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(Seleção
de textos, revisão crítica e apresentação Heliana Angotti
Salgueiro). São Paulo: EDUSP^OOl.
8. A H I S T Ó R I A LEVA OS A T O R E S A S É R I O ? "
O ato e a ação por muito tempo foram preteridos em benefício das estruturas
de longa duração. O eclipse do ator parece chegar ao fim. A sociedade é agora vista
como produto da interação, como uma categoria da prática social Assistimos a uma
tes (menos de uma centena), que podem ser qualificados, em sua maioria,
baseada na definição dos fatos sociais: "os fatos sociais devem ser interpreta-
dos como relações entre uma pluralidade de atores ou de agentes" (p. XIII);
* Thistoire prend-ellc les acteurs au séricux?", cm Espaces Temps, les cahiers, 1995, n. 59-60-61 (Le temps
1. R. Boudon e F. Bourricaud, Dictionnaire critique de lã sociologie, Paris, PUF, 1982. [F.d. em português:
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(ausente nos sociólogos), mas não se encontra "ato" ou "ação". Seus substi-
uma ação (intencional ou não, coletiva ou não), também não consta, mas
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esfera dos esquemas explicativos que ela utilizou nas duas ou três últimas gera-
,/A análise interna dc uma produção diversificada corre vários riscos, dos
1798, idoso demais para lecionar, Kant publica o texto de seus cursos dos anos
encontra uma definição fundadora das ciências do homem distintas das ciências
homem, enquanto ser de livre atividade, faz ou pode ou deve fazer de si mes-
da instituição do homem por ele mesmo. Ela também propõe, em poucas pala-
3. V. Dcscombres, "Sciences sociales, sciences pragmatiques", Critique, 529-530, jun.-jul. 1991, pp 419-426.
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utilizarei essa definição da ciência pragmática nem como emblema (ela figuraria
então como exergo), nem como ponto de encontro (eu fingiria então descobri-
la ao fim de minha explanação), mas apenas, por sua feição sistemática, como
grade destinada a situar melhor, uns em relação aos outros, os diferentes ele-
do dos t r a b a l h o s de Wallerstein e r e t o m a d o na s ú m u l a b r a u d e l i a n a
4. F. Braudel e E. I.abroussc, Histoire cconomiquc ct sociale de la France, t.l, Paris, PUF, 1970.
5. F. Braudel, Civtlisation matérielle, économie et capitalismc, XVf-XVIIf süele, Paris, Armand Colin, 1979.
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' „ tinham "efetivamente acontecido" e dos motivos das personagens que estavam
e m s u a or
. "V ' g e r n » e s t e toma o essencial emprestado a Durkheim por intermédio
r
de Simiand. Trata-se de indicar variações concomitantes e regularidades estrutu-
y . o • j; ( ~~ , b
j ; ' 'jais, isto é, de submeter dados agrupados a tratamentos estatísticos adequados.
V
„-. V* J v U m segundo motivo deve-se buscar do lado do esquema causai adotado.
<> mia, que o autor, para efeito retórico e por referência à atualidade da época,
y
personifica e eleva à condição de personagem central: "Falou-se, a respeito de
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, -j*- Revolução inscreve-se então como o efeito de uma conjunção de causas inde-
longo "quase desde sempre" das oposições sociais, tempo cíclico das evoluções
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v
, econômicas, tempo curto das estratégias e das imputaçÕes políticas. Desde que
6. F.. Ijbrousse, "Commenr naissene les Rívolutions?", em Actesdu congrcihistoriquede la Rívolution de 1848,
pp. 1-20.
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/ 1
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valor emblemático 7 /
REPRESENTAÇÕES COMUNS
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pelo conjunto da obra dc Jacques Le Goff e pelos trabalhos da segunda fase de
y c novos objetos. O corpo (e não mais a mortalidade), a vida amorosa (e não mais
nham agora o verdadeiro estado desta ou daquela sociedade antiga. Dessa mu-
, - ^dança de objeto resulta uma desqualificação do método quantitativo em favor
^ não estava muito equipada). Daí resulta ainda uma modificação dos esquemas
>J
V" y^ V <b temporais de
' "referencia: a inércia
. . das
. " categorias fundamentais das culturas leva a
>.-' quase imóvel. Braudel já escrevera: "as representações mentais são prisões de >.j
.: f longa duração".i1'!' J
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m termo característico da historiografia francesa encabeça o catálogo dos S r "
objetos particulares cujo estudo se tornou então pertinente: as "mentalidades" Jé, ^ ' V'
7. J. Ranciire, Les noms de 1'histoire. Estai depoétiquedu savoir, Paris, Scuil, 1992.
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partilhadas de que apenas a escala (ou seja, a identificação dos limites dos grupos
j- que a partilham) está por determinar. A natureza das relações entre a representação.
