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Nunca pensei que estaria em uma situação como essa. Escondido nas sombras de
um beco fétido e imundo, pronto para atacar qualquer coisa que vier em minha direção.
Isso se desconsiderar meu braço quebrado e as diversas feridas no meu corpo, que mal
me deixam pensar direito.
Ah, mas que falta de educação da minha parte. Me chamo Lithio, Lithio
Lentenive. Há cerca de duas horas eu tinha uma vida normal, trabalhava normalmente
em uma fábrica de comida enlatada, se é que dá pra chamar isso que eles produzem de
comida. Vivia em um apartamento meia boca na província leste da cidade, era pequeno,
mas tinha seus luxos. Meus avôs vieram para Zantum com a 402° imigração, depois que
a Terra havia chegado às suas ruínas.
Por volta dos anos de dois mil e vinte, começara a exploração de outros planetas
adequados para a habitação humana. Por sorte, os cientistas encontraram um pequeno
planeta com condições similares à Terra, em um canto remoto da galáxia. Alguns anos
depois da descoberta, foi realizada a primeira imigração, e conforme mais e mais
pessoas iam para Zantum, pior ficava a condição na Terra. A viagem era muito cara e
consumia uma quantidade absurda de recursos. Foi levado o máximo de pessoas
possível, mas estima-se que mais de 70% da população mundial foi abandonada em um
planeta morto.
Para tentar contornar esses problemas, os grandes governantes das cidades, que
já assumiam o papel de países, entraram em um acordo que ficou conhecido como
“redenção” que basicamente consistia na unificação geral dos povos. Fazendo todo o
mundo uma única nação, assim todos os esforços e avanços seriam em beneficio da
população mundial como um todo, além de todos falarem o mesmo idioma, adotarem a
mesma moeda entre outras medidas. E claro, uma declaração de paz permanente que
inclusive reduziu todas as forças militares apenas para segurança interna. Pura balela.
Energia.
O planeta não tinha grandes quantidades de água, ou minérios como o carvão
para produção de energia, e com os recursos sendo cada vez mais usados para manter o
povo vivo, essa crise elétrica ia só se agravando.
Entretanto, algo que parecia ser apenas mais uma doença, se mostrou a salvação
para Zantum.
Porém, não era o bastante. O vírus era muito complexo para ser recriado em
laboratório, e só infectava seres humanos. O entendimento sobre o funcionamento do
agente no organismo era ínfimo e a progressão dos experimentos se tornou algo
perigoso para os infectados. Tempos desesperadores necessitam de medidas
desesperadas. Foi anunciada a caça aos portadores do vírus, que carinhosamente foram
apelidados de baterias. Armas foram desenvolvidas especialmente para imobilizar e até
mesmo matar sem derramar uma gota de sangue, exércitos criados para encontrar,
capturar e levar as baterias para serem estudadas e transformadas em energia.
As baterias não tinham outra opção a não ser isolar-se das cidades e viver longe
da civilização, nas florestas e desertos.
Bem, agora faltou explicar porque eu estou aqui, parecendo um mendigo que
levou uma surra. Mas isso é muito simples de resolver.
CAPITULO 1
Mas acho que tenho coisas para explicar ainda, essa é a hora que vocês
imaginam aquele efeito de flashback.
Como qualquer dia normal, acordei com o som do trem que passa em cima da
minha casa, acho que é por isso que o aluguel é tão barato. Esse trem liga todos os
setores da cidade e passa apenas umas duas ou três vezes por dia. Por mim poderiam era
sucatear de vez essa cobra de metal barulhenta.
Fui até a geladeira, percebi que só havia um resto de pizza embolorado, que eu
guardo pra momentos de desespero total, e uma garrafa de algum liquido misterioso
quase vazia. Não sei por que ainda checo, peguei minha xícara favorita, é uma com um
ursinho. Não me julgue. Esquentei um resto de café que ainda estava na chaleira e o
bebi enquanto me vestia para o trabalho.
Dona berny é minha vizinha, e também sindica do prédio, ela tem uma memória
meio ruim para nomes, mas nunca vi ela esquecer de cobrar o aluguel.
Esse trajeto já era tão familiar para mim, meio que automático, passava pela
floricultura, depois pelo mercado do velho joe, pelos correios – O cheiro de merda de
pombo era insuportável nesse ponto - e finalmente pelo bar do mint. Lar da melhor
cerveja da região, não contem pra ninguém mas o ingrediente secreto é alho e creme de
barbear, nojento, mas impressionantemente gostoso
- Lithio, volta pra sua esteira, se o chefe te ver aqui ele te manda pra rua.
