redlands. Eu não sei quando Eli vai
embora, mas quando ele voltar pra Nairobi, eu suponho que o apartamento vai ficar
disponível.

- Mas Eli não vai voltar pro Quênia até depois do nosso casamento.

Katie não tinha certeza de porque Julia sabia daquele pequeno detalhe, mas isso
não parecia algo importante para se descobrir.

- Quando é o casamento? Katie perguntou.

- Na semana depois da colação de grau. Eu ainda não tinha lhe dito isso?

- Talvez, mas eu posso ter esquecido. Sobrecarga de dever de casa. Uau, rápido,
hein?

- Eu sei. Quando John e eu decidimos que queríamos nos casar na parte elevada
do campus, nós tivemos que ficar com uma das poucas datas disponíveis restantes.
Desde que Cris e Ted realizaram casamento deles na colina no ano passado, esse se
tornou um lugar popular para muitos dos estudantes da Rancho, os antigos e os atuais.
Eles realmente começaram algo.

- Não deixe a tia Marta ouvir você falando isso. Ela vai querer uma parte dos lucros
de todos os eventos realizados lá. Foi ela quem organizou toda a decoração, os
fornecedores, e as flores.

- Nosso casamento não será tão elaborado. E não vai ser tão grande, também.
Estamos tentando mantê-lo para cerca de cinqüenta pessoas. Setenta e cinco no
máximo.

- Pequeno mesmo.

- Nós percebemos que ambos conhecemos muitas pessoas. Se nós abríssemos,


seria praticamente um evento para a escola inteira. Nós decidimos que queremos
apenas a família e os amigos próximos. Já que John e Patrícia não tiveram filhos, nós
não precisamos nos preocupar com a união de todos os nossos parentes.

- A recepção também será lá na campina também?

- Sim. Vai ser simples. Bolo e ponche. Uma amiga minha está fornecendo o bolo
como um presente. A Nicole lhe contou que ela está fazendo as flores?

- Contou. Tenho certeza que ela vai fazer um trabalho maravilhoso para vocês. Ela
é muito talentosa. E quanto ao seu vestido?

- Eu vou usar o vestido de casamento da minha irmã. Ela vai mandar pra mim.

- Ela virá para o casamento?

- Não, ela está no terceiro trimestre de uma gravidez difícil, e o médico disse que
ela não pode andar de avião. Nós conversamos sobre adiar o casamento até o bebê
chegar e ambos estarem em condições de viajar. Mas isso seria bem no meio de
Setembro e o John estaria dando aulas.

- Está tudo bem pra você sua irmã não estar aqui?

Júlia acenou com a cabeça.

- Foi ela que insistiu para eu ir em frente e me casar.

- Bom, diga o que você precisa que eu faça e quando você precisa que esteja
pronto e eu farei tudo.

- Eu estou trabalhando em uma lista. Se você tiver tempo agora, nós podemos dar
uma olhada em alguns detalhes.

- Claro. Mas espere. Você não tinha que me dar minha avaliação de fim de ano?

- Oh, certo. Katie, você fez um bom trabalho este ano. Continue assim nessas
semanas finais.

- Ok.

- Algum problema em particular?

- Só o normal.

- Ok. Bom. Fim da avaliação.

As duas riram. Julia foi até uma pequena escrivaninha que se encaixava
agradavelmente em um canto do apartamento e tirou um grande fichário.

- Uau! Eu pensei que você tinha dito que seria um casamento simples.
- É simples. Está tudo bem aqui. Este é o meu cérebro. Se perdê-lo, estou perdida.

Enquanto Julia colocava o livro na mesa de café, um cartão de visita rodopiou e


pousou no sapato de Katie.

Então, enquanto trabalhava em seu projeto final extremamente atrasado na noite


seguinte, uma idéia brilhante lhe ocorreu. Julia e seu amado não precisavam de cem
pombas. Apenas uma.Correndo para o quarto de Nicole, ela encontrou sua amiga já na
cama.

- Ei, acorde. São só onze e meia. O que você está fazendo?

- Dormindo. Você realmente deveria tentar fazer isso às vezes. Nicole acendeu a
luz próxima à sua cama, olhando para Katie com os olhos meio fechados.

- É a melhor idéia de todos os tempos. Eu não podia esperar até de manhã para te
contar.

- Katie, eu pensei que alguma coisa estivesse errada!

- Não, alguma coisa está certa. Ou pelo menos vai ficar certa. Belamente certa.

Katie iniciou um relatório de como o Dr. Ambrose queria pombas no casamento e


Julia tinha dito para jogar fora o cartão, mas Katie tinha ligado para obter informações.

- Aqui está o meu golpe de mestre. Quando você desenhar as flores, você pode
fazer com que no meu buquê tenha uma gaiola escondida, grande o suficiente para
uma pomba.

- Katie...

- Não, ouça, é perfeito. Eu não estou falando de um buquê de pombas. É só uma


pomba. Isso vai ser uma surpresa para eles. Eu vou soltá-la do buquê logo depois que
eles disserem 'Sim'. Ou depois que eles se beijarem. Ou talvez, logo depois que eles
saírem pelo corredor. Vai ser perfeito! Você não vê? O Dr. Ambrose vai amar. A única
pomba simboliza, quando Julia entrar pelo corredor, que ela e o Dr. Ambrose eram
duas pessoas separadas, com dois corações. O mistério do casamento é que os dois se
tornam um. Uma pomba. Um coração. Unidos como um. Você não amou?

- Realmente... Nicole estava sentada agora e tinha parado de piscar sob a luz
brilhante. Eu amei. Que grande idéia, Katie.

- Eu acho que não seria difícil incorporar uma pequena gaiola no centro do buquê.
Contanto que a pomba seja tipo uma dessas pombas de mágico que não se importam
de ficar confinada em lugares pequenos.

- Podemos pedir uma pomba que não seja claustrofóbica. Como vai ser?
- Você vai ter que ter um buquê grande. Tudo bem, porque o buquê da Julia vai ser
grande também. Ela deixou pra eu decidir sobre o seu, então ela provavelmente não
vai questionar o que eu desenhar pra você. Que divertido!

- Eu sei. Dr. Ambrose vai amar.

Katie e Nicole sentaram-se juntas na cama dela pela próxima hora, repassando os
planos do casamento de Julia.

- Uma ajuda sua pra comprar meu vestido de mulher de honra seria muito útil
também. Quaisquer idéias que você tiver serão muito apreciadas.

- Que estilo ou cor a Julia quer que você use?

- Ela disse que isso é comigo já que eu não tenho que combinar com ninguém. Eu
estava pensando em ir com um pretinho básico. O que você acha.

- Eu acho que é uma boa. Nós vamos encontrar alguma coisa esplêndida pra você.
Quando você tem tempo para ir às compras?

As duas descobriram quando teriam tempo livre em suas agendas e então


passaram aos planos da festa de formatura.

- Eu enviei meus convites na última segunda-feira, Katie disse.

- Eu também. Eu tenho alguns sobrando, se você precisar de mais.

- Não, eu também tenho muitos sobrando.

- Você enviou um para os seus pais, não enviou?

- Sim. Eu duvido que eles venham. Eu não encomendei convites para a colação,
então o convite para a festa vai servir duplamente pra mim. Pelo menos meus pais vão
saber que eu me formei. Isto é, se eu terminar tudo nas próximas semanas.

- Espero que os seus pais venham, Katie. Você disse que as coisas estavam um
pouco melhores com eles no Natal.

- Sim, Rick e eu fomos lá no fim do dia de Natal. Eu lhe contei, né? Nós levamos
alguns presentes. Minha mãe fez sopa, o que é o mais sofisticado que meus pais tem
feito de comida ultimamente. Nosso tempo com eles foi ok. Não divertido, mas ok.
Nós ficamos lá por umas duas horas. Meu pai agradeceu por termos ido vê-los, então
eu acho que valeu a pena.

- Talvez ele pense que valha a pena vir para a sua formatura.

- Talvez.
Nicole bocejou e educadamente cobriu a boca com a mão.

- Eu deveria deixar você dormir, Katie disse, se levantando. Obrigada por ouvir.
Estou feliz que você tenha gostado da idéia.

- Você compra a pomba e eu vou desenhar o buquê com a gaiola escondida.

Katie correu corredor abaixo até o seu quarto, parando para conversar com outras
duas corujas noturnas que ainda estavam de pé, passeando pelo corredor em seus
pijamas. Katie reconheceu suas expressões estressadas e aéreas. Ela encorajou a
ambas dizendo que elas iriam conseguir passar por aquele semestre.

- Tomem porções extra de vitamina C sempre que vocês puderem.

- Obrigada, mamãe, uma das moças disse com um sorriso.

- Seu sistema imunológico vai me agradecer por isso.

Quando ela retornou para o seu quarto, ela seguiu seu próprio conselho e
procurou pelo seu suprimento de vitamina C. Tomando três das pastilhas mastigáveis,
ela ligou sua hot pot26 na tomada. Ela não estava particularmente interessada em chá,
mas uma caixa de macarrão tailandês instantâneo parecia uma boa. Em seis minutos
ela estava de volta ao seu laptop. A tigela fumegante de macarrão soprava sua
fragrância como uma benção sobre sua sessão de estudos à meia-noite.

Isso vai funcionar, não vai? Eu vou terminar isso esta noite finalmente. Eu vou
conseguir passar pelas provas finais e vou me formar. Ela sorvia vagarosamente o
caldo do macarrão, sentindo-se aquecida dentro da sua barriga, assim como em seu
espírito.

Colados na parede ao lado da sua escrivaninha havia cinco cartões nos quais ela
havia escrito alguns dos seus versículos favoritos. Seu olhar parou em um que ela tinha
escrito mais de um ano e meio atrás, quando ela e Cris eram colegas de quarto. Ela o
tinha fixado em seus pensamentos antes de começar a sair com Rick.

Salmo 138:8 – “O Senhor cumprirá o seu propósito para comigo.”

Eu acredito que você fez isso, Senhor. Você ainda está cumprindo seus propósitos
para mim.

O versículo no cartão ao lado desse era um de Êxodos 20:24: “Construa altares nos
lugares onde eu te lembro de quem eu sou e eu virei e te abençoarei lá.”

Ela lembrava que tinha chegado a esse versículo em agosto passado durante o
retiro de AR's na Ilha Catalina. Em resposta, como seu não convencional ato de

26
Hot pot seria como um esquentador de marmita (uma marmi-quente, como conhecemos aqui).
adoração, Kate tinha construído um altar e dedicado o ano seguinte ao
Senhor. Passando ao terceiro cartão, ela tirou-o da parede e sorriu. Esse, dos Salmos,
era o verso que algumas mulheres do andar tinham selecionado especialmente para
Katie para aquele ano. Ele também estava escrito perto da foto dela na montagem que
tinha sido feita no mural delas desde o início do ano letivo.

Katie tinha voltado àquele mural várias vezes e tinha lido todos os versículos nas
fotos com tanta frequência que tinha se tornado imune ao versículo "dela".

“O Senhor guardará a tua entrada e a tua saída, desde agora e para sempre.”

Você fez isso também. Você guardou e abençoou todos os meses em que eu estive
com o Rick.

Katie sabia que era extraordinário sentir-se tão em paz sobre como tudo tinha
acabado com Rick.

Você abençoou a minha saída, e agora eu acredito que você vai abençoar a minha
entrada. Entrada em que? Entrada para uma aterrissagem nesse longo vôo chamado
Universidade Express. Tudo o que eu peço Senhor, é um pouso seguro. Depois... o quê?
O que você quer que eu faça?

Katie tirou um cartão vazio da pilha em sua escrivaninha e escreveu uma nota para
si mesma. Durante todo o ano letivo ela tinha feito notas mentais para si própria.
Parecia adequado que ela, finalmente, escrevesse uma dessas notas com papel e tinta
de verdade.

Surpreendentemente, a nota acabou não sendo escrita como se fosse ela quem
estava falando. Ela não planejou, mas ela escreveu como se Deus estivesse escrevendo
pra ela.

Querida Katie, eu tenho tudo resolvido. Continue confiando em mim e fique atenta
às próximas atrações. Não se esqueça: Você também é uma vítima da minha graça.

Amor, Deus.
Capítulo 20
No dia antes da formatura de Katie, o celular dela tocou às 3:05 da manhã. A
princípio ela pensou que o tinha colocado para despertar e tentou desligar aquela
função do telefone. Quando ele continuou tocando, seus olhos se ajustaram à luz da
tela do celular, e ela viu que era Eli quem estava ligando.

- Eli, o que foi? Você está bem?

- Estou. Você quer fazer algo meio maluco para comemorar o fato de nós
estarmos prestes a nos formar?

- Maluco? Eli, maluco é você me ligando às três da manhã em um dia que eu


poderia dormir até meio dia se eu quisesse!

- Você pode dormir o quanto quiser semana que vem. Venha comigo. Eu vou ver o
nascer do sol.

- Aonde você vai?

- Às montanhas.

- Vai levar duas horas pra chegar lá. Katie estava, agora, sentada e envolvendo sua
mente naquela espontânea ideia.

- Por isso que nós precisamos ir agora se quisermos pegar o primeiro raio de sol.
Você tá dentro?

Katie hesitou por um momento.

- Sim. Por que não? Eu vou com você.

Apesar de ela estar respondendo calmamente, Katie sentiu suas emoções se


agitarem de ansiedade. Depois de toda a pressão das últimas semanas, isso era como
um cartão concedendo liberdade-da-prisão.

Era ela quem normalmente sugeria aventuras bizarras para seus amigos, de
repente soou legal ter mais alguém que a convidasse para uma saída maluca no meio
da noite.

- Onde você quer que eu lhe encontre?

- Eu irei até o Crown Hall e lhe encontrarei aí na entrada.

Com um sopro de energia, Katie estava de pé e se vestindo com roupas quentes.


No momento em que ela pisou fora do lobby para a fria escuridão, Eli estava saindo do
carrinho de segurança do campus.
- Não me diga que você vai dirigir aquele carrinho de palhaço pra algum lugar.

Katie tirou uma touca de sua bolsa e colocou na cabeça.

- Não, eu acabei de sair do trabalho. Eu estava esperando que você dirigisse. Eu


ainda não peguei uma carona no seu carro novo. Ou eu deveria dizer no ‘Trevo’.

- Sim, meu Trevinho verde. Claro, eu dirijo. Eu acredito que o Trevo esteja
animado para uma aventura também.

Katie procurou por suas chaves e alcançou o passo de Eli. Eles caminharam até o
carro num ritmo constante e entraram. Katie ligou o carro e deu ré.

- Você sabe aonde nós estamos indo? Big Bear? Lago Arrowhead? Ela perguntou.

Uma das coisas que os alunos de outros estados amavam na Universidade Rancho
Corona era sua localização. Uma pessoa poderia dirigir uma hora no sentido oeste e
estar na praia, uma hora no sentido sudeste e estar no deserto, ou duas horas pro
nordeste e estar nas montanhas.

- Eu imprimi um mapa, Eli disse. Você já esteve no Crestline ou no Rim of the


World? 27

- Talvez. Não tenho certeza.

- Um dos caras com quem eu trabalho, morava lá. Ele me disse pra eu ir a um lugar
chamado Strawberry Peak Fire Lookout. O mapa diz que demora uma hora e cinquenta
e cinco minutos daqui até lá.

- Eu nunca ouvi falar de nenhum Strawberry Peak Lookout. Mas eu já andei de


trenó no Big Bear. Ou talvez foi no Lago Arrowhead . Enfim, o que você acha de irmos
pra estrada e você me diz pra onde ir?

- Está bem. Obrigada por vir comigo, Katie.

Ela olhou para ele e ofereceu um sorriso de contentamento.

- Obrigada por me convidar para ir. Eu amo uma aventura.

- Eu sei. Eu também. Eu estava fazendo minhas rondas usuais no meu carro de


palhaço, como você diz, e percebi que eu já estou aqui há quase um ano, mas nunca
fui às montanhas.

- Que triste que você não foi durante o inverno, quando havia neve. Você já viu
neve?

27
Ponta do mundo.
- Claro que já.

- Bem, é que você é da África e tal...

Eli olhou surpreso.

- Nós temos umas montanhas na África também, você sabe.

- Sério? Montanhas onde neva?

- Você já ouviu falar no Kilimanjaro?

- Talvez.

- É do outro lado da fronteira da Tanzânia, mas não é longe de onde meus pais
moram. O topo tem mais de 6.000 metros.

- Seis mil metros? Uau, iria mesmo pegar um pouco de neve com essa altura toda.

- O Kilimanjaro é a montanha mais alta na África. Eu e meu pai a escalamos dois


anos atrás. Não até o topo. É preciso estar vestido apropriadamente para caminhar até
o ponto mais alto. Nós fomos longe o bastante para congelar nossos traseiros e tirar
fotos maravilhosas.

- Ah, é, agora pensando nisso, eu vi mesmo umas fotos da apresentação que você
fez na capela.

- Aquele era o Kilimanjaro.

- Eu quero ir à África um dia.

- Quer?

Katie lançou-lhe um olhar.

- Eu nunca lhe contei isso?

- Não. Estou surpreso.

- Por quê?

- Quando a equipe missionária se reuniu uns meses atrás, você foi ao primeiro
encontro, mas saiu depois de vinte minutos.

- Eu recebi uma mensagem dizendo que eu precisava voltar para o dormitório por
causa de um problema que surgiu. Eu não lembro agora o que era. Eu não fui ao
encontro seguinte ou me inscrevi para a viagem por causa do Rick.

- Por quê? O Rick não queria que você fosse?


- Ele não disse que não, mas eu sabia que ele não entenderia porque eu queria ir.
Naquela época, as coisas estavam tão bem entre mim e Rick que eu não quis colocar
nosso relacionamento em risco.

Katie parou por um momento antes de acrescentar:

- Que patético, não é? Eu deixei de ir à África, e veja como tudo acabou?

- Eu não vejo sua decisão como patética.

- Obrigada, Eli, mas de alguma forma, foi sim.

- Como é que pode ser patético estar comprometido com alguém com o qual você
se importa profundamente? Eu acho que o nível de lealdade que tanto você como Rick
mostraram um para com o outro e o relacionamento de vocês era comovente.

- Comovente, huh? É isso que nós éramos? O Rick provavelmente iria gostar dessa
descrição.

- Eu não consigo pensar em nenhum outro casal que eu conheço que tentou tanto
por tanto tempo fazer um ao outro feliz. O que vocês dois passaram foi comovente.

Katie não estava certa sobre como receber o comentário de Eli. Ela aprendeu em
uma de suas aulas desse semestre que, quando uma pessoa finge não se incomodar
com algo que o outro faz, o relacionamento não é saudável. Eventualmente a
personalidade mais forte vence na hora de tomar as decisões, e a outra pessoa,
falsamente condescendente, acaba sufocada e frustrada.

O professor daquela aula tinha aplicado aquele modelo de relacionamento às


políticas e o desvio de fundos das nações em desenvolvimento. Entretanto, enquanto
estudava para sua prova final, Katie colocou Rick e ela mesma no modelo. Mesmo não
achando que o conceito se aplicava totalmente a eles, ela via similaridades. Ela queria
acreditar que tinha permanecido verdadeira à sua personalidade durante o
relacionamento deles e não fingido nada, mas ela não tinha certeza de que Rick tinha
feito o mesmo.

- Eu ainda não vejo o motivo de você dizer que o que Rick e eu tivemos foi
comovente.

- Porque vocês dois se esforçaram muito.

- Parece que você não acha que um bom relacionamento requer muito esforço ou
muito trabalho duro.
- Claro que requer. Mas eu também acho que um bom relacionamento flui
naturalmente, sem ser forçado. Como as ondas. O amor vem no seu próprio tempo. É
inconveniente e orgânico, e é isso que o faz real.

Katie se contorceu em seu assento e ajustou seu retrovisor. As palavras de Eli


fizeram seu coração saltar levemente, e isso a deixou desconfortável. Se fosse para ela
ser honesta consigo mesma e com Eli, ela diria que concordava com ele. Essas eram as
coisas que ela tinha tentado expressar para Rick por meses, mas ele estava
determinado demais a pesar, medir e planejar cada passo do relacionamento deles.

Ela não pôde se permitir concordar com aquela declaração de Eli. Ao invés disso,
ela o desafiou:

- Então me diga, qual é a sua ideia de um relacionamento bem sucedido?

Katie odiava essas duas palavrinhas: bem sucedido, já que esse era o termo
definidor para Rick, mas elas pareciam ser as melhores palavras a serem usadas se
fosse para a conversa permanecer em um nível menos pessoal.

Eli se ajeitou no banco do passageiro.

- Eu não sou muito de medir as coisas pelo sucesso.

- E qual a razão disso?

Ela sabia que estava apresentando o outro lado de seus sentimentos, mas ela
também não iria baixar a guarda. Não aqui. Não agora.

- Eu acredito que muitos de nós não sabemos como, acuradamente, medir


sucesso. Eli disse. É por isso que os caminhos de Deus não são os mesmos que os
nossos, e seus pensamentos não são os nossos. Muito do reino de Deus é medido em
uma balança diferente da que o mundo usa para medir valores. Eu devo lhe alertar, eu
acabei de entregar um trabalho final na semana passada para minha aula de doutrina
na Lei de Cristo, então me pare se você não quiser ouvir uma palestra.

- Nós temos mais que uma hora. Vá em frente, coloque seu conhecimento pra
fora. Prove que você já é quase um estudante graduado.

Eli pareceu gostar do desafio.

- O título do meu trabalho foi, ‘Ame a Deus e Faça O Que Você Quiser’.

Katie tinha ouvido essa frase um ano atrás em sua aula de doutrina. Ela até
lembrava vagamente o que tinha escrito em seu trabalho. Algo sobre como Cristo
cumpriu o mandamento do Velho Testamento de “amar ao Senhor seu Deus com todo
seu coração, toda sua alma e todo seu entendimento” e que Ele acrescentou, “ame
seu próximo como a si mesmo.” Isso significava que as pessoas precisam se amar para
que pudessem tratar os outros com o mesmo amor e bondade que têm por si mesmas.

Ela tirou 78 em 100 em seu trabalho e supôs que o trabalho de Eli tinha seguido a
mesma linha. Entretanto, assim que sua fala pegou ritmo, ela viu o quão apaixonado
ele estava pelas suas ideias. De alguma forma, Eli a lembrava de Ted, com seu lado
espiritual da vida sendo o valor básico de Eli em qualquer assunto. Isso aparecia
especialmente em seu jeito sutil, porém imponente quando ele estava na frente das
pessoas.

A boa aparência de Rick dava a ele uma presença imponente não importava onde
ele estava. Quando ele dava instruções no café, todos acatavam como se fossem dadas
por um comandante. Suas palavras eram frequentemente claras e diretas. E elas eram
obedecidas.

Com Eli, o ar imponente era diferente. Ele parecia uma pessoa mediana por fora.
Mais do que mediana, na verdade. Especialmente agora que seu cabelo estava grande
e anelado. Ele tinha um belo rosto, nada escultural como o de Rick, mas mais acessível
e não intimidador. Enquanto Eli parecia ser mediano e acessível por fora, assim que ele
se colocava na frente de um grupo e falava, sua presença se tornava
surpreendentemente poderosa. Suas palavras fluíam com clareza e constância, como
uma mina de água pura que encontrava seu caminho por debaixo da terra até a
superfície e regava tudo à sua volta.

- O amor começa no coração, Eli disse. Não apenas na cabeça. O amor envolve as
emoções.

Katie se voltou para o que ele estava dizendo.

- Então, se eu amo a Deus e, eu quero dizer, amo de verdade a Deus com renúncia,
então eu devo passar a amar a mim mesmo, a minha vida. Eu preciso amar minha
história de coração. É nisso que eu acredito que a vida é para todos nós. Uma história
sendo escrita por Deus. Ele é o Autor e Consumador da nossa fé. Quando eu começo a
amar minha história, com todas as suas confusas idas e vindas, então eu posso amar
outras pessoas que estão vivendo suas próprias histórias com todas as suas confusas
idas e vindas também.

Katie disse subitamente.

- Eu tenho aprendido, nesse ano, a fazer as pazes com minha história também. Ou,
eu acho que deveria dizer, a história que Deus está escrevendo na minha vida. Eu
tenho minha porção de idas e vindas bagunçadas.

- Todos nós temos. Se não tivéssemos, por que precisaríamos de um Salvador? Por
que precisaríamos da graça de Deus? E na minha história, por que eu precisaria do
poder do perdão se eu pudesse, simplesmente, cuidar da minha raiva por mim
mesmo?

- Você acha que realmente perdoou o homem que atacou você e sua mãe?

- Sim. Não tudo de uma vez. Tem sido um processo. Mas, sim, eu o perdoei. Eu
não guardo nada contra ele mais.

- Ele foi preso ou algo do tipo?

- Não. Ele não foi preso, nem levado a juízo, nem mesmo capturado. Não naquela
parte do Zaire. Para algumas coisas, a justiça nunca será feita. Pelo menos, não no
nível humano. É por isso que eu disse que não guardo nada contra ele mais. Se há de
ter alguma justiça, ela será feita por Deus, não por mim.

- Isso é bem intenso.

- Eu sei. É o que eu estava dizendo sobre nossas histórias. Eu não sei a história
daquele homem. Por que ele faria aquilo? Que força demoníaca o levou a agir daquela
maneira? Quero dizer, se eu vou sair por aí dizendo que eu amo a Deus, então eu
tenho que confiar nele e acreditar que tudo na minha vida passou primeiro pelos
dedos d’Ele. Nada acontece fora de seu controle. Apenas Ele fará justiça sobre todas as
coisas um dia. Tudo que eu tenho que fazer é amar minha própria história para que eu
possa amar a história daquele homem também.

