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CURSO DE PSICOLOGIA
ARACAJU/SE
2018
ERICK DE JESUS ALMEIDA
RODRIGO DILLAN JOSÉ SANTOS LIMA
THÉRCIA TAMILLES DE SOUZA MOTA
ARACAJU/SE
2018
ERICK DE JESUS ALMEIDA
RODRIGO DILLAN JOSÉ SANTOS LIMA
THÉRCIA TAMILLES DE SOUZA MOTA
Aprovado em:
Banca Examinadora
1. INTRODUÇÃO........................................................................................................... 9
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................ 38
9
1. INTRODUÇÃO
seriam pessoas entendidas como qualquer outro usuário das redes, porém com uma gama
de seguidores muito acima da média e que são capazes de movimentar aqueles que os
acompanham a mudar opiniões, comportamentos e visões de mundo através de suas
postagens, como uma espécie de modelo que as pessoas querem ser.
Esses modelos podem ser definidos como uma estruturação estética da
personalidade do sujeito, moldada em recortes daquilo que pode (por ser atrativo de
visibilidade) e deve (por ser socialmente desejável) ser exibido nas redes (SIBILIA, 2008;
ZHAO, 2008). O indivíduo passa a ser um composto de fragmentos de sua personalidade
articulados para um grande público interessado em consumir seus relatos cotidianos como
forma de legitimá-lo e legitimar-se (SANTA CRUZ, 2014). Com base nisso, é
fundamental discutirmos sobre a fantasia, conceito fortemente disseminado por Freud e
Melanie Klein, e que tem, primariamente, o propósito de ser um aporte para a construção
da realidade exterior a partir de uma realidade psíquica.
Serão levantadas reflexões acerca do que as redes sociais virtuais geram na vida
moderna, permeando assuntos como a necessidade de compartilhamento das experiências
cotidianas dos usuários, a tendência ao exibicionismo e a espetacularização de si e a
influência midiática na construção de perfis e estilos de vida entendidos como almejados
ou ideais, todos reflexos de uma necessidade de consumo como desenvolvimento da
subjetividade ou de experimentar-se como algo diferente do que se percebe (PINHEIRO,
2009; MOREIRA; JESUS, 2010; SILVA; TESSAROLO, 2016).
Portanto, entendendo a constituição da subjetividade do indivíduo como
estruturada através de suas relações com as pessoas e o ambiente e os significados que dá
para elas, perceber como essas relações se estabelecem quando mediadas por aplicativos
através da internet é fundamental para tentar compreender como se estrutura seu
funcionamento em uma perspectiva pós-moderna líquida e imediata que resulta em
atitudes em busca da visibilidade social e do destaque individual através das redes. Esse
campo de estudo se encontra trabalhado em áreas como Marketing e Publicidade, mas se
faz necessário observar o assunto pelos olhos da base filosófica da Psicologia para então
questionar como são essas formas de representação social e comportamento humano.
Para melhor entendimento do que aqui é proposto, a divisão dos capítulos
consistiu em: primeiramente um contexto histórico sobre a origem da internet, a inserção
dos sujeitos nesse novo ambiente cultural e relacional e, por fim, a presença da mídia e
marketing nas redes sociais; o segundo capítulo consiste em uma discussão acerca da
influência político-econômica pós-moderna na subjetividade dos sujeitos e seu efeito na
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construção dos perfis nas redes sociais; o terceiro capítulo elucida os conceitos
psicanalíticos de desejo e fantasia de Freud e Klein, bem como o conceito de virtual de
Pierre Lévy, como fundamentos estruturantes da compreensão da realidade no meio
virtual. Nas considerações finais, propõe-se a associação entre os conceitos levantados
nos três capítulos como arcabouço para o desenvolvimento do termo instagramização da
vida.
1.1 Método
O uso de tecnologias virtuais que se centralizam na internet deu início à uma forma
específica de cultura, chamada de cibercultura (ROSA; SANTOS, 2015). Os autores
supracitados definem esse termo como uma união de processos nos âmbitos da
tecnologia, mídia e interação social, que teve começo por volta dos anos 70, época do
grande avanço das comunicações telefônicas e virtuais. Segundo Capobianco (2010), o
avanço tecnológico que atinge a maior parte dos setores define as bases da cibercultura,
mas esta necessita de uma nova forma de organizar-se em relação ao trabalho, lazer e
comunicação das pessoas agora imersas na tecnologia. De acordo com a autora, a
cibercultura e suas delimitações ou características são construídas à medida que cresce
sua utilização, eficiência e acesso, mas ainda é fundamental que se conceitue de forma
mais abrangente o que possa ser cibercultura, visto que a mesma engloba a diversidade
tão característica do mundo digital.