-Sai daqui...
Esse mala aí é o Mike, ele trabalha comigo desde que eu entrei na fábrica. Ele
não é dos mais bem humorados, deve ser a idade. Para falar a verdade nunca perguntei
isso para ele, mas a julgar pelo grande foco de calvice no topo da sua cabeça deve ter
seus 40 e poucos. Ainda sim, já troquei boas risadas com ele.
E esse, senhoras e senhores, é meu chefe. Ele é tão relevante pra essa historia
que nem vale à pena citar o nome dele, mas vamos chamá-lo de Sr.Balofo por enquanto.
Acho que isso já é descrição suficiente para ele.
Já trabalho aqui a um bom tempo, os dias são tão parecidos que nem lembro
mais a data exata em que comecei. O salário não é lá essas coisas, mas é melhor que
trabalhar de coletor na zona externa.
-E não se esqueçam hoje tem inspeção.
Isso que o Sr.Balofo disse é uma exame para ver se você está doente,ou seja,se é
uma bateria. Os soldados responsáveis por essa tarefa usam um capacete estranho que
parece um balde com antenas de inseto, que sinceramente só serve para fazer eles
ficarem ridículos. Porém, eu não mexeria com eles se fosse você. Eles são treinados
desde pequenos para servir ao governo, ou como eles se auto intitulam, A Organização.
Suas mentes e seus corpos são levados ao extremo para conseguirem cumprir a tarefa
com precisão e consistência.
Por isso é feito essa conferência periódica, para se certificar caso uma nova
bateria tenha surgido. Toda informação sobre os indivíduos é atualizada no sistema
deles, nome, endereço, trabalho, tudo. Além do mais os boatos dizem que eles nunca
esquecem um rosto.
-Ei, Mike, acha que o chefe se importa se eu sair mais cedo hoje?
- Eu sei, eu sei...
-Lithio, você não sai com ninguém desde aquela festa em que vo...
-Você venceu, quero sair mais cedo pra ficar de bobeira em casa
-A e você realmente espera que o chefe libere? Você só pode ter ficado maluco!
-Eu invento alguma coisa, posso ir fazer a inspeção no posto médico do bloco
central, digo que já teria que fazer alguns exames de qualquer forma.
-Me ajuda ai cara, pensa em alguma coisa, não aguento mais ficar aqui!
-Mas você acabou de voltar do horário de almoço!
Os soldados entraram bem lentamente, não dava para ver seus rostos por causa
do capacete, mas parecia que constantemente procuravam por algo, como se estivessem
sob uma iminente ameaça
Foi só ele terminar de falar para o Sr. Balofo descer as escadas de seu escritório
correndo. Se falar, o diabo realmente aparece.
-Sejam bem vindos! Fiquem a vontade- disse meu chefe com uma risada nervosa
-Sério três soldados para tirar sangue? Pensei que a Organização era um pouco
mais eficiente- cochichei para Mike.
-Lithio, esses caras tão armados, segure essa língua antes que eles cortem ela
fora por ti.
Não havia muitos funcionários na fábrica, o processo não durou muito mais que
dez minutos.
-Próximo!
A que novidade me deixaram por último, sabe acho que isso é uma conspiração
contra minha pessoa
Eu nunca fui muito fã de agulhas pra falar a verdade, ainda mais quando
manuseadas por um cosplay mal feito de robocop. Ver o rubro de meu sangue encher o
frasco era uma sensação estranhamente incomodativa, meu corpo se arrepiou por um
segundo.
Passaram uns 10 segundos até o aparelho terminar a análise. Em seguida um
apito no dispositivo de coleta começou um barulho infernal, meu sangue gelou, eu não
acreditava no que meus olhos estavam vendo.
-Bateria!!
Meu único pensamento foi correr assim que percebi os guardas sacando suas
armas. Minhas pernas se moveram sozinhas, em uma pura ânsia pela sobrevivência
Meus pés deslizavam pelo chão empoeirado da fábrica, não me atrevi a olhar
para trás, o barulho de projeteis passando ao lado de minha cabeça já eram motivação o
suficiente para eu continuar correndo.
Sai pelo grande portão e virei a primeira esquina em que bati meus olhos. Segui
na rua por um tempo, as pessoas que viam a cena ficavam simplesmente paradas, como
se fosse apenas o rumo natural das coisas, como se aquilo simplesmente fosse meu
destino. Os olhos quase inexpressivos, faziam meus passos ficarem mais pesados e um
sentimento de solidão me dominou por um instante, mas não havia tempo para eu ficar
melancólico, primeiro eu tinha que sobreviver.
