Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Belo Horizonte
2016
DANIEL CARNEIRO MACHADO
Belo Horizonte
2016
Machado, Daniel Carneiro
M149a A (in)compatibilidade do incidente de resolução de demandas
repetitivas com o modelo constitucional de processo: a participação
democrática do juiz e das partes na construção do provimento
jurisdicional / Daniel Carneiro Machado. – 2016.
Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Juliana Moreira Pinto – CRB 6/1178
DANIEL CARNEIRO MACHADO
________________________________________
Professor Doutor Fernando Gonzaga Jayme
Orientador
Universidade Federal de Minas Gerais
_________________________________________
Professor Doutor Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves
Membro titular
Universidade Federal de Minas Gerais
_________________________________________
Professor Doutor João Alberto de Almeida
Membro titular
Universidade Federal de Minas Gerais
_________________________________________
Professor Doutor Edilson Vitorelli Diniz Lima
Membro titular
Universidade Presbiteriana Mackenzie
_________________________________________
Professor Doutor Antônio Pereira Gaio Júnior
Membro titular
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
_________________________________________
Professor(a) Doutor(a)
Membro suplente
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus por trilhar o meu caminho para a conquista de mais uma vitória na
minha vida profissional e acadêmica. O sonho da conclusão do Doutorado na respeitada
Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais se torna realidade.
À minha família, minha fortaleza e fonte de inspiração. Minha mãe Lúcia e meus irmãos,
meus incentivadores. Minha esposa Constança, pelo amor e apoio sempre incondicional, pela
compreensão nas minhas ausências e por ouvir minhas incertezas ao longo da pesquisa
sempre me ajudando a superá-las.
Aos meus filhos Davi e Matheus, por serem o meu maior tesouro.
Ao prezado professor e orientador Fernando Jayme, pelas valiosas críticas e sugestões feitas
nas aulas da Pós-Graduação quando já estudávamos o projeto do NCPC e, principalmente,
durante a realização deste trabalho.
The present research critically examines the Repetitive Demands Incident Resolution
established by Law 13105; March 16th 2015, showing its incompatibility with the
constitutional model of Brazilian civil procedure. This class incident endowed with binding
effect has the purpose of bringing celerity and uniformity to the interpretation of the repetitive
matter of law in many demands. This research addresses the juridical nature of the incident,
the suitable hypothesis, the legitimacy, the procedure and its trial effects, focused on the way
that affected parts participate as well as their fair representativeness in addition to the impact
on jurisdictional first instance judge work. Therefore, the study has addressed the necessary
conflict between the mass incident and the democratic participation guarantee, parting from
the adversary proceeding´s concept, considering Fazzalari’s theory constitutional view, in
order to demonstrate the importance of the interested parts’ participation as well as the
judge´s role in the construction of the state provision. The study focus on Italo Andolina and
Giuseppe Vignera‘s Italian civil procedure unique constitutional model, yet on Comoglio’s
perspective of the fair process, perfectly suitable to Brazil due to its constitutional guarantees.
The study supports the idea that the new institute transforms the adversary proceeding in mere
legal fiction in order to guarantee the celerity on the standard interpretation of a legal matter
discussed in many actions. The new legislation does not ensure control of the suitable
representation of the parties that will be affected by the trial and the right to opt-out of its
effects, featuring unproportional restriction on access to Justice. Finally, the research shows
that the ordinary courts cannot be considered precedent cuts and also that it is inadequate to
define the IRDR as a bind precedent. Only the Supreme Courts, that are the higher level in
judiciary organization, should play the role of the “Court of Precedent”. It also shows that,
according to the Supreme Court’s precedents in Brazil, the common law cannot establish
binding force to any court judgment, being incompatible with the judicial independence,
which is an essential guarantee of the constitutional process model.
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10
CONCLUSÃO....................................................................................................................... 289
INTRODUÇÃO
A toda evidência, não se pode negar que, em razão das dificuldades enfrentadas
pelo Poder Judiciário, as exigências em torno da uniformização da jurisprudência e da
redução do tempo do processo são uma tônica do direito processual contemporâneo.
1
GRINOVER, Ada Pellegrini. Deformalização do processo e deformalização das controvérsias. Novas
tendências do direito processual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990, p. 175.
11
energias na busca pela concretização de um processo judicial mais célere e efetivo diante da
necessidade de “desafogar” o Poder Judiciário atingido por uma avalanche de demandas com
altíssima taxa de congestionamento; de outro, parcela de juristas defende a necessidade de se
reforçar a legitimidade democrática do processo decisório, sobretudo mediante o
fortalecimento da participação e do direito de influência das partes na construção do
provimento jurisdicional. 2
O processo não tem que ser rápido/ célere: o processo deve demorar o tempo
necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional.
(...) A partir do momento em que se reconhece a existência de um direito
fundamental ao processo, está-se reconhecendo, implicitamente, o direito de
que a solução do conflito deve cumprir necessariamente, uma série de atos
obrigatórios, que compõem o conteúdo mínimo do devido processo legal. A
exigência do contraditório, o direito à produção de provas e aos recursos,
certamente, atravancam a celeridade, mas são garantias que não podem ser
desconsideradas ou minimizadas. É preciso fazer o alerta, para evitar
discursos autoritários, que pregam a celeridade como valor insuperável.4
2
FRANCO, Marcelo Veiga. Processo justo: entre efetividade e legitimidade da jurisdição. Belo Horizonte: Del
Rey, 2016, p. 1-2.
3
JAYME, Fernando Gonzaga. Obstáculos à tutela jurisdicional efetiva. Rio de Janeiro: Revista Forense, v. 399,
2008, p. 95-110.
4
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do processo e processo de conhecimento.
Salvador, Editora JusPodivm, 2010, p. 59.
12
5
Os professores Humberto Theodoro Júnior, Dierle Nunes e Alexandre Bahia entendem que a repercussão geral
criada no direito processual brasileiro como pressuposto de admissibilidade do recurso extraordinário (art. 102, §
3º da Constituição de 1988 e arts. 543-A e 543-B do CPC) se encaixa no perfil técnico das chamadas “causas
piloto” ou “processos teste”, no qual, para a resolução dos litígios em massa, uma ou algumas causas são
escolhidas pela similitude na sua tipicidade para serem julgadas e cuja solução permite que se resolvam
rapidamente todas as demais causas paralelas. Os referidos juristas consideram que a técnica de julgamento dos
recursos repetitivos seria equivalente a um “mecanismo de pinçamento” (escolha do recurso representativo da
controvérsia) que, por sua vez, não permitiria uma participação efetiva dos interessados, eis que a escolha do
recurso (pinçamento) pelo órgão a quo não garante que todos os argumentos relevantes para o debate e deslinde
da causa, suscitados por todos os interessados, sejam levados em consideração no momento da construção da
decisão. A participação efetiva se limitaria às partes dos recursos afetados, que podem ou não ter apresentado
13
fundamentação jurídica idônea e técnica. (THEODORO JÚNIOR. Humberto; NUNES, Dierle José Coelho;
BAHIA, Alexandre. Litigiosidade em massa e repercussão geral no recurso extraordinário. Revista de Processo,
nº 177, nov. 2009, p. 22-23)
6
Conforme informa Antônio do Passo Cabral, “ainda que não existam muitos mecanismos com funções de
conferir tutela coletiva a questões comuns, a legislação processual pátria admite, há muito tempo, a quebra de
cognição em alguns procedimentos, com um juízo decidindo sobre uma ou algumas questões prévias, deixando o
julgamento da questão principal a outro órgão judiciário. Assim ocorre com o incidente de reserva de plenário
(art.97 da Constituição da República de 1988 e art.480 e ss. do CPC) para a declaração de inconstitucionalidade
das leis pelos tribunais, bem como o incidente de uniformização de jurisprudência, previsto no art.476 do CPC.
Nestes incidentes, a cognição da questão prévia é remetida ao pleno ou órgão especial dos tribunais, deixando às
câmaras ou turmas (órgãos fracionados), a decisão sobre o mérito do recurso.” (CABRAL, Antônio do Passo. O
novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às ações coletivas. Revista de Processo,
mai. 2007, p. 143)
14
7
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Notas sobre alguns aspectos do processo (civil e penal) nos países anglo-
saxônicos. Temas de direito processual: sétima série. São Paulo: Saraiva, 2001, 155.
8
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:
Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988, p. 163.
9
BRASIL. Anteprojeto do novo Código de Processo Civil. Brasília-DF, 2010. 381 pp. Disponível em:
HTTP://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf. Acesso em: 09 mar. 2015.
10
MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. Ações coletivas no direito comparado e nacional. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002, p. 57.
15
É por isso que o devido processo legal ou devido processo justo deve envolver um
tempo específico definido em bases constitucionais, e este não é um inimigo, mas um fator
relevante para o debate e a própria estruturação equilibrada do processo no Estado
11
MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. Ações coletivas no direito comparado e nacional. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002, p. 59.
16
Democrático de Direito. 12
Na mesma linha teórica, o professor Dierle Nunes13 adverte que o processo deve
ser estruturado em qualquer situação sob uma perspectiva comparticipativa e policêntrica,
ancorado nas garantias fundamentais previstas na Constituição, constituindo um espaço
12
NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático: uma análise crítica das reformas
processuais. Curitiba: Juruá, 2008, p. 211.
13
NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático: uma análise crítica das reformas
processuais. Curitiba: Juruá, 2008, p. 211.
17
14
MARINONI, Luiz Guilherme. Da teoria da relação jurídica processual ao processo civil do Estado
Constitucional. In: DIDIER Jr., Fredie e JORDÃO, Eduardo. Teoria do Processo: panorama doutrinário
mundial. Salvador: Editora Juspodivm, 2008, p. 544.
15
JAYME, Fernando Gonzaga. Obstáculos à tutela jurisdicional efetiva. Rio de Janeiro: Revista Forense, v. 399,
2008, p. 95-110.
16
ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 23.
18
dos fundamentos jurídicos apresentados pelas partes no processo, representa garantia do povo
e da democracia.
17
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 180.
19
CAPÍTULO 01
18
BOBBIO, Norberto. Estado, Governo, Sociedade. Para uma teoria geral da política. Trad. Marco Aurélio
Nogueira. São Paulo: Paz e Terra, 2011, p. 115.
19
TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 24.
20
20
THEODORO JR., Humberto. O processo justo e as tutelas jurisdicionais proporcionáveis aos direitos
substanciais em crise. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, n. 123, jun., 2013, p 33.
21
CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p.
55.
22
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010,
p. 47.
21
23
SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris,
2006, p. 12-13.
24
CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p.
57.
25
TEIXEIRA, Ludmila Ferreira. Acesso à Justiça Qualitativo. 2012. Dissertação (Mestrado em Direito) –
Faculdade de Direito do Sul de Minas. Programa de Pós-Graduação em Direito, Pouso Alegre, MG, 2012, p. 53.
26
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:
Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988, p. 8.
22
pelo autor. 27
27
TEIXEIRA, Ludmila Ferreira. Acesso à Justiça Qualitativo. 2012. Dissertação (Mestrado em Direito) –
Faculdade de Direito do Sul de Minas. Programa de Pós-Graduação em Direito, Pouso Alegre, MG, 2012, p. 60.
28
SANTOS, Boaventura de Sousa; MARQUES, Maria Manual Leitão; PEDROZO, João. Os tribunais nas
sociedades contemporâneas. Revista Brasileira de Ciências Sociais, ano 11, n. 30, fev. 1996, p. 33.
23
política do Estado, que começa a assumir um papel mais intervencionista, paternalista, saindo
da posição negativa do liberalismo para adotar uma conduta positiva no sentido de garantir
direitos sociais mínimos. Nas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet29, “não se cuida mais,
portanto, de liberdade do e perante o Estado, e sim de liberdade por intermédio do Estado”.
29
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010,
p. 47.
30
CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p.
58.
31
ROMÃO. José Eduardo Elias. Justiça Procedimental: a prática da mediação na teoria discursiva do Direito de
Jurgen Habermas. Brasília: Maggiore, 2005, p. 31.
32
SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris,
2006, p. 19.
24
Para dar resposta aos novos tipos de conflitos, foi criada no Brasil a Justiça do
Trabalho em 1939, permitindo a atuação do Poder Judiciário voltada à proteção do direito
33
CARVALHO NETTO, Menelick de. Requisitos Pragmáticos da interpretação jurídica sob o paradigma do
Estado Democrático de Direito. Revista de direito comparado. Belo Horizonte: Mandamentos, 1999, p. 480.
34
CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. Direito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p.
59.
25
social dos trabalhadores, o que, sem dúvida, proporcionou maior acesso à Justiça. O Decreto-
Lei 1.608, de 1939, que cria o Código de Processo Civil, também se insere com grande
relevância no contexto histórico de ampliação de acesso à Justiça no Brasil.
Alguns anos depois, no regime ditatorial de 1964, motivado já àquela época pela
quantidade de processos em tramitação no Poder Judiciário, foi elaborado outro Código de
35
Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1930-1939/decreto-lei-1608-18-setembro-1939-
11638-norma-pe.html Acesso em: ago. de 2015.
26
36
BRASIL. Senado. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/177828 Acesso em agosto de
2015.
27
Com efeito, o direito processual daquela época ainda era voltado primordialmente
à proteção do indivíduo, dos direitos individuais; quanto aos direitos de titularidade coletiva,
sobretudo os difusos, ainda não havia mecanismos eficientes para a sua defesa.
37
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil: Lei 8.455, de 24-08-92, 8.637, de
31-3-93, 8.710, de 24-9-93, 8.718, de 14-10-93, 8.898, de 29-6-94, 8.950, de 13-12-94, 8.951, de 13-12-94,
8.952 de 13-12-94 e 8.953, de 13-12-94. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 22.
38
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:
Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988, p. 49-50.
28
Para demarcar a passagem dos paradigmas dos Estados Liberal e Social de Direito
ao do Estado Democrático de Direito, destacam-se as palavras de Bernardo Gonçalves
Fernandes:
(...) o Estado Democrático é muito mais que um princípio, configurando-se
um verdadeiro paradigma – isto é, pano de fundo de silêncio – que compõe e
dota de sentido as práticas jurídicas contemporâneas. Vem representando,
principalmente, uma vertente distinta dos paradigmas anteriores do Estado
Liberal e do Estado Social. Aqui a concepção de direito não se limita a um
mero formalismo como no primeiro paradigma, nem descamba para uma
materialização totalizante como no segundo. A perspectiva assumida pelo
direito caminha para a procedimentalização, e por isso mesmo, a ideia de
democracia não é ideal, mas configurando-se pela existência de
procedimentos ao longo de todo o processo decisório estatal, permitindo e
sendo poroso à participação dos atingidos, ou seja, da sociedade. 39
39
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p.
206-207.
40
HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio
Antônio Fabris Editor, 1991.
29
O fundamento desse novo paradigma do Estado não é apenas a defesa dos direitos
de primeira dimensão (direitos civis e políticos) e de segunda dimensão (direitos sociais,
econômicos e culturais), mas também a efetiva proteção e implementação dos direitos
fundamentais de terceira dimensão42 (direitos difusos)43.
41
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. São Paulo: Método, 2010, p. 636.
42
Registre-se que a divisão dos direitos fundamentais em dimensões está amparada no surgimento histórico de
tais direitos, sendo que parte doutrina tem evitado o termo “geração”, trocando-o por “dimensão”. Isso porque a
ideia de “geração” está diretamente ligada à de substituição ou superação, sendo que os direitos fundamentais
não se sobrepõem, não são suplantados uns pelos outros. A distinção entre gerações serve apenas para,
pedagogicamente, situar os diferentes momentos em que esses grupos de direitos surgem como reivindicações
acolhidas pela ordem jurídica, conforme a evolução do Estado.
43
GRECO, Leonardo. Novas perspectivas da efetividade e do garantismo processual. In: SOUZA, Márcia
Cristina Xavier de. RODRIGUES, Walter dos Santos (Coord.). O novo Código de Processo Civil: o projeto do
CPC e o desafio das garantias fundamentais. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 02.
30
O acesso efetivo à Justiça ganha, portanto, novo impulso com o advento dos
direitos de terceira e quarta gerações, relacionados ao meio ambiente, ao desenvolvimento
sustentável, à proteção do consumidor, e demais direitos difusos e coletivos. Por conseguinte,
as declarações jurídicas consagraram a prerrogativa inarredável de que todo cidadão faz jus a
receber dos tribunais solução efetiva e em tempo razoável para os atos que violem seus
direitos.
44
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Malheiros, 2006, p. 571-572.
45
SAMPAIO, José Adércio Leite. A constituição reinventada pela jurisdição constitucional. Belo Horizonte:
Del Rey, 2002, p. 302.
46
NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático: uma análise crítica das reformas
processuais. Curitiba: Juruá, 2008, p. 42.
31
Por outro lado, a ineficiência do Estado quanto à efetivação dos direitos básicos à
educação, saúde, moradia e ao trabalho assegurados pela Constituição da República de 1988
tem acarretado grande insatisfação social. Ou seja, existe uma discrepância alarmante entre as
promessas constitucionais e a realidade vivenciada, demonstrando a conduta recalcitrante dos
entes públicos e grandes empresas – instituições financeiras, concessionárias de serviços
públicos em geral – em transformar e melhorar a qualidade e eficiência dos serviços.
Assim, o Poder Judiciário apático e inerte de outrora cede seu lugar a um Poder
prospectivo e atuante, em decorrência da denominada “judicialização” das políticas públicas
para a efetivação dos direitos.
47
NUNES, Dierle José Coelho. Processualismo constitucional democrático e o dimensionamento de técnicas
para a litigiosidade repetitiva, a litigância de interesse público e as tendências ''não compreendidas'' de
padronização decisória. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 36, n. 199, set. 2011, p. 43.
48
BARROSO, Luis Roberto. Constituição, democracia e supremacia judicial: direito e política no Brasil
contemporâneo. Revista Jurídica da Presidência, Brasília, v. 12, n. 96, fev/maio 2010, p. 6-7.
32
de representação política para a atuação decisória dos tribunais, o que, sem sombra de dúvida,
causou um redimensionamento do papel do Judiciário para o qual ele não estava preparado.
Boaventura de Sousa Santos51 já advertia há mais de uma década que tudo isso
resultaria em uma explosão de litigiosidade à qual a administração da justiça dificilmente
poderia responder, acarretando sérios problemas de eficiência e morosidade ao Poder
Judiciário.
49
GONÇALVES, Gláucio Maciel; DUTRA, Victor Barbosa. Apontamentos sobre o novo incidente de resolução
de demandas repetitivas no Código de Processo Civil de 2015. RIL Brasília a. 52 n. 208 out./dez. 2015, p. 190.
50
Conforme dados disponíveis em: http://ftp.cnj.jus.br/Justica_em_Numeros/relatorio_jn2015.pdf. Acesso em:
set. 2015.
51
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice. O social e o político na pós-modernidade. Porto:
Afrontamento, 1999, p. 145.
33
Importante alertar, contudo, que a “Crise do Poder Judiciário” não pode ser
entendida de forma simplista como se fosse apenas uma questão de direito processual,
quando, na verdade, ela envolve uma crise de todo o Sistema de Justiça e até mesmo do
próprio Estado que não consegue, já há muito tempo, proporcionar a satisfação do cidadão
com o acesso aos serviços públicos essenciais de qualidade.
A atual crise da justiça se insere num contexto muito mais amplo de crise do
próprio Estado e de perda de credibilidade das instituições políticas. Não é
somente a justiça que não atende aos anseios dos cidadãos. É o próprio
Estado que não logra dar conta da sua missão de velar pelo bem-estar da
52
BANCO MUNDIAL. Fazendo com que a Justiça conte. Medindo e Aprimorando o Desempenho da Justiça no
Brasil. Relatório nº 32.789-BR do Banco Mundial Unidade de Redução de Pobreza e Gestão Econômica.
30.12.2004. Disponível em: http://www.amb.com.br/docs/bancomundial.pdf. Acesso em: set. 2015.
34
53
GRECO, Leonardo. Novas perspectivas da efetividade e do garantismo processual. In: SOUZA, Márcia
Cristina Xavier de. RODRIGUES, Walter dos Santos (Coord.). O novo Código de Processo Civil: o projeto do
CPC e o desafio das garantias fundamentais. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 11.
54
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à Justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: RT,
2011, p. 89.
55
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à Justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: RT,
2011, p. 135-136.
56
A nova lei 13.140, de 2015, acerca da mediação e conciliação, traz um capítulo próprio para a conciliação
judicial extrajudicial nos conflitos em que for parte a Administração Pública – o maior litigante do Sistema de
Justiça no Brasil, propondo a criação de câmaras de mediação e conciliação e a conciliação por adesão, com fim
de possibilitar aos interessados, optarem por um acordo na via administrativa, evitando-se a judicialização. Além
da previsão normativa, importantes medidas estão sendo concretizadas para ampliar a cultura da conciliação e
mediação no Brasil. Em razão da Política Nacional da Conciliação implementada e incentivada pelo CNJ, já
foram criados cerca de 500 (quinhentos) Centros Judiciários de Resolução de Conflito e Cidadania (Cejuscs) em
todo o país. Dentre os casos que podem ser resolvidos nos Cejuscs estão questões relativas ao direito civil,
especialmente ao direito de família, como regularização de divórcios, investigação de paternidade, pensão
alimentícia e renegociação de dívidas. O CNJ divulgou que cerca de 270 mil casos foram solucionados nos
referidos Centros Judiciários de Resolução de Conflito e Cidadania (Cejuscs) em 2015, evitando a entrada de
mais processos no já congestionado Judiciário brasileiro. Os dados referem-se a oito estados e não contabilizam
as audiências que ocorrem nas semanas nacionais de conciliação. Só em São Paulo, estado com o maior número
de centros (153 unidades), 138 mil casos foram finalizados com a ajuda de conciliadores, magistrados,
servidores e instituições envolvidas nas audiências de conciliação. Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2016-mar-07/conciliacao-judiciario-livrou-270-mil-processos-2015. Acesso em: mar.
2016.
57
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à Justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: RT,
2011, p. 173.
58
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à Justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: RT,
2011, p. 120.
35
também ocorre por motivações divorciadas da análise técnica e estratégica necessária para a
melhor distribuição do Sistema de Justiça. É o que se dá, por exemplo, com o não
desmembramento do Tribunal Regional Federal da 1ª. Região, que ainda abrange 13 Estados
da federação mais o Distrito Federal, acarretando grave desequilíbrio do acesso ao segundo
grau da Justiça Federal no Brasil. A ausência de planejamento gera, enfim, custos
desnecessários e ineficiência da atividade jurisdicional no Brasil59.
59
A título de comparação, oportuno destacar a diferença de planejamento estratégico e de avaliação de
desempenho dado à estrutura do Poder Judiciário na Inglaterra. Em junho de 2010, “o Ministério da Justiça
anunciou a intenção de fechar 157 tribunais e abriu consulta pública para ouvir a opinião da população. De posse
das respostas, o governo decidiu poupar 15”. A Inglaterra e o País de Gales tinham àquela época 530 cortes na
primeira instância da Justiça. Dessas, 330 eram Magistrate’s Courts, espécie de Juizado Especial; 219 County
Courts, o equivalente britânico às varas de primeira instância; e 91, Crown Court Centres, que cuidam dos
processos criminais e nas quais acontecem os júris (a soma dá mais de 530 porque o mesmo tribunal pode
abrigar duas cortes diferentes). Foram fechadas 93 Magistrates’ Courts e 49 County Courts. A redução de
prédios da Justiça faz parte da faxina pela qual passa o Judiciário britânico. O objetivo anunciado pelo Ministério
da Justiça seria o de tornar o Judiciário inglês mais efetivo e econômico. (Disponível em
http://www.conjur.com.br/2010-dez-20/governo-inglaterra-decide-fechar-142-tribunais-todo-pais. Acesso em:
fev. 2016). Mais recentemente, a Inglaterra anunciou nova redução do número de órgãos de primeira instância do
Poder Judiciário. “Cinco anos depois de fechar quase um quarto dos tribunais de primeira instância, o Ministério
da Justiça do Reino Unido anunciou que vai acabar com mais 86 cortes na Inglaterra e no País de Gales.
Segundo o governo, essas cortes são usadas por apenas dois dias por semana. No restante do tempo, permanecem
vazias. O fechamento faz parte do programa do governo para tornar o Judiciário mais econômico e, ao mesmo
tempo, eficiente. Segundo o Ministério da Justiça, uma pesquisa mostrou que 48% dos 460 tribunais na
Inglaterra não foram usados para audiências e julgamentos por mais da metade do tempo disponível no ano
passado. Isso significa que foi gasto dinheiro para manter uma estrutura quase dispensável”. (Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2016-fev-13/reino-unido-planeja-fechar-86-tribunais-falta-uso. Acesso em: fev.
2016).
60
MOREIRA, José Carlos Barbosa. O futuro da Justiça: alguns mitos. Revista Forense, v. 96, n. 352, out-dez,
2000, p. 117.
61
MORAIS, José Luis Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e arbitragem: alternativas à
jurisdição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 78-79.
36
62
O professor e juiz federal Carlos Haddad defende que a Justiça pode melhorar muito, basta ser bem
administrada. Em artigo publicado no Conjur, o ilustre jurista narra sua experiência pessoal exitosa
implementada, em 2011, na Subseção Judiciária de Montes Claros/ MG, para agilizar a tramitação dos processos
e melhorar os serviços judiciários daquela subseção, cujo acervo processual contava naquele ano com absurdos
23.704 processos em tramitação. Haddad fez um diagnóstico dos problemas do órgão do Poder Judiciário e
implantou um modelo de gestão. Para Haddad, todo modelo de gestão se baseia em cinco pilares fundamentais,
que ajudam o gestor a pensar de maneira estruturada em como atingir com eficiência e eficácia os objetivos
propostos. São eles: a) estratégia; b) estrutura e recursos; c) calendário de atividades; d) rotinas e projetos; e e)
indicadores e metas. O modelo de gestão é o veículo que conduzirá a unidade judiciária ao objetivo estratégico
proposto. Após a implantação do modelo de gestão e a ajuda de um software CTPJ (Controle do Tramite de
Processos Judiciais), foram realizadas várias reuniões de organização do trabalho, estabelecendo-se prazos
máximos de tramitação e elaboração de rotinas mais eficientes, o que acarretou enorme melhoria na execução
dos serviços da Vara Federal. Em pesquisa de satisfação com os usuários da Vara Federal de Montes Claros, ao
serem indagados sobre a ocorrência de melhorias na qualidade da prestação jurisdicional no último ano, 75% dos
usuários respondeu positivamente. Foi criada a 2ª Vara Federal em 2012, o que reduziu à metade o acervo
original. De qualquer forma, mesmo ingressando 11.471 ações no período de 22 meses, o volume de processos
reduziu-se a pouco menos de 6.000, e os prazos de tramitação também sofreram expressiva diminuição. Da
referida experiência, Haddad relata algumas lições importantes: 1) Os juízes não são oniscientes e precisam de
ajuda especializada para bem administrar; 2) O tratamento célere e resolutivo dos processos é parte inseparável
da qualidade da prestação jurisdicional; 3) Somente em casos extremos a prestação de serviço público de
qualidade depende de mais dinheiro e mais pessoas; 4) É preferível trabalhar com um grupo menor, mas coeso, a
contar com multidão batendo cabeças; 5) A Justiça, enfim, pode ser melhorada. (HADDAD, Carlos. Acredite: a
Justiça pode melhorar, basta bem administrar. Disponível em http://www.conjur.com.br/2016-jan-17/segunda-
leitura-acredite-justica-melhorar-basta-bem-administrar Acesso em: jan. 2016).
37
Enfim, é preciso ter em mente que o tema da crise do Poder Judiciário deve
ser visto sob várias frentes, pois direta ou indiretamente são muitas as causas
às quais se pode atribuir esse nefasto efeito de demora irrazoável na
prestação jurisdicional. Sem sombra de dúvida que um desses fatores decorre
da crise estrutural do Poder Judiciário, que reflete a ausência de
infraestrutura (instalação, espaço, pessoal, equipamentos, etc.) para a
prestação do serviço jurisdicional. O número de demandas que ingressam no
Judiciário é muito maior do que as que saem, e a estrutura existente (pessoal
e equipamentos) para lidar com esses números é arcaica, limitada e
insuficiente. (...) Outro fator considerável dessa crise – também já revelado
pela radiografia do Judiciário feita pela Fundação Getúlio Vargas – é a
ineficiência e a incapacidade de autogestão administrativa do Poder
Judiciário. A má administração da deficiente infraestrutura, a ausência de
logística e planejamento, a inexistência de ações de administração, de
resultados e metas, constituem também fatores decisivos para tal fenômeno.
64
63
SERRA, Umpierre de Mello. Gestão de Serventias. v. 1. Rio de Janeiro: FGV, 1996, p. 7-8.
64
ABELHA, Marcelo. Manual de Execução Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 29.
38
A referida comissão composta por diversos juristas, tais como Ada Pellegrini
Grinover, Celso Agrícola Barbi, Humberto Theodoro Júnior, José Carlos Barbosa Moreira,
entre outros, foi responsável pela elaboração de 11 anteprojetos de lei para modificação de
pontos específicos do CPC, tendo 10 deles sido convertidos em leis que aperfeiçoaram a fase
probatória, os atos de comunicação processual, introduziram a tutela antecipada com o
propósito de conferir maior efetividade ao processo. A legislação introduziu, ainda, no CPC a
ação monitória como tutela diferenciada para obtenção mais célere do título executivo
judicial. 66
65
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil: Lei 8.455, de 24-08-92, 8.637, de
31-3-93, 8.710, de 24-9-93, 8.718, de 14-10-93, 8.898, de 29-6-94, 8.950, de 13-12-94, 8.951, de 13-12-94,
8.952 de 13-12-94 e 8.953, de 13-12-94. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 28.
66
Destacam-se a Lei 8.455/1992 que alterou dispositivos referentes à prova pericial; a Lei 8.710/1993 que
previu a citação por meio de serviço postal e alterou outros dispositivos relativos aos atos de comunicação
pessoal; Lei 8.898/1994, prevendo a citação do réu, na liquidação por arbitramento e por artigos, na pessoa do
advogado constituído nos autos; a Lei 8.950/94 que alterou dispositivos relativos aos recursos; Lei 8.951/94 que
alterou dispositivos das ações de consignação em pagamento e de usucapião; Lei 8.952/94 que alterou
dispositivos do processo de conhecimento e do cautelar, prevendo o instituto da antecipação dos efeitos da tutela;
Lei 8.953/1994 que alterou dispositivos do processo de execução; Lei 9.079/1995 que introduziu no direito
processual brasileiro a ação monitória; a Lei 9.139/95 que alterou dispositivos do recurso de agravo de
instrumento; e, por fim, a Lei 9.245/1995 que alterou dispositivos do procedimento sumário.
39
(...) dessa moldura se conclui que, sem maiores esforços, há uma nítida
distinção entre o Judiciário que a sociedade reclama, e todos desejamos, e o
Judiciário que aí está posto, que a todos descontenta, inclusive, e sobretudo,
aos juízes, em quem acabam recaindo as críticas generalizadas,
desconhecendo os jurisdicionados a real dimensão da problemática, quando
temos um juiz para cada 25.000 a 29.000 habitantes (a média, na Europa, é
de um para cada 7.000 a 10.000), sendo que o Supremo Tribunal Federal
julga mais de 100.000 processos por ano (enquanto a Suprema Corte dos
Estados Unidos julga menos de 100 causas em igual período) e o Superior
Tribunal de Justiça mais de 150.000, números de longe sem similar no plano
internacional, sendo de que acrescentar que igualmente super congestionadas
estão as instâncias ordinárias.68
67
TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A reforma do Poder Judiciário. In: MARTINS, Ives Gandra; NALINI, José
Renato (Coord.). Dimensões do direito contemporâneo: estudos em homenagem a Geraldo de Camargo Vidigal.
São Paulo: IOB, 2001, p. 57-58.
68
TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A reforma do Poder Judiciário. In: MARTINS, Ives Gandra; NALINI, José
Renato (Coord.). Dimensões do direito contemporâneo: estudos em homenagem a Geraldo de Camargo Vidigal.
São Paulo: IOB, 2001, p. 58-59.
69
BRASIL. Secretaria de Reforma do Judiciário. I Pacto Republicano. Brasília: Secretaria de Reforma do
Judiciário. 2004. Disponível em www.mj.gov.br. Acesso em: ago. 2015.
40
70
De acordo com as informações do site do Supremo Tribunal Federal, o I Pacto Republicano foi decisivo para a
efetivação de mecanismos que aumentaram a agilidade da Justiça, como a regulamentação dos institutos da
Súmula Vinculante e da Repercussão Geral por meio, respectivamente, das Leis 11.417 e 11.418, ambas de
dezembro de 2006. A plena vigência desses institutos contribuiu para desafogar os gabinetes dos 11 Ministros da
Corte, possibilitando um andamento mais célere aos processos, visto que impediram a interposição de inúmeros
de Recursos Extraordinários e Agravos de Instrumento. De acordo com o Presidente do STF à época, Ministro
Cezar Peluso, a aplicação da sistemática da repercussão geral já resultou, desde 2007, na redução de 41,2% do
número de recursos que chegam a Corte. Entre outras ações aprovadas no Pacto Republicano estão a criação de
um cadastro centralizado de crianças e adolescentes desaparecidos; a tipificação de crime de sequestro e a
revisão da legislação sobre crimes sexuais. Dos 41 projetos encaminhados ao Congresso Nacional que
buscavam atingir maior efetividade do Judiciário, 11 viraram lei; 4 aguardam entrar na pauta; e o restante tramita
nas comissões do Senado Federal ou da Câmara dos Deputados. (Disponível em:
http://www2.stf.jus.br/portalStfInternacional/cms/verConteudo.php?sigla=portalStfDestaque_pt_br&idConteudo
=173547. Acesso em: ago. 2015).
71
Merecem destaque também as seguintes leis aprovadas: Lei 11.187/2005 que disciplinou o cabimento dos
agravos de instrumento e retido; Lei 11.232/2005 que estabeleceu a fase de cumprimento de sentença – execução
sincrética – revogando dispositivos relativos ao processo de execução de título judicial; Lei 11.276/2006 que
previu a súmula impeditiva de recursos no caso de interposição de apelação; Lei 11.277/2006 que permitiu o
julgamento initio litis de demandas repetitivas; Lei n. 11.382/2006 que reformou a disciplina do processo de
execução fundada em título executivo extrajudicial; a Lei 11.419, de 2006, que regulamentou o uso de meio
eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças nos processos civil,
penal e trabalhista, bem como nos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição; Lei 11.441/2007 que
possibilitou a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual na via
administrativa; Lei 11.448/2007 que modificou a lei da ação civil pública para assegurar a legitimidade da
Defensoria Pública para sua propositura; e também a Lei 11.672/2008 que estabeleceu o procedimento para o
julgamento de recursos repetitivos no âmbito da competência do Superior Tribunal de Justiça.
72
Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-fev-22/brasileiro-poder-judiciario-lento-caro-imparcial
Acesso em: ago. 2015.
41
73
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Outros/IIpacto.htm Acesso em: ago. 2015.
42
Estados e do Distrito Federal, com competência para processar, conciliar e julgar causas
cíveis, de pequeno valor, de interesse dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
ampliando o acesso à Justiça.
O III Pacto Republicano ainda não foi firmado, mas várias propostas já estão
sendo debatidas. Atualmente, o Conselho Nacional de Justiça está coordenando os estudos e
as prévias propostas74 para a celebração do futuro pacto também voltado para o
aperfeiçoamento do Sistema de Justiça.
74
Após convite do Conselho Nacional de Justiça para que formulasse sugestões de agenda positiva para a
possível elaboração de novo Pacto Republicano, a Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE
apresentou, em 05 de agosto de 2015, propostas de medicadas voltadas aos aprimoramentos da execução fiscal, à
redução da litigiosidade excessiva veiculada por demandas repetitivas e propostas de alterações quanto ao tema
administração e destinação de bens apreendidos. Em relação às demandas repetitivas, a associação apresentou as
seguintes propostas: a) Alterar a lei para que se crie uma sistemática processual própria para os litígios que
envolvem o cidadão e o poder público, de modo a se evitar soluções conflitantes e anti-isonômicas, com maior
alcance do que as medidas propostas no novo CPC; b) Criação de núcleos de monitoramento de demandas
repetitivas nas Seções Judiciárias da Justiça Federal, composto pelos próprios magistrados em rodízio, de modo a
que os processos replicados não cheguem a ser distribuídos sem um gerenciamento prévio e o início do diálogo
interno e interinstitucional; c) Instituir filtros e restrições ao ajuizamento de questões já decidas em sede de
recurso repetitivo, repercussão geral ou consolidadas em súmula vinculante, como multas, aumento de custas ou
outras sanções; d) Promover uniformização legislativa do patamar de concessão da assistência judiciária gratuita.
(Disponível em: www.ajufe.orb.br. Acesso em: ago. 2015).
43
75
ABELHA, Marcelo. Manual de Execução Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 31.
76
(...) esse arroubo otimista, revelado em frases de efeito, de que um novo Código de Processo Civil seria a
solução para os problemas da crise do Judiciário, nos faz lembrar um recente fato, de otimismo exacerbado, que
foi seguido de uma previsível frustração que aconteceu com a introdução no Texto Constitucional do inciso
LXXVIII do art. 5º pela EC 45/2004. Nesse dispositivo consagrou-se o direito fundamental à razoável duração
do processo, mas nem por isso teve o condão, da noite para o dia, de transformar processos de duração irrazoável
em duração razoável, pois, como se disse, não são os “excessos de recursos” nem o “formalismo processual” os
principais algozes desse fenômeno. (ABELHA, Marcelo. Manual de Execução Civil. Rio de Janeiro: Forense,
2015, p. 28)
77
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à Justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: RT,
2011, p. 52.
78
Conforme dados disponíveis em: http://ftp.cnj.jus.br/Justica_em_Numeros/relatorio_jn2015.pdf. Acesso em:
set. 2015.
44
Dessa forma, mesmo que o Poder Judiciário fosse paralisado sem ingresso de
novas demandas, com a atual produtividade de magistrados e servidores seriam necessários,
no mínimo, 02 anos e meio de trabalho para que se julgasse todo o estoque. Entretanto, como
não se julga sem contraditório, antever o tempo para sentenciar um processo é pura alquimia,
o encontro da pedra filosofal. Como historicamente a entrada de processos é sempre superior
à saída, a tendência é de crescimento do acervo. Além disso, apesar do aumento de 12,5% no
total de processos baixados no período 2009-2014, os casos novos cresceram em 17,2%, fato
que contribuiu para o acúmulo do estoque de processos.