A fim de então aprofundar esse conceito, é necessário entender o significado dos
termos ciberespaço e cultura. O ciberespaço é um local que se afasta do espaço cotidiano
e se instala em um ambiente de liberdade de expressão (LEMOS, 2006) e entende-se sua
origem em setembro de 1969, pela ARPA (Advanced Research Projects Agency), com o
nome de Arpanet. Reino (2015) afirma que a Arpanet foi uma resposta à necessidade de
melhoria no sistema de comunicação entre os centros de pesquisa na época,
descentralizando as informações e ampliando a sua propagação. Segundo Castells (2001),
em 1983 o Departamento de Defesa dos Estados Unidos decide criar a MILNET, uma
rede independente de uso exclusivamente militar, pois se criou a preocupação com
possíveis brechas na segurança, enquanto a Arpanet se tornou a ARPA-INTERNET, e foi
dedicada a fins acadêmicos e de pesquisa. O autor afirma ainda que no início da década
de 1990 o Departamento de Defesa decide comercializar a internet e a descreve como um
ambiente com vários provedores de serviços da Internet com suas próprias redes com
portas de comunicação e pontos comerciais.
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A internet passa por três grandes fases, as Webs 1.0, 2.0 e 3.0. A primeira delas,
afirmam Madeira e Gallucci (2009) pode ser vista como a primeira geração da Internet
comercial, seja para uso pessoal ou empresarial, que ainda não desenvolvia muitas formas
de interação entre seus usuários, principalmente pelos serviços nela disponíveis (criação
de sites e páginas) terem preços acima do mercado, o que restringia o interesse e o acesso
de muitas pessoas ao serviço.
A Web 2.0 facilita a interação entre pessoas físicas e empresas. Dessa grande
interação, surgem as redes sociais, que se tornaram mais populares a cada dia. Sua
principal característica é o sistema fácil e intuitivo, não utilizando de conhecimentos
técnicos. Sendo assim, como afirmam Madeira e Gallucci (2009, p. 7), “esta é, portanto,
sua principal característica, a forte participação dos usuários na elaboração e edição dos
conteúdos publicados”.
Atualmente a internet se encontra na fase 3.0 da Web e é baseada na interação
entre usuários em tempo real. Madeira e Gallucci (2009) descrevem os ambientes virtuais
comuns como jogos interativos online e ambientes virtuais em geral. Além disso, hoje
possuímos a mobilidade com nossos Smartphones e Laptops, o que dá mobilidade ao
usuário, que pode postar conteúdo quando quiser.
A cultura, por sua vez, pode ser entendida como uma criação coletiva de pessoas
que partilham ativamente suas experiências trazendo consigo suas próprias percepções
sobre o que vivenciam e que carrega uma simbologia que o sujeito interpreta
singularmente, afirma Leme (2003). A cultura também pode ser vista como “conjunto de
experiências humanas (conhecimentos, costumes, instituições, etc.) adquiridas pelo
contato social e acumuladas pelos povos através dos tempos” (LUFT, 2000, p. 209).
A partir do estudo entre ambos os conceitos e suas relações, compreende-se que
“a cultura contemporânea, associada a tecnologias digitais (ciberespaço, simulação,
tempo real, processos de virtualização, etc.) vai criar uma nova relação entre a técnica e
a vida social que chamaremos de cibercultura” (LEMOS, 2013, p. 15).
Segundo Bolesina e Gervasoni (2015), a cibercultura tem sua origem nas
comunidades do Vale do Silício em um movimento de corrente oposta ao modelo
hierárquico e linear adotado na época, partindo da premissa de construir um “novo
mundo”, desenvolvendo habilidades que gerassem uma autonomia e autenticidade
individual e se desvencilhasse do modelo engessado de produção de cultura, adotando
símbolos que edificassem essa nova visão como “as ideias de liberdade (s),
simultaneidade, fluidez, adaptabilidade, experimentação, empoderamento e
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uma interação maior, mais dinâmica e que há uma influência bilateral do sujeito
(PEREIRA; MORAES, 2003).