Exausto e sem mais para onde correr. Até agora não sei por que tive a brilhante
ideia de subir para o segundo andar, acho que tinha esperança do teto desabar na cabeça
dos meus perseguidores.
Os guardas estavam subindo as escadas, cada vez mais próximos, eu tinha que
pensar em algo.
A janela.
Eu dei alguns passos pra trás para tomar impulso, comecei a correr e pulei, o
vidro se estilhaçou e os cacos deixaram cortes em toda minha pele. Para completar a
desgraça eu aterrissei em uma enorme lata de lixo, parecia mais fácil e menos doloroso
nos filmes.
Como se não bastasse, quando tentei me levantar notei uma dor aguda do lado
esquerdo do corpo. Meu braço estava virado ao contrario fazendo meu cotovelo ser
projetado para frente. Eu mordo meu lábio para aguentar a dor e não gritar com todas as
minhas forças e alertar os guardas mas é inútil, minha fuga foi apenas temporária, eu só
ganhei alguns minutos a mais, talvez não tenha sido uma escolha muito inteligente.
Bem, e agora estamos no mesmo lugar onde começamos, foi bom pra você?
CAPITULO 2
-Naquele beco.
Parece que os convidados chegaram, foi legal trocar uma ideia antes de morrer,
por mais que eu tenha falado bem mais, isso acontece com vocês também? A deixa pra
lá. Enfim foi um prazer.
-Esse inútil conseguiu se quebrar todo, já que ele já está sangrando mesmo não
vejo porque não ensiná-lo que não se deve fugir da policia
-Mais alguma piadinha? Acho que não. Eu até que gostaria de acabar com essa
sua existência deplorável, mas tenho ordens para te levar vivo até o laboratório.
Meus olhos se fecharam por alguns segundos preparados para não abrirem mais,
mas um som de metal preencheu o local, ouvi alguns gritos e tiros
Uma figura peculiar, cabelo alaranjado, bem magro, usava um manto bege com
um capuz, em seus pulsos haviam faixas que cobriam todo seu braço e no seu rosto
havia estampado um sorriso bem grande.
-Oi? Comigo?
Mas que cara ousado, só por que me salvou ta se achando o rei da cocada preta.
-Com isso.
Um tanto suspeito, eu pensei, mas de qualquer forma não estou em uma situação
muito propicia a bancar o cético.
-Temos um longo caminho pela frente, mas nesse estado você não aguentará a
viagem, vou te levar até um conhecido meu.
-Arg... Por isso que odeio encontrar novatos, sempre o mesmo papo. Estamos no
mesmo barco agora, se você não quer minha ajuda posso te deixar para morrer ai
mesmo.
-Ok, eu vou com você mas só se me prometer que irá explicar o que diabos está
acontecendo aqui.
-Justo.
-Você é pesadinho.
-Uhum, sei.
-Longa historia...
CAPITULO 3
Eu conseguia ver por cima do meu ombro as pessoas olhando para mim e então
sussurrando entre si, não faço idéia do que falavam mas pelo olhar em seus rostos não
parecia ser algo muito amigável.
-Viemos para tratar esses ferimentos, atualmente você não passa de um peso
morto.
Nesse ponto meu corpo estava em seu limite, eu mal me aguentava em pé, e a
dor no meu braço crescia a cada segundo que passava.
-Chegamos.
Olhei para cima e vi uma casa de madeira caindo aos pedaços, parecia tão frágil
que nem os cupins tinham mais interesse nela
-Pois é, não tenho saído muito para coletas.- disse Cuprie com um sorriso
-Mas o que o trás aqui? Aquela sua amiga já passou para pegar os remédios.
-Preciso que você trate desse cara.
-E ai doutor, beleza?
Esse "doutor" tem umas coisas bem legais na casa dele, tipo uns vidros com
coisinhas flutuando dentro, o que será que é? Será que está vivo?
-Por favor, me chame de Victor.Você parece estar bem mal, venha, deite-se na
cama.
Ele usava um jaleco branco comprido, ia até pés, cabelos negros e uma aparência
um tanto pálida. Sua postura era quase que corcunda, mãos nos bolsos e um cigarro na
boca, a fumaça mal deixava eu enxergar os seus olhos e os óculos dificultavam mais
ainda.
Esse cara ta tentando me matar, doutor é uma ova, ta mais pra carrasco
-Espero que não estejam com pressa por que isso vai demorar.