Esse cenário demonstra que, embora tenham sido criados por lei diversos
mecanismos que se prestam a fomentar a racionalidade na utilização do serviço judiciário, a
exemplo do processo eletrônico e das novas técnicas de julgamento dos recursos
extraordinários (repercussão geral) e especiais (recursos repetitivos) já referidas, a perspectiva
concreta e realista não é de redução de acervo e, principalmente, não é de celeridade
processual, estando longe disso.
Outro ponto relevante, que não pode ser ignorado na presente análise, relaciona-se
com o papel e a atuação prática dos tribunais diante das novas técnicas de julgamento já
implementadas para “remediar” a crise de morosidade da Justiça.
79
Disponível em: http://cnj.jus.br/noticias/cnj/80428-litigiosidade-na-justica-federal-aumenta-em-2014-
principalmente-no-1-grau Acesso em: set. 2015.
80
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O futuro da Justiça: alguns mitos. Revista Forense, v. 96, n. 352, out-
dez, 2000, p. 118.
46
81
Secretaria de Reforma do Judiciário, Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais (CEBEPEJ) e Escola
de Direito da FGV-SP. Análise da gestão e funcionamento dos cartórios judiciais. SILVA, Paulo Eduardo Alves
da (Coord.). Brasília, DF: Secretaria de Reforma do Judiciário: CEBEPEJ, 2007.
82
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Justiça em números, 3. ed., 2005. Disponível em:
http://www.cnj.gov.br. Acesso em: ago. 2015.
47
83
Relatório anual do Conselho Nacional de Justiça, 2005, p. 61. Disponível em: http://www.cnj.gov.br. Acesso
em: ago. 2015.
84
Disponível em: http://cnj.jus.br/noticias/cnj/80428-litigiosidade-na-justica-federal-aumenta-em-2014-
principalmente-no-1-grau Acesso em: set. 2015.
85
De acordo com informações recentes divulgadas pelo próprio tribunal, o Superior Tribunal de Justiça encerrou
o primeiro semestre de 2016 com 223.167 processos julgados. O balanço inclui as decisões colegiadas, nas
sessões, as decisões monocráticas tomadas pelos relatores, e ainda o julgamento de recursos internos, como
agravos regimentais e embargos de declaração. Na maior parte, os processos submetidos ao STJ foram
resolvidos por decisões monocráticas: 181.709 ao longo do semestre. O STJ julgou 720 processos repetitivos,
que orientam os tribunais de todo o País na solução das demandas de massa. Desses, 80 foram decididos pela
48
TRF-4 67.550 -
Corte Especial. A Primeira Seção do STJ, responsável pelos casos de direito público, julgou a maior parte dos
repetitivos: 415. A Segunda Seção, que trata de direito privado, decidiu 164 recursos; a Terceira, especializada
em matéria penal, foi responsável por 61. Apesar do resultado, ressalta-se que o número de processos recebidos
pelo STJ aumentou 20% em relação ao mesmo período do ano de 2015. Até 27 de junho de 2016, o tribunal
conta com 399.251 processos em tramitação. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: jul. 2016.
86
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 26-27.
87
Pesquisa também divulgada no http://www.conjur.com.br/2015-fev-20/artur-souza-demora-torna-inocua-
ferramenta-demandas-repetitivas. Acesso em: set. 2015.
49
De acordo com dados informados pelo próprio Supremo Tribunal Federal, desde
2007, ou seja, num período de quase uma década, a Corte julgou 284 temas com repercussão
geral, apenas 30% dos 906 casos que tiveram a repercussão geral reconhecida até julho de
2016.
Percebe-se que foi dada maior prioridade aos casos com repercussão nos últimos
dois anos, mas a demora dos julgamentos, gerando o sobrestamento de milhares de processos
por prazos indefinidos, atenta contra o Direito, por violentar a segurança jurídica, a
previsibilidade decisória almejada pelo instituto e, outrossim, a duração razoável do processo.
88
Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: jul. 2016.
89
MORAES, Vânila C. A. Demandas repetitivas decorrentes de ações e omissões da administração pública:
hipótese de soluções e a necessidade de um direito processual público fundamentado na Constituição. Séries
Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2012, p. 67.
90
Para ilustrar o grave problema da morosidade dos tribunais no julgamento de teses jurídicas, importante
destacar outros três casos emblemáticos. O primeiro relativo aos expurgos inflacionários de poupança, o segundo
relativo à desaposentação e o terceiro caso referente à ilegalidade a correção do FGTS pela TR.
1º: Há milhares de processos judiciais suspensos, nos quais são pleiteadas diferenças de remuneração sobre
50
demonstrando que as técnicas de julgamento que possibilitam a suspensão dos processos para
a definição da tese jurídica não são sinônimas de celeridade processual, de previsibilidade
depósitos em cadernetas de poupança existentes no advento dos diversos Planos Econômicos implantados no
Brasil. Esses planos (Bresser de 1987, Verão de 1989, Collor I de 1990 e Collor II de 1991) foram adotados para
controlar a inflação galopante nos momentos em que ela ameaçava se transformar em hiperinflação e as
controvérsias sobre o direito dos poupadores ainda não foram dirimidas definitivamente pelo Poder Judiciário,
mesmo diante das novas técnicas de julgamento para uniformizar e acelerar a prestação jurisdicional. As
demandas têm como elemento comum a iniciativa (titulares de cadernetas de poupança ou outros atores em
benefício daqueles) e o polo passivo (grandes bancos comerciais públicos e privados). Não obstante o Superior
Tribunal de Justiça já tenha decidido a questão em julgamento de recurso repetitivo n. REsp 1.107.201 /DF, em
25/08/2010, a indefinição ainda persiste em razão da matéria de fundo ser também de natureza constitucional.
Em razão dos recursos das instituições financeiras, alguns processos subiram ao Supremo Tribunal Federal, onde
esperam decisão definitiva. O Supremo é chamado a decidir, especificamente, sobre quatro recursos
extraordinários com repercussão geral – RE 591797 (plano Collor I), relator Min. Toffoli; RE 626307 (planos
Bresser e Verão), relator Min. Toffoli; RE 631363 (plano Collor I), relator Min. Gilmar Mendes; e RE 632212
(plano Collor II), relator Min. Gilmar Mendes – e uma arguição de descumprimento de preceito fundamental
(ADPF 165), que estão sendo analisados conjuntamente. Os referidos recursos estão pendentes de julgamento
desde 2008 e não existe qualquer previsão.
2º: A controvérsia sobre o direito dos segurados do RGPS à desaposentação também é antiga. Na prática, o
trabalhador renuncia ao seu benefício de aposentadoria e pede outro mais vantajoso, considerando no cálculo as
contribuições pagas após o requerimento da primeira aposentadoria. O Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS não reconhece o direito dos segurados, de forma que hoje ele só pode ser obtido por via judicial, sendo
crescente o número de ações em tramitação no Poder Judiciário. Embora o Superior Tribunal de Justiça já tenha
julgado, desde maio de 2013, recurso especial n. 1334488 sobre o tema, pelo rito do julgamento dos recursos
repetitivos, reconhecendo a existência do direito à desaposentação, o INSS não cumpre a orientação do STJ no
âmbito administrativo para os demais segurados. A questão também possui fundo constitucional e o Supremo
Tribunal Federal ainda não concluiu o julgamento dos recursos extraordinários sobre o tema. Em 2003, um caso
do Rio Grande do Sul chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) através do recurso extraordinário n. 381367.
No fim de 2014, o processo voltou ao plenário do Supremo, mas a votação está suspensa já que a ministra Rosa
Weber apresentou um pedido de vista para analisar o caso. Ou seja, o caso está em tramitação na mais alta corte
do país há mais de 12 anos e sem previsão da conclusão do julgamento. Outro recurso extraordinário de n.
661256/SC de 2011 também foi levado ao plenário da Suprema Corte e a decisão foi suspensa já que três
ministros não estavam presentes na sessão. A opinião dos ministros está dividida.
3º: Outra tese jurídica ainda não definida se refere à suposta ilegalidade da utilização da TR como índice de
correção do saldo do FGTS. A controvérsia especificamente sobre o tema é relativamente recente, tendo surgido
em razão do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, em março de 2013, das Ações Diretas de
Inconstitucionalidade n. 4357 e 4425, no qual aquela Corte definiu que a TR não seria índice de correção
monetária e que não poderia ser aplicada para a correção monetária dos precatórios devidos pela Fazenda
Pública, por violação à isonomia. A partir do pronunciamento do Supremo em relação aos precatórios, milhares
de ações judiciais foram ajuizadas contra a Caixa Econômica Federal, pleiteando a alteração do índice de
correção do FGTS e o pagamento das diferenças desde 1999, quando o índice apurado da TR passou a ser
inferior à inflação oficial. A questão é singular, pois, muito antes da existência de controvérsia entre os Tribunais
Federais ou no âmbito do próprio Superior Tribunal de Justiça, o ministro Benedito Gonçalves, do Superior
Tribunal de Justiça, suspendeu, já em fevereiro de 2014, o andamento de todas as ações judiciais que discutem o
uso da Taxa Referencial (TR) como índice de correção do saldo do Fundo de Garantia (FGTS). O caso foi
levado ao STJ por meio de Recurso Especial 1.381.683 /PE, que foi afetado pelo ministro para ser julgado sob o
rito dos recursos repetitivos. Posteriormente, o referido recurso não foi conhecido, mas o relator determinou
novamente a suspensão de todas as ações em razão do Recurso Especial n. 1.614.874 também afetado ao rito dos
repetitivos. De fato, existem milhares de ação em tramitação sobre o tema. Segundo levantamento da Caixa
Econômica Federal seriam mais de 70.000 em fevereiro de 2014, sendo que outras milhares foram ajuizadas
posteriormente. Ressalta-se, todavia, que, até a suspensão de todas as ações, principalmente aquelas em
tramitação na primeira instância, ainda não havia sido realizado amplo debate sobre a questão. Sequer havia
divergência configurada nos Tribunais, apenas algumas sentenças de primeira instância. A questão que se coloca
é se a suspensão das ações seria medida benéfica à melhor definição da tese jurídica. As ações foram suspensas
e, passados quase dois anos, ainda não há previsão para o julgamento do tema pelo Superior Tribunal de Justiça.
Informações extraídas dos sites do STF (www.stf.jus.br) e do STJ (www.stj.jus.br). Acesso em: set. 2016.
51
A referida lei também suprimiu o §10º do artigo 1.035 e o §5º do artigo 1.037. Os
referidos dispositivos estabeleciam um marco temporal de duração da suspensão de processos
em todo território nacional prevista no artigo 1.037, II, o que poderia induzir maior agilidade
dos tribunais superiores no julgamento dos recursos repetitivos, impedindo que tal suspensão
se eternizasse pela mora dos tribunais ao julgar os recursos.
A garantia de acesso à justiça não deve ser entendida como a mera admissão do
processo ou a possibilidade de ingressar em juízo; é sim, a garantia de que os cidadãos
possam demandar e defender-se adequadamente em juízo, isto é, ter acesso à efetividade no
processo com os meios e recursos a ele inerentes de modo a obter um provimento
jurisdicional justo, construído em tempo razoável a partir do amplo debate e participação
democrática dos sujeitos interessados.
Sem olvidar, ainda, de que isto poderá causar uma perniciosa e inconstitucional
discricionariedade dos tribunais superiores em escolher quando determinadas temáticas
deverão ser dirimidas e quando deverão ser mantidas em suspensão.
52
O estudo revelou inúmeras vantagens dos litigantes habituais, tais como: (I) maior
experiência com o Direito que lhes possibilita melhor planejamento do litígio; (II) uso de
economia de escala, consistente no uso de uma mesma estrutura para atender a um maior
número de casos; (III) oportunidade de desenvolver relações informais com os membros da
instância julgadora; (IV) diluição dos riscos da demanda por maior número de casos e (V) a
possibilidade de testar estratégias em casos específicos de modo a garantir expectativa mais
favorável nos casos futuros92.
91
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:
Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988, p. 21.
92
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:
53
Eles podem diluir os riscos da demanda por maior número de casos, o que diminui
o peso de cada derrota, que será eventualmente compensado por algumas vitórias. E também
podem testar estratégias diferentes em determinados casos (de natureza material ou
processual), de modo a criar precedentes favoráveis em pelo menos alguns deles, garantindo
expectativa mais favorável em relação a casos futuros.
O que deve ser aferido é se o referido litigante habitual abusa de tal condição para
se beneficiar da litigiosidade de massa e da morosidade do Sistema de Justiça. Essa situação
parece ser o caso da Justiça no Brasil, já que esses litigantes habituais dificilmente alteram ou
melhoram suas práticas administrativas em favor de outros cidadãos não beneficiários de
julgamentos pelo Poder Judiciário.
94
O Estado é o maior responsável pelos recursos no STF. Disponível em http://www.conjur.com.br/2011-mar-
22/estado-quem-ocupa-tempo-supremo-materia-recursal. Acesso em: set. 2015.
95
A pesquisa do Conselho Nacional de Justiça analisa apenas as novas ações judiciais ingressadas na primeira
instância da Justiça e nos juizados especiais. Segundo a referida edição, o Instituto Nacional de Seguro Social
(INSS) continua a ocupar o primeiro lugar no ranking das organizações públicas e privadas com mais processos
no Judiciário Trabalhista, Federal e dos estados. O órgão respondeu por 4,38% das ações que ingressaram nesses
três ramos da Justiça nos 10 primeiros meses do ano passado. Na sequência, vem a BV Financeira (1,51%), o
município de Manaus (1,32%), a Fazenda Nacional (1,20%), o estado do Rio Grande do Sul (1,17%), a União
(1,16%), os municípios de Santa Catarina (1,13%), o Banco Bradesco (0,99%), a Caixa Econômica Federal
(0,95%) e o Banco Itaucard S/A (0,85%), respectivamente ocupando da segunda à décima posição. Disponível
em http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/59351-orgaos-federais-e-estaduais-lideram-100-maiores-litigantes-da-
justica. Acesso em: set. 2015.
96
ABELHA, Marcelo. Manual de Execução Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 31.
97
CORRÊA, Priscila Pereira Costa. Direito e desenvolvimento: Aspectos relevantes do Judiciário brasileiro sob
a ótica econômica. Séries Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2014, p. 129.
55
poderiam ser facilmente solucionados na instância administrativa, o que, nas suas palavras,
demonstra o uso patológico dessa instituição pelo Poder Público.
Priscila Corrêa99 sustenta, ainda, que haveria uma lógica econômica perversa que
justifica a conduta dos litigantes habituais, sejam eles agentes privados ou públicos, de
insistirem na utilização do Poder Judiciário, retroalimentando a litigiosidade. Os agentes
privados possuem, na visão da referida jurista, uma verdadeira estratégia baseada em um
cálculo racional que demonstra que os custos desta opção são inferiores aos ganhos obtidos, o
que é evidente, pois, se não houvesse proveito econômico não estariam gastando para manter
milhares de litígios judiciais.
Vale dizer, é melhor para os grandes litigantes, sob a ótica financeira, manter sua
postura e práticas adotadas extrajudicialmente do que adequá-las aos posicionamentos dos
tribunais.
Não obstante o aumento dos gastos, o Poder Executivo não demonstra ter se
incomodado com o desperdício de recursos públicos, mantendo sua postura reticente aos
posicionamentos dos tribunais, contribuindo para o aumento crescente da litigiosidade. Essa
situação levou Priscila Corrêa100 a considerar como motivação mais evidente para o uso
98
CORRÊA, Priscila Pereira Costa. Direito e desenvolvimento: Aspectos relevantes do Judiciário brasileiro sob a
ótica econômica. Séries Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2014, p. 130.
99
CORRÊA, Priscila Pereira Costa. Direito e desenvolvimento: Aspectos relevantes do Judiciário brasileiro sob
a ótica econômica. Séries Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2014, p. 131.
100
CORRÊA, Priscila Pereira Costa. Direito e desenvolvimento: Aspectos relevantes do Judiciário brasileiro sob
a ótica econômica. Séries Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2014, p. 132.
56
patológico da Justiça a ânsia da utilização imediata dos recursos públicos por parte dos
titulares dos mandatos políticos nos seus programas de governo. O uso do Poder Judiciário
serviria, nesse contexto, como uma forma de postergação da saída dos recursos dos cofres
públicos. Assim, quanto mais moroso for o processo melhor será para o Poder Executivo. Há
de ser considerado, ainda, o fato de que o Executivo enxerga o Poder Judiciário como se não
fosse parte do poder estatal e não utilizasse recursos públicos para gerir o seu funcionamento.
(...) o Estado existe para servir a sociedade, para reconhecer e fazer respeitar
os direitos dos cidadãos, não para com todos litigar. O Estado que os
cidadãos respeitam é o Estado que respeita o cidadão e que reconhece
direitos, sem a necessidade de postulação judicial. Enquanto essa
mentalidade não mudar na Administração Pública brasileira nós não
poderemos contar com a lealdade processual da advocacia pública que, numa
concepção desvirtuada de seu papel, considera que é seu dever opor todos os
obstáculos à vitória do cidadão, quando o papel do Estado deve ser outro. A
vitória do cidadão não representa a derrota do Estado, pois o Estado é
vitorioso quando o Direito prevalece e não quando o cidadão perde.102
101
NERY JR., Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal. São Paulo: RT, 2010, p. 325.
102
GRECO, Leonardo. A reforma do poder judiciário e o acesso à justiça. Revista Dialética de Direito
Processual, São Paulo: Oliveira Rocha, n. 27, jun. 2005, p. 73.
57
O seu art. 927 dispõe que os juízes e tribunais deverão observar nos julgados as
decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade, os
enunciados de súmulas vinculantes, das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria
constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional, os acórdãos
proferidos em incidentes de assunção de competência ou de resolução de demandas
repetitivas e de julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos e, por fim, a
orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
Não vai restar uma matéria para ser decidida pelo juiz, qualquer colegiado de
qualquer instância proferirá decisões vinculantes. Ora, nem os Ministros do STF se vinculam
aos precedentes da própria Corte, como no caso do Ministro Celso de Mello em relação à
execução provisória da pena. O STF reviu entendimento anterior e passou a admitir o
cumprimento das penas antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, mas o
Ministro decidiu monocraticamente no HC 135.100 para suspender o mandado de prisão, não
sucumbiu e rejeitou a decisão do Plenário em favor do não retrocesso dos direitos
fundamentais.
Com efeito, o legislador ordinário não previu a eficácia vinculante dos referidos
precedentes para o Poder Público, que, portanto, poderá continuar incentivando a litigiosidade
a despeito de eventual posição pacificada no âmbito do Poder Judiciário. A litigiosidade
58
103
MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas de processo civil. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 33-34.
59
litigantes habituais, que, não raras vezes, conforme mencionado, utilizam de forma patológica
e abusiva o Poder Judiciário, permitindo a pulverização de demandas de idêntica natureza
mesmo diante de posicionamentos contrários já firmados pelos tribunais.
104
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade na prestação jurisdicional: insuficiência da
reforma das leis processuais. Revista de Processo, n. 125, jul. 2005, p. 61-78.
60
CAPÍTULO 02
2.1 Introdução
105
BRASIL. Senado. Anteprojeto do novo Código de Processo Civil. Brasília-DF, 2010. Disponível em:
http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/anteprojeto.pdf. Acesso em: 12 de jan. 2016.
61
106
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. Incidente de resolução de demandas repetitivas e ações coletivas.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 527.
107
TEMER, Sofia Orberg. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 60-
61.
108
TEMER, Sofia Orberg. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 63.
62
É por isso que o referido incidente proposto desde o Anteprojeto elaborado pela
Comissão de juristas é, sem dúvida alguma, a mais impactante modificação surgida desde o
início das discussões da elaboração do CPC/2015. 110
109
GONÇALVES, Gláucio Maciel; DUTRA, Victor Barbosa. Apontamentos sobre o novo incidente de
resolução de demandas repetitivas no Código de Processo Civil de 2015. RIL Brasília a. 52 n. 208 out./dez. 2015,
p. 190-191.
110
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 612.
111
Sofia Temer faz importante advertência no sentido de que, apesar de as “demandas repetitivas”
compreenderem situações que, em tese, poderiam ser classificadas como “direitos individuais homogêneos” (nas
hipóteses de demandas relativas a pretensões isomórficas decorrentes de origem comum, em que as relações
substanciais sejam análogas e sejam repetidas as causas de pedir e pedidos), também compreendem situações
que não poderiam ser enquadradas como tal (hipóteses em que há apenas um ponto marginal em comum entre as
demandas). As demandas repetitivas, no contexto no CPC 2015, abrangem situações mais amplas do que os
direitos individuais homogêneos, o que é um motivo para evitar o emprego deste termo como se fossem
sinônimos. (TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p.
62)
112
Tal como previsto na legislação brasileira, o IRDR pode, em tese, ser instaurado a partir de qualquer
“processo modelo”, sendo irrelevantes os argumentos ali apresentados, se mais ou menos complexos do que os
aduzidos em outros casos. Não há previsão na novel legislação de critérios objetivos para escolha da causa piloto
ou qualquer forma de controle da representatividade adequada da atuação dos sujeitos processuais. O tema é
objeto de análise em tópico específico do capítulo seguinte.
113
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
63
A distinção básica entre a ação coletiva (ação de classe) e o IRDR está em que
naquela os litígios cumulados são solucionados simultaneamente pelo julgamento único,
enquanto que no incidente apenas se delibera sobre a idêntica questão de direito presente em
várias ações, as quais continuam tramitando para receber sentença própria com análise
específica da matéria fática pelo respectivo julgador.117
Aliás, pode-se ir além, para se afirmar que é drástica a distinção entre o IRDR e a
ação coletiva, o que trará forte repercussão no direito brasileiro. Enquanto na ação coletiva
prevista no direito brasileiro, por meio da substituição processual, a coisa julgada é secundum
eventum litis, ou seja, vincula os substituídos apenas se os beneficiar; no novo incidente o
julgamento é pro et contra, vale dizer, vincula os envolvidos favorável ou desfavoravelmente,
repercutindo sobre os processos pendentes e também os futuros. É inegável que a definição de
uma tese jurídica, especialmente se for sobre direito material, terá fator decisivo para a
resolução dos processos sobrestados já que o respectivo julgador estará vinculado àquela
interpretação do direito. Daí a maior importância que se deve conferir à efetiva participação
das partes e do juiz de primeiro grau na construção da decisão judicial.
Assim, justamente por se tratar de uma técnica processual própria é que se exige o
aprofundamento de estudos críticos para demonstrar sua (in)compatibilidade com o modelo
constitucional de processo assegurado na Constituição de 1988.
Pode-se dizer que existem dois grandes modelos de tutela coletiva no direito
contemporâneo. Existe o modelo de tutela pela class action (ação coletiva) adotada
principalmente nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, e o modelo de tutela pela group action
(ação de grupo) adotado na Europa em geral, com peculiaridades, na Inglaterra, Alemanha e
Portugal. 118
As referidas ações de grupo surgiram como uma nova alternativa para se alcançar
a celeridade, eficiência e amplitude de acesso à justiça, ao lado das ações coletivas,
representativas de classe, sem, no entanto, possuir alguns obstáculos e inconvenientes práticos
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 736.
118
ROSSONI, Igor Bimkowski. O incidente de resolução de demanda repetitivas e a introdução do group
litigation no direito brasileiro: avanço ou retrocesso? p. 4-5. Disponível em
http://www.tex.pro.br/home/artigos/44-artigos-dez-2010/4740-o-incidente-de-resolucao-de-demandas-
repetitivas-e-a-introducao-do-group-litigation-no-direito-brasileiro-avanco-ou-retrocesso. Acesso em: dez. 2015.
65
119
BASTOS, Antonio Adonias Aguiar. O devido processo legal nas causas repetitivas. p. 4943. Disponível em:
<http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/salvador/ antonio_adonias_aguiar_bastos.pdf> Acesso em:
jan. 2016.
120
BASTOS, Antonio Adonias Aguiar. O devido processo legal nas causas repetitivas. p. 4943-4944. Disponível
em: <http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/salvador/ antonio_adonias_aguiar_bastos.pdf> Acesso
em: jan. 2016.
121
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 128.
66
membro do grupo envolvido é tratado como uma parte, ao invés de uma “não parte”
substituída. É a tentativa de estabelecer algo análogo a uma class action, mas sem classe e os
inconvenientes da ficção da substituição processual.
A ação de classe do direito americano, por sua vez, encontra seu fundamento na
possibilidade de, com a atuação de um ou alguns membros de uma determinada classe, todos
os demais, que não agiram diretamente, serem afetados pelos efeitos daquela decisão,
inclusive no que se refere à imutabilidade do quanto decidido, isto é, no que se refere à
formação da coisa julgada.
122
ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 34-35.
123
DIDIER JR. Fredie; ZANETI JR. Hermes. Processo Coletivo. v. 4. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 51.
124
Em atenção ao artigo 81, parágrafo único, inciso II, da Lei 8.078, de 1990, está-se diante de um interesse ou
direito coletivo quando “todos os co-titulares dos direitos mantêm relações jurídicas ou vínculos jurídicos
formais com a parte contrária, ou seja, a parte contra a qual se dirige a pretensão ou o pedido” ou em razão “de
uma relação jurídica base que une os sujeitos entre si, de modo a fazer com que eles integrem grupo, classe ou
categoria diferenciada de pessoas determinadas ou determináveis com interesses convergentes sobre o mesmo
bem indivisível (jurídica ou faticamente), independente de manterem ou não vínculo jurídico com a parte
contrária”, conforme leciona Alcides A. Munhoz da Cunha (CUNHA, Alcides Munhoz. Evolução das Ações
Coletivas no Brasil. Revista de Processo, n. 77, 1995, p. 229). Pedro Lenza também explica sobre a
indivisibilidade dos bens sobre os quais convergem os interesses coletivos: “Em relação aos interesses coletivos,
a indivisibilidade dos bens é percebida no âmbito interno, dentre os membros do grupo, categoria ou classe de
pessoas. Assim, o bem ou interesse coletivo não pode ser partilhado internamente entre as pessoas ligadas por
uma relação jurídica-base ou por um vínculo jurídico; todavia externamente, o grupo, categoria ou classe de
pessoas, ou seja, o ente coletivo, poderá partir o bem, exteriorizando o interesse da coletividade.” (LENZA,
Pedro. Teoria Geral da Ação Civil Pública. São Paulo, RT, 2003, p. 71)
125
De acordo com o artigo 81, parágrafo único, inciso III, da Lei 8.078, de 1990, está-se diante de direitos
individuais homogêneos, quando um direito eminentemente individual foi erigido à categoria de interesses
metaindividuais meramente para fins de tutela coletiva. A transindividualidade do direito individual homogêneo
é legal ou artificial. Pode-se dizer “acidentalmente coletivos” os direitos individuais homogêneos, porquanto os
sujeitos são perfeitamente identificados ou identificáveis e a união entre aqueles coletivamente tutelados
decorrerá de uma situação fática de origem comum a todos. Pedro Lenza entende que os interesses individuais
homogêneos “caracterizam-se por sua divisibilidade plena, na medida em que, além de serem os sujeitos
determinados, não existe, por regra, qualquer vínculo jurídico ou relação jurídica-base ligando-os”. (LENZA,
Pedro. Teoria Geral da Ação Civil Pública. São Paulo, RT, 2003, p. 71)
68
126
HOLANDA, Marcelo Cunha. A possibilidade do controle judicial da adequação do autor coletivo no direito
brasileiro. Revista Brasileira de Direito Processual. Belo Horizonte: Editora Fórum, n. 69, jan-mar. 2010, p.
152.
69
que não possuem, por regra, qualquer vínculo ou relação jurídica base entre si.
127
NUNES, Dierle José Coelho; SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 389.
128
ROSSONI, Igor Bimkowski. O incidente de resolução de demanda repetitivas e a introdução do group
litigation no direito brasileiro: avanço ou retrocesso? Disponível em: http://www.tex.pro.br/home/artigos/44-
artigos-dez-2010/4740-o-incidente-de-resolucao-de-demandas-repetitivas-e-a-introducao-do-group-litigation-no-
direito-brasileiro-avanco-ou-retrocesso. Acesso em: dez. 2015. p. 31-32.
70
Diante dos problemas constatados nas ações de classe, ou mesmo a total falta de
tradição com processos coletivos, como no caso da Alemanha, vários ordenamentos jurídicos,
especialmente na Europa129, que relutam em introduzir formas de tutela coletiva mais
próximas à class action americana, buscaram criar novos instrumentos de tutela (ações de
grupo) que fossem capazes de conferir tratamento adequado aos processos repetitivos, mas
sem a formação de uma classe, sem a representação por substitutos processuais.
A referida lei sobre a demanda modelo nas causas relativas ao mercado de capitais
– Kapitalanleger-Musterverfahrensgesetz – KapMuG – entrou em vigor em 1º de novembro
de 2005 motivada por conflitos de milhares de investidores contra a Deutsche Telekom132 e a
necessidade de uma resposta jurisdicional mais célere.
Entre 1999 e 2000, a empresa Deutsch Telekom lançou suas ações na bolsa de
valores de Frankfurt, tendo distorcido informações patrimoniais relevantes que lastrearam a
129
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 317-324.
130
BRASIL. Senado. Anteprojeto do novo Código de Processo Civil. Brasília-DF, 2010. 381 pp. Disponível em
HTTP://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf. Acesso em dezembro de 2015.
131
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 124-125.
132
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 115-116.
71
emissão daqueles papéis, o que causou falsas expectativas no mercado financeiro, culminando
em graves prejuízos aos investidores.
Dentro deste contexto, como resposta aos recursos, a KapMuG foi promulgada em
2005, e o Musterverfahren foi instituído com o objetivo de ser a ferramenta processual capaz
de racionalizar a resolução de tais ações repetitivas envolvendo o mercado de capitais. Foi
publicada como lei temporária, com previsão inicial de término de vigência em 1º de
novembro de 2010. Posteriormente, a KapMuG foi prorrogada até 1º de novembro de 2020134.
Esta lei não introduziu no sistema alemão uma class action, onde um autor
representa uma pluralidade indeterminada de sujeitos; na realidade, a
KapMug representa uma tentativa de afrontar e resolver os problemas
procedimentais nascentes da introdução contextual de uma massa de
demandas ressarcitórias reunidas entre elas e caracterizadas pela richiesta di
danni piú o meno contenuti. (...) Ainda que a normatividade alemã esteja
dissociada e seja distinta da class action americana, alguns pressupostos dela
133
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 329-330.
134
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 331.
72
135
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 116-117.
136
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 132-133.
137
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 334-335.
73
condenatórias para adimplemento contratual baseado em oferta pública, nos termos da Lei de
Aquisição e Transmissão de Valores Mobiliários.
138
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 133.
139
ROSSONI, Igor Bimkowski. O incidente de resolução de demanda repetitivas e a introdução do group
litigation no direito brasileiro: avanço ou retrocesso? Disponível em: http://www.tex.pro.br/home/artigos/44-
artigos-dez-2010/4740-o-incidente-de-resolucao-de-demandas-repetitivas-e-a-introducao-do-group-litigation-no-
direito-brasileiro-avanco-ou-retrocesso. Acesso em: dez. 2015. p. 23.
74
com a mesma pretensão comum, sob pena de rejeição. O tribunal de segunda instância
(Oberlandesgericht-OLG)140 está vinculado ao exame das questões comuns apresentadas pelo
juiz de primeira instância em sua decisão vinculativa, cabendo-lhe julgar o procedimento.
140
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 339.
141
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 340.
142
ROSSONI, Igor Bimkowski. O incidente de resolução de demanda repetitivas e a introdução do group
litigation no direito brasileiro: avanço ou retrocesso? Disponível em: http://www.tex.pro.br/home/artigos/44-
artigos-dez-2010/4740-o-incidente-de-resolucao-de-demandas-repetitivas-e-a-introducao-do-group-litigation-no-
direito-brasileiro-avanco-ou-retrocesso. Acesso em: dez. 2015. p. 24-25.
143
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
75
146
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 139.
147
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 348-349.
148
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 349-350.
149
ROSSONI, Igor Bimkowski. O incidente de resolução de demanda repetitivas e a introdução do group
litigation no direito brasileiro: avanço ou retrocesso? Disponível em: http://www.tex.pro.br/home/artigos/44-
artigos-dez-2010/4740-o-incidente-de-resolucao-de-demandas-repetitivas-e-a-introducao-do-group-litigation-no-
direito-brasileiro-avanco-ou-retrocesso. Acesso em: dez. 2015. p. 25.
77
150
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 139.
151
STURNER, Rolf. Sobre as reformas recentes no direito alemão e alguns pontos em comum com o projeto
brasileiro para um novo Código de Processo Civil. In: Revista de Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, n.
193, mar. 2011, p. 361.
78
Ou seja, a GLO é uma forma específica de reunião das partes por meio de
listagem de ações com registro em grupo, a fim de racionalizar o julgamento dos processos
que versam sobre as mesmas questões de fato ou de direito, sendo considerada atualmente o
principal instrumento do sistema inglês para o tratamento dos litígios com múltiplas partes.155
152
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 357.
153
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 357.
154
O inteiro teor da legislação inglesa está disponível em: http://www.opsi.gov.uk/si/si2000/20000221.htm
155
ANDREWS, Neil. O moderno processo civil: formas judiciais e alternativas de resolução de conflitos na
Inglaterra. Orientação e revisão da tradução Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista os Tribunais,
2009, p. 343.
156
LÉVY, Daniel de Andrade. O incidente de resolução de demandas repetitivas no Anteprojeto do Novo
Código de Processo Civil. Exame à luz da Group Litigation Order Britânica. Revista de Processo, n. 196, jul.
2011, p. 185.
157
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 358.
79
Dessa forma, pode o juiz, ao perceber que uma série de demandas tem questões
comuns de fato ou de direito, criar um group litigation.160 Uma vez criado o GLO, esse deve,
obrigatoriamente, conter as especificações sobre o caso para o registro do grupo, a
especificação das questões comuns (GLO issues) tratadas no grupo e a designação do tribunal
(management court) que gerirá o caso. A instauração do grupo pode ser feita tanto de ofício,
como pelo autor ou pelo réu.
Nesse sentido, Neil Andrews ensina que, no sistema inglês, existe a previsão de
dois níveis de aprovação da ordem de litígio em grupo. Assim, nas hipóteses de decisão pela
instauração de ofício ou nos casos de provocação das partes, existe a necessidade de
158
LÉVY, Daniel de Andrade. O incidente de resolução de demandas repetitivas no Anteprojeto do Novo Código
de Processo Civil. Exame à luz da Group Litigation Order Britânica. Revista de Processo, n. 196, jul. 2011, p.
186-187.
159
ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezende. O case management inglês: um sistema maduro? Revista Eletrônica
de Direito Processual – REDP. v. VII. Rio de Janeiro. Jan./jun. 2011, p. 288-300.
160
ROSSONI, Igor Bimkowski. O incidente de resolução de demanda repetitivas e a introdução do group
litigation no direito brasileiro: avanço ou retrocesso? Disponível em: http://www.tex.pro.br/home/artigos/44-
artigos-dez-2010/4740-o-incidente-de-resolucao-de-demandas-repetitivas-e-a-introducao-do-group-litigation-no-
direito-brasileiro-avanco-ou-retrocesso. Acesso em: dez. 2015. p. 18.
80
ratificação da decisão preliminar por um senior judge, uma espécie de juiz superior161.
O tribunal gestor, por sua vez, deverá dispor, entre outras, sobre a escolha de uma
ou mais ações registradas como ações-modelo (test claims), indicando um advogado de uma
ou mais partes para ser o advogado principal dos demais autores ou dos réus. Trata-se de uma
espécie de controle de representatividade exercida pelo gestor dos casos para conferir maior
legitimidade ao procedimento de coletivização e ao julgamento.
Além disso, a legislação inglesa permite que as partes de uma ação individual já
registrada requeiram, a qualquer tempo, perante o tribunal gestor, o direito de serem excluídas
do cadastro coletivo para que não sejam submetidas aos efeitos do julgamento.
161
ANDREWS, Neil. O moderno processo civil: formas judiciais e alternativas de resolução de conflitos na
Inglaterra. Orientação e revisão da tradução Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista os Tribunais,
2009, p. 345.
162
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 361-362.
163
ANDREWS, Neil. O moderno processo civil: formas judiciais e alternativas de resolução de conflitos na
Inglaterra. Orientação e revisão da tradução Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista os Tribunais,
2009, p. 345-346.
81
Enfim, pode-se concluir que a ordem de litígio em grupo (GLO) do sistema inglês
instaura um incidente de resolução coletiva de litígios de massa com três características
marcantes: a) a faculdade das partes das demandas individuais de aderir ou não ao grupo,
resguardando-se a possibilidade de não se submeter à eficácia vinculante da decisão proferida
(modelo opt in); b) durante a tramitação do incidente, o tribunal exerce ampla gestão dos
casos e da instrução; e c) os efeitos da decisão sobre as questões comuns atingem apenas as
ações registradas no grupo, compartilhando a responsabilidade pelo pagamento das custas
entre os membros do grupo.
164
LÉVY, Daniel de Andrade. O incidente de resolução de demandas repetitivas no Anteprojeto do Novo
Código de Processo Civil. Exame à luz da Group Litigation Order Britânica. Revista de Processo, n. 196, jul.
2011, p. 193-194.
82
165
MORAES, Vânila C. A. Demandas repetitivas decorrentes de ações e omissões da administração pública:
hipótese de soluções e a necessidade de um direito processual público fundamentado na Constituição. Séries
Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2012, p. 119.
166
Art. 48 Processo em massa (CPTA)
1. Quando sejam intentados mais de 20 processos que, embora reportados a diferentes pronúncias da mesma
entidade administrativa, digam respeito à mesma relação jurídica material ou, ainda, que, respeitantes a
diferentes relações jurídicas coexistentes em paralelo, sejam susceptíveis de ser decididos com base na aplicação
das mesmas normas a idênticas situações de facto, o presidente do tribunal pode determinar, ouvidas as partes,
que seja dado andamento a apenas um ou alguns deles, que neste último caso são apensados num único processo,
e se suspenda a tramitação dos demais.
2. O tribunal pode igualmente determinar, ouvidas as partes, a suspensão dos processos que venham a ser
intentados na pendência do processo selecionado a que preencham os pressupostos previstos no número anterior.