Moreira (2010) ainda afirma que a mídia virtual viabiliza o efeito das propagandas
a partir do momento que adotam uma postura de se equiparar ao sujeito que recebe a
mensagem, tornando seu produto mais real e palpável. Seu ambiente de liberdade do
usuário entrar em contato apenas com o que lhe interessa significa que o mesmo busca a
propaganda por desejar vê-la; esse é o grande trunfo da propaganda pela internet, a falsa
sensação de realidade e liberdade, de forma que o sujeito “pode escolher” o que absorverá
de mídia e o que absorverá de lazer.
Com esse espaço de frequente troca de informações de forma casual, o
investimento em mídia e influência passa a se concentrar em pessoas que, entre os muitos
nas redes sociais, possuem mais destaque e são capazes de mobilizar comportamentos e
opiniões de grande parte de seus seguidores: os influenciadores digitais (SILVA,
TESSAROLO, 2016). Os autores propõem que através da incessante oferta de produtos,
empresas e promoções, sejam esses novos ou não, o cidadão se vê perdido em meio a
tanta informação e, por isso, passa a procurar por meios que já conheça ou tenha sido
indicado entre essa enxurrada de propostas; essas indicações por vezes vem dos
influenciadores digitais.
A partir do momento que são vistos pelo seu público enquanto inspiração ou
símbolo de identificação, seus seguidores querem “usar o que eles usam, faz parte do
processo de se sentir ‘gente como a gente’. São pessoas ‘comuns’ como o seu público,
mas com um estilo admirado por uma multidão” (SILVA, TESSAROLO, 2016, p. 6).
Quem reitera esse pensamento é Keen (2012, p. 71):
A rede digital de hoje está transformando a amizade em mercadoria [...]
Riqueza corresponde a conectividade no mundo da web 3.0. Portanto, quanto
mais ‘amigos’ você tem no twitter ou no Facebook, mais potencialmente
valioso você se torna em termos de levar seus amigos a comprar ou fazer
coisas.
realidade, permitindo ao sujeito que se liberte das amarras que vivencia cotidianamente e
possa testar como seria se fosse diferente (MOREIRA, 2010).
Os autores Oliveira, Vilar e Barros (2017) discutem o exibicionismo que traz a
busca por reconhecimento em redes sociais e sua decorrente exposição, na qual abordam
a perspectiva de que o like passa ser o fator necessário para a felicidade e que para
consegui-lo as pessoas podem se expor ao máximo, deixando de lado sua segurança e sua
privacidade. Silva e Tessarolo (2016) trazem mais fatos para esse argumento ao afirmar
que, por a internet ser um polo de livre emissão, ou seja, que qualquer um pode adicionar
conteúdo a ela, não é incomum que um assalto a ônibus seja gravado por um passageiro
do mesmo, levantando o questionamento sobre o quanto as pessoas estão dispostas a se
comprometer para obterem reconhecimento nas redes sociais digitais.
A necessidade de ser percebido e a procura por um destaque nas redes sociais
virtuais alinhadas ao avanço da mídia e do marketing com seus investimentos em
influenciadores digitais, com suas frequentes publicações e seus estilos de vida
diferenciados, orientam os usuários para uma busca do perfil ideal e que, ao obtê-lo, essa
perfeição possa ser transferida para além da tela do celular ou computador (SILVA;
TESSAROLO, 2016; MOREIRA, 2010). Mas o que constitui um perfil enquanto ideal?
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Guattari, segundo Carvalho (2016), é o autor que fala a respeito de uma sociedade
capitalística, sendo este termo um indicativo de que há um transbordamento dos limites
das sociedades qualificadas como capitalistas. É neste tipo de sociedade que se encontram
um conjunto das relações humanas com certas delimitações quanto ao tipo de produto, de
consumo, troca, circulação de bens, etc. Guattari inspira-se na tese de Marx (1999), em
sua obra Para a crítica da economia política, no qual é possível observar uma relação
entre o valor da mercadoria e como este é ligado de forma intrínseca aos modos como
fora produzida, seu consumo, sua troca e até a sua circulação. (GUATTARI, 1996 apud
CARVALHO, 2016).