Fala sério, eu vou ter que dormir aqui?! Esse dia ta indo de mal a pior, pelo
menos a cama é confortável
-Não fazia parte dos meus planos, mas realmente não é muito seguro ir até a
base durante a noite, partiremos ao amanhecer, não quero incomodar ainda mais o
senhor. - disse Cuprie
- Relaxe Cuprie, é uma honra ter hospedes, as vezes sinto falta de companhia
nessa casa.- disse o doutor calmamente
- Sei co...
A noite foi longa, o medico voltava de tempos em tempos pra checar meus
ferimentos, de certa forma sua presença era reconfortante fazia-me esquecer da dor.
- Até que você leva jeito pra coisa. - eu disse enquanto Victor passava algum
tipo de pomada em meus cortes
-Te entendo, acho que ele não está muito a meu favor ultimamente...
-Teu braço já está melhor, mas evitaria fazer força com ele, os cortes ainda vão
incomodar um pouco, mas com uma boa noite de sono já não serão um problema.
-Como assim?
-Infelizmente essa é uma pergunta que só você pode achar a resposta, agora
descanse.
Ele saiu e comecei a ouvir o vento assoviando ao passar pela janela, minha
mente borbulhava, o que será de mim agora? Para onde estou indo? O que é tudo isso?
E no meio de tantas duvidas o cansaço finalmente me venceu.
Pulei da cama o mais rápido que pude me sentia ótimo, meu braço quase não
doía, estava novo em folha.
Antes que Cuprie pudesse terminar de falar já corri para a mesa, olhei para um
apetitoso omelete, meu estomago roncava como um trator.
Dei a maior garfada que consegui e comecei a mastigar. Assim que o omelete
entrou em minha boca, fui de uma alegria extrema para uma depressão profunda,
parecia que estava comendo um pedaço de couro temperado com lixo e morte.
- Eu tentei avisar...
- Doutor, fique com a parte da medicina!
Depois de lavar minha língua muitas vezes para passar o gosto, ainda
conseguimos fazer uma breve refeição antes de partimos
CAPITULO 4
Saímos da casa do doutor perto das oito da manhã, não demorou muito até
chegarmos a fronteira da cidade, dali pra frente a única coisa que meus olhos
conseguiam ver era uma densa floresta. O dia estava bonito os dois sois brilhavam por
entre as folhas das árvores, porém, o ar que circulava era suave e fresco. Havia uma
trilha no meio da floresta, quase uma estrada pra falar a verdade, era um caminho um
pouco estreito e com muitas curvas.
Eu nunca havia saído da cidade antes, não era muito da natureza, sabem como é
né? Garoto de apartamento.
Cuprie levou a mão até sua cintura e de baixo de seu manto puxou uma faca,
flexionou seus joelhos e olhou fixamente para uma moita alguns metros a frente.
-Está vindo!
E não, não é um Pokémon, bem que podia ser, mas não, era parecido com um
lobo, porém bem maior e com quatro pares de olhos, por que todo mundo sabe que
qualquer alienígena que se preze tem que ter mais de dois olhos. Nunca havia visto um
pessoalmente, só no remake do crepúsculo, e antes que pergunte, continua ruim.
-Fique quieto!
O animal olhava fixamente para Cuprie, rosnados e latidos pareciam não abalar a
sua determinação. Até que a fera fez a investida, pulou pra cima de Cuprie com a boca
aberta, a fileira de dentes era algo assustador.
Cuprie se abaixou e com um movimento rápido passou por baixo da fera e
esticou seu braço, assim perfurando a barriga do dilupu, o animal gritou em agonia e
acabou aterrissando de lado.
Isso tudo aconteceu em uma fração de segundo, não pensava ser humanamente
possível reagir tão rápido, e ainda proferir um golpe com tanta força a ponto de virar
uma criatura com o peso de um urso, a besta se levantou e avançou novamente na
direção de Cuprie , que desviou para o lado e em um giro atingiu um dos olhos do
dilupu, o que o irritou ainda mais.
-Vai Cuprie!!
-Tsc...
Dessa vez foi Cuprie quem avançou, e fera ficou de pé para atacá-lo com suas
garras,porem Cuprie pulou e cravou sua faca no fucinho da criatura antes que ela
pudesse atacar.
O animal se sacudiu e jogou Cuprie para longe que bateu em uma árvore, vendo
que ele estava caído o dilupu correu para cima pra finalizar sua preza. Então Cuprie
enfiou sua faca na garganta do dilupu, o manto de Cuprie ficou coberto em sangue e o
corpo do dilupu caiu ao chão e o baque da queda se misturou com o canto dos pássaros.