3. No exercício dos poderes conferidos nos números anteriores, o tribunal deve certificar-se de que no processo
ou processos aos quais seja dado andamento prioritário a questão é debatida em todos os seus aspectos de facto e
de direito e que a suspensão da tramitação dos demais processos não tem o alcance de limitar o âmbito da
instrução, afastando a apreciação de factos ou a realização de diligências de prova necessárias para o completo
apuramento da verdade.
4. Ao processo ou processos seleccionados segundo o disposto no nº. 1 é aplicável o disposto neste código para
os processos urgentes e no seu julgamento intervêm todos os juízes do tribunal ou da secção.
5. Quando no processo seleccionado seja emitida pronúncia transitada em julgado, as partes são imediatamente
notificadas da sentença, podendo o autor optar por:
a) Desistir do seu próprio processo;
b) Requerer ao tribunal a extensão ao seu caso dos efeitos da sentença proferida, deduzindo qualquer das
pretensões enunciadas nos ns. 3, 4 e 5 do art. 176;
c) Requerer a continuação do seu próprio processo;
d) Recorrer da sentença no prazo de 30 dias, no caso de ela ter sido proferida em primeira instância.
6. Quando seja apresentado o requerimento a que se refere a alínea b) do número anterior, seguem-se os trâmites
do processo de execução das sentenças de anulação de actos administrativos previstos nos artigos 177º a 179º.
7. Se o recurso previsto na aliena d) do n. 5 vier a ser julgado procedente, pode o autor exercer a faculdade
prevista na alínea b) do mesmo número, sendo também neste caso aplicável o disposto no número anterior.
(SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 119-120)
167
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 119-120.
83
A desistência da ação pelo autor para não se submeter aos efeitos da decisão
modelo só tem sentido na hipótese em que a decisão proferida no processo selecionado for
desfavorável ao autor, para que, assim, ele não tenha que arcar com os ônus da
sucumbência.170
A extensão dos efeitos da sentença aos processos em massa, por sua vez, está
tratada no art. 161172 do CPTA português.
168
OLIVEIRA, Rodrigo Esteves de. OLIVEIRA, Mário Esteves de. Código de Processo nos Tribunais
Administrativos Anotado. Coimbra: Almedina, 2004, p. 322.
169
MORAES, Vânila C. A. Demandas repetitivas decorrentes de ações e omissões da administração pública:
hipótese de soluções e a necessidade de um direito processual público fundamentado na Constituição. Séries
Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2012, p. 122.
170
MORAES, Vânila C. A. Demandas repetitivas decorrentes de ações e omissões da administração pública:
hipótese de soluções e a necessidade de um direito processual público fundamentado na Constituição. Séries
Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2012, p. 127.
171
OLIVEIRA, Rodrigo Esteves de. OLIVEIRA, Mário Esteves de. Código de Processo nos Tribunais
Administrativos Anotado. Coimbra: Almedina, 2004, p. 328.
172
O art. 161 do CPTA assim dispõe sobre a extensão dos efeitos da sentença:
84
1. Os efeitos de uma sentença transitada em julgado que tenha anulado um acto administrativo desfavorável ou
reconhecido uma situação jurídica favorável a uma ou várias pessoas podem ser estendidos a outras que se
encontrem na mesma situação jurídica, quer tenham recorrido ou não à via judicial, desde que, quanto a essas,
não exista sentença transitada em julgado.
2. O disposto no número anterior vale apenas para situações em que existam vários casos perfeitamente
idênticos, nomeadamente no domínio do funcionalismo público e no âmbito de concursos, e só quando, no
mesmo sentido, tenham sido proferidas cinco sentenças transitadas em julgado ou, existindo uma situação de
processos em massa, nesse sentido tenha sido decidido o processo selecionado, segundo o disposto no artigo 48
n. 1.
3. Para o efeito do disposto no n. 1, o interessado deve apresentar, no prazo de um ano, contado da data da última
notificação de quem tenha sido parte no processo em que a sentença foi proferida, um requerimento dirigido à
entidade administrativa que, nesse processo, tenha sido demandada.
4. Indeferida a pretensão ou decorridos três meses sem decisão da Administração, o interessado pode requerer,
no prazo de dois meses, ao tribunal que tenha proferido a sentença, a extensão dos respectivos efeitos e a sua
execução em seu favor, sendo aplicáveis, com as devidas adaptações, os trâmites previstos no presente título para
a execução das sentenças de anulação de actos administrativos.
5. A extensão dos efeitos da sentença, no caso de existirem contra-interessados que não tenham tomado parte no
processo em que ela foi proferida, só pode ser requerida se o interessado tiver lançado mão, no momento próprio,
da via judicial adequada, encontrando-se pendente o correspondente processo.
6. Quando, na pendência de processo impugnatório, o acto seja anulado por sentença proferida noutro processo,
pode o autor fazer uso do disposto nos números 3 e 4 do presente artigo para obter a execução da sentença de
anulação. (in MORAES, Vânila C. A. Demandas repetitivas decorrentes de ações e omissões da administração
pública: hipótese de soluções e a necessidade de um direito processual público fundamentado na Constituição.
Séries Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2012, p. 129-130)
173
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 120.
85
o Poder Judiciário para a solução específica da sua questão, o que evidentemente não
diminuirá a litigiosidade e a crise causada pelo excesso de processos no Sistema de Justiça
brasileiro.
174
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 504-505.
175
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC. Críticas e propostas. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2010, p. 177.
86
A partir das referidas considerações, defende-se que, nesse aspecto, o IRDR não
se confunde com o antigo incidente de uniformização de jurisprudência.
176
Código de Processo Civil de 1973
Art. 476. Compete a qualquer juiz, ao dar o voto na turma, câmara, ou grupo de câmaras, solicitar o
pronunciamento prévio do tribunal acerca da interpretação do direito quando:
I - verificar que, a seu respeito, ocorre divergência;
II - no julgamento recorrido a interpretação for diversa da que Ihe haja dado outra turma, câmara, grupo de
câmaras ou câmaras cíveis reunidas.
Parágrafo único. A parte poderá, ao arrazoar o recurso ou em petição avulsa, requerer, fundamentadamente, que
o julgamento obedeça ao disposto neste artigo.
Art. 477. Reconhecida a divergência, será lavrado o acórdão, indo os autos ao presidente do tribunal para
designar a sessão de julgamento. A secretaria distribuirá a todos os juízes cópia do acórdão.
Art. 478. O tribunal, reconhecendo a divergência, dará a interpretação a ser observada, cabendo a cada juiz
emitir o seu voto em exposição fundamentada.
Parágrafo único. Em qualquer caso, será ouvido o chefe do Ministério Público que funciona perante o tribunal.
Art. 479. O julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o tribunal, será objeto
de súmula e constituirá precedente na uniformização da jurisprudência.
Parágrafo único. Os regimentos internos disporão sobre a publicação no órgão oficial das súmulas de
jurisprudência predominante. (BRASIL. Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo
Civil. Diário Oficial da União, 17 jan. 1973)
87
O ‘nomen iuris’ atribuído pelo legislador ao instituto não foi o mais preciso,
porquanto não revelou sua verdadeira essência.
Para Luiz Norton Baptista de Mattos, o IRDR, “à semelhança das ações coletivas
para a tutela de direitos individuais homogêneos, tem uma feição objetiva e coletiva, urdida
para a definição de uma questão jurídica comum a várias relações jurídicas similares”178. No
mesmo sentido é a lição de Alexandre Flexa, Daniel Macedo e Fabrício Bastos179, para os
quais o alcance do julgamento a ser proferido e todas as características do procedimento
demonstram que o incidente é um verdadeiro processo objetivo.
177
Importante ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça também reconheceu, em certa medida, o caráter
objetivo do julgamento dos recursos especiais repetitivos para definição de teses jurídicas. Nesse sentido, a
ementa do julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Especial Repetitivo n. 1.213.082/PR, relatado
pelo ministro Mauro Campbell Marques (DJ 18, de novembro de 2011): (...) 1. Não se pode olvidar que os
recursos representativos da controvérsia possuem um dado grau mínimo de objetividade que os distancia em
certa medida do caso concreto para firmar suportes fáticos hipotéticos (teses) que permitam abarcar situações
semelhantes. A fixação de parâmetros de julgamento deve ser objetiva e não subjetiva, muito embora tenha
como ponto de partida sempre um caso concreto. 2. A técnica de julgamento do recurso representativo da
controvérsia não trata apenas do exame da admissibilidade do recurso, da amplitude de seu feito devolutivo e da
solução ao caso concreto, mas também, de firmar objetivamente a tese vencedora de modo que sua aplicação seja
possível aos demais processos sobrestados. Nessa toada, separar as hipóteses que constituem regra, das hipóteses
que constituem exceção a uma dada tese se torna obstáculo intransponível ao exame dos recursos sobrestados, já
que o usual é a parte sustentar o enquadramento de sua situação na regra ou na exceção, conforme sua
conveniência. 3. O art. 543-C, §§4º e 5º, do CPC, ao permitir a intimação do Ministério Público Federal, de todas
as pessoas, órgãos, entidades e partes interessados, o fez no intuito de proteger essa eficácia objetiva mínima do
acórdão em recurso especial representativo da controvérsia, pois oportunizou aos conhecedores da jurisprudência
da Casa levantar todas as questões relevantes para reafirmar ou modificar a jurisprudência em torno de
determinado tema, notadamente as hipóteses de exceção, se conhecidas.
178
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 191.
179
FLEXA, Alexandre; MACEDO, Daniel; BASTOS, Fabrício. Novo Código de Processo Civil. Temas inéditos,
mudanças e supressões. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 626.
88
180
TEMER, Sofia Orberg. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 80.
181
Na Ação Declaratória de Constitucionalidade - ADC n. 1-1/DF, o Relator, Ministro Moreira Alves, assim
asseverou: Esta Corte já firmou o entendimento, em vários julgados, de que a ação direta de
inconstitucionalidade se apresenta como processo objetivo, por ser processo de controle de normas em abstrato,
em que não há prestação de jurisdição em conflitos de interesses que pressupõem necessariamente partes
antagônicas, mas em que há, sim, a prática, por fundamentos jurídicos, do ato político de fiscalização dos
Poderes constituídos decorrente da aferição da observância, ou não, da Constituição pelos atos normativos deles
emanados. Na análise de Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI-MC n. 1434, Relator
Ministro Celso de Mello, j. em 20.08.1996, DJ de 22.11.1996, p. 45.684, ficou assentado o seguinte: (...)
CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE - PROCESSO DE CARATER OBJETIVO -
IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSAO DE SITUACOES INDIVIDUAIS E CONCRETAS. - O controle
normativo de constitucionalidade qualifica-se como típico processo de caráter objetivo, vocacionado
exclusivamente a defesa, em tese, da harmonia do sistema constitucional. A instauração desse processo objetivo
tem por função instrumental viabilizar o julgamento da validade abstrata do ato estatal em face da Constituição
da República. O exame de relações jurídicas concretas e individuais constitui matéria juridicamente estranha ao
domínio do processo de controle concentrado de constitucionalidade. A tutela jurisdicional de situações
individuais, uma vez suscitada a controvérsia de índole constitucional, há de ser obtida na via do controle difuso
de constitucionalidade, que, supondo a existência de um caso concreto, revela-se acessível a qualquer pessoa que
disponha de interesse e legitimidade (CPC, art. 3o). (...).
89
um “processo objetivo” que, apesar de instrumento de jurisdição, “não pode ser tomado como
meio para composição de uma lide. É que, sendo ‘objetivo’, inexiste lide no processo
inaugurado pela ação direta genérica de inconstitucionalidade. Não há, afinal, pretensão
resistida”182.
Com efeito, no IRDR não existe propriamente um autor e um réu, mas vários
sujeitos legitimados e interessados. Também corrobora tal interpretação o fato de que não se
admite a posteriori desistência ou o abandono do processo. Isso porque, uma vez provocada a
atuação do tribunal local e presentes os pressupostos de admissibilidade do IRDR, deve o
órgão competente se pronunciar acerca da definição da tese jurídica, sem prescindir, em
qualquer caso, da ampla divulgação e participação democrática dos interessados.183
Não se pode negar que se trata de um processo objetivo bastante peculiar. Foi
conferido, por lei ordinária, aos tribunais de segundo grau, que não possuem competência
constitucionalmente atribuída para definirem teses jurídicas com eficácia vinculante em
relação aos juízes de primeiro grau, principalmente. Trata-se de verdadeiro controle abstrato
182
CLÈVE, Clemerson Merlin. A fiscalização abstrata de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo:
RT, 1995, p. 112-113.
183
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 148.
90
de legalidade anômalo.
184
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 88.
185
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 736.
91
do tribunal.186
O artigo 976 do novo Código de Processo Civil prevê o cabimento do IRDR desde
que presentes simultaneamente as seguintes situações: a) efetiva repetição de processos; b)
controvérsia sobre a mesma questão de direito; e c) o risco de ofensa à isonomia e à segurança
jurídica.
186
Sofia Temer discorda da assimilação do IRDR ao processo coletivo e às suas características. Em sua recente
obra, a referida processualista defende que, embora seja inegável que há uma dimensão coletiva no incidente,
que decorre da repetição das mesmas questões em diversos casos (o que fundamenta o uso do instituto) e que se
observa na abrangência do âmbito de aplicação da tese fixada, há elementos importantes que demonstram que ele
não é um meio processual propriamente coletivo, ou seja, não é uma técnica processual coletiva, e por isso, se
distancia das ações coletivas para defesa de direitos individuais homogêneos. (TEMER, Sofia Orberg. Incidente
de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 92) O tema é realmente polêmico e a
própria Sofia Temer reconhece que reformulou seu entendimento já externado em trabalhos anteriores quando
sustentou que o IRDR era um mecanismo de coletivização. (MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; TEMER,
Sofia. O incidente de resolução de demandas repetitivas do novo Código de Processo Civil. Revista de Processo,
vol. 243, maio/2015, p. 283-332; LAMY, Eduardo de Avelar; TEMER, Sofia Orberg. A representatividade
adequada na tutela de direitos individuais homogêneos. Revista de Processo, vol. 206, 2012, p. 167-189.)
187
NUNES, Dierle José Coelho. Precedentes, padronização decisória preventiva e Coletivização – Paradoxos do
sistema jurídico brasileiro: uma abordagem constitucional democrática. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim.
(coord.). Direito Jurisprudencial. São Paulo: RT, 2012, p. 267-268.
92
Para que se possa fixar uma tese jurídica a ser aplicada a casos futuros, é
preciso que sejam examinados todos os pontos de vista, com a possibilidade
de análise do maior número possível de argumentos. E isso não se concretiza
se o incidente for preventivo, pois não há, ainda, amadurecimento da
discussão. Definir uma tese sem que o assunto esteja amadurecido ou
amplamente discutido acarreta o risco de haver novos dissensos, com a
possibilidade de surgirem, posteriormente, novos argumentos que não foram
debatidos ou imaginados naquele momento inicial em que, preventivamente,
se fixou a tese jurídica a ser aplicada a casos futuros.188
188
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Anotações sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas
previsto no Projeto de novo Código de Processo Civil. Revista de Processo. São Paulo: RT, n. 193, mar. 2011, p.
262.
189
O jurista Luiz Henrique Volpe Camargo criticou a alteração do projeto de lei realizada pela Câmara dos
Deputados, sustentando que a modificação legislativa retirou “a possibilidade de instauração do incidente
preventivo, ou seja, antes da concreta reprodução massificada de causas. (...) a versão do Senado é mais afinada
com um dos principais objetivos do incidente, que é desafogar o Poder Judiciário de questões repetitivas”.
(CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. O incidente de resolução de demandas repetitivas no projeto de novo CPC:
a comparação entre a versão do Senado Federal e a da Câmara dos Deputados. In: FREIRE, Alexandre et al
(Orgs.). Novas tendências do processo civil. vol. III. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 283)
190
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 128.
93
Como muito bem advertem Gláucio Maciel Gonçalves e Victor Dutra, diante da
ausência de critérios objetivos previstos na legislação brasileira, corre-se o sério risco da
utilização precoce do IRDR, antes que outras partes afetadas pela mesma questão de direito
tenham trazido ao Poder Judiciário novas perspectivas e sem que uma quantidade razoável de
juízes tenha se posicionado sobre a matéria de direito. Tal situação poderia “culminar em
decisões-modelo desconectadas da amplitude das realidades fáticas”192
A mesma crítica é realizada por Júlio Rossi, para o qual a referida cisão é
“fantasiosa na medida em que, firmada a tese vinculante no bojo de um IRDR, dificilmente
191
NUNES, Dierle José Coelho; SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 389.
192
GONÇALVES, Gláucio Maciel; DUTRA, Victor Barbosa. Apontamentos sobre o novo incidente de resolução
de demandas repetitivas no Código de Processo Civil de 2015. RIL Brasília a. 52 n. 208 out./dez. 2015, p. 193.
193
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 132-133.
94
saberemos distinguir o que é uma matéria ou questão de direito e o que é de fato, aplicando
nosso precedente à brasileira por critério de silogismo ou mero procedimento”194.
Nessa toada, haverá controvérsia sobre determinada questão de direito para fins de
cabimento do IRDR quando houver, de forma preponderante, discordância quanto à forma de
interpretação de determinada norma jurídica, cuja análise independa de dilação probatória.
194
ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de demandas
repetitivas. Revista de Processo. Ano 37, vol. 208, jun 2012, p. 233.
195
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Questão de fato e questão de direito. Revista da Academia Paulista de
Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 3, jan./jun., 2012, p. 235-236.
196
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Questão de fato e questão de direito. Revista da Academia Paulista de
Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 3, jan./jun., 2012, p. 236-237.
95
normas cada vez mais gerais e abstratas, cada vez mais distantes das peculiaridades dos casos
concretos, o que foge ao tradicional papel do Poder Judiciário de fazer a subsunção do fato à
norma para a composição da lide no caso concreto. 197
Nos termos do parágrafo único do art. 928 do novo CPC, o incidente será cabível
para estabelecer teses jurídicas sobre questões de direito material ou de direito processual
comuns em demandas repetitivas, não havendo restrição legal, portanto, quanto à matéria
jurídica que será objeto do julgamento.
197
GONÇALVES, Gláucio Maciel; DUTRA, Victor Barbosa. Apontamentos sobre o novo incidente de
resolução de demandas repetitivas no Código de Processo Civil de 2015. RIL Brasília a. 52 n. 208 out./dez. 2015,
p. 195.
198
NUNES, Dierle José Coelho. SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 367.
199
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 133-134.
96
Segundo Artur César de Souza, “a sociedade não se satisfaz mais com o conflito
de decisões diante da mesma questão jurídica, pois o favorecimento de uns em prejuízo de
outros demonstra a inconsistência das decisões judiciais e a falta de senso de justiça”200.
200
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 125.
201
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. O regime processual das causas repetitivas. Revista de Processo. São
Paulo: RT, n. 179, jan. 2010, p.138.
202
Esse também é o entendimento manifestado por Gláucio Maciel Gonçalves e Victor Dutra. In: Apontamentos
sobre o novo incidente de resolução de demandas repetitivas no Código de Processo Civil de 2015. RIL Brasília
a. 52 n. 208 out./dez. 2015, p. 194.
97
do debate processual.
Embora tal exigência não tenha sido admitida no Congresso Nacional quando da
aprovação da novel legislação, a interpretação teleológica ora apresentada é a mais coerente
com as garantias fundamentais do processo já que impede a instauração prematura do IRDR
antes que efetivamente existam posicionamentos antagônicos sobre a questão jurídica
isomórfica, favorecendo o debate processual para que a tese jurídica somente seja firmada
através do incidente a partir do surgimento de ampla divergência. Ou seja, é necessário existir
controvérsia jurisprudencial preexistente ao incidente.
(...) para caber o incidente, seria mais adequado haver, de um lado, sentenças
admitindo determinada solução, havendo, por outro lado, sentenças
rejeitando a mesma solução. Seria, enfim, salutar haver uma controvérsia já
disseminada para que, então, fosse cabível o referido incidente. Dever-se-ia,
na verdade, estabelecer como requisito para a instauração de tal incidente a
existência de prévia controvérsia sobre o mesmo assunto.203
203
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Anotações sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas
previsto no Projeto de novo Código de Processo Civil. Revista de Processo. São Paulo: RT, n. 193, mar. 2011, p.
262.
204
ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de demandas
repetitivas. Revista de Processo. Ano 37, vol. 208, jun 2012, p. 231.
205
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 738.
98
Finalmente, destaca-se que, nos termos do parágrafo 4º do art. 976, o IRDR não
será cabível quando um dos tribunais superiores, no âmbito da sua respectiva competência
constitucional, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material
ou processual repetitiva, na forma dos artigos 1036 e 1041 da novel legislação.
exista demanda sobre a questão de direito repetitiva tramitando no tribunal local ou regional
para a instauração do IRDR.
Embora não haja previsão expressa na legislação sobre tal exigência, é o que se
extrai da interpretação, conforme a Constituição de 1988, do parágrafo único do artigo 978206
do novo Código de Processo Civil, segundo o qual “o órgão colegiado incumbido de julgar o
incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o
processo de competência originária de onde se originou o incidente”.
206
Importante ressaltar que diversos autores defendem a inconstitucionalidade formal do referido dispositivo, em
razão de ofensa ao devido processo legislativo. Isso porque não havia previsão similar ao dispositivo nas versões
aprovadas no Senado e na Câmara dos Deputados. Não se poderia admitir que o referido dispositivo tenha
surgido como emenda de redação, haja vista seu conteúdo substancial distinto dos textos aprovados. (CABRAL,
Antonio do Passo. Comentários aos arts. 976 a 987. In: CABRAL, Antonio do Passo; CRAMER, Ronaldo.
Comentários ao novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 1428 No mesmo sentido:
TEMER, Sofia Orberg. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 104-
105; CAVALCANTI, Marcos de Araújo. Incidente de resolução de demandas repetitivas e ações coletivas.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 453.) Não obstante, entende-se que eventual inconstitucionalidade do referido
dispositivo legal não impede a interpretação ora preconizada, que se respalda no respeito à garantia
constitucional do contraditório substancial, considerada indispensável à validade do processo, e no sistema de
competências delimitado taxativamente pela Constituição de 1988.
207
BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 613.
208
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo
civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum. v. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 580.
209
Humberto Theodoro Júnior admite na obra referenciada a necessidade da existência de “controvérsias
jurisprudenciais preexistentes” para cabimento do incidente, mas entende que não é preciso que exista demanda
sobre a questão repetitiva transitando pelo tribunal, nem que algum recurso já tenha sido interposto.
(THEODORO JR., Humberto. Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com
o Novo Código de Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 737-
741).
210
TEMER, Sofia Orberg. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 103-
115.
211
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 136.
100
instância sem qualquer prévio pronunciamento judicial, seja ele por decisão ou sentença,
colide frontalmente com o contraditório substancial robustecido pelo debate processual mais
amplo que deveria permear qualquer procedimento voltado à fixação de posicionamentos
vinculantes de modo a lhes conferir legitimidade constitucional.
De igual modo, seria inócua a requisição prevista no artigo 982, inciso II, para a
obtenção de informações perante os órgãos jurisdicionais, nos quais tramitam os processos
que tem por objeto a questão de direito repetitiva, na medida em que os julgadores de
primeiro grau não poderiam remeter qualquer pronunciamento jurisdicional com a abordagem
necessária dos argumentos pertinentes à controvérsia jurídica já que os processos estariam
suspensos pelo incidente antes mesmo de qualquer análise da questão e dos argumentos
apresentados.
212
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 170-171.
101
tribunal terá, sob seu escrutínio, vários pontos de vista sobre a questão, o que
possibilita um melhor amadurecimento sobre a controvérsia e a formação de
um precedente de melhor qualidade.213
(...) estando os processos ainda em primeira instância, sem que tenha havido
a interposição de recurso ou sequer a prolação de sentença, o incidente de
demanda repetitiva é incidente de que? A resposta é fácil: a nada! Não se
tratando de causa de competência originária do tribunal e não havendo ainda
recurso, a decisão a respeito da interpretação do direito não constitui uma
questão prévia a ser resolvida pelo tribunal antes de proferir um julgamento,
porque o julgamento propriamente dito, ainda que condicionado, não será
proferido pelo órgão ad quem, mas pelo órgão a quo. Não há, em verdade,
incidente, mas a avocação pelo tribunal de parcela das questões relevantes
para o julgamento de mérito (...)214
Assim, para que haja respeito ao contraditório efetivo, o incidente somente poderá
ser instaurado a partir de um caso modelo no qual, além do amplo debate entre as partes, a
questão de direito repetitiva também já tenha sido enfrentada pelo juiz de maneira
fundamentada na sentença. Ou seja, é preciso o maior debate das questões e para tanto a causa
tem que chegar ao tribunal por via do recurso ou da remessa necessária.216
Para Marcos Cavalcanti217 basta que o tribunal esteja examinando alguma das
causas repetitivas para cabimento do IRDR, não havendo qualquer importância se eventual
recurso tiver sido interposto de sentença ou decisão interlocutória, sendo que, nessa hipótese,
porém, a cognição do incidente ficaria restrita ao efeito devolutivo do recurso de agravo de
213
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1..
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 172.
214
YOSHIKAWA, Eduardo Henrique de Oliveira. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo
Código de Processo Civil. Revista de Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 206, abr., 2012, p. 252.
215
CABRAL, Antonio do Passo. Comentários aos arts. 976 a 987. In: CABRAL, Antonio do Passo; CRAMER,
Ronaldo. Comentários ao novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 1422.
216
CABRAL, Antônio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo, v. 39, n. 231. São Paulo: RT, maio 2014, p. 209.
217
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 433-434.
102
instrumento. Segundo defendido por Cavalcanti em sua obra, o incidente instaurado a partir
de um processo modelo pendente no tribunal para análise do recurso de agravo de instrumento
interposto contra decisão interlocutória teria também cognição sumária e a tese ali proferida
deveria servir de parâmetro apenas para os exames dos requerimentos repetitivos de
antecipação dos efeitos da tutela. Tal restrição não possui previsão na legislação e esvaziaria a
finalidade do incidente quando interposto em tais situações, mesmo porque existem as
decisões de mérito que possuem caráter definitivo e cognição exauriente.
218
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 113-114.
219
No mesmo sentido se manifestou Artur César de Souza. (SOUZA, Arthur César de. Resolução de Demandas
Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 137-143).
220
CF. Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.
103
respectivos Estados, do que se conclui que o Código de Processo Civil – lei ordinária de
caráter nacional – não tem legitimidade constitucional para ampliar a competência originária
dos referidos órgãos do Poder Judiciário.
De igual modo, a lei ordinária, que regulamenta o Código de Processo Civil, não
pode ampliar a competência originária dos Tribunais Regionais Federais prevista de forma
taxativa no art. 108221 da Constituição da República.
Enfim, seja do ponto vista material – respeito ao efetivo contraditório com maior
debate processual e participação do magistrado de primeiro grau –, seja do ponto de vista
formal – impossibilidade de lei ordinária ampliar rol de competência originária dos tribunais –
, a interpretação que deve prevalecer é a de que o cabimento do IRDR pressupõe a existência
de processo sobre a questão jurídica repetitiva pendente de julgamento no tribunal.
A legitimidade para requerer a instauração do incidente foi regulada pelo art. 977
do Código de Processo Civil.
A referida norma legal dispõe que o requerimento para instauração do IRDR deve
ser dirigido ao tribunal local ou regional pelo juiz ou relator, por ofício; pelas partes, por
petição; pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, também por petição.
§ 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária
de iniciativa do Tribunal de Justiça.
221
CF. Art. 108 - Compete aos Tribunais Regionais Federais:
I - processar e julgar, originariamente:
a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes
comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da
Justiça Eleitoral;
b) as revisões criminais e as ações rescisórias de julgados seus ou dos juízes federais da região;
c) os mandados de segurança e os habeas data contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal;
d) os habeas corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal;
e) os conflitos de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal;
104
Mesmo que os processos ainda não tenham sido remetidos ao tribunal, é possível
que o juiz de primeira instância exerça sua legitimidade para requerer a instauração do
incidente mediante ofício, desde que venha instruído com documentação suficiente para
demonstrar que a questão de direito repetitiva já se encontra pendente de análise pelo tribunal
em outros casos.
Nesse sentido, Luiz Henrique Volpe Camargo entende que “o juiz de 1º grau, por
sua função, tem mais facilidade em considerar a multiplicação de causas com a mesma
questão jurídica, pois, é a ele que as demandas de variados autores, muitas vezes
representados por diferentes advogados, é dirigida” 224.
No tribunal, por sua vez, somente o relator de algum dos processos repetitivos,
seja em razão de recurso, remessa necessária, ou em razão de causa de competência
222
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 155.
223
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.).Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 178.
224
CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. O incidente de resolução de demandas repetitivas no projeto de novo
CPC: a comparação entre a versão do Senado Federal e a da Câmara dos Deputados. In: FREIRE, Alexandre et
al (Orgs.). Novas tendências do processo civil. vol. III. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 288.
105
É certo que as partes legitimadas não são apenas aquelas que integram a relação
processual da causa pendente no tribunal. Qualquer das partes dos processos repetitivos, tendo
conhecimento de que já existe demanda de mesma natureza pendente de análise no tribunal,
tem legitimidade para requerer a instauração do IRDR, mediante petição fundamentada,
instruída por documentos e procuração para representação por advogado habilitado. 225
225
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 437.
226
A previsão do texto legal é expressa nesse sentido: § 3º Visando à garantia da segurança jurídica, qualquer
legitimado mencionado no art. 977, incisos II e III, poderá requerer, ao tribunal competente para conhecer do
recurso extraordinário ou especial, a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos em curso no
território nacional que versem sobre a questão objeto do incidente já instaurado.
227
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 438.
106
Ressalta-se, por fim, que a lei não faz exigência de que a petição das partes seja
revestida dos requisitos formais da petição inicial, mas, a toda evidência, é necessário que o
requerimento seja amplamente fundamentado pela parte interessada, demonstrando a
existência dos pressupostos de admissibilidade, além de fundamentos jurídicos para sustentar
a prevalência de determinada interpretação jurídica que lhe seja favorável.
228
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 146.
229
NUNES, Dierle José Coelho. SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 388.
107
230
característica das ações coletivas , qual seja, a previsão da legitimação extraordinária ou
substituição processual pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública para a tutela de
direitos de partes envolvidas nas demandas repetitivas sobre determinada questão de direito.
Em outras palavras, “a legitimação do Ministério Público e da Defensoria Pública para
suscitar o IRDR tem, a princípio, forte relação com a legitimidade extraordinária dessas
entidades para o ajuizamento de ação civil pública na defesa de direitos individuais
homogêneos”.231
230
ARAÚJO, José Henrique Mouta. O incidente de resolução das causas repetitivas no novo CPC e o devido
processo legal. In: MACEDO, Lucas Buril et al (orgs.). Processo nos Tribunais e Meios de Impugnação às
Decisões Judiciais. Coleção novo CPC – Doutrina Selecionada. vol. 06. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 328.
231
CAVALCANTI, Marcos. Incidente de resolução de demandas repetitivas e ações coletivas. Salvador:
Juspodivm, 2015, p. 540.
232
Brasil. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 631.111/GO, Relator Ministro Teori Zavascki,
julgado em 07.08.2014, publicado em 30.10.2014, com a seguinte ementa: CONSTITUCIONAL E
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL COLETIVA. DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS (DIFUSOS E
COLETIVOS) E DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DISTINÇÕES. LEGITIMAÇÃO DO
108
repercussão geral da matéria, decidiu que o Ministério Público detém legitimidade para
ajuizar ação coletiva em defesa dos direitos individuais homogêneos dos beneficiários do
seguro DPVAT (seguro obrigatório, por força da Lei 6.194/74, voltado à proteção das vítimas
de acidentes de trânsito), dado o interesse social qualificado presente na tutela dos referidos
direitos subjetivos.
MINISTÉRIO PÚBLICO. ARTS. 127 E 129, III, DA CF. LESÃO A DIREITOS INDIVIDUAIS DE
DIMENSÃO AMPLIADA. COMPROMETIMENTO DE INTERESSES SOCIAIS QUALIFICADOS.
SEGURO DPVAT. AFIRMAÇÃO DA LEGITIMIDADE ATIVA.
1. Os direitos difusos e coletivos são transindividuais, indivisíveis e sem titular determinado, sendo, por isso
mesmo, tutelados em juízo invariavelmente em regime de substituição processual, por iniciativa dos órgãos e
entidades indicados pelo sistema normativo, entre os quais o Ministério Público, que tem, nessa legitimação
ativa, uma de suas relevantes funções institucionais (CF art. 129, III).
2. Já os direitos individuais homogêneos pertencem à categoria dos direitos subjetivos, são divisíveis, tem titular
determinado ou determinável e em geral são de natureza disponível. Sua tutela jurisdicional pode se dar (a) por
iniciativa do próprio titular, em regime processual comum, ou (b) pelo procedimento especial da ação civil
coletiva, em regime de substituição processual, por iniciativa de qualquer dos órgãos ou entidades para tanto
legitimados pelo sistema normativo. (...)
4. O art. 127 da Constituição Federal atribui ao Ministério Público, entre outras, a incumbência de defender
“interesses sociais”. Não se pode estabelecer sinonímia entre interesses sociais e interesses de entidades públicas,
já que em relação a estes há vedação expressa de patrocínio pelos agentes ministeriais (CF, art. 129, IX).
Também não se pode estabelecer sinonímia entre interesse social e interesse coletivo de particulares, ainda que
decorrentes de lesão coletiva de direitos homogêneos. Direitos individuais disponíveis, ainda que homogêneos,
estão, em princípio, excluídos do âmbito da tutela pelo Ministério Público (CF, art. 127).
5. No entanto, há certos interesses individuais que, quando visualizados em seu conjunto, em forma coletiva e
impessoal, têm a força de transcender a esfera de interesses puramente particulares, passando a representar, mais
que a soma de interesses dos respectivos titulares, verdadeiros interesses da comunidade. Nessa perspectiva, a
lesão desses interesses individuais acaba não apenas atingindo a esfera jurídica dos titulares do direito
individualmente considerados, mas também comprometendo bens, institutos ou valores jurídicos superiores, cuja
preservação é cara a uma comunidade maior de pessoas. Em casos tais, a tutela jurisdicional desses direitos se
reveste de interesse social qualificado, o que legitima a propositura da ação pelo Ministério Público com base no
art. 127 da Constituição Federal. Mesmo nessa hipótese, todavia, a legitimação ativa do Ministério Público se
limita à ação civil coletiva destinada a obter sentença genérica sobre o núcleo de homogeneidade dos direitos
individuais homogêneos.
6. Cumpre ao Ministério Público, no exercício de suas funções institucionais, identificar situações em que a
ofensa a direitos individuais homogêneos compromete também interesses sociais qualificados, sem prejuízo do
posterior controle jurisdicional a respeito. Cabe ao Judiciário, com efeito, a palavra final sobre a adequada
legitimação para a causa, sendo que, por se tratar de matéria de ordem pública, dela pode o juiz conhecer até
mesmo de ofício (CPC, art. 267, VI e § 3.º, e art. 301, VIII e § 4.º).
7. Considerada a natureza e a finalidade do seguro obrigatório DPVAT – Danos Pessoais Causados por Veículos
Automotores de Via Terrestre (Lei 6.194/74, alterada pela Lei 8.441/92, Lei 11.482/07 e Lei 11.945/09) -, há
interesse social qualificado na tutela coletiva dos direitos individuais homogêneos dos seus titulares,
alegadamente lesados de forma semelhante pela Seguradora no pagamento das correspondentes indenizações. A
hipótese guarda semelhança com outros direitos individuais homogêneos em relação aos quais - e não obstante
sua natureza de direitos divisíveis, disponíveis e com titular determinado ou determinável -, o Supremo Tribunal
Federal considerou que sua tutela se revestia de interesse social qualificado, autorizando, por isso mesmo, a
iniciativa do Ministério Público de, com base no art. 127 da Constituição, defendê-los em juízo mediante ação
coletiva (RE 163.231/SP, AI 637.853 AgR/SP, AI 606.235 AgR/DF, RE 475.010 AgR/RS, RE 328.910 AgR/SP
e RE 514.023 AgR/RJ).
8. Recurso extraordinário a que se dá provimento.
109
interesses sociais qualificados, sob pena de não restar caracterizada a legitimidade específica
para a instauração do IRDR, que não deixa de ser espécie de tutela coletiva voltada para
resolução em bloco de demandas repetitivas.
233
BRASIL. STJ. Precedentes: Recurso Especial n. 1.264.116/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, julgado em 18/10/2011, publicado no DJe em 13/04/2012; Embargos de Divergência em Recurso
Especial n. 1192577 / RS, Relatora Ministra Laurita Vaz, Corte Especial, julgado em 21/10/2015, publicado no
DJe em 13/11/2015.
234
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 190.
110
Isso porque, enquanto na ação coletiva prevista no direito brasileiro, por meio de
representação ou substituição processual, a coisa julgada é secundum eventum litis, ou seja,
vincula os substituídos apenas se os beneficiar; no novo IRDR o julgamento é pro et contra,
ou seja, vincula os envolvidos tanto se favorável, quanto se desfavorável, repercutindo sobre
os processos pendentes e também os futuros.
235
BRASIL. STF. ADI 3943/DF, julgada em 07/05/2015 e acórdão publicado no DJE nº 154, divulgado em
05/08/2015 com a seguinte ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Legitimidade ativa da defensoria
pública para ajuizar ação civil pública (art. 5º, inc. II, da lei n. 7.347/1985, alterado pelo art. 2º da lei n.
11.448/2007). Tutela de interesses transindividuais (coletivos strito sensu e difusos) e individuais homogêneos.
Defensoria pública: instituição essencial à função jurisdicional. Acesso à justiça. Necessitado: definição segundo
princípios hermenêuticos garantidores da força normativa da Constituição e da máxima efetividade das normas
Constitucionais: art. 5º, incs. XXXV, LXXIV, LXXVIII, da Constituição da República. Inexistência de norma de
exclusividade do Ministério Público para ajuizamento de ação civil pública. Ausência de prejuízo institucional
do Ministério Público pelo reconhecimento da legitimidade da Defensoria Pública. Ação julgada improcedente.
111
236
Basta consultar o artigo 5º, §3º da Lei 7.347/1985, que dispõe sobre a Ação Civil Pública, e o artigo 9º da Lei
4.717/1965, que regula a Ação Popular.
237
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 566.