Katie sentiu um turbilhão de emoções das palavras de Eli. Ela concordava com ele
na teoria e até conhecia pessoalmente um pouco da liberdade do perdão. No começo
do semestre, Julia a ajudou durante o processo de perdoar seus pais por serem tão
desligados emocionalmente da vida dela. Ela também perdoou Rick pelas formas como
ele a machucou durante os anos de ensino médio deles. Ela sabia como era não mais
carregar o peso da falta de perdão. Mas perdoar alguém que fez o que aquele homem
fez com Eli? Impossível Katie conseguir relacionar a profundidade daquele tipo de
perdão.

- Você meio que me impressiona, Katie disse de um jeito estranho.

- Por que você disse isso?

- Para começar, eu acho que nunca vi você falar tanto assim. E essas coisas são
mesmo profundas, Eli.

- Essas são as coisas das quais a vida é feita. O mundo é um lugar sombrio.

Katie sentiu uma melancolia cobri-la. Ela ouvira muitas mulheres em seu andar
contarem partes de suas histórias. Ela sabia que o mundo era cheio de coisas sombrias.
Coisas terríveis aconteceram a pessoas muito boas.
Ela tentou se lembrar de como ela tinha se sentido algumas semanas atrás quando
Eli disse que ele era uma vítima da graça. Ela queria retornar agora para aquele mesmo
sentimento de esperança.

A voz de Eli diminuiu.

- Você sabe, eu acho que a melhor coisa que aprendi esse ano foi quando eu
ajudei a colocar os pisca-piscas em volta das palmeiras na parte mais alta do campus.

- E o que foi que você aprendeu com as palmeiras, Oh Sábio?

- Eu não aprendi nada com as palmeiras. O que eu aprendi foi que a luz transforma
a escuridão. A primeira vez que nós apertamos o botão ON, eu não pude acreditar em
quanta diferença um pequeno toque de luz fez no meio de toda aquela escuridão. Nós
todos somos um monte de lâmpadas, sabe? Nós só ficamos lá pendurados, e quando a
energia de Deus vem é maravilhoso. A escuridão é transformada. Especialmente
quando nós permanecemos conectados um ao outro.

Katie olhou para ele de novo. Meia dúzia de pensamentos se enroscaram dentro
dela, tentando se alinhar com tudo que ela sabia sobre vida, amor e Deus.

- É simples assim? Nós somos ficamos conectados, e Deus é quem aperta o botão
ON com todos os seus poder?

Ela estava se sentindo estranhamente nervosa e seu estômago estava apertado.


Voltando sua visão para a estrada adiante, Katie ainda não podia acreditar o quão
aberto Eli estava. Ele parecia uma pessoa diferente do Eli que ela tinha visto pela
primeira vez no casamento de Cris e Ted.

- Espere um minuto, Eli pegou uma pequena lanterna e olhou para seu mapa
dobrado. Pegue a próxima saída. Não essa, a próxima. Waterman.

- Ok.

Katie ligou a seta e mudou de pista, pronta para virar e sair da estrada rumo às
montanhas. Por um momento ela teve um flashback de uma conversa que teve com
Rick meses atrás enquanto eles estavam na estrada. Naquela época, ela estava irritada
com o fato de estar na pista lenta do relacionamento deles por tanto tempo. Ela queria
que Rick ligasse a seta do namoro e mudasse para a pista rápida.

Naquele momento, Rick não queria fazer aquela mudança. O relacionamento


deles permaneceu naquela mesma pista reta e lenta por tempo demais aos olhos de
Katie.
Simbolicamente, ela gostava do que estava acontecendo agora. Era muito melhor
sair das pistas retas da estrada e pegar as marginais tortuosas que levavam a destinos
ainda não explorados.

- Não dá pra acreditar o quão longe nós chegamos em tão pouco tempo. Katie
estava se referindo à distância que eles tinham andado de carro. Eli, aparentemente,
entendeu o comentário dela como se ela se referisse ao quão longe os dois tinham
chegado depois da conversa aberta deles nessa uma hora.

- Eu sei, Eli disse. Eu queria que você e eu tivéssemos conversado um com o outro
desse jeito no último verão. Teria sido um ano letivo completamente diferente. Eu
ainda não tinha chegado lá.

Ele pausou e acrescentou:

- Mas agora eu cheguei.


Capítulo 21
Katie se recusou a ler qualquer coisa no comentário de Eli sobre “estar lá agora”.
Ela olhou para ele com o canto do olho. Estaria ele indicando que estava pronto para
buscar um relacionamento com ela além do que havia agora?

Não, não pode ser isso que ele quis dizer. Como ele poderia algum dia insinuar
uma coisa dessas? Ele vai voltar para o Quênia, e eu estou em jejum de
relacionamentos amorosos. De jeito nenhum eu vou me lançar de cabeça em outra
paixão sem saída. Eu tenho feito isso com muita frequência.

Assim que Katie pensou isso, ela sentiu seu coração batendo mais forte. Ela sabia
que Eli nunca seria uma paixão. Não, não uma paixão. Ela percebeu que se ela abrisse
o coração para ele, a vida, como ela conhece, seria passado. Esse cara a amaria de
volta com mais gentileza, intensidade e liberdade do que ela algum dia experimentou.
Exceto talvez pelo relacionamento que ela tem com a Cris. E agora com a Julia. Katie
sabia como era estar conectada no coração com amigos verdadeiros.

Mas ela se recusava sequer a considerar um relacionamento nesse nível com Eli.
Parando o carro num semáforo da Waterman Avenue, ela sentiu sua expressão facial
fechar. Ela não gostava da conclusão a que havia acabado de chegar enquanto esticava
a linha curvilínea que tinha sido o seu relacionamento com Eli no último ano.

Basicamente, você acabou de dizer a si própria que se você vai ter um


relacionamento com Eli, vai ter que ser tudo ou nada. Ele se preocupa com você. Você
sabe, você só não admite. Se você se permitir por um minuto se preocupar, nem que
seja só um pouquinho com ele, ele vai entrar no seu coração, e você sabe disso.

Katie chegou mais perto e ligou o rádio do seu carro. Ela pressionou um botão que
mudava para a própria seleção de músicas dela e foi para algo próximo de jazz.

- Já ouviu esse grupo antes? Katie tinha que falar alto por sobre a música. Sua voz
soava urgente. Ela precisava redirecionar a conversa. Rapidamente!

- Não é música dançante africana como que você tinha quando nós fomos ao
deserto, ela acrescentou. Mas é bom pra nos animar. A propósito, você quer parar pra
tomar café? Com certeza nós podemos encontrar um posto de gasolina com uma loja
de conveniência aberta em algum lugar por aqui.

Parecia que Eli estava estudando-a, tentando entender a mudança abrupta em seu
comportamento.

Katie deu uma olhada para ele e olhou novamente para a estrada.
- Sem querer ser rude ou qualquer coisa do tipo, Eli, mas você está encarando de
novo.

Ele ficou quieto por um momento. Então ele contra-atacou com:

- Sem querer ser rude ou qualquer coisa do tipo, Katie, mas você está nervosa e na
defensiva de novo.

Katie sentiu-se enrubescer. Ela olhou para frente e cerrou os dentes. Ninguém
jogava seus defeitos na sua cara. Ninguém!

Ela não sabia o que dizer.

Imóvel diante do seu desconforto ou seu silêncio, Eli trocou de música. Ele mudou
para uma música diferente que tinha uma batida mais definida. Iluminando com sua
pequena lanterna de mão, ele checou o mapa novamente.

- Essa estrada vai nos levar para o alto da montanha, Eli disse. Permaneça na
Waterman.

- Ok. A voz dela veio sólida, mesmo que seu coração estivesse trêmulo. Ela dirigiu
mais alguns quilômetros e se acalmou. Eli estava calmo. Por que ela não deveria estar
calma? Não havia razão para ficar chateada ou começar uma guerrinha ali no carro.
Mas Katie se sentia estranha, deixando o assunto flutuar ali no meio deles sem forçar
uma resolução ou conclusão. Ela também se sentia segura. Esta era a parte estranha.
Katie sabia que ela não tinha que ajustar seu temperamento ou personalidade quando
ela estava com Eli.

Ela parou no posto de gasolina antes de se dirigir para a subida da montanha na


San Bernardino Mountains. Eli pediu um grande copo de café enquanto Katie escolheu
uma garrafa de água glacial da Nova Zelândia e ficou na fila atrás de Eli.

- Eu pago. Ele apanhou a garrafa de água dela.

- Não, está tudo bem. Eu tenho dinheiro.

Um cara entrou com três caixas que pareciam conter donuts e foi para os fundos
da loja. Assim que ele passou, Katie sentiu o aroma e soube que sua suspeita estava
certa.

- São para vender? ela perguntou.

- Serão assim que eu os colocar na prateleira.

- Eu vou levar um.

- Eu também, Eli disse.


Alguns minutos depois os dois estavam de volta ao carro de Katie, afundando seus
dentes nos donuts ‘frescos-da-padaria-de-manhã-cedo’.

- Nossa. Katie murmurou depois do seu primeiro pedaço. Eles ainda estão
quentes.

- Bom, Eli disse. Nós certamente nunca tivemos essas guloseimas pra comer
quando estávamos crescendo.

- Quer mais um?

Antes que Eli pudesse responder, ela estava do lado de fora com seu donut entre
os lábios e sua carteira na mão. Ela comprou três donuts. Dois deles eram pra ela e
para Eli. O terceiro ela deu para o caixa e disse, “Feliz Natal”.

Ele olhou surpreso e mordeu o donut antes que ela saísse pela porta.

- Você não precisava me comprar outro, Katie.

- Sim, eu precisava. Você só comeu o Glazed Donut 101. Se você vai aprender os
modos glutões dos americanos e os prazeres da carne, você realmente precisa
frequentar esse curso avançado. Donut 201. Coberto com chocolate, creme de leite à
moda antiga. Esta é a razão pela qual alienígenas continuam tentando pousar no
planeta Terra. Eles querem esta receita.

Eli deu uma mordida.

- Ah, sim, isso é perigoso.

Katie juntou-se a ele na aula do Donut 201, deixando o chocolate ainda quente
derreter em sua língua.

- Você tem que viver perigosamente de vez em quando. É o que eu digo.

- Especialmente no nosso último dia oficial como estudantes universitários.


Amanhã você e eu seremos graduados.

- Sim, seremos. A nós! Katie levantou seu donut meio comido, convidando Eli a
brindar com ela.

- Sim, Eli ecoou. A nós.

Eles bateram os donuts e deram uma mordida ao mesmo tempo.

Os olhos deles fixos um no outro em alegria compartilhada. Eli não piscou. Seus
olhos estavam falando com ela, mas Katie se recusava a ouvir. Ela olhou para longe e
sentiu um forte estrondo por dentro.
Meu estômago está me dizendo que é muito cedo para tanto açúcar? Nunca. Não
o meu estômago. Por que eu sinto como se uma manada de búfalos estivessem
debandando dentro de mim?

Ela baixou o donut e tomou um longo gole de água. Pressionando as costas da


mão em sua testa, ela checou pra ter certeza de que não estava com febre.

- Você está bem?

- Sim, tudo bem. Só mandando isso pra dentro muito rápido, eu suponho. Pedaços
menores, certo? É gostoso, não é?

- É sim, Eli concordou.

Katie colocou sua atenção novamente em dirigir montanha acima. Enquanto ela
sorvia a água, a debandada dos búfalos se acalmou. A música começou assim que ela
ligou o carro, e providenciou assuntos seguros para as conversas deles. Contanto que
ela não precisasse manter contato visual com Eli, ela estava bem.

Cuidar do contato visual não era um problema porque Katie precisava de ambos
os olhos na estrada e ambas as mãos no volante, à medida que a estrada da montanha
serpenteava mais e mais alta. Ambos disseram que seus ouvidos estavam estalando.
Eli direcionou Katie sobre qual desvio tomar uma vez que eles estavam em Crestline. O
vale abaixo era um vasto campo de luzes cintilantes no que restava da noite escura. A
única luz à frente vinha dos faróis do Trevo e uma ocasional luz na rua.

- Tem certeza que está certo?

- Eu acho que sim. O mapa diz para ficarmos nesta estrada por mais uns cinco
quilômetros e então procurar um sinal para o Strawberry Peak Lookout à esquerda.

- Por que ‘morango’28? Essa elevação é muito alta para dar morangos.

- Eu não tenho idéia de onde esse nome veio.

Katie manteve seu foco na estrada. Eles encontraram o sinal como predito,
viraram em uma estrada íngreme, e se dirigiram para o que parecia uma imensa torre
de micro-ondas. Desligando o motor e subindo, eles foram pegos desprevenidos pela
frieza do ar.

- Eu tenho um cobertor no meu porta-malas. Katie foi até o pequeno cobertor de


lã que ela tinha posto ali logo depois de comprar o carro.

- Você vai ficar aquecido o suficiente?

28
Strawberry é morango em português.
Eli levantou o zíper na frente do seu suéter e colocou o capuz em sua cabeça.

- Sim, eu estou bem. E você?

- Eu estou bem também. Com o cobertor enrolado em seus ombros, Katie colocou
as chaves do carro em seu bolso e entrou no carro procurando sua câmera. Ela tinha se
lembrado que ele estava em sua bolsa e ficou contente. Desse ponto ela poderia tirar
ótimas fotos do vale abaixo e todos os pontinhos de luz.

No silêncio da pré-alvorada, enquanto eles caminhavam ao redor da área aberta


próxima à torre Katia, bateu fotos das luzes reluzentes no vale escuro. Ela tirou de
algumas das miríades de estrelas que se apresentavam em glória reluzente. Ela tirou
um retrato do perfil de Eli enquanto ele olhava para os céus com as mãos no bolso do
seu suéter e o capuz caindo.

Então aconteceu. O som de um pássaro piando em uma árvore acima. Uma


chamada singular para a adoração. Katie olhou para Eli para ver se ele havia escutado.
Ele estava olhando para ela, e as características do seu rosto subitamente pareceram
mais definidas. Katie olhou para o leste, para onde Eli tinha voltado o olhar. O amplo
panorama do espaço se tornara uma sombra pálida de lavanda. Outro pássaro se
juntou ao som matinal e então vários outros.

Vocês fazem isso todos os dias, passarinhos? Vocês cantam para o céu pela
manhã?

O som dos pássaros e o alvorecer pareciam suavemente conectados, enquanto Eli


e Katie permaneciam a alguns metros de distância um do outro, ambos hipnotizados
na mudança do céu bem vindo pela sinfonia. Nenhum dos dois falou. Teria arruinado o
momento tentar comentar o que eles estavam testemunhando.

Como você diz, “Oh, que bonitinho!” pra uma coisa tão grandiosa como esta?
Katie não podia se lembrar de algum dia ter testemunhado o nascimento de um novo
dia como esse antes.

Você faz isso todos os dias, não faz, Pai? Quem percebe? Você apresenta o nascer
do sol para uma casa praticamente vazia. Eu estou muito contente por nós estarmos
aqui para ver isso. Eu aplaudo o seu trabalho, Deus. Bravo!

Uma meia dúzia de tons de azul apareceram como rios de fitas de cetim em um
céu sem fim diante deles. Fracos reflexos de rosa e pálidos narcisos amarelos tocavam
a lona celestial. Uma frota rebelde de nuvens da cor de prata enferrujada navegava
para o sul. Seu número escasso parecia se dissipar enquanto o contorno das
montanhas alcançava a vista.
Em tudo ao redor deles a paisagem começou a mostrar seus níveis complexos de
montanhas e vales. Os cumes revelavam sua riqueza de altos pinheiros. Acima deles,
na árvore mais alta, um grande coral de pássaros cantava a plenos pulmões... O
coração de Katie martelava de expectativa e temor.

Silenciosamente, sem ser notado pela maior parte da vasta criação de Deus, o
novo dia chegou. O sol flutuava no céu sobre a linha do horizonte e em um fluxo de
preciosa glória enviou feixes de luz para cobri-los. Ela tinha se esquecido de tirar fotos
porque ela estava muito presa no momento. Com uma mão firme, Katie tentou
capturar a beleza. Virando para o oeste, onde a montanha ainda escondia o sol do
novo dia do vale dormente, tudo era preto e cinza, exceto por determinadas luzes
elétricas. Os esforços humanos para iluminar o mundo nunca poderiam se comparar
ao mundo de brilho espetacular e singular de Deus. Todas as estrelas cansadas se
recolheram para o dia enquanto o sol se levantava.

Katie sussurrou seus pensamentos de adoração para Deus. Ela se sentiu


confortável com seu pai celeste naquele momento, ainda que Eli estivesse parado
apenas alguns metros de distância. Ele parecia preso em seus próprios pensamentos.
Eles ficaram desse jeito por algum tempo, esperando até o sol tomar o centro do palco
no céu da manhã e estar a caminha de sua subida eterna aos céus.

Katie bateu mais fotos da vista extraordinária do vale abaixo. Ela não sentiu
necessidade de dizer nada. Ela amava esse conforto, esse lugar secreto e a beleza que
eles tinham acabado de testemunhar.

Eli chegou mais perto e sussurrou alguma coisa, mas ela não entendeu.

Ele estava completando um pensamento? Uma oração? Ou ele estava falando


comigo?

Katie perguntou:

- Então, o que você acha? Está pronto para ir?

- Claro.

Eles desceram a montanha em silêncio. Nenhum deles parecia ter muita coisa em
suas mentes. Katie não sabia como processar tudo que ela tinha acabado de
testemunhar, então ela redirecionou seus pensamentos. No topo da lista estava o
pensamento sobre como ela iria tirar o resto das suas coisas do quarto no dormitório.
Ela tinha outra semana que poderia ficar no quarto, já que ela concordara em
permanecer no serviço depois da formatura para terminar seu trabalho de AR e
dispensar todos os alunos que estavam saindo do dormitório.
O único problema era que ela ainda não sabia para onde ia mover seus pertences.
Ela tinha várias ofertas. Ela poderia se mudar para um apartamento há cinco
quilômetros com outras duas AR’s que tinham conseguido trabalhos no campus para o
verão. Cris disse que ela poderia ficar com eles em seu pequeno apartamento se ela
não se importasse com um colchão de ar na sala de estar e desde que fosse apenas por
algumas poucas semanas.

Nicole também não tinha decidido o que ela ia fazer. Ela disse que poderia voltar
para Santa Barbara e ficar com os pais até encontrar um emprego em algum lugar, mas
aquela possibilidade a deprimia.

Katie tinha considerado o mesmo tipo de opção indesejável de se mudar para a


casa dos seus pais em Escondido. Pelo menos ela assumiu que poderia fazer isso. Ela
não perguntou.

Financeiramente ela tinha dinheiro suficiente pra alugar sua própria casa, e essa
era sua opção preferida. Ela sabia que deveria ter tudo isso decidido um mês atrás,
mas ela esteve ocupada passando nas matérias. Em algumas delas com facilidade.
Katie tinha muito para celebrar amanhã quando ela caminhasse no palanque e
recebesse o seu diploma. Ela celebraria primeiro e decidiria onde morar depois.

- É aqui que vira pra pegar a via expressa. A voz de Eli interrompeu seus
pensamentos.

- Oh, obrigada.

- Seus pais virão para a cerimônia de formatura amanhã? Eli perguntou.

Katie se perguntou de onde ele tinha vindo com essa pergunta.

- Eu não sei. Provavelmente não. Ela imaginou se ele estava triste que seus pais
não pudessem vir e acrescentou, Eu tenho certeza que sua mãe e seu pai estariam aqui
se pudessem.

- Estariam mesmo. Meus pais se conheceram aqui, na Rancho Corona.

- Sério?

- Meu pai era colega de quarto do meu tio. Irmão da minha mãe. Ele os
apresentou e eles se casaram seis meses depois.

- Uau! Foi rápido.

- Eles disseram que apenas sabiam, então porque adiar o inevitável?

- Eles já tinham se formado na faculdade?


- Não, eles ainda estavam estudando. Eles trabalharam no campus, frequentaram
a escola de verão, viveram de arroz e feijão. É uma daquelas histórias que se expande
e se embeleza a cada vez que é contada. Eu acho que uma das versões inclui eles
caminhando na neve descalços pra chegar à aula.

Katie riu. Ela estava grata que a conversa entre eles estivesse em um assunto mais
leve do que estivera na subida da montanha.

- E quanto aos seus pais? Eli perguntou. Como eles se conheceram?

A risada dela se dissipou. Katie não queria responder a essa pergunta em


particular. Ela sabia a resposta, mas não era algo que se encaixasse nas respostas de
alunos típicos da Rancho Corona para essa pergunta. Ela também sabia que o que quer
que dissesse a Eli, ela se sentiria segura em confiar a isso ele. Isso era parte da história
dela. Sua confusa história de vida. Ela decidiu que poderia muito bem ter essa história.

- Meus pais se conheceram em um bar.

Sem uma insinuação de julgamento, Eli perguntou:

- Foi amor à primeira vista?

A pergunta dele a pegou desprevenida.

- Não, eu acho que não. Eu não sei. Meus pais são mais velhos. Eles estão na casa
dos sessenta agora. Eu acho que meu pai tem sessenta e oito. Pode ser sessenta e
nove. Em todo caso, eu fui um bebê surpresa, obviamente. Eu não posso dizer
exatamente que tive uma infância normal, o que quer que normal signifique.

- Faz você se sentir desconfortável conversar sobre isso?

Katie deu uma olhada para ele.

- Sim, um pouco.

- Isso é bom, Eli disse.

- Bom?

- Sim, bom. É bom conversar sobre coisas que te fazem sentir desconfortável.
Colocá-las pra fora te dá muita liberdade. Permite que você se movimente dentro de
sua vida e fique confortável.

- Ok, você pode parar agora. Você está começando a soar como um daqueles
grupos de terapia na TV.

- E se eu estiver? É verdade, Katie. Você não acreditaria no quanto me ajudou


conversar com você, Ted e Cris sobre o que aconteceu no Zaire. Até mesmo dizer em
voz alta que eu fui a um aconselhamento foi um grande passo para mim. Eu guardei
muita coisa por muito tempo. Aliás, você está com fome?

Katie seguiu a linha de visão dele e viu que ele estava olhando para uma placa de
um restaurante fast-food pela qual eles estavam passando.

- Sim. Na verdade, não. Quero dizer, eu estava pensando que poderia comer no
café quando nós chegarmos ao campus. Velhos tempos e tudo o mais.

Katie não tinha certeza do por que ela tinha dito a parte sobre “velhos tempos”.
Ela não sentia compulsão de comer na cantina nunca mais. Era mais uma resposta
preventiva. Se ela e Eli parassem em algum lugar para comer em um restaurante ou
mesmo em um drive-thru, ela não tinha certeza que seria capaz de manter um
bloqueio em suas emoções vulneráveis que estiveram bem confusas esta manhã.

- Nós deveríamos voltar para o campus.

Ela esperava que suas palavras saíssem firmes e convincentes. Contanto que ela
pudesse manter o momento de adoração ao nascer do sol separado de qualquer outro
nascer de sentimentos do fundo do coração, ela estaria bem.

- Ok. Bem, se você mudar de idéia sobre parar para o café da manhã, você vai me
dizer, não vai? Eli perguntou.

- Tudo bem.

Eles rodaram cerca de dois quilômetros antes de Eli dizer:

- E se você mudar de idéia sobre a outra coisa, você vai me dizer também, não vai?

- Que outra coisa? Ela podia senti-lo olhando para ela.

- Você sabe, ele disse. A outra coisa.

Eles estavam parados em um sinal vermelho. Katie olhou para ele, esperando que
sua expressão parecesse tão desentendida quanto ela estava tentando parecer.

O olhar de Eli estava nela. Ele colocou a mão no peito dela e disse uma única
palavra:

- Nós.

Katie sentiu a manada de búfalos em seu estômago.


Capítulo 22
Katie ignorou o comentário de Eli, assim como o seu gesto sincero.
Ela entrou na via expressa e ligou a música novamente. A parte mais difícil em ignorar
o rumo que o Eli queria que a conversa fosse era de que ela não sentia mais a
liberdade de conversar com ele. Suas conversas tinham sido tão boas antes.

Considere essa perda de conversa uma casualidade de sua nova campanha de vida
Katie. A campanha para manter todas as linhas sinuosas da sua vida agradáveis, em
linha reta e desembaraçadas. É melhor desse jeito. Você vai ver.

Eli tomou o seu silêncio assim como ele tinha tomado todas as curvas que ela
tinha direcionado a ele. Ele não estava irritado. Ele não a intimidou a continuar a
conversa e nem a pressionou para respondê-lo.

Eli parecia estar descansado, à vontade, por assim dizer. A sua falta de agressão
deu a Katie o espaço para se mexer sem ter que tocar no tópico sem-assunto
determinado. Ela achou que isso foi muito gracioso da parte do Eli, de deixar tópicos
adormecidos quietos.

Eles dirigiram durante muito tempo, com somente a música enchendo o espaço
entre eles com palavras.

Depois que Katie estacionou em uma vaga no estacionamento de Crown Hall, ela
desligou o motor e pegou a sua bolsa.

- Obrigada por me convidar para ir com você Eli. Foi maravilhoso. Realmente
maravilhoso.

- Foi mesmo. Você esta indo agora ao refeitório comer o café da manha?

- Não, acho que vou só voltar para cama.

Uma pausa tensa se seguiu. Nenhum dos dois se mexeu. A expressão de Eli deixou
bem claro que ele não estava mais completamente à vontade.

Ele achou que eu ia me abrir com ele quando a gente voltasse pro Campus?

Katie sentiu a tensão, mas não sabia o que fazer. Ela não via nenhuma utilidade
em abrir o seu coração para qualquer possibilidade com o Eli. Ela não iria procurar
dentro de si mesma por nenhum sentimento pelo Eli que pudesse estar dormente e
esperando por alguma fantasia de primavera que lhes daria a liberdade de florescer.

Não. Os sentimentos não correspondidos que Eli sentia por Katie teriam que
permanecer congelados e cobertos na fase onde ainda eram sementes. Ele logo iria
voltar para o Quênia, e Katie tinha certeza que ela iria parar no final da lista de coisas
que Eli teria que pensar. Se Eli fosse o homem que Katie achava que ele era, ele podia
suportar isso. Aparentemente ele era, pois ele disse tchau e foi embora sem pressionar
mais a Katie.