- Foi tipo pau, pou, pei e daí tu pegou e fez iaa, e ele arhggggg e daí...
-Cale-se!
-Ops...
-Vamos temos que ser rápidos- dizia Cuprie enquanto tirava seu manto.
-O cheiro de sangue só nos torna alvos mais fáceis, uma pena, adorava esse
manto...
-Estamos indo para a base, uma aldeia no meio da floresta habitada por apenas
baterias.
Cuprie correu mata adentro e eu o segui a medida do possível, o seu ritmo era
impressionante, nem mesmo o terreno acidentado se mostrava um empecilho pra sua
velocidade.
De repente ouço algo atrás de mim, mal tenho tempo de me virar para perceber o
que era, outro dilupu. Provavelmente em busca de vingança pelo seu amigo.
Todo meu corpo gelou, e em um reflexo rápido minha mão foi ao chão em
direção de uma pedra e com o impulso do movimento rodei no ar acertando o lado
esquerdo da mandíbula superior do dilupu fazendo ele ir para o lado, de onde tirei essa
força?
Com o giro acabei caindo no chão de costas e quando levantei minha cabeça vi a
fera correndo em minha direção, pude ver o ferimento que causei e fiquei impressionado
com a gravidade.
E antes do dilupu chegar em mim um som soou por toda a floresta: um tiro.
Aquele barulho era absurdamente alto, meus ouvidos zuniam e meus joelhos
tremiam, parte por causa da corrida e parte por que quase me borrei.
-Bem vindo de volta Cuprie! Parece que você trouxe carne nova.
-Obrigado Zin!
-Eu sei.
Ainda estava um pouco desnorteado e consegui dar uma breve olhada no
atirador misterioso tinha um cabelo longo e loiro e era um pouco baixinho, não consegui
ver o rosto mas tinha uma voz aguda e um pouco irritante.
Quando me levantei consegui olhar na cara do cara do atirador que para meu
espanto não era um atirador e sim uma atiradora, ela usava um coturno que ia até a
metade de sua canela, calça e colete verdes e uma camisa branca, seu rosto era delicado,
bochechas rosadas e olhos verdes,em contra ponto ao rifle de precisão robusto que
carregava nas costas, o armamento tinha quase seu tamanho. Apesar de aparentar anos
de pratica com a arma, parecia ser bem jovem.
-O importante é que ele está morto, quem se importa onde o tiro pegou?- disse
Cuprie em um tom sarcástico.
-Eu me importo.
-Ele está certo- disse Cuprie sem jeito- Estamos perto, mas ainda sim não é
totalmente seguro.
Ela riu da minha piada, vocês viram?! Quer dizer,eehh.. digo, pois é né? Que
simpática.
-Engraçadinho você... Ela se chama Zin, é uma bateria como nós, ela faz parte
do grupo de caça.
-Grupo de caça?
-Esse cara não tem jeito mesmo- disse Zin dando um tapinha nas costas de
Cuprie- Então vamos, quero chegar logo na base, estou morta de fome.
CAPITULO 5
-Bem vindo à base!- disse Zin abrindo os braços – Aqui é o lar de toda bateria,
um lugar seguro em que podemos viver uma vida normal.
-Vamos logo para o refeitório! - disse Zin enquanto puxava Cuprie e eu pelo
braço
-Vá indo na frente... E leve ele com você, tenho assuntos a tratar com o Nick. -
Cuprie falou em tom sério
-Entendido.
Cuprie se afastou de nós e Zin ficou acompanhando sua trajetória com os olhos
-Ah o Nick ele é como se fosse o dono daqui – respondeu Zin em espanto como
se tivesse acordado de um transe- Ele meio que fundou isso tudo.
-Aqui dentro todos têm uma função, ali na esquerda tem a casa dos fazendeiros,
eles são responsáveis pelas plantações e pelos animais. Logo a cima, a casa dos
caçadores, além de caçar e recolher alguns recursos dentro da floresta como madeira,
por exemplo, eles fazem patrulhas em volta da base, tipo guardas. Ali na direita a casa
dos construtores e artesões, é um grupo pequeno, mas de extrema importância, eles
produzem roupas, armas, moveis e casas. Mais ao fundo a casa dos exploradores, eles
saem para cidade para coletar alguns recursos e servem como mensageiros. Ainda mais
ao fundo tem a casa dos curandeiros, eles tratam dos feridos, distribuem os remédios,
ensinam as crianças e também cuidam da cozinha. Por fim ali no centro fica o salão
principal, onde ocorrem as reuniões e comemorações. Entendeu?