238
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In: Coleção
Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1. GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Salvador:
Juspodivm, 2015, p. 183.
112
239
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 736, p. 740.
240
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 148.
241
Nas ações de controle abstrato de constitucionalidade também não se admite a desistência, conforme dispõe o
art. 5º da Lei 9.868/99: “Art. 5º Proposta a ação direta, não se admitirá desistência.”
242
TEMER, Sofia Orberg. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 78-
79.
113
José Carneiro da Cunha243 sustentava que o julgamento deveria prosseguir, definindo a tese
jurídica que seria aplicável aos processos que ficaram sobrestados e aos futuros que viessem a
ser ajuizados sobre a questão jurídica repetitiva, mas isso não atingiria a parte que, pelo ato de
sua vontade, desistiu do recurso.
De igual modo, Antonio Adonias Aguiar Bastos244 ensina que, uma vez afetado o
processo ao regime de julgamento dos recursos repetitivos, deve seguir até o seu final com a
definição da tese jurídica. Isso não impede, contudo, que a parte desista de seu recurso. O
interesse público seria respeitado sem violar o direito fundamental processual da parte.
243
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. O regime processual das causas repetitivas. Revista de processo. São
Paulo: RT, n. 179, jan. 2010, p. 155.
244
BASTOS, Antônio Adonias Aguiar. A necessidade de compatibilização do interesse público com os direitos
processuais individuais no julgamento das demandas repetitivas. In: DIDIER Jr, Fredie; BASTOS, Antonio
Adonias Aguiar (coord.). O Projeto do Novo Código de Processo Civil: estudos em homenagem ao professor
José Joaquim Calmon de Passos. Salvador: JusPodiym, 2012, p. 125.
245
BRASIL. STJ. Desistência no Recurso especial n. 1370698/SP, Relator Ministro João Otávio de Noronha, 3ª
Turma, j. 21/11/2013. Por ilustrar bem o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, importante
destacar trecho do voto-desempate proferido pela eminente Ministra Maria Isabel Gallotti: (...) uma vez
selecionado pelo relator determinado recurso para ser julgado no rito do art. 543-C, há verdadeira irradiação de
efeitos processuais a outros tantos que tratem da mesma questão, com a ordem de suspensão da tramitação destes
e, após o julgamento do recurso representativo da controvérsia, a possibilidade de re-julgamento da causa ou de
negativa de seguimento do recurso pelo Tribunal de segundo grau, como dispõe o artigo 543-C, §§ 2º e 7º, II, do
CPC, de modo que o referido rito evidencia a transcendência do mero interesse das partes. Assim, o direito
potestativo da parte de desistir do recurso interposto em seu interesse particular (CPC, art. 501) não poderia
mesmo prejudicar o andamento dos processos de inúmeros litigantes suspensos no aguardo do julgamento do
recurso representativo da controvérsia, nos termos do art. 543-C. Como assinalado pelo Ministro João Otávio de
Noronha, a rigor, no caso do recurso representativo da controvérsia, sequer há propriamente exceção ao direito
potestativo de desistência do recurso. O que ocorre é a postergação do exame da petição de desistência para após
a apreciação da questão de direito que justificou a afetação do processo para julgamento pelo rito do art. 543-C.
114
Tal exigência mínima da lei não ofende a competência privativa dos tribunais para
definir no regimento interno as atribuições dos seus órgãos colegiados, mas apenas estabelece
coerência para que a definição da tese jurídica no julgamento do IRDR ocorra pelo órgão, que
também possua dentre as suas atribuições a de uniformização da jurisprudência, já que a
decisão proferida vinculará os demais membros do tribunal e, principalmente, os juízes de
primeira instância.
Nesse sentido, discordo do que sustentado por Leonardo José Carneiro da Cunha:
246
NUNES, Dierle José Coelho. SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 389. Trata-se da Resolução 203 , de 15 de março de 2016, do TST.
115
O parágrafo único do art. 978 estabelece, por sua vez, uma espécie de prevenção
do órgão colegiado que julgou o IRDR para julgar também o recurso, a remessa necessária ou
o processo de competência originária de onde se originou o incidente processual.
247
CUNHA, Leonardo José Carneiro. Anotações sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas previsto
no Projeto de novo Código de Processo Civil. Revista de Processo. São Paulo: RT, n. 193, mar. 2011, p. 271.
248
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 453.
249
BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 618.
116
usurpação da competência dos tribunais para estabelecerem suas atribuições por meio do
regimento interno, nos termos do art. 96, inciso I, alínea “a”, da Constituição da República.
Para Humberto Theodoro Jr.250, quando o incidente for suscitado em processo que
já tramita pelo tribunal, seu processamento dar-se-á dentro dos próprios autos, a exemplo do
que se passa com os embargos de declaração e o agravo interno.
De acordo com o regramento dado pelo novo CPC (art. 979 e parágrafos), a
instauração e o julgamento do incidente coletivo serão precedidos de ampla divulgação e
publicidade, com alguma semelhança ao procedimento-modelo alemão e à ordem de litígio
em grupo do direito inglês.
250
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 741-742.
117
máxima precisão a questão de direito material ou processual que será objeto de análise pelo
tribunal local.
251
Disponível em: www.cnj.jus.br. Acesso em: jul. 2016.
118
oficial.252
252
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 458.
253
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 192.
254
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 742.
255
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.).Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 193.
119
Tal interpretação vai ao encontro da previsão do art. 932, inciso III e IV do novo
CPC que atribui poderes ao relator para não conhecer de recurso manifestamente
inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da
decisão recorrida, e para negar provimento a recurso que for contrário a entendimento
sumulado, acórdão proferido em julgamento de recursos repetitivos, ou contrário a tese
256
MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; TEMER, Sofia. O incidente de resolução de demandas repetitivas do
novo Código de Processo Civil. Revista de Processo, vol. 243, maio/2015, p. 316.
257
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 621.
258
NUNES, Dierle José Coelho. SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 391.
120
259
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 129-130.
260
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 130.
121
Embora o silêncio da lei, a suspensão determinada pelo IRDR também poderá ser
afastada pontualmente se a parte requerer o prosseguimento do seu processo, demonstrando a
distinção do caso em relação à questão de direito que será dirimida no incidente. O
requerimento deverá ser endereçado ao juiz do processo, se ainda na primeira instância, ou ao
relator, para aqueles que já estiverem em tramitação no segundo grau, a quem competirá
decidir sobre o andamento daquela ação específica.263
261
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 155.
262
NUNES, Dierle José Coelho; SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p.392.
263
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 155.
122
A regra não foi mantida no texto final aprovado no processo legislativo. Não
obstante, em relação às pretensões já ajuizadas, Scarpinella Bueno266 defende, por uma
interpretação sistemática, a possibilidade de se sustentar a suspensão da prescrição
intercorrente, sob pena de se admitir que a demora de julgamento do IRDR implicará, por vias
transversas, a eliminação dos processos em tramitação, cujas pretensões seriam fulminadas
pela prescrição intercorrente simplesmente por estarem parados. No mesmo sentido é a
interpretação dada pelo Enunciado 452 do Fórum dos Processualistas Civis, segundo o qual
“durante a suspensão do processo prevista no art. 982 não corre a prescrição intercorrente”267.
Em relação aos processos ainda não ajuizados, a situação não comporta a mesma
solução. Segundo Marcos Cavalcanti, “não há como se sustentar a interrupção ou a suspensão
do prazo prescricional das pretensões individuais não ajuizadas sem lei expressa que a
determine”268, matéria que deveria se submeter a regramento pelo Código Civil e não pela
legislação processual.
264
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 121-124.
265
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 622.
266
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 624-625.
267
NUNES, Dierle José Coelho; SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 393.
268
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 563.
269
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 156.
123
efetiva interrupção do prazo prescricional, ainda que o processo fique suspenso enquanto não
julgado o incidente de resolução de demandas repetitivas.
Assim, as partes devem propor suas ações para não correr o risco de ter a
pretensão fulminada pelo transcurso do prazo prescricional, salvo se já houver ação coletiva
suspensa pelo IRDR na qual aquela parte seja substituída processual e, portanto, beneficiária
dos efeitos interruptivos da prescrição no processo coletivo.
Além da suspensão dos processos, o relator poderá requisitar, nos termos do art.
982, inciso II já citado, informações aos juízos perante os quais tramitam as demandas
repetitivas.
O art. 983 do CPC/2015 dispõe que o relator do IRDR deverá ouvir as partes e os
demais interessados, inclusive pessoas, órgãos e entidades com interesse na controvérsia de
direito.
270
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p.743.
124
Apesar disso, não foram previstos critérios objetivos para a escolha do processo
originário. Não foi prevista a escolha de um “líder” ou de controle judicial da representação
no incidente coletivo, tal como ocorre no direito comparado, para assegurar a efetiva
participação daqueles que serão afetados pelo processo e, ao mesmo tempo, conferir
legitimidade ao julgamento dotado de efeito vinculante. 271
Ainda que não se admita a atuação dos litigantes dos processos sobrestados como
partes no IRDR, em razão da ausência de previsão legal específica, mostra-se evidente o
direito à intervenção no procedimento como terceiros interessados.
Com efeito, as partes dos processos suspensos pelo IRDR serão impactadas
diretamente pelo julgamento do incidente, possuindo inquestionável interesse jurídico na
definição da tese jurídica, o que lhes assegura o direito constitucional de efetiva participação
para conferir legitimidade ao julgamento proferido pelo tribunal e impedir que sejam
surpreendidas.
274
MARINONI, Luiz Guilherme. O “problema” do incidente de resolução de demandas repetitivas. Revista do
Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Brasília.Vol. 28, n. 5/6, maio/junho 2016, p. 39.
275
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.).Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1..
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 189-190.
126
processo modelo, a intervenção da parte deverá ser indeferida pelo relator do IRDR, não
havendo, na visão do referido jurista, violação ao contraditório uma vez que os mesmos
argumentos já teriam sido levados ao conhecimento do órgão julgador pelas partes do
processo a partir do qual o incidente foi instaurado.
Posição semelhante foi sustentada por Ticiano Alves e Silva276 que, ao proceder
ao estudo do regime de repercussão geral dos recursos extraordinários, na vigência do Código
revogado, defendeu que a intervenção da parte que teve o recurso sobrestado não reflete o
direito fundamental ao contraditório se desprovida de argumentos jurídicos novos,
constituindo uma manifestação vazia de conteúdo que não tem a possibilidade de influenciar
de maneira diferente o convencimento dos julgadores, causando apenas tumulto processual.
Sofia Temer também admite a intervenção das partes dos processos sobrestados,
sustentando, de igual modo, que o melhor filtro para nortear a atuação dos referidos sujeitos
interessados seja a apresentação de novos argumentos que possam efetivamente contribuir
com a melhor interpretação da questão de direito objeto do IRDR.277 Se a parte do processo
sobrestado não trouxer novos elementos para serem considerados no debate, não haveria
necessidade da sua participação e isso não violaria o contraditório. Logo em seguida, conclui
a ilustre processualista:
276
SILVA, Ticiano Alves e. Intervenção de sobrestado no julgamento por amostragem. Revista de Processo. v.
182. São Paulo: RT, abr. 2010, p. 240. No mesmo sentido é o entendimento de Teresa Arruda Wambier e José
Miguel Medina. In: Sobre o novo art. 543-C do CPC: sobrestamento de recursos especiais “com fundamento em
idêntica questão de direito”. Revista de Processo, vol. 159, maio/2008, p. 215-220.
277
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 177.
278
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 178.
127
279
Consoante já decidiu o Supremo Tribunal Federal, “a admissão do terceiro, na condição de amicus curiae, no
processo objetivo de controle normativo abstrato, qualifica-se como fator de legitimação social das decisões do
Tribunal Constitucional, viabilizando, em obséquio ao postulado democrático, a abertura do processo de
fiscalização concentrada de constitucionalidade, em ordem a permitir que nele se realize a possibilidade de
participação de entidades e de instituições que efetivamente representem os interesses gerais da coletividade ou
que expressem os valores essenciais e relevantes de grupos, classes ou estratos sociais”. (...) o Supremo Tribunal
Federal, em assim agindo, não só garantirá maior efetividade e atribuirá maior legitimidade às suas decisões,
mas, sobretudo, valorizará, sob uma perspectiva eminentemente pluralística, o sentido essencialmente
democrático dessa participação processual, enriquecida pelos elementos de informação e pelo acervo de
experiências que o amicus curiae poderá transmitir à Corte Constitucional, notadamente em um processo - como
o de controle abstrato de constitucionalidade – cujas implicações políticas, sociais, econômicas, jurídicas e
culturais são de irrecusável importância e de inquestionável significação. (in ADIN-MC 2.130-SC, Relator
Ministro Celso de Mello, j. em 20.12.2000, DJ de 02.02.2001, p. 00145) Disponível em www.stf.jus.br. Acesso
em fevereiro de 2016.
280
O Supremo Tribunal Federal, num primeiro momento, resolvendo questão de ordem na Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 2.223, Relator Min. Marco Aurélio, não admitiu, por maioria, a sustentação oral do
amicus curiae. Contudo, revendo sua posição, o Supremo Tribunal Federal, também resolvendo questão de
ordem nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade n. 2675/PE e 2777/SP, em decisão de 26 e 27 de novembro de
2003, admitiu a possibilidade de realização de sustentação oral por terceiros admitidos no processo abstrato de
constitucionalidade, na qualidade de amicus curiae. Os Ministros Celso de Mello e Carlos Britto, em seus votos,
ressaltaram que o § 2º do art. 7º da Lei 9.868/99, ao admitir a manifestação de terceiros no processo objetivo de
constitucionalidade, não limita a atuação destes à mera apresentação de memoriais, mas abrange o exercício da
sustentação oral, cuja relevância consiste na abertura do processo de fiscalização concentrada de
constitucionalidade; na garantia de maior efetividade e legitimidade às decisões da Corte, além de valorizar o
sentido democrático dessa participação processual. O Min. Sepúlveda Pertence, de outra parte, considerando que
a Lei 9.868/99 não regulou a questão relativa a sustentação oral pelos amicus curiae, entendeu que compete ao
Tribunal decidir a respeito, através de norma regimental, razão por que, excepcionalmente e apenas no caso
concreto, admitiu a sustentação oral. Vencidos os Ministros Carlos Velloso e Ellen Gracie, que, salientando que
a admissão da sustentação oral nessas hipóteses poderia implicar a inviabilidade de funcionamento da Corte,
pelo eventual excesso de intervenções, entendiam possível apenas a manifestação escrita. (in Informativo n. 331)
Disponível em www.stf.jus.br. Acesso em: fev. 2016.
281
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 744.
128
De igual modo, para Del Prá283, o amicus curiae é um terceiro que intervém
legitimamente no processo para fornecer ao órgão julgador informações fáticas, técnicas ou
jurídicas relevantes para a definição da tese jurídica, estando desvinculado das partes, embora
possa com a sua atuação influenciar o convencimento do Juízo de uma das teses contrapostas,
favorecendo, indireta ou reflexamente, uma das partes.
O novo CPC, por sua vez, deu tratamento específico no art. 138285 à figura do
282
AGUIAR, Mirella de Carvalho. Amicus Curiae. Coleção Temas de Processo Civil. v.5. Salvador:
JusPODIVM, 2005, p. 05.
283
DEL PRÁ, Carlos Gustavo Rodrigues. Amicus curiae: instrumento de participação democrática e de
aperfeiçoamento da prestação jurisdicional. Curitiba: Juruá, 2007, p. 111-113.
284
Nesse sentido, impende citar trechos do voto do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal,
proferido no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2548: “(...) Não há dúvida, outrossim, de
que a participação de diferentes grupos em processos judiciais de grande significado para toda a sociedade
cumpre uma função de integração extrema mente relevante no Estado de Direito. (...) Ao ter acesso a essa
pluralidade de visões em permanente diálogo, este Supremo Tribunal Federal passa a contar com os benefícios
decorrentes dos subsídios técnicos, implicações político-jurídicas e elementos de repercussão econômica que
possam vir a ser apresentados pelos “amigos da Corte”. Essa inovação institucional, além de contribuir para a
qualidade da prestação jurisdicional, garante novas possibilidades de legitimação dos julgamentos do Tribunal
no âmbito de sua tarefa precípua de guarda da Constituição. É certo, também, que, ao cumprir as funções de
Corte Constitucional, o Tribunal não pode deixar de exercer a sua competência, especialmente no que se refere à
defesa dos direitos fundamentais em face de uma decisão legislativa, sob a alegação de que não dispõe dos
mecanismos probatórios adequados para examinar a matéria. Entendo, portanto, que a admissão de amicus curiae
confere ao processo um colorido diferenciado, emprestando-lhe caráter pluralista e aberto, fundamental para o
reconhecimento de direitos e a realização de garantias constitucionais em um Estado Democrático de Direito.”
Disponível em www.stf.jus.br. Acesso em: fev. 2016.
285
CPC Art. 138. O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da
demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento
das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica,
órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua
intimação.
§ 1o A intervenção de que trata o caput não implica alteração de competência nem autoriza a interposição de
recursos, ressalvadas a oposição de embargos de declaração e a hipótese do § 3o.
129
amicus curiae, destacando o seu papel no processo civil brasileiro, com poderes inclusive de
apresentar recursos contra o julgamento do IRDR. Não obstante, o legislador conferiu ao
relator o poder de definir os poderes processuais, o que possibilita eventual limitação da
atuação do terceiro, limitação esta, em qualquer medida, ofensiva à garantia constitucional do
contraditório substancial elemento estruturante do modelo constitucional de processo.
§ 2o Caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus
curiae.
§ 3o O amicus curiae pode recorrer da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas.
286
Por diversas vezes, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu restrições à atuação e intervenção do amicus
curiae nos processos de julgamento dos recursos repetitivos, o que, em última análise, restringe o debate
processual, tornando ilegítima a tese jurídica firmada. A título de exemplo, destacam-se os seguintes julgados:
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MOMENTO PARA HABILITAÇÃO COMO AMICUS CURIAE EM
JULGAMENTO DE RECURSO SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC. O pedido de intervenção,
na qualidade de amicus curiae, em recurso submetido ao rito do art. 543-C do CPC, deve ser realizado antes do
início do julgamento pelo órgão colegiado. Isso porque, uma vez iniciado o julgamento, não há mais espaço para
o ingresso de amicus curiae. De fato, já não há utilidade prática de sua intervenção, pois nesse momento
processual não cabe mais sustentação oral, nem apresentação de manifestação escrita, como franqueia a
Resolução 8/2008 do STJ, e, segundo assevera remansosa jurisprudência, o amicus curiae não tem legitimidade
recursal, inviabilizando-se a pretensão de intervenção posterior ao julgamento (EDcl no REsp 1.261.020-CE,
Primeira Seção, DJe 2/4/2013). O STJ tem entendido que, segundo o § 4º do art. 543 -C do CPC, bem como o
art. 3º da Resolução 8/2008 do STJ, admite-se a intervenção de amicus curiae nos recursos submetidos ao rito
dos recursos repetitivos somente antes do julgamento pelo órgão colegiado e a critério do relator (EDcl no REsp
1.120.295-SP, Primeira Seção, DJe 24/4/2013). Ademais, o STF já decidiu que o amicus curiae pode pedir sua
participação no processo até a liberação do processo para pauta (ADI 4.071 AgR, Tribunal Pleno, DJe
16/10/2009)” (Questão de Ordem no Recurso Especial nº 1.152.218/RS, relator ministro Luis Felipe Salomão,
Corte Especial, Informativo 540/STJ) “Em questão de ordem, a Corte Especial, por maioria, firmou a orientação
de não reconhecer o direito do amicus curiae de exigir a sua sustentação oral no julgamento de recursos
repetitivos, a qual deverá prevalecer em todas as Seções. Segundo o voto vencedor, o tratamento que se deve dar
ao amicus curiae em relação à sustentação oral é o mesmo dos demais atos do processo: o STJ tem a faculdade
de convocá-lo ou não. Se este Superior Tribunal entender que deve ouvir a sustentação oral, poderá convocar um
ou alguns dos amici curiae, pois não há por parte deles o direito de exigir sustentação oral ” (Questão de Ordem
no Recurso Especial n. 1.205.946/SP, relator ministro Benedito Gonçalves, Corte Especial, Informativo 481)
Disponível em www.stj.jus.br. Acesso em: fev. 2016.
287
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça também restringe de maneira inconstitucional as
possibilidades de atuação da Defensoria Pública como amicus curiae. Sobre o tema, oportuno destacar os
seguintes julgados: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INTERVENÇÃO COMO AMICUS CURIAE EM
PROCESSO REPETITIVO. Não se admite a intervenção da Defensoria Pública como amicus curiae, ainda que
atue em muitas ações de mesmo tema, no processo para o julgamento de recurso repetitivo em que se discutem
encargos de crédito rural, destinado ao fomento de atividade comercial. Por um lado, a representatividade das
pessoas, órgãos ou entidades referidos no § 4º do art. 543-C do CPC e no inciso I do art. 3º da Resolução 8/2008
do STJ deve relacionar-se, diretamente, à identidade funcional, natureza ou finalidade estatutária da pessoa física
130
Sua intervenção deve acrescentar algo de novo para o processo. Ele deve
acrescentar algum elemento, alguma informação, algum dado, alguma coisa,
enfim, para que o juiz tenha melhores condições de julgar a causa. Todos
esses dados, evidentemente, devem sempre ser rentes ao interesse
institucional que qualifica a intervenção do amicus curiae e devem ser
analisados daquela perspectiva. É isso, repetimos, que justifica sua
intervenção.289
ou jurídica que a qualifique para atender ao interesse público de contribuir para o aprimoramento do julgamento
da causa; não é suficiente o interesse em defender a solução da lide em favor de uma das partes (interesse
meramente econômico). Por outro lado, a intervenção formal no processo repetitivo deve dar-se por meio da
entidade de âmbito nacional cujas atribuições sejam pertinentes ao tema em debate, sob pena de prejuízo ao
regular e célere andamento deste importante instrumento processual. A representação de consumidores em
muitas ações é insuficiente para a representatividade que justifique intervenção formal em processo submetido
ao rito repetitivo. No caso em que se discutem encargos de crédito rural, destinado ao fomento de atividade
comercial, a matéria, em regra, não se subsume às hipóteses de atuação típica da Defensoria Pública. Apenas a
situação de eventual devedor necessitado justificaria, em casos concretos, a defesa dessa tese jurídica pela
Defensoria Pública, tese esta igualmente sustentada por empresas de grande porte econômico. Por fim, a
inteireza do ordenamento jurídico já é defendida pelo Ministério Público Federal. (Recurso Especial n.
1.333.977/MT, relatora ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, Informativo 537/STJ) DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. INTERVENÇÃO DA DPU COMO AMICUS CURIAE EM PROCESSO
REPETITIVO. A eventual atuação da Defensoria Pública da União (DPU) em muitas ações em que se discuta o
mesmo tema versado no recurso representativo de controvérsia não é suficiente para justificar a sua admissão
como amicus curiae. Precedente citado: REsp 1.333.977- MT, Segunda Seção, DJe 12/3/2014. (Recurso Especial
n. 1.371.128/RS, relator ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, Informativo 547/STJ) Disponível
em www.stj.jus.br. Acesso em: fev. 2016.
288
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 455.
289
BUENO, Cássio Scarpinella. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático. São Paulo:
Saraiva, 2012, p. 503.
131
O fato de se tratar de questão de direito não significa, por si, que as discussões
sobre a repercussão fática não sejam relevantes para se alcançar a interpretação mais justa e
próxima à realidade subjacente aos conflitos intersubjetivos repetitivos. A título de exemplo,
para se definir a existência ou não do direito à desaposentação, poderia ser relevante a análise
demonstrativa do impacto financeiro e a repercussão sobre o equilíbrio atuarial do Regime
Geral da Previdência Social.
290
MORAES, Anderson Júnio Leal. Audiências públicas como instrumento de legitimação da jurisdição
constitucional. Dissertação apresentada ao programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade de Direito da
Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2011. Disponível em:
http://www.bibliotecadigital.ufmg.br. Acesso em: jan. 2016, p.79.
291
A título de exemplo, o procedimento das audiências públicas no Supremo Tribunal Federal foi regulado no
Regimento Interno daquela corte pela emenda 29, de 18 de fevereiro de 2009. O zelo pela participação igualitária
está previsto expressamente nos incisos II e III do parágrafo único do art. 154, que dispõem, respectivamente,
que “havendo defensores e opositores relativamente à matéria objeto da audiência, será garantida a participação
das diversas correntes de opinião” e que “caberá ao Ministro que presidir a audiência pública selecionar as
pessoas que serão ouvidas, divulgar a lista dos habilitados, determinando a ordem dos trabalhos e fixando o
tempo que cada um disporá para se manifestar”. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em jan.2016.
292
MORAES, Anderson Júnio Leal. Audiências públicas como instrumento de legitimação da jurisdição
constitucional. Dissertação apresentada ao programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade de Direito da
Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2011. Disponível em
http://www.bibliotecadigital.ufmg.br. Acesso em: jan. 2016, p. 87-88.
133
processual de se manifestar.
Conforme preconiza a lei no § 2º do art. 984, deverão ser abrangidos pelo acórdão
“todos os fundamentos suscitados concernentes à tese jurídica discutida”, sejam eles
favoráveis ou desfavoráveis ao entendimento adotado pelo tribunal, sob pena de nulidade do
julgado por ausência de fundamentação.
Nesse contexto, determina o inciso IV do § 1º do art. 489 do novo CPC que não
deve ser considerada fundamentada a decisão judicial que não enfrente todos os argumentos
deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador. Os
293
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1.
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 193.
135
Arenhart, Marinoni e Mitidiero294 entendem que o juiz não tem o dever de rebater
todos os argumentos superficiais ou periféricos levantados pelas partes, mas sim aqueles
relevantes, ou seja, todos os que forem capazes de infirmar a conclusão adotada pelo julgador,
aqueles idôneos para a alteração do julgado.
294
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo
Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 493.
136
cada processo suspenso. A resolução individual da lide deduzida em cada demanda suspensa
continuará ocorrendo em sentenças próprias, que poderão, inclusive, ser de sentido final
diverso, por imposição de quadro fático distinto analisado pelo juiz natural da causa.295
295
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 736.
296
THEODORO JR., Humberto; NUNES, Dierle José Coelho; BAHIA, Alexandre Melo Franco Bahia;
PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC. Fundamentos e sistematização. Lei 13.105, de 16.03.2015. Rio de
Janeiro: Forense, 2015, p. 392.
297
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1..
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 195.
137
Todavia, o parágrafo único do art. 980 do novo CPC permite que o relator
prorrogue a suspensão, se entender necessário, por decisão fundamentada. Nesse caso, não
haverá limite de tempo para a suspensão, o que constitui um verdadeiro “cheque em branco”
dado ao tribunal que, diante da enorme morosidade do Sistema de Justiça, já abordada
criticamente no primeiro capítulo, poderá gerar enorme represamento dos processos,
engessando o debate processual e, por conseguinte, obstando a formação de jurisprudência
sobre a questão de direito controvertida já que todos os órgãos vinculados ao tribunal e os
juízes de primeira instância não poderão se manifestar sobre a questão.
Em relação às causas futuras, se a petição inicial tiver pedido que contrarie a tese
jurídica firmada no julgamento do IRDR, caberá o julgamento liminar (ou imediato) de
improcedência do pedido, antes mesmo da citação do réu e desde que não seja necessária
dilação probatória sobre os fatos alegados pelo autor, nos termos do art. 332, inciso III da
novel legislação.
Daí a maior importância que se deve conferir à efetiva participação das partes na
construção da decisão judicial, sob pena de se caracterizar a incompatibilidade do novel
instituto com o modelo constitucional de processo.
Tal como a súmula vinculante, a tese jurídica firmada terá forte impacto na
atividade jurisdicional, especialmente na exercida pela primeira instância, pois terá eficácia
erga omnes dentro da área de competência do tribunal que julgou o incidente, não se
restringindo apenas aos processos em tramitação, mas projetando-se também, pela vontade da
lei, sobre as causas futuras, como em um regime de precedentes vinculantes.
298
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 746.
299
CABRAL, Antônio do Passo. O novo procedimento-modelo (Muterverfahren) alemão: uma alternativa às
ações coletivas. Revista de Processo, mai. 2007, p. 139.
140
A referida posição, no entanto, não é compartilhada por Artur César de Souza, que
considerada manifestamente inconstitucional a previsão de eficácia vinculante ao julgamento
do IRDR. Defende o jurista que “em nosso ordenamento jurídico somente haverá eficácia
vinculante quando a decisão for objeto de súmula vinculante ou de ações abstratas de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade”302.
300
THEODORO JR., Humberto; OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 746.
301
THEODORO JR., Humberto; OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 749.
302
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 160.
141
A segunda parte do inciso I do art. 485, já citado, também impôs a extensão dos
efeitos vinculantes do julgamento do IRDR aos processos que versarem sobre a mesma
questão de direito em tramitação nos juizados especiais no respectivo Estado ou região.
Importante ressaltar que a extensão dos efeitos do IRDR aos juizados não estava
prevista no anteprojeto do novo Código e tampouco no projeto que tramitou inicialmente no
Senado da República.
Quanto ao art. 995 do SCD, que estende o alcance da tese jurídica fixada
pelo pertinente Tribunal a toda área de sua jurisdição, com inclusão dos
juizados especiais do respectivo estado ou região, é preciso reconhecer a sua
adequação. De fato, contra a extensão dos efeitos do julgamento do incidente
de demandas repetitivas aos Juizados Especiais, ergue-se a tese da
inconstitucionalidade, que, em um primeiro momento, falsamente convence.
Alega-se, em suma, que, como a Carta Magna não deferiu competência
recursal aos Tribunais para decisões prolatadas no âmbito dos Juizados
Especiais, seria inconstitucional estender os efeitos de julgamentos feitos por
aqueles aos Juizados. No entanto, essa não é a melhor leitura da Carta
Magna.
Em primeiro lugar, recorda-se que, no arranjo de competência desenhado
pela Constituição Federal, com posterior esclarecimentos trazidos pelo
Supremo Tribunal Federal (STF) e pela legislação ordinária, o Superior
Tribunal de Justiça (STF) assumiu o papel de, em última instância, pacificar
a interpretação da legislação infraconstitucional, ao passo que o STF, o de
uniformizar a interpretação da Carta Magna. Causas provenientes dos
juizados especiais desaguarão no STJ ou no STF para uniformização de teses
jurídicas, seja por conta da reclamação (admitida pelo STF para os Juizados
Especiais Estaduais), seja na forma da Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001
(para os Juizados Especiais Federais). Esse fato demonstra que a intenção do
legislador é a de garantir, ao máximo, que todos os brasileiros tenham acesso
a uma resposta jurisdicional uniforme. O incidente de resolução de resolução
de demandas repetitivas segue essa orientação constitucional.
Em segundo lugar, os Juizados Especiais e os Tribunais locais e regionais
costumeiramente apreciam matérias jurídicas idênticas. Por exemplo,
demandas de revisão de contratos bancários, com alegação de abusividade de
taxa de juros, frequentam os Juizados Especiais e os Tribunais. A diferença é
que, no âmbito dos Juizados, há valor de alçada. Nesses casos, diante de
demandas multidinárias, a Constituição Federal, prestigiando o princípio da
duração razoável do processo, sediada no art. 5º, e reconhecendo a
competência dos Tribunais para pacificar o Direito no Estado ou na Região,
empresta seu irrestrito beneplácito a que os Tribunais possam, em sede de
incidente de resolução de demandas repetitivas, garantir a solução de
milhares de milhares de processos com teses idênticas de modo uniforme,
com possibilidade de eventual provocação futura do STJ, corte incumbida da
unificação nacional da interpretação da legislação infraconstitucional.
142
303
Texto disponível no endereço: www.senado.leg.br. Parecer Final n. 956, de 2014, relatado pelo Senador Vital
do Rêgo sobre o substitutivo aprovado na Câmara dos Deputados, p. 177-178. Acesso em: fev. 2016.
143
304
MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; NETO, Odilon Romano. O incidente de resolução de demandas
repetitivas (IRDR) e os Juizados Federais. In: GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.). Coleção
Repercussões do Novo CPC, Magistratura. v. 1. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 58-59.
305
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 629.
306
A defesa da extensão dos efeitos do IRDR aos juizados também encontra respaldo nas lições de: ATAÍDE
JR., Jaldemiro Rodrigues de. As demandas de massa e o projeto do novo Código de Processo Civil. In: FREIRE,
Alexandre (org.). Novas tendências do Processo Civil: estudos sobre o projeto do novo Código de Processo
Civil. v. 3. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 50-54. Destaca-se, ainda, o Enunciado n. 93 do Fórum Permanente de
Processualistas Civis – FPPC, segundo o qual admitido o incidente de resolução de demandas repetitivas,
também devem ficar suspensos os processos que versem sobre a mesma questão objeto do incidente e que
tramitem perante os juizados especiais no mesmo estado ou região. (In: NUNES, Dierle; SILVA, Natanael Lud
Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015. Referenciado com os dispositivos correspondentes no
CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e
com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 392)
144
jurídica e isonomia aos litigantes dentro de determinado território, o vício que se apresenta é
de natureza formal e insuperável.
307
O Supremo Tribunal Federal decidiu que a competência para o processamento e julgamento do mandado de
segurança para o controle de decisão de juiz em exercício nos juizados especiais, contra a qual a legislação
especial não prevê a admissibilidade de qualquer recurso, é originária das respectivas turmas recursais, e não do
tribunal de justiça ou tribunal regional federal, caso a autoridade coatora seja juiz de juizado especial federal.
(Reclamação n. 1086-RS, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 19/11/2004, p. 30). No
entendimento do Ministro Ricardo Lewandowski, as turmas recursais qualificam-se como órgãos recursais
ordinários de última instância em relação aos julgamentos dos juizados especiais, de modo que os juizados e as
respectivas turmas recursais não estão sujeitos à jurisdição dos tribunais de justiça e dos tribunais regionais
federais no âmbito da justiça estadual e federal, respectivamente. (STF, Tribunal Pleno, RE n. 586.789/PR,
Relator Ministro Ricardo Lewandowski, com repercussão geral, acórdão eletrônico publicado em 24/02/2012)
308
A propósito do tema, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 376, segundo a qual “compete à
turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial”.
145
tribunal não teria meios para impor-lhe obediência aos seus julgados.309
309
MATTOS, Luiz Norton Batista. O incidente de resolução de demandas repetitivas no novo CPC. In:
GAJORDONI, Fernando da Fonseca. (coord.).Coleção Repercussões do Novo CPC, Magistratura, v. 1..
Salvador: Juspodivm, 2015, p. 207.
310
A propósito, cita-se a ementa do julgamento da reclamação n. 2.132-MG, relatado pelo Ministro Celso de
Mello, 2ª Turma, DJU 14/02/2003: JUIZADO ESPECIAL (LEI Nº 9.099/95) - DECISÃO EMANADA DE
TURMA RECURSAL - CABIMENTO, EM TESE, DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO - JUÍZO
NEGATIVO DE ADMISSIBILIDADE - INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - RECUSA
DE SEU PROCESSAMENTO - HIPÓTESE CONFIGURADORA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. - As decisões de
Turmas Recursais, proferidas em causas instauradas no âmbito dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95), são
passíveis de impugnação mediante recurso extraordinário dirigido ao Supremo Tribunal Federal, desde que se
evidencie, no julgamento do litígio, a existência de controvérsia de natureza constitucional. Precedentes. - Cabe
reclamação, para o Supremo Tribunal Federal, nos casos em que o Presidente da Turma Recursal, usurpando
competência outorgada à Suprema Corte, nega trânsito a agravo de instrumento interposto contra decisão que
não admitiu recurso extraordinário. Precedentes.
311
Trata-se do julgamento dos embargos de declaração interpostos no recurso extraordinário n. 571.572, da
relatoria da então Ministra Ellen Gracie, cujo acórdão foi publicado no DJe em 27/11/2009. Em razão do novo
paradigma criado pelo entendimento do STF, importante destacar a ementa do referido julgado: EMBARGOS
DE DECLARAÇÃO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO
EMBARGADO. JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. APLICAÇÃO ÀS
CONTROVÉRSIAS SUBMETIDAS AOS JUIZADOS ESPECIAIS ESTADUAIS. RECLAMAÇÃO PARA O
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CABIMENTO EXCEPCIONAL ENQUANTO NÃO CRIADO, POR
LEI FEDERAL, O ÓRGÃO UNIFORMIZADOR.
1. No julgamento do recurso extraordinário interposto pela embargante, o Plenário desta Suprema Corte apreciou
satisfatoriamente os pontos por ela questionados, tendo concluído: que constitui questão infraconstitucional a
discriminação dos pulsos telefônicos excedentes nas contas telefônicas; que compete à Justiça Estadual a sua
apreciação; e que é possível o julgamento da referida matéria no âmbito dos juizados em virtude da ausência de
complexidade probatória. Não há, assim, qualquer omissão a ser sanada.
146
Embora não seja cabível a interposição do recurso especial, a Lei 10.259, de 2001,
que regulou os juizados especiais federais, já dispunha, nos §§§ 4º, 5º e 6º do art. 14, sobre a
possibilidade do Superior Tribunal de Justiça ser chamado a intervir quando a decisão da
turma nacional de uniformização divergir daquela corte quanto à interpretação da legislação
infraconstitucional.
2. Quanto ao pedido de aplicação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, observe-se que aquela
egrégia Corte foi incumbida pela Carta Magna da missão de uniformizar a interpretação da legislação
infraconstitucional, embora seja inadmissível a interposição de recurso especial contra as decisões proferidas
pelas turmas recursais dos juizados especiais.
3. No âmbito federal, a Lei 10.259/2001 criou a Turma de Uniformização da Jurisprudência, que pode ser
acionada quando a decisão da turma recursal contrariar a jurisprudência do STJ. É possível, ainda, a provocação
dessa Corte Superior após o julgamento da matéria pela citada Turma de Uniformização. 4. Inexistência de órgão
uniformizador no âmbito dos juizados estaduais, circunstância que inviabiliza a aplicação da jurisprudência do
STJ. Risco de manutenção de decisões divergentes quanto à interpretação da legislação federal, gerando
insegurança jurídica e uma prestação jurisdicional incompleta, em decorrência da inexistência de outro meio
eficaz para resolvê-la.
5. Embargos declaratórios acolhidos apenas para declarar o cabimento, em caráter excepcional, da reclamação
prevista no art. 105, I, f, da Constituição Federal, para fazer prevalecer, até a criação da turma de uniformização
dos juizados especiais estaduais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na interpretação da legislação
infraconstitucional.