Ótimo. Isso foi ótimo. Tudo isso. Resolvido.

Katie voltou ao seu quarto, se arrastou de volta para cama e dormiu menos de
uma hora antes de duas mulheres do seu andar virem ao seu quarto agitadas. As duas
haviam perdido as chaves dos seus quartos. Katie se levantou, resolveu o problema e
depois comeu um pouco de cereal no seu quarto enquanto olhava para fora da janela.

Entre na marcha certa Weldon, você tem coisas a fazer hoje.

Katie passou o resto do dia andando em círculos. Ela tinha formulários estudantis
para preencher e precisava ir ao banco que ficava descendo a colina. Do lado do seu
banco havia uma drogaria com um cartaz na janela anunciando que eles estavam
dando vacinas para gripe de graça. Katie parou. O cartaz parecia que havia sido posto
lá em dezembro. Ela pensou por um momento quais outras imunizações eles teriam
disponíveis na farmácia que ficava dentro da drogaria. Ela sabia pelo breve momento
em que esteve na reunião com o time de evangelização que se ela quisesse ir para
África, ela teria que tomar algumas vacinas. E pílulas para Malária. Se ela pudesse
tomar essas vacinas agora ela poderia ir para África quando quisesse. E ela teria as
pílulas contra Malaria também. Parecia lógico. Esteja preparado para futuras
aventuras. Risque algumas coisas da sua lista.

Katie terminou o que tinha para fazer no banco e entrou na drogaria. Antes que
ela tivesse tempo de mudar de idéia ela foi até a farmácia e fez um monte de
perguntas.

Vinte e cinco minutos depois ela saiu da drogaria com um band-aid no seu braço
esquerdo e uma receita para pílulas contra Malária na mão.

Ela voltou correndo para a faculdade para o ensaio da formatura ás quatro. Eli
acenou para ela durante o ensaio e ela acenou de volta.

Que bom. Sem ressentimentos.

Ela notou que quando levantou o braço este estava dolorido.

Mais tarde Katie foi até a cidade com três mulheres do seu andar que haviam
planejado um jantar especial para as quatro, elas falaram que queriam fazer alguma
coisa especial com Katie para comemorar a sua formatura. Elas riam de algumas
experiências que tiveram juntas. Vicki brincou com Katie lembrando da vez que Katie
tinha colocado os sapatos de Vicki no forno para fazer uma brincadeira e eles
derreteram.
O que deixou Katie surpresa foi que as três mulheres disseram que ela as havia
encorajado, motivado e inspirado nesse ultimo ano. Katie nunca haveria dado a si
mesma uma avaliação tão alta como A.R. Ela disse às mulheres que se sentia como se
estivesse correndo o ano todo e nunca conseguia terminar o que ela começava.

- Falando em terminar as coisas, Vicki disse. Nós ficamos sabendo que você
terminou seu namoro com o Rick.

Katie fez que sim com a cabeça. Ela não queria adicionar nenhum detalhe, pois
não queria começar uma conversa sobre isso.

- Deve ter sido muito difícil, Emily disse.

- E foi. Mas a decisão foi certa. Foi verdadeira. Veio do meu coração. Então! Katie
deu um suspiro. Próximo assunto. Me contem o que vão fazer nas férias.

O jantar terminou sem Katie ter que dar mais detalhes sobre sua vida amorosa
ajustada. De algum jeito Katie acreditava que entendia melhor o porque de Julia ter
guardado os detalhes do seu noivado em segredo por tanto tempo. Não existe nada
como uma comunidade de alunos que moram bem perto um do outro para que se
espalhem pedaços de historias de amor por todo lado.

Quando Katie voltou ao campus ela foi até onde Julia morava para a festa de
formatura para todos os AR’s e DR’s do Crown Hall. Katie chegou atrasada, mas isso
não parecia importante. Todos pareciam cansados, amadurecidos e não preparados
para celebrar essa conquista da formatura ainda.

Depois de uma hora e meia, as conversas baixas e a proximidade de todos naquele


pequeno espaço começou a irritar Katie. Ela foi embora quando a festa ainda não tinha
acabado, dizendo que tinha que lavar roupa, o que era verdade.

Surpreendentemente ela se controlou antes de anunciar a todos na festa que


gostaria de ter calcinhas limpas para usar no dia da formatura. Ao invés disso, ela saiu
com a boca fechada.

Nota a mim mesma: Parabéns por finalmente ter demonstrado um pouco de


cautela.

Andando a passos largos no corredor até o seu quarto Katie pensou:

Então onde estava você, Miss cautela e Miss moderação no comecinho desse ano?
Vocês decidiram aparecer um pouco tarde na minha vida universitária, não acham? Por
acaso vocês são um presente de formatura para mim? Sintam-se a vontade para ficar,
tudo bem?
Depois de colocar suas roupas na maquina de lavar Katie voltou ao seu quarto e
passou as fotos daquela manhã para o seu computador. Ela tinha prometido a sua
amiga Selena um e-mail longo antes do dia da formatura, e aqui estava Katie, quase
perdendo o prazo para fazer algo que ela havia planejado, como sempre.

Selena e Katie se conheceram na Inglaterra vários anos atrás, quando as duas


eram voluntárias em um grupo de evangelização. Era com essa mesma organização
que Ted e Eli trabalharam quando estavam na Espanha.

Depois de um ano na Rancho, Selena foi para o Brasil no verão passado e não
voltou. De acordo com o seu último e-mail, Selena disse a Katie que ela não pretendia
voltar para os Estados Unidos tão cedo.

Originalmente ela pretendia fazer algumas aulas e fazer alguns trabalhos de


evangelização, quando a Selena se instalou com a família que a estava recebendo e
com a igreja de lá, ela começou a trabalhar ajudando uma professora de inglês que
ensinava adolescentes de uma escola particular.

Selena amava o que estava fazendo, e de acordo com os seus e-mails animados,
ela tinha aprendido a se comunicar em português, a língua dos estudantes brasileiros.
Ela não era fluente, mas conseguia se virar. Selecionando três das melhores fotos do
por do sol, Katie anexou elas ao e-mail curto, mas com algumas novidades que estava
mandando para Selena.

Katie tinha muito a contar para ela, começando com o termino do seu namoro
com o Rick, o dia que tomou conta do adorável bebe Daniel e também sobre seu carro
novo. Ela deixou de fora qualquer menção ao Eli. Ela sabia que quando fosse escrever
um e-mail para Selena de novo o Eli seria somente uma linda memória.

Com o apertar de o botão enviar, Katie olhou no seu relógio: 1:15.

Por mais que ela quisesse entrar em uma de suas paginas de relacionamento e
checar a vida de vários de seus amigos, que estavam tanto perto e longe, ela desligou
o laptop e depois desligou a luz. Seus pensamentos estavam em todo lugar, e ela sabia
que precisava dormir mais do que precisava do que qualquer tipo de socialização,
fosse real ou virtual.

Na manhã seguinte ela sentiu como se tivesse recuperado a consciência.


Cris ligou logo após Katie ter voltado ao seu quarto depois de ter tomado um banho.

- Bom dia para a minha formanda preferida! Eu queria ser a primeira pessoa a te
desejar os parabéns!

- Obrigada Cris. Vocês vão vir para a cerimônia não vão? Vai ser no ginásio.
- Sim. Nós estaremos lá. Bob e Marta também vão. Eu liguei para Trícia ontem a
noite, e ela disse que ela e o Douglas vão tentar ir. Eles não tem certeza se Daniel
consegue ficar quieto durante toda a cerimônia, então talvez eles só irão pra festa na
casa dos Doyle depois. Vai ser muito divertido, estarmos todos juntos de novo.

- Eu sei. Mal posso esperar. Eu tenho que secar meu cabelo agora. A gente se vê
daqui a pouco.

Algumas semanas atrás. Katie e Nicole tinham arranjado um tempo para fazer
algumas compras durante umas duas horas. Katie achou o vestido preto perfeito para
usar no casamento de Julia e decidiu que iria usá-lo também como seu vestido de
formatura.

Nicole a convenceu a comprar também um sapato preto quando disse: “Você não
vai poder pegar os meus sapatos pretos emprestados porque nesse dia eu vou usá-
los.”

Com seu cabelo seco, seu vestido e sapatos novos e usando maquiagem o
suficiente para se sentir bonita, Katie tentava decidir se deveria adicionar alguma
bijuteria. Foi aí que ela se lembrou do broche caro que Rick havia lhe dado. Ela
precisava devolvê-lo.

Colocando a caixa dentro da sua bolsa, Katie pensou que ela poderia achar um
momento apropriado na casa dos pais do Rick hoje á tarde para devolver o broche. Ela
não queria chamar nenhuma atenção, então ela sabia que teria que ser sensível
quanto ao momento que ela faria isso.

Katie tirou sua beca e seu chapéu de formatura do armário. Deixando o seu quarto
animada, ela seguiu a trote para o quarto de Nicole, e bateu na porta.

- Tragam as formandas, Ela gritou.

Nicole abriu a porta, ela tinha um olhar confuso.

Katie conhecia aquele olhar indeciso. Ela imediatamente disse a mesma coisa que
já havia dito a Nicole em outras ocasiões.

- Você está maravilhosa. Nem pense em trocar de roupa. Vem, vamos indo.

- Você tem certeza? Eu estava usando essa saia mais cedo, com essa blusa, e...

- Não. O vestido que você esta usando e perfeito, vamos lá. Katie pegou a beca e o
chapéu de formatura de Nicole.

- Mas eu estava pensando...


- Ahá! Esse é o seu problema, bem aí. Não pense. Vai com a sua intuição. Olha pra
si mesma no espelho. Dá uma viradinha, viu? Você não esta maravilhosa? Vamos lá,
diga.

- Eu até gosto desse vestido, e do jeito que ele me cai aqui. Mas...

- Viu? Você gosta! Essa é a sua resposta final. Fique com ela. Vamos lá, Além do
mais, você vai estar usando um roupão genérico por cima do seu vestido durante a
primeira parte do dia.

- Eu sei, mas na festa nos não estaremos usando as nossas becas.

- Nós podíamos, se quiséssemos. Nós podíamos começar uma nova tradição.

- Tá bom! Eu vou usar esse.

- Essa é a Nicole que eu estava esperando. Vamos lá, pega a sua bolsa, está bem
ali. Você precisa de mais alguma coisa?

- Ah, eu quase me esqueci Nicole foi pegar uma sacola de presente. A sacola de
listras tinha um papel de bolinhas nas cores amarelo e rosa saindo de dentro dela.

- Para mim? Ah, você não deveria ter me comprado nada.

- Não. Me desculpe. É para a mãe do Rick. Um presentinho de agradecimento.

Katie não tinha nem pensado em comprar um presente para a mãe do Rick. E ela
sabia que deveria, porque no passado a sua etiqueta social previa que ela deveria levar
um presente de agradecimento para os pais de Rick sempre que ia para a casa deles
em alguma situação especial. Nicole celebrou o ultimo dia de ação de graças com eles
e levou para a mãe de Rick um pote de flores perfeitas enquanto Katie levou uma caixa
muito grande e bem cara de chocolates feitos a mão que a mãe de Rick nem abriu,
pois ela estava tentando manter o peso.

- E a propósito, Nicole disse, Eu assinei o cartão com nossos dois nomes.

- Você assinou? Obrigada Nicole, você me salvou mais uma vez. Você é
maravilhosa.

As duas começaram a andar pelo corredor.

- Então, o que nós compramos para ela?

- Sais de banho.

Katie riu.

- Não, é sério. O que você comprou para ela?


- É um tipo especial de sais de banho e cremes. A marca que ela gosta é difícil de
achar. Eu acho que é porque os sais de banho vêm do mar morto.

Katie, que nunca usou sais de banho na vida, sabe que ela nunca teria a idéia para
comprar tal presente. Quem poderia saber que sal vindo do mar morto, de todos os
lugares que ele poderia vir, viraria um presente tão atencioso?

Katie pensou em como Nicole se encaixava tão bem com a família do Rick. Que
pena que o Rick ainda não havia chegado nessa conclusão. Ela pensou sobre sua
decisão anterior de não empurrá-lo para cima da Nicole. Ela já tinha terminado o
namoro com ele a mais de sete semanas. Rick e Nicole já estiveram juntos em varias
situações, mas o denso Doyle não havia ainda demonstrado nenhum interesse nela.

Katie decidiu que quando fosse falar a sós com o Rick, para devolvê-lo o broche,
que ela acharia um jeito sutil de descobrir o que estava acontecendo. Não que sutileza
fosse um de seus pontos fortes.

De repente um pensamento veio a sua cabeça. Talvez Rick não tenha ido atrás da
Nicole porque estava interessado em outra pessoa. Alguém que ele havia contratado
para o novo café, talvez. Se esse fosse o caso, Katie gostaria de saber.

Ao chegarem ao enxame de formandos que se aglomeraram na porta lateral do


ginásio, Katie e Nicole pararam de andar. Todos os formandos que estavam ali já
estavam usando sua beca e chapéu.

- Katie, eu achei que a gente deveria trazer nossas becas, e não usá-las.

- Eu também achei. Nós podemos coloca-lás aqui mesmo e jogar os cabides e as


sacolas nos arbustos ou algo assim.

- Nós não podemos deixar nossas bolsas nos arbustos. Eu não sei o que estava
pensando trazendo minha bolsa e esse presente. Precisamos voltar ao dormitório.
Rápido!

- Se a gente for vamos estar atrasadas, Katie disse.

- Não se a gente for rápido. Vamos!

As duas amigas saíram em direção a Crown Hall em um passo admiravelmente


rápido. Considerando que elas estavam usando sapatos não muito confortáveis. Elas
tinham acabado de passar da cafeteria quando viram outro formando, vestido com sua
beca e chapéu, vindo na sua direção, dirigindo um carrinho de golf branco de
segurança.

- Eli! Katie acenou com os braços para cima. Pare! Nós precisamos de uma carona!
Ele parou, com um ar bem heróico em sua beca flutuante e com a sua borla29 azul
escura indo de um lado para o outro. Seu cabelo castanho enrolado estava saltitando
por debaixo do chapéu inclinado. Seu sorriso estava muito fofo.

- Eu sempre soube que algum dia desses você iria apreciar a minha forma de
transporte pelo campus.

- Pode esquecer Lorenzo. Essa não é a hora de se glorificar, no máximo de


agradecer por ter convencido duas meninas bonitas a andar com você no seu
conversível. Agora pisa fundo nesse carrinho e nos leve para Crown Hall o mais rápido
que conseguir!

Imediatamente se tornou evidente para os três que aquele carrinho não estava
acostumado a carregar tantos passageiros, especialmente quando estava subindo um
morro. Eles estavam andando ao som de um aranhado ensurdecedor.

- Serio mesmo Eli, essa e a velocidade mais rápida que o seu carro de palhaço
consegue ir?

- Sério mesmo Katie, essa é a melhor queixa que você pode pensar?

- Ah não, eu tenho muitas queixas. Qual você quer ouvir primeiro? Como os meus
sapatos novos já me deram uma bolha no calcanhar? Ou você quer ouvir a queixa
sobre o meu braço esquerdo? Está doendo tanto que eu mal consigo levantar.

- Porque o seu braço está doendo? Nicole perguntou.

- Eu tomei algumas vacinas ontem.

- Pra que?

- Febre amarela, Tifóide. Ah, e Tétano porque a última vez que tomei vacina de
Tétano foi à dez anos atrás.

- Porque qual motivo no mundo você tomaria tantas imunizações? Nicole


perguntou. E porque você as tomaria um dia antes da formatura?

Katie encolheu os ombros.

- Parecia uma boa idéia na hora.

Eli virou para Katie com um sorriso largo. Ele parecia a criança mais feliz do
planeta. Ela sabia que ele sabia o que a combinação de imunizações queria dizer. Ela
desejou que tivesse ficado de boca calada. Mas agora era tarde demais. Eli sabia.

29
Aquela cordinha que cai do chapéu de formando.
Vamos lá Miss prudência! Onde está você quando eu preciso? Tente me
acompanhar, tá bom?

Naquela hora eles já estavam na frente de Crown Hall, Nicole e Katie pularam do
carrinho e correram para o quarto de Nicole.

- Katie, eu não acredito que você tomou todas essas vacinas de uma vez só! Não é
a toa que o seu braço está doendo. Porque qual razão no mundo todo você faria isso?

- Eu queria estar preparada. O cara da drogaria disse que elas iam durar cinco
anos. Menos a de Tétano, essa dura dez anos.

- Você tomou as vacinas numa drogaria? E não no médico?

- O cartaz dizia que eles eram especialistas em imunizações para viagem. O cara
que aplicou a vacina disse que elas seriam muito mais baratas lá do que se eu tomasse
em uma clinica ou um consultório. Ele disse que aplicava vacinas o tempo todo.
Especialmente em pessoas mais velhas que fazem cruzeiros em lugares rudimentares
ao redor do mundo.

- Porque alguém faria um cruzeiro para um lugar rudimentar? Nicole descartou a


própria pergunta e disse, Katie, eu não acredito que você colocou tantas doenças no
seu corpo ao mesmo tempo. Será que o seu sistema imune agüenta?

Elas tinham colocados suas becas e os chapéus e estavam dividindo o espelho de


corpo inteiro de Nicole, tentando equilibrar seus chapeis na cabeça.

- Parece que vou descobrir.

- Então você vai fazer um cruzeiro?

- Não, eu só achei que devia atualizar todas as minhas imunizações pro caso de eu
querer ir a alguma viagem missionária de ultima hora, para algum lugar como Malásia
ou Índia.

Nicole olhou para ela e disse:

- Ou África.

- Claro, África é uma possibilidade. Eles têm mosquito lá, sabia?

- E febre amarela. Nicole fitou Katie, até que ela não podia fazer mais nada além
de olhar pra ela. A pele perfeita de Nicole deixava fácil a leitura de sua expressão. E a
que ela estava fazendo agora era a de: ‘Já-que-a-sua-mãe-nunca-te-disse-isso-então-
sou-eu-que-vou-ter-que-dizer-agora’, preste atenção.
- Não o torture Katie. Os sentimentos de Eli por você são tão óbvios, você tem que
saber que ele já está muito triste por sua causa. Por Favor. Sua voz se elevou
suavemente. Eu conheço algumas coisas sobre sentimento de amor não
correspondido. Então por favor, não de nenhuma esperança a ele a não ser que você
queira.

Katie sentiu o peso do tapa de luva de Nicole. Se elas tivessem mais tempo, Katie
teria deixado uma lágrima cair de dentro da fortaleza que ela construíra ao redor do
coração.

Mas elas não tinham tempo. E Nicole também sabia disso.

- Promete. Nicole disse em tom firme. Me promete que não vai bagunçar com os
sentimentos do Eli.

Katie acenou com a cabeça.

- Eu prometo.

- Ótimo, agora abaixa a cabeça. Nicole pegou o chapéu de Katie. Você precisa por
mais para baixo ai na frente. Assim. Não, aqui, deixa que eu faço. Me dá alguns desses
grampos de cabelo. Assim! Você está pronta? Vamos lá!

Elas correram pelo corredor, passaram pela entrada, cada uma com sua beca
esvoaçante e uma mão no alto da cabeça. Katie não pode deixar de notar o quão
adequado era que ela estava correndo pra chegar a tempo a sua formatura. Isso
resumia seu último ano inteiro.

Eli estava esperando no carrinho.

- Nós vamos conseguir mais velocidade quando descermos o morro. Então


segurem os seus chapeis.

Katie não colocou uma mão no seu chapéu do mesmo jeito que Nicole fez. O
carrinho começou a correr, mas nada muito impressionante. Os grampos fizeram o seu
trabalho, se não tivessem, Katie teria que ter saído correndo atrás do chapéu,
enquanto o carrinho descia o morro em direção ao ginásio.

Eli estacionou em uma das vagas para seguranças do campus, na parte de trás do
ginásio. Os três correram para os seus lugares na fila enquanto todos os outros
estudantes já estavam em ordem alfabética.

- Chegou bem na hora. Um dos organizadores disse a Katie quando ela entrou no
final com as outras W, seguidas de um Y e dois Z. Os estudantes já estavam entrando
no ginásio. Nicole estava no lugar certo, no meio das S, mas Katie não podia ver se Eli
tinha conseguido entrar junto com os L.
Ela sentiu uma onda de ansiedade. Ou talvez fosse a adrenalina dos últimos 15
minutos. O que quer que fosse, Katie se sentiu como se estivesse sufocando embaixo
daquele longo Robe.

O ar quente dentro do ginásio e todos os seus sentimentos guardados a fizeram se


sentir fraca. Ela nunca havia sido uma pessoa de desmaiar fácil, mas naquele momento
ela gostaria de ter um leque ou uma garrafa de água.

As cadeiras para os formandos se alinhavam o meio do ginásio, enquanto os


convidados não paravam de tirar suas fotos nas extremidades e nas arquibancadas. O
lugar estava cheio. Katie olhou em volta e sabia que seria impossível de encontrar
qualquer um de seus amigos. Ela só estava feliz de estar no seu lugar, sentando na sua
cadeira marcada quando o Reitor da Rancho Corona começou a cerimônia com um
“Bem vindos” e uma oração.

Depois disso todos se sentaram. A melhor parte foi que como o sobrenome de
Katie começava com W, ela poderia sentar-se por muito tempo até a hora de levantar
de novo.

O coro cantava maravilhosamente. Um homem baixinho usando uma beca longa


deu um discurso e terminou falando para os formandos que eles poderiam terminar
tudo que eles fizerem de coração, pela graça de Deus.

Um aluno que formou ano passado começou a tocar piano, enquanto uma
formanda desse ano cantava um solo. Os aplausos foram revigorantes.

Katie continuava olhando ao ser redor. Ela não conseguia ver onde Eli estava
sentado, mas ela tinha decidido consigo mesma durante a descida até o ginásio que
ela manteria sua distancia para com ele, tanto física quanto emocionalmente. Tudo
que Nicole tinha dito estava certo. Não era justo da parte de Katie de dizer ou fazer
qualquer coisa que pudesse aumentar as esperanças de Eli.

Sua exploração mudou para a arquibancada. Ela queria achar a Cris e o Ted, ou
talvez o Tio Bob. Mas até agora ela não os havia achado no meio da grande massa de
gente.

O presidente da universidade tomou seu lugar no pódio para dar suas palavras
finais antes que os estudantes se levantassem fila por fila e fossem ao palco receber
seu diploma.

Katie desistiu de procurar seus amigos e voltou sua atenção para o palco.

A primeira fileira de formandos se levantou e deixou suas cadeiras vazias.


Katie os viu andando em direção ao palco e teve uma sensação de satisfação
crescendo dentro dela. Em alguns momentos ela estaria lá em cima também,
recebendo seu diploma. Ela tinha conseguido!

Agora que alguns estudantes tinham saído, Katie podia ver o grupo de pais atentos
que estavam no nível inferior da arquibancada, nas primeiras fileiras. Ela sabia que
essas pessoas tinham que ter chegado pelo menos duas horas antes da cerimônia para
pegar esses lugares, pois eles eram reservados para convidados. Essas pessoas eram
ou os pais mais pacientes do mundo, ou os que sentiam mais orgulho dos filhos. Talvez
essas famílias fossem uma combinação dos dois.

De repente Katie parou de sorrir. Ela piscou e se inclinou para frente o máximo
que conseguia para poder ver melhor. Ela não tinha dúvida. Sentados nos primeiros
lugares da primeira fileira estavam as duas ultimas pessoas que ela esperava ver. Seu
pai e sua mãe.
Capítulo 23
Katie estava confusa. Ela tinha confiado em seus sentimentos... bem, grande parte
da sua vida. Algum tempo atrás ela tinha dito a si mesma, Se você não se importa, você
não se machuca. O que talvez tenha sido a maior lição que sua mãe lhe ensinou sem
nunca ter dito uma palavra.

Mesmo assim, ali estava Vivian Weldon, quebrando todas as suas próprias regras,
sentada na fileira da frente com o pai de Katie, demonstrando à sua única filha todo o
orgulho e cuidado jamais expressados.

Katie deixou algumas lágrimas correrem. Ela não se importou com quem a via.
Deixou que pensassem que ela estava feliz por estar se formando. Ela assistiu seus
colegas andando pelo palco. Ela aplaudiu e continuou enxugando suas lágrimas na
manga da sua beca. Quando chegou nos “Ls”, Katie assistiu Eli dar passos fortes e
confiantes para receber seu diploma. Ela sorriu, chorou, aplaudiu e riu um pouco
quando ela ouviu o amigo ganês de Eli, Joseph, de algum lugar nas arquibancadas dar
um grito selvagem.

Todo o tempo, Katie pensava em como seus pais estavam esperando que ela
caminhasse pelo palco. Isso, a presença deles, devia ser o melhor presente que seus
pais já tinham lhe dado.

Katie bateu palmas quando o nome “Nicole Sanders” foi chamado. Ela não foi a
única, Nicole pareceu receber mais aplausos que qualquer outro estudante até aquele
momento. Na confusão, Katie pensou ter ouvido um dos agudos assobios de Rick. Isso
a fez sorrir sutilmente porque ela sabia que podia assobiar melhor do que Rick e tinha,
várias vezes, tentado ensiná-lo a melhorar suas habilidades.

A fileira à frente de Katie ficou de pé. O rapaz que tinha se sentado exatamente na
frente dela olhou pra ela antes de ir. Ela o conhecia dos jogos educacionais de softball
que ela tinha se envolvido no seu primeiro ano na Rancho. Ele abriu um sorriso quando
olhou pra ela.

- Essa foi boa, Weldon.