-As casas servem como um centro de encontro entre todos que praticam a
mesma profissão, alguns poucos realmente vivem ali dentro, mas a maioria dorme nas
barracas que tem ao redor.
-E eu?
Agora que eu disse isso em voz alta me bateu uma vergonha alheia.
-Bem, se você não se interessou por nada você pode deixar essa decisão para as
casas e esperar que alguma delas te escolha.
-Como assim?
-Quando algum novato chega e não tem nenhuma casa em mente, as próprias
casas buscam pelo novato, é quase como um leilão.
Comecei a ficar a tonto, as palavras já não saiam mais, minha cabeça doía como
nunca havia doido antes, minha visão foi escurecendo e não consegui fazer nada contra,
parecia que tinha perdido o controle sobre o meu corpo. Acabei desmaiando.
-O que aconteceu com você é normal, todos reagem dessa forma à primeira dose
de CDM.
-CDM?
-Catalisador de mutação, uma droga que potencializa as capacidades de mutação
do vírus.
-Não... - Respondeu Cuprie virando os olhos – Você se lembra do que fez com
aquele dilupu na floresta?
-Sim
-Você não percebeu, mas fez aquilo com o braço que estava quebrado, não acha
estranho uma fratura tão seria se regenerar tão rápido? Sem falar dos múltiplos cortes,
isso não é algo que se cura em uma noite de sono
-O CDM é uma droga desenvolvida pelo doutor Victor , ela faz com o que o
vírus modifique quase todas as estruturas do teu corpo por um determinado período de
tempo, te deixa mais forte, mais rápido, com os sentidos mais aguçados e melhores
capacidades regenerativas. A primeira exposição a ela é a mais duradoura, porém ao
mesmo tempo a mais prejudicial. Seu organismo nunca recebeu esse estimulo antes
então assim que a droga começa perder o efeito seu sistema imunológico entra em ação
e tenta eliminá-la, e isso desgasta muito seu corpo.
-Não se preocupe, vai passar. Aliás, tem alguém ali fora querendo falar com
você.
Então esse é o tal do Nick, ele não parece tão velho quando pensei que fosse.
-Já conheceu o local?- ele perguntou enquanto servia um pouco de água, o copo
quase sumia nas mãos dele.
-Mais ou menos, mas já me explicaram como funciona.
-Obrigado.
Nick parecia ser um homem calejado, cicatrizes no rosto, voz rouca e pesada,
olhos profundos e atentos, parecia que estava analisando sua alma.
-Você teve sorte garoto. - ele disse enquanto virava as costas para mim- Já fazia
tempo que não tínhamos um sobrevivente.
-Bem, eu tenho alguns assuntos para resolver, te vejo a noite para a cerimônia.
-Que ceri...
Uma moça entrou me trazendo comida, afinal, era algo perto de uma hora da
tarde. O cheiro da sopa me fez perceber que já fazia horas que não comia nada, meu
estômago se revirou.
Acho que vou dar uma voltinha então, estava no extremo nordeste da base na
casa dos curandeiros, a casa era relativamente bem grande, a maioria das casas eram
todas em madeira, com alguns detalhes com cordas ou pedras, bem rústico.
Segui até a casa dos exploradores para procurar por Cuprie, ela era bem menor
que a casa dos curandeiros, na verdade, era a menor casa de todas. Dentro dela também
não havia muitas coisas, apenas um quadro com diversos papéis grudados, uma mesa
central que ocupava boa parte do espaço e uma escadaria que levava até alguns quartos
no segundo andar.
Entrei pela porta e fiz uma varredura geral no local com meus olhos, porém não
consegui achar Cuprie.
-Ele está no campo de treinamento- ele disse e apontou para uma porta- Fica nos
fundos.
Passei por aquela estreita porta e me deparei com um campo de areia com alvos
e espantalhos espalhados por toda sua extensão, cercado por muretas de madeira
amaradas por cordas. Havia também alguns estandes de madeira com diversas armas
dispostas: lanças de madeira, adagas, arcos. Tinha de tudo um pouco
Tinha alguns poucos homens golpeando os bonecos, os golpes eram tão fortes
que o som da madeira envergando enchia toda a sala
Cuprie estava no meio do campo e assim que me viu começou a vir em minha
direção.
-Boa...eu acho.
-Não se preocupe, a cara do Nick assusta, mas ele é uma pessoa do bem.