147
constitucional, e não por lei ordinária como ocorreu no caso dos juizados. Para Cunha, “em
razão do princípio da tipicidade, as competências dos órgãos jurisdicionais são apenas as
expressamente previstas na Constituição”312.
A despeito disso, a citada interpretação dada pelo STF acabou por conferir, ao
menos implicitamente, legitimidade constitucional à previsão dos §§§ 4º, 5º e 6º do art. 14 da
Lei 10.251 e do § 3º do art. 18 e do art. 19, caput, da Lei 12.153, de 2009, para assegurar a
uniformização da interpretação jurídica nos juizados especiais.
Por isso a tese jurídica adotada pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior
Tribunal de Justiça será aplicada no território nacional a todos os processos individuais ou
coletivos que versarem sobre a mesma questão de direito, o que inclui, por coerência
sistêmica e por competência funcional dos referidos tribunais superiores, aquelas causas em
tramitação nos juizados.
312
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Jurisdição e competência. São Paulo: RT, 2008, p. 47.
148
litigantes. Isso porque lidam com o interesse público e os anseios sociais, de maneira que suas
condutas administrativas afetam diretamente um grande universo de pessoas.
O art. 927 da novel legislação processual dispõe apenas que os juízes e tribunais
deverão observar nos seus julgados as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle
concentrado de constitucionalidade, os enunciados de súmulas vinculantes, das súmulas do
Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em
matéria infraconstitucional, os acórdãos preferidos em incidentes de assunção de competência
ou de resolução de demandas repetitivas e de julgamento de recursos extraordinário e especial
repetitivos e, por fim, a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem
vinculados.
obrigatoriamente pelos juízes de primeiro grau, mas, por outro lado, paradoxalmente, não
precisará ser adotada, em caráter geral, pela Administração Pública, não havendo a previsão
normativa de qualquer sanção para eventual inércia dos entes públicos em adequar suas
condutas e práticas administrativas à interpretação jurídica sedimentada no julgamento do
incidente. Ou seja, o Poder Público poderá continuar incentivando a litigiosidade a despeito
da posição pacificada no âmbito do Poder Judiciário.
Esse dispositivo deve ser lido, pensamos, como um mecanismo que confere
uma eficácia persuasiva em relação à administração pública. A comunicação
pode levar à alteração da conduta dos prestadores dos prestadores de serviço
público, por exemplo, ainda que isso decorra de uma questão financeira
(pelo cálculo do custo da litigância nesta hipótese) e não da direta obediência
à tese. O significado do art. 985, §2º, é diverso, portanto, do significado do
art. 927. Enquanto este prevê a eficácia vinculativa, aquele dispõe de uma
eficácia que não é compreendida como diretamente obrigatória, e, por isso,
não prevê uma subordinação. Uma das consequências dessa diferenciação é
que não caberá reclamação contra ato da administração pública que não
150
Qual a razão de não se ter conferido pela lei a mesma eficácia vinculante dos
precedentes judiciais para os entes públicos em geral e demais litigantes habituais nos demais
casos de julgamentos de casos repetitivos ou de enunciados de súmula do Supremo Tribunal
Federal e do Superior Tribunal de Justiça? Interessa realmente ao Poder Público modificar
suas práticas administrativas em razão dos precedentes judiciais? As respostas para tais
indagações dependerão da atitude do Poder Público diante dos precedentes judiciais após a
vigência do CPC/2015.
313
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 221.
314
A propósito, a Lei 9469/97, que regulamenta o disposto no inciso VI do art. 4º da Lei Complementar nº 73, de
10 de fevereiro de 1993, prevê que “o Advogado-Geral da União poderá dispensar a inscrição de crédito,
autorizar o não ajuizamento de ações e a não-interposição de recursos, assim como o requerimento de extinção
das ações em curso ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, para cobrança de créditos da União e das
autarquias e fundações públicas federais, observados os critérios de custos de administração e cobrança” (art. 1º-
A) A lei estende semelhante faculdade aos dirigentes máximos das empresas públicas federais, que “poderão
autorizar a não-propositura de ações e a não-interposicão de recursos, assim como o requerimento de extinção
das ações em curso ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, para cobrança de créditos, atualizados,
de valor igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), em que interessadas essas entidades na qualidade de
autoras, rés, assistentes ou opoentes, nas condições aqui estabelecidas” (art. 1º-B). O art. 2º, com redação dada
pela Lei 13.140, de 2015, também autoriza que “o Procurador-Geral da União, o Procurador-Geral Federal, o
Procurador-Geral do Banco Central do Brasil e os dirigentes das empresas públicas federais mencionadas no
caput do art. 1o poderão autorizar, diretamente ou mediante delegação, a realização de acordos para prevenir ou
terminar, judicial ou extrajudicialmente, litígio que envolver valores inferiores aos fixados em regulamento”.
315
A Lei 9469/97 também dispõe que “não havendo Súmula da Advocacia-Geral da União (arts. 4º, inciso XII,
e 43, da Lei Complementar nº 73, de 1993), o Advogado-Geral da União poderá dispensar a propositura de ações
ou a interposição de recursos judiciais quando a controvérsia jurídica estiver sendo iterativamente decidida pelo
Supremo Tribunal Federal ou pelos Tribunais Superiores” (art. 4º). O Ato Regimental n. 1, de 02 de julho de
2008, da Advocacia Geral da União define, por sua vez, jurisprudência iterativa dos Tribunais como sendo:
entende-se por jurisprudência iterativa dos Tribunais, para os efeitos deste Ato Regimental, as decisões judiciais
do Tribunal Pleno ou de ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal, dos Órgãos Especiais ou das Seções
Especializadas dos Tribunais Superiores, ou de ambas as Turmas que as compõem, em suas respectivas áreas de
competência, que consagram entendimento repetitivo, unânime ou majoritário, dos seus membros, acerca da
interpretação da Constituição ou de lei federal em matérias de interesse da União, suas autarquias e fundações.
Disponível em: www.agu.gov.br. Acesso em: fev. 2016.
316
Nesse sentido, o Decreto Federal n. 2.346, de 10 de outubro de 1997, alterado pelo Decreto 8.157, de 2013,
151
Por sua vez, nas causas fiscais em que a representação da União competir à
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, havendo manifestação jurisprudencial reiterada e
uniforme e decisões definitivas do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de
Justiça, em suas respectivas áreas de competência, o Decreto 2346, de outubro de 1997,
conferiu ao Procurador-Geral da Fazenda Nacional a autorização para declarar, mediante
parecer fundamentado, aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda, as matérias em relação
às quais é de ser dispensada a apresentação de recursos.
que consolida normas de procedimentos a serem observadas pela Administração Pública Federal em razão de
decisões judiciais, e dá outras providências, dispõe que:
Art. 1º-B. Compete exclusivamente ao Advogado-Geral da União e ao Ministro de Estado do Planejamento,
Orçamento e Gestão se manifestarem, prévia e expressamente, sobre a extensão administrativa dos efeitos de
decisões judiciais proferidas em casos concretos, inclusive ações coletivas, contra a União, suas autarquias e
fundações públicas em matéria de pessoal civil da administração direta, autárquica e fundacional.
§ 1º Os pedidos de extensão administrativa, instruídos com manifestação jurídica, documentos pertinentes e,
quando possível, jurisprudência dos Tribunais Superiores, serão submetidos à análise do Advogado-Geral da
União e do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão.
§ 2º A extensão administrativa dos efeitos de decisões judiciais será realizada por meio de Portaria
Interministerial do Advogado-Geral da União e do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão.
§ 3º As autarquias e fundações públicas encaminharão o pedido de extensão administrativa por meio do titular do
órgão ao qual estejam vinculadas.
§ 4º Os procedimentos para o trâmite dos pedidos de extensão serão disciplinados em ato conjunto do
Advogado-Geral da União e do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão.
Art. 2º Firmada jurisprudência pelos Tribunais Superiores, a Advocacia-Geral da União expedirá súmula a
respeito da matéria, cujo enunciado deve ser publicado no Diário Oficial da União, em conformidade com o
disposto no art. 43 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.
Art. 3º À vista das súmulas de que trata o artigo anterior, o Advogado-Geral da União poderá dispensar a
propositura de ações ou a interposição de recursos judiciais.
317
Em razão da importância do entendimento externado pela Procuradoria da Fazenda Nacional, destaca-se a
152
decisões judiciais que se mostrarem consentâneas com os precedentes judiciais formados sob
a sistemática dos julgamentos dos recursos extraordinário e especial repetitivos e também a
não interporem defesa e impugnação quando o pedido formulado pela parte estiver em
consonância com os referidos julgados.
Interessante ressaltar que o ato normativo não fez referência aos julgamentos do
IRDR pelos tribunais locais e regionais, deixando claro o entendimento de que, pelo menos
nas questões de natureza tributária, tais acórdãos não vincularão a União, num primeiro
momento, já que a Fazenda Nacional utilizará dos instrumentos recursais disponíveis para
submeter a tese jurídica ao reexame do STJ ou do STF.
318
A título de exemplo, cita-se a Solução de Consulta COSIT (Coordenação-Geral de Tributação da Receita
Federal) n. 152, de 17 de junho de 2015, publicada no DOU de 23/06/2015, seção 1, p. 41, com a seguinte
ementa: EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CONTRIBUIÇÃO DE 15% SOBRE NOTA
FISCAL OU FATURA DE COOPERATIVA DE TRABALHO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº
595.838/SP. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 595.838/SP, no âmbito da
sistemática do art. 543-B do Código de Processo Civil (CPC), declarou a inconstitucionalidade – e rejeitou a
modulação de efeitos desta decisão – do inciso IV, do art. 22, da Lei nº 8.212, de 1991, dispositivo este que
previa a contribuição previdenciária de 15% sobre as notas fiscais ou faturas de serviços prestados por
cooperados por intermédio de cooperativas de trabalho.
Em razão do disposto no art. 19 da Lei nº 10.522, de 2002, na Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 2014, e na
Nota PGFN/CASTF nº 174, de 2015, a Secretaria da Receita Federal do Brasil encontra-se vinculada ao referido
entendimento. O direito de pleitear restituição tem o seu prazo regulado pelo art. 168 do CTN, com observância
dos prazos e procedimentos constantes da Instrução Normativa RFB nº 1.300, de 20 de novembro de 2012, com
destaque, no caso, para os arts. 56 a 59, no que toca à compensação.
Disponível em: http://www.normaslegais.com.br/legislacao/solucao-de-consulta-cosit-152-2015.htm. Acesso
em: fev. 2016. Importante esclarecer que a Cosit, Coordenação-Geral de Tributação, é um órgão da Receita
Federal, cuja principal responsabilidade é responder consultas de cunho tributário por meio das chamadas
“Soluções de Consulta”. Suas soluções geram efeito vinculante no âmbito da Administração Tributária não
apenas a quem fez a pergunta, mas em relação a todos os contribuintes em situação semelhante.
154
319
Nesse sentido, destaca-se o Memorando- Circular Conjunto n. 2 do INSS, de 23 de julho de 2015, que
determina o cumprimento, no âmbito da Previdência Social, do entendimento adotado pelo Supremo Tribunal
Federal em julgamento com repercussão geral, in verbis: (...) Observada a decisão do Supremo Tribunal Federal
(STF) no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) nº 664.335, a qual apresentou novo entendimento para a
análise do tempo especial de segurados expostos ao agente nocivo ruído e a Nota nº
00006/2015/CGPL/PFE/AGU, solicitamos que sejam observadas as orientações a seguir: a) os casos de
exposição do segurado ao agente nocivo ruído, acima dos limites legais de tolerância, a declaração do
empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sobre a eficácia do Equipamento de
Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o enquadramento como atividade especial para fins de
aposentadoria; b) a decisão passa a ter obrigatoriedade para o INSS a contar de 12/02/2015, data da publicação
na Ata de Julgamento no Diário da Justiça; c) aplica-se o novo entendimento aos processos pendentes de decisão
em 12/02/2015 e requerimentos posteriores, inclusive para o período de atividade laboral anterior a essa data; d)
relativamente aos processos indeferidos e em fase de recurso às Juntas de Recursos ou às Câmaras de
Julgamento do Conselho de Recurso da Previdência Social, ainda pendentes de julgamento, aplicam-se as
orientações contidas acima, considerando que não ocorreu o ato conclusivo da administração e não foi exaurida a
esfera administrativa; e) devem ser preservados os atos administrativos já consolidados em última instância.
Entretanto, caso haja novo requerimento apresentado pelo segurado, após esse novo entendimento, será
analisado à luz da orientação atual contida na IN/INSS/PRES nº 77/15; e f) nos pedidos de revisões
administrativas o INSS poderá utilizar os novos critérios de análise, porém não terá efeitos retroativos, devendo
os efeitos financeiros ser fixados na data do pedido de revisão-DPR. Disponível em:
http://www.alexandretriches.com.br/memorando-circular-conjunto-no-2dirsatdirbeninss/ Acesso em: fev. 2016.
320
Embora não haja determinação ou orientação normativa para que os entes federais possam adequar suas
práticas administrativas ao entendimento do precedente judicial, a Portaria n. 487, de 27 de julho de 2016, da
Advocacia-Geral da União autoriza expressamente os Advogados da União a reconhecer a procedência do
pedido, a abster-se de contestar e de recorrer e a desistir de recursos já interpostos quando a pretensão deduzida
ou a decisão judicial estiver de acordo com a tese jurídica definida em acórdão transitado em julgado, proferido
pelo Supremo Tribunal Federal em sede de recurso extraordinário em incidente de resolução de demandas
repetitivas, processado nos termos do art. 987 do CPC (art. 2º, inciso V) ou em acórdão transitado em julgado,
proferido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso especial em incidente de resolução de demandas
repetitivas (art. 3º, inciso II). Disponível em: www.agu.gov.br. Acesso em: ago. 2016.
155
O art. 987 do novo CPC dispõe que do julgamento de mérito do IRDR caberá o
recurso extraordinário ou o especial, conforme o caso.
Não obstante, entende-se que a lei ordinária pode sim estabelecer restrições ao
cabimento de recursos.
A propósito, o professor Humberto Theodoro Jr. entende que o duplo grau “não
chega a ser uma garantia constitucional que, em caráter absoluto, tenha de funcionar a todo
instante e em qualquer procedimento” 323.
321
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 162.
322
Em brilhante obra sobre o tema, Marina Santos defende, à luz do processo justo idealizado pela Constituição
de 1988, que o duplo grau de jurisdição é sim garantia fundamental de efetividade do processo, abrindo à
doutrina brasileira uma oportunidade para a revisitação da temática e aprofundamento crítico do posicionamento
jurisprudencial. Para Marina Santos, “o Estado Democrático de Direito está assentado em um modelo
constitucional que exige a busca pela efetividade do processo, e esta não prescindirá do asseguramento tanto do
controle da atividade estatal quanto da construção democrática dos direitos. A garantia do duplo grau de
jurisdição constitui, nestes termos, pressuposto inafastável de liberdade e de democracia no processo civil
contemporâneo”. (in SANTOS, Marina França. A garantia constitucional do duplo grau de jurisdição. Belo
Horizonte: Del Rey, 2012, p. 166)
323
THEODORO JR., Humberto. O processo civil brasileiro: no limiar do novo século. Rio de Janeiro: Forense,
2002, p. 192.
324
ALVIM, Eduardo Arruda; MARTINS, Critiano Zanin. Apontamentos sobre o sistema recursal vigente no
direito processual civil brasileiro à luz da lei 10.352/2001. In: NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda
Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impugnação às decisões
judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 137.
157
325
O Supremo Tribunal Federal tem assentado que não há um direito ao duplo grau de jurisdição, salvo nos
casos expressamente garantidos pela Constituição, como, por exemplo, o do recurso ordinário constitucional, que
devolve a matéria à instância imediatamente superior. (In: MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo
Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 444)
326
Sobre a possibilidade de restrições ao cabimento de recursos pela lei ordinária, também merece transcrição
trecho de substancioso voto proferido pelo então Ministro Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal:
(...) Tudo isso me conduziu - sem negar-lhe a importância, mormente como instrumento de controle – à
conclusão de que a Constituição - na linha de suas antecedentes republicanas - efetivamente não erigiu o duplo
grau de jurisdição em garantia fundamental. Certo, não desconheço ser ele quase universalmente um princípio
geral do processo. Daí,a previsão constitucional de Tribunais cuja função - básica nos de segundo grau (v.g, art.
108, II), e extraordinária, nos Superiores (arts. 105, II, e 121, § 4º, III a V) e até no Supremo (art. 102, II) - é a de
constituir-se em órgão de recursos ordinários. Entretanto, não só a Carta Política mesma subtraiu do âmbito
material de incidência do princípio do duplo grau as numerosas hipóteses de competência originária dos
Tribunais para julgar como instância ordinária única, mas também, em linha de princípio, não vedou à lei
ordinária estabelecer as exceções que entender cabíveis, conforme a ponderação em cada caso, acerca do dilema
permanente do processo entre a segurança e a presteza da jurisdição. Essa convicção me levou duas vezes - esta
é a terceira - a negar estatura constitucional ao duplo grau de jurisdição e até à regra menor do duplo exame: a
primeira, no voto como relator da ADInMC 675, DJ 20.6.97 - vencido por outros motivos -, e a segunda,
quando, com o respaldo da Primeira Turma, neguei força de garantia constitucional à embargabilidade das
decisões das ações penais originárias, que não as do Supremo Tribunal (HC 71.124, 1ª T., 28.6.94, Pertence, DJ
23.9.94). Com a reserva, que entendo cabível, do exame, em cada hipótese, da razoabilidade da exclusão legal do
recurso ordinário - continuo persuadido desse entendimento, isto é, de que a Constituição, quando não o repila
ela mesma, não garante às partes o duplo grau de jurisdição. STF, RHC 79785 RJ, Relator Ministro Sepúlveda
Pertence, Julgamento: 28/03/2000, Tribunal Pleno, Publicação: DJ 22-11-2002 PP-00057. Informativo n. 187.
Brasília, 1º a 5 de maio de 2000. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: fev.2016.
158
327
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 631-632.
328
SILVA, Ticiano Alves e. Os embargos de declaração no novo Código de Processo Civil. In: MACEDO,
Lucas Buril et al (Orgs.). Processo nos Tribunais e Meios de Impugnação às Decisões Judiciais. Coleção novo
CPC – Doutrina selecionada. Vol. 06. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 661-684.
159
Nesse contexto, para facilitar o acesso ao Supremo Tribunal Federal, que tem
papel fundamental na uniformização da interpretação constitucional, a novel legislação previu
a presunção da repercussão geral do tema decidido no julgamento do IRDR.
329
THEODORO JR., Humberto; OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 749.
160
O art. 986 do novo CPC prevê a possibilidade de revisão da tese jurídica firmada
no julgamento definitivo do IRDR.
330
THEODORO JR., Humberto; OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 748.
331
NUNES, Dierle José Coelho. SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 396.
161
aos precedentes judiciais de modo que possam ser revistos quando se alterarem as
circunstâncias fáticas ou jurídicas subjacentes ao julgamento do incidente. Como afirma
Scarpinella Bueno (2015, p. 630), “é assim com a edição de novas leis e não haveria razão
para ser diverso com os “precedentes judiciais””, os quais também possuem caráter
normativo.
Quanto à legitimidade, a tese jurídica poderá ser revista pelo próprio tribunal, de
ofício, ou mediante requerimento do Ministério Público ou da Defensoria Pública –
legitimados nos termos do art. 977, inciso III. O pedido de revisão poderia se basear em
mudança superveniente do direito, em decorrência de reforma legislativa ou constitucional,
viabilizando a reanálise da questão jurídica repetitiva. O julgamento se aplicará apenas aos
processos ainda em curso e aos futuros.
As partes do caso modelo, dos processos suspensos e, inclusive, aquelas das ações
ajuizadas após o julgamento do IRDR, embora sejam afetadas pela tese jurídica fixada, não
possuem legitimidade específica para requerer a instauração do procedimento de revisão.
Scarpinella Bueno333 sustenta que, nesse ponto, o dispositivo legal padece também
de inconstitucionalidade formal, uma vez que no substitutivo apresentado na Câmara dos
Deputados havia previsão expressa da legitimidade das partes para o pedido de revisão da tese
jurídica, o que foi suprimido do texto somente na fase de revisão pelo Senado Federal antes
332
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015, p. 163.
333
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 630.
162
Não há como, com o devido respeito, tolerar esta prática que representa
verdadeira subversão do processo legislativo. Destarte, é o caso de sustentar
que as partes também têm legitimidade para o pedido de revisão, nos termos
do texto aprovado pelo Senado Federal na sessão de 17 de dezembro de
2014, considerando-se não escrita, porque formalmente inconstitucional, a
restrição contida no art. 986.334
334
BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 631.
335
NUNES, Dierle José Coelho. SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015.
Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do
Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo
Horizonte: Fórum, 2015, p. 396.
163
local, de maneira que os juízes poderão afastar, no caso concreto, a tese jurídica firmada no
IRDR, demonstrando a superação daquele precedente sem que incorra em descumprimento do
efeito vinculante.
164
CAPÍTULO 03
3.1 Introdução
336
CARBONELL, Miguel. Neoconstitucionalismo: elementos para uma definição. In: MOREIRA, Eduardo
Ribeiro; PUGLIESI, Marcio (coords.). 20 anos da Constituição Brasileira. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 198.
337
CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo. Papnótica, Vitória, ano 1, n.6, fev. 2007, p.7.
338
A supremacia da Constituição é destacada na Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, para o qual “a ordem
165
Dentro dessa perspectiva, o direito processual não pode ter tratamento diferente
dos demais ramos da ciência do Direito e está hoje totalmente constitucionalizado no campo
de seus fundamentos e de sua estrutura. Os poderes de acesso à justiça, da competência, da
independência judicial, o direito à participação na construção da tutela jurisdicional integram
as garantias fundamentais proclamadas pela Constituição democrática de 1988.
jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas
é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da
relação de dependência que resulta do facto de a validade de uma norma, cuja produção, por seu turno, é
determinada por outra; e assim por diante, até abicar finalmente na norma fundamental – pressuposta. A norma
fundamental – hipotética, nestes termos – é, portanto, fundamento de validade último que constitui a unidade
desta interconexão criadora”. (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. Coimbra:
Armênio Amado, 1976, p. 310)
339
BUENO, Cássio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. v.1. São Paulo: Saraiva, 2009,
p. 85-86.
340
THEODORO JR., Humberto. Direito Processual Constitucional. Revista Estação Científica. Juiz de Fora, v.
01, n. 04, out-nov. 2009, p. 30.
166
341
ÁLVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2003, p.
252.
342
A propósito, destacam-se as teorias do processo como contrato e como quase-contrato que tiveram como
principais precursores, respectivamente, Pothier, em 1800, e Savigny e Guényvau, em 1850. Pothier entendia
que o processo era um contrato que se firmava entre os litigantes a partir do comparecimento espontâneo das
partes em juízo para a solução do conflito. Conforme destacado pelo professor Rosemiro Pereira Leal, essa teoria
revelou-se inadequada para explicar a natureza jurídica do processo, pois, já no século XVIII, o juiz não
precisava de prévio consenso das partes para tornar coativa a sentença. A teoria do processo como quase-
contrato também foi buscar nas fontes romanas os seus fundamentos, tendo Savigny insistido que o processo
deveria ser enquadrado na esfera do direito privado, mas que não seria tipicamente um contrato já que o
consentimento das partes não era inteiramente livre. A parte que ingressava em juízo já consentia que a decisão
pudesse ser favorável ou desfavorável, ocorrendo um nexo entre o autor e o juiz, ainda que o réu não aderisse
espontaneamente ao debate da lide (In: LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo. Primeiros Estudos.
Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 87-88). As referidas teorias foram superadas na medida em que incorreram em
erro metodológico ao enquadrar o processo e a jurisdição nas categorias de direito privado. Outros motivos
também se destacam: imposição de obstáculos à independência da magistratura; dificuldade na enumeração de
elementos conceituais; atenuação do caráter jurisdicional do processo; possibilidade de arbitrariedade no
exercício da jurisdição. (In: FRANCO, Marcelo Veiga. Processo Justo: entre efetividade e legitimidade da
jurisdição. Belo Horizonte: Del Rey, 2016, p. 1-2).
167
Em 1868, o alemão Oskar von Bulow publicou célebre obra intitulada “Das
exceções processuais e dos pressupostos processuais”343, que se constitui num marco do
estudo científico do processo.
343
BULOW, Oskar von. Teoria das exceções e dos pressupostos processuais. Trad. Ricardo Rodrigues Gama.
Campinas: LZN, 2005.
344
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo: Malheiros,
2006. p. 19.
345
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINARMARCO, Cândido Rangel. Teoria
geral do processo. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 278.
346
BULOW, Oskar von. Teoria das exceções e dos pressupostos processuais. Trad. Ricardo Rodrigues Gama.
Campinas: LZN, 2005, p. 06-07.
168
347
DINARMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 27.
348
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo. Primeiros Estudos. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 88.
349
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, v. 1, 1965, p. 37.
350
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, v. 1, 1965, p. 55.
169
351
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil. Trad. Cândido Rangel Dinamarco. Rio de
Janeiro: Forense, 1984, p. 40-41.
352
GONÇALVES. Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 97.
353
FRANCO, Marcelo Veiga. A evolução do contraditório: a superação da teoria do processo como relação
jurídica e a insuficiência do processo como procedimento em simétrico contraditório. Revista do Programa de
Pós-graduação em Direito da UFBA, Salvador, vol. 22, n. 24, 2012, p. 181.
170
354
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 132.
171
Para Fazzalari,
355
BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias; SOARES, Carlos Henrique. Manual Elementar de Processo Civil. Belo
Horizonte: Del Rey, 2011, p. 103.
356
FAZZALARI, Elio. Instituições de Direito Processual. Campinas: Bookseller, 2006, p. 113-114.
172
357
FAZZALARI, Elio. Instituições de Direito Processual. Campinas: Bookseller, 2006, p. 118-119.
358
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 115.
359
FAZZALARI, Elio. Instituições de Direito Processual. Campinas: Bookseller, 2006, p. 119.
360
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 68.
173
361
LEAL, André Cordeiro. O contraditório e a fundamentação das decisões no direito processual democrático.
Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p. 38.
362
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 160-161.
174
Por isso o contraditório não deve ser entendido como uma participação
meramente episódica dos sujeitos do processo no momento da defesa ou de sua oitiva.363
363
FAZZALARI, Elio. Instituições de Direito Processual. Campinas: Bookseller, 2006, p. 124.
364
FAZZALARI, Elio. Instituições de Direito Processual. Campinas: Bookseller, 2006, p. 119-120.
365
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 120.
366
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 127.
175
Mais uma vez vale citar Cândido Rangel Dinamarco, que apesar de ainda filiar-se
à teoria do processo como relação jurídica, também ressalta a importância do contraditório
como critério de legitimação do provimento jurisdicional. Na visão do processualista,
Nesse contexto, todo provimento jurisdicional (entenda-se ato estatal) deve ser
construído nos estreitos ditames do Estado Democrático de Direito, a partir de uma estrutura
dialético-discursiva, o que possibilitará a concretização prática da cidadania, assegurando a
defesa de todos os direitos fundamentais e efetivando o exercício verdadeiro do devido
processo substancial.
367
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 79.
368
FRANCO, Marcelo Veiga. A evolução do contraditório: a superação da teoria do processo como relação
jurídica e a insuficiência do processo como procedimento em simétrico contraditório. Revista do Programa de
Pós-graduação em Direito da UFBA, Salvador, vol. 22, n. 24, 2012, p. 52.
369
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide, 2001, p. 193.
176
preconizado pela relação jurídica processual. Perante o contraditório, não se pode admitir uma
relação jurídica de sujeição ou subordinação entre as partes ou perante o juiz, órgão estatal.
As partes se sujeitam apenas ao provimento, ato final do processo, de cuja preparação
participaram efetivamente a partir do debate processual.
A principal crítica que se faz à referida teoria é que Fazzalari quando distinguiu o
processo de procedimento, integralizando em sua teoria o contraditório, não “fê-lo
originariamente pela reflexão constitucional”370a partir da constitucionalização e idealização
dos direitos fundamentais.
370
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo. Primeiros Estudos. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 93.
371
BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Processo Constitucional e Estado Democrático de Direito. Belo
Horizonte: Del Rey, 2010, p. 91.
177
Assim, Italo Andolina e Giuseppe Vignera afirmam que, numa perspectiva “pós-
constitucional” (entendida, conforme acima exposto, como o cenário de valorização das
disposições constitucionais e da sua supremacia no ordenamento jurídico), o processo não
pode ser definido apenas pelo seu “ser”, isto é, “sua organização concreta segundo as leis
ordinárias vigentes”, mas deve, necessariamente, levar em consideração o seu dever-ser, ou
seja, “a conformidade de sua ordem positiva à normativa constitucional sobre o exercício da
atividade jurisdicional” 372. (tradução livre)
372
“Nella nuova prospettiva post-costituzionale, quindi, il problema del processo no riguarda soltanto il suo
essere (idest: la sua concreta organizzazione secondo le leggi ordinarie vigenti), ma anche il suo dover essere
(idest: la conformitá del suo assetto positivo alla normativa costituzionale sull’ esercizio dell’attività
giurisdizionale). Il problema della giursidizione, a sua volta, non è più una mera questione di tipo
(essenzialmente) definitorio interessante soprattutto la teoria generale del diritto e dello Stato, costituendo
invece um tema dalle implicazioni pratiche assai marcate, poiché soltanto di fronte ad um procedimento
(positivo) strumentale all’esercizio della funzione giurisdizionale occorre controllare se lo stesso effetivamente é
come dovrebbe (secondo la Costituzione) essere. L’oggetto di queste lezioni é costituito proprio dalla
“giurisdizionalità costituzionalmente derivata” del processo, dal suo dover essere alla stregua della normativa
costituzionale.” (ANDOLINA, Ítalo Augusto; VIGNERA, Giuseppe. Il modello costituzionale del processo
civile italiano. Torino: G. Giappichelli Editore, 1990, p. 11.)
178
373
“Le norme ed i principi costituzionali riguardanti l’esercizio della funzione giurisdizionale, se considerati
nella loro complessità, consentono all’interprete di disegnare un vero e proprio schema generale de processo,
suscettibile di formare l’oggetto di una esposizione unitaria.” (ANDOLINA, Ítalo Augusto; VIGNERA,
Giuseppe. Il modello costituzionale del processo civile italiano. Torino: G. Giappichelli Editore, 1990, p. 13)
374
“Prima de prendere in considerazione i singoli elementi (oggetivi e soggettivi) del modello costituzionale del
processo civile, é doveroso evidenziare in questa sede i suoi caratteri generali, che possono individuarsi: a)
nella espansività, consistente nella sua idoneità (conseguente alla posizione primaria delle norme costituzionali
nella gerarchia delle fonti) a condizionare la fisionomia dei singoli procedimenti giurisdizionali introdotti da
legislatore ordinário, la quale (fisionomia) deve essere comunque compatibile coi connotati di quel modelo; b)
nella variabilità, indicante la sua attitudine ad assumere forme diverse, di guisa che l’adeguamento al modello
costituzionale (ad opera del legislatore ordinario) delle figure processuali concretamente funzionanti può
avvenire secondo varie modalità in vista del perseguimento di particolari scopi; c) nella perfettibilità,
designante la sua idoneità ad essere perfezionato dalla legislazione sub-costituzionale, la quale (scilicet: nel
rispetto, comunque, di quel modello ed in funzione del conseguimento di objettivi particolari) bem può costruire
procedimenti giurisdizionali caratterizzati da (ulteriori) garanzie ed istituti ignoti al modello costituzionale: si
pensi, per esempio, al principio di economia processuale, a quello del doppio grado di giurisdizione ed
all’istituto della cosa giudicata.” (ANDOLINA, Ítalo Augusto; VIGNERA, Giuseppe. Il modello costituzionale
del processo civile italiano. Torino: G. Giappichelli Editore, 1990, p. 14-15.)
179
375
“I sopra descritti connotati generali del modello costituzionale del processo inducono conclusivamente a
considerare lo stesso com una sorta di “schema in bianco”. Esso, infatti, contiene in nuce gli elementi costanti
ed indefettibili di ciascun procedimento giurisdizionale (validamente) presente nell’ordinamento giuridico, ma
presenta al contempo dei “caratteri mobili” e degli “spazi vuoti”, destinati ad essere – rispettivamente – variati
e colmati dal legislatore sub-costituzionale in vista del conseguimento di determinati objettivi.” (ANDOLINA,
Ítalo Augusto; VIGNERA, Giuseppe. Il modello costituzionale del processo civile italiano. Torino: G.
Giappichelli Editore, 1990, p. 15)
376
“(...) La centralità del processo giurisdizionale all’interno del sistema delle garanzie giustifica la particolare
attenzione ad esso dedicata dalla Costituzione, la quale ha disegnato appunto un modello di processo
giurisdizionale. Come è noto, invero, la Carta costituzionale ha individuato alcuni connotati o requisiti che
devono caratterizzare il procedimento strumentale all’esplicazione della giurisdizione. La presenza di tali
elementi è, dunque, indefettibile e necessaria in ciascun procedimento che voglia ritenersi costituzionalmente
giurisdizionale. Punti nodali del modello (modello tuttavia non rigido ma, al contrario, duttile e dinamico,
perennemente in fieri, frutto di costante lettura e rilettura in chiave evolutiva del dettato costituzionale)
disegnato dal costituente sono: a) il diritto di accesso alla giustizia; b) il diritto di difesa; c) il contraddittorio e
la c.d. parità delle armi tra le parti; d) l’indipendenza e la terzietà del giudice; e) l’obbligo di motivazione dei
provvedimenti giurisdizionali; f) il sindacato (diffuso) di legittimità, ad opera della Corte di Cassazione, sui
provvedimenti giudiziali decisori (non altrimenti impugnabili). Sono questi gli elementi che caratterizzano la
nozione di “giusto processo”; nozione che è, peraltro, antecedente alla modifica dell’art. 111 Cost. compiuta
dalla legge cost. 23 novembre 1999, n. 2. (ANDOLINA, Ítalo Augusto. Il “Giusto Processo” nell’esperienza
Italiana e Comunitária. Revista de Processo: RePro, v. 30, n. 126, ago. 2005, p. 93)
377
“(...) il processo in Itália é diventato un’entità “a modello único ed a tipologia plurima”: espressione che
(nella sua apparente contraddittorietà) esprime efficacemente – ci sembra – l’idea che, se esiste un solo
paradigma costituzionale di processo, esiste (recte: può esistere) altresì nell’ordinamento una pluralità di
procedimenti giurisdizionali.” (ANDOLINA, Ítalo Augusto; VIGNERA, GIUSEPPE. Il modello costituzionale
del processo civile italiano. Torino: G. Giappichelli Editore, 1990, p. 15).
180
378
BARROS, Flaviane de Magalhães. O Modelo Constitucional de Processo e o Processo Penal: a necessidade
de uma interpretação das reformas do processo penal a partir da Constituição. In: MACHADO, Felipe Daniel
Amorim; CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade (coord.). Constituição e Processo: A contribuição do
processo ao constitucionalismo democrático brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 335.
181
Para que coincida o devido processo com o processo justo é fundamental, na visão
de Comoglio, a presença de requisitos mínimos de justiça procedimental, consubstanciada na
imparcialidade e independência do juiz, no amplo acesso à justiça, ampla defesa, no
contraditório, além da coerência da forma com o escopo institucional do processo, de maneira
a excluir a possibilidade de alguém ser privado de seus direitos sem a adequada possibilidade
de ser ouvido e de se defender perante o julgador.381
379
Nella “costituzionalizzazione” del concetto di “giusto processo” – che è clausola generale di “giustizia
procedurale”, “principio ad assetto variabile” o a “tessitura aperta”, eticamente accettabile perché conforme
alla cultura giuridica della legalità, nello Stato di diritto moderno – trovano spazio sia l’idea del processo
“giusto” in quanto “regolato per legge” (o secondo “legalità processuale”), sia la parità delle parti, intesa
quale corrispondenza dinamica di reciproci diritti fra Le parti medesime sulla base di una loro sostanziale
eguaglianza. Ma vi rientrano altresì: 1) il contraddittorio (quale garanzia di paritaria difesa e quale cânone
oggettivo o strutturale del “giusto processo”, sino ad oggi non enunciati in forma esplicita nella Costituzione);
2) la “imparzialità” e la “terzietà” del giudice (intese: la prima, in senso funzionale, come “foro interiore” del
magistrato giudicante, doverosamente scevro da personali pregiudizi, neutrale ed equidistante dalle posizioni di
parte; la seconda, in senso strutturale, come garanzia dell’indipendenza e della diversità soggettiva del
magistrato giudicante, rispetto alle parti in lite); 3) la garanzia della “durata ragionevole” del processo.
(COMOGLIO, Luigi Paolo. Il “Giusto Processo” Civile in Italia e in Europa. Revista de Processo: RePro, v. 29,
n. 116, jul.-ago. 2004, p. 107)
380
“(...) E´ certo, invece, che il “processo” non possa dirsi “giusto”, se non in quanto la “legge”, da cui è
comunque “regolato”, rispetti ab intrinseco le condizioni essenziali (quali sono: il contraddittorio, la parità
delle parti, la terzietà e l’imparzialità del giudice), che sono dettate nel 2.º comma dell’art. 111 (giacché ogni
diversa interpretazione sarebbe riduttiva e fuorviante). Tali condizioni o componenti essenziali rappresentano, a
loro volta, talune garanzie minime, necessarie e sufficienti perché il “processo” che le rispetti o Le attui possa
definirsi, appunto, “giusto”, “equo” e “dovuto”.” (COMOGLIO, Luigi Paolo. Il “Giusto Processo” Civile in
Italia e in Europa. Revista de Processo: RePro, v. 29, n. 116, jul.-ago. 2004, p. 129)
381
COMOGLIO, Luigi Paulo. Garanzie costituzionali e ‘giusto processo’ (modelli a confronto). Revista de
Direito Comparado, Belo Horizonte: UFMG, v. 2, n. 2, mar./1998, p. 272.
182
382
COMOGLIO, Luigi Paolo. Etica e técnica del ‘giusto processo’. Torino: G. Giappichelli Editore, 2004, p.
162.