Katie não tinha idéia do que ele estava falando. E ela nem teve tempo de soltar
alguma piada sobre seus dias de softball. Quando sua fila estava de pé. Katie se
compôs. Ela checou se o chapéu dela estava no lugar onde Nicole havia arrumado pra
ela. Sua beca estava fechada até em cima. Suas lágrimas tinham parado. Ela podia
sentir a umidade da manga que tinha funcionado como lenço, mas ela não se
importava. Tudo que ela tinha que fazer era caminhar pelo corredor, subir os degraus
sem tropeçar, acenar com a mão direita, receber o diploma com a mão esquerda, e
descer os degraus do outro lado do palco.
Esse era o momento dela. Cada passo significava sucesso. Ela negou a si mesma o
prazer de olhar para seus pais quando ela chegou ao fim da fila. Suas emoções
estavam no máximo, e ela não queria fazer qualquer coisa que a fizesse explodir em
lágrimas.

Olhando para frente, Katie subiu as escadas com seus sapatos novos. Ela se sentiu
como num cortejo de princesa, flutuando pelo palco para o pódio. Ela esperou um,
dois, três segundos. Então, na hora certa, seu nome foi chamado.

Katie estendeu sua mão direita, acenou para o presidente da Universidade Rancho
Corona, recebeu seu diploma com a esquerda, e de repente estava consciente dos
aplausos por duas razões. A primeira era porque seu cérebro ligado no som de palmas,
com alguns assobios e um grito ganês. A segunda razão era por causa das expressões
atordoadas e quase de desaprovação nas faces do presidente e do professor que
entregou seu diploma.

No começo da cerimônia, um pedido foi feito de que todos os aplausos


esperassem até o fim, mas, depois dos primeiros dois ou três estudantes, alguém
acabou descumprindo a regra e, depois disso, todo mundo aplaudia o seu formando
favorito. Isso era uma tradição.

Katie não sabia dizer, já que seu coração estava batendo nas suas orelhas, mas
talvez ela tenha recebido mais aplausos que os outros estudantes, e, portanto, seus
amigos e familiares tinham sido super zelosos na violação do pedido de não aplaudir.

Ela não sabia por que via claras expressões de desaprovação, mas naquele
momento, isso não importava. Ela tinha seu diploma na mão! Elevando-o bem alto e
dando um aceno, ela se virou para o auditório e soltou um modesto, mas significativo,
“Woo hoo!”

Várias pessoas riram e algumas apontaram. Isso foi embaraçoso porque um casal
tinha saído do palco com a sua própria versão controlada de uma dança alegre, então
Katie sabia que não tinha exagerado com sua expressão de celebração. Deixe que
professores olhem para ela com desdém. Deixe o auditório rir e apontar. Ela não se
importava. Ela agora estava graduada!

Voltando pelo corredor, Katie sentiu como se os olhos de todos os graduandos


estivessem nela. Ela sorriu e acenou com seu diploma para Nicole quando ela fez
contato visual com Katie.

Nicole olhou aturdida. Ela apontou para sua bochecha e então ansiosamente
apontou para Katie. Katie tocou sua bochecha. Não tinha nada preso na sua face. O
que Nicole estava tentando dizer?
No momento que Katie estava de volta ao seu assento, os alunos restantes tinham
ido para a fila e o reitor tinha voltado para o pódio. Ele disse para todos os graduandos
se levantarem. Num momento solene, todos os graduandos colocaram em prática o
que tinham ensaiado no dia anterior. Eles colocaram a borla de seus chapéus do outro
lado, recitaram em uníssono o Salmo 23 que tinha sido selecionado por eles no
começo do ano durante a capela sênior. Katie se levantou e, de cabeça erguida, recitou
audaciosamente junto com sua classe:

- “O Senhor é meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-
me mansamente às águas tranqüilas. Refrigera minha alma.”

O som de muitas vozes recitando com eles o restante do capítulo foi poderoso no
eco do ginásio. Essa era a tradição preferida de Katie das cerimônias de graduação da
Rancho Corona. Agora ela, uma formanda, estava participando da bênção do
encerramento das aulas.

Quando os graduandos chegaram as linhas finais de “Certamente que a bondade e


a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida.” Katie rapidamente puxou os
grampos do chapéu. Logo que as palavras finais “E habitarei na casa do Senhor por
longos dias” foram proferidas, os graduandos foram apresentados ao auditório. Então
todos os chapéus foram atirados para o ar.

Eclodiu uma feliz agitação de cadeiras quando os convidados foram alertados para
sair para encontrar os graduandos no gramado e não no ginásio. Katie assistiu seu
chapéu ser arremessado e descer. Ela o pegou e olhou ao redor.

- Muito bem, Katie, um dos seus amigos disse.

Outro bateu nas costas dela.

- Eu sabia que se alguém poderia fazer uma brincadeira, essa pessoa seria você.

O rapaz perto dela disse:

- Sutil, mas ponto marcado. Vai jogar como lançadora ou armadora?

Katie não tinha idéia do que qualquer um deles estava falando.

Nesse momento então ela sentiu alguém agarrar seu braço. Era Nicole.

- Ei, parabéns! Katie foi dar um abraço nela, mas Nicole quase derrubou uma
cadeira puxando Katie pra longe de seu assento.

- Katie, seu rosto! Vem comigo. Agora. Não olhe pra ninguém. Apenas continue
andando.

- O que foi?
- Eu vou te mostrar em um minuto.

Nicole se apertou pela multidão e se dirigiu para os banheiros da sala de ginástica


ao lado do ginásio, ao invés de ir aos banheiros da frente que, provavelmente,
estariam cheios. Nicole praticamente empurrou Katie pra dentro do banheiro e
apontou para o espelho.

Katie olhou e ficou de boquiaberta. Sobre as duas bochechas haviam marcas


pretas que se assemelhavam a “pintura de guerra” preta que os jogadores de futebol
americano usam. Não era nada sutil. Era preto e grande.

- O que aconteceu? Katie pegou um papel toalha.

Nicole abriu a torneira de água morna e molhou o papel toalha.

- Olhe! Nicole apontou o redemoinho preto na pia. A manga da beca de Nicole


tinha se juntado ao fluxo de água da torneira quando ela molhou o papel toalha. Assim
que ela espremeu a manga para torcê-la, o corante da beca criou um redemoinho
preto na pia.

- Eu estava chorando, Katie disse, segurando sua manga. Eu usei minha manga
como lenço.

- Você deve ter chorado muito.

- Eu chorei. Nicole, meus pais estão aqui.

- Os meus também. Vamos lá, tente se apressar. Nicole então pareceu entender o
que Katie tinha dito. Espere. Seus pais estão aqui? Katie! Uau.

- Eu sei. Me ajude a limpar isso. Eu não posso acreditar. Agora eu sei por que eu
estava recebendo aqueles olhares. Eu não posso imaginar o que o presidente e o reitor
pensaram de mim. Ai, meu Deus!

Nicole ajudou-a a se limpar. Mesmo com sabonete líquido e água quente, nem
toda a mancha saiu. Mas finalmente saiu o suficiente para parecer uma sombra e não
uma tarja em negrito.

- Quando nós voltarmos para o meu quarto para pegar nossas bolsas e o presente,
eu tenho um pó mineral que cobrirá tudo. Mas por agora, nós realmente precisamos
sair para o gramado e tirar algumas fotos antes que todo mundo vá embora.

Elas foram apressadas pelo caminho de volta e a primeira pessoa que Katie viu foi
Eli. Ele estava em pé junto com Joseph , Shiloh e sua pequena filha, Hope. Katie acenou
para Joseph e Shiloh e eles acenaram de volta. Logo que Eli viu Katie, ele atravessou o
gramado até ela e envolveu os seus braços ao redor dela, e deu-lhe um abraço
apertado. Eli nunca tinha lhe dado um abraço como aquele, e tudo que ela conseguiu
pensou, Uau, esse cara sabe abraçar!

Ele também estava cheiroso.

Em seu ouvido ele disse:

- Parabéns, Katie girl.

- Obrigada. Ela disse afastando-se para trás, sentindo que seu rosto estava
vermelho por vários motivos.

- Parabéns pra você também.

- Obrigado.

Olhando por cima da cabeça dele, ela disse:

- Meus pais estão aqui em algum lugar.

- Eles estão? Katie isso é incrível! Onde eles estão?

- Eu não sei. Eu tenho que encontrá-los.

- Eu vou com você.

- Não, eu estou bem. Você tem pessoas aqui pra você. Katie virou e viu que Joseph
e Shiloh moveram-se no meio da multidão. Foi quando ele percebeu que Eli não tinha
mais ninguém ali pra ele.

- Na realidade, Eli, porque você não vem comigo? Talvez meus pais tenham
achado o Rick, ou o Ted e a Cris.

Nicole tinha desaparecido na multidão. Eram apenas Eli e Katie andando no mar
de pessoas. Eles se separaram enquanto tentavam deixar para trás um grande grupo
que se organizava para fotos de família com as meninas gêmeas que tinham se
formado. Katie instintivamente estendeu a mão por trás dela e apontou para Eli ficar
um pouco mais perto.

Eli pegou a sua mãe e segurou-a. Ele sentiu a mão dele mais áspera e forte do que
teria imaginado. Naquele momento, a manada de búfalos apareceu e debandou pelo
intestino dela. Katie teria soltado a mão de Eli, mas ela estava paralisada. Ou talvez
isso estivesse mais pra hipnotizada. Ela não podia soltar. Na verdade, ela podia, mas
não queria.

Eli foi quem soltou a mão, logo que passaram do engarrafamento humano para
um bom lugar onde podiam avistar a área aberta.
- Olha o Ted. Eli apontou para a esquerda.

Katie viu Tio Bob e Tia Marta de pé junto com Ted e Cris. Rick estava com eles
também, assim como Nicole e seus pais. Mas os pais dela não estavam em lugar
nenhum. Seu coração continuava acelerado.

- Espero que eles não tenham ido embora. Katie disse para si mesma que o
coração acelerado era devido ao nervosismo que ela sentia por ver seus pais. Ou talvez
fosse devido ao efeito das vacinas.

- Eles planejaram ir à festa? Talvez eles tenham ido pra casa dos Doyles.

- Eu duvido.

Katie mordeu seu lábio inferior e tentou pensar como seus pais. Essa multidão
seria demais para eles. Mesmo que tenha sido dado o anúncio para que todos se
reunissem no campo, Katie suspeitou que seus pais teriam ficado longe das multidões.

- Talvez eles continuem no ginásio.

Antes que Katie pudesse decidir se suas conclusões eram uma boa possibilidade,
Eli pegou-a pela mão novamente. Dessa vez ele estava conduzindo o caminho de volta
pra o ginásio com passos rápidos. Katie deixou-o guiá-la e mentalmente disse a si
mesma, Isso não significa nada. Nós apenas estamos tentando nos mover pela
multidão nessa caçada aos meus pais.

Eli levou Katie até a entrada frontal do ginásio e soltou a mão dela. Ela sentiu a
pressa de seu calor e apoio deixarem-na no momento em que ela viu sua mãe.

Vestida com o mesmo vestido floral que Katie a tinha visto vestida dez anos atrás,
Vivian Weldon estava junto da parece com as duas mãos em sua bolsa como se alguém
pudesse arrancá-la dela, aqui no campus dessa ótima universidade cristã.

Katie tentou formar a simples palavra Mãe, mas nada saiu. Emoções profundas
surgiram nela, fazendo com que os lábios se enrolassem em um vulnerável sorriso de
menina. Com dez passos deliberados para frente, ela ficou, vestida com sua beca de
graduação, com seu chapéu na mão e um pequeno sorriso congelado nos seus lábios,
na frente da sua mãe.

Sua mãe olhou para cima, assustada, quase como se não esperasse ver a filha
naquele momento.

- Você veio. Você veio para minha colação de grau.

Sua mãe não sabia o que fazer com cumprimento.

- Bem, você nos mandou o convite.


- Eu sei. Mas você não tinha que vir, e você veio. Obrigado.

- Nós não vamos para a festa. Sua mãe afirmou. Seu pai não está se sentindo
muito bem. Eu acho que é a vesícula. Ele está no banheiro. O banheiro das mulheres
estava com uma fila terrível. É sempre assim. Eu vi que você tirou a tinta do seu rosto.
O que você estava fazendo, tentando fazer uma piada?

O espírito de Katie esmoreceu e seu sorriso também.

- Não, eu estava chorando. Eu usei a manga do meu vestido, e a tinta saiu no meu
rosto. Eu não sabia que tinha tinta no meu rosto. De verdade.

- Bem, por que a cor ia sair? Eles reciclam as becas e as tingem novamente?

- Eu não sei. A beca não importa. O importante é que eu não estava tentando ser
divertida ou qualquer coisa. Foi um acidente.

- Você certamente tem uma coisa com acidentes, não é?

Katie tentou deixar de lado o velho golpe familiar. Ela respirou profundamente e
olhou por cima do ombro. Eli continuava de pé junto a porta do ginásio. Mas ele não
estava sozinho. Ele estava falando com Julia e o noivo dela, Dr. Ambrose.

- Mãe, venha comigo. Quero que você conheça alguns dos meus amigos.

- Eu disse a seu pai que iria esperar por ele aqui. Eu não vou me mexer.

- Okay, eu vou trazê-los aqui. Katie foi até Julia. Eu gostaria muito que vocês
fossem ali conhecer minha mãe.

Os três seguiram Katie para a parede em frente ao banheiro masculino onde sua
mãe estava, ainda segurando sua bolsa com as duas mãos.

- Esse é meu amigo Eli, minha DR, Julia, e... Katie tentou decidir o que ela deveria
dizer “Dr. Ambrose” ou “Noivo de Julia” quando ela foi apresentar o terceiro membro
do trio.

Eli jogou a decisão pra longe de Katie pegando as apresentações e dizendo:

- Esse é meu tio, John Ambrose.

- Seu tio? Katie olhou surpresa para Eli.

Eli confirmou com a cabeça.

Dr. Ambrose estava vestindo sua beca super elegante com chapéu de professor e
fitas de doutor. Ele apertou a mão da mãe de Katie.

- Você deve estar orgulhosa.


A mãe de Katie parecia afobada. Seu cabelo crespo tinha ficado cinza com os anos,
e ela o mantinha curto, mas bem cheinho. Sua face era longa, e seus óculos eram
redondos, o mesmo que ela tinha desde que Katie se lembrava.

Em resposta a pergunta do Dr. Ambrose, Vivian Weldon levantou o nariz no ar.

- Eu pensei que orgulho fosse um pecado pra vocês cristãos.

Então Katie soube que aos três tinha sido dado um vislumbre de sua vida. Antes
que Dr. Ambrose ou qualquer outro deles pudesse responder, o pai de Katie saiu do
banheiro usando uma bengala.

- Oi, pai, Katie o cumprimentou cautelosamente. É o joelho novamente?

- É o meu pé. Sua mãe não lhe disse? Tem alguma coisa errada com meu
calcanhar. Andar todo o caminho do estacionamento até aqui não me fez bem.

- Eu posso levar você de volta ao estacionamento. Eli disse. Eu trabalho com a


segurança do campus. Eu posso levar você no carrinho de golf.

- Eu estou pronto para ir agora, o pai de Katie disse. Onde está o carrinho?

- Eu vou trazê-lo aqui para frente.

- Obrigada, Eli, Katie disse quando ele se virou para ir.

Ele olhou para ela por cima do ombro e deu-lhe um sorriso. Katie gostaria que ela
tivesse uma foto só dele então, saindo pela porta, ainda com sua beca, cabelo meio
atrapalhado e a grande luz em seus olhos. Essa é uma foto que ela gostaria de tirar e
enviar para os pais dele com uma nota dizendo: “Vocês têm um filho maravilhoso. Eu
gostaria que vocês pudessem estar aqui para ver a colação de grau dele. Vocês
ficariam orgulhosos dele.”

Seja como for, Katie sabia que os pais de Eli ficariam orgulhosos. Eles não
atacariam de volta com declarações sobre orgulho ser pecado. Voltando-se para seus
pais, Katie lembrou-se de como Eli disse que perdoar as ofensas deles era um
processo. Katie sabia que ela tinha perdoado seus pais no verão passado. Julia estava
lá com ela. Mas este parecia mais um passo do processo. Sem reservas, Katie
expressou seu desapontamento e frustração sobre o comentário de sua mãe ao Dr.
Ambrose. Ela respirou e esperou que o ar fresco lhe desse uma sensação igualmente
fresca em seu espírito.

Katie olhou para sua descontente mãe e para seu pai, que estava obviamente bem
desconfortável e decidiu que este era um momento de um outro tipo de graduação
para ela. Chegando perto de sua mãe, Katie cuidadosamente envolveu-a em seus
braços e deu-lhe um beijinho na bochecha.
Dando um passo mais pra perto de seu pai, Katie abraçou seu pai mais forte. Ele
respondeu batendo nas costas dela, como se ela fosse um cachorro bem grande e
tivesse acabado de capturar um pato. Katie colocou aquela imagem para fora da sua
mente e disse nos ouvidos dele.

- Eu realmente gostei muito de você ter vindo, pai. Isso significa muito pra mim.

Seus pais pareceram ficar tocados pelas expressões de afeto dela, mas nenhum
deles parecia saber como reagir. Isso não era incomum. Katie, porém, sentiu que o
jeito que ela estava agindo agora era o mais próximo que ela estava de seu verdadeiro
eu desde que ela era muito jovem.

- Eu estou com minha câmera. Julia disse. Vocês três gostariam de tirar uma foto
juntos?

- Não perto do banheiro, a mãe de Katie falou.

- Que tal por aqui? Katie caminhou sete passos para uma grande parede branca.
Era um fundo meio sem graça, mas pelo menos sua mãe não podia se queixar. Com
algum esforço, seus pais vieram para onde Katie estava em pé. Ela se colocou entre
eles e colocou seu chapéu de volta.

- Tenha certeza que colocou a borla do lado certo. A mãe dela disse.

- Bem observado, mãe. Obrigada. Katie fez a mudança e Julia deu um grande
sorriso.

Julia tirou várias fotos e disse que gostaria de dar cópias a Katie, então ela poderia
enviar para seus pais. Julia e Dr. Ambrose saíram, deixando Katie e seus pais sozinhos
na entrada do ginásio. Katie sabia que Cris e os outros deveriam estar se perguntando
o que tinha acontecido com ela. Ela desejou estar com seu celular, assim poderia pelo
menos mandar uma mensagem de texto.

Isso não importava. Eli estava na porta com o carrinho de golf, e Katie podia vê-lo
vindo em sua direção, pronto para levar seus pais para o estacionamento. Com uma
oportunidade final na frente dela antes que a cortina se fechasse sobre esse momento.
Katie se lembrou como Eli tinha dito que o amor real vem do coração. É espontâneo,
orgânico. E não planejado. Ele também disse que era inconveniente.

Katie voltou-se para seus pais, e com uma profunda e repentina sinceridade
surgindo na sua voz, ela disse:

- Eu te amo mãe. Eu te amo, pai. Obrigada por terem vindo.

A mãe de Katie desviou o olhar. Mas antes disso, Katie estava certa que ela viu
alguma coisa que ela nunca tinha visto antes na face da sua mãe. Um sorriso pequeno,
como uma lua crescente, foi acentuada por uma lágrima de prata, que vinha para a
lua.

Se Katie nunca acreditou na beleza ou no poder do amor que nascia da graça, ela
acreditava agora.
Capítulo 24
- Você sabe que nós quase desistimos de você e fomos para a festa.

Tia Marta deixou claro que estava bem nervosa na hora que Katie se juntou ao
grupo no campo. Muitas famílias já haviam se dispersado, incluindo a de Nicole e a de
Rick. Douglas e Trícia ainda estavam lá, empurrando o pequeno Daniel um para o
outro.

- Ela chegou , disse Bob. Vá em frente e a presenteie com a lei. A câmera está
pronta. Vamos tirar algumas fotos em grupo.

Ted e Cris presentearam Katie com uma bela lei de orquídeas. Ela cheirou, mas
não tinha fragrância. Nos últimos anos, leis tinham se tornado um símbolo de honra
para muitos graduandos da Rancho. O site da escola tinha uma foto de um formando
do Havaí que estava sendo parabenizado pela sua família que tinha vindo das ilhas.
Muitas leis estavam empilhadas até o seu queixo. Depois que aquela foto foi colocada,
graduandos queriam partilhar do gosto do que era ser parabenizado com um círculo
fragrante e colorido de flores.

- É um milagre que esta não tenha murchado ou secado completamente. Marta


tinha uma lei de cravos e rosas enrolada em seu braço. Ela a colocou sobre a cabeça de
Katie e fez um som de beijo próximo ao ouvido de Katie.

Katie não podia reclamar por nenhum deles não querer se aproximar. Ela ainda
estava quente por ter corrido para o campo depois de ajudar seus pais a subirem no
carrinho de Eli. Seu rosto parecia grudento de suor. Sem mencionar o trabalho que ela
teve ao tentar esfregar a tinta de suas bochechas.

Cris tocou a bochecha de Katie.

- Então, o que foi isso? Eu não entendi.

- Ainda dá pra ver?

- Só um pouco. Não como quando você estava no palco.

- Sorria! Tio Bob gritou.

- Qual era o objetivo disso?

- Nenhum. Katie deu um grande sorriso para a câmera. Eu não fiz de propósito. A
tinta saiu dessa beca ridícula.

- Por que só estava aí, no seu rosto?


- Eu estava chorando. Meus pais vieram, Cris. Eu estava lá agora. Conversando
com eles no ginásio. Acredita que eles vieram?

Cris jogou seus braços em volta de Katie e a abraçou apertado.

- Katie, isso é maravilhoso! Eu estou tão feliz por você!

Afastando-se, Cris checou pra ter certeza de que a beca não tinha soltado tinta em
suas roupas. Não tinha.

- Sim, foi bom que eles vieram. É muito, muito bom que vocês tenham vindo.
Muito obrigada. Sinto muito por deixá-los esperando.

- Compreensível, disse tio Bob. Estou feliz por saber que seus pais vieram.
Parabéns, Katie.

- Obrigada.

Ela abriu o seu melhor sorriso, enquanto Bob erguia a câmera e batia a foto.

Em seguida, a sessão de fotos começou de verdade. Katie com Cris, Katie com o
grupo inteiro, Katie apenas com Daniel, que se contorcia e esticava o braço para que
seu pai o pegasse.

O momento era muito parecido com o que ela havia sonhado, diferente apenas
porque seus pais tinham vindo e ido . Ela estava com o seu povo. Exceto por Nicole que
não estava lá. Ou Rick.

Ou Eli.

Katie podia sentir o suor escorrendo por suas costas e testa.

- Vocês se importam se nós pararmos com as fotos e encontrarmos água em


algum lugar? Eu estou assando. Eu quero tirar essa beca.

Bob cedeu, e o grupo se dirigiu outra vez para o ginásio. Douglas deu a Katie um
último abraço e disse que ele a veria mais nos Doyles.

- Eu tenho que pegar uma coisa no meu quarto antes de ir para a festa, Katie disse.
No quarto de Nicole, na verdade.

- Nós a encontramos lá. Marta decidiu. Nós temos um mapa. Venha, Robert. Nós
estacionamos por aqui.

Cris e Ted mantiveram o passo com Katie enquanto ela entrava pela porta do
ginásio e tomava um grande gole de água do bebedouro mais próximo. Ela abriu o
fecho da beca e tirou seu chapéu. Eu estou assando. Vocês querem ir em frente
também?
Cris e Ted se entreolharam. Ted deu de ombros.

- Nós vamos te esperar, Cris disse. Você pode ir de carona conosco, se quiser. Eu
tenho algo que quero te dar, e gostaria de fazer isso antes de nós chegarmos à casa do
Rick.

O trio de longa data se dirigiu ao estacionamento e deslizou para dentro do carro


de Cris e Ted, para que eles levassem Katie ao Crown Hall. No caminho Katie contou a
eles como Eli veio em seu carro branco de golfe e salvou o dia para ela e Nicole
algumas horas mais cedo.

- Eli nos contou sobre a viagem que vocês fizeram às montanhas ontem, Ted disse.

- Você viu alguma das fotos? Katie perguntou. Eu postei algumas delas. Não dá pra
descrever de tão bonito que é. Estou muito contente por termos ido.

- Eu não vi nenhuma das suas fotos, mas eu estou pensando em levar alguns dos
estudantes do grupo de jovens pra lá nesse verão, Ted disse.

- Se você for, eu adoraria ir com vocês, Katie disse. Na verdade, eu adoraria ajudá-
lo com o grupo de jovens esse verão, com o que você precisar.

- Então você vai ficar por aqui no verão?

- Eu acho que sim.

- O que você decidiu? Cris perguntou.

- Você quer dizer, onde eu vou morar e trabalhar e tudo o mais? Isso eu não
resolvi ainda. Eu ainda tenho mais uma semana no dormitório.

- Nossa oferta ainda está de pé, Ted disso. Você pode vir se juntar a nós quando
quiser. Desde que você não se importe em dormir em um colchão de ar.

- Eu acho que vou alugar um lugar pra mim antes de me aproveitar de vocês. Mas
obrigada pela oferta.

- Katie estava transpirando como louca no carro quente. Ela não podia esperar
para entrar no dormitório, onde certamente estaria mais fresco. Ela pegou a chave
mestra na recepção, foi até o quarto de Nicole e destrancou a porta. Sua bolsa estava
na cama de Nicole com uma nota dizendo que Nicole tinha ido para a festa nos Doyles
com seus pais, mas o pó mineral que ela havia mencionado estava na sua escrivaninha
com o pincel para aplicar.

Katie decidiu deixar sua maquiagem intocada e apenas ir à festa. Então, dando
uma rápida olhada para o espelho em seu caminho para fora, Katie parou. Ela estava
horrível. Seu rosto estava pálido e úmido de suor, exceto pelas suas bochechas, que
pareciam machucadas. Seu cabelo estava marcado por causa do chapéu que tinha
ficado preso seguramente no lugar com os grampos de Nicole. E seu vestido estava
quente e pinicando.

Katie ligou para o celular de Cris.

- Se vocês quiserem ir em frente, vou levar alguns minutos aqui. Eu posso ir com o
meu carro.

- Nós não nos importamos de esperar. É a sua festa de formatura. Você pode ficar
elegantemente atrasada se quiser.

