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"Quatro anos é pouco"

É dura, muito dura a vida de escritor _Mestre Cony que o diga. Em sua coluna da última segunda-feira
("Esperando o espetáculo"), liam-se estas palavras: "O PT admitiu explicitamente que a sua meta é um
mandato de oito anos para Lula. Evidente que tem motivos e razões para isso. Quatro anos são pouco. A
Constituição de 88, que diminuiu o mandato de Sarney...".

A ultracorreção fez alguém "intervir" no texto do Mestre para eliminar um "erro" de concordância. Cony
escreveu "Quatro anos é pouco"; em vez disso, publicou-se "Quatro anos são pouco". Não tenho
procuração de Cony, não. Tenho acesso aos computadores do jornal para ver o que o-correu. Lá está o
original do Mestre: "Quatro anos é pouco".

A esta altura o leitor talvez se pergunte o que vem a ser "ultracorreção". Trata-se de termo técnico, assim
definido no "Aurélio": "Preocupação de falar bem que redunda em erro; hiperurbanismo, hipercorreção".

Um caso clássico de ultracorreção é o emprego de "houveram" no lugar de "houve", em frases como


"Houveram dois acidentes ontem" ou "Os a-cidentes que houveram ontem...". Nos dois exemplos, a
forma padrão é "houve" (empregado com o sentido de "ocorrer", o verbo "haver" não é flexionado no
plural).

Os mecanismos que levam o falante a empregar "houveram" nas frases do parágrafo anterior são
explicáveis pela influência do processo adotado com verbos sinônimos. Como se diz
"Ocorreram/Aconteceram dois aci-dentes", acaba-se achando que se deve dizer "Houveram dois
acidentes". Não houveram; houve. Na língua padrão, o verbo "haver" fixou-se como impessoal quando
tem o sentido de "existir", "ocorrer" ou quando equiva-le a "fazer" na indicação de tempo decorrido.

Bem, voltemos ao texto de Cony e à concordância do verbo "ser", que, convém dizer, é osso duro de
roer. Não é à toa que, nas gramáticas e no programa da prova de português de muitos concursos públicos,
o verbo "ser" costuma constituir capítulo à parte.

Pois bem, nesse capítulo das gramáticas, indica-se que, quando tem por sujeito uma expressão que denote
preço, quantidade, medida etc. e por predicativo palavras como "muito", "pouco" etc., o verbo "ser" fica
no singular ("a expressão numérica é considerada em sua totalidade", dizem Celso Cunha e Lindley
Cintra): "Mil reais é pouco para manter uma famí-lia"; "Duzentos reais é muito dinheiro por uma
refeição", "Quatro anos é pouco".

Ao optar por "é", Cony escreveu de acordo com a tradição da língua cul-ta (em que se apóiam as
gramáticas para indicar o que é padrão nesse caso). Talvez por influência do que se faz com a maior parte
dos verbos ("Quatro anos bastam", "Quatro anos passam rapidamente", "Quatro a-nos fazem muita
diferença" etc.), o "interventor" sapecou um plural "sal-vador" no verbo "ser".

Que fique claro, pois: em se tratando de língua padrão, quatro anos é ("era", "foi", "será", "seria") pouco.
Bem, se o leitor preferir, pode colo-car um "não", o que não muda nada, em termos de concordância, pelo
menos ("Quatro anos não é pouco"). É isso.

Coluna publicada no dia 04 de setembro de 2003, no jornal "Folha de S. Paulo".

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