Se antigamente havia uma necessidade de justificar o consumo, Pinheiro (2009)
define que atualmente essa justificativa pode (e será aceita se) se resumir ao prazer
pessoal, pois consumir é dar liberdade às vontades e fantasias do sujeito, tornando-se o
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protagonista de seu próprio incentivo. É com base nisso que se conceitua a sociedade do
consumo, sendo ela correlacionada à sociedade capitalística como um prazer em desfrutar
o próprio desfrutar como forma de produção de subjetividade: o consumo se faz parte
constituinte da personalidade do sujeito (CARVALHO, 2016).
Segundo Camargo (2014), ao perceber uma semelhança no funcionamento da
produção e condução da economia e, consequentemente, da subjetividade de
determinadas sociedades, Guattari optou por agrupá-las no que chamou de sociedade
capitalística. (CAMARGO, 2014).
Há uma produção subjetiva que acaba oferecendo um gabarito a demandar
respostas corretas de cada modo ser de seus sujeitos. Sendo assim, mesmo em
uma sociedade não industrializada encontraremos uma “indústria” que produz,
que faz circular e que enfatiza o valor de troca de apenas um certo número
reduzido de códigos culturais, sociais, simbólicos, estéticos, linguísticos,
éticos, etc. conforme as regras instituídas para os seus consumos. Em nosso
caso, ou seja, o da sociedade industrializada, a sociedade capitalística “é uma
máquina significante que predetermina aquilo que deverá ser bom ou ruim para
mim e meus semelhantes nesse ou naquele ambiente potencial de consumo”
(GUATTARI, 1974, p. 127 apud CARVALHO, 2016).
mais. Já a sua alma externa, a qual se constitui pelo status que o posto de alferes lhe
concedia, passava a ser a sua nova identidade. Na segunda situação, a autora cita a revista
estadunidense TIME, que em 2013 elegeu “Você” como a personalidade do ano,
colocando na capa da revista, um papel espelhado, de forma metafórica.
A partir das informações supracitadas, pode-se inferir de maneira análoga que as
pessoas até então vistas como pessoas “comuns” podem passar a alterar suas relações
com as mídias sociais ao se tornarem importantes formadores de opinião. Ambos os casos
são importantes meios para ilustrar como os aspectos externos, isto é, a visibilidade,
torna-se uma questão relevante, desde o século XIX, até a sociedade ocidental em virtude
daquilo que o indivíduo realmente é. (RODRIGUES, 2017). Segundo Debord (2003), a
modernidade dá mais destaque à representação do que à vivência do acontecimento, ou
seja, o foco está naquilo que é notório e seus efeitos sociais e não no acontecimento
original. Portanto, “o espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social
entre pessoas, mediatizada por imagens” (DEBORD, 2003, p. 14) que, de acordo com
Santa Cruz (2014), passa a invadir os ambientes sócio relacionais dos sujeitos de forma
material.
Sibilia (2008) relata que, no século XIX, para entrar em contato com a sua
subjetividade, era fundamental ter um local isolado da interação externa que permitisse
ao sujeito ser como originalmente é, pois o ambiente público lhes impunha normas que
impossibilitavam de dar espaço aos impulsos e desejos. Era como uma espécie de refúgio
em que a pessoa pudesse ampliar seu autoconhecimento, externalizar o que sentia e
pensava sem a presença de uma outra pessoa: o que ali acontecia, ali ficava. Kallas (2016)
complementa esse raciocínio ao discutir que a partir do avançar dos anos é possível
perceber que o homem se estrutura, subjetivamente, pelos moldes sociais estabelecidos
em sua época. Enquanto há algumas décadas atrás os limites da intimidade eram
estabelecidos pelas paredes dos quartos e pelas páginas dos diários, atualmente, com o
avanço da tecnologia e das redes sociais virtuais, tais paredes se tornaram efêmeras e
irrelevantes. Através dessa presença cada vez mais forte do mundo virtual em nossas
vidas, somos permitidos pensar em o quanto isso influencia na formação da subjetividade
e no modo de ser e viver do homem contemporâneo.