383
“Nel nuovo contesto costituzionale, non vi è più spazio per alcun apprezzamento puramente discrezionale da
parte del giudice, giacché la previa provocazione del contraddittorio e la previa “trattazione” di qualsiasi
“questione pregiudiziale” non sono più materia di mere valutazioni di “opportunità” processuale, rimesse al
medesimo giudice, ma diventano invece una conseguenza costituzionalmente necessaria della loro
“indicazione” (o, se si preferisce, del loro rilievo d’ufficio).” (COMOGLIO, Luigi Paolo. Il “Giusto Processo”
Civile in Italia e in Europa. Revista de Processo: RePro, v. 29, n. 116, jul.-ago. 2004, p. 139)
384
COMOGLIO, Luigi Paolo. Il “Giusto Processo” Civile in Italia e in Europa. Revista de Processo: RePro, v.
29, n. 116, jul.-ago. 2004, p. 138.
385
THEODORO JR., Humberto. Processo justo e contraditório dinâmico. Revista de Estudos Constitucionais,
Hermenêutica e Teoria do Direito (RECHTD), jan.-jun. 2010, p. 68.
183
3.6 O modelo de processo eficiente para a América Latina: uma proposta do Documento
Técnico nº 319 do Banco Mundial para a reforma do Poder Judiciário
386
THEODORO JR., Humberto. Processo justo e contraditório dinâmico. Revista de Estudos Constitucionais,
Hermenêutica e Teoria do Direito (RECHTD), jan.-jun. 2010, p. 67.
184
Várias leis foram publicadas no Brasil nestes últimos 20 anos para se tentar
modificar o cenário da crise, mas os Relatórios da Justiça em Números divulgados pelo
Conselho Nacional de Justiça demonstram que a situação do Judiciário é ainda muito
preocupante em face do congestionamento processual e do aumento contínuo da litigiosidade.
387
Os Documentos Técnicos são publicados com a finalidade de comunicar com a maior brevidade possível os
resultados dos trabalhos e pesquisas do Banco Mundial, no desenvolvimento comunitário. Os estudos são
produzidos para auxiliar governos, pesquisadores e operadores do direito no desenvolvimento de futuros
programas de reforma e aperfeiçoamento do Poder Judiciário. O Documento Técnico 319 foi publicado em
junho de 1996. A permissão para reproduzir partes do documento para uso estudantil é garantida pelo Centro de
Autorização para Direitos Autorais, suíte 910, 222, Rosewood Drive, Danvers, Massachusetts 01923, U.S.A.
388
DAKOLIAS, Maria. O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe: elementos para reforma. Trad. Sandro
Eduardo Sardá. Banco Mundial. Documento Técnico n. 319. 1996, p. 08. Disponível em www.anamatra.org.br.
Acesso em: mar. 2016.
185
Além disso, não se pode falar na independência total se não for assegurada a plena
autonomia orçamentária do Poder Judiciário. Sem os recursos necessários e sua gestão
eficiente é impossível adequar o processo ao desenvolvimento econômico da sociedade.
Visando garantir uma alocação eficiente de recursos orçamentários, o Judiciário deve
apresentar habilidades técnicas de contabilidade financeira e de auditorias. Na maioria dos
países latino americanos, o quadro de pessoal do Judiciário não esta suficientemente treinado
em matérias de contabilidade e finanças390. A propósito, no Brasil, a criação do Conselho
Nacional de Justiça pela Emenda Constitucional 45, de 2004, contribuiu fortemente para
maior controle e fiscalização dos gastos orçamentários pelo Poder Judiciário, evitando-se
abusos e malversação do erário.
389
DAKOLIAS, Maria. O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe: elementos para reforma. Tradução de
Sandro Eduardo Sardá. Banco Mundial. Documento Técnico n. 319. 1996, p. 11-12.
390
DAKOLIAS, Maria. O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe: elementos para reforma. Tradução de
Sandro Eduardo Sardá. Banco Mundial. Documento Técnico n. 319. 1996, p. 30.
186
Tais fatores, que podem parecer distantes do processo, não o são na realidade,
pois repercutem diretamente na atuação e cultura dos profissionais do Direito e, por
conseguinte, na qualidade e eficiência da condução e prática dos atos processuais.
391
DAKOLIAS, Maria. O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe: elementos para reforma. Tradução de
Sandro Eduardo Sardá. Banco Mundial. Documento Técnico n. 319. 1996, p. 13.
392
DAKOLIAS, Maria. O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe: elementos para reforma. Tradução de
Sandro Eduardo Sardá. Banco Mundial. Documento Técnico n. 319. 1996, p. 38.
187
É possível perceber, por fim, que a pesquisa do Banco Mundial também deu
ênfase à verticalização do Poder Judiciário como forma de se assegurar a previsibilidade das
decisões e a tão desejada celeridade processual.
processos.
A crítica que se coloca é que, embora muitas das recomendações formuladas pelo
Banco Mundial sejam, de fato, pertinentes para a melhoria da qualidade do processo, não se
pode relegar ao segundo plano a garantia efetiva de participação e do contraditório das partes
para a realização de um processo mais justo e eficiente, de acordo com normas e garantias
preconizadas pela Ordem Constitucional de cada país da América Latina.
Ao contrário, ele deve ser visto como sendo um paradigma interpretativo dotado
de diretrizes obrigatórias a serem seguidas na realidade prática do Sistema de Justiça, pois,
efetivando-se tal modelo, efetiva-se a própria Constituição e a garantia dos direitos
fundamentais concebidos no Estado Democrático de Direito.
Na segunda metade do século XX, após duas guerras mundiais e diante das graves
barbáries cometidas, a constitucionalização do processo e a proteção das garantias
fundamentais passaram a ocupar espaço de estudo no direito comparado, tal como já
mencionado neste capítulo acerca das teorias de Andolina, Vignera e Comoglio, além de
diversos outros juristas394.
393
BUENO, Cassio Scarpinella. O “Modelo Constitucional do Direito Processual Civil”: um paradigma
necessário de estudo do direito processual civil e algumas de suas aplicações. In: JAYME, Fernando Gonzaga;
FARIA, Juliana Cordeiro de; LAUAR, Maira Terra (coord.). Processo Civil: Novas Tendências. Belo Horizonte:
Del Rey, 2008, p. 158.
394
No mesmo sentido é a lição do jurista italiano, Nicolò Trocker, que defende o direito a um processo justo que
se desenvolve segundo os parâmetros fixados pelas normas constitucionais e pelos valores aceitos pela
coletividade (tradução livre). “Giusto é il processo che si svolge nel rispetto dei parametri fissari dalle norme
costituzionali e dei valori condivisi dalla collectività”. (In: Processo civile e costituizione. Milano: Giuffre,
1974, p. 383-384.) O uruguaio Eduardo Couture também apresenta esboço de um direito processual
constitucional, sob a perspectiva do caráter dialético do processo, que, através do contraditório, deve franquear o
debate processual às partes e ao juiz para que a atividade jurisdicional alcance a verdade. (In: Introdução ao
Estudo do Processo Civil: Discursos, Ensaios e Conferências. Trad. Hiltomar Martins Oliveira. Belo Horizonte:
Líder, 2008, p. 44)
190
Democrático de Direito.395
Para Humberto Theodoro Jr, pode-se constatar no referido período duas grandes
mudanças de rumo do direito processual: a primeira se refere à aproximação do tratamento
das figuras processuais em relação ao direito material, reforçando o papel do processo na
tutela dos direitos subjetivos permeados de valores humanos e éticos, dando origem ao devido
processo justo; a segunda consistente no fenômeno da constitucionalização do processo e da
regulação dos direitos fundamentais396. O processo passa a ser estudado e aplicado a partir de
suas relações com a Constituição.
395
THEODORO JR., Humberto. Constituição e Processo: desafios constitucionais da reforma do processo civil
no Brasil. In: MACHADO, Felipe Daniel Amorim; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de
(coord.). Constituição e Processo: A contribuição do processo ao constitucionalismo democrático brasileiro.
Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 234.
396
THEODORO JR., Humberto. Direito Processual Constitucional. Revista Estação Científica. Juiz de Fora, v.
01, n. 04, out-nov, 2009, p. 31.
397
O mexicano Hector Fix-Zamudio destacou em sua obra publicada na década de 70 que as garantias
fundamentais previstas nas Constituições passaram a ter relevância no estudo e interpretação do direito
processual, concluindo que é impossível desvincular qualquer legislação processual de tais direitos fundamentais
previstos pelas normas constitucionais. (FIX-ZAMUDIO, Hector. Constituición y Proceso Civil en
Latinoamérica. México: Instituto de Investigaciones Juridicas, 1974)
398
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria Geral do Processo Constitucional. Revista Forense. Rio de
Janeiro, v. 383, jan-fev. 2006, p. 132.
399
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Direito Processual Constitucional: Aspectos Contemporâneos. Belo
Horizonte: Fórum, 2008, p. 15.
191
400
CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. O processo constitucional como instrumento de jurisdição
constitucional. Revista da Faculdade Mineira de Direito. Belo Horizonte, v. 03, n. 5 e 6, 2000, p. 165.
192
401
THEODORO JR., Humberto. Direito Processual Constitucional. Revista Estação Científica. Juiz de Fora, v.
01, n. 04, out-nov, 2009, p. 30.
402
THEODORO JR., Humberto. Direito Processual Constitucional. Revista Estação Científica. Juiz de Fora, v.
01, n. 04, out-nov, 2009, p. 31.
403
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto; MITIDIERO, Daniel. Curso de Processo Civil. v.1. São Paulo:
Atlas, 2010, p. 28.
404
FRANCO, Marcelo Veiga. Processo justo: entre efetividade e legitimidade da jurisdição. Belo Horizonte: Del
Rey, 2016, p. 88-89.
193
Trata-se de garantia para a existência de um processo justo, uma vez que a atuação
independente do Poder Judiciário promove a efetivação dos direitos fundamentais, corrigindo
as ilegalidades ou omissões dos demais poderes, figurando como mecanismo de freio e
contrapesos que visa a manter o equilíbrio entre os poderes.
405
FRANCO, Marcelo Veiga. Processo justo: entre efetividade e legitimidade da jurisdição. Belo Horizonte: Del
Rey, 2016, p. 89.
406
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Entendimento manifestado no Inq 2.699-QO, Rel. Min. Celso de Mello,
julgamento em 12-3-2009, Plenário, DJE de 8-5-2009.
407
BOTELHO, Guilherme. Direito ao processo qualificado: o processo civil na perspectiva do Estado
Constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 96.
194
408
BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Fundamentos constitucionais da jurisdição no Estado Democrático de
Direito. In: GALUPPO, Marcelo Campos (Coord.). Constituição e democracia: fundamentos. Belo Horizonte:
Fórum, 2009, p. 229.
409
BRÊTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Processo Constitucional e Estado Democrático de Direito. Belo
Horizonte: Del Rey, 2010, p. 92.
410
ARAÚJO, Marcelo Cunha de. O novo processo constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p. 97-
98.
411
ARAÚJO, Marcelo Cunha de. O novo processo constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p. 105.
195
412
NUNES, Dierle José Coelho. Comparticipação e prolicentrismo. Horizontes para a democratização
processual civil (Tese de doutoramento). PUC-MG, Belo Horizonte, 2008, p. 106.
413
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda examinados à luz do contraditório.
In: TUCCI, José Rogério Cruz e; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Causa de pedir e pedido no processo
civil: questões polêmicas. São Paulo: RT, 2002, p. 20.
196
414
O juiz Hércules é uma metáfora utilizada por Dworkin (1999) para demonstrar as qualidades excepcionais,
quase divinas, do juiz que toma a melhor decisão em cada caso, respeitando o princípio da integridade e
garantindo a coerência do Direito. (DWORKIN, Ronald. O império do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999,
p. 377-492)
415
PICARDI, Nicola. Il principio del contraddittorio. Rivista di Diritto Processuale. Padova, CEDAM, n. 3,
1998, p. 673-674.
416
JAYME, Fernando Gonzaga; FRANCO, Marcelo Veiga. O princípio do contraditório no Projeto do novo
Código de Processo Civil. Revista de Processo, v. 39, n. 227, jan. 2014, p. 356.
197
tempo em cada uma dessas ações” 417, assumindo o incidente verdadeiro papel de polo difusor
da resolução única e vinculante sobre a questão de direito repetitiva.
417
BARBOSA, Andrea Carla; CANTOARIO, Diego Martinez Fervenza. O incidente de resolução de demandas
repetitivas no projeto do Código de Processo Civil: apontamentos iniciais. In: FUX, Luiz (coord.). O novo
processo civil brasileiro: direito em perspectiva. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 491-492.
198
418
NERY JR., Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil, penal e administrativo.
São Paulo: RT, 2009, p. 206.
419
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. v. I. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p.
50.
420
TESHEINER, José Maria Rosa. Elementos para uma teoria geral do processo. São Paulo: Saraiva, 1993, p.
44.
199
Trata-se, nas palavras de Fernando Jayme e Marcelo Franco, “da conjugação dos
direitos das partes ao conhecimento e à participação no processo em simétrica paridade
(dimensão estática), com a possibilidade de interferência e de fiscalização dos resultados
advindos do exercício da função jurisdicional (dimensão dinâmica)” 421.
A igualdade das partes e a sua mera audiência bilateral no processo não satisfazem
o contraditório participativo como instrumento do princípio político da participação
democrática. É necessário que o contraditório instaure um diálogo humano, que permita a
efetiva contribuição das partes na formação da decisão. O juiz confere às partes a
oportunidade concreta de apresentarem e debaterem seus argumentos, produzirem as provas e
influenciarem a formação do convencimento do juízo.
Por isso, Dierle Nunes adverte que o processo deve ser estruturado em qualquer
situação sob uma perspectiva comparticipativa e policêntrica, ancorado nas garantias
fundamentais previstas na Constituição, constituindo um espaço público no qual se
apresentam plenas condições comunicativas para que todos os legitimamente interessados
participem da formação do provimento jurisdicional 423.
421
JAYME, Fernando Gonzaga; FRANCO, Marcelo Veiga. O princípio do contraditório no Projeto do novo
Código de Processo Civil. Revista de Processo, v. 39, n. 227, jan. 2014, p. 344-345.
422
NUNES, Dierle José Coelho. Curso de Direito Processual Civil: fundamentação e aplicação. Belo Horizonte:
Fórum, 2011, p. 81.
423
NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático: uma análise crítica das reformas
processuais. Curitiba: Juruá, 2008, p. 211.
200
segundo o qual:
424
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento.
Salvador: JusPodivm, 2010, p. 52.
201
425
JAYME, Fernando Gonzaga; FRANCO, Marcelo Veiga. O princípio do contraditório no Projeto do novo
Código de Processo Civil. Revista de Processo, v. 39, n. 227, jan. 2014, p. 345.
426
THEODORO JR., Humberto; NUNES, Dierle José Coelho. Uma dimensão que urge reconhecer ao
contraditório no direito brasileiro: sua aplicação como garantia de influência, de não surpresa e de
aproveitamento da atividade processual. Revista de Processo. São Paulo, n. 168, 2009, p. 125.
427
ZANETI JR., Hermes. Processo constitucional: o modelo constitucional do processo civil brasileiro. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 191.
428
JAYME, Fernando Gonzaga; FRANCO, Marcelo Veiga. O princípio do contraditório no Projeto do novo
Código de Processo Civil. Revista de Processo, v. 39, n. 227, jan. 2014, p. 346-347.
202
objetivo impõe-se alcançado pelo fortalecimento dos poderes das partes, por
sua participação mais ativa e leal no processo de formação da decisão, em
consonância com uma visão não autoritária do papel do juiz e mais
contemporânea quanto à divisão do trabalho entre o órgão judicial e as
partes.429
Essa nova postura das partes em face do juiz no direito processual contemporâneo
também foi destacada nas palavras de Mancuso:
429
ÁLVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Poderes do juiz e visão cooperativa do processo. Revista da
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Lisboa, v. 44, 2003. p. 26.
430
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à Justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: RT,
2012, p. 435.
431
BRASIL. Câmara dos Deputados. Parecer da Comissão Especial referente ao Projeto de Lei nº 8.046, de
2010. Rel.: dep. Paulo Teixeira. Brasília, 26 mar. 2014, p. 35-36. Disponível em: <http://www.camara.gov.br>.
Acesso em: ago. 2015.
203
Por isso, o julgador não “proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja
previamente ouvida” (art. 9º do CPC/2015) e também não poderá “decidir, em qualquer grau
de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes
oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de
ofício” (art. 10º – princípio da não surpresa).
432
GRECO, Leonardo. O princípio do contraditório. Estudos de Direito Processual. Campos dos Goytacazes:
Faculdade de Direito de Campos, 2005, p. 541.
433
COMOGLIO, Luigi Paolo. Etica e tecnica del giusto processo. Torino: G. Giappichelli, 2004, p. 60; No
mesmo sentido: COMOGLIO, Il “Giusto Processo” Civile in Italia e in Europa. Revista de Processo: RePro, v.
29, n. 116, jul.-ago. 2004, p. 138.
204
435
ALEXY, Robert. Constitucionalismo Discursivo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 163.
436
JAYME, Fernando Gonzaga; FRANCO, Marcelo Veiga. O princípio do contraditório no Projeto do novo
Código de Processo Civil. Revista de Processo, v. 39, n. 227, jan. 2014, p. 354.
437
Sofia Temer defende, por sua vez, uma nova concepção de contraditório, que não seja entendido como
igualdade de condições de participação direta e pessoal, mas que atenda ao caráter objetivo do IRDR e seja
compatível com a tutela das demandas repetitivas. Nas palavras da referida jurista: “a natureza objetiva do
incidente dispensa, então, a perquirição da vontade dos sujeitos parciais das demandas repetitivas, porquanto não
haverá direta interferência em sua esfera de direitos e, por conseguinte, no espaço em que devem poder exercer
sua autonomia. Como o incidente visa à definição da melhor solução para um problema de conformidade e
coerência do ordenamento jurídico, o direito à influência no debate que ocorre no incidente decorre da
possibilidade de estabelecimento de diálogo fundado em argumentos racionais. A participação aqui é vista,
então, como a possibilidade de convencimento, através da apresentação (direta ou indireta) de razões para a
resolução da controvérsia jurídica”. (TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas.
Salvador: Juspodivm, 2016, p. 137-138). Entende-se, ao contrário, que transformar o direito ao contraditório em
mera ficção jurídica em relação, sobretudo, aos litigantes ausentes é o mesmo que desconsiderá-lo no
206
Tanto quanto as partes, tem o juiz interesse em que sua função atinja
determinados objetivos, consistentes nos escopos da jurisdição. Os valores
determinantes do modo de ser do juiz na condução da relação processual não
são os mesmos vigentes no início do século. A crescente complexidade das
situações regidas pelo direito substancial, a enorme disparidade econômica
entre os sujeitos do direito, a integração cada vez maior de culturas jurídicas
diferentes, determinada pelo que se convencionou chamar de globalização,
tudo isso exige maior preocupação do representante estatal com o resultado
do processo. Vem daí a ideia do juiz participativo.438
O direito de ampla participação e influência atua ainda, sob outra ótica, como um
limite ao poder do juiz, gerando a existência de um dever de debate por parte do julgador,
mesmo nos casos em que seja possível e recomendável a sua atuação de ofício. 440
Em outras palavras, tudo que o juiz decidir fora do debate travado pelas partes
implica surpreendê-las, ofendendo o caráter dialético e democrático do processo, mesmo que
procedimento do IRDR.
438
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda examinados à luz do contraditório.
In: TUCCI, José Rogério Cruz e; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Causa de pedir e pedido no processo
civil: questões polêmicas. São Paulo: RT, 2002, p. 21.
439
NUNES, Dierle José Coelho. O princípio do contraditório. Boletim Técnico da Escola Superior de Advocacia
da OAB/MG. Belo Horizonte, v. 1, jan.-jun. 2004, p. 41.
440
ZANETI JR., Hermes. Processo constitucional: o modelo constitucional do processo civil brasileiro. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 196.
207
441
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. O processo civil na perspectiva dos direitos fundamentais. In:
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. (org.) Processo e Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.
194.
442
GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. v. II. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 271.
208
De igual modo, determina o inciso IV do § 1º do art. 489 do NCPC que não deve
ser considerada fundamentada a decisão judicial que não enfrente todos os argumentos
deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.
O art. 489, § 1º, inciso IV do CPC dispõe que o órgão julgador não tem o dever de
rebater todos os argumentos superficiais ou periféricos levantados pelas partes, mas sim
aqueles que são relevantes, ou seja, todos os que são capazes de infirmar a conclusão adotada
pelo julgador, aqueles que são idôneos para a alteração do julgado. 444
443
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. v. IV. São Paulo: Malheiros, 2004,
p. 661.
444
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo
Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 493.
209
445
É importante citar a ementa do Mandado de Segurança nº 24.268 (rel. min. Gilmar Mendes, Diário Oficial de
17/9/2004): “Mandado de Segurança. 2. Cancelamento de pensão especial pelo Tribunal de Contas da União.
Ausência de comprovação da adoção por instrumento jurídico adequado. Pensão concedida há vinte anos. 3.
Direito de defesa ampliado com a Constituição de 1988. Âmbito de proteção que contempla todos os processos,
judiciais ou administrativos, e não se resume a um simples direito de manifestação no processo. 4. Direito
constitucional comparado. Pretensão à tutela jurídica que envolve não só o direito de manifestação e de
informação, mas também o direito de ver seus argumentos contemplados pelo órgão julgador. 5. Os princípios do
contraditório e da ampla defesa, assegurados pela Constituição, aplicam-se a todos os procedimentos
administrativos. 6. O exercício pleno do contraditório não se limita à garantia de alegação oportuna e eficaz a
respeito de fatos, mas implica a possibilidade de ser ouvido também em matéria jurídica. 7. Aplicação do
princípio da segurança jurídica, enquanto subprincípio do Estado de Direito. Possibilidade de revogação de atos
administrativos que não se pode estender indefinidamente. Poder anulatório sujeito a prazo razoável.
Necessidade de estabilidade das situações criadas administrativamente. 8. Distinção entre atuação administrativa
que independe da audiência do interessado e decisão que, unilateralmente, cancela decisão anterior. Incidência
da garantia do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal ao processo administrativo. 9. Princípio
da confiança como elemento do princípio da segurança jurídica. Presença de um componente de ética jurídica.
210
Corte decidiu que a pretensão à tutela jurídica justa (processo justo) envolveria não só o
direito de informação e de manifestação, mas também o direito de influência, isto é, o direito
de as partes verem seus argumentos contemplados pelo órgão julgador. O entendimento foi
446
reiterado no Mandado de Segurança nº 25.787 , conforme decisão do plenário do Supremo
Tribunal Federal publicada em 14 de setembro de 2007.
Aplicação nas relações jurídicas de direito público. 10. Mandado de Segurança deferido para determinar
observância do princípio do contraditório e da ampla defesa (CF art. 5º LV)”.
446
Ementa: “Mandado de Segurança. 2 Decisão do Presidente da República que, em processo administrativo,
indeferiu recurso hierárquico e, por consequência, manteve decisão que declarou a caducidade da concessão
outorgada à Transbrasil S.A Linhas Aéreas para a prestação de serviço de transporte aéreo. 3. Alegada violação
aos princípios da ampla defesa e do contraditório, assim como a dispositivos da Lei nº 9.784/99, pois a
impetrante não teria sido comunicada da instauração do processo administrativo ou de qualquer ato nele
praticado, não lhe tendo sido concedida oportunidade de proferir defesa de forma adequada. 4. Os documentos
juntados aos autos pela própria impetrante, porém, demonstram cabalmente que lhe foram asseguradas todas as
garantias da ampla defesa e do contraditório, como os direitos de informação sobre os atos produzidos no
processo, de manifestação sobre seu conteúdo e de ter seus argumentos devidamente considerados pela
autoridade administrativa. 5. Mandado de Segurança indeferido.”
447
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança nº 24.268. Relator ministro Gilmar Mendes.
17/9/2004.
211
3.8 A ausência de controle judicial da representatividade adequada das partes que serão
afetadas pelo IRDR e sua repercussão no contraditório substancial
448
GIDI, Antônio. A class action como instrumento de tutela coletiva dos direitos: as ações coletivas em uma
perspectiva comparada. São Paulo: RT, 2007, p. 99.
449
GIDI, Antônio. A class action como instrumento de tutela coletiva dos direitos: as ações coletivas em uma
perspectiva comparada. São Paulo: RT, 2007, p. 99.
450
GIDI, Antônio. A class action como instrumento de tutela coletiva dos direitos: as ações coletivas em uma
perspectiva comparada. São Paulo: RT, 2007, p. 101.
451
CAVALCANTI, Mauro de Araújo. Incidente de resolução de demandas repetitivas e ações coletivas.
212
O sistema processual brasileiro, por sua vez, não adota de maneira efetiva o
controle judicial da representação adequada.
454
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 599.
214
A sua peculiaridade, de acordo com a novel legislação, está no fato de que a tese
jurídica definida pelo tribunal local repercutirá em caráter pro et contra diretamente sobre os
vários processos em curso e os futuros, vale dizer, poderá prejudicar ou beneficiar as partes
envolvidas em cada demanda independentemente da participação ou não no incidente
coletivo. Daí a importância de se garantir o contraditório substancial, com a efetiva
participação das partes afetadas.
455
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 208.
215
Os litigantes habituais podem, como parte processual, optar sobre qual dos
processos suscitarão o incidente coletivo. Desta maneira, poderão provocar o incidente a
partir de um litígio melhor instruído, com argumentos mais precisos em seu favor, bem
escritos ou completos, no qual a parte contrária não tenha apresentado fortes argumentos
contrários ou que não disponha do mesmo aparato profissional para o acompanhamento
técnico da causa.456
456
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 205.
216
Para se evitar tal nefasta consequência, defende-se que o órgão julgador tem o
dever de realizar o controle da representação adequada, independentemente de lei que
autorize, valendo-se da cláusula constitucional do devido processo legal, como ensina
Antonio Gidi459.
Nesse sentido, Antonio do Passo Cabral propõe critérios para escolha da causa-
piloto ou processo modelo. O referido autor indica dois vetores básicos que se complementam
e devem ser analisados conjuntamente: a amplitude do contraditório e a pluralidade e
representatividade dos sujeitos do processo originário. 460
457
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Voto-vista vencido proferido pelo Ministro Herman Benjamin no
julgamento do REsp 911.802/RS, DJU. 24.10.2007.
458
. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Voto-vista vencido proferido pelo Ministro Herman Benjamin no
julgamento do REsp 911.802/RS, DJU. 24.10.2007.
459
GIDI, Antônio. Rumo a um código de processo civil coletivo: a codificação das ações coletivas no Brasil. Rio
de Janeiro: Forense, 2008, p. 81.
460
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 210.
217
461
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 210- 217.
462
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 210.
463
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 214.
464
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 211.
218
O segundo vetor elencado por Antonio do Passo Cabral possui aspecto subjetivo,
pois se relaciona aos sujeitos do processo e à sua representatividade. Em razão dos efeitos
vinculantes e erga omnes do IRDR, deve-se fomentar a participação no incidente e assegurar
o contraditório substancial.
Para que seja assegurado maior pluralismo do debate processual, deve ser
selecionado o processo modelo no qual preferencialmente se figuram vários autores, réus e
intervenientes. Ou seja, “se o pluralismo e o estímulo à participação são a tônica dos inciden-
tes de coletivização, ao buscar escolher uma causa-piloto em que esta participação tenha sido
tão mais plural já nas instâncias inferiores, reduz-se o problema do déficit de participação no
curso do próprio incidente” 466.
1. uma causa com litisconsórcio deve ser preferida a uma causa com apenas
um autor e um réu; 2. devem-se preferir litisconsórcios tanto no polo ativo
como passivo; 3. deve-se priorizar um processo originário no qual tiver
havido intervenção de terceiros; 4. entre os processos com intervenção de
terceiros, deve ser preferido sobretudo um processo em que tenha havido a
atuação de amicus curiae, que é um terceiro desinteressado e que intervém
465
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 158.
466
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 218.
219
467
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 219.
468
CABRAL, Antonio do Passo. A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos repetitivos.
Revista de Processo: RePro, v. 39, n. 231, mai. 2014, p. 220.
220
O sistema opt out consiste em permitir que cada indivíduo, membro da clas-
se, requeira em juízo sua exclusão da ação coletiva de modo a ser consi-
derado terceiro, não sujeito à coisa julgada. Todos os demais membros da
classe, que não tenham exercido a opção de excluir-se, são considerados
partes e sofrem os efeitos da coisa julgada, seja ela positiva ou negativa (...)
O sistema exige ampla divulgação da demanda, por todos os meios de
comunicação e – quando possível – até pessoal, para que os membros da
classe que não queiram ser abrangidos pela coisa julgada, favorável ou
desfavorável, possam exercer seu direito de opção, retirando-se do processo.
É raro nos países da civil law – seguido apenas por Holanda e Portugal.469
No sistema norte americano das ações coletivas de indenização (class actions for
damages), os membros da classe ou do grupo devem ser intimados ou notificados da
existência da demanda.
A finalidade principal desta intimação é permitir que o interessado opte por não
fazer parte do processo, o que caracteriza o modelo right to opt out (direito de autoexclusão).
Exercido o opt out o representando não será beneficiário se a sentença for procedente e
tampouco prejudicado se a pretensão for improcedente. Esta opção de sair da demanda
somente é admitida na hipótese de ações indenizatórias – class action for damages – que
podem ser comparadas com a ação coletiva no Brasil que versa sobre a tutela do direito
individual homogêneo ou massificado.470
Antonio Gidi471 ressalta que a intimação, em geral, acontece na fase inicial, logo
após a certificação da class action, e tem o objetivo de informar os membros ausentes a
respeito da propositura e da certificação da ação coletiva, oportunizando que compareçam em
juízo e intervenham na ação ou, se for o caso, requeiram a sua autoexclusão do grupo. Se os
indivíduos se mantiverem inertes, se submeterão aos efeitos do julgamento
independentemente do resultado.
469
GRINOVER, Ada Pellegrini. Os processos coletivos nos países da civil law. In: GRINOVER, Ada Pellegrini;
WATANABE, Kazuo; MULLENIX, Linda (Org). Os processos coletivos nos países da civil law e da common
law: uma análise de direito comparado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 242.
470
BARROSO, Luís Roberto. A proteção coletiva dos direitos no Brasil e alguns aspectos da class action Norte
Americana. De Jure: Revista Jurídica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, n.8,
jan./jun. 2007, p. 51.
471
GIDI, Antônio. A class action como instrumento de tutela coletiva dos direitos: as ações coletivas em uma
perspectiva comparada. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2007, p. 215.
221
Pelo modelo opt in, quem não manifestar expressamente o desejo de inclusão no
processo de caráter coletivo não será abrangido pelos efeitos da coisa julgada, não sendo
prejudicado ou beneficiado pelo julgamento. Para Ada Pellegrini Grinover, a escolha pelo
modelo opt in “pode, em muitos casos, esvaziar o processo coletivo, frustrando seus ideais –
sobretudo o de resolver, de uma vez por todas, litígios de massa, evitando multiplicação das
demandas, decisões contraditórias, fragmentação da prestação jurisdicional” 474.
Segundo Vânila Moraes, o sistema brasileiro afastou-se dos modelos opt out ou
opt in, escolhendo inicialmente um critério mais condizente com sua realidade so-
cioeconômica, levando em consideração as deficiências de informação e de politização da
sociedade, as dificuldades de comunicação e a própria ausência de controle judicial da
472
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 604-605.
473
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 607.
474
GRINOVER, Ada Pellegrini. Os processos coletivos nos países da civil law. In: GRINOVER, Ada Pellegrini;
WATANABE, Kazuo; MULLENIX, Linda (Orgs). Os processos coletivos nos países da civil law e da common
law: uma análise de direito comparado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 243.
222
475
MORAES, Vânila C. A. Demandas repetitivas decorrentes de ações e omissões da administração pública:
hipótese de soluções e a necessidade de um direito processual público fundamentado na Constituição. Séries
Monografias do CEJ. Brasília: CJF, 2012, p. 84.
476
FLEXA, Alexandre. MACEDO, Daniel. BASTOS, Fabrício. Novo Código de Processo Civil. Temas inéditos,
mudanças e supressões. Bahia: JusPODIVM, 2015, p. 635.
477
Hipótese semelhante foi prevista recentemente pela Lei 13.300, de 23 de junho de 2016, que disciplina o
processo e o julgamento dos mandados de injunção individual e coletivo. O parágrafo único do art. 13 dispõe
expressamente que “o mandado de injunção coletivo não induz litispendência em relação aos individuais, mas os
efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante que não requerer a desistência da demanda individual no
prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração coletiva”. Portanto, em relação ao
mandado de injunção, a lei exige a desistência (e não mera suspensão) da ação individual para que o impetrante
possa se beneficiar dos efeitos da ação coletiva. (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2016/Lei/L13300.htm. Acesso em junho de 2016)
223
possibilidade da coisa julgada pro et contra nas ações de caráter coletivo. A coisa julgada
relativa aos conflitos que envolvem direitos individuais homogêneos ou massificados opera
seus efeitos secundum eventus litis, ou seja, somente gera efeitos quando procedente a
pretensão, evitando prejuízos aos litigantes substituídos que não participaram de forma direta
do processo justamente por não haver a previsão do modelo de autoexclusão e do controle
judicial da representação adequada.
Com efeito, o Brasil consagrou no novo Código de Processo Civil o seu próprio
modelo de solução das demandas repetitivas, imputando a todos os jurisdicionados com
demandas individuais homogêneas os efeitos da decisão paradigma, seja ela favorável ou não
(pro et contra), inclusive para os casos futuros.
fundamental de ação, de sorte que o legislador não poder criar uma forma de
vinculação absoluta pro et contra sem estabelecer mecanismos processuais
que assegurem seu pleno exercício. 478
Desse modo, para que não exista violação ao direito fundamental de ação, é
preciso que seja assegurado aos litigantes dos processos representativos um
dos sistemas acima referidos: opt-in ou opt-out. Isto é, o NCPC, de uma
forma ou de outra, deve assegurar às partes o direito de optarem pela não
participação no julgamento do IRDR. Como o NCPC é omisso quanto ao
ponto, impõe-se a aplicação subsidiária do microssistema processual coletivo
para suprir a lacuna. Feitas as adaptações necessárias, o art. 104 do CDC
merece ser aplicado ao regime jurídico do IRDR. Assim, interpretando-se tal
dispositivo a partir do direito fundamental de ação, deve ser extraída a regra
no sentido de que o litigante tem o prazo de trinta dias para requerer sua
exclusão do julgamento do IRDR, a contar da ciência formal da
admissibilidade do IRDR nos autos do processo repetitivo. 479
Sofia Temer defende, por sua vez, a inadequação da aplicação dos modelos opt-in
e opt-out ao IRDR em razão do caráter objetivo do incidente. Nas suas palavras:
478
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 606-607.
479
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. O incidente de resolução de demandas repetitivas e as ações coletivas.
Salvador: JusPodiym, 2015, p. 608.
480
ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de demandas
repetitivas. Revista de Processo. Ano 37, vol. 208, jun 2012, p. 232.
225
Assim, com ou sem a aplicação do art. 104 do CDC, esse novo modelo processual
pode, em prol da celeridade processual a qualquer custo, culminar na perniciosa padronização
das decisões judiciais, restringindo a participação efetiva dos sujeitos interessados na
interpretação do direito e, em última análise, restringindo o próprio acesso à justiça – garantia
inerente ao modelo constitucional de processo.
481
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 235-236. A
referida autora entende, portanto, que a previsão de vinculação dos órgãos jurisdicionais à tese jurídica definida
pelo IRDR seria uma exigência constitucional que se funda no direito à isonomia, à segurança jurídica e à
coerência e unidade do direito. A parte não teria o direito de autoexclusão para obter decisão que desrespeite essa
uniformização, como não teria o direito a se autoexcluir de decisões em controle de constitucionalidade e de
súmulas vinculantes.
226
CAPÍTULO 04
4.1 O movimento de aproximação dos sistemas civil law e common law: a valorização da
jurisprudência no Brasil como fonte normativa do Direito
482
DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. Lisboa: Meridiano, 1978 p.22.
483
“(...) o termo Civil Law refere-se ao sistema legal adotado pelos países da Europa Continental (com exceção
dos países escandinavos) e por, praticamente, todos os outros países que sofreram um processo de colonização,
ou alguma outra grande influência deles – como os países da América Latina. O que todos esses países têm em
comum é a influência do Direito Romano, na elaboração de seus códigos, constituições e leis esparsas. É claro
que cada qual recebeu grande influência também do direito local, mas é sabido que, em grande parte desses
países, principalmente os que são ex-colônias, o direito local cedeu passagem, quase que integralmente, aos
princípios do Direito Romano. E, por isso, a expressão Civil Law, usada nos países de língua inglesa, refere-se ao
sistema legal que tem origem ou raízes no Direito da Roma antiga e que, desde então, tem-se desenvolvido e se
formado nas universidades e sistemas judiciários da Europa Continental, desde os tempos medievais; portanto,
também denominado sistema Romano-Germânico.” (VIEIRA, Andréia Costa. Civil Law e Common Law: os dois
grandes sistemas legais comparados. Porto Alegre: S. A. Fabris, 2007, p. 270.)
484
O sistema do common law, por sua vez, possui balizamento firme nas decisões judiciais. Consiste,
basicamente, em princípios, usos e regras de ação, aplicáveis ao Estado e à sociedade, cuja autoridade não é
positivada em um ato normativo do Poder Legislativo, mas substancialmente criada pelos costumes e pelas
decisões judiciais. Assim, o decidido (ratione decidendi) torna-se precedente, holding, paradigma, leading case,
binding case, ou seja, a jurisprudência passa a constituir fonte do direito. A isso chamamos de sistema do stare
decisis (stare decisis, et non quita movere – aderir ao que está decidido e não alterar as coisas que estão estabe-
lecidas). (ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de
demandas repetitivas. Revista de Processo. Ano 37, vol. 208, jun 2012, p. 206-207)
485
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 55-56.
227
interpretar e integrar a lei, já que, na base deste sistema, está o reconhecimento de que é
impossível ao legislador regular todas as possíveis situações humanas.
Por sua vez, a principal fonte das normas jurídicas, no âmbito do civil law, sempre
foi tradicionalmente a lei, como estrutura abstrata e fechada, voltada à regulação de todas as
relações humanas, funcionando o “precedente judicial” dos tribunais apenas como uma
espécie de reforço argumentativo e persuasivo acerca da melhor interpretação da disposição
legal ou constitucional.