- Eu vou tentar ser rápida. Katie correu para o seu quarto. Ela pegou o que
precisava e tomou um banho super rápido. Uma lavagem do rosto melhorou o
trabalho que a toalha de papel tinha começado no banheiro do ginásio. Ela
rapidamente enxaguou seu cabelo, resolvendo que ele poderia secar ao ar livre com a
janela aberta no caminho para a festa.

Aplicando uma camada extra de desodorante, Katie estava quase pondo seu novo
vestido outra vez até ela sentir o cheiro que sua transpiração tinha deixado na roupa.

- Ótimo. O que eu vou vestir?

Optando pela primeira saia e blusa que encontrou, Katie se vestiu.


Podia não ser tão estiloso ou bonito quanto o vestido, mas as roupas estavam frescas e
limpas, assim como ela.

Antes de correr pra fora, Katie pegou seu novo tubo de rímel com a intenção de
passar um pouco no carro. Notando o cartão de vacina perto do rímel, na penteadeira,
ela percebeu que a transpiração e a febre poderiam ser os efeitos colaterais das
vacinas.

Praticamente mergulhando no banco de trás do Volvo de Ted e Cris, Katie disse:

- Para a festa, James. E eu espero que vocês não se importem se nós formos com
as janelas abertas.

- Você tomou banho? Cris perguntou.

- Sim. Acredite, você deveria estar contente. Você sentiu meu cheiro antes?

- Não.

- Bem, isso é bom.

- Aqui, abra isso. Cris estendeu para Katie um pacote embrulhado. Esse é o meu
presente de formatura para você.
- É de nós dois, Ted disse.

Cris deu a ele um olhar divertido.

- Ei! Ted retornou o olhar. Eu assisti você trabalhar nele. E eu disse que você
estava fazendo um ótimo trabalho.

Katie abriu o presente.

- Um scrapbook? Cris, eu amei! Eu não acredito que você fez isso pra mim.
Ninguém nunca fez nada assim pra mim. Eu sempre quis um scrapbook. Obrigada,
obrigada, obrigada!

- Por nada.

- É, Ted ecoou. Por nada. Que bom que você gostou.

Cris deu um soco no braço dele, brincando.

Abrindo a primeira página, Katie soltou uma gargalhada. A foto era realmente
velha. A amiga delas do Ensino Médio, Jane, tinha batido uma foto das duas de pijama
em uma festa do pijama. Foi quando Cris e Katie se conheceram. Foi também a noite
em que o grupo saíra no meio da noite e empapelou a casa de Rick Doyle em
Escondido. Esse foi o começo da amizade de Cris e Katie.

- Eu não acredito que você tem essa foto!

- Tem mais. Várias muito boas. Levou um tempo para juntá-las. Espere até você
ver a nossa no Lago Shasta, na viagem de esqui aquático.

- Esta é do nosso anuário, não é? Katie segurou o livro e apontou para uma foto
dela jogando vôlei pelo time do Colégio Kelley. Eu me lembro disso porque você estava
na equipe do anuário, e eu ficava tanto tempo com o Michael naquele semestre que
eu cheguei atrasada para a foto do time. Ou eu nem cheguei a tempo?

- Não tenho certeza. Foi um período duro para a nossa amizade, mas nós
sobrevivemos.

- Sim, eu fui pouco teimosa naquela época.

- Naquela época? Ted perguntou.

Katie ignorou a piadinha dele e virou a página.

- Oh, essa é boa. Você tirou na nossa viagem de esqui ou em um dia de neve?

- Essa é da viagem de esqui. Continue. Há uma foto ótima de nós duas no Natal
que você trabalhou como ajudante de Papai Noel no shopping.
- Você tem uma daquele Natal? Katie passou algumas páginas até encontrar a foto
dela usando orelhas pontudas de elfo. Isso é hilário! Como você não está vestida assim
também?

- Eu trabalhava na loja de animais, lembra?

- Ah, é. Ei, isso me lembra de uma coisa. Você acha que aquela loja de animais
ainda está lá? Eu preciso de uma pomba. Eu ia alugar uma, mas acabou que o cara só
vende. Eu estou achando muito caro. Eu pensei que talvez seu antigo chefe pudesse
me dar um desconto.

- Pra quê você precisa de uma pomba? Cris perguntou.

Katie contou a ela dos planos que ela e Nicole haviam formulado para o
compartimento secreto no buquê da mulher de honra.

- Grande idéia, Ted disse. Amei o simbolismo. Nós deveríamos ter feito isso,
Kilikina.

Nem o uso de Ted do apelido romântico Havaiano de Cris pareceu suavizar a


sugestão dele, Cris lançou-lhe outro olhar de ‘diga-que-você-está-brincando’ e não fez
nenhum comentário.

A essa altura, eles já haviam chegado a casa dos Doyles. Carros se enfileiravam na
rua, então Ted foi até a entrada da garagem e deixou que as duas descessem, dizendo
que ele iria descer o quarteirão para encontrar uma vaga.

Enquanto Cris e Katie caminhavam para a porta da frente, Katie reclamou que
tinha esquecido sua câmera.

- Eu trouxe a minha. Vou bater algumas fotos pra você. Por acaso você tirou uma
foto com seus pais?

- Sim, Julia tirou algumas.

- Isso é bom.

- Eu sei, mas eu queria tirar uma foto do Eli. Eu acho que ele deveria ter uma foto
para enviar aos pais dele.

- Talvez Julia tenha tirado uma dele também.

Katie não estava certa se ela tinha visto Julia bater alguma de Eli, mas Katie tinha
sido envolvida por seus pais naquele momento.

- Eu vou me certificar de tirar algumas fotos de Eli aqui na festa, Cris disse.
- Não vai ser a mesma coisa. Emoldurada na imaginação de Katie estava uma
imagem de um Eli sorridente em seu chapéu e beca. Primeiro no carrinho durante seu
passeio feroz e então quando ele estava deixando o ginásio em seu ato de gentileza
com os pais dela.

- A mesma coisa que o quê?

- Que quando ele estava com seu chapéu e beca. Seu cabelo estava saindo em
todas as direções e ele estava com aquele sorriso...

- Cris parou e colocou a mão no braço de Katie. Seus olhos estavam arregalados.

- Katie!

- Quê?

- Olá!

- Olá pra você também. O que eu perdi?

- Aparentemente muito. Ou talvez tenha sido eu quem perdeu.

- Do que você está falando? Katie checou as solas de seus sapatos. Eu pisei em
alguma coisa? O preto ainda está aparecendo no meu rosto?

- Não. Cris encarou-a, um pequeno sorriso brincando em seus lábios. Tudo o que
eu tenho que dizer a você, Katie girl, é fique atenta às próximas atrações.

Katie deu a ela um olhar estranho em resposta. Ela se lembrava de usar aquela
frase com Rick meses atrás, embora ela não se lembrasse porque. Ouvindo Cris falar
isso agora, Katie disse:

- Essa frase soa como o início de um velho DVD ou qualquer coisa do tipo.

- Oh, é o começo de alguma coisa, com certeza.

Cris se virou e subiu os degraus, deixando Katie parada na entrada da casa dos
Doyles com ambas as mãos nos quadris. Katie não estava entendendo Cris. Mas isso
não a surpreendeu. Sua cabeça e seu coração estavam um pouco sobrecarregados no
momento. Deixando de lado o comportamento estranho de sua amiga, Katie se juntou
a Cris na porta da frente.

Cris tocou a campainha, e Katie pensou em como todos eles tinham ido longe
desde a noite em que ela e Cris empapelaram a antiga casa de Rick e então lutaram
pra correr ou se esconder nos arbustos.

Agora mesmo, se esconder nos arbustos parecia algo que Katie gostaria de fazer.
Ela só não estava certa do porquê.
Capítulo 25
A mãe de Rick tinha, mais uma vez, se superado em dar uma festa de primeira. O
que foi bom porque, devido a quantidade considerável de pessoas reunidas na
espaçosa casa, Katie e Cris entraram sem deixar óbvio que elas estavam entre os
últimos a chegar.

O que também significou que Marta havia engajado em uma longa conversa com a
mãe de Rick; falavam de tudo, desde os aperitivos a tratamentos em spas. Katie podia
ouví-las conversando enquanto enchia um prato com tira-gostos da mesa de jantar,
que, a propósito, estava transbordando de coisas gostosas.

Tudo parecia estar indo bem até Marta avistar Katie. Mudando de assunto, Marta
disse:

- Claro, quando chegar a hora de Rick e Katie fazerem o anúncio especial deles, eu
adoraria que a festa fosse lá em casa.

A mãe de Rick ficou surpresa. Ela se virou para Katie.

Katie rapidamente foi para perto de Marta e disse:

- Nós não vamos fazer anúncio algum. Rick e eu não estamos mais juntos.

- O quê! A exclamação de Marta calou todas as conversas ao redor, assim como


meia dúzia de convidados olhou para ver o que estava acontecendo.

- Você e Rick terminaram? Quando? Por que ninguém me contou?

Katie percebeu que algumas pessoas ouviriam sua resposta. Ela tentou escolher
suas palavras cuidadosamente e manter a voz baixa.

- Nós terminamos alguns meses atrás.

Marta parecia enfurecida.

- E você só me diz agora? Você faz ideia do que eu passei para reservar o Newport
Beach Iate Clube para vocês? Eu disse a eles que deixassem três fins-de-semana
separados pra vocês. Dois em novembro e um em outubro.

- O Iate Clube? Pra mim? Por que cargas d’água você reservou o Iate Clube pra
mim?

Marta apontou seu dedo para Katie:

- Quando você estava na minha casa, você, claramente, disse que você e Rick
estavam esperando até a formatura para que fizessem o anúncio de vocês. Você disse
que seis meses era uma duração boa para um noivado. Isso significa que o casamento
seria no outono. Eu estava lá quando você disse isso.

- Eu nunca disse isso!

Agora a voz de Katie é que estava aumentando.

- Foi você quem disse isso. Tudo isso. Todos esses planos e datas foi você que
inventou aí nessa sua cabecinha. Rick e eu nunca dissemos nada além de que nós
iríamos esperar até que o café abrisse e eu me formasse para tomarmos alguma
decisão sobre o que fazer em seguida.

- Não foi isso que você disse.

- Marta, ninguém lhe pediu para fazer reserva em nenhum iate clube por qualquer
que fosse o motivo!

Rick apareceu ao lado de Katie e escorregou o braço dele no dela. Com sua voz
serena e firme, Rick disse:

- Nós dois gostaríamos de nos desculpar por não termos nos comunicado com
você, Marta. Nós não fazíamos ideia que você estava fazendo planos para nós. Nós
sentimos muito pelo inconveniente que lhe causamos. Não é mesmo, Katie?

Ela o sentiu apertando o braço enquanto ele comprimia o músculo.

- Sim, sentimos muito.

Outros convidados tinham migrado para a sala de jantar para descobrir o motivo
de toda aquela confusão. Rick manteve o braço dado ao de Katie enquanto ela se
virava para ver a grande multidão.

- Eu acredito que o erro foi meu. Eu peço desculpas. Parece que há um anúncio
que eu deveria ter feito antes. Já que Katie está aqui e já que ela e eu estamos de
acordo nisso, nós temos um anúncio a fazer.

Katie olhou para Rick com um olhar cético e tirou o braço dela do dele. Ou ele
estava encontrando uma maneira de, graciosamente, tirar o foco de Marta, ou os dois
tinham um plano juntos de armarem uma armadilha para levar Katie a voltar com Rick.

Ela sabia que a segunda opção era altamente improvável, então ela permaneceu
de pé e deixou Rick falar pelos dois. Ele olhou para ela, e ela lhe deu um olhar de “vá
em frente, eu confio em você.”

- Katie e eu somos amigos há muito tempo. De fato, nós dois somos amigos de
muitos de vocês aqui nessa sala há muito tempo. Nós apreciamos a amizade de vocês
mais do que podemos expressar. Esse é um momento para celebrarmos um marco na
vida de Katie, Nicki e Eli.

Katie viu Nicole e Eli em cantos opostos, ambos olhando para Rick, esperando para
ver o que aconteceria em seguida.

- Nicki? Eli? Vocês dois poderiam se juntar a mim e à Katie aqui?

Nicole e Eli caminharam até a mesa.

Rick tinha a multidão sob controle. Pelo menos cinquenta pessoas enchiam a sala
de jantar e transbordavam pela sala de estar. Todos olhando atentos para Rick,
inclusive Marta.

- Como muitos de vocês sabem, é tradição de nossa família oferecer um brinde


nas comemorações, e essa é, definitivamente, uma comemoração para os meus três
amigos. Se você tem um copo perto de você, você poderia levantá-lo para fazermos
um brinde?

Quase todos tinham um copo para levantar.

- Esse vai para Eli Lorenzo, meu excelente companheiro de apartamento, e esse
para Nicki Sanders, a excelente assistente de design da minha mãe, e esse vai para
Katie Weldon, minha ‘uma-vez-namorada’ e agora minha excelente amiga para
sempre.

O olhar dele passou pela multidão reunida.

- Brinde comigo. Parabéns aos formandos!

Os convidados ovacionaram e tomaram um gole de limonada, chá gelado ou o que


quer que estivesse no copo deles, e o quase espetáculo entre Katie e Marta se
dissolveu. As conversas começaram de novo. Alguns dos convidados voltaram para o
outro cômodo. Eli estava recebendo bastante atenção de pessoas mais velhas, que
eram obviamente amigos dos Doyles.

Rick, entretanto, não tinha acabado. Ele se virou para Katie e disse:

- Você poderia ir lá em cima e esperar por mim no cômodo em cima da garagem?


Eu preciso falar com você.

Ele então se inclinou para perto de Marta que estava com um copo com algo
espumante nas mãos. Ela estava olhando para Rick, como se não estivesse muito certa
do que acabara de acontecer. Katie assistia-o virar o queixo e com seu jeito suave
assumir a responsabilidade por não notificar Marta sobre o status do relacionamento
dele com Katie. Katie o ouviu oferecer para pagar qualquer depósito que Marta fizera
pelas reservas no iate clube. Lá vai você, Rick, mais uma vez, ser o perfeito gentleman.

Katie saiu da sala de jantar com seu prato de petiscos na mão. Ela sentiu como se
estivesse fazendo algo errado, tirando a comida da área designada à alimentação e
esperando Rick no andar de cima.

Ela voltou ao lugar onde tinha deixado sua bolsa e a levou consigo. Talvez não
fosse esse o momento pelo o qual ela esperara, em que ela iria devolver o broche a
Rick, mas com ele, ela tinha que aproveitar o tempo que tivesse.

O cômodo acima da garagem era uma junção de uma sala de ginástica com uma
esteira e uma espécie de ‘recanto’ com uma televisão velha e uma poltrona. Katie não
precisou esperar muito até ouvir Rick subindo as escadas. Quando ele apareceu, ele
quase preencheu todo o vão da porta.

- Você salvou o dia, Doyle. Alguém já lhe contou que as suas habilidades estão
sendo desperdiçadas no ramo alimentício? Você deveria ser um negociador
internacional. Ou no mínimo, um advogado de divórcios.

Pela expressão do rosto dele, ela não soube dizer se ele iria xingá-la ou receber os
elogios dela e usá-los como se fossem uma medalha de honra.

Katie decidiu fazer suas próprias tentativas em mudar de assunto.

- Ei, antes que você diga o que quer que você vá dizer, eu quero lhe devolver isso.
É o broche da sua avó. Desculpe-me por não ter-lhe devolvido antes.

Rick pegou a caixa dela.

- Está bem. Obrigado.

Ele parecia preocupado com algo, Katie imaginou que fosse o que acabara de
acontecer com a tia Marta.

Ele cruzou os braços.

- Katie, eu pensei que você e eu deveríamos conversar. Eu estou tentando fazer o


que é certo para nós dois. É o que eu sempre busquei em nosso relacionamento, e eu
ainda busco por isso.

- Eu sei, e eu fico muito grata, Rick. O que você fez lá embaixo, ajeitando o que
poderia ter sido um grande desastre com a Marta foi ótimo. Obrigada. Eu tenho
certeza de que Eli e Nicole ficaram muito felizes por terem recebido honras também.

- Espero que sim. Ele parecia nervoso. Ouça, eu tenho algo que preciso lhe contar.
Eu não estou certo sobre como dizer isso, mas eu vou dizer assim mesmo. Eu estou
tendo dificuldades em ficar perto dela agora que as coisas não são mais como eram
entre mim e você.

Katie percebeu que fora ela quem pressionara Bob e Marta a virem a sua
formatura. Se ela não tivesse feito isso, a discussão na sala de jantar não teria
acontecido.

- Você queria que ela não tivesse vindo?

- Não, Rick disse. Eu a quero aqui. Ela é uma parte da sua vida. É isso que deixa as
coisas complicadas. Quando você e eu estávamos juntos, não era difícil... Não sei se
essa é a palavra certa, mas não era difícil ignorá-la. Agora, toda vez que estou perto
dela, eu acabo tendo que fazer um grande esforço para evitá-la porque ela...

- Ela lhe deixa meio louco, né?

- Exatamente. Ele pareceu aliviado. Katie, eu espero que você não se importe de
eu falar isso com você.

- Não. Você tá brincando? Você pode falar disso comigo quando quiser. Você
mesmo disse na hora do brinde - nós somos amigos pra sempre.

Ele ofereceu um sorriso a ela.

- Obrigada. Eu não sei por que eu me sinto assim, mas quando eu estou perto
dela, eu simplesmente... Rick estendeu as mãos como se estivesse sem palavras.

Katie se compadeceu dele, transferindo todos os sentimentos dela com relação à


tia Marta para ele.

- Você quer enfiar um ovo dentro da boca dela e mostrá-la o caminho da porta.
Acredite, eu também sinto a mesma coisa.

O maxilar de Rick caiu.

- Por quê? O que você quer fazer quando a vir?

- Para ser honesto, eu quero convidá-la para sair.

Katie quase pulou da poltrona.

- Você quer sair com a tia da Cris? Que pervertido, Rick!

Rick deu um passo para trás.

- Marta! Você pensou que eu estava falando da Marta?

- Sim, claro. Você disse que ela lhe deixa maluco; você tenta ignorá-la quando
estão no mesmo lugar. Quem mais poderia ser?
- Não a Marta, Rick disse devagar.

- Não, não a Marta. Katie concordou rapidamente. Ela tapou a boca com a mão
para que não deixasse escapar um gritinho.

- Eu estava falando da Nicki, Rick disse.

- Ah, claro. Eu sabia. Só estava tentando fazer uma piadinha idiota sobre a Marta.
Risque essa piadinha da minha lista de material para comédia stand-up. Foi
obviamente reprovada. Desculpa. Péssima escolha. Péssima, péssima escolha de
material para comédia. Não vai se repetir.

Rick se sentou na velha cadeira reclinável, no canto, de frente para Katie. Ele
parecia irritado agora, como se ele realmente tivesse acreditado que Katie estava
fazendo uma piada.

- Então é, Katie esperou que eles pudessem continuar conversando sobre isso.
Nicole. Ou Nicki como você a chama. Ela é ótima. Mas você já sabe disso. Eu acho que
você deveria convidá-la para sair. Quero dizer, parece que é como você disse, você fez
um bom trabalho em ignorá-la quando estavam no mesmo lugar. Então talvez agora
você deveria conversar com ela e ver o que acontece.

- Eu quero fazer o que é certo, Katie.

- Isso é certo, Rick. Sério, eu tenho certeza de que isso é certo.

- Eu pensei que fosse sábio esperar.

- Esperar o que? Esperar até que ela volte para Santa Barbara e você tenha que
ficar cinco horas no trânsito para vê-la?

- É isso que ela vai fazer? Ela decidiu? Minha mãe disse que ela não tinha decidido
ainda.

- Ela está pensando em voltar para Santa Barbara. Ela tem essa semana para
pensar e depois... Quem sabe?

Rick esfregou a nuca. Ele sempre fazia isso quando estava estressado. Ela queria
poder dizer toda a verdade sobre o que Nicole sentia por ele, assim, ele não ficaria tão
nervoso para convidá-la para sair, ou pelo menos, para conversar com ela sobre algo
além da cor da pintura do banheiro masculino.

- Você sabe, eu pensei que seis meses de espera depois do fim de um


relacionamento fosse um bom tempo. Especialmente porque você e eu ficamos juntos
por tanto tempo. Mas agora eu estou pensando-
- Esse é o seu problema. Bem aí, Rick Doyle. Quero dizer, se você não se importa
em eu ser bem franca, você pensa demais. É hora de você agir com seus instintos. Seu
coração, Rick. Aja com seu coração. Eu sei que seu coração é constante. Ouça-o. O
amor é um mistério. Não pode ser planejado. Ele tem um tempo próprio. É
inconveniente e orgânico, mas é o que faz dele real. Relacionamentos bons de verdade
são aqueles que vêm naturalmente e não são forçados. Como ondas.

Katie percebeu que as palavras que ela usara tinham vindo de Eli.

Rick pareceu surpreso.

Katie se inclinou para frente. Enquanto ela tivesse a atenção de Rick, ela também
poderia contar a ele o que estava pensando.

- Ouça, Rick, eu sei que seu objetivo no nosso relacionamento era fazer tudo certo.
E você fez. Você concluiu esse objetivo. Você foi um namorado maravilhoso, e você fez
tudo de acordo com sua cabeça. Seu plano. Sua lógica. Deu certo.

- Obrigado, Katie. Obrigado por dizer isso.

- Agora eu estou lhe dizendo para seguir adiante sem um plano. Vá, ache Nicole,
olhe nos olhos dela, e diga o que seu instinto lhe disser. O que você já sabe no seu
coração? Comece por aí e depois faça tudo certo partindo do seu coração. Não faça
isso da sua cabeça.

Katie se sentiu sufocada enquanto acrescentou:

- Vocês dois já estão mais ligados no coração do que imaginam. Você só está
sendo lógico demais pra ver. Não desperdice essa chance, Doyle.

Rick estava perplexo. Ele foi até onde Katie estava sentada. Oferecendo sua mão,
como um verdadeiro gentleman, ele levantou Katie. Ela ouviu o som de pessoas
subindo as escadas. Se ela e Rick tinham algumas últimas palavras para dizer um ao
outro, essa era a chance deles.

Olhando para ela e alisando gentilmente o lado do cabelo dela, Rick parecia buscar
por algo nos olhos dela. O toque dele parecia, agora, o toque de um estranho para ela.
Carinhoso, mas não especificamente romântico. Katie não sentiu vontade de beijá-lo, e
nem ela esperava que ele iniciasse um beijo. A amizade verdadeira permaneceu. Os
sentimentos românticos se foram.

O que quer que fosse que Rick estivesse buscando nos olhos dela, ele
aparentemente não encontrou. Ele balançou a cabeça lentamente em afirmação, e
com um gesto legal, amigável, como se fosse um técnico de futebol, ele colocou as
mãos nos braços de Katie.
- Não, Rick, não! Katie gritou enquanto Rick apertou os braços dela.

Ted, Cris e Eli entraram na sala enquando Katie se contorcia de volta na poltrona
em resposta a dor na pele sensível em volta de suas vacinas.

Eli correu até ela. Ele olhou para Rick e depois para Katie.

- Você está bem? A mão de Eli estava no ombro dela, pronto para confortá-la.

Katie levantou seu dolorido braço esquerdo alguns centímetros.

- Sim. É meu braço. Tá muito dolorido. Eu tomei umas vacinas ontem, Rick. Você
não sabia.

Rick levantou a sobrancelha e olhou para Eli e disse:

- Mais alguma coisa que eu não sei?

- Não, Katie respondeu. Só isso. Só meu braço dolorido.

Rick ainda estava olhando para Eli. Ele abaixou o queixo. Como se ninguém
estivesse na sala, Rick disse ao seu companheiro de apartamento:

- Você sabia no verão passado, não sabia?

Eli encarou Rick por um momento antes de responder afirmando lentamente com
a cabeça. Os dois continuaram a se encarar. Katie não estava certa do que estava
acontecendo.

Então a expressão de Rick relaxou e se tornou em um sorriso.

- Bem, parece que nós estamos de acordo, né, Katie? Nós dois estamos prontos
para seguir adiante.

- Eu acho que nós deveríamos seguir rumo ao andar de baixo, Cris sugeriu. Ela
tinha, em sua voz, um pouco do tom organizacional de tia Marta, só que com um jeito
muito mais gracioso.

- Nós queremos tirar umas fotos de todos, Cris disse. Quem sabe quando todos
nós vamos estar juntos num lugar assim de novo?

Os cinco trocaram rápidos olhares em resposta à realidade que havia na última


frase do comentário de Cris. Esse era o fim de uma época peculiar para todos eles.

- Nós precisamos de fotos juntos, Katie se levantou da poltrona. Muitas fotos.


Capítulo 26
Katie passou os três últimos dias sentindo-se pior do que havia se sentido desde o
Dia dos Namorados. Ela transpirava demais para uma mulher. Quase não comia. Estava
sem apetite e seu estômago dava nós.

Por sorte, suas horas de plantão eram mínimas. Isso lhe deu tempo para separar,
organizar e empacotar suas coisas. Entretanto, na quarta-feira pela manhã, Katie ainda
não havia tomado nenhuma decisão com relação a conseguir uma nova casa e um
novo trabalho. Ela estava perdida. Navegando no seu vasto mar de possibilidades em
sua pequena e flutuante jangada da indecisão.

Parecia que a única maneira de sair do lugar era conversando com Julia. Tentar
arrumar um horário com ela era difícil porque Julia estava atarefada com os detalhes
finais de seu casamento. Katie se sentiu mal por causa disso também, porque ela era a
‘mulher-de-honra’, mas não sentia que estava ajudando em muita coisa.

Katie e muitas outras ARs tinham organizado um chá de panela bem sucedido para
Julia, mas esse fora o máximo de envolvimento de Katie no casamento. Agora faltavam
apenas três dias para o casamento, e Katie tinha uma tarefa que ela impusera a si
mesma. Ela precisava de uma pomba.