A cultura do espetáculo faz com que essa cisão entre público e particular, que era
fortemente definida, passe a distorcer-se, de modo que os sujeitos se sentem inclinados a
mostrar sua rotina diária (SANTA CRUZ, 2014). Ainda com base nos pensamentos deste
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autor, a exibição é uma forma de ser notado (percepção que era exclusivamente de nobres)
e, por consequência, uma fonte de poder em relação aos outros.
As mídias sociais apenas intensificaram esses valores que surgiam no século XIX.
Goffman (2004) afirma que as atitudes do sujeito no ambiente social já eram ligadas às
expectativas do outro, mesmo sem a existência de redes sociais, podendo utilizar do
exemplo de atores (e aqui falamos de atuação cênica de fato e não do conceito de
participantes das redes sociais) que almejavam demonstrar uma impressão específica
àqueles que os assistem, fazendo uso de linguagem, expressão corporal e outros recursos
para enriquecer essa interação. O autor salienta que o indivíduo está em constante procura
pela noção das opiniões externas sobre si para controlá-las e que, com o advento das redes
sociais, essa característica se mantém a partir do momento em que o usuário modela seu
perfil em geral para convencer os outros daquilo que exibe (GOFFMAN, 2004).
De acordo com Rodrigues (2017), é utilizando essa ressignificação da visibilidade
que ocorreu no século XIX que é possível perceber a transmissão desses valores em um
movimento hierárquico, do topo para a base da hierarquia. Portanto, as redes sociais
amplificaram a relevância do valor de exteriorizar da vida cotidiana, que é seguido com
outros dois valores em paralelo: a visibilidade e a espetacularização de si, em um processo
que tem começo nas camadas mais altas e, aos poucos, se espalha para as mais diferentes
classes – um funcionamento semelhante aos influenciadores digitais da atualidade
(RODRIGUES, 2017).
Goffman (2004) define o conceito chamado “fachada” como tudo que o indivíduo
utiliza para expressar aquilo que o representa. No entanto, nas redes sociais não existe um
espaço físico que delimite essa expressão e sim um espaço virtual, o que leva Rodrigues
(2017) a compreender o perfil do usuário de mídias sociais como a “fachada virtual”: sua
descrição de si, interesses, imagens, o que escreve e compartilha.
É nesse espaço que ele publica fotos que mais gostam, tem acesso à opinião
das pessoas sobre seu visual na rede, “curtem” páginas com conteúdos que os
interessam. Além de ser o lugar em que eles interagem com seus laços virtuais,
ao visitar outros perfis, consegue encontrar pessoas com pensamentos e gostos
semelhantes. Dessa maneira, ao encontrar um espaço em que ele pode montar
sua identidade, ter acesso a informações que o interessam e achar pessoas com
gosto em comum, nesse mundo tão conturbado e fragmentado, o jovem
encontra certo sentimento de pertencimento. Ele percebe que não está sozinho
no mundo. (RODRIGUES, 2017, p. 31-32)
que intensifica o individualismo, de forma que existir significa ser visto no ciberespaço,
o que acarreta em uma necessidade de se constituir como parte dessa sociedade em rede,
apropriando-se do ambiente virtual pela construção de um novo “eu” manifesto neste. Se
o usuário não atualiza seu perfil, não será reconhecido e tampouco o sentimento de
pertencimento será alcançado (SIBILIA, 2008; RECUERO, 2009).
Santa Cruz (2014) define esse funcionamento como uma busca de significado para
a própria vida através da produção e descoberta de novas identidades ao passo que
compartilhar seu cotidiano é deixá-lo mais verdadeiro e, portanto, sua experiência mais
realista, transformando a exibição do seu íntimo como também uma forma de se
reencontrar e autoconhecer.
Segundo Pinheiro (2009), é a estrutura que compõe cada perfil nas redes sociais
que as deixam atrativas, à medida que o usuário pode descrever-se e chamar a atenção
dos outros para si enquanto dá espaço para estetizar sua própria personalidade, seja
descobrindo mais sobre um self que não entra muito em contato ou liberando suas
fantasias e, a partir daí, escolher quem verá o que sobre seu perfil. Esse ato de expor-se
de forma seletiva faz parte do processo de se inserir em uma rede que dá constantes
feedbacks sobre o sujeito, através de julgamentos, manifestações de afeto e opiniões,
fatores que reforçam a inserção de mais produtos (postagens) e consumo (reações às
postagens) no contato relacional entre os participantes dessa rede.