486
SOUZA, Marcelo Alves Dias de. Do precedente judicial à súmula vinculante. Curitiba: Juruá, 2007, p. 310-
312.
487
BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: a justificação e a aplicação das regras
jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, pp. 106 e ss.
488
BARREIROS, Lorena Miranda Santos. Estruturação de um sistema de precedentes no Brasil e concretização
da igualdade: desafios no contexto de uma sociedade multicultural. In: DIDIER JR., Freddie; CUNHA,
Leonardo Carneiro da; ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de; MACÊDO, Lucas Buril de. (coords.) Precedentes.
Coleção Grandes Temas do NCPC. V. 3. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 187.
228
O sistema common law e o civil law representam, dentro desse novo contexto,
aspectos de uma mesma e grande tradição jurídica ocidental.489
José Carlos Barbosa Moreira já alertava há mais de uma década que é “indubitável
que o peso do universo anglo-saxônico tem aumentado no direito brasileiro, talvez mais
noutros campos, agora diretamente alcançados pelas vagas da globalização econômica, mas
também no terreno do processo civil” 491.
Sofia Temer aponta, por sua vez, alguns motivos importantes que culminaram na
maior valorização das decisões judiciais no sistema brasileiro, entre os quais se destacam:
489
MARINONI, Luiz Guilherme. Apresentação. In: MARINONI, Luiz Guilherme (coord.). A força dos
precedentes: estudos dos cursos de mestrado e doutorado em direito processual da UFPR. Salvador: JusPodivm,
2010, p. 07.
490
Em sua clássica obra, René David explica que “as colônias espanholas, portuguesas, francesas e holandesas
da América aceitaram de modo natural as concepções jurídicas típicas da família romano-germânica”. (in
DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. Lisboa: Meridiano, 1978 p. 77)
491
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O processo civil brasileiro entre dois mundos. In: BARBOSA
MOREIRA, José Carlos. Temas de Direito Processual. Oitava série. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 41-42.
492
PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre common law, civil law e o precedente judicial. Estudo em homenagem ao
Professor Egas Moniz de Aragão. 2007, p. 06. Disponível em: www.abdpc.org.br. Acesso em: 22 abr. 2016.
229
Como preencher esses conceitos? Como dar a eles força normativa, para
estabelecer regras de conduta e consequências jurídicas na solução concreta dos conflitos? A
partir do momento em que a lei não o faz, a tarefa passa ao juiz e aos tribunais que, apoiados
na doutrina, assumem um papel de interpretação e “criação”494 do direito.
493
TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 199.
494
Conforme esclarecimento realizado por Lucas Buril de Macêdo, citando Pontes de Miranda, com “criação”
pretende-se significar que se chega institucionalmente a uma determinada norma jurídica que pode ser
racionalmente atribuída aos elementos normativos fornecidos anteriormente, mas ainda assim até então
inexistente de forma expressa. É também claro que a constituição, modificação e extinção do Direito realizada
pelo juiz possuem limites, que são impostos pelo próprio ordenamento jurídico e que a criação judicial do
Direito não significa uma inovação completa, a partir do nada. O Direito é construído e reconstruído sempre em
determinado contexto histórico-social, do qual o intérprete não pode se alienar: a norma é gota de tinta em um
copo, e sua cor é assumida em conformidade ao todo. Em interessante passagem do Sistema, Pontes de Miranda,
tendo isso em mente, acaba por dizer que não há atos criativos do Direito: o direito é processo social de
adaptação e é forjado pela e na própria sociedade, ao legislador e ao juiz cabe reconhecê-lo. (...) Para Pontes, o
jurista não cria o Direito assim como o arquiteto nada cria, simplesmente reordena e combina os elementos
encontrados na natureza para lhes dar o aspecto novo: constrói. Não há aí criação, pois toda substância era
anterior ao ato, novidade só há na forma como se organizou e na função que se deu. O tema é extremamente
complexo e sua tratativa de forma adequada requereria uma pesquisa à parte (...) Pode-se dizer que se utiliza,
nesta tese, um sentido fraco ou superficial de “criação”, enquanto Pontes utiliza o termo em sentido forte ou
profundo. (MACÊDO, Lucas Buril de. A disciplina dos precedentes no direito brasileiro: do anteprojeto ao
Código de Processo Civil. In: DIDIER JR., Freddie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ATAÍDE JR., Jaldemiro
Rodrigues de; MACÊDO, Lucas Buril de. (coords.) Precedentes. Coleção Grandes Temas do NCPC. V. 3.
Salvador: JusPodivm, 2015, nota 23, p. 464.)
230
firmando os limites de sua interpretação e de seus efeitos práticos diante de cada caso. 495
495
THEODORO JR., Humberto; OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 673.
496
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Precedentes vinculantes no direito comparado e no direito brasileiro.
Salvador: JusPodivm, 2013, p. 51.
497
THEODORO JR., Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Breves considerações da politização do
Judiciário e do panorama de aplicação no direito brasileiro – Análise da convergência entre o civil law e o
common law e dos problemas da padronização decisória. Revista de processo, São Paulo: RT, v. 189, nov. 2010,
p. 03.
498
TUCCI, Jogé Rogério Cruz e. Precedente Judicial como fonte do Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004, p. 281.
499
SILVA, Celso de Albuquerque. Do efeito vinculante: sua legitimação e aplicação. Rio de Janeiro: Lúmen
Juris, 2005, p. 141.
231
jurisprudência dominante”500.
500
TUCCI, Jogé Rogério Cruz e. Precedente Judicial como fonte do Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004, p. 281.
232
Com efeito, o juiz de primeiro grau da jurisdição é, em regra, aquele que realiza o
primeiro contato direto com as particularidades do conflito vivenciado pelas partes,
participando efetivamente do debate processual. A verticalização e a vinculação pura e
simples aos julgamentos dos tribunais, especialmente dos de segundo grau como ocorre no
caso do IRDR, podem acarretar precipitação, reduzindo o espaço cognitivo do processo,
espaço essencial ao debate público dos fundamentos aduzidos pelas partes.
501
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. São Paulo. Revistas dos Tribunais, 2010, p.216.
233
Ao lado da ratio decidendi, o precedente judicial também pode ser composto por
considerações periféricas, no entanto, desprovidas de força vinculante para julgamentos
posteriores. Denominam-se obter dictum os argumentos jurídicos expostos apenas de
passagem na fundamentação do julgado, caracterizando, na essência, “juízos normativos
acessórios, provisórios, secundários, impressões ou qualquer outro elemento jurídico-
hermenêutico que não tenha influência relevante e substancial para a decisão” 505.
502
STRECK, Lênio Luiz; ABBOUD, Georges. O que é isto – o precedente judicial e as súmulas vinculantes?
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 63.
503
DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael; BRAGA, Paula. Curso de direito processual civil. v. II. Salvador:
Juspodivm, 2013, p. 385.
504
DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael; BRAGA, Paula. Curso de direito processual civil. v. II. Salvador:
Juspodivm, 2013, p. 428.
505
DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael; BRAGA, Paula. Curso de direito processual civil. v. II. Salvador:
Juspodivm, 2013, p. 430.
506
SOUZA, Marcelo Alves Dias de. Do precedente judicial à súmula vinculante. Curitiba: Juruá, 2007, p. 139.
234
vinculante em caso análogo, o obter dictum pode perfeitamente ser referido como argumento
de persuasão507.
Pode-se perceber, assim, que nem toda decisão proferida pelo Poder Judiciário
deve adquirir o status de precedente judicial, mas, por outro lado, todo precedente judicial
deve possuir algumas características essenciais, como a relevância de seu conteúdo jurídico,
que delineia de forma cristalina determinada tese jurídica, e a antecedência, para que possa ser
apto a irradiar seus efeitos para outros casos subsequentes. Além disso, nem todo o conteúdo
do precedente judicial adquire força normativa vinculante, mas somente a parte do juízo
decisório que fundamenta a construção de determinada tese jurídica.
O precedente possui força vinculante no common law, pois, como fonte inovadora
do Direito, deve dar consistência ao sistema, assegurando a coerência e segurança jurídica. E
507
TUCCI, José Rogério Cruz e. O regime do precedente judicial no novo CPC. In: DIDIER JR., Fredie;
CUNHA, Leonardo Carneiro da; MACÊDO, Lucas Buril de; ATAIDE JR., Jaldemiro R. de (coords).
Precedentes. Salvador: JusPodivm, p. 445/458, 2015, p. 177.
508
NUNES, Dierle. Processualismo constitucional democrático e o dimensionamento de técnicas para a
litigiosidade repetitiva. A litigância de interesse público e as tendências “não compreendidas” de padronização
decisão. Revista de Processo, São Paulo: RT, v. 199, set. 2011, p. 38.
509
NUNES, Dierle. Processualismo constitucional democrático e o dimensionamento de técnicas para a
litigiosidade repetitiva. A litigância de interesse público e as tendências “não compreendidas” de padronização
decisão. Revista de Processo, São Paulo: RT, v. 199, set. 2011, p. 438.
235
quem diz que o precedente vincula não é a lei, mas outro precedente. Isso porque aquele
sistema não se baseia na lei, mas é formado por decisões judiciais proferidas nos casos
concretos, a partir das quais se extrai a norma de direito genérica que vai se reproduzindo nos
casos subsequentes. 510
510
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Precedentes vinculantes no direito comparado e no direito brasileiro.
Salvador: JusPodivm, 2013, p. 129-130.
511
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência jurisprudencial e súmula vinculante. São Paulo: RT, 2010, p.
47.
512
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da Reforma. São Paulo: RT, 2003, p. 186-187.
236
513
TARUFFO, Michele. Precedentes e Jurisprudência. Revista de Processo. São Paulo: RT, n. 199, 2011, p. 142.
514
NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada. São Paulo: RT, 2009.
p. 529.
237
imposição da própria codificação, que introduziu, por lei ordinária, a autoridade vinculante de
alguns julgamentos dos tribunais, inclusive de cortes regionais e locais da segunda instância,
para reduzir o grau de imprevisibilidade jurídica no Sistema de Justiça no Brasil.
Nesse sentido, o art. 926 do CPC/2015 dispõe que a jurisprudência dos tribunais
deve se manter íntegra, coerente e estável, com intuito de que os tribunais respeitem seus
próprios precedentes, evitando a oscilação da interpretação jurídica. Uma das formas de se
alcançar esse intento, segundo o §1º do referido dispositivo legal, é que os tribunais devem
editar súmulas que correspondam à sua jurisprudência dominante.
515
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Precedentes vinculantes no direito comparado e no direito brasileiro.
Salvador: JusPodivm, 2013, p. 23.
516
STRECK, Lênio Luiz; ABBOUD, Georges. O que é isto – o precedente judicial e as súmulas vinculantes?
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 100.
517
Em razão da importância do referido dispositivo legal para o sistema de precedentes adotado pelo NCPC,
oportuno destacar alguns enunciados interpretativos do Fórum Permanente dos Processualistas Civis: Enunciado
170 - “As decisões e precedentes previstos nos incisos do caput do art. 927 são vinculantes aos órgãos do
jurisdicionais a eles submetidos”; Enunciado n. 173 – “Cada fundamento determinante adotado na decisão capaz
de resolver de forma suficiente a questão jurídica induz os efeitos de precedente vinculante, nos termos do
Código de Processo Civil”; Enunciado n. 318 – “Os fundamentos prescindíveis para o alcance do resultado
fixado no dispositivo da decisão (obter dicta), ainda que nela presentes, não possuem efeito de precedente
vinculante”; Enunciado n. 460 – “O microssistema de aplicação e formação dos precedentes deverá respeitar as
técnicas de ampliação do contraditório para amadurecimento da tese, como a realização de audiências públicas
previas e participação de amicus curiae”. (NUNES, Dierle; SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo
Civil. Lei nº. 13.105/2015. Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado, com os
enunciados interpretativos do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição
Federal e da Legislação. Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 363-365)
238
As súmulas, aliás, por sua característica de síntese e abstração, não tem condições
de expressar com precisão as circunstâncias de fato pertinentes aos casos julgados em que se
definiu a interpretação jurídica sintetizada nos enunciados, por isso “é ilógico dar-lhes a
função de precedentes, na medida em que só a decisão do caso concreto é capaz de espelhar
em toda a sua plenitude o contexto fático em que a ratio decidendi se insere” 518.
518
MARINONI, Luiz Guilherme. Julgamento nas Cortes Supremas: precedente e decisão do recurso diante do
novo CPC. São Paulo: RT, 2015, p. 23.
519
MARINONI, Luiz Guilherme. Julgamento nas Cortes Supremas: precedente e decisão do recurso diante do
239
Naquele sistema, é muito difícil surgir um precedente (um padrão decisório a ser
seguido) a partir de um único julgamento, o que, a toda evidência, será o caso do Brasil.
Conforme destacam Dierle Nunes e Humberto Theodoro Jr. em relação ao common law, “nem
todas as decisões se tornam precedentes, mesmo quando proferidas pela Suprema Corte (isso
pode ocorrer porque a decisão dividiu o Tribunal ou porque este, de toda sorte, se expressa no
sentido de que a decisão não cria precedente)” 522.
O precedente fornece uma regra (universalizável, como já foi dito) que pode
ser aplicada como critério de decisão no caso sucessivo em função da
identidade ou – como acontece em regra – da analogia entre os fatos do
primeiro caso e os fatos do segundo caso. Naturalmente, a analogia das duas
fattispecie concretas não é determinada in re ipsa, mas é afirmada ou
excluída pelo juiz do caso sucessivo conforme este considere prevalecentes
os elementos de identidade ou os elementos de diferença entre os fatos dos
dois casos. É, portanto, o juiz do caso sucessivo que estabelece se existe ou
não existe o precedente e desta forma – por assim dizer – “cria” o
precedente. 524
522
THEODORO JR, Humberto; NUNES, Dierle José Coelho; BAHIA, Alexandre Melo Franco Bahia;
PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC. Fundamentos e sistematização. Lei 13.105, de 16.03.2015. Rio de
Janeiro: Forense, 2015, p. 358.
523
RE, Edward D. Stare Decisis. Trad. Elle Gracie Northfleet. Revista Forense, v. 327, 1990, p. 38.
524
TARUFFO, Michele. Precedentes e Jurisprudência. Revista de Processo. São Paulo: RT, n. 199, 2011, p. 142-
143.
241
do caso já decidido, porque somente com essa condição é que se pode aplicar a regra pela
qual a mesma ratio decidendi deve ser aplicada a casos idênticos ou ao menos similares. 525
525
TARUFFO, Michele. Processo civil comparado. Ensaios. Trad. Daniel Mitidiero. São Paulo: Marcial Pons,
2013, p. 131.
526
SCHMITZ, Leonard Ziesemer. Compreendendo os “precedentes” no Brasil: fundamentação de decisões com
base em outras decisões. Revista de Processo. São Paulo: RT, v. 38, n. 220, jun. 2013, p. 361.
527
NERY JR., Nelson; ABBOUD, Georges. Stare decisis vs direito jurisprudencial. In: FREIRE, Alexandre et
al.(orgs.) Novas tendências do processo civil. Vol. I. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 497-498.
242
Nessa toada, Georges Abboud cita a fala do ministro Napoleão Nunes Maia em
debate no Superior Tribunal de Justiça sobre o impacto dos julgamentos dos recursos
repetitivos:
528
FRANCO, Marcelo Veiga. Processo justo: entre efetividade e legitimidade da jurisdição. Belo Horizonte: Del
Rey, 2016, p. 119.
529
STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do
Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 107.
530
THEODORO JR., Humberto; NUNES, Dierle José Coelho; BAHIA, Alexandre Melo Franco Bahia;
PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC. Fundamentos e sistematização. Lei 13.105, de 16.03.2015. Rio de
Janeiro: Forense, 2015, p. 327.
243
Não se pode negar, pois, que o modelo de “precedentes obrigatórios” adotado pelo
CPC/2015 representa uma mudança de paradigma não só para a interpretação do direito
processual do país, mas na cultura jurídica brasileira, acarretando sérias consequências para a
prática judiciária. Talvez por isso tal modelo deveria ter sido implementado mediante uma
profunda reforma constitucional condizente com a ruptura do paradigma anterior, já que a
novel legislação atribuiu aos tribunais, inclusive àqueles de segundo grau, o poder de definir
teses jurídicas dotadas de caráter normativo geral e abstrato.
Nesse sentido, a crítica de José Rogério Cruz e Tucci ao art. 927 do CPC/2015:
Salta aos olhos o lamentável equívoco constante desse dispositivo, uma vez
que impõe aos magistrados, de forma cogente – “os tribunais observarão” –,
os mencionados precedentes, como se todos aqueles arrolados tivessem a
mesma força vinculante vertical. Daí, em princípio, a inconstitucionalidade
da regra, visto que a Constituição Federal, como acima referido, reserva
efeito vinculante apenas e tão somente às súmulas fixadas pelo Supremo,
mediante devido processo e, ainda, aos julgados originados de controle
direto de constitucionalidade. À míngua de uma dogmática própria, o
legislador pátrio perdeu uma excelente oportunidade para regulamentar um
regime adequado da jurisprudência de nossos tribunais, entre as várias
espécies de precedente judicial, a partir de sua natureza, considerando a sua
respectiva origem. 532
531
ABBOUD, Georges. Discricionariedade administrativa e Judicial: o ato administrativo e a decisão judicial.
São Paulo: RT, 2014, p. 402-403.
532
TUCCI, José Rogério Cruz e. O regime do precedente judicial no novo CPC. In: DIDIER JR., Fredie;
CUNHA, Leonardo Carneiro da; MACÊDO, Lucas Buril de; ATAIDE JR., Jaldemiro R. de (coords).
Precedentes. Salvador: JusPodivm, p. 445/458, 2015, p. 454.
533
NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 1837.
534
CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015, p. 425-442.
244
535
Para Sofia Temer, “o termo “tese” deve ser compreendido de uma forma ampla, compreendendo tanto os
fundamentos e argumentos sopesados como a própria conclusão sobre a questão de direito (seja em relação a sua
interpretação, à sua constitucionalidade, à sua incidência em relação à determinada categoria fática). Por isso,
talvez seja possível afirmar que, em relação à decisão do IRDR, há um regime de estabilidade e de eficácia
vinculativa do conjunto fundamentos apreciados à luz de uma determinada categoria fática + conclusão. Para
nós, essa é a tese jurídica.” (TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Salvador:
Juspodivm, 2016, p. 212).
536
ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de demandas
repetitivas. Revista de Processo. Ano 37, vol. 208, jun 2012, p. 204.
537
NUNES, Dierle. Processualismo constitucional democrático e o dimensionamento de técnicas para a
litigiosidade repetitiva. A litigância de interesse público e as tendências “não compreendidas” de padronização
decisão. Revista de Processo, São Paulo: RT, v. 189, set. 2011, p. 38.
245
Desse modo, tal como concebido, o incidente coletivo não proporciona ou exige o
esgotamento prévio da temática antes da utilização do seu julgamento como padrão decisório,
especialmente pelo fato de que é da competência dos tribunais locais, cortes de apelação e não
verdadeiras Cortes de Precedentes, conforme se verá a seguir.
A propósito desse ponto, merece destaque a crítica apresentada por Júlio Rossi:
Parece que o Código projetado, ao criar o IRDR, fincou esforços para re-
solver apenas questões antecipadas de forma, ao invés de estabelecer os con-
tornos necessários a uma adequada decisão judicial e uma maneira efetiva de
controlá-la em nível recursal. Preferiu-se impor apenas a força da autoridade
538
NUNES, Dierle. Processualismo constitucional democrático e o dimensionamento de técnicas para a
litigiosidade repetitiva. A litigância de interesse público e as tendências “não compreendidas” de padronização
decisão. Revista de Processo, São Paulo: RT, v. 189, set. 2011, p. 38.
539
ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues. Precedentes vinculantes e irretroatividade do direito no sistema
processual brasileiro: Os Precedentes dos Tribunais Superiores e sua Eficácia Temporal. Curitiba: Juruá, 2012,
p.130.
246
540
ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de demandas
repetitivas. Revista de Processo. Ano 37, vol. 208, jun 2012, p. 234-235.
541
SANTOS, Evaristo Aragão. Em torno do conceito e da formação do precedente judicial. In WAMBIER,
Teresa Arruda Alvim (coord.). Direito jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p.176.
247
Nas palavras de Taruffo, “uma função desse gênero se manifesta com particular
evidência quando o acesso às cortes supremas é subordinado a uma seleção e a atividade
dessas cortes é orientada principalmente à produção e ao controle dos precedentes
jurisprudenciais” 546. (tradução livre)
544
La “tutela” della legalità allude alla funzione reattiva che molte corti svolgono, e che si esplica quando una
violazione del diritto si è già verificata e l’intervento della corte è finalizzato ad eliminarla e – quando è
possibile – a neutralizzarne o eliminarne gli effetti. La “promozione” della legalità allude alla funzione che (con
un anglismo forse tollerabile) si potrebbe definire come proattiva: essa si esplica quando le decisioni delle corti
supreme sono finalizzate (anche o soprattutto, o soltanto) ad ottenere effetti futuri, sia nel senso di prevenire
violazioni della legalità, sia nel senso di favorire l’evoluzione e la trasformazione del diritto. (TARUFFO,
Michele. Le Funzioni delle Corti supreme: cenni generali. Revista Magister de direito civil e processual
civil, v. 8, n. 46, jan./fev. 2012, p. 96)
545
Controllo di legittimità della decisione nel singolo caso significa – come è chiaro ad esempio proprio nel
caso della Cassazione italiana, della Cour de Cassation francese e del Tribunal Supremo spagnolo – che la
funzione della corte consiste essenzialmente nel verificare se la legge, sostanziale e processuale, è stata
correttamente applicata dai giudici di merito. Assume particolare rilievo la dimensione reattiva di questa
funzione (...) (TARUFFO, Michele. Precedentes e Jurisprudência. Revista de Processo. São Paulo: RT, n. 199,
2011, p. 98)
546
Una funzione di questo genere si manifesta invero con particolare evidenza quando l’accesso alle corti
supreme è subordinato ad una selezione25, e l’attività di queste corti è orientata principalmente alla produzione
e al governo dei precedenti giurisprudenziali. (TARUFFO, Michele. Precedentes e Jurisprudência. Revista de
Processo. São Paulo: RT, n. 199, 2011, p. 101)
249
547
MARINONI, Luiz Guilherme. A ética dos precedentes: justificativa do novo CPC. São Paulo: RT, 2014, p.
65.
548
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. v. 1. São Paulo: Malheiros, 2001, p.
368.
250
decisões proferidas pelos órgãos inferiores das instâncias ordinárias. As decisões do Superior
Tribunal de Justiça se sobrepõem àquelas da Justiça Federal comum, da Estadual e do Distrito
Federal, ao passo que as decisões do Supremo Tribunal Federal se sobrepõem a todas as
Justiças e Tribunais do Poder Judiciário do Brasil. 549
Apesar de não ser uma Corte constitucional nos moldes, por exemplo, do sistema
adotado na Alemanha, no qual o Tribunal Constitucional foi criado especificamente para o
controle da constitucionalidade551, o Supremo Tribunal Federal possui relevante papel na
efetividade da jurisdição constitucional, seja no controle difuso, através do recurso
extraordinário, seja no controle concentrado, mediante o julgamento das ações diretas de
inconstitucionalidade por ação e omissão, da ação declaratória de constitucionalidade e de
549
LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. São Paulo: Método, 2005, p. 346.
550
MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 990.
551
O modelo da Europa continental, seguindo a tradição de Kelsen, caracteriza-se por concentrar em um só
órgão especial, o chamado tribunal constitucional, colocado fora e acima do Judiciário, a função de velar pela
constitucionalidade das leis e subsequente respeito do texto constitucional. A fisionomia técnico-jurídica do
sistema europeu-continental caracteriza-se pelo fato de que, nos casos de inconstitucionalidades suscitada pelos
órgãos judiciários, a decisão do tribunal constitucional é remetida ao órgão do judiciário que suscitou a questão
de inconstitucionalidade para ser aplicada ao caso concreto. Cabe assinalar, porém, que o procedimento ante o
tribunal constitucional não se esgota com a questão incidental suscitada pelos órgãos judiciários. Há também a
impugnação direta da norma supostamente inconstitucional, a ser exercitada por certos sujeitos especialmente
legitimados a tal fim. Finalmente, outro traço saliente do sistema europeu-continental está no fato de que a
declaração de inconstitucionalidade do tribunal constitucional produz sempre efeito erga omnes, seja na
suscitação incidental, seja na ação direta, já que, segundo a concepção kelseniana, o tribunal constitucional é um
legislador negativo. (ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros,
1995, p.87-88)
251
552
ASSIS, Guilherme Bacelar Patrício de. Precedentes vinculantes em recursos extraordinários e especial
repetitivos. 2016, 296f. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Programa de Pós-
graduação em Direito. Belo Horizonte, 2016, p. 148.
553
THEODORO JR., Humberto. Repercussão geral no recurso extraordinário (Lei nº.11.418) e súmula
vinculante do Supremo Tribunal Federal (Lei nº 11.417). Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil,
Porto Alegre, n.18, maio/jun. 2007, p.6.
252
A definição do STF como Corte Suprema, vale dizer, como Corte de Precedentes,
tem, portanto, amparo na Carta de 1988555, o que se mostra essencial para se dar racionalidade
e coerência interna ao Sistema de Justiça, especialmente quando se admite o controle difuso
de constitucionalidade.
554
ARRUDA, Alvim. A EC n. 45 e o instituto da repercussão geral. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. et. al.
(Coord.). Reforma do Judiciário: primeiras reflexões sobre a Emenda Constitucional n. 45/2004. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 84.
555
O Supremo Tribunal, sob pena de se comprometerem as elevadas funções que a Constituição lhe conferiu,
não pode ter seus julgados desobedecidos (por meios diretos ou oblíquos), ou vulnerada sua competência. Trata-
se (...) de medida de Direito Processual Constitucional, porquanto tem como causa finalis assegurar os poderes e
prerrogativas que ao Supremo Tribunal foram dados pela Constituição da República. (BRASIL, Supremo
Tribunal Federal, Reclamação n. 1723-CE, Relator Ministro Celso de Mello, DJ de 06/04/2001)
556
MARINONI, Luiz Guilherme. A ética dos precedentes: justificativa do novo CPC. São Paulo: RT, 2014, p.
55.
253
557
MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes: recompreensão do sistema processual
da corte suprema São Paulo: RT, 2013, p. 159.
558
ASSIS, Guilherme Bacelar Patrício de. Precedentes vinculantes em recursos extraordinários e especial
repetitivos. 2016, 296f. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Programa de Pós-
graduação em Direito. Belo Horizonte, 2016, p. 150.
559
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2005, p. 512.
254
A previsão do art. 927 do CPC/2015 que confere, por lei ordinária, o status de
precedente aos julgamentos do recurso extraordinário e especial repetitivos, além dos
julgamentos do controle de constitucionalidade concentrado, tem, sob a perspectiva do
conceito de “Corte Suprema”, respaldo na interpretação da competência constitucional do
Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
Nesse sentido, importante destacar o voto proferido pelo Ministro Teori Zavascki,
do Supremo Tribunal Federal, citando Calamandrei:
560
ALVIM, Arruda. A alta função jurisdicional do Superior Tribunal de Justiça no âmbito do recurso especial e a
relevância das questões. In: STJ 10 anos: obra comemorativa 1989-1999. Brasília: Superior Tribunal de Justiça,
1999, p. 38.
561
MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes: recompreensão do sistema processual
da corte suprema. São Paulo: RT, 2013, p. 80.
255
(...) as decisões dos juízes de civil law, no mínimo quando abordam matéria
constitucional ou se valem de cláusula geral, relacionam-se com a
previsibilidade nos mesmos moldes das decisões de common law, o que
significa que a nossa realidade, que convive com a correção da legislação a
partir dos direitos fundamentais por qualquer juiz ou tribunal ordinário e
com o emprego cada vez mais difundido de cláusulas abertas, não pode adiar
a teorização de um sistema de precedentes obrigatórios capaz de dar a devida
autoridade às decisões das Cortes Supremas – isto é, do STJ e do STF. 563
562
Trecho do voto proferido pelo Ministro Teori Zavascki que demonstra a evolução da legislação processual no
Brasil e a tendência de valorização e de expansão da força dos precedentes das Cortes Superiores, especialmente
do STF (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Reclamação n. 4335/AC, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJ.
22/10/2014).
563
MARINONI, Luiz Guilherme. A ética dos precedentes: justificativa do novo CPC. São Paulo: RT, 2014, p.
62-63.
564
O jurista Hermes Zaneti Jr. manifesta posição contrária. Segundo Zaneti Jr., de fato, “não se pode falar de
ordenamento jurídico e de precedentes normativos formalmente vinculantes sem identificar nas Cortes Supremas
as principais personagens da construção deste modelo. Como vimos acima um modelo de precedentes é um
modelo de e para as Cortes Supremas. Contudo, não se pode esquecer da premissa fixada pela teoria do direito
segundo a qual o direito regula inclusive as suas fontes, a sua criação. Como o direito é artificialmente
construído nos parece impossível limitar os precedentes apenas às Cortes Supremas, especialmente no
ordenamento jurídico brasileiro, formalizado pelo art. 927 e incisos. Neste caso serão precedentes mesmo as
decisões que não forem de Cortes Supremas, desde que, por evidente, limitem-se à sua esfera de influência
formal e, portanto, respeitem as decisões das instâncias formalmente superiores”. (O valor vinculante dos
precedentes: teoria dos precedentes normativos formalmente vinculantes. Salvador: JusPODIVM, 2016, p. 372)
256
Na esfera estadual, existem 27 (vinte e sete) Tribunais de Justiça (um por unidade
565
federativa) e, na esfera federal, 5 (cinco) Tribunais Regionais Federais . A enorme
quantidade de tribunais locais já é suficiente para demonstrar que tais cortes locais não detém
o papel constitucional de uniformização do direito.
565
A Emenda Constitucional 73/2013, promulgada em junho de 2013, determinou a criação de mais quatro
tribunais regionais federais (TRFs), com sedes em Curitiba, Belo Horizonte, Salvador e Manaus. Logo depois de
ser promulgada, todavia, a emenda foi alvo de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5.017) ajuizada
pela Associação Nacional dos Procuradores Federais (Anpaf) e o então presidente do Supremo Tribunal Federal
(STF), Joaquim Barbosa, concedeu uma liminar para suspender seus efeitos. Atualmente a ação, relatada pelo
ministro Luiz Fux, aguarda decisão de mérito do Plenário do STF. O Procurador Geral da República apresentou
parecer pela improcedência da ADI, defendendo a constitucionalidade da emenda constitucional.
257
Nessa toada, a divergência jurisprudencial não pode ser vista como um mal para o
sistema. Ela se justifica principalmente pela extensão territorial do Brasil, na qual convivem
as mais variadas culturas dentro de díspares sistemas econômicos, e pelos pródigos
legisladores que, neste país de dimensões continentais, editam muitas leis que nem sempre
guardam concorrência entre si, fazendo com que os vários centros de dicção do direito tendam
mesmo à divergência interpretativa.
É importante deixar claro que não se está negando aos juízes e tribunais de
segundo grau a função jurisdicional de interpretação do direito. Pelo contrário, todos os
órgãos do Poder Judiciário devem desempenhar tal papel.
566
ASSIS, Guilherme Bacelar Patrício de. Precedentes vinculantes em recursos extraordinários e especial
repetitivos. 2016, 296f. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Programa de Pós-
graduação em Direito. Belo Horizonte, 2016, p. 155.
258
567
MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes: recompreensão do sistema processual
da corte suprema. São Paulo: RT, 2013, p. 160.
259
568
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Representação n. 946/DF, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, DJ
01/07/1977.
260
objetivo é previsto nos artigos 926 e 927 do CPC/2015, para também se conferir eficácia
vinculante ao julgamento do IRDR pelos tribunais de segundo grau.
Ficou definido pela Suprema Corte que seria inconstitucional qualquer ato
normativo que dissesse que os prejulgados daquele tribunal superior deveriam
necessariamente ser observados pelos juízes das instâncias inferiores. Ou seja, não caberia ao
Tribunal Superior Trabalho formular teses jurídicas de caráter normativo, geral e vinculante
para as instâncias inferiores da justiça laboral.
Oportuno ressaltar que, após o julgamento pelo STF, foi editada a Lei 7.033, de
05/10/1982, que revogou o instituto. O TST, em seguida, transformou os seus antigos
prejulgados em enunciados da sua jurisprudência dominante, mas sem eficácia vinculante.
569
Disponível no site: www.stf.jus.br. Acesso em: maio 2016.
570
BRASIL, Tribunal Superior Eleitoral, Recurso Especial Eleitoral n. 9.936/RJ, Relator Ministro Sepúlveda
Pertence, julgamento de 14/09/1992. Disponível em www.tse.jus.br. Acesso em: maio de 2016.
261
Entendeu o TSE que o texto legal positivo não pode emprestar força normativa
vinculante à interpretação judicial do direito no âmbito da Justiça Eleitoral.
571
Disponível em: www.tse.jus.br. Acesso em: maio de 2016.
262
Nos termos do § 2º do art. 102 da Constituição de 1988, com redação dada pela
referida emenda, “as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal
Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade (...), produzirão eficácia contra todos e
efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo”.
572
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Questão de ordem na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 01,
Rel. Ministro Moreira Alves, julgamento em 27/10/1993, DJ 16/06/1995.
573
A literalidade dos textos normativos que consagram o efeito vinculante o dissocia da eficácia contra todos. Ao
atribuir às decisões proferidas em sede de controle abstrato de constitucionalidade eficácia contra todos e efeito
vinculante, lógica e naturalmente, está-se a distinguir conceitualmente os dois institutos. Assimilar o efeito
vinculante à eficácia erga omnes, ou mesmo à coisa julgada, seria negar-lhe autonomia de conteúdo e utilidade
prática, bem como violentar o dogma do legislador. (LEAL, Roger Stiefelmann. O efeito vinculante na
jurisdição constitucional. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 145)
574
LEITE, Glauco Salomão. Súmula Vinculante e jurisdição constitucional brasileira. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 157.
575
SOUZA, Marcelo Alves Dias de. Do precedente judicial à súmula vinculante. Curitiba: Juruá, 2007, p. 210.
263
A eficácia vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário, por sua
vez, redundaria em importante consequência de ordem processual. Isso porque a
inobservância do julgamento da ação declaratória de constitucionalidade configurará afronta à
autoridade da Suprema Corte, dando ensejo à reclamação.
(...) faz sentido não ser vinculante uma decisão da Suprema corte do país?
Não estou falando, naturalmente, de fatos concretos, cada um com seu perfil,
reclamando esforço hermenêutico da lei pelo juiz que conhece as
características próprias do caso. Estou me referindo a hipóteses de pura
análise jurídica. Tem alguma seriedade a ideia de que se devam fomentar
decisões expressivas de rebeldia? A que serve isso? Onde está o interesse
público em que esse tipo de política prospere? 577
576
Trecho do voto proferido pelo ministro Moreira Alves, relator da questão de ordem na Ação Declaratória de
Constitucionalidade - ADC n. 01. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: maio 2016.
577
Trecho do voto proferido pelo ministro Francisco Rezek, no julgamento da questão de ordem na Ação
Declaratória de Constitucionalidade - ADC n. 01. Disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: maio 2016.
265
O ministro Gilmar Mendes defendeu em seu voto que o efeito vinculante está
intimamente relacionado à própria natureza da jurisdição constitucional, no Estado
Democrático, e à função de guardião da Constituição desempenhada pela Suprema Corte.
578
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ag. Reg. na Reclamação n. 1880-6, Relator Ministro Maurício Corrêa,
DJ 19/03/2004.
579
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2231/DF, Rel. Ministro Néri da
Silveira, Julgamento 05/12/2001.
266
580
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ag. Reg. na Reclamação n. 1880-6, DJ 19/03/2004, p. 19.
581
THEODORO JR., Humberto. OLIVEIRA, Fernanda Alvim de. REZENDE, Ester Camila Gomes Norato
(Coord.). Primeiras linhas sobre o novo direito processual civil brasileiro (de acordo com o Novo Código de
Processo Civil, Lei 13.105, de 16 de março de 2015). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 749.
267
4.5.4 A polêmica sobre a ampliação dos efeitos da decisão proferida pelo STF em sede de
controle difuso de constitucionalidade: existe vinculação aos demais órgãos do Poder
Judiciário?
582
Com a seguinte ementa: Reclamação. 2. Progressão de regime. Crimes hediondos. 3. Decisão reclamada
aplicou o art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.072/90, declarado inconstitucional pelo Plenário do STF no HC 82.959/SP,
Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 1.9.2006. 4. Superveniência da Súmula Vinculante n. 26. 5. Efeito ultra partes da
declaração de inconstitucionalidade em controle difuso. Caráter expansivo da decisão. 6. Reclamação julgada
procedente. (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Reclamação n. 4335/AC, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJ.
22/10/2014)
268
havido uma mutação constitucional no art. 52, inciso X, da Constituição Federal, na medida
em que o papel do Senado Federal no controle difuso de constitucionalidade teria se
restringido apenas a dar publicidade às decisões proferidas pela Suprema Corte.
583
Inteiro teor do acórdão da Reclamação n. 4335/ AC disponível em: www.stf.jus.br. Acesso em: maio 2016.
269
A polêmica sobre o tema ainda persiste, uma vez que, em 14 de março de 2014, o
Supremo Tribunal Federal julgou procedente a referida Reclamação n. 4.335, mas por
fundamento determinante diverso, qual seja, a violação à Súmula Vinculante n. 26, editada
três anos após o ajuizamento daquela ação. Entendeu-se que a aprovação do enunciado da
súmula vinculante sobre o mesmo tema (inconstitucionalidade da proibição da progressão de
regime em relação aos crimes hediondos) constituiria fato superveniente que não poderia ser
desconsiderado pelos julgadores.
584
Inteiro teor do acórdão da Reclamação n. 4335/ AC disponível no site www.stf.jus.br. Acesso em: maio 2016.
270
uma vez se evidencia que a força de um precedente depende da Corte da qual ele emana e do
papel constitucional desse tribunal no Sistema de Justiça.