Sua primeira ligação foi para a loja de animais em Escondido onde Cris trabalhara
na época do ensino médio. O dono da loja se lembrou bem de Katie. Talvez até um
pouco bem demais. O motivo ela não sabia.

- Ouça Jon, eu estou tentando achar uma pomba. Uma boa e silenciosa pomba
que voará para fora de um buquê de noiva quando eu abrir a porta da gaiola. Você
pode me ajudar?

Nenhuma resposta.

- Alô? Jon, você ainda está aí?

- Sabe, se fosse qualquer outra pessoa ligando, eu teria desligado. Mas já que é
você, Katie, eu acredito que isso não seja um trote.

- Claro que não é um trote! É sério; eu preciso de uma pomba.

- Ok, sem problema. Quando você pode vir buscá-la?

- Sério? Você tem uma?

- Eu não tenho aqui na loja, mas posso conseguir uma e ela estará aqui por volta
da próxima semana.
- Não, eu preciso pra já. O casamento é sábado.

- Sábado. Bem de última hora.

- É, eu sei. História da minha vida. E aí? Você pode me arranjar a pomba?

- Eu vou tentar e ligo pra você de volta. A propósito, quem é o noivo sortudo?

- O nome dele é Dr. Ambrose. Quer dizer, John. John Ambrose.

- Um doutor, hein? Que bom pra você, Katie.

- Não, eu não estou me casando. Eu sou a dama de honra. Bem, na verdade, eu


sou a mulher de honra. Nós decidimos que ‘mulher’ soa melhor que ‘dama’.

- É tudo a mesma coisa, não?

Katie estava irritada com a piadinha de Jon. Ela não era mais a garotinha vestida
numa fantasia de elfo no Natal. Ela era uma graduada e queria ser tratada com mais
respeito.

- Só me consiga a pomba. Pode ser, Jon? Até sexta, no máximo.

- Verei o que posso fazer.

Katie desligou, resmungando para si mesma. Ela pegou suas coisas de banho e
desceu corredor abaixo. Quando ela entrou no banheiro, Nicole estava lá, escovando
os dentes.

- Ei, graduada, Katie brincou. Não vejo você há dias.

Sem graça, Nicole cuspiu na pia e enxaguou sua boca antes de se virar para Katie
com uma expressão hesitante.

- Eu estava evitando você.

- Por quê?

Nicole ergueu uma sobrancelha. Sua pele ficou levemente rosada.

- Rick me convidou para sair.

Katie soltou sua toalha e seu shampoo e se lançou em direção a Nicole com um
grande abraço de urso.

- Fantástico!

Nicole se afastou.

- Você tem certeza de que está bem com isso?


- Absolutamente. Deus abençoe você, abençoe o Rick, e abençoe todos os seus
futuros filhos, netos e bisnetos.

Nicole analisou a expressão de Katie mais cuidadosamente.

- Você não está tendo uma reação a todas aquelas vacinas, está?

- Não, eu estou feliz por você, é só isso. Já que noite passada eu parei de suar, a
propósito. Eu acho que meu sistema imunológico encontrou o tétano, a febre amarela
e a tifóide e os venceu.

- Você já decidiu para onde vai?

- Ainda não. E você?

Nicole hesitou.

- Por que você está me olhando desse jeito? Onde você vai morar?

A mãe do Rick me convidou para ficar no quarto de hóspedes deles durante o


verão até que uma oportunidade de um emprego permanente surja. Ela disse que eu
poderia ajudar com o negócio da família, se eu quisesse, e eu disse que queria. Eu não
tinha mais nada em mente. Meus pais conversaram sobre isso com eles na festa de
formatura, e eles acham que é uma boa opção.

- Uau.

Mesmo Katie estando feliz por Nicole, ela estava sentindo pontadas de
arrependimento. Ou talvez fossem pontadas de ciúme. Se Katie e Rick ainda
estivessem juntos, Katie poderia se enxergar montando acampamento no luxuoso
quarto de hóspedes dos Doyles. Ela teria coisas maravilhosas para comer todos os dias
e muito conforto. Ela teria uma correnteza de bondade e afirmação da graciosa mãe
de Rick, e Katie pertenceria a algum lugar.

Mas ela não queria ficar absorvida nos empreendimentos em expansão dos Doyle.
Disso ela estava certa. Não havia nada de errado com o empenho maravilhoso e bem
sucedido deles. Os Doyle eram uma família generosa e boa. Mas o mundo deles não
era o mundo que Katie queria para algo a longo prazo.

- Que ótimo, Nicole. Katie esperava que sua expressão combinasse com suas
palavras e não refletissem o estrondo pós-choque no seu coração enquanto ela falava.

- Obrigada pelo incentivo, Katie.

- Então aonde o Rick vai levar você para o primeiro grande encontro de vocês, e
quando será?
- Será amanhã à noite. Nós vamos à inauguração de uma exposição de arte em San
Diego e depois a um restaurante no topo de um prédio na baía.

Katie deu um assovio baixo.

- Que chique!

- Ele me disse para eu ir bem arrumada. Nicole sorriu. Eu devo precisar de ajuda
para decidir o que vestir.

Katie teve que desenhar uma linha imaginária ali; seus sentimentos estavam
sensíveis demais para se aventurar profundamente no relacionamento de Nicole e
Rick.

- Eu não estou certa se vou poder lhe ajudar com isso, Nicole. Eu estou com o
horário bem apertado hoje. E na sexta também. E depois tem o casamento no sábado,
e a propósito, eu estraguei meu vestido novo durante a formatura. Eu vou ter que
arranjar outra coisa para o casamento.

- Não dá para mandar lavar a seco?

- Talvez. Mas eu prefiro conseguir outra coisa para o casamento.

- Você quer que eu vá fazer compras com você?

- Não, está tudo bem. Eu tenho que ir até Escondido no fim dessa semana e pensei
em dar uma olhada no shopping de lá.

- Se você não conseguir, você sabe que pode pegar o que quiser emprestado
comigo.

- Obrigada. Katie sabia que não queria mais pedir roupas emprestadas à Nicole.

Algo forte e levemente triste acontecera com ela durante essa conversa. Mesmo
ela concordando que Nicole e Rick deveriam sair, ela não sentia como antes com
relação a compartilhar roupas e segredos. Quando chegar o dia em que Rick beijará
Nicole, Katie não vai querer ouvir a respeito.

- É melhor eu ir andando. Katie foi para o chuveiro. Divirta-se no seu encontro.

- Obrigada, Katie. Você é a melhor das melhores. Nicole estava radiante.

Até isso era um pouco difícil de suportar. Enquanto a princípio ela concordava com
tudo isso, a perda de Rick em sua vida lhe entristecia o coração. Pelo menos ele a leva
aos lugares de classe alta que eu nunca quis ir, como exposições de arte e restaurantes
sofisticados.
Katie entrou no chuveiro e ligou a água morna. Quando Rick me levou a San Diego,
nós fomos ao zoológico e a uma churrascaria brasileira. Naquele momento Katie
decidiu que não iria começar uma lista de comparações. Se ela plantasse um campo
inteiro daquelas sementes em seu coração, nada de bom nasceria delas.

Pai, limpe meu coração de todo ciúme e dor sem motivo. Eu não sou a rejeitada
nesse cenário. Eu sou uma vítima de sua graça. Você tem outros planos para mim.
Planos de paz e não de mal. Você tem algo sob medida desenhado para mim. Então o
que é? Onde você quer que eu more? O que você quer eu faça?

Katie foi cautelosa em não perguntar se Deus tinha algum rapaz em mente para
ela agora que Rick estava fora da jogada. Ela sabia que um relacionamento com
qualquer rapaz agora não era onde seu foco precisava estar. Ela tinha necessidades
mais importantes para serem supridas, como uma casa e um emprego.

Voltando para seu quarto, depois do banho, Katie viu que ela tinha perdido uma
ligação. Jon havia deixado uma mensagem dizendo que ele conseguira a pomba para
ela. O preço era muito maior do que ela esperava, mas quando ela pensou nisso,
percebeu que não se importava em pagar o que ele pediu.

Katie procurou, pelo quarto, algo para comer. Seu peculiar suprimento de lanches
tinha se acabado, e seu pequeno frigobar continha apenas um pedaço de cream
cheese de morango e uma garrafa fechada de molho de soja. Não exatamente uma
combinação bacana quando ela não tinha nem bagels e nem macarrão.

Sua opção mais fácil foi ser a primeira na fila para o almoço na cafeteria. Então, ela
checaria se poderia fazer algo para Julia. Depois disso, ela iria colocar seus
pensamentos em ação para encontrar um lugar para morar.

Quando Katie chegou na cafeteria, ela não era a primeira na fila. Mas ela era,
definitivamente, a única formada. Foi engraçado estar lá. Sim, era tudo tão familiar
que ela podia ir pela fila e encontrar tudo que quisesse, e ainda fazer uma casquinha
de frozen yogurt na máquina de olhos vendados.

Ela sabia que aquele sentimento desconfortável ali tinha mais a ver com algo
mental. Em sua cabeça, ela já estava cheia. Hora de arrumar uma vida. Hora de fazer
seus próprios sanduíches de peru com pão branco com seu próprio pote de maionese
de sua própria geladeira em seu próprio apartamento. Katie tinha acabado de encher
seu totalmente-familiar copo de plástico da cafeteria com leite da nunca vazia
vaquinha de metal quando viu Eli em seu uniforme de segurança na fila da salada.

- Então você foi promovido, hein? Segurança oficial dos tomate-cereja?

Ela tinha a intenção de continuar caminhando, mas a expressão séria dele a fez
parar.
- Não, foram as torradinhas, ele disse sério. Nós recebemos uma denúncia de
armazenamento ilegal de torradinhas por um subvertido grupo de calouros infelizes.

Eli disse de um jeito tão convincente que Katie teve que pensar pra entender que
ele estava fazendo hora com ela.

- Não faça hora comigo, Lorenzo. Eu sou uma graduada.

- Não faça hora comigo, Weldon. Eu sou um graduado, e eu sei o brado da tribo
dos guerreiros Masai.

- E o que acontece quando você dá esse brado da tribo dos... guerreiros sei lá das
quantas?

- Isso é algo pra eu saber e pra você ficar curiosa.

Ela lhe lançou um olhar com os olhos meio fechados e balançou a cabeça.

- Você é um pacote de mistérios. Por exemplo, ‘Ah, surpresa! O Dr. Ambrósio é


meu tio’.

- Por que isso importa?

- Bem, ele está se casando com a Julia. Minha DR. Minha amiga. Eu acho que isso
significa que você estará no casamento no sábado.

Ele concordou com a cabeça.

- Você tem algo contra meu tio?

- Não, eu o acho maravilhoso. Apesar de ele ter me dado um B- no meu primeiro


ano aqui, e eu acredito que se ele tivesse pensado mais ele poderia ter me dado um
sólido e legal B. Mas eu não estou reclamando. Eu consegui me formar de qualquer
forma e escolhi não guardar contra ele aquele escorregão temporário nas suas
habilidades de dar nota. Todos temos nossas fraquezas.

- Meu tio é um homem extremamente generoso, Eli disse. Talvez não em notas,
mas de outras maneiras. Ele não sabe que eu sei disso, mas ele encontrou uma
maneira de pagar minha faculdade. Toda. Ele fez isso anonimamente, mas eu sei que
só pode ter sido dele.

Katie engoliu forte e tentou não deixar seu rosto mostrar nenhuma pontinha de
desacordo. De jeito nenhum que ela gritaria, ”Fui eu, Eli. Eu paguei sua faculdade.”
Assim era muito melhor. Deixe Eli pensar que tinha sido o Dr. Ambrose.

- É ele o tio com quem você morou no último verão? Katie perguntou calmamente.

- É.
- Então isso faz dele o tio que veio para essa faculdade anos atrás e apresentou
seus pais um para o outro.

- Isso mesmo. Você lembrou.

Katie sorriu.

- Bem, eu tenho que ir; estou com pressa. Como sempre, eu tenho muito a fazer e
pouco tempo para fazer tudo.

Eli deu um passo em direção a ela e a olhou nos olhos.

- Antes que você fuja, eu quero lhe pedir um grande favor.

- Claro. Katie sentiu o olhar dele vindo sobre ela como uma onda da qual ela não
podia escapar. Quando Douglas ensinou Katie a surfar, ele mostrou a ela como prender
a respiração, mergulhar por debaixo da onda e flutuar pelas águas menos turbulentas
antes de surgir do outro lado. Subconscientemente, ela prendeu a respiração e
mergulhou.

Eli disse em voz baixa:

- Na África nós temos um ditado que diz, ‘Se você quiser ir rápido, vá sozinho. Se
você quiser ir longe, vá acompanhado’.

Katie surgiu do outro lado em seu mergulho no coração, piscando.

Isso não foi tão impressionante. Na verdade, foi um ditado lindo.

Então a onda de verdade a pegou em cheio.

- Antes de eu voltar para casa, eu quero que você considere ‘nós’, Katie. Pondere
como seria se nós fôssemos juntos. Não sozinhos e rápidos, mas juntos e longe.

Katie não tinha palavras. Nenhuma piadinha, réplica, ou jargão inteligente.

Quando ficou claro que ela não iria responder, Eli se virou e saiu.

Ela o assistiu ir; ela estava brigando com seus pensamentos, mas se recusou a
chamá-lo.

Então ele se virou. Um oceano de pessoas entre os dois. Ele olhou para Katie,
colocou sua palma aberta sobre o peito e bateu três vezes.
Capítulo 27
Katie de repente perdeu o apetite. Ela foi até a esteira da máquina de lavar louças
no refeitório e deixou lá a bandeja de comida intocada.

Indo direto até o seu carro, ela decolou, indo para Escondido. Dirigir ajudou.
Dirigiu descendo a colina, para longe do Rancho. Longe de tudo. Longe do Eli.

Eu não posso fazer o que você pediu, Eli. Eu não posso considerar "nós". Isso
acontece no coração. Eu não posso ir lá. Não, não agora. Você vai para sua casa na
África, e você vai ver. É melhor se não abrirmos qualquer um desses lugares de reflexão
do coração.

Katie ligou-se na música e tentou encontrar algo para cantar junto. Ela queria algo
em sua cabeça além da imagem hipnotizante de Eli batendo a palma da mão sobre o
peito. Música de letra irritante seria ótimo.

Nada parecia grudar.

Ela entrou na via expressa e fez uma lista de tarefas pendentes em voz alta.

- Encontrar um vestido para o casamento, pegar a pomba na petshop, ligar para


Julia e ver se ela precisa de ajuda com os detalhes do casamento, ficar de plantão às
sete da noite, talvez comer alguma coisa.

Katie passou a alinhar uma segunda lista para quinta-feira. E outra para sexta-
feira. Ela sabia que podia encontrar muita coisa para ocupar-se no sábado com o
casamento. Então, domingo, ela teria que ir para algum lugar. Isso a manteria
ocupada. Segunda-feira iria procurar um emprego.

Isso provavelmente levaria alguns dias. Até lá, uma semana inteira teria passado.
Embora ela não soubesse quando Eli planejava voltar para o Quênia, ela pensou que
em uma semana estaria protegida.

Só mais uma semana. Então ele vai estar muito longe, e eu vou conseguir me
concentrar no que Deus quer que eu faça em seguida. Ignorando a sensação dos
búfalos debandando em seu estômago, Katie continuou dirigindo. Quando ela chegou
ao antigo shopping em Escondido, ela pensou em como aquele lugar costumava ser
um ponto de encontro familiar. Como a maioria das coisas na vida, ele mudara. Muitas
das pequenas lojas tinham fechado ou mudaram para outra seção do shopping.

Surpreendentemente, a velha loja de animais agora estava localizada no lado


movimentado do shopping e havia se expandido para o dobro do tamanho que tinha
quando Cris trabalhava lá. Quando Katie entrou, percebeu que ainda havia o cheiro de
ração de coelho e hamster.
Jon estava atrás do caixa e não reconheceu Katie à primeira vista. Quando o fez,
agiu como se estivessem saindo de uma festa, conversando.

- Então você não é casada, né?

- Não.

- Mora com alguém?

- Jon.

- Ei, você não seria a primeira a declamar todos os seus princípios cristãos aos
dezesseis anos e mudá-los antes dos vinte e um.

Essa afirmação agitou ainda mais o estômago dela e por razões que ela não queria
pensar. Ela sabia que estava entre os seus poucos amigos que ficaram firmes na
caminhada com Cristo, mantendo seus compromissos morais e se guardando para um
herói.

- Então eu acho que sou de uma espécie rara e quase extinta de amigos de Deus
que ainda vive e respira o que acreditava naquela época. Só que agora é mais real do
que nunca porque está em mim. O Espírito de Deus está em mim, me mudando. Não
apenas ao meu redor, me influenciando.

Sua resposta direta parecia assustá-lo. Ele não tinha resposta.

- Então, você tem a pomba?

Jon apontou para o relógio na parede atrás dele.

- Não são duas horas ainda.

Katie viu que era apenas 13:20h.

- Tá, tudo bem. Volto depois.

Ela foi até a praça de alimentação e caminhou por cada um dos restaurantes de
fast food para ver o que seu fraco estômago podia segurar. Ela optou por um saudável
smoothie de frutas, com um reforço de vitamina C. Em seguida, ela foi até a principal
loja de departamentos e a três pequenas lojas de vestuário antes de encontrar um
vestido preto elegante que se encaixava e não a incomodava. Tudo isso em menos de
duas horas.

Katie se sentiu muito vitoriosa quando voltou à loja de animais com seu novo
vestido em um cabide dentro de um saco de roupas.

- Já passou das duas horas, disse Jon com um azedo no final de suas palavras.
- Eu segurei o pássaro para você por mais de uma hora.

- É você, senhor Brilho-do-Sol? É assim que trata todos os seus clientes que lhe
pagam? Eu disse que estaria de volta, eu não disse quando. Eu tinha algumas compras
para fazer. Katie levantou o saco de roupa, caso ele não tivesse percebido o óbvio.

- Então o que você está esperando, senhor? Entregue a pomba, e ninguém se


machuca.

Jon saiu de trás do balcão e ergueu uma pequena gaiola com uma adorável pomba
branca que cumprimentou Katie com uma seqüência rápida de arrulhos.

- Ela é tão doce, Katie disse. Vou precisar de um pouco de comida para ela. Apenas
por dois dias. E você tem certeza que ela ficará bem solta, não é? Quero dizer, quando
eu soltá-la. Ela não é tão domesticada que não vá saber como encontrar comida e
cuidar de si mesma.

- Ela vai ficar bem.

Katie pagou a Jon o valor acordado pelo pássaro e os alimentos. Ela estava quase
saindo, quando ele disse:

- Eu acho que você vai ficar bem também.

Katie deu-lhe um olhar divertido.

- O que é que isso quer dizer?

- Se você sair de sua gaiola e bater as asas na natureza, eu acho que você vai ficar
bem, Katie. Você pode ser uma espécie de cristãos em extinção, mas sobrevive o mais
apto, você sabe. Você vai continuar a mesma na natureza.

- Jon, isso foi totalmente poético. Obrigada. Eu aqui pensando que você tinha se
transformando em um velho rabugento. Facilite, senhor Brilho-do-Sol. Eu vou dizer a
Cris que você mandou um oi.

- Diga-lhe para vir me visitar algum dia.

- Eu direi. Katie saiu com a gaiola em uma mão e seu vestido novo e melhorado de
dama de honra na outra.

Ela se sentiu melhor na volta para a escola do que ela se sentira na ida para
Escondido. O comentário de Jon sobre ela permanecer a mesma continuava flutuando
em seus pensamentos. Foi bem legal ele ter dito isso. Ela se perguntou se ele achava
que a gaiola era a faculdade cristã em que ela vivera nos últimos anos. Ou ele estava
fazendo alusão a algo mais? Como ela poderia saltar do estilo de vida ocidental
confortável a que estava tão acostumada e se manter em um país em
desenvolvimento.

Não importava o que ele quis dizer. Ela estava se sentindo muito bem no
momento, e comida começou ia soar interessante de novo. Em vez de ir diretamente
para a escola, ela foi até um restaurante fast food e pediu um sanduíche de frango
grelhado. Pegando o longo caminho de volta para a escola, Katie foi mordiscando
enquanto dirigia. A pomba voltara a arrulhar na sua posição no chão do lado do
passageiro.

- Você está com fome, amiguinha? Vou alimentá-la assim que chegarmos na
escola. Mas primeiro eu preciso para fazer uma parada. Aqui. Katie tirou um pedacinho
do pão do seu sanduíche e apertou-a através das grades. A pomba bicou no pão e
pareceu só um pouco interessada.

- Eu vou dar-lhe sua própria comida em breve. Eu prometo.

Entrando no complexo de apartamentos de Ted e Cris, Katie foi para o escritório.


O gerente menos-amigável deve ter se lembrado de quando ela contou do gato morto,
Senhor Tropeço, no outono passado.

- Eu queria saber se você tinha algum apartamento vago.

- Só no primeiro dia do mês.

- Eu estou interessada nele.

Ele passou o resumo das exigências do primeiro e último mês aluguel e o que
estava ou não incluído nas taxas. Deu-lhe um pedido para preencher e sublinhou a
necessidade de seu relatório de crédito ser claro.

- Entendi, disse Katie. Obrigada. Devolvo estes papéis amanhã.

- Não só os papéis, mas também um cheque. Eu não aceito cheques nominais.


Primeiro e último aluguéis, mais o depósito de segurança. E tem extra para bichos de
estimação.

Quanto mais?

- Depende do bicho. O que você tem?

- Nenhum. Eu só estava curiosa.

Katie dirigiu de volta ao campus, contando os dias para primeiro de Junho. Ela não
perguntara ao gerente, mas presumiu que se mudaria para o apartamento de Rick e
Eli. Depois que ela saísse do dormitório no domingo, ela precisava encontrar um lugar
para ficar até o apartamento estar disponível. A sala de Ted e Cris era uma opção. Ir
para um hotel era outra opção.

E se eu tirasse férias por alguns dias? Isso seria divertido. Quem poderia ir comigo?
Para onde eu iria?

Ela sorriu para si mesma. Eu estou completamente imunizada. Eu poderia ir até


num cruzeiro de idosos, que atravessa o Canal do Panamá. Ou eu poderia descansar
em um resort nas Bahamas. Isso seria um bom presente de graduação para mim.

Olhando para a gaiola da pomba embaixo, ela ouviu as palavras de Jon sobre como
ela estaria bem se ela fosse lançada na vida selvagem.

Ou eu poderia ir para a África.

Seu coração bateu um pouco mais rápido. A atração por esse canto do mundo não
ia tão longe.

Eu poderia ir para a África, com exceção de o Eli estar indo pra lá, e apesar de ser
um continente grande, não quero parecer que estou seguindo-o até os confins da
terra.

Em seguida, em uma tentativa de espiritualizar sua pequena epifania sobre ir para


a África, Katie disse em voz alta:

- Mas eu quero segui-lo até os confins da terra, Senhor. Onde você quer que eu
vá? Diga a palavra, e eu estarei lá.

- Coo, a pomba soou.

- A Terra de ‘Coo’, você diz. Onde fica isso, exatamente, minha pombinha? Katie
parou em um semáforo. Ela percebeu que o homem no orelhão ao lado estava
olhando para ela. Ela apertou o botão que abriu sua janela.

Voltando sua atenção para o semáforo, ela disse:

- Não se importe comigo, Sr. Curioso. Isso é o que os graduados fazem. Nós
dirigimos por aí e falamos com os pássaros que você não pode ver, então você pensa
que nós estamos falando sozinhos.

Dirigindo-se à planície que dava na universidade, Katie pensou em voz alta.

- Eu teria que vender meu carro se eu fosse à Terra do ‘Coo’, não teria? Você sabe,
eu poderia vendê-lo para Cris. Por um dólar. Já ouvi falar de pessoas fazendo isso.
Dessa forma, ela e Ted teriam um segundo carro, e você, pequeno Trevo, teria uma
nova família.
- Coo. Coo.

Eu sei. Você está certo. Estou tonta para sequer pensar sobre isso. Eu vou mudar
para o antigo apartamento de Rick e Eli, e eu vou encontrar um emprego em algum
lugar fazendo algo importante e que mude a minha vida. Você vai ver. Você pode voar
e me visitar sempre que quiser. Vou colocar a semente do pássaro para você do
mesmo jeito que a Cris fazia para colocar a comida de gato para o Senhor Tropeço.

Katie segurou a gaiola atrás do saco de roupa quando ela retornou ao Crown Hall.
Ela conhecia as regras. Nenhum animal. Mas desta vez era diferente. Esta pombinha
desempenharia um papel importante no casamento de Julia dali a três dias.
Certamente, neste caso, uma exceção deveria ser feita.

Ela não podia fazer isso.

Katie virou-se e caminhou de volta para seu carro. Ela dirigiu de volta colina abaixo
onde Cris trabalhava e deixou o pássaro no carro. Entrando na livraria, Katie encontrou
Cris estocando as prateleiras na seção "Bíblia".

- Eu preciso pedir um favor. Você pode guardar um segredo e um pássaro?

Não demorou muito para convencer Cris a ficar com o pássaro para Katie nos
próximos três dias. A única parte da explicação de Katie que deixou Cris chateada foi
quando Katie disse a Cris que fora à loja de animais em Escondido e não a levara junto.

- Jon quer que você apareça uma hora para dar um oi. E quando você for, eu acho
que você deveria levar para ele uma dessas Bíblias. Uma versão fácil de entender. Ele
precisa de um pouco de esperança, luz e verdade em sua vida.