A constante reformulação da identidade nas redes sociais é evidenciada pelo
pensamento de Rosa e Santos (2015), quando os autores pontuam o uso das redes como
canal libertador, sem amarras físicas e que, por vezes, são veículos para reencontrar
pessoas do passado, como amigos de infância ou colegas de escola. É então permitido ao
usuário reinventar-se ou, ainda, reciclar suas vivências em um modelo presente. Esse ato
de rebuscar o passado é fundamental para a elaboração identitária, pensamento
corroborado por Recuero (2008 apud ROSA; SANTOS, 2015) ao discutir que uma nova
identidade se forma à medida que o sujeito participa de grupos virtuais, promovendo uma
troca entre suas experiências e as experiências dos participantes, gerando uma vinculação
subjetiva nos membros. Seria, então, uma negociação de identidades em um processo de
legitimação de si e do outro que interage em direção ao pertencimento naquele local.
As redes podem, então, serem vistas por duas perspectivas: um ambiente ilusório
e fluido, no qual a intimidade do sujeito é constantemente exposta e consumida por outros
usuários através de uma mercantilização de si que é paga com visibilidade, pautada na
divulgação e celebração de atos sem significado e, por outro lado, como um resgate ao
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é nem aquilo que o sujeito recusa e suprime em sua personalidade nem aquilo que é
completamente pautado na fantasia ideal. O self esperado significa uma identidade
socialmente desejável que o sujeito gostaria de apresentar aos outros e que, embora
alcançável, ainda não sabe como.
Zhao (2008) discute que não há diferença direta entre as identidades virtuais ou
reais, visto que ambas tem impacto significativo na vida dos sujeitos que as vivem. O self
esperado conceituado no parágrafo anterior é entendido como uma identidade que ainda
não está completamente estruturada fora de um ambiente digital e, ainda que se diferencie
da personalidade já estabelecida pelo sujeito no ambiente offline, é tão verdadeira quanto,
à medida que atinge subjetivamente o sujeito em tamanha proporção. Ainda com base no
autor, podemos afirmar que identidades são construtos subjetivos que as pessoas
convencem umas às outras a pensar sobre si, sendo irrelevante onde essas identidades
foram construídas (online ou offline) e como elas são vistas (socialmente desejáveis ou
refutáveis).
Discutimos neste capítulo sobre o efeito do cenário político-econômico na
subjetividade contemporânea e seu reflexo na formação identitária dos sujeitos nas redes
sociais virtuais. Identidades estas que podem ou não ser estruturadas com base em
exibicionismo e espetacularização de si, mas que com certeza sofrem influência do
feedback social, culminando no termo estetização do self, que consiste em uma elaboração
e estruturação organizada de sua personalidade em relação ao outro.
Se Rodrigues (2017) metaforiza o espelho como uma distinção entre o eu interior
e o eu exterior do sujeito que, por vezes, não consegue enxergar-se como gostaria de ser,
digamos que as redes sociais virtuais possam funcionar como uma vitrine pessoal em que
o usuário pode expor seu modelo ideal de si. É preciso entender essa perspectiva de um
ponto de vista neutro e, por isso, discutimos tanto os aspectos positivos quanto os
negativos em relação à formação e produção de identidades do sujeito, para então
podermos chegar ao termo self esperado de Zhao (2008), o meio termo entre a realidade
e aquilo que poderia ser real que o indivíduo experimenta dentro das redes sociais e que
dá vazão ao desejo de ser diferente, ainda que inicialmente apenas pelo meio virtual.
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alternativa na rota da realidade psíquica, com roteiros imaginários digitalizados que estão
disponíveis a todo o público. (NOBRE E MOREIRA, 2013).
Tomando como referencial as contribuições de Nobre e Moreira (2013), os autores
assinalam que há uma clara analogia entre as formas de conceber e experimentar as
dimensões temporal e espacial, e as características tópicas da fantasia, como as definições
que Freud já havia proposto em seu artigo “O inconsciente”, da seguinte forma:
Se por um lado são como formas altamente organizadas, sem autocontradição
e que utilizam os recursos do sistema Consciente (Cs), por outro lado, são
inconscientes, e portanto, não há como se tornar consciente. Além disso, há
também um ponto de vista tópico da metapsicologia freudiana, na qual a
mobilidade da fantasia, como na realidade virtual, que acaba permitindo a
própria fluidez destes conteúdos oriundos do inconsciente, permitindo ao
indivíduo um maior aproveitamento desse plus vital, de modo que haja um
deslocar das barreiras da realidade material. (FREUD, 1915/1996, v.14, p.195
apud NOBRE e MOREIRA, 2013).