-Imagino... Ele comentou de uma cerimônia, o que ele quis dizer com isso?
Que reconfortante.
-Ta, já entendi. Toma – ele disse enquanto me entregava uma espada curta de
madeira- Vamos ver do que é capaz.
Eu mal fechei minha boca e ele já investiu pra cima, ele empunhava um bastão,
um tipo de porrete, seu passo era firme e a ponta do bastão foi direto em meu peito.
-Desgraçado...
Ele mantinha uma base estável, uma posse de alguém experiente em combate
corpo a corpo, aprendi isso com os filmes de kung fu. Tentei imitar a posição dos pés e
ajeitei minha espada estendendo meus braços pra frente na altura da minha cintura e a
apontando para Cuprie.
Parei imediatamente.
E em um movimento rápido soltei uma das mãos que segurava a espada a girei
violentamente para o lado oposto de que vi a areia sendo jogada, mas não foi rápido o
suficiente, meu golpe foi interrompido pelo bastão de Cuprie, a pancada fez minha mão
quase perder a espada.
Tentei responder, mas antes que eu pudesse falar qualquer coisa Cuprie deu um
chute no meu joelho fazendo eu me virar para esquerda, assim ficando de costas para
ele, e em seguida me deu um golpe nas costelas com o porrete q me fez cair na areia de
dor.
-Recomponha-se!
CAPITULO 6
Uma figura nos olhava do outro lado da cerca, um homem com cabelos
compridos e negros, porém, presos formando quase um rabo de cavalo, um cavanhaque
igualmente longo e olhos castanhos bem escuros, sua pele era um tanto morena e seu
rosto possuía linhas extremamente retas.
Segurava um tipo de chapéu entre o braço e o tronco, parecia uma boina, usava
um manto semelhante à de Cuprie, mas, mais detalhado com bordados nas pontas e um
broche no peito
Cuprie me ajudou a levantar e limpou a poeira de suas roupas.
-Já te falei Cuprie, não precisa dessa formalidade toda- disse o homem enquanto
entrava no campo.
-Força do habito.
O QUE!? PAI?
Dei uma coçada de garganta bem alta, chegou a arder minhas cordas vocais
-Pai, esse é o Lithio, o recruta novo- disse Cuprie com a animação de uma mosca
morta
-Ah,mas que deselegância de minha parte não me apresentar- ele botou a boina e
fez uma posição de reverencia- Me chamo Ilev, sou o líder da casa dos exploradores e
pai desse belíssimo rapaz.
-O meu sucessor? - Perguntou Ilev abraçando Cuprie e enchendo seu peito com
orgulho, Cuprie não estava nem um pouco confortável sendo apertado daquela forma.
O rosto de Ilev ficou vermelho e ele começou a tossir como um fumante assíduo
-Eu sou mais parecido com minha mãe- disse Cuprie enquanto se livrava dos
braços de seu pai- Venha vamos sair daqui, é bom você conhecer melhor as casas antes
do ritual.
-Calma filho- Ilev se esforçava para parar de tossir- Te vejo em casa no jantar!
-Ta bom velhote...
Cuprie me puxou pelo braço com tanto força que ficaram marcas do seu dedo
em meu pulso, tenha uma leve impressão de que ele não se dá muito bem com seu pai
Saímos da casa e eu já podia ver o sol começando a descer, não tínhamos muito
tempo sobrando
Tinha acabado de perceber que ele não estava no meu bolso, será que caiu na
floresta, ou será que eu deixei na barraca perto da casa dos curandeiros, bem pode ter
ficado também no camp...
-Não se preocupa, nós não usamos celulares aqui, nem sinal tem.
-Calma bebe, te dou um novo no natal. - Cuprie disse com um sorriso sarcástico.
A sorte dele que ainda estou um pouco dolorido da luta, se não eu quebrava cada
dentinho dessa merda de boca!
-Que luxo...
Realmente a cabana era muito bem decorada por dentro por mais que por fora só
parece-se uma grande oca com um pano bonito
-E ai, o que achou? - Disse Cuprie enquanto se jogava em uma das almofadas
-Rústico...
-E meu pai...
-E a sua mãe?
Cuprie ficou sério, acho que foi a primeira vez que o vi dessa forma, seus olhos
caíram ao chão e sua mão que antes estava jogada em cima de sua coxa se fechou em
um punho como se segurasse algo
-Não tem problema- Cuprie tentou se recompor forçando um sorriso- Deixa isso
pra lá, gosta de cerveja?