Com a pomba e a comida de pássaros entregues a Cris, Katie voltou ao campus e


encontrou Julia em seu quarto. Julia preparara uma pequena lista de tarefas do
casamento e estava grata por Katie ter se oferecido para cuidar delas para ela. Katie
realizou metade da lista, durante o seu plantão na recepção naquela noite. Ela chamou
o supervisor do campus para verificar o número de cadeiras que seria necessário
arrumar. Ela ligou para a empresa de decoração e deixou uma mensagem pedindo que
ligassem de volta e verificassem se tinham o comprimento certo do tapete branco para
o corredor central, e que seria entregue junto com o arco do jardim antes das dez
horas da manhã de sábado. A última ligação que Katie fez para Julia foi para a loja de
aluguel de smoking. Eles ainda estavam abertos, e Katie perguntou se o noivo e o
padrinho tinham retirado seus smokings. A resposta foi sim.

Katie atacou cada um dos itens restantes da lista na quinta-feira, entre seus
pertences embalados no quarto. A maior dica de organização que ela pegara de Nicole
naquele semestre foi: “Só manter o que considera ser bonito ou útil.”
O lema ajudou a decidir sobre um monte de itens variados que tinham cumprido o
seu propósito.

Ela saiu de uma vida simples a uma vida frugal em duas viagens para carregar o
lixo e três caixas de brindes no trailer do Exército da Salvação, que fica estacionado no
campus a cada ano durante a última semana de aula.

As posses de Katie caberiam no banco traseiro de seu carro. Sentia-se como uma
cigana. Ela até tinha separado o suporte de um abajur de mesa que se queimara no
início de seu segundo ano, mas ela guardara, dizendo que ele seria consertado. A
lâmpada estava queimada e precisava ser jogada fora. Sua próxima tarefa era tirar o
que sobrou da decoração no mural dos Tesouros Peculiares de seu dormitório naquele
ano.

Carregando o abajur e seu último saco de lixo pelo saguão, ela saiu pela porta da
frente e quase trombou com Rick.

- Hey!

- Ei, você.

- Ei, é quinta-feira, Katie disse.

- Sim, quinta-feira.

Ele estava ótimo. Um pouco nervoso, mas o verdadeiro e suave Rick.

- Então, Nicole me disse que vocês vão a uma exposição de arte e, depois jantar
em algum lugar elevado.

- Em algum lugar elevado, Rick repetiu.

- Você sabe, em algum lugar superior. Um restaurante chique.

Ele balançou a cabeça.

- Você tem certeza que está bem com isso, Katie?

Ela riu de sua própria linguagem.

- Sim, de verdade, eu estou. Eu não esperava vê-lo aqui. Não assim.

- Ela estava com sua camiseta mais velha, que ela planejava jogar fora no final do
dia. Dando de ombros, Katie sorriu para Rick.

- Tenha um ótimo encontro. Espero que vocês se divirtam.

- Também espero.
Katie voltou-se para a lixeira, quando Rick disse:

- Ah, Katie, você recebeu o e-mail sobre a inauguração do café? Está marcado para
sábado.

- Este sábado?

- Sim. O forno de pizza já foi instalado e já foi feita a inspeção elétrica. Tudo certo.

- Tenho um casamento neste sábado. Da Julia. Eu acho que não vou conseguir
fazer as duas coisas.

- Certo, o casamento. Bem, eu espero que seja bom também.

- Obrigada. Parabéns pelo café, e por alcançar seu objetivo, e tudo mais.

Katie levantou o pé da lâmpada quebrada que ela segurava.

- Pra você, Rick. Bom trabalho.

Ele riu.

- Eu acho que nunca fui brindado com uma lâmpada antes.

- Bem, é uma lâmpada torrada, então vamos lá.

Katie fez questão de não retornar imediatamente ao seu andar depois de despejar
o lixo. Ela não queria passar no quarto de Nicole e vê-la perfeitamente linda, vestida de
felicidade. As duas trabalhariam juntas com as flores do casamento no dia seguinte.
Katie imaginava que receberia um relatório sobre eles, por isso não precisava ter
nenhum vislumbre de Nicole indo se encontrar com Rick.

Alguns estudantes foram registrar sua saída durante o turno de Katie na quinta-
feira. Nos anos anteriores, o êxodo não começara até sexta-feira, e ocorrera em
períodos não planejados durante todo o fim de semana. Katie ficou ocupada durante
todo o seu turno e permaneceu em serviço por mais de duas horas para ajudar
Jordânia quando ela veio para o trabalho. Quando seguia para o quarto vazio, às 11:10,
ela percebeu que era a última vez, ela nunca mais teria que ficar na recepção em sua
vida. Ela estava realizada. Seu horário oficial como assistente de residentes acabara.

Katie não esperava sentir um vazio enquanto caminhava pelo corredor com as
paredes limpas e quartos parcialmente desocupados. Ela parou naquele lugar
silencioso.

- Obrigada. Obrigada por tudo isso. Este ano todo. Todas essas mulheres. Tudo o
que aconteceu. Obrigada.
Ela achou difícil dormir naquela noite. Seu apetite não retornara desde... Katie
tentou pensar quando ela perdeu o interesse de comer em sua capacidade habitual.
Ela percebeu que começou na manhã em que viajou para ver o sol nascer nas
montanhas. Quando ela comprou as rosquinhas quentes, e ela e Eli os pegaram juntos,
e ela disse: “Para nós”, ele olhou para ela e disse: “Para nós”. Foi quando ela sentiu a
debandada de búfalos.

A citação africana de Eli veio golpeá-la, sobre ir rápido e sozinho, ou ir longe e


juntos. Colocando o travesseiro sobre sua cabeça, Katie virou-se na cama e soltou um
gemido abafado.

- Não!

Um toque soou em sua porta.

- Katie?

Era Nicole. A maçaneta girou, e ela abriu a porta alguns centímetros.

- Katie, você está bem?

- Sim, eu estou bem.

Ela encheu-se de coragem.

- Como foi o seu grande dia?

- Incrível! Você se importa se eu entrar? Se eu não falar com alguém, eu vou


explodir.

Katie estava sentindo a mesma sensação, mas no lado oposto da gangorra do


amor.

- Sim, claro. Entre. Só não acenda a luz. E não se preocupe em bater em nada no
escuro. Meu quarto está vazio.

Ela se sentou na cama e abriu espaço para Nicole na ponta.

A luz do corredor brilhava quando Nicole entrou. Ela deixou a porta aberta poucos
centímetros para, deixando entrar luz suficiente para ela chegar ao pé da cama de
Katie. Nicole sentou com seu elegante vestido vermelho. Katie se lembrou de como
Rick costumava dizer a Cris que gostava dela de vermelho, uma cor de Katie não
poderia usar com muito sucesso por causa dos cabelos ruivos. Nicole estava ótima de
vermelho.

- Tivemos um momento maravilhoso, Katie. A exposição de arte foi de classe


mundial. Eles tinham peças originais de museus da Rússia, Viena e Paris. Eu vi um
Monet original. Original! Foi de tirar o fôlego. Rick sabia muito sobre as pinturas dos
artistas italianos. Eu não sabia que ele tinha parentes na Itália. Ele esteve lá. E o
restaurante tinha a vista mais incrível do porto e das luzes. Nós falamos sem parar.
Katie, eu estou tão feliz. Tão feliz.

Os olhos de Katie tinham se ajustado à luz. Ela podia ver o brilho suave no rosto de
Nicole.

Katie sabia que poderia alfinetar a experiência de Nicole com Rick com pedaços de
ressentimento e ciúme, e Nicole seria uma vítima da autopiedade de Katie. Ou ela
poderia estender a Nicole o mesmo amor e oferecer inclusão a Deus fazendo Nicole
vítima de graça.

Katie, pegando a mão de Nicole deu um aperto.

O relacionamento dos dois ia dar certo. Katie perguntou quanto tempo demoraria
até que Rick e Nicole percebessem que acabariam casados.

Talvez eles já soubessem.


Capítulo 28
Na manhã do casamento de Julia, Katie foi bem cedo ao apartamento de Ted e
Cris, choveu algum tempo durante a noite. As nuvens esconderam o sol. Sugerindo a
possibilidade de outro chuvisco.

Ela foi direto à sua lista de coisas a fazer do dia, começando com entregar um
cheque ao gerente do apartamento e pegar a pomba com Ted e Cris. Na tarde
anterior, Katie havia ido ao condomínio com os papéis do aluguel e o cheque de
pagamento. No entanto, o gerente não estava lá. Ela deixou um bilhete na porta dele
dizendo que ela voltaria nesta manhã.

Como eram apenas 7:35 quando Katie chegou, ela decidiu ir primeiro ao
apartamento de Cris e Ted. Eles estavam esperando por ela, e dessa maneira ela não
correria o risco de acordar o gerente em uma manhã de sábado, deixando-o ainda
mais rabugento que o normal.

Cris atendeu à porta com a gaiola na mão. Katie gargalhou:

- Você não estaria ansiosa para se livrar da queridinha, estaria?

- Não, o pássaro se comportou como um hóspede perfeito. É que Eu estou com


pressa para sair logo. Ted tem que me deixar de carro no trabalho cedo porque ele
tem um encontro com alguns caras da faculdade. Ei, você já deu entrada dos seus
papéis do contrato de aluguel? Nós estamos tão felizes por você vir morar aqui.

- Eu estou a caminho do escritório agora. Obrigada por vigiar minha pombinha.


Katie pegou a gaiola.

Ted apareceu atrás de Cris.

- Você já decidiu onde você vai ficar durante a próxima semana?

- Não exatamente. Eu tenho estado meio atarefada com as coisas do casamento.

- Fique conosco. Disse Cris.

Katie olhou para Ted.

- Sim, fique aqui, Katie. Nós estávamos falando sério quando convidamos você.

- Tem certeza?

Ted e Cris disseram, “sim”, em uníssono.


- Ok, se vocês têm certeza. Será apenas por alguns dias. E vocês podem me chutar
pra fora a qualquer momento se eu roncar alto demais, fizer uma bagunça muito
grande ou explodir o seu micro-ondas de novo.

- Esses parecem termos razoáveis. Disse Ted com um meio-sorriso.

Cris fez uma cara de ‘Não-dê-atenção-a-ele’.

- Nós ficaremos ansiosos para ouvir como será o casamento hoje.

- Eu vou te contar tudo sobre o casamento amanhã quando eu mudar com minhas
duas sacolas e duas caixas – a extensão de todas as minhas posses.

- E nós estaremos com colchão de ar pronto para você.

Katie agradeceu-lhes novamente e seguiu para o escritório com a gaiola na mão.


Ela virou o canto da rua que circunda o condomínio e avistou o gerente vindo em sua
direção.

- Bom dia! Eu estava indo ao seu escritório.

- Isso é um pássaro?

- Sim. Você sabe o que dizem. Mais vale um desses na mão do que dois desses
voando.

O gerente do condomínio não pareceu achar nada engraçado.

- Este pássaro é seu?

- Sim, mas ele não vai se mudar comigo. Cris estava vigiando ele pra mim por uns
dias.

- Quantos dias?

- Três, por quê?

- Ela terá que pagar um extra este mês.

- Você está falando sério? Aqui. Katie puxou do bolso do seu jeans todo o dinheiro
que ela tinha dentro dele. Isto paga? Três dias de taxa de segurança para pássaro.

Ele pareceu satisfeito e foi logo empurrando o dinheiro no seu próprio bolso.

- Eu tenho todos os papéis do contrato de aluguel e meu cheque comigo. Katie


colocou a gaiola no chão. Ele pegou o envelope da mão dela e olhou ainda mais
descontente do que o normal.
- Você viu o bilhete que eu deixei ontem, certo? Eu disse no bilhete que iria trazer
tudo hoje de manhã.

- Eu vi o bilhete. Mas o apartamento não está disponível.

- O que? O que você quer dizer com isso?

- Outra pessoa depositou o dinheiro ontem de manhã. Eu estou apenas esperando


pela liberação da papelada.

- Mas você sabia que eu queria o apartamento. Eu...

- É assim que as coisas funcionam, Katie. Você é a primeira na lista de espera. Eu


te ligo na próxima semana. Ele começou a andar, passou por Katie e continuou
andando.

Ela permaneceu ali em choque por alguns momentos antes do arrulho da pomba
chamar sua atenção para prosseguir andando. Ela foi dando passos mais largos de
volta ao seu carro, a seguir Katie retornou ao seu passo normal e tentou pensar no que
fazer em seguida. A única escolha acertada era colocar esta reviravolta inesperada dos
eventos de lado e se preocupar com isso amanhã. Hoje, ela tinha alguns outros
assuntos mais urgentes para se concentrar.

Quando voltou ao pátio principal do campus, Katie não podia acreditar em como a
frente do Hall da Coroa havia se transformado em um circo de caixas, caminhões e
estudantes engravatados tentando forçar os vagões de seus carros estufados de
bagagens a fechar. Havia sido dessa maneira nos últimos dois dias. O
congestionamento esta manhã era o dobro do que havia sido nos dias anteriores. Mais
uma vez, Katie estava agradecida que ela tinha cumprido todas as suas horas na
Recepção antes de o movimento frenético eclodir.

Ela tomou banho em um dormitório assustadoramente quieto, e se deparou com


um fluxo de visitantes correndo pelos corredores e ela correu para seu quarto
apertando bem o seu roupão. Fechando a porta, Katie colocou uma música e
aumentou bem o volume para abafar o barulho ocasionado pelo deslocamento no
corredor. O novo vestido de Katie serviu direitinho. O seu cabelo secou
completamente, apesar de ela saber que precisava aparar as pontas logo.

Um pouco de maquiagem, uma borrifada de um perfume com fragrância fresca e


frutal que ela tinha escondido em sua bolsa de maquiagem. Ela havia jogado ali a loção
que acabara de usar e os outros frascos de perfume na quinta-feira. Ela estava pronta.
Mais do que isso, ela estava adiantada.

Katie lamentou o fato de não poder dar um pulo até a porta da Nicole, como ela
tinha feito tantas vezes aquele ano, dar um grande Ta-dáááá, e ouvir Nicole exclamar o
quanto ela estava impressionada porque Katie estava adiantada e que ela estava muito
linda.

Nicole queria ir ao novo Café do Rick no Redlands assim que ela pudesse, então,
ela partiu bem cedo aquela manhã para trabalhar com as pessoas da área do campus e
colocar todas as flores enquanto eles montavam as cadeiras e montavam o corredor.

O combinado foi para que Nicole deixasse os buquês e arranjos de flores na capela
superior do campus, e Katie os pegaria lá.

Já que esse casamento seria pequeno e simples, Julia retirou várias tradições
extras, como o ensaio e o jantar de ensaio. Isso fez Katie se sentir cada vez mais
confiante de que seu pequeno presente, a pombinha, seria um toque especial na
cerimônia.

Katie subiu a escadas e bateu na porta de Julia.

- Se você é a Katie, entre. Se você não é a Katie, então eu não estou.

- Sou eu. Ela entrou e perguntou, Então, como está indo? Você precisa de mim
para arrumar algum alfinete ou botão em seu vestido ou nas suas jóias ou em outra
coisa?

- Não, mas dê a volta. Nós estamos no meu quarto.

Katie parou no quarto de Julia e foi apresentada ao pai e à mãe dela. Então Katie
deixou escapar um longo, profundo e avaliativo: “Ooh!”.

- Julia, você está absolutamente formidável. Esse vestido ficou perfeito em você.

O vestido tinha um estilo clássico e se ajustava às melhores curvas de Julia. Katie


amou a maneira como a saia fluía em uma contínua elegância.

- Obrigada. Julia estava radiante.

- Eu estou tão feliz por você. Katie se inclinou e deu a Julia um tipo de abraço com
um toque leve que não ia amarrotar o seu vestido ou seu véu.

- Obrigada, Katie. Nicole acertou tudo com você a respeito das flores? Eu sei que
ela já foi para Redlands esta manhã.

- Sim, eu estou indo agora para a parte superior do Campus. Eu farei com que você
seja informada se houver algum problema lá. Mas você sabe que estará tudo em
ordem. A Nicole preparou tudo. Ficará tudo impecável.

- Quando você chegar até lá, se o pastor aparecer, você poderia dizer a ele que
nós mudamos a música para a minha entrada no corredor da Igreja? Agora é “Water
Music” do Handel. Isso não afeta em nada as coisas que ele deve fazer, mas eu não
quero que ele seja pego de surpresa.

- Entendi tudo. Você precisa de mais alguma coisa?

Julia sorriu de leve.

Não. Nós encontraremos com você lá em mais ou menos meia hora.

Katie foi para o seu carro e apanhou o pássaro. Em vez de dirigir pela bagunça de
carros e caminhões estacionados em todos os lugares que eles não deveriam estar, ela
foi andando até a parte superior do Campus, balançando suavemente a gaiola.

Pequenos tremores de incerteza pelo apartamento agora indisponível voltaram,


mas ela tentou ignorar esses pensamentos. Afinal, este era o dia do casamento de
Julia.

Deus vai cuidar de tudo. Ele sempre cuida.

Estava quieto quando ela chegou à parte superior do Campus. O ar do final


daquela manhã esquentou suavemente, e uma brisa agradável farfalhou as folhas das
palmeiras. Katie sorriu para elas, todas alinhadas, balançando as suas jubas
embaraçadas como um bando de surfistas retornando do mar na expectativa da
próxima maré promissora.

Katie se lembrou de como, na recepção do casamento de Cris e Ted, Julia havia


abordado ela sobre ser uma RA. Aquela provisão para o seu ano sênior tinha sido uma
(inesperada) surpresa de Deus.

Deus vai cuidar de tudo. Ele sempre cuida.

A capela estava aberta, e as flores estavam exatamente onde Nicole havia


prometido colocar. O buque de dama de honra de Katie foi firmado com a porta da
gaiola secreta aberta. Ela colocou a atual casa do pombo bem do lado desta, abriu a
porta e inclinou a gaiola. A gravidade foi sua amiga e a ajudou a persuadir o pequeno
pombo a escorregar pra dentro de seu novo local de trabalho.

- Aconchegante e cheiroso. O que você acha disso?

O pombo protestou com um bater selvagem de asas e um arrulhar descontente.

- Ei, esta tudo bem. Você vai ficar legal. Relaxe. É só por alguns momentos. Então
você ficará livre. Livre como um pássaro. Vendo por esse ponto, isso não é tão ruim, é?

Katie colou o pássaro no buquê mais para o lado e deixou o pombo se acomodar.
Então ela foi até o lado de fora para checar a organização. O bolo estava colocado
abaixo da abóbada amarela. Uma mulher com um bebê em um carrinho do seu lado
estava inclinada sobre o bolo com um tubo de glacê, adicionando os toques finais.

Todas as sugestões de que poderia cair outra chuva rápida haviam passado. O sol
estava fazendo o que ele faz de melhor. O ar estava limpo e fresco. Este era um dia
perfeito para um casamento.

Katie localizou o pastor parado perto do arco que Nicole havia atado com flores e
plantas. Katie andou até ele, se apresentou, e deu a ele a mensagem de Julia sobre a
música.

- E mais uma coisa, Katie acrescentou, enquanto o violinista começava a afinar seu
instrumento. Eu vou soltar uma pomba de uma gaiola escondida em meu buque no
final, antes de eles saírem pelo corredor da Igreja. Julia não sabe disso.

- O John sabe?

- Não, o Dr. Ambrose não sabe também.

O pastor pareceu um pouco cético.

Como nós podemos saber que o pombo irá sair na hora certa?

Katie deu de ombros.

Você é um homem de oração, por acaso?

- De fato, eu sou, ele disse com uma aparência rabugenta.

- E eu também sou, disse uma voz por traz de Katie.

Ela sentiu a volta dos búfalos mesmo antes de ela se virar e olhar para uma versão
de Eli que ela nunca tinha visto antes. Vestido em um terno preto, permanecendo em
pé, e distante dela apenas um passo. Eli era o homem mais lindo e ousado que Katie já
tinha visto.

O seu cabelo ondulado estava penteado para traz. O seu cavanhaque estava
perfeitamente barbeado, e em seus lábios havia aquele sorriso irresistível que fez Katie
de longe esquecer onde ela estava e o que ela tinha acabado de dizer.

- Eu sou um homem de oração, Eli repetiu. Havia alguma coisa que você precisava
que eu orasse? Alguma grande decisão da vida? Planos futuros? Relacionamentos que
você tem em vista?

A coragem dele surpreendeu-a e ocasionou a resposta direta de Katie.

- Não! Não ore mais. Não por mim. Não ore por nada.
Ela sentiu seu rosto corar com o movimento desconcertante e rapidamente foi
pisando forte pelo campo coberto de grama de volta à capela. Cenas do ultimo ano
passaram como flashes em sua cabeça a cada passo que dava.

Naquele mesmo prado, um ano atrás, Katie havia perseguido a porta da limusine
de Ted e Cris. Ela perdeu um sapato e a sua tiara de flores durante a corrida maluca. Eli
se aproximou dela com o seu “halo” perdido, e ela, desinteressadamente, disse a ele
para jogá-lo fora pra ela.

Em vez disso, Eli pendurou a tiara no espelho retrovisor do seu carro. Meses mais
tarde, quando Katie perguntou a ele por que ele guardou a tiara ressequida, ele disse a
ela que isso o lembraria de orar. Por ela. Ele havia orado por ela durante um ano.

Então? E daí? Isso não muda nada.

Katie relutou contra o ímpeto de olhar para ele de relance sobre o ombro.

Por que ninguém me disse que ele ia ser o padrinho? Por que ele tem que parecer
tão... tão... bom? O que há de errado comigo? Vamos lá, Katie, respire. Isso não muda
nada. Só mais uns dias, e ele vai embora. E você vai...

Ela fez um movimento brusco para abrir a porta da capela e viu Julia parada lá,
esperando pelo seu buque e posando para uma foto perto da janela de vitrais.

Katie piscou rapidamente os olhos para se livrar da revelação cortante de que ela
não sabia onde estaria em alguns dias. Não pense sobre isso agora. Este é o dia da
Julia. Este é o momento dela. Você é a dama de honra. É hora de fazer as coisas que
uma dama de honra faz e depositar toda a sua atenção na noiva.

Os pais de Julia estavam parados em pé ao lado da filha. Inspirando coragem, Katie


foi até eles e sussurrou:

- Vocês já viram as suas flores lá na caixa? E os seus arranjos? Deixe-me pegá-los


para vocês.

A partir desse momento, a movimentação aumentou: fotos, sorrisos e convidados


chegando e ocupando os seus assentos.

O violinista executou o seu solo e Katie foi dando seus passos firmes pelo corredor
da Igreja, segurando à frente de seu corpo o seu buquê de pássaro, tentando o
máximo possível não balançá-lo para que a pomba não saísse voando.

Ela olhou de relance para o Dr. Ambrose. Ele parecia feliz e confiante, parado lá
debaixo do arco, esperando pela sua noiva. Katie deu a ele um leve sorriso e manteve
o seu foco de olhar direto pra frente. Ela não se atreveu a deixar seus olhos se
aventurarem para a direção onde Eli estava em pé perto do noivo.
Kate fez a volta na frente graciosamente e ouviu o distinto “coo” do seu
passageiro clandestino.

Está tudo bem. É um casamento ao ar livre. Ninguém vai pensar que é anormal
ouvir um pássaro por aqui.

A mãe de Julia levantou de sua cadeira, e os outros convidados levantaram com


ela. O violinista mudou para o que Kate sabia agora que deveria ser “Water Music” de
Handel, e descendo o corredor branco Julia apareceu como que deslizando.
Todas as noivas são lindas, disso Katie tinha certeza. E Julia não era exceção. Ela veio
direto, serena e radiante. Ao passo que Julia tomou seu lugar ao lado do seu futuro
esposo, ela abandonou o braço do seu pai e entregou o seu buquê para Katie.

Katie havia se esquecido daquela obrigação de dama de honra. Ela estava se


saindo bem com seu buquê contanto que usasse ambas as mãos para segurá-lo com
firmeza. Agora ela estava com o buquê de Julia em uma das mãos e o seu na outra.

Você pode fazer isto. Relaxe. E não importa o que você faça, não olhe para Eli!

A cerimônia foi tradicional e adorável em sua simplicidade. Durante todo o


evento, Katie podia sentir o olhar persistente de Eli fixo nela. Ela olhou na direção dele
apenas uma vez, quando ele entregou as alianças ao seu tio. Katie pensou que Eli
estaria olhando para o Dr. Ambrose quando ele fez a entrega, mas não, Eli encontrou o
olhar dela, e o seu pobre estômago ficou uma bagunça. Ela olhou pra baixo e percebeu
um cocô branco recentemente depositado na frente do seu vestido preto pela pomba
nervosa.

Ótimo! Eu sei que você está um pouco apertado aí, pombinha, mas será que você
poderá aguentar só mais um pouquinho?

Katie concentrou mais uma vez o seu foco em Julia. Votos trocados e o Dr.
Ambrose foi convidado a “beijar a noiva”. Ele deu a Julia um beijo curto, seguido de um
segundo e de um terceiro beijos.

Os convidados começaram a murmurar baixinho da maneira que todos os


convidados fazem em casamentos, sempre que o beijo entre a noiva e o noivo é
especialmente carinhoso.

Julia e Dr. Ambrose se viraram para encarar seus convidados, os dois com sorrisos
e com os rostos corados. Katie entregou a Julia o seu buque.

- Ok, é isso aí, pombinha.

Katie estendeu a mão para o trinco na parte traseira do seu buquê.


O pastor disse:
- Pra mim é um privilégio apresentar a vocês pela primeira vez... Ele olhou de
relance para Katie, esperando que ela lançasse o pombo.

Katie deu uma leve mexida na gaiola. Vamos lá querido, estenda as suas asas.
Você pode fazer isso!

- ...estas duas pessoas que todos nós temos conhecido e amado...

O pastor estava claramente armando a tenda em favor de Katie. Ela inclinou a


gaiola. A gravidade havia sido sua útil ajudante até agora. Por que não estava
funcionado desta vez?

Katie sacudiu o buquê, e o pombo tombou para a grama e ficou lá, sem se mover.

Oh, não! Ele está morto!

Antes de Katie entrar em pânico, o pastor levantou sua voz dizendo:

- ... os recém-casados, Doutor e Senhora Jonathan Ambrose.