Freud começa seus trabalhos impulsionado pela doença recorrente da sua época:
a histeria. Tais manifestações histéricas fizeram Freud buscar sua própria ideia de verdade
acerca do tema. Inicialmente, movido pelos relatos das pacientes, nos quais traziam
situações de abuso sexual que teriam sofrido, Freud então elabora a teoria da sedução.
Neste momento, a verdade do sujeito estaria no trauma sofrido por ele, o qual, por sua
vez, seria o causador do sintoma e que estaria sendo reprimido e precisaria vir à
consciência. A partir da recorrência de relatos de abusos sexuais em seu consultório,
Freud se pergunta se seria realmente possível que todas aquelas pacientes tivessem
sofrido algum tipo de abuso sexual de fato. A verdade, neste instante, é colocada por ele
não mais como uma verdade absoluta, mas como uma verdade produzida pelo sujeito, ou
seja, uma construção imaginária, e é exatamente aí que ele estipula o conceito de fantasia
(ESPEZIM e REMOR, 2009).
Furtado (2016) afirma que, para Freud, em termos de efeito, a realidade psíquica
e a realidade material se indeferem. É, aliás, a realidade psíquica, as fantasias, que tem
palavra final na constituição de uma neurose. Espezim e Remor (2009) seguem por esse
caminho e estipulam que na fantasia o sujeito dispõe de uma liberdade que não estaria
disponível na função da realidade. É a partir do conflito entre os limites do corpo e do
psiquismo do sujeito e o mundo externo que a fantasia emerge. Ferreira-Lemos (2011)
completa o pensamento citando que, para Freud, no inconsciente não há indícios de
realidade, sendo difícil a separação de realidade e ficção, ou seja, no inconsciente se
confundem as histórias que foram vividas de fato, com construções fantasiosas, porém
ambas possuem a mesma capacidade de produzir efeitos.
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As relações estabelecidas entre o sujeito e os objetos são pautadas em divisões, como por
exemplo bom e mau, de forma a não haver uma integração. Já a projeção diz respeito a
identificar nos objetos externos aspectos que são seus, mas não são reconhecidos como
tal. Além disso, a fantasia pode funcionar tanto como defesa contra a realidade como
contra outras fantasias. “Por exemplo, fantasias de um objeto idealizado e de um self
idealizado tanto são fantasias de satisfação de desejo, quanto defesas contra um terror
subjacente.” (SEGAL, 1993. p. 38).
A partir do exposto, podemos concluir com as ideias de Ferreira-Lemos:
O ciberespaço é propício à fantasia porque a tela que se abre para o ‘virtual’,
deixando a ‘realidade’ em suspenso, desterritorializando-se, adentrando o
espaço, também virtual, de uma janela da fantasia. A virtualização assemelha-
se, assim, à fantasia, pois emerge, igualmente, de lacunas na realidade. Tanto
na virtualização quanto na fantasia o sujeito tenta preencher os furos da
realidade, tenta obter satisfação. (FERREIRA-LEMOS, 2011, p. 65)
Além disso, as contribuições de Klein, trazidas por Segal (1993), também nos
auxiliam a agregar e estruturar ainda mais a concepção do conceito de instagramização
da vida. A utilização da ideia do caráter defensivo das fantasias, nos mostra uma das
características da instagramização. Tanto a cisão quanto a projeção, defesas conceituadas
previamente, atuam concomitantemente, de forma a estruturar a realidade
instagramizada. Entre o olhar e a tela, há a idealização de si e do outro e a consequente
divisão do eu. A projeção se insere nesse contexto como plano de fundo. É o
reconhecimento da sua natureza humana imperfeita e, a partir disso, vestir o outro com
as soluções para suas próprias máculas.
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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
1
Snapchat ou Instagram Stories: são aplicativos de redes sociais cujas postagens ficam disponíveis por
apenas um dia e têm limite máximo de duração de dez a quinze segundos.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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