O sistema atual não apenas confere especial força expansiva aos julgamentos do
STF na jurisdição constitucional, com amparo na própria Constituição, mas também institui
fórmulas procedimentais para tornar concreta e objetiva a sua aplicação aos casos pendentes
de julgamento. 585
585
O CPC/2015 prevê, inclusive, a possibilidade de utilização da ação de reclamação constitucional em caso de
descumprimento de julgamento do STF de recurso extraordinário com repercussão geral após esgotadas as
instâncias ordinárias. A lei ordinária visa superar a jurisprudência restritiva do STF sobre o não cabimento da
reclamação em tais casos. Por tratar-se de competência originária da Suprema Corte, com hipóteses taxativas de
cabimento extraídas com base no texto constitucional, entende-se que a ampliação por mera lei ordinária das
hipóteses de cabimento da ação constitucional de reclamação não é compatível com a Constituição. Conforme
entendimento pacífico do STF antes da vigência do CPC/2015, “(...) a reclamação é inadmissível pelo só
descumprimento de tese fixada em repercussão geral assentada no julgamento de recurso extraordinário, por isso
que o instituto não é servil à substituição dos recursos cabíveis in itinere contra as decisões judiciais, porquanto
raciocínio inverso consagraria pleito per saltum com indevida supressão de instância (Reclamação nº 10.793/SP,
Rel. Min. Ellen Gracie, j. em 13 de abril de 2011). Reclamação ajuizada contra decisão de segundo grau que, em
sede de apelação, declarou a inconstitucionalidade da contribuição social prevista no arts. 25 da Lei nº 8.212/91 e
25 da Lei nº 8.870/94, ressaltando, porém, que o crédito do contribuinte deveria sofrer “compensação com
contribuições sobre folha de salários prevista no art. 22, incisos I e II, da Lei nº 8.212/91”. Alegação de
descumprimento da autoridade dos precedentes proferidos por este Supremo Tribunal Federal no julgamento dos
Recursos Extraordinários nºs 363.852/MG e 596.177/RS, oportunidade nas quais restou rejeitado o pleito de
modulação da declaração de inconstitucionalidade das normas tributárias em jogo. Inexistindo, in casu,
precedente fruto de exercício da fiscalização abstrata de constitucionalidade, a reclamação constitucional não
pode ser admitida, sob pena de frustrar a teleologia indispensável para a subsistência do sistema recursal pelo
manejo indevido da medida como sucedâneo de recurso de índole ordinária ou extraordinária. Reclamação não
271
conhecida”. (BRASIL, STF, Rcl 12692 AgR, Relator(a): Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 27/02/2014,
DJe 21-03-2014)
586
Em suas atuações no Supremo Tribunal Federal, o Ministro Gilmar Mendes e o então Ministro Eros Grau
destacaram-se como os maiores defensores da objetivação dos efeitos do controle difuso de constitucionalidade,
conforme se depreende do acórdão da lavra do ministro Eros Grau proferido no julgamento do RE n. 376.852:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL.
ALTERAÇÃO. BASE DE CÁLCULO. LEI N. 9.718/98. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 239 DA CONSTITUIÇÃO
DO BRASIL. O Supremo Tribunal Federal tem entendido, a respeito da tendência de não-estrita subjetivação ou
de maior objetivação do recurso extraordinário, que ele deixa de ter caráter marcadamente subjetivo ou de defesa
de interesse das partes, para assumir, de forma decisiva, a função de defesa da ordem constitucional objetiva.
Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento. (BRASIL, STF, RE 475812 AgR, Relator(a): Min.
Eros Grau, 2º Turma, J. 13.06.2006, DJ 04.08.2006)
272
587
ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de demandas
repetitivas. Revista de Processo. Ano 37, vol. 208, jun 2012, p. 234.
588
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. O processo civil na perspectiva dos direitos fundamentais. In:
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. (org.) Processo e Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 09.
589
Para Guilherme Botelho, a independência judicial não estaria incluída entre os direitos informativos do
processo civil, indo além de seus princípios e garantias. O referido autor considera que a independência do juiz é
fenômeno que pressupõe a própria existência da jurisdição. “Vale dizer, onde inexiste julgador independente e
imparcial, sequer existe jurisdição”. (BOTELHO, Guilherme. Direito ao processo qualificado: o processo civil
na perspectiva do Estado Constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 100-101)
590
A independência do julgador depende da conjugação de outras cinco garantias que devem ser observadas em
prol do juiz, mas que indiretamente também resguardam à própria sociedade no Estado de Direito:
inamovibilidade; dignidade da profissão judicial, mediante instituição de carreira; independência econômica
(remuneração condizente ao cargo e a garantia da sua irredutibilidade); execução de suas decisões (autoridade); e
273
um órgão adequado para assegurar a realização das condições anteriores. (FIX-ZAMUDIO, Hector.
Constituición y Proceso Civil en Latinoamérica. México: Instituto de Investigaciones Juridicas, 1974, p. 35-53)
591
FRANCO, Marcelo Veiga. Processo justo: entre efetividade e legitimidade da jurisdição. Belo Horizonte: Del
Rey, 2016, p. 9-11.
592
ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 28-30.
274
593
DAKOLIAS, Maria. O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe: elementos para reforma. Tradução de
Sandro Eduardo Sardá. Banco Mundial. Documento Técnico n. 319. 1996, p. 20-21. Disponível em:
www.anamatra.org.br. Acesso em: maio 2016.
594
La dottrina non ha mancato, poi, di precisare che nell’indipendenza istituzionale del giudice é possibile
cogliere e distinguere due aspetti: quello dell’indipendenza esterna e quello dell’indipendenza interna. Di
indipendenza esterna suole parlarsi per designare la (garantita) esclusione di ogni ingerenza nell’operato del
giudice da parte di altri organi pubblici incardinati in un potere diverso da quello cui egli appartiene. (...) Per
indipendenza interna, a sua volta, si intende la (garantita) esclusione di interferenze com l’attività del giudice
promananti da altri organi giurisdizionali inquadrati nel suo stesso ordine: con la conseguenza che deve
considerarsi sicuramente estranea all’organizzazione del potere giurisdizionale l’operatività dei principi di
gerarchia e di direzione (caratteristici nelle relazioni tra organi della Pubblica Amministrazione) (...)
(ANDOLINA, Italo Augusto; VIGNERA, Giuseppe. Il Modello Costituzionale del Processo Civile Italiano.
Torino: G. Giappichelli Editore, 1990, p. 36-37.)
275
obrigatória vertical não apenas aos julgamentos das Cortes Superiores, o que se considera
salutar, mas também a alguns dos tribunais locais e regionais.
É certo que, a partir dos estudos abordados neste capítulo acerca do papel
constitucional das Cortes Supremas, a definição de teses jurídicas no âmbito do Supremo
Tribunal Federal, no que se refere à interpretação da Constituição, e do Superior Tribunal de
Justiça, acerca da interpretação da legislação federal, privilegia a unidade do direito, podendo
servir de parâmetro decisório para outras instâncias do Judiciário sem que isso vulnere a
garantia da independência judicial.
(...) essa nova realidade pressupõe que o juiz, individualmente, sinta-se parte
da estrutura propulsora da interpretação, não seu opositor. Deve ver na
decisão uniformizante uma regra de direito para o bem da realidade jurídica
e da própria estrutura judicial da qual faz parte, não uma camisa de força.
(...) Isso equivale a dizer que o juiz consciente do seu papel deve pautar suas
ações de acordo com a cúpula da estrutura judicial como se obrigação
houvesse, mesmo que contrário à sua própria convicção. Isso não significa
estar tolhido da sua liberdade de decidir, e sim ter noção de que é parte de
uma estrutura que deve ter uma visão sobre determinados temas (em que a
divergência seja infundada), sob pena de contribuir com a desigualdade e a
incerteza jurídica. Esse é um reflexo do caráter público da jurisdição. 595
595
PARENTE, Eduardo de Albuquerque. Jurisprudência – da divergência à uniformização. São Paulo: Atlas,
2006, p. 21.
276
Haveria, assim, dois tipos de juízes: aqueles que interpretam a questão de direito,
definindo tese jurídica de caráter erga omnes e vinculante, que são os julgadores do incidente;
e aqueles que se limitam a aplicar a decisão padronizada às demandas individuais, repetindo
as anteriores, tornando o precedente judicial para as demandas repetitivas algo estático e
acabado.
Marcelo Barbi Gonçalves critica a força vinculante do IRDR, entendendo que, tal
como previsto pela legislação infraconstitucional, vai de encontro à garantia da independência
judicial:
Não creio que aqueles que têm a função de julgar possam estar submetidos a
algo diverso, estranho à própria consciência. Estou certo de que, pelo menos,
da parte dos juízes, teremos uma resistência democrática e republicana,
porque, se estivesse na primeira instância, trilharia esse caminho. Repito: as
decisões do Supremo Tribunal Federal se impõem, não pelo papel, pelo fato
de um dispositivo de lei ordinária dizer que essas decisões são obrigatórias,
mas pela respeitabilidade, pelo conteúdo dessas mesmas decisões. A adoção
da jurisprudência há de ser espontânea; cada processo é um processo, e
devemos fugir a tudo que leve à generalização e à tendência do homem de se
acomodar e evitar o maior esforço. 597
596
GONÇALVES, Marcelo Barbi. O incidente de resolução de demandas repetitivas e a magistratura deitada.
Revista de Processo. Volume 222. São Paulo: RT, ago/2013, p. 233-234.
597
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Ag. Reg. na Reclamação n. 1880-6, DJ 19/03/2004, p. 72. Disponível
em: www.stf.jus.br. Acesso em: maio 2016.
277
A censura realizada pelo tribunal de segundo grau, como corte de revisão na sua
essência, deveria situar-se apenas no plano jurisdicional para resolver, em novo julgamento, a
causa apresentada, sem interferir na independência do juiz a quo. Ou seja, os tribunais
ordinários devem se limitar a dar solução ao caso sem ditar parâmetros obrigatórios e teses
jurídicas para julgamentos futuros.
(...) Um juiz rebelde - leia-se juiz ético - não se conforma com esse estado de
coisas. E muitos deles já existem. (...) Para afirmar-se como Poder do
Estado, o Judiciário precisa dos bons rebeldes. Aqueles que se não recusem a
um plus. Além da produtividade na solução dos problemas, a formulação de
soluções novas para a justiça. (...) É por isso que se insiste num juiz rebelde,
revoltado, teimoso e desobediente. Rebelde com causa; revoltado com a
justiça; teimoso em reformar o mundo; desobediente em relação a regras
superadas, formalismos estéreis e preconceitos alimentados pelo arcaísmo.
599
598
GONÇALVES, Marcelo Barbi. O incidente de resolução de demandas repetitivas e a magistratura deitada.
Revista de Processo. Volume 222. São Paulo: RT, ago/2013, p. 235-236.
599
NALINI, José Renato. O juiz e o acesso à justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 154-158.
600
Luiz Flávio Gomes elabora, de forma crítica, cinco modelos de atuação judicial. O juiz adstrito
exclusivamente à lei representa o modelo “positivista-legalista”; o que coloca, de acordo com seus critérios
pessoais, o valor “justiça” acima de tudo, inclusive da lei, retrata o modelo “alternativista extremado”; o que
aceita a súmula vinculante, espelha o modelo opressivo hierárquico; por último, o que tem por base o “direito”
278
Com efeito, o juiz de primeiro grau não pode ser visto como um mero aplicador
mecânico da letra da lei ou do enunciado da jurisprudência, ou do precedente vinculante, um
computador programado para apenas processar a tese jurídica definida pelo tribunal, extraindo
uma solução automática ao caso concreto.
Para tanto, faz mister um juiz pró-ativo e independente, que analise com
propriedade direitos e princípios debatidos no processo para que não apresente soluções
demasiadamente simplistas frente à complexidade dos fatos ou para que não reproduza
mecanicamente a interpretação já dada pelo tribunal sem se debruçar sobre os fundamentos
submetidos ao debate processual.
O risco das causas costuma estar neste antagonismo: entre o juiz lógico e o
juiz sensível; entre o juiz consequencial e o juiz precursor; entre o juiz que
para não cometer uma injustiça está disposto a se rebelar contra a tirania da
jurisprudência e o juiz que, para salvar a jurisprudência, está disposto a
deixar esmagar nas inexoráveis engrenagens da sua lógica um homem vivo.
601
Desse modo, ao interpretar o direito para resolver os casos concretos que lhe são
apresentados, o magistrado não só os resolve, mas aponta um caminho inovador e mais seguro
para a sociedade. Vale dizer, manejando a lei no caso concreto, o juiz também a enriquece e
contribui para o desenvolvimento do direito e o alcance da interpretação mais justa e
adequada para aquele tipo de conflito. Isso é verdade tanto para os países da common law
quanto para os países da tradição romano-germânica.602
Para Dworkin, por sua vez, embora o direito deva ser analisado como um todo,
evitando-se julgamentos isolados do contexto geral e da história institucional, o juiz não pode
agir de maneira mecanizada, simplesmente reproduzindo decisões prontas.
juiz. Brasília: Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, 2015, p. 18.
603
DWORKIN, Ronald. O império do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 275.
280
criar da melhor maneira possível o romance em elaboração, assegurando sua evolução. 604
Enfim, o juiz, ao decidir um caso, não pode considerá-lo como um caso isolado,
mas inserido em um todo (integridade), num processo construtivo a que o julgador dá
necessária continuidade. Isso não significa que o juiz tenha de repetir mecanicamente a
mesma decisão passada quando está diante de um caso similar, pois que o juiz, ao mesmo
tempo em que aplica o direito, é também autor (pois acrescenta algo ao edifício jurídico) e
crítico do passado (pois que o interpreta).605 O juiz não é um mero repetidor, mas, ao mesmo
tempo, intérprete e criador da decisão.
(...) quando se diz que o juiz tem uma obrigação de respeitar a integridade e
a coerência do direito, não significa que ele deve ser “a boca da
jurisprudência”. Menos ainda se quer dizer que lhe bastará, para resolver um
caso, repetir ementas e trechos de julgados anteriores, como se só lhe fosse
exigido seguir uma “corrente jurisprudencial”. A integridade não traz
semelhantes facilidades e, ao contrário, traduz-se em um ônus adicional. 606
604
DWORKIN, Ronald. O império do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 276.
605
NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Tendências de padronização decisória no PLS n. 166/2010: o Brasil
entre o Civil Law e o Common Law e os problemas na utilização do “Marco Zero Interpretativo”. In:
MAGALHÃES, Flaviane Barros; BOLZAN, José Luiz (Coord.). Reforma de processo civil: perspectivas
Constitucionais. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 86.
606
RAMIRES, Maurício. Crítica à aplicação dos precedentes no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2010, p. 104.
281
Destarte, o IRDR, como instituto que visa retirar matérias jurídicas do âmbito do
debate processual realizado perante o juiz natural de primeiro grau, fixando-lhes interpretação
unívoca e obrigatória, apresenta-se maculado de inconstitucionalidade, colidindo com a
construção do direito a partir do contraditório e da independência do julgador e, assim, com o
próprio Estado Democrático de Direito.
(...) veem estes de mais perto os interesses e os desejos dos que recorrem à
607
FRANCO, Marcelo Veiga. Processo justo: entre efetividade e legitimidade da jurisdição. Belo Horizonte: Del
Rey, 2016, p. 74.
282
608
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 180.
609
CARVALHO, Mayara de; SILVA, Juliana Coelho Tavares da. Ressalva de entendimento e valorização da
primeira instância no sistema de precedentes brasileiro. In: DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro
da; ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de; MACÊDO, Lucas Buril de. (coords.) Precedentes. Coleção Grandes
Temas do NCPC. V. 3. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 744.
283
(...) vale ressaltar que a ressalva de entendimento a que se refere nesse tópico
é, como dito, a técnica específica de decisão, na qual o dispositivo está em
conformidade com o precedente, mas a fundamentação é realizada segundo o
entendimento que pretende influir para revertê-lo. Difere, portanto, do
sentido majoritariamente atribuído à expressão no Brasil em que é
empregada para designar que dado julgamento colegiado não foi unânime,
sem referir-se a divergência específica quanto aos elementos condicionantes
da ratio de dado precedente. (...) A técnica não é voltada especificamente
para a primeira instância, ressalta-se, antes, constitui método de decisão
estratégica no sistema de precedentes. Tem aptidão, assim, para influir
concretamente na reformulação de entendimentos sem interferir
negativamente na segurança jurídica e na expectativa das partes. 611
610
BUSTAMANTE, Thomas. Teoria do Precedente Judicial: A justificação e a aplicação de regras
jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012, p. 425-426.
611
CARVALHO, Mayara de; SILVA, Juliana Coelho Tavares da. Ressalva de entendimento e valorização da
primeira instância no sistema de precedentes brasileiro. In: DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro
da; ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de; MACÊDO, Lucas Buril de. (coords.) Precedentes. Coleção Grandes
Temas do NCPC. V. 3. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 745.
284
Não se quer defender algo utópico. A referida técnica existe, de fato, no direito
comparado e é importante para a oxigenação do direito jurisprudencial, mas somente terá
612
Nesse sentido é o enunciado n. 172 do Fórum Permanente dos Processualistas Civis: “a decisão que aplica
precedentes, com a ressalva de entendimento do julgador, não é contraditório”. (NUNES, Dierle; SILVA,
Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei nº. 13.105/2015. Referenciado com os dispositivos
correspondentes no CPC/73 Reformado, com os enunciados interpretativos do Fórum Permanente de
Processualistas Civis (FPPC) e com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo Horizonte: Fórum,
2015, p. 365)
285
613
ASSIS, Guilherme Bacelar Patrício de. Precedentes vinculantes em recursos extraordinários e especial
repetitivos. 2016, 296f. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Programa de Pós-
graduação em Direito. Belo Horizonte, 2016, p. 57-58.
614
TUCCI, Jogé Rogério Cruz e. Precedente Judicial como fonte do Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004, p. 174.
286
615
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Precedentes vinculantes no direito comparado e no direito brasileiro.
Salvador: JusPodivm, 2013, p. 212.
616
ASSIS, Guilherme Bacelar Patrício de. Precedentes vinculantes em recursos extraordinários e especial
repetitivos. 2016, 296f. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. Programa de Pós-
graduação em Direito. Belo Horizonte, 2016, p. 61.
617
NUNES, Dierle; HORTA, André Frederico. Aplicação de precedentes e distinguishing no CPC/2015: Uma
breve introdução. In: DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues
de; MACÊDO, Lucas Buril de. (coords.) Precedentes. Coleção Grandes Temas do NCPC. V. 3. Salvador:
JusPodivm, 2015, p. 309.
287
618
NUNES, Dierle; HORTA, André Frederico. Aplicação de precedentes e distinguishing no CPC/2015: Uma
breve introdução. In: DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues
de; MACÊDO, Lucas Buril de. (coords.) Precedentes. Coleção Grandes Temas do NCPC. V. 3. Salvador:
JusPodivm, 2015, p. 332-333.
619
NOGUEIRA, Gustavo Santana. Precedentes vinculantes no direito comparado e no direito brasileiro.
Salvador: JusPodivm, 2013, p. 213.
288
Com efeito, muitas vezes se depara com demandas repetitivas, que apresentam
fundamentos jurídicos distintos, uns de natureza constitucional e outros, infraconstitucional,
por exemplo, de modo que se o julgamento paradigma que deu origem ao precedente não tiver
analisado todos aqueles fundamentos, caberá ao juiz do caso concreto proceder à nova
interpretação do direito a partir daqueles argumentos ainda não analisados, sem que haja
violação à força vinculante do precedente.
CONCLUSÃO
tutela dos direitos dos cidadãos, certamente não é a carência de instrumentos processuais que
responde por isso.
adotar uma postura coerente com a intenção manifestada de melhoria do Sistema de Justiça.
Uma postura de respeito aos posicionamentos firmados pela Justiça, alterando-se as práticas
administrativas consideradas ilegais não só em favor daqueles que obtiveram êxito no
processo, mas também em favor de todos os administrados na mesma situação, o que, de fato,
reduziria a litigiosidade.
processo civil italiano de Ítalo Andolina e Giuseppe Vignera e, ainda, do processo justo
(devido processo) na perspectiva de Comoglio, perfeitamente aplicáveis ao Brasil em razão
das garantias processuais da Constituição da República de 1988.
Não é a Constituição que deve ser interpretada a partir das técnicas processuais
criadas em prol da celeridade, mas são as referidas técnicas que devem se moldar às garantias
constitucionais intangíveis do devido processo justo. Garantias essas que devem se
concretizar na prática jurídica, não podendo ser reduzidas a uma mera presunção ou ficção
jurídica.
De tudo que foi analisado, pode-se concluir que o IRDR constitui uma categoria
distinta de processo, que não se identifica propriamente com os instrumentos utilizados nas
demandas puramente individuais e tampouco com os mecanismos de representação e
substituição processual típicos da ação coletiva, tendo inspiração, ao contrário, nas chamadas
ações de grupo instituídas na Europa.
Em tais casos, a decisão do incidente, dotada pela lei de caráter vinculante pro et
contra, pode não vir a ser a melhor e mais consistente solução da controvérsia de massa, com
evidente impacto prejudicial à conclusão da multiplicidade de demandas sobrestadas.
Em outras palavras, tal como previsto pelo CPC/2015, o novel instituto favorece
os litigantes habituais, que possuam diversos processos versando sobre a mesma matéria, os
quais poderão provocar o incidente a partir de um litígio com argumentos mais precisos em
seu favor, bem escritos ou completos, no qual a parte contrária não tenha apresentado fortes
argumentos contrários ou que não disponha do mesmo aparato profissional para o
acompanhamento técnico da causa.
O sistema opt out consiste em permitir que cada indivíduo, membro da classe ou
do grupo, requeira em juízo sua exclusão de qualquer processo de natureza coletiva de modo a
ser considerado terceiro não sujeito aos efeitos do julgamento. Todos os demais membros
daquele grupo, que não tenham exercido a opção de excluir-se, são considerados partes e
sofrem os efeitos do julgamento, seja ele positivo ou negativo (pro et contra).
Isso não foi previsto pelo novo modelo adotado em relação às demandas
repetitivas ou de massa, no qual se insere o IRDR como instrumento de definição rápida da
interpretação do direito dotado de caráter vinculante e erga omnes.
do julgamento do IRDR aos processos dos juizados especiais, em razão da manifesta ausência
de competência funcional absoluta dos tribunais locais ou regionais para uniformizarem a
interpretação jurídica no âmbito dos juizados especiais.
Federal, que o efeito vinculante não pode ser atribuído por lei ordinária a julgamentos de
tribunais da instância ordinária.
constitucional.
Ficou definido pela Suprema Corte, ainda sob a vigência da Constituição de 1946,
que seria inconstitucional qualquer ato normativo que dissesse que os prejulgados do Tribunal
Superior do Trabalho deveriam necessariamente ser observados pelos juízes das instâncias
inferiores. Ou seja, não caberia ao Tribunal Superior Trabalho formular teses jurídicas de
caráter normativo, geral e vinculante para as instâncias inferiores da justiça laboral.
sua participação e autoridade como necessárias para moldar o direito ao caso concreto,
gerenciando os litígios para que se preze por uma prestação jurisdicional qualificada e não
padronizada.
Haveria, assim, dois tipos de juízes: aqueles que interpretam a questão de direito,
definindo tese jurídica de caráter erga omnes e vinculante, que são os julgadores do incidente;
e aqueles que se limitam a aplicar a decisão padronizada às demandas individuais, repetindo
as anteriores, tornando o precedente judicial para as demandas repetitivas algo estático e
acabado.
Com efeito, o juiz de primeiro grau não pode ser visto como um mero aplicador
mecânico da letra da lei ou do enunciado da jurisprudência, um computador programado para
apenas processar a tese jurídica definida pelo tribunal, extraindo uma solução automática ao
caso concreto.
Os tribunais locais e regionais, por sua vez, integram apenas a instância ordinária,
cujo papel é apenas de corte de revisão das decisões proferidas pela primeira instância. Ao
contrário do previsto para as Cortes Supremas, cabem aos órgãos jurisdicionais ordinários –
juízes de primeira instância e aos tribunais locais ou regionais – cuidarem da solução das
controvérsias, realizando a devida apuração dos fatos e a aplicação do direito aos casos
concretos para tutelar o direito das partes. Em outras palavras, nas instâncias ordinárias
exercita-se a jurisdição com o objetivo de obter uma decisão justa para o caso concreto
voltado à satisfação dos interesses das partes. Não agem com caráter prospectivo e para
construção de teses jurídicas. Mesmo porque também não deteriam a última palavra sobre a
questão, que ficará sujeita aos meios impugnativos endereçados às Cortes Supremas.
302
REFERÊNCIAS
AGUIAR, Mirella de Carvalho. Amicus Curiae. Coleção Temas de Processo Civil. v.5.
Salvador: JusPODIVM, 2005.
ALVIM, Arruda; MARTINS, Critiano Zanin. Apontamentos sobre o sistema recursal vigente
no direito processual civil brasileiro à luz da lei 10.352/2001. In: NERY JR., Nelson;
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de
outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
ARAÚJO, José Henrique Mouta. O incidente de resolução das causas repetitivas no novo
CPC e o devido processo legal. In: MACEDO, Lucas Buril et al (orgs.). Processo nos
Tribunais e Meios de Impugnação às Decisões Judiciais. Coleção novo CPC – Doutrina
Selecionada. Vol. 06. Salvador: Juspodivm, 2015.
ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de. As demandas de massa e o projeto do novo Código de
Processo Civil. In: FREIRE, Alexandre (org.). Novas tendências do Processo Civil: estudos
sobre o projeto do novo Código de Processo Civil. v. 3. Salvador: Juspodivm, 2014.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O futuro da Justiça: alguns mitos. In: Revista Forense,
v. 96, n. 352, out-dez, 2000.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Notas sobre alguns aspectos do processo (civil e penal)
nos países anglo-saxônicos. Temas de direito processual: sétima série. São Paulo: Saraiva,
2001.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A motivação das decisões judiciais como garantia
inerente ao Estado de Direito. Temas de Direito Processual – 2ª série. São Paulo: Saraiva,
1988.
305
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O que deve e o que não deve figurar na sentença.
Temas de Direito Processual – 8ª série. São Paulo: Saraiva, 2004.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O processo civil brasileiro entre dois mundos. Temas de
Direito Processual. Oitava série. São Paulo: Saraiva, 2004.
BARROSO, Luis Roberto. A proteção coletiva dos direitos no Brasil e alguns aspectos da
class action Norte Americana. De Jure: Revista Jurídica do Ministério Público do Estado de
Minas Gerais. Belo Horizonte, n.8, jan.-jun. 2007, p. 34-55.
BASTOS, Antonio Adonias Aguiar. O devido processo legal nas causas repetitivas. p. 4940-
4954. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/salvador/
antonio_adonias_aguiar_bastos.pdf> Acesso em: 12 jan. 2016.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Os elementos objetivos da demanda examinados à luz
do contraditório. In: TUCCI, José Rogério Cruz e; BEDAQUE, José Roberto dos Santos.
Causa de pedir e pedido no processo civil: questões polêmicas. São Paulo: RT, 2002. p. 20-
38.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São
Paulo: Malheiros, 2006.
BOBBIO, Norberto. Estado, Governo, Sociedade. Para uma teoria geral da política. Trad.
Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Paz e Terra. 2011.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Malheiros, 2006.
306
BRASIL. Congresso Nacional. Senado Federal. Presidência. Projeto de Lei do Senado nº 166,
de 2010 (Do Senador José Sarney, proveniente dos trabalhos da Comissão de Juristas,
instituída pelo ato nº 379, de 2009, do Presidente do Senado Federal). Dispõe sobre a reforma
do Código de Processo Civil. Diário do Senado Federal, Brasília, DF, 09 jun. 2010, pp.
26692-26950.
BRASIL. Câmara dos Deputados. Parecer da Comissão Especial referente ao Projeto de Lei
nº 8.046, de 2010. Rel.: dep. Paulo Teixeira. Brasília, 26 mar. 2014. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br>. Acesso em ago. 2015.
BRASIL. Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Diário
Oficial da União, 17 jan. 1973.
BRASIL. Lei no 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial
da União, 17 mar. 2015.
BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva,
2015.
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. v.1. São
Paulo: Saraiva, 2009.
BULOW, Oskar von. Teoria das exceções e dos pressupostos processuais. Trad. Ricardo
Rodrigues Gama. Campinas: LZN, 2005.
CABRAL, Antônio do Passo. Comentários aos arts. 976 a 987. In: CABRAL, Antonio do
Passo; CRAMER, Ronaldo. Comentários ao novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2015, p. 1415-1454.
CALAMANDREI, Pietro. Eles, os juízes, vistos por um advogado. São Paulo: Martins
Fontes, 1995.
CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015.
308
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet.
Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988.
CARVALHO, Mayara de; SILVA, Juliana Coelho Tavares da. Ressalva de entendimento e
valorização da primeira instância no sistema de precedentes brasileiro. In: DIDIER JR.,
Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de; MACÊDO,
Lucas Buril de. (coords.) Precedentes. Coleção Grandes Temas do NCPC. v. 3. Salvador:
JusPodivm, 2015, p. 729-751.
COMOGLIO, Luigi Paolo. Etica e tecnica del giusto processo. Torino: G. Giappichelli, 2004.
309
CUNHA, Alcides A. Munhoz. Evolução das ações coletivas no Brasil. Revista de Processo,
São Paulo, ano 20, n. 77, jan.-mar.1995, p. 224-235.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Anotações sobre o incidente de resolução de demandas
repetitivas previsto no Projeto de novo Código de Processo Civil. Revista de Processo. São
Paulo: RT, n. 193, mar. 2011, p. 255-271.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. O regime processual das causas repetitivas. Revista de
processo. São Paulo: RT, n. 179, jan. 2010, p. 139-174.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Jurisdição e competência. São Paulo: RT, 2008.
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Processo Coletivo. v. 4. Salvador: Juspodivm,
2008.
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Possibilidade de Sustentação Oral do Amicus
Curiae. Revista Dialética de Direito Processual nº 8, out./2003, p. 33-38.
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral
do processo e processo de conhecimento. Salvador, Editora JusPodvm, 2010.
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes; OLIVEIRA, Rafael; BRAGA, Paula. Curso de
direito processual civil. v. II. Salvador: Juspodivm, 2013.
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. O princípio da cooperação: uma apresentação.
Revista de Processo. São Paulo, RT, n. 127, 2005. p. 75-79.
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Princípio do contraditório: aspectos práticos.
Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, Gênesis, n. 29, 2003.
310
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil: Lei 8.455, de 24-
08-92, 8.637, de 31-3-93, 8.710, de 24-9-93, 8.718, de 14-10-93, 8.898, de 29-6-94, 8.950, de
13-12-94, 8.951, de 13-12-94, 8.952 de 13-12-94 e 8.953, de 13-12-94. São Paulo: Malheiros,
1995.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. v. IV. São Paulo:
Malheiros, 2004.
FLEXA, Alexandre. MACEDO, Daniel. BASTOS, Fabrício. Novo Código de Processo Civil.
Temas inéditos, mudanças e supressões. Bahia: JusPODIVM, 2015.
GIDI, Antônio. A class action como instrumento de tutela coletiva dos direitos: as ações
coletivas em uma perspectiva comparada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
GIDI, Antônio. Rumo a um código de processo civil coletivo: a codificação das ações
coletivas no Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 2008.
311
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo. Rio de Janeiro: Aide,
2001.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Os processos coletivos nos países da civil law. In: GRINOVER,
Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo; MULLENIX, Linda (Org). Os processos coletivos nos
países da civil law e da common law: uma análise de direito comparado. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2008.
HADDAD, Carlos. Acredite: a Justiça pode melhorar, basta bem administrar. Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2016-jan-17/segunda-leitura-acredite-justica-melhorar-basta-bem-
administrar Acesso em: 18 jan. 2016.
HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto
Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1991.
JAYME, Fernando Gonzaga. Obstáculos à tutela jurisdicional efetiva. Revista Forense. Rio
de Janeiro: Forense. v. 399, 2008, p. 95-110.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. Coimbra: Armênio
Amado, 1976.
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo, Primeiros Estudos. Rio de Janeiro:
Forense, 2001.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. O acesso à Justiça como direito humano e fundamental.
Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª. Região. Belém: TRT 8ª Região, v. 41, ano
80, 2008, p. 91-92.
LENZA, Pedro. Teoria Geral da Ação Civil Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direito processual civil. Trad. Cândido Rangel
Dinamarco. Rio de Janeiro: Forense, 1984.
MACÊDO, Lucas Buril de. A disciplina dos precedentes no direito brasileiro: do anteprojeto
ao Código de Processo Civil. In: DIDIER JR., Freddie; CUNHA, Leonardo Carneiro da;
ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de; MACÊDO, Lucas Buril de. (coords.) Precedentes.
Coleção Grandes Temas do NCPC. v. 3. Salvador: JusPodivm, 2015.
MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas de processo civil. São Paulo: Malheiros, 2000.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso
de processo civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum. v. 2. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2015.
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. São Paulo. Revistas dos Tribunais,
2010.
MARINONI, Luiz Guilherme. A ética dos precedentes: justificativa do novo CPC. São Paulo:
RT, 2014.
MORAIS, José Luis Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e arbitragem:
alternativas à jurisdição. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.
NALINI, José Renato. O juiz e o acesso à justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
NERY JR., Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal. São Paulo: RT, 2010.
NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada. São
Paulo: RT, 2009.
NERY JR., Nelson; ABBOUD, Georges. Stare decisis vs direito jurisprudencial. In: FREIRE,
Alexandre et al.(orgs.) Novas tendências do processo civil. Vol. I. Salvador: Juspodivm,
2013, p. 485-514.
NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático: uma análise crítica das
reformas processuais. Curitiba: Juruá, 2008.
NUNES, Dierle José Coelho. O princípio do contraditório. Boletim Técnico da Escola Superior
de Advocacia - ESA/MG, v. 1, jan/jul. 2004, p. 39-55.
315
NUNES, Dierle José Coelho. Direito constitucional ao recurso: da teoria geral dos recursos,
das reformas processuais e da comparticipação nas decisões. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2006.
NUNES, Dierle José Coelho. Novo enfoque para as tutela diferenciadas no Brasil?
diferenciação procedimental a partir da diversidade de litigiosidades. Revista de Processo.
São Paulo, n. 184, p. 109-140, jun. 2010.
NUNES, Dierle José Coelho. Curso de Direito Processual Civil: fundamentação e aplicação.
Belo Horizonte: Fórum, 2011.
NUNES, Dierle José Coelho; SILVA, Natanael Lud Santos e. Código de Processo Civil. Lei
nº. 13.105/2015. Referenciado com os dispositivos correspondentes no CPC/73 Reformado,
com os enunciados interpretativos do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) e
com artigos da Constituição Federal e da Legislação. Belo Horizonte: Fórum, 2015.
OLIVEIRA, Rodrigo Esteves de. OLIVEIRA, Mário Esteves de. Código de Processo nos
Tribunais Administrativos Anotado. Coimbra: Almedina, 2004.
PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre common law, civil law e o precedente judicial. Estudo em
homenagem ao Professor Egas Moniz de Aragão. 2007. Disponível em: www.abdpc.org.br.
Acesso em: abr. 2016.
RE, Edward D. Stare Decisis. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Revista Forense, v. 327, 1990.
ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros,
1995.
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2010.
317
SILVA, Ticiano Alves e. Os embargos de declaração no novo Código de Processo Civil. In:
MACEDO, Lucas Buril et al (Orgs.). Processo nos Tribunais e Meios de Impugnação às
Decisões Judiciais. Coleção novo CPC – Doutrina selecionada. Vol. 06. Salvador: Juspodivm,
2015, p. 661-684.
SOUZA, Artur César de. Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo: Almedina, 2015.
SOUZA, Marcelo Alves Dias de. Do precedente judicial à súmula vinculante. Curitiba: Juruá,
2007.
STRECK, Lênio Luiz; ABBOUD, Georges. O que é isto – o precedente judicial e as súmulas
vinculantes? Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.
STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da
construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.
STURNER, Rolf. Sobre as reformas recentes no direito alemão e alguns pontos em comum
com o projeto brasileiro para um novo Código de Processo Civil. Revista de Processo. São
Paulo: Revista dos Tribunais, n. 193, mar/2011, p. 355-371.
TARUFFO, Michele. Le Funzioni delle Corti supreme: cenni generali. Revista Magister de
direito civil e processual civil, v. 8, n. 46, jan./fev. 2012, p. 93-115.
TARUFFO, Michele. Processo civil comparado. Ensaios. Trad. Daniel Mitidiero. São Paulo:
Marcial Pons, 2013.
TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2012.
TESHEINER, José Maria Rosa. Elementos para uma teoria geral do processo. São Paulo:
Saraiva, 1993.
THEODORO JÚNIOR. Humberto; NUNES, Dierle José Coelho. Uma dimensão que urge
reconhecer ao contraditório no direito brasileiro: sua aplicação como garantia de influência,
de não surpresa e de aproveitamento da atividade processual. Revista de Processo. São Paulo,
n. 168, p. 107-141, 2009.
THEODORO JÚNIOR. Humberto; NUNES, Dierle José Coelho; BAHIA, Alexandre Melo
Franco Bahia; PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC. Fundamentos e sistematização. Lei
13.105, de 16.03.2015. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
THEODORO JÚNIOR. Humberto. O processo civil brasileiro: no limiar do novo século. Rio
de Janeiro: Forense, 2002.
TUCCI, Jogé Rogério Cruz e. Precedente Judicial como fonte do Direito. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2004.
TUCCI, Jogé Rogério Cruz e. O regime do precedente judicial no novo CPC. In: DIDIER JR.,
Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; MACÊDO, Lucas Buril de; ATAIDE JR., Jaldemiro
R. de (coords). Precedentes. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 445-458.
VIEIRA, Andréia Costa. Civil Law e Common Law: os dois grandes sistemas legais
comparados. Porto Alegre: S. A. Fabris, 2007.
VILELA, Hugo Otávio Tavares. Além do Direito: o que o juiz deve saber. A formação
multidisciplinar do juiz. Brasília: Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários,
2015.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Questão de fato e questão de direito. Revista da Academia
Paulista de Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 3, jan./jun., 2012, p. 235–256.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. Sobre o novo art. 543-C
do CPC: sobrestamento de recursos especiais “com fundamento em idêntica questão de
direito”. Revista de Processo, v. 33, n. 159, maio/2008, p. 215-221.
ZAFFARONI, Eugenio Raul. Poder Judiciário. Crise, Acertos e Desacertos. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1995.
ZANETI JR., Hermes. O valor vinculante dos precedentes: teoria dos precedentes normativos
formalmente vinculantes. Salvador: Juspodivm, 2016.
ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de
direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.