Nesse momento, o pombo de coração forte levantou sua cabecinha, esticou suas
asas, e voou. Todos ficaram ofegantes. Foi como se o bater de asas do pombo no
casamento tivesse sido coregrafado. Ela voou em um meio-círculo sobre a cabeça de
Katie, em seguida sobre o pastor, e então sobre Eli, e depois de maneira graciosa,
batendo de leve as suas asas brancas, a pomba parecia repousar no meio do ar acima
de Julia e Dr. Ambrose no exato momento que eles caminhavam pela passagem entre
os bancos.

A boca de Katie se abriu de espanto, enquanto a gentil pombinha seguiu os noivos


até o fim do corredor, e em seguida, em uma magnífica mostra de bravura e força
elevou-se aos céus.

Todos viram esse momento. Seus rostos expressaram assombro e encanto.


Especialmente o Dr. Ambrose. Quando Katie notou a expressão dele, ela soube que o
seu presente da pombinha foi muito mais do que apenas a ideia de uma surpresa
engraçada. Foi uma “COISA DE DEUS”. Foi uma ideia de Deus para um presente de
casamento especial o tempo todo. Ele simplesmente incomodou e usou Katie para
ajudá-lo a mostrar.

O rosto de Katie se parecia com o nascer do sol rosado devido a sua celeste
alegria. Ela permaneceu em seu lugar, sorrindo larga e descontroladamente e se
esqueceu do próximo passo, o passo final da cerimônia. Ela deveria encontrar Eli a
meio caminho do altar, pegar o braço dele, e sair descendo o corredor com ele.
O pastor limpou a sua garganta. Katie olhou pra ele de canto de olho. Ele inclinou
a cabeça e levantou os seus olhos castanhos sobre o topo do aro de seus óculos em um
sinal de que Katie tinha que corresponder e fazer alguma coisa.

- Oh!

Katie olhou para Eli. Ela deu os seus três passos até o meio do corredor. Ele fez o
mesmo. Só que, a cada passo que Eli dava, a mão dele se aproximava do seu coração, e
os seus olhos estavam fixos em Katie. Da mesma maneira que ela o tinha visto fazer
antes, Eli bateu em seu peito com a palma da sua mão. Uma... Duas... Três vezes.

Em um lugar profundo e ressoante lá dentro de seu ser, Katie ouviu as palavras


não ditas que os ligavam a essas três batidas. Elas vieram a ela devagar, como uma
onda.

Eu... te... amo...


Capítulo 29
- Você deveria tentar comer alguma coisa. Cris olhou para Katie com uma
expressão de preocupação. Eu tenho bolinhos ingleses. Você quer que eu asse um pra
você?

- Não, eu não acho que o meu estomago agüenta esses bolinhos. Katie deixou-se
cair pesadamente de volta ao colchão de ar onde ela estava acampada, no canto da
sala de estar de Cris e Ted. Cara, quando foi que você me ouviu dizer que eu não
consigo comer? Tipo, nunca, certo?

- E você disse que você não tem nenhum outro sintoma? Nenhum suor excessivo,
ou dor, ou coisa desse tipo?

- Não, eu apenas não consigo comer. Katie olhou para o relógio de parede. Você
não precisa ficar acordada até essa hora, só pra assistir eu me esvair em nada.

- Não se desfaça do meu jeitinho de cuidar de você, ou devo dizer, de velar seu
colchão de ar, mas eu estava acordada esperando pelo Ted. Ele normalmente já está
em casa a esta hora nas noites de domingo. Ele provavelmente está conversando com
alguém. Esse parece ser uma parte do trabalho dele ultimamente, ficar ouvindo os
jovens e aconselhando-os. Pelo menos a bancada de Lideres reconheceu as horas
adicionais que ele gasta aconselhando, e eles concordaram em mantê-lo no quadro de
funcionários durante o verão.

- E então?

- Nós não sabemos ainda.

Katie descruzou as pernas de dentro de seu cobertor em forma de casulo.

- Eu acho que Deus está mantendo todos nós em suspense sobre o que vai
acontecer agora.

Cris sorriu docemente.

- Ele nos manteve em suspense, mas nunca nos abandonou.

Katie pegou o seu travesseiro com sua fronha de pequena sereia e o abraçou
contra seu peito.

- Bem, pode haver uma primeira vez para todas as coisas. Especialmente se o seu
gerente cativante não me ligar esta semana dizendo que outro inquilino se mudou
para que eu possa ficar com o apartamento.
- Katie, você sabe que Deus está fazendo uma de suas ‘Coisas de Deus’. Ele sempre
faz. Quantas vezes nos anos passados você foi a única que me disse isso?

- Eu acho que é mais fácil acreditar em coisas boas e esperança para os seus
amigos do que para você mesma.

- Então é uma coisa boa eu ser sua melhor amiga, Katie, porque eu acredito. Eu
acredito que Deus coloca as suas mãos na tua vida. Ele tem feito isso desde o
momento que você foi concebida. Deus tem planos pra você. Planos surpreendentes. A
tua vida foi ideia d’Ele. Este não é um triste fim das coisas, mas sim um começo de
novas aventuras.

Nesse exato momento a porta da frente se abriu. Ted deu um grande sorriso à sua
esposa. Daí seu olhar recaiu sobre Katie e ele a olhou de maneira penetrante.

- O que há de errado? Ele perguntou.

Katie enxugou uma lágrima.

- Nada. A sua esposa estava apenas tentando me alegrar.

- Se eu soubesse que vocês duas estavam aqui alegrando uma a outra, eu as teria
chamado para nos ajudar. Ted rumou para a cozinha e abriu a geladeira.

- Ajudar quem? Cris perguntou.

Ted puxou um suco de maçã e bebeu o restante que havia direto da garrafa.

- Eli. Na mudança de um cara chamado Eli. Eu estava ajudando eles a desmontar e


carregar as coisas pra dentro do caminhão do cara. Não havia muita coisa, mas
demorou um pouquinho. O Eli está se mudando pela manhã. Você sabia disso, certo,
Katie?

Katie se sentiu como se Ted a tivesse acertado com um soco no estômago.

- Não, eu não sabia quando ele iria embora.

- Está certo. Ted deu um passo de volta à sala de estar e olhou seriamente para
Katie com seus olhos azuis, Você provavelmente não sabia quando que ele ia embora
porque não estava falando com ele. Ele disse que você o evitou durante o casamento
ontem. Você ficará bem sabendo que ele vai embora e você não vai se despedir?

Katie balançou a cabeça devagar.

- Não, eu acho que eu não me sinto bem com isso. Eu achei que estaria, mas eu
realmente não estou. Eu tenho que subir até o apartamento dele e dizer adeus. Ou
seja, ele está indo pra longe. Eu posso nunca mais vê-lo de novo. Os olhos de Katie se
encheram de lágrimas.

Cris disse:

- Você deve ir, Katie. Vá lá falar com ele.

- Ele não está lá, disse Ted.

- Onde ele está?

- Ele tem ido pra casa do tio dele passar a noite, desde que ele vendeu a cama e
não tem lugar pra dormir. Julia e o Dr. Ambrose estão em lua de mel, então a casa
deles está vazia.

Katie sentiu as mãos dela fechar e abrir dentro do bolso frontal de seu blusão de
moletom.

- Você sabe onde o Dr. Ambrose mora?

- Não.

- Bem, talvez eu vá apenas ligar para o Eli. Katie marchou até o quarto e procurou
em sua bolsa pelo seu telefone. Você viu meu celular, Cris? Eu o coloquei pra carregar
em algum lugar?

Ted se sentou no sofá.

- Então, o que você vai dizer pro Eli quando ligar pra ele?

- Eu não sei. Eu vou desejar a ele uma viagem tranquila. Onde está meu celular?
Talvez eu tenha deixado ele no meu carro.

- E depois de desejá-lo uma viagem tranquila, o que você irá dizer a ele?

Cris agora tomou assento perto de Ted. Os dois focaram seus olhares em Katie.

- Eu não sei. Acho que eu vou dizer a ele que eu espero que ele tenha uma vida
boa na África.

- Isso é tudo?

- Provavelmente. Katie encarou os seus amigos com as duas mãos nos quadris. O
que é isto? Algum tipo de intervenção?

Ted e Cris se entreolharam e trocaram expressões que Katie não conseguiu


categorizar.
- Agora existe uma opção que nós nunca tínhamos levado em consideração, Ted
disse.

- Ouçam. Katie tentou se acalmar sentando em uma cadeira em frente da banca


examinadora. Vocês acham que Eli é maravilhoso. Eu entendo isso. Sem argumentos
pra isso. Mas, quanto a eu e ele, nós dois, ou seja lá qual for a maneira que vocês
digam... não.

- Não? Os olhos azuis de Cris a encarando estavam como que queimando e


perfurando Katie.

- Por que não? A voz de Ted soou exigente e autoritária, coisa que não era o do
seu feitio.

- Ele é... Eu sou... Nós somos... Não!

- Por que? Ted perguntou de novo, desta vez com menos euforia.

- Ele está indo viver na África. Katie exclamou. Provavelmente pelo resto da vida
dele. Lá é onde mora o coração dele, África.

- Você disse que sempre quis ir à África, Cris a lembrou.

- Eu disse. Eu quero! Mas, eu estava pensando mais em ir fazer uma visita. Ir fazer
alguma coisa boa e depois voltar.

- Voltar pra que? Ted perguntou.

Katie sentiu os sentidos diminuir. Ela não podia responder a ele.

- O que você tem aqui que não pode deixar pra traz?

Ela não respondeu.

Ted perguntou mais uma vez.

- Realmente, o que você tem que poderia te prender permanentemente a este


lugar?

- Nada! Katie soltou a resposta verdadeira e clara. Você sabe disso. Todos os meus
pertences estão prontos na traseira do meu carro. Eu não tenho nada que me faça
ficar aqui.

- Agora nós estamos chegando a algum lugar. Ted prosseguiu. Então, o que você
tem a perder se você se desprender de tudo que tem aqui – e se desprender significa
ter uma chave para o que está acontecendo aqui – e se você comprar um bilhete só de
ida para o Quênia? O que você teria a perder, Katie?
Ela desejou, nesse momento, ter algum tipo de resposta atrevida, mas tudo que
ela tinha era a verdade flutuando abertamente no topo do seu espírito. Ela pegou essa
verdade e entregou ao Ted em resposta.

- Nada.

Ted coçou o lado do seu maxilar.

- Eu vejo apenas uma imagem em tudo isto. A imagem de Cristo e sua noiva, a
Igreja.

Cris deu a Ted um olhar de questionamento, como se ela não pudesse acreditar
que aquilo tinha saído da boca dele.

- É mais ou menos assim, Katie. Ted voltou a sentar no sofá. Você tem toda razão
de acreditar que Eli quer estar com você e dividir a vida com você. Mas você resiste,
apesar de você não ter nada a perder. É uma coisa do coração, realmente. Você sabe
disso. A questão foi feita, e permanece, você quer ele?

Katie ficou imóvel. Seu estômago estava uma bagunça. Retendo as lágrimas que
ela se recusava a deixar sair. Ela levantou o queixo.

- Então o que você acha que pode acontecer se eu disser sim?

Ted entrelaçou as mãos atrás do seu pescoço.

- Diga-me você.

Cris sorriu levemente.

- De uma coisa eu tenho plena certeza, seu apetite voltaria.

- E você está dizendo que eu e Eli devemos ir viver com as girafas e leões e viver
felizes para sempre. Katie pode ouvir o tremor em sua voz.

Ted e Cris se entreolharam com sorrisinhos.

- Isso pode acontecer, Ted disse.

Katie sentiu como se uma centena de pipocas estivesse estourando em sua


cabeça.

- Eu não posso acreditar que vocês estão dizendo para mim que está tudo bem se
eu apenas arrumar as minhas malas...

- Suas malas já estão arrumadas, Cris interrompeu.

- ...e comprar um bilhete de passagem só de ida para o Quênia amanhã.


- Por que não? Ted perguntou. As maravilhas do mundo moderno. Você pode
comprar uma passagem de avião dentro do conforto do nosso apartamento. E se você
não tiver o bastante para cobrir o preço da passagem, Cris e eu ajudaremos você a
pagar, não é Cris?

- Eu acho que ela tem o bastante. Cris manteve os seus olhos azuis de raio laser
fixos em Katie. Ela tem o bastante de tudo que ela precisa pra fazer essa decisão,
incluindo todas as suas vacinas e pílulas contra malária. Analisando os fatos, eu acho
que você já fez esta decisão há muito tempo atrás, Katie. Você só estava esperando
que alguém como nós te desse um pequeno empurrãozinho.

O momento continuou. Katie não olhou mais para Ted e Cris.

A voz calma de Ted ecoou no silêncio.

- Katie, do que você está com medo?

Uma pequena capa de lágrimas embaçou a sua visão.

- Eu tenho investido tanto no Rick. Tantos anos. Tantas emoções. Tanto de mim
mesma. Parece que eu tenho que esperar um pouco mais. Não ficar vulnerável de
novo tão rápido. Seria mais seguro esperar, não acham? É melhor eu esperar e não
ficar emocionalmente ligada a ninguém. Especialmente não me ligar a uma pessoa do
outro lado do mundo. É demais, é muito cedo, muito longe.

- Dói muito quando você cai de cima de uma nuvem, disse Ted. Mesmo se você
pular dela. Todos nós entendemos isso. Então isso significa que você vai se deitar no
chão e se fingir de morta?

Katie se lembrou da pomba tombando de sua gaiola floral ontem e permanecendo


na grama sem se mover.

- Não. A voz de Katie era quase um sussurro. Então, novamente, com mais certeza,
como se a sua alma estivesse começando a flutuar, ela disse enfaticamente, Não!

- Então faça isso, Katie! Os olhos de Cris brilharam. Entre naquele avião amanhã e
veja o que Deus tem para você e para o Eli juntos na África. Você pode sempre voltar
pra casa. Nós estaremos aqui para você. Mas se você não agarrar esta chance agora,
você pode perder a próxima surpreendente ‘coisa de Deus’ que Ele tem esperando por
você.

Katie e Cris trocaram entre si um olhar de entendimento do fundo dos seus


corações.

- Okay.
Ao passo que Katie falava a palavra de ouro, Ted se levantou.

- Okay, ele repetiu enfaticamente. Ele abriu o laptop e se sentou à mesa da


cozinha. O vôo de Eli sai de San Diego as 06:30 amanhã de manhã.

- Como você sabe disso? Você vai dar uma carona pra ele?

- Não. Eli deu o carro dele para o Joseph. Eu os ouvi falando sobre o horário que o
Joseph precisava buscá-lo. Eu ouvi também o Eli dizer que ele tem uma escala em
Londres. Tudo que nós temos de fazer é achar um vôo às 06:30 para Nairóbi saindo de
San Diego que faz conexão em Londres e ver se Deus guardou um assento pra você.

- Comece a arrumar suas coisas, disse Cris. Nós guardaremos o que você não
precisa aqui em nosso armário de armazenamento. Se você quiser alguma pasta de
dentes extra ou xampu, você pode pegar o quanto eu tiver.

Katie começou a arrumar as malas mais uma vez, desta vez simplificando sua vida
em o que ela poderia acomodar em uma grande mochila de tecido e uma bagagem de
mão. Ted achou o vôo que correspondia aos critérios e reservou um assento na janela
para Katie.

- Ou você prefere o corredor?

- Eu não ligo. Eu não acredito que nós estamos fazendo isto. Vocês dois são
cúmplices, viram? Se tudo isso não der certo, vocês terão que admitir o seu
envolvimento. Pode ficar muito bagunçado.

- O amor tende a ser bagunçado, Ted falou.

- E inconveniente, Katie acrescentou, lembrando o que Eli disse no passeio ao


monte Strawberry. Vocês realmente acham que isto é amor? Vocês acham que eu
estou apaixonada pelo Eli, e eu só não quero admitir para mim mesma?

- O que quer que seja isto, você vai ter muito tempo para imaginar em sua viagem
pra lá. O seu vôo dura vinte sete horas, Ted respondeu.

- Com um escala de quatro horas em Londres, Cris acrescentou. Você quer tomar
um banho?

- Em Londres?

- Não, agora. São 1:45 da manhã. Se você quiser estar no aeroporto duas horas
antes da partida para vôos internacionais e se levar uma hora pra nós irmos dirigindo
até o aeroporto, isso significa que nós devemos sair em uma hora.
Katie tomou um banho corrido. Ela vestiu as suas roupas de viagem mais
confortáveis e prendeu uma barra de sabão debaixo do lavabo. Puxando todos os
documentos importantes do seu fichário, Katie chamou:

- Cris, você tem um dólar?

- Eu acho que sim. Você não vai precisar de mais dinheiro que isso? Cris abriu a sua
carteira e puxou de lá uma nota de vinte dólares e mais algumas de um.

- Tudo que eu preciso é de um dólar. Agora, você pode assinar isto aqui e devolver
pra mim?

- O que é isto?

- A transferência da Clover.

- Clover?

- Meu carro. Eu acabei de vendê-la a você por um dólar. Assine aqui, e ela será
sua.

- Katie!

- Não faça uma cena, Senhora Spencer. O que eu irei fazer com um carro? Você
precisa de um. E eu não. Você acaba de comprá-lo.

Cris e Ted agradeceram a Katie mais do que o necessário.

- Se isso tudo explodir em cima de mim, eu posso comprá-la de volta por um dólar.
Oh, e diga ao seu senhorio que eu retiro as minhas aplicações de aluguel. Rasgue o
cheque pra mim também, você pode fazer isso?

Depois de finalizarem mais alguns afazeres, os três rodaram pela rua vazia às três
da manhã. A meia-lua embaçada escorregou por trás de um punhado de nuvens, e
Katie mordeu o seu lábio inferior.

- Digam-me de novo por que está é uma boa ideia?

Cris disse:

- Assim que o Eli te ver você vai saber.

Ted e Cris entraram no aeroporto com Katie e a acompanharam o mais rápido que
podiam pelo check in. Eli não estava em nenhum lugar que pudesse ser visto por eles.

- Eu não vou embarcar no avião se ele não estiver lá dentro. Disse Katie.

- Ele pode estar chegando atrasado. Ted sugeriu.


- Ou pode já ter passado pela segurança e pelo portão de embarque, Cris disse.

- Você pode passar pela segurança logo, Katie. Você tem o seu telefone; o meu
está ligado. Nós vamos esperar aqui. E se ele não estiver lá até a hora de o avião
embarcar, então não entre nele. Ligue pra nós e nós vamos imaginar alguma saída.

- Okay. Bem, até.

O bolo na garganta de Katie estava muito grande para ela engolir quando ela
percebeu que estava dizendo adeus aos seus amigos de longa data. Os olhos de Cris se
encheram e lágrimas, mas o seu sorriso confiante ainda estava no mesmo lugar
quando ela abraçou Katie. Ted colocou a sua mão larga na testa suada de Katie e a
abençoou:

- Katie, que o Senhor te abençoe e te guarde. Que o senhor faça Sua face
resplandecer sobre você e que Ele te dê a Sua paz. E que você sempre ame
primeiramente a Jesus, acima de tudo o mais.

Quase que sussurrando:

- Obrigada.

Katie entrou na linha de segurança. E quanto mais ela passava pela área de
segurança ela se apressava mais para chegar ao portão de embarque procurando por
Eli. Ela não tinha ideia do que dizer a ele quando ela o encontrasse. Se ela o
encontrasse.

Isto é loucura.

Chegando ao portão e prendendo a respiração, Katie verificou cada passageiro


sentado na área de espera. Nada de Eli. Ela foi andando pela área adjacente da área de
espera. Nada de Eli.

E se o Ted pegou o dia errado? Ou o aeroporto errado? E se o vôo for na verdade


às 6:30 da noite? Esta deve ser a coisa mais “por capricho” que eu já fiz durante toda a
minha carreira como tesouro peculiar. Então o que acontece com a minha bagagem se
eu não embarcar no avião? Ela vai pra Nairóbi sem mim?

A manada de búfalos estava começando a demolir tudo o que ela havia deixado
em seu canal digestivo.

Nesse exato momento o seu telefone celular tocou. Ela estendeu a mão para
atender.

- Ele está aqui, era Cris sussurrando. Nós acabamos de vê-lo descer do carro na
área de restrição. Nós estamos nos escondendo atrás de um pilar, por isso ele não
pode nos ver. Ele está verificando a bagagem dele agora mesmo com um boné. Ele
está vestindo uma jaqueta marrom e um boné de beisebol.

Katie não sabia se ela deveria ficar lá e esperar ou refazer os seus passos de volta à
área de segurança para encontrá-lo lá.

- O que eu devo fazer: Ficar aqui ou voltar pra área de segurança?

A voz de Ted apareceu na linha.

- Encontre-o na metade do caminho, no estilo de Isaque e Rebeca. Todo


relacionamento que dá certo é aquele entre duas pessoas que estão querendo se
encontrar na metade do caminho. Vai lá!

Katie agarrou sua bagagem rapidamente, apertou o passo e correu de volta à área
de segurança. Ela se sentiu como a mulher de Cânticos de Salomão que correu pelas
ruas tentando encontrar o seu amado. O seu estômago estava doendo. Ela não
conseguia respirar. Diminuindo o seu passo, ela maneirou a sua respiração, e então ela
o viu. Ele estava pegando a sua bagagem de mão do escâner de segurança e
balançando o seu pé direito dentro de seu sapato. Eli!

Ela parou exatamente onde ela estava e esperou, o seu coração batendo como um
tambor africano.

Eli firmou a sua mochila em um braço e levantou a sua bagagem de mão com o
outro. Ele segurou o seu bilhete de passagem na mão direita e parou em frente à lista
eletrônica de embarque, checando sua passagem e depois checando a lista de
embarque novamente.

Ele estava apenas a dez passos de distância. Katie esperou até que ele a avistasse.

Dando as costas para a lista de embarque, Eli andou mais três passos antes de
olhar pra cima. E foi nesse momento que ele viu Katie exatamente lá na sua frente. Ele
piscou como se ela fosse um sonho. Em seguida ele deixou cair a sua bagagem,
exclamando:

- Você está aqui!

- Eu estou aqui.

- Por quê?

- Eu...

- Você está indo para Nairóbi, não é? O rosto de Eli se iluminou.

- É isso que diz no meu bilhete de passagem.


- Quando? Quando você?....

Na noite passada. Esta manhã. Algumas horas atrás. Eu não sei. Ted e Cris me
induziram.

A expressão atordoada de Eli se relaxou e se transformou em um sorriso.

- Você disse aos meus pais que você estava vindo?

- Não. Eu deveria ter mandado um e-mail ao seu pai, mas tudo aconteceu muito
rápido.

Eli estendeu a mão e passou suavemente as costas dos seus dedos pela bochecha
de Katie.

- Está tudo bem. Não importa. Eu acho que eles já sabem.

- Como?

- Minha mãe disse que você deveria estar vindo.

- Sua mãe? Como ela soube?

Eli curvou o seu queixo e olhou para Katie com um de seus ricos e hipnóticos
olhares, dizendo:

- Minha mãe é uma mulher de oração.

Katie sentiu os seus olhos se encherem de lágrimas. Tudo em seu interior dizia a
ela que isto era certo. Isto era verdade. Um lugar havia sido preparado pra ela mesmo
antes de ela perceber. Mesmo enquanto ela estava sendo obstinada e cheia de medo.
Toda a hesitação se foi. Katie soube que ela estava exatamente onde ela deveria estar
e fazendo exatamente o que ela deveria fazer.

O seu estômago roncou, e ela soube que seu apetite tinha voltado. Porque ela
estava profunda e humildemente maravilhada por Deus e sua maneira de vida que
mais parecia um furacão. O amor chegou até ela em seu próprio tempo, e isso foi
inconveniente e orgânico. Ela teve todas as razões para acreditar que isto era muito
real.

Relaxando a sua respiração, Katie deu um passo atrás. Ela levantou o braço e abriu
a sua mão. Com o olhar fixo em Eli, ela bateu a palma de sua mão aberta contra o
coração três vezes.

A expressão de Eli era de que ele claramente havia recebido a mensagem. Ele
estendeu a mão pra ela, tomou o seu rosto com as suas fortes mãos e olhou-a nos
olhos.
- Você tem certeza?

- Sim, eu tenho certeza.

- Então, eu vou beijar você. ♥

E ele a beijou.

Eli beijou Katie com toda a ternura surpreendente de um homem do qual as


orações acabaram de ser respondidas. Katie recebeu o seu beijo, sentindo como se um
magnífico amanhecer estivesse nascendo em seu interior tão vívido e transformador
como o nascer do sol que eles haviam experimentado juntos. A escuridão se foi. Ela
pode ver abertamente as possibilidades diante deles.

Esse homem era um guerreiro. Um guerreiro de oração.

Ele pressionou a sua testa contra a dela e depois tomou distância o bastante para
olhá-la nos olhos. O que Katie leu no olhar dele foi profundo e misterioso, como uma
chuva de meteoros à meia-noite, brilhando com pequenas ondas de luz.

Eli tomou a mão dela pra junto da sua e rumou a caminho do portão de
embarque.

Katie estava lá, nesse exato momento que o Autor e Finalizador de sua história de
vida estava prestes a começar um novo capítulo no livro de seus dias. Este capítulo
poderia ser preenchido com tudo que ela havia sonhado até agora – aventura,
mistério, esperança, e amor. Sim, mais especificamente amor.

Ela deu um aperto de leve na mão de Eli.

- Eu acho que isto significa que nós vamos juntos.

Eli sorriu.

- Sim, nós vamos. Nós estamos indo juntos. E você sabe o que isso significa, não
sabe?

Katie se lembrou do ditado africano que ele falou para ela na cafeteria.

- Isso significa que nós vamos longe.

Ao passo que falava essas palavras, Katie tomava ciência do doce sentimento de
paz que estava chegando como uma onda entre eles dois. E foi nesse momento que
ela soube. O Espírito de Deus estava agindo. Ele estava ligando os corações deles dois
um ao outro.

FINALMENTE.

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