Mais abrangente, a representação possui, assim, uma dignidade maior que justifi-
ca o fato de lhe darem uma atenção preferencial. JPor simetria, nessas condições, a .
j nf -vf y • taçÕes
* " do mundo que os sustentam (e, dessa forma, o número de missas que
° " • devem ser rezadas para o repouso da alma dos defuntos ou o das velas que devem
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ser acesas são tomados como indicadores pertinentes não da prática religiosa, mas
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se, para Soboul, de "indicar o verdadeiro lugar dos sans-culottes parisienses, [...]
culotte e tão bem desindexada do processo revolucionário, que pôde ser objeto,
de tão distanciada dos registros dos valores familiares quanto normas econômi-
dos dois níveis de análise ao mesmo tempo. Mas isso significa resolver de fora a
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A S O C I E D A D E ? UM DECALQUE
uma historiografia que nós separamos, mas que têm em comum o esquecimen-
tros termos, a definição de qualquer sociedade antiga era obtida por dedução,
não era saber o que a sociedade, sendo formada de seres de livre atividade, faz
• O RESTABELECIMENTO DA CONFIANÇA
.fA análise, para ser completa, deve agora percorrer a vertente inversa para
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ção da pilhagem são seus aspectos descritos com mais freqüência. Juntos, eles
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V^' O1"' - \fí operários, que se instalaram primeiro cm Lyon, em caráter experimental, cm
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12. A. Couttcreau, "Justice et injusticeordiniiresur les lieux de travail d'après les audiences prud'hommales
(1806-1866)", LeMouvement Social, out.-dci. 1987, pp. 25-59. e "Espace public et capacite dejuger. I j
stahilisation d'un espace public en France aux lendemains de Ia Révolution", Raisom Pratiquei n. 3, Paris,
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Y
sua dimensão mais singular: um tecelão que sofreu uma redução de salário por
haver realizado um ato que não considera contrário aos regulamentos ou aos
desenvolve como uma relação direta entre indivíduos, que não podem fazer-se
confrontam seus pontos de vista sobre o caso; cada uma reescreve, dotando-o
Mas, seja porque a conciliação reforça seu caráter de uso reconhecido, seja
porque a decisão do conselho lhe confere uma sanção jurídica, por generaliza-
ção, o uso torna-se uma ordem legítima, nascida da interação social, no âmbi-
to da jurisdição l o c a l /
randos propõem, a partir do ano VIII, que os conflitos do trabalho sejam arbi-
trados por júris formados de patrões e empregados: embora com grande pru-
dência retórica, eles estabelecem um elo entre esses júris e as jurandas de outrora.
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afasta a instituição das práticas do Antigo Regime. Poucos casos, como disse-
conselheiro patronal c um conselheiro operário), mas não apela para sua arbitra-
^ viam com recurso a uma terceira pessoa em situação social superior à dos prota-
1
k^/yv ^ gonistas, a solução apóia-se numa dinâmica igualitária, em vez de reativar, e
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desse modo reforçar, a hierarquia social. Trata-se, pois, da duplicação de princí-
pios revolucionários? Poderíamos crer que sim, já que essa prática organiza um
ções a instituição tem por função exatamente igualar por um momento. Mas a
diferença decisiva: não mais a Nação, e sim o escalão local; não mais a delegação
* eletiva, e sim o frente-a-frente dos protagonistas; não mais a lei universal, e sim
a
o-' regra local,'A reativação na ação, à custa de uma espécie de bricolagem inter-
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' pretativa de experiências indexadas em passados diferentes, encontra-se assim
A S O C I E D A D E ? U M A C A T E G O R I A DA P R Á T I C A
De um lado, trata-se desta vez "daquilo que o homem, enquanto ser de livre
detalhamento, esse modelo parece muito propício ao ajuste dos efeitos provocados
V ' .
P c l a inclusão da ação e do ator nas proposições interpretativas, Destacarei os prin-
cipais efeitos disso sobre duas questões: a do objeto c a do modelo interpretativo.