-Tenho umas artesanais, é produzida aqui na base mesmo- Ele estendeu a mão
até um dos armários e retirou uma garrafa – Aqui, prove.
Ficamos ali bebendo por um tempo e jogando conversa fora, o álcool ajudou a
quebrar o clima tenso que tinha ficado no ambiente. Mal vimos o tempo passar.
-Ai ai, essa foi boa- Disse Cuprie enquanto recuperava o fôlego e soluçava.
-Pois é... Vem cá, a gente não precisava estar em algum lugar agora?- eu
indaguei coçando o topo da cabeça
Eu pulei da almofada em que estava sentado o mais rápido que eu pude e sai da
cabana, o sol já tinha praticamente sumido, remanesciam apenas alguns poucos raios de
sua luz
Cuprie tentou fazer o mesmo que eu, porém cambaleou e caiu sentado no chão,
além de derrubar algumas garrafas vazias que estavam ao seu lado.
Ele não era muito forte para bebida, logo nos primeiros copos suas bochechas já
ficaram coradas, além de que ele bebeu no mínimo um terço a mais do que eu.
-A gente tem tempo, só cala a boca e me ajuda a levantar!- ele disse enquanto
estendia os braços em minha direção
Puxei Cuprie e logo que sua cabeça se aproximou da minha o bafo de bêbado
intoxicou meu nariz. Não que eu estivesse muito diferente, mas ao menos conseguia me
manter em pé
Fomos os dois, andando meio em zigue-zague, a vila parecia estar meio vazia,
praticamente a única fonte de luz era o salão principal.
-Nick gosta de enrolar- Cuprie soluçava a cada frase- da aqueles discursos chato
sobre responsabilidade e essas coisas.
-Nunca pensei que ia agradecer por ter palestra antes de uma janta.
-Você abre- Disse Cuprie enquanto tentava se endireitar e parecer o mais sóbrio
possível.
Levantei meu punho direito como forma de ameaça, porém no meio da trajetória
ouvi um som estranho.
Todos dentro do salão estavam olhando fixamente para nós dois. Soltei a gola de
Cuprie que automaticamente caiu sentado, ele parecia não ter entendido o que estava
acontecendo.
-Boa noite cavalheiros- Disse Nick se levantando de sua grande cadeira – Agora
já podemos começar.
-Onde vocês estavam?- Perguntou zin o mais baixo possível e sem mexer os
lábios - Bem, só senta ali que eu cuido do garotão aqui.
Quando eu percebi estava sozinho dentro daquele salão, o som da grande porta
se fechando e os cochichos de todos que estavam presente me fez me sentir como um
inseto
O lugar estava cheio, enormes mesas ocupavam quase todo o espaço exceto um
circulo no centro que possuía um grande tapete bordado, e logo a frente desse tapete
estava Nick em seu trono, como um rei, e ao seu lado duas mesas em forma de meia lua
uma á esquerda e outra á direita com três cadeiras cada.
-Por favor, sente-se... –Nick disse fazendo um gesto com a mão apontando para
uma das mesas.
Seu rosto estava totalmente pálido, olhos arregalados e suava como um animal,
claramente ele sofreria consequências pelos atos de seu filho
A minha vergonha era tão grande que não tive culhões para responder,
simplesmente fingi que não ouvi.
-Não seja assim rapaz- Ele continuo enquanto me abraçava com um dos braços-
Parece que não fui só eu que apreciei sua chegada.
Ele apontava discretamente para uma mulher sentada na mesma mesa de Ilev,
seu cabelo escuro e volumoso chegava até quase os pés da cadeira, duas tranças
mantinham ele preso e formavam um nó em sua nuca, sua roupa branca era quase
imaculada, e da mesma forma que seu cabelo, era extremamente longa.
Um rosto delicado e suave, quase como de uma criança, com maças do rosto
bem desenhadas e rosadas, o que contrastava bem com o tom de pele quase albino que
dominava sua feição. Ela era realmente linda e passava um ar de segurança, seus olhos
eram pequenos mas ao mesmo tempo profundos, ela sorria de maneira meiga, tapando o
centro dos lábios com a mão, da qual só os dedos não estavam encobertos pela grande
manga do roupão.
- Quem é ela? – as palavras saíram de minha boca antes que eu pudesse pensar
em qualquer coisa.
- Naoru, líder da casa dos curandeiros, é muita areia pro seu caminhãozinho
garoto! Pode desistir.
Tentei retomar minha postura o mais rápido possível, e desviei os meus olhos
pro outro extremo do salão