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ria. Ela não é mais definida como uma das dimensões particulares das relações
como uma categoria da prática social. Para organizar suas estruturas ou regular
suas dinâmicas, a_s_ociedade não dispõe de jiçnhum ponto fixo (de natureza
trução de uma dada ordem manufatureira passa pela ativação social, na esfera
sociedade constitui para si mesma (ou seja, para todos eles) seu próprio motor e
técnica da produção ou por uma disciplina de ateliê) não têm mais natureza,
apenas usos. Isso significa que, dentro dos limites impostos pela situação, eles
guesia) assegura sua estabilidade, já que, a cada momento, elas se tornam aquilo
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elas sejam. Ao mesmo tempo, o que faz uma sociedade manter-se coesa (sem o
abalada e como o acordo sobre o papel eminente do monarca foi desfeito por
que ela ocorre (desde o caso de rapto de crianças na Paris de 1750 19 até o
14. J.-P. Dupuy, Ijipanique, Paris, Synthc-l j b o , col. "Les cmpécheurs dc penser en rond", 1991.
15. L. Boltanskie L.Thévenot, De Ltjustification. Les économiei de la grandeur, Paris, Gallimard, 1991.
16. C.Topalov, Naissancedu chômeur, 1880-1910, Paris, Albin Michel, 1994.
17. S. Kaplan, l*complot defamine. Histoiredune rumeurau XVIlf siècle, Paris, ArmandColin, 1982.
18. A. Dcsrosières, Ijipolitique desgrands nombres. Histoire de lã rauon statistujue. Paris, I j Découverte, 1993;
E. Brian, Lã mesurede iÉtãt. Administniteurs etgéometres auXVTÍf silcle, Paris, Albin Michel, 1994.
19. A 1-argcc J. Revel, Logiquei delafoule. Lafjairedes enUvementsd'enfants. Paris, 1750, Paris, Hachetre, 1988.
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mudanças de paradigmas são reconhecidas por sua capacidade para esse tipo de
reorganização de conjunto.
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enfim, é menos precisa (seria mais difícil traduzi-la num sistema de datas, a
menos que espaçadas) e concerne a várias décadas: nela são evocados tanto o
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prazo (as jurandas dos protagonistas dos episódios da restauração de uma or-^
9
d e m econômica durante o Consulado são, em parte, desejadas, e suas virtudes
depois, quando das medidas tomadas por Turgot em 1776 e do debate feroz que
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elas suscitaram...), mas um recorte feito do exterior, e apriori, das durações e de
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sua articulação. Assim, essas cronologias fazem do presente da ação o tempo da
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história20/
-yT francês com o título Le futur passé, para a variação histórica dos modelos
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}J temporais empregados na ação e para a pluralidade das formas de articula-
í ção, no presente, do passado e do futuro 2 1 . Levar suas análises a sério é
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' ^ esforçar-se por reconstituir o caráter dos horizontes temporais dos atores
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da história. Estes põem à prova, na ação presente, formas passadas e valo-
tóctones;/
20. B. Lepetit, "Le présent de 1'histoire", em La forma de 1'expérience, op. cit.. n. 13, pp. 273-298.
21. R. Koselleck, Lefutur passé. Contribution à Ia simantujue da temps historiques. Paris, Ed. de 1'EHE.SS, 1990.
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<r., de Bergson) coloca-o em posição constatativa. Como têm sua fonte na seqüên-
mente não encontram sua razão de ser em nenhuma outra parte que não em seu
ticularmente f r a c o /
ciências sociais. Para fazer frente à objeção, uma solução consiste em explorar / V
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nutras. O modelo descritivo, para o qual o sociólogo Louis Qucré, em especial,
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0 y»/1 vem chamando a atenção há vários anos, é desse tipo 22 . Modelo mais fraco dc
(então se falará em descrição processual, que apreende a ação segundo suas coor-
denadas espacial e temporal) e à questão "por quê?" (então se falará que a descri-
22. l/>uis Quérec, "Le cournanr descriptifcnsociologic", Current Sociology, vol. -40, n. 1, 1992, pp. 139-165-
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ção é semântica, uma vez que ela relaciona a ação a seus contextos de sentido). A
desses dois registros (em cuja articulação ainda é preciso pensar). Destaque-se
também, pois é preciso terminar, que suas capacidades heurísticas estão histori-
camente atestadas: ela constituiu no século XVIII uma das bases do projeto dos
ções sobre as linguagens, uma reflexão cujo dossiê hoje valeria a pena reabrir/
23. Dcnis Reynaud, "Pour une théorie de Ia dcscriptiun au XVIII'sièclc", Dix-HuitibneSiècle, n. 22,1990, pp.
347